PRINCÍPIOS PRÁTICOS DE FARMACOTERAPIA GERIÁTRICA Alunos Word

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PRINCÍPIOS PRÁTICOS DE

FARMACOTERAPIA GERIÁTRICA
EDGAR NUNES DE MORAES
FLÁVIA LANNA DE MORAES
DEBORA LORENA VASCONCELOS GONÇALVES
LUÍS VICTOR DE SOUZA ROSAS
SORAYA COELHO COSTA BARROSO

OBJETIVOS

Ao final da leitura deste capítulo, o leitor será capaz de

 reconhecer as particularidades da farmacocinética, da farmacodinâmica e da


farmacogenética no idoso;
 aplicar os critérios explícitos e os implícitos de prescrição inapropriada de
medicamentos;
 analisar as escalas de avaliação da carga anticolinérgica dos medicamentos;
 conceituar medicamento inapropriado, potencialmente inapropriado e fútil;
 definir prescrição apropriada e inapropriada;

colocar em prática estratégias de prescrição e desprescrição no idoso, considerando a


funcionalidade e as metas terapêuticas.

ESQUEMA CONCEITUAL
INTRODUÇÃO

O envelhecimento é acompanhado por diversas alterações estruturais nas células, nos órgãos e
nos tecidos, que estão associadas à desregulação dos mecanismos homeostáticos. Além disso,
a maior vulnerabilidade do idoso às agressões do meio interno e/ou externo é resultado do
somatório de uma série de fatores (hábitos de vida, doenças adquiridas ao longo da vida, fatores
genéticos, de risco, associados ao acaso), que se acumulam ao longo do tempo, justificando a
grande heterogeneidade de patologias entre os idosos. Uma vez estabelecida, a senilidade (ou
envelhecimento patológico) está associada ao uso de diferentes fármacos.1

A resposta do indivíduo aos medicamentos varia ao longo do tempo e se torna difícil de ser
plenamente definida em virtude da variabilidade fisiológica entre os idosos. Esses indivíduos
dificilmente são incluídos em estudos que avaliam a eficácia e a segurança dos fármacos,
principalmente aqueles muito idosos (com mais de 80 anos), frágeis (com declínio funcional
estabelecido, ou seja, dependentes para as atividades de vida diária), portadores de
comorbidades múltiplas (presença de cinco ou mais condições crônicas de saúde) e com
polifarmácia (uso de cinco ou mais fármacos diariamente). Isso torna o processo terapêutico no
idoso relativamente imprevisível.1

Nessa faixa etária, percebe-se um encurtamento da distância entre o efeito terapêutico e o


efeito adverso de vários medicamentos, além de uma maior dificuldade de adesão, devido à
maior prevalência de determinadas condições físicas (imobilidade), psíquicas (depressão,
ansiedade, demência) e sociais (insuficiência sociofamiliar).1

É fundamental conhecer os princípios da farmacoterapia geriátrica para a gestão adequada e


individualizada dos cuidados de saúde nessa população. A tomada da melhor decisão
terapêutica deve ter como base as características clínico-funcionais do idoso e a segurança do
medicamento proposto, buscando a melhor relação custo-benefício e o objetivo final de
melhorar a vida do paciente.

FARMACOTERAPIA GERIÁTRICA

No idoso, o processo terapêutico é complexo e deve considerar uma série de fatores, que serão
abordados detalhadamente a seguir (Figura 1).
FIGURA 1: Farmacoterapia geriátrica. // Fonte: Arquivo de imagem dos autores.

O conhecimento das alterações da farmacocinética (o que o corpo faz com o fármaco) e


da farmacodinâmica (o que o fármaco faz com o corpo), na população idosa, é importante para
que se possa prever o risco da relação entre efeito terapêutico e efeito adverso. Assim,
aumentam-se a segurança e a eficácia no uso de fármacos nessa faixa etária (Figura 2).1

FIGURA 2: Farmacocinética e farmacodinâmica no idoso. // Fonte: Arquivo de imagem dos


autores.
FARMACOCINÉTICA

A farmacocinética é um processo composto


por absorção, distribuição, metabolismo e excreção dos medicamentos que permite ao
fármaco atingir o seu sítio de ação (receptores, canais iônicos, enzimas, transportadores) nas
concentrações necessárias para provocar seu mecanismo de ação.

Nessa cascata, o envelhecimento normal causa alterações secundárias à interação fármaco-


senescência, contribuindo para reduzir os efeitos terapêuticos e aumentar o risco de efeitos
adversos.1

ABSORÇÃO

Após sua administração por via oral, o fármaco passa pelo processo de dissolução, absorção
passiva ou ativa e metabolização inicial pelo fígado e/ou intestino (metabolismo de primeira
passagem). O envelhecimento normal afeta minimamente essas fases; porém, algumas
alterações ocorrem quando há presença de comorbidades (Quadro 1).

QUADRO 1

PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DA ABSORÇÃO DE FÁRMACOS NOS


IDOSOS

SENESCÊNCIA SENILIDADE (COMORBIDADES


FREQUENTES)

 Presbiesôfago.  Doença do refluxo


 Alteração da síntese gastresofágico e
de HCl e aumento disperistalse
do pH gástrico: esofagiana: aumento
alteração na do risco de lesão
ionização e na esofagiana (úlcera e
solubilidade de estenose).
alguns fármacos.  Infecção
 Redução do por Helicobacter
esvaziamento pylori, gastrite
gástrico e da atrófica,
motilidade gastrectomia, uso de
gastrintestinal. inibidores da bomba
 Redução do de prótons: reduz
metabolismo de vitamina B12, ferro e
primeira carbonato de cálcio.
passagem.  Demência: o
comprimido
permanece maior
tempo na cavidade
oral, o que pode
provocar irritação
local.

