(20210930-PT) VisÃ o 1491

ESPECIAL IMOBILIÁRIO PREÇOS DAS CASAS
DISPARAM NA PERIFERIA DE LISBOA E PORTO

AS ZONAS MAIS EM CONTA PARA COMPRA E ARRENDAMENTO
A NEWSMAGAZINE MAIS LIDA DO PAÍS WWW.VISAO.PT
SAÚDE
Nº 1491 . 30/9 A 6/10/2021 . CONT. E ILHAS: €3,70 . SEMANAL
FALTA DE MÉDICOS
E LISTAS DE NOVE
ESPERA DEIXAM ESCAPADAS
HOSPITAIS EM DE OUTONO
ESTADO CRÍTICO
CA R L O S M O E DA S
O HOMEM QUE MUDOU O JOGO

SERÁ A VITÓRIA SURPREENDENTE NA CAPITAL O INÍCIO DE UMA MUDANÇA POLÍTICA NO PAÍS?
OS TRUNFOS, OS ARGUMENTOS E AS FRAGILIDADES DA NOVA ESPERANÇA DA DIREITA
omegawatches.com
A ESCOLHA DE JAMES BOND
Na perseguição de um vilão misterioso, James

%RQG HQIUHQWD D VXD ¼OWLPD PLVV¥R HPb Sem
Tempo para Morrerb FRP R 20(*$ 6HDPDVWHU
Diver 300M no pulso. Este relógio chega
pronto para a ação com um design ultra leve em
WLW¤QLRb H R PDLV HOHYDGR SDGU¥R GH SUHFLV¥R H
antimagnetismo Master Chronometer.
BOUTIQUE OMEGA • Av. da Liberdade, 192A • Lisboa

VISÃO
30 SETEMBRO 2021 / Nº 1491
12 Entrevista: Renato
Miguel do Carmo
RADAR
17 Raio X
18 A semana em 7 pontos
20 Holofote
MARCOS BORGA
21 Inbox
22 Almanaque
24 Transições
26 Próximos capítulos
28 Oceano de Esperança 42 SNS em estado crítico
A pandemia deu finalmente tréguas, mas há muito que as patologias
do Serviço Nacional de Saúde se agravam. As enchentes na urgência,
FOCAR a debandada dos profissionais ou o número de utentes sem médico
70 Alemanha: Quem quer de família são o reflexo de algumas das suas doenças crónicas
casar com “herr” Scholz?
74 A atração pelos vulcões
76 TV: rir e integrar
30 Carlos Moedas: quem é a nova estrela da política
nacional?
A vitória inesperada do antigo comissário europeu, em Lisboa,
VAGAR projeta-o como um dos mais importantes ativos da direita portuguesa.
80 O regresso das aventuras Conheça a história de um vencedor improvável
de Hergé
86 Pessoas
88 Tendências
38 António Costa responde com remodelação
O primeiro-ministro estará a preparar uma remodelação para depois
do Orçamento do Estado – e a entrada de Fernando Medina no Governo
é o mais recente tabu. Mas essa não é a única consequência destas
VISÃO SETE eleições. Veja em que estado fica cada um dos partidos, no dossier
dedicado ao rescaldo das autárquicas
52 Rumo às periferias das grandes cidades

Nos concelhos vizinhos de Lisboa e do Porto, os preços das casas
já começaram a disparar, sinalizando a preferência de muitas famílias
portuguesas por viver mais longe dos centros. Caderno mensal VISÃO
Imobiliário
91 Escapadas de outono
OPINIÃO Online W W W.V I S A O . P T

8 Mia Couto Últimos artigos no site da VISÃO
10 Rui Tavares Guedes
16 Pedro Marques Lopes
73 José Carlos de Vasconcelos
90 Capicua
114 Ricardo Araújo Pereira Inês Margarida Martins Manuel Delgado Manuela Niza
MODA SAÚDE IGUALMENTE DESIGUAIS
Tendências de calçado ADSE: Incoerências e Negacionistas,
Interdita a reprodução, mesmo parcial, para o outono/inverno modelos ultrapassados terroristas e outros istas
de textos, fotografias ou ilustrações sob
quaisquer meios, e para quaisquer fins,
inclusive comerciais.
Todos os dias, um novo texto assinado por um dos 28 especialistas convidados
4 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

Seja responsável, beba com moderação.

O perfil singular da terra, a força do sol, a expressão das castas,
os olhos de quem cuida, a espera, a minúcia, a dedicação,
a certeza de uma experiência genuína.
Tudo o que é único tem uma origem
e esta é Monção e Melgaço.
LINHA DIRETA Correio do leitor
A revolução das periferias

Peter Everson e Ana Filipa Coelho
são dois dos entrevistados da
jornalista Marisa Antunes, na
reportagem A febre das periferias,
que publicamos nesta edição.
Tencionam casar-se em breve
e, por isso, vão mudar-se para
um T3 no empreendimento Vila Algo vai muito mal na paz
Viva, em Vila Franca de Xira. “É a
nossa primeira casa em comum e podre em que vivemos.
há muito que procurávamos um
imóvel nos arredores de Lisboa.
Se os negacionistas negam
Quando ouvimos falar neste, pesou o direito à livre circulação
o facto de ser um condomínio
privado, ser um projeto novo e que
e convivência, as autoridades
MARCOS BORGA
nos poderia dar a qualidade de vida devem intervir, punindo
que queremos”, explicam à VISÃO.
Além de casos concretos, o artigo,
com mão pesada
Ademar Costa, Póvoa de Varzim
que o leitor pode conhecer a partir
da página 56 desta edição, inclui também entrevistas com especialistas do
setor que nos comprovam a tendência: muitas famílias portuguesas estão AUTÁRQUICAS
a ser atraídas pelas zonas à volta das grandes cidades, o que tem feito os De facto, o País é só Lisboa, tudo o
resto é paisagem. As autarquias ganhas
preços dispararem. O trabalho abre o caderno mensal VISÃO Imobiliário, em todo o País por um só partido,
integrando ainda informação estatística sobre esta subida de preços nos maioritariamente, não têm qualquer
concelhos vizinhos de Lisboa e do Porto. valor, face ao partido que ganhou a
câmara de Lisboa. O resto do País é de
segunda categoria… E, curiosamente,
tantos dos que hoje só olham para
Exposição World Press Photo, em Oeiras

os resultados eleitorais autárquicos,
assumindo que Lisboa é a vitória mais
importante, ontem atacavam Lisboa
pelo seu centralismo, por não deixar
Até 15 de outubro, a exposição que junta as melhores fotografias de 2021 do World sair de Lisboa nenhum dos seus vastos
Press Photo está patente, no Parque dos Poetas, em Oeiras (entrada Templo poderes. Afinal, comprovam e aprovam
da Poesia). Com organização da VISÃO, em parceria com a Câmara Municipal exatamente isso. Sem hesitar. Quando
de Oeiras, a mostra reúne o que de melhor se produziu, no ano que passou, no se está de fora, é tão cómodo atacar os
de dentro, quando lá se chega, muda-se
fotojornalismo mundial (de segunda a domingo, das 10 às 20 horas, entrada tão rapidamente de opinião.
grátis). Em simultâneo, a VISÃO também organiza um conjunto de workshops A. Küttner
com profissionais especializados em diversos estilos de fotografia. As sessões
decorrem aos sábados, das 15h30 às 17h30, sendo a lotação limitada a 25 pessoas Perante uma hecatombe social,
(inscrições no próprio dia, no Templo da Poesia). No próximo sábado, 2, o workshop os candidatos autárquicos nem afloram
este flagelo. Estamos perante 800 mil
será dedicado ao fotojornalismo e orientado por Marcos Borga, desempregados reais, as moratórias
da equipa da VISÃO. a acabar, os sem-abrigo pululam e estes
temas são invisíveis. Estas notórias
ausências são graves demais para serem
Já nas bancas esquecidas. Não admira que a abstenção

volte a ser relevante.
Vítor Colaço Santos, São João das Lampas
Contactos
[email protected]
As cartas devem ter um máximo
de 60 palavras e conter nome, morada
e telefone. A revista reserva-se
o direito de selecionar os trechos
que considerar mais importantes.
NOVA MORADA
FUTEBOL NOVO ANO AFEGANISTÃO CORREIO: Rua da Fonte da Caspolima
Como o desporto-rei está a LETIVO Talibãs estão – Quinta da Fonte,
dar a volta à pandemia Regresso às aulas de volta Edifício Fernão Magalhães, 8,
2770-190 Paço de Arcos

MAPEADOR DE ILHAS
Uma submissa
desobediência
POR MIA COUTO
ILUSTRAÇÃO: SUSA MONTEIRO
H
á horas que espero descalça na cozinha, que, a esta hora da noite, o chão são paredes que subo
os pés juntos como quem vai de saída. e desço sem parar. De vez em quando, suspendo as
Esta é a última noite do ano. Escutam- limpezas, para suspirar: como é que os que não têm
-se os derradeiros e tardios foguetes, fios nada produzem tanto lixo?
cansados de música cada vez mais dis- Chegam-me à lembrança as festas da nossa antiga
tante. Ainda ecoam pela casa as vozes dos casa. Para poupar dinheiro, juntávamos os aniversá-
filhos e dos netos que vieram da capital rios dos cinco filhos num único festejo. Essa celebra-
para a passagem do ano. Durante escassas ção coletiva acontecia numa noite igual a esta, a noite
horas, a nossa família voltou a partilhar a do Fim do Ano. Um só bolo, uma única vela, cinco
casa. Num breve instante, o bairro dan- latas de refresco. O meu marido, o Joel, ironizava:
çou e cantou sob um mesmo céu. Foi reino de pouca vamos morrer todos no mesmo dia para pouparmos
dura. No instante seguinte, a cidade voltou a erguer os no funeral.
seus muros e os meus filhos partiram entre acenos e Esta noite trouxe de longe essas memórias e lan-
promessas de regresso. Assim que se retiraram, o meu çou-as no chão da cozinha. Já não tenho força para
marido também se despediu. Tinha afazeres com os limpar aqueles despojos.
amigos, era coisa de meia hora. Foi assim que Joel se – Não é o tempo que cura – vaticinava a minha
justificou. Baixei os olhos, acenei em silêncio, sabendo velha mãe, as mãos apoiadas no cabo da vassoura. E
como eram infinitas aquelas meias horas. acrescentava, num interminável suspiro: – Não espe-
Arrumei sozinha a casa, varri o chão e juntei as res nada do tempo, minha filha. A vida. A vida é quem
garrafas no caixote de lixo. Fiz tudo isso descalça por- cura as feridas do viver.

Já amanhece e o locutor da rádio celebra o despontar Será o meu marido quem descerá à terra envergando o
de uma nova vida. Assegura que hoje tudo pode começar. seu fato de cerimónia. Ou melhor, Joel usará o meu ves-
Estou tão sozinha que acredito nas palavras do locutor, tido de noiva. Com grinalda, véu e laçarotes, Joel cruzará
com medo de que também ele desapareça na estrada por as mãos sobre o peito, com um sorriso de uma inocen-
onde foram os meus filhos. Então, me ocorre o seguinte: te donzela. Sim, a rádio tem razão. Hoje é um princípio.
não posso estar assim tão descalça, tenho de engrande- Aquela não é apenas uma passagem do ano. Vou virar o
cer esta espera. Tenho de me aprontar, preciso de estar à mundo do avesso. E não haverá mais esperas. E a vida vai
altura do momento. Vou-me vestir e calçar a rigor. curar-me das feridas do viver.
Olho o chão e desisto. Os meus pés não são parte de Ergo-me de rompante como se a cadeira fosse uma
mim. São os pés da minha mãe, gordos e desleixados. prisão. Lá fora, começa a chuviscar. Devia ir para o quin-
Lembro-me dela dançando no quintal abraçada a uma tal e deixar que a chuva refrescasse o meu corpo e lavasse
garrafa de cerveja e, a cada volta que dava, a garrafa cres- o suor e as más lembranças. Mas guardo-me na cozinha
cia de tamanho até que ambas, ela e a garrafa, tombavam como se esse lugar fosse a minha única nação. Desligo o
num único corpo. Eu corria a apanhar os cacos e aqueles rádio, e contemplo o anel na mão direita. Com inespera-
vidros rasgavam-me os dedos como se fossem pedaços da gana, decido arrancar a aliança. Não quero nunca mais
da minha mãe. Certa vez, ela me abraçou fundo. Pensei esse falso brilho. Mas o anel ficou cravado na carne como
que fosse um raro acesso de ternura. Não era. Ela me cin- se fosse um osso crescendo em redor da pele.
gia junto ao peito para que eu não pudesse ver o seu rosto Decido então: se é para começar uma vida, vou esperar
enquanto falava. como espera uma noiva. Vestida e calçada como man-
– O meu corpo deixou de gostar de mim – disse ela, dam as regras. Para mostrar a Joel que o nosso casamen-
babando-se nas minhas costas. – Mas não culpes o teu to nunca aconteceu. E que eu me entregarei ao primeiro
pai, filha: as saídas dele, à noite, estão autorizadas por homem que bater à porta.
mim. O teu pai vai-me buscar no corpo de outras mu- Dispo-me e saio nua para o quintal. Deixo que a chu-
lheres. va escorra na minha pele como se
Certo dia, a minha mãe não tombou. nascesse dentro de mim e regresso à
Abraçada à garrafa, ela se adentrou pela Tudo isso recordo, cozinha para lavar os pés. Não quero
casa e regressou, carregando nas mãos
trémulas uma fotografia do casamento.
sentada na minha sujar os sapatos de cetim. Enquan-
to esfrego os tornozelos, penso que
– Vê como eu era esbelta – disse ela. cozinha, em frente à aqueles não são os meus os pés, assim
– Não é a idade, a felicidade é que nos porta que nunca mais tão campestres, tão feitos de chão. São
dá beleza. os pés da minha mãe, escaparam-lhe
Pediu-me, então, que eu, sendo a se abre. O locutor pelos buracos dos sapatos. Vejo que
única filha, garantisse que a tradição da rádio insiste: hoje ela tinha razão: pesa muito carregar
fosse cumprida. E foi clara, explicando
os mandamentos da nossa gente: aquilo
pode ser o primeiro uma alma vazia.
Agora, sim, com passo firme, vou
que se usa no casamento não pode ser dia de uma vida nova buscar o vestido e os sapatos que estão
herdado, nem vendido, nem doado, sob emoldurados na parede da sala. Não
pena de desgraçar a nova dona. Seria os pendurei no armário. Fiz como se
eu a guardiã desse velho preceito: que o seu vestido fosse faz com a ceia de Cristo. Coloquei-os em duas caixas de
colocado no caixão junto aos anéis, colares e pulseiras. cartão e cobri-os com uma folha de plástico, como se re-
Ou, melhor ainda: que ela descesse à terra envergando o ceasse que fugissem ou desbotassem com o tempo. Com
vestido de noiva. uma tesoura, alargo as costuras e esgueiro-me por entre
– Vai tudo comigo, é parte do meu corpo – declarou os panos com medo de rasgar as costuras. Visto-me com
a mãe, num quase enlevado murmúrio. – Quando me o tecido ao avesso: o lado fosco para fora, o lado acetina-
olharem no fundo do caixão, todos dirão: como vai bonita do para dentro. Não sei quanto irá durar a espera, quero
a noiva! sentir o cetim como se fosse uma carícia.
Lembro-me do funeral, lembro-me de que o corpo É manhã, adormeci como a minha mãe no seu último
dela não ocupava nem metade do caixão. Ocorreu-me, na sono: deitada sobre um vestido de cetim. Acordo com o
altura, que tivessem ido buscar uma urna já usada. O que meu marido abrindo a porta. Abraça-me, com surpreen-
sobrava do caixão eram os seus pés, tão vivos e friorentos dente delicadeza.
que me apeteceu ir buscar uma capulana para lhe cobrir – Madalena, meu amor – suplica ao meu ouvido. E
as pernas. E o vestido? – perguntaram-me os familia- murmura, a boca dando nós nas palavras: – Por amor de
res. – Vai por baixo do corpo – assegurei. Assim, a mãe Deus, Madalena, desculpa. Vai por baixo do corpo.
deitava-se sobre o seu passado. Os parentes anuíram com Eu desculpo. Não me chamo Madalena. E o meu ma-
um aceno comedido. rido não me traiu. Joel não esteve com ninguém. Pelo de-
Tudo isso recordo, sentada na minha cozinha, em sespero do seu abraço, percebo que a solidão dele é maior
frente à porta que nunca mais se abre. O locutor da rádio do que a minha. Ajudo-o a que se deite, deixo-o a dormir
insiste: hoje pode ser o primeiro dia de uma vida nova. e regresso à sala para me despir. Com gestos lentos, os
De súbito, sou tomada por uma decisão: não serei como a dedos amarrados pela culpa, volto a emoldurar na parede
minha mãe. Não usarei, no meu caixão, vestidos e rendas. o vestido de noiva da minha mãe. [email protected]
30 SETEMBRO 2021 VISÃO 9

OPINIÃO
HISTÓRIAS
DA CAPA
Vamos falar a sério
sobre a abstenção?
P O R R U I T A V A R E S G U E D E S / Diretor-executivo
1
E
stas eleições autárquicas, com uma ditar no órgão de comunicação social que as
dúzia de resultados surpreendentes veicula como se fossem um facto indesmen-
entre uma esmagadora maioria de tível e que até, por vezes, querem fazer crer
desfechos previsíveis, deram algumas que será imutável.
lições. Demonstraram, por exemplo, As autárquicas confirmaram, por outro
que por mais que as campanhas elei- lado, que a abstenção é um problema já
torais se centrem nos temas nacio- endémico no nosso sistema democrático.
nais acabam por ser os sentimentos Mesmo numas eleições em que concorriam
locais a decidir quem ganha e quem perde. dezenas de milhares de candidatos, em to-
Provaram que, para os eleitores, a perce- dos os pontos do País, cerca de metade dos A vitória
ção da realidade presente e o balanço que eleitores optou por nem sequer se deslocar surpreendente
de Carlos Moedas,
fazem do passado próximo são bem mais às mesas de voto. A abstenção foi superior
em Lisboa, merece
importantes do que as promessas futuras aos 46%, o segundo maior valor em eleições
a capa. Mas com
e mirabolantes, que se possam repetir nas deste género – mas que, de uma forma ou que foto?
ações de rua ou nos diretos para as televi- de outra, começa a ser norma em quase to-
sões. De facto, a cobertura mediática que se dos os atos eleitorais.
faz das eleições tem muito pouca impor- É preciso começar a falar a sério sobre a
tância na hora da votação – aí o que conta,
mesmo, é a decisão do eleitor, quase sempre
abstenção e, acima de tudo, tomar medi-
das para evitá-la, exatamente como muitos
2
sob o mesmo prisma: mais do que eleger outros países têm feito por esse mundo fora.
uma alternativa, o que o move é se pretende Basta ver que, no mesmo dia das nossas au-
ou não castigar a liderança autárquica que o tárquicas, também os alemães tiveram elei-
governou no último mandato. E pode fazê- ções, mas com uma diferença substancial:
-lo de duas maneiras: votando no opositor uma larga percentagem dos eleitores já tinha
ou, simplesmente, desistir e nem sequer votado pelo correio, através dos boletins
comparecer na mesa de voto. enviados, dias antes, para a casa de todos
Ficou claro, também, que a confiança os inscritos nos cadernos eleitorais. Mais
desmedida dos autarcas-candidatos, ali- ou menos o mesmo ocorreu na Islândia, no
mentada pelas sondagens e por perceções último sábado, em que um quinto dos elei-
erradas da realidade, quando se transforma tores também votou por antecipação. Podia ser uma
em arrogância, acaba por ser duramente Por cá, continua tudo a funcionar exata- foto da noite
eleitoral ou um
condenada. Cada vez mais, neste tipo de mente como há mais de 40 anos. Os tempos
retrato feito já no
sufrágios, é valorizada a proximidade que mudaram, a abstenção está a crescer, mas
dia seguinte.
os autarcas conseguem manter ou não com nada se altera no sistema ou nos proce-
as populações – ao longo do mandato e não dimentos. Continuamos a viver na era do
apenas nas curtas semanas da campanha edital afixado à porta da assembleia eleito-
eleitoral. Quem se mostra mais próximo e
atento aos problemas do quotidiano tem
ral, mas nada se faz para tentar aproximar o
boletim de voto das pessoas. Nem mesmo a 3
sempre mais probabilidades de ser reeleito. experiência do voto antecipado para todos,
Quem, pelo contrário, se refugia nos salões que teve boa afluência nas presidenciais de
dos paços do concelho, sem dar importância janeiro, por causa da pandemia, foi agora
às pequenas queixas que se vão acumulando repetida: voltou a ficar condicionada a casos
no exterior, acaba muitas vezes por ver re- específicos de força maior e, portanto, a
duzida a sua maioria ou até por ser derrota- quase ninguém.
do – para sua surpresa (obviamente). A abstenção não é um problema exclusi-
Estas eleições demonstraram também vo de Portugal. Há anos que preocupa quase
que é preciso começar a olhar para as son- todos os regimes democráticos. A grande
dagens de uma forma diferente. Analisá-las diferença é que muitos países têm procura-
apenas como um indicador do que pode do combatê-la: com eleições a prolongar-se Esta é a melhor
ser uma tendência, e não como um retrato por mais dias, urnas móveis, voto eletrónico solução, já que
indesmentível da realidade. E os órgãos de ou por correio, e outras soluções. Em Por- ilustra, de forma
comunicação social têm de saber refletir so- tugal, pelo contrário, continuamos na inação categórica, o
bre isso, até porque o resultado está à vista: do costume, a deixar a democracia a ser protagonismo
quando as pessoas deixam de acreditar nas minada. No combate à abstenção somos... súbito de Moedas,
em Lisboa e no
sondagens, elas deixam igualmente de acre- abstencionistas. [email protected]
País.

Tem falta de espaço?
ANTES
Já pensou em utilizar
o sótão?
RECOMENDAÇÃO A sua família está a aumentar e a falta de espaço já se faz

DE UM sentir. Para ganhar metros quadrados, pensou em adaptar
PROFISSIONAL o sótão esquecido, mas duvidava que fosse possível…
© 2021 Groupe VELUX VF 7391-0721 ® VELUX e o logótipo VELUX são marcas comerciais e modelos registados e utilizados sob licença pelo grupo VELUX.
Michel Legrand Mais simples do que uma mudança de casa, mais barato do que fazer um aumento:
Especialista VELUX a adaptação do sótão esquecido é a solução ideal para ter metros quadrados
adicionais. Na verdade, sob o seu telhado, há espaço para criar a divisão adicional
As etapas de uma renovação de que precisa: quarto das crianças, quarto principal com casa de banho,
Pretende calcular a duração e as etapas escritório… e é melhor do que criar essa divisão na garagem ou na cave, certo? Mas
essenciais de uma obra de renovação do tem dúvidas sobre a viabilidade do projeto: neste momento, é impossível circular no
sótão? Inspire-se nos elementos deste tipo sótão, porque as vigas em perfil de "W" ocupam o espaço todo. Não se preocupe, é
Este documento não é contratual. VELUX France, S.A.S. com um capital de 6 400 000 euros, R.C.S EVRY 970 200 044.
de obra, que permitiu libertar 70 m² ao possível converter qualquer tipo de sótão e o seu não é exceção! Ao fazer algumas
nível do piso. obras, poderá ganhar mais espaço e criar um local tranquilo e atípico, ideal para
dormir, brincar ou trabalhar.
Duração da obra Obras rápidas e sem inconvenientes

35 dias É uma obra de curta duração, durante a qual pode continuar a viver na sua casa
sem qualquer inconveniente. Na verdade, as obras e o transporte dos materiais
Reforço estrutural
são normalmente efetuados a partir do exterior do edifício, através do telhado, o
(estrutura/piso)
que minimiza o pó ou a passagem de trabalhadores no resto da sua casa!
Instalação de janelas no telhado
Divisão e isolamento Deixe entrar a luz do sol
Eletricidade Para tornar o espaço sob o telhado num lugar agradável e polivalente, não se
esqueça da luz natural. Para se sentir bem num espaço interior, é essencial que
Instalação das escadas e
exista luz natural suficiente. Ao multiplicar as janelas no telhado, permite a entrada
acabamentos
do máximo de luz natural possível. Isto contribui para tornar as novas divisões
criadas confortáveis para o dia a dia e atualizáveis ao longo dos anos. Aliás, se, por
Custo por m²: um lado, nos queixamos de falta de luz, nunca o fazemos quando há em
600 euros abundância!
Em suma, a adaptação do seu sótão esquecido é a melhor solução para ampliar

consideravelmente o espaço habitável da sua casa, tirando partido dos metros
www.velux.pt/ quadrados adicionais mais baratos do mercado. No entanto, certifique-se de que
reforma deixa entrar muita luz natural para desfrutar plenamente da divisão.
Renato Miguel do Carmo
Diretor do Observatório das Desigualdades
Esta sensação de incerteza

permanente desgasta, cria
ansiedade e frustrações.
As pessoas estão sempre
a gerir o imediato.
A precariedade não é apenas
um fenómeno laboral
NUNO AGUIAR LUÍS BARRA

A
A economia portuguesa já entrou
na fase de recuperação da crise
pandémica, mas o mercado de
trabalho esconde fragilidades que
as estatísticas não permitem expor.
Em O Trabalho Aqui e Agora (Tinta-
da-china), Renato Miguel do Carmo
e outros três autores (Isabel Roque,
Jorge Caleiras e Rodrigo Vieira de
foi uma espécie de dique contra o
aumento do desemprego. Os apoios
ao rendimento, as moratórias de
crédito e, mais tarde, o apoio aos
trabalhadores mais precários... A
política pública fez a diferença.
As estatísticas não nos dizem
tudo sobre o emprego que está
a ser criado. Esta crise pode
marcar uma diferença no tipo de
vínculos oferecidos e no nível de
precariedade?
As estatísticas não captam toda a
realidade, nomeadamente situações
de maior informalidade. Neste
período, entre 2015 e 2020, o
emprego estava a aumentar, mas
parte dele era de pouca qualidade,
com enquadramento contratual
muito débil e sem proteção social.
Essas realidades são invisíveis e
vividas muitas vezes de forma isolada.
Este livro tenta dar-lhes visibilidade.
feito numa posição de ainda maior
fragilidade?
Sim, esse é o grande desafio. As
estatísticas já mostram isso. Há um
conjunto de indicadores que mostram
que os jovens foram especialmente
afetados. Estamos a falar de uma
geração que sofreu a crise anterior
quando ainda estava no ensino ou a
iniciar-se no mercado de trabalho
e que, no período de recuperação,
identificou alguma melhoria entre
2015 e 2019, mas em que a qualidade
do emprego continuava a ser um
problema. E agora sofre mais uma
crise profunda. Paradoxalmente,
falamos sempre dela como a geração
mais qualificada de sempre, com
um enorme potencial, mas que vive
situações laborais muito difíceis. Têm
grandes dificuldades em ingressar
no mercado de trabalho ou, se foram
despedidos, em reingressar.
Assis) descrevem um ambiente Sabemos que estão muito presentes A partir do momento em
cada vez mais desafiante para os na vida das pessoas, principalmente que se começa numa posição
trabalhadores, depois de terem das novas gerações. Um trabalhador de fragilidade, ela pode ter
atravessado, em dez anos, duas crises jovem com contrato permanente é repercussões durante muitos anos?
de dimensão histórica. O livro usa os uma excepção. Convém não individualizar. Tentamos
percursos de 53 trabalhadores para Esta crise criou a sensação de demonstrar que tem que ver com as
mostrar um mundo de incerteza que existem dois países? O País trajetórias anteriores. As condições
e precariedade: saltos de emprego daqueles que puderam ir para casa, sociais de partida.
para emprego e de área para área, em layoff ou teletrabalho, e o País Continuam a ser muito relevantes
por vezes sem contrato ou proteção daqueles que, por vários motivos, em Portugal?
social. Para muitos, a insegurança não o podiam fazer? Trajetos de escolarização
deixou de ser excecional. O mercado Sim, houve desigualdades que se interrompida e abandono escolar
de trabalho tornou-se um ambiente reforçaram. Mas a crise ainda não ainda existem em grande número
mais de constragimento do que de acabou. Estamos a viver um período em Portugal e acabam por refletir
oportunidades. A VISÃO conversou incerto. Os apoios vão terminando grandes dificuldades para ter uma
com Renato Miguel do Carmo sobre e a economia está a recuperar, mas trajetória mais estável no mercado
esta realidade, muitas vezes, invisível a questão é saber qual é a força da de trabalho. Ainda há um prémio
ao debate público. retoma para conter o aumento do associado à qualificação superior. Mas
Acabámos de atravessar uma desemprego. E isso é um pouco quem, à partida, tem um conjunto
quebra enorme do PIB, o imprevisível. É claro que virão de desvantagens, nomeadamente
desemprego já está ao nível do também apoios via PRR [Plano do ponto de vista escolar, tem
pré-crise e a população empregada de Recuperação e Resiliência], dificuldades acrescidas.
está em máximos. Porque temos de mas poderão tardar. É um pouco Escrevem sobre o mercado de
nos preocupar com o que se está a essa a incógnita – estamos num trabalho como um ambiente
passar no mercado de trabalho? ambiente periclitante e já há alguns não de oportunidade mas de
Se compararmos com a crise anterior, sinais, nomeadamente no número constrangimento. O que querem
a pandemia e o confinamento tiveram de despedimentos coletivos. Mas dizer com isso?
impacto imediato no desemprego, não há dúvida de que, no primeiro Não é específico de Portugal, mas há
que afetou em grande medida quem embate da crise, houve disparidades dinâmicas do mercado de trabalho
estava em situação vulnerável – sem muito fortes. Pessoas que não eram que fazem com que as pessoas
contrato, com contrato a prazo ou elegíveis para o layoff e o subsídio estejam inseridas de forma muito
em período experimental. Algumas de desemprego. E essa transição precária, o que tem consequências
dessas pessoas são captadas pelas para o teletrabalho também criou para a sua qualidade de vida. A
estatísticas, outras não. Mas o facto é desigualdades entre famílias com questão fundamental é esta sensação
que, a determinada altura, a política maior ou menor capacidade para de incerteza permanente. Desgasta,
pública teve impacto. gerir o confinamento. cria ansiedade e frustrações. As
É a grande diferença entre as duas O livro tem um segmento sobre pessoas estão sempre a gerir o
crises? como é decisivo o momento de imediato e a antecipar riscos mais
Penso que sim, foi uma variável muito entrada no mercado de trabalho. graves. Não podemos olhar para
significativa. O layoff simplificado Depois desta crise, esse início será a precariedade apenas como um

fenómeno laboral. Tem repercussões surgiram novos movimentos, tensões
em várias dimensões das nossas
Os apoios vão com sindicatos, alianças. Foi um
vidas. Anthony Giddens fala no terminando e a momento muito rico. Nesta crise,
conceito de segurança ontológica, isso não existiu ou foi residual, o que
um pilar da modernidade. Existia um
economia está a é dramático. O protesto faz parte da
contrato social, as pessoas tinham recuperar, mas a democracia, desde que devidamente
confiança nas instituições e havia enquadrado. E ele faz-se nas arenas
proteção a vários níveis. No fundo,
questão é saber habituais. Quando elas não podem
estamos agora a assistir a uma qual é a força da ser usadas, como a rua, torna-se
insegurança ontológica. A incerteza já problemático. É importante reforçar
não é excecional. Passou a haver uma
retoma para conter o papel dos sindicatos. Além da
grande rotatividade, sempre a correr o aumento do centralidade do contrato de trabalho,
atrás do prejuízo e sempre a tentar é muito importante dar novo fôlego à
sobreviver. Isso gera insegurança e
desemprego contratação coletiva.
corrói várias dimensões da vida das A legislação laboral voltará a estar
pessoas. Não só do ponto de vista ligada ao debate orçamental deste
material, mas também existencial.
Algumas pessoas, ano. Vivemos ainda com o legado
E gera um mal-estar tremendo nas mais jovens, das mudanças feitas no período
sociedades. da Troika. Perante aquilo que
Isso contrasta com algum debate
consideravam-se concluem no livro, que mudanças
público, que trata a flexibilidade precárias, mas não deveriam ser consideradas?
como uma oportunidade. Os Não entrando no detalhe das
trabalhadores com quem falam no
valorizavam tanto medidas, há uma questão
livro não parecem especialmente fazer contribuições interessante: ao contrário de outras
gratos por ela. áreas que produzem desigualdades
Muitas vezes flexibilidade significa
para a Segurança e que são muito difíceis de regular
precarização. A grande questão, Social. à escala nacional – como fluxos de
principalmente para os mais jovens, capitais –, do ponto de vista laboral
não é regressar ao paradigma do
Essa perceção há uma margem significativa para
emprego para a vida. É não viver alterou-se. as políticas nacionais. Deveria ser
permanentemente em risco. Ter um um princípio orientador para essas
conjunto de garantias, segurança
Perceberam negociações. E deve ser norteado
contratual e proteção social. Com que era importante pela centralidade do contrato de
a pandemia, e nós acompanhámos ter proteção trabalho, a formalização das relações
alguns casos, havia pessoas com laborais e o direito à proteção
rendimentos razoáveis, mas sem social. A valorização da negociação
contratos de trabalho e que, de um coletiva e o reconhecimento do
momento para o outro, deixaram próprio trabalho. Isso é importante
de ter rendimento e não puderam nas novas formas de trabalho que
ser elegíveis para apoios sociais. passam por plataformas, conhecidas
Esta sensação é terrível. É como como uberização ou gig economy. O
cair num buraco negro. O caso mais Livro Verde avança com o princípio
gritante foi o setor do turismo, que a trabalhar, sempre online. Há ainda o de presunção de laboralidade que é
praticamente fechou. Condutores de facto de o teletrabalho individualizar interessante. Reconhecer, na ligação
tuk-tuks, trabalhadores de limpeza de e isolar ainda mais as pessoas, entre trabalhador e plataforma,
Airbnb deixaram de ter rendimento. distanciando-as da esfera de ação uma relação laboral. Esses devem
E foi até curioso: algumas destas coletiva. São riscos muito grandes, ser os princípios: ter políticas que
pessoas, mais jovens, consideravam- que podem contribuir para uma reduzam a tremenda rotatividade e
se precárias, mas não valorizavam maior vulnerabilidade. Penso que o fragmentação de muitos percursos
assim tanto fazer contribuições para trabalho presencial deve continuar laborais e o facto de muitas
a Segurança Social. Essa perceção a ser central, com a possibilidade de pessoas estarem em situações
alterou-se. Nesse equilíbrio, entre ser complementado com teletrabalho, informais ou na fronteira entre a
ter rendimento ou proteção social, mas devidamente regulamentado. formalidade e a informalidade. Isso
perceberam que era importante ter Senão, será mais uma esfera para tem consequências laborais, mas
proteção. existirem abusos. também para as contribuições para
Ainda é cedo, mas já existem pistas A organização coletiva é mais a Segurança Social. É preciso pensar
sobre que efeitos terá uma maior complicada, quando só nos vemos o futuro do trabalho a partir do
prevalência do teletrabalho? uma vez por mês? presente. A coesão das sociedades
É uma área em que é fundamental Esses processos de individualização passa por aqui. No fundo, criar
haver regulamentação no âmbito do quebram redes. O confinamento e o políticas que permitam às pessoas
código laboral. Sem isso, há grandes distanciamento social são obstáculos conquistar a sua segurança ontológica
riscos. Desde logo, na gestão do à participação coletiva e organização e o controlo sobre o seu tempo
tempo. A ideia de que se está sempre de protestos. Na crise anterior, presente e futuro. [email protected]

