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ANÁLISE DE LIVROS DIDÁTICOS DA EJA SOB O

OLHAR DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA: EXISTE


TRANSVERSALIDADE?

Fabíola Andrade 1
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ)
https://orcid.org/0000-0003-4355-1366
Teo Bueno de Abreu 2
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ)
https://orcid.org/0000-0002-8120-9986
Pedro Hollanda Carvalho 3
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ)
https://orcid.org/0000-0002-0051-9932

1
Doutoranda em Ciências Ambientais e Conservação (UFRJ). Possui graduação em Ciências
Biológicas pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Especialização em
Educação de Jovens e adultos pelo IFF e é Mestra em Ciências Ambientais pela UFRJ.
Atualmente é professor de ciências físicas e biológicas da Prefeitura Municipal de Conceição de
Macabu e Agente de desenvolvimento rural da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
do Estado do Rio de Janeiro.
2
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro fazendo parte do corpo docente da
UFRJ/Campus Macaé e ministrando disciplinas do núcleo pedagógico das licenciaturas em
Ciências Biológicas dessa instituição. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em
Educação em Ciências. Mestrado e Doutorado em Educação em Ciências e Saúde pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Graduação em Ciências Biológicas pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro.
3
Professor adjunto no NUPEM-UFRJ (Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade - UFRJ).
Bacharel em Zoologia-Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mestre
em Ciências Biológicas pela Universidade de Genebra. Doutor em Genética e Evolução pela
Universidade de São Paulo.
1
Revista Ambiente & Educação
Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental – PPGEA/FURG
v. 27, n. 2; dezembro de 2022.
Recebido em: 07/08/2021
Aceito em: 06/10/2022
Resumo: Os Temas Contemporâneos Transversais (TCT) têm como objetivo articular os
diferentes componentes curriculares de forma integrada, bem como conectá-los às situações
vivenciadas pelos estudantes em suas realidades. Este trabalho se ocupa em identificar se o
TCT “Meio Ambiente” está sendo abordado de forma transversal nos livros didáticos PNLD- EJA
2014-2016, que compreendem todas as disciplinas do currículo do ensino fundamental II, do 6º
ao 9º ano de escolaridade. E ainda, se tal TCT está sendo abordada sob o viés crítico, à luz da
Educação Ambiental Crítica e transformadora. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, onde foi
feita uma análise de conteúdo do material (livro didático) em categorias temáticas. De acordo
com os dados obtidos neste estudo, pôde-se concluir que em geral o material apresenta
conteúdos ligados ao meio ambiente, porém de maneira conservadora e pouco articulada às
questões sociais, econômicas e políticas.
Palavras-chave: EJA. Transversalidade. Educação Ambiental.

ANALYSIS OF EJA TEXTBOOKS FROM THE PERSPECTIVE OF CRITICAL


ENVIRONMENTAL EDUCATION: IS THERE TRANSVERSALITY?

Abstract: The Transversal Contemporary Themes (TCT) aim to articulate the different curricular
components in an integrated manner, as well as connect them to the situations experienced by
students in their realities. This work is concerned with identifying whether the TCT “Environment”
is being addressed in a transversal way in the textbooks PNLD-EJA 2014-2016, which cover all
the subjects of the curriculum of elementary school II, from the 6th to the 9th grade. And yet, if
such TCT is being approached from a critical perspective, in the light of Critical and transformative
Environmental Education. This is a qualitative research, where a content analysis of the material
(textbook) was carried out in thematic categories. According to the data obtained in this study, it
could be concluded that, in general, the material presents contents related to the environment,
but in a conservative way and poorly articulated to social, economic and political issues.
Keywords: Youth and adult education. Transversality. Environmental Education.

NOTAS INTRODUTÓRIAS
A Educação no Brasil em seus vários contextos históricos não apresenta,
necessariamente, uma proposta democrática, libertadora, transformadora,
especialmente a ofertada para as massas. De maneira geral, os sistemas
educacionais sempre estiveram submetidos aos interesses econômicos de cada
época, constituindo um modelo predominantemente mercadológico, e
assimilando algumas características próprias de países em desenvolvimento,
que a partir de uma enorme desigualdade na distribuição da renda, geram
imensas deficiências no sistema educacional.
Segundo a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA)
(BRASIL,1999), a educação se propõe, em sua forma mais abrangente,

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Aceito em: 06/10/2022
favorecer ao indivíduo a análise crítica sobre seu lugar no mundo e considerar o
significado de desenvolvimento sustentável e as formas de manejá-lo,
construindo assim, uma população informada, ativa e preocupada não somente
com a geração atual, mas também com as gerações futuras.
Ainda nesse contexto, a Educação Ambiental crítica se faz urgente, tendo
em vista a evolução das demandas ambientais que surgem com o passar do
tempo e o crescente esgotamento de recursos naturais em razão do modelo de
desenvolvimento exploratório adotado especialmente no último século, em uma
sociedade que se baseia na expansão econômica pela produção e consumo de
mercadorias (Loureiro, 2015). A inserção crítica se dá na reflexão de que as
relações sociais e a superação de formas de dominação (típicas do capitalismo)
propicia aos indivíduos a compreensão das inúmeras possibilidades e
potencialidades individuais (LOUREIRO, 2015). E assim como defende
Layrargues & Lima (2011):
A educação, ao não problematizar os padrões societários
ambientais, adota uma postura conservadora, centrada no
indivíduo, no alcançar a condição de ser humano integral e
harmônico, pressupondo a existência de finalidades
previamente estabelecidas na natureza e de relações ideais. As
práticas pedagógicas, ao se eximirem da crítica aos processos
em desenvolvimento na sociedade, atenuam as raízes dos
problemas ambientais e deixam de lado seu compromisso de
transformação social (LAYRARGUES & LIMA, 2011).

