Ivone Sousa - Violência Nas Escolas Brasileiras
Ivone Sousa - Violência Nas Escolas Brasileiras
Ivone Sousa - Violência Nas Escolas Brasileiras
doi.org/10.51891/rease.v9i11.12722
RESUMO: O presente artigo analisa possíveis fatores motivacionais para os recentes ataques às
escolas brasileiras tomando como base o contexto nacional e suas implicações no campo político.
As profundas transformações no cenário nacional dos últimos anos tiveram influência também
no comportamento dos sujeitos e precisam ser consideradas. Compreender as especificidades do
cenário escolar brasileiro e a relação com a construção identitária de adolescentes e jovens é
fundamental para a construção de argumentos sobre as violências que se multiplicam e fazem
vítimas na comunidade escolar. Para tanto, a metodologia utilizada foi a de pesquisa
bibliográfica sobre a violência escolar, o contexto político brasileiro e a juventude. Os resultados
obtidos permitem abordar as políticas armamentistas, o incentivo aos discursos de ódio contra
minorias, bem como o avanço da extrema-direita no país. Tais aspectos contribuíram para um
aumento nos casos de violência nas escolas. 3656
ABSTRACT: This article analyzes possible motivational factors for the recent attacks on
Brazilian schools based on the national context and its implications in the political field. The
profound transformations in the national scenario in recent years have also influenced the
behavior of subjects and need to be considered. Understanding the specificities of the Brazilian
school scenario and the relationship with the identity construction of adolescents and young
people is fundamental for building arguments about the violence that multiplies and causes
victims in the school community. To this end, the methodology used was bibliographical
research on school violence, the Brazilian political context and youth. The results obtained
make it possible to address arms policies, the encouragement of hate speech against minorities,
as well as the advance of the extreme right in the country. These aspects contributed to an
increase in cases of violence in schools.
1Lienciadaem Geografia pela Universidade Estadual da Bahia, Especialização em Gestão e Educação Ambiental
pela Faculdade de Administração, Ciencias, Educação e Letras, Mestranda do Curso Mestrado em Ciências
Educação da COLLEGE EDUCALER UNIVERSITY.
2Doutora em Educação (Universidade de Barcelona), Mestre em Terapia Coporal e Psicomotricidade (Universidade
Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação. São Paulo, v.9.n.11. nov. 2023.
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RESUMEN: Este artículo analiza posibles factores motivacionales de los recientes ataques a escuelas
brasileñas a partir del contexto nacional y sus implicaciones en el campo político. Las profundas
transformaciones vividas en el escenario nacional en los últimos años también han influido en el
comportamiento de los sujetos y requieren ser consideradas. Comprender las especificidades del
escenario escolar brasileño y la relación con la construcción de identidad de adolescentes y jóvenes es
fundamental para construir argumentos sobre la violencia que se multiplica y causa víctimas en la
comunidad escolar. Para ello, la metodología utilizada fue la investigación bibliográfica sobre la violencia
escolar, el contexto político brasileño y la juventud. Los resultados obtenidos permiten abordar las
políticas armamentísticas, el fomento del discurso de odio contra las minorías, así como el avance de la
extrema derecha en el país. Estos aspectos contribuyeron a un aumento de los casos de violencia en las
escuelas.
Palabras clave: Violencia. Educación. Juventud.
INTRODUÇÃO
Como recorte da sociedade, no cenário escolar é possível vivenciar muitas das mazelas
que ocorrem no espaço exterior a ela, o que torna as dinâmicas internas ainda mais desafiadoras.
Muitos momentos que envolvem violências no interior da escola são reflexos de situações
trazidas do exterior. É o que tem ocorrido, nas situações recentes de violências com mortes
dentro de instituições de ensino.
Muitos destes casos, que somam mais de 50 vítimas desde 20113, tem como assasssinos
estudantes, ex-estudantes e funcionários das escolas. Como agentes motivadores, situações de
bullying sofridas ainda enquanto estudantes, condições de trabalho ou agentes externos que é o
que verificaremos mais detidamente neste artigo.
O aumento significativo de casos de violência nas escolas nos últimos anos, levaram a
diversas reflexões de pesquisadores sobre o impacto que o aumento da violência fora das escolas,
teve neste ambiente. A descoberta da relação de assassinos com grupos armamentistas e
vinculados a ideologias de extrema-direita que disseminam discursos de ódio contra minorias,
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acendem o alerta para as causas dos atentados e a necessidade de criação de uma frente mais
ampla para o seu combate.