POLITICAMENTE CORRETO
Sinais de mudança
P O R P E D R O M A R Q U E S L O P E S / Colunista
O
Partido Socialista governa 148 câmaras mu- ta fez uma campanha empenhada e bem conduzida, e
nicipais, é de longe o maior partido autár- Rio uma anárquica e com erros gigantescos, percebe-
quico e tem a maioria dos municípios mais -se que o mais importante para ganhar umas eleições
populosos. Não há dúvidas: é o vencedor está a acontecer: o desgaste de quem está no poder.
incontestado das eleições. Vai-se sentindo um sentimento contra a arrogân-
No entanto, Rui Rio ganhou a noite elei- cia do PS que, mais do que gerar simpatias para com
toral do último domingo. Parece contradi- o PSD, gera rejeição ao PS. Se a simpatia em política
tório, mas não é. se conquista com o tempo, a rejeição não é facilmente
O líder do PSD estabeleceu uma meta ultrapassável.
eleitoral e atingiu-a; mais do que isso, ga- A viragem concretizar-se-á? É difícil de se prever. O
rantiu que será ele o candidato a primeiro-ministro PSD cresceu nos meios urbanos, aumentou o número
nas próximas legislativas, quando os seus adversários de capitais de distrito, mas ainda falta muito para que
já desembainhavam as espadas. esteja próxima uma vitória nas legislativas. E, claro,
Por outro lado, a omnipresença de António Costa vêm aí muito dinheiro, muita obra, muitos empregos,
não teve os efeitos esperados. A sua popularidade, os e será o PS a distribuir todo esse bodo. Importa lem-
bons resultados na luta contra a pandemia e a pro- brar que Cavaco Silva ganhou uma das suas maiorias
metida chuva de milhões não deram a estamina que absolutas depois de perder umas autárquicas.
chegasse para uma vitória que ele pensava poder ser Houve, porém, alguém que carimbou a afirmação
esmagadora. Foram os autarcas socialistas que ganha- de Rui Rio: Carlos Moedas. Sem essa vitória, o re-
ram e nada têm a agradecer ao primeiro-ministro. No sultado não deixaria de ser bom, mas foi ele que deu
caso de Lisboa, bem pelo contrário. dimensão ao crescimento do PSD e, sobretudo, que
Na semana passada, pedi neste mesmo espaço ao fez acender as luzes amarelas dos socialistas.
líder do PSD que se afastasse. Estava convencido de Moedas fez também uma má campanha, com um
que teria uma vitória pirrónica, e, se assim tivesse discurso que mostrava pouco conhecimento dos
sido, acentuar-se-ia a sensação no partido e no País problemas da cidade, muito virada à direita, e foi até
de que Rui Rio não teria as condições mínimas para derrotado no debate com Fernando Medina, mas,
sequer disputar eleições com António Costa ou quem mesmo assim, conseguiu uma vitória que teve tanto
quer que o substitua – paradoxalmente, penso que há de inesperada como de extraordinária. Uma que é
agora mais hipóteses de Costa se candidatar às legis- tanto dele como de Rui Rio.
lativas do que havia no sábado. Enganei-me. Não foi Mais uma vez, o sinal de rejeição mostrou-se.
um resultado poucochinho, foi um bom resultado. Moedas poucos mais votos teve do que o PSD e o CDS
Não foi só um aumento na votação, no número de em 2017, mas Medina perdeu mais de 25 mil votos. Ou
câmaras, de vereadores, foi um sinal de inversão de seja, a campanha sobranceira e a inexistência de voto
ciclo. E é bom lembrar: nunca um líder do PSD partiu útil à esquerda não ajudaram, mas foi a rejeição ao
para umas eleições em circunstâncias tão adversas. PS em Lisboa que fez a diferença. E não há quem não
Vinha de resultados historicamente baixos, com uma saiba o valor simbólico de uma vitória para a câmara
névoa de desconfiança ao seu redor e debaixo de um de Lisboa.
intenso fogo interno. A rejeição que o PS já cria num conjunto alargado
Em termos relativos, Rio ganhou a Costa porque o de cidadãos ainda não chega para ganhar claramente
seu handicap era muitíssimo superior. umas eleições, mas é assim que, em primeiro lugar, se
Fez Rio uma boa campanha? Não, foi até bastante criam as condições para fazer um caminho.
má. Para não variar, deu sinais contraditórios, voltou É cedo para que se possa dizer se esta tendência se
a cair, por exemplo, no discurso simplista da subsi- mantém e se consolida, mas é um primeiro passo.
diodependência e voltou à lengalenga dos ataques às As próximas eleições legislativas vão ser, afinal,
empresas de sondagens e comentadores. muito mais disputadas do que se pensava. E se Rui
Há aqui um sinal que não pode ser desprezado. Rio se deixar de ziguezagues e se António Costa ouvir
As eleições, mais do que se ganham, perdem-se. Ao o canto das sereias europeias e deixar o poder para
assumir-se que Costa tinha todas as armas na mão, e um delfim, o PSD tem finalmente hipótese de acabar
Rio quase nenhumas, ao se ter a sensação de que Cos- com a hegemonia socialista. [email protected]

RAIO X
O IVA foi, mas volta A partir de 1 de outubro, já pode usar o saldo do

IVAucher em compras em alojamento, restauração
e cultura – os setores mais afetados pela pandemia
P A U L O Z A C A R I A S G O M E S [email protected]
Como funciona
1. Na primeira fase do programa, o contribuinte acumulou
o IVA pago nas compras com fatura nos setores abrangidos
2. É preciso, depois, aderir ao IVAucher no site
www.ivaucher.pt. Na aplicação e-fatura pode conferir
as faturas abrangidas e o valor acumulado em IVA
3. Para participarem no programa, os comerciantes também
Primeira fase se registam no site e podem afixar um selo identificativo no
seu estabelecimento
1 de junho a 31 de agosto
Acumulação do valor do IVA no saldo IVAucher 4. Na segunda fase, em cada compra num estabelecimento
dos contribuintes que pediram faturas aderente dos setores abrangidos, o consumidor pode
nos setores abrangidos descontar 50% do valor ao seu saldo de IVA. Exemplo:
numa compra de 20 euros, pode descontar 10 euros
5. Esse valor é transferido, no máximo, ao fim de dois dias
Segunda fase úteis, para a conta bancária do cartão que utilizou, até
esgotar o saldo do IVA acumulado.
1 de outubro a 31 de dezembro 6. O valor que não for usado até ao fim do programa será
Desconto do valor acumulado em IVA deduzido no IRS em 2022, permitindo abater a este imposto
nos estabelecimentos aderentes 15% do IVA suportado
396 500
Consumidores inscritos no IVAucher
28 de dezembro Percentagem
Limite para os
consumidores aderirem
50% do valor de cada
compra que pode
ser devolvida
123 123 123
€200 milhões
€81,6 milhões
Valor acumulado em IVA
pago pelos contribuintes
na primeira fase
2 400
Comerciantes que aderiram
ao programa
Teto orçamentado
para o programa IVAucher
€680 milhões SaltPay

Base de tributação dos três setores
(junho a agosto de 2021). Ficou acima
16 BANCOS Operadora do programa,
que envolve ainda
Aderentes
dos €510 milhões de 2020 e dos a Autoridade Tributária, a DGTF
€600 milhões de 2019 (pré-pandemia) (Ministério das Finanças) e o IGCP
FONTES Ministério das Finanças, IVAucher.pt, Direção-Geral do Orçamento; dados atualizados às 12h00 de 27 de setembro INFOGRAFIA AR/VISÃO

7
PONTOS DA SEMANA
POR
MAFALDA ANJOS*
LUSA
VITÓRIAS, DERROTAS, PERFUME E BAFIO

A beleza da democracia a funcionar é que ela
é como o tempo: podemos tentar antecipá-lo,
cartão amarelo a António Costa. Se não esti-
ver já demasiado inebriado consigo próprio,
mas não o podemos dar por garantido. Como com o faro político que lhe assiste, o primei-
o Homem e a Natureza, a democracia tem ro-ministro e o secretário-geral do PS que
tudo de orgânico: ajusta-se, adapta-se, rebe- confluem na mesma pessoa saberão lê-lo
la-se, surpreende. Há quem diga que tropeça como tal. Zelarão ambos pela autopreserva-
e erra (o tema faz correr rios de tinta entre ção do Governo e do partido, desinsuflando
ensaístas e académicos), mas, ao contrário o balão de altivez que tem crescido aos olhos
de todas as outras formas de governação, é a dos portugueses de forma bastante nítida.
única que se pode autocorrigir. Tão nítida que deu no que deu em Lisboa. Os
Para quem gosta da democracia, seja qual for péssimos resultados do PCP e do BE (apenas
o desfecho de uma eleição, vê-la a funcionar 4 vereadores eleitos em todo o País!) também
legitimamente é sempre qualquer coisa de não passarão despercebidos.
emocionante. E domingo foi um dia de emo- Ao centro-direita, as eleições sabem a vitó-
ções fortes. Carlos Moedas, o herói da noite, ria, cheiram a vitória, mas vêm, para quem
sublinhou o óbvio no discurso de vitória: estiver atento, com um travozinho agridoce.
venceu Lisboa “contra tudo e contra todos”. Não é hora, pelo menos para já, de se falar
Só faltou acrescentar o “apesar” que não podia de uma mudança galvanizadora nacional. O
pronunciar em voz alta. Mas é justo dizer o PSD ganhou Lisboa, Coimbra e Funchal, mas
óbvio: Moedas venceu Lisboa, apesar de Rui sozinho teve menos câmaras, menos maiorias
Rio e do estado do PSD. Mostrou que é ao absolutas e menos autarcas. A direita tradicio-
centro-direita, com compostura e sem desva- nal fragmentada, toda somada, anda ela por
rios populistas, que o PSD ganha território. O ela com o PS sozinho – antes de o PS começar
que é, a todos os níveis, um grande feito. a distribuir, magnânimo, o dinheiro dos fun-
Muitas vezes se diz que as eleições não se dos europeus que tanto agitou na campanha.
ganham, perdem-se. E no caso de Lisboa, E o PSD e o CDS ganham, sublinhe-se, uma
carregada de valor material e simbólico, isso capital com uma maioria de esquerda nos ve-
foi particularmente notório. Foi Fernando readores e na Assembleia Municipal. Um osso
Medina, e com ele o PS, que para surpresa duro de roer onde será difícil fazer diferente.
geral (até da oposição) as perdeu, ao fim de Já para o futuro do PSD e do CDS, o desfe-
14 anos de governação socialista na capital. O cho eleitoral (e a vitória de Moedas em Lisboa)
número de votos no PS em Lisboa vêm a cair pode, na verdade, ser um presente envenena-
desde 2009, e acentuaram-se agora, com do a médio prazo. Adia as soluções e mascara
menos 25 mil votos do que em 2017. Já a su- os problemas notórios de liderança e posicio-
bida do PSD foi pequena face a 2017, apenas namento estratégico com que ambos os par-
mais cerca de três mil votos. Muitas razões tidos se deparam. Disfarça o odor no ar com
poderão ser apontadas para explicar o desai- perfume intenso atrás das orelhas, mas não
re de Medina, que fez de Lisboa uma cidade resolve o travo a bafio das roupas descon-
melhor, mais moderna e mais bonita, mas chavadas e démodé com as quais não é nada
não há como não lê-lo também como um sensato apresentar-se a votos em 2023.
*Diretora
[email protected]

11,5%
NÚMERO FRASE
“O objetivo está cumprido”

No dia da despedida da coordenação
da task force para a vacinação contra
a Covid-19, o vice-almirante Gouveia
e Melo despiu o camuflado e vestiu
Aumento das a farda branca para garantir que
novas rendas Portugal tem a pandemia controlada.
no segundo
trimestre
O número impressiona, REDES
porque dá nota de
uma forte subida das Twitter diz chega
rendas. O valor dos
novos contratos de
a Ventura
arrendamento disparou, André Ventura viu a sua
a nível nacional, 11,5% conta oficial do Twitter
num trimestre, segundo suspensa na segunda-
os dados divulgados pelo feira por violação das
INE. As zonas que mais regras de conduta da
subiram foram o Oeste, rede, normas que visam
Aveiro, Madeira e Grande evitar as partilhas de
Porto. Paralelamente à conteúdos de ódio e fake.
subida, disparou também Já em maio foi aplicada
o número de negócios ao presidente do partido
celebrados: quase mais Chega uma suspensão por
50% do que no mesmo 12 horas, por ter escrito
período do ano anterior. que tinha vontade de que o
ministro da Administração
E U R O PA Interna, Eduardo Cabrita,
PA N D E M I A “fosse decapitado”, algo
Mudanças na Alemanha que choca de frente com
DGS e as normas O desfecho das eleições alemãs, no domingo passado,
as regras “contra abuso
e assédio” que levaram,
de isolamento importa, e muito, ao futuro de Portugal. O que saiu do
sufrágio foi uma vitória do Partido Social-Democrata
no limite, a que Donald
profilático: (SPD) por uma pequena margem, e a CDU/CSU a cair,
Trump fosse banido
desta rede. “Até o Twitter
alcançando o pior resultado da sua história. Ambos os
irredutibilidade candidatos, Olaf Scholz e Armin Laschet, dizem agora
topa o que o Tribunal
Constitucional ainda
ou inação? que se preparam para formar governo, negociando
coligações, mas a vontade de mudança mais à esquerda
não conseguiu topar”,
Há semanas que a comentou de imediato
parece clara. A boa notícia foi a queda da extrema-
DGS está a avaliar a Ana Gomes.
direita, AfD, de terceira para quinta força política no
atualização da norma Parlamento, alcançando “apenas” 10,3% dos votos
sobre o isolamento preliminares.
profilático de forma a
distinguir vacinados e não
vacinados quando existe
um contacto de risco com EFEITOS Universidade de Oxford,
um doente com Covid-19. que registou que a
Neste momento, e apesar Pandemia anula dimensão das perdas na
de 84% da população
estar inoculada,
progressos na expectativa de vida foi
assinalável na maioria
continuam a ser exigidos mortalidade dos 29 países: 22 tiveram
14 dias de isolamento. perdas de mais de meio
O que a esmagadora A Covid-19 provocou ano em 2020. A pandemia
maioria dos especialistas perdas na esperança anulou assim o equivalente
já disse há muito ser média de vida que não a vários anos de progressos
desnecessário. Porquê se registavam desde na mortalidade. De notar
tanto tempo para rever a Segunda Guerra o facto de os homens
algo que onera muito Mundial. O cálculo é de registarem uma descida
sociedade e economia? uma investigação da maior do que as mulheres.

HOLOFOTE
Mauricio Botton Milionário benemérito

É HERDEIRO DOS
Ordem do Mérito Adeus,
O gesto Catalunha
benemérito
valeu ao casal FUNDADORES DA Fixando atividade
em 300 hectares
a condecoração
com a Grã-Cruz
DANONE. ELE E A perto de Avinyonet
del Penedès,
da Ordem do
Mérito, atribuída
MULHER, CARLOTA, os Botton
DOARAM 50 MILHÕES
transformaram
Pioneiro pelo Presidente Fortuna a pequena aldeia
Lisboa foi, na
última segunda-
da República,
Marcelo Rebelo DA FORTUNA FAMILIAR Os Botton
não serão dos
catalã de apenas
1 700 habitantes
feira, 27, palco de Sousa, durante
a cerimónia de PARA AJUDAR A CRIAR, milionários mais na segunda mais
rica de Espanha,
EM LISBOA, O BOTTON-
de um evento conhecidos de
histórico: a inauguração do Espanha. Apesar tal a quantia em
novo centro de impostos que ali
inauguração
do Botton- investigação, a que -CHAMPALIMAUD de discretos,
com uma fortuna pagavam. Em
PANCREATIC CANCER
Champalimaud assistiram, entre avaliada em 455 2019, porém, o
Pancreatic Cancer muitas outras milhões de euros, casal abandonou
Centre, a primeira
unidade no
individualidades,
os reis de Espanha, CENTRE ocupam, segundo o
jornal El Mundo, o
a região,
descontente com
mundo pensada Filipe VI e Letizia. 111º lugar da lista a realização do
MANUEL BARROS MOURA
e construída de Presentes dos mais ricos do referendo pró-
raiz tendo como estiveram país. Na origem independência.
fim a investigação também, como desta riqueza está Fixaram-se, então,
e o tratamento não podia deixar o avô de Mauricio, entre Paris e
do cancro do de ser, Leonor o judeu sefardita Madrid, gerindo
pâncreas. Este Beleza e João Isaac Carasso, as participações
tipo de tumor Silveira Botelho, fundador, em em diversos
representa, respetivamente 1919, da Danone, a investimentos,
atualmente, a presidente e primeira empresa que incluem a
quarta causa de vice-presidente a comercializar produção de azeite
morte por cancro da Fundação iogurte. Nascido no Alentejo. Mas
na Europa, e Champalimaud, em Paris há 88 dedicaram-se
estima-se que, nos determinantes, anos, Mauricio também a ações
próximos dez a 20 como o próprio esteve sempre beneméritas. Além
anos, o número de Mauricio Botton ligado ao negócio desta doação para
novos casos possa explicou ao El da família. Foi, o novo centro
aumentar em mais País, na sua durante 40 anos, de investigação
de 70% e tornar-se decisão de se diretor da área Botton-
a segunda causa associar a este de investigação e Champalimaud,
de morte por projeto. Foi desenvolvimento, Mauricio e Carlota,
cancro, na Europa há três anos, sendo-lhe atribuída que não têm filhos,
e também nos durante uma a responsabilidade são patronos da
Estados Unidos visita do casal a pela criação do Fundação Germina,
da América. Esta Lisboa: “Vimos Actimel, um dos que apoia crianças,
obra pioneira com tínhamos grandes sucessos jovens e famílias
tornou-se possível objetivos comuns da companhia. vulneráveis, e
através da parceria e decidimos fazer Em 2015, vendeu da Fundação
entre a Fundação algo com eles.” todas as ações Hispano-Judia,
Champalimaud e e dedicou- que visa recuperar
o casal Mauricio e -se a outros a história das
Carlota Botton, que investimentos, raízes judaicas
doaram 50 milhões nomeadamente à de Espanha e da
de euros. produção de azeite. América Latina.

INBOX
M O D É S T I A À PA R T E
Não me apoderei
de nada.
Tive de me Fiquei
chegar à frente
RUI COSTA
O presidente interino do Benfica
brutalmente
e candidato às eleições de 9 de
outubro explica a forma como
sucedeu a Luís Filipe Vieira desfigurada.
Perdi o
sustento
e entrei
num ciclo
As pessoas estão
depressivo.
todas é a ficar um
bocado paranoides
Tornei-me
e desconfiadas
umas das outras
uma reclusa
JOSÉ LUÍS PIO ABREU LINDA EVANGELISTA
Médico, professor da A antiga top model revelou que um
Universidade de Coimbra e procedimento estético mal feito lhe provocou
ex-presidente da Sociedade uma hiperplasia adiposa paradoxal e exige,
Portuguesa de Psicodrama agora, uma indemnização de €42,7 milhões
A história de Portugal
só vai ser verdadeira C H O Q U E F R O N TA L FRASE DA SEMANA
quando disser
respeito a todos, O livro em papel está
sem preconceito condenado e morrerá
VALTER HUGO MÃE
O escritor regressa aos romances
com As Doenças do Brasil, após
no século XXI
oito anos de interregno e quando ARTURO PÉREZ-REVERTE
completa 50 anos O romancista espanhol não desiste,
porém, de escrever e publicar livros.
A sua obra Sidi – El Cid, O Nascimento
de Uma Lenda ainda agora chegou
Poucos países Ganhámos com Ouvi o secretário a Portugal e já está a preparar
o lançamento de novo romance, O Italiano
estarão numa a Covid-19, porque de Estado, em dia
situação como a enfrentámos com que me parece
bastante êxito. não brilhante para
a nossa Isso teve um efeito ele. Dizer que a
MANUEL CARMO GOMES
O epidemiologista concorda positivo sobre pandemia até
com as medidas de a marca Portugal acabou por ser boa
desconfinamento anunciadas EURICO BRILHANTE DIAS toca o ridículo
para 1 de outubro mas alerta Secretário de Estado
para o perigo da abertura RUI RIO
da Internacionalização Presidente do PSD
de bares e discotecas, onde
considera que só se deve poder
entrar com certificado digital
Fontes: BBC, Diário de Notícias, Record, Jornal i, Novo Magazine, Público

ALMANAQUE
NÚMEROS DA SEMANA
100
Ao volante de um Mercedes,
o piloto britânico de Fórmula 1,
Lewis Hamilton, conquistou,
no domingo, 26, em Sochi,
o Grande Prémio da Rússia,
somando assim a 100ª vitória
da carreira.
56%
GETTY
A maioria dos eleitores de
Berlim aprovou, no domingo,
Corrida aos filmes no Espaço

A Rússia vai iniciar as rodagens daquela que promete ser a primeira
26, um referendo não
vinculativo para expropriar
as propriedades de grandes
empresas imobiliárias na
capital alemã, tendo em vista
produção cinematográfica filmada na órbita da Terra, antecipando-se a sua colocação no mercado
a um projeto de Hollywood, protagonizado por Tom Cruise de arrendamento a valores
substancialmente mais baixos.
Uma equipa formada pela atriz Yulia tornou a primeira pessoa a orbitar a Em causa estarão cerca de
Peresild, o veterano astronauta Anton Terra, superando os Estados Unidos 226 apartamentos.
Shkaplerov e o cineasta Klim Shipenko em plena Guerra Fria, também agora
deverá partir, já na próxima terça-feira, Moscovo tenta superar os eternos
5, a bordo da nave Soyuz MS-19 rumo
à Estação Espacial Internacional (ISS)
onde vão decorrer as gravações de O
rivais norte-americanos. Neste caso,
a produção cinematográfica russa
procura antecipar-se ao projeto que
1 421
Um total de 1 421 agressores
Desafio, o primeiro filme rodado no conta com a participação de Tom (crime de violência doméstica)
Espaço. A equipa deverá permanecer Cruise e do realizador Doug Liman, estavam, em agosto,
12 dias a bordo da ISS, num projeto em colaboração com a NASA e a Space com pulseira eletrónica,
da produtora Yellow, Black and White, X, de Elon Musk. O filme russo contará representando mais de
financiado pela empresa aeroespacial a história de uma médica que precisa metade das pessoas sujeitas
Roscomos e pelo Canal Um da de viajar ao Espaço para tentar salvar a este sistema de vigilância
televisão russa, o mais visto do país. a vida de um astronauta doente que eletrónica, segundo o relatório
Tal como há seis décadas, quando o não pode regressar à Terra. Assim uma da Direção-Geral de Reinserção
cosmonauta russo Yuri Gagarin se espécie de Missão Impossível à russa. e Serviços Prisionais.
ESTUDO INTERNACIONAL
Centenas de mamíferos ameaçados por atropelamentos 49 452

Mais de 49 mil novos
É do conhecimento geral que existem inúmeras espécies animais em risco de estudantes entraram agora
extinção pelos mais variados motivos. O que talvez não se soubesse tão bem é que os para o Ensino Superior, tendo
atropelamentos podem ser uma dessas causas. O lince-ibérico, o urso-pardo, o urso-negro, ficado sem colocação 33% dos
o tigre, o jaguar e o macaco-cauda-de-leão são algumas das 124 espécies de mamíferos candidatos à primeira fase do
terrestres mais expostas aos atropelamentos, conclui uma investigação – cujas conclusões concurso nacional de acesso.
constam de um artigo publicado na revista científica Global Ecology and Biogeography –
realizada em diferentes continentes e liderada por Clara Grilo, do Centro de
Estudos do Ambiente e do Mar, da Faculdade de Ciências da Universidade
de Lisboa. A investigadora
portuguesa considera esta realidade
especialmente preocupante, quando,
€550 milhões
O défice das contas públicas
nesta altura, está a ser planeada agravou-se em 550 milhões
a construção de qualquer coisa de euros até agosto, face ao
como 25 milhões de quilómetros período homólogo, atingindo
de estradas em todo o mundo. €6 878 milhões.

C O N T E Ú D O PAT R O C I N A D O
SE JÁ VIU, TEM DE IR VER

A retina não pode esperar
No Dia Mundial da Retina, o Grupo de Estudos da Retina de Portugal (GER) alerta
para a importância de abrir os olhos para a realidade: identificar os sintomas a tempo
e procurar a ajuda de um médico oftalmologista são os primeiros passos
Q
uando pensamos em cegueira DEGENERESCÊNCIA MACULAR máticas até atingirem um estádio avan-
associada à idade, a primeira DA IDADE çado. No entanto, também existem sin-
palavra que nos vem à cabeça A DMI é a principal causa de cegueira nos tomas aos quais devemos estar atentos:
será provavelmente “catara- países desenvolvidos na população com manchas no campo visual, geralmente
tas”. No entanto, os dados da OMS mos- mais de 55 anos. É uma doença degene- na parte central, ou deformações das
tram uma realidade bem diferente. Nos rativa causada por danos na parte central imagens (ondulações, curvas).
países desenvolvidos, a Degenerescência da retina responsável pela visão fina e de Menosprezar os sintomas, ou fazer um
Macular da Idade (DMI) é a principal pormenor, que levam a manchas escuras, autodiagnóstico errado são situações
causa de cegueira em pessoas com idade sombras ou distorção das imagens. O risco muito comuns. Por isso Ângela Car-
igual ou superior a 55 anos. Em Portugal, de desenvolver DMI aumenta com a idade, neiro, atual presidente do GER, frisa
o cenário confirma-se, e a DMI tem uma por isso, a partir dos 55 anos, consultar um que “nem todos os problemas de visão
prevalência de 15,5% nesta faixa etária. oftalmologista para fazer a sua deteção são cataratas. As cataratas, sendo muito
A par da DMI, a retinopatia diabética, precoce é fundamental. prevalentes na população idosa, têm
associada às diabetes tipo 1 e tipo 2, uma solução cirúrgica com alta taxa
não pode ser negligenciada. Se não for RETINOPATIA DIABÉTICA de sucesso, havendo uma recuperação
diagnosticada a tempo, poderá causar Associada à diabetes, este tipo de retino- completa de visão após a cirurgia. .
danos irreversíveis, levando à cegueira. patia caracteriza-se por danos nos vasos Pretendemos alertar para o facto de
Apesar das evidências, muitas vezes sanguíneos da retina. A perda da visão existirem outros tipos de problemas de
desvalorizamos os sintomas. A pergun- ocorre devido ao inchaço ou edema na visão associados a doenças retinianas.
ta é: o que é que podemos não estar a parte central da retina, podendo nas fases Nestas doenças, quando o doente chega
ver? Muito. Sobretudo a importância de mais avançadas haver desenvolvimento muito tarde, há pouco a fazer, pois a
estarmos atentos e agir rapidamente. de vasos anómalos que podem sangrar e perda visual é irreversível”.
E por isso o Grupo de Estudos da Retina descolar a retina. Para realizar o diagnóstico deste tipo
de Portugal alerta para a importância de de doenças, deve fazer-se uma con-
identificar e tratar as principais doenças PREVENÇÃO sulta com um médico oftalmologista
da retina, e fazê-lo a tempo. As doenças da retina podem ter uma origem que, através da observação do fun-
Porque são doenças que evoluem silen- hereditária (quase 50% do risco), mas estão do do olho, deteta as lesões iniciais
ciosamente, podendo causar danos irre- também associadas a fatores como taba- e identifica os doentes com risco de
versíveis, o tempo pode ser a diferença gismo ou nutrição. Por isso é fundamental progressão da doença. Por isso é tão
entre ver e não ver. Daí a importância adotar um estilo de vida saudável, com uma importante, a partir dos 55 anos, con-
vital do diagnóstico precoce. Um dos alimentação rica em antioxidantes, vitami- sultar um médico
principais problemas das doenças da nas A, C e E, peixe, fruta e legumes verdes, oftalmologista de
retina é que muitas vezes são assinto- agindo sobre os fatores modificáveis. dois em dois anos.
TRANSIÇÕES
MORTES
O realizador e encenador
Roger Michell, que dirigiu a
comédia romântica Notting
Hill, morreu na quarta-
-feira, 22, aos 65 anos.
As causas da morte não
foram reveladas.
O médico obstetra e
ginecologista Nuno
Montenegro, que foi diretor
do Serviço de Ginecologia
e Obstetrícia do Hospital
de São João e subdiretor
e professor catedrático
da Faculdade de Medicina
da Universidade do Porto,
morreu quarta-feira, 22,
aos 66 anos, vítima de
doença prolongada.
A banda rock britânica

Status Quo anunciou, no T H É O N E ST E B AG O S O R A 19 41-2 0 2 1
domingo, 26, a morte do seu
baixista Alan Lancaster,
72 anos, um dos fundadores
do grupo. O músico sofria,
há anos, de esclerose
múltipla.
O que fazer no adeus a um monstro?
Foi o cérebro do genocídio no Ruanda, em 1994. O maior responsável
pela morte de 800 mil pessoas, em cerca de três meses
O realizador e escritor Não é possível romantizar a vida de as atrocidades de que foi capaz, até
Melvin Van Peebles, um homem como Théoneste Bagosora, estranhamos que tenha sido pai.
figura destacada do cinema e é talvez por essa razão que hoje se Entre 7 de abril e 15 de julho de 1994,
afro-americano, morreu na sabe tão pouco sobre os seus primeiros extremistas de etnia hutu mataram
terça-feira, 21, aos 89 anos,
anos. Os crimes que veio a cometer 800 mil tutsis e hutus moderados.
em Nova Iorque. Peebles
foram tão hediondos que não parece Théoneste Bagosora era chefe de
influenciou toda uma
geração de cineastas afro-
haver jornalistas com vontade de o gabinete do ministro da Defesa e foi
-americanos, incluindo Spike tornar humano. Não seremos, por o principal instigador do massacre.
Lee e John Singleton. isso, os únicos a sublinhar a suprema Em 1993, ao bater com a porta das
ironia de ele ter morrido na sequência negociações com os rebeldes tutsis, na
de problemas cardíacos. Custa a crer Tanzânia, anunciara que ia regressar
O piloto de motos espanhol que este antigo coronel do exército a casa para “preparar o apocalipse”.
Dean Berta Viñales, de ruandês, de estatura baixa e sorriso Três anos antes, começara a distribuir
apenas 15 anos, morreu, no irónico, tivesse coração. armas pelos extremistas hutus.
sábado, 25, na sequência de Podemos escrever que nasceu em Em 2008, foi condenado à prisão
um acidente na corrida de Giciye, uma pequena cidade no norte perpétua pelo Tribunal Internacional
Supersport 300, no circuito do Ruanda, numa família católica e de Criminal das Nações Unidas para o
de Jerez de La Frontera, etnia hutu relativamente privilegiada. Ruanda, por genocídio, crimes contra a
anunciou a organização do O pai, Mathias Bagirubwiko, era um humanidade e crimes de guerra. Ficou
mundial de superbike. Mwalimu, um respeitado professor provado que ele e outros dois militares
O jovem piloto, que do ensino primário, conhecido na conspiraram para “criar um plano com
era primo do piloto do vizinhança como “o sortudo”. A mãe, a intenção de exterminar a população
mundial de motoGP Anastasie Ntibayazi, andava sempre civil tutsi e eliminar membros da
Maverick Viñales, sofreu ocupada com os restantes seis filhos, oposição”. A sua pena seria revista e
lesões severas na cabeça
todos mais novos. Ele havia de fazer os deveria ficar na prisão de Koulikoro,
e no tórax. Apesar de
estudos secundários num seminário no Mali, até 2030. Mas foi transferido
prontamente assistido, não
resistiu aos ferimentos.
e ajudar à missa, mas não adianta para uma clínica em Bamako, a capital,
alongarmo-nos sobre o seu passado onde acabou por morrer no sábado, 25.
de menino do coro. Quando sabemos Tinha 80 anos. R.R.

