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A Dedução Fiscal das Perdas no


Recebimento de Créditos
Fábio Piovesan Bozza
Advogado em São Paulo.

Resumo
Não são poucas as situações em que a legislação brasileira impõe uma sé-
rie de condições para permitir a dedução fiscal de custos, despesas e per-
das nas bases de cálculo do imposto de renda pessoa jurídica e da contri-
buição social sobre o lucro líquido. Neste estudo, pretende-se analisar as
principais características do regime de dedução fiscal relativamente às per-
das no recebimento de crédito, tratado nos arts. 9th e seguintes da Lei n.
9.430, de 27 de dezembro 1996.

Abstract
There are not a few situations in which Brazilian legislation imposes a series
of requirements on the deduction of costs, expenses and losses from the
calculation basis of corporate income tax and social contribution tax on net
profits. In this article, we intend to analyze the main features of the tax
deduction system related to creditor losses, regulated by art. 9th and followings
of Law n. 9.430, of December 27th, 1996.

1. Introdução
Desenvolver uma atividade empresarial não é uma tarefa simples. O sucesso
do empreendimento depende, além da coordenação de esforços das várias pessoas
envolvidas, de uma série de sacrifícios para gerar receitas, correspondentes a cus-
tos, despesas e perdas.
Em geral, os custos referem-se ao emprego de recursos financeiros ou equi-
valente, ou a assunção de dívidas, para aquisição de bens e direitos que passarão a
compor o ativo da empresa, a exemplo, da aquisição de imóvel para instalação da
fábrica, da compra de máquinas e equipamentos, de móveis e utensílios etc.
Já as despesas voltam-se para a obtenção de utilidades ou benefícios que não
são passíveis de apropriação no ativo, muito embora elas sejam igualmente necessá-
rias ao desenvolvimento da atividade institucional da pessoa jurídica, a exemplo
do pagamento dos salários dos empregados, do recolhimento dos tributos, do pa-
gamento dos juros sobre empréstimo contraído.
Custos e despesas são sacrifícios desejados, pretendidos, queridos, ainda que
mal dimensionados ou incorridos em excesso. As perdas, ao revés, não estão sob o
controle da empresa, não são planejadas nem desejadas, embora sua ocorrência,
em determinados casos, possa ser antecipada e seus efeitos minimizados. Alguns
exemplos de perdas: divergência entre o controle de estoque e o inventário físico,
geadas ou secas que podem comprometer plantações ou criações de animais, in-
cêndios ou inundações que podem atingir estoques, máquinas e outros ativos.
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Nesse contexto, a perda no recebimento de crédito, isto é, a inadimplência dos


devedores no cumprimento de suas obrigações, é um exemplo de sacrifício inevi-
tável ao giro dos negócios. Em virtude da sua recorrência, as empresas começaram
a, conservadoramente, registrar provisões para perdas com créditos de liquidação
duvidosa em suas demonstrações financeiras, com base nas médias históricas de
inadimplência ou em percentuais predeterminados.
Até 1996, as importâncias necessárias à formação da provisão para créditos
de liquidação duvidosa eram dedutíveis como despesa operacional, para fins de
apuração do lucro real. Entretanto, desde o ano de 1997, a sistemática de provisão
constituída com base em percentual aplicável sobre o total dos créditos a receber
foi substituída pelo regime de dedução direta de perdas ocorridas no recebimento
de créditos, conforme estabelecido pela Lei n. 9.430, de 27 de dezembro de 1996.
O presente trabalho pretende investigar as principais características do atual
regime fiscal de dedução de perdas no recebimento de créditos.

2. Dedutibilidade de Perdas no Recebimento de Créditos


O art. 9º da Lei n. 9.430 encontra-se redigido nos seguintes termos:
“Seção III
Perdas no Recebimento de Créditos
Dedução
Art. 9º As perdas no recebimento de créditos decorrentes das atividades da
pessoa jurídica poderão ser deduzidas como despesas, para determinação
do lucro real, observado o disposto neste artigo.
§ 1º Poderão ser registrados como perda os créditos:
I - em relação aos quais tenha havido a declaração de insolvência do deve-
dor, em sentença emanada do Poder Judiciário;
II - sem garantia, de valor:
a) até R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por operação, vencidos há mais de seis
meses, independentemente de iniciados os procedimentos judiciais para o
seu recebimento;
b) acima de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) até R$ 30.000,00 (trinta mil reais),
por operação, vencidos há mais de um ano, independentemente de inicia-
dos os procedimentos judiciais para o seu recebimento, porém, mantida a
cobrança administrativa;
c) superior a R$ 30.000,00 (trinta mil reais), vencidos há mais de um ano,
desde que iniciados e mantidos os procedimentos judiciais para o seu re-
cebimento;
III - com garantia, vencidos há mais de dois anos, desde que iniciados e
mantidos os procedimentos judiciais para o seu recebimento ou o arresto
das garantias;
IV - contra devedor declarado falido ou pessoa jurídica declarada concor-
datária, relativamente à parcela que exceder o valor que esta tenha se com-
prometido a pagar, observado o disposto no § 5º.
§ 2º No caso de contrato de crédito em que o não pagamento de uma ou
mais parcelas implique o vencimento automático de todas as demais par-
celas vincendas, os limites a que se referem as alíneas a e b do inciso II do
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parágrafo anterior serão considerados em relação ao total dos créditos, por


