Este documento discute como a sensibilidade, sensualidade e sexualidade são entendidas na cultura ocidental moderna. O autor argumenta que esses conceitos devem ser compreendidos como parte de um sistema cultural maior que envolve a construção da pessoa. Ele propõe analisar como esses elementos estão interligados e como foram desenvolvidos historicamente, influenciando instituições sociais. O objetivo é oferecer uma nova perspectiva para entender questões contemporâneas relacionadas à sexualidade.
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Luiz Fernando Dias Duarte - O Império Dos Sentidos
Este documento discute como a sensibilidade, sensualidade e sexualidade são entendidas na cultura ocidental moderna. O autor argumenta que esses conceitos devem ser compreendidos como parte de um sistema cultural maior que envolve a construção da pessoa. Ele propõe analisar como esses elementos estão interligados e como foram desenvolvidos historicamente, influenciando instituições sociais. O objetivo é oferecer uma nova perspectiva para entender questões contemporâneas relacionadas à sexualidade.
Título original
Luiz Fernando Dias Duarte - O império dos sentidos
Este documento discute como a sensibilidade, sensualidade e sexualidade são entendidas na cultura ocidental moderna. O autor argumenta que esses conceitos devem ser compreendidos como parte de um sistema cultural maior que envolve a construção da pessoa. Ele propõe analisar como esses elementos estão interligados e como foram desenvolvidos historicamente, influenciando instituições sociais. O objetivo é oferecer uma nova perspectiva para entender questões contemporâneas relacionadas à sexualidade.
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Luiz Fernando Dias Duarte - O Império Dos Sentidos
Este documento discute como a sensibilidade, sensualidade e sexualidade são entendidas na cultura ocidental moderna. O autor argumenta que esses conceitos devem ser compreendidos como parte de um sistema cultural maior que envolve a construção da pessoa. Ele propõe analisar como esses elementos estão interligados e como foram desenvolvidos historicamente, influenciando instituições sociais. O objetivo é oferecer uma nova perspectiva para entender questões contemporâneas relacionadas à sexualidade.
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o imprio dos sentidos:
sensibilidade, sensualidade e sexualidade na cultura ocidental moderna Luiz Fernando Dias Duarte ' <> 1)" Esta breve anlise do imprio dos sentidos na cultura ocidental modema ,; , ' para mim 0 desenvolvimenlo de uma pista de trabalho claramente ",' antropolagica, No enlanto, devo reconhecer, nao parece antropolagica ... ..! 1/'.,.,ql J..,primeira vista, porque nao "etnogrfica", nao traz 30 exame comparti lhado material de campo, de pesquisa direta - essa pedra de toque da : organizaao do nosso saber. antropolagica, contudo, fundarnentalmente por ter uma perspectiva comparada a sustentar 0 essencial do seu des en- . ,.,.. . volvimento. Essa comparaao estaexpressa desde j nareferncia cultura ocidental modema, 0 que significa levar em cons'iderao que as repre- ----- senlaoes que suslentam nossas bipaleses, nosso trabalho de pesquisa cientffica, sao oriundas e especificas de uma determinada cultura (mesmo que ela se pense como 0 apogeu da "civilizao" e do conhecimento humano), A hipalese da realidade desse ente analitico tem sido importante para minha reflexo (seguindo 'Uuitas outras e presti:;osas reflexOes), mas hoje sujeita a considervel controvrsia. De um modo geral, estamos acostumados a considerar que participa- mos de uma cultura comum: falamos corn freqncia de Ocidente, falamos mesmo de cultura ocidenlal, evenlualmente. Quase 0 tempo todo falamos tambm de modernidade, e mesmo j de pas-modemidade, Mas muito raro que levemos realmente a srio 0 que isso significa em termos de fronteiras culturais pertinentes para nos distinguir das outras culturas - das culturas portadas por outras sociedades, Isso se deve em parte ao fato de que temos uma srie de duvidas a respeito das origens desta nossa cuItura: se naseeu na Grcia, se tem raizes judaico<rists, se brotou corn o Renascimento ou emergiu corn a Revoluao Francesa; mas se deve sobretudo ao fato de que - como OCOITe corn todas as culturas - vivemos 21 Vj' ..