Quando
pensávamos
que estava tudo
inventado...
...eis que aparecem os smartphones
dobráveis, que cabem no bolso, são
resistentes à água, permitem fotografias
e vídeos sem segurar no telefone e uma
quantidade de features que prometem
deixar KO os viciados em multitasking Galaxy Z Fold3 5G
J
á nem o céu é o limite quando o tema são smartphones. Não mais durável. A característica que mais se destaca é o multitasking,
há fronteiras para a criatividade e o universo da tecnologia ou seja, permite fazer várias coisas ao mesmo tempo, navegar em
já provou ser capaz de superar-se em curtíssimo espaço diferentes apps em simultâneo, ter interações sem ter de abrir o
de tempo. E pensar que há menos de 20 anos usávamos dispositivo, assim como tirar fotografias e fazer vídeochamadas
os telemóveis para fazer chamadas e trocar sms de 160 caracteres sem ter de segurar no telefone. Todo um novo mundo.
escritas em teclados com mini displays a preto e branco?
Tudo mudou – para muito melhor – e hoje trazemos a vida EXPERIÊNCIA MELHORADA
a vibrar no bolso e somos capazes de realizar inúmeras tarefas Os utilizadores pediram, a Samsung concretizou. Do design
do dia-a-dia através do smartphone com um simples toque, de icónico ao entretenimento imersivo, o Z Flip3 5G e o Z Fold3
forma intuitiva e segura. Mas isso até nem é novidade, certo? 5G oferecem novas formas de trabalhar, de visualizar e criar
Novidade mesmo é tudo o que conseguimos fazer com os no- conteúdos multimédia e gaming.
vos modelos Galaxy Z Flip3 5G e Galaxy Z Fold3 5G da Samsung, Criados para durar, estão equipados com IPX8 resistente
que elevam a produtividade e o entretenimento a todo um novo à água, pelo que os utilizadores já não têm de se preocupar
nível. Assim em resumo,
esumo, estes que são os primeiros smartphones quando são apanhados
apa pela chuva. Os dois dispositivos são
dobráveis resistentes
ntes à água com um ecrã mais resistente – logo, construídos com o nosso novo Armor Aluminum e
também constr
ainda o mais resistente
re Corning® Gorilla® Glass Victus™,
para proteger ccontra riscos.
Para os fãs dod entretenimento de última geração, o Z Fold3
5G é uma verda
verdadeira ferramenta multitasking, com desempe-
nho de nível superior
sup e um ecrã Infinity Flex de 7,6 polegadas.
É também o primeiro
pr dispositivo dobrável a suportar S Pen.
Com um design fino e elegante, está disponível em três cores:
Phantom Black
Black, Phantom Green e Phantom Silver.
Para aqueles que procuram o estilo aliado à função, o Z
Galaxy Z Flip3 5G Flip3 5G é o smsmartphone ideal, apresentando um design ele-
gante, compacto e de bolso, além de características de câmara
melhorada e um ecrã exterior maior, construído para uma
rápida utilização em movimento. Repleto de algumas das mais
recentes funcio
funcionalidades de câmara, os utilizadores podem
tirar selfies hands-free
han com o modo Flex, ou podem manter o
dispositivo dobrado
dob e tirar uma fotografia rápida – até mesmo
em vídeo – a partir
pa do ecrã exterior.
A Samsung eestá empenhada em dar acesso à experiência
única dos FoFoldables a mais consumidores e por isso ambos
os disp
dispositivos surgem agora aos melhores preços de
sempre: o Galaxy Z Fold3 5G está disponível por
sem
18
1859,90€, e o Galaxy Z Flip3 5G
por 1099,90€..
p

A corrida ao
abastecimento
PRÓXIMOS CAPÍTULOS
tem provocado
falta de
combustíveis
PERISCÓPIO
ALTERNATIVAS desastre, também

Há sempre uma no Funchal, teve
câmara ao lado consequências mais
Na noite eleitoral de danosas. A derrocada
Fernando Medina, do PS, que perdeu a
no Pátio da Galé, em câmara para o PSD, fez
Lisboa, já ao início da pelo menos uma vítima
madrugada, quando grave: Paulo Cafôfo,
a capital começava a líder socialista madei-
ser dada como ganha rense, demitiu-se em
por Moedas, era ver resultado da derrota.
(mais ouvir) alguns Há dias assim...
assessores socialistas
a receberem convites SAÍDA
para rumarem a mu- Benfica melhor
nicípios vizinhos, onde que o Governo
EFEITOS DO BREXIT o PS venceu. “Ir para Uma boa alternativa
a Moita ainda vai ficar para o presidente
Quando faltam mãozinhas... um pouco fora de mão. cessante da câmara

Vamos ver...”, respondia de Lisboa, Fernando
uma das assessoras Medina, agora mais
que por ali andavam. disponível, seria a de
O aperto das regras de imigração levou à falta de integrar a lista de Rui
motoristas. Para que haja combustíveis e peru no MADEIRA Costa, para o Benfica.
Natal, Boris Johnson vai ter de abrir fronteiras Dia de derrocadas Quem já pertenceu a
O domingo foi abalado, comissões de honra de
na Madeira, por uma Luís Filipe Vieira tam-
Grande parte do Reino Unido, sobretudo as grandes áreas bém pode aventurar-se
derrocada, na Praia
urbanas, tem vivido, na última semana, dias de pânico no dirigismo despor-
Formosa, no Funchal.
devido ao medo de uma eventual rutura no abastecimento de Embora não tivesse tivo – e deve ser mais
combustíveis, bem como de outros bens. Com a entrada em havido grandes danos emocionante do que
vigor das novas regras de imigração pós-Brexit, mas também pessoais, apenas um lugar de vereador.
de inúmeras restrições na mobilidade, motivadas pelo combate alguns feridos, o outro Ou de ministro.
à pandemia, o Reino Unido depara-se com uma brutal falta
de motoristas qualificados para a condução de camiões de
abastecimento. Perante isto, além de começarem já a escassear
alguns bens nas prateleiras dos supermercados, surgiu ainda
a dificuldade de abastecer os postos de combustível de todo o
país, levando à formação de impressionantes filas de condutores,
particulares e profissionais, que pretendiam abastecer o máximo
que lhes fosse possível. O governo de Boris Johnson garante que
não existe falta de gasolina ou gasóleo para toda a gente, mas
reconhece a dificuldade de conseguir fazer chegar os produtos
das refinarias até aos pontos de abastecimento. Daí que, as
primeiras medidas anunciadas foram no sentido de aliviar os
entraves à imigração, emitindo-se cinco
mil vistos temporários, válidos por três
meses, para motoristas qualificados, por AJUDA
COMO FEZ forma a assegurar que nada falta, pelo

menos até ao Natal. O mesmo acontecerá
Make Alentejo “great again”
Um Centro de Hipnose Regressiva, que promete
PORTUGAL NA com outros 5 500 vistos temporários, resolver problemas do passado, abriu em frente
à casa do líder do PCP, em Pirescoxe, Santa Iria
GREVE DOS mas estes para quem trabalha na criação
de aves. Claro está, para que não falte de Azoia (Loures). O espaço, onde a pessoa pode
MOTORISTAS, EM o peru na consoada dos britânicos. entrar no transe hipnótico enfrentando memórias,
está localizado no número 10 da rua onde vive
2019, LONDRES Downing Street lançou ainda um
programa de formação acelerado para Jerónimo de Sousa, sendo que o secretário-geral
PONDERA formar mais quatro mil condutores comunista vive do outro lado, no número 13. Tendo
em conta o azar das últimas idas às urnas da
COLOCAR de pesados e apelou ao regresso de
motoristas que se reformaram ou tenham
CDU, que tem feito os comunistas regredirem em
MILITARES A deixado a profissão. E não descarta a territórios como o Alentejo, talvez esteja aqui uma
solução imediata para alguns problemas de estra-
TRANSPORTAR hipótese de convocar as Forças Armadas,
colocando militares a conduzir camiões.
tégia política da Soeiro Pereira Gomes. F.L./N.M.R.
COMBUSTÍVEIS Onde é que nós já vimos isto? M.B.M.

JUNTE-SE A TODAS ESTAS MARCAS
NA LUTA CONTRA O DESPERDÍCIO ALIMENTAR.
UNIDOSCONTRAODESPERDICIO.PT
R
OCEANO DE ESPERANÇA
Oceano de Esperança é um projeto da VISÃO em parceria com a ROLEX, no âmbito da sua iniciativa Perpetual Planet, para dar
voz a pessoas e a organizações extraordinárias que trabalham para construir um planeta e um futuro mais sustentáveis
O grito dos Oceanos

Ao contrário dos plásticos, a poluição acústica no mar não se vê, mas é
mais um desastre provocado pelo Homem e “não pode continuar a ser
ignorado”, alerta o especialista em Bioacústica, Michel André
BRUNO LOBO
Em 1956, Jacques Cousteau e Louis Malle ganharam a Palma podem coexistir, mas será necessário recorrer à tecnologia
de Ouro em Cannes com Le Monde du Silence. Foi um dos para que isso aconteça. A mesma tecnologia que durante
primeiros documentários a retratarem o fundo do mar a um século prejudicou os oceanos pode ser utilizada para
cores, e maravilhou inúmeros espetadores por todo o mun- atingirmos o equilíbrio acústico”, afirma.
do. Ganhou inclusivamente um Óscar no ano seguinte, mas Tem sido esse o trabalho da sua vida ao longo dos últimos
o título dado ao filme não podia estar mais errado. 20 anos. Michel André é agora professor de Bioacústica na
Durante séculos, a Humanidade criou esta imagem de Universidade Politécnica da Catalunha, em Barcelona, e
um azul profundo e silencioso, mas os oceanos nunca foram dirige o LAB (Laboratório de Bioacústica Aplicada), onde
silenciosos. Na água, o som propaga-se mais veloz e mais criou um projeto de observação sonora à escala mundial
longe do que no ar, ao contrário da luz que apenas consegue com mais de 150 “postos de escuta”, todos conectados em
penetrar meia dúzia de metros em profundidade. O som é o rede e criando “uma imagem verdadeiramente global do
único “sentido” para muitas espécies, desempenhando um som do oceano e os seus efeitos”. Descobriu como até os
papel fundamental na sua orientação e comunicação – e é seres mais insuspeitos, como polvos, crustáceos, bivalves,
por isso que o aumento da poluição sonora é tão perigosa: alforrecas ou corais, desprovidos de aparelho auditivo,
“Temos de perceber que o ruído é vital para a sobrevivência possuem sensores sensíveis às vibrações acústicas, e so-
do oceano, e para a sobrevivência da Humanidade, e temos frem igualmente com níveis de ruído muito altos. As suas
de dar o nosso melhor para reduzir esta contaminação so- pesquisas saltaram inclusivamente do meio aquático e são
nora”, avisa o especialista em Bioacústica, Michel André, o agora utilizadas para evitar atropelamentos de elefantes
principal responsável por esta nova perceção da realidade. por comboios, na Índia, para criar uma nova disciplina da
O cientista francês realizou os primeiros estudos espeleologia baseada na acústica dentro das cavernas, ou
bioacústicos no mar na viragem do milénio, recorrendo a para salvar a maior floresta do mundo: “Os satélites con-
um conjunto de novas tecnologias como os hidrofones, e seguem ver se estão a derrubar árvores na Amazónia, mas
rapidamente se apercebeu da existência de todo o tipo de não conseguem perceber qual o estado de saúde da floresta.
sons provocados pelo Homem que inutilizavam as suas A acústica consegue.”
gravações. “Pensei então se não estaria a acontecer o mesmo Nestes últimos anos assistimos já à adoção de algumas
com os animais, se todos estes sons estranhos não os impe- boas práticas, como a insonorização das salas de máqui-
diam também de receber as informações que procuravam. nas nos navios de carga mais modernos, ou a utilização de
Podíamos estar perante um problema de conservação que membranas isolantes, nas turbinas eólicas colocadas em
desconhecíamos.” alto-mar, mas há ainda muito a fazer, “sobretudo no caso
De facto, pouco depois surgiram relatos de colisões entre das explorações de petróleo e de gás natural, atividades
cachalotes e ferries de passageiros nas ilhas Canárias – co- excessivamente ruidosas para a vida marinha, tal como
lisões fatais para os animais. Michel André mudou-se para os sonares das marinhas de guerra. Temos de continuar a
Las Palmas onde descobriu como os cetáceos (que dependem procurar soluções alternativas”, conclui, sempre com uma
da acústica para se orientarem) estavam a ser vítimas do nota de esperança.
ruído gerado pelo tráfego marítimo, que os desorientava. Até lá, Michel André continua a “tentar ouvir a Natu-
Esse trabalho valeu-lhe um Rolex Award For Enterprise reza”. Mesmo quando não está a trabalhar, mesmo sem
em 2002, e aproveitou o prémio para financiar a investi- equipamentos especiais, porque “a Humanidade perdeu
gação de um sistema de alerta que permitisse aos navios essa capacidade há muitos anos, de ouvir e compreender
evitarem os cachalotes. “Acredito que progresso e Natureza a Natureza”. E ele está a tentar recuperá-la. [email protected]

FOTO: TERESA CORREA/ROLEX
30 SETEMBRO 2021 VISÃO

29
LUÍS BARRA
CARLOS MOEDAS
A NOVA
ESPERANÇA
DA DIREITA
O triunfo da coligação de centro-direita em Lisboa foi um
volte-face perante o que se esperava de Carlos Moedas. Mas
dada a vitória à tangente, sobre o PS, a capacidade negocial,
a aptidão para estabelecer consensos e a calma, que os mais
próximos lhe apontam, serão essenciais para provar que o
presidente eleito da capital é um sinal de que pode estar em
marcha uma mudança política no País
N U N O M I G U E L R O P I O E R I TA R AT O N U N E S *
M
Mais de 250 mensagens entraram, umas atrás
das outras, no telemóvel de Carlos Moedas,
logo após as duas horas da manhã de segun-
da-feira, assim que se soube que a coligação
de centro-direita tinha conquistado ao PS o
município de Lisboa. Grande parte das SMS de
felicitações, vindas de vários cantos do País e
da Europa, principalmente de quem com o so-
cial-democrata trabalhou quando este passou
pelo governo e por Bruxelas, ainda estava por
responder a meio da tarde do primeiro dia, já
como presidente eleito da câmara da capital.
ANA BRIGIDA
A vitória do engenheiro civil de 51 anos, que

se revelou naquele que ficou conhecido como
o “governo da Troika”, apanhou de surpresa
toda uma direita que, ao acordar da mais longa
noite eleitoral dos últimos anos, passou a ver
em Moedas o rosto da mudança e um sinal de
que um regresso ao poder nacional já esteve
bem mais longe. Numa semana em que, na
Alemanha, a família política do autarca lisboeta
perdeu terreno, da Europa também veio um
sinal de esperança, como foi o caso das palavras
enviadas por telemóvel pelo primeiro-ministro
grego, Kyriákos Mitsotákis.
Se, em 2011, a chegada de Carlos Moedas
a secretário de Estado Adjunto e a indicação
para comissário europeu, no final de 2014,
foram uma aposta do então líder do PSD,
Passos Coelho – que à VISÃO disse não es-
ANA BRIGIDA
tar disponível para comentar esta vitória do

seu ex-colaborador, por querer manter-se
afastado dos holofotes políticos –, agora, a
conquista da principal câmara do País é o
primeiro grande feito de Moedas, encarado Confiança renovada “Tenho uma filha que está a estudar fora.
como um volte-face nas probabilidades que Vitória em Lisboa deu Os outros estão cá. E deitaram-se muito,
lhe eram apontadas ao longo das últimas ao PSD motivos para muito tarde. Deitaram-se tão tarde, que
semanas. Algo semelhante, com as devidas festejar, contribuiu lhes dei a possibilidade de ficarem em casa
distâncias, à chegada a deputado por Beja, para silenciar a de manhã e pedi desculpas aos professores.
em 2011 – depois de 16 anos em que o PSD oposição interna a Aliás, o meu filho tinha dois testes – só es-
não teve qualquer parlamentar eleito por Rui Rio e fez crescer pero que os resultados desses testes sejam
aquele círculo. O resultado inesperado terá as expectativas bons”, admitiu à VISÃO, após o almoço que
deixado atónita a própria família, já que, no do partido para as fez questão de ter com os funcionários da
legislativas de 2023
dia seguinte às eleições, as rotinas tiveram de higiene urbana e das oficinas do municí-
ser alteradas à última hora – a começar pela pio, nos Olivais, em Lisboa, no primeiro dia
dos três filhos. como presidente eleito – a quem, três dias

A Lisboa de Moedas
Uma “fabrica de unicórnios”, transportes
gratuitos para avós e netos, menos
impostos – estas foram as promessas que
levaram o social-democrata à câmara
A “FÁBRICA nos de 35 anos, que

DE UNICÓRNIOS” comprem a primeira
A primeira palavra casa.
do programa vai
para os empreende- TRANSPORTES
dores. Moedas quer GRÁTIS
atrair talento “de Todos os lisboetas até
todo o mundo” para aos 23 anos e com
a capital portugue- mais de 65 terão direi-
sa e incentivar as to, segundo o progra-
startups lisboetas a ma, a um passe gra-
tornarem-se “marcas tuito da Carris, para
globais”. Para isso, colaborarem com
promete criar um a “transição verde”.
espaço dedicado à Mas, ao mesmo tem-
inovação, onde estas po, Moedas prometeu
empresas possam 50% de desconto no
partilhar experiên- estacionamento da
cias – uma “fábrica EMEL para morado-
de unicórnios”, como res. Ainda em matéria
lhe chama. de transportes, o so-
cial-democrata quer
CASAS PARA acabar com a linha de
Quem ganhou onde? AS ARTES
Todas as freguesias
comboio de superfície
entre Algés e o Cais
Votação para a Câmara Municipal de Lisboa, nas freguesias do concelho deverão ter espaços do Sodré, para “esba-
dedicados à cultura ter as barreiras que
Novos Tempos Mais Lisboa (“espaços LXIS”), impedem os lisboetas
PSD/CDS/MPT/PPM/A PS/Livre onde os lisboetas de aproveitar” o rio
PARQUE possam assistir a Tejo.
SANTA
CLARA DAS NAÇÕES espetáculos e onde
os que sonham com CIDADE AZUL
OLIVAIS o mundo artístico Aproveitando a tradi-
LUMIAR
possam ter opor- ção marítima, Moedas
CARNIDE tunidade de dar os quer “construir, em
primeiros passos. Lisboa, as infraes-
ALVALADE
SÃO DOMINGOS MARVILA
33,31% Para o Parque Mayer, truturas necessárias
o engenheiro civil para torná-la uma
34,26% DE BENFICA
AVENIDAS AREEIRO
80 869 votos
idealizou um Centro capital global da
NOVAS 7 mandatos Nacional de Cultura, economia do mar” e
83 163 votos BENFICA
CAMPOLIDE
BEATO
7 mandatos ARROIOS PENHA

SANTO
DE FRANÇA
que reúna artistas,
aspirantes e chefes
uma “referência inter-
nacional” em termos
CAMPO
DE OURIQUE ANTÓNIO de cozinha. portuários.
AJUDA
SÃO VICENTE LISBOA
ESTRELA BAIXAR IMPOSTOS REFORMADOS
SANTA MARIA MAIOR Abstenção
BELÉM
MISERICÓRDIA 49,08% Foi uma das princi- No espaço de um
ALCÂNTARA pais bandeiras da ano, espera construir
FONTE MAI AR/VISÃO campanha: Carlos quatro centros inter-
Moedas defendeu geracionais com re-
uma redução no IRS sidências para idosos
O RISCO DE ABANDONAR A GULBENKIAN

dos lisboetas até ao e creches, bem como
patamar máximo distribuir seguros
PELO INCERTO COMPENSOU. MOEDAS

permitido às autar- de saúde gratuitos
quias – 5 por cento. E a todas as pessoas
PÕE FIM A 14 ANOS DE PS NA CÂMARA

a isenção do IMT para com mais de 65 anos
os jovens, com me- “que precisem”.

antes, jurou ali rumar, em caso de êxito, no
domingo. Apesar de um grande cansaço, que Quanto valeu
o terá levado a equacionar adiar para terça o
cumprimento da promessa, fontes ligadas à Moedas como
candidatura revelaram que mudou de ideias
quando percebeu o quão simbólico seria esse comissário
gesto para os quase dez mil trabalhadores da
Câmara Municipal de Lisboa num momento
europeu?
de transição de poder.
Na Comissão Juncker,
Para Moedas, que repetiu o percurso de
entre 2014 e 2019,
três horas dentro daquelas instalações, “nem
geriu um dos maiores
sempre as pessoas se sentem valorizadas no programas de Ciência
seu trabalho, ainda por cima em funções tão e Inovação do mundo,
duras como estas que acontecem nestas ofi- no valor de 77 mil
cinas”. “Senti que não podia deixar de vir aqui milhões de euros, e
no primeiro dia como presidente eleito, para desenhou o programa
valorizar as pessoas, dar ânimo aos mais des- Horizonte Europa,
contentes com a sua vida profissional e dizer- que totalizou 100 mil
-lhes que vamos ter em atenção os recursos milhões de euros. Foi
humanos, para perceber qual é o potencial elogiado à esquerda e
das pessoas e onde devem estar”, adiantou, à direita, em Portugal
2,6
quando vinha ao seu encontro Filipa Penedos,
diretora municipal de Higiene Urbana. Se, na
sexta-feira, esta dirigente, que esteve envolvi-
da no escândalo da alegada vacinação indevida
contra a Covid-19 e que levou à demissão do
vereador Carlos Castro, em fevereiro, não
tinha recebido Moedas, desta vez, fez questão
de o guiar e de desejar “boa sorte” aos novos MIL MILHÕES DE
EUROS
donos da casa, principalmente ao vereador
centrista eleito, Filipe Anacoreta Correia, com foi quanto entregou a
uma palmadinha nas costas. Moedas prome- Portugal, através do a queda de Carmona Rodrigues, apoiado pelo
teu a todos um “diagnóstico” sobre a forma Plano Juncker PSD, e duas décadas passadas sobre semelhan-
251
como se distribuem os que fazem funcionar te conquista por Santana Lopes.
aquela máquina municipal.
Quando o autarca passou por aqueles FÓRMULA: NEGOCIAÇÃO E BOA EQUIPA
serviços, três dias antes, a confiança da can- Quem esteve com Moedas no governo de
didatura Novos Tempos – que juntou o PSD coligação de Pedro Passos Coelho e Paulo
ao CDS, Aliança, MPT e PPM – não era a Portas vê o autarca com capacidade para gerir
maior relativamente à prestação do filho de VISITAS a frágil solução política em que a câmara e a
“Zé” Moedas, um comunista ferrenho cofun- assembleia municipal ficam, tendo em conta a
aos então 27 Estados-
dador do jornal Diário do Alentejo, e de uma maioria de esquerda em ambos os órgãos. “Não
membros da União
educadora de infância, Lurdes Moedas. “Já há como escamotear: há uma maioria que lhe
Europeia
se estava a assentar a ideia de que podíamos é adversa formalmente. Isso vai exigir muita
300
não ganhar, mas que perder por muito pou- negociação e estabelecimento de pontes, que
co também iria ser uma enorme frustração”, não lhe são alheias. Quando esteve no gover-
confidenciou um dos elementos que acom- no, não só fez muitas dessas pontes como as
panhavam o cabeça de lista da coligação. Um trabalha bem. Aliás, faz um trabalho apurado
prego no otimismo foi espetado a caminho – há, até, quem o acuse de ser muito técnico.
do sábado de reflexão, perante a fraca divul- Mas é porque ficam surpreendidos com o facto
gação mediática do comício de sexta-feira à REUNIÕES de ser um excelente técnico, e agora vai poder
noite, que tinha sido o maior investimento com chefes de Estado, mostrar que é um excelente político”, aponta
financeiro da campanha. governos e deputados Paula Teixeira da Cruz, ex-ministra da Justiça
O político alentejano, que saiu de Beja aos 18 e antiga presidente da Assembleia Municipal
530
anos para estudar no Instituto Superior Técni- de Lisboa, a quem, em 2009, na sua saída
co – onde se licenciou em 1993 –, acabou por desse órgão, todas as bancadas – da direita à
ter de esperar já pela madrugada de segunda- esquerda – elogiaram a capacidade negocial
-feira para saber que, com 34,26% dos votos, durante um período difícil da autarquia, que
ultrapassara à tangente o ainda presidente da incluiu a queda de um executivo por suspeitas
câmara, o socialista Fernando Medina, que ob- de corrupção, a gestão do município por uma
tivera 33,31% (separados por 2 294 votos, mas DISCURSOS comissão administrativa durante meses e ainda
com o mesmo número de mandatos – sete). proferidos durante os eleições intercalares, ganhas por António Costa
A direita voltou assim ao poder, 14 anos após quatro anos com uma maioria relativa.

“É UMA PESSOA
NATURALMENTE
EXIGENTE E AFÁVEL,
QUE CRIA EMPATIAS”
MARCOS BORGA
MARCOS BORGA
PAULA TEIXEIRA DA CRUZ
ex-ministra da Justiça
Borges; ajudou a criar o Eurohypo AG, um

banco detido Commerzbank e especializa-
do em imobiliário; e, até à quase chegada da
Troika, rumou a Portugal, onde se dedica à
própria empresa de gestão de investimentos.
É devido a esse currículo que Eduardo Catro-
ga o leva consigo na comitiva do PSD para as
negociações com o governo de José Sócrates,
sobre o Orçamento do Estado de 2011.
Com as legislativas que se seguiram e o
resgate financeiro do País, Passos escolheu-o
para o cargo de intermediador entre executivo
e credores. Desses tempos, reconhecem-lhe
ANA MARIA BAIÃO CORREIA
“uma grande capacidade de trabalho” e dizem

ser “organizado e arrumado ao ponto de ser
obstinado, controlador: tinha muita sede de
LUÍS BARRA
antecipar tudo e de estar sempre preparado”.

“A segurança que demonstra resulta de muita
preparação”, disse à VISÃO quem trabalhou
com ele na equipa que preparou aquela que
De acordo com a ex-vice-presidente Política ficou conhecida como a “saída limpa” do País,
da direção de Passos, “obviamente que a de consensos Foi em maio de 2014, meses antes de rumar ao
dimensão de vitória surpreendeu quase elogiado da direita cargo de comissário europeu – para o qual o
todos, e quem disser o contrário estará a à esquerda, e até nome da então ministra das Finanças, Maria
faltar à verdade, porque ultrapassou as expor António Costa o Luís Albuquerque, chegou a ser apontado.
pectativas, tal como em 2001”. “O PS pode seu percurso como É desse período que Diogo Moura, líder da
ter a tentação de precipitar novas eleições, comissário europeu foi concelhia do CDS/Lisboa, se lembra de Moe-
reconhecido. Em 2019,
porque é difícil digerir uma derrota após das, ainda que só nestas eleições autárquicas
o primeiro-ministro
14 anos. Mas Carlos Moedas nunca tratou tenha conhecido o social-democrata, por quem
disse que a relação
mal ninguém – está na sua natureza. É uma entre os dois era
desenvolveu uma “admiração” imediata. “É um
pessoa naturalmente exigente e afável, que “impecável”, “acima político diferente, um bom homem e que tem
cria empatias. Por isso, é a pessoa ideal para dos partidos”. Aqui, visão”, garante Moura, um dos dois vereadores
estabelecer essa negociação permanente”, com Passos Coelho, centristas eleitos pela coligação Novos Tempos,
defende Teixeira da Cruz, que aponta a fór- António Costa, Jean- que admite ter ficado com a sensação de uma
mula a seguir: “É importante que se rodeie Claude Juncker e Vítor possível viragem, no domingo, após a visita à
de pessoas que possam fazer essa ponte po- Gaspar unidade de higiene urbana, nos Olivais, dois
lítica e a negociação permanente. E ter uma dias antes. “Havia uma maioria silenciosa
boa equipa técnica e de imprensa, porque na rua que se notava que queria apoiá-lo. E
a atual câmara comunicou bem demais.” naquele dia, nesse serviço, os trabalhadores
As características apontadas por Paula vieram ter com ele e garantiram que iam votar
Teixeira da Cruz são desconhecidas por na coligação”, revela, admitindo que a vitória
muitos que só contactaram com Moedas de Moedas “é um sinal de que o País está farto
após 2011. Para trás, além de uma passagem das políticas do PS”.
pelo setor da energia, na francesa Engie, em No Hotel Sana, em Lisboa, quartel-general
meados dos anos 90, o presidente eleito escolhido pela coligação, o ambiente na noite
da autarquia de Lisboa havia estabeleci- de domingo traduzia um sentimento que se
do uma carreira no setor financeiro – já vivia há semanas na São Caetano à Lapa, prin-
depois de concluído um MBA em Gestão cipalmente por quem geriu a estratégia do PSD
na Universidade de Harvard. Passou pelo à lupa nestas autárquicas: a incógnita. Só às 21
departamento de aquisições do Goldman horas, quando as televisões apresentaram as
Sachs, em que terá conhecido o já faleci- primeiras projeções, é que, na sede nacional
do economista social-democrata António laranja, se começou a acreditar numa viragem.

