Josué Soares Flores - Maternidade de Deus em Juliana de Norwich
Josué Soares Flores - Maternidade de Deus em Juliana de Norwich
Josué Soares Flores - Maternidade de Deus em Juliana de Norwich
Porto Alegre
2013
JOSU SOARES FLORES
Porto Alegre
2013
JOSU SOARES FLORES
__________________________
Prof. Dr. Urbano Zilles PUC/RS
__________________________
Prof. Dr. Flvio Schmitt EST
DEDICATRIA
ABSTRACT
The next text is a Dissertation towards a Master Degree in the Faculty of Theology at The
Pontifical Catholic University of the Rio Grande do Sul about The Maternity of God in
Julian of Norwich, in tree acts: Maternity in Creation, Maternity in Incarnation and Maternity
in Grace. The text rescues the importance of Julians mystical thinking at XIV century
context, and its relevance for: the ecclesiology, soteriology, creation and imago Dei doctrines.
As well for the sacramental and anthropological and philosophical concepts, cosmology,
cosmogony and theodicy concepts in medieval thinking. Julian of Norwich is an anchoress
who lived c. 1343 - c . 1413, and wrote two versions of her visions known as Revelations of
Divine Love popularly called Short Text and Long Text.
INTRODUO ...............................................................................................................08
1. Contexto Histrico de Juliana ........................................................................................17
2. Alguns apontamentos biogrficos sobre Juliana ................................................................29
3. Status da questo at a Idade Mdia ............................................................................38
4. Maternidade de Deus na Criao ........................................................................................43
5. Maternidade na Encarnao ........................................................................................51
6. Maternidade na Graa ...................................................................................................59
7. Atualidade da Teologia da Maternidade de Deus ................................................................66
CONCLUSO ...............................................................................................................73
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ............................................................................77
8
INTRODUO
Esse apontamento da teloga leiga anglicana Evelyn coloca o contexto das reflexes
msticas, muito mais no cho que no ar, ou seja, o mstico no um privilegiado por Deus,
mas algum que vive numa realidade em que Deus o centro de toda sua ateno, trabalho e
vocao. Assim, o misticismo muito alm de um movimento ou escola, deve ser a
realidade vital da religio, qualquer que seja2. Desta forma, o mstico no algum que detm
1
Para M. THORNTON, os msticos ingleses se enquadram em uma escola que entendida como um
movimento que empresta, elabora e mantm uma tradio viva. Uma escola no uma seita, mas uma tradio
viva que se desenvolve a partir do que ela empresta e adapta de outras tradies. cf. THORNTON, 1963, 45.
2
Para o telogo anglicano Martin Thornton prefervel palavra contemplao a misticismo, quando ele mesmo
diz: A palavra Contemplao prefervel a misticismo, e nas raras ocasies em que o ltimo termo usado,
significa - certo ou errado - apenas os estados extraordinrios associados geralmente com o ensino de pseudo-
Dionsio. idem, 20. Para ele, uma vida contemplativa era uma vida mstica e o misticismo era muito mais uma
busca pelos estados extraordinrios da vida espiritual.
9
poderes extra-humanos ou natureza privilegiada, mas apenas algum que, ilumina a normal
vida espiritual daqueles que creem.
Sabemos que a literatura mstica aflorou com maior profuso, durante a Idade Mdia.
Da procede destaques na literatura acadmica sobre os tipos ou gneros literrios da
Teologia Medieval, tal como a Escolstica, a literatura mstica tambm foi rotulada por ser
parte de um conjunto de obras de msticos que por sua vez, faziam parte de tradies
regionais-teolgicas como a Escola Germnica, Escola Cisterciense, Escola Franciscana,
entre outras3. Todas elas so entendidas como um tpico movimento literrio da Teologia
medieval, chamada misticismo. Entretanto, no estamos certos da conscincia da formao de
escolas ou mesmo da compreenso consciente de um tipo de gnero literrio. Os msticos,
acima de tudo, eram bastante livres em suas reflexes, e suas disciplinas de vida estavam
muito mais ligadas prxis da religio do que a um contexto literrio-acadmico. Seus
escritos so fundamentalmente direcionados s pessoas em seus dilemas concretos.
3
A Teologia Anglicana mantm um forte cunho agostiniano, enquanto em alguns aspectos da Teologia espiritual
da moderna Igreja Inglesa ainda absolutamente beneditina. A linha agostiniana que mais influencia
profundamente a tradio anglicana continuou atravs de Sto. Anselmo, os cnegos regulares de Austin, e,
especialmente, a escola de S. Victor, a Teologia Asctica de Hugh produziu uma profunda marca, mais do que os
conhecidos escritos de Ricardo Rolle. Este lado mais especulativo nos conduz a S. Toms e aos dominicanos; S.
Toms proporciona a principal fonte da Teologia Carolina e os frades-pregadores exercitam sua influncia nas
parquias inglesas. Todas essas fontes so claramente visveis na consumao do sculo XIV na religio inglesa.
A linha beneditina segue com a reforma cisterciense, de que a influncia sobre a Inglaterra evidente para
qualquer pessoa que tenha olhado para a histria monstica da Inglaterra. Este o lado afetivo, mas a
espiritualidade inglesa segue o Cistercianismo do mais reflexivo Guilherme de St. Thierry e do menos austero
Aelred de Rievaulx, em vez de S. Bernardo. Na histria da religio inglesa, Guilherme de S. Thierry desempenha
o papel de uma espcie de valete na manga: sempre aparecendo em lugares inesperados. A influncia franciscana
continua o esforo afetivo, mas a doutrina asctica, que ns devemos olhar, est para S. Boaventura, em vez do
prprio S. Francisco. Esta linha, tambm, leva diretamente para a formulada escola inglesa do sculo XIV.
10
o prisma de sua experincia com Deus. Por isso, o misticismo acaba no sendo refm de
definies estreitas e/ou excludentes, debaixo de princpios categricos como a lgica e razo.
O misticismo no tem essa preocupao de harmonizar a experincia ao intelecto, a f com a
razo, a religio com a cincia. Por isso, o misticismo cristo compreendido como
fundamentalmente inclusivo, pois seu entendimento passa pelo no alheamento do indivduo
busca de isolamento, mas pelo engajamento reflexivo s questes prticas da vida crist.
O tpico mstico, ento, a pessoa que tem uma certa experincia e conhecimento de
Deus atravs do amor e a literatura do misticismo expressa, ou tenta nos dizer, que o finito
esprito humano chegou a conhecer inteiramente o amor da relao entre o pequeno esprito
do homem quase-pronto e do Infinito Esprito-Deus. O mstico aquela pessoa que produz e
mantm acesa a sensao de Deus. Esta experincia com Deus pode vir de muitas formas e
sob diversos disfarces simblicos. Ela pode ser firme ou fugaz, fraca ou intensa, mas, na
medida em que direta e intuitiva sempre uma experincia mstica4. Vrias coisas podem
resultar dela, uma mudana total e reorientao de vida, uma disciplina longa, dura e
crescimento interior, uma imensa transformao da personalidade, um grande poder criativo.
Esses de quem falamos como grandes msticos, raramente so sonhadores contemplativos,
mas so pessoas cujas vidas foram todas refeitas em harmonia com esta experincia
avassaladora de Deus, e que, finalmente, conseguiram a unio com o Seu Esprito e ao na
ordem temporal com uma estranha originalidade e poder. Como Evelyn define: O estado
4
Para Thornton (1963, 17), fazendo um contraponto ao seu conceito de contemplao, um mstico
necessariamente produz experincias fantsticas e extraordinrias. diferente com os estados extraordinrios
de que trata a Teologia mstica - estados como unio mstica com suas manifestaes concomitantes - ou seja,
xtase, vises e revelaes. A marca desses estados a sua independncia de quem os vivencia. Eles so o
privilgio dos visionrios para quem Deus se une inefavelmente inundando-os com luz e amor. Ningum pode
efetuar estes fenmenos msticos dentro de si por quaisquer esforos ou mritos prprios. A alma do asceta com
a ajuda da graa faz um esforo para subir em direo a Deus, mas a alma do mstico repentina e
impetuosamente visitada por Deus, sem exercer qualquer atividade alm de receber e apreciar o dom divino.
11
final do mstico no o xtase alienante na Divindade, mas algo ao mesmo tempo mais difcil
e mais divino Uma difuso do amor para com todos em comum. (UNDERHILL, 1949,
115). Neste sentido, Martin Thornton em seu conceito de contemplao, tambm o aborda no
ambiente da prtica religiosa em seu estado de normalidade, fazendo da experincia concreta
na liturgia, sacramentos e orao comunitria, um intenso canal da vida mstica dos
indivduos, tal como pensava tambm Evelyn Underhill.
O que Thornton quer afirmar sua convico de que em toda vida litrgica,
devocional, piedade prtica e ao individual, refletem de um ato contemplativo, de uma
orao mental e silenciosa, que insere o indivduo no mistrio da f, e por isso mesmo, na
dimenso daquilo que vimos chamando de vida mstica. Apesar das diferentes concepes
sobre o objeto, que acaba tendo vrios sinnimos, a experincia mstica (como preferimos
dizer), lapidou uma importante contribuio na literatura, a qual Thornton chama de Asctica-
Teologia. Uma boa parte da Asctica-Teologia vem at ns em forma de progresses e
hierarquias: As trs formas de Purgao, Iluminao e Unio so fundamentais para a
espiritualidade catlica; S. Toms torna-os pessoais com a classificao Iniciantes,
Proficientes e Perfeitos. H tambm os 12 graus de humildade de S. Bento no cap. 7 do
Regula, a quntupla escada de Hugh de St. Vitor, e assim por diante. No de estranhar que
muitos dos clssicos espirituais incluem em seus ttulos palavras como escala, escada,
ascenso, e montanha que o cristo est a subir. Esses esquemas so no melhor sentido,
tericos. Isso no significa intil, impraticvel, ou acadmico, mas que eles devem ser
devidamente interpretados e utilizados. Todos os msticos catlicos incluem esses elementos
em propores variveis, mas a maioria deles tem vis suficiente para um lado ou para o outro
12
para ser facilmente classificados: os cistercienses produziram grandes estudiosos, mas eles
so claramente afetivos, os dominicanos produziram grandes santos devotos, mas sua nfase
claramente especulativa. A caracterstica central dos msticos ingleses que eles no podem
ser classificados dessa maneira (afetivo/especulativo), com constncia notvel mantm uma
sntese quase perfeita.
5
H um certo interesse na Igreja Celta, especialmente em seu sistema penitencial at a pr-Conquista do
beneditismo. Entretanto o pai-fundador, em quem a espiritualidade inglesa est primeiro claramente encarnada, a
primeira gerao por assim dizer, aparece na pessoa de Sto. Anselmo.
13
mstico ingls, estudou em Oxford e Paris, onde entrou em contato com os escritos dos
msticos franceses, italianos e alemes. Suas prprias obras, que so diretas e livres com
ideias difceis ou abstraes, foram lidas nos prximos dois sculos. Ele atacou a corrupo
dos mosteiros e pediu uma reforma do clero. Seu culto do Santo Nome de Jesus sobreviveu
Reforma, e muito da astcia de Rolle advm do imaginrio caseiro, especialmente aquela
que vem de seu trabalho mais conhecido, Fogo do Amor, que reapareceu em livros de piedade
ingleses dos sculos XV, XVI e XVII. Um contemporneo annimo de Rolle escreveu a
Nuvem do no-saber, que preenchido com as ideias e frases de Dionsio, o Areopagita.
Hilton (1396), tambm influenciado por Rolle, foi o autor da Escala de Perfeio, um
segundo devocional clssico em popularidade que perde apenas para a Imitao de Cristo.
Estes trabalhos mostram que, na Inglaterra, como no Continente, houve uma intensa vida
devocional dentro da Igreja. Fora dessas mesmas correntes veio o ensino de Wycliffe e a
pregao dos lollardos. Sua nfase sobre a corrupo da Igreja, a necessidade de uma
abordagem direta com Deus, e o valor da leitura da Bblia em lngua verncula simplesmente
levaram adiante, a heresia, a emoo religiosa intensa e o zelo moral e reforma dos msticos.
A Igreja parecia ter ido dormir em Sio, mas entre os fiis, as misrias da sociedade e as
muitas desordens na Igreja, despertaram uma devoo ardente de ideais cristos6.
6
Para mais detalhes sobre os msticos ingleses medievais cf. ARTZ, 1959.
14
Assim, o que queremos destacar, no o fato em si, pois no existem evidncias que
possam comprovar as ligaes de Juliana com existncia da chamada comunidade de
interpretao amigos de Deus postulada por vrios estudiosos. O que frisamos o fato de
que, assim como em Juliana, tambm foi comum para outros msticos formao de um
grupo de recepo, elaborao e partilha de novas ideias, concepes, conceitos recebidos
pelas vias contemplativas ou msticas. Talvez tenha sido essa prtica, que deu origem aquilo
que sublinhamos ser importante em nosso trabalho, o desenvolvimento de uma Asctica-
Teologia. Thornton destaca que existem duas formas ou concepes de vermos a Teologia,
uma a Asctica-Teologia a outra a Teologia-Asctica.
Essas duas dimenses so o foco de nossa preocupao maior com a Teologia. bem
sabido que Teologia convive com uma crise de mtodo na sociedade contempornea. Boa
parte de todo o instrumental desenvolvido desde o sculo XIX com o Liberalismo Teolgico,
o Mtodo Histrico-Crtico, a logicidade e racionalizao da Teologia Dogmtica, elevaram
Teologia ao status de cincia, nos padres cartesianos, mas tornaram-na uma terra
improdutiva no que tange transcendncia do esprito. Longe dos padres da Teologia
Patrstica, dominada fortemente pelo Mtodo Alegrico, Asctica-Teologia, como definida
por Thornton muito mais uma questo de mtodo que de fazer teolgico, mesmo assim, sua
15
Igreja. A Teologia dos Msticos toda aquela coleo de Literatura Mstica Medieval de que
temos falado. A Teologia-Asctica aquela produzida pelo intelectual que ir debruar-se
sobre os escritos dos msticos e dela produzir uma Teologia com rigor acadmico, como este
trabalho pretende ser, um olhar fixo no conceito de Maternidade de Deus elaborado a partir
das vises msticas de Juliana de Norwich. Destacamos que em todas essas definies, o
ascetismo uma disciplina irrevogvel e indispensvel. Para o mstico necessrio uma
intensa vida de orao e disciplina espiritual em que Deus possa revelar-se em sua vida
normal, e para o Telogo, o ascetismo ser fundante para a produo de uma reflexo que de
fato, queira atingir seu fim ltimo, a adorao a Deus por meio do estudo.
7
Referimo-nos ao ramo da Teologia que se dedica anlise, estudo e crtica das relaes de gnero no
desenvolvimento das religies, em particular o cristianismo, os reflexos das relaes de poder e domnio no
campo simblico-imaginrio e em todo o campo das representaes simblicas. Cabe a Teologia de Gnero a
tarefa de clareza dos desequilbrios operantes no sistema religioso e a desmistificao das reprodues sociais
com o objetivo de um maior inclusivismo religioso-teolgico.
17
Como percebemos, embora haja discordncia sobre a provvel data de confeco dos
textos, isso porque, no dispomos dos manuscritos originais, e com o trabalho de copistas,
algumas discordncias surgiram, a obra est dentro do contexto do longo sculo XIV, longo
porque os principais eventos na histria da Igreja e da Inglaterra sucederam-se nesse tempo.
Vejamos alguns deles.
Como sabemos, o idioma escrito oficial durante a Idade Mdia foi o latim, uma
reminiscncia do Imprio Romano que ainda unificava a Europa aps o colapso. Isso to
pouco significa que no existissem as lnguas regionais. Na Inglaterra mesmo, o breto foi
lngua falada at as sucessivas invases vikings que acabaram suprimindo o idioma. Depois,
com a invaso normanda ao sul da ilha, o francs tornou-se idioma oficial da corte,
juntamente com o uso escrito do latim. Curiosamente, no sculo XIV que o sentimento
nacional ingls ressurge, o desejo pela autonomia e emancipao, e o ingls ser smbolo
cultural dessa resistncia8. Por isso, Juliana conhecida como a primeira mulher a escrever
em ingls, ainda em sua forma arcaica, pois a lngua era apenas oralizada, e por isso, este
indicativo j importante em si, pois destacam vrias incgnitas, como a questo de se ela
seria de fato simpatizante da causa nacional ligada aos movimentos literrios de Chaucer e
Langland, ou se estava mais associada ideologicamente concepo pr-reformada de
Wycliffe que foi o primeiro tradutor das Sagradas Escrituras em ingls, ou se ela de fato, no
conhecia o latim e por isso escreveu em ingls. Os poetas ingleses estavam absolutamente
engajados com o nacionalismo. Este sentimento expresso no poema de Langland, Vises de
Piers, o lavrador. O grito do poeta Inglaterra para a Inglaterra! Ele denuncia o papa por
intervir nos benefcios ingleses e indicar estrangeiros para eles; ele denuncia a exportao de
dinheiro ingls para Avignon ou Roma e prope que os piedosos homens ingleses faam as
suas peregrinaes, no para S. Pedro, em Roma, mas para cadeias, hospitais e casas de
8
Segundo Alister McGrath havia uma ansiedade complexa dentro da academia inglesa sobre a prpria
natureza do idioma ingls. Para os latinos - e os crticos de lngua francesa, ingls era uma lngua brbara, sem
qualquer estrutura gramatical real, incapaz de expressar as verdades profundas e nuances da Bblia, em
particular, e da f crist em geral. Esse descontentamento foi implicitamente rejeitado no sculo XIV do ingls
como uma sria linguagem de f, e se tornou um importante debate em Oxford em 1401. Ricardo Ullerston
defendeu o ingls contra seus crticos bravamente, mas acabou em vo. Concluiu-se que o ingls no era uma
linguagem apropriada para a traduo da Bblia. Foi um pequeno passo, mas a partir deste julgamento literrio
houve a deciso essencialmente poltica de proibir o idioma ingls de todos os aspectos da vida da Igreja inglesa.
Esta deciso, tomada em 1407-9 por Toms Arundel, Arcebispo de Canturia, teve especial relevncia para a
questo da traduo bblica. O ingls [...] tornou-se assim a linguagem religiosa subterrnea. Escrever em ingls
era o equivalente a pregar ideias herticas. At o fim de 1513, Joo Colet - ento reitor da Catedral de S. Paulo,
em Londres - foi suspenso de seu cargo por traduzir a Orao do Senhor para o ingls. Passim. Apud: JOHN-
JULIAN. 2009, 49-50. Susan Mahan destaca em sua dissertao que at meados do sculo XIV havia duas
lnguas vernculas, anglo-normando e ingls mdio, para duas classes da sociedade, os mais instrudos e os
camponeses. Mas por volta de 1363, o ingls mdio estava bem estabelecido como lngua oficial dos tribunais
civis e do Parlamento. Por volta de 1380, tornou-se a lngua diria do comrcio entre o pblico em geral. O
anglo-normando no foi expurgado, mas foi integrado e fornece grande parte de sua preciso e riqueza,
especialmente em seu legado de sinnimos. MAHAN, 1987, 12.
20
pobres em suas prprias vizinhanas. No pode haver dvida de que Langland expressava o
sentimento de um crescente grupo de ingleses.
A citao acima uma aluso ao fato de que a prpria Juliana descreve-se como uma
mulher iletrada. Furlog em sua tese argumenta que ela provavelmente conhecia apenas o
ingls, apesar de seu conhecimento bblico, em grande parte atribudo a sua vida religiosa,
especialmente a disciplina da Lectio Divina. Ainda assim, parece-nos intrigar, o fato de que
Juliana em sua argumentao, costura muito bem sua redao com a inspirao de outros
grandes clssicos do misticismo medieval alm de seu profundo conhecimento bblico. Se ela
no lia latim, que verso das Escrituras teria utilizado? A nica verso em ingls disponvel
era a de Wycliffe (1380-1388). No h estudioso de Juliana que conteste a proposio de que
Juliana demonstra uma familiaridade com as Sagradas Escrituras. Alguns acreditam que ela
foi educada (provavelmente em um convento) e que ela poderia ler o texto da Vulgata Latina
da Bblia, fazendo suas prprias tradues. O Pe. John-Julian (2009, 57), comenta [...] pode-
se notar que no captulo 4 (das Revelaes do Amor Divino), Juliana cita as palavras da
Santssima Virgem: Lo me, Gods handmayd(Lucas 1:38 Eis aqui a serva do Senhor), e
pode ser interessante notar que somente Wycliffe traduz a palavra (Grego: idou; latim: ecce)
como lo .... Todos os outros tm a palavra traduzida como Behold (Eis que ...) ou
omitem completamente. (grifo do autor). A presena desses elementos, faz-nos entender uma
certa familiaridade com a traduo de Wycliffe, visto que as demais tradues para o ingls
surgem depois, como conhecida a verso do Novo Testamento de Tyndale (1526) e a
Verso do Rei Tiago (1611). Conforme o Pe. John-Julian (2009, 52) durante a vida de Juliana,
a Vulgata Latina de S. Jernimo foi nica verso autorizada da Escritura em uso geral em
toda a Igreja. Ele acredita que cultural e literariamente improvvel que Juliana conhecia o
latim - pelo menos no no momento do primeiro registro de suas revelaes.
21
Porque Juliana se arriscaria escrevendo em ingls, num perodo em que apesar do forte
sentimento nacionalista surgindo na Inglaterra, o uso do latim considerado quase dogma
pela Igreja no somente em sua liturgia, mas no ambiente acadmico e documental? Porque
Juliana se arriscaria escrevendo em ingls, num perodo em que Wycliffe e os Lollardos
tentam tirar o monoplio de interpretao das Escrituras traduzindo a Bblia e por isso serem
considerados hereges eles, e seus seguidores e suas tradues serem queimadas como
esprias? Ao mesmo tempo em que parece estar associada ideologicamente ao movimento
lollardista, no nos parece provvel, visto que o foco de maior tenso dos lollardos era
justamente os mosteiros, eremitrios, abadias e conventos, e parece-nos pouco provvel que
Juliana teria estado ao lado de um movimento que condenava suas prticas e disciplinas
religiosas. No nos parece ento muito inteligente da parte de Juliana ter escrito em ingls, a
menos que tenha sido de fato, intencional, pontuando seus posicionamentos ideolgicos e
eclesisticos.
neste perodo que a situao das relaes da Inglaterra com o Papado mudam muito.
Houve uma sria instabilidade na Igreja. No estgio mais amplo, a cristandade ocidental foi
dividida pelo Grande Cisma de 1378-1414 com dois, e s vezes trs, pretendentes a papa. Foi
durante esse sculo que o papado foi submetido humilhao do seu Cativeiro Babilnico,
em Avignon. O conceito hildebrandino9 de soberania papal tinha encontrado a sua mais
brilhante expresso no pontificado de Inocncio III (1198-1216). Deste znite papal, a histria
s de declnio e desiluso. Os apelos temporais do papado receberam golpes sobre golpes,
at que os papas foram forados a deixar Roma. De 1309 at 1377, o papado ficou alojado em
Avignon, no Reno, e todos os papas foram franceses. Parecia ao mundo que o papado tinha se
tornado uma instituio francesa. Para os olhos ingleses, o papado aparecia como um aliado e
instrumento do inimigo nacional. (cf. Oliveira. 1994)
9
Hildebrando, tambm conhecido como Papa Gregrio VII desenvolveu o Conceito de Soberania Papal, em que
a Igreja era soberana a qualquer poder temporal e o Papa a maior autoridade da Terra. O papa o senhor
absoluto da Igreja estando acima de fiis e clrigos, da igreja local e nacional e acima dos conclios. Todos lhe
devem submisso, incluindo os prncipes e imperadores.
22
Sabemos que a luta pela hegemonia poltica e comercial entre Inglaterra e Frana
anterior mudana do papado de Roma para Avignon. O surgimento do sentimento nacional
ingls, o incio do conflito que foi conhecido por Guerra dos Cem Anos entre Inglaterra e
Frana, atrelado ao fato da entronizao de um papa francs que muda a s para o territrio do
inimigo, tornam as relaes entre a Inglaterra e Papado complexas. Esta situao de
desconforto ir eclodir no prximo conclave em que a presso para que o papado volte para
Roma, e a revolta do povo italiano que pressionava para a escolha de um Papa Italiano,
acabou por eleger Urbano VI, que era um arcebispo napolitano, e foi o ltimo papa eleito que
no era cardeal. Urbano comeou seu pontificado por fazer vrias reformas, particularmente
no poder e privilgios dos cardeais. Desgostosos com esta situao, um grupo de cardeais,
reunidos em Anagni, na Itlia, declararam a eleio de Urbano VI nula e escolheram Roberto
de Genebra, outro francs, que foi entronizado como Clemente VII. Logo Clemente VII
restaurou a antiga corte papal em Avignon e o papado estava dividido. Uma cruzada foi
pregada na Inglaterra por Spencer, bispo de Norwich, cujo objeto foi a de reunir um exrcito
que poderia apoiar as pretenses de um Papa contra o outro. Como um Papa teve o apoio da
Frana, o outro Papa estava ansioso para o apoio da Inglaterra. Ele prometeu, portanto, a
absolvio, e salvao eterna para aquelas pessoas que fossem e lutassem contra seu rival. O
Bispo Spencer trabalhou duro pela causa, e tendo reunido um exrcito pobre e mal equipado
de devotos iludidos, comeou em Calais, massacrando toda a populao, mas finalmente
encontrou-se em cheque, e foi obrigado a se render. (cf. CARPENTER, 1905, 152-153).
23
10
Aps o cisma papal de 1378, quando havia duas obedincias e papas rivais que anatematizavam e lutavam
entre si, Wycliffe chegou a considerar o papado como o Anticristo, um antema. Ele desafiou toda a teoria do
poder papal, e negou as reivindicaes papais como bblicas. PATTERSON, 1937, 157.
24
por D. Joo para si e seus sucessores. Esta alegao foi enfaticamente rejeitada pelo
Parlamento, e a susserania papal renunciada. Por um tempo, mesmo o pagamento do bolo de
S. Pedro11 foi interrompido. Foi possivelmente nesta ocasio, mas mais provavelmente em
1374, que Wycliffe foi contratado pelo Rei para escrever uma resposta rebatendo a alegao
papal.
Apesar do Grande Cisma ter relativamente pouco efeito prtico sobre o cristo local,
na Inglaterra, foi certamente parte da percepo geral de que a Igreja e seus poderes sobre as
pessoas estavam se enfraquecendo. Adicione a isso a degenerao moral geral das ordens
religiosas inglesas, a prevalncia de clero paroquial iletrado e inadequado, o engajamento
esmagador dos bispos e arcebispos na vida poltica secular, a agitao popular dos Lollardos,
e a escalada gradual de textos religiosos disponveis no vernculo. O resultado foi um
movimento quase inconsciente (mas generalizado), que comeou a dar validao significativa
para uma espiritualidade sria que dependiam menos e menos das formais fontes eclesisticas
ou de aprovao clerical, e mais na experincia pessoal e santidade - como os escritos de
devotos como Juliana de Norwich e seus companheiros msticos ingleses.
11
Esmola ou oferta dos fiis ao Papa para fins especficos de caridade a fieis em situao de risco, dioceses e
institutos em dificuldades, a manuteno institucional, etc. cf.
<http://www.vatican.va/roman_curia/secretariat_state/obolo_spietro/documents/actual_po.html>
25
12
Peste Negra a designao pela qual ficou conhecida, durante a Baixa Idade Mdia, a pandemia de peste
bubnica que assolou a Europa durante o sculo XIV e dizimou entre 25 e 75 milhes de pessoas, sendo que
alguns pesquisadores acreditam que o nmero mais prximo da realidade de 75 milhes, um tero da
populao da poca.
26
inquietao, decretou o Estatuto dos Trabalhadores, em 1351, que tratava de limitar salrios e
sujeitar os trabalhadores a sua ocupao presente. Os trabalhadores no puderam ser tolhidos
e se rebelaram abertamente contra as altas taxas estabelecidas em 1380 e 1381. Um exrcito
desses rebeldes rurais, liderado por Walt Tyler, marchou sobre Londres e ocupou a cidade.
Entre esses rebeldes estavam alguns clrigos, notadamente Joo Ball. Esses clrigos
denunciavam arrojadamente, s injustias polticas e sociais, mas eram, na maioria,
integrantes do clero menor. Essa rebelio foi, pois, contra o sistema feudal e Igreja, j que
esta, em si, era uma enorme e rica proprietria feudal de terras. (cf. OLIVEIRA, 1994, 52).
Revolta dos Camponeses eclodiu em Norwich em 17 de junho de 1381, quando um bando
rebelde, liderado por Geoffrey Lister, foraram a abrir as portas da cidade. Lister saciava-se
com o espetculo, banquetes e orgias enquanto os seus, saqueavam a cidade. Nada era
considerado sagrado, a propriedade foi tomada, mosteiros saqueados e igrejas destrudas. A
paz foi finalmente restabelecida pelo bispo de Norwich, Henrique Despenser. A execuo de
G. Lister, segundo estudiosos, se deu muito prximo o local onde Juliana viveu. (cf.
FURLOG, 1996, 187). No entanto, com a paz veio o ressentimento porque revolta havia
sido enraizada no desespero dos pobres conduzidos a medidas extremas por causa da fome.
Em Norwich, pode-se dizer, que os eventos ocorriam primeiro, pois era segunda
principal cidade da Inglaterra, sendo um importante porto de navegao e comrcio europeu.
Norwich desfrutava de riqueza econmica, principalmente por causa de sua posio
dominante no comrcio de l. Ela est localizada na Anglia Oriental no Rio Yare e seu
afluente, o Wensum. Isto permitiu o acesso direto cidade de Great Yarmouth e as rotas do
Mar do Norte para o continente. No s os bens materiais, tais como l, passaram por
Norwich, mas tambm novas ideias seculares e religiosas. Quase todas as grandes ordens
religiosas (franciscana, beneditina, dominicana, carmelita e os frades de Austin), tinham casas
em Norwich. provvel que cada um destes mosteiros tinham uma boa biblioteca pois eles
produziam um nmero significativo de estudiosos. Havia tambm 46 guildas (agremiaes)
de artesanato e confrarias piedosas em 91 diferentes artes. (cf. BIOLLO, 1999, 19-21).
Outro importante fator para entender Inglaterra nos dias de Juliana, e j temos
destacado anteriormente, est associado figura de J. Wicliffe que viveu cerca de 1320 a
1384, de esprito ousado, reformado muito antes da Reforma, mestre dos Hussitas da Bomia
e puritano antes da existncia do termo, pertencera nos primrdios da sua carreira Igreja
cesariana. Estivera a servio da Coroa, veio a ser em Oxford um dos telogos mais clebres
27
13
Joo Duns Scotus, ou Scot, nasceu em Maxton, condado de Roxburgh na Esccia (ou Ulster) em 1265, viveu
muitos anos em Paris, em cuja universidade lecionou, e morreu em Colnia no ano de 1308. Membro da Ordem
Franciscana, filsofo e telogo da tradio escolstica, chamado o Doutor Sutil, foi mentor de outro grande nome
da filosofia medieval: Guilherme de Ockham, conhecido como o Doutor Invencvel, nasceu na vila
de Ockham, nos arredores de Londres, na Inglaterra, em 1285, e dedicou seus ltimos anos ao estudo e
meditao num convento de Munique, onde morreu em 9 de abril de 1347, vtima da Peste Negra.
28
associado com Chaucer e Langland. Os dois textos de Juliana so, de fato, os mais antigos
escritos populares de uma mulher inglesa hoje conhecidos. (SHELDRAKE, 2005, 129-131).
29
A Tradio afirma ter sido Juliana uma reclusa, um tipo de monasticismo anacoreta
bastante comum na Idade Mdia e ainda hoje resistente na Tradio Carmelita. O texto acima
citado Ancrene Riwle (ou Ancrene Wisse) nada mais que uma regra especfica para reclusos,
evidentemente muito mais disciplinada e severa que s conhecidas regras monsticas, porque
os anacoretas eram conhecidos pelo isolamento, solido, recluso em suas celas. Alguns
pesquisadores associam hbitos e usos de Juliana quilo que previsto pelo Ancrene Riwle.
30
A citao acima corrobora com a que outros autores tambm vm afirmando. O que
desejamos destacar o alto nvel de clausura a que eram submetidos os anacoretas. Tendo ou
no mais de um quarto ou jardim, a privao de relacionamentos, inclusive entre outros
anacoretas, era total. O ritual de enclausuramento fundamentado sobre o ritual de Requiem
atesta o fato de que o anacoreta deveria ser esquecido como algum que vive, e lembrado
por ele mesmo, como algum que morreu para o mundo. Desde o Ancrene Wisse que se
probem anacoretas de ter qualquer tipo de animal, exceto um gato, que tornou tradicional
para mostrar a hagiografia de Juliana16, outros dados sobre Juliana podem ser obtidos a partir
de documentos, cartas e textos que atestam sua existncia.
16
O gato tinha um uso prtico, o de manter baixa a populao de ratos.
32
incio de sua obra, dizendo ter 30 anos e meio no dia das vises e com base na data do
documento, h um consenso sobre o ano de seu nascimento.
17
O Pe. John-Julian em sua anlise sobre os manuscritos afirma que: a data real do incio das vises no
totalmente clara, porque os dois manuscritos importantes discordam: o Manuscrito Sloane diz no captulo 2, que
as vises ocorreram no viiith day of May [dia 08 de maio], enquanto o Manuscrito Paris l the xiij daie of
May [no dia treze de maio]. Um dos escribas cometeu um erro na transcrio de um x para um v, ou vice-
versa. Desde o Manuscrito Sloane que era o mais popular e mais familiar na dcada de 1970, foi deciso de
ambas, a Igreja da Inglaterra e Igreja Episcopal dos Estados Unidos incluir a comemorao de Juliana nos
calendrios eclesisticos em 8 de maio. cf. JOHN-JULIAN. 2009, 35-36.
33
Alguns autores defendem a tese de que ela no tinha tanto conhecimento de latim, e
que provavelmente seu conhecimento era fundado no culturalmente conhecido,
particularmente as expresses litrgicas. Ainda assim, no h algum estudioso que afirme no
ter um conhecimento bblico aprofundado para os padres medievais e tambm grande parte
dos crticos afirma que ela tem de fato um conhecimento da tradio dos escritos msticos e
escolsticos. O fato de que sua forma de escrever, dando a impresso de algum que conhece
os fundamentos da retrica clssica e tambm de sua conscincia sobre a profundidade dos
temas teolgicos por ela abordados, aponta para que ela talvez tivesse tido uma educao
privilegiada. O fato de que h um salto de qualidade de reflexo teolgica e de escrita entre o
Texto Curto e Longo inegvel. A questo como e onde ela poderia ter recebido sua
educao e o que representa este salto qualitativo entre os textos. Uma indicao bvia de
imerso de Juliana na Tradio Monstica ocidental a proliferao de emprstimos e de
aluses aos escritores monsticos da Tradio. Grande parte da Teologia trinitria de Juliana e
de sua antropologia crist baseada nos escritos de Guilherme de S. Thierry, que por sua vez
35
se baseia na Tradio que o precedeu. Parece evidente que ela leu a Epstola Dourada e h
indcios de que ela tinha acesso, a pelo menos trechos de vrios outros de seus trabalhos. No
Texto Longo de Juliana se encontram as pegadas de outros telogos monsticos. claro que
ela foi exposta a muitos dos escritos fundamentais da Tradio Monstica. Alguns autores
indicam familiaridade com as cartas de sua grande contempornea Sta. Catarina de Siena 18, e
h vrias outras partes de seu texto que parecem ter sido sugeridas pelo ensino de Eckhart19.
Teria sido realmente estranho, se ela no tivesse sido influenciada pelo reavivamento
espiritual no continente, por Norwich, como a segunda maior cidade da Inglaterra e do centro
do comrcio de l, que estava em comunicao estreita e constante com os Pases Baixos.
Como uma mulher poderia ter galgado algum conhecimento e educao no contexto
medieval, se no fosse oriunda de uma classe aristocrtica ou religiosa? 20 No nos parece to
bvio a tese mais defendida entre os autores e a discusso pode ser relevante a partir do seu
prprio nome. Segundo boa parte dos estudiosos, era uma prtica comum os monges, frades,
freiras, mudar seus nomes para o nome de um santo quando faziam os seus votos. Por isso,
muitos supem que ela teria recebido o nome de Juliana por conta da ligao com a Igreja de
S. Julien de Le Mans. Mas h contestaes que indicam que no era comum que uma monja
ou freira recebesse um nome de santo masculino mesmo que na Inglaterra da poca tivessem
mulheres com nome de batismo Julian ou Juliana. A questo que no era comum que uma
mulher recebesse o nome de um santo masculino.
18
Catarina de Siena nasceu em 25 de Maro 1347 e morreu em 29 de Abril 1380 aproximadamente. Foi uma
leiga da Ordem Terceira de So Domingos, venerada como Santa Catarina na Igreja Catlica. Nasceu
em Siena, Itlia. Embora analfabeta, Catarina ditou mais de 300 cartas endereadas a todo o tipo de pessoas,
papas, reis e lderes, e ao povo em geral. Uma das suas obras ditadas, Dilogo sobre a Divina Providncia, um
livro ainda hoje considerado um dos maiores testemunhos do misticismo cristo e uma exposio clara de suas
ideias teolgicas e espiritualidade.
19
Eckhart de Hochheim, O.P., mais conhecido como Mestre Eckhart, nasceu em Tambach, Turngia, em 1260 e
morreu em Colonia, 1328. Era chamado de Mestre em reconhecimento aos ttulos acadmicos obtidos durante
sua estadia na Universidade de Paris. Foi um frade dominicano, reconhecido por sua obra
como telogo e filsofo e por suas vises msticas.
20
Alguns autores no assumem uma posio categrica, no seguindo nem a tradio, mas tambm no
confirmando as especulaes recentes, um exemplo Philip SHELDRAKE (2005, 129) que diz: Como era
prtica comum entre eremitas, o nome Juliana foi tirado da igreja de Norwich, S. Julian, qual seu convento ou
eremitrio era agregado. No sabemos se ela chegou a ser casada, se era originalmente freira ou se pertencera a
um dos grupos religiosos mais informais de mulheres, vindos de Flandres (beguinas) que existiam em Norwich.