-::... 22 Sexualidade nela como se fosse "a cultura" por excelncia, sinnimo da verdadeira humanidadc. Somos levados pelo senso comum a considera-la mais uni- versai que qualquer outra, em ftrno do extraordim\rio dinamismo e potncia com que progressivamente se imps ao conjunto do planeta ao longo dos dois ultimos sculos. Resistncias mais recentes, fun dadas numa perspectiva empirista, racionalizam essa naturalidade do nosso ponto de vista, argurnentando contra 0 carter sistmico, estrutural, da conscincia ativa da oposio entre culturas, defendendo a possibilidade de um co- nhecimento de puras emergncias tapicas. Do ponto de vista comparado, que acredito ser 0 mais radicalmente antropolagico, ftrndamental, porm, considerannos que seja razoavel essa rupotese: a de que participamos de um sistema de significao especifico a que se pode chamar, tentativamente, de "cultura ocidental modema", que implica uma certa maneira de perceber e compreender os fenmenos de nossa vida e, sobretudo, de imaginar que podemos perceber e compreender os fenmenos das outras culturas. Somos participes, ele- mentos desse ente, dessa instituio especifica que nos da autoridade. Nas, a cada gerao, internalizamos, portamos, praticamos e transmitimos tais val ores a nossos descendentes. Ao mesmo tempo, essa perspectiva pode nos permitir enfocar um pouco melhor os prognosticos para 0 futuro, j que a maneira de encararmos, de construirmos, nossas questes, as pro- blematicas fundamentais que nos envolvem hoje -, neste final de sculo e de milnio -, ja traz em si algumas das possibilidades de encami- nhamento, de equacionamento, permitidas pelo nosso espao de imagina- o cultural. Essas questes compem uma agenda de preocupaes muito agudas, que envolvem, em muitos casos, a instituio da sexualidade. Como no lembrar, em primeiro lugar, do problema da Aids, da relao entre esta e 0 comportamento sexual e, particulannente, os traos desse comportamento envolvidos na complexa questo da preveno da contarninao? Veja-se 0 problema do uso dos preservativos - to re.istente disseminao. Veja-se a questiio da "promiscuidade" - to delicada de se definir e de se compreender. Veja-se ainda a pluralidade das formas de contato sexual e a delicada opacidade dos regimes de prazeres. Ha ainda as drogas. 0 consumo de drogas, embora em parte indepen- dente do complexo da sexualidade, bastante lindeiro a ela, por comparti- Ihar da referncia aos prazeres corporais imediatos, sensualidade - apresentando tambm uma interface direta corn a Aids atravs das drogas injetaveis. Ha a medicamentalizao de um modo geral e, mais es- pecificamente, todos os fenmenos que hoje excitam e avassalam os meios de comurucao de massa a proposito do uso do corpo, da construo de unl corpo otimo, da maximizao da saude etc. Basta lembrar a questo o imprio dos sentidos 23 do consuma, por exempla, de um medicamento nova como 0 Viagra, dedi cado a ofcrecer lima potncia masculina ilimitada, para ver como tuda isso passa diretamente pela dimenso da sexualidade. Poderiamos lembrar tambm a comunicao virtual , um tema importantissimo dos novos horizon tes da sociabilidade contempornea, e que vern envolvendo tambm a questo da sexualidade atravs das redes especficas de consuma e discusso de matrias sexuais. A recente inter- venao dos govemos nacionais sobre a circulao de informaes acerca da pedofilia nesse meio, por exemplo, demonstra bem como esses fen- men os, que so muito abrangentes, de algum modo implicarn a questo da sexualidade neste fmal de sculo e podem ser, talvez, mais bem iluminados pela perspectiva que Ihes trago de examinar as relaes instituintes entre sexualidade e sensibilidade na construo da