A Educação Nas Constituições

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VIEIRA, Sofia Lerche. A educao nas constituies brasileiras: texto e contexto.

Revista
Brasileira de Estudos Pedaggicos, Braslia, v.88, n.219, 2007. Disponvel em:
<http://rbep.inep.gov.br/index.php/rbep/article/view/749>. Acesso em: 08 set. 2016.

Este ensaio apresenta uma reflexo acerca dos dispositivos sobre educao nas diversas
constituies brasileiras, detendo-se sobre elementos do contexto onde estas so concebidas.
(p.293)

Constituio de 1824
A primeira Constituio brasileira data do Imprio, tendo sido promulgada por Dom Pedro I.
Retrata o momento poltico subsequente Independncia, quando os anseios de autonomia
convivem com ideias advindas da antiga Colnia. (p. 293)

Com a abertura da Assemblia Legislativa e Constituinte, em 3 de maio de 1823, D. Pedro


referiu-se necessidade de uma legislao particular sobre a instruo. [...] A primeira Carta
Magna brasileira traz apenas dois pargrafos de um nico artigo sobre a matria. Ao tratar da
inviolabilidade dos direitos civis e polticos dos cidados brasileiros, estabelece que "A
instruo primria gratuita a todos os cidados" (art. 179, 32). A segunda referncia diz
respeito aos "Colgios e universidades, onde sero ensinados os elementos das cincias, belas
letras e artes" (art. 179, 33). (p. 294)

O momento de maior destaque para a educao no perodo a promulgao da Lei de 1827


posterior Carta de 1824, no tendo com esta uma relao direta. Torna-se clara, assim, a
pequena relevncia do tema para os constituintes sob o jugo da autoridade do primeiro
imperador. (p. 294)

Constituio de 1891
A Assemblia Nacional Constituinte instalada no primeiro aniversrio da proclamao da
Repblica, sendo a nova Constituio promulgada em fevereiro de 1891. (p. 294)

A passagem do Imprio para a Repblica faz emergir anseios de um novo projeto para a
educao. Nesse contexto proposta a Reforma Benjamin Constant, que aprova os
Regulamentos da Instruo Primria e Secundria do Distrito Federal, do Ginsio Nacional
(Decretos n 981/90 e n1.075/90, respectivamente) e do Conselho de Instruo Superior
(Decreto n 1.232-G/91) (p.295)

A nova Carta Magna define como atribuio do Congresso Nacional "legislar s obre [...] o
ensino superior e os demais servios que na capital forem reservados para o Governo da
Unio" (art. 34, inciso 30); suas responsabilidades limitam-se esfera da Unio. Tem ainda a
incumbncia de "no privativamente: animar, no Pas, o desenvolvimento das letras, artes, e
cincias [...] sem privilgios que tolham a ao dos governos locais, criar instituies de
ensino superior e secundrio nos Estados e prover instruo primria e secundria no
Distrito Federal" (art. 35, incisos 2, 3 e 4). (p.295)

Caracterizada pela separao entre Estado e Igreja, a nova Carta traz como grande inovao a
laicidade do ensino, ao dispor que seria "leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos
pblicos" (art. 72, 6) (p. 296)

Um ltimo aspecto a mencionar a proibio do voto aos analfabetos (art. 70, 1) (p.296)

Constituio de 1934
A Carta de 1934 a primeira a dedicar espao significativo educao, com 17 artigos, 11
dos quais em captulo especfico sobre o tema (cap. II, arts. 148 a 158). Em linhas gerais,
mantm a estrutura anterior do sistema educacional, cabendo Unio "traar as diretrizes da
educao nacional" (art. 5, XIX), "fixar o plano nacional de educao, compreensivo do
ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados, organizar e manter" os sistemas
educativos dos Territrios e manter o ensino secundrio e superior no Distrito Federal (art.
150), assim como exercer "ao supletiva na obra educativa em todo o Pas" (art. 150, "d" e
"e"). (p. 296)