Considerando que Educação Ambiental (EA) é um tema transversal


curricular proposto desde os PCNs em 1997, objetiva-se com este estudo uma
análise crítica dos livros didáticos (LD) ofertados na rede pública para o público
da EJA, no que concerne à abordagem de temas em EA/Meio Ambiente. No
caso, buscamos identificar de que maneira tais temas se apresentam nestes
materiais e sob que vertente de EA - conservadora, pragmática ou crítica
(Sanchez 2019), tomando como referência a Base Nacional Comum Curricular
(BNCC) sobre os Temas Contemporâneos Transversais (TCT) - Meio
Ambiente/EA. Buscamos identificar de que maneira os conteúdos de Educação
Ambiental nos livros da EJA articula a transversalidade de seus temas. Esta
análise se torna relevante no sentido de propor uma reflexão crítica acerca de

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v. 27, n. 2; dezembro de 2022.
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se e como a EA está sendo abordada nesta modalidade de ensino através do
LD.

A PROBLEMÁTICA AMBIENTAL INCORPORADA À EDUCAÇÃO


Muitos autores entendem a Educação como sendo o caminho para a
construção da autonomia, criticidade, protagonismo social dos educandos e
como meio para transformação da realidade atual. Essa concepção de uma
educação libertadora está muito presente nas obras de Freire (1974), onde o
aluno é protagonista desse processo, sendo agente de transformação, e essa
ideia fica muito explícita no trecho da obra Pedagogia da autonomia, onde o
célebre autor afirma: “É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o
que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática.”
(FREIRE, 1996, p. 61). A Educação, portanto, é antes de tudo um ato político e
social.
Na mesma obra, Freire (1996) define que “[...] como experiência
especificamente humana, a educação é uma forma de intervenção no mundo”
(p.61). Sob essa ótica, Freire nos coloca frente a reflexão de que a Educação
portanto não apenas interfere na realidade, mas é essencial para reinventá-la.
Desta forma, o conceito de educação perpassa pelo processo de construção do
conhecimento e mudança da realidade. Sendo a EA um campo que relaciona as
questões ambientais com as questões educacionais, temos uma síntese dessa
proposta no PNEA, lançado pelo governo federal no final da década de 1990.
Em vários de seus estudos, Loureiro (2015) reafirma a pertinência do
embasamento da educação ambiental nos pressupostos da pedagogia crítica e
transformadora, e conforme defende Trein (2012, citado por Loureiro, 2015):
Ler a realidade de forma crítica nos ajuda a explicitar as relações
sociais mercantilizadas e alienantes que perpassam a forma
hegemônica de organizar a sociedade. Por isso entendemos que
incorporar a dimensão ambiental na educação é expressar o caráter
político, social e histórico que configura a relação que os seres
humanos estabelecem com a natureza mediada pelo trabalho. [...]
(TREIN, 2012, p. 316).

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A PNEA é regida pela lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999. Os
conteúdoenglobam: conceito, objetivos, princípios, atuação e sua relação com a
educação.
Art. 1º. Entendem-se por educação ambiental os processos por meio
dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais,
conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a
conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial
à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. (PNEA, 1999, p. 1).

Nesse sentido, a Educação Ambiental (EA) demanda que esta seja


instrumentalizada e praticada da mesma forma: sob o viés crítico, autônomo e
de transformação social, compreendendo a complexidade política, social e
ecológica intrínsecas nesta prática.

O LIVRO DIDÁTICO NO CONTEXTO ESCOLAR


No dia a dia escolar o livro didático apresenta-se como o principal
instrumento utilizado por professores e alunos no processo de ensino e
aprendizado, servindo muitas vezes como base na condução do currículo e
planejamento dos conteúdos a serem aplicados ao longo do ano letivo, estando
sempre muito presente em sala de aula (MARPICA & LOGAREZZI, 2010). Dada
a importância e sua alta adesão dentro do contexto escolar e considerando as
diretrizes nacionais no âmbito da EA, espera-se que este instrumento didático
seja munido de conteúdos em EA com uma abordagem crítica e transversal,
permeando toas as disciplinas do currículo escolar do estudante.
Quando tratamos especificamente de livro didático voltado para o público
de EJA, observa-se ainda uma condensação dos conteúdos, a fim de que caibam
no calendário escolar encurtado, próprio dessa modalidade de ensino, o que
naturalmente os torna, de alguma forma, um pouco menos aprofundados, dada
a impossibilidade de esmiuçá-los pela falta de tempo hábil, além de
possivelmente estar em desacordo com a realidade escolar dos alunos desta
modalidade, conforme defende Souza (2011). Temos aí uma outra questão:
como inserir os temas transversais em tais conteúdos, já que o calendário
escolar diminuído impossibilita o desmembramento das ideias contidas no
currículo?

