Antropologia Bíblica - para Impressão

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1

A DOUTRINA DO HOMEM COM RELAÇÃO A DEUS


(Antropologia Bíblica)
Jairo Costa1
I - A Origem do Homem

A. A doutrina do Homem na Dogmática


“Quando contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, e a lua e as estrelas
que estabeleceste, que é o homem, que dele te lembres? E o filho do homem, que o
visites?” (SI 8.3,4). Ao contemplar o incomensurável espaço sideral, crendo ser isso
obra dos dedos de Deus; e na imensidão do universo pontuar os grandes gigantes
estabelecidos por Deus como luzeiros e marcadores do tempo, o salmista Davi deixa
transparecer ao senso comum a impressão de que é ilusório pensar o homem, dada
a sua pequenez, pois o homem parece ser apenas um pequeno detalhe no grande
cenário. Do grande cenário, passa para o pequeno cenário, a Terra. Na terra o
salmista concebe que a grandeza da graça e da misericórdia do Deus
transcendente, transcende a toda a realidade macro cósmica e Deus desce de forma
imanente, e visita, e habita com o homem considerando atentamente cada detalhe
de sua miséria e dor.
A antropologia bíblica propõe que o homem é criação de Deus, separado de
Deus e dele dependente e que sobre o homem Deus exerce sua soberania e
providência. Contudo, na contramão da teologia está a mentalidade naturalista de
que o homem é um ser separado de Deus, possuindo existência própria e vivendo
como um autônomo-autômato, independente e criando suas próprias leis e sendo
regido por elas sem a influência externa.
Horton considera que estamos vivendo uma catástrofe universal com a
mudança de mente, mudança que afeta frontalmente a concepção hodierna da
antropologia, daí esse autor especifica.

No momento presente, estamos contemplando uma mudança


sísmica na antropologia ocidental de uma concepção do Ego como
estável, semidivino, entidade espiritual que transcende o corpo e o
tempo para a ideia de um ego como sendo nada mais que uma
construção social e interações químicas. Na prática, pelo menos, a
soberania e a autonomia do ego governam tanto relato Platônico
quanto o materialista: nenhum dos dois está preparado para receber
a individualidade, a humanidade e a pessoalidade do outro -
especialmente de Deus - como um dom e como uma
responsabilidade.2

O teólogos iniciam suas magnas obras considerando a necessidade de


estudar a origem do homem como elemento fundamental para a compreensão da
antropologia bíblica. Chafer aponta que a “resposta para o problema da origem do
homem é de importância imensurável, pois de sua resposta depende toda a
estrutura da antropologia. Necessariamente, a natureza do homem, a sua
responsabilidade e destino estão determinados pelo fato fundamental de seu ser
essencial da forma em que foi criado.”3

1
O autor é professor no IBEL
2
HORTON, Michael. Doutrinas da fé cristã. Tradução João Paulo Thomaz de Aquino. São Paulo:
Editora Cultura Cristã, 2016. p. 395.
3
CHAFER, Lewis Sperry. Teologia Sistemática. Tradução Heber Carlos de Campos. São Paulo:
Hagnos, 2003. p. 540. vols. 1 e 2.
2

Questões fundamentais da ordem da política, economia e principalmente da


ordem ética são respondidas com formatos diferentes pela compreensão que se tem
da origem do homem, tais como: a sociedade, a violência, a exploração do mais
fraco, luta de classe, distribuição da renda, a família, o aborto, o sexo, a validade do
casamento, a lei Maria da Penha, etc.
Ferreira lista alguns conceitos e os rumos que os mesmos podem tomar
demonstrando:
1) O kardecismo afirma que as almas das pessoas não são criadas no momento da
concepção, mas já existiam antes de chegar a este mundo.
2) O naturalismo, que nega a existência de qualquer realidade espiritual, diz que o
ser humano é apenas matéria. Desde Demócrito 4, um filósofo grego, até hoje, vários
eruditos têm proposto a ideia de que o homem é produto do acaso, num universo
sem Deus.
3) O panteísmo propõe que o homem é resultado de um processo espiritual, mas,
ainda assim, impessoal. O Uno impessoal5 deu origem a vários seres espirituais,
sendo que alguns desses assumiram corpos físicos.
4) O islamismo difere do cristianismo na doutrina de Deus justamente na
antropologia. O homem foi criado, mas não como imagem de Alá, pois este é
transcendente. A mulher criada para o conforto do homem.
5) No mormonismo de Joseph Smith a antropologia é literal. Deus teria um corpo de
carne e osso e, assim, a imagem de Deus na humanidade também incluiria seu
corpo físico. Na doutrina mórmon a matéria é eterna, cheia de divindades e capaz de
obter inteligência. O próprio Young ensina que “jamais houve uma ocasião em que
não existiu essa matéria [...] Ela é reunida e organizada e tornada capaz de receber
conhecimento, para ser entronizada em glória, para dela serem feitos anjos,
deuses”. A matéria é eterna, o próprio Deus que veio da matéria reuniu e coordenou
esta matéria produzindo a criação do planeta Terra tal qual é conhecido.
Humanidade - “Nós fomos gerados primeiro como bebês espirituais no céu e então
nascemos naturalmente na terra”.6
Acrescenta-se a isso o desenvolvimento do “mecanicismo”. Teoria segundo a
qual todos os fenômenos que se manifestam nos seres vivos são mecanicamente
determinados e, em última análise, essencialmente de natureza físico-química e isto
fornece a explicação biológica dos fenômenos vitais pelas leis mecânicas, isto é, não
precisa recorrer ao espírito. No campo da teologia foi teoria estimada pelos deístas.

4
Demócrito de Abdera (460-370 a.C.) é o filósofo pré-socrático e fundador da escola atomística. Sua
tese é a de que o átomo é a causa última da realidade. Átomos são partículas invisíveis e indivisíveis
presentes em toda a realidade. Nada do que existe possui existência sem a presença do átomo. A
implicação mais aguda do atomismo de Demócrito é a negação da doutrina da providência: como o
mecanicismo que prega tudo o que existe no universo nasce do acaso e da necessidade. Isto é,
“nada nasce do nada, nada retorna ao nada, tudo tem uma causa e os átomos são a causa última do
mundo.” Assim, os postulados de Demócrito abrem caminho para a negação da intervenção de Deus
no ato criativo que implica até mesmo na sua própria existência.
5
Uno é um conceito filosófico grego que é fundamentado pela primeira vez no diálogo Parmênides
por Platão e primordial em sua Teoria das Ideias. Relacionado à Mônada do pitagorismo e ao
questionamento da unidade versus multiplicidade (problema do um e muitos) pelos pré-socráticos, foi
desenvolvido posteriormente por outros platonistas e neopitagóricos, especialmente no
neoplatonismo por Plotino(205-270) e seus sucessores. Henologia=hen=um) refere-se ao estudo do
Um. Plotino define o "Uno" como uma entidade suprema, totalmente transcendente, além de todas as
categorias do Ser e Não-ser. O primeiro princípio do qual todas as coisas existentes derivam. Ele é
relacionado ao conceito de Absoluto e de Causa Primeira.
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Um_(filosofia)>.
6
Journal of Discourses, vol. 4, p. 218. Apud. Disponível em:
<https://carm.org/languages/portuguese/doutrinas-estranhas-do-mormonismo> Acesso: 30 abril 2016.
Ibid. p. 77.
3

A Antropologia é contemplada com profundidade pela Teologia Sistemática.


Dentro de seu arcabouço esta doutrina ocupa sempre um segundo momento.
Considerando-se que a Teologia Sistemática sempre contempla num primeiro
momento a teontologia (estudo sobre o ser de Deus), ou a teologia (estudo sobre
Deus) propriamente dita. Dr. Campos com perspecácia observa: “a transição da
teontologia para a antropologia é absolutamente necessária, porque a primeira
prepara o terreno para a segunda. [...] Os departamentos da sistemática estão
absolutamente interligados”. 7
Berkhof considera natural estudar antropologia (estudo sobre o homem)
depois de ter estudado Teologia (estudo sobre Deus) Esse autor elenca três razões
da importância de estudar uma antropologia bíblica: 1 O homem é a coroa da
criação e objeto de um especial cuidado de Deus. 2 A revelação de Deus na
Escritura é endereçada ao homem com interesse vital. 3 É um registro da redenção
que Deus preparou para o homem. 8
Chafer, considera o estudo da origem do homem como fundamental para a
antropologia bíblica e aponta que existe duas únicas explicações para a origem do
homem: a revelação que é uma série de verdades razoáveis e harmoniosas e a
outra é a teoria da evolução que é uma hipótese, conjectura, pura suposição
especulativa; “é a melhor solução que a mente não regenerada, espiritualmente não
iluminada e finita pode construir.” 9
Antropologia teológica difere da antropologia geral, pois enquanto esta tem o
homem como um fim em si mesmo a antropologia teológica estuda o homem e sua
relação com Deus. Berkhof orienta que ela “ocupa-se unicamente do que a Bíblia diz
a respeito do homem e da relação em que ele está e deve estar com Deus. Ela só
reconhece a Escritura como a sua fonte, e examina os ensinamentos da experiência
humana à luz da palavra de Deus. 10
Há quem faça uso de uma nomenclatura diferente para identificar o estudo da
doutrina do homem. Horton prefere a expressão “antropologia da aliança” 11 por
entender que se trata da relação pactual do homem com Deus. Ferreira e Myatt usa
o termo “antropologia teológica”. 12
O Apóstolo Paulo define perfeitamente a origem do homem ao dizer que
“somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras” (Ef 2.10).
Considerando que o termo “feitura” no texto original é poi,hma poema que aponta a
criação do homem como tendo sido de caso pensado como a construção de um
poema com rima, métrica e entonação. A expressão grega “poema” é aplicada pelo
Apóstolo Paulo também em Rm 1.20 numa dupla de expressão usando kti,sij e
poi,hma criação e feitura, demonstrando o cuidado de Deus na criação do homem e
sua perfeição, o que faz do homem indesculpável por não compreender e ou admitir
o criacionismo. Além do que Paulo propõe que o homem foi criado na base certa,

7
CAMPOS, Heber Carlos de, Antropologia Bíblica [Estudo da Doutrina do Homem e do Pecado] p.
12.
8
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Tradução Odayr Olivetti. 3. ed. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2007. p. 167.
9
CHAFER, Lewis Sperry. Teologia Sistemática. Tradução Heber Carlos de Campos. São Paulo:
Hagnos, 2003. p. 540. vols. 1 e 2. Lewis Sperry Chafer (1871-1952) foi discípulo de Cyrus Ingerson
Scofield (1843-1921 autor da Bíblia Scofield), Tanto Scofield quanto Chafer eram pastores ordenados
pela Igreja Presbiteriana. A linha de teologia de Chafer é calvinista, pré-milenista e
dispensacionalista.
10
Idem.
11
HORTON, Michael. Doutrinas da fé cristã. Tradução João Paulo Thomaz de Aquino. São Paulo:
Editora Cultura Cristã, 2016. p. 395.
12
FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan. Teologia sistemática: uma análise histórica, bíblica e
apologética para o contexto atual. São Paulo: Vida Nova, 2007. p. 386.
4

“em Cristo” com propósito definido “para boas obras”. Estas “boas obras” é = para a
Glória de Deus.

O Catecismo Maior de Westminster - CMW na pergunta 17 propõe:


Como criou Deus o homem?
Depois de ter feito todas as mais criaturas, Deus criou o homem, macho e
fêmea; formou-o do pó, e a mulher da costela do homem; dotou-os de almas
viventes, racionais e imortais; fê-los conforme a sua própria imagem, em
conhecimento, retidão e santidade, tendo a lei de Deus escrita em seus corações e
poder para a cumprir, com domínio sobre as criaturas, contudo sujeitos a cair. Gn
1.7; 2.7,32; 1.26-28; 3.6; Mt 19.4; Ec 12.9; Mt 10.28; Cl 3.10; Ef 4.24; Rm 2.14-15

A origem do homem é apresentada na Bíblia como criação de Deus num


duplo relato (Gn 1.26,27 e 2.7, 21-23. Berkhof menciona que a alta crítica vê nestes
dois capítulos narrativas de fontes distintas independentes e contraditórias. O
teólogo contradiz essa posição e esclarece mostrando que a possível contradição
vista pela alta crítica entre Gênesis 1 e 2 é aparente: “A primeira narrativa contém o
relato da criação de todas as coisas na ordem em que ocorreu, enquanto que a
segunda agrupa as coisas em sua relação com o homem, [...] como o rei da
criação.”13

Bavinck observa uma semelhança e ao mesmo tempo grande diferença entre


a criação do homem e dos animais. Esse autor destaca como ponto focal que a
criação culmina na criação do homem.

A criação culmina na humanidade, em que o mundo espiritual e o


material são unidos. De acordo com o relato da criação, em Gênesis
1, a “humanidade”, homem e mulher, foi criada no sexto dia (Gn
1.26ss.), depois da criação dos animais terrestres. Por meio dessa
organização, a Escritura ensina também a existência de estreita
relação entre homem e animal. Ambos foram criados no mesmo dia;
ambos foram formados do pó da terra. Mas, juntamente com essa
semelhança, há também uma grande diferença. Ao comando de
Deus, os animais foram produzidos pela terra (Gn 1.24). O homem,
porém, foi criado, depois de deliberação divina, à imagem de Deus,
para ser mestre sobre todas as coisas. O primeiro capítulo oferece
uma história geral da criação, que tem seu objetivo e fim na
humanidade, enquanto o segundo trata especialmente da criação
humana e da relação que os seres humanos mantêm com as outras
criaturas. No primeiro relato, o ser humano é o fim da natureza; no
segundo, é o começo da História. O primeiro relato mostra como
todas as outras criaturas preparam o advento da humanidade; o
segundo introduz o estado humano original.14

Berkhof propõe que o homem sobressai na criação em relação aos outros seres
vivos pelas seguintes razões básicas:
1 A criação do homem foi precedida por um solene conselho divino;
2 A criação do homem foi, no sentido mais estrito da palavra, um ato imediato de
Deus;
3 Em distinção das criaturas inferiores, o homem foi criado conforme um tipo divino;

13
Ibid. p. 168.
14
BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada: Deus e a criação. Volume 2. (org.) John Bolt. São
Paulo: Editora Cultura Cristã, 2012. p. 519, 520.
5

4 distinguem-se claramente os dois diferentes elementos da natureza humana;


5 o homem é imediatamente colocado numa posição exaltada. 15
Turretini defende a tese de que o homem não foi criado em estado de
natureza pura uma vez que foi dotado de capacidade para glorificar a Deus.

declaramos que o homem jamais foi criado num estado de natureza


pura, nem tampouco cremos que ele pudesse ter sido criado assim.
As razões são: (1) Porque o homem foi feito à imagem de Deus (Gn
1.26) e assim moralmente bom e reto (Ec 7.29). Porque, visto que a
imagem (como mais tarde expressa) consistia principalmente de
retidão original, não se pode dizer que ele foi criado num estado dc
natureza pura, e que ele foi adornado com isso desde o princípio. (2)
Ele foi feito para glorificar e adorar a Deus (Pv 16.4; Rm 11.36),
deveres que ele não poderia realizar a menos que fosse revestido
dos dons necessários (a saber, sabedoria e santidade).16

Esse conceito abordado por Turretini é de elevada importância no estudo da


antropologia, pois por “natureza pura” seria a ideia de neutralidade de natureza não
tendo conhecimento nem do bem, nem do mal – o homem como um ser neutro.

Teoria evolucionista da origem do homem


A maioria dos teólogos sistemáticos discutem a questão evolucionista para a
origem do homem. Isso deveria ser óbvio, considerando que essa discussão é
inevitável, devido às duas possibilidades de conceber a origem do homem natural ou
criacional, impessoal ou pessoal. Geração espontânea ou um design inteligente. Em
suma, o homem é produto da matéria como eterna ou foi criado por Deus que é
criador de tudo inclusive da matéria, do tempo e do espaço?
Berkhof, de imediato já aponta o importante elemento, ou o princípio da
continuidade; princípio este que mina a teoria/hipótese da evolução. “Um dos
princípios mais importantes da teoria é o da rigorosa continuidade entre o mundo
animal e o homem. Ela não pode admitir qualquer descontinuidade em nenhum
ponto ao longo do curso da evolução, pois toda e qualquer ruptura é fatal para a
teoria.”17
A teoria/hipótese da evolução acabou sendo degustada por alguns teólogos
com a roupagem do evolucionismo teísta. Berkhof aponta que “o evolucionismo
teísta, que parece mais aceitável a muitos teólogos, simplesmente considera a
evolução como o método de ação de Deus.”18 Matos elucida que “alguns aspectos
do evolucionismo ganharam simpatizantes não só entre os teólogos liberais, mas
também entre alguns conservadores. Dois exemplos conhecidos são o presbiteriano
Benjamin B. Warfield e o batista Augustus H. Strong”.19
Bavinck já em 1900 reagia ao darwinismo ou teoria da descendência ou
evolucionismo apontando sua insustentabilidade por algumas razões:

15
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Tradução Odayr Olivetti. 3. ed. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2007. p.168.
16
TURRETINI, François. Compendio de Teologia Apologética. Org. James T. Dennison, Jr. São
Paulo: Cultura Cristã, 2011. p. 585. Vol. I.
17
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Tradução Odayr Olivetti. 3. ed. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2007. p.169.
18
Ibid. p. 169.
19
MATOS, Alderi Souza de. No princípio... o quê? Darwin, o evolucionismo e os cristãos. Março a
abril 2019. Disponível em: <http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/317/no-principio-o-que-darwin-
o-evolucionismo-e-os-cristaos>. Acesso em: 02 jan. de 2018.
6

Primeira razão - as explicações absurdas da origem da vida, tais como: 1-


geração ambígua, o orgânico surge da combinação acidental do inórgânico; 2-
suposição de que os protoplasmas ou germes da vida tinham sido trazidos à terra
por meteoritos vindos de outros planetas; 3 - a teoria de que as células e os germes
da vida sempre existiram juntamente com a matéria inorgânica e, portanto — assim
como a matéria, a força e o movimento eram eternos. Conclui Bavinck, “aqueles que
fazem com que a matéria, o movimento e a vida sejam eternos não resolvem o
mistério, mas perdem a esperança de uma solução”.
Segunda razão - o darwinismo não é razoável para explicar o
desenvolvimento dos seres orgânicos. A Bíblia ao descrever o evento da criação
com o “produza a terra” (Gn 1.11,20,24) não dá margem para admitir a geração
ambígua e a evolução da espécie, pois todo esse evento criacional surgiu da
ordenação de Deus. Bavinck esclarece: “a terra só pôde produzir esses seres
orgânicos por uma palavra da onipotência divina e que esses seres orgânicos
existiram lado a lado desde o início como espécies distintas, cada um com sua
própria natureza.” Bavinck mostra que como o Darwinismo era sustentado pela
filosofia especulativa. “O próprio Darwin, de qualquer maneira, afirma que muitas
das interpretações que apresentou eram altamente especulativas.”20
Terceira razão - o darwinismo não consegue explicar a origem da
humanidade. O teólogo recorrendo a textos científicos de 1881 aponta: “O estudo,
por um lado, de espécies antropóides de macacos e, por outro, de uma variedade de
ossos, crânios, humanos anormais, microcefálicos, anões, e assim por diante,
terminou na observação de que a diferença entre animais e seres humanos é
essencial e sempre existiu”.21
Quarta razão - o darwinismo tem problemas para explicar a estrutura
psicológica, ou a dimensão psíquica da natureza humana. “Darwin começou com a
tentativa de derivar todos os fenômenos mentais encontrados no seres humanos
(consciência, linguagem, religião, moralidade, etc.) de fenômenos que ocorrem nos
animais, e muitos outros o seguiram nisso. No entanto, até agora, essas tentativas
também não foram bem-sucedidas. [...] Nas palavras de Max Müller, a linguagem é o
Rubicão22 entre nós e o mundo animal.”23
Ao que parece somente em 1928 apareceu um animal que fala, o Mickey
Mouse criado por Walt Disney. De fato até ontem o Teddy Murph24 não conseguia
falar, somente latir e emitir um grunhido quando ameaçado.

Berkhof aponta duas objeções ao evolucionismo da origem do homem.


Primeiro, a evolução é contrária aos ensinamentos das Escrituras;
Segundo, a evolução não tem base em fatos bem estabelecidos.

20
BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada: Deus e a criação. Volume 2. (org.) John Bolt. São
Paulo: Editora Cultura Cristã, 2012. p. 526.
21
BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada: Deus e a criação. Volume 2. (org.) John Bolt. São
Paulo: Editora Cultura Cristã, 2012. p. 527.
22
Cneu Pompeu Magno (106–48 a.C.) governava Roma Rubicão (Rubico, em latim), é o antigo nome
de um pequeno rio no norte da Península Itálica, que marcava a divisa entre a província da Gália
Cisalpina e o território da cidade de Roma. Ficou conhecido na História, pelo fato de que a lei de
Roma, no período da República, proibia qualquer general de atravessá-lo, acompanhado de suas
tropas, quando retornavam de campanhas ao norte de Roma. Quando Caio Júlio César (100-44 a.C)
atravessou o Rubicão, em 49 a.C., em perseguição à Pompeu, violou a lei e tornou inevitável o
conflito com o Senado. Nesta ocasião teria proferido a frase ¨alea jacta est¨, que significa: ¨a sorte
está lançada ¨. Até hoje, a expressão ¨atravessar o Rubicão¨, significa uma decisão sem volta.
23
BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada: Deus e a criação. Volume 2. (org.) John Bolt. São
Paulo: Editora Cultura Cristã, 2012. p. 527, 528.
24
Nome do meu animal de estimação.
7