pessoa na cultura ocidental modema. A proposta a de que 0 senti do e 0 papel da sexualidade entre nos dev!1rser-colnpIeendidos num uiliverso maior de..significao, que ha mu'tOtempo se desenrola no interior de nossa cultura e que engloba essas problematicas citadas. Esse enquadramento, esse mbito mais abrangente, deve ser compreendido exatamente - segundo a minha proposta - numa articulaiio entre os fenmenos ligados sexualidade, sensualidade e sensibilidade, em seu sentido mais amplo. ESta ltlma e uma plVf'o maiS oaslco senso comum. Raramellte nos detemos para pensarno que ela significa verdadeiramente para nos: uma categoria de pensamento que consumimos inconscientemente, como todas as demais. Ela tem, no entanto, uma historia, foi construida em determinado momento da tradio ocidental, evoluiu, se transfonnou e instruiu certas cornposies ns- titucionais dentro das sociedades abarcadas pela cultura ocidental moder- na, estando certamente na raiz de uma srie de desenvolvimentos do que "-Michel Foucault (1977) chamou de "dispositivo da .exualidade". ~ Proponho uma releitura da hipatese ftrndamental de Foucault, agora exposta luz de outros autores das cincias sociais contemporneas, de modo a explorar mais plenamente as perspectivas e paradigmas que nos cercam neste momento. Penso, para tanto, nos trabalhos c1ssicos de Norbert Elias (1990) sobre 0 processo civilizatorio, mas sobretudo no trabalho mais recente de Elias e Dunning (1992) sobre a excitao no esporte. Penso no trabalho de Collin Campbell (1995) sobre 0 espirito do consumismo contemporneo associado a wna tica romntica - trabalho que esta comeando a ser consumido corn mais freqncia na antropolo- gia. Penso, claro, em Louis Dumont (1985), 0 autormais importante para este tipo de reflexo, com a sua proposta complexa de uma teoria geral da hierarquia e de unla historia da ideologia do individualismo. Inspiro-me 26 Sexuatidade Esse fi sicalismo mplica algumas modficaoes graves da concepao do nlllcionamento do corpo. Ternas, em prirneiro lugar, 0 surgimento da fisiologia (natural. animal e especificarnente humana), que comea com a descriao do modela de circulaao sangfnea proposto por Harvey e alinge o seu apogeu na descriao do modelo de construao cientifica e ideol6gica do sistema nervoso, uma crucial invenao do sculo XVIII. A hist6ria do sistema nervoso bem conhecida e central para compreender como esses sujeitos perfectiveis, que vivem num mundo nutrido pela experincia, podem funcionar: atravs do sistema nervoso que se articula a relaao entre os senti dos e 0 crebro, que centraliza essas infonnaoes e assim toma cada um desses seres capaz de avanar na senda da perfectibilidade. Esses nervos sao dotados - e isso vai ser matria da descriao dos grandes fisiologistas do sculo XVIII - das propriedades de excitabilidade, ir ritabilidade e sensibilidade (cf. Figlio, 1975; Rousseau, 1975; e Lawrence, 1979). Mas dotado fundarnentalmente de sensibilidade, e em tome dessa sensibilidade que se articula a passagem da linguagem "cientifica;' dos nervos para a linguagem moral , esttica, psicol6gica das emo5es senslveis. Esses fatos sao, de modo geral , conbecidos. Todo mundo sabe mais ou menos 0 que sensibilidade, e bem se pode reconbecer que continuam convivendo entre ns a acepao "fisiolgica" e a acepo "sentimental" da categoria. Porm esta ultima acepao certamente mais englobante, fazendo supor que seja natural imaginar as afeci5es do espirito como ao mesmo tempo dependentes e autnomas do "substrato" nervoso. Como contribuio a essa discussao, minha proposta juntar esses trs temas de fonna a nos pennitir perceber que ha uma articulaao interna entre esses fenmenos e essas instituioes. Tais temas nao sao esparsos, nao sucederam arbitrariamente no tempo ao longo de nossa experincia cultural desde 0 fmal do sculo XVII, mas nos conduziram ao ponto em que nos encontramos hoje e provaveimente ainda irao nos impor certos earninhos para os novos horizon tes que deveremos enfrentar. Collin Campbell, na obra ja citada, traz um aporte bastante util, para a compreensao dos carnlnhos da sensibilidade ocidental, empreendendo uma di scussao crfticada hip6tese e Max Weber (1967) sobre a correlaao entre a tica protestante e 0 espfrito do capitalismo. Ele procura demonstrar que Weber se deteve de modo excessivamente exclusivo no "puritanismo" at 0 final do sculo XVII, desprezando todos os desenvolvimpntos do "sentimentalismo". Este teria se iniciado concomitantemente ao puritanis- mo, produzindo uma espcie de incitaao sensibilidade que teria, assim, comeado muito cedo, dentro da Reforma - e nao em oposiao a ela. . ,. -r , (.:..... .e. _ o imprio dos senti dos 27 .. "Arg' - Romantismo ja vinharn enfatizando a importncia ieli luterano alemao para 0 desenvolvimento do umont, . . ," .. '- ,m;- dirna' pari .. .Qutros desenvolyimentos na 7 Inglaterra - sempre to associada '1.? - e mostra como, de certa maneira, 0 Romanbsmo nasceu, na verdade, na Inglaterra, antes do Romantismo "oficial" alemao. Essa origem localizase na COlTente do sentimentalismo que viceja fortemente na Inglaterra, ao longe do sculo XVIII, produzindo, entre outras coisas, a primeira grande fomada dos romances ocidentais modemos. Richardson um dos primei ros produtores daquilo que viemos a compreender como "romance" e que sera uma das estratgias de exploraao e divulgaao da sensibilidade que nos afeta at hoje, arrastando consigo os fenmenos da sexualidade emergente. Uma resenha muito rapida dos fenmenos que podem ser articulados nesse processo nos permite entrever as intimas correlai5es entre as fOl11las'modernas do comportamento sexual (que decorrem dessa incitaao sensibilidade no sentido mais arnplo), a preeminncia de um estilo de vida que privilegia 0 novo sobre 0 "tradicional" (produzindo os fenmenos da vanguarda, da moda e da "esttica do mal"), 0 acelerado desenvolvimento das tecnologias teraputicaspreventivas (voltadas para a maximizao da extenso da vida e a otimizao do uso do corpo) e 0 surgimento do consumo generalizado de "drogas". Nao me refiro apenas s drogas "i1egais", mas s drogas em sentido lato, inclusive aquelas a que podemos nao s6 charnar de legais, mas mesmo considerar como uma ualimentao sunturia": 0 aucar, 0 caf, 0 ch, 0 chocolate, 0 tabaco etc., que se tornararn fundarnentais para a economia do Ocidente, para a nossa "civilizaao" (e particularmente para 0 nosso pais). Sao 0 que os alemes chamam de Genussmitteln (cf. Schivelbusch, 1993): recursos de prazer, meios de sensibilizaao do corpo, de.;:',citas:[o dos geril1 Mesmo os teeUfSos de excttaao tradlClOnais na cultura como as _ ' 5iOas alc06hcas, passaramissii1Tr e sup emeiifOalmimif'lfaiiii dsenfatizada e S,!!!!Lqua)idades . ;sensoriais sao Sulo xvljiOOe ser conslfr3aii um exemp 0 desse processo. , As dlversas estrareglas Ge' mXimiZao da Via e otimizaao do , corpo, a clinica, a higiene, a assepsia, a anestesia, a odontologia, a ginecologia, a gerontologia, a psicofarmacologia - todas essas es pecialidades s6 puderam surgir em funao da sistematica exploraao do corpo hurnano como sede da busca indefinida, etemarnente perfectivel, da exacerbaao da sensibilidade, do refinamento ou intensificaao do prazer. Mais uma vez, Campbell instrutivo a esse respeito: sua'analise procura 1 i 1 1 , , 28 Sexualidade demonstrar camo 0 hedonismo modemo opera corn uma estratgia quali- tativa de busca de intensidade sempre maior, por oposio ao hedoni smo "tradicional" - ocupado no consumo quantitativo de um elenco fechado de recursos. A arte, em todos os seus aspectos (de vangt'arda, de massa, as artes do espetaculo), e tudo 0 que se abriga sob a rubrica contempornea das diversse lazer (coma os shopping centers) tm como pano de fundo uma valorizao das experincias sensoriais novas, ou seja, daquelas que f acrescentam algo via do aperfeioamento. As viagens e suas nwnerosas 1 instituies, todas elas criadas nestes ultimos dois sculos, so um belo
a viagem de frias; 0 turismo; a observao e 0 uso da natureza
Oi elemento de consumO (estao de aguas: praia, estao de ,\esqut), pensado a parnr da Ide,a da "palsagem" como estImulo sentimental (cf. Nery, 1998). Ao mesmo tempo, muito do que foi reelaborado da tradio ludica popular - como as feiras, os circos, 0 teatro - se v investido de novos senti dos, produzindo-se a miriade de nOVQS recursos de massa para excitao e sensibilizao. As grandes exposis indus- triais do sculo XIX e os grandes museus de historia natural ja prenuncia- vam - corn sua nfase nas novas fronteiras abertas pela "cincia" - 0 amplo florescimento dos recursos da sensibilidade de massa, ainda mais alargados pela emergncia dos recursos tcnicos do cinema e da televiso. A historia do teatro , nesse sentido, particularrnente importante. Luc Boltanski - em seu trabalho monumental sobre as formas do vrnculo politico modemo emergentes da colocao em discurso da piedade pelo \ ! sofrirnento de outrem - particularrnente iluminador sobre a importncia . ; do teatro no sculo XVII coma recurso de produo dos novos patamares 1 : de senslblltdade que vmam caractenzar as socJedades modemas (Boltan- l, ski, 1993). Teriamos ainda a acrescentar 0 esporte, sobre cujas proprie- dades de aproveitamento e estimulo das potencialidades do corpo seria longo discorrer aqui. I!l\ A relao entre " dispositivo de sensibilidade e 0 dispositivo de . i sexualidade fenmeno complex?, um movirnento historico Il de longa duraao que Jaz no amago da dmamlca da cultura ocidental 1 mode;na. E essa relao sugere, neste final de sculo, uma ateno especlfica que proponho para conclutr esta breve exposiao e como estimulo discusso posterior: trata-se da tenso entre a maximizao da vida (atravs da totalidade da pessoa), que um inveshmenlo no longo "jii'ZOe na durao, e a otimizao do corpo (atravs da concentrao no prazer), que uma aposta no curlo prazo e na intensidade. Essa uma tenso muito vivi da para diversos problemas centrais que enfrentamos coma analistas sociais. il ' . 1' (<) 1_. <. (\ ..:; e.. .Y".rJ ... t 1J.... .... 1 l ' 1 1 1 1 ! )/' , - A -.;, ' 1 _ ' 1 \ ' 1\ ' ' , \ ' Ovv-, ,, <l; ,\"Mri vo) J V' . l.-<. r 0.. 1"" ; "'--" J,.. _ i"l,.4 - \',1 v V.A (" ) l'Il ul l-v.. .L: ".; c\ \ L) k 11''70 M.}. ':. ",' \. ... o imprio dos sentidos 29 Lemhro particularrnente a questo da Aids e dos comportamentos para sua prevenao. Por que usar preservativo? Sabemos que esse recurso tcnico pode ser considerado freqentemente coma algo que limita 0 prazer, que diminui 0 patamar de sensibilidade associado consumao do ato sexual. A decisao sobre 0 seu uso pode implicar muitas questes (algumas muito diferentes das que exponho aqui, como se pode ver em Guimares, 1998, no tocante s classes populares), mas pode certamente envolver, para uma grande faixa de seus potenciais usurios, uma aposta diferencial: ou se aposta na intensidade e na qualidade otima do prazer irnediato e se enfrenta a eventual destruio da unidade vida/corpo/pessoa, ou se aposta numa continuidade maxima dessa unidade, de modo que ela possa ser sensivel e prazerosa por um longe tempo. Ha ai em ao um juizo extremamente delicado a que se expm as camadas sociais individualizadas contemporneas, um juizo de gravis- simas implicaes para 0 futuro de nossas sociedades. Ele demarcado por esse conjunto de valores, por esse sistema de representaes, por essa cosmologia de que Ihes apresentei 0 escoro sumrio. Em si mesmo, ele nao nos habilita a melhor compreender os inumerveis fenmenos pon - tuais em que se expressa a problemtica da sexualidade em nossa cultura. Sem a conscincia, porm, desse muito amplo e estruturante patamar de articulaao de nossos valores, nao compreenderemos nada do que possam dizer nossas imprescincliveis pesquisas pontuais. REFERNCIAS B IBLIOGRAFICAS Il BOLTANSKI, L. (1993) La souffrance distance. Morale humanitaire, mdias el politique. Paris, Editions Mtaili. BRUFORD. W.H. (1975) The German Tradition of Sel[-cultivation. Bildung from
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