A Inserção Profissional na Docência Universitária: Dilemas, Desafios e Aprendizagens Profissionais
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A Inserção Profissional na Docência Universitária - José Ângelo Gariglio
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO, TECNOLOGIAS E TRANSDISCIPLINARIDADE
P R E F Á C I O
O tema da iniciação à docência é recente nas pesquisas no campo da formação de professores. Por longo período, foi mantida a compreensão de que a formação acadêmica inicial atestava a condição dos saberes para o exercício profissional, o qual seria lapidado com a prática do fazer cotidiano. Pouco era publicado sobre as dificuldades dos professores, atribuindo aos estudantes a incapacidade de responder ao que cada docente definia como pressuposto de suas práticas. Essa condição acirrava-se, de forma mais intensa, quanto mais a escolarização avançava para os níveis médio e superior, onde se atribuía a sustentação do ensino à centralidade do conhecimento.
É certo que a Pedagogia, como bem informa a etimologia da palavra, visou à educação da criança e, na perspectiva da escolarização, foi produzida especialmente para esse público, tendo como base, em especial, a psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. Nessa perspectiva, as professoras das fases iniciais da escolarização — público feminino por excelência — foram as mais envolvidas em processos de formação continuada, mesmo que não houvesse discursos voltados especialmente para a iniciação à docência.
A preocupação dos órgãos mundiais — como o Banco Mundial e a OCDE, para citar alguns exemplos — com a educação em relação direta com o desenvolvimento econômico dos países surpreendeu os educadores quando começaram a discutir políticas educacionais e de formação de professores. O que, até então, pensávamos que era um tema afeito à profissão, agora estava na pauta dos economistas que procuravam soluções, preocupados com a eficiência dos sistemas educativos a médio prazo.
Os anos 1990, com as políticas neoliberais, atingiram em cheio as reformas do Estado, com a diminuição dos recursos para as áreas sociais, e resultaram, com isso, na racionalização dos processos administrativos. Consequentemente a isso, atingiram a autonomia dos professores. Sua condição de intelectuais foi dando lugar à subordinação às normas preestabelecidas, regradas por materiais instrucionais e sujeitos a avaliações externas de larga escala que definiam sua condição de êxito, independentemente das condições objetivas de trabalho.
Os efeitos não foram bons. E os próprios organismos internacionais e os Estados começaram a investigar alternativas para minimizarem estatísticas desanimadoras. Alguns países perceberam, por meio de estudos, que um grande contingente de professores que ingressavam na carreira docente desistia nos primeiros quatro anos de exercício, causando prejuízos aos sistemas educacionais. Os motivos giravam em torno da falta de apoio às dificuldades que encontravam, da remuneração insatisfatória, da solidão profissional e das condições precárias para o exercício profissional.
Decorrem, desse diagnóstico, as primeiras iniciativas governamentais que envolveram os sistemas de educação no sentido de olhar o professor iniciante como alguém que precisa de acompanhamento e apoio. Provavelmente, diferentes experiências tenham sido feitas nessa direção. Entre as primeiras divulgadas, estão as de Israel e do Chile, ambas recorrendo à parceria de docentes experientes para o acompanhamento dos iniciantes, registradas na literatura contemporânea.
Com relação à educação superior, o impacto do Tratado de Bolonha, na reformulação curricular de grande parte das universidades europeias, causou movimentos significativos que, no Brasil, vimos com um misto de desconfiança e de admiração.
Fomos compreendendo, entretanto, que o discurso da organização dos currículos por competências, ainda que o significado do termo possa ter sido amplamente questionado, alterou, significativamente, as bases da pedagogia universitária de países como Portugal e Espanha. Essa condição influenciou muito a educação brasileira, pois basta ver quantas teses de doutorado e pesquisas de pós-doutorado lá foram realizadas na área de educação. Além disso, tanto a literatura quanto os autores ibéricos são citados na produção da área no Brasil.