O crescimento do acesso às redes sociais, assim como o acesso descontrolado às armas
contribuiu para a formação de grupos que incentivam violências e estimulam a sua propagação
em diversos espaços. Neste interim, a escola, pela vulnerabilidade de sua estrutura, se tornou um
local considerado alvo para disseminação da cultura de violência.
MÉTODOS
RESULTADOS E DISCUSSÃO
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Segundo Veloso e Pimentel (2023, p. 01): “Foram 12 atentatos realizados desde 2011 em
unidades de ensino em todo o país, sendo o massacre de Janaúba (MG) o mais fatal, com 13
mortes”4.
O último ataque ocorrido no Brasil aconteceu numa creche em Santa Catarina, no dia 05
de abril de 2023, cometido por um homem de 25 anos que invadiu a instituição e desferiu golpes
de facas contra crianças de 04 a 07 anos que estavam brincando no parque da creche. Apesar das
tentativas de professoras e demais funcionárias de conter o assassino, não foi suficiente para
impedir que houvessem vítimas fatais. Além das quatro mortes mais quatro crianças foram
atacadas e ficaram feridas com o atentado5.
Este crime ocorreu menos de um mês depois de uma morte ocorrida numa escola de São
Paulo, quando um adolescente de apenas 13 anos, recém ingresso na instituição, matou uma
professora a facadas na tentativa de atingir também estudantes. Um dos crimes em escolas mais
letais do Brasil e mais conhecidos ocorreu na cidade de Realengo, no Rio de Janeiro, um ex-
estudante da instituição invadiu a escola armado e atingiu mortalmente 12 adolescentes com
idade entre 13 a 16 anos, mais 12 estudantes ficaram feridos no atentado.
Os crimes ocorreram na Escola Municipal Tasso da Silveira, o atirador, um jovem de
3659
apenas 23 anos, cometeu suicídio ainda dentro da instituição. Em seus pertences foi encontrada
uma carta em que ele afirmava que tinha sido vítima de bullying durante o período escolar e que
esta teria sido a motivação para o crime6.
O ataque mais letal, no entanto, como dito anteriormente ocorreu em Janaúba, em Minas
Gerais. O vigilante de uma creche, de 50 anos, jogou gasolina no próprio corpo e nos corpos de
mais 10 crianças. Na tentativa de resgatar as crianças, mais três adultos foram mortos,
totalizando 13 mortes mais a morte do próprio vigilante. Ou seja, o atentado resultou em 14
mortes. Este crime aconteceu no ano de 20177.
A violência nas escolas do Brasil não é um fenômeno isolado. Nem no que diz respeito à
motivação, muito menos nas consequências que traz para todo o quadro da escola e para a
sociedade. Os últimos ataques, sobretudo, geraram uma onda de pânico e dissseminou notícias
falsas de que novos ataques viriam repercutindo em toda a população.
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Após os ataques, ondas de ameaças passaram a circular nas redes sociais e nos grupos de
comunicação instantânea, incitando a realização de novos crimes ou a ameaça deles. Pela
repercussão midiática, alguns deles foram impedidos de ocorrer outros não passaram de
ameaças. O último ataque ocorrido em abril de 2023, inclusive, motivou uma mudança de
comportamento da imprensa brasileira, a partir deste episódio não mais divulgarm nomes, idade
ou quaisquer informações acerca dos criminosos, já que, foi constatado que a visibilidade dada às
imagens é um dos fatores que motivam a realização de crimes desta natureza.
Um relatório apresentado ao atual governo, discute possíveis causas para a onda de
crimes no país. Intitulado “O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil:
ataques às escolas e alternativas para a ação governamental”, foi produzido por pesquisadores da
educação de todo o país engajados em discutir a temática e pensar sobre soluções para o
problema. Com objetivo de subsidiar a discussão para construção de políticas públicas no campo
da educação, o relatório buscou apresentar como os ataques estão relacionados com um contexto
social que se entrelaça com o avanço do ultraconservadorismo e extremismo de direita.
