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em design, arte e
arquitetura
Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 2-3. ISSN: 1984-5596 v. 17, n. 1, Janeiro 2024
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arcos design
Fechamos mais uma edição reafirmando o compromisso da revista Arcos
Design de se manter atenta às produções significativas no campo do Design
ampliado e atravessado por outras áreas e saberes, refletindo o que nomea-
mos aqui como “emergências do presente”.
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Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 2-3. ISSN: 1984-5596
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expediente
Endereço
Rua do Passeio nº 80, Centro, CEP 20021-290. Rio de Janeiro, RJ
[email protected]
Editor Executivo
Tarcísio Martins Filho, ESDI/UERJ
bolsistas
Camila Niemeyer, ESDI/UERJ
Carlos Alberto Fernandes, ESDI/UERJ
Gabriela Dionizio, ESDI/UERJ
Raiane Cardoso, ESDI/UERJ
Renan Bentes, ESDI/UERJ
Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 4-7. ISSN: 1984-5596
v. 17, n. 1, Janeiro 2024
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Avaliadores
Alexandre Farbiarz, UFF Luiz Saboya, ESDI/UERJ
Almir Mirabeau, ESDI/UERJ Maíra Lacerda, UFF
Ana Maynardes, UNB Márcia Bergmann, PUC-RIO
André Monat, ESDI/UERJ Márcio Guimarães, UFMA
Anelise de Carli, APPH Marco André Mazzarotto, UTFPR
Bruno Sergio Oliveira, ESDI/UERJ Marina Sirito, ESDI/UERJ
Camila Assis, UFRJ Marisa Maass, U.PORTO
Carina Martins, ESDI/UERJ Noni Geiger, ESDI/UERJ
Caroline Muller, UFPR Paula Camargo, ESDI/UERJ
Cristine Nogueira, PUC-Rio Priscila Andrade, PUC-RIO
Daniel Portugal, ESDI/UERJ Raquel Ponte, UFRJ
Denise Portinari, PUC-RIO Roberta Portas, PUC-RIO
Fabiana Heinrich, EBA/UFRJ Romulo Guina, UVA/RJ
Flavio Sabrá, IFRJ Rosana Alexandre, PUC-RIO
Guilherme Altmayer, ESDI/UERJ Tiago Silva, UNB
Guilherme Xavier, PUC-RIO Wagner Rufino, ESDI/UERJ
Gabriel Schvarsberg, ESDI/UERJ
Glaucineide Coelho, ESDI/UERJ
Humberto Costa, PUCPR
India Mara Martins, CONCORDIA
Joaquim Redig, UERJ
Jofre Silva, UFRJ
Júlia Rabetti, UFF
Julieta Sobral, PUC-RIO
Lindsay Cresto, UTFPR
Lucy Niemeyer, UFRJ
Luiz Agner, PUC-RIO
Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 4-7. ISSN: 1984-5596
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Sumário
2 Editorial
artigos temáticos
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Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 4-7. ISSN: 1984-5596
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102 Fazer coisas é contar histórias: mapeamento
sistemático sobre o conceito de narrativa na
dimensão do design e dos saberes artesanais
Luiza Gomes Duarte de Farias (UFMA, Brasil)
Raquel Gomes Noronha (UFMA, Brasil)
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Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 4-7. ISSN: 1984-5596
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Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 8-26. ISSN: 1984-5596
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Design, cidade e a leitura do sensível:
premissas epistemológicas para práticas
do design em ambiências urbanas
Abstract: This article aims to present the fundamentals of design that guide
design practices while immersed in urban atmospheres. To this, it goes through
reflections regarding the design and city interface in order to elucidate the
concept of urban atmospheres and, thus, highlight the epistemological bases of
this design for ambiences. The research undertakes a qualitative investigation,
in which the methodology adopted was the literature review. It is expected to
build a dialogue in which, having the designer as an interlocutor, it is possible
to think and design in the city from a sensitive reading of urban atmospheres.
It envisions, therefore, a space for the designer when (re)thinking cities.
Keywords: Design, City, Urban Atmosphere, Episteme.
figura 1. Caracterização das ambiências urbanas. Fonte: Thibaud (2000, p.105) tradução da autora.
Já que uma ambiência nos leva a refletir sobre tipos de experiência, per-
cepção e ação em determinados e específicos contextos, podemos dizer
que sua definição está muito mais próxima do campo empírico do que
teórico. Por isso, ultrapassar as amarras que tornam as ambiências ob-
jetos explicitados simplesmente pela junção de descobertas e conceitos
definidores tem sido, há algumas décadas, um mote (DUARTE, 2013, p.1)
as primeiras três pistas que tentam esclarecer a ambiência (quais são seus
usos?), avaliar as consequências práticas desse conceito (quais são seus
efeitos?) e revisar os contextos de pensamento nos quais ela está basea-
da (quais são os desdobramentos?), abrem caminho para uma ecologia
pragmática da cidade sensível. Assim, a questão não é tanto perguntar, de
uma vez por todas, o que é uma ambiência, mas sim refletir sobre o que
ela faz e em que ela se torna, e o que ela provavelmente afetará e trans-
formará quando for experimentada e testada concretamente em situa-
ções atuais (THIBAUD, 2010, p.14).
Dessa forma, a partir de Nogueira (2018) entende-se que esse design para
as subjetividades pode firmar-se como uma polícia ou uma política, sendo
a última um meio coerente de se produzir rupturas na ordem sensível e por
isto, inovação e impacto social. O autor postula que o design enquanto ar-
ticulador das subjetividades como política orienta “a produção de pequenas
fissuras na ordem do sensível, que desloquem os sujeitos de sua identida-
de e daquilo que os fixa a si próprios, abrindo potência para a emergência
contingencial de singularidades” (NOGUEIRA, 2018, p.8). Enquanto polícia,
Para Nogueira (2018, p.12) “o problema da política tem que passar pela
estética, e é através dela que o design performa suas articulações simbóli-
cas e materiais”. Impasse que orienta uma resposta efetiva para a leitura das
ambiências, que para Thibaud (2010, p. 10) “restitui o lugar dos sentidos
na experiência dos espaços vividos; permite caracterizar nossas formas de
experienciar a vida urbana; ela auxilia também a imaginar e criar espaços
urbanos e arquitetônicos”.
À vista disso é relevante a consolidação de um delineamento ontológico
desse design para ambiências urbanas, de modo a orientar uma atividade
Considerações Finais
Considerando a abrangência dos conceitos empreendidos e os visíveis gan-
hos para a realidade da prática e da pesquisa em design espera-se aprimo-
rar as aproximações já realizadas de modo a estreitar e consolidar o diálogo
acadêmico de um design sensível para ambiências urbanas. Vislumbra-se,
portanto, um amplo espaço para o designer ao se pensar e repensar as ci-
dades no que tange as leituras estético-simbólicas inerentes à práxis do de-
signer. Crê-se que a orientação ao ser humano empreende ao design uma
série de responsabilidades que, se bem aplicadas, são capazes de promover
leituras sensíveis e respostas eficientes ao espaço urbano, o que ocasionará
ambiências adequadas, pertencimento e uma série de ganhos para a vida
nas cidades.
É necessário, portanto, debruçar sobre os pontos de contato da pesquisa
e do projeto em design de ambientes a partir do entendimento de ambiên-
cias e dos impactos dos ambientes nas pessoas, assim como são estudados
os impactos das pessoas nos ambientes. Há, pois, a necessidade de se pensar
em políticas de design a partir das ambiências e o primeiro ponto para tal,
empreende a sistematização e o desenho de ferramentas e orientações para
as investigações que têm como finalidade as bases sensíveis para este design.
Referências
ANDRÉS, Roberto. A dupla exclusão: como a quarentena joga luz sobre
as crises do clima e das cidades. In: Revista Piauí. Edição 165, online.
Junho, 2020.
GEHL, Jan. Cidades para pessoas. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2015.
GEHL, Jan; SVARRE, Birgitte. A vida na cidade: como estudar. São Paulo:
Perspectiva, 2018.
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DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.78892
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Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024,, pp. 27-42. ISSN: 1984-5596
v. 17, n. 1, Janeiro 2024
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27
Mobiliário urbano e arte pública em tempos
de ressignificação do espaço público
Abstract: The year 2020 marked the beginning of the circulation of the Cov-
id-19 disease and a new way of meaning life in cities through an emergency
and strategic emptying of public space. The aim of this article is to analyze how
urban furniture and public art stand out in these times of pandemic as ma-
terial and symbolic evidence to think about new and old questions about the
importance of public space for the constitution of the public sphere. Through
literature review, selection of news in the media and systematic observation
of living in the spaces, it is verified that urban furniture and public art have
become key pieces in recent actions that take place in public spaces of sever-
al cities around the world, as the creation of new elements to meet demands
for hygiene, shelter from bad weather and, above all, to claim the subjective
dimension, as in the case of the removal of monuments and sculptures of con-
troversial historical personalities. It is concluded that this diverse set of urban
elements claims to the public space its condition of arena for discussion of so-
cial issues that enlarge the democratic status.
Keywords: Urban furniture; Public Art; Public Sphere; Contemporary City.
4.Considerações finais
A pesquisa hemerográfica e empírica revelou múltiplas facetas dos espaços
públicos em diversas cidades em tempos de pandemia. Algumas iniciati-
vas se destacaram pela presença de elementos urbanos e artísticos que têm
conseguido agregar pessoas e valores pautados em ações em prol da vida.
A apropriação dos espaços públicos se apresenta como a melhor estratégia
na busca pela qualidade de vida nas cidades e a sua ressignificação se mos-
tra como o caminho para essa conquista. De fato, as experiências apresen-
tadas se mostram como referências positivas e possibilidades viáveis e reais
no processo de construção de cidades com espaços públicos ressignificados.
E mais, as crises, sejam sanitárias, ambientais, políticas, econômicas ou de
segurança se apresentam como uma convocação para que se reexamine a
maneira como agimos e vivemos. Para os planejadores urbanos, gestores,
arquitetos e urbanistas o momento atual é uma oportunidade para rediscu-
tir e repensar as cidades em prol de novas diretrizes para transformação do
ambiente urbano e melhoria da qualidade de vida de sua população, vul-
nerável, sobretudo.
Nos espaços públicos ocupados pelos sujeitos, à arte pública e ao mobiliá-
rio urbano somam-se camadas de subjetividade capazes de provocar tanto
estreitamentos quanto distanciamentos. Uma leitura individualizada desses
espaços revela angústias, temores, esperança, desejos, e um sem-número de
5.Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com o apoio do CNPq, Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Brasil.
Referências
ARANTES, O. et al. A cidade do pensamento único: desmanchando
conceitos. Petrópolis: Vozes, 2000.
AUTOR, 2003.
GEHL ARCHITECTS. Public Space & Public Life during COVID 19.
Copenhague, 2020. Disponível em: https://covid19.gehlpeople.com.
Acesso em: 22 jul 2020.
RIO de Mãos Dadas: ‘Mãos gigantes’ se unem nas ruas do Rio de Janeiro.
SESC RIO, Rio de Janeiro, 26 fev 2021. Disponível em: https://www.
sescrio.org.br/noticias/institucional/rio-de-maos-dadas-maos-gigantes-
se-unem-nas-ruas-do-rio-de-janeiro/. Acesso em: 16 mar 2021.
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DOI: https://doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.78876
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Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 43-59. ISSN: 1984-5596
v. 17, n. 1, Janeiro 2024
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43
A estética do não lugar: a paisagem urbana como
imagem efêmera e a partilha do sensível
Resumo: Por meio de revisão bibliográfica das teorias de não lugar de Marc
Augé, dos conceitos de estética dos filósofos Terry Eagleton e Jacques Ran-
cière, dos pensamentos sobre cidade de David Harvey, Lucrécia Ferrara,
Otília Arantes, Rem Khoolhaas, e os estudos sobre imagens e artes de Didi-
-Huberman e de Merleau-Ponty, o artigo é construído, partindo da concei-
tualização dos lugares de passagem contemporâneos (“não lugares” de Marc
Augé), e se desenvolve expondo reflexões teóricas, articuladas às demais
fontes que ajudam a fundamentar os paralelos traçados entre os “não luga-
res”, com centro comerciais de rua, o modus operandi da publicidade gráfica
efêmera contida nesses locais, e o crescimento urbano neoliberal contempo-
râneo. Por alto, aqui, pensamos a paisagem urbana como imagem efêmera
partilhando mensagens e experiências sensíveis lacunares, mas ao mesmo
tempo, quase que comuns às sociedades de cultura ocidental do mundo glo-
balizado e das “altas” tecnologias. Percebemos a mimetização da linguagem
do poder hegemônicos no aparato visual dos centros comerciais urbanos e
buscamos fazer emergir questionamentos econômicos, políticos e sociais.
Palavras-chave: Não lugar; Estética; Paisagem urbana; Urbanismo; Lin-
guagem visual
[…] nossa relação com as coisas não é uma relação distante, cada uma
fala ao nosso corpo e à nossa vida, elas estão revestidas de característi-
cas humanas (dóceis, hostis, resistentes...) e, inversamente, vivem em
nós como tantos emblemas das condutas que amamos ou detestamos.
O homem está investido nas coisas, e as coisas investidas nele (Merleau-
Ponty, 1948, p. 24).
Referências
ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A Cidade do Pensamento
Único: desmanchando consensos. Petrópolis: Vozes, 2000.
SÁ, T. Lugares e não lugares em Marc Augé. In: Tempo Social - Revista
de sociologia da USP, v. 26, n. 2, 2013.
ww2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/aurora/article/view/4711/3 442.
Acesso em: 3 de jun. de 2023.
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DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.78832
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Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 60-78. ISSN: 1984-5596
v. 17, n. 1, Janeiro 2024
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60
Queer designers: Experimentações não-
conformativas na geração de uma rede dissidente
Abstract: This study aims to create a network of queer designers with the
purpose of experimenting methods set out to challenge normative design bi-
ases about gender and sexuality. Queer-only design workshops were conduct-
ed with the goal of bringing together designers to discuss alternative strategies
to strengthen the knowledge base within the gender non-conforming creative
community. The research method sought to establish strategies that could ac-
count for queering design practices plus proposing non-binary ways to confront
power/knowledge design structures. The results include an in-depth critical
essay based on queer theory and design history and other thoughts evoked by
the group members. The aim is to continue the counter-normative strategies
experimented with, in order to support an open and dynamic process of de-
signing thinking. In conclusion, this study points out ways to provoke debates
and stimulate subjective production in the design field by LGBTQIA+ non-nor-
mative bodies.
Keywords: Queer designers, Design Anthropology, Design workshops.
2. Metodologia
Para fundamentar métodos que possam dar conta de uma queerização da
prática de design é preciso agir de forma contra-normativa às suas estruturas
de saber/fazer. Design Anthropology foi pensado como o meio que possibilita
uma interdisciplinaridade da pesquisa em design ao instigar o olhar para a
antropologia. Nessa perspectiva, é possível, enquanto abordagem metodo-
lógica, tirar de foco um design de processos normatizantes e direcionar o
olhar para um design voltado à pluralidade. Zoy Anastassakis (2013) bus-
ca expandir essa concepção ao indicar que o design pode estabelecer uma
sinergia de saberes com a antropologia, fortalecendo modos de produção
do conhecimento voltados para a vida, agregando as pessoas e formulan-
do meios sustentáveis voltados para os desejos e aspirações humanas. “Para
isso, uma tal antropologia, operacionalizada através de processos de design,
deve ser, sobretudo, experimental e improvisatória.” (ANASTASSAKIS, p. 182)
Ao instigar o olhar para a vida e, consequentemente, para os desejos do
corpo, tal concepção de design se aproxima do propósito desestabilizador
em práticas e pensamentos queer. As bases do Design Anthropology trazem
à tona a subjetividade dos indivíduos que compõem o estudo, para além de
3. Queerizando o design
Em um primeiro momento, para tecer essa complexa discussão que en-
volve design e questões queer, invoco nos dois seguintes tópicos uma forte
influência bibliográfica que acompanhou os estudos de um de seus pesquisa-
dores ao longo de um projeto de TCC. Posteriormente, no último subtópico,
figura 1. A partir da definição dos encontros, foram pensadas estratégias de comunicação para convidar
as pessoas. Cartazes com composição gráfica experimental e impressos em papéis coloridos foram
colados por paredes e muros como uma prática interventiva própria. (fonte: dos autores)
3.3.1 Aproximações
No primeiro encontro do Laboratório de Design Queer, a reunião de nossos
corpos realizou-se em uma sala de aula desocupada no prédio que abriga o
curso de Design da Universidade Federal do Ceará (UFC). Enquanto cada
corpo presente se apresentava, era reforçado o interesse de fazer parte de
um circuito direcionado a corpos invisibilizados em uma estrutura norma-
tizante de design. Enquanto pesquisadores acadêmicos, entendemos que a
junção de sujeitos dissidentes em gênero e sexualidade em um espaço públi-
co abre margem para retaliações, em específico, por um reflexo próprio da
cisheteronormatividade sedimentada nas estruturas sociais em que estamos
envolvidos. Entretanto, naquele momento, a potência de nossa união nos
direcionava para uma trilha de prosperidade e de intensificação de nossas
conexões. Não estávamos mais sozinhes.
Ao todo, foram reunidos 15 participantes para uma roda de conversa e
atividade de colagem. A discussão toma forma à medida que é compreen-
dido que as contribuições de criativos dissidentes sofrem apagamentos sis-
tematizados pela própria história moderna do design. Essa linha de pensa-
mento se soma à concepção de que o design caminhou, por muito tempo,
para uma neutralidade em seu fazer, se distanciando de processos de sub-
jetivação. Os sujeitos engajados na discussão, portanto, pontuaram o seu
sentimento de não pertencimento.
figura 3. Resultados visuais do experimento de colagem-narrativa. Como parte do exercício, foi solicitado que
as imagens construídas fossem narradas a partir de termos. Os meios apontados para compor as narrativas
foram variados, porém se destacam aqui: impacto e desconforto; ambientes higienizados em contraposição
a elementos que incomodam; destruição ao corpo, destruição de memória; narrativa auto-identitária; não
pertencimento; hostilidade; estilhaçamento de corpos; observação de corpos; segregação; corpos que não
fazem parte. (fonte: dos autores)
figura 5. Síntese, em forma de diagrama, dessa nuvem de saberes e fazeres comuns ao grupo, com
o objetivo de constituir uma primeira visualização de possibilidades criativas dentro desse sistema
coletivo. (fonte: dos autores)
4. Conclusão
A discussão e as oficinas descritas não são uma conclusão concreta da
tentativa de formar uma rede-design-dissidência, busca-se encerrar esta
escrita em um desejo de expansão das estratégias contra-normativas ex-
perimentadas. Este processo aberto - não estático - possibilitou um mer-
gulho para as questões que envolvem um design possivelmente queeriza-
do. Paralelamente, a partir do referencial teórico abordado, as oficinas para
queer designers tiveram o papel de buscar formas de tangibilizar e se somar
às discussões críticas instigadas.
Buscou-se nas reflexões geradas pelo relato das oficinas, cumprir com os
objetivos de gerar identificação, fortalecer conexões entre designers dissi-
dentes, elaborar vivências colaborativas a fim de contribuir com uma crítica
ao design e a normatividade e, sobretudo, fortalecer um olhar queer a par-
tir do design. Este processo também teceu argumentos críticos às questões
de binarismos de gênero no design, à conformação do campo ao impulso
industrial, à relação entre o design da “forma e função” e o design univer-
sal e, consequentemente, às questões de poder que envolvem este campo.
O desenrolar da escrita também objetivou compreender sobre a politiza-
ção do campo, da sensibilização por meio da subjetivação, da construção de
processos horizontais e colaborativos, do estímulo a uma pluriversalidade
Referências
ALTMAYER, Guilherme; VERAS, Leno. Design é coisa de veado:
estratégias para o desenho de uma plataforma digital para memórias sexo
e gênero dissidentes. Estudos em Design, v. 29, n. 3, 2021.
MOMBAÇA, Jota. Não vão nos matar agora. Editora Cobogó, 2021.
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DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.78885
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Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 79-101. ISSN: 1984-5596
v. 17, n. 1, Janeiro 2024
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Militância e design na era das plataformas
virtuais: uma análise semiótica da
“memeficação” do engajamento político
2. Análise semiótica
A análise será feita a partir do post referido anteriormente. Dele, foi retirada
a ilustração que o compõe (figura 3). O primeiro passo da análise é identifi-
car a imagem em questão como um signo, sob a ótica da semiótica peircea-
na. Para Peirce (CP, 2228), o signo é um representamen, que representa algo
para alguém (em alguma medida ou capacidade), e que cria em sua mente
outro signo, mais desenvolvido (um interpretante). Esta ordem apontada
na definição já apresenta a estrutura triádica do signo-objeto-interpretante.
7 https://pt.wikipedia.org/wiki/Girl_from_Rio
9 Curiosidades dos bastidores que revelam a locação e o aspecto simbólico do modelo es-
pecífico de ônibus: https://onibusetransporte.com/2021/04/27/cenario-de-foto-de-single-
-de-anitta-frente-de-apache-vip-iv-viraliza-na-internet/. Acesso em 13 de abril de 2023.