Ao lado de idias liberais, o texto constitucional tambm expressa tendncias conservadoras,


favorecendo o ensino religioso "de freqncia facultativa [...] nas escolas pblicas primrias,
secundrias, profissionais e normais" (art. 153). (p. 297)

Importante matria do texto o financiamento da educao. Pela primeira vez so definidas


vinculaes de receitas para a educao, cabendo Unio e aos municpios aplicar "nunca
menos de dez por cento e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte por cento, da
renda resultante dos impostos na manuteno e no desenvolvimento do sistema educativo"
(art. 156). (p. 297)

Constituio de 1937
De orientao oposta ao liberal texto de 1934, a Constituio do Estado Novo claramente
inspirada nas constituies de regimes fascistas europeus. Amplia-se a competncia da Unio
para "fixar as bases e determinar os quadros da educao nacional, traando as diretrizes a que
deve obedecer a formao fsica, intelectual e moral da infncia e da juventude" (art. 15, IX).
(p. 298)

O dever do Estado para com a educao colocado em segundo plano, sendo-lhe atribuda
uma funo compensatria na oferta escolar destinada "infncia e juventude, a que
faltarem os recursos necessrios educao em instituies particulares" (art. 129). (p.298)

idia de gratuidade da Constituio de 1934 o texto de 1937 contrape uma concepo


estreita e empobrecida. Embora estabelea que "o ensino primrio obrigatrio e gratuito"
(art. 130), acrescenta no mesmo artigo o carter parcial dessa gratuidade [] idia de
gratuidade da Constituio de 1934 o texto de 1937 contrape uma concepo estreita e
empobrecida. Embora estabelea que "o ensino primrio obrigatrio e gratuito" (art. 130),
acrescenta no mesmo artigo o carter parcial dessa gratuidade (p. 298)

Constituio de 1946
Os anos quarenta caracterizam-se por reformas educacionais que passariam histria como as
Leis Orgnicas do Ensino, aluso ao ttulo de cada uma, acrescido da rea especfica a que se
destinam. (p. 299)

Aps a queda de Vargas, em 1945, so propostas medidas relativas ao ensino fundamental


(Lei Orgnica do Ensino Primrio Decreto-Lei n 8.529/46), ao ensino normal (Lei Orgnica
do Ensino Normal Decreto-Lei n8.530/46) e ao ensino agrcola (Lei Orgnica do Ensino
Agrcola Decreto-Lei n 9.613/46). Tambm institudo o Servio Nacional de
Aprendizagem Comercial (Senac Decretos-Lei n 8.621/46 e n 8.622/46). (p. 299)

O texto de 1946 faz ressurgir o tema da educao como direito de todos. No h, entretanto,
um vnculo direto entre esse direito e o dever do Estado em um mesmo artigo, como ocorrera
no texto de 1934. (p. 300)

Entre outros dispositivos a destacar no texto de 1946, cabe lembrar ainda a novidade da
vinculao de recursos para a educao, estabelecendo que a Unio deva aplicar nunca menos
de 10% e Estados, Municpios e Distrito Federal, nunca menos de 20% das receitas
resultantes de impostos na "manuteno e desenvolvimento do ensino" (art. 169).(p.301)

Constituio de 1967
Primeiro, concebida a reforma do ensino superior (Lei n 5.540/68). Depois toma corpo a
reforma da educao bsica, que fixa as diretrizes e bases para o ensino de 1 e 2 graus (Lei
n 5.692/71). (p. 301)

[] a Constituio de 1967 define a competncia da Unio para legislar sobre diretrizes e


bases da educao nacional (art. 8, XVII, "q"). So acrescidas atribuies relativas aos
planos nacionais de educao (art. 8, XIV). Orientaes e princpios de Cartas anteriores so
reeditados, tais como: o ensino primrio em lngua nacional (Constituio de 1946, art. 168, I,
e Constituio de 1967, art. 176, 3, I), a obrigatoriedade e a gratuidade do ensino primrio
(Constituio de 1946, art. 168, I e II, e Constituio de 1967, art. 176, 3, II), o ensino
religioso, de matrcula facultativa como "disciplina dos horrios normais das escolas oficiais
de grau primrio e mdio (Constituio de 1946, art. 168, 5, e Constituio de 1967, art.
176, 3, V). noo de educao como "direito de todos", j presente no texto de 1946 (art.
166), a Constituio de 1967 acrescenta "o dever do Estado" (art. 176). (p. 302)