A falta de criminalização da disseminação de discurso de ódio e sua difusão nas mídias
sociais favoreceu esta situação. O discurso de ódio propagado pelo ex-presidente da república,
3660
fez com que casos de violência tenham crescido substancialmente. Além da propagação do ódio,
vimos a derrocada de investimentos nas áreas de combate a violência contra a mulher, combate a
homofobia e outros crimes ligados às minorias.
A investigação de cooptação de grupos da extrema-direita foi confirmada com o caso de
violência no dia 25 de novembro de 2022 com os ataques a duas instituições Escola Estadual de
Ensino Fundamental e Médio Primo Bitti e do Centro Educacional Praia de Coqueiral,
localizadas no município de Aracruz, no Espírito Santo. Os ataques resultaram em quatro
mortes e 12 feridos. O autor dos atentatos, um adolescente de 16 anos, afirmou que tinha sido
cooptado pela extrema-direita.
Os alvos de cooptação pelo discurso de extrema-direita são majoritariamente
adolescentes brancos e heterossexuais, e a misoginia exerce um papel crucial no
processo. Frustração sexual e raiva do mundo, dentre outros processos típicos da
adolescência, são mobilizados em espaços de discussão online onde muitos desses jovens
se reúnem para desabafar ditas frustrações e confraternizar (BRASIL, 2022, p. 17).
Ainda neste relatório, destaca-se que as mulheres foram as maiores vítimas da violência e
que associações ligadas aos discursos do ex-presidente, também, se deram através das constantes
declarações de ódio. Alguns meios de cooptação, comumente utilizados, como o uso de humor, a
estética e falas violentas, linguagem do que se conhece como machosfera: um grupo delimitado
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que se reúne em fóruns de discussão, que costumam utilizar dialeto misógino e racista de
supremacista branco.
Além disso, outras formas de cooptação utilizadas são as postagens conhecidas como
trollagens, utilizando polêmicas para incentivar as discussões e assim identificar perfis com
predisposição à violência. Os fóruns que envolvem jogos online com incitação de violência é
outra forma bastante utilizada para atrair potenciais alvos com disposição para realização de
crimes.
O Conselho de Direitos Humanos da Assembleia Geral da ONU, em Relatório sobre o
tema já enfatizava, em 2019-20, sobre as estratégias de atração e engajamento de jovens
em sites mantidos por lideranças neonazistas, com uso de músicas, games, atividades
lúdicas, uso de personagens de desenhos animados e memes. Nessa perspectiva, o
crescente uso das comunidades de “gamers” e dos chats de conversa em “games” têm
funcionado como mecanismo de “sedução” de jovens de todo mundo, a fim de angariar
simpatia a ideias de extremismo de direita, de forma ainda mais intensificada durante o
período da pandemia da Covid-19 (BRASIL, 2022, p. 18).
O período de pandemia contribuiu para o avanço destes grupos pela ampliação do acesso
as redes sociais em decorrência do isolamento. O aumento da quantidade de tempo que
adolescentes e jovens permaneceram em frente às telas foi um prato cheio para a cooptação
através dos fóruns. O método dos grupos extremistas para cooptação, neste sentido, foi
favorecido. Quando a identificação ocorre no fórum mais amplo, a interação passa a ocorrer de 3661
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Como afirma Francine Nesello (et. al, 2014) a violência é um fenômeno inerente à vida
humana, ela pode se expressar em diferentes contextos por diferentes motivações. Depois do
ambiente familiar, a escola é o ambiente onde crianças e adolescentes permanecem mais tempos
no convívio social.
Nas últimas décadas, tem crescido o interesse em compreender a violência no contexto
escolar, não só por suas implicações no processo de integração de crianças e adolescentes
à sociedade, mas pela íntima relação que apresenta com o fracasso de objetivos mais
amplos da escola, como educar, ensinar e aprender (NESELLO et al, 2014, p. 120).
Para Becker e Kassouf (2016) a escola tem um papel fundamental na identificação de
quem são potenciais agressores ou que apresentem comportamentos violentos e por meio do
ensino e monitoramento pode prevenir que novos casos de violência ocorram. Além disso, as
autoras defendem que monitorar o engajamento de adolescentes e jovens pode ser um fator
fundamental para diminuir o potencial para ações violentas. Por outro lado, o que denominam
“efeito concentração” a integração de muitos adolescentes e jovens no mesmo espaço pode
favorecer a incidência de casos de violência.