Em contrapartida, h tambm os autores que, com base na prpria definio de Juliana no primeiro captulo de
seu Texto Curto afirmam ter sido ela uma mulher quase-analfabeta mas que teve um salto de conhecimento para
o Texto Longo. cf. HERBERT THURSTON, S. J. DONALD ATTWATER. 1956, 301-302.
36
ter falado de um de seus filhos. Assim, Pe. John-Julian contesta a verso de que ela tenha sido
uma anacoreta com os argumentos abaixo:
A controvrsia sobre quem foi Juliana relevante, uma vez que documentos externos
como os anteriormente citados, destacam-na como uma anacoreta, e em contraponto, a partir
de elementos internos ao texto, John-Julian parece refutar totalmente a ideia de que ela tenha
sido uma anacoreta. Parece-nos estar muito mais inclinado a aceitar o fato de que ela tenha
sido uma religiosa de vida monstica ou semi-monstica mas no uma reclusa. De qualquer
forma, consenso de que ela tinha um aprofundado conhecimento das Sagradas Escrituras,
dos escritos teolgicos da Tradio e tambm da Literatura Mstica.
38
Como lemos acima, mesmo no estando explicitamente dita a palavra me, cunhada
em algumas passagens bblicas que j citamos, vemos que essas referncias so entendidas, na
concepo hebraica e depois grega, como caractersticas/atributos femininos, como o
conceito de Shekinah e Sophia e que depois na traduo para a cultura latina e ocidental, sero
entendidos como um atributo masculino. S. Toms de Aquino em sua reflexo ontolgica
sobre Deus elimina a concepo de gnero presente na Escritura. Embora as expresses
sempre fossem metafricas, elas buscam explicar a relao do ser de Deus e sua ao com a
humanidade.
39
[...] parece que Deus no est em gnero algum como uma espcie, a
adio da diferena ao gnero o que constitui a espcie; logo a
essncia de toda espcie compreende algo alm do gnero. O ser, que
a essncia de Deus, no contm em si adio alguma, logo Deus no
espcie de gnero algum. Alm disso: como todo gnero contm
diferenas em potncia, em todo ser cuja constituio est baseada no
gnero e as diferenas tem ato misto de potncia: assim que Deus
um ato puro sem mescla de potncia, segundo se tem mostrado antes;
logo sua essncia no consta de gnero e diferenas, e pelo mesmo
no est em gnero algum. (AQUINO, 1943, 23).
21
Entendemos por teologia escolstica medieval quela teologia que se utilizou do mtodo do escolasticismo que
nada mais foi que a tentativa da conciliao da f crist com o pensamento racional, especialmente com a
filosofia grega. Tem como seus principais expoentes Anselmo de Canturia, Alberto Magno, Roberto
Grosseteste, Rogrio Bacon, Pedro Abelardo, Bernardo de Claraval, Joo Escoto Ergena, Joo Duns Scot, entre
outros.
40
22
A sua origem remonta fundao da Abadia de Cister, na comuna de Saint-Nicolas-ls-Cteaux, Borgonha,
em 1098, por Roberto de Champagne, abade de Molesme. Este, juntamente com alguns companheiros monges,
deixara a congregao monstica de Cluny para retomar a observncia da antiga regra beneditina, como reao
ao relaxamento da Ordem de Cluny. A ordem cisterciense promove o ascetismo, o rigor litrgico e erige, em
certa medida, o trabalho como valor fundamental, conforme comprovam seu patrimnio tcnico, artstico e
arquitetnico. Alm do papel social que desempenha at a Revoluo Francesa, a ordem exerce grande
influncia no plano intelectual e econmico, assim como no campo das artes e da espiritualidade, devendo seu
considervel desenvolvimento a Bernardo de Claraval (1090-1153), homem de excepcional carisma.
Atualmente, a ordem cisterciense de fato constituda de duas ordens religiosas e vrias congregaes. So
comumente chamados "trapistas", pois a criao da ordem resultou da reforma da abadia da Trapa (em Soligny-
la-Trappe, Baixa-Normandia, Frana). Mesmo separadas, as duas ordens tm ligaes de amizade e relaes de
colaborao. O hbito tambm semelhante. Os cistercienses so conhecidos como monges brancos em razo da
cor do seu hbito.
42
ideia materna ou feminina de Deus na Tradio Bblica, Escolstica e mstica que antecedem
Juliana, elas no passam de citaes rpidas e no muito sistematizadas num conceito crtico
como ser pensado e aprofundado por Juliana em Revelaes do Amor Divino. Nos prximos
captulos, iremos explorar o conceito a partir da prpria concepo de Juliana como ela
mesma o entende, a Maternidade de Deus na Criao, a Maternidade de Deus na Encarnao
(Paixo) e a Maternidade de Deus na Graa (Trabalho).
43
E portanto, a ns nos corresponde amar a nosso Deus, em quem temos nosso ser,
agradecendo-lhe reverentemente e louvando-lhe por nossa criao, orando vigorosamente a
nossa Me pela misericrdia e a piedade, e a nosso Senhor o Esprito Santo por graa e
ajuda. (Juliana de Norwich, cap. 59).
Para Juliana, Deus carrega consigo toda a Criao, preserva em unidade consigo, e
essa unidade se d por duas vias, primeiro por uma ideia remota de cuidado uterino que gera o
cosmo, depois pela ideia da Encarnao, em que Jesus Cristo assume nossa substncia e
sensualidade como ela define, unindo mais uma vez, na recriao, Deus e a Criao. Essa
unidade substancial pode ser percebida em sua citao abaixo:
23
Em geral, o termo partenognese est associado ao dogma da imaculada conceio de Maria ou nascimento
virginal de Jesus. A referncia est em consonncia com o uso que S. Mateus faz em sua narrativa do termo
parthenos retirado de sua interpretao da Septuaginda da Profecia de Isaas 7,14. Evidentemente que os crticos
concordam que o termo original em hebraico almah que no refere-se a virgindade seno a uma moa jovem
ou menina. O uso que fazemos do termo partenognese, que biologicamente uma reproduo assexuada ou
virginal, no est vinculado s narrativas do nascimento de Jesus, mas Teologia da Criao, em que Deus pari
de si mesmo toda a Criao e d a luz a humanidade sua imagem e semelhana.
44
Pois nesta unidade onde reside a vida de toda a humanidade que ser
salva. Pois Deus tudo o que bom, segundo vi, e Deus tem criado
tudo o que tem sido criado, e Deus ama tudo o que Ele tem criado, e
todo o que ama em conjunto a todos seus semelhantes cristos devido
a Deus, ama tudo o que . Pois na humanidade que ser salva est
compreendido tudo, quer dizer, tudo o que tem sido criado e o Criador
de tudo. Pois Deus est no homem e em Deus est tudo, e quem assim
ama, ama tudo. (JULIANA de Norwich. cap. 9).
Para ela Deus est no homem, e todas as coisas esto em Deus, pois Ele a me de
todas as naturezas e nele esto todas elas, mesmo assim, Deus no elas, de forma que Deus
em natureza, maior que elas, portanto Deus no se confunde com o cosmo, mas est presente
nele, de forma que a implicao tica do amor a Deus, implica num amor de cuidado e
preservao de toda a Criao, pois quem ama a Deus, segundo Juliana, ama a tudo ou a todas
as coisas, pois Deus est em todas elas uma vez que tudo fluiu de sua bondade e amor
criacional e toda a natureza foi assumida pelo Cristo. A Natureza est na existncia de Deus:
isto , a Bondade que a Natureza , Deus. Deus a Base, a Substncia, a mesma coisa que a
essncia da Natureza. Deus verdadeiramente Pai e Me da Natureza e todas as naturezas que
fluem de Deus para cumprir a vontade divina sero renovadas e trazidas de volta para Deus,
pela libertao das pessoas por meio da obra da graa. (DOYLE, 1993, 110). Aqui, no
somente o dado ontolgico sobre Deus, mas tambm a cosmologia e soteriologia de Juliana se
confundem, e esto intimamente imbricadas, associadas, de forma que no possvel entender
a salvao de todo o cosmo sem compreender a natureza ontolgica do prprio Deus e a
cosmogonia. Assim como Deus verdadeiramente nosso Pai, Deus tambm
verdadeiramente nossa Me. (DOYLE, 1993, 107). Em sua viso, a concepo de Deus-Pai
est presente do incio ao fim de seus textos, no havendo conflito, pois para ela, tanto a
paternidade quanto a maternidade so atributos de Deus que a humanidade empresta e no o
contrrio, como S. Toms entendia. Para ela, dizer que Deus Me, no se trata de emprestar
uma imagem humana para metaforizar o ser de Deus, mas o inverso verdadeiro, trata-se de
um emprstimo que Deus faz daquilo que , por isso, para ela, apenas Deus deveria ser
chamado verdadeiramente de Me. O servio materno mais prximo, mais pronto e mais
certo. Essa funo ningum tem capacidade nem sabe como preencher a contento, exceto
Deus. (DOYLE, 1993, 109). Em minha anlise, essa afirmao de Juliana supera os enfoques
que alguns estudiosos do ao atribuir a Juliana um olhar sobre a Teologia de Gnero. Pelo
contrrio, olhando fixamente para o ser ontolgico de Deus, sua natureza amorosa e ao,
45
que ela encontrar a imagem da verdadeira Me e no voltar sua ateno humanidade, ela
revela que somente Deus verdadeiramente Me. Deus sente grande prazer em ser nosso
pai, e Deus sente grande prazer em ser nossa Me, e Deus sente grande prazer em ser nosso
verdadeiro Esposo e nossa alma a Esposa amada. Cristo sente grande prazer porque Ele
nosso Irmo, e Jesus sente grande prazer, porque Ele nosso Libertador. So cinco grandes
alegrias que Deus quer que desfrutemos. (DOYLE, 1993, 89). Essa definio de Juliana em
seu Texto Curto parece-nos apontar para uma diversidade de atributos, mas todas elas esto
envolvidas pelo conceito de maternidade. Como dissemos, para ela Deus Pai-Me, mas ela
tambm diz ser Ele nosso Esposo, utilizando aquelas imagens tpica do Cntico dos Cnticos.
