Fasciculo Port
Fasciculo Port
Fasciculo Port
Braslia 2008
Presidncia da Repblica
Ministrio da Educao
Secretaria Executiva
Secretaria de Educao Bsica
Diretoria de Polticas de Formao,
Materiais Didticos e de
Tecnologias para a Educao Bsica
Alfabetizao e Linguagem
Autores
Fascculo Complementar
Maria Beatriz Ferreira
Fascculo do Tutor - Formao de Professores:
Fundamentos para o Trabalho de Tutoria
Beatriz Gomes Nadal e Marin Holzmann Ribas
Projeto Grfico, Editorao e Reviso
Sygma Comunicao e Edio
Coordenao Tcnica Editorial
Selma Corra e Silvana Godoy
DISTRIBUIO
SEB - Secretaria de Educao Bsica
Esplanada dos Ministrios, Bloco L, 5o Andar, Sala 500
CEP: 70047-900 - Braslia-DF - Brasil
ESTA PUBLICAO NO PODE SER VENDIDA. DISTRIBUIO GRATUITA.
A exatido das informaes e os conceitos e opinies emitidos so de exclusiva responsabilidade do autor.
Capacidades Lingsticas:
Alfabetizao e Letramento
fascculo 1
Sumrio
Apresentao ........................................................................... 6
Introduo................................................................................. 8
A seo apresenta os objetivos e a estrutura do texto proposto
Unidade I
Pressupostos da aprendizagem e do ensino da alfabetizao.......... 9
A seo apresenta, na forma de verbetes, conceitos e concepes que
so fundamentos da abordagem proposta.
Unidade II
As capacidades lingsticas da alfabetizao...................................... 14
A seo apresenta, na forma de verbetes e de quadros de sntese, as
capacidades essenciais alfabetizao e sua distribuio ao longo dos
trs primeiros anos do Ensino Fundamental, em cinco grandes eixos:
Eixo da compreenso e valorizao da cultura escrita:
Eixo da apropriao do sistema de escrita;
Eixo da leitura;
Eixo da produo de textos escritos;
Eixo do desenvolvimento da oralidade.
Apresentao
Fascculo Complementar:
Este fascculo trata de questes relacionadas ao processo de ensino e aprendizagem da lngua
escrita, nas sries ou ciclos iniciais do Ensino Fundamental, a partir de relatos sobre ao
pedaggica desenvolvida com o tema Histria de Vida. Retoma e aprofunda tambm questes a
respeito da leitura e da produo textual na formao lingstica do aluno e na sua constituio
como sujeito-leitor e produtor de textos.
Este material foi elaborado com toda a dedicao que as aes na rea da Educao
merecem. Procuramos estabelecer um dilogo efetivo entre questes cruciais para o
ensino de Lngua Portuguesa e as condies de trabalho do professor brasileiro.
Esperamos ter contemplado um pouco da diversidade de formao e da realidade das
escolas do nosso pas.
Introduo
Unidade I
Pressupostos da aprendizagem
e do ensino da alfabetizao
Como ponto de partida desta abordagem, sero apresentadas algumas concepes que
fundamentaro esta proposta e que, por essa razo, sero retomadas ao longo de todo o texto.
So pressupostos que devem estar presentes em todas as reflexes atualmente desenvolvidas em
torno da aprendizagem e do ensino da alfabetizao, orientando o trabalho docente na escolha
de contedos, procedimentos e formas de avaliar este processo.
Nas duas primeiras unidades deste fascculo, a apresentao ser feita por
meio de verbetes, ou seja, comentrios resumidos ou bastante sintticos, de
forma parecida com as apresentaes de enciclopdias ou dicionrios, para
facilitar a localizao de conceitos e propiciar maior autonomia de leitura.
Conceitos:
Lngua e ensino de lngua
Alfabetizao
Letramento
Ensino da lngua escrita
A lngua um sistema que tem como centro a interao verbal, que se faz atravs de textos ou
discursos, falados ou escritos. Isso significa que esse sistema depende da interlocuo
(inter+locuo = ao lingstica entre sujeitos).
Partindo dessa concepo, uma proposta de ensino de lngua deve valorizar o uso da lngua em
diferentes situaes ou contextos sociais, com sua diversidade de funes e sua variedade de
estilos e modos de falar. Para estar de acordo com essa concepo, importante que o trabalho
em sala de aula se organize em torno do uso e que privilegie a reflexo dos alunos sobre as
diferentes possibilidades de emprego da lngua.
Isso implica, certamente, a rejeio de uma tradio de ensino apenas transmissiva, isto ,
preocupada em oferecer ao aluno conceitos e regras prontos, que ele s tem que memorizar, e
de uma perspectiva de aprendizagem centrada em automatismos e reprodues mecnicas. Por
isso que uma adequada proposta para o ensino de lngua deve prever no s o
Alfabetizao
A partir dos anos 1980, o conceito de alfabetizao foi ampliado com as contribuies dos
estudos sobre a psicognese da aquisio da lngua escrita, particularmente com os trabalhos de
Emilia Ferreiro e Ana Teberosky. De acordo com esses estudos, o aprendizado do sistema de
escrita no se reduziria ao domnio de correspondncias entre grafemas e fonemas (a
decodificao e a codificao), mas se caracterizaria como um processo ativo por meio do qual
a criana, desde seus primeiros contatos com a escrita, construiria e reconstruiria hipteses
sobre a natureza e o funcionamento da lngua escrita, compreendida como um sistema de
representao.
Os termos grafemas e fonemas correspondem, aproximadamente,
a letras e sons, usados na linguagem corrente. A conceituao de fonema
e grafema apresentada mais frente.
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Letramento
na segunda metade dos anos 1980 que essa palavra surge no discurso de especialistas das
Cincias Lingsticas e da Educao, como uma traduo da palavra da lngua inglesa literacy.
Sua traduo se faz na busca de ampliar o conceito de alfabetizao, chamando a ateno no
apenas para o domnio da tecnologia do ler e do escrever (codificar e decodificar), mas tambm
para os usos dessas habilidades em prticas sociais em que escrever e ler so necessrios.
Implcita nesse conceito est a idia de que o domnio e o uso da lngua escrita trazem
conseqncias sociais, culturais, polticas, econmicas, cognitivas, lingsticas, quer para o
grupo social em que seja introduzida, quer para o indivduo que aprenda a us-la.
continuaremos
utilizando estas
noes
fundamentais de
Letramento e
Alfabetizao.
A lngua um sistema que se estrutura no uso e para o uso, escrito e falado, sempre
contextualizado. No entanto, a condio bsica para o uso escrito da lngua, que a apropriao
do sistema alfabtico, envolve, da parte dos alunos, aprendizados muito especficos,
independentes do contexto de uso, relativos aos componentes do sistema fonolgico da lngua e
s suas inter-relaes. Explicando e exemplificando: as relaes entre consoantes e vogais, na
fala e na escrita, permanecem as mesmas, independentemente do gnero textual em que
aparecem e da esfera social em que circule; numa piada ou nos autos de um processo jurdico,
as consoantes e vogais so as mesmas e se inter-relacionam segundo as mesmas regras.
O estgio atual dos questionamentos e dilemas no campo da educao nos impe a necessidade
de firmar posies consistentes, evitando polarizaes e reducionismos nas prticas de
alfabetizao.
Algumas questes relacionadas aos mtodos de alfabetizao podem tornar mais acessveis
essas ponderaes. A opo pelos princpios do mtodo silbico, por exemplo, contempla
alguns aspectos importantes para a apropriao do cdigo escrito, mas supe uma progresso
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de um processo que tem incio quando a criana comea a conviver com as diferentes
manifestaes da escrita na sociedade (placas, rtulos, embalagens comerciais, revistas, etc.) e
se prolonga por toda a vida, com a crescente possibilidade de participao nas prticas sociais
que envolvem a lngua escrita (leitura e redao de contratos, de livros cientficos, de obras
literrias, por exemplo). Esta proposta considera que alfabetizao e letramento so processos
diferentes, cada um com suas especificidades, mas complementares e inseparveis, ambos
indispensveis.
Assim, no se trata de escolher entre alfabetizar ou letrar; trata-se de alfabetizar letrando.
Tambm no se trata de pensar os dois processos como seqenciais, isto , vindo um depois do
outro, como se o letramento fosse uma espcie de preparao para a alfabetizao, ou, ento,
como se a alfabetizao fosse condio indispensvel para o incio do processo de letramento.
O desafio que se coloca para os primeiros anos da Educao Fundamental o de conciliar esses
dois processos, assegurando aos alunos a apropriao do sistema alfabtico-ortogrfico e
condies possibilitadoras do uso da lngua nas prticas sociais de leitura e escrita.
Considerando-se que os alfabetizandos vivem numa sociedade letrada, em que a lngua escrita
est presente de maneira visvel e marcante nas atividades cotidianas, inevitavelmente eles
tero contato com textos escritos e formularo hipteses sobre sua utilidade, seu
funcionamento, sua configurao. Excluir essa vivncia da sala de aula, por um lado, pode ter o
efeito de reduzir e artificializar o objeto de aprendizagem que a escrita, possibilitando que os
alunos desenvolvam concepes inadequadas e disposies negativas a respeito desse objeto.
Por outro lado, deixar de explorar a relao extra-escolar dos alunos com a escrita significa
perder oportunidades de conhecer e desenvolver experincias culturais ricas e importantes para
a integrao social e o exerccio da cidadania.
Assim, entende-se que a ao pedaggica mais adequada e produtiva aquela que contempla,
de maneira articulada e simultnea, a alfabetizao e o letramento.
Ver os verbetes: Alfabetizao; Letramento; Desenvolver as capacidades necessrias para
o uso da escrita no contexto escolar.
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Unidade II
As capacidades lingsticas
da alfabetizao
Sabe-se que os trs anos iniciais da Educao Fundamental no esgotam essas capacidades
lingsticas e comunicativas, que se desenvolvem ao longo de todo o processo de escolarizao
e das necessidades da vida social. Sabe-se, tambm, que o trabalho a ser feito nesses trs anos
iniciais no se esgota na alfabetizao ou no desenvolvimento dessas capacidades lingsticas.
Mas elas so importantes porque na alfabetizao e no aprendizado da lngua escrita que vm
se concentrando os problemas localizados no apenas na escolarizao inicial, como tambm
em fracassos no percurso do aluno durante sua escolarizao.
O que se pretende oferecer, nesta abordagem, uma expectativa das capacidades lingsticas
que as crianas devem desenvolver gradualmente, ou seja, daquilo que cada criana deve ser
capaz de realizar a cada ano. O aprendizado e a progresso da criana, entretanto, dependero
do processo por ela desenvolvido, do patamar em que ela se encontra e das possibilidades que o
ambiente escolar lhe propiciar, em direo a avanos e expanses.
Espera-se, por isso, que a consolidao dos princpios aqui definidos possa se combinar com
propostas para os demais anos da Educao Fundamental, bem como com propostas das outras
reas curriculares desenvolvidas na fase inicial da escolarizao.
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O termo capacidade ser muito utilizado neste texto, quase sempre associado aos termos
conhecimentos e atitudes.
Seria possvel falar das capacidades das crianas usando outros termos e conceitos, como
competncias, procedimentos e habilidades.
Essa escolha por capacidades se deve ao fato de se tratar de um termo bastante amplo, que
pode abranger desde os desempenhos mais simples da criana (como seus primeiros atos
motores), at os mais elaborados (como o ato de ler, de produzir uma escrita ou um conceito
abstrato).
Na organizao de um currculo ou de um programa de ensino,
conhecimentos costumam se referir a contedos (como, por exemplo, a
vegetao de uma regio). O termo atitudes se refere a crenas,
disposies ou preconceitos em relao a algo. Habilidades,
procedimentos, competncias e capacidades abrangem modos de
fazer algo, processos mentais ou comportamentos como, por exemplo, saber
ler e escrever, desenhar, costurar, dirigir um carro.
Alm desses termos, sero utilizados, com bastante freqncia, alguns verbos para descrever as
capacidades, de modo observvel. Isso significa que os procedimentos propostos devero
orientar as aes docentes na definio do tipo de abordagem que deve enfatizar no trabalho
pedaggico. Em outras palavras, esses componentes podem auxiliar o professor ou a professora
a levar em conta as capacidades j desenvolvidas por seus alunos, decidindo o que dever:
introduzir, levando os alunos a se familiarizarem com contedos e conhecimentos (ou
retomar eventualmente, quando se tratar de conceitos ou capacidades j dominados ou
consolidados em perodo anterior);
trabalhar sistematicamente, para favorecer o desenvolvimento pelos alunos;
procurar consolidar no processo de aprendizagem dos alunos, sedimentando os avanos em
seus conhecimentos e capacidades.
Supe-se que a clareza de diagnsticos e avaliaes dessas capacidades propiciar a base para
uma descrio dos desempenhos dos alunos e das condies necessrias superao de
descompassos e inconsistncias em suas trajetrias ao longo dos trs primeiros anos.
As capacidades selecionadas esto organizadas em torno dos eixos mais relevantes para a
apropriao da lngua escrita:
(1) compreenso e valorizao da cultura escrita;
(2) apropriao do sistema de escrita;
(3) leitura;
(4) produo de textos escritos;
(5) desenvolvimento da oralidade.
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O tom mais claro significa que a capacidade deve ser introduzida, para possibilitar a
familiarizao dos alunos com os conhecimentos em foco, ou retomada, se j tiver sido
objeto de ensino-aprendizagem em momentos anteriores. O mdio significa que a
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capacidade deve ser trabalhada de maneira sistemtica, com vista ao domnio pelos alunos.
O tom mais escuro significa que a capacidade, tendo sido trabalhada sistematicamente, deve
ser enfatizada de modo a assegurar sua consolidao.
A letra I significa introduzir; a letra R, retomar; seu uso no quadro indica que a capacidade
deve merecer nfase menor, sendo ou introduzida ou retomada, conforme o caso (introduzir a
novidade; retomar eventualmente o que j tiver sido contemplado). A letra T significa
trabalhar sistematicamente. A letra C, consolidar. Quando as trs letras aparecem ao mesmo
tempo, isso significa que a capacidade em questo necessita ser dominada mais cedo e que em
um mesmo ano dever ser Introduzida, Trabalhada e Consolidada.
Aps a apresentao, nos quadros, das capacidades mais gerais, elas sero sintetizadas em
verbetes, como se explicitou anteriormente. Muitas vezes, quando se trata de uma capacidade
de natureza mais complexa, os verbetes desdobram essa capacidade em sub-capacidades. Nos
verbetes, o professor ou a professora poder encontrar uma descrio da capacidade, uma
explicao de sua importncia para a alfabetizao e, para auxiliar sua compreenso, indicaes
gerais de atividades que possibilitam o seu desenvolvimento.
Os verbetes podero ser consultados pelos leitores de acordo com seu
interesse ou necessidade, no obrigando a uma leitura seqencial e linear. Do
mesmo modo, tambm os quadros no dependem uns dos outros; cada um
deles pode ser lido e compreendido sem a leitura dos outros. Por isso, os
Quadros 3 e 4, para funcionarem com autonomia, retomam pontos que
aparecem tambm nos Quadros 1 e 2.
Deve-se ressaltar, mais uma vez, que as aprendizagens relativas s capacidades apontadas no
constituem etapas a serem observadas numa cadeia linear. Elas so simultneas e exercem
influncia umas sobre as outras. A apresentao seqencial que se faz neste volume se deve
apenas necessidade de organizao e busca de clareza na exposio. Alm disso, sempre
necessrio que o professor ou a professora considere qual a melhor organizao e
seqenciao, tendo em mente a efetiva situao de aprendizado de seus alunos.
importante observar que as diferentes redes adotam distintos sistemas de organizao,
algumas optando por ciclos de formao, outras pela seriao. Por essa razo, as referncias
sero sempre aos trs primeiros anos do Ensino Fundamental, ou seja, s turmas de seis, sete
e oito anos, tanto no sistema seriado, quanto no sistema de ciclos.
Capacidades:
Compreenso e valorizao da cultura escrita
Apropriao do sistema de escrita
Leitura
Produo de textos escritos
Desenvolvimento da oralidade
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So considerados, aqui, alguns fatores e condies essenciais integrao dos alunos no mundo
letrado. Trata-se do processo de letramento, que deve ter orientao sistemtica, com vista
compreenso e apropriao da cultura escrita pelos alunos. Os verbetes indicam conhecimentos
gerais e capacidades a serem adquiridos e alguns procedimentos pedaggicos que podem ser
adotados para a realizao desses objetivos.
Como j foi dito no verbete Ensino da lngua escrita, ressalta-se que o trabalho voltado para o
letramento no deve ser feito separado do trabalho especfico de alfabetizao. preciso
investir nos dois ao mesmo tempo, porque os conhecimentos e capacidades adquiridos pelos
alunos numa rea contribuem para o seu desenvolvimento na outra rea.
Buscando a visualizao dessa dinmica que foi feita a gradao dos tons de cinza do Quadro
1. O conhecimento e a valorizao da circulao, dos usos e das funes da lngua escrita na
sociedade so capacidades que devem ser trabalhadas com vista consolidao, nos trs anos
considerados, ainda que isso se faa com estratgias didticas diferenciadas a cada ano. J as
capacidades necessrias para o uso dos materiais de leitura e escrita especificamente escolares
devem ser tratadas sistematicamente e consolidadas logo na chegada das crianas e mantidas,
retomadas, sempre que necessrio, at o fim do perodo.
A cultura escrita diz respeito s aes, valores, procedimentos e instrumentos que constituem o
mundo letrado. Esse processo possibilita aos alunos compreenderem os usos sociais da escrita
e, pedagogicamente, pode gerar prticas e necessidades de leitura e escrita que daro
significado s aprendizagens escolares e aos momentos de sistematizao propostos em sala de
aula.
Na nossa civilizao, todo cidado, qualquer que seja seu grau de escolaridade ou sua posio
social, est, de algum modo, inserido numa cultura letrada: tem documentos escritos e realiza,
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bem ou mal, prticas que dependem da escrita (ex.: tomar nibus, pagar contas, etc.).
Entretanto, sempre possvel alargar as possibilidades de integrao e participao ativa na
cultura escrita, pela ampliao da convivncia e do conhecimento da lngua escrita.
Estar ativamente inserido na cultura escrita significa ter comportamentos letrados, atitudes e
disposies frente ao mundo da escrita (como o gosto pela leitura), saberes especficos
relacionados leitura e escrita que possibilitam usufruir de seus benefcios. A compreenso
geral do mundo da escrita tanto um fator que favorece o progresso da alfabetizao dos alunos
como uma conseqncia da aprendizagem da lngua escrita na escola. Por isso um dos eixos a
serem trabalhados desde os primeiros momentos do percurso de alfabetizao. Isso significa
promover simultaneamente a alfabetizao e o letramento.
A maioria das crianas brasileiras sobretudo as que so atendidas pelas redes pblicas de
ensino tem acesso mais restrito escrita, desconhece muitas de suas manifestaes e
utilidades. Por isso importante que a escola, pela mediao do professor ou da professora,
proporcione aos alunos o contato com diferentes gneros e suportes de textos escritos.
Gneros de textos so as diferentes espcies de texto, escritos ou falados,
que circulam na sociedade, reconhecidos com facilidade pelas pessoas. Por
exemplo: bilhete, romance, poema, sermo, conversa de telefone, contrato de
aluguel, notcia de jornal, piada, reportagem, letra de msica, regulamento,
entre outros.
Os suportes referem-se base material que permite a circulao desses
gneros, com caractersticas fsicas diferenciadas. Por exemplo: o jornal, o
livro, o dicionrio, a placa, o catlogo, a agenda e outros.
O contato com esses diferentes textos poder proporcionar aos alunos vivncia e conhecimento:
dos espaos de circulao dos textos (no meio domstico, urbano e escolar, entre outros);
dos espaos institucionais de manuteno, preservao, distribuio e venda de material
escrito (bibliotecas, livrarias, bancas, etc.);
das formas de aquisio e acesso aos textos (compra, emprstimo e troca de livros, revistas,
cadernos de receita, etc.);
dos diversos suportes da escrita (cartazes, outdoors,
livros, revistas, folhetos publicitrios, murais escolares,
livros escolares, etc.);
dos instrumentos e tecnologias utilizados para o
registro escrito (lpis, caneta, cadernos, mquinas de
escrever, computadores, etc.).
Ver os verbetes: Letramento; Conhecer os usos e
funes sociais da escrita; Desenvolver atitudes e
disposies favorveis leitura; Compreender e
valorizar o uso da escrita com diferentes funes,
em diferentes gneros.
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Nossa vida social se organiza em torno da escrita. No dia-a-dia dos cidados, as prticas de
leitura e escrita esto presentes em todos os espaos, a todo momento, cumprindo diferentes
funes.
H escritas pblicas que funcionam como documentos (a carteira de identidade, o cheque, as
contas a pagar), outras que servem como formas de divulgao de informaes (o letreiro dos
nibus, os rtulos dos produtos, os avisos, as bulas de remdio, os manuais de instruo) e
outras que permitem o registro de compromissos assumidos entre as pessoas (os contratos, o
caderno de fiado). H tambm outras que viabilizam a comunicao distncia (os jornais, as
revistas, a televiso), outras que regulam a convivncia social (as leis, os regimentos, as
propostas curriculares oficiais) e outras, ainda, que possibilitam a preservao e a socializao
da cincia, da filosofia, da religio, dos bens culturais (os livros, as enciclopdicas, a Bblia).
Por outro lado, as prticas pessoais e interpessoais de leitura e escrita nos possibilitam
organizar o cotidiano, nos entender, registrar e rememorar vivncias (agendas, listas de
compras, dirios, cadernos de receita), bem como incrementar as trocas, a comunicao, a
convivncia, enfim (bilhetes, cartas de amor, e-mails).
Trabalhar conhecimentos, capacidades e atitudes envolvidas na compreenso dos usos e
funes sociais da escrita implica, em primeiro lugar, trazer para a sala de aula e disponibilizar,
para observao e manuseio pelos alunos, muitos textos, pertencentes a gneros diversificados,
presentes em diferentes suportes. Mas implica tambm, ao lado disso, orientar a explorao
desses materiais, valorizando os conhecimentos prvios do aluno, possibilitando a ele dedues
e descobertas, explicitando informaes desconhecidas.
Especificamente, o professor ou a professora pode desenvolver atividades que possibilitem aos
alunos:
antes de tudo, ler livros, jornais e revistas e conversar sobre a leitura;
reconhecer e classificar, pelo formato, diversos suportes da escrita, tais como livros, revistas,
jornais, folhetos;
identificar as finalidades e funes da leitura de alguns textos a partir do exame de seus
suportes;
relacionar o suporte s possibilidades de significao do texto.
Ver os verbetes: Letramento; Conhecer e utilizar modos de manifestao e circulao da
escrita na sociedade; Desenvolver atitudes e disposies favorveis leitura;
Compreender e valorizar o uso da escrita com diferentes funes, em diferentes gneros.
Entre os suportes e instrumentos de escrita do cotidiano escolar nos dias de hoje podemos
listar, por exemplo, livro didtico, livros de histrias, caderno, bloco de escrever, papel ofcio,
cartaz, lpis, borracha, computador. Conhecer esses objetos de escrita significa saber para que
servem e como so usados, identificando suas particularidades fsicas (tamanho, formato,
disposio e organizao do texto escrito, tipo usual de letra, recursos de formatao do texto,
interao entre a linguagem verbal e as linguagens visuais utilizadas com mais freqncia,
etc.).
Muitas crianas chegam escola sem ter tido oportunidade de conviver e se familiarizar intensa
e amplamente com os meios sociais de circulao da escrita. Nessas condies, no de
surpreender que essas crianas faam hipteses inusitadas sobre a natureza, as funes e o uso
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Tambm se pode mostrar ao aluno o que pode acontecer quando ele pe mais fora no lpis do
que o necessrio para se escrever na folha do caderno, apontando e marcando as linhas da folha
que servem de referncia para escrever no caderno, etc. Nesses momentos, o foco para
observao e anlise junto com os alunos o instrumento de escrita caderno e suas
especificidades materiais, que definem a maneira de usar esse material escolar de escrita. Tudo
isso voltar a ser o foco da ateno dos alunos quando eles forem utilizar, de fato, esse
instrumento, escrevendo em sala de aula.
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O que se escreve para ser lido pelos outros ou por ns mesmos, algum tempo depois. Se os
alunos compreenderem isso, vai fazer mais sentido para eles esforarem-se para conseguir uma
caligrafia legvel e com boa apresentao esttica, como tambm se empenharem na
organizao adequada da escrita nos cadernos ou nos diversos textos que produzirem.
Para escrever rapidamente e de modo legvel, h tcnicas especficas para isso, que envolvem
um modo adequado de segurar no lpis ou na caneta e movimentos especficos para grafar
letras e estabelecer ligaes entre elas. Para desenvolver essas tcnicas, no precisamos de um
perodo especialmente destinado ao trabalho com a psicomotricidade, pois essa dimenso
ligada escrita pode ser desenvolvida quando se desenha, quando se organizam objetos na
explorao de conhecimentos matemticos e, mais importante, quando se escreve e se l.
Assim, no faz sentido adiar o trabalho com a leitura e a escrita para, antes, preparar o aluno
ou desenvolver sua prontido. Pode ser, porm, interessante, em diferentes momentos, fazer
exerccios que auxiliem o aluno no desenvolvimento de sua caligrafia, treinos por meio dos
quais exercite a capacidade de escrever por mais tempo, de progressivamente abandonar o uso
de linhas e pautas, de segurar o lpis durante muito tempo, e escrever adequada e
repetitivamente letras e palavras de acordo com os movimentos que constroem uma caligrafia
legvel e eficiente.
Esta seo trata dos conhecimentos que os alunos precisam adquirir para compreender as regras
que orientam a leitura e a escrita no sistema alfabtico, bem como a ortografia da lngua
portuguesa. So apresentadas aqui algumas capacidades importantes para a apropriao do
sistema de escrita do portugus e que devem ser trabalhadas de forma sistemtica em sala de
aula.
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Antes de passar aos verbetes, insistimos na idia de que o desenvolvimento das capacidades
lingsticas que constam do Quadro 1 e do Quadro 2, bem como dos Quadros 3, 4 e 5, no
acontece de maneira estritamente seqencial, mas sim simultaneamente, umas
contribuindo para a aquisio das outras, e que, portanto, sua abordagem na sala de aula
tambm deve ser concomitante, variando a nfase, o grau de focalizao.
No se trata de contedos ou matrias a serem dados um depois do outro; trata-se de
capacidades interligadas, necessrias ao domnio do sistema de escrita.
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letras e desenhos;
(ii)
letras e rabiscos;
(iii)
letras e nmeros;
(iv)
(
, , *, +, =, %, , 9).
Como se trata de conhecimento bsico para a compreenso da natureza da escrita, ele precisa
ser introduzido, trabalhado sistematicamente e consolidado logo no perodo inicial da
alfabetizao.
Esse tipo de conhecimento pode ser abordado, por exemplo, atravs da explorao, em livros,
revistas e outros impressos, das diferenas grficas entre o texto escrito e o desenho, entre a
escrita alfabtica e os cones e sinais, muito usados atualmente, mas que no representam a
pauta sonora. Quanto distino entre letras e nmeros, possvel propor aos alunos que
procurem saber ou levantem hipteses sobre a presena dos smbolos que representam os
nmeros em calendrio, listas telefnicas, folhetos com preos de mercadorias, etc.
Ver os verbetes: Alfabetizao; Conhecer os usos e funes sociais da escrita; Conhecer e
utilizar modos de manifestao e circulao da escrita na sociedade.
Dois tipos bsicos de conveno grfica no sistema de escrita do portugus precisam ser
compreendidos pelos alfabetizandos logo no incio do aprendizado: (i) nossa escrita se orienta
de cima para baixo e da esquerda para a direita; (ii) h convenes para indicar a delimitao
de palavras (espaos em branco) e frases (pontuao). Por isso se recomenda que sejam
introduzidos e trabalhados sistematicamente no 1 ano da Educao Fundamental, objetivandose a sua consolidao.
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escrita ocupa, em seqncia, a frente e o verso da folha de papel; escreve-se dentro das
margens, a partir da margem esquerda. A compreenso desse princpio convencional bsico
que abrange a ordenao das letras nas palavras indispensvel para o aluno desvendar os
segredos da escrita alfabtica.
O avano tecnolgico e as necessidades sociais de comunicao impulsionaram o surgimento
de alguns gneros de texto que, eventualmente, modificam a orientao convencional da
escrita. Isso pode acontecer, por exemplo, em textos veiculados pelo computador, sobretudo na
Internet, nas propagandas impressas e televisivas, nos textos literrios. Os diversos formatos
desses textos sugerem diferentes maneiras de se ler: de baixo para cima, de um lado qualquer
para o outro. Ou seja, excepcionalmente, a direo da escrita pode variar, dependendo do
gnero do texto e do suporte em que ele circula. Os alunos precisam, ento, perceber e aprender
a lidar com essas diferentes formas de ler em suas prticas cotidianas de leitura, o que constitui
um item importante do seu conhecimento da cultura escrita. Para aprender a ler, os alunos
devem saber, logo no incio de sua aprendizagem, em que direo a escrita se orienta. bom
que eles comecem por perceber e aprender a direo convencional e que, aos poucos, possam
analisar outras disposies da escrita, em diferentes materiais. Num momento posterior do
processo, um objetivo a alcanar ser, por exemplo, ensinar aos alunos os princpios direcionais
da leitura de grficos e tabela.
No incio do processo, uma atividade que contribui para o aprendizado da orientao e do
alinhamento convencionais a leitura em voz alta pelo professor ou pela professora,
assinalando com o dedo ou com uma rgua (na lousa ou no quadro) as linhas dos textos que l,
para que os alunos observem a direo da leitura. Nesse caso, os alunos tm um modelo e uma
oportunidade para que observem a relao existente entre o que se l e os signos escritos
presentes no texto. Progressivamente, os alunos devero ganhar autonomia, lendo por conta
prpria textos que ocupam linhas inteiras ou que se organizam em colunas, alm de poemas de
diferentes configuraes.
Tanto a fala quanto a escrita so produzidas em seqncia linear, isto , som depois de
som, ou letra depois de letra, palavra depois de palavra, frase depois de frase. Mas um dos
pontos fundamentais no incio da alfabetizao compreender que essa linearidade acontece de
maneira diferente na fala e na escrita. Para quem j sabe ler, esse conhecimento parece muito
simples e acionado quase que de forma automtica. No entanto, para um aprendiz iniciante, as
questes decorrentes desse fato podem no ter sido ainda percebidas e representar grande
dificuldade.
Em geral, os enunciados da fala parecem aos ouvidos uma cadeia contnua, em que no se
distinguem nitidamente os limites entre as palavras. Quando falamos, articulamos consoantes e
vogais, mas a inteno de nos comunicar com o outro, num determinado contexto, nos leva a
marcar a seqncia sonora com determinada entonao e determinado ritmo, enfatizando
determinadas palavras ou expresses. Na fala de todo dia, que a que a criana domina,
emendamos palavras (ex.: casamarela), deixamos de pronunciar algumas palavras ou partes de
palavras (por exemplo, numa pronncia bem comum em Minas Gerais: Guardei a fita denda
gaveta ao invs de dentro da gaveta).
Quando escrevemos, grafamos as palavras por inteiro, de acordo com as convenes
ortogrficas, e as separamos nitidamente por espaos em branco. A delimitao das palavras
por espaos em branco, bem como a delimitao de frases ou partes de frases por sinais de
pontuao (pontos e vrgulas) e a delimitao de conjuntos de frases pela paragrafao, tudo
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No uso falado da lngua, as pessoas, em geral, cuidam apenas do assunto e no costumam dar
ateno aos sons que produzem. Eventualmente, por alguma necessidade comunicativa, elas
destacam e enfatizam algumas pores sonoras das palavras, por exemplo, escandindo as
slabas ou brincando com rimas e aliteraes. No entanto, para aprender a ler e escrever com
autonomia, o requisito indispensvel ser capaz de operar racionalmente com unidades sonoras
de apreenso mais difcil os fonemas e com as complexas relaes entre os fonemas e o
modo de represent-los graficamente.
O conceito de fonema apresentado no box do prximo verbete.
Por isso, tem-se considerado til, nos primeiros momentos do processo de alfabetizao, criar
situaes em que as crianas prestem ateno pauta sonora da lngua e operem, ludicamente,
com unidades do sistema fonolgico. O sombreado e as letras (I/T/C) nas quadrculas do
Quadro 2, neste item, pretendem indicar que essa
uma habilidade a ser introduzida, desenvolvida e
consolidada j no 1 ano da Educao Fundamental.
Jogos e brincadeiras
com a sonoridade das
palavras, (dentre
outros) sero
apresentados no
fascculo 5.
27
terminem, com determinada slaba. H diversas brincadeiras infantis que tambm permitem
essa explorao. Por exemplo, cantigas de roda como Atirei o pau no gato; jogos de salo
como L vai a barquinha carregadinha de (palavras comeadas com [ca], terminadas com
[o], etc.), a lngua do p, os trava-lnguas. Trazendo essa produo cultural para a sala de aula,
podem-se criar situaes ldicas que levaro os alunos a operar deliberadamente com slabas,
rimas, aliteraes, assonncias, etc.
Ver os verbetes: Dominar as relaes entre fonemas e grafemas.
Aliterao a repetio de um fonema numa frase ou numa palavra (por
exemplo: quem com ferro fere, com ferro ser ferido).
Assonncia uma espcie de rima em que no h identidade entre os traos
fnicos do final das palavras. Em geral, vale-se da coincidncia entre as
vogais das palavras, como nos versos de Manuel Bandeira: Belo, belo, belo/
Tenho tudo quanto quero.
Conhecer o alfabeto
Essa relao entre nomes de letras e sons observada na maioria dos casos (a, b, c, d, , efe,
etc.); as excees so poucas e de uso menos freqente (h, y, w, por exemplo).
Conseqentemente, o domnio do nome das letras pode auxiliar na leitura, na compreenso da
grafia das palavras.
Isso significa que o professor ou a professora deve apresentar aos alunos o alfabeto e promover
situaes que lhes possibilitem a descoberta de que se trata de um conjunto estvel de smbolos
as letras, sejam consoantes ou vogais cujo nome foi criado para indicar um dos fonemas que
cada uma delas pode representar na escrita, representando os sons das palavras que falamos.
bom que o estudo do alfabeto se faa com a apresentao de todas as 26 letras,
preferencialmente seguindo a ordem alfabtica, visto que muitos dos nossos escritos se
organizam pela ordem alfabtica.
importante que todas as letras estejam visveis na sala de aula, para que os alunos, sempre que
28
for necessrio, tenham um modelo para consultar. Esse mais um exemplo de como trabalhar
simultaneamente na direo da alfabetizao e do letramento.
Com o sombreamento e as letras do Quadro 2, estamos sugerindo que o aluno comece a se
familiarizar com a natureza e o funcionamento do alfabeto logo no 1 ano e que as capacidades
relativas a esse conhecimento sejam abordadas sistematicamente no 2. Se necessrio, esses
conhecimentos podero ser retomados no 3 ano.
Conhecer o alfabeto implica, ainda, que o aluno compreenda que as letras variam na forma
grfica e no valor funcional. As variaes grficas seguem padres estticos, mas so tambm
controladas pelo valor funcional que as letras tm. As letras desempenham uma determinada
funo no sistema, que a de preencher um determinado lugar na escrita das palavras. Portanto,
preciso conhecer a categorizao das letras, tanto no seu aspecto grfico, quanto no seu
aspecto funcional (quais letras devem ser usadas para escrever determinadas palavras e em que
ordem). Apesar das diferentes formas grficas das letras em nosso alfabeto (maisculas,
minsculas, imprensa, cursiva), uma letra permanece a mesma porque exerce a mesma funo
no sistema de escrita, ou seja, sempre usada da maneira exigida pela ortografia das palavras.
Dizendo de outra maneira: mesmo variando graficamente, as letras tm valores funcionais
fixados pela histria do alfabeto e, principalmente, pela organizao das palavras em cada
lngua.
Por exemplo, as letras A, a, A, a ou a representam, todas, o mesmo fonema
/a/, apesar de terem formas grficas diferentes.
Para aprofundamento, veja o livro de Luiz Carlos Cagliari, Alfabetizando sem o
b-b-bi-b-bu (So Paulo: Scipione, 1999).
Uma das implicaes do princpio de identidade funcional das letras para o processo de
alfabetizao que o aluno precisa aprender que no pode escrever qualquer letra em qualquer
posio numa palavra, porque as letras representam fonemas, os quais aparecem em posies
determinadas nas palavras.
bom ressaltar que conhecer o alfabeto representa desenvolver capacidades especficas,
conforme se trate de ler ou de escrever. Para ler, indispensvel a capacidade perceptiva que
possibilita identificar cada letra, distinguindo umas das outras. Para escrever, alm da acuidade
perceptiva, necessria a capacidade motora de saber grafar devidamente cada letra.
Embora a unidade foco do alfabeto seja a letra, podem ser propostas atividades em que as letras
sejam situadas em slabas, em palavras e em textos. Por exemplo, diante de textos lidos
mesmo que pelo professor ou pela professora os alunos podem se deter no reconhecimento
das letras e de sua posio, distribuio e funo nas palavras. Do mesmo modo, na tentativa de
escrever mesmo que textos simples como etiquetas, crachs, listas os alunos podero operar
direta e produtivamente com diferentes tipos e funes das letras. Essa sugesto mostra uma das
maneiras de trabalhar simultaneamente um conhecimento especfico do domnio do cdigo
escrito com conhecimentos relacionados insero no mundo letrado (isto , conhecimentos
que incrementam o grau de letramento do aluno), como o emprego til da escrita em textos que
fazem sentido para as crianas.
Ver os verbetes: Desenvolver capacidades especficas para escrever; Conhecer e utilizar
diferentes tipos de letra.
29
Alguns estudos recomendam o uso exclusivo de letras de frma maisculas nos primeiros
momentos da alfabetizao, pelo menos at que o aluno passe a reconhecer todas as letras e
tenha destreza na escrita das palavras. Essa orientao apia-se em alguns pontos. No mbito
da leitura, um argumento que, por serem unidades separadas (e no contnuas ou
emendadas como as letras cursivas manuscritas), as maisculas de imprensa podem ser
diferenciadas e contadas mais facilmente pelos alunos. Outro argumento que mais fcil
reconhecer as letras que aparecem em seqncia nas diversas palavras quando essas letras se
apresentam com tipos uniformes e regulares, ao invs de mostrarem traos variados (ora
maisculas, ora minsculas; ora letra de frma ou de imprensa, ora letra cursiva). No mbito da
escrita, o principal argumento que as letras maisculas so mais fceis de escrever,
especialmente para as crianas pequenas.
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tambm importante que professores e professoras fiquem atentos ao momento mais adequado
para apresentarem sistematicamente aos seus alunos as letras minsculas e as cursivas.
Especificamente quanto s funes da escrita cursiva, importante o aluno saber que, alm de
representar estilos individuais de traar as letras, ela tambm serve para se escrever com
rapidez. Compreendendo os usos da escrita cursiva, os alunos podero concluir que possvel
escrever com a letra que quiserem quando fizerem anotaes pessoais, mas que devero
procurar fazer letra boa quando forem escrever para outras pessoas. O desenvolvimento de
uma caligrafia legvel e com boa apresentao esttica, alm da organizao adequada da
escrita nos cadernos, ainda continuam sendo objetivos a serem alcanados pela escola.
Ver os verbetes: Letramento; Desenvolver capacidades especficas para escrever;
Compreender a categorizao grfica e funcional das letras.
Nem todos os sistemas humanos de escrita grafam os sons da lngua falada, e entre os que o
fazem, nem todos so alfabticos. H smbolos da escrita chinesa, por exemplo, que no
representam sons, mas idias, conceitos. So ideogrficos. Na escrita japonesa, h sinais que
representam slabas.
Nosso sistema de escrita alfabtico. Isso significa que seu princpio bsico o de que cada
som representado por uma letra ou seja, cada fonema por um grafema. A histria
da inveno da escrita e a existncia de diferentes sistemas de escrita mostram que a
correspondncia som-letra nem bvia e natural, nem a nica possvel. Isso significa, por um
lado, que perfeitamente plausvel que algumas crianas imaginem que a escrita do portugus
seja ideogrfica, ou silbica, por exemplo. E, por outro lado, significa que necessrio
trabalhar essa questo em sala da aula.
31
32
fonema /f/
grafema B;
grafema V.
Mas, mesmo assim, h padres bsicos nos valores atribudos aos grafemas, h regras que o
professor ou a professora precisa compreender para saber propor atividades adequadas a seus
alunos e para interpretar com pertinncia as dificuldades que eles apresentam.
As relaes que predominam so as complexas, que dependem da posio do fonema-grafema
na palavra (so posicionais), ou dos fonemas/grafemas que vm antes ou depois (so
contextuais).
Alguns exemplos de atividades propcias para esse aprendizado so as que se
baseiam na decomposio e composio de palavras em slabas. Separar
em slabas palavras faladas e observar de que maneira essa separao se
configura na escrita ajuda os alunos na identificao e percepo da
representao grfica dos fonemas. Outras atividades importantes so as que
pedem a identificao e comparao da quantidade, da variao e da
posio das letras na escrita de determinadas palavras: bingo, texto com
lacunas, colocao de palavras em ordem alfabtica, confronto entre a
escrita produzida pelo aluno e a escrita padro.
Uma questo que no pode ser esquecida o ponto de vista do aprendiz. A criana que est
sendo alfabetizada conhece a fala, no a escrita, e parte de seu conhecimento da fala para
descobrir os segredos da escrita. As palavras da lngua falada so conhecidas, fazem sentido,
mesmo quando decompostas em suas unidades sonoras. Assim, no aprendizado do sistema de
escrita importante para o aluno contar com o apoio do significado, em vez de ser obrigado a
lidar exclusivamente com abstraes tais como fonemas e slabas.
Prever o significado das palavras a serem reconhecidas na leitura pode ser uma chave
importante na decifrao das seqncias de grafemas e no aprendizado das relaes fonemas/
grafemas. Essa proposta corresponde natureza da lngua, na medida em que considera as
dimenses fonolgica e semntica, que funcionam integradamente no sistema lingstico.
A dimenso semntica se refere aos significados e sentidos das palavras.
Palavras como bola, carro e peteca pertencem a um mesmo campo
semntico, porque se referem a brinquedos (um significado comum a esses
objetos que, por isso, podem ser colocados em uma mesma categoria ou
lista).
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Esse princpio pode ser assumido na organizao geral do trabalho de alfabetizao ou pode ser
adotado nos momentos de sistematizao de conhecimentos que tenham sido desenvolvidos por
meio de aprendizagens conduzidas de maneira menos sistemtica.
Dominar as relaes fonema-grafema significa, em ltima instncia, dominar a ortografia. A
discusso sobre qual o papel da ortografia, a ser considerado durante o processo de
alfabetizao, tem gerado muita polmica no interior das escolas. Uma posio apresenta
excesso de rigor com os erros ortogrficos dos alunos e defende que estes devem ter aprendido
a ortografia correta de todas as palavras quando chegam ao final do primeiro ano de
alfabetizao. Uma outra posio a de que os erros ortogrficos no devem ser corrigidos nem
tomados como objeto de reflexo, porque o que considerado importante incentivar o aluno a
escrever sem medo de errar, sem se preocupar com as regras que organizam o sistema de
escrita. De acordo com essa concepo, a ortografia deveria ser estudada somente aps o
domnio pelo aluno da base alfabtica.
preciso achar o caminho do meio entre essas duas posies radicais.
O ensino das regras ortogrficas parte indissocivel do processo de alfabetizao. No incio do
processo de alfabetizao, quando o aluno comea a compreender as regras que organizam o
sistema da escrita e, assim, a descobrir como funcionam os mecanismos de codificao e
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Uma vez compreendida a natureza alfabtica do sistema, ou seja, quando o aluno demonstrar
ter compreendido que as unidades menores da fala so representadas por letras, o processo de
alfabetizao precisa se orientar pela abordagem sistemtica das relaes entre grafemas e
fonemas, no sentido do domnio da ortografia do portugus.
Conforme j se analisou, essas relaes, na maior parte dos casos, no so biunvocas (isto ,
no h um s grafema para representar determinado fonema, o qual, por sua vez, s pode ser
representado por aquele grafema) e, alm disso, elas envolvem diferentes graus de dificuldade.
Por isso particularmente recomendvel que nesse momento do ensino da escrita a
sistematizao em sala de aula se oriente pelo critrio da progresso, indo do mais simples para
o mais complexo: dos casos nos quais os valores atribudos aos grafemas independem do
contexto para os casos nos quais os valores dos grafemas dependem do contexto.
A seguir, apresentamos rapidamente algumas das regras de correspondncia entre grafemas e
fonemas, organizando-as em dois grupos: o dos grafemas cujo valor no depende do contexto e
o daqueles cujo valor dependente do contexto. Advertimos que com isso estamos longe de
esgotar a questo. Essa apresentao sucinta serve apenas para que o professor tenha uma idia
do quanto importante um aprofundamento nesse tema, para que possa conduzir
adequadamente o seu trabalho.
Para estudar essa questo, o professor ou a professora poder consultar, entre
outros, os seguintes livros:
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetizando sem o b-b-bi-b-bu. So Paulo:
Scipione, 1999; e SCLIAR-CABRAL, Leonor. Guia prtico de alfabetizao. So
Paulo: Contexto, 2003.
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Grafemas cujo valor no depende do contexto Esse o caso dos grafemas considerados
os mais fceis para o aluno aprender, pois a cada grafema corresponde apenas um fonema. So
exemplos desse caso as letras P, B, T, D, F, V e tambm grupos de letras, como o dgrafo NH,
que representa sempre o mesmo fonema e a nica possibilidade de grafar esse fonema em
portugus. Deve-se chamar a ateno para o fato de que os valores desses grafemas no so
pronunciados isoladamente, seus sons so definidos sempre a partir do apoio da vogal que os
segue.
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ew/, /iw/, /ow/, que as crianas vem escritos ora com U, ora com L (gol/pegou; anel/cu;
Brasil/partiu). Essa dificuldade pode ser bastante amenizada com a compreenso de que a
terminao de todos os verbos, sem exceo, no pretrito perfeito, sempre com U (pegou,
lavou, vendeu, comeu, sorriu, caiu). Deve-se ressaltar que, para se lidar com essas
regularidades nos anos iniciais da alfabetizao, no necessrio envolver os alunos na
memorizao de conceitos gramaticais, como substantivo, verbo, sufixo ou terminao.
perfeitamente possvel e proveitoso trabalhar com esses casos recorrendo aos conhecimentos
lingsticos intuitivos dos alunos e lidando com muitos exemplos e com formulaes
simplificadas.
A partir da anlise dos exemplos acima, pode-se afirmar que fazem parte da aprendizagem do
aluno a compreenso e o domnio das regras que organizam as relaes entre grafemas e
fonemas em nosso sistema da escrita. Mas, pela complexidade da tarefa, no se pode esperar
que ele descubra sozinho a chave do segredo. O trabalho pedaggico atento, explcito e
sistemtico fundamental na orientao do aprendizado, e pode tornar efetivo o domnio das
regularidades ortogrficas at o 3 ano da Educao Fundamental.
No Quadro 2, o sombreado e as letras nas linhas relativas ao domnio das regularidades
ortogrficas correspondem sugesto de que esses conhecimentos sejam apenas introduzidos
no 1 ano e trabalhados sistematicamente, com vistas consolidao, nos dois anos seguintes.
38
palavras, com palavras cuja grafia precisa ser memorizada. Sobretudo importante deixar os
alunos em alerta para as grafias que podem lhes trazer dificuldades e estimul-los a procurar a
soluo de suas dvidas no dicionrio ou na consulta aos professores, aos colegas, a outros
adultos. Se as crianas puderem ter acesso ao computador, uma boa situao de aprendizado
escrever com o corretor ortogrfico acionado. Na tela do computador, as palavras escritas em
desacordo com as regras ortogrficas que o programa conhece so sempre sublinhadas de
vermelho, o que leva o aluno a se perguntar qual foi o erro cometido e como pode corrigi-lo.
Nessa situao, o professor ou a professora precisar acompanhar atentamente as crianas,
porque pode acontecer de o programa sublinhar uma palavra no porque ela tenha sido escrita
incorretamente, mas simplesmente porque ela no consta do seu dicionrio. Pode acontecer
tambm de o programa no marcar uma palavra porque ela pode ser escrita de duas formas
diferentes, resultando em significados diferentes, como o caso de concerto e conserto. Ou
seja, no trabalho com a ortografia, o computador pode ser um aliado, mas no dispensa, de
modo algum, o saber e a ateno do professor ou da professora.
No Quadro 2, o sombreamento e as letras usadas esto indicando que se considera adequado
comear a lidar apenas preliminarmente com as irregularidades da ortografia no 1 ano e
trabalh-las sistematicamente, buscando consolidao, s a partir do 2 ano. Diante da
complexidade dos casos examinados, que esto longe de esgotar a questo, de se esperar que
algumas dificuldades ortogrficas permaneam mesmo ao final dos anos iniciais da
alfabetizao e que tenham que ser retomadas nos anos posteriores. O mais importante que o
professor ou a professora procure estudar e ter clareza sobre as particularidades de cada tipo de
problema, para saber distinguir os mais simples dos mais complicados, saber lidar com as
dificuldades especficas que cada caso envolve e, assim, poder conduzir adequadamente seu
trabalho e dimensionar com equilbrio suas expectativas.
Leitura
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A leitura uma prtica social que envolve atitudes, gestos e habilidades que so mobilizados
pelo leitor, tanto no ato de leitura propriamente dito, como no que antecede a leitura e no que
decorre dela. Assim, o sujeito demonstra conhecimentos de leitura quando sabe a funo de um
jornal, quando se informa sobre o que tem sido publicado, quando localiza pontos de acesso
pblico e privado aos textos impressos (bibliotecas), quando identifica pontos de compra de
livros (livraria, bancas, etc.). Dizendo de outra forma, depois que um leitor realiza a leitura, os
textos que leu vo determinar suas futuras escolhas de leitura, serviro de contraponto para
outras leituras, etc.
Atitudes como gostar de ler e interessar-se pela leitura e pelos livros so construdas, para
algumas pessoas, no espao familiar e em outras esferas de convivncia em que a escrita
circula. Mas, para outros, sobretudo na escola que este gosto pode ser incentivado. Para isso
importante que a criana perceba a leitura como um ato prazeroso e necessrio e que tenha os
adultos como modelo. Nessa perspectiva, no necessrio que a criana espere aprender a ler
para ter acesso ao prazer da leitura: pode acompanhar as leituras feitas por adultos, pode
manusear livros e outros impressos, tentando ler ou adivinhar o que est escrito.
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Coerentemente com a orientao dada no Quadro 2, mantemos, neste verbete e nos seus
desdobramentos, o sombreado mais escuro na coluna do 2 ano. Isso significa que as
capacidades mais essenciais apropriao do sistema de escrita sejam sistematicamente
trabalhadas nesse ano.
A decodificao um procedimento utilizado pelo leitor para identificao das relaes entre
grafemas (letras) e fonemas (sons). Conforme j se enfatizou, na alfabetizao, esse um
conhecimento crucial, decisivo. Os leitores iniciantes costumam manifest-lo decifrando letra
por letra, mas tambm descobrindo e utilizando outros procedimentos, como a identificao de
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unidades fonolgicas alm do fonema como slabas e partes de palavras. esse processo de
anlise, isto , de decifrao de pequenas unidades, que faz com que, tanto o leitor iniciante
quanto o leitor maduro, consigam ler palavras que nunca foram vistas antes, mesmo sem
compreender o seu significado. Para o aprendiz iniciante a aplicao desse princpio de anlise
fonolgica ainda mais importante, porque, para ele, a maioria das palavras escritas que
aparecem para leitura so realmente novas.
O reconhecimento global de palavras outro procedimento bsico, que ajuda a ler e tambm a
compreender, uma vez que, quando algum no precisa analisar cada parte das palavras,
porque j as reconhece instantaneamente, tem acesso imediato ao significado. No incio das
aprendizagens feitas fora e dentro da escola, os alunos reconhecem determinadas palavras ou
textos utilizando vrias estratgias: decoram palavras e pequenos textos, associam certas
palavras a uma imagem ou cor (como nas etiquetas), associam a forma da palavra escrita a um
perfil ou silhueta grfica, ou a um nome que conhecem e que tem para eles valor afetivo e
prtico.
O reconhecimento de palavras, sem ateno anlise de seus componentes internos, como
fonemas e slabas, favorece uma leitura rpida, porque permite que o leitor no se detenha em
fragmentos como sons e nomes de letras. , portanto, uma estratgia global. Da mesma
forma que a decodificao, um procedimento utilizado pelo leitor iniciante e pelo leitor
adulto. O reconhecimento global aplicado por crianas especialmente a palavras ou textos
que so mais familiares e aparecem com mais freqncia (como o caso do nome prprio, das
palavras utilizadas para organizao da classe e dos tempos escolares). Para o adulto que est
h muito tempo exposto cultura impressa, essa estratgia de ler por reconhecimento ajuda
muito na rapidez de leitura e na compreenso. Finalmente, para a criana, esse procedimento
ajuda na compreenso e na formao de atitudes favorveis ao ato de ler, que podem ser
traduzidas pela alegria da expresso: eu j sei ler!
Ver os verbetes: Compreender a natureza alfabtica do sistema de escrita; Dominar
relaes entre grafemas e fonemas.
A capacidade de ler com fluncia e silenciosamente est associada a dois fatores principais. Por
um lado, est ligada ao desenvolvimento do conhecimento lingstico da criana, sobretudo da
ampliao de seu vocabulrio, ao domnio progressivo das estruturas sintticas da lngua escrita
e do aumento do conhecimento de mundo. Por outro lado, est relacionada possibilidade de,
com base nesses conhecimentos, diminuir a quantidade de unidades utilizadas para compor o
texto.
Entre os recursos empregados para ler fluentemente h importantes procedimentos de leitura,
que podem ajudar na formulao de hipteses sobre o texto e na busca de compreenso do que
se l. Por exemplo: o reconhecimento global e instantneo de palavras, a leitura de partes
inteiras de frases, a previso do que vir em seguida, o apoio nas pistas do texto ou de fatores
no textuais (como imagens, ilustraes).
Quatro princpios gerais podem auxiliar na seleo e na elaborao de atividades para o
desenvolvimento da fluncia em leitura. O primeiro deles consiste em diminuir a quantidade de
informao visual para apoio do leitor. Isto pode ser feito forando uma leitura mais rpida
(apresentando, por exemplo, rapidamente, fichas com palavras de um mesmo campo semntico,
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para que sejam lidas pela turma), ou retirando partes da informao visual (mostrando, por
exemplo, apenas parte de um texto).
O segundo princpio est baseado no trabalho com o vocabulrio e com estruturas sintticas
freqentemente utilizadas em textos escritos. Evidentemente, no preciso (nem produtivo)
ensinar anlise sinttica para os alunos iniciantes. Mas vale a pena fazer atividades em que os
alunos, a partir de um conjunto pr-definido de palavras, possam formar frases; ampliar
sentenas por meio do acrscimo de novas unidades e palavras, ou colocar palavras em lacunas
retiradas de frases ou textos.
O terceiro princpio consiste em levar o aluno a usar intensivamente seu conhecimento prvio
para formular hipteses sobre o que ler ou estar lendo, buscando, tambm confirm-las. Isto
pode ser feito pela explorao prvia do texto (com base no ttulo, sobre o que voc acha que
texto vai falar? que tipo de texto ser? com base no conhecimento de outros textos do autor,
como voc acha que o texto ser? de acordo com o que foi lido at agora, o que voc acha que
acontecer?).
O quarto e ltimo princpio faz parte da tradio pedaggica e utilizado por muitos
professores. Trata-se da leitura em voz alta, em situaes mais formais, aps uma preparao
prvia. Para que a leitura em voz alta seja fluente, a criana precisar, progressivamente, fazer
previses, utilizar seus conhecimentos lingsticos com maior intensidade. Nessas situaes,
como manda a boa tradio pedaggica, no seria adequado acompanhar a leitura com o dedo
ou uma rgua, pois isso diminuiria a fluncia (embora em outras situaes tais recursos sejam
necessrios, como por exemplo, nas leituras iniciais feitas pelo professor ou pela professora e
na leitura de uma lista, em que apontar com o dedo pode ter um papel fundamental na
localizao de informaes).
Compreender textos
A compreenso dos textos pela criana a meta principal no ensino da leitura. Para chegar a
esse ponto, as estratgias de decifrao e reconhecimento so caminhos e procedimentos
importantes.
Ler com compreenso inclui, entre outros, trs componentes bsicos: a compreenso linear, a
produo de inferncias, a compreenso global. A compreenso linear do texto diz respeito
capacidade de reconhecer informaes visveis no corpo do texto e construir, com elas, o fio
da meada que permite a apreenso de sentidos. Essa capacidade se manifesta na possibilidade
de, ao acabar de ler uma narrativa, saber dizer quem fez o que, quando, como, onde e por qu.
Outra capacidade fundamental para ler com compreenso a de produzir inferncias. Trata-se
de ler nas entrelinhas ou compreender os subentendidos, realizando operaes como associar
elementos diversos, presentes no texto ou que fazem parte das vivncias do leitor, para
compreender informaes ou inter-relaes entre informaes que no estejam explicitadas no
texto. A identificao das informaes pontuais presentes no texto e a produo de inferncias
que vo possibilitar a compreenso global do texto lido, a composio de um todo coerente e
consistente, ou seja, a construo de sentido.
Como a capacidade de compreenso no vem automaticamente nem plenamente desenvolvida,
precisa ser exercitada e ampliada, em diversas atividades com os alunos, durante toda a
trajetria escolar no apenas nos anos iniciais da Educao Fundamental. Por isso que, no
Quadro 3, as linhas que se referem aos desdobramentos deste verbete esto todas sombreadas
no tom mais escuro de cinza. A sugesto que sejam introduzidas desde o primeiro ano e, j a
partir da, trabalhadas sistematicamente, com vistas consolidao. A gradao, necessria,
deve ser feita com base nas caractersticas dos textos lidos (temtica, complexidade de estrutura
e de linguagem, tamanho) e no progresso da autonomia das crianas. Essas duas capacidades
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fazem parte da capacidade mais importante, que ler com compreenso, mas no so prrequisitos para se chegar a ela.
O trabalho com a compreenso pode e deve ser comeado antes mesmo que as crianas tenham
aprendido a decodificar e a reconhecer globalmente as palavras.
Como j foi dito no verbete Desenvolver atitudes e disposies favorveis
leitura, quando o professor ou a professora l em voz alta e comenta ou
discute com seus alunos os contedos e usos dos textos lidos, est
contribuindo para o desenvolvimento da capacidade de compreenso. Este
um procedimento que pode ocorrer desde a educao infantil, tomando
como objeto contos infantis, poemas, notcias cujo tema interesse s crianas,
entre outros.
Para contribuir com o desenvolvimento da capacidade dos alunos de ler com compreenso,
importante que o professor ou a professora lhes proporcione a familiaridade com gneros
textuais diversos (histrias, poemas, trovas, canes, parlendas, listas, agendas, propagandas,
notcias, cartazes, receitas culinrias, instrues de jogos, regulamentos), lendo para eles em
voz alta ou pedindo-lhes leitura autnoma. Alm disso, desejvel abordar as caractersticas
gerais desses gneros (do que eles costumam tratar, como costumam se organizar, que recursos
lingsticos costumam usar, para que servem). A capacidade de reconhecer diferentes gneros
textuais e identificar suas caractersticas gerais favorece bastante o trabalho de compreenso,
porque orienta adequadamente as expectativas do leitor diante do texto.
Assim, antes da leitura feita em voz alta pelo professor ou pela professora,
em grupos ou individualmente pelos alunos bom propor s crianas
perguntas como: o texto que vamos ler vem num jornal? num livro? num
folheto? numa caixa de brinquedo? que espcie (gnero) de texto ser esse?
para que ele serve? quem que conhece outros textos parecidos com esse?
onde?
Outro tipo de procedimento importante para desenvolver a capacidade de
compreenso buscar informaes sobre o autor do texto, a poca em que
ele foi publicado, com que objetivos foi escrito. Esses dados permitem situar o
texto no contexto em que foi produzido e ampliam a compreenso e o prazer
pela leitura, alm de contribuir para a formao de um leitor cada vez mais
bem informado e interessado, mais capaz de tirar proveito do que l.
44
Um saber importante que integra a capacidade de ler com compreenso diz respeito a prestar
ateno nos componentes formais do texto: a) sua estrutura composicional, isto , sua
organizao em partes; b) os recursos lingsticos que emprega (por exemplo: se usa o discurso
direto ou discurso indireto; se usa muitos diminutivos; em que tempo esto os verbos que
utiliza; se usa gria, ou uma linguagem coloquial, ou linguagem muito culta; se tem mais frases
curtas ou mais frases longas); c) os recursos expressivos e literrios a que recorre, como rimas,
linguagem figurada, jogos de palavras, etc. Tudo isso a estrutura composicional, os recursos
lingsticos e os literrios so elementos importantes da construo do sentido dos textos e da
capacidade de ler com compreenso.
Nesse trabalho de construir sentido produzindo inferncias, os alunos podem se lembrar de
outros textos conhecidos, construindo pontes intertextuais, e tambm utilizar-se de
conhecimentos que j tm (do tema, da sociedade em geral, da lngua, de sua prpria
experincia de vida). Ler nas entrelinhas, produzindo inferncias o jeito mais completo e mais
gostoso de ler, porque proporciona ao leitor o prazer da descoberta, o sentimento de ser
cmplice do autor. o que possibilita ao leitor dizer consigo mesmo: Ah, ento isso!... Bem
que eu desconfiei... Os leitores iniciantes, ainda muito dependentes do processo de
decodificao, precisaro mais da orientao do professor ou da professora para realizar
inferncias. Pode-se, por exemplo, recomendar-lhes buscar pistas auxiliares, como palavras em
destaque, formatos grficos e ilustraes; outras vezes poder fazer uma leitura expressiva e
completa do texto, com o objetivo de dirigir o foco para alguns elementos-chave para a
compreenso.
45
Ler com compreenso implica ser capaz de produzir uma viso global do texto, de tal modo
que, ao final da leitura, o leitor saiba do que o texto fala, por onde ele comea, que caminhos ele
percorre, como ele se conclui. Isso significa ser capaz de resumir o texto lido e de recont-lo ou
repass-lo para algum. tambm importante ser capaz de explicar e discutir o texto lido,
demonstrando para professores(as) e colegas em que se sustenta a prpria interpretao. Essa
compreenso global resultado de uma leitura atenta, que foi formulando e testando hipteses,
relacionando informaes, produzindo inferncias. A capacidade de fazer inferncias, j
descrita anteriormente, merece trabalho especial na sala de aula: deve-se instigar os alunos a
prestarem ateno e explicarem o que est nas entrelinhas, a descobrirem e explicarem os
porqus, a explicitarem as relaes entre o texto e seu ttulo. Insistimos na questo de que tudo
isso pode comear a ser desenvolvido antes de os alunos serem capazes de ler com autonomia, a
partir da leitura oral feita pelo professor ou pela professora, ou da leitura feita em grupo, com o
apoio de outros adultos ou de um colega mais avanado nesse nvel de compreenso da leitura.
(vi) Avaliar tica e afetivamente o texto, fazer extrapolaes
Depois da leitura, que pode ter sido feita em voz alta pelo professor ou pela professora, os
alunos podem partilhar suas atitudes diante do texto com os colegas, avaliando e comentando
tica e afetivamente o que leram, concordando ou no com afirmaes e passagens, fazendo
extrapolaes (isto , projetando o sentido do texto para outras vivncias, outras realidades),
buscando outros textos do mesmo autor, ou sobre o mesmo tema. Ser capaz de fazer
extrapolaes pertinentes sem perder o texto de vista importante para o aprendizado de
descobrir que as coisas que se lem nos textos podem fazer parte da nossa vida, podem ter
utilidade e relevncia para ns.
Esta seo trata especialmente das capacidades necessrias ao domnio da escrita, considerando
desde as primeiras formas de registro alfabtico e ortogrfico at a produo autnoma de
textos.
A produo escrita concebida aqui como ao deliberada da criana com vistas a realizar
determinado objetivo, num determinado contexto. A escrita na escola, assim como nas prticas
sociais fora dela, deve servir a algum objetivo, ter alguma funo e dirigir-se a algum leitor.
Assim como foi feito na seo dedicada leitura, o Quadro 4 e os verbetes relativos escrita
retomam e desdobram alguns itens tratados nas sees Compreenso e valorizao dos usos
46
47
A compreenso e valorizao das funes sociais da escrita uma aprendizagem ligada aos
planos conceitual, procedimental e atitudinal, que pode ter incio desde os primeiros momentos
da chegada da criana escola e deve continuar at o final de sua formao estudantil.
Muitas crianas chegaro escola sem saber no s como se escreve, mas tambm por que e
para que se escreve. De acordo com grande nmero de estudos e pesquisas recentes, o sucesso
na apreenso do como est diretamente ligado compreenso do por que e do para que.
Em nossa sociedade, escreve-se para registrar e preservar informaes e conhecimentos, para
documentar compromissos, para divulgar conhecimentos e informaes, para partilhar
sentimentos, emoes, vivncias, para organizar rotinas coletivas e particulares. Essas funes
da escrita se realizam por meio de diferentes formas os diversos gneros textuais , que
circulam em diferentes grupos e ambientes sociais, em diferentes suportes (ou portadores de
texto). Acredita-se que um processo eficiente de ensino-aprendizagem da escrita deve tomar
como ponto de partida e como eixo organizador a compreenso de que cada tipo de situao
social demanda um uso da escrita relativamente padronizado. Essa relativa padronizao,
nascida dos usos e funes sociais, que justifica o empenho da escola em ensinar e o
empenho do aluno para aprender as convenes grficas, a ortografia, a chamada lngua
culta. Isso pode ser feito na sala de aula desde os primeiros dias do Ensino Fundamental. O
professor ou a professora estar orientando seus alunos para a compreenso e a valorizao dos
diferentes usos e funes da escrita, em diferentes gneros e suportes, quando
ler em voz alta para eles histrias, notcias, propagandas, avisos, cartas circulares para os pais,
etc.;
trouxer para a sala de aula textos escritos de diferentes gneros, em diversos suportes ou
portadores e explorar esse material com os alunos (para que servem, a que leitores se destinam,
onde se apresentam, como se organizam, de que tratam, que tipo de linguagem utilizam);
fizer uso da escrita na sala de aula, com diferentes finalidades, envolvendo os alunos (registro
da rotina do dia no quadro de giz, anotao de decises coletivas, pauta de organizao de
trabalhos, jogos e festas coletivos, etc.).
Assim, sugerimos no Quadro 4 que essa capacidade seja introduzida j no 1 ano e, a partir de
sua introduo, seja trabalhada sistematicamente, para que se consolide como disposies e
atitudes permanentes nos alunos.
Ver os verbetes: Letramento; Conhecer, utilizar e valorizar os modos de produo e
circulao da escrita na sociedade; conhecer os usos e funes sociais da escrita;
Desenvolver atitudes e disposies favorveis leitura.
Uma palavra qualquer, um nome prprio podem ser um texto, se forem usados numa
determinada situao para produzir um sentido. Assim, as crianas que iniciam sua
escolarizao podem produzir textos escritos desde os primeiros dias de aula. Tudo depende de
os exerccios de escrita estarem vinculados a situaes de uso em que eles faam sentido,
tenham razo de ser e obedeam a determinadas convenes ou regras para cumprirem com
adequao seus objetivos (convenes grficas, regras ortogrficas, por exemplo).
No Quadro 4, a linha referente a essa capacidade geral est toda no tom mais escuro de cinza,
com a indicao de que ela deve ser introduzida desde o 1 ano e, da para frente, trabalhada
48
Saber pegar no lpis e traar letras, compondo slabas e palavras, bem como dispor, ordenar e
organizar o prprio texto de acordo com as convenes grficas apropriadas, so capacidades
que devem ser desenvolvidas logo no incio do processo de alfabetizao.
Mas as primeiras experincias de escrita das crianas no precisam se limitar a exerccios
grafo-motores ou a atividades controladas de reproduzir escritos e preencher lacunas. Mesmo
na realizao desses pequenos trabalhos possvel atribuir alguma funo e algum sentido s
prticas de escrita na sala de aula. Por exemplo, copiar o prprio nome ganha razo de ser
quando se conjuga confeco de um crach que ser efetivamente usado e permitir aos
colegas memorizarem a escrita dos nomes uns dos outros. Distinguir e aprender a traar as
letras e memorizar a ordem alfabtica um aprendizado cuja utilidade se manifesta na
organizao de agenda de telefones dos alunos da turma, ou de um caderno de controle de
emprstimo e devoluo dos livros do cantinho de leitura, ou de listas de alunos escalados para
realizar determinadas tarefas.
Atividades como essas envolvem, simultaneamente, aprendizagens na direo da alfabetizao
e do letramento, porque requerem habilidade motora, perceptiva e cognitiva no traado das
letras e na disposio do escrito no papel, convidam reflexo sobre o sistema de escrita e
suscitam questes sobre a grafia das palavras, ao mesmo tempo em que do oportunidade s
crianas de vivenciarem importantes funes da escrita.
Em momentos posteriores do Ensino Fundamental, a necessria capacidade de dominar o
sistema ortogrfico pode ser associada produo de textos escritos com funo social bem
definida. Por exemplo, cartazes, avisos, murais so gneros textuais que, em razo de seus
objetivos e de sua circulao pblica, devem apresentar a ortografia padro. Assim, se as
crianas se envolverem na produo, individual ou coletiva, de textos como esses, tendo em
mente as circunstncias em que sero lidos, compreendero que, nesses casos, justificvel
dedicar ateno especial grafia das palavras.
Ver capacidades descritas a partir do quadro 2, no eixo da apropriao do sistema de escrita
(iii) Planejar a escrita do texto considerando o tema central e seus
desdobramentos
A chamada coerncia textual diz respeito organizao dos contedos do texto de modo que
ele parea, para seus leitores, lgico, bem encadeado e sem contradies.
Essa uma capacidade importante a ser desenvolvida na escola, desde os anos iniciais da
alfabetizao. O prprio convvio social proporciona s crianas boas intuies sobre como
organizar as idias para produzir textos orais que os ouvintes considerem coerentes. No
entanto, a organizao e o encadeamento dos textos da conversa cotidiana so diferentes do que
se espera no caso de textos escritos, principalmente se tiverem circulao pblica. Por isso,
necessrio trabalhar explcita e sistematicamente essa questo em sala de aula.
possvel comear a aprender a planejar o texto que se vai escrever, cuidando deliberadamente
da escolha do tema e da seleo e encadeamento das idias em que ele vai se desdobrar, antes
49
Assim como outras capacidades j discutidas, esta tambm pode comear a ser desenvolvida
antes que a criana saiba ler e escrever com autonomia. Quando o professor ou a professora l
em voz alta, na sala de aula, histrias, poemas, notcias, cartas, convites, avisos, est
possibilitando que os alunos se familiarizem com o padro de composio desses gneros.
possvel e recomendvel, tambm, alm disso, uma abordagem sistemtica, em que se chame a
50
ateno dos alunos explicitamente para essa questo, perguntando a eles como acham que se
deve organizar determinado texto, ou apontando os componentes e explicando sua funo,
quando se tratar de gnero desconhecido. Esse trabalho pode ser feito nas produes coletivas,
em que os alunos ditam e o professor ou a professora funciona como escriba, registrando o
texto no quadro de giz, mas tambm nas produes em grupo ou individuais.
(v) Usar a variedade lingstica apropriada situao de produo
e de circulao, fazendo escolhas adequadas quanto ao vocabulrio e
gramtica
O portugus, como todas as lnguas humanas, varia de acordo com as caractersticas dos
diversos grupos de falantes e com as diferentes situaes sociais de uso. As pessoas so capazes
de perceber com facilidade como difere o modo de falar de uma regio para outra, ou como as
pessoas mais escolarizadas falam diferente das que pouco freqentaram a escola, ou como os
jovens falam diferente dos adultos e dos velhos. Alm disso, uma mesma pessoa, em
circunstncias sociais diversas, muda seu estilo de falar: em geral, no se conversa com o bispo
ou com o prefeito da mesma maneira como se conversa
com a famlia, dentro da prpria casa. Essa diversidade
no uso da lngua o que se chama variao
lingstica e cada um dos modos peculiares de falar
Voltaremos a este
chamado de variedade. A variao lingstica
acontece no apenas na fala, mas tambm na escrita.
assunto no Fascculo 7,
consensual a crena de que se vai escola para
quando procuraremos
aprender uma dessas variedades, a que tem maior
responder questo:
prestgio social, que a lngua padro escrita ou
Por que temos na
norma culta.
lngua variantes que
51
textos lidos pelo professor ou pela professora, da leitura de textos de gneros diversos, da
participao na redao e na avaliao coletiva de textos na sala de aula.
(vi) Usar recursos expressivos (estilsticos e literrios) adequados ao gnero e
aos objetivos do texto
O uso expressivo dos recursos lingsticos se manifesta tanto nos textos literrios quanto nos
textos prticos do cotidiano e pode servir aos objetivos de produzir encantamento, comover,
fazer rir, ou convencer racionalmente. Pode-se avaliar a importncia disso quando se pensa no
poder de seduo das propagandas, ou no poder de persuaso e convencimento de um discurso
poltico ou de um sermo religioso.
Essa tambm uma capacidade de uso da escrita que pode ser ensinada e aprendida na escola.
Saber fazer versos rimados um aprendizado que pode
ter incio com a sensibilizao ldica para as rimas, o
ritmo e a cadncia de textos lidos pelo professor ou
pela professora e pelos prprios alunos, ou
Os aspectos ldicos
memorizados e declamados em pblico (poemas,
canes populares, cantigas de roda, trovas,
da linguagem e da
quadrinhas, etc.). As crianas podem aprender a
aprendizagem
produzir, interpretar e apreciar a linguagem potica
tambm sero objeto
nos textos lidos e escritos em sala de aula, assim como
de estudos neste
podem aprender a criar efeitos de humor com jogos de
curso, sobretudo no
palavras. Mas, sobretudo, importante que aprendam a
fascculo 5 O ldico
escolher deliberadamente os recursos adequados aos
na sala de aula:
objetivos que seu texto deve cumprir junto aos leitores
projetos e jogos.
a que se destina.
52
No fascculo
complementar
atividades de escrita de
listas de nomes prprios:
as listas, em geral,
constituem escrita
contextualizada, escrita
que faz sentido ao aluno
porque diz respeito a
coisas relacionadas ao
seu mundo.
Os alunos devem aprender a considerar diferentes dimenses de seus textos, levando em conta
a adequao aos objetivos, ao destinatrio, ao modo e ao contexto de circulao.
Ver os verbetes: Lngua e ensino de lngua; Alfabetizao; Letramento; Ensino da Lngua
Escrita; Dominar convenes grficas; Compreenso de textos.
Desenvolvimento da Oralidade
Esta seo focaliza um ponto que s h pouco tempo passou a integrar as responsabilidades da
escola: o desenvolvimento da lngua oral dos alunos. S recentemente a Lingstica e a
Pedagogia reconheceram a lngua falada, de importncia to fundamental na vida cotidiana dos
cidados, como legtimo objeto de estudo e ateno.
No entanto, vem em boa hora essa novidade, agora incorporada nos documentos oficiais de
orientao curricular. Coexistem, em nossa sociedade, usos diversificados da Lngua
Portuguesa. justo e necessrio respeitar esses usos e os cidados que os adotam, sobretudo
quando esses cidados so crianas ingressando na escola. Os alunos falantes de variedades
lingsticas diferentes da chamada lngua padro, por um lado, tm direito de dominar essa
variedade, que a esperada e mais aceita em muitas prticas valorizadas socialmente; por outro
lado, tm direito tambm ao reconhecimento de que seu modo de falar, aprendido com a
famlia e a comunidade, to legtimo quanto qualquer outro e, portanto, no pode ser
discriminado.
O Quadro 5 e os verbetes que se seguem apontam algumas capacidades relativas lngua
falada que preciso desenvolver nos alunos, para possibilitar a todos a plena integrao na
sociedade.
53
54
55
56
questionrio, jogar determinado jogo, superar algum obstculo numa gincana, montar ou fazer
funcionar um aparelho, etc.
Neste primeiro fasculo, foram apresendados os cinco eixos de capacidades que devem ser
focalizados no processo de alfabetizao:
(1) compreenso e valorizao da cultura escrita;
(2) apropriao do sistema da escrita;
(3) leitura;
(4) produo de textos escritos;
(5) desenvolvimeto da oralidade.
No prximo fascculo, abordaremos uma dimenso complementar e indispensvel ao processo
de alfabetizao: a avaliao dessas capacidades e suas implicaes para a aprendizagem e o
ensino nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
57
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60
Alfabetizao e Letramento:
Questes sobre Avaliao
fascculo 2
Sumrio
Introduo................................................................................. 6
A seo apresenta os objetivos e a estrutura do texto proposto
Unidade I
Concepes atuais em relao avaliao....................................... 7
A seo apresenta uma reviso de aspectos conceituais relacionados ao
processo de avaliao, tendo em vista os trs primeiros anos do Ensino
Fundamental. Sugere alguns instrumentos para registro e anlise do
processo de aprendizagem dos alunos, com nfase nas possibilidades
oferecidas por fichas descritivas. Conclui com propostas de estratgias
para interveno na aprendizagem dos alunos e para avaliao do
trabalho realizado pelas escolas.
Concluindo................................................................................23
Apresentao de uma sntese da proposta
Referncias Bibliogrficas....................................................24
Anexo
Introduo
66
Unidade I
Concepes atuais em relao avaliao
Na ltima dcada, a avaliao educacional passou a ocupar lugar central nas polticas pblicas
de educao no Brasil, em documentos oficiais sobre parmetros e diretrizes para a educao
bsica. Do ponto de vista terico, ampliou-se bastante o conjunto de referncias sobre aes e
estratgias de avaliao, em todas as formas de organizao escolar do processo de ensinoaprendizagem.
As diferentes redes adotam distintos sistemas de organizao, algumas
optando por ciclos de formao, outras pela seriao.
Por isso continuaremos nos referindo, tambm nesta parte do texto, aos trs
primeiros anos do Ensino Fundamental, ou seja, s turmas de seis, sete e oito
anos.
Uma evidncia das formas de excluso referidas tem sido o crescente nmero
de alunos que chegam ao final do Ensino Fundamental sem nveis adequados
de escrita e leitura ou como analfabetos funcionais. Isso significa que, embora
essas pessoas dominem algumas das capacidades bsicas relacionadas
leitura e escrita descritas anteriormente neste texto, no so capazes de
utilizar a escrita e a leitura nas situaes sociais da vida cotidiana.
Vimos que diagnosticar coletar dados relevantes, por meio de instrumentos que expressem o
estado de aprendizagem do aluno, levando em considerao as metas e as capacidades que se
pretende avaliar.
Tendo em vista o foco de nossa abordagem a alfabetizao nos anos iniciais no Ensino
Fundamental a avaliao diagnstica deve se orientar por algumas questes essenciais
reflexo de professores e professoras que se ocupam do trabalho de alfabetizar:
At que ponto as experincias extra-escolares dos alunos em relao escrita tm sido
consideradas como apoio para o trabalho desenvolvido em sala de aula?
At que ponto os alunos desenvolveram ou consolidaram determinadas capacidades em um
certo nvel ou etapa da srie ou do ciclo?
At que ponto os progressos valorizados nas aes avaliativas esto sendo confrontados com
outras produes dos alunos em momentos anteriores de seu processo de aprendizagem?
At que ponto as capacidades desenvolvidas ou aprendidas permitiro aos alunos acompanhar,
com proveito, o nvel ou patamar seguinte?
At que ponto os instrumentos ou procedimentos de avaliao selecionados e utilizados
permitem captar, com indicadores descritivos, os progressos realizados pelos alunos em relao
a essas capacidades?
Para lidar com essas questes, vrios instrumentos tm sido utilizados nas prticas de avaliao
como fontes de informao sobre os processos de aprendizagem dos alunos. Tendo em vista os
requisitos j enfatizados para que a avaliao seja formativa e continuada, alguns desses
instrumentos expressam conquistas que merecem ser consolidadas e aprimoradas.
10
11
Questes desse tipo podem ser utilizadas na avaliao de um conhecimento mais especfico,
como no exemplo anterior, relacionado compreenso de princpios de nosso sistema de escrita
ou de vrios conhecimentos e capacidades, como no caso de se avaliar uma escrita espontnea
da criana ou sua leitura de um texto. Torna-se possvel, assim, compreender as hipteses
espontneas da criana e as elaboraes conceituais propiciadas pelas intervenes dos adultos
que com ela interagem, em torno das capacidades em construo.
Instrumentos deste tipo so muito usados nas chamadas avaliaes
psicogenticas, como as propostas por Emlia Ferreiro e outros pesquisadores,
para sondagem das concepes das crianas em relao ao sistema de
escrita. [ver Psicognese da lngua escrita (FERREIRO, 1988) e O ensino da
linguagem escrita (NEMIROVSKY, 2002)].
Um dos exemplos mais utilizados no campo da alfabetizao diz respeito
sondagem do realismo nominal. Esse processo ocorre quando a criana
ainda no sabe que a escrita representa sons e sinais convencionais, julgando
que ela representa diretamente o objeto, tal como se apresenta na realidade,
como se fosse um desenho ou fotografia (da o nome realismo nominal).
devido a essa caracterstica que essa criana formula a hiptese, por
exemplo, de que a palavra BOI, quando escrita, deve ser maior que a palavra
PERNILONGO (pois um boi muito maior que um pernilongo).
12
O sentido maior do uso desse instrumento seria o registro acumulativo e progressivo de dados
pertinentes s aprendizagens, em torno de duas direes que o aluno se coloca: O que aprendi?
De que forma aprendi? A partir desses eixos, construir o registro de aes, atividades
espontneas ou dirigidas pelo professor ou pela professora, produes prprias ou reprodues
de informaes e documentos, coletas de informaes em outras fontes, apreciaes e
dificuldades. A periodicidade de sua elaborao determinada pelos objetivos de cada etapa de
aprendizagem e pelas motivaes ao longo do processo, podendo ser trimestral, semestral ou
mesmo anual.
13
Embora todos esses instrumentos estejam colocados a servio da aprendizagem dos alunos, vale
lembrar que a escola tambm lana mo de registros burocrticos ou institucionais, para
informar dados comunidade escolar e ao prprio sistema (atravs de fichas, formulrios,
relatrios, histricos escolares ou outras formas), relativos a avaliaes de final de sries, ciclos
ou a transferncia de alunos.
Isso significa que a conciliao dessas duas dimenses da avaliao a burocrtica e a
pedaggica uma tarefa rdua, que exige a permanente reavaliao do sistema e de cada
projeto institucional, quanto aos procedimentos que demandam: por um lado, mecanismos de
certificao e, por outro lado, mecanismos processuais e formativos. A construo de
instrumentos mais sensveis, nessa perspectiva, somente poder ser implementada pelos
prprios agentes das aes pedaggicas, no podendo ser previamente definida como prescrio
rgida.
Tambm na perspectiva da correo dos erros dos alunos, deve prevalecer a indicao de
elementos observveis aos olhos dos educandos e dos familiares, para que estes saibam,
objetivamente, em quais aspectos podem auxiliar seus filhos em casa.
Mas o que significa transformar o erro do aluno em algo observvel?
14
Comecemos pelo que no uma ajuda neste processo. Uma correo vaga, feita pelo professor
ou pela professora, nas produes dos alunos como, por exemplo, apenas riscar uma resposta
considerada errada, ou inserir um ponto de interrogao em uma parte do texto produzido, sem
que sejam apontados indicadores explcitos que reorientem o aluno em sua reviso , no estar
contribuindo para a localizao de problemas ou para a reelaborao de atividades.
Por outro lado, uma contribuio objetiva e observvel ocorre, por exemplo, quando o(a)
professor(a) utiliza cdigos e legendas, com os alunos, para sinalizar aspectos que merecem
ateno especial em suas produes, alm de registrar comentrios mais pontuais nas mesmas,
evidenciando progressos, sugerindo revises e alternativas de reelaborao. At mesmo quando
o retorno se faz coletivamente, possvel evidenciar os erros mais freqentes e propor formas
de correo individual, com ajuda de outros colegas e de outros recursos (dicionrio, fontes
externas, etc.).
15
proposta, mas se adequando ao nvel de elaborao dos projetos curriculares e das reflexes
sobre prticas pedaggicas desenvolvidas.
Assim, o objetivo central da exemplificao que se segue o de oferecer maior visibilidade aos
pressupostos que fundamentam um instrumento de avaliao de carter formativo e contnuo,
contemplando:
1. capacidades esperadas para um determinado ciclo, srie ou segmento do Ensino
Fundamental;
2. desempenhos observveis nos alunos, em termos de capacidades mais globais e mais
especficas;
3. possveis metas propostas para a continuidade do processo.
A ficha que apresentaremos a seguir um exemplo de registro feito pela professora de uma
turma de 1 ano do Ensino Fundamental, de uma escola pblica da rede estadual de Minas
Gerais, a partir da aplicao de um dos possveis instrumentos de avaliao diagnstica das
capacidades de alfabetizao anteriormente abordadas. O instrumento utilizado no est sendo
apresentado, neste momento, porque o interesse do exemplo apenas ilustrar uma possibilidade
de registro descritivo.
O instrumento de Avaliao Diagnstica utilizado pela professora do exemplo
apresentado foi produzido pelo CEALE Centro de Alfabetizao, Leitura e
Escrita/UFMG (2005). A referncia completa est na bibliografia final. Voc
ter uma cpia deste instrumento, juntamente com algumas sugestes de
atividades de avaliao diagnstica das capacidades lingsticas dos alunos,
no ANEXO que est presente no final deste fascculo.
16
NVEL 1
NVEL 2
NVEL 3
N
ALUNOS
N
ALUNOS
N
ALUNOS
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17
Um aspecto abordado anteriormente deve ser relembrado: a avaliao dessas distncias entre
processos reais e processos esperados deve levar em considerao os progressos de cada aluno
em relao a sua prpria trajetria (o que se modificou tendo em vista seu percurso de
aprendizagens?); em relao turma (como se situam os progressos do aluno tendo como
referncia o coletivo da turma?), e em relao aos patamares de capacidades valorizados como
metas curriculares (quais dessas capacidades j se encontram em desenvolvimento?).
18
A partir dessa formulao, pode ficar mais ntido que o registro do nvel 2, tal como indicado na
ficha, exigiria uma ao correspondente no plano do ensino: trabalhar as lacunas ou
capacidades ainda no desenvolvidas e sistematizar as que se encontram em patamares mais
avanados.
Outros alunos podero, ainda, estar em um nvel de maior consolidao em uma ou vrias das
capacidades avaliadas (Nvel 3). Algumas dessas capacidades podero at mesmo estar
desenvolvidas no incio da alfabetizao, dependendo das experincias anteriores da criana;
outras, de maior complexidade conceitual, sero consolidadas progressivamente ao longo dos
trs primeiros anos do Ensino Fundamental. Diagnosticado tal nvel, fica evidente que a ao
pedaggica esperada a de reconhecer as consolidaes e avanar. Tais avanos se referem s
possibilidades de novas e mais elaboradas aprendizagens.
O registro das dificuldades reveladas por determinados alunos poder oferecer claras pistas
para as possibilidades de mediao do professor ou da professora, que poder acompanhar e
monitorar as aprendizagens desses alunos, utilizando todas as formas de interveno que
podero ser mobilizadas pela escola. Esses alunos merecero um olhar especial, para que
cheguem ao final dessa primeira etapa com o domnio de algumas das capacidades bsicas que
sero necessrias nos processos de alfabetizao e letramento.
19
Tem sido reiterado, nesta proposta, que as dificuldades diagnosticadas ao longo do processo de
alfabetizao so fonte de informaes para as decises relativas ao trabalho docente e ao
projeto pedaggico da escola.
Entretanto, um ponto deve ficar bem evidente: avaliar a aprendizagem do aluno, nesta
perspectiva implica tambm a avaliao das prticas de ensino e das instituies responsveis
por esse ensino. Em outros termos: quando identificamos problemas na aprendizagem dos
alunos, devemos buscar tambm problemas que podem estar ocorrendo nas prticas de ensino.
Afinal, o trabalho docente precisa ser permanentemente avaliado.
Algumas questes poderiam guiar essa reflexo, acompanhando as avaliaes diagnsticas dos
desempenhos dos alunos:
Quais foram as oportunidades de aprendizagem vivenciadas pelo aluno no perodo a que se
refere a avaliao diagnstica em discusso?
Foram explorados contedos e atividades correspondentes s capacidades demandadas aos
alunos? Quais foram as capacidades no trabalhadas?
O professor ou a professora propiciou variedade de recursos, procedimentos e alternativas
metodolgicas para atender aos diversos nveis de aprendizagem e de dificuldades no interior
da turma?
O(a) professor(a) ofereceu suficientes oportunidades de reviso e reelaborao das produes
dos alunos, com sua interveno, com trocas recprocas ou auto-avaliaes dos alunos?
Quais alunos no tiveram oportunidade de participar dessas atividades ou no chegaram a
consolidar e avanar nos conhecimentos e capacidades esperados para essa etapa? Foram
propiciadas a tais alunos outras possibilidades de recomposio de seu processo de
aprendizagem?
20
Algumas propostas
21
22
Concluindo
Esta proposta buscou oferecer a professores e professoras que atuam nos anos iniciais da
Educao Fundamental uma sntese de concepes essenciais aos processos de alfabetizao e
letramento e de capacidades que devem ser atingidas pelas crianas nessa escolarizao
inicial. Deve-se ressaltar que cabe escola e aos profissionais que alfabetizam analisarem, para
cada realidade, quais sero as condies aptas a garantir essas aprendizagens, levando em conta,
como fator particularmente relevante, as experincias prvias dos alunos com a escolarizao e
sua familiaridade com a cultura escrita.
O sucesso de um projeto pedaggico de alfabetizao depende crucialmente do envolvimento
dos profissionais comprometidos com a alfabetizao. A esses profissionais que cabe, afinal,
perguntar e responder: quem so as crianas que temos nossa frente? como trabalhar
acreditando que toda criana pode aprender a ler e escrever? que condies sero buscadas para
garantir uma alfabetizao de qualidade para todos?
Esta abordagem buscou, ainda, evidenciar a complexidade das aes e estratgias relacionadas
avaliao da aprendizagem, tambm no campo da alfabetizao. Procurou-se deixar claro
que necessrio avaliar as aprendizagens dos alunos, o processo de ensino, a realizao de
metas de planejamento, programas e projetos estabelecidos pela escola e pelo sistema. Por isso,
enfatizou-se a importncia de que a avaliao do desempenho dos alunos seja complementada
pela avaliao do trabalho desenvolvido pela escola. Assim, uma importante conquista ser o
monitoramento de aes desenvolvidas pelo sistema de ensino, com propostas efetivamente
voltadas para as condies de trabalho do profissional da alfabetizao entre essas, a
ampliao do tempo de professores(as) para atividades de planejamento e avaliao do trabalho
realizado, e a garantia de sua formao continuada, na perspectiva valorizada nesta proposta.
O que importa que todos os instrumentos propostos se coloquem a servio da alfabetizao.
Para os profissionais que trabalham nos anos iniciais do Ensino Fundamental, tais instrumentos
precisam contribuir para o fortalecimento de sua identidade, para sua valorizao como
alfabetizadores(as) e para a consistncia de seu trabalho pedaggico. Para alunos desse
segmento e, por extenso, para suas famlias todas as aes e instrumentos propostos devem
ter como metas a consolidao de suas capacidades em nveis crescentes de autonomia, o
resgate da qualidade de sua alfabetizao e de seu processo de letramento, a restituio de seu
direito a uma escola pblica respeitada.
Para que tais metas sejam alcanadas, importante que o professor tenha condies de
organizar o seu trabalho, de organizar o tempo da aula. deste assunto que trata o Fascculo 3,
intitulado A Organizao do Tempo Pedaggico e o Planejamento do Ensino, seu prximo
objeto de estudos neste curso, ao qual esperamos que voc se dedique depois de analisar e
desenvolver as atividades apresentadas no Anexo deste Fascculo 2.
Bom trabalho!
23
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26
Avaliao diagnstica da
alfabetizao
Anexo:
Atividades para o(a) professor(a)
Caro(a) professor(a).
Voc j estudou neste fascculo sobre as capacidades lingsticas que devero ser objeto de
ensino no seu trabalho de alfabetizao. Estamos propondo agora uma atividade que tem como
objetivo retomar esses conhecimentos e aplic-los em uma situao concreta de sala de aula.
Para isso, recomendamos que voc faa uma leitura cuidadosa do texto abaixo sobre avaliao
diagnstica, analise o instrumento de avaliao que estamos propondo e procure aplic-lo com
seus alunos. Posteriormente, analise os resultados obtidos em sua classe com os seus colegas de
curso.
Boa sorte!
29
30
A estrutura da matriz
Pontos-chave
31
2 Conhecer o alfabeto e os
diferentes tipos de letras
32
Descritores
Procedimentos
de Avaliao
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
1, 2, 3
4, 5, 6 , 7
8, 9, 10
17, 18, 19
Descritores
Procedimentos
de Avaliao
Exemplos de
atividades:
20, 21
33
LEITURA
Capacidades
avaliadas
7 Ler e compreender palavras
compostas por slabas cannicas e
no cannicas.
11 Inferir informaes.
34
Descritores
Procedimentos
de Avaliao
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
22, 23,24
25
25, 26 e 27
27, 28, 29 e 30
31, 32, 33 e 34
33 e 35
36
16 Escrever sentenas.
Descritores
Procedimentos
de Avaliao
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
Exemplos de
atividades:
19
18, 21, 22
10, 21
37
37, 38
ao destinatrio;
s convenes grficas
apropriadas ao gnero;
s convenes ortogrficas.
35
Atividade 1
Professor (a), apresentar criana diferentes suportes (livros, revistas, jornais, folhetos, cartes
e outros) para que, folheando esses suportes, ela possa apontar aspectos que distingam o
sistema de escrita de outros sistemas de representao.
36
Atividade 4
Ao lado voc encontra letras do nosso alfabeto e
outros sinais grficos. Circule todas as letras que
aparecem no quadro.
Atividade 5
Observe as letras do nosso alfabeto que esto escritas nos quadrinhos abaixo e faa o que seu
(sua) professor (a) vai ler.
37
Atividade 6
Escreva nos quadrinhos abaixo as letras que seu (sua) professor (a) ditar. Se voc no souber
alguma letra, deixe o quadrinho vazio.
Atividade 7
Leia as palavras da primeira
coluna, com ajuda do(a)
professor(a). Ligue as
palavras iguais em cada
coluna, como no modelo.
Atividade 8
Voc conhece a quadrinha
ao lado? Leia para seu
(sua) professor(a).
Atividade 9
Leia a quadrinha ao lado
com a ajuda de seu
professor ou professora:
Circule cada palavra da
quadrinha.
38
REI CAPITO
SOLDADO LADRO
MOA BONITA
DO MEU CORAO
Atividade 10
Entregar uma folha de papel em branco, ditar uma frase para ser escrita. (Ex.: Eu gosto de
brincar.)
Atividade 11
Realizar oralmente a atividade ldica L vai uma barquinha carregadinha de..., pedindo para
cada criana da turma ou do grupo completar a frase com palavras terminadas em -o, -eza, -ol,
-inha, etc.
Atividade 12
Realizar oralmente atividades ldicas como Macaco mandou falar s palavras comeadas
com... (Em momentos mais avanados do processo de alfabetizao, o comando poder ser
para escrever as palavras, de modo a explorar as relaes entre grafemas e fonemas.)
Atividade 13
Ler as seqncias de palavras para os alunos e pedir que identifiquem a palavra que no termina
com os mesmos sons ou rimas.
1- sapateira torneira bola cadeira
2- corao limo banana sabo
3- panela colher janela canela
Atividade 14
Ler para os alunos cada par de palavras e pedir que digam quais pares combinam.
1- gato cachorro
2- anel chapu
3- borracha lpis
4- meia areia
5- po caf
6- limo cho
7- uva- luva
8- sapato p
Atividade 15
Pedir que as crianas digam uma palavra parecida com a palavra que vai ser falada.
Po
Boneca
Cadeira
39
Atividade 16
Ler para os alunos cada par de palavras e pedir que indiquem os pares que comeam com o
mesmo som.
1- chinelo chave
2- abacate amarelo
3- arroz feijo
4- sabonete cidade
5- meia sapato
6- macaco menino
7- lua rua
8- faca formiga
Atividade 17
Apresentar para as crianas uma folha com as palavras abaixo e pedir que elas faam um X
onde estiver escrita a palavra BOI. (exemplo de instruo falada pelo(a) professor(a): faa um
X onde est escrita a palavra boi.)
PERNILONGO
BOI
FORMIGA
Atividade 18
Escreva nas linhas abaixo as palavras que seu(sua) professor(a) vai ditar.
40
1___________________________
7____________________________
2___________________________
8____________________________
3___________________________
9____________________________
4___________________________
10____________________________
5___________________________
11____________________________
6___________________________
12____________________________
Atividade 19
Escreva nas linhas abaixo palavras que voc sabe escrever sozinho:
___________________________
____________________________
___________________________
____________________________
___________________________
____________________________
Atividade 20
Escreva uma lista com quatro brincadeiras que voc conhece.
Atividade 21
Escreva nas linhas abaixo o texto que seu (sua) professor(a) vai ditar.
Atividade 22
Professor (a), escolha um dos textos apresentados a seguir para ditar aos seus alunos.
Texto 1:
O menor co do mundo
O menor cachorro que j existiu no mundo era do tamanho
de uma fita cassete. Quando ficou adulto, ele media seis
centmetros de altura e dez centmetros de comprimento. Era
da raa Terrier. Em vez de caar gatos, fugia deles.
Pensavam que era um camundongo.
(Folha de So Paulo, Caderno Folhinha, 02/03/1991)
41
Texto 2:
Dona Barata
A Barata diz que tem
sete saias de fil.
mentira da barata
que ela tem
uma s.
A Barata diz que tem
um anel de formatura.
mentira da barata
que ela tem casca dura.
(Cantiga de domnio popular)
Atividade 23
Observe as fichas de
palavras ao lado.
H cinco palavras em cada
uma. Faa uma cruz nas
palavras que seu (sua)
professor(a) vai ler para
voc.
Atividade 24
Faa um crculo em
volta da palavra que
corresponde
figura.
42
Atividade 25
Leia para o(a) professor(a) o que est escrito em cada quadro.
Atividade 26
Leia este texto:
Agora responda:
1) Sobre o que o texto est falando?
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________
Atividade 27
Leia este texto:
43
Responda:
1) Qual o assunto do texto?
_________________________________________________________________________
Atividade 28
Leia a notcia ao lado:
turistas
44
Apelido
Peso
Comprimento
Cor
Idade
Atividade 29
Leia o anncio abaixo, retirado de um jornal.
Responda:
Qual o objetivo desse texto?
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________
O que est sendo vendido?
_____________________________________________________________________________
Segundo o autor, o carro nunca foi batido e est sendo vendido barato. Por que o autor diz isso
no texto?
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________
45
Atividade 30
Leia esta lista de telefones teis:
46
Atividade 31
Leia o texto abaixo:
Atividade 32
Leia o texto abaixo:
O camaleo assume a cor do lugar em que se encontra. Ele tambm muda de
cor em vrias situaes. Ele pode mudar de cor quando est com medo, quando
est zangado e quando est apaixonado.
(CIBOUL, Adle. As cores. So Paulo: Moderna, 2003; Coleo Criana Curiosa.
Texto adaptado)
Atividade 33
Leia o texto abaixo:
As minhocas so muito importantes para o homem
As minhocas abrem caminhos na terra cavando tneis. Com essa atividade elas
ajudam a manter a qualidade do solo a terra fica mais ventilada, frtil e
produtiva. Assim, elas fazem muito bem para a terra e para o plantio. Por isso, em
muitos lugares, elas so vendidas para o uso na agricultura.
(REVISTA Semanal da Lio de Casa. So Paulo: Klick Editora, n 21, p.4-5. Texto
adaptado)
47
Responda:
Por que o ttulo do texto As minhocas so muito importantes para o homem?
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
Atividade 34
Leia o texto abaixo:
O Lobo
Apesar da m fama da histria do Chapeuzinho vermelho, o lobo no perigoso
e nem ataca o homem. Ele pode ficar muito manso e a prova que os cachorros
que hoje vivem na casa da gente descendem de lobos selvagens que h
milhares de anos passaram a viver nas cavernas, com nossos antepassados. (...)
(O ESTADO DE SO PAULO. Estadinho, 2/10/1993.)
Responda:
O que acontece na histria do Chapeuzinho Vermelho para que o lobo tenha m fama, como
afirma o autor?
_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
Por que a prova de que o lobo no perigoso so os cachorros que vivem nas casas das
pessoas?
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________
48
Atividade 35
Pelo ttulo, que informaes voc acha que essa notcia vai nos dar?
Atividade 36
Professor(a), escolha entre os diferentes textos apresentados no instrumento. Voc vai precisar
de uma cpia do texto para ser usada pelos alunos e vrias cpias onde far suas observaes do
desempenho de cada um deles ao ler o texto.
Solicite a cada aluno que faa a leitura oral do texto e faa anotaes de como o aluno o leu.
Atividade 37
Solicitar criana que reescreva ou reconte (de acordo com o seu desenvolvimento) uma
narrativa curta como, por exemplo:
O leo e o ratinho
Um leo, cansado de tanto caar, dormia espichado debaixo da sombra de uma
boa rvore. Vieram uns ratinhos brincar em cima dele e ele acordou. Todos
conseguiram fugir, menos um, que o leo prendeu debaixo da pata. Tanto o
ratinho pediu e implorou que o leo desistiu de esmag-lo e deixou que fosse
embora. Algum tempo depois, o leo ficou preso na rede de uns caadores. No
conseguindo se soltar, fazia a floresta inteira tremer com seus urros de raiva. Nisso
apareceu o ratinho e, com seus dentes afiados, roeu as cordas e soltou o leo.
Moral: amigos pequenos podem ser grandes amigos.
(Brasil. Braslia: MEC, s/d. p. 8 - Atividade de apoio aprendizagem I verso do aluno.
Fundescola/ Secretaria de Educao Infantil e Fundamental Ministrio da Educao MEC)
49
Atividade 38
Leia o aviso que estava afixado em uma sala de aula.
Agora escreva um aviso, dizendo aos colegas e professores para no se esquecerem de que no
dia seguinte a turma far uma excurso prefeitura da cidade.
Atividade 39
Observe os ces que aparecem nas fotos.
Escolha um cachorro e escreva uma carta. A carta deve ser escrita para algum amigo ou parente
que est ausente. Conte que voc ganhou um cachorro e diga:
Como ele ; o que sabe ou no sabe fazer.
50
fascculo 3
Sumrio
Introduo................................................................................. 6
Unidade I
Os tempos da leitura na sala de aula ...................................................
7
Tempo, tempo, tempo, tempo ................................................................ 7
Jeitos e jeitos de viver o tempo da leitura na sala de aula ........................ 7
Unidade II
Os tempos da escrita na sala de aula ................................................... 13
Quanto tempo tem o tempo da escrita?.................................................. 13
Como as situaes apresentadas podem nos ajudar
a organizar o tempo na sala de aula? ....................................................
18
Unidade III
Planejamento ............................................................................................ 22
Planejar: trabalhar com escolhas prvias ............................................... 22
O nosso planejamento e o interesse dos alunos:
como se relacionam? .............................................................................
22
Atividade e reflexo sobre o planejamento ............................................. 24
Ns inclumos as crianas no nosso planejamento?
O ato de planejar contempla os saberes j construdos
pela criana? ................................................................................
24
Planejar viagens e planejar aulas: o que h em comum? ............. 25
E o improviso, no tem lugar na rotina? ........................................ 26
Se planejamento sinnimo de escolhas, como faz-las? ............ 26
Planejamento tambm instrumento de avaliao ...................... 27
Apontamentos finais .................................................................................
29
Sntese ...................................................................................................... 30
Referncias e sugestes bibliogrficas .......................................... 31
Introduo
Muitos de ns, diante de uma proposta pedaggica como a que se apresenta nestes fascculos, j
ouvimos de algum, ou dissemos a ns mesmos: Interessante! Mas como que vou dar conta
disso?
Esse tipo de comentrio revela algumas de nossas preocupaes com o trabalho dirio em sala
de aula. Uma delas refere-se ao tempo. Somos cobrados a respeitar os horrios e os prazos da
escola, a dar conta de projetos comuns a toda a rede de ensino em que nos inserimos, a nos
comprometer com a realizao das festas e das reunies, sem
que nos atrasemos no andamento dos contedos a serem
ensinados. Alm disso, h a realizao das tarefas de avaliao,
(...) como vou
de registro e de documentao estabelecidas ao longo dos
arranjar tempo
bimestres e semestres letivos. Diante desse quadro to familiar,
para ler todo dia
perguntamo-nos: como vou arranjar tempo para ler todo dia
com os alunos, para conversar com eles, para possibilitar que
com os alunos,
escrevam e re-escrevam seus textos, para fazer circular o que
para conversar
por eles foi produzido?
com eles....
Unidade I
Os tempos da leitura na sala de aula
Tempo, tempo, tempo, tempo...
Bate o sinal. Na sala de aula, mais um dia comea. Lem-se textos. Escreve-se na lousa e nos
cadernos. A leitura e a escrita so objeto de conhecimento e instrumento para a apropriao de
outros conhecimentos.
Embora saibamos da presena macia da leitura e da escrita na escola, cabe perguntar: O que se
l? O que se escreve? Para qu se l? Para que se escreve? Quando? Para quem? Com quem?
Em que condies, l-se e escreve-se na escola?
Atividade
Para comear nossa conversa, propomos que voc escreva a rotina de seu
trabalho com a leitura e com a escrita, tendo em conta as perguntas acima
formuladas. Elaborar uma lista das atividades de leitura e de escrita que voc
desenvolve pode ajud-lo(a) nessa tarefa.
Aproveite essa lista para pensar tambm em como voc distribui essas atividades
no dia e na semana e destaque aquelas que so realizadas ocasionalmente ou
s quando sobra tempo. Registre seus apontamentos para que
depois possamos conversar sobre eles.
Compostas a partir de escolhas feitas por ns (ou de escolhas com as quais concordamos ou a
que nos submetemos), nossas rotinas retratam o que fazemos na classe com nossos alunos.
Analisando-as, podemos perceber com que freqncia uma atividade aparece no dia ou na
semana, se essa atividade tem ou no um horrio e um espao definidos para acontecer e em
que momento do dia acontece, a durao prevista para ela e como ela se relaciona com outras
atividades. Esses elementos indicam o que consideramos mais ou menos importante no nosso
trabalho com as crianas e o que de fato mais valorizamos no tempo que compartilhamos com
elas.
De modo a melhor compreendermos como as rotinas escolares do visibilidade a nossos
objetivos e propsitos como professores, mesmo que nem sempre o percebamos, analisemos
algumas situaes que acontecem em nosso cotidiano escolar.
Relato 1:
Relato 2
Uma outra situao de rotina em sala de aula foi-nos narrada por uma professora. Leiamos seu
relato e analisemos o que ela conta em sua narrativa. Antes, importante mencionar que essa
narrativa parte do depoimento que essa professora forneceu a respeito de sua histria com a
leitura:
A menina que no se chamava Maria e o menino que no se chamava Joo
Essa foi uma histria que eu contei para os meus alunos, em partes, porque era
longa. s vezes acontece isso, eu leio um livro que surpresa para mim e
surpresa para as crianas. Esse livro foi muito interessante, forte, mobilizou um
monte de emoo. Tinha hora que eu tinha vontade de chorar. Eu falava: o que
que eu fao? Vamos dar uma respirada e amanh a gente continua.
Tem um outro livro de poesia que a gente leu h pouco tempo. Era um livro de
cores: A histria das cores. um livro narrado em espanhol, tem as duas
verses: portugus e espanhol. Eu li as duas verses para mim. Eles queriam,
claro, que eu lesse em espanhol. Comecei a ler, eles no entenderam muito. A
eu lia as duas verses, lia primeiro em portugus e depois espanhol, o espanhol
depois em portugus. Foi essa brincadeira at o final do livro. O livro tambm era
longo, durou sei l quantos dias, mas teve essa brincadeira.
A brincadeira
tambm tem lugar na
escola, e ela tambm
merece ser planejada.
o que veremos no
Fascculo 5 O ldico
na sala de aula:
projetos e jogos.
A professora tambm menciona: Esse livro foi muito interessante, forte, mobilizou um
monte de emoo, tinha hora que eu tinha vontade de chorar. No momento em que l
para as crianas, ela vive o momento com intensidade. O momento da leitura em sala de aula
para ela tambm um momento de fruio, ou seja, de prazer.
Sabemos que a leitura como fruio ainda vista, na escola, como um tempo desperdiado, j
que o objetivo predominante da leitura instrutivo, ligando-se realizao de tarefas e de
exerccios.
Isso acontece porque o modo como entendemos o tempo na escola e fora dela, apesar de nos
parecer natural, est diretamente ligado s condies histricas. Ou seja, os modos de viver,
marcar, usar e avaliar o tempo variam na histria e entre os povos, relacionando-se com as
diferentes tecnologias a que os grupos sociais tm acesso e com o modo como o trabalho
organizado socialmente.
Se considerarmos como o tempo era vivido na Idade Mdia, um perodo da histria humana em
que no existia o relgio, o trabalho industrial, o carro ou a televiso, teremos um exemplo de
experincia do tempo diferente da nossa. Nesse perodo, analisam os historiadores, as formas
de marcar o tempo e os usos que dele se faziam eram relacionados s atividades e s variaes
da natureza. As unidades de tempo eram definidas pela durao das tarefas: o tempo do preparo
da terra, o tempo do cozimento de um alimento, o tempo que levava o couro para curtir ou para
fiar-se um tapete, etc., e elas eram afetadas pelas condies naturais, de frio ou de calor, de
luminosidade, dos perodos de chuva e de estio, do movimento das mars variando de uma
estao do ano para outra.
J com o trabalho industrial e com a criao do relgio, resultantes do desenvolvimento de
novos conhecimentos e de novas tcnicas, o tempo passou a ser definido e medido atravs de
unidades externas s atividades de trabalho, externas aos ciclos da natureza, externas vida.
10
Dividido, subdividido e ordenado em segundos, minutos e horas, esse tempo externo a ns, que
passa e no volta, tornou-se o maestro que rege todas as instncias de nossas vidas.
Foi Comenius, o autor da Didtica Magna, o primeiro a sistematizar, em 1657, as rotinas
escolares com base no funcionamento do relgio e da tipografia. Preocupado em organizar uma
escola que ensinasse tudo a todos de modo
padronizado, eficiente e rpido, Comenius defendia a
idia de que o funcionamento dessas duas mquinas,
baseado na diviso ordenada e complementar de
tarefas, deveria ser o modelo para a organizao da
No fascculo 4
escola.
desenvolveremos
melhor esta questo:
a leitura na escola no
precisa ser sempre
acompanhada de
exerccios; afinal, a
leitura j , em si, uma
atividade.
Reflexo
Exercitando a anlise:
Procure lembrar quantas vezes voc
realizou atividades de leitura de histrias
para seus alunos e registre como foi que
aconteceu: qual o nome da histria e
em que momento de sua aula ela foi
feita? Seus alunos se envolveram com a
atividade? Se voc acha que a
atividade foi um sucesso, liste e escreva
as razes para isso; caso no tenha sido
bem sucedida, tambm procure
levantar hipteses que possam explicar o no sucesso.
Aps refletir sobre isso, o que voc acha que pode ser importante para que a
atividade de leitura de histrias em voz alta seja gostosa?
11
Atividade
Praticando
Faa uma lista das histrias que voc j leu e de que mais gostou. Depois
encontre os livros dessas histrias e organize um planejamento em que cada dia
da semana voc dever ler para sua classe.
A cada dia de leitura feita, depois de acabar a aula, anote e registre em uma
folha de seu caderno suas impresses de como foi esse momento, quais as
dificuldades que voc sentiu para realiz-lo, quais foram as reaes dos alunos e
se deixou de realizar alguma outra atividade para garantir a realizao da leitura
da histria (indique a atividade que foi substituda pela leitura da histria).
Planeje mais uma semana de leitura, realize-a e anote novamente suas
impresses, dificuldades, reao dos alunos e alteraes em sua rotina habitual.
Aps essas duas semanas, retome suas anotaes e verifique como se
materializou seu planejamento. Observe e compare se a cada vez que realizou a
atividade planejada, ela saiu tal qual o pensado. Veja em que medida ou em que
aspectos o planejamento permitiu que a atividade fosse bem desenvolvida.
Analise e anote o que voc considera que ficou faltando em seu trabalho em
funo das atividades suprimidas e que aspectos dessas atividades foram
garantidos pela realizao da leitura da histria.
12
Unidade II
Os tempos da escrita na sala de aula
Quanto tempo tem o tempo da escrita?
No tpico anterior, enfatizamos as atividades de leitura, destacando que ns, professores, lemos
com as crianas e para as crianas em diferentes momentos do dia ou da semana e o fazemos de
modos distintos e com interesses diversos. Essa diversidade de modos de ler e os interesses
implicados nas leituras imprimem a elas duraes distintas. No fascculo seguinte sero
abordados os temas da organizao e uso da
biblioteca escolar e das salas de leitura e as muitas
possibilidades de praticar a leitura na escola.
Relato 3
Eu me lembro que esperei na maior ansiedade a hora de entrar na escola. S
que quando eu entrei na 1 srie, chorava muito e no queria ir mais. Eu queria
escrever, no queria ficar copiando o alfabeto, um monto de vezes seguidas...
Eu j sabia escrever o meu nome, que minha irm tinha ensinado, sabia formar
algumas palavras, mas a professora no me deixava escrev-las. Lembro que
escondido dela eu tentava copiar e ler palavras escritas nos cartazes feitos por
alunos da turma que usava a mesma sala em outro perodo.
Esse depoimento chama nossa ateno para o fato de que as crianas chegam escola desejosas
de aprender, ansiosas por escrever e ler. Afinal, convivem com a escrita fora da escola, com
maior ou menor intensidade, sabem de sua importncia em nossa sociedade, sabem que tm
algum conhecimento sobre ela, mas que tambm desconhecem muitos de seus segredos. Elas
tm expectativa de que os adultos lhes ensinem e usem a escrita com elas.
13
Relato 4
O fato de eu ler, todos os dias um livro para minha sala, tem a ver com esse meu
gosto pela leitura por que, se eu no gostasse de ler, eu no faria isso. Eu fui
escrever hoje uma carta com eles para a D1 . Eu estava com as crianas
escrevendo e eles tinham que contar algumas coisas que eles faziam na escola.
A primeira coisa que eles lembraram foi assim: A gente l muita histria. Uma
coisa que eu achei muito legal ter vindo deles que eles disseram: A gente l,
no a professora quem l mas : A gente quem l. Eles fizeram uma relao
de um monte histrias que eu li, e que nem eu lembrava que tinha lido para essa
turma. Para voc ter idia de como aquilo foi marcante para eles! Outro ponto: o
cuidado que eles tm com o livro, por exemplo. Quando acontece o emprstimo
de biblioteca, ao observar seus comportamentos em relao ao manuseio e
conservao, percebo que foi uma coisa que eu passei para eles, principalmente
em funo do modo de me relacionar com a leitura, com os livros.
Em sua narrativa, a professora, cita alguns eventos que fazem parte da rotina de trabalho
estabelecida com as crianas: a leitura coletiva em voz alta, a escrita de cartas pelas crianas na
proposta de correspondncia entre escolas e a ida biblioteca.
Esse modo de referir-se presena da leitura e da escrita no cotidiano de sua sala indicia que as
prticas de escrita e de leitura orientam-se pelo uso real que ambas tm na vida das pessoas.
Refere-se a uma professora de outra turma e escola com a qual as crianas estavam se
comunicando por meio de cartas.
14
Seus dizeres indicam tambm que partes do seu tempo de trabalho dirio em classe so
dedicadas para ler e para escrever junto com as crianas, em prticas colaborativas que
possibilitam a participao de todos os alunos, mesmo daqueles que ainda no dominam os
aspectos mais tcnicos da escrita.
Ao escreverem cartas com a ajuda da professora crianas experimentam-se na autoria do texto
escrito, um texto que circula de fato e lido por outra(s) pessoa(s), alm da prpria professora.
As cartas lidas e respondidas mobilizam, por sua vez, novos momentos de escrita, que
sustentam e expandem suas experincias iniciais de escrita para o outro.
Relato 5
A professora Luciana trabalha com crianas que esto em processo de
aquisio da escrita e da leitura, em uma escola da Rede Municipal de Ensino
da cidade de Campinas, no Estado de So Paulo. Ela props, no incio do ano,
um trabalho de registro (parcial) das histrias de vida das crianas de sua sala.
Para isso, ela organiza diariamente com a turma uma roda que conta com a
presena do responsvel por uma das crianas (me, pai, av, tia
15
16
Atividade
Vamos a mais um exerccio de anlise e de interveno. Preencha o horrio
semanal desenhado abaixo com as atividades de escrita que voc realiza com
seus alunos.
17
Atividade
Em seguida, analise e liste o que a criana aprende sobre as prticas de leitura
e escrita quando realiza cada uma dessas atividades. Preencha a tabela
abaixo com os aprendizados que voc identificou em cada atividade.
Voc faria alteraes na sua rotina? Justifique. Caso voc tenha considerado a
possibilidade de alteraes, indique quais seriam elas.
18
O fato de terem esse tempo assegurado na rotina escolar e a constncia com que se realizam
indicam, nos dois casos, que essas atividades so importantes para os professores, que se
preparam para realiz-las, tanto em termos materiais quanto organizacionais.
Ou seja, para assegurar a realizao diria da roda de leitura, o professor escolhe o que vai ler,
prepara-se para essa leitura, garante a ela um tempo adequado para acontecer sem interrupes,
sem disperso e de modo a ser compartilhada com todos os alunos do comeo ao fim. Ele se
prepara materialmente, assegurando-se desse modo o acesso a um acervo de obras para a
leitura.
No caso da escrita como registro da histria dos sujeitos o professor organiza a seqncia em
que os responsveis pelas crianas viro escola,
combina o horrio e o dia em que cada um
conversar com a turma, dispe do material
necessrio para o registro do depoimento, prepara
as crianas para a realizao desse tipo de
atividade. De modo a garantir condies adequadas
para um projeto de longa durao como esse, o
professor organiza, etapa a etapa, ao longo dos
dias, semanas e meses de sua realizao.
19
Em uma rotina assim organizada, cada atividade tem sentido e importncia em sua relao com
as outras tantas atividades que, com ela, compem nosso dia e nossa semana. Assim, a roda de
leitura, como um momento de contato com a literatura, integra-se a momentos de leitura e
compreenso de textos do livro didtico, de produo e reescrita de textos, de elaborao de
comentrios sobre notcias lidas ou ouvidas e de realizao de exerccios de decodificao,
anlise e reconhecimento da palavra, entre outros. no conjunto dessas atividades diversas que
se amplia o vocabulrio, que se exercita a cpia de informaes pertinentes a um fazer ou de
produes coletivas no impressas, que a leitura ganha fluncia, que as normas da lngua so
aprendidas, que o traado das letras se consolida.
As atividades dirias e semanais no se complementam apenas pela diversidade que garantem,
mas tambm pelos saberes e processos comuns que elas envolvem, possibilitando, no seu
conjunto, a imerso do aluno no mundo da escrita e a articulao entre os tempos investidos
pelos professores e pelos alunos para sua realizao.
Por outro lado, muitos pesquisadores e estudiosos da escola criticam vrias atividades e as
nomeiam como atividades sem sentido.
E o que torna uma atividade sem sentido? Uma atividade torna-se sem sentido quando nos
esquecemos de seus limites e de sua necessria articulao com outras atividades. Nesses casos,
acabamos por investir excessivamente em uma ou outra atividade, o que resulta em situaes de
especializao desastrosas, que bem conhecemos hoje, tais como o aluno copista que no sabe
20
21
Unidade III
Planejamento
Planejar: trabalhar com escolhas prvias
Comenius, conforme citado anteriormente, j anunciava no sculo XVII que o estudo na escola
deveria ser distribudo por anos, meses, dias e horas. Apontava tambm a necessidade de se
apresentar ao aluno um caminho fcil e seguro de pr o conhecimento aprendido em prtica e
com bom resultado. Havia tambm, j naquela poca, a preocupao de oferecer uma escola em
que houvesse menos barulho, menos enfado, menos trabalho intil, e que, ao contrrio,
ensinasse aos alunos mais recolhimento, mais atrativos na arte de aprender e que esse
aprendizado fosse mais slido e trouxesse progresso a quem o adquirisse.
Segundo definio do dicionrio Houaiss, planejamento o servio de preparao de um
trabalho, de uma tarefa, com o estabelecimento de mtodos convenientes; um conjunto de
procedimentos, de aes visando realizao de determinado projeto.
Na escola sempre ouvimos falar de planejamento. Temos a semana de planejamento, data de
entrega de planejamento, reviso do planejamento, atualizao do planejamento. No entanto, na
maioria das vezes em que somos lembrados ou cobrados do planejamento, ele vem
acompanhado de tarefas que julgamos burocrticas e para as quais no vemos utilidade ou
sentido na rotina escolar.
Propomos neste texto fazer uma reflexo sobre o que vem a ser planejamento. No o
burocrtico e sem sentido que muitas vezes nos vemos solicitados(as) a fazer, mas um
planejamento que possa contribuir para a realizao de um trabalho intencional e tambm para
nossa tarefa de formar alunos com maior domnio dos conhecimentos que a escola deve
trabalhar.
Tomemos o planejamento como uma ferramenta que possa contribuir de fato com as escolhas e
com os trabalhos, os quais ns professores e professoras somos chamados(as) a fazer nas
escolas brasileiras escolas que, ao longo da sua histria, nunca tiveram um nmero to
grande e to diversificado de alunos.
22
Entretanto, at mesmo quando elegemos o livro didtico como nosso material de trabalho
permanente, o planejamento e a organizao do nosso trabalho so essenciais. Ler os textos, os
exerccios, selecionar pginas, inverter a ordem das unidades, acrescentar idias, levar uma
msica ou um filme relacionados a um conhecimento abordado no livro, questionar dizeres ali
presentes, so posturas que requerem de ns educadores uma atitude diferente daquela de
somente escrever no caderno o nmero a que
corresponde a unidade do livro didtico que se
pretende desenvolver naquela semana: Hoje vou
dar a unidade 1 do livro didtico, amanh a
unidade 2 e assim por diante. Quando optamos
por escrever apenas o nmero da unidade a que
corresponde o trabalho, estamos mostrando
com essa atitude que o nosso planejamento
reduz-se somente a uma aceitao do livro
didtico, tal como ele .
23
suas aulas. Em seu planejamento de trabalho a professora partiu da realidade do aluno, mas no
permaneceu nela. Assumiu como perspectiva que o prprio conhecimento tambm se
transforma.
O convite que fazemos, ento, para tomarmos o planejamento como possibilidade de fazer da
rotina escolar um momento de escolha e deciso. Aquele professor ou professora que analisa
sua classe aprende a conhecer seus alunos, enxerga suas necessidades, busca atividades, aes,
interferncias para que os alunos avancem na qualidade do domnio do conhecimento escolar.
Somos ns os responsveis por ouvir, respeitar e considerar o interesse dos alunos, e tambm
somos ns os profissionais que decidem, escolhem e tm autoridade para definir qual o trabalho
mais adequado a ser implementado.
Quem est na sala de aula trabalhando com os alunos sabe que no so s os seus interesses, ou
s o que eles gostam de fazer que devem ser contemplados no planejamento. Somos ns a
autoridade da sala de aula, responsveis pela relao ensino-aprendizagem e pela escolha de
aes que resultem no aprendizado do aluno. Ou seja, importante partir do interesse dos
alunos, mas quem planeja e decide o trabalho somos ns.
Nesse sentido, o planejamento define-se como um instrumento didtico necessrio, flexvel e
inacabado. Por exemplo, dificilmente um professor que, no incio do ano, planeja pela primeira
vez suas aulas pode prever uma enchente que mobilizar seus alunos e que esse fato abrir
excelentes perspectivas de trabalho.
Para contemplarmos imprevistos como a enchente, por exemplo, trabalhamos com a idia de
dois planejamentos. Um cheio2 , elaborado previamente, contendo os objetivos, os contedos
e as estratgias didticas especficas para cada srie e um vazio, que contemple os
imprevistos trazidos pelos alunos ou pelo prprio professor. A partir da idia de planejamento
cheio e vazio fica mais fcil incorporar assuntos e acontecimentos relevantes ao grupo sem
cairmos no espontanesmo que a falta de planejamento gera.
24
Ao ler o trecho mencionado podemos nos perguntar: o que uma viagem tem em comum com
uma sala de aula? Em que as diferenas entre os conceitos de viagem e de aventura
apresentados por Amyr Klink podem contribuir para refletirmos sobre a organizao do nosso
trabalho na escola? Por que um navegante, apesar de ter feito algumas viagens sozinho, d em
suas entrevistas o depoimento de no ter se sentido solitrio em suas viagens?
Talvez, uma das possibilidades de resposta para essas questes esteja dentro desse mesmo
trecho do livro Paratii, pois o autor diz: Um rumo e um destino fazem a diferena em qualquer
situao.
Uma reflexo sobre a diferena entre o conceito de viagem e o de aventura (circunstncia ou
lance acidental, inesperado; peripcia, incidente) talvez possa nos ensinar um pouco sobre o
tempo pedaggico e o planejamento na escola.
Planejam-se viagens, mudanas, rumos, construes. Planeja-se encontrar pessoas queridas, ter
filhos, conhecer novas pessoas. Os acontecimentos que vivenciamos no nosso dia-a-dia, na
maioria das vezes, mostram os resultados ou os efeitos dos planejamentos e das escolhas que
fizemos. Na escola no diferente: para colocarmos em prtica nossas escolhas, utilizamos
instrumentos. Navegadores como Amyr Klink utilizam a bssola (eu tinha, antes de mais nada,
uma bssola) para garantir o rumo de suas viagens e os objetivos que se quer atingir (e um
lugar para ir). O planejamento, ao reunir uma srie de procedimentos que pretendemos
desenvolver com nossos alunos, d uma direo ao nosso trabalho.
No entanto, ao refletirmos sobre nosso trabalho no dia-a-dia na escola, constatamos, algumas
vezes, que ele tem se aproximado mais de uma aventura cheia de espontaneidade, como j
citamos anteriormente, do que de uma viagem, que planejada com cuidado e em que se
considera a importncia de cada detalhe.
So tantas as solicitaes com as quais nos deparamos em nosso cotidiano: das famlias, das
campanhas e dos projetos sociais com informaes sobre sade, alimentao, higiene, trnsito,
violncia e comportamento, que parece no sobrar tempo para trabalhos como os de leitura e de
KLINK, Amir. Paratii: entre dois plos. So Paulo: Companhia das Letras, 1992.
4
25
escrita. Todos os temas trazidos para a escola so importantes, mas eles j tm espao em outras
instituies sociais. J o trabalho com a sistematizao do conhecimento sobre a leitura e a
escrita cabe escola. Cabe a ns, professores e professoras, o trabalho em favor do domnio da
leitura e da escrita pelos alunos.
O planejamento - a programao das atividades, a distribuio do tempo de modo a controlar o
trabalho - certamente uma das possibilidades de estabelecer uma rotina que contemple
atividades de leitura e de escrita.
O planejamento da rotina entendido como compromisso com a organizao das atividades
dentro do tempo pedaggico. O planejamento passa a ser visto sob a tica da escolha e do
controle do professor sobre seu prprio trabalho. Com isso, garantimos novas escolhas, que
geram a liberdade para mudanas, adequaes e alteraes necessrias.
Para isso, no devemos ter medo nem nos livrar da responsabilidade de organizarmos cada
atividade da rotina, seja ela dentro ou fora da sala de aula. Ns, professores e professoras,
somos responsveis pela articulao das vrias atividades e reas do conhecimento que
compem o trabalho de ensinar.
O planejamento da rotina , portanto, uma tarefa que cabe a ns, professores e professoras.
Das vrias reas do conhecimento trabalhadas pela escola, sem dvida, uma das que mais tem
sido questionada, sem dvida, a que se refere ao ensino da lngua materna. A qualidade do
domnio da leitura e da escrita apresentada pelos alunos depois de terem freqentado vrios
anos de escola vem sendo considerada precria pelos prprios professores desde as sries
iniciais at as universidades.
26
So os usos sociais da lngua oral e escrita que devem balizar o trabalho da escola, cabendo a
ns professores, principalmente das sries iniciais, aprender a: ouvir, ler, sugerir, corrigir, rever,
refazer, apresentar, formar leitores e oferecer aos alunos o domnio da norma padro do registro
escrito. Por exemplo, o uso do dicionrio em sala de
aula um trabalho que busca implementar o
aprendizado da lngua padro.
No fascculo 4
h uma unidade
especialmente
dedicada aos usos do
Dicionrio na escola.
Alm disso, como professores(as) das sries iniciais, cabe-nos trabalhar com as vrias reas do
conhecimento: Geografia, Histria, Matemtica, Cincias e Lngua Portuguesa. Para fazermos
esse trabalho, necessitamos estudar e dominar os conhecimentos especficos de cada uma
dessas reas para que estejam presentes no planejamento de aulas com atividades, com
pesquisas, com trabalhos individuais ou em grupo, de todas essas disciplinas. Junto a isso, esses
conhecimentos esto necessariamente articulados a atividades de leitura e de escrita, pois so
ensinados, apropriados e elaborados pelas crianas atravs da linguagem.
27
a ser seguida.
O planejamento possibilita uma avaliao e reviso freqentes do nosso trabalho e dos avanos
dos alunos. Por exemplo, ao analisar uma semana de aula, visualizamos quantas atividades de
leitura e de escrita fizemos e o que ficou faltando.
Vejamos a seguir, a ttulo de exemplo, um quadro de planejamento semanal feito por
professoras que trabalham em uma mesma escola com alunos de 2 srie do Ensino
Fundamental. Elas so parceiras de srie, planejam o trabalho em conjunto e consideram que 06
aulas de Lngua Portuguesa por semana um nmero ideal para desenvolverem o trabalho com
a lngua materna.
2 feira
3 feira
4 feira
5 feira
6 feira
Leitura
ouvir
histria
Leitura
ouvir
histria
Leitura
ouvir
histria
Leitura
ouvir
histria
Leitura
ouvir
histria
Uma aula
1 leitura de
carta
escolhida pela
professora
para iniciar o
trabalho com
esse gnero
de texto.
No h aula
de Portugus
s terasfeiras
Uma aula
2 leitura de
carta de outros
tipos: mostrar as
cartas que
chegarem e
identificar quem
as envia e em
quais situaes
sociais.
Duas aulas
Escolher
uma carta,
com ela
fazer
atividades
de
identificao,
anlise e
reflexo
sobre as
regras
ortogrficas
e as normas
de escrita
da carta.
Duas aulas
Produo de
uma primeira
verso de
uma carta do
mesmo
gnero
trabalhado
no dia
anterior.
Para amanh:
Pedir aos
alunos que
tiverem
qualquer tipo
de carta em
casa, que
tragam para a
escola.
Professora
tambm
separa cartas
para mostrar
aos alunos.
28
Ler algumas
cartas
exemplificando
os tipos: de
banco, de
cobrana, de
familiares,
empresariais, de
propaganda,
etc... Evidenciar
diferenas de
linguagem
presentes nos
textos.
Para a
semana
seguinte:
A primeira
verso ser
revista na
prxima
semana, at
que fique
adequada
quanto:
ortografia,
caligrafia,
adequao
do texto.
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Intervalo
Intervalo
Intervalo
Intervalo
Intervalo
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Aula
Observemos ainda que, alm das seis aulas, h um tempo dirio reservado em todo incio de
perodo para leitura. Nesse momento, so elas quem lem para as crianas histrias escolhidas e
preparadas previamente. As professoras trazem textos de diferentes gneros literrios. As
crianas tambm so incentivadas a trazerem sugestes de leitura que as professoras analisam,
preparam e incluem no cronograma, caso considerem adequada.
No planejamento da semana, elas iniciaram o trabalho com o gnero carta. Como professoras,
elas mostram diferentes modelos de carta; fazem anlise do texto levantando as caractersticas
desse gnero; chamam a ateno dos alunos e informam sobre os modos de diagramao;
identificam com eles os diferentes momentos sociais de uso da carta e, depois dessa primeira
fase de explicaes e anlise coletiva do texto, as professoras propem aos alunos que
comecem o processo de produo de suas prprias cartas.
Os alunos fazem uma primeira verso da carta na primeira semana e na seguinte faro a
reviso, ou seja, re-escrita do texto.
Percebemos ainda que, alm da leitura diria, somadas s seis aulas de Lngua Portuguesa
previstas, h uma quantidade grande de aulas que so distribudas entre as outras disciplinas
(Matemtica, Cincias, Histria, Geografia, Educao Fsica, Educao Artstica) previstas para
essa srie.
Apontamentos finais
29
O planejamento visa a organizao do nosso tempo pedaggico dentro da nossa rotina. Como
lemos na introduo desse texto, vamos nos voltar para aquilo que fazemos na escola,
descrever o que ali acontece, procurar compreender como a escola funciona e como nosso
trabalho funciona dentro dela: por que fazemos o que fazemos do jeito que o fazemos (anlise)
e tambm considerar como podemos modificar nosso modo de trabalhar e o modo de
funcionamento da escola...
... mesmo que seja um pouquinho (interveno).
E esse pouquinho pode fazer toda a diferena...
Sntese
30
31
fascculo 4
Sumrio
Introduo................................................................................. 6
Unidade I
Biblioteca Escolar ......................................................................................
7
Biblioteca escolar. Para qu? Como utiliz-la? ........................................ 8
Reflexo sobre a organizao e os usos da biblioteca
e das salas de leitura ..............................................................................
10
11
E as escolas que no possuem biblioteca? ............................................. 13
Os suportes dos textos na formao do leitor
........................................... 16
A ilustrao dos livros infanto-juvenis ...................................................... 17
Unidade II
21
E na sala de aula, como ficam a leitura e a escrita? ................................ 23
O acesso ao acervo e o papel do(a) professor(a) ................................... 25
Situaes de leitura ..................................................................................... 28
A leitura nossa de cada dia .................................................................... 29
Atividades de leitura .............................................................................. 31
Unidade III
Uso do dicionrio ....................................................................................... 34
O uso do dicionrio na escola .................................................................
34
E na sala de aula? Como podemos utilizar o dicionrio? .......................... 36
Outras atividades de leitura na sala de aula,
com base no dicionrio..........................................................................
37
Sntese ...................................................................................................... 43
Referncias bibliogrficas ................................................................ 44
Introduo
Caro(a) Professor(a),
Neste fascculo vamos refletir, especialmente, sobre a importncia da Biblioteca escolar ou da
sala de leitura, apontando elementos relacionados sua organizao e possibilidades de uso.
Analisaremos tambm diferentes modalidades de leitura e a fundamental mediao do(a)
professor(a) ao longo desse processo. Alm disso,
discutiremos a relevncia do Dicionrio como aliado no
dia-a-dia da sala de aula.
Vrias razes nos fizeram pensar em construir este
material, voltado para a organizao e o uso da
biblioteca escolar, salas de leitura ou mesmo um
cantinho de leitura na sua escola.
Vivemos em uma sociedade imersa em letras e imagens.
A pessoa que ainda l com dificuldade e no consegue
estabelecer relaes entre os sentidos do texto e o
mundo sua volta encontra srios impedimentos para
tomar parte dos eventos sociais que envolvem o
letramento e para usufruir os bens culturais por
direito, de todos. Verifica-se, ento, a grande
necessidade de formarmos alunos leitores e produtores
de textos, motivo pelo qual a leitura precisa ocupar
lugar central no currculo escolar das sries iniciais.
Por tudo isso, convidamos voc, professor(a), a
embarcar conosco nessa histria. Nossa inteno maior
criar um espao de reflexo, onde, juntos, possamos
apontar alternativas criativas para o dia-a-dia do seu
trabalho com os alunos. Podemos contar com voc e
com toda a sua experincia, no mesmo?
Aludimos aqui
ao conceito apresentado
no fascculo 1:
Letramento , pois, o
resultado da ao de
ensinar ou de aprender a
ler e escrever, bem como
o resultado da ao de
usar essas habilidades em
prticas sociais: o estado
ou condio que adquire
um grupo social ou um
indivduo como
conseqncia de ter-se
apropriado da lngua
escrita e de ter-se inserido
num mundo organizado
diferentemente: a cultura
escrita.
Unidade I
Biblioteca Escolar
Relato 1:
Foi assistindo ao filme Central do Brasil, vendo as cartas de Dora, viajando no
tempo, lembrei-me que, por volta dos 9 anos, tive uma oportunidade de
colocar o que havia aprendido na escola para ajudar a minha vizinha. D. Luzia,
que lavava roupa para acrescentar no oramento domstico, solicitou a minha
me que me deixasse fazer o rol das roupas lavadas, e, assim, lembro-me
emocionada e nitidamente daquele momento, da importncia do saber ler e
escrever que senti ao poder ajud-la, relacionando pea por pea e somando
o valor a ser cobrado. Lembro-me perfeitamente do orgulho que senti em ser
capaz de fazer a tarefa; foi ali naquela oportunidade que descobri o valor de
ser uma pessoa alfabetizada e, ento, letrada; foi naquele momento que pude
dar sentido a tudo que j tinha aprendido.
Este foi sem dvida um momento marcante para a construo da
aprendizagem da leitura e da escrita e tambm a contribuio de meu pai,
que sempre comprava livros e contava historinhas dos nossos autores
brasileiros, como Monteiro Lobato. Muitos livrinhos chegavam s minhas mos
com lendas, que me levavam muito longe e mexiam com minha criatividade e
emoo.
Portanto, ainda cedo, descobri que a leitura e a escrita so fundamentais para
explicar fatos, acontecimentos e processos, que ocorrem na natureza, na
sociedade e no pensamento humano, mas, principalmente, para ajudar a
transformar a prpria pessoa.
(Ktia, professora e aluna do curso de Pedagogia).
O depoimento desta professora traz tantos elementos interessantes para nossa conversa, no
acha?
As suas primeiras experincias com a leitura e com a escrita mostram como no estamos
falando de atos isolados, que dizem respeito apenas ao ambiente da escola. Ao contrrio, no dia
em que esta professora utilizou seus conhecimentos para colaborar com uma vizinha,
estabelecendo relaes com a vida em sociedade, ficou claro para ela que no estava apenas
alfabetizada, mas tambm letrada.
Por isso ela nos transmite uma grande carga de emoo ao relembrar a importncia da leitura e
da escrita nas trocas, nos eventos sociais de que tomou parte, ainda menina.
Outro elemento muito importante foi o convvio com seu pai em um ambiente rico em
diferentes tipos de leituras. A professora nos fala do contato com autor expressivo da literatura
infanto-juvenil brasileira, Monteiro Lobato, e relembra como as histrias tambm chegavam de
muito longe, despertando-lhe criatividade e emoo.
Achamos que ela tem toda razo! Como formar pessoas leitoras, criativas, envolvidas, se no
houver um ambiente adequadamente organizado para este fim? Da, a necessidade de
pensarmos na organizao e no uso da biblioteca escolar, das salas de leitura. Afinal, grande
parte das crianas brasileiras no tem como comprar livros e, como passa considervel tempo
de sua vida na escola, esses espaos ganham importncia duplamente.
hora, portanto, de refletirmos sobre a biblioteca e suas funes. Para nos inspirarmos, que tal
acompanhar outra histria de leitura?
Repare bem como este depoimento nos ajuda a refletir sobre funes e usos da biblioteca
escolar: Estava inserida em um ambiente onde livros, lpis e papel estavam pela casa; em
nossa casa havia vrias colees, capa vermelha, com letras douradas, que enchiam nossas
noites de histrias e a figura de uma av, que, alm de contar histrias, ainda nos deixava
manusear os livros, desde que com o devido cuidado.
Esses nos parecem elementos essenciais para
comearmos nossas reflexes sobre os significados da
biblioteca escolar e as possibilidades de sua utilizao.
E por que afirmamos isso? Em primeiro lugar, a
biblioteca por excelncia o lugar de acesso a livros,
colees, peridicos, jornais, gibis. Enfim, aos mais
variados tipos e alternativas de material impresso. Alm
disso, espao com lpis e papel, para que um leitor
inspirado tenha a chance de fazer os seus registros,
copiar um poema que o fascinou, um ttulo de romance
para recomendar a um colega, ou simplesmente para
escrever algo de seu interesse.
Na verdade, todas essas alternativas podem ser uma ocasio singular para se fazer uso das
prticas de leitura e de escrita que circulam socialmente: registrar, lembrar, seduzir, orientar.
No assim que usamos a leitura e a escrita na vida?
Um outro elemento fundamental para a compreenso deste espao diz respeito ao acesso
cultura, aos bens simblicos e materiais criados pelos mais distintos grupos sociais ao longo da
histria da humanidade. A biblioteca pode ser, portanto, um lugar em que se possa respirar
cultura e tambm produzi-la, como bem nos lembra Carolina.
H pelo menos dois outros personagens que nessa histria no poderiam ser esquecidos: Paulo
Freire e Ceclia Meireles, que voc possivelmente j relaciona aos estudos no campo da
Pedagogia e da Literatura. Mas, por hora, gostaramos de trazer as suas contribuies no que se
refere s funes da biblioteca e sua utilizao.
Paulo Freire, em uma de suas inesquecveis palestras, alm de discutir a importncia do ato de
ler, refere-se tambm ao valor e ao sentido da biblioteca popular.1
Para ele, trata-se de um verdadeiro Centro Cultural, onde a memria viva das comunidades
deveria ficar registrada. Desse modo, afasta-se da idia bastante conservadora, que a reconhece
apenas como mero depsito de livros. Incentiva-nos, por outro lado, a programarmos momentos
coletivos de leitura, no s para nos aproximarmos dos textos, mas, sobretudo, para
aprofundarmos a sua compreenso.
J Ceclia Meireles, alm dos belos poemas que nos legou, teve grande interesse pela infncia e
sua educao. Talvez por isso, na dcada de 1930, tenha inaugurado a primeira biblioteca
infantil de que temos notcia no Brasil. Localizava-se no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro.
Havia sees de livros, enciclopdias, colees, miniaturas, folclore infantil. Tudo que poderia,
enfim, interessar aos pequenos leitores e onde eles pudessem se movimentar com liberdade e
prazer. A educadora criou naquele espao momentos programados para leitura, pesquisa e
entretenimento.
Acreditamos poder extrair dessas experincias importantes lies. Afinal, foi-se o tempo em
que a idia de biblioteca era a de um lugar austero para se entrar e contemplar as capas dos
livros de longe, sem poder lev-los para casa emprestados ou escolh-los livremente. bem
verdade que no passado, no tempo dos reis e rainhas, a biblioteca j foi pensada como uma
redoma de vidro, a que s uns poucos iluminados e alfabetizados tinham acesso. Se
retornarmos no tempo, Idade Mdia, por exemplo, era comum encontrarmos os livros
manuscritos, de natureza religiosa, copiados e guardados pelos monges. Assim, o saber
permanecia entesourado nas bibliotecas dos mosteiros e restrito a algumas pessoas.2
Veja tambm...
O romance O nome da Rosa, de Umberto Eco, tambm trata deste assunto:
do acesso restrito aos livros no perodo medieval. H um filme, com o mesmo
nome, baseado nesta obra.
Ver a este respeito: FREIRE, Paulo. A importncia do ato de ler: em trs artigos que se
completam. 36a ed. So Paulo: Cortez, 1998.
Ver a este respeito, dentre outros, SCHWARCZ, Lilia Moritz. A longa viagem da biblioteca dos
reis: do terremoto de Lisboa Independncia do Brasil. So Paulo: Companhia das Letras, 2002;
CAMPOS, Arnaldo. Breve histria do livro. Porto Alegre: Mercado Aberto, Instituto Estadual do
Livro, 1994.
Contudo, professor(a), para uma direo bastante oposta a essa que queremos convid-lo(a) a
organizar e pensar nos usos da biblioteca e salas de leitura na sua escola.
Livre acesso aos livros de todas as formas, tamanhos e cores; ambiente acolhedor, onde todos
queiram estar; opes de leitura para todos os gostos e idades; esses nos parecem ingredientes
essenciais para a sua organizao inicial e, lgico, sem esquecer de muitas outras alternativas
que voc possa criar, pois, afinal, voc quem conhece o grupo de crianas com o qual
trabalha, seus sonhos, histrias e interesses.
Ento, mos obra e vamos caprichar na organizao de nossa biblioteca, sem esquecer,
porm, que o leitor a parte mais importante dessa histria.
No custa, entretanto, observarmos juntos alguns detalhes que podem fazer a diferena:
10
Outra questo muito freqente dos professores e professoras diz respeito relao entre a faixa
etria de seus alunos e as suas leituras. Sempre ouvimos perguntas do tipo: com que idade a
criana pode ter acesso a livros mais grossos? A criana que ainda no domina fluentemente a
leitura pode ler livros com textos? E muitas outras questes, que dizem respeito a obras
literrias, indicadas para faixas etrias especficas. Mas esse assunto bastante polmico e
talvez no haja uma nica maneira de encar-lo.
Para nos ajudar a ampliar o foco de viso, convidamos outra professora a nos contar as suas
primeiras experincias de leitura:
Relato n 3
Querida Carolina,
Pensei em lhe escrever ao remexer algumas gavetas e encontrar uma foto
minha um pouco antiga. Eu estava na 2 srie do ento chamado primrio,
com minha professora Rosana.
Lembro-me que, neste mesmo ano, ganhei de minha me o livro Alice no Pas
das Maravilhas, de Lewis Carroll, e o li com muito interesse, apesar do nmero
de folhas. No era um livro indicado para minha faixa etria e nele no havia
figuras. Mas, ainda assim, o li vorazmente!
Fui muito incentivada a ler por meus pais. A ler e a escrever, na verdade.
(Carla, professora e aluna do curso de Pedagogia)
11
Mais uma vez a histria nos ensina que talvez fosse bastante prudente perguntar prpria
criana o que ela acha do assunto. Provavelmente, iramos nos surpreender ao v-la atrada por
livros grossos ou finos, com ou sem figuras.
Porm, na verdade, o que est por trs da viso do livro fino para a criana na faixa etria de
trs anos e livro grosso para a criana na faixa etria de oito anos, por exemplo, uma
concepo bastante limitada de criana, como se ela evolusse por estgios previamente
definidos e fosse incapaz de compreender algo ainda no vivenciado.
Para reforar essa viso equivocada, h tambm os catlogos de editoras, que criaram um semnmero de colees baseadas em faixas etrias definidas.
Conforme pesquisas na rea, esta uma tendncia que se acentuou dos anos 1980 em diante. Ao
desenvolver uma pesquisa sobre a histria do livro no Brasil, Laurence Hallewell3 aborda os
livros destinados criana que foram editados nos anos 80. Destaca que a variedade e a
produo mostraram um aumento considervel na rea, atingindo mais de mil ttulos.
Podemos perceber, portanto, que o mercado de livro voltado para o pblico infanto-juvenil
cresce e, quanto mais se fragmenta a criana, mais livros podem ser vendidos. Lgica de
mercado, no mesmo?
Mas, felizmente, as pesquisas sobre a criana tambm se fortalecem e aprendemos com esses
estudos que a criana no um feixe de faixas etrias reunidas, um corpo biolgico apenas. A
criana um ser de cultura, que, ao se relacionar com o mundo, aprende nos intercmbios com
seus pares e capaz de modific-lo; dotado de uma lgica singular, consegue ir alm do
desenvolvimento alcanado em um dado momento.4
Retomando a carta da professora Carla, podemos perceber que no havia problemas para a
leitora em formao quanto ao nmero de pginas, ausncia de ilustraes naquele momento;
o que parecia mov-la para a leitura era a profunda curiosidade, o seu grande nvel de interesse.
A me, ao presente-la com Alice no Pas das Maravilhas, agiu como uma verdadeira
mediadora entre a criana e a leitura, provocando-a a ir alm de seus limites.
E no seria esse o lugar mais interessante para o(a) professor(a) ocupar naqueles momentos em
que precisa selecionar, indicar a leitura para as crianas, instigando-as a superarem seus
limites?
Exatamente por tudo o que dissemos anteriormente, sugerimos haver mais de uma resposta para
aquelas questes: um(a) professor(a)-mediador(a), que impulsiona o nvel de desenvolvimento
da criana ou um(a) professor(a) que a deixa restringir-se aos seus limites?
Obviamente a escolha de cada um. Contudo, a me da professora de nossa ltima histria nos
parece uma educadora com a viso bastante apurada, no acha?
Para complementar a histria extrada da experincia com a leitura de Alice no Pas das
Maravilhas, talvez seja mesmo prudente ouvir o que alguns leitores, famosos ou no,
relembram sobre diferentes tipos de leitura, especialmente as proibidas, e as modalidades que
mais os atraam.
3
A este respeito, ver, entre outros, PERROTI, Edmir. A criana e a produo cultural. In:
ZILBERMAN, Regina. A Produo cultural para a criana. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1990.;
VYGOTSKY, Lev Semenovich. A formao social da mente: o desenvolvimento dos processos
psicolgicos superiores. So Paulo: Martins Fontes, 1991; VYGOTSKY, Lev Semenovich.
Pensamento e linguagem. So Paulo: Martins Fontes, 1998.
12
Assim, que tal prestarmos ateno no que o escritor Joel Rufino tem para nos contar sobre os
seus primeiros contatos com a leitura?
Relato n 4
As histrias em quadrinhos, como se sabe, surgiram na imprensa americana em
fins do sculo passado. Logo chegaram ao Brasil, mas proliferaram, de fato, aps
a segunda guerra. Surgem as bancas de jornal, fascinantes, oferecendo gibis a
mancheias (...): Capito Marvel, Flash Gordon, Brucutu, Ferdinando (...). Meu
preferido era o prncipe submarino, com suas orelhas de peixe.
Minha me proibia. Queixava-se das mesmas coisas que muitos pais de hoje
com relao televiso: estimula a violncia, o sexo precoce, a
superficialidade, o banditismo... Essa proibio foi o segundo fracasso de minha
me: o gibi ganhou mais um gozo para mim, o do proibido. Eu sonhava ganhar
meu primeiro salrio na vida para arrematar inteira uma banca de jornal.5
Joel Rufino
Esta experincia nos ensina mais uma vez que no adianta muito ficar controlando o leitor e
suas escolhas. Afinal, ele sempre encontra uma brecha para fazer suas opes de leitura e tomar
a direo para o caminho que lhe parea mais interessante.
Ento, ser que o gibi pode fazer parte do acervo de nossa biblioteca? recomendvel para
qualquer faixa etria? Outra vez, o leitor tem razo e, se queremos, de fato, estar a seu lado e
ajudar a form-lo, nada mais saudvel do que lhe oferecer um cardpio bem variado e ir
observando o seu crescimento, a sua fluncia.
Afinal, uma das piores sensaes a indigesto, no acha?
Em um pas como o nosso, em que a realidade sempre mais difcil do que os planejamentos,
sendo preciso, muitas vezes, fazer adaptaes e mudanas temporrias, para atender a
prioridades, pode acontecer de no existir uma biblioteca escolar, ou de esta precisar ser
desocupada, temporariamente, para ser utilizada como sala de aula. Esta situao aconteceu
duas vezes na infncia de Luciana, que sempre estudou em escolas pblicas:
Relato n 5
Quando eu estava na quarta-srie, nossa turma foi transferida para o perodo da
tarde, e a sala por ela ocupada era a antiga biblioteca. No fiquei sabendo onde
os livros que estavam l foram parar, mas sei que senti pelo fato de aquele lugar,
onde antes cabiam todos os meus sonhos e fantasias, ser transformado em sala
de aula, alm de tudo apertada... Felizmente aquele arranjo durou apenas um
ano, sendo que no ano seguinte os livros voltaram para l, magicamente!
Na segunda escola, onde fiz o colegial, hoje chamado Ensino Mdio, tive outra
13
Histrias como a de Luciana nos fazem refletir sobre o que fazer quando no h uma biblioteca
na escola. Pensemos em algumas alternativas.
Uma delas seria o(a) professor(a), em consonncia com a Direo escolar, encontrar um meio
de formar um acervo e guard-lo em um armrio na sala de aula, como nos depoimentos de
alguns professores, registrados na revista Leitura, teoria e prtica:
Relato n 6
Na sala de aula havia espaos livres para a circulao dos alunos. As mesas,
encostadas umas nas outras, compunham grupos que ficavam face a face com a
mesa da professora centralizando os trabalhos, com o quadro de giz s suas
costas. No fundo da sala, em uma mesa, empilhavam-se revistas velhas e jornais.
Em outro canto, havia um armrio contendo livros de histrias infantis de
propriedade da professora, uma vez que a escola no possui uma biblioteca ou
uma sala de leitura, ficando assim a cargo da professora, a partir de seu interesse
e seleo, a oferta de textos literrios.6
Outra alternativa seria procurar livros em bibliotecas pblicas, ou mesmo fazer uma visita
monitorada a uma delas, onde os alunos poderiam fazer seus cadastros e tomar livros
emprestados. Se voc tiver uma classe numerosa, pode programar esta visita e dividir os alunos
em duas ou trs turmas, para irem biblioteca em dias alternados, requerendo, para isso, a
ajuda de um(a) professor(a) estagirio(a) ou eventual.
A escola onde Luciana estudava ficava ao lado da biblioteca pblica, e ela, por iniciativa
prpria, a consultava. claro que o fato de ser aluna do Ensino Mdio e de ter iniciativa
fizeram diferena, mas o interesse pode ser despertado por voc, pois a moderna pedagogia
sempre enfatiza que o(a) professor(a) o modelo, o espelho, o exemplo.
MATA, Maria Lutgarda; Garcia, Pedro Benjamim; Dauster, Tnia. Prticas de leitura: escola e
centro de lazer. in Revista Leitura: teoria e prtica. Ano 15. Dezembro de 1996, nmero 28, p.56.
O texto um relato da observao do quotidiano de uma escola da zona sul do Rio de
Janeiro, com alunos oriundos de favelas.
14
Numa escola sem bibliotecas, a sala de aula pode e deve se tornar um espao
para serem colocados e expostos os livros e outros materiais de leitura. Se voc
costuma receber ttulos das editoras ou distribuidoras, pode traz-los para seus
alunos. Outra idia seria formar um acervo da classe por meio de doaes da
comunidade, campanhas ou gincanas, ressaltando a importncia dos livros
para a escola e para a prpria comunidade. Alm de livros, podem ser
utilizados outros suportes de textos, como jornais, revistas, gibis, materiais de
propaganda e at mesmo livros compostos pelos prprios alunos.
Os livros e demais materiais de leitura podem ser guardados em caixas de
papelo, organizados por assunto. Alm de serem utilizados em sala de aula,
em momentos de leitura, tambm podem ser emprestados, ressaltando-se a
importncia do registro de emprstimo e do prazo de devoluo. Mas a
burocracia no pode afastar leitor e livro.
Diversas escolas foram contempladas com livros infantis de alta qualidade, que podem
interessar a muitos alunos. Um exemplo de ttulos hoje disponveis para as escolas pblicas
so os 110 ttulos que foram distribudos pelo MEC no ano 2000, por meio do Programa
Nacional Biblioteca na Escola. Trata-se de um material extremamente rico e variado,
abrangendo desde textos contemporneos at os clssicos, e o manual que acompanha as
obras (Histrias e Histrias7 ) oferece vrios exemplos de trabalho com os livros em sala de
aula. Alm disso, pelo ndice do manual o(a) professor(a) pode saber quais os ttulos do
acervo.
E se a sua escola tiver material para leitura, mas no tiver espao para guard-lo de forma
organizada, como aconteceu com Luciana? Nesta hiptese, existe a necessidade de um
funcionrio cuidar da conservao e, principalmente, do acesso ao material de leitura. Se no
houver funcionrio responsvel, voc pode dialogar com seus pares e pedir para ter acesso
aos livros da escola. Algumas vezes a falta da biblioteca apenas temporria: no caso de os
livros j terem circulado anteriormente, uma das formas de encontrar os ttulos que possam
interessar aos alunos a consulta ao registro das obras que eram retiradas quando a
biblioteca funcionava regularmente. Assim, junto com seus (suas) colegas e alunos, voc
pode selecionar e solicitar os ttulos que acreditar serem significativos, retirando
temporariamente alguns deles e deixando-os no armrio de sua sala de aula. Pode tambm
orientar seus alunos sobre a responsabilidade com o material, tarefa que pode ser dividida
entre professores(as) e alunos. Embora este trabalho tome tempo, cria maior intimidade com
o acervo.
No exemplo relatado por Luciana, no faz sentido as obras ficarem empilhadas, acumulando
poeira, quando poderiam ser lidas pelos alunos, principalmente aqueles como ela,
interessados pela leitura. Para tanto, importante fazer com que os livros continuem a
circular, mesmo que a escola passe um perodo sem o espao apropriado. Vale ressaltar que
devem ser tomadas providncias para que este arranjo seja apenas temporrio.
Os catlogos das editoras, que trazem as ilustraes das capas, alm de outras informaes
importantes, tambm so formas de chamar a ateno dos leitores, razo por que voc,
professor(a), quando receb-los, pode apresent-los aos alunos. Mas, sobretudo, importante
que voc sempre tenha curiosidade em se atualizar sobre as obras infantis, entrando em
7
LAJOLO, Marisa et alii. Histrias e histrias; guia do usurio do Programa Nacional Biblioteca
da Escola PNBE/99. Braslia: MEC; Secretaria de Educao Fundamental, 2001.
15
contato com editoras, livrarias, sebos e bibliotecas, pesquisando catlogos, lendo e analisando o
material a ser empregado em sala de aula.
Se no houver possibilidade de organizar uma sala de leitura, outros lugares podem ser usados
para esse fim. Alm da sala de aula, uma ou outra vez voc pode levar seus alunos para a quadra
de esportes ou o ptio, para deix-los em contato com a natureza. Qualquer cantinho pode servir
para voc sentar-se com seus alunos e contar ou ouvir histrias. o caso da professora Sandra,
que utilizou a obra De repente d certo, de Ruth Rocha, com uma turma de alunos:
Relato n 7
Em meu trabalho como eventual, peguei uma vez uma turma de pradolescentes a quem tinha a misso de contar uma histria. Havia lido o livro
De repente d certo, da autora Ruth Rocha e, acreditando que o assunto iria
interessar quele pblico, me propus a apresent-lo a eles. A princpio, os
alunos mostraram desinteresse pela histria, preferindo outras atividades. Mas,
medida que eu fui contando, seu interesse foi despertado e ao final da
histria, eles se mostraram encantados.
Dias depois, encontrei alguns desses alunos na rua, j que minha cidade
pequena. Eles me cumprimentavam e diziam de repente d certo, no ,
dona?. Fiquei muito feliz, pois esta experincia fez com que o tema da histria
se repetisse na prtica. De repente deu certo. Por qu? Talvez porque no
houve cobrana, porque a atividade foi realizada num ambiente informal e
porque o texto escolhido despertou o interesse dos alunos, que tiveram
empatia pelas personagens, podendo apreciar a histria.
(Sandra, professora de Lngua Portuguesa no Ensino Fundamental e Mdio)
O trabalho desta professora mostra que um arranjo despretensioso acabou por despertar o
interesse dos alunos pela obra. Sandra escolheu uma obra que agradou ao pblico infantojuvenil pelo seu tema, o amor. Os temas podem ser sugeridos depois de uma observao daquilo
que agrada aos alunos. E o interesse dos leitores-ouvintes pode ser despertado pelo(a)
professor(a).
Se, diferente destas experincias, a sua escola tem uma biblioteca, convm conhec-la bem para
utiliz-la da melhor forma possvel. Para isso, convidamos voc a refletir a respeito de alguns
aspectos dos materiais que lemos.
Quando pensamos em leitura, logo imaginamos um conjunto de produes escritas em papel
publicadas em livros, jornais ou revistas. Porm, no s a que esto os textos escritos.
Lidamos com a leitura o tempo todo, j que fazemos parte de uma sociedade grafocntrica, em
que a escrita parte constitutiva das mais diversas atividades do nosso dia-a-dia: h textos
escritos em muros, outdoors, camisetas, papis, cartes, livros, livrinhos e livres. Estes so
alguns dos diferentes suportes do texto.
Conta a Bblia, no livro do xodo, que Moiss recebeu de Deus, no Monte Sinai, as tbuas da
lei, textos escritos diretamente na pedra, que ele depois quebraria, atirando-as ao cho. Por
menos usual que hoje nos parea, a pedra tambm foi um suporte da escrita. E, depois dela,
papiros e pergaminhos foram utilizados com a mesma funo, com a vantagem de serem mais
leves e, portanto, mais portteis.
16
Os escritores em geral se preocupam com este tipo de coisa que, ao contrrio do que pode
parecer para alguns, no apenas um detalhe.
Os livros destinados infncia recebem, muitas vezes, cuidado especial no que diz respeito a
seus aspectos grficos ilustrao, capa, tipo e tamanho da letra, cores das pginas e das
letras, relevo, tamanho do livro, tamanho do texto, interao entre texto e ilustrao, disposio
de textos e imagens na pgina do livro, etc. O escritor, o editor, o ilustrador, o designer e outros
profissionais participam das escolhas destes elementos grficos. Em geral, este tipo de trabalho
interfere na nossa maneira de ler. Ns no lemos apenas o texto, lemos todo o livro.
17
Alice, personagem de Lewis Carroll, observando o livro que sua irm lia, aborrece-se e
pergunta: Pra que serve um livro sem figura nem conversa?8 E Mrio Quintana, quase um
sculo depois de Carroll, tambm defende a presena de ilustraes, mas feitas pelos prprios
leitores:
Da Paginao
Os livros de poemas devem ter margens largas e muitas pginas em branco e
suficientes claros nas pginas impressas, para que as crianas possam enchlos de desenhos gatos, homens, avies, casas, chamins, rvores, luas,
pontes, automveis, cachorros, cavalos, bois, tranas, estrelas que passaro
tambm a fazer parte dos poemas...9
Atividade
Que tal fazer com seus alunos uma atividade de ilustrao e edio? Eles
podem ler um determinado texto que voc escolher, sem ilustraes, e depois
podem fazer as suas ilustraes para o texto. Estes textos ilustrados,
encadernados por eles mesmos, podem integrar o acervo da biblioteca da
escola. E assim, nos anos seguintes, novos alunos lero livros ilustrados pelos
colegas da mesma escola.
CARROLL, Lewis. Alice no Pas das Maravilhas. [traduo: Ana Maria Machado] So Paulo:
tica, 1997. p.13.
9
QUINTANA, Mrio. Apontamentos de histria sobrenatural. Poesias. So Paulo: Crculo do Livro,
1976. p. 228.
10
Para saber mais, veja, sobretudo, o artigo do escritor e ilustrador Lus Camargo: Para que
serve um livro com ilustraes? publicado em JACOBY, Sissa (org.). A criana e a produo
cultural. Porto Alegre: Mercado Aberto, 2003. p.273-301. E tambm o livro do mesmo autor:
Ilustrao do livro infantil. Belo Horizonte: Editora L, 1995.
18
de ornar ou elucidar o texto, mas ela tambm dialoga com ele, nem sempre representando o que
o autor escreveu.
Ao mesmo tempo em que lemos os textos, lemos tambm as ilustraes. Se isso verdade,
ento as ilustraes podem modificar a compreenso, podem interferir na leitura.
H escritores que ilustram, eles mesmos, seus livros, como o caso de ngela Lago, Eva
Furnari, Lus Camargo, Ricardo Azevedo, Roger Mello e Ziraldo, dentre outros. E h tambm
livros feitos apenas de imagens, que podem ser lidos inclusive por crianas que esto na fase
inicial da aquisio da leitura e da escrita. Veja por exemplo o livro Ida e Volta, de Juarez
Machado, que ganhou da Fundao Nacional do Livro Infanto-Juvenil o prmio de melhor
livro sem texto.
Nessa mesma noite, o rei, a rainha e os bares fazem grande festa a Perceval
(...). Festejam toda a noite, mais o dia seguinte. Depois, no terceiro dia, vem
chegar uma donzela sobre uma mula amarela, que guia com a mo direita,
duas tranas negras s costas. Homem jamais viu ser to feio, mesmo no
inferno! Homem jamais viu metal to bao como a cor de seu colo e das mos.
Outra cousa porm era bem pior: os dois olhos, dois buracos no maiores que
olhos de ratos. O nariz era um nariz de gato, os lbios de burro ou boi, os dentes
amarelos como gema de ovo. A barba era a de um bode. Peito corcunda,
espinha torcida. Ancas e ombros mui bons para o baile. Outra corcunda nas
costas, pernas tortas como vara de vime, tambm prprias para a dana.11
O livro de onde esta citao foi extrada no traz nenhuma ilustrao. Porm, a narrativa feita
de forma to plstica, como neste trecho, que podemos imaginar e visualizar cenas, cenrios e
personagens. Um ilustrador que quisesse reeditar este livro com outro projeto grfico poderia se
valer desta caracterstica da narrativa medieval para produzir as ilustraes. E ns, leitores,
construmos em nossa imaginao as ilustraes que (ainda) no foram feitas.
19
20
Unidade II
Atividades de Leitura
Leitura: uma prtica social na escola
Para que nossos alunos se tornem leitores, efetivamente, e para que a leitura seja uma prtica
social em suas vidas, preciso que ela comece a se tornar uma prtica relacionada a esta
dimenso tambm na escola porque, para muitos alunos, a escola o ambiente em que eles
mais tero contato com materiais e ambiente de leitura.
Alguns escritores, ao contarem como comearam a ler e a se interessar pela escrita, referem-se
s bibliotecas com as quais tiveram contato em sua infncia, bibliotecas de seus pais e avs.
Joo Ubaldo Ribeiro, por exemplo, refere-se com encantamento grande quantidade de livros
que havia em sua casa, em Aracaju:
Relato n 8
No sei bem dizer como aprendi a ler. A circulao entre os livros era livre
(tinha que ser, pensando bem, porque eles estavam pela casa toda, inclusive
na cozinha e no banheiro), de maneira que eu convivia com eles todas as
horas do dia, a ponto de passar tempos enormes com um deles aberto no colo,
fingindo que estava lendo e, na verdade, se no me trai a v memria, de
certa forma lendo, porque quando havia figuras, eu inventava as histrias que
elas ilustravam e, ao olhar para as letras, tinha a sensao de que entendia
nelas o que inventara.1 2
Dada a situao scio-econmica do nosso pas, ter uma biblioteca em casa, ter uma casa
repleta de livros algo impensvel para a maioria dos nossos alunos, para a maioria dos leitores
brasileiros. A escola, ento, a grande biblioteca para muitos deles. claro que, como
dissemos anteriormente, se houver uma outra biblioteca em sua cidade, ser bem interessante
que voc, em sincronia com a Direo da escola, planeje uma visita de toda a turma
biblioteca. Assim multiplicar as possibilidades (suas e dos alunos) de acesso aos livros.
Clarice Lispector, no conto Felicidade Clandestina, criou uma situao bastante diferente
desta vivida por Joo Ubaldo: a de uma menina que desejava ardorosamente ler as Reinaes de
Narizinho, de Monteiro Lobato, livro que uma amiga de escola tinha, mas que insistia em no
lhe emprestar. Ela finalmente conseguiu ter o livro, por interveno da me de sua amiga.
Quando finalmente ela o teve em suas mos, ficou deslumbrada:
RIBEIRO, Joo Ubaldo. Um brasileiro em Berlim. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1995. p.
137.
12
21
Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele,
comendo-o, dormindo-o. E completamente acima das minhas posses (...)
Chegando em casa, no comecei a ler. Fingia que no o tinha, s para depois
ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fecheio de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer po com
manteiga, fingi que no sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por
alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa
clandestina que era a felicidade.1 3
Na histria destas duas crianas, uma que tinha muitos livros, e outra que no tinha, a leitura
desempenhou um papel fundamental, transformador e ldico. Voc no acha que nossas
crianas de hoje tambm merecem este tipo de experincia?
Observe que, nas duas histrias, a leitura e o acesso aos livros se do por intermdio de outro
leitor, ou de outros leitores, que compartilham com a criana uma experincia vivida, uma
histria lida e apreciada. Na vida de muitas crianas, o(a) professor(a) que desempenha esta
funo de apresentar-lhes os livros, ajud-los a escolher um dentre os vrios ttulos, estimular a
leitura de alguns livros em particular, ensinar a maneira de ter acesso aos livros, por meio das
bibliotecas.
Esta tanto pode ser uma atividade prvia s aulas, feita s entre pais, professores(as) e
funcionrios da escola, como tambm pode ser feita com o envolvimento e a cumplicidade dos
alunos, que assim tomaro contato com as diferentes prticas de leitura de sua famlia e de sua
comunidade.
13
LISPECTOR, Clarice. Felicidade Clandestina in O primeiro beijo e outros contos. Antologia. 9a
ed. So Paulo: tica, 1994. p.54-55.
22
Levamos em
considerao, aqui,
toda a discusso lida no
Fascculo 3 a respeito
da necessidade de
planejamento das
atividades didticas e
de organizao do
tempo pedaggico.
Voc, como leitor ou leitora experiente, pode ler com seus alunos e pode ler para os seus
alunos. Pode tambm contar histrias. E pode usar as histrias lidas e ouvidas como estmulo
para a escrita dos alunos. No porque o texto lido seja necessariamente um ponto de partida
para um exerccio. s vezes, a leitura se encerra em si mesma. Podemos ler e depois fazer um
exerccio de escrita, como tambm podemos ter atividades de leitura que no sejam
acompanhadas de exerccio algum, porque a leitura j , em si, uma atividade.
Sabemos que muitas vezes os leitores (fora da escola ou estimulados pela escola) escrevem para
os escritores dos livros de que gostaram! Muitos escritores relatam as conversas que tiveram
com seus leitores, as cartinhas que receberam deles!
Monteiro Lobato no s recebia cartas de seus leitores e
escrevia para eles, como tambm os inseria em suas
histrias: alguns leitores, ento, passaram a fazer parte
das histrias do Stio do Picapau Amarelo14 . Era o que a
Lemos no fascculo 3: Ao
leitora criada por Clarice queria fazer: morar no livro.
escreverem cartas com a
Nossos alunos, leitores em formao, podem aproveitar
a leitura para dialogar (por meio da escrita) com os
escritores dos livros de que gostaram, como tambm
podem dialogar com outros leitores, de perto e de longe.
muito comum lermos nas pginas de jornais e revistas
resenhas de livros e filmes, e em funo destas resenhas
decidimos ler ou no um livro, assistir ou no a um
filme. Este tipo de troca de idias e informaes entre
leitores pode ser feito dentro da prpria escola,
formando uma rede de leitura: leitores escrevem
recomendaes de leitura e assim entram em contato
com outros leitores, de hoje ou de amanh.
Um jornalzinho escolar, por exemplo, pode ter sees a
respeito das leituras dos alunos. Depois de lidos os
livros, eles escreveriam recomendaes de leitura,
espcies de resenhas ou cartas a novos leitores. Esta
ajuda da professora
crianas experimentamse na autoria do texto
escrito, um texto que
circula de fato e lido por
outra(s) pessoa(s), alm
da prpria professora.
Numa atividade de troca
de correspondncia com
outras escolas ou classes
da mesma escola, as
crianas podem usar
como tema as leituras
feitas, suas opinies,
recomendaes, etc.
A catarinense Eliane Debus escreveu o livro Monteiro Lobato e o leitor, esse conhecido, em
que ela analisa as cartas trocadas entre Lobato e seus leitores. (Florianpolis-SC, Ed. UFSC/
UNIVALI, 2004.)
14
23
seria uma maneira de articular leitura e escrita, fazendo com que a atividade da escrita tenha
em vista outros destinatrios alm do(a) professor(a). Desta forma, o aluno registra os livros
que leu, de que gostou (ou no gostou) e explica por qu. Esta uma forma de se estabelecer
um dilogo entre leitores. E este dilogo pode ser uma estratgia para ampliar a compreenso
do texto lido e tambm as relaes sociais dos alunos.
Quando lemos um livro reagimos a ele. Elaboramos esta reao de diferentes maneiras: dizendo
se gostamos do livro ou no, recomendando o livro a um amigo, escrevendo uma crtica para o
jornal, abraando o livro, falando bem ou mal do escritor... Alguns leitores no param por a.
Resolvem interferir na histria e criam, assim, outras histrias a partir do texto lido. Ana Maria
Machado escreveu A Audcia dessa mulher, estimulada pela leitura de Dom Casmurro. Depois
de lido o livro, recriou a personagem Capitu, modificando a criao de Machado de Assis. A
leitora tornou-se escritora.
O poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade tambm no se conformou com o fim da leitura
de Robinson Cruso, no porque no tenha gostado do fim da histria, mas porque queria que
ela continuasse:
FIM
Por que dar fim a histrias?
Quando Robinson Cruso deixou a ilha,
que tristeza para o leitor do Tico-Tico.
Era sublime viver para sempre com ele e com
Sexta-Feira,
na exemplar, na florida solido,
sem nenhum dos dois saber que eu estava aqui.
Largaram-me entre marinheiros-colonos,
sozinho na ilha povoada,
mais sozinho que Robinson, com lgrimas
desbotando a cor das gravuras do Tico-Tico.15
15
ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia Completa. 3a ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002.
p. 989.
24
Vamos compartilhar uma pequena parte da histria de leitura de Maria, que resgata a
importncia da biblioteca em sua formao como leitora:
Relato n 9
Sempre estudei em escola pblica e toda semana tnhamos um horrio
especfico para ir biblioteca. J na segunda srie, com sete para oito anos,
comecei me interessar por livros um pouco mais grossos que o normal para
crianas da minha idade, o que ocasionou duas indisposies com a
bibliotecria: uma vez ela me perguntou se eu realmente lia os livros que
pegava ou se os devolvia sem ler; outra vez me deu uma enorme bronca por
estar procurando livros nas prateleiras da terceira e quarta sries (essa era a
diviso da biblioteca, por sries). Minha autora preferida nesse perodo foi Ruth
Rocha.
No final da segunda srie e incio da terceira comecei a ler a srie Cachorrinho
Samba, li todos que tinham na biblioteca e repeti os que mais gostei. Quando
acabou essa srie comecei (ainda na terceira srie) a ler a Coleo Vagalume. Dessa coleo s no li aqueles cujo ttulo no me despertavam
interesse, e novamente repetia a leitura daqueles que mais gostava. Para
selecionar os que iria ler, olhava uma espcie de catlogo que vinha na capa
de cada livro; primeiro olhava a figura e depois o ttulo.
Durante a quinta e incio da sexta srie, como j havia lido todos os livros da
Coleo Vaga-lume que tinham na biblioteca da escola que estudava,
comecei a emprestar livros na Biblioteca Municipal. Minha me trabalhava no
centro e era quem os pegava pra mim. Eu anotava o ttulo daqueles que ainda
no tinha lido (e que via na capa dos outros livros) e assim consegui ler
praticamente toda a coleo. O interessante da Biblioteca Municipal que
cada livro emprestado era permitido pegar tambm um gibi. Foi a que
desenvolvi o gosto por esse tipo de leitura tambm.
(Maria Aparecida, aluna da Especializao em Literatura Brasileira)
25
Como voc pode notar neste relato, as visitas semanais biblioteca da escola apesar das
citadas indisposies da bibliotecria foram fundamentais para transformar Maria em uma
leitora apaixonada e freqentadora assdua de bibliotecas. Atualmente, ela professora,
continua lendo muitos livros e aperfeioando seus estudos.
Mas a histria de Maria diferente da de muitas outras Marias. No Brasil, a freqncia de
crianas e adolescentes biblioteca ainda rara. As recentes estatsticas sobre a prtica do
emprstimo nas bibliotecas expostas pela pesquisa Retrato da Leitura no Brasil16 e confirmadas
pelos resultados do INAF 200117 mostram o espao perifrico que a biblioteca ocupa na vida do
brasileiro: apenas 8% das pessoas entrevistadas sempre retiram livros.
A problemtica do acesso aos livros indicada como uma das principais barreiras que
dificultam a promoo da leitura, principalmente na populao de baixo poder aquisitivo, e
pode ser estendida tambm para a leitura e consulta de revistas e jornais.
O(a) professor(a) pode colaborar para alterar essas estatsticas e transformar a imagem e a
rotina da biblioteca ou da sala de leitura em sua escola. Por onde podemos comear? Para
promover e orientar a leitura preciso ser leitor, vivenciar prticas de leitura e dar depoimentos.
Comece com o relato de sua memria de leitura:
Atividade
Procure se lembrar e escrever sobre a sua histria de leitura:
Quais espaos e objetos foram importantes na sua histria de leitura?
Quem foram os mediadores importantes na sua histria de leitura?
Por que eles foram importantes?
Havia uma biblioteca na sua escola ou na sua cidade? Voc costumava
freqent-la? Voc se lembra de alguma experincia de leitura na biblioteca?
Quais livros foram significativos para sua leitura do mundo?
Conte sua histria com muito prazer e emoo.
Como voc j sabe, o gosto pela leitura despertado pelo prprio entusiasmo do adulto que
incentiva a criana a aproximar-se dos livros. Ou seja, para formar leitores, preciso que voc
se interesse por livros de tipos variados e que compartilhe suas descobertas e aprendizagens.
Aprender a ler no uma atividade natural, para a qual a criana se capacita sozinha. Entre
livros e leitores h importantes mediadores. O mediador mais importante voc, professor(a),
figura fundamental na histria de cada um dos alunos. A leitura ferramenta essencial para a
prtica de seu ofcio, por isso voc precisa revelar-se um(a) leitor(a) dedicado e uma forte
referncia para seus aprendizes. Cabe a voc o papel de desenvolver no aluno o gosto pela
leitura a partir de uma aproximao significativa com os livros. No h receitas a seguir: cada
professor(a), de acordo com sua histria de leitura e as necessidades de seus alunos, tem
condies de avaliar o melhor caminho a ser desbravado. No entanto, para que haja xito na
formao do leitor, precisamos efetivar uma leitura estimulante, reflexiva, diversificada, crtica,
ensinando os alunos a usarem a leitura para viverem melhor.
16
RIBEIRO, Vera Masago (org.). Letramento no Brasil: reflexes a partir do INAF 2001. So Paulo:
Global, 2003. p. 261.
26
A formao de leitores depende muito da relao que o(a) professor(a) estabelece com os livros,
de um trabalho integrado com toda a equipe escolar, com objetivos claros. Assim, antes de
iniciarmos as atividades com os alunos, vamos nos familiarizar com o acervo da escola?
Podemos aproveitar as reunies pedaggicas e outros momentos oportunos para nos
aproximarmos, com muita sensibilidade e intimidade, dos livros que compem o acervo. E deixar
essa paixo nos invadir de mansinho, aumentar e contaminar toda a comunidade escolar... E os
livros sairo das estantes, caixas e armrios para as mos dos leitores.
Se entendemos a biblioteca como um Centro Cultural, precisamos cuidar de fazer junto com
toda a equipe escolar uma programao com diversas atividades para o ano letivo: contao de
histrias, debates, entrevistas, depoimentos, histrias de leituras narradas pela comunidade
escolar, recital de poesia, concursos, dramatizao, jogos, hora do conto, teatro de fantoches,
coral, etc. Ao elaborarmos essa programao, como uma forma de aproximar alunos e livros,
podemos incluir a divulgao dos recursos da biblioteca, tais como: livros, revistas, discos infantis
ou fitas cassetes com canes e histrias infantis, gibis, informaes, filmes, fotografias, jogos,
brinquedos, etc.
Essas atividades precisam ser muito bem planejadas e variadas para que a biblioteca se torne um
lugar atraente e significativo para as crianas. O uso de diferentes recursos possibilita diferentes
experincias e vises de mundo. Assim, preciso ter clareza de que ouvir ou ler uma histria,
por exemplo, diferente de assistir a uma histria em vdeo, ainda que seja sobre o mesmo
assunto. Cada recurso desenvolve habilidades diferentes no processo de letramento e, portanto,
um no pode substituir o outro.
Lembre-se de que os primeiros contatos com o livro so fundamentais para a formao de um
futuro leitor. importante dispor os livros de maneira que o leitor das sries iniciais possa
escolh-los pelas capas e ttulos. Coloque sua criatividade e conhecimento do acervo para
apresentar os livros de forma interessante e ldica aos leitores. Use e abuse de diversos
recursos: varal de poemas, mural com a reproduo de capas de livros, fantoches, cestos com
diversos trajes e objetos para dramatizaes, tapetes, almofadas, gravadores, etc.
bom que a biblioteca ou sala de leitura esteja, sempre que possvel, de portas abertas, pronta
para acolher os leitores. Tambm preciso escutar sempre o que os freqentadores tm para
dizer. A organizao do acervo deve se adequar ao desejo dos leitores e ao trabalho dos
professores e professoras, disponibilizando diversos tipos
de textos: informaes, estudo, pesquisa, lazer, etc.
Procure planejar com antecedncia os espaos e
horrios para usar a biblioteca ou a sala de leitura,
programando visitas regulares que atendam a diferentes
prticas de leitura. Nessas visitas, interessante
possibilitar o livre acesso aos livros, porque deixar o
leitor mexer livremente nas estantes ou expor alguns
livros sobre as mesas proporciona um contato direto dos
alunos com o material da biblioteca, o que estimula a
curiosidade e o interesse individual.
Para dinamizar o uso da biblioteca e atrair leitores,
incentive a conversa entre eles e a troca de impresses
para conhecer o gosto e orientar a escolha das obras.
Oferea aos alunos opes variadas de leitura, convvio
permanente com os livros e com a biblioteca. Ao
devolver o livro, estimule a criana a comentar o
Na organizao do
tempo pedaggico,
voc pode reservar
algum tempo para visita
da classe biblioteca
escolar. Algumas das
atividades de leitura
podem ser realizadas
na prpria biblioteca,
outras na sala de aula,
outras em casa. O
importante que todas
sejam planejadas!
27
enredo, os personagens, as ilustraes. Outra sugesto fixar cartazes nas paredes com
opinies das crianas sobre os livros de que mais gostaram.
Se no houver livros suficientes para todos os alunos, a escola pode fazer campanha de doaes,
organizar festas (junina, da primavera, etc.) para arrecadar verbas, dentre outras iniciativas.
Uma idia interessante contada por essa aluna:
Relato n 10
Recordo-me de um fato interessante que julgo ser o princpio do meu gosto
pela literatura. Por volta da 3 srie do Ensino Fundamental, para estimular a
leitura entre os alunos, na escola em que estudava toda a semana os alunos
eram convidados a trazer de casa um livro qualquer que julgassem
interessante. A professora responsvel pela sala recolhia todos os livros dentro
de uma caixa e, depois da aula, deixava que cada aluno escolhesse um para
que pudesse levar para casa, sendo que cada aluno se comprometia em ler e
devolver o livro no mesmo estado em que emprestou. Essa estratgia surtiu um
efeito muito interessante na sala, pois o aluno se responsabilizava por devolver
sem estragar algo que no era dele, criando nas crianas um senso de
responsabilidade e ao mesmo tempo instigando uma certa competio, pois
sempre estvamos dispostos a ler mais do que os nossos colegas.
(Regina, aluna da Especializao em Literatura Brasileira.)
Enfim, o importante que todos tenham acesso aos livros e que voc seja o(a) protagonista
dessa histria que vai dar incio a muitas outras histrias.
Situaes de Leitura
Depois de garantir o acesso aos livros, o que podemos fazer para tornar nossos alunos leitores
experientes? Por que muitos deles conseguem decodificar os textos, transformando letras em
palavras, mas no compreendem o que esto lendo? Voc j pensou que oportunidades de
leitura estamos oferecendo aos alunos na escola?
Se concordamos que a leitura uma prtica social, fundamental para entender melhor o mundo,
vamos discutir e encontrar juntos uma maneira de organizar o trabalho para que os alunos
possam aprender e experimentar diversas situaes de leitura na escola e para que se tornem
leitores experientes.
Os estudos atuais sobre leitura mostram algumas descobertas interessantes a respeito do assunto
e apontam alguns caminhos. Voc j deve ter ouvido dizer que o significado de um texto
construdo pelo leitor, a partir da ativao de seus conhecimentos prvios, para interpretar o que
est escrito18 . Quando lemos um texto, importante atribuirmos um significado a ele,
relacionando os seus componentes com nossos entendimentos e sentimentos. Ou seja, o texto s
faz sentido quando ele se articula com as informaes que o leitor possui. Assim, ler palavras
muito mais do que converter letras em sons, atribuir significados s palavras para que
possamos entender o mundo.
Para que a leitura faa sentido em nossas vidas para alm dos muros e obrigaes escolares,
precisamos trabalhar com a variedade de textos que circulam na sociedade, com materiais
18
Veja, por exemplo, KLEIMAN, ngela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas,
SP: Pontes, 1999.
28
Relato n 11
Com 7 anos, no Mackenzie, minha professora Dona Nicota nos iniciou nos
mistrios da Cartilha do povo... Tenho viva, gravada, a primeira pgina at
hoje: uma imensa mo, onde cada dedo apontava pruma vogal: a-e-i-o-u...
Mas a grande marca do Mackenzie foi a sua biblioteca, que no registro de
minha memria era imensa, infinita, onde se podia achar tudo! Ia l todos os
dias, pegava emprestado todos os livros, lia vorazmente... Particularmente nos
dois primeiros anos da escola primria, lembro de como era insacivel com O
Tesouro da Juventude, especialmente com O livro dos contos. O que mais me
encantava estava impresso no volume nmero 1: era A dana das doze
princesas, que lia, relia, trelia, sempre fascinada... (s adulta soube que era
dos irmos Grimm...)
Ah, a volpia de poder ler sozinha, de mergulhar no mundo mgico das letras
pretas que remetiam a tantas histrias fantsticas!!! Como era triste e
comovente O soldadinho de chumbo, e tambm triste e dadivosa A
sereiazinha, dois contos de Andersen... Como era deleitoso, delicioso,
lagartear (no ao sol, mas onde fosse e nas condies climticas que fossem...)
com os livros de Monteiro Lobato. (Fanny Abramovich)19
19
ABRAMOVICH, Fanny. Literatura infantil: gostosuras e bobices. 2 ed. So Paulo: Scipione, 1991.
p. 11-12.
29
Nesse caso, podemos usar a leitura colaborativa, que consiste no seguinte: o(a) professor(a) faz
a leitura compartilhada do livro em captulos, estabelecendo um dilogo constante com a turma,
por meio da discusso de pistas e questes que possam auxiliar a compreenso do texto. Todos
colaboram para a construo do significado do texto. Leitura bem participativa e democrtica,
no mesmo?
Mas nem s de voz alta e pela escuta de algum que l feita a leitura. Ela tambm pode ser
realizada de forma silenciosa, individualmente, com a livre escolha de uma obra e o
envolvimento total da mente e dos sentidos. Podemos nos inspirar em uma famosa personagem
da literatura infantil, a Professora Maluquinha, criada por Ziraldo, e ficarmos bem quietinhos,
junto com os alunos, lendo nossos livros e revistas prediletos...20
20
30
PINTO, Ziraldo. Uma professora muito maluquinha. So Paulo: Melhoramentos, 1995. p.43.
Atividades de leitura
As atividades de leitura podem ajudar no trabalho do(a) professor(a), mas a didtica no prev
toda a complexidade da prtica pedaggica21 . No existem receitas prontas, pois o incentivo
leitura um trabalho complexo e depende da realidade da turma, de modo que os relatos e
sugestes devem passar pelo crivo do(a) professor(a). voc, professor(a), quem deve observar
se uma experincia que deu certo uma vez pode ou no dar certo nas outras.
Vamos refletir sobre as situaes de leitura de textos literrios, como contos e obras curtas, com
pouco texto e grande quantidade de ilustraes.
Muitos alunos universitrios, quando tm contato com a histria da literatura infantil brasileira,
seus autores e obras22 , afirmam que no conheciam a maioria deles. Parece que esta foi uma
falha em sua educao, j que existem vrias obras infantis em circulao, assim como textos a
respeito delas. Por isso importante voc procurar se informar sobre o que existe para seu
pblico e, lendo, definir prioridades, fazer suas escolhas. Essa seleo importante, pois o(a)
professor(a) deve ler os textos anteriormente a fim de analisar o que pode ou no interessar para
seu leitor. Para isso, pode tambm utilizar suas aulas para aprender sobre o gosto de seus
educandos. Muitas vezes a experincia sobre o que agrada ou no aos alunos pode servir para o
trabalho com outras turmas, lembrando o fato de que o (a) professor(a) aprende muito quando
ensina. E aprender a ensinar um ato prazeroso, especialmente quando se trata de textos
infantis, com belas ilustraes.
Dentre as vrias formas de trabalhar com leitura em sala de aula, a apresentao oral de um
texto lido uma das maneiras mais simples e ao mesmo tempo mais eficientes de despertar o
gosto pela leitura. Deixando que o aluno se dirija biblioteca e escolha a obra que lhe aprouver,
voc faz com que o contato com os livros seja estabelecido. O fato de poder ver e tocar os
vrios volumes, as vrias ilustraes, faz com que o aluno desenvolva uma espcie de leitura, a
leitura sensorial23 . Por meio do manuseio dos livros, ele pode escolher o que mais lhe agradar.
Muitas vezes as ilustraes despertam a ateno das crianas, mas h outros itens que apelam
aos outros sentidos como o olfato e o tato. Desta forma, a ida biblioteca importante para as
crianas. Voc, quando vai comprar uma roupa, no acha que h uma grande diferena entre ver
a foto de uma camiseta num catlogo e sentir com as mos a pea, percebendo sua maciez? Pois
, tambm com os livros isso pode se dar, e por isso importante deixar que o aluno veja e
toque o acervo.
H tambm alguns preconceitos que devem ser evitados. J aconteceu de bibliotecrios ou
professores no deixarem que uma criana pegue determinado livro por julgarem-no
inadequado para sua faixa etria. Isso aconteceu com Lgia:
21
SILVA, Ezequiel Teodoro da. A dimenso pedaggica do trabalho do bibliotecrio. In Leitura
na escola e na biblioteca. 9 ed. Campinas-SP: Papirus, 2004.
22
LAJOLO, Marisa e ZILBERMAN, Regina: Literatura infantil brasileira: histria e histrias. 3. ed. So
Paulo: tica, 1987. E tambm, das mesmas autoras, Um Brasil para crianas: para conhecer
melhor a literatura infantil brasileira: histria, autores e textos. So Paulo: Global, 1986.
23
31
Relato n 12
Quando tinha dez anos de idade, fui biblioteca da escola pra escolher um
livro. Gostei de Cinco semanas num balo, de Jlio Verne. Como sempre
adorei histrias sobre viagens, imaginei que aquele livro me traria a
oportunidade de fantasiar, viajar na leitura e no balo. Mas, quando quis
retir-lo, a bibliotecria me disse que aquele era muito grosso pra mim. Ento
resolvi troc-lo por outro mais fininho, s que em minha opinio muito menos
interessante. (Lgia, professora do Ensino Fundamental.)
24
Ver, a esse respeito, o livro de Betty Coelho, Contar histrias, uma arte sem idade So Paulo:
tica, 1995. A autora relata sua experincia, dando alguns exemplos de como contar histrias.
25
32
Leve em
considerao as
estratgias de
organizao do
tempo escolar. Evite
que o momento da
leitura coincida com
o final da aula.
Alguns contos, como Joo e Maria, podem ser encenados, como aconteceu na infncia de
Rafaela:
Relato n 13
Na dcada de 1970, quando era criana e ainda no sabia ler, eu assistia ao
Stio do Picapau Amarelo na televiso. Gostei muito da histria Joo e Maria,
e tive a idia de chamar alguns amiguinhos para fazermos uma encenao
sobre ela. Um era Joo, outro era Maria, outro a bruxa, e eu era a diretora.
Minha cena preferida era aquela em que a bruxa trancava Joo, pedia para
Maria aliment-lo e ia a cada dia verificar se ele havia engordado, para
devor-lo. Na histria da telinha, ele apresentava um p de galinha, que a
bruxa apertava e achava muito magro, adiando seu sacrifcio. Na falta de um
p de galinha, usvamos, em nossa brincadeira, um graveto com forquilha e a
nossa fantasia. (Rafaela, estudante de Pedagogia)
O exemplo acima mostra que a televiso teve influncia na imaginao de Rafaela e seus
amigos. Talvez a nova verso do Stio do Picapau Amarelo ou outras histrias televisivas
possam servir de inspirao, se no para as crianas, pelo menos para o(a) professor(a). Encenar
alguma histria, inclusive com mscaras, pode despertar nos alunos o interesse pela leitura dos
textos.
33
Unidade III
Uso do dicionrio
O uso do dicionrio na escola
No decorrer das atividades de leitura, para ampliarmos nossos conhecimentos, podemos contar
com um forte aliado o dicionrio.
Dentre todos os livros que compem nossas bibliotecas, alguns deles se destacam dos demais
por serem livros de consultas, e no livros que costumamos ler do incio ao fim. So os
dicionrios, enciclopdias, guias de viagens, listas telefnicas, pginas amarelas, livros de
culinria, etc. So livros nos quais procuramos uma informao pontual, mas nem sempre
lemos apenas aquilo que procurvamos. Uma vez procurando numa enciclopdia um verbete
sobre o escritor Jos Saramago, talvez leiamos tambm, por curiosidade, o verbete sobre Jos
de Arimata. A mesma coisa acontece quando procuramos uma palavra no dicionrio, voc j
percebeu? Seja num dicionrio de lngua portuguesa, seja num dicionrio de lngua estrangeira,
a consulta sempre uma oportunidade de aprendizagem de novas construes lingsticas.
O dicionrio um tipo de livro muito especial, porque nele est registrada uma grande
quantidade de palavras da lngua, palavras que usamos e que j no usamos mais, palavras que
so usadas em algumas regies do pas e no em outras, palavras muito usuais e palavras muito
raras. muito interessante ver a surpresa de algumas crianas quando elas descobrem que esto
no dicionrio palavras que elas no podem ou no devem pronunciar os palavres, palavras
relacionadas ao seu corpo, sua sexualidade, etc.
O dicionrio , ento, uma espcie de registro histrico da lngua, um tipo de arquivo, de
memria da lngua.
Nem tudo, porm, entra nesta memria. Voc j reparou que h algumas palavras que usamos e
que no esto no dicionrio? Em geral, demoram algum tempo para serem incorporadas a este
grande arquivo as palavras novas da lngua, como as grias e as palavras relativas tecnologia.
Por causa dessas inovaes da lngua que os dicionrios so constantemente atualizados:
assim que eles incorporam novas palavras.
A escritora carioca Ceclia Meireles adorava dicionrios:
No sei se muita gente haver reparado nisso mas o Dicionrio um dos
livros mais poticos, se no mesmo o mais potico dos livros. O Dicionrio tem
dentro de si o Universo completo.
Logo que uma noo humana toma forma de palavra que o que d
existncia s noes vai habitar o Dicionrio. As noes velhas vo ficando,
com seus sestros de gente antiga, suas rugas, seus vestidos fora de moda; as
noes novas vo chegando, com suas petulncias, seus arrebiques, s vezes,
sua rusticidade, sua grosseria. E tudo se vai arrumando direitinho, no pela
34
Como voc pde notar, ela se referiu a dicionrios caros e dicionrios baratos. Eles no so
todos iguais. Voc j fez a experincia de comparar dois dicionrios diferentes? uma
interessante forma de perceber que ali h diferenas, que os escritores dos dicionrios no so
unnimes quanto aos significados das palavras. Talvez porque as palavras mudem de
significado. Talvez tambm por outros motivos; deve haver outras explicaes para essas
diferenas. Qual a sua explicao?
No fcil explicar o significado de uma palavra. Algumas so mais simples, outras no.
Atividade
Faa este exerccio com seus alunos ou com seus (suas) colegas: tente definir
de maneira bem objetiva uma palavra que voc conhea bem. Depois tente
outras. E por fim compare a sua definio com a de um dicionrio. E tambm:
compare sua definio com as definies dadas por alunos ou outros(as)
professores(as).
H palavras mais facilmente definveis que outras. Em Mania de Explicao, belo e inteligente
livro de Adriana Falco, uma menina explica (de maneira bastante pessoal) o significado de
vrias palavras de uso cotidiano. Segundo ela, vergonha um pano preto que voc quer pra se
cobrir naquela hora; raiva quando o cachorro que mora em voc mostra os dentes; e
beijo um carimbo que serve pra mostrar que a gente gosta daquilo27 .
Certamente o dicionrio d outras definies para vergonha e raiva. Mas estas definies, alm
de poticas, parecem nos aproximar de alguns dos sentidos das palavras.
26
MEIRELES, Ceclia. Obra em Prosa. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1998.
27
35
H alguns anos o governo tem comprado dicionrios para distribuir para as escolas pblicas de
todo o Brasil. Verifique se a sua escola recebeu os dicionrios e observe quantos dicionrios h
na biblioteca, para saber que tipo de atividade possvel desenvolver em sala de aula, para
saber se seus alunos vo poder usar os dicionrios individualmente ou coletivamente. Compare,
em diferentes dicionrios, quais so mais adequados para os seus alunos. Afinal, temos uma
grande variedade de dicionrios no mercado, e eles no so todos iguais. a estas diferenas
que se refere a professora Maria da Graa Krieger:
Ao lidar com acervos, o professor ser tambm levado a perceber que os
dicionrios no so todos iguais, diferenciam-se quantitativa e qualitativamente,
exigindo-lhe maior poder explicativo para tratar das diferenas constitutivas da
obra. O reconhecimento das diferenas tambm motivador para que o
professor utilize as obras, considerando a adequao de seus contedos e formas
de tratamento dos dados aos exerccios de apoio alfabetizao e ao letramento
dos alunos do ensino fundamental.28
Atividade
Este exerccio de comparao pode ser feito tanto em sala de aula, como
tambm numa atividade com outros professores. Voc certamente descobrir
tesouros escondidos por trs da aparente neutralidade dos dicionrios!
KRIEGER, Maria da Graa. Recomendaes para uma poltica pblica de materiais didticos:
rea de dicionrios. Programa Nacional do Livro Didtico 2006. Braslia - DF: MEC; SEB, 2005.
28
36
Relato n 14
Quando eu era pequena, 9 ou 10 anos, lembro que estava fazendo lio de
casa e precisava encontrar no dicionrio a palavra moa, para saber como ela
era escrita se com ss ou . Mas eu no sabia como procurar a palavra,
porque eu no sabia onde estava o c-cedilha no dicionrio, eu achava que
esta nem era uma letra do alfabeto. Eu recitava e recitava o a-b-c-d-e... e a
cedilha no chegava nunca! Quando minha me chegou, ela me ajudou a
encontrar o tal c-cedilha naquele livro que me parecia interminvel. Mas a
eu tive outro problema: o dicionrio tinha a palavra mossa e a palavra moa!
At hoje, e olha que j faz tempo, eu acho que nunca usei a palavra mossa. E
at hoje me pergunto: por que que chamam o dicionrio de pai dos burros?
Tinha que ser pai dos inteligentes, isso sim! (Marina, professora)
Procurar a ortografia de uma palavra uma das finalidades do uso do dicionrio. No a nica,
nem talvez a mais importante. No caso acima, depois de encontrar as palavras moa e mossa,
foi preciso que a criana entendesse o significado de cada
verbete para escolher qual deles deveria usar.
Depois de encontrar o verbete procurado, a criana ainda
precisar lidar com os diferentes significados que uma
mesma palavra pode ter. Se quiser procurar uma palavra
no feminino, talvez no a encontre, porque alguns
dicionrios trazem s o masculino. O mesmo acontece
com o plural... E com os verbos, s no infinitivo.
No comeo, usar o dicionrio no uma tarefa simples.
Mas pode ser muito prazerosa e muito instrutiva se
houver, por perto, algum experiente no uso deste livro.
Que tal ser voc esta pessoa que vai fazer a diferena?
Agora, ainda apoiados nessa obra de referncia, queramos, junto com voc, pensar sobre outras
atividades para serem desenvolvidas em sala de aula e no dia-a-dia das crianas.
37
Atividade de Anlise
Ordem alfabtica e definies
Trazer para a sala de aula mais de um exemplar de dicionrio, de preferncia
um por grupo. Propor exerccios de observao, por meio dos quais podemos
constatar alguns princpios de sua organizao: ordem alfabtica, verbos no
infinitivo, adjetivos no-flexionados. Algumas vezes os dicionrios trazem
informaes sobre a origem e a evoluo da palavra, ou seja, a sua
etimologia, que pode ser explorada. H tambm algumas abreviaturas que,
para um leitor pouco experiente, podem causar confuses ou mesmo
desnimo. Por exemplo: s.m. (abreviatura de singular, masculino), Bras. gir.
(Brasil, gria). De incio, importante fixarmos essas noes, visando a um
melhor aproveitamento de sua consulta. importante tambm mostrar ao
aluno que muitos dicionrios trazem uma lista que explica as abreviaes
utilizadas. A nossa sugesto que haja atividades variadas e instigantes para
esses exerccios de observao, tais como destacar um determinado verbete
e refletir sobre as diversas informaes ali presentes: etimologia, abreviaturas,
dentre outros.
Atividade
Produo de um dicionrio da classe
Depois de observarmos cuidadosamente a apresentao dos textos nos
dicionrios, que tal criarmos um dicionrio da turma, com os nomes das
crianas, relacionado-os em ordem alfabtica? A turma poderia propor
descries de natureza fsica e afetiva sobre os colegas para compor as
definies, por exemplo, incorporando etimologia, abreviaes e outros
conceitos importantes.
Alm disso, voc pode usar estratgias que sirvam tanto para o estudo e uso da ordem
alfabtica, quanto para uma maior integrao entre os alunos. Pode ser, por exemplo, uma
atividade a partir da lista de chamada:
Atividade
Ordem alfabtica dos nomes
Cada aluno escreve em um papel o nome de outro aluno da classe, aquele que
vem logo depois do seu na lista de chamada, sendo que o ltimo da chamada
ficar encarregado de escrever o nome do primeiro. O(a) professor(a)
embaralha todos os nomes e depois solicita que os alunos coloquem os papis
em ordem alfabtica, colando-os numa cartolina para serem visualizados por
todos. Voc tanto pode trabalhar com nomes inteiros, quanto com o primeiro ou
o ltimo nome, e assim, com estas alternativas, pode repetir o jogo algumas
vezes, de maneira diferente.
38
Essa atividade foi inspirada no livro Uma professora muito maluquinha, de Ziraldo:
A primeira chamada que ela fez foi assim: mandou cada um de ns escrever o
nome de um outro aluno. O nome por inteiro. Grande vantagem saber escrever
seu prprio nome ela brincou. Depois embaralhou os nomes de todos ns e
mandou que a gente arrumasse tudo direitinho na exata ordem do ABC.
Gastamos quase a aula inteira s para descobrir que o nome de um colega nosso
chamado Pedro da Silva Marins tinha que ficar na frente do nome de outro colega
que imaginem s! chamava-se Pedro da Silva Martins. Em compensao
ficamos craques em dicionrios e catlogos.29
Atividade
Jogo de adivinhao:
Cada grupo consulta o dicionrio e escolhe uma palavra de uso pouco
freqente. Em seguida, registra no caderno uma definio extrada do
dicionrio e uma outra inventada pelo grupo. Ento, um grupo l as duas
definies para o outro, que deve dizer qual a definio real e qual a
inventada. Afinal, alm de consolidar os conceitos trabalhados, os jogos
podem tornar as aulas mais alegres e descontradas.
PINTO, Ziraldo. Uma professora muito maluquinha. Il. do autor. So Paulo: Melhoramentos,
1995. p.23-24.
29
39
Voc conhece outro jogo relacionado consulta do dicionrio? Compartilhe suas idias com
seus (suas) colegas!
Atividade
Jogo do comeo
O (a) professor(a) leva para a classe diversos textos anncios, jornais,
cartazes e capas de revistas e solicita aos alunos que encontrem as palavras
que comeam com a letra A. Os alunos copiam as palavras comeadas por A
no caderno e depois colocam em ordem alfabtica. Em seguida, o(a)
professor(a) pede para encontrarem palavras que comeam com a letra M,
por exemplo, e assim sucessivamente at completar todo o alfabeto.
Este jogo pode ser integrado com a consulta ao dicionrio, para as palavras desconhecidas,
como no jogo abaixo.
Atividade
Campeonato de palavras ou caa-palavras
O (a) professor(a) distribui diversos textos para os alunos, divididos em grupos,
e solicita que eles circulem todas as palavras difceis. Em seguida, cada grupo
vai anotar os vrios significados propostos para cada uma das palavras
circuladas. Depois, os grupos voltam aos textos para discutir qual o significado
que se aproxima do contexto em que a palavra foi utilizada. Se houver
discordncias, o problema ser resolvido numa plenria maior, com a
participao de toda a classe.
Atividade
Stop modificado
O aluno divide uma folha de papel em branco, em colunas verticais com os
seguintes nomes: flores, cores, frutas, meninos, meninas, cidades, carros, etc.
Essa atividade tambm pode ser feita coletivamente no quadro-negro desde o
princpio ou no final para visualizar o resultado geral. Em seguida, o(a)
professor(a) sorteia uma letra do alfabeto e d um tempo para cada aluno
pensar e escrever (5 minutos para cada letra sorteada), por exemplo a letra A:
Amor-perfeito (flor), Amarelo (cor), Abacate (fruta), Amauri (menino), Amlia
(menina), Adamantina (cidade) e Alfa Romeu (carro). Quem no conseguir
encontrar algum nome comeado com A, deixa o local em branco. No final da
atividade, cada um soma sua pontuao (pode estipular 5 pontos para os
nomes repetidos e 10 pontos para os nomes que no se repetem na folha de
outros colegas). Depois de tudo finalizado, os alunos podem juntar todas as
folhas individuais e, juntos, organizarem todos os nomes encontrados em
ordem alfabtica num grande mural, feito com papel manilha.
40
Para a rotina de trabalho semanal, interessante que possamos reservar momentos de aula
visando produo de texto e ao seu aprimoramento. Essa uma ocasio em que o dicionrio
costuma ser um grande aliado:
Atividade
Reviso e reescrita de texto
No momento dedicado ao aperfeioamento do texto, podemos dividir a turma
em grupos e distribuir uma produo diferente para cada um. Um cdigo
acertado com a turma um crculo, por exemplo indicaria incorreo
ortogrfica nos textos analisados previamente pelo(a) professor(a). Os grupos
teriam um tempo estipulado para conferir a ortografia das palavras circuladas
no dicionrio e reescrever os textos, focalizando o seu aprimoramento.
Atividade de Reescrita
Quais so as suas sugestes para o aperfeioamento deste texto?
41
Sugerimos aqui algumas estratgias para o uso do dicionrio. Voc certamente conhece outras.
Mas antes de tudo, muito importante que o aluno possa consultar o dicionrio livremente,
quando lhe parecer interessante. A curiosidade um estimulante e tanto da aprendizagem, como
vemos no relato de uma professora:
Relato n 15
O fato de haver um dicionrio na sala de aula j pode ser um motivo de
curiosidade. Me lembro de que, quando estava na quinta srie, a professora de
Cincias deixava uns quatro dicionrios distribudos pelos balces do
laboratrio. A viso daqueles livres bonitos, de capa dura e preta, chamava
nossa ateno. Eles no eram utilizados apenas para buscarmos as palavras
encontradas nos livros didticos, mas principalmente para procurarmos outras
palavras que fossem de nosso interesse. Me lembro da palavra z povinho.
Achei to estranha aquela palavra dentro do Aurlio... Alguns alunos iam
procurar palavres, como normal. Me lembro da decepo dos alunos ao
descobrirem que alguns palavres no constavam no dicionrio, ou ento que
as palavras que procuravam tinham outros nomes, mais cientficos.
(Ana, professora)
Esperamos que, a partir das experincias e sugestes apresentadas neste nosso fascculo, a sua
biblioteca, sala de leitura, canto de leitura e sala de aula dem muitos frutos saborosos. Tomara
que voc possa nos enviar alguns!
42
Sntese
43
Referncias bibliogrficas
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44
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VYGOTSKY, Lev Semenovich. Pensamento e linguagem. So Paulo: Martins Fontes, 1998.
45
O Ldico na
Sala de Aula:
Projetos e Jogos
fascculo 5
Sumrio
Introduo................................................................................. 6
Unidade I
1. Almanaque para crianas: o livro que at os professores
e as professoras gostariam de ter ..........................................................
Unidade II
2. Mais brincadeiras... lendo e escrevendo .............................................
3. Cantar tambm faz rir e brincar
17
.......................................................... 25
Unidade III
4. Jogar para compreender o sistema de escrita alfabtica e
dominar as suas convenes: mais alguns exemplos ...............................
28
5. Enfim ................................................................................................. 35
Referncias bibliogrficas ................................................................ 37
Introduo
No cotidiano da sala de aula, professores e professoras buscam formas de tornar o ensino mais
eficaz e tambm mais estimulante. Uma das alternativas aliar o prazer e o divertimento
aprendizagem. Porm nem sempre isso fcil, mesmo porque os interesses e as solicitaes das
crianas so bem diversos, e no so todas as situaes de ensino-aprendizagem que
possibilitam um trabalho com a dimenso ldica na escola.
No caso especfico de jogos e brincadeiras, no
entanto, quando direcionados para a alfabetizao e
o ensino de lngua materna, isso perfeitamente
possvel. Por meio deles integram-se o prazer e o
aprender, sabor e saber. Este fascculo, portanto,
tem o propsito geral de auxiliar o professor e a
professora no uso de jogos e brincadeiras para
promover tanto a apropriao do Sistema de Escrita
Alfabtica quanto prticas de leitura, escrita e
oralidade significativas.
Entende-se
alfabetizao como o
processo de
apropriao do
sistema alfabtico de
escrita e letramento
como o processo de
insero e
participao na
cultura escrita.
Vejamos, ento, na discusso dos resultados de algumas experincias vividas, como brincar
pode ser coisa sria na escola!
Unidade I
1. Almanaque para crianas: o livro que at os
professores e as professoras gostariam de ter...
Logo no incio, a professora buscou conquistar a turma para a adeso ao projeto, explicando o
que seria o almanaque e levando alguns para serem manuseados pelas crianas. A motivao foi
essencial, especialmente no caso do almanaque, pois nada podia ser feito sem a participao do
grupo, como disse Shalimar:
E mostrei que isso s seria possvel se eles abraassem o projeto, porque, na
verdade, no seria eu quem iria construir o almanaque e, sim, eles. E, estando
este contrato firmado, otimizaria a participao e a aprendizagem.
Descrio
Proposta do Projeto:
delimitao dos
produtos e da
culminncia
(almanaque,
organizao do dia do
lanamento do
almanaque).
Construo de um
questionrio para
definio do que
haver no almanaque:
orientaes gerais
sobre o questionrio (o
que , para que serve).
Atividade de Reflexo 1
Discuta com os(as) colegas as questes a seguir, confrontando as respostas de
cada um(a):
Voc avalia que o carter ldico da brincadeira e do prazer foi garantido nos
momentos iniciais do projeto? Por qu?
Qual a funo de se combinar com os alunos as etapas do projeto e de
registr-las num cartaz visvel na sala? Em que isso pode ajudar no processo de
ensino-aprendizagem?
Que funes da escrita foram salientadas nessas primeiras etapas, ou seja,
para que os alunos leram e para que escreveram?
Vamos continuar com a nossa anlise. Observe, agora, as etapas posteriores do projeto, em que
os alunos tiveram novas oportunidades de ler, escrever e de pensar sobre o sistema de escrita
alfabtico:
10
Descrio
Aplicao do
questionrio
Planejamento das
aes (continuidade
do projeto) com
avaliao das
atividades j
realizadas e definio
de como o produto
final ser socializado.
Leitura e explorao
dos gneros a serem
produzidos (no mbito
literrio: cano).
11
A sonoridade e a
musicalidade prprias do
texto potico so
agradavelmente
percebidas pelas crianas
no ato de uma expressiva
leitura, o que mostra que
esse um gnero que se
presta leitura oral,
individual ou em coro.
(Fascculo Complementar)
Pedi para que eles percebessem que cada uma delas [as msicas] composta
por rimas. Ressaltei que as rimas so palavras que combinam umas com as
outras. Da, pedi para que eles me mostrassem onde apareciam as rimas,
fizemos isso em cada msica. Nesse momento, falei que essas rimas poderiam
ser substitudas por outras palavras, que, dependendo da msica, poderiam
mudar tambm at a histria que tinha na msica. Ento distribu a msica
(digitada em meia folha de ofcio com margens nas laterais para eles
desenharem conforme sua pardia), mas, em cada verso, faltavam as ltimas
palavras, e pedi para que eles completassem com outras palavras. E que,
nessa hora, eles tivessem o cuidado de lembrar da estrutura do texto, o sentido
do mesmo, e eles fizeram. Nossa! Saiu cada msica to linda e engraada.
Com todo esse trabalho, a professora explorou habilidades de leitura e de produo textual ao
mesmo tempo em que permitiu que as crianas pensassem sobre a lgica da nossa escrita,
especialmente na montagem do caa-palavras. Lembramos ainda que cada momento estava
carregado de significao, afinal, estavam produzindo o livro que toda criana queria ter, com
direito a selecionar e criar os textos!
As etapas seguintes tambm foram bastante ricas, com leitura e produo de gneros variados
(receitas, instrues diversas, histrias em quadrinhos). Vejamos:
12
Descrio
Leitura e explorao
dos textos instrucionais
a serem produzidos
(Receita e instrues
de mgicas,
confeco de
brinquedos e
brincadeiras)
Leitura e explorao
de histrias em
quadrinhos
13
Descrio
- Produzir ilustraes nos quadrinhos de acordo
com o enredo;
- Preenchimento dos bales;
- Eleio dos quadrinhos que iro compor o
almanaque;
- Arquivamento das produes para o almanaque;
- Produo de atividade: desenhos para colorir.
Atividade de Reflexo 2
Discuta com os (as) colegas as questes a
seguir:
Qual a importncia de se refletir sobre o
gnero que ser produzido, antes de
comear a escrev-lo? Como o projeto deu
conta disso?
No momento de revisar os textos
instrucionais produzidos, qual foi o critrio
usado para avaliar se as produes estavam
boas? Voc concorda com esse critrio? Por
qu?
Na produo do
almanaque, a biblioteca
escolar ser um importante
aliado. (ver Fascculo 4)
Percebemos que a produo dos gneros foi sempre precedida por atividades de leitura,
inclusive de leitura-deleite, nas quais os alunos puderam familiarizar-se com os textos, divertirse com eles e tambm refletir sobre como eles funcionam nas interaes dirias, para que
servem, como se organizam.
Ao utilizar seus conhecimentos prvios para a anlise dos gneros, as crianas evidenciaram o
fato de que todos os que vivemos em uma sociedade letrada (regulada pelas prticas que
envolvem a escrita) temos alguma experincia com textos escritos, sejamos alfabetizados ou
no. Em outras palavras, mesmo um indivduo que ainda no se alfabetizou letrado em
algum grau, tem alguma experincia com a escrita e elabora hipteses a respeito das suas
funes, como dizem Soares (1998) e outros autores. Esse indivduo pode, portanto, ser
desafiado a ler e a escrever, o que a escola deve proporcionar de forma prazerosa.
nesse sentido que trabalhar numa perspectiva de letramento ganha ainda mais relevncia, pois
permite que as crianas entrem em contato com o mundo da escrita, no apenas como um
cdigo a ser decifrado, mas como um universo de possibilidades para interagir socialmente.
Refletir sobre como os textos circulam e como so produzidos em contextos extra-escolares
fundamental, uma vez que a escola no o nico lugar onde as crianas (e tambm os
adolescentes e adultos) tm contato com textos escritos, seja lendo ou escrevendo.
No momento em que os alunos revisavam os textos que tinham escrito por exemplo, os
instrucionais a professora chamou a ateno para a necessidade de o texto ser compreensvel
14
pelos leitores, para que estes pudessem seguir as instrues. A esse respeito, afirmam os
Parmetros Curriculares Nacionais (PCN):
preciso que se coloquem as questes centrais da produo desde o incio:
como escrever, considerando, ao mesmo tempo, o que pretendem dizer e a
quem o texto se destina afinal, a eficcia da escrita se caracteriza pela
aproximao mxima entre a inteno de dizer, o que efetivamente se
escreve e a interpretao de quem l. (PCN 1o e 2o - ciclos, 1998: 48)
Descrio
10
Elaborao da capa e
ilustraes do
almanaque
11
Produo do sumrio,
da apresentao e dos
dados dos autores.
15
Etapas do projeto
Descrio
12
Organizao e
reproduo do
almanaque
13
Organizao do
lanamento do
almanaque
14
Divulgao do
lanamento do
almanaque.
15
Lanamento do
almanaque.
Esperamos que, com a discusso sobre esse projeto, o almanaque possa ser mais do que um
desejo infantil: um livro que todo professor e toda professora gostariam de trabalhar em sala de
aula.
16
Unidade II
2. Mais brincadeiras... lendo e escrevendo
O segundo projeto didtico que vamos discutir com voc o de Brincadeiras populares, que
foi desenvolvido por Leila Nascimento, professora de uma turma da 1 srie do Ensino
Fundamental composta por 21 alunos com idade entre 6 e 8 anos, na Escola Municipal Santa
Catherine Labour, na cidade de Jaboato dos Guararapes / PE.
A professora acompanhava a turma desde a Educao Infantil e adotava o trabalho com
projetos didticos como uma das formas de organizar seu ensino. A turma de Leila era
heterognea quanto aos conhecimentos sobre a escrita alfabtica: parte da turma estava
vivenciando ainda as hipteses iniciais da escrita e outra parte estava mais avanada.
O projeto realizado por Leila encantou no apenas alunos e professora, mas tambm todos
aqueles que tiveram a oportunidade de apreciar o Catlogo de brincadeiras, elaborado por
esses pequenos artistas. No dia em que a professora props o tema a ser estudado, todos se
entreolharam. Afinal de contas, brincar era tudo o que eles queriam. Como nos disse Leila:
Eles ficaram muito empolgados. Apesar de estarem acostumados ao trabalho a
partir de projetos, percebo que, a cada novo tema, o interesse deles se renova.
Quando lancei pra eles a idia desse projeto, envolvendo brincadeiras
populares, notei que o interesse foi imediato. Afinal, descobrir novas
brincadeiras e vivenci-las era tudo de bom. Participaram de todos os
momentos com muito engajamento, inclusive os alunos que no estavam
ainda alfabetizados. Pensaram comigo sobre qual seria o nosso produto final,
quais seriam as etapas gerais do projeto, organizaram o cronograma, sempre
de olho no tempo que podamos contar naquele momento. Tudo ganhou
significado! E, a todo o momento, sabiam o porqu de estarmos realizando
aquelas atividades.
A professora planejou o projeto com as crianas, de modo que foram pensadas nove etapas de
brincadeira, leitura e escrita. No quadro abaixo, descrevemos as primeiras etapas do Projeto.
17
Descrio
Apresentao da
proposta e
planejamento coletivo
Seleo das
brincadeiras que iro
compor o catlogo de
brincadeiras
Planejamento da
estrutura do catlogo
Atividade de Reflexo 3
Responda s questes abaixo e discuta com seus (suas) colegas as respostas
dadas.
O que voc achou sobre o modo como Leila iniciou o Projeto didtico?
Quais foram os objetivos didticos de Leila, ao propor essa seqncia de
atividades?
O que voc acha que os alunos aprenderam nessas etapas do projeto?
18
Vimos no Fascculo 4
que a formao de
leitores depende muito
da relao que o(a)
professor(a) estabelece
com os livros.
Cronogramas e
calendrios so gneros
textuais diretamente
relacionados com a
organizao do tempo,
com o planejamento das
atividades, como vimos
no Fascculo 3.
A etapa em que os alunos fizeram a seleo das brincadeiras que iriam compor o catlogo
tambm se revestiu de uma riqueza imensa. A estratgia utilizada para coletar informaes
(brincadeiras que eles no conheciam) propiciou o contato deles com outro gnero textual:
entrevista. Eles participaram tanto da elaborao das perguntas (roteiro), o que interessante
para um trabalho voltado para a estruturao de sentenas e para o uso da pontuao (mais
especificamente o ponto de interrogao), quanto da fase de organizao dos dados coletados
por meio da entrevista. Por outro lado, os depoimentos tambm poderiam ser usados no livro a
ser escrito pela turma, caso a brincadeira citada pelo entrevistado fosse escolhida.
Outro destaque que podemos fazer quanto ao trabalho com lista. A produo de listas, como
sabemos, uma forma muito interessante para nos concentrarmos nos processos de ensino e
aprendizagem do Sistema de Escrita Alfabtica, ou seja, para que os alunos aprendam a lgica
da nossa escrita, as listas se oferecem como textos que propiciam ao professor e professora
19
um espao adequado para reflexes acerca da escrita de palavras. Leila contou-nos detalhes
sobre como realizou a tarefa de escrita da lista de brincadeiras:
O trabalho com lista foi essencial nesse projeto. Uma das primeiras atividades
do projeto foi fazer um levantamento das brincadeiras conhecidas das
crianas. Para isso, distribu tirinhas de papel e formei duplas entre eles. Aps
essa escrita em dupla, pedi para os alunos socializarem com os demais.
medida que cada dupla apresentava sua brincadeira, eu ia escrevendo no
quadro e pedindo que eles confrontassem com a forma que escreveram no
papel. Alguns antes mesmo de olhar j antecipavam seus erros e conseguiram
entender o porqu de a escrita no ser da forma que escreveram. Depois disso,
colocamos os nomes das brincadeiras num cartaz para deixar visvel na sala e,
assim, podermos consultar quando necessrio. Esse trabalho representou um
momento importante de reflexo sobre a escrita das palavras, tanto para os
alunos de um nvel mais avanado como para os demais. Pude explorar muita
coisa nesse momento. Tirei dvidas importantes das crianas. Foi timo!
Atividade de Reflexo 4
Para ampliar nossas discusses sobre a importncia do trabalho com listas em
sala de aula, rena-se com seus (suas) colegas e planeje uma atividade de
escrita de lista. Sugerimos que tal atividade:
Possibilite que os alunos pensem sobre a escrita das palavras;
Incentive os alunos a trocarem idias com seus (suas) colegas sobre como as
palavras podem ser escritas (nmero de slabas, nmero de letras, ordem das
letras...);
Favorea a sua interveno didtica, auxiliando os alunos na escrita e
refletindo com eles a escolha das letras e suas relaes com os sons.
Ainda no quadro do relato inicial sobre este projeto, notamos que a professora discutiu com os
alunos sobre a estrutura do catlogo, decidindo coletivamente o que estaria nele contido. O
registro em cartaz desses dados foi outro momento oportuno de mostrar as diferentes
finalidades da escrita. Nesse caso, ele apareceu como apoio memria e como roteiro de
trabalho. A partir da leitura do cartaz, eles recuperavam, sempre que possvel, o que precisaria
ainda ser feito.
Esse contato com diferentes espcies de textos imprescindvel para a aprendizagem da leitura
e da escrita. No entanto, no podemos esquecer que isso precisa ser feito de modo que os
alunos pensem sobre as finalidades para as quais os textos foram escritos. Leila mostra essa
preocupao na etapa seguinte, quando ela promove atividades de familiarizao com o gnero
instrues de brincadeiras (ver quadro).
20
Atividades de
familiarizao das
crianas com o
gnero instrues de
brincadeiras
Descrio
- Explorao de instrues de brincadeiras em
livros, jornais, caixas de jogos, em grupos;
- Escolha de trs brincadeiras que no faro parte
do catlogo;
- Leitura coletiva das instrues das brincadeiras
para entender como se deve brincar;
- Vivncia das brincadeiras (com leitura das
instrues, quando tiverem dvida);
- Reflexo sobre os textos lidos (estrutura,
finalidades e destinatrios).
Alm de desenvolverem estratgias de leitura importantes, as crianas, por meio das reflexes
conduzidas pela professora, preparavam-se para produzir textos desse mesmo gnero, que fez
parte da etapa seguinte do projeto:
21
Descrio
Produo das
instrues de
brincadeiras
Elaborao da
capa e ilustraes
do catlogo
Produo do sumrio,
da apresentao e
dos dados dos
autores.
Montagem e
reproduo do
catlogo
22
Atividade de Reflexo 5
Escreva o relato de uma situao didtica em que voc tenha trabalhado com
brincadeiras em sua sala de aula. Nesse relato, descreva as atividades de
leitura e de produo de textos. Caso voc no tenha realizado tais tipos de
atividades, descreva atividades que voc acha que poderiam ser
desenvolvidas com sua turma.
Depois se rena com quatro ou cinco colegas, leiam e discutam sobre os
relatos escritos por vocs. Procurem identificar os objetivos das atividades.
Sugerimos ainda que vocs executem as atividades em suas salas e discutam
com os colegas os resultados.
23
Descrio
- Organizao do dia do lanamento, com
tomadas de decises sobre as atividades a serem
feitas;
- Planejamento de tudo o que ser feito
(brincadeiras, mesa de autgrafos...);
- Produo de textos de divulgao do dia da
brincadeira (cartazes e convites para os pais e
para as outras turmas da escola);
- Vivncia do dia do lanamento, com entrega do
catlogo biblioteca.
Atividade de Reflexo 6
Para concluir nossas reflexes sobre o projeto desenvolvido por Leila, releia
todos os quadros com o relato do projeto, identificando os objetivos de cada
atividade. Aps a anlise do Projeto, rena-se com um(a) colega ou um grupo
de colegas e planeje um projeto didtico, usando a temtica jogos e
brincadeiras. Recomendamos que vocs pensem sobre:
Qual ser o produto final do projeto (um catlogo, jogos de sucata, semana da
brincadeira ou outro jogo qualquer);
Como sero as etapas do projeto;
Quais atividades de leitura, produo de textos e reflexo sobre o sistema de
escrita sero realizadas.
Depois executem o projeto e socializem com o restante da escola os resultados
obtidos. No esqueam de registrar tudo o que for feito e entregar para o
coordenador de grupo.
24
Para recuperar algumas questes suscitadas durante a discusso, vamos analisar um terceiro
projeto didtico desenvolvido com crianas de escolas pblicas. A professora que desenvolveu
o projeto foi Cludia Vasconcelos, que regia uma turma de 1 ano do 1 ciclo da Escola
Municipal Stio do Berardo, no Recife. A turma tinha 20 alunos com diferentes nveis de
conhecimentos sobre o sistema de escrita alfabtica. Vejamos o esquema que resume as etapas
vivenciadas pelos alunos de Cludia.
Etapas do projeto
Descrio
Apresentao da
proposta e
planejamento coletivo
Levantamento de
cantigas
populares
Atividades de
familiarizao das
crianas com o
gnero cantigas
populares
Produo do livreto
25
Etapas do projeto
Descrio
Produo da fita
cassete
Lanamento da
fita e do livro
- Organizao do Sarau.
- Planejamento de tudo o que seria feito
(autgrafos, apresentao...).
- Divulgao do Sarau e Lanamento da fita, com
a produo de cartazes e de convites.
- Realizao do dia do Sarau e de Lanamento da
fita e do livro.
Muitos aspectos positivos podem ser destacados no trabalho desenvolvido por Cludia. Para
retomar o que vnhamos discutindo anteriormente, salientamos que:
Os alunos estavam engajados em atividades ldicas, por meio das quais eles se divertiram e
aprenderam;
Os alunos ampliaram seus repertrios de msicas, aumentando os conhecimentos e
valorizando a cultura local;
Atividades de leitura e escrita foram realizadas durante todo o projeto, ajudando os alunos a
desenvolver diferentes capacidades textuais;
As atividades de escrita das cantigas, que as crianas sabiam de cor, e de palavras, como na
brincadeira a palavra , com ajuda da professora, foram ricas situaes de reflexo sobre o
sistema de escrita alfabtica.
A explorao das cantigas, particularmente das rimas, contribuiu para o processo de
alfabetizao das crianas, medida que fez com que elas pensassem sobre as semelhanas
entre as palavras e sobre as relaes entre a escrita e a pauta sonora, como explicitou a
professora:
Bem, quando a criana entra em contato com algumas palavras mais
significativas, na msica, por exemplo, comea a perceber que no se escreve
s com vogais, que se escreve com consoantes, e que essas letras tm uma
relao com o som. A criana comea a se apropriar que as cantigas de roda
so mais em versos, que cada verso tem rimas tambm. A gente aproveitou
pra trabalhar muito com rima, e a eles vem que as palavras que rimam
geralmente terminam iguais. Tudo isso a criana vai se apropriando.
26
Atividade de Reflexo 7
Antes de iniciarmos o estudo da Unidade III deste fascculo, rena-se com seus
colegas e assistam ao programa de vdeo Jogos e brincadeiras no ensino da
lngua portuguesa. Discutam sobre as concluses mais importantes extradas
pelo grupo. Elaborem um cartaz com as aprendizagens que mais contriburam
para a prtica em sala de aula.
27
Unidade III
4. Jogar para compreender o Sistema de Escrita Alfabtica e
dominar as suas convenes: mais alguns exemplos
Nas trs sees anteriores (nas Unidades I e II), mesmo trabalhando com projetos que
envolviam, sobretudo, a leitura e produo de textos variados (e, s vezes, mais longos), vimos
que, em alguns momentos ao explorar rimas ou palavras de uma lista, por exemplo , as
professoras levavam os alunos a refletir sobre as palavras de nossa lngua, de modo a
examinarem suas caractersticas grficas e sonoras. Na presente seo, vamos nos deter
especificamente em jogos que se voltam para esse objetivo: ajudar os alunos a se apropriarem
de nosso Sistema de Escrita Alfabtica.
Para avanarmos na discusso de como pr essa meta em prtica, partiremos, tambm, de
relatos de professoras que, no cotidiano de suas turmas, vinham sistematicamente usando desse
recurso que permite s crianas gostar de brincar com as palavras e, com tais brincadeiras,
dominar a notao escrita.
Atividade de Reflexo 8
Antes de comearmos a debater aquelas experincias, responda s seguintes
questes e as discuta com seus (suas) colegas:
Que jogos e brincadeiras voc tem usado, que permitem aos alunos refletir
sobre palavras, observando, por exemplo, semelhanas sonoras ou as relaes
entre letras e sons?
Como os alunos participam dessas situaes? Quais jogos tm se tornado
mais atrativos para eles e quais no? A que voc atribui a preferncia dos
alunos por determinados jogos?
Que ganhos e dificuldades voc observa (ou observava) ao desenvolver, em
sua sala de aula, esses jogos voltados pro ensino do sistema de escrita
alfabtica?
Niedja Marques de Santana tinha uma turma de 1 srie na Escola Municipal Odete Pereira
Carneiro. Sua turma era bastante heterognea. Contou-nos que as idades dos alunos variavam
entre 7 e 12 anos e que seus nveis de aprendizagem eram bem diversificados.
J a professora Ana Carolina Sobral ensinava na Escola Municipal Jos Collier, no municpio
de Camaragibe, vizinho ao Recife. Sua turma de primeira srie tinha 19 alunos, com idades
variando entre 5 e 8 anos. Conforme seu depoimento, no que diz respeito ao nvel de
compreenso do sistema de escrita, seus alunos estavam assim distribudos: 40% no perodo
alfabtico, 10% no pr-silbico e os demais no silbico (qualitativo e quantitativo).
A idia de usar, no dia-a-dia, jogos intencionalmente preparados para a aprendizagem da
escrita era algo claro no planejamento de ensino das duas mestras. Como declararam:
28
Como podemos perceber, a chegada sala de aula dos jogos dedicados ao ensino do sistema de
escrita alfabtica foi algo pensado, planejado. Vemos, pelos depoimentos anteriores, que eles
passaram a constituir parte das atividades permanentes da didtica de alfabetizao das mestras
e algo corriqueiro na rotina dos alunos.
Mas, como fica explcito naqueles registros, preciso selecionar os jogos propostos, pensar
sobre quais se adequam a alunos com diferentes nveis de escrita e familiarizar os aprendizes
com suas regras e materiais. Isso requer, por um lado, cuidados na confeco e escolha do que
ser proposto para alunos com conhecimentos diferentes, o que no elimina a necessidade de
testar e registrar as reaes e dificuldades encontradas no momento de real aplicao, de modo
a fazer os ajustes adequados.
Registro da rotina que a mestra faz todos os dias, no quadro, sobre o que iro fazer durante a
jornada.
29
A negociao das regras com os alunos e sua familiarizao com o jogo tambm precisam ser
bem conduzidas. s vezes, os(as) docentes optam por fazer essa explicao para o coletivo de
alunos e vivenciar uma primeira jogada com todos juntos, mesmo que, para alguns subgrupos
da turma, o jogo seja pouco ou muito desafiador. Ou, o que pode resultar melhor, dedicar-se a
explicar um novo jogo aos subgrupos que iro, de fato, brincar com ele, enquanto os demais
colegas esto desenvolvendo outra atividade ou jogo. Como nos alertaram as professoras Niedja
e Ana Carolina em alguns de seus registros:
A dificuldade que eu senti foi administrar os grupos com jogos diferentes. Isto ,
aplicar jogos diferentes em grupos diferentes. Mas, depois que eles foram tendo
autonomia nos jogos, ficou mais fcil de observar e de intervir quando
necessrio. (Prof. Niedja)
Apenas uma nica vivncia deste jogo (Corrida das palavras, que ser
analisado mais adiante) ainda no ofereceu elementos suficientes para fazer
uma avaliao mais precisa e profunda. Senti dificuldade de proporcionar a
vivncia daquele jogo juntamente com outros tipos de jogos, pois os alunos
solicitaram muito minha ajuda para conseguir refletir sobre as palavras. Mesmo
assim, achei um jogo rico em sua finalidade pedaggica. (Prof. Ana Carolina).
Em ambas as turmas eram vivenciados jogos variados. Para poder explorar, de forma
comparativa, as prticas ali realizadas, vamos tratar, um a cada vez, os jogos: A Corrida das
Palavras e o Jogo das Vogais.
30
No cuidadoso registro de sua prtica, a professora Ana Carolina fez as seguintes observaes:
Logo que apresentei o jogo Corrida das Palavras, os alunos se mostraram
receptivos e todos queriam jogar. Expliquei que, como no tinha a quantidade
suficiente para todos, teriam que esperar a vez de jogar e, enquanto isso,
poderiam jogar outros jogos. O jogo foi vivenciado em dois grupos de quatro
alunos (quantidade de alunos por mesa).
Alguns se negaram a jogar outros jogos e ficaram esperando a oportunidade,
por vezes, tumultuando aqueles que queriam jogar. Percebi que os alunos que
estavam num processo inicial da leitura aproveitaram a atividade, vinham me
perguntar, por exemplo: Tia, que palavra essa, DADO ou DEDO? Pedia que
observassem a forma como estava escrita e prestassem ateno letra com
que estava escrita e a que ele estava perguntando. Percebi que este jogo foi
muito bem aceito. As crianas conseguiram se concentrar e, ao acertar as
palavras, pareciam bastante motivadas, alegres.
Em uma avaliao preliminar, percebi que o jogo proporciona uma reflexo
sobre a palavra e os sons das letras, tanto das vogais quanto das consoantes.
Tanto os alunos que estavam no silbico de qualidade como os alfabticos
pareciam aproveitar a brincadeira.
Acredito que esse jogo poderia ser tambm adaptado para outros nveis de
alfabetizao, ampliando o grau de dificuldade: faltando letras, em algumas
palavras, ou ainda palavras que os alunos pudessem corrigir ortograficamente.
Estar atento s perguntas e solues que propem os alunos, nestes momentos de brincadeira,
uma tima oportunidade para o docente observar as estratgias usadas por eles e os progressos
que vo fazendo. Gostaramos de enfatizar, ainda, algo que a professora Ana Carolina registrou
no final de sua reflexo: quase sempre possvel reformatar um jogo, usando materiais e
regras semelhantes, mas variando o nvel de complexidade das brincadeiras propostas. No caso
em pauta, a partir de um jogo que foi concebido para alunos que precisam avanar no domnio
do funcionamento das relaes som-grafia, ela concluiu que o mesmo poderia ser remodelado
31
para ensinar a norma ortogrfica (atravs de uma Corrida onde, a cada jogada, no envelope
recebido, o aluno teria que escolher dentre trs palavras aquela que estava ortograficamente
correta).
32
Em seu registro, a professora Ana Carolina comentou que, em sua turma, os resultados colhidos
tambm foram bem proveitosos:
A vivncia desse jogo aconteceu com os alunos que ainda no faziam
distino do som das vogais nas palavras, ou o faziam com dificuldade.
Tambm foi jogado por alunos que tinham menos dificuldade nesse aspecto,
por exemplo, aqueles que j percebiam o som das vogais e sua presena nas
palavras, mas ainda no dominavam a escrita destas.
Percebi uma boa receptividade desse jogo, especialmente por parte de um
aluno que apresentava muita dificuldade de perceber a escrita das vogais nas
palavras e, at mesmo, a sua relao com o som nas palavras. Para outros
alunos que possuam essa mesma dificuldade, acredito que tambm ser
importante.
Gostei muito (do jogo) porque abriu uma janela para que eu pudesse trabalhar,
de forma mais especfica, com aqueles alunos que no conseguem
acompanhar o andamento da turma.
Dentre as novas lies que podemos extrair desses relatos, ressaltamos a confirmao de que
certos jogos se prestam mais a promover a reflexo de alunos que se encontram em momentos
especficos no processo de apropriao da escrita alfabtica. preciso ver que, com jogos que
so prazerosos, como o agora enfocado, podemos oferecer um atendimento apropriado para
subgrupos de alunos, respeitando seus tempos de aprendizagens, algo que muitos docentes tm
dificuldade de pr em prtica no dia- a- dia.
Sim, possvel, adequado e necessrio permitir que, brincando (!!!), os alunos avancem em sua
compreenso da escrita alfabtica, diariamente. Como balano de sua experincia, a professora
Niedja relatou:
33
As atividades ldicas que aqui estamos discutindo permitem algo precioso e fundamental para a
alfabetizao: que o aluno assuma uma atividade metalingstica, isto , uma atitude de reflexo
sobre a lngua, sobre suas unidades (palavras, slabas, sons,letras...). Afinal, como observam
diferentes estudiosos (por exemplo, Leal, 2005, Morais, 2005), para desvendar os mistrios do
sistema de escrita alfabtica, o aprendiz (criana, jovem ou adulto) precisa descobrir uma srie
de propriedades da escrita alfabtica, que implicam, por exemplo:
compreender que utilizamos letras j socialmente definidas para escrever;
compreender que, embora veiculem significados, as palavras escritas so um registro da
seqncia de sons que pronunciamos, ao fal-las;
comparar palavras orais e escritas, observando a quantidade de sons e de letras;
comparar palavras orais e escritas, observando semelhanas e diferenas na sonoridade e na
seqncia grfica;
usar das pistas que j domina para buscar ler e registrar por escrito as palavras.
Dentre os jogos que ajudam nessa empreitada, alguns deles, como vimos, promovem
especialmente as habilidades de reflexo fonolgica. Outros se voltam para a explorao e
domnio das relaes som-grafia, propiciando avanos tanto na fluncia de leitura (ou no uso de
pistas iniciais para ler), como na escrita (inclusive, no domnio da ortografia)3 . O mais
gratificante lembrarmos que naquelas situaes, ao jogar, ao brincar, os alunos esto sempre
partilhando, prazerosamente, com os colegas e o(a) professor(a), as descobertas que vo
conseguindo fazer sobre como escrevemos e lemos as palavras de nossa lngua.
Atividade de Reflexo 9
Antes de concluirmos essa seo sobre jogos especialmente planejados para
promover a compreenso do Sistema de Escrita Alfabtica e o domnio de suas
convenes, faa, com um grupo de colegas (quatro, por exemplo), um plano
de trabalho que inclua o uso de distintos jogos que se prestem ao mesmo fim.
Propomos que cada membro do grupo escolha um jogo com objetivo diferente
e:
Descreva o plano de funcionamento do jogo (objetivo, materiais ou
componentes, participantes, finalidade ou meta, regras);
Justifique seu uso (objetivos e definio dos grupos de alunos que devero se
beneficiar mais com o jogo);
Ponha em prtica o jogo em sua sala de aula e registre as reaes e solues
reveladas pelos alunos;
Analise os aspectos positivos que constatou, as dificuldades que encontrou
para realizar o jogo proposto, registrando o que modificaria o seu
planejamento inicial, para realizar novamente aquela atividade.
Discuta com o grupo e socialize seus produtos (planos, registros e comentrios).
Assim, avanaremos bastante na montagem de um grande banco de jogos
voltados ao ensino do Sistema de Escrita Alfabtica.
Para uma ampliao do repertrio de jogos que se prestam a essas diferentes finalidades,
sugerimos a leitura de Leal, Albuquerque e Rios (2005)
34
Enfim...
Por meio da anlise dos projetos e atividades realizados, buscamos evidenciar o seu papel na
articulao de momentos significativos e variados de leitura e escrita e de situaes voltadas
para a apropriao do sistema de escrita alfabtica.
Na discusso dos resultados das vivncias relatadas, algumas concluses comuns podem ser
sintetizadas:
Vimos no fascculo 3 a
diferena entre improvisao
e espontaneidade. Assim, a
improvisao em uma aula,
no feita de modo
espontneo, sem
conhecimento anterior, de
forma instintiva. Quando
improvisamos em nossas
aulas, buscamos frmulas
antigas, saberes j
consolidados a respeito do
que vem a ser uma aula, que
aspectos fazem parte dela.
Depois dessas reflexes, esperamos que voc, professor(a), se sinta mais preparado(a) e
estimulado(a) para incluir, entre as outras atividades do dia-a-dia, os jogos e as brincadeiras.
Sem a pretenso de ter esgotado todos os aspectos que poderiam ser abordados, priorizamos os que
julgamos mais relevantes. Esperamos que cada professor(a), no seu percurso de autoformao,
amplie as possibilidades aqui oferecidas, refletindo sobre as sugestes e recriando-as nas salas de
aula, de modo a atender as especificidades de suas turmas, de seus alunos.
De fato, nenhuma criana precisa que lhe ensinem a brincar, pois o jogo e a brincadeira fazem
parte da vida das crianas desde o seu nascimento. Podemos sim, como professores e
professoras, apresentar novas facetas das brincadeiras, que escondem um imenso potencial: o
de preciosas oportunidades de se envolver em prticas de letramento diversas, ao mesmo tempo
em que se apropriam das convenes e regularidades do nosso sistema de escrita. Enfim,
brincando tambm se aprende!
35
Bem, conclumos mais uma etapa de nosso curso. Mas no terminamos por aqui nossa conversa.
Nos prximos encontros, teremos bons momentos de estudo e discusso sobre as relaes entre
fala e escrita, em uma perspectiva de ensino voltada para a reflexo sobre a linguagem e sobre
as prticas sociais de produo e compreenso de textos orais e escritos. Assim como fizemos
nas trs unidades deste fascculo, tambm realizaremos atividades de discusso em grupo acerca
de prticas de professores e professoras do Ensino Fundamental. Nosso objetivo teorizar a
ao docente e os objetos de ensino e de aprendizagem.
36
Referncias bibliogrficas
BRASIL, Secretaria da Educao Fundamental. Parmetros Curriculares Nacionais
Lngua Portuguesa. Vol 2. Braslia: Ministrio da Educao e Cultura. (PCN 1 E 2 Ciclos, 1998).
LEAL, Telma Ferraz e BRANDO, Ana Carolina P. Usando textos instrucionais na
alfabetizao sem manual de instrues. in BRANDO, Ana Carolina P. e ROSA,
Ester Caland de S. (orgs). Guia Didtico: leitura e produo de textos na
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LEAL, Telma Ferraz; ALBUQUERQUE, Eliana Borges C. e RIOS, Tnia S. Jogos:
alternativas didticas para brincar alfabetizando (ou alfabetizar brincando?). In:
MORAIS, A.; ALBUQUERQUE, E. e LEAL, T. (orgs.) Alfabetizao: apropriao do
sistema de escrita alfabtica. Belo Horizonte: Autntica, 2005.
MENDONA, Mrcia. Projetos temticos: integrando leitura, produo de texto e
anlise lingstica na formao para a cidadania. Construir Notcias, 21, 2005. p.
49-53.
MORAIS, Artur Gomes. Se a escrita alfabtica um sistema notacional (e no um
cdigo), que implicaes isto tem para a alfabetizao? In: MORAIS, A.;
ALBUQUERQUE, E. e LEAL, T. (orgs.) Alfabetizao: apropriao do sistema de
escrita alfabtica. Belo Horizonte: Autntica, 2005.
TEBEROSKY, Ana. Alfabetizao e tecnologia da informao e da comunicao. in
TEBEROSKY, Ana e GALLART, Marta S. Contextos de alfabetizao inicial. [Trad.
Francisco Settineri]. Porto Alegre: Artmed, 2004.
TEBEROSKY, Ana; RIBEIRA, Nria. Contextos de alfabetizao na aula. in:
TEBEROSKY, Ana; GALLART, Marta S. Contextos de alfabetizao inicial. [Trad.
Francisco Settineri]. Porto Alegre: Artmed, 2004.
VAL, Maria de Graa C. & BARROS, Lcia Fernanda P. Receitas e regras de jogo: a
construo de textos injuntivos por crianas em fase de alfabetizao. in ROCHA,
Gladys & VAL, Maria da Graa C. Reflexes sobre prticas escolares de produo
de texto: O sujeito-autor. Belo Horizonte: Autntica, 2003.
37
fascculo 6
Sumrio
Introduo................................................................................. 6
Unidade I ................................................................................................. 7
1. Antigos e novos livros didticos de Lngua Portuguesa
e Alfabetizao .........................................................................................
10
Unidade II ............................................................................................... 19
3. O livro didtico de Lngua Portuguesa das sries iniciais do Ensino
Fundamental e as mudanas no foco do ensino-aprendizagem ..............
19
30
36
39
Introduo
Este fascculo tem como objetivo refletir sobre algumas questes relacionadas ao uso do livro
didtico em sala de aula. Procuraremos discutir, entre outras coisas, sobre os seguintes
aspectos:
O processo de modificao dos livros didticos de alfabetizao e de Lngua Portuguesa a
partir da institucionalizao do PNLD (Programa Nacional do Livro Didtico);
Unidade I
1. Antigos e novos livros didticos de Lngua
Portuguesa e Alfabetizao
Atividade de reflexo 1
Para iniciar, gostaramos que voc refletisse sobre as seguintes questes:
1) Quando voc estudava, os professores e professoras faziam uso de livros
didticos?
2) Como seus professores e professoras usavam o livro didtico?
3) Quando aluno(a), o que voc achava dos livros didticos com que
estudava?
4) Voc acha que hoje os livros didticos so diferentes dos da sua poca? Em
qu?
No parece haver dvidas de que o livro didtico em geral e, no caso da presente anlise, o
Livro Didtico de Lngua Portuguesa (LDLP) e o Livro Didtico de Alfabetizao (LDA)
ocupam um significativo espao na cultura escolar brasileira. De fato, independentemente de
restries ao seu uso, sob o argumento principal de que condiciona a autonomia do professor e
da professora, o livro didtico permanece como um dos suportes bsicos na organizao do
trabalho pedaggico. Nesse sentido, mesmo admitindo-se atitudes de resistncia a esse tipo de
material, mesmo reconhecendo-se sua utilizao por vezes parcial, seletiva ou reinterpretada
por parte dos educadores, no h como menosprezar a fora do livro didtico nas definies
pedaggicas no cotidiano da escola. Alm dessa influncia, no se pode esquecer que o LDA e
o LDLP atuam decisivamente sobre as experincias de letramento2 dos alunos, pois, muitas
vezes, constituem o principal material escrito manuseado e lido de forma sistemtica pelas
crianas e at mesmo pelos professores e professoras que vivem em localidades mais
afastadas dos grandes centros urbanos.
O livro didtico pode constituir um material de regulao de muitos aspectos da prtica do
professor e da professora: os contedos a serem ensinados, a ordem em que eles deveriam ser
trabalhados, as atividades a serem desenvolvidas, os textos a serem lidos, a forma de correo
dos exerccios.
No entanto, se perguntarmos hoje aos professores e professoras se eles usam e seguem um livro
didtico, teremos diferentes tipos de resposta. Alguns diro imediatamente que usam o livro,
sim, mas s como um apoio, e acrescentaro que utilizam vrios materiais. Outros podem dizer
que no usam um livro especfico, mas retiram atividades de diferentes livros. J outros diro
2
Entende-se por letramento, a capacidade do indivduo de relacionar-se com as diversas
dimenses sociais da escrita, competncia essa desenvolvida nas diferentes comunidades de
prtica (SOARES, 1998).
que no usam livro, pois os que tm chegado escola no lhes parecem adequados, porque
apresentam um nvel muito elevado para seus alunos e so difceis de trabalhar. Essas
diferentes respostas se relacionam a duas questes principais: ao surgimento de um forte
discurso contrrio ao uso desse material e s mudanas ocorridas nos livros didticos a partir da
implantao do PNLD (Programa Nacional do Livro Didtico) pelo MEC.
Desde o final da dcada de 1970 assistimos apario de crticas severas utilizao de livros
didticos. O uso desse material passou a ser vinculado a uma prtica tradicional de ensino,
que precisaria ser ultrapassada.
Por um lado, essa utilizao foi apontada como vinculada desqualificao profissional de
professores e professoras:
Os livros didticos criariam uma dissociao entre aqueles que executam o
trabalho pedaggico os docentes e aqueles que o concebem, planejam e
estabelecem suas finalidades os autores de livros didticos e as grandes
editoras , e a principal conseqncia dessa dissociao consistiria numa
diminuio das exigncias de formao e preparo docente (BATISTA, 2000, p.
538).
Por outro lado, os livros passaram a ser criticados por apresentarem erros conceituais e por
divulgarem preconceitos ou certas ideologias, revelando um ponto de vista parcial e
comprometido sobre a sociedade. No que diz respeito s cartilhas, especificamente, estas
receberam fortes crticas por se basearem em mtodos tradicionais de alfabetizao e por
apresentarem falsos textos, que eram, na realidade, amontoados de frases descontextualizadas.
Nessas ltimas trs dcadas, novas concepes relacionadas ao ensino de Lngua Portuguesa e
de Alfabetizao passaram a ser divulgadas/produzidas no Brasil. Estas concepes foram
desenvolvidas em diferentes reas: Pedagogia, Sociolngstica, Psicolingstica, Anlise do
Discurso, etc. e tiveram um grande impacto sobre as
formas como idealizamos que devam ocorrer o ensino e a
aprendizagem da lngua na escola. Mudanas nas
prticas dos professores e professoras passaram a ser
Vimos no Fascculo 4
exigidas e, para que estas fossem efetivadas, seria
que, com os livros no
necessrio que os mestres parassem de organizar seus
didticos, livros de
trabalhos a partir da utilizao de livros baseados em
leitura para a
orientaes terico-metodolgicas questionadas e
Biblioteca, ocorre
criticadas.
tambm uma seleo e
Compreendendo a importncia dos livros didticos na
posterior distribuio
organizao da prtica pedaggica do professor e da
por programas do MEC.
professora, e reconhecendo que muitos deles se
Os professores e
distanciavam das propostas curriculares e dos projetos
professoras, bem como
elaborados pelas Secretarias de Educao, alm de
a Direo, tm a
serem desatualizados e apresentarem erros inaceitveis,
importante tarefa de
o MEC passou a desenvolver, desde 1995, o Programa
garantir o acesso dos
Nacional do Livro Didtico (PNLD). Os livros inscritos
alunos a estes livros.
no programa so submetidos a um trabalho de anlise e
avaliao pedaggica3 , que resulta na publicao de
O trabalho de anlise e avaliao pedaggica dos livros didticos feito por equipes de
especialistas que atuam nas reas de conhecimento bsico. Responsvel pela avaliao
sistemtica e contnua dos livros didticos, o Programa tambm se encarrega da aquisio do
livro e de sua distribuio s escolas pblicas do Ensino Fundamental e, mais recentemente, do
Ensino Mdio.
um Guia de Livros Didticos, que traz informaes sobre esses livros, constituindo-se em um
material que orienta a escolha do livro didtico pelo professor e pela professora.
Assim, desde 1996, os professores e professoras da rede pblica de ensino s podem escolher
livros didticos recomendados no Guia do Livro Didtico. No entanto, para muitos, os livros
que tm chegado escola no correspondem s suas expectativas. Se, como j dissemos, alguns
docentes afirmam que os novos livros so difceis de serem trabalhados, outros, considerando
suas experincias de ensino, criticam o fato de os novos livros apresentarem certas lacunas ou
no priorizarem certos tipos de atividades.
A fim de retomarmos a discusso sobre o PNLD, transcreveremos, a seguir, a apresentao do
Programa Nacional do Livro Didtico, conforme consta no site do MEC (www.mec.gov.br):
Atividade de reflexo 2
Para saber mais sobre o PNLD e outros programas brasileiros de poltica pblica
destinados compra e distribuio de materiais didticos, como o PNLEM e
o PNBE, sugerimos que voc e seus (ou suas) colegas assistam ao Programa 1
da Srie Materiais Didticos: escolha e uso, do programa de Educao a
Distncia Salto para o Futuro4 .
4
Salto para o Futuro um programa de Educao a Distncia realizado pela TV Escola (canal
educativo do Ministrio da Educao) e produzido pela TVE Brasil, que tem como proposta a
formao continuada e o aperfeioamento de docentes que trabalham em Educao, bem
como de alunos dos cursos de Magistrio. Para saber mais informaes e acessar os textos dos
programas da Srie Materiais Didticos: escolha e uso, coordenada pela professora Roxane
Rojo, entrar no site www.tvebrasil.com.br/salto
10
No caso particular da alfabetizao, o livro didtico vem ocupando posies muitas vezes
antagnicas nas prticas pedaggicas das escolas. Nas prticas consideradas tradicionais,
organizadas pelos mtodos de alfabetizao de base sinttica (mtodos fnico, silbico e
alfabtico) ou de base analtica (mtodos global, ecltico, sentenciao e palavrao), seu papel
tem sido mais central, ao definir e regular todos os passos
da prtica de ensino da leitura e da escrita.
Nesses casos tambm se controla o acesso das
crianas a outros tipos de textos impressos, uma
(...) importante que a
criana perceba a leitura
vez que essa etapa s ocorre depois que todos j
como um ato prazeroso e
esto alfabetizados. O mtodo silbico, por
necessrio e que tenha os
exemplo, contempla alguns aspectos importantes
adultos
como modelo. Nessa
para a apropriao do sistema alfabtico, mas
perspectiva,
no necessrio
supe uma progresso fixa e previamente definida
que
a
criana
espere aprender
e reduz o alcance dos conhecimentos lingsticos,
a ler para ter acesso ao prazer
quando no explora o uso e as funes sociais da
da leitura: pode acompanhar
escrita.
as leituras feitas por adultos,
Mas, afinal, quais as principais crticas feitas a
pode manusear livros e outros
esse material nas ltimas dcadas?
impressos, tentando ler ou
adivinhar
o que est escrito.
Um dos pontos mais importantes diz respeito ao
(Fascculo 1)
uso de textos forjados, os chamados
pseudotextos, para alfabetizar. Em que
consistem esses textos e por que eles esto
presentes tanto em cartilhas silbicas, como nas
que se baseiam no mtodo fnico?
Um dos pressupostos bsicos daqueles mtodos
tradicionais o de que primeiro tem que se ensinar
as unidades menores das palavras (letras, fonemas
e slabas) para s depois os alunos poderem ler
frases e textos. Assim, para garantir que os alunos
lessem apenas palavras que continham as unidades
j trabalhadas, os autores das cartilhas passaram a
inventar textos, controlando o repertrio das
palavras neles contidas. A seguir, ilustraremos esse
procedimento com um exemplo retirado da cartilha
Pipoca: 1
11
apresentado no incio da lio formado apenas por palavras constitudas das slabas j
ensinadas. Os textos cartilhados se caracterizam, portanto, por um amontoado de frases que,
juntas, no correspondem a um texto, uma vez que no possuem uma unidade de sentido.
Observe que, para garantir a presena de palavras compostas pelas unidades (slabas) j
ensinadas, muitas frases eram artificiais e sem sentido, como as clssicas o boi bebe, o beb
baba, ou Ivo viu a uva.
Enfim, os textos cartilhados correspondem a um gnero textual que foi criado pela escola, para
alfabetizar os alunos atravs de uma prtica descontextualizada. Ao invs de proporem a leitura
e a escrita de textos que circulavam na sociedade, os livros apresentavam textos
completamente artificiais.
Mas as crticas s antigas cartilhas no se
limitam presena dos pseudotextos.
importante discutirmos sobre os tipos de
atividades presentes nesses manuais e sobre
como elas ajudariam pouco os alunos a se
apropriarem do sistema de escrita alfabtica.
No fascculo 1 analisamos a
diferena entre alguns mtodos de
alfabetizao, dentre eles o
silbico: A opo pelos princpios
do mtodo silbico (...) contempla
alguns aspectos importantes para
a apropriao do cdigo escrito,
mas supe uma progresso fixa e
previamente definida e reduz o
alcance dos conhecimentos
lingsticos, quando desconsidera
as funes sociais da escrita.
12
13
mundo. Expostos a seqncias de frases artificiais, muitos alunos introjetavam a idia de que,
para escrever seus textos, deveriam imitar o que liam nas cartilhas. A maioria de ns j viu
crianas recm-alfabetizadas (com aqueles mtodos) que produziam escritos como:
O cachorro do menino.
O cachorro bonito.
O cachorro branco.
O cachorro da famlia
(etc.)
Atividade de reflexo 4
Responda s questes abaixo e discuta com seus (suas) colegas:
1) Os livros de alfabetizao recomendados pelo PNLD que voc conhece so
diferentes das antigas cartilhas?
2) Em quais aspectos os livros de alfabetizao recomendados pelo PNLD se
diferenciam (ou no) das antigas cartilhas?
3) Em sua prtica de alfabetizao, voc prefere usar uma cartilha
tradicional ou os novos livros de alfabetizao? Por qu?
4) Em sua avaliao, quais so os pontos positivos e negativos dos livros de
alfabetizao recomendados pelo PNLD?
14
algumas capacidades e
conhecimentos
necessrios para a
apropriao do sistema de
escrita. Se preciso, retome
o Quadro 2: Apropriao
do sistema de escrita
15
Que atividades tm sido propostas para os alunos compreenderem esses princpios? Se alguns
livros recomendados com ressalvas, por um lado, mudaram no que se refere ao trabalho com
textos, substituindo os pseudotextos por textos autnticos e de diferentes gneros, por outro,
no que diz respeito aquisio do sistema alfabtico, continuam presos a algum mtodo de
alfabetizao e, com isso, priorizam atividades mecnicas, como as discutidas anteriormente.
Outros livros (tanto Recomendados com Ressalvas como Recomendados) tm buscado
contemplar atividades que levam a refletir sobre alguns dos princpios de funcionamento do
Sistema de Escrita Alfabtica, dentre as quais: comparao de palavras quanto ao nmero de
slabas e/ou de letras; anlise de correspondncias grafofnicas; composio e decomposio de
palavras; familiarizao com letras de diferentes tipos; identificao e produo de rimas;
escrita de palavras a partir de determinadas letras e/ou slabas; trabalho com palavras estveis
(especialmente com os nomes dos alunos). Alguns tm buscado tambm respeitar e valorizar a
escrita espontnea das crianas, atravs da qual se podem perceber os diferentes nveis de
construo de hipteses alcanados pelos alunos. Mas nem sempre estas propostas tm sido
adotadas ou aparecem de modo sistemtico.
16
17
Atividade de reflexo 5
1) Voc concorda com as concluses acima apontadas?
2) O livro de alfabetizao que se usa em sua escola apresenta, alm de
atividades de leitura e produo de textos, outras que possibilitem a
apropriao do Sistema de Escrita Alfabtica? Quais?
3) Que aspectos positivos e que lacunas (ou problemas) voc identifica no
modo como aquele livro ensina o Sistema de Escrita Alfabtica?
Discuta com seus (suas) colegas as respostas formuladas.
Apesar das lacunas citadas, importante no esquecermos que os novos livros didticos so de
boa qualidade, alm de serem distribudos para cada aluno, o que facilita o desenvolvimento
das atividades no dia-a-dia da sala de aula. preciso, portanto, saber como us-los, para
garantir que os alunos se alfabetizem em uma perspectiva de letramento. Voltaremos a discutir
sobre isso mais adiante.
18
Unidade II
3. O livro didtico de Lngua Portuguesa das sries
iniciais do Ensino Fundamental e as
mudanas no foco do ensino-aprendizagem
19
revises aos Livros Didticos de lngua materna. Desse modo, o ensino/aprendizagem proposto
nos LDLP, sobretudo a partir da segunda metade da dcada de noventa, passou, paulatinamente,
a:
1) tratar os fenmenos da linguagem em funo das prticas de letramento e a oportunizar
momentos diversificados de trabalho textual em contextos concretos de uso;
2) trabalhar com os gneros textuais da oralidade e da
escrita que circulam socialmente, tanto nas atividades
de compreenso quanto nas de produo;
3) valorizar as variedades7 dialetais e a pluralidade das
experincias culturais dos aprendizes; e
4) estabelecer parmetros diversificados de avaliao e
de auto-avaliao, levando em conta o percurso
percorrido pelo aluno, o conhecimento em construo,
os pequenos ganhos, sem se fixar apenas nos resultados
finais, no produto.
Gneros textuais,
variedades dialetais,
situaes concretas de
uso da lngua e
avaliao foram
aspectos j abordados
em fascculos anteriores
desta coleo. Que
tratamento o seu livro
didtico d a estes
aspectos do ensino?
20
mltipla, pois traz tona modos distintos de se observar a lngua e de trat-la no espao escolar,
como procuraremos mostrar na seqncia. A reflexo a seguir desenvolvida foi organizada em
funo dos conhecimentos de leitura e produo de textos (orais e escritos); da abordagem
lingstica; e do encaminhamento da proposta avaliativa, aspectos que os professores e
professoras deveriam levar em conta, com proveito, quando da escolha do livro didtico que
pretendem adotar em sala de aula. Na anlise so comparados os encaminhamentos
contemplados em colees didticas do incio da dcada de 90 com os adotados por obras de
publicao mais recente. Esperamos, com essa estratgia, tornar mais evidentes as alteraes
introduzidas no LDLP ao longo dos ltimos dez anos.
Atividade de reflexo 6
1) Que gneros textuais so contemplados no livro didtico de Lngua
Portuguesa utilizado por voc? Esses textos so autnticos?
2) Em sua avaliao, os gneros textuais da esfera literria esto
adequadamente representados na coleo didtica adotada por voc?
3) Que tipos de atividades so propostas no encaminhamento do estudo do
texto naquela coleo? Que outras atividades, consideradas relevantes por
voc, esto ausentes?
Discuta com seus (suas) colegas as respostas formuladas.
At meados dos anos noventa, as obras didticas disponibilizavam para a leitura quase
exclusivamente textos literrios, sobretudo as narrativas ficcionais. o caso, por exemplo, da
coleo Porta de papel: lngua portuguesa (BRAGANA et al, 1992), cujo volume 4 estava
dividido em 32 unidades, todas contendo um nico texto autntico, no-integral (e sem a
indicao dos cortes feitos!), extrado de obras literrias. A experincia de leitura que se
oferecia aos alunos em livros com esse tipo de coletnea era, nesse sentido, bastante reduzida.
Obviamente, um livro didtico no deve cair no outro extremo, ou seja, apresentar gneros
textuais de contextos sociais diversos mas, ao mesmo tempo, descuidar-se da leitura de autores
representativos da literatura. Com isso, deixaria de contribuir para o cumprimento de uma das
funes primordiais da escola, a formao do leitor literrio. Uma anlise das colees
21
didticas recentemente editadas permite concluir que um nmero significativo delas est mais
atento qualidade e ao equilbrio na oferta da coletnea, tanto no que tange aos gneros
textuais quanto no que se refere aos temas explorados, ambos provenientes das vrias esferas de
circulao social.
Uma boa seleo de textos favorece (embora no garanta) o desenvolvimento de estratgias
diversificadas de leitura, contribuindo para a formao de leitores capazes de lidar com
diferentes materiais escritos, de compreenderem os textos a partir das pistas mais evidentes, e
tambm das que esto implcitas; de extrapolarem, com coerncia, as fronteiras textuais, de
construrem relaes consistentes entre o que j sabiam e o que vieram a aprender com a
leitura.
Por trabalhar a leitura como uma atividade efetiva de interlocuo, as obras editadas em anos
mais recentes cuidam, com freqncia, de recuperar, para o aluno, o contexto de produo dos
textos selecionados, indo alm da mera indicao dos dados bibliogrficos. Exemplifiquemos.
Em se tratando de narrativas ficcionais, preocupam-se agora em discorrer sobre os autores, em
apresentar um breve resumo da obra ou mesmo em reproduzir a capa do livro, do qual foi
extrado o trecho a ser lido e estudado. Em se tratando de uma reportagem, so observadas as
caractersticas do jornal ou da revista de onde a mesma foi retirada e so indicados data, autoria
e local. Antes de iniciar a leitura, os aprendizes so
convidados a conversar, a levantar e, posteriormente, a
O fascculo 7 apresenta
confirmar hipteses a respeito dos personagens, do
uma atividade de leitura
ambiente e dos acontecimentos relativos histria ou
em que a professora
reportagem. Com esse encaminhamento, que sofre
desenvolve estas
adaptaes conforme o gnero textual e o tema
estratgias (conversa
trabalhado, ao mesmo tempo em que se desperta a
prvia e levantamento
curiosidade dos estudantes, constri-se um sentido para
de hipteses),
a leitura.
despertando a
Na seqncia, as atividades exploram elementos que se
curiosidade e garantindo
encontram, em maior ou menor grau, implcitos no
o envolvimento dos
texto e que, por isso mesmo, exigem o investimento de
leitores em formao.
diferentes estratgias de leitura. Assim, o aluno
convidado a realizar inferncias9 ora locais ora globais,
a recorrer a seu conhecimento de mundo, a estabelecer
comparaes entre informaes contidas no prprio texto ou entre diferentes textos, a emitir
opinio, a construir relaes com outras reas do conhecimento, a inter-relacionar o texto verbal
com outros no-verbais, sempre com o propsito de aprofundar a compreenso leitora.
O encaminhamento acima sugerido, no trabalho com o texto, difere de modo significativo do que
vinha sendo realizado pelas obras didticas at meados dos anos 90. Tome, como exemplo, a
unidade 10 do livro Porta de papel: lngua portuguesa (BRAGANA et al, 1992). Nas
pginas 76 e 77, disponibilizado o texto Aquele ovo!, sem qualquer contextualizao ou
indicao de objetivo para a leitura. Percebe-se que o aluno no era minimamente motivado
para a atividade a ser desenvolvida, o que refora uma viso de leitura ento dominante como
mera tarefa escolar. Aps, o aprendiz deveria responder aos questionamentos seguintes:
9
O processo inferencial envolve operaes cognitivas, por meio das quais o leitor articula um
conjunto de informaes e chega a concluses no explicitadas no texto.
22
Exemplo 1
a) O que Guga gostava de fazer quando estava no stio da vov?
b) O que Guga respondia quando a vov lhe perguntava o que estava
fazendo?
c) O que o pai ensinou menina sobre ecologia?
d) O que Guga falou para a vov sobre a utilidade das minhocas?
e) O que Guga encontrou enterrado junto a uma grande rvore?
f) O que Guga resolveu fazer com o ovo?
g) Por que Guga no deixou de ser ecologista quando parou de afofar a terra
para as minhocas?
h) O que voc achou de Guga?
As seis primeiras perguntas pouco exigem do aluno, pois todas as respostas se encontram na
superfcie do texto. O texto , claramente, tomado como suporte de informaes e chega-se ao
sentido textual pela mera localizao e decodificao. Observe-se, ainda, que as questes so
repetitivas, cinco delas iniciando-se com a expresso O que Guga.... A stima (g) a nica
pergunta a solicitar um trabalho inferencial do aluno, enquanto a oitava (h) requer uma opinio
pessoal do aprendiz, sem que da decorra qualquer desdobramento crtico.
Como se pode observar, luz das descries e do exemplo apresentados, o estudo do texto nas
obras didticas sofreu, ao longo da ltima dcada, vrias mudanas. A mais significativa delas,
ao que tudo indica, diz respeito incorporao dos princpios que fundamentam uma viso
sociointerativa e funcional da lngua e, mais especificamente, da textualidade. Nesse sentido, o
professor ou professora que se propuser a estimular, com o apoio do livro didtico, os usos e as
prticas sociais da leitura em sala de aula, deve estar atento, no momento da escolha da coleo
que pretende adotar, diversidade de gneros da coletnea, presena significativa de textos
literrios, e pluralidade de estratgias de leitura encaminhada pela obra.
Atividade de reflexo 7:
1) Como a produo de texto (redao) era solicitada nos livros didticos
usados por voc, na poca em que era estudante?
2) H diferenas e semelhanas entre aquela abordagem e a dispensada hoje
escrita de texto nos livros didticos? Quais so elas?
3) Que aspectos voc observa, quando escolhe um livro didtico, no que se
refere produo de texto?
Discuta com seus (suas) colegas as respostas formuladas.
Produzir um texto uma atividade motivada, ou seja, os usurios elaboram um texto para
alcanar algum objetivo que tm em mente. Quando uma pessoa vai ao supermercado fazer
compras, pode preparar anteriormente uma lista, como apoio memria. Se algum precisa
combinar algo com algum e no quer ou no est em condies de usar o telefone, pode deixar
um bilhete, enviar uma carta ou uma mensagem eletrnica, entre outras possibilidades. Quando
23
um leitor discorda ou se entusiasma com certa reportagem publicada na mdia, pode escrever
uma carta do leitor, expressando sua opinio, com chances de v-la veiculada no respectivo
jornal ou revista. Se uma pessoa for comemorar seu aniversrio, pode redigir um convite e
distribu-lo entre seus amigos. E assim por diante... Em cada uma das situaes aqui
apresentadas, o tema, o gnero textual, o leitor presumido, o suporte, o contexto social de
circulao, o objetivo da produo distinto. E o escritor letrado, envolvido com as prticas
sociais de escrita, no ter maiores dificuldades em passar de um gnero para outro, em mudar
de um registro informal para um mais formal, em considerar em sua produo o contexto
scio-histrico de circulao do texto. Isso porque, para ele, as condies de produo esto
bastante claras. provvel, ainda, que o escritor revise e reescreva seus textos vrias vezes, at
chegar a uma formulao que julgue adequada e com a qual se d por satisfeito.
No o que ocorre, muitas vezes, na rotina da escola. Historicamente, a redao tem sido
solicitada aos alunos nos livros didticos com base na indicao de um tema ou de um tipo
textual (narrativo, descritivo, argumentativo, injuntivo) a ser desenvolvido. Nesses casos, a
orientao principal dada aos aprendizes escreva um texto, desconsiderando-se
inteiramente que a atividade de escrita precisa fazer sentido, caso contrrio transforma-se num
simples exerccio a ser feito porque o professor ou professora mandou. Outro aspecto
freqentemente deixado de lado pelo livro didtico que a elaborao de um texto necessita
ser aprendida e, em decorrncia, ensinada de modo sistemtico, tendo em vista as
caractersticas estruturais e scio-discursivas do gnero textual focalizado. A postura rotineira
da escola, reproduzida pelos LDLP ao longo da dcada de noventa, associa-se ideologia do
dom, no entendimento de que o aluno possuiria aptides inatas (maior ou menor jeito pra
escrever) e, portanto, saberia naturalmente e logo na primeira verso, redigir corretamente o
texto exigido. Para isso, bastaria que dominasse as regras gramaticais, de pontuao e de
acentuao, tidas como suficientes para o escrever bem e correto.
Vejamos dois exerccios com a escrita, apresentados no exemplo 2 (coleo Eu gosto de
comunicao, PASSOS & SILVA, s/d, v.4, p. 11) e no exemplo 3 (coleo Festa das palavras,
AZEVEDO, 1992, v. 4, p. 38), que adotavam esse tipo de encaminhamento.
Exemplo 2
24
Exemplo 3
25
Atividade de reflexo 8:
1) Os livros didticos da primeira a quarta srie que voc conhece tomam a
lngua falada como objeto de ensino/aprendizagem?
2) H uma preocupao dessas obras em explorar as caractersticas dos
gneros orais, tanto em atividades de produo como em exerccios de
compreenso? Como isso feito?
3) Para voc, que aspectos da oralidade o livro didtico deve contemplar,
para ser considerado de qualidade?
Discuta com seus (suas) colegas as respostas formuladas.
Algumas colees didticas, publicadas na primeira metade dos anos noventa, como Porta de
papel: lngua portuguesa (BRAGANA et al, 1992), no dedicavam uma nica pgina s
26
27
Atividade de reflexo 9:
1) Em quais caractersticas os mais recentes livros didticos da primeira
quarta srie se diferenciam dos utilizados alguns anos atrs, no que se refere ao
estudo dos conhecimentos lingsticos (de gramtica)?
2) Que aspectos positivos e que lacunas voc identifica no livro didtico
atualmente usado por voc em sala de aula, quanto ao tratamento dispensado
aos conhecimentos lingsticos?
3) No processo de escolha do livro didtico, voc leva em considerao o tipo
de trabalho realizado pela obra com os conhecimentos lingsticos? Que
aspectos voc observa, principalmente?
Discuta com seus (suas) colegas as respostas formuladas.
28
29
Unidade III
4. A escolha do livro didtico: uma deciso importante
sobre a sua qualidade
Antes de iniciarmos uma discusso sobre a escolha do livro didtico, responda s seguintes
questes:
No contexto desses debates sobre a escolha e o uso de livros didticos, temos de concordar que
fundamental exigir a qualidade do livro, pois as suas contribuies efetivas na aprendizagem
das crianas dependem desse fator. Parece-nos, a princpio, que essa uma concluso muito
simples, mas de fato no . Isso porque a qualidade do livro didtico tem se revelado h muito
tempo um problema srio na educao brasileira. Para termos uma pequena idia desse
problema, na dcada passada foi feito um diagnstico por especialistas da qualidade dos livros
didticos destinados s quatro primeiras sries do 1 grau (BATISTA e VAL, 2004). O estudo
concluiu pela deficincia e inadequao dos livros, evidenciando que o MEC vinha comprando
e distribuindo s escolas pblicas verdade que por solicitao delas mesmas livros
didticos com graves erros conceituais, espantosa desatualizao de contedo e de metodologia,
inaceitvel induo a preconceitos, enfim, livros inadequados e, mais que isso, prejudiciais
formao do aluno.
Como conseqncia desses problemas de qualidade, vimos que o Ministrio da Educao
(MEC) passou a submeter os livros didticos a avaliao, com o objetivo de orientar os
professores e professoras na escolha. Conseqentemente, a qualidade dos Livros Didticos de
Alfabetizao e de Lngua Portuguesa vem passando por transformaes significativas que
podem ser relacionadas ao processo de avaliao instaurado pelo MEC. Analisando os
resultados das ltimas avaliaes PNLD de Alfabetizao e Lngua Portuguesa, evidenciamos,
entre outros aspectos, um certo investimento das editoras na produo de novos ttulos, um
investimento maior no trabalho de reviso/atualizao das obras mais antigas, ao mesmo tempo
em que ocorre a excluso dos livros de menor qualidade pelos pareceristas que participam das
avaliaes do MEC. Essas mudanas, promovidas pela poltica do Governo, ao repercutirem no
mercado editorial, tm contribudo de forma significativa para a melhoria da qualidade dos
livros didticos produzidos no pas.
30
Mas nem sempre tem havido sintonia entre as orientaes dadas pelos Guias do PNLD e as
escolhas feitas nas redes pblicas de ensino. Cabe ento refletir: Por que as escolas desprezam
as classificaes mais altas dadas ao livro didtico?
Mesmo reconhecendo uma evoluo no padro de qualidade dos livros didticos produzidos
atualmente no pas, as pesquisas mais recentes sobre a escolha e o uso desses novos livros de
alfabetizao tm revelado que a preferncia dos professores e das professoras ainda continua
sendo bastante conservadora, pois o processo de escolha tem recado na seleo de obras que
obtm a menor classificao nas avaliaes do PNLD (BATISTA e VAL, 2004). Ou seja, seis
em cada dez livros didticos de 1 a 4 srie, escolhidos pelos professores e professoras para
uso na rede pblica nos ltimos anos, receberam apenas uma estrela no guia do MEC. Isso
significa que, apesar de estarem dentro dos padres mnimos de qualidade, condio
indispensvel para a incluso na lista de compras, essas obras so recomendadas com ressalvas
pelos especialistas que fizeram a avaliao.
Um outro aspecto importante sobre o processo de escolha de livros didticos de Alfabetizao e
de Lngua Portuguesa, que merece ser comentado, refere-se ao movimento de adeso e
incorporao dos pressupostos sociointeracionista e do letramento, presentes nos livros
Recomendados, s prticas das escolas. Os dados nacionais sobre a escolha de livros didticos
tambm tm revelado que, se em um primeiro momento algumas escolas tendem a escolher os
livros mais representativos desse novo corpus de conhecimentos sobre ensino da lngua escrita,
em um segundo momento tendem a substitu-los por livros que obtiveram a menor
classificao. Ou seja, verifica-se que os livros didticos considerados de melhor qualidade
chegam a ser escolhidos por grupos de escolas, mas, aps o primeiro ano de uso, parte
significativa dos profissionais decide substitu-los por outros organizados com propostas de
alfabetizao ou didtica da lngua mais tradicionais. Dito de outra forma, mesmo em contextos
escolares de mudanas pedaggicas, continua predominando o retorno s prticas que fazem
parte da tradio escolar.
A realidade desses fatos nos leva a indagar quais seriam as razes para essa tendncia de
escolha e uso de livros didticos das escolas: teria predominado a fora mercadolgica das
editoras? A explicao estaria na precariedade da formao dos professores e professoras, que
os tornaria temerosos de enfrentar livros mais atualizados, avanados, considerados por eles
como alm de suas capacidades tcnicas? Ou a explicao estaria nas propostas dos livros, que
se distanciam das expectativas dos professores e professoras?
Podemos concluir com esses dados que a questo da qualidade do livro didtico muito mais
complexa do que tem sido considerada. No simplesmente uma questo de excluir do
mercado os livros de pior qualidade, tambm no simplesmente uma questo de classificar os
livros de melhor qualidade e fazer chegar essa classificao aos professores e professoras. H
toda uma histria por detrs da autoria, da edio, da comercializao do livro didtico; h toda
uma histria por detrs da escola e dos professores e professoras que temos hoje no Brasil.
Precisamos refletir sobre as relaes existentes entre produo, distribuio e uso do livro
didtico no pas e o conjunto de relaes que governam a sociedade e influenciam ou mesmo
determinam as estruturas e os processos educacionais. Ou seja, nem sempre as decises sobre o
livro didtico tomadas no campo das polticas educacionais e no campo editorial representam
aquilo que de fato as escolas necessitam, desejam ou utilizam em sala de aula.
Alguns autores tm procurado explicar as razes dessa pouca procura dos professores e
professoras por livros didticos com a avaliao do PNLD como Recomendados com distino
ou Recomendados, argumentando que positivo o fato de que os materiais didticos mais
apropriados para as diferentes realidades do pas podem e devem ser diferentes. Contudo,
a escolha e o uso do livro didtico dependem de uma srie de condies, materiais e humanas,
31
existentes em cada escola do pas. Tambm precisamos considerar que as resenhas publicadas
no Guia oferecem um conjunto de informaes importantes sobre as caractersticas pedaggicas
e editoriais das obras, mas no explicam para que tipo de docente ou de comunidade escolar o
livro indicado. Alm disso, no so capazes de prever sua adequao para as diferentes
realidades educacionais existentes nas escolas pblicas do pas. As avaliaes tambm no do
conta dos descompassos existentes entre as teorias mais atualizadas sobre ensino da leitura e da
escrita e a realidade das prticas de ensino existentes nas diferentes localidades brasileiras.
Portanto, a deciso sobre a qualidade do livro didtico indiscutivelmente dos professores e
professoras e da escola.
Desse modo, reconhecemos os mritos da avaliao do MEC, no sentido de retirar do mercado
os livros de baixssima qualidade e incentivar a produo de obras mais atualizadas, mas temos
que questionar as contradies que existem entre as expectativas de quem avalia e de quem usa
os livros nas escolas. Ser que um dos problemas o perfil de quem avalia?
Sabemos que embora alguns pareceristas que avaliam os livros didticos para o MEC atuem no
Ensino Mdio e Fundamental, a maioria dos avaliadores formada por professores e
professoras universitrios. Alguns crticos ao PNLD acusam que muitos desses profissionais
esto distantes da sala de aula, imersos em pesquisas de ponta na rea do ensino da leitura e
escrita. No seria, ento, o caso de se criar uma cultura de avaliao permanente que envolvesse
todos os docentes dos ensinos Fundamental e Mdio? Ou seja, as escolas, representadas pelos
seus diferentes profissionais, deveriam se envolver de forma mais organizada no processo de
avaliao de livros didticos e, aps o seu uso, socializar como avaliam essas obras junto ao
MEC. Ouvir a opinio dos professores e professoras e dos demais profissionais das escolas
sobre os livros didticos adotados de fundamental importncia para que a escolha desse livro
auxilie, de fato, as prticas escolares.
Por todos esses motivos, importante que a escolha do livro didtico seja feita de forma
criteriosa e fundamentada na competncia dos professores e professoras que, juntos com os
alunos, vo fazer dele um instrumento de trabalho. Nesse sentido, a tarefa dos professores e
professoras de escolher o livro didtico que iro utilizar no prximo ano letivo uma
responsabilidade de quem deve procurar decidir pela qualidade desse material.
Alguns estudos tm procurado investigar como ocorre o processo de escolha de livros didticos
nas escolas do pas e apontam algumas falhas dessa poltica de governo que precisam receber
melhor ateno do MEC (BATISTA e VAL, 2004). Destacamos, a seguir, alguns dos argumentos
mais apresentados, nas recentes interaes com os professores e professoras de sries iniciais,
sobre esse processo:
os livros recebidos no correspondem s escolhas originalmente feitas, por vrias razes:
processo acelerado de escolha; desconhecimento do Guia, das resenhas ou das prprias obras;
centralizao de decises em poucas pessoas das equipes pedaggicas e rotatividade de
professores e professoras na instituio;
as obras no atendem s opes metodolgicas dos professores e professoras, exigindo
substituio, elaborao integral ou complementar de materiais mais coerentes com sua
formao e sua proposta didtica para a alfabetizao e sries seguintes; e
os contedos dos livros utilizados no correspondem realidade cultural dos alunos ou ao
perfil da turma.
32
Para promover uma reflexo crtica sobre os processos de escolha de livros didticos adotados
no interior das escolas, preciso, em primeiro lugar, que os profissionais recuperem informaes
sobre como ocorre esse processo: quem participa dessas decises, quais os critrios mais
adotados para a escolha do livro, como as decises so encaminhadas no interior e fora da
escola, entre outras. Sabemos que os processos vividos nas escolas se diferenciam, uma vez que
a realidade de cada rede pblica de ensino do pas define diferentes condies materiais e
objetivos educacionais para a realizao desse processo. Por exemplo, algumas redes pblicas
de ensino tm decidido pela escolha de um nico livro para todas as escolas, outras redes
deixam essas decises a critrio dos coordenadores pedaggicos. O importante que a reflexo
sobre os processos de escolha vividos por cada escola seja objeto de reflexo dos profissionais,
para que possam tomar decises sobre a melhor forma de conduzi-lo.
Um conjunto de questes poderia orientar esse levantamento de informaes, funcionando
como indicadores dos nveis de envolvimento e de problemas internos de cada escola.
Atividade de reflexo 11
Experimente responder s seguintes questes sobre o processo de escolha de
sua escola. Depois discuta com seus (suas) colegas as respostas dadas.
Processos de escolha
Sempre
Nunca
s vezes
33
Tendo essas questes iniciais como eixos de anlise, os professores e professoras podero
levantar outras informaes para investigar o grau de envolvimento e controle nos processos
institucionais existentes em sua escola para a escolha de livros didticos. Julgamos que as
discusses sobre escolha de livros didticos obtero resultados mais positivos quando esse
processo:
resultar de informaes e reflexes coletivas dos profissionais da prpria escola, envolvendo
professores e professoras, coordenao pedaggica e direo, em processos de escolhas
efetivamente institucionalizados;
levar em considerao o nvel especfico a que se destina o livro didtico, para organizao
dos grupos de referncia e de estudo das obras pertinentes;
assegurar o acesso ao Guia de Livros Didticos, alm da anlise cuidadosa das resenhas nele
contidas e da ampliao de acervos das obras didticas disponveis nas escolas, para exame dos
professores e professoras;
estabelecer controles de formas de presses ou interferncias de editoras ou outras instncias
alheias ao processo institucional, para que as decises de carter pedaggico no se submetam a
interesses parciais ou estritamente comerciais; em contrapartida, no se pode prescindir do papel
das editoras no que se refere disponibilizao de obras e a parcerias em projetos pedaggicos,
cabendo s redes de ensino uma sistematizao de tais processos; e
envolver avaliaes contnuas de obras j adotadas institucionalmente, de experincias bem
sucedidas com elas ou de alternativas encontradas pelos professores e professoras para
superao de limites e lacunas dessas obras; uma direo interessante pode ser a prtica de
oficinas especficas em torno de determinados focos ou eixos do ensino de lngua e da
alfabetizao, sob responsabilidade de profissionais com maior experincia ou xito em
alfabetizao, tendo como suporte: a) propostas que usem o livro utilizado como efetivo fio
condutor do trabalho docente; b) propostas que o utilizam como material de apoio, apelando
para outros materiais complementares, didticos e paradidticos; c) projetos de ampliao de
recursos associados a bibliotecas, salas de leitura, Cantos de Leitura, entre outras alternativas;
d) trocas de experincias entre instituies de uma mesma rede, como forma de incentivo a
escolhas coletivas e mais articuladas.
Aps o levantamento das informaes sobre o processo de escolha vivido nas escolas, um
segundo eixo de anlise se refere aos critrios de avaliao dos livros didticos, quanto sua
proposta de alfabetizao e de ensino de Lngua Portuguesa. Um importante ponto de partida
poder ser a reviso crtica dos critrios utilizados pelos professores e professoras para escolher,
manter em uso ou substituir determinado livro didtico. Como nem sempre os professores e
professoras tero sua disposio todas as obras indicadas nas resenhas do Guia de Livros
Didticos, deve-se valorizar, principalmente, a contnua anlise das obras j adotadas na escola,
para melhor fundamentao de suas futuras escolhas. Eis algumas questes que podero
orientar essa reflexo:
Atividade de reflexo 12
Experimente analisar o livro didtico de alfabetizao adotado pela sua
escola, respondendo s questes abaixo. Discuta com seus (suas) colegas as
respostas dadas.
34
Questes
Sim
Parcialmente No
Alm dessas questes, j do conhecimento dos professores e professoras que outros critrios
devem ser considerados, tais como: a contribuio da obra para a cidadania, com iseno de
preconceitos e doutrinaes; a correo de conceitos e informaes bsicas; a correo e a
pertinncia metodolgicas; e o atendimento aos principais eixos do ensino da lngua e s
diversas capacidades envolvidas em sua aprendizagem. Deduz-se, a partir da, que a cuidadosa
anlise das resenhas apresentadas aos professores e professoras pelos Guias pode ser um apoio
efetivo ao seu processo de deciso. Elas estaro sinalizando, por exemplo, as obras que
oferecem uma abordagem mais completa e enriquecedora e aquelas cujas ressalvas ou lacunas
exigiro trabalho atento dos professores e professoras para sua complementao e ampliao.
35
36
Entre os outros materiais que usavam para alfabetizar os alunos, algumas professoras, como a
professora Maria Elesuses Santos, citaram as cartilhas tradicionais:
Eu gosto mais dos livros tradicionais, eu tenho um l em casa, o Porta Papel,
ele muito colorido e chamativo, bom para o aluno trabalhar, mas no se pode
deixar o aluno trabalhar sozinho. (Maria Elesuses Santos)
Ao mesmo tempo em que utilizavam outros materiais para alfabetizar, alm do livro didtico,
elas afirmaram que no usavam o livro que receberam na seqncia proposta pela autora.
Geralmente, o livro didtico era incorporado s situaes didticas do planejamento ou
calendrio escolar (unidades do ano letivo). Elas faziam as atividades de acordo com o que
tinham planejado. Por exemplo, no incio do ano, algumas professoras que planejaram trabalhar
com a questo da identidade e da escrita dos nomes dos alunos realizaram leituras de textos e
atividades relacionadas a essa temtica:
A gente tem aproveitado vrios textos para os projetos da escola.
(Lenia Maria Souza).
importante destacar, no entanto, que o livro foi pouco usado, ou no foi utilizado no primeiro
semestre, como declarou a professora Maria Elesuses Santos:
Ainda no trabalhei com os alunos, porque tudo no livro o professor que faz
(professor explique, leia, faa, etc.).
37
Difcil de ser usado por crianas no incio do processo de alfabetizao (crianas prsilbicas).
O livro pressupe uma criana j alfabtica, que no o caso de nossas
crianas da rede pblica, no a nossa realidade, tanto que nos dois primeiros
meses eu no usei o livro, porque eu achava que a minha criana precisava de
uma preparao para receber esse livro. (Snia Virgnia Martins)
Mas os professores e as professoras, quando usavam o livro didtico, como o faziam? O que
priorizavam? A ttulo de exemplo, vejamos como a professora Cludia de Vasconcelos utilizou,
em uma de suas aulas, o livro didtico adotado na rede. Ela realizou as seguintes atividades:
Leitura de um texto do livro, solicitando que os alunos acompanhassem em seus livros,
seguindo a instruo da atividade;
Realizao da atividade de interpretao oral do texto com base nas questes sugeridas no
livro;
Leitura de um outro texto presente na mesma unidade do livro, que correspondia a uma outra
verso da histria lida anteriormente;
Realizao de atividade de interpretao do segundo texto lido. Uma das questes feitas pela
professora envolvia uma reflexo sobre o modo como os dois textos foram escritos, uma vez
que o segundo correspondia a um poema com rimas. Cludia no s solicitou que os alunos
descobrissem a diferena entre os textos, como tambm pediu que identificassem algumas
palavras que rimavam, atividade esta que no estava presente no livro;
Realizao de algumas atividades de apropriao do Sistema de Escrita Alfabtica sugeridas
no livro;
Leitura de um livro de literatura infantil, relacionada aos textos lidos;
Realizao de uma atividade de produo individual de texto: Cludia solicitou que os alunos
escrevessem um texto, recontando a histria dos textos lidos por ela.
Como pode ser observado nessa aula da professora Cludia, ela no s usava o livro didtico,
como inovava a partir dele: ela lia textos do livro e outros com a mesma temtica; fazia
atividades do livro e outras, como a de segmentao das palavras em slabas. Enfim, a prtica
dessa professora mostra que possvel se beneficiar dos avanos encontrados nos novos LDA,
mas preciso estarmos vigilantes, no sentido de, sistematicamente, praticar com os alunos
atividades diretamente ligadas apropriao do sistema alfabtico.
38
Enfim, acreditamos que os professores e professoras no devem usar o livro como o nico
material de apoio para a organizao do trabalho pedaggico. Mas entendemos que ele hoje,
com as mudanas que vem sofrendo, um bom material sobre o qual podemos construir e criar
as atividades de alfabetizao.
Atividade de reflexo 14
Professor ou professora, para aprofundar algumas questes relacionadas s
mudanas ocorridas na produo dos livros didticos de alfabetizao e Lngua
Portuguesa e ao uso desse material didtico na organizao da prtica
pedaggica do professor, rena-se com seus colegas e assista ao programa de
vdeo O uso do livro didtico na sala de aula. Discutam sobre as concluses
mais importantes extradas pelo grupo.
Atividade de reflexo 15
Vamos, para finalizar, discutir um pouco mais sobre o uso do livro didtico na
sala de aula. Para isso, pegue um livro didtico recomendado pelo PNLD (de
preferncia o que voc utiliza), selecione uma unidade e, em dupla, tente
planejar uma seqncia de atividades a partir daquelas sugeridas pelo autor
do livro e de outras que voc e seu(sua) colega considerarem importante
acrescentar. Depois, socialize o que foi planejado. Propomos que voc e
seu(sua) colega apresentem para o grande grupo a seqncia de atividades
por vocs planejada. No esqueam de anotar as sugestes dos(as) colegas.
Propomos que voc vivencie com sua turma o que foi planejado. Depois,
pense sobre as seguintes questes:
O que, da seqncia didtica elaborada por voc e seus colegas, foi ou no
realizado?
Que dificuldades voc encontrou para realizar a atividade proposta?
Como seus alunos participaram da atividade? Todos se envolveram?
Alguns tiveram dificuldades? Que dificuldades foram estas?
Voc modificaria o seu planejamento inicial para realizar novamente as
atividades? Que modificaes voc faria?
39
Bem, chegamos ao final do curso e de mais uma etapa da sua formao que, com certeza,
no terminar aqui. Esperamos que as questes discutidas ao longo de todo o curso venham
contribuir para o repensar de sua prtica pedaggica no intuito de aperfeio-la, e
desejamos que continue refletindo com seus/suas colegas sobre suas experincias de ensino
na rea de alfabetizao e de Lngua Portuguesa.
40
Referncias bibliogrficas
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ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002, pp. 13-20.
41
42
fascculo 7
Sumrio
Introduo................................................................................. 6
Unidade I
A construo do texto coletivo em sala de aula .................................
8
Relato 1 ................................................................................................. 8
Reflexo sobre lngua oral e lngua escrita no
processo de construo de textos coletivos.........................................
12
Unidade II
A monitorao na fala e na escrita ........................................................ 13
Relato 2 ................................................................................................
14
15
sobre a fala espontnea das crianas .................................... 16
18
20
21
22
23
Unidade III
Lendo histrias infantis em sala de aula ................................................ 28
Reflexo sobre atividades de leitura em sala de aula .............................. 29
Relato 3 ................................................................................................. 29
Concluindo ........................................................................................... 38
Introduo
Neste fascculo, vamos discutir modos de falar e modos de escrever, e comentar como se d a
integrao entre essas duas modalidades discursivas. Para tal, vamos retratar, em trs
momentos, o trabalho pedaggico na classe de alfabetizao de uma mesma professora em uma
escola pblica do Distrito Federal. O primeiro momento ocorreu no 4 ms do ano letivo. Nesse
momento direcionamos nossas discusses para a questo da produo textual com crianas em
fase de alfabetizao.
Em um segundo momento, que ocorreu em meados do ano letivo, trabalhamos a questo do
processo de leiturizao com as mesmas crianas, que j estavam comeando a ler e a escrever.
H ainda um 3 momento, no final do ano letivo, em que voltamos a trabalhar a produo
textual.
Neste fascculo queremos atingir os seguintes objetivos:
Objetivos:
1. refletir sobre as caractersticas do texto oral espontneo de alunos de primeira srie e do
texto escrito elaborado coletivamente em sala de aula;
2. trabalhar com regras variveis freqentes nas nossas comunidades de fala, que vo aparecer
na produo oral das crianas;
3. refletir sobre a integrao dos saberes da oralidade na
produo escrita dos alunos;
4. refletir sobre convenes da lngua escrita;
5. refletir sobre atividades de leitura e interpretao em
sala de aula.
Nesses trs momentos partimos do fato de que nossos
alunos, ao chegarem escola, j so falantes
competentes em sua lngua materna, ou seja, j tm uma
competncia comunicativa bem desenvolvida, uma vez
que j so capazes de se comunicar bem, no mbito da
famlia, em conversas com amigos, colegas, professores,
etc.
Competncia
comunicativa a
capacidade que
qualquer indivduo tem
de produzir enunciados
em sua lngua,
ajustando o seu discurso
ao interlocutor e
situao de fala. A
competncia
comunicativa inclui,
portanto, a capacidade
de formar as sentenas
da lngua e de ajustarse s normas sociais e
culturais que definem a
adequao da fala em
qualquer interao.
Unidade I
A construo do texto coletivo
em sala de aula
O Memorial JK um
monumento muito grande e
bonito construdo em
homenagem ao Presidente
Juscelino Kubitscheck,
fundador de Braslia, no Eixo
Monumental da Capital. L
h um salo nobre onde
repousam os restos mortais
do Presidente e um museu
com vrias salas onde se
encontram em exposio
objetos de seu uso pessoal e
de sua esposa, D. Sarah
Kubitscheck, bem como
documentos e objetos
oficiais da Presidncia da
Repblica no perodo de
1956 a 1960.
Relato 1
P (para uma aluna) Voc gostou do
nibus? Voc desenhou um nibus a.
P (para outro aluno) Como foi o passeio?
As crianas estavam educadas,
comportadinhas, prestando ateno?
P E voc desenhou uma bandeira!
A Professora se prepara para comear a
escrever o texto sobre o passeio.
A O passeio de ontem.
A Professora est
introduzindo as crianas
ao emprego de ttulos,
que uma conveno
da lngua escrita.
A Professora j substituiu
nome por ttulo,
que a palavra
mais adequada.
A Professora est
mostrando que a
qualquer momento
podemos apagar o que j
escrevemos e reescrever,
se acharmos um jeito
melhor de nos expressar.
Sem interromper a
atividade, a professora
agrega ao trabalho um
aluno que estava distrado.
As Fomos.
P Ento tem de colocar ns.
P Jefferson, vem aqui, eu preciso de voc.
P (Lendo o que havia escrito)
Ontem, ns, os alunos da primeira
srie da Escola Classe 29 de
Taguatinga, fomos ao passeio.
P Fomos a um passeio ou ao
passeio do aniversrio de Braslia?
P Se escrevemos que o passeio
do aniversrio de Braslia, j
explicamos o que fomos fazer.
P Samos de qu? De moto?
As De nibus.
A A primeira coisa que fomos ver
foi o Memorial JK.
Novamente a Professora
est em busca de mais
preciso e informatividade
para o texto.
10
A Professora volta a
chamar a ateno do
aluno que no est
participando.
A Professora introduz
a palavra urna e a
expresso restos mortais,
que sero incorporadas ao
texto. Tambm os ajuda a
lembrarem-se de outros
detalhes.
A Professora acolhe a
sugesto da aluna, olhando
para ela e fazendo um sinal
afirmativo com a cabea.
Mas no incorpora a
referncia ao banheiro
porque no tinha relevncia.
A Professora mostra
que preciso dar um
fecho ao texto.
JK
11
12
Unidade II
A monitorao na fala e na escrita
Estamos introduzindo
aqui o conceito de
monitorao da
linguagem. Monitorar a
linguagem quer dizer
prestar mais ateno ao
que estamos falando ou
escrevendo e cuidar mais
de um planejamento
mental em nossa
exposio.
Atividade 1
Reflexo sobre monitorao da fala
Reflita sobre sua preocupao em monitorar a prpria linguagem quando
est escrevendo e quando est falando. Em que circunstncias voc
13
Relato 2
A1 Eu quase num consegui entend o que o Chico Bento fal, ele fala muito
enrolado. Fala muito errado. Parece que ele ainda t aprendeno a fal. Acho que t
sem dente.
A2 Ele fala tudo errado mermo. Quando foi dizer olha, fal oia.
A3 Eu acho que ele ainda muito pequeno, t aprendeno a fal agora.
A4 porque ele ainda no estuda. Quando ele for pa escola, ele vai aprend a
fal bem direitim.
P Vocs observaram onde o Chico mora?
A5 Acho que ele mora numa chcara, porque tem uma floresta.
A6 Ele usa ropa de festa junina, ento ele caipira, deve mor na roa.
A7 se ele morasse na cidade ingual ns, ele usava ropa normal, ingual a nossa.
A8 ele usa chapu de paia deve de mor em fazenda. O pai dele deve s
casero.
A9 Agora entendi, ele fala assim, porque ele mora na roa. Eu tenho um tio que
tem um amigo que mora na roa e ele fala parecido o Chico.
P Ento vocs acham que a forma de falar de quem mora na roa diferente da
forma de quem mora na cidade?
A10 Claro, na roa, fala diferente da cidade, eles no tm escola.
P Mas vocs conseguiram entender a conversa do Chico com o Z Lel no filme?
Conseguiram entender a histria?
A11 Sim, at posso cont.
P Ento o que h de diferente entre a fala do Chico e a fala de vocs?
A12 Agora eu t pensando, a diferena porque ele mora na roa, fala igual as
14
Vamos agora conversar sobre o relato que acabamos de ler. Ele muito revelador da
competncia comunicativa dos alunos, de suas habilidades de tecer comentrios pertinentes
sobre o filme que assistiram e de dar respostas adequadas professora. Observe que essas
crianas de primeira srie j so capazes de discorrer sobre diferenas entre a vida na roa e a
vida na cidade. Para interpretar as caractersticas sociodemogrficas do personagem Chico
Bento, que representa a cultura rural, eles as associam a experincias que tm com chcaras,
caseiros e festas juninas. Tambm j so capazes de perceber que as diferenas na fala no
campo e nas cidades no impedem a
compreenso, e acompanham bem o raciocnio da
professora quando esta os leva a concluir que o
O Relativismo cultural uma
portugus falado em reas rurais no se
postura adotada nas
caracteriza como erro, apenas diferente do
Cincias Sociais, inclusive
na Lingstica, segundo a
portugus falado em reas urbanas. Observe que
qual
uma manifestao de
os alunos criam vrias hipteses sobre a fala de
cultura
prestigiada na
Chico Bento. Comentam que o Chico fala muito
sociedade
no
enrolado e que parece que ele est aprendendo a
intrinsecamente superior a
falar; que ele no estuda e quando for para a
outras. Quando
escola vai aprender a falar bem direitim. A
consideramos que as
professora vai acatando as hipteses e
variedades da lngua
apresentando perguntas que os levam a
portuguesa empregadas na
desenvolver o raciocnio. Aos poucos, as crianas
escrita ou usadas por
substituem os primeiros enunciados em que se
pessoas letradas quando
esto prestando ateno
pode perceber uma certa desqualificao da fala
fala
no so intrinsecamente
de Chico Bento por outros j baseados no
superiores
s variedades
Relativismo cultural.
Um deles diz: Cada pessoa fala de um jeito, se
mora na cidade fala do jeito do povo da cidade, se
mora na roa fala do jeito do povo da roa. A
essa altura, a Professora introduz duas perguntaschave: sobre o entendimento mtuo entre falantes
de variedades diferentes e sobre o juzo de valor
relativo ao certo e ao errado.
15
Atividade 2
Pesquisa de situaes comunicativas
Procure imaginar outras situaes comunicativas em que um dos falantes pode
ter dificuldade para entender bem o que o outro est falando. Converse com
seus colegas sobre esses problemas de compreenso.
Quando prestamos ateno fala dos alunos no dilogo com a professora, observamos vrias
caractersticas. Vamos comentar algumas delas. O aluno
A12 falou: e ns moramo aqui na cidade, falamo igual
Sugerimos a voc ficar
as pessoa da cidade. Veja que o som (ou melhor
atento(a) ao uso de
dizendo) o fonema /s/ foi suprimido trs vezes. Em as
plurais nos nomes, tanto
pessoa vemos que o aluno marcou o plural no artigo
em textos que voc
as mas no repetiu a marca de plural no nome
estiver lendo quanto na
pessoa. Esse uso muito freqente quando estamos
sua prpria fala e na fala
falando sem prestar muita ateno forma de nossa fala.
de seus alunos, colegas,
amigos...
Geralmente fazemos a concordncia nominal colocando
a marca de plural nos elementos que ocorrem esquerda
16
do nome; podem ser artigos (os, as, uns, umas) ou pronomes (meus, esses, aquelas, todas etc) e
deixamos de marcar o nome que vem em seguida. Se usarmos a marca de plural vrias vezes,
dizemos que estamos marcando o plural redundantemente. Se marcamos o plural s uma vez,
como fez o aluno A12, estamos optando pela marcao no-redundante. A marcao redundante
empregada na lngua escrita e na lngua oral mais monitorada. Para entender isso melhor, leia
o texto seguinte.
Texto complementar
A regra de concordncia no-redundante ocorre com mais freqncia nos
estilos no-monitorados, isto , quando no precisamos ser formais na nossa
fala, mas chega, s vezes, at mesmo, aos estilos monitorados, formais.
Por estar to generalizada na lngua,
certo que nossos alunos vo empreg-la
em seus textos escritos que, por sua
natureza, exigem a regra da concordncia
redundante prevista na gramtica
normativa. Por isso, ns, professores, temos
que ficar muito atentos ao uso da regra de
concordncia nominal na produo de
nossos alunos e na nossa prpria produo.
H duas coisas de que voc no pode se
esquecer quando lidar com esse
fenmeno:
17
O aluno A12 deixou de usar o /s/ para marcar o plural redundantemente e tambm na forma
verbal falamo. Para voc refletir mais sobre essa tendncia que temos de suprimir o /s/ que
ocorre em final de palavras, sugerimos que faa a atividade seguinte.
Atividade 3
Pesquisa sobre o emprego de palavras no plural
Preste ateno em sua prpria fala e na fala de seus alunos em diversas
circunstncias: conversas, leituras em voz alta, apresentao em sala de aula e
outras. Faa uma lista das palavras no plural que so pronunciadas sem a
marca de plural. Veja se h uma tendncia no material que voc coletou a se
marcar menos os plurais como amigo-amigos, mo-mos do que os
chamados plurais irregulares, como novo-novos, caminho-caminhes.
Observe tambm a ocorrncia de palavras plurais escritas pelos alunos sem a
marca de plural. Planeje exerccios que voc poder usar em sala de aula
para ajudar seus alunos a se lembrarem de usar a marca de plural nos nomes
quando esto escrevendo ou tm necessidade de monitorar a fala.
Vamos voltar agora ao relato 2 de sala de aula que lemos. A aluna A3 disse Eu acho que ele
ainda muito pequeno, t aprendeno a fal agora. Quando no estamos monitorando a nossa
fala, tendemos a suprimir a slaba es nas formas do verbo estar. Dizemos: Ele (es)t,
ns(es)tivemos, (es)t falando com voc. Ao escrever, os alunos tendem a suprimir tambm a
slaba que suprimem na fala. Os(as) professores(as) tm de ficar atentos(as) para essas
ocorrncias na escrita do aluno. Observem tambm que, quando suprimimos a slaba inicial
es, as formas do verbo estar ficam iguais s formas do verbo ter: (es)tiver/tiver,
(es)tivermos/tivermos, (es)tiverem/ tiverem etc. Os alunos precisam saber quando cabe
usar a forma do verbo ter e quando cabe usar a forma do verbo estar. Por exemplo:
Quando eu estiver em So Paulo, vou visitar minha v que mora l./ Se meu pai tiver
dinheiro, ns vamos viajar nas frias.
18
Atividade 4
Pesquisa sobre a supresso de fonemas em final
de palavras e o reflexo disso na escrita
Observe na sua prpria fala e na fala de seus alunos e colegas como
freqente a supresso do /r/ no final das palavras. Pea a um aluno ou a um
colega que leia um texto em voz alta para voc. V anotando as palavras
terminadas em /r/ que forem pronunciadas sem o /r/. Anote tambm as que
forem pronunciadas com o /r/. Verifique depois se houve uma maior
ocorrncia de supresso do /r/ nas formas verbais e nas palavras de mais de
uma slaba. Depois dessa observao sobre a pronncia, preste ateno aos
textos escritos pelos seus alunos e verifique se eles esto suprimindo a letra r
no final de palavras. Planeje fazer com eles um exerccio chamando a ateno
para essa letra no final de palavras.
19
No h, de fato, no Brasil
uma fronteira rgida entre
zona rural e zona urbana.
O que h um contnuo:
em uma extremidade
temos as comunidades
rurais mais isoladas; na
outra as comunidades
urbanas. Na zona
intermediria do contnuo
encontram-se reas
rurbanas. As periferias de
cidades ou distritos ligados
sede de um municpio
podem ser consideradas
regies rurbanas.
20
Atividade 5
Pesquisa sobre os antecedentes sociolingusticos
e socioculturais dos alunos
Como vimos, importante que o(a) professor(a) conhea os antecedentes
sociodemogrficos de seus alunos: onde nasceram; em que comunidade esto
sendo criados; qual a profisso dos pais; se na famlia predomina uma cultura
oral ou se combinam no mbito da famlia eventos de cultura oral e de cultura
letrada etc. Levando em conta esses tpicos e outros que voc julgar
relevantes, faa um portflio para cada aluno, com essas informaes. Pea a
eles que tragam, se puderem, cpia da certido de nascimento, e que faam
entrevistas com os pais, avs e outros parentes sobre a histria de sua famlia. A
pesquisa que fizerem poder ser apresentada oralmente e tambm por escrito.
Planeje outras atividades em sala de aula com esses textos orais e escritos dos
alunos.
Sempre que temos duas ou mais maneiras de dizermos a mesma coisa, dizemos que estamos
diante de uma regra varivel na lngua. As diferentes maneiras de dizer a mesma coisa so
chamadas variantes. Em uma regra varivel sempre h uma variante que tem mais prestgio
enquanto outras so desprestigiadas ou at
consideradas erro.
As atividades sociais so
regidas por normas,
algumas explcitas e outras
implcitas.
Um exemplo de normas
explcitas so os cdigos
processuais que definem,
entre outras coisas, como
se processa um jri em um
tribunal. J as normas
implcitas no so
consignadas em um
cdigo, mas tambm so
observadas. Em um jantar
na casa de parentes ou
amigos, por exemplo,
seguimos normas culturais
implcitas que nos informam
como devemos nos
comportar, quais as
atitudes que devemos ou
no assumir.
21
22
Os alunos falantes de
variedades lingsticas
diferentes da chamada
lngua padro, por um lado,
tm direito de dominar essa
variedade, que a esperada
e mais aceita em muitas
prticas valorizadas
socialmente; por outro lado,
tm direito tambm ao
reconhecimento de que seu
modo de falar, aprendido
com a famlia e a
comunidade, to legtimo
quanto qualquer outro e,
portanto, no pode ser
discriminado. (Fascculo 1,
pg. 53)
importante observar que nem todos os problemas que as crianas apresentam em sua escrita
podem ser explicados pelos seus hbitos de pronncia. Muitos so simplesmente conseqncia
do carter arbitrrio das convenes da lngua, isto , um mesmo fonema pode ser representado
de duas formas ou mais. Veja por exemplo o fonema /s/ que pode ser representado pelas letras
s, c, , x, z (no final de palavras) e pelos dgrafos ss, sc, s e xc. A forma de
representar o fonema /s/ em cada palavra convencionada pelas regras de ortografia, no
processo de padronizao da lngua, na elaborao dos dicionrios por exemplo.
Para que os alunos de sries iniciais reflitam sobre as convenes da ortografia, especialmente
as referentes representao do fonema /s/, desenvolva com eles atividades como esta pequena
pea de teatro que pode ser representada pelos alunos ou com fantoches.
23
Esta msica pode ser substituda por qualquer outra que fale sobre sino.
24
Letra C: Mas comigo que podemos cantar Ciranda, cirandinha vamos todos
cirandar...
Letra S: Mas comigo se escreve seleo brasileira. (Pega um microfone
improvisado e comea a narrar um jogo: Ronaldinho Gacho recebeu a bola
de Roberto Carlos, tabelou com Rivaldo. Ronaldinho est na rea, vai chutar, e
GOOOL do Brasil).
Palhao Cocoric (PC): Com as letras C e S seguidas de I e de E podemos
escrever muitas palavras, no crianas? (Volta-se para as letras) Para vocs
no brigarem mais, vamos escrever no quadro palavras com S e C seguidos de
E e I. (Vai ao quadro e o divide em quatro colunas: SE, SI, CE e CI) Agora,
crianas, vocs vo ditar para o Palhao Cocoric, as palavras para
completarmos esses quadros.
As crianas comeam a sugerir palavras, o palhao as repete e as escreve na
coluna certa. A cada palavra as letras envolvidas se movimentam. Por
exemplo, na palavra agradecer, o C abraa o E, e fazem uns passinhos de
dana, e assim sucessivamente. Quando o quadro estiver completo, o Palhao
se despede.
Palhao Cocoric (PC): (Para as crianas) Parabns crianas, com tantas
palavras aqui, o S e o C no precisam brigar mais. (Para as letras) Venham
fazer as pazes.
As letras C e S se adiantam e cantam: Pirulito que bate-bate, pirulito que j
bateu, quem gosta de mim ela, quem gosta dela sou eu.
Palhao Cocoric (PC): Ento, antes de ir embora, vamos cantar todos juntos:
Ciranda, cirandinha vamos todos cirandar...
Enquanto todos cantam, o PC rege o coro como um maestro e as quatro letras
brincam de roda.
FIM.
Bortoni-Ricardo, Stella Maris. Praler Programa de apoio leitura e escrita, MEC/
Fundescola, unidade 15 (http://www.mec.gov.br > IDEB: Saiba como melhorar >
PRALER)
Para que voc possa entender melhor a diferena entre problemas na escrita dos seus alunos
que refletem a pronncia da palavra e problemas que podem ser explicados pelo sistema
arbitrrio das convenes ortogrficas, leia o
texto seguinte:
25
Texto Complementar
Essa historinha ilustra bem a questo das interferncias da pronncia na lngua escrita, que
a primeira fonte de problemas ortogrficos que estudamos.
Como voc percebeu, o componente humorstico da piadinha est justamente na reproduo
da fala: a slaba for inicial da palavra formiga sendo reduzida a fu.
Leia agora a segunda historinha:
Uma turma de formandos resolve fazer um evento para arrecadar dinheiro para
a formatura e envia o seguinte convite:
Venha assistir um conserto de piano, sbado noite, no Clube Municipal.
Chegou o sbado e o clube estava cheio. Um aluno entrou no palco,
cumprimentou os presentes, tirou um martelinho do bolso e bateu com ele na
26
Estamos a diante de uma trapalhada criada, intencionalmente, pelo fato de que o som /s/
pode ser representado, entre outras, pela letra s e pela letra c. Problemas como esse
esto includos no que consideramos uma segunda fonte de problemas de ortografia: a
arbitrariedade das normas ortogrficas.
O domnio da ortografia gradual, lento, demorado. Quanto mais oportunidades temos de
observar a lngua escrita, refletindo sobre suas caractersticas, mais domnio vamos
adquirindo sobre as convenes que a regem. As crianas levam muito tempo para
automatizar as regras ortogrficas. Seu domnio dessas convenes s vai se consolidar
depois que tiverem muito contato com os textos escritos.
27
Unidade III
Lendo histrias infantis em sala de aula
28
Vamos, agora, perceber, passo a passo, o processo interacional construdo pela professora e
como dessa interao resulta uma interpretao adequada do texto.
A professora inicia a aula escrevendo um provrbio no quadro: O tempo o melhor remdio.
Passa a discutir com a turma o significado do provrbio. Em seguida convida os alunos a
sentarem-se no tapete da sala, sem sapatos. Comea a falar sobre o ttulo da histria e relaciona
esse ttulo com a discusso anterior, mostrando que Maria vai com as outras um provrbio
tambm. Na seqncia, mostra o livro e fala sobre a autora dizendo:
Relato 3
P J veio histria dela aqui, a Slvia Orthoff. (Comea a narrativa, pega uma
ovelha de feltro e mostra. Em seguida diz:) esta uma histria de uma... (
mostra a ovelha)
As Uma ovelha.
P Agora eu quero um pra ler o ttulo da histria
As Eu, eu... (Escolhe um aluno que l o ttulo)
P (lendo) Maria vai com as Outras- Slvia Orthoff- Editora tica, que que isso,
uma editora?
P aonde a Slvia Ortoff entregou o livro dela pra eles fazerem os desenhos e
as letras.
(A professora, ento, inicia a leitura e faz a leitura integral do texto. Em seguida,
recomea a leitura, enfatizando os aspectos cruciais para a compreenso,
29
30
Agora, vamos analisar como ocorreu a construo da leitura desse texto em sala de aula. Pelo
relato acima, ficou evidenciado o empenho desta professora em tornar o ato de leitura algo
prazeroso e, principalmente, algo que faz sentido para seus alunos.
Para tal, vamos discutir um pouco sobre o que ler e, em seguida, analisar como este processo
ocorreu.
Como voc j deve ter percebido, para que se obtenha sucesso em uma aula de leitura,
fundamental que o texto lido faa sentido, que seus alunos o compreendam, sendo capazes de
perceber as intenes do autor, entender seus pontos de vista e, at, adivinhar as
possibilidades de desfecho para um determinado texto, entre outros.
Para que estes aspectos da leitura sejam ativados, necessrio que se compreenda uma srie de
componentes do texto, alm daquilo que est escrito na sua superfcie. preciso que o alunoleitor no entenda apenas as palavras que compem o texto, mas que perceba o contexto em
que ele est inserido, o gnero textual, com suas caractersticas e formas especficas, as
intenes do produtor do texto e as informaes implcitas que o texto nos d, bem como as
marcas de outros textos nele inseridos, entre outros.
Para compreender os passos utilizados pela professora na construo da leitura de Maria vai
com as outras, temos que refletir sobre as dimenses que compem o texto:
31
Essa a primeira referncia ao contexto. A professora mostra que j h uma familiaridade das
crianas com a autora: j veio histria dela aqui e mostra turma o que uma ovelha. Este
aspecto importantssimo na compreenso do texto. Para a maioria das crianas,
principalmente as que residem em zona urbana, ovelha um animal desconhecido, ausente,
portanto, de suas experincias de vida. Observe, outrossim, como a professora interage com as
crianas, levando-as a serem co-autoras no processo de construo da leitura:
P agora eu quero um pra ler o ttulo da histria
As eu, eu... (Escolhe um aluno que l o ttulo)
P (lendo) Maria vai com as Outras Slvia Orthoff Editora tica, que isso, uma
editora?
P aonde a Slvia Ortoff entregou o livro dela pra eles fazerem os desenhos e as
letras.
A leitura do ttulo, seguida das referncias autora e Editora, caracterizam-se como mais uma
estratgia de contextualizao da leitura. Nesse momento as crianas percebem, por exemplo,
que a ovelha se chama Maria e que o livro foi escrito pela Slvia Orthoff, mas organizado, com
as letras e as gravuras, pela Editora. Observe, tambm, a participao constante da criana na
leitura.
32
P Um dia as ovelhas foram para o Plo Sul. O Plo Sul onde? Em cima ou
embaixo? (faz gestos indicando).
P Ser que eu leio histrias aqui s para me divertir? Para que ser que eu
escolhi Maria vai com as outras?
P A senhora leu essa histria para a gente aprender que se as pessoas tiverem
fazendo coisa errada para a gente no imitar.
P O Gabriel Carvalho falou que eu trouxe a histria aqui para mostrar, para
ilustrar que a gente no deve imitar as coisas erradas.
33
2.2. Coerncia:
Para um texto ser coerente, necessrio que os elementos responsveis pela sua progresso
temtica estejam de tal forma organizados que possamos perceber, de forma clara, o
desenvolvimento desse tema em uma seqncia lgica, com comeo, meio e fim. necessrio,
tambm, que o texto se estruture dentro do gnero proposto. Quando evidenciamos esses
elementos bem articulados no texto, dizemos que h coerncia, posto que tal texto possui uma
organizao interna que permite sua compreenso.
A professora teve um cuidado especial em demonstrar essa progresso temtica, enfatizando os
recursos que estruturaram sua organizao interna, como a repetio e a seqenciao. Observe
a forma como ela solicita aos alunos que complementem as informaes, enfatizando essa
estrutura da repetio, que o recurso utilizado pela autora para reforar o fato de que tudo o
que as ovelhas faziam, Maria fazia tambm. Alm disso, importante que percebamos como
ela constri um ambiente interacional extremamente propcio leitura, incentivando, inclusive,
seus alunos a complementarem diversas passagens no texto:
P Onde as ovelhas iam... Maria ia tambm...
P As ovelhas iam pra cima...
As Maria ia pra cima...
P Maria ia sempre com as...
As outras.
P Quando todas as ovelhas comiam jil...
As Maria comia tambm.
Implcito: o que no
falado abertamente, mas
que se levado a
perceber pelas pistas
que o texto nos d.
34
Como podemos fazer, portanto, a leitura do que est implcito, como complemento do que est
explcito? Para tal, necessrio que, a partir das pistas que o texto nos d, ns sejamos capazes
de perceber outras informaes que completam o sentido do texto, ou seja, ns temos que ativar
a nossa capacidade inferencial.
E o que seria essa capacidade inferencial?
Vejamos um exemplo: voc convidado(a) a ir casa de uma amiga. Embora esteja quente,
chegando l, a casa encontra-se com todas as janelas e portas fechadas. Voc, sentindo-se
incomodado(a), diz: Como est abafado hoje, como tem feito calor, n? Na verdade, voc
espera que sua amiga abra as janelas, ou seja, pratique a ao esperada por voc e no apenas
concorde com voc, dizendo tambm que est abafado. Se ela fizer a ao de abrir janelas ou
portas, ela ter feito uma leitura inferencial do que voc disse, ou seja, ela ter feito uma leitura
de suas intenes que estavam implcitas no dilogo.
No presente texto, a professora criou, em vrios momentos, perguntas cujas respostas no esto
explcitas no texto. Perguntar como ser a reao a certos fenmenos uma maneira de se fazer
inferncias, principalmente considerando a pouca idade das crianas, pois as ajuda a entender
quais as conseqncias negativas de se imitar os outros:
P Maria pegou gripe. Como que elas faziam?
As Atchim!
P Retomando a leitura: Maria suspirou. Como que suspirar? (Os alunos
suspiram).
No decorrer da leitura, a professora constri outras perguntas inferenciais, que objetivam levar
o aluno a perceber a questo central da histria, qual seja, a de que imitar os outros nem sempre
traz bons resultados. Observe como os alunos conseguem inferir adequadamente:
P (lendo) Um dia, todas as ovelhas resolveram comer salada de jil. Maria
detestava jil. Mas, como todas as ovelhas comiam jil, Maria comia tambm.
Que horror! Foi quando, de repente, Maria pensou: Se eu no gosto de jil, por
que que eu tenho que comer salada de jil? O que vocs acham disso?
A Era porque ela ficava fazendo tudo que as outras fazia...
35
aquela criana captasse, de forma to rpida, a principal inferncia que o texto fazia. Naquele
momento, a professora teve a garantia de que o texto realmente foi compreendido, ou seja, de
que houve, realmente, um processo de leiturizao.
Atividade 7
Reflexo sobre as dimenses de um texto
Agora, voc ir construir a sua aula de leitura, considerando todos os aspectos
discutidos acima:
1. O contexto
2. O texto
3. O infratexto
4. O intertexto
No deixe tambm de
E, alm de trabalhar todas essas
planejar em que momento do
dimenses, procure refletir sobre quais
dia vai desenvolver esta
as possibilidades de interao que voc
atividade. Se for preciso, volte
ir promover com seus alunos, com o
ao Fascculo 3, onde tratamos
intuito de:
da importncia do
1. lev-los a se interessar pela leitura;
planejamento.
2. aumentar sua auto-estima e
confiana ao responder s perguntas;
3. fazer deles co-participantes da leitura;
4. lev-los a produzirem um texto sobre a histria lida.
36
Vamos ao texto:
A fada do teatro
ANA BEATRIZ MAGNO (da equipe do Correio). Correio Brasiliense. Caderno Super.
2 de abril de 2005. Trs.
Era uma vez uma menina que queria ser artista. No uma artista como essas
que aparecem na televiso e no cinema.
Maria Clara Machado queria inventar histrias. No histria de livro como as
que seu pai, o escritor Anbal Machado, costumava escrever.
Ela queria contar histria de carne e osso, com personagem que se mexe na
frente de nossos olhos.
Leu sobre vrias profisses e descobriu que s uma capaz de tal magia: a do
teatrlogo, profissional que cria peas de teatro.
Maria Clara Machado foi a maior teatrloga infantil brasileira. Escreveu mais de
30 peas, criou mais de cem personagens e ganhou uma montanha de
prmios.
O segredo para conseguir tudo isso Maria Clara descobriu ainda pequena: a
leitura. A leitura acende o pensamento. S escreve bem, quem l muito desde
criancinha.
Maria Clara Machado tinha 29 anos quando resolveu ir estudar em Paris, a
capital mundial da arte. Voltou para o Brasil cheia de idias.
Em 1955, criou a pea Pluft, o fantasminha, histria engraada de um fantasma
que tinha medo de menino.
Maria Clara era assim: gostava de inverter a ordem das coisas, de bagunar os
medos e as crenas da gente.
Por isso, depois do fantasma medroso, veio A bruxinha que era boa e tantos
outros personagens sados da cachola de Maria Clara.
O personagem que ela mais gostava era o Vicente, o menino pobre da pea
Cavalinho Azul, um garoto pobre que carrega a gente para o mais rico dos
mundos: o da imaginao.
Maria Clara Machado tinha alma de professora. Em 1952, criou O Tablado,
escola de teatro que formou um monte de atores que hoje so famosos, como
a Marieta Severo, a Cludia Abreu, a Regina Cas, a Malu Mader e a Luclia
Santos.
Seus alunos a chamavam de Fada Madrinha. Eles tinham razo. A teatrloga
de sorriso largo morreu de cncer aos 80 anos, em 2001, mas at hoje sua
varinha de condo faz milagres: acende a alma da platia.
37
Concluindo
38
Referncias bibliogrficas
BAGNO, Marcos. A lngua de Eullia: novela sociolingstica. So Paulo: Contexto,
1997.
BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Educao em lngua materna: a sociolingstica
na sala de aula. So Paulo: Parbola Editorial, 2004.
BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Ns cheguemu na escola e agora?
Sociolingstica e educao. So Paulo: Parbola Editorial, 2005.
DELLISOLA, Regina L.P. Leitura: Inferncias e contexto sociocultural. Belo Horizonte:
Universitria, 2004.
KATO, Mary. A. No mundo da escrita. So Paulo: tica, 1993.
KLEIMAN, Angela B. Oficina da leitura. Teoria e prtica. Campinas: Pontes, 1993.
KOCH, Ingedore G. V. Introduo lingstica textual. So Paulo: Martins Fontes,
2004.
MOLLICA, Maria Ceclia. Da linguagem coloquial escrita padro. Rio de Janeiro:
7Letras, 2003.
MORAIS, Arthur Gomes de (org.) O Aprendizado da ortografia. Belo Horizonte:
Autntica, 2000.
ORTHOFF, Sylvia. Maria vai com as outras. So Paulo: tica, 1982.
39
fascculo complementar
Sumrio
Introduo................................................................................. 7
Unidade I
Atividades relacionadas identidade: possveis contribuies
ao desenvovimento lingstico, afetivo e social do aluno ..................
11
13
15
18
19
Unidade II
A contribuio da leitura na formao lingstica
do aluno e na sua constituio como sujeito leitor ............................. 21
2.1 Estratgias de leitura ........................................................................
2.2 Ler para qu? ...................................................................................
2.3 A leitura como processo compartilhado de produo de sentido .......
2.4 Articulaes da leitura com oralidade ...............................................
Sntese da unidade ................................................................................
21
24
26
28
30
Unidade III
Textos de alfabetizandos: uma reflexo
sobre os fatores discursivos e lingsticos .............................................. 31
3.1 A produo de textos na fase inicial da alfabetizao ......................
31
3.2 A estrutura narrativa .......................................................................... 33
3.3 Produo de textos nas sries iniciais: uma possibilidade de anlise
dos fatores textuais e contextuais ...........................................................
34
36
39
41
Concluso ............................................................................................... 42
Referncias bibliogrficas ................................................................ 43
Introduo
Professor(a):
Neste fascculo, a partir de relatos sobre ao pedaggica desenvolvida com o tema Histria de
Vida, voc ter a oportunidade de refletir sobre questes relacionadas ao processo de ensino e
aprendizagem da lngua escrita, nas sries ou ciclos iniciais
do Ensino Fundamental. Tais relatos foram produzidos
por professoras que atuam nessa modalidade de ensino,
em escola comunitria1 da cidade de Ponta Grossa No fascculo 1 vimos que
PR, as quais se dispuseram a compartilhar sua prtica
O desafio que se coloca
com voc e com os demais professores que esto
para os primeiros anos da
participando deste processo de formao continuada.
Educao Fundamental
Dentre os objetivos que embasaram o fazer pedaggico
o de conciliar esses dois
das mencionadas professoras, destacam-se dois: a)
processos, assegurando
realimentar constantemente o processo pelo qual os
aos alunos a apropriao
alunos chegam compreenso do funcionamento do
do sistema alfabticosistema alfabtico de escrita; b) oportunizar a toda a
ortogrfico e condies
classe a vivncia da lngua oral e escrita como prtica
possibilitadoras do uso da
discursiva que se manifesta por meio de textos de
lngua nas prticas sociais
diferentes gneros.
de leitura e escrita.
Portanto, o trabalho relatado assim como a proposta
de estudo que apresentamos est fundamentado na
concepo interacionista, que assume a linguagem em sua funo discursiva, ou seja, como
linguagem em ao, cujo sentido depende de certas condies de produo, especificadas no
decorrer deste fascculo. Apiam-se, pois, em uma concepo de alfabetizao na qual se
reconhece a necessidade e a importncia da apropriao do sistema alfabtico de escrita, para
que ele seja utilizado em prticas sociais cotidianas de leitura e de escrita.
Assim, numa perspectiva dialgica, interativa, que propomos compartilhar com voc reflexes,
experincias e conhecimentos, com vistas a atingir os objetivos a seguir.
Objetivos gerais
Constatar a necessidade e a importncia de uma ao pedaggica que, nas sries ou ciclos
iniciais, possibilite a todas as crianas a participao em prticas sociais de letramento.
Refletir sobre diferentes possibilidades de ao pedaggica com o sistema de escrita, a partir
de contextos significativos de uso desse sistema.
Identificar a leitura como processo em que, mediados pelo professor, os alunos atuam como
Voc ver que, no decorrer do fascculo, vrios discursos se entrecruzam: o dos diversos
autores que fundamentam o texto; o das professoras de 1 a 4 srie, ao relatarem suas
experincias pedaggicas; o dos alunos, presente de forma implcita nos relatos docentes; o
meu, fruto de pesquisas e de anos de vivncia em turmas de 1 a 4 srie; e o seu, enquanto
professor(a) que vem a cada dia consolidando sua prtica docente e que, por isso, tem muito a
contribuir neste estudo.
Os relatos vm acompanhados de tpicos cuja finalidade possibilitar-lhe uma reflexo sobre
os contedos trabalhados e a devida articulao entre teoria e prtica. Cada unidade, que
fechada com um pargrafo sntese, apresenta questes para que voc faa uma auto-avaliao
sobre a reflexo realizada.
Unidade I
Atividades relacionadas identidade:
possveis contribuies ao desenvolvimento
lingstico, afetivo e social do aluno
Voc j observou que a primeira palavra que geralmente os alunos desejam aprender a ler e
escrever o prprio nome? Talvez isso acontea porque eles sentem o nome como algo
realmente seu, algo que faz parte de sua histria pessoal. Por isso nada mais natural que, na 1
srie ou ciclo e, de modo especial, no trabalho com o tema Histria de Vida, propor-se aos
alunos uma apresentao e, depois, usar a leitura e a escrita do nome como um primeiro passo
para seu ingresso deles no mundo alfabetizado (ou para assegurar a participao deles nesse
mundo), como mostra a professora Karine, de 1 srie, a seguir:
Relato 1:
Vrias questes pontuadas pela professora Karine podem servir de base para sua reflexo. Por
exemplo: ao fazer aos alunos uma pergunta simples o que poderiam fazer para lembrar de
todos os nomes ela desafiou-os a refletir e a perceber que o registro escrito seria a nica
maneira de no se esquecerem dos nomes. Alm de criar naquele momento uma necessidade
real para a escrita dos nomes, a professora oportunizou s crianas vivenciarem a funo social
da escrita e entend-la enquanto registro que pode extrapolar o tempo e o espao. Por outro
10
Saiba mais
Por meio das muitas atividades que podem ser realizadas com os nomes, os alunos so
incentivados a ler e a escrever, individualmente e em grupos, ainda que no o faam da forma
convencional. Por isso e pelo fato de o nome constituir uma palavra-texto, j que geralmente se
apresenta carregado de significado (por estar ligado histria de vida de cada um), tambm nas
sries subseqentes ele oferece a professores(as) e alunos ricas possibilidades de trabalho com
a lngua escrita, como mostra a professora Brbara, de 2 srie:
Relato 2:
[...] Embora soubesse que a maioria dos alunos
j se conhecia e que todos sabiam escrever
seus nomes, propus a eles uma apresentao
Vimos no Fascculo 4 a
um pouco diferente: cada aluno apresentouimportncia do domnio
se aos colegas dando-lhes dicas sobre seu
de convenes dentre
nome, como, por exemplo: Meu nome
as quais a ordem
comea com a letra M e tem trs slabas e
alfabtica para
sete letras (Marcelo). Que nome esse? A
o uso do dicionrio.
seguir, propus s crianas que fizssemos um
cartaz, que poderia ser ilustrado, com todos os
nomes, escritos em ordem alfabtica. Depois
de explicado aos alunos esse tipo de texto, o cartaz foi elaborado
coletivamente e afixado na sala. Outras atividades foram tambm
desenvolvidas com os nomes dos alunos, destacando-se dentre elas as de
diviso e constituio silbica, composio e decomposio de palavras.
11
Alm de abrir as portas para as interaes que acontecem no dia-a-dia, os nomes possibilitam
diferentes aes lingsticas, principalmente no que diz respeito apropriao do sistema
alfabtico de escrita. No caso de os nomes serem utilizados para o trabalho silbico e, por
conseqncia, para o estabelecimento de relaes entre a fala e a escrita, eles permitem mostrar
s crianas os vrios tipos de slabas, desfazendo assim a hiptese formulada por muitas
crianas, de que as slabas so sempre formadas por consoante + vogal (hiptese essa
decorrente da priorizao, por algumas cartilhas e professores, do trabalho com palavras como
bola, pato, vov). Ao observarem diferentes formaes silbicas, os alunos podero constatar,
com a mediao do(a) professor(a), que todas as slabas contm vogal, o que lhes permitir
perceber que a vogal constitui base silbica. Podero, ainda, usar as diferentes slabas para
formar outras palavras do seu universo vocabular, constatando que com as 26 letras do alfabeto
e um determinado nmero de combinaes silbicas possvel registrar todas as palavras da
lngua (princpio da economia lingstica).
Assim como fez a professora Brbara, planeje com seus alunos a produo de
um cartaz. Reflita com eles sobre tal tipo de texto, a fim de que possam
identificar caractersticas desse gnero textual. Depois de comentar com
colegas a prtica desenvolvida, registre-a. importante que, nesse registro,
voc explicite as questes refletidas com os alunos e indique se eles atingiram
os objetivos propostos para a produo citada.
Dando continuidade ao seu relato, a professora Brbara comenta um fato ocorrido em momento
de interao oral com os alunos.
Relato 3:
[...] Dado o interesse dos alunos pelo assunto, perguntei a eles se sabiam quem
havia escolhido o seu nome e como foi feita essa escolha. Essa pergunta
provocou acalorada conversa: muitos alunos queriam falar e ao mesmo
tempo, o que gerou um certo tumulto na sala. Sem nenhum comentrio, liguei
o gravador e fiquei observando os alunos. Eles ficaram surpresos, ao ouvir a
gravao. Passados alguns minutos, perguntei-lhes: D para entender quando
todo mundo fala ao mesmo tempo? A resposta de todos foi um sonoro
NO!. Aproveitei ento o momento para explicar aos alunos que o ouvir
imprescindvel no processo comunicativo e que escutar o outro constitui,
tambm, uma questo de respeito e boa educao.
A atividade de ouvir faz parte da competncia comunicativa do falante, uma vez que possibilita
a ele entender o que o outro diz e, assim, participar do processo interlocutivo. Tal participao
permite, entre outras coisas, que os alunos ampliem seu repertrio vocabular e aprendam a
expor suas idias, usando argumentos para defend-las. Todavia, h momentos em que eles
extrapolam seu direito de falar, como aconteceu na situao relatada. o caso, ento, de o
professor intervir e reorientar o processo de interao na sala de aula, em uma postura no
12
repressiva, mas firme e esclarecedora, que mostre aos alunos no s a funo interativa do saber
ouvir quem fala como tambm a necessidade de observncia das regras sociais que definem o
comportamento do ouvinte diante dos que falam.
Saiba mais
Os Parmetros Curriculares Nacionais de Lngua Portuguesa (BRASIL, 1997)
propiciam aos professores do Ensino Fundamental interessante reflexo sobre a
lngua oral, seus usos e formas. Tambm Antunes (2004), dentre outros autores,
compartilha com os leitores reflexes e atividades pedaggicas que
oportunizam, em sala de aula, o exerccio fluente da linguagem oral e da
linguagem escrita.
Como voc pde notar pelo relato 3, a maioria dos alunos gosta de participar das atividades que
envolvem a oralidade. Todavia, h aqueles que preferem isolar-se no seu canto e permanecer
no habitual mutismo, quando se trata de expor a um pblico maior o que pensam ou sentem. E
isso acontece, muitas vezes, porque sua maneira de falar criticada, vista como errada,
pelos colegas ou at mesmo pelo prprio professor. O relato a seguir, tambm da professora
Brbara, mostra uma situao de limitada participao de alunos em atividades orais, ao mesmo
tempo em que aponta possibilidade de ao pedaggica quanto questo das variedades
lingsticas:
Relato 4:
Por outro lado, observei que alguns alunos aqueles que provm de classe
scio-econmica desprestigiada participaram com relutncia da atividade,
como se no gostassem ou tivessem receio de falar. Em todas as atividades
que envolvem a oralidade acontece a mesma coisa, apesar de eu incentivlos sempre a falar. Tenho explicado classe que, nas interaes dirias,
comum a utilizao de variados dialetos, os quais atendem a diferentes
propsitos comunicativos, e desenvolvido uma prtica que mostra aos alunos o
emprego dessas variedades lingsticas nos diversos contextos de uso. Mas,
mesmo assim, os resultados do meu trabalho me parecem um tanto lentos.
13
Saiba mais
A Sociolingstica cincia que trata das relaes entre linguagem e
sociedade vem mostrando que no existem falas certas ou erradas,
superiores ou inferiores: h falares adequados aos diferentes propsitos
comunicativos e aos diferentes contextos de uso da linguagem. Para ampliar
seus conhecimentos sobre o assunto, leia a obra Linguagem e escola: uma
perspectiva social, da professora Magda Soares (1991).
14
Enquanto atividade humana, a linguagem tem uma dimenso histrica e social que atribui a ela
diferentes funes. O relato a seguir, da professora Maria Lcia (tambm de 2 srie) evidencia
o uso, certamente prazeroso para os alunos, da linguagem em sua funo ldica e sonora, como
voc pode constatar:
Relato 5:
15
Saiba mais
Na srie ou ciclo inicial, em maior ou menor escala, as crianas apropriam-se
das caractersticas lingsticas que diferenciam a linguagem escrita da
linguagem falada. Mesmo tendo conquistado a base alfabtica, essa
apropriao continua acontecendo: nas sries ou ciclos subseqentes, passam
a eleger outros aspectos para observao e anlise, na busca por
compreenderem o funcionamento da lngua. Da a importncia de o(a)
professor(a) continuar trabalhando com textos que, por serem prazerosos,
incitam os alunos a realizar anlises cada vez mais elaboradas sobre as
relaes entre a fala e a escrita.
Relato 6:
Iniciei o trabalho com o projeto Histria de Vida
perguntando aos alunos Quem so vocs?
Como vocs se vem?. A meu ver, instigados
por essas perguntas, eles se expressariam
livremente, compartilhando informaes sobre
si mesmos. Seria uma maneira de todos,
professora e alunos, nos conhecermos um
pouco mais. Foram momentos de rica
interao, em que as crianas se expuseram
com a sinceridade e a autenticidade que lhes
so prprias.
16
J tratamos da
avaliao diagnstica
no Fascculo 2. Vimos
que: Quando se
acompanha de perto
um processo de
aprendizagem, passo a
passo, (...) criam-se
oportunidades de
alterar a rota traada,
propor outras formas de
organizao dos
alunos, outras aes ou
estratgias de ensino.
Pode-se, enfim,
replanejar as metas de
ensino e corrigir aes
inadequadas.
O que voc entende por avaliao diagnstica? Aps trocar idias com
colegas sobre o assunto, planejem e desenvolvam em suas turmas algumas
atividades por meio das quais possam levantar um diagnstico de seus alunos,
no aspecto psicolgico e/ou cognitivo. (Se necessrio, retome o fascculo 01).
Depois de comentar com o grupo os resultados dessa ao pedaggica,
registre suas impresses sobre ela.
Saiba mais
De acordo com Jobim e Souza (1995), por meio da linguagem juntando
palavra e emoo que a criana no s anuncia o sonho e a esperana,
como desvela seus medos, inseguranas e frustraes. Essa forma de
intersubjetividade, abordada por Vygotsky (1991), tem sido enfatizada
especialmente pela autora citada (1995) e por Kramer (1993).
17
Relato 7:
[...] propus aos alunos que preenchessem uma ficha de identificao com seu
nome, data de nascimento, altura, peso, cor dos olhos, cor dos cabelos,
brincadeiras e comidas preferidas, locais onde gostam de passear e o que
gostam de fazer nas horas vagas. Depois, pedi a cada aluno que trocasse sua
ficha com a do colega ao lado. Cada um deveria fazer cuidadosa leitura da
ficha do outro, expressando sua opinio sobre as informaes registradas. A
seguir, aproveitando informaes contidas nas fichas, os alunos organizaramse e fizeram um levantamento da altura e peso de toda a classe. Sob minha
orientao, elaboraram grficos de colunas, com os dados coletados. Com
base nesses grficos, foram criadas situaes-problema que foram lidas,
discutidas, interpretadas e resolvidas pelos alunos.
18
Saiba mais
Alm de orientarem o aluno quanto s estruturas textuais, as atividades
controladas, de preenchimento, contribuem para a aprendizagem das
convenes ortogrficas. Mas, cuidado: esse tipo de esquema de produo
textual pode gerar dependncia do aluno, se for utilizado com muita
freqncia.
Como voc certamente tem percebido, as prticas da leitura e da produo de textos, que
envolvem a oralidade e o conhecimento do sistema alfabtico de escrita, se entrecruzam em
todos os instantes. Apesar de reconhecer que, em termos do uso lingstico, no d para separar
essas prticas, neste fascculo visando a uma melhor organizao dos momentos reflexivos
elas sero enfocadas tambm em unidades especficas. Assim, dando continuidade reflexo
ora iniciada, cuja sntese voc ver a seguir, na prxima unidade os relatos e decorrentes
momentos reflexivos estaro centrados na leitura, prtica dialgica hoje entendida
essencialmente como espao de produo de sentido.
Sntese da unidade
Estes conceitos
fundamentais podem ser
consultados nos verbetes
do Fascculo 1, onde
vimos que no se trata
de escolher entre
alfabetizar ou letrar; tratase de alfabetizar
letrando.
Portanto, vivenciando essas prticas em sala de aula, ainda que no saiba ler e escrever da
forma convencional, que o aluno apropria-se, gradativamente, do sistema de escrita, em um
processo que supe situaes de aprendizagem que o levem a refletir sobre as hipteses que
19
20
Unidade II
A contribuio da leitura na formao
lingstica do aluno e na sua constituio
como sujeito leitor
Para Soares (1998), dentre outras habilidades/capacidades, a leitura inclui as de fazer previses
sobre o texto, de construir significado combinando conhecimento prvio e informao textual,
de refletir sobre o significado do que foi lido e tirar concluses sobre o assunto enfocado. Por
outro lado, essas habilidades/capacidades so desenvolvidas medida que o leitor, no ato de
ler, faz uso das chamadas estratgias de leitura. Considerando a necessidade de que voc
reconhea a importncia que as estratgias de leitura tm no processo de construo de sentido
do texto e a necessidade de o (a) professor(a) desenvolver uma prtica em que elas sejam
contempladas, proponho-lhe que leia o relato a seguir, referente a uma prtica de leitura
desenvolvida pela professora Sandra, em turma de 4 srie:
Relato 8:
Em uma das atividades desenvolvidas com o
tema Histria de Vida, os alunos falavam
sobre coisas de que eu gosto e coisas de que
no gosto, quando um deles comentou que
no gostava de ter medo. Diante da pergunta
Medo de qu?, o menino respondeu: Ora,
medo de assombrao. Estava instaurada a
polmica: algumas crianas afirmavam que
assombrao no existe, outras queriam contar
21
A COISA
Ruth Rocha
22
2
Linguagem conotativa aquela em que as palavras apresentam um sentido figurado,
subjetivo, relacionado a determinado contexto e s experincias de cada um.
23
Entendendo-se que a leitura precisa ter sentido para os alunos, a indagao Ler este texto para
qu? precisa ser objeto de reflexo em sala de aula. Ao fazer essa pergunta, o professor levar
os alunos a perceberem no s as diversas intenes que esto por trs dos textos lidos, como
tambm o fato de que diferentes intenes implicam diferentes formas de escrever, diferentes
gneros textuais.
O relato a seguir da professora Neuza, de 3 srie mostra que, na escola, possvel trabalhar
com diferentes gneros de textos e mostrar para os alunos o para que desse trabalho:
Relato 9:
Depois de ressaltar que o nome como uma marca de cada pessoa, pois
serve para sua identificao, perguntei aos alunos se conheciam mais alguma
coisa que pudesse identific-los. Como eles no acertassem a resposta, conteilhes que algumas linhas que temos na pele da ponta dos dedos tambm
servem para nos identificar. Diante da sua surpresa, afirmei que poderiam
entender melhor essa questo aps a leitura do texto a seguir.
Impresso digital
A impresso digital uma marca de identificao das pessoas. Na pele da
ponta dos dedos de cada um h linhas que formam um desenho nico,
diferente para cada pessoa. Por isso esse desenho, a impresso digital,
pode ser usado para a identificao.
comum, em filmes policiais, assistirmos a detetives descobrindo a autoria
de um crime atravs da anlise de objetos tocados pelo suspeito. Isso s
possvel porque na pele h uma camada de suor e leos que imprime a
marca da impresso digital naquilo que tocamos. Segure um copo limpo
durante alguns segundos. Depois, observe-o contra a luz. Voc poder ver
as marcas que seus dedos deixaram.
VVIO, C. L. (coord.). Viver, aprender: educao de jovens e adultos (Livro 1).
So Paulo: Ao Educativa; Braslia: MEC, 1998, p. 34.
Deixei claro para as crianas que essa leitura traria a elas mais informaes
sobre o assunto. Chamei a sua ateno para o fato de que, apesar de o texto
ser predominantemente informativo, no final ele contm um pargrafo
instrucional, com o qual o autor visa ensinar alguma coisa ao leitor. Pedi aos
alunos que lessem com bastante ateno o texto, para ficarem cientes de
todas as informaes e instrues nele contidas sobre o assunto indicado no
ttulo. Depois que o texto foi lido e discutido, propus s crianas a leitura do
texto Coletando impresses digitais, produzido com a inteno de ensinar o
leitor a coletar suas impresses digitais. importante destacar que, no decorrer
das duas leituras, as crianas foram incentivadas a fazer uso das estratgias de
leitura, principalmente das de previso e inferncia.
24
O ato de ler supe uma certa experincia textual, como o contato e a familiaridade com
diferentes gneros e estruturas textuais, de forma que o aluno perceba que ler um texto
informativo diferente de ler uma instruo, ler uma notcia diferente de ler uma histria, e
assim por diante. Os gneros textuais constituem, como
voc viu na unidade anterior, tipos especficos de textos
que se caracterizam por determinado contedo temtico,
por certa estrutura ou forma de composio (narrativa,
Esta discusso reitera
descritiva, dissertativa, instrucional, etc.) e por um estilo
algumas questes j
especfico (ligado escolha e uso da linguagem).
apontadas no
fascculo 4, no item
Para fazer do aluno um leitor, a escola deve oportunizar-lhe
Leitura na Escola.
condies de vivenciar, desde a alfabetizao, a
funcionalidade de cada gnero e da prpria linguagem
escrita. Foi o que aconteceu com os alunos da professora
Neuza, que entenderam por que estavam lendo um e, depois, o outro texto. Compreenderam,
inclusive, o seu papel enquanto sujeitos-leitores: prestar ateno na leitura, identificar as
informaes, reconhecer os enunciados instrucionais (principalmente, pelo uso do modo
imperativo: segure, observe, esfregue...) e descobrir a inteno do autor, ao escrever os dois
textos.
25
Saiba mais
A pseudoleitura uma leitura simulada que muitas vezes se transforma em
pesquisa para o aluno, que tenta relacionar os smbolos grficos com os
smbolos da fala. Essa simulao favorece a ele a observao de certas
caractersticas da escrita, tais como o traado das letras, as semelhanas e
diferenas que elas apresentam, a sua posio nas palavras.
Como voc pde observar nas prticas de leitura relatadas, ela precisa ser trabalhada em sala de
aula como um processo compartilhado entre professor(a) e alunos, principalmente nas sries ou
ciclos iniciais, como mostra a professora Cleusa, de 4 srie:
Relato 10:
[...] Em outro momento, li para a classe o poema
Nome da Gente, de Pedro Bandeira:
Eu no gosto do meu nome,
no fui eu quem escolheu.
Eu no sei porque se metem
Com um nome que s meu.
O nenm que vai nascer
Vai chamar como o padrinho,
Vai chamar como o vov,
Mas ningum vai perguntar
O que pensa o coitadinho.
26
Troque idias com colegas sobre a prtica que vm realizando com poemas: o
que vocs consideram relevante trabalhar nesse gnero textual? Como
explorar a sonoridade potica? Planejem, juntos, uma ao pedaggica com
esse tipo de texto, desenvolvam-na em suas turmas e, depois, por escrito,
comentem o resultado do seu trabalho.
Saiba mais
De acordo com Cademartori (1987), as parlendas (do tipo Dedo mindinho,
Cad o toicinho daqui?), assim como as cantigas de ninar e de roda,
constituem uma preparao para a sensibilidade verbal que a poesia requer.
recomendvel, pois, que sejam utilizadas em sala de aula tambm com
essa funo.
27
Ao ser experienciada como uma prtica em que professor e alunos trocam idias sobre o texto,
compartilhando significados e sentidos, a leitura possibilita ricas situaes de oralidade. Foi o
que aconteceu no trabalho com o texto Nome de Gente, o qual, segundo a professora Cleusa,
provocou tantas perguntas e comentrios dos alunos, que acabou desencadeando a leitura de
outro texto com a mesma temtica, como mostra o relato a seguir:
Relato 11:
Por que a gente no pode escolher o prprio nome?
Quando uma criana nasce, os pais tm que registrar essa criana no cartrio,
para ela existir como cidad, como moradora oficial da cidade, do pas, do
mundo. A certido de nascimento o primeiro documento que a gente tem. E
os pais tm que pr o nome e o sobrenome da criana na certido de
nascimento, e no adianta perguntar para um beb que nome ele quer ter,
adianta?
Flvio de Souza. As estripulias de Biba, Pedro e Zeca. So Paulo: Companhia das
Letras, 1997. p. 9.
O texto Por que a gente no pode escolher o prprio nome? serviu como
resposta s insistentes perguntas de alguns alunos, que desejavam saber por
que os pais no podem esperar que a criana cresa, para que ela mesma
escolha o prprio nome. Nele o autor utiliza uma linguagem coloquial e
conclui com a indagao ... e no adianta perguntar para um beb que
nome ele quer ter, adianta?, ressaltando a funo interlocutiva do texto, que
informativo. Tal pergunta gerou muitos comentrios das crianas quanto aos
nomes que indicariam para si mesmas, se pudessem falar quando bebs.
Aproveitei o momento para lev-las a argumentar sobre as escolhas que
fariam, na situao mencionada, e sobre o significado da fraseexistir como
cidad, como moradora oficial de cidade, do pas, do mundo, contida no
texto. Ao perceber que alguns alunos estavam em dvida quanto ao sentido
da palavra cidad, propus a eles que o procurssemos no dicionrio.
Encontrado, o texto-verbete foi anotado no quadro, lido e copiado por todos.
28
inclusive quando fizeram uso do dicionrio para procurar um significado que, naquele
momento, era do seu interesse conhecer.
Relate uma situao em que voc conjugou uma atividade de leitura com a
interao oral e comente as contribuies dessa prtica no processo de ensino
e aprendizagem da linguagem.
Saiba mais
A leitura deve ser trabalhada desde a alfabetizao como uma atividade
permanente, fazendo-se do ato de ler um processo de produo de sentido
que deve acontecer em momentos de interao e de reflexo, que podem,
inclusive, gerar outras atividades com a lngua oral e escrita.
29
Sntese da unidade
30
Unidade III
Textos de alfabetizandos: uma reflexo sobre
os fatores discursivos e lingusticos
Relato 12:
No incio do perodo letivo e do processo de
alfabetizao, quando trabalhava com o
tema Histria de Vida, comentei com as
crianas acontecimentos que, apesar de
no estarem diretamente ligados a ns,
fazem parte da nossa realidade, do contexto
onde vivemos. Elas participaram desse
momento interlocutivo relatando situaes
ocorridas com seus familiares, ou com
pessoas do seu relacionamento. Diante da
proposta de produzirem um texto sobre
algum acontecimento que tivesse chamado
sua ateno, alguns alunos disseram que no sabiam, ainda, escrever textos. No
momento em que lhes disse que poderiam usar desenhos para expressar o que
queriam e/ou produzir oralmente seus textos, que depois eu os ajudaria a
escrev-los, ficaram animados e iniciaram suas produes, dentre as quais eu e
os alunos selecionamos uma para ser afixada no mural do dia.
31
O(a) professor(a) pode intervir no referido processo e ajudar o aluno a avanar em suas
hipteses propondo-lhe atividades de reflexo fonolgica e, simultaneamente, de reflexo sobre
a escrita das palavras grafadas silabicamente, dando destaque quantidade de letras e slabas
nelas contidas. Atividades de desmontar e montar palavras, com o uso de alfabeto mvel, e de
as ler em voz alta (a fim de perceber bem os sons e estabelecer suas relaes com as letras
correspondentes) contribuem bastante para a compreenso do sistema alfabtico de escrita,
como a sua experincia provavelmente tem lhe
mostrado.
32
De acordo com Pazini (1998), o trabalho textual implica momentos de envolvimento do aluno
com a escrita, que vo desde a motivao para a produo do texto; a reflexo, que inicia com a
proposta e que envolve tanto as chamadas condies de produo como todo o processo; at a
reestruturao ou refaco, que constitui prtica reflexiva, por excelncia. Uma das questes
que precisam ser refletidas pelos alunos (e com os alunos) nesses momentos diz respeito ao
como eles vo escrever seus textos, que estrutura condiz com o tema e a situao de produo.
Saiba mais
As condies de produo que determinam os textos: quem escreve; o que
escreve; para quem, para que e por que escreve; quando e onde escreve,
questes essas que conduzem ao uso de uma certa variedade de lngua, um
certo registro, um como escrever (BRASIL, 1997).
Relato 13:
No trabalho com a histria de vida, pedi aos alunos que buscassem na
memria um acontecimento que tivesse sido muito importante em sua vida.
Destaquei que todas as pessoas, qualquer que seja sua idade, tm uma histria
de vida que marcada por fatos que vivenciaram: alguns alegres, divertidos,
engraados; outros tristes, que causam medo, inseguranas, sofrimento. Quase
todos os alunos lembraram-se de alguma coisa e quiseram falar. Por vezes
paravam no meio do discurso, mas com a interferncia dos colegas - E da, o
que aconteceu?, O que voc fez, ento? - acabavam concluindo seus
relatos. Para que no nos esquecssemos dos fatos relatados, propus s
crianas que escrevessem sobre eles. Talvez porque a produo escrita
demanda mais tempo para reflexo, algumas delas mudaram suas histrias,
afirmando que lembraram de outros fatos ainda mais significativos.
33
Planeje uma situao ou tema que leve os alunos (em duplas) a produzirem
um texto narrativo. Lembre seus alunos de que, nesse tipo de texto, preciso
responder s perguntas: o qu? Quem? Como? Quando? Onde? Promova
entre eles a troca de idias sobre o assunto. Terminadas as produes, solicite
s duplas que leiam o texto que escreveram e, com os demais alunos, faa
uma apreciao geral desse texto, Depois, por escrito, comente a prtica
desenvolvida.
Saiba mais
Estudos recentes mostram que a reescrita de histrias conhecidas ou de
informaes j divulgadas constitui um momento privilegiado para a
apropriao, pela criana, de modelos de estruturao textual, ou seja, de
caractersticas que a lngua assume em cada tipo de texto, bem como de
caractersticas formais da modalidade escrita, tais como a segmentao das
palavras, a pontuao, a ortografia. (CAVALCANTI, 1997)
Quando o professor faz do texto o centro do seu trabalho com a lngua oral e escrita desde a
alfabetizao, os alunos produzem textos que se configuram, verdadeiramente, como prticas
interlocutivas. Para tanto, eles utilizam os recursos lingsticos de que o idioma dispe para
estabelecer as necessrias ligaes textuais e contextuais3 , ou seja, para tornar o texto coerente
e coeso.
Diante da j mencionada proposta feita pela professora Marilene aos alunos (contar um fato
significativo ocorrido na histria de vida deles), a aluna Eliete, de 8 anos, produziu o relato
transcrito a seguir. Dentre os muitos textos ento escritos pelos alunos, foi escolhido esse para
anlise porque, apesar de curtinho, constitui uma unidade de sentido. Com base nele,
As ligaes contextuais so aquelas que estabelecem relaes entre o texto e o contexto, o
qual est relacionado s condies de produo j mencionadas.
34
proponho-lhe uma reflexo que poder servir de alicerce para a prtica textual que voc
desenvolve em sala de aula, com alunos das sries ou ciclos iniciais do Ensino Fundamental.
Relato 14:
Aconteseu na praia
Era uma vez eu estava na praia e encontrei um pasarinho. A me dele tinha
morrido e deichou o filhotinho e eu dei para ele o nome de pico. O filhote
creseu e um dia fugiu da minha casa e at oje tenho saudade do pico. E
nunca mais eu vi ele.
O relato de Eliete constitui um discurso significativo, na medida em que a autora tem uma
histria a contar a algum, com a inteno de compartilhar um acontecimento que para ela foi
importante. O texto apresenta todos os elementos que caracterizam a estrutura narrativa. Nele, o
narrador participa dos acontecimentos, ou seja, personagem da histria, por isso o foco
narrativo est em 1 pessoa, o que condiz com a proposta de produo feita pela professora. As
formas verbais foram adequadamente empregadas: por conta de os relatos (e, por decorrncia, a
estrutura narrativa) se referirem a fatos j acontecidos, o pretrito o tempo caracterstico desse
tipo de texto. Vrios recursos de coeso tambm foram bem utilizados no texto: para fazer
referncias a palavras j empregadas, a aluna usou elipses4 (dentre elas, da palavra eu, em
encontrei; da palavra me, em deichou); pronomes (dele, ele, minha); e os substantivos
filhotinho, pico, filhote, em substituio palavra pasarinho. Ao fazer uso desses elementos
de coeso referencial, ela demonstra ter percebido que, nos textos escritos, evitam-se
redundncias.
J no que diz respeito ao emprego dos recursos responsveis pela ligao entre as partes que
constituem o texto recursos de coeso , observa-se no relato apenas o uso do conectivo e.
Possivelmente por influncia da oralidade, a aluna repete-o vrias vezes, fato esse que precisa
ser apontado a ela no momento de reviso ou de reestruturao do texto. Essa e outras marcas
de oralidade (a, da, ento, etc.), empregadas geralmente no incio das produes escritas,
podem ser eliminadas ou substitudas, proporo que o professor reflete com os alunos sobre
as diferentes possibilidades de se estabelecerem ligaes no texto escrito e, conseqentemente,
sobre os fatores que colaboram para que o texto se configure como uma unidade de sentido.
Saiba mais
Dentre os chamados fatores textuais ou fatores de textualidade destacam-se a
coerncia, que possibilita tanto ao autor como ao leitor a atribuio de sentido
ao texto; e a coeso, que diz respeito s ligaes textuais, como voc pode
constatar pela anlise do relato 14.
35
texto tambm acarreta essa quebra semntica, conforme podemos observar em um relato cujo
pargrafo inicial traz apenas uma orao subordinada que, como o nome indica, depende de
outra para ser entendida: Quando eu encontrei a Nina!. Nesse caso, o leitor no tem como
atribuir sentido a essa orao sem a presena da outra, a principal (o que teria acontecido em tal
encontro?). Quando se empregam no texto palavras semanticamente inadequadas, como em
Mais eu tive tambem um pezadelo bom, foi um pezadelo que eu e minha familha fiquemos
ricos e compremos um carro e uma fazenda com gados e com tudo que tipo de planta, o
sentido do texto tambm fica um tanto prejudicado.
Saiba mais
importante destacar que, em geral, a incoerncia no ocorre em todo o
texto. Ela parcial, isto , acontece em parte (ou partes) do texto. Por isso,
observado o problema, h possibilidades de se consertar o texto. Em Koch e
Travaglia (1991), voc obtm mais informaes sobre o assunto.
Embora os referidos textos possibilitem a interlocuo desejada por seus autores, eles podem
melhorar consideravelmente em termos do que se considera a principal qualidade de um texto:
a clareza. Para que isso acontea, o(a) professor(a) precisa enfocar, na prtica da reestruturao,
algumas questes que precisam ser refletidas sempre, dentre elas as indicadas a seguir.
Uma das grandes dificuldades dos alunos a segmentao do texto em pargrafos. Apesar de
no haver uma definio que d conta de explicar exatamente o que o pargrafo, possvel
consider-lo como agrupamento de idias afins, que se articula com outros pargrafos (ou
agrupamentos) para formar um todo coeso. Por isso, o professor pode propor aos alunos uma
36
leitura atenta do texto selecionado e, depois, em uma atividade reflexiva conjunta, professor e
alunos faro a identificao dos blocos de idias afins e a decorrente segmentao do texto,
observando como as ligaes entre os pargrafos foram estabelecidas. Embora a paragrafao
seja uma tarefa relativamente difcil, h alunos que talvez pelos efeitos visuais de uma boa
segmentao conseguem cumpri-la a contento nos textos que produzem, como fez a Cristiane,
de 8 anos, no texto apresentado a seguir:
O dia em que papai caiu
Um dia, eu e os meus pais fomos andar de bicicleta no asfauto. Papai estava
olhando douas garotas. E a minha me falou:
Cuidado com a construo.
Mas ele continuou olhando para elas e derrepente bum! Papai caiu no buraco
da construo.
Quando ele levantou a minha me falou:
Viu, voc quer ser metido. Bem feito.
Outras questes tambm precisam ser refletidas nos textos produzidos pelos alunos, dentre as
quais se destacam estas: o uso da pontuao, que contribui para as ligaes textuais e,
conseqentemente, para o sentido do texto; o emprego dos dilogos direto e indireto,
geralmente utilizados em estruturas narrativas, que so as mais usadas pelas crianas; os
processos argumentativos usados nos diferentes textos; as concordncias verbal e nominal.
Assim, os fatos lingsticos sero entendidos em sua funcionalidade j nas sries ou ciclos
iniciais, por meio de uma reflexo esclarecedora entre professor e alunos e, sobretudo, de uma
interao constante do professor com o autor do texto, como evidencia a professora Jaqueline,
de 3 srie, em cena mostrada no vdeo.
importante lembrar que, na prtica da reestruturao ou refaco, podem ser abordadas
tambm questes ortogrficas, caso essa seja a opo do professor (ele pode apresentar aos
alunos um texto j corrigido e trabalhar apenas com os aspectos discursivos e estruturais).
Mesmo que certas grafias no convencionais no interfiram no sentido do texto, o professor
pode aproveitar o momento para, com os alunos, descobrir as hipteses que esto por trs de
tais erros (como, por exemplo, as que teriam levado Cristiane a escrever asfauto, douas,
derrepente).
O fragmento textual - O meu primo cortou a mo e ele teve que ir no espital para costura
quando ele saiu do ispital ele chorou. Mais no hospital ele ficou queto.- de aluno de 2 srie,
mostra que existem crianas que, por vezes, elaboram mais de uma hiptese sobre determinada
grafia e, talvez, diante da sua insegurana quanto forma convencional, valem-se
(espertamente!) de todas essas hipteses, no mesmo texto5 :
Como certamente do seu conhecimento, existem professores que ainda avaliam as produes
textuais dos alunos apenas, ou prioritariamente, por critrios ortogrficos. No percebem que o
chamado erro lingstico advm quase sempre de um processo de reflexo e de hipteses do
aluno quanto quela escrita. Tais hipteses geralmente revelam que, ao escrever, o aluno
procura estabelecer uma ligao entre a fala e a escrita, sem saber ainda que as relaes entre
fonemas e letras so, muitas vezes, irregulares e arbitrrias, no sistema alfabtico de escrita: h
5
Nesse fragmento e em todos os textos transcritos no fascculo, foi mantida a grafia original.
37
fonemas que tm mais de uma representao grfica (entre outros, o fonema /z/, de casa, exame
e azar; o fonema /s/, de cebola, sino, pssaro, prximo, nascer, cresa, excelente); por outro
lado, h letras que tm mais de uma representao fontica ( o caso da letra x, usada em
xcara, texto, mximo, xito, txi, por exemplo; ou de vogais que, conforme as palavras em que
se encontram, podem ter pronncias abertas, fechadas ou nasaladas, indicadas ou no por sinais
especficos agudo, circunflexo, ou o til). Existem tambm os dgrafos, os quais, como o nome
indica, so constitudos por duas letras que tm um nico som; e a letra h, que, no incio da
palavra, sequer pronunciada. H ainda a questo das variedades dialetais: certas grafias que,
para alguns professores, constituem graves erros, revelam simplesmente a fala de
determinados grupos sociais, o uso de uma variedade de lngua diferente daquela considerada
como padro.
Saiba mais
As interferncias devem acontecer aos poucos e nos textos dos alunos.
preciso estabelecer prioridades entre as questes que precisam ser
trabalhadas, pois muitas alteraes ao mesmo tempo e em um mesmo texto
podem confundir as crianas.
Agora, com vistas a ajud-lo(a) a entender certas grafias observadas em textos produzidos por
alunos nas sries ou ciclos iniciais, proponho-lhe refletir, a seguir, sobre a tipologia de erros
apresentada pelo professor e lingista Luiz Carlos Cagliari, em seu livro Alfabetizao &
lingstica (1991).
38
2) Dialetao - neste caso, a escrita tambm se baseia na fala, mas em uma variedade ou
dialeto praticado pelos grupos socialmente desprestigiados: O susto que levemo foi de varde
(O susto que levamos foi debalde.); Ento ele puxo a carsa do amigo (Ento ele puxou a
cala do amigo.).
3) Juntura vocabular ou hiposegmentao tambm reflete influncia da fala, que no
mostra criana como separar as palavras de uma expresso ou de um enunciado, como
evidenciam os exemplos: Ele dizia tocumfomi (Ele dizia estou com fome.); Eraumaveiz eu
fui caminha me... (Era uma vez eu fui com a minha me...).
4) Separao indevida ou hipersegmentao decorre, provavelmente, do fato de as
crianas j conhecerem parte da palavra como vocbulo autnomo: De pois fui para casa.
(Depois fui para casa.); Fiquei com tente com o presente que ganhei do meu pai. (Fiquei
contente com o presente que ganhei do meu pai.).
5) Hipercorreo - como conseqncia da nfase exagerada que se d a certas correes,
a criana acaba generalizando os critrios utilizados e usando-os, indevidamente, em outras
situaes: Minha filia, porque voc fez isso? a grafia de filia decorreu, provavelmente,
da correo de alguma palavra escrita, equivocadamente, com lh (como familha, por
exemplo); Papai estava olhando douas garotas. neste caso, possvel que a autora tenha
tomado como base para a escrita douas a correo de palavra em que se suprimiu a
semivogal do ditongo: poco (pouco), por exemplo.
6) Troca, omisso ou acrscimo de letras - como no nosso sistema de escrita nem sempre
se cumpre o j mencionado princpio das escritas alfabticas, muitos erros de grafia advm
das irregularidades do prprio sistema, como j se comentou. o caso, por exemplo, de
grafias como sidade (cidade), jelo (gelo), pisina (piscina), charope (xarope), oje (hoje), etc.
Numa ao previamente planejada, a produo e a reestruturao de textos precisam ser
trabalhadas em um processo que implica construes e reconstrues, nas quais o erro ser
visto no s como indcio de possveis dificuldades do aluno, mas tambm como resultado de
um momento reflexivo que, apesar de equivocado em dada situao, pode ser repensado e
realimentado, com a mediao do professor.
Essa mediao, que consiste na ligao entre os elementos de ensino professor, aluno e
conhecimento pode ser realizada atravs de situaes didticas que envolvem, por exemplo,
a leitura e anlise de textos de diferentes gneros, para que os alunos, ao refletirem
sobre as estratgias textuais, tenham boas referncias para suas produes; a utilizao de
textos em quadrinhos, os quais constituem instrumental eficiente para auxiliar as crianas
6
39
Saiba mais
Quando o professor descobre as hipteses da criana, o que geralmente
acontece interagindo com ela, perguntando-lhe por que escreveu desta ou
daquela forma, torna-se mais fcil planejar e desenvolver atividades que
mostrem, por exemplo, as diferenas que h entre fala e escrita, as situaes
de escrita em que d para utilizar o dialeto familiar e aquelas que exigem o
dialeto padro, as diferentes relaes entre certos fonemas e letras.
40
Por fim, professor(a), desejo compartilhar com voc algumas recomendaes sobre a avaliao
dos textos produzidos por alunos:
a) no avalie o texto como um produto pronto e acabado, mas como um processo passvel de
avanos e melhorias;
b) no veja, nas avaliaes, apenas os erros dos alunos: preciso entend-los como indcios
das dificuldades sentidas pelas crianas e, conseqentemente, como elementos que apontam
possibilidades de ao lingstico-pedaggica;
c) no estabelea parmetros comparativos no que se refere s produes de diferentes alunos.
A nica comparao que pode ser feita aquela que acontece entre textos de um mesmo aluno,
produzidos em diferentes momentos e situaes, para ver no que ele melhorou e o que precisa
ainda aprender;
d) lembre-se de que um bom texto no apenas um texto correto, mas um texto bem
encadeado, bem ordenado, claro, interessante e adequado aos seus objetivos e aos seus
leitores (Antunes, 2004, p. 116).
Sntese da unidade
Como voc teve a oportunidade de constatar, no texto que a linguagem se materializa como
discurso significativo, como forma de algum, o autor ou locutor, dizer algo (oralmente ou por
escrito) a outro algum, o interlocutor, com uma determinada inteno e com a clareza
necessria para que a interlocuo realmente acontea. No que se refere produo escrita, essa
materializao pressupe a realimentao constante, pelo(a) professor(a), dos dois processos
que so bsicos no ensino e aprendizagem da lngua escrita: o da alfabetizao, pelo qual as
crianas compreendem o funcionamento do sistema alfabtico de escrita; e o do letramento,
pelo qual elas interagem com a diversidade de textos que permeiam o dia-a-dia.
Foi possvel perceber, no decorrer da unidade, que tanto em relao produo textual quanto
ao trabalho ps-produo (que envolve a reestruturao e a correo), preciso aceitar o
desafio de uma prtica em que, assumindo uma postura dialgica com seus alunos, os
professores e professoras possam contribuir para que eles cheguem almejada competncia
textual e, por conseqncia, ao uso criativo e crtico das prticas sociais de leitura e escrita.
41
Concluso
Para que essa meta seja atingida, necessrio dar a vez e a voz s crianas (oralmente e por
escrito) e garantir que todas elas se expressem, que possam falar de si, de sua famlia e do
mundo. Destinando diariamente momentos para esse fim, voc
assegura um espao de troca entre os alunos, e entre eles e
voc, para que aprendam a manifestar-se de forma clara e
Tratamos da
organizada, defendendo seus pontos de vista e respeitando os
organizao do
dos outros, convivendo com as diferenas.
tempo pedaggico
Vale relembrar que, ao vir para a escola, o aluno j tem
no fascculo 3.
conhecimentos prticos sobre a lngua que utiliza em suas
interaes cotidianas. Portanto, o referido processo precisa
acontecer a partir do cruzamento que o aluno possa fazer entre
o que j sabe e o que lhe est sendo ensinado. assim que cada criana vai construindo a sua
teia de relaes entre o que j foi aprendido, o contexto de aprendizagem e a prpria realidade,
descobrindo o sentido do aprender mais sobre a lngua. E que voc passa a entender o
significado do ensinar a lngua para quem j possui uma experincia lingstica que pode ser
ampliada e estendida escrita, favorecendo a insero dos alunos em prticas reais de leitura e
escrita, em prticas de letramento.
42
Referncias bibliogrficas
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43
Braslia 2008
Introduo
A questo da qualidade e da eqidade tem assumido, nos ltimos anos, lugar de destaque nas
discusses sobre polticas pblicas de educao, ressaltando a importncia do processo de
avaliao, em todos os nveis, para a obteno de informaes sobre a realidade educacional no
Pas.
No mbito escolar, a avaliao realizada pelo professor, em sala de aula, uma das etapas do
processo ensino-aprendizagem. Diagnostica as necessidades, os interesses e os problemas dos
alunos, permitindo aos professores e escola acompanhar a construo do conhecimento pelo
aluno, no incio, durante e ao final do processo. Os resultados dessa avaliao subsidiam o
professor tanto para planejar atividades de ensino mais adequadas, quanto para definir novos
rumos.
A necessidade de obter informaes mais gerais sobre a educao no Pas leva adoo da
avaliao de sistema. Essa avaliao utiliza procedimentos metodolgicos de pesquisa, formais e
cientficos, que garantem sua confiabilidade, para coletar dados sobre o desempenho do aluno e
as condies internas e externas que nele interferem.
A anlise dos resultados do desempenho do aluno, nesse tipo de avaliao, permite verificar, por
extenso, o desempenho da escola e dos sistemas de ensino, para fornecer informaes que
permitam a adoo de programas e projetos voltados melhoria da qualidade educacional, uma
vez que funo primordial da avaliao de sistema fornecer elementos para subsidiar polticas
educacionais adequadas realidade, em mbito local, nacional e mesmo internacional.
Com a finalidade de fornecer aos gestores dos sistemas de ensino informaes que subsidiem o
processo de tomada de deciso e elementos para monitorar as polticas pblicas de educao no
Pas, surgiu, em 1990, o Sistema Nacional de Avaliao da Educao Bsica (Saeb).
O Saeb avalia o que os alunos sabem e so capazes de fazer em diversos momentos de seu
percurso escolar, considerando as condies existentes nas escolas brasileiras. Para tanto, o
Saeb utiliza instrumentos especficos: provas aplicadas a alunos de escolas selecionadas, por
meio das quais medido o desempenho acadmico dos mesmos; questionrios, pelos quais so
investigados os fatores intra e extra-escolares associados ao desempenho dos alunos. Por isso,
as informaes do Saeb permitem a identificao e a anlise de aspectos que contextualizam o
processo de ensino-aprendizagem em que foram obtidos os resultados de desempenho. Tais
dados so levantados por meio da aplicao de questionrios aos professores, aos diretores e
aos alunos.
Para atingir os objetivos a que se prope, o Saeb avalia, a cada dois anos, o desempenho
cognitivo dos alunos de 4 e 8 sries do Ensino Fundamental e de 3 srie do Ensino Mdio,
assim como os fatores associados a esse desempenho. As informaes resultantes desses
levantamentos permitem, ento, fazer associaes, correlaes, anlises e estudos que oferecem
um quadro da realidade educacional brasileira.
Desde 2005, foi acrescida ao sistema de avaliao a chamada Prova Brasil, cujo nome oficial
Avaliao Nacional do Rendimento Escolar (ANRESC). Assim, o Sistema de Avaliao da
Educao Bsica (Saeb), conforme estabelece a Portaria n. 931, de 21 de maro de 2005,
passa a ser composto por dois processos: o de Avaliao Nacional da Educao Bsica (Aneb)
e o de Avaliao Nacional do Rendimento Escolar (Anresc).
A Aneb realizada por amostragem das Redes de Ensino em cada Unidade da Federao e
foca as gestes dos sistemas educacionais. Por manter as mesmas caractersticas, a Aneb ainda
recebe o nome do Saeb em suas divulgaes; a Anresc mais extensa e mais detalhada que a
Aneb, pois foca em cada unidade escolar. Por seu carter universal, a Anresc recebe o nome de
Prova Brasil em suas divulgaes e aplicada a todas as escolas pblicas urbanas brasileiras,
com mais de 20 alunos na srie avaliada.
A realizao de uma avaliao de sistema com amplitude nacional, para ser efetiva, exige a
construo de uma matriz de referncia que d transparncia e legitimidade ao processo de
avaliao, informando aos interessados o que ser avaliado. As matrizes descrevem o objeto da
avaliao, so um referencial curricular mnimo a avaliar em cada disciplina e srie, informando
as competncias e habilidades esperadas dos alunos.
Torna-se necessrio ressaltar que as matrizes no englobam todo o currculo escolar. feito um
recorte com base no que possa ser aferido por meio do tipo de instrumento de medida utilizado
no Saeb e na Prova Brasil e que, ao mesmo tempo, seja representativo do que est contemplado
nos currculos vigentes no Brasil.
Assim compreendidas, as matrizes no podem ser confundidas com procedimentos, estratgias
de ensino ou orientaes metodolgicas nem com contedo para o desenvolvimento do trabalho
do professor em sala de aula. Esses elementos esto presentes nos guias ou propostas
curriculares dos sistemas de ensino.
As matrizes tm por referncia os Parmetros Curriculares Nacionais mas foram construdas a
partir de uma consulta nacional aos currculos propostos pelas Secretarias Estaduais de
Educao e por algumas redes municipais. O INEP consultou tambm professores regentes das
redes municipal, estadual e privada, de 4 e 8 sries do Ensino Fundamental e, ainda, examinou
os livros didticos mais utilizados para essas sries, nas mesmas redes.
As matrizes de referncia so a base para a elaborao dos itens dos testes do SAEB e da
Prova Brasil. Reitere-se que Item a denominao adotada para as questes que compem a
prova. Essa nomenclatura deve-se ao entendimento de que o termo item se refere a questes
que abordam, com preponderncia, uma nica dimenso do conhecimento.
Cada matriz de referncia apresenta tpicos ou temas que, com descritores, indicam as
habilidades de Lngua Portuguesa e de Matemtica a serem avaliadas. O descritor uma
associao entre contedos curriculares e operaes mentais desenvolvidas pelo aluno que
traduzem certas competncias e habilidades. Essa associao apresenta um resultado que a
matria-prima a partir da qual possvel elaborar um item de prova. As respostas dadas pelos
alunos a esses itens possibilitam a descrio do nvel de desempenho por eles atingido. A partir
da, dado conhecer o desempenho dos sistemas de ensino.
A preocupao com a articulao interna entre descritores e itens das provas, com vista sua
coerncia e sua consistncia, foi determinada pelo objetivo de avaliar, com mais rigor, o que os
alunos realmente sabem e o que lhes falta alcanar a cada etapa conclusiva de nvel ou ciclo de
escolarizao.
Ler uma atividade complexa que faz amplas solicitaes ao intelecto e s habilidades
cognitivas superiores da mente: reconhecer, identificar, agrupar, associar, relacionar, generalizar,
abstrair, comparar, deduzir, inferir, hierarquizar. No est em pauta apenas a simples
decodificao, mas a apreenso de informaes explcitas e implcitas e de sentidos subjacentes,
e a construo de sentidos que dependem de conhecimentos prvios a respeito da lngua, dos
gneros, das prticas sociais de interao, dos estilos, das diversas formas de organizao
textual.
A matriz de referncia que norteia as provas de Lngua Portuguesa do Saeb e da Prova Brasil
est estruturada sobre o FOCO LEITURA, que requer a competncia de apreender o texto
como construo de conhecimento em diferentes nveis de compreenso, anlise e
interpretao. Em relao ao teste de Lngua Portuguesa, na perspectiva assumida do texto
como objeto de estudo, os descritores tm, como referncia algumas das competncias
discursivas dos sujeitos, tidas como essenciais na situao de leitura.
Os testes de Lngua Portuguesa do Saeb, cujo foco a leitura, tm por objetivo verificar se os
alunos so capazes de apreender o texto como construo de conhecimento em diferentes nveis
de compreenso, anlise e interpretao. A alternativa por esse foco parte da proposio de que,
ser competente no uso da lngua significa saber interagir, por meio de textos, em qualquer
situao de comunicao (Idem, p. 17).
O texto , pois, a unidade significativa que concretiza as competncias e habilidades lingsticas
relacionadas a situaes concretas. , portanto, o ponto central da organizao das atividades e
contedos que compem os testes do Saeb e da Prova Brasil. O prprio texto, que serve de
suporte construo do item, um dos elementos que determina sua complexidade.
Por fim, convm relembrar que os conhecimentos e competncias lingsticas indicadas nos
descritores da Matriz de Referncia de Lngua Portuguesa esto presentes, de forma
consensual, nos currculos das unidades da Federao e nas Diretrizes Curriculares Nacionais.
Esses descritores so apresentados em trs nveis: 4 e 8 sries do ensino fundamental e a 3
srie do ensino mdio.
MEC. Secretaria de Educao Fundamental. Parmetros curriculares nacionais: lngua
portuguesa.v. 2 Braslia, DF. 1997.p.53.
Como visto anteriormente, as matrizes de Lngua Portuguesa do Saeb e da Prova Brasil esto
estruturadas da seguinte forma: na dimenso objeto do conhecimento, foram elencados tpicos;
na dimenso competncia, foram elaborados descritores referentes a cada tema ou tpico.
A matriz de Lngua Portuguesa do SAEB / Prova Brasil est constituda de seis tpicos:
I
procedimentos de leitura;
II
VI variao lingstica.
A cada um destes tpicos esto associados alguns descritores que compem a matriz de Lngua
Portuguesa utilizada nas avaliaes do Saeb e /ou da Prova Brasil, como segue.
Neste tpico, so abordadas competncias bsicas que sero demonstradas por meio de
habilidades, como localizar informaes explcitas e inferir as implcitas em um texto. As
informaes implcitas exigem maior habilidade para que possam ser inferidas, visto exigirem do
leitor que extrapole o texto e reconhea o que no est textualmente registrado e sim
subentendido ou pressuposto.
Os textos nem sempre apresentam uma linguagem literal. Deve haver, ento, a capacidade de
reconhecer novos sentidos atribudos s palavras dentro de uma produo textual. Alm disso,
para a compreenso do que conotativo e simblico, preciso identificar no apenas a idia,
mas tambm ler as entrelinhas, o que exige do leitor um conhecimento de mundo. A tarefa do
leitor competente , portanto, apreender o sentido global do texto.
relevante ressaltar que, alm de localizar informaes explcitas, inferir informaes implcitas
e identificar o tema de um texto, nesse tpico, deve-se tambm distinguir os fatos apresentados
da opinio formulada acerca desses fatos em textos narrativos e argumentativos. Reconhecer
essa diferena essencial para que o aluno possa tornar-se mais crtico, de modo a ser capaz de
distinguir o que um fato, um acontecimento, da interpretao que lhe dada pelo autor do
texto.
A seguir, so apresentados os descritores deste tpico e exemplos de itens a ele relacionados.
florzinha seca.
(B)
folhinha verde.
(C)
galhinho seco.
(D)
raminho de planta.
10
Bula de remdio
VITAMIN
COMPRIMIDOS
embalagens com 50 comprimidos
COMPOSIO
Sulfato ferroso .................... 400 mg
Vitamina B1 ........................ 280 mg
Vitamina A1 ........................ 280 mg
cido flico ......................... 0,2 mg
Clcio F .............................. 150 mg
INFORMAES AO PACIENTE
O produto, quando conservado em locais frescos e bem ventilados, tem
validade de 12 meses.
conveniente que o mdico seja avisado de qualquer efeito colateral.
INDICAES
No tratamento das anemias.
CONTRA-INDICAES
No deve ser tomado durante a gravidez.
EFEITOS COLATERAIS
Pode causar vmito e tontura em pacientes sensveis ao cido flico da
frmula.
POSOLOGIA
Adultos: um comprimido duas vezes ao dia. Crianas: um comprimido uma
vez ao dia.
LABORATRIO INFARMA S.A.
Responsvel - Dr. R. Dias Fonseca
CCCO, Maria Fernandes; HAILER, Marco Antnio. Alp Novo: anlise, linguagem e pensamento. So
Paulo: FTD, 1999. v. 2. p. 184.
(B)
(C)
(D)
11
noite.
(B)
tarde.
(C)
de madrugada.
(D)
pela manh.
12
A habilidade que pode ser avaliada por meio deste descritor refere-se ao reconhecimento pelo
aluno do assunto principal do texto, ou seja, identificao do que trata o texto. Para que o aluno
identifique o tema, necessrio que relacione as diferentes informaes para construir o sentido
global do texto.
Essa habilidade avaliada por meio de um texto para o qual solicitado, de forma direta, que o
aluno identifique o tema ou o assunto principal do texto.
Chapeuzinho Amarelo
Era a Chapeuzinho amarelo
Amarelada de medo.
Tinha medo de tudo, aquela Chapeuzinho.
J no ria.
5
Em festa no aparecia.
No subia escada
nem descia.
No estava resfriada,
mas tossia.
10
15
20
brincava de amarelinha.
(B)
gostava de festas.
(C)
(D)
13
A raposa e as uvas
Num dia quente de vero, a raposa passeava por um pomar. Com sede e
calor, sua ateno foi capturada por um cacho de uvas.
Que delcia, pensou a raposa, era disso que eu precisava para adoar
a minha boca. E, de um salto, a raposa tentou, sem sucesso, alcanar as uvas.
5
(B)
(C)
(D)
14
Para o desenvolvimento dessas competncias, tanto o texto escrito quanto as imagens que o
acompanham so importantes na medida em que propiciam ao leitor relacionar informaes e se
engajar em diferentes atividades de construo de significados.
A seguir, so apresentados os descritores deste tpico e exemplos de itens a ele relacionados.
MESMO NESTE
MOMENTO, VOCS
PODEM SENTIR
MINHA PRESENA
... PORQUE
ESTOU BEM
ATRS DE
VOC!
VOC
OLHOU,
N?
acanhado.
(B)
aterrorizado.
(C)
decepcionado.
(D)
estressado.
15
Eva Furnari
EVA FURNARI - Uma das principais figuras da literatura para crianas. Eva
Furnari nasceu em Roma (Itlia) em 1948 e chegou ao Brasil em 1950,
radicando-se em So Paulo. Desde muito jovem, sua atrao eram os livros de
estampas e no causa estranhamento algum imagin-Ia envolvida com
cores, lpis e pincis, desenhando mundos e personagens para habit-Ios...
A finalidade do texto
(A)
(B)
(C)
(D)
16
Este tpico requer que o aluno assuma uma atitude crtica e reflexiva em relao s
diferentes idias relativas ao mesmo tema encontradas em um mesmo ou em diferentes
textos, ou seja, idias que se cruzam no interior dos textos lidos, ou aquelas encontradas em
textos diferentes, mas que tratam do mesmo tema; assim, o aluno poder ter maior
compreenso das intenes de quem escreve.
As atividades que envolvem a relao entre textos so essenciais para que o aluno construa a
habilidade de analisar o modo de tratamento do tema dado pelo autor e as condies de
produo, recepo e circulao dos textos.
Essas atividades podem envolver a comparao de textos de diversos gneros, como os
produzidos pelos alunos, os textos extrados da Internet, de jornais, revistas, livros e textos
publicitrios, entre outros.
A seguir, so apresentados os descritores deste tpico e exemplos de itens a ele relacionados.
17
Texto I
Os cerrados
Texto II
Os Pantanais
(B)
(C)
(D)
O Tpico IV trata dos elementos que constituem a textualidade, ou seja, aqueles elementos que
constroem a articulao entre as diversas partes de um texto: a coerncia e a coeso.
Considerando que a coerncia a lgica entre as idias expostas no texto, para que exista
coerncia necessrio que a idia apresentada se relacione ao todo textual dentro de uma
seqncia e progresso de idias.
Para que as idias estejam bem relacionadas, tambm preciso que estejam bem interligadas,
bem unidas por meio de conectivos adequados, ou seja, com vocbulos que tm a finalidade de
ligar palavras, locues, oraes e perodos. Dessa forma, as peas que interligam o texto, como
pronomes, conjunes e preposies, promovendo o sentido entre as idias so chamadas
18
coeso textual. Enfatizamos, nesta srie, apenas os pronomes como elementos coesivos. Assim,
definiramos coeso como a organizao entre os elementos que articulam as idias de um texto.
As habilidades a serem desenvolvidas pelos descritores que compem este tpico exigem que o
leitor compreenda o texto no como um simples agrupamento de frases justapostas, mas como
um conjunto harmonioso em que h laos, interligaes, relaes entre suas partes.
A compreenso e a atribuio de sentidos relativos a um texto dependem da adequada
interpretao de seus componentes. De acordo com o gnero textual, o leitor tem uma
apreenso geral do assunto do texto.
Em relao aos textos narrativos, o leitor necessita identificar os elementos que compem o
texto narrador, ponto de vista, personagens, enredo, tempo, espao e quais so as relaes
entre eles na construo da narrativa.
A seguir, so apresentados os descritores deste tpico e exemplos de itens a ele relacionados.
O hbito da leitura
A criana o pai do homem. A frase, do poeta ingls William
Wordsworth, ensina que o adulto conserva e amplia qualidades e defeitos que
adquiriu quando criana. Tudo que se torna um hbito dificilmente deixado.
Assim, a leitura poderia ser uma mania prazerosa, um passatempo.
Voc, coleguinha, pode descobrir vrias coisas, viajar por vrios lugares,
conhecer vrias pessoas, e adquirir muitas experincias enquanto l um livro,
jornal, gibi, revista, cartazes de rua e at bula de remdio. Dia 25 de janeiro foi
o dia do Carteiro. Ele leva ao mundo inteiro vrias notcias, intimaes,
saudades, respostas, mas tudo isso s existe por causa do hbito da leitura. E a,
10 vamos participar de um projeto de leitura?
5
No trecho Ele leva ao mundo inteiro vrias notcias... (l. 8), a palavra
sublinhada refere-se ao
(A)
carteiro.
(B)
jornal.
(C)
livro.
(D)
poeta.
19
Venha morar comigo na cidade e voc ver como l a vida mais fcil.
L se foram os dois para a cidade, onde se acomodaram numa casa rica e
bonita.
(B)
se empanturrou de comida.
(C)
(D)
20
A raposa e as uvas
Uma raposa passou por baixo de uma parreira carregada de lindas uvas.
Ficou logo com muita vontade de apanhar as uvas para comer.
Deu muitos saltos, tentou subir na parreira, mas no conseguiu.
Depois de muito tentar foi-se embora, dizendo:
Eu nem estou ligando para as uvas. Elas esto verdes mesmo...
ROCHA, Ruth. Fbula de Esopo. So Paulo, FTD, 1992.
(B)
(C)
(D)
21
Pepita a piaba
L no fundo do rio, vivia Pepita: uma piaba miudinha.
Mas Pepita no gostava de ser assim.
Ela queria ser grande... bem grandona...
Tomou plulas de vitamina... Fez ginstica de peixe... Mas nada...
5
Continuava miudinha.
O que isso? Uma rede?
Uma rede no rio! Os pescadores!
Ai, ai, ai... Foi um corre-corre... Foi um nada-nada...
Mas... muitos peixes ficaram presos na rede.
10
E Pepita?
Pepita escapuliu... Ela nadou, nadou pra bem longe dali!
CONTIJO, Solange A. Fonseca. Pepita a piaba. Coleo Miguilim. So Paulo: Nacional, 2004.
causa.
(B)
explicao.
(C)
lugar.
(D)
tempo.
O uso de recursos expressivos possibilita uma leitura para alm dos elementos superficiais do
texto e auxilia o leitor na construo de novos significados. Nesse sentido, o conhecimento de
diferentes gneros textuais proporciona ao leitor o desenvolvimento de estratgias de
antecipao de informaes que levam o leitor construo de significados.
Em diferentes gneros textuais, tais como a propaganda, por exemplo, os recursos expressivos
so largamente utilizados, como caixa alta, negrito, itlico, entre outros. Os poemas tambm se
valem desses recursos, exigindo ateno redobrada e sensibilidade do leitor para perceber os
efeitos de sentido subjacentes ao texto.
Vale destacar que os sinais de pontuao, como reticncias, exclamao, interrogao etc., e
outros mecanismos de notao, como o itlico, o negrito, a caixa alta e o tamanho da fonte,
podem expressar sentidos variados. O ponto de exclamao, por exemplo, nem sempre expressa
surpresa. Faz-se necessrio, portanto, que o leitor, ao explorar o texto perceba como esses
elementos constroem a significao, na situao comunicativa em que se apresentam.
A seguir, so apresentados os descritores deste tpico e exemplos de itens a ele relacionados.
22
Continho
Era uma vez um menino triste, magro e barrigudinho. Na soalheira
danada de meio-dia, ele estava sentado na poeira do caminho, imaginando
bobagem, quando passou um vigrio a cavalo.
Voc, a, menino, para onde vai essa estrada?
Ela no vai no: ns que vamos nela.
(B)
(C)
(D)
23
Frias, sol e praia so alguns dos bons motivos para comemorar a chegada
do vero e achar que essa a melhor estao do ano. E realmente seria, se no
fosse por um nico detalhe: as baratas. Assim como ns, elas tambm ficam bem
animadas com o calor. Aproveitam a acelerao de seus processos bioqumicos
para se reproduzirem mais rpido e, claro, para passearem livremente por todos os
cmodos de nossas casas.
Nessa poca do ano, as chances de dar de cara com a visitante indesejada,
ao acordar durante a noite para beber gua ou ir ao banheiro, so trs vezes
maiores.
Revista Galileu. Rio de Janeiro: Globo, N 151, Fev. 2004, p.26.
apresentar.
(B)
avisar.
(C)
desafiar.
(D)
questionar.
24
Televiso
Televiso uma caixa de imagens que fazem barulho.
10
(B)
"Em vez de ficar olhando essa gente brincar de mentira, prefiro ir brincar
de verdade..."
(C)
(D)
25
Consideraes Finais
Tendo em vista que a LEITURA condio essencial para que se possa compreender o mundo,
os outros, as prprias experincias e a necessidade de inserir-se no mundo da escrita, torna-se
imperativo que o aluno desenvolva habilidades lingsticas para que possa ir alm da simples
decodificao de palavras. preciso lev-lo a captar por que o escritor est dizendo o que o
texto est dizendo, ou seja, ler as entrelinhas. Pode-se fazer mais: proporcionar ao aluno
experincias de leitura que o levem no s a assimilar o que o texto diz, mas tambm como e
para quem diz (Kato, 1990).
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