10 Catecismo I Parte

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PRIMEIRA PARTE

PRLOGO
PAI,... a vida eterna esta: que eles te conheam a ti, o Deus nico verdadeiro, e aquele
que enviaste, Jesus Cristo(J 17,3). Deus, nosso Salvador... quer que todos os homens
sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade(1Tm 2,3-4). No h, debaixo do
cu, outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos (At 4,12), afora o nome
de JESUS.
I. A vida do homem conhecer e amar a Deus
1. Deus, infinitamente Perfeito e Bem-aventurado em si mesmo, em um desgnio de pura
bondade, criou livremente o homem para faz-lo participar de sua vida bem-aventurada.
Eis por que, desde sempre e em todo lugar, est perto do homem. Chama-o e ajuda-o a
procur-lo, a conhec-lo e a am-lo com todas as suas foras. Convoca todos os homens,
dispersos pelo pecado, para a unidade de sua famlia, a Igreja. Faz isto por meio do Filho,
que enviou como Redentor e Salvador quando os tempos se cumpriram. Nele e por Ele,
chama os homens a se tornarem, no Esprito Santo, seus filhos adotivos e, portanto, os
herdeiros de sua vida bem-aventurada.
2. A fim de que este chamado ressoe pela terra inteira, Cristo enviou os apstolos que
escolhera, dando-lhes o mandato de anunciar o Evangelho: Ide, fazei que todas as naes
se tornem discpulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Esprito Santo e
ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os
dias at a consumao dos sculos(Mt 28, 19-20). Fortalecidos com esta misso, os
apstolos saram a pregar por toda parte, agindo com eles o Senhor, e confirmando a
Palavra por meio dos sinais que a acompanhavam(Mc 16,20).
3. Os que com a ajuda de Deus acolheram o chamado de Cristo e lhe responderam
livremente foram por sua vez impulsionados pelo amor de Cristo a anunciar por todas as
partes do mundo a Boa Notcia. Este tesouro recebido dos apstolos foi guardado fielmente
por seus sucessores. Todos os fiis de Cristo so chamados a transmiti-lo de gerao em
gerao, anunciando a f, vivendo-a na partilha fraterna e celebrando-a na liturgia e na
orao1.
II. Transmitir a f a catequese
4. Bem cedo passou-se a chamar de catequese o conjunto de esforos empreendidos na
Igreja para fazer discpulos, para ajudar os homens a crerem que Jesus o Filho de Deus,
a fim de que, por meio da f, tenham a vida em nome dele, para educ-los e instrui-los
nesta vida, e assim construir o Corpo de Cristo2
5. A catequese uma educao da f das crianas, dos jovens e dos adultos, a qual
compreende especialmente um ensino da doutrina crist, dado em geral de maneira
orgnica e sistemtica, com o fim de os iniciar na plenitude da vida crist.3
6. Sem confundir-se com eles, a catequese se articula em torno de determinado nmero
de elementos da misso pastoral da Igreja que tm um aspecto catequtico e que
preparam a catequese ou dela derivam: primeiro anncio do Evangelho ou pregao
missionria para suscitar a f; busca das razes de crer; experincia de vida crist;
celebrao dos sacramentos; integrao na comunidade eclesial; testemunho apostlico e
missionrio4.
7. A catequese anda intimamente ligada com toda a vida da Igreja. No somente a
extenso geogrfica e o aumento numrico, mas tambm e mais ainda o crescimento
interior da Igreja, sua correspondncia ao desgnio de Deus que dependem da catequese
mesma5
8. Os perodos de renovao da Igreja so tambm tempos fortes da catequese. Eis por
que, na grande poca dos Padres da Igreja, vemos Santos Bispos dedicarem uma parte
importante de seu ministrio catequese. a poca de S. Cirilo de Jerusalm e de S. Joo
Crisstomo, de Sto. Ambrsio e de Sto. Agostinho, e de muitos outros Padres cujas obras
catequticas permanecem como modelos.
9. O ministrio da catequese haure energias sempre novas nos Conclios. O Conclio de
Trento constitui neste ponto um exemplo a ser sublinhado: deu catequese prioridade em
suas constituies e em seus decretos; est ele na origem do Catecismo Romano, que
tambm leva seu nome e constitui uma obra de primeira grandeza como resumo da
doutrina crist. Este conclio suscitou na Igreja uma organizao notvel da catequese.
Graas a santos bispos e telogos, tais como S. Pedro Cansio, S. Carlos Borromeu, S.
Torbio de Mogrovejo, S. Roberto Belarmino, levou publicao de numerosos catecismos.
10. Diante disso, no estranha que, no dinamismo que seguiu o Conclio Vaticano II (que o
papa Paulo VI considerava como grande catecismo dos tempos modernos), a catequese da

1
Cf. At 2,42
2
Cf Joo Paulo II, CT1, AAS 71 (1979), 1277-1278
3
CT 18
4
Cf. CT 18.
5
CT 13.
Igreja tenha novamente despertado a ateno. Do testemunho deste fato o Diretrio
geral da Catequese, de 1971, as sesses do Snodo dos Bispos dedicadas evangelizao
(1974) e catequese (1977), as exortaes apostlicas correspondentes, Evangelii
nuntiandi (1975) e Catechesi tradendae (1979). A sesso extraordinria do Snodo dos
Bispos de 1985 pediu: Seja redigido um catecismo ou compndio de toda a doutrina
catlica seja sobre a f seja sobre a moral6. O Santo Padre Joo Paulo II endossou este
desideratum expresso pelo Snodo dos Bispos, reconhecendo que este desejo responde
plenamente a uma verdadeira necessidade da Igreja universal e das Igrejas particulares7.
Ele envidou todos os esforos em prol da realizao deste desideratum dos Padres do
Snodo.
III. O objetivo e os destinatrios deste Catecismo
11. O presente Catecismo tem por objetivo apresentar uma exposio orgnica e sinttica
dos contedos essenciais e fundamentais da doutrina catlica tanto sobre a f como sobre
a moral, luz do Conclio Vaticano II e do conjunto da Tradio da Igreja. Suas fontes
principais so a Sagrada Escritura, os Santos Padres, a Liturgia e o Magistrio da Igreja.
Destina-se ele a servir como um ponto de referncia para os catecismos ou compndios
que so elaborados nos diversos pases8
12. O presente Catecismo destinado principalmente aos responsveis pela catequese: em
primeiro lugar aos Bispos, como doutores da f e pastores da Igreja. oferecido a eles
como instrumento no cumprimento de seu ofcio de ensinar o Povo de Deus. Por meio dos
Bispos, ele se destina aos redatores de catecismos, aos presbteros e aos catequistas. Ser
tambm til para a leitura de todos os demais fiis cristos.
IV. A estrutura deste Catecismo
13. O projeto deste Catecismo inspira-se na grande tradio dos catecismos que articulam
a catequese em torno de quatro pilares: a profisso da f batismal (o Smbolo), os
sacramentos da f, a vida de f (os Mandamentos), a orao do crente (o Pai-Nosso).
Parte I: A profisso da f
14. Os que pela f e pelo Batismo pertencem a Cristo devem confessar sua f batismal
diante dos homens9. Por isso, o Catecismo comea por expor em que consiste a Revelao,
pela qual Deus se dirige e se doa ao homem, bem como a f, pela qual o homem responde
a Deus (Seo I). O Smbolo da f resume os dons que Deus outorga ao homem como
Autor de todo bem, como Redentor, como Santificador, e os articula em torno dos trs
captulos de nosso Batismo a f em um s Deus: o Pai todo-poderoso, o Criador, Jesus
Cristo, seu Filho, nosso Senhor e Salvador, e o Esprito Santo, na Santa Igreja (Seo II).
Parte II: Os sacramentos de f
15. A segunda parte do Catecismo expe como a salvao de Deus, realizada uma vez por
todas por Cristo Jesus e pelo Esprito Santo, se torna presente nas aes sagradas da
liturgia da Igreja (Seo I), particularmente nos sete sacramentos (Seo II).
Parte III: A vida da f
16. A terceira parte do Catecismo apresenta o fim ltimo do homem, criado imagem de
Deus: a bem-aventurana e os caminhos para chegar a ela: mediante um agir reto e livre,
com a ajuda da f e da graa de Deus (Seo I); por meio de um agir que realiza o duplo
mandamento da caridade, desdobrado nos dez Mandamentos de Deus (Seo II).
Parte IV: A orao na vida da f
17. A ltima parte do Catecismo trata do sentido e da importncia da orao na vida dos
crentes (Seo I). Ela termina com um breve comentrio sobre os sete pedidos da orao
do Senhor (Seo II). Com efeito, nesses sete pedidos encontramos o conjunto dos bens
que devemos esperar e que nosso Pai celeste quer conceder-nos.
V. Indicaes prticas para o uso deste Catecismo
18. Este Catecismo foi pensado como uma exposio orgnica de toda f catlica. Por isso
preciso l-lo como uma unidade. Numerosas referncias dentro do prprio texto, bem
como o ndice analtico no fim do volume, permitem ver a ligao de cada tema com o
conjunto da f.
19. Muitas vezes os textos da Sagrada Escritura no so citados literalmente, mas so
feitas apenas referncias (mediante a indicao cf.). Para uma compreenso mais
aprofundada de tais passagens, preciso consultar os prprios textos. Essas referncias
bblicas constituem um instrumento de trabalho para a catequese.
20. Quando em certas passagens se usa corpo menor, graficamente isto indica que se
trata de observaes de tipo histrico, apologtico, ou de exposies doutrinais
complementares.

6
Relatrio final II B a 4
7
Discurso de 7 de dezembro de 1985
8
Snodo dos Bispos de 1985, Relatrio final II B a 4.
9
Cf. Mt 10,32; Rm 10,9
21. As citaes, em corpo menor, de fontes patrsticas, litrgicas, magisteriais ou
hagiogrficas so destinadas a enriquecer a exposio doutrinal. Com freqncia esses
textos foram escolhidos para uso diretamente catequtico.
22. No final de cada unidade temtica, uma srie de textos sucintos resumem em frmulas
condensadas o essencial do ensinamento. Esses resumindo tm por objetivo oferecer
sugestes catequese local para frmulas sintticas e memorizveis.
VI. As adaptaes necessrias
23. Neste Catecismo a nfase posta na exposio doutrinal. Quer ele ajudar a aprofundar
o conhecimento da f. Por isso mesmo est orientado para o amadurecimento desta f,
para seu enraizamento na vida e sua irradiao no testemunho10.
24. Por sua prpria finalidade, este Catecismo no se prope realizar as adaptaes da
exposio e dos mtodos catequticos exigidas pelas diferenas de culturas, de idades, de
maturidade espiritual, de situaes sociais e eclesiais daqueles a quem a catequese
dirigida. Tais adaptaes indispensveis cabem aos catecismos apropriados e mais ainda
aos que ministram instruo aos fiis:
Aquele que ensina deve fazer-se tudo para todos (1Cor 9,22), a fim de conquistar todos
para Jesus Cristo... Particularmente, no imagine ele que lhe confiado um nico tipo de
almas, e que conseqentemente lhe permitido ensinar e formar de modo igual todos os
fiis verdadeira piedade, com um s e mesmo mtodo, sempre igual! Saiba ele bem que
uns so em Jesus Cristo como que criancinhas recm-nascidas, outros, como que
adolescentes, e finalmente alguns esto como que na posse de todas as suas foras... Os
que so chamados ao ministrio da pregao devem, na transmisso dos mistrios da f e
das regras dos costumes, adaptar suas palavras ao esprito e inteligncia de seus
ouvintes11.
ACIMA DE TUDO A CARIDADE
25. Para concluir este Prlogo, oportuno lembrar este princpio pastoral enunciado pelo
Catecismo Romano:
Toda a finalidade da doutrina e do ensinamento deve ser posta no amor que no acaba.
Com efeito, pode-se facilmente expor o que preciso crer, esperar ou fazer; mas
sobretudo preciso fazer sempre com que aparea o Amor de Nosso Senhor, para que
cada um compreenda que cada ato de virtude perfeitamente cristo no tem outra origem
seno o Amor, e outro fim seno o Amor12.
A PROFISSO DE F
PRIMEIRA SEO
EU CREIO NS CREMOS
26. Quando professamos nossa f, comeamos dizendo: Eu creioou Ns cremos. Por
isso, antes de expor a f da Igreja tal como confessada no Credo, celebrada na Liturgia,
vivida na prtica dos Mandamentos e na orao, perguntamo-nos o que significa crer. A
f a resposta do homem a Deus que se revela e a ele se doa, trazendo ao mesmo tempo
uma luz superabundante ao homem em busca do sentido ltimo de sua vida. Por isso
vamos considerar primeiro esta busca do homem (captulo I), em seguida a Revelao
divina, pela qual se apresenta ao homem (captulo II), e finalmente a resposta da f
(captulo III).
CAPTULO I
O HOMEM CAPAZ DE DEUS
O Desejo de Deus
27. O desejo de Deus est inscrito no corao do homem, j que o homem criado por
Deus e para Deus; e Deus no cessa de atrair o homem a si, e somente em Deus o
homem h de encontrar a verdade e a felicidade que no cessa de procurar:
28. O aspecto mais sublime da dignidade humana est nesta vocao do homem
comunho com Deus. Este convite que Deus dirige ao homem, de dialogar com ele,
comea com a existncia humana. Pois se o homem existe, porque Deus o criou por
amor e, por amor, no cessa de dar-lhe o ser, e o homem s vive plenamente, segundo a
verdade, se reconhecer livremente este amor e se entregar ao seu Criador13.
Em sua histria, e at os dias de hoje, os homens tm expressado de mltiplas maneiras
sua busca de Deus por meio de suas crenas e de seus comportamentos religiosos
(oraes, sacrifcios, cultos, meditaes, etc.). Apesar das ambigidades que podem
comportar, estas formas de expresso so to universais que o homem pode ser chamado
de um ser religioso:

10
Cf. CT 20-22;25.
11
Catech. R., prefcio, 11.
12
Catech. R., prefcio, 10.
13
GS 19, 1.
De um s (homem), Deus fez toda a raa humana para habitar sobre toda a face da terra,
fixando os tempos anteriormente determinados e os limites de seu hbitat. Tudo isso para
que procurassem a divindade e, mesmo se s apalpadelas, se esforassem por encontr-
la, embora Ele no esteja longe de cada um de ns. Pois nele vivemos, nos movemos e
existimos (At 17,23-28).
29. Mas esta unio ntima e vital com Deus14 pode ser esquecida, ignorada e at
rejeitada explicitamente pelo homem. Tais atitudes podem ter origens muito diversas15: a
revolta contra o mal no mundo, a ignorncia ou a indiferena religiosas, as preocupaes
com as coisas do mundo e com as riquezas16, o mau exemplo dos crentes, as correntes de
pensamento hostis religio, e finalmente essa atitude do homem pecador que, por medo,
se esconde diante de Deus17 e foge diante de seu chamado18.
30. Alegre-se o corao dos que buscam o Senhor! (Sl 105,3). Se o homem pode
esquecer ou rejeitar a Deus, este, de sua parte, no cessa de chamar todo homem a
procur-lo, para que viva e encontre a felicidade. Mas esta busca exige do homem todo o
esforo de sua inteligncia, a retido de sua vontade,um corao reto, e tambm o
testemunho dos outros, que o ensinam a procurar a Deus.
Vs sois grande, Senhor, e altamente digno de louvor: grande o vosso poder, e a vossa
sabedoria no tem medida. E o homem, pequena parcela de vossa criao, pretende
louvar-vos, precisamente o homem que, revestido de sua condio mortal, traz em si o
testemunho de seu pecado e de resistis aos soberbos. A despeito de tudo, o homem,
pequena parcela de vossa criao, quer louvar-vos. Vs mesmo o incitais a isto, fazendo
com que ele encontre suas delcias no vosso louvor, porque nos fizestes para vs e o nosso
corao no descansa enquanto no repousar em vs19.
As vias de acesso ao conhecimento de Deus
31. Criado imagem de Deus, chamado a conhecer e a amar a Deus, o homem que
procura a Deus descobre certas vias para aceder ao conhecimento de Deus. Chamamo-
las tambm de provas da existncia de Deus, no no sentido das provas que as cincias
naturais buscam, mas no sentido de argumentos convergentes e convincentes que
permitem chegar a verdadeiras certezas.
32. O mundo: a partir do movimento e do devir, da contingncia, da ordem e da beleza do
mundo, pode-se conhecer a Deus como origem e fim do universo.
S. Paulo afirma a respeito dos pagos: O que se pode conhecer de Deus manifesto entre
eles, pois Deus lho revelou. Sua realidade invisvel seu eterno poder e sua divindade
tornou-se inteligvel desde a criao do mundo atravs das criaturas (Rm 1,19-20)20.
E Sto. Agostinho: Interroga a beleza da terra, interroga a beleza do mar, interroga a
beleza do ar que se dilata e se difunde, interroga a beleza do cu... interroga todas estas
realidades. Todas elas te respondem: olha-nos, somos belas. Sua beleza um hino de
louvor (confessio). Essas belezas sujeitas mudana, quem as fez seno o Belo (Pulcher,
pronuncie plquer), no sujeito mudana?21.
33. O homem: Com sua abertura verdade e beleza, com seu senso do bem moral, com
sua liberdade e a voz de sua conscincia, com sua aspirao ao infinito e felicidade, o
homem se interroga sobre a existncia de Deus. Mediante tudo isso percebe sinais de sua
alma espiritual. Como semente de eternidade que leva dentro de si, irredutvel s
matria22, sua alma no pode ter origem seno em Deus.
34. O mundo e o homem atestam que no tm em si mesmos nem seu princpio primeiro
nem seu fim ltimo, mas que participam do Ser em si, que sem origem e sem fim.
Assim, por estas diversas vias, o homem pode aceder ao conhecimento da existncia de
uma realidade que a causa primeira e o fim ltimo de tudo, e que todos chamam
Deus23.
35. As faculdades do homem o tornam capaz de conhecer a existncia de um Deus
pessoal. Mas, para que o homem possa entrar em sua intimidade, Deus quis revelar-se ao
homem e dar-lhe a graa de poder acolher esta revelao na f. Contudo, as provas da
existncia de Deus podem dispor f e ajudar a ver que a f no se ope razo humana.
O conhecimento de Deus segundo a Igreja
36. A santa Igreja, nossa me, sustenta e ensina que Deus, princpio e fim de todas as
coisas, pode ser conhecido com certeza pela luz natural da razo humana a partir das

14
GS 19, 1.
15
Cf. GS 19-21.
16
Cf. Mt 13,22.
17
Cf. Gn 3,8-10.
18
Cf. Jn 1,3.
19
Sto. Agostinho, Conf. I, 1,1.
20
Cf. At 14,15.17; 17,27-28; Sb 13,1-9.
21
Serm. 241,2: PL: 38, 1134
22
GS 18, 1; cf. 14,2.
23
Sto. Toms de Aquino, S. Th. I,2,3.
coisas criadas24. Sem esta capacidade, o homem no poderia acolher a revelao de
Deus. O homem tem esta capacidade por ser criado imagem de Deus25.
37. Todavia, nas condies histricas em que se encontra, o homem enfrenta muitas
dificuldades para conhecer a Deus apenas com a luz de sua razo:
Pois, embora a razo humana, absolutamente falando, possa chegar com suas foras e
lume naturais ao conhecimento verdadeiro e certo de um Deus pessoal, que governa e
protege o mundo com sua Providncia, bem como chegar ao conhecimento da lei natural
impressa pelo Criador em nossas almas, de fato, muitos so os obstculos que impedem a
mesma razo de usar eficazmente e com resultado desta sua capacidade natural. As
verdades que se referem a Deus e s relaes entre os homens e Deus so verdades que
transcendem completamente a ordem das coisas sensveis, e quando estas verdades
atingem a vida prtica e a regem, requerem sacrifcio e abnegao. A inteligncia humana,
na aquisio destas verdades, encontra dificuldades tanto por parte dos sentidos e da
imaginao como por parte das ms inclinaes, provenientes do pecado original. Donde
vemos que os homens, em tais questes, facilmente procuram persuadir-se de que seja
falso ou ao menos duvidoso aquilo que no desejam que seja verdadeiro26.
38. Por isso, o homem tem necessidade de ser iluminado pela revelao de Deus, no
somente sobre o que ultrapassa seu entendimento, mas tambm sobre as verdades
religiosas e morais que, de per si, no so inacessveis razo, a fim de que estas no
estado natural do gnero humano possam ser conhecidas por todos sem dificuldade, com
uma certeza firme e sem mistura de erro27.
Como falar de Deus?
39. Ao defender a capacidade da razo humana de conhecer a Deus, a Igreja exprime sua
confiana na possibilidade de falar de Deus a todos os homens e com todos os homens.
Esta convico est na base de seu dilogo com as outras religies, com a filosofia e com
as cincias, como tambm com os no-crentes e os ateus.
40. Uma vez que nosso conhecimento de Deus limitado, tambm limitada nossa
linguagem sobre Deus. S podemos falar de Deus a partir das criaturas e segundo nosso
modo humano limitado de conhecer e de pensar.
41. As criaturas, todas elas, trazem em si certa semelhana com Deus, muito
particularmente o homem criado imagem e semelhana de Deus. Por isso as mltiplas
perfeies das criaturas (sua verdade, bondade e beleza) refletem a perfeio infinita de
Deus. Em razo disso podemos falar de Deus a partir das perfeies de suas criaturas,
pois a grandeza e a beleza das criaturas fazem, por analogia, contemplar seu Autor (Sb
13,5).
42. Deus transcende a toda criatura. Por isso, preciso incessantemente purificar nossa
linguagem daquilo que possui de limitado, de proveniente de pura imaginao, de
imperfeito, para no confundirmos o Deus inefvel, incompreensvel, invisvel,
inatingvel28 com as nossas representaes humanas. Nossas palavras humanas
permanecem sempre aqum do Mistrio de Deus.
43. Assim falando de Deus, nossa linguagem se exprime, sem dvida, de maneira humana,
mas ela atinge realmente o prprio Deus, ainda que sem poder exprimi-lo em sua infinita
simplicidade. Com efeito, preciso lembrar que entre o Criador e a criatura no se pode
notar uma semelhana, sem que se deva notar entre eles uma ainda maior
dessemelhana29, e que no podemos aprender de Deus o que ele , mas apenas o que
ele no e de que maneira os outros seres se situam em relao a ele30.
RESUMINDO
44. O homem , por natureza e por vocao, um ser religioso. Porque provm de Deus e
para Ele caminha, o homem s vive uma vida plenamente humana se viver livremente sua
relao com Deus
45. O homem feito para viver em comunho com Deus, no qual encontra sua felicidade:
Quando eu estiver inteiramente em Vs, nunca haver dor e provao; repleta de Vs por
inteiro, minha vida ser verdadeira31.
46. Quando escuta a mensagem das criaturas e a voz de sua conscincia, o homem pode
atingir a certeza da existncia de Deus, causa e fim de tudo.
47. A Igreja ensina que o Deus nico e verdadeiro, nosso Criador e Senhor, pode ser
conhecido com certeza por meio de suas obras graas luz natural da razo humana32.

24
Conc. Vaticano I: DISCPULOS 3004; cf. 3026; DV 6.
25
Cf. Gn 1,27
26
Pio XII, Encclica Humani generis: DS 3875.
27
Ibid., DS 3876; cf. Conc. Vaticano I: DS 3005; DV 6; Sto. Toms de Aquino, S. Th. I,1,1.
28
Liturgia de S. Joo Crisstomo, Anfora.
29
Conc. Lateranense IV; DS 806.
30
Sto. Toms de Aquino, S. c. gent. I,30.
31
Sto. Agostinho, Conf. 10,28,39.
32
Cf. Conc. Vaticano I: DS 3026.
48. Podemos realmente falar de Deus partindo das mltiplas perfeies das criaturas,
semelhanas do Deus infinitamente perfeito, ainda que nossa linguagem limitada no
esgote seu mistrio.
49. Sem o Criador, a criatura se esvai33. Eis por que os crentes sabem que so impelidos
pelo amor de Cristo a levar a luz do Deus vivo queles que o desconhecem ou o recusam.
CAPTULO II
DEUS VEM AO ENCONTRO DO HOMEM
50. Mediante a razo natural, o homem pode conhecer a Deus com certeza a partir de suas
obras. Mas existe outra ordem de conhecimento que o homem de modo algum pode atingir
por suas prprias foras, a da Revelao divina34. Por uma deciso totalmente livre, Deus
se revela e se doa ao homem. F-lo revelando seu mistrio, seu projeto benevolente, que
concebeu desde toda a eternidade em Cristo em prol de todos os homens. Revela
plenamente seu projeto enviando seu Filho bem-amado, nosso Senhor Jesus Cristo, e o
Esprito Santo.
ARTIGO 1
A REVELAO DE DEUS
Deus revela seu projeto benevolente
51. Aprouve a Deus, em sua bondade e sabedoria, revelar-se a si mesmo e tornar
conhecido o mistrio de sua vontade, pelo qual os homens, por intermdio de Cristo, Verbo
feito carne, no Esprito Santo, tm acesso ao Pai e se tornam participantes da natureza
divina35.
52. Deus, que habita uma luz inacessvel (1Tm 6,16), quer comunicar sua prpria vida
divina aos homens, criados livremente por ele, para fazer deles, no seu Filho nico, filhos
adotivos36. Ao revelar-se, Deus quer tornar os homens capazes de responder-lhe, de
conhec-lo e de am-lo bem alm do que seriam capazes por si mesmos.
53. O projeto divino da Revelao realiza-se ao mesmo tempo por aes e por palavras,
intimamente ligadas entre si e que se iluminam mutuamente37. Este projeto comporta
uma pedagogia divina peculiar. Deus comunica-se gradualmente com o homem, prepara-
o por etapas a acolher a Revelao sobrenatural que faz de si mesmo e que vai culminar
na Pessoa e na misso do Verbo encarnado, Jesus Cristo.
Sto. Irineu de Lio fala repetidas vezes desta pedagogia divina sob a imagem da
familiaridade mtua entre Deus e o homem: O Verbo de Deus habitou no homem e fez-se
Filho do homem para acostumar o homem a aprender a Deus e acostumar Deus a habitar
no homem, segundo o beneplcito do Pai38.
As etapas da Revelao
DESDE A ORIGEM, DEUS SE D A CONHECER
54. Criando pelo Verbo o universo e conservando-o, Deus proporciona aos homens, nas
coisas criadas, um permanente testemunho de si e, alm disso, no intuito de abrir o
caminho de uma salvao superior, manifestou-se a si mesmo, desde os primrdios, a
nossos primeiros pais39. Convidou-os a uma comunho ntima consigo mesmo,
revestindo-os de uma graa e de uma justia resplandecentes.
55. Esta Revelao no foi interrompida pelo pecado de nossos primeiros pais. Deus, com
efeito, aps a queda destes, com a prometida redeno, alentou-os a esperar uma
salvao e velou permanentemente pelo gnero humano, a fim de dar a vida eterna a
todos aqueles que, pela perseverana na prtica do bem, procuram a salvao40.
E quando pela desobedincia perderam vossa amizade, no os abandonastes ao poder da
morte.(...) Oferecestes muitas vezes aliana aos homens e s mulheres41.
A ALIANA COM NO
Desfeita a unidade do gnero humano pelo pecado, Deus procura antes de tudo salvar a
humanidade passando por cada uma de suas partes. A Aliana com No depois do dilvio42
exprime o princpio da Economia divina para com as naes, isto , para com os homens
agrupados segundo seus pases, cada um segundo sua lngua, e segundo seus cls (Gn
10,5)43.
Esta ordem ao mesmo tempo csmica, social e religiosa da pluralidade das naes44
destina-se a limitar o orgulho de uma humanidade decada que, unnime em sua

33
GS 36.
34
Cf. Conc. Vaticano I: DS 3015.
35
DV 2.
36
Cf. Ef 1,4-5.
37
DV 2.
38
Adv. haer. III, 20,2; cf por exemplo III,17,1; IV,12,4; IV,21,3.
39
DV 3.
40
DV 3.
41
MR Orao eucarstica IV, 118
42
Cf. Gn 9,9.
43
Cf 10,20-31.
44
Cf. At 17,26-27.
perversidade45, gostaria de construir por si mesma sua unidade maneira de Babel46.
Contudo, devido ao pecado47, o politesmo, assim como a idolatria da nao e de seu
chefe, constitui uma contnua ameaa de perverso pag para essa Economia provisria.
A Aliana com No permanece em vigor durante todo o tempo das naes48, at a
proclamao universal do Evangelho. A Bblia venera algumas grandes figuras das
naes, tais como Abel, o justo, o rei-sacerdote Melquisedeque49, figura de Cristo, ou
os justos No, Daniel e J50. Assim, a Escritura exprime que grau elevado de santidade
podem atingir os que vivem segundo a Aliana de No, na expectativa de que Cristo
congregue na unidade todos os filhos de Deus dispersos(Jo 11,52).
DEUS ELEGE ABRAO
Para congregar a humanidade dispersa, Deus elegeu Abro, chamando-o para fora de seu
pas, de sua parentela e de sua casa (Gn 12,1), para fazer dele Abrao, isto , o pai de
uma multido de naes (Gn 17,5): Em ti sero abenoadas todas as naes da terra
(Gn 12,3)51.
O povo originado de Abrao ser o depositrio da promessa feita aos patriarcas, o povo da
eleio52, chamado a preparar o congraamento, um dia, de todos os filhos de Deus na
unidade da Igreja53; ser a raiz sobre a qual sero enxertados os pagos tornados
crentes54.
Os patriarcas e os profetas, bem como outras personalidades do Antigo Testamento, foram
e sero sempre venerados como santos em todas as tradies litrgicas da Igreja.
DEUS FORMA SEU POVO ISRAEL
Depois dos patriarcas, Deus formou Israel como seu povo, salvando-o da escravido do
Egito. Fez com ele a Aliana do Sinai e deu-lhe, por intermdio de Moiss, a sua Lei, para
que o reconhecesse e o servisse como o nico Deus vivo e verdadeiro, Pai providente e juiz
justo, e para que esperasse o Salvador prometido55.
Israel o Povo sacerdotal de Deus56, aquele que traz o Nome do Senhor (Dt. 28,10). o
povo daqueles aos quais Deus falou em primeiro lugar57, o povo dos irmos mais
velhos da f de Abrao58.
Por meio dos profetas, Deus forma seu povo na esperana da salvao, na expectativa de
uma Aliana nova e eterna destinada a todos os homens59, e que ser impressa nos
coraes60. Os profetas anunciam uma redeno radical do Povo de Deus, a purificao de
todas as suas infidelidades61, uma salvao que incluir todas as naes62. Sero
sobretudo os pobres e os humildes do Senhor63 os portadores desta esperana. As
mulheres santas como Sara, Rebeca, Raquel, Miriam, Dbora, Ana, Judite e ster
mantiveram viva a esperana da salvao de Israel. Delas todas, a figura mais pura a de
Maria64.
Cristo Jesus Mediador e Plenitude de toda a Revelao65
DEUS TUDO DISSE NO SEU VERBO
Muitas vezes e de modos diversos falou Deus, outrora, aos pais pelos profetas; agora,
nestes dias que so os ltimos, falou-nos por meio do Filho (Hb 1,1-2). Cristo, o Filho de
Deus feito homem, a Palavra nica, perfeita e insupervel do Pai. Nele o Pai disse tudo, e
no haver outra palavra seno esta. S. Joo da Cruz, depois de tantos outros, exprime
isto de maneira luminosa, comentando Hb 1,1-2:
Porque em dar-nos, como nos deu, seu Filho, que sua Palavra nica (e outra no h),
tudo nos falou de uma s vez nessa nica Palavra, e nada mais tem a falar, (...) pois o que
antes falava por partes aos profetas agora nos revelou inteiramente, dando-nos o Tudo
que seu Filho. Se atualmente, portanto, algum quisesse interrogar a Deus, pedindo-lhe
alguma viso ou revelao, no s cairia numa insensatez, mas ofenderia muito a Deus
por no dirigir os olhares unicamente para Cristo sem querer outra coisa ou novidade
alguma66
NO HAVER OUTRA REVELAO

45
Cf. Sb 10,5.
46
Cf. Gn 11,4-6.
47
Cf. Rm 1,18-25.
48
Cf. Lc 21,24.
49
Cf. Gn 14,18.
50
Ez 14,14.
51
Cf. Gl 3,8.
52
Cf. Rm 11,28.
53
Cf. Jo 11,52; 10,16.
54
Cf. Rm 11,17-18.24.
55
Cf. DV 3.
56
Cf. Ex 19,6.
57
MR, Sexta-feira Santa 13: Orao universal VI.
58
Cf. Joo Paulo II, Alocuo na sinagoga durante o encontro com a comunidade hebraica da cidade de Roma (13 de abril de 1986), 4: Ensinamentos de Joo Paulo I IX/1, 1027.
59
Cf. Israel 2.2-4.
60
Cf. Jr 31,31-34; Hb 10,16.
61
Cf. Ez 36.
62
Cf. Is 49,5-6; 53,11.
63
Cf. Sf 2,3.
64
Cf. Lc 1,38.
65
DV 2.
66
Subida Del Monte Carmelo 22,2, cf S. Joo da Cruz, p. 703. LH, 2 Semana do Advento, segunda-feira, Ofcio de leitura.
A Economia crist, portanto, como aliana nova e definitiva, jamais passar, e j no h
que esperar nenhuma nova revelao pblica antes da gloriosa manifestao de Nosso
Senhor Jesus Cristo 67. Todavia, embora a Revelao esteja terminada, no est
explicitada por completo; caber f crist captar gradualmente todo o seu alcance ao
longo dos sculos.
No decurso dos sculos houve revelaes denominadas privadas, e algumas delas tm
sido reconhecidas pela autoridade da Igreja. Elas no pertencem, contudo, ao depsito da
f. A funo delas no melhorar ou completar a Revelao definitiva de Cristo, mas
ajudar a viver dela com mais plenitude em determinada poca da histria. Guiado pelo
Magistrio da Igreja, o senso dos fiis sabe discernir e acolher o que nessas revelaes
constitui um apelo autntico de Cristo ou de seus santos Igreja.
A f crist no pode aceitar revelaes que pretendam ultrapassar ou corrigir a
Revelao da qual Cristo a perfeio. Este o caso de certas religies no-crists e
tambm de certas seitas recentes que se fundamentam em tais revelaes.
RESUMINDO
Por amor, Deus revelou-se e doou-se ao homem. Traz assim uma resposta definitiva e
superabundante s questes que o homem se faz acerca do sentido e do objetivo de sua
vida.
Deus revelou-se ao homem, comunicando-lhe gradualmente seu prprio Mistrio por meio
de aes e de palavras.
Para alm do testemunho que Deus d de si mesmo nas coisas criadas, ele manifestou-se
pessoalmente aos nossos primeiros pais. Falou-lhes e, depois da queda, prometeu-lhes a
salvao68 e ofereceu-lhes sua aliana.
Deus fez com No uma aliana eterna entre Ele e todos os seres vivos69. Esta h de durar
enquanto durar o mundo.
Deus escolheu Abrao e fez uma aliana com ele e sua descendncia. Da formou seu
povo, ao qual revelou sua lei por intermdio de Moiss. Pelos profetas preparou este povo
a acolher a salvao destinada humanidade inteira.
Deus revelou-se plenamente enviando seu prprio Filho, no qual estabeleceu sua Aliana
para sempre. O Filho a Palavra definitiva do Pai, de sorte que depois dele no haver
outra Revelao.
ARTIGO 2
A TRANSMISSO DA REVELAO DIVINA
Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade
(1Tm 2,4), isto , de Jesus Cristo70. preciso, pois, que Cristo seja anunciado a todos os
povos e a todos os homens, e que desta forma a Revelao chegue at as extremidades do
mundo:
Deus disps com suma benignidade que aquelas coisas que revelara para a salvao de
todos os povos permanecessem sempre ntegras e fossem transmitidas a todas as
geraes71.
A Tradio apostlica
Cristo Senhor, em quem se consuma toda a revelao do Sumo Deus, ordenou aos
Apstolos que o Evangelho, prometido antes pelos profetas, completado por ele e por sua
prpria boca promulgado, fosse por eles pregado a todos os homens como fonte de toda a
verdade salvfica e de toda a disciplina de costumes, comunicando-lhes os dons divinos72.
A PREGAO APOSTLICA...
A transmisso do Evangelho, segundo a ordem do Senhor, fez-se de duas maneiras:
oralmente pelos apstolos, que na pregao oral, por exemplos e instituies,
transmitiram aquelas coisas que ou receberam das palavras, da convivncia e das obras de
Cristo ou aprenderam das sugestes do Esprito Santo;
por escrito como tambm por aqueles apstolos e vares apostlicos que, sob
inspirao do mesmo Esprito Santo, puseram por escrito a mensagem da salvao73.
... CONTINUADA NA SUCESSO APOSTLICA
Para que o Evangelho sempre se conservasse inalterado e vivo na Igreja, os apstolos
deixaram como sucessores os bispos, a eles transmitindo seu prprio encargo de
Magistrio74. Com efeito, a pregao apostlica, que expressa de modo especial nos

67
DV 4.
68
Cf. Gn 3,15.
69
Cf. Gn 9,16.
70
Cf. Jo 14,6.
71
DV 7.
72
DV 7.
73
DV 7.
74
DV 7.
livros inspirados, devia conservar-se por uma sucesso contnua at a consumao dos
tempos75.
Esta transmisso viva, realizada no Esprito Santo, chamada de Tradio enquanto
distinta da Sagrada Escritura, embora intimamente ligada a ela. Por meio da Tradio, a
Igreja, em sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as geraes tudo o que
ela , tudo o que cr76. O ensinamento dos Santos Padres testemunha a presena
vivificante desta Tradio, cujas riquezas se transfundem na praxe e na vida da Igreja
crente e orante77.
Assim, a comunicao que o Pai fez de si mesmo por seu Verbo no Esprito Santo
permanece presente e atuante na Igreja: O Verbo que outrora falou mantm um
permanente dilogo com a esposa de seu dileto Filho, e o Esprito Santo, pelo qual a voz
viva do Evangelho ressoa na Igreja e atravs dela no mundo, leva os crentes verdade
toda e faz habitar neles abundantemente a palavra de Cristo78.
A relao entre a Tradio e a Sagrada Escritura
UMA FONTE COMUM...
Elas esto entre si estreitamente unidas e comunicantes. Pois, promanando ambas da
mesma fonte divina, formam de certo modo um s todo e tendem para o mesmo fim79.
Tanto uma como outra tornam presente e fecundo na Igreja o mistrio de Cristo, que
prometeu permanecer com os seus todos os dias, at a consumao dos sculos (Mt
28,20).
... DUAS MODALIDADES DISTINTAS DE TRANSMISSO
A Sagrada Escritura a Palavra de Deus enquanto redigida sob a moo do Esprito
Santo.
Quanto Sagrada Tradio, ela transmite integralmente aos sucessores dos
apstolos a Palavra de Deus confiada por Cristo Senhor e pelo Esprito Santo aos apstolos
para que, sob a luz do Esprito de verdade, eles, por sua pregao, fielmente a conservem,
exponham e difundam80.
Da resulta que a Igreja, qual esto confiadas a transmisso e a interpretao da
Revelao, no deriva a sua certeza a respeito de tudo o que foi revelado somente na
Sagrada Escritura. Por isso, ambas devem ser aceitas e veneradas com igual sentimento
de piedade e reverncia81.
TRADIO APOSTLICA E TRADIES ECLESIAIS
A Tradio da qual aqui falamos a que vem dos apstolos e transmite o que estes
receberam do ensinamento e do exemplo de Jesus e o que receberam por meio do Esprito
Santo. Com efeito, a primeira gerao de cristos ainda no dispunha de um Novo
Testamento escrito, e o prprio Novo Testamento atesta o processo da Tradio viva.
Dela preciso distinguir as tradies teolgicas, disciplinares, litrgicas ou
devocionais surgidas ao longo do tempo nas Igrejas locais. Constituem elas formas
particulares sob as quais a grande Tradio recebe expresses adaptadas aos diversos
lugares e s diversas pocas. luz da grande Tradio que estas podem ser mantidas,
modificadas ou mesmo abandonadas, sob a guia do Magistrio da Igreja.
A interpretao do depsito da f
O DEPSITO DA F CONFIADO TOTALIDADE DA IGREJA
O patrimnio sagrado82 da f (depositum fidei), contido na Sagrada Tradio e na
Sagrada Escritura, foi confiado pelos apstolos totalidade da Igreja. Apegando-se
firmemente ao mesmo, o povo santo todo, unido a seus Pastores, persevera
continuamente na doutrina dos apstolos e na comunho, na frao do po e nas oraes,
de sorte que na conservao, no exerccio e na profisso da f transmitida se crie uma
singular unidade de esprito entre os bispos e os fiis
O MAGISTRIO DA IGREJA
O ofcio de interpretar autenticamente a Palavra de Deus escrita ou transmitida foi
confiado unicamente ao Magistrio vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de
Jesus Cristo83, isto , foi confiado aos bispos em comunho com o sucessor de Pedro, o
bispo de Roma.
Todavia, tal Magistrio no est acima da Palavra de Deus mas a servio dela, no
ensinando seno o que foi transmitido, no sentido de que, por mandato divino, com a
assistncia do Esprito Santo, piamente ausculta aquela palavra, santamente a guarda e

75
DV 8..
76
DV 8.
77
DV 8.
78
DV 8.
79
DV 9.
80
DV 9.
81
DV 9.
82
Cf. 1Tm 6,20; 2Tm 1,12-14.
83
DV 10.
fielmente a expe, e deste nico depsito de f tira o que nos prope para ser crido como
divinamente revelado84.
Os fiis, lembrando-se da palavra de Cristo a seus apstolos Quem vos ouve a mim ouve
(Lc 10,16)85, recebem com docilidade os ensinamentos e as diretrizes que seus Pastores
lhes do sob diferentes formas.
OS DOGMAS DA F
O Magistrio da Igreja empenha plenamente a autoridade que recebeu de Cristo quando
define dogmas, isto , quando, utilizando uma forma que obriga o povo cristo a uma
adeso irrevogvel de f, prope verdades contidas na Revelao divina ou verdades que
com estas tm uma conexo necessria.
H uma conexo orgnica entre nossa vida espiritual e os dogmas. Os dogmas so luzes
no caminho de nossa f que o iluminam e tornam seguro. Na verdade, se nossa vida for
reta, nossa inteligncia e nosso corao estaro abertos para acolher a luz dos dogmas da
f86.
Os laos mtuos e a coerncia dos dogmas podem ser encontrados no conjunto da
Revelao do Mistrio de Cristo87. Existe uma ordem ou hierarquia das verdades da
doutrina catlica, j que o nexo delas com o fundamento da f crist diferente88.
O SENSO SOBRENATURAL DA F
Todos os fiis participam da compreenso e da transmisso da verdade revelada.
Receberam a uno do Esprito Santo, que os instrui89 e os conduz verdade em sua
totalidade90.
O conjunto dos fiis... no pode enganar-se no ato da f. E manifesta esta sua peculiar
propriedade mediante o senso sobrenatural da f de todo o povo, quando, desde os bispos
at o ltimo dos fiis leigos, apresenta um consenso universal sobre questes de f e
costumes91.
Por este senso da f, excitado e sustentado pelo Esprito da verdade, o Povo de Deus, sob
a direo do sagrado Magistrio, (...) adere indefectivelmente f uma vez para sempre
transmitida aos santos; e, com reto juzo, penetra-a mais profundamente e mais
plenamente a aplica na vida92.
O CRESCIMENTO NA COMPREENSO DA F
Graas assistncia do Esprito Santo, a compreenso tanto das realidades como das
palavras do depsito da f pode crescer na vida da Igreja:
Pela contemplao e estudo dos que crem, os quais as meditam em seu corao93, em
especial a pesquisa teolgica que aprofunda o conhecimento da verdade revelada94.
Pela ntima compreenso que os fiis desfrutam das coisas espirituais95; Divina eloquia
cum legente crescunt as palavras divinas crescem com o leitor96.
Pela pregao daqueles que, com a sucesso episcopal, receberam o carisma seguro da
verdade97.
Fica, portanto, claro que segundo o sapientssimo plano divino, a Sagrada Tradio, a
Sagrada Escritura e o Magistrio da Igreja esto de tal modo entrelaados e unidos que um
no tem consistncia sem os outros, e que juntos, cada qual a seu modo, sob a ao do
mesmo Esprito Santo, contribuem eficazmente para a salvao das almas98.
RESUMINDO
O que Cristo confiou aos apstolos, estes o transmitiram por sua pregao e por escrito,
sob a inspirao do Esprito Santo, a todas as geraes, at a volta gloriosa de Cristo.
A Sagrada Tradio e a Sagrada Escritura constituem um s sagrado depsito da Palavra
de Deus99, no qual, como em um espelho, a Igreja peregrinante contempla a Deus, fonte
de todas as suas riquezas.
Em sua doutrina, vida e culto, a Igreja perpetua e transmite a todas as geraes tudo o
que ela , tudo o que cr100 .
Graas a seu senso sobrenatural da f, o Povo de Deus inteiro no cessa de acolher o dom
da Revelao divina, de penetr-lo mais profundamente e viver dele com mais plenitude.