Embora outros dispositivos possam ser destacados acerca da matria na Constituio de


1967[...] oportuno acrescentar apenas mais dois aspectos relativos ao tema do
financiamento. Em primeiro lugar, admite-se a "interveno do Estado no municpio" que no
aplicar "no ensino primrio, em cada ano, de vinte por cento, pelo menos da receita tributria
municipal" (art. 15).
Em segundo lugar, vale registrar o flagrante retrocesso representado pela desvinculao dos
recursos para a educao. Enquanto pela Constituio de 1946, a Unio estaria obrigada a
aplicar "nunca menos de dez por cento, e os Estados, o Distrito Federal e os Municpios nunca
menos de vinte por cento da renda resultante dos impostos na manuteno e desenvolvimento
do ensino" (art. 169), na Carta de 1967 tal obrigao desaparece. (p.303)
Constituio de 1988
Em sintonia com o momento de abertura poltica, o esprito do texto o de uma "Constituio
Cidad" que prope a incorporao de sujeitos historicamente excludos do direito
educao, expressa no princpio da "igualdade de condies para o acesso e permanncia na
escola" (art. 206, I). Outras conquistas asseguradas so: a educao como direito pblico
subjetivo (art. 208, 1), o princpio da gesto democrtica do ensino pblico (art. 206, VI), o
dever do Estado em prover creche e pr-escola s crianas de 0 a 6 anos de idade (art. 208,
IV), a oferta de ensino noturno regular (art. 208, VI), o ensino fundamental obrigatrio e
gratuito, inclusive aos que a ele no tiveram acesso em idade prpria (art. 208, I), o
atendimento educacional especializado aos portadores de deficincias (art. 208, III). (p.304)

Os princpios norteadores do ensino so tratados em um mesmo artigo (art. 206). Alm


daqueles j mencionados antes (art. 206, I e VI), outros cinco assim se expressam: a
"liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber"; o
"pluralismo de idias e de comcepes pedaggicas, e coexistncia de instituies pblicas e
privadas de ensino"; a "gratuidade do ensino pblico em estabelecimentos oficiais"; a
"valorizao dos profissionais do ensino, garantido, na forma da lei, plano de carreira para o
magistrio pblico, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso
pblico de provas e ttulos, assegurado regime jurdico nico para todas as instituies
mantidas pela Unio"; e a "garantia de padro de qualidade" (art. 206, II, III, IV, V e VII). (p.
304)

Esta a primeira Carta Magna a tratar da autonomia universitria, estabelecendo que "as
universidades gozam de autonomia didtico-cientfica, administrativa e de gesto financeira e
patrimonial, e obedecero ao princpio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extenso" (art. 207). (p.305)

A Constituio de 1988 mantm a competncia privativa da Unio para "legislar sobre


diretrizes e bases da educao nacional" (art. 22, XXIV) e compartilhada com os Estados, o
Distrito Federal e os Municpios para "proporcionar os meios de acesso cultura, educao
e cincia" (art. 23, V). (p.305)

A vinculao de recursos para a educao recebeu tratamento prioritrio, sendo estabelecido


que a Unio aplicaria "anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e
os municpios vinte e cinco por cento, no mnimo, da receita resultante de impostos,
compreendida a proveniente de transferncias, na manuteno e desenvolvimento do ensino"
(art. 212). (p.305)

O Plano Nacional de Educao (PNE), discutido intensamente depois da aprovao da


Constituio de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB) de 1996, foi
votado pelo Congresso Nacional e aprovado com vetos pelo Presidente da Repblica, atravs
da Lei n 10.172, de 9 de janeiro de 2001. (p.306)

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