A família
do presidente
Ao lado do autarca está a sempre discreta
Céline. Investigadora, gestora, académica
e mãe dos seus três filhos
Carlos Moedas afiliada na ESCP

aguarda, sozinho, à Europe, e docente
porta de uma sala na Católica Lisbon. É
a “rebentar pelas ainda administradora
costuras”, em autêntica não executiva da CUF
ebulição. É assim, (desde 2016) e da Vista
sozinho, que, segundos Alegre Atlantis (desde
depois, atravessa 2020). O livro O Papel
a multidão que o do Design na Inovação
aguarda, há horas, sem (Universidade Católica
arredar pé, no Hotel Editora) é da sua
Sana, junto ao Marquês autoria.
de Pombal. E é assim, Residente em Campo
sozinho, que este pai de Ourique, desde
de duas raparigas que foi nomeado
e de um rapaz, vive administrador da
a sua vida pública, Gulbenkian, em
conservando o seu 2019, Moedas tem
núcleo familiar. motivos para afastar
A seu lado, há mais a família da vida
de duas décadas, está pública: na memoria Família Moedas tem
Céline Abecassis- estão episódios como um casamento de Apesar de os estudos de opinião, encomen-
Moedas, 49 anos, aqueles em que, mais de 20 anos com dados pelo PSD, mostrarem um crescimento
com quem casou em devido às políticas Céline Abecassis- qualitativo da simpatia por Moedas no con-
2000 – e que assistiu de austeridade, foi Moedas, mãe dos seus traste com Fernando Medina, “a expectativa
ao discurso de vitória ofendido na rua três filhos (dois vivem não era de que pudéssemos ganhar”, assume
junto ao palco, de olhos quando caminhava em Portugal e uma o coordenador autárquico social-democrata,
emocionados, a uma com o filho – hoje com está a estudar fora) José Silvano. Essa expectativa chegou com as
distância discreta. 16 anos e um “ás” primeiras percentagens oficiais renhidas. No
Com raízes francesas, no ténis. Todavia, os segundo piso da São Caetano à Lapa – onde a
descendente secular filhos levam uma vida direção de Rui Rio esteve reunida toda a noite,
de judeus sefarditas, quase normal, que longe dos olhares dos jornalistas –, “a tensão
Céline formou-se em relatam nas contas aliviou”, pois “havia hipóteses”.
Economia e Gestão de Instagram, criadas
pela École Normale quando viveram em “LIA MUITO, ESTUDAVA MUITO”, DIZ O AMI-
Supérieure de Cachan Bruxelas.
GO DE BEJA
e na Paris-Sorbonne. Tem uma irmã, que
Em Beja, também se viveu uma madrugada de
Por França, fez vive em Lisboa. Por
ainda o mestrado Beja, está a mãe
nervos. “Sentimo-nos sempre ao lado dele”,
e o doutoramento. Lurdes, viúva de José conta Nuno Palma Ferro, 51 anos, conterrâneo
Abraçou a vida Moedas, que faleceu e amigo de infância de Moedas. Cresceram
académica em 2002, em 1993, com uma ambos na mesma rua, onde, à noite, a brin-
na Queen Mary doença provocada pelo cadeira de eleição eram as escondidas. Mas, à
University of London alcoolismo, em que medida que iam crescendo, Carlos, “sempre
e na MIT Sloan School entrou nos últimos oito pequeno e franzino”, dava mais atenção às
of Management. É anos de vida – algo que atividades intelectuais. “Lia muito, estudava
diretora académica o autarca já relatou muito”, recorda o também colega de escola.
do Center for como tendo sido uma O autarca estava sempre entre os melhores
Technological “época dificílima”. da turma, destacando-se na Matemática, e,
Innovation & Fotos de família? Para por isso, os professores começaram a incen-
Entrepreneurship, em já, ficam guardadas no tivá-lo a seguir Medicina. Sem sucesso: “O
Lisboa, professora álbum. Carlos não podia ver sangue à frente.” Ainda

LUÍS BARRA
LUÍS BARRA
falou durante uns tempos em Arquitetura, O dia seguinte Newton, crê que, “nas grandes reformas es-
mas acabaria a estudar Engenharia Civil – até Horas depois de truturais, Carlos Moedas vai necessitar de
pelo facto de se poder mudar para a capital e ser eleito, Moedas toda a capacidade negocial com um PS que
descobrir um mundo “que sempre quis co- cumpriu a primeira tem uma visão completamente diferente da
nhecer”. Nunca perdeu o contacto com Palma promessa da nossa”. “Ele tem as características determi-
Ferro, que acabou por se ligar à política, tendo campanha e foi nantes que fazem um grande político, entre
almoçar com os
sido o candidato social-democrata à câmara elas a natureza conciliadora, que tenta jun-
trabalhadores da
de Beja, nestas autárquicas. “Mais depressa tar visões opostas para melhorar o processo
higiene urbana e das
o via como grande financeiro do que como oficinas do município,
de decisão”, defende Newton, que terá a seu
grande político. Aqui, o mais próximo que nos Olivais cargo a bancada do PSD na Assembleia Mu-
esteve da política foi como tesoureiro da nicipal – a escolha do futuro presidente deste
associação de estudantes no liceu”, lembra o órgão será um primeiro teste à sobrevivência
amigo, que consultou Moedas antes de aceitar de uma vitória, que, questionado pela VISÃO
ser o candidato. quanto ao seu simbolismo, Carlos Moedas fez
No horizonte, que estima ser o próximo questão de frisar que foi conquistada “por um
ano de mandato, o líder do PSD/Lisboa, Luís projeto e não por esta ou aquela liderança
partidária, nem por um Messias da direita”. Já
Paula Teixeira da Cruz aponta o que muitos
pensam: “O PSD, objetiva e inegavelmente,
OS PROFESSORES perdeu as eleições autárquicas e não pode
cantar vitória. O que teve foi umas vitórias
INCENTIVARAM-NO estrondosas e inesperadas em cidades como
Coimbra, Portalegre ou Funchal.” “Agora, em
A IR PARA MEDICINA, Lisboa, dado o simbolismo e importância,
MAS MOEDAS
ganhou uma pessoa que se chama Carlos
Moedas, que reúne os requisitos de que o
NÃO PODE VER

PSD precisa. Isto é um facto”, concluiu aquela
que é uma opositora de Rio e que pertence à
SANGUE ala centro-esquerda do partido. [email protected]

* com João Amaral Santos

37,36% PS 34,23% + em coligações 3,13% 31,96%
PS PSD
AS SEQUELAS DO
“EFEITO AUTÁRQUICAS”
O primeiro-ministro estará a preparar uma remodelação para depois PSD
do Orçamento do Estado – e a entrada de Medina no Governo é o mais
recente tabu. Mas essa não é a única consequência destas eleições. Moedas boas
Vejamos em que estado fica cada um dos partidos substituem as más?
FILIPE LUÍS Há 17 anos, Cavaco Silva escre-
veu um artigo em que citava a
Lei de Gresham: a má moeda
tende a expulsar do mercado a
boa. E fazia uma analogia com a
classe política. Na altura, o alvo
era Santana Lopes, que tinha
chegado a primeiro-ministro,
alegadamente, “expulsando”
os “bons políticos”. Dezassete
anos depois, Carlos Moedas
tenta inverter, no PSD, a Lei de
Gresham. Moedas foi decisivo
para que Rui Rio atingisse o
seu objetivo de reversão dos
resultados de 2017. Sobretudo,
também bateu os resultados de
2013. Ainda perdeu as elei-
ções, é certo, mas recuperou
em zonas urbanas, aumentou
o número de municípios (mais
16), conquistou mais capitais de
distrito e roubou câmaras à es-
querda. A conquista de Lisboa,
PS por Carlos Moedas, foi um gan-
cho de direita que levou o PS ao
Costa responde com remodelação tapete. Se tivesse sido o único
êxito importante, a vitória teria
É possível que Eduardo Cabrita saia do Governo antes que se saiba a que veloci- de ser creditada, exclusivamen-
dade seguia o seu carro de serviço, quando, em junho, esteve envolvido no célebre te, a Moedas. Tendo confirmado
acidente da A6. O ministro da Administração Interna é um dos nomes apontados uma tendência de recuperação,
na possível remodelação, depois da aprovação do Orçamento do Estado, ao qual se o sucesso terá de ser dividido
podem juntar o da ministra da Cultura, Graça Fonseca, e da Justiça, Francisca Van com Rio – que, aliás, escolheu
Dunem. António Costa já desmentiu que haja uma remodelação “em consequência o candidato. Consequência
das autárquicas”, talvez porque ela esteve sempre prevista, independentemente imediata: fica adiada a “cla-
dos resultados. Segundo apurou a VISÃO, a mexida pode passar por uma dança rificação” no PSD (como já
de cadeiras que possibilite a entrada direta de Fernando Medina no executivo, reconheceu Paulo Rangel, num
numa outra pasta – mas isso é assunto tabu. Este domingo, a história do cerco de artigo do Público…) e Rui Rio,
Lisboa deixou de ser apenas um título de José Saramago: a derrota na capital fere contra todas as probabilidades,
o PS onde mais dói. Ainda há oito anos, António Costa tinha tido 51% em Lisboa, e resistirá até às legislativas. Já
Medina foi uma escolha sua. Agora, Medina é a primeira baixa dos socialistas na Moedas torna-se um ativo de
corrida à sucessão, na liderança, fixando-se Pedro Nuno Santos na pole position. E peso que limita as ambições de
o nervosismo sobre a discussão do orçamento aumenta: o PCP está ferido. Ora, se Rangel, Moreira da Silva ou Luís
houver crise política, a maioria absoluta fica demasiado distante... Montenegro.

CDS 1,70% PAN
PSD 13,21% + em coligações 18,75% 8,21% 7,11% CDS 1,48% + colig. 0,22% 1,14%
CDU Independentes Chega BE Outros
4,16% 2,85% 1,69%
66 MUNICÍPIOS-CAMALEÃO RESULTADOS
IL 1,30%
2021
O PSD ganha 26 concelhos ao PS,
5 aos independentes e 1 à CDU. Por sua
vez o PS conquistou 12 ao PSD, 6 à CDU
CÂMARAS
e 4 aos independentes. A CDU tirou 2 ao PS
e os grupos de independentes ganharam
6 ao PS e 4 ao PSD
PS
149
GANHOS
PS + outros
PSD
114
PSD + CDS + outros
CDU 19
PERDAS Independentes 19
CDS 6
JPP 1
RESULTADOS
2017
PS 161
PSD 98
CDU 24
CDS-PP 6
Indep. 17
JPP 1
Nós, Cidadãos 1
VOTANTES
FONTE www.autarquicas2021.mai.gov.pt
4 999 918
INSCRITOS
9 319 551
ABSTENÇÃO
46,35%
A ABSTENÇÃO DESDE 1976 No domingo passado, 26, registou-se a segunda maior taxa de sempre em autárquicas
% %
60 35,34% 36,98% 39,14% 36,56% 39,90% 39,88% 39,06% 40,97% 47,40% 45,03% 60
40 28,26% 28,95% 40
20 20
12 dez 16 dez 12 dez 15 dez 17 dez 12 dez 14 dez 16 dez 9 out 11 out 29 set 1 out 26 set
1976 1979 1982 1985 1989 1993 1997 2001 2005 2009 2013 2017 AR/VISÃO 2021
BE
Catarina “herda”
problemas de Rui Rio?
Catarina Martins reagiu aos resul-
tados eleitorais a dois tempos: na
noite eleitoral disse “boa noite” e
foi à sua vida, com os resultados a
meio, corporizando o sentimento
do Bloco de Esquerda em eleições
autárquicas: só espera que passem
depressa. No dia seguinte, reconhe-
ceu a derrota, mais explicitamente.
Em resposta, entrincheira-se:
nada de acordos com a direita – à
atenção de Carlos Moedas, sem
maioria absoluta, em Lisboa. E até
sugeriu uma geringonça, na capital:
“Existe uma maioria de esquerda
que pode travar a direita.” Mesmo
não sendo um partido autárquico,
o BE ainda tinha 19 vereadores,
espalhados pelo País – e ficou com PCP
quatro. Manter uma vereadora
em Lisboa foi difícil. Conquistar a
primeira vereação no Porto foi a
João Ferreira ao fundo do túnel
única e fugaz alegria. Isto tem mais O PCP ficou com a fama de reivindicar vitória em todas as noites
que se lhe diga do que as dificul- eleitorais, mas isso já foi chão que deu uvas. Não foi a primeira vez que
dades tradicionais dos bloquistas Jerónimo de Sousa reconheceu uma derrota – mas, desta vez, foi mais
no poder local: é uma tendência de explícito do que nunca: “Não atingimos os objetivos.” A CDU perde vá-
erosão que já tinha produzido um rias maiorias absolutas – a começar por Setúbal e a acabar em Évora…
murro no estômago, nas últimas – e mais cinco câmaras, incluindo três bastiões em mãos comunistas
presidenciais. A associação com o desde 1976. E volta a deixar escapar Loures, a “Almada” deste ano.
PS e a proximidade do poder terão Antes de 2017, os comunistas governavam 34 municípios – hoje lide-
condicionado o “partido de protes- ram 19. Contudo, há uma luz ao fundo do túnel, e essa chama-se João
to”, o que pode levar o BE a tirar Ferreira, que reforçou a votação em Lisboa: mais um ponto percentual
algumas conclusões, na discussão e, mesmo com uma maior abstenção, consegue, em contracorrente,
do orçamento. Por outro lado, com mais 700 votos do que os obtidos em 2017. Comparando o seu discur-
resultados destes, para quê provo- so com o de Jerónimo de Sousa, no domingo, percebe-se, no tom, a
car uma crise política – e eleições? diferença geracional e de abordagem. Pareciam dirigentes de partidos
Internamente, é inevitável a contes- diferentes: Jerónimo lambia as feridas, Ferreira falava de futuro. É ele
tação à liderança. E os problemas a última esperança? Para o futuro imediato, sobra a tensão nas nego-
que se antecipavam para Rui Rio ciações do orçamento: se o PS pode reclamar conquistas inesperadas,
podem surgir… no Bloco. elas foram à custa da CDU. E o PCP pode tirar as suas conclusões
sobre o abraço de urso de António Costa que há seis anos sufoca os
comunistas.
CDS
O partido-cuco
Poucos anteviam uma noite eleito- câmaras, com maioria absoluta
ral tão descansada, mas Francisco (sendo que um dos vencedores nem
Rodrigues dos Santos é o único sequer era o incumbente) e contri-
líder que pode reivindicar uma buiu para resultados interessantes
vitória em todas as frentes: o CDS das coligações com o PSD, no resto
está associado aos sucessos de do País. Quer isto dizer que Chicão
Rui Moreira, no Porto (candidatura ficará até às legislativas? No novo
que apoiou e integrou), e de Carlos programa de comentário político
Moedas, em Lisboa. Ponto essen- da SIC, Linhas Vermelhas, Adolfo
cial, conseguiu manter as suas seis Mesquita Nunes (crítico interno da

Chega
O problema total
André Ventura segue à risca os ensina-
mentos de Álvaro Cunhal e, em todas
as eleições, reclama para o seu partido
uma grande vitória – embora, desta
vez, tenha concedido que ela “não foi
total”. E podem ser feitas duas leituras:
o Chega apresentou uma rede nacional
PAN de candidaturas e parece ter garan-
Resistência ou
tido uma grande transversalidade de
eleitorados (suburbano e rural, classes
estagnação?
altas e baixas, jovens e velhos). Tem 19
vereadores, mais do que alguma vez o
BE alcançou. Obtém 396 mandatos, o IL
Falta qualquer
que pulveriza os resultados da “concor-
Nem um: o PAN voltou a não con- rência”. Fere o PCP nos seus principais
seguir eleger qualquer vereador,
coisa...
bastiões no Alentejo e coloca verea-
mas aguenta os resultados de 2017. dores nas principais câmaras da AML,
Desce ligeiramente, em número excetuando a capital. Mas perde mais
de votos, o que pode ser atribuído de 200 mil votos desde as presidenciais.
ao aumento da abstenção, e sobe Tem uma implantação residual a norte Associada à vitória de
ligeiramente, em número de manda- do Mondego. Fica muito longe de ser a Rui Moreira, no Porto, a
tos, o que levou a sua dirigente, Inês terceira força política. Não fica sequer Iniciativa Liberal chegou a
de Sousa Real, a reclamar vitória, perto de conquistar qualquer câmara. E ser dada, por sondagens,
pela “consolidação do partido” nas não consegue mais do que o 3º lugar na como perto de conseguir
autarquias. De referir que o Pessoas- Assembleia Municipal de Moura, onde eleger um vereador em
-Animais-Natureza elegeu quatro o líder queria ganhar. E a qualidade de Lisboa – e isso teria
deputados para a Assembleia da alguns dos seus “candidatos a martelo” feito toda a diferença.
República, em 2019, sem que a sua terá causado um dano reputacional com Mas não: os 4,22% em
implantação local, ou em número de influência nos votos. Lisboa correspondem ao
mandatos autárquicos, se compare resultado em legislativas,
sequer ao saldo conseguido pelo na capital, mas não há
Chega. E mesmo a Iniciativa Liberal crescimento. Aliás, a IL
conseguiu mais mandatos do que o vê-se ultrapassada pelo
PAN. Os resultados são discretos, Chega, por quase 500
mas sem que se verifique qualquer votos, quando, em 2019, o
erosão, o que livra o PAN, a experi- partido de André Ventura
mentar uma liderança recentemente tinha ficado muito atrás. No
eleita, de possíveis perturbações Porto, a IL não conseguiu
internas. E a associação do partido a medir forças, por estar
algumas coligações locais parece ter integrada no movimento
sido criteriosa e prudente. Qualquer de Rui Moreira (que, ainda
conclusão sobre o crescimento ou por cima, perdeu a maioria
definhamento eleitoral do PAN fica absoluta). Partido de nichos
adiada para outros atos eleitorais. urbanos, o que se confirma
agora, revelou, assim, ter
dificuldades em eleições
autárquicas, apesar de
ter visto mais eleitos
seus do que o PAN. Com
efeito, em zonas urbanas,
a IL obteve percentagens
liderança centrista) pôs água na interessantes e, nalguns
fervura e analisou os resultados do casos, percentualmente
CDS, sozinho, fora dos seus seis superiores às que
bastiões: sempre atrás do Chega e, conseguiu nas legislativas
frequentemente, da IL. O partido- de 2019. A prestação não
-cuco anda a pôr os ovos no ninho foi brilhante, mas, como
do PSD, mas tem dificuldade em dizia o célebre anúncio,
construir o seu próprio ninho. E dos anos 70, a uma marca
essa vai ser a narrativa dos oposito- de automóveis, os liberais
res de Chicão. vieram para ficar – e
ficaram mesmo.

SAÚDE
EM ESTADO
CRITICO
O investimento na Saúde aumentou (de 9,4%
para 10,2% do PIB) e o número de camas
nos cuidados intensivos duplicou. Ainda
assim, os relatos de norte a sul do País são
de desespero – enchentes nas urgências,
debandada de profissionais, milhares de
utentes sem médico de família e outros
milhares à espera de cirurgia. Para lá da
Covid-19, as “doenças crónicas” do Serviço
Nacional de Saúde não dão tréguas
D A N I E L A C O S TA T E I X E I R A E VÂ N I A M A I A

A
LUCÍLIA MONTEIRO
Ariana Meireles, 28 anos, tem uma
história “kafkiana” e sofrida para con-
tar. A jovem de Vila Real começou a
sentir fortes dores nas costas em 2018,
que a médica de família atribuiu ao
facto de passar muito tempo sentada.
“Fui ao privado e disseram-me que a
cirurgia tinha de ser feita, mas que
devia falar com o médico de família
para tentar uma consulta de Orto-
VASCO CÉLIO
LUÍS BARRA
pedia o mais rapidamente possível.”
Pedida no verão de 2019, a consulta
foi conseguida em março de 2020 no
Centro Hospitalar de Trás-os-Montes
e Alto Douro. Relatos aflitivos Médicos do Depois de conseguir falar com o
“O médico assegurou-me logo de SNS que nos descrevem as suas diretor clínico da unidade de Vila Real,
que eu nunca na vida ia ser operada condições de trabalho e a situação a situação resolveu-se em agosto,
tão cedo por causa da Covid-19”, con- dos seus serviços. (no sentido do quando Ariana foi operada: “Não só
tinua. Até Ariana receber o pedido de ponteiro do relógio) Adelina Pereira, precisei de tirar uma hérnia, como foi
transferência de hospital, em fevereiro Miguel Abreu, Elsa Landim, Pedro necessário fazer a fusão da coluna (pôr
de 2021, seguiram-se chamadas atrás Barreira e João Rosa parafusos) porque os nervos estavam
de chamadas, num desespero que ia a ser estrangulados pela falta de discos
além da dor física. “Tive de deixar o entre as vértebras”, explica.
meu trabalho, engordei dez quilos, Quem não conhece outras histórias
não conseguia fazer nada com as do-
res que tinha. Cheguei a ir às urgên-
MUITOS MÉDICOS destas? São aos milhares e milhares
por todo o País. O nosso Serviço Na-
cias do hospital e a estar com quatro
medicações diferentes intravenosas e
FORAM PARA O cional de Saúde de excelência, que
tanto nos orgulha na luta contra a
a dor não passava.”
Recebeu um vale-cirurgia, foi a um
PRIVADO, ONDE Covid-19, tem problemas crónicos
desesperantes. Para lá da pandemia,
dos hospitais privados indicados, mas
foi recusada (“disseram que não era
CONSEGUEM GANHAR há listas de espera gigantes e profis-
sionais esgotados. Se não fossem eles,
operável”). Recebeu outro vale-cirur-
gia, foi a outro hospital privado, que CERCA DE CINCO MIL aliás, o drama seria bem maior.
Dentro dos hospitais, há médicos
confirmou a urgência da operação,
mas precisava de um novo relatório EUROS DE ORDENADO mais velhos a fazer urgências apesar
de estarem dispensados delas – mas
médico do hospital público: durante
o ano e meio em que esteve à espera, BASE, O EQUIVALENTE não conseguem largar um serviço
que muitas vezes se torna caótico.
a condição agravou-se e a cirurgia
requeria mais procedimentos. “No AO SALÁRIO DE UM Há enfermeiros a trabalhar 16 horas
seguidas, dia após dia após dia. E,
público não aceitaram [mudar o pe-
dido de cirurgia]. Voltei à estaca zero. CHEFE DE SERVIÇO COM por muitos concursos que se abram
para a contratação de profissionais,
Tinha um médico disponível, mas não
podia ser operada”, lamenta. 40 ANOS DE PROFISSÃO o Interior fica sempre à míngua com
vagas por preencher. Mas quem esco-

MILHARES À ESPERA
O mais recente Relatório Anual de
Acesso a Cuidados de Saúde nos
Estabelecimentos do SNS e Entidades
Convencionadas, referente a 2020,
levanta o véu sobre as listas em ano de
LUCÍLIA MONTEIRO
pandemia
414 000 212 000

CONSULTA DE LISTA DE ESPERA
ESPECIALIDADE PARA CIRURGIA
HOSPITALAR No final de 2020,
Do total de utentes eram mais 46% os
em espera, pacientes à espera
cerca de 70,2% de operação do
encontravam-se na que em 2019. A
lista há menos de mediana do tempo
nove meses de espera foi de 3,8
meses
MARCOS BORGA
577 000
lhe trabalhar no serviço público mais continuarem a atender quem chegas-
horas por menos dinheiro? se pelo seu próprio pé. Esta situação
Começa aqui uma viagem pelas acontece quando apenas conseguem
maiores dores do nosso SNS. garantir três médicos de serviço.
“Sempre que tomamos a decisão de
NASCER NA AFLIÇÃO fechar a urgência é para proteger as
Na noite anterior à conversa com grávidas e os seus bebés”, sublinha. ENTRADAS NA LISTA
a VISÃO, a obstetra Elsa Landim, O ideal seria o hospital ter 32 obs- DE INSCRITOS EM CIRURGIA (LIC)
37 anos, teve um turno de urgência tetras, estima Elsa Landim, que ali- Do total, foram operadas 514 mil
difícil. Às tantas, tinham sido admi- menta a esperança de, no final do pessoas no âmbito do SIGIC
tidas oito grávidas e estavam apenas primeiro trimestre do próximo ano, (-18,2% face a 2019)
quatro obstetras de serviço. “Já não chegarem aos 23 especialistas. Apesar
846 100
havia tempo para transferir ninguém de os médicos estarem dispensados de
e, se dois bebés nascessem ao mes- fazer urgências a partir dos 55 anos,
mo tempo, seria muito complicado”, são muitos aqueles que continuam a
relata. A médica tem a missão de fazê-las. “Na minha unidade, 80% já
gerir o quebra-cabeças da escala de não teriam de entrar na escala, mas a
urgência obstétrica e ginecológica do maior parte deles entra por uma ques-
Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca, tão de solidariedade. Seria impossível ATENDIMENTO DIAS PARA
na Amadora. “Somos 20 obstetras, funcionarmos sem eles”, garante. E é SNS 24 A PRIMEIRA
mas nem todos fazem urgência. Cada raro o dia sem um médico prestador Tempo médio CONSULTA
turno deve ter cinco elementos, mas de serviços na linha da frente, os cha- de espera, em Apesar da
normalmente são quatro, é raro o dia mados “tarefeiros”. segundos, entre diminuição dos
ou noite com cinco”, admite. A obstetra atribui a falta de es- abril e dezembro inscritos no sistema
Desde setembro do ano passado pecialistas, essencialmente, à pouca de 2020. Nesse Consulta a Tempo e
que a urgência do hospital não é to- atratividade do SNS. “É muito mais período, foram Horas (menos 639
talmente encerrada, mas ainda há três sedutor trabalhar 30 horas no privado feitas 3 508 712 790), a mediana do
semanas foi necessário entrar em con- a ganhar mais, do que trabalhar 40 chamadas para a tempo de espera
tingência, ou seja, avisar o INEM para horas ou mais no público a ganhar Saúde 24 aumentou
não enviar ambulâncias, apesar de menos”, afirma. As dificuldades de

progressão na carreira são outro dos Protestos Em defesa do Serviço tras, e a usar o meu tempo, para ver
entraves: “Sou especialista desde 2016 Nacional de Saúde, no Porto, aquela grávida que precisa mesmo
e recebo o mesmo que um colega que em novembro de 2020, uma de ser vista”, afirma. É habitual sair
terminou o internato no ano passado”, iniciativa organizada pelo PCP uma ou duas horas depois do horário
em vários pontos do País
compara (o ordenado de um assistente estipulado. Horas essas que são ofere-
hospitalar começa nos €2 700 brutos). cidas ao SNS, dado que não são pagas.
Ao mesmo tempo, os hospitais com “Uma vez, uma grávida ficou muito
falta de recursos humanos são menos zangada por esperar quatro horas pela
atrativos para os candidatos porque consulta, e eu tive de lhe explicar que
são sinónimo de mais trabalho. todos os dias tenho de decidir se vou
“Até se pode estar a formar espe- ou não buscar a minha filha à escola,
cialistas mais jovens, mas além de a cumprindo o meu horário, mas dei-
formação em Ginecologia e Obste-
trícia ser longa, a verdade é que uma
O MINISTÉRIO DA xando lá os doentes”, conta.
pessoa quando acaba a especialidade

não se sente completamente capaz
SAÚDE AFIRMA QUE MAIS DINHEIRO, PROBLEMAS IGUAIS
Não seria descabido dizer que o Es-
de resolver todas as situações que
possam surgir”, explica Nuno Clode,
“A 31 DE AGOSTO DE tado vai confiado na “carolice” dos
seus profissionais de saúde, mas tam-
presidente da Sociedade Portuguesa
de Obstetrícia e Medicina-Materno 2021 REGISTAVAM- bém não seria totalmente correto.
De acordo com o Instituto Nacional
Fetal, apontando ainda a complexi-
dade da área: “O problema que se põe SE MAIS 11 634 de Estatística, a percentagem do PIB
dedicado aos gastos com a saúde au-
é que estas especialidades são muito
interdependentes. Obstetrícia não TRABALHADORES mentou de 9,4%, em 2018, para 10,2%,
no ano passado.
funciona sem anestesia, se não houver
anestesistas não há epidurais.” NO SNS DO QUE EM Contactado pela VISÃO, o Minis-
tério da Saúde afirma que “a 31 de
Não é só a urgência que traz dores
de cabeça a Elsa Landim, coordena- FEVEREIRO DE 2020”. agosto de 2021 registavam-se mais
11 634 trabalhadores no SNS do que
dora das consultas de diabetes gesta-
cional e de planeamento familiar. Por MAS HÁ CONCURSOS em fevereiro de 2020”. Durante este
período, deu-se “a integração de 1 370
vezes, chega a agendar 25 consultas,
num dia em que deveria dar apenas QUE FICAM SEM trabalhadores na área de cuidados de
saúde primários, de 871 nas unidades
15. “Se não tenho vagas até novembro,
sou obrigada a marcar consultas ex- CANDIDATOS de cuidados intensivos e de 220 tra-
balhadores na área da saúde pública”.

A Medicina Intensiva foi das espe-
cialidades que mais beneficiaram com o
investimento financeiro. Antes da crise
sanitária, Portugal dispunha de 6,4 ca-
mas de medicina intensiva por cem mil
Falta de profissionais
A escassez de recursos humanos e a incapacidade de o Serviço Nacional
habitantes. Atualmente, existem nove. de Saúde captar profissionais têm sido apontados como os principais desafios.
“E temos a perspetiva de crescer, até ao O que dizem os números
30 873
ano que vem, para as 11 camas por cem
1 293 51%
mil habitantes”, revela um dos elemen-
tos da direção da Sociedade Portuguesa
de Cuidados Intensivos (SPCI), António
Pais Martins. Assim, o País ficará com
praticamente o dobro das camas conta- APOSENTAÇÕES MÉDICOS NO SNS
bilizadas há dois anos, aproximando-se DESDE 2019 MÉDICOS Dos inscritos na Ordem,
da média europeia. De janeiro a maio deste Do total de médicos a exercer apenas metade exerce
Contudo, nesta especialidade a ano, aposentaram-se no SNS, dez mil são internos no serviço público.
no SNS mais de 231 Portugal tem um rácio
carência de recursos humanos con-
49 490
médicos, incluindo de 5,4 médicos por 1
tinua igualmente a fazer-se sentir. O
nesse número 131 000 habitantes (3,5 é a
também coordenador da Unidade de média da OCDE)
especialistas em
Cuidados Intensivos Cirúrgicos do
Medicina Geral e
Hospital São Francisco Xavier, em
63%
Familiar. Em 2019
Lisboa, estima que faltem cerca de aposentaram-se
40 intensivistas e 150 enfermeiros 409 médicos, no ano ENFERMEIROS
especializados só na região de Lisboa passado foram 653 Total de trabalhadores da classe
e Vale do Tejo (LVT), que permitiriam de enfermagem a exercer no SNS
ENFERMEIROS
funcionar de forma mais “tranquila”. NO SNS
1 532
No entanto, Pais Martins ressalva que Há 78 117 enfermeiros
7,4
“é preciso não esquecer que a média registados na Ordem,
de idades destes especialistas é de 55 sendo que 113 desses
anos, o que exigirá mais renovação”. estão no estrangeiro
Na semana passada, foram abertas
26%
18 vagas para especialistas em medi- RÁCIO DE
cina intensiva em hospitais de LVT, ENFERMEIROS POR VAGAS PARA MÉDICOS
que fazem parte de um total de 60 1 000 HABITANTES DA ÁREA HOSPITALAR,
lugares que serão disponibilizados a EM PORTUGAL MEDICINA GERAL E FAMILIAR
nível nacional (está ainda prevista a Em 2020, o rácio da E SAÚDE PÚBLICA ESPECIALISTAS
contratação de 626 enfermeiros e de OCDE e da União No concurso aberto em julho No final de 2020,
198 assistentes operacionais). Europeia era de 8,2 deste ano, um terço das vagas a Ordem contava
enfermeiros por cada mil para contratar 459 médicos de com apenas 21
Carlos Meneses Oliveira também é
habitantes. Em Aveiro é Medicina Geral e Familiar ficou 061 enfermeiros
intensivista, mas no Hospital Beatriz
de apenas 4,4/1 000 por preencher especialistas
Ângelo, em Loures, e considera que
um dos principais problemas que
afetam muitas unidades é a sobrecarga
de casos sociais, ou seja, situações em
que os doentes têm alta clínica, mas
continuam no hospital. “Tem implica-
O TEMPO NAS URGÊNCIAS
ções porque para aceitarmos doentes, De 28 de agosto a 27 de setembro de 2021, registou-se um total de 454 494
temos de dar alta a outros. E, a dado episódios de urgência em todo o País, segundo os dados de monitorização diária do
momento, não conseguimos enviar SNS e da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS)
doentes para as enfermarias devido aos
casos sociais”, alerta. O especialista em
Medicina Intensiva explica que estas
11 232 39
situações são mais comuns em hos-
pitais inseridos junto de populações
mais frágeis, como o Beatriz Ângelo.
“Já tivemos casos de crianças em que MINUTOS MINUTOS MINUTOS
um juiz considerou mais saudável esta-
rem internadas do que irem para junto
Tempo entre admissão Tempo médio de Tempo entre triagem
dos pais, que estavam em processo de e triagem permanência no e primeira observação
divórcio”, ilustra. Chegam a estar ocu- serviço de urgência médica
padas com casos sociais quase 10% das
camas nas enfermarias, calcula. Fontes: Serviço Nacional de Saúde, Análise Mensal do Balanço Social do SNS, Ordem dos Médicos, Ordem dos Enfermeiros
Além de defender uma maior ar-

ticulação entre os hospitais e os ser- que estima em 140 milhões de euros o
viços sociais, Carlos Meneses Oliveira encargo com prestadores de serviços
sente “indiretamente a falta de mé-
dicos de família”, já que a população SEM MÉDICO DE FAMÍLIA médicos no SNS, em 2019.
“Há dificuldade de alocação de
de contextos socioeconómicos mais De acordo com os dados do Portal da médicos à urgência porque é um tra-
vulneráveis não tem alternativa ao Transparência, referentes a agosto balho duro, que pode ter uma procura
centro de saúde, e “acaba por chegar deste ano, mais de um milhão de enorme e imprevisível. E quem lá
mais doente do que deveria”. utentes não têm médico de família trabalha não tem acesso a progressão
atribuído na carreira porque, em Portugal, não
TRABALHO DURÍSSIMO existe a especialidade de Urgência.
42 995 86 104
Os problemas nas urgências não Por isso, muitas pessoas acabam por
se resumem aos utentes que a elas ficar desmotivadas e vão-se embora”,
recorrem sem extrema necessida- diz Adelina Pereira. Apenas em quatro
de. “As macas nos corredores dos ARS Alentejo ARS Algarve países europeus não existe a especia-
hospitais são um problema que se lidade de urgência: Portugal, Espanha,
arrasta ao longo de quase todo o Alemanha e Chipre.
ano. É raro não haver doentes in- Num País com 500 mil episódios
724 629 165 536

ternados nos serviços de urgência”, de urgência por mês, sendo cerca
descreve a presidente da Sociedade de 40% deslocações desnecessárias,
Portuguesa de Medicina de Urgên- Adelina Pereira diz ser fundamental
cia e Emergência, Adelina Pereira, ARS Lisboa e Vale intervir ao nível dos cuidados de saú-
ARS Centro
médica no Hospital Pedro Hispano, do Tejo de primários, “porque muitas pessoas
em Matosinhos, que chega a regis- acabam por recorrer à urgência por
tar 300 episódios de urgência, nos não terem outra alternativa”.
135 983 1 155 247

dias piores. Em 2019, a internista Aos 53 anos, a internista faz fre-
teve oportunidade de reunir com quentemente 24 horas semanais de
todas as administrações regionais trabalho extra na urgência, mas po-
de saúde para traçar o retrato das ARS Norte TOTAL dem ser mais, se algum colega tiver
urgências do País. Sem surpresa, a de faltar. Contudo, não considera que
escassez de recursos humanos é o exista escassez de médicos em Portu-
principal drama. gal: “Eles não estão é no SNS.” E se em
“Temos recebido várias queixas de redor dos maiores centros urbanos
vários serviços de urgência e o que do País ainda vai sendo possível en-
acontece nessas exposições é que
os colegas relatam uma sobrecarga
imensa de trabalho que os leva a li-
A ANGÚSTIA DA OPERAÇÃO contrar profissionais para preencher
vagas, nas zonas mais remotas é uma
tarefa quase impossível.
Em julho, de acordo com os dados
mites físicos, psicológicos e por vezes
do Portal da Transparência, quase
éticos também, pela grande afluência, LONGE DA CAPITAL
200 mil pessoas ainda aguardavam
mas também pelo que é uma falta por uma cirurgia, inscritas na lista “Eu vi esta unidade nascer e, ago-
crónica de enfermeiros”, diz Sérgio do SIGIC ra, estou a vê-la morrer. Custa-me
Branco, dirigente da Ordem dos En- muito pelas crianças.” O lamento do
fermeiros. No Hospital de Faro, um diretor do serviço de Medicina Inten-
79 530 63 693
dos que têm apresentado constran- siva Pediátrica e Neonatal do Centro
gimentos nas últimas semanas, os Hospitalar Universitário do Algarve
enfermeiros do serviço de urgência (CHUA) é consequência da “imensa
“chegaram a ter cada um à sua res- falta de gente” de que padece o único
Região de Saúde Região de Saúde
ponsabilidade cerca de 30 doentes no LVT Norte
centro hospitalar algarvio. “O que nos
serviço de urgência. É humanamente torna especiais é que, se fecharmos as
impossível conseguir prestar cuida- urgências pediátricas, o hospital de
6 158 9 487
dos em segurança às pessoas que nos referência mais próximo fica a 250
procuram”, continua Sérgio Branco. quilómetros. E transferir um prema-
É raro as urgências terem equipas turo para Lisboa é muito delicado,
próprias. Habitualmente, dependem Região de Saúde põe em risco a vida dos bebés”, alerta
Região de Saúde
inteiramente dos especialistas que do Alentejo João Rosa.
do Algarve
fazem urgências semanalmente e de “Na unidade de cuidados intensi-
médicos sem especialidade. “O pri- vos pediátricos deviam estar sempre
39 182 198 050

meiro atendimento, muitas vezes, é dois médicos, mas nem sempre estão.”
feito por tarefeiros”, afirma Adelina João Rosa reconhece que é um risco
Pereira. Os médicos prestadores de quando só está um especialista de ser-
serviços, chamados “tarefeiros”, re- Região de Saúde TOTAL viço, mas é esse o preço a pagar para
presentam cerca de 40% da mão de do Centro conseguirem continuar a responder às
obra nas urgências, segundo o Sindi- necessidades da população. “Abrem-
cato Independente dos Médicos (SIM), -se as vagas, mas os concursos ficam