84
DV 10.
85
Cf. LG 20.
86
Cf. Jo 8.31-32
87
Cf. Conc. Vaticano I: DS 3016: nexus mysteriorum; LG 25.
88
Cf. UR 11.
89
Cf. 1Jo 2,20.27
90
Jo 16,13.
91
LG 12.
92
LG 12.
93
DV 8.
94
GS 62; cf. 44, 2: DV 23; 24; UR 4.
95
DV 8.
96
S. Gregrio Magno, Hom. Ez 1,7,8: PL: 76,843.
97
DV 8.
98
DV 10,3.
99
DV 10.
100
DV 8.
O encargo de interpretar autenticamente a Palavra de Deus foi confiado exclusivamente ao
Magistrio da Igreja, ao Papa e aos bispos em com comunho com ele.
ARTIGO 3
A SAGRADA ESCRITURA
I Cristo Palavra nica da Sagrada Escritura
Na condescendncia de sua bondade, Deus, para revelar-se aos homens, fala-lhes em
palavras humanas: Com efeito, as palavras de Deus, expressas por lnguas humanas,
fizeram-se semelhantes linguagem humana, tal como outrora o Verbo do Pai Eterno,
havendo assumido a carne da fraqueza humana, se fez semelhante aos homens101.
Por meio de todas as palavras da Sagrada Escritura, Deus pronuncia uma s Palavra, seu
Verbo nico, no qual se expressa por inteiro102:
Lembrai-vos que uma mesma a Palavra de Deus que est presente em todas as
Escrituras, que um mesmo Verbo que ressoa na boca de todos os escritores sagrados;
ele que, sendo no incio Deus junto de Deus, no tem necessidade de slabas, por no
estar submetido ao tempo103.
Por este motivo, a Igreja sempre venerou as divinas Escrituras, como venera tambm o
Corpo do Senhor. Ela no cessa de apresentar aos fiis o Po da vida tomado da Mesa da
Palavra de Deus e do Corpo de Cristo104.
Na Sagrada Escritura, a Igreja encontra incessantemente seu alimento e sua fora105, pois
nela no acolhe somente uma palavra humana, mas o que ela realmente: a Palavra de
Deus106. Com efeito, nos Livros Sagrados o Pai que est nos cus vem carinhosamente ao
encontro de seus filhos e com eles fala107.
Inspirao e verdade da Sagrada Escritura
Deus o autor da Sagrada Escritura. As coisas divinamente reveladas, que se encerram
por escrito e se manifestam na Sagrada Escritura, foram consignadas sob inspirao do
Esprito Santo.
A santa Me Igreja, segundo a f apostlica, tem como sagrados e cannicos os
livros completos tanto do Antigo como do Novo Testamento, com todas as suas partes,
porque, escritos sob a inspirao do Esprito Santo, eles tm Deus como autor e nesta sua
qualidade foram confiados prpria Igreja108.
Deus inspirou os autores humanos dos livros sagrados. Na redao dos livros sagrados,
Deus escolheu homens, dos quais se serviu fazendo-os usar suas prprias faculdades e
capacidades, a fim de que, agindo ele prprio neles e por meio deles, escrevessem, como
verdadeiros autores, tudo e s aquilo que ele prprio queria109.
Os livros inspirados ensinam a verdade. Portanto, j que tudo o que os autores inspirados
(ou hagigrafos) afirmam deve ser tido como afirmado pelo Senhor, deve-se professar que
os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro a verdade que Deus em
vista de nossa salvao quis fosse consignada nas Sagradas Escrituras110.
Todavia, a f crist no uma religio do Livro. O Cristianismo a religio da Palavra
de Deus, no de uma palavra escrita e muda, mas do Verbo encarnado e vivo111. Para
que as Escrituras no permaneam letra morta, preciso que Cristo, Palavra eterna de
Deus vivo, pelo Esprito Santo nos abra o esprito compreenso das Escrituras112.
O Esprito Santo, intrprete da Escritura
Na Sagrada Escritura, Deus fala ao homem maneira dos homens. Para bem interpretar a
Escritura preciso, portanto, estar atento quilo que os autores humanos quiseram
realmente afirmar e quilo que Deus quis manifestar-nos pelas palavras deles113
Para descobrir a inteno dos autores sagrados, h que levar em conta as condies da
poca e da cultura deles, os gneros literrios em uso naquele tempo, os modos, ento
correntes, de sentir, falar e narrar. Pois a verdade apresentada e expressa de maneiras
diferentes nos textos que so de vrios modos histricos ou profticos ou poticos, ou nos
demais gneros de expresso114.
Mas, j que a Sagrada Escritura inspirada, h outro princpio da interpretao correta,
no menos importante que o anterior, e sem o qual a Escritura permaneceria letra morta:

101
DV 13.
102
Cf. Hb 1,1-3
103
Sto. Agostinho, En. in Ps. 103,4: PL 37, 1378.
104
Cf. DV 21.
105
Cf. DV 24.
106
Cf. 1Ts 2,13.
107
DV 21.
108
DV 11.
109
DV 11.
110
DV 11.
111
S. Bernardo, Homilia super missus est, 4,11: Pl 183,86B.
112
Cf. Lc 24,45.
113
Cf. DV 12, 1.
114
DV 12, 2.
A Sagrada Escritura deve tambm ser lida e interpretada com a ajuda daquele mesmo
Esprito em que foi escrita115.
O Conclio Vaticano II indica trs critrios para uma interpretao da Escritura
conforme o Esprito que a inspirou116.
1. Prestar muita ateno ao contedo e unidade da Escritura inteira. Pois, por mais
diferentes que sejam os livros que a compem, a Escritura una em razo da unidade do
projeto de Deus, do qual Cristo Jesus o centro e o corao, aberto depois de sua
Pscoa117
O corao118 de Cristo designa a Sagrada Escritura, que d a conhecer o corao de Cristo.
O corao estava fechado antes da Paixo, pois a Escritura era obscura. Mas a Escritura foi
aberta aps a Paixo, pois os que a partir da tm a compreenso dela consideram e
discernem de que maneira as profecias devem ser interpretadas119.
2. Ler a Escritura dentro da Tradio viva da Igreja inteira. Consoante um adgio dos
Padres, Sacra Scriptura principalius est in corde Ecclesiae quam in materialibus
instrumentis scripta a Sagrada Escritura est escrita mais no corao da Igreja do que
nos instrumentos materiais120. Com efeito, a Igreja leva em sua Tradio a memria viva
da Palavra de Deus, e o Esprito Santo que lhe d a interpretao espiritual da Escritura
(...segundo o sentido espiritual que o Esprito d Igreja)121.
3. Estar atento analogia da f122. Por analogia da f entendemos a coeso das
verdades da f entre si e no projeto total da Revelao.
OS SENTIDOS DA ESCRITURA
Segundo uma antiga tradio, podemos distinguir dois sentidos da Escritura: o sentido
literal e o sentido espiritual, sendo este ltimo subdividido em sentido alegrico, moral e
anaggico. A concordncia profunda entre os quatro sentidos garante toda a sua riqueza
leitura viva da Escritura na Igreja.
O sentido literal. o sentido significado pelas palavras da Escritura e descoberto pela
exegese que segue as regras da correta interpretao. Omnes sensus fundantur super
litteralem Todos os sentidos (da Sagrada Escritura) devem estar fundados no literal123.
O sentido espiritual. Graas unidade do projeto de Deus, no somente o texto da
Escritura, mas tambm as realidades e os acontecimentos de que ele fala, podem ser
sinais.
1. O sentido alegrico. Podemos adquirir uma compreenso mais profunda dos
acontecimentos reconhecendo a significao deles em Cristo; assim, a travessia do Mar
Vermelho um sinal da vitria de Cristo, e tambm do Batismo124.
2. O sentido moral. Os acontecimentos relatados na Escritura devem conduzir-nos a um
justo agir. Eles foram escritos para nossa instruo(1Cor 10,11)125.
3. O sentido anaggico. Podemos ver realidades e acontecimentos em sua
significao eterna, conduzindo-nos (em grego: anagog; pronuncie anagogu) nossa
Ptria. Assim a Igreja na terra sinal da Jerusalm celeste126.
Um dstico medieval resume a significao dos quatro sentidos:
Littera gesta docet, quid credas allegoria,
moralis quid agas, quo tendas anagogia127.
A letra ensina o que aconteceu; a alegoria, o que deves crer;
a moral, o que deves fazer; a anagogia, para onde deves caminhar.
dever dos exegetas esforar-se, dentro dessas diretrizes, por entender e expor com
maior aprofundamento o sentido da Sagrada Escritura, a fim de que, por seu trabalho
como preparatrio, amadurea o julgamento da Igreja. Pois todas estas coisas que
concernem maneira de interpretar a Escritura esto sujeitas, em ltima instncia, ao
juzo da Igreja, que exerce o divino ministrio e mandato do guardar e interpretar a
Palavra de Deus128.
Ego vero Evangelio non crederem, nisi me catholicae
Ecclesiae commoveret auctoritas.
Eu no creria no Evangelho, se a isto no me levasse a autoridade da Igreja catlica129.

115
DV 12. 3.
116
Cf. DV 12. 3.
117
Cf. Lc 24,25-27.44-47.
118
Cf. Sl 22,15.
119
Sto. Toms de Aquino, Expositio in Psalmos, 21,11.
120
Cf. Sto. Hilrio de Poitier, Lber ad Constantium imperatorem 9; CSEL 65, 204 (PL 10, 570); S. Jernimo, Commentarius in Epistulam Glatas 1, 1, 11-12; PL 26, 347.
121
Orgenes, Hom. in Lv 5,5.
122
Cf. Rm 12,6.
123
Sto. Toms de Aquino, S. Th. I, 1,10, ad 1.
124
Cf. 1Cor 10,2.
125
Cf. Hb 3-4,11.
126
Cf. Apstolos 21,1-22,5.
127
Agostinho de Dcia, Totulus pugillaris, I: ed. A. Walz: Angelicum 6, 1929, 256
128
DV 12,3.
129
Sto. Agostinho, Contra epistulum Manichaei quam vocant fundamenti, 5,6: PL 42,176.
O Cnon das Escrituras
Foi a Tradio apostlica que fez a Igreja discernir que escritos deviam ser enumerados na
lista dos Livros Sagrados130. Esta lista completa denominada Cnon das Escrituras. Ela
comporta 46 (45, se contarmos Jr e Lm juntos) escritos para o Antigo Testamento e 27
para o Novo131:
Gnesis, xodo, Levtico, Nmeros, Deuteronmio, Josu, Juzes, Rute, os dois
livros de Samuel, os dois livros dos Reis, os dois livros das Crnicas, Esdras e Neemias,
Tobias, Judite, ster, os dois livros dos Macabeus, J, os Salmos, os Provrbios, o
Eclesiastes (ou Colet), o Cntico dos Cnticos, a Sabedoria, o Eclesistico (ou Sircida),
Isaas, Jeremias, as Lamentaes, Baruc, Ezequiel, Daniel, Osias, Joel, Ams, Abdias,
Jonas, Miquias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias, para o Antigo
Testamento; os Evangelhos de Mateus, de Marcos, de Lucas e de Joo, os Atos dos
Apstolos, as Epstolas de S.Paulo aos Romanos, a primeira e a segunda aos Corntios, aos
Glatas, aos Efsios, aos Filipenses, aos Colossenses, a primeira e a segunda aos
Tessalonicenses, a primeira e a segunda a Timteo, a Tito, a Filmon, a Epstola aos
Hebreus, a Epstola de Tiago, a primeira e a segunda de Pedro, as trs Epstolas de Joo, a
Epstola de Judas e o Apocalipse, para o Novo Testamento.
O ANTIGO TESTAMENTO
O Antigo Testamento uma parte indispensvel da Sagrada Escritura. Seus livros so
divinamente inspirados e conservam um valor permanente132, pois a Antiga Aliana nunca
foi revogada.
Com efeito, a Economia do Antigo Testamento estava ordenada principalmente para
preparar a vinda de Cristo, redentor de todos. Embora contenham tambm coisas
imperfeitas e transitrias os livros do Antigo Testamento do testemunho de toda a divina
pedagogia do amor salvfico de Deus: Neles encontram-se sublimes ensinamentos acerca
de Deus e uma salutar sabedoria concernente vida do homem, bem como admirveis
tesouros de preces; nestes livros, enfim est latente o mistrio de nossa salvao133.
Os cristos veneram o Antigo Testamento como verdadeira Palavra de Deus. A Igreja
sempre rechaou vigorosamente a idia de rejeitar o Antigo Testamento sob o pretexto de
que o Novo o teria feito caducar (marcionismo).
O NOVO TESTAMENTO
A Palavra de Deus, que fora de Deus para a salvao de todo crente, apresentada e
manifesta seu vigor de modo eminente nos escritos do Novo Testamento134. Estes escritos
fornecem-nos a verdade definitiva da Revelao divina. Seu objeto central Jesus Cristo, o
Filho de Deus encarnado, seus atos, ensinamentos, paixo e glorificao, assim como os
incios de sua Igreja sob a ao do Esprito Santo135.
Os Evangelhos so o corao de todas as Escrituras, uma vez que constituem o principal
testemunho da vida e da doutrina do Verbo encarnado, nosso Salvador136.
Na formao dos Evangelhos podemos distinguir trs etapas:
1. A Vida e o ensinamento de Jesus. A Igreja defende firmemente que os
quatro Evangelhos, cuja historicidade afirma sem hesitao, transmitem fielmente aquilo
que Jesus, Filho de Deus, ao viver entre os homens, realmente fez e ensinou para a eterna
salvao deles, at o dia em que foi elevado.
2. A tradio oral: O que o Senhor dissera e fizera, os apstolos, aps a
ascenso do Senhor, transmitiram aos ouvintes, com aquela compreenso mais plena de
que gozavam, instrudos que foram pelos gloriosos acontecimentos de Cristo e esclarecidos
pela luz do Esprito de verdade.
3. Os Evangelhos escritos. Os autores sagrados escreveram os quatro
Evangelhos, escolhendo certas coisas das muitas transmitidas ou oralmente ou j escrito,
fazendo sntese de outras ou explanando-as com vistas situao das igrejas,
conservando, enfim, a forma de pregao, sempre de maneira a transmitir-nos, a respeito
de Jesus, coisas verdadeiras e sinceras137.
O Evangelho quadriforme ocupa na Igreja um lugar nico, como atestam a venerao que
lhe tributa a liturgia e o atrativo incomparvel que desde sempre tem exercido sobre os
santos:
No existe nenhuma doutrina que seja melhor, mais preciosa e mais esplndida que o
texto do Evangelho. Vede e retende o que nosso Senhor e Mestre, Cristo, ensinou com
suas palavras e realizou com seus atos138.

130
Cf. DV 8,3.
131
Cf. Decretum Damasi: DS 179-180; Conc. de Florena, Decretum pro Iacobitis: DS 1334-1336; Conc. de Trento, 4 sesso, Decretum de Libris Sacris et de traditionibus recipiendis: DS
1501-1504.
132
Cf. DV 14.
133
DV 15.
134
DV 17.
135
Cf. DV 20.
136
DV 18.
137
DV 19.
138
Sta. Cesria, a Jovem, A sainte Richilde et sainte Radegonde: SC 345,480.
acima de tudo o Evangelho que me ocupa durante as minhas oraes; nele encontro
tudo o que necessrio para minha pobre alma. Descubro nele sempre novas luzes,
sentidos escondidos e misteriosos139.
A UNIDADE ENTRE O ANTIGO E O NOVO TESTAMENTO
A Igreja, j nos tempos apostlicos140, e depois constantemente em sua Tradio, iluminou
a unidade do plano divino nos dois Testamentos graas tipologia. Esta discerne, nas
obras de Deus contidas na Antiga Aliana, prefiguraes daquilo que Deus realizou na
plenitude dos tempos, na pessoa de seu Filho encarnado.
Por isso os cristos lem o Antigo Testamento luz de Cristo morto e ressuscitado. Esta
leitura topolgica manifesta o contedo inesgotvel do Antigo Testamento. Ela no deve
levar a esquecer que este conserva seu valor prprio de Revelao, que o prprio Nosso
Senhor reafirmou141. De resto, tambm o Novo Testamento exige ser lido luz do Antigo.
A catequese crist primitiva recorre constantemente a ele142. Segundo um adgio antigo, o
Novo Testamento est escondido no Antigo, ao passo que o Antigo desvendado no Novo:
Novum in Vetere latet et in Novo Vetus patet143.
A tipologia exprime o dinamismo em direo ao cumprimento do plano divino, quando
Deus ser tudo em todos (1Cor 15,28). Tambm a vocao dos patriarcas e o xodo do
Egito, por exemplo, no perdem seu valor prprio no plano de Deus, pelo fato de serem ao
mesmo tempo etapas intermedirias deste plano.
A Sagrada Escritura na vida da Igreja
to grande o poder e a eficcia encerrados na Palavra de Deus, que ela constitui
sustentculo e vigor para a Igreja, e, para seus filhos, firmeza da f, alimento da alma,
pura e perene fonte da vida espiritual144. preciso que o acesso Sagrada Escritura seja
amplamente aberto aos fiis145.
Que o estudo das Sagradas Pginas seja, portanto, como que a alma da Sagrada
Teologia. Da mesma palavra da Sagrada Escritura tambm se nutre salutarmente e
santamente floresce o ministrio da palavra, a saber, a pregao pastoral, a catequese e
toda a instruo crist, na qual deve ocupar lugar de destaque a homilia litrgica146.
A Igreja exorta com veemncia e de modo peculiar todos os fiis cristos... a que, pela
freqente leitura das divinas Escrituras, aprendam a eminente cincia de Jesus Cristo (Fl
3,8). Com efeito, ignorar as Escrituras ignorar Jesus147.
RESUMINDO
Omnis Scriptura divina unus lber est, et hic unus lber est Christus, quia omnis Scriptura
divina de Christo loquitur, et omnis Scriptura divina in Christo impletur148. Toda a
Escritura divina um nico livro, e este livro nico Cristo, j que toda Escritura divina
fala de Cristo, e toda Escritura divina se cumpre em Cristo.
As Sagradas Escrituras contm a Palavra de Deus e, por serem inspiradas, so
verdadeiramente Palavra de Deus149.
Deus o autor da Sagrada Escritura ao inspirar seus autores humanos; age neles e por
meio deles. Fornece assim a garantia de que seus escritos ensinem sem erro a verdade
salvfica150.
A interpretao das Escrituras inspiradas deve antes de tudo estar atenta quilo que Deus
quer revelar por intermdio dos autores sagrados para nossa salvao. O que vem do
Esprito s plenamente entendido pela ao do Esprito151.
A Igreja recebe e venera como inspirados os 46 livros do Antigo e os 27 livros do Novo
Testamento.
Os quatro Evangelhos ocupam um lugar central, j que Cristo Jesus o centro deles.
A unidade dos dois Testamentos decorre da unidade do projeto de Deus e de sua
Revelao. O Antigo Testamento prepara o Novo, ao passo que este ltimo cumpre o
Antigo; os dois se iluminam reciprocamente; os dois so verdadeira Palavra de Deus.
A Igreja sempre venerou as divinas Escrituras da mesma forma como o prprio Corpo do
Senhor152: ambos alimentam e dirigem toda a vida crist. Tua Palavra a lmpada para
meus ps, e luz para meu caminho (Sl 119,105)153.
CAPTULO III

139
Sta. Teresinha do Menino Jesus, Ms autob. A 83v.
140
Cf. 1Cor 10,6.11; Hb 10,1; 1Pd 3,21.
141
Cf. Mc 12,29-31.
142
Cf. 1Cor 5,6-8; 10,1-11.
143
Sto. Agostinho, Quaestiones in Heptateucum, 2,73; PL 34,623; cf DV 16.
144
DV 21.
145
DV 22.
146
DV 24.
147
DV 25; cf. S. Jernimo, Commentarii in Isaiam, Prologus: CCL 73,1 (PL 24,17).
148
Hugo de So Vtor, De arca Noe, 2,8: PL 176, 642; cf. ibid., 2,9: PL 176,642-643.
149
DV 24.
150
Cf. DV 11.
151
Orgenes, Hom. in Ex. 4,5; SC 321, 128 (PG 12,320).
152
DV 21.
153
Cf. Is 50,4.
A RESPOSTA DO HOMEM A DEUS
Por sua revelao, o Deus invisvel, levado por seu grande amor, fala aos homens como a
amigos, e com eles se entretm para os convidar comunho consigo e nela os
receber154. A resposta adequada a este convite a f.
Pela f, o homem submete completamente sua inteligncia e sua vontade a Deus. Com
todo o seu ser, o homem d seu assentimento a Deus revelador155. A Sagrada Escritura
denomina obedincia da f esta resposta do homem ao Deus que revela156.
ARTIGO 1
EU CREIO
I. A obedincia da f
Obedecer (ob-audire) na f significa submeter-se livremente palavra ouvida, visto que
sua verdade garantida por Deus, a prpria Verdade. Desta obedincia, Abrao o
modelo que a Sagrada Escritura nos prope, e a Virgem Maria, sua mais perfeita
realizao.
ABRAO O PAI DE TODOS OS CRENTES
A Epstola aos Hebreus, no grande elogio f dos antepassados, insiste particularmente na
f de Abrao: Foi pela f que Abrao, respondendo ao chamado, obedeceu e partiu para
uma terra que devia receber como herana, e partiu sem saber para onde ia (Hb 11,8)157.
Pela f, viveu como estrangeiro e como peregrino na Terra Prometida158. Pela f, Sara
recebeu a graa de conceber o filho da promessa. Pela f, finalmente, Abrao ofereceu seu
filho nico em sacrifcio159
Abrao realiza, assim, a definio da f dada pela Epstola aos Hebreus: A f uma posse
antecipada do que se espera, um meio de demonstrar as realidades que no se vem (Hb
11,1). Abrao creu em Deus, e isto lhe foi revelado em conta de justia (Rm 4,3)160.
Graas a esta f poderosa (Rm 4,20), Abrao tornou-se o pai de todos os que haveriam
de crer (Rm 4,11.18)161.
O Antigo Testamento rico em testemunhos desta f. A Epstola aos Hebreus proclama o
elogio da f exemplar dos antigos, que deram o seu testemunho (Hb 11,2.39). No
entanto, Deus previa para ns algo melhor, a graa de crer em seu Filho Jesus, o autor
e realizador da f, que a leva perfeio (Hb 11,40; 12,2).
MARIA BEM-AVENTURADA A QUE ACREDITOU
A Virgem Maria realiza da maneira mais perfeita a obedincia da f. Na f, Maria acolheu o
anncio e a promessa trazida pelo anjo Gabriel, acreditando que nada impossvel a
Deus (Lc 1,37)162 e dando seu assentimento: Eu sou a serva do Senhor; faa-se em mim
segundo a tua palavra (Lc 1,38). Isabel a saudou: Bem-aventurada a que acreditou, pois
o que lhe foi dito da parte do Senhor ser cumprido (Lc 1,45). em virtude desta f que
todas as geraes a proclamaro bem-aventurada163.
Durante toda a sua vida e at sua ltima provao164, quando Jesus, seu filho, morreu na
cruz, sua f no vacilou. Maria no deixou de crer no cumprimento da Palavra de Deus.
Por isso a Igreja venera em Maria a realizao mais pura da f.
Sei em quem pus minha f (2Tm 1,12)
CRER SOMENTE EM DEUS
A f primeiramente uma adeso pessoal do homem a Deus; , ao mesmo tempo e
inseparavelmente, o assentimento livre a toda a verdade que Deus revelou. Como adeso
pessoal a Deus e assentimento verdade que ele revelou, a f crist diferente da f em
uma pessoa humana. justo e bom entregar-se totalmente a Deus e crer absolutamente
no que ele diz. Seria vo e falso pr tal f em uma criatura165.
CRER EM JESUS CRISTO, O FILHO DE DEUS
Para o cristo, crer em Deus , inseparavelmente, crer naquele que Ele enviou, seu Filho
bem-amado, no qual Ele ps toda a sua complacncia166; Deus mandou que o
escutssemos167. O prprio Senhor disse a seus discpulos: Crede em Deus, crede
tambm em mim (Jo 14,1). Podemos crer em Jesus Cristo porque ele mesmo Deus, o
Verbo feito carne: Ningum jamais viu a Deus: o Filho unignito, que est voltado para o

154
DV 2.
155
Cf. DV 5.
156
Cf. Rm 1,5; 16,26.
157
Cf. Gn 12,1-4.
158
Cf. Gn 23,4.
159
Cf. Hb 11,17.
160
Cf. Gn 15,6.
161
Cf. Gn 15,5.
162
Cf. Gn 18,14.
163
Cf. Lc 1,48.
164
Cf. Lc 2,35.
165
Cf. Jr 17,5-6; Sl 40,5; 146,3-4.
166
Cf. Mc 1,11.
167
Cf Mc 9,7.
seio do Pai, este o deu a conhecer (Jo 1,18). Por ter ele visto o Pai (Jo 6,46), ele o
nico que o conhece e pode revel-lo168.
CRER NO ESPRITO SANTO
No se pode crer em Jesus Cristo sem participar de seu Esprito. o Esprito Santo que
revela aos homens quem Jesus. Pois ningum pode dizer Jesus o Senhor a no ser
no Esprito Santo (1Cor 12,3). O Esprito sonda todas as coisas, at mesmo as
profundidades de Deus... O que est em Deus, ningum o conhece a no ser o Esprito de
Deus (1Cor 2,10-11). S Deus conhece a Deus por inteiro. Cremos no Esprito Santo
porque Ele Deus.
A Igreja no cessa de confessar sua f em um s Deus, Pai, Filho e Esprito Santo.
As caractersticas da f
A F UMA GRAA
Quando S. Pedro confessa que Jesus o Cristo, Filho do Deus vivo, Jesus lhe declara que
esta revelao no lhe veio da carne e do sangue, mas de meu Pai que est nos cus169.
A f um dom de Deus, uma virtude sobrenatural infundida por Ele. Para que se preste
esta f, exigem-se a graa prvia e adjuvante de Deus e os auxlios internos do Esprito
Santo, que move o corao e o converte a Deus, abre os olhos da mente e d a todos
suavidade no consentir e crer na verdade170.
A F UM ATO HUMANO
Crer s possvel pela graa e pelos auxlios interiores do Esprito Santo. Mas no menos
verdade que crer um ato autenticamente humano. No contraria nem a liberdade nem a
inteligncia do homem confiar em Deus e aderir s verdades por Ele reveladas. J no
campo das relaes humanas, no contrrio nossa prpria dignidade crer no que outras
pessoas nos dizem sobre si mesmas e sobre suas intenes e confiar nas promessas delas
(como, por exemplo, quando um homem e uma mulher se casam), para entrar assim em
comunho recproca. Por isso, ainda menos contrrio nossa dignidade prestar, pela f,
revelao de Deus, plena adeso do intelecto e da vontade171 e entrar, assim, em
comunho ntima com ele,
Na f, a inteligncia e a vontade humanas cooperam com a graa divina: Credere est
actus intellectus assentientis veritati divinae ex imprio voluntatis a Deo motae per
gratiam Crer um ato da inteligncia que assente verdade divina a mando da vontade
movida por Deus atravs da graa172.
A F E A INTELIGNCIA
O motivo de crer no o fato de as verdades reveladas aparecerem como verdadeiras e
inteligveis luz de nossa razo natural. Cremos por causa da autoridade de Deus que
revela e que no pode nem enganar-se nem enganar-nos173. Todavia, para que o
obsquio de nossa f fosse conforme razo, Deus quis que os auxlios interiores do
Esprito Santo fossem acompanhados das provas exteriores de sua Revelao174. Por isso,
os milagres de Cristo e dos santos175, as profecias, a propagao e a santidade da Igreja,
sua fecundidade e estabilidade constituem sinais certssimos da Revelao, adaptados
inteligncia de todos176, motivos de credibilidade que mostram que o assentimento da f
no de modo algum um movimento cego do esprito177
A f certa, mais certa que qualquer conhecimento humano, porque se funda na prpria
Palavra de Deus, que no pode mentir. Sem dvida, as verdades reveladas podem parecer
obscuras razo e experincia humanas, mas a certeza dada pela luz divina maior
que a que dada pela luz da razo natural178. Dez mil dificuldades no fazem uma nica
dvida179.
A f procura compreender180: caracterstico da f o crente desejar conhecer melhor
Aquele em quem ps sua f e compreender melhor o que Ele revelou; um conhecimento
mais penetrante despertar por sua vez uma f maior; cada vez mais ardente de amor. A
graa da f abre os olhos do corao (Ef. 1,18) para uma compreenso viva dos
contedos da Revelao, isto , do conjunto do projeto de Deus e dos mistrios da f, do
nexo deles entre si e com Cristo, centro do Mistrio revelado. Ora, para tornar cada vez
mais profunda a compreenso da Revelao, o mesmo Esprito Santo aperfeioa

168
Cf. Mt 11,27.
169
Mt 16,17; cf. Gl 1,15-16; Mt 11,25.
170
Cf. Gl 1,15-16; Mt 11,25.
171
Conc. Vaticano I: DS 3008.
172
Sto. Toms de Aquino, S. Th. II-II,2,9; cf. Conc. Vaticano I: DS 3010.
173
Conc. Vaticano I, DF, c. 3: DS 3008.
174
Ibid., DS 3009.
175
Cf. Mc 16,20; Hb 2,4.
176
Conc. Vaticano I, DF, c. 3: DS 3009.
177
Conc. Vaticano I, DF, c. 3: DS 3010.
178
Sto. Toms de Aquino, S. Th. II-II, 171,5, obj. 3.
179
Newman, Apologia pro vita sua.
180
Sto. Anselmo, Proslogion, proem: PL 153, 225A.
continuamente a f por meio de seus dons181. Assim, segundo o adgio de Sto.
Agostinho182, eu creio para compreender, e compreendo para melhor crer.
F e cincia. Porm, ainda que a f esteja acima da razo, no poder jamais haver
verdadeira desarmonia entre uma e outra, porquanto o mesmo Deus que revela os
mistrios e infunde a f dotou o esprito humano da luz da razo; e Deus no poderia
negar-se a si mesmo, nem a verdade jamais contradizer a verdade183. Portanto, se a
pesquisa metdica, em todas as cincias, proceder de maneira verdadeiramente cientfica,
segundo as leis morais, na realidade nunca ser oposta f: tanto as realidades profanas
quanto as da f originam-se do mesmo Deus. Mais ainda: quem tenta perscrutar com
humildade e perseverana os segredos das coisas, ainda que disso no tome conscincia,
como que conduzido pela mo de Deus, que sustenta todas as coisas, fazendo com que
elas sejam o que so184.
A LIBERDADE DA F
Para que o ato de f seja humano, o homem deve responder a Deus, crendo por livre
vontade. Por conseguinte, ningum deve ser forado contra sua vontade a abraar a f.
Pois o ato de f por sua natureza voluntrio185. Deus de fato chama os homens para
servi-lo em esprito e verdade. Com isso, os homens so obrigados em conscincia, mas
no so forados... Foi o que se patenteou em grau mximo em Jesus Cristo186. Com
efeito, Cristo convidou f e converso, mas de modo algum coagiu. Deu testemunho
da verdade, mas no quis imp-la pela fora aos que a ela resistiam. Seu reino... se
estende graas ao amor com que Cristo, exaltado na cruz, atrai a si os homens187.
A NECESSIDADE DA F
necessrio, para obter esta salvao, crer em Jesus Cristo e naquele que o enviou para
nossa salvao188. Como, porm, sem f impossvel agradar a Deus (Hb 11,6) e chegar
ao consrcio dos seus filhos, ningum jamais pode ser justificado sem ela, nem conseguir
a vida eterna, se nela no permanecer at o fim (Mt 10,22; 24,13)189.
A PERSEVERANA NA F
A f um dom gratuito que Deus concede ao homem. Podemos perder este dom
inestimvel; S. Paulo alerta Timteo sobre isso: Combate... o bom combate, com f e boa
conscincia; pois alguns, rejeitando a boa conscincia, vieram a naufragar na f (1Tm
1,18-19). Para viver, crescer e perseverar at o fim na f, devemos aliment-la com a
Palavra de Deus; devemos implorar ao Senhor que a aumente190; ela deve agir pela
caridade (Gl 5,6)191, ser carregado pela esperana192 e estar enraizada na f da Igreja.
A F COMEO DA VIDA ETERNA
A f nos faz degustar como por antecipao a alegria e a luz da viso beatfica, meta de
nossa caminhada na terra. Veremos ento a Deus face a face (1Cor 13,12), tal como Ele
(1Jo 3,2). A f j , portanto, o comeo da vida eterna:
Enquanto desde j contemplamos as bnos da f, como um reflexo no espelho, como
se j possussemos as coisas maravilhosas que um dia desfrutaremos, conforme nos
garante nossa f193.
Por ora, todavia, caminhamos pela f, no pela viso (2Cor 5,7), e conhecemos a Deus
como que em um espelho, de uma forma confusa... imperfeita (1Cor 13,12). Luminosa
em virtude daquele em que ela cr, a f muitas vezes vivida na obscuridade. A f pode
ser posta prova. O mundo em que vivemos muitas vezes parece estar bem longe daquilo
que a f nos assegura; as experincias do mal e do sofrimento, das injustias e da morte
parecem contradizer a Boa Nova; podem abalar a f e tornar-se para ela uma tentao.
ento que devemos nos voltar para as testemunhas da f: Abrao, que creu, esperando
contra toda esperana (Rm 4,18); a Virgem Maria, que na peregrinao da f194 foi at a
noite da f195, comungando com o sofrimento de seu Filho e com a noite de seu tmulo196;
e tantas outras testemunhas da f: Com tal nuvem de testemunhas ao nosso redor,
rejeitando todo fardo e o pecado que nos envolve, corramos com perseverana para o
certame que nos proposto, com os olhos fixos naquele que autor e realizador da f,
Jesus (Hb 12,1-2).
ARTIGO 2
NS CREMOS

181
DV 5.
182
Serm 43,7,9: PL 38, 258.
183
Conc. Vaticano I: DS 3017.
184
GS 36,2.
185
DH 10; cf. CIC, cn. 748, 2.
186
DH 11.
187
DH 11.
188
Cf. Mc 16,16; Jo 3,36; 6,40 e.o.
189
Conc. Vaticano I: DS 3012; cf. Conc. de Trento: DS 1532.
190
Cf. Mc 9,24; Lc 17,5; 22,32.
191
Cf. Tg 2,14-26.
192
Cf. Rm 15,13.
193
S. Baslio, Lber de Spiritu Sancto, 15,36: PG 32,132; cf. Sto. Toms de Aquino, S. Th. II-II.4.1.
194
LG 58.
195
Joo Paulo II, R. Mater, 17: AAS 79 (1987) 381.
196
Joo Paulo II, R, Mater 18: AAS 79 (1987) 382-383.
A f um ato pessoal: a resposta livre do homem iniciativa de Deus que se revela. Ela
no , porm, um ato isolado. Ningum pode crer sozinho, assim como ningum pode
viver sozinho. Ningum deu a f a si mesmo, assim como ningum deu a vida a si mesmo.
O crente recebeu a f de outros, deve transmiti-la a outros. Nosso amor por Jesus e pelos
homens nos impulsiona a falar a outros de nossa f. Cada crente como um elo na grande
corrente dos crentes. No posso crer sem ser carregado pela f dos outros, e pela minha f
contribuo para carregar a f dos outros.
Eu creio197: esta a f da Igreja, professada pessoalmente por todo crente,
principalmente pelo batismo. Ns cremos198: esta a f da Igreja confessada pelos
bispos reunidos em Conclio ou, mais comumente, pela assemblia litrgica dos crentes.
Eu creio tambm a Igreja, nossa Me, que responde a Deus com sua f e que nos
ensina a dizer: eu creio, ns cremos.
Olhai, Senhor, para a f da vossa Igreja
antes de tudo a Igreja que cr e que desta forma carrega, alimenta e sustenta minha f.
antes de tudo a Igreja que, em toda parte, confessa o Senhor (Te per orbem terrarum
sancta confitetur Ecclesiae A vs por toda a terra proclama a Santa Igreja, assim
cantamos no Te Deum), e com ela e nela tambm ns somos impulsionados e levados a
confessar: Eu creio, ns cremos. por intermdio da Igreja que recebemos a f e a
vida nova no Cristo pelo batismo. No Ritual Romano, o ministro do batismo pergunta ao
catecmeno: Que pedes Igreja de Deus? E a resposta: A f. E que te d a f?. A
vida eterna199.
A salvao vem exclusivamente de Deus, mas, por recebermos a vida de f por meio da
Igreja, esta ltima nossa me: Ns cremos na Igreja como a me do nosso novo
nascimento, e no como se ela fosse a autora de nossa salvao200. Por ser nossa me, a
Igreja tambm a educadora de nossa f.
A linguagem da f
No cremos em frmulas, mas nas realidades que elas expressam e que a f nos permite
tocar. O ato (de f) do crente no pra no enunciado, mas chega at a realidade
(enunciada)201. Todavia, temos acesso a essas realidades com o auxlio das formulaes
da f. Estas permitem expressar e transmitir a f, celebr-la em comunidade, assimil-la e
viv-la cada vez mais.
A Igreja, que a coluna e o sustentculo da verdade (1Tm 3,15), guarda fielmente a f
uma vez por todas confiada aos santos202. ela que conserva a memria das Palavras de
Cristo, ela que transmite de gerao em gerao a confisso de f dos apstolos. Como
uma me que ensina seus filhos a falar e, com isto, a compreender e a comunicar, a
Igreja, nossa Me, nos ensina a linguagem da f para introduzir-nos na compreenso e na
vida da f.
Uma nica f
H sculos, mediante tantas lnguas, culturas, povos e naes, a Igreja no cessa de
confessar sua nica f, recebida de um s Senhor, transmitida por um nico batismo,
enraizada na convico de que todos os homens tm um s Deus e Pai203. Sto. Irineu de
Lio, testemunha desta f, declara:
Com efeito, a Igreja, embora espalhada pelo mundo inteiro at os confins da terra, tendo
recebido dos apstolos e dos discpulos deles a f... guarda [esta pregao e esta f] com
cuidado, como se habitasse em uma s casa; nelas cr de forma idntica, como se tivesse
uma s alma; e prega as verdades de f, as ensina e transmite com voz unnime, como se
possusse uma s boca204.
Pois, se no mundo as lnguas diferem, o contedo da Tradio uno e idntico. E nem as
Igrejas estabelecidas na Germnia tm outra f ou outra Tradio, nem as que esto entre
os iberos, nem as que esto entre os celtas, nem as do Oriente, do Egito, da Lbia, nem as
que esto estabelecidas no centro do mundo...205. A mensagem da Igreja , portanto,
verdica e slida, pois nela que um nico caminho de salvao aparece no mundo
inteiro206.
Esta f que recebemos da Igreja, ns a guardamos com cuidado, pois sem cessar, sob a
ao do Esprito de Deus, guisa de um depsito de grande preo encerrado em um vaso
precioso, ela rejuvenesce e faz rejuvenescer o prprio vaso que a contm207
RESUMINDO

197
Smbolo dos Apstolos.
198
Smbolo niceno-constantinopolitano, original grego.
199
Ordo initiationis christianae adultorum, 75, Tipografia Poliglota Vaticana, 1972, p. 24; ibid., 247, p. 91.
200
Fausto de Riez, De Spiritu Sancto, 1,2: CSEL 21,104.
201
Sto. Toms de Aquino, S. Th. II-II, 1,2, ad 2.
202
Cf. Jd 1,3.
203
Cf. Ef. 4,4-6.
204
Sto. Irineu, Adv. haer. 1,10,1-2; SC 264, 154-158 (PG 7,550-551).
205
Ibid., 1,10,2: SC 264, 158-160 (PG 7,531-534).
206
Ibid., 5,20,1: SC 153, 254-256 (PG 7,1177).
207
Ibid., 3,24,1: SC 211,472 (PG 7,966).
A f uma adeso pessoal do homem inteiro a Deus que se revela. Ela inclui uma adeso
da inteligncia e da vontade Revelao que Deus fez de si mesmo por suas aes e
palavras.
Por conseguinte, crer tem uma dupla referncia: pessoa e verdade; verdade, por
confiana na pessoa que a atesta.
No devemos crer em ningum a no ser em Deus, o Pai, o Filho e o Esprito Santo.
A f um dom sobrenatural de Deus. Para crer, o homem tem necessidade dos auxlios
interiores do Esprito Santo.
Crer um ato humano, consciente e livre, que corresponde dignidade da pessoa
humana.
Crer um ato eclesial. A f da Igreja precede, gera, sustenta e alimenta nossa f. A
Igreja a me de todos os crentes. Ningum pode ter a Deus por Pai, que no tenha a
Igreja por me208.
Ns cremos em tudo o que est contido na Palavra de Deus, escrita ou transmitida, e que
a Igreja prope a crer como divinamente revelado209.
A f necessria salvao. O prprio Senhor afirma: Aquele que crer e for batizado ser
salvo; aquele que no crer ser condenado (Mc 16,16).
A f um antegozo do conhecimento que nos tornar bem-aventurados na vida
futura210.
O Credo

Smbolo dos Apstolos211 Smbolo niceno-constantinopolitano212

Creio em Deus Creio em um s Deus.