É importante destacar ainda que o “efeito concentração” pode contribuir para a redução
do comportamento violento dos jovens se no ambiente escolar não predominarem as
ações violentas e a escola fornecer bons exemplos de conduta aos alunos, inibindo a
agressividade através de punições e incentivos ao bom comportamento (BECKER;
KASSOUF, 2016, p. 655). 3662
O estudo das pesquisadoras destaca como a escola é um recorte social que está envolvido
num cenário, mais amplo, que tem relação direta com o que acontece no seu entorno. É
importante observar que fatores econômicos sociais e econômicos interferem diretamente nesta
dinâmica, logo, o contexto nacional e o avanço da violência, de modo geral, impactam nas
relações que se estabelecem nesse ambiente.
Becker e Kassouf (2016, p. 656) destacam como a construção identitária da juventude é
um momento que favorece a influência de terceiros na tomada de atitudes que podem ser
benéficas ou maléficas: “Como o jovem não tem experiência suficiente para basear suas decisões
na própria vivência, muitas vezes, ele observa o comportamento dos indivíduos ao seu redor e os
considera como modelos de determinada conduta”.
Como exemplo, as autoras utilizam a referência de filhos que convivem em um ambiente
violento e acabam por reproduzir tais comportamentos como reflexo da linguagem, dos gestos e
atitudes que acompanham dentro das suas casas.
Sobre este aspecto, o relatório do governo de transição intitulado “O extremismo de
direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação
governamental”, ressalta:
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Diversos pesquisadores tem se dedicado aos estudos no campo da educação, por isso
compreender este cenário de forma mais aprofundada é fundamental para o desenvolvimento de
políticas públicas que colaborem para melhores condições de ensino e aprendizagem para
profissionais da educação e estudantes.
As pesquisas sobre violência no ambiente escolar já enfatizaram que este é um fenômeno
atravessado por diversos fatores que têm influência de questões que estão no interior e no
exterior da escola.
Um fenômeno que tem avançado significativamente no universo recente, no entanto,
precisa ser aprofundado: os casos de violências e mortes que fazem cada vez mais vítimas no
ambiente escolar, repetindo casos que eram mais recorrentes somente no cenário internacional,
estes devem ser analisados com base nos fatores que no contexto nacional são relevantes.
A falta de estrutura das insituições de ensino, sobretudo públicas, favorecem o acesso
destes grupos que acabam reproduzindo o modo operacional frequentemente observado fora do
país, principalmente, nos Estados Unidos.
O avanço da extrema-direita associado ao discurso de ódio propagado nos últimos anos
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confirmadamente contribuíram para o avanço da violência nas escolas com o apoio, em alguns
momentos, de grupos extremistas. É fato que o país se tornou mais violento e o acesso às armas
colaborou com este cenário que alcançou as escolas de forma impactante.
Analisar detidamente este contexto é fundamental para a compreensão de como será
possível agir para limitar, quando não, eliminar todas as possibilidades que colocam em risco a
comunidade escolar e toda a sociedade.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, M. Introdução à Metodologia do Trabalho Científico. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2017.
BECKER, Kalinca L.; KASSOUF, Ana L. Violência nas escolas públicas brasileiras: uma análise da
relação entre o comportamento agressivo dos alunos e o ambiente escolarv.26 n.2 p.653-677 2016.
Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/0103-6351/2591. Acesso em: maio de 2023.
MASSACRE em escolas brasileiras aumentam no último ano. In: JORNAL Casarão. Universidade
Federal Fluminense 13 de junho de 2023. Disponível em: https://jornalocasarao.uff.br. Acesso em: junho
de 2023
NESELLO, Francine (et al.). Características da violência escolar no Brasil: revisão sistemática de
estudos quantitativos. Rev. Bras. Saúde Matern. Infant., Recife, 14 (2): 119-136 abr. / jun., 2014. Disponível
em: https://doi.org/10.1590/S1519-38292014000200002. Acesso em: maio de 2023.
VELOSO, Natália; PIMENTEL, Juliana. Brasil teve 5 ataques com mortes em escolas em 2022 e 2023.
Disponível em: https://www.poder360.com.br/brasil/brasil-teve-5- . Acesso em: junho de 2023.
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