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Em meio a esse cenário, o livro didático se revela como uma boa
oportunidade de inserção da transversalidade necessária para tratar uma
temática complexa como é a questão ambiental na atualidade, sobretudo na
abordagem de uma educação ambiental problematizadora, crítica e
transformadora, isto é, que encara a questão ambiental sem dissocia-la das
questões sociais, culturais, éticas e políticas, dada a sua importância e urgência,
tal como descrevem Carvalho (2004); Guimarães (2004); Loureiro (2006);
Sorrentino, Ferraro Júnior & Portugal (2005); Tozoni-Reis (2004) e outros, já que
é o instrumento didático mais comumente utilizado pelos docentes (MARPICA &
LOGAREZZI, 2010). A transversalidade, nesse contexto, vem como uma forma
de inserir a problemática ambiental em momentos diferentes do dia a dia escolar,
permeando todas as disciplinas/áreas de conhecimento, tornando-a presente e,
evidentemente, necessária tanto para os discentes como para os docentes e
gestores, pois o engajamento deve ser de todos, se estendendo para além dos
muros da escola.

EJA: PANORAMA, REALIDADES E PERSPECTIVAS


A Educação de Jovens e Adultos é assegurada na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDBEN), na Sessão V do capítulo II:
Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que
não tiveram acesso ou continuidade de estudos no Ensino
Fundamental e Médio na idade própria.
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e
aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular,
oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as
características do alunado, seus interesses, condições de vida e de
trabalho, mediante cursos e exames (BRASIL, 1997).

O retorno dos jovens e adultos a escola nem sempre se resume ao fato


de almejarem um trabalho ou realocar-se no mercado de trabalho. Apesar destas
serem algumas das razões, elas não são as únicas. Já dizia Paulo Freire em seu
livro “A Pedagogia do Oprimido” (1996) que não há nada melhor para o
desenvolvimento dos educandos que o respeito aos conhecimentos com os
quais o educando chega aos bancos escolares, sendo dever do educador e

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mesmo da Unidade Educacional o de instigar para que essa bagagem de vida
seja ampliada e até mesmo melhor entendidos em um contexto amplo.
Uma leitura dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) (BRASIL,
1997) a respeito dessa questão mostra que os motivos que levam jovens e
adultos ao retorno à escola referem-se predominantemente às suas expectativas
de conseguir um emprego melhor. Mas suas motivações, porém, não se limitam
a esse aspecto, pois muitos referem-se também à vontade mais ampla de
“entender melhor as coisas”, e “se expressar melhor” (BRASIL, 1997, p. 42).
Ampliando o nosso campo de visão e indo para além dos motivos
imediatistas do retorno desse alunado às salas de aulas da EJA, encontramos a
concepção de Rummert, Ventura (2007, p. 13) que ilustram bem essa realidade:

O caráter utilitarista e empobrecido da concepção de educação


proposta para os jovens e adultos brasileiros está amplamente
coerente com a opção de sermos uma economia inserida no
mercado mundial de forma associada e subordinada às nações
centrais, posição que nos coloca predominantemente ligados às
atividades econômicas neuromusculares, as quais necessitam
de pouco investimento em educação. Trata-se de uma
concepção de Educação para Jovens e Adultos trabalhadores
restrita às necessidades do modelo societário do capital, que nos
coloca, predominantemente, como consumidores e não como
produtores de tecnologia. (RUMMERT, VENTURA, 2007, p. 13).

Como docentes, ao observar as características da EJA no município de


Conceição de Macabu, RJ, concluímos que o perfil obedece a esse padrão de
“objetivos” dos alunos com o retorno às salas de aula, como se o ciclo básico
pudesse ser “concluído”, dando um aspecto de terminalidade do processo de
educação, que serviria, de imediato, para postos de trabalho melhores, com
melhor remuneração, proporcional à escolaridade alcançada, sem a
preocupação ou incentivo à continuidade dos estudos para níveis mais elevados
e inserção, por exemplo, na universidade e na pesquisa. Observa-se que esse
seria um cenário enxergado pelos próprios alunos (e, de alguma forma,
legitimado pelos professores e gestores) como “impossível” de se inserir.

EA E TRANSVERSALIDADE NO COTIDIANO ESCOLAR

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Segundo o Ministério da Educação, os Temas Contemporâneos
Transversais (TCT) têm como objetivo articular os diferentes componentes
curriculares de forma integrada, bem como conectá-los às situações vivenciadas
pelos estudantes em suas realidades, “contribuindo para trazer contexto e
contemporaneidade aos objetos do conhecimento descritos na Base Nacional
Comum Curricular - BNCC” (BRASIL, 2019).
Nessa linha, os TCTs na BNCC demonstram como objetivo cumprir a
legislação que versa sobre a Educação Básica, garantindo aos estudantes os
direitos de aprendizagem, do acesso ao conhecimento e “a formação para o
trabalho, para a cidadania e para a democracia e que sejam respeitadas as
características regionais e locais, da cultura, da economia e da população que
frequentam a escola” (BRASIL, 2019).
Os Temas Contemporâneos Transversais então se estruturam em seis
macro áreas temáticas, conforme a figura abaixo e são articulados pela
Coordenação-Geral de Educação Ambiental e Temas Transversais da Educação
Básica, no Ministério da Educação:
Figura 1: Os Temas Contemporâneos Transversais.

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Aceito em: 06/10/2022
Fonte: BNCC (BRASIL, 2019, pag. 7)4.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais – Tema Transversal Meio


Ambiente:
os conteúdos de Meio Ambiente serão integrados ao currículo através
da transversalidade, pois serão tratados nas diversas áreas do
conhecimento, de modo a impregnar toda a prática educativa e, ao
mesmo tempo, criar uma visão global e abrangente da questão
ambiental (BRASIL, 1997, p. 36).