MARCOS BORGA
MARCOS BORGA
desertos”, diz o pediatra. “Não con- Doentes em desespero “o trabalho dos prestadores de serviço
seguimos competir com os privados, Ariana Meireles (em cima, à deixou de ser excecional e tornou-se a
nem com o SNS, porque somos um esq.) esperou quase três anos regra em todos os hospitais”, afirma o
hospital periférico”, nota. por uma cirurgia; Maria Dulce pediatra. Nem todas as equipas veem
João Rosa já viu serem formados Figueiredo, Acácio Santos com bons olhos os prestadores de
50 pediatras no hospital de Faro, nos e Carmen Zúnia estão entre serviços, já que a sua remuneração à
últimos 30 anos, “mas só 19 cá fica- as milhares de pessoas sem hora é bastante superior à dos médi-
ram”, contabiliza. Muitos foram para médico de família no Carregado cos contratados. Enquanto os traba-
o privado, onde conseguem ganhar lhadores do quadro recebem entre €15
cerca de cinco mil euros de ordena- e €20 por hora, os tarefeiros podem
do base, o equivalente ao salário de chegar aos €30, €40, €50 ou mesmo
um chefe de serviço com 40 anos de €60 por hora (valores brutos).
profissão. No SNS, os médicos com Segundo dados do Ministério da
20 anos de trabalho, ganham entre 3 Saúde, o CHUA era o centro hospitalar
200 e 3 600 euros brutos. com maior volume de horas de pres-
APENAS EM QUATRO
O infeciologista Miguel Abreu já foi tação de serviços médicos, em 2018,
aliciado pela medicina privada. Numa que representavam uma despesa de
PAÍSES EUROPEUS
dessas ocasiões, ofereceram-lhe 7 500 mais de oito milhões de euros. À VI-
euros brutos, por 35 horas de tra- SÃO, a presidente do conselho de ad-
balho, com consultas extras pagas à ministração do CHUA revela que se o
parte. E até do estrangeiro já lhe che-
garam convites. Aos 41 anos, já devia
NÃO EXISTE A pagamento das horas extraordinárias
dos médicos contratados aumentas-
ter ascendido a assistente graduado há
cerca de cinco anos, mas mantém-se
ESPECIALIDADE se 50%, o centro hospitalar, mesmo
assim, pouparia cerca de metade dos
como assistente hospitalar, com um
ordenado a rondar os 1 700 euros
DE URGÊNCIA: gastos com os prestadores de serviço
(à volta de quatro milhões de euros,
limpos. “Só subo quando abrir um
concurso, o que pode só acontecer
PORTUGAL, ESPANHA, em 2018). “Se eu pagar melhor aos
‘meus’ médicos, eles fazem mais horas
daqui a vinte anos”, diz o médico do
Hospital de Santo António, no Porto.
ALEMANHA E CHIPRE. extraordinárias e fixam-se mais facil-
mente”, acredita Ana Varges Gomes.
“Nunca trabalho menos de 50 ou 55
horas por semana”, garante. SEM ELA NÃO HÁ Mais do que as vagas carenciadas,
que procuram incentivar a mobilidade
Apesar dos seus 57 anos, João Rosa
continua a fazer urgências. “E tam- PROGRESSÃO NA geográfica através de vários benefícios,
como um acréscimo salarial a rondar
bém faço noites, porque se um de
nós falha, o serviço fecha.” Por isso, CARREIRA os 40%, durante seis anos, é a forma-
ção de médicos no hospital que mais

SÓ EM ANO DE
PANDEMIA A ORDEM
DOS ENFERMEIROS
RECEBEU 1 230
PEDIDOS DE
DECLARAÇÃO
PARA EXERCER
NO ESTRANGEIRO
contribui para a sua fixação, defende
Ana Varges Gomes. Além disso, as
vagas carenciadas são limitadas, por
exemplo, das três vagas de pediatria
abertas este ano no CHUA, apenas
uma era ao abrigo deste regime.
Anestesiologia, Ginecologia, Ortope-
dia e Pediatria são as especialidades que
“tiram o sono quase todos os dias na
hora de organizar escalas”. A adminis-
tradora é perentória: “Se me trouxerem
um especialista destas áreas, contrato-
-o na hora.” Atualmente, Ana Varges
Gomes tem disponibilidade financeira
para contratar 150 enfermeiros, mas não
consegue encontrá-los. E até já propôs serão feitos “com os mesmos recur- 474 profissionais de saúde contrata-
à Universidade do Algarve duplicar as sos, as mesmas pessoas e com uma dos para combater a Covid-19, 1 366
vagas do curso de Enfermagem de 30 agravante: é que há pessoas que estão são enfermeiros. No entanto, as más
para 60, por acreditar que será mais fácil a reformar-se e as admissões não são condições salariais, a acumulação de
fixar os estudantes algarvios. nenhumas”. horas extra e o não reconhecimento
Mauro Rosa é enfermeiro há 18 dos riscos e penalidades da profissão
CLASSE LIGADA ÀS MÁQUINAS anos e está há 15 no serviço de ur- levam muitos enfermeiros a procurar
Segundo o Sindicato dos Enfermeiros, gência do Centro Hospitalar Univer- construir carreira no estrangeiro. Só
neste momento o número de profis- sitário de São João, no Porto. Aponta em ano de pandemia, a Ordem dos
sionais no SNS é de cerca de 49 mil, a injusta remuneração como um dos Enfermeiros recebeu 1 230 pedidos
mas continua a não ser suficiente para sinais de desprezo face à profissão de declaração para exercer no es-
fazer frente às necessidades atuais e e que traz consequências não só na trangeiro.
futuras. A acumulação de horas extra e motivação como na própria prática
a necessidade de salvaguardar turnos profissional e na vida pessoal – todos ONDE HÁ MÉDICOS DE FAMÍLIA?
para garantir os serviços mínimos é estes fatores também agravados pela Já sabemos que não basta formar mais
uma das preocupações de Pedro Cos- carga excessiva de trabalho durante médicos e enfermeiros se o SNS não
ta, presidente do sindicato. a pandemia. “Estou no primeiro esfor atrativo para estes profissionais.
“O limite de horas extraordinárias calão de base da carreira, tal como Em todos os aspetos. “Há sítios sem
que está definido para os profissionais quando comecei a trabalhar. Ou computadores, com telefones avaria-
de saúde, que são 150 horas, já foi seja, quando um colega meu inicia dos e onde chove lá dentro”, descreve
há muito esgotado. Neste momento agora a sua atividade profissional, o presidente da Associação Portuguesa
cumprem-se jornadas de trabalho de acabado de sair da escola, vai ter as de Medicina Geral e Familiar (APMGF),
16 horas diárias, por exemplo”, diz, mesmas condições remuneratórias Nuno Jacinto. Poderá ser essa uma das
mostrando-se inquieto com a capa- que as minhas, apesar de eu fazer a razões para ter ficado por preencher
cidade dos enfermeiros de assegurar formação dele. Isto traduz o não re- mais de um quarto das 435 vagas aber-
os cuidados no resto do ano e ainda conhecimento, a não valorização da tas em Medicina Geral e Familiar, em
a campanha de vacinação contra a carreira, valorização que, na prática, setembro do ano passado.
gripe, que, este ano, acontece a par é inexistente”, explica. Segundo os mais recentes dados
da vacinação contra a Covid-19, sendo Quanto a contratações, segundo do Portal da Transparência, referen-
que ambos os processos de vacinação o Despacho nº 4794-A/2021, dos 2 tes a agosto, há mais de um milhão de

cos. Além de ter passado a trabalhar
35 horas por semana, confirma que
ganha “substancialmente melhor”.
Nuno Jacinto identifica um desfasa-
mento entre as vagas e os locais onde
os especialistas são precisos: “Há mais
vagas no Norte e no Centro, mas é no
Sul que elas fazem mais falta.” Também
é no Norte que existem mais Unidades
de Saúde Familiar de modelo B, mais
autónomas e exigentes, mas mais bem
remuneradas, podendo chegar aos seis
ou sete mil euros ilíquidos mensais.
O Centro de Saúde do Carregado é
um dos exemplos da escassez de clíni-
cos e tem sido palco de reivindicações.
Dos cerca de 13 mil moradores, pouco
mais de mil têm médico atribuído.
Na semana passada, a Comissão de
Moradores do Carregado juntou cerca
de 50 pessoas em frente ao centro de
saúde numa vigília, algumas prontas
a lá pernoitarem para conseguirem
marcar lugar para uma das quatro
consultas disponíveis no dia seguinte,
como foi o caso de Carmen Zúnia, 29
anos. “Grande parte das pessoas que
JOSÉ CARLOS CARVALHO
conheço e que precisam de médico

tem de dormir aqui. Estou de baixa
porque vou ser operada à coluna e
quando vim renovar a minha baixa saí
da consulta e não tinha como marcar
a próxima, só tinha vaga para o final
portugueses sem médico de família Mês quente da Covid de novembro”, conta à VISÃO.
atribuído. A APMGF estima que sejam Janeiro de 2021. As filas Segundo João Silva, da comissão de
necessários, pelo menos, mais 700 mé- de ambulâncias à porta do moradores, o centro de saúde está “só
dicos de família no SNS para resolver Hospital de Santa Maria, com um médico de família há uns dois
este problema, sendo que a especiali- em Lisboa, abriram os ou três anos” e o acesso a consultas é
dade atravessa um pico de reformas telejornais cada vez mais complicado. “As pes-
que deverá estender-se até 2023. soas ou vão para as urgências ou têm
O médico de família Pedro Barreira de pagar ao particular”, tal como já
atingiu o seu limite em julho deste aconteceu com Acácio Santos. “Tomo
ano, quando deixou para trás o SNS. medicamentos para a diabetes e o co-
“A minha saída não se prendeu apenas lesterol, fiz análises para a diabetes mas
com razões financeiras”, começa por não sei como estão, só tenho consulta
dizer. “Os centros de saúde estão so- para novembro. Tenho de ir pagar 55
brecarregados de tarefas, são eles que euros a uma clínica particular. Já tive
dão apoio aos centros de vacinação, às
áreas de doença respiratória Covid ou
SERIAM de o fazer e isto é uma vergonha.”
Os utentes do Carregado têm tam-
que fazem a vigilância telefónica dos
doentes infetados”, ilustra. “Somos
NECESSÁRIOS bém dificuldade em conseguir em
tempo útil baixas médicas e receitas
clínicos, mas também somos obriga-
dos a ser burocratas.”
700 MÉDICOS de medicamentos. A última receita
que Maria Dulce Figueiredo, 79 anos,
O especialista de 32 anos trabalhava
no Centro de Saúde da Alameda, em DE FAMÍLIA pediu ali levou 20 dias a ficar pronta,
garante. “A minha sorte é ir à farmá-
Lisboa, e tinha a seu cargo 1 816 doen-
tes, sem contar com os utentes sem PARA COBRIR AS cia e, como eles já sabem que tomo
aqueles medicamentos, dão-mos e eu
médico de família – 18 mil nesta uni-
dade de saúde. Costumava trabalhar NECESSIDADES DE levo a receita quando a tiver”, relata.
À falta de médicos de família, va-
55 horas por semana, oferecendo 15
horas ao SNS. Agora, dá consultas no MAIS DE UM MILHÃO lham-nos os farmacêuticos amigos
da família! Mas quem nos pode valer
SAMS e diz ter tempo para ser médico,
investigar e, até, discutir casos clíni- DE PORTUGUESES quando as dores são já incomportá-
veis? [email protected]

IMOBILIÁRIO / DOSSIER
PERIFERIAS
A FERVER
D.R.

Atrás de apartamentos novos e de uma melhor qualidade de
vida, muitas famílias portuguesas estão a ser atraídas pelas
zonas à volta de Lisboa e do Porto. Mas nestes concelhos
vizinhos, os preços já começaram a disparar e, em alguns casos,
mais do que duplicaram. A classe média está a instalar-se nas
periferias e a provocar uma verdadeira revolução imobiliária
MARISA ANTUNES
A outra margem Almada

continua a ser uma alternativa
para muitas famílias de Lisboa,
apesar da subida vertiginosa
dos preços

C
Os desejados terraços
No empreendimento Seixal Baía,
IMOBILIÁRIO / DOSSIER os preços variam entre os €240 mil
e os €650, para tipologias T2 e T3
onde vão entusiasticamente começar

a sua vida de casal.
“É a nossa primeira casa em co-
mum, e há muito que procurávamos
um imóvel nos arredores de Lisboa.
Quando ouvimos falar neste, pesou
o facto de ser um condomínio priva-
do, de ser um projeto novo e que nos
poderia dar a qualidade de vida que
queremos”, sublinha Peter.
O ter “lugar de estacionamento,
jardim murado acessível só aos re-
sidentes e até salão de festas fez a
diferença no momento da decisão”,
reforça Filipa, acrescentando que, em
contrapartida, “a distância em relação
a Lisboa não teve qualquer importân-
cia” quando resolveram avançar com
a aquisição.
O T3 que adquiriram no Vila Viva,
em Vila Franca de Xira, empreendi-
mento com dois edifícios, foi um dos
45 da primeira fase que literalmente
‘voaram’ assim que os promotores – a
D.R.
Rio Capital e o Estrutural Group – os
Comprar um apartamento novinho, colocaram à venda. De origem bra- mas, claro, a pandemia acelerou ainda
a estrear, com as tão ansiadas varan- sileira, estas empresas têm mais de mais as vendas”, conta o responsá-
das, uma cozinha equipada, lugar de uma década de experiência a construir vel, salientando os grandes “trunfos”
garagem, num condomínio fechado, para a classe média no Brasil, onde exacerbados pelos confinamentos e
onde não faltam um ginásio, salão de já somam mais de dois mil imóveis em que se incluem as varandas que
festas e um generoso jardim, a dois edificados. Em Portugal, este foi o existem em todas as casas e o jardim
mil euros o metro quadrado e perto primeiro projeto da parceria e a co- exclusivo de mais de dois mil metros
de Lisboa... Missão impossível, certo? mercialização não poderia ter corrido quadrados.
Errado. Uma nova dinâmica está a melhor. E, claro, o preço. “O máximo de
surgir nas zonas periféricas da capital O primeiro edifício, com 45 uni- €2 000/m2 é quanto os jovens ca-
e do Porto que está a levar milhares dades, já está totalmente vendido e sais portugueses conseguem pagar”,
de famílias a apostar num verdadeiro do segundo, com mais 40 habitações, sublinha, acrescentando que é esta,
virar de página. A entrada no mer- restam apenas 10, com preços diver- aliás, a premissa que rege a escolha
cado de novos e modernos projetos sos. Os da tipologia T1, por exemplo, dos projetos que abarcam. Agora
imobiliários a preços mais acessíveis não chegam aos €200 mil e os T2 que estão a terminar este empreen-
nas periferias e, em contrapartida, começam nos 250 mil euros. dimento, cuja conclusão global está
os valores proibitivos das casas nos A rapidez das vendas não sur- prevista para março de 2022, já estão
centros das duas principais cidades preendeu Carlos Silva, CEO da Es- em busca de terrenos ou imóveis da
do País, bem como a possibilidade de trutural Group. “Sabíamos que existia banca (como era o caso do Vila Viva,
estar em teletrabalho, nem que seja escassez deste tipo de produto imo- que foi adquirido ao Montepio) para
alguns dias por semana (uma novidade biliário para o mercado português, avançar com novos projetos. “Se não
trazida pela pandemia), criaram este segmento para o qual trabalhamos, conseguirmos vender a esse valor aos
movimento “irreversível”, asseguram nossos clientes, viramos logo a página
as diversas fontes contactadas pela e continuamos a procurar outro tipo
VISÃO Imobiliário. de oportunidades”, reforça ainda o
O casal Peter Everson e Ana Filipa
Coelho, com 27 e 26 anos, faz parte COMPRAR UM CEO da Estrutural Group.
desta recente vaga de compradores.

Namorados de longa data, planeiam APARTAMENTO OS PREÇOS A DISPARAR
Construir para a classe média come-
casar-se em breve e há muito que pro-
curavam uma casa que se encaixasse
A ESTREAR, NUM ça a ser uma realidade, e a rapidez
das vendas comprova a necessidade
exatamente nas suas expectativas.
Atualmente, cada um vive numa ha-
CONDOMÍNIO do mercado. Mas o produto novo é
ainda escasso, o que tem estimulado
bitação arrendada – ele em Lisboa, ela FECHADO, A €2 de forma exponencial o preço dos
MIL/M2 E PERTO DE
no Cacém – e ambos trabalham em imóveis usados. Dados da Confi-
Oeiras. Dentro de dois meses, irão dencial Imobiliário cedidos à VISÃO
LISBOA... É POSSÍVEL
mudar-se para Vila Franca de Xira, (ver infografias), com a evolução dos
local que conheciam pela rama, mas preços de venda por metro quadra-

do, nos últimos cinco anos, revelam
bem as mais-valias que estão a ser
obtidas. Imóveis situados em zonas
como Moita, Mafra, Sintra, Sesimbra
ou Almada, a sul, e Matosinhos ou
Vila do Conde, a norte, praticamente
duplicaram de valor.
“Antes da pandemia, já havia um
aumento do interesse pelas periferias.
E esse interesse desenrolou-se numa
lógica de mancha de óleo em que, na
prática, a valorização dos centros de
Lisboa e Porto favorecia a valorização
dos mercados mais próximos que iam
atraindo também a promoção imo-
biliária”, explica Ricardo Guimarães,
diretor da Confidencial Imobiliário,
realçando que, neste processo, é es-
sencial “que haja uma planificação
urbana de tal maneira que, em termos
de equipamentos sociais, transporte
ou mobilidade, exista a capacidade de
gerar novas centralidades que sejam
aprazíveis e que tragam soluções de
habitação e boas condições de vida
para as famílias”.
O que nem sempre acontece. “O
problema no nosso território é que
é muito heterogéneo, e encontramos
locais extraordinários colados a sí-
tios que são verdadeiros desastres
em termos de qualificação urbana e
de desordenamento. Há que reverter
esse desordenamento. Não temos de
viver todos nos centros de Lisboa e do
Porto”, enfatiza ainda o economista.
Mas, quando acontece, a valoriza-
ção imobiliária é imediata. “Muitos
municípios à volta destas cidades têm
sido inteligentes na sua gestão urbana,
com a criação de espaços que levam
as pessoas a comprar, não só porque
é mais barato do que na capital, por
MARCOS BORGA
exemplo, mas porque começam a ser

mesmo uma primeira opção”, diz, por
seu turno, Ricardo Sousa, CEO do
grupo Century21.
E exemplifica: zonas como Barrei-
ro, Seixal, Montijo ou Alcochete “que
VILA FRANCA DE XIRA
no passado eram tidas apenas como
dormitórios e que hoje garantem
CONDOMÍNIO PARA A CLASSE MÉDIA acessibilidade de transportes, preços
mais controlados e são claramente
ganhadoras”, ou Amadora e Odivelas,
O casal Peter e Ana Filipa namora há dez anos, e há muito que procurava onde as casas têm beneficiado de uma
uma casa que se encaixasse exatamente nas suas expectativas. valorização exponencial desde que o
Encontraram-na em Vila Franca de Xira, local que mal conheciam, mas metropolitano passou a cobrir estas
onde conseguiram comprar apartamento num condomínio privado a áreas geográficas, acrescenta ainda
preços de classe média. Por dois mil euros o metro quadrado, o Vila Viva Ricardo Sousa.
compensa a distância de Lisboa, oferecendo varandas espaçosas, ginásio “O conceito da ‘cidade dos 15 mi-
e um jardim privativo para os residentes. nutos’ começa a ser cada vez mais uma
realidade e não só em bairros dentro
de Lisboa, como Campo de Ourique

SUBIDA VERTIGINOSA Nova construção O Seixal

Baía (à esq.) deverá estar
ÍNDICE DE RENDAS RESIDENCIAIS – VALORES NO 2º TRIMESTRE 2021
concluído em 2022, assim
VARIAÇÃO FACE AO 2º TRIMESTRE DE 2016 como o Vila Viva, em Vila
Franca de Xira
+41% +21% +30% +46%
Porto Lisboa Restante Restante

Área Metropolitana Área Metropolitana
do Porto de Lisboa
FONTE Confidencial Imobiliário – Índice de Rendas Residenciais
RENDAS MÉDIAS CONTRATADAS MAIS MAIS

VALORES NO 2º TRIMESTRE 2021 CARO BARATO
ÁREA METROPOLITANA DO PORTO MÉDIA POR M2 € 9,1 MÉDIA T2 - 90m2 € 819
D.R.
PREÇO MÉDIO RENDA
CONCELHO RENDAS €/m2 €/T2 - 90 m2
ou Alvalade. Já não há concentração
do ócio no centro da capital, mas uma
1 PORTO 10,5 945 descentralização crescente da cultura,
3 2 MATOSINHOS 9,2 828 restauração e bares com impacto di-
2 5
3 MAIA 8,2 738 reto na vida social destas zonas peri-
1
6
4 VILA NOVA DE GAIA 7,4 666 féricas”, reforça o responsável.
4 5 VALONGO 7,2 648
6 GONDOMAR 6,7 603 À PROCURA DE QUALIDADE DE VIDA
Para Rui Torgal, CEO da ERA Portugal,
a movimentação atual das periferias
só vem confirmar um processo, que
é “irreversível” e que resulta de uma
ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA MÉDIA POR M2 € 11,2 MÉDIA T2 - 90m2 € 1 008 valorização natural do preço da ha-
bitação nos centros das duas maiores
PREÇO MÉDIO RENDA cidades portuguesas. “Lisboa e Porto
CONCELHO RENDAS €/m2 €/T2 - 90 m2 afirmaram-se, nos últimos anos, como
1 CASCAIS 12,5 1 125 grandes marcas internacionais. Isso
2 LISBOA 12,5 1 125 não vai mudar. Essa valorização até
8
3 OEIRAS 11,0 990 já veio atrasada em relação a outras
15
4 AMADORA 9,7 873 capitais europeias”, afirma o respon-
5 ALMADA 9,7 873 sável, lembrando que, nesse movi-
6 mento, “muitas pessoas venderam as
9 6 LOURES 9,1 819
7 suas casas nos centros das cidades a
4
7 ODIVELAS 9,0 810
2 16
8,8 792
NA AMADORA E EM
1 3 8 MAFRA
16
9 SINTRA 8,7 783
5 13
11 10 17 10
11
BARREIRO
SEIXAL
7,6
7,6
684
684 ODIVELAS, AS CASAS
12
14 12 SESIMBRA 7,6
7,4
684
666
VALORIZARAM
BASTANTE
13 MOITA
14 SETÚBAL 7,4 666
15
16
VILA FRANCA DE XIRA
MONTIJO
7,3
6,8
657
612 DESDE QUE O
17 PALMELA 5,6 504 METROPOLITANO LÁ
FONTE Confidencial Imobiliário / SIR – Sistema de Informação Residencial AR/VISÃO CHEGOU
um preço que nunca pensaram con-
seguir atingir”.
A Covid-19 ampliou ainda mais
este movimento de êxodo para as
periferias, diz. “Há quatro ou cinco
anos, isso já acontecia por questões
meramente de mercado. Agora, a pan-
demia lançou um alerta em relação ao
tipo de vida que as pessoas tinham e
obrigou muitas a parar, a refletir e a
perceber que estava na altura de elas
terem mais tempo de qualidade para
si”, acentua Rui Torgal.
Foi precisamente isso que fez Susa-
na Tadeu. A viver desde janeiro deste
ano na Charneca da Caparica, Susana
vendeu, em 2020, por 220 mil euros,
o seu T2 em Sete Rios, construído em
LUÍS BARRA
1935, para rumar a sul. “Ia a pé para

o meu local de trabalho, mas estava
saturada de Lisboa. Queria mesmo
morar num local calmo, com espaço
exterior onde pudesse relaxar, e os
SEIXAL
meus cães também”, conta. A procu-
ra do imóvel durou ano e meio, e à
UM TERRAÇO COM VISTA PARA A BAÍA quinta visita fechou negócio, adqui-
rindo uma pequena moradia perto dos
pinhais e da praia por 260 mil euros.
Jorge Carvalho tem boas memórias de infância no Seixal, local “A exigência de área exterior, de
onde os avós sempre residiram e de onde ele nunca se desligou. mais privacidade, até de um maior
Quando surgiu a possibilidade de comprar um apartamento com isolamento em relação a habitações
vista para a baía e um terraço maior do que muitas casas, não contíguas, bem como a existência de
resistiu e avançou para a compra de um T3 por 354 mil euros, no espaços para desenvolver a atividade
Seixal Baía, que vai estar concluído em 2022. Na foto, Jorge com a profissional a partir de casa passaram
mulher Susana e as filhas Íris e Ariana. a ser fatores determinantes na procu-
ra de casa nas periferias de Lisboa”,
confirma Rui Martins, broker da Cen-

OS PREÇOS DUPLICARAM EM 5 ANOS

ÍNDICE DE PREÇOS RESIDENCIAIS – VALORES NO 2º TRIMESTRE 2021
VARIAÇÃO FACE AO 2º TRIMESTRE DE 2016
+121% +94% +91% +85% +79% +68%
Porto Matosinhos Vila do Conde Valongo Gondomar Espinho
+84% +112% +111% +110% +102% +100%
Lisboa Mafra Oeiras Cascais Moita Sintra

FONTE Confidencial Imobiliário – Índice de Preços Residenciais
PREÇOS MÉDIOS DE VENDA
LUCÍLIA MONTEIRO
MAIS MAIS
VALORES NO 2º TRIMESTRE 2021 CARO BARATO
ÁREA METROPOLITANA DO PORTO MÉDIA POR M2 € 1 683 MÉDIA T2 - 90m2 € 151 470
6 PREÇO MÉDIO VENDA
CONCELHO VENDAS €/m2 €/T2 - 90 m2 tury21 Tipy Family, que intermediou
5 a venda da casa de Susana.
1 PORTO 2 506 225 540
Toda a margem a sul do Tejo tem
2 MATOSINHOS 1 975 177 750 estado em grande frenesim, confirma
3
7
3 MAIA 1 417 127 530 Rui Martins, que aponta para aumen-
2
1 4 VILA NOVA DE GAIA 1 391 125 190 tos da procura na ordem dos 35%
8 5 VILA DO CONDE 1 355 121 950 no Seixal, 29% em Setúbal e 21% em
4 6 PÓVOA DE VARZIM 1 297 116 730 Almada, por exemplo.
7 VALONGO 1 264 113 760 É exatamente no Seixal, com uma
8 GONDOMAR 1 257 113 130 vista aberta sobre o Tejo, que está a
nascer o Seixal Baía, empreendimento
com conclusão prevista para novem-
ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA MÉDIA POR M2 € 2 371 MÉDIA T2 - 90m2 € 213 390 bro de 2022. O projeto residencial
com 46 frações aposta em apartamen-
PREÇO MÉDIO VENDA tos com janelas panorâmicas, terraços
CONCELHO VENDAS €/m2 €/T2 - 90 m2 e varandas.
1 LISBOA 3 833 344 970 “O início da comercialização acon-
2 CASCAIS 3 169 285 210 teceu em junho e já registámos 52,2%
9
3 OEIRAS 2 876 258 840 de reservas e de contratos-promessa
12
4 ODIVELAS 2 149 193 410 de compra e venda”, conta Nelson Reis,
5 SESIMBRA 2 053 184 770 franquiado da agência ERA Amora/
6 Seixal, responsável pela comercializa-
10 6 LOURES 2 034 183 060
4 ção deste empreendimento, cujos pre-
7
7 AMADORA 1 938 174 420 ços variam entre os 240 mil euros e os
2 15
1 3 11 8 ALMADA 1 919 172 710 650 mil euros para tipologias T2 e T3.
15
9 MAFRA 1 810 162 900 Na sua maioria, os clientes são
8 18
17 16 10 SINTRA 1 678 151 020 nacionais e cerca de 20% são estran-
13
11 ALCOCHETE 1 615 145 350 geiros, que, inesperadamente, estão a
14 12 VILA FRANCA DE XIRA 1 533 137 970 descobrir a Margem Sul, desfrutando
5 da melhor vista sobre Lisboa.
13 SEIXAL 1 525 137 250
Jorge Carvalho e a família trocaram
14 SETÚBAL 1 397 125 730
a Quinta do Conde por um dos apar-
15 MONTIJO 1 378 124 020 tamentos maiores. “Comprámos o T3
16 PALMELA 1 372 123 480 do piso térreo, que tem um terraço
17 BARREIRO 1 257 113 130 enorme de 120 m2 à volta de toda
18 MOITA 1 040 93 600 a casa. E claro, a melhor vista para
FONTE Confidencial Imobiliário / SIR – Sistema de Informação Residencial AR/VISÃO Lisboa”, diz, entusiasmado, Jorge,

Gaia à beira Embora estas
localizações já estejam muito
valorizadas, as casas neste
concelho ainda são mais em
conta do que as do Porto,
sobretudo no interior
GONDOMAR É UMA
DAS PERIFERIAS
COM MAIOR
PROCURA NA ÁREA
METROPOLITANA DO
PORTO, MAS ESTÁ
TUDO A CRESCER
acrescentando que procurava uma
habitação com espaço exterior, mas
“que não desse tanto trabalho como
dá uma moradia”.
Nelson Reis confirma “a dinâmica
extremamente positiva” da Margem
Sul, “sempre numa curva ascendente
desde 2012-2013”, continuando bas-
tante ativa e constante na captação de
potenciais investidores. “As obras de
requalificação do tecido histórico têm
gerado, por si só, um grande interesse
no setor privado, em alternativa ao
mercado de Lisboa, o que veio criar,
consequentemente, pressão sobre os
valores por metro quadrado”, adianta.
À VOLTA DO PORTO
A norte, a pressão dos preços também
se faz sentir, e quem pode não deixa
a oportunidade fugir. O saldo não é
apenas financeiro.
A família Teixeira sempre apreciou
a cosmopolita vida da cidade do Porto,
até a pandemia chegar e obrigar toda
a gente a confinar-se entre quatro pa-
redes. “Logo em junho de 2020, resol-
LUCÍLIA MONTEIRO
vemos colocar o nosso apartamento

