DEMARTINI, Zeila. Crianças Imigrantes - Necessárias, Invisíveis, Mas Perigosas

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Dossiê Migrações Artigo

Internacionais e Infâncias Original

CRIANÇAS IMIGRANTES: “NECESSÁRIAS”, “INVISÍVEIS”,


MAS “PERIGOSAS”
Immigrant children: “necessary”, “invisible”, but “dangerous”

Zeila de Brito Fabri DEMARTINI


Centro de Estudos Rurais e Urbanos (CERU- USP)
Universidade Estadual de Campinas-Unicamp
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico -CNPq
São Paulo, Brasil
[email protected]
https://orcid.org/0000-0002-5682-5816

A lista completa com informações dos autores está no final do artigo

RESUMO
A intenção neste texto é apreender os sujeitos crianças em seus deslocamentos ou de suas famílias e como,
de alguma maneira, foram constituintes desses processos. É, de certa forma, uma reflexão autobiográfica,
pois se pauta nas marcas que a presença de crianças imigrantes/filhas de imigrantes foi deixando nas
pesquisas que realizei. Procurou-se assinalar como a temática foi tratada em estudos sociológicos e
históricos, assim como pelo Estado brasileiro e paulista. Considerando que nos muitos fluxos migratórios
vieram várias crianças, procurou-se verificar a situação com relação a crianças no século XIX e primeiras
décadas do século XX, quando, apesar de “invisíveis”, eram “perigosas”, mas “necessárias”. Observou-se
as repercussões nas experiências infantis no tenso período nacionalista e da Segunda Guerra Mundial de
1930 a 1950 e as restrições que recaíram sobre elas. Finalmente, refletiu-se sobre o período pós-Guerra,
com a chegada de novos imigrantes e elaboração de novos projetos para as crianças.
PALAVRAS-CHAVE: Crianças imigrantes. Imigração. Século XX. São Paulo.

ABSTRACT
The intention in this text is to apprehend the child subjects in their displacements or the displacements of
their families and how, in some way, these processes were constituted. It is, in a way, an autobiographical
reflection, as it is based on the marks that the presence of the immigrant children, or of the daughters and
sons of immigrants, left in the research I carried out. We tried to point out how the theme was treated in
sociological and historical studies, as well as by the Brazilian federal government and by the São Paulo
State. Considering that in the many migratory flows to Brazil several children came, we tried to verify the
situation with respect to children in the 19th century and in the first decades of the 20th century, when,
although “invisible”, they were “dangerous” but “necessary”. We observed the repercussions on children's
experiences in the tense nationalist period and in World War II, from 1930 to 1950, and the restrictions
that fell on them. Finally, we reflected on the post-war period, with the arrival of new immigrants and the
development of new projects for children.
KEYWORDS: Immigrant children. Immigration. 20th Century. São Paulo.

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INTRODUÇÃO

A intenção neste texto é apreender os sujeitos crianças em seus deslocamentos


ou de suas famílias e como, de alguma maneira, foram constituintes desses processos.
É quase uma inversão do olhar, tentando perscrutar no meio das informações já
levantadas, as crianças quase invisíveis nas experiências migratórias, geralmente
focadas na mão-de-obra adulta.
A opção foi refletir sobre pesquisas que conduzi nas últimas décadas procurando
verificar como as crianças surgiram nos dados coletados, sob vários ângulos de análise:
referem-se em grande parte ao final do século XIX até a segunda metade do século XX.
O texto é, de certa forma, uma reflexão autobiográfica, pois se pauta nas marcas
que a presença de crianças imigrantes/filhas de imigrantes foi deixando nas pesquisas
que realizei. Não pretendemos, assim, trazer informações novas sobre as pesquisas
mais recentes que tenho realizado com imigrantes do século XXI, que chegaram ou
saíram do Brasil.

OS ESTUDOS SOBRE A IMIGRAÇÃO E AS CRIANÇAS

Refletir sobre a temática da infância no contexto de migrações internacionais


implica, para nós, refletir sobre como as crianças foram tratadas nos estudos
sociológicos e históricos que tradicionalmente abordaram aspectos dessa temática,
tanto pelo Estado, como pela sociedade receptora.
Os deslocamentos de pessoas entre regiões do globo ocorreram ao longo da história
da humanidade, motivadas por perseguições, provações, desejos, projetos, crises
pessoais, familiares, políticas, econômicas, ambientais... Variaram os fluxos e os
motivos ao longo das épocas, envolvendo sujeitos de origens sociais e culturais diversas
nos vários deslocamentos: são as experiências desses diferentes migrantes que as
ciências sociais tentam apreender e analisar, visando também a elaboração de
propostas para os problemas dos sujeitos envolvidos.
Do ponto de vista dos estudos sobre fluxos migratórios, grande parte preocupou-se
com a questão do trabalho que os permeava. O foco na mão-de-obra imigrante foi
também sempre preocupação dos governantes desde que o trabalho escravo começou
a ser questionado e, junto com a questão de uma imigração adequada para trabalhar
principalmente na agricultura, somaram-se as preocupações com a composição da

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população brasileira, visando seu branqueamento por meio da incorporação de
imigrantes brancos europeus.
Nesse contexto que foi se delineando a partir de meados do século XIX e percorreu
a primeira metade do século XX, pouca atenção era dada às crianças que vinham de
fora, geralmente com sua família. O foco estava no trabalho que as famílias poderiam
realizar.
Como foi bem analisado por Bassanezi e Scott (2005), a documentação dos
primeiros tempos da imigração não traz informações sobre as experiências das crianças
em sua inserção no novo contexto (DEMARTINI, 2015).
Entretanto, elas eram muitas. Como constatamos em levantamentos realizados, as
crianças eram componentes dos deslocamentos migratórios, mas permaneciam quase
invisíveis. Eram consideradas como parte da mão-de-obra familiar ou como ajudantes
para serviços que os pequenos poderiam realizar com mais destreza, na indústria e nos
serviços. Mesmo Davatz, que talvez possa ser considerado um dos primeiros
documentaristas da imigração em São Paulo e que para cá veio como mestre-escola
(portanto para ensinar os pequenos), pouco se deteve em seu livro/relatório sobre as
experiências infantis no novo contexto do interior paulista, na fazenda do senador
Nicolau de Campos Vergueiro, em que foi realizada a primeira experiência particular de
trazer imigrantes europeus (suíços) para trabalhar na lavoura em meados do século
XIX (DAVATZ, 1951). Os imigrantes se preocupavam com a escolarização dos filhos,
mas pouco se sabe como as crianças vivenciaram o processo migratório, que para os
adultos foi traumático, levando Davatz a proclamar que nenhum europeu deveria vir
para trabalhar nas fazendas paulistas.
O interesse dos estudiosos pela infância e juventude foi se intensificando nas
primeiras décadas do século XX, que passaram a se preocupar com as atividades que
os pequenos imigrantes desempenhavam, principalmente nas indústrias que se
desenvolveram nas cidades, em especial em São Paulo, assim como em outros serviços
perigosos da cidade.
Como anotamos em outro texto, as crianças e jovens mais novos, quando
trabalhavam, não eram o foco (e, aqui, aventamos a hipótese, nem era bom que
constassem) das estatísticas do mundo do trabalho tendo como referência a população
nacional e estrangeira. O trabalho era considerado uma forma de aprendizado e
importante na formação de crianças e jovens, tanto por empresários, como por políticos
e pais de família, tanto nacionais como estrangeiros. Parecia haver certa “naturalidade”
nesse fato (DEMARTINI, 2015).

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Paralelamente, a presença de grupos étnico-culturais muito diversos também levou
à preocupação de governantes com os perigos de que cada um deles fosse constituindo
o que chamavam de “quistos étnicos”, considerados perigosos à constituição de uma
nação “brasileira”, preferencialmente branca. As crianças imigrantes começaram a ser
objeto de preocupação, mas não ainda de estudos sobre suas experiências em todas as
atividades de sua vida: as autoridades visavam o processo de educação dos pequenos
imigrantes como forma de controlar os vários “nacionalismos” possíveis no território
paulista. Projetos e leis foram elaborados, determinando o ensino em língua portuguesa
nas escolas de grupos imigrantes e a presença de professores considerados nacionais
(embora muitos deles se considerassem pertencentes aos grupos de origem), como
detalharemos mais adiante.

FLUXOS MIGRATÓRIOS: VÁRIAS CRIANÇAS, MUITAS EXPERIÊNCIAS

Chegaram crianças de várias idades, vindas de regiões muito diferentes do


mundo, carregando marcas físicas e culturais variadas. Sua cor, suas tradições e língua
se encontraram no contexto paulista, nem sempre vistos da mesma forma pela
sociedade local. Relembrando dados do período da grande imigração (1908 – 1936),
entraram pelo porto de Santos 178.603 crianças com até sete anos, 103.690 com idade
entre sete e doze anos, totalizando 282.293 no período de 1908 a 1936. Eram, como
afirmamos, vindas de diferentes regiões do mundo, predominando as espanholas
(65.938), japonesas (53.062), portuguesas (51.942), italianas (44.265), romenas
(7.304), alemãs (7.155), iugoslavas (6.467), lituanas (4.735), turcas (4.342),
austríacas (3.205), polonesas (3.139), sírias (3.107), além de crianças de outras
origens (VASCONCELOS apud SCOTT, 2001).
Após esse período, crianças continuaram chegando, muitas vindas de países da
América do Sul, fluxos que se intensificaram nas últimas décadas, como também de
outras regiões, tanto da Europa, como do Oriente e África (AYDOS; BAENINGER;
DOMINGUEZ, 2008).
Neste texto tomamos como apoio o que pudemos constatar em várias pesquisas
realizadas envolvendo diferentes grupos de imigrantes e até problemáticas diferentes
em cada estudo, referentes a momentos distintos da história. Certamente seria
necessário um levantamento detalhado e cuidadoso para a discussão dessa temática,
isto é, um estudo amplo para que as observações pudessem ser consistentes. Dadas as
dificuldades para levar a efeito em curto prazo tal empreitada, procuraremos levantar

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aqui alguns pontos que fomos anotando durante as pesquisas que realizamos nas
últimas décadas envolvendo a presença de imigrantes do Estado de São Paulo. Para
tanto, baseamo-nos nas Ciências Sociais, em perspectiva que chamamos de sociológico-
histórica, por seguir orientações de dois sociólogos desde o início das pesquisas:
Florestan Fernandes e Maria Isaura Pereira de Queiroz que nos alertavam sobre a
importância da reconstrução histórica para a compreensão dos fatos e processos sociais,
abordagem que se tornou fundamental para o estudo dos deslocamentos humanos
(DEMARTINI, 2018).
A adoção da abordagem biográfica em várias pesquisas, em que tentamos
(re)construir com os sujeitos sua história de vida, apreendendo assim suas experiências
desde os primeiros anos de vida, assim como sua participação no contexto familiar e
em seu contexto de origem, foi permitindo que pudéssemos refletir sobre as várias
crianças e infâncias presentes em regiões e períodos diversos que vieram para o Estado
de São Paulo.

CRIANÇAS IMIGRANTES NO SÉCULO XIX E PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX:


“NECESSÁRIAS”, “INVISÍVEIS”, MAS “PERIGOSAS/AMEAÇADORAS”

Trataremos de dois períodos em parte diferenciados: o que vai até mais ou menos
o final de 1930, com a chegada dos grandes fluxos de imigrantes, e o período posterior,
até o final da Segunda Guerra Mundial, em que houve redução dos fluxos e maior
controle do Estado.

As crianças durante as primeiras décadas republicanas

As primeiras observações que realizamos sobre as crianças filhas de imigrantes


foram para a elaboração de tese de doutorado, ainda na década de 1970 (DEMARTINI,
1980). Como abordava diferentes categorias de agricultores procurando discutir a
questão de demanda por estudo entre elas, desde o final do século XIX, fomos nos
deparando com dados e indícios que indicavam o grande interesse de todos pela
escolarização dos filhos: entre os imigrantes essa aspiração foi apontada em vários
documentos, embora, como afirmamos, as crianças viessem para trabalhar com a
família e não eram consideradas como sujeitos autônomos. Grande parte dos
estrangeiros vieram para trabalhar como colonos em terras paulistas. Pudemos
constatar nesse estudo que, se as autoridades escolares e governantes baixavam leis

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determinando a frequência de crianças à escola, não havia, por outro lado, escolas para
os que residiam em áreas rurais, como colonos. Ficavam assim os filhos de imigrantes
na dependência dos coronéis locais (fazendeiros) para que tivessem acesso à
escolarização, inexistente e incerta. Mesmo quando os próprios imigrantes construíam
suas escolas, isso geralmente ocorria em área de pequenos agricultores que não
dependiam das decisões dos coronéis; a escola, para esses últimos só era bem vista
como um elemento de troca com os colonos, como forma de manter a mão de obra nas
fazendas. A escola para as crianças imigrantes fazia parte do jogo político da época e,
como afirmou o entrevistado Damasco Pena, valia mais a fazenda que tinha escola,
porque nela as famílias queriam permanecer (DEMARTINI, 1989).
Para aprofundar essas e outras questões, realizamos depois duas pesquisas que,
de alguma maneira, se complementaram: foram entrevistados educadores que
começaram a ensinar ainda na Primeira República, em áreas rurais e na área
metropolitana de São Paulo, para diferentes grupos da população. Na primeira foram
abordados aqueles que trabalharam diretamente com populações rurais (DEMARTINI;
TENCA; TENCA, 1988). Na segunda, os professores entrevistados haviam atuado em
escolas da já diversificada rede educacional da área metropolitana, em escolas públicas
e privadas (DEMARTINI, 1988).
As histórias de vida desses educadores e os documentos levantados são
importantes para a compreensão da presença das crianças nessas décadas iniciais do
século XX.
Posteriormente, ao realizar pesquisas junto a grupos de imigrantes portugueses,
japoneses e alemães que chegaram a São Paulo no começo do século, podemos também
apreender como esses imigrantes foram se inserindo nesse novo contexto e como suas
crianças vivenciaram esse processo.
Como não é possível neste breve texto detalhar o que foi observado nos vários
estudos, solucionamos alguns aspectos e dados que podem evidenciar como as crianças
de famílias imigrantes foram consideradas nestas décadas de grandes restrições.
Com relação às relações entre o campo educacional e os imigrantes, observamos
que a vinda de um mestre-escola com o grupo de Davatz (1951), acima citado, já é
indicador da importância atribuída pelos pais ainda no século XIX ao estudo para as
crianças. Aos colonos, como os de Ibicaba ou os de outras colônias particulares que
surgiram em outras fazendas, o trabalho dos filhos figurava na base dos próprios
contratos estabelecidos entre colonos e fazendeiros. Por um lado, interessava ao colono
que o maior número de filhos trabalhasse, pois isto lhe aumentaria a renda anual, visto

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que poderia se encarregar de uma parte maior da lavoura para cuidar, correspondendo,
por outro lado, à expectativa do fazendeiro, que assim ampliaria seus ganhos. As
próprias condições em que se estabelecia o vínculo com os colonos implicavam que
estes últimos fossem levados a recorrer obrigatoriamente à utilização do trabalho dos
filhos, o que atendia plenamente aos interesses dos fazendeiros. Não haveria, assim,
interesse por parte destes últimos em criar condições de estudo que pudessem implicar
a diminuição do volume de trabalho familiar.
Algumas obras escritas por pessoas que viveram durante esse período na zona
rural também oferecem indicações sobre o problema com relação a colonos de fazendas.
Raimundo Pastor, num livro de memórias, relatou a história de sua vida no interior de
São Paulo – Região Sorocabana – desde quando ainda menino: veio da Espanha com a
família, até se tornar professor (PASTOR, 1974). Descreveu nela como a educação era
vivenciada pelos trabalhadores, geralmente estrangeiros, que viviam nas fazendas de
café nesse período da Primeira República.
O relato do autor referia-se ao período de 1900-1919, durante o qual trabalhara
em fazendas de café juntamente com a família, sob formas variadas de contrato como
colono. Os filhos, à medida que iam atingindo certo desenvolvimento físico, por volta
dos dez anos de idade, passavam a trabalhar com o pai. O que era evidente nessa obra
era o desejo expresso várias vezes pelo pai de Raimundo Pastor: sua preocupação
constante de dar instrução aos filhos; no seu dizer, “aprender a ler, escrever e contar
em brasileiro”. Essa aspiração interferia, algumas vezes, nas suas decisões sobre
propostas de contrato de trabalho. Como geralmente não havia escolas nas fazendas
onde trabalhava, nem nas proximidades, o pai chegou certa vez a contratar o próprio
administrador da fazenda para dar aula aos três filhos, pagando para tanto dois mil réis
por cabeça. Os filhos, quando já crescidos, e como a família trabalhava numa fazenda
próxima a Botucatu, puderam, assim, cursar a escola noturna na cidade. Raimundo
Pastor entrou na escola com vinte anos e seus irmãos com dezoito e quinze; tinham
grande interesse pela escola, e terminaram o curso primário com sucesso, continuando,
entretanto, a trabalhar na roça.
Este trabalho levou-nos a presumir que, se muitos trabalhadores eram
analfabetos ou não frequentavam escolas, o problema era antes resultante da falta das
mesmas escolas do que da não disposição de frequentá-las.
Nas atas da III Conferência Nacional de Educação, realizada em São Paulo em
1929, constatamos as observações de Hilário Freire, que afirmou:

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A maior massa de analphabetos se encontra exactamente no campo; a população
do campo que lavra a terra, que trabalha e que produz, a que mais concorre para
a expansão econômica a que se referiu o eminente Sr. Secretário do Interior, na
sessão inaugural desta Assembleia, é, entretanto, a classe que menos recebe o
ensino, quando outras, que concorrem com muito menos, recebe muito mais. Essa
desigualdade, porém não é producto da vontade dos homens; é uma contingência
da natureza das causas.”. Sugere que os proprietários rurais (“aristocracia rural”)
sejam envolvidos no trabalho de melhorar a situação do ensino no meio rural;
para tanto, baseia-se em fatos observados em Jahu: “Certa ocasião, conforme
relatei em um memorial dirigido à secção de ensino primário fui à propriedade de
um modesto italiano... vi, sobre uma mesa, uma lousa, um pedaço de giz, e alguns
livros de ensino elementar sobre geographia, arithmética, etc. Tudo na mais
perfeita ordem. Indagando a razão de ser desse facto, informaram-me que um
filho do fazendeiro depois de haver concluído o seu curso no grupo escolar de
Jahu, ministrava o ensino a todo o pessoal da fazenda... dirigi-me à vários colonos
e verifiquei que todos elles, adultos ou crianças, tinham aprendido o ensino
elementar – ler e escrever – com o filho do fazendeiro. Quer isso dizer que o
analphabetismo havia desapparecido daquella propriedade [...] (ANNAES, 1929.
p. 209-213).

Para complementar esses dados, também efetuamos durante a elaboração da


pesquisa de doutorado quatro entrevistas, com autoridades escolares e professores que
trabalharam na zona rural durante esse período e que nos forneceram elementos
valiosos. Foram realizadas entrevistas com: um Delegado Regional de Ensino, Luiz
Damasco Pena, de grande atuação no campo educacional, que também foi professor
primário rural nos anos de 1917 e 1918, no município de Redenção (Vale do Paraíba);
um inspetor escolar, João Severino Villela, também professor de escola rural em
Tremembé, de 1914 a 1920; o professor Nelson Martins, que lecionou em Porongaba
nos anos de 1920 e 1921 e a professora Acaricy Reis Guimarães, que lecionou em Sales-
Oliveira (região de Sorocaba) no período de 1926-1930. Segundo as observações
desses informantes, nos quatro municípios citados em que atuaram, áreas de pequenos
proprietários (sitiantes) e também de colonos voltados para uma agricultura
diversificada e pecuária com produções destinadas ao consumo e à venda, a frequência
das crianças à escola era excelente, apesar da longa distância que os alunos tinham
que percorrer a pé. O professor Damasco Pena afirmou que a frequência “nunca decaiu
durante o ano”, que “o curso era apenas de dois anos e ninguém o interrompia”, mesmo
nas épocas de maior trabalho na roça, quando os pais poderiam recorrer à mão-de-
obra infantil para o trabalho da lavoura. Esta também foi a situação relatada pelo
terceiro entrevistado, segundo o qual os pais incentivavam a frequência à escola. O
segundo e o quarto entrevistados, entretanto, afirmaram que havia problemas de
frequência por ocasião de colheita, quando os pais precisavam do trabalho dos filhos.
Como analisamos, as informações dos quatro entrevistados mostraram que havia
uma procura educacional evidente por parte da população local; o motivo seria a
utilidade que viam na escola: “Tinham perfeita consciência de que a escola servia para

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algo: meu filho não há de ser como eu!”, afirmou Damasco Pena. Havia já naquela
época um desejo expresso de que os filhos tivessem uma situação melhor de vida e aí
a escola era vista como o meio de atingi-la. Segundo Villela, mais ou menos a metade
dos pais ambicionava que os filhos fossem trabalhar na cidade, em casas comerciais,
pois podiam melhorar sua situação saindo da lavoura. Outros pais achavam que era
bonito saber ler, o indivíduo ficava mais “esclarecido”, indicando assim, que não viam
utilidade no ensino apenas para sair de zona rural. Este segundo aspecto também se
depreendia das colocações de Nelson Martins: mesmo se referindo à área relativamente
isolada, com poucos meios de comunicação, mostrou o grande interesse dos roceiros
pela escolarização dos filhos, aparentemente para continuarem nas próprias atividades
locais. Também a quarta professora entrevistada afirmou que os pais achavam que a
escola servia para “não ficarem analfabetos”.
O que constatamos também foi a situação desprivilegiada em que se colocavam
os filhos de colonos, quanto à própria escolarização primária, em locais onde havia
escola. Segundo Damasco Pena (baseado na experiência não só em Redenção da Serra,
mas de todo o período em que trabalhou para o ensino), “era mais fácil desenvolver as
atividades escolares em áreas de pequenos proprietários do que em ‘escola de fazenda’,
porque a fazenda absorvia muito a vida do colono e isto se refletia nos filhos”; “a
fazenda era uma ‘ordem social’ e a escola vinha representar uma competição incômoda.
Também o segundo entrevistado, com base em sua vivência como professor, diretor e
inspetor escolar, manifestou a mesma opinião, considerando o trabalho do professor
mais difícil na fazenda, pois aí a frequência dos alunos era pior; havia mais exigência
de trabalho nas plantações, colheitas, as crianças eram mais aproveitadas na labuta.
Os fazendeiros de modo geral não colaboravam com o professor: “exigiam” e
“aceitavam o trabalho dos menores com mais agrado porque pagavam menos do que
para os pais.”. E realmente os entraves criados por fazendeiros deviam ocorrer com
certa frequência, tanto que as leis republicanas alertavam para o fato de que o patrão
que dificultasse a frequência das crianças à escola seria sujeito a multas.
A escolarização da população rural não dependia apenas do “despertar” de uma
aspiração educacional ou da expansão da rede escolar, mas, também, e
fundamentalmente das posições em que essa população se encontrava no tocante às
relações de trabalho e à posse da terra. Para os proprietários, mesmo pequenos
sitiantes, as chances de escolarização dos filhos eram maiores do que para os colonos,
estes sempre obedecendo às ordens e interesses da “fazenda”, isto é, de seu
proprietário.

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A esse respeito, acrescentam-se ainda as informações do segundo entrevistado
de que os pais, quando eram empregados e “não tinham propriedade no lugar”,
mudavam-se muito, procurando novos locais onde houvesse trabalho; muitos alunos
eram retirados da escola em decorrência desse fato, o que também foi apontado pela
quarta informante como motivo de evasão escolar (DEMARTINI, 1980).
A preocupação maior não era a escolarização das crianças, mas a presença
“ameaçadora” dos colonos imigrantes. A Lei n° 1.185, de 16 de dezembro de 1909, e
a Lei n° 1.579, de 19 de dezembro de 1917, que criavam respectivamente trinta e
cinquenta escolas rurais para servirem aos centros agrícolas, foram elaboradas nesse
sentido. Esta também era a preocupação da Secretaria da Agricultura que, nessa época,
por intermédio do Patronato Agrícola, estabelecia escolas com o intuito de educar os
filhos de imigrantes, procurando seguir o mesmo regime, ensino e disciplina adotados
nas escolas isoladas do Estado; no ano de 1917, as escolas do Patronato eram em
número de sessenta e oito, funcionando em núcleos coloniais e fazendas, ministrando
a instrução primária a 3.647 alunos (DEMARTINI, 1980. p. 316).
A preocupação com a educação do imigrante no meio rural, visando sua
“assimilação”, era evidente nos pronunciamentos dos encarregados da educação do
Estado de São Paulo já na década de 1910:

Bem avisado andou o Sr. Dr. Secretário do Interior que, de mãos dadas com o
Congresso, estabeleceu na nossa legislação escolar as chamadas escolas rurais,
cujo provimento, independendo de formalidades burocráticas, pode ser feito,
imediatamente, nas zonas rurais, onde vive, aglomerada, uma população
estrangeira, que precisa ser, quanto antes, assimilada ao nosso meio”
[...]. ”De 1827 até hoje, entraram do estrangeiro em São Paulo, para arrotear
suas terras, impulsionar suas fábricas e povoar suas cidades, 1.823.293
imigrantes, analfabetos, na sua quase totalidade [...]. A educação, pois, do
imigrante, sobre ser uma questão pedagógica, é ainda e mais um problema
social de máxima importância para o nosso progresso econômico e
aperfeiçoamento moral, problema cuja resolução compete ao perseverante
trabalho das nossas escolas” [...]. “Os (imigrantes) que se aboletam nas cidades,
facilmente se matriculam nas escolas diurnas, quando menores, e nas nocturnas,
quando adultos, aprendendo, numas e noutras, a falar nossa língua e recebendo
noções elementares de arithmética, geographia e história da pátria; os que se
estabelecem nos campos e nas fazendas, distantes dos centros urbanos, vivem,
crescem e prosperam na completa ignorância da língua, do meio, dos usos e
costumes, dos nossos recursos, inteiramente estranhos à vida social e política do
país que lhes dá hospitaleiro agasalho e fartura (ANNUARIO, 1917, p.129-132
grifo nosso).

Segundo Infantosi (1983), levando em conta o número de núcleos de colonização


oficial existentes, que em 1911 totalizava quinze, poder-se-ia dizer que estes
representavam as localidades mais bem servidas por escolas e estas atendiam a quase
totalidade de sua população escolar. Exemplifica com o caso do Núcleo Colonial Nova
Odessa, em Campinas, onde funcionavam, em 1911, quatro escolas preliminares

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atendendo a uma população escolar de 236 indivíduos. As sessenta e cinco escolas
criadas em grandes domínios rurais, estariam, provavelmente, destinadas a servir ao
colonato estrangeiro.
Em 1915, as escolas em núcleos coloniais estavam a cargo do Patronato Agrícola
(Patronato Agrícola estava diretamente ligado ao Comissariato Generale per
l’Emigrazione, como parte da política emigratória italiana para proteção ao imigrante),
instituição, criada em 1911, destinada a disciplinar os contratos de trabalho e melhorar
condições de vida dos colonos nas fazendas de café. Incumbia-se de promover a
organização, fiscalização e funcionamento de cooperativas dos núcleos coloniais sob a
orientação do Patronato Agrícola, cinquenta e sete escolas, sendo sete masculinas, uma
feminina e quarenta e nove mistas. Mais da metade dos alunos era estrangeira,
predominando os italianos, seguidos de espanhóis, alemães e suíços. Em 1925, todos
os núcleos oficiais estavam emancipados (INFANTOSI, 1983. p. 99-100).
Em 1918 houve várias sugestões de autoridades educacionais da época para a
nacionalização do ensino no meio rural: formação específica de professores para as
escolas rurais, adaptação do ensino às peculiaridades das zonas agrícolas, planos para
a formação de um “patrimônio escolar” e extinção do analfabetismo, especial
importância a ser atribuída ao ensino da língua-pátria, educação moral e cívica e
educação física etc. (ANNUARIO, 1918).
A preocupação com o problema do nacionalismo também se voltava para áreas
de produtores não colonos de fazendas, mas ligados a outros projetos imigratórios,
como os japoneses no Vale do Ribeira e litoral sul:

Aqui e ali, por todos os cantos, onde a immigração tem penetrado, núcleos de
estrangeiros se tem formado, conservando-se alheios ao nosso país. Não havendo
escolas nossas, fundam elles as suas; recebem de além Atlântico, todos os
objectos necessários e subvenção remunerada, estudam sua língua, a história e
a geographia de sua pátria; conservam suas tradições e seus costumes. [...] Este
facto, profundamente alarmante, só de há pouco tempo para cá conseguiu chamar
a nossa attenção, sem que tenhamos, entretanto, procurado dar remédio a essa
gravíssima anomalia. [...] Basta citar um facto recentíssimo, verificado entre nós:
- os japoneses que se estabeleceram no Valle da Ribeira de Iguape, para cultivar
o arroz, não encontrando ali escolas brasileiras onde seus filhos estudassem,
installaram imediatamente, escolas suas improvisando professor um dos colonos.
Apesar de o nosso Congresso ter criado este anno escolas para essa colonia, só
serão ellas installadas no anno próximo, e a nossa difficuldade para as implantar
naquelle meio serão maiores [...]. Filhos de japoneses, embora ali nascidos e
registrados optarão pela escola em que se fala a língua de seus paes. (ANNUARIO,
1917, p. 130-131).

De modo geral, pode-se afirmar com base nas narrativas de professores que o
sistema educacional público que atinge as várias categorias sociais rurais, só começou
realmente a expandir-se pelo interior do Estado, na última década da Primeira

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República. Nas regiões novas e até nas mais antigas, como o Vale do Paraíba, Campinas,
Sorocaba, São Carlos, as escolas em que os professores lecionaram eram recém-
criadas, não tendo existido antes outras naqueles locais. Era um sistema educacional
que se instalava primeiramente nas cidades, depois nos núcleos constituídos pelas vilas,
distritos, expandindo-se depois pelas propriedades rurais. Mas fica evidente que não
havia uma política educacional orientando esta expansão, procurando localizar as
escolas onde elas pareciam ser mais necessárias. Pelo contrário, o padrão usual era a
improvisação e o atendimento individualizado, “de favor”: as escolas eram criadas em
locais em que havia políticos ou fazendeiros que as desejavam, nem sempre onde eram
mais necessárias; os professores, nomeados muitos deles através de interferências
políticas ou de amizade, iam para onde eles próprios ou os políticos queriam; a escola
nem sempre ia “atrás” das crianças, mas estas é que precisavam andar muito para
chegar à escola.
Era um sistema de ensino que, embora atendendo a camadas mais baixas da
população rural, funcionava de modo precário e intermitente. Parecia não haver,
principalmente quando as escolas localizavam-se em fazendas, uma certeza de
continuidade de funcionamento da mesma nos anos seguintes à sua criação: o
funcionamento da unidade escolar dependia da boa vontade do dono das terras, da
existência de professor, da concordância do chefe político local etc. Tudo parecia
improvisado e sem critérios uniformes: enquanto alguns professores conseguiam vagas
por concurso, outros iam para os mesmos lugares através de política.
O grande número de analfabetos pelo interior e a própria existência de um
sistema de ensino paralelo ao oficial, funcionando ainda no final da Primeira República
são o atestado mais claro da precariedade do sistema oficial. A existência de uma
grande clientela potencial fora das escolas oficiais abrira cursos noturnos para os
trabalhadores adultos dos locais em que lecionavam para crianças, cobrando em alguns
casos pelas aulas dadas. Mas constatou-se também a existência de ensino particular
que tentava sanar as deficiências do ensino público no atendimento até mesmo de
crianças, em área de pequenos sítios: os pais, com a falta de escola e sem recursos
para mandarem os filhos estudarem na cidade, recorriam então aos meios que
apareciam, para dar algum estudo aos filhos, pagando a professores leigos, sem
formação específica, para que ensinassem as crianças.
Por outro lado, este tipo de ensino deixa bastante evidente, e de forma
inquestionável, o interesse manifesto das várias categorias rurais pela escolarização:
fazendeiros, sitiantes e colonos pagavam por ela.

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Embora a maior parte da população trabalhadora do estado de São Paulo
residisse nas primeiras décadas do século na zona rural, havia muitas famílias de
imigrantes nas áreas urbanas. Muitas crianças dessas famílias trabalhavam duramente
e sofriam restrições em seu processo de escolarização.
Segundo Infantosi (1983), em 1909, pela primeira vez, revelou-se a preocupação
com a falta de instrução dos trabalhadores menores.

Com a lei 1.184 de 3 de dezembro de 1909 determinou-se a criação de cinquenta


escolas preliminares noturnas para crianças operárias na Capital e em outros
municípios do Estado. Tais estabelecimentos deveriam localizar-se nas
proximidades das fábricas nas quais trabalhassem, tendo primazia de instalação
aqueles para cujo funcionamento fossem oferecidas acomodações pelas empresas
fabris interessadas. Segundo o texto da lei, o horário de aulas deveria fixar-se de
acordo com a administração das fábricas. Estipulou-se o número máximo de
cinquenta alunos por escola – o que propiciaria o atendimento de 2500 crianças
– vedada a matrícula a alunos não operários ou que não fossem filhos de
operários; a prioridade caberia aos analfabetos e desamparados. [...] As escolas
preliminares noturnas para operários adultos ou crianças não tinham como
finalidade precípua o ensino de uma arte ou ofício, portanto, não eram escolas
profissionais; no entanto, diferiam das escolas primárias comuns porque nelas
prevalecia uma nítida preocupação de dirigir seus programas e currículos para o
mundo do trabalho, bipartido nas suas dimensões mais significativas: pragmática
e ideológica. Destarte, o ensino da linguagem, por exemplo, deveria efetuar-se
mediante “lições de coisas tratando-se das qualidades, emprego, uso e
propriedades de corpos e objetos de uso nas artes e indústrias e lições que
contribuam para a educação da vontade, onde sejam narrados os triunfos da
perseverança e exaltadas as alegrias da vida ativa, fecunda e tranquila do
trabalhador honesto (INFANTOSI, 1983. p. 96 - 98).

Em 1919, a matrícula para o total dos estabelecimentos de ensino primário


(inclusive as escolas particulares estrangeiras) somava 254.109 crianças. Entre
os matriculados, 110.000, aproximadamente, eram estrangeiros ou filhos de
estrangeiros. Assim, a participação destes últimos na população que frequentava
a escola primária correspondia, grosso modo, a 44% (INFANTOSI, 1983. p. 55).

Como já afirmamos em vários textos, o colono imigrante foi a solução econômica


encontrada para a agricultura paulista, mas constituía, ao mesmo tempo, um “perigo
nacional”, do ponto de vista político. E, nesse caso, a escola, para educar as crianças
como brasileiras, era vista por muitos como uma forma de acabar com este perigo em
áreas rurais e urbanas. Para os empresários interessava muito o trabalho dos pequenos
imigrantes e não só a sua família para as quais a precária sobrevivência dependia em
parte do trabalho dos próprios filhos (MOURA, 1999, p.263).

A classe operária paulistana formou-se, portanto, sob o signo da imigração,


sobretudo a italiana, que emprestaria a bairros como o Brás, onde o operariado
tenderia a concentrar-se, os tons da italianidade. Muitos dentre esses operários
eram crianças e adolescentes, alguns, imigrantes como seus pais – caso de
Vicente e Angelina, - outros, filhos de imigrantes, imprimindo à composição da
classe operária paulistana, a indelével marca da diversidade. Em meados da
década de 1870, anúncios de estabelecimentos industriais solicitando crianças e
adolescentes para trabalharem principalmente no setor têxtil, começavam a
multiplicar-se na imprensa paulistana. Em princípios do século XX os termos
usados para caracterizar minimamente a mão-de-obra requerida – meninos,

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meninas, assim como crianças e aprendizes – enfatizavam a inserção precoce na
atividade produtiva. Exemplo disso, o menor Núncio, espanhol, filho de José Miron
que, em 1913, aos dez anos de idade já estava empregado em uma fábrica de
papelão da rua 25 de março. No jornal Fanfulha, de língua italiana, uma vez
concretizada a imigração de massa, palavras como bambini, fanciulli, ragazzi,
minorenni, nos anúncios em busca de trabalhadores, tornavam pública a
mensagem do empresariado, no sentido de que as portas das oficinas, os portões
das fábricas, estavam de fato abertos para crianças e adolescentes. (MOURA,
1999, P.261-262).

Outras atividades eram exercidas no contexto urbano: no comércio, na


construção civil, em atividades informais pelas ruas. A participação das crianças e
jovens nas atividades industriais era tão frequente, significando para os mesmos
prejuízo em seu processo de escolarização, como apontaram professores entrevistados
que lecionaram na capital, que começou a exigir atenção especial dos poderes públicos
para que essa situação fosse “resolvida”. É interessante constatar que muitas soluções
visavam mais as indústrias que crianças e jovens, como foi bem ressaltado por Costa
em estudo sobre a legislação educacional da Primeira República; nesse período foi
criado um novo tipo de escola isolada, pela Lei 1.184, de 3 de dezembro de 1909:

[...] destinada a crianças operárias e que deveriam ser localizadas nas


proximidades das fábricas em que se ocupassem crianças e cujo período de
funcionamento estaria de acordo com a administração da fábrica a que deveriam
servir. O programa de ensino dessas escolas denotava uma insistência na
formação educativa voltada para o mundo do trabalho. (COSTA, 1983, p.95).

A criação dessas escolas elementares para operários coincidia, segundo a autora


e os dados também analisados nas entrevistas com professores, com o crescimento das
atividades ligadas à indústria em São Paulo, que, a partir de 1910, assume a dianteira
dessa produção no país destacando-se o ramo têxtil, que em 1920 representava 25%
dos estabelecimentos fabris de São Paulo; esse foi o ramo que mais utilizou crianças e
mulheres; em 1920, o total da mão-de-obra considerada como industrial compreendia,
só na cidade de São Paulo, 115.190 trabalhadores, dos quais 33.893 eram menores
(COSTA, p. 95-96). Como já foi observado acima, era justamente o ramo têxtil o que
concentrava grande número de estrangeiros e descendentes. Para as crianças
operárias, foram então criadas, em 1909, cinquenta escolas preliminares noturnas, na
capital e em outros municípios do Estado (COSTA, p. 95-98), com currículos e
programas de interesse das indústrias.
Além da exploração capitalista do trabalho de crianças e jovens, que poderia
exaurir suas forças e mutilá-los, ainda havia o comprometimento maior de sua
formação, dado pela exclusão das escolas, que não existiam para todos ou pelas
oportunidades cruéis que lhes eram oferecidas de frequentar escolas que visavam

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atender às necessidades da indústria e não a saúde e educação da infância (DEMARTINI,
2015).
Na capital, as crianças de famílias operárias frequentavam grupos escolares e
escolas isoladas da rede pública, além das escolas particulares dos vários grupos de
imigrantes.
Os filhos de operários representavam a maioria dos alunos em grupos escolares,
ao lado de filhos de trabalhadores urbanos em geral. Apesar dos altos níveis de evasão
escolar no período, a camada de baixa renda não estava excluída do sistema de ensino.
É interessante observar também que, em 1918, segundo dados do Anuário do Ensino,
9.951 alunos de grupos da Capital eram filhos de brasileiros, enquanto 18.067 crianças
eram filhas de pais estrangeiros, quase o dobro dos nacionais. Esses números vêm
complementar as memórias de praticamente todos os mestres com experiências em
grupos escolares, que lembram dos inúmeros sobrenomes italianos, alemães,
espanhóis, sírios e outros de seus antigos alunos. Esta situação aponta para duas
questões importantes: em primeiro lugar, a dificuldade de integração dos imigrantes à
sociedade nacional deve ser relativizada; em segundo, apesar da existência de muitas
escolas particulares mantidas por colônias estrangeiras, a maior parte dessa população
se encaminhava à instrução pública e gratuita.
As populações residentes nos bairros em que ficavam escolas isoladas sempre
manifestaram um grande interesse pela escolarização dos filhos, segundo os
depoimentos. Este aspecto também fica muito explícito na grande demanda por escola
– em todas as escolas isoladas, as classes eram numerosas.
As professoras entrevistadas não fizeram referências a problemas de faltas,
embora em alguns locais – poucos, segundo os relatos – os alunos precisassem
trabalhar. Uma das professoras narrou como agia com relação a alunos seus que
trabalhavam como operários de uma tecelagem no Ipiranga:

E naquele tempo era permitido o trabalho de menores. Eu tinha alunos que


trabalhavam... na fábrica. E Cirene também tinha alunos que trabalhavam na
fábrica. Mas eram dois ou três só que trabalhavam. Eu me lembro bem do
Francisco e da Elvira. A Elvira eu nunca esqueci, porque era uma menina linda,
filha de italianos. Muito bonita. Mas ela era transparente, porque ela trabalhava
de seis à meia-noite. De modo que quando apitava 4 horas na fábrica, ela saía da
aula. Ela não ficava, porque tinha que pegar o turno da 6. E o Francisco era o
contrário. Ele trabalhava de 6 ao meio-dia. E... De modo que ele chegava sempre
um pouco atrasado na escola. Que foi muitas vezes causa de discussão minha
com um inspector só de... porque eu não marcava falta no livro, só enchia o livro
de chamada depois que eles chegavam. Eu não falsificava a verdade, mas eu só
dava uma folga pra criança, não é? (Entrevistada professora de escola
pública de São Paulo)

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É importante observar como o Estado, os fazendeiros e empresários encaravam
a presença dos imigrantes durante o primeiro período republicano para compreender o
modo como as crianças eram aí tratadas. Analisar as políticas de Estado sob o ângulo
das experiências infantis leva a hipóteses por nós antes não explicitadas.
Podemos afirmar, assim, que as políticas de assimilação dos imigrantes
implantadas pelo Estado tinham como foco primordial as crianças: elas eram “invisíveis”
como trabalhadoras (embora necessárias), mas eram elas que poderiam pôr em risco,
em futuro próximo, a unidade da nação brasileira, se crescessem de acordo com a
cultura, orientações e apoio dos contextos/nações de origem.
Os adultos, de alguma forma, eram controlados pelo mercado de trabalho e pelas
penalidades previstas em lei.
Os grupos de imigrantes mais organizados procuraram oferecer educação às
crianças, pelo menos a elementar, mediante a criação de escolas por eles mantidas.
Assim as crianças frequentavam as centenas de escolas italianas, japonesas, alemãs,
entre outras, que foram criadas nas primeiras décadas republicanas. Muitas foram
criadas em cidades, mas também em áreas rurais em que os imigrantes de um mesmo
grupo criaram e subsidiavam as escolas, mantendo professores para garantir o estudo
das crianças. Em 1917, existiam, para crianças filhas de imigrantes, 101 escolas
particulares de vária nacionalidade só na capital (ANNUARIO, 1917).
Nessas escolas, cada grupo procurava preservar a cultura e as normas de seu
grupo de origem, embora todos seguissem a legislação oficial do estado de São Paulo,
que determinava o ensino da língua portuguesa e das disciplinas do sistema oficial de
ensino, assim como a presença de professor de origem “brasileira”. Mas a maior parte
delas atuava seguindo também as orientações do sistema de ensino do contexto de
origem.
As escolas particulares voltadas para imigrantes eram instituições que
conseguiam ao mesmo tempo atender às necessidades práticas de sanar as falhas do
sistema educacional local, garantir a identidade do grupo, fundamentalmente por meio
do estudo da língua da terra de origem. Procuravam cultuar a tradição e manter o
vínculo com a nação de origem para onde muitos pretendiam voltar. Eram geralmente
escolas pagas – dessa forma, eram procuradas ou mantidas por imigrantes que
dispunham de algum recurso para tanto, isto é, dos que já estavam prosperando e,
assim, colocavam-se quase como expoentes do grupo (a escola era ao mesmo tempo
um veículo de ascensão social e de demonstração dessa ascensão aos seus pares).
Embora saindo da Europa ou do Oriente, a nação de origem continuava exercendo certa

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“tutela” sobre os imigrantes, seja porque esses continuavam aqui com a nacionalidade
de origem, seja porque o país de origem procurava vigiar as condições em que aqui
viviam, colaborando nas iniciativas tomadas por esses grupos. Alemães, italianos e
japoneses receberam auxílios de seu país de origem para a construção de escolas na
cidade de São Paulo (DEMARTINI, 2017, p. 45).
Muitos imigrantes, entretanto, matriculavam seus filhos nas escolas oferecidas
pelo poder público estatal, como já afirmamos. Nessas escolas, todos eram “iguais”, e
havia uma preocupação crescente das autoridades para que os estrangeiros fossem se
nacionalizando o mais rápido possível.
Nas primeiras décadas republicanas, as crianças de família imigrante tinham
experiências diferenciadas quando se consideram os campos escolar e do trabalho: as
que só trabalhavam; as que trabalhavam e estudavam; as que só estudavam.
As que só trabalhavam pertenciam a famílias de poucos recursos, residentes em
locais sem escola, estes geralmente em zonas rurais, ou trabalhavam em atividades
urbanas que impossibilitavam a frequência à escola, por esgotamento físico provocado
pelas atividades desenvolvidas (muitas delas trabalhavam em indústrias) e pelos
horários de trabalho incompatíveis (muitas trabalhavam em período noturno)
(DEMARTINI, 2015).
É preciso destacar que a população nacional – especialmente a branca – não
recebia os imigrantes tão facilmente como se poderia imaginar. Ao contrário, durante
todo esse período, as manifestações de paulistanos contra imigrantes, de modo geral,
ou determinados grupos deles, aparecem declaradamente em jornais e revistas de
maior tiragem. Mas também vamos encontrá-las de forma mais diluída, mais disfarçada,
em revistas especializadas, como por exemplo, nos Annuarios de ensino, publicação da
Directoria do Ensino do Estado de São Paulo. Outro exemplo interessante é a série de
artigos de Oscar Egídio de Araújo sobre a população no município de São Paulo, onde
transparece a preocupação que acompanhava os estudos realizados, de conhecer os
agrupamentos estrangeiros e o comportamento dessa população para melhor orientar
a política de imigração (DEMARTINI, 2011).
Muitas crianças de famílias italianas enfrentaram preconceitos desde que as
grandes levas foram chegando no fim do século XIX, disputando o mercado de trabalho
principalmente urbano (FAUSTO, 1984). E havia as que eram filhas de imigrantes
anarquistas, que sofriam perseguições policiais e tinham que se mudar com frequência,
pois eram considerados opositores do governo. Foram eles que batalharam muito contra

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o trabalho das crianças e sua exploração nas indústrias e no comércio (DEMARTINI,
2015; SIMÃO, 1966).
As crianças de famílias mais pobres, principalmente as que não podiam pagar as
escolas mantidas pelos próprios imigrantes, sofriam, além das consequências do
trabalho precoce, preconceitos por parte de colegas de escola. Os apelidos eram
comuns, sempre procurando desqualificá-las pelos traços físicos e costumes diferentes.
Mas as crianças também conseguiam superar as barreiras entre elas, apesar das
diferenças: eram importantes nesse caso as brincadeiras que faziam pelas ruas, como
foi analisado, muitos anos depois, por Florestan Fernandes sobre as Trocinhas do Bom
Retiro. Na década de 1920, o professor Takeshita, que dava aula na Escola Taicho na
Liberdade, achava que era muito difícil ensinar japonês para os filhos de japoneses, que
preferiam falar português para brincar com os amigos do bairro. Também um pequeno
portuguesinho preferia conversar com os amigos italianinhos do bairro, que tinha em
casa uma educação muito diferente da educação autoritária que ele recebia em sua
casa, com muitos castigos e trabalho. Mas nem sempre só o trabalho precoce
comprometia as convivências infantis: também pesavam as exigências familiares, que
muitas vezes cerceavam a liberdade das crianças (o espaço urbano parecia ameaçador
para muitas famílias) que vinham de áreas rurais e pequenos povoados.
O que mais é ressaltado pelos que frequentaram escolas públicas é que eram
encarados como diferentes e hostilizados por meio de apelidos:

[...] a gente, como estrangeiro, a gente se considera estrangeiro. [...] Eu lembro


quando eu era moleque, quem dominava aqui era a colônia italiana, então os
portugueses eram muito maltratados... eu lembro quando eu ia na escola tinha 7
de setembro, dia da Bandeira, tudo que falasse da Pátria, falar mal dela era
português, tanto que quando eu andava na escola às vezes... eu não dizia que
era português que a turma, né... Eu sou brasileiro, que eu falava que era
brasileiro, que se eu falasse que era português achincalhavam, ‘português burro’,
‘português bacalhau’, saía tudo quanto era nome. A colônia italiana era maior.
(Entrevistado de família de imigrantes portugueses).

Uma outra lembrou que mexiam com ela por causa das bochechas vermelhas.
Havia diferenciações internas a cada grupo decorrentes dos maiores ou
menores recursos econômicos dos imigrantes e do tipo de relações sociais
estabelecidas no contexto de adoção. Algumas famílias reproduziram aqui os modelos
de educação europeia, usuais da elite paulistana, isto é, uma educação mais “europeia”
para as filhas, em casa ou em colégios religiosos, enviando ou deixando os filhos
homens estudando na Europa.
Nas primeiras décadas republicanas havia uma convivência com muitos outros
grupos, o que provocava medo nos pais, geralmente provenientes de pequenas

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aldeias; havia também uma pressão para que as crianças trabalhassem, pois, as
condições de sobrevivência eram difíceis. Mas, o que parece ter sido a maior fonte dos
conflitos que surgiam, nestes casos, era a rejeição ao modo de ser do próprio grupo e
não aos “outros”.
As crianças faziam comparações entre as diversas formas de as famílias
educarem os filhos – entre pais mais autoritários ou mais amorosos, mais
preconceituosos com relação a outros grupos étnicos ou incentivadores das trocas
interétnicas, mais acolhedores dos costumes de outros grupos ou menos. Tal dimensão
só foi por muitos percebida quando já eram adultos, e explicitada nos relatos como
fruto de comparação que o fato de serem filhos de imigrantes lhes propiciou, como
relatou um entrevistado:

[...] Eu costumo dizer o seguinte: a escola foi a alavanca da vida, não é, na escola
você conhece pessoas diferenciadas. Meu pai se relacionava com as pessoas do
mundo dele, do mundo do trabalho e do mundo de origem. Então ele se
relacionava com pessoas que tinham caminhão de areia, caminhão de tijolo... Se
relacionava com as pessoas... imigrantes como ele, da mesma aldeia. O
relacionamento deles era esse. Eles gostavam de conversar entre eles sobre seu
passado na aldeia, sabe... (...) Era o mundo dele, entende? Era o mundo de
saudade deles, porque eles são mais saudosistas. Eu não sou saudosista, eu vim
com seis anos, então a minha formação é de moleque brasileiro, não é verdade?
Eu joguei bola com os moleques brasileiros... (Entrevistado de família de
imigrantes portugueses).

As situações de deslocamento dos imigrantes envolveram muitas vezes não só


os conflitos com os “outros” do novo contexto, mas com os próprios familiares. No caso
da imigração do início do século, foram vários os relatos de cisões familiares, que
implicaram em providenciar estratégias de sobrevivência. Quando crianças ficavam em
Portugal na ausência dos pais, o que era comum, geralmente sua vida era marcada pelo
trabalho junto à família, sob o controle da mãe ou da avó, para enfrentarem as
dificuldades econômicas.

O PERÍODO DO NACIONALISMO CONTROLADOR DOS FLUXOS E DOS


IMIGRANTES E A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

O tenso período entre 1930 e 1950 foi de grandes conflitos entre as nações, que
repercutiram nas experiências das crianças de famílias imigrantes.
Se até o início dos anos 1930, apesar do controle sobre os imigrantes e a
preocupação com o direcionamento da educação dos pequenos era manifesto (em São
Paulo), foi nessa década e durante o período da Segunda Guerra Mundial que o
cerceamento das atividades das crianças se intensificou, muitas vezes de forma

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violenta. A política nacionalista de Getúlio Vargas, no âmbito federal e a perseguição a
alguns grupos estrangeiros em decorrência das alianças políticas durante a guerra
implicaram que principalmente japoneses, alemães e italianos fossem controlados pelas
forças policiais e leis que proibiram o uso da língua materna de cada grupo, as reuniões
e, principalmente, a liberdade para veiculação da cultura de origem. As escolas foram
as instituições mais afetadas, sendo muitas delas fechadas, os alunos ficando sem
aulas, o que ocorreu principalmente em núcleos coloniais e áreas consideradas de
segurança nacional, como no litoral paulista. Mudanças radicais foram introduzidas nos
currículos das escolas, professores estrangeiros foram impedidos de lecionar e o ensino
da língua dos grupos imigrantes foi proibido para as crianças. Também proibidas as
obras escritas em outras línguas.
Intensificou-se, então, o controle sobre a educação dos pequenos, pois
simultaneamente também havia uma pressão dos países de origem para que os
imigrantes continuassem ligados aos projetos nacionalistas destes últimos. As crianças
ficaram, então, convivendo em sua família e escola sob a tensão entre o governo
brasileiro e os países do Eixo, opositores no plano mundial. Por que não podiam mais
falar a língua dos avós? Por que só a língua portuguesa? E as festas, as músicas? E os
livros que liam em outras línguas?
Apesar dos ideais republicanos de educação para todos, as políticas imigrantistas,
de forma direta, pretendiam desde o início determinar a composição de características
da população brasileira e, assim, das crianças. Discriminando os negros (já libertos),
mas querendo eliminar suas características “físicas/morais”, além das marcas fortes da
presença indígena no território paulista, a política visava a superação com a vinda de
brancos europeus. Não sabemos como a chegada de tantas crianças brancas em uma
população até então com uma presença grande de negros e mestiços vindos da
escravidão e uma herança cultural indígena alterou as relações estabelecidas pelas
pessoas e instituições com as várias crianças.
Mas o que podemos perceber é que as crianças brancas que chegavam eram
consideradas superiores às demais (negras, mestiças e indígenas), assim como as
orientais “amarelas” que começaram a chegar a partir de 1908. Entretanto, sobre as
crianças imigrantes brancas também se exercia a política nacionalista. Nunca
esquecemos a fala de uma professora que começou a lecionar na Primeira República,
explicitando que naquela época achava que os negros já haviam sido colocados em seu
devido lugar, mas que os imigrantes deviam ser controlados.

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Para além de sua importância como pequenas trabalhadoras, as crianças
representavam a esperança de um país mais “civilizado”, daí a priorização do ensino
primário (ANTUNHA, 1976).
O problema da nacionalização do ensino adquiriu naquela época dois aspectos
distintos, porém solidários; tratava-se de (a) abrasileirar os brasileiros por meio da
alfabetização e da educação moral e cívica e de (b) integrar o imigrante estrangeiro.
No primeiro caso, foi imenso o trabalho que se realizou, tanto no campo da
alfabetização, quanto no da educação moral e cívica (ANTUNHA, 1976. p. 167).
Muitas crianças tiveram sua escola fechada pelo poder público e muitas famílias
foram obrigadas a se mudar, como em Santos, para outras regiões do estado, em
poucas horas. Mesmo na cidade de São Paulo, em que os imigrantes desenvolveram
desde sua chegada estratégias para manter sua cultura mesmo em escolas oficiais, as
consequências para as crianças certamente foram grandes.
Não só a guerra interferiu nos processos de educação escolar, como nos projetos
de vida das famílias, interrompendo os sonhos e possibilidades de retorno para os
contextos de origem. Mas sobre as crianças recaíram ainda, com maior intensidade, os
preconceitos contra os que vieram de fora, especialmente japoneses.
Com a política nacionalista de Getúlio e todas as restrições impostas aos
estrangeiros (além das restrições à sua entrada, com a Lei de Cotas para cada grupo).
O problema que afetou crianças foi a questão das línguas, faladas por suas famílias e
em suas escolas, quando havia professores mantidos pelo grupo, como era muito
comum entre japoneses, alemães e italianos. Muitas continuaram aprendendo em casa,
com os mais velhos e até nas escolas onde o ensino da língua estrangeira era dado de
forma clandestina. Muitos imigrantes que moravam na cidade de São Paulo e arredores
relataram como pagavam professores para ensinar seus filhos, embora houvesse uma
fiscalização contínua do governo sobre todos. Procuravam também eles observar se
algum fiscal se aproximava, e aí, aquele japonês, que era professor, se transformava
em agricultor, por exemplo. Na conhecida Escola de Dona Akama, que era voltada para
a formação cultural e profissionalizante de meninas de famílias japonesas, as tradições
e leitura em japonês continuaram: os livros eram escondidos quando chegava um fiscal.
Em escolas alemãs, os currículos eram alterados; a incorporação da língua portuguesa
permeou todas as disciplinas e até as músicas deixavam de ser em alemão, dando lugar
a hinos nacionais e de louvação ao Brasil. Como podemos constatar em análise de
material usado pelas crianças de uma escola alemã do Bairro de Friburgo, em Campinas,
a mudança foi radical (DEMARTINI, 1991; DEMARTINI, 2004).

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Podemos dizer, assim, que a política nacionalista impôs às crianças a fala e a
escrita só em português, proibindo-as de se expressarem também em outra língua,
como até então já podiam fazer há muito tempo em São Paulo. As crianças não podiam
ser presas, como seus pais, mas suas formas de expressão ficaram limitadas.
Além disso, a situação de guerra e as restrições foram comprometendo o sonho
de muitas famílias de retornarem para seu contexto de origem e, assim, desestimulando
o aprendizado das línguas estrangeiras. Muitas foram crescendo, então, com a
perspectiva dos pais de que pudessem ascender socialmente como cidadãos brasileiros,
portanto, falantes da língua portuguesa e frequentadores das escolas públicas de
qualidade. Muitas escolas étnicas continuaram funcionando durante esses anos e
procuraram se assemelhar às nacionais, mas, de alguma forma, conseguiram veicular
a cultura dos grupos a que estavam ligados, pois as crianças carregavam de casa os
costumes e tradições de sua família. O habitus do grupo de pertencimento certamente
não foi apagado pelas leis e restrições estabelecidas, nem pelos currículos escolares
importantes.
Nas décadas de 1940 e 1950 a preocupação com a assimilação dos grupos
imigrantes continuou muito forte, como se pode constatar nas discussões realizadas
durante o VIII Congresso Brasileiro de Educação da década de 1940. Para muitos
educadores, a criança estrangeira ainda continuava sendo uma ameaça, especialmente
quando presentes em áreas de colonização mais recentes, as zonas pioneiras
(DEMARTINI, 1980).
É interessante observar como, de algum modo, eram simultâneas as vertentes
nacionalista e eugenista das políticas imigrantistas, que implicavam, assim, a seleção
dos imigrantes brancos desejáveis, mas que representavam justamente um perigo ao
Estado por virem de nações politicamente consideradas perigosas à soberania nacional
brasileira.
Talvez seja possível aventar que a priorização da entrada de brancos europeus e
sua consideração como hierarquicamente superiores aos demais grupos da sociedade e
demais imigrantes, tenha reforçado as desigualdades sociais e a discriminação e
preconceitos contra alguns deles. Na Primeira República, embora os ideais republicanos
propagassem a educação para todos.
Verificou-se que os negros eram excluídos das escolas públicas. Um dos principais
participantes do movimento negro nesse período, José Correia Leite, relatou-nos como,
quando criança, não conseguia frequentar escolas públicas; depois passou a conviver
com famílias italianas para participar de espaços sociais da cidade (DEMARTINI, 1989).

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Não sabemos se essa hierarquização dos grupos e de suas crianças era percebida
por estas, mas o fato de muitas crianças frequentarem as chamadas escolas étnicas
certamente as afastou de passarem pelos mesmos processos de escolarização.

A SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: O PÓS-GUERRA E NOVOS PROJETOS PARA


AS CRIANÇAS

Por outro lado, o pós-guerra trouxe para alguns grupos de imigrantes um reforço
de sua cultura de origem, com a chegada de novas levas, vindas da Europa e do Oriente.
Vieram muitas famílias de portugueses e espanhóis, ainda fugindo da ditadura de
Salazar e Franco, e uma nova imigração de japoneses em consequência da derrota do
Japão na Segunda Guerra. Com as novas levas, vieram muitas crianças, algumas que
já haviam frequentado os anos iniciais da educação elementar, tendo assim que passar
por adaptações em seu processo de escolarização.
Para as crianças japonesas, essa foi uma situação difícil, pois sua língua e o
alfabeto da escrita ocidental eram totalmente desconhecidos para elas. Uma professora
entrevistada que deu aula para essas crianças que chegaram em Itaquera e tinham que
se preparar para o exame de admissão ao ginásio, contou como teve que inventar
métodos visuais inovadores para que eles aprendessem o português em pouco tempo.
Além disso, ainda enfrentavam os japoneses o forte preconceito contra os “amarelos”
que ressurgiu nesse período com a derrota do Japão na Guerra e, principalmente, com
as consequências da atuação da Shindo-Renmei (Liga dos Súditos do Imperador),
movimento paramilitar que defendia o nacionalismo e supremacia do Japão, negando
sua derrota e praticando muitos crimes que levaram à cisão do grupo japonês em São
Paulo. Com isso, muitas famílias foram afetadas, muitas crianças tiveram que mudar
de escola, por discordâncias políticas dos pais com a direção da escola que
frequentavam, como ocorreu na escola de Dona Akama, na Vila Mariana, pois essa
acreditava na derrota do Japão, ao contrário de vários pais. Muitas famílias que viviam
no interior foram enganadas e, acreditando que o Japão havia vencido a Guerra,
venderam suas terras com pagamento em ienes (que não valiam mais nada) para voltar
para o Japão; ficaram na miséria e tiveram que recomeçar sua vida (foi um período de
muitos suicídios de pais de família) (DEMARTINI, 2004).
O período da Segunda Guerra e as décadas de 1950 e 1960 foram direcionando
as crianças para projetos familiares voltados para sua inserção no contexto paulista,
deixando de lado o sonho de retorno de muitos imigrantes.

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Ao mesmo tempo, o país que se industrializava foi aumentando as possibilidades
de trabalho, sendo as crianças e os jovens cada vez mais direcionados para aquisição
de qualificação profissional e formação de nível superior, visando á realização de
empreendimentos em várias áreas (imobiliária, horticultura, serviços diversos,
indústrias etc.). Meninos e meninas participaram desse processo de ascensão,
incentivados pela família (DEMARTINI, 1985). No caso das crianças japonesas, pesava
ainda a tradição de que deveriam se esforçar muito para atingir seus objetivos
(gambarê).
No início da segunda metade do século XX, as crianças migrantes que foram
chegando encontraram um sistema educacional já estruturado, com a rede de educação
primária pública e privada cobrindo todo o estado e começando a passar por reformas
para ampliar o atendimento para os anos do então chamado ginásio. Assim a criação
de escolas por parte dos próprios imigrantes não era tão necessária, pois as crianças
poderiam ingressar nas escolas já disponibilizadas. A escolha do tipo de escola voltou-
se assim mais para o objetivo de ascensão socioeconômica das famílias, algumas com
orientação para o ensino profissionalizante, outras visando carreiras liberais, via ensino
superior.
A preocupação também com a escolha da escola, que de alguma forma
mantivesse relação com a cultura de origem, como colégios italianos, japoneses,
alemães, que continuaram funcionando, principalmente na metrópole, sendo sempre
muito demandados.

ANOTAÇÕES FINAIS

Como observamos no início, as reflexões aqui apresentadas são resultantes das


informações coletadas durante pesquisas realizadas com alguns grupos de imigrantes
no estado de São Paulo, alguma referentes ao período das grandes migrações do final
do século XIX e primeiras décadas do século XX, outras a processos de deslocamentos
mais recentes.
O que conseguimos constatar a partir desses estudos é que durante muitas
décadas as crianças de grupos imigrantes foram sujeitos importantes; necessárias à
sobrevivência das famílias e ao desenvolvimento econômico da sociedade de adoção,
embora nem sempre fossem evidenciadas nas estatísticas oficiais. Conjugavam-se,
assim, os interesses de imigrantes, de empregadores e do Estado. Ao mesmo tempo,
entretanto, do ponto de vista do Estado era preciso torná-las “brasileiras”: vinham de

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outras nações, consideradas “mais civilizadas” e poderiam pôr em risco os projetos
nacionalistas brasileiros. Sobre as crianças incidiram, assim, as políticas de assimilação,
que viam nelas a forma de acabar com as culturas e interesses nacionalistas dos grupos
de origem.
Há indicações de que a chegada de crianças europeias e asiáticas na sociedade
na sociedade paulista foi reforçando a hierarquia que discriminava os que aqui
anteriormente residiam e estavam nas camadas mais pobres, negros e mestiços com
origem na escravidão, mesmo quando os imigrantes viviam em situações também
precárias.
As políticas nacionalistas e a Segunda Guerra Mundial estabeleceram controles
rígidos sobre as crianças de alguns grupos imigrantes, mas, ao mesmo tempo, levaram
ao rompimento dos projetos de retorno aos contextos de origem, solidificando projetos
para a inserção no contexto brasileiro, geralmente pautados na escolarização em níveis
mais elevados.
Os novos fluxos migratórios do final do século XX chegam em contexto com maior
oferta de educação e também com as proteções estabelecidas pelos Direitos Humanos,
não só a crianças, mas aos imigrantes pela legislação brasileira. As questões ligadas ao
trabalho de crianças imigrantes aparentemente vão ficando para trás, mas continuam
sendo discutidas as questões pedagógicas relacionadas à escolarização das crianças
vindas de várias regiões do mundo, e que continuam muitas delas vivenciando situações
precárias. Não há ainda clareza nas políticas públicas atuais, mas várias experiências
vêm sendo realizadas nesse processo de atendimento a crianças que se deslocaram.
Para os pesquisadores, ficam as indagações: como acompanhar os
deslocamentos contínuos de crianças e suas vivências? Como elas registram suas
experiências? As mudanças contínuas deixam que marcas em suas emoções e
identidades?
A questão que permanece é: se por um lado, no campo acadêmico, se
intensificaram os estudos sobre fluxos migratórios e sobre infância, e por outro como o
sistema educacional foi se expandindo, teriam as crianças imigrantes deixado de serem
vistas como “ameaçadoras” no contexto em que se inserem? Ou outras formas de
hierarquização e/ou reforço de antigas representações continuam persistindo de
maneira mais disfarçada?
Este texto, por ironia do destino, foi sendo finalizado quando, ao contrário de
deslocamentos às crianças do mundo, incluindo as brasileiras, foi imposto um
confinamento para escaparem de contaminação altamente contagioso, muito mais

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rápido em seus deslocamentos próprios. Que consequências essa terrível ameaça trará
a crianças migrantes no mundo é impossível prever. Mas muitas no Brasil já estão sem
escola e os pais sem emprego. Tudo é incerto e ameaçador.

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NOTAS

CRIANÇAS IMIGRANTES: “NECESSÁRIAS”, “INVISÍVEIS”, MAS “PERIGOSAS”


Immigrant children: “necessary”, “invisible”, but “dangerous”

Zeila de Brito Fabri Demartini


Doutora em Sociologia
Departamento de Ciências Sociais
Universidade de São Paulo
São Paulo, Brasil
[email protected]
https://orcid.org/0000-0002-5682-5816

Endereço de correspondência do principal autor


Rua Nibe Perobelli, 192, Jardim Rolinópolis, Butantã, CEP 05535-050, São Paulo/SP- Brasil

AGRADECIMENTOS
Agradecemos a todos os entrevistados que contribuíram com seus relatos para realização das pesquisas
sobre a educação e imigração em São Paulo, assim como aos assistentes que auxiliaram na obtenção de
dados das pesquisas em diferentes momentos.

CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA
Concepção e elaboração do manuscrito: Z. B. F. Demartini
Coleta de dados: Z. B. F. Demartini
Análise de dados: Z. B. F. Demartini
Discussão dos resultados: Z. B. F. Demartini
Revisão e aprovação: Z. B. F. Demartini

CONJUNTO DE DADOS DE PESQUISA


O conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo não está disponível publicamente.

FINANCIAMENTO
Os dados foram obtidos em diferentes pesquisas que contaram com o apoio do INEP (Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico), por meio de bolsas de bolsa de Produtividade e Pesquisa da autora, bolsas de
iniciação científica e assistência técnica, verba para aquisição de material e pagamento de despesas para
a coleta das entrevistas, organização dos materiais coletados, reprodução e digitalização de material (Os
processos estão disponíveis no site do CNPq).

CONSENTIMENTO DE USO DE IMAGEM


Não se aplica.

APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA


Não se aplica.

CONFLITO DE INTERESSES
Não se aplica.

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- NUPEIN/CED/UFSC. Publicação no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de
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EDITORES – uso exclusivo da revista


Márcia Buss-Simão e Kátia Agostinho.

HISTÓRICO – uso exclusivo da revista


Recebido em: 15-05-2020 – Aprovado em: 03-06-2020

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