// Fonte: Adaptado de Moraes (2018).1

A via cutânea ou transdérmica é pouco alterada pela senescência, sendo alternativa útil para
fármacos associados a maior risco de reações adversas medicamentosas (RAMs) ou
biodisponibilidade reduzida por inativação gastrintestinal ou por metabolismo de primeira
passagem.

O uso de fármacos por via enteral, por sua vez, pode sofrer influências na sua biodisponibilidade
por várias razões, como redução da dissolução e interação com alimentos enterais ou com o
revestimento da sonda.2

DISTRIBUIÇÃO

O nível sérico dos fármacos depende da composição dos compartimentos corporais. Após os
50 anos, ocorre redução anual de cerca de 1% da água corporal. Além disso, há redução
progressiva da massa muscular (principalmente em homens) e aumento da gordura corporal
(particularmente nas mulheres). Devido a esses fatores, os idosos são mais suscetíveis à
toxicidade de fármacos lipossolúveis.3

O envelhecimento também afeta proteínas (redução da albumina e aumento da a1-ácido


glicoproteína), que são responsáveis pelo transporte de alguns fármacos pela corrente
sanguínea (varfarina, sertralina, olanzapina, antidepressivos tricíclicos e betabloqueadores).
Essas alterações podem ser agravadas por algumas comorbidades, como caquexia, câncer e
doenças inflamatórias.

METABOLISMO

Com o envelhecimento, ocorrem algumas mudanças hepáticas, como a redução:2


 do fluxo sanguíneo em 20 a 50%;
 do tamanho do fígado em 20 a 30%;
 do conteúdo, da afinidade e da atividade das enzimas hepáticas (sistema microssomal
hepático — P450).

Doenças inflamatórias e hepáticas, traumas, câncer, entre outras enfermidades, podem afetar
as fases I e II do metabolismo e alterar o funcionamento de alguns sistemas, como o CYP450.
Além disso, determinados CYPs podem ser inibidos por alguns medicamentos comumente
utilizados no idoso, o que pode resultar em interações fármaco-fármaco com relevância clínica
(por exemplo, clopidogrel e omeprazol).2
EXCREÇÃO

Ainda não se sabe se a redução da função renal em idosos faz parte do envelhecimento normal
ou se reflete a presença de comorbidades. Estudos revelam redução do clearance de creatinina
(ClCr) de 0,75mL/min por ano nos indivíduos entre 30 e 90 anos.4

Independentemente de as alterações renais estarem ou não relacionadas à senescência ou à


senilidade, é sabido que comprometem o clearancedos fármacos, aumentando a toxicidade
daqueles excretados pelos rins. Por esses motivos, recomenda-se que se calcule o ClCr
rotineiramente em todos os idosos, com correção de doses e intervalos em alguns fármacos.

A fórmula da Chronic Kidney Disease Epidemiology Collaboration (CKD-EPI) é considerada a mais


apropriada para uso clínico no idoso. Esse cálculo é mais difícil de ser executado e, por isso, o
ClCr estimado pela fórmula deve ser fornecido pelo laboratório onde foi feita a dosagem sérica
da creatinina. Atualmente, aplicativos que realizam tal cálculo também estão facilmente
disponíveis.

FARMACODINÂMICA

A farmacodinâmica é a resposta final do organismo a determinado fármaco. Com o


envelhecimento, essa resposta pode estar reduzida, aumentada ou inalterada. Essa
variabilidade de efeitos se dá pela redução dos mecanismos homeostáticos, particularmente no
idoso frágil, o que altera o efeito dos medicamentos e aumenta o risco de RAMs que não
ocorreriam nos adultos ou em idosos robustos.1

O Quadro 2 apresenta as restrições da reserva homeostática no idoso.

QUADRO 2

RESTRIÇÕES DA RESERVA HOMEOSTÁTICA NO IDOSO

 Comprometimento da estabilidade vascular, com


maior risco de hemorragias.

 Comprometimento do reflexo laríngeo, com maior


risco de aspiração e pneumonia.

 Menor controle da pressão arterial, com maior risco


de hipotensão ortostática.

 Comprometimento do controle postural, com maior


tendência a quedas.

 Redução da função dopaminérgica, com maior


sensibilidade extrapiramidal.

 Menor atividade colinérgica central, com maior


tendência a confusão mental e delirium.
// Fonte: Adaptado de Moraes (2018).1

O sistema nervoso central (SNC) é o sistema fisiológico mais vulnerável aos efeitos dos
medicamentos, e as alterações causadas pelo envelhecimento justificam algumas
particularidades nos idosos. Como exemplo, é possível citar a maior permeabilidade da barreira
hematoencefálica, que facilita a penetração dos fármacos no SNC. Além disso, algumas
modificações estruturais e funcionais justificam:
 o maior risco de declínio cognitivo e de delirium com fármacos anticolinérgicos e
sedativos;
 a lentificação global;
 a dificuldade com os reflexos posturais;
 a consequente maior suscetibilidade a quedas.