Dessa maneira, propõe-se que a educação ambiental deva ter um caráter


transversal e permanente na escola, “não constituindo uma disciplina, mas
permeando todas as já existentes” relacionando-a às questões da atualidade
(BRASIL, 1997).
Procuramos analisar o material sob a luz da EA crítica, pois consideramos
que esta é a que se aproxima melhor e com maior coerência da proposta de
educação libertadora, autônoma e crítica, já proposta por Freire (1996). Foi feita
uma correlação deste com o que rege a BNCC em seus TCT, se atendo ao TCT
Meio Ambiente (MA)/EA.
Considerando as diretrizes para a educação ambiental, já lançadas em
vários documentos oficiais até o momento, atreladas neste estudo às
especificidades do perfil de aluno da EJA, buscamos através do material
analisado respostas sobre como se dá a abordagem de temas em MA nas várias
disciplinas do currículo, procurando entender esta discussão no livro didático
ofertado a este público, num contexto de transversalidade.

PERCURSO METODOLÓGICO

CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
Este estudo é de caráter qualitativo e trata-se de uma análise documental
baseada na análise de livros didáticos da EJA sobre a transversalidade da
abordagem de temas em EA. Optamos por analisar a transversalidade da EA em

4
Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/implementacao/guia_pratico_
temas_contemporaneos.pdf
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todas as áreas do conhecimento, nos apoiando na metodologia da Análise do
Conteúdo (BARDIN, 2011) explorando aspectos textuais e discursivos dos livros
didáticos.

MATERIAL ANALISADO

O presente estudo considerou os quatro livros do ensino fundamental- 2º


segmento “EJA Moderna”, publicado pela Editora Moderna no ano de 2013 e
selecionado pelo Plano nacional do Livro Didático EJA (PNLD) – 2014/2016.
Nessa coleção, os livros de cada ano de escolaridade, apresentam todos os
conteúdos do currículo de cada disciplina em um único volume.
Figura 2: Coleção EJA Moderna.

Fonte: https://www.moderna.com.br/pnldeja2014/ejamodernaanosfinaisensinofundamental/

Os livros da coleção apresentam todas as oito (8) disciplinas curriculares


divididas em duas unidades, conforme o quadro abaixo:

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Quadro 1: estrutura dos livros didáticos quanto aos temas abordados nas
unidades.
Ano I II Quantidade de
Unidade páginas
6º ano Identidade e Alimentação 448
Pluralidade
7º ano Moradia Saúde e qualidade de vida 422
8º ano O país A sociedade Brasileira 424
9º ano Trabalho Desenvolvimento e 432
Sustentabilidade
Fonte: Elaborado pela autora.

Ou seja, em cada livro as disciplinas Língua Portuguesa (LP), Matemática


(M), História (H), Geografia (G), Ciências(C), Artes (A), Inglês (I) e Espanhol (E)
são organizadas em duas unidades de acordo com a temática de cada ano. Do
ponto de vista estrutural, os livros apresentam um equilíbrio na quantidade de
páginas em todos os anos.
A análise dos livros desenvolveu-se em três etapas: Pré-análise, que
consistiu em fazer o reconhecimento inicial do material a ser analisado, tal como
coloca Franco (2007, p. 52):
A primeira atividade da pré-análise que consiste em estabelecer
contatos com os documentos a serem analisados e conhecer os
textos e as mensagens neles contidas, deixando-se invadir por
impressões, representações, emoções conhecimentos e
expectativas [...].

Após a primeira etapa, os conteúdos considerados na avaliação foram


divididos em 5 categorias temáticas, (padrões e tópicos presentes) (Bogdan &
Biklen, 1994) por método dedutivo (Moraes & Galiazzi, 2011), e então seguimos
com a exploração do material, onde foi possível confirmar as categorias
temáticas antes determinadas e, por último, tratamento dos resultados (BARDIN,
2011). Tais categorias temáticas são as que se seguem:

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Aceito em: 06/10/2022
Quadro 2: categorias temáticas utilizadas na análise dos livros.
Categorias de análise Foco da análise
1- solo usos, preservação
2- água usos, preservação
3- ar impactos na sua qualidade
4- Fauna e flora usos da cobertura vegetal, sua preservação e seus
impactos no equilíbrio ambiental; extinção de espécies
5- Desenvolvimento com economia/ equilíbrio de uso dos recursos naturais
base sustentável
Fonte: Elaborado pela autora.

Como na literatura não foi encontrado quais temas em EA são os temas-


chave para se trabalhar, a escolha de categorias foi baseada nas unidades
temáticas da BNCC- Área do conhecimento Ciências Naturais – 7º ano, unidade
temática Vida e evolução/ Terra e universo, cujos temas considerei se
relacionarem diretamente com a problemática ambiental, contemplando
conteúdos básicos em educação ambiental, sendo suas habilidades esperadas
referenciadas pelos códigos a seguir (Quadro 3). O objetivo principal foi
identificar qual enfoque é dado quando os livros se referem a temas ligados ao
Meio Ambiente:

Quadro 3: Unidade temática “Terra e Universo”, 7º ano, área do conhecimento


Ciências Naturais
(EF07CI07Caracterizar os principais ecossistemas brasileiros quanto à paisagem, à quantidade
de água, ao tipo de solo, à disponibilidade de luz solar, à temperatura etc., correlacionando essas
características à flora e fauna específicas.);
(EF07CI08 Avaliar como os impactos provocados por catástrofes naturais ou mudanças nos
componentes físicos, biológicos ou sociais de um ecossistema afetam suas populações,
podendo ameaçar ou provocar a extinção de espécies, alteração de hábitos, migração etc.);
(EF07CI12Demonstrar que o ar é uma mistura de gases, identificando sua composição, e discutir
fenômenos naturais ou antrópicos que podem alterar essa composição.);
(EF07CI13 Descrever o mecanismo natural do efeito estufa, seu papel fundamental para o
desenvolvimento da vida na Terra, discutir as ações humanas responsáveis pelo seu aumento
artificial (queima dos combustíveis fósseis, desmatamento, queimadas etc.) e selecionar e
implementar propostas para a reversão ou controle desse quadro.);
(EF07CI14 Justificar a importância da camada de ozônio para a vida na Terra, identificando os
fatores que aumentam ou diminuem sua presença na atmosfera, e discutir propostas individuais
e coletivas para sua preservação. (BNCC, 2108)
Fonte: BNCC (BRASIL, 2019, p. 347)