A imagem de esposo poder ser compreendida no contexto da Maternidade da Encarnao,
assim como a de irmo e por ltimo a de libertador que ser compreendida na concepo
de Maternidade na Graa. Essas so as cinco alegrias da humanidade.
humanidade. Orar ao Esprito Santo por socorro e graa tem relao direta com a vida e
presena sacramental no interior do mistrio da Igreja, seja no sacramento do Batismo seja na
Eucaristia que sero entendidos como o Novo Nascimento e a Alimentao divina a nossa
substncia e transformao de nossa sensualidade. A maternidade incorpora propriedades
que pertencem unidade trinitria da divindade. (HIDE, 1999, 279). Em Juliana, o conceito
de substncia ir repousar no interior do prprio ser ontolgico da Trindade e para ela Deus
em sua sabedoria assume a maternidade de toda humanidade quando ela diz: E nossa
substncia est em nosso Pai, Deus Todo-poderoso, e nossa substncia est em nossa Me,
Deus todo Sabedoria, e nossa substncia est em nosso Senhor, o Esprito Santo, Deus todo
Bondade, pois nossa substncia est integramente em cada Pessoa da Trindade, que um s
Deus. (JULIANA de Norwich, cap. 58). A sabedoria identificada depois com a segunda
pessoa da Trindade, Jesus Cristo exerce fundamental importncia na arquitetura do raciocnio.
nosso ser sensvel, nossa redeno e nossa salvao, pois Ele nossa Me, Irmo e Salvador.
(JULIANA de Norwich, cap. 58). Cristo verdadeiramente a me de todos os que sero
salvos. Mesmo que ela continue a aludir Maria como me da Santa Me Igreja, a
propriedade da maternidade pertence a Cristo e Santssima Trindade como um todo. A
imagem de Cristo como Me no simplesmente uma nica viso, mas recapitula toda a
relao, no amor divino, entre a humanidade e Deus, que se desenvolve atravs das
Revelaes de Juliana. A maternidade de Cristo um smbolo ou resumo da soteriologia.
Assim pois Jesus Cristo, que ope o bem ao mal, nossa verdadeira Me, dEle temos nosso
ser, de onde comea o fundamento da maternidade, com toda a doce proteo do amor que
acompanha a isto por toda a eternidade. (JULIANA de Norwich, cap. 59). Juliana considera
a maternidade de Jesus sob trs aspectos: Jesus nossa me presenteia-nos com a nossa
humanidade, a sustenta, e guia-a at sua maturidade.
como em graa, por Sua prpria bondade. (JULIANA de Norwich, cap. 59). As funes da
maternidade, alm de presentear-nos com nossa sensualidade, esto ligadas tambm ao
sustento, particularmente a amamentao no seio da me, e o acompanhamento at nossa
maturidade, pela via sacramental, em que as graas maternas nos conduzem a plenitude da
salvao, o retorno ntimo e unidade em comunho com a Trindade. E assim, Jesus nossa
verdadeira Me enquanto a natureza, por nossa primeira criao, e Ele nossa verdadeira Me
enquanto a graa por ter assumido nossa natureza criada. (JULIANA de Norwich, cap. 59).
Com essa citao de Juliana passaremos para o segundo ato materno de Deus, em Jesus
Cristo, por meio da kenosis ou encarnao. A Teologia da Encarnao em Juliana ter um
papel a exercer que est centralizado na Paixo que o trabalho do Filho para a recriao de
todo o cosmo.
51
5. Maternidade na Encarnao
pois a unidade da Divindade dava fora a sua natureza humana para, por amor, sofrer
mais do que todos os homens poderiam sofrer. (Juliana de Norwich, cap. 20).
Jesus, para Juliana, assume uma dupla maternidade, a primeira dada na Criao, como
dissemos anteriormente, que est intrinsecamente conectada com nossa natureza substancial,
o elemento ontolgico que nos liga a Deus, que em alguns lugares podemos entender como
nossa alma. Mas tambm Jesus, pela Encarnao, torna-se nossa me em nossa natureza
sensual, que podemos entender aqui como nossa matria carnal. E tambm, vi que a Segunda
Pessoa, que nossa me no que concerne substncia, essa mesma Pessoa amada se tem
convertido em nossa Me em nosso ser sensvel, pois somos duplos pela Criao de Deus:
quer dizer, substanciais e sensveis. (JULIANA de Norwich, cap. 58). A dupla maternidade,
criacional e soteriolgica no pensamento de Juliana fundante, pois em sua antropologia, o
ser humano dotado de uma dupla natureza. Nossa substncia a parte mais elevada, que
52
referncia de Cristo como o Segundo Ado no nova, mas uma referncia bblica.
Essa identificao para Juliana essencialmente est prefigurada pela natureza em plenitude de
Cristo. Sua alma completa ou plena o resgate da verdadeira inteno primordial da Criao.
Juliana falando sobre o ato kentico de Deus em Jesus destaca sua humildade, mas tambm
desejada preparao para ser nossa Me em tudo. Para isso ela utiliza sempre a imagem da
Virgem Maria, mas sempre em papel secundrio, em contraponto a Teologia Medieval que
em boa parte da Tradio, destaca seu papel na Histria da Salvao. Jesus nossa Me
enquanto natureza, nossa Me enquanto graa, porque Ele desejou converter-se
completamente em nossa Me em tudo, Ele aceitou ao fundamento de Sua obra muito
humildemente e muito docilmente no ventre da virgem. (JULIANA de Norwich, cap. 60). A
Maternidade da graa ser destaque em nosso prximo captulo, em que Juliana elaborar o
terceiro ato da maternidade divina. Humildade e docilidade so s palavras que Juliana utiliza
para a submisso de Jesus para a unio ontolgica de nosso ser natureza substancial da
54
realidade trinitria. Ou seja, nosso altssimo Deus, a suprema Sabedoria de tudo, neste
humilde ventre se vestiu e se preparou gostosamente com nossa pobre carne, a fim de que Ele
mesmo pudesse realizar o servio e a tarefa da maternidade em todas as coisas. (JULIANA
de Norwich, cap. 60). Juliana utiliza um paralelo com o hino kentico de Filipenses 2, quando
S. Paulo utiliza a palavra despiu-se de sua glria e no ventre de Maria, ele se veste com
nossa carne. Quando Deus estava unido a nosso corpo no ventre da Virgem, Deus tomou
nossa Sensualidade e uniu-a a nossa Substncia. Assim, nossa Senhora nossa Me em quem
todos estamos e, em Cristo, dela nascemos. E Jesus nossa verdadeira Me, em quem sempre
somos carregados e de quem nunca sairemos. (DOYLE, 1993, 103). Nossa vinculao
Virgem Maria no se d por qualquer aspecto soteriolgico, mas nica e exclusivamente
porque estamos unidos maternalmente em Cristo, pela encarnao de nossa natureza sensvel,
desde o ventre de Maria. Juliana est bastante alinhada doutrina nestoriana do Cristotokos25,
em que Maria genitora da humanidade ou natureza sensvel de Jesus, mas Cristo, nossa
verdadeira Me, que em sua Paixo, o trabalho de parto, pari a nova humanidade redimida.
Uma vez utilizada metfora kentica, em que Jesus se despe de sua natureza e
encarna no ventre de Maria, vestindo-se de nossa carne (natureza), agora ela inverte a
realidade inserindo-nos no contexto da divina gestao da nova humanidade. Jesus nos
envolve, sustenta e nos possui, em seu divino amor. a infinita bondade amorosa de Jesus,
que permite que toda a humanidade esteja envolta em seu ventre de amor para ser concebida
na graa. Oh, o que isso? Seno a nossa verdadeira Me Jesus, ele carrega-nos para a
alegria e vida eterna, bendito seja. Ele carrega-nos dentro de si no amor de um trabalho de
parto, at o final quando ele desejou sofrer as maiores dores e cruis espinhos que existiram
25
A doutrina nestoriana da Cristotokos foi uma tentativa frustrada de Nestrio, arcebispo de Constantinopla
entre 428 a 431 a.D., de ser uma via mdia entre as disputas daqueles que entendiam a virgem Maria como
Theotokos, por ser me de Jesus, e por isso Me de Deus e os que acreditavam que ela no era merecedora de
algum ttulo, pois o Eterno no pode simplesmente nascer. Nestrio foi excomungado no Conclio de feso (431
a.D.) por sua crena de que Maria era Me do Deus Encarnado.
55
ou existiro, e no final ele morreu. (JULIANA de Norwich. Apud. FURLOG, 1996, 238).
Como dissemos anteriormente, Juliana transfigura a Paixo de vergonha para alegria, mas a
analogia da crucifixo com as dores de parto so simtricas. Antes, Jesus nos carrega dentro
de si no amor. Essa gestao amorosa de Jesus que muda ontologicamente o ser de Deus e o
ser da humanidade. A imagem de maternidade de Juliana no e passiva, mas vista como uma
obra. Ela destaca o processo de dar luz tanto em nossa criao natural como no
renascimento da salvao (p.ex. Texto Longo 57, 60, 63, 64). A Paixo um trabalho, e
comparada s dores do trabalho de parto (60). H a nutrio (Texto Longo 60 e 63) e o
aleitamento (Texto Longo 43, 57 e 60) como dimenses do amor de Deus. Mas a maternidade
no meramente uma questo de proteo amorosa. H tambm uma maternidade de
sabedoria e conhecimento. propriedade da maternidade pertencem natureza, o amor, a
sabedoria e o conhecimento (JULIANA de Norwich, cap. 60). Essa funo orientadora traz a
alma humana sua apropriada realizao.
enxertados organicamente por seu divino amor. Thornton (1963, 216) falando sobre a
Teologia de Juliana, particularmente sobre o parto da nova humanidade diz: ... a paixo est
ligada alegria atravs da Maternidade de Cristo de trabalhar espiritualmente parindo. o
nascimento da nova humanidade, o parto do Segundo Ado, que incorpora o sofrimento de
nossa Senhora, a Segunda Eva. No renascimento da humanidade, a nossa Santa Me Cristo
[...] esquece a angstia, para a alegria de que a humanidade nasce para o mundo. O uso
gerndio do verbo parir est intrinsecamente ligado com o que estamos dizendo sobre o
infinito nascer em Cristo. NEle, todos renascem com sua natureza, e Cristo exerce, pela graa,
o mistrio espiritual do novo nascimento.
6. Maternidade na Graa
Deus um manto que nos envolve, abraa e agasalha para nunca nos abandonar.
(DOYLE, 1993, 28).
que tem uma profunda propriedade. Ela expressa o terno amor de maternidade divina.
Perpetuamente incorporada no amor, fonte da misericrdia o amor e obra de
misericrdia manter os seres humanos em amor. Em ltima anlise, misericrdia todo
amor no amor. Na misericrdia Cristo restaura e reforma-nos atravs de sua paixo, morte e
ressurreio, nossa natureza sensual para a nossa substncia. (HIDE, 1999, 289). Como vimos
no captulo anterior, misericrdia se expressa fundamentalmente na Paixo, Jesus nossa me
na misericrdia. Entretanto, Graa parte da ao de Deus no amor.
Num sculo em que a insegurana era total, tanto do aspecto da seguridade de vida,
por conta das vrias epidemias e guerras, quando da seguridade da salvao, por conta do
declnio moral e institucional da Igreja, a Maternidade de Deus expressa na Graa torna-se
relevante, muito embora ela no esquematize em um modelo de ascenso pessoal ou
exerccios espirituais, muito tpico dos escritores msticos medievais, para ela a Graa algo
dado a toda a humanidade, a hospitalidade dEle. Assim compreendi que todos Seus
benditos filhos, que tm sido gerados por Ele segundo a natureza, sero levados novamente a
Ele pela graa. (JULIANA de Norwich. cap. 63). A graa por assim dizer, o religamento da
humanidade e seu Criador. Juliana parece desconsiderar esquemas ascensionrios e rigorosas
disciplinas ascticas, bem como os esquemas penitenciais da Igreja baseado em indulgncias
por um religamento suave e simples, fundado no amor (compassivo e gracioso) de Deus que
nos acolhe e nos envolve como um manto.
Nossa Nova Criao, para Juliana, est intimamente ligada vida Sacramental da
Igreja. Para ela, os Sacramentos so fundamentalmente importantes para o sentido de nossa
filiao com Cristo, nossa Me. Temos dito anteriormente sobre a importncia do sacramento
eucarstico para Juliana, entretanto aqui tambm estamos nos referindo ao sacramento do
Batismo, que na Igreja Primitiva era tambm chamado de sacramento da iluminao,
26
O termo Hpostasis na Teologia originariamente utilizado para a definio da dupla natureza de Cristo,
entretanto, em toda a idade mdia, na antropologia filosfica, a humanidade tambm foi separada em duas
naturezas, a substancial e a sensual (conforme a nomenclatura de Juliana de Norwich), a espiritual e a fsica.
Essas duas substncias so conflituosas entre si. Em Juliana de Norwich, essas duas naturezas, a substancial e a
sensvel, eram separadas pela ao do pecado, entretanto, na ao amorosa e misericordiosa de Deus, essas duas
naturezas so unidas e reconciliadas, da o uso do termo hpostasis, enquanto uma unio de naturezas num ser.
64
associado ao novo nascimento, ter sido parido, dado luz. Moltmann falando sobre isso,
destaca a retomada da concepo ntico-testamentria da ruah.
A ideia de um novo nascimento gerado pelo sacramento do Batismo aponta para uma
divindade parturiente. Deus a fonte da vida, consoladora, pois o Esprito (Parclito)
nosso consolador tal como a me consola seus filhos. Esse nascimento mstico no nos parece
ter relao com a Teologia batismal que incorpora a ideia de arrependimento e converso, mas
de um nascimento para uma nova realidade soteriolgica porque insere o fiel no mistrio da
graa de Deus, e escatolgica, porque na restaurao da natureza humana, insere-o
prolepticamente em uma nova realidade, a do Reino de Deus.
Quando vemos claramente nossas falhas e nossa misria pela doce luz da graa e
sentimos vergonha e desgraa, a me de misericrdia deseja que assumamos a condio de
uma criana e fujamos para os seus braos, confiando no terno amor e pedindo a ela para ter
misericrdia. Sempre coerente no amor, a Me celestial gradualmente permite aos seres
humanos amadurecer ou crescer, embora muitas vezes eles cometam erros e sintam vergonha.
Em vez de uma retirada de ternura maternal e amor, os pecadores recebem mais virtude e
graa. Apesar do pecado, a Me de misericrdia e graa incessantemente trabalha na
sensualidade humana. Esta presena da misericrdia e da graa na me Cristo, que nos
permite ver nossa misria e pedir perdo, habitando a misericrdia e graa no meio do pecado
humano. Quando nos deparamos com a me Cristo em nossa pecaminosidade encontramos
nascimento espiritual em nossa sensualidade que nos cura do pecado e da culpa, at que nos
tornemos um com a nossa substncia. Atravs do sensvel cuidado nos alimentando da me
Cristo, experimentamos o efeito santificante e divinizante da graa.
27
Postura terica que defende e privilegia um ente de determinado gnero em detrimento do outro.
66
E por tanto, algo incerto, algo bom e virtuoso, o desejar humilde e fortemente estar
sujeito e unido a nossa Me, a Santa Igreja, quer dizer, Jesus Cristo. Pois a torrente de
misericrdia que Seu amado Sangue e Sua preciosa gua suficiente para fazer-nos justos
e puros. (JULIANA de Norwich, cap. 61).
28
Equidade de gnero refere-se busca pela igualdade de gnero. O termo pode referir-se a palavra justo, no
sentido dos gneros no se diferenciarem entre si em grandeza por critrio discriminatrio, mas encontrarem-se
em mesmo patamar, plano ou nvel em suas potencialidades e virtudes.
29
A literatura crist-gnstica inicia no primeiro sculo sob diversos grupos como os Nestorianos, Ctaros,
Albigenses, Cavaleiros Templrios, Hermetistas, Beguinas, Lollardos, etc. e a literatura Hermtica tem como
expoente a literatura de Hermes Trismegisto. farta a atribuio a Deus nas literaturas gnsticas do aspecto
hermafrodita, ele o que tudo contm. Por isso, a figura feminina nunca foi excluda da imagem de Deus e a
experincia feminina com Deus tampouco foi suprimida.
67
atribuda ao relato do Gnesis em que Deus cria o homem a sua imagem e semelhana, e
depois cria a mulher a partir da costela de Ado. Essa imagem consolidou na Teologia crist
que o homem possuidor dessa imagem de Deus. Isso colocava as mulheres num segundo
plano, inferior aos homens. Juliana destacando o atributo feminino e ao materna de Deus
resgata a dignidade e recupera o feminino em Deus impactando profundamente a doutrina
tradicional da Imago Dei.
30
Para Jung, arqutipo uma espcie de imagem apriorstica incrustada profundamente no inconsciente
coletivo da humanidade, refletindo-se (projetando-se) em diversos aspectos da vida humana, como sonhos e at
mesmo narrativas. Imagens universais, arcaicas, primordiais, que existiram desde os tempos mais remotos. Elas
se originam de uma constante repetio de uma mesma experincia, durante muitas geraes. Eles so as
tendncias estruturantes e invisveis dos smbolos. Por serem anteriores e mais abrangentes que a conscincia do
ego, os arqutipos criam imagens ou vises que balanceiam alguns aspectos da atitude consciente do sujeito.
68
Juliana ir utilizar uma linguagem andrgena para suas referncias a Trindade, a Jesus,
ao Esprito, etc., numa criatividade tpica dos msticos. Que o discurso teolgico hoje, como
sempre, precisa ser vivel e prtico, equilibrado e abrangente, no precisa ser demonstrado.
Que as mulheres devem fazer ouvir a sua voz que para Deus uma exigncia verdadeiro.
Juliana pode dar fora a essas vozes e ajudar a abrir uma estrada, tanto para o que ela diz
quanto pelo tom em que ela diz. No uma reivindicao de feminilidade contra
masculinidade, no uma proposta que celebra a maternidade em detrimento da paternidade,
o que seria contra todo o seu caminho e pensamento, que no caminha em direo da
oposio, mas sim para integrao. Sua contribuio leva a uma viso de Deus mais rica e
mais equilibrada, mais completa e, portanto, mais atraente. (GIULIANA Di Norwich, 2003,
86).
Funcionam como centros autnomos que tendem a produzir, em cada gerao, a repetio e a elaborao dessas
mesmas experincias. Eles se encontram entrelaados na psique, sendo praticamente impossvel isol-los, bem
como a seus sentidos.
69
Sabe-se que em toda a Idade Mdia, os sacramentos estavam sendo mal administrados,
as controvrsias sobre a Eucaristia acabaram fixando-as nas festas de Pscoa e Natal, e a
adorao ao Santssimo e veneraes a sacrrios e relquias acabaram tornando-se o centro da
vida comunitria. Alm disso, a vida comunitria era entendida muito mais enquanto
cristandade do que como eclesialidade. Juliana centra a ateno para esses dois fundamentos
da vida crist que, nos parecem ser salutares para uma reviso atual, uma vez que o fenmeno
de igrejas massificadas est cada vez mais popular e os sacramentos sendo deixados de lado a
favor de novas prticas clticas. Gostaria de destacar que Juliana parece afirmar a doutrina
catlica dos sacramentos, evidentemente seu contexto ainda no o da Reforma Protestante,
mas ela no parece ser convencida pelas teorias sacramentais de Wycliffe, e sua concepo
eucarstica est de acordo com a doutrina da Presena Real e o batismo de novo nascimento e
no de arrependimento. Um sacramento eucarstico que fosse apenas memorial ou
consubstancial para ela no refletiria a nutrio materna designada por Cristo na Me Igreja,
71
CONCLUSO
Como vimos, Juliana escreve para um tempo muito difcil da histria da Humanidade,
talvez um dos sculos mais tensos, pela amplitude do caos estabelecido. No temos
informaes precisas sobre sua vida e posicionamentos, o que temos uma reconstruo de
seus hbitos e conjecturas fundadas em seu prprio texto, que podem ser consideradas
relevantes para a compreenso de sua identidade. Mas, nos parece que seu texto um Grande
Consolo nao inglesa do sculo XIV. Em meio epidemia que colhia as jovens vidas dos
filhos, em meio s guerras que colhiam muitos que se quer ainda tinham constitudo suas
famlias, garotos enfileirados em vaidosas batalhas, em meio escassez de alimentos gerada
pela crise e o padecimento geral das classes mais pobres, entre elas a dos camponeses, em
meio descrena institucional com o declnio moral e o Grande Cisma, parece que a voz de
Juliana surge como algum que porta uma Boa Notcia, um Evangelho revigorado, uma
Revelao para o povo de Deus, um consolo s almas aflitas e a certeza de que Deus sofre por
ns, mas que transmuta nosso sofrimento em uma nova realidade. Poucos foram os que se
preocuparam como ela, em apascentar o povo em seu desespero. A luta pela manuteno
institucional e o clima apocalptico propiciaram um clero, salvo raras excees, medocre e
descolados da realidade dos que sofrem. Juliana foi esta voz pastoral, pois sua preocupao
foi a de preservar a esperana e f, proftica, pois no se intimidou com as barreiras de seu
tempo e nem com os riscos de suas revelaes, e ao mesmo tempo sacerdotal, pois convoca
toda a realidade da Igreja para a agregao e reafirmao da vida sacramental.
Juliana hoje considerada pelos Telogos Ascetas, uma das mais importantes figuras
de seu sculo. Sua obra desafia a prpria literatura asceta do perodo. Como j dissemos,
muitos msticos, impulsionados pelo esprito do tempo, redigiam verdadeiros tratados de
exerccios espirituais, disciplinas severas, progressos ascensionistas, com o objetivo de
oferecer um aporte queles que se preocupavam com a degenerao social e religiosa. Este
gnero literrio da Mstica foi muito popular, panfleteado profusamente nos dias de Juliana.
Entretanto, ela, assim como outros poucos msticos, no ir sucumbir a esta preocupao
individualista ou a seduo da fama por ter um escrito popular. Como Meister Eckhart que
75
se dirige a nao alem, Juliana de Norwich dirige seu texto nao inglesa, e o resultado
disso que ela foi primeira mulher a escrever em sua lngua materna. At ento, poucos
haviam feito isso, como Chaucer e Langland, mas todos eram homens. Juliana rompe a
tradio latinista, e escreve em ingls como um indicativo de que seu pblico no eram os
acadmicos, mas o povo simples, de que sua preocupao no era individualista para com os
projetos ascensionrios, mas com o amparo da nao. Por isso, seu lugar de destaque, embora
no tivesse tido essa pretenso, garantido, pois seu texto funda, juntamente com outros, o
nacionalismo ingls, numa poca em que o anglo-normando e o latim dominavam a ilha,
numa poca em que a interferncia externa era equnime ao poder do monarca. Juliana
tornou-se numa herona nacional nas letras e na religio.
chama a existncia, mas de um Deus que tira de si, de dentro de si, a existncia de todas as
naturezas e seres. A Maternidade de Deus implica em outra Cristologia, muito alm de ver na
Paixo um paralelo sacrificial e expiatrio, a Paixo o prprio desejo de Deus em Jesus de
gestar novamente a humanidade em sua Encarnao e dar luz, embora mediante o
sofrimento, como todo o parto implica, Deus nos pari para outra realidade elevando nossa
prpria sensualidade para o interior da Trindade, nos nutrindo para uma vida santa com seu
prprio sangue e carne, transmutando toda dor do pecado em alegria da nova criao. A
Maternidade de Deus implica em outra Eclesiologia, muito alm de conceber a Igreja como
uma assembleia em que cada um busca individualmente conforto espiritual em absolvio, a
Igreja o prprio Cristo que continua em trabalho de parto, dando luz no Batismo nova
humanidade, nutrindo a toda humanidade com seu precioso leite/sangue eucarstico. A Igreja
um todo orgnico, vivo e dinmico, onde na vida sacramental encontramos a ternura e
cuidado de Deus-Me.
Por fim, Juliana exerce uma fundamental importncia em sua afirmao da Igreja, no
enquanto instituio, mas como o prprio Cristo. A Igreja sendo o corpo vive a experincia da
Graa de Deus por meio da vida sacramental. A Igreja a realidade externa e visvel que nos
liga ontologicamente a realidade da prpria Trindade, no um lugar, no uma organizao,
mas um corpo dinmico e vivo formado pelos nascidos da Me Deus e por ele sustentados em
seu misericordioso amor. A vida sacramental no um servio que a Igreja oferece, muito
menos uma coletnea de ritos e cerimnias que configuram o cristianismo, mas a seiva de
vida pela qual emana o ser da Igreja, eles existem no como um fim em si mesmos, mas
porque o prprio Deus deseja nos dar luz e nos nutrir com sua Graa. Ser Igreja ser
profundamente sacramental. Juliana reconcilia tudo em Deus, nossas naturezas substancial e
sensual, nossa existncia ao prprio ser de Deus, nossa criao ao propsito soteriolgico de
Deus, nossa vocao humana e a iniciativa divina. Desejamos poder ter colaborado mais para
o debate da literatura mstica e teolgica a partir destas frentes vanguardistas que Juliana de
Norwich nos convida a fazer.
77
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
AQUINO, Toms de. Compendio de Teologia. Buenos Aires: Editora Cultural, 1943.
ARTZ, Frederick B. The Mind of the Middle Ages A.D. 200-1500. New York: Alfred A.
Knopf, Third Edition, Revised, 1959.
BIOLLO, Elaine Marie. A God with many names: an exploration of the naming of God in
Showings by Julian of Norwich. 1999. 212 f. Tese (Doutorado em Teologia) Faculty of Regis
College and the Theology Department of the Toronto School of Theology. Toronto, 1999.
CARPENTER, William Boyd. A popular history of the Church of England From the
earliest times to the present Day. New York: E. P. Dutton and Company, 1905.
DOYLE, Brendam (org.). Meditaes com Julian de Norwich. So Paulo: Ed. Gente, trad.
Barbara Theoto Lambert, 1993.
FURLOG, Monica. Visions & Longings Medieval Women Mystics. London: Mowbray,
1996.
HANSEN, Elisabeth Marie. A vision of her place: Julian of Norwich and the contemplatives
role in the Christian Community. 2007. 90 f. Dissertao (Mestrado em Artes-Ingls)
Department of English and the Graduate Scholl of the University of Wyoming, Laramie,
2007.
78
HIDE, Kerrie Margaret Mary. Gifted origins to graced fulfillment the soteriology of Julian of
Norwich. 1999. 440 f. Tese (Doutorado em Filosofia) Australian Catholic University, School
of Theology, Faculty of Arts and Sciences, Ascot Vale, 1999.
MAHAN, Susan M. Thrift. The Christian anthropology of Julian of Norwich. 1987. 270 f.
Tese (Doutorado em Filosofia) Faculty of the Graduate School Marquette University,
Milwaukee, 1987.
MASKULAK, Marian. The love Mysticism of Bernard of Clairvaux and Julian of Norwich.
Review for Religious A journal of Catholic Spirituality. St. Louis/Missouri: Quarterly 69.4,
2010.
MAUROIS, Andr. Histria da Inglaterra. Rio de Janeiro: irmos Pongetti Editores, trad.
Carlos Domingues, Nova Edio Revista, 1959.
MILLS, Luke William. Julian of Norwichs concept of the human soul. 2007. 50 f.
Dissertao (Mestrado em Artes) Graduate Faculty of North Caroline State University,
Raleigh, 2007.
MOORMAN John R. H. A History of the church in England. London: Adam and Charles
Black, 1963.
79
bulo de So Pedro. O bulo de So Pedro nos dias de hoje. Roma. Disponvel em:
<http://www.vatican.va/roman_curia/secretariat_state/obolo_spietro/documents/actual_po.ht
ml> Acesso em: 12 de fev. de 2013.
OLIVEIRA, Vera Lucia Simes (trad. e adap.). A Histria da Igreja da Inglaterra. (Partilha
Teolgica), n. 1, Seminrio Teolgico Nacional da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil,
1994.
THORNTON, Martin. English Spirituality (an outline of ascetical theology according to the
english pastoral tradition). London: SPCK, 1963.
THURSTON, Herbert, ATTWATER, S. J. Donald. Butlers Lives of the Saints. New York: P.
J. Kenedy & Sons. Volume II, complete edition, 1956.
UNDERHILL, Evelyn. Collected Papers of Evelyn Underhill. London: Longmans, Green and
CO. 1949.