Pai todo-poderoso, Pai todo-poderoso,
criador do cu e da terra. criador do cu e da terra,
de todas as coisas visveis e invisveis.
E em Jesus Cristo, seu Creio em um s Senhor, Jesus Cristo,
nico Filho, Filho Unignito de Deus,
Nosso Senhor, nascido do Pai antes de todos os sculos:
Deus de Deus,
Luz da Luz,
Deus verdadeiro de Deus verdadeiro;
gerado, no criado,
consubstancial ao Pai.
Por ele todas as coisas foram feitas.
E por ns, homens, e para nossa
salvao, desceu dos cus
que foi concebido pelo poder do e se encarnou pelo Esprito Santo,
Esprito Santo, no seio da Virgem Maria,
nasceu da Virgem Maria, e se fez homem.
padeceu sob Pncio Pilatos, Tambm por ns foi crucificado sob
foi crucificado, morto Pncio Pilatos,
e sepultado. padeceu e foi sepultado.
Desceu manso dos mortos,
ressuscitou ao terceiro dia, Ressuscitou ao terceiro dia,
conforme as Escrituras,
subiu aos cus e subiu aos cus,
est sentado direita onde est sentado direita doPai.
de Deus Pai
todo-poderoso,
donde h de vir a julgar os E de novo h de vir, em sua glria,
vivos e os mortos. para julgar os vivos e os mortos;
e o seu reino no ter fim.

208
S. Cipriano, De unitate: PL 4,503A.
209
SPF 20.
210
Sto. Toms de Aquino, Comp. Theol. 1,2.
211
DS 30.
212
DS 150.
Creio no Esprito Santo, Creio no Esprito Santo,
Senhor que d a vida
e procede do Pai e do Filho;
e com o Pai e o Filho
adorado e glorificado:
na Santa Igreja Catlica Ele que falou pelos profetas.
na comunho dos santos, Creio na Igreja,
una, santa, catlica e apostlica.
na remisso dos pecados, Professo um s batismo
na ressurreio da carne, para a remisso dos pecados.
na vida eterna. E espero a ressurreio dos mortos
Amm. e a vida do mundo que h de vir.
Amm.

SEGUNDA SEO
A PROFISSO DA F CRIST
OS SMBOLOS DA F
Quem diz creio diz dou minha adeso quilo que ns cremos. A comunho na f precisa
de uma linguagem comum da f, normativa para todos e que una na mesma confisso de
f.
Desde a origem, a Igreja apostlica exprimiu e transmitiu sua prpria f em frmulas
breves e normativas para todos213. Mas j muito cedo a Igreja quis tambm recolher o
essencial e sua f em resumos orgnicos e articulados, destinados sobretudo aos
candidatos ao Batismo:
Esta sntese da f no foi elaborada segundo as opinies humanas, mas da Escritura inteira
recolheu-se o que existe de mais importante, para dar, na sua totalidade, a nica doutrina
da f. E assim como a semente de mostarda contm em um pequenssimo gro um grande
nmero de ramos, da mesma forma este resumo da f encerra em algumas palavras todo
o conhecimento da verdadeira piedade contida no Antigo e no Novo Testamento214.
Estas snteses da f chamam-se profisses de f, pois resumem a f que os cristos
professam. Chamam-se Credo em razo da primeira palavra com que normalmente
comeam: Creio. Denominam-se tambm Smbolos da f.
A palavra grega symbolon significava a metade de um objeto quebrado (por exemplo,
um sinete) que era apresentada como sinal de reconhecimento. As partes quebradas eram
juntadas para se verificar a identidade do portador. O smbolo da f , pois, um sinal de
reconhecimento e de comunho entre os crentes. Symbolon passa em seguida a
significar coletnea, coleo ou sumrio. O smbolo da f a coletnea das principais
verdades da f. Da o fato de ele servir como ponto de referncia primeiro e fundamental
da catequese.
A primeira profisso de f feita por ocasio do Batismo. O smbolo da f
inicialmente o smbolo batismal. Uma vez que o Batismo dado em nome do Pai e do
Filho e do Esprito Santo (Mt 28,19), as verdades de f professadas por ocasio do
Batismo esto articuladas segundo sua referncia s trs pessoas da Santssima Trindade.
O smbolo est, pois, dividido em trs partes: Primeiro, fala-se da primeira Pessoa divina
e da obra admirvel da criao; em seguida, da segunda Pessoa divina e do Mistrio da
Redeno dos homens; finalmente, da terceira Pessoa divina, fonte e princpio de nossa
santificao215. Esses so os trs captulos de nosso selo (batismal)216.
Estas trs partes so distintas, embora interligadas. Segundo uma comparao usada com
freqncia pelos Padres, chamamo-las de artigos. Pois da mesma forma que em nossos
membros existem certas articulaes que os distinguem e os separam, assim tambm
nesta profisso de f, com acerto e razo, se deu o nome de artigo s verdades em que
devemos crer especificamente e de forma distinta217. Segundo uma antiga tradio, j
atestada por Sto Ambrsio, tambm se costuma contar doze artigos do Credo,
simbolizando com o nmero dos apstolos o conjunto da f apostlica218.
As profisses ou smbolos da f tm sido numerosos ao longo dos sculos e em resposta s
necessidades das diversas pocas: os smbolos das diferentes Igrejas apostlicas e
antigas219, o Smbolo Quicumque, dito por Sto. Atansio220, as profisses de f de certos

213
Cf. Rm 10,9; 1Cor 15,3-5 etc.
214
S. Cirilo de Jerusalm, Cathecheses illuminandorum, 5,12: PG 33,521-524.
215
Catech. R. 1,1,4, ed. P. Rodrguez (Citt del Vaticano Pamplona, 1989), p.20.
216
Sto. Irineu. Dem. ap., 100.
217
Catech. R. 1,1,4.
218
Cf. Expl. Symb., 8: PL 17, 1158D.
219
Cf. DS 1.64.
220
Cf. DS 75-76.
Conclios (Toledo221; Latro222; Lio223; Trento224) ou de certos papas, como a Fides
Damasi225 (Profisso de F de S. Damaso) ou o Credo do Povo de Deus [SPF], de Paulo
VI (1968)226.
Nenhum dos smbolos das diferentes etapas da vida da Igreja pode ser considerado
ultrapassado e intil. Eles nos ajudam a viver e a aprofundar hoje a f de sempre por meio
dos diversos resumos que dela tm sido feitos. Entre todos os smbolos da f, dois ocupam
um lugar particularssimo na vida da Igreja.
O Smbolo dos Apstolos, assim chamado por ser, com razo, considerado o resumo fiel da
f dos apstolos. o antigo smbolo batismal da Igreja de Roma. Sua grande autoridade
vem do seguinte fato: Ele o smbolo guardado pela Igreja Romana, aquela onde Pedro,
o primeiro apstolo, teve sua S e para onde ele trouxe a comum expresso de f
(sententia communis = opinio comum)227.
O Smbolo denominado niceno-constantinopolitano tem a sua grande autoridade no fato de
ter resultado dos dois primeiros Conclios ecumnicos (325 e 381). Ainda hoje ele
comum a todas as grandes Igrejas do Oriente e do Ocidente.
Nossa exposio da f seguir o Smbolo dos Apstolos, que constitui, por assim dizer, o
mais antigo catecismo romano. Contudo, a exposio ser completada por constantes
referncias ao Smbolo niceno-constantinopolitano, muitas vezes mais explcito e mais
detalhado.
Como no dia de nosso batismo, quando toda a nossa vida foi confiada regra de
doutrina ( Rm 6,17), acolhamos o Smbolo de nossa f que d a vida. Recitar com f o
Credo entrar em comunho com Deus Pai, Filho e Esprito Santo. tambm entrar em
comunho com a Igreja inteira, que nos transmite a f e no seio da qual cremos:
Este Smbolo o selo espiritual, a meditao do nosso corao e o guardio sempre
presente; ele , seguramente, o tesouro da nossa alma228.
CAPTULO I
CREIO EM DEUS PAI
Nossa profisso de f comea com Deus, pois Deus o Primeiro e o ltimo (Is 44,6), o
Comeo e o Fim de tudo. O Credo comea com Deus Pai, pois o Pai Primeira Pessoa
Divina da Santssima Trindade; nosso Smbolo comea pela criao do cu e da terra,
porque a criao o comeo e o fundamento de todas as obras de Deus.
ARTIGO 1
CREIO EM DEUS PAI TODO-PODEROSO,
CRIADOR DO CU E DA TERRA
PARGRAFO 1
CREIO EM DEUS
Creio em Deus: esta primeira afirmao da profisso de f tambm a mais
fundamental. O Smbolo inteiro fala de Deus, e, se fala tambm do homem e do mundo,
f-lo pela relao que eles tm com Deus. Os artigos do Credo dependem todos do
primeiro, da mesma forma que os mandamentos explicitam o primeiro deles. Os demais
artigos nos fazem conhecer melhor a Deus tal como se revelou progressivamente aos
homens. Os fiis fazem primeiro profisso de crer em Deus229.
Creio em um s Deus
com estas palavras que comea o Smbolo niceno-constantinopolitano. A confisso da
Unidade de Deus, que tem sua raiz na Revelao Divina da Antiga Aliana, inseparvel
da confisso da existncia de Deus, e igualmente fundamental. Deus nico, s existe um
Deus. A f crist confessa que h Um s Deus, por natureza, por substncia e por
essncia230.
A Israel, seu eleito, Deus revelou-se como o nico: Ouve, Israel: O Senhor nosso Deus
o nico Senhor! Portanto, amars o Senhor teu Deus com todo o teu corao, com toda
a tua alma e com toda a tua fora (Dt 6,4-5). Por meio dos profetas, Deus chama Israel e
todas as naes a se voltarem para Ele, o nico: Voltai-vos para mim e sereis salvos,
todos os confins da terra, porque eu sou Deus e no h nenhum outro!... Com efeito,
diante de mim se dobrar todo joelho, toda lngua h de jurar por mim, dizendo: S no
Senhor h justia e fora231.

221
DS 525-541.
222
DS 800-802.
223
DS 851-861.
224
DS 1862-1870.
225
Cf. DS 71-72.
226
Sollemnis Professio fidei: AAS 60 (1968) 433-445.
227
Sto. Ambrsio, Expl. Symb. 7: PL 17, 1158D.
228
Sto. Ambrsio, Expl. Symb. 1: PL 17,1155C.
229
Catech. R. 1,2,6, ed. P. Rodrguez (Citt del Vaticano) Pamplona, 1989), p. 23.
230
Catech. R. 1,2,8, ed. P. Rodrguez (Citt del Vaticano) Pamplona, 1989), p. 26.
231
Is 45,22-24; cf. Fl 2,10-11.
Jesus mesmo confirma que Deus o nico Senhor e que preciso am-lo de todo o
corao, com toda a alma, com todo o esprito e com todas as foras232. Ao mesmo tempo,
d a entender que ele mesmo o Senhor233. Confessar que Jesus o Senhor o
especfico da f crist. Isso no contraria a f em Deus nico. Crer no Esprito Santo que
Senhor e d a Vida no introduz nenhuma diviso no Deus nico:
Cremos firmemente e afirmamos simplesmente que h um s verdadeiro Deus eterno,
imenso e imutvel, incompreensvel, todo-poderoso e inefvel, Pai, Filho e Esprito Santo:
Trs Pessoa, mas uma Essncia, uma Substncia ou Natureza absolutamente simples234
.
Deus revela seu nome
A seu povo, Israel, Deus revelou-se, dando-lhe a conhecer o seu nome. O nome exprime a
essncia, a identidade da pessoa e o sentido de sua vida. Deus tem um nome. Ele no
uma fora annima. Desvendar o prprio nome dar-se a conhecer aos outros; , de certo
modo, entregar-se a si mesmo, tornando-se acessvel, capaz de ser conhecido mais
intimamente e de ser chamado pessoalmente.
Deus revelou-se progressivamente a seu povo e com diversos nomes, mas a revelao
do nome divino feita a Moiss na teofania da sara ardente, pouco antes do xodo e da
Aliana do Sinai, que se tornou a revelao fundamental para a Antiga e a Nova Aliana.
O DEUS VIVO
Deus chama Moiss do meio de uma sara que queima sem consumir-se. Ele diz a Moiss:
Eu sou o Deus de teu pai, o Deus de Abrao, o Deus de Isaac e o Deus de Jac (Ex 3,6).
Deus o Deus dos pais, Aquele que havia guiado os patriarcas em suas peregrinaes. Ele
o Deus fiel e compassivo que se lembra deles e de suas prprias promessas; vem libertar
seus descendentes da escravido. Ele o Deus que, para alm do espao e do tempo,
pode e quer faz-lo, e que colocar sua onipotncia em ao a servio desse projeto.
EU SOU AQUELE QUE
Moiss disse a Deus: Quando eu for aos filhos de Israel e disser: O Deus de vossos pais
me enviou at vs, e me perguntarem: Qual o seu nome?, que direi? Disse Deus a
Moiss: Eu sou Aquele que . Disse mais: Assim dirs aos filhos de Israel: EU SOU me
enviou at vs... Este o meu nome para sempre, e esta ser a minha lembrana de
gerao em gerao (Ex 3,13-15).
206. Ao revelar seu nome misterioso de Iahweh, Eu sou Aquele que ou Eu Sou
Aquele que SOU ou tambm Eu sou Quem sou, Deus declara quem Ele e com que
nome se deve cham-lo. Este nome divino misterioso como Deus mistrio. Ele ao
mesmo tempo um nome revelado e com que a recusa de um nome, e por isso mesmo
que exprime da melhor forma a realidade de Deus como ele , infinitamente acima de tudo
o que podemos compreender ou dizer: ele o Deus escondido (Is 45,15), seu nome
inefvel235, e ele o Deus que se faz prximo dos homens.
207. Ao revelar seu nome, Deus, revela ao mesmo tempo sua fidelidade, que de
sempre e para sempre, vlida tanto para o passado (Eu sou o Deus de teus pais, Ex 3,6)
como para o futuro (Eu estarei contigo, Ex 3,12). Deus, que revela seu nome como Eu
sou, revela-se como o Deus que est sempre presente junto a seu povo para salv-lo.
Diante da presena atraente e misteriosa de Deus, o homem descobre sua pequenez.
Diante da sara ardente, Moiss tira as sandlias e cobre o rosto236 em face da Santidade
Divina. Diante da glria de Deus trs vezes santo, Isaas exclama: Ai de mim, estou
perdido! Com efeito, sou um homem de lbios impuros (Is 6,5). Diante dos sinais divinos
que Jesus faz, Pedro exclama: Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um pecador (Lc
5,8). Mas porque Deus santo, pode perdoar o homem que se descobre pecador diante
dele: No executarei o ardor da minha ira... porque sou Deus e no homem, eu sou santo
no meio de ti (Os 11,9). O apstolo Joo dir: Diante dele tranqilizaremos nosso
corao, se nosso corao nos acusa, porque Deus maior do que nosso corao e
conhece todas as coisas (1Jo 3,19-20).
Por respeito santidade de Deus, o povo de Israel no pronuncia seu nome. Na leitura da
Sagrada Escritura, o nome revelado substitudo pelo ttulo divino Senhor (Adonai, em
grego Krios). com este ttulo que ser aclamada a divindade de Jesus: Jesus
Senhor.
DEUS DE TERNURA E DE COMPAIXO
210. Depois do pecado de Israel, que se desviou de Deus para adorar o bezerro de
ouro237, Deus ouve a intercesso de Moiss e aceita caminhar no meio do um povo infiel,
manifestando, assim, seu amor238. A Moiss, que pede para ver sua glria, Deus responde:

232
Cf. Mc 12,29-30.
233
Cf. Mc 12,35-37.
234
Conc. Lateranense IV: DS 800.
235
Cf. Jz 13,18.
236
Cf. Ex 3,5-6.
237
Cf. Ex 32.
238
Cf. Ex. 33,12-17.
Farei passar diante de ti toda a minha beleza e diante de ti pronunciarei o nome de
Iahweh (Ex 33,38-19). E o Senhor passa diante de Moiss e proclama: Iahweh, Iahweh,
Deus de ternura e de compaixo, lento para a clera e rico em amor e fidelidade (Ex
34,6). Moiss confessa ento que o Senhor um Deus que perdoa239.
211. O nome divino Eu sou ou Ele exprime a fidelidade de Deus, que, apesar da
infidelidade do pecado dos homens e do castigo que ele merece, guarda seu amor a
milhares (Ex 34,7). Deus revela que rico em misericrdia (Ef. 2,4), indo at o ponto
de dar seu prprio Filho. Ao dar sua vida para libertar-nos do pecado, Jesus revelar que
ele mesmo traz o Nome divino: Quando tiverdes elevado o Filho do Homem, ento
sabereis que EU SOU (Jo 8,28).
S DEUS
Ao longo dos sculos, a f de Israel pde desenvolver e aprofundar as riquezas contidas na
revelao do nome divino. Deus nico, fora dele no h deuses240. Transcende o mundo
e a histria. Foi Ele quem fez o cu e a terra: Eles perecem, mas tu permaneces; todos
ficam gastos como a roupa... mas tu existes, e teus anos jamais findaro! (Sl 102,27-28).
Nele no h mudana, nem sombra de variao (Tg 1,17). Ele Aquele que , desde
sempre e para sempre, e assim que permanece sempre fiel a si mesmo e s suas
promessas.
A revelao do nome inefvel Eu sou aquele que sou contm, pois, a verdade de que s
Deus . neste sentido que j a traduo dos Setenta e, na esteira deles, a Tradio da
Igreja compreenderam o nome divino: Deus a plenitude do Ser e de toda perfeio, sem
origem e sem fim. Ao passo que todas as criaturas receberam dele todo o seu ser e o seu
ter, s ele seu prprio ser, e por si mesmo tudo o que .
Deus, Aquele que , Verdade e Amor
Deus, Aquele que , revelou-se a Israel como Aquele que rico em amor e em
fidelidade (Ex 34,6). Esses dois termos exprimem de forma condensada as riquezas do
nome divino. Em todas as suas obras Deus mostra sua benevolncia, bondade, graa,
amor, mas tambm sua confiabilidade, constncia, fidelidade, verdade. Celebro teu nome
por teu amor e verdade (Sl 138,2)241. Ele a Verdade, pois Deus Luz, nele no h
trevas (1Jo 1,5), Amor, como ensina o apstolo Joo (1Jo 4,8).
DEUS A VERDADE
O princpio de tua palavra a verdade, tuas normas so justia para sempre (Sl
119,160). Sim, Senhor Deus, s tu que s Deus, tuas palavras so verdade (2Sm 7,28);
por isso que as promessas de Deus sempre se realizam242. Deus a prpria Verdade,
suas palavras no podem enganar. por isso que podemos entregar-nos com toda a
confiana 1a verdade e fidelidade de sua palavra em todas as coisas. O comeo do
pecado e da queda do homem foi uma mentira do tentador que induziu a duvidar da
palavra de Deus, de sua benevolncia e fidelidade.
A verdade de Deus sua sabedoria que comanda toda a ordem da criao e do governo do
mundo243. Deus, que sozinho criou o cu e a terra244, o nico que pode dar o
conhecimento verdadeiro de toda coisa criada em sua relao com ele245.
Deus verdadeiro tambm quando se revela: o ensinamento que vem de Deus uma
doutrina de verdade (Ml 2,6). Quando enviar seu Filho ao mundo, ser para dar
testemunho da Verdade (Jo 18, 37): Ns sabemos que veio o Filho de Deus e nos deu a
inteligncia para conhecermos o Verdadeiro246.
DEUS AMOR
Ao longo de sua histria, Israel pde descobrir que Deus tinha uma nica razo para
revelar-se a ele e para t-lo escolhido dentre todos os povos para ser dele; seu amor
gratuito247. E Israel entendeu, graas a seus profetas, que foi tambm por amor que Deus
no cessou de salv-lo248 e de perdoar-lhe sua infidelidade e seus pecados249.
O amor de Deus por Israel comparado ao amor de um pai por seu filho250. Este amor
mais forte que o amor de uma me por seus filhos251. Deus ama seu Povo mais do que um
esposo ama sua bem-amada252; este amor se sobrepor at s piores infidelidades253; ir
at a mais preciosa doao: Deus amou tanto o mundo, que entregou seu Filho nico (Jo
3,16).

239
Cf. Ex. 34,9.
240
Cf. Is 44,6.
241
Cf. Sl 85,11.
242
Cf. Dt 7,9.
243
Cf. Sb 13,1-19.
244
Cf. Sl 115,15.
245
Cf. Sb 7,17-21.
246
1Jo 5,20; cf. Jo 17,3.
247
Cf. Dt 4,37; 7,8; 10,15.
248
Cf. Is 43,1-17.
249
Cf. Os 2.
250
Cf. Os 11,1.
251
Cf. Is 49,14-15.
252
Cf. Is 62,4-5.
253
Cf. Ez 16; Os 11.
O amor de Deus eterno (Is 54,8): Os montes podem mudar de lugar e as colinas
podem abalar-se, mas o meu amor no mudar (Is 54,10). Eu te amei com um amor
eterno, por isso conservei por ti o amor (Jr 31,3).
Mas S. Joo ir ainda mais longe ao afirmar: Deus Amor (1Jo 4,8.16); o prprio Ser de
Deus Amor. Ao enviar, na plenitude dos tempos, seu Filho nico e o Esprito de Amor,
Deus revela seu segredo mais ntimo254: Ele mesmo eternamente intercmbio de amor:
Pai, Filho e Esprito Santo, e destinou-nos a participar deste intercmbio.
O alcance da f no Deus nico
Crer em Deus, o nico, e am-lo com todo o prprio ser tem conseqncias imensas para
toda a nossa vida.
Significa conhecer a grandeza e a majestade de Deus: Deus grande demais para que o
possamos conhecer (J 36,26). por isso que Deus deve ser o primeiro a ser servido255
Significa viver em ao de graas. Se Deus o nico, tudo o que somos e tudo o que
possumos vem dele: Que que possuis, que no tenhas recebido? (1Cor 4,7). Como
retribuirei ao Senhor todo o bem que me fez? (Sl 116,12).
Significa conhecer a unidade e a verdadeira dignidade de todos os homens. Todos eles so
feitos imagem e semelhana de Deus (Gn 1,27).
Significa usar corretamente das coisas criadas. A f no Deus nico nos leva a usar de tudo
o que no Ele, na medida em que isso nos aproxima dele, e a desapegar-nos das coisas,
na medida em que nos desviam dele256:
Meu Senhor e meu Deus, tirai-me tudo o que me afasta de vs.
Meu Senhor e meu Deus, dai-me tudo o que me aproxima de vs.
Meu Senhor e meu Deus, desprendei-me de mim mesmo para doar-me por inteiro a vs257
Significa confiar em Deus em qualquer circunstncia, mesmo na adversidade. Uma orao
de Sta. Teresa de Jesus exprime-o de maneira admirvel:
Nada te perturbe / Nada te assuste
Tudo passa / Deus no muda
A pacincia tudo alcana / Quem a Deus tem
Nada lhe falta / S Deus basta258
RESUMINDO
Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus o nico Senhor... (Dt. 6,4; Mc 12,29). preciso
necessariamente que o Ser supremo seja nico, isto , sem igual... Se Deus no for nico,
no Deus259.
A f em Deus leva-nos a nos voltar s para Ele como nossa primeira origem e nosso fim
ltimo, e a nada preferir a Ele nem substitui-lo por nada.
Ao revelar-se, Deus permanece Mistrio inefvel: Se o compreendesses, ele no seria
Deus260.
O Deus de nossa f revelou-se como Aquele que ; deu-se a conhecer como cheio de
amor e fidelidade (Ex 34,6). Seu prprio ser Verdade e Amor.
PARGRAFO 2
O PAI
Em nome do Pai, do Filho e do Esprito Santo
Os cristos so batizados em nome do Pai, do Filho e do Esprito Santo (Mt 28,19). Antes
disso, eles responderam Creio trplice pergunta que os manda confessar sua f no Pai,
no Filho e no Esprito: Fides omnium christianorum in Trinitate consistit A f de todos os
cristos consiste na Trindade261.
Os cristos so batizados em nome do Pai e do Filho e do Esprito Santo, e no nos
nomes destes trs262, pois s existe um Deus, o Pai todo-poderoso, seu Filho nico e o
Esprito Santo: a Santssima Trindade..
O mistrio da Santssima Trindade o mistrio central da f e da vida crist. o mistrio
de Deus em si mesmo. , portanto, a fonte de todos os outros mistrios da f, a luz que
os ilumina. o ensinamento mais fundamental e essencial na hierarquia das verdades de
f263. Toda a histria da salvao no seno a histria da via e dos meios pelos quais o
Deus verdadeiro e nico, Pai, Filho e Esprito Santo, se revela, reconcilia consigo e une a si
os homens que se afastam do pecado264.

254
Cf. 1Cor 2,7-16; Ef 3,9-12.
255
S. Joana dArc, Dictum.
256
Cf. Mt 5,29-30; 16,24; 19,23-24.
257
S. Nicolau de Flue, Orao.
258
Sta. Teresa de Jesus, Poes. 9: Biblioteca Mstica Carmelitana, v. 6, Burgos, 1919, p. 90.
259
Tertuliano, Ad, Marc. 1,3.
260
Sto. Agostinho, Serm. 52,6,16: PL 38,360.
261
S. Cesrio de Arles, Expositio Symboli (sermo 9): CCL 103,48.
262
Cf. Profisso de f do papa Virglio em 552: DS 415.
263
Cf. DCG 43: AAS 64 (1972) 123.
264
Cf. DCG 47.
Neste pargrafo se expor brevemente de que modo revelado o mistrio da Santssima
Trindade (I), de que maneira a Igreja formulou a doutrina da f sobre este mistrio (II), e,
finalmente, de que modo, mediante as misses divinas do Filho e do Esprito Santo, Deus
Pai realiza seu desgnio benevolente de criao, de redeno e de santificao (III).
Os Padres da Igreja distinguem entre a Theologia e a Oikonomia, designando com o
primeiro termo o mistrio da vida ntima do Deus-Trindade e com o segundo todas as
obras de Deus por meio das quais ele se revela e comunica sua vida. mediante a
Oikonomia que nos revelada a Theologia; mas, inversamente, a Theologia que
ilumina toda a Oikonomia. As obras de Deus revelam quem Ele em si mesmo e,
inversamente, o mistrio de seu Ser ntimo ilumina a compreenso de todas as suas obras.
Acontece o mesmo, analogicamente, entre as pessoas humanas. A pessoa mostra-se em
seu agir e, quanto melhor conhecermos uma pessoa, tanto melhor compreenderemos seu
agir.
A Trindade um mistrio de f no sentido estrito, um dos mistrios escondidos em Deus
que no podem ser conhecidos se no forem revelados do alto265. Sem dvida, Deus
deixou vestgios de seu ser trinitrio em sua obra de Criao e em sua Revelao ao longo
do Antigo Testamento. Mas a intimidade de seu Ser como Santssima Trindade constitui
um mistrio inacessvel pura razo e at mesmo f de Israel antes da Encarnao do
Filho de Deus e da misso do Esprito Santo.
A revelao de Deus como Trindade
O PAI REVELADO PELO FILHO
A invocao de Deus como Pai conhecida em muitas religies. A divindade muitas
vezes considerada pai dos deuses e dos homens. Em Israel, Deus chamado de Pai
enquanto Criador do mundo266. Deus Pai, mais ainda, em razo da Aliana e do dom da
Lei a Israel, seu filho primognito (Ex 4,22). tambm chamado de Pai do rei de
Israel267. Muito particularmente Ele o Pai dos pobres, do rfo e da viva que esto sob
sua proteo de amor268.
Ao designar a Deus com o nome de Pai, a linguagem da f indica principalmente dois
aspectos: que Deus origem primeira de tudo e autoridade transcendente, e que ao
mesmo tempo bondade e solicitude de amor para todos os seus filhos. Esta ternura
paterna de Deus pode tambm ser expressa pela imagem da maternidade269, que indica
mais a imanncia de Deus, a intimidade entre Deus e sua criatura. A linguagem da f
inspira-se, assim, na experincia humana dos pais (genitores), que so de certo modo os
primeiros representantes de Deus para o homem. Mas esta experincia humana ensina
tambm que os pais humanos so falveis e que podem desfigurar o rosto da paternidade e
da maternidade. Convm ento lembrar que Deus transcende a distino humana dos
sexos. Ele no nem homem nem mulher, Deus. Transcende tambm a paternidade e a
maternidade humanas270, embora seja a sua origem e a medida271: ningum pai como
Deus o .
Jesus revelou que Deus Pai num sentido inaudito: no o somente enquanto Criador,
mas eternamente Pai em relao a seu Filho nico, que s eternamente Filho em
relao a seu Pai: Ningum conhece o Filho seno o Pai, e ningum conhece o Pai seno o
Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar (Mt 11,27).
por isso que os apstolos confessam Jesus como o Verbo que no incio estava junto de
Deus e que Deus (Jo 1,1), como a imagem do Deus invisvel (Cl 1,15), como o
resplendor de sua glria e a expresso do seu ser (Hb 1,3).
Na esteira deles, segundo a Tradio apostlica, a Igreja, no ano de 325, no primeiro
Conclio Ecumnico de Nicia, confessou que o Filho consubstancial272 ao Pai, isto , um
s Deus com Ele. O segundo Conclio Ecumnico, reunido em Constantinopla em 381,
conservou esta expresso em sua formulao do Credo de Nicia e confessou o Filho
nico de Deus, gerado do Pai antes de todos os sculos, luz de luz, Deus verdadeiro de
Deus verdadeiro, gerado, no criado, consubstancial ao Pai273.
O PAI E O FILHO REVELADOS PELO ESPRITO
Antes de sua Pscoa, Jesus anuncia o envio de outro Parclito (Defensor), o Esprito
Santo. Em ao desde a criao274, depois de ter outrora falado pelos profetas275, ele
estar agora junto dos discpulos e neles276, a fim de ensin-los277 e conduzi-los verdade

265
Conc. Vaticano I, DF, c. 4; DS 3015.
266
Cf. Dt 32,6; Ml 2,10.
267
Cf. 2Sm 7,14.
268
Cf. Sl 68,6.
269
Cf. Is 66,13; Sl 131,2.
270
Cf. Sl 27,10.
271
Cf. Ef 3,14-15; Is 49,15.
272
Smbolo niceno: DS 125.
273
DS 150.
274
Cf. Gn 1,2.
275
Smbolo niceno-constantinopolitano.
276
Cf. Jo 14,17.
277
Cf. Jo 14,26.
inteira (Jo 16,13). O Esprito Santo assim revelado como outra pessoa divina em relao
a Jesus e ao Pai.
A origem eterna do Esprito revela-se em sua misso temporal. O Esprito Santo enviado
aos apstolos e Igreja tanto pelo Pai, em nome do Filho, como pelo Filho em pessoa,
depois que este tiver voltado para junto do Pai278. O envio da pessoa do Esprito aps a
glorificao de Jesus279 revela em plenitude o mistrio da Santssima Trindade.
A f apostlica no tocante ao Esprito foi confessada pelo segundo Conclio Ecumnico, em
381, em Constantinopla: Cremos no Esprito Santo, que Senhor e que d a vida; ele
procede do Pai280. Com isso a Igreja reconhece o Pai como a fonte e a origem de toda a
divindade281. Mas a origem eterna do Esprito Santo no deixa de estar vinculada do
Filho: O Esprito Santo, que a Terceira Pessoa da Trindade, Deus, uno e igual ao Pai e
ao Filho, da mesma substncia e tambm da mesma natureza... Contudo, no se diz que
Ele somente o Esprito do Pai, mas ao mesmo tempo o Esprito do Pai e do Filho282. O
Credo da Igreja, do Conclio de Constantinopla, confessa: Com o Pai e o Filho ele recebe a
mesma adorao e a mesma glria283.
A tradio latina do Credo confessa que o Esprito procede do Pai e do Filho (Filioque). O
Conclio de Florena, em 1438. explicita: O Esprito Santo tem sua essncia e seu ser
subsistente ao mesmo tempo do Pai e do Filho e procede eternamente de Ambos como de
um s Princpio e por uma nica expirao... E uma vez que tudo o que do Pai o Pai
mesmo o deu ao seu Filho nico ao ger-lo, excetuado seu ser de Pai, esta prpria
processo do Esprito Santo a partir do Filho, ele a tem eternamente de Seu Pai que o
gerou eternamente284.
A afirmao do filioque no figurava no smbolo professado em 381 em Constantinopla.
Mas, com base em uma antiga tradio latina e Alexandrina, o papa S. Leo o havia
confessado dogmaticamente em 447285, antes que Roma conhecesse e recebesse, em 451,
no Conclio de Calcednia, o smbolo de 381. O uso desta frmula no Credo foi sendo
admitido pouco a pouco na liturgia latina (entre os sculos VIII e XI). Todavia, a
introduo do filioque no Smbolo niceno-constantinopolitano pela liturgia latina constitui,
ainda hoje, um ponto de discrdia em relao s Igrejas ortodoxas.
A tradio oriental pe primeiramente em relevo o carter de origem primeira do Pai em
relao ao Esprito. Ao confessar o Esprito como procedente do Pai (Jo 15,26), ela afirma
que o Esprito procede do Pai pelo Filho286. A tradio ocidental pe primeiramente em
relevo a comunho consubstancial entre o Pai e o Filho, afirmando que o Esprito procede
do Pai e do Filho (Filioque). Ela o afirma de forma legtima e racional287, pois a ordem
eterna das pessoas divinas em sua comunho consubstancial implica no s que o Pai seja
a origem primeira do Esprito enquanto princpio sem princpio288, mas tambm,
enquanto Pai do Filho nico, que seja com ele o nico princpio do qual procede o Esprito
Santo289. Esta legtima complementaridade, se no for radicalizada, no afeta a identidade
da f na realidade do mesmo mistrio confessado.
A Santssima Trindade na doutrina da f
A FORMAO DO DOGMA TRINITRIO
A verdade revelada da Santssima Trindade esteve desde as origens na raiz da f viva da
Igreja, principalmente por meio do Batismo. Ela encontra sua expresso na regra da f
batismal, formulada na pregao, na catequese e na orao da Igreja. Tais formulaes
encontram-se j nos escritos apostlicos, como na seguinte saudao, retomada na liturgia
eucarstica: A graa do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunho do Esprito
Santo estejam com todos vs (2Cor 13,13)290.
No decurso dos primeiros sculos, a Igreja procurou formular mais explicitamente sua f
trinitria, tanto para aprofundar sua prpria compreenso da f como para defend-la de
erros que a estavam deformando. Isso foi obra dos Conclios antigos, ajudados pelo
trabalho teolgico dos Padres da Igreja e apoiados pelo senso da f do povo cristo.
Para a formulao do dogma da Trindade, a Igreja teve de desenvolver uma terminologia
prpria, recorrendo a noes de origem filosfica: substncia, pessoa, ou hipstase,
relaoetc. Ao fazer isso, no submeteu a f a uma sabedoria humana, mas imprimiu um
sentido novo, inaudito, a esses termos, chamados a significar a partir da tambm um
Mistrio inefvel, que supera infinitamente tudo o que ns podemos compreender dentro
do limite humano291.

278
Cf. Jo 14,26; 15,26; 16,14.
279
Cf. Jo 7,39.
280
DS 150.
281
VI Conc. de Toledo em 638: DS 490.
282
XI Conc. de Toledo em 675: DS 527.
283
DS 150.
284
DS 1300-1301.
285
Cf. DS 284.
286
Cf. AG 2.
287
Conc. de Florena em 1439: DS 1302.
288
DS 1331.
289
II Conc. de Lio em 1274; DS 850.
290
Cf. 1Cor 12,4-6; Ef 4,4-6.
291
Paulo VI, Sollemnis professio fidei, 9: AAS 60 (1968) 437.
A Igreja utiliza o termo substncia (traduzido tambm, s vezes, por essncia ou por
natureza) para designar o ser divino em sua unidade, o termo pessoa ou hipstase
para designar o Pai, o Filho e o Esprito Santo em sua distino real entre si, e o termo
relao para designar o fato de a distino entre eles residir na referncia de uns aos
outros.
O DOGMA DA SANTSSIMA TRINDADE
A Trindade Una. No professamos trs deuses, mas um s Deus em trs pessoas: a
Trindade consubstancial292. As pessoas divinas no dividem entre si a nica divindade,
mas cada uma delas Deus por inteiro: O Pai aquilo que o Filho, o Filho aquilo que
o Pai, o Esprito Santo aquilo que so o Pai e o Filho, isto , um s Deus por natureza293.
Cada uma das trs pessoas esta realidade, isto , a substncia, a essncia ou a
natureza divina294.
As pessoas divinas so realmente distintas entre si. Deus nico, mas no solitrio295.
Pai, Filho, Esprito Santo no so simplesmente nomes que designam modalidades do
ser divino, pois so realmente distintos entre si: Aquele que o Pai no o Filho, e
aquele que o Filho no o Pai, nem o Esprito Santo aquele que o Pai ou o Filho296.
So distintos entre si por suas relaes de origem: o Pai que gera, o Filho que gerado,
o Esprito Santo que procede297. A Unidade divina Trina.
As pessoas divinas so relativas umas s outras. Por no dividir a unidade divina, a
distino real das pessoas entre si reside unicamente nas relaes que as referem umas
1as outras: Nos nomes relativos das pessoas, o Pai referido pelo Filho, o Filho ao Pai, o
Esprito Santo aos dois; quando se fala destas trs pessoas considerando as relaes, cr-
se todavia em uma s natureza ou substncia298. Pois tudo uno [neles] l onde no se
encontra a oposio de relao299. Por causa desta unidade, o Pai est todo inteiro no
Filho, todo inteiro no Esprito Santo; o Filho est todo inteiro no Pai, todo inteiro no Esprito
Santo; o Esprito Santo, todo inteiro no Pai, todo inteiro no Filho300.
Aos Catecmenos de Constantinopla, S. Gregrio Nazianzeno, denominado tambm o
Telogo, confia o seguinte resumo da f trinitria:
Antes de todas as coisas, conservai-me este bom depsito, pelo qual vivo e combato, com
o qual quero morrer, que me faz suportar todos os males e desprezar todos os prazeres:
refiro-me profisso de f no Pai e no Filho e no Esprito Santo. Eu vo-la confio hoje. por
ela que daqui a pouco vou mergulhar-vos na gua e vos tirar dela. Eu vo-la dou como
companheira e dona de toda a vossa vida. Dou-vos uma s Divindade e Poder, que existe
Una nos Trs, e que contm os Trs de maneira distinta. Divindade sem diferena de
substncia ou de natureza, sem grau superior que eleve ou grau inferior que rebaixe... A
infinita conaturalidade de trs infinitos. Cada um considerado em si mesmo Deus todo
inteiro... Deus os Trs considerados juntos. Nem comecei a pensar na Unidade, e a
Trindade me banha em seu esplendor. Nem comecei a pensar na Trindade, e a unidade
toma conta de mim301.
As obras divinas e as misses trinitrias
O lux beata Trinitas et principalis Unitas luz, Trindade bendita. primordial
Unidade302! Deus beatitude eterna, vida imortal, luz sem ocaso. Deus amor: Pai, Filho
e Esprito Santo. Livremente, Deus quer comunicar a glria de sua vida bem-aventurada.
Este o desgnio de benevolncia (Ef 1,9) que ele concebeu desde antes da criao do
mundo no seu Filho bem-amado, predestinando-nos adoo filial neste (Ef. 1,5), isto
a reproduzir a imagem do seu Filho(Rm 9,29) graas ao Esprito de adoo filial(Rm
8,5). Esta deciso prvia uma graa concedida antes de todos os sculos (2Tm 1,9),
proveniente diretamente do amor trinitrio. Ele se desdobra na obra da criao, em toda a
histria da salvao aps a queda, nas misses do Filho e do Esprito, prolongadas pela
misso da Igreja303.
Toda a economia divina obra comum das trs pessoas divinas. Pois da mesma forma que
a Trindade no tem seno uma nica e mesma natureza, assim tambm no tem seno
uma nica e mesma operao304. O Pai, o Filho e o Esprito Santo no so trs princpios
das criaturas, mas um s princpio305. Contudo, cada pessoa divina cumpre a obra comum
segundo sua propriedade pessoal. Assim a Igreja confessa, na linha de Novo
Testamento306: Um Deus e Pai do qual so todas as coisas, um Senhor Jesus Cristo

292
II Conc. de Constantinopla em 553: DS 421.
293
XI Conc. de Toledo em 675: DS 530.
294
IV Conc. Lateranense em1215: DS 804.
295
Fides Damasi: DS 71.
296
XI Conc. de Toledo em 675: DS 530.
297
IV Conc. de Latro em 1215: DS 804.
298
XI Conc. de Toledo em 675: DS 528.
299
Conc. de Florena em 1442: DS 1330.
300
Conc. de Florena em 1442: DS 1331.
301
Or. 40,41: PG 36,417.
302
LH. Hino das vsperas do domingo da 4 semana.
303
Cf. AG 2-9.
304
Cf. II Conc. de Constantinopla em 553: DS 421.
305
Conc. de Florena em 1442: DS 1331.
306
Cf. 1Cor 8,6.
mediante o qual so todas as coisas, um Esprito Santo em quem so todas as coisas307.
So sobretudo as misses divinas da Encarnao do Filho e do dom do Esprito Santo que
manifestam as propriedades das pessoas divinas.
Obra ao mesmo tempo comum e pessoal, toda a Economia divina d a conhecer tanto a
propriedade das pessoas divinas como sua nica natureza. Outrossim, toda a vida crist
comunho com cada uma das pessoas divinas, sem de modo algum separ-las. Quem
rende glria ao Pai o faz pelo Filho no Esprito Santo; quem segue a Cristo, o faz porque o
Pai o atrai308 e o Esprito o impulsiona309.
O fim ltimo de toda a Economia divina a entrada das criaturas na unidade perfeita da
Santssima Trindade310. Mas desde j somos chamados a ser habitados pela Santssima
Trindade: Se algum me ama diz o Senhor, guardar a minha palavra, e meu Pai o
amar e viremos a ele, e faremos nele a nossa morada ( Jo 14,23).
meu Deus, Trindade que adoro, ajudai-me a esquecer-me inteiramente para firmar-me
em Vs, imvel e pacfica, como se a minha alma j estivesse na eternidade: que nada
consiga perturbar a minha paz nem fazer-me sair de Vs, meu Imutvel, mas que cada
minuto me leve mais longe na profundidade do vosso Mistrio! Pacificai a minha alma!
Fazei dela o vosso cu, vossa amada morada e o lugar do vosso repouso. Que nela eu
nunca vos deixe s, mas que eu esteja a, toda inteira, completamente vigilante na minha
f, toda adorante, toda entregue vossa ao criadora311.
RESUMINDO
O mistrio da Santssima Trindade o mistrio central da f e da vida crist. S Deus no-lo
pode dar a conhecer, revelando-se como Pai, Filho e Esprito Santo.
A Encarnao do Filho de Deus revela que Deus o Pai eterno, e que o Filho
consubstancial ao Pai, isto , que ele no Pai e com o Pai o mesmo Deus nico.
A misso do Esprito Santo, enviado pelo Pai em nome do Filho312 e pelo Filho de junto do
Pai (Jo 15,26), revela que o Esprito com eles o mesmo Deus nico. Com o Pai e o Filho
adorado e glorificado313
O Esprito Santo procede do Pai enquanto fonte primeira e, pela doao eterna deste
ltimo ao Filho, do Pai e do Filho em comunho314.
Pela graa do Batismo em nome do Pai e do Filho e do Esprito Santo (Mt 29,19) somos
chamados a compartilhar da vida da Santssima Trindade, aqui na terra, na obscuridade da
f, e para alm da morte, na luz eterna315.
Fides autem catholica haec est, ut unum Deum in Trinitate, et Trinitatem in unitate
veneremur, neque confundentes personas, neque substantiam separantes: alia enim est
persona Patris, alia Filii, alia Spiritus Sancti; sed Patris et Filii et Spiritus Sancti est una
divinitas, aequalis gloria, coaeterna majestas A f catlica esta: que veneremos o nico
Deus na Trindade, e a Trindade na unidade, no confundindo as pessoas, nem separando a
substncia: pois uma a pessoa do Pai, outra, a do Filho, outra, a do Esprito Santo; mas
uma s a divindade do Pai, do Filho e do Esprito Santo, igual a glria, co-eterna a
majestade316.
Inseparveis naquilo que so, da mesma forma o so naquilo que fazem. Mas na nica
operao divina cada uma delas manifesta o que lhe prprio na Trindade, sobretudo nas
misses divinas da Encarnao do Filho e do dom do Esprito Santo.
PARGRAFO 3
O TODO-PODEROSO
De todos os atributos divinos, s a onipotncia de Deus mencionada no Smbolo:
confess-la de grande importncia para nossa vida. Ns cremos que ela universal, pois
Deus, que criou tudo317. governa tudo e pode tudo, tambm de amor, pois Deus nosso
Pai318; e misericrdia, pois somente a f pode discerni-la, quando (a onipotncia divina)
se manifesta na fraqueza (2Cor 12,9)319.
ELE FAZ TUDO O QUE QUER (Sl 115,3)
As Sagradas Escrituras professam reiteradas vezes o poder universal de Deus. Ele
chamado o Poderoso de Jac (Gn 49,24; Is 1,24 e.o.), o Senhor dos exrcitos, o
Forte, o Valente (Sl 24,8-10). Se Deus todo-poderoso no cu e na terra (Sl 135,6),
porque os fez. Por isso, nada lhe impossvel320, e Ele dispes vontade de sua obra321;

307
II Conc. de Constantinopla: DS 421.
308
Cf. Jo 6,44.
309
Cf. Rm 8,14.
310
Cf. Jo 17,21-23.
311
Orao da bem-aventurada Elizabete da Trindade.
312
Cf. Jo 14,26.
313
Smbolo niceno-constantinopolitano: DS 150.
314
Sto. Agostinho, De Trin. 15,26,47: PL 42,1095.
315
Cf. SPF 9.
316
Smbolo Quicumque: DS 75.
317
Cf. Gn 1,1; Jo 1,3.
318
Cf. Mt 6,9.
319
Cf. 1Cor 1,18.
320
Cf. Jr 32,17; Lc 1,37.
321
Cf. Jr 27,5.
Ele o Senhor do universo, cuja ordem estabeleceu, ordem esta que lhe permanece
inteiramente submissa e disponvel; Ele o Senhor da histria: governa os coraes e os
acontecimentos vontade322. Teu grande poder est sempre a teu servio, e quem pode
resistir fora de teu brao? (Sb 11,21).
TU TE COMPADECES DE TODOS, PORQUE TUDO PODES (Sb 11,23)
Deus o Pai todo-poderoso. Sua paternidade e seu poder iluminam-se mutuamente. Com
efeito, ele mostra sua onipotncia paternal pela maneira como cuida de nossas
necessidades323, pela adoo filial que nos outorga ( Serei para vs um pai, e sereis para
mim filhos e filhas, diz o Senhor todo-poderoso: 2Cor 6,18), e finalmente por sua
misericrdia infinita, pois mostra seu poder no mais alto grau, perdoando livremente os
pecados.
A onipotncia divina de modo algum arbitrria. Em Deus o poder e a essncia, a
vontade e a inteligncia, a sabedoria e a justia so uma s e mesma coisa, de sorte que
nada pode estar no poder divino que no possa estar na vontade justa de Deus ou em sua
inteligncia sbia324.
O MISTRIO DA APARENTE IMPOTNCIA DE DEUS
A f em Deus Pai todo-poderoso pode ser posta prova pela experincia do mal e do
sofrimento. Por vezes, Deus pode parecer ausente e incapaz de impedir o mal. Ora, Deus
Pai revelou sua onipotncia da maneira mais misteriosa no rebaixamento voluntrio e na
Ressurreio de seu Filho, pelos quais venceu o mal. Assim, Cristo crucificado poder de
Deus e sabedoria de Deus. Pois o que loucura de Deus mais sbio do que os homens, e
o que fraqueza de Deus mais forte do que os homens (1Cor 1,25). Foi na Ressurreio
e na exaltao de Cristo que o Pai desdobrou o vigor de sua fora e manifestou que
extraordinria grandeza reveste seu poder para ns, os que cremos (Ef 1,19-22).
Somente a f pode aderir aos caminhos misteriosos da onipotncia de Deus. Esta f gloria-
se de suas fraquezas a fim de atrair sobre si o poder de Cristo325. Desta f, a Virgem Maria
o modelo supremo, ela que acreditou que nada impossvel a Deus (Lc. 1,37) e que
pde engrandecer o Senhor. O Todo-poderoso fez grandes coisas em meu favor, seu
nome Santo (Lc 1,49).
Por isso, nada mais adequado para consolidar nossa F e nossa esperana do que a
convico profundamente gravada em nossas almas de que nada impossvel a Deus. Pois
tudo o que [o Credo] a seguir nos propor as maiores coisas, as mais incompreensveis,
bem como as que mais ultrapassam as leis ordinrias da natureza , desde que nossa
razo tenha pelo menos idia da onipotncia divina, ela as admitir facilmente e sem
qualquer hesitao326.
RESUMINDO
Juntamente com J, o justo, ns confessamos: Reconheo que tudo podes e que nenhum
dos teus desgnios fica frustrado (J 42,2).
Fiel ao testemunho da Escritura, a Igreja dirige com freqncia sua prece ao Deus todo-
poderoso e eterno (omnipotens sempiterne Deus...), crendo firmemente que nada
impossvel a Deus (Lc 1,37)327.
Deus manifesta sua onipotncia convertendo-nos dos nossos pecados e restabelecendo-
nos em sua amizade pela graa (Deus, qui omnipotentiam tuam parcendo mxime et
miserando manifestas... Deus, que manifestais o vosso poder sobretudo na
misericrdia....328.
Se no crermos que o amor de Deus todo-poderoso, como crer que o Pai pde nos criar,
o Filho, remir-nos, o Esprito santificar-nos?
PARGRAFO 4
O CRIADOR
No princpio, Deus criou o cu e a terra (Gn 1,1). Com essas solenes palavras inicia-se a
Sagrada Escritura. O Smbolo da f retoma estas palavras confessando Deus Pai todo-
poderoso como o Criador do cu e da terra329, de todas as coisas visveis e invisveis330.
Por isso, falaremos primeiro do Criador, em seguida de sua criao e, finalmente, da queda
do pecado, do qual Jesus Cristo, o Filho de Deus, veio resgatar-nos.
A criao o fundamento de todos os desgnios salvficos de Deus, o comeo da histria
da salvao331, que culmina em Cristo. Inversamente, o mistrio de Cristo a luz decisiva
sobre o mistrio da criao; ele revela o fim em vista do qual, no princpio, Deus criou e

322
Cf. Est 4,17c; Pr 21,1; Tb 13,2.
323
Cf. Mt 6,32.
324
Sto. Toms de Aquino, S. Th. I, 25,5, ad 1.
325
Cf. 2Cor 12,9; Fl 4,13.
326
Catech. R. I,2.13.
327
Cf. Gn 18,14; Mt 19,26.
328
MR, Coleta do 26 Domingo.
329
Smbolo dos Apstolos: DS 30.
330
Smbolo niceno-constantinopolitano: DS 150
331
DCG 51.
cu e a terra (Gn 1,1): desde o incio, Deus tinha em vista a glria da nova criao em
Cristo332.
por isso que as leituras da Viglia Pascal, celebrao da criao nova em Cristo, comeam
pelo relato da criao; da mesma forma, na liturgia bizantina, o relato da criao constitui
sempre a primeira leitura das viglias das grandes festas do Senhor. Segundo o
testemunho dos antigos, a instruo dos catecmenos para o batismo segue o mesmo
caminho333.
A catequese sobre a criao
A catequese sobre a criao se reveste de uma importncia capital. Ela diz respeito aos
prprios fundamentos da vida humana e crist, pois explicita a resposta da f crist
pergunta elementar feita pelos homens de todas as pocas: De onde viemos? Para onde
vamos? Qual a nossa origem? Qual o nosso fim? De onde vem e para onde vai
tudo o que existe? As duas questes, a da origem e a do fim, so inseparveis. So
decisivas para o sentido e a orientao de nossa vida e de nosso agir.
283. A questo das origens do mundo e do homem objeto de numerosas pesquisas
cientficas que enriqueceram magnificamente nossos conhecimentos sobre a idade e as
dimenses do cosmo, o devir das formas vivas, o aparecimento do homem. Essas
descobertas nos convidam a admirar tanto mais a grandeza do Criador, a render-lhe
graas por todas as suas obras, pela inteligncia e pela sabedoria que d aos estudiosos e
aos pesquisadores. Com Salomo, estes ltimos podem dizer: Ele me deu um
conhecimento infalvel dos seres para entender a estrutura do mundo, a atividade dos
elementos... pois a Sabedoria, artfice do mundo, mo ensinou (Sb 7,17.22).
284 O grande interesse reservado a essas pesquisas fortemente estimulado por uma
questo de outra ordem e que ultrapassa o mbito prprio das cincias naturais. No se
trata somente de saber quando e como surgiu materialmente o cosmo, nem quando o
homem apareceu, mas, antes, de descobrir qual o sentido de tal origem: se ela
governada pelo acaso, um destino cego, uma necessidade annima, ou por um Ser
transcendente, inteligente e bom, chamado Deus. E, se o mundo provm da sabedoria e
da bondade de Deus, por que existe o mal? De onde vem? Quem o responsvel por ele?
Haver como libertar-se dele?
285. Desde os incios, a f crist tem-se confrontado com respostas diferentes da sua no
que diz respeito questo das origens. Assim, encontram-se nas religies e nas culturas
antigas numerosos mitos acerca das origens. Certos filsofos afirmaram que tudo Deus,
que o mundo Deus, ou que o devir do mundo e o devir de Deus (pantesmo); outros
afirmaram que o mundo uma emanao necessria de Deus, emanao esta que deriva
dessa fonte e volta a ela; outros ainda afirmaram a existncia de dois princpios eternos, o
Bem e o Mal, a Luz e as Trevas, em luta permanente entre si (dualismo, maniquesmo);
segundo algumas dessas concepes, o mundo (pelo menos o mundo material) seria mau,
produto de uma queda, e portanto deve ser rejeitado ou superado (gnose); outros
admitem que o mundo tenha sido feito por Deus, mas maneira de um relojoeiro que,
uma vez terminado o servio, o teria abandonado a si mesmo (desmo); outros,
finalmente, no aceitam nenhuma origem transcendente do mundo, vendo neste o mero
jogo de uma matria que teria existido sempre (materialismo). Todas essas tentativas do
prova da permanncia e d universalidade da questo das origens. Esta busca prpria do
homem.
286. Sem dvida, a inteligncia humana j pode encontrar uma resposta para a questo
das origens. Com efeito, a existncia de Deus Criador pode ser conhecida com certeza por
meio de suas obras, graas luz da razo humana334, ainda que este conhecimento seja
muitas vezes obscurecido e desfigurado pelo erro. por isso que a f vem confirmar e
iluminar a razo n compreenso correta desta verdade: Foi pela f que compreendemos
que os mundos foram formados por uma palavra de Deus. Por isso que o mundo visvel
no tem sua origem em coisas manifestas (Hb 11,3).
A verdade da criao to importante para toda a vida humana que Deus, em sua
ternura, quis revelar a seu Povo tudo o que til conhecer a este respeito. Para alm do
conhecimento natural que todo homem pode ter do Criador335, Deus revelou
progressivamente a Israel o mistrio da criao. Ele, que escolheu os patriarcas, que fez
Israel sair do Egito e que, ao escolher Israel, o criou e o formou336, se revela com Aquele a
quem pertencem todos os povos da terra, e a terra inteira, como o nico que fez o cu e
a terra (Sl 115,15; 124,8; 134,3).
Assim a revelao da criao inseparvel da revelao e da realizao da Aliana de
Deus, o nico, como seu Povo. A criao revelada como sendo o primeiro passo rumo a
esta Aliana, como o testemunho primeiro e universal do amor todo-poderoso de Deus337.

332
Cf. Rm 8,18-23.
333
Cf. Etria, Pereg. 46: PLS I,1047; Sto. Agostinho, De cathechizandis rudibus,5,5: PL 40,256.
334
Cf. DS 3026.
335
Cf. At 17,24-20; Rm 1,19-20.
336
Cf. Is 43,1.
337
Cf. Gn 15,5; Jr 33,19-26.
Alm disso, a verdade da criao se exprime com um vigor crescente na mensagem dos
profetas338, na orao dos salmos339 e da liturgia, na reflexo da sabedoria340 do Povo
eleito.
Entre todas as palavras da Sagrada Escritura sobre a criao, os trs primeiros captulos
do Gnesis ocupam um lugar nico. Do ponto de vista literrio, esses textos podem ter
diversas fontes. Os autores inspirados puseram-nos no comeo da Escritura, de sorte que
eles exprimem, em sua linguagem solene, as verdades da criao, da origem e do fim
desta em Deus, de sua ordem e de sua bondade, da vocao do homem e finalmente do
drama do pecado e da esperana da salvao. Lidas luz de Cristo, na unidade da Sagrada
Escritura e na Tradio viva da Igreja, essas palavras so a fonte principal para a
catequese dos Mistrios do princpio: criao, queda, promessa da salvao.
A criao obra da Santssima Trindade
No princpio, Deus criou o cu e a terra (Gn 1,1). Trs coisas so afirmadas nestas
primeiras palavras da Escritura: o Deus eterno ps um comeo a tudo o que existe fora
dele. S ele Criador (o verbo criar em hebraico, bara sempre tem como sujeito
Deus). Tudo o que existe (expresso pela frmula o cu e a terra) depende daquele que
lhe d o ser.
No princpio era o Verbo... e o Verbo era Deus... Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi
feito(Jo 1,1-3). O Novo Testamento revela que Deus criou tudo por meio do Verbo Eterno,
seu Filho bem-amado. Nele foram criadas todas as coisas, nos cus e na terra... tudo foi
criado por Ele e para Ele. Ele antes de tudo e nele subsiste (Cl 1,16-17). A f da Igreja
afirma outrossim a ao criadora do Esprito Santo: Ele o doador de vida341, o Esprito
Criador (Veni, Creator Spiritus), a Fonte de todo bem342.
Insinuada no Antigo Testamento343, revelada na Nova Aliana, a ao criadora do Filho e
do Esprito, inseparavelmente una com a do Pai, claramente afirmada pela regra de f da
Igreja: S existe um Deus...: ele o Pai, Deus, o Criador, o Autor, o Ordenador.
Ele fez todas as coisas por si mesmo, isto , pelo seu Verbo e Sabedoria344, pelo Filho e
pelo Esprito, que so como suas mos345. A criao a obra comum da Santssima
Trindade.
O mundo foi criado para a glria de Deus
Eis uma verdade fundamental que a Escritura e a Tradio no cessam de ensinar e
celebrar: O mundo foi criado para a glria de Deus346. Deus criou todas as coisas, explica
S. Boaventura, non propter gloriam augendam, sed propter gloriam manifestandam et
propter gloriam suam, communicandam no para aumentar a [sua] glria, mas para
manifestar a glria e para comunicar a sua glria347. Pois Deus no tem outra razo para
criar a no ser seu amor e sua bondade: Aperta manu clave amoris creaturae prodierunt
aberta a mo pela chave do amor, as criaturas surgiram348. E o Conclio Vaticano I
explica:
Este nico e verdadeiro Deus, por sua bondade e por sua virtude onipotente, no para
aumentar sua felicidade nem para adquirir sua perfeio, mas para manifestar essa
perfeio por meio dos bens que prodigaliza s criaturas, com vontade plenamente livre,
criou simultaneamente no incio do tempo ambas as criaturas do nada: a espiritual e a
corporal349.
A glria de Deus consiste em que se realize esta manifestao e esta comunicao de sua
bondade em vista das quais o mundo foi criado. Fazer de ns filhos adotivos por Jesus
Cristo: conforme o beneplcito de sua vontade para louvor glria da sua graa (Ef 1,5-
6): Pois a glria de Deus o homem vivo, e a vida do homem a viso de Deus: se j a
revelao de Deus por meio da criao proporcionou a vida a todos os seres que vivem na
terra, quanto mais a manifestao do Pai pelo Verbo proporciona a vida queles que vem
a Deus350. O fim ltimo da criao que Deus, Criador do universo, tornar-se- tudo em
todas as coisas (Cl 15,28), procurando, ao mesmo tempo, a sua glria e a nossa
felicidade351.
O mistrio da criao
DEUS CRIA POR SABEDORIA E POR AMOR
Cremos que Deus criou o mundo segundo sua sabedoria352. O mundo no o produto de
uma necessidade qualquer de um destino cego ou do acaso. Cremos que o mundo procede

338
Cf. Is 44,24.
339
Cf. Sl 104.
340
Cf. Pr 8,22-31.
341
Smbolo niceno-constantinopolitano.
342
Liturgia bizantina, Troprio de Vsperas de Pentecostes.
343
Cf. Sl 33,6; 104,30; Gn 1,2-3.
344
Sto. Irineu, Adv. haer, II,30,9.
345
Ibid., IV, 20,1.
346
Conc. Vaticano I: DS 3025.
347
In II Sent. I,2,2,1.
348
Sto. Toms de Aquino, In II Sent., prol.
349
DS 3002.
350
Sto. Irineu, Adv. haer. IV, 20,7.
351
AG 2.
352
Cf. Sb 9,9.
da vontade livre de Deus, que quis fazer as criaturas participarem de seu ser, de sua
sabedoria e de sua bondade: Pois tu criaste todas as coisas: por tua vontade que elas
existiam e foram criadas (Ap 4,11). Quo numerosas so as tuas obras, Senhor, e todas
fizeste com sabedoria! (Sl 104,24). O Senhor bom para todos, compassivo com todas
as suas obras (Sl 145,9).
DEUS CRIA DO NADA
Cremos que Deus no precisa de nada preexistente nem de nenhuma ajuda para criar353. A
criao tambm no uma emanao necessria da substncia divina354. Deus cria
livremente do nada355.
Que haveria de extraordinrio se Deus tivesse tirado o mundo de ma matria preexistente?
Um artfice humano, quando se lhe d um material, faz dele tudo o que quiser. Ao passo
que o poder de Deus se mostra precisamente quando parte do nada para fazer tudo o que
quer356.
A f na criao a partir do nada atestada na Escritura como uma verdade cheia de
promessa e de esperana. Assim, a me do sete filhos os encoraja ao martrio:
No sei como que viestes a aparecer no meu seio, nem fui eu que vos dei o esprito e a
vida, nem tambm fui eu que dispus organicamente os elementos de cada um de vs. Por
conseguinte, foi o Criador do mundo que formou o homem em seu nascimento e deu
origem a todas as coisas, quem vos retribuir, na sua misericrdia, o esprito e a vida,
uma vez que agora fazeis pouco caso de vs mesmos, por amor s leis dele... Eu te
suplico, meu filho, contempla o cu e a terra e observa tudo o que neles existe. Reconhece
que no foi de coisas inexistentes que Deus os fez, e que tambm o gnero humano surgiu
da mesma forma (2Mc 7,22-23.28).
Uma vez que Deus pde criar do nada, pode, pelo Esprito Santo, dar a vida da alma a
pecadores, criando neles um corao puro357, e a vida do corpo aos falecidos, pela
ressurreio, Ele, que faz viver os mortos e chama existncia as coisas que no
existem (Rm 4,17). E uma vez que, pela sua Palavra, pde fazer resplandecer a luz a
partir das trevas358, pode tambm dar a luz da f queles que a desconhecem359.
DEUS CRIA UM MUNDO ORDENADO E BOM
J que Deus cria com sabedoria, a criao ordenada: Tu dispuseste tudo com medida,
nmero e peso (Sb 11,20). Feita no e por meio do Verbo eterno, imagem do Deus
invisvel (Cl 1,15), a criao est destinada, dirigida ao homem, imagem de Deus 360,
chamado a uma relao pessoal com Ele. Nossa inteligncia, que participa da luz do
Intelecto divino, pode entender o que Deus nos diz por sua criao361, sem dvida no sem
grande esforo e num esprito de humildade e de respeito diante do Criador e de sua
obra362. Originada da bondade divina, a criao participa dessa bondade: E Deus viu que
isto era bom... muito bom (Gn 1,4.10.12.18.21.31). Pois a criao querida por Deus
como um dom dirigido ao homem, como uma herana que lhe destinada e confiada.
Repetidas vezes a Igreja teve de defender a bondade da criao, inclusive do mundo
material363
DEUS TRANSCENDE A CRIAO E EST PRESENTE NELA
Deus infinitamente maior que todas as suas obras364: Sua majestade mais alta do que
os cus (Sl 8,2), incalculvel a sua grandeza (Sl 145,3). Mas, por ser o Criador
soberano e livre, causa primeira de tudo o que existe, Ele est presente no mais ntimo das
suas criaturas: Nele vivemos, nos movemos e existimos (At 17,28). Segundo as palavras
de Sto. Agostinho, ele superior summo meo et interior intimo meo maior do que o que
h de maior em mim e mais ntimo do que o que h de mais ntimo em mim365.
DEUS MANTM E SUSTENTA A CRIAO
Com a criao, Deus no abandona sua criatura a ela mesma. No somente lhe d o ser e
a existncia, mas tambm a sustenta a todo instante no ser, d-lhe o dom de agir e a
conduz a seu termo. Reconhecer esta dependncia completa em relao ao Criador uma
fonte de sabedoria e liberdade, alegria e confiana:
Sim tu amas tudo o que criaste, no te aborrece com nada do que fizeste; se alguma coisa
tivesse odiado, no a terias feito. E como poderia subsistir alguma coisa se no a tivesses
querido? Como conservaria a sua existncia se no a tivesse chamado? Mas a todos
perdoas, porque so teus: Senhor, amigo da vida! (Sb 11,24-26).
Deus realiza o seu projeto: a divina providncia
353
Cf. Conc. Vaticano I, DF, c. 1: DS 3002.
354
Cf. Conc. Vaticano I: DS 3023-3024.
355
DS 800; 3025.
356
S. Tefilo de Antioquia, Ad. Autolicum II, 4: PG 6,1052s.
357
Cf. Sl. 51,12.
358
Cf. Gn 1,3.
359
Cf. 2Cor 4,6.
360
Cf. Gn 1,26.
361
Cf. Sl 19,2-5.
362
Cf. J 42,3.
363
Cf. DS 286; 455-463; 800; 1333; 3002.
364
Cf. Eclo 43,30.
365
Conf. III, 6,11.
A criao tem sua bondade e sua perfeio prprias, mas no saiu completamente acabada
das mos do Criador. Ela criada em estado de caminhada(in statu viae) para uma
perfeio ltima a ser ainda atingida, para a qual Deus a destinou. Chamamos de divina
providncia as disposies pelas quais Deus conduz sua criao para esta perfeio:
Deus conserva e governa com sua providncia tudo o que criou; ela se estende com vigor
de um extremo ao outro e governa o universo com suavidade (Sb 8,1). Pois tudo est nu
e descoberto aos seus olhos (Hb 4,13), mesmo os atos dependentes da ao livre das
criaturas366
O testemunho da Escritura unnime: a solicitude da divina providncia concreta e
direta, toma cuidado de tudo, desde as mnimas coisas at os grandes acontecimentos do
mundo e da histria. Com vigor, os livros sagrados afirmam a soberania absoluta de Deus
no curso dos acontecimentos: O nosso Deus est no cu e faz tudo o que deseja (Sl
115,3); e de Cristo se diz: O que abre e ningum mais fecha, e, fechando, ningum mais
abre (Ap 3,7). Muitos so os projetos do corao humano, mas o desgnio do Senhor
que permanece firme (Pr 19,21).
Assim vemos o Esprito Santo, autor principal da Escritura, atribuir muitas vezes aes a
Deus, sem mencionar causas segundas. Esta no uma maneira de falar primitiva, mas
uma forma profunda de lembrar o primado de Deus e o seu senhorio absoluto sobre a
histria e o mundo367 e de assim educar para a confiana nele. A orao dos Salmos a
grande escola desta confiana368.
Jesus pede uma entrega filial providncia do Pai Celeste, que cuida das mnimas
necessidades de seus filhos: Por isso, no andeis preocupados, dizendo: Que iremos
comer? Ou, que iremos beber?... Vosso Pai Celeste sabe que tendes necessidade de todas
essas coisas. Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus sua justia, e todas essas coisas
vos sero acrescentadas (Mt 6,31-33)369.
A PROVIDNCIA E AS CAUSAS SEGUNDAS
Deus o Senhor soberano de seus desgnios. Mas, para realizao dos mesmos, serve-se
tambm do concurso das criaturas. Isso no um sinal de fraqueza, mas da grandeza e da
bondade de Deus todo-poderoso. Pois Deus no somente d s suas criaturas o existir,
mas tambm a dignidade de agirem elas mesmas, de serem causas e princpios umas das
outras e de assim cooperarem no cumprimento e seu desgnio.
Aos homens, Deus concede at de poderem participar livremente de sua providncia,
confiando-lhes a responsabilidade de submeter a terra e de domin-la370. Deus concede
assim aos homens serem causas inteligentes e livres para completar a obra da Criao,
aperfeioar sua harmonia para o bem deles e de seus prximos. Cooperadores muitas
vezes inconscientes da vontade divina, os homens podem entrar deliberadamente no plano
divino, por suas aes, por suas oraes, mas tambm por seus sofrimentos371. Tornam-se
ento plenamente cooperadores de Deus (1Cor 3,9)372 e do seu Reino373.
Eis uma verdade inseparvel da f em Deus Criador: Deus age em todo o agir de suas
criaturas. E a causa primeira que opera nas causas segundas e por meio delas: Pois
Deus quem opera em vs o querer e o operar, segundo a sua vontade (Fl 2,13)374. Longe
de diminuir a dignidade da criatura, esta verdade a reala. Tirada do nada pelo poder,
sabedoria e bondade de Deus, a criatura no pode nada se for cortada de sua origem, pois
a criatura sem o Criador se esvai375; muito menos pode atingir seu fim ltimo sem a
ajuda da graa376.
A PROVIDNCIA E O ESCNDALO DO MAL
Se Deus Pai todo-poderoso, Criador do mundo ordenado e bom, cuida de todas as suas
criaturas, por que ento o mal existe? Para esta pergunta to premente quo inevitvel,
to dolorosa quanto misteriosa, no h uma resposta rpida. o conjunto da f crist que
constitui a resposta a esta pergunta: a bondade da criao, o drama do pecado, o amor
paciente de Deus que se antecipa ao homem por suas Alianas, pela Encarnao redentora
de seu Filho, pelo dom do Esprito, pelo congraamento da Igreja, pela fora dos
sacramentos, pelo chamado a uma vida bem-aventurada qual as criaturas livres so
convidadas antecipadamente a assentir, mas da qual podem, por um terrvel mistrio,
abrir mo tambm antecipadamente. No h nenhum elemento da mensagem crist que
no seja, por uma parte, uma resposta questo do mal.
Mas por que Deus no criou um mundo to perfeito que nele no possa existir mal algum?
Segundo seu poder infinito, Deus sempre poderia criar algo melhor377. Todavia, em sua

366
Conc. Vaticano I: DS 3003.
367
Cf. Is 10,5-15; 45,5-7; Dt 32,39; Eclo 11,14.
368
Cf. Sl 22; 32; 35; 103; 138; e. o.
369
Cf. Mt 10,29-31.
370
Cf. Gn 1,26-28.
371
Cf. Cl 1,24.
372
Cf. 1Ts 3,2.
373
Cf. Cl 4,11,
374
Cf. 1Cor 12,6.
375
GS 36,3.
376
Cf. Mt 19,26; Jo 15,5; Fl 4,13.
377
Cf. Sto. Toms de Aquino, S. Th. I,25,6.
sabedoria e bondade infinitas, Deus quis livremente criar um mundo em estado de
caminhada para sua perfeio ltima. Este devir permite, no desgnio de Deus,
juntamente com o aparecimento de determinados seres, tambm o desaparecimento de
outros, juntamente com o mais perfeito, tambm o menos imperfeito, juntamente com as
construes da natureza, tambm as destruies. Juntamente com o bem fsico existe,
portanto, o mal fsico, enquanto a criao no houver atingido sua perfeio378.
Os anjos e os homens, criaturas inteligentes e livres, devem caminhar para seu destino
ltimo por opo livre e amor preferencial. Podem, no entanto, desviar-se. E, de fato,
pecaram. Foi assim que o mal moral entrou no mundo, incomensuravelmente mais grave
do que o mal fsico. Deus no de modo algum, nem direta nem indiretamente, a causa
do mal moral379. Todavia, permite-o, respeitando a liberdade de sua criatura e,
misteriosamente, sabe auferir dele o bem:
Pois o Deus todo-poderoso..., por ser soberanamente bom, nunca deixaria qualquer mal
existir em suas obras se no fosse bastante poderoso e bom para fazer resultar o bem do
prprio mal380.
Assim, com o passar do tempo, pode-se descobrir que Deus, em sua providncia toda-
poderosa, pode extrair um bem das conseqncias de um mal, mesmo moral, causado por
suas criaturas: No fostes vs, diz Jos a seus irmos, que me enviastes para c, foi
Deus:...o mal que tnheis a inteno de fazer-me, o desgnio de Deus o mudou em bem a
fim de...salvar a vida de um povo numeroso (Gn 45,8; 50,20)381. Do maior mal moral
jamais cometido, a saber, a rejeio e o homicdio do Filho de Deus, causado pelos
pecados de todos os homens, Deus, pela sua superabundncia de sua graa382, tirou o
maior dos bens: a glorificao de Cristo e a nossa Redeno. Com isso, porm, o mal no
se converte em um bem.
Sabemos que, para os que amam a Deus, tudo concorre para o bem (Rm 8,28). O
testemunho dos santos no cessa de confirmar esta verdade.
Assim Sta. Catarina de Sena diz queles que se escandalizam e se revoltam com o que
lhes acontece: Tudo procede do amor, tudo est ordenado salvao do homem, Deus
no faz nada que no seja para esta finalidade383.
E Sto. Toms More, pouco antes de seu martrio, consola sua filha: No pode acontecer
nada que Deus no tenha querido. Ora, tudo o que ele quer, por pior que possa parecer-
nos, o que h de melhor para ns384.
E Lady Juliana de Norwich: Aprendi, portanto, pela graa de Deus, que era preciso
apegar-me com firmeza f e crer com no menor firmeza que todas as coisas iro bem...
Tu mesma vers que qualquer tipo de circunstncia servir para o bemThou shalt see
thyself that all MANNER of thing shall be well385.
Cremos firmemente que Deus o Senhor do mundo e da histria. Mas os caminhos de sua
providncia muitas vezes nos so desconhecidos. S no final, quando acabar o nosso
conhecimento parcial, quando virmos Deus face a face (1Cor 13,12), teremos pleno
conhecimento dos caminhos pelos quais, mesmo por meio dos dramas do mal e do pecado,
Deus ter conduzido sua criao at o descanso desse Sbado386 definitivo, em vista do
qual criou o cu e a terra.
RESUMINDO
Na criao do mundo e dos homens, Deus colocou o primeiro e universal testemunho de
seu amor todo-poderoso e de sua sabedoria, o primeiro de seu desgnio benevolente, o
qual encontra sua meta na nova criao em Cristo.
Embora a obra da criao seja particularmente atribuda ao Pai, igualmente verdade de
f que o Pai, o Filho e o Esprito Santo so o nico e indivisvel princpio da criao.
S Deus criou o universo, livremente, diretamente, sem nenhuma ajuda.
Nenhuma criatura tem o poder infinito que necessrio para criar no sentido prprio da
palavra, isto , produzir e dar o ser quilo que no o tinha de modo algum (chamar
existncia ex nihilo = do nada)387.
Deus criou o mundo para manifestar e para comunicar sua glria. Que suas criaturas
participem de sua verdade, de sua bondade e de sua beleza, a glria para a qual Deus as
criou.
Deus, que criou o universo, o mantm na existncia por seu Verbo, este Filho que
sustenta o universo com o poder de sua palavra (Hb 1,3) e pelo seu Esprito Criador que
d a vida.

