18454-Texto Do Artigo-73218-1-10-20210424
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E MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Milene Tonetto
Universidade Federal de Santa Catarina
Resumo: O principal objetivo deste artigo é investigar quais princípios da ética do clima (a saber, os
princípios poluidor-pagador, beneficiário-pagador, capacidade para pagar, igualdade de emissões per
capita; princípios híbridos: princípio poluidor-pagador sensível à pobreza e capacidade para pagar
sensível historicamente) podem ser usados na defesa de um modelo justo a ser desenvolvido para
distribuir os deveres de mitigação das emissões, reparação e adaptação às mudanças climáticas. O
artigo defende que um modelo justo de distribuição deverá reconhecer a contribuição histórica das
emissões de gases de efeito estufa (GEE) para as mudanças climáticas, os beneficiários atuais das
emissões de GEE, a capacidade de pagar os encargos e não impedir o desenvolvimento daqueles que
pouco se beneficiaram com as emissões passadas.
Palavras-chave: Ética ambiental, mudanças climáticas, justiça global, direitos humanos.
Abstract: The main aim of this paper is to investigate which principles of climate ethics (namely, the
polluter pays, beneficiary pays, ability to pay, equal emissions per capita; hybrid principles: poverty
sensitive polluter pays principle and ability to pay historically sensitive) can be used to defend a fair
model to be developed to distribute the duties of mitigating emissions, repairing and adapting to climate
change. The article argues that a fair distribution model should recognize the historic contribution of
greenhouse gas (GHG) emissions to climate change, the current beneficiaries of GHG emissions, the
ability to pay charges and not hinder the development of those who have benefited little from past
emissions.
Keywords: Environmental ethics, climate change, global justice, human rights.
Considerações iniciais
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a) Igualdade de encargos
1 Uma versão desse princípio é defendida por Martino Traxler (2002) como sendo a atribuição mais justa
dos encargos de redução das emissões de CO 2 . Traxler argumenta que um tratado deve igualar os
encargos de redução de emissões em vez da quantidade ou porcentagem de reduções nos estados.
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[a]s pessoas que vivem em pobreza extrema não devem ser obrigadas a restringir
suas emissões, permanecendo assim na pobreza, a fim de que aqueles que vivem
no luxo não precisem restringir suas emissões (...). Qualquer estratégia de
manter a riqueza para algumas pessoas, mantendo outras pessoas em ou abaixo
da subsistência é (...) evidentemente injusto (SHUE, 2014, p. 50).
Para Shue, é injusto exigir que países muito pobres assumam custos
que reduziriam o progresso e desenvolvimento para manter estilos de vida
mais privilegiados nos países desenvolvidos. A redução das emissões podem
dizer respeito a medidas diferentes de acordo com cada sociedade. As reduções
dos países ricos podem ser significantes, mas elas podem estar relacionadas a
hábitos luxuosos enquanto que as reduções dos países pobres podem significar
perdas de bens essenciais ameaçando o direito de se desenvolver.
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3 De acordo com Caney, “essa abordagem foi examinada por vários países em desenvolvimento,
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b) Beneficiário-pagador
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4 Lukas Meyer (2013) argumenta que as pessoas que vivem atualmente precisam respeitar os direitos
básicos das pessoas futuras como uma questão de justiça intergeracional. Bjørn Lomborg (2001)
defende que não devemos nos preocupar com as gerações futuras porque elas serão mais ricas do que
nós. Nesta lógica, os sacrifícios feitos pelas gerações presentes para beneficiar as gerações futuras são
vistos como uma transferência de riqueza daqueles que são menos favorecidos para aqueles que estão
em melhor situação.
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Caney defende uma abordagem que baseia em princípios híbridos que serão
apresentados a seguir.
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Princípio 1: As pessoas devem arcar com o ônus das mudanças climáticas que
elas causaram, desde que isso não as empurre para baixo de um padrão de vida
decente (2010b, p. 218).
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transferidas dos países ricos para os pobres” (2011b, p. 221). Como pode ser
visto, isso requer financiamento dos países mais ricos algo que também pode
ser justificado pelos princípios híbridos. Para finalizar, pode-se defender que
os princípios híbridos também podem determinar quem deve financiar as
ações de adaptação. Como foi observado anteriormente, é amplamente
reconhecido que as populações mais pobres do mundo serão as mais
vulneráveis aos perigos da mudança do clima e, portanto, sua capacidade
adaptativa precisa ser desenvolvida. Aplicando os princípios híbridos, fica claro
que os mais pobres não devem arcar com esses custos. “O PPPSP os isentaria
(seja por causa de sua pobreza e/ou porque suas emissões são muito baixas) e,
uma vez que estão em desvantagem, também seriam isentos pelo componente
da habilidade de pagar” (2010b, p.222). Caney sugere a necessidade de haver
um fundo de adaptação global financiado por aqueles que emitiram
quantidades excessivas de GEE e pelos mais favorecidos do mundo. Isso
permite que essa posição mantenha o senso de justiça do PPP e do princípio
de capacidade para pagar e, assim, satisfazer as preocupações de equidade.
Tendo apresentado a posição baseada nos princípios híbridos,
podemos agora compará-la com o PRCPD apresentado pela maioria dos
documentos internacionais que tratam das mudanças climáticas. Pode-se
verificar que um ponto de semelhança entre as abordagens é que elas
conseguem incluir elementos de consideração histórica para averiguar a
contribuição do problema e a sensibilidade pela condição de pobreza para
determinar o que eles são capazes de fazer.
Além dessas semelhanças, há algumas diferenças. Em primeiro lugar,
o PRCPD refere-se às responsabilidades dos Estados. A abordagem dos
princípios híbridos, todavia, não restringe deveres apenas aos Estados, mas
também aos indivíduos, empresas e autoridades políticas. Uma segunda
diferença é que o PRCPD tende a ser interpretado de tal maneira que os
Estados que se beneficiaram com a industrialização são responsabilizados pelas
decisões das gerações anteriores. Essa posição de acordo com os princípios
híbridos deve levar em conta as responsabilidades históricas, a capacidade de
pagar e se a riqueza foi produzida de forma injusta. Outra diferença é que o
PRCPD, ao contrário da abordagem híbrida, não leva em conta o que foi
chamada de ignorância desculpável. À luz dessas diferenças e semelhanças,
pode-se sustentar que a abordagem híbrida revela-se uma maneira de defender
os valores gerais afirmados pelo princípio de PRCPD afirmadas em
documentos jurídicos internacionais.
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Considerações finais
Referências
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Email: [email protected]
Recebido: 04/2020
Aprovado: 10/2020
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