RESULTADOS E DISCUSSÃO

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DADOS QUANTITATIVOS
Ao analisar os 4 livros de forma quantitativa, identificamos quantas vezes
algum tema em Meio Ambiente aparecia nos conteúdos das disciplinas. Com
base nessa amostragem construímos o seguinte quadro (Quadro 4):

Quadro 4: Quantidade de vezes que algum tema em meio ambiente é citado


dentro do conteúdo dos livros didáticos analisados.
Disciplina 6º 7º 8º 9º
/ano
Unidad Unidade Unida Unida Unida Unida Unida Unidade II
e I- II - de I de II de I- de II – de I
Identida Alimenta Mora Saúde O A Traba Desenvolvi
de e ção dia e país socied lho mento e
Pluralid qualid ade Sustentabili
ade ade de brasilei dade
vida ra
Língua P. 0 0 5 13
Matemát. 5 2 0 4
História 2 1 0 7
Geografia 7 2 1 11
Ciências 10 4 3 17
Arte 0 0 0 0
Inglês 0 1 0 7
Espanhol 0 0 0 10
Fonte: Elaborado pela autora.
Ao categorizar os temas citados nos livros, conforme metodologia
adotada, baseada em Bardin (2011), chega-se aos seguintes dados gráficos:

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Gráfico 1: distribuição da ocorrência das categorias temáticas em cada
disciplina no livro do 6º ano.

Análise do livro 6ª fase


quantidade de vezes que cada categoria é

10
identificada no livro, em cada disciplina

9
8
7
6
5
4 4
4
3 3
3
2 2 2
2
1 1 1 1 1
1
000 000 0 000 00000000 0 0 000 0 0 00 0
0
solo água ar Fauna e flora Desenv.
Sustentável
categorias temáticas

L. Port. Mat. His. Geo. Ciênc. Art. Ing. Esp.

Fonte: Elaborado pela autora.

Ao observar a gráfico acima, percebe-se que a categoria temática “ar” não


foi abordada em nenhuma das disciplinas, nem mesmo na disciplina de Ciências.
Gráfico 2: distribuição da ocorrência das categorias temáticas em cada
disciplina no livro do 7º ano.

Análise do livro 7ª fase


10
quantidade de vezes que cada categoria é
identificada no livro, em cada disciplina

9
8
7
6
5
4
3 2 22 2 2
2 1 1 1 1 1
1 0000 000 0 000 000 0000 0 00 000 0 0000 0
0
solo água ar Fauna e flora Desenv.
Sustentável
categorias temáticas

L. Port. Mat. His. Geo. Ciênc. Art. Ing. Esp.

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Fonte: Elaborado pela autora.

Após a condensação dos dados, observa-se que nos primeiros anos de


escolaridade do Ensino Fundamental- 2º segmento há pouca menção a temas
em Meio Ambiente/Ecologia, chamando atenção para as disciplinas de Arte, e
Línguas estrangeiras, onde nos 3 primeiros anos (6º, 7º e 8º) praticamente não
houve qualquer abordagem ao tema. A disciplina de Língua Portuguesa também
chama a atenção para a baixa abordagem ao tema, especialmente nos livros de
6º e 7º anos, com nenhuma menção. Tais temas poderiam ser abordados nessas
disciplinas, por exemplo, ao se trabalhar textos em línguas (Português e
estrangeiras), trazendo textos que se referem a alguma problemática ambiental,
já que as unidades temáticas de cada livro propiciam essa abordagem.
Mais uma vez, as disciplinas Artes e espanhol não trataram de nenhum
tema ambiental em seu conteúdo.
Gráfico 3: distribuição da ocorrência das categorias temáticas em cada
disciplina no livro do 8º ano.

Análise do livro 8ª fase


quantidade de vezes que cada categoria

10
é identificada no livro, em cada

9
8
7
6
5
disciplina

4
3 2 2
2 11 1 1 1 1
1 00 000 000 000 00000000 000 000 000000 0
0
solo água ar Fauna e flora Desenv.
Sustentável

categorias temáticas

L. Port. Mat. His. Geo. Ciênc. Art. Ing. Esp.

Fonte: Elaborado pela autora.

Em uma escala macro de análise dos gráficos apresentados, podemos


perceber que o livro do 8º ano é o que menos apresenta alguma discussão sobre
a questão ambiental, tendo a maioria das disciplinas sem qualquer menção a
isso. Como era de se esperar, a disciplina de Ciências lidera a quantidade de

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vezes em que temas em Meio Ambiente /Ecologia aparecem nos 4 livros, exceto
no livro do 8º ano, onde é a disciplina de Língua Portuguesa quem aborda mais
o tema, quantitativamente, o que comprova que há possibilidade de se abordar
tais temas, independente da disciplina. Provavelmente isso se dá por causa do
conteúdo curricular da disciplina de ciências neste ano de escolaridade, que se
refere principalmente à anatomia e fisiologia do corpo humano. A categoria “ar”
mais uma vez não foi citada em nenhuma das disciplinas do livro da 8ª fase,
evidenciando que é um tema muito pouco trabalhado.
Gráfico 4: distribuição da ocorrência das categorias temáticas em cada
disciplina no livro do 9º ano.

Análise do livro 9ª fase


10
10
quantidade de vezes que cada categoria é
identificada no livro, em cada disciplina

9
8
7 6 6
6 5 5
5
4 3 3 3 33 3 3
3 2 2 2 2
2 1 1 11 1 1 1 1 1
1 0 0 0 0 0 00 0 0 0 0000 0
0
solo água ar Fauna e flora Desenv.
Sustentável
categorias temáticas

L. Port. Mat. His. Geo. Ciênc. Art. Ing. Esp.

Fonte: Elaborado pela autora.

O livro do 9º ano é o que apresenta uma maior quantidade de assuntos


que abordam o tema Meio Ambiente, na maioria das disciplinas (excetuando-se
a disciplina de Arte, onde nenhuma menção é feita), sendo um total de 69
menções. Isso pode ser explicado pelos temas centrais escolhidos para as 2
unidades do livro: o primeiro, “Trabalho”, onde observa-se pouca preocupação
em relacionar tal tema com MA, e o segunda unidade vem com o tema
“Desenvolvimento e Sustentabilidade”, onde aí sim se observa a maioria das
abordagens em MA.

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A seguir, tentamos ir mais a fundo e compreender melhor o que esses
dados quantitativos nos dizem, o que os números podem revelar, sob o ponto de
vista qualitativo, para uma visão mais abrangente deste cenário.

DADOS QUALITATIVOS
A partir da análise dos quatro livros disponibilizados oficialmente através
do PNLD 2014-2016, identificamos dados que relacionavam conteúdos
identificados com caráter ambiental/ecológico ao TCT Meio Ambiente/EA da
BNCC. Buscamos nessa sessão dialogar com este documento e reconhecer
traços da transversalidade do Tema EA nas disciplinas do currículo da EJA. A
partir dessas análises desenvolvemos uma discussão sobre as diferentes formas
que essa transversalidade é realizada nos Livros didáticos da EJA.

LIVRO DO 6º ANO
Ao analisar o livro do 6º ano , observa-se que na primeira disciplina Língua
Portuguesa (LP), na primeira unidade nada é mencionado e na segunda unidade,
cujo tema é “Alimentação”, são citados rapidamente os alimentos orgânicos,
restringindo à questão da saúde individual, como o consumo de alimentos mais
saudáveis e com menos agrotóxicos, sem problematizar ou relacionar a
produção os impactos no solo, lençol freático, coletividade, e portanto não
consideramos aqui como menção ao Meio Ambiente (Figura 3).
Figura 3: trecho do livro onde o assunto “alimentos orgânicos” é tratado.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 6º, p. 66.

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A segunda disciplina Matemática (M), curiosamente, faz algumas
abordagens em temas ambientais já na primeira unidade, quanto ao consumo e
descarte de lixo, reciclagem ao explorar o uso de tabelas (Figura 4).
Figura 4: trecho do livro sobre reciclagem de lixo, expondo o tema através do
uso de tabela.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 6º, p. 95.

Ao explorar o uso e interpretação de gráficos, fala da quantidade de água


consumida para a produção de alimentos e ainda sugere uma pesquisa sobre
formas de se economizar água, na p. 104, tal qual também observa Santos
(2011) em seu trabalho, onde em uma atividade proposta no livro analisado pela
autora, na qual usa um o tema “consumo de água” para ensinar interpretação de
gráficos, o que estimula o sujeito (aluno) a refletir sobre temas diversos e
consequentemente perceber a funcionalidade da Matemática em situações do
cotidiano. Na unidade 2, o livro discute rapidamente o desperdício de alimentos
no mundo, para ensinar o conteúdo de Frações. Porém, como também
observado no trabalho de Melo e Groenwald (2012) onde as autoras identificam
que os conteúdos em meio ambiente contidos no livro de matemática por elas
analisado “o espaço não é oportunizado pelos autores para o diálogo e a
discussão do tema”, fato que pôde ser também observado no material por nós
analisado, uma vez que se limita ao uso do tema ambiental apenas para objetivo
de ensinar frações. Apesar disso, as autoras consideram a abordagem do TCT
Meio Ambiente como sendo articulado e contextualizado aos conteúdos de
matemática, de forma crítica.
A terceira disciplina História (H) fala suscintamente sobre a redução de
áreas de floresta, desde a invasão e colonização europeia no Brasil até os dias

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atuais (p. 172). Já na segunda unidade, o livro trata de produção e consumo
sustentáveis de alimentos (p. 198) de maneira muito rápida, sem problematizar.
A disciplina de Geografia (G) traz uma caracterização do território brasileiros nas
suas 12 primeiras páginas. Na página 223 é falado rapidamente sobre a
“Amazônia Legal” e a proteção da Amazônia e seu desenvolvimento. Na página
230 é retomado o assunto “Amazônia” e aí sim relaciona problemas ambientais
deste Bioma e seus impactos em outras regiões do país, especialmente no
regime de chuvas. Na página 245 (unidade 2) o livro aborda a questão dos
recursos naturais na produção de alimentos/agricultura tradicional. Nas
atividades propostas para os alunos das páginas 250 e 251 é proposta uma
reflexão com palavras-chave: agricultura familiar, sustentabilidade, mercado
interno e sobre os impactos ambientais causados pelas novas tecnologias nas
atividades rurais e uso de transgênicos.
A partir da página 253 o livro trata diretamente sobre a produção de
alimentos e os impactos ambientais, relacionando-os. Até aqui podemos
considerar que a problemática ambiental tomou a tendência politicamente
conservadora, ao exemplo do que discute Loureiro (2003, p. 37) em seu trabalho,
onde podemos identificar no livro essas tendências politicamente conservadoras
“que dissociam o social do ambiental, sob bases conceituais idealizadas e
dualistas entre sociedade e natureza”.
Figura 5: trecho em que trata sobre a produção de alimentos e seus
impactos ambientais.