Daí Berkhof afirmar: “até o momento não passa de hipótese” e mais critica:
“Quando Darwin publicou as suas obras, pensou-se que afinal fora encontrada a
chave do processo, mas ao transcorrer do tempo se viu que a chave não servia na
fechadura.”25
Ferreira percebe a importância de uma antropologia teológica para a
compreensão dos fatos atuais referentes a decisões de cunho político, ético, social e
teológico. Esse autor aponta: “A busca por um caminho para se tentar resolver essa
divisão revela que, no fundo desta discussão, existe uma completa discordância
sobre os conceitos básicos acerca da natureza do ser humano.”26
Ferreira elenca uma série de visões da origem do homem. “Ao tratar da
questão da natureza do ser humano, as religiões e filosofias oferecem várias
respostas. Não obstante, todas caem em duas categorias: ou o ser pessoal, o
homem, tem uma origem pessoal ou tem uma origem impessoal”.27 assim conclui: “a
filosofia de Karl Marx é a que tem tido maior impacto na vida das pessoas,
especialmente no Ocidente. O marxismo reduziu a natureza humana ao resultado
dos embates de forças econômicas e sociais, ao dizer especificamente que o modo
de produção econômica é o que determina a consciência do homem.”28
Costa aponta com propriedade algumas afirmações categóricas e
impactantes sobre o homem. “O homem está acima de toda a criação; ele talvez
seja o mais frágil de tudo o que foi criado; todavia ele sabe quem e o que é; é um
“caniço pensante”;29 por isso mesmo o homem é o milagre mais portentoso de
todos:30 é a obra-prima de Deus31”32
Há por parte dos naturalistas uma completa desilusão quanto à origem do homem.
Salum percebe isto e aponta alguns depoimentos nesse sentido

Nenhuma época teve noções tão variadas e numerosas sobre o


homem como a atual. Nenhuma época conseguiu, como a nossa,
apresentar o seu conhecimento de um modo tão eficaz e fascinante,
nem comunica-lo de um modo tão fácil tão rápido. Mas também é
verdade que nenhuma outra época soube menos que a nossa o que
é o homem. Nunca o homem assumiu um aspecto tão problemático
como atualmente.33

Continua Salum... informando-nos da “melancólica constatação com que Jacques


Monod 1910 1976 detentor do prêmio Nobel de Filosofia e Medicina em 1965
encerrou o seu famoso livro.”

Talvez se trate de uma utopia, mas não de um sonho incoerente. É


uma ideia que se impõe pela força única de sua coerência lógica. Tal
é a conclusão a que a busca da autenticidade leva necessariamente.
Rompeu-se antiga aliança. Enfim, o homem sabe que está sozinho

25
Berkhof - Idem. p. 170.
26
FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan. Teologia sistemática: uma análise histórica, bíblica e
apologética para o contexto atual. São Paulo: Vida Nova, 2007. p. 385.
27
FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan. Teologia sistemática: uma análise histórica, bíblica e
apologética para o contexto atual. São Paulo: Vida Nova, 2007. p. 386.
28
FERREIRA,
29
B. Pascal, Pensamentos, VI 347. p. 127
30
Sófocles, A Antígone, 2. Ed. Petrópolis, RJ.: Vozes, 1968, 330.
31
W. Shakespeare, Hamlet, São Paulo: Abril Cultural, (Obras Primas), 1978, II.2.
32
COSTA, p. 222.
33
SALUM, Oadi. Teologia Sistemática Reformada. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2017. p. 218.
Depoimento de Martin Heidegger (1889-1976) filósofo alemão reconhecido como um vulto
exponencial do existencialismo
8

na imensidão indiferente do universo, de onde emergiu por acaso.


Não mais do que seu destino, seu dever não está escrito em lugar
algum. Cabe-lhe escolher entre o Reino e as trevas.34

Considerando que para Monod o Reino do homem é a “noosfera” isto é o


reino das ideias e do conhecimento. Seria as trevas a ignorância.
Hodge aponta:

A filosofia e a teologia ocupam terreno comum. Ambas presumem


ensinar o que é verdadeiro no que diz respeito a Deus, ao homem ao
mundo e a relação que Deus mantém com suas criaturas. Embora
seus objetivos sejam até aqui idênticos, ambas se esforçando por
obter um conhecimento das mesmas verdades, seus métodos são
essencialmente diferentes. a filosofia busca obter conhecimento por
meio de especulação e indução, ou pelo exercício de nossas próprias
faculdades intelectuais. A teologia confia na autoridade, aceitando
como verdade tudo que Deus tem revelado em sua Palavra. Ambos
os métodos são legítimos. Os cristãos não negam que nossos
sentidos e a razão sejam informantes confiáveis; que nos capacitam
a chegar à certeza quanto ao faz parte de sua esfera. Deus é o autor
de nossa natureza e o Criador do céu e terra, portanto nada que as
leis de nossa natureza ou os fatos do mundo externo provam ser
verdadeiro pode contradizer as verdades da filosofia ou da ciência.35

Chafer observa a inadequação das propostas de geração natural do


evolucionismo, quanto à origem do homem, detectando a grave incoerência de seus
argumentos na rejeição de Deus como criador, por ser inconsistente com da
existência e da conduta da moralidade humana.

Não é ensinado que a evolução como um sistema ensina a


imoralidade diretamente; está declarado, contudo, que essa filosofia
pagã, por ser destituída de Deus que é a única fonte dos ideais
morais, não pode gerar qualquer impulso moral. Tão certamente
como Deus criou o homem, assim certamente o homem sustenta
uma responsabilidade moral inerente de ser igual a Deus na conduta
e virtude, a fim de ser semelhante a Deus por criação. Deus
concedeu uma ordem razoável para as suas criaturas humanas:
“Sede santos, porque eu sou santo” (1Pe 1.16; Mt 5.48).36

Percebe-se que Chafer foi até sensato, para não dizer: muito modesto, em
não acusar o evolucionismo de ser antimoral e antiético.
Tim Barnett desenvolve um artigo onde conclui que “evolução e moralidade
não se misturam”, nada obstante reconhecer que os evolucionistas não descansam
na busca de uma explicação para a crise existente entre moralidade e evolução.
Esse autor desenvolve quatro teses básicas conforme sintetizadas a seguir:
1. A evolução natural não pode obter um “deve” de um “é”. A ciência descreve como
o mundo natural é, não nos diz como deveria ser e este diz respeito a valores
morais.
2. A moralidade evolutiva continua evoluindo. Consequentemente, aqueles
comportamentos que são louvados como virtuosos seriam imorais, e aqueles

34
SALUM, Oadi. Teologia Sistemática Reformada. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2017. p. 219.
35
HODGE. P. 42
36
CHAFER, Lewis Sperry. Teologia Sistemática. Tradução Heber Carlos de Campos. São Paulo:
Hagnos, 2003. p. 541. vols. 1 e 2.
9

considerados viciosos seriam morais. Regras epigenéticas do ser não evoluído é


diferente da dos seres biologicamente evoluídos.
3. Evolução naturalista explica a moralidade. Dado que a moralidade evolutiva é
orientada pela conveniência e não pela verdade, muitos naturalistas têm
questionado a existência da moralidade.
4. Evolução natural mina todas as crenças morais. Charles Darwin era um cético
convicto quanto a possibilidade de racionalidade dada a evolução natural. Ele
escreve: “Comigo, a horrenda dúvida sempre surge quando as convicções da mente
do homem, que foi desenvolvido a partir da mente dos animais inferiores, tem algum
valor ou são de todo confiáveis. Será que alguém confiaria nas convicções da mente
de um macaco, se é que existem convicções em tal mente?” Em uma visão
evolucionista, não existem razões para confiarmos em nossas convicções morais.37

37
Tim Barnett. Quatro problemas na moralidade evolutiva. Tradução Semi Chung Azeka. Disponível
em: <http://www.napec.org/apologetica/quatro-problemas-na-moralidade-evolutiva/>. Acesso em: 02
abr. 2018. Artigo do site da NAPEC - Núcleo Apologético de Pesquisas e Ensino Cristão

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