operação, com o mesmo devedor.
§ 3º Para os fins desta Lei, considera-se crédito garantido o proveniente de
vendas com reserva de domínio, de alienação fiduciária em garantia ou de
operações com outras garantias reais.
§ 4º No caso de crédito com empresa em processo falimentar ou de con-
cordata, a dedução da perda será admitida a partir da data da decretação
da falência ou da concessão da concordata, desde que a credora tenha ado-
tado os procedimentos judiciais necessários para o recebimento do crédi-
to.
§ 5º A parcela do crédito cujo compromisso de pagar não houver sido hon-
rado pela empresa concordatária poderá, também, ser deduzida como per-
da, observadas as condições previstas neste artigo.
§ 6º Não será admitida a dedução de perda no recebimento de créditos com
pessoa jurídica que seja controladora, controlada, coligada ou interligada,
bem como com pessoa física que seja acionista controlador, sócio, titular ou
administrador da pessoa jurídica credora, ou parente até o terceiro grau
dessas pessoas físicas.”
Quando analisamos o art. 9º da Lei n. 9.430, a primeira premissa a ser esta-
belecida é a de que esse regime fiscal regula a dedução antecipada e provisória de
perdas possíveis, relativamente a créditos para os quais não tenha sido dada quita-
ção aos respectivos devedores. Enquanto tais, essas perdas não envolvem falar em
esgotamento dos meios de cobrança.
Basta verificar que algumas das hipóteses constantes do art. 9º condicionam
a dedutibilidade da perda à constituição de uma espécie de provisão contábil e ao
início e à continuidade de medidas administrativas e/ou judiciais de cobrança, de-
monstrando que a perda ainda não é definitiva, embora seja efetiva1.
Aliás, esse é outro ponto que deve ser, desde logo, esclarecido, pela confusão
que pode causar. O fato de a dedução fiscal abranger “perdas efetivas” - expressão
cunhada pelo item 10 da exposição de motivos da Lei n. 9.430, abaixo transcrito -
não significa que a perda deva, necessariamente, ser permanente ou definitiva.
Significa, isto sim, que ela já deve ter acontecido, de fato, para o credor, em virtu-
de da inadimplência do devedor, sendo a correspondente dedutibilidade depen-
dente do preenchimento das condições legais que foram fixadas pelo art. 9º. Na
verdade, essa locução foi utilizada para explicar a mudança introduzida pela Lei
n. 9.430 nos critérios legais então vigentes (art. 43 da Lei n. 8.981, de 1995) para
cálculo e dedução fiscal da provisão para crédito de liquidação duvidosa, ou sim-
plesmente PDD (“Provisão para Devedores Duvidosos”), cuja constituição baseava-
se em perdas estimadas ou prováveis:

1
No caso de créditos sem garantia, de valor até R$ 5.000,00, o procedimento de dedução estabele-
cido pela legislação determina o lançamento da perda diretamente à conta do ativo que registra o
crédito (como se fosse uma perda definitiva) e independente da existência ou manutenção de me-
didas de recuperação dos mesmos. Isso os coloca numa situação “sui generis” porque, havendo pro-
cedimento administrativo ou judicial de cobrança, a dedução fiscal será tida como provisória, ao
contrário do que poderia ocorrer se não existisse tal procedimento de cobrança, em que a dedução
estará mais próxima de uma perda definitiva.
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“10. Os arts. 9º a 14 representam grande evolução na sistemática da base


de cálculo do imposto de renda, no que diz respeito às perdas sofridas pe-
las pessoas jurídicas no recebimentos de seus créditos. Propõe-se uma re-
visão conceitual dos atuais critérios, a exemplo do que vem ocorrendo na
legislação do imposto de renda dos países industrializados desde a meta-
de dos anos 80. Essa revisão consiste na substituição dos atuais critérios de
provisionamento, baseados em médias históricas, que nem sempre espe-
lham a realidade, por uma sistemática que contempla perdas efetivas so-
fridas pela pessoa jurídica, a partir de regras objetivas.”
Evidenciando a diferença entre as “perdas prováveis” e as “perdas efetivas”,
vale citar a ementa do Acórdão n. 103-23509, julgado em 26 de junho de 2008 pelo
antigo 1º Conselho de Contribuintes (atual Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais - Carf), já na vigência do regime de dedutibilidade de perdas efetivas da Lei
n. 9.430, mas cujo caso concreto envolveu a glosa de dedução feita no regime an-
terior de PDD:
“Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ
Ano-calendário: 1994
Ementa: Provisão para Devedores Duvidosos - Constituição - Causa ou Ori-
gem dos Créditos - Na interpretação do art. 221 do RIR/80, que contem-
plava a sistemática das ‘perdas prováveis’ e não das ‘perdas efetivas’, não
cabe fazer distinções a respeito da causa ou origem dos créditos que ser-
vem de base de cálculo da provisão, não previstas expressa ou implicitamen-
te no texto legal, o que implica dizer que é desnecessária a prova nos autos
de que a provisão foi constituída sobre os créditos decorrentes da explora-
ção da atividade operacional da interessada.”
Desse modo, as deduções provisórias e antecipadas contrapõem-se às perdas
definitivas, enquanto que as perdas efetivas opõem-se às perdas estimadas ou pro-
váveis. A jurisprudência administrativa é pródiga em exemplos.
Para confirmar a distinção entre o regime de dedução antecipada e o regime
de perda definitiva, citamos os seguintes acórdãos do antigo 1º Conselho de Con-
tribuintes, que afastam as regras do primeiro regime (dedução antecipada) para
privilegiar a aplicação do segundo (perdas definitivas), em situações envolvendo
descontos ou abatimentos concedidos pelo credor ao devedor, como meio de ob-
ter o recebimento parcial do crédito e evitar maiores prejuízos, ou perdas havidas
em cessão de créditos para terceiros2:
- Acórdão n. 101-91160, de 12 de junho de 1997, segundo o qual o perdão
de crédito sem esgotar os meios de cobrança constitui perda indedutível:
“Provisão para Devedores Duvidosos - O art. 221 do RIR/80 não autoriza
o lançamento como despesa, a débito da conta Provisão para Devedores
Duvidosos, do valor concernente ao ‘perdão de débitos’ dado a cliente tido
como insolvente, se não for provada a utilização de todos os meios legais
previstos à cobrança do crédito. De igual modo, são indedutíveis os valo-

2
Para uma análise mais profunda do tema, recomendamos a leitura do inteiro teor desses acórdãos,
porquanto suas ementas nem sempre revelam a verdadeira extensão do julgado.
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res dos créditos dos clientes vencidos há mais de 180 dias, lançados a dé-
bito da conta Provisão para Devedores Duvidosos, se não provado o pré-
vio esgotamento dos meios legais à sua cobrança.”
- Acórdão n. 101-91254, de 19 de agosto de 1997, que assentou que a baixa
de crédito incobrável pela inexistência de bens não constitui perdão de dívida:
“Custos, Despesas Operacionais, Encargos - O [sic] baixa de crédito que se
tornou incobrável pela inexistência de bens do devedor para garanti-lo não
representa ‘perdão de dívida’, liberalidade do credor a impedir sua dedu-
tibilidade. A desnecessidade da despesa para fundamentar a glosa há que
ser suficientemente demonstrada pela autoridade fiscal.”
- Acórdãos n. 107-06500, de 6 de dezembro de 2001, e n. 107-06506, de 17
de dezembro de 2001; que estabeleceram que os descontos concedidos não seguem
a regra de dedução antecipada da perda constante do art. 43 da Lei n. 8.981, mas
o regime geral de dedutibilidade das despesas; além disso, descontos e abatimen-
tos tornam a perda definitiva e não correspondem à liberalidade, mas à prática ne-
gocial lícita no sentido de evitar maiores prejuízos:
“Despesas Operacionais - Abatimentos Concedidos na Liquidação de Cré-
ditos - Dedutibilidade - Não se tratando a situação fática de perdas com
créditos de liquidação duvidosa, prevista no artigo 43 da Lei nº 8.981/95,
não há que se falar em esgotamento das possibilidades e meios de cobran-
ça. Assim, os abatimentos concedidos ao devedor na liquidação de opera-
ções de crédito classificam-se como despesas operacionais e são dedutíveis
do lucro operacional.”
- Acórdão n. 101-94233, de 11 de junho de 2003, entendeu não se aplicar o
art. 9º da Lei n. 9.430 às perdas em cessão de crédito:
“IRPJ - Glosa de Despesa - Dedutibilidade - Perdas em Cessão de Crédito
- As perdas apuradas em transações de cessão de direitos de crédito, não
tendo restado dúvidas quanto a sua efetividade, nem questionado o valor
referente à transação, devem ser consideradas como necessárias, normais
e usuais para o tipo de atividade desenvolvida pela empresa, e não há como
questionar a dedutibilidade correspondente à diferença, em face da legis-
lação de regência.”
- Acórdão n. 101-94261, de 2 de julho de 2003, de acordo com o qual a de-
dução dos prejuízos havidos em determinada operação não está sujeita à norma do
art. 9 da Lei n. 9.430:
“IRPJ. Pessoas Jurídicas Administradoras de Cartões de Crédito. Custos e
Despesas Operacionais. ‘Charge Back’. Nos contratos que tratam de atos
jurídicos coligados ou negócios jurídicos coligados, os custos ou despesas
denominados de ‘Charge Back’ de responsabilidade das empresas adminis-
tradoras de cartões de créditos são dedutíveis para a determinação do lu-
cro líquido e, consequentemente, na determinação do lucro real, por se tra-
tarem de encargos necessários, usuais e normais para o tipo de atividade
desenvolvida.”
- Acórdão n. 107-08121, de 16 de junho de 2005, que considerou dedutível o
desconto concedido pelo credor ao devedor, como forma de incentivar o pagamento
da dívida:
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“IRPJ - Glosa de Despesa - Dedutibilidade - Desconto Concedido - É de-