378
Cf. Sto. Toms de Aquino, S. Gent. III,1.
379
Cf. Sto. Agostinho, De libero arbtrio, I,1,2; Sto. Toms de Aquino, S. Th. I-II,79,1.
380
Sto. Agostinho, Enchir. 3,11: CCL 46, 53 (PL 40,236).
381
Cf. Tb 2,12-18 Vulg.
382
Cf. Rm 5,20.
383
Sta. Catarina de Sena, Dilogo sobre a Providncia, cap. IV, 138, ed. G. Cavallini (Roma, 1995), p. 441.
384
Margarida Roper, Epistula ad Aliciam Alington (agosto de 1534): The Correspondence of Sir Thomas More, ed. E. F. Rogers, Princeton, 1947, pp. 531-532.
385
Juliana de Norwich, Revelao do amor divino, 13,32: A Book of Showings to the Anchoress Julian of Norwich, ed. E. Colledge J. Walsh, vol. 2, Toronto, 1978, pp 426 e 422.
386
Cf. Gn 2,2.
387
Cf. DS 3624.
A Divina Providencia so as disposies pelas quais Deus conduz com sabedoria e amor
todas as criaturas at seu fim ltimo.
Cristo convida-nos entrega filial Providncia de nosso Pai celeste388, e o Apstolo S.
Pedro lembra: Lanai sobre ele toda a vossa preocupao, porque ele que cuida de
vs389.
A Providncia divina age tambm por meio da ao das criaturas. Aos seres humanos Deus
concede cooperar livremente para seus desgnios.
A permisso divina do mal fsico e do mal moral um mistrio que Deus ilumina por seu
Filho, Jesus Cristo, morto e ressuscitado para vencer o mal. A f nos d a certeza de que
Deus no permitiria o mal se do prprio mal no tirasse o bem, por caminhos que s
conheceremos plenamente na vida eterna.
PARGRAFO 5
O CU E A TERRA
O Smbolo dos Apstolos professa que Deus o Criador do cu e da terra390, e o Smbolo
niceno-constantinopolitano explicita: ... do universo visvel e invisvel391.
Na Sagrada Escritura, a expresso cu e terra significa tudo aquilo que existe, a criao
inteira. Indica tambm o nexo no interior da criao, que ao mesmo tempo une e distingue
cu e terra: a terra o mundo dos homens392; o cu ou os cus pode designar o
firmamento393, mas tambm o lugar prprio de Deus: nosso Pai nos cus (Mt 5,16)394
e, por conseguinte, tambm o cu que a glria escatolgica. Finalmente, a palavra
cu indica o lugar das criaturas espirituais os anjos que esto ao redor de Deus.
A profisso de f do IV Conclio Vaticano de Latro afirma que Deus criou conjuntamente,
do nada, desde o incio do tempo, ambas as criaturas, a espiritual e a corporal, isto , os
anjos e o mundo terrestre; em seguida, a criatura humana, que tem algo de ambas, por
compor-se de esprito e de corpo395
Os anjos
A EXISTNCIA DOS ANJOS UMA VERDADE DE F
A existncia dos seres espirituais, no corporais, que a Sagrada Escritura chama
habitualmente de anjos, uma verdade de f. O testemunho da Escritura a respeito to
claro quanto unanimidade da Tradio.
QUEM SO OS ANJOS?
Sto. Agostinho diz a respeito deles: ngelus officii nomen est, non naturae. Quaeris
nomen huius naturae, spiritus est; quaeris officium, ngelus est; quaeris officium, angelus
est, ex eo quod est, spiritus est, ex eo quod agit, angelus Anjo (mensageiro)
designao de encargo, no de natureza. Se perguntares pela designao da natureza,
um esprito; se perguntares pelo encargo, um anjo: esprito por aquilo que , anjo
por aquilo que faz396. Por todo o seu ser, os anjos so servidores e mensageiros de Deus.
Porque contemplam constantemente a face de meu Pai que est nos cus (Mt 18,10),
so poderosos executores de sua palavra, obedientes ao som de sua palavra (Sl 103,20).
Como criaturas puramente espirituais, so dotados de inteligncia e de vontade: so
criaturas pessoais397 e imortais398. Superam em perfeio todas as criaturas visveis. Disto
d testemunho o fulgor de sua glria399.
CRISTO COM TODOS OS SEUS ANJOS
Cristo o centro do mundo anglico. So seus os anjos: Quando o Filho do homem vier
em sua glria com todos os seus anjos... (Mt 25,31). So seus porque foram criados por e
para Ele: Pois foi nele que foram criadas todas as coisas, nos cus e na terra, as visveis e
as invisveis: Tronos, Dominaes, Principados, Potestades; tudo foi criado por Ele e para
Ele (Cl 1,16). So seus, mais ainda, porque Ele os fez mensageiros de seu projeto de
salvao. Porventura no so todos eles espritos servidores, enviados ao servio dos que
devem herdar a salvao? (Hb 1,14).
Eles a esto, desde a criao400 e ao longo de toda a Histria da Salvao, anunciando de
longe ou de perto esta salvao e servindo ao desgnio divino de sua realizao: fecham o
paraso terrestre401, protegem Lot402, salvam Agar e seu filho403, seguram a mo de
Abrao404, comunicam a lei por seu ministrio405, conduzem o povo de Deus406, anunciam
388
Cf. Mt 6,26-34.
389
1Pd 5,7; cf. Sl 55,23.
390
Smbolo dos Apstolos: DS 30.
391
Smbolo niceno-constantinopolitano: DS 150.
392
Cf. Sl 115,16.
393
Cf. Sl 19,2.
394
Cf. Sl 115,16.
395
DS 800; cf DS 3002 e SPF 8.
396
Sto. Agostinho, Em. in Psal. 103,1,15.
397
Cf. Pio XII: DS 3891.
398
Cf. Lc 20,36.
399
Cf. Dn 10,9-12.
400
Cf. J 38,7, onde os anjos so chamados filhos de Deus.
401
Cf. Gn 3,24.
402
Cf. Gn 19.
403
Cf. Gn 21,17.
404
Cf. Gn 22,11.
nascimentos407 e vocaes408, assistem os profetas409, para citarmos apenas alguns
exemplos. Finalmente, o anjo Gabriel que anuncia o nascimento do Precursor e o do
prprio Jesus410.
Desde a Encarnao at a Ascenso, a vida do Verbo Encarnado cercada da adorao e
do servio dos anjos. Quando Deus introduziu o Primognito no mundo, disse: Adorem-
no todos os anjos de Deus (Hb 1,6). O canto de louvor deles ao nascimento de Cristo no
cessou de ressoar no louvor da Igreja: Glria a Deus... (Lc 2,14). Protegem a infncia de
Jesus411, servem a Jesus no deserto412, reconfortam-no na agonia413. embora tivesse
podido ser salvo por eles da mo dos inimigos414, como outrora fora Israel415. So ainda os
anjos que evangelizam416, anunciando a Boa Nova da Encarnao417 e da Ressurreio418
de Cristo. Estaro presentes no retorno de Cristo, que eles anunciam419, a servio do juzo
que o prprio Cristo pronunciar420.
OS ANJOS NA VIDA DA IGREJA
Do mesmo modo, a vida da Igreja se beneficia da ajuda misteriosa e poderosa dos
anjos421.
Em sua Liturgia, a Igreja se associa aos anjos para adorar o Deus trs vezes Santo422; ela
invoca a sua assistncia (assim em In Paradisum deducant te Angeli... Para o Paraso te
levem os anjos, da Liturgia dos defuntos423, ou ainda no hino querubnico da Liturgia
bizantina424). Alm disso, festeja mais particularmente a memria de certos anjos (S.
Miguel, S. Gabriel, S. Rafael, os anjos da guarda).
Desde o incio425 at a morte426, a vida humana cercada por sua proteo427 e por sua
intercesso428. Cada fiel ladeado por um anjo como protetor e pastor para conduzi-lo
vida429. Ainda aqui na terra, a vida crist participa na f da sociedade bem-aventurada
dos anjos e dos homens, unidos em Deus.
O mundo visvel
Foi Deus mesmo quem criou o mundo visvel em toda a sua riqueza, diversidade e ordem.
A Escritura apresenta a obra do Criador simbolicamente como uma seqncia de seis dias
de trabalho divino que terminam com o descanso do stimo dia430. O texto sagrado
ensina, a respeito da criao, verdades reveladas por Deus para nossa salvao431 que
permitem reconhecer a natureza profunda da criao, seu valor e sua finalidade, que
glria de Deus432:
No existe nada que no deva sua existncia a Deus criador. O mundo comeou quando foi
tirado do nada pela Palavra de Deus; todos os seres existentes, toda a natureza, toda a
histria humana tm suas razes neste acontecimento primordial: a prpria gnese pela
qual o mundo foi constitudo e o tempo comeou433.
Cada criatura possui sua bondade e sua perfeio prprias. Para cada uma das obras dos
seis dias se diz: E Deus viu que isto era bom. Pela prpria condio da criao, todas
as coisas so dotadas de fundamento prprio, verdade, bondade, leis e ordens
especficas434. As diferentes criaturas, queridas em seu prprio ser, refletem, cada uma a
seu modo, um raio da sabedoria e da bondade infinitas de Deus. por isso que o homem
deve respeitar a bondade prpria de cada criatura para evitar um uso desordenado das
coisas, que menospreze o Criador e acarrete conseqncias nefastas para os homens e seu
meio ambiente.
A interdependncia das criaturas querida por Deus. O sol e a lua, o cedro e a pequena
flor, a guia e o pardal: as inmeras diversidades e desigualdades significam que nenhuma
criatura se basta a si mesma, que s existem em dependncia recproca, para se
completarem mutuamente, a servio umas das outras.

405
Cf. At 7,53
406
Cf. Ex 23,20-23.
407
Cf. Jz 13.
408
Cf. Jz 6,11-24; Is 6,6.
409
Cf. 1Rs 19,5.
410
Cf. Lc 1,11.26.
411
Cf. Mt 1,20; 2,13.19.
412
Cf. Mc 1,13; Mt 4,11.
413
Cf. Lc 22,43.
414
Cf. Mt 26,53.
415
Cf. 2Mc 10,29-30; 11,8.
416
Cf. Lc 2,10.
417
Cf. Lc 2,8-14.
418
Cf. Mc 16,5-7.
419
Cf. At 1,10-11.
420
Cf. Mt 13,41; 25,31; Lc 12,8-9.
421
Cf. At 5,18-20; 8,26-29; 10,3-8; 12,6-11; 27,23-25.
422
Cf. MR,Prex eucharistica, 27, Sanctus Tipografia Poliglota Vaticana, 1970, p. 392.
423
Oex 50, Tipografia Poliglota Vaticana, 1969, p. 23.
424
Liturgia Byzantina sancti Ionnis Chrysostomi, Himnus cherubinorum Liturgies Eastern and Western, ed. F. E. Brightman, Oxford, 1896, p. 377.
425
Cf. Mt 18,10.
426
Cf. Lc 16,22.
427
Cf. Sl 34,8; 91,10-13.
428
Cf. J 33,23-24; Zc 1,12; Tb 12,12.
429
S. Baslio, Ad. Eunomium 3,1: PG 29,656B.
430
Cf. Gn 1,1-2,4.
431
Cf. DV 11.
432
LG 36.
433
Cf. Sto. Agostinho, De Genesi contra Manichaeos, 1,2,4: PL 35,175.
434
GS 36,2.
A beleza do universo. A ordem e a harmonia do mundo criado resultam da diversidade dos
seres e das relaes que existem entre eles. O homem as descobre progressivamente
como leis da natureza. Elas despertam a admirao dos sbios. A beleza da criao reflete
a infinita beleza do Criador. Ela deve inspirar o respeito e a submisso da inteligncia do
homem e de sua vontade.
A hierarquia das criaturas expressa pela ordem dos seis dias, que vai do menos
perfeito ao mais perfeito. Deus ama todas as suas criaturas435, cuida de cada uma, at
mesmo dos pssaros. Apesar disso, Jesus diz: Vs valeis mais do que muitos pardais (Lc
12,7), ou ainda: Um homem vale muito mais do que uma ovelha (Mt 12,12).
O homem a obra-prima da obra da criao. A narrao bblica exprime isto distinguindo
nitidamente a criao do homem da criao das outras criaturas436.
Existe uma solidariedade entre todas as criaturas pelo fato de terem todas o mesmo
Criador e de todas estarem ordenadas sua glria:
Louvado seja, meu Senhor,
Com todas as tuas criaturas,
Especialmente o senhor irmo Sol.
Que clareia o dia
E com sua luz nos alumia.
Louvado sejas, meu Senhor,
Pela irm gua,
Que muito til e humilde
E preciosa e casta...
Louvado sejas, meu Senhor,
Por nossa irm, me Terra,
Que nos sustenta e governa,
E produz frutos diversos
E coloridas flores e ervas.
Louvai e bendizei a meu Senhor,
E dai-lhe graas,
E servi-o com grande humildade437
O Sbado fim da obra dos seis dias. O texto sagrado diz que Deus concluiu no stimo
dia a obra que tinha feito, e assim o cu e a terra foram terminados, e no stimo dia
Deus descansou, e santificou e abenoou este dia (Gn 2,1-3). Essas palavras inspiradas
so ricas de ensinamentos salutares:
Na criao, Deus depositou um fundamento e leis que permanecem estveis438, nos quais
o crente poder apoiar-se com confiana e que para ele sero o sinal e a garantia da
fidelidade inabalvel da Aliana de Deus439. Por sua parte, o homem dever ficar fiel a este
fundamento e respeitar as leis que o Criador inscreveu nele.
A criao est em funo do Sbado e portanto do culto e da adorao de Deus. O culto
est inscrito na ordem da criao440. Nada se anteponha obra de Deus, diz a regra de
S. Bento441, indicando assim a ordem correta das preocupaes humanas.
O Sbado constitui o corao da lei de Israel. Observar os mandamentos corresponder
sabedoria e vontade de Deus expressa em sua obra de criao.
O oitavo dia. Mas para ns nasceu um dia novo: o dia da Ressurreio de Cristo. O stimo
dia encerra a primeira criao. O oitavo dia d incio nova criao. Assim, a obra da
criao culmina na obra maior da redeno. A primeira criao encontra seu sentido e seu
ponto culminante na nova criao em Cristo, cujo esplendor ultrapassa o da primeira442.
RESUMINDO
Os anjos so criaturas espirituais que glorificam a Deus sem cessar e servem a seus
desgnios salvficos em relao s demais criaturas: Ad omnia bona nostra cooperantur
angeli. Os anjos cooperam para todos os nossos bens443.
Os anjos cercam Cristo, seu Senhor. Servem-no particularmente, no cumprimento de sua
misso salvfica para com os homens.
A Igreja venera os anjos que a ajudam em sua peregrinao terrestre e protegem
cada ser humano.

435
Cf. Sl 145.9.
436
Cf. Gn 1,26.
437
S. Francisco de Assis, Cntico das criaturas, 426.
438
Cf. Hb 4,3-4.
439
Cf. Jr 31,35-37; 33,19-26.
440
Cf. Gn 1,14.
441
S. Bento, Regula, 43,3: CSEL 75, 106 (PL 66,675).
442
Cf. MR, Viglia pascal: orao aps a primeira leitura.
443
Sto. Toms de Aquino, S. Th. I, 114,3, ad 3.
Deus quis a diversidade de suas criaturas e a bondade prpria delas, sua interdependncia
e ordem. Destinou todas as criaturas materiais ao bem do gnero humano. O homem, e
por meio dele a criao inteira, destina-se glria de.
Respeitar as leis inscritas na criao e as relaes que derivam da natureza das coisas
princpio de sabedoria e fundamento da moral.
PARGRAFO 6
O HOMEM
Deus criou o homem sua imagem, imagem de Deus o criou, homem e mulher os
criou (Gn 1,27). O homem ocupa um lugar nico na criao: ele imagem de
Deus(I); em sua prpria natureza une o mundo espiritual e o mundo material (II);
criado homem e mulher(III); Deus o estabeleceu em sua amizade (IV).
imagem de Deus
De todas as criaturas visveis, s o homem capaz de conhecer e amar seu Criador444;
ele a nica criatura na terra que Deus quis por si mesma445; s ele chamado a
compartilhar, pelo conhecimento e pelo amor, a vida de Deus. Foi para este fim que o
homem foi criado, e a reside a razo fundamental de sua dignidade:
Que motivo vos fez constituir o homem em dignidade to grande? O amor inestimvel pelo
qual enxergastes em vs mesmo vossa criatura, e vos apaixonastes por ela; pois foi por
amor que a criastes, foi por amor que lhe destes um ser capaz de degustar vosso Bem
eterno446.
Por ser imagem de Deus, o indivduo humano tem a dignidade de pessoa: ele no
apenas alguma coisa, mas algum. capaz de conhecer-se, de possuir-se e de doar-se
livremente e entrar em comunho com outras pessoas, e chamado, por graa, a uma
aliana com seu Criador, a oferecer-lhe uma resposta de f e de amor que ningum mais
pode dar em seu lugar.
Deus criou tudo para o homem447, mas o homem foi criado para servir e amar a Deus e
oferecer-lhe toda a criao:
Quem , pois, o ser que vai vir existncia cercado de tal considerao? o homem,
grande e admirvel figura viva, mais precioso aos olhos de Deus do que a criao inteira:
o homem, para ele que existem o cu e a terra e o mar e a totalidade da criao, e
salvao dele que Deus atribuiu tanta importncia que nem sequer poupou seu Filho nico
em seu favor. Pois Deus no cessou de tudo empreender para fazer o homem subir at ele
e faz-lo sentar-se sua direita448.
Na realidade o mistrio do homem s se torna claro verdadeiramente no mistrio do
Verbo Encarnado449.
So Paulo ensina-nos que dois homens esto na origem do gnero humano: Ado e
Cristo... O primeiro Ado, diz ele, foi criado como um ser humano que recebeu a vida; o
segundo um ser espiritual que d a vida. O primeiro foi criado pelo segundo, de quem
recebeu a alma que o faz viver... O segundo Ado estabeleceu sua imagem no primeiro
Ado quando o modelou. E assim se revestiu da natureza deste ltimo e dele recebeu o
nome, a fim de no deixar perder aquilo que havia feito sua imagem. Primeiro Ado,
segundo Ado: o primeiro comeou, o segundo no acabar. Pois o segundo
verdadeiramente o primeiro, como ele mesmo disse: Eu sou o Primeiro e o ltimo450.
Graas origem comum, o gnero humano forma uma unidade. Pois Deus de um s fez
toda a raa humana (At 17,26)451:
Maravilhosa viso que nos faz contemplar o gnero humano na unidade de sua origem em
Deus...: na unidade de sua natureza, composta igualmente em todos de um corpo material
e de uma alma espiritual; na unidade de seu fim imediato e de sua misso no mundo; na
unidade de seu hbitat: a terra, de cujos bens todos os homens, por direito natural,
podem usar para sustentar e desenvolver a vida; na unidade de seu fim sobrenatural:
Deus mesmo, ao qual todos devem tender; na unidade dos meios para atingir este
fim;...na unidade do seu resgate, realizado em favor de todos por Cristo452.
Esta lei de solidariedade humana e de caridade453, sem excluir a rica variedade das
pessoas, das culturas e dos povos, nos garante que todos os homens so verdadeiramente
irmos.
Corpore et anima unus (Uno de alma e corpo)
A pessoa humana, criada imagem de Deus, um ser ao mesmo tempo corporal e
espiritual. O relato bblico exprime esta realidade com uma linguagem simblica, ao
444
GS 12,3.
445
GS 24,3.
446
Sta. Catarina de Sena, Dial. 13: ed. G. Cavallini, Roma, 1995, p. 43.
447
Cf. GS 12, 1; 24, 3; 39, 1.
448
S. Joo Crisstomo, Serm. in Gen. 2,1: PG 54,587D-588A.
449
GS 22, 1.
450
S. Pedro Crislogo, Serm. 117, 1-2: CCL 24A, 709 (PL 52,520).
451
Cf. Tb 8,6.
452
Pio XII, enc. Summi pontificatus, cf. NA 1.
453
Pio XII, enc. Summi pontificatus; AAS 31 (1939) 426.
afirmar que O Senhor Deus modelou o homem com a argila do solo, insuflou em suas
narinas um hlito de vida e o homem se tornou um ser vivente (Gn 2,7). Portanto, o
homem em sua totalidade querido por Deus.
Muitas vezes o termo alma designa na Sagrada Escritura a vida humana454 ou pessoa
humana455 inteira. Mas designa tambm o que h de mais ntimo no homem456 e o que h
nele de maior valor457, aquilo que mais particularmente o faz ser imagem de Deus:
almasignifica o princpio espiritual no homem.
O corpo do homem participa da dignidade da imagem de Deus: ele corpo humano
precisamente porque animado pela alma espiritual, e a pessoa humana inteira que est
destinada a tornar-se, no Corpo de Cristo, o Templo do Esprito458:
Unidade de corpo e de alma, o homem, por sua prpria condio corporal, sintetiza em si
os elementos do mundo material, que nele assim atinge sua plenitude e apresenta
livremente ao Criador uma voz de louvor. No , portanto, lcito ao homem desprezar a
vida corporal; ao contrrio, deve estimar e honrar seu corpo, porque criado por Deus e
destinado ressurreio no ltimo dia459.
365. A unidade da alma e do corpo to profunda que se deve considerar a alma como a
forma do corpo460; ou seja, graas alma espiritual que o corpo constitudo de matria
um corpo humano e vivo; o esprito e a matria no homem no so duas naturezas
unidas, mas a unio deles forma uma nica natureza.
366. A Igreja ensina que cada alma espiritual diretamente criada por Deus461-- no
produzida pelos pais e imortal462: ela no perece quando da separao do corpo na
morte e se unir novamente ao corpo na ressurreio final.
Por vezes ocorre que a alma aparece distinta do esprito. Assim, S. Paulo ora para que
nosso ser inteiro, o esprito, a alma e o corpo, seja guardado irrepreensvel na Vinda do
Senhor (1Ts 5,23). A Igreja ensina que esta distino no introduz uma dualidade na
alma463. Esprito significa que o homem est ordenado desde a sua criao para seu fim
sobrenatural464, e que sua alma capaz de ser elevada gratuitamente comunho com
Deus465.
A tradio espiritual da Igreja insiste tambm no corao, no sentido bblico de fundo de
ser (Jr 31,33), onde a pessoa se decide ou no por Deus466.
Homem e mulher nos criou
IGUALDADE E DIFERENA QUERIDAS POR DEUS
O homem e a mulher so criados, isto , so queridos por Deus: por um lado, em perfeita
igualdade como pessoas humanas e, por outro, em seu ser respectivo de homem e de
mulher. Ser homem, ser mulher uma realidade boa e querida por Deus: o homem e a
mulher tm uma dignidade inamissvel que lhes vem diretamente de Deus, seu Criador467.
O homem e a mulher so criados em idntica dignidade, imagem de Deus. Em seu
ser-homem e seu ser-mulher refletem a sabedoria e a bondade do Criador.
Deus no de modo algum imagem do homem. No nem homem nem mulher. Deus
puro esprito, no havendo nele lugar para a diferena dos sexos. Mas as perfeies do
homem e da mulher refletem algo da infinita perfeio de Deus: as de uma me468 e as de
um pai e esposo469.
UM PARA O OUTRO __ UMA UNIDADE A DOIS
Criados conjuntamente, Deus quer o homem e a mulher um para o outro. A Palavra de
Deus d-nos a entender isto por meio de diversas passagens do texto sagrado. No
bom que o homem esteja s. Vou fazer uma auxiliar que lhe corresponda (Gn 2,18).
Nenhum dos animais pode ser este vis-a-vis do varo470. A mulher que Deus modela da
costela tirada do varo e que leva a ele provoca da parte do homem um grito de
admirao, uma exclamao de amor e de comunho: osso de meus ossos e carne de
minha carne (Gn 2,23). O homem descobre a mulher como um outro eu da mesma
humanidade.
O homem e a mulher so feitos uma para o outro: no que Deus os tivesse feito apenas
pela metade e incompletos; criou-os para uma comunho de pessoas, na qual cada um
dos dois pode ser ajuda para o outro, por serem ao mesmo tempo iguais enquanto

454
Cf. Mt 16,25-26; Jo 15,13.
455
Cf. At 2,41.
456
Cf. Mt 26,38; Jo 12,27.
457
Cf. Mt 10,28; 2Mc 6,30.
458
Cf. 1Cor 6,19-20; 15,44-45.
459
GS 14,1.
460
Cf. Conc. de Viena em 1312: DS 902.
461
Cf. Pio XII, enc. Humani generis, 1950: DS 3896; SPF 8.
462
Cf. V Conc. de Latro em 1513: DS 1440.
463
IV Conc. de Constantinopla em 870: DS 657.
464
Conc. Vaticano I: DS 3005; cf. GS 22,5.
465
Cf. Pio XII, Enc. Humani generis, 1950: DS 3891.
466
Cf. Dt 6,5; 29,3; Is 29,13; Ez 36,26. Mt 6,21; Lc 8,15; Rm 5,5.
467
Cf. Gn 2,7.22.
468
Cf. Is 49, 14-15; 66, 13; Sl 130,2-3.
469
Cf. Os 11,1-4. Jr 3,4-19.
470
Cf. Gn 2,19-20.
pessoas (osso de meus ossos...) e complementares enquanto masculino e feminino471.
No matrimnio, Deus os une de maneira que, formando uma s carne (Gn 2,24), possam
transmitir a vida humana: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra (Gn 1,28). Ao
transmitir a seus descendentes a vida humana, o homem e a mulher, como esposos e pais,
cooperam de forma nica na obra do Criador472.
No desgnio de Deus, o homem e a mulher tm a vocao de submeter a terra473 como
intendentes de Deus. Esta soberania no deve ser uma dominao arbitrria e
destrutiva. imagem do Criador que ama tudo o que existe (Sb 11,24), o homem e a
mulher so chamados a participar da Providncia divina em relao s demais criaturas.
Da a responsabilidade deles para com o mundo que Deus lhes confiou.
III. O homem no Paraso
O primeiro homem no s foi criado bom, mas tambm foi constitudo em uma amizade
com seu Criador e em tal harmonia consigo mesmo e com a criao que o rodeava que s
sero superadas pela glria da nova criao em Cristo.
Interpretando de maneira autntica o simbolismo da linguagem bblica luz do Novo
Testamento e da Tradio, a Igreja ensina que nossos primeiros pais, Ado e Eva, foram
constitudos em um estado de santidade e de justia original474. Esta graa da santidade
original era uma participao da vida divina475.
Pela irradiao desta graa, todas as dimenses da vida do homem eram fortalecidas.
Enquanto permanecesse na intimidade divina, o homem no devia nem morrer476 nem
sofrer477. A harmonia interior da pessoa humana, a harmonia entre o homem e a mulher478
e, finalmente, a harmonia entre o primeiro casal e toda a criao constituam o estado
denominado justia original.
O domnio do mundo que Deus havia outorgado ao homem desde o incio realizava-se
antes de tudo no prprio homem como domnio de si mesmo. O homem estava intacto e
ordenado em todo o seu ser, porque livre da trplice concupiscncia479 que o submete aos
prazeres dos sentidos, cobia dos bens terrestres e auto-afirmao contra os
imperativos da razo.
O sinal da familiaridade com Deus o fato de Deus o colocar no jardim480. L vive para
cultiv-lo e guard-lo (Gn 2,15): o trabalho no uma penalidade481, mas sim a
colaborao do homem e da mulher com Deus no aperfeioamento da criao visvel.
toda esta harmonia da justia original, prevista para o homem pelo desgnio de Deus,
que ser perdida pelo pecado de nossos primeiros pais.
RESUMINDO
Pai Santo, criastes o homem e a mulher vossa imagem e lhes confiastes todo o
universo, para que, servindo a Vs, seu Criador, dominassem toda criatura482.
O homem predestinado a reproduzir a imagem do Filho de Deus feito homem imagem
do Deus invisvel (Cl 1,15) , a fim de que Cristo seja o primognito de uma multido de
irmos e de irms483.
O homem corpore et anima unus (uno de corpo e alma)484. A doutrina da f afirma que
a alma espiritual e imortal criada diretamente por Deus.
Deus no criou solitrio. Desde o incio, Deus os criou varo e mulher (Gn 1,27). Esta
unio constituiu a primeira forma de comunho de pessoas485.
A revelao d-nos a conhecer o estado de santidade e de justia originais do homem e da
mulher antes do pecado: da amizade deles com Deus advinha a felicidade da existncia
deles no Paraso.
PARAGRFO 7
A QUEDA
Deus infinitamente bom e todas as suas obras so boas. Todavia, ningum escapa
experincia do sofrimento, dos males existentes na natureza que aparecem ligados s
limitaes prprias das criaturas e, sobretudo, questo do mal moral. De onde vem o
mal? Eu perguntava de onde vem o mal e no encontrava sada, diz Sto. Agostinho486, e
sua prpria busca sofrida no encontrar sada, a no ser em sua converso ao Deus vivo.
Pois o mistrio da iniqidade (2Ts 2,7) s se explica luz do Mistrio da piedade487. A
471
Cf. Joo Paulo II, MD, 7: AAS 80 (1988) 1664-1665.
472
Cf. GS 50,1.
473
Cf. Gn 1,28.
474
Conc. de Trento: DS 1511.
475
Cf. LG 2.
476
Cf. Gn 2,17; 3,19.
477
Cf. Gn 3,16.
478
Cf. Gn 2,25.
479
Cf. 1Jo 2,16.
480
Cf. Gn 2,8.
481
Cf. Gn 3,17-19.
482
MR. Orao eucarstica IV.
483
Cf. Ef 1,3-6; Rm 8,29.
484
GS 14, 1.
485
GS 12, 4.
486
Conf. 7,7,11.
487
Cf. 1Tm 3,16.
revelao do amor divino em Cristo manifestou ao mesmo tempo a extenso do mal e a
superabundncia da graa488. Precisamos, pois, abordar a questo da origem do mal
fixando o olhar de nossa f naquele que, e s Ele, o Vencedor do mal489.
Onde o pecado abundou, a graa superabundou
A REALIDADE DO PECADO
O pecado est presente na histria do homem: seria intil tentar ignor-lo ou dar a esta
realidade obscura outros nomes. Para tentarmos compreender o que o pecado, preciso
antes de tudo reconhecer a ligao profunda do homem com Deus, pois fora desta relao
o mal do pecado no desmascarado em sua verdadeira identidade de recusa e oposio a
Deus, embora continue a pesar sobre a vida do homem e sobre a histria.
A realidade do pecado, e mais particularmente a do pecado das origens, s se entende
luz da Revelao divina. Sem o conhecimento de Deus que ela nos d no se pode
reconhecer com clareza o pecado, e somos tentados a explic-lo unicamente como uma
falta de crescimento, como uma fraqueza psicolgica, um erro, a conseqncia necessria
de uma estrutura social inadequada etc. Somente luz do desgnio de Deus sobre o
homem compreende-se que o pecado um abuso da liberdade que Deus d s pessoas
criadas para que possam am-lo e amar-se mutuamente.
O PECADO ORIGINAL UMA VERDADE ESSENCIAL DA F
Com o progresso da Revelao, esclarecida tambm a realidade do pecado. Embora o
Povo de Deus do Antigo Testamento tenha conhecido a dor da condio humana luz da
histria da queda narrada no Gnesis, no era capaz de entender o significado ltimo
desta histria, que s se manifesta plenamente luz da Morte e Ressurreio de Jesus
Cristo490. preciso conhecer a Cristo como fonte da graa para conhecer Ado como fonte
do pecado. o Esprito-Parclito, enviado por Cristo ressuscitado, que veio estabelecer a
culpabilidade do mundo a respeito do pecado (Jo 16,8), ao revelar Aquele que o
Redentor do mundo.
A doutrina do pecado original e, por assim dizer, o reverso da Boa Notcia de que Jesus
o Salvador de todos os homens, de que todos tm necessidade da salvao e de que a
salvao oferecida a todos graas a Cristo. A Igreja, que tem o senso de Cristo491, sabe
perfeitamente que no se pode atentar contra a revelao do pecado original sem atentar
contra o mistrio de Cristo.
PARA LER O RELATO DA QUEDA
O relato da queda (Gn 3) utiliza uma linguagem feita de imagens, mas afirma um
acontecimento primordial, um fato que ocorreu no incio da histria do homem492. A
Revelao d-nos a certeza de f de que toda a histria humana est marcada pelo pecado
original cometido livremente por nossos primeiros pais493.
A queda dos anjos
Por trs da opo de desobedincia de nossos primeiros pais h uma voz sedutora que se
ope a Deus494 e que, por inveja, os faz cair na morte495. A Escritura e a Tradio da Igreja
vem neste ser um anjo destronado, chamado Satans ou Diabo496. A Igreja ensina que
ele tinha sido anteriormente um anjo bom, criado por Deus. Diabolus enim et alii
daemones a Deo quidem natura creati sunt boni, sed ipsi per se facti sunt mali Com
efeito, o Diabo e outros demnios foram por Deus criados bons em (sua) natureza, mas se
tornaram maus por sua prpria iniciativa497.
A Escritura fala de um pecado desses anjos498. Esta queda consiste na opo livre desses
espritos criados, que rejeitaram radical e irrevogavelmente a Deus e seu Reino. Temos um
reflexo desta rebelio nas palavras do Tentador ditas a nossos primeiros pais: E vs sereis
como deuses (Gn 3,5). O Diabo pecador desde o princpio (1Jo 3,8), pai da
mentira(J 8,44).
o carter irrevogvel de sua opo, e no uma deficincia da infinita misericrdia divina,
que faz com que o pecado dos anjos no possa ser perdoado. No existe arrependimento
para eles depois da queda, como no existe para os homens aps a morte499.
A Escritura atesta a influncia nefasta daquele que Jesus chama de o homicida desde o
princpio(Jo 8,44) e que at chegou a tentar desviar Jesus da misso recebida do Pai500.
Para isto que o Filho de Deus se manifestou: para destruir as obras do Diabo (1Jo 3,9).
A mais grave dessas obras, devido s suas conseqncias, foi a seduo mentirosa que
induziu o homem a desobedecer a Deus.
488
Cf. Rm 5,20.
489
Cf. Lc 11,21-22; Jo 16,11; 1Jo 3,8.
490
Cf. Rm 5,12-21.
491
Cf. 1Cor 2,16.
492
Cf. GS 13,1.
493
Cf. Conc. de Trento: DS 1513; Pio XII, Humani Generis: DS 3897; Paulo VI, discurso de 11 de julho de 1966.
494
Cf. Gn 3,1-5.
495
Cf. Sb 2,24.
496
Cf. Jo 8,44; Ap 12,9.
497
IV Conc. Lateranense em 1215: DS 800.
498
Cf. 2Pd 2,4.
499
S. Joo Damasceno, De fide orthodoxa, 2,4: PG 94, 877C.
500
Cf. Mt 4,1-11.
Contudo, o poder de Satans no infinito. Ele no passa de uma criatura, poderosa pelo
fato de ser puro esprito, mas sempre criatura: no capaz de impedir a edificao do
Reino de Deus. Embora Satans atue no mundo por dio contra Deus e seu Reino em
Jesus Cristo, e embora a sua ao cause graves danos de natureza espiritual e,
indiretamente, at de natureza fsica para cada homem e para a sociedade, esta ao
permitida pela Divina Providncia, que com vigor e doura dirige a histria do homem e do
mundo. A permisso divina da atividade diablica um grande mistrio, mas ns
sabemos que Deus coopera em tudo para o bem daqueles que o amam (Rm 8,28).
III. O pecado original
A LIBERDADE POSTA PROVA
Deus criou o homem sua imagem e o constituiu em sua amizade. Criatura espiritual, o
homem s pode viver esta amizade como livre submisso a Deus. o que exprime a
proibio, feita ao homem, de comer da rvore do conhecimento do bem e do mal, pois,
no dia em que dela comeres, ters de morrer (Gn 2,17). A rvore do conhecimento do
bem e do mal (Gn 2,17) evoca simbolicamente o limite instransponvel que o homem,
como criatura, deve livremente reconhecer e respeitar com confiana. O homem depende
do Criador, est submetido s leis da criao e s normas morais que regem o uso da
liberdade.
O PRIMEIRO PECADO DO HOMEM
O homem, tentado pelo Diabo, deixou morrer em seu corao a confiana em seu
Criador501 e, abusando de sua liberdade, desobedeceu ao mandamento de Deus. Foi nisto
que consistiu o primeiro pecado do homem502. Todo pecado, da em diante, ser uma
desobedincia a Deus e uma falta de confiana em sua bondade.
Neste pecado, o homem preferiu a si mesmo a Deus, e com isso menosprezou a Deus:
optou por si mesmo contra Deus, contrariando as exigncias de seu estado de criatura e
conseqentemente de seu prprio bem. Constitudo em um estado de santidade, o homem
estava destinado a ser plenamente divinizado por Deus na glria. Pela seduo do Diabo,
quis ser como Deus503, mas sem Deus e antepondo-se a Deus, e no segundo Deus504.
A Escritura mostra as conseqncias dramticas desta primeira desobedincia. Ado e Eva
perdem de imediato a graa da santidade original505. Tm medo deste Deus506, do qual
fizeram uma falsa imagem, a de um Deus enciumado de suas prerrogativas507.
A harmonia na qual estavam, estabelecida graas justia original, est destruda; o
domnio das faculdades espirituais da alma sobre o corpo rompido508; a unio entre o
homem e a mulher submetida a tenses509; suas relaes sero marcadas pela cupidez e
pela dominao510. A harmonia com a criao est rompida: a criao visvel tornou-se
para o homem estranha e hostil511. Por causa do homem, a criao est submetida
servido da corrupo512. Finalmente, vai realizar-se a conseqncia explicitamente
anunciada para o caso de desobedincia513: o homem voltar ao p do qual formado514.
A morte entra na histria da humanidade515.
A partir do primeiro pecado, uma verdadeira invaso do pecado inunda o mundo: o
fratricdio cometido por Caim contra Abel516; a corrupo universal em decorrncia do
pecado517; na histria de Israel, o pecado se manifesta freqentemente e sobretudo como
uma infidelidade ao Deus da Aliana e como transgresso da Lei de Moiss; e mesmo aps
a Redeno de Cristo, entre os cristos, o pecado se manifesta de muitas maneiras518. A
Escritura e a Tradio da Igreja no cessam de recordar a presena e a universalidade do
pecado na histria do homem:
O que nos manifestado pela Revelao divina concorda com a prpria experincia. Pois o
homem, olhando para seu corao, descobre-se tambm inclinado ao mal e mergulhado
em mltiplos males que no podem provir de seu Criador, que bom. Recusando-se
muitas vezes a reconhecer Deus como seu princpio, o homem destruiu a devida ordem em
relao ao fim ltimo e, ao mesmo tempo, toda a sua harmonia consigo mesmo, com os
outros homens e com as coisas criadas519.
CONSEQNCIAS DO PECADO DE ADO PARA A HUMANIDADE

501
Cf. Gn 3,1-11.
502
Cf. Rm 5,19.
503
Cf. Gn 3,5
504
S. Mximo Confessor, Ambiguorum lber: PG 91,115bC.
505
Cf. Rm 3,23.
506
Cf. Gn 3,9-10.
507
Cf. Gn 3,5.
508
Cf. Gn 3,7.
509
Cf. Gn 3,11-13.
510
Cf. Gn 3,16.
511
Cf. Gn 3,17.19.
512
Cf. Rm 8,20.
513
Cf. Gn 2,17.
514
Cf. Gn 3,19.
515
Cf. Rm 5,12.
516
Cf. Gn 4,3-15.
517
Cf. Gn 6,5.12; Rm 1,18-32.
518
Cf. 1Cor 1-6; Ap 2-3.
519
GS 13, 1.
Todos os homens esto implicados no pecado de Ado. So Paulo o afirma: Pela
desobedincia de um s homem, todos se tornaram pecadores (Rm 5,19). Como por
meio de um s homem o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte, assim a morte
passou para todos os homens, porque todos pecaram... (Rm 5,12). universalidade do
pecado e da morte o Apstolo ope a universalidade da salvao em Cristo: Assim como
da falta de um s resultou a condenao de todos os homens, do mesmo modo, da obra da
justia de um s (a de Cristo), resultou para todos os homens justificao que traz a vida
(Rm 5,18).
Na linha de S. Paulo, a Igreja sempre ensinou que a imensa misria que oprime os homens
e sua inclinao para o mal e para a morte so incompreensveis, a no ser referindo-se ao
pecado de Ado e sem o fato de que este nos transmitiu um pecado que por nascena nos
afeta a todos e morte da alma520. Em razo desta certeza de f, a Igreja ministra o
batismo para a remisso dos pecados mesmo s crianas que no cometeram pecado
pessoal521.
De que maneira o pecado de Ado se tornou o pecado de todos os seus descendentes? O
gnero humano inteiro em Ado sicut unum corpus unius hominis como um s corpo
de um s homem522. Em virtude desta unidade do gnero humano, todos os homens
esto implicados no pecado de Ado, como todos esto implicados na justia de Cristo.
Contudo, a transmisso do pecado original um mistrio que no somos capazes de
compreender plenamente. Sabemos, porm, pela Revelao, que Ado havia recebido a
santidade e a justia originais no exclusivamente para si, mas para toda a natureza
humana: ao ceder ao Tentador, Ado e Eva cometem um pecado pessoal, mas este pecado
afeta a natureza humana, que vo transmitir em um estado decado523. um pecado que
ser transmitido por propagao humanidade inteira, isto , pela transmisso de uma
natureza humana privada da santidade e da justia originais. E por isso que o pecado
original denominado pecado de maneira analgica: um pecado contrado e no
cometido, um estado e no um ato.
Embora prprio a cada um524, o pecado original no tem, em nenhum descendente de
Ado, um carter de falta pessoal. a privao da santidade e da justia originais, mas a
natureza humana no totalmente corrompida: ela lesada em suas prprias foras
naturais, submetida ignorncia, ao sofrimento e ao imprio da morte, e inclinada ao
pecado (esta propenso ao mal chamada concupiscncia). O Batismo, ao conferir a
vida da graa de Cristo, apaga o pecado original e faz o homem voltar para Deus. Porm,
as conseqncias de tal pecado sobre a natureza, enfraquecida e inclinada ao mal,
permanecem no homem e o incitam ao combate espiritual.
A doutrina da Igreja sobre a transmisso do pecado original adquiriu preciso sobretudo no
sculo V, em especial sob o impulso da reflexo de Sto. Agostinho contra o pelagianismo, e
no sculo XVI, em oposio Reforma protestante. Pelgio sustentava que o homem
podia, pela fora natural de sua vontade livre, sem a ajuda necessria da graa de Deus,
levar uma vida moralmente boa; limitava assim a influncia da falta de Ado de um mau
exemplo. Os primeiros Reformadores protestantes, ao contrrio, ensinavam que o homem
estava radicalmente pervertido e sua liberdade anulada pelo pecado original: identificavam
o pecado herdado por cada homem com a tendncia ao mal (concupiscncia), que seria
insupervel. A Igreja pronunciou-se especialmente sobre o sentido do dado revelado no
tocante ao pecado original no segundo Conclio de Oranges, em 529525, e no Conclio de
Trento, em 1546526.
UM DURO COMBATE...
A doutrina sobre o pecado original ligada doutrina da Redeno por meio de Cristo
propicia um olhar de discernimento lcido sobre a situao do homem e de sua ao no
mundo. Pelo pecado dos primeiros pais, o Diabo adquiriu certa dominao sobre o homem,
embora este ltimo permanea livre. O pecado original acarreta a servido debaixo do
poder daquele que tinha o imprio da morte, isto , do Diabo527. Ignorar que o homem
tem uma natureza lesada, inclinada ao mal, d lugar a graves erros no campo da
educao, a poltica, da ao social528 e dos costumes.
As conseqncias do pecado original e de todos os pecados pessoais dos homens conferem
ao mundo em seu conjunto uma condio pecadora, que pode ser designada com a
expresso de S. Joo: O pecado do mundo (Jo 1,29). Com esta expresso quer-se
exprimir tambm a influncia negativa que exercem sobre as pessoas as situaes
comunitrias e as estruturas sociais, que so o fruto dos pecados dos homens529.