Nesse contexto, o olhar sobre os professores principiantes estabeleceu-se também na educação superior, especialmente por meio da modalidade da tutoria. Um professor senior estaria ao lado daquele que começava sua carreira a fim de que houvesse uma troca que beneficiaria os dois. Isso envolvia observação recíproca de aulas e de seminários, partilha de experiências investigativas e a orientação de estudantes. Tive a oportunidade de acompanhar um projeto dessa natureza, o qual foi coordenado pela professora Cristina Mayor Ruiz, da Universidade de Sevilha, e testemunhei o quanto ele foi promissor.
A estratégia da monitoria foi se ampliando como proposta, até mesmo para que os estudantes mais adiantados pudessem acompanhar e ajudar os ingressantes, diminuindo, com isso, a evasão e a reprovação, adotando os mesmos pressupostos.
No Brasil, no caso da educação superior, a emergência de iniciativas dessa natureza instalou-se com a ampliação crescente das instituições de educação superior, fazendo um destaque para o plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Esse Programa governamental, com início em 2003, implicou uma significativa ampliação e interiorização das Universidades Federais e dos Institutos Federais de Educação Tecnológica.
Em poucos anos, tivemos um contingente imenso de jovens professores ingressantes no Sistema Federal de Ensino. Eles chegavam com suas formações de mestres, sendo que a maioria deles eram doutores com formação para a pesquisa, mas com rara experiência e/ou poucos saberes para o ensino. Justamente num momento em que a universidade chegava ao interior, querendo se democratizar, incluindo públicos que, até então, pouco tinham acesso aos seus bancos. Esses Institutos de Ensino Superior (IES) incluíam cotas étnicas e, principalmente, cotas para estudantes oriundos de escolas públicas, os quais participam com 50% das vagas de cada Instituição. O desafio foi dado e as IES precisaram se movimentar na direção da formação dos docentes, em especial os que ingressaram na carreira.
A expansão democratizante também teve efeito sobre as redes estaduais e municipais da área pública. De forma particular, atingiu a rede privada de educação superior. Esses IES foram objeto do Programa Universidade para Todos (Prouni) que até hoje beneficia com bolsas de estudos estudantes de baixa renda e professores das redes públicas de ensino básico.
A importância da inclusão dos professores novatos nos quadros acadêmicos intensificou-se como um desafio para as Instituições e para o campo da pedagogia universitária. Culturas precisaram ser revistas e iniciativas de formação repensadas nas suas formas de implementação. Um campo de pesquisa abriu-se com potentes questionamentos.
Encontrar, nesse cenário, a Rede sobre Professorado Principiante, que o professor Carlos Marcelo García e seus colegas da Universidade de Sevilha criaram, a qual está aberta a pesquisadores e a interessados internacionais, foi um achado para nós, que tínhamos pouca produção e reflexão teórica sobre o tema. A Rede também estava constituindo-se e, graças a isso, tivemos a oportunidade de participar de seu 1º Congresso em Sevilha, o qual ocorreu em junho de 2008. Éramos poucos brasileiros que, por acaso, estávamos na Península Ibérica a estudo e, desse modo, aproveitamos a oportunidade para conhecer o grupo e participar dele.
O 2º Congresso aconteceu em Buenos Aires, em 2010, bem mais perto de nós, o que favoreceu a presença de mais brasileiros e, além disso, de trabalhos que evidenciavam uma inicial produção no campo, em nosso país. Desse Congresso fizemos um artigo tipo estado da arte, a partir dos trabalhos apresentados para compreender a amplitude do campo e os focos de interesse que vinham sendo cobertos.
O 3º Congresso teve Santiago do Chile, em 2012, como sede, e a presença de brasileiros foi bem maior. Nessa ocasião, já houve uma significativa apresentação de resultados de pesquisas evidenciando que grupos envolvendo teses e dissertações se debruçavam sobre o tema. Revelava-se, no caso da produção brasileira, um amadurecimento e reconhecimento acerca do tema no campo da pedagogia universitária. Também a pesquisa coordenada pela profa. Marli André, com a participação de um grupo significativo de pesquisadores, trouxe contribuições, fazendo um levantamento nos municípios brasileiros para identificar experiências inovadoras na educação básica. O reconhecimento desse avanço do interesse no país fez com que o Brasil fosse escolhido como sede do próximo Congresso.
Portanto, a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), com sede em Curitiba, e com apoio da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR), liderou o 4º Congresso Internacional sobre professorado Principiante e inserção profissional à docência. O esforço para levar a cabo esse evento foi intenso, incluindo as dificuldades de financiamento internacional. Mesmo assim, o evento foi um sucesso, consolidando, ainda mais, a presença da produção brasileira sobre a temática da iniciação à docência. Ele não só foi importante no contexto da Rede, mas como propulsor de um campo de estudos que assumiu uma condição reconhecida na área da formação de professores e de suas políticas. Basta ver, por meio de estudos como estado da arte, que há significativa produção nacional sobre o tema, a qual dialoga com a literatura internacional e mantém a conexão com os autores que sustentam a Rede.
O 5º Congresso teve a República Dominicana como sede e ocorreu em 2016. A presença de brasileiros foi em menor número, mas, ainda assim, expressiva, em que pese as dificuldades maiores de ordem econômica para o acesso ao evento, tendo em vista o local de realização. Mesmo assim, trabalhos foram apresentados, evidenciando que a produção mantém-se e que o tema veio para ficar.
A pandemia do Coronavírus interrompeu o ciclo e apenas em 2021, foi realizado, de forma virtual, o 6º Congresso, organizado na sua matriz, a Universidade de Sevilha. Apesar das imensas dificuldades, foi possível dar continuidade a esse ciclo tão importante de encontros internacionais que se articulam em torno de um tema de alta significação. Por isso o nosso entusiasmo.
Os textos apresentados neste livro são frutos desses Congressos. Esses escritos revelam estudos decorrentes de pesquisas e de experiências realizadas em um tempo que propiciou que a iniciação à docência fosse constituída como objeto de estudo da formação docente e da pedagogia universitária.
No entanto, registro que o livro só acontece pelos significativos esforços do professor José Ângelo Gariglio, apoiado pelas professoras Janilse Fernandes Nunes e Cristina Mayou Ruiz e com a anuência do mestre inspirador Carlos Marcelo García. Com eles, oferecemos, de forma articulada e solidária, produções que possam inspirar novos estudos.
Não há, aqui, a intenção de cobrir um campo reconhecidamente vasto e instigador. Apenas queremos imaginar que esses textos possam ser inspiradores de diálogos para outras tantas produções, as quais tornem muito mais estimulantes as trajetórias dos professores iniciantes.
Cumpriremos, então, o sentido dessa produção.
Maria Isabel da Cunha
Porto Alegre, 8 de novembro de 2021.
Sumário
INTRODUÇÃO 15
Nadiane Feldkercher
Docente do Departamento de Teoria e Prática da Educação,
da Universidade Estadual de Maringá.
FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES INICIANTES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR 19
Alboni Marisa Dudeque Pianovski Vieira
Mirian Célia Castellain Guebert
Sirley Terezinha Filipak
PROFESSORES PRINCIPIANTES NA CARREIRA DOCENTE EM UMA UNIVERSIDADE PÚBLICA FEDERAL: DESAFIOS E ENFRENTAMENTOS 41
Edenise do Amaral Favarin
Michele de Oliveira Rodrigues
Luciana Patrícia Schumacher Eidelwein
EL DOCENTE NOVEL, APRENDIENDO A ENSEÑAR 57
Jordi Escartín
Cristina Mayor-Ruiz
Jordi Pallàs
Vicent Ferrer
LOS INICIOS DEL CONOCIMIENTO DOCENTE DEL PROFESOR UNIVERSITARIO: ESTUDIO DE CASOS EN LA UNIVERSIDAD NACIONAL DE NORDESTE-ARGENTINA 67
Patricia B. Demuth
M. Graciela Fernández
Orfilia E. Fernández
María T. Alcalá
PROFESSORES ESTREANTES NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA: DESAFIOS E POSSIBILIDADES 79
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Maria Isabel da Cunha
PROFESSORES PRINCIPIANTES: DIFICULDADES DA DOCÊNCIA SUPERIOR 91
Vanessa Michelon Cocco
Silvia Maria de Aguiar Isaia
Hedioneia Maria Foletto Pivetta
Sinara Porolnik
Patrícia Oliveira Roveda
APRENDER A ENSINAR: CONTRIBUIÇÕES DE UM PROGRAMA ONLINE PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES 107
Josiane Pozzatti Dal-Forno
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CONCEPÇÕES DE DOCENTES UNIVERSITÁRIOS INICIANTES SOBRE A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR 119
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Nadiane Feldkercher
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INÍCIO DA CARREIRA UNIVERSITÁRIA: ALTERNATIVAS DE APOIO APONTADAS POR DOCENTES INICIANTES 135
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Neridiana Fabia Stivanin
A FORMAÇÃO INICIAL PARA O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO SUPERIOR 149
Marielda Pryjma
O PROFESSOR INICIANTE: O CLARO/ESCURO NAS POLÍTICAS E NAS PRÁTICAS DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL 159
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PROGRAMA DE MENTORIA ONLINE DA UFSCAR: A PERSPECTIVA DE UMA PROFESSORA INICIANTE À EXPERIENTE 171
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A TRAJETÓRIA DO PAPIC: UM PROGRAMA DE ACOMPANHAMENTO DE PROFESSORES EM INÍCIO DE CARREIRA
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Maria Eugênia Batista da Silva-Neta
Letícia Pereira Jesus
Paula Rogéria da Silva Ferreira
Nathália Santos Véras
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PROFESSORES PRINCIPIANTES: PERCEPÇÕES A PARTIR DA AUTOEFICÁCIA DOCENTE 239
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ALICE E A LAGARTA: QUEM É O PROFESSOR INICIANTE NO ENSINO SUPERIOR? 281
Renata Cristina da Cunha
A FORMAÇÃO ACADÊMICA VERSUS A PRÁTICA DOCENTE DOS PROFESSORES UNIVERSITÁRIO INICIANTES 305
Nadiane Feldkercher
Neridiana Fabia Stivanin
Beatriz Maria Boéssio Atrib Zanchet
PROFESSORES INICIANTES: DESAFIOS DO INGRESSO NA CARREIRA UNIVERSITÁRIA 321
Cristina P. Duarte Boéssio
Claudia H. Centeno Neves
Mauricio Vitoria Fagundes
Helena Beatriz M. de Sousa
Beatriz M. Atrib Zanchet
CURRÍCULOS DOS ORGANIZADORES E DOS AUTORES 335
INTRODUÇÃO
Este livro é uma coletânea de artigos que abordam, no contexto específico da educação superior, o professor iniciante e a inserção desse profissional na docência. A obra reapresenta alguns trabalhos socializados nas quatro primeiras edições do Congreso Internacional sobre el Profesorado Principiante y la Inducción a la Docencia, idealizado pela Universidad de Sevilla, da Espanha, as quais foram realizadas em 2008, em Sevilla-Espanha; em 2010, em Buenos Aires-Argentina; em 2012, em Santigo-Chile e, em 2014, em Curitiba-Brasil.
A inserção profissional na docência superior pode ser compreendida como um importante momento da constituição profissional do docente e como uma fase privilegiada para as aprendizagens sobre o ser professor e o exercício da docência. Isso porque, muitas vezes, esses profissionais ingressantes, na carreira, tiveram uma formação voltada à pesquisa, com pouca ou nenhuma ênfase à formação docente. Assim, é no próprio exercício do magistério que muitos desses profissionais formam-se professores.
No entanto, não é somente pela prática que o professor forma-se. O desenvolvimento profissional também requer ações formativas específicas, as quais podem ser feitas por meio de cursos de formação continuada voltados à docência, de assessoramento pedagógico, de espaços para conversas sobre práticas pedagógicas, de estudos e de pesquisas. Espera-se que as instituições de educação superior que acolhem esses profissionais assumam esse compromisso formativo.
A ênfase deste livro é sobre esse profissional que se insere na docência superior e sobre seus processos formativos. As pesquisas e os relatos de experiências apresentados envolvem uma representatividade internacional (contemplando estudos da Argentina e da Espanha), mas com ênfase em investigações brasileiras (desenvolvidas no centro-oeste, no nordeste, no sudeste e no sul do Brasil).
Os 22 capítulos foram escritos por 56 autores que, em sua quase totalidade, são professores (principalmente da educação superior, porém alguns atuam na educação básica) e investigadores pertencentes a Grupos de Pesquisa. Nesses textos, o professor iniciante da educação superior, sua inserção profissional e sua formação docente são abordados por distintas perspectivas. De modo geral, os capítulos abordam a formação dos docentes iniciantes, as facetas dessa fase da profissão e as concepções dos docentes iniciantes.
Os capítulos sobre a formação dos docentes iniciantes contemplam políticas e práticas de formação do professor iniciante (CUNHA, 2021a), a contribuição da formação inicial para o desenvolvimento docente (PRYJMA, 2021), a articulação entre a formação acadêmica e a prática docente (FELDKERCHER; STIVANIN; ZANCHET, 2021), a formação do professor de ensino superior e sua inserção profissional (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2021), os movimentos construtivos da docência (VISENTINI; BARBIERO; VEIGA, 2021), a formação continuada (VIEIRA; GUEBERT; FILIPAK, 2021), a pesquisa-ação e a prática coletiva reflexiva na formação (AMORIM; BEHRENS; BACILA, 2021), o aprender a ensinar (ESCARTÍN et al., 2021), alternativas de apoio pedagógico (VIGHI; STIVANIN, 2021), um programa de acompanhamento de professores em início de carreira (PENA et al., 2021), um programa de mentoria on-line (MASSETTO; REALI, 2021), um programa on-line para formação de professores focado no aprender a ensinar (DAL-FORNO; REALI, 2021) e o desenvolvimento profissional de uma professora-tutora de um curso de graduação em início de carreira (CESÁRIO; VOLTARELLI, 2021).
No conjunto de textos sobre as facetas do ingresso profissional na docência superior há análises sobre as distintas interfaces da profissão (CUNHA, 2021b), os conhecimentos profissionais dos docentes iniciantes (DEMUTH et al., 2021), os desafios e os enfrentamentos desse profissional (BOÉSSIO et al., 2021; FAVARIN; RODRIGUES; EIDELWEIN, 2021; COCCO et al., 2021; SANTOS, 2021) e sobre desafios e acerca das possibilidades da estreia de professores atuantes na educação profissional e tecnológica (WIEBUSCH; CUNHA, 2021).
Nas concepções dos docentes iniciantes, há um estudo sobre as percepções de qualidade da educação superior (RIBEIRO; FELDKERCHER; SOUZA, 2021) e outro sobre a autoeficácia (COSTA FILHO; IAOCHITE, 2021).
Os resultados das pesquisas colaboram na evidência das especificidades dessa fase específica da carreira do docente da educação superior. Destaca-se, desse modo, a necessidade da formação voltada à docência e a de iniciativas de apoio e de acompanhamento profissional a esses professores.
Apesar dessas distintas perspectivas e abordagens sobre o professor iniciante e a inserção profissional dele na docência superior, esses estudos não esgotam as discussões sobre o tema. Em vez disso, eles objetivam somar e/ou ajudar a consolidar esse campo de pesquisa que, talvez, ainda pode ser percebido como em constituição.
A organização desta obra foi possível pelos esforços dos professores José Ángelo Gariglio, Janilse Nunes, Carlos Marcelo García e Cristina Mayor Ruiz. Para eles, nossos agradecimentos pela possibilidade de publicação desses estudos e dessas pesquisas acadêmico-científicas.
Fica o convite à leitura, além do desejo de que ela permita a sequência das reflexões, das pesquisas e dos diálogos acerca dos desafios e das aprendizagens da inserção profissional na docência superior.
Nadiane Feldkercher
Docente do Departamento de Teoria e Prática da Educação,
da Universidade Estadual de Maringá.
FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES INICIANTES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR
Alboni Marisa Dudeque Pianovski Vieira
Mirian Célia Castellain Guebert
Sirley Terezinha Filipak
Introdução
A explosão na oferta de cursos, a qual vem ocorrendo, nos últimos anos, nas instituições de educação superior, passou a demandar muitos professores. Além disso, ainda há preocupações relativas à concorrência, às condições de infraestrutura, às metodologias inovadoras, ao uso de tecnologias de informação e aos projetos pedagógicos de qualidade.
Ao ingressarem, como docentes, na educação superior, os egressos de cursos de bacharelado, com especialização, mestrado ou doutorado em suas áreas específicas, passam a atuar em uma área em que tão somente o conhecimento dos conteúdos não é o suficiente. A dinâmica da sala de aula e a orientação para a aprendizagem dos estudantes são procedimentos complexos e que exigem formação específica. Sem essa formação, esses docentes, muitas vezes, repetem o modelo que conheceram quando eram alunos; outras vezes, buscam informações fragmentadas sobre a aplicação de técnicas em sala de aula; muitos, ainda, reproduzem o tipo de professor que mais admiravam enquanto acadêmicos; ou, ainda, com a ajuda de colegas, buscam, por meio de ensaio e erro, formas de encontrar a melhor metodologia para a condução das classes em que atuam. Tendo isso tudo em vista, podemos dizer que há professores, portanto, que acreditam que para ensinar, basta transmitir conteúdos e que isso pode ser simplesmente aprendido na prática.
No início de sua carreira, em especial, os docentes demonstram ter dúvidas na elaboração do planejamento das disciplinas, no encaminhamento pedagógico dos processos avaliativos, no emprego de metodologias de ensino adequadas à disciplina que ministram, bem como nas formas de registro acadêmico adotadas pelas instituições. Não raramente, é possível perceber dificuldades na relação pedagógica e interpessoal com seus alunos.
Eles apresentam, também, dificuldades em lidar com o arsenal documental e com o legislativo que norteiam a vida de uma instituição: Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), Projeto Pedagógico Institucional (PPI), Projeto Pedagógico de Curso (PPC), Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), Programa Universidade para Todos (Prouni), apenas para citar os mais relevantes.
Para a docência, além dos conhecimentos específicos das áreas científicas, é necessário possuir competências e habilidades que possibilitem melhorar a qualidade da atividade em sala de aula. A questão fundamental, portanto, não é explicar bem o conteúdo, mas sim propiciar a aprendizagem do estudante, desenvolvendo suas competências e habilidades e formando um cidadão ético e crítico.
A tendência da educação superior, nas próximas décadas, impulsionada pelo apoio governamental, ainda é de expansão significativa, não apenas do ponto de vista quantitativo, mas também qualitativo. Grupos de jovens com chances menores, sob a ótica social e econômica, buscam superar, na universidade, as desvantagens trazidas de anos anteriores de escolaridade, com o intuito de realizar, em condições de igualdade, sua formação superior.
Em uma sociedade globalizada, do conhecimento e da informação, a incorporação da tecnologia da informação e da comunicação, em sala de aula, deve ser considerada como ferramenta que auxilie a construção do conhecimento do educando. Mais que isso, com o advento das Diretrizes Curriculares Nacionais sobre educação ambiental, direitos humanos e diversidade, a discussão sobre as questões sociais e as relativas à sustentabilidade não podem ser negligenciadas.
Diante de tantos desafios, as instituições de educação superior, preocupadas com a qualidade da educação que oferecem, realizam atividades de formação continuada para os professores iniciantes, visando a fornecer a eles estratégias que os apoiem em sua prática pedagógica. Atividades fragmentadas, no entanto, desenvolvidas sem que o professor iniciante tenha ampla compreensão do processo pedagógico, amparado por uma concepção de sociedade, de ser humano e de educação, coerentes e integradas entre si, não são suficientes para a obtenção de resultados formativos e duradouros.
Justificando a necessidade de formação continuada do professorado, Imbernón (1994, p. 7) menciona, sobretudo, a [...] evolução e o progresso das ciências [...], as mudanças sociais e culturais, o questionamento contínuo e a obsolescência dos conteúdos de ensino e o desenvolvimento dos professores no sistema educativo
. A partir dessas considerações, passou-se a investigar em que condições o professor iniciante assume seu trabalho docente nas instituições de educação superior, identificando as necessidades didático-pedagógicas por ele manifestadas.
Como objetivo geral, a pesquisa visa refletir sobre a prática pedagógica dos professores iniciantes e as necessidades por eles identificadas. Os objetivos específicos delineados dizem respeito a: contextualizar a formação pedagógica continuada na educação superior, do ponto de vista histórico-político; discutir o conceito de formação inicial e continuada; apresentar a proposta institucional desenvolvida por uma universidade privada de grande porte; e analisar as práticas e as necessidades didático-pedagógicas dos professores iniciantes, a partir de sua ótica.
O apoio teórico ao estudo foi buscado e encontrado nas obras de Imbernón (1994), Masetto (2001), Tardif (2002), Gil (2009) e Saviani (2009), entre outros. Foram utilizadas, também, como suporte, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional — Lei n.º 9.393/96; o documento "Educación y conocimiento: eje de la transformación productiva con equidad", publicado pela Comissão de Estudos para América Latina e Caribe (Cepal), com a Unesco, em 1992; e o Relatório Delors, igualmente apresentado pela Unesco (1998).
Do ponto de vista do percurso metodológico, trata-se de estudo de caso realizado a partir do programa de formação continuada desenvolvido por uma instituição de educação superior. Os procedimentos de coleta de dados envolveram questionários respondidos por professores iniciantes, contratados pela instituição pesquisada entre 2009 e 2011. A análise dos dados, após sua tabulação e a categorização das respostas, foi realizada cotejando-se as informações coletadas com os estudos teóricos efetivados.
Relatos dos professores pesquisados indicaram o pouco conhecimento, por parte deles, sobre os encaminhamentos pedagógicos, a fundamentação teórica da educação em relação aos princípios institucionais, técnicas e instrumentos avaliativos e a aplicação de recursos tecnológicos em educação.
O texto, dessa forma, está organizado em três tópicos, a partir da introdução: a formação continuada de professores iniciantes sob o ponto de vista histórico-político; reflexões sobre o conceito de formação continuada; e a descrição dos dados coletados, sua análise e discussão.
Como resultado, espera-se haver colaborado para demonstrar a necessidade da formação pedagógica aos professores iniciantes que atuam na educação superior, suscitando algumas reflexões sobre suas práticas e as necessidades evidenciadas a partir delas.
A formação continuada de professores iniciantes sob o ponto de vista histórico e político No Brasil, embora a formação de professores para o ensino fundamental e médio estivesse presente nas universidades, desde a década de 1930, não se pode dizer isso a respeito da formação do professor para atuar no ensino superior.
De modo geral, são poucos os livros e os artigos que tratam da formação continuada do professor iniciante na educação superior, muito embora as exigências feitas a eles estejam cada vez mais presentes. Pesquisas realizadas no Portal de Periódicos da Capes, no Banco Digital de Teses e Dissertações, e na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações demonstram que o número de trabalhos especificamente sobre a formação continuada de professores iniciantes não é significativo.
Na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, com o descritor formação continuada
ou formação contínua
, em pesquisa realizada em 18 de janeiro de 2021, foram localizados 4.877 resultados. Quando a pesquisa foi afunilada, com o acréscimo do descritor ensino superior
, foram obtidos 329 trabalhos e, se acrescentado a esses o descritor professores iniciantes
, apenas duas dissertações foram localizadas. A primeira delas, de Camila Zanella, intitulada A prática dos professores recém-graduados e a sua formação permanente
, apresentada na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, em 2011, traz resultados que apontaram que [...] os professores iniciantes sentem dificuldades, nos primeiros anos de docência, assim como os professores com mais experiência também sentiam logo após sua formação
, mas que [...] se o trabalho das instituições de ensino superior e de formações continuadas embasarem mais seu ensino na práxis, grande parte das dificuldades dos futuros docentes e professores iniciantes desaparecerão
(ZANELLA, 2011, p. 8).
A autora, em sua pesquisa, percebe que os professores têm consciência de suas dificuldades e buscam formas de resolvê-las, mas, para isso, é necessário que sejam criados ambientes com autonomia, tanto para os professores quanto para as instituições de ensino. A outra dissertação encontrada remete-se à formação de professores e de tutores na educação a distância, o que não constitui o objeto deste estudo.
A pesquisa realizada no Portal de Periódicos da Capes, com os mesmos descritores, apresentou 2.580 resultados para formação continuada
ou formação contínua
; 504 resultados para formação continuada
+ ensino superior
; e 15 resultados para a busca com formação continuada
+ ensino superior
+ professores iniciantes
. Desses 15 resultados, interessam, ao escopo deste estudo, os trabalhos de Nascimento e Romanowski (2020), que tratam do tema na perspectiva das contribuições da formação continuada para o aprendizado e a superação das dificuldades da docência; de Santos e Giasson (2019), que buscam compreender a formação e o desenvolvimento profissional de professores iniciantes que atuam no ensino superior; de Bolzan e Powaczuk (2019), que discutem a construção da docência, focalizando a tessitura da professoralidade de professores iniciantes no contexto universitário; e de Zanchet e Feldkercher (2016), que destacam os espaços pedagógicos para o desenvolvimento profissional dos docentes universitários iniciantes.
A definição das políticas de formação continuada relativas ao docente que atua na educação superior, no Brasil, merece, ainda, ser discutida e elaborada. Alguns pesquisadores, como Schön (2000), defendem que a formação do professor dá-se pela experiência, pela vivência no trabalho docente cotidiano e pela reflexão do próprio docente sobre sua prática. Entendemos, contudo, haver necessidade da formação pedagógica para o professor, uma vez que, sem a realização desses estudos, como bem lembra Oliveira Jr. (2008), em estudo sobre o docente do ensino técnico, a capacidade de refletir sobre a própria prática fica prejudicada
Verifica-se, dos documentos internacionais que tratam da educação nos países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil se inclui, que as políticas para a educação superior estão expressas em dois documentos principais: "Educación y conocimiento: eje de la transformación productiva con equidad", publicado pela Comissão de Estudos para América Latina e Caribe (Cepal), com a Unesco, em 1992; e o Relatório Delors, sobre a educação necessária para o século XXI, também publicado pela Unesco (1998).
O documento da Cepal, "Educación y conocimiento", considera relevante o papel do Estado como avaliador e respeita certa autonomia das instituições de educação superior para o desempenho de suas funções. Afirma que as instituições de educação superior não podem ser medidas unicamente em função do conceito habitual de rentabilidade, uma vez que sua finalidade não é produzir utilidades, mas, sim, buscar a função qualitativa da educação. De acordo com esse documento, a profissionalização docente é de importância capital. Para tanto, não há necessidade de tornar a carreira docente mais rígida, mas, sim, de abri-la para o trabalho em equipe e com pessoas de outras áreas profissionais. Textualmente, refere que:
Para melhorar o desempenho dos futuros docentes, a formação para o magistério não deve concentrar-se em uma longa formação acadêmica, mas contemplar uma preparação pedagógica mais breve, que incorpore, desde o início, práticas diretas, nas quais o aluno-professor vá assumindo responsabilidades crescentes. [...] Posteriormente, ao longo da vida profissional, podem ser oferecidas oportunidades flexíveis e estimulantes de aperfeiçoamento contínuo (CEPAL, 1992, p. 89, tradução nossa).¹
No caso da educação superior, acrescenta, é conveniente que as instituições tenham maior liberdade para recrutar docentes, contando com especialistas provenientes do setor produtivo, sobretudo na educação técnica e profissional. De acordo com a Unesco, a formação continuada dos professores
[...] é um processo educativo dirigido à revisão e à renovação de conhecimentos, atitudes e habilidades previamente adquiridas, determinado pela necessidade de atualizar os conhecimentos