O sistema cardiovascular também passa por alterações estruturais e funcionais com o


envelhecimento (redução da frequência cardíaca e aumento do aparecimento de arritmias
supraventriculares), que podem afetar a resposta aos fármacos.

Duas das principais RAMs nos idosos são a hipotensão ortostática e a síndrome do QT longo,
ambas relacionadas ao sistema cardiovascular. Elas apresentam alta morbidade e mortalidade
nessa população e, devido a sua importância na prática clínica, devem ser pesquisadas
rotineiramente em todos os idosos.

HIPOTENSÃO ORTOSTÁTICA

A hipotensão ortostática é definida como a queda da pressão arterial quando o paciente assume
a posição de ortostatismo.

A hipotensão ortostática é uma causa importante de declínio funcional no idoso e tem


prevalência variável (desde 30% nos idosos residentes na comunidade até 70% nos idosos com
doença de Parkinson). Possui etiologia multifatorial:
 senescência;
 uso de fármacos (diuréticos, vasodilatadores, simpaticolíticos);
 presença de doenças neurodegenerativas.

Essa doença manifesta-se pela presença de fraqueza, “tontura”, sensação de “cabeça vazia”,
síncope, quedas de repetição, angina e até mesmo acidente vascular cerebral, secundários a
hipoperfusão cerebral. Geralmente, esses sintomas estão associados ao ortostatismo e ao
período após as refeições (pós-prandial).

O diagnóstico de hipotensão ortostática é feito na presença de queda sustentada igual ou


superior a 20mmHg na pressão sistólica e/ou 10mmHg na pressão diastólica, dentro de 3
minutos após o paciente assumir a posição ortostática. Deve-se averiguar se a queda de pressão
arterial é acompanhada ou não de aumento da frequência cardíaca (superior a 20bpm). Na
disautonomia, não se observa aumento significativo da frequência cardíaca, ao contrário do que
ocorre na depleção de volume.

A abordagem do paciente com hipotensão postural inclui:


 suspender fármacos com ação hipotensora;
 manter a volemia por meio de hidratação adequada e ingestão de sal;
 melhorar o retorno venoso de membros inferiores com o uso de meias elásticas de
compressão;
 evitar refeições copiosas e calor excessivo.

A fludrocortisona (100 a 200mcg/dia) pode estar indicada em alguns casos, devendo ser usada
com cautela na insuficiência cardíaca e na hipoalbuminemia. Concomitantemente, é necessária
a ingestão de sal e líquidos, e o monitoramento de hipocalemia.

PROLONGAMENTO DO INTERVALO QT

O intervalo QT engloba a despolarização e a repolarização ventricular, sendo um marcador não


invasivo da repolarização ventricular. Esse intervalo deve ser medido em todos os idosos, pois
seu prolongamento é frequente (particularmente nas mulheres).

O prolongamento do intervalo QT está associado a arritmias ventriculares graves,


como Torsades de pointes. Tais arritmias apresentam risco elevado de repercussão
hemodinâmica, com hipotensão arterial e síncope, podendo haver degeneração para fibrilação
ventricular e morte súbita.

O intervalo QT deve ser calculado pela distância desde o início do QRS até o final da onda T, de
preferência nas derivações em que a onda T tem maior amplitude (DII, V5 e V6). Esse intervalo
deve ser corrigido em relação à frequência cardíaca, utilizando-se a fórmula de Bazett, gerando
o intervalo QT corrigido (QTc). É considerado prolongado quando for superior a 430ms, no
homem, e superior a 450ms na mulher.

Outra maneira mais fácil e rápida de estimar o QT é traçar uma linha exatamente no meio de
dois complexos QRS. Se a onda T terminar após essa linha, provavelmente trata-se de um QT
longo que deve ser rigorosamente avaliado e acompanhado.

A Figura 3 apresenta o cálculo do intervalo QT.

FIGURA 3: Cálculo do intervalo QT. // Fonte: Arquivo de imagem dos autores.

Vários fármacos podem prolongar o QTc, principalmente na presença de distúrbios


hidroeletrolíticos, hipotermia e cardiopatias estruturais. A prescrição de qualquer um desses
medicamentos deve ser precedida, obrigatoriamente, da avaliação do intervalo QT (Quadro 3).
QUADRO 3

ALGUNS DOS MEDICAMENTOS COM RISCO DE


PROLONGAMENTO DO INTERVALO QT

Amiodarona Donepezila Nortriptilina

Amantadina Esomeprazol Omeprazol

Azitromicina Fluconazol Ondansetrona

Ciprofloxacino Hidroxicloroquina Risperidona

Citalopram Lítio Sertralina

Clozapina Metronidazol Trazodona

Domperidona Mirtazapina Venlafaxina

// Fonte: Adaptado de Moraes (2018).1

FARMACOGENÉTICA

A farmacogenética é o estudo da influência das causas genéticas nas variações individuais de


resposta aos fármacos.

A maioria dos medicamentos tem seus efeitos determinados por vários genes que influenciam
a farmacocinética e a farmacodinâmica. Estima-se que sequências genéticas variantes sejam
responsáveis por 20 a 95% da biodisponibilidade e dos efeitos colaterais dos fármacos.

A determinação desses polimorfismos pode ser utilizada com o objetivo de prever a eficácia, a
dose adequada e a toxicidade de determinadas substâncias, maximizando a probabilidade de
sucesso terapêutico, especialmente em idosos frágeis, que apresentam maior risco de RAM.

Um exemplo de variação genética são as enzimas do CYP, uma superfamília de enzimas


metabolizadoras que têm um papel relevante na fase I do metabolismo microssomal hepático.
De forma geral, a população pode ser classificada em cinco fenótipos em relação às enzimas
CYP:
 metabolizador extensivo ou normal — fenótipo mais frequente, para o qual as doses
dos medicamentos habitualmente recomendadas se destinam;
 metabolizador ultrarrápido — indivíduos que não respondem às doses convencionais
dos medicamentos;
 metabolizador pobre ou lento — ocorre acúmulo do medicamento no organismo,
predispondo a altas concentrações plasmáticas e efeitos adversos;
 metabolizador intermediário — indivíduos que podem acumular o fármaco no
organismo no decorrer do tratamento, apesar de apresentarem boa resposta
terapêutica inicialmente;
 metabolizador rápido — apresenta atividade rápida da enzima.
A farmacogenética também possui particularidades na população idosa. As modificações
fisiológicas do envelhecimento na metilação do DNA (principal mecanismo epigenético
regulador da expressão gênica em seres humanos) resultam na redução da expressão gênica do
CYP e de outros genes com o avançar da idade. Com isso, ocorre um desequilíbrio no
metabolismo dos fármacos e há maior prevalência de fenótipo de piores respondedores às
substâncias.

CLASSIFICAÇÃO DOS MEDICAMENTOS

Todo medicamento é prescrito buscando-se um efeito benéfico sobre o organismo, que pode
ser a cura de uma doença, a melhora de seus sintomas, o retardo da sua história natural ou a
sua prevenção. Todavia, a presença dos efeitos benéficos não impede a ocorrência de efeitos
maléficos (RAM) sobre o paciente, e ambos podem coexistir no mesmo indivíduo. Desse modo,
é importante avaliar rigorosamente a relação risco-benefício de toda intervenção terapêutica,
compartilhando a decisão do uso ou não de um medicamento com o paciente e sua família.1

Segundo Moraes,1 os medicamentos podem ser classificados da seguinte forma:


 apropriado — apresenta evidências claras de efeito terapêutico e segurança, levando-
se em conta todas as variáveis necessárias para sua prescrição, incluindo as
comorbidades, a polifarmácia e a fragilidade do idoso;
 inapropriado — está associado a efeitos adversos e inefetividade terapêutica atuais;
nesse caso, o risco de ocorrer evento adverso é superior ao benefício clínico;
 potencialmente inapropriado — pode estar associado a efeitos adversos ou à falta de
efetividade em um futuro próximo, ou seja, risco de RAM em potencial;
 fútil — não apresenta eficácia terapêutica comprovada para determinada condição para
a qual está sendo utilizado; além disso, pode apresentar efeitos adversos, além do
alto custo direto e indireto de sua aquisição e utilização.

A Figura 4 apresenta uma síntese da classificação dos medicamentos.

FIGURA 4: Classificação dos medicamentos. // Fonte: Arquivo de imagem dos autores.


PRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTOS

Prescrição é toda intervenção, farmacológica ou não, destinada a melhorar a saúde atual ou


futura do indivíduo.

A partir da classificação dos medicamentos, chega-se a outros dois conceitos sobre prescrição:
a apropriada e a inapropriada.

APROPRIADA

A prescrição é apropriada quando se utilizam todos os medicamentos indicados para as


condições clínicas do paciente, visando à melhora da sua saúde e evitando o uso de
medicamentos:1
 inapropriados;
 potencialmente inapropriados;
 fúteis.

INAPROPRIADA

A prescrição é inapropriada (ou inadequada) quando são prescritos medicamentos


inapropriados, potencialmente inapropriados ou fúteis, e também quando há omissão de
medicamentos que claramente têm indicação em determinada condição clínica do paciente.1

A subprescrição (undertreatment) é caracterizada pela omissão de medicamentos


potencialmente benéficos em determinadas situações clínicas do paciente subdiagnosticado.

A prescrição inapropriada em idosos é bastante frequente na prática clínica, com prevalência


que varia de 20 a 79%, dependendo do critério utilizado. Esse tipo de prescrição também inclui
o uso de medicamentos com posologia inadequada (dose, frequência ou duração superiores à
recomendada) e as interações perigosas (fármaco-fármaco ou fármaco-doença ou fármaco-
alimento).

A adequação de determinado medicamento pode ser prevista com base no uso de indicadores
de processo ou de medidas de resultados. Os indicadores de processo são informações
previamente estabelecidas por evidências científicas, que mostram os riscos associados a
determinados medicamentos (critérios explícitos). As medidas de resultados ou de desfecho
clínico consideram os fatores relacionados ao medicamento acrescidos dos fatores específicos
da condição clínica do paciente (critérios implícitos).

Os critérios explícitos são mais mensuráveis e podem ser consultados e avaliados de forma mais
direta. A aplicação de critérios implícitos, por sua vez, também exige conhecimento sobre os
medicamentos inapropriados para idosos, bem como sua farmacocinética, sua farmacodinâmica
e suas interações. Os critérios implícitos são mais específicos para cada idoso e deveriam ser
utilizados sempre que possível nessa população, principalmente nos idosos frágeis, nos quais
cada intervenção proposta deve ser condicionada à avaliação multidimensional do idoso
(Figura 5).1
FIGURA 5: Prescrição racional para idosos. // Fonte: Arquivo de imagem dos autores.

CRITÉRIOS EXPLÍCITOS

Geralmente, os critérios explícitos são obtidos por meio de revisão de literatura, opinião de
especialistas e utilização de técnicas de consenso. Com o passar dos anos, várias listas de
critérios foram desenvolvidas pelo mundo (Figura 6).

FIGURA 6: Critérios explícitos de prescrição inapropriada distribuídos pelos continentes. //


Fonte: Arquivo de imagem dos autores.

O critério de Beers5 é um dos principais exemplos; além de ser o pioneiro, apresenta o maior
número de revisões, com grande abrangência e representatividade. Também podem ser citados
o sistema Fit For The Aged (FORTA)6 e o Screening Tool of Older People’s
Prescriptions(STOPP)/Screening Tool to Alert to Right Treatment(START),7 que são robustos na
prevenção de RAMs e na avaliação do impacto dos desfechos mais importantes nos idosos.
Outros critérios explícitos (com o conteúdo das suas listas e outros detalhes) podem ser
consultados no livro-texto A arte da (Des)Prescrição no Idoso: a dualidade terapêutica.1

CRITÉRIOS IMPLÍCITOS

Como exemplo de critério implícito é possível citar o Individualized Medication Assessment and
Planning(iMAP).8 Ele consiste em um programa de gestão abrangente da terapia
medicamentosa com foco no idoso, cujo objetivo é identificar problemas relacionados a
medicamentos (PRMs) e evitar desfechos negativos, como internação ou consulta de urgência.
O programa é estruturado em 10 passos, conforme descrito na Figura 7.

FIGURA 7: Dez passos do iMAP. // Fonte: Arquivo de imagem dos autores.

Outro critério desse grupo é o Systematic Tool to Reduce Inappropriate


Prescribing (STRIP),9 cuja principal característica é o forte envolvimento do paciente na tomada
de decisão. A valorização de seus desejos, suas necessidades e expectativas é uma forma de
aumentar a adesão ao tratamento. O programa é desenvolvido em cinco passos, conforme
apresentado na Figura 8.

FIGURA 8: Operacionalização do STRIP. // Fonte: Arquivo de imagem dos autores.


CARGA ANTICOLINÉRGICA

O sistema colinérgico, mediado pela acetilcolina, é responsável por várias funções centrais e
periféricas nos indivíduos. A acetilcolina é um neurotransmissor fundamental para a cognição,
e está estritamente relacionada com:10
 atenção;
 velocidade de processamento cognitivo;
 aprendizado;
 memória.

Os idosos são mais suscetíveis aos efeitos anticolinérgicos de vários medicamentos utilizados na
prática clínica, pelo fato de o envelhecimento estar associado à maior prevalência
de polipatologia, polifarmácia e automedicação. Além disso, a reserva colinérgica está
reduzida no idoso, principalmente em algumas doenças, como nas demências e no delirium.10

Existe uma correlação bem estabelecida entre o uso de anticolinérgicos e o elevado risco de
internação, reinternação, quedas, declínio físico e cognitivo e mortalidade, principalmente em
idosos frágeis.

São efeitos anticolinérgicos centrais:


 declínio cognitivo;
 confusão mental;
 desatenção;
 sintomatologia psicótica.

Entre os efeitos anticolinérgicos periféricos, estão:


 boca e olho secos;
 visão borrada;
 constipação intestinal;
 retenção urinária;
 taquicardia.

Os medicamentos anticolinérgicos são fármacos que bloqueiam os receptores da acetilcolina


central ou perifericamente, resultando na ação terapêutica desejada e/ou no efeito indesejado.

Além dos fármacos anticolinérgicos propriamente ditos (por exemplo, biperideno, atropina,
escopolamina, ipratrópio, oxibutinina e solifenacina), existem os medicamentos com atividade
colinérgica invisível, ou seja, aqueles que não fazem parte do primeiro grupo, mas que possuem
ação anticolinérgica em grau variável (por exemplo, carisoprodol, ranitidina, metoclopramida,
hidroxizina e prometazina). Esses últimos, quando utilizados simultaneamente, podem resultar
em alta potência anticolinérgica.

Todos os idosos devem ter sua carga anticolinérgica cuidadosamente avaliada. Não há consenso
quanto à melhor metodologia para medir a atividade anticolinérgica; contudo, uma das mais
clássicas é o cálculo da carga anticolinérgica (CAch), definida pelo efeito cumulativo dos
múltiplos medicamentos com atividade anticolinérgica. Essa atividade pode ser quantificada da
seguinte forma:1
 0 — ausência de efeito anticolinérgico;
 1 — efeito anticolinérgico leve;
 2 — efeito anticolinérgico elevado;
 3 — efeito anticolinérgico muito elevado.

Uma CAch (resultado do somatório da atividade anticolinérgica de cada medicamento


isoladamente) igual ou superior a 3 pontos é considerada clinicamente relevante, devendo ser
avaliada a suspensão do fármaco ou sua substituição por outro com menor ação anticolinérgica.

Mesmo quando definido pela utilização da CAch, existem várias escalas para sua avaliação, não
havendo consenso sobre qual é a melhor para uso na prática clínica. Geralmente, as mais
empregadas são as escalas de Boustani,11 Rudolph12 e Carnahan.13
Mais detalhes sobre as escalas de Boustani, Rudolph e Carnahan podem ser obtidos no livro-
texto A arte da (Des)Prescrição no Idoso: a dualidade terapêutica.1

FUNCIONALIDADE E METAS TERAPÊUTICAS

A terapia farmacológica na população idosa deve ser individualizada, levando em conta as


particularidades e os vários aspectos que envolvem o medicamento e o paciente. Nesse
contexto, a avaliação da capacidade funcional do idoso é de suma importância.14,15

A partir da avaliação da funcionalidade (dependência ou independência para atividades de vida


diária avançadas, instrumentais e básicas), em conjunto com as condições crônicas de saúde
presentes, Moraes e Lanna definiram a classificação clínico-funcional (CCF) do idoso, conforme
apresentado na Figura 9.14,15
AVDs: atividades de vida diária; IAM: infarto agudo do miocárdio; HA: hipertensão arterial;
DM: diabetes melito; AAVDs: atividades avançadas de vida diária; AIVDs: atividades
instrumentais de vida diária; ABVDs: atividades básicas de vida diária; CP: circunferência da
panturrilha; CCL: comprometimento cognitivo leve; VM: velocidade da marcha; TUG:
teste Timed Up and Go.
FIGURA 9: Classificação clínico-funcional dos idosos. // Fonte: Adaptada de Moraes e Lanna
(2016).14

Uma vez classificados em estratos, podem-se ainda dividir os idosos em três grandes
grupos: robustos(estratos 1, 2 e 3), em risco de fragilização (estratos 4 e 5) e frágeis (estratos 6
a 10). Esses grupos podem ser mais bem compreendidos por meio da escala visual de fragilidade
(EVF), mostrada na Figura 10.

FIGURA 10: Escala visual de fragilidade e classificação clínico-funcional do idoso. // Fonte:


Adaptada de Moraes e colaboradores (2016).15
A divisão dos idosos em estratos permite definir metas terapêuticas condizentes com a situação
atual do idoso e evitar iatrogenias, que podem gerar piora da funcionalidade e da qualidade de
vida.16

Na abordagem da hipertensão arterial, por exemplo, é importante respeitar


a heterogeneidade entre os idosos. A magnitude da redução da pressão arterial depende
diretamente do grau de vitalidade do idoso. Quanto maior a redução da pressão arterial, maior
o risco de reações adversas. Portanto, sugerem-se metas mais flexíveis e individualizadas nos
idosos, respeitando a CCF.

Idosos mais robustos (estratos 1 a 3) podem se beneficiar de metas pressóricas mais rigorosas.
Já idosos mais frágeis (estratos 9 e 10, por exemplo) beneficiam-se de metas mais flexíveis,
principalmente na presença de polifarmácia, com o objetivo de reduzir as RAMs.17,18

A Figura 11 apresenta as metas pressóricas conforme a CCF do idoso.

FIGURA 11: Metas pressóricas conforme a CCF do idoso. // Fonte: Arquivo de imagem dos
autores.

O mesmo raciocínio se aplica ao diabetes melito. Idosos mais frágeis podem ter glico-
hemoglobina mantida em níveis mais altos, porém, ainda seguros, o que impede o
desenvolvimento de complicações metabólicas secundárias à hiperglicemia (desidratação,
cetoacidose diabética e coma hiperosmolar). Idosos robustos, por sua vez, são candidatos a um
tratamento semelhante ao do adulto, já que o risco de efeitos adversos nesse grupo é menor
(Figura 12).17,18
FIGURA 12: Metas glicêmicas individualizadas conforme a CCF. // Fonte: Arquivo de imagem
dos autores.

A hipoglicemia é um efeito colateral grave dos medicamentos hipoglicemiantes, devendo ser


valorizada, principalmente nos idosos frágeis, já que pode levar a perda de consciência, quedas,
fraturas por fragilidade, entre outras repercussões.17,18

DESPRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTOS

Como mencionado anteriormente, prescrição é toda intervenção, farmacológica ou não,


destinada a melhorar a saúde atual ou futura do indivíduo. A desprescrição, por sua vez, é a
atitude inversa, ou seja, é a suspensão de intervenções que podem estar causando danos. As
duas ações são absolutamente indissociáveis, complementares e igualmente importantes.1

A desprescrição consiste no processo supervisionado de suspensão ou redução da dose de


qualquer medicamento considerado inapropriado, com o objetivo de melhorar a saúde do idoso
e reduzir os custos assistenciais. É uma prática clínica recente e ainda pouco conhecida pela
maioria dos médicos.

Todos os idosos podem se beneficiar da retirada de um fármaco, todavia, os idosos frágeis são
os indivíduos com maior benefício, por serem mais vulneráveis e apresentarem menor reserva
homeostática, sendo mais suscetíveis a RAMs.

Existem vários algoritmos para desprescrição, mas não há evidências claras sobre a
superioridade de qualquer um deles, sendo o processo ainda empírico para a maioria dos
medicamentos.

A decisão de descontinuidade de um fármaco deve ser compartilhada, respeitando-se valores,


preferências, medos e desejos do paciente e de sua família.

A desprescrição de um fármaco pode ser súbita ou gradual. A suspensão súbita está indicada
quando o paciente apresenta efeitos adversos diretamente relacionados ao medicamento, e sua
descontinuidade tem alta probabilidade de reverter o quadro clínico do paciente (melhora da
sintomatologia desagradável ou melhora global da funcionalidade). Como exemplo, é possível
citar a retirada de anti-hipertensivos e antidiabéticos, com melhora de hipotensão ortostática,
tonturas e fraqueza geral relacionadas ao controle excessivo da pressão arterial e dos níveis
glicêmicos.1

Já a suspensão lenta e gradual de um fármaco é recomendada nos casos de:1


 dúvida diagnóstica;
 insegurança do paciente e/ou da família;
 medicamentos associados à síndrome de retirada, como:
 anticonvulsivantes;
 benzodiazepínicos;
 betabloqueadores.

A forma de desprescrição de um fármaco também é influenciada pela intenção do tratamento.


Existem, basicamente, dois grandes grupos de medicamentos: os preventivos e
os sintomáticos. A retirada dos preventivos pode ser mais rápida e condicionada à decisão
médica e da equipe de saúde responsável, aliada às preferências do paciente e da família.

Já a suspensão dos sintomáticos é mais complexa, pois não depende somente da decisão, em si,
mas também de uma técnica de retirada apropriada para evitar reações de rebote, abstinência
ou recrudescência dos sintomas (Figura 13).1

FIGURA 13: Principais medicamentos preventivos e sintomáticos. // Fonte: Arquivo de


imagem dos autores.

ESTRATÉGIAS PARA MELHORIA DA SEGURANÇA MEDICAMENTOSA E A IMPORTÂNCIA DO


TRABALHO GERIÁTRICO GERONTOLÓGICO

Os benefícios da farmacoterapia são obtidos a partir da seleção adequada dos medicamentos,


da sua administração em doses seguras, por períodos adequados e no momento certo.

Os PRMs são comuns e, além das RAMs, podem apresentar os seguintes resultados:
 inefetividade;
 sobredosagem;
 subdosagem;
 interações medicamentosas.

Os PRMs poderiam ser evitados se fosse dada maior atenção à conciliação medicamentosa, por
exemplo, quando os pacientes são admitidos ou recebem alta do hospital, ou na transição do
cuidado nos diferentes níveis de atenção à saúde. Outro fator importante é a comunicação
inadequada que há entre os profissionais de saúde envolvidos no cuidado e entre esses
profissionais e os pacientes/cuidadores.

Na população idosa, frequentemente são prescritos regimes medicamentosos complexos,


realizados por vários prescritores em um contexto de multimorbidades. Em função da resposta
à farmacoterapia e da gravidade das doenças tratadas, torna-se necessária a utilização de vários
medicamentos que atuam sinergicamente para otimizar os resultados. Entretanto, a redução da
polifarmácia pode prevenir efeitos adversos. Estudos de intervenções na prescrição dos idosos
encontraram melhora na qualidade de vida e redução na hospitalização e na mortalidade.19,20

Na avaliação da segurança no uso dos medicamentos, é necessário conhecer os hábitos relativos


à sua administração e identificar se há automedicação, uso de medicamentos isentos de
prescrição e de venda livre, fitoterápicos e plantas medicinais. As alterações na resposta ao
tratamento e as informações completas sobre a farmacoterapia devem ser consideradas pelos
profissionais de saúde, a fim de:
 definir estratégias para a melhoria da adesão;
 identificar demandas não tratadas;
 fornecer o aconselhamento adequado;
 reduzir os efeitos adversos e os erros de medicação.

A abordagem multidisciplinar deve ser considerada uma importante estratégia para melhorar
os resultados em saúde, em substituição a intervenções unilaterais. Estudos recentes
evidenciam a importância de uma prática colaborativa multidisciplinar para a identificação
precoce e o acompanhamento de condições crônicas, em particular diabetes e hipertensão
arterial.21

Uma metanálise de 30 estudos, incluindo 3.328 pacientes, mostra que, na insuficiência cardíaca
(IC), por exemplo, as intervenções multidisciplinares — que incluíram informações de médicos,
farmacêuticos, enfermeiros, educadores em saúde, nutricionistas e assistente social —
reduziram os riscos de:22
 admissão por todas as causas em 13%;
 mortalidade em 21%;
 admissão por IC em 30%.

Nos últimos anos, houve aumento da interação do farmacêutico com os pacientes, os


cuidadores e, especialmente, o médico, o que resultou em uma maior efetividade nas
intervenções realizadas. Em geral, há evidências de que o modelo de atendimento colaborativo
e centrado no paciente é benéfico para a melhoria do controle das doenças crônicas, o uso
apropriado da farmacoterapia, a promoção da saúde e o bem-estar.

Além disso, as intervenções realizadas no atendimento individualizado, em alternativa à


abordagem convencional, demonstraram resultados terapêuticos e de segurança da
farmacoterapia favoráveis em diferentes doenças ou condições, incluindo diabetes,
dislipidemia, hipertensão arterial, obesidade, asma, doença pulmonar obstrutiva crônica,
doenças infecciosas, condições psiquiátricas e prevenção da osteoporose.

Os serviços prestados podem ser classificados em atividades:


 dirigidas a pacientes/cuidadores;
 direcionadas aos profissionais de saúde;
 prestadas no âmbito de um trabalho em equipe multidisciplinar.

Tal abordagem torna necessária a elaboração de um plano de cuidados individualizado.


Entre as atividades com o objetivo de melhorar a segurança e a adesão à farmacoterapia em
idosos, podem ser citadas:
 educação e aconselhamento a paciente/cuidador;
 revisão da farmacoterapia;
 acompanhamento farmacoterapêutico;
 monitoração terapêutica;
 conciliação de medicamentos.

EDUCAÇÃO E ACONSELHAMENTO A PACIENTE/CUIDADOR

O processo de aconselhamento sobre a farmacoterapia compreende o uso de diferentes


estratégias educativas — por meio da integração dos saberes popular e científico — para
contribuir com o aumento de conhecimentos, habilidades e atitudes sobre os problemas de
saúde e seus tratamentos. Tem como principal objetivo promover a autonomia dos pacientes e
seu comprometimento com:
 promoção da saúde;
 prevenção e controle de doenças;
 melhoria da qualidade de vida.

Nas orientações ao paciente, o baixo letramento em saúde pode limitar a capacidade do idoso
de compreender informações escritas ou verbais sobre medicamentos, o que pode interferir na
adesão ao regime terapêutico prescrito. Além disso, o baixo grau de escolaridade, as
dificuldades de visão e/ou audição, as distrações e o declínio das funções cognitivas são fatores
dificultadores.

Os idosos são particularmente vulneráveis nos sistemas de saúde, pois são mais propensos a ter
várias comorbidades e regimes medicamentosos complexos.

REVISÃO DA FARMACOTERAPIA

A revisão da farmacoterapia representa a análise estruturada e crítica dos medicamentos que


o paciente utiliza, com a finalidade de minimizar a ocorrência de PRMs e melhorar a adesão ao
tratamento e os resultados terapêuticos.

Vários tipos de problemas podem ser identificados, como:


 necessidade de desprescrição;
 adesão inadequada;
 RAMs;
 erros de dosagem;
 interações medicamentosas clinicamente relevantes.

Além disso, destacam-se as oportunidades de redução dos custos do tratamento e a melhoria


do acesso aos medicamentos nos programas públicos de assistência farmacêutica.
ACOMPANHAMENTO FARMACOTERAPÊUTICO

A partir da revisão da farmacoterapia, pode ser identificada a necessidade de realizar o


acompanhamento farmacoterapêutico, isto é, promover a continuidade do cuidado ao
paciente em múltiplos atendimentos. Nesse processo, são identificados os PRMs e os
resultados negativos da farmacoterapia, e realizadas as intervenções documentadas com o
objetivo de resolver e/ou prevenir esses problemas.

No cuidado longitudinal, é possível realizar educação em saúde, conciliação medicamentosa e


gestão da condição de saúde. Recomenda-se que os registros estejam acessíveis à equipe de
saúde e, especialmente, ao prescritor.

MONITORAÇÃO TERAPÊUTICA

O serviço de monitoração terapêutica é recomendado nos casos de idosos com alterações


importantes na função renal e hepática, e em uso de fármacos com índice terapêutico estreito
ou com concentrações-alvo difíceis de monitorar.

O objetivo é determinar, a partir dos níveis plasmáticos, as doses individualizadas necessárias


para a obtenção de concentrações plasmáticas efetivas e seguras.

CONCILIAÇÃO DE MEDICAMENTOS

A conciliação tem como objetivo prevenir erros de medicação resultantes das discrepâncias da
prescrição, evitando danos desnecessários. Um exemplo são as duplicidades ou omissões de
medicamentos, principalmente quando o paciente transita por diferentes níveis de atenção ou
distintos serviços de saúde.

O sucesso da prática colaborativa multidisciplinar torna imprescindível a aquisição de


conhecimentos específicos da farmacoterapia geriátrica e o desenvolvimento de habilidades e
competências por parte dos profissionais envolvidos no cuidado.

A introdução progressiva de tecnologias de informação em saúde — e, em particular, da


telemedicina e do telemonitoramento — pode fornecer novas maneiras de
comunicação entre os pacientes e sua equipe de saúde, possibilitando o
compartilhamento eletrônico de informações sobre medicamentos, estilo de vida e
estado de saúde do paciente.

CONCLUSÃO

O sucesso terapêutico no idoso é resultado de um processo complexo, que envolve o ajuste de


intervenções farmacológicas e não farmacológicas às metas previstas para cada paciente, de
acordo com a sua funcionalidade.
O conhecimento da farmacologia e das patologias crônicas é essencial para a definição do
tratamento. Outro aspecto importante é a individualização das decisões, que devem ter como
base as particularidades e os desejos do paciente e de sua família. Dessa forma, procura-se
atingir o efeito terapêutico desejado e evitar as RAMs ao máximo, principalmente na população
mais frágil.
clínico.
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COMO CITAR A VERSÃO IMPRESSA DESTE DOCUMENTO

Moraes EN, Moraes FL, Gonçalves DLV, Rosas LVS, Barroso SCC. Princípios práticos de farmacoterapia geriátrica. In: Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia; Cabrera
M, Cunha UGV, organizadores. PROGER Programa de Atualização em Geriatria e Gerontologia: Ciclo 7. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2021. p. 11–46. (Sistema de
Educação Continuada a Distância, v. 2).

DOI

https://doi.org/10.5935/978-65-5848-280-2.C0001

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