PRATA FORTES O Latim Hoje

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sine die?

O latim teimara em persistir, não mais como /(r'/r'rénclas bibl iográficas


sinal de reação e de exciusão social. Pelo contrário, como
âtesta este volume, os que se aventuram pelo idioma lati-
no são pessoas de origens sociais variadas, cujos pais ou t ,\( ìl,AR, L. R. (2011). "Romanisation oÍ no romanisalion,
avós, muitas vezes, pouco estudaram. O latim 1â não é that is the question of socioJinguistic in the Roman
mais arma da opressão, mas da Jiberdade, não mais língua F,mpire." Slnergiu Turquìe,4. Istambul: IstikÌa1 Cad-
moïta, mas r.'iva, naquilo que caracteriza a vtda'. o mol'i- desi, pp. 131-138.
menro, o crescimento (phjsis). t r\Iì\ALHO, M. M. e FUNARI, P. P. A. (2007). "Os ar,zn-
Desde a democracia (1985), o interesse pelo latim, ços da História Ântiga no BtasiÌ: algumas pondeta-
no Brasil, só tem feito crescer. Isso não é de espantâr, ções." Hisíórìa,26, 1. São Paulo: Unesp, pp. 14-19.
nem se ït^ta de um paradoxo, mas é o resultado de um (,Í(.ERO (séc. I a.C.[1999]). Dos deueres.Tradução do latim
movimento histórico de ampio espectro. Este volume de Ângéìica Chiappetta. São Paulo: Nlartins Fontes'
mostra a imensa vitalidade do campo dos estudos clássi- Iì[jSTE,L DE, COULÂNGE,S, N. D. (1864[1956]), ThC AN-
cos, em geral, e mais especificâmerÌte do latim em nosso cient Cìgt. Nova York: Garden Ciw.
país. Como lembra Paulo Vasconcellos, há uma salutar (;ARR-A.FFONI, R. S. e FUNÂRI, P. P. A. (201'2)' "The
diversidade de pontos de vista e abordagens. Para alguns, uses of Roman heritage inBnzlI: traditionaÌ recep-
busca-se o retoÍno direto ao passado, às categorias dos don and new critical approaches." Heritage and Sodei,
antigos, a caminho de um túnel do tempo que nos possa vol. 5, n" 1. N[anev: Leeds.
fazer tevivet os gêneros Literários e as categotias dos an- ( ìÌORDANO, F. (1993). Fìklagi efascìsmo: glì sradì dì lìtteratura
tigos. Perspectiva validíssima, conquanto se aceite como
latìna ne//'Encickpedia Ita/ìana. NápoÌes: Artetipografi-
uma abordagem, frente a outras, dentre as quais a inter-
textuaLidade, em sua sanha por retomar âs reâpropÍiações
I IINGLEX R. (1997). "Bdtannia, Otigin N{yths and the Bri-
constantes e infindáveis da vida humana. Como pensaï
tish Empire", ìn: COTTANI, S.; DUNGSS(/ORTH,
na viagem, sem lembrar de LIlisses, dos Lasíada1 deJoyce,
D. e TAYLOR, J. (eds.) Tk4C91. Proceedìngs of tbe
mesmo que o caminho seja a estrada de Santos (para citar
fourtb annual Roman Theoretìcal Arcbaeology Conference,
Roberto Carlosl). Outros, ainda, dirão que sem lìnguística
Durbam / 994. Oxford: Oxfotd Universiq' Press, pp.
nàolnâ conhecimento de idioma algum, eriquanto outros
11.-23.
mostraÍão a presença de Roma sem o latim, na narcatjva
IIINGLEY, R. (1996). "The'legac1'' of Rome: the rise, de-
da História. Tudo isso e muito mais está presente nestâ
c[ne and fall of the theot,v of Romanizaï)on", ìn:
coletânea e farâ cot:;, que o leitor, ao frna)., saia nào âpenas
\ú'EBSTER, e COOPER, N. (eds.) Roman Imperìa'
J.
satisfeito como ár,'ido de mais leituras e conhecimentos.
/ìsm: past-colonìal perryectìues. Leicester, pp. 35-48.
Não há melhor teceita para a satisfação. Boa leitura!
IIINGLEY R. (2010). O Inpeialismo Rontano. São Paulo:
Annablume/ CÂPES/Unicamp.

lÂNSEN, C. e BORGGRAFFE, H. (2000. Ì{atìon,I{atìona-


litrìt, l{ a tìa n alìs m as. F t ankfutt: Campus.

15
anos da escola ptmâria. Os poucos que següam p^r^ o rr'r,oltos da busca desenfreada pela liberdade de expres-
grnásio tinham uma formação erudita à anngz. O influxo ,,;r(), ()s
estudos clássicos logo se frtmaram como elemen-
da sociedade de massas, a industrialização e a busca pelo t,,s rlc "empoderamento". Esse poder advém de dois as-
domínio tecnológico do mundo soteÍrou essa pátina de lì('('t()s: sua capacidade de fornecer elementos para um
cultura clássica na décaàa de 1960. No bojo do regime 1,, rsicionamento crítico
e, em seguida, por sua capacidade
militar que acabou com as r-eleidades e pretensões inte- ,lt ampìiar hoÍizontes. Conhecer a ftadiçào ocidental é
lectuais, colocou-se em lugar da erudição a busca do su- rrnr imperativo, para que possâmos conhecer-nos a nós
cesso nas proflssões técnicas (tákhnai, diríamos nós, clas- rìÌcsmos (Settis 2004[2006]). Júlio César não é apenas o
sicistas), que deviam, de forma programática, prescindir rutor dâ Gwerra da Gália, nem apenas o personagem de
do pensamento e da reflexão. Slralrespeare, mas também nomeia o cesarìsmo, inspirador
t lr r golpe de primeiro de abril de 1'964 e de tantos outros,

O mundo mudou muito nas últimas décadas e, no decotrer da História. A hrstória mestra da vida nasce
mais ainda, o Brasil. A destruição clos conceitos norma- t'rrm Cícero (De Oratore 2,9), r:i'as nurÌca nos abandona. A
tivos segundo os quais todos devemos set iguais e obe- ,rrtogância Qtjbrìò como erro (hanartía) catastrófico nos
-
decer às normas - levou consigo os usos teacionários do It'va às tragédias, antigas e contemporâneas. Em seguida a

mundo antigo. O ressurgimento do interesse generahza' cssa crítica, a Antiguidade mostra-rÌo s a arbitrartedade de

do peÌa Antiguidade C1ássica deu-se, em primeiro lugar, rodos os preceitos, modernos e antigos. Raças não havia
para compfeender a nossa própria ctvtltzaçã'o, tão anco- c são, portanto, invenções modernas (a serviço de quem?
(,ai bono?). A amizade não separa espírito e cotpo,philia e
rada no mundo antigo. Se, no passado, oprimiram-se as
mulheres com o argumento ex aactaritate de que elas não rrmìcitia mostram que o contâto físico não leva a identida-

tinham voz no mundo antigo, hoje elas ressrÌrgem nas .'lcs fixas e excludentes.

inscrições parietais, nas leituras a contrapelo, nas pintu- O latim teve sorte particular, nestas circunstâncias
ras parietais e em vâsos cerâmicos. Se antes Marcial ou rnais amplas. Idioma dalgteja por centenas de anos, ele
Sêneca podiam set usados para condenâr o amor entre se associou, de forma indelél'el, ao dogma e à hierarquia,
homens, hoje as inúmetas referências antigas ao erotismo tanto católica quanto protestante (não nos esqueçamos
entre iguais pâssaram ser de Jiberação. rÌo idioma latino de Caivino 11509-1564]). Língua dos
^ ^rmz-
tudo é verdade em âmbito ocidental, tan-
Se isto lrrocardos jurídicos, o latim aPÍesentou-se como defensor
to mais o é nas circunstâncias brasileiras. Não por acaso, fìdeì, tal como Henrique VIII 11491-1547), pronto parâ
a Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos foi fundada serrrir como defensor reì pub/icae. Não import^v^, estava à
em 1985, ao findar de longa dìtadura (1964-1985) e no serviço ào statws qaa (o:utro termo latino!). O ápice desses
despettar das liberdades (Carvalho e Funari 2007). Não usos do latim foi segurdo pelo repúdio rreemente: tudo
mais se podia impor o jugo do tecnicisrrro, mâs tâmpouco clue fedesse a latim devia ser banido. Jâ não havia causa
se podia ignorat a emergência das massas sine imagìnìbws, martìs ào latim, mas a causa da morte era clata era o idio-
sem antepassados. Os estudos cÌássicos ressurgiam, qual rrÌa moïto a ser uma vez mais sepultado, pois que teimava
Fênix, não mais como símbolo da dominação, mas como !Ì mexeÍ-se) em plena tumba, em deliriunt tremens. Mas, por
arn-ia cla Jìbetação. De início tímidos, em meio âos mâres
clue não se deixal'a sepultar? Porque se adiava seu erìterro

12 .t3
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Dados lnternacionais de Catalogação na Publicação (Cl P)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)


o
Patricia Prata, Fábio Fortes, (organizadores). - Campinas,
5P : Mercado de Letras, 201 5.

Vários autores.
tsBN 978-85-75S1,359-8

1. Latim - Estudo e ensino 2. Literatura latina 3. Edu-


cação 4. Educação clássica L Prata, Patricia. Il. Fortes,
Fábio.
SUMARIO
't5-04795 cDD-470.O7
índices para catálogo sistemático:
1. Latim : Estudo e ensino 47O.07

capa e gerência edltorlai: Vande Rotta Comide


/magens: Página de um manuscrito das Bucólicas de Virgílio, do século V
e Mosaico Tunísio, do século lll d.C., representando Virgílio entre Prefácio
Clio e Melpômene (Fonte: Wikipédia) A ATUALIDADE DO LATIM NO BRASIL......7
Revisores: Neiva Ferreira Pinto e
Pedro Paulo de Abreu Funari
Paulo Sérgio de Vasconcellos

CPEL - Crupo de Pesquisa sobre o Ensino de Latim - CNPq TNTRODUÇÃO ................. .........................1 7
lnstituto de Estudos da Linguagem
Uni( dmp
A SOBREVTVÊNC|A DO 14T1M........... .......23
Fábio Fortes e Patricia Prata

NOSSA HERANÇA.
DIRÊITOS RESERVADOS PARA A LINCUA PORTUCUESA: NOSSO TRABALHO.. ,,,,.,.,,,,.41 .
O MERCADO DE LETRAS@ Neiva Ferreira Pinto
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Telefax: (i 9) 3241-7514 - CEP 13070-116 ENSINO E PESQUISA DE LÍNCUA
Campinas SP Brasil E LITERATURA LATINA NO
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...................53
I [email protected]
Paulo SérgÌo de Vasconcellos

s edição
1
ENSI NAN DO E PESQUISANDO
outubro/201 5
IMPRESSÃO DICITAL
o MU NDO CLÁSS1CO...............................69
//l,íPRE55O NO BRÁ5/I William I. Dominik

Êsta obÍa eslá pÍotegida pela Lei 9610/98.


ENSINO DE LATIM: ABORDACENS
É proibida sua reprodução parcial ou total
sem a autorização prévìa do EditoÍ. O inÍralor METO DOLOC ICAS E LEITU R4.................. 89
estará sujeito às penalidades previstas na Lei. Patricia Prata e Fábìo Fortes
ú- LATIM E LINCUíSTICA: CONCEPçÕES
DE LTNCUACEM E ENS1NO.....................1 19
Fábio Fortes

APRENDËNDO A LER _
E A FALAR - EM 1AT1M............................131
Leni Ribeiro Leìte

S. LATIM PARA euEM? coMENTÁRros


DE UMA EXPERIÊNCIA NO NORTE Prefácio
DO BRAS|L... .......................1s3 A atualidade do
Carlos Renato Rosário de /esus Iatim no Brasil

}" AS LíNCUAS CLÁSSICAS NO


ENSINO FUNDAMENTAL:
coNSIDERAÇOES n pnnttR or
UMA EXPERIÊNCIA RECENTE ..................1 67
Pedro Pauht A. Funarì
Alessandro Rolim de Moura e
Renala Senna Carrafoni
A Antiguidade Clássica constitui uma pre-
SOBRE OS AUTORES ..........205 sençâ nem sempre visível ou teconhecida, de forma
consciente, pela sociedade contemporânea. Esse proces-
so ocorreu no mundo ocidental e pode ser entendido em
suas circunstâncias históricas concretâs. A Antigúdade,
em geral, e os autores antigos, em particular, foram toma-
dos pelcls modernos como justificadotes de situações so-
ciais que, a rigor, pouco tinham a ver com gregos e roma-
nos. Assim foi, em particular, com â invenção moderna
do conceito de plebe ociosa (idk mab), preocupação das
eJites capitalistâs emergentes em caracÍertzar os trabalha-
cÌores como propeflsos à indolêncìa, necessitados, pois,
de correção, coritrole e r,'igilância $úbod 1988). As mas-
sas câmponesas destituídas de tetras e os artesãos despo-
jados de suas oficinas toram taxados como uma multidão
urbana preguiçosa. Contudo, essa ociosidade perniciosa
r-rão foi explicada pelas condições modernas do capital,
Lnas foram usados os antigos para ilustrar os malefícios
cìessa situação de falta de obrigação de tabalho. Segun-
do os teóricos do capital - baseados em classicistas - "o (o latim da época de ouro, consubstanciado em Cícero) e
crdadão encontïâ\-a poucos empregos, pouco a fazer; trrla fronteira de estado nacìonal modetno: inventava-se
o desejo de ocupação logo o toÍna\-a indolente. Como ,r conceito de lìmes. As próprias palavtas latinas, como
ele r.ia apenas os escravos trabalhando, ele desprezar'-a o /ìtttes,eram ressignificadas,à7uz do estado nação e do im-
trabalho"l (Fustel de Coulanges 1864[1956, p. 337])' Os ;rcrialismo. Nunca houve lìmes usado como fÍonteka frxa
antigos serviram, portanto, para iustiflcar o combate à rlc um estado nacional. Esse uso só foi criado no século
ociosidade moderna. A Fiiologia esteYe a serviço da auto- XIX. Criavam-se, ainda, neologismos latinos, como r0m/7-
ridade e até mesmo do arbítrio (Giordano 1993). ttitas, e inventavam-se outros, como Ramanìsìerwng logo
Na mesma linha, o imperialismo moderno foi to- traduzido como romanizaiTon, romanisation, romatúza-
mado como uma enésima manifestação da grandeza dos ção (Hingley 1996). Os romarìos nunca pensaram rÌesses
antigos com seus impérios que serviam de modelo (Nlat- termos e, poïtânto, tais conceitos relacionam-se à moder-
tingly 1996). Embora não houvesse apalavra imperiaüs- nidade (Çaglar 2011).
mo em grego ou latim, logo surgiram estucÌos sobre os Mas, a qual modernidade? Não àquela dos pro-
impetialismos de Alexandre e Íomâno, assim como apâ- ìetários, incultos, camponeses ou outros grupos sociais
receÍâm pïocessos de aculturação modetnos, aplicados subalternos. Essa modernidade era a das classes altas, se-
à Antiguidade (Hingley 2010). A missão civilizadora do jam as aristocrâícas, sejam as burguesias em ascensão. O
Ocidente e de potências específicâs, como a Gtã-Bteta- estudo dos clássicos era apanâg1o de classe e marca de
nha e a França, foi tomada como parâmetro pat^ te- distinção. Fazra parte do que o sociólogo ftancês Pier-
^
lação entre gregos e não-gregos e entre romanos e os re Bourdieu chamaría de capital cultural. Os dirigentes
povos conquistados (Hingley 1995). As situações britâni- dos impérios sabiam todos eles o latim dos clássicos, as-
ca na Índra e a francesz na Argéha inspiravam a maneita sim como todos os que exercessem qualquer função de
como se considerava a rcLação de gregos e romanos com mando, mesmo se o fizessem âpenâs em suâ paróquia,
os bárbaros. No campo dos estados nacionais que se con- por assim dizer ffance 1997). O latim e os autores 1a-
soìidavam, o mundo antigo foi tomado como nacionali- tinos canônicos eram o pâssâporte necessário e obriga-
dades modeÍnas, com suas características tão típicas de tórto pan uma posição social privilegiada, mesmo nos
um povo, uma língua e um tetritório (eìn Volk, eìne Sprache ambientes mais burgueses e capitalistas. Um empresário
wnd ein l-and) Qhtesse 2001; Jansen e Borggrâfe 2007). com Friedrich Engels [1820-1895] dominava os clássicos,
O lema da coletânea de fontes Monumenta Germaniae Hìs- assim como seu amigo I(ar1 Marx [1818-1883], mesmo e
ndca (1826) já nos disse muito sobte essa ligação entre quando se opusessem ào capit^\, em teímos programátt-
nação.e Laúm; sanctus aruorpatrìae dat anìraum. Assim como cos (À{arx 1841 [1975]). Fora dos clássicos, não havia vida
devia surgir um povo alemão, com seu idioma de cultura pensante, poder-se-ia dizer, nem proeminência social.
(hoch Deutsrh) e um tetritório de[mitado por fronterras,
Esse mundo dos clássicos a serviço da lei e da or-
os romanos deviam ter um idioma estável e permanente
dem (nónos kaì táxìs, seria mais chique dizer) não deixava
de ser contestado, tanto pelos movimentos sociais, como
no interior das próprias eJites (Silva e Feitosa 2009). Ope-
The citiqurfaandJew empÌEmenís, lìttle to dn; the wanï of arupatìon soon

renrltred hìm ìndolent. As lte saw on/y sÌaues at work, he de'rpised /abor.
târtos, anatqústas, comunistas, mulheres, esses e tântos
outros logo se opuseÍam à ordem e, como Íesultado, à suâ r'() (lue havia dito que os que trabalham erâm asquerosos
cultura de classe. Já nas elites, nem sempre era necessário, l.rrtriìdl?2
nem conr,rcnieÍìte, o domínio das letras e da erudíção, pois
Esse processo acorÌteceu nas potências centrais.
o dinheiro falal'a mais altc,. Para choque dos ilustrados, ( ) Brasil sofreu esse processo de forma muito mais
semianalfabetos que ignoravam quem eïâ Shakespeare
rguda, pois a elite, aqui, sempÍe foi muito mais exígua
amealhar.am fortunas no império britânico. Tanto menos
((ìarrafforu e Funari 2012). O BrasiÌ contina^ ser, n
saberiam de Júlio César, que ignotavam mesmo seÍ um ^
scgunda década do século XXI, um dos países mais de-
personâgem shakespeariano.
si{Ìuais do mundo. Claro que o latim e a cultura clássica
Quando isso começou a mudar? Difícil de preci- l'<t:ram apanâgio de pouqússimos. O latim foi obrigatório
sâr, mâs, depois da Segunda Guerra Mundtal (1.939-1.945), no ginásio e no colégio até o início da pdmeira fase de ge-
aquele mundo entrou em rápida erosão, com a emergên- ncraltzação da escola, nadêcada de 1950. Nessa altura,a
cia de movimentos sociais, por um 1ado, e com a cordda imensa muorta das pessoas anngSa, no máximo, os quâtro
tecnológica e científica, por outro. Os impérios esvaíam-
se, como logo atestou a independência da Índìa (1947),
as mulheres ganhavam direito de voto e visibilidade, logo Cf. Cícero, De Oficììs,1,42,150,Ian de arÍìfrììs qui
et quaestìbus,

lìberales habendì, qui sordìdi sint, haecfere accepìnus. Prìmun impro-


receberam o contÍaceptivo e o feminismo lutou por sua
bantur ìi qilã€Íttls, qui ìn odia honinam ìncurrunl, al pzrtxtlrum, al
lìberação (R.abinowitz e Richlin 1993). Os negros e outras
;t'eneral0run. Il/ìbera/t: aale/// et sonÌìdì quaestus mercennariotam am-
minorias étnicas, reìigiosas ou sexuais combateram por nìun, qaoram aperctq nan qazrum artes emilnÍilr; est tnìn in ìl/ìs ipsa
seus direitos. Em outra direção, a disputa entre capitalìs- men:es ãuclzranenttlm seruìtutìs. Sardìdì etian putandì, qaì mercanïur
a mercataribus, quod statìm uendant; nìhil enim profdant, nìsì adma'
mo e comunismo dava-se também, e de forma acenÍuada,
dwm mentiantur; nec uer7 ert quìcqaan tarPias uanitdïe. Opifnsque
no domínio da tecnologia. Tudo que cheirasse a tradição, omnes ìn sordida ar"te urcantur; nec enim quirquam ìngenuun habere
letras, cultura passou a ser visto como empeci-lho para o potest ofi.cina. Minineque arter eLTe probandae, quae minìsÍr"ae suní

almelado domínio do mundo. O resultado de ambos os uo/uptaÍum: Cetdriì, ldnii, coquì, fartoru, piscatores, wt ait Terentias;
adde huc, sì placeí, ungaenÍarìos, sa/talores, lztilnlqae /adun ta/ariun,
moyimentos não se fez esperar. Pata as eütes, o mundo (Ttadução de Angéüca Chiappetta: "Quanto às ocupações e
clássico, antes símbolo máximo do status e da pertença ganhos, dispomos dos seguintes pteceitos para avaliar quaìs
de classe, foi relegado nem tanto ao esquecimento, como devam set cons.iderados dignos de homens lívres e quais são
sórdidos. Em pdmeiro lugar, desaprovamos os ganhos que
à denegação: cheirava a mofo e â umâ visão de mundo
suscitam ódio nos homens, como os dos recebedotes de ím-
â ser superada.Pata produzir foguetes, bombas e cârÍos postos e dos usurários. São ignóbeis e sórdidas âs Íemunerâ-
de nada serr4a - e muito prejudicava * toda a bagagem ções de todos os trabalhadores pagos pelo esforço e não peÌa
clássica, vista como eÍrtÍaves. Se antes o latim era ferca- habjlidade. Com efeito, neles, o ptóprio salâito é o penhor
da setvidão. Devem ser tidos como vis os que compram dos
menta tão ou mais útil do que a matemâttca para a inte-
mercadotes pata vender em seguida: nada ganham a não set
ligência e o espírito, como peso moÍto a se mentitem de algum modo, e nada é mais torpe que a ftau-
^gorÀ ^precia
ser descartado o mais depressa possír-el. Se essa eta a de. Todos os operários ptaticam umâ âíte abjeta: não haver
percepção das novas eütes, as classes sociais emeÍgentes engenho algum na ofrcina, sendo arnda mais reprováveìs as
funções que se põem a serviço dos prazetes: Pekeitos, carni-
clesconheciam os clássicos e deles tinham apenas a oleriza
ceiros, cozinheitos, salsicheiros, pescadores, como dÌz Terên
natutal que emanavâ da leitura dominante: não era Cíce- cio; acrescenta à lista, se te agradat, perfumistas, dançalnos e
ptofrssionais dos espetácuÌos.')

11
N'IÂtu\, K. (1841[1975]). Dì/ferenqder denokrìtìschen und Eì'
kareì s ch en N atarp hi lo sop hie. B eÀtm: Dietz Verlag.

ÌvIATTINGLY, D. (199ó). "From one colonialjsm to âno-


ther: imperialism and the Maghreb", z7: \IEBSTER,
J. e COOPER, N. (ed.) Raman Imperìalism:
past-colanial
perspectìues. Leicester, pp. 49 -7 0.

R*ABINOWITZ, N. Z. e RICHLIN, Â. (eds.) (1993). Femì'


nist Theory and the Classìa. Londres: Routledge.
lntrodução
SF.TTIS, S. (2004[2006]). Tbefuture of the 'classical'. Cambn
dge: Polity Press.

SIL\l\, G.J. . FEITOSÂ, L. M. G. C. (2009). "O mundo


antigo sob lentes contempotâneas", z7: FUNARI, P P.

Â. SILVA, M. Â. O. (eds.) Polítìca e ìdeníìdades


e na mando Fábia Fofies
anÍìga.São Paulo: Ànnablume, pp. 209-250. Patrìcìa Prata
THIESSE, A. M. (2001). La cniaÍìon des identités natìonales, Ea-
rope XWIIe.-XXe. Siècles Paris: Éditions du Seui,l.

VÂNCE, N. (1997). The Vìctorìans and Ancìent Rome. Oxfotd'. O latin nãa pade ìnuocar direìtos de cidadanìa na estoÌa

só pe/os seus mérìÍos patsados. O pìor seraìçn rlae se


Oxford Universifi, Press.
pode prestar a essa clìscì.plìna éjasiantente o de conleruá
\ilOOD, E. NI. (1988). Peasant-cìtìryn and slaue, The founda- -/a só par saadosìsmo acriilco.
tions of Athenian democracy. Londres: Verso. (Cova 1982, apad Lima, Uma estranha língaa?
paestões de lìngaagen e nétodo, 1995)

O lugar do latim, suas finalidades e seu papel na


contemporaneidade. Essâs, entre outras, são r,'adáveis que
não se podem perder de vista quando se pensa em umâ
lrropostâ pedagógica p^r^ o ensino dessa língua. Frente à
situação educacional brasileira, pensar o ensino de latim
pode até mesmo soar como algo alheio à nossa sociedade
c ao nosso tempo, como o cultivo de um rralot deslocaclo
no passacÌo, que não faz parte da história do Brasil. Pelo
rÌenos, não à primeira vista.3 No detaÌhe, porém, o latim

Gúmarães (2008, p. 5): 'Além do mais, que contdbúção [os


classicistas] poderìam dar pata a construção de uma memória
nacional? Qual seria, de fato, a importância do estudo desse

17
e â cultufa clássica pefmâfÌccc1l vivos, rcvigorlrtlos :tló professores. Tal é o nosso objetivo: ampliar a discus-
mesmo entfe nós, brasileiros. Às:tistit-t-tost :t u1ììrÌ lcl()1ììiÌ(l:Ì são, oferecendo aÌgumas considerações sobre o ensino
e â um cfescente interesse pclo c:r;tr-tcÌo tlcsslt Iírrqtrr i-'rÌc de latim, contribuinclo pâïâ que suâ prática seja cada vez

sua l-iteratuta. mais reflexir'a e efrcaz. Não representa nossa pretensào


apresentar fespostâs definitilas, tampouco uma discussão
À concorrência pelos cLrrs()s tlc lrrtitri rt.t tttrr ct'
exaustiva sobre a pedagogia do latim. Ao contrário: esta é
sidacle, a proliferação de pescluisa rlc 1.ront:t rì:r :ir'(;r, rì, '
uma coilreÍsâ entÍe professores; derirra, por um 1ado, dos
Brasil, a mobilização e orgânizâçito tÌos pt'olì'ssot'cs rÌc
resr-rltados parciais da pesquisa desen'oh'ida no âmbitcr
latim em encontÍos que prir'-rÌegtat-r'r u tliscLrss.Ì() (rìì [()r'
do GPF,L - Grupo de Pesquisa sobre o Ensino cle Latim
no de seu ensino, até mesmo sua incslrcrittllt pt'r's, nçlt no
(CNPq), mas, por outro, é motivada e enriquecida pelos
meio popular: de letras de rock â tatLrâg( rìs, tlt r'ítlt,,s clo
frutíferos diálogos propiciados pelos Encontros de Pro-
Youtube à Vikìpédia latina, de Harry Pnl/rr u rlLt:ttlt'ittlros c
fcssores de Latim.a
mângás em latim, passando por entÍcvistrs nl 'l'V cott-t
Nesse sentido, no câpítulo 1, "À sobrevivência do
especiaìistas e por discussões em Ìatim ctn t-c'tlcs soci:tis
que, de um sabef outrora c,rttsirlc'rlttìo cru
latim", os orgânizadores clo livro abordam a impnrtân-
- tudo âtesta
dito e elitista, reservâdo a poucos c1-rc pocÌcrirrnt t'sltrrÌar cia do Ìatim para a formação acadêmica, discutindo os
uma "Língua morta", o latim slbreúL'e. ScguntÌr, nos cÌiz mitos que se perpetuaram em torno dessa 1íngua, mas
Àlceu Dias Lima (1995, p. 56), "se a Língua cÌcixrt tl. st't'r,ir enfatizando, à luz das Direttizes Curticulares Nacionais,
ao seu fim, à produção do sentido, c()rrì () tlLrtl rrìo se
o importante papel que o latim pode desempenhar nâ
formação dos gtaduandos em letras. Na segunda parte,
confunde (...) é que alguma coisa não dcu cct'to rì() scu
os autores atnda fazem um brer.e histórico de como essa
ensino", e, como professores de latim, a exPcriôrìci1t tô111
Língua foi ttatada na cultura escolar brasileira.
nos dado à cettezâ de que essa Língua continLrlr rt pt'ocÌttzir
sentidos que ecoâm em nossa cultura.
Por esse moti\-o, este livïo respondc uos rttrscios clc
tântos quantos se dedicam a ensinar latitn no llllsil. l)cs
Os Encontros cle Professotes de Latin'r, sedìados, em 2010, na
de a pubJicação de Uma esíranha língua? (1995), cnrlr<trrt o Unir-ersìdade FedetaÌ de Jr,riz de Fora, em 2011, na Universida-
tema apareça aqui e ali em lormâ de artigos, t.t-t.rt, rut';tlì.ts, de Estadual de Campinas, em 20L2, na Unir.etsidacle Fecletal
FÌumìnense, em 201,1, na Universidade FecÌeral da Paraíba e,
dissettações e teses, o fato é que não houve r-rtr livt'o clttc
em 2015, na Universidade Iìederal cla Bahia represcntâm umâ
condensasse algumas ideias, destinado, solrrctLr(l(), l),Ì1',ì tentâtivâ de estabelecer um forum nacìonal de reflexão so
bte o latjm e sua didática nos cursos de ensino superior do
Brasil. Em suas cinco ediçòes, u c\-entc, coLìtou com repÍe
mundo longínc1uo, no espâço e no tc1ìll)(), lrrtriÌ urììrt rìrìçii()
sentântes de muitas Universidades brasileiras, representarir-as
cuja histirria começa no século XVI? NcrtltLrltì,[, 1Ìl)iÌl(rìlc'
de todas :rs regiões clo país. Infirrmações e relatos das dis
mente. E,ssa antiguidade europeìa, cttir rLrttriticlrttìc sr' ,,,rr,'i
cussões dos cinco F,ncontros podem ser encontradas no site:
corl-ìo o couro cle velhas encadern:rçòcs lrarccr', rtrlt trtlis, cslrtt
http: /,/r'ep1201 5.wir.com/r-epl201 5#!encontros anteriotes/
çxce.Si\ âmenrC rÜ'fanre farl Cr )nC. til( l. :r( r i. .'i ir'\ ( rì\.r"' ìì
c29g. Pata informações mais detalhadas âcerca dos ttês pri
r.oga cle nossos ú:açâdos de fundacãri. l'inrtc ntclttr'rrirt t ltjs
meiros Encontros, como Atas, programaçâo completa, textos
tória, a cultr-rra identitária brasileira não terrt tcscrvrtrlo grrtrrlc
aptesentados, parúcìpantes, entre outías, ver site clos cr-entos
esprlço, em seu Pânteão cuÌtural cm roc()1ìstruçaìo, los lrcrt'ris
:

http:./ / sites. google.com/ site/ encontrodeprofessoresdelatjm.


de antenho da antìguidade cÌá-.sìca."
19
1B
No capítulo 2, "Nossa herança. Nosso trabalho", No capítu1o 6, "Latim e Linguística: concepçòes
de linguagem e ensino", Fábio Fortes aborda diferentes
Neir.a Ferreira Pinto reflete sobre as relações cntrc o lc-
concepções de ìinguagem, oriundas de correntes dos es-
gado cultutal clássico e a cultura contcmPorânca, c sobre
como o professor de latim pode contribuir para cÌLrc os tudos lingústicos modernos, que podem ser úteis pata
repensar a Jíngua latina e, consequentemente, seu modelcr
textos daquela tradição possâm ser reconhcciclos comil
tradicional de ensino gramatical.
parte da nossa própria cultura.
No capítulo 3, "Ensino e pcsclr-ris:r cÌc líts^urì c lite No capítulo 7, 'i\prender aTer - e a falar - em la-

raturalaïtna no Brasil de hoie", Paulo Sórgio clc Vascon-


tim", Leni Ribeiro Leite disserta sobre metodologias que
inclúam práticas âtjyâs pâre o ensino do latjm - a fala e a
ceilos trâçâ um amplo painel das caractcrísticlts cÌo cnsino
escrita -, oferecendo uma expücação histódca pârâ que,
e da pesquisa em Letrâs Clássicas, discutinc'lo l rclcvâncÌa
das teorias modernas da linguística e dos cstr,rcìos Ìitcrários
nos séculos XIX e XX, tais práticas fossem eliminadas dcr
ensino de línguas clássicas - a despeito de terem sido utrli-
p^r^ as pesquisas em torno do texto ântigo, lrct.n comcr
zadas amplamente no passado - e discutindo a viabilidade
lançando os desallos que se apresentam para a rircrL.
de sua reinsetção no ensino dessa Língua.
No capítulo 4, "Ensinanclo e pesquisancìo o 1'r-rt-tt-t
do clássico", \ü"illiam Dominik discr,rte a inrlrortinci:r, No capítulo 8, "Latim para quem? Comentários
de uma experiência no norte do país", Cados Renato Ro-
reler'ância e viabilidacle dos Estudos Clássicos c clas I h-r-
sário de Jesus traz à discussão alguns dos resultados dos
manidades no ambiente unir''ersitário contct.t-t1torânco.
EncontÍos dc Professores de Latìm, comentando, a parttr
Fornece uma visão geral das oportunic{adcs c clos cÌe-
de sua experiência como docente de Jíngua e literatura
safios que estão diante de pesquisadores, profìss()rcrs e
Iatrna na. Universiclade Federal do Amazonas, a situação
estudantes dessas áreas de estudo no comcç() cÌo novcr
daqueles cuÍsos de latim que se inserem como parte das
milênio. Ao desenr-olver essas discussões, scr,t cstttclcr
matrizes curticulares de cursos de Letras que habilìtam
proporciona uma percepção do largo alcancc clos lìstu
licenciados em línguas modernas, comentando seus desa-
dos Clássicos pâra o pensamento humzinístic() tÌ P:Ìr,r o
fios e oportunidades.
mundo moderno.
No capítulo 9,'i\s línguas clássicas no ensino fun-
No capítuio 5, "Ensino de latim: aborclagcns me
damental: considerações a partir de uma experiênciâ re-
todológicas e leitura", os organizadores tccclll algr-rmas
cente", Alessandro Roüm de N{or,rra e Renata Gatraffoni
considetações a respeito de métodos e mct()clol()giâs
âpresentam os resultados de seu proieto de ensino de lín-
adotadas no ensino de latim. Comentam aÌguns Ìivros di
gua e cultura clássica nas escolas de Ensino Fundamental
dáticos utilizados desde a década de 50 c, a partir clcssa
da cidacle de Curiuba. A partir dessa expetiência, que re-
análise, ptopõem uma sistemaazaçào prclin-rinrrr I re spe ì-
laciona o ensino universitário do iatim (e clo grego) à for-
to das abordagens metodológicas apLicaclas ari ct-lsit-tt> cl<r
mação educacional ampla, clescle o Ensino Fundamental,
latim ao iongo desse período, crtm r.istas a contriÌruir para
discutem a vrabiüdade de inserção de disciplìnas optalivas
a reflexão relatir.a à didática dtt ensino cÌcssa língr-ra, tlfcre-
de cultura clássica no Ensino Fundamental, como contri-
cendo alguns apontamentos adicionais clÌranto à mctodo
buição para a formação crítica dos estudantes.
logia textual, que contempla a literatr-rra latina no cnsinc-r
da língua.

: 21
20
Dessa maneíta, cultura, linguagem e ensino per-
passam estâs páginâs a partir de referenciais teóricos,
abotdagens e experiências tão plurais quanto os autores
que colaborâm neste livro. Experiências de cnsino em
diferentes níveis e em diferentes regiões do BrasiÌ e do
mundo, nos dias de hoje, atestam a pcrenidacÌc clesse le-
gado cultural que nós, brasileiros, também consideramos
nosso: a cultura clássica. Que ela esteja cacla vcz mais dis- &.
ponír,rl para todos que se interessem pcla sua linguagem A sobrevivência do Latim
e cultura é o que move a pesquisa destes quc cofaboraram
neste projeto, sem os quais este livro não seria possível
e aos quais dirigimos nossos mais profunclos agradeci-
mentos. Na pluralidade dessas vozes, oferecern,rs, assim,
a outïos colegas, nossa contdbuição pârâ pensârmos o Fábio Fortes
Patrìcìa Prata
laíin ho1e.

lntrodução

Apesar do valor ora ou outra concedido à cultura


clássica (e às línguas antigas, porta de acesso paÍa essa
cultura),1 a suaprâtica de ensino encorÌtÍa, de resto, obs-
táculos que esvaziam a contribuição potencial dessa dis-
ciplina, e, muitas vezes, a reduzem a um saber mecânico
e desarticulado da formação universitâria, sela de licen-
ciados em Letras, seja de bacharéis e licenciados em ou-
tras áreas, totnando o seu ensino ornamental e inefrcaz.
Ocupando os primeiros períodos do curso de Letras, por
exemplo, quando não também do de Filosofia e Histó-
ria, os alunos, recém-egressos do Ensino Médio, em geral

Como assinala Fìorin (1991, p. 515): "conhecer nossas oti


gens signiÊca conhecer também as cultutas grega e latina.
Elas são, pois, uma herança a conseÍvar e uma ttadição de
conhecimeero a rransmiú".

23
22
encâïam a disciplina com um misto de deslumbramento Uma estranha Iíngua?3 Preconceìtos e
mitos do |atim em nossos dias
de um saber "etudito" e raro no Brasil (restrito ao ensino
em nír'el supetior, com rarâs exceções) e uma tesistência
â esse mesmo ensino, motivada pela rcleia de que se tratâ
de uma drsciplina difícil,2 que envoÌve a aquisição de nu- Quando nos detemos especiÍicamente a pensar
sobre o ensino de línguas clássicas, atualmente restrito,
merosos conceitos e paraàigmas linguísticos, cÌes contex-
praticamente, aos cufsos de Letras, somos ler,-ados reco-
tuabzada e, sobretudo, sem utilidade. ^
nhecer que esse quadro se compõe, muitas vezes, a partir
A meta deste texto inicial é refletir, cm primeiro da permanência de preconceitos que concernem:
lugar, sobre os mitos que se crìararn em torno do latim
e seu ensino e que colabor^ram p^ra a maneira como a
r) às de seu ensìno: o mito da "supralín-
fnalidadu
disciplina foi encarada ao longo do tempo; em segun-
gua", cujo conhecimento seÍia a chave neces-
do, temos em mente apresentaÍ duas razões pelas quais,
sâria para o aprendizado cle muitas outras e,
acreditamos, se concebeu tâl repÍesentação "negativa"
especialmente, do pottuguês; ou o extremo
do latim no coniunto das letras e das humanidades, que
oposto, a consideÍação de que se tratâ de uma
dizem respeito à maneira como a política educacional o
discipüna menor, para não dizer um apêndice
trâtou e, consequentemente, o eliminou dos cutrículos
desnecessário, conservador e quase saudosis-
escolares o{iciais em meados do século XX, bem como
tâ que ainda sobrer'-ive no conjunto de disci-
aos métodos utilizados tradicionalmente em seu ensino
plinas que eritrâm na formaçào do graduado
que, malgrado terem sido produzidos para contextos em Letras;
escolares muito diversos dos que hoje representam os 2) ao conceìto de língua em quesíão: a uniformizaçào
espaços do ensino do latim (isto é, o ensino universitá- do que seria o "Laitm", um epifenômeno Lin-
rio), ainda, muitas vezes, são utilizados contemporâne- guístico, cujo conceito na pedagogla lattna
amente. oculta, entretanto, as diferenças diacrônicas,
regionais, sociais e estilísticas que emergem
da análise dos textos; bem como a noção de
"Língua rrroïta", ou "língua clássica", a ele
apJicado; e

3) a prátìca pedag,ígìca enz si, qae realtza, no mais


das vezes, uma espécie de "espelhamento às
Chamamos a atenção para mais esse mito criaclo pela tradìção
de ensino do latim: o de que o latìm é uma língua de difíciÌ
a\.essas": pâïâ expücar fenômenos idiossin-
aprendizagem, mais difícil que as demais... Embora saibamos cráticos da morfossintaxe latinz, Íecorre-se a
que poÍ ser uma Íngua antiga, utilizada em contextos dir-ersos um instrumental oriundo da gramâtrca tïadi-
dos nossos, seu aprendizado ptessupõe o conhecimento cul-
tutal da época em que esse Ìatim era utíüzaclo até pâÍâ conse-
guir 1et e compreendet um telitoJ o latim, enquânto estÍutura
-1. Títr,rÌo do ür'ro de Alceu Dias Lima (Una artranha Ìíngua? paes-
lingústica, digamos assim, é uma língua e, como tal, possul
tões de /ìngaageru e mírodo. Unesp, 1995).
suas dificuÌdades e particularidades.
25
24
cional contemporânea, expììcando, para citar termédio do latim vulgar, odginou gta:mâtlca da língua
^
um exemplo, a sintaxe dos casos a partir de poftuguesa.
premissas nem sempre precisas oLÌ consen-
suaìs oriundas da terminoJogia gïamâtical 2) O /ailnt, na uerdãde, são laÍìns.
tradicionaÌ - como a de "objcto direto" na
defimção de "acusativo", ou a de "adjunto
O ensino de latim não deve desconsiderar o fato
adverbial" na expÌicação clo "ablativo".
de que aquilo que se costuma uni{ormizar sob o rótulo
de "Latim" é o conjunto mais ou merÌos homogêneo de
Esses três aspectos, também examinaclr>s em outro princípios gramaticais, semânticos, estilísticos e de textos
trabalho (Fortes 2010),lelzm-nos, dessc m<;clo, a reco- variados, aos quais temos acesso a parnr do trabalho de
nhecer três pontos de partida, em resposta â csses mes- filólogos e gramáticos que se debruçaram sobre mais de
mos itens: onze séculos de tradição escritâ lattna.s A diversrdade da
Língua não deve ser desconsiderada por ocasião de seu
1) Estamos dìante de uma lingua estran,qeìtu "c/issìca" ensino, umâ vez que â línguâ de Plauto e Terêncio em
muitos aspectos é diversa daquela de Cícero e Qúntiìia-
no, por sua vez diferente da de Santo Agostinho e Pris-
Embora seja inegável que, do ponto cÌc vista le-
ciano. Mesmo considerando o mesmo período temporal,
xical e morfossintático, o conhecimento da língua latina
não se devem desconsiderar as variações de registro (for-
permita ao estudioso de Íngua portuguesa (e, eventual-
malf informal, erudito/popular), fato por demais conhe-
mente, ao de outras Ìínguas indo-europeias) um conhe-
cido mesmo entre os gramáticos antigos.6
cimento invulgar de suas origens, não é possír.el
^cerc^
ignorar o fato de que, païa o falante contemporâneo, o
lanm (e sua cultura) representa, necessariamente, uma 5. A pedodização do que seda o "latim clássico" ó fato de bas-
língua (e cultura) estrangeira, diferente das outras âpenas tante compÌexidade e que, por esse motir.o, está além do es-
copo desse trabaÌho. Conr-ém apenas tessaltaÍ que, se con
no que corìceÍne à ora[dade (não mais possír'el ou "rÌâ-
sidetatmos apenâs os textos [terários que nos chegaram ao
tural" em latim clássico), cujo estatuto não Ìhe garante, conhecimento nos dias de hoje, o período em que o latim
por isso mesmo, uma posição "especiai" ou "superior" escrito é documentado recobriria do sécuÌo III a.C., com as
no conjunto das drscipììnas de língua. Por <>utro lado, sua inscrições tumulares, textos Ìegais e Litetários: Néúo, Catão,
Plauto e Tetêncio com suas comédias, até uma data que é di-
reler'ância justifica-se pela cultura que eÌa representa e dá fícil ptecisar, talvez determinár.el apenas de forma a*:ittâita.
voz, a cultura clássica,a cujos textos ainda furndamentam Evidentementer em todo esse pedodo a Jíngua Ìatina escrita,
boa parte da cultura ocidental e cuja gramâtica, por in- pÍesente nos textos, solteu algum tipo de variação, fato que
justificatia os rótulos de "Ìatim arcatco", para o período de
Plauto e Terêncio (século III a.C.), "latim clássico" (para o
Estamos tomando o adjetivo "clássico" cm sua acepção tradi período de Cícero e César, século I a.C.-I d.C.), "latim pós-
cional, ao nos teferìrmos, de forma ampla às culturas anrigas clássico" (para o período posterior ao sécr-rÌo I d.C.) etc.
grega e Íomanâ. Não estamos fazencÌo menção ao período O conceito de Latìnìtas, caÍo aos autotes das artet granmatìcac
específico do "classicìsmo" gtego (séc. \rÌ\t a.C.) e romano dos séculos III, IV e V, engendrou certo conceito de "nor-
(séc. I a.C-I d.C). ma sociaÌ e ìinguística" no âmbito da gtamâtca antiga, o que