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Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 6º, p. 253.

Na próxima disciplina, Ciências (C), como é de se esperar, é feita uma


caracterização da paisagem natural do Brasil, discutindo a ação antrópica desde
a ocupação do país pelos exploradores estrangeiros no século XVI. Já na
unidade 2, p. 293, o livro traz uma discussão sobre contaminação de água,
propondo aos alunos que escrevam sobre as consequências para as cadeias
alimentares do local afetado. Nas indicações de material extra, das 8 indicações,
5 estão diretamente relacionadas à ecologia e conservação. Observa-se aqui um
maior engajamento e preocupação em propor discussão mais integrada entre
MA, política e sociedade, mesmo que de maneira sucinta. Essa tendência de tais
conteúdos aparecerem predominantemente nas disciplinas de Ciências e
Geografia corrobora com o que FAZENDA (1991, p.56) chama atenção, quando
diz que é “difícil pensar em interdisciplinaridade quando fomos acostumados a
pensar a educação compartimentalizada, produto da escola tecnicista”.
Figura 6: trecho do livro onde é discutido o assunto “poluição da água”.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 6º, p. 293.

Nas três últimas disciplinas do livro Artes (A), Inglês (I) e Espanhol (E)
nada é mencionado a respeito de MA e sociedade. Amorim (2019) cita em seu
estudo de caso que professores de Inglês de uma rede municipal de ensino
também deixam de abordar TCT durante a sua observação em sala.
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De maneira geral, observa-se que a categoria “fauna e flora” é a que
possui maior frequência de menções no livro por inteiro, porém a abordagem,
em geral é feita de maneira mais conservadora, tal como identifica Matos et al
(2017) em seu trabalho em análises de livros sobre o tema transversal MA, e
apontam também que o material evidencia uma concepção de ação e reação,
onde a natureza é destruída pelo homem e, em consequência, causa problemas
para a sociedade. Concepções de natureza intocada e intervenção artificial se
entrelaçam para obter soluções aos problemas apontados.

LIVRO DO 7º ANO
Em nenhum momento na disciplina de Língua Portuguesa o tema de MA
é tratado. Portanto, não foi identificada nenhuma categoria temática nessa
disciplina. O mesmo ocorre com a segunda disciplina (M). na disciplina de
História, fala-se rapidamente sobre saneamento básico ao longo dos séculos no
país (o que consideramos a categoria “água” como mais pertinente). Seguindo
para a disciplina seguinte (G), identificamos a abordagem de questões
ambientais referentes a qualidade e poluição da água e ar no processo de
urbanização e aglomeração populacional, especialmente nas páginas 208 e 233,
onde trata dos custos dos danos ambientais e outros fatores que afetam a
qualidade de vida das pessoas, relacionando com a desigualdade social,
abordagem que se aproxima um pouco da criticidade esperada na introdução da
EA nos conteúdos didáticos.

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Figura 7: trecho do livro onde é discutido o assunto poluição atmosférica e da
água.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 7º, p. 208.

Ao analisar a disciplina de Ciências, percebemos mais uma vez a visão


conservadora e reducionista da abordagem dos temas ambientais, onde
especialmente na página 250 há um texto que transfere a responsabilidade da
diminuição das reservas de água para os cidadãos comuns, não se preocupando
em problematizar a questão do grande volume de água utilizado na irrigação de
plantações, por exemplo, ou o uso indiscriminado desse recurso pelas indústrias
e o seu descarte na maioria das vezes irresponsável.

Figura 8: trecho do livro em que se discute a economia de água mencionando o


uso doméstico.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 7º, p. 250.

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Para finalizar, na segunda unidade, cujo tema central é saúde e
“Qualidade de vida”, o livro nesta disciplina fala de saúde humana sem relacioná-
la ao ambiente em geral como fator de bem-estar social e humano.
Seguindo nas próximas disciplinas (A, I e E), na primeira nada foi
identificado como tema ambiental. Na segunda, Inglês, na página 354 fala-se de
meio ambiente e economia de maneira bastante superficial, quando trata de
sistemas de energia solar e moradias sustentáveis. Na última disciplina do livro,
Espanhol, nada é mencionado.
Figura 9: trecho do livro em que é apresentado um exemplo de “moradia
sustentável”, com o uso de fontes alternativas de energia.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 7º, p. 354.

