Conto
Conto
Lá estava eu, em mais uma noite de trabalho no restaurante "Delícia". Tinha duas pizzas para
entregar e um hambúrguer duplo.
Sim sou entregador. Entrego todo o tipo de comida rápida em qualquer lugar.
Meus familiares dizem que eu não deveria ter um emprego tão miserável.Mas ajuda-me a ganhar
algum dinheiro e eu gosto do emprego. Exceto a parte dos cães. Estes adoram perseguir-me.
O telefone toca:
- Sim, senhora.
- Já sei...
- Já sabe? Como?
- Bem, dessa hora as pessoas pedem pizza porque o jantar queimou, ou estragou... Enfim e qual a
sua preferencia?
- Pizza de peixe.
- Só isso?
- Sim.
- Sinto que não atendes bem os clientes. Se queres continuar no teu emprego terás de encará-lo
com maior entusiasmo.
- Mas eu trato os clientes bem. Entrego o que há para entregar. Sabe, houve uma cliente que pediu
pizza de peixe, mas não disse qual peixe. Então e se eu lhe der uma pizza de baleia ela terá do
aceitar, certo?
- Baleia é um mamífero.
- Credo, o senhor é dono de restaurante ou professor de biologia! Estou atrasado, por isso tenho de
ir fazer entregas.
Ir de moto fazer entregas é emocionante. Já fiz as primeiras três entregas e agora falta o da cliente
estranha.
- Eu não pedi nada. Mas talvez tenha sido a minha mulher. Com certeza ela queimou o jantar. Oh
Samira! Vem atender!
- Já vou.
- Depressa mulher. Ela não serve pra nada! Nem para cozinhar.
A senhora vem a porta limpando as mãos sujas no avental. Tinha olheiras e parecia cansada.
Impressão minha ou ela tinha hematomas nos braços? O homem saiu esfregando a barriga.
- Claro.
- Porquê tantos hematomas no braço? - Ela tapou-me a boca com as mãos e fez sinal de silencio.
- Não sei! Só queria que ele voltasse a ser o homem que era. Talvez precise de um psicólogo. Mas
receio que ele é perigoso para mim.
- Não. As pessoas não mudam assim. Ele precisa da policia. Tem de ir para a prisão. - Ela baixou a
cabeça. - Não consegue telefoná-los?
- Isso não pode continuar assim. Ele não é o seu pai. Porque não se separam? - Desta vez ela não
teve uma resposta imediata. Pensou e disse:
- Uma ... simpática, ... em querer dar-me gorjeta. Aqui tem a sua pizza de peixe, aproveite.
Fui para a minha mota e arranquei. Que sorte! Ainda bem que inventei isso de imediato. Vejo o
homem a empurrar a mulher para dentro e a fechar a porta. Coitada da mulher. Tenho de a ajudar.
Quando cheguei em casa meu pai estava lendo o jornal enquanto que a minha mãe estava
limpando a sala com aquele aspirador vindo da Espanha. Isso me incomodou.
- Oh eu sei mãe, eu sei que consegues, mas o pai poderia ajudar-te não? (Olho com ar desafiador
para ele)
- Pai!...
- Filho!...
Ah, desisto. Não posso lutar contra meu pai. Afinal de contas, ele é policia. Policia! É isso!
Depois de jantar (o jantar estava delicioso) enviei algumas mensagens no celular. Bati no quarto
dos pais e por sorte a mãe não estava por lá.
- Entra, filho.
- Exato.
- Não, não sou machista. Gosto da tua mãe e ela gosta de mim. E tratamo-nos bem um ao outro.
- Ela não trabalha. Eu trabalho. Então ela limpa a casa, tarefas domésticas. Ajudamo-nos um ao
outro.
- Pai, esquece, não vou discutir. Tenho coisas mais importantes para te dizer.
- Pai, acho que hoje dei de caras com um casal abusivo. O homem bate na mulher. E eu quero ajudá-
la.
- Filho não te metas. Ele pode ser perigoso. Deixa isso para a policia.
- Mas eu preciso.
Fecho a porta dirijo-me ao meu quarto. Não vou desistir. Pego no meu bloco de notas novo. Vou
usá-lo para a minha investigação.
No dia seguinte acordei cedo. Estou pronto para a investigação. Pego na minha moto e vou para a
casa dos alvos.
O dia está calmo. Gosto sempre de dirigir por aquele caminho porque a estrada é limpa e os
passeios possuem canteiros de flores e árvores que dão sombra. O ar é fresco, e consigo ouvir
pássaros cantarem. Tudo isto transforma este subúrbio num paraíso.
Bato a porta.
- Quem é?
- O entregador.
A porta abre. Entro rápido. A casa está escura. Janelas fechadas e televisor desligado.
- Não se preocupe, tenho um plano. Vou arranjar câmeras de segurança. Vai colocá-los pela casa.
- Depois entrego as provas que incriminem o seu marido. (Ela ficou triste quando chamei "marido" a
quem outrora seria um "bom marido".)
- Está bem.
Ela dirige-se para a cozinha. A sala de estar é pequena. Com os típicos sofás de um, dois e três
assentos. Muitos objetos de adorno. Quando digo "muitos" é porque são muitos mesmo.
De seguida, Samira trouxe um copo de água a transbordar. Como estava com sede, bebi tudo.
- Sabes estou cansado. E ainda eu encontro o animal na porta e quase tropeço nele...
- Eu sei, precisas de descansar meu amor. Senta aqui no sofá. Vou preparar o jantar.
- Pequeno almoço...
- Samira o que há. Estás a esconder-me algo. Não gosto que me mintas!
Rastejo pela grama das traseiras da casa. Ainda estou vivo e não quebrei nenhum osso.
A Samira! Ela está a gritar! O que faço. Pego o telemóvel para pôr o gravador. Sem bateria!
Ouço o barulho de socos. Ela pede ajuda. Vidros quebram. Lágrimas saem-me dos olhos. Estou com
medo.
"Computadores lda", a empresa de computadores da minha prima Suellen. Aberto das 08:00 às
12:00 e das 15:00 às 19:00. (Porque é que eu li isto?)
Falei com ela sobre tudo. Ela aceitou ajudar-me. Forneceu-me tres cameras pequenas.
Ainda estou transtornado pelo que aconteceu. Só quero ver como a Samira está.
- Mas porquê?
- Ora porque ... vocês foram o nosso milésimo cliente. Estes objetos são de adorno por isso pode
espalha-los pela casa. Não são lindos?
- Ela? - disse com desprezo - É uma péssima dona de casa. Vou chamá-la.
Ele dirigiu-se para a cozinha. Ela veio triste e quando me viu, recuperou um pouco de animo. Depois
o homem abriu a porta.
E fechou a porta.
- Nem sabia que ele se chamava Pedro. Enfim. Irá colocar estas cameras espalhadas pela casa. Em
locais onde o "Pedro" nunca desconfiaria.
- Vou colocar duas aqui em baixo. Ajuda-me e coloca a outra no corredor lá em cima. Na estante.
Fiz o que ela ordenou. Coloquei-a na estante. Nas paredes do corredor haviam muitos quadros,
mas um chamou-me atenção. Samira e Pedro juntos e felizes. Algo me fez pensar que talvez ela não
queira abandona-lo. Mas temos de fazer escolhas difíceis na vida.
- Não compreendes! Sabes o que é estar sempre em casa a limpar e nunca sair. De ver o mundo pela
janela ou pela televisão.
De não ter amigas para que eu possa desabafar. Ele acha que meus problemas são leviandades.
- Claro que tive. Na escola, no liceu… Eu era a rainha da turma. Tinha amigas a valer.
Depois o Pedro chegou. O rapaz charmoso que toda a garota desmaiava quando passava. Ele
parecia gostar de mim. Gostava dele.... e ainda gosto... Ele elogiava-me e oferecia-me presentes.
- Quando ele começou a afastar-me das minhas amigas. Dizia que elas tinham inveja de mim. Que
eram interesseiras. Dava-me conselhos e eu confiava cegamente. Dependia dele.
- Em qualquer aspeto?
- Sim. O que ele dizia era ordem para mim. Era meu soberano e eu o louvava. E quando ele chateava-
se eu tinha de fazer tudo para lhe agradar.
- E eu ia. Mas no dia seguinte ele apareceu na minha casa com um buquê de flores. Meus pais
estavam por lá e eles acharam sua atitude romântica. Pediu-me desculpas e disse que estava
incomodado com algo.
- É disto que eu temo. Não tenho coragem para sair na rua sem o Pedro me dizer onde vou e porquê
vou. De colocar os pés no chão, sentir o ar fresco e viver por conta própria.
- Ninguém merece ser o objeto de alguém. Juntos colocaremos este homem na prisão.
- Bem, estou a sair. Se precisar de alguma coisa ligue para o Restaurante Delícia.
- Mas tens de escolher. Quanto mais cedo, melhor. A propósito, acho que davas um bom juiz.
- Juiz? Não, que horror. Para colocar pessoas na cadeia... e quando eles saírem? Vão perseguir-me.
Fecho a porta. Está na hora. Ligo o computador. Abro a aplicação que a minha prima transferiu.
Fantástico, consigo ver das três cameras e com som. Samira está a lavar os pratos. Consigo ver
tristeza no seu rosto. Tristeza e medo. Essa camera mostra a cozinha e o quintal. Através do vidro
vejo um cão enorme ( um pitbull talvez )
Da segunda camera vejo a sala de estar vazia e triste. Da terceira vejo o corredor lá de cima.
Oh não. Fui descoberto. Porque é que ele não bate a porta de vez em quando.
- Pai, eu...
- Pai, escuta-me tenho um plano. Vou dar as cenas à policia. O homem é detido e todo o mundo fica
bem.
Espera, ele trancou-me no quarto? Puxo a maçaneta. Nada! Estou farto dele... Espera... Ouço
gritos... Oh não! A Samira! Ele está a sufocá-la com as mãos à volta do seu pescoço. Tenho de gravar.
Mas não sei como. Talvez minha prima amanhã possa ajudar-me.
O Pedro parou. Pensou. Foi para a sala e de seguida para o corredor. E... está a olhar para mim!
Quebrou as cameras uma por uma. Por um instante meu ecrã estava preto.
No dia seguinte acordei cedo e fui para a empresa com todos os equipamentos. ( Sim, depois o pai
destrancou a porta. )
Felizmente minha prima conseguiu recuperar a cena e a transferiu para uma pendrive. Já tenho
provas agora é só ir à policia. Mas vou primeiro para casa. Por as ideias no lugar.
Toco a campainha.
Não acredito...
- Olá entregador.
- O emprego que estás sempre a faltar? Nesses últimos dias telefonei para o teu trabalho para pedir
sanduíches e disseram que entregas não estavam disponíveis. Talvez estivesses demasiado ocupado
com algo.
- Oh sim. Ele está a investigar um homem que parece cometer violência baseada no género! - Pedro
sorriu satisfeito.- E não me perguntes como descobri, filho!
- Faço-te a mesma pergunta. Não te metas na minha vida. Senão pagarás caro!
- Sabes que mais, não! Estou farto dela e penso arranjar outra.
- Porque ela pode ser um perigo se andar por aí à solta. Agora rapaz faça-me um favor, não dê uma
de esperto comigo. Espero que não esteja a gravar o que eu digo.
- Passear meu cão. Eu sei que soa ridículo, mas pago 5 mil escudos por semana.
- Uau. Mas não quero. Não quero passear um pitbull e correr o risco de ser devorado por ele.
- Parece que tenho de ir. Agradeço o seu café minha senhora. O seu filho não quer o meu emprego.
- Então não tenho escolha. - ele tirou algo da sua bolsa. Nesse momento eu saltei do sofá e corri para
longe.
Nesse momento a porta foi aberta. Meu pai surgiu com um revólver nas mãos.
Nesse momento, num ato de desespero Pedro dirigiu-se para minha mãe com a faca levantada. Mas
meu pai foi mais rápido e deu um tiro nele.
E agora Pedro estava deitado no chão com um furo no peito. Meu pai foi tirou a faca de suas mãos.
- Eu contei. – minha mãe disse vitoriosa. - A princípio pensei que ele era um bom homem. Mas
depois eu ouvi tudo da cozinha. Esqueceram-se que a cozinha tem uma abertura para a sala?
Telefonei para o teu pai logo.
E assim que tudo terminou. Fomos à casa da Samira, e contamos tudo o que se passou. Ela deu um
grito de felicidade, o que é estranho pois pensei que ela ainda amava o marido. Agora ela sairá pelas
ruas livremente.
Eu e o pai reconciliamo-nos. Fui despedido do trabalho por faltar muitas vezes. Mas estou feliz!
Feliz porque sei qual será o meu curso. Vou ser deputado e lutarei pela igualdade de género no meu
pais.
Bem, é o fim!