11
26
3) O estudo da língua requer rìgor teórico e dcessa dar
lugar, as representações que sobre ela se perpetuam no
textos.
seu ensino e se busque contemplâr as premissas acima
apresentadâs. Uma maneira de fazer isso é, sem dúr'ida,
inserir em sua didática os própÍios textos antigos, fazen-
Entre os professores de latim, é notória a consta
do reviver a Língua n yoz daqueles que â tiverâm como
tação de que há poucos manuajs de ensino para o nível
ni,aterna e nela escreveram obras de relevo em variados
em que essa língua é ensinada, no ensino surperior, à disr
campos do sabet humano.
posição no mercado em língr-ra portuÍluesâ. Entre esses, â
maiotia são súmulas gramaticais, que oferecem uma des-
crição simpìrfr.cada da morfossintaxe latina, por suâ vez
A importância das línguas clássicas na
baseada em descrições feitas pela tradição filológica de
educação brasileira: um breve histórìco
estudos clássicos, de até meados do século XX. Galjndo
(1995, p. 65) afrrma que os métodos empregados p^ra o
ensino do latim consâgrâram a repetição de fórmulas es-
Beard e Henderson, considerando a ìmportância
tereotipadas que foram acumuladas pela tradição (desde
do "clássico" pata a cultura contemporânea ocidental,
o modelo das artes) e que reproduziram algo mais pare-
afirmam que
cido com um "catequismo gramatical" do que com um
"üvÍo vivo".
Por isso, a fim de que a língua latina desempenhe Todos nós já nascemos cÌassicistas, por mais (ou me-

um papel formador, é preciso desmitificar, em primeiro nos) que suponhamos conhecet dos gtegos e dos ro-
manos. Nunca poderemos chegar aos clássicos como

completamente estranhos. Não há nenhuma cultuta


significa o reconhecimento de certa vztiação do uso Jìnguísti
estrangeìra que seja tão parte da nossa hìstória. @e,
.o. É o q,r" \,emos, poÍ exemplo, em Diomedes (GL,I,439,
10): Intinìtas erl ìnnrrupte hqumdì obseruatio secundam Romanam ard e Henderson 1995[i998], p. 44)
/ìnguam. can.rtat aatem, ul adnrìt I/arro, hìs qhalltíar, natura analagia
consuetudìne auctorìtate. Natura aerboram nomìnumqae ìnnnÍabì/ìs ut
net qaicquam aat mìnus awtp/as tradidìt nobis qaant qaod arcepìt. nam Set, ao mesmo tempo, estrangeiro e famüar faz da
:iEtis dimt scinba pro eo qaod ut súho, non anabgtae uìrlule sed na- Antigúdade Clássica um território no qual podemos ex-
tarae ìpsitts constiíutione canuindtur. analagia sermonìs a ndtilftt prnditì
plorar não somente o que nos é próprio e, a partir disso,
ordìnalio esï secandum lechnìcos neque a/iter barbaram lìnguam ab erndi-
a plunba dìssocìat. (,"Laünìras é o cúdado com
ta qt4am (trgenían
melhor compreender as concepções familìares âo nosso
o falat de forma incorrupta, de acordo com a ìíngua româna. pensamento contempof âneo, como também registrar-lhe
Consta, além disso, conlotme afirma Varão, destas quâtío as diferenças que nos sepâram no tempo e,pela diferen-
propriedades: n^toÍeza, analogia, uso e autoridade. A natureza
das palavras e dos nomes é imutár-el; ela nos tÍânsmitiu nada a
ça, entender melhor o nosso espaço sociocultural.
mais ou a menos do que o tecebido. De tato, se alguém disser Assim, em primeiro lugar, a proposta de conhecer
scimba em vez de snìba, não por tbrça da analogia, mas da ptó
essa cultuÍa, que é, não resta dúr.ida, p^tte da nossa his-
pria natureza será conencido do que se ffatâ. A anaÌogia da
linguagem ptoduzida de acotdo com a nâilrïeza é, segundo os tória, nunca abandonou o seu ìntrínseco carâter forma,
especialìstas, não outrâ coisa que a distinção entre uma iíngua dor: o mundo antigo descortina aQuns dos fundamentos
l:ãrbati' e uma erudita, como a prata se sepârâ do chumbo").
?q
28
a partir dos quais a nossâ propria cultura é constituída. 4 flasófca: a partu do fato de
perspectìua literárìa e

que âs línguas literárias modernas, em que se


Nesse sentido, a inserção da disciplina nos quadros regu-
escreveram os textos literários fundadores das
Iares do cutso de LetÍas rer..ela-se de fundamental impor-
literaturas nacionais, dialogam com o latim e
rànciapara o atendimento dos anseios de r-rma formação
a literatura annga. É impossír.el pensar a Li-
mais ampla, historicamente contextuals,zada da cultura e
Íeraí)ra ocidental sem considerar, em alguma
da linguagem esctita, expressos até mesr'.o pelas Dìretriles
medida, o papel dos clássicos. Também a tra-
Currìculares Nacionaìs para os cursos de Letras, Filosofia e
dição filosófica eflcontra no classicismo o seu
outÍas ciências humanas (CNE,/CES 492/2001), únda ponto de partida e teve a língua latina como
\rigentes: "aârez- de letras, auorigaàa nas ciências humanas, seu veículo de dir-ulgação durante séculos;
põe em relevo atelação dialética entíe o pragmatismo da b) perspectìua lìnguístìca: não somente as línguas to-
sociedade contemporânea e o cultivo dos valores huma- mânicas correspondem, de cetto modo, à con-
nistas". Mais adiante, na legislação, se afirma que o curso tinuação de uma variedade do latim - o "latim
de letras, entre outras competências, terÌì â de promover r.ulgat" ou "latim popular", falado em todas as
"uma reflexão analittca e crítica sobre a linguagem como épocas da cultura laina - como o latim clás-
fenômeno psicológico, educacional, social, histórico, cul- sico permanece como uma espécie de "tutoï"
tura1, político e ideológico". das línguas modetnas, fornecendo-1hes estru*
O latim e sua cultura deveriam, de fato, trazet à tuÍas e vocabulário permanentemente.
formação dos estudantes a conttibuição que lhe compete:
apottà de acesso à cultura antiga e a consciência histórica No entanto, as potenciais contribuições do latim
da Jinguagem humana. Esses dois fatores contribuiriam, para os formandos em Letras (ou, eventualmeflte, em ou-
sem dúvida, pan amphar a reflexão analittca e crítica so- tros cursos de humanas), obJiteram-se, frequentemente,
bre a linguagem, nos âmbientes em que ela é requisitada. em virtude dos "mitos" em torno do Ìatim, sobre os quais
Grimal (1.971, p.6) chega a afrrmar que o latim, de fato, falamos há pouco, construídos não por âcâso, mâs por
é uma espécie de "matemânca das ciências humanas", no conclicionantes históticos que levaram o latim da con-
sentido que representarta a base do pensamento ìinguís- dição de "disciplina obrigatória" dos currículos formais
escolares, até meados do século XX, à condição de "nú-
tico, literário, filosófico e Lristórico do ocidente, tal qual
cleo básico" dos currículos dos cursos de Letras, sendo,
a matemâttca é o fundamento das ciências da nattueza.T
posteÍiormente, desobrigado também do currículo ofrcial
O seu ensino justificar-se-ia, também, pelo caráter prope-
de Letras, que trabalha, atualmente, com competências, e
dêutico que teriâ para se aYancal nos estrÌdos em ciências
não com disciplinas obrigatórias.
humanas, especialmente nos estudos da linguagem, por
uma dupla perspectiva: Até o século XIX, o ensino dos clássicos se inseria
em um quadro àe valonz,ação dos ideais de "civiüzação"
europeia:
a Não se der-e, no entafÌto, tomaÍ es-sâ expressão no sentido em
que se tomou no passado: o latim terìa uma lógica cettada e
seu estudo se podería compâ{âÍ ao da matemática..'
31
30
Os conhecimentos conectados à ttadição clássrca Assim, com as transformações culturais e educa*
constitúam um ideal de erudição e cuÌtura, enoíme- cionais da primeira metade do século XX, a críticâ âo
mente valotizados nos países que perseg.riram uma modelo greco-latino se âcentuou e conduziu, como é
concepção de civiLização adr,"ìnda da Et'topa, como atestâdo pela hrstória da educação, à exclusão do latim
o própdo Brasil do.início do sécr-rlo XIX. Esta erudi- e de outras discipl-inas humanas dos curtículos oficiais,
ção, Ligada à ttadição c1ássìca, permeava grande par- apelo finalmente consoljdado na década de 60. Assim,
te dos campos do conhecìmento, como a filosofia, a nâquela década, com as reformas educacionais, o latim
Íetórìca, o estudo das línguas antigas (grego e latim, foi finalmente extinto dos currículos oficiais do ensino
principalmente), aritrr'étrca, a história, dentte outros básico, não sem os pÍotestos dos humanistas e intelec-
pontos. Bstavalotização da hetança cuÌruraÌ da Anti tuais da época, entre os quais pensadores do gabatito de
guìdade, nos diversos câmpos do conhecimento, tem
Ernesto Faria:
um reflexo dìreto na instrução púbÌica, que deveria
difundit o ideal de civilizaÇão atrar'és do ensino. (Pen O ponto essencial do ptoblema é que, pot mais que
na 2008, p. 67) esteja o nosso país voltado pata a modetnidade e para

o fururo, por maìs rìgorosa que seia a sua parucipa

E s s e p anora ma " idealtzante", engendrâdo p oÍ c er- ção na r'ìda nova do mundo, não the é possível des
tâ leitura que se fez da Anuguidade Clássica até o século conhecet a ìtremovível r'inculação de sua cultura com
XIX, gerou, em consequëncia, a ctíica a esses mesmos as origens helênicas e Ìatinas. Não seria convenìente
valores âo longo do século XX.
Segundo Guimarães rompeÍ com essas fontes. Com este rompìmento,
(2008), desde a dêcada de 50 do século pâssâdo, a ideia
perderíamos o contato e a influência de uma velha
de transformâf o pâís em uma "nação moderna" resul-
cultura. (Faria 1959, p. 130)
tou em ataques frequentes às chamadas "humanidades",
como expressão da política que defendi^ úma vasta re-
forma educativa e culturâl, que era a condição sìne qu(i nan Faria, atnda no frna7 da década de 50, chamavà
para que o Brasil atingisse o "primeiro mundo": atenção, portafrto, p^r^ o surgimento de um "discurso
utilitarista", como tâmbém Guimarães:
^frrrna
A imagem do classicista posta em circulação foi a de
A6naÌ, que uso, paÍa a fotmação dos recursos huma-
um rabugento professor de grego e latim que exigia
nos necessários ao país, que marchava em passos lat-
as declinações nâ pontâ da üngua (...). Esses "huma-
gos, tetia esse saber clássìco, transmitido por pessoas
nistas" não passavâm, assim, de exemplares anacrô-
que não manipulavam nem equações, nem gráÊcos,
nicos de uma ttadição plena de espítito retórìco, ba-
nem estatísticas? Nenhuma, respondiam e1es. (Gú-
charelesco, declamatório, qte fazia lembrar o Brasil
marães 2008, p. 10)
fotmaüsta, notarial, tribunício, antimoderLrc. (Guima-
rães 2008, p. 9)

32 33
A consequência disso foi a representação de que do do Latim para formação dos graduandos em Letras,
o latim (e a cultura ciássica) eravmz- discipLina, senão eli- a permanência, na prâtica, das disciplinas do currículo
tista e consen'adora, ao menos itrelevante para os pro- mínimo, afinal, nos parece o motir-o prtncipal que justifi-
pósitos nacionais da época, uma visão que perpetuou â ca sua permanência na maioria dos cutsos de Letras das
imagem da Antiguìdade como um antiquário, ainda que universidades púbJicas do país.
bela, empoeirada e gasta pelo tempo. E, o professor de
Recentemente, um mor-imento de congregaçào
latim? E,sse era o profissional igualmcnte esteÍeotipado,
de professores vem se firmando nac.ionalmente, através
repetìdor de listas de declinações, caractetísticas de uma
dos "Encontros de Professores de Latim", ocorridos em
língua totalmente apartada da cultura à qual ela deu voz.
20L0 na" Faculdade de Letras da UFJF, em 2011 no Ins-
Em suma, levou à concepção, afinal, de que o latim era
tituto de Estudos da Linguagem da Unicamp e em 2012
uma Jíngua mortâ e, como diz l.itma "Morla, sinônimo cle
no Instituto de Letras da UtrF. A partir desses encontros,
matada, não defalecìda" (Lima 1995, p.25).
foi possível refletir sobre o mapa do latim no Brasil.s De
Depois disso, o latim ficou restrito ao ensino su- âcordo com os dados recoÌhidos, existem, ao menos, três
perior, estando concentrado especiaimente nos cursos de tipos de contextos acadêmicos em que o latim é ensina-
Letras. Sua obrigatodedade rÌos cursos de letras é fotma- do: nas faculdades onde existem cuÍsos de graduação
ltzada com a elaboração, em 1.962, dos chamados "cur- completos em latim, nas faculdades onde o latim é pate
rículos mínimos" pârâ os cursos de educação superior, da formação geral em Letras e nas faculdades privadas,
aprovados pelo Conselho Federal de Educação. De acor- que se constituem uma realidade à parte.
do com o artigo 1." do Cunícalo Mínìno Federal de Letras, o
Nos cursos em que hâ graduação em latim, existe
Latim está entre as discipiinas obrigatórias: Língua Portu-
uma oferta maior de discipl"inas específicas de língua e ìi-
gue s a, Literatura Portugue s a, Literatu ra B raslleka, Ling:ua
terat\tr ,que permitem o aprendizado mats aptofundado
Latina e Linguística, a7êm de três outrâs eletivas derÌtro
da Língua e da cultura clássicas e haÌrilitam os formandos
do elenco: Cultura Brasileira, Teoria da Literaturà, :uma.
â se torrÌâïem proficientes na ieitura dos textos antigos,
língua estrangeira modernâ, Literatura Lattna, Filologia
possibilitando sua continúdade na pós-graduação. Aiém
Românica e Língua Grega.
disso, em muitas dessas universidades, que estão concen-
Esse sistema de currículo disciplinar vigorolr até tradas nas tegiões sul e sudeste do Brasil,e há também o
1996, com a elaI:oraçã.o da fui de Diretrìrys e Bases da Edu-
ensino de grego clássico. Por outro lado, os professores
caçãa Q,DB,Lei9394/96), que desobrigou a existência de
de latim que representaram tais universidades nos "En-
um elenco especí{1co de discipünas, substituindo-as pelas contros de Professores de Latim" relatatam as dificulda-
Dìretrìqes Cunicalaru Ì{acìanais, que traça os objetivos de
cada cuÍso, partindo das competências e habiÌidades que
der.'erão norteaÍ a composição curricular, que, dessa ma- Os documentos produzidos ao longo dos Encontros, a pat
neira, ê flexível. tlr das discussões tealizadas pelos professotes e alunos, en
contram-se reunidos no site: http: //sites.google.com/site/
Atualmente, como afirma Paiva (2005), os currícu- encon trodepro lte.sore.deladm.
los de Letras ainda se baseiam fortemente nas disciplinas Com exceção da UFBA e daUFPB, os cursos de graduação (-i-
dos currículos mínimos. Apesar da importância do estu- cenciaturas ou Bacharelados) em Língua e Ijteratura Latina esrào
concenúados em estâdos das tegiões suÌ e sudeste do BtasiÌ.

35
des frequentemeflte encontradas por um quadro docente trangidos a abrirem mão de disciplinas eletivas da ârea,
reduzido, târÌto em decortôncia da histórica carência de pârâ ministrar disciplinas básicas de língua portuguesa,
\.âgas destinadas às universidades públicas, quanto da es-
consideradas mais importantes. Por esses motivos, ain-
cassez de ptoâssionais da ârea, que somente muitci recen-
da, alguns professoÍes descrer.em uma diminuição de sua
temente têm tido a oportunidade de ingressâr em cursos
cargahorâria, mudança de diretrizes da educação
de mestrado e doutorado em estudos clássicos ou afins. ^pós ^
que desobrigov a catgahorârta mínima de latim. Apesar
A esse respeito, desde a década de 80, com a fundação da
dessas dificuldades, os professores de latim tentam en-
Sociedade de Estudos Clássicos (SBEC) e a consequeflte
contÍar soÌuções atra\'és da mobi[dade acadêmica, que
rcva\oúzação da ârea, assiste-se a uma implementaçào e
pÍopiciâ a seus alunos â complementação de sua forma-
ctescimento de programas e linhas de pesquisa da Área
de Clássicas, como aponta Guimarães: ção naârea em outras instituições de ensino superior, da
participação em eventos da ârea, da interdiscìp[naridade
com outras áreas como literatura, filologia e história.
a formação de uma getação de classicìstas, qre fez
As instituições privadas tiveram pouquíssimos re-
seus estudos de doutorado ou pós-doutorado no ex
pfesentantes nos "EncorÌtros de Professores de Latim".
terior, em países de sólida ttadição nesse campo de
A partir de seu relato e dos clados levantados por Carpani
estudos, permitiu que a catência de especiaüstas de
(2010), em sua monografia de conclusão de curso em Le-
dicados à intetpretacão de fontes epigtáficas, atque-
tras a respeito do erisino de latim em faculdades privadâs
o.lógicas e Ìitetárias, fossem minoradas. (Gúmaràes de Campinas e região, o latim em tâis instituições quase
2008, p. 11) desapareceu. Âs expücações aventadas são as pressòes
sofridas por tais instituições para incluírem a disciplina
Nas universidades públicas em que o latim se con, de LIBRAS (tornada obrigatória desde o Decreto Federal
figuta como uma disciplina ou grupo de disciplinas da 5.626, de 22 de dezembro de 2005) e ampliarem à c tg
formação básica em letras, o latim ó considerado uma horâria de disciplinas práticas em cursos de licenciaturas
disciplina propedêutica p^ra. formação de professores sem âLrmeritar o ônus financeiro para a instituição e, con-
^
de português e Literatura. Em grande parte, seu ensino é sequentementet parz- os alunos. Pot outro lado, não deve-
fortemente atrelado ao ensino de português. Segundo o mos desconsiderat a c^tència de profissionais de latim no
relato dos professores presentes nos Encontïos, seu en* mercado, observada âté mesmo para o preenchimento de
sino limita-se a um coniunto de, no máximo, três disci- \'âgas em unir-ersidades públ-icas em algumas regiões do
plinas, compostas, cle forma geraì, de dois semestres de país, o que explica, também, o fato de que muitos profes-
língua e um de üteratura. Na maioria dos casos, o latim é sores de latim do Brasil não serem sequer formados na
ministrado em apenas um semestre, em que a ìíngua, não ârea, o qìle se constata também nos dados dos Encontros
â liteÍatlrrâ e a cultura, é priviìegiada. Nfuitos professores e de Carpani.
rcLatam as dificuldades encontradas em desperï:ar a aten-
E o que essa história nos ensina? Ainda que não
ção para a área e implementar projetos de pesquisa ]á na sigamos [teralmente a mâvima ciceroniana, bistorìa ma-
graduação, e alguns professores relatam sentir-se cons-

36
37
gìstru aitae,la compulsando alguns dados da história des- DION{EDES (1855-1 880 [repub. Hildesheim: Oìms, 1981]).
sa disciplina, somos càpazes de iclentificar, juntamente Diomedis ars. 1z: Ì(EIL, H. (ed.). Grantnatìcì Latìnì, I,
com os âspectos negâti\.os, outrí)s tanros caminhos que 299-529. Leipzig: Teubner.
se abrem e se mostram auspiciosos. Sc por r-rm lado, é FARIA, E. (1959). Introdução à dìd,ltica do Latìm. Âcadêmica:
possír'el identificar os mitos que, historicemente constru- Rio de Janeiro.
ídos, parecem ainda permaneceï no cnsino de latim, por
FIORIN, José Luiz (1991). "Letras Clássicas no 2" Grau:
outro lado, a suâ permanência (e a crítica a eles) revela a competência textual e intertextual." Anaìs... II Con-
resistência que os estudos latinos oferecem frente à sua gressa liacianal de Estudos Clásicos, 199/, Sào Pau/0.
possibilidade de extinção. MiÍ0, relìgìão e sociedade. São Paulo: SBEC, r'oÌ. 1, pp.
Resistência atualmente motivada pela retomacla do 51.4-519.
ensino e das pesquisas, da reflexão teórica sobre seu en- GRINIAL, P. (1971). Guide de l'étildìãnt ldtìnìsÍe.Pa:-ìs: Presses
sino e o lugar que ocupa nâ sociedade atual. Na esteira Universitaires cle France.
dessa busca pela sobrevivência do latim, se apresentâm,
GUIN,f,\RÃES, J. O. (2008). "Reatuallzar a traclição clássi-
sem dúl'ida, as novas reflexões em toÍno de seu ensino e
cà", ìn'. CHEVITARESE, A. L. et a/. A tradìção clássìca
a rer.isão dos métodos e metodologias ttadicionais, bem ea Brasil. Brasília: Archai/Forttum, pp. 5-13.
como clo espaço do professor de latim, temas que serão
HARTOG, F. (2011). "Plus et moins qu'une discipÌine: Ie
abordados ao longo deste livro. Citando Settis (2005),
cas d'étucles classiques." Dossìer' LHT, n" 8, publica-
Hartog Q011) afrrma "os clássicos perderam e perdem clo em 16 de maio de 2011. Disporuvel em htrp:f f
numeÍosas batalhas. Nfas não a guerra". Pensando bem, wwwfabula.otg/Iht/8/hattog.html. Àcesso em:
não temos razão para cuÌtivarmos o pessimismo, repetin 04/09 /2013.
do com Hattog: prae/ìo uìüus, non be/lo.
Ln{-\, Â. D. (1995). Llma estranha língaa? Questões de linguagem
e método. São PauÌo: Unesp.

PENNA, n Â. (2008). "A importância da traclição cÌássica


Reíerênclas b i bl i ográf i c as
no nascimento da discipìina escolar História no Im-
perial Colégio de Pedro II", ìn: CHEVITÂRESE, A.
L. et al. A tradìcão clássìca e o Brasil. Brasília: Archail
BEARD, À{. e HENDÌIRSON, J. 0995 [1998]). Antzgaìdade
Fortium.
clássìra: urna breuíssìnta ìnÍroduçã0. Rio de Janeiro: Jorge
SETTIS, S. (2004[2005]) Le j'ttur du dassiqae. Tradução fran-
Zahar.
cesa de Liana Levi. Paris.
CARPANI, N{. Nf. (2010) .O ensìna de Latint nlr rllt".tls de leíras

dasfacalrladu paftìarlares de Canrpinas e regtãa. N'Ionogra-


fia de Bacharelado em Linguística. Campinas: Insti-
tuto de Estudos da Linguagem da Unicamp.

1íJ. Cícero, Dr oratore,II,9, 36.

3B
3
fut
Nossa herança. Nosso trabalho'

lleim Ferreìra Pinto

Ardaino Bolìuar, a teu latim


foì perdìdo para mim.
não

Muìto aprendì coníìgo: a uida é am uerso,

sem sentìdo taÌue7, mas rzln qile música!


(Cados Drummond de Andrade, Poesia e Prosa,

Boitempo, 1979)

O latim que vive em nós

Qaando se trata de dar conïa das mudanças abseruá-


ueìs na eìolução de ana dìscìplina - au de am campl
dìscìplìnar- a drtcaHade consìste em dìstìngair nelas

osfen,ômenos de moda ìntelectual proprìamente dìtas


das artìculações paradignátìtas de tìpo conjantural,
dispostas em dìacronìa, e em reconhecer nelas euentu-
almente tuansfarmações de epìstené naìs prafundas.
(Greimas 1990)

Este texto é um conjunto de comentários derivados de minha


tese de doutorado e de conr..ersâs com meus alunos na UtrJF.
Não é, de modo aÌgum, uma teflexão indiscutível sobte nos-
sas questoes de ensino de laum.

41
Este não é um trabalho de latinista, se se enten- e mantém-se nos limites de um saber filoÌógìco no
der por latinista o pesquisador que se debruçou ânos â âmbito dos dois idiomas, já que o r,'ade retro da Vul-
fio sobre pecuLiaridades da língua e da cultura íomarÌas, gâta se Íecupera de maneita cômoda sob a versão de
amparado por uma bibliogtafia altamente especializada e
Riobaldo, sem que nenhum disparate seja dito em
Lrma vasta erudição. Nem mesmo quanto aos objetir..os é
português. (I-ima 1992, p. 169)
este um trabalho de latinista, porque não se orìenta para
a conservação do prestígio do latim como "língua de cul-
O presente trabalho é o exercício de um professor
tura", próprìa de um grupo especializadc.., como denuncia
Lér,'i-Strauss: "Há mais ainda: o humanismo clássico não
que pâssou a maiot parte de sua \,-ida profissional alfa-
era restrito apenas qlranto a seu objeto, mas quanto aos betizando alunos de escolas rurâis e ensinândo "anâltse
sintática do Português" a pobres adolescentes indefesos,
beneficiários que forma-"'am a classe prir.'ilegìada" (I-évi
e que, somente nos últimos anos de magistério, vej.o ensi
-Strauss 197 3119871, p. 217).
rrz;r n Universidade um "lâtim de alfabeitzação" a ior'-ens
Nossa propostâ orienta-se, de outro modo, p^r^ o
não menos inermes. Dito assim, parece um lâmento e um
reconhecimento do ladm como unza lingaa da nossa cw/tu-
protesto. É rn.tn constatação e, âinda que ingênua, uma
ra, acessível a quem quer que se cledique a aprender um
pfoposta.
idioma para \er textos que participam de forma viva de
nosso imaginátio.
É possível ler um texto latino com o apoio de ins-
trumentos que um curso de Letrâs oferece a um aluno
Um exemplo, apenas, comentado por AÌceu Dias
razoà\íelmerrte empenhado, ou seja, ainda que não dis-
Lima, mostra que o latim não é propriedade da elite in-
ponha de um conhecimento altamente especializado,
telectuaÌ, mas está tão profundamente inserido em rìossa
e sem que ele precise isolar-se de seu tempo como se
r,'ida, que pôde ser usado na composição de personagem
fosse praticar culto a mortos sâgrados. A aprendizagem
"popular", rústica, por Guimarães Rosa, um escritor que,
da Língua lattna é quâse sempre precária em nossos cur-
como poucos, soube apanhar a complexidade de nossa
sos de graduação e a leituïâ em latim pârece uma meta
r,-ida cultural:
inatingível, somente reservada a poucos eleitos, mas essa
precariedade não deve serr.ir de entfâve absoluto p^ra o
Âo esconjurar os dernônios de Hermógenes e Ri conrato cL)m o te\to anúgo.
cardão que o mantêm sob cerco, exclama eÌe lRio A história trouxe poucas mudanças parz' o lato de
baÌdo] a ceÍtâ a.ltrlrâ do relato: '1./rí de retro!" qre e que a educação, sobretudo a educação escolar que pÍo-
como o seu vulgar l1-re permite decoch{ìcar o latim, duz o que se respeita como "cultura", sela ainda parcial.
mesmo o da Vulgata. [...] E, com efeito, aí, no respeito Em países como o Brasil, poder ttabalhar com "textos
ao sentìdo, o mesmo em Ìatim e em pottuguês, clue escïitos" (e estrangeirosl e ântigosl) é um prir'ìÌégio. E,sse
Guimarães Rosa, ao mesmo tempo ern que mântém fato não deve senir para afast:ar dos textos "cIássicos"
íntegro o caráter da suâ peÍscine!ìelrr, cuia coerência um professoï com preocupações sociais, â pretexto de
é incompatír.el com o conhecimento do 1atim, exor-
que eles não interessam ao pol'o. Determinar o que the
interessa ê tate{a do povo. Ào estudioso, especialmente
ciza ctistãmente o demônio corì1 umâ fórmuÌa ritual
àquele que tem consciência do comprometimento ideo-
42
43
1ógico de seu trabalho, cabe cuidar paÍâ que seus estudos l'ista estritamente linguístico, seu sistema foi preservado
estejam disponíveis para quem se interessar peÌo assunto, e é conhecido. Cabe aqui a advertência de Alceu Dias
pâfâ quem se pfeocupar com uma construçào da cultura Lima'.
que se aproxime mais do conceito antropoÌógco do que
do prirdlégio, como argumentâ Claude Lévi-Strauss no
Fique, pois cÌaro e assentado: a ìdeìa com que aqui
artigo citado acima.
se trabalha é a de que o "o Ìatim ê tmalíngaa uiua do
A desmistificação do latim como uma língua di-
passado" e, portânto, só em relação a esse passado
ficil, através de um ensino voltaclo pâra o sistema e nào
cabem as providências que diferenciam o seu ens.ino
pata as exceções (Lima 1995), o reconhecimento expLíci-
to de que é uma língua estrangeirâ, com todas as questões do de qualquer língua esttangeìta do presente. (-ima

inerentes ao aprendizaclo cle uma língua segunda, o uso 199s, p. 19)

cla traclução como apoio de leituta, não só como objetivo,


a aceitaçào de metodologias atuais de anáJìse, que priúle- Ainda que â forma essencial da língua, a sua ora-
giam o texto como lugar de resgate cÌa intertextuaüdade e lidade, tenha-se perdido, não se pode aceitar que seus
do contexto - ïesgate de enunciação - são estratégias que textos sejam tratâdos como despojos, muitas vezes incô-
poderão dat ao aluno o "prazer do texto". A expressão modos, de um moïto que não se pode ignorar, esconder,
consagrada por Roland Barthes (1973) em seu Le plaìsir fazer desapareceï, e, por isso, ou se deprecia ou se supe-
du texte ê perfeita para definir o objetivo maior da lçitura restima. Isso soa como incoerência clepois de milênios
do texto latino - e oferece uma confortante dignidade que fizeram da escrita o meio privilegrado de transmissão
ao professor universitário de hoje, que tantâs r,'ezes deve de cultura, de desem.olvimento generâüzado da Linguís-
dir.idir seu tempo de estudos com discussões sobte a "ne- ttca.
cessidade de ensinar 1atim". A perda da criatir.'idade não é absoluta porque, se
Recuperar o "prazer clo texto" implica reconhecer se pode interpretar um texto, ele não está morto: ao con-
que o latim não é uma "língua tÍiorta"2 - nem enquanto trário, ele conser\ra sua ptodutividade (mesmo nos teïmos
sistema nem enquanto dìscurso. Se o latim perdeu parte da dc Júlia lfuistcr-a), ele "gefa" outros textos atÍavés dos
criatividade própria dos sistemas semióticos - nào tem tempos e se mantém r,.ivo no jogo da intertextualidade.
"fala nova" *, é apenas o fato extralinguístico, historica- É o texto que fesgatâ, na sua posteÍidâde, o contexto em
mente determinado, que tofna inconsequente o uso de que foi produzido e mântém viva e plena de significação,
uma língua que já não tem falantes naturais. Do ponto de não apenas a língua, mâs sua cultura de origem. É curio-
so que outïos objetos de cultura, das artes, por exemplo,
não são tratados como anacÍônicos e impertinenfes ao
A expressão em Saussure ê infeliz, porque ele mesmo ensina
pfesente, como "coisa mortâ", por mais que não haja su-
como as línguas antigas permânecem jnte[gíveis (Saussure
1916 [1988], p.31): "Nós não iãiamos mais as ìínguas mor-
jeitos nem capazes nem iriteressados em produzi-los ou
tas, mas nós podemos muito bem assimilar o seu organismo reproduzi-los. Assim, toda a pirÌtura, toda a estataârta e
línguístico" flradução de: "Nous ne parlons plus Ìes langues toda a arquitetura "clássicas" são vistas como parte de
mortesr mais nous pouvons fort bicn nous assimìler Ìeur or
uma cir..iJização rril'a. Pot que tanta dificuldade quando se
ganisme Linguìsúque").

44
45
ì

Íata de línguas antigas? Porque não hâ faÌantes? N{as, por obriga a um embate filológico com a língua original, a
acaso, há escultores, pintores, arquitetos com os mesmos uma inquidção do momerÌto histódco, da cultura, até
r.alores culturais clássicos? De modo mais clato: há, hoje, mesmo do percutso de transmissão do texto.
enunciadores com â competência própria do artista do
Todos nós estudiosos das culturas c1ássicas so-
mundo clássico? Não apenas conhecedores de seus câno-
mos um pouco historiadores. Melhor dizendo, atuahza-
nes, mas sujeitos dessa cultuta? Ou a ârte, a filosofra, não
dores de um momento histórico. A cada vez que lemos
sofrem determinações históricas, nem se inscrevem em
um texto antigo - um poema f um muralf uma estâtú^f
sistemas? Não se está aqui esquecendo a relatir,-idade do
am graf.ttì - estâmos buscando apreender esse momento
conceito de sistema, nem sc propondo que a âïte tenha o
da história que esse texto materializa para nós. Não só
mesmo estâtuto cultural que a língua: não somos, os pro-
do que está tecido no texto * às vezes tão fugidio, mas
fessores de línguas antigas, tão ingênuos... E, porque nào
também do momento da tecitura que teceu o texto: Lrm
se é tão ingênuo, essas questões - elementares - ainda
texto é um fragmento de cultura. Falando sobre Tácito,
precisam ser mencionadas. Jacvntho Lins Brandão (con-
disse que seus textos eram história rom fla no dupÌo sen-
l'ersando informalmente sobre o âssunto, mas autorizan-
tido de que registra\-am fatos da história romana e eïam
do a citação), lembta: "alguém usâ a expressão'f/osofa
frâgmentos dessa História. No século I d.C., um homem
morta?1" Se a arte e a filosofia _ atetc:ítca! _ aínda"fazem
romano chamado Títcito escre\reu esse texto, que hoie eu
sentido", como pode a língua estar motta?
leio como História cle Roma, mas, principalmente, como
A língua latina está r'iva nos textos que, felizmente, fragmento da cuÌtura de Roma naquele século.
ainda podemos ler com proveito e encantamento. Não
Sinto-me à vontade pan lalar disso porque minha
será temeridade afrrmar que ainda que não existisse um
formação na semiótica francesa pnvilegia o texto e r''ê a
único l-ivro de gramâtica, alrngua latina está de tal forma
leitura como um resgate de enunciação. Podemos pattir
documentada - não só na sua noïmâ clássica - que seria
do texto p^r^ ïesg t^t as condições de sua produção, seu
possível depreender "um sistema da língua faitna" a paritr
momento cultural, sem o fisco de ficar mais no efltorno,
dos discursos que nos fr.catam, como ensinou Saussure
com â esperança de encontrar os pontos da ancotagem
[1 Bs7-1 91 3].
discutsiva que mârcam esse texto, sem o risco de grancle
anacronismo, porqrÌe é uma tentativa de Íesgâtâr valores
Postos e pfessupostos pelo texto.
Nossa herança - nosso trabalho
E aqui entramos num problema crucial, parece
que também inerente aos estudos cÌássicos: o do emara-
nhado de estudos, de linhas de abordagem, de discussão
Em nossa pÍopostâ pata criação de uma ârea de
^ sobre os textos Lidos. Principalmente no Brasil, onde as
filologia clássica nas tabelas da CÀPES/CNPq, as ins-
fontes são tão escassâs, mesmo agorâ com a Internet. Hâ
tituições que, no Brasil, regulam e flnanciam pesquìsa e
que peflsâr que um objeto de estudo qì.Ìe peÍdura por mi-
pós-graduação, em nír.el federal, esctevi que a ìnterdìscì-
lênios não poderia mesmo estâr em outra sitlração... Para
plìnaidade é inerente a rÌosso trabalho, porque mesmo o
não se perder muito nesse emaranhado, a recomendação
mais específico estudo literárjo de um texto ântigo nos
é a mesma que âmpara âs pesqúsas em outras áreas: bus-

46 47
car as fontes, it sempre que possír,-el ao original, e procu- so, por exemplo: sua poesia, diz Ignâcio, "pode ser vista
rar a coerêncta teoúca. Parece fácil, mas é difícil mânter â como um ato de ünguagem que faz seÍ um estado novo"
coerência quando é necessário enfrentar o debate, discer- (1995, p. 91). Dito assim, faz-me pensar que a metamor-
nir entre as várias opiniões... fose não é anter.or (menos ainda exterior!) à narcatla,
Se não é bom desprezar os estudos feitos e con- mas "construída" porf com ela, o que vem claramente
sagrados, é preciso lembrar que cada um é um novo lei- demonstrado no fascinante Antìga Masa (arqueologia da fc-
tor, que está lendo com os olhos de um leitor do século ção) delacyntho Lins Brandão (2005).
XXII3 E, de se esperar qÌre sua leitura seja diferente, pode- No artigo "Eco: Linguagem e Paixão" @into
ria mesmo ser diferente de tudo que já foi feito, mas não 2003), proponho uma leitura do episódio de Eco, de
é preciso tanto, basta que você leia seu texto, ou mesmo hletanorfows (III, 356-507) de Ol-ídio, para determinar, a
o de um comentador, lembrando-se de que sua leitura, o partir de um ponto de vista semiolinguístico, o que perde
comentário que você escreve é, também, um fiagmento a uocalis nlnpha âo ser metamorfoseada em eco porJuno;
de história, de cultura, e que tem a especialíssìma caracte- proponho uma relação dessa perda com â linguagem. Já
rística de "àm^tra-t as duas pontas" de nossa história: ttaz em minha tese de doutotado, propus uma leituta de Vita
par^ o século XXI cl pensamento de um autor de milê- Agricolae, de Tácito, com umâ combinação da teoria sem-i-
nios... Não é um privilégio? Para dar um exemplo de que ótica francesa e da semiónca da cultura de Lotman, o que
esses intrincados estudos aceitam até mesmo aplicação de me permitiu ressâltar a eÍiciente textuahzação de Tácito e
metodologias contempoÍâneas de análise, poderia apon- destacar a funcionalidade intríseca de cada paÍte do texto
tar alguns estudos de textos antigos que incluem propos- (Pinto 1992).
tas de Barthes, da semióirca da cultura de Yuri Lotman e Outro exemplo: em uma ousada leitura para um
da semiótica francesa. Vou passar por eles rapidamente, aluno de graduação em latim, \üellington Feneita Iima
citando também certa leitura de Catulo pelo enfoque da (2003), hoje professor de latim da Unir.'ersidade Federal
Semiótica das Paixões, um desenvolvimeflto bem atual da de Alfenas, em umâ aproximação instigante, mostrâ que
semiótica francesa. Roland Barthes poderia substituir citações em Fragmen-
Em Fìgaratìaìqação e Metanorfosa O nìto de Narciso poÍ versos da Eneìda. No estudo
tos de wm discurso amzrzsa

- [vro que acabou por ser uma espócie de documento "Um discurso âmoroso em fragmentos", diz \íellington,
flnal de uma vida de estudo - Ignácio Assis Silva (1995) então graduando da UtrJF:
faz uma afrrrl.':ração muito instigânte sobre Ovídio, poeta
ïomâno do final século I a. C, cujo poema Metamorfoses
 leìtura de uma obra como a Eneìda de Virgílio nos
fora o ponto de partida pata a anâ)tse do mito de Narciso,
cxpòc e rodas as dilercncat que existcm enlre o nos-
que ele r.ai acompanhar em r.árias artes, até em Picas-
so mundo e o mundo de Augusto. Texto cânone da
üteratura Ocidental, a Eneida simboüza aspirações
Disse Donaldo Schüler, no Congresso Nacional de Estu,
e ìdeoÌogìas de um povo que tânto difere de nós e
dos Clássìcos, em 2011, no Rio, que, se the fosse novâmente
petguntado se lia HerácÌito com olhos dos sécuios X,I(, não nossos costumes. Uma coisa, porém, em pouco di-
responderia maìs serem aqueles os únicos que tinha, mas cor- fere o antigo do contemporâneo: a importância da
rìgiria, dizendo "com olhos do sécr,rlo X,\f'.

48
iinguagem. (...) Espera se alcançar, attavés da obra de ASSIS SILVÂ, I. (1995). Fìgaraf,ìuiz1zçào e ntetamarfose: 0 mitr de

Roland Barthes Fragmentos de um Dìscarso Amarosa, uma lJarrìso. São Pauio: UNESP.
ìdentificação do sujeito Dido no Canto IV dc Eneìda, BARTHES, R. (1973). Le plaisìr da texte. Paris: Édidons du
intetpretando-o como eÌemento que se realiza no dis- Seuil.
cuÍso enquânto enunciador e enuncìação, não como BERTRA.ND, D. (2000[2003f). Cantìnbos da Semìrítìca lìterárìa,
ser dotado de quaÌquer caÍacterísticâ aquém da lin Bauru, SP: EDUSC.
guâgem. É, tr.rt" perspectir.a, o próptio rexto-objeto BR*A.NDÃO, J. L.
(2005). Aníiga Masa (arqaealogìa da fcçao).
que seleciona e reescÍe\re a teoria que nele se apJìcará, Belo Horizonte: Faculdade de Letras/UFMG.
pÍotegendo, assìm, o analista da sombíâ cartesiana de COVÂ, P. V (1982). Latino e Dìdattìca della Continuìtà. Brescia:
veÍdade estabelecida. (I-rma 2003, p.7) La Scuola.
GREIN{ÂS,J. Â. (1990). "Novos desenvolvimentos nas ci-
Essa rápida menção, de modo nenhum exaustivâ, a ências da ìinguagem." CruTeìro Semìótìco, n" 12. Porto:
alguns estudos desen'oÌvidos no Brasil, é uma espécie de Associação Portuguesa de Semiótica.
captãti 0 b e n uo le n tìae, uma j ustifi ca tiva paru no ssa proposta
e
LEVI-STRAUSS, C. (1973 [1987]). "Os três humanismos",
de leitura, um modo de dizer que não â estâmos inven- ìn: LEYI-STR-\USS, C. Antropolagìa Estrutural II. 2"
tândo, mas seguindo um caminho que lá foi bem trilhado. ed. Rio de Janeito: Tempo Btasileiro, pp.277-280.
É, portanto, apenas uma tentativa de ler com uma teoÍia
LIMÂ, Â. D. (1992). "O golpe do latim." Classìca (Brasil)
contempoïânea essa parxão tão antiga como a poesia que
5/6, supl. 1. Belo Horizonte: SBEC, pP.169-171.
à ttaz nós. Menos que uma contribuição à leitura de
^té LINIA, \fl H (2003). "Um discurso âmoÍoso em fragmentos."
um poeta antigo, essâ leitura tem o sentido de aprender
Comunicação Individual. XIV Congresso da Socieda-
com Catulo, por exemplo, como se carÌta uma paixão há
de Brasileira de Estudos CÌássicos. PeÌotas: SBEC.
2000 anos, ao mesmo tempo em que pcde oferecer mais
uma evidência de como a poesia construiu e codificou LOPES, E. (1990). "Paixões no espelho: sujeito e objeto
uma Jìnguagem do discurso apâixonado, que continua a como investimefltos passionais ptimordiais." Craryì-
configurar muito de nosso imaginário passional nos tem- ro Semìótìco, n" 1.1-12. Porto: Âssociação Portuguesa
pos modernos, cuja síntese é o dístico Odì et ano. Ou seria de Semiótica, pp. i54-160.
"
por âcâso qLÌe Leâridro e Leonardo, no século XX, can- OLIVÂ NETq J. Â. (199ó). O lìuro de Catula. Tradwção co-
târam "Íespondi tenho ódio e morro de amor por eÌa?". mentada dos poemas de Catulo. São Paulo: Edusp.

PINTO, N. F. (1992). De Vita lulliiÂgricolae, deTácìÍ0.l{atas


de Leìtura. Tese de Doutorado. Ataraquara: Programa
Referéncias b ib Ii ogr áfì cas de Pós-Graduação em Lettas e Linguística, UNESP.

(2003). "Eco: Linguagem e Paixão". Iíìner'iias


* Reuìsta de Lìteratara, n. 20. Aranquata: Unesp -
ÀNDRADE, C. D. (1979). Poesìaf Pra:a. Br.tìtempa. Rio deJa- Faculdade de Ciências e Letras, Pós-Graduação em
neiro: Nova ÂguiÌar. Letras: Estudos l-iterários.