à venda e começámos a procurar um
terreno para construir uma moradia.
Tendo uma criança com quatro anos,
a pandemia trouxe-nos uma urgên-
cia maior de ter um espaço exterior”,
GONDOMAR conta Patrícia Teixeira.
A casa, um T3 localizado nas Antas,
O CAMPO PERTO DA CIDADE integrado num edifício dos anos 60

e que tinha custado, em 2016, cer-
ca de 87 mil euros (mais 30 mil em
A família Teixeira vendeu pelo dobro do preço o apartamento que obras de renovação), foi vendida por
comprou, há menos de cinco anos, na zona das Antas, para investir 202 mil euros. E o terreno onde irão
num terreno, perto de Gondomar, a pouco mais de 10 minutos do construir a casa de sonho, desenhada
local onde trabalha. “Já queríamos fazer essa mudança, mas ter uma pelo marido Pedro, que é arquiteto, foi
criança de 4 anos e viver em confinamento imposto pela pandemia encontrado em Gondomar por pouco
criou-nos uma urgência maior de ter um espaço exterior”, conta mais de 102 mil euros.
Patrícia Teixeira. O marido Pedro é arquiteto e já desenhou a casa à “É um terreno com 1 800 m2, onde
exata medida dos desejos da família. iremos construir uma casa com 200
m2, que seja energeticamente o mais
eficiente possível. Portanto, sobra

QUEM NÃO AGUENTA

O AUMENTO DE
PREÇOS ESTÁ A SER
EMPURRADO PARA
AS ZONAS MAIS
INTERIORES OU
RURAIS
Valorização Em cinco anos, o preço
das casas em Sintra duplicou
ainda uma área exterior bastante sig- que contam investir para desfrutar
nificativa. Quando nos reformarmos, dele. Ter áreas exteriores passou a ser
imagino-me a fazer uma horta”, sonha fundamental, bem como um espaço o metro quadrado custa entre seis
a empresária. reservado para escritório”, realça. mil e sete mil euros, valores pouco
Gondomar é uma das periferias ajustados à classe média. “Não fal-
com maior procura na Área Metropo- AS PERIFERIAS DAS PERIFERIAS ta procura – moradias na Aroeira,
litana do Porto. “Mas está tudo a cres- Este êxodo crescente de população Verdizela, Marisol ou Charneca da
cer. A zona de Gaia sempre teve uma para as áreas limítrofes de Lisboa e do Caparica vendem-se num instante”,
procura considerável e agora cresceu Porto não está alinhado com a oferta diz Orlando Sampaio.
ainda mais, tal como Matosinhos e de novos projetos imobiliários para Antes da Covid-19 ainda era pos-
Maia. Em alguns destes locais, estão estes mercados. “A oferta, de facto, é sível adquirir, nestas zonas, uma mo-
previstos novos projetos em 2022. muito limitada, e isso reflete-se nos radia V3 com 160 m2, zona de jardim,
Nessa altura, os imóveis usados terão preços que, não tenho dúvidas, con- churrasqueira e lugar de garagem por
de ajustar os preços”, explica Miguel tinuarão a aumentar nos próximos 150 mil euros. Hoje, para o mesmo
Barradas, o consultor imobiliário da dois ou três anos”, afirma Orlando espaço, os valores andam na ordem
Remax Vantagem, que acompanhou Sampaio, broker da Century21 Rio. dos 280 a 300 mil euros.
a família Teixeira na sua transação. A agência, que abriu em Almada há Quem não tem capacidade finan-
Olímpio Barbiéri, o broker da agên- apenas dois meses, não tem tido mãos ceira de aqui comprar, mas não desis-
cia Remax Vantagem, fala de uma a medir, com pedidos muito especí- tiu do sonho de ter uma moradia, está
diferença comportamental. “Antes ficos moldados à nova normalidade a criar um novo mercado. “As pessoas
da pandemia, a localização era um pós-pandémica. estão a estender os seus territórios
dos fatores decisivos na compra da O resultado deste frenesim refle- de localização ainda mais para sul,
habitação. Agora, as famílias dão mais te-se de forma esmagadora no valor mesmo em zonas onde o mercado era
importância ao imóvel e ao tempo das casas. Na Aroeira, por exemplo, pouco ativo, antes da pandemia, de-
vido à ausência do comboio e à fraca
mobilidade. Fernão Ferro e Quinta do
C H A R N E C A D A C A PA R I C A Conde são bons exemplos desse fenó-
meno”, diz o broker da Century21 Rio.
QUANDO A CIDADE “Estamos a começar a assistir às

periferias das periferias”, diz, por seu
JÁ CANSA turno, Rui Torgal, CEO da ERA Portu-
gal, e dá o exemplo a norte. “Quando
falamos em Gaia ou Matosinhos, as
Susana Tadeu trocou o seu duas zonas com maior procura da
apartamento de décadas, bem Área Metropolitana do Porto (e aci-
perto do hospital onde trabalha ma até da própria cidade do Porto),
(e para onde se deslocava a pé), existem duas realidades: a habitação
por uma moradia na Charneca junto à orla marítima e as zonas de
da Caparica. “Estava saturada de interior. As pessoas que antigamente
Lisboa e há muito que desejava conseguiam comprar uma casa junto à
ter mais contacto com a Nature- linha da água, hoje têm de deslocar-se
za, bem antes até de toda esta
para a periferia da periferia e comprar
situação provocada pela Co-
no interior ou nas zonas rurais destes
vid-19”, conta Susana. Trabalhar
por turnos ajuda a fintar a hora de
concelhos”, resume.
ponta na ponte, diz, e hoje anda Uma expansão imobiliária que vai
manter-se nos próximos tempos,
LUÍS BARRA
muito mais relaxada.

com impacto direto nos preços.
[email protected]

IMOBILIÁRIO / TENDÊNCIAS
Regresso à Natureza
com vista para
o campo de golfe
A prática segura desta modalidade, numa altura
em que o distanciamento físico é essencial, fez subir
o número de praticantes, animando as vendas nos
resorts com campos de golfe
A
MARISA ANTUNES
pandemia trocou a voltas consecutivos, o prémio de Melhor

ao mundo do desporto, e Destino de Golfe do Mundo, no âm-
nesta nova normalidade bito dos World Golf Awards. Mais
há uma modalidade que recentemente, o Algarve foi escolhido
ficou a ganhar – o golfe. como “melhor destino de golfe do
A garantia de distancia- mundo para 2020”, pela Associação
mento de outros joga- Internacional de Operadores de Turis-
dores num ambiente na- mo de Golfe (IAGTO), pela qualidade
turalmente arejado, onde dos 40 campos da região.
é possível retemperar a “Estamos a caminhar num sen-
forma físico-mental, está na origem tido positivo. Em 2021, ainda não
desta inesperada popularidade. chegámos às voltas de 2019, mas, se
Números da National Golf Fou- continuarmos assim em outubro e
ndation (NGF), instituição norte-a- novembro, que é a época alta do golfe,
mericana especializada em dados do iremos acabar este ano com números
setor, mostram que, só no primeiro acima de 2020 (um aumento de cerca
ano da pandemia, o número de jo- de 30%)”, realçou à VISÃO Imobiliário
gadores de golfe nos EUA se situou Luís Correia da Silva, presidente do
nos 24,8 milhões, com o dos novos Conselho Nacional da Indústria do
praticantes (iniciados que jogam a Golfe (CNIG). servas, principalmente de praticantes
sua primeira volta e golfistas que As reservas que chegam dos ope- britânicos”.
deixaram de jogar mas voltaram aos radores ou diretamente dos hotéis Mas não só aqui. “Em Inglaterra, na
campos pela primeira vez em anos) a estão a crescer e, diz o responsável, Alemanha, nos países escandinavos,
chegar aos 6,2 milhões, o maior nú- “até março do próximo ano, já há re- na Holanda, nunca os campos de golfe
mero de todos os tempos. As mulhe- locais tiveram tantos jogadores. Mui-
res representaram 40% destes novos tas pessoas aproveitaram o facto de
praticantes, também o mais alto dos
últimos cinco anos. OS INGLESES estarem em teletrabalho para ganhar
algum tempo de qualidade. E muitas
Um frenesim realçado num co-
municado divulgado à indústria pelo PAGARAM, EM destas, assim que têm oportunidade e
podem viajar, voltam aos locais onde
presidente da NGF. “Não tem havido
tanto otimismo e novas atividades
MÉDIA, €6 600 POR já foram felizes”, lembra o presiden-
te da CNIG, referindo que 90% dos
no negócio do golfe desde o virar do
século”, sublinhou Joe Beditz.
METRO QUADRADO praticantes nos campos de golfe em
Portugal são estrangeiros.
Um pouco por toda a Europa, a POR CASAS NOS Muitos dos que estão a chegar são
RESORTS À VOLTA DE
situação repete-se. E, por cá, este novos praticantes. “Temos verificado
entusiasmo é muito bem-vindo. Re- que há um segmento de golfistas, com
ALBUFEIRA E LOULÉ
corde-se que Portugal tem batido a um handicap de golfe mais elevado,
concorrência e arrecadado, por anos que começaram a praticar golfe nos

Em alta O resort Penha
Longa, em Sintra (em cima
e em baixo à esq.) e a Quinta
do Lago (em baixo à dir.)
últimos 12 a 18 meses e que também e zonas para passear. Portanto, o campo assinalar o ‘regresso’ de outros com-
estão a procurar-nos, o que é muito de golfe é um atributo muito apreciado pradores europeus, alguns dos quais
interessante”, frisa ainda o responsável. nos resorts”, diz, por seu turno, Pedro ausentes no semestre anterior”, diz o
Fontainhas, diretor-executivo da As- estudo, dando destaque aos cidadãos
ESTRANGEIROS DOMINAM sociação Portuguesa de Resorts (APR). da Irlanda, Países Baixos e Alemanha.
Se o turismo de golfe começa agora De acordo com o mais recente Os portugueses, ainda que pouco
a reanimar, no imobiliário de luxo estudo sobre o Mercado dos Resorts representativos nestas contas, co-
associado aos resorts, que tradicio- em Portugal, realizado pela Confi- meçaram subitamente a olhar para
nalmente têm o golfe como âncora, o dencial Imobiliário em parceria com a o imobiliário de luxo durante a pan-
interesse manteve-se sempre em alta. APR, os compradores do Reino Unido demia, esclarece ainda o responsável.
“O imobiliário e a decisão de com- continuam a ser a principal fonte de “O mercado nacional despertou para
prar casa obedecem a um ciclo mais procura internacional para os resorts este tipo de produto e percebeu que
longo do que marcar umas férias, por portugueses, reforçando a sua quota tinha uma oferta imobiliária espeta-
isso a quebra não foi tão grande como no Algarve entre julho e dezembro do cular que já cá está há imenso tempo
se poderia prever, bem pelo contrário. ano passado. Neste período, os britâ- a oferecer aquilo que as pessoas agora
Além disso, os resorts apelam a dois nicos realizaram 56% das aquisições querem: casas maiores, bem infraes-
tipos de clientes – os que jogam golfe feitas por internacionais em Albufeira- truturadas e próximas da Natureza.
e os que, não jogando, querem ter uma -Loulé (a uma média de €6 600 o me- As pessoas, hoje mais do que nunca,
espécie de jardim grande à frente das tro quadrado) e 35% no Barlavento. No querem aproveitar a vida”, remata
suas casas, com amplos relvados, lagos segundo semestre de 2020, “é ainda de Pedro Fontainhas. [email protected]

I M O B I L I Á R I O / E N T R E V I S TA
Teresa Nunes da Ponte

É o turismo
que nos permite
a reabilitação
de Lisboa
É uma das poucas mulheres, em Portugal,
a liderar um atelier de arquitetura.
À VISÃO fala da “merecida renovação” da capital
D
MARISA ANTUNES LUÍS BARRA
as mais proeminentes tarde, estive também na Comissão

arquitetas do País, Teresa Nacional de Eleições... Foram expe-
Nunes da Ponte voltou a riências muito ricas que me propor-
ver o seu trabalho reco- cionaram uma visão do funciona-
nhecido recentemente, mento das instituições e do Estado e
com a renovação do gran- que também me ajudaram na minha
de auditório da Fundação carreira na arquitetura.
Calouste Gulbenkian, Quando fundou o seu atelier?
através do prémio Doco- Abri o meu atelier em 1988, depois Como avalia a transformação que
momo Internacional, que de dez anos de experiência – tinha foi tomando conta de Lisboa?
distingue projetos de preservação da trabalhado com o arquiteto Vasco Lisboa tem tido, nos últimos anos,
arquitetura moderna no mundo. À Câmara Pestana e com o meu colega um desenvolvimento excecional.
frente do atelier TNP, é das poucas e amigo Manuel Bastos, e trabalhei Penso que se consegue perceber o
mulheres a liderar um gabinete de também numa empresa de promo- planeamento que tem sido feito e
arquitetura em Portugal. ção e construção, em que tive con- que está a dar frutos. A reabilita-
Há mais arquitetas do que tacto com a obra. Depois comecei a ção do centro histórico é notória.
arquitetos em Portugal. minha vida profissional com vários Têm surgido jardins um pouco por
Porém, são muito poucas as projetos de reabilitação de patrimó- todo o lado, onde apetece circular e
que se destacam. No seu caso, nio e de espaço público. Mas nunca passear. Tenho acompanhado par-
o que permitiu alcançar essa perdemos contacto com a obra nova ticularmente o projeto do jardim da
notoriedade? e temos trabalhado com várias es- Praça de Espanha, porque a Fun-
Existe, de facto, essa discrepância, calas, desde o objeto até à cidade, o dação Calouste Gulbenkian doou
e estamos perante uma questão que é particularmente estimulante. uma obra vasta da Cristina Iglesias
cultural que demora muito tem- à cidade, para estar naquele parque
po a mudar. Porém, essa mudan- urbano, que se chama agora Jardim
ça está a acontecer. No meu caso, Gonçalo Ribeiro Telles.
as coisas foram acontecendo. Fiz
muitos sacrifícios mas também tive
A ARQUITETURA É UMA Falou-se muito da gentrificação,
antes da pandemia. Qual é a sua
imensa sorte com as oportunidades,
os clientes, o ambiente de trabalho,
PROFISSÃO MUITO opinião?
É evidente que temos muitos tu-
os colaboradores... Comecei a vida DIFÍCIL QUE NÃO É ristas, mas isso não me perturba,
SUFICIENTEMENTE
profissional no 25 de Abril, numa embora reconheça que há algu-
altura muito rica em experiências. mas situações que merecem uma
RECONHECIDA
E comecei a trabalhar em áreas atenção especial, como é o caso da
que não têm nada que ver com a Baixa. Mas acho que, de modo geral,
arquitetura. Aos 19 anos, pediram- a transformação é muito positiva, e
-me para ir apoiar um secretário de espero que assim continue, pois a
Estado (Vasco Graça Moura) e, mais cidade merece esta renovação. Além

IMOBILIÁRIO / NEGÓCIOS
ESCRITÓRIOS
Google investe milhões em Manhattan

O Google vai gastar 1,8 mil milhões de euros para adquirir um edifício de escritórios junto
ao rio Hudson, numa das zonas mais luxuosas de Manhattan, em Nova Iorque. A aquisição,
uma das mais caras dos últimos tempos no mercado de escritórios, vem animar o setor
imobiliário, a braços com uma crise, provocada pela pandemia e pelo trabalho remoto, que
deixou muitos espaços de trabalho vazios. O gigante tecnológico tem 12 mil trabalhadores
só em Nova Iorque e pretende recrutar mais dois mil nos próximos anos.
O edifício já estava arrendado pelo Google, que aproveitou o efeito da pandemia nos
preços do mercado de escritórios para o adquirir com algum desconto (não obstante
o valor astronómico). Apesar da popularidade da prática do teletrabalho, a verdade
é que os gigantes da tecnologia têm aproveitado os preços mais baixos dos edifícios
de escritórios, nas cidades dos Estados Unidos da América, para investir no seu
património imobiliário. Recorde-se a aquisição do edifício Lord & Taylor, na mítica 5ª
Avenida, pela Amazon, por 978 milhões de dólares (837 milhões de euros), no ano
passado, e o arrendamento do Farley Building, pelo Facebook Inc., que se situa mesmo
em frente a outro espaço emblemático, o Madison Square Garden.
disso, não nos podemos esquecer de

que é o turismo que nos permite a
16 200
NÚMERO INVESTIMENTO
reabilitação de Lisboa e nós precisa-
mos também desse impacto positivo
na economia. A vaga
Que conselhos daria a uma jovem
arquiteta que estivesse a entrar
dos espanhóis
nesta profissão e que desejasse Há cada vez mais espanhóis
vingar mas também ter uma vida a olhar para o imobiliário
pessoal plena? de luxo português. Depois
É o número de apartamentos registados em da vaga de investidores
Tenho muitas arquitetas jovens a Alojamento Local (AL), mas que, em julho
trabalhar comigo e muitas outras chineses, franceses e
deste ano, estavam sem atividade. Segundo brasileiros, chegou a
passaram pelo atelier e foram para a Confidencial Imobiliário, o número de fogos vez dos nossos vizinhos
outros sítios. É engraçado que nor- com atividade efetiva no AL perfazia pouco ibéricos. Segundo a
malmente temos tido mais mulhe- mais de cinco mil unidades no conjunto de plataforma imobiliária
res do que homens, e nós já equa- Lisboa e Porto, estando reduzido a 2 800 Idealista, entre os
cionámos a necessidade de termos fogos na capital e a 2 300 na Invicta. estrangeiros os espanhóis
quotas para os homens [risos]. A são aqueles que encabeçam
arquitetura é uma profissão muito as pesquisas de imóveis de
difícil, que exige uma enorme dedi- valores acima de um milhão
cação e que não é suficientemente de euros, com 11,7% do
reconhecida. E, neste momento, total da procura. Seguem-
julgo que é muito mais difícil do se os ingleses (11,6%), os
que quando eu comecei a profissão, norte-americanos (9,7%),
tal como é mais complicado fazer os franceses (9,5%) e
um atelier, tanto para uma mulher os alemães (8,9%). Os
como para um homem. É preci- distritos de Lisboa, Faro e
so ter uma enorme perseverança, Setúbal estão no top 3 das
muito trabalho e muito trabalho em preferências.
equipa. [email protected]

IMOBILIÁRIO / OPINIÃO
Dificuldades do investimento
residencial
P O R J O S É CA R D O S O B O T E L H O E F I L I PA A B R E U -T E I X E I R A
/ VA N G U A R D P R O P E R T I E S
P
ortugal, a par de muitos outros países euro- passar os 130 euros por m2 calculados sobre a área total
peus, tem um desafio por resolver na oferta de construção.
de habitação condigna para a classe média, Constata-se facilmente a incongruência quando
especialmente nos principais centros urba- se afirma que a habitação é uma prioridade, mas é
nos. E a falta de oferta tem múltiplas causas. justamente o segmento mais afetado pela elevadíssi-
Iremos fixar a nossa atenção no tema da fis- ma fiscalidade. Neste contexto e a título de exemplo,
calidade e do licenciamento, que nos parece veja-se a nossa vizinha Espanha, em que a fiscalidade
ser o mais premente. do setor é consideravelmente inferior, destacando-
Ao contrário do que se imagina, esta -se a dedutibilidade do IVA da primeira habitação e
problemática não afeta somente o promotor, uma isenção de IMT, inexistindo ainda o AIMI... em
mas também o próprio Estado central, as autarquias, Portugal, também a aquisição da habitação própria e
os múltiplos prestadores de serviços e, naturalmente, permanente beneficia de uma isenção de IMT, limitada
os clientes finais. Refira-se que, no nosso país, a fis- a imóveis até €92 407 – o que se revela totalmente
calidade aplicável ao imobiliário residencial é curio- desatualizado face à evolução do valor médio do metro
samente a mais alta de todo o setor. Vejamos, então, quadrado nos grandes centros urbanos.
alguns dos impostos na construção de um novo edifí- Outro ponto que nos parece pertinente sublinhar,
cio, em área urbana: relacionado com o licenciamento, deve-se à inexis-
· O IMT, aplicado de forma tendencialmente pro-
gressiva, mas que atinge uma taxa de 6% para imóveis
tência de um mecanismo processual único em todas
as câmaras municipais, tornando a gestão do pro-
de valor superior a €574 323, ou cesso mais morosa, onerosa e
mesmo 7,5% no caso de imóveis de complexa. A enorme burocracia,
valor superior a €1 milhão, que é A elevada fiscalidade o deficitário investimento e a
um custo avultado e é devido cada é dos elementos que escassa integração digital atrasam
vez que o ativo seja transacionado; os processos de licenciamento e
mais contribuem para
· O Imposto do Selo, que é
habitualmente contabilizado como o aumento do preço
afetam múltiplas entidades. Neste
sentido, o Estado central demo-
0,8% do preço de compra (pago no
momento da celebração da escri-
da habitação ra mais tempo a cobrar o IVA, o
IRC (resultante do lucro de uma
tura de aquisição), mas que se apli- operação imobiliária) e o Imposto
ca igualmente caso exista concessão de financiamento de Selo, enquanto as autarquias, além das taxas que
– aplicando-se, nesse caso, sobre o valor do crédito cobram, recebem mais tarde o IMT resultante da ven-
bancário concedido (até 0,6%), bem como sobre os da das frações construídas. Já os projetistas, arquitetos
juros e comissões bancárias (4%); e engenheiros cobram os seus serviços em função das
· O IVA na construção, atualmente à taxa de 23%,
que é, em regra, recuperável no caso de investimento
fases do projeto, terminando os contratos com a con-
clusão da obra. Ou seja, atualmente, entre a assinatura
destinado a hotelaria, escritórios ou comércio, mas, do contrato de prestação de serviços e a sua conclu-
pasme-se, no caso da habitação é um custo efetivo, são, podem decorrer mais de cinco anos (!), pondo em
não recuperável por parte do promotor e, por isso, risco a solvência de muitos.
suportado pelo adquirente; A elevada fiscalidade, associada à morosidade do
· O AIMI, que é especialmente focado em imó-
veis residenciais, incluindo terrenos para construção
licenciamento, considerando a dimensão e o peso
na economia nacional, é certamente um entrave ao
habitacional. Por exemplo, para o segmento médio, investimento, ao nosso crescimento e geração de ri-
é aplicado nas habitações ou terrenos de valor igual queza, sendo certo que estes serão porventura os dois
ou superior a €600 mil. Contudo, não se aplica aos elementos que mais contribuem para o aumento do
escritórios, comércios, logística, entre outros imó- preço da habitação.
veis afetos a uma atividade comercial, industrial ou Tendo por base estas premissas e muitas outras que
agrícola; não foi possível partilhar, conclui-se fácil e rapida-
· A construção nos centros urbanos é sobrecar-
regada com a TRIU e Compensações Urbanísticas,
mente que a oferta de habitação acessível à classe mé-
dia passa pela análise e criação de soluções estruturais,
o que, no caso de Lisboa, poderá, no conjunto, ultra- transversais e com real impacto. [email protected]

APARTAMENTO T3 COM VISTA TEJO MORADIA T3 NO PÁTEO BAGATELA
Príncipe Real, Lisboa Amoreiras, Lisboa
Ref. GBLISBLBN200392 Ref. GBLISBLBN210418
CONTACTAR ANTÓNIO +351 916 133 446 CONTACTAR FÁTIMA +351 910 489 081
APARTAMENTO T2 NA BAIXA APARTAMENTO T2 DUPLEX

Baixa, Lisboa Príncipe Real, Lisboa
Ref. GBLISBLBN210404 Ref. GBLISBLBN210390
CONTACTAR ANTÓNIO +351 916 133 446 CONTACTAR PAULA +351 911 741 010
A sua consultora imobiliária

com alcance global na
compra e venda da sua casa.
Visite-nos na
Praça Marquês de Pombal, 16A
+351 21 313 9000
savills.pt
AMI 5446
TAGUSPARK
Conhecimento
e civismo
Além do compromisso com a inovação, produção e divulgação de conhecimento,
o Taguspark destaca-se pela qualidade de vida que promove e bem-estar dos
colaboradores que aqui trabalham
“E stamos focados em gerir um parque que forneça

felicidade e qualidade de vida para o quotidiano
dos que aqui trabalham e frequentam o Parque”. As
palavras de Eduardo Baptista Correia, CEO do Ta-
guspark, em entrevista à VISÃO, sublinham as práticas cívicas
possam usufruir do espaço fora do horário de trabalho e vivam
o espírito de comunidade e interligação próprio do Taguspark”,
justifica o responsável.
FATORES DIFERENCIADORES
e ambientais, bem como a promoção regular de concertos, o Num cenário em que as previsões apontam para que, nos
acolhimento de um mercado semanal de frescos ou a criação próximos anos, um número recorde de pessoas trabalhem
de um Museu de Arte Urbana nesta cidade do conhecimento. em espaços de coworking e serviced offices, a capacidade de
“Ambicionamos um espaço com economia pujante, distri- adaptação é encarada como trunfo. “A capacidade de readaptar
buição de riqueza, bem-estar coletivo, civismo, dinâmicas edifícios existentes e de construir de raiz permite-nos adap-
associadas à tecnologia, às artes e ao desporto”. A intitulada tar a oferta às necessidades que nos chegam”, salienta. PHC,
‘cidade do conhecimento’ começou, inclusivamente, a acolher Miniclip e Novartis são exemplos de empresas com quem o
eventos variados semanalmente, “para que os colaboradores parque empresarial construiu edifícios de raiz, cumprindo os
4 PILARES
De que é feito
o Parque Mais Cívico
da Europa
COMPORTAMENTAL
Zero beatas, zero papéis no chão
e zero automóveis mal-estacionados.
GESTÃO DE RESÍDUOS
Integração de projetos de economia
circular. Por exemplo, as beatas
recolhidas no Taguspark são
matéria-prima de uma solução de
tijolos para construção civil.
EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
Instalação de mais de 1566 painéis
fotovoltaicos com objetivo de
alcançar a independência energética
da rede.
DIGNIDADE LABORAL
Acordo com as empresas
prestadoras de serviços
(manutenção, limpeza, jardinagem)
para salário mínimo de 900€
a 1.200€ para colaboradores Eduardo Baptista Correia
no Taguspark.
requisitos específicos das organizações, no âmbito de “projetos sidades. Agregar realidades tão distintas é um desafio supe-
em parceria, com o ocupante e uma equipa de arquitetos e rado através de “um pensamento estratégico atrativo”, mas
engenheiros.” O Taguspark abriga uma incubadora de star- também da comunicação, do “reconhecimento mútuo” e da
tups nas áreas das tecnologias de telecomunicações, novos “liderança pelo exemplo”, considera Eduardo Correia. “Cha-
modelos de transporte, saúde e ciências da vida, que conta mámos representantes de todas as empresas e dissemos o
com um “edifício próprio, com alguns serviços que queríamos fazer, respondemos a perguntas,
de apoio, onde se debate o desenvolvimento das sugestões e reclamações, que encaramos como
23%
organizações e a aproximação a ambientes mais oportunidades para recuperar a confiança”,
internacionais”. Mas, para já, não conta com es- conta, referindo-se à política destinada a tornar
paços de coworking: “Não sentimos a procura o Taguspark o “parque mais cívico da Europa”
desses espaços”, diz o responsável. (ver caixa). “Quando começámos, eu próprio
Redução de dependência chamava as pessoas à atenção e ia apanhar
A ERA DO TRABALHO HÍBRIDO da rede elétrica beatas. Só é possível atingir certos objetivos se
Melhoria da qualidade de vida, dos fluxos de conseguida com a todos dermos o nosso contributo”.
transporte e da poluição ambiental são vanta- instalação de painéis
gens da redução das deslocações diárias ao es- fotovoltaicos EFEITOS DA PANDEMIA
critório, na visão do responsável. Reconhecendo Num ano em que o regresso ao trabalho repre-
a adoção de modelos de trabalho híbridos como senta também um retomar da presença habitual
251
tendência, enfatiza a importância da interação nos escritórios, o homem que lidera os destinos
cara a cara: “Somos seres sociais, a nossa ne- do maior parque empresarial português recusa
cessidade de convivência faz-se também no qualquer efeito negativo da pandemia no negó-
local de trabalho e a construção da cultura cio. “O nosso volume de negócios no primeiro
organizacional faz-se através do convívio. Há TONELADAS semestre de 2021 foi substancialmente superior
uma necessidade de as pessoas se afastarem Valor das emissões de ao período homólogo em 2020. Não fosse o
das suas casas para conviverem e debaterem CO2 evitadas tema da restauração e do número de pessoas
em proximidade. Numa sociedade contempo- mais reduzido em circulação no Parque, não
rânea, inovadora, com tecnologias à disposição, daríamos pelo impacto da pandemia”, diz. O
o modelo híbrido faz sentido.” feito é atribuído ao “processo de regeneração”, iniciado em
2018 e concluído no início de 2020, no sentido de modernizar
CONSTRUIR COMUNIDADE o parque. “Passámos a ter uma oferta de edifícios adaptados ao
Num espaço de trabalho com 360 hectares, 160 empresas século XXI, recuperando o posicionamento
e 16 mil profissionais, há lugar para empresas nacionais e original como um dos locais de excelência
multinacionais, startups, centros de investigação e univer- para trabalhar”, justifica.
FOCAR
“O consenso
é a negociação
da liderança”
Margaret Thatcher
Política britânica
(1925-2013)
Quem quer casar

ALEMANHA
com “herr” Scholz?