520
Cf. Conc. de Trento: DS 1512.
521
Conf. Conc. de Trento: DS 1514.
522
Sto. Toms de Aquino, Quaestione disputate de malo, 4,1.
523
Cf. Conc. de Trento: DS 1511-1512.
524
Cf. Conc. de Trento: DS 1513.
525
Cf. DS 371-372.
526
Cf. DS 1510-1516.
527
Conc. de Trento: DS 1511; cf. Hb 2,14.
528
Cf. CA 25.
529
Cf. RP 16.
Esta situao dramtica do mundo, que inteiro est sob o poder do Maligno (1Jo 5,19)530,
faz da vida do homem um combate:
Uma luta rdua contra o poder das trevas perpassa a histria universal da humanidade.
Iniciada desde a origem do mundo, vai durar at o ltimo dia, segundo as palavras do
Senhor. Inserido nesta batalha, o homem deve lutar sempre para aderir ao bem: no
consegue alcanar a unidade interior seno com grandes labutas e o auxlio da graa de
Deus531.
No o abandonaste ao poder da morte
410. Depois da queda, o homem no foi abandonado por Deus. Ao contrrio, Deus o
chama532 e lhe anuncia de modo misterioso a vitria sobre o mal e o soerguimento da
queda533. Esta passagem do Gnesis foi chamada de proto-evangelho, por ser o primeiro
anncio do Messias redentor, a do combate entre a serpente e a Mulher e a vitria final de
um descendente desta ltima.
411. A tradio crist v nesta passagem um anncio do novo Ado534, que, por sua
obedincia at a morte de Cruz (Fl 2,8), repara com superabundncia a desobedincia de
Ado535. De resto, numerosos Padres e Doutores da Igreja vem na mulher anunciada no
proto-evangelho a me de Cristo, Maria, como nova Eva. Foi ela que, primeiro e de
uma forma nica, se beneficiou da vitria sobre o pecado conquistada por Cristo: ela foi
preservada de toda mancha do pecado original536 e durante toda a vida terrestre, por uma
graa especial de Deus, no cometeu nenhuma espcie de pecado537.
Mas por que Deus no impediu o primeiro homem de pecar? S. Leo Magno responde: A
graa inefvel de Cristo deu-nos bens melhores do que aqueles que a inveja do Demnio
nos havia subtrado538. E Sto. Toms de Aquino: Nada obsta a que a natureza humana
tenha sido destinada a um fim mais elevado aps o pecado. Com efeito, Deus permite que
os males aconteam para tirar deles um bem maior. Donde a palavra de S. Paulo: Onde
abundou o pecado superabundou a graa (Rm 5,20). E o canto do Exultet: feliz culpa,
que mereceu tal e to grande Redentor539.
RESUMINDO
Deus no fez a morte, nem tem prazer em destruir os viventes... Foi pela inveja do Diabo
que a morte entrou no mundo (Sb 1,13; 2,24).
Satans ou o Diabo, bem como os demais demnios, so anjos decados por terem se
recusado livremente a servir a Deus e a seu desgnio. Sua opo contra Deus definitiva.
Eles tentam associar o homem sua revolta contra Deus.
Constitudo por Deus em estado de justia, o homem, instigado pelo Maligno, desde o
incio da histria, abusou da prpria liberdade. Levantou-se contra Deus, desejando atingir
seu objetivo fora dele540.
Por seu pecado, Ado, na qualidade de primeiro homem, perdeu a santidade e a justia
originais que havia recebido de Deus no somente para si, mas para todos os seres
humanos.
sua descendncia, Ado e Eva transmitiram a natureza humana ferida por seu primeiro
pecado, portanto privada da santidade e da justia originais. Esta privao denominada
pecado original.
Em conseqncia do pecado original, a natureza humana est enfraquecida em suas
foras, submetida ignorncia, ao sofrimento e dominao da morte, e inclinada ao
pecado (inclinao chamada de concupiscncia).
Afirmamos, portanto, com o Conclio de Trento, que o pecado original transmitido com a
natureza humana, no por imitao, mas por propagao, e que ele , portanto, prprio
de cada um541.
A vitria sobre o pecado, conseguida por Cristo, deu-nos bens melhores do que aqueles
que o pecado nos havia tirado: Onde avultou o pecado, a graa superabundou (Rm
5,20).
Segundo a f dos cristos, este mundo foi criado e conservado pelo amor do Criador, na
verdade, este mundo foi reduzido servido do pecado, mas Cristo crucificado e
ressuscitado quebrou o poder do Maligno e libertou o mundo...542.
CAPTULO II
CREIO EM JESUS CRISTO, FILHO NICO DE DEUS

530
Cf. 1Pd 5,8.
531
GS 37,2.
532
Cf. Gn 3,9.
533
Cf. Gn 3,15.
534
Cf. 1Cor 15,21-22.45.
535
Cf. Rm 5,19-20.
536
Cf. Pio IX: Ineffabilis Deus: DS 2803.
537
Cf. Conc. de Trento: DS 1573.
538
Serm. 73,4: PL 54,396.
539
S. Th. III, 1.3. ad 3.
540
GS 13,1.
541
SPF 16.
542
GS 2,2.
A BOA NOVA: DEUS ENVIOU SEU FILHO
Quando, porm, chegou a plenitude do tempo, enviou Deus seu Filho, nascido de uma
mulher, nascido sob a Lei, para remir os que estavam sob a Lei, a fim de que
recebssemos a adoo filial (Gl 4,4-5). Este o Evangelho de Jesus Cristo, Filho de
Deus543: Deus visitou seu povo544, cumpriu as promessas feitas a Abrao e sua
descendncia545; f-lo para alm de toda expectativa: enviou seu Filho bem-amado.
Cremos e confessamos que Jesus de Nazar, nascido judeu de uma filha de Israel, em
Belm, no tempo do rei Herodes Magno e do imperador Csar Augusto, carpinteiro de
profisso, morto e crucificado em Jerusalm, sob o procurador Pncio Pilatos, durante o
reinado do imperador Tibrio, o Filho eterno de Deus feito homem; que ele veio de
Deus (Jo 13,3), desceu do cu (Jo 3,13; 6,33), veio na carne546, pois o Verbo se fez
carne e habitou entre ns, e ns vimos sua glria, glria que ele tem junto ao Pai, como
Filho nico, cheio de graa e de verdade... Pois de sua plenitude ns recebemos graa por
graa (Jo 1,14-16).
Movidos pela graa do Esprito Santo e atrados pelo Pai, cremos e confessamos acerca de
Jesus: Tu s o Cristo, o Filho do Deus vivo (Mt 16,16). Foi sobre a rocha desta f,
confessada por S. Pedro, que Cristo construiu sua Igreja547.
ANUNCIAR... A INSONDVEL RIQUEZA DE CRISTO (Ef 3,8)
A transmisso da f crist primeiramente o anncio de Jesus Cristo, para levar f nele.
Desde o comeo, os primeiros discpulos ardiam do desejo de anunciar Cristo: Pois no
podemos, ns, deixar de falar das coisas que vimos e ouvimos (At 4,20). E convidam os
homens de todos os tempos a entrarem na alegria de sua comunho com Cristo:
O que ouvimos, o que vimos com nossos olhos, o que contemplamos e o que nossas mos
apalparam do Verbo da vida porque a Vida manifestou-se: ns a vimos e lhe damos
testemunho e vos anunciamos a Vida Eterna, que estava voltada para o Pai e que nos
apareceu o que vimos e ouvimos, vo-lo anunciamos para que estejais tambm em
comunho conosco. E nossa comunho com o Pai e com seu Filho Jesus Cristo. E isto vos
escrevemos para que nossa alegria seja completa (1Jo 1,1-4).
CRISTO O CENTRO DA CATEQUESE
No centro da catequese encontramos essencialmente uma Pessoa, a de Jesus de Nazar,
Filho nico do Pai..., que sofreu e morreu por ns e agora, ressuscitado, vive conosco para
sempre... Catequizar... desvendar na Pessoa de Cristo todo o desgnio eterno de Deus
que nela se realiza. procurar compreender o significado dos gestos e das palavras de
Cristo e dos sinais realizados por Ele548. A finalidade definitiva da catequese levar
comunho com Jesus Cristo: s ele pode conduzir ao amor do Pai no Esprito e fazer-nos
participar da vida da Santssima Trindade549.
Na catequese, Cristo, Verbo Encarnado e Filho de Deus, que ensinado todo o resto
est em relao com ele; e somente Cristo ensina; todo outro que ensine, f-lo na medida
em que seu porta-voz, permitindo a Cristo ensinar por sua boca... Todo catequista
deveria poder aplicar a si mesmo a misteriosa palavra de Jesus: Minha doutrina no
minha, mas daquele que me enviou (Jo 7,16)550.
Aquele que chamado a ensinar o Cristo deve, portanto, procurar primeiro este ganho
supereminente que o conhecimento de Cristo; preciso aceitar perder tudo... a fim de
ganhar a Cristo e ser achado nele, e conhecer o poder de sua Ressurreio e a
participao em seus sofrimentos, conformando-me com ele em sua Morte, para ver se
alcano a ressurreio de entre os mortos (Fl 3,8-11).
deste conhecimento amoroso de Cristo que jorra o desejo de anunci-lo, de
evangelizar e de levar outros ao sim da f em Jesus Cristo. Mas ao mesmo tempo se
faz sentir a necessidade de conhecer cada vez melhor esta f. Para este fim, segundo a
ordem do Smbolo da f, primeiro sero apresentados os principais ttulos de Jesus: Cristo,
o Filho de Deus, o Senhor (artigo 2). Em seguida, o Smbolo confessa os principais
Mistrios da vida de Cristo: os de sua Encarnao (artigo 3), os de sua Pscoa (artigos 4 e
5) e, finalmente, os de sua Glorificao (artigos 6 e 7).
ARTIGO 2
E EM JESUS CRISTO, SEU FILHO NICO, NOSSO SENHOR
Jesus
Jesus quer dizer, em hebraico, Deus salva. No momento da Anunciao, o anjo Gabriel
d-lhe como nome prprio o nome de Jesus, que exprime ao mesmo tempo sua identidade
e misso551. Uma vez que s Deus pode perdoar os pecados (Mc 2,7), Ele que, em
543
Cf. Mc 1,1.
544
Cf. Lc 1,68.
545
Cf. Lc 1,55.
546
Cf 1Jo 4,2.
547
Cf. Mt 16,18; S. Leo Magno, Serm. 4,3: PL 54,151; 51,1: PL 54,390B; 62,2: PL 54, 350C-315A; 83,3: PL 54,432A.
548
CT 5.
549
Ibid.
550
Ibid., 6.
551
Cf. Lc 1,31.
Jesus, seu Filho eterno feito homem, salvar seu povo dos pecados (Mt 1,21). Em Jesus,
portanto, Deus recapitula toda a sua histria de salvao em favor dos homens.
Na Histria da Salvao, Deus no se contentou em libertar Israel da casa da escravido
(Dt 5,6), fazendo-o sair do Egito. Salva-o tambm de seu pecado. Por ser o pecado
sempre uma ofensa feita a Deus552, s Ele pode perdo-lo553. Por isso Israel, tomando
conscincia cada vez mais clara da universalidade do pecado, no poder mais procurar a
salvao a no ser na invocao do Nome do Deus Redentor554.
O nome de Jesus significa que o prprio nome de Deus est presente na pessoa de seu
Filho555 feito homem para a redeno universal e definitiva dos pecados. o nico nome
divino que traz a salvao556 e a partir de agora pode ser invocado por todos, pois se uniu
a todos os homens pela Encarnao557, de sorte que no existe debaixo do cu outro
nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos (At 4,12)558.
O nome de Deus Salvador era invocado uma s vez por ano pelo sumo sacerdote para a
expiao dos pecados de Israel, depois de ele aspergir o propiciatrio do Santo dos Santos
com o sangue do sacrifcio559. O propiciatrio era o lugar da presena de Deus560. Quando
S. Paulo diz de Jesus que Deus o destinou como instrumento de propiciao, por seu
prprio Sangue (Rm 3,25), quer afirmar que na humanidade deste ltimo era Deus que
em Cristo reconciliava consigo o mundo(2Cor 5,19).
A Ressurreio de Jesus glorifica o nome de Deus Salvador561, pois a partir de agora o
nome de Jesus que manifesta em plenitude o poder supremo do nome acima de todo
nome562. Os espritos maus temem seu nome563, e em nome dele que os discpulos de
Jesus operam milagres564, pois tudo o que pedem ao Pai em seu nome o Pai lhes
concede565.
O nome de Jesus est no cerne da orao crist. Todas as oraes litrgicas so concludas
pela frmula per Dominum nostrum Iesum Christum por Nosso Senhor Jesus Cristo....
A Ave-Maria culmina no e bendito o fruto do vosso ventre, Jesus. A orao oriental do
corao, denominada orao a Jesus, diz: Jesus Cristo, Filho de Deus, Senhor, tem
piedade de mim, pecador. Numerosos cristos, como Sta. Joana dArc, morrem tendo nos
lbios apenas o nome de Jesus566.
Cristo
Cristo vem da traduo grega do termo hebraico Messias, que quer dizer ungido. S se
torna o nome prprio de Jesus porque este leva perfeio a misso divina que significa.
Com efeito, em Israel eram ungidos em nome de Deus os que lhe eram consagrados para
uma misso vinda dele. Era o caso dos reis567, dos sacerdotes568 e, em raras ocasies, dos
profetas569. Esse devia ser por excelncia o caso do Messias que Deus enviaria para
instaurar definitivamente seu Reino570. O Messias devia ser ungido pelo Esprito do
Senhor571 ao mesmo tempo como rei e sacerdote572, mas tambm como profeta573. Jesus
realizou a esperana messinica de Israel em sua trplice funo de sacerdote, profeta e
rei.
O anjo anunciou aos pastores o nascimento de Jesus como o do Messias prometido a
Israel: Hoje, na cidade de Davi, nasceu-vos um Salvador que o Cristo Senhor (Lc
2,11). Desde o incio Ele aquele que o Pai consagrou e enviou ao mundo (Jo 10,36),
concebido como Santo574 no seio virginal de Maria. Jos foi chamado por Deus a receber
Maria, sua mulher, grvida daquele que foi gerado nela pelo Esprito Santo (Mt 1,21),
para que Jesus, que se chama Cristo, nascesse da esposa de Jos na descendncia
messinica de Davi (Mt 1,16)575.
A consagrao messinica de Jesus manifesta sua misso divina. , alis, o que indica seu
prprio nome, pois no nome de Cristo est subentendido Aquele que ungiu. Aquele que foi
ungido e a prpria Uno com que ele foi ungido: Aquele que ungiu o Pai, Aquele que foi
ungido o Filho, e o foi no Esprito, que a Uno576. Sua consagrao messinica eterna
revelou-se no tempo de sua vida terrestre, por ocasio de seu Batismo por Joo, quando

552
Cf. Sl 51,6.
553
Cf. Sl 51,11.
554
Cf. Sl 79,9.
555
Cf. At 5,41; 3Jo 7.
556
Cf. Jo 3,18; At 2,21.
557
Cf. Rm 10,6-13.
558
Cf. At 9,14; Tg 2,7.
559
Cf. Lv 16,15-16; Eclo 50,22; Hb 9,7.
560
Cf. Ex 25,22; Lv 16,2; Nm 7,89; Hb 9,5.
561
Cf. Jo 12,28.
562
Fl 2,9-10.
563
Cf. At 16,16-18; 19,13-16.
564
Cf. Mc 16,17.
565
Cf. Jo 15,16.
566
Cf. La reabilitation de Jeanne la Pucelle. Lenqute ordonne par Charles VII em 1450 et le codicille de Guillaume Bouill, ed. P. Doncoeur-Y. Lanhers, Paris, 1956, pp. 39.45.56.
567
Cf. 1Sm 9,16; 10,1; 16,1.12-13; 1Rs 1,39.
568
Cf. Ex 29,7; Lv 8,12.
569
Cf. 1Rs 19,16.
570
Cf. Sl 2,2; At 4,26-27.
571
Cf. Is 11,2.
572
Cf. Zc 4,14; 6,13.
573
Cf. Is 61,1; Lc 4,16-21.
574
Cf. Lc 1,35.
575
Cf. Rm 1,3; 2Tm 2,8; Apstolos 22,16.
576
Sto. Irineu, Adv. haer., 3,18,3.
Deus o ungiu com o Esprito Santo e poder (At 10,38), para que ele fosse manifestado a
Israel (Jo 1,31) como seu Messias. Por suas obras e palavras ser conhecido como o
Santo de Deus577.
Numerosos judeus e at certos pagos que compartilhavam a esperana deles
reconheceram em Jesus os traos fundamentais do Filho de Davi messinico, prometido
por Deus a Israel578. Jesus aceitou o ttulo de Messias ao qual tinha direito579, mas com
reserva, pois este era entendido por uma parte de seus contemporneos segundo uma
concepo demasiadamente humana580, essencialmente poltica581.
Jesus acolheu a profisso de f de Pedro, que o reconheceu como o Messias anunciando a
Paixo iminente do Filho do Homem582. Desvendou o contedo autntico de sua realeza
messinica, seja na identidade transcendente do Filho do Homem que desceu do Cu (Jo
3,13)583, seja em sua misso redentora como Servo sofredor: O Filho do Homem no veio
para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate pela multido (Mt 20,28)584.
Por isso o verdadeiro sentido de sua realeza s se manifestou do alto da Cruz585.
somente aps sua Ressurreio que sua realeza messinica poder ser proclamada por
Pedro diante do povo de Deus: Que toda a casa de Israel saiba com certeza: Deus o
constituiu Senhor e Cristo, este Jesus que vs crucificastes (At 2,36).
Filho nico de Deus
Filho de Deus, no Antigo Testamento, um ttulo dado aos anjos586, ao povo da Eleio587,
aos filhos de Israel588 e a seus reis589. Significa ento uma filiao adotiva que estabelece
entre Deus e sua criatura relaes de uma intimidade especial. Quando o Rei-Messias
prometido chamado filho de Deus590, isso no implica necessariamente, segundo o
sentido literal desses textos, que ele ultrapasse o nvel humano. Os que designaram Jesus
como Messias de Israel591 talvez no tenham tido a inteno de dizer mais do que isto592.
No acontece o mesmo com Pedro, quando confessa Jesus como o Cristo, o Filho do Deus
vivo593, pois este lhe responde com solenidade: No foi a carne e o sangue que te
revelaram isso, e sim meu Pai que est nos Cus (Mt 16,17). Paralelamente, Paulo dir a
propsito de sua converso no caminho para Damasco: Quando, porm, aquele que me
separou desde o seio materno e me chamou, por sua graa houve por bem revelar em
mim o seu Filho, para que eu o evangelizasse entre os gentios... (Gl 1,15-16).
Imediatamente, nas sinagogas, comeou a proclamar Jesus, afirmando que ele o Filho
de Deus (At 9,20). Este ser desde o incio594 o centro da f apostlica595 professada
primeiro por Pedro como fundamento da Igreja596.
Se Pedro pde reconhecer o carter transcendente da filiao divina de Jesus Messias foi
porque este o deu a entender claramente. Diante do Sindrio, pergunta de seus
acusadores: Tu s ento o Filho de Deus?, Jesus respondeu: Vs dizeis que eu sou (Lc
22,70)597. J bem antes, Ele se designara como o Filho que conhece o Pai598 e que
diferente dos servos que Deus enviou anteriormente a seu povo599, superior aos prprios
anjos600. Distinguiu sua filiao daquela de seus discpulos, no dizendo nunca nosso
Pai601, a no ser para responder-lhes: Portanto, orai desta maneira: Pai Nosso (Mt 6,9);
e sublinhou esta distino: Meu Pai e vosso Pai (Jo 20,17).
Os Evangelhos narram em dois momentos solenes o Batismo e a Transfigurao de
Cristo a voz do Pai a design-lo como seu Filho bem-amado602. Jesus designa-se a si
mesmo como o Filho nico de Deus (Jo 3,16) e afirma com este ttulo sua preexistncia
eterna603. Exige a f em nome do Filho nico de Deus (Jo 3,18). Esta confisso crist
aparece j na exclamao do centurio diante de Jesus na cruz: Verdadeiramente, este
homem era Filho de Deus (Mc 15,39), pois somente no Mistrio Pascal o fiel cristo pode
entender o pleno significado do ttulo Filho de Deus.
depois de sua Ressurreio que a filiao divina de Jesus aparece no poder de sua
humanidade glorificada: Estabelecido Filho de Deus com poder por sua Ressurreio dos

577
Cf. Mc 1,24; Jo 6,69; At 3,14.
578
Cf. Mt 2,2; 9,27; 12,23; 15,22; 20,30; 21,9.15.
579
Cf. Jo 4,25-26; 11,27.
580
Cf. Mt 22,41-46.
581
Cf. Jo 6,15; Lc 24,21.
582
Cf. Mt 16,16-23.
583
Cf. Jo 6,62; Dn 7,13.
584
Cf. Is 53,10-12.
585
Cf. Jo 19,19-22; Lc 23,39-43.
586
Cf. Dt 32,8; J 1,6.
587
Cf. Ex 4,22; Os 11,1; Jr 3,19; Eclo 36,14; Sb 18,13.
588
Cf. Dt 14,1; Os 2,1.
589
Cf. 2Sm 7,14; Sl 82,6.
590
Cf. 1Cr 17,13; Sl 2,7.
591
Cf. Mt 27,54.
592
Cf. Lc 23,47.
593
Cf. Mt 16,16.
594
Cf. 1Ts 1,10.
595
Cf. Jo 20,31.
596
Cf. Mt 16,18.
597
Cf. Mt 26,64; Mc 14,62.
598
Cf. Mt 11,27; 21,37-38.
599
Cf. Mt 21,34-36.
600
Cf. Mt 24,36.
601
Cf. Mt 5,48; 6,8; 7,21; Lc 11,13.
602
Cf. Mt 3,17; 17,5.
603
Cf. Jo 10,36.
mortos (Rm 1,4)604. Os apstolos podero confessar: Ns vimos a sua glria, glria que
ele tem junto ao Pai como Filho nico, cheio de graa e de verdade (Jo 1,14).
Senhor
Na verso grega dos livros do Antigo Testamento, o nome inefvel com o qual Deus se
revelou a Moiss605, Iahweh, traduzido por Kyrios [Senhor]. Senhor torna-se desde
ento o nome mais habitual para designar a prpria divindade do Deus de Israel. neste
sentido forte que o Novo Testamento utiliza o ttulo de Senhor para o Pai, e tambm e
a est a novidade para Jesus reconhecido assim como o prprio Deus606.
Jesus mesmo atribui-se de maneira velada este ttulo quando discute com os fariseus
sobre o sentido do Salmo 110607, mas tambm de modo explcito dirigindo-se a seus
apstolos608. Ao longo de toda a sua vida pblica, seus gestos de domnio sobre a
natureza, sobre as doenas, sobre os demnios, sobre a morte e o pecado demonstravam
sua soberania divina.
Muito freqentemente nos Evangelhos determinadas pessoas se dirigem a Jesus
chamando-o de Senhor. Este ttulo exprime o respeito e a confiana dos que se achegam
a Jesus e esperam dele ajuda e cura609. Sob a moo do Esprito Santo, ele exprime o
reconhecimento do Mistrio Divino de Jesus610. No encontro com Jesus ressuscitado, ele se
transforma em expresso de adorao: Meu Senhor e meu Deus! (Jo 20,28). Assume
ento uma conotao de amor e afeio que tornar-se- peculiar tradio crist: o
Senhor! (Jo 21,7).
Ao atribuir a Jesus o ttulo divino de Senhor, as primeiras confisses de f da Igreja
afirmam, desde o incio611, que o poder, a honra e a glria devidos a Deus Pai cabem
tambm a Jesus612, por ser Ele de condio divina (Fl 2,6) e ter o Pai manifestado esta
soberania de Jesus ressuscitando-o dos mortos e exaltando-o em sua glria613.
Desde o princpio da histria crist a afirmao do senhorio de Jesus sobre o mundo e
sobre a histria614 significa tambm o reconhecimento de que o homem no deve
submeter sua liberdade pessoal, de maneira absoluta, a nenhum poder terrestre, mas
somente a Deus Pai e ao Senhor Jesus Cristo: Csar no o Senhor615. A Igreja cr...
que a chave, o centro e o fim de toda a histria humana se encontram em seu Senhor e
Mestre616.
A orao crist marcada pelo ttulo Senhor, quer se trate do convite orao o Senhor
esteja convosco ou da concluso da orao, por Jesus Cristo nosso Senhor, ou ainda do
grito cheio de confiana e esperana: Maran atha (o Senhor vem!) ou Marana
tha(Vem, Senhor!) (1Cor 16,22): Amm, vem, Senhor Jesus! (Apstolos 22,20).
RESUMINDO
O nome de Jesus significa Deus que salva. A criana nascida da Virgem Maria chamada
Jesus, pois Ele salvar seu povo de seus pecados (Mt 1,21): No existe debaixo do cu
outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos (At 4,12).
O nome Cristo significa Ungido, Messias. Jesus o Cristo pois Deus o ungiu com o
Esprito Santo e com poder (At 10,28). Ele era aquele que h de vir (Lc 7,19), o objeto
da esperana de Israel617.
O nome Filho de Deus significa a relao nica e eterna de Jesus Cristo com Deus, seu Pai:
Ele o Filho nico doPai618 e o prprio Deus619. Crer que Jesus Cristo o Filho de Deus
necessrio para ser cristo620.
O nome Senhor designa a soberania divina. Confessar ou invocar Jesus como Senhor
crer em sua divindade. Ningum pode dizer Jesus Senhor a no ser no Esprito Santo
(1Cor 12,3).
ARTIGO 3
JESUS CRISTO FOI CONCEBIDO PELO PODER DO ESPRITO SANTO, NASCEU DA VIRGEM
MARIA
PARGRAFO 1
O FILHO DE DEUS SE FEZ HOMEM
Por que o Verbo se fez carne?

604
Cf. At 13,33.
605
Cf. Ex 3,14.
606
Cf. 1Cor 2,8.
607
Cf. Mt 22,41-46; cf. tambm At 2,34-36; Hb 1,13.
608
Cf. Jo 13,13.
609
Cf. Mt 8,2; 14,30; 15,22.
610
Cf. Lc 1,43; 2,11.
611
Cf. At 2,34-36.
612
Cf. Rm 9,5; Tt 2,13; Ap 5,13.
613
Cf. Rm 10,9; 1Cor 12,3; Fl 2,11.
614
Cf. Apstolos 11,15.
615
Cf. Mc 12,17; At 5,29.
616
GS 10,2; cf. 45,2.
617
Cf. At 28,20.
618
Cf. Jo 1,14.18; 3,16.18.
619
Cf. Jo 1,1.
620
Cf. At 8,37; 1Jo 2,23.
Com o Credo niceno-constantinopolitano, respondemos, confessando: E por ns, homens,
e para nossa salvao, desceu dos cus e se encarnou pelo Esprito Santo, no seio da
Virgem Maria, e se fez homem621.
O Verbo se fez carne para salvar-nos, reconciliando-nos com Deus: Foi Ele que nos amou
e enviou-nos seu Filho como vtima de expiao por nossos pecados (1Jo 4,10). O Pai
enviou seu Filho como o Salvador do mundo (1Jo 4,14). Este apareceu para tirar os
pecados (1Jo 3,5):
Doente, nossa natureza precisava ser curada; decada, ser reerguida; morta, ser
ressuscitada. Havamos perdido a posse do bem, era preciso no-la restituir. Enclausurados
nas trevas, era preciso trazer-nos luz; cativos, espervamos um salvador; prisioneiros,
um socorro; escravos, um libertador. Essas razes eram sem importncia? No eram tais
que comoveriam a Deus a ponto de faz-lo descer at nossa natureza humana para visit-
la, uma vez que a humanidade se encontrava em um estado to miservel e to infeliz?622.
O Verbo se fez carne para que, assim, conhecssemos o amor de Deus: Nisto manifestou-
se o amor de Deus por ns: Deus enviou seu Filho nico ao mundo para que vivamos por
Ele (1Jo 4,9). Pois Deus amou tanto o mundo, que deu seu Filho nico, a fim de que todo
o que crer nele no perea, mas tenha a Vida Eterna (1Jo 3,16).
O Verbo se fez carne para ser nosso modelo de santidade: Tomai sobre vs o meu jugo e
aprendei de mim... (Mt 11,29). Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida; ningum vem ao
Pai a no ser por mim (Jo 14,6). E o Pai, no monte da Transfigurao, ordena: Ouvi-o
(Mc 9,7)623. Pois Ele o modelo das Bem-aventuranas e a norma da Nova Lei: Amai-vos
uns aos outros como eu vos amei (Jo 15,12). Este amor implica a oferta efetiva de si
mesmo em seu seguimento624.
O Verbo se carne para tornar-nos participantes da natureza divina (2Pd 1,4): Pois esta
a razo pela qual o Verbo se fez homem, e o Filho de Deus, Filho do homem: para que o
homem, entrando em comunho com o Verbo e recebendo, assim, a filiao divina, se
torne filho de Deus625. Pois o Filho de Deus se fez homem para nos fazer Deus626.
Unigenitus Dei Filius, suae divinitatis volens nos esse participes, naturam nostram
assumpsit, ut homines deos faceret factus homo O Filho Unignito de Deus, querendo-
nos participantes de sua divindade, assumiu nossa natureza para que aquele que se fez
homem dos homens fizesse deuses627.
A Encarnao
Retomando a expresso de S. Joo (O Verbo se fez carne Jo 1,14), a Igreja denomina
Encarnao o fato de o Filho de Deus ter assumido uma natureza humana para realizar
nela a nossa salvao. Em um hino atestado por S. Paulo, a Igreja canta o mistrio da
Encarnao:
Tende em vs o mesmo sentimento de Cristo Jesus. Ele tinha a condio divina, e no
considerou o ser igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente. Mas esvaziou-se a si
mesmo, e assumiu a condio de servo, tomando a semelhana humana. E, achado em
figura de homem, humilhou-se e foi obediente at a morte, e morte de cruz! (Fl 2,5-8)628.
A Epstola aos Hebreus fala do mesmo mistrio:
Por isso, ao entrar no mundo, ele afirmou: No quiseste sacrifcio e oferenda. Tu, porm,
formaste-me um corpo. Holocaustos e sacrifcios pelo pecado no foram de teu agrado. Por
isso eu digo: Eis-me aqui... para fazer a tua vontade (Hb 10,5-7, citando Sl 40,7-9 LXX).
A f na Encarnao verdadeira do Filho de Deus o sinal distintivo da f crist: Nisto
reconheceis o Esprito de Deus. Todo esprito que confessa que Jesus Cristo veio na carne
de Deus (1Jo 4,2). Esta a alegre convico da Igreja desde o seu comeo, quando canta
o grande mistrio da piedade: Ele foi manifestado na carne (1Tm 3,16).
Verdadeiro Deus e verdadeiro homem
O acontecimento nico e totalmente singular da Encarnao do Filho de Deus no significa
que Jesus Cristo seja em parte Deus e em parte homem, nem que ele seja o resultado da
mescla confusa entre o divino e o humano. Ele se fez verdadeiramente homem
permanecendo verdadeiro Deus. Jesus Cristo o verdadeiro Deus e o verdadeiro homem.
A Igreja teve de defender e clarificar esta verdade de f no decurso dos primeiros sculos,
diante das heresias que a falsificavam.
As primeiras heresias, mais do que a divindade de Cristo, negaram sua humanidade
verdadeira (docetismo gnstico). Desde os tempos apostlicos a f crist insistiu na
verdadeira Encarnao do Filho de Deus, que veio na carne629. Mas desde o sculo III a

621
DS 150.
622
S. Gregrio de Nissa, Or. catech. 15: PG 45,48B.
623
Cf. Dt 6,4-5.
624
Cf. Mc 8,34.
625
Sto. Irineu, Adv. haer., 3,19,1.
626
Sto. Atansio, De Incarnatione 54,3: PG 25,19B.
627
Sto. Toms de Aquino, Opusc. 57 in festo Corp. Chr. 1.
628
Cf. Canticum ad I Vsperas Dominicae: Liturgia Horarum, Tipografia Poliglota Vaticana, 1973-1974, v. 1, pp 545.629.718.808; v. 2, pp. 844, 937, 1037.1129; v. 3, 1973, pp.
548.669.793.916; v. 4, pp. 496, 617.741.864; LH, cntico de Vsperas do sbado.
629
Cf. 1Jo 4,2-3; 2Jo 7.
Igreja teve de afirmar, contra Paulo de Samsata, em um conclio reunido em Antioquia,
que Jesus Cristo Filho de Deus por natureza e no por adoo. O I Conclio Ecumnico de
Nicia, em325. confessou em seu Credo que o Filho de Deus gerado, no criado,
consubstancial (homousios) ao Pai630 e condenou Ario, que afirmava que o Filho de Deus
veio do nada631 e que ele seria de uma substncia diferente da do Pai632.
A heresia nestoriana via em Cristo uma pessoa humana unida pessoa divina do Filho de
Deus. Diante dela, S. Cirilo de Alexandria e o III Conclio Ecumnico, reunido em feso em
431, confessaram que o Verbo, unindo a si em sua pessoa uma carne animada por uma
alma racional, se tornou homem633. A humanidade de Cristo no tem outro sujeito seno
a pessoa divina do Filho de Deus, que a assumiu e a fez sua desde sua concepo. Por isso
o Conclio de feso proclamou, em 431, que Maria se tornou de verdade Me de Deus pela
concepo humana do Filho de Deus em seu seio: Me de Deus no porque o Verbo de
Deus tirou dela sua natureza divina, mas porque dela que ele tem o corpo sagrado
dotado de uma alma racional, unido ao qual, na sua pessoa, se diz que o Verbo nasceu
segundo a carne634.
Os monofisistas afirmavam que a natureza humana tinha cessado de existir com tal em
Cristo ao ser assumida por sua pessoa divina de Filho de Deus. Confrontado como esta
heresia, o IV Conclio Ecumnico, em Calcednia, confessou em 451:
Na linha dos santos Padres, ensinamos unanimemente a confessar um s e mesmo Filho,
Nosso Senhor Jesus Cristo, o mesmo perfeito em divindade e perfeito em humanidade, o
mesmo verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, composto de uma alma racional
e de um corpo, consubstancial ao Pai segundo a divindade, consubstancial a ns segundo a
humanidade, semelhante a ns em tudo, com exceo do pecado635; gerado do Pai antes
de todos os sculos segundo a divindade, e nesses ltimos dias, para ns e para nossa
salvao, nascido da Virgem Maria, Me de Deus, segundo a humanidade.
Um s e mesmo Cristo, Senhor, Filho nico, que devemos reconhecer em duas naturezas,
sem confuso, sem mudanas, sem diviso, sem separao. A diferena das naturezas no
de modo algum suprimida por sua unio, mas antes as propriedades de cada uma so
salvaguardadas e reunidas em uma s pessoa e uma s hipstase636.
Depois do Conclio de Calcednia, alguns fizeram da natureza humana de Cristo uma
espcie de sujeito pessoal. Contra eles, o V Conclio Ecumnico, em Constantinopla, em
553, confessou, a propsito de Cristo: No h seno uma nica hipstase [ou pessoa],
que Nosso Senhor Jesus Cristo, Um da Trindade637. Na humanidade de Cristo, portanto,
tudo deve ser atribudo sua pessoa divina como ao seu sujeito prprio638; no somente
os milagres, mas tambm os sofrimentos639, e at a morte: Aquele que foi crucificado na
carne, Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus, Senhor da glria e Um da Santssima
Trindade640.
A Igreja confessa, assim, que Jesus inseparavelmente verdadeiro Deus e verdadeiro
homem. Ele verdadeiramente o Filho de Deus que se fez homem, nosso irmo, e isto
sem deixar de ser Deus, nosso Senhor:
Id quod fuit remansit et quod non fuit assumpsit Ele permaneceu o que era, assumiu o
que no era, canta a liturgia romana641. E a liturgia de S. Joo Crisstomo proclama e
canta: Filho nico e Verbo de Deus, sendo imortal, vos dignastes por nossa salvao
encarnar-vos da Santa Me de Deus e sempre Virgem Maria, vs que sem mudana vos
tornastes homem e fostes crucificado, Cristo Deus, que por vossa morte esmagastes a
morte, sois Um da Santssima Trindade, glorificado com o Pai e o Esprito Santo, salvai-
nos!642.
De que maneira o Filho de Deus homem
Uma vez que na unio misteriosa da Encarnao a natureza humana foi assumida, no
aniquilada643, a Igreja tem sido levada, ao longo dos sculos, a confessar a plena
realidade da alma humana, com suas operaes de inteligncia e vontade, e a do corpo
humano de Cristo. Mas, paralelamente, teve de lembrar toda vez que a natureza humana e
Cristo pertence in proprio pessoa divina do Filho de Deus que a assumiu. Tudo o que
Cristo e o que faz nela depende do Um da Trindade. Por conseguinte, o Filho de Deus
comunica sua humanidade seu prprio modo de existir pessoal na Trindade. Assim, em

630
Smbolo niceno: DS 125.
631
DS 130.
632
DS 126.
633
DS 250.
634
DS 251.
635
Cf. Hb 4,15.
636
DS 301-302.
637
DS 424.
638
Cf. j o Conc. de feso: DS 255.
639
Cf. Conc. de Constantinopla II, 8 sesso, cnon 3; DS 423.
640
DS 432.
641
In sollemnitate Sanctae Dei Genetricis Mariae, Antiphona ad Benedictus: Liturgia Horarum, v. 1, Tipografia Poliglota Vaticana, 1973, p. 394; cf. S. Leo Magno, Serm. 21,1: CCL 138,
87 (PL 54,192).
642
Liturgia bizantina, troprio O monoghenis.
643
GS 22,2.
sua alma como em seu corpo, Cristo exprime humanamente os modos divinos de agir da
Trindade644:
[O Filho de Deus] trabalhou com mos humanas, pensou com inteligncia humana, agiu
com vontade humana, amou com corao humano. Nascido da Virgem Maria, tornou-se
verdadeiramente um de ns, semelhante a ns em tudo, exceto no pecado645.
A ALMA E O CONHECIMENTO HUMANO DE CRISTO
Apolinrio de Laodicia afirmava que em Cristo o Verbo havia substitudo a alma ou o
esprito. Contra esse erro a Igreja confessou que o Filho assumiu tambm uma alma
racional humana646.
Esta alma humana que o Filho de Deus assumiu dotada de um verdadeiro conhecimento
humano. Enquanto tal, este no podia ser em si ilimitado: exercia-se nas condies
histricas de sua existncia no espao e no tempo. Por isso o Filho de Deus, ao tornar-se
homem, pde aceitar crescer em sabedoria, em estatura e em graa (Lc 2,52) e tambm
informar-se sobre aquilo que na condio humana se deve aprender de maneira
experimental647. Isto correspondia realidade de seu rebaixamento voluntrio na
condio de escravo648.
Mas, ao mesmo tempo, este conhecimento verdadeiramente humano do Filho de Deus
exprimia a vida divina de sua pessoa649. A natureza humana do Filho de Deus, no por si
mesma, mas por sua unio ao Verbo, conhecia e manifestava nela tudo o que convm a
Deus650. Este , em primeiro lugar, o caso do conhecimento ntimo e direto que o Filho de
Deus feito homem tem de seu Pai651. O Filho mostrava tambm em seu conhecimento
humano a penetrao divina que tinha dos pensamentos secretos do corao dos
homens652.
Por sua unio Sabedoria divina na pessoa do Verbo encarnado, o conhecimento humano
de Cristo gozava em plenitude da cincia dos desgnios eternos que viera revelar653. O que
ele reconhece desconhecer neste campo654 declara alhures no ser sua misso revel-lo655.
A VONTADE HUMANA DE CRISTO
Paralelamente, a Igreja confessou no VI Conclio Ecumnico que Cristo possui duas
vontades e duas operaes naturais, divinas e humanas, no opostas, mas cooperantes,
de sorte que o Verbo feito carne quis humanamente na obedincia a seu Pai tudo o que
decidiu divinamente com o Pai e o Esprito Santo por nossa salvao656. A vontade humana
de Cristo segue a sua vontade divina, sem estar em resistncia nem em oposio em
relao a ela, mas antes sendo subordinada a esta vontade toda-poderosa657.
O VERDADEIRO CORPO DE CRISTO
Visto que o Verbo se fez carne assumindo uma verdadeira humanidade, o corpo de Cristo
era delimitado658. Em razo disso, o rosto humano de Jesus pode ser desenhado659. No
VII Conclio Ecumnico660, a Igreja reconheceu como legtimo que ele seja representado
em imagens sagradas.
Ao mesmo tempo, a Igreja reconheceu que, no corpo de Jesus, Deus, que por natureza
invisvel, se tornou visvel aos nossos olhos661. Com efeito, as particularidades individuais
do corpo de Cristo exprimem a pessoa divina do Filho de Deus. Este fez seus os traos de
seu corpo humano a ponto de, pintados em uma imagem sagrada, poderem ser
venerados, pois o crente que venera sua imagem venera nela a pessoa que est
pintada662.
O CORAO DO VERBO ENCARNADO
Jesus conheceu-nos e amou-nos a todos durante sua Vida, sua Agonia e Paixo e
entregou-se por todos e cada um de ns: O Filho de Deus amou-me e entregou-se por
mim (Gl 2,20). Amou-nos a todos com um corao humano. Por esta razo, o sagrado
Corao de Jesus, traspassado por nossos pecados e para a nossa salvao663, praecipuus
consideratur index et symbolus... illius amoris, quo divinus Redemptor aeternum Patrem
hominesque universos continenter adamat considerado o principal sinal e smbolo

644
Cf. Jo 14,9-10.
645
GS 22,2.
646
Cf. DS 149.
647
Cf. Mc 6,38; 8,27; Jo 11,34 etc.
648
Cf. Fl 2,7.
649
Cf. S. Gregrio Magno, Ep. 10,39; DS 475.
650
S. Mximo Confessor, Quaestiones et dubia, Q. I. 67: CCG 10, 155 (66: PG 90,840).
651
Cf. Mc 14,36; Mt 11,27; Jo 1,18; 8,55 etc.
652
Cf. Mc 2,8; Jo 2,25; 6,61 etc.
653
Cf. Mc 8,31; 9,31; 10,33-34; 14,18-20.26-30.
654
Cf. Mc 13,32.
655
Cf. At 1,7.
656
Cf. III Conc. de Constantinopla, em 681, 18 sesso, Definitio de duabus in Christo voluntatibus et operationibus: DS 556-559.
657
DS 556.
658
Cf. Conc. de Latro em 649: DS 504.
659
Cf. Gl 3,1.
660
II Conc. de Nicia em 787: DS 600-603.
661
MR, Prefcio de Natal.
662
II Conc. de Nicia em 787: DS 601.
663
Cf. Jo 19,34.
daquele amor com o qual o divino Redentor ama ininterruptamente o Pai Eterno e todos os
homens664.
RESUMINDO
No tempo determinado por Deus, o Filho nico do Pai, a Palavra Eterna, isto , o Verbo e a
Imagem substancial do Pai, encarnou: sem perder a natureza divina, assumiu a natureza
humana.
Jesus Cristo verdadeiro Deus e verdadeiro homem, na unidade de sua Pessoa Divina: por
isso Ele o nico mediador entre Deus e os homens.
Jesus Cristo possui duas naturezas, a divina e a humana, no confundidas, mas unidas na
nica Pessoa do Filho de Deus.
Sendo verdadeiro Deus e verdadeiro homem, Cristo tem uma inteligncia e uma vontade
humanas, perfeitamente concordantes com e submetidas sua inteligncia e sua
vontade divinas, que tem em comum com o Pai e o Esprito Santo.
A Encarnao , portanto, o Mistrio da admirvel unio da natureza divina e da natureza
humana na nica Pessoa do Verbo.
PARGRAFO 2
... CONCEBIDO PELO PODER DO ESPRITO SANTO,
NASCIDO DA VIRGEM MARIA
Concebido pelo poder do Esprito Santo...
A Anunciao a Maria inaugura a plenitude dos tempos (Gl 4,4), isto , o cumprimento
das promessas e das preparaes. Maria convidada a conceber aquele em quem habitar
corporalmente a plenitude da divindade (Cl 2,9). A resposta divina sua pergunta Como
se far isto, se no conheo homem algum? (Lc 1,34) dada pelo poder do Esprito: O
Esprito Santo vir sobre ti (Lc 1,35).
A misso do Esprito Santo est sempre conjugada e ordenada do Filho665. O Esprito
Santo enviado para santificar o seio da Virgem Maria e fecund-la divinamente, ele que
o Senhor que d a Vida, fazendo com que ela conceba o Filho Eterno do Pai em uma
humanidade proveniente da sua.
Ao ser concebido como homem no seio da Virgem Maria, o Filho nico do Pai Cristo,
isto , ungido pelo Esprito Santo666 desde o incio de sua existncia humana, ainda que
sua manifestao s se realize progressivamente: aos pastores667, aos magos668, a Joo
Batista669, aos discpulos670. Toda a vida de Jesus Cristo manifestar, portanto, como Deus
o ungiu com o Esprito e com poder (At 10,38).
...Nascido da Virgem Maria
O que a f catlica cr acerca de Maria funda-se no que ela cr acerca de Cristo, mas o
que a f ensina sobre Maria ilumina, por sua vez, sua f em Cristo.
A PREDESTINAO DE MARIA
Deus enviou Seu Filho (Gl 4,4), mas, para formar-lhe um corpo671, quis a livre
cooperao de uma criatura. Por isso, desde toda a eternidade, Deus escolheu, para ser a
Me de Seu Filho, uma filha de Israel, uma jovem judia de Nazar na Galilia, uma virgem
desposada com um varo chamado Jos, da casa de Davi, e o nome da virgem era Maria
(Lc 1,26-27):
Quis o Pai das misericrdias que a Encarnao fosse precedida pela aceitao daquela que
era predestinada a ser Me de seu Filho, para que, assim como uma mulher contribuiu
para a morte, uma mulher tambm contribusse para a vida672.
Ao longo de toda a Antiga Aliana, a misso de Maria foi preparada pela misso de santas
mulheres. No princpio est Eva: a despeito de sua desobedincia, ela recebe a promessa
de uma descendncia que ser vitoriosa sobre o Maligno673 e a de ser a me de todos os
viventes674. Em virtude dessa promessa, Sara concebe um filho, apesar de sua idade
avanada675. Contra toda expectativa humana, Deus escolheu o que era tido como
impotente e fraco676 para mostrar sua fidelidade sua promessa: Ana, a me de
Samuel677, Dbora, Rute, Judite e Ester, e muitas outras mulheres. Maria sobressai entre
(esses) humildes e pobres do Senhor, que dele esperam e recebem com confiana a

664
Pio XII, enc. Haurietis aquas: DS 3924; cf. DS 3812.
665
Cf. Jo 16,14-15.
666
Cf. Mt 1,20; Lc 1,35.
667
Cf. Lc 2,8-20.
668
Cf. Mt 2,1-12.
669
Cf. Jo 1,31-34.
670
Cf. Jo 2,11.
671
Cf. Hb 10,5.
672
LG 56; cf. 61.
673
Cf. Gn 3,15.
674
Cf. Gn 3,20.
675
Cf. Gn 18,10-14; 21,1-2.
676
Cf. 1Cor 1,27.
677
Cf. 1Sm 1.
Salvao. Com ela, Filha de Sio por excelncia, depois de uma demorada espera da
promessa, completam-se os tempos e se instaura a nova economia678.
A IMACULADA CONCEIO
Para ser a Me do Salvador, Maria foi enriquecida por Deus com dons dignos para
tamanha funo679. No momento da Anunciao, o anjo Gabriel a sada como cheia de
graa680. Efetivamente, para poder dar o assentimento livre de sua f ao anncio de sua
vocao era preciso que ela estivesse totalmente sob a moo da graa de Deus.
Ao longo dos sculos, a Igreja tomou conscincia de que Maria cumulada de graa por
Deus681, foi redimida desde a concepo. isso que confessa o dogma da Imaculada
Conceio, proclamado em 1854 pelo papa Pio IX:
A beatssima Virgem Maria, no primeiro instante de sua Conceio, por singular graa e
privilgio de Deus onipotente, em vista dos mritos de Jesus Cristo, Salvador do gnero
humano, foi preservada imune de toda mancha do pecado original682.
Esta santidade resplandecente, absolutamente nica da qual Maria enriquecida desde
o primeiro instante de sua conceio683 lhe vem inteiramente de Cristo: Em vista dos
mritos de seu Filho, foi redimida de um modo mais sublime684. Mais do que qualquer
outra pessoa criada, o Pai a abenoou com toda a sorte de bnos espirituais, nos cus,
em Cristo (Ef 1,3). Ele a escolheu nele (Cristo), desde antes da fundao do mundo, para
ser santa e imaculada em sua presena, no amor (Ef 1,4).
Os Padres da tradio oriental chamam a Me de Deus a toda santa (Pan-hagia;
pronuncie pan-hagua), celebram-na como imune de toda mancha de pecado, tendo
sido plasmada pelo Esprito Santo, e formada como uma nova criatura685. Pela graa de
Deus, Maria permaneceu pura de todo pecado pessoal ao longo de toda a sua vida.
FAA-SE EM MIM SEGUNDO A TUA PALAVRA...
Ao anncio de que, sem conhecer homem algum, ela conceberia o Filho do Altssimo pela
virtude do Esprito Santo686, Maria respondeu com a obedincia da f687, certa de que
nada impossvel a Deus: Eu sou a serva do Senhor, faa-se em mim segundo a tua
palavra (Lc 1,37-38). Assim, dando Palavra de Deus o seu consentimento, Maria se
tornou Me de Jesus e, abraando de todo o corao, sem que nenhum pecado a retivesse,
a vontade divina da salvao, entregou-se ela mesma totalmente pessoa e obra de seu
Filho, para servir, na dependncia dele e com Ele, pela graa de Deus, ao Mistrio da
Redeno688:
Como diz Sto. Irineu, obedecendo, se fez causa de salvao tanto para si como para todo
o gnero humano689. Do mesmo modo, no poucos antigos Padres dizem com ele: O n
da desobedincia de Eva foi desfeito pela obedincia de Maria; o que a virgem Eva ligou
pela incredulidade a virgem Maria desligou pela f690. Comparando Maria com Eva,
chamam Maria de me dos viventes e com freqncia afirmam: Veio a morte por Eva e
a vida por Maria691.
A MATERNIDADE DIVINA DE MARIA
Denominada nos Evangelhos a Me de Jesus (Jo 2,1; 19,25)692, Maria aclamada, sob o
impulso do Esprito, desde antes do nascimento de seu Filho, como a Me de meu Senhor
(Lc 1,43). Com efeito, Aquele que ela concebeu do Esprito Santo como homem e que se
tornou verdadeiramente seu Filho segundo a carne no outro que o Filho eterno do Pai, a
segunda Pessoa da Santssima Trindade. A Igreja confessa que Maria verdadeiramente
Me de Deus (Theotkos)693.
A VIRGINDADE DE MARIA
Desde as primeiras formulaes da f694, a Igreja confessou que Jesus foi concebido
exclusivamente pelo poder do Esprito Santo no seio da Virgem Maria, afirmando tambm
o aspecto corporal deste evento: Jesus foi concebido do Esprito Santo, sem smen695. Os
Padres vem na conceio virginal o sinal de que foi verdadeiramente o Filho de Deus que
veio numa humanidade como a nossa:
Assim, Sto, Incio de Antioquia (incio do sculo II): Estais firmemente convencidos
acerca de Nosso Senhor, que verdadeiramente da raa de Davi segundo a carne696, Filho

678
LG 55.
679
LG 56.
680
Lc 1,28.
681
Cf. Lc 1,28.
682
DS 2803.
683
LG 56.
684
LG 53.
685
LG 56.
686
Cf. Lc 1,28-37.
687
Cf. Rm 1,5.
688
Cf. LG 56.
689
Sto. Irineu. Adv. haer. 3,22,4; SC 211, 440 (PG 7,959).
690
Cf. Sto. Irineu, Adv. haer. 3,22,4; SC 211, 442-444 (PG 7,959-960).
691
LG 56.
692
Cf. Mt 13,55.
693
Cf. DS 251.
694
Cf. DS 10-64.
695
Conc. de Latro, em 649: DS 503.
696
Cf. Rm 1,3.
de Deus segundo a vontade e o poder de Deus697, verdadeiramente nascido de uma
virgem... ele foi verdadeiramente pregado, na sua carne, [ cruz] por nossa salvao sob
Pncio Pilatos... ele sofreu verdadeiramente, como tambm ressuscitou,
verdadeiramente698.
Os relatos evanglicos699 entendem a conceio virginal como uma obra divina que
ultrapassa toda compreenso e toda possibilidade humanas700: O que foi gerado nela vem
do Esprito Santo, diz o anjo a Jos acerca de Maria, sua noiva (Mt 1,20). A Igreja v a o
cumprimento da promessa divina dada pelo profeta Isaas: Eis que a virgem conceber e
dar luz um filho (Is 7,14, segundo a traduo grega de Mt 1,23).
Por vezes tem-se estranhado o silncio do Evangelho de S. Marcos e das epstolas do Novo
Testamento sobre a concepo virginal de Maria. Houve tambm quem se perguntasse se
no se trataria aqui de lendas ou de construes teolgicas sem pretenses histricas. A
isto deve-se responder: a f na concepo virginal de Jesus deparou com intensa oposio,
zombarias ou incompreenses da parte dos no-crentes, judeus e pagos701. Ela no era
motivada pela mitologia pag ou por alguma adaptao s idias do tempo. O sentido
deste acontecimento s acessvel f, que o v no nexo que interliga os mistrios entre
si702, no conjunto dos Mistrios de Cristo, desde a sua Encarnao at a sua Pscoa. Sto.
Incio de Antioquia j d testemunho deste nexo: O prncipe deste mundo ignorou a
virgindade de Maria e o seu parto, da mesma forma que a Morte do Senhor: trs mistrios
proeminentes que se realizaram no silncio de Deus703.
MARIA SEMPRE VIRGEM
O aprofundamento de sua f na maternidade virginal levou a Igreja a confessar a
virgindade real e perptua de Maria704, mesmo no parto do Filho de Deus feito homem705.
Com efeito, o nascimento de Cristo no lhe diminuiu, mas sagrou a integridade virginal
de sua me706. A Liturgia da Igreja celebra Maria como a Aeiparthenos (pronuncie
eiparthnos), sempre virgem707.
A isto objeta-se por vezes que a Escritura menciona irmos e irms de Jesus708. A Igreja
sempre entendeu que essas passagens no designam outros filhos da Virgem Maria: com
efeito, Tiago e Jos, irmos de Jesus (Mt 13,55), so os filhos de uma Maria discpula de
Cristo709 que significativamente designada como a outra Maria (Mt 28,1). Trata-se de
parentes prximos de Jesus, consoante uma expresso conhecida do Antigo
Testamento710.
Jesus o Filho nico de Maria. Mas a maternidade espiritual de Maria711 estende-se a
todos os homens que Ele veio salvar: Ela gerou seu Filho, do qual Deus fez o primognito
entre uma multido de irmos (Rm 8,29), isto , entre os fiis, em cujo nascimento e
educao Ela coopera com amor materno712.
A MATERNIDADE VIRGINAL DE MARIA NO DESGNIO DE DEUS
O olhar da f pode descobrir, tendo em mente o conjunto da Revelao, as razes
misteriosas pelas quais Deus, em seu desgnio salvfico, quis que seu Filho nascesse de
uma virgem. Essas razes tocam tanto a pessoa e a misso redentora de Cristo quanto o
acolhimento desta misso por Maria em favor de todos os homens:
A virgindade de Maria manifesta a iniciativa absoluta de Deus na Encarnao. Jesus tem
um s Pai: Deus713. A natureza humana que ele assumiu nunca o afastou do Pai...; por
natureza, Filho de seu Pai, segundo a divindade; por natureza, Filho de sua Me, segundo
a humanidade; mas propriamente Filho de Deus em suas duas naturezas714.
Jesus concebido pelo poder do Esprito Santo no seio da Virgem Maria, pois ele o Novo
Ado715 que inaugura a nova criao: O primeiro homem, tirado da terra, terrestre; o
segundo homem vem do Cu (1Cor 15,47). A humanidade de Cristo , desde a sua
concepo, repleta do Esprito Santo, pois Deus lhe d o Esprito sem medida (Jo 3,34).
da plenitude dele, cabea da humanidade remida716, que ns recebemos graa por
graa (Jo 1,16).

697
Jo, 1,13.
698
Ad Smyrn. I-II.
699
Cf. Mt 1,18-25; Lc 1,26-38.
700
Cf. Lc 1,34.
701
Cf. S. Justino, Dialogus cum Tryphone Iudaeo, 66-67: CA 2, 234-236 (PG 6,628-629); Orgenes, Contra Celsum, 1,32: SC 132, 162-164 (PG 8,720-724); ibid., 1,69: SC 132, 270 (PG
8,788-789); et alii.
702
DS 3016.
703
Sto. Incio de Antioquia, Ad Eph. 19,1; SC 10bis, 74 (Funk, 1,228); cf. 1Cor 2,8.
704
CF. DS 427.
705
Cf. DS 291; 294; 442; 503; 571; 1880.
706
LG 57.
707
Cf. LG 52.
708
Cf. Mc 3,31-35; 6,3; 1Cor 9,5; Gl 1,19.
709
Cf. Mt 27,56.
710
Cf. Gn 13,8; 14,16; 29,15 etc.
711
Cf. Jo 19,26-27; Ap 12,17.
712
LG 63.
713
Cf. Lc 2,48-49.
714
Conc. de Friuli em 796: DS 619.
715
Cf. 1Cor 15,45.
716
Cf. Cl 1,18.
Jesus, o Novo Ado, inaugura por sua concepo virginal o novo nascimento dos filhos de
adoo no Esprito Santo pela f. Como se far isto (Lc 1,34)717. A participao na vida
divina no vem do sangue, nem de uma vontade da carne, nem de uma vontade do
homem, mas de Deus (Jo 1,13). O acolhimento desta vida virginal, pois esta
totalmente dada pelo Esprito ao homem. O sentido esponsal da vocao humana em
relao a Deus718 realizado perfeitamente na maternidade virginal de Maria.
Maria virgem porque sua virgindade o sinal de sua f, absolutamente livre de qualquer
dvida719, e de sua doao sem reservas vontade de Deus720. sua f que lhe concede
tornar-se a Me do Salvador: Beatior est Maria percipiendo fidem Chrisi quam concipiendo
carnem Christi Maria mais bem-aventurada recebendo a f de Cristo do que
concebendo a carne de Cristo721
Maria ao mesmo tempo Virgem e Me por ser a figura e a mais perfeita realizao da
Igreja722. A Igreja... torna-se tambm ela Me por meio da palavra de Deus que ela
recebe na f, pois pela pregao e pelo Batismo ela gera para a vida nova e imortal os
filhos concebidos do Esprito Santo e nascidos de Deus. Ela tambm a virgem que
guarda, ntegra e puramente, a f dada a seu Esposo723.
RESUMINDO
Na descendncia de Eva, Deus escolheu a Virgem Maria para ser a Me de seu Filho.
Cheia de graa, ela o fruto mais excelente da Redeno724. Desde o primeiro instante
e sua concepo, foi totalmente preservada da mancha do pecado original e permaneceu
pura de todo pecado pessoal ao longo de toda a sua vida.
Maria verdadeiramente Me de Deus, visto ser a Me do Filho Eterno de Deus feito
homem, que ele mesmo Deus.
Maria permaneceu Virgem concebendo seu Filho, Virgem ao d-lo luz, Virgem ao
carreg-lo, Virgem ao aliment-lo de seu seio, Virgem sempre725: com todo o seu ser Ela
a Serva do Senhor (Lc 1,38).
A Virgem Maria cooperou para a salvao humana com livre f e obedincia726.
Pronunciou seu fiat (faa-se) em representao de toda a natureza humana727. Por sua
obedincia, tornou-se a nova Eva, Me dos viventes.
PARGRAFO 3
OS MISTRIOS DA VIDA DE CRISTO
No tocante vida de Cristo, o Smbolo da F fala somente dos mistrios da Encarnao
(Conceio e Nascimento) e de Pscoa (Paixo, Crucifixo, Morte, Sepultamento, Descida
aos Infernos, Ressurreio, Ascenso). No diz nada, explicitamente, dos mistrios da vida
oculta e pblica de Jesus. Mas os artigos da f referentes Encarnao e Pscoa de
Jesus iluminam toda a vida terrestre de Cristo. Tudo o que Jesus fez e ensinou, desde o
comeo at o dia em que foi arrebatado (At 1,1-2), deve ser visto luz dos mistrios do
Natal e da Pscoa.
A Catequese, conforme as circunstncias, h de desenvolver toda a riqueza dos Mistrios
de Jesus. Aqui suficiente indicar alguns elementos comuns a todos os mistrios da vida
de Cristo (I), para em seguida esboar os principais mistrios da vida oculta (II) e pblica
(III) de Jesus.
Toda a vida de Cristo mistrio
Muitas coisas que interessam curiosidade humana acerca de Jesus no figuram nos
Evangelhos. Quase nada dito sobre sua vida em Nazar, e mesmo uma grande parte de
sua vida pblica no relatada728. O que foi escrito nos Evangelhos foi para crerdes que
Jesus o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome (Jo
20,31).
Os Evangelhos foram escritos por homens que estiveram entre os primeiros a ter a f729 e
que queriam compartilh-la com outros. Depois de terem conhecido na f quem Jesus,
puderam ver e fazer ver os traos de seu mistrio em toda a sua vida terrestre.. Desde os
paninhos de sua natividade730 at o vinagre de sua Paixo731 e o sudrio de sua
Ressurreio732, tudo na vida de Jesus sinal de seu Mistrio. Por meio de seus gestos, de
seus milagres, de suas palavras, foi revelado que nele habita corporalmente toda a
plenitude da divindade (Cl 2,9). Sua humanidade aparece, assim, como o sacramento,

717
Cf. Jo 3,9.
718
Cf. 2Cor 11,2.
719
LG 63.
720
Cf. 1Cor 7,34-35.
721
Sto. Agostinho, De sancta virginitate, 3: PL 40,398.
722
Cf. LG 63.
723
LG 64.
724
SC 103.
725
Sto. Agostinho, Serm., 186, 1: PL 38,999.
726
LG 56.
727
Sto. Toms de Aquino, S. Th. III, 30,1.
728
Cf. Jo 20,30.
729
Cf. Mc 1,1; Jo 21,24.
730
Cf. Lc 2,7.
731
Cf. Mt 27,48.
732
Cf. Jo 20,7.
isto , o sinal e o instrumento de sua divindade e da salvao que ele traz: o que havia de
visvel em sua vida terrestre apontava para o mistrio invisvel de sua filiao divina e de
sua misso redentora.
OS TRAOS COMUNS DOS MISTRIOS DE JESUS
Toda a vida de Cristo Revelao do Pai: suas palavras e seus atos, seus silncios e seus
sofrimentos, sua maneira de ser e de falar. Jesus pode dizer:Quem me v, v o Pai (Jo
14,9); e o Pai pode dizer: Este o meu Filho, o Eleito; ouvi-o (Lc 9,35). Tendo Nosso
Senhor se feito homem para cumprir a vontade do Pai733, os mnimos traos de seus
mistrios nos manifestam o amor de Deus por ns734.
Toda a vida de Cristo mistrio de Redeno. A Redeno nos vem antes de tudo pelo
sangue da Cruz735, mas este mistrio est em ao em toda a vida de Cristo: j em sua
Encarnao, pela qual, fazendo-se pobre, nos enriqueceu por sua pobreza736; em sua vida
oculta, que, por sua submisso737, serve de reparao para nossa insubmisso; em sua
palavra, que purifica seus ouvintes738; em suas curas e em seus exorcismos, pelos quais
levou nossas fraquezas e carregou nossas doenas (Mt 8,17)739; em sua Ressurreio,
pela qual nos justifica740.
Toda a vida de Cristo mistrio de Recapitulao. Tudo o que Jesus fez, disse e sofreu
tinha por meta restabelecer o homem cado em sua vocao primeira:
Quando ele se encarnou e se fez homem, recapitulou em si mesmo a longa histria dos
homens e, em resumo, nos proporcionou a salvao, de sorte que aquilo que havamos
perdido em Ado, isto , sermos imagem e semelhana de Deus, o recuperamos em
Cristo Jesus741. , alis, por isso que Cristo passou por todas as idades da vida, restituindo
com isto a todos os homens a comunho com Deus742.
NOSSA COMUNHO COM OS MISTRIOS DE JESUS
Toda a riqueza de Cristo destinada a cada homem e constitui o bem de cada um743.
Cristo no viveu sua vida para si mesmo, mas para ns, desde sua Encarnao por ns,
homens, e por nossa salvao744 at sua Morte por nossos pecados (1Cor 15,3) e sua
Ressurreio para nossa justificao (Rm 4,25). Ainda agora, Ele nosso advogado
junto do Pai (1Jo 2,1), estando sempre vivo para interceder a nosso favor (Hb 7,25).
Com tudo o que viveu e sofreu por ns uma vez por todas, Ele permanece presente para
sempre diante da face de Deus a nosso favor (Hb 9,24).
Em toda a sua vida, Jesus mostra-se como nosso modelo745. Ele o homem perfeito746
que nos convida a tornar-nos seus discpulos e a segui-lo: por seu rebaixamento, deu-nos
um exemplo a imitar747; por sua orao, atrai orao748; por sua pobreza, chama a
aceitar livremente o despojamento e as perseguies749.
Tudo o que Cristo viveu foi para que pudssemos viv-lo nele e para que Ele o vivesse em
ns. Por sua Encarnao, o Filho de Deus, de certo modo, se uniu a todo homem750. Ns
somos chamados a ser uma s coisa com Ele: Ele nos faz partilhar (comungar), como
membros de seu corpo, de tudo o que (Ele), por ns e como nosso modelo, viveu em sua
carne.
Devemos continuar e realizar em ns os estados e os mistrios de Jesus, e pedir-lhe
muitas vezes que os complete e realize em ns e em toda a sua Igreja... Pois o Filho de
Deus deseja conceder uma certa participao, e fazer como que uma extenso e
continuao de seus mistrios em ns e em toda a sua Igreja, pelas graas que quer
comunicar-nos, e pelos efeitos que quer operar em ns por esses mistrios. Por estes
meios quer realiz-los em ns751.
Os mistrios da infncia e da vida oculta de Jesus
A PREPARAO
A vinda do Filho de Deus terra um acontecimento de tal imensido que Deus quis
prepar-lo durante sculos. Ritos e sacrifcios, figuras e smbolos da Primeira Aliana752,
tudo ele faz convergir para Cristo; anuncia-o pela boca dos profetas que se sucedem em
Israel. Desperta, alm disso, no corao dos pagos a obscura expectativa desta vinda.

733
Cf. Hb 10,5-7.
734
Cf. 1Jo 4,9.
735
Cf. Ef 1,7; Cl 1,13-14 (Vulgata); 1Pd 1,18-19.
736
Cf. 2Cor 8,9.
737
Cf. Lc 2,51.
738
Cf. Jo 15,3.
739
Cf. Is 53,4.
740
Cf. Rm 4,25.
741
Sto. Irineu, Ad. haer. 3,18,1.
742
Ibid. 3,18,7; cf 2,22,4.
743
RH 11.
744
Smbolo niceno-constantinopolitano: DS 150.
745
Cf. Rm 15,5; Fl 2,5.
746
GS 38.
747
Cf. Jo 13,15.
748
Cf. Lc 11,1.
749
Cf. Mt 5,11-12.
750
GS 22,2.
751
S. Joo Eudes, Tractatus de regno Jesu. LH, Tempo comum, 33 semana, Sexta-feira, Ofcio das leituras.
752
Cf. Hb 9,15.
So Joo Batista o precursor753 imediato do Senhor, enviado para preparar-lhe o
caminho754. Profeta do Altssimo (Lc 1,76), ele supera todos os profetas755, deles o
ltimo756, inaugura o Evangelho757; sada a vinda de Cristo desde o seio de sua me758 e
encontra sua alegria em ser o amigo do esposo (Jo 3,29), que designa como o Cordeiro
de Deus que tira o pecado do mundo (Jo 1,29). Precedendo a Jesus com o esprito e o
poder de Elias (Lc 1,17), d-lhe testemunho por sua pregao, seu batismo de converso
e, finalmente, seu martrio759.
Ao celebrar cada ano a liturgia do Advento, a Igreja atualiza esta espera do Messias:
comungando com a longa preparao da primeira vinda do Salvador, os fiis renovam o
ardente desejo de sua Segunda Vinda760. Pela celebrao da natividade e do martrio do
Precursor, a Igreja se une a seu desejo: preciso que Ele cresa e que eu diminua (Jo
3,30).
O MISTRIO DO NATAL
Jesus nasceu na humildade de um estbulo, em uma famlia pobre761; as primeiras
testemunhas do evento so simples pastores. nesta pobreza que se manifesta a glria do
Cu762. A Igreja no se cansa de cantar a glria dessa noite:
Hoje a Virgem traz ao mundo o Eterno
E a terra oferece uma gruta ao Inacessvel.
Os anjos e os pastores o louvam
E os magos caminham com a estrela.
Pois Vs nascestes por ns, Menino, Deus eterno!763
Tornar-se criana em relao a Deus a condio para entrar no Reino764; para isso
preciso humilhar-se765, tornar-se pequeno; mais ainda; preciso nascer do alto (Jo 3,7),
nascer de Deus766 para tornar-nos filhos de Deus767. O mistrio do Natal realiza-se em
ns quando Cristo toma forma em ns768. O Natal o mistrio deste admirvel
intercmbio:
O admirabile commmercium! Creator generis humani, animatum corpus sumens, de
Virgine nasci dignatus est; et procedens homo sine semine, largitus est nobis suam
deitatem Admirvel intercmbio! O Criador da humanidade, assumindo corpo e alma,
dignou-se nascer de uma Virgem; e, tornando-se homem sem interveno do homem, nos
doou sua prpria divindade!769
OS MISTRIOS DA INFNCIA DE JESUS
A circunciso de Jesus, no oitavo dia depois de seu nascimento770, sinal de sua insero
na descendncia de Abrao, no povo da Aliana, de sua submisso Lei771 e de sua
capacitao para o culto de Israel, do qual participar durante toda a vida. Este sinal
prefigura a circunciso de Cristo, que o Batismo772.
A epifania a manifestao de Jesus como Messias de Israel, Filho de Deus e Salvador do
mundo. Com o Batismo de Jesus no Jordo e com as bodas de Can773, ela celebra a
adorao de Jesus pelos magos vindos do Oriente774. Nesses magos, representantes
das religies pags circunvizinhas, o Evangelho v as primcias das naes que acolhem a
Boa Nova da salvao pela Encarnao. A vinda dos magos a Jerusalm para adorar ao
Rei dos Judeus775 mostra que eles procuram em Israel, luz messinica da estrela de
Davi776, aquele que ser o Rei das naes777. Sua vinda significa que os pagos s podem
descobrir Jesus e ador-lo como Filho de Deus e Salvador do mundo voltando-se para os
judeus778 e recebendo deles sua promessa messinica, tal como est contida no Antigo
Testamento779. A Epifania manifesta que a plenitude dos pagos entra na famlia dos
patriarcas780 e adquire a dignidade israeltica781.

753
Cf. At 13,24,
754
Cf. Mt 3,3.
755
Cf. Lc 7,26.
756
Cf. Mt 11,13.
757
Cf. At 1,22; Lc 16.16.
758
Cf. Lc 1,41.
759
Cf. Mc 6,17-29.
760
Cf. Apstolos 22,17.
761
Cf. Lc 2,6-7.
762
Cf. Lc 2,8-20.
763
Kontakion de Romano, o Meldio.
764
Cf. Mt 18,3-4.
765
Cf. Mt 23,12.
766
Cf. Jo 1,13.
767
Cf. Jo 1,12.
768
Gl 4,19.
769
LH, antfona do primeiro salmo das Vsperas na Oitava do Natal (Santa Me de Deus).
770
Cf. Lc 2,21.
771
Cf. Gl 4,4.
772
Cf. Cl 2,11-13.
773
Cf. LH, antfona do Magnificat das segundas vsperas da Epifania.
774
Cf. Mt 2,1.
775
Cf. Mt 2.2.
776
Cf. Nm 24,17; Ap 22,16.
777
Cf. Nm 24,17-19.
778
Cf. Jo 4,22.
779
Cf. Mt 2,4-6.
780
S. Leo Magno, Serm. 33,3: CCL 138, 173 (PL 54,242).
781
MR, Viglia pascal 26: orao aps a terceira leitura.
A apresentao de Jesus no Templo782 mostra-o como o Primognito pertencente ao
Senhor783. Com Simeo e Ana, toda a espera do Israel que vem ao encontro de seu
Salvador (a tradio bizantina designa com este termo tal acontecimento). Jesus
reconhecido como o Messias to esperado, luz das naes e Glria de Israel, mas
tambm sinal de contradio. A espada de dor predita a Maria anuncia esta outra
oblao, perfeita e nica, da Cruz, que dar a salvao que Deus preparou diante de
todos os povos.
A fuga para o Egito e o massacre dos inocentes784 manifestam a oposio das trevas luz:
Ele veio para o que era seu e os seus no o receberam (Jo 1,11). Toda a vida de Cristo
estar sob o signo da perseguio. Os seus compartilham com Ele esta perseguio785. Sua
volta do Egito786 lembra o xodo787 e apresenta Jesus como o libertador definitivo.
OS MISTRIOS DA VIDA OCULTA DE JESUS
Durante a maior parte de sua vida, Jesus compartilhou a condio da imensa maioria dos
homens; uma vida cotidiana sem grandeza aparente, vida de trabalho manual, vida
religiosa judaica submetida Lei de Deus788, vida na comunidade. De todo este perodo -
nos revelado que Jesus era submisso a seus pais789 e que crescia em sabedoria, em
estatura e em graa diante de Deus e diante dos homens (Lc 2,52).
A submisso de Jesus sua me e a seu pai legal cumpre com perfeio o quarto
mandamento. Ela a imagem temporal de sua obedincia filial a seu Pai celeste. A
submisso diria de Jesus a Jos e a Maria anunciava e antecipava a submisso da Quinta-
feira Santa: No a minha vontade... (Lc 22,42). A obedincia de Cristo no cotidiano da
vida escondida inaugurava j a obra de restabelecimento daquilo que a desobedincia de
Ado havia destrudo790.
A vida oculta de Nazar permite a todo homem estar unido a Jesus nos caminhos mais
cotidianos da vida:
Nazar a escola na qual se comea a compreender a vida de Jesus: a escola do
Evangelho... Primeiramente, uma lio de silncio. Que nasa em ns a estima do silncio,
esta admirvel e indispensvel condio do esprito... Uma lio de vida familiar. Que
Nazar nos ensine o que a famlia, sua comunho de amor, sua beleza austera e simples,
seu carter sagrado e inviolvel... Uma lio de trabalho. Nazar, casa do Filho do
Carpinteiro, aqui que gostaramos de compreender e celebrar a lei severa e redentora
do trabalho humano... ; assim como gostaramos finalmente de saudar aqui todos os
trabalhadores do mundo inteiro e mostrar-lhes seu grande modelo, seu irmo divino791.
O reencontro de Jesus no Templo792 o nico acontecimento que rompe o silncio dos
Evangelhos sobre os anos ocultos de Jesus. Nele Jesus deixa entrever o mistrio de sua
consagrao total a uma misso decorrente de sua filiao divina: No sabeis que devo
ocupar-me com as coisas de meu Pai? (Lc 2,49). Maria e Jos no compreenderam esta
palavra, mas a acolheram na f, e Maria guardava a lembrana de todos esses fatos em
seu corao (Lc 2,51), ao longo dos anos em que Jesus permanecia mergulhado no
silncio de uma vida ordinria.
Os mistrios da vida pblica de Jesus
O BATISMO DE JESUS
A vida pblica de Jesus tem incio793 com seu Batismo por Joo no rio Jordo794. Joo
Batista proclamava um batismo de arrependimento para a remisso dos pecados (Lc
3,3). Uma multido de pecadores, de publicanos e soldados795, fariseus e saduceus796 e
prostitutas797 vem fazer-se batizar por ele. Jesus aparece, o Batista hesita, mas Jesus
insiste. E Ele recebe o Batismo. Ento o Esprito Santo, sob forma de pomba, vem sobre
Jesus, e a voz do cu proclama: Este o meu Filho bem-amado (Mt 3,13-17). a
manifestao (Epifania) de Jesus como Messias de Israel e Filho de Deus.
O Batismo de Jesus , da parte dele, a aceitao e a inaugurao de sua misso de Servo
sofredor. Deixa-se contar entre os pecadores798; , j, o Cordeiro de Deus que tira o
pecado do mundo (Jo 1,29), antecipa j o Batismo de sua morte sangrenta799. Vem, j,
cumprir toda a justia (Mt 3,15), ou seja, submete-se por inteiro vontade de seu Pai:
aceita por amor este batismo de morte para a remisso de nossos pecados800. A esta

782
Cf. Lc 2,22-39.
783
Cf. Ex 13,12-13.
784
Cf. Mt 2,13-18.
785
Cf. Jo 15,20.
786
Cf. Mt 2,15.
787
Cf. Os 11,1.
788
Cf. Gl 4,4.
789
Cf. Lc 2,51.
790
Cf. Rm 5,19.
791
Paulo VI, discurso de 5 de janeiro de 1964, em Nazar.
792
Cf. Lc 2,41-52.
793
Cf. Lc 3,23.
794
Cf. At 1,22.
795
Cf. Lc 3,10-14.
796
Cf. Mt 3,7.
797
Cf. Mt 21,32.
798
Cf. Is 53,12.
799
Cf. Mc 10,38; Lc 12,50.
800
Cf. Mt 26,39.
aceitao responde a voz do Pai, que coloca toda a sua complacncia em seu Filho801. O
Esprito que Jesus possui em plenitude desde a sua concepo vem repousar sobre
Ele802. Jesus ser a fonte do Esprito para toda a humanidade. No Batismo de Jesus,
abriram-se os Cus (Mt 3,16) que o pecado de Ado havia fechado; e as guas so
santificadas pela descida de Jesus e do Esprito, preldio da nova criao.
Pelo Batismo, o cristo sacramentalmente assimilado a Jesus, que antecipa em seu
Batismo a sua Morte e a sua Ressurreio; deve entrar neste mistrio de rebaixamento
humilde e de arrependimento, descer gua com Jesus para subir novamente com ele,
renascer da gua e do Esprito para tornar-se, no Filho, filho bem-amado do Pai e viver
em uma vida nova (Rm6,4):
Sepultemo-nos com Cristo pelo Batismo, para ressuscitar com Ele; desamos com Ele,
para ser elevados com Ele; subamos novamente com Ele, para ser glorificados nele803.
Tudo o que aconteceu com Cristo d-nos a conhecer que, depois da imerso na gua, o
Esprito Santo voa sobre ns do alto do Cu e que, adotados pela Voz do Pai, nos tornamos
filhos de Deus804.
A TENTAO DE JESUS
Os Evangelhos falam de um tempo de solido de Jesus no deserto, imediatamente aps
seu Batismo por Joo: Levado pelo Esprito ao deserto, Jesus ali fica quarenta dias sem
comer, vive com os animais selvagens e os anjos que o servem805. No final dessa
permanncia, Satans o tenta por trs vezes, procurando questionar sua atitude filial para
com Deus. Jesus rechaa esses ataques que recapitulam as tentaes de Ado no Paraso e
de Israel no deserto, e o Diabo afasta-se dele at o tempo oportuno (Lc 4,13).
Os evangelistas assinalam o sentido salvfico desse acontecimento misterioso. Jesus o
novo Ado, que ficou fiel onde o primeiro sucumbiu tentao. Jesus cumpre perfeio a
vocao de Israel: contrariamente aos que provocaram outrora a Deus durante quarenta
anos no deserto806, Cristo se revela como o Servo de Deus totalmente obediente vontade
divina. Nisso Jesus vencedor do Diabo: ele amarrou o homem forte para retomar-lhe a
presa807. A vitria de Jesus sobre o tentador no deserto antecipa a vitria da Paixo,
obedincia suprema de seu amor filial ao Pai.
A tentao de Jesus manifesta a maneira que o Filho de Deus tem de ser Messias o
oposto da que lhe prope Satans e que os homens808 desejam atribuir-lhe. por isso que
Cristo venceu o tentador por ns: Pois no temos um sumo sacerdote incapaz de
compadecer-se de nossas fraquezas, pois Ele mesmo foi provado em tudo como ns, com
exceo do pecado (Hb 4,15). A Igreja se une a cada ano, mediante os quarenta dias da
Grande Quaresma, ao mistrio de Jesus no deserto.
O REINO DE DEUS EST BEM PRXIMO
Depois que Joo foi preso, Jesus veio para a Galilia proclamando, nestes termos, o
Evangelho de Deus: Cumpriu-se o tempo e o Reino de Deus est prximo. Convertei-vos e
crede no Evangelho (Mc 1,14-15). Para cumprir a vontade do Pai, Cristo inaugurou o
Reino dos cus na terra809. Ora, a vontade do Pai elevar os homens participao da
Vida Divina810. Realiza tal intento reunindo os homens em torno de seu Filho, Jesus Cristo.
Esta reunio a Igreja, que na terra o germe e o comeo do Reino de Deus811.
Cristo est no centro do congraamento dos homens na famlia de Deus. Convoca-os
junto a si por sua palavra, por seus sinais que manifestam o reino de Deus, pelo envio de
seus discpulos. Realizar a vinda de seu Reino sobretudo pelo grande mistrio de sua
Pscoa: sua morte na Cruz e sua Ressurreio. E eu, quando for elevado da terra, atrairei
todos a mim (Jo 12,32). A esta unio com Cristo so chamados todos os homens812.
O ANNCIO DO REINO DE DEUS
Todos os homens so chamados a entrar no Reino. Anunciado primeiro aos filhos de
Israel813, este Reino messinico est destinado a acolher os homens de todas as naes814.
Para ter acesso a ele, preciso acolher a palavra de Jesus:
Pois a palavra do Senhor comparada semente semeada no campo: os que ouvem com
f e so contados no nmero da pequena grei de Cristo receberam o prprio Reino; depois,
por sua prpria fora, a semente germina e cresce at o tempo da messe815.

801
Lc 3,22.; Is 42,1.
802
Cf. Jo 1,32-33; Is 11,2.
803
S. Gregrio Nazianzeno, Orationes, 40,9: PG 36,369B.
804
Sto. Hilrio, In Ev. Matthaei 2,6: SC 254, 110 (PL 9,927).
805
Cf. Mc 1,13.
806
Cf. Sl 95,10.
807
Cf. Mc 3,27.
808
Cf. Mt 16,21-23.
809
LG 3.
810
LG 2.
811
LG 5.
812
Cf. LG 3.
813
Cf. Mt 10,5-7.
814
Cf. Mt 8,11; 28,19.
815
LG 5.
O Reino pertence aos pobres e aos pequenos, isto , aos que o acolheram com um corao
humilde. Jesus enviado para evangelizar os pobres (Lc 4,18)816. Declara-os bem-
aventurados, pois o Reino dos Cus deles (Mt 5,3); foi aos pequenos que o Pai se
dignou revelar o que permanece escondido aos sbios e aos entendidos817. Jesus
compartilha a vida dos pobres desde a manjedoura at a cruz; conhece a fome818, a
sede819 e a indigncia820. Mais ainda: identifica-se com os pobres de todos os tipos e faz do
amor ativo para com eles a condio para se entrar em seu Reino821.
Jesus convida os pecadores mesa do Reino: No vim chamar justos, mas pecadores
(Mc 2,17)822. Convida-os converso, sem a qual no se pode entrar no Reino, mas
mostrando-lhes, com palavras e atos, a misericrdia sem limites do Pai por eles823 e a
imensa alegria no cu por um nico pecador que se arrepende (Lc 15,7). A prova
suprema deste amor ser o sacrifcio de sua prpria vida em remisso dos pecados (Mt
26,28).
Jesus convida a entrar no Reino por meio das parbolas, trao tpico de seu
ensinamento824. Por elas, convida ao festim do Reino825, mas exige tambm uma opo
radical: para adquirir o Reino, preciso dar tudo826; as palavras no bastam, so
necessrios atos827. As parbolas so como espelhos para o homem: este acolhe a palavra
como um solo duro ou como uma terra boa828? Que faz ele dos talentos recebidos829. Jesus
e a presena do Reino neste mundo esto secretamente no corao das parbolas.
preciso entrar no Reino, isto , tornar-se discpulos de Cristo para conhecer os mistrios
do Reino dos Cus (Mt 13,11). Para os que ficam de fora (Mc 4,11), tudo permanece
enigmtico830
OS SINAIS DO REINO DE DEUS
Jesus acompanha suas palavras com numerosos milagres, prodgios e sinais (At 2,22)
que manifestam que o Reino est presente nele. Atestam que Jesus o Messias
anunciado831.
Os sinais operados por Jesus testemunham que o Pai o enviou832. Convidam a crer nele833.
Aos que a Ele se dirigem com f, concede o que pedem834. Assim, os milagres fortificam a
f naquele que realiza as obras de seu Pai: testemunham que Ele o Filho de Deus835. Eles
podem tambm ser ocasio de escndalo836. No se destinam a satisfazer a curiosidade e
os desejos mgicos. Apesar de seus milagres to evidentes, Jesus rejeitado por
alguns837; acusam-no at de agir por intermdio dos demnios838.
Ao libertar certas pessoas dos males terrestres da fome839, da injustia840, da doena e da
morte841, Jesus operou sinais messinicos; no veio, no entanto, para abolir todos os
males da terra842, mas para libertar os homens da mais grave das escravides, a do
pecado843, que os entrava em sua vocao de filhos de Deus e causa todas as suas
escravides humanas.
O advento do Reino de Deus a derrota do reino de Satans844: Se pelo Esprito de
Deus que eu expulso os demnios, ento o Reino de Deus j chegou a vs (Mt 12,28). Os
exorcismos de Jesus libertam homens do domnio dos demnios845. Antecipam a grande
vitria de Jesus sobre o prncipe deste mundo846. pela Cruz de Cristo que o Reino de
Deus ser definitivamente estabelecido: Regnavit a ligno Deus Deus reinou do alto do
madeiro847.
AS CHAVES DO REINO
Desde o incio de sua vida pblica, Jesus escolhe homens em nmero de doze para estar
com ele e para participar de sua misso848; d-lhes participao em sua autoridade e

816
Cf. Lc 7,22.
817
Cf. Mt 11,25.
818
Cf. Mc 2,23-26; Mt 21,18.
819
Cf. Jo 4,6-7; 19,28.
820
Cf. Lc 9,58.
821
Cf. Mt 25,31-46.
822
Cf. 1Tm 1,15.
823
Cf. Lc 15,11-32.
824
Cf. Mc 4,33-34.
825
Cf. Mt 22,1-14.
826
Cf. Mt 13,44-45.
827
Cf. Mt 21,28-32.
828
Cf. Mt 13,3-9.
829
Cf. Mt 25,14-30.
830
Cf. Mt 13,10-15.
831
Cf. Lc 7,18-23.
832
Cf. Jo 5,36; 10,25.
833
Cf. Jo 10,38.
834
Cf. Mc 5,25-34; 10,52 etc.
835
Cf. Jo 10,31-38.
836
Cf. Mt 11,6.
837
Cf. Jo 11,47-48.
838
CF. Mc 3,22.
839
Cf. Jo 6,5-15.
840
Cf. Lc 19,8.
841
Cf. Mt 11,5.
842
Cf. Lc 12,13.14; Jo 18,36.
843
Cf. Jo 8,34-36.
844
Cf. Mt 12,26.
845
Cf. Lc 8,26-39.
846
Cf. Jo 12,31.
847
Hino Vexilla Regis.
848
Cf. Mc 3,13-19.
enviou-os a proclamar o Reino de Deus e a curar (Lc 9,2). Permanecem eles para sempre
associados ao Reino de Cristo, pois Jesus dirige a Igreja por intermdio deles:
Disponho para vs o Reino, como meu Pai o disps para mim, a fim de que comais e
bebais minha mesa em meu Reino, e vos senteis em tronos para julgar as doze tribos de
Israel (Lc 22,29-30).
No colgio dos Doze, Simo Pedro ocupa o primeiro lugar849. Jesus confiou-lhe uma misso
nica. Graas a uma revelao vinda do Pai, Pedro havia confessado: Tu s o Cristo, o
Filho do Deus vivo (Mt 16,16). Nosso Senhor lhe declara na ocasio: Tu s Pedro, e
sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as Portas do Inferno nunca prevalecero contra
ela (Mt 16,18). Cristo, Pedra viva850, garante a sua Igreja construda sobre Pedro a
vitria sobre as potncias de morte. Pedro, em razo da f por ele confessada,
permanecer como a rocha inabalvel da Igreja. Ter por misso defender esta f de todo
desfalecimento e confirmar nela seus irmos851.
Jesus confiou a Pedro uma autoridade especfica: Eu te darei as chaves do Reino dos
Cus: o que ligares na terra ser ligado nos Cus, e o que desligardes na terra ser
desligado nos Cus (Mt 16,19). O poder das chaves designa a autoridade para governar
a casa de Deus, que a Igreja. Jesus, o Bom Pastor (Jo 10,11), confirmou este encargo
depois de sua Ressurreio: Apascenta as minhas ovelhas (Jo 21,15-17). O poder de
ligar e desligar significa a autoridade para absolver os pecados, pronunciar juzos
doutrinais e tomar decises disciplinares na Igreja. Jesus confiou esta autoridade Igreja
pelo ministrio dos apstolos852 e particularmente de Pedro, o nico ao qual confiou
explicitamente as chaves do Reino.
UM ANTEGOZO DO REINO: A TRANSFIGURAO
A partir do dia em que Pedro confessou que Jesus o Cristo, o Filho de Deus vivo, o
Mestre comeou a mostrar a seus discpulos que era necessrio que fosse a Jerusalm e
sofresse... que fosse morto e ressurgisse ao terceiro dia (Mt 16,21): Pedro rechaa este
anncio853, os demais tambm no o compreendem854. neste contexto que se situa o
episdio misterioso da Transfigurao de Jesus855 sobre um monte elevado, diante de trs
testemunhas escolhidas por ele: Pedro, Tiago e Joo. O rosto e as vestes de Jesus tornam-
se fulgurantes de luz, Moiss e Elias aparecem, falavam de sua partida que iria se
consumar em Jerusalm (Lc 9,31). Uma nuvem os cobre e uma voz do cu diz: Este o
meu Filho, o Eleito; ouvi-o (Lc 9,35).
Por um instante, Jesus mostra sua glria divina, confirmando, assim, a confisso de Pedro.
Mostra tambm que, para entrar em sua glria (Lc 24,26), deve passar pela Cruz em
Jerusalm. Moiss e Elias haviam visto a glria de Deus sobre a Montanha; a Lei e os
profetas tinham anunciado os sofrimentos do Mestre856. A Paixo de Jesus sem dvida a
vontade do Pai: o Filho age como servo de Deus857. A nuvem indica a presena do Esprito
Santo: Tota Trinitas apparuit: Pater in voc; Filius in homine, Spiritus in nube clara A
Trindade inteira apareceu: o Pai, na voz; o Filho, no homem; o Esprito, na nuvem
clara858:
Vs vos transfigurastes na montanha e, porquanto eram capazes, vossos discpulos
contemplaram vossa Glria, Cristo Deus, para que, quando vos vissem crucificado,
compreendessem que vossa Paixo era voluntria e anunciassem ao mundo que vs sois
verdadeiramente a irradiao do Pai859.
No limiar da vida pblica, o Batismo; no limiar da Pscoa, a Transfigurao. Pelo Batismo
de Jesus declaratum fuit mysterium primae regenerationis foi manifestado o mistrio da
primeira regenerao: o nosso Batismo; a Transfigurao est sacramentum secundae
regenerationis o sacramento da segunda regenerao: a nossa prpria ressurreio860.
Desde j participamos da Ressurreio do Senhor pelo Esprito Santo que age nos
sacramentos do Corpo de Cristo. A Transfigurao d-nos um antegozo da vinda gloriosa
do Cristo, que transfigurar nosso corpo humilhado, conformando-o ao seu corpo
glorioso (Fl 3,21). Mas ela nos lembra tambm que preciso passarmos por muitas
tribulaes para entrarmos no Reino de Deus (At 14,22):
Pedro ainda no tinha compreendido isso ao desejar viver com Cristo sobre a montanha861.
Ele reservou-te isto, Pedro, para depois da morte. Mas agora Ele mesmo diz: Desce para
sofrer na terra, para servir na terra, para ser desprezado, crucificado na terra. A Vida

849
Cf. Mc 3,16; 9,2; Lc 24,34; 1Cor 15,5.
850
Cf. 1Pd 2,4.
851
Cf. Lc 22,32.
852
Cf. Mt 18,18.
853
Cf. Mt 16,22-23.
854
Cf. Mt 17,23: Lc 9,45.
855
Cf. Mt 17,1-8 par.; 2Pd 1,16-18.
856
Cf. Lc 24,27.
857
Cf. Is 42,1.
858
Sto. Toms de Aquino, S. Th III, 45,4, ad 2.
859
Liturgia bizantina, Kontakion da festa da Transfigurao.
860
Sto. Toms de Aquino, S. Th. III, 45,4, ad 2.
861
Cf. Lc 9,33.
desce para fazer-te matar; o Po desce para ter fome; o Caminho desce para cansar-se da
caminhada; a Fonte desce para ter sede; e tu recusas sofrer?862
A SUBIDA DE JESUS A JERUSALM
Ora, quando se completaram os dias de sua elevao, Jesus tomou resolutamente o
caminho de Jerusalm (Lc 9,51)863. Com esta deciso, indicava que subia a Jerusalm
pronto para morrer. Por trs vezes tinha anunciado sua Paixo e sua Ressurreio864. Ao
dirigir-se para Jerusalm, disse: No convm que um profeta perea fora de Jerusalm
(Lc 13,33).
Jesus lembra o martrio dos profetas que tinham sido mortos em Jerusalm865. Todavia,
persiste em convidar Jerusalm a congregar-se em torno dele: Quantas vezes quis eu
ajuntar os teus filhos, como a galinha recolhe seus pintinhos debaixo das asas... e no o
quiseste (Mt 23,37b). Quando Jerusalm est vista, chora sobre ela866 e exprime uma
vez mais o desejo de seu corao: Ah! Se neste dia tambm tu conhecesses a mensagem
de paz! Agora, porm, isto est escondido a teus olhos (Lc 19,42).
A ENTRADA MESSINICA DE JESUS EM JERUSALM
Como vai Jerusalm acolher seu Messias? Embora sempre se tivesse subtrado s
tentativas populares de faz-lo rei867, Jesus escolhe o momento e prepara os detalhes de
sua entrada messinica na cidade de Davi, seu pai (Lc 1,32)868. aclamado como o filho
de Davi, aquele que traz a salvao (Hosana quer dizer salva-nos!, d a salvao!).
Ora, o Rei da Glria (Sl 24,7-10) entra em sua cidade montado em um jumento (Zc
9,9): no conquista a Filha de Sio, figura de sua Igreja, pela astcia nem pela violncia,
mas pela humildade que d testemunho da Verdade869. Por isso os sditos de seu Reino,
nesse dia, so as crianas870 e os pobres de Deus, que o aclamam como os anjos o
anunciaram aos pastores871. A aclamao deles Bendito seja o que vem em nome do
Senhor (Sl 118,26) retomada pela Igreja no Sanctus da liturgia eucarstica, para
abrir o memorial da Pscoa do Senhor.
A entrada de Jesus em Jerusalm manifesta a vinda do Reino que o Rei-Messias vai
realizar pela Pscoa de sua Morte e de sua Ressurreio. com sua celebrao no
Domingo de Ramos, que a liturgia da Igreja abre a grande Semana Santa.
RESUMINDO
Toda a vida de Cristo foi um contnuo ensinamento: seus silncios, seus milagres, seus
gestos, sua orao, seu amor ao homem, sua predileo pelos pequenos e pelos pobres, a
aceitao do sacrifcio total na Cruz pela redeno do mundo, sua Ressurreio constituem
a atuao de sua palavra e o cumprimento da Revelao872.
Os discpulos de Cristo devem conformar-se com Ele at Ele se formar neles873. por isso
que somos inseridos nos mistrios de sua vida, com Ele configurados, com Ele mortos e
com Ele ressuscitados, at que com Ele reinemos874.
Seja pastor, seja mago, no se pode atingir a Deus na terra seno ajoelhando-se diante da
manjedoura de Belm e adorando-o escondido na fraqueza de uma criana.
Por sua submisso a Maria e Jos, assim como por seu humilde trabalho durante longos
anos em Nazar, Jesus nos d o exemplo da santidade na vida cotidiana da famlia e do
trabalho.
Desde o incio de sua vida pblica, em seu Batismo, Jesus o Servo, inteiramente
consagrado obra redentora que se realizar pelo Batismo de sua paixo.
A tentao no deserto mostra Jesus, Messias humilde que triunfa sobre Satans por sua
total adeso ao desgnio de salvao querido pelo Pai.
O Reino dos cus foi inaugurado na terra por Cristo. Manifesta-se lucidamente aos
homens na palavra, nas obras e na presena de Cristo875. A Igreja o germe e o comeo
deste Reino. Suas chaves so confiadas a Pedro.
A Transfigurao de Jesus tem por finalidade fortificar a f dos apstolos em vista da
Paixo: a subida elevada montanha prepara a subida ao Calvrio. Cristo, Cabea da
Igreja, manifesta o que seu Corpo contm e irradia nos sacramentos a esperana da
Glria (Cl 1,27)876.

862
Sto. Agostinho, Serm. 78,6: PL 38,492-493.
863
Cf. Jo 13,1.
864
Cf. Mc 8,31-33; 9,31-32; 10,32-34.
865
Cf. Mt 23,37a.
866
Cf. Lc 19,41.
867
Cf. Jo 6,15.
868
Cf. Mt 21,1-11.
869
Cf. Jo 18,37.
870
Cf. Mt 21,15-16; Sl 8,3.
871
Cf. Lc 19,38; 2,14.
872
CT 9.
873
Cf. Gl 4,19.
874
LG 7.
875
LG 5.
876
Cf. S. Leo Magno, Serm. 51,3: PL 54,310 C.
Jesus subiu voluntariamente a Jerusalm, embora soubesse que l morreria de morte
violenta por causa da contradio por parte dos pecadores877.
A entrada de Jesus em Jerusalm manifesta a vinda do Reino que o Rei-Messias, acolhido
em sua cidade pelas crianas e pelos humildes de corao, vai realizar por meio da Pscoa
de sua Morte e Ressurreio.

161-186
ARTIGO 4
JESUS CRISTO PADECEU SOB PNCIO PILATOS, FOI CRUCIFICADO, MORTO E SEPULTADO
571. O mistrio pascal da Cruz e da Ressurreio de Cristo est no centro da Boa Nova que
os apstolos e a Igreja, na esteira deles, devem anunciar ao mundo. O projeto salvador de
Deus realizou-se uma vez por todas (Hb 9,26) pela morte redentora de seu Filho, Jesus
Cristo.
572. A Igreja permanece fiel interpretao de todas as Escrituras dada por Jesus
mesmo antes e tambm depois de sua Pscoa878. No era preciso que Cristo sofresse tudo
isso e entrasse em sua glria? (Lc 24,26). Os sofrimentos de Jesus tomaram sua forma
histrica concreta pelo fato de ele Ter sido rejeitado pelos ancios, pelos chefes dos
sacerdotes e pelos escribas (Mc 8,31), que o entregaro aos gentios para ser
escarnecido, aoitado e crucificado (Mt 20, 29).
573. A f pode, pois, tentar perscrutar as circunstncias da Morte de Jesus, transmitidas
fielmente pelos Evangelhos879 e iluminadas por outras fontes histricas, para melhor
compreender o sentido da Redeno.
PARGRAFO 1
JESUS E ISRAEL
574. Desde o inicio do ministrio pblico de Jesus, fariseus e adeptos de Herodes, com
sacerdotes e escribas, mancomunaram-se para mat-lo880. Por causa de certos atos por ele
praticados (expulso de demnios881, perdo dos pecados882, curas em dia de sbado883,
interpretao original dos preceitos de pureza da Lei884, familiaridade com os publicanos e
com os pecadores pblicos)885, Jesus apareceu a alguns mal-intencionados, suspeito de
possesso demonaca886. Ele acusado de blasfmia887 e de falso profetismo888, crimes
religiosos que a Lei punia com a pena de morte sob forma de apedrejamento889.
575. Muitos atos e palavras de Jesus constituram, portanto, um sinal de contradio*
para as autoridades religiosas de Jerusalm que o Evangelho de S. Joo com freqncia
denominada os judeus* -- mais ainda do que para o comum do povo de Deus *. Sem
dvida, suas relaes com os fariseus no foram exclusivamente polmicas. So os
fariseus que previnem do perigo que corre. Jesus elogia alguns deles, como o escriba de
Mc 12,34, e repetida vezes come com fariseus. Jesus confirma doutrinas compartilhadas
por essa elite religiosa do povo de Deus: a ressurreio dos mortos, as formas de piedade
(esmola, jejum e orao) * e o hbito de dirigir-se a Deus como Pai, a centralidade do
mandamento do amor a Deus e ao prximo.*.
576. Aos olhos de muitos, em Israel, Jesus parece agir contra as instituies essenciais do
Povo eleito:
_ a submisso Lei na integralidade de seus preceitos escrito e, para os fariseus, na
interpretao da tradio oral; _a centralidade do Templo de Jerusalm como lugar santo,
em que Deu habita de forma privilegiada; _ a f no Deus nico, cuja glria nenhum
homem pode compartilhar.

I Jesus e a Lei
577. Jesus fez uma advertncia solene no comeo do Sermo da Montanha, em que
apresentou a Lei dada por Deus no Sinai por ocasio da Primeira Aliana luz da graa da
Nova Aliana: No penseis que vim revogar a Lei e os Profetas. No vim revog-los, mas
dar-lhes pleno cumprimento, porque em verdade vos digo que, at que passem o cu e a
terra, no ser omitido um s i, uma s virgula da Lei, sem que tudo seja realizado.
Aquele, portanto, que violar um s destes menores mandamentos e ensinar os homens a
fazerem o mesmo ser chamado o menor do Reino dos Cus; aquele, porm, que os
praticar e os ensinar, esse ser chamado de grande Reino dos Cus (Mt 5,17-19).

877
Cf. Hb 12,3.
878
Lc 24,27.44-45.
879
Cf DV 19. -
880
Cf. Mc 3,6. -
881
Cf. Mt 12,24 -
882
Cf. Mc 2,7. -
883
Cf. Mc 3,1-6. -
884
Cf. Mc 7,14-23. -
885
Cf. Mc 2,14-17 -
886
Cf. Mc 3,22; Jo 8,48; 10-,20 -
887
Cf. Mc 2,7; Jo 5,18; 10,33. -
888
Cf. Jo 7,12; 7,52
889
Cf. Jo 8,59; 10,31. -
578. Jesus, o Messias de Israel, portanto o maior no Reino dos Cus, tinha a obrigao de
cumprir a Lei, executando-a em sua integridade at seus mnimos preceitos, segundo suas
prprias palavras. Ele o nico que conseguiu cumpri-la com perfeio*. Os judeus,
conforme sua prpria confisso, nunca conseguiram cumprir a Lei em sua integridade sem
violar-lhe o mnimo preceito*. Esta a razo pela qual, em cada festa anual da Expiao,
os filhos de Israel pedem a Deus perdo por suas transgresses da Lei. Com efeito, a Lei
constitui um todo e, como recorda S. Tiago, aquele que guarda toda a Lei, mas
desobedece a um s ponto, torna-se culpado da transgresso da Lei inteira (Tg 2,10).
579. Esse princpio da integridade da observncia da Lei, no somente em sua letra, mas
em seu esprito, era caro aos fariseus. Tomando-o extensivo a Israel, levaram muitos
judeus do tempo de Jesus a um zelo religioso extremo*. Este zelo extremo, se no
quisesse envolver-se em uma casustica hipcrita*, s podia preparar o povo para essa
interveno inaudita de Deus que ser o cumprimento perfeito da Lei exclusivamente pelo
Justo em lugar de todos os pecadores*.
580. O cumprimento perfeito da Lei s podia ser obra do Legislador divino nascido sujeito
Lei na pessoa do Filho*. Em Jesus, a Lei no aparece mais gravada nas tbuas de pedra.
Mas no fundo do corao (Jr 31,33) do Servo, o qual, pelo fato de trazer fielmente o
direito (Is 42,3), se tornou a Aliana do Povo (Is 42,6). Jesus cumpriu a Lei at o ponto
de tomar sobre si a maldio da Lei* in quod illi incurrerant Qui non permanent in
omnibus, quae scripta sunt, ut faciant ea, na qual incorreram aqueles que no praticam
todos os preceitos da mesma*, pois a morte de Cristo aconteceu para resgatar as
transgresses cometidas no Regime da Primeira Aliana (Hb 9,15).
581. Jesus apareceu aos olhos dos judeus e de seus chefes espirituais como um
rabi*.Com freqncia argumentou na linha da interpretao rabnica da Lei *. Mas ao
mesmo tempo Jesus s podia chocar os doutores da Lei, j que no se contentava em
propor sua interpretao em p de igualdade com as deles, seno que ensinava como
algum que tem autoridade, e no os escribas (Mt 7,28-29). Nele, a mesma Palavra de
Deus que tinha ressoado no Sinai para dar a Moiss a Lei escrita, que se faz ouvir
novamente sobre o Monte das Bem-aventuranas*. Ela no abole a Lei, mas a cumpre,
fornecendo de modo divino a interpretao ltima dela: Aprendestes o que foi dito aos
antigos... eu, porm, vos digo (Mt5,33-34). Com esta mesma autoridade divina, Ele
desabona certas tradies humanas * dos fariseus que invalidam a Palavra de Deus*.
582. Indo mais longe, Jesus cumpre a Lei a respeito da pureza dos alimentos, to
importantes na vida diria judaica, revelando o sentido pedaggico dela * por uma
interpretao divina: Tudo o que vem de fora, entrando no homem, no pode torn-lo
impuro... _ assim declarava puros todos os alimentos. O que sai do homem, que saem
as intenes malignas (Mc 7,18-21). Ao dar com autoridade divina a interpretao
definitiva da Lei, Jesus acabou confrontando-se com certos doutores da Lei que no
aceitavam a interpretao da Lei dada por Jesus, apesar de garantia pelos sinais divinos
que acompanhavam. * Isto vale particularmente para a questo do Sbado: Jesus lembra,
muitas vezes com argumentos rabnicos, que o descanso do Sbado no lesado pelo
servio de Deus ou do prximo *, executado por meio de curas operadas por Ele.
II. Jesus e o Templo
583. Jesus, como os profetas anteriores a Ele, teve pelo Templo de Jerusalm o mais
profundo respeito. Nele foi apresentado por Jos e Maria quarenta dias aps seu
nascimento *. Com doze anos, decide ficar no Templo para lembrar a seus pais que deve
dedicar-se s coisas de seu Pai. * Durante os anos de sua vida oculta, subiu ao Templo a
cada ano, no mnimo por ocasio da Pscoa *; at seu ministrio pblico foi ritmado por
suas peregrinaes a Jerusalm para as grandes festas judaicas *.
584 Jesus subiu ao Templo como lugar privilegiado de encontro com Deus. O Templo
para ele a morada de seu Pai, uma casa de orao, e se indigna pelo fato de seu trio
externo Ter-se tornado um lugar de comrcio. * Se expulsa os vendilhes do Templo,
por amor zeloso a seu Pai. No faais da casa de meu Pai uma casa de comrcio. Seus
discpulos lembram-se do que est escrito: O zelo por tua casa me devorar (Sl 69,10)
(Jo 2,16-17). Depois de sua Ressurreio, os apstolos mantiveram um respeito religioso
pelo Templo. *
585. Contudo, no limiar de sua Paixo, Jesus anunciou a runa desse esplndido edifcio, do
qual no restar mais pedra sobre pedra. * H aqui um anncio de um sinal dos tempos
finais que vo abrir-se com sua prpria Pscoa. * Esta profecia, porm, pde ser relatada
de modo deformado por testemunhas falsas no momento do interrogatrio de Jesus diante
do sumo sacerdote, * sendo-lhe atribuda como injria quando ele foi pregado cruz. *
586. Longe de Ter sido hostil ao Templo,* local em que alis, ministrou o essencial de seu
ensinamento*, Jesus fez questo de pagar o imposto do Templo, associando a esse ato
Pedro, * que acabara de estabelecer como fundamento para sua Igreja futura.* Mais
ainda: identificou-se com o Templo ao apresentar-se como a morada definitiva de Deus
entre os homens. * Eis porque sua morte corporal decretada *anuncia a destruio do
Templo, (destruio) que manifestar a entrada em uma nova era as Histria da Salvao:
Vem a hora em que nem sobre esta montanha nem em Jerusalm adorareis o Pai ( Jo
4,21) *
III. Jesus e a f de Israel no Deus nico e Salvador
587. Se a Lei e o templo de Jerusalm puderam ser ocasio de contradio * da parte de
Jesus para as autoridades religiosas de Israel, foi o papel dele na redeno dos pecados, a
obra divina por excelncia, que constituiu para elas a verdadeira pedra de escndalo.*
588. Jesus escandalizou os fariseus ao comer com os publicanos e os pecadores * com a
mesma familiaridade com que comia com eles.* Contra os que, dentre os fariseus,
estavam convencidos de serem justos e desprezavam os outros (Lc 18,9) *, Jesus
afirmou: Eu no vim chamar os justo, mas os pecadores, ao arrependimento (Lc 5,32).
Foi mais longe ao proclamar diante dos fariseus que, sendo pecado universal, * os que
pretendem no necessitar de salvao esto cegos para sua prpria cegueira.*
589. Jesus escandalizou sobretudo porque identificou na conduta misericordiosa para com
os pecadores com a atitude do prprio Deus para eles.* Chegou ao ponto de dar a
entender que, partilhando a mesa dos pecadores,* os estava admitindo ao banquete
messinico.* Mas foi particularmente ao perdoar os pecados que Jesus deixou as
autoridades religiosas de Israel diante de um dilema. Foi isto que disseram com razo,
cheios de espanto: S Deus pode perdoar os pecados (Mc 2,7). Ao perdoar os pecados,
ou Jesus blasfema _ pois um homem que se iguala a Deus _, ou diz a verdade, e sua
pessoa torna presente e revela o Nome de Deus.*
590. Somente a identidade divina da pessoa de Jesus pode justificar uma exigncia to
absoluta quanto esta: Aquele que no est comigo est contra mim (Mt 12,30); assim,
tambm, quando diz que nele est mais do que Jonas... mais do que Salomo (Mt l2,41-
42), mais do que o Templo, * ou quando lembra, referindo-se a si mesmo, que Davi
chamou o Messias de seu Senhor*, ao afirmar Antes que Abrao fosse, Eu Sou ( Jo 8,58);
e at Eu e o pai somos um (Jo 10,30).
591. Jesus pediu s autoridades religiosas de Jerusalm que cressem nele por causa das
obras de seu Pai que se realiza. * Tal ato de f tinha de passar, no entanto, por uma
misteriosa morte de si mesmo em vista de um novo nascimento do alto,* sob o impulso
da graa divina. * Essa exigncia de converso ante um cumprimento to surpreendente
das promessas * permite compreender o trgico desprezo do sindrio ao estimar que Jesus
merecia a morte como blasfemo.* Seus membros agiam assim por ignorncia * e ao
mesmo tempo pelo endurecimento * da incredulidade. *
RESUMINDO
592. Jesus no aboliu a Lei do Sinai, mas a cumpriu * com tal perfeio * que revela seu
sentido ultimo * e resgata as transgresses contra ela. *
593. Jesus venerou o Templo, subindo a ele nas festas judaicas de peregrinao, e amou
com amor cioso esta morada de Deus entre os homens. O Templo prefigura seu prprio
mistrio. Se anuncia a destruio do Templo, como manifestao de sua prpria morte e
da entrada em uma nova era da Histria da Salvao, na qual seu Corpo ser o Templo
definitivo.
594. Jesus realizou atos _ como o perdo dos pecados _ que o manifestaram como o
prprio Deus Salvador. * Alguns judeus, no reconhecendo o Deus feito homem * e vendo
nele um homem que se faz Deus,* julgaram-no blasfemo.
PARGRAFO 2
JESUS MORREU CRUCIFICADO
I. O processo de Jesus
DISSENSES ENTRE AS AUTORIDADES JUDAICAS EM RELAO A JESUS
595. Entre as autoridades religiosas de Jerusalm no houve somente o fariseu Nicodemos
* ou o ilustre Jos de Arimatia como discpulos secretos de Jesus*, a ponto de, s
vsperas de sua Paixo, S.Joo pode dizer deles que, um bom nmero deles creu nele,
ainda que de forma bem imperfeita (Jo 12,42). Isso no tem nada de surpreendente se
levarmos em conta que no dia seguinte a Pentecostes uma multido de sacerdotes
obedecia f ( At 6,7) e que alguns do partido dos fariseus haviam abraado a f (At
15,5), a ponto de S.Tiago poder dizer a S.Paulo que zelosos partidrios da Lei, milhares
de judeus abraaram a f (At 21,20).
596. As autoridades religiosas de Jerusalm no foram unnimes na conduta a adotar em
relao a Jesus. * Os fariseus ameaaram de excomunho os que o seguirem.* Aos que
temiam que todos crero em Jesus e os romanos viro e destruiro nosso Lugar Santo e a
nao (Jo 11,48), o Sumo sacerdote Caifs props, profetizando: No compreendeis que
de vosso interesse que um s homem morra pelo povo e no parea a nao toda ? (Jo
11,50). O Sindrio depois de declarar Jesus passvel de morte* na qualidade de
blasfemador,mas tendo perdido o direito de p-lo morte, entrega Jesus aos romanos,
acusando-o de revolta poltica,*o que colocar Jesus no mesmo p que Barrabs, acusado
de sedio (Lc 23,19). So tambm ameaas polticas o que os chefes dos sacerdotes
fazem a Pilatos para que condene Jesus morte.*
OS JUDEUS NO SO COLETIVAMENTE RESPONSVEIS PELA MORTE DE JESUS
597. Levando em conta a complexidade histrica do processo de Jesus manifestada nos
relatos evanglicos, e qualquer que possa ser o pecado pessoal dos atores do processo
(Judas, o Sindrio, Pilatos), conhecido s de Deus, no se pode atribuir a responsabilidade
ao conjunto dos judeus de Jerusalm, a despeito dos gritos de uma multido manipulada *
e das censuras globais contidas nos apelos converso depois de Pentecostes.*O prprio
Jesus, ao perdoar na cruz,* e Pedro, depois dele, apelaram para a ignorncia* dos
judeus de Jerusalm e at dos chefes deles. Menos ainda pode-se, a partir do grito do
povo: Seu sangue caia sobre ns e sobre nossos filhos(Mt 27,25), que significa uma
frmula de ratificao,* estender a responsabilidade aos outros judeus no espao e no
tempo. Por isso a Igreja declarou muito oportunamente o Conclio Vaticano II: Aquilo que
se perpetrou em sua Paixo no pode indistintamente ser imputado a todos os judeus que
viviam ento, nem aos de hoje... Os judeus no devem ser apresentados nem como
condenados por Deus nem como amaldioados, como se isto decorresse das Sagradas
Escrituras.*
TODOS OS PECADORES FORAM OS AUTORES DA PAIXO DE CRISTO
598. No magistrio de sua f e no testemunho de seus santos, a Igreja nunca esqueceu
que foram os pecadores como tais os autores e como que os instrumentos de todos os
sofrimentos por que passou o Divino Redentor.* Levando em conta que nossos pecados
atingem o prprio Cristo,* a Igreja no hesita em imputar aos cristos a responsabilidade
que com excessiva freqncia estes debitaram quase exclusivamente aos judeus. Devemos
considerar como culpados desta falta horrvel os que continuam a reincidir em pecados. J
que so os nossos crimes que arrastam Nosso Senhor Jesus Cristo ao suplcio da cruz, com
certeza os que mergulham nas desordens e no mal de sua parte crucificam de novo o
Filho de Deus e o expes s injrias (Hb 6,6). E imperioso reconhecer que nosso prprio
crime, nesse caso, maior do que o dos judeus. Pois estes, como testemunha o Apstolo,
se tivessem conhecido o Rei da glria, nunca o teriam crucificado (1 Cor 2,8). Ns,
porm, fazemos profisso de conhec-lo. E quando o negamos por nossos atos, de certo
modo levantamos contra Ele nossas mos homicidas. * Os demnios, ento, no foram
eles que o crucificaram; s tu que com eles o crucificaste e continuas a crucific-lo,
deleitando-te nos vcios e nos pecados.*
II. A morte redentora de Cristo no designo divino de salvao.
JESUS ENTREGUE SEGUNDO O DESGNO BEM DETERMINADO DE DEUS
599. A morte violenta de Jesus no foi o resultado do acaso num conjunto infeliz de
circunstncias. Ela faz parte do mistrio do projeto de Deus, como explica S.Pedro aos
judeus de Jerusalm j em seu primeiro discurso de Pentecostes: Ele foi entregue
segundo o desgnio determinado e a prescincia de Deus (At 2,23). Esta linguagem bblica
no significa que os que entregaram Jesus* tenham sido apenas executores passivos de
um roteiro escrito de antemo por Deus.
600. