Os Annales Numa Perspectiva Global

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Peter Burke

Os

Annales
numa perspectiva global
É tempo de examinar a carreira do
movimento dos Annales além das
fronteiras - não só da França, mas
também da própria ciência histórica.

Peter Burke
A acolhida dos Annales
Antes da Segunda Guerra Mundial, os Annales
já tinham aliados e simpatizantes no exterior,
tais como Henri Pirenne na Bélgica, R. H.
Tawney na Grã-Bretanha e Bronislaw Geremek
na Polônia.

Foi apenas na era de Braudel que o movimento


se tornou conhecido por toda a Europa, uma
vez que O Mediterrâneo e o mundo
mediterrâneo nos tempos do Rei Felipe II
naturalmentr atraiu leitores de todo o mundo,
recebendo traduções italiana e espanhola.
A acolhida dos Annales
Na Alemanha dos anos 1950 e 1960, a história
política permaneceu predominante, em
grande medida devido aos traumas do nazi-
fascismo, havendo um grande direcionamento
para a história dos acontecimentos e das
controvérsias históricas de Hitler e das duas
guerras mundiais.

Apenas a geração do pós-guerra, que


chegaria à maturidade nos ano 1970, se
abriria para uma história do cotidiano, da
cultura popular e das mentalidades.
A acolhida dos Annales
A princípio, a Inglaterra teve dificuldade de aceitar os Annales
e, como dizia Braudel, demonstravam "recusa em tomar
emprestado".

A primeira edição de O Mediterrâneo não teve repercussão em


nenhuma revista importante de lá, nem da English Historical
Review, nem na Economic Historical Review.

Diferente da França, em que o marxismo e a Escola dos


Annales nem sempre estiveram unidos (à exceção de Ernest
Labrousse, Pierre Vilar, Maurice Agulhon, Michel Vovelle), na
Grã-Brtanha foram justamente os marxistas que primeiro
recepcionaram esse grupo, com historiadores tais como Eric
Hobsbawm, autor de Era das revoluções, Era do capital, Era dos
impérios e Era dos extremos.
A acolhida dos Annales
Um outro aspecto da influência dos Annales é a difusão dos
conceitos, abordagens e métodos, de um período histórico para o
outro, de uma região para outra.

O foco dos estudos do grupo se voltou para a Idade Média ou o


início da era moderna, cuja explicação é o fato de que a história
contemporânea (do século XIX para cá) vinha sendo muito marcada
pela história política, a qual, a princípio, teve pouca importância
nos estudos dos Annales.

Por outro lado, a história antiga receberia muita atenção de


historiadores inspirados pelos Annales, tais como Paul Veyne e
Jean-Pierre Vernant, que levantaram questões relativas a
religiosidade, costumes, cotidiano e sexualidades.
A acolhida dos Annales
De um mundo geral, o mundo exterior à Europa permaneceu relativamente
afastada dos Annales.

Poucos historiadores da África ou afroscentrados se sentiram influenciados


pela Escola dos Annales, à exceção do antropólogo belga Jan Vasina, que
estudou a tribo Kuba, da África Central.

Com relação à Ásia, a questão se torna mais complicada, visto que os


historiadores hindus aproximaram-se pouco dos Annales, mas desenvolveram
um campo próprio, o de "história dos subalternos", demonstrando
conhecimento da tradição francesa, mas aproximando-se mais do marxismo.

Os chineses, embora abertos ao espírito dos Annales, carregam consigo um


modo de pensamento que tornaria difícil o uso do conceito de mentalidades.
A acolhida dos Annales
Já na América Central e do Sul, aparece uma
maior recepção aos Annales, a exemplo do Brasil,
onde as aulas de Braudel na Universidade de São
Paulo nos anos 1930 ainda hoje são lembradas.

A famosa trilogia do historiador-sociólogo


Gilberto Freyre (Casa-grande & senzala, Sobrados
& mucambos, Ordem & progresso) se volta para
uma história da família, sexualidade, infância e
cultura material, o que anteciparia o que, nos
Annales, só seria feito a partir dos anos 1960 e
1970.
A acolhida dos Annales
A acolhida dos Annales nunca se limitou às fronteiras da
história.

Ainda que não tivesse conectado com o grupo dos Annales,


a terceira geração teve importância na formação de
Michel Foucault, que ampliou os temas da história que
chegava a temas como loucura, prisões, medicina e
sexualidade.

No entanto, Foucault se distanciava e criticava nos Annales


sua grande importância na continuidade, pois sua intenção
era partir de um problema para perceber os descontínuos,
os cortes.
A acolhida dos Annales
Três ciências tiveram grandes diálogos com os Annales: a
geografia, a sociologia e antropologia.

Na geografia, os geógrafos Vidal La Blanche procurava


fazer uma geo-história, muito marcada por sua
aproximação com Lucien Febvre.

No tocante à sociologia, houve aproximação dos Annales


do sociólogo Maurice Halbwachs, autor do clássico A
memória coletiva, muito utilizada pelos historiadores.

Por sua vez, no campo antropológico, embora poucos se


aproximaram-se dos Annales, um deles seria Levi-Strauss
(colega de Braudel na USP) e Evans-Pritchard.
Um balanço final
Qual a originalidade e qual o valor da nova história dos
Annales?

Apesar de buscar uma novidade, a proposta dos


Annales se encontrava com as rupturas com o estilo de
história tradicional proposta anterior a eles.

Para Peter Burke, provavelmente a intenção de Marc


Bloch e Lucien Febvre não era a de substituir ou
suplantar a história política, de relegá-la ao ferro-velho,
assim como criticaram os historiadores tradicionais.

No entanto, a lógica de universalidade se modificaria


com Braudel, que, apesar de falar de uma história de
"mil faces", sob seus domínios se buscou construir uma
nova história em prejuízo da velha.
"É por essas razões que o título desse
livro se refere à 'Revolução francesa na
historiografia' e que seu prefácio se
inicia com estas palavras: 'Da produção
intelectual, no campo da historiografia,
no século XX, uma importante parcela
do que existe de inovador, notável e
significativo origina-se na França'.
A historiografia jamais será a mesma."
(Burke, 2010, p. 143)

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