Após uma relação longa e estável com Angela
Merkel, os alemães optaram pela mudança: nas
urnas, penalizaram os democratas-cristãos
e mostraram maior simpatia, embora ligeira,
pelos sociais-democratas de Olaf Scholz –
agora obrigado a pedir Verdes e liberais em
“casamento” para poder ser o novo chanceler
de Berlim. Mas a que preço?
R U I TAVA R E S G U E D E S

Missão impossível? Ganhar as
eleições pode ter sido o mais fácil para
Olaf Scholz – agora vai ter de conseguir
A
formar uma coligação estável
estabilidade foi, duran-

te 16 anos, o principal
trunfo político que An-
gela Merkel serviu aos
alemães. Esse tempo che-
gou ao fim, e as eleições
de domingo, 26, foram
claras quanto ao que os
eleitores querem para o
futuro: uma mudança na
governação e, acima de
tudo, alguém em Berlim
que os possa ajudar a enfrentar, com
êxito, os grandes e urgentes desafios
com que o país se confronta, como as
alterações climáticas, a transição digital
e a modernização das infraestruturas.
De preferência, já sem os compromis-
sos paralisantes e a ausência de decisões
estratégicas que marcaram os últimos
anos da chamada Grande Coligação
(entre democratas-cristãos e sociais-
-democratas), chefiada por Merkel. Estas
tarefas são mais urgentes do que nunca
e, se não forem bem-sucedidas, podem
abalar seriamente a poderosa economia
alemã, que parece inabalável quando
vista de longe, mas que, de perto, se per-
cebe estar seriamente ameaçada. Num
mundo em que o centro geoestratégico
começa a deslocar-se para a região do
Indo-Pacífico, em vez do Atlântico, de
facto, a economia alemã continua as-
sente na indústria do século passado
e está muito exposta aos riscos que se
avizinham, como foi evidente na tragédia
das inundações do verão passado, bem
como na quase falta de comparência que
os alemães demonstram, atualmente, nas
empresas tecnológicas que irão marcar
o futuro.
Ao fragmentarem a distribuição de
lugares no parlamento, de uma forma
nunca vista, os alemães ditaram que,
embora o SPD (social-democrata) e a
CDU/CSU (democratas-cristãos) con-
tinuem a ser os partidos mais votados
(ambos em redor dos 25% de votos),
o futuro tem de ser planeado e gerido
com a ajuda de outros mais pequenos.
A continuação da Grande Coligação
– que há quatro anos demorou seis
meses a ser formada – não é desejada
por ninguém, embora ainda seja mate-
maticamente possível. Também não se
pode ainda excluir a hipótese de tanto
o social-democrata Olaf Scholz (25,7%
dos votos) como o democrata-cristão
Armin Laschet (24,1%) poderem ocupar
o lugar de Merkel – apesar de o segundo
estar a perder terreno, dia para dia, ata-

ALEMANHA
Coligações possíveis
Esperam-se meses de negociações
para se conseguir um governo apoiado
numa maioria parlamentar… que pode
ser de vários estilos
SPD CDU/CSU Verdes FDP Linke

Maioria absoluta (368) Total: 735 dep.
QUÉNIA
520
A solução mais estável, em que a Grande
Coligação (que funcionou em 12 dos 16
anos de Merkel) passaria a contar com a
presença também dos Verdes. Muito pouco
provável, pelo menos nos próximos tempos.
ALEMANHA
494
Outra variação da Grande Coligação,
agora com as cores da bandeira alemã
e com a presença dos liberais do FDP.
Também está posta de parte nas primeiras
negociações.
cado no interior do seu partido, depois Esbater as diferenças Annalena
de ter protagonizado o pior resultado Baerbock, dos Verdes, e Christian
SEMÁFORO de sempre na história da CDU. Do que Lindner, dos liberais do FDP, vão ter
416 ninguém tem dúvidas é, isso sim, a quase de se entender, se quiserem entrar
A solução em que, nesta fase, Olaf Scholz inevitabilidade da presença, na coligação no governo de Berlim
está a apostar tudo: uma coligação dos so- do próximo governo, dos Verdes e dos
ciais-democratas com os Verdes e os liberais. liberais do FDP. É para eles que Scholz
Seria inédita, mas corresponderia ao desejo mais olha, convencido, até, de que po-
de mudança manifestado pelos alemães. derá alcançar um acordo mais rápido do Verdes e liberais estão de acordo em al-
que muitos pensavam. guns dossiers, mas defendem medidas
JAMAICA absolutamente opostas noutros, que
CONCILIAR O IRRECONCILIÁVEL? ambos consideram fulcrais.
406
Atualmente, em alguns estados, existem É o caso do tema que, segundo as
A aposta de Armin Laschet para chegar já governos de coligação tripartida, mas sondagens, foi o principal assunto de
ainda a chanceler, sem ter vencido as elei-
desde os tempos iniciais da república preocupação dos eleitores: a crise climá-
ções. Precisará, no entanto, de fazer mais
alemã que essa fórmula não é tentada ao tica. Enquanto os liberais têm o objetivo
concessões aos Verdes e liberais para os
convencer primeiro do que Scholz.
nível do governo federal. Para complicar, de transição climática menos ambicioso
de todos os principais partidos alemães
– propondo adiar a neutralidade car-
GRANDE COLIGAÇÃO bónica até 2050 e, mesmo assim, através
402 de esquemas de comércio de emissões –,
A fórmula do tipo Bloco Central que já os Verdes querem antecipar essa meta
funcionou nos últimos quatro anos.
A diferença seria, agora, que o chanceler
SE NÃO EXISTIR para 2041. E pretendem fazê-lo de uma
forma dura, já que preconizam também
seria social-democrata. É a solução
menos desejada, por enquanto.
NOVO GOVERNO ATÉ o encerramento das centrais elétricas
a carvão até 2030, oito anos antes do
19 DE DEZEMBRO, objetivo atual do país.
ANGELA MERKEL
VERMELHO-VERMELHO-VERDE Os dois partidos também se afastam,
363 e muito, na política económica. Os Ver-
A grande coligação à esquerda deixou ULTRAPASSARÁ des, por exemplo, são favoráveis ao au-
mento do salário mínimo e à imposição
HELMUT KOHL COMO A
de ser hipótese, depois das eleições, em
que Linke, de extrema-esquerda, sofreu
de uma taxa especial para os mais ricos
(ambas duas “bandeiras” da campanha
CHANCELER COM MAIS
um duro revés. Já não permite maioria
absoluta para segurar um governo. de Scholz) – ideias que o FDP rejeita.
Apesar dessas diferenças, a verdade é
FONTE Comissão Eleitoral da Alemanha AR/VISÃO TEMPO NO PODER que os dois partidos partilham uma base

OPINIÃO
Surpresas…?
ou talvez não
P O R J O S É C A R L O S D E VA S C O N C E L O S
1
Não vou repetir o óbvio sobre os “Sendo assim, o que fará o PS?
resultados das autárquicas. Tendo Creio óbvio que devia (tentar) fazer
em conta que em eleições eles também coligações ou acordos. De
não se avaliam só pelos “números” imediato pelo menos em Lisboa (...).
finais em si, mas pela comparação Se quando estavam de costas voltadas
com os anteriores, os objetivos de- PS e PCP se conseguiram entender
finidos e as expectativas criadas, de para conquistar a câmara, será incom-
forma telegráfica na minha leitura preensível e um enorme erro político,
destaco: 32 anos e um acordo de governo de-
a) uma “vitória” do PS com nu- pois, não fazerem nada nesse sentido.”
merosas sombras e derrotas muito Pois é… E houve ainda outros er-
significativas, o que lhe dá um sabor ros, como uma sobredose de António
(quase?) amargo; b) uma “não vitória” Costa e a contestável abordagem/
do PSD, para o partido e seu líder martelagem de temas como o dos
(idem para o CDS) com mais sabor, fundos europeus. Enfim, tudo, re-
peso e consequências de vitória do sultados incluídos, a constituir um
que a “vitória” do PS; c) a confirmação aviso sério ao primeiro-ministro, a
da trajetória eleitoralmente descen- exigir menos autossuficiência, mais
dente do PCP e da incapacidade do BE abertura e humildade democrática.
de apoio muito semelhante, formada esse afirmar fora dos principais centros Sobre Moedas voltarei a falar nou-
sencialmente por jovens, com formação urbanos (como o PAN) e da irradiação tra altura. Sobre Fernando Medina su-
superior e residente em centros urba- das suas três estrelas, Catarina, Joana blinho a forma exemplar como soube
nos. Segundo um estudo do Centro de e Marisa; d) o sempre perder – e estou certo
Ciências Sociais de Berlim (WZB) sobre crescente número e de que continuará a
os programas dos dois partidos, tanto sucesso de candidatu- Os resultados ter um assinalável fu-
os Verdes como os liberais partilham ras sem chancela par- das turo político, a (re)co-
ideias progressistas sobre questões so- tidária; e) o sinal da di- autárquicas, meçar já, talvez, num
ciais consideradas fraturantes noutros mensão do Chega e da próximo governo.
tempos, como as do género, da igualdade Iniciativa Liberal, esta uma previsão
3
racial e dos direitos humanos. No que com tendência para confirmada O MAI infor-
divergem é, sim, nas soluções económi- aumentar (e os votos e uma menor mou, e todos
cas para os problemas sociais. de ambos, de certeza repetiram, que
Neste momento, a coligação Semáfo- na sua maioria saídos percentagem de a abstenção foi de
ro, entre SPD, Verdes e FDP parece ser a de anteriores votantes abstenção real 46,3%, a segunda
mais desejada, com Olaf Scholz a ocupar do PSD, só faz avultar mais alta em au-
o lugar de chanceler, coadjuvado por um o êxito de Rui Rio). tárquicas. Percen-
ministro das Finanças dos liberais (o seu tagem obtida a partir do número
2
líder Christian Lindner não esconde o Em relação ao PS, os seus maio- de inscritos nos cadernos: mais de
desejo de ocupar essa pasta) e com os res desaires foram talvez em 9,310 milhões. Ora o País tem, cen-
Verdes a ir para outra das pastas prin- Coimbra e, sobretudo, em Lis- so de 2021 (arredondo os números),
cipais e de grande protagonismo, como boa. Ora, lembro o que aqui escrevi 10, 347 milhões de habitantes, dos
a dos Negócios Estrangeiros – em que logo a 26 de fevereiro: “A candida- quais um milhão e 390 mil com
fariam ouvir, com mais clareza, as suas tura de Carlos Moedas à Câmara idade até aos 14 anos; e, mantendo
críticas à Rússia e à China. Essa coli- de Lisboa é uma boa notícia. E não a proporção, mais 300 mil até aos
gação teria a vantagem de ser chefiada só para o PSD. Porque é de toda a 17. Ou seja, quase um milhão e 800
pelo líder mais votado pelos alemães e conveniência haver bons candida- mil com menos de 18. Assim, os
ser formada pelos três únicos partidos tos – para haver bons autarcas. (...) eleitores, vivos e residentes no País,
que aumentaram a sua representação no Também em Coimbra o PSD de não podem ultrapassar os 8,550
parlamento. Mas as negociações não se Rui Rio terá um cabeça de lista de milhões, menos cerca de 760 mil do
adivinham fáceis, e uma certeza já existe: peso, José Manuel Silva (...). Se a isto que os inscritos. A abstenção real
se não houver novo governo até 19 de acrescentarmos as coligações com terá sido, pois, de cerca de 40% e
dezembro, Angela Merkel ultrapassará o CDS e outros acordos, torna-se não de 46,3%. Ou estarei enganado
Helmut Kohl como a chanceler que pas- evidente um efetivo potencial de e alguém fará o favor de esclarecer?
sou mais tempo no poder, na Alemanha vitória.” [email protected]
do pós-guerra. [email protected]

C ATÁ S T R O F E S
Anda comigo ver os vulcões

Tal como sucede na Indonésia ou em Itália, a ilha de La Palma
já sente os efeitos dos turistas e curiosos que querem ver,
ao vivo e o mais perto possível, um vulcão em plena atividade
O
FILIPE FIALHO
dialeto das Canárias tem um As viagens-aventura são um negó- incorreto, na sequência das críticas que
vocábulo que descreve às mil cio em alta, e o nicho da vulcanologia lhe fizeram por estar a ofender as 400
maravilhas um estranho fenó- contribui de forma decisiva para que tal famílias que perderam as casas.
meno que está a ocorrer em La aconteça. As férias e as deslocações com Por coincidência, no mesmo dia em que
Palma. Por causa da erupção adrenalina e selfies em lugares radicais o Cumbre Vieja (Cume Velho) deu origem
vulcânica iniciada a 19 de se- rendem como nunca visualizações nas re- a um novo lahar (termo javanês que sig-
tembro, centenas de pessoas des sociais. É exatamente a esta tipologia nifica avalanche e serve para descrever as
estão a golifiar o parque na- de voyeurismo que se referia a ministra torrentes de lava e lama) e despejava em
cional de Cumbre Vieja. Isto é, da Indústria, Comércio e Turismo de Es- barda materiais piroclásticos (gases, cinzas
andam a bisbilhotar. Não para panha, María Reyes Maroto, quando falou e fragmentos de rocha incandescente), o
se meterem na vida dos outros, mas para pela primeira vez, publicamente, da erup- diário El País publicou um artigo sobre
obterem as melhores imagens do vulcão ção do vulcão também conhecido como os novos visitantes que estão a chegar a
que colocou o arquipélago em estado de “Cabeça de Vaca”. “É uma atração que nós La Palma. Um deles, o uruguaio Andrés
sítio. São turistas e curiosos, bisbilhoteiros podemos aproveitar”, disse a governante Amegeiras, de 33 anos, queria de tal forma
de alto risco, dispostos a quase tudo para no início da semana passada, para logo assistir ao espetáculo vulcânico que pagou
observarem de perto as forças da Natureza a seguir, em menos de 24 horas, pedir 500 euros pela curta viagem desde a vizi-
em plena atividade. desculpas pelo comentário politicamente nha ilha de Tenerife e cujo preço normal

Adrenalina e fotogenia Do Hawai à Islândia
(em cima), passando pelas Canárias e Itália,
dezenas de milhões de pessoas visitam
anualmente os vulcões ativos
não costuma exceder os sessenta. Ele é teve a ilha Branca, na Nova Zelândia, e
1 400
apenas um dos responsáveis pelo facto o Whakaari como protagonistas. A 9 de
de os alojamentos em La Palma estarem dezembro de 2019, este vulcão começou
à beira da lotação máxima (17 mil camas), a largar um enorme fluxo piroclástico e
face à elevada procura que resulta igual- apanhou de surpresa um grupo de meia
mente da presença de jornalistas, bom- centena de visitantes – 22 não sobrevi-
beiros, cientistas e forças de segurança. veram e os demais ficaram com marcas e
A avidez de emoções fortes de An- traumas para o resto dos seus dias.
drés Amegeiras é idêntica à que tinham De qualquer forma, nem estes aciden-
os jovens aristocratas que, nos séculos M I L H Õ ES tes parecem demover o crescente inte-
XVIII e XIX, faziam questão de incluir o Número de pessoas em resse pela observação dos 1 500 vulcões
Vesúvio no seu “Grand Tour” pelo Velho todo o mundo que vive ativos no planeta – 50 deles em erupção,
Continente. A Enciclopédia de Diderot e a menos de 100 km de segundo o Instituto Smithsonian. Uma
de Alembert já fazia referência aos vul- um dos 1 500 vulcões simples busca online é suficiente para
cões transalpinos e ajudou a popularizar ativos no planeta (18% da constatar a variada oferta que existe neste
o famoso cone montanhoso que faz parte população global) nicho de mercado: do Hawai à Indoné-
da paisagem de Nápoles e explodiu no sia, passando pela ilha caribenha de São
280
ano 79 d.C., soterrando as antigas cida- Vicente, vendem-se pacotes personali-
des romanas de Pompeia e Herculano. zados para todos os gostos, em função
Atualmente, este vulcão é um dos mais do orçamento disponível, incluindo para
vigiados (a cidade da pizza, com mais de os destinos de maior risco, como sucede
três milhões de habitantes, fica a pouco com a República Democrática do Congo e
mais de 20 quilómetros) e visitados do o vulcão mais perigoso de África, o Nyira-
mundo. Em 2019 (os dois últimos anos gongo. A troco de quatro mil euros, apro-
FOTOS: GETTY IMAGES
não contam por causa da pandemia), perto ximadamente, os mais temerários podem
de 750 mil pessoas subiram os penosos
MIL agendar um passeio a este colosso com 3
800 metros, ladeira acima, até alcançarem Estimativa do número de 470 metros de altura que despertou a 22
a cratera que entrou em erupção pela pessoas que morreu na de maio e que, num mês de erupções, fez
última vez em 1942, em plena II Guerra sequência de erupções 32 mortos e meio milhão de desalojados.
Mundial – nessa ocasião, só 26 perderam vulcânicas, desde o início Nada que ver com os vulcões islande-
a vida, mas receia-se que a próxima seja do século XVII ses, igualmente ameaçadores mas moni-
bem mais mortífera. torizados com todo o tipo de tecnologias,
1 143
Nos últimos 400 anos, nas contas e sempre com equipas de resgate e de
do Instituto de Física do Globo de Paris salvação por perto, para que a indústria
(IPGP), estima-se que 280 mil pessoas turística local não seja afetada. Entre ja-
tenham morrido devido à atividade vul- neiro e agosto, 336 511 viajantes aterraram
cânica, um número relativamente baixo no aeroporto de Reiquiavique e a maioria
se comparado com outras catástrofes não deixou escapar a oportunidade de co-
naturais. Mesmo assim, na última déca- nhecer o novo ex-líbris vulcânico da ilha.
da, houve mais de um milhar de vítimas Mortes resultantes de Em fevereiro, o Fagradalsfjall acordou de
– e algumas eram seguramente turistas. erupções vulcânicas, um prolongado descanso eruptivo – oito
O exemplo mais recente e mediático desde 2010 séculos – e agora contribui até para o
aumento dos preços do mercado imobi-
129
liário (fica a meia centena de quilómetros
da capital) e para um aceso debate sobre
o acesso a terrenos privados a partir dos
quais se podem ver as erupções. Será que
algo assim ainda vai acontecer em La Pal-
ma? Para já, os canários têm de fazer pela
EM LA PALMA, JÁ SE vida e, como afirmou ao diário catalão La
Vanguardia Jorge Miranda, dirigente do
PEDE AOS TURISTAS Número de vulcões ativos
na Indonésia. Este país, o
CIT (uma associação privada de empre-
TEMERÁRIOS QUE
sários turísticos da ilha de La Palma), “não
Japão (110) e as Filipinas
(23) são os principais
queremos aqui pessoas que encham as
FIQUEM EM CASA E responsáveis pelo famoso
Anel de Fogo do Pacífico,
estradas e atrapalhem as equipas de emer-
gência (...). Quem quiser ver bem o vulcão
VEJAM O ESPETÁCULO que representa 84% da que fique em casa e ligue a televisão!”. O
importante por estes dias, como se diz na
VULCÂNICO PELA
ameaça vulcânica global
ilha Bonita, e recorrendo a uma palavra
de origem portuguesa, é que ninguém se
TELEVISÃO deixe “enchumbar”. [email protected]

TELEVISÃO
Rir com
a diáspora
A mestiçagem enraizada
num bairro da Margem Sul
do Tejo dá o mote para a
nova sitcom portuguesa
Café Kwanza. Seguindo
as linhas de ficção norte-
americana e britânica, a
integração de imigrantes
também se faz através do
humor
C
SÓNIA CALHEIROS
hama-se café Kwanza, nome do ou britânicas (com forte presença de

rio em Angola e da moeda des- imigrantes indianos em Londres), esta
se país africano, mas poderia sitcom nacional quer parodiar sobre o
chamar-se Café Tejo, rio que modo como vivem os imigrantes e os seus
banha o Barreiro na margem descendentes, veiculando que também
sul de Lisboa, onde há mais de eles são portugueses. Mas será a comédia
40 anos se tem fixado uma vas- a melhor forma de ajudar à integração
ta comunidade africana, já com dos imigrantes ou, pelo contrário, poderá
várias gerações de angolanos, perpetuar estereótipos?
moçambicanos ou guineenses. O humor é sempre uma excelente
Café Kwanza, a sitcom idealizada por ferramenta de comunicação, desde que
Matamba Joaquim, 39 anos, não aborda de fez da política um tema, como lembra o
forma especial a descolonização, a imigra- sociólogo Pedro Góis. “Os cartoons são
ção ou o racismo. O foco acende-se sobre mais antigos, mas na televisão portugue- imigrantes ao nosso lado. Nos últimos 10
a população de um bairro e o dia a dia de sa, a partir dos anos 1980, já Herman José a 15 anos também foi um tema dessacra-
quem entra e sai do café. “Queremos que fazia humor com a política, dessacralizan- lizado, mas continua a existir uma linha
os portugueses brancos percebam que há do-a. No caso da imigração, esse é o passo muito ténue entre o que é racismo e o que
portugueses não brancos. A comunidade natural, pois estamos habituados a ter os é humor, entre o que é agressão e o que é
afro-descendente é enormíssima”, expli- a normalidade discursiva. O humor ajuda
ca Matamba, ator natural de Luanda, em à integração, mas não devemos procurar
Portugal há 22 anos. Apesar de o elenco esse caminho. Deve acontecer progressi-
ser maioritariamente negro, Café Kwanza vamente e de forma natural”, afirma.
não é uma série africana, é uma produção QUANTOS MAIS
‘JEAN PIERRE, VIEN ICI’
IMIGRANTES FALAREM
portuguesa, feita com atores africanos e
lusos. “Este projeto é também uma forma Há oito anos, o filme A Gaiola Dourada,
de nós contarmos a nossa história com
uma visão diferente do que é habitual- DAS SUAS VIVÊNCIAS, comédia de Rúben Alves, ator e realizador
luso-francês, além de ter sido um fenó-
mente contado”, diz Miguel Sermão, 46
anos, responsável pela direção de atores.
MAIS INCLUSIVAS E meno de popularidade – o filme mais
visto de 2013 em Portugal, com mais de
Tal como já acontece em produções
norte-americanas (centradas nos afro-
NORMALIZADAS AS 755 mil espectadores – “foi muito im-
portante”, na opinião de Pedro Góis, mas
-americanos e nos asiáticos na América) SITUAÇÕES SE TORNAM “foram precisos mais de 50 anos para um

Protagonistas Os atores Manuela
Paulo, Daniel Martinho e Gio Lourenço
nas gravações de Café Kwanza
OLHAR AO ESPELHO
expressão: não pode ferir nem ofender a
dignidade humana. A partir daí deixa de
Estas comédias podem ajudar a mudar ser útil como produto cultural e passa a
a forma como a sociedade vê as suas ser uma agressão.”
comunidades de imigrantes
MENOS RACISMO, MAIS BAIRRISMO
Os oito episódios de Café Kwanza, filma-
B L AC K- I S H dos ao estilo de cinema, “tinham todos os
As peripécias dos Johnson – família condimentos para ser um drama, mas pre-
negra norte-americana a morar num ferimos uma comédia, para normalizar a
bairro branco de classe média-alta –, nossa vida, para que as pessoas se revejam
protagonizadas por Anthony Anderson na diáspora”, justifica Matamba Joaquim.
e Tracee Ellis Ross, já deram para sete “A comédia consegue falar de um as-
temporadas, desde 2014. sunto sério de uma forma leve, fazendo
refletir e, ao mesmo tempo, divertin-
do-nos. Mas não deve ser só isso. É um
GOODNESS GRACIOUS ME objeto artístico que nos leva para outros
( VA L H A - M E D E U S ) paradigmas”, destaca Miguel Sermão.
Sátira às culturas inglesa e indiana “É fundamental mais projetos como
através dos indianos e paquistaneses Café Kwanza para dar visibilidade, com-
estabelecidos em Londres. Humor inglês bater o preconceito e o dito isolamento das
dos anos 1990, começou na BBC Radio 4 e comunidades – têm de aparecer em todas
passou para a televisão, BBC Two. as esferas da vida coletiva. Não é aceitável
FOTOS: LUÍS BARRA
que não tenhamos pessoas racializadas en-

tre os atores ou os artistas de todas as artes
RAMY performativas”, sublinha Mamadou Ba.
Ramy Youssef, filho de imigrantes Quantos mais negros falarem de ne-
egípcios, é o autor e protagonista da gros e das suas vivências, mais inclusivas
série original da Hulu centrada numa e normalizadas as situações se tornam,
filme ter a capacidade de interagir com a família egípcia e muçulmana a morar em tal como fazem nos EUA os comediantes
nossa emigração”. Na altura, o produtor Nova Jersey, nos EUA. Os contrastes de Trevor Noah, sul-africano, Dave Chappelle
e realizador Christophe Fonseca contou temas como fé, feminismo, sexualidade e ou Chris Rock, ambos afro-americanos.
ao sociólogo que, em diferentes proje- tradições familiares vão dar para muitas “É muito diferente de uma chacota ra-
ções da longa-metragem em Paris, na gargalhadas. cista, feita de um branco sobre um ne-
plateia sentavam-se a patroa francesa e a gro, ou misógina, de um homem contra
empregada portuguesa, e ambas diziam: uma mulher. Rir-se de si próprio é uma
“Esta é a história da minha vida.” Pedro F R E S H O F F T H E B O AT forma de esvaziar preconceitos sobre o
Góis não tem dúvidas: “Muitos dos por- A série passa-se em 1995, quando a que a maioria pensa sobre as minorias”,
tugueses emigrados na década de 1960 família chinesa Huang se muda de adianta o ativista.
redescobriram-se neste filme. Não sendo Washington para Orlando, na Flórida, Mas o sociólogo Pedro Góis aponta
um filme racista ou xenófobo, tornou-se, onde nem sequer existe uma Chinatown. que, nos países pós-coloniais, tanto a
sem dúvida, um clássico.” Gerir uma steakhouse e educar três filhos branquitude como a negritude ainda são
Vale a pena relembrar que os portugue- poderá ser hilariante. um fator distintivo, sobretudo no discurso
ses no Brasil, por exemplo, sempre foram político. “Será possível, em breve, ter um
alvo de chacota, através das anedotas com Presidente negro em Portugal? Talvez não,
um fundo racista. “Se se conseguir fazer MASTER OF NONE mas um líder branco em Angola ou em
humor sem a nuance racista, acrescenta O autor é o comediante Aziz Ansari. Moçambique também não vai existir tão
à integração. Pelo contrário, sempre que Com a sua amiga de infância Denise e depressa”, exemplifica.
se inferioriza na comparação, sempre que o seu eclético grupo de amigos, lidam Produção de baixíssimo orçamento,
soa a bullying ou quando generalizamos com questões sobre o amor, as carreiras feita com poucos meios técnicos e um
a partir de um estereótipo para vincar e os tabus sociais. Do vasto leque de elenco reduzido, Café Kwanza tem estreia
uma característica de superioridade é personagens fazem parte os pais de marcada para dezembro na RTP África,
discriminatório”, salienta o investigador Ansari, imigrantes da Índia. pelo menos para já. “A RTP1 ainda se dis-
da Universidade de Coimbra na área das tancia de conteúdos negros, mas a RTP
Migrações Internacionais. África começou a apostar na ficção negra”,
Para Mamadou Ba, ativista e dirigente N E V E R H AV E I E V E R constata Jaime Adão. Para a estética visual
do movimento SOS Racismo, o humor, A vida complicada de uma adolescente de Café Kwanza, o realizador foi buscar
quando bem mobilizado, é um catalisa- indiana norte-americana, inspirada na referências a Cheers, Aquele Bar e a Black-
dor de mudanças de comportamentos própria infância de Mindy Kaling (The -Ish (ver caixa). “Aqui são os portugueses
culturais. “Em tese, o limite da expres- Office), a atriz que assina o argumento e a e os seus dilemas, com menos racismo e
são artística é igual ao da liberdade de produção da série. mais bairrismo”, conclui. [email protected]

Vidas com cor

Assumidamente disruptivo desde o seu nascimento, o Grupo Ageas
Portugal renova agora a sua promessa de vir colorir o mundo dos seguros,
desafiando os seus próprios colaboradores a partilharem as cores
da sua vida. As respostas chegaram de todas as tonalidades e matizes
?
2. O QUE MAIS GOSTA DE c Um festival de música onde um pescador de pérolas;
FAZER PARA RELAXAR os animais sejam bem-vindos c Falar com os animais;
DEPOIS DE UM DIA DE d Trekking no Gerês; d Conseguir sobreviver numa
TRABALHO? e Um workshop de floresta usando apenas o que
a Kickboxing; carpintaria – nunca se tem lá há;
b Padel – a ver o sol pôr-se demasiadas prateleiras. e Saber consertar um carro
no mar 4. FÉRIAS DE SONHO? só com um martelo, uma
1. O QUE LHE TRAZ MAIS c Meditação; a Paris em 2024, para chave de fendas e uma lata
ALEGRIA PELA MANHÃ? d Um passeio no parque assistir aos próximos Jogos de lubrificante.
a Fazer uma corrida; com uma app sobre botânica Olímpicos; 6. ÚLTIMA COISA QUE FAZ
b Dar um mergulho no mar; para aprender os nomes das b Nadar com tubarões nas ANTES DE IR DORMIR?
c Passear o cão, fazer festas plantas; praias da Austrália; a Preparar o saco do ginásio
ao gato e largar a catatua e Munir-se de pincéis, palitos c Um mês num ashram na e o kit para a corrida matinal;
pela casa; e cotonetes, e limpar o pó à India; b Meter uma toalha de praia
d Regar as plantas, falar sua colecção de carrinhos. d Explorar a selva do Bornéu; na mochila do trabalho;
com elas e mudá-las de sítio 3. MELHOR PLANO PARA e Uma digressão pelos c Ouvir música;
para que não se aborreçam; UM FIM-DE-SEMANA melhores museus do mundo. d Admirar o seu jardim de
e Ouvir um podcast sobre PROLONGADO? 5. QUE TALENTO GOSTARIA ervas aromáticas enquanto
física quântica, ecologia a Um percurso de triatlo para DE TER? bebe um chá de hortelã
ou aeromodelismo – o que iniciados; a Ser capaz de escalar o acabada de colher;
importa é que todos os dias b Um mini cruzeiro pelos Evereste; e Ler um dos 15 livros que
aprenda algo novo. Fiordes da Noruega; b Mergulhar em apneia como tem na mesa-de-cabeceira.
Q
uando uma fotografia a preto e branco é restaurada e a vemos a cores, as pes- Mário Coelho, vencedor
soas ganham vida. Vemo-las como realmente são. É esse o poder da cor. Faz-nos da 2.ª edição do Prémio
sentir em sintonia com o que nos define. Ninguém merece uma vida cinzenta. Revelação Ageas Teatro
Ninguém merece viver com medo de experimentar coisas novas, de arriscar, de Nacional D. Maria II,
seguir em frente. é quem protagoniza
Foi por isso que o Grupo Ageas Portugal desafiou os seus colaboradores a o vídeo institucional do
revelarem o que dá cor às suas vidas. O casting interno resultou numa campanha inclusiva (pela Grupo Ageas Portugal. Uma
utilização da linguagem gestual e do código ColorAdd), que insta todas as pessoas a refletirem campanha que promete
sobre o que lhes traz mais alegria. E como alguns hobbies são mais audaciosos que outros, é bom espalhar cor
ter o apoio de um grupo segurador. Com a Médis, a Ocidental, a Ageas Seguros, a Ageas Pensões e recordar a importância
ou a Seguro Directo, entre outras marcas do Grupo, tudo é mais fácil de concretizar. Porque o de proteger a vida
Grupo Ageas vive ao lado das pessoas, tornando o mundo mais seguro, empreendedor e humano. e que estará presente
Faça o teste e descubra a sua cor. Porque a cor de cada um é o que se faz por ela. na televisão e digital.
a A SUA COR É O LARANJA: anda preocupada com a sua tanto sentido para si. Sempre fuga de água com os técnicos
Correr, escalar, dar socos num ideia de fazer mergulho ou foi no campo que se sentiu especializados da Ageas
saco. Vale tudo menos estar desportos aquáticos, contacte mais livre. A trepar às árvores Repara.
quieto. Só está bem quando os um Mediador Ageas Seguros e e a rebolar no meio das folhas. SOPA DE LETRAS TODAS
músculos ardem e sente que proteja-se. E hoje ainda é no meio do AS CORES SÃO A SUA COR:
testou o seu corpo ao máximo. c A SUA COR É O BRANCO: verde que se sente mais feliz. É um apaixonado pela vida
Se parar é morrer, por este Não precisa de muito para Com todas essas caminhadas, com todas as suas cores e
andar, fica cá para a semente. ser feliz. Desde que tenha a o mais provável é que viva nuances. Surf, parapente,
O problema é que com isso sua música, os seus animais muitos anos. Como as árvores. croché, levantamento do copo,
de aliviar o stress à pancada, e o tapete onde se senta para Fale com a Médis e proteja o yoga, gatos, cachorrinhos
ainda se arrisca a lascar um meditar, a vida corre-lhe bem. quanto antes a sua saúde. e papagaios, tiro ao alvo,
dente. Calha bem poder contar E se essa ideia de ir passar um e A SUA COR É O ROSA: ayahuasca, bungee jumping,
com a Clínica Médis para mês a um ashram é mesmo a A sua casa é o seu castelo. É danças de salão, motocross,
qualquer urgência dentária. sério, e por isso e precisar de lá que estão os seus livros, os bolas de Berlim e folhas de
b A SUA COR É O AZUL: um hotel para o seu animal, seus kits de aeromodelismo couve kale. Os pobres dos
Nada lhe transmite mais paz contacte a plataforma Mundo e as suas colecções. Mas, se seus amigos parecem faróis
do que o mar. De dia ou de Ageas e encontre a melhor quer um conselho, aproveite quando tentam acompanhar
noite, de verão ou de inverno, solução. o tempo para aprender mais as suas paixões. Com uma
é lá o seu lugar. Afinal, se há d A SUA COR É O VERDE: coisas (parece que isso da vida tão colorida, o melhor é
sítio onde não dá para atender Quando era pequeno disseram- física quântica não vai lá com mesmo entregar-se nas mãos
o telemóvel, é mesmo debaixo lhe que o verde era a cor da um podcast), e deixe eventuais do Grupo
de água (ainda). A sua família liberdade e nunca nada fez problemas de canalização ou Ageas.
VAGA R
FIGURA
“O que há de
melhor numa
coisa nova é
aquilo que
As aventuras
de...
satisfaz um
desejo antigo”
Paul Valéry
Escritor
(1871-1945)
HERGÉ
CONHECER MELHOR A VIDA DO CRIADOR
DE TINTIM É A IRRESISTÍVEL PROPOSTA
DUMA NOVA EXPOSIÇÃO NA GULBENKIAN,
EM LISBOA. QUEM ERA HERGÉ?
PEDRO DIAS DE ALMEIDA

C
FIGURA
Caminhando a passos largos, e sempre

de poupa ao vento, para os festejos dos
100 anos, Tintim continua a ser discu-
tido, e mesmo incómodo, em todo o
mundo. Apareceu há 92 anos, em 1929,
nas páginas do Le Petit Vingtième, su-
plemento juvenil do jornal belga Le
Vingtième Siècle. Quando o padre Nor-
bert Wallez, diretor do jornal, convidou
Georges Remi – que, aos 17 anos, em
1924, passou a assinar Hergé, a partir das
iniciais do seu nome, ao contrário: “R” e
“G” – para ser redator principal do su-
plemento, nunca terá sonhado que esse
título da Imprensa belga, desaparecido
em 1940, iria sobretudo ficar célebre, ao
longo dos tempos, como berço de uma
personagem de BD: Tintim.
O Vingtième Siècle, onde Hergé co-
meçou a trabalhar (primeiro no serviço
de assinaturas, depois como ilustrador)
era um semanário católico conserva-
dor, alinhado com os nacionalismos e
fascismos que despontavam na Europa.
Wallez era um admirador de Mussolini
(em 1944, será mesmo detido por co-
laboracionismo com os nazis e, mais
tarde, condenado a cinco anos de pri-
são). As primeiras aventuras de Tintim
são, pois, profundamente marcadas por
esse contexto sociopolítico. O diretor
não deixava nada ao acaso no seu jornal,
e os primeiros temas dessa novíssima
banda desenhada passaram pela sua de-
cisão. A estreia de Tintim acontece com
uma aventura “no País dos Sovietes”. Os
objetivos eram claros: afirmar um anti-
comunismo sem contemplações para que viria a ser chamada “linha clara”). A
os leitores mais jovens, denunciando fortíssima tradição da BD franco-belga
o que se passaria na URSS. A base para que atravessou o século XX e chegou até
essas primeiras aventuras de Tintim foi hoje começou, pode dizer-se, aí.
um livro que se tinha tornado um bes-
t-seller em França e na Bélgica: Moscou A ERA DOS PRECONCEITOS
sans Voiles [“Moscovo sem Véus”], de um Hergé viria a renegar essa primeira aven-
ex-cônsul belga, Joseph Douillet, edita- tura do repórter como uma espécie de
do em 1928. O tom era inevitavelmente “pecado da juventude”, assumindo até
propagandístico. “Eis o que os sovietes que era muito pouco exigente na narra-
fizeram desta cidade magnífica que era
Moscovo: um pardieiro infeto”, dirá A FORTÍSSIMA tiva, improvisada semana após semana
(assim funcionavam as tirinhas de BD
Tintim, a páginas tantas, num balãozi-
nho a preto-e-branco. Mas, em termos
TRADIÇÃO DA BD nos jornais da época) em vez de pensada
de início. Tintim no País dos Sovietes
formais, a estreia da personagem no FRANCO-BELGA, QUE seria a única história que, no futuro, não
ATRAVESSOU O SÉCULO
Petit Vingtième foi bastante... revolu- iria retocar e colorir para a apresentar
cionária. Influenciado pelas tirinhas de no formato de álbum (mas, já nos anos
comics que chegavam dos EUA (como
Krazy Kat e Bringing Up Father), Hergé XX E CHEGOU ATÉ HOJE, 80, seria disponibilizada em fac-símile;
hoje está editada, como uma espécie de
apostou em incluir as falas em balões
(antes, o normal nas histórias ilustradas
COMEÇOU COM TINTIM, preciosidade arqueológica).
Educado em meios católicos conserva-
era escrever em baixo das imagens) e foi
aprimorando o seu traço simples e exa-
EM 1929, COM A MARCA dores e desde cedo parte do movimento
do escutismo (os seus primeiros traba-
to, então ainda rudimentar (uma técnica DE HERGÉ lhos podem ver-se na revista belga Le

Hergé para além de Tintim
A exposição dedicada a Hergé, patente na Gulbenkian até 22 de janeiro de 2022,
percorre toda a vida do criador de Tintim. Para muitos, será uma surpresa ver
logo na primeira sala um conjunto de quadros que nada tem
que ver com a banda desenhada e a criação mais célebre de Georges Remi
(1907-1983), para sempre conhecido como Hergé
OUTRAS PERSONAGENS
As aventuras de Tintim eram demasiado
absorventes, e Hergé dedicou-se-lhes de
forma quase obsessiva, sem ter muito
tempo para a invenção de outras histórias
e personagens. A sua criação mais célebre,
além do repórter aventureiro, foi a dupla de
miúdos irrequietos Quick e Flupke (Quim e
Filipe, na tradução portuguesa) que, a partir
de 1930, apareceu no mesmo suplemento
que viu nascer Tintim, Le Petit Vingtième
(em baixo, um grafíti que os homenageia
em Bruxelas). Na revista francesa Coeurs
Vaillants, em 1935, surgiu uma nova série:
Jo, Zette e Jock (As Aventuras de Joana,
João e o Macaco Simão).
PUBLICIDADE
A ilustração para cartazes
PINTURA publicitários também
Entre 1960 e 1964, Hergé entusiasmou Hergé. No início
produziu vários quadros, num de carreira, o jovem Georges
estilo abstrato, com claras Remi até acreditaria que a sua
influências de artistas como Miró vida profissional iria mais por
ou Dubuffet. O pintor belga Louis esse caminho... Não escondia
van Lint serviu-lhe de mestre a sua admiração pelos artistas
ao iniciá-lo nesse universo. A gráficos responsáveis pelos
ideia era mesmo distanciar-se, grandes cartazes publicitários
de algum modo, do mundo de da época, uma área profissional
Tintim que tanto lhe ocupava em franco desenvolvimento.
os dias, há demasiado tempo. A partir de 1923, criou vários
Mas Hergé percebeu, depressa, logótipos e estava disponível para
que tinha mesmo de fazer uma encomendas na área do design
escolha. “A banda desenhada é a gráfico, e em 1934 fundaria,
minha forma de expressão. Que mesmo, uma empresa para essa
mais tenho à minha disposição? área: Atelier Hergé-Publicité.
A pintura? É preciso dedicar-lhe A empresa atraiu clientes
uma vida. E como só tenho uma, importantes, como os grandes
e já bem avançada, tenho de armazéns belgas À L’Innovation
escolher entre a pintura e Tintim, (que seriam totalmente
não as duas coisas. Não posso destruídos por um violento
ser um ‘pintor de fim de semana’, incêndio, em 1967) – em cima,
é impossível!”, disse numa anúncios à secção de brinquedos
entrevista. dessa loja.