{h
e/Y dt

Ensino e pesquísa de língua e


literatura latina no Brasil de hoje'

Pau/o Sárgio de Vascancellos

Introdução

No Brasil, vivemos hof e um grancle momento nos


estudos clássicos, uma espécie de "ïenascimento", se le-
vâïmos em corìta o pànorama desanimador que se tinha
há décadas atrás. No caso do latim, se seu estudo continua
praticamente excluído da grade curricular do ensino fun-
damental e médio, nas universidades púbücas discipünas
de l-íngua e literatura latina r.'êm atraindo maior número
de alunos (N{iotti 2006); além disso, pesquisa-se na ârea
cada vez mais em nível de iniciação cienttfr.ca, mestrado
e doutorado. Por outto lado, o mercado editorial está
aberto à pubìicação de traduções dos clássicos latinos; se

Minhas tef,exões iniciais sobre esse mesmo tema se encon-


trâm no texto "Ensino e pesquisa de língua ehteratttalaúna
no Btasil: novas perspectir,zs", za: Silr'eita, EÌaine N{ara (org.)
Q01.1'1. As bordas da lnguagem. UberÌândia: EDUFU, pp. 303-
i17.
I

docente ou mesmo aluno de mestrado ou doutorado


ì-rm aprendidas nas gramáticas, takez jamars fossem empÍe-
produz uma tradução de bom nír'el, não é difícil erìcon- gados por um falante nativo. Assim, inventar frases lati-
trar editor disposto a pubücá-la, por vezes estampando o nas não apoiadas diretamente rios textos herdados pode
texto latino ao lado da tradução. ser um recurso diclático, a que, porém, não se deve dar
Em suma, sinais evidentes de vitalidade fazem peso maior. O estudante derre ser treinado para ler textos
prever um futuro ainda melhor pàra os estudos clássi- escritos em latim, tendo consciência do carâter pecuüar
cos no Brasil. Não é à toa que atualmente pesquisadores desse latim: língua ltterâria que, mesmo em gêneros que
estrangeiÍos, em visita a nossas univetsjdades, admiram- deixam transpareceÍ a língua coloquial, é altamente esti-
se diante do grande interesse pelos estudos clássicos em por exemplo, rìo câso da poesia, a res-
l:.zada, submetida,
nosso país (e da juventude de grande parte dos docentes trições de ritmo.
em nossas unir-ersidades púbìicas!). Somos professores de língua e literatura mesmo
Neste breve p^norama, gostaria Ce apontar o que quando só tratamos de Língua... Nfétodos como o Readìng
vejo como aspectos muito positivos nos estudos clássicos l.ztin, de Cambridge, agora lançado no Brasil em versão
brasileiros, sobtetudo naârea de latim, e o que considero traduzida e adaptada, desde as primeiras lições apresen-
campo ainda a ser explofado, ou procedimentos a serem tam textos baseados em textos antigos, em vez de frases
expandidos e aperfeiçoados. Não pretendo pontificar soltas, destituídas de contexto, isolando da forma mais
sobre nada, âpenas relatat um ponto de vista embasa- arafrcial as declinações (com frases do itpo Filìa agrìcolae
do numa experiência profissional de mais de vinte anos prtn'eiï^ decÌinaçào....
ìn sìlua ambulat), para ensinar
como professot de língua e literatura latina. ^
Se os estudos de litetatura lanna florescem e dia-
logam com outras âreas, creto que ainda há mu-ito por
fazer quanto ao ensino da língua latina. Uma dificuldade
Língua e lìteratura latinas: uma unìdade indissociável
aqui é o peso da tradição: mesmo um método dinâmico
e arejado como o Readìng Latìn é preponderantemente
tradicional na descrição sistemática das estrutuÍâs grâ-
É .or..nro hoje que não mais podemos sepeLtat,
maticais. Cito uma experiência pessoal: admito ter ficado
como no passado se fez, ensino de língua e de literatura.
um pouco frustrado ao examinal a sintâxe de Conte et al.
O latim é uma ltngaa a que se tem acesso quase que ex-
(2006): tendo em r-ista o nome do grande estudioso que
cÌusivamente pela Ìiteratura e o Ìatim dessa literatura está
tão brilhantemente reno\rou o estudo da )tteratura larina,
no centro de nossas aulas e pesquisas. Não faz sentido
espera\a algo mais arrojado, mais influenciado pela mo-
ensinar um utópico "latim vivo", uma Jíngua que, em vez
derna linguística; entretanto, o trâtâmento dado à sintaxe
de.,-iva, é um arremedo aproximativo de um latim que um
latina aqui é similar ao de sintaxes como a de Ernout e
dia lbi falado... por que estrato social e em que contexto?
Thomas. É ornn ótima sintaxe, como a dos autores fran-
Sem a figura do falante nativo, sequer podemos testar a
ceses, didáticâ e completa, mas seglre, em Linhas gerais,
gramadcalidade (no sentido chomskiano) de enunciados
o modelo descritivo consagtado sem grandes inovações.
que, aparentemente corretos do ponto de vista das regras

55
Noçoes de linguística nas aulas de Iatim O escravo chamou o senhor.
ACENTE (sujeito NOMINATIVO marcado pela ordem das palavras)

Devo dizer que tenho me esforçado por empre-


Seru-rls domi num uocau ìt.
gar em minhas aulas de língua noções da linguística que
ACENTE marcado pela desinência -US (sujeito NOMINATIVO)
julgo esclarecedoras, mas que o não faço tão sistemati-
câmente como tah,-ez pudesse. Por outro lado, não vejo
 vantagem dessa pequena intervenção da lìngús-
como ideaÌ que o professo! por exemplo, exponha aos
tica... (Astori2011, p. 355) é mostrar ao aluno que umâ
alunos a sintaxe gerativo-transformacional, o que toma,
Língua flexir,a se distingue não por ter casos, nesse sentido
ria muito tempo e> pafa o não especialista, traria o risco
mais amplo da palzvra cdsz, mas por dat a esses câsos ex-
da superÍiciaìidade, dada a complexidade dos desdobra-
pressão morfológica. Toda língua tem casos, um universal
mentos desse modelo explicativo (teoria de princípios
linguístico. O pottuguês, no quadro dos pronomes pesso-
e parâmetros, minimaiismo...). Mas noções como as de
ais, apresenta a mesmâ caractetisïtca do quadro nominal
estrlrturâ profunda e superficial (de resto, ausentes da do latim: vaúaçào de forma parainücar o caso: eu/me/
descrição atual propostâ poÍ esse modeÌo!) podem de al- mim/comigo.
guma forma ajudar na descdção de certas estruturas do
Entretanto, estuclos que apLicam instrumental te-
latim, sobretudo na apresentação dos casos. Tradicional-
órico da Jinguística ao latim são de dificil acesso; encon-
mente ensinamos os casos das deciinações latinas como
tram-se, mundo afota, em teses não publicadas, artigos
se fossem uma c tacterística exclusiva do latjm e línguas
em periódicos, anais de congressos e relativamente pou-
afins, que deixou apenas vestígìos no sistema pronominal cos üvros. Sobretudo, produzimos, no Brasil, escassa re-
do português. Julgo muito proveitoso introduzir, no mo- flexão a respeito. Eis um campo a se explorâr muito tnais:
mento em que tratamos dos casos latinos, a ideia de que buscar na linguística, em suas várias subáreas, concep-
toda ìíngua, em estrutuÍa profunda, tem casos semânticos
ções que refinem nossa abordagem do latim; num plano
abstratos (agente, paciente, beneficiário...) qo., em cada formal, penso sobretudo nas descrições gramaticais mo-
uma delas, ganha substância concreta de forma variada. dernas de prestígio (funcionalistas, getativistas ou outras)
Um pequeníssimo exemplo: o português marca o sujeito, que podem ser úteis p^ra apteseritâcão, em sala de aula,
^
geralmente, na ordem das palavras: sujeito é a expressào das estruturas gramaticais do latim. A título de exemplo, a
nominal que vem geralmente antes do verbo, que com ele noção de "gramaúcalização", termo criado pelo classicis-
concorda. Em latim, essa função não é determinada pela ta Meillet(!), pârece-me extremamente útil na expÌicação
ordem das palar.ras, mas poÍ uma desinência que Ín rca de certos fenômenos (das mais variadas línguas, aliás). Na
na forma a função. Em suma, o latim não é especial por minha opinião, mesmo que essas "intetvenções" não sit-
ter câsos, mas pertence a um grupo de linguas que dá y^rn p^r^ que o aluno leia latim com mais fluência, objeto
expressão ao caso na forma, geralmente, de desinências. maior de nossâs aulas, contdbuem para que tenham uma
Com um r,-erbo de ação, teremos: visão menos ingênua da língua. Estereótipos correntes
atê hâ pouco, âo merÌos no imaginário popular, de um
latim "harmônico" e "lógico", uma língua caractertzada tura etc., mâs ao abordarmos os textos antigos âpl,icamos
por qualidades que a distinguiriam das outras etc. não re- a eles câtegorias que, mesmo implícitas, nossa in-
^fet^m
sistem à mais superficial abordagem em termos da mo terpretação. Se r.ou anaLisar um poema amoroso escïito
derna Ìinguística. em primeira pessoa, certamente Togo frsarâ claro se faço
leitura biografista, de viés romântico, ou, influenciado pe-
las teorias do Ì{ew Crìtìcism, considero o "eu poético" uma
O ensino de literatura: teoria e prática perszna. Sem mesmo citar nenhuma teofla, chegamos ao
texto impregnado de pressupostos. Julgo sâlutar que ex-
pücitemos âo máximo rìossos instrumentos teóricos; que
Se no trato com â língua o âpoÍte teórico de estu- tenhamos consciência de que é impossível abordar um
dos modernos é ainda escasso na prâúca üâria da sala de texto qualquer sem o cfivo de certâ teoria mais ou menos
aula, aqui e1â fora, o quadro é outro quando se considera impìícita, mais ou menos sofisticada. Não o fazer contri-
o ensino e a pesquisa em literatura latina. Restrinjo-me ao bui para se (re)cair nâ atitude positivista de julgar que o
nosso contexto btasileiro. Está se tornando uma atitude texto ântigo pode ser tÍatado de modo r comple-
^ ^p^g
isolada renegar a teoria no trato com os textos da Anti- tamente a histótia que nos sepa;r^ dele e ser âpïesentado

guidade. Conselhos como o que dá David ìíest, confor- na plenitude de objeto objetivamente considerâdo. Se o

me a citação abaixo, não parecem justificáveis: texto pudesse ser assim recuperâdo como quem resgata
das areias do deserto uma estátuâ perfeitamente conser-
vadâ, o olhar dos antigos sobre esse texto e essâ estátua
Conrinuo conr-encido de que uma boa porção do tra- só pode seÍ reconstruído de forma especulativa, sem a
baÌho moderno baseado na teotìa não nos tem ajuda- cetÍeza de que nossos padrões de ar''aliação, anacrônicos,
do, de maneira alguma, a compreender os textos [...] não esteiam interferindo na observação. Não se foge da
N{eu conselho ao jovem seria deixat de lado a teoria e teoria como não se foge da história.
it ao ttabaÌho concfeto com os textos, os objetos su,
pérstites, a er.idêncìa.2 Sest, apadFo',vler 2000, p. 1 15)

Análìse e ìnterpretaÇão dos textos antlgos


A questão é: não se pode fugir dateorta. Podemos a partir de teorias...antìgas?

não expLicitar nosso instrumental teórico ou nossâs con,


vicções pessoais sobre o que seja texto e o que seja ütera-
Como aqui e no exterior se vê, por vezes, certâ
posição pecúar do estudioso da ârea de estudos clássi-
"Iam still conr.-inced that a fair âmount of modern wotk with
a theoretical basis has not helped us in any $.ay to undeís- cos, julgo adequado, neste breve panorama sobre a ârea
tand the texts [. . .]. NIy 2df içs to the young u'ould be to cast no Brasil, tecer algum comentário a seu respeito. Trata-se
out úeotg and get dorvn to real worlç on the texts, tl-re mo- da decisão de aceitar apeíÌas o instrumental teódco dos
numents, the sun'iving objects, the er.idence". Neste ensaio,
traduziremos as citações da bibLiogtafia em língua esttangeirr,
Antigos tn anâl1se e interpretação de textos antigos. Nes-
mas só poremos em nota o texto original quando flos pâfeceÍ se tipo de estudo, retóricas e poéticas da Antiguidade são
necessário.

58 59
inr,-ocadas para refletir sobre convenções genéricas, tipo Posiçòes como â de Heath se mostrâm ingenua-
de linguagem, etc. A meu ver, recorrer a retóricas e poéti- mente inconscientes de sua própria atbitrariedade: sua
cas antigas é extremamente interessante e tem produzido escolha, tão discutír'el quanto qualquer outra, de ler o tex-
estudos importantes em nosso país. Essa postuÍa propi- to em certa chave interpretatíva. Problema maior se tem
cia que se terÌte reconstituir, ao menos especulativamente, quando se parece considerar o texto como deposrtário de
o modo como os textos eram produzidos e "recebidos" um sentido a ser Íesgatâdo pela p:urezz' não anacrõntca
no contexto em que foram publicados. N{as negar que de uma análise centrada em instrumental teórico antigo...
outros insttumentos teóricos, porque modetnos, e entào Resume Feeney (1995, p. 312): "Ciassicistas, dentre todas
anacrônicos, possam ser empregados, é uma decisão ar- as pessoas, deveriam ter â peïspectiva histórica païa ver
bitrâria cujo autoritarismo salta aos olhos. O pesquisador que qualquer ato de críaca é provisório..."
do caráter precârio e provisório de
der,'e estar consciente
Não nego a reÌevância de estudos que utilizam Íe-
toda teoria, mesmo a anttga... Afinal, a prestigiosa Poétìca
tóricas e poéticas antigas (no Brasì1 eles têm sido profí-
de Aristóteles disse tudo o que se pocieria dizer sobre
cuos, como já disse); ponho em discussão o modo como
a tragédia antiga? Por acaso há, modernamente, algum
esse instrumental teóÍico é por vezes apresentado, ins-
estudo interessante sobre a tragédia grega que tenha se
ciente de que suâ reconstrução das retóricas e poéticas
baseado apenas em Aristóteles, que, aliás, não foi con-
antigas jâ ê um ato de interpretação sujeito a discussão.
temporâneo sequer de Eurípides?
Um campo da teoria moderna que me parece mui-
Ainda que pudéssemos reconstituir com seguran-
to útil aos classicistas é o da recepção ou das teoriâs sobre
ça o modo de recepção da época em que os textos ânti
recepção, já qu.e não há uniformidade total entre os vá-
gos foram produzidos, como leitores não somos càpezes
de ler as obras sem as nossas próprias determinações his-
rios teóricos. Por que, â meu veÍ, estudos sobre recepçào
tóricas inconscientes. Analogamente, podemos our,-ir um são importantes para a ârea? Esboço algumas ideias:

conceïto de música com instrumentos que reproduzem


exatamente os da época da peça musicai executada, mas 1,. O texta laíino (oa grego) r1ue lenos j,l á flírada por
seremos incapazes de ou-n'ir a música com ouvidos "não wm prirteìro leìtor, o flókgo que estabeleceu o
contaminados" pelas estéticas posteriores (À{ardndale texto, fâzendo escolhas entÍe várias leituras
1993, p. B). dos manuscritos. Essas escolhas são influen*
Valemo-nos de Denis Feenel,', que, num ensaio, ciadas pelos pressupostos teóricos do filólogo
discute o tipo de postura que tenho considerado aqú e de sua época.
como inadequado. O estudioso critica a c)pinião, formula, 2. Os cltíssìcas latincts se caracteriqam pela "arle alusi-
da por Heath, de que "o testemunho antigo é nossa única ila". O texto que alude faz uma leitura de um
chave interpretativa" (Feeney 1995, p. 303). Destacâmos outro texto. Nas anáüses intettextuais ttadi-
em suâ crítica: "Heath está sempre denunciando precon- cionais, é comum esquecer esse aspecto: não
ce-ito modetflo, mâs a ideia de que nós só podemos ler a apenâs o texto que alude não tem um sentido
hteratura antiga nos teÍmos da crítica anuga é, ela mesma, fixo, mas também o texto aludido.
um preconceito moderno" (ìd., p. 30a).
Trata,se de um pÍocesso eminentemente dinâmico, O episódio é baseado na llíada: Zets aparente-
dialógico, em que o texto aludido é 6ltradc por uma leitura mente chora "lágrimas de sângue" por SarpédorÌ, seu

do texto que alude. "Intertextualidade é um euenta, não um próprio filho; mas no originâ1, diz-se, mais literalmente,
objeto. Não é uma coisa, um dado fixo a set analisado, mas que o cleus verteu sobre a terta "gotas sangúneas" (XVI,
uma relação em movimento, até mesmo LÌma desestabiü- v. 469) p^ra honrar o filho. Ao tratar da imitação virgi-
zação dtnãmica" (Barchiesi 2001, p. 142).3 Entre o rexro liana, os críticos tendem a mencionar urn pranto de Zeus

aludido e o que alude há roda uma história cultural, uma no poema homérìco, mas Bârchiesi lembra que o original
parece de fato falar numa chuaa de sarìgue, um prodígio
recepção, de que o crítico não pode se esqllecer.
divino, não num prânto do deus. Platão, poÍém, jâhavia
Por exemplo: a ol>ta The homeric scholia and the Ae- lágrimas.
interpretado o episódio como umâ referência às
neid, de Schiunk (1974), mosffâ como Virgílio, em sì-ra
Assim,
apropriação de Homero, parece demonstÍar ter levado
em contâ certas críticas que se faziam a respeito das epo-
peias homéricas. Assim, desvendar o diálogo entre ViÍ- a Íransfornação de Homero não é compreensíveÌ sem
levar em consideração z sua recepção'. não tânto porque
gíìio e Homero não se reduz a interpretat Virgílio, mas a
interpretar também Homero - "inteÍtextuaLidade envol- Vitgí1ìo partiu, necessariamente, de uma sua Ìeìtura

ve a interpretação de pelo menos dois textos, não de um particuÌat do modelo...mas sobretudo na medida em

só" (id., ìbìd., p. ftaüçào que se seguiu a ele até que essâ tecepção constitú jâ o sisnna de exputa/tuas
1,47)4 - ea
a Eneìda. Tomemos de Barchiesi um exemplo de como é cuharais com o qual a obta se der.e confrontar para
importante levar em consideracão a recepção em análises empreendet â sua aventuta comunicatir'-a. (Barchiesi

intertextuais. No canto X da Eneida, diante da iminência 1984, pp. 23 24)5

da morte de Palante, Hércules ouve umâ prece do jovem


e chora (antes de ser consolado porJúpiter): Â anfise inteÍtextual tem a grande vantagem de
colocâr em foco o papel do leitor: a e1e compete identiÍi-
câr (ou não!) os textos aludidos e compor uma inteïpre-
Audììt Ahidu ìuuenem nagnamqae sub imo
tação do diálogo entre os textos, ou seiâ, um sentido não
corde premtt gemìtam lanìmasque effandit ìnanis. $, v.v.
explicitâdo pela obra. Pensemos na Eneida: algum leitor
464,465) jama.rs a leu ciente de tados os textos que evoca? Lembre-
"Oul'iu ao jor.em o Alcides e no fundo do coração mos que o extenso volume de I(nauer (1'964), que lista
conteve grande gemido e verteu lágrimas inanes." todas as reminiscências hométicas na epopeia virgiliana
- e só elas (e arnda hâ Safo, Catulo e tânto mais) - é
incompleto: de quando em quando se âventâ um nor.o
patalelo homérico! E quantos ecos textuais não somos
"Intettextualiç is an etent, nat an abject. It rs not a thing, a fixed mais capazes de percebet, jâ qrue certamente deve haver
gir-en ro be analysed, but a relârion in motion, er.'en a dynamic
destabilization".
4. "intertextualìq,'invoh'es the interpretation of at leâst t\r.o tex O que dizemos a respeito do episódio foi baseado nesse livro
ts, not of one alone". brilhante.

63
62
evocação de textos que não chegaram até nós? Cada lei- Soüdifica-se, assim, certa l'isão das obtas como um
tor, então, tem uma bagagem de textos diversa e parcial; pressuposto indiscutível, ou inconsciente. Um aspecto a
cada um lê intertextualmente de uma maneira singular, já salentar é a construção da históriallterârta influenciada
que levando em conta um certo número de hipotextos. poï considerações dos antigos (como a desvalortzação da
Âlém disso, o que cada leitor extrai do diálogo entre texto obra de Lír'io Andronico por Horácio6), adotada
^ctiitca.-
evocado e texto evocador não é controlável. Em suma, o mente pelos pósteros, sobtetudo quando possuímos ape-
ponto de vista intertextual opera como desestablkzador nas fragmentos escassos da obra de determinado autoï.
da ideia de sentidos fixados nâ estrutuÍa do texto e deco, Reavaliar constântemente a históri a ltterâria é ur.rra tareia
dificados univocamente pela anáüse do fiìólogo. importante, e isso se faz constatando-se a provisoriedade
de nossas leituras ctíticas:
3. Lìdamos com traduções. As traduções são já uma
leitura do original, influenciada pelos ptessu
Toda leitura é diíerente de qualquet outra leitura; de
postos vários (de ordem teórica, estética...)
noro, nào há nenl^um texto em-:i-me\mo. mxs tào
do tradutor. De ordem estéticâ: pensemos na
somente uma sétie (potencialmente, sem frm?) de lei-
preferência pela famosa concisão e pelavatia-
turas rivais (ou complementares). (N{artrndale 1993,
ção (breuìtas e uarìatio...) de um Odorico Men-
p.18)
des, por exempÌo. Por vezes, percebe-se com
facilidade a influência do gosto da época no
texto da traducão.
Desafìos

Em suma, se o leitor leigo tende atnda a achar que


existe uma tradução fiel e unívoca, a traduçào que íepro-
duz mìlimetricamente o original, as teorias da tecepçãcr Por fim, âponto alguns dos desafios do futuro.
nos advertem para instabilldade essencial dos sentidos A1ém do diálogo maior com a ünguística, a área precisa
^ no que as âgênciâs de fomento chamam de "in-
do texto: â tïadução é uma reconstituição prol'isória, in- ^v^rrçat
Íluenciada por gostos e pressupostos, datada historica, ternacíonaü.zaçào" e na interdisciplinaridade.
mente como qualquer outra leitura. Além disso, nunca São vários os sinâis de uma maior internacionali-
se poderia dtzer o mesmo num outro sistema linguístico, zação: participação de docentes e pós-graduandos brasi-
questão complexa que não nos compete abc:rdar aqui. O leiros em e\rerÌtos no exterior; participação, em e\-entos
que importa: a história das traduções se insere na história nacionais, de pesquisadores de renome internacionai;
maior da recepção dos textos. publicaçào cìe arügos em reristas inrcrnacionais esPe-
ciaü.zadas. Creio que nos próximos âÍlos assistitemos a
4. Àiarsas atiuìdades bermenêaÍicas têtn tradìção de sí- um aprofundamento desse fenômeno, importànte P^r
a sedimentação de conhecimentos não
cw/os:
postos à pror,z de nor.-as evidências e refle-
xões é um risco frequente.
6.

64 65
divulgar as pesquisas aqui realtzadas e pâra fomentar um coruparatìue gramztan Newcasde upon T1.'ne: Cambrid-
intercâmbio com o qual só temos a nos enriquecer. ge Scholars Publìshing, pp. 355-369.
Por outro lado, enfoques interdisciplinares estão BARCHIESI, A. (2001). "Some Points on a N{ap of Shi-
na ordem do dia,7 e nossa área nasceu para ainterdiscipli-
p'\ì/recks", za: BARCHIESI, A. Speakìng uolumet. I'iar-
naridade (a Íìlologia não estuda os textos sem os inserìr ralìue and ìntertext ìn Oaid and other Latìn poets. Londres:
num contexto), e o estudioso de língua e literatura latina Duckrvorth, pp. 141-154.
só tem a ganhat no contato constânte com áreas como
(1984). l a traaìa del nadello. ffietti omeicì nella nar-
ArqueoÌogia, História anúga, Filosofia anttga, História da
raqìone airgìlìana. Pisa: Giardini.
Ârte, só para mencionar as disciplinas mais estreitamente
telacionadas com o cuÌtor dos textos antigos. BARCHIESI, À e SCHEIDEL, \ï. (2010). The OxJbrd Han-
dboak of Roman Studìes. Oxfotd: Oxfotd University
Por fim, chamo z aÍenção p^rà o fato de que colo*
Press.
car em discussão nossos pressLlpostos teóricos e refletir
sobre nosso papel de professor e pesquisador, rejeitando CONTE, G. B.; BERTI, E. e À,IARIOTTI, NI. (2006). I-r
posturas fossilizaclas e reiteração preguiçosa de estereó- sìnÍassì del latìno. Fitenze: Le Monniet.

tipos, demonstra também a vita[dade da ârea, c p^z de, FEENEY D. (1995). "Criticism ancient and modetn", ìn'.

autocriticando-se, reinventâÍ-se e atendef às nor,'as de- INNESS, D. et a/. Ethìcs and rhetoric. Classical essayfor
mandas (da ciência, dos alunos e, por que não?, até mes- Donald Rttssell on bìs :eueníh-f,fth bìnhda1 Oxford: CÌa-
mo do púbÌico leitor dos clássicos situado fota da acade- tendon Press.
mia). Certamente, essa tarcfa crittca tem contribuido para FOWLER, D. (2000). "On the shoulders of Giants: Inter-
que a ârea de estudos clássicos conheça o vigor de que textuaüty and CÌassical Studies", z7: FOWLER, D.
r.em desfrutando atualmente em nosso país. Roman construcÍìons. Readìngs ìn postmodern latìn. Ox-
ford: Oxford Universiw Ptess, pp. 115-137.
KNÂUER, G. N. (1964) . Die Aeneìs wnd Homer. \'tudìen 7ur
Referéncias b ib Ii ogr áf i cas poetìschen Technik Vergils nìt Lìsten der Homerqìtate in der
Aeneis. Gottingen: Vandenhoeck & Ruprecht.
N'{ARTINDALE, C. (1993). Redeemìng the texí. I'atìn paetry
ASTORI, D. (2011). "Sintassi dei casi latini e moderna d-
and the hermsneatìcs of reception. Cambridge: Cambridge
{lessione linguistìca: note teoriche e üdalche", ìn:
Unir.'ersiw Press.
ONIGA, Renato et alìi (2011). Formal lìngaìsÍìcs and
N,ÍIOTTI, C. (2006). O ensino de latzm nas nnìuersidadespublìcas
the teacbìng o;f ktìn. Tlseoretìcal and applìed perspectìues in
do utado de São Paulo e o métado ìnglâsPieeürgLaan:
wm estada de caso.Dissertação de Nlesttado. Campinas:
ì'lesse sentido, ioi muito auspiciosa a publìcacão, em 2010, do Instituto de Estudos da Linguagem/Unicamp.
Iiwo The O>.fotd Handbaok Ía Rottan stadìes, editado por Âle
xandte Barchiesi e \X/a1ter Sci-reidel: aqui o mundo romano é SCHLUNK, R. R. (1974). Tbe honeit scholìa and the Aenetd.
estudado sob os mais variados ângulos, nas r'árias subáreas A studl of Íhe ìnfaence af ancient Hamerh lìferary citirìsm
dos estudos clássicos, empregando-se também jnsttumental
teórico de outrâs áÍeâs do conhecimento.

66
on Ltergìl. Ann Ârbor: The University of Nlichigan
Ptess.

\ASCONCELLOS, P. S. cle (2011). "Ensino e pesquisa cle


Íngua e literatura latina no Brasil: nolzs petspecti-
vas", ìn: SILVEIRA., Elaine Nfara (otg.) A: bardas da
lìngaagem. Ubedândia: EDUFU, pp. 303-317.

4.
Ensinando e pesquisando
o mundo clássíco'

Williaru J. Danìnìk

Introdução

Quando os estudântes se mâtriculam em uma


universidade para estudâr Humanidades, eles têm nume-
rosas decisões a tomar: "Quais cuÍsos eu deveria esco-
ther? Será que é possível estudar Humanidades e ainda
alcançar um estilo de vida confortável? Ou eu deveria
escolher somente cursos que conduzirão a urr'a carreira
mais bem remunerada?" Os estudantes de Humanidades
sabem que tâis decisões determinarão o cuÍso de suas vi-
das, pois eles têm somente alguns poucos anos para se
educarem na unir,-ersidade e, nesse pÍocesso, adquirir a1-

Gostaria de agradecer ao Prof. Leonardo \f. \rreira Glni


versidade Federal da Bahia) e Prof. Dr. Btunno \l G. Vieira
Qnesp - Arataquara) pot sua assistência, íespectivâmente, na
ttadução e na revjsão deste texto para publicação. Eu também
gostaria de expressar a minha gratidão à Capes pela outotga
da bolsa que fez esta publicação possível.
gum veÍniz de erudição humanística e, ainda, preparar-se cútica, mas também como os bastiòes da expressão livte
para os desafios que a sociedade atual apresenta. Diante e aberta. As funções tradicionais de uma universidade são
dessas questões, proponho a discussão de um tópico que produzir e disseminar conhecimento poÍ meio do ensino
é muito especìal para mirrr: a importância, reler.áncia e e da pesquisa. Assim, o propósito de uma universidade
r,-rabilidade dos Estudos Clássicos e das Humanidades no moderna é essencialmente duplo: salvaguardar a herança
ambiente universitário contemporâneo. Procurarei forne- científico-cultural e ampliar o conhecimento poÍ meio do
cer umâ l'isão geral das oportunidades e dos desafios que, desenvolvimento de novas abordagens teóricas e áreas de
segundo eu peflso, estão colocados pata pesquisadores, estudo. A palavra universidade, como se sabe, é derivada
professores e estudantes de Clássicas e de Humanida- do vocábulo lattno anìuersitas ('unir-etsalidade','totalida-
des no começo do novo milênio. Ao desewolver essas de', 'o todo), que, poÍ sua vez, é formado poÍ duas outras
discussões, espeÍo tornaÍ perceptíveis o largo alcance e palavras latinas, anus ('untco) e uersl.ts ('voltado para); quer
reler,ância dos Estudos Clássicos patã o pensamento hu- dizer: um estado; uma condição; uma instituição, neste
manístico e pàra o mundo moderno.
câso, que inclú tudo, todo o conhecimento coletivo. As
Por "clássicos", eu me refiro àquelas obras que são Humanidades são inerentemente humanas e humanízan-
geÍalmente descritas como "clássicos ocidentais" em par- tes, como fica evidente ao obserYarmos a palavra latina
tes do mundo como aÍndia,aChtnae oJapão, que têm humanilas, que significa literalmente 'flatttrez^ humana'. O
suas próprias tradições clássicas. Curiosamente, o estudo papel das Humanidades é, em parte, preserr.at o coração
dos clássicos gregos e latinos possui uma forte tradição e a alma da humanidade. Realmente, acredito que nós ne-
nas universidades de numeÍosos países mesmo fota da cessitamos das Humanidades precisamente porque elas
Europa. Ao longo do meu trabalho, nos últimos vinre fornecem um tipo de verdade que tem suas or,igens no
anos, como editor e diretor da revista de Estudos Clássi- espíÍito humano.
cos Scho/ìa, tomei conhecimento dos mais de setecentos
O termo'humanidades' é relativamente modetno,
departamentos, em mais de cinquenta países de seis con-
mas âs Humanidades têm suas raízes no Nfundo Clássico,
tinentes, nos quais as Letras Clássicas são ensinadas no
nas artes /iberales das universidades medievais e nos studìa
nível universitâtio, e também de muitos outros países que
hamanìlatìs do Renascimento. Os gregos antigos diziam
contâm com seu ensino no ensino médio e em institui-
que o propósito ptincipal da educação era exerc-itar e
ções religiosas. Portanto, os comentários que se seguem ampliar a mente. Durante os últimos três milênios, esse
são baseados em minhas ptóprias experiências acumuÌa-
conceito de uma educação humanística formou o núcleo
das durante mais de trintae cinco anos de estudo, ensino
da {ìloso{ia educacional em diferentes partes do mundo.
e pescluisa na âte de E,studos Clássicos e de Humanìda-
 ideia gteg en de que a educação devetia fotnecer às
des, período em que vivi em sete desses países.
mefltes jovens uma compreensão básica das reaììzações
humanas nos vários campos intelectuais e criativos, tais
O papel das humanidades na unìversidade como idiomas, literatura, história, artes, mâtemâtica e ci-
ências naturais. Embora a concepçào grega das Humani-
dades não fosse totalmente diferente, em certos aspectos,
As universidades há muito tempo são vistas não só da nossa compreensão hoie, é em um campo de conhe-
como âs defensoras do conhecimento e da investigação cimento como os Estudos CÌássicos, ao qual se l,-inculam
r,árias disciplinas das Humanidades, que tem ..o ..pnço o
70
71
estudo do mundo ocidental antigo, especialmente aquele Os estudiosos dos clássicos del.eriam, portanto,
repïesentado pelas culturas grega e romanâ que abran- abordar o estudo da Anuguidade principalmente a partir
gem um período de aproximadamente miÌ e duzentos
da perspectiva do presente. Uma das melhores maneitas
anos, do tempo do poeta grego Homero at'é a queda do
de se reaLizar isso é torrìar os artefatos do passado cÌispo-
Império Romano do Ocidente.
nír'eis pata a observação e o estudo. Esses artefatos ori-
Hoje em dia, nas universidades do mundo todo, ginais propiciam uma ügação real entre aquele que os vê
há uma pressão para ensinar apenas aquilo que é rele- e aqueles que os frzeram e os usaram hâvârjas cerìtenâs
vante. De fato, eu aÍìrmo que os Estudos Clássicos so- de anos, mas tais objetos em mútos lugares do mundo
mente têm um papel no ensino supetiot do começo do
nem sempre estão disponíveis para o estudante moder-
novo milênio por câusa da sua reler.ância. E afirmar isso
no, â não ser por meio dos livtos ou da internet. Nlinha
é relativamente fâcil, um
yez que os Estudos Clássicos
abordagem par^ o mundo clássico em geral é baseada na
estão, dentro da tradição ocidental, no próprio coração
convicção de que o estudo do mundo antigo é semelhan-
das Humanidades como, provavelmente, o mais antigo
te a um museu, no qual os cdticos literários e os ârque-"
câmpo de estudo multicuÌtural e interdiscipü,nar. Estudan-
ólogos estudam os restos literários e mateÍiais tendo em
do o passado atraués dct presente.
vista não só a reconstrução, mas também o aprendizado
Tenho um interesse particular no papel e no valot
aparnr do passado.
dos Estudos Clássicos em países da petileria acadêmi-
ca, ou seja, fc,tta da Europa e da América do Norte, bem
como nas oportunidades disponíveis para os estudiosos
dos clássicos em tais ambientes e em umâ era de cres- História social e política comparada
cente tecnocncia. Ficarâ claro, a partir dos meus comen-
tários que eu acredito que os Estudos Clássicos devem
buscar se situar no presente pelo estudo do passado. O Provavelmente, é na ârea da História Social e Po-
passado é nossa herança e é inerentemente interessante lítica Comparada que os estudiosos dos c1ássicos têm a
para muitos de nós, como o foi pata os romanos. Uma melhor oportunidade de contextua[zat a sua disciplina,
das características definidoras do empreendimento cultu- pois a pesquisa e os cuïsos nessa área apresentâm umâ
ral romano foi a percepção do seu próprio lugar nos mo, hgação demonstrár'el com os deses'olvimentos sociais e
vimentos culturais da História. Essa percepção é er,-idente políticos contemporârieos em muitas partes do mundo.
nas referências autoconscientes de sua lttera:.rua e cultura As estruturas de classe; os papéis de homens e de mulhe-
matenal das coisas do passado, das obras do passado, dos res, de escravos e de libertos; as famílias e o matrimônio;
estilos e das realizações do passado, especialmente daque- os ritos sociais de passagem; o sexo, a sexualjdade e a ho-
Ìes dos gregos. Como os próprios romanos perceberam, mossexuaüdade; o status de certas ocupações e de cettos
o passado fornece muitas lições r,'aliosâs, mas isso tem grupos sociais; as funções sociais e políticas da rel,igião; a
pouco sentido sem referências ao presente. O presente é democracia, a arJtocïàcia e atlr2jni2'; gtlertà e o império;
uma função do passado e, umâ vez que o presente pas- ^
o eíüo e o "outro"; o tratamento das nações submetidas
sou, ele se torna o passado e estarâ perdido para sempre
nos mundos grego e romano, tudo isso pode ser exami-
a menos que seja ressusc-itado.
nado com referência às cuitutas tradicionais e modetnas.

73
Desse modo, o mundo antigo é paradoxalmente moder- expressar seu descontentamento e sua oposição aos regi-
no na sua articulação desses e de outros assuntos. mes opïessores.
A repressão social das muÌheres e a submissão po- Uma das questões ma,is importantes no exame da
lítica de povos por Roma e por Atenâs se assemelham lìteratura imperial romaflz- é a maneira pela qual os escri-
especialmente à situação sociopolítica em aÌguns países
tores respondiam, em suas obrâs, às mudanças políticas
modernos. Os paralelos entre o destino dos povos subju- sob o gor,'erno dos imperadores. NIeu principal interesse
gados no mundo greco-Íomano e as experiências das ra,
de pesquisa é a ltïeratura da época dos imperadores flâ-
ças poüticamente oprimidas sob o apaftheìd na Afnca dc; viânos, que pode set situada, grosso modo, nas últimas três
Su1, onde eu I'ir,i durante aproximadamente no\-e anos,
décadas do século I d.C. A época flar,'iana foi um período
tornâram mais fácil para mim a compreensão de algumas tanto de sucesso econômico e militat, como de estabilida-
das questões políticas que surgiam na esctita cla literatura
de no mundo romarìo, durante o qual os esctitores foram
impedal Íoma;fia. patrocinados pelas autoridades em um grau iamais visto
N{uito cla üteratura moderna da Africa sulista, das desde a época de Augusto no começo do século. Disso,
Américas, da Eutopa Oriental e da Ásia ttata de questões resultou um rico fotescimento lttetârio que continuou
como liberdade e direitos civis e serve como uma for- a fascinar e impressionar a E:uropa Ocidental ao longo
ma de protesto sociopolítico em sociedades nas quais os da Idade Média e do Renascimento. A Ìiteratura fr.avtzna,
escritores compuserâm sob um clima de repressão. Tal porém, não foì apenas frnanciadapelos círculos imperiais,
literatura também seÍve, em muitos casos, como uma pâ- mas tâmbém controlada por eles. Consequentemerìte,
râbola paÍa os conflitos étnicos e políticos que assolam surgem indagações do grau de comprometimento
^cerc
várias regiões do mundo. Em muitos casos, essas obras, genuíno que os escritores dessa época tinham com o sis-
dentre as quais algumas contêm alusões clássicas, não tema imperial e de quanta discotdância poderia estar sob
somente tocam em sìtuações sociais e políticas que têm a superfície (Bo,v1e e Dominik 2002).
uma conexão direta com suas sociedades, mas também  escrita da üteratura sob o governo dos impera-
apresentam uma importância mais ampla pan a reflexão
dores me intriga, em pârte, porque eu posso rclactonâ-Ia
sobre a propria condição humana. facilmente com a escÍita da literatura modetna sob um re-
Nos cont-inentes acimâ mencionados, alguns crí- gime opressivo e autocrático como o regime do apartheìd
ticos literários habituaram-se â considerar o posiciona- nn Afú.rn do Sul. De fato, para certos críticos literários
merÌto, muitas vezes ambíguo, de escritores que com- vários exemplos de escritores que procurâram expïessar
puserâm suas obras em um clima de repressão política a sua desaprovação e oposição a regimes políticos em um
e cuja produção hterfura estar.a submetida ao escrutínio ambiente repressivo de censura ltterâria, poderiam ser
oÊ.cial. Isso geralmente significa examinar como tais es- comparados com justeza a vmr- parte da literatura escrita
critores emprega\-am r'ários estratagemas retóricos, tais sob os imperadores. Em anos recerÌtes, tais críticos têm
como o uso de códigos, a ambiguidade, a ironia, a alego- dispensado uma crescente atenção à questão de como os
ria, o deslocamerÌto de sentido, a linguagem pror.erbial, escdtores romanos do período imperial responderâm às
metâfota, a circunlocucão e a erpressão cifrada, para mudanças poìíticas. Àlguns desses cdticos, entre os quais
^
eu me incluo, tenraram mostrâr como a jronia e a am-

74
75
biguidade, por exemplo, foram usadas com um notável
apoio aos imperadores, ou se> poï outro lado, podem ser
sucesso por certos poetas e prosadores [)omiruk et a/.
r-istos como, em alguma medida, uma crítica aos mesmos
200e).
e a suas ações, devido ao uso da ambigutdade e da ironia
Um dos modelos teóticos empregados no estudo pelos poetâs.
das poÌíticas do período imperial ler,a em consideração o
Para alguns estudiosos, esses cÍíticos literários que
uso de discursos-dúbios que demonstram como os es-
sllstentam a possibil-idade dos escritores imperiais terem
ctìtores imperiais exprimiam seus sentimentos, sob regi-
usado a ironia, a ambiguidade e outros artifícios estão, nâ
mes opressivos, pela subversão de seus próprios textos e
reaüdade, âpenas fzzendo generaltzações â partir da men-
pela sugestão da desconfiança de que o sentido real era
talidade modetna. Do meu ponto de vista, esta é uma
diferente daquele que estâ\'a üteralmente expresso. Eu
explicação muito fácil. Vasil,v Rudich, um classicista que
mesmo defendi que a ambigurdade poderia ser usada de
mo(ou na Rússia da era pré-Gorbacheq cita como exem-
forma sutil para ffansmitit, âo mesmo tempo, um deter-
plo um artigo que ele escÍeveu da administração
minado sentido parl- o imperador e outro difeÍente parâ ^cerc^
imperial sob o impetador Cláudio e que foi reieitado para
os seus opositores; enquanto o uso da ironia, ao incluir
pubJicação porque insinuava uma crítica ao sistema sovi-
a percepção da dissimulação e do encobrimento da si-
étrco (Rudich 1997). Os paralelos entÍe o lugar dos escri-
tuação real, poderia ser mais complexo, especialmente
tores no império e daqueles situados em uma socìedade
quando o sentido estava sutilmente quâlificado: uma de*
moderna como a Rússia da era pré-Gorbachev der.eriam
claração irônica poderia significar menos ou mais em vez
ajudar os estudiosos modernos da literatura imperial,
de simplesmente signìlicâÍ o oposto do que foi sugerido
dentre os quais Poucos experimentâram pessoalmente
(Dominik 1994, pp. 138-1 S0).
qualquer forma de opressão política, a entendeÍ o dilema
É com.,m, rÌo entanto, que os estudiosos da lite- de um poeta cuiâ hteraturà tinha uma tradição de comen-
ratura impertal tomana pÍocurem dissociar-se das, assim tário político pertinente aos interesses nacionais.
chamadas, interpretações 'modernas' que afirmam a pos-
O que me interessa, particularmente, é como a
sibilidade de os poetas e escritores ïomanos terem usado
proeminência de certas questões políticas e de certas
ferramentas Íetóricâs, tais como a uotia e a sâitta, pata
imagens culturais nallteratura imperial encoraia o leitot a
sugerir críticas contra seus imperadores. Tais estudiosos
refletir da relel-ância dos episódios míticos, histó-
ou negam firmemente que os poetas imperiais teriam uti- ^cerc
ricos e dos eventos ïepresentâdos parz- realidade histó-
lizado algumas das mesmas estÍatégiâs verbais dos escri- ^
rica, social e política do mundo romano. Até mesmo l{arl
tores modernos, para comentaï de forma crítica o prin-
N{aru [1818-1883], o fundador do materialismo dialético,
cipado, ou esforcam*se dutamente parl- evitar o assunto,
foi levado a refletir, em seus escritos sociológicos, sobre a
por medo de ter suâs ideias etiquetadas como presunço_
relevância de Roma p^r^ a sua época. N{arx recebeu uma
sas e fantasiosas. Esse debate demonstra o alto grau de
educação clássica, escre\.eu uma tese de doutorado acercz
polaitzação entre a geração atual de latinistas sobre se,
da filosofia natural dos gregos (1841), foi tradutot dos
por um lado, a produção ltterárja dos escritores roma,
autores latinos O-,'ídio e Tâcito, e se referia aos escrito-
rÌos e os elogios que apârecem em sì.ra superfície der.em
res greco-românos como er.idências para suas opiniões.
ser literalmente interpretados como uma manifestação de
Esses fatos, contudo, não impedirâm que as autoridades