10 Até hoje, a segunda canção mais gravada do mundo. A obra, de Tom Jobim e Vinicius de
Morais, tornou-se um Símbolo brasileiro internacionalmente reconhecido. https://oglobo.glo-
bo.com/cultura/garota-de-ipanema-a-segunda-cancao-mais-tocada-da-historia-4340449.
3. Considerações Finais
Embora os critérios de rankeamento e priorização de conteúdos na platafor-
ma estudada sejam parcialmente desconhecidos, é possível observar alguns
efeitos práticos a partir da análise. A referência a temas de repercussão social
acentuada parece ser determinante para o sucesso de uma publicação. Mas
também a forma do conteúdo, com as propriedades semióticas e semioses
proporcionadas, é fundamental para obtenção de uma comunicação efeti-
va, com aderência por parte de uma audiência. Esta aderência, que se re-
vela em forma de concordância, faz parte da construção do perfil social do
autor do post viral. Cabe lembrar que a publicação faz parte do perfil de um
ilustrador e “designer ativista” (como ele próprio se denomina), que possui
um público coeso e numeroso dentro da plataforma estudada, o que pode
contribuir para que suas publicações sejam entregues com mais frequência
na lógica algorítmica do site.
Tudo isso se conecta com o conceito, ainda incipiente, de Política-Selfie.
A ideia-conceito não diz respeito exclusivamente ao retrato narcisista de
um indivíduo diante de um protesto político, mas à reverberação de te-
mas políticos a partir de uma espécie de espetacularização individual, que
parte de perfis reconhecidos e utiliza linguagens amplamente aceitas. Um
Referências
BENTES, Ana. Quase um tique: Economia da atenção, vigilância
e espetáculo em uma rede social. Rio De Janeiro: Editora UFRJ,
2021. 254 p.
LANIER, Jaron. Dez argumentos para você deletar agora suas redes
sociais. São Paulo: Intrínseca, 2018, 192 p.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 79-101. 100
Como referenciar
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DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.78884
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Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. ISSN: 1984-5596
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102
Fazer coisas é contar histórias: mapeamento
sistemático sobre o conceito de narrativa na
dimensão do design e dos saberes artesanais
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 103
1 Introdução
Diante do cenário contemporâneo de crise, torna-se necessário a problema-
tização das práticas projetuais e suas abordagens insustentáveis consolida-
das pelos modos de produção capitalistas. Em meio à turbulência causada
pela intensificação de problemas ambientais, sociais, econômicos e culturais,
abordagens contemporâneas vêm refletindo sobre o fazer design como um
modo situado, incorporado e relacional de responder a contextos particu-
lares, por meio da negociação coletiva em torno do projeto de coisas tangí-
veis e intangíveis (Simonsen et al., 2014).
Neste sentido, valoriza-se o reconhecimento dos saberes e fazeres arte-
sanais tradicionais, assumindo a escolha de contar as histórias que foram
paulatinamente ignoradas e invisibilizadas pela modernidade. Isto repre-
senta uma mudança de eixo nos modos de se conceber a prática e pesquisa
em design, situando e engajando a prática de produção de conhecimento
em seu território (Escobar, 2016).
Ao articular processos coletivos de materialização de formas e constru-
ção de significados, o design pode contribuir na construção e contação das
histórias plasmadas no fazer artesanal, promovendo o reconhecimento de
saberes tácitos e a preservação de heranças histórico-culturais. Sendo assim,
este artigo objetiva o mapeamento teórico a respeito da relação entre de-
sign, práticas artesanais e construção de narrativas, através de uma Revisão
Sistemática de Literatura (Obregon, 2017), que visa o levantamento de da-
dos sobre uma certa temática com base em critérios rígidos para revisão de
obras acadêmicas.
Primeiramente, faz-se uma breve reflexão sobre o caráter ontológico das
práticas de design e sua relação com os saberes e fazeres artesanais. Em se-
guida, descreve-se o percurso metodológico, apresentando os critérios e ín-
dices de pesquisa de dados. Por fim, revelam-se os resultados, no que tan-
ge à descrição e síntese derivadas das categorias apresentadas, indicando as
lacunas no estado da arte e os possíveis alcances da investigação.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 104
globalizados, refletindo sobre o design como uma ferramenta de negação
de futuros e formas de vida.
Historicamente, a constituição do design como campo de saber acompa-
nhou o ímpeto pelo progresso e pela racionalidade dos processos tecno-in-
dustriais, pautados na separação entre o produtor de conhecimento e objeto
de seu saber (Kazazian, 2005). Na América Latina, tal narrativa foi opera-
cionalizada por meio da profissionalização e institucionalização do design
como um saber especializado que levaria à modernização de aspectos “sub-
desenvolvidos” e “atrasados” dos territórios (Escobar, 2014).
Neste contexto, o design moderno foi instrumentalizado como uma prá-
tica assentada em categorias ocidentalizadas, com a racionalização de seus
processos projetuais, a instituição de universalismos e a simplificação de ele-
mentos oriundos de um complexo tecido social e cultural (Escobar, 2014).
A partir do ponto de vista da subalternidade colonial, vários teóricos ini-
ciam um processo de retomada de epistemologias e práticas localizadas,
superando o caráter ocidental de formas de ser, saber e fazer cultuadas em
vários domínios de conhecimento. (Ballestrin, 2013).
O olhar volta-se, desse modo, para modos de fazer coisas que não se ca-
tegorizam dentro do cânone, mas que possuem, em suas performances prá-
ticas, traços e características que podem se enquadrar como formas loca-
lizadas de projetar. Esses “desenhos outros” ou designs com outros nomes,
como conceitua Gutiérrez-Borrero (2020), aludem à produção de coisas a
partir de uma ontologia pluriversal, que reconhece a existência de diferen-
tes formas de design e busca reconstruir mundos duradouros. Segundo o
autor, esse processo “circunscreve os ressurgimentos de sabedorias depre-
ciadas ou ignoradas como fontes de conhecimento válido no mundo mo-
derno capitalista” (p. 269, 2020).
O saber-fazer artesanal pode ser considerado como uma dessas formas
de desenhos outros, pois está particularmente ligado aos modos de conhe-
cimentos incorporados e locais, que são aprendidos através das relações prá-
ticas e da oralidade entre artesãos e aprendizes (Casciani e Vandi, 2022), o
que dificulta o processo de descrição e formalização e o leva a ser ignorado
(Spinuzzi, 2005).
Além disso, o fazer artesanal inclui a dimensão intangível e simbólica do
ato de produção de artefatos, ou seja, técnicas, conhecimentos, materiais e
modos de fazer que são heranças culturais de uma localidade e comunidade
(Gonçalves, 2013). Conforme Noronha e Abreu (2021), o artefato e o pro-
cesso artesanal tornam-se rastros tangíveis de histórias, que se externam e
se tornam explícitas por meio de sua contação: o modo em que os seus pra-
ticantes valoram e comunicam sobre suas tradições e sua ancestralidade.
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O aprofundamento sobre a dimensão ontológica das múltiplas formas de
designs nos oferece pistas para especular sobre as práticas e os produtos do
fazer como vestígios de narrativas incorporadas, isto é, produzidas por tem-
pos, sujeitos, lugares e relações específicas. Em meio a esse emaranhado, o
design se distingue como um modo de tangibilizar tais histórias em formas
condizentes com os modos de vida, os valores e os sistemas simbólicos das
comunidades artesanais.
3 Abordagem metodológica
Neste estudo, realizou uma revisão sistemática de literatura com o intuito
de localizar trabalhos de cunho teórico e estudos de caso acerca do concei-
to e uso de narrativa na intersecção entre design e artesanato. A RSL ofere-
ce uma perspectiva de mapeamento do estado da arte da área de pesquisa,
com base na aplicação de filtros de buscas em bases de dados reconhecidas
cientificamente (Obregon, 2017). Segundo Castro (2001), a revisão siste-
mática compreende uma verificação planejada, que inicia com a delinea-
ção de uma pergunta específica. A fim de respondê-la, utiliza-se métodos
sistemáticos de identificação, seleção e avaliação crítica de dados contidos
em estudos científicos.
O processo sistemático para produção da Revisão Sistemática de litera-
tura abrangeu as seguintes etapas: a) formulação da pergunta de pesquisa
e palavras-chaves; b) localização e seleção dos estudos em bases de dados
eletrônicas; c) avaliação crítica dos estudos com base nos critérios determi-
nados; d) coleta de dados nos estudos selecionados; e) análise, agrupamento
e apresentação dos dados; f) interpretação dos dados; e g) aprimoramento
e atualização da revisão (Castro, 2001).
A primeira etapa do processo de pesquisa sistemática consistiu na deli-
mitação da pergunta de pesquisa. Portanto, foi estabelecido o seguinte ques-
tionamento: como o design e o fazer artesanal se relacionam aos processos
de construção e contação de narrativas?
Em seguida, foi produzido um protocolo para coleta de dados, identifi-
cando os critérios e parâmetros para a pesquisa, como a escolha das bases
de dados, o tipo de documento, a área de concentração, os idiomas e o pe-
ríodo das publicações.
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figura 1. Protocolo de rsl (fonte: Produzida pela autora)
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dos termos em “Qualquer campo”, “Todos os tipos”, “Qualquer idioma” e
“Últimos 10 anos”. No total, foram identificados 200 artigos.
Já na base da Blucher Proceedings, não há como realizar a “busca avan-
çada” como nas demais plataformas, portanto, foram considerados apenas
a inserção dos termos de busca na barra de pesquisa disponibilizada no site.
Assim, verificou-se a existência de 133 artigos. Por fim, na base de dados
da Oasisbr, a pesquisa dos termos foi gerada com base na configuração dos
seguintes filtros de busca: o termo “design” no “título”, “artigo” como “tipo
de documento” e a definição do período entre “2013 e 2023”. Foram iden-
tificados 58 artigos, no total.
Com base nos artigos identificados, partiu-se para primeira seleção, consi-
derando os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos no protocolo da RSL.
Ao fim, foram selecionados 67 artigos na Base CAPES, 16 artigos na Blucher
Proceedings e 12 artigos na Oasisbr. A somatória dos dados deu origem a
95 artigos, que foram analisados de forma mais criteriosa na etapa seguinte.
figura 4. Esquema de inclusão e exclusão dos dados (fonte: Produzida pela autora)
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figura 5. Identificação dos artigos selecionados (fonte: Produzida pela autora)
4. Resultados e Discussões
Nesta etapa, foi produzida a análise descritiva dos estudos colhidos, os quais
foram ordenados em agrupamentos de acordo com os seus objetivos, mé-
todos, abordagens e resultados. Cabe ressaltar que tais categorizações não
se excluem ou impõem limites epistemológicos, visto a possibilidade de um
estudo se associar a mais de uma das ênfases.
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têxteis são, desse modo, analisadas segundo elementos discursivos, como
a presença de metáforas, metonímias, prosopopéia, repetição e sinonímia.
De modo semelhante, Larrea-Solórzano (2019) reflete sobre a transcul-
turação estética e a permeabilidade cultural da produção artesanal do povo
Salasaca, no Equador. Por meio da interpretação dos elementos gráficos pre-
sentes nas tapeçarias nativas, pode-se perceber os processos de mudança que
atravessaram a província de Tungurahu e a atualização dos atributos simbó-
lico-culturais Salasaca através do processo de trocas com agentes externos.
As narrativas visuais impressas nas peças contam processos de apropriação,
ressignificação e rejeição ao processo de transculturação sofrido pelo povo.
No contexto brasileiro, autores como Santos et al. (2022) e Barbosa,
Cavalcanti e Noronha (2022) discutem sobre representações do imaginá-
rio popular e sua relação com o design e o artesanato, examinando como
os discursos e os significados da cultura local são adaptados no processo
de criação artesanal. A figuração desses imaginários no processo criativo
de designers e artesãos se apresenta nos estudos dos primeiros autores, que
examinam os usos e reflexos do repertório visual da região amazônica em
artefatos artesanais contemporâneos. Já Barbosa, Cavalcanti e Noronha
(2022) compreendem o design como uma ferramenta para a análise da nar-
rativa intrínseca ao objeto, tendo como foco as especificidades discursivas
e semióticas dos suvenires artesanais do Alto do Moura - PE. Aqui, as for-
mas antropomórficas e as cenas representadas nas peças contam memórias
e histórias comuns ao cotidiano da localidade, que possibilitam a conexão
social entre os produtores e os consumidores.
Alguns estudos também sinalizaram o potencial dos processos de parti-
cipação em torno do fazer artesanal, a fim de produzir discursos sobre pro-
cessos histórico-culturais e subjetivos, como o caso de Eliçabe (2020) e sua
investigação sobre a produção têxtil de mulheres migrantes no Sul global.
Na visão da autora, os artefatos têxteis examinados possuem a capacidade
de narrar a identidade das mulheres através da ligação entre a tangibiliza-
ção visual e das representações verbais. Sendo assim, faz-se a interpretação
comparativa da associação entre os elementos da linguagem visual presen-
te nas peças e as enunciações que emergem ao convidar as artesãs a relatar
os significados impressos na materialidade.
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nossa). Nesta categoria, os estudos sinalizaram de maneiras diversas a po-
tência das narrativas como um dispositivo de especulação capaz de fabricar
situações para transformação social através de materialidades e processos
de design.
Rosner et al. (2018) investiga os processos generificados do artesanato
encobertos pela produção digital no design e na engenharia da computa-
ção, desafiando a diferenciação entre trabalho digital (cognitivo, masculi-
no, inovador) e o trabalho manual (feminino, corporal, desvalorizado). Este
processo de recuperação histórica se baseia no reconhecimento do traba-
lho oculto das mulheres que teceram à mão os dispositivos de memória dos
computadores da NASA, utilizados na Missão Apollo durante a Guerra Fria.
O caminho metodológico da pesquisa associa as práticas do design espe-
culativo e os recursos arquivísticos, por meio do processo de cocriação de
um quilt (tomado como um artefato de design historicamente informado).
Com o objetivo de reconstruir a história da memória do núcleo magnético,
os participantes da pesquisa são convidados a experenciar as técnicas em-
pregadas pelas mulheres na época. Assim, é possível revisitar práticas que
desapareceram, mas que possibilitam a reflexão e especulação sobre futuros
alternativos na prática e pesquisa em design.
Kuthy e Broadwater (2014) entendem as histórias como instrumentos
para tomada de decisão e construção da identidade. Para as autoras, uma
narrativa é uma reunião de saberes situadas capaz de estimular a agregação
coletiva e a habilidade de atenção e resposta do espectador.
Esta ideia é compartilhada por De Rosa, Tassinari e Vergani (2021), que
acionam processos de design especulativo e design participativo, através de
processos de visualização de futuros para o debate sobre questões urbanas e
o engajamento cidadão. Nesse sentido, investe-se na cocriação de um jogo
como um artefato capaz de desencadear diálogos coletivos sobre práticas
futuras e atuais, incentivando a narração coletiva entre os participantes.
A dimensão processual da pesquisa merece destaque, tendo em vista a
articulação entre as seguintes etapas: 1 - coleta das histórias dos cidadãos; 2
- construção do artefato narrativo, que traduziu para o nível abstrato e sim-
bólico as diversas histórias colhidas (por exemplo, pessoas, ações e lugares
tornaram-se personagens, eventos e cenas); e 3 - a experiência do jogo co-
letivo, que percorreu as atividades de construção do mundo comum (pro-
dução de uma visão da cidade compartilhada) e a cocriação de uma história
no contexto da cidade fictícia (abstração dos pontos de vistas em dimensões
temporais e espaciais específicas).
Uma outra face da prática fabulatória se encontra no modo em que auto-
res como Hofverberg (2020) e Jukes (2020) experimentam práticas de fazer
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 111
coisas, através da especulação sobre as histórias que os materiais contam em
seus entrelaçamentos entre pessoas, coisas e lugares. Estes exercícios se ali-
nham com visões críticas da sustentabilidade, que questionam a centralidade
do humano, dando atenção à vida material das coisas e dos seres e buscan-
do modos alternativos de responder à insustentabilidade no Antropoceno.
A partir de um estudo exploratório, Hofverberg (2020) reflete sobre as
relações humano-materiais no processo de aprendizagem, observando os
efeitos do encontro com a materialidade na criação de coisas. Para tanto, a
autora se vale do conceito de conhecimento narrativo de Tim Ingold (2011),
como um processo de construção de significado que emerge de uma prática
de correspondência como um fazer específico e que depende de uma conti-
nuidade entre a prática passada, prática atual e o propósito/resultado espe-
rado, mas não prescritos. Sobretudo, a narração textual e gráfica do proces-
so criativo de reciclagem serve como um modo de refazer os fios históricos
dos materiais e possibilita a reflexão na prática sobre os emaranhados nos
quais os materiais e humanos vivem e aprendem juntos.
Ao narrar o processo de fazer de um remo, Jukes (2020) também espe-
cula sobre as histórias ecológicas dos materiais e dos corpos que interagem
com eles. Para o autor, preocupar-se com as histórias amplas e situadas das
quais os materiais fazem parte amplia o diálogo ético sobre os problemas
ambientais “indo além da materialidade direta da madeira para outras ques-
tões correlatas” (p.1747, tradução nossa). Considerar a agência narrativa dos
materiais requer um modo de contar que se aproxima da ficção e, nas pala-
vras do autor, as histórias não nascem individualmente, mas com os múl-
tiplos outros. Dialogando com Ursula K. Le Guin (1989) e seu conceito de
narrativas contínuas como “bolsas”, que colecionam histórias da vida e dos
fazeres cotidianos, a história sob o viés ecológico oferece uma alternativa
às histórias lineares dos heróis, isto é, as narrativas hegemônicas que conti-
nuam a ser contadas como perspectivas únicas nos diversos campos do saber.
O fazer do remo e a correspondência com a materialidade estimula o dis-
curso, pois histórias emergem continuamente do fazer. “De onde veio seu
pedaço de madeira? Qual era a vida dele antes de tomá-lo em sua posse?
Qual dos lugares de onde a árvore pode ter vindo?” (Jukes, 2020, p. 1758,
tradução nossa) são perguntas que percorrem a experiência e especulam
sobre a vida dos materiais e artefatos que habitam o mundo. Na dimensão
ontológica da prática de design, estas questões evocam alternativas possí-
veis sobre como nossas práticas podem contribuir na construção de mun-
dos mais regenerativos.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 112
4.3. Narrativas como registros sociohistóricos
A reunião de artigos aqui analisados percorreu a ênfase nos processos so-
ciais, históricos e culturais das narrativas e seu papel em preservar a autono-
mia identitária de sujeitos e comunidades que exercem a atividade artesanal.
Mier y Terán e Barrera (2019) refletem sobre o caráter ontológico do de-
sign, examinando como as narrativas reproduzidas através das ferramentas
e objetos moldam noções de território, memória, história, linguagens e va-
lores. Os autores pensam junto aos materiais e artefatos artesanais - especi-
ficamente, o barro e as louças cerâmicas - e suas formas de plasmar modos
de vidas alternativos aos hegemônicos. A partir da ideia de autonomia e
pluriverso (Escobar, 2016), valoriza-se a autossuficiência e autodeterminação
de comunidades, que reproduzem saberes adequados à escala e em relação
com o ambiente, às necessidades reais, o corpo e o espírito. O estudo objeti-
va reconhecer a multiplicidade de designs, refletindo sobre o que a interde-
pendência inerente a estas práticas nos ensina sobre nossos modos de fazer.
De modo semelhante, MacDonald (2020) debate a partir de uma perspec-
tiva histórica, crítica e politizada das narrativas que emergem das práticas
e objetos de design, investigando as dinâmicas de poder, trabalho e gênero
intrínsecas às histórias das ferramentas utilizadas na construção de obje-
tos pelo povo indígena Tla'amin, do oeste do Canadá. Segundo a autora, as
histórias das ferramentas são pistas para entender como, ao longo dos sécu-
los, a comunidade defendeu “a agência em suas próprias histórias, fazendo
coisas em resposta às mudanças nas circunstâncias históricas e aos impac-
tos mutáveis do colonialismo” (p.6, tradução nossa). O foco no estudo das
ferramentas, como o fuso e o furador, desloca o foco dos objetos acabados
para reconhecer as histórias implícitas dos processos de feitura artesanal,
que evidencia os movimentos constantes de negociação e adaptação frente
às trocas com comunidades externas.
Com base nas narrativas de descendentes indígenas que resgatam estes
fazeres artesanais como formas de pertencimento, fazer coisas é fazer histó-
rias, não apenas construindo símbolos identitários, mas fornecendo oportu-
nidades de inserção socioeconômica em um novo tempo e de reinterpreta-
ção de experiências passadas. As materialidades que atravessam as práticas
artesanais constituem fontes históricas valiosas graças a sua capacidade em
narrar as especificidades sociais, culturais e ambientes de um certo modo
de viver, bem como as relações conflituosas entre os atores internos e ex-
ternos a certa localidade.
Em um contexto distinto, Arantes (2020) traz à tona a questão da tempo-
ralidade do artesanato e como esta se reflete nas narrativas sociais de gêne-
ro construídas pelas particularidades de certos fazeres. A autora esclarece
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 113
como a relação entre materialidade, corpo e questões sociais estrutura uma
noção diferente de tempo, pois o fazer com os materiais está sempre em
correspondência às situações cotidianas comumente vivenciadas por mu-
lheres, como a dupla jornada de trabalho, os trabalhos domésticos e o cui-
dado com os filhos.
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com o outro, gerando identificação e representação de futuros possíveis.
Focalizando as narrativas acerca de empreendimentos cerâmicos artesanais
de La Encantada, no Peru, a autora desenvolve formas de escrita de histó-
rias sobre o fazer artesanal, que traz para cena ambientes, personagens e
dinâmicas narratológicas, envolvendo os costumes e valores da comunida-
de artesanal.
Além de promover o registro de conhecimentos tradicionais, a iniciativa
valoriza a divulgação sobre os modos de fazer locais, sendo um forte incre-
mento na geração de valor aos produtos e no desenho de estratégias que vão
além da venda de artefatos físicos, como a oferta de oficinas, visitas guia-
das e ações relacionadas ao turismo de experiência. A lacuna do estudo, no
entanto, se encontra na falta de participação dos produtores na criação das
narrativas, que são criadas apenas com base em dados coletadas em entre-
vistas e questionários.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 115
de atenção para os múltiplos outros seres também emergem como uma das
provocações sobre a prática projetual (Hofverberg, 2020; Jukes, 2020).
Um outro aspecto relevante diz respeito à reconstrução das narrativas
impressas nos fazeres como uma forma de resgatar modos de vida margi-
nalizados, como no artigo de MacDonald (2020) e a ênfase dada às ferra-
mentas como narradoras de histórias de resistência indígena frente às incur-
sões coloniais no passado e no presente. Nesse sentido, os objetos artesanais
contam narrativas que oferecem caminhos distintos às visões de mundos e
sistemas de conhecimentos dominantes.
Finalmente, a revisão produzida pôde constatar uma diversidade de for-
matos através dos quais essas histórias podem se tornar tangíveis: sistemas
digitais de documentação e registro de processos artesanais; plataformas di-
gitais para contação de histórias situadas sobre processos artesanais; ações
de tradução iconográfica da identidade; construção de narrativas escritas
e visuais associadas aos produtos tangíveis; e sistemas e serviços de design
para encenação ou criação de experiências que tratem sobre os aspectos
simbólicos relacionados ao fazer. Além disso, pôde-se ampliar o repertório
sobre técnicas narrativas e sobre a dimensão metodológica da construção
de narrativas, tendo em vista o potencial de adequação às situações parti-
culares das pesquisas.
6 Considerações finais
Este estudo objetivou o mapeamento teórico sobre os modos de incorpora-
ção do conceito de narrativa na dimensão das práticas de design e dos sa-
beres e fazeres artesanais. As pesquisas apontadas revelam o predomínio de
estudos que se baseiam no caráter representativo e descritivo dos conceitos,
abordagens e métodos a respeito da categoria, o que oportuniza a produção
de processos de pesquisa que tragam as narrativas para o terreno da expe-
riência e da construção conjunta de conhecimentos entre os participantes,
as coisas, materiais e ambientes envolvidos.
O conjunto de resultados colhidos nos artigos foram agrupados segundo
as ênfases dadas às narrativas, sendo estas: a interpretação, a fabulação, o
resgate sociohistórico e a apresentação. A possibilidade de inserção dos es-
tudos em mais de um dos agrupamentos indica a natureza holística e com-
plexa da temática. Destaca-se também a possibilidade de associação entre
os resultados obtidos na revisão sistemática com os produtos de uma revi-
são assistemática em estudos futuros.
Em suma, o percurso de revisão culminou em um repertório amplo e
diversificado sobre a categoria da narrativa no campo epistemológico do
design e de outras ciências sociais que versam sobre a cultura material e
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saberes tradicionais, como antropologia, sociologia e história. Este mapa
teórico servirá no exercício de escolhas conceituais a serem empregadas nos
processos de pesquisa em andamento, que objetiva a cocriação e contação
de narrativas com comunidades artesanais à luz da do design participativo
e do designantropologia.
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Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 121
Como referenciar
———
DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.78887
———
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 102-122. 122
arcos design
Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. ISSN: 1984-5596
v. 17, n. 1, Janeiro 2024
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/arcosdesign
123
Projetando para Emoções e Relações: Um Novo
Paradigma no Design Contemporâneo
Abstract: This article examines the shift in design from an approach focused
on aesthetics and functionality to one more centered on relationships. Initial-
ly, it discusses the paradigmatic transition in the field of design. Subsequently,
the focus shifts to Emotional Design, exploring how it aims to create positive
and transformative experiences that impact long-term well-being. Then, the
article addresses Relational Design, integrating this concept with Emotional
Design and highlighting the need for more humanized and collaborative design
approaches. The discussion includes critiques and limitations, pointing to chal-
lenges such as balancing the needs of stakeholders. It concludes that, despite
the challenges, the integration of relational and emotional design is essential
to address the complex social challenges faced by contemporary design, pro-
moting meaningful solutions centered on the human being and communities.
Keywords: Relational Design; Emotional Design; Complex Social Challenges
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 124
1. Introdução
Em uma fase marcada por rápidas mudanças tecnológicas e desafios sociais
complexos, o design vive sua transformação significativa. Longe de serem
apenas estéticos ou funcionais, os projetos contemporâneos estão cada vez
mais imersos em contextos sociais e emocionais. Cabe ao designer neste
momento, conectar saberes e pessoas, de modo a, coletivamente e colabo-
rativamente, desenvolver recursos para lidar com a complexidade desses
contextos. Como dito por Rafael Cardoso (2013) “a grande importância do
design reside, hoje, precisamente em sua capacidade de construir pontes e
forjar relações num mundo cada vez mais esfacelado pela especialização e
fragmentação de saberes” (p.234).
Este artigo visa explorar esta evolução paradigmática, destacando a mu-
dança do design de uma abordagem centrada em estética e funcionali-
dade para uma focada nas relações humanas e no impacto emocional.
Inicialmente, analisaremos como o design tem se adaptado às novas exi-
gências de um mundo em constante mudança, refletindo sobre o movimen-
to em direção a uma abordagem mais relacional e contextual, tendo como
interlocutores Andrew Blauvet (2008), Klaus Krippendorff (2006), Rafael
Cardoso (2013) e Jorge Frascara (2002).
Em seguida, aprofundaremos no conceito de Design Emocional, inves-
tigando como esta abordagem busca não apenas satisfazer as necessidades
imediatas, mas também criar experiências positivas e transformadoras que
promovam o bem-estar a longo prazo. A partir de uma contextualização
histórica, iremos refletir sobre como tem se desenvolvido uma ênfase no
design emocional, que é voltada ao bem-estar humano e social, para além
do prazer hedônico. Pesquisadores como Tonetto, Fokkinga e Desmet, con-
tribuem com a discussão, através da abordagem do design para o bem-estar
e do design positivo.
Traremos por fim, o Design Relacional, um conceito emergente que inter-
liga o design com a dinâmica das relações humanas. Aqui, destacaremos a
importância de integrar o Design Emocional ao Design Relacional, formando
uma prática de design mais holística, humana e colaborativa. Abordaremos
habilidades e ferramentas necessárias para desenvolver projetos com esse
foco, tendo como interlocutor Daniel Goleman (2019). Concluiremos com
exemplos de projetos que demonstram a importância de focar nos aspec-
tos emocionais e relacionais humanos ao projetar, principalmente quando
abordamos desafios sociais complexos.
Finalmente, argumentaremos que, apesar dos desafios, a integração do
design relacional e emocional é essencial para enfrentar os desafios sociais
do design contemporâneo, conduzindo a soluções que são significativamente
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 125
centradas no ser humano e na comunidade. Este artigo propõe lançar luz
sobre como o design, em sua essência, está evoluindo para além de sua for-
ma e função tradicionais, assumindo um papel crucial na facilitação de ex-
periências humanas mais ricas e profundas.
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fase do design. Construída com pedaços de madeira reciclados, similares
aos encontrados nas favelas brasileiras, esta cadeira transcende a função e
estética, incorporando uma dimensão de significado cultural e social. Este
design reflete a importância do contexto cultural, simbolismo e narrativa,
elementos centrais da segunda fase. Finalmente, a cadeira Aeron, desenha-
da por Don Chadwick e Bill Stumpf, exemplifica a terceira fase. Conhecida
pela ergonomia e adaptabilidade ao usuário, esta cadeira vai além de forma
e significado, focando na experiência do usuário, no conforto e adaptabili-
dade. Ela enfatiza a interação e performance no uso cotidiano, refletindo a
abordagem pragmática que caracteriza a terceira fase do design (figura 1).
figura 1.
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Klaus Krippendorff é um renomado teórico, pesquisador e professor no
campo do design. Entre suas contribuições mais notáveis, Krippendorff de-
senvolveu a “Teoria Semântica do Design”, que explora a relação entre os
objetos de design e os significados que eles comunicam aos usuários. Esta
abordagem coloca ênfase na maneira como os usuários interpretam e inte-
ragem com os produtos de design, considerando o design não apenas como
uma questão de estética ou funcionalidade, mas também como um meio de
comunicação e expressão.
Em 2006, Krippendorff, explorou a complexidade e a natureza imaterial
do mundo contemporâneo e como o design responde a esses desafios. Ele
delineou uma “trajetória de artificialidade” no design, que vai desde o de-
sign de produtos materiais até a criação de discursos, abrangendo interfa-
ces, redes e sistemas multiusuários e projetos. Ele enfatiza que esta evolução
não representa etapas fixas, mas fases que expandem as fronteiras do design
para novos tipos de artefatos.
No gráfico da imagem 2, observamos essas mudanças de perspectiva.
Na fase dos produtos, itens como a poltrona Wassily e a Four Side Table de
Marcel Breuer, e as louças de Hans Roericht são exemplos da busca por uma
estética universalista e funcionalidade. A fase dos bens, serviços e identidades
muda o foco para a estética e simbolismo, com exemplos como o espreme-
dor de laranja de Philippe Starck e a cadeira de balanço de Oscar Niemeyer,
além da identidade corporativa ilustrada pela Apple.
Na fase da interface, a experiência do usuário vem à tona, exemplificada
pelo iMac da Apple que democratizou o uso do computador através de uma
interface intuitiva e pela Cadeira Aeron de Bill Stumpf e Don Chadwick, que
destacam a importância da reconfigurabilidade e adaptabilidade. A fase dos
sistemas e redes multiusuários concentra-se na criação de comunidades di-
gitais, com o Orkut e o Facebook servindo como exemplos, onde informa-
tividade, conectividade e acessibilidade são essenciais.
A fase de projetos enfatiza a viabilidade social, direcionalidade e com-
promisso, com o design participativo e o codesign emergindo como concei-
tos-chave para projetos colaborativos. Por fim, a fase do discurso baseia-se
em generatividade, rearticulabilidade e solidariedade, exemplificada pelo
aplicativo “Tem Açúcar?”, que promove conexões entre vizinhos e uma eco-
nomia colaborativa e sustentável, ressaltando a importância das relações
interpessoais.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 128
figura 2. Infográfico demonstrativo da trajetória da artificialidade de Krippendorff. Fonte: as autoras
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Com isso, observamos uma transição do design de uma orientação cen-
trada na tecnologia para uma abordagem focada no ser humano. De acor-
do com Krippendorff (2006), essa transição inclui: (a) a conversão do de-
sign de produtos convencionais em design de artefatos com funções sociais
diversificadas; (b) a transição de uma visão de design universal e cultural-
mente neutra para uma que enfatiza a linguagem na criação de contextos
específicos para diferentes comunidades; (c) a mudança das funções e usos
estabelecidos de produtos e tecnologias para uma abordagem que permite
aos usuários personalizá-los de acordo com suas necessidades e contextos;
(d) a transformação do papel dos designers de figuras solitárias para cola-
boradores ativos, envolvendo usuários e partes interessadas no processo de
design; e (e) a mudança do foco em objetos materiais para um maior enten-
dimento dos processos de criação e reconfiguração de ambientes artificiais.
As transformações significativas no campo do design, apontadas por
Andrew Blauvelt e Klaus Krippendorff, são intensificadas pelas atuais ino-
vações tecnológicas. Rafael Cardoso, em seu livro “Design para um mundo
complexo” (2013), explora essas transformações, examinando os impactos
da era digital na economia, política, sociedade e cultura. Em meio à comple-
xidade crescente e à interconexão dos sistemas, ele percebe o design como
um campo em expansão, crucial para a construção de relações em um mun-
do cada vez mais especializado. Essa perspectiva reforça as observações de
Blauvelt e Krippendorff sobre a transição do design para abordagens mais
focadas nas relações humanas e na comunidade. As mudanças tecnológicas
estão impulsionando transformações sociais que afetam diretamente os ob-
jetivos do design, exigindo dos designers novas habilidades e a aplicação de
ferramentas em contextos complexos.
Ao explorar as transformações no campo do design, identificamos uma
mudança significativa - de uma abordagem centrada na estética e funcio-
nalidade para uma mais orientada para as relações e contextos humanos.
Esta evolução, destacada pelas contribuições de pensadores como Blauvelt
e Krippendorff, abre caminho para um entendimento mais profundo e hu-
manizado do design. A próxima fase desta evolução se manifesta claramente
no emergente campo do Design Emocional, onde as emoções e experiências
humanas tornam-se centrais no processo criativo.
3. O design emocional
O Design Emocional, conforme descrito por Vera Damazio (2016), é uma
área interdisciplinar de pesquisa, focada no desenvolvimento de conheci-
mentos teóricos e práticos sobre a habilidade do design em evocar emoções
e criar experiências positivas intencionais. Esse campo enfatiza o impacto
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 130
do design nas respostas emocionais, comportamentos e atitudes. Desde a
década de 1980, o Design Emocional integra conceitos teóricos e metodo-
lógicos de diversas áreas, destacando a influência das emoções em aspectos
como julgamento, tomada de decisão, percepção, atenção e processamento
de informações. Damazio também ressalta que emoções são frequentemen-
te desencadeadas por uma variedade de estímulos, incluindo objetos reais
ou representações mentais, e sublinha a raridade de interações emocional-
mente neutras com o design.
Podemos identificar duas ênfases principais no Design Emocional. A pri-
meira abordagem, centrada em emoções positivas, direciona-se a produtos
e interfaces, visando estimular emoções positivas e experiências prazero-
sas. Esta abordagem integra conceitos das ciências cognitivas, marketing e
psicologia, focando na identificação de emoções nas interações homem-
-computador e homem-produto, no impacto da estética nas percepções e
respostas emocionais dos usuários, e no desenvolvimento de ferramentas
para avaliar a experiência do usuário. A segunda abordagem, voltada para
emoções adequadas, abrange o design em um espectro mais amplo, incluin-
do produtos, serviços, políticas públicas e dinâmicas sociais. Ela visa pro-
mover emoções específicas que induzam mudanças positivas no estilo de
vida e situações sociais, envolvendo conceitos de sociologia, antropologia
e estudos culturais para entender as necessidades emocionais dos usuários
e seus contextos culturais, propondo métodos e frameworks para o desen-
volvimento de intervenções de design que contribuam para estilos de vida
e realidades sociais mais saudáveis (Damazio, 2016).
A pesquisa de Stevens et al. (2019) levanta algumas divergências acerca
do que significa o Design Emocional. Segundo os autores, alguns pesquisa-
dores associam o campo apenas à primeira abordagem, alinhada ao bem-
-estar hedônico, focado na satisfação com a vida e nos aspectos afetivos. Por
outro lado, eles citam outras abordagens possíveis, como a abordagem das
capacidades, o design para o bem-estar e o design positivo, que focam nos
elementos fundamentais para uma vida boa, a partir da percepção do indi-
víduo como detentor de potencialidades. Estas abordagens são menos cen-
tradas em emoções passageiras e mais preocupadas com o impacto a longo
prazo na qualidade de vida. Tais abordagens alinham-se à segunda ênfase
do Design Emocional.
O campo do Design Emocional, inicialmente focado nas emoções posi-
tivas, recebeu contribuições significativas de vários pesquisadores. Patrick
Jordan (2002), Donald Norman (2008) e Pieter Desmet (2002) são figuras-
-chave na evolução desta área. Jordan foi pioneiro na exploração das di-
mensões imateriais do design, articulando o conceito de ‘Prazer do Produto’
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e classificando o prazer derivado dos produtos em quatro categorias: fi-
siológico, social, psicológico e ideológico. Norman popularizou o Design
Emocional em 2004, destacando três níveis de design: visceral, comporta-
mental e reflexivo, com raízes na experiência do usuário (UX), introduzida
por ele em 1993. Sua obra enfatizou a minimização de emoções negativas
como frustração e raiva durante o uso de produtos. Pieter Desmet introdu-
ziu em 2002 um modelo fundamentado na “Appraisal Theory” para ajudar
os designers a entender a interação emocional dos usuários com o design.
Esta teoria cognitiva das emoções permite ao designer determinar qual
emoção deseja evocar no usuário e, em seguida, identificar os fatores que
contribuem para essa resposta emocional, visando integrar esses elementos
ao processo de design.
Posteriormente, em 2020, Fokkinga e colaboradores desenvolveram um
framework abrangente para avaliar os impactos psicológicos, sociais e com-
portamentais do design, decorrentes das interações humanas. Este modelo,
resultante da análise de 186 estudos de caso em workshops especializados,
estrutura-se em três níveis: experiências imediatas com o produto (abran-
gendo aspectos estéticos, significativos e emocionais), impactos a médio
e longo prazo em comportamentos, atitudes e conhecimentos dos usuá-
rios, e influências na qualidade de vida e na sociedade como um todo. Os
pesquisadores observaram que, no primeiro nível, os designers geralmen-
te trabalham com tipologias de emoções, comportamento, necessidades e
sentimentos. O segundo nível expande-se para abarcar emoções derivadas
de experiências ricas ou ferramentas, métodos e estratégias para promover
mudanças comportamentais. Contudo, ressaltaram uma lacuna significati-
va no terceiro nível, especialmente na avaliação de efeitos duradouros dos
projetos de design.
O Design Emocional, visando contribuir para sociedades mais saudáveis,
concentra-se principalmente nos níveis intermediário e avançado do fra-
mework de Fokkinga e colaboradores. Isso é exemplificado no design para
o bem-estar e no design positivo, que visam impactos sociais positivos e
sustentáveis, e serão abordados em seguida.
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positivas, domínio do ambiente e autonomia, sendo denominado bem-es-
tar psicológico.
Os designers podem adotar duas formas de intervenção ao projetar para
o bem-estar. Na primeira abordagem, investigam e projetam explicitamente
para evocar níveis mais elevados de bem-estar. Isso pode ser alcançado ao
incitar afeto positivo, inibir emoções negativas, melhorar a avaliação geral
da vida, estimular o sentido da vida e potencializar o uso das virtudes pes-
soais. Nessa abordagem experimental, variáveis independentes relacionadas
ao design são manipuladas, e seus efeitos no bem-estar são medidos. Essa
abordagem está associada a construtos como bem-estar psicológico ou sub-
jetivo, e está alinhada à psicologia positiva.
Na segunda abordagem, o foco não está diretamente no bem-estar em si,
mas sim em projetar para estimular preditores de bem-estar. Nesse caso, o
design concentra-se em características e experiências humanas que se acre-
dita melhorarem o bem-estar, como a resolução de conflitos internos e in-
fluências ambientais. Essa perspectiva requer uma expansão do escopo do
design, indo além de artefatos individuais para o design de um ecossistema
que proporcione uma experiência duradoura de bem-estar. Essa abordagem
está alinhada aos princípios do design relacional.
Dessa forma, o design para o bem-estar pode ser realizado tanto por
meio de uma intervenção direta, visando diretamente o bem-estar, quanto
por meio de uma intervenção indireta, projetando para estimular fatores
que se acredita estarem relacionados ao bem-estar. Ambas as abordagens
contribuem para a compreensão e a prática do design centrado nas pessoas
(Tonetto, 2019). Compreender como as emoções, sentimentos e humores
afetam o bem-estar e as relações mediadas pelo design é fundamental para
projetar de forma mais humana, assertiva e empática.
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em vez de focar nos aspectos negativos. Em seguida, há o equilíbrio entre
o bem-estar hedônico e eudaimônico. O terceiro aspecto é o foco no ajuste
pessoal por meio de uma abordagem centrada na pessoa. Além disso, des-
taca-se o envolvimento ativo do usuário e a busca de impacto a longo prazo,
abordando questões pessoais e sociais mais amplas, como mudanças com-
portamentais e satisfação com a vida.
O Design Emocional, como vimos, representa uma resposta inovadora às
mudanças paradigmáticas no design, enfatizando a criação de experiências
positivas e transformadoras. Esta abordagem não apenas complementa as
tendências contemporâneas no design, mas também prepara o terreno para
uma prática ainda mais integrada e centrada no ser humano: o design rela-
cional. Este próximo tópico expandirá como o Design Emocional se entrelaça
com práticas relacionais, destacando a importância da empatia e da colabo-
ração na construção de soluções de design mais significativas e impactantes.
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melhorar a qualidade de vida, focando nas necessidades individuais e pro-
movendo relações significativas.
A habilidade do Design Emocional de facilitar emoções e sentimentos po-
sitivos, aliada à abordagem relacional de criar conexões interpessoais autên-
ticas, fornece um terreno fértil para o florescimento do bem-estar pessoal e
social. Assim, ao integrar práticas do Design Emocional, o Design Relacional
emerge como um catalisador para experiências humanas enriquecedoras,
centradas nas emoções, nos relacionamentos e no desenvolvimento huma-
no. Esta integração destaca a necessidade de ferramentas e habilidades que
nutram e potencializem a abordagem relacional, promovendo relações mais
profundas e significativas.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 135
que implica agência, ação e sugere a necessidade de “se envolver” e efetuar
mudanças.
Como abordagem de design, assume que o designer é um participante
ativo em estratégias para fazer uma diferença positiva na vida das pessoas.
Exige que o pesquisador de design seja empático e responsivo à pessoa para
quem está projetando, e informado sobre o contexto em que vivem e os de-
safios que enfrentam. O Design Compassivo foca em três componentes vi-
tais que são fundamentais para esse fim: estimular os sentidos, ser altamente
personalizado e ajudar a promover conexões entre as pessoas.
No design, a abordagem das emoções pode ser subjetiva e pessoal. As
respostas conscientes dos participantes nem sempre refletem suas verdadei-
ras emoções e experiências na interação com o ambiente e com os outros.
A experiência pessoal do pesquisador em situações análogas pode oferecer
insights mais profundos, levando a uma abordagem mais empática do pro-
jeto. Isso pode ser facilitado por métodos de pesquisa autoetnográficos. Por
exemplo, a pesquisa de Bochner (2019) sobre luto em diferentes culturas
ilustra como a experiência pessoal de perda pode aprofundar a compreen-
são desse sentimento. Observar as próprias emoções com estranhamento e
as emoções dos outros com familiaridade oferece uma abordagem valiosa
no design emocional, apesar de ser rara na prática.
Xue & Desmet (2019) defendem a adoção de uma perspectiva de primeira
pessoa na pesquisa de fenômenos subjetivos. Esta abordagem reflexiva per-
mite que o pesquisador utilize suas próprias experiências subjetivas como
dados valiosos. A introspecção do pesquisador é particularmente relevante
quando este faz parte do grupo-alvo estudado, facilitando o entendimento
das normas e experiências desse grupo
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 136
dessas habilidades. Conforme Carla Cipolla (2018) podemos projetar faci-
litadores que atuam como mediadores nos processos pessoais e interpes-
soais. Seu modelo se baseia nas relações interpessoais e inclui mecanismos
para facilitar a confiança necessária.
Cipolla destaca que projetar facilitadores promove uma vulnerabilidade
intencional que aumenta a probabilidade de formar vínculos sociais for-
tes. A autora classificou os facilitadores em quatro categorias, em virtude
de seu mecanismo de efeito: (a) artefato facilitador, projetado para mediar
a colaboração e as relações interpessoais; (b) facilitador atitudinal, proje-
tado para facilitar a expressão de atitudes ou sentimentos pessoais para os
outros; (c) facilitador processual, projetado para promover relações inter-
pessoais por meio de uma sequência de etapas; e, (d) facilitador narrativo,
projetado para estimular as relações interpessoais por meio de uma inter-
pretação pessoal dos eventos, ou uma narrativa ficcional organizada e mon-
tada (Cipolla, 2018).
Adotar facilitadores relacionais, tanto em termos de consciência emo-
cional quanto de práticas que promovam conexões sociais, torna-se funda-
mental para criar soluções de design que se conectem profundamente com
as pessoas. O design relacional transforma a maneira como projetamos e
interagimos, estabelecendo uma base para um futuro onde conexões hu-
manas e experiências emocionais se tornam centrais no processo criativo.
Como exemplo, Van der Bijl-Brouwer (2022) enfatiza a importância de
estudos que examinem o papel do design na promoção de relacionamentos
positivos, especialmente em situações de transformação sistêmica. Um pro-
jeto educacional ilustra isso, onde o objetivo era otimizar o processo de ela-
boração de planos de ensino para professores. Diante de feedbacks negativos
na fase de prototipação, os designers optaram por organizar um workshop
colaborativo para os professores. Neste evento, os participantes comparti-
lharam suas experiências e práticas, o que resultou na co-criação de planos
de ensino mais eficazes. Esta experiência revelou que a integração do de-
sign relacional, focado em fortalecer as interações humanas, pode ser um
catalisador poderoso para a inovação e o desenvolvimento pessoal, impac-
tando positivamente tanto o bem-estar individual dos professores quanto a
dinâmica social da comunidade educativa.
Um estudo de Nielsen & Bjerck (2022) sobre pacientes submetidos a cirur-
gias demonstrou a importância das relações médico-paciente. Os pacientes
que mantinham relações de confiança com seus médicos relataram sentir-se
mais seguros e bem informados sobre seus procedimentos e recuperação.
Esta observação ressalta que, no design voltado à saúde, o foco nas relações
humanas pode ser mais impactante do que meramente classificar pacientes
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 137
em categorias ou personas. Este estudo sugere a adoção de uma visão mais
ampla, na qual os pacientes são considerados membros ativos de redes so-
ciais, e não apenas como entidades isoladas. Além disso, os autores propõem
a utilização de métodos autoetnográficos em design, argumentando que es-
tes podem oferecer insights mais profundos sobre as experiências humanas
e resiliência, sugerindo a necessidade de uma abordagem mais holística e
empática no design em contextos de saúde.
Finalmente, Yoon e Kim (2022) examinaram como a diversidade de emo-
ções positivas influencia o uso da tecnologia e o bem-estar dos usuários. Os
resultados mostram que uma abordagem de design que contempla uma va-
riedade de emoções positivas enriquece a experiência do usuário. Este es-
tudo sublinha a capacidade da tecnologia em servir como um veículo para
emoções positivas e atividades enriquecedoras. Os pesquisadores ressaltam
a importância do papel do designer em focar nas experiências e atividades
possibilitadas pela tecnologia, além de seus aspectos físicos. A pesquisa su-
gere que a emodiversidade positiva no design de produtos tecnológicos pode
ser uma ferramenta valiosa para a construção de relações sociais duradou-
ras e o fortalecimento do bem-estar a longo prazo.
Ao nos aprofundarmos no design relacional e na empatia, fica eviden-
te como esses conceitos enriquecem e expandem as abordagens do Design
Emocional. Esta integração reflete a evolução do design e destaca a necessi-
dade de práticas de design enraizadas na compreensão das relações humanas
e na empatia. A convergência destes campos surge como uma necessida-
de para enfrentar eficazmente as complexidades e desafios do design con-
temporâneo, iluminando um caminho promissor para o futuro do design.
5. Apontamentos finais
Este artigo traçou um caminho de mudança no campo do design, começan-
do com a transformação paradigmática do foco na estética e funcionalidade
para uma abordagem mais rica e contextual, passando pelo desenvolvimen-
to do Design Emocional e culminando na integração do Design Relacional.
Através desta jornada, fica claro que a prática do design está se movendo
em direção a uma compreensão mais profunda e humanizada, onde a em-
patia, a experiência emocional, e a colaboração não são apenas elementos
complementares, mas fundamentais.
A mudança no design, como demonstrado inicialmente, reflete uma mu-
dança de perspectiva, onde os designers são desafiados a ir além das solu-
ções tradicionais e a considerar as complexidades sociais e emocionais dos
seres humanos. Em seguida, ao explorar o Design Emocional, revelamos
como este campo se tornou essencial para criar experiências significativas
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 138
e transformadoras, reconhecendo a importância das emoções e sentimen-
tos na interação com o outro e com o artefato. Ao integrar estas ideias ao
design relacional, destacamos como esses conceitos se combinam para for-
mar uma abordagem mais holística e centrada nas relações humanas. Este
enfoque não só enriquece as experiências dos indivíduos, mas também pro-
move uma cocriação mais efetiva e genuína, estabelecendo um novo padrão
para o design futuro.
Buscamos neste estudo, discutir mudanças apontadas por diversos estu-
diosos da área, como Blauvelt (2008), Krippendorff (2006) e Fokkinga (2021).
Porém, compreendemos a necessidade de pesquisas práticas e de uma abor-
dagem a longo prazo de acompanhamento das mudanças sociais e do im-
pacto do design para esse processo. Assim, ressaltamos que a convergência
destes aspectos - O design centrado no humano, o Design Emocional, e o
Design Relacional - é mais do que uma tendência; é uma necessidade vital
para responder de forma adequada aos desafios e complexidades do mun-
do contemporâneo. O futuro do design, portanto, será marcado por uma
abordagem mais integrada e empática, onde a criação de soluções significa-
tivas e humanizadas será a pedra angular. Esta evolução não apenas melho-
ra a qualidade das soluções de design, mas também fortalece as conexões
humanas, transformando o design em uma ferramenta poderosa para um
impacto social positivo e duradouro.
Referências
BLAUVET, Andrew. Towards Relational Design. Design Observer. 2008.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 139
DAMAZIO, Vera. Design and Emotion. The Bloomsbury Encyclopedia
of Design. London: Bloomsbury Design Library, 2018.
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NORMAN, Donald. Design emocional: porque adoramos (ou
detestamos) os objetos do dia-a-dia. Rio de Janeiro: Rocco, 2008
PETERMANS, Ann & CAIN, Rebbeca. Setting the scene for design for
subjective wellbeing. Design for Wellbeing. London: Routledge, 2019
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 141
Como referenciar
———
DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.78580
———
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 123-142. 142
arcos design
Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 143-175. ISSN: 1984-5596 v. 17, n. 1, Janeiro 2024
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/arcosdesign
143
Tomando um lado: formação crítica e prática
extensionista no Laboratório de Design contra Opressões
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 143-175. 144
1. Introdução
Nos últimos anos, surgiram novas vozes no debate sobre pensar e fazer de-
sign fora da hegemonia dos cânones modernistas. Essas vozes denunciam a
pretensa neutralidade do design moderno, desbancando o discurso de que
só há uma forma correta de projetar o mundo, a forma capitalista do Norte
Global. Importantes e diferentes justamente pela sua pluralidade, menciona-
mos algumas dessas vozes: design para o pluriverso (ESCOBAR, 2018), design
decolonial (TLOSTANOVA, 2017; ANSARI, 2019), design nas bordas (SILVA,
2022), pesquisa militante no design (SERPA, 2022) e estudos de opressão
no design (VAN AMSTEL, GONZATTO e NOEL, 2023). Além dessas, existem
muitas outras que podem ser referidas como “outros designs” (CARVALHO
et al, 2021) ou até mesmo práticas fora do campo institucionalizado do de-
sign, o “design com outros nomes” (GUTIÉRREZ BORRERO, 2022). Portanto,
se o Design hegemônico (SILVA, 2022; OKABAYASHI e DOS SANTOS; 2022) é
aquele que busca impor uma prática pautada apenas pelo modelo capitalista
desenvolvimentista Angloeuropeu, essas vozes contra-hegemônicas buscam
encontrar fissuras nesse modelo nas quais a diversidade de modos de ser e
de fazer do Sul Global possam também florescer.
Podemos identificar alguns pontos em comum levantados por essas vo-
zes, por exemplo, a proposição de um design crítico e político, que possa se
tornar aliado nas lutas de grupos oprimidos pela sua libertação. Nessa pro-
posta, o design deixa de ser uma teoria e/ou prática de uma classe de desig-
ners institucionalmente autorizados para isso e passa a ser considerado um
direito dos povos oprimidos na sua busca por autodeterminação. Design
já foi anunciado como um direito humano há muito tempo (BUCHANAN,
2001), porém, o que essas vozes querem hoje é que design não seja apenas
um meio para proteger a dignidade humana, mas sim aquilo mesmo que
deve ser protegido.
Isso implica em uma atitude diferente para designers. Em vez de atuarem
como solucionadores de problemas detentores do privilégio de projetar, de-
signers atuam como defensores do direito de uma comunidade de se auto-
-projetar (ESCOBAR, 2018). Mudar a Educação em Design atual é crucial para
explorar e fundamentar essa nova forma de atuação. Infelizmente, educado-
res em design que atuam em diversos mundos chegaram à conclusão de que
a Educação em Design carrega um viés colonial, Eurocêntrico e capitalista
(Noel et al, 2023). Devido a esses vieses, essas novas vozes, oriundas prin-
cipalmente do Sul Global, não chegam a entrar em diálogo com a maioria
dos estudantes de design, nem mesmo no próprio Sul Global.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 143-175. 145
Formar criticamente designers para que pensem e pratiquem o seu que
fazer1 de forma libertadora se mostra um grande desafio, principalmente
quando a educação, em sua ampla aplicação, se caracteriza por atitudes ban-
cárias que negam outras epistemologias, outras formas de conhecer o mundo
(FREIRE, 2021). Assim, surge a pergunta crucial desta pesquisa: como for-
mar profissionais de design que estejam preparados para defender o design
como um direito humano?
Longe de dar uma resposta final a esta pergunta, este artigo visa descrever
e analisar a formação crítica e prática extensionista proporcionada pelo pro-
jeto de extensão chamado Laboratório de Design contra Opressões (LADO)
na UTFPR, que visa desenvolver projetos de design em conjunto com movi-
mentos sociais. Este projeto está sendo desenvolvido a partir da perspecti-
va dialético-existencial sobre design e educação. Essa perspectiva permite
perceber o design enquanto um projeto existencial humano e, assim, reve-
lar suas implicações materiais e políticas.
Na primeira parte deste artigo, buscamos estabelecer algumas diretrizes
que mostrem o que fazer do designer não como algo neutro, mas sim como
atividade intrinsecamente humana e determinante histórica na produção de
existência, objeto de um direito humano fundamental. Para isso, lançamos
mão das categorias de projeto e consciência crítica concebidas por Álvaro
Vieira Pinto (2005; 2020; 2021) e expandidas por Paulo Freire (1980; 2014;
2021). Destacamos seu pensamento ontológico e epistemológico, assim como
conceitos de educação crítica, diálogo, autonomia e práxis. Logo após essa
exposição, serão apresentadas as experiências de formação crítica e prática
extensionista do laboratório mencionado.
2. Projeto e existência
Rememorando a história do design, vemos que ele nasce da divisão social do
trabalho surgida com a revolução industrial, que separou aquele que planeja
daquele que executa objetos. O objetivo era atingir a padronização necessá-
ria para que uma produção em série fosse possível (CARDOSO, 2008). Em sua
presente forma histórica, podemos definir o design hegemônico como uma
abordagem profissional para resolução de problemas de produção e con-
sumo por meio de projetos calcados em métodos pré-definidos (LÖBACH,
2012). Este modo de entender design reproduz ética e esteticamente uma
práxis de manutenção do status quo da classe dominante.
1 Mais que um puro fazer, o “que fazer” não dicotomiza ação e reflexão, integrando-os em
um fazer e pensar dialético (FREIRE, 2021).
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 143-175. 146
Esta visão de projeto é criticada por diversos autores. Silva e colegas, por
exemplo, consideram a solução de problemas uma visão reducionista do
design, pois “valores como cultura e contexto são mencionados em exem-
plos, mas não existe uma discussão sobre abrangência ou limites de ambos
dentro do processo de design” (SILVA; KIRA; MERKLE, 2016, p. 9). Os autores
chamam a atenção para a etimologia da palavra projeto, que significa jogar a
frente, impulsionar algo no espaço e no tempo. Por outro lado, Van Amstel,
Botter e Guimarães (2022) afirmam que todo projeto contém também um
trajeto, que nos informa em qual modo será produzido; qual a divisão so-
cial do trabalho será empregada para realizá-lo; quem irá pensar quais as
necessidades devemos priorizar; qual o impacto no meio-ambiente; etc. Ao
projetar idealmente uma nova condição de existência e realizá-la material-
mente, deixando como um trajeto para novos projetos, seres humanos es-
tão projetando também a si mesmos, visto que estão modificando objetiva-
mente as condições nas quais vivem, as forças e as relações produtivas com
a natureza (MARX, 2015; VIEIRA PINTO, 2020).
A historicidade do ser humano não se manifesta, entretanto, como uma
série de ações lineares direcionadas a um fim pré-definido. Cada ser humano
é um ser projetante autônomo e pode ou não se associar com outros seres
humanos para formar seres projetantes mais poderosos, tais como comu-
nidades, organizações e Estados, os chamados corpos projetuais coletivos
(ANGELON e VAN AMSTEL, 2021). Esses corpos coletivos não são homogê-
neos, pois os seus corpos individuais têm projetos conflitantes e trajetos de
vida completamente diferentes. Mesmo que os conflitos sejam resolvidos,
permanecerá a contradição entre o que fazer individual e o que fazer cole-
tivo. Essa contradição costuma arrastar outras contradições para o espaço
de projeto, gerando a necessidade da deliberação democrática entre os par-
ticipantes do projeto existencial coletivo.
Partindo desta perspectiva dialético-existencial do projeto, compreen-
demos a consciência do sujeito enquanto uma representação subjetiva de
um dado objetivo do mundo real, que dá origem à ação transformadora
do espaço social em que está inserida por meio do trabalho (FREIRE, 1980;
2021; VIEIRA PINTO, 2020). Esta historicidade, tanto do sujeito quanto do
objeto, trabalha o tempo não em sua matriz cronológica, mas sim existen-
cial (VAN AMSTEL e GONZATTO, 2022). O projeto se coloca à frente do ser
atual para abrir a possibilidade do vir-a-ser. Portanto, a consciência do ser
não é limitada ao momento atual da história humana, senão que se localiza
precisamente entre passado e futuro. As condições objetivas — e o próprio
ser — se modificam a cada passo do processo dialético de análise do obje-
to historicamente situado, sendo necessária uma nova atualização do olhar
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crítico dos sujeitos perante à realidade para capturar sua própria historici-
dade (FREIRE, 1980).
Segundo Álvaro Vieira (2020; 2021), a historicidade da consciên-
cia pode ser capturada de duas maneiras. A consciência ingênua se destaca
ao estar centrada em si mesma, não admitindo os processos de influência
que a realidade objetiva tem sobre ela. Ela se vê como atemporal e incriada.
Em contraposto, há a consciência crítica, que reflete a sua existência diale-
ticamente com a realidade, penetrando na essência fenomênica do objeto
(FREIRE, 1980). A conscientização descrita por Paulo Freire seria justamen-
te o processo de passagem da consciência ingênua para a crítica, ultrapas-
sando o mero ato falsamente intelectual de tomada de consciência que re-
cai sobre a ingenuidade. Em outras palavras, o ato crítico do conhecimento
consiste no exame racional do objeto, tornando consciente os seus funda-
mentos, condicionamentos e seus limites, ao passo que se faz a verificação
destes nos processos históricos reais (NETTO, 2009). A conscientização se
dá na criticidade da consciência, no desvelamento e no agir do ser na rela-
ção consciência-mundo (FREIRE, 1980).
O processo de apreensão do real por parte do sujeito nos revela a vocação
ontológica enquanto essa capacidade de ser mais (FREIRE, 1980), de sermos
seres livres que negam sua certeza acerca do objeto percebido, e que, ao ne-
garem-no, o assimilam criticamente, buscando versões mais potentes de seu
entendimento do objeto e do seu próprio ser consciente de si, de ser melhor
que seu eu de ontem e construir, a partir do hoje, seu amanhã. Porém, na
situação de opressão, o ser consciente, historicamente privilegiado, objeti-
fica e destrói o outro em seu processo de apreensão do mundo, transpor-
tando-o à uma categoria inferior, não humana, o ser menos. Neste sentido,
a opressão se configura e é efetivada quando se constitui em um ato proibi-
tivo do ser em sua apreensão do real, a negação do ser mais (FREIRE, 2021).
As relações sócio-históricas de opressão fazem com que tanto opressores
quanto oprimidos participem de um processo de desumanização que limi-
ta a consciência de seus projetos possíveis e trajetos já realizados. A história
de classes se vê repleta de exemplos que demonstram essa realidade desu-
manizadora. Do colonialismo ao imperialismo, passando pelo machismo,
racismo e LGBTQIAP+fobia, todos esses regimes de opressão negam a capa-
cidade dos indivíduos de serem livres para si.
O processo de conscientização descrito por Freire (1980) é um processo
de retomada dessa capacidade negada. O educando percebe a situação de
opressão, encontra o seu lugar nela, se posiciona politicamente e age com fins
a superar a sua opressão ou a opressão do outro. Se ver como oprimido é o
primeiro passo. Depois, o educando se entende também como opressor em
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uma relação diferente. Por exemplo, uma mesma pessoa pode ser oprimida
na relação de classe, caso seja trabalhadora assalariada, e opressora na rela-
ção de gênero, caso seja um homem (BOAL, 1979). O importante aqui não é
só se identificar com a opressão, mas também agir para liberta-se da mesma.
Esta é a essência do design enquanto um projeto da existência humana:
continuar sendo livre no contexto vindouro, ou seja, numa situação dife-
rente da que já se está. Neste sentido, o design exerce o papel de ponte para
a realização material da abstração cultivada nas mentes e buriladas nas mãos
das pessoas. A partir da conscientização das pessoas acerca de suas realida-
des como seres oprimidos — seja de classe, raça, gênero, etnia, etc. e suas
respectivas intersecções — pelas condições sócio-históricas e de suas capa-
cidades de transformação do mundo, as pessoas podem lidar com as con-
tradições desta realidade sem reducionismos, criando, assim, formas mais
complexas de ser e de viver. A transmissão cultural dessas formas de ser e de
viver coloca um desafio grandioso para a educação, principalmente, para a
educação de designers, pois o design costuma ser ensinado e praticado em
um escopo muito mais reduzido.
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Na perspectiva dialético-existencial, todos são designers, mas alguns são
mais designers do que outros. A paráfrase da afirmação alegórica de George
Orwell (1945) de que “(na fazenda) todos os animais são iguais, mas alguns
animais são mais iguais do que outros” encapsula a contradição entre direi-
tos e privilégios que a teoria do design precisa encarar. Em uma sociedade
estruturada por classe, gênero, raça e outras formas de opressão, o direito de
projetar os meios de existência é negado em prol de um privilégio de pou-
cos. Grupos historicamente desprivilegiados são considerados incapazes de
projetar suas condições de existência, mesmo que o tenham feito por sécu-
los. O direito de projetar é negado em favor de uma noção paternalista de
uso, ou seja, de que os oprimidos são sempre os usuários do design e nunca
os seus protagonistas (GONZATTO, 2018).
Em tais circunstâncias históricas, é possível apelar aos direitos humanos
e incluir o design como um direito universal de todos os seres humanos: o
direito de projetar a si mesmo com base em seus próprios propósitos. Isso
não é uma premissa ética nova no design. O design participativo é uma
abordagem de projeto que, desde os anos 1970, combate este privilégio.
Inspirada nos escritos de Paulo Freire (RIBEIRO, 2018), dentre outros auto-
res, o design participativo se propõe a incluir todos aqueles que são afeta-
dos por um projeto (EHN, 1988).
Lançando mão da análise crítica sobre a educação como uma prática
bancária (FREIRE, 1980) — na qual o professor, detentor de todo o conheci-
mento, vai “depositando” nas cabeças de alunos o que o sistema educacional
julga ser necessário, deixando de lado o “saber de experiência feito” — cria-
-se uma hierarquia entre aquele que sabe, e aqueles que não sabem, e por
isso devem ser iluminados. O design participativo busca romper com esta
noção hierarquizante, exercendo a solidariedade para com aquelas pessoas
que têm sua criatividade tolhidas, visto que o processo de emancipação e
conscientização se faz na atividade dialógica, quando as pessoas se enten-
dem como detentoras de saber e que, através de sua inserção num processo
projetual feito com elas e não para elas, podem ter um papel importante na
resolução de problemas complexos.
Deste modo, “não podemos esquecer que a libertação dos oprimidos é li-
bertação de homens e não de ‘coisas’. Por isso, se não é autolibertação – nin-
guém se liberta sozinho –, também não é libertação de uns feita por outros”
(FREIRE, 2021, p. 74). Sendo assim, a educação libertadora em design não
pode ser feita apenas por designers, mas também por usuários, em comu-
nhão, inseridos em projetos participativos que visam a transformação de
suas realidades. Esta busca difere o design participativo das práticas cola-
borativas do design hegemônico que também envolvem usuários. Enquanto
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a primeira tem a formação de consciência crítica e a libertação das opres-
sões como propósito primordial, a última se aproveita de uma participação
domesticada e ingênua, que não questiona as relações de poder e continua
a criar produtos que reforçam os modos de existência entre opressores e
oprimidos.
No design participativo, os usuários participam dos jogos de projetar
propostos pelos designers e assim adquirem novas linguagens para trans-
formar sua realidade (EHN, 1988). Segundo Paulo Freire (2021), ao ler um
livro, jornal, histórias em quadrinhos, entre outros, não estamos apenas me-
canicamente lendo. A linguagem falada e, principalmente, a escrita nos é
ensinada como uma habilidade motora, e o fazemos como tal. É uma ativi-
dade cultural complexa que envolve posicionamentos políticos (VYGOTSKY,
1991). Freire (2021) pontua que “a leitura de mundo precede a leitura da
palavra”, o que significa que trata-se de um contato com o mundo que, me-
diatizado por este mesmo mundo, as pessoas possam se educar e projetar
as suas existências.
Essa visão expandida de educação nos abre a possibilidade de repensarmos
o ensino e a prática projetual do design, sobretudo nos exercícios participa-
tivos. Quando escrevemos sobre a necessidade de inserirmos o pensamento
de Paulo Freire nos processos educativos e de projeto de design não é sobre
exercer uma sloganização, citar suas frases e pensamentos para a ornamen-
tação da prática. Mas sim, sobre a inserção da práxis dentro do design, re-
fletir criticamente sobre o papel de “fazedoras do mundo” que cada pessoa
tem em busca de ser mais, em um processo de conscientização do sujeito
acerca de sua realidade objetiva e de como transformá-la.
Para evitarmos que nossa atuação seja pautada em um messianismo que
ilumina palavras àquelas e àqueles na escuridão, criando assim outra peri-
gosa contradição, devemos exercer a práxis. Para Freire (2021), a consciên-
cia e a esperança idealista por si só não dão cabo das mudanças necessárias
do mundo. A práxis deve ser entendida na relação dialética entre prática e
teoria que nos faz desvelar, conhecer e recriar o mundo a partir de suas con-
tradições (ENH, 1988). Portanto, na próxima seção iremos descrever ativi-
dades fundadoras da práxis de um laboratório de design contra opressões
orientada pela perspectiva dialético-existencial apresentada até aqui.
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opressão é uma contradição que os oprimidos precisam superar através de
muita luta, as atividades do LADO visam experimentar como o design pode
se posicionar coerentemente nesta luta em busca do ser mais. O próprio
nome do laboratório é uma alusão à ação política de tomar um lado des-
ta contradição. Conforme coloca o arcebispo e ativista político Desmond
Tutu, “se você fica neutro em uma situação de injustiça, você escolhe o lado
do opressor”. A participação nos experimentos do LADO é, por si só, uma
espécie de declaração de apoio aos oprimidos.
Os objetivos do LADO são: a (1) formação crítica em design, auxiliando
no desvelamento da sua dimensão opressiva, ao mesmo tempo em que po-
tencializa formas libertadoras de projetar; (2) a abertura horizontal para a
práxis do design, entendendo que todas as pessoas não só tem a capacidade,
como o direito de projetar seus mundos; e (3) resgatar, valorizar e/ou desin-
visibilizar outras formas de pensar e criar o mundo à nossa volta, principal-
mente a partir de pensadoras e pensadores latino-americanos e dos conhe-
cimentos e práticas dos movimentos sociais populares.
No que tange à sua organização interna, o LADO mantém suas atividades
por meio da autogestão (GONZATTO et al., 2021), que busca substituir hie-
rarquias pelo diálogo horizontal. A realização das ações ocorre por meio
de Grupos de Trabalho (GTs), que podem ser propostos por qualquer par-
ticipante e que se mantém abertos para quem quiser se engajar no corpo
coletivo. Os GTs não tem uma liderança autocrática, mas sim uma ou mais
pessoas que assumem o papel de “puxadoras” do grupo, incentivando a
participação, convocando encontros ou sendo mais ativa na proposição de
ações. As decisões e ações, porém, são sempre coletivas.
Para evitar que cada GT atue de maneira isolada há uma reunião sema-
nal de articulação, o bate-bumbo, denominada assim por alusão a um dos
principais instrumentos utilizado em rodas de Samba para marcar o ritmo
de fundo. Nesta reunião, que dura no máximo uma hora, os grupos contam
suas novidades e pedem ajuda dos demais GTs caso precisem. Na reunião,
também são criados, mesclados ou desfeitos os GTs existentes. Batendo o
bumbo, esse corpo projetual coletivo (ANGELON e VAN AMSTEL, 2021), for-
mado por diversos grupos independentes, se alinha e se realinha para se-
guir juntos nas diversas lutas contra a opressão.
O início do projeto de extensão se deu em 2021, em resposta a um ma-
nifesto escrito por estudantes de design sobre a necessidade de maior poli-
tização da sua própria formação (ANGELON e VAN AMSTEL, 2021). A Rede
Design & Opressão já havia acolhido alguns desses estudantes em suas ati-
vidades remotas de formação crítica em design (SERPA et al., 2022), porém,
os estudantes queriam desenvolver projetos de extensão junto à comunidade
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no entorno da universidade. O laboratório foi fundado, então, como uma
das unidades dessa coalizão insurgente de design (VAN AMSTEL et al., 2021).
Os primeiros experimentos do LADO foram realizados na modalida-
de remota devido à pandemia COVID-19, seguindo o modelo de apropria-
ção pedagógica do aplicativo Discord criado pela Rede Design & Opressão
(SERPA et al., 2022). Nesse primeiro momento, a contradição principal era
entre a educação bancária (FREIRE, 1980) predominante na educação remo-
ta emergencial da universidade e a educação libertadora da Rede Design &
Opressão, que dependia da autonomia do estudante que a educação ban-
cária desincentivava.
No ano de 2022, quando as atividades começaram a ser realizadas presen-
cialmente em um espaço dentro da universidade, novas contradições sur-
giram. Uma delas era como se constituíam as relações de poder no espaço
entre os participantes da atividade extensionista. Por exemplo, a Figura 1
apresenta a configuração espacial típica da reunião de bate-bumbo, que visa
reduzir a hierarquia no espaço social, mas que ainda se baseia na loquaci-
dade para distribuir o espaço de fala.
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dialógica e crítica. Ambos os níveis de formação, começando pelo primeiro,
são apresentados a seguir.
2 O método Elos é um conjunto de diretrizes que guiam as práticas do Instituto Elos, sendo
elas: olhar, afeto, sonho, cuidado, milagre, celebração e re-evolução. O instituto tem como
objetivo, a partir do seu método, incentivar o desenvolvimento comunitário por meio do
protagonismo cidadão, capacitando-os para responder aos problemas locais (ALVES, 2018;
MARMENTINI e PINHEIRO, 2017).
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figura 2. O nosso método. (fonte: do autor)
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figura 3. Experimento “Personas não, pessoas”. (fonte: acervo do lado)
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figura 4. Experimento de sonhos individuais dos participantes do lado. (fonte: acervo do lado)
3 Baseado no conceito de “conhecimento das mãos”, o método visa facilitar através de blocos
de montar do tipo Lego o engajamento de todas as pessoas participantes em um projeto,
de forma a melhorar a comunicação, pensamento e construção de ideias (KRISTIANSEN e
RASMUSSEN, 2015).
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linguagem tridimensional metafórica. Depois de montar seus modelos in-
dividuais, os participantes do experimento montaram um modelo coletivo
que agregava todos os modelos individuais (Figura 5). Cada modelo apre-
sentado suscitava um diálogo rico em posicionamentos e reflexividade. A
visão geral dos posicionamentos permitiu (des)nortear os planos futuros
para o projeto Nosso LADO: a) buscar mais diversidade e alegria nos espa-
ços; b) evitar artefatos que excluam e dividam, e c) sempre ter a luta contra
as opressões como guia.
figura 5. Experimento com Lego Serious Play para criação do nosso sonho coletivo. (fonte: acervo do
lado)
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para o café, biblioteca compartilhada de obras literárias e cadeiras customi-
zadas começaram a tomar forma e se destacar como prioritários.
figura 6. Experimento de desenho coletivo da planta baixa do espaço do lado. (fonte: acervo do lado)
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figura 7. Experimentos de customização de cadeiras e de mural artístico participativo desenvolvido
pelos participantes do lado. (fonte: acervo do lado)
Visando celebrar o progresso feito pelo grupo, realizamos uma “festa das
cadeiras”. Na oportunidade cada pessoa deu um nome para a cadeira na qual
estava sentada, refletindo a sua percepção estética daquele espaço. Em se-
guida, praticamos o Jogo de Xadrez do Teatro do Oprimido (BOAL, 2002).
Como mostra a figura 8, o jogo consistia em (des)organizar as cadeiras pelo
espaço de forma aleatória. Os participantes permaneceram sentados, com
exceção de dois, sobrando apenas um assento livre. Destes atores que per-
maneceram em pé, um caminhava lentamente buscando sentar-se onde es-
tava vago, enquanto o outro assumia o papel de mediador que gestualmente
direcionava aqueles sentados para a cadeira vazia, tentando evitar que o pri-
meiro se sentasse. Através dos direcionamentos gestuais, o mediador incor-
porava metaforicamente o papel do líder em um ambiente autogestionário,
que se revela aquele que puxa e incentiva a ação dos demais atores mas que,
sem a participação sincronizada do coletivo, não alcança feitos significativos.
Pensar a diferença entre líderes, mediadores e seguidores por meio deste
jogo de teatro articulou dialeticamente a prática e teoria da autogestão. Os
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participantes perceberam que a opressão nem sempre se manifesta de ma-
neira explícita, mas também na forma como um oprimido reage à opressão
isoladamente, por exemplo, tomando uma postura autocrática ou lenien-
te em relação aos outros. Nesse experimento com Teatro do Oprimido, fo-
ram ensaiadas diversas reações à opressão, algumas com maior sucesso do
que outras.
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feitas intervenções artísticas nos registros fotográficos dos arquivos do LADO
(Fig. 9), como forma de rememorar o processo vivido e refletir criticamente
sobre ele, afirmando graficamente o posicionamento dos participantes do
laboratório em relação à opressão, enfim, de que LADO eles estavam.
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atividades pedagógicas voltados para temáticas contra-hegemônicas, como
por exemplo a roda de conversa “Por um design que liberte” ou o clube de
leitura do livro Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire (1980). Porém, essa
abordagem mostrou-se limitada para atrair novos participantes para o LADO,
principalmente por, de forma contraditória, ignorar os próprios preceitos
freireanos de uma educação que se desenvolva a partir do interesse dos edu-
candos. Para muitos designers em formação, principalmente no início do
curso, mesmo fazendo parte de diversos grupos oprimidos, a discussão so-
bre opressão e suas relações com o design não está entre suas prioridades,
fruto de uma consciência ainda ingênua. A partir da reflexão autocrítica,
o GT começou a adotar o princípio dos temas geradores de Freire (2021) e
pesquisar temas de interesse junto aos estudantes.
O tema mercado de trabalho foi abordado por meio de uma conversa so-
bre cooperativismo e outras formas não capitalistas de trabalho. Já o inte-
resse dos estudantes pela aprendizagem de softwares foi contemplado por
uma oficina de colagens digitais politizadas. A vontade de fazer ativismo
no design foi trabalhada na oficina de Lambe Lambe com temas ligados à
opressão. Como pode ser visto na Figura 10, essas ações conseguiram atrair
novos participantes. Os experimentos partiram de interesses que muitas ve-
zes ainda estavam na consciência ingênua dos estudantes, mas que puderam
ser abordados pelo processo de conscientização coletiva em níveis maiores
de criticidade gradualmente pela interação com colegas.
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figura 10. Oficina de Lambe Lambe e roda de conversa “Dá pra pagar boleto trabalhando para
movimentos sociais?”. (fonte: acervo do lado)
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4.2 Práticas extensionistas e projetos
existenciais com a comunidade externa
A formação crítica que se configurava no LADO não estaria completa sem a
tentativa de transformar a realidade da comunidade no entorno da univer-
sidade através da participação em projetos existenciais. O que o LADO busca
— e ainda está aprendendo a desenvolver — é uma práxis de design em que
a formação crítica e a prática extensionista ocorram em diálogo constan-
te, tal como Freire (2014) preconiza. Nesse sentido, o design participativo
do GT Nosso LADO e a pedagogia crítica do GT Pensamento Crítico visam
apoiar a produção de espaços críticos em diálogo com comunidades opri-
midas e movimentos sociais.
A seguir, descrevemos sucintamente três experimentos desenvolvidos
pelo LADO com a comunidade no entorno da universidade. “Construindo
nosso Iguaçu” (Fig. 11), em aliança com o movimento Uniperifa e O Povo
pelo Povo, que busca melhorar a infraestrutura pública de um bairro pe-
riférico que sofre descaso por parte da Prefeitura de Curitiba. Este projeto
de urbanização em favelas realocou pessoas próximas ao centro da cidade
para as áreas periféricas, deixando as pessoas desconectadas da cidade e
com pouco senso de comunidade. O projeto existencial identificou diversas
questões de sustentabilidade que exigiam o aumento desse senso de comu-
nidade, como, por exemplo, fazer lobby para a coleta pública de lixo. Após a
realização de uma oficina de design participativo, decidimos nos concentrar
na renovação do centro comunitário como um sinal do poder de mobiliza-
ção. Estudantes de design se juntaram ao coletivo Uniperifa para renovar
o centro comunitário de Iguaçú, fazendo também coisas que normalmen-
te não são associadas ao trabalho de design, como limpeza e organização
do espaço. Os estudantes aprenderam que precisavam se identificar com os
oprimidos para projetar e criar coisas com os oprimidos, pelos oprimidos
e para os oprimidos. Subvertendo a lógica da Prefeitura, os moradores da
comunidade passaram de meros usuários de projetos existenciais alheios
para assumir o papel de designers de seus próprios projetos.
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figura 11. Projeto Construindo Nosso Iguaçu. (fonte: acervo do lado)
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figura 12. Projeto ecoa. (fonte: acervo do lado)
Por fim, o Projeto Identidade (Fig. 13), em aliança com associações co-
munitárias e organizações de economia solidária, tem como objetivo desen-
volver identidades visuais para empreendimentos baseados na solidariedade
ou pequenos empreendedores em comunidades oprimidas. Nesse proces-
so de design, o método foi decidido em comunhão com os envolvidos. Um
exemplo disso foi quando a comunidade decidiu não seguir a proposta do
designer de desenhar os logotipos de forma colaborativa, o processo par-
ticipativo mais óbvio. Em vez disso, optaram por trabalhar em conceitos e
significados (momentos abstratos e estratégicos do processo de design) que
foram materializados pelos estudantes de design posteriormente. Além dis-
so, oferecemos cursos e consultorias sobre softwares e fotografia, visando a
emancipação da comunidade na criação de seus próprios materiais gráficos.
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figura 13. Projeto Identidade. (fonte: acervo do lado)
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através de um diálogo horizontal constante entre alunos e alunos, alunos e
professores, professores e membros da comunidade, alunos e membros da
comunidade, e membros da comunidade entre si. Nesses diálogos, anali-
samos e praticamos o design de maneira crítica, não existindo um método
rígido para guiar o desenvolvimento destes projetos existenciais, pois seria
contraditório com a premissa do design como um direito humano. Por ou-
tro lado, o praticamos como uma série de momentos que ditam nosso ethos,
respeitando a epistemologia da práxis. Os métodos mais adequados pare-
cem ser aqueles que colocam os oprimidos como protagonistas do projeto,
tal como o design participativo (EHN, 1988) e o Método Elos (ALVES, 2018),
que guiaram o GT Nosso LADO. Alguns pontos em comum que podemos
citar são: a) a aliança com movimentos sociais para desenvolvimento con-
junto desses projetos; b) a valorização das vozes de todos os participantes;
c) a presença em território fora das paredes da universidade; d) o papel do
design não como liderança, nem como mediação, mas sim como aliado so-
lidário que está pronto para ajudar como for necessário; e) a adoção de va-
lores como humildade, solidariedade, afeto e esperança; f) a valorização da
autonomia; g) a busca pela consciência crítica e pela superação de relações
de opressão a partir de nosso posicionamento político.
Admitir a inexorabilidade do design hegemônico implica em constan-
temente ressignificar e recriar o que entendemos como design. Conforme
Johan Redström (2017) ressaltou, todo design que emerge de um progra-
ma de pesquisa de design coerente é, ao mesmo tempo, uma definição de
design feita por meio desse próprio design. Isso não é apenas um exercício
linguístico. Redefinir o design permite aos designers acolher o “inédito viá-
vel” (FREIRE, 2021), abrindo portas para a ação transformadora, enquan-
to examina, simultaneamente, por meio da teoria, as contradições geradas
pelas ações dos designers.
Na construção participativa do espaço do laboratório, nos encontros
formativos e também no trabalho com movimentos sociais, os participan-
tes perceberam as opressões sentidas, mas que nem sempre são entendidas
claramente devido à consciência ingênua (VIEIRA PINTO, 2020). As práticas
realizadas dentro e fora do LADO denunciam estruturas injustas por meio da
inserção de análise crítica da realidade articulada pelos sujeitos ali presen-
tes. Esta denúncia é típica do processo de conscientização e emancipação
em um design participativo que acolhe as mais diversas pessoas e instiga a
geração da consciência crítica (SANTOS, 2002), visto que pretende possibili-
tar a desmistificação do mundo e a possibilidade de anúncio de um menos
desumanizante (FREIRE, 1980).
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Ao longo dos experimentos, percebeu-se como aqueles mais engajados
nas ideias e práticas foram além no processo de conscientização coletiva. A
vontade e a ação do ser com autonomia são indispensáveis para transfor-
mar em realidade a imagem subjetiva de um futuro a ser feito por meio de
projetos existenciais. Nesse sentido, é notável ver como alguns estudantes
participantes do LADO desenvolveram grande autonomia, conduzindo ações
de formação, como a oficina de Lambe Lambe, o clube do livro ou o desen-
volvimento do mural em homenagem a Paulo Freire. Entretanto, também
se mostra desafiador que essa autonomia ainda não esteja plenamente pre-
sente em muitos participantes do LADO, que têm dificuldade de se libertar
do papel de ouvinte passivo que a universidade na maioria das vezes lhes
confere (ANGELON e VAN AMSTEL, 2021).
Outro desafio que vem da epistemologia freireana é a práxis, conceito
caro ao LADO, mas que muitas vezes foi difícil de realizar, com momentos
do projeto muito focados em discussões críticas que pouco impactaram no
entorno, assim como momentos de muita ação onde a reflexão foi deixada
mais ao lado do LADO. O desenvolvimento da consciência crítica aliada à
transformação da realidade é um desafio constante.
No tocante à descrição aqui oferecida, nota-se a dificuldade de docu-
mentação, visto que a escrita centrada em “poucas mãos” não abarca essa
horizontalidade que buscamos no espaço do projeto existencial. Com o
argumento de uma neutralidade da forma, o campo específico da pesqui-
sa acadêmica é reducionista na representação das diferenças (ARCOVERDE
JUNIOR, 2021). Aqui fica o questionamento acerca dos limites de registro
no campo universitário: como documentar de forma a não propagar opres-
sões por meio da forma e da linguagem? Como criar registros de um proje-
to acadêmico que subverta os usos da linguagem, de maneira a reconhecer
a diversidade dos seres?
Com este trabalho, nos propusemos a pensar o design como projeto exis-
tencial e, portanto, um direito humano, lançando mão de dois pensadores
latino-americanos, Álvaro Vieira Pinto (2005; 2020; 2021) e Paulo Freire
(1980; 2021). A perspectiva dialético-existencial não é contra a profissiona-
lização do design; ela permite vislumbrar uma nova forma de atuação para
este profissional, como um catalisador do processo participativo de um de-
fensor do direito de se auto-projetar. Nessa perspectiva, todo ser humano
deve exercer seus direitos democráticos também no espaço do projeto, pro-
jetando assim suas existências através de um design participativo que insti-
gue a consciência crítica nas pessoas e as engaje na construção de um futu-
ro menos opressivo. Neste sentido, outros designs munidos de ferramentas
ontológicas e epistemológicas dos excertos Freireanos tem grande potencial
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 143-175. 170
para questionar “quem cria o mundo” e “quem tem o direito de projetar este
mundo”, bem como exercer esta práxis contra-hegemônica que é, ao nosso
ver, libertadora e revolucionária.
Referências
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Jogo Oasis. 2018. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de
Minas Gerais.
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Verlag, 1999.
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Doutorado. Arbetslivscentrum.
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BATISTA, Sâmia . Design como prática de liberdade: a rede Design &
Opressão como um espaço de reflexão crítica. In: CRUZ, Cristiano C.;
KLEBA, John B.; ALVEAR, Celso A. S.. (Org.). Engenharias e outras
práticas técnicas engajadas. Volume 2 – Iniciativas de formação
profissional. 1ed. Campina Grande, PB: EDUEPB, 2021, v. 2, p. 433-
468. http://eduepb.uepb.edu.br/download/engenharia-e-outras-
praticas-tecnicas-engajadas-vol-2/?wpdmdl=1836&masterkey=618ed6
8a15375
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Como referenciar
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Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 176-188. ISSN: 1984-5596
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Um livro é um livro; no entanto, se move
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1. Introdução
Os livros que comumente acessamos em nosso imaginário, enquanto sig-
nos, se distanciam cada vez mais daqueles livros com os quais temos conta-
to cotidianamente. Aquele códice tradicional perdeu o protagonismo – ou,
ao menos, a exclusividade nas estantes. Com a expansão das editoras e fei-
ras gráficas independentes, em especial, nos deparamos com uma varieda-
de imensa em relação à produção gráfica, bem como ao projeto gráfico. Em
tamanhos, extensões, acabamentos, impressões. Livros sem uma palavra, li-
vros feitos para serem destruídos, livros interativos. Livros de doze páginas
ou duas mil, livros que cabem na palma da mão ou maiores que uma pes-
soa. Livros de folhas avulsas, sem cola, grampo ou costura. Livros em en-
velopes ou de capa dura. O que tornaria todos esses objetos livros, de fato?
Já faz tempo que não cabe ao livro ser apenas folhas preenchidas, uni-
das por cola ou costura. Seus antecessores já fugiam a esse acabamento: ro-
los de pergaminho, placas de argila. Depois da invenção da prensa de tipos
móveis, a reprodução permitiu variações nas categorias de impressos, como
um jornal, uma revista ou um livreto; são todos artefatos capazes de carre-
gar textos, mas algumas mudanças em sua estrutura ou funções os fazem
ter outros nomes. Não precisariam se chamar livro. Porém, pensando ao
longo do tempo, seria mais fácil ampliar a definição de livro para abranger
todos esses suportes ou apelar para um neologismo? Uma tábua de argila
feita há mais de quatro mil anos estaria mais próxima do que entendemos
como livro do que um fanzine?
Quando trabalhamos com conceitos, pensamos em palavras ou expres-
sões que têm um peso de significação consolidado. O objetivo deles é, afi-
nal, capturar uma essência com alguma estabilidade; é aquilo que nos per-
mite reconhecer uma coisa dessa maneira, percebendo suas leis e estrutura
interna (breitbach, 1988, p. 122). Ele não deve ser confundido com o ob-
jeto, mas é, na realidade, um signo dele, para dizer em termos peircianos;
algo que busca representá-lo em alguma capacidade. É um símbolo, uma
convenção social: a palavra que permite que os falantes de uma mesma lín-
gua identifiquem aquilo enquanto conversam. O signo bem estabelecido é
aquilo que, por exemplo, nos permite falar a mesma língua sem precisar re-
correr a extensos sistemas sígnicos para colocar os interlocutores no mesmo
patamar. Sem conhecer a palavra livro, precisaríamos dizer, por exemplo:
“objeto portátil que carrega uma extensão de conteúdo verbal e/ou visual”,
tornando a troca mais complexa.
Assim, propomos uma reflexão sobre o que compõe a suposta essência de
um conceito, ou de uma ideia, aplicada nesse objeto simultaneamente fami-
liar e peculiar que é o livro. Colocamos essa discussão como uma provocação
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 176-188. 178
para nos localizarmos diante de convenções (como é dar nome a algo) e
os automatismos derivados delas (como é compreender, sem esforços, que
certos objetos detêm certos nomes). O livro é uma escolha assertiva, visto
que acompanha a história da humanidade; anda lado a lado com a história
da escrita e pode, assim, retratá-los: humanidade e registro. Ademais, com-
preender a essência desse objeto demonstra-se um desafio real. Existe uma
máxima bem difundida para a escrita, que é a de que, para quebrar as regras
com maestria, é preciso conhecê-las bem. Sem saber em que consiste um
livro, temos a mesma fluidez ao criar esse objeto, como designers, editores,
escritores, leitores? Ter certo domínio da definição de livro pode aperfeiçoar
processos e criações editoriais e nos permitir organizar nossos ofícios com
mais precisão e criatividade ao redor desse objeto? Questões relativas à ca-
pacidade da língua, de nos dar bases para estimar a materialidade que os
conceitos guardam, podem ser consideradas como wicked problems1? Essas
são algumas das indagações que levantamos para nos orientar de modo a
nos aproximar de uma solução adaptável, mas não fluida em demasia.
2. Um livro é um livro
Dentre as definições possíveis para o livro, citamos algumas. É um produ-
to portátil que consiste em páginas de conteúdo reunidas. Parte da relação
entre um substrato, que pode ser físico ou digital, e um conteúdo, que pode
consistir de palavras, códigos e imagens (schmidt; santos, 2020). Em re-
lação ao conteúdo, é a forma mais antiga de registrar conhecimentos, ideias
e crenças (haslam, 2007, p. 6). Para a Unesco, restringe-se a “uma publica-
ção impressa não-periódica com, no mínimo, 49 páginas envoltas por capas,
publicada em um país e disponibilizada ao público” (ribeiro, 2011, p. 98).
Segundo a lei nº 10.753, de 30 de outubro de 2003, artigo 2º, é “a publicação
de textos escritos em fichas ou folhas, não periódica, grampeada, colada ou
costurada, em volume cartonado, encadernado ou em brochura, em capas
avulsas, em qualquer formato e acabamento” (brasil, 2003). Também: é
um “símbolo histórico, entrecruzado por textos que possuem estabilidade
de informação”, e o conteúdo se estenda no tempo (araújo, 2008). Por isso
é apreciado; valorizamos a sua durabilidade por concebermos sua existência
como algo que faz perdurar a memória da humanidade (gomes; carvalho,
2022). Talvez, a descrição mais valiosa seja a que contempla sua importância
1 Wicked problems, ou “problemas perversos”, é um termo cunhado por Horst Rittel na dé-
cada de 1960 para designar problemas mal formulados do sistema social, em que as va-
riáveis para abordá-los são diversos e a informação se ramifica, dificultando a tomada de
decisões e impossibilitando uma solução definitiva (buchanan, 2022).
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no desenvolvimento da humanidade, intelectual, cultural e econômico (has-
lam, 2007, p. 12). “Livros de papel já eram mídias móveis”, como disse Ana
Elisa Ribeiro (2011, p. 98).
Buscar descrições é evitar a armadilha da definição circular: um livro é
um livro! Ou: um livro é aquilo que seu criador nomeou como um livro.
Em um dicionário, a circularidade ocorre quando uma palavra é definida
por um sinônimo (costa; silva, 2018), e assim, não se agregam novas in-
formações ao fazê-lo, como ao recitar um silogismo2. Dessa maneira, não
se enquadra naquilo que investigamos: compreender no que consiste o livro
enquanto definição, a partir da premissa de que o conceito compõe e guia
a observação; logo, nossa interpretação do que é o livro interfere em nossa
relação com ele: seja construindo-o ou lendo-o.
Ribeiro e Milani (2009, p. 56-59) sintetizaram os propósitos do conceito
para o conhecimento, bem como seu esvaziamento, da seguinte maneira:
2 Um silogismo bem conhecido é aquele expresso pela dedução “todo homem é mortal”.
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hipotético que determina o tanto de abrangência que um conceito deve ter
e o quanto de indeterminação precisa ou pode resguardar. Pensamos aqui
no conceito em três utilidades específicas: 1) um signo convencionado que
torna a comunicação uma possibilidade; 2) aquilo que nos permite conhe-
cer, interpretar e criticar algo e, por consequência, 3) participa de nossa re-
lação com a realidade, com a linguagem e com os fenômenos, interferindo
em nossa percepção sobre eles.
Se a característica fundamental de um livro é ser portátil3, o que excluiria,
portanto, as primeiras tábuas de argila com inscrições como “livros”, per se,
como tomamos projetos como o Guinness World Records, com categorias
de maior livro, ou mais pesado4? De que tipo de portabilidade se trata? As
tábuas de argila não seriam de transporte mais fácil do que os extravagantes
livros “recordistas”? Estaria, então, necessariamente relacionado ao papel,
negando possibilidades como o livro de tecido5? Seria definido pelo propó-
sito, o grande norteador: transmitir textos? Como ficariam, então, os livros
apenas ilustrados, com fotografias, colagens ou ilustrações?
Para abstrair as definições levantadas anteriormente, propomos um olhar
para o conceito como movente e referencial, mais relacionado a uma ideia
hieraclitiana, desenvolvida a seguir com o auxílio de uma história.
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significante-significado, não configura uma contradição (ou uma heresia,
para entrar nos termos da história) dizer que um conceito pode ser bem
definido (ou seja, não cair em uma tautologia “um livro é um livro”) e, ain-
da assim, se transformar: sofrer alguma mutação por se adequar e adaptar
ao contexto – inclusive, histórico.
Para complementar esse raciocínio, lançamos mão de uma história como
um apoio para a explicação: um paradoxo conhecido como O navio de Teseu.
Defendemo-lo como uma metáfora para se pensar definições que persistem,
ainda que com mudanças, ao longo dos anos. A seguir, o incorporamos a
partir da nota de rodapé de Vieira (2019, p. 13):
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coletivo. A noção de processo criativo eterno, onde as semioses não se en-
cerram, faz parte da semiótica de Peirce e da crítica de processos6. O movi-
mento é a regra: a ciência está em constante aperfeiçoamento, projetos de
design podem sempre receber novas edições ou rebrandings, artefatos mu-
dam quando as condições sociais e econômicas o permitem – ou o obrigam.
É possível dizer que tudo muda, mas segue o mesmo?
Se pensarmos no artefato como o objeto que cumpre certo propósito em
um momento de determinada sociedade, mais do que o meio físico que pos-
sibilita que isso aconteça, o livro poderia, sim, mudar nesse deslocamento
temporal, e ainda conter em si a imaterialidade de sua função: carregar, da
maneira possível para aquele contexto, uma informação. O livro é o índi-
ce que permite a interação da leitura. As maneiras (de processo até os ma-
teriais escolhidos) se diversificam conforme a sociedade se modifica, sem
deixar de incorporar os antecessores. Em sua plasticidade, afinal, a língua
também é viva, passa a agrupar novas variações. A questão que permanece
é que, para dar conta de englobar todos esses momentos e variações em um
mesmo período, a definição se torna cada vez mais vaga, imprecisa. Definir,
no entanto, é delimitar, e uma nova contradição se acende. Nosso navio, ao
não abrir mão de nenhuma peça, sendo estas cobertas, envernizadas, guarda
para si todos os fragmentos. Mesmo aqueles dos quais ele precisa se livrar,
continuam residindo em sua história – e talvez, em algum porão. O navio
livresco são dois, são todos os derivados.
O livro diz respeito ao contato com o leitor. Um livro que jamais saiu da
gaveta do autor não seria um livro, de fato, pois este não contribuiria para o
desenvolvimento da humanidade, como mencionado por Haslam (2007, p.
12). Existe algo nas definições listadas que pode configurar um complemen-
to. Para complementar a precisão conceitual, podemos deslocar a questão
para outro centro; é isso que o pensamento em wicked problems nos pro-
porciona. Rittel e Webber (1973) já haviam colocado: redefine-se a sintaxe
“o que estes sistemas fazem?”, ao invés de “do que estes sistemas são feitos?”,
onde a própria elaboração do problema é um wicked problem, que se en-
cerra não por tê-lo resolvido, mas por considerar o ponto em que chegou
“suficientemente bom” (rittel; webber, 1973, p. 162).
Para chegar até o leitor, esse texto precisa tomar alguma forma, seja ela a
partir de um dispositivo como o leitor de e-books, seja o papel encaderna-
do. A portabilidade, no entanto, permanece ambígua. Móveis são portáteis,
no sentido de que podem ser deslocados de um ambiente a outro. Podem
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pesar cinco ou quinhentos quilos; caso não estejam fundidos a um piso ou
parede, são, sim, portáteis; móveis, moventes. Há livros em diferentes níveis
de portabilidade. Para Gill (1988, p. 105), o design do livro deve ser guiado
pelas mãos e pelos olhos:
A book is a thing to be read — we all start with that — and we will assu-
me that the reader is a sensitive as well as a sensible person. Now, the first
thing to be noticed is that it is the act of reading & the circumstances of
that act which determine the size of the book and the kind of type used;
the reading, not what is read. A good type is suitable for any and every
book, and the size of a book is regulated not by what is in it but by the
fact that it is read held in the hand (e.g. a novel), or at a table (e.g. books
of history or reference with maps or other necessarily large illustrations),
or at a desk or lectern (e.g. a missal or a choir book), or kept in the po-
cket (e.g. a prayer book or a travellers’ dictionary)7.
7 Em tradução livre: Um livro é algo para ser lido – vamos começar por isso – e vamos as-
sumir que o leitor é tão sensato quanto é sensível. Agora, a primeira coisa que devemos
perceber é que é o ato da leitura e as circunstâncias daquele ato que determina o tamanho
do livro e o estilo tipográfico usado; a leitura, não o que é lido. Uma boa tipografia é ade-
quada para qualquer livro, e o tamanho do livro está de acordo não pelo que está nele, mas
sim, pelo fato de que é lido e segurado nas mãos (ex: um romance) ou na mesa (ex: livros
de história ou referência com mapas ou outras ilustrações grandes) ou em uma escrivani-
nha ou atril (ex: um missal ou livro de coro), ou mantido no bolso (ex: um livro de oração
ou um dicionário de viagem).
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É inerente ao conceito se mover em alguma perspectiva. O que pode apa-
rentar contraditório não é algo inválido; contraditório e coerente não são
antagônicos. Por isso, é possível pensar em coisas que mudam, mas perma-
necem as mesmas, em algum grau ou perspectiva. Não diríamos “livro de
papel” por ser uma redundância, a princípio, mas o “livro de tecido” troca
algumas placas de madeira do navio, sem deixar de sê-lo; chama a atenção
para o material por ser algo fora do esperado, bem como dizer “livro digital”.
A referência do livro desde a invenção do códex de papel é o próprio códice.
Por mais que nem todos os livros sejam de papel, tê-lo como esse núcleo é
importante para que a vagueza, no geral, não nos engula em suas elabora-
ções cheias de incerteza. Mantilla (1999) denuncia a vagueza na linguagem
utilizada, de modo geral, por teóricos do pós-modernismo, e afirma que se
utilizam de uma escrita cheia de nuances, incertezas de modo que chega a
confundir o leitor, fazendo-o duvidar da própria capacidade intelectual. É
valioso preservar um pouco das essências de Platão para que a confusão da
linguagem não nos paralise. E voltamos, por fim, ao dito popular que afir-
ma ser importante conhecer as regras para saber como quebrá-las – e iden-
tificar onde é possível fazê-lo.
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projeto gráfico e da proposta de produção gráfica. Assim, para cada momen-
to sociocultural, escolher criar um livro do modo mais convencional àquele
momento representa uma proposta; desviar, traz outros sentidos. Seja em
rolo, códice ou lâminas avulsas, o livro é regido por uma ordem interna que
não se oferece em um só momento. Por esse motivo, a informação é recor-
tada pela moldura da mancha gráfica: a parte que se apresenta ao leitor em
determinado momento, lida tabular e linearmente.
Defendemos que, sim, conhecer a fundo a definição de um artefato inter-
fere em sua confecção ao atravessar dimensões do objeto que, muitas vezes,
não tomamos consciência, e alcançá-las pode alavancar novas conexões na
criação. É, sim, possível que o conhecimento engesse alguns; isso diz res-
peito à interação de cada sujeito com a informação, em sua subjetividade.
Mas é inegável que reconhecer uma estabilidade, um limite próprio do ar-
tefato, funciona como um ponto de orientação. Criar irrestritamente é uma
pressão imensa. A partir de algumas margens organizadoras, transitamos
melhor no processo.
Chamamos a atenção para algumas regras gerais sobre os wicked pro-
blems, conforme traduzido em Buchanan (2022): o problema não ter uma
formulação definitiva, e estabelece uma solução de acordo com a questão,
que irá ressaltar determinada perspectiva ou viés; para responder a esse tipo
de elaboração, não há uma maneira de saber que se alcançou uma solução
definitiva, e sim uma suficientemente boa; além disso, solucionar aquela
formulação em determinado contexto e temporalidade não é atingir a tota-
lidade da questão. A discussão filosófica acerca de definições é incorporada
ao design de modo que possamos refletir sobre por que as coisas são como
são (silva, 2019, p. 208), o que nos permite também arejar nossa percepção
a respeito dos automatismos – na interpretação e na criação de um projeto.
Referências
ARAÚJO, Emanuel. A construção do livro: princípios da técnica de
editoração. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Brasília: Instituto Nacional do
Livro, 1986.
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BUCHANAN, Richard. Wicked problems no pensamento de design.
Estudos em Design, v. 30, n. 1 (2022), p. 6‐27. https://doi.org/10.35522/
eed.v30i1.1382. [Tradução do artigo “Wicked Problems in Design
Thinking”, de 1992].
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 176-188. 187
[S. l.], v. 17, n. 2, p. 1–13, 2020. DOI: 10.51358/id.v17i2.837. Disponível
em: https://infodesign.org.br/infodesign/article/view/837. Acesso em: 14
out. 2022.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 176-188. 188
Como referenciar
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DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.74701
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Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 176-189. 189
arcos design
Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. ISSN: 1984-5596
v. 17, n. 1, Janeiro 2024
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/arcosdesign
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Prospectando qualidades relacionais na educação
em Design através da quilt-terapia
Abstract: The COVID-19 pandemic deeply altered the well-being and mental
health of humanity. People were forced to isolate, stay at home, to interactions
mediated by virtual environments. The return to in-person classes was trau-
matic, full of uncertainties and fears compound with stress, anxiety, decline
of well-being and, most importantly, negation of Being. This study explores
the relational aesthetics of quilt-therapy as a means for reconstruction of the
being among Design students. The making of a quilt of pieces that reflect the
experience of surviving the pandemic reveal qualities that are historically ne-
glected in Design Education, such as empathy, trust and care.
Keywords: Design Education, Quilt aesthetics, Design and Well-being.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 191
1. Introdução
A pandemia COVID-19, os mecanismos criados para a sua mitigação e as
ações necessárias para sobrevivência à doença relacionada geraram impactos
globais cujos escopo e escala não encontram precedente na história huma-
na recente. Praticamente todos os sobreviventes da pandemia tiveram seu
bem-estar comprometido por problemas biológicos e mentais. Infelizmente,
muitos desses problemas continuam existindo alguns anos após o ponto
mais preocupante da pandemia (WANG, MARKERT e SASANGOHAR, 2021;
KHANNA e JONES, 2021; GILSBACH, HERPETZ-DAHLMANN e KONRAD, 2021;
KELLER et al., 2022; LI, 2023).
Segundo a secretaria da OMS (Organização Mundial de Saúde - World
Health Organization) (WHO, 2022), a saúde mental é um estado de bem-es-
tar que permite que as pessoas realizem seu potencial de ser em conjunto
com outros seres humanos, ou seja, um estado que permite lidar com es-
tresse, aprendizagem, trabalho e tomada de decisões. Esse tipo de bem-es-
tar não significa ausência de sofrimento mental, mas sim a capacidade de
lidar com o mesmo. A pandemia, por exemplo, é considerada como um so-
frimento que muitas pessoas não conseguiram ainda superar, enfim, é um
trauma coletivo (NEGRI et al., 2023).
Diversas pesquisas buscaram mitigar o impacto da pandemia na saúde
mental dos estudantes através de abordagens pontuais. Li (2023), por exem-
plo, faz uma revisão de uso de tecnologias digitais para melhoria de bem-es-
tar e saúde mental após a pandemia. Teleterapia, saúde móvel, intervenções
via web entre outras formas de tratamento são as mais citadas nesses estudos.
Em larga medida, esses estudos restringem o papel da comunidade aca-
dêmica ao de mero indicador do sistema de saúde (SHAPIRO, LEVINE e KAY,
2020) ou como um contexto para intervenções mediadas por tecnologias
(WANG, MARKERT e SASANGOHAR, 2021; VIARDOT, BREM e NYLUND, 2023).
Se por um lado as tecnologias auxiliam na conectividade e na realização de
atividades impedidas durante a pandemia, por outro lado, as tecnologias
também aumentaram a insegurança, stress e ansiedade (SARANGI et al., 2022).
Estudos como esse propõe soluções digitais individualizadas para proble-
mas de natureza social, que pertencem ao domínio da Saúde Coletiva e da
Educação, nem sempre considerados. A limitação principal de tais estudos
é avaliar a qualidade mediadora da tecnologia por uma perspectiva objeti-
ficante que exclui seu papel relacional entre o mundo material e o mundo
humano (MISA, 1992). A tecnologia é considerada na sua eficácia, eficiên-
cia, custo ou facilidade de uso, mas não em suas qualidades relacionais, isto
é, nas qualidades que se tornam evidentes apenas quando faz parte de um
mundo de seres que se relacionam.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 192
Em um cenário em que estudantes experimentam impaciência, relações
fragilizadas, aumento no comportamento agressivo, baixo rendimento no
processo de aprendizagem, aumento de faltas às aulas por motivos associados
à saúde mental, dentre outros, as qualidades relacionais precisam ser prio-
rizadas na avaliação de tecnologias educacionais. Segundo a Organização
Mundial de Saúde (WHO, 2022), a falta desse tipo de qualidade é detrimen-
tal para que o ser humano possa experienciar toda a sua potencialidade, o
ser mais que é historicamente negado pela opressão (Freire, 1972).
Até o presente momento, não há estudos específicos sobre como culti-
var qualidades relacionais na Educação em Design, porém, existem estu-
dos sobre como cultivar tais qualidades na prospecção de transições em
sistemas sociotécnicos (Van Amstel, Botter e Guimarães, 2022). Nessa toa-
da, o Design Prospectivo trata o ser humano como um ser dependente de
vários outros seres e, por isso mesmo, melhor definido como um interser.
Conforme Daniel Wahl (2020, p. 136) observa, “a palavra interser descreve
uma mudança de percepção de si e do outro que mora no centro de cocriar
culturas humanas regenerativas e uma presença sustentável dos humanos
na Terra”. O desafio primordial que se coloca para o Design Prospectivo é
desenvolver uma percepção e uma expressão estética do interser. Para isso,
o Design Prospectivo recorre ao conceito de qualidades relacionais desen-
volvido por Cipolla e Manzini (2009).
Um dos principais impactos da COVID-19 é a dificuldade de perceber as
qualidades relacionais cultivadas por interseres. A disseminação de informa-
ções falsas não é apenas um problema técnico, mas uma doença do interser
coletivo que é a sociedade conectada por tecnologias digitais: a infodemia
(PELANDA e VAN AMSTEL, 2021). A pandemia tornou visível uma série de
relações fundamentais para a existência do ser humano que estavam invisí-
veis nas infraestruturas automatizadas do cotidiano. Realizar um estudo so-
bre qualidades relacionais na Educação em Design no momento de retorno
às aulas é uma oportunidade para contribuir não só para este campo, mas
também para o Design Prospectivo e outras estéticas relacionais. Embora
hajam estudos que destaquem a necessidade de incrementar práticas rela-
cionais no campo do Design (ALMEIDA et al., 2019), não há estudos empíri-
cos que destaquem o papel das qualidades relacionais no interser do Design.
O presente estudo busca preencher essa lacuna a partir de experimentos
pedagógicos conduzidos pelo primeiro autor como parte da disciplina de
Semiótica do Curso de Bacharelado em Design, ofertada em uma univer-
sidade federal pública de uma grande capital do país em 2022. Os experi-
mentos começaram quando o primeiro autor percebeu múltiplas dificulda-
des para executar o planejamento pedagógico típico. A estudantada estava,
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 193
de uma maneira geral, ansiosa, dispersa, desmotivada, estressada, irritada,
desafiadora. As atividades propostas não eram realizadas. Os atritos entre
seus colegas eram frequentes.
Em um primeiro momento, o primeiro autor alterou a sua prática peda-
gógica e adotou a quilt-terapia como abordagem para criar um ambiente
em que os estressores da pandemia fossem dissipados e ao mesmo tempo
trabalhar a percepção estética de qualidades relacionais. A proposta foi fei-
ta para as quatro (04) turmas, tendo sido aceita por três (03) delas. Na tur-
ma que não aceitou a proposta, outras atividades foram realizadas, cujo teor
fogem ao escopo deste relato.
Considerando a estética quilt, que é, pela sua natureza, colaborativa, ar-
tística e projetual (MENEGUCCI, MARTINS e MENEZES, 2016), foi levantada
a seguinte questão: que qualidades relacionais os estudantes estão sentin-
do falta e, ao mesmo tempo, estão precisando para realizar o seu interser?
A palavra quilt provém do latim culcita, uma espécie de coberta. O quilt
pode servir como lazer (cuja feitura é por puro prazer), como exercício e
também como um produto de valor comercial. Takiguchi et al. (2022) in-
dicam que a participação em atividades de lazer promovem o bem-estar e
a saúde mental. A feitura do quilt também é considerada terapêutica, pois
permite refletir sobre o feitio do próprio interser (MAINARDI, 1982; DICKIE,
2011a; DICKIE 2011b). Neste estudo, o processo de feitura durou três sema-
nas e culminou na costura coletiva das peças criadas por cada participante.
As peças continham representações de sentimentos, objetos, desejos, luga-
res etc., que proporcionassem uma ou várias qualidades relacionais. Este
artigo apresenta alguns conceitos teóricos, o processo de feitura dos quilts
e os depoimentos de alguns estudantes que foram questionados sobre os
possíveis efeitos terapêuticos da atividade. O objetivo é destacar o papel das
qualidades relacionais no projeto de ser em conjunto, o chamado interser.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 194
Dentre os principais fatores estressores desse momento, podemos citar os
de estilo de vida (distanciamento social, convivência forçada etc.), os orga-
nizacionais (as aulas passaram a ser mediadas por computador), os finan-
ceiros (dificuldades de manter ou achar emprego), os sociais (falta de con-
tato pessoal presencial) e, claro, os ambientais (sair de casa representava um
risco de morte). Na pesquisa de Hamouche (2020), as principais fontes de
preocupação foram: a percepção de falta de segurança e risco de contágio,
a obesidade, o desconhecido, a quarentena e o confinamento, o estigma e a
exclusão social e as inseguranças financeiras.
Aksunger et al. (2023) apontam um aumento de prevalência de depressão
de mais de 25% em países de baixa renda — um número expressivo que não
encontra a devida atenção nos estudos científicos. Outros estudos, como o
de Dale et al. (2023) corroboram estes achados ao apontarem sintomas se-
veros negativos de bem-estar, depressão, ansiedade, insônia (MEAKLIM et
al., 2021), qualidade de sono e de vida. Brausch, Whitfield e Clapham
(2023) notaram um aumento nos casos de hospitalização, abuso de substân-
cias tóxicas e pensamentos suicidas durante a pandemia. Foti (2023) diz que
os transtornos causados pela pandemia equiparam-se aos Transtornos de
Estresse Pós-Traumático. Um dos fatores apontados em seu estudo é a falta
de apoio de colegas. Os jovens confidenciam mais com seus pares do que
com profissionais, porém, com a interrupção do contato, eles não tiveram
com quem compartilhar suas angústias(KUTCHER, WEI e CONIGLIO, 2016;
MüLLER, DELAHUNTY e MATZ, 2023).
As instituições agravaram os problemas (COLIZZI et al, 2023; FOSTER et
al, 2023). A imprensa tradicional não fez seu papel investigativo e de in-
formação, o que abriu espaço para a divulgação de mitos, mentiras e de-
sinformação por meio de redes sociais, a chamada infodemia (PELANDA e
VAN AMSTEL, 2021). Alguns governos minimizaram as mortes e as taxas
de transmissão; divulgaram mentiras em relação às vacinas. A ciência teve
problemas iniciais na determinação das formas de transmissão e infecção;
mas a ciência agiu de forma cooperativa e rápida na criação da vacina (VAN
AMSTEL, GUIMARÃES e BOTTER, 2021). Neste quadro, as medidas tomadas
eram incoerentes, incertas, o que aumentou a insegurança quanto à segu-
rança individual e coletiva. As interações eram feitas sempre com receio, e
as comunicações eram, via de regra, mediadas por sistemas computacionais.
O aumento de problemas de bem-estar e saúde mental foi uma decorrência
deste caos que instalou-se.
Embora múltiplas pessoas jovens tenham facilidade de manter interações
sociais online (POZZA et al., 2023), Nia e Jia (2023) dizem que as interações
pessoais (ou seja, presenciais, sem a mediação de sistemas) são cruciais para
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melhorar e manter o bem-estar, a saúde mental e física. Por exemplo, em
relação ao trabalho, Yao et al. (2023) reportam que o uso excessivo de tec-
nologia pós-pandemia pode ter aumentado a procrastinação.
A transição que ocorreu pós-pandemia, com a volta das aulas presen-
ciais não se deu sem os seus medos e problemas. Por exemplo, as pessoas
saíram da proteção de suas casas para ambientes em que estão expostas a
agressões, riscos, insultos, discriminação, ataques pelo fato de usar ou não
a máscara, entre outros.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 196
adquiriu significações condizentes com o propósito de sua criação, como o
quilt-comunidade, o quilt-acolhimento, o quilt-celebração, o quilt-história,
o quilt-união, dentre outras possibilidades (MAINARDI, 1982; TORSNEY e
ELSLEY, 1994; BLAIR e MICHEL, 2007; DICKIE, 2011a; DICKIE, 2011b; HOWELL
e PIERCE, 2011).
Podemos, então, falar da estética do quilt-terapia: sua natureza mesmo
de reunir “retalhos” por meio de ações de costura, remendos, busca formar
uma unidade. Este processo, colaborativo, proporciona o ambiente em que
qualidades relacionais emergem na expressão estética. Berkenbroc-Rosito
et al. (2021), por exemplo, utilizaram uma metodologia análoga à de con-
fecção de um quilt para formar professores, e construir a identidade de en-
sino da pessoa. Para as autoras, a feitura envolve o entendimento do inter-
ser — ao narrar a sua história, a pessoa reflete sobre si, seu lugar no mundo
e suas relações com este mundo. Já Patricia Polacco (1988) conta a história
de um quilt feito por uma família de imigrantes para ajudar a lembrar as
origens, e trazer para perto as pessoas lá deixadas. O quilt era o símbolo de
amor e fé para a família.
Em um outro estudo, Dickie (2011a, 2011b) elenca as diversas aprendiza-
gens que ocorrem na feitura de um quilt: aprender a técnica, as ferramentas,
a estética; aprender a reconhecer-se como membro da cultura que faz qui-
lt, que a pessoa é uma fazedora de quilt e aprender a participar. Na Saúde
Pública, Blair e Michel (2007) apresentam o Quilt Memorial da AIDS, que
marca a vida e morte de milhares de pessoas, além de representar centenas
de milhares de outras pessoas que não são nomeadas explicitamente, pro-
vendo assim espaços para múltiplas formas de rituais para lembrar os mortos.
Mainardi (1982) mostra a importância utilitária do quilt, e acrescenta a
este dimensões artísticas, políticas, pessoais, religiosas, abstratas etc. A au-
tora afirma que as mulheres tinham essa liberdade de criar nos quilts uma
vez que o trabalho não era mesmo considerado arte. No entanto, Blair e
Michel (2007) apontam que o quilt não se restringe à hierarquia mãe-filha
de transmissão, mas seguia sim uma abordagem de inclusão para além desta
hierarquia. Dickie (2011a, 2011b) elenca os benefícios terapêuticos da prá-
xis, do fazer, focando na feitura de quilts. Para a autora, a terapia refere-se
à maneira como a feitura dos quilts-terapia foi usada para lidar com situa-
ções difíceis ou para proporcionar sensações de bem estar.
Busca-se, portanto, na estética do quilt-terapia, a reconstrução do interser,
do propósito, da amizade, dos elementos que trazem valores de companhei-
rismo e afeto. Esta estética permite que o interser se reconheça livremente.
Para Witzling (2009), a estética quilt-terapia tem o potencial de transformar
fragmentos em unidades, em outras palavras, seres em interseres.
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4. Metodologia
A pesquisa teve caráter exploratório, usando de conceitos de Semiótica e
quilt-terapia para criar um ambiente seguro, acolhedor, que promovesse a
aproximação, a conversa e a criação de laços. Enquanto um experimento
pedagógico, a proposta de trabalhar com a estética quilt foi feita com a in-
tenção de promover reflexões pessoais e em grupo, discussões, conversas
motivacionais, compartilhamento de histórias, troca de informações, coo-
peração em atividade, seguindo de perto a proposta de Ni e Jia (2023).
Enquanto um experimento de design, esta é uma pesquisa através do de-
sign, ou seja, feita através do design (FRANKEL e RACINE, 2010). Nesse tipo
de pesquisa, o desenvolvimento do projeto é a forma epistemológica mes-
ma que produz conhecimentos que podem vir a ser generalizados a partir
da reflexão-na-ação (REDSTRÖM, 2017; KOSKINEN et al, 2011; SCHÖN, 2009).
Desta forma, a feitura dos quilts é o meio da pesquisa, valorizado pelo ca-
ráter prospectivo adotado neste trabalho. O resultado, que envolve a refle-
xão sobre todo o projeto, da ideia inicial ao produto final, foi identificar as
qualidades relacionais que possam ser cultivadas na Educação em Design.
Podemos esquematizar o processo adotado como a seguir:
I - Identificação dos fragmentos resultantes dos estressores da pandemia e
da volta às aulas na estudantada
II - Discussão geral de formas de reconstrução do interser
III - Discussão geral de como significar o bem-estar e a saúde mental
IV - Discussão da estética relacional do quilt-terapia
V - Discussão de como a estética relacional do quilt-terapia pode ressigni-
ficar o bem-estar e a saúde mental
VI - Produção das peças individuais
VII - Produção dos quilts
Os estudantes ficaram surpresos e empolgados em realizar uma atividade
artesanal dentro de uma disciplina de teoria. Esta empolgação cresceu na
medida em que os mesmos foram compreendendo o potencial terapêutico
do quilt. O fazer coletivo se tornou um momento de reflexão, crescimento,
acolhimento, lazer, suporte e apoio.
As peças criadas em grupo e que seriam posteriormente incorporadas ao
quilt-terapia do grupo eram signos do estado desejado, e/ou das ações que
poderiam levar ao estado desejado, das atividades que tornaram-se possí-
veis com a volta das aulas presenciais, do encontro com o outro, com o ou-
tro etc. A incorporação destas peças deu-se por meio da costura das mes-
mas em colchas de retalhos. O momento da celebração, do entendimento
do processo de reconstrução do interser, simbolizado pela estética da qui-
lt-terapia, foi uma forma de pensar pelo fazer.. O desenho produzido por
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um dos estudantes a partir do diálogo com o educador (Figura 1) sintetiza a
proposta estética: “Sejamos guarda-chuva, um misto de proteção, acolhida e
conforto, mas também disposição para ir lá enfrentar o que for necessário”.
O tema principal foi definido como “Bem-estar e Saúde Mental Pós-
Pandemia”. Cada grupo de estudantes escolheu um sub-tema: memórias,
sentimentos, atividades possíveis com o encontro presencial. Em sua maioria,
as peças foram otimistas, prospectando relações possíveis em um presente
alternativo. A partir dessas peças individuais, as turmas foram convidadas
a costurar quilts que tivessem aderência ao tema principal.
A participação era voluntária e os grupos adotaram a prática de autoges-
tão para se organizar. Os sub-temas variaram entre os problemas que en-
frentaram durante a pandemia; as qualidades de uso das tecnologias coti-
dianas; atividades que puderam fazer uma vez que as aulas voltaram a ser
presenciais, dentre outros.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 199
A estética quilt permite a costura alinhavada, solta, reproduzindo um pos-
sível estado de não-totalidade, usando peças que significam a reconstrução
do interser a partir das experiências fragmentadas que a vida proporciona.
O primeiro experimento coletivo foi um quilt memorial, que serviu como
um processo de aprendizagem (DICKIE, 2011b) sobre as ferramentas e lin-
guagens disponíveis para os demais quilts produzidos.
Após a criação do quilt memorial, os grupos trabalharam na confecção
dos quilts finais. Foram projetados 10 quilts no total, cada um contendo, em
média, 14 peças. O processo de montagem dos qui demandou capacidades
de articulação e negociação para escolher qual peça deveria estar mais pró-
xima da outra (Figura 3).
5. Resultados alcançados
Cada peça tem a sua história semiótica, sobretudo porque elas eram repre-
sentações do interser que as produziu, e, portanto, carregavam consigo o
contexto, as interações, as condições de produção e as escolhas feitas embu-
tidas em signos. Cada peça podia ter sido produzida pelo estudante sozinho
ou com a ajuda de colegas. Ela podia ter sido levada para casa e feita com a
ajuda de familiares, quiçá retomando laços afetivos perdidos. A peça podia
ter sido motivo de discussão em grupo, cujo apoio tenha sido fundamental
na sua realização. Estas considerações estão aqui colocadas como um ponto
para lembrar do papel da participação, da colaboração, e do grau de refle-
xão que cada interser colocou na peça. Sendo assim, podemos considerar
que a peça também fala por si mesma.
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As peças da Figura 4 funcionaram como um sistema de significações de
empatia e cuidado, enfim, o amor, seja ele fraterno ou romântico. As peças
comunicam um desejo de aproximação, de criação de laços; e falam do re-
torno do encontro com a natureza. Elas comunicam a vontade de re-plan-
tar o jardim para que as borboletas venham, como diz a vox populi. A liga-
ção da natureza com a saúde voltou a ganhar destaque durante a pandemia,
quando percebeu-se que o comportamento extrativista da sociedade foi
uma das causas da mesma.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 201
As peças acima são um apanhado do total de peças produzidas. Buscou-se
representar a estética quilt-terapia e as múltiplas representações da estudan-
tada serviram para enriquecer o processo de reconstrução do interser. Na
próxima sessão, será apresentada uma análise dos quilts sobre as qualidades
relacionais sentidas e representadas durante e depois do processo de feitura.
Conversa com colegas”, “trabalho em grupo”; “inte- ambiente pedagógico de projeto para laços
ração e apoio de colegas”; “união”; “descontração
Fonte: Os autores
Podemos ver pelas respostas que o processo de design do quilt foi consi-
derado descontraído e divertido. O trabalho manual trouxe relaxamento e
distração dos problemas imediatos do cotidiano. O trabalho em grupo fa-
voreceu a criação e fortalecimento de laços de amizade em um ambiente
seguro e de apoio e união. Várias respostas referiam-se à qualidade trans-
formadora para o bem-estar e saúde mental. A aplicação de conceitos de
Semiótica ajudaram na representação de sentimentos e desejos para o bem-
-estar e a saúde mental. A seguir, apresentam-se respostas para a pergunta:
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“Como a feitura dos quilts ajudou a melhorar o seu estado de bem-estar e
saúde mental” (Quadro 2):
"o processo de fazer o quilt uniu o grupo”; “reforcei ambiente pedagógico de projeto para laços
minha amizade com as pessoas que conhecia apenas
pelo computador”; “alegria”; “companheirismo”
"nunca havia imaginado o uso do design para ambiente pedagógico de projeto acolhedor
projetar algo para o bem-esta e a saúde mental”
"nunca havia costurado antes e fiquei muito feliz”; ambiente pedagógico de projeto descontraído
“costurar é divertido”; “arte sempre proporciona
bem-estar e satisfação”; “tranquilidade”
Fonte: os autores.
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Pública, Psicologia e Educação. Com base nessa literatura, a diversidade
de qualidades foi reduzida para três qualidades principais, que conseguem
capturar de maneira mais universal a experiência concreta dos estudantes.
Empatia: É comum pensar em empatia como sendo a capacidade de en-
tender o outro, seus sentimentos e emoções, pelo referencial do outro. Reddy
(2023) expande este conceito para abranger o ser e o outro e denomina de
openness (“abertura”), valorizando tanto o entender como se fosse o outro,
quanto considerar a ação de ir ao encontro do outro. Desta maneira, Reddy
(2023) diz que as raízes da intersubjetividade são amplas na nossa maneira
de ser, ver e relacionar-se com o mundo. Ferguson e Wimmer (2023) com-
plementam que a habilidade de distinguir entre o interser e o outro ser é
importante para múltiplos processos cognitivos, e indicam o uso da imagi-
nação para a promoção da empatia.
Confiança: A psicologia define confiança como sendo a intenção de acei-
tar um certo grau de vulnerabilidade baseado na expectativa de intenções
e comportamentos do outro. Isto inclui uma aceitação do Ser e do outro
em suas capacidades de serem pessoas em que se possa depender, em cuja
competência pode-se confiar (LEGOOD et al., 2022, p. 1).
Cuidado: Cuidado é a ação de cuidar (preservar, guardar, conservar,
apoiar, tomar conta). O cuidado implica ajudar os outros, tentar promover
o seu bem-estar e evitar que sofram de algum mal. Foucault retoma os filó-
sofos clássicos para nos dizer que ao ser humano foi-lhe confiado o cuidado
de si também (FOUCAULT, 2006). Garcia (2004) amplia o conceito ao trazer
elementos de satisfação de necessidades vitais. Para o autor, o cuidado ético
pressupõe a interação e o contato moral entre seres. A ética do cuidado tem
por base o entendimento de que o mundo é uma rede de relações na qual es-
tamos imersos, com responsabilidade tanto para o Ser quanto para o outro.
7. Considerações
As consequências negativas para o bem-estar e a saúde mental dos estudan-
tes de Design foram devastadoras. Múltiplos fatores estressores, com ampla
variação de graus de impactos representam desafios que os estudos indicam
ainda vão perdurar por algum tempo. Diversas são as estratégias para mi-
tigar esse impacto.
Aqui constatou-se que a quilt-terapia ressignificou e visibilizou as qua-
lidades relacionais de empatia, de confiança e do cuidar, essenciais para a
reconstrução do interser. Este trabalho reverteu um quadro de estresse, es-
tranhamento, medo, inseguranças entre outros estressores que a estudan-
tada apresentava no retorno à aula presencial. Ao abordar diversos estres-
sores, o processo contribuiu com a formação de laços afetivos e de amizade,
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conversas distraídas, suporte de grupo, empatia, confiança e a qualidade
do cuidar.
A formação de designers por meio da estética relacional da quilt-terapia
trouxe uma nova dimensão ao Design Prospectivo enquanto uma aborda-
gem para a produção de conhecimentos sobre o interser, sobre o ser humano
em suas relações vitais. Considerando que o mundo atual apresenta carên-
cias de qualidades relacionais causadas por contradições em sistemas sócio-
-técnicos, pretendemos experimentar no futuro a quilt-terapia para elicitar
novos desejos, sonhos e futuros para a construção de um mundo melhor.
Podemos, pelo resultado, concluir por uma hipótese, a ser melhor inves-
tigada, de que projetos que cultivam qualidades relacionais possuem um
potencial de promoção do autoconhecimento, autocuidado e autogestão
no âmbito do interser, ou seja, no ser com os outros..
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Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 210
Como referenciar
———
DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.77916
———
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 190-211. 211
arcos design
Arcos Design
Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 212-229. ISSN: 1984-5596 v. 17, n. 1, Janeiro 2024
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/arcosdesign
212
Como o design estratégico pode aumentar a
assertividade de uma empresa calçadista
Abstract: Pop, the first magazine aimed at Brazilian youth, circulated between
1972 and 1979, dialoguing with behavioral transformations of the period driv-
en by the counterculture and the black, gay and feminist movements. I seek to
understand how the covers of Pop shaped models of youth that, a priori, ques-
tioned social conservatism, expanding references for the construction of youth
identities. In this perspective, I use research on Youth, Gender, Race, History,
Image and Design. The study of the media is relevant, as they construct rep-
resentations that seem to be reality itself, legitimizing and expanding, but also
interdicting ways of being in the world, which can reiterate and/or stress social
inequalities. The study indicated that Pop questioned traditional models of
behavior, although it produced, to a large extent, representations of juvenility
linked to privileged strata, whiteness and heteronormativity.
Keywords: Pop magazine; Youth; 1970s.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 212-229. 213
1. Introdução
Contando com crescimento de 15,7% de vagas de trabalho – condizente a
novos 7,2 mil cargos no intervalo de janeiro a junho de 2022 –, o setor cal-
çadista representou quase 30% da força trabalhista do estado do Rio Grande
do Sul (ABICALÇADOS, 2022).
A ascensão de um cenário de forte competição dentro do mercado manu-
fatureiro tem provocado a exigência de um novo posicionamento estratégico.
Neste contexto, o design estratégico representa uma alternativa para inova-
ção e diferenciação de produtos. Por meio da análise de resultados, vendas
e outras variáveis, pode-se buscar a possibilidade de melhorar a competiti-
vidade e assertividade do desenvolvimento projetual.
Define-se como assertividade da produção a tomada de decisão funda-
mentada e capaz de atender às necessidades dos consumidores. Isso en-
volve elementos como custo e experiência de uso, visando a satisfação de
stakeholders1, tendo como pano de fundo os objetivos do empreendimento
(CORREA et al., 2020).
A criatividade, insumo principal das indústrias criativas, (BENDASSOLI et
al., 2009), tem sido associada ao empreendedorismo na proposição de no-
vos produtos ou serviços e sua implementação (AMABILE, 1997). A criati-
vidade se transforma em fator produtivo. As ideias e processos podem ser
a base para a inovação desejada e requisitada no mercado.
Para Klopsch (2011), a estratégia competitiva consiste no agrupamento
de atividades empenhadas em oferecer uma combinação resultante em va-
lor. Sobre isso, Best (2012) teoriza o planejamento como o processo decisó-
rio de execução da produção.
A partir dos fundamentos supracitados, admite-se como questão nortea-
dora: de que modo o design estratégico pode auxiliar de modo assertivo nas
coleções de uma empresa calçadista?
Este manuscrito encontra-se dividido da seguinte maneira: na seção dois,
os métodos científicos são explicados. Sequencialmente, a seção três agru-
pa a fundamentação de design estratégico, casos e gestão do design. As en-
trevistas e análises do output estão localizadas na seção quatro. Por fim, os
comentários finais estão expostos na quinta seção.
2. Procedimentos metodológicos
Optou-se pela utilização de estudo de caso com a empresa investigada,
Boamar, que será abordada nos parágrafos seguintes. Este método, segundo
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Yin (2015), é caracterizado como uma abordagem de investigação empírica
que se dedica à análise de um fenômeno em particular para compreender
de modo abrangente objeto de estudo.
Neste artigo, foram utilizadas: revisão quantitativa documental externa
(dados de comercialização e design estratégico de competidores do mercado)
e interna (dados de comercialização da empresa investigada) e entrevistas
qualitativas com dois funcionários de diferentes setores da marca. Foi ana-
lisado o histórico empresarial, para compreender o que já foi implementa-
do e quais meios poderiam ser incrementados.
A pesquisa foi instrumentada por duas rodadas de entrevistas: em um pri-
meiro momento, foi entrevistado um gestor da marca e, subsequentemen-
te, uma segunda entrevista foi aplicada com o responsável técnico do setor
produtivo. Conforme Minayo, Deslandes e Gomes (2011), entrevistas são
aparatos qualitativos a serem apropriados para coleta de dados em campo
sobre o assunto da investigação.
Os estudos qualitativos das entrevistas e as análises quantitativas de ven-
das e produtos da marca são opções de triangulação preconizadas por Yin
(2015) no estudo de caso. Bryman (2006) entende a triangulação como a
razão de combinar aparatos quantitativos e qualitativos, de forma a gerar
dados mais abrangentes na pesquisa.
O roteiro semi estruturado para entrevistas agrupou as seguintes pergun-
tas nas respectivas categorias conforme o Quadro 1. Como objeto de estu-
do, foi selecionada a empresa Boamar, atuante no ramo da matrizaria, cor-
respondente ao espaço de fabricação de matrizes de injeção. Todo calçado
injetado possui um molde de injeção, fabricado em alumínio ou aço. Esses
moldes concedem a forma para os calçados produzidos.
Para a compreensão das práticas empresariais e sua oferta, torna-se fun-
damental estudar os produtos e métodos do setor de P & D (pesquisa e de-
senvolvimento) pertencente ao empreendimento. Logo, foram investigados
os processos internos de inovação, as estratégias e o planejamento da cole-
ção e os produtos pertencentes.
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Quadro 1. Roteiro semi estruturado para entrevistas.
Categoria Pergunta
fonte: Os autores.
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3.1. Design estratégico
Mintzberg e Quinn (2001) definem estratégia como o conjunto de metas e
ações agrupadas em um plano integrador, que é executado por uma orga-
nização com base em suas estruturas. O plano é desempenhado e articula-
do de modo a engendrar uma estrutura sistêmica, harmoniosa e coerente,
conducente à consecução dos objetivos institucionais.
A estratégia pode orientar o posicionamento da marca em relação aos
preços de seus produtos no mercado. De acordo com Porter (1996), a en-
tidade deve focar em ser líder de custos (preços baixos) ou líder em valor
(entrega de qualidade superior, geralmente acompanhada de preços mais
elevados). Quando uma empresa tenta adotar ambas as abordagens, ela
tende a ficar presa no meio do caminho, sem implementar eficazmente ne-
nhuma estratégia.
Do ponto de vista do empreendedorismo, como argumentado por Amabile
(1997), a ideia precursora do novo está relacionada a: a) novos produtos ou
serviços; b) identificação de mercados; c) métodos de produção e entrega
de produtos e serviços; e d) formas de obtenção de recursos para produzir
ou entregar serviços. O designer estratégico pode executar todos esses itens,
com o objetivo de proporcionar à empresa uma vantagem competitiva em
relação à concorrência.
Martins (2011) conclui que a redefinição do papel do designer possibilita
que ele atue de forma consistente no aumento do desempenho competiti-
vo das empresas, desenvolvendo planos estratégicos. A inovação é um ele-
mento essencial para a competitividade, resultante da aplicação adequada
de criatividade e experiência técnica
A análise dos casos de aplicação do design estratégico no mesmo segmen-
to de mercado e na indústria pode fornecer insights relacionados ao posi-
cionamento, ao processo e ao desenvolvimento de coleções. As entidades
selecionadas para análise são Havaianas e Melissa, uma vez que pertencem
ao mesmo segmento produtivo, ainda que sob a limitação de possuírem um
tamanho empresarial aquém da estudada neste artigo.
3.1.1. Havaianas
A marca Havaianas é uma empresa de calçados amplamente reconhecida
por seus chinelos confortáveis. A empresa se destacou por ser pioneira na
criação desses produtos com baixo custo, inspirados nos chinelos do povo
Zori (FASHION NETWORK, 2022).
O recente reposicionamento da marca contribuiu para a estabilidade fi-
nanceira e a expansão internacional da empresa (MOURAD; SERRALVO, 2014).
Em 2022, Havaianas conquistou quase 45% do mercado de chinelos no Brasil,
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com os três pontos de venda mais comuns sendo supermercados (33,8%),
lojas especializadas (31,4%) e lojas de departamento (20,2%) (YUP, 2022).
Outras estratégias adotadas incluem a mudança do slogan de “as legíti-
mas” para “todo mundo usa”, destacando a adoção generalizada por dife-
rentes classes econômicas. Além disso, a empresa empregou atletas e cele-
bridades para fortalecer o valor do produto, o novo slogan e a criação de
vínculos emocionais.
Os resultados empíricos de Schünke et al. (2021) demonstram que alinhar
a produção com influenciadores ou pessoas de interesse para o público da
marca de moda pode resultar em efeitos positivos, como um aumento nas
vendas. Isso ocorre porque a comunicação desempenha um papel funda-
mental na cadeia de valor dos produtos de moda (CIETTA, 2017).
Visando diferenciação ante às concorrentes no mercado de chinelos, a
Havaianas trouxe a tradição em uma linha de calçados. Sendo um produto
de investimento com matrizes, o mix de produto foi incrementado paula-
tinamente, de três em três anos. Tais inovações eram comunicadas a cada
estação, com alterações em cores, estampas e detalhes, como pode ser con-
ferido na Figura 1.
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figura 2. Payout da Alpargatas. Fonte: Status Impact.
3.1.2. Melissa
Tal como a Havaianas, a marca Melissa também realizou uma ação de re-
posicionamento estratégico, que envolveu a alteração do público-alvo e dos
preços dos produtos. A decisão de aumentar os preços dos produtos resul-
tou em uma queda nas vendas, mas, no entanto, a margem EBITDA mos-
trou-se elevada.
O planejamento incluiu a transformação do calçado de plástico, que re-
quer investimento em matrizes e moldes, em um objeto de desejo. Isso foi
alcançado por meio da participação em desfiles, a criação de um espaço
conceitual em São Paulo e a oferta limitada de pares, promovendo o apelo
colecionável das peças.
Tais ações aumentaram o valor percebido do produto, respaldando a vi-
são de Mozota (2011) de que a estratégia de gerar maior valor, mesmo com
um volume de vendas menor, pode ser bem-sucedida quando há uma di-
ferenciação consistente e relevante, apoiada pela gestão do design. O repo-
sicionamento de marca vai além da inovação de produtos, afetando o fun-
cionamento da marca e a cultura interna.
A rentabilidade da empresa no início da pandemia da COVID-19 pode ser
conferida na Figura 3.
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figura 3. Rentabilidade da marca Melissa no período 2020-2021. Fonte: suno.
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estratégico pode ser um ativo importante, uma vez que, munido de infor-
mações e dados, pode desenvolver uma abordagem mais precisa, estudando
e compreendendo o comportamento de consumo do público-alvo.
A gestão empresarial envolve o processo de tomada de decisões alinhado
aos objetivos organizacionais de forma eficiente (MAXIMIANO, 1996). Isso
torna o planejamento um processo de extrema importância para a saúde
financeira e o funcionamento eficaz da empresa.
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Ainda, o supervisor alertou que “quando se dá início ao processo de uma
nova coleção, o que está como padrão? Caixa, transporte, mas e se pergun-
tarmos quanto tempo isso não é revisado dentro da empresa?”. Por meio da
entrevista, foi possível compreender a necessidade de se estudar novamente
todos os processos, dada a quantidade de inovação que o setor do desenvol-
vimento cria, e outros processos são esquecidos de maneira sincronizada.
O gestor da empresa acredita que haja uma necessidade de equilíbrio
entre custos – mediante investimentos nas características do produto – e
o investimento estrutural administrativo. Segundo ele, é necessário que se
compreendam “os processos da empresa dentro do setor de desenvolvimento,
para conseguir uma estratégia para aumentar a lucratividade da empresa”.
Referindo-se ao papel que o designer desempenha e sua importância com-
petitiva, o gestor conclui que: “o design tem como função relevante dentro da
empresa, tanto para fazer diferenciação de produtos perante aos concorrentes,
quanto para diferenciação de margens e eficiência produtiva”.
Enquanto isso, considerando a eficiência, é de opinião do supervisor
que “quando o produto tem como função ser um produto de combate, de pre-
ço acessível, não se pode desenvolver um produto que não vai chegar no va-
lor adequado”.
Dado o fato que a matriz assume um orçamento mínimo de R$ 140.000,00
(cento e quarenta mil reais), o produto requer que suas especificações este-
jam alinhadas com o público, pois sem essa conexão planejada, não há um
preço alinhado nem eficiência produtiva, aumentando o valor no ponto de
venda final.
Conforme relatos de ambos, a empresa não cogita a criação de outras
marcas para acrescer seu mix de produtos, por uma experiência sem sucesso
no passado. O sistema de indumentária na forma fast fashion faz com que
os produtos sejam renovados semestralmente, por um lead time diminuto,
elevando o orçamento em matrizes. As indumentárias resultaram em pior
desempenho comercial do que os calçados atuais. A decisão dos gestores foi
de encerrar a atividade da marca, e dedicar os investimentos em produtos
novos e atemporais para o ramo calçadista.
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a modalidade B2B3, assumindo o processo de desenvolvimento de grandes
empresas calçadistas regionais, como Lança Perfume, Carmim, Loeffler,
Handal, etc.
A coleção principal própria do segmento B2C compreende 35 modelos
injetados – sem contar os modelos que seguem vendendo no mercado ex-
terno, o que elevaria a contagem para 80 produtos. Ainda, a especialidade
da marca é o calçado do tipo injetado, ao passo que a entidade fornece as
próprias matrizes. A Figura 4 representa esta configuração, situando mo-
delos por preço de varejo.
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figura 5. Volume de vendas. Fonte: Os autores.
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a atmosfera, cores e demais referências visuais registradas no moodboard,
elabora-se o layout de um novo produto, gerando alternativas e esboços de
peças da coleção que será ofertada no mercado.
4.5. Insights
Por meio da análise das informações mencionadas, é possível identificar
os elementos essenciais para uma análise aprofundada da coleção, visando
enriquecer o conjunto de dados e facilitar o processo de tomada de decisão.
Os discursos dos entrevistados contribuíram de modo a elencar as análi-
ses processuais, o público mirado, a utilização de margem para futuros in-
vestimentos na marca. Por meio do que foi comunicado aos pesquisadores,
o designer estratégico pode atuar na produção, nas estratégias de mercado
e comércio e em aspectos de organização empresarial.
Combinando as análises documentais internas com os relatos do gestor
e supervisor, pôde-se concluir elementos dos quais o designer estratégico
pode agir. Tais elementos são: a) relatórios de vendas (por número e região
geográfica); b) cores mais vendidas; c) estampas mais vendidas; d) escolha
de embalagens adequadas; e) identificação de logos; f) avaliação das espes-
suras dos produtos; e g) análise da margem de lucro dos produtos.
Mediante os elementos supracitados juntamente com outros dados dispo-
níveis, é possível criar uma coleção mais enxuta em termos de quantidade
de produtos, mas altamente eficaz. Isso pode levar a um desempenho eco-
nômico superior para a empresa, aumentando a lucratividade e reduzindo
o esforço no processo de desenvolvimento.
5. Considerações finais
Este trabalho versa que por meio da análise de resultados, vendas e variá-
veis como a análise de público, podem melhorar a competitividade e asser-
tividade do desenvolvimento do design. O designer estratégico pode atuar
em tais áreas, assumindo a responsabilidade de conceber as fases do proje-
to, reduzindo ineficiências no processo produtivo e auxiliando no desem-
penho comercial.
Além de identificar as necessidades dos consumidores, o designer pode
usufruir de pesquisas de mercado para prever e perceber os desejos e as
demandas, e, por meio do design estratégico, alterar positivamente as per-
cepções de valor.
Os relatos da empresa Boamar permitiu uma visão organizada dos ele-
mentos e etapas que embasam e constituem a construção de uma coleção de
calçados assertiva e conectada a um planejamento estratégico, o que pode
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garantir um eficiente desempenho econômico e trilhar na direção de van-
tagem competitiva.
Referências
ABICALÇADOS, Indústrias de calçados gerou mais de 27 mil postos
no semestre Disponível em: <https://www.abicalcados.com.br/noticia/
industrias-de-calcados-gerou-mais-de-27-mil-postos-no-semestre>
Acesso em: 1 jun. 2023.
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projetos%20do%20setor%20de%20transportes.pdf>. Acesso em: 19
out. 2023.
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SUNO. Fundos de Investimento Melissa < https://www.suno.com.br/
fundos-de-investimento/melissa-fic-fim-cp-ie> Acesso em: 1 jun. 2023.
Arcos Design. Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, Janeiro 2024, pp. 212-229. 228
Como referenciar
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DOI: https://www.doi.org/10.12957/arcosdesign.2024.76854
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