dutível o desconto concedido pelo contribuinte com o objetivo de recebi-
mento de créditos cuja liquidação se torna de difícil realização.”
- Acórdão n. 101-95258, de 9 de novembro de 2005, que discorreu sobre a
dedutibilidade de prejuízo na liquidação do crédito através de dação em pagamen-
to, não se aplicando as normas contidas no art. 9º da Lei n. 9.430:
“Lucro Real - Despesas - Perda Efetiva no Recebimento de Créditos - A di-
ferença entre o montante dos créditos escriturados e o dos bens móveis e
imóveis recebidos em pagamento da dívida representa perda efetiva, e
como tal, é dedutível, como despesa operacional, na apuração do lucro
real.”
- Acórdão n. 101-95469, de 26 de abril de 2006, que versou sobre abatimen-
tos concedidos pelo credor para liquidação do crédito, os quais foram qualificados
como despesa operacional dedutível, e não como perda no recebimento de crédi-
to:
“Perdas no Recebimento de Créditos. Despesas Operacionais - Abatimen-
tos concedidos na Liquidação de Créditos - Dedutibilidade - Não se tratan-
do a situação fática de perdas com créditos de liquidação duvidosa, previs-
ta no artigo 43 da Lei nº 8.981/95, não há que se falar em esgotamento das
possibilidades e meios de cobrança. Os abatimentos concedidos ao deve-
dor na liquidação de operações de crédito classificam-se como despesas
operacionais e são dedutíveis do lucro operacional.”
- Acórdão n. 101-95760, de 21 de setembro de 2006, que analisou situação de
aquisição de créditos já vencidos, cuja contrapartida não transitou por resultado,
tendo o julgado considerado a baixa não dedutível pelo regime da Lei n. 9.430,
mas dedutível quando ficar comprovada a perda efetiva:
“Perdas na Liquidação de Créditos - Aquisição de Carteira de Créditos
Vencidos - A presunção de perdas no recebimento de créditos previsto no
art. 9º da Lei nº 9.430, de 1996, materializa, na esfera fiscal, o princípio
da prudência e do conservadorismo preconizados pela ciência contábil, ser-
vindo de verdadeira proteção para evitar a tributação sobre resultado fis-
cal improvável. Em se tratando de créditos adquiridos vencidos, cuja con-
trapartida não transitou por conta de resultado, o mero atendimento aos
requisitos contidos naquele dispositivo não autoriza sua apropriação como
despesa. Neste caso, para fins fiscais, somente se admite a repercussão no
resultado quando fique comprovada a perda definitiva do crédito.”
- Acórdão n. 103-22937, de 28 de março de 2007, que declarou que a perda
na cessão de crédito de ICMS rege-se pela norma geral de dedutibilidade:
“Perdas em Cessão de Crédito - Dedutibilidade - As perdas apuradas na ces-
são de direitos de crédito, não restando dúvidas quanto ao valor ou à efeti-
vidade, são dedutíveis, na apuração da base de cálculo do IRPJ.”
- Acórdão n. 101-96433, de 8 de novembro de 2007, que tratou de glosa da
dedução de perdas por, supostamente, não atender ao art. 9º da Lei n. 9.430; o
acórdão, todavia, declarou que o art. 9º não se aplica aos abatimentos ou descon-
tos concedidos pela credora para liquidação de seus créditos, por não se tratar de
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uma perda pela impossibilidade de cobrança, mas de concessão para recebimento


do que lhe é devido:
“Perdas no Recebimento de Créditos. Despesas Operacionais - Abatimen-
tos Concedidos na Liquidação de Créditos - Dedutibilidade - Não tratan-
do, a situação fática, de perdas provisórias, isto é, a créditos para os quais
não foi dada quitação ao devedor, mas que já estejam vencidos há um ou
dois anos, conforme previsto no art. 9º da Lei 9.430/96, não há que se fa-
lar em esgotamento das possibilidades e meios de cobrança. Os abatimen-
tos concedidos ao devedor na liquidação de operações de crédito classifi-
cam-se como despesas operacionais e são dedutíveis do lucro operacional.”
Outrossim, as diferenças e as semelhanças entre os regimes de dedução ante-
cipada (perdas estimadas ou prováveis “versus” perdas efetivas) podem ser vislum-
bradas nos seguintes julgados administrativos, todos do antigo 1º Conselho de
Contribuintes3:
- Acórdão n. 101-93974, de 16 de outubro de 2002, que examinou a mudan-
ça de sistemática para dedução das perdas, a qual, anteriormente, era feita com base
em provisão, sob bases estimadas, e, posteriormente, passou a ser feita com base
na “perda efetiva”, nos termos da Lei n. 9.430:
“IRPJ Perda no Recebimento de Créditos: Dedutibilidade - Nos anos-calen-
dário de 1996 e 1997 são dedutíveis os valores correspondentes aos crédi-
tos vencidos, considerados como perdas de acordo com as normas previs-
tas nos artigos 9º a 14 da Lei 9.430/96.”
- Acórdão n. 101-94543, de 14 de abril de 2004, que analisou a dedução de
perdas no recebimento de crédito no caso de concordata ou falência, ressaltando a
diferença entre perda antecipada (presumida, sem baixa contábil, ainda que não
se encontre definitivamente configurada) e perda definitiva (com baixa contábil):
“Perdas no Recebimento de Créditos. Atendidas as condições previstas no
art. 9º e seus §§ da Lei nº 9.430/96, não compete às autoridades julgado-
ras exigir o cumprimento de outras exigências não estabelecidas pela lei.
Assim, decretada a falência ou concordata, inexiste previsão legal para exi-
gência de procedimento judicial contra todos os avalistas.
Perdas no Recebimento de Créditos. Sendo o credor o maior interessado
na manutenção desse crédito: se ele, verificando que o tomador dos recur-
sos (pessoa jurídica), não possui bens, mover ação de cobrança contra os
sócios quotistas, estará atendida a exigência de procedimento judicial para
recebimento do crédito.
Perdas no Recebimento de Créditos. Se, em decorrência da execução, se ve-
rificar serem insuficientes ou inexistentes as garantias, deixará de existir
fundamento legal ou razão lógica que justifiquem esperar o transcurso de
dois anos, eis que, com a liquidação da garantia, mediante a contabiliza-
ção do resultado do arresto, a parte do crédito não recuperado ou a insub-
sistência da suposta garantia real dos demais créditos, já tendo decorrido

3
Para uma análise mais profunda do tema, recomendamos a leitura do inteiro teor desses acórdãos,
porquanto suas ementas nem sempre revelam a verdadeira extensão do julgado.
168 DIREITO TRIBUTÁRIO ATUAL nº 23

mais de um ano do vencimento sem pagamento, tais valores passaram a se


enquadrar no art. 9º, § 1º, inciso II, da Lei nº 9.430, de 1996, isto é, crédi-
tos sem garantia, podendo eles ser baixados. Entendimento do Conselho
nesse sentido.
Habilitação em Concordata. A habilitação na concordata é feita pelo pró-
prio concordatário, o credor somente se manifesta para eventual retifica-
ção, ante a existência de omissão ou irregularidade no rol e/ou no valor dos
créditos submetidos ao Juiz.
Parcelas Dedutíveis - É dedutível a diferença entre o valor: (i) do crédito e
do bem recebido em dação em pagamento; (ii) pelo qual o bem está regis-
trado na contabilidade e o efetivo valor de alienação.
Garantia Fidejussória. A caução de duplicatas protestadas e não pagas, no-
tas promissórias e cheques em iguais condições; promessas de pagamento
não cumpridas etc. não se constituem em garantia real, e sim fidejussória,
como tem decidido o Poder Judiciário.
Regime de Caixa. Em face do disposto no art. 41, § 1º, da Lei nº 8.981, de
1995, os tributos e contribuições que tenham sua exigibilidade suspensa não
são dedutíveis pelo regime de competência.”
- Acórdão n. 101-95469, de 26 de abril de 2006, que reafirmou que tanto o
regime de antiga PDD, quanto do atual art. 9º da Lei n. 9.430 referem-se a perdas
provisórias, e não a perdas definitivas (ementa já transcrita acima);
- Acórdão n. 101-95921, de 8 de dezembro de 2006, no qual a fiscalização
questionou a dedução da perda em razão de suposto diferimento da receita; toda-
via, restou provado que não houve o diferimento, sendo que a impossibilidade de
constituição da perda por conta do diferimento da receita sequer chegou a ser apre-
ciada pelo tribunal, sendo tecidas considerações sobre os regimes de dedução de
PDD e do art. 9º da Lei n. 9.430:
“IRPJ e CSLL Perdas no Recebimento de Crédito - Ainda que o contri-
buinte constitua Provisão para Devedores Duvidosos, deve ser excluída da
exigência a parcela em relação à qual restou comprovado corresponder a
títulos que poderiam ser considerados como perdas, nos termos do § 1º do
art. 9º da Lei 9.430/96.”
- Acórdão n. 101-96433, de 8 de novembro de 2007, que, ao examinar a de-
dutibilidade de abatimentos ou descontos concedidos pela credora para liquidação
de seus créditos, afirmou que o art. 9º da Lei n. 9.430 trata de dedução antecipa-
da e provisória de perdas, não havendo que se falar em esgotamento dos meios de
cobrança (ementa já transcrita acima).
Como se percebe, o art. 9º da Lei n. 9.430 dispõe sobre a dedutibilidade an-
tecipada, provisória e efetiva de perdas no recebimento de créditos.
Além dessas peculiaridades, a dedução da perda aludida pelo art. 9º consti-
tui uma faculdade outorgada pelo legislador em favor do contribuinte. Primeiro,
porque a própria redação do art. 9º não deixa dúvidas desse fato quando mencio-
na que as perdas “poderão ser deduzidas” ou os créditos “poderão ser registrados
como perda”. Segundo, porque a formalização do registro das perdas, aliada ao fato
de que a Lei n. 9.430 sucedeu o regime estabelecido pela Lei n. 8.981, confere à
dedução antecipada características que a aproxima bastante de uma provisão de-
DIREITO TRIBUTÁRIO ATUAL nº 23 169

dutível que, tradicionalmente, sempre foi considerada uma opção colocada à dis-
posição dos contribuintes, no momento de se apurar o IRPJ e a CSL devidos.
Enfim, dois regimes fiscais de apuração de perdas no recebimento de crédi-
tos convivem no mesmo sistema fiscal, de forma harmoniosa e independente: um,
de dedução antecipada, e outro, de perda definitiva.
O regime de dedução antecipada notabiliza-se pelas regras objetivas estabe-
lecidas pelo art. 9º da Lei n. 9.430, enquanto que a perda definitiva segue a nor-
ma geral de dedutibilidade, prevista no art. 47 da Lei n. 4.506, de 30 de novem-
bro de 1964, segundo a qual são dedutiveis as despesas não computadas nos cus-
tos, que sejam necessárias, normais e usuais à atividade da pessoa jurídica.
Nesse sentido, o art. 10 da Lei n. 9.430 representa uma verdadeira “ponte”
entre esses dois regimes, já que define as hipóteses em que as deduções antecipa-
das tornam-se definitivas, muito embora o dispositivo não exaure as situações de
perdas definitivas, abrangidas pelo art. 47 da Lei n. 4.506.
O art. 10 da Lei n. 9.430 possui a seguinte redação:
“Registro Contábil das Perdas
Art. 10. Os registros contábeis das perdas admitidas nesta Lei serão efetua-
dos a débito de conta de resultado e a crédito:
I - da conta que registra o crédito de que trata a alínea a do inciso II do
§ 1º do artigo anterior;
II - conta redutora do crédito, nas demais hipóteses.
§ 1º Ocorrendo a desistência da cobrança pela via judicial, antes de decor-
ridos cinco anos do vencimento do crédito, a perda eventualmente regis-
trada deverá ser estornada ou adicionada ao lucro líquido, para determi-
nação do lucro real correspondente ao período de apuração em que se der
a desistência.
§ 2º Na hipótese do parágrafo anterior, o imposto será considerado como
postergado desde o período de apuração em que tenha sido reconhecida a
perda.
§ 3º Se a solução da cobrança se der em virtude de acordo homologado por
sentença judicial, o valor da perda a ser estornado ou adicionado ao lucro
líquido para determinação do lucro real será igual à soma da quantia rece-
bida com o saldo a receber renegociado, não sendo aplicável o disposto no
parágrafo anterior.
§ 4º Os valores registrados na conta redutora do crédito referida no inciso
II do caput poderão ser baixados definitivamente em contrapartida à con-
ta que registre o crédito, a partir do período de apuração em que se com-
pletar cinco anos do vencimento do crédito sem que o mesmo tenha sido
liquidado pelo devedor.”