76
77
russas banissem a educação clássica, em 1917, der,-ido a popular, foram levados a comentâr as características mul-
sua alegada n tüÍeza elitista. ticulturais da Roma e da Alexandda do séc. I d'C. Juvenal
Escritores latinos, desde Horácio até Juvenal, cos- menciona ou se tefere de forma flegativa à multicultuta[-
tumavam usâr uma variedade de técnicas retódcas paÍa zaçáo àe Roma, causada pela presença de iudeus, atenien-
comunicar: suas preocupações acerca do sistema político ses, sírios, siconianos, macedônios, ândriânos, samianos,
sob o governo dos imperadores, dutante as épocas de cários, moufos, esÌal'os, trácios, tarsenses e samotrácios;
Augusto, de Nero, dos Flavianos e de Trajano. A patit enquanto Dio Crisóstomo nota que a população de Ale-
disso, fica evidente que muito da literat:ura imperial ro, xandria compunha-se de gregos, italianos, persas, líbios,
mana fala repetidâmente de questões sociais e poJíticas da sírios, etíopes, cítios, indianos, árabes, bactrianos e ci1í-
época. É isso precisamerÌte o que âcontece com os temas cios.2 Como em numeïosos países hoie, essas minorias
mitológicos e com a história de épocas remotas presentes definiam-se a parúr de uma relação com a corrente cul-
na épica impedal. Apesar do fato de esses temas estarem tural dominarìte, sem, no efÌtarìto, ceder completâmente
distantes dos seus próprios escÍitoÍes, a épica imperial a ela. Por exemplo, os gregos, em Roma, expressaram
põe em cena tipos específicos de comportamento políti- uma identidade cultural própúa ao longo do processo de
co que estão ligados âo contexto histórico imediato e que adaptação à cultuta latina dominante.
eram objetos de grande preocupação nos círculos literá-
O multiculturalismo está no próprio núcleo do es-
rios e intelectuais da Roma Imperial. As imagens desse tudo da Antiguidade. Como acontece em muitas partes
comportâmento são usadas pafa mostfaf um tipo de con-
do mundo hoje, Roma e Alexandria não eram meros ca-
flito, a guerra civil, que reflete e cÌá origem a vma forma
dinhos, mas sim mundos culturalmente pluralistas cujos
particular de poder, a rirania, qlre, por sua vez, produz ti-
habitantes eram originários de várias outras sociedades
pos particulares de resposta pessoal, tais como o súcídio
mútas das quais não difedam totalmente das sociedades
e o silêncio. Tais imagens e questões tornâm o campo de
dominantes em que eles se acomodavam. Mas as diferen-
estudo da êpoca imperial particuÌarmente relevante para
ças em Roma eram tão abertantes Parà Juvenal, que ele
os interesses modernos.
desprezou a internacion altzação e o multiculturalismo da
sua cidade. No entanto, foram precisamente essas dife-
ïenças que permitiram que emergisse entre os fomanos
O multiculturalismo uma percepção de sua pecuJìaddade cultural, principal-
merìte com relação à cultura grega por eles herdada' Em
païte, a idenudade cultural dos romanos se desenr.-olveu
Um tópico a respeito do qual eu gosto de falat quando eles se comprometerâm e se famlltartzarz:m com
quando abordo os Estudos Clássicos é o do muÌticultura- a cultura gfega e dela tomaram empréstimos, mesmo
ìismo. Eu sustento que o multiculturalismo e o estudo da quando se sentiam inferiores e se ressentiam dessa cu1-
Ántiguidade clássica são interesses compÌementares, pois turâ estrângeira, mas, sobretudo, quando a aàaptatam e a
o mundo gÍeco-româno abarcava duas das mais multi-
culturais sociedades antigas. Juvenal, um poeta satírico
romaflo, e Dio Crisósromo, um orador gÍego e fiÌósofo Jurrcnal, Saturae 3, esp. \.\-. 61-83; Dio Crisóstomo, Oratìanes
32.40.
-F-
exploreram, esta\am comprometendo,s e, famiüatizando- Âs habiüdades multicultìlrâis são meis essenclals
se tomando empréstimos de aspectos da cultura gregâ, do que nunca no mundo de hoie. Estamos vilcndo em
mas também, adaptando-â e e\plorando-a. Esse fenôme- um mlrndo de fronteiras cadâ \.ez menos claras, no qual é
no pâÍece paradoxal: os ladnos se definiram por meio da fundamental sef capâz cle entender, apreciar e se cumufli
teferência âo "outro" -isto é, âos greslos - meslno qlrân, car com umâ variedâde de outras cuÌturas fotmadas por
do se aproptiavam da sua própria cultura. diferentes raçâs, linguagens e religiões. À cultura clássica
Gosto de ressaltar o fenômeno do multicuÌturalis- é parte da herança cultural geral de toda a humanidade.
mo, porque o ato de cl-ramar atenção paÍa as semelhanças Com seu conjunto de tradições cultutais, religiosas e in
e as diferençâs cntre a cultura cÌe gregos e de romanos telectuais, a Àntiguidade Clássica fornece lições valiosas
em relação às outras é um modo cÌe ajudar a deÍini-las. p^r^ o mundo moderno. Os estudiosos do Nlundo Clás-
i
Embora eu descreva lir.remente essa abordagcm como sico der.em juntar forças com os praticantes das outras
muÌticulturaì, eu prefctirra chamâ-la de interculturaÌ, de- discipLinas humanísticas para rec()nstruir e preser\rar o
r.ido a sua constaflte teferência a ()LÌtras culturas. A mito- passado como parte da herança contínua da humanidade.
logia clássica, por exemplo, satisfaz a nossa necessidade Em um mundo multicultutal, der-emos contribuir para
ptofundamente arrâigâda de conhecer a nós mesmos, de preservâr um passado multicultural. Nfesmo na cornuni-
conhecer as culturas ântigas quc herdamos e as cuÌtutas dade acadêmica, nossa sensibilidade parâ questões multi-
inclígenas e modernas que nos ccrcâm. Após exarninar- culturais derre faciütar, pârâ os intelectuais, o engajamento
mos a naturez^ e o sigmlìcado da mitologia clássica, po- em um drálogo construtivo com os outros membros da
dcmcrs. e'n1ao. pruceder a uma comparaçào cnrÍe o miro
sua comunidade, a apreciação das difercntes perspectir-as,
clássico e os sistemas míticos de outros po\-os em outras
a aceitação dessas diferenças como um fenômeno posi-
cr-rlturas cle praticamente clualquer lugar do mundo. Tal
tivo, a ênfase e o apoio às aspirações clos colegas e dos
comparação de sistemas míticos entre culturas revelâ quc
estudantes e, finalmente, a busca pelo ernpreendimento
e1es, tanto no pensâmento quânto naprâtica,
- incluindo comum da pesquisa, do ensino e do aprendizado.
rituais, cosmogonias, heróis, noções de tempo, relaciona-
mento entïe os munclos temporal e espiritual, origens de
tribos e cÌãs aos quais pertenccm pessoâs bem distantes
flo tempo e no cspaço - refletem não apenas diferenças A intertextualidade
agudas, mas também similaridades impactântes e sugesri-
l?s de uma ancestralidade comum.
 abordagem multicuÌtural é possír'el em r.árias Outra abordagem adequada à pesquisa e ao ensino
outras áreas dos E,studos Clássicos, inclusir.e naquiÌo que na ârea dos Estudos Clássicos e dâs outras discipLinas hu-
se refère à tradição oraÌ e à tradição clássica. O ensino e manísticas, no começo do século r-inte e um, é a ptâttca
a pesquisa nessa área põem em foco, cle fr;rma r-ír.ida, o intertextual. Â intertextuahdade é agon, possivelmente,
senddo e a ubrqutdade do multicr-úturalismo e ilustram a moda crítica dominante na academia. Eu usct o termo
colrÌo LÌma cuÌtura, mesnro quando toma empróstimos e 'intertextualidade' para me referir à condição geral pela
se adapta â aspectos de uma ouffa, cstabelece para si um qual é possír'el que um te\to seie um teÌto, quer dtzet, a
lugar distinto cm um ambiente culrural mais amplo. rede completa de reÌações, convenções e expectati\-as POr

80 8-l
meio da qual o texto é definidci. ConsiderancÌo que qual, mente muitas ocasiões para ressaltar a importância fun-
qLrer texto pode ser construído como um "inteïtexto" damental do tema em ensaios intercliscipJinâres e montâï
constituído pof umâ intefseção de outros texros passados cursos coniuntos com colegas de outíos campos. Os Es-
e futuros, a intertextualidade se refere ao relacionamento tudos Ciássicos estão passando, internacionaÌmente, por
entre todos os tipos dc textos: Literários, materiais ou de mudanças dtamáticas e as abordagens intetdiscipLinares e
quaÌquer outro ripo. contextuais estão no cerne clos esforços atuais de desen-
Em minhas pescluisas acerca da literatura latina, eu voh'imento curricular. Dada a n Errezà interdisciplinar
clo seu campo de estudo, deveria ser natural para os clas-
usei a intertextualidade ao demonstrâr como os poetas
sicistas se oporem à excessiva compartimcntalização do
Íomanos dos períodos repubLicano e imperial estavam
conhecimento. De fato, as discipJinas acadêmicas mudam
preocupados queÍ com o reconhecimento, de uma manei-
e as fronteiras entre elas se deslocam. Der.ido à ptópria
râ autoconsciente e autotteferente, da sua própria condi,
n firrez^ atbitrâria e fluida dessas mesmas disciplinas, os
ção tardia na tradição poética, qlÌer com avalorização da
acadêmicos deveriam estâr dispostos a compârtilhar seu
contribuição de suas obras para essa mesmâ tradição por
conhecimento com os colegas de outras áreas.
meio de suas declarações autocentrâdâs e autobiografis-
tas. Âo invés de negâr o número e a exrensão das inlluên, Os estudiosos dos ciássicos deveriam ser câpazes
cias precursoras sobre os seus poemâs, os poetas Íoma, de confcrir umâ perspectiva largamente interdiscipJinar
nos c()nstantemente reforçam o seu débito com elas, seja não apenas â suas atividades de ensino, mâs também a
diretamente, seja por meio de várias alusões intertextuais suas pesquisas. LJma formação básica em mais de uma
aos seus predecessores. Em r-ez de coustituir um fator disctplina é o idealmente necessário antes c'le envolver-
inibidor par:a o desenvoÌr.'imento de suas narrattvas, esse se com uma pesquisa interdiscipltnar. Para os classicistas,

reconhecimento aberto da dívida poética lìbera os poe- ìsso signi.fica não apenas ter um sóüdo conhecimento das
tes romarÌos para expressar ideias e sugerir sentidos de línguas e literaturas antigâs, mas também uma larga fami-
formas provocativas e reveladoras que são tanto reminis- liaridade com as aproximações teóricas e os métodos de
centes quanto dir.-ergentes daquelas dos seus precuÍsores. outras disciplinas.
Tão ptovocativas e rer.eladoras, que os críticos discordam A pesquisa na ârea dos llstudos CÌássicos, agora,
ecerca de como ler suas obras (Dominik 2003, p. 91) tende a ter uma base interdisciplinat. Dois de meus lil-ros
sobre retórica lattna, poÍ exemplo, utilizam uma grande
r-atiedade de aproximações críticas, exâminando o papel
A i nte rdi sci p Ii n ari dade tla retórica na sociedade romana e a relação entïe â retó-
rica e os principais gêneros litetários de Roma (Dominik
1997; Dominik e HaÌI2007[2010]). Os livros dão ênfase
A abordagem ìnterdiscipünar fornece uma das me- à teoria e prânca da retórica em umã r,ariedacle de con-
lhorcs oporrunidadcs na pesquisa c no ensjno. seja para textos sociais, políticos e üterários. AÌém de demonstrar
os classicistas, seja para os {)utros especiaììstas das Huma- o significado cÍítico da teïottca para cultura romana,
^
nidades. Considerando que os Estudos Clássicos sào um eles revelam o importante papel desempenhado por ela
campo interdiscipJìnar por tradìcão. existem potenciaÌ- na formação dos vários gêneros literários. Um dos pro-

83
B2
i
,

!
1,,
pósitos dessa abordagem é demonstíâr que à retóricala- mas também é muldcultural, iá que mostra à n^túreza
tina ó r-ista de modo mais produtìr'o como parte de um inter-relacional das cultutâs grega e ïomana e explora a
vasto processo cultural, or-r seja, não apenas como um contertos culturais tão
Ligação de palavtas e conceitos em

coniunto de regras apücáveis à linguagem oral e escrita, distantes, mas ão mesmo tempo tão correlatos, como sào
mas sim como um componente fundamental no estudo oantìgoeomoderno.
da sociedade e da iiteratura de Roma. Outro propósito é
esclarecer que a retóïica, como outr{)s campos de ativi-
dade, é construídâ social, política e cognitir'âmeflte em Os ìdiomas c/ássicos
modos clue refletem, expressam e prolongam - pot mcio
de suas regfas, estruturâs, processos e va.lores - a cultura
que a produz. E outro propósito ainda é mostÍâr que o Qual é o papel dos idiomas clássicos no ensincr

rlso romano da retórica - confrrrme ele aparece nas suâs da Anuguidade? No passado, os Estudos Clássicos ten-
formas dir,.ersas - oclÌpâ posição central dentre as maio- deram a alocat muito tempo e recursos no ensino dos
res formas literárias e culturais de Roma. idiomas. Essa ênfase mudou em r.árias pârtes do mundo.
Embora os estudantes hoje estejam menos interessados
nos antigos icliomas antigos do que os estuc{antes de ge-
Etimologìa rações passaclas, eles poclem set mais bem informados na
sua apteciação das duas culturas. É, portanto, necessário
que os estudiosos clo mundcl clássico concentrem seus
Outrâ maneira por meio da qual os Estuclos Clás recursos e esforços na pesquisa e no ensino da cultura
sicos mostram sua relevânciapata o mundo contemporâ- clássica por meio dos idiomas modernos.

neo é a sua contribuiçào para o r.ocabulário e âs estrutu- Apesar dessas novas perspectir''as de ensino, o es-
ras linguísticas de muitos idiomas modernos, inclusive do tuclo do latim e do grego antigos ó indispensár'el pata
pottuguês, cujo vocabulâtio é, aproximacÌamel1te, noven- a discipìina dos Estudos Clássicos e p^r^ a credibihdade
tâ por cento dedvado do latim. De fato, o estudo cÌa eti- acadêmica cle um Departamento de Letras CÌássicas. Sem
mologia cÌemonstta a relevância da cultura gïeco-Íomaflâ o domínio desses idiomas, não é possír'e1 haver pesquisa
e de seus idiomas âté mesmo quando eles são julgados consistente na ârea dos Estudos Clássicos. Dito de modo
âpenas no tocante a sua contribuição pata o pensâmen- simples: o latim e o grego não podem seÍ completâmen-
to e a expressão. Em meu Livro didático intituladc:, Wbrds te separados das culturas que os produziram. Sempre há
and ldea.ç ("Palar.tas e ldeias", Domrnik 2002 [2009]), os uma interação íntima entre a cultura e o idioma. Já que o
estudantes encontram uma seleção cÌe conceitos atuais estudo dos icliomas antigos é, no Íim clas contas, o canal
derivados de ideias antigas e as palar.ras char-es que es- mais importante por meio do qual a herança cultural dos
tão associaclas a eles. Essas são estudadas por grupos de gregos e romarÌos pode ser acessada, o pescluisador sério
categorias, tais como N,{ito, N{edicina, Poìítica e Direito, dos Estudos Clássicos deve ser proficiente em grego e

Comércio e E,conomia, FiÌosoÍra e Psicologia, e História. latim.


W'hrfu and ldea-r não é somente uma obra intetdisciplinar,

85
8!t
Em resumo As universidades nunca der.em perder de vista
aquele que é um dos propósitos do ensino superir,r: a
presen ação de tudo aquilo que, na cir-ìlização, mere çâ ser
FinaÌmente, por que os E,studos Clássicos são im- presetvado. Os classicistas carÍegâm uma respollsabilida-
portantes? Por que o currículo unir.ersitário der..eria in- de particular com â preservação do passado. Os oradotes

cluir cursos que tratâm das ideias e clos ralores do pas, ïomanos Cíceto e Quintiliano Íecorìheceram os âsPcctos
sado, quando a tendência hole é focaLzar aquilo que é humanísticos e civiüzadores das artes Liberais,3 mes, como
imediato e atual? NIeu próprio instinro me diz que, em outÍos retores, acreditavam Llue o seu fim último era a
um mundo de fluxo constante, todos nós temos um educação de homcns para persuadit e liderar âs mâssas
profundo anseio de conhecer nossâs origens e de nos na clireção de um correto modo de ptoceder.a De acordo
conectar com o passado. O homem moderno tem umâ com Aristóteles, um dos ptopósitos mais importantes da
tendência paÍâ enxergar a História como uma sucessão educação é treínat a mente parâ pensar. No começo clo
de eventos, mas eLÌ, pafticularmente, acho mais provei- novo milênio, isso ainda está no cerne de tudo aquilo que
toso veÍ a experiência comum da humanidade a partir cle diz respeito à educação humanística.
uma pefspectiva sincrônica e não diacrônica. Para sermos
veÍdadeirâmente completos, ptccisamos de um contexto,
dc um quadro de referências e de uma compreensão das Referénclas bi b I i ogr áf i cas
icleias duradouras e dos valores humanísticos comparti-
lhados por todas as épocas. O passado ajuda a fornecer
todos esses elementos. O estudo dos clássicos ampüa a BOYLE, A. J. e DON{INÌK, \í: J. (ecìs.) (2002). F/auìan llart :
e

nossâ compreensão acercz- das socieclades que originaram Cultwre, Inage,'I7xí. Leiden: BriÌl.
â rlossa própria sociedade ocidental moderna. DON{INIK, \[1 J.; GARTHV"ÂITE,, ]. e. ROCHE, P. A.
Desenvolr,-imerÌtos em países de todos os cântos (ecls.) (2009). ILritittgPolìtìcs ìn ImpeÈal Rorue. Leiden:

do mundo mostram que os clássicos tên-r um papel sig- Brill.


nificatir.o a desempenhar nâ progressão educacional dos DON{INÌK, \\l J. e HÂLL, J. (eds.) (2007f20i01). '1 Canpa-
estudantes. Os Estudos Clássicos hoje se destrnam a to nian ta Roruan Rlteloic, Oxford: Blackwell.
dos, mas eles der.em ser baseados no mundo real. Toda a DON,IÌNIK, \{l J. (1994). Tbe A,\thic l1ìce of \'tdtius: Potver
concepção da discrplìna se expandiu: os estudantes pre- and Polìtia in tlLe Thebaìd. Leiden: tsriÌl.
Ferem a inr-estigação da herança cultural do mundo anti-
(ed.) (1997). Rotztatt Ehtquence: Rhetoic ìn .Sacieg
go ao estudo dos seus idiomas. Existen oportunidades
an d Lìterature. Lonclres: Routledge.
ímpares disporur.'eis para os classicistas no ensino e na
pesquisa poï câLrsa dos paralelos estreitos entrc as civili-
zações modetnas autóctones e as clássicas, especialmente
no campo da História Social e Política, da tradição oral,
do mito, da religião e do ritual. Cf., por exempÌo, Cícero" Pro Àrchìa, e-<p. 2 3; QuìntLlìano, lzr'
ÍtÍiltìo Oralorìã 2.21.
Cf. ArìstóteÌes, Polìnra 8.

l
(ed.) (2002[20091). Vhrds dz ldem Vàuconda:
Bolchazr'- Ca rd ucci.

in Whose Footsteps? The


(2003). "Follos'ing
Epilogue to Statius' ThebaiÌ', za: BÂSSON, Â. F. e
DONIINIK, \f. J. (eds.) Lìterature, Art, Hìstory: Studies
on Classical Antiquìfl and Tradìtìan. In Honoar tí V. l.
Hendersan. Frankfurt: Peter Lang Pubüshers. JF
&
h-/ 0ì
(2007). lVards d> Ideas: Answer KeT. ìíauconda:
Bolchazv-Card ucci.
Ensino de Latim: abordagens
metodológicas e leitura'
RUDICH, \l (1997). Dìssidence and Lìterature ander Nera: The
Price of RhetoicìVatìon New Haven: Routledge.

Fáhia Fortes
Patrícia Prata

Rosa, P'osa, Rosae na aula de /atinorum do Prof'


Euangelìstorum só as moscas t)llrtr'm' nìngaóm pìorum.
Kosae, Rosa, kosam por qaalqaer coìsorum o ProJ
Jwá Euange/ìsta re/ampeoram, trouelorum. todos A
castìgabas, grìtaua Vìoleta, Vìoktaq Vìo/eíoram.

@obato Dmmm ond, A notu de DJ. en Paris' 197 1)

A memória de uma disciplina extíemamen-


te tediosa e tepetitiva, com ênfâse em estudos gramaticais
descontextu ah.zaàos, ministradas por professores exces si-
\ramente severos, poderia talvez explicat a representaçào
tão negatir'-a da attJa de latim, tal como lemos no exceÍto
do conto em epígrafe. Investigando o papel do professor
de latim no cinema, \'asconcellos (2008, p. 97) também
revela uma representâção anâloga fÍequente nos filmes

Este texto é uma r.ersão modihcada e ampliada da comunì-


cação: "Notas sobre metodos e metodologias do ensino de
latim", apresentada no I Encontro de Estudos Clássicos da
Bahia, no dia 15 de iunho de 2012.
analisados: o professor de latim ora é retratado como um Antes de mais nada, ïessaltamos que, embora atu-
homem emocionaÌmente inadaptado, que esconde sua âlmerÌte se possâ rcconhecer inaclecluações didátrcas de
fragiìrdade por trás cle sua erudicão e de aulas monírtonas certos mamÌais or-r abordagens parà () ensino de Ìatim
nos contextos universitários, muitas cÌas quais conduzem,
e "cinzentas", ora é representado como um disciplìnador
sem dúr.icla, a um quadro semelhante à caricatuta que se
sádico, que tem pr?tzer em tortuÍar seus alunos com "mé-
faz no cinema e no conto em epígrafe, é precisct compre-
todos inquisitoriais de ensino".
ender que ctiitcz â um livro clidático ou a determinada
Se desconsiderarmos o perfi1 psicológco dos perso, ^
metodologia de ensino requeÍ que se pense, de antemão,
rÌâgens tetratados nessas oì:ras, resta, sem dúrada, a metodo, na inserção histórica dessa metodologia, para que nìo se
logia de ensino como a principal câusa que tornaria o apren peÍca nà avaüâção apressâda e na exigência absurda de
clizado de latrm uma experiência "traumátic " fia memória que tais ou tais métodos devessem oferecer aquilo que
dos alunos. Ainda que os lir.ros drdáncos de lattm - ou cle lhes era extemporâneo, ou tivessem Preocupações teó-
qualquer outra língua - não possam ser tomados como os ricâs que estâ\am absolutamente ausentes de sua êpoca.
"viÌões da história" para o ensino (Nier,'es 2A02,p.233), nosso
objetivo neste artigo é examinar as metodologias que estão
na base dos pnncrpais lil-ros drdáticos utiiizados no ensino Abordagens metodologicas do latìm
de latrm no Brasil da segunda metade do século XX aos dias
atuais. Propomos, â princípio, a existência de quatro aborda-
A partir da clbserl'ação da proposta apresentada
gens metodolóEcas atualmente d,rsponír.ers para o ensino cla
poï métodos e compênclios gtamaticais do latìm, sobre-
língua latina, a parnr das quais oferecemos uma análise dos
tudo em seus prefácios, r-erificamos que sua utilização em
manuais clue tomamos como cotpus.2
sala de aula pode responcler â quatro diferentes abotda-
Não é nossa intençào fizcr ume resenha crítica e gens metodológicas3 cle ensino. Queremos propor que a
exaustir,z de todos os métodos, apenas temos em mente utitzaçào de difetentes ür-ros e métodos, bem como a
eleger alguns que ïepresentem dìlerentes metodoÌogias em- adoção de diferentes práticas pedagógicas no ensino do
pregadas no ensino contemporâneo do latim, como un-Ìa ìatim, nos permitem Íeconhecer os aspectos gerais de
amostrâ possír,el pâÍa ilustfar as diferentes abordagens me- quetro grandes abordagens metoclológicas :' a tradicional,
todológicas. Em seguida, discut.imos mais particularmente â a estrutural, â textual e a comunicatir.a. Apresentamos, no
abordagem textual, que, como acreditamos, permite urn en- quadro a seguir, as principais carâcterísticas de tais abor-
sino mais efetir,-o da língua e, sobretudo, da iiteratura latinas. dagens, sobre as quais comentamos cm seguida:

Para uma tipologia mais dehnitir-a, seria necessátìa a investr-

2. Irm nossa análise, 12 métodos di-sponír'vrs em ìíngua portr-r gação de um númeto maior de materiais didáticos, em uma
anál.ise mais exatLstira. O clue apresentamos aqui é, até certo
guesâ e 5 em Língua estrangeira. Ilntre os compêndios gra
maticars, examinamos 7 em língua portulluesa e 4 em língua ponto, Lrm esboço passír'el de apcrleiçoamento futuro, com
nor.as investigações.
estrangeirâ. Como nosso objetivo é examjnar o ensino de la
tim no Brasìl, eniadzamos os manuais cìisponíveis em língua Esta caracterização se aproprìa do conceito de abordagcm
metodoìógìca empregado, âtrìalmcntr:, para descrição das ptá-
portuguesa ou aqueles estrangeiros de eletìr-o uso no Btasil.
:\Lista desses compênrlios gran'raticais e métodos pode ser
ticas de ensino de línguas moclernas, embora não ptetenda-
encontrada no item Campéndta: grãfi:ãlttãlç e ntíÍodos de /aÍìn: mos, nem seria possível, transpoí tcidas as carâcterísdcas do
ensino cle uma língua rnoderna para o Ìatim.
a l;aizÌagtn-, meiadoló,gias e nas Rdirlncit.ç hi hlnXráfca:.

91
90

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Na não se utiliza um métodcr
abotdagen tradìcialtal
L\ o
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-o específico.5 Em vez disso, diferentes recursos são mobi-
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q- ; lìzados: r,rm clicionário latim-pottuguês, LÌmâ grâmádca,
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G o textos, coletâneas de frases etc. A câracterística mâis im-
NOL
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'ü poïtânte dessa abordagem é a apresentâção gramartcal a
d c
a -o- :9 piori. Antes da leitura, se apresentam caÍâcterísticas gra-
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,c _ o maticais da língua latìna, na oÍdem tradicional (os casos,
c aU ,õ9
c
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@JUQ c uo(! as decLinaçrìes, os tempos verbais etc.), com exercícios
uo o;
de fixação gramâticâis e cle ttadução como complemen-
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:::::::.1:r :ì:
E ^= to. Tal metodologia, também chamada de "gramática-
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..ì,........ tradução", tem progÍessão relativamente rápida: em um
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_:-
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.:=O semestre ou dois é possível âpresentaÍ os principais fatos
.díÈrd
ffiffi 95u
*-o,ã@i X Ã
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gramâticais da ìíngua, com ênfâse na sr-lâ morfologia, mas
:::::=:l ", .6
aX.-'õo U não pressupondo a concomitânte aquisição de outtos re-
(u
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d) a, N 6
o o-C)oíl.Y ';> 'o
xO õ^tX:U cursos c de características textuais (de gênero, de fluxcl
rE9Èã:Y o
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C 'dãoc.aV C
Y.a.z
À' d, Õ- informacional, de referência intratextual etc.). O aluno,
o Juõ(J6u
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U
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frequentemente, tem díficuldade de leituta de textos ori
L aaaaa ô.OO
ginais mais exteÍrsos.
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I .' A1ém disso, não se desenr.oh-e um repertório lexi-
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xõoe1, dr € =C cal (secluet das palavras funcionais), o que leva o aluno a
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demorar-se em traduções âté de sentenças mais simples,
f, dr a
- ! 4 ú-i 6lroõ oã
f H H- : U* do.=
ú.:-=,õ Ã o- - bl) r,-isto que a recorrência ao dicionárìo precisa se dar em
0) .!õ o
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OG^ UO cada palavta. Outra carâcterístjcâ frequente, motirtada, é
c -L.õOU.=:õ
A--XLU!
(oiÊu
oCÈUUUF .9oõ verdâde, pela maneita com que se pensou a "didática"
o UFC O)Y
I aaa ^=v
JU clos manuais de gramática, é a compatação reaüzada entre
lllt ,.1- J_ .4 õ o português e o latim, o que, de resto, tende a equipa-
llì::ll o.o õ
C
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o oP ú E
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r[$ili -c F .,r
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'õõ g Tomamos "método" no sentido de manual didático pârâ uso
CP
ê)
Y6 9g em sala, em oposÌçào aos Ìivros de consttlta sobre gramática,
:::€: U
owft
m: -X: .;
l:O que chamamos "compêndios gramaticais", como \ÌeÍemos
.G 64
adiante. Potém, se considerarmos "método" c1e tbtrna ampla
:::.F: E
g ú-. .(UO/ì
+D Õ,)
Yi'.r.-_
(como todo tipo dc ptocedimento didático utüzado em de
G
c
J
5;,:C.!
d, -
=
-^
.Üõ 9.ry termìnacÌa abordagem), diremos que a abordagem tradiciona.l
:,e: 9 aü seutiliza, frequentemente, de compêndicis gramaticais. clicio
.-i-a
u i9 a-
)4) nários e seletas cle textos como seus métodos.

93
92
râr âmbas as línguas. Frequentemente, estruturas que são simples frases a serem completadas ef ou traduzrdas, mas
sequências repetidas de padrões estruturais, a serem trei-
idiossincráticas em latim, tais como a noção de caso, são
explicados com referência a estrututas <io português, de nados longamente com vistas a certa automatszacào na

forma irrefletida (o caso datir-o é o objeto indireto, pot produção e compÍeensão das estïuturas.

exemplo), sem considerar que, na maiotta das vezes, tais A abordagem íextua/ tem como característica mais
afirmatilzs são simplificações meramente didáticas e não importante proeminência conferida âo texto. Dessa for-
a

fazem jus nem à estrutura gramatical da ìíngua portugue- ma, em geral, se desenr,-oh'em com a apresentação a prìon
sâ, menos ainda à da laúna. de determinado texto - em geral adaptados, com base
em textos autênticos, mas também, em alguns métodos,
textos forjados - â partir do qual se segue o estudo do
t\ abordagem estratara/, porém, reflete o latim e seu
vocabulário e da gramática. Os métodos mais recentes
ensino a partir de uma teoria relativâmeíìte conhecida: o
que se baseiam nessa perspectiva, como o Readìngl-atin,6
Estruturalismo Linguístico. Em geral, ela deriva do ar-
mantêm um esforço consciente de apresentar os tópicos
razoado teórico presente em alguns métodos, tal como
gtamaticais e iexicais segundo uma progressão gradual,
o Latin - a strwctural approach (Sweet 1957) ou o Latìm e
bem como de não desvincular língua e cultura clássica,
saar estn/tarãr (Tannus et a/., 1.988). Essa abordagem tem
levando, paulatinamente, o aprendiz à proficiência da 1ei-
como metâ lertar o aluno à aquisição das oposições sin-
tura em latim, com o auxfio eventual de um dicionário.
tagmáticas e paradigmáticas elementares da língua laitna,
Outros, mais antigos, como os métodos da série Cradus,
através de exercícios de leitura de sentenças e de pergun-
de Paulo Rónai, a despeito de apresentaïem essa peÍspec-
tas e respostas recorÍentes sobre determinada estrutura
tiva, antepondo o texto à gramâúca, têm a clesvantagem
da frase, de modo a assimilar determinadas oposições
de apresentafem textos muito artificiais, pouco relacio-
estrutuÍais, tais como a noçào de caso, de tempo, aspecto
nados à cultura româna. Em um câso ou em outfo, um
etc. Em geral, o latim se coloca como uma Língua estrân-
prejuzo frequentemente associado a essa abordagem é a
geira tal como as demais, possír'el de ser adquirida pelo
progressão telatirramente lenta, do que decorre a necessi-
estudante, com metâ não à leitura somente, mas tam-
dade de a instituição poder contar com vários semestres
bém à produção escrita e oral, tendo como base os
^té sequenciais de língua lanna,paraque o método possa ser
modelos lapidares da Língua - as sentenças e pror'érbios
empregado em sua totalidade.
extraídos de autores latinos.
Como se baseia em oposições elementates, sobre-
tudo sintagmáticas, em geral, os métodos que se âpÍesen-
6. Vale infotmar que acabou de rü à luz a ttadução do método
tam segundo essa perspeciva fazem pouca (se alguma) ReadìngLatìn (Cambridge): Jones, P \i e Sìdr.vell, K. C. (2012).
referência a aspectos histódcos, culturais ou contextuais Aprmdenda lalìm. Ttadução e supenrisão técnica Isabella Tat-

da língua, âparentemente desvincuÌando a aquisição do din Cardoso, Paulo Sétgio de \iasconcellos e equipe. São Pau-
1o: Od,vsseus. Esse método, dutante anos uti.[zado em Língua
sistema à sua inserção cultural. A natureza dos exercícios inglesa, foi Íecentemeflte ttaduzido e adaptado para o leitor
é também bastante particular: não ma's se apresentam que tem como língua maternâ o português.

95
94
Finalmente, a ahordagetx catuunicatiua é aquela que em aulas de um curso que se baseia numa abordagem pre-
tem, nos últimos anos, se aproveitado de pdncípios da dominantemente "estrutural", e as sim sr-rcessivamente).
abordagem comunicativa para o cnsino de Línguas estran-
Veremos, agora, como os manuais didáricos que
geiras moderflâs, em prol do ensino de latim. De forma
examinamos confinam, diferentemente, aspectos dcssas
geral, tal perspectiva pensâ o latim como uma lingua rriva
quatro aborclagens.
e tem por meta Ìer.at o aprendiz à aquistção nào somen-
te da leitura, mas também à produção oral/escrita nes-
sa língua. Embora os métodos que são pensados nessa
Compêndios gramaticaìs e métodos de latim:
perspectir..a sejam bastante variados (podemos citar como abo r d age n s m etodo I ogi c as
exemplo o Conuersatìonal l-afrn for oral profcìency, de Trau
pmân, 1^ edição 1996), todos eles têm como premissa a

crença de que o apror.eitamento cle ptáticas ativas - seja Os professores de latim podem âtuâlmente con-
de fala ou escrita do latim - pode auxjlar a tornar o en- tar com um númeto relativamente pequeno de manuais
sino da ìíngua mais atre.ente, motir,'ador, portanto, coÌa- de ensino disponíveis, sobretudo em edições atualtza-
borar na eÊ.câcia da aquisição de todas as habiüdades da das, se comparado com o volume de obtas relativas ao
língua. Essa aborcÌagem, em geral, lança mão de cons- ensino de línguas modernas. Excetuando-se os manu-
truções hipotéticas da fala latina, baseada em modeÌos ais de latim produzidos em outros países, alguns den-
culturais ïomanos, mas também, com alguma frequência, tre os quais são atualmente utilizados em universidades
desapegadas dos aspectos históricos d,r latim clássico, brasileiras, e ainda cârentes de tradução, a maioria dos
pÍomovendo, em certos casos, umâ "atualtzação" lexical métodos brasileiros foram produzidos de acordo com
da Língua, com vistas à expressão cle conteúdos do mun- merodolugias tradicionais, quc remontam à epoca em
do contemporâneo, eviclentemente auselltes em relação à que o latim era ensinado na escola funclamentai. Âlém
cultura antiga. disso, há gtamáticas de latim que, PoÍ ter caráter mais
Dessa maneira, delineamos um "esboço" para uma ou menos escolar (algumas se apresentâm como méto-
sistematização das abordagens metodoÌógicas de ensino dos, tal qual a de Napoleão N'fendes de Àlmeida, que foi
do latim atualmente disponír.eis e ptaticadas no BrasiÌ. publicada na década de 40, e iá tem 30 edições, sendo a
Queremos ressaltar que a prática individ'"ral do ensino do úlama de 2011), são também utilizadas como livros di-
latim, no mais das r.ezes, 1ança mão de aspectos variados dáticos. Considerando também as gramáticas, podemos
de d-iferentes metodologias (un-r exercício gramatical mais agrupâr os livros djdátrcos de ensino da Língrra latìna em
"tradicionaÌ" pode ser parte de algumas aulas de um cur- português (ou ttaduzidos) em dois tipos, que sistemat.i
so que se baseia numa abordagem pre,Jominantemente z^mos na tabela:
"textuâl", por exemplo, bem como determinados exercí-
cios "comunicatir.o s" podem ser utilizâdo s et'entualmente

S{t 97

ii
q

Descrição:
CraÌnáticas do latìn-r, utilizadas no aprendizado da ìíngua, com exercicios oll llos de cuTso que trazem, além da descrição gramatical (mals focada no estu-
não. Em geraì, oferecem uma descrição morfossintática resumìda da lÍngua lati' , ,, rrorfológico), também Írases, exercicios ou textos (normalmente adaptados)
na, baseada, por sua vezl nos tratàdos europeus de gramática latina do fìnaì do ,l ('seTVem para a aplicação e fixação da gramática estudada. Foram produzi-
século XIX e inícÌo do século XX. ,1 )\ para serem utilìzados como manuais de ensino da Ìíngua em saìa de aula.

Exem plos *:
c Compèndio de gramátìca /atina - Almendra e Figueiredo (1996); Aprenclendo latlm - Jones e Sìdwell (2012)'"
. Cramátìca Latìna - António Freire (1956, primeÌra edição; a última, a 6d
Latin via Ovid - Coldman e Nyenhuis (1982)
edição, é de 1998); Ars Latina - Comes de Castro (1970, primeira edição; a 34" edição é de
. Cramática Latìna Cart et a/. (1955, ano da primeira edição 2002);
primeìra e única edição da tradução portuguesa data de '1 986); Cradus Pilmus, de Paulo Rónaì ('1 954, primeira edição, a 23" edição é de
t Cramática Latina - Júìio Comba (1958, ano da primeira edição; a última, 2003);
5" edição, é de 2004); tntrodução à teoria e prátìca doiatim - Melasso (2008);
. Cnmática l.atìna - Napoleão Mendes cle Almeìda (1942, primeira edição; Latin do ginásìo - Nóbrega (1 956);
esta obra teve muitas ediçÕes, a 30a e, por enquanto, a última edição é de Latim e suas estruturas - Tannus et a/., (1 9BB);

2O1 1); Latim para o Cìnásío, de Cretella-Júnìor (.1 960);


. Cramátíca superior da línguaiatina - Ernesto Faria (1958, primeira ediçã<r Língua e Literatura Latìna e sua derlvação portuguesa - Furlan (2006);
- já esgotada); Latìn para os a/unos, de Pastorino (1 961 );
. Sintaxe /atina Ciuseppe Lipparini (1961 - única edição da tradução por. latina essentia - Rezende (1 993, com a 4' edição revista e ampliada em 2009);
tuguesa da sintaxe latina); Latìnìdade, de J. L. de Almeida (1 951);
. Slntaxe do período subordinado latino - Paulo Sérgio de Vasconcellos Masa Primus, de Alencar (1958);
(2013).
O Latìm nos Cinásios, de Almeìda (1960).

* Visto que pouc2Ìs obtas ìndicar.ani, nas edições consultacìas, as datas tl O Àprendendo Latìn, cottirtrme Observemos ântes, tÍàt2Ì se da tradução
primeúas edições, relerências clue intbrmamos no patágtalo são aprtt,
as
e adaptação pata estudantes brasileiros dct ReadìngI'atin (1986), que, du-
meçòes, a partir de pesqr:isa que fizemos nas bib[otecas ao nosso alcan rante muitos anos, Foi utiÌizado em íngga inglesa no Btasil'
e da citação c1e tais obras em outÍos trabaÌhos. Uma precisão cronológt
erigiria un'ra pesquisa mais mjnuciosa clue nào compete a este estuclo.

Os compêndios gramaticais, ptocluzidos, em sua tâxe a uma parte merlor) atrelada ao estudo dos casos,
maioÍiâ, até meados do sóculo XX, são ainda adotados d; concordância e da regênciâ. Nenhuma das gramáticas
com{r material ccimplementar ao ensino de latim, pârale- consideraclas chega ao texto como unidade, enceÍrafldo'
lamente ou não à adoçào de um método específico. Sua em geral, sua discussão rÌa fÍâse e sua estilística, com ní)-
característicâ geral é obsen ar mais ampla e e specialmen- ções de métrica e apresentâção clas figuras e r'ícicls de ljn-
te a morfolol',, do latim (com excecão da J'ìntaxe I.atina guagem, noïmâlmente ao finâI, como um apêndice. Em
de Iipparini e, recentelnente, com a Sirttaxe do Peúada Su- geraÌ, os exemPlos oferecidos, extraídos dos autores ca-
hordìnado da Latítz, de \rasconcelÌos, que visam, antes, à nônicos, são descontextualizados e resumidos.
abordagem específica da sintaxe do latirn). com ênfase Existem ainda outros mânuâis de gramática es-
nas classes e pâÍadigmas morfológicos, reduzindo a sin- trangeiros c1e refcrência, ainda não traduzid()s, que sãc)
eventualmente utilizados no ensino de latim no BrasiÌ
98 99
em cursos mais a\-ânçados da língua, ou mesmo par,;- a cufsos glnâs1als, e apresentam cafàctef1.stlc s mals ou me-
formação do professor, tais como a o Traìtá de grammaire nos difusas das abordagens textual, estrutural e coruanicatìaa.
mtnparíe des langues rlassiqaes, de N{eiÌlet e Vendryes (1968),
Os métodos produzidos nas décadas de 50 e 60
Slataxe Latìne de Ernout e Thomas (1"972), Prapedeutìca
são muito parecidos entÍe si na forma como âpresentam
al latìno anìuersitarìa de Traina e Perini (1971, r'ol. I;1972,
a ltngua lattna. Cada capítlrlo, dedicado a um ponto gÍa-
vol. I!, Intraducdón a /a Sìntaxis Estrutwral del Latín (1966), matical diferente, costumâ contâr com um pequeno texto
de Lisardo Rubio, bem como tratados de gramática lati- aritfrcial, nas primeirâs lições, e, nas liçòes mais arznca-
na internacionais mais recentes não tão conhecidos no das, textos adaptados, às r.ezes algum excerto de texto
Brasil, como La sintassi del Latina (2006), de Gian Biagio original de diferentes autores de prosa latina. A própria
Conte et a/. disposição do conteúdo é muito semelhante: uma figura
Todos os compêndios de gtamática, mesmo aque- no alto da pâgSna", um texto em latim (arúfr.ciaI, adaptado
les em que se percebem eventuais problemas de concep- ou original) a ser tradazido, um pequeno vocabulário, a
ção relativos ao ensino de latim, continuam, entÍetanto, explicação gramaitcal e, no final do capítulo, alguns exer-
a set excelentes materiais de apoio didático, cm muitos cícios pata a frxação do conteúdo. A util-ização de textos
casos, mesmo, imprescindíveis para o estudo do latim e, faz com que esses métodos âpÍesentem elementos de
principalmente, p^ta aleitura dos textos originais. Porém, uma abordagem textwa/, porém, esses textos são comumen-
nenhum desses compêndios representa, de fato, métodos, te forjados e ainda sem referências consistentes à cultura
ou seja, manuais didáticos parâ uso do professor em sala anúga, caracterísúce.s que os diferenciam dos métodos
de aula. Em muitos casos, a uirlização desses compêndios
modernos que se valem da abordagem textuâl (como
gramaticais em contextos de ensino acompanha o estudo
Aprendendo Latìm e lrtÍin uia OuìQ, sobre a qual discutire-
mos em detalhes no próximo item.
de excertos de textos latinos originais, de forma que, nes-
sas situações, nenhum método específico é adotado, e tais Esse é o modelo apresentâdo, por exemplo, pelo
compêndios são utilizados, portânto, como insttumentos Gradus Primus, de Paulo Rónai (1954[2003]), que ainda é

a b o rdage m tra di cì o n a / (" gramâtica-tradução'


pubücado e frequentemente utiïzâdo no ensino superior,
p
^t ^^
).
apesar de ter sido produzido p^ra o ensino fundamental.
Desse modo, a abordagem tradicional (isto é, o en-
Âlém do método de Paulo Rónai, também Ltnaidade, de
sino r-ia gramâttca e textos originais) tem, por um lado, a
virtude de apresentar aos alunos os textos latinos (e sua J. L. de AÌmeida (1951), I-arin para c,s alanos, de Pastorino
(1961), Masa Prìruus, de AÌencar (1958), I-atin para o Ci-
cultura) logo de início, por outro lado, corre-se o risco de
ntísio, de Cretella-Júnior (19ó0), e O Latìn nos Gìnásios, de
tofnâr o ensino excessil.amente gramatical, ou então, em
Almeida (1960), lazem pafte de uma tradição de métodos
instituições onde existem várias turmas de níveis iniciais,
latinos que pouco fotalterada com o pâssâr dos anos e que
de não permitit uma uniÍbrmidade metodoÌógica que fa-
tinha como público-alvo os estudantes da escola básica.
ciüte uma progressão no aptendizado.
A maioria dos métodos brasiÌeiros p^rà o ensino
A crítica que se pode fazer a tais métodos é a refe-
rência escassâ a tópicos culturais ef ouhterârtos Íomanos,
de língua latina foi produzida por r-olta da década de 50
e 60, época em que o ensino de latjm era obrigatórlo nos
ou, quando o fazem, é, muitas das l'ezes, sobre textos
atificiais * em sua maioria, textos sequer adaptados de
odginais da cultura latina -, que são utilizados unicamen-

101
te como ponto de pârtida parâ as explicações gramati- oral está expressâ em seu prefácio, em que a concepçào
câis, sem serem discutidos ou interpretados. Alguns deles dofa/ar Ìatìm assim se apresenta:
âpreseÍÌtam â mesma concepção, já discutida, de latim
como "supraÌíngua", tal como \,-emos na obra de Pasto- Tornarâ amot e interesse pelo ìüoma latino, porque
rino (op. dt), que chega a comparâr o ensino da língua a indução é atir''a, não meÍamente receptiva. Guiado
latina com o ensino de matemática, ao defender que os sempre pelo mestÍe, penetrará, aos poucos. no que
textos não devem conteÍ nenhum conteúdo gramaacal
ditíamos, alma do Linguajat Ìatino, e faÌatá a 1íngua de
que ainda não tenha sido ensinado aos alunos, devendo
Cíceto com sentimento e compteensão. (Gomes de
ser, segundo o próptio autor, cuidadosamente escolhidos
Castto et. a/. 1970p0021, p.9';
e adaptados, ou mesmo redigidos artificialmente em la-
tim, para não se coÍrer o risco de colocar diante do aluno É importante ressaltar que tais manuais foram
uma estrututa gratrrraacal que ele desconheça.
produzidos pâÍa um contexto escolar diverso do atual. Se
Vale ressaltar que os exercícios presentes na maior empregados em contextos universitários, onde o latim,
patte desses métodos são de fixação dos tópicos gt^m - em geral, é disciplina que visa à fotmação cultutai clássica
ticais tratados no capítulo'. enfaazam-se exercícios de fi- e aquisição da habilidade de leitura de textos antigos e
xação gtamatical por meio da repetição, bem como da medievais, a matoria dos métodos brasileiros das décadas
tradução de frases em latim e da r.'ersão cle outras por- de 50, 60 e 70 seria inadequada. Contudo, é impottante
tuguesas p^r^ o latim, esquema que reproduz o tipo de ressaltar que tais inadequações decorrem exatamente dis-
exercício comum nas abordagens trâdicional e estrutural. so: até meados do século XX, o latim ainda tinha presença
Alguns dos métodos analisados âpÍesentam uma em outros contextos sociais, tais como o eclesiástico, de
preocupação com a oraüdade latina. Não podemos, de forma que â concepção de "7attm falado" não se apresen-
fato, üzer que se ttaÍ-:- de livros que tenham uma concep- tava tão estranhâ como poderiâ soar em nossos dias, do
ção consciente da abordagem comunicaíìua,7 mas, ao se pre- mesmo modo que os textos apaÍentemente infantis dos
ocupârem com a aquisição da oralidade, se aproximam métodos desse período eïam perfeitamente adequados ao
dessa abordagem. Um exemplo pafiicwlar da túJtzação púbüco infantil e adolescente da década de 50 e 60.8

de práticas de produção oralpara o ensino ê o Arc I 'tttìna,


de Gomes de Castro et a/., de 7970120021, que apÍesentâ
exercícios que simulam práticas otais a partir de um pe- De fato, podemos especular que, se compâÍados com méto-
queno texto adaptado. A preocupação com a ptodução dos análogos de ensino de língua poÍtuguesa ou estrangeita
do período, r'oltados pârâ o mesmo público, as "inadequa-
ções" clos métodos de latim sob erame também estariam
píesentes nos mótodos utilìzados peÍa âs ôutías línguas. A
Não temos métodos modernos ptoduzidos no Brasll que difetença principal reside no fato de que, enquânto rârâmente
tenham a concepÇão clara da abordagem comunicativa para um professor unir,ersitádo de pottuguês ou Língua estrangeira'
o ensino do latim, contemplada, por outro lado, em méto- moderna Ìançana mão, em nossos dias, de um manual pto-
clos estrangeìros tais quais cis de Traupman (1996) e Orberg duzido para o ensino ginasial na década de 50 e 60, no caso
(1991 [200ó]). Pata ,-rma reflexão mais aprofundada dessa do latim, essa situação, por absurda que pâreçal peÍmanece'
abordagem, remetemos ao texto de Lem Ribeito Leite, cons- em decorrèncìa da ausência de métodos e abordagens mals
tânte deste [\'ío. contemporâneas.