FIGURA
A grande família Nas Aventuras de

Tintim foram identificadas mais de 350
personagens. Este era o cartão de boas-
-festas dos Studios Hergé, no ano de 1973
Boy Scout Belge), George Remi sempre burguês em que vivia. Era 1930. Eu não
gostou muito de desenhar e era um jovem conhecia desse país a não ser o que as
fascinado pelo imaginário americano dos pessoas contavam na época: ‘Os negros
índios e cowboys. Era natural que, depois são como crianças grandes, felizmente
do “país dos sovietes”, ele quisesse levar para eles nós estamos lá!’ E desenhei-os,
Tintim para a América... Mas esse projeto os africanos, segundo estes critérios, com
teria de esperar, a ideia do padre Wallez o mais puro espírito paternalista, que era
era outra. A partir de 1930, seria mostrada o da altura na Bélgica.”
no Petit Vingtième a viagem de Tintim ao
Congo belga. Os objetivos políticos eram, ‘O VENTO E O OSSO’
mais uma vez, claros. A ideia era promover Talvez como reação às fragilidades dessas
a grande colónia junto dos mais jovens. primeiras histórias, Hergé iria tornar-
Tornar-se-ia uma espécie de “livro mal- -se obsessivo na documentação para
dito”, desde cedo acusado de racismo. as muitas aventuras de Tintim que se
Nos anos recentes, com o aumento de um seguiriam na sua vida (quando morreu,
olhar crítico para os estereótipos coloniais em 1983, aos 75 anos, deixou inacaba-
que continuam presentes na cultura oci- do o 24º álbum: Tintin et L’Alph’Art,
dental, este Tintim no Congo é sempre ambientado no mundo das artes). Um
um alvo a abater. Os clichés coloniais e livro (que começou por ser, em 1934,
racistas são óbvios. Hergé que, ao con- uma série de tirinhas semanais) marca
trário do que aconteceu com as tirinhas um “antes” e um “depois” na carreira
de estreia, transformaria esta aventura de Hergé e do herói que marcou toda a
num álbum colorido, sabia-o bem e vá- O Lótus Azul A atriz Anna May Wong sua vida: O Lótus Azul. Desta vez, o país
rias vezes, ao longo da vida, foi recordado (Shangai Express) na revista belga a visitar pelo intrépido repórter com a
desse facto. Muitos anos depois, numa A-Z serviu de inspiração para a capa companhia de sempre, o fox-terrier Milu,
histórica entrevista com Numa Sadoul, do álbum marcante de Tintim O Lótus era a complexíssima e misteriosa China.
explicar-se-ia: “Tanto para o Congo como Azul. Hergé tinha um grande acervo de Na exposição que esta sexta-feira, 1, abre
para o País dos Sovietes, o facto é que eu documentos e objetos que o inspiravam portas na Fundação Gulbenkian, uma
estava cheio dos preconceitos do mundo para as suas criações das nove salas é-lhe totalmente dedicada

(A Lição do Oriente). Pela primeira vez,
o enredo foi pensado de início e não
era uma sucessão de situações rocam-
bolescas mais ou menos improvisada.
E, mais importante, Hergé conheceu
Tchang Tchong-Yen, um estudante chi-
nês de Escultura em Bruxelas, com a sua
idade (27 anos quando se conheceram,
em 1934) que o ajudou profundamente
a perceber melhor as mil e uma subti-
lezas da cultura chinesa e de quem se
tornaria amigo para a vida. “Tchang era
um rapaz excecional”, diria, na mesma
entrevista a Sadoul. “Fez-me descobrir e
amar a poesia chinesa, a escrita chinesa...
O vento e o osso, o vento da inspiração
e o osso da firmeza gráfica. Para mim,
foi uma revelação. Também lhe devo o
facto de me ter ajudado a compreender
melhor o sentido da amizade, da poesia,
da Natureza.” Tchang dá mesmo nome
a uma jovem e simpática personagem
nessa aventura chinesa de Tintim. Em Bruxelas, Hergé em maio de 1946 com a obtenção de um
Esse livro é a primeira prova de que em sua casa, no ano “certificado de civismo”, que o ilibava de
da publicação da última
Hergé conseguiria fazer o seu caminho. ter sido colaborador das forças nazis.
aventura completa
Tintim deixou de ser uma espécie de Podia, então, voltar a publicar e surgiu
de Tintim, em 1976
veículo de propaganda, mais ou menos (Tintim e os Pícaros)
um excelente meio para o fazer: a revista
disfarçada, e, sempre inserido num certo de banda desenhada sediada em Bruxelas
contexto com fortes ligações à realidade, Tintim, “para jovens dos 7 aos 77 anos”,
passou a ser um aventureiro mais curioso que seria replicada em várias línguas
e atento ao mundo que o rodeava. Em O (português incluído) e duraria até 1988.
Lótus Azul, influenciado pelas conver- Essa espécie de renascimento forta-
sas com Tchang, aborda diretamente a leceu Hergé e o seu profissionalismo, às
ameaça imperialista japonesa na China, vezes quase obsessivo. Nos Studios Hergé,
cinco anos antes do eclodir da Segunda fundados em 1950, o trabalho à volta das
Guerra Mundial. O afastamento de Wallez aventuras de Tintim tornou-se um rigo-
da direção do jornal, em 1933, por causa roso trabalho de equipa. Edgar P. Jacobs
das suas simpatias fascistas, ajudou a uma (que começou por trabalhar como assis-
emancipação de Tintim e a uma maior tente de Hergé logo em 1947) teve, aí, um
autonomia e crescimento de Hergé. papel importante. Na edição dos álbuns
Os tempos, na Europa, não seriam coloridos de Tintim nada era deixado ao
fáceis e com o encerramento do Petit acaso. É também isso que nos faz ler e
Vingtième, em 1940 (data da ocupação da reler estes livros, encontrando sempre
Bélgica pelos nazis), podia-se temer pelo novos pormenores a prenderem-nos a
futuro de Tintim... Mas ele resistiria, como
num livro de aventuras com um gesto ar-
TINTIM NO CONGO atenção. Não era raro construírem ma-
quetas (como a do foguetão de Rumo À
riscado, que valeria a Hergé alguns suores TORNOU--SE UMA ESPÉCIE Lua) para ajudar no momento dos dese-
DE “LIVRO MALDITO”,
frios. As aventuras de Tintim passaram nhos, e Hergé desde cedo que acumulou
a ser publicadas no jornal Le Soir, com documentos e objetos das mais variadas
uma grande tiragem, mas tomado pelos
ocupantes nazis. Hergé foi cauteloso nos DESDE CEDO ACUSADO origens para o ajudarem a dar realismo e
credibilidade à série que revolucionou a
temas a abordar, mas depois da libertação
não se livrou de ser olhado, por muitos,
DE RACISMO. “ESTAVA banda desenhada. Algum desse acervo,
nascido da curiosidade infinita de Hergé
como colaboracionista. Foi detido várias
vezes, em setembro de 1944, para inter-
CHEIO DE PRECONCEITOS”, pode, por estes dias, ser visto (até janeiro
de 2022) na primeira exposição que lhe
rogatórios e só foi oficialmente absolvido ADMITIRIA HERGÉ é dedicada em Portugal. [email protected]

PESSOAS
Rita Redshoes
‘‘PARECEU-ME MAIS AUTÊNTICO ESCREVER O DISCO SOBRE
A MINHA FILHA EM PORTUGUÊS”
D
epois de uma pri- Começando pelo título do disco. nha preocupação enquanto mãe de uma
meira experiência, Há aqui um “lado bom” menina, de querer que ela tenha a sua
em 2016, no seu e diferente da Rita? liberdade, dignidade e identidade sem-
álbum Her, a cantora Eu acho que sim. Toda a pandemia, pre asseguradas e respeitadas por todos.
e compositora Rita o processo de criação do álbum e o Há uma nova vivência
Redshoes edita agora nascimento da minha filha vieram de amor no álbum?
o seu primeiro disco trazer ao de cima uma melhor versão O amor de mãe é diferente, com-
integralmente em português. Lado de mim, muito mais inteira e completamente avassalador, torna-nos
Bom é o seu quinto álbum e foi criado pleta. A ideia do disco já a tinha antes mais fortes e, ao mesmo tempo, mais
entre 2018 e 2019, durante e depois da de engravidar, mas acabei por escre- frágeis. No disco, eu avalio os outros
gravidez. Abordando temas incon- ver quase todas as canções durante tipos de amor que eu já conhecia à luz
tornáveis como o papel das mulheres e depois da gravidez. O Lado Bom é deste novo sentimento. E aí apercebo-
na sociedade e o seu futuro, a artista uma espécie de diário sobre todas as -me de que nem todos os amores são
fala deste disco como “um sobrevi- transformações e lutas interiores que incondicionais, nem sempre damos
vente”, que resistiu à pandemia e aos vêm com a experiência da maternida- tudo de nós...
sucessivos atrasos na sua edição. Em de e da paternidade. Porquê só agora o primeiro
conversa com a VISÃO, Rita Redshoes, Como surgiu o single Rosa Flor? álbum em português?
nascida há 40 anos em Lisboa, fala da O início da letra e a melodia foram Foi um misto de coincidências. Por um
influência do seu papel enquanto mãe escritas muito antes de a Rosa nascer lado, a relação que eu construí com
no processo de criação do álbum, a (ainda nem sabia que era menina), mas a minha filha e a forma como relatei
depressão pós-parto que sofreu e os já finalizei a canção com ela ao colo. É essa experiência foi totalmente em
desafios para o futuro. um poema de amor que espelha a mi- português. Por outro, o desejo antigo

de escrever um álbum inteiramente na dutor, o Mikkel Solnado, achou que um
minha língua ganhou ainda mais força dueto encaixava bem na letra, por esta
com a gravidez. Pareceu-me muito se assemelhar a um diálogo. O Camané
mais autêntico escrever o disco sobre é um dos artistas de quem eu mais gos-
a minha filha em português. to e a profundidade que ele tem na voz,
O disco é um assomo de esperança no seu timbre, acabou por encaixar bem
para mulheres que estejam a passar no meu registo suave. Aliás, todas as
por depressões pós-parto? participações, como as letras do Samuel
Tenho essa expectativa, exatamen- Úria na Canção Canora e do Pedro da
te por saber o sofrimento e a solidão Silva Martins n’ O Amor não é Razão e
que vêm com esse assunto tabu. Eu a presença da harpa do Eduardo Raon,
passei por uma depressão pós-parto, são reflexo de uma junção bonita de
depois de ter a Rosa, e senti na pele pessoas, que mergulharam em conjunto
o preconceito de associar esta doen- neste projeto duma forma intimista.
ça a uma incapacidade de amar ou de Este disco estava feito há algum
cuidar, quando, na verdade, são coisas LADO BOM tempo. Que projetos tem agora?
completamente diferentes. Acredito No seu quinto disco, o primeiro Inspirada na Rosa e nas canções que
que o meu testemunho na canção Vai integralmente em português, a minha mãe lhe cantava, com letras
Tristeza pode reconfortar quem esteja Rita Redshoes apresenta-se inventadas sobre animais, tenho muita
a passar por esse processo difícil, que como uma mulher renovada. vontade de me aventurar num espe-
também pode ser vivido por homens. Com o tema da maternidade táculo musical infantil, mas mais fora
A música pode ser um refúgio para es- em foco, o álbum explora as da caixa, mais perto do abstrato e não
tas pessoas, tal como foi para mim. novas emoções vividas pela só de uma vertente lúdica. Também
De onde surgiu a ideia para o dueto artista, desde o medo ao amor quero explorar a minha escrita nou-
com o Camané? incondicional. O single Rosa Flor tros registos, um livro, quem sabe... E,
é um poema de amor escrito
Eu sabia que a Contigo É P’ra Perder ia claro, voltar aos concertos. Acho que
pela cantora à sua filha, Rosa,
ser uma valsa, um género normalmente todos precisamos de regressar à músi-
agora com 4 anos.
dançado a dois. Durante o processo de ca ao vivo. Alexandre Abrantes Neves
gravação da canção no estúdio, o pro- [email protected]
EDIÇÃO MENSAL
GRATUITA,
EXCLUSIVA PARA
INVISUAIS
Porque
é bom ler
Com o apoio de:
PA P E L F OR NE C ID O P OR :
Para mais informações: [email protected] e o tel: 913 998 221

TENDÊNCIAS
Uns murros saudáveis

Sozinhos contra o saco ou numa luta corpo a corpo
são cada vez mais os praticantes de desportos de combate
a pisarem o tatami, seja para uma manutenção fit,
perder peso ou descompressão mental
SÓNIA CALHEIROS*
C
om o ginásio perto em quatro minutos o escritor e humorista
do ministério, Pedro perdeu o combate.
Nuno Santos, 44 anos, Multiplicam-se nas redes sociais dos
não perde a oportuni- mais célebres fotografias de punho em riste,
dade de praticar não como do fadista Ricardo Ribeiro cujos trei-
uma mas três moda- nos, em 2017, o ajudaram a perder mais de
lidades de desportos 30 quilos, do humorista António Raminhos,
de combate: boxe, ki- ora a praticar MMA (artes marciais mistas)
ckboxing e muay thai. Apesar de um vídeo com o campeão João Naré, ora muay thai,
recente, publicado no Instagram do seu ou da fadista Cuca Roseta, com o quimono
treinador, ter posto a descoberto mais uma de taekwondo.
veia combativa do ministro das Infraestru- “Os desportos de combate eram um des-
turas e da Habitação, desde a adolescência porto de classe baixa, de bairros marginais.
e até entrar para a faculdade Pedro Nuno Agora são cada vez mais pessoas formadas
Santos praticou “viet vo dao”, uma arte que procuram praticá-los, desde médicos
marcial vietnamita. Mas agora, este trio de a advogados. Acredito que seja assim, em
combate que, há um ano, o leva sempre que relação ao MMA, devido à publicidade”,
pode até ao ringue, é diferente. “Também afirma José Fortes, mestre de muay thai
tem as técnicas de defesa e de ataque, mas e fundador da escola Zfortes, para quem TODOS DIFERENTES
estas são modalidades muito exigentes a ní- o MMA “implica uma maior exigência em Em 2015, quando Pedro Kol abriu a Acade-
vel cardio, com um desgaste muito grande. termos de recrutamento de grupos mus- mia Kolmachine, nas Avenidas Novas, em
E não faço fitboxing, apenas com o saco e culares e outra preparação física”. Lisboa, foi pioneiro em atrair um novo tipo
sem contacto direto com outra pessoa. Faço de praticantes de kickboxing. “O que era
combate com outros adversários”, explica. visto como um desporto só para homens,
É costume associar-se estas modalida- violento e muito de bairro, tornou-se mais
des à força, mas Pedro Nuno Santos destaca elitista, com mais mulheres a praticar”,
outras vantagens: praticar exercício físico, explica o campeão de kickboxing, com
melhorar a forma física e o cardio, libertar a cinco títulos nacionais, três europeus e
tensão acumulada após um dia de trabalho um mundial.
LUCÍLIA MONTEIRO
e desenvolver o lado estratega do desporto. Homens e mulheres perderam o medo

“Quando jogamos boxe com outra pessoa, de levar um soco e partir o nariz, perce-
estamos sempre a pensar, primeiro em bendo que podem praticar desportos de
atacar, depois em atingir e, por fim, em de- combate só para manutenção, num treino
fendermo-nos dos ataques do adversário.” técnico e físico, com saco ou dois a dois,
Assim, até parece um combate político. mas sem combater. “Querer estar em for-
Para uma maior procura das aulas nos ma, perder peso e ser terapêutico, melhora
ginásios muito terá contribuído o facto de RICARDO ARAÚJO PEREIRA a confiança e a autoestima”, elenca Pedro
PARTICIPOU NA TAÇA DE
algumas das modelos internacionais da Kol sobre as principais motivações dos
Victoria’s Secret terem partilhado vídeos praticantes. “É mesmo preciso estar focado.
de treinos e, por cá, o humorista Ricardo
Araújo Pereira ser praticante assíduo da PORTUGAL DE KICKBOXING E Defender exige mais estratégia”, acrescenta
o atleta e treinador.
Academia Kolmachine, indo cinco vezes
por semana, o que já lhe permitiu, em
MUAY THAI, EM 2019. APESAR Já Alan Azevedo, mestre de jiu jitsu bra-
sileiro e dono do ginásio Level Up Fight &
dezembro de 2019, participar na Taça de
Portugal de kickboxing e muay thai, em
DO ESFORÇO, EM QUATRO Fitness, diz-nos que, ao praticar esta arte,
algo que deve ser feito para desenvolver
S. João da Madeira. Apesar do esforço, MINUTOS PERDEU O COMBATE as nossas capacidades de defesa pessoal

Combate Antes desportos de
bairros marginais e classes
baixas e agra desportos de elites
DESPORTOS DE COMBATE
BENEFÍCIOS
Treino completo para manter
a forma e queimar calorias
Fortalece os músculos centrais

do corpo e aumenta a definição
dos braços e das pernas
Aumenta a força física e o nível

de resistência
Melhora a coordenação motora

e a capacidade de foco
Liberta tensões físicas e alivia

o stresse
Promove a autoconfiança
RISCOS
Contusões (raras) em caso de
movimento acidental ou queda
Possibilidade (baixa) de lesões

(cartilagem, tecidos, músculos)
Evitar exercícios com impacto em

GETTY
casos de problemas osteoarticulares
e autocontrolo, uma vez que “estamos a Em cerca de 20 anos a trabalhar com a do boxe é a solidão do jogador e a pressão
exercitar, a mexer articulações, aumentamos Federação Portuguesa de Judo, o ortope- psicológica. “Na sua autobiografia, o tenista
capacidade cardiorespiratória e aprendemos dista nunca viu uma lesão cervical grave ou Andre Agassi faz o paralelismo entre o ténis
a usar o corpo em todos os sentidos, com traumatismos cranianos de monta, porque e o boxe, centrado na individualidade, em
mais consciência na execução das técnicas”. “as pessoas aprendem a cair”; há, sim, tor- não existir um companheiro de equipa.
“Quem faz disto um hobby tem de ter a ções dos ombros e da coluna, lesões nos Explica como se cria uma endurance muito
parte mental muito mais desenvolvida.” joelhos e nos dedos das mãos. grande para a vida e como esta também
António Ramalho, especialista em boxe pode ser facilmente derrubada. Reconhe-
e criador da escola AnRam na Outurela, UM CULTO CINEMATOGRÁFICO ço-me nessas características”, assume.
defende, por sua vez, que o boxe é trans- Antes de chegar aos 40, há dois anos e No ambiente familiar da academia de
versal: “Todos nós já sabemos boxe, temos meio, Bernardo Pires de Lima foi desafiado bairro, “é possível a quem não compete
movimentos inatos. Toda a gente pode por um amigo, o dono da Rounds Academy, estar no mesmo grupo de treino de algum
praticar, quer tenha mais ou menos força, em Campo de Ourique, para experimentar campeão e este desce ao nível do outro e
seja mais forte ou fraco.” umas aulas de boxe. “Coincidiu com o fim estimula-o. Somos postos à prova pelos
Além de questões educativas de postura, de uma década e pensei que a próxima mais experientes.”
do respeito pelo adversário, do treino das mereceria outros desafios e novas aprendi- Bernardo Pires de Lima sublinha o
quedas e do desenvolvimento corporal, zagens”, lembra o politólogo e comentador “culto diferente” à volta do boxe, “até pelo
ganhar autoconfiança e segurança é das de assuntos internacionais. Pires de Lima imaginário cinematográfico e da própria
vertentes mais importantes do desporto começou por ir três vezes por semana, logo literatura”. E relembra, no cinema, desde
de competição de luta, na opinião de Ja- às sete da manhã, antes de levar os filhos à a saga Rocky (1976), com o seu lado mais
cob Frischknecht, ortopedista de medicina escola. “Admito que ajuda à descompressão, kitsch, a Robert De Niro em O Touro En-
desportiva, sobretudo para os jovens numa mas o desafio maior foi o de entrar num raivecido (1980) ou, por cá, Belarmino
fase em que precisam de as ter. “Quem desporto que desconhecia, sem bola, mas (1964), de Fernando Lopes, e mais recente-
está habituado a treinar com regras é uma que, do ponto de vista técnico e de mo- mente São Jorge (2016), de Marco Martins,
pessoa muito mais calma e segura de si vimentação, até tem semelhanças com o com Nuno Lopes. Uma mística que atrai
quando acontece uma adversidade, com ténis [que praticou em alta competição].” cada vez mais praticantes. [email protected]
um autodomínio muito grande”, descreve Para o comentador político, mais do que
o especialista em traumatologia. a violência das técnicas, a maior violência * Com Maria Ana Bau

CRÓNICA
O
verão terminou. (Angústia de fim de festa.) Temos a
sensação de que não aproveitámos o suficiente. De
que podíamos e devíamos ter ido mais vezes à praia.
Mergulhado mais. E de que desperdiçámos os dias ao
ar livre que escassearão nos meses que se seguem. Só as
crianças sentem os verões como intermináveis, e as férias
como “grandes”. Para nós, o verão é sempre de menos, e
P O R C A P I C U A / Rapper as férias terminam quando começávamos a desligar.
Este ano, passei o mês de agosto na casa onde passei todos os agostos
da infância. Não estava de férias e levei o trabalho comigo, mas serviu para
Longos
enganar o cansaço da rotina e para fazer feliz o meu filho. A casa estava
cheia. Mas o grande quintal e os campos em volta fazem que o espaço
chegue para todos. O mesmo quintal e campos em volta que foram território
verões
de aventura para a minha avó e suas irmãs, para a minha mãe e seus irmãos
e primas, até ser o meu, dos meus irmãos e dos meus primos e, hoje, o do
meu filho e dos seus primos.
Todos esperámos pela hora em que (com a digestão feita) podíamos
mergulhar no gelado tanque de granito. Todos aprendemos a andar de
bicicleta naqueles caminhos. Todos sabemos o nome das suas árvores e
ficamos verdadeiramente tristes quando morre alguma. Todos tocámos
ao gongo na varanda grande, só pelo prazer de ouvir ecoar o som metálico
pelo meio das japoneiras. Todos nos sentimos em casa quando a brisa de
Ageratina ligustrina nos passa pelo nariz. E todos partilhamos os mesmos
verões, mesmo que em tempos, décadas e gerações diferentes.
O permanente som da água a cair (das bicas que enchem o tanque)
e o céu muito estrelado fazem-me ter vontade de relento. Nos agostos
da infância, estendíamos mantas no terraço para ver a chuva de estrelas
cadentes. Líamos mais porque não havia televisão. Dormíamos a sesta na
cama de rede. Jogávamos badmínton. Andávamos de canoa no rio. Dávamos
passeios na mata. Arranhávamos muito os joelhos. Brincávamos aos cafés
de água com terra. Dormíamos em beliches, todos no mesmo quarto.
Almoçávamos sopa e sanduíches com alface, tomate, fiambre, ovo cozido
e mostarda, bebíamos água com groselha e apanhávamos amoras pelo
caminho. Às vezes, andávamos à bulha. Quando anoitecia e ainda estávamos
em parte incerta, a minha avó gritava pela janela os nossos nomes, um a um,
até ver o carreirinho dos aventureiros a regressar. Revirávamos as arcas do
sótão para vestir roupas antigas. Festejávamos o aniversário do Pedro, com
festas de arromba e gelados caseiros. Muitas vezes tínhamos ideias estúpidas
ou projetos mirabolantes. E uma vez hipnotizámos um pato como tínhamos
visto num documentário. Quase sempre brincávamos no espigueiro.
Foi esse espigueiro, aliás, que incluí num dos versos do poema “Ser criança
é ser feliz” e que tantos elogios me valeram junto da professora Teresinha. E
não era só lirismo vão. Até hoje posso garantir que ver o pôr do Sol atrás das
ripas daquele espigueiro, sentada na eira quente, é programa que não desilude.
Os figos também não. Aparecem sempre para nos adoçar a boca quando o
verão está prestes a terminar e é altura da vindima.
Quando era criança, adorava a vindima. Todos a encher cestas de verga.
A subir para a carroça do trator, para andar aos solavancos pelos caminhos
ensobrados de videiras. Quando era criança, aquele quintal e os campos em
Apesar de já não ter volta eram muito maiores do que me parecem hoje, e ainda tinham gatos.
Quando era criança, não tinha medo de gatos e ficava a fazer-lhes festas nas
a capacidade de ser escadas da cozinha. Quando era criança, era profundamente feliz ali. Como
feliz como só uma vejo o meu filho a ser. E, apesar de já não ter a capacidade de ser feliz como só
criança consegue, uma criança consegue, ainda sinto um enorme conforto cada vez que entro
naquele portão. A sombra do velho cedro, o chão cor de rosa sob o rododendro,
ainda sinto um as buganvílias a emoldurar o alpendre, o ponto de fuga da ramada, o perfume
enorme conforto das glicínias nos dias de calor e o conjunto dos elementos que compõe aquele
lugar são o habitat da infância preservada. Esse lugar seguro ao qual podemos
cada vez que entro regressar para ficar mais perto dos longos verões da memória e do conforto de
naquele portão não ter de pensar na chegada do outono. [email protected]

(20210930-PT) VisÃ o 1491

Enviado por

Direitos autorais:

Formatos disponíveis

(20210930-PT) VisÃ o 1491

Enviado por

Dados do documento

Título original

Direitos autorais

Formatos disponíveis

Compartilhar este documento

Compartilhar ou incorporar documento

Opções de compartilhamento

Você considera este documento útil?

Este conteúdo é inapropriado?

Direitos autorais:

Formatos disponíveis

(20210930-PT) VisÃ o 1491

Enviado por

Direitos autorais:

Formatos disponíveis

ESPECIAL IMOBILIÁRIO PREÇOS DAS CASAS

DISPARAM NA PERIFERIA DE LISBOA E PORTO

O HOMEM QUE MUDOU O JOGO

Na perseguição de um vilão misterioso, James

BOUTIQUE OMEGA • Av. da Liberdade, 192A • Lisboa

52 Rumo às periferias das grandes cidades

OPINIÃO Online W W W.V I S A O . P T

4 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

A revolução das periferias

Exposição World Press Photo, em Oeiras

Já nas bancas esquecidas. Não admira que a abstenção

6 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

8 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

30 SETEMBRO 2021 VISÃO 9

10 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

RECOMENDAÇÃO A sua família está a aumentar e a falta de espaço já se faz

Duração da obra Obras rápidas e sem inconvenientes

Em suma, a adaptação do seu sótão esquecido é a melhor solução para ampliar

Esta sensação de incerteza

12 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

30 SETEMBRO 2021 VISÃO 13

14 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

16 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

O IVA foi, mas volta A partir de 1 de outubro, já pode usar o saldo do

123 123 123

€680 milhões SaltPay

30 SETEMBRO 2021 VISÃO 17

VITÓRIAS, DERROTAS, PERFUME E BAFIO

18 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

“O objetivo está cumprido”

30 SETEMBRO 2021 VISÃO 19

Mauricio Botton Milionário benemérito

20 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

Fontes: BBC, Diário de Notícias, Record, Jornal i, Novo Magazine, Público

Corrida aos ﬁlmes no Espaço

Centenas de mamíferos ameaçados por atropelamentos 49 452

22 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

SE JÁ VIU, TEM DE IR VER

A banda rock britânica

24 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

30 SETEMBRO 2021 VISÃO 25

ALTERNATIVAS desastre, também

Quando faltam mãozinhas... um pouco fora de mão. cessante da câmara

COMO FEZ forma a assegurar que nada falta, pelo

COMBUSTÍVEIS Onde é que nós já vimos isto? M.B.M.

O grito dos Oceanos

28 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

30 SETEMBRO 2021 VISÃO

A vitória do engenheiro civil de 51 anos, que

tar disponível para comentar esta vitória do

32 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

A “FÁBRICA nos de 35 anos, que

7 mandatos ARROIOS PENHA

O RISCO DE ABANDONAR A GULBENKIAN

PELO INCERTO COMPENSOU. MOEDAS

PÕE FIM A 14 ANOS DE PS NA CÂMARA

30 SETEMBRO 2021 VISÃO 33

34 VISÃO 30 SETEMBRO 2021

Borges; ajudou a criar o Eurohypo AG, um