LIVRO DO 8º ANO
Conforme identificado, na primeira disciplina (LP) há 5 menções sobre
assuntos relacionados a temas ambientais, entre eles a questão do
desmatamento para beneficiamento de madeira, esgoto doméstico e sobre
ativismo ecológico, especialmente na segunda unidade (“A sociedade
brasileira”). Mais uma vez, de maneira pouco aprofundada e sem relacionar tais
assuntos com a sociedade e a política, a abordagem é limitada e de forma mais
conservadora, tal como sugere REIGOTA (2001, p.112), “sem uma
transformação das consciências e dos comportamentos das pessoas” não
haverá quebra de paradigma social que leve a transformações de ordem
econômica, política e cultural. Tais concepções são indissociáveis.
A segunda disciplina (M) não traz nenhuma abordagem sobre temas
ambientais, e o mesmo ocorre com a próxima disciplina (H). A disciplina de
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Geografia fala de desigualdade social, porém sem mencionar a questão
ambiental atrelada a ela. A disciplina de Ciências, na qual normalmente fica
incumbida a tarefa de introduzir tais temas em MA, é a que de fato, mais uma
vez, apresenta algum conteúdo sobre poluição atmosférica, saneamento básico,
e biopirataria, porém, mais uma vez, sem problematizar. As três últimas
disciplinas (A, I, E) não possuem qualquer conteúdo relacionado a temas
ambientais.

Figura 9: trecho do livro de Ciências relacionando saneamento básico e


doenças infecciosas.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 8º, p. 288.


LIVRO DO 9º ANO
O livro do 9º ano traz duas unidades temáticas. São elas: “Trabalho” e
“Desenvolvimento e Sustentabilidade”. De imediato, já se supunha que, ao
menos na segunda unidade, encontraríamos abordagens relacionadas a temas
ambientais. Bastava saber qual a forma de abordagem, e se a EA estava de fato
sendo trabalhada de maneira crítica ou não.
Ao analisar a primeira disciplina (LP), na primeira unidade não se
menciona nada relacionado a Meio ambiente. Já na segunda unidade, a
disciplina explora assuntos como o desenvolvimento sustentável, introduzindo
uma ideia de diálogo entre empresas, sociedade e governos para a questão da
geração de energia, com o incentivo à adoção de fontes “limpas e renováveis”,
que é uma tendência pós-moderna. Ainda nesta disciplina, o livro traz um texto
sobre o novo código florestal e explora o uso de agrotóxicos. Na página 60, o

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livro traz uma reflexão mais crítica sobre o atual modelo de desenvolvimento,
provocando os estudantes a pensarem mais sobre seus impactos no meio
ambiente.

Figura 10: texto sobre o atual modelo de desenvolvimento e seus impactos


ambientais.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 9º e p. 60.

A segunda disciplina (M) traz um texto curto sobre energia solar em sua
segunda unidade, para apresentar o conceito de funções. A próxima disciplina
(H) discute o modelo desenvolvimentista e seus impactos ambientais, com um
total de 7 menções.
A disciplina de Geografia fala de consciência ambiental, separação de
lixo, porém não problematiza, por exemplo, a coleta e destinação seletiva dos
resíduos não só domésticos, mas também industriais e agrícolas.

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Figura 11: trecho do livro em que discute “consumo consciente”
doméstico/individual.

Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 9º, p. 295.

A disciplina de Ciências é, como já se esperava, a que mais aborda as


questões ambientais atuais, falando, por exemplo, da desigualdade nos padrões
de consumo, além da interação política X sociedade (páginas 291 a 294) e
página 295 traz um texto sobre consumo doméstico consciente, diminuição de
desperdício etc.
Figura 12: página do livro de ciências em que apresenta uma “receita de bolo”
para um mundo mais sustentável.

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Fonte: Coleção EJA Moderna PNLD 2014 – 9º, p. 294.

A próxima disciplina, Artes, mais uma vez não aborda temas em Meio
ambiente. A disciplina de Inglês aborda a questão dos padrões de consumo e a
última disciplina (E) traz textos que falam sobre consumo doméstico de água,
separação de lixo e outras abordagens conservadoras e desarticuladas das
questões ambientais, se aproximando com o que questiona Loureiro (2003, p.
38) sobre a abordagem do tema “lixo” nas escolas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tomamos como direção, neste estudo, destacar a Educação Ambiental
no seu viés transformador e crítico, de acordo com os pressupostos teóricos que
nos deram o embasamento para tal, de modo a identificá-la no material didático
lançado no último PNLD-EJA, através do TCT “Meio Ambiente”, sob uma análise
atenta que dialoga com os documentos oficiais que tratam do assunto, bem
como com as questões ambientais contemporâneas intrínsecas no dia a dia não
somente dos alunos da EJA, mas também de todos os integrantes da
comunidade escolar. Em um momento em que procuramos trazer a discussão
toda a urgência da problemática ambiental numa perspectiva muito mais
abrangente do que se costuma fazer, entendemos que a Educação Ambiental é
o meio pelo qual podemos instigar e multiplicar informações e desconstruções
acerca de uma visão conservadora que não tem mais espaço atualmente.
Por fim, através dos apontamentos feitos neste estudo, identificando neste
material analisado a transversalidade, quando identificada, ocorre numa
abordagem conservadora do tema central (Meio Ambiente), majoritariamente
dentro da disciplina de Ciências, nos quatro livros analisados, o que já era de se
esperar. Porém, algo que nos chamou muito a atenção foi a disciplina de Arte
não ter abordado em nenhum dos seus conteúdos algum tema em MA, além das
línguas estrangeiras terem pouquíssimas abordagens de tais temas. Esperamos
aqui contribuir, dentro das limitações deste texto, para o interesse e para a
reflexão daqueles que, de alguma forma, identificam na sua trajetória profissional
e acadêmica o quão necessário é sempre trazer à tona tal discussão,
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especialmente na conjuntura econômica, ambiental e social atual em que
vivemos, a nível global, considerando o processo educativo indispensável para
a sua superação.

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Aceito em: 06/10/2022
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