102 103
l-
Da década de 70 à década de 90, obsetva-se uma da história da literatura ladna ('estilos, gêneros, au-
^cerc^
lacuna na produção de nor.os manuais didáucos p^r^ o tores, obtas e textos representativos", p. 199) e de sua pro-
ensino de latim no Brasil. A pattit da década de noven- dução dita lingústica ("conceitos, princípios, teorias, em
ta, percebemos no\ras publicações rÌessa áÍea, como os especial a àa gramâttca", ìbìd.), umâ vez que seu obleur.-o
métodos Latìna Essentìa, de Rezende (199312009]), Ltn- é apresentar a graduandos (e também pós-gtaduandos,
gt'ta e LìteraÍara Lalìna e sua derìaação ?artagaera, de Fudan
como nos diz o autor) de letras/português aspectos rztia-
(200ó), e a Introduçào à teoria e priítìca do latìm, de Nfelasso
dos sobre altngua e a [teratura latinas, que complemente
(1993[2008]). Embora em uma roupagem mais modetna,
sua formação. Como tem pouco Íepertório textual original
l.olrados p^r^ o público universitário e já desprovidos dos
e se apÍesenta como um método que introduza o aluno à
"mitos" em torno do latim, tais ttabalhos, no entânto,
gramâaca e üteratura latinas, podemos dizer que o método
pouco a\rançam em termos de metodologia. Em geral,
também contempla a abardagern tradicional de ensino, embo-
tais ürrtos recoÍrem mais à abordagem lradicìanal no trata.
ra nos pareçâ, antes uma introducão acercE- de fatos sobre
mento conferido âos âspectos do ensino.
o latim do que de um método, propriamente dito, que leve
Embora apÍesente a leitura dos textos como o
o estudante à aqursição da língua.
objetir.o final do ensino, o l-atìna Essentia, por exemplo,
O único método em língua portuguesa que âpre-
apresenta os fatos introdutórios ao latim p^rtir de uma
^ senta claramerÌte umâ abordagem, a abordagem estratara/, ê
abordagem que parte dos conhecimentos gramaticais
para os pequenos textos adaptados, com exercícios de o L.atim de Tannus et al. (1988). Sua ideia
e saas estrwtura.r,

frases. Porém, embora continue a tral>alhar com senterì- era tÍanspor p^ta a língua portuguesâ o método estrutu-
ralista norte-âmericano I ntin - a stractaral approach (Sweet
ças isoladas, o autor introduz pequenos textos, adaptados
de fábulas e de obras clássicas, bem como âpresenta, ao 1957). Embora o método brasileiro, diferentemente do
final, trechos sem adaptação cle São Jerônimo (a Vulgata método proposto por Sweet, não ofereça um arcazoado
da Bíblia), de Catulo e Fedro, lançando mão, por essa ra- teórico acetca dos princípios da Linguística Estrutural
zão, de elementos da abordagem textual. Assim, rel'ela-se, que estão na base dessa concepção, pode-se constatá-la
claramente, a concepção de que o estr,rdo clo latim ler,zrá atÍâvés das caractetísticas particulares confericlas ao tra-
o aluno à sua principal finalidade, a leitura dos antigos, e tâmento do material de ensino. Âssim como no Srveet, os
não à produção escrita ou oral, menos ainda a um supos- autores partem da sentença latina, que é extraída de tex-
to benefício cognitir,-o produzido pelo seu aptendizado, tos originais, para estabeiecer padtões morfossintáticos,
concepções, de resto, tão comuns naqueles manuais das que, pela repetição, são assimilados pelos alunos.
décadas 50 e 60.
No caso do método de Su'eet (1957), o autor cla-
O método lingua e Lìteratara l-atina e swa deriuação ÍamerÌte situa o seu método como uma inol'ação à me-
partagaua (2006), tem como característica particular a abor- todologia tradicional de sua época, contextualizando a
dagem de aspectos comparados entre o latim clássico e o explicação gtamatical às então ïecentes descobertas da
português, incluindo tópicos de fiÌologia românica ao estlÌ- ünguística estrutlrÍal. O interessante é que, tal como no
do do latim. Outro aspecto é a inclusão de um capítulo, o Aprendenda Latim e no Latin uìa OLid, o foco é a aquisição
terceiro, denominaclo LìÍe ratura e e studos lìnguistico- liteníi o s, da capacidade de Ìeitura, e não memotiz^ção de regras
^
104 105
gramâticais que possâm peÍmitir a trâduÇão às vezes me- Fl.
N
cãtica dos textos. Por outro, como o autoí trâbalhâ com o
5L!
e não textos -, Pârece-nos difícil con- rl
frases isoladâs - o
N oa
ceber que o objetivo apresentado - a leitura de textos - Õ-.)
-o
-E
c.L

possâ, de fato, ser alcançado.


õ !a
ho: o
ì e o ácl
Em síntese, podemos dizer que, do corpus de mé- - i^

todos de latim em Língua portuguesa analisados, uma 'È:È-c -o


U:
grande pâÍte contempla as abordagens ttadicional e tex* -srõE
õoo-o
.=, aË
'! c U?
tual, embora, rleste último caso, ainda apresentem textos ãn
.:q.Y\L
: ô l: qO
1

claramente artlficiais em suâ maioria, bem como pouca ì ôìi

ancoÍâgem em elementos cultutais antigos. Alguns méto- R l


O eú c .d
dos, ao se preoclrparem com a fala, se otientam P^ra \:tm N
:YI
=0, I i-u
abordagem comunicativa, embora não apresentem uma 1
nÉ I
q l

coerência global com os princípios da dessa abordagem N o^ Ç-'or


çFã cõ ^
e não deixem de apresentar fortes elementos ttadicionais'
-óf
Apenas um método em língua portuguesâ parece seguir a
l
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Eã1ì^:
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abordagem estrututal, não apresentando, contudo, expli* =
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cações teóricas que fundamentem tal abordagem, como Ë4ìor --:.-ï9cP'FR*õr.õ
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em seu equivalente em língua inglesa. :!o S ç *ìoz3_r*ÈÈrà:òI


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aiõH': ^r;==::=.:õ=4Ê!
Os métodos que têm características da aborda- -q:\dtU.q<-NZIg>S
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gem textuâl não deixam de apresentar, também, fortes
çq ì

características da abordagem tradicional, com ênfase !;'14


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G ô^":
perticulâr no ensino da gramâttca e ftaca telação com õ :€ ú,õ d

a cultura arrtlg e, p^rtic1rl^ÍmerÌte, consistem, em suâ =ó


Èo, !u*
q)

maioria, de métodos das décadas de 50 e 60, voltados


^ !.Y
l

bài ;o
l

pa;l;a o ensino escolar fundamental, como iá dissemos' Ul ì Ca!

Os métodos mais recentes, das décadas de 90 e 2000, 'Èè


contemplam uma abotdagem predominantemerÌte tÍa-
so --: i- ì
ì

N
dicional. A única exceção é o Aprendendo l-atin (Jones e 00
ryì
u -'
C 'lì!F
Sidv.'ell 2012), disponível em língua portuguesâ, atïavés õ 'SG _ ,u :
3^à=S.
da ttadução e adaptação de Cardoso et a/.. Sobre esse
O
õ íiÕ.:Oõ=8: 35U
método e a abordagem textual, falaremos particular-
oo
c E
9-.

.ó.J-*Í
s!:s I

o:o-:3:^ I

= '---\o
* --o
mente no próximo item. O
= o::-ìoo < LË
v:il-u-gJ'!!

\tejamos, em síntese, no quadro a seguir: -o


o
õìiÈÈí=tË
^=uxdtJ>_
;.=>t<oïì-
.O L
<QôZc-Y2'ì*4 '' =
Abordagem textual: da literatura à língua tres letir.os païâ ser concluído, já que a carga horária das
disciplinas de Ìatim em nosso país é geralmente reduzida:
a culpa não é do métoclo, mas do tempo qr-Ìe se tem pâra
A abordagem textual é bem representada por al- sua utiììzação.
guns métodos estrangeiros, sobretudo em língua inglesa, O método Larìn L'ia Orid apresentâ a mesma con-
que são corÍentemente utiljzados pâfa o ensjno de latim cepção do Apretdendo l-atìn: o intuito é aptesentar a
no Brasil, tais como <t Latìn via Ouìd (Goldman e Nye- língua a parúr dos textos, inicialmente adaptados, para
nhuis 1982) e o Aprendendo Latim flones e Sidrveli 2012), chegar, pouco â pouco, à leitura de textos originais. A
ambos originaJmente desenvoh.'idos na década de 80, patticularidade é que a obra se baseia apenas nas A'[eta-
ainda editados, que âpresentâm concepçòes bastante se moçt'oses de Or-ídio, a partir das quais, cada lição trabalha
melhantes e, em r'ários âspectos, diferentes dos métodos um episódio mitológico. Do ponto de vista do conteúcìo
brasileiros mais atuais, que, em geral, contemplam a abor- gramatical, a progressão, nas primeitas unidades, é mais
dagem tradicional, como vimos no ú1timo item. râpida, comparando com o Aprendendo Latitzt, mas os tex-
Utilizando, ptincipalmentc, textos da Antiguidade tos iniciais, aiém cle menores, sã.o mais aclaptados, não
ciássica adaptados (mr-rito adaptados iniciaÌmente, mas antecipânclo itens gramaticais que serão apresentados /
gtadativamente menos modificaclos, cheganclo ao frnal posterìorì.
sem nenhuma modificação), o Aprendendo Latìm sistema- Os dois mótodos citados, embora sr-Ìa metâ sejâ a
nza paulaanamente os conteúdos gramaticais, que t'ão leitura e tradução de textos, con]ugam o ensino do texto
aparecendo no decorrer dos textos apresentados em cada ao ensino de tópicos gramaticais, o que nos parece es
seção (r'ale mencionar que os textos não trazem apenâs sencial no estudo de uma ìíngua como o latim que usual-
os tópicos grâmâticais tratados na seção em questão,
mefÌte só costuma ser aprendida tardiamente, durante a
mas 1â âpresentâm tópicos mais ar.'ançados. que serìo graduação, como acontece no Brasìl. Não se pode abcli-
vistos e sistematizados em seções postetiores, possibiLi- car do ensino da gramática, embora não deva ser esse o
tando, assim, que as adaptações não soem tão artificiais objeuvo úlumo dos cursos/discipLinas cle latim no con-
e se mârÌterÌham mais próximas do texto original). trsse texto universitário.
método ttabalha especialmente com âs peças atribuídas
Nesse contexto, a abordagem textual se mostra'
ao comediógrafo latino Plauto, com obras de Cícero e
assim, a mais profícu:' pâti- o aprendizaclo de uma 1íngua
Saiústio, contemplândo, nas seções finais do metoclo, a
como o latim - que não se configura mais como língua
poesia de autores como Catulo e VirgíLio, apresentando,
nattva p^r^nenhum falante moderno e não é mais util'iza-
também, já desde âs pÍimeiïas seçôes, epigramas de N'Iar-
da no cotidiâno, apenâs Presente em textos escrìtos que
cial, epitáfios e trechos da Valgata nâ parte denominada
cÌistam há múto no tempo cle nós -, poìs possib-ilita patti-
De/ìcìae I -tÍìnae (um apêndice a cada seção), clue têm o ob-
cularmente o ensino das habìlidades de leitr-rra e tradução
jetivo de introduzir o estudânte, desde o início, a tópicos
dos textos da tradição clássica, bem como o da estrutura
culturais diversos, bem como pequenos textos otiginais.
a
gramatical da língua de um modo mais atrâente e com
Uma desvantagem que professores que o adotam apon-
propósito mais claro - o de auxiliar a 11uência da leitura e
tam é o fato de set um métcldo que requer r-ários semes-
interpretação dos textos.

108 't
09
Faz-se necessário, contudo, trazer Ltma ressalrra de dicional em que o ensino da gramânca âcabou por ser suâ
Cacho (2001) a respeito da motir,'ação do uso de textos especiflcidade. O obietivo é a fluência na leitura dos tex-
no ensino do latim:e tos dâ tadição clássica, que permitirá seu entendimento
e interpretação.

O texto não é objeto de estudo para o modeÌo getati- Dada a especiácidade do ensino de uma língua
\.o-estruturâÌ, seja por consideÍaÍem que suâ estíutura como o latim, a escolha dos textos se mostra fundamen-
não segue regtas, seja porque o considetam objeto de
t^Ipar^que o uso de tal abordagem tenhâ sucesso:
outras discipÌinas. Seu estudo lfnca suas taizes na te-
tórica clássica e possui diferentes denominações Qin- Os textos (...) devem ser completos. DeYem teí umâ
guística do texto, gtamática do discurso etc.). Insistrr extensão adequada e sufrclente para transmitir uma
mais uma vez,para não cait na mesmâ armaülha que mensagem com um sentido que, contextuaLizado,
a didátìca tradicional, que nosso propósito não é estu- petmìta aos alunos dar o signifrcado aproptiado. O
dat a gramâúca do texto, mas sim entender os textos: trabaÌho com unidades menoÍes, ftases especìaÌmen-
a anáüse do texto é uma ferramenta, um pâsso inter- te, é aptopriado pata teforçat os asPectos gtamaticais.
mediádo paía se compÍeender os textos, nuncâ, nos Não se deve rejeitar, pot isso, sua ur:1tzaçào. A exten-
níveis do bacharelado, um Íim em si. (Cacho 2001, são e complexìdade dos textos dependerão do nír'el
p.178)10 dos alunos e os obietivos das atividades que queira-
mos tealizar. Qd., ìbìd.,P. 180)11

Como vemos, o texto deve ser estudado como foÍ-


ma de se acessâr â culturâ e latinas, não como A
escolha, segundo Cacho, deve consider^r ex-
^lTteratvra ^
pfetexto pâfa se estucÌaÍ a g[amâúc^ do texto - effo que tensão: os textos não podem ser muito pequenos a pon-
se pode incorret, como aconteceu com a abordagem tra' to de o conteúdo de sua mensagem {icar obscurecido,
e, como peÍÌsamos, nem tão gÍândes que possam pfe-
\,'ale considerar que Cacho patte de e propõe um enfoque
judicar, digamos assim, â fl:uidez, a informatividade e a
comunicativo para o ensino de Ìatim. A despeito disso, sào agilrdade das aulas/do materlài didático - não há como
muito pertinentes suâs obserr.ações sobre o ensìno do texto e não pensaÍ nos estudantes, textos muito longos podem
da Lteratura e cir iìrzaçào Ìariras.
10 "O texto non es objeto de estúdio pata el modelo estÍucturaÌ
generativo, bien por consicletar que su estÍuctÌría no seguía
unas reglas, bìen porque 1o consideran objeto de otras discipÌi "Los textos (...) deben set completos. Deben ser una exten-
nas. Su esúdio hunde sus raíces en Taretotica clásica, t'tiene sión adecuada v suficiente patl transmitir un mensaie con
diferentes denomiraciones (ìinguística del texto, gramática de1 sentido que, contextualizado, permita a 1os alumnos dar 1a sig-
discurso, etc.). Insisdr una r.ez más, pâÍa no caer em la mrsma ni6cación apropriada. E1 trabaio com unidades más pequeòas,
trampa en que lo hace la didáctica tradicional, en que nuestro frases especialmeÍlte, es apropiado pata refotzar los aspectos
propósito no es estudiar la gramática deÌ terto, sino lÌegar a gramaticaÌes. No debe rechazarse, por ello, su utilzación La
comprender ios textos: e1 aná[sis del texto es un instrumento, extensión e compÌeiidad de los textos estará en función del
un paso intermedio para la comprensión de los textos, nunca, nír,el de los aÌumnos -v de los objetivos de las actividades que
en Ìos nÌr.e1es de Bachillerato, un Íin en si mismo." pensemos realtzer."

Í10 111
Fazer tender o aprendizado, mediânte o tlatamen-
{azer com que o andamento do ensino/aprendizagem da
Língua flque monótono, além de impossibihtar que outros to conjunto dos aspectos moríológìcos, sintáticos

textos do mesmo ou de outros âutores sejam apresenta- e semânticos que se inter-relacionam.

dos, considerando que é imprescindível que os estudan- Relacionar motfossinta-te e tipos de texto.
tes possâm âcessaí o máximo possível de textos e âLltores Relacionar morfossintaxe e elementos textuais etc.
representativos do legado Ìiterário-cultural dessa língua. (Cassan1, er a/.1994, p. 304)11

Também observa que â extensão e a complexidade


dos textos dependem do uso que se quer fazet deles, bem Como obsetvamos, o ensino da gramática deve
como do nível de conhecimento dos alunos. Oferece dois estar ât(elado ao ensino do texto, e iulgamos que o en-
conselhos relativos à aptesentação clos textos em sala de sino do texto, por sua vez, deve estâf atrelado ao ensino
aula: da üteratura. Ensinar )tteratura, embora pressuponha o
ensino de textos, veículo de sua manifestação, não pode
. se restringiï a ele, pois a interpretação ltteratra considera
manipuláJos o menos possír'el (seguindo, em todo
o texto e o arqútexto (usando terminologia propostâ poÍ
caso, algumas regtas), e
Gerard Genette em seu Palinpsutes,1982), isto é, os tipos
. não substituir os termos difíceis, se esses são de
de textos, o gênero hterârio, bem como sua insetção his-
uso comum, por slnônimos mais trânsPâÍentes em
tórico-culturaL, alêm de 1ançar mão de uma teoria que â
castelhano fportuguês]: é pteferír'el fazer tm co
noïteia. Mas isso é um assunto para outÍo texto, o ensino
mentário oraì ou Por escrito.
de literatura merece um câpítulo à parte.
(ìd., ìbid.,p.1B1)12

Cacho, contudo, não descarta o uso de frases iso- Conclusão


ladas no ensino da língua latina, pois são necessári^s pata
a apreensão e fixação dos conteúdos gramatica,is, sem os
quais o aprendizado da língua fica pteiudicado. O autor Como vimos pela discussão traçada, a abordagem
âpresentâ alguns princípios metodológicos propostos metodológica que nos parece mais interessante pâra ser
por alguns estudiosos: :uúltzada no ensino de latim - cuio objetivo seja o de en-
sinar as habilidades de leitura e tradução de textos da tra-
Contextuâ[zaÍ os elementos morfossintáticos. dição clássica - ê a abordagem textual. Vmos também
F,xtrair exempÌos da Íngua real.

17. "- ContextuaLizar Ìos elementos morfosintáctìcos.


- ExtrâeÍ ejemplos de1 1ìnguaje rea1.
- Rentabì1izar los aptendizajes mediante el tratâmiento con-
12 "- manipuÌados 1o menos posibie (seguiendo, en todo caso, junto de los aspectos morfológicos, sintáctlcos v semánticos
unas normas), y - no sustituir los tórminos dilíciles, si éstos que se intettelacionan.
son de uso común, por sinónimos más tfaÍl-spârentes en cas - Relacionar morfosintaxìs ,v tipos de texto.
tellano: es preferibile hacet un comentatio oral o por escrito'" - Relacionar mofosintaxis l. elementos textuales, etc."

112 113
que, dentre os métodos brasileiros de ensino do latìm, nessa 1íngua, e erìsiíìar litetatata, e mesmo cultura, não
a maiorta apenâs âpârentemente segue tal abordagem. significa apenâs estampar textos adaptados ou mesmo
'Aparentemente", porque a maioda desses livros didáti- originais, muitâs \-ezes âpenas com o intuito de ensinar
cos âpresenta um ecledsmo metodológico e poucâ coe- greLm^tic4 ou somente indicar a sequência histórica dos
rência com uma abordagem em particular. fatos e/ou âutores/textos, numa espécie de linha do tem-
po, mas sim focar nos textos pensando nos gêneÏos ]jte-
No efltânto, embora trabalhem em algum grau
rários, em suâ constíução e interpretaçãofleitura.
com textos, os métodos brasileiros, em geral, apresentam
textos ârtificiais, fazendo pouca ou nenhuma referëncía a
tópicos culturais ef oulrterârios romanos. Os textos sào
Re fe ê nci as b i b I i ogr áf cas
udüzados âpenas como pretexto para o ensino gramaü- r ì

cal. Como nos diz CodoÀer:

ÂLENCÀR, M. (1958). Masaprimus-para apimeira e a segan-


Nem a monotonia do ensino ttadicionaÌ: declina da sérìes do car.ro ginasìal Rio de Janeito: E,ditota Paulo
ções, conjugações, acompanhadas de frases simples de Azevedo.
que alicetçam o conhecìmento adqútido de memó
ÂLMEIDÂ,J. C. (1960) O I'atìm nos Cìnásìot- /o stirie curso
ria, nem o sistema "modetno", criado à imitação das gi n as ìa/. São Paulo: Melhotamentos.
Ìínguas faladas na atualidade, são plenamente satis-
ALMEIDA, L. (1951). Latìnìdade * seganda sérìe gìnasìal. São
J.
fatórios. Há uma desvantagem fundamentai: o tédio Paulo: Companhia Editota Nacional.
gerado pela repetição, apaÍentemente sem objetrvo,
ÂLMF,IDA, N. M. de. (1,942120111). Crarttátìca Latìna. 30
de paradigmas, e a íeconstrução de uma sociedade
ed. Sào Paulo: Sarair-a.
inexistente a parir de esquemas atuais, fato que,
ÀLMENDR-\, M. Â. e FIGUEIREDO,I. N. (1996). Can-
pâÍâ começaÍ, distorce aquela realìdade. (Codoõer
pêndìo de gramáilca latìna. Porto: Porto Editora-
1.995, p.23)14
CART, A. et al. (1955[1986]). Gramátìca latina. Ttaduçã"o e
adaptaçào de Mada EvangeLina Villa Nova Soeito.
Desse modo, julgamos que o ensino do latim não São Paulo: T.A. Queiroz.
pode ser dissociado do ensino da Literatura produzida
CÂSSANY D; LUNA, M. e SANZ, G. 0994). Ïinseiar /en-

gaa. Graó: Barcelona.

14. "Ni la monotonia de 1a ensefranza tradicionaÌ: dec.linaciones,


CODONER, C. (1995). "La retórica en 1â enseffânza deI
conjugaciones, acompaôadas de ftases simples que cimenten \atin",ìr;ESTEFÂNÍÂ, D. e AN,IADq N{. T. (1995).
el conocimiento adqúrido de memoria, ni e1 sistema'moder- Actas del Co/laqaium Didaüìcum Classìcan XV Salntaatì-
no' creado a imitación de las lenguas habladas en la actualidad,
cense. Sanïtago de Compostela.
son plenamente satisfactonos. Existe un ìnconr.eniente bási-
co: el abutrimiento generado poÍ una repetición de paradig COMBÂ, J. (1958[2004]). Granzátìca lartna. 5. ed. São Paulo:
mas falto âpâíentemente de objetiros, y la reconstrucción de Salesiana.
una sociedad inexistente sobre unos esquemas actuales, hecho
que, paÍâ empezar, falsea aquella rea[dad."

115
114
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716
t-

m,
Latim e Linguística: concePções
de linguagem e ensÍno

Fáhio Fortes

Introdução

A clássica dicotomia saussuriana entre langae e pa-


role loi cetta vez revi.sitada por Lima (1995) ao abordar
questões metodológica:s àcercado latim, em sua oltraUma
estranha língwa? paestõu de lìngwagen e méÍodo. O estudioso
ahnhava" a perspectiva do uso linguístico âos textos pro-
duzidos nessa língua, relacionando, por assim üzer, a ü-
cotomia entre dualidade saus-
sistema lìnguístin e literatwra à
suriana Ìangue e paro/e, para concluir que "sem os textos,
que, no caso das línguas antigas, são a única expressão e
testemunho do dizer indiúdual (...) não há porque perÌsâr
na linguagem como fator da formação humana" 0 ima
1995, p. 2r.'É,assim que o autoÍ constâtavâ que o ensino
do laum sem a sua p/ro/e, ort seja, sem os seus textos, sem
a sua literatura, declarara a moÍte da própria Língua.

Por outro lado, pril-tlegiar a anáhse do texto não


prescinde de, em algum momento, produzit reflexões de

119
rl

carâtil metâlinguístico, ÍeÍlexões, em sumâ, sobre o pró- Língua como fator de identidade
prio sistema gramatìcal da língua - nos nír'eis consagra-
dos pela Linguística: fonótica/fonologia, morfologia, sin-
taxe, semântica e pragmática. Nesse r..iés, em particuÌar, Ainda na i\nugurdade gÍeco-romana, a vinculação
é preciso que a análise ultrapasse os ümites clos manuais entre língua e identidade cultural eÍa um lugar-comum
nas rel1exões sobre a Jinguagem. A oposição enrrc o ci-
tradicionais e, ainda, que partâ cÌesses mesmos manuais e
dadão grego (ou, posterioÍmente, romano) e o bárbato
produza uma visão crítica acetca dessa tradição.
passavâ pelo domínio da própria língua: como é bastânte
O modeÌo de ensino gÍâmatical, assentado sobre a
conhecido, a própria palar-ra "bârbaro" (po.gpapcç), como
âpresentâção de declinações, conjugações e ftases simples
nos informa Chantraine (19ó5), se apÍesentâ em numeïo-
(Codofrer 1995, p. 23), necessita de uma inor,zção, como
sos autores clássicos como oposto a "heleno" (r1)\vLrcóç),
consequência de a) a reduzida cargahorâita da disciplina, isto é, "grego", falante de grego, e designar.a aqueles que,
nos dias âtuais; b) a necessidade de motivar os alunos e
sendo estrangeiros, não conheciem o grego e apenas bal-
c) o desenr,'olvimento contemporâneo dr: novas didáticas buciavam palavtas.
(Etienne 1995, p. 325). Enfim, para que se ptoduza uma
A ideia que r-incula língua a identidade (seja ela de
inovação nos quadtos de ensino de latim, Cacho (200i,
grupo, de gênero, ou mesmo nacional), é recorÍente na
p. B5) defende, então, ser necessátia uma incorporação de história do pensamento metalinguístico ocidental, e pocle
contribuições adl'indas de outras disciplinas, tais como a
ser encontrâdo, pot exemplo, reÍletida nos manuais de
Fikrkrgia e, sobretudo, a Linguística. ensino de 1íngua maternâ, como nos informa Marcuschi
Nesse sentido, buscatemos em algumas correntes sobre o que acontecia até meados do século XX:
dos estudos ünguísticos do sécu1o XX, aquelas concep-
ções de Língua e linguagem sem as quais, acredito, não se Para tanto, existiam os I'-/otì/égìos, .\'e/eÍa.ç e as famosas
pode pensar contemporâneamente ensino cle uma língua com seÌeção de tertos cÌássìcos da ljtetatu
Anla/ogia.r
(clássica ou moderna). Tais concepções representam, é
ra. Seguiam-se os pteceitos da Filolc-,gia que coman-
r.erdade, recortes teóricos histoticamente sìtuados na his-
cìava entãci o estudo da iíngua. À ìdeia era a de que
tória da Linguística no sécu1o passado, ou, emprestanclo
a Língua formar-a um grande quaclro c1a ìdent'ìdade w'
o termo já consagrado de T. I{uhn, diferentes paradigmas
donal e era o depositário da ca/ttra nacìana/. E esta se
dessa disciplina ao longo do século XX. Para delimitação
expressâva na Literatura cle um povo, que devia ser
dessas perspectivas e suas poterìciais contribuiçôes para
imitada. Era ainda o icÌeal greco latjno do ensino cle
o ensino do iatim, adotaremos um recorte que conciiia a
língua. Na língua estaria o patrimônio ea páttia de um
anáiise de Cacho (2001, p. 29 er seq.) e N'Iarcuschi (2000), a
povo, e até mesmo â r'isão de mundo clue o animara,
saber: 1) Língua como lator de tdentidade; 2) ìíngua como
tâÌ comÕ postulara FlumboÌdt. Em certo sentido istcr
sistema de regras; 3) língua como competência cclmuni-
percÌura ainda hoje nas Âcaclemjas e nas visões mais il
catir.a e textual e; 4) língua como fenômeno social e his
tór:ico. consen'adotas que não aclmitem outÍo er-ìsino a não
ser o da Língua dita padrão e exemplar de ncissos me-

121
thotes e mais consagrados autores. (À,Íarcuschi 2000, Língua como sistema de regras
p. 193, grifos do autot)

O primei-
Cwrso de lingaística geral (1'91'611'9731), cuia
Ainda que se salvaguarde certo "nacionalismo lin-
ra edição, orgatizada por C. Bally, A. Sechehave e A. Rie-
guístico", de carâtet conservâdor, que se pode depreen-
dlinger, veio a lume em 1com as ideias que Ferdinand
91 6,
der da passagem acima - o que, em outras pâlavras, era
de Saussure teria discutido em seus cursos proferidos na
já expresso pela máxima "minha pâtria é a língua por-
Univeïsidade de Genebra, erìtÍe 1'907 e 1911,1 ê tomado
tuguesâ", atribuída ao heterônimo Bernardo Soares de
como um verdadeiro dfi,-isor de águas na história do pen-
Fernando Pessoa (fragmento 259 de O liuro do desassassega)
samento metaJinguístico ocidental e muitos há que o con-
- é impotante reconhecer que essa concepção de ì-ingua-
sideram como o real iniciador da disciplina. Embora hoje
gem, oriurÌda de reflexões sobre a Linguagem anteriores à
sejam bastante conhecidas as ideias pïecursoÍâs do tra-
propria Lingústica moderna, tem como tÍaço caracterís-
balho de Saussure (como as dos chamados "neogramáti-
tico a indissociação entre Jíngua e cultura.
cos", por exemplo, em relação às quais Saussure não tena
Conforme mencionamos acima, por ser o Ìatim rompido de forma absoluta), não se pode desconsiderar,
uma língua cujo acesso é franqueado pol intermédio de entretanto, o papel inovador que a obta desempenhou ao
seus textos escritos, é necessário reconhecer a vinculação longo do sécu1o XX: "Não é uma'bíblia'da Linguística
desses textos à cultura que os ïepresenta, ou à multipli- moderna, que dê a ultima palavra sobre os fatos, mas é o
cidade cultural da civllszaçào greco-romana, às suas ins- ponto de païttàz- de uma ptoblemática que continua na
tituições e valores, a fim de que o seu ensino nào se res- ordem do dia" (Salum 1973, apadSaussuÍe 1'916$973),p.
trinla a um elenco de formas e decünações sem contexto. XXI). Por se tr^t^r de um "clássico" - ao qual, ainda que
Estudos como o de Benveniste (196911995f), O uocabalá- divergentes, as principais correntes lingústicas do século
qte rastreia no vocabulá- passado haveriam de se referir, as concepções de língua
rio das ìnstitaiçõu ìndo+aropeìas -
rio greco-latino âs suâs raízes indo-europeias e as associa e ì-inguagem presentes nessa obra e nos estudos que â
aos valores culturais dessas ciülizações, no âmbito da seguiram - de carâtet estrutlÌrafista - podem se tevelar

economia, sociedade, relìgrão e expressão artística igualmente relevantes para se pensar o ensino de línguas
- ou
clássicas na universidade.
o de Nfada Helena da Rocha Pereira (1965[2006]), Esta-
dos de bìstória da calíura clássìca * que icientifica nos textos As dicotomias saussurianas (diacronia e sìnlanìa,
antigos os valores culturais dessas civilizações, tais como bem como a noção de "valor linguístico",
langwe e parole)

g/arìa, ç; mos maìoram, entre outros concretitzada na célebre rrretâfora da partida de xadrez,
a pìetas, a lìbertas, a
- po-
dem contribair para que o ensino dessas línguas clássicas ttaduzem umâ concepção de língua como sistema for-
mado por componentes inter*relacionâdos - dos nír.eis
âpresente a perspectir,z identitária, sem z. qual tais línguas
deixam de ser o testemunho e a expressão r,'iva da cultura
desses po\ros.
Cf. Ì. N. Salum (1973, XVI), no "Prefácio à edição brasileira",
coÍÌstante na obta citada de Saussure em sua tradução brasi-
leira-

123
ptoduzir-se-á um solecismo, do mesmo modo que a
menores, no âmbito da Fonologia, passando pela Mor-
desarmonia das Ìetras ou das síÌabas, ou de suas pro-
fologia, até chegar à relação entre palavrâs e sentençâs'
ptiedades em cada uma das palavras, produz batbaris-
Sintaxe.
mÕ. Portânto, do mesmo modo que o sistema correto
Reconhecer que as línguas clássicas são, por assim
da escrita ensina a junção correta das Ìetras, essìm
dizer, a expressão de um sistema, e nele identificar os
também o sistema de ordenação tevela a composiçào
nír,eis c1e análise que a Lingústica estruturalìsta propôs,
correta da otação. @risciano, Inst. gram., XVII, 6)
pode garantir, em sumâ, que seu ensino seja revestido de
um tefinamento teótico e conceptual que, mr-útas vezes,
não está presente nos manuais. Partindo do enunciado Como se depteende da passagem acima, o con-
latino, as realizações dos morfemas se definem não pela ceito de ordem das palavras no gramático anago 1â era
materialidade exte(ior da forma, mas peias oposições de suscetível de ser compreendido à luz de certa "lógica" ou
valores dentro desse sistema, no sistema verbal e nominal. "sistema" (ratìo). Desconsiderar esse sistema signifrcana
Diga-se ainda, de pâssagem, que a concepção de
produzir sentenças malformadas (solecismos), do mes-
mo modo que, no interior das palavras, ignorar a logSca
língua como sistema de regras estzrva l^ presente nos tÍâ-
das combinações fonéticas (ou de lettas) significaria pïo-
tados gramaticais da Antrguidade, entre os quais o De
duzk palav ras mal- cons truídas (b arbaris mo s).
constructìone, de Prisciano (séc. VI), ao tratar da ordem das
palavras nâ sentença:

Língua como competência comunicativa e textual


inspectìone
Quomodo aaÍem /ìlerarum ratìonem ue/ scrìptarae
ueÌ aariam sensa dìludicamos, sic eiam ìn dicrionun ordìna-
ilham sil an nan'
ione dìsceptamus t"ationem czntextils) reôlã
Do sistema de regras l-ingústicas ao texto: da com-
Nam, i incongrua sìt, saloecismumfaìet, qaatì e/emenlis ora- petência à performance. Ao longo do século XX, as cor
lionìs ìnnnrinne coeunlìbus, qaanado inconcìnniïas lìÍerarum rentes de análise linguística posteriores à Jinguística es-
uel Ellabaram uel eis auìdentìam ìn sìgalis dìctìonìbas fant trutuÍal e gerativa deslocaram a da análise formal
^tenção
barbaismam. Sicat ìgìlar reüa ratirt scrìpÍurae decel /iteraram cla sentença patà sua inserção em blocos maiores do
^
clngrvdm ìunctaram, sit etìam rectatn oratìottis compoirtanem discurso: a cofirersação, o texto e o discurso.
ralìa ordinarionis o.çtendìt A importância do "texto" no ensino das línguas
clássicas é por demais conhecida, haja vista o fato de que,
Do modo que discernimos o sistema clas Ìetras, tanto sem selÌs textos - o monumerìtal legado da cultura gre-

pela observação da escrita, quanto pelo sentido dos


co-romana, ainda, em muitos casos, desconhecido - tais
línguas perdem o seu estatuto cle existência e fazem fus à
our.-idos, assim também iuÌgamos o sistema do enca-
correto
metâfora a elas, mútas vezes iniustamente, imputada de
deamento na otdenação das palavras - se está
"ìÍnguas mortas'). Em suma, é na recepção de seus textos
ou não. Com efeito, caso esteja incoerente, estando
que o latim e o grego clássico sobrevivem, recePção que'
unidos desatmoniosamente os eÌementos da oração,
se, enfim, possa também se dâr pelo r,-iés da tradução,

125
124
t-
nível textual: a mârÌutenção da coerênciâ, os conectoÍes
muitas vezes se ressente de uma atençáo mais próxima
textuais, a coesão lexical linguística (sinonímia, homoní-
das idiossincrasias lìnguísticas que os perlazem e dos efei-
mia, heteronímia etc.) e referencial (recorrência, coïrefe-
tos de sentido engendrados de forma singulat poí tais
rência, repetição e eüpse) e a progressão de ideias novas
línguas.
e dadas. O outro lado dessa questão é compreender que
Porém, para que a ltteratura Tattna lato sewa possa
o texto não existe por si mesmo, mas insere-se em um
se rer-e1ar instÍumento efrcaz no ensino cìo latim, necessá-
framework comunicativo, cujos partícipes definem entre si
rio se faz que o professor, que também é chamado a de-
relações sociais e históricas específicas (por exemplo: a
sempenhar o papel de analista da linguagem, reconheça
quem Cíceïo direcionala as suas invectivas das Catilìná-
as particularidades teóricas que embasam hodietnamente
mútos casos dividindo turnos de fala (como
rìas?), em
as teorias sobre o texto e tenha, no mínimo, a concepção
nas comédias de Plauto) e compârtilhando cofi-enções
de que, diante do entrelaçado de palavras que compòem
de norma e gênero.
o texto latino, encontÍamos, de fato,

a unidade ünguística comunicativa fundamentai, pro- Língua como fenômeno socìal e hìstórìco
duto da atividade r-erbaÌ humana, que possú sempre
um caráter social, está catactet'tza'd.o pelo seu cerne
semântico e comunicadvo, assim como Por sua coe JâHorâcio, em suâ Epìstwla ad Pìsones, afrrmava'.

rência profunda e superficial, devido à intenção (co-


municativa) do falante de criat um texto íntegro, e à
Ma/ta renascenïar qaae iam ncìdere, cadentque qhlte nl/ni
sua estÍutuÍação mediante dois coniuntos de regras: sant it honore aocabu/a, si ualeí ustts, qaem petxes arbitrìun
as próprias do nível textuâl e as do sistema da língua.2 est et ias et normd /oqaendi.

(Bernardez 1982, p. 46)

Nfuitas palavras que já morreram terão um segundo


O texto latino constitui-se, portarÌto, de um pro- nascimento, e cakão muìtas das que âgorâ gozam das
duto cultural socialmente contextualizado, cuio acesso é honras; se assim o quiser o uso, em cujas mãos está o
possível mediante não somente o domínio das regras que arbítio, o direito e a Ìei da faiLa. (lJotâcio, Ep. ãd Pil ,
definem o sistem per.re, mâs também âquelas próprias do 70 et seq.)

O tom dominante na pâssagem é a realiclade histó-


"(...) la unidad lingüística comunicativa fundamental, produc
to de la actir.idad r-erbaÌ humana, que posee siempre caráctet
nca da língua: em vez de um sistema homogêneo e uni-
social, está cttactetizado por su cierre semántico Y comuni forme, a linguagem é multiforme e plurâl, sujeita a pres-
caúr-o, así como por su cohetencia ptofunda v superficial, sões do uso, de seu empÍego em determinado contexto
debida la intención (comunlcativa) del hablante de cteat un histórico e sociâl. Assim, supera-se a dicotornia certo-er-
texto íntegro, v â su estÍLÌcturac.ión mediante dos conjuntos
râdo e âdota-se umâ relação multidirecional: a adequação
de reglas: las propias del nìr'el textual ,v las deÌ sistema de la
lengua".

-126 127
t-
ou ifladequação do emprego é fenômeno definido por enriquecer com as concepções de Ì-inguagem modernas
múltiplas variár,-eis: em que diacronia? Para que flnahclade aplicadas às línguas narurais.
comunicativa? Em que papel social? Repensar o latim como a) fator de identidade; b)
Os usuários, a comunidade de faìa, o seu Íepertó- sistema de tegras; c) competência textual e comunicativa
rio (vocabular, retórico, estético), a desigualdade de letra- e d) fenômeno social e histórico pode ocultat, de fato,
mento e acesso à esctita, são fatotes socialmente induzi- os embates teóricos entre âs correntes representativas
dos que não se devem perder de vista quando se pensa o de cada uma dessas concepções, mas p^r^ efeito didático
latim e seu ensino. Um breve exemplo: a Lìnguagem em- tesulta em umâ anáüse reflexiva sobre a língua, que tem
pregada na famosa Cena Trìnahhìonis, da obra Sa4trìcan de por mérito aprecta-7a sob diferentes prismas : da estrutu-

Pettônio (ca.27-66),em contraste comafala do narrador ra Jinguística interna a súa inserção social e histórica,
^tê
da obra, revela indícios peïtinentes a determinada classe passando pelas consequênsias de ordem comunicativa e
social da Roma Imperial à época de Nero - a plebe -, ao pngmâttca e da relação entre essa língua e a identidade
mesmo tempo que elenca formas de linguagem próprias cultural de que se faz veículo.
do latim corrente. De fato, embora a nartaítva seja escrita Acteditamos, em sumâ, que a língua latina cum-
na modaüdade padtão clássica do latim (ainda que com prcâ a sua finalidade de formação cultural e ìinguística
as transformações já em cuïso na época impertal), a fala a que objetiva no currículo dos cursos de graduação em
dos personagens übertos pârtícipes do lantar testemunha letras e ciências humanas, quando se the franquear um
uma variedade outra dessa Jingua, em seus nír'eis lexicais, tratamento que se destacâ pelo rigor teórico e cdtico e
morfossintáticos e fonéticos, em que se elencam formas pelas aproximações interdisciplinares entre essa e outras
vadadas de coloquialismos, figuras populates e expres- disciplinas no campo da linguagem.
sões proverbiais próprias àa fala.
Reconhecer em sala de aula o latim enquânto uma
Referências bi b I i ogr áf i c as
realidade linguística social e histórica é, de fato, reconhe-
cer â sua pluralidade de empregos, em vatiados âutores e
em r.ariadas épocas, de acordo com o gênero dos textos. BEARD, Ìú. e HENDERSON,J. (1995 U9981) . Anttguìdade
A língua latina deixa de ser uma massa uniforme e homo- clássìca: ama breaíssìma ìníroduçãa. Rio de Janeiro: Jorge

gênea a pode set vista como um conjunto de variantes. Zahar.


BENVENISTE, E. (19ó9[1995]). O uocabuÌário das ìnstìtuìções

ìnda-earopeìat, vols. I e II Campinas: Unicamp.


Conclusão
BERNARDE,Z,E. (1'982). Introduccìón a la lìngüístìca del TexÍa.
N{adri: Espasa-Calpe.
Apresentamos, brevemente, alguÍrs apontamentos
CACHO, J. F. (2001). Dìdáxìca del I'atht. Saragoça: Instituto
que têm como metâ uma revisão da didática tradicionaÌ
de Ciencias de la Educación.
da 1íngua laúna. Para dirimit os mitos que se peïpetuam
CHANTR-{INE, P e SECHÂN, L (ed.) (1895[2000]). L,
em seu ensino e a tornam uma disciplina descontextua-
grand Baì/$. Dictionnaire Grec-Français. Rédigé avec
bzada e pouco interessante aos estudantes contemporâ-
le concours de E. Egger. Paris: Hachette'
neos, é preciso teconhecer que o ensino de latim pode se
t-
CODONER, C. (1995). "La retótca en la enseõanza del
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^cetca
ROCHA PEREIRÂ, À{. H. (1965[2006]). Estudos da hìstóia fomentou a citação de novas teorias e de novas práticas,
da ultura rlátsìca, r'oÌs. 1 e 2. 10 ed. Lisboa: Calouste que orâ se apresentam ao docente de língua latina como
Gulbenkian. complementâres, ora como conflitantes. Neste ttabalho,

130 131
r
pretendemos abordat uma das práticas docentes que cer- Ou seja, o aluno româno, que tinha o latim como
tamente tem causado reações as mais diversas entre â co- idioma mâteÍno, aprendia-o atrâvés cle uma sistematiza-
munidade acadêmica nacional e internacional: o uso das ção da língua, e só vinha a ler textos após ter dominado
práticas atiras no ensino de latìm. Procuraremos mostrâr todo o esquema morfológico e sintático. Este modeÌo de
que âs práticas ati'as no ensino de língua clássica: a) dife- educação da Antigúdade parece ainda sustentar alguns
rentemente do que se pode cret, não são uma inovação - dos mais modernos métodos de ensino de idiomas clássi-
muito ao contrário, têm séculos de tradiçào ininterrupta; cos, que seguem a ordem do alfabeto e pâssam à memo-
b) se abandonadas por um ceÍto petíodo em alguns luga- itzaçãc: das declinações e conjugações, passando primei-
res, foram retomadas já nas décadas de sessenta e setenta ro pela gramaaca puÍa antes de chegar às leituras como
do século XX, como parte da abordagem que advogar'-a corolário do ptocesso. No entânto, todo o percurso de
a. apltcação das teorias ünguísticas modernas no ensino aprenüzado na Anuguidade incluía também a" prâaca att-
de línguas clássicas; c) têm o propósito claro e definido va, com frequentes redações e apresentâções orais. Os
de contribuiï com o objetrvo último do ensino de língua alunos não só liam em voz alta e recitavam de memória
clássica, que é o contato diÍeto com o arcabouço cultural textos de autores selecionados, como também produziam
e ìiterário legado a nós pelo passado. Por fim, pretende- textos e os liam pata o professor.
mos oferecer alguns exemplos de uso de práticas ativas Não podemos deixar de reconhecer, entretârÌto,
no ensino de língua latina no Brasil e no exterior. que, pâra um falante nâtivo de latim, uma palavra solta,
usada à exaustão como modeÌo morfológico, eïâ pârte
O ensino de latim entre a estrutura e a leitura de seu conhecimento passivo e ativo do idioma, poÍque,
como pârte de sua ìíngua maternz, era r-ista em contexto
significatir,'os em seu üa-a-dia, o que não ocoïre com o
Às mais antigas notícias que temos aceÍca de como
aluno de ho1e. Uma vez que muitos dos métodos moder-
ensinat latim chegam a nós dos próprios falantes natjvos.
nos que seguem uma estÍuturação semelhante à do sis-
Quintiliano (nsí. 0r.,I,6,45) afrrma que o latim falado pe-
tema de ensino ântigo techaçam a produção ativa, como
las multidões nos teatros estava distante da forma corcetà
veremos, o aluno contemporâneo nosso é apresentado às
a ser ensinada aos alunos. Havia então um ensino, mais
ou menos institucionalizado, que buscar..a o aprimora- palavras da Língua latina usadas como exempládo somen-

mento do idioma falado em uma Yasta extensão de ter- te durante as aulas de latim; paÍa este aluno, pae/la ou agri-
ras. A metodologia da época se baseava principalmente co/a nada significam, e não são r,-istos em contextos outros

em tatefas mnemônicas e tepedtrvas, como demonstram que não a declinação latina. Na opinião de Fábio Fortes:
testemunhos não só latinos como também gregos' Da
memonzação do altãbeto passâ\ra-se à silabação, tecttada o uso extensir-o dessa abordagem pedagógica acaba,
e escrita; da ortografia, passâ\'â-se a um esquem^ gtam -
em sumâ, promovendo com eflcácia a ctença de que,
tical de aprendizado do latim, atrar'és do conhecimento
de fato, os estudantes estão diante de uma "língua di-
das declinações e conjugações, com análise das partes da
fícil", ou, o que é piot, uma língua "para poucos".
oração e leitura de textos clássicos.
(2010, p. 65)

132
Uma situação diferente dessa ocorreu na Idade com âs Línguas r.ernáculas, sendo ainda a preferida nos
À,Iédia e no peÍíodo do Renascimento, durante os quais tratos políticos e científicos.
outrâs Línguas -, ernáculas eram línguas maternâs dos di- Foi durante os séculos XIX e XX que as ptátt-
\rersos aluno. de latim, mas em que o objetir.o maior do cas ativas de latim perderâm seu prestígio. A demanda
aptendizado do Ìatim era adqúrir a habilìdade de falar e por maior "utilidade" dos currículos escolares refletia o
escreveÍ com faciüdade, por conta do uso extensivo do momento racionalista e cientificistâ europeu, que se es-
latim como língua de cultura e de comunicação entÍe os palhou pelo mundo e atingiu os currículos escolares das
povos. Naquele período, pelo que lemos em seus méto- Américas e da Europa em geral, através de uma oieriza
dos, o sucesso no falar, acreditava-se,tràzi^ a habiÌrdade a qualquer coisa que ressoasse a educação clássica, por
de ler e escre\rer, indispensáveis então a qualquer pessoe conta de sua estreitâ ügação com as adstocracias cortesãs.

de cultura mediana, o que justifrcou a criação de métodos


Este sentimento também não se âpagou e ainda se faz
sentir por toda pârte, emirzado numa sociedade caàavez
que incluíam situações cotidianas, perguntas e respostas'
mais utiÌitarista e inimiga da erudição per se'
compreensão de texto, como os métodos compostos por
Lús Yives (Exercìtatìct linguae I'atinae, siue Colloquìa Agravando a situação, iá di{ícil em função do des-
Juan
contentamento de uma parcela da sociedade que não via
11492-1540]) e Etasmo de Roterdam
(Colloqaia;t'anilìarìa
diálogos utrlidade imediata no latim ou que ìigava o ensino do la-
U466-I536]). Ambos são coleções de pequenos
tim ao elitismo e à soberba, as metodologias pareciam
de personagefls comuns em situações cotidianas' Erasmo
obsoletas. Como não mais se faiava Ìatim, por que ainda
prefacia sua obra com uma defesa da utilidade do estudo
se ensinava a falar em latim? Se não erâ necessária aque-
do latim e do uso dos cliálogos neste estudo' Ou seja,
la habilidade, por que então gâstar tempo em sala com
naquele período, as práticas ativas do latim constituíam
seu estudo? Surgitam assim as defesas do estudo do latim
o cerne mesmo da pedagogia do latim, tendo sua razão apenas atrarrés da leitura.
de ser jusuficada no uso do latim na época, como idioma
O método depois denominado filológico é uma
utilizaclo por toda â EuroPa.
resposta ao fim do latim falado, mas também à necessida-
A contemporaneidade, rio entanto' esqueceu com
de de formar profissionais capazes de lidar com o texto
erÌorme npidez este staÍus de língua ftanca que o latim enquanto código, o trabalho, por exemplo, de um papi-
possuiu durante as Idades Antiga, Média e \{oderna' rologista que precisa decodificar um fragmento recente-
Nlesmo sendo a afirmação das línguas nacionais como mente descoberto, ou de dominar o esqueleto de r'árias
línguas de cultura tarüa na mítoria das naçòes, e quase línguas, a fim de desenvolver um trabalho ne átea de Gra-
sempre presa à fotmação dos estados nacionais, os sé- mâtica Compatatir,a. Os métodos que seguem o modelo
culos XIX e XX fizeram questão de apagar este passâ- filológico se estabelecem rìos séculos XIX e XX, quando
do, dando ênfase nos currículos de lìteratura e história às o latim não é mais a Língua da ciência e da comunicação
obras em língua vernácula e esquecendo-se de mencio- entÍe os po\ros, e também quando aquelas áreas do saber
nâÍ que até pelo me1Ìos o século X\IIII, o latim conr iveu ganhar:n importância. Essa finalidacle da aprendizagem
do latrm é testemunhada por Roland Barthes (1986):

135
Lembto me dos cursos de Ìatim que frequentei no gi-
O problema que enfrentam muitos professores de
násio e na universidade; ao todo, seis anos dedìcados Ìatim é a inadequação dos métoclos aos objetìvos. Ora
a domìnar os meandros de sua gtamática; na facuÌ- por falta de teflexão teórica, orâ por ausência de meios,
dade, estudei gtamática histórica e procurei rs raízes o que temos de mais acessír-el para, o aprendizado do Ìa-
indo-europeias das palavras; mas a prática da Jíngua, tim não condiz com o que os docentes dos séculos XXI
o âcesso aos textos clássicos, antigos ou modernos, desejam desenvolver em suas sâlâs de aula. Esta prâúca,
sempre foi relegado a segundo plano. Eta para ìsso comum no século XX, de ensinar aos alunos atrarrés de
que servia esse ensìno? (apudLima 1995, p.58) métodos gramaicats, e exigir deles habilidade de leirura,
geÍou uma situação em que os alunos, quando muito, sa-
íam dos cursos não com um conhecimento da literatura
A resposta é simpÌes: sim, eta para isso que set-
latina, mas com o manejo dos aspectos técnicos do idio-
via esse ensino, umavez que o obieti\-o do latim naquele
ma, das regras gramaticais e mecânicas. Isto quando o
contexto educacional era o conhecimento de sua estru-
ensino de latim não se rcduzia à memoÁ.z^ção de textos
tüt p^ra o estudo da gramâttca histórica. No entanto,
famosos ou morâlmente edificantes, como podem com-
quando o objetivo do estudo do latim não é a âpreensão
provâï algumas pessoas que, tendo estudado latim quan-
de modelos estruturâis ünguísticos, e sim o contato com
do crianças atrarrés destes métodos, ainda rccitam Galìa
o texto ântigo ou moderno, o mais preciso conhecimento
est onnis diuisa in partes tres ou uma fábula de Fedro, sem,
da gramâitca não será suficiente.
no entanto, terem qualquef compÍeensão do idioma.
A questão que urge propoï âos docentes de latim,
portanto, é: estamos treinando alunos para corrhecer a Já naquele momento, alguns jâ apontavam o des-
gosto da cultura do "traduciorrismo", ou seiâ, do portu-
estrutura de uma língua, seu árido esqueleto, ou para leÍ
guês obtuso que saía dos 1ápis dos alunos que faziam ffa-
e compÍeender textos? Na resposta a esta questão fepou-
duções mecânicas e extremamente literais de estruturas
sa o tipo de ensino de latim que será levado aos alunos.
típicas do latim, mas que não são paÍte do repertório da
Parece claro que um aluno ensinado sob o método filo-
língua de chegada da tradução, tais como o ablatir-o ab-
1ógico não fará. urlrra leitura de texto latino, a não set de
soluto. Para solucionar este problema, alguns professores
forma lenta e desencorajadora. No entanto, se o objetivo
começarâm a defender a introdução do latim oral nas sa-
é a leitata de textos em quantidade e velocid^de razo-
á-n'eis, o modelo humanista, por exemplo, instrumentará
1as de aula
- como vimos, um passo atrás, de volta à Id,ade
\{édia. Um exemplo deste posicionâmento é a conferên-
melhor o estudioso, e não por acaso rúmos em Erasmo,
cia The art af Reading I -atin do professor William Gardner
em Viçes e em r'ários ouLros escrjtores que vireram em
HaIe, scho/ar da Cornell Unir-ersin'. Em conferência pro-
épocas nas quais o conhecimento clo latim era não a fr.-
ferida em 28 de dezembro de 1886, Hale defendeu o uso
nalidade de uma disciplina, mâs o instrumento atrar'és do
do latim falado na sala de aula, com permânentes Ìeituras
qlÌal se abriam âs portâs pàrE- o conhecimento de todas as
e exercícios de perguntas e respostas, com o objetivo de
outras discipìinas, métodos de ensino da língua latina que
tornâï o aluno proficiente não só na leiura dos c1ássicos,
incluem práticas ativas.
mas também em our.-ir e faTar em latim.

136
137
As palar.ras proferidas há mais de cem anos são l1m que pesem os estereótipos hetdacÌos da tra-
ainda aplicár.eis em alguns meios contemporâneos' L) dição novecentistâ e que aincla \iâ€ìam pelos correclorcs
prof. Hale se levanta contra o método que ele cìassifica clas universidades e junto ao público em geral, Pârece clue
como antinatural de ensino de latim, clueixanclo-se não para os docentes de latim os objetìr-os de sua prática clo -
só cle que elc afasta o aluno da ftuição estética clo texto' cente são, de forma imediata, â comPreensão clos textc-rs
ao apresentar-lhe não uma obra de atte, mas um que- latinos; consequentemente, o cc-rnhecimento das origens
bra-labeça cle palavras a ser decifrado, mas também da cla civilização ocidental e todos os beneficios advindos de
baixa eficácia do método, constatada por eie ao receber tal compreensão. Â drsputa se dá, portanto, no campo do
alunos qr-re, após quatro anos de estudos, eram incapazes como chegar a tais obietivos de forma satisfattida'
de traduzir de vista uma frase de Tito Lívio' O professor C) caminho escolhido, potém, pelos docentes de
ârgumenta que o método então utilizado, que desde o ìíngua latina para se chegar a este resultado, não é o mes-
início, dii.'jde a frase em pedaços e faz os alunos seguirem mo e, portânto, produzem-se mótodos diferentes, mais ou
tateendo em br-rsca de verbos e objetos, é inadequado e menos Lraseados naqueles dojs moclelos qlre explÌsemos.
inefrcaz em uma leitura corriclâ. Ele escreve também que O tipo de método mais tradicional, chamado
a creÍÌca propagada da dificuldadc do latim partiria neces-
também gramatical-tradutório, considera a gramâtict o
sâriâmente clo absutdo ptincípio de que âs mentes româ- foco ptincipal do aprendizado de uma 1íngua clássica, e
nas seriam mais capazes do que as modernas, ^o útllt'z^r
a tradução é usada como apoio. Os alunos aptendem as
cotidianamcnte um idioma "impossír'el de set lalado com decünações e as coniugações, os patadigmas c r sìnta-
fluência". Grancle parte das metodologias ainda usadas xe, e apLcam esse conhecimento na ttadução de textos
no Brasil ingenuamente retêm muitas clas mesmas estra- clo latim pâra sua língua mâternâ. Geralmente. prime-iro
tégìas utiJìzadas no Passado'
aprende-se a morfol()gia e apenas a sintaxe mais simples.
Depois que os estudantes conhecem bem as cìec1ìnações,
Latim para leìtura as conjugações e outros paradigmas morfológìcos' Passx-
se ao cxâme da sintaxe mais compÌexa. O ob jetrvo é tra-
^
dução corretz' p^t^ o idioma mâteÍno' Um dos métodos
Para e rnaioria dos cìocentes de latim da atualidacle, mais populares em LÌso nos Estados Unidos peltence a
porém, o obietivo do ensino de latim está clâro, c nàc'' se este grlrpo, o llTheelockl Latin (.1956[2000]). No Brasil, o
baseia naquilo que Fábio Fortes (2010, p' 64), retomando curso cle latim cle Paulo Rónai, cujos primeiros r'-olumes,
Alccu Dias Lima (1995), chama de "mito cla supraLíngua", Gradu.ç Pinas e Grrtdas Setundus (1954[2003]) ainda sãc;
a cÍenca instauracla não só efltre os alunos, mas erìtre os editaclos, também se fiLia a este tipo.
docentes de Letras, de que o latim está nâ grade cutricular
Como vimos, porém, apÌicado com o objetir-o de
para que os alunos "sa-ibam mais português", ou que "o
format leitores de latim, o método do tipo ÉÌramatical-
conhecimento do latim é a chave PÃrà ^ compreensão de
tradutório não parece atingir a meta satisfatoriamentc,
toclos os outÍos icliomas". Ao contrário, é o contato com
como obseÍt am vários docentes, entfe os cluais B. Dextet
a língua enquanto /íngua, ou seia, o contato com o texto,
Ho1,os, qlÌe escreveu, na tentâtivâ de sanar o problema da
com â [teratura, colTÌ o atcabouço cultr-rra1 que o larim
leitura deficiente do latim por parte dos alunos ensinados
repfesentâ que se põe como metâ do ensino de latim'
atrã\-és daquele métoc1o, Ittíìn: Haat Ío read ìt faenf! - a

r38 139
r
pruclical tranual, em 199i . Ora, se há nece ssidade de mate- complexo. A gramática é ensinada atrâvés do uso da lín-
riaìs de apoio pata desenvolvimento daquilo que deveria gua-alr.'o, eafala, a audição, aleitlrra c a cscrita são trcina,
ser o foco primeiro do método que se adota, isso parece das igualmente. C)utros ür'ros que se prendem a e ste gru
apontar parâ o fracasso do métoclo principaì. po sã<r o alemão Pìper.fa/ue (1998) c o Ìrritâr-rico Psettrlo/u.ç
Um outro tipo, suryido mais rccentcmente, a pettir: l{0.çíer (1 950[1 964]).
da metacle do sóculo r'ìnte, vcm responder a esta deman- Acriação de tais métodos gcroLr uma forte reacãr.r
da de discentes e doccntcs de língua latina de um métoclcr contrária junto àqueles que não viam a necessidade de tra-
que tir,esse a leitura como ftrco pnncipal. Nos métodos de zet c-t Tattm pâra as salas de aula modernas atrar..és do aban-
leitr-Lra, cujo título mais fãmoso é possir.-elmente o Readìng
dono dos textos cIássicos. Surgem aí as ctítjcas ferrenhas
Larìn (..1986'1, os alunos aptendem latim através da ìeitr-rra aos chamados modernizadores do laim, sob a alegação de
de textos preparados, que gradualmente passâm de frases que cleturpar.am a Língua clássica e afastar,zm o aiuno da
sìmples a trechos mais complexos. O desenvolvimento convir'ência com os modelos "reais", os únicos r.álidos. C)
da habilidade de leitura se dá atrar'és da construção de tempo gasto com técnicas do ensino de línguas modernas
expectatil.as gramaticâis - de fato, através da internaliza- parecia aos olhos dos detratores da inor,zção um despercü-
ção das estruturâs sintáticas - e de frases normaljzadas. cio inútil, e o latim criado pelos âLrtores dos livros didáticos
O foco ó a constução da habthdacle cie Ìeitura atrâvés era ruim e desnecessário. O argumento contrário, ofereci-
da lcitura extensiva. A gramática é importante, mas ela do pelos defensores dos métodos diretos eïe, no entânto,
é oferecida gradualmente a serviço cla leitura dos textos. bastante simpies. Nenhum aluno iniciante em inglês pode
Dcntto deste grupo incÌucm-sc também o Oxford Latin ou salre traduzit Shakespeare; nenhum aprencliz da língua
(oarse (198611 9961), o Cantbidge Laíìn Caurse (1 970
[2001]) espanhola é capaz de compreender Cervantes. Todos co-
c a sótie Ecce Ronanì (1971120041). meçam com textos s-imples, criados com objetir.os cüdáti-
Por r.olta da metade do século XX, o ensino de cos, e passam mais tarde à üteratura.
Jínguas clássicas cofiÌeçolr a sentìr, ainda que tardiamen Ossultados dessa Ìonga discussão, quc nào mt-rs-
re
tc, o influxo dos novos estudos linguísticos. Entte eles, tta sinais de ter chegado ao fim,é uma quantidade raz-oâ-
halia os que consìderavam que as novâs perspectivas da veÌ de posicioflâment()s intetmecliários, em que tcntatjr-a-
Linguística apLcadas já então com êxito no ensino de Lín- merÌte se incorporam a métodos tradicionais elementos
guas modernas deveriam também beneficiar o ensino de das norras tecnoÌogias, ou se mesclam igualmente os estu-
Jínguas cÌássicas. Isso fez com que surgissc cla parte de
dos gramaticais e tradutórios com algumas práticas atir-as.
clocentes de Ìíngua ladna o desejo de experimentar o mé
todo direto de ensìno de idiomas. Nele, o aluno aptende
Iatim em laíìnt, c:tt seja, sem interferência da Língr-ra mater-
Prátìcas ativas no ensino de latim
na. Estc tipo dc método, de grande sucesso no ensino cle
Línguas modernas, tem como ÍepÍesentânte mais famo-
so a sérje L.ingaa LaÍìua Per .\'e Ilhstrata (1991[2006]), cle
Hans Çlrberg. O método direto prerende-se um método Assim aÍgumenta \X/aldo Su'eet, conhecido por seu
de ìmersão, e seus proponentes defendem que o Ìatim rnétodo Afies Latinae (1988[1996]), em que defende o uso
cieve set entendido como uma língua, e não um código cxcÌusivo de trechos de latim ar-rtêntico, em artigo de 1967:
Âinda que o latim clássico exista, obviarnente, aPe- desem,olvimento da habilìdade da leitura, Ìhe contt

nas na forma escrita, o âÍgtxrÌento dos estrutuÍâ[stâs re ã rãntdgem de não ler qae exercìtar as denais habìJìdades

de que a Língua era um compoltâmento basicamente (o wì r, fa la r, e scre ue r). (O)tv eit a 2001, p. 5, gdfo no s so)

otal-autal sugeriu que o processo de aprendìzado se-


ria mais eficìente se os alunos lalassem e ouvissem o Como vimos, porém, metodologias que usam o
latim na sala de aula e se eles também pudessem pra latim como língua de âpÍendizâgem' e' portanto, fazem
ticat essas habiüdades com gravadotes, discos e frtas' com que o aluno não só leia, mas também fale, ouça e
(Ss.'eet 1967, P. 141) escfevâ em latim, estão novamente em uso em muitas
partes do mundo. Além de séries de ììvtos que usam o
Como vimos, as ptáticas atir,zs de uso dâ Língua, ou
método direto de aprendizado do idioma, já citados an-
teriormente, ihâainda âs práticas e métodos híbridos ou
seia, a composição escrita e oÍal em língua latina, remon-
mistos, que, apesar de seguirem em suas ünhas gerais o
tam ao ensino da época humanísdca, e foram grâdati\-a-
mente sendo abandonadas, com o declínio do uso do latrm
método gramaacal ou o método de leitura, agregam ele-
mentos de prática ativa às suas ativicìades'
falaào;nos séculos XIX e XX, de prestígio do método gra-
matical, como jâ mencionâmos, os exercícios de composi- Isto se dá de duas formas' Por um lado' materiais

ção em latim, ou quaiquer tentativa de produção


de latim didáticos que não se apoiam sobÍe o método direto vêm
poï parte dos aiunos foram consideÍados condenáveis e incluindo eírtre suas atividades propostas de escrita ou
prejudiciais, como podemos ver em trecho de Introdução à fala de latim. Dentre eles' um que vem gânhando am-
didátìca do latìm, de Ernesto Faria, publicado em 1959: pla acettação nos Estâdos Unidos é o I'rttìn for the new
millenìum, cujo primeiro volume foi lançado em 2008' o
segundo em 2009, e cuio terceiro volume está em fâse
Conqufilto nos tenhamos mostrâdo absoÌutamente
de preparaçào. Nesta série, além de exercícios reguìares e
contrários à composição latina, talr'ez cause mais sut-
frequentes de produção escritâ em latim, ao fim de cada
presa afltmarmos que a versão nos Parece ainda mais
capítulo há um diálogo, a ser reproduzido oralmente por
condenár'el do que aquela. Isto porque, se a prìmeìra professor e alunos. Por outro lado, ptofessores que usâm
tem o veredito conttádo da lingústica, a segunda não lir.ros didáticos âpoiados sobre outÍos métodos acres-
se justifrca â nosso ver nem sequer à 1uz da psicologia centam em sua ptâíc docente atividades de uso ativo
educacional. (trada 1959, P. 198) do latim em suâs aulas. Para auxiüar neste processo, vêm
sendo criados materiais de apoio, que não se pÍetendem
Mais modernamente, aprâíÇ^ativa do latim conti- o ür'to didático centrâl p^r*o desenr'-olvimento do curso
nuâ irÌcornum no Btasil. Nas palal'ras de A. Oür'eita: de língua latina em escolas ou universidades, mas que são
usados em parâlelo. DeÍrtre estes, ìlm dos mais populares
ê o Conuersational I'atìn for Oral Profciencl Q99612001]), de
Àcrescente se ainda a e sses motivos de ordem socio edição, e acompânhaclo
John Traupm ^n, iâ em sua quaïta
crrltural, um outto de ordem ptâttca: a especillcidade de dois CDs com gravâções, em pronúncia reconstituída'
clo ttabalho com as Línguas clássicas que, restrito ao dos diálogos imPressos no livro'

143
É importante obsenzr que cluando falamos em assim descreve os problemas enfrentados no ensino das

prátìcas atiuas no ensino de Ìatim, estâmos abarcando sob Línguas Clássicas (LC):

umâ mesmâ nomenclaturâ uma série de atir'idades bas-


tante difèrentes efltÍe si e ap1ìcadas sob diferentes forma- Além disso, esta concepçâo cìc lcjtura parece seÍ es

tos e em diferentes momentos do aptendizado da Língua pecialmente ptejudicial para o ensino de LCs, clerìclo
latina, tais como um diábgo sobre um tema do cotidiano, a reforçar seu carátet de línguas moÍtâs, pois reflete
a descriçào de uma Írgura, a natraçào de uma história ou uma rìsão não-comunicativa da natuteza da Ìrngua
a tradução da letra de uma música do português pâra o gem em clue a contrìbuìção dos patticipantes na cons
latim. O qlle une todas essas práticas é o fato de que o
trução do signìficado, o leitot e o escritor, no ato da
aprenüz é lel.ado a pr:duzir em ìíngua latina.
compteensão não é lerada em consìderação. Isso co-
Em algumas pattes do mundo, no que pesem a
labora para desenr-oÌver uma risão do ensino dessas
redução de carga horârta e os questionamentos acerca de Línguas como exemplilìcação de formas linguísticas a
sua utilidade, as pfáticas âti\-as nunca estiverâm totalmen- serem analisadas, mas desptor-idas dc se u vaÌor comu
te eusentes, como é o câso das classes de Latin l)rose Com- nicativo. [...] É portanto, a recuperação da natureza
posìtion na Inglaterra. Se ântes bem mais frequentes e co-
comunìcatir-a cla Jìn$ragem que, em úÌtima análìse,
muns, a composição de prosa or-r poesia em latim nunca
patece vitaÌ para o desenr.oìr'imento cìe uma peda-
abandonou comPletamente os currículos das instituições
gogìa mais adequacla pata o ensino cle compreensào
superiotes de maior prestígio' Era, porém, uma habilicla-
escrita em LCs. (N{oita Lopes 1996, pp. 152 153)
de espccífica, opcional, tesenrada a uns poucos diletantes,
e vista tah.,ez com um tanto de admiração pela drÍiculdade
De forma geral, o pensamento teórico sobte as
da tarefa e um tanto de desdém pela inutrliclade do ob-
práticas ativas em latim no Brasil parecem caminhâr em
jetivo. Às práticas ativas a que nos referimos são aplica-
direção à construção e aplicação de métodos mistos;
das clesde as primeiras aulas de língua latina, têm como
como exemplo, podemos citar, Giovanna Longo (2008)
púbüco-alvo pteferido o iniciante e não se restringem à
que, em slÌa proposta, desenha um método do tipo "Ìei-
composição de prosa e poesia litetários; pelo contrário,
tura"; isto é patente atra\'és da obsen'ação na proposta da
pâssam também por atir,idades que ent'oltrem aspectos
âutoïa das características deste tipo de métoclo, a sâber: o
orais, r'-isuais e auditivos.
objetivo de "proporcionar uma leitura efetir,a de seus tex-
No Brasil, o mesmo caminho de busca peÌas prá- tos" claramente definido; o âluflo entrâ em contato com
ticas atir-as vem serÌdo trilhado, e a curiosidade acerca de textos desde o início (no caso do attigo em questào, Lrm
propostas no ensino de língua latina dilerentes dos méto- trecho de Virgílio); gta:máúcz' é apresentada em função
^
dos gramatìcâis vem surgindo. A constatação das desvan- dcis textos; a pÍesença de normalizaÇão cle frases. A au-
agens do método tradicional e das dificuldarles enfrenta- tora acrescenta ao seu método, porém, uma prática ati\ra
das pelo ensino de ladm está pÍesente no pensâmento de dc uso da Língua latina, ainda que de forma mais tímida
dìr..ersos autores como os iá citadosLima (1995) e Fortes do que os métodos do tipo direto, ou mesmo em relação
(2010), n-ras também en'r Nüotti (200ó) c I'Ioita Lopes, que â outros mótodos mistos publicados nos últimos anos:

114 145
t-
ttadicicinal, com a permissào do editor, fbtam dattlo-
7. Puguúat. C)utto procedimento destinado a esdmu-
gtafadas palar.ra por paÌar.ra e ftase por frase, e mos-
lar a recotrência, a sìnru/ação da ata/ìdade, consiste nâ
tradas na tela. C)s alunos eram tÍeinâdos a responcler a
realiztçáo de cliáiogos mínimos' na iorma de pergun
Caesar como Césarfa7a/guma toisa, encÌLÌanto (.ae:aren
tàs e respostâs, a partrt de elementos Ìexicais tomados
stgnifrcava Á/gana nìsa acantece conz César. (Sr.i'eet 1967,
das próprias ftases normaLizadas' Para a elaboração
p. 146)
das perguntas são usados pÍonomes e advérbios tn

terrogatiYos. Uma das príncipais virtudes desse pto-


Como se pode peÍceber, Su'eet estava treinancÌo
ccdimento, que o fazem indispensár-eÌ ao método,
com os alunos habiüdades básicas necessáriâs para aler-
é ser feìto com elementos que Possuem o esrâtuto
tura do texto latino com fluidez; mas, païâ que essa com-
cle nome e, por isso, estão sujeitos ao fenômeno da
pïeensão viesse à mente com â ràPidez necessáriâ P^r^
declinação, tal como as classes de repertório aberto' ^
leitura corrida, seu método usavâ dâs respostas em voz
(I-ongo 20tJ8, P. 153)
alta a parttt de um estímuio visr-ral.

Não defendemos qlre todas as estrâtégiâs pensadas


Sem dúvida o obietivo f,nal dos cursos de latim
pàrz- o ensino de Línguas modetnas possâm set indistin-
é, e deve ser, o deserÌvolvimento das habilidades de 1ei-
tamente apücadas ao ensino de Línguas clássicas, e muito
tura. Afinal, o que se dese]a é a familiaridade com um
menos que o simples uso de recuÍsos modernos - r-isuais,
legado milenar que nos deixaram nossos antepassados'
auditil'os, compì-rtacionais - resolve o problema do inte-
No entanto, as habilidades de ouvir, lalzr e escrever dãc) tesse do aluno nas línguas clássicas. O uso de tecnologia
apoio umas às outras e ao obieti\-o finai da leitura' A1-
ou de qualquer estratégia deve ser baseado em prernissas
guns li\rros didáticos começam a utrlizàr um enfoque
pedagógicas só[das. Enttetanto, onde os métodos gra-
multifuncionz,Ipz;r^ o ensino do latim, e se preocupam
maticais falhar.am, os métodos que usam de práticas ati-
c^dà\tez mâis em prover o âluno de atividades vâÍiadas,
\ras pâÍecem estaÍ se saindo muito melhor. Os métodos
interativas e plenâs de signillcado em si mesmâs' Parece
com práticas ativas que não perdem de vista o objetivo
óbvio que neste âspecto o latim se beneficìa dos cstudos
da leitura e compreensão e nem se permitem descuidar
pedagógrcos voltados p^r^ o ensino de línguas estrân-
j'ncluiu de garantir um totâl domínio das estruturâs do idioma lo-
geiras. O mesmo \\laldo Su'eet, na década de 60,
grâm mantef as \rantâgens dos métodos grâmaticais com
em seu método o uso de figuras parâ ciue' a pardr delas,
a adíção de elementos clue podem fazer a diferença no es-
os âlunos produzissem perguntas e respostas' Porém, o
tabelecimento do latim como umâ disciphna interessante
uso do l'isual não se restringiâ às figutas' Desta forma
e ptàzefosà, e, consequentemente, contfibuif para retirar
Sll,eet descreve o uso de práticas ativas de latim com
o latim do exíLio da erudição desnecessária em que foi
base em mateÍial l.isual:
posto. Onde o enfoque gramatical frequentemente deixa
os alunos com a sensação de que o latim é um estranho
Para separar as frases latinas e levar o aluno a obset código a ser decifrâdo, que "latim não faz senddo" e que
\'âr os aspectos morfoiógicos, histótias de um texto "não ser\-e para nada", a prâtica atir.'a do latim cria stgni-

147
146
uso de práticas ativas em turmas iniciantes ou de ativi-
{ìcarlo. É neste campo de batalha que âs práticas atir''as
dacles multidisciplinares e de habilidades múltìplas, como
também surgem como armâ.
os ofetecidos por Gavlan Dubose, em scu Farra.qo L'rt/i-
Cotno constâtam proÈssores .1ue cxpcrimcnt'tm na (2001)? Como os professores poderr-r inccirporar aos
métodos ativos em suas salas de aula, falar em latim é pr()gramas de latim novas formas de ensino para que os
rliuetÍìda p^t^ maiotia dos alunos, e faz com que eles se
^ alunos se beneficiem de um aptendizaclo menos penoso,
sintam bem em usar um idioma tão diferente, tão cheicr mas não percam de r-ista a Ìeituta dos clássicos? A práuca
de vetustez e tradição. Por Íim, <l latim conversacional é docente bem pÌanejada e embasada em pteceitos teóricos
p/eno rle signzf cado Porque dá ao aluno uma sensação de
claros poderão nos ttazer as respostas pâra essas e olrtÍas
utrlidade imediata. Nesse sentido' Abbott e Davis (1996) perÉÌuntas que agota se põem e propiciat, a docentes e
sustefltam que é precisâmente através de métodos atuais discentes de língua latina, uma melhor vir.ência do ensino
de ensìno de idiomas que o latim pode parecer mais signi- e da aprendize.gern das línguas clássicas.
ficatil.o para os alunos e, portanto' ser melhor aprenclido'
As autorâs propõem que as habjlidacles de compreensão
aucÌitir.a, fala e escrita, mesmo no caso da língua latina, Re/eréncias bì b I ìográf ic as
propiciam um significatir-o desenvoh'-imento da capaci-
dade de comPreensão de textos.
Ou seja, e prâttca do latim ativc-r como c()mple ABBOTT, DAVIS, S. (2006). "Hyperrealitv and the
N'I. G. e
mentação ao estudo da estrutuÍa do idioma, e como Stud,v of I-atin: Lir-ing in a Fairy Tale \ïbrld." T/e
instrumentaltzação e preparação para a leìtura coÍrente Modern I-angaage Journal, r,-ol. 80, pp. 85-86. Acesso
vem curiosamente afinar-se com â própria máxima latina em: 20/n3/201| '

rJocere, de/eclare, mlrcr€: ensinar, cleleitar, mover' () apren- BAI-N{E,, }f. G. e N{OR\X/OOQ J. (1986[1996]). OxJord La
drzado de um idioma deve trazer mais prazer do que so- tin. Course.2^ ed. Oxford: Oxford Unìr.ersitr'.
frimento, uma \-ez que oferece ao ser humano uma porta CÀIRUS, H. F. (2005). "Ensinar grego (2)." Bltcos Online.
para a suâ expressão c comunicacão, sem no entânto âbrir CoÌuna l.etras CÌássicas. Disponír-eÌ em: http:/ /
mão da precisão e da completude do conhecimento' Cer- rr,-u'rvblocosonLine.com.bt f htentura f ptosa/colunis-
tamente um estudo aprofundado de molfologia e sinta- x f hc00 0.htm.
tas f hcar 1

xe é indispensár,el a alunos que iá tenham adquirido as CAN,IBRIDGE L,\-TIN COURSE (1970[20011). 4" ed.
noções básicas do idioma e que deseiem aprimorar seus Cambridge: Cambridge Universitt'.
conhecimentos, mâs especialmente os aìunos iniciantes
encontÍam caÃa vez maior dificuldade com um enfoque
DUBOSE, G. (2001). Farrago Latìna -Á Teacher Í\esaurce.
\Vauconda: BoÌchaz)- Carducci.
gramaticista que se âpresenta em profundo descompasscl
ECCE RON,{-\NI (1971[200q). 3'ed. Nova \brk: Prenrice
com â pedagogra de ensino de idiomas atual'
Hall.
Outros estudos, e principaimente um acon'lpanha-
FARIÀ, E. (i959). Ìntrodação à iìdátita do latin. Rio de Janei-
mento do desempenho desses materiais em sala de ar-rla,
ro: Âcadêmica.
serão certamente necessátios. Quais são os etèi'tos do
14q
148
da SBEC, Ourv Pret'o: 05 a 70 de Agosta de 20A/. Ouro
FORTES, F. S. (2010). 'A 'iíngua' e os textos: gramáuca e
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tradição no ensino de latim." Insíranento: Rerìsta de
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150
é3
{9.
Latim para quem? Comentários de
uma experiêncía no norte do Brasil

Carlos Renato Rosárìo de [uus

Introdução

Um mais do que opoÍtuno evento que reúne pro-


fessores de latim e, eventualmente, de grego, chegou a
sua terceira edição em201.2, na cidade de Niterói, encâm-
pado pela Universidade Federal Fluminense. O "Encon-
tro de Ptofessores de Latim",1 ocorrido, nos dois anos
anteriores, respectivarnerite, emJuiz de Fora (JtrJF) e em
Campinas (Jnicamp), agÍegou latinistas e helenistas, pro-
fessores e estudantes, de diversas partes do país e foi re-
presentado por quase todos os estados brasileiros, onde,
de uma forma ou de outta, o latim constituía disciplina
pÍesente na grade curricular dos cursos de Letras nas uni-

O registro da expedêncìa desses encontros está à disposição


no seguinte endereço eletrônico: https:/ /sites.google.com/
site/encontrodeprofessotesdelatim/.

153
\.ersidâcfes púbhcas (em sua maioria) ou particulâÍ desses
estados.
vivenciada pela maioria dos professores das univers_ida-
des que ainda mantêm a disciplina dc "Latim" nas suas -ll
grades curriculares rrinculada às licenciarures em Lctras.
Das calorosas discussões desse et'ento princ-ipaÌ
Nessa incursão, tentaremos apontar algr-rmas possír.eis ra-
mènte do segundo encolltïo, que contou com a Pïesen-
zões e caminhos pâra o cluadro apontado grancÌc parte
ça de mais de B0 parttcipantes - tesultaram importântes -
do qual esquadtinhado já no II Encontro de professorcs
constatações, diretrizes, propostas e. acima de tudo, a
de Latim -, partindo da exposição cla nossa experiência
configutação de um quadro nacional a respeito do ensi-
como professor de latjm no Estado do Amazc,nas, mais
no de latim na universidade. Sob vertentes distintas, mas
espccificamente nâ cidade cÌe i\{anaus, onde atuamos, há
igualmente significatir.as, procurou-s e tra.ç^r um painel da
aÌguns ânos, como professor. Muito do que cÌiremos cer-
situação da língua Ìatina, por um 1ado, nos lugares onde
tamente coinciditá com os própdos anseios e pÍeocupa_
existe habiLitação específi c p^r^ a formação do profissio-
ções compartilhados pelos professores de latim que atu
nal, ou que, pelo menos, haja um curso regular e cctntínuo
âm em situação semeÌhante em tantos outros lugares do
do latim (como é o caso da Unicamp); e, por outro, nos
Brasil. Por isso, patecer1. um texto escrito a muitas mãos,
lugares onde o latim se resume a poucos semestÍes (geral-
por pessoâs de Ìugares c circunstâncias diferentes, mas
mente dois) de ensino nos cursos de Lettas, r.ia de regra.
que compaÍtilham vestígios sintomáticos de uma única
Os debates entre os professotes e estudantes que conjuntura.
se enquadram nestâ últtma situação caminharam para
a constatação de uma reaLidade que relletia um cenário
muito comum. A quantidade exígua cle aulas, compacta-
Antes de tudo, alguns dìlemas
das em poucâs discipÌinas, nem sempre obrigatótias, em
grades voltadas pata a formação de professores de Língua
portuguesa ou de ìínguas estrângeirâs modernas, revelou
 cìiscipLina "Lài7m" não
é mais tratada como
â poucâ projeção do latim nâs universidades onde ainda
obrigatória pelo N{EC nos cursos de nír.el superior no
a disciplina sobrer-ir.e e a inviabi[dade de formar novos
Brastl há aÌguns anos, embor a atnda possâ ser encontrada
latinistas. Ou, sem a pretensão de ser otimìsta, relegava a
nos cuÍsos de graduação em Letras, por exemplo. I)esde
discipl,ina ao papel de instrumento auxiLar pâÍa â com-
a década de 60 não é mais ensinado no seguindo grau.
pteensão do português, haja vista a impossibiüdade de
Mesmo assim, nos grandes centros acadêmjcos do Bra_
fixat estruturas linguísticas sufrcientes a fim de propor-
siÌ, os Estudos Clássicos r-êm Ílorescendo cada vez mais,
cionar alguma autonomia ao estucÌante que queira aden-
graças às diversas pesquisas na ârea das línguas e litera_
ttar o unir.erso clássico.
turas clássicas (em latim, grcgo c, até mesmo, sânscrito).
Neste pequeno texto, cle cunho mais subjetivo do Particularmente no estado de São Par-rlo, taìs estuclos são
que rigorosamente acadêmico, longe da lntenção de deü- regulares e constantes e â procura por esses estudos vem
near com profundidaCe o panorama nacìonal, pretende- crescendo. Pror.a disso é que, um pouco mais recente_
mos discorrer brevemente sobre a realidade do ensino cle merìte, um exemplo positir-o l.eio da Unicamp, onde a
latim e da formaÇão do proÍissional de ìrnguas clássicas, a pÍocuÍâ pelos cursos de línguas clássicas aumentou rnais
parúr de uma realidade pessoal, mas também certamente

155
154
de 150% nos últimos 20 anos, de acordo com o Ìer-anta- so a pubÌicações da ârea e a uma inÍìnidade de textos
mento reaLizado por Fonseca (2008). Ou seja, qr-rando era originais tornou-se muito comum e facilitado. Djversas
de se esperar que o latim se esr.aísse de r.ez do mundo pubLicaçôes, muiras delas divulgadas recentemente, pere-

acadêmico, ele parecer ganhar mais força e cada r.'ez mais cem mostïâr o interesse que na sociedadc moderna se
as diversas áreas do conhecimento voltâm sua atençào tem despertacÌo para a ricluíssima cultura greco-romana c
suas incessantes conttibuições aos estudos humanístjcos
pãra o unir.erso antigo.
contempotâneos (para ficar nas questões mais evidentes)
Outro indícro da l'ivacidade dos Estudos C1ássicos
e à compreensão do unir-erso cultural que se manifesta
nos últimos anos é a proliferação de encontros, reuni-
no pfesente.
ões e congtessos culturais e científicos da área ou que
tematizem aspectos da Antiguldacle, ou, ainda, que con- Se esse cenário soa um tanto animador, há clue
se considetar, no entanto, que se trata de um fenômeno
tenham, entÍe seus grupos de trabalhos, equipes que se
bastânte restrit<t às unir,-ersidades do Sul/Sudcste, onde
debruçam sobre os Estudos Clássicos. As reuniões da So-
se concentram as maiores instituições de ensino superior
ciedade Brasileira cle llstudos Clássicos (SBEC) são um
bom exemplo. Organizadas a cada cÌois anos, em lugares do país, nas quais, via de regrâ, existe babiJìtação espe-
diferentes, congregam centenas cÌe estuclantes de todos cífica em latim ou algo equir-alente. Daí resulta que, em
os ní\'eis (da graduação ao Pós-doutorado) e de todas as grande parte do país, os Estudos Clássicos não têm espa_

regiões do Brasil, atraindo, inclusil'e, clezenas de congres- ço suficiente na Âcademia pàr:' garantir LÌma aulonomia
em tcrmos de pesquisa e ensino, muito menos as condi-
sistâs estïângeiros nos últimos anos, a1ém dos conferen-
cistas convidados. Os congÍessos da SBIIC são, portanto, ções mínimas para formar nor.os professores de 1atim.
uma janela pzr;- a vigorosa proclução intelectual brasilei-
 maioria dos professores que atuâm nas unir-ersidacles
mais distantes dos grandes centros ó obrigada a se des_
ra no âmbito dos Ìlstudos Clássicos e uma ptestigìr-rsl
Ìocar de sua scde para começar ou dar prosseguimento à
oportunidade de atrair nol.os talentos da graduação para
a formação na ârea.
sur preparaçào acaclernica.

De igual modo, outros encontros periódicos pro- São poucas as unir.ersidades que oferecem a for_
mação completa, desde a gtaduação, como, por exempÌo,
movidos por cliversas instituições de renomc (tais como
o Congresso da ÀNPOLL, os Seminários do Grupo cle UtrPB, UFPR, UFBÂ, Utrtr, UtrJF, UNIFË,SP, UÌ{ESP,
Estudos Linguísticos de São Paulo - GEL, as reuniões
UtrNfG, UF-RJ, UEry, USP. A LÌmcamp não tem habi-
litação em iatim, mas disponibiliza regularmente oiro
anuais da SBPC, as inúmeras 'Jotnadas" ou "Semanas
semestres de discipÌinas destinadas à formacão do alu_
de Estudos Clássicos", promor,-idas por diferentes uni-
no que quiser dar continuidade aos esrudos clássicos na
i ersidades ctc.) contam, com frequència. com parricipan-
Pós-Graduação que, no caso, recebe o suporte da grande
tes que âpresentam e debatem ttabalhos sobte o latim e
área de Lìnguística, no IEL. Dessas ìnstituições, âpenas a
sua cultura. Em suma, esse é um pânorama que parece
UNESP, UFI,IG, UFRJ, USP, UFPR e Unicamp possuem
bastante otimista, iá identificado pctt Zélta de Almeida
Programas de Pós-Gtaduacão que abarcamlinhas dc pes,
Cardoso há quase 20 anos (Catdoso 1994).
quisa voÌtadas pâra os Estuclos Clássicos, ou qLrc accitam
Além disso, é importante considerar que, hoje em
ptojetos na âtea,, em nír'el de Mestraclo e Doutorado. O
dia, com â crescerÌte populalizaçào da internet, o aces-

156 157
grande problema, nâ verdâde, Íeside no .lilema de lormar cÌomínio pleno da compreensão lìnguística dessas línguas.
profissionais fora dos grandes centros e também atrair Isso conduz a ouffo objedvo proposto p^t^ o ensino cle
os profissionais dos grandes ceflttos às regiões mais pe- latim, ainda segundo a pesquisadora: permitir ao estudan-
riféricas. te o âcesso à Ìeitura clos textos originais.

Além primeira empreitada a da carência Nem seria preciso nos alongarmos nesse ponto,
clessa -
de profissionais especializados em regiões periféricas -, pois apenas dois scmestres, em média, de declicação ao Ìa-
ainda resta estabelecer que objetivos de ensino se del'e ter tim não faculta a nenhum estucÌante as condições mínimas
em mente quando se está inserido em um contexto em paÍa que chegue à leitum ou tradução segura de um texto
que a Língua latina será ministtada em poucos semestres: originaÌ. Isso sem mencìonar toda uma necessária e profi-
com que suporte podemos ensinar latim em pouco tem- ciente discussão a respeito do que se entende por tradu,
po, r-inculaclos a ücenciaturas de línguas modernas? Em ção, os fundamentos epistemológicos a respeito de texto/
trabalho recente, Nlaranhão (2009) eÌenca algumas ques- autor, a noção de "Ìíngua", a contextualização cultural etc.

tões pertinentes â esse respeito. Em seu attigo, a pesqui- Com efeito, a ausência de um substrato teótico que
sadora examinou os objetivos do ensino da Jíngua latina possa cingir metodologicamente o ensino em r,-olta de um
geralmente propostos pelos Livros didátrcos disponír'eis e escopo mais coerente com os âvânços da Linguística sub-
pelas disposições do MEC. Assrm, em síntese, slrgere-se sidia alguns preconceitos nocivos ao ensino de latrm, à
que é pteciso sobrer,Ìr'ência da Jíngua no meio acacÌêmico e ao entendi-
mento da importância de se mantêla como objeto de en,
sino e estudo em qualquer nír-el. Segundo Fortes (2010),
proporcionar melhor compreensão cla língua pottu-
podetíamos resumir em três os principais preconccitr.,s
guesa, notaclamente o aptìmoramento clos conheci-
ou equívocos que caracterizam uma abordagem tradicio_
mentos de anáLise sintática, possibìlitado peÌa marca
naÌ no ensino dc latim: a) o mito da "supralíngua',, que
sufiral do caso, que evidencia a função sintátlca clos sustenta a nocão de que o latim constitui a chavc para
vocábulos latinos na sentenca, e de vocal'uÌário, v;sto ^
compreensão de muitas outras línguas, inclusive o poÍtu-
que constitui o latim a principal fonte dc, léxìco pot guês; or-r, no caminho inverso, que o restringe a um ador-
tuguês. (l.{aranhão 2009, p. 29) no intelectuaÌ, saudosista, que nada interfere na forma-
ção do profissional de Letras; b) o conceito de língua em
No entanto, â professofa destaca ql-Ìe, se o intento questão, que suprime, na pedagogia latina tradicional, a
é fixar parâmetros de anáLise sintática, então poder-se-ia variedade ünguística, os subsffatos regionais, sociais, esti-
utüzar como matéria outras Línguas mcrdernas que tâm- Jísticos, em favorecimento do estigma de',Iíngua clássica"

bém se expressem pelo sistema de cascls, como o aiemão ou "língua morte"; c) a prâtica pedagógica em si, que,
e o russo, com â \'antagem de que, flesses idi rmas, exis- fiequentemente, tropeça numa espécie de "espelhamento
te â possibilidade de contato real com falantes natir-os, às a\-essas" para expJicar fenômenos idiossincráticos e re_

maior acesso a textos, informações culturais e material corre à gramática tradicional hodicrna, utilizando tcrmos
de aprendizagem. Nas Jínguas clássicas, o estudante fica gramaticais inapropriados, parâ desìgnar ocorrências es_
restÍito à habilidacle de leitura, o que obsta ainda mais o pecíficas da língua latina.

158
ï
Por hm, contradições e tentaril-as existem; assim Ao que parece, lrm problema clurc já cra sentido
como avanços e dessetviços se altetna'm num cenáritr na regìão chegou ao [mite: fãlta de professorcs cpralifica-
que, feìizmcntc, começa a distinguir com ciateza, um dos, com fotmação especíÍtca na âtea. Por mtrit, r lc1tt1'tt r'
contínuo e, muitas vezes, isolâdo empenho de criar uma quem ensinar'.a latim eram alunos graduados en-r l,ctras
nova atmosfera parz- os estudos clássicos no Rrasil' Nas ach.indos da UFÂN'I, que, poÍ iniciatira própria, clcdica
páginas seguintes, falaremos um pouco dos pontos altos \ram-se um pouco mais ao idioma, mâs que não recebiam

e baixos dessa gangorra acadêmica em que o latim insiste nenhuma formação a mais ou /a/o Je/lJ/,/ P^fa isso, con-
em erguer-se pâÍa um novo fô1ego nâs terras do Norte' tânclo âpenâs com as disciplinas rcguìares de latim rece
biclas e com uma generosâ close de boa vontade' Para se
ter uma ideia, nos últimos r''inte anos (para ficat nurna
mafgem segufa, embora a situação se mostfe a mesma
Rurros do Norte: relato do quadro atual
há muito mais tempo), hou\.e âpenas um clÌÍso de pós-
gracÌuação lato sensu em "I-íngua e Literatuta Latina", de
2004 a 2005, na UFAN{, que formou cerca de 10 alunos.
O Âmazonas possui, de acordo com o Censo
Desses, quase nenhum atua nas ìnstituições que olerecem
2010, 3,5 milhões de habitantes' concentrados, em sua
latrm. A univetsidade federaÌ, a[ás, é a única, atualmente,
maiotia, na capital clo Estado, N{anaus' A cidade também
que concentra mítor quantidade de disciplinas obrigató-
abriga cerca de 20 insutuições de ensino superior, sendo
tias de latim na grade de Letras; são três disciplinas c1e
apenas duas púbhcas (UFANI - Universidade Federal clo
latim e mais uma de literatura latina. E a única qr'Ìe con-
Àmazonas e UF,A LÌnir-ersiclade do Estado do Amazo-
- ta, ainda, com dois professores cioutores na âtea, ambos,
nas), das quais apenas cinco oferecem licenciaturas t:m
evidentemente, formados fora do Estado (um deles, fora
Letras, nenhuma com habi[tação em latrm' f) quadro é
do país, pois de origem portuguesa).
im,ariar.elmente o mesmo de sempre. i\lgumas institui-
ções particulares2 reduzem o ensincl
ao mínimo necessá- Do mesmo modo, o curso de I-etras da UEA
rio: a UNIP tem apenas uma disciplìna de ìatim na grade, tambem pter'ê discipünas obrigatórias de latim (duas de
"Língua e cultura latìnas", assim como a UNINORTE, Língua e mais uma de literatura) na gracìe curticular- No
que mantém na grade "Língua I'at)na", de 40 horas, ape- entanto, como â unil'ersidade possui diversos cantfì no
nâs nâ habilitação em ìíngua portuguesâ' As demais habi- interior do Estado, muitos dos professores de ìatim fora
Litaçòes, em espanhol e em inglês, não preveem latim' Já da capital não têm formação específica ou cuÍsos de pós-

a E,SBANI não dispõe de nenhuma discrpüna de latim na graduação na ârea. Em N{anaus, há apenas um ptolessot
sua grade. Intetessante notar que' há pouco mais de sete de latim com I'[estrado na ârea.
ânos, essas mesmas instituições mantinham pelo menos A verdade é que, embo:l:'hala certa resistência do
duas discipìinas de ìíngua latina, algumas' inclusirre, com Latim nas universidades públicas no Estaclo do Amazcl
uma terceira clisciplina de Liter:atura latina' nas, o pdncipal problema que elas enfrentam, a falta de
material humano, logo poderá tornar-se perigo5211361"
decisivo para que aconteça o mesmo que YeÍÌ1 âcontecen-
Todas as informeções a respeito cla gradc curticuÌar rlessas clo nas unir.ersidacles particulares, a gradatila sr-rpressào
universiclades iotam reitadas do sìte cÌas lnesmes

160 161

J
do latim de suas matrizes curr.iculares. Trata-se, de fato, ou buscat formação fora do Esrado, embora, há algum
de um ptoblema bastante antigo que tende a piorar' Até tempo, tenha havido um exponencial incentivo, por meio
a década de 90, a UFAN{ eta a intca a ofetecer [cencia- da ofetta de bolsas de estudo, à saída de estudantes e pro-
tura em LetÍas no Estado e, na ocasião, iâhavia falta de fessores para outras instituições do país, a fim de buscar
docentes pós-graduados na ârea. O ctescimento da cida- a formacão condizente.
de na década seguinte ocasionou o sutgimento de novas Não obstante, a despeito desse tímido, mas signi-
Faculdadcs e novos cursos, que seguiram mais ou menos ficatil'o avanço, o ensino de latim no Arnazonas enfrenta
de perto o modelo cuÍricular da UFANI (o que explica um problema que certamente está presente em muitos
â pÍeseflça, num primeiro momento da obrigatotiedade outros lugares: a carència de material didático de ensi-
do latim nos cursos de Letras dessas faculdades), mas no de latim escrito em português. Infelizmente, os livros
que, posteriormente, como l,-imos, esbarrou na falta de didáticos mais comuns - e, nâ verdade, pradcamente os
proÍissionais especiaiizados. O problema não é apenas únicos - de se encontrâr nas livrarias de Manaus são, no
resultado do fato de Manaus locaüzar-se distante das uni- mínimo, inefr,cazes. Durante muito tempo, pÍestava-se a
versidades que poderiam receber os alunos interessados um verdadeiro desserviço ao latim, quando se ensinava
em aperfeiçoar-se nâ âtea. A dtficuldade de locomoção tendo como referência livros excessivamente gramatìcais
- possível apenas por via aêrea -, as diferenças culturais ou, então, manuais elaborados em meados do século XX
e, por muito tempo, a lalta de apoio fi.nanceito do Esta- pata o ensino de latim para crianças, métodos, em suma,
do foram determinantes pâÍa emperrar uma dinâmica de francamente desatualizados. Isso quando não se restrin,
acesso à pós-graduação pelos professores das unfi'etsi- gia o ensino ao método gr^mâtrc^-tradução (normalmen-
dades do Âmazonas. Desse modo, distante dos grandes te de frases criadas), em que a Gram,ítìca Latìaa, de Napo-
cerìtïos universitários do país, o Amazonas demorou a leão Mendes de Almeida (1942L2011]) teinava absoluta.
buscar alternatir''as p^r^ o problema - não só do latim, Em muitos casos, o próprio professor tinha que elabo-
mas de muitas outras áreas de conhecimento - e ainda ïar seu método de ensino e, dada a exiguidade do curso,
enfrentar,z outro, tão gra\-e quanto o pr-imeiro: a falta de comprimir o máximo de elementos da língua em pou-
m^terier\ didático adequado, problema' aLiás, presente até cas aulas. É forço.o dizer que essa prática ainda persiste,
hoje, em toclo o país. Sair do Estado para buscar forma- embora alternativas mais r.iáveis entrem em pauta, pois,
ção e mateÍial sempre foi um fator isolado e excepcional' após r'ários anos de umaprâttca improfícua, aos poucos
No entanto, houve grande crescimento de cursos de pós- a busca por novos horizontes começâ a firmar-se, ainda
gtaduação sticto sensu, em dir-etsas áreas de conhecimen- timidamente, mâs com propriedade.
to, inclusive em Lettas, tanto nâ UFÀ\{ quanto na UEA,
mas ainda não há nenhuma linha de pesquisa em clássi
cas, não só der.ido à falta de doutotes na ârea, mas princi-
Concluindo
palmente porque as unir.'ersidades carecem de melhor in-
fraesttutura, com âcervo adequado e atuaüzado' Por isso,
qualquer estudante interessado em iniciar-se nos estudos
Em conformidade com colegas de tantos outros
clássicos ainda precisa t'aler-se de seu interesse pessoal
lugares do país, temos a consciência da necessidade de
âsslrmir novâs posturâs diante da ptoblemática por que Referénclas b ìb Ii ogr áf i cas
passâ o latim nas unir.-ersidades sem habilitação específica.
Os pontos discutidos nos Encontros de Professores de
Latim em conjunto com coÌegas professores em situação
ALN'IEIDA, N. NI. de (1942P0111). Gramátìca I-ntìna.30. ed.
semelhante âpontaram para algumas postuÍas que pode-
São Paulo: Saraiva.
rão senrir de "nofte" pata à sobrertivência dos estudos
clássicos em rìossas universídacles. Em primeito lugar, é CÂRDOSO, Z. A. (1994). "Letras Clássicas". Estudos Auan-
preciso desmitificar a ideia de que o latim seriâ apenas . çados, vol. 8, n. 22. São Paulo: USP. DisponíveÌ em:
um "instrumento" de acesso aos conteúdos gtamalicais h ttp : / /s'u'w-. s cielo. br / s cieto.p hp ? scrip t = s ci_ar r-
da Língua Portuguesa. O latim deve ter sua identidade e text&picl=S0103-40141994000300049. Âcesso em:
âutonomiâ, sendo ensinadaper.td, como um sistema lin- mal/2012.
guístico igual a qualquer outÍo, em que pese apenas o fato N[,\RÂNHÃq S. NÍ. (2011). "Reflexões sobre o ensino de
de seu conhecimento ser franqueado pela habilrciade de Língua Latina em cursos superiotes de Letras Mo-
Ieituraf tradttção. Sem uma mudança de postura do pto- dernas." Instrumenío: Reaìsta de Estuda e Pesqaìsa em
fessor de latim, pouca coisa mudará substancialmcnte. Edacação,vol. 13, n" 2.Juiz de Fora: tJFJtr,pp.27-36.
Em segundo \ugar, a formação complementaÍ ao CONSELHO NÂCTONAL DE EDUCÂÇÀO/CON_
aluno de graduaçào que se interessar cm prosseguir nos SELHO DE ENSINO SUPERIOR (2001). Parecer
estudos clássicos sem sair de Nlanaus, pode ser facultada
Diretrizes curriculates nacionais dos cur-
492 / 200/ .
atrâvés de diversos mecanismos, como cuÍsos de exten-
sos de Fi1osofia, História, Serl'iço Social, Comuni-
são, disciplìnas optativas e bolsas de rniciação científica
cação SociaÌ, Ciências Sociais, Lettas, Bibüotecono-
que, no Amazonas, feüzmente, não são taras, 1â que ofe-
mia, Âtquir-ologia e Nluseologia. Relatores: Eunice
recidas pela fundação estadual de fomento à pesquisa
Ribeiro Durham, Silke Sfleber e ViÌma de Mendonça
(FÂPEAND, agência que foi criadahâ pouco mais de 10
Figueiredo. Brasília: Diário Oficial da Repúbüca Fe-
anos rÌo Esta,ì.r e que possui dit ersos programas de in-
derativa do Brasil, 09 / 07 / 2001 , seção 1 e, p. 50.
centivo a pesqúsadotes do Estado. Inclusive um progrâ-
ma de bolsas paÍa cursos de pós-graduação strìcto sewa em FONSECÂ, T. (2008). "Â tessurreição do latim." Disponí-
ourros Esrados. ÀÌgo basranre tempesrìr'o. pc,is o incentj- ve1 em : http: / / p.php.uol. com.br/ tropico /html/ tex-
\ro e complementacão dos estudos de Ìatim na graduação tosf 2765,1.sh1. Acesso em: jun/201.2.
seriam r.ãos sem a perspectiva do estudante de garantir FORTES, F. S. (2010). "Â "língua" e os textos: gtamâúca
seu aperfeiçoamento na pós-graduação. Por isso a neces- e tradição no ensìno de Ìatim." Insíramento: ReaìÍa de
sidade de criar uma [nha de pesquisa em estudos cìássi- Estado e Pesquisa em Edacaçã0, r'o1. 12, n" 1. Juiz de
cos nos programas cle pós-graduação existentes, rÌo câso, Fora: UFJF, pp.64-70.
na UEÂ. São planos futuros.Já houve no Amazonas mais
quantidade que qual-idade. Hoje, dentro da política de ca-
pacitação e quaJif,cação de seu quadro docente, a UEA
coloca no horizonte um cenário bastante promlssor para
os estudos clássicos no Estado. ValeaA
{&
As línguas clássicas no Ensíno
Fundamental: considerações a
partir de uma experíência recente

Alessandro Ro/ìm de Moura


Re n ata S en n a G ar raffò nì

Introdução

Este breve ensaio procura costurar algumas ideias


surgidas do projeto de extensão universitária "Grécia e
Roma na Escola'", realtzado de maio de 2009 a agosto de
2011, sob os auspícios da Universidade Federal do Pa-
ranâ, no espaço de ttês escolas de Curitiba.' O projeto

E aqui o momento de registrat o papeÌ determinante que


tiveram diversas pessoas e institúções no planejamento e
concretização das atìvidades. Contamos com a participaçào
dos estudantes de graduação Ingrìd Cristlni l{roich Frandji,
Tairon \ïl-i Neves da Silr.a, Thiago F,r,-aÌdo Rosa e \-inicius
Rochembacl-r Campos (que receberam a chamada boÌsa per
manência da UtrPR), bem como de Andréìa Rosin Caprino,
Denise Ribeìro Kuntz, Natascha Eggers e Rodrigo Francisco
Barbosa (que teceberam da mesma unir-ersidade bolsas cÌe ex,
tensão). A todos, muìto obrigado/a. LÌm agracìecimenro espe

167
ï
foi de nl:úrezã multtdiscipJinar, tendo trabalhado com ObjetÌvos e origem do projeto: prìncípios básìcos
diversos assuntos no interior das duas grandes áreas de
Letras e História. Desempenhâvâ um papel significat-ivcr
no projeto um conjunto de atir..idadcs com as línguas gre- O projeto r,{sava à realização, no cspaço das esco-
ga e latina. Passaremos â umâ exposição sobre o caráter e las, de atÌvidades extrâcurriculares relacionacÌas à história
a orgamzação do projeto, pârâ, em seguida, telatar alguns e à cultura (especialmente língua e Ìiteratura) das civiLi-
tesultados e âpresentâï algumas conclusões que, no nos- zacões grega e Íomana antigas. Todas as atividades, clue
so entendimento, têm vaÌor mais geral. chamamos "oficinâs" e estâvâm organizadas segundo os
Não se trata, portanto, de uma teÍìexão excÌusirta eixos temáticos descr-itos mais adiante (em "N{etodolo-
sobte o ensino do latim, mas sobte uma fotma de ensi- gia"), tinharn, em geraÌ, tÍês momentos distintos: (a) uma
naÍ em que o latim, conjugado ao gïeg() e aos estuclos exposição diaiogada que contavâ, quândo necessário,
literáric-rs e históricos, ocupa uma posição -importante. com o apoio de imagens, r-ídeos e arquir-os de som; (b)
Optamos poï essâ perspectiva pedagógica por compar- um momento dedicado â uma atividade (drama-
^rtístlc
tilharmos de uma postllrâ teórica e prâttca que valoriza tizações, contação de estórias etc.); (c) um momento de
o diálogo entre diferentes campos dos Estuclos Clássicos práticas reahzadas pelos alunos (ptodução de textos, de-
pata expandir a compteensão do munclo grego e roma senhos, pinturas, encenações, jogos etc.).
no. Ora, a finaliclade da experiência pedagógica era da4 Os partrcipantes forâm peqlrenos gÍupos de alu-
tanto às crianças quânto aos unir-ersitários que ttabalha- nos das escolas (1 públ-ica e 2 privadas), todos do.Ensincr
Íam no ptojeto, meios de desenl.olvet uma r-isão crítica FundamentaÌ, a maioria das (ainda então chamadas) 5'
cla história. Entrc esses meicrs, a experiência del'ia ressal- e 6u séries.2 A intenção era cfi^r um espaco cle contato
tar a impottância do conhccimento de Jínguas para nos entre â UFPR e alunos e professores das escolas, com o
aproximarmos de cultutas cìe outro tempo e espaço. Foi intuito de divulgat o trabalho da universidade nas áreas
por essâs razões que trabalhamos com uma petspectir-a de História Antiga e Letras Clássicas, tÍocaÍ experiencias.
multidisciplinat, pois entendemos que é num espaço de coletar dados para pesquisa e ajudar a melhoÍâr a quaLida-
diákrgo como esse que o ensino da Língua latina tende a de do ensino na escola e na UFPR. Nem todas as coisas
dar mais frutos. ocorfefam, e clatct, conforme o planejado, e tivemos que
lazet vârtas aclaptações ao longo do caminho.
Começamos a desenr.-oÌr-er o ptojeto em maio cÌe
cial destina se à adn-rinistração e à ccluìpe de coordenadores e
2009, sob a forma de projeto vinculado ao programa de
profcssotcs da Escola Estadual Ernani Vidal, da EscoÌa Israe-
lita Brasileira SaLomão Guelmann e do Cológio Nor-o Arener:, bolsas-permanência da Pró-Reitoria de Assuntos Estu-
que aco)lrerat-r o projcto com entusiasmo. Nossa maior gratr dantis da LTFPR. O início aos trabâlhos restringìu-se a
dão metecem também as pessoâs clue participaram do projet,
'
de maneira totalmente voluntária, frequentemente assumindo
qrancles responsabìlidades e câÍ!Ìas de trab:rÌho: âs âffìzes-pro- Particìpatam das oÊcìnas 32 ctianças na Escola Ernani \ri-
fèssoras Anclressa l.Iecleiros e Patrícia Reis Brega, a graduanda dai, 8 na IsraeLita e 30 no Nor.o Ate neu, totalizando portânto
em I-ettas llar.ia Fróes da N'Iotta Budant, os pós qtaduandos 70 estudantes. Nas duas escolas privadas (a saber, Israelita e
cm História I-olena Pantaleão cla Silva e À'laieus B,-rffone e o Novo Àteneu), as professoras responsáveis peÌos horários ce-
protessor (ìuilhenne Gontijo Flores.
I

didos assistirarn aos rabaÌhos. Ì

168 169
t-
leituras, preparação de materiais e teuniões de planeja- da Pró-Reitoda de Extensão e Cultura da UFPR, o qual
mento, com a particìpação do coordenador, Âlcssandro seria concretizado um pouco dep<-ris com bolsas de ex-
Rol,im de N,{oura, e dois acadêmicos do cutso de Histó- tensão para outtos estudantes. O ptojeto amadurecia aos
ria, Thiago Er,zÌdo Rosa e lngrid Cristini l{roich Frandji. poucos.
Em seguida incorpotou-se ao projeto a professora Re- Antes que se iniciassem âs oficinâs, as visitas a e s-
nata Senna Ganaffoni, na função de r-ice-coordenadora. colas, consultas à bibliografia especialtzada e a experiên-
\'árias dcssas reuniòes iniciais cr ìnlaïam com a parricipa- cia, por parte dos professores da UFPR envohridos, nâ
ção voluntária de duas atrizes profissionais de Curìtiba, docência das discipünas de História Anttga e de l-itera-
Patrícia Reis Braga e Andressa l{edeiros.3 Como ambas turas e Línguas Clássicas em cursos cle ÌicenciatuÍa, nos
tr^zlàm também uma experiência reier,znte com arte-e- permitiram desenhar o perfi1 da formação que âs escolas
ducação, considetamos a possibiJidade de contar com â brasileitas proporcionam nessâs áteas. A1ém disso, algu-
partrcipação mais constante, devidamente remunerada, mâ experiência antetior de docência no Ensino N'Iédio,
de pelo menos uma deÌas. Ìsso se revelou, ccintudo, muito a consulta aos materiais drdátrcos de história, língua e li-
clificil, cieviclo a obstáculos incontornáveis na burocracia teratura do Ensino Fundamental e NIédro, bem como à
da própria unir-etsidade.a descrição dos conteúdos e habthclades objetivadas pelos
() contato com as escolas não foi fácil.
Inicial- Parâmetros Cutriculares Nacionais clo Nlinistério da Edu-
mente planejáramos trabalhar exclusivamente com esco- cação, especialmentc (mas não cxclusivamente) no que se

las pírbücas, um purismo de que depois clesistjmos para refere às matérias de Hrstória e Língua Portuguesa, nos
r.iabilizar uma expansão da experiência.s \{as felizmente ler-aram à conclusão de que as culturas cla Ântrguidade
obtiveram sucesso as negociações com a Escola EstaduaÌ cÌássica, n^ m^rof1z- dos casos, são estudadas de maneira

Ernani Vidal, onde teríamos nossa primeira e mais com- insufi ciente ou questionável.
pleta série de oficinas àpa.rtlr do primeiro semestte letir-o Traço comum a muitos desses pïocedimentos es-
de 2010. Nesse momento, já contá\-amos com o respaldcr colâres é a superficialidacÌe: a cultura clássica aparece (seja
como mocìelo de civilizaçào, seja como esrágio primìtiio
"felizmente" superaclo) Íiltrada poÍ um discurso profes-
Duas integrantes da Companhra lljarÌaHomero, sobre a quaÌ soral que a trata com() refeïência a seÍ l'ista de passagem
\.er http: / /ìÌiadahomero.rvordpÍess. com.
e esquematicâmerite (uma nota cle rodapé sobre os mo-
Registre-se agü, sem entrâr cm detalhes tediosos, que é prati
câmente impossíveÌ encontíaf rneios legaìs paÍa contÍatar um delos ciássicos da ììterâtuta btasileira do sécuÌo XVIII,
ârtistâ parâ um projeto de extensão na UFPR. Os objedr",s nomes de autores que nLrnca se 1ê, nomes de instituições
cuÌturais da universiclade, sugeridos pela própria existência de
atenienses que são memorizados, mas que permanccem
rrma Ptó Reitoria de Extensão e Cultura, são extremamente
prejudicados por barreitas administrativas crìadas peÌa pró
incompreendidos), e quâse nunca atrar.'és dos priiprios
pria instìtuição. documentos que os entigos nos legâram.6 Note se, de
A princípio o proieto estâ\,a âberto a oferecer oficinas tanto
para o Ensino Fundamental qlÌânto para o Módio, com as
devrdas adaptações. \a prática, conseguimos oportunidades
6. Para uma probÌematìzação dessas questôes, tentâdvâs de um
àpenâs no -Ensìno Fundamental, mas acredìtamris que um tía-
balho semelhante pode ser feito com estudantes do Lnsrnrr diálogo com profèssores e propostas de materìai-s rlidáticos,
mesmo que em pequena escala, cf., pot exempìo, Furnri e
i\{édio.

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170
passaÉlem, que o leitor terá uma grande dificuldade para Todos os participântes do prcijeto ingressarâm na
escola depois de 1961, quânclo passou e vigorâr a l-ei de
encontrar teferências às línguas latina e grega nos progrâ-
mas de ensino e materiais cÌidáticos.7
Direttizes e Bases da liducação que âbriu espaço parâ
a eliminação do estudo do latim (c do grego) cÌa esco-
la brasileira. É, d. ..rt^ forma, espântoso constatâr cluc,
Garraffoni (200'1) e Garraffcrni e Funarì (2010). de discrplina obrigatória àïé 1960, no espaco cle alguns
()s ParâtzteÍra: Ctrintlare: Naaonai: P.nsìno À,[édio), parte ]I: Ììn-
poucos anos, o latim torna-se assunto completamefite ex-
.qtagens, cridì.go.r t suas letnologìas (2000) mencionam o latim e o
grego à p. 25 apenas pâÍa e\rocâÍ, na seçào sobre o ensino cluído da vida escolar brasileita, praticâmente sem deixar
de Línguas estrangeiras, uma época em que "valorizouse [...] trâcos. Os motir.os pedagógicos, políticos e ideológicos
o [...] acesso à Ìiteratura cÌássica". Na sr:ção sobre o cnsino pâre. Í^I eìiminação tão radical, bem como a hìstória de
das artcs, o texto preoclÌpa-se em observat que "fdlerivada
como isso se deu n^ prâtica, ajnda estão por estudâï com
do grego, a paÌar.ra 'estética' significa 'sentjr"'. Na introdução
r'procuroll construiÍ maior profundiclacle.B
geraÌ, à p. 8, diz se que a filosofia gÍegâ
teorias expücatir.as sobre as linguagens que hoje ainda sãc.r Como resposta a esse estado de coisas, um princí-
consideradas como paradigmas". Em seguida, r'ra p. 9, afirma-
sc: "Na escola, a transposição clidática desses estudos pode
pio básico seguido em nossas oficinas era trabalhar com
relletir o consen'adorismo de determinados pontos cle rrste
clue nada possuem de teóricos e são funclados no senso co-
mum". Para auxjliar no "confronto de opiniões e pontos de
8. Uma histriria do declínio clo latim no Ocìdente é contacla em
r.ista fundamentados", a educação deve voÌtat se para a "hc-
\{hqLret (2001). trm contÍaste, obsene se o relato de Tìjsse
rança clo agora" (!bid.). r\ seção sobte o snsino de português
ling (2006), para a Holanda, e o de Glúcklich (2006b), para
não menciona o grego nem o latim. Já no clocumento PCN
a ,\1emanha, p:ríses em que o ensiro clo latim e do grego,
Ensìno f,[ídìo l, oienlacões contp/enentares aas Parânúros Ctrrìrtt-
mesmo tendo softido ttansfotmações considerár-eis, man
lare.r Nacianaìs (/ìnguagns, údiqo.r e saas Íecuo.ÌogÌas), disponível, as-
têm uma posição firme nos cutrículos. O Rahnenkhrp/an fir
sim como o documento antetiot, no potral do N{EC (http:/ /
die g,nnasìale Ohrr:tafe, La.nìn, púJiceção oficjal do Senatsr-e-
portal.mec.govrbr), a única referência ao latim e âo gíego vem
n'aÌtung füLr Bilclung, Jugend und Sport de Betün (2006), clue
também na parte declicada ao ensìno de línguas estrângefuâs
pocÌe ser encontrado em http://db.Ì<mk.org/lehrplanf , apte-
modetnas @. 119): "é pteciso clue o aluno se lamiÌiarize com
sentâ âs justificativas clo ensino clo latim nos GJ,trnasìet e esco-
os processos cle dedr.ação por prefixação e sufixação [...], o
las analogas dessa região, além de cxpoÍ poÍmenodzaclamente
quc faciljta a compreensão por meio da exploração de cogna
os conteúdos â setem ministrados e âs competências que se
tos ou das chamadas 'palavras tÍenspârentes', isto ó, aquelas
pretende que os estudantes adquiram. C) retrato é de lazer
de cirigem grega ou latrna, ciue se assemelham ao lp]ottu
inveja mesmo às nossas unir.ersldades. Notícias sobre uma
gr-rês". Â seção sobre artes mencìona tâpidamente a tragédìa
recuperação do espaço dos Estudos Clássicos na educecào
grega (p. 185), sugetindo un'ra possível comparação com uma
em d-iversos países às vezes emergenl em textos acadêmic,rs
ttagédia atual. E rnuito pouco. Em outro texto ofrcia1 (drspo
e na imprensa (e.g. N{aurizìo 2008, Bo,vé 2009), n'ras ainda se
níveÌ para dau,nload no mesmo sítio), intitulado Parámeíros Cu-
espere um trabalho que demonstre cí)m reg.istros sìgnìficati
ica/arts Nadanaìs:7'trtu'o e Ouaúa Cìr\o: dt Ensino Fundantenta/:
vos cÌue isso ó uma tendêncìa geral e profunda o bastante pata
Língn Pr'ftugtesa (1998), sah-o enganoJ é ainda mais inftuúfera
rer imp;ct,, eleÜro nr educaçju cle h,rt.. É cìrru qtrc r.ì,, r.
a busca por qualquer sugestão c1e trabalho com a história da
espeÍa que os Lstuclos Clássicos r-oltem a oclÌpil umâ pr ìsjçào
língua que envoh'a conhecimentos de latim. Na nossa maneira
semeihante à que tinham, pc)í exemplo, na eclucacão inglesa
de ver as coisas. isso podena set m,-rìto útrl no estudo da r-aria
no ÍìnaÌ do sécuÌo XIX, quanclo detinham o monopiillo das
ção linguística, tão ralorlzado pelo documento. O ensino de atiüdades escolares, em detrimento clas ciências e até mcsmcr
portuguès atual eniatiza a vadação sincrônica, nias a telaciona
do ensino clo vernáculo. N{as certo progressci ó rÌln fìlturc)
apenas ìmperfeitamente com a r-ariecão diacrômca, embora as
possír'eÌ.
duas estejam fortemente reÌacioradas.
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172
r
aAntiguidade âtrâvés dos textos e obietos que ela próprta 1960) das discìpJinas de Língua Grega e Latìna (e, por
produziu, e não apenas atÍâvés de livros didátrcos escritos consequência, dos conteúdos Ligados à literatura desses
nos dias de hoje. Procurár.-amos dar grande ênfase à leitu- por.-os) das escolas brasileiras criou uma lacuna muito
ra de passagens de tertos cÌássicos ou de pequenos textos grande e deixou os poucos conteúclos afins aìnda existen-
na íntegra e à análise de reproduções de artefâtos antrgos. tes desptor.idos de maiores chances cÌe aprofunclalrìerÌto,
Uma ideia importante era a de que o valor estético dos apesar de a ìigação do BrasiÌ com e cuÌtr-rra clássica estar

textos e obtas de ârte apresentadas deveria ser também reptesentada por uma significativa radição (Chevitarese
enfatizaclo, âtrâvés de leituras em voz alta, récitas, drama er a/. 2008). PoÍ outro lado, desde os âl1os 1980, as áre-

tizações e exercícios cle pintura e desenho, por exemplo.e as de Letras CÌássicas, Filosofia Ânuga e História Antrga

Nessa patte do projeto, nossos resultados foram preiu- têm alcançado bons resultados na universidade, com pre-
dicados pot não podermos contar com a colaboraçãcr sença significativa no ensino de graduação e nas pesqui-

de proÍìssionais com formação específ;ca, mâs mesmo sas realizadas na pós-graduação, e com vários pesquisa

assim conseguimos reaüzar algumas atil-idades ârtísticas dores brasileiros com certa projeção internacional. Desse
relevantes, sobretudo uma peça de teatro baseada em He- modo, o projeto justifica-se cxatamente pelas carências
síodo que âpresefltamos para mais de 100 pessoas num do Ensino N{édio e Fundamental, em que os alunos têm
evento de final de ano na Ernani \ridal. poucas chances de entrar em contâto com o mundo an-
tigo, especialmente com o conhecimento especializado
O ÌacÌo prático erl- enfattzz:do em tndas as oficinas,
produzido pelas áreas acadêmicas que a ele se dedicam,
e com isso pretendíamos que os Particilìântes se apro-
e pela oportuniclade de fazer uma ponte cntre e pesquisa
priassem das informações e obras apresentadas e fossem
ar.ançada feita no ensino superior e as escolas brasileiras.
estimulaclos a dar a elas sua própta interpre taçào com
base em conhecimentos mais sóüdos. As oficinas partiam O mundo antigo está fortemente pÍesente na
também de temas cotidianos e buscarram provocâÍ a re- atuaüdade, em filmes, desenhos animados, jogos, Jìr.ros

flexão sobre diferentes frrrmas de vida, as da Antigúda- infantis, na arquitetura do espaço urbano, na discussão
de e as de hoje, estimulando âssim o pensamento crítico
política, nas reügiões (Beard e Hendetson 1998; Bakos
sobre o presente dos participantes. Pensamos que esses 2004; Ideiner 2005). Isso mostra que a cultura clássica
permanece, de alguma forma, relevante. Por outro lado,
dois aspectos, o ârtístico e o acadêmico, sem perder sua
soberania, podem ter cada um o seu papel a serviço da
o cofltato com essas manifestações culturais contempo-
râneas que dialogam com o mundo clássico, dá-se grande
educação.
parte das r.'ezes de maneira acrittca e fragmentada. O for-
Conteúdos ligados à cultura clássica se ressentem
taiecimenro dos estudos clássicos nas escoÌas permitìrá
de diversos problemas na escola brasileira atual. O currí
aos alunos e professores interpretar sob outro viés es-
culo não reserva muito e spaço a lais âssurìtos (com ex-
sas r.árias manifestações da recepção da cultr,rra clássic:1,
ceção de módulos específicos nas matérias de HistótÌa e
e quiçá compreender de modo mais profundo como as
Filosofia), e os professoïes em geral têm pouco preparo
culturas gregâ e rorr'anz' enftam na c()rìstituiçãr> cla cul-
específìco na ârea. Á quase total eliminação (nos anos
tuta brasileira contempofânea, com selrs Lrsos e abusos
attísticos e ìdeológicos.
t). \rer adiante "À{etorloÌogia"
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174
t- ï
Nas oficinas, notamos que muitos alunos tinham cidade brasileira (e tah,ez em qualquet grande cidade do
contato com r..ariadas representações do mundo clássico continente americeno) para r.erificat c1uão abundante ó
attavés de filmes, jogos de computador e outros produtos a ofefi:a de materiais de entretenimento com temáticâ
da indústria cultural. Antes de iniciarmos as oficinas na ciássìca. Disso tudo conclui-se que, queirâmos ou nào,
EscoÌa Estadual Ernani Vidal, reaìizamos nesse estabe- nossas criancas c iolens entrarào cm conrlro. tm maior
lecimento uma enquete com 104 alunc,s de 5^ e 6o sé- ou menoÍ medida, com esses assuntos, pois a Grécia e a
ries, na fclrma de um questìonário com 5 perguntas, uma Roma antigas são civiLizacões relatjr,'amente recentes ne
das quais era: "Onde mais, aIém da escola, r,-ocê já r,'iu treletírta da humanidade e ainda constituem referenciais
coisas sobre Grécia e Roma (filmes, desenhos, estóriâs, para a sociedade de ho1e. Cabe aos educadores decidit se

jogos etc.)?" Ao todo, 94 alunos (ru seja, aproximacla- conr'ém se contentâr com as imagens do mundo antigo
mente 90.38D/o do total) responderam que tinham tido aÌ- oferecidas por esses produtos da indústria cultural, que
gum c()ntat() com esses temas n()s mais lariados meios, 6 muitas vezes estão imbuídos de uma ideologia problemá-
(aproximadamente 5.7 6n/o) responderam negati\-arnente e tìca, reforcam estereótipos sobfe os gregos e romanos e
4 (aproximadamente 3.840/o) disseram não lembrar. quase nunca têm grancle preocupação com um intento
pedagógico ou com maior rigor histórico. Não será pre,
No univetso daqueles que responderam positi
ferír,'e1 aprofundar o trabaÌho com âs civiüzações clássicas
vamente, foram citados títuÌos de 19 drferentes fiÌmes,
na escola, utilizando inclusive uma leitura crítica desses
desenhos ou jogos.'o O mais citaclo foi a produção ci-
produtos? Sem entrar no mérito desses materirìs enquân-
nemâtogÍáfica Troìa (1 1 vezes; 13, se o título O caaalo de
to obrâs de arte e peçâs de enttetenimento, que inclusive
Troia cortesponder ao mesmo filme), seguida pelo dese-
por seu aspecto lúdico podem contribuiï enormemente
nho animado H,írca/es (mencionado 9 r.ezes) e do filme
com a educação, encontramos âí um cabedal de informa-
)00 (mencictnado 4 r'ezes). Foram também citados o jogo
Cod of lvdt"e os ílmes Alexandre, Spafiacus e Perry Jackson, ções sobre a Ântiguidade digeridas pela cultura contem-
porânea que podem nos instruir tanto soÌ:re os antigos
o ladrão de raìos.'1 Resultados semelhantes foram obtidos
quanto sobre nossas próprias maneiras de r.ê-ios.l2 Po-.
por PiÌar Rivero Gracia em uma pesquisa realizada com
estudantes espanhóis do primeito ano da Educação Se
cundária Obrigatótia, o qual equir..ale, aproximadamente, 12 N|-rito matetial sobre a presenÇa da cultura clássica no crnc
à nossa antiga 5n série (Gracia 2009). mâ, nos cluadrinhos, na informática, na literatura infantil, na
música e no r-ídeo, bem como discussão sobre como expìo-
É suflciente uma brer.e -"isita a uma Lir.raria, ban-
râr esse repertório no ensino, pode-se encontfaÍ nas dir-ersas
ca de jornais ou locadora de r..ídeo em quaÌquet grande contrìbuiçòes reunìdas em Ferreìra e Dias (2003). Cabe cles,
tacâí qLÌe, embora nosso projeto elfcrclue o munclo grcta() c
ron'ìano, os cstudos sobre a presença dos egípcios na cultura
10. Ne-.se unìverso, duas citações de um {ìlme ou jogo chamado de massa e a possibilidade de ú:ansformar os procÌutos rìcstl
Crnqala traduzem uma confusão entre períodos histórlcos em fetramentas cle reflexão nas cscolas têm sido objcto rÌe
que petcebemos em olÌtros momeÍìtos do proieto. pesquìsa e estudo c1e RaclueÌ Funati há vátios anos. Nlrritri rlc

11 O único 1rr.ro citado nomìnalmente como lonte de conhe- nossas erperiêncÌas no projeto relletem o diálogo c()rÌì rìs c\

cimento não escolar sobte o assuÍ-Ìto ioi a Biblìa (ao todo, 5 periências de Funarì, à qual sorno.s também b:rstanto st:rtos.
estudântes mencionaram histór:las bíbÌicas ou alguma igrejr Sobre a relação entre o Egito antigo e a educacão no LJrasil, cL
co-no llnre: de i-tìrrmaçìoì. Funari (200ó,2009a, 2009b,2012) e Funari e Fur.ari (2ÍtLít).

176 177
derá ajudar nisso um contâto maior entre as escolas e as chamar a atenção para o valor estético e filo
universidades, onde se tealizam estudos que submetem a sófico das obras antigas e o potenciaÌ criatir.cr
heranca clássica e â sua recepção â constantes releituras e crítico que advém de seu estr-rdo;
à luz de novos métodcis e descobertas. O projeto, assim, estudar, attarrés de conversas e questionários, a
r'-isarra não só clivulgar os conhecimefltos eÌâborados na visão do púbüco sobre as culturas entigas em
universiclade, mas também intertrir atir.amente na rea- questão;
hdade da escola. Como se isso não bastasse, o retorrÌo pensar nos r.ários espectos da relação entre
para a UFPR dara-se principalmente através tle um maior nossa cultura e essâs culturas antigas através
conhecin-rento sobte a situação das cscolas brasileiras, das situações exemplates que surgirão do con-
conhecimento que seria muito útil pata as pesquisrs e a tato entre, de um lado, os proÍìssionais espe-
lormação continuada dos docentes e bolsistas do projeto. ciaüzados no estudo dessa área e, de outto,
Os conteúdos telacionados às Jínguas grega e lati- crianças e jovens brasileiros que frequentam
rÌâ estavam presentes em praticamente todas as ativida- a escola púb1ica (principalmente, mas sem ex-
des, mas compareceÍam sobretudo nas oficinas centraclas clusão de experiências com o ensino pnvado);
na temâticz cla história da escrita. Imaginár'.amos ìniciaÌ aperfeiçoar o ensino de Históda e Língua Por-
mente cÌue esse âssunto seria o mais ári<Ìo e o mais difícil tuguesa na escola;
de apresentar às crianças, mas l1a ptâttca, para flossa sur- coletar expetiências para aperfeiçoâr as estrâ-
presa, â temática despertou uma enorme curiosidade, o tégias de formação de profissionais de Histo-
que comentâremos também, a seguir. ïia e Letras na UFPR.
Vejamos âgora em forma resumida os obietivos do
pro jeto.
Metodologìa adotada no desenvo/vimento do proieto

Objetìuo gera/:

Como já foi dito acima, um princípio básico das


Permitir ao público e âos participantes estudos e
ofrcinas era trabaltraï com a Ântiguiclade atrar.és dos
I'ivências que alimentem uma melhor compreensão das
textos e objetos que e1a ptópria produziu e nào apenas
cir.ilìzações clássìcas e de suas relações com a cultura bta-
através de [r.ros didáticos escritos nos dias de hoje.]3
sileita de hoje.
E,m todas as ollcinas enfattzâvamos o contato com tex-
tos clássicos e reproduções de artefatos afltigos. Tânto
O bj e tì u a.r e sp e c(ì co -r:

Fornecer ao púb1ico contato com matedais de


13. À inspitação pam esse princípio vem sobretudo cÌe FrLrr,rri
estudo, como texlos e tbtos, entre outfos, que (1995, 1996,1997 e 2001), para o ensino de Histtilia, e dc
correspondam âo que há de mzus avanÇado Luna (1995), pata o ensino de Líng'uas e Literatrrras Clissrcas.
mund-ialmente nos Esmdos Clássicos, e rea  ideia de se trabaÌhar com o latim utihzendo rlrcnâs te,\tos
autênticos iá se encontra, no Brasil, de modo bastirntc explici-
lizar com o púìrhco discussão dcssc material;
tci, en-r Faria 119.{1).

178 179
r-- ï
quanto possível nesse nível introdutório, ptocurár'amos sír-el. Âs inscrições fim de maneire e s-
se ptestam a esse
dat informações sobre as Línguas ântigas e sobre métodos pecial, pois, ao contrário do texto de um lir.ro, estão tnui-
arqueológicos e filoÌógicos. Por outro lado, o elemento da to mais fortemente conectadas a um espaço determinado,
arte-educação e as atividadcs práticas, qLre contavâm com que é a primeira informação a ser ler.ada em contâ nâ
orientação por parte dos bolsistas, procurâ\ram amplificar l,ocalzação histórica daquele discurso e na reflexão sobre
o alcance das explicaçõe s teóricas e teinterpretá-las numa qlÌem o ptoduziu e a quem se destinara. E.sse aspecto d<r
outra char..e. Llma das icleias centtais sempre foi, como já texto é fundamental para que se apresente a 1íngua clássi-
dissemos, pÍocuraÍ estimuÌat â pensar a Antiguidade de câ como uma língua que, num determinado momento do
maneira mais ptóxima ao nosso cotidiano c scnsibilizar as prassado, foi uma Jíngua viva como são as de hoje.ra
pessoâs para importância das diferençâs entre passado
^ Certamente, contudo, as aulas de línguas clássicas
e pfesent(].
não podem se teduzir à Ìeitura de te:<tos epigráficos. Pdn-
;\ partir dessas considerações, acabamos por con- cipalmente nos nír'eis iniciais do ensino de línguas clás-
cluir que a oficina sobre formas de escrita assumir u1rl pa sicas, o professor poderá tet dificuldades para eflcontrar
pel central, umâ vez que dizia respeito a rariadas formas textos liteÍários autênticos quc sejam adequaclos aos co-
de cxpressão tanto da cultuta etudita como da popr-rlat, nhecimentos dos alunos, emborâ isso não seja impossível.
quer da Antiguidacle, euer do presente. Cf trabalho se cleu No campo do 1atim, a ualtzação de epigramas de Nfarcial,
sobretuclo com textos autênticos de inscrições, através de cle passagens da Vu/gata e de determinados historiadores
fotos acompanhadas de ffanscrições e traducões. Enten- tardios, como Eutópio, permite atingit ótimos resulta-
demos que isso concÍetiza;ila. a proposta de oferecer um dos. Mesmo trechos de textos técnicos como as próprias
contâto direto com cliscursos da Àntiguidacle. Por isso gramáticas antigas são acessíveis para o iniciante. Basta
decicÌimos rcalizat essas oficìnas primeito, não obstante que o professor procure no c7rp/.$ dâ ljteratura antiga ,rs
ccrta insegurança cÌuanto ao moclo como isso poderia ser textos em que predominem elementos linguísticos aPrr)-
recebicÌo. priados aos seì,rs fins didátrcos e conduza a leitura com
O trabaÌho com textos epigráficos nas aulas de um comentário adequado. Isso exige, é claro, um trabalhcr
Históda e de Línguas Clássicas tem a \rantâgem de per- de preparação mais penoso cìo que o de se fiar nas lições
mitir a leitura de textos completos, pois há um imenso prontas de um livro didático.
repertório de inscrições currâs, c rnuites seguem uma lin- Entendemos, no entafÌto, que o trabalho com tex-
guâgem formular que pocle ser pcrceb-ida rapidamente. tos adaptados não precisa ser absolutamente abandona-
I,Íesmo qlÌe eventualmente contenham um te\to mais do. Uma experiência de mais de dez anos de empÍego
complexo do ponto de vista linguístico, inscricões mais do método inglês Readìrg Latìn (1986),15 adaptaclo para
curtas nào impedem que, por meio de um comefltári()
adequado, o ptofcssor consiga concÌuir a leitura de um
te\to na íntegra em apcnas uma aula. À utiLização da Íoto 1't. Patafraseamos aqui uma fbrmuÌaçãr-r de X{arouzeau (19'11, p.
8): "tâchons au moins de traiter le latin comme unc Languc .1uì
da inscrição é essencial. O ideal do trabaÌho com textos
a vécu". Note se, a propósito, o traba.lho de lJaltrett (2{ì08),
antìgos na sala de aula é fornecer, no comentário, uma um matetial diclático de Ìatrm inteirâmente basetdo cm in..cri
contextualização histórica e cultr-rral a mais profunda pos- ções e grffiti.
15 Llma adaptação para o poÍtltguès foi recentenLcntc Lrnçacla
180
181
t-
o português, tem conseguido, na formação de bacharéis pedimos aos alunos, todos ctianças de dez a doze anos,
em Língua e Literatura L^trn da LÌFPR, resultados apre- que voltassem ao latim e, cotÌÌpârando-o ao português,
ciár-eis. Isso porque o mótodo âpenâs adapta textos litctá- dissessem por cluais palar..ras portuguesas determinadas
rios genuínos, garantindo que ct produto fi.nal permaneca passagens do original tinham sido raduzidas. Se fejto sis
nos horizontes da cultura antigâ, procurâ fazê-lo com tematicamente, esse trabalho com a intr-riçãrl linguística
crinsttuções e paÌavras largamente utilizadas no latim "de dos alunos, mesmo com uma gramática complexa, Pocle
r-erdade" e r.ai ptogressivamente tornanclo as adaptações Ìer.á-los a deduzit e, âos poucos, assimilat determinadas
bem próximas dos originais. -,\inda que o livro tenha di- estruturas ünguísticas e muito do iéxico mâis c()ïrente.
versas limitaÇões, estamos bem longe das lições basea- E,m princípio, nenhum texto cÌássico está forâ do alcan-
das em ftases do tipo Brasilìa íerra est. Existem muitos ce das crianças, desde que o professor conduza a leitura
métodos de latim qlre apostam nessa ênfase no trabalho de forma paciente e saiba exPücaï. A peça de teatto que
com textos, e r.ários cìeles foram pensados para crjan- montamos com base em Hesíodo foi esctita coletiramen-
ças e aclolescentes. Â lnglatctta tem sido especialmente te, pelos ministtantes da oficina e pelas ctianças, x partir
produtiva nesse câmpo, numa notár,eÌ teação contïâ os de leituras sucessir-as, com esclarecimentos paulatinos,
métodos tradicionais que se iniciou iustamente quando cle traduções das passagens da Teagoaìa e dcts Traballto.ç e

os llstr-rdos Clássicos softeram o grande abalo dos anos dias qve contâm os mitos de Prometeu e Panclora. O uso
1960.16 O Brasjl é catente de Ìivros clicláticos que tentem de traduções e leituras em latim qr-re "passem por cima"
nor.-as abordagens. de cleterminados detalhes da gtamáticâ, em bcnefício de
N{esmo o texto autêntico mais complexo e extenso uma leitura mais ágil, era reconhecido como uma partc
nío frca inteitamente fora clas possibilidades dos alunos impoïtânte do ensino do latim por Nfatouzeau (1941 , pp.
principiantes. Uma alternatir-a a ser sempre considerada 732-133).Isso não excÌui, de forma alguma, uma leituta
é empregat a leituta do original após o uso da adaptação mais paciente e acompenhada de análise minuciosa. Cada
ou a leitura paralela de tracluçõcs como leituras comple- atividade pode ter seu momento e suâ dosagem adcqua-
mentafes, o qÌ-Ìe ampliâ o contato do aluno com a cultura dos a diferentes contextos e níveis de ensino.
antìga e prepara para leituras futuras dos originais' Um Às oficinas estavam plane]adas em torno de quatro
ptocedimento que utilizamos numa ofìcina e qlle obtel'e difercntes eixos temáticos, nomeadamerÌte: (i) formas de
muito sucesso fcri ler cm voz alta um poemâ de Catu- escrita; (ii) mitologia e religião; (iii) sexualìdade e gênero;
1o e, logo em seguida, sua tradução. l)epois de um tra- (ir,) guerra. Na Escola Estadual F,rnani Vidal a equipe dis-
baÌho de interpretação dr: texto feito sobre a tradução, punha de uma tatde inteira por semana paÍa as atit'idades,
com alunos que tinham suas aulas normais pela manhã e
peÌa editota Od,vsscus, sob ti título /aíìn,teaL'z:.àa viam nas o{ìcinas uma atividade totalmente nào-obriga-
"lprendenda
por Cardoso, 1. Ï. et a/. tória. Ali desem,olvemos oficinas sobre a esctita durantc
16. Vej am-se os nrétoclos C n nt b i dge I'tÍi n co tr r.ç e (191 l\' O xJòrd La
o primeiro semestre de 2010 e oúcina-" sobre mirologia e
Ífu ronrse (tsalme e N'lc-'rrvood 1986) e llinìntu: (Bell e Fotte
1999). Este último, pensado como ìntrodução ro ìatim para
reLigião no segundo semestre do mesmo ano. Na Escola
crìancas de 7 a ltl anos, atrebatou um ptêmio da CÌassical Israeüta e no Colégio Novo Âteneu, professoras de Hìs-
Âssociation en-r 2[.]l-15, quando já rer-ia vendido óL).{100 e:em rória e Língua Portuguesa nos cederam uma aula sema-
pìares e sjdo adotaclo em i.500 escolas.

142 183
nâl, nos horárjos not:mais dessas disciplinas, ao longo de eleitoral, textos parâ dir..ulgação de espetáculos públicos
pouco menos de um mês. Fizemos, então, um trabalho etc.), grafites e cârtas. Esses contextos são estarÌqlÌes or'l
específico com â Eneìda cle Virgíììo, abotdando aspectos há influência mútua entte eles? Como a escrita rparecie
que pertenciam a dirrersos desses eixos temáticos. A ex- no cotidiano naquela época e como âpârece hoje? Outra
periência na Ernani Vidal mosttou qlÌe é possír.el, dadas questão é a oposiçào entre escïita e oralidade. Ern que
as condições adequadas, pensâr em matérias optativas de cofltextos é importante obsen'ar essa distinção? Como
Estudos Clássicos na escola brasileira. Nas outras duas elementos da escrita penetÍam na oralidade e r.ice-r-ersa?
escolas, fizemos um experimento com o clue fepresenta- Uma das fotmas de aquisição cÌe conhecimentos
ria um aprofundamento de temas clássicos nâs própdas sobte os povos antigcis é o estudo clos textos que eles nos
matérias já existentes. Em todas essas ati\.idâdes har.ia, legaram. Como esses textos são lidos? Que conhecimentos
em maior ou menor grau, â presencâ de questões linguís- técnicos são neccssários pâÍa a sua decifração? Como es-
ticas, mas como as oficinas sobte a escrita antiga foram as ses textos foram ffansmitidos? Como apârecem esses ele-
que mais abotdaram esse assunto, \ramos nos restringir. merÌtos na constïução de personagens da indústria cultural
neste trâbalho, a descrer.er em maiores detalhes apenas o associadas ao trabalho arqueológico (como, por exemplo,
clue fizemos desse eixo temático específico. o professor, arqueólogo e aventureiro IndianaJones)? No
^pa:rï1t
Eis, em primeiro lugar, a ementâ clessas oficinas contexto da discussão sobre as Íespostâs a essâs perguntas,
decìdimos inclúr uma introdução ao estudo da paleogra-
sobre escrita, reproduzindo o texto do projcto quase sem
fr.a, ur;r'a imciação ao alfabeto grego e uma introdução às
acÌaptaçõcs:
línguas clássicas. Pensamos que nesse momento podemos
despertar a cutiosidade do público p^t^ o desafio e, ao
Fornas de escita mesmo tempo, para o carâter lúdico e estimulante do pro-
cesso de interpretação das palavras dos antigos.
Estas oficinas dcstinam-se a estudar os divcrsos
Olrtro âspecto que pretendemos trabalhar ó a es-
formatos e usos da esctita na Antiguidade clássica. A ideia
tética da escrita.lB A Antiguidade clássica e a Idade N{édia
e famlharizer o púbJìco com reproduções de e sctitos an-
(a ser considerada aqui no seu papel de transmissota da
tigos (fotos de manusctitos e inscrições pârietais, equipa
cuÌtura antiga) desenvolr..eram a escrita não só como su-
mentos util,izados na escritâ etc.) e conveÍsar sobre como
porte pârâ o arti:' zenamento e a transmissão de textos,
textos eÍam produzidos e circulavam naquela época, bem
mas também como expressão de um interesse plástico.
como discutir a rrisão que ()s antigos gregos e romanos
Nota-se em muitos manuscritos um cuidado especial
tinham da escrita e suas funções.17 Assim, a proposta se
com a aparência dos textos. Nesse campo, a caiigrafia e
constitui do estudo da escrita em diversos contex-
^p^rtl{ as iluminuras de manuscritos desempenham um papel
tos sociais, entrc os quais se destacam o texto literár'io, os
fundamental. Também aí temos, ê claro, paralelos con-
documentos da r.ida pública (inscrições de propaganda
tempoÍâneos. Esse tópico tem gtande colaboração a dar
às atir.idacles de educaÇão arústica dos estudantes.
1i \rer, entre or-rtros, I{enl'on (1951), Turner (1987), Salles
(1994), Desborcles (i995), tsagna1l (2009). À revr.cta Classica
de 1998,11999 traz dìr.ersas contrìbuìcòes sobre a esctita nr
Ver, por exempÌo, Bischoft (1990), EasterÌing e IlandÌerr
Antiguidade.
llnul), e CIrrn.n. t Gralram (2n0:;.
18,t
l85
Os objetìr'os são aguçar a consciência dci púbLico ()ra, como isso foi rcalizado?
pata o modo como o conhecimentci histórico é constru-
ído atrar'és do estudo de documentos escritos, ampliar a
Como tir.emos bastante tempo com as crianças cla
visão das formas que a escrita pode assumir, comparândo
Escoia Ernani VidaÌ, foi possír.el aborclar preticrttncnte
as formas antigas com as contempotâneas, e sen-ir como
todas essas questões. Foi notár.el o intetesse qLrc c()nsc-
compÌemento à consoLidação do processo de alfabetiza-
guimos despettar para os tópÌcos apârentementc mais di-
ção dos estudantes e do aprendizaclo de interpretação de
fíceis, como o alfabeto gÍego e o traçado das Ìettas nos
textos, além de teï Lrm papel no desem'oh.'imento cla sen-
srbilidacle cstéticâ. .q"dfrtrì de Pompeia. Parece-nos que r maioria das esco-
las subestima as capacidades inteÌectuais dos estuclantes.
Consicleranclo essas questões e objetir.os mais ge-
N,Iuitos deles, ao se depararem com âssuntos que fogem
tais, r>tganizamos o trabaiho com os seguintes tópicos:
à rotina das aulas normais e exigem que se dê, digamos,
um pâsso além, ficam mais interessacìos. É claro que tudo
1. Nlzrteriais e suportes isso foi feito num contexto ül.re de muitas clas formas de
Papiros coerção empregadas peia escola, como â frequêncìa obri-
")
b) Códices em pcrgaminh<; gatória e a notâ, o que contribuiu para que as dificuldades
.) Inscrições inerentes ao assllnto fossem desr.inculadas da tcnsào na-
2. Contextos cle uso da escrita tural causada, por exemplo, pela necessidade de mostrar
 escrita hterârta um bom desempenho numa prova.
^) A escrita no cotidiancr
b) Num contexto como esse. e partindo do pres-
3. O estLrdo clos tcxros entigos suposto de que o objetivo é ensinar algo da hrstóna da
Âs Lrrguas arrügrs escrita, acreditamos que o ptofessor não deve {ìcar ob-
^) () alfabeto,
b) sua história c suas variantes cecado com e ideia de cumprir um programa de tópicos
4. Âlgr-rns dos textos literários a serem utiüzados gramaticais a seíem sistematizados pelos alunos. Um res-
a) Passagens de Platão sobte a origem e os quício do ensino da língua latina com excessit-a ênfase na
pt rigos cla cccrita gramática descontextualtzada que predominat'a nas esco
b) As Heroides de Or-ídio 1as brasileitas âté 1960 é encontrar até hoie alguns alunos
.) Ãs Baccltìde.ç de Plauto veteÍanos que, clescobrindo que trabalhamos com latim,
5) Propostas de atividades práticas recitam a decJinação àe rosa c>v pue//a, mâs mostrâm qlre
ü llscreva sua própria calta r()m^fl^ não retir,.eram nada além disso. Um método que enfatize
b) Você é um arqueóÌogo: decifre esta ins- os textos, mesmo que, no início, não sistematize muito da
crição gramática, dá ao aluno, desde as primeiras aulas, ct con-
.) Faça um càrtaz com palavras e desenhos tato com um dos propósitos mais universalmente reco
que imitem os grafites de Pompeia nhecidos do ensino das línguas antigâs: ler os textcis no
d) Pinte uma iluminura de um manuscr-itcr original. É tu."p".tutiva dessa descoberta e desse Pràzet
me dier.al de ler os textos originais que normalmente velros muitos
iovens aduÌtos iniciarem um curso de latim ou grego.

186 147
F
Um exemplo mais concreto de atir.idade foi o tra- sugerida pela ilustração que a pr(tprìa Ìápide contém. A
balho que fizemos com uma inscrição grega do pedodo gramática não é demasiado complexa.
romano, um epigrama funerário acompanhaclo de um re-
A noção de caso gtamatical pode ser convenien
levo que fepresenta um esqueleto.le TÍanscrer.emos o tex-
temente abordada atïavés de outra inscrição gregâ qì-Ìe
to abaÌrio, já com a disposição em versos, a seperacào en-
utiLizamos, dessa r.ez de 334 antes da nossâ eÍ4, uma de
tre as palar.ras e o acréscimo de acentuacão e pontuação:
dicatória de um templo a Atena Políade feita por AÌexan-
dre, o Gtancle:"'
ener,t riç}ú't urat I orc\r oç)rtnoouprcn ) aA pigaç
w"ep' -f)'lç | 4 8) ep oetry \"r, a I rap oìewu; p o J.e,t ç A)'.é7.a'r3p o,c fi 'rye'r òr aüt I A0 a íi1 r f I C. áà
a"
I a.t ",t
1r,
t L.

C) trabaÌho começa com a obsen'ação da fotogra- Comentários semelhantes aos sugeÍidos acima so
Íia e o reconhecìmento das letras do alfabeto. Em seguida bre questões epigráficas e paleográficas caberiam aqui,
observa-sc que em geral não há separação entre as pa- com pâÍticuler atenção p2jr2- o fato de o traçâdo das letras
lavras ou pontuação, com excecão dos finais de linha e gregâs ser muito dilerente nos dois casos, o que se pode
do espaço acompanhado de um símbolo (uma trança de expLicar pela distância histórica entre eles e pelo c^râter
hera) em posição mcdial quc separa àAp\oa"çdc eine p (ou distinto de cada inscrição, fâtores que implicam difeten-
seja, no ümite entrc os versos). Fotnecendo-se a tïanscri- tes estilos. Notar-se-á também que a própda fotma crrmo
cão, comenta se sobre o porquê de o mesmo texto apâre- o segundo texto foj disposto em linhâs ajuda na articula-
cer teproduzido de maneira tão diferente no papel. Para-
ção sintátìca, sepaÍando na primeira linha o norninativo,
ftaseanclo, o texto peÍgunta ao observaclor quem poderia nâ se€+rnda o verbo com seu complemento âcusati\-o c na
dizer, olhando para um cadár.er cÌescarnado, se é o corpo última o datir.'o. Âinda no p1âno cla iinguagem utilizada,
de Hilas ou de Tersites. O uso do r-erso e a referência as difetenças estiLísticas em relação âo exemplo ânterior
às duas personagens que aparecem em famosos poemas também meïecem uma atenção espcciaÌ. (]ue não se dei-
ântigos, bem como o uso do compostoìLrcouprcov e da xe de lado â oportunidade de explorar a história política
peculiar ordem das palar.ras, permitem r'ários comentá- e militar do mundo helênico e os significados, nesse con-
rios de teor literário e linguístico. A interpretaçào do tex- texto, de uma dedicatótia de um tempÌo à deusa Atena.
to pode ser conduzidâ aos polrcos e vem já de imediato
Os primeiros momentos desse tìpo de atir.idade
podem ser instruídos por inscrições ainda mais simples,
como o grafite de Pompeia contendo ume caricetuÍa so-
1,9 'Ilrata inscrição greea do Britjsh N{useum, cataÌogada sob
se cla bre a qual se Ië; Iü{as esÍ.21 N'Iesmo os momentos mais
o número 11 14 l= IC Xl\i2131), teprocluzida em Cook (1996,
p. 349, fig. 19). Traclução: "( ) trânscuntc, quen podc dizer,
olhando para um cadáver clescarnado, se eta Hilas ou Tersites?"
20. GIBII 399 (= CIC 219), reproduzida em COOK (1996, p.
Obsen-em se as conr-encões aquì utilìzadas ln transcrÌcão de
341. fig. 12). Tradução: "O rei Alexandre dedicou o templo a
inscrições: o -sin.al indica c; início de uma no\ra iinha no odgi
Atena Po1íade".
nal; os parènteses incLicam letras acrescentadas para completar
?1 . CIL lV9 226, reproduziclo em Funati (1 99 6, p. 30). Tradução :
uma paJavra que âpar-.ece abreriada no origrnzrl.
"fEstel é Rufo".

188
189
t complexos do trabaÌho corrÌ a litetatura também podem
p

adaptações exceto pelos espaços separândo as palar-ras e


ser enriquecidos com dados epigráficos, como t-oi o caso pelos sinais indicando os inícios de linhas:
das oficinas em que âpresentâmos o proêmio da Eneida
às crianças.22 Depois de uma contextualizaÇão histórica
apoiada por muitas imagens, lemos o texto lâtino e três
rfH.,\AI ENOA^E I TTIIOTNTAI KAI I XAIâI-
IONTAI I Ì\AOII IEPOI)' I :TN F,NEPI'EIAI: I AH-
diferentes traducões. Foi aptesentado em seguicla o grafi-
I
te de Pompeia em que se Ìê:
MOIIAI:

TITVLI I HEIC ORDiNANTVRET ] SCVLPVNTVR


fullone.r alulamque cdlto ilail arna aìramq(ue)23
I AIDIB\s
I
SACREIS I

Essa dir.ertida patódia do primeiro r-erso do po- QiN{ OPËRVM I P\TBLICORVM


emã, encontrada na oficina de um pisoeiro chamado
Fabius Ulútremulus, na fachada da qual há uma pintu- À'Iúto vadadâs são as possibilldades de abordagem
Ía Íepresentando Ânquises e Eneias, dâ ao ptofessor a desse texto. Exemplos são o problemâ importantíssimo
opottunidade de discutir a recepção de Virgíìio, seu apÍo, do biünguismo no mundo româno, a contextualtzação
veitamento em diferentes contextos, o elemento criativo explícita do texto no âmbito de uma profissão, as pró-
de uma expressão popular e anôníma que clialoga com prias questões técnicas â que o texto alude mencionandct
um poema erudito de um âutoÍ cons2Ìgrado, entre outros as duas fases básicas do trabalho de se compor uma ins
temas. Uma possibilidade não desprovida de importân- crição (dispot as letras no e spâço disponír'el e grar.'á-las).
cia ofetecicla pelo verso e sua recriação, quando Lidos em O artesão pârece dominar a língua grega meihot do que a
paraÌe1o, é o espaço que abrcm p^r^ o estudo da motfos- latina. Â presença de uma fotma como (lum lPerum núm
sintaxe do acusativo. inscrição permite discutir a noção de erro no uso da lin-
Outro exemplo frutífero foi uma inscricão biLín- guagem e desr-incular o latim de uma imagem ideahzada
gue (do N{useo Ârcheologico Nazionale de Palermo) que de Língua-modelo para a .correção gramaticâl. Note-se,
oferece serviço lapidário.2a Veja-se o texto, sem quaisquer mais uma vcz, a disposição das palâvrâs numa colomettia
que farrorece a compreensão da sintaxe. Na Alemanha,
Hans-Joachim Glück|ch propõe aulas com um método
22. hvesse caso, na EscoÌa lsrac[ta e no Colégìo Nor-o Àteneu.
de leitura de textos latinos que separa os períodos em di-
23. Carnz. Ltt. Ilp/g'. 1936 (= ALIY.9131). Ttaducão: "Canro os
pisoeiros e a coruja, nâo as armas e o rarão". O gtafite e inter- \rersas linhas seguincìo as dil'isões entre os sintagmas. Se-
pretado por Âusnn, 1971, acl l.l 7, como evrdência de que a gundo ele, isso "combina com a maneira como os leitores
Eneìt/a citculata. con'r a abertura arm rìranqae etc., não com os
fomanos liam e entendiam. Seus textos efam escïit()s em
cluâtro \.eÍsos (,i//e ego, qil qaandam etc.) que, segundo Donatcr
(.nìrã 42:) e Sérr-io (no prefácio a seu comenrárjo), foram reti colunas estreitas" (Glücldich 2006a, p. 133).'?5
rados clo texto pelos primeiros editores de Virgí[o. (Jdor:ico
traduz esse ptoêmio aÌternativo em sua. Eneìda Inz-,ìhira.
24. CILX.7296 /çroi,.ar.eimente do séc. I da nossa era), reproduzida
25. Os te stemunho-s papiroló5Jicos gregos considetados pot Tut
em lrelancÌ (1983, p. 221, frg 1E6). liaduçãci: 'i\qui fazemos o
ner (1968, p. 63) apontam para Linhas curtas, de 15 a 25 Ìetras,
ial,aat e gvavalvss hsctições para templos e obras públicas".
em textos de história, oratór-ia ou filosoíia. enquanto lìnhas
190
191
I
TrabaÌhamos com muitos outfos exerlplos que, primeira melade do século X-!, mas as formâs de traba-
por qLÌestões de espaço, seria inconveniente reproduzir thar corl o latim e o grego que tiYcm()s a uP()rtunidade de
aqui.26 Em todos os câsos aqui mencionados é possír.el a experimentâr nessas oficinas Podem ser LlesefiÌohddas e
comparação com a realidade contemporânea, chamando aplicadas mâis sistematicamente em cursos de Língua. Uma
a atençào parâ o fenômeno do grafite nas ciclades brasì possível expânsão de um PÍojeto com() estc seÍia levar â
leiras, para as formas de produção, regisrro e circulação cabo urn módulo que se centraÍ.ix no ensino do latim, em
de textos escritos nos dias de hoje e p^ra. como essâs di- que pcrcleda ter Ìugar mâior sistemaÏtzaçàct grâmâtjcâl.
versas formas se relacionam com difercntes vâriedâdes Àtrvidacles c1o gêneto que contemplamos neste
da ìíngua pot:tugucsa. trabalho poderiam ser tentadas em outÏas escolâs por
Não podemos afirmar que as crianças que parrici equipes de outras univetsidades btasileiras' Temos ccl-
parâm das atividades aqui clescritas aprenderam o latim e nhecimento de experiências semelhantes reaüzadas por
o grego em termos de conteúdos Jinguísticos que pudes- colegas de outras instituições.27 As oÍìcinas aclui prcrpr-'s-
sem ser medidos numa pro\e cle tradução, ou que tenham tas funcionariam, iclealmente, com grupos pequenos, em
adquirido uma metalin€Fâgem para dcscrever fenômenos torno de quinze alunos. A ideia e trabalhar com um eixo
dessas línguas. N{as certamcnte o interesse pelas Jínguas temático de cada vez, ao longo do ano, sendo que um
foi despertado, e os alunos entraÍâm em contâto com mesmo aluno pode participar de mais cle um móclulo.
uma constelação de informações e discussões relaciona- Pode,se lazer :uma dir-u1gação no espaço da escola, com
das a probÌcmas ünguísticos e üterários. Isso scm sombra c rt^zes, pot exemplo' Os professores podem ajudar avi-
de clúr.ida fez wma diferença pãri- a compreensão cla cul- sando âs turmas e con'ersando com os alunos clue têm
tr,rra ciássica que esses estudantes puderam desenr.oh.er.
maior intercsse e po.lem lir a se inscrcr cr.

No contextc) em que trabalhamos e com os propósitos Antes e/cru ao finaÌ de cada mócÌulo seria interes-
quc tínhamos em trìente, as lín€pas eÍâm o complemento sante passaf um peclueno questionário pafa os estudantes
do trabalho com a civilização, c não o contïário (que é cr e fazer Lrma pecluena Íeunião com os professofcs intercs

que ocorria com âs auÌas de latim na escola brasilera da sados, para discutir os obietir''os e resultaclos das oficinas
e pensar na r-iabilidade de ensinar tópicos semeÌhantes
ou utilizar métodos parecidos nas aulas, bem como para
mais Jongas pocliam seí encontraclas cm textos de nrúsica e que a equipe da unir.ersidade se famlltaitze com o qÌre
em lt'lbrtnnernattr. Na poesia, normalmente o \-etso const-Ltut vem seírdo tèito nas escolas, e âssim colete novâs ideias
tan'rbém a unidade gráÍìca. Numa avaLação mais atualizada dcr
parâ fuÍuras oficinas. Às atir.'idacles desenvolr'idas ao lon-
Ìivto grego e Íomano ern geraÌ flohnson 20t19, pp. 257 261),
estima-se o comprimerrto típico de r-rma linha cle prosa enfre go do projeto \.isat'am, portânto, não só propotcirlnar às
4.5 e 7.5 cm (mais raramente! aÌguns lir-ros apresentam linhas crianÇas um contato diferenciado com as várias lormas
de rre 0 cn^ . l\c,, dei ìr pe-rrttir em rìuir0S c.r... oS ÈrIil. da cultura clássica, mâs também abrir aos bolsistas novas
'-llrc
das lÌnhas coincidissem com vátìos pontos-chave da articula
perspectivas de ensino, bem como fornecet aos protesso-
çào sintárica dc um petíodo. Por outro lado, a tendência de se
"justìficar" (como num editor de textos compurâdonzado) a res das escolâs enr.oÌr'idas meìos cle continuer atividades
màlgem direita das colunas agia no senticlo de cortar o texto semelhantes cle n:raneira independente'
em pontos aleatórios.
?-6 \.er o matenal disponir-el em Lang (197.1) com muìros excm-
pÌos grego-s que utüzamc;s. 21 Ver, por exempÌo, Dezotti e de Souza (1991).

192 193
O latim e os Ëstudos Clássìcos na Europa em geta1.30 Quanto ao BrasiÌ, ainda hoje nota-
na educação brasìleìra hoje se essa visão, que encontrou uma lotma lapìdar nas paÌa-
\-râs de Nfartim Francisco Ribeiro de Andrada (segundo
Etnestcr Faria, a primeira voz em nosso país que clefen-
A expedência de ler textos antigos originaìs com deu a exclusão das ìínguas clássicas da escoÌa, em 1B25):
crianças no Ensino Fundamental, mesmo que em ativida-
des que a princípio não l'isam principalmente atr ensino
tào inútil será o conhecimento dess:rs duas línguas, à
da língua, pode serr.ir como pÍeparacào e estímulo para
classe méclia, que se destìna ao comércio, e às artes
futuros estudos no Ensino À,Iédio e Superior. A forma,
úteis, como necessátjo ao ìegislador, ao Íìlósofcr e ao
ção de filólogos e historiadores competentes no Brasil
homem de 1ìna eclucação que se preza de conh,=cet a
depende cle um incentirrc e cìe um contato com o âssunto
boa literatura. @ibeiro de Anclrada 1.825, apud Fatia
que comecem o mais cedo possír'el. A uma escola ver-
1941, p. 71, tevìsão ortogtáfica nossa)
dadeiramente democrática caberia oferecer uma gama
maior de discíplinas optatir-as às crianças e adolescentes,
paÍa que eles pelo menos tenham a oportuniclade de co, Percebe-se aí, pdncipalmente na últrrna categoria
meçaÍ a estudar áreas do conhecimento que tah'ez Ìhes affoÌâcla, a do "homem de fina educação", que os Es-
reveÌem no\ras perspectir.as intelectuais e mesmo profis- tudos Clássicos são associâdos a LÌmâ espécie de rrerniz
sionais. É curiosa a persistência, em muitos ambientes, cultural, cuja função poderia ser entendida como â de
do esteteótipo que associa os F,studos Clássicos a uma distinguir âs pessoas de escol. Ideias de \-ariada colorâção
educação eLitjsta. Ta1 entendimento remonta ao sentido eLitista âpâÍecem também no pârtido oposto, como num
etimolcigico de "c1ássico", eue pror-ém de um adjetivo artigo c1e Aubreton que defende o ensino de grego na
latino que significarra, entre outrâs coisas, "pertencente à escola nos seguintes teÍmos:
primeira classe, à classe mais a1ta".28
Essa percepção da átea é identificada como traço () ensino secundár'io tem uma finalidacÌe mais pro-
bastante disseminado na opinião pública em Portugal2e e funda. Cabe lhe formar crìaturas c^p^zes d- [...]
pensar de modo independente e [r,re [...], forrnar o
28 Já no latim de Cícerci, apììcaclo também acs melhores autores pensamento e.a n:rentaÌjdade de uma eLite. (;\ubreton
do passado, como lembta Cetti, 21101, p. 395. Daí o termo
195ó, p. z1)
passa a designat as civiÌizaçòes gïega e romanâJ eÌltendidas,
especialmente no Renascìmento, como ápice e modelo. O
julgamento de r-aÌor subjacente ao vocábulo, frequentemente Numa sociedade como â inglesa, em qlre o âcesso
evocado poí personâEjens que, no espectro polítrco, alinham-
âo grego e ao latim ó frequentemente r..inculado à pos-
se com postufas conservadora.c é o caso de uma figura
folclórica como Olavo de CarvaÌho - (ver Vasconcellos 2007, p. sibiüdade de lie<luencar escolâs pagas (em especial as

9ó) não deve oiuscar o que a revisìtação da cuÌtura antìga


-,
sempre representou como impulso revolucìonálio c quesuo-
naclor do stâtus quo, cìadci histórìco tecuperado também por
Cerri í2001, esp. pp. 392-4);r'er também }inox (1993).
30. Bulu'er (2006. pp. 2, 5, 8 9). Ver também \rasconcellos (2007,
to pp. 95, 113 114.n" 2 e 3, e p. 115, n" 13).
Ver do Couto e de f)lìr.eira, 2006, p. 98.

195
lg4
-T
chamadas publh schaols,3l como Eton, que têm uma forte demais esotéticos p^rà maÌoria, exlstlssem como opção
^
tradição no ensino dessas disciplinas), pode até ser justi- em boa parte clas escolas púbìicas, a sociedade teliaaínão
ficada uma petcepção dos Estudos Clássicos como LÌmâ um fator de dtvisão interna e aprofundamerÌto do abismcl
prerrogativa da eLite, embora isso venha mudando nos entte a elite, intelectual ou econômica, e os demais, mas
últimos anos, em função de que, de um lado, parte da sim um catahzador dainclusão social.
e[te deixou de r-alor.izar essa marca de disunção social e, A alegação de que esses âssuntos são inúteis para
de outro, ceÍtas escolâs estatais ainda oferecem discipü- as futuras ptollssões da maioria dos alunos é de pouco ou
nas da átea, sobretudo o latim e uma chamada Classica/ nenhum valor. Também gtande parte dos conteúdos de
Ciui/ìsatìon. Em países como â Holanda, onde não há um ciôncias hoje presentes no currículo só comparecerão na
sistema de escolas privadas competindo com o Estado e r.ida cotidiana cle uma pequenâ parte dos fututos profis-
exìste larga oferta de latim e grego, principalmente nos sionais que passam pela escola. N'Ias o ensino cla ciência
Clmnasia, a situação é cclmpletamente distinta. não l.isa apenas à formação de fututos cientistas, mâs âo
alargamento do conhecimento do mundo e à criação de
No Brasil de hoje, onde o grego e o latjm pratica-
um espírito crítico e investigador,32 objetir-os que qualquer
mente inexistem no Ensino Ntédio e Fundamental, seria
sociedade que se preze der.e cultivar na formação de seus
difícil pensar nessas línguas como umâ ïnàrcà de perten-
cidadãos. Os Estudos CÌássicos e, mais especificamente, as
cimento â uma elite. A profissionaÌização dos estudiosos
Línguas C1ássicas, como qualquer ol-Ìtra disciplina quando
da Antrguidade Clássica no seio da unir.ersidade púbüca bem ensinadâ, também tèm sua contribuição a dar nesse
tem formado pesquisadores das mais ,rariadas origens câmpo. Renunciar ao.investimento no seu estudo ou ümitá
sociais. São filósofos, historiaclores, Linguistas, fiÌólogos -1o a pequenos gÍupos isolados nas universidades significa
e críticos üterários comprometidos corrr os métodos de pitvar a população de uma herança cultural que tâmbém
suas cÌiscipünas e que têm seu trabalho avaliado segundo é sua, e que só patecerâ totaÌmente estranha a quem nào
critérios clue regulam , mulalìs matandìs, tolas as outras áre- tiver a chance de nela prestar atencào ou se recusat a re-
as de pesquisa na academia. Se a pecha de elitista deve ser conhecê-la, o que infelizmente tem se visto neste país não
atribuída ao estuclo das línguas clássicas por sua supos- só em relação ao mundo clássico, mas também com outÍas
ta dificuÌdade (o que é muito relatir.o), uma dificuldade parcelas cÌo nosso patrimônio cultLrral.
teoricamente inaclequada às "massas" e, portanto, pedra
de toque parâ separâr os mais hábeis, não estaremos tal-
I'ez partindo do pressuposto cle que ao povo só de\.emos Considerações finais
ensinar coisas bem elementates, já que a "turba" nuncâ
conseguirá superar seus ümites intelectuais e suâs ocu-
pações de carâter emìnentemente braçal? Se os Estudos O telato aqui exposto foi resultado de uma expe-
Clássicos, junto com outros assuntos considerados por riência fundamentada no diálogo e nâ postura política de

PeÌo menos cluando o método de ensìno dá alguma ênlase aos


lt. Observe se que o tetmo não pode ser traduzido por "escoÌas
32
rrétodos científicos e não se reduz à apresentação de conteú
púbìicas". A.s pnbli ichoals peÍteflcem eo setoÍ inclependente e
dos prontos a sefem memorìzados.
cohram taxas rnuitas vezes e1tíssimas.

197
I96
acreditar na necessidade de experiências concretas paÍa niflcados da cuitura gÍ.:co-românâ e â apresentação de
rever velhas posicòes elitistas que dificuitam a construção mâterial genuíno (os textos e documcntos arqueológicos
de pontes entre a unir.ersidade e as escolas e ajudam a que constituem, afinal, a base do conhecimento históriccr
crtarbarceuas pâra o ensino do Ìatim e do grego no Ensi- e linguístico sobre essas cultutas) tem mais chances de
no FundamentaÌ e À,Iédio. O resultado da experiência foi, despertar nos estudantes o deseio de aprender mais sobre
a nosso veÍr bâstante positivo, embora tenhamos enfÍen- as línguas e culturas antigâs, mesmo quanclo csse apren-
tado aÌguns probÌemas, especialmente entÍâves burocrátj- dizado envolver ql-Ìestões técnicas e conteúdos que, em
cos. De certa forma, fomos surpreendidos em diferentes olrtfos c()ntextos, pareceriam tal\'ez "inúteis", mas que
instâncias: primeiro pelo interesse de várias escolas pelo aqui farão toclo o sentido pata aprolundar e fundamentat
proieto em segundo lugar, pela disposição dos alunos e
e, o debate.
sua curiosidade em reÌação a rÌovas línguas. Supor que as
criâncâs e jor.ens de hoje são necessariamente desinteres-
sâdos e hostis ao estudo é um preconceito que cÌificulta Reíerénclas b ib Iì ogr áf i cas
a educação. Âos poucos notamos que enfatìzar a divetsi,
dade linguísuca e histórica aluda a construir abordagens
educacionais que propiciam o reconhecimento das dife- AUBRtrTON, R. H. (195ó). "O ensino do grego". Bolttìnt
renças (étnicas, sociais ou sexuais), proJuzindo uma vi- de [lstudos Clássìcas, r.'o1. 1. São Paulo: Âssociação de
são crítica. Essas questòes esta\-am muito presentes nos Estudos Clássicos do Brasil/LÌSP, pp. 71-75.
debates que surgiram quando ministramos as oficinas, e ÂUSTIN, R. G. P. (1971). Vergìlì \Laronìs Aeneìdos Lìber Pi-
eram levantadas muitas -u'ezes pelos próprios alunos. tza.ç. Oxf<;td Clarendon Press.
Mesmo que tenhâ sido breve, nossa experiôncia BÀGNALL, R. S. (ed.) (2009). "llLe Oxford Handbook of Pa-
nos leva a concluir que há abertura parâ novos espaços ro lagt. Oxfotcl : O rford Unil'ersiq' Pre s s.
PJ,
de reflexão na escola. Se bem exploradas, experiências Ïlgito no Brasì|. São
BAKOS, N{. (org.) (2004). flgìptotnanìa: a
como essâ permitem despertar empatia peÌo tema estu
Paulo: Paris trditorial.
claclo em jovens com difetentes formações e estimulam
BALNIE, NI. e NfOR\ÍOOD, J. (1986). Ox'ford I 'atìn Caarse.
a compançãr> cúrtca entre o passado e o pïesente e en,
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tre as cÌiferentes formas de l-ir.er, falar e escrever. Como
apontou Settis em um trabalho receÍrre (Settìs, 2006), é BEARD, \'I. e HENDERSON, J. (199sli998li). Antryaìdade
preciso reinserir gregos e romarÌos em um ambiente de clássicd: ana breuissìttta ìntrodaçà0. Trad. de N'{. Penchel.

debate. Esse espírito questionador nos inspira a ïepensar Rio de Janeiro:Jorge Zahar.
as maneiras como esses povos são apresentados a crian- tsELL, B. e FOR'I'E, H. (1999). t\[ìnimus. Cambridge: Cam-
ças e adolescentes e a buscar abordagens mais flexíveis, briclge Universiw Pres s.
menos elitistas e, tanto quanto possír'eÌ, mais diretas no BÌSCFIOFF, B. (1 9 90). I níì n Pa lae agrap 14 : A n ti q uì fi an d Mi d d -
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tábio Forlm l)outor (2012) e Mestre (200âl Ëffi Llngtthllt a,


área de I:slurlos Clássicos, pela Unicamp, pÕtrul lltent lclrrrt

1. l)<'srrrr ;rrrros clue todas as informaçrìcr lqul ËallEktif€E lntÊltl


rctr!Jrl;r: tlrr (lutticulum Lattes dc c$lr l*lttr.

204
em Letras Latim e Literaturas peÌa Universidade Federal de na Literatura Latina: teorias e práticas intertextuais na Literatura
-
Latina e sua recepção" e do CPEL - Crupo de Pesquisa sobre o
Juiz de Fora (2006). Atualmente é Professor Adjunto de Latim e
Crego Clássico da Universrdade Federal de Juiz de Fora - UFJF, Ensino de Latim. Atua principalmente nos seguintes temas: Oví-
onde também atua no Programa de Pós-Crad'"ração em Linguís- clio (literatura do exílio, sobretudo), VirgÍlio, intertextualidade e
tica. É vice-líder do CPEL - Crupo cle Pesquisa sobre o Ensino ensi no de Latim. E-mai I : pprata@ìel.un icamp'br.

de Latim (CNPq/Unicamp) pesquisador do CrEC - Crupo de Es-


Paulo Sérgio de Vasconcellos - Possui graduação em Letras
tudos Clássicos - UFJF e do Proaera - Programa de Altos Estu-
(Português, Francês e Latim) pela Universidade de São Paulo
dos em Representações da Antiguidade. Seus temas principais
(l983), mestrado em Letras Clássicas pela Universidade de São
de pesquisa são: Filosofia grega (Platão), gramáticos gregos e
Paulo (1990) e doutorado em Letras Clássicas pela mesma uni-
latinos, bilinguismo greco-latino na tradição gramatical antiga,
versidade (1996). Atualmente, é professor assistente da Univer-
en si no de atim. E-mai I : fabi [email protected] u. br.
I
sidade Estadual de Campinas. Tem-se dedicado ao estudo da
Leni Ribeiro Leite - Doutora (200S) e Mestre (2003) em Letras poesia Iatìnà (Catulo e Virgilio), à intertextualidade nos estudos
Clássicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, tem Es- clássicos e à questão do biografìsmo na interpretação da poesia
pecialização em Língua Latina pela Universidade do Estado do subjetiva romana. Nos últimos anos, consagrou-se ao projeto
Rio de Janeiro (2001) e Licenciatura e Bacharelado em Letras de anotação e comentltrio das traduçoes de Virgílìo feitas pelo
maranhense Oriori< o Mc'r'rcJes, coordenando o Grupo de Traba-
- Portuguès/Latim pela Universidade do Estado do Rio de Janei-
ro. Atualmente é Professora Adjunta da Universidade Federal lho Odorico Mt'rrrlt's, que j1r publìcou a tradução anotada das
do Espírito Santo, onde atua no Programa de Pós-Craduação Bucólicas e rl.r I:nt'icla rler ()dorico Mendes. E-maiì: odoricano@
em Letras. Faz parte do corpo editorial da Codex - Revista Dis- ig.com.br.
cente de Estudos Clássicos e da Contexto (UFES). Tem experi-
Pedro Paulo dc Abreu Funari - É bacharel em História (1981),
ência na área de Letras, com ênfase em Literaturas CIássicas,
mestre em Antropologia Social (1986) e doutor em Arqueologia
atuando principalmente nos seguintes temas: Livro, História da
(1990) peìa USP, livre-docente em História (1996) e Professor
Leitura, Marcial, Epigrama. F-mail: [email protected].
Titular (2004) do Departamento de História da Unlcamp. É pro-
Neiva Ferreira Pinto - Doutora em Linguística e Língua Portu- fessor de progr.ìmas de pós-graduação da Unicamp e USP, Dis-
guesa (1992), Mestre em Semiótica - Estudc,s Literários (1986) tiguished Lecturer University of Stanford, Research Associate
e Lìcenciada em Letras pela Unesp. É membro dos grupos de - lllinois State University e Universidad de Barcelona. Participa
pesquisa CASA - Cadernos de Semiótica Aplicada - e NEAM do conselho editorial de mais de 50 revistas científicas estran-
geiras e brasileiras. Publicou e organizou mais de B0 livros e
- Núcleo de Estudos Antigos e Medievais. Atualmente é Profes-
sora Titular de Latim e Literatura Latina da Faculdade de Letras reediçoes e de 215 capítulos, assim como mais de 545 artigos
da Universidade Federal de Juiz de Fora. Tem experiência na em mais de 130 revistas científicas estrangeiras e brasileiras ar-
área de Letras, com ênfase em Língua e Literatura Latinas, e Se- bitradas. Tern experìência na área de História e Arqueologia,
miótica, atuando principalmente nos seguintes temas: Jiteratura com ênfase em História Antiga e Arqueologia Histórica, além
latina, historiografia romana, ideologia, semiótica e Iiteratura. de Latim, Crego, Cultura Judaica, Cristianismo, Religiosidades,
E-mai | : [email protected].
Ambiente e Sociedade, Estudos Estratégìcos, Turismo, Patrimô-
nio, Relações de Cênero, Estudos Avançados. E-mail: ppfuna-
Patricia Prata - Doutora 12007) e Mestre (2002) em LinguÍstica, ri@reitorìa.un icamp.br.
área de Estudos Clássicos, pela Unicamp, tem graduação em
Linguistica pela mesma universidade. Atualmente é Professora Renata Senna Garrafoni - Doutora (2004), Mestre (1 999) e
Craduada em História (1997) pela Unicamp. Atualmente é
Doutora de Língua e Literatura Latina da Unicamp, onde atua
Professora-Adjunta da Universidade Federal do Paraná - UFPR.
no Programa de Pós-Craduação em Linguística. É líder dos
Atua junto ao Centro de Pensamento antigo (CPA) da Unicamp
grupos do CNPq "Poesia lmperial Romana", "lntertextualidade

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(Universidade Estadual de Campinas), é membro da Socieda-
de Brasileira de Estudos Clássicos (SBEC), Associação Nacio-
nal dos Professores de História (ANPUH), Roman Society for
Classical Studies e World Achaeological Cortgress (WAC). Tem
experiência na área de História, com ênfase em História Antiga,
atuando principalmente nos seguintes temas: Antiguidade clás-
sica, cultura popular, cuttura material e literatura latina, gladia-
dores romanos e releituras do mundo antigo na modernidade.
E-mai I: resennag3@hotmai l.com.

William f. Dominik Professor de Estudos Clássicos da Uni-


-
versidade de Otago/Nova Zelândia, também foi professor e ca-
tedrático de Estudos Clássicos e Humanidades em diferentes
universidades: Texas Tech University, University of Edinburgh,
University of Leeds, University of Cambridge e Monash Univer-
sity, em períodos de um semestre a três anos. Também atuou
como Professor-Visitante da Universidade Federal da Bahia
- UFBA. Administrador e Editor do periódico Scholia, desde
sua fundação em 1991, e coeditor de Literatura Latina da The
Literary Encyclopedia, desde 2005. Suas principais áreas de
interesse são: literatura politizada romana, especialmente da
época imperial, retórica romana, tradição e recepção clássica e
lexicograf ia. Emai : wi I I iam.dom
I i n i k@ota go.ac.nz.

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