3. Momento da Dedutibilidade das Perdas Antecipadas


Conquanto seja facultativa, isso não significa que a dedução antecipada pre-
vista no art. 9º da Lei n. 9.430 possa ser tomada no momento de melhor conve-
niência para o contribuinte.
A liberdade conferida deve ser exercida no próprio período em que as condi-
ções legais tenham sido alcançadas, havendo risco na realização da dedução “a
posteriori”.
170 DIREITO TRIBUTÁRIO ATUAL nº 23

Com efeito, a sistemática de apuração desses dois tributos encontra-se alicer-


çada no regime de competência, previsto nos arts. 177 e 187 da Lei n. 6.404, de
15 de dezembro de 1976, e transposto pela legislação fiscal, como regra geral, pelo
art. 6º do Decreto-lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1976 (art. 273 do RIR/99 e
Parecer Normativo Cosit n. 2/96).
O respeito ao regime de competência deflui, ainda, da própria lógica utiliza-
da pelo legislador na construção da sistemática de dedução antecipada de que tra-
ta a Lei n. 9.430.
Apenas para demonstrar essa afirmação, vamos tomar como paradigma o tra-
tamento dispensado aos créditos pendentes, superiores a R$ 30.000. Se, de um
lado, a dedução antecipada desses créditos depende, basicamente, (i) do crédito
estar vencido há mais de um ano, se sem garantia, ou há mais de dois anos, se com
garantia, e (ii) do contribuinte credor ter iniciado e mantido os procedimentos ju-
diciais de cobrança, por outro lado, a própria legislação, ciente de que a dedução
antecipada carrega consigo o fardo da provisoriedade, fixa um prazo pelo qual se
presume a definitividade da perda. Trata-se dos parágrafos 1º e 4º do art. 10, se-
gundo o qual os valores registrados em conta redutora do crédito “poderão ser
baixados definitivamente em contrapartida à conta que registre o crédito, a partir
do período de apuração em que se completar cinco anos do vencimento do crédi-
to sem que o mesmo tenha sido liquidado pelo devedor”.
O decurso do prazo de cinco anos define o marco de uma presunção legal de
perda. O parágrafo 4º do art. 10 da Lei n. 9.430, acima transcrito, permite que,
após cinco anos do vencimento do crédito que antes tenha sido deduzido, nos ter-
mos do art. 9º, seja feita a sua baixa definitiva. O parágrafo 1º do mesmo artigo,
por outro lado, determina a tributação do valor debitado, em caso de desistência
da ação judicial, antes de completado o quinquênio.
A legislação, portanto, confere ao contribuinte a presunção absoluta de per-
da definitiva àqueles créditos para os quais os procedimentos judiciais de cobran-
ça foram iniciados e mantidos, até que a inadimplência do devedor complete cin-
co anos.
Em outras palavras, a legislação considera razoável tornar definitiva a dedu-
ção fiscal para aquele contribuinte que iniciou e manteve uma ação judicial de co-
brança por quatro anos, se o crédito não tiver garantia (cinco anos do vencimento
para dedução definitiva menos um ano para dedução provisória), ou por três anos,
se o crédito tiver garantia (cinco anos do vencimento para dedução definitiva me-
nos dois anos para dedução provisória), e que não conseguiu a satisfação do seu
direito. Daí a justificativa para a distinção de prazos de dedução de créditos a par-
tir da existência ou não de garantia, sendo presumido que o crédito com garantia
deverá ser satisfeito num período de tempo inferior ao do crédito sem garantia.
Mais do que isso. Entendemos ser plenamente razoável que o disposto no
parágrafo 4º do art. 10 da Lei n. 9.430 consagre uma presunção genérica de per-
da, após o quinto ano do vencimento do crédito, aplicável a todos os contribuin-
tes, quer eles tenham ingressado com a ação judicial de cobrança, quer não, justa-
mente porque o prazo de vencimento do crédito teria sido o único parâmetro uti-
lizado pela lei para tratar da dedução definitiva da perda.
DIREITO TRIBUTÁRIO ATUAL nº 23 171

Pois bem. Exceto pelas perdas definitivas previstas no art. 10 da Lei n. 9.430,
que acabam por referendar os critérios objetivos de dedução constantes do art. 9º,
tratando-se de perda no recebimento de crédito que siga a norma geral de deduti-
bilidade do art. 47 da Lei n. 4.506, não existe uma definição legal precisa sobre o
momento em que a definitividade da perda se configura. O reflexo dessa constata-
ção na jurisprudência administrativa é imediato, sendo inúmeros os exemplos das
controvérsias geradas e das discussões com o Fisco, a fim de comprovar o exauri-
mento das possibilidades de cobrança e de satisfação do crédito.
Além disso, outras hipóteses de dedução fiscal consideradas como facultati-
vas, em função do comando legal empregar o verbo “poder”, também devem guar-
dar respeito ao regime de competência. É o caso da dedução das despesas de de-
preciação, constante do art. 57 da Lei n. 4.506, segundo o qual “poderá ser com-
putada como custo ou encargo, em cada exercício, a importância correspondente
à diminuição do valor dos bens do ativo resultante do desgaste pelo uso, ação da
natureza e obsolescência normal”.
As manifestações do Fisco deixam claro que a depreciação de bens do ativo é
uma faculdade, não uma obrigação (Parecer Normativo CST n. 79/76). O sistema
tolera que a pessoa jurídica deixe de tomar a depreciação pela taxa integral, exa-
tamente porque ela é estimada. No entender da fiscalização, a taxa estimada fun-
cionaria como limite máximo de depreciação sem laudo técnico, mas não como uma
imposição, podendo a pessoa jurídica tomar uma depreciação menor, ou mesmo
nada depreciar, sem qualquer necessidade de explicar o motivo para o seu proce-
dimento.
A questão da inobservância do regime de competência pode surgir quando a
pessoa jurídica deseja recuperar quotas de depreciação não deduzidas anteriormen-
te, ou deduzidas apenas parcialmente. Embora a recuperação seja admitida, des-
de que não seja efetuada em percentual superior ao máximo de depreciação per-
mitido no ano (Acórdão n. 101-94975, de 18 de maio de 2005), há ainda de ser
avaliado se a dedução extemporânea, sem razões técnicas ou de operação, acarre-
ta vantagem indevida ao contribuinte e prejuízo ao Fisco4.
Trata-se da aplicação do disposto nos parágrafos 5º a 7º do art. 6º do Decre-
to-lei n. 1.598. O prejuízo decorrente da postergação pode existir quando a dedu-
ção se dê em período posterior no qual a alíquota do tributo tenha sido majorada
(o que acarretaria um ganho econômico de maior redução do valor tributo), ou
quando a postergação da dedução contribuiu para reduzir o limite de trinta por
cento para compensação de prejuízos fiscais (o que poderia ocorrer deixando-se a
dedução para período posterior mais lucrativo).
Como o mencionado art. 6º não fixa um limite temporal para a dedução fis-
cal após o período-base competente, restringindo-se a permiti-la com as restrições
expostas, em geral não se dá conta de que há um limite, o qual está previsto em
outras disposições legais.

4
“Plantão Fiscal - IRPJ” da Secretaria da Receita Federal, edição de 1990, Pergunta n. 257, cujo
entendimento é confirmado, mais recentemente, no “Perguntas e Respostas - IRPJ - 2008”, resposta
à Pergunta n. 053 do capítulo VIII.
172 DIREITO TRIBUTÁRIO ATUAL nº 23

Ou seja, uma despesa é dedutível no período-base em que é incorrida, o qual


é o período-base competente, mas pode ser deduzida depois dele se a postergação
não causar prejuízo ao Fisco e se for feita dentro de determinado tempo, pois a
dedução representa um direito, e todo direito tem um prazo para ser exercido, sob
pena de perecimento por decadência.
As primeiras normas a serem consideradas, na ausência de determinação ex-
pressa pelo art. 6º, são as regras legais limitadoras do direito de lançamento e do
direito de repetição do indébito, inclusive do direito de retificação de declarações
de rendimentos, que são normas de decadência desses direitos. Realmente, após o
prazo de decadência do seu direito de lançar um tributo, o Fisco não pode mais agir
contra o contribuinte, e este também perde direito contra o Fisco, inclusive o de
deduzir despesas e perdas que não tenham sido deduzidas no período-base com-
petente.
Como se sabe, a decadência fiscal ocorre no prazo de cinco anos, o qual, no
caso de IRPJ e de CSL, começa a ser contado do encerramento do período-base.
Além disto, fora do Direito Tributário, há uma norma geral de direito públi-
co, a chamada “prescrição quinquenal” do Decreto n. 20.910, de 6 de janeiro de
1932, com as alterações do Decreto-lei n. 4.597, de 19 de agosto de 1942, que dis-
ciplina a prescrição e a decadência de direitos e ações contra as Fazendas Públicas,
e que no âmbito tributário vem sendo largamente aplicada para conter o exercício
extemporâneo de direitos em várias situações relacionadas a tributos, como a to-
mada fora do período competente de créditos de IPI e de ICMS5.
A íntima correlação entre os casos envolvendo a dedução de despesas de de-
preciação e a dedução de perdas no recebimento de crédito mereceu especial des-
taque no voto proferido pelo Conselheiro Mário Junqueira Franco Júnior, no jul-
gamento do Acórdão n. 101-95786, em 18 de outubro de 2006:
“Não restam dúvidas que o registro das depreciações é um fato contábil, li-
mitado em seu efeito fiscal por índices máximos permitidos. Apenas em
casos de depreciação acelerada, expressamente previstos no legislação,
poderá o contribuinte fazer ajustes na apuração da base do tributo.
O registro abaixo do índice máximo é uma opção do contribuinte, não se
lhe facultando alterá-lo posteriormente em retificações, pois o que é passí-
vel de retificação é sempre um erro material, não uma opção ou faculdade
legal.
O mesmo raciocínio serve para ajustes de perdas em recebimentos de cré-
ditos utilizados pelo contribuinte em sua retificadora. As normas de dedu-
tibilidade por lançamento a perdas conferem uma faculdade ao contri-
buinte que deve utilizá-la em tempo certo. Não o fazendo contabilmente,
impossível a retificação como compensação de valor devido.”

5
Relativamente a créditos extemporâneos de créditos de IPI, o Fisco também entende ser possível
apenas dentro do prazo de cinco anos (Parecer Normativo CST n. 515/71), e é pacífica a jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça, como, por exemplo: 1ª Turma, Recurso Especial n. 497.749-PR,
de 29 de junho de 2004; 1ª Turma, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 868.053-SC,
de 14 de agosto de 2007; 2ª Turma, Recurso Especial n. 554.794-SC, de 14 de setembro de 2004;
1ª Seção, Agravo Regimental nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 449.008-SC, de
14 de fevereiro de 2007.
DIREITO TRIBUTÁRIO ATUAL nº 23 173

Em suma, entendemos que o art. 9º da Lei n. 9.430 trata da dedução anteci-


pada, provisória e facultativa de perdas no recebimento de créditos, e que não se
confunde com as perdas definitivas registradas sob o fundamento da norma geral
de dedutibilidade, que é o art. 47 da Lei n. 4.506.
Apesar de facultativa, a dedução antecipada das perdas deve respeitar os di-
tames do regime de competência para o registro no período de apuração correto.
Consequentemente, entendemos ser possível a dedução antecipada em período-
base posterior ao do preenchimento dos requisitos constantes do art. 9º da Lei n.
9.430, desde que a postergação dessa dedução não cause prejuízo ao Fisco.
Essa também é a posição das autoridades fiscais federais que jurisdicionam os
contribuintes do Estado de São Paulo (Superintendência da 8ª Região Fiscal), con-
forme se denota da leitura da Solução de Consulta n. 286/98, de 2 de setembro de
1998:
“Assunto: IRPJ - Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica.
Ementa: Perdas no Recebimento de Créditos - Poderão ser deduzidas as
perdas no recebimento de créditos decorrentes das atividades da pessoa
jurídica desde que atendam as condições do art. 9º da Lei nº 9.430/96 e
sejam contabilizadas conforme o artigo 10 desta Lei. O reconhecimento
destas perdas poderá ser feito em período posterior ao que ocorrer, desde
que não produza efeito fiscal diversos daquele que seria obtido se realiza-
do na data prevista.
Dispositivos legais: Lei nº 9.430/96, arts. 9º e 10; IN SRF nº 11/96, art. 34.”
Além da observância dos efeitos da postergação, há prazo para a dedução
extemporânea das perdas em comento, a qual não poderá ser efetuada além de dez
anos a contar do vencimento do crédito. A fixação desse prazo provém da conju-
gação do parágrafo 4º do art. 10 da Lei n. 9.430 (baixa definitiva dos créditos de-
duzidos antecipadamente, após cinco anos do vencimento do crédito) com a “pres-
crição quinquenal” do Decreto n. 20.910, de 1932.
Passados dez anos do vencimento do crédito, o cômputo como despesa fiscal
somente será possível no regime de perdas definitivas do art. 47 da Lei n. 4.506,
no qual o contribuinte deverá estar apto a provar, por todos os meios admitidos em
Direito, a impossibilidade jurídica ou econômica de ver o seu direito de crédito
adimplido, no todo ou em parte.
Afinal, se a sistemática de dedução fiscal das perdas antecipadas não se con-
funde com a das perdas definitivas, também poderão ser diferentes os momentos
de registro dessas perdas, segundo o regime de competência.
É por esse motivo que os descontos e abatimentos concedidos pelo credor
como forma de obter do devedor a liquidação parcial da dívida não constitui mera
liberalidade, mas prática negocial lícita, no sentido de evitar maiores prejuízos,
conforme jurisprudência acima citada. As perdas assim registradas são definitivas
e seguem o regime do art. 47 da Lei n. 4.5066.

6
Não obstante nosso entendimento vale mencionar os argumentos que, normalmente, são invoca-
dos para defender a tese da dedução integral das perdas no momento mais adequado para o con-
tribuinte: (i) a dedução antecipada da perda é faculdade legal que o contribuinte usa discricionaria-
mente, sem comprometer o direito à dedução posterior da perda definitiva; (ii) nesse sentido, o
174 DIREITO TRIBUTÁRIO ATUAL nº 23

4. Conclusão
Em vista do exposto, concluímos que o art. 9º da Lei n. 9.430 trata da dedu-
ção antecipada, provisória e facultativa de perdas no recebimento de créditos. Por
ser provisória, referida dedução não se confunde com as perdas definitivas regis-
tradas sob o fundamento da norma geral de dedutibilidade, que é o art. 47 da Lei
n. 4.506. Embora facultativa, a dedução antecipada das perdas deve respeitar os
ditames do regime de competência para o registro no período de apuração corre-
to. O registro fora do momento adequado afigura-nos possível, mas desde que a
dedução não acarrete prejuízo ao Fisco.

acórdão proferido pela 2ª Turma do STJ no julgamento do REsp n. 840.002-MG, em 2 de setem-


bro de 2008, entendeu que o provisionamento apenas parcial da PDD (estamos, portanto, no regi-
me anterior à Lei n. 9.430) deve ser interpretado como um ato discricionário da pessoa jurídica,
por ausência de expectativa de uma perda significativa de seus créditos; ademais, a constituição a
menor da PDD não acarreta tributação indevida, porque os créditos não liquidados no final do
período de apuração serão sempre levados à conta de despesas operacionais; (iii) a dedução ante-
cipada poderá ser tomada em período-base posterior ao do preenchimento dos requisitos constan-
tes do art. 9º, também sob o argumento de que o dispositivo se refere ao requisito temporal, sem-
pre aludindo ao vencimento ocorrido “há mais de” um tempo variável, conforme os casos; (iv) con-
sequentemente, mesmo depois do período-base em que o contribuinte preenche os requisitos, o
crédito continua vencido “há mais” do que o tempo requerido.

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