O Realismo
O Realismo
O Realismo
Foi nessa época que Charles Darwin publicou seu livro A origem das espécies (1859),
cuja teoria evolucionista influenciou diversas áreas do saber, incluindo a literatura. A
ideia de que os seres vivos passam por um processo de seleção natural, que determina as
espécies que sobrevivem e as que são extintas, estendeu-se para a dimensão das relações
humanas: é o chamado darwinismo social.
Outra teoria em voga na época era o determinismo científico, que entendia que o
comportamento humano é determinado pelas condições do meio, outro pensamento
preconceituoso à serviço da estratificação social.
Filhos de seu tempo, os realistas abraçaram a ciência como grande patrona do século
XIX, substituindo as idealizações e anseios de liberdade do romantismo por uma
postura analítico científica, dissecando a realidade que se via em constante
transformação.
Características do realismo
Valorização da objetividade e dos fatos.
Impessoalidade, apagamento das ideias do autor.
Descrições de tipos sociais ou situações típicas.
Fim das idealizações: retratos de adultério, miséria e fracasso social.
Prevalência das formas do romance e do conto.
Frequentes críticas às hipocrisias da moralidade da nova classe dominante, a
burguesia.
Aceitação da realidade tal como ela é, em oposição aos anseios de liberdade dos
românticos.
Esteticismo: linguagem culta e estilizada, escrita com proporção e elegância.
Tentativa de explicar o real, recorrendo muitas vezes à ciência ou ao
determinismo.
Abordagem psicológica das personagens como composição da realidade que
veem.
Realismo na Europa
Nascido na França, herdeiro dos romances de Balzac e Stendhal, o realismo consolidou-
se como movimento literário a partir da obra de Gustave Flaubert. Flaubert é
considerado o pai do realismo. Sua Madame Bovary (1857) foi um escândalo à época,
pois centrava o enredo em Emma, uma moça sonhadora que esperava encontrar no
matrimônio a grande realização de sua vida, mas, ao desposar Charles Bovary,
desencanta-se rapidamente com o casamento e com a mediocridade do rapaz, um jovem
cirurgião sem talentos e de mentalidade obtusa.
O principal romancista do realismo português foi Eça de Queirós, que além de escritor
era diplomata, tendo viajado para diversos lugares, como Cuba, Egito e América do
Norte. Sua obra pode ser dividida em três fases: uma de preparação, composta
majoritariamente por produções veiculadas na imprensa (1866-1867) e alguns textos
ainda de cunho romântico; uma de realismo agudo, quando escreve os grandes
romances críticos O crime do padre Amaro (1875/1876/1880), O primo Basílio (1878) e
Os Maias (1888); e uma de maturidade, caracterizada por um humanismo saudosista,
época em que publica A ilustre casa de Ramires (1900) e A cidade e as serras (1901).
No trecho acima, o autor descreve os acontecimentos que se dão logo depois de padre
Amaro tomar conhecimento de que Amélia, moça com quem se via envolvido,
quebrando o celibato, tinha marcado casamento com João Eduardo. A cadência da
linguagem é bela e ordenada, trabalhada com afinco, descrevendo com minúcias o
pensamento do pároco, desde a preocupação com sua posição na Igreja até as
“picadinhas na consciência”.
Realismo no Brasil
Enquanto o movimento europeu era norteado pelas mudanças do avanço industrial, que
já alçava sua segunda etapa, o Brasil, por sua vez, iniciava um lento processo de
modernização, atravancado pelo ranço colonial que se mantinha na política do Segundo
Reinado e na manutenção da mão de obra escrava. Em sua maioria, os escritores
realistas brasileiros foram republicanos e abolicionistas, não raro abordando em suas
obras esses ideais.
Aluísio Azevedo
Aluísio Azevedo, contudo, diferencia-se dos outros dois por sua estética de tendência
naturalista. Corrente literária fundada pelo francês Émile Zola, que, embora se
assemelhe ao realismo e intente uma visão objetiva da realidade, tem características
próprias: no Naturalismo prevalecem as descrições animalescas da personalidade
humana, a abordagem patológica das personagens, a ênfase nos instintos, perversões
e comportamentos sexuais, bem como a explicação dos fatos apoiada no determinismo
científico. É o caso das obras Casa de pensão (1883) e O cortiço (1890), célebres
produções de Azevedo.
No trecho a seguir, o autor narra o amanhecer no cortiço. A caracterização de homens e
mulheres como machos e fêmeas, aglomerados num “zunzum”, molhando o pelo, bem
como a escolha dos verbos “fossando e fungando” e as crianças “se despachando ali
mesmo”, sem uso das latrinas, remete ao comportamento humano relacionado às
excrescências, elemento natural que nos aproxima da vida animal.
Raul Pompeia
A seguir, trecho que ilustra os dizeres do diretor Aristarco ao interceptar uma carta de
um aluno para outro, revelando também a condenação moral a que estava submetida a
prática homossexual na época:
Machado de Assis
Machado de Assis, por sua vez, é aclamado como o maior escritor brasileiro de todos
os tempos, principalmente pela riqueza com que explora as técnicas narrativas e pelo
retrato apurado da psique humana. Autor de romances, contos, crônicas, peças de teatro
e textos de crítica literária e teatral, além de poesias, sua prosa realista, que lhe rendeu
o posto de glória na literatura brasileira, passou a ser produzida a partir de 1870.
Desse modo, a realidade, matéria-prima da estética realista, não é feita apenas de fatos,
mas de como as pessoas percebem esses fatos. Assim, a narrativa machadiana é repleta
de interferências, fluxos de pensamento, memórias, digressões de todos os tipos, o que
aproxima a prosa da maneira como a mente de fato funciona.
Machado também é dono de um humor peculiar e de uma ironia sutil, presentes em
boa parte de sua obra, dando a situações críticas uma certa leveza, e faz uso frequente da
metalinguagem, ou seja, refere-se à elaboração do livro no próprio livro, como no
exemplo a seguir: