Ficha Educacao Literaria 6

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Ficha de Educação Literária 6

Nome N.o 10.o Data / /

Avaliação E. Educação Professor

Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente


Lê o excerto da Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente. Caso seja necessário, consulta as notas.

O Escudeiro vendo cantar a Inês Pereira, mui agastado lhe diz:

Vós cantais Inês Pereira Pode ser maior aviso


em bodas me andáveis vós? maior discrição e siso
Juro ao corpo de Deos que guardar eu meu tisouro?
que esta seja a derradeira. 35 Nam sois vós molher meu ouro?
5 Se vos eu vejo cantar Que mal faço em guardar isso?
eu vos farei assoviar.
Inês Bofé senhor meu marido Vós não haveis de mandar
se vós disso sois servido Em casa somente um pêlo
bem o posso eu escusar. se eu disser isto é novelo
40 havei-lo de confirmar.
10 Escudeiro Mas é bem que o escuseis E mais quando eu vier
e outras cousas que não digo. de fora haveis de tremer
Inês Por que bradais vós comigo? e cousa que vós digais
Escudeiro Será bem que vos caleis. nam vos há de valer mais
E mais sereis avisada 45 que aquilo que eu quiser. (…)
15 que não me respondais nada
em que ponha fogo a tudo Aqui fica Inês Pereira só fechada
porque o homem sesudo lavrando e cantando esta cantiga:
traz a mulher sopeada1.
Quem bem tem e mal escolhe
Vós não haveis de falar por mal que lhe venha nam s’anoje.
20 com homem nem molher que seja
nem somente ir à igreja
nam vos quero eu leixar.
Já vos preguei as janelas
por que vos não ponhais nelas
25 estareis aqui encerrada
nesta casa tão fechada
como freira d’Oudivelas.

Inês Que pecado foi o meu?


Por que me dais tal prisão?
30 Escudeiro Vós buscais discrição
que culpa vos tenho eu?

Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 10.o ano 110


Falado: Renego da discrição
comendo ao demo o aviso
50 que sempre cuidei que nisso
estava a boa condição.
Cuidei que fossem cavaleiros
fidalgos e escudeiros
nam cheos de desvarios2
55 e em suas casas macios
e na guerra lastimeiros3.
(…)
Juro em todo meu sentido
que se solteira me vejo
assi como eu desejo
60 que eu saiba escolher marido.
À boa fé sem mal engano
pacífico todo o ano
que ande a meu mandar.
Havia-me eu de vingar
65 deste mal e deste dano.
Gil Vicente, «Farsa de Inês Pereira», in As obras de Gil Vicente, vol. II, dir. de José Camões,
Lisboa, IN-CM, 2002, pp. 583-586 (texto com supressões).

1
sopeada: dominada; 2 desvarios: loucuras; 3 lastimeiros: bravos.

1. Indica o motivo por que, no início do excerto, o Escudeiro se mostra muito irritado com Inês.
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2. Aponta a ameaça que Brás da Mata faz à sua mulher.


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3. Interpreta os versos «porque o homem sesudo / traz a mulher sopeada» (versos 17-18), relacionando-
-os com as imposições que Brás da Mata apresenta a Inês.
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111 Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 10.o ano


4. Demonstra que o comportamento da protagonista, ao longo da sua interação com o marido,
evidencia o caráter injusto das atitudes de Brás da Mata.
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5. Enuncia os argumentos que o Escudeiro utiliza para justificar o modo como se comporta com a
sua mulher. Fundamenta a resposta através de citações textuais.
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6. Explica o sentido dos versos «Quem bem tem e mal escolhe / por mal que lhe venha nam s’anoje»
(versos 46-47), relacionando-o com o percurso da protagonista ao longo da obra.

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7. Completa as afirmações apresentadas, selecionando a hipótese correta para cada uma das
alíneas.

No monólogo de Inês que é apresentado no final deste excerto, esta personagem mostra
arrependimento por a) __________, reconhecendo que errara ao pensar que os cavaleiros
e os escudeiros eram b) __________. Assim, caso volte a ficar solteira, escolherá
um marido c) __________.

a) b) c)
1. ter desejado um marido 1. ousados em combate, mas gentis
1. obediente, elegante e sereno
discreto e «avisado» na sua vida privada
2. não ter casado de acordo 2. corajosos na guerra, mas
2. franco, submisso e pacífico
com a sua vontade cobardes em casa
3. não ter casado com um 3. insensatos em combate, mas
3. abnegado, calmo e inteligente
fidalgo equilibrados em casa

Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 10.o ano 112


1. O Escudeiro mostra-se irritado com Inês por esta estar a cantar, comportamento que ele considerava inadequado
para uma mulher de respeito.
2. Brás da Mata ameaça Inês de que, se ela não parar de cantar, ele a fará «assoviar» (v. 6), metáfora que pode ser
interpretada como uma alusão à violência física.
3. Brás da Mata considera que o homem «sesudo», isto é, sério, deve manter a sua mulher sob o seu domínio. Por esse
motivo, avisa Inês de que não lhe deve responder, ainda que ele tenha um comportamento manifestamente
desequilibrado. Além disso, proíbe-a de falar com outras pessoas, impedindo-a, inclusivamente, de ir à igreja e não lhe
permitindo sequer que esteja à janela. Não lhe reconhece qualquer autoridade em casa, exigindo que Inês o tema e
corrobore tudo o que ele disser. Finalmente, afirma que aquilo que ela disser apenas terá o valor que ele determinar.
4. Inês, no início da sua interação com o marido, mostra-se disposta a acatar a sua exigência de que não cante. No entanto,
para sua surpresa, Brás da Mata continua a ameaçá-la, chegando inclusivamente a gritar, facto que a leva a perguntar por
que lhe fala de forma tão agressiva – questão que mostra o caráter absurdo do comportamento do seu marido.
Finalmente, ao ser informada da repressão a que estaria sujeita, pergunta ao Escudeiro o que fizera para merecer viver em
tal opressão, mostrando, desta forma, mais uma vez, o caráter totalmente arbitrário do comportamento de Brás da Mata.
5. O Escudeiro afirma, ironicamente, que apenas está a agir de acordo com as pretensões de Inês. Se esta queria um
marido discreto e «avisado», tem de se sujeitar a ser alvo daquilo que ele considera uma atitude sensata: tratá-la como
um objeto precioso que deve ser guardado de todos os olhares («Vós buscais discrição / que culpa vos tenho eu? /
Pode ser maior aviso / maior discrição e siso / que guardar eu meu tisouro? / Nam sois vós molher meu ouro? / Que
mal faço em guardar isso?», vv. 30-36).
6. Nestes versos, Inês censura-se por ter escolhido mal o seu marido, rejeitando a proposta de Pero Marques, que
reconhece agora que era boa, e aceitando o pedido de Brás da Mata, que mostra ser um verdadeiro tirano. Assim,
reconhece-se como merecedora de todas as consequências negativas que advierem da sua decisão: «Por mal que
lhe venha nam s’anoje» (v. 47).
7. a) 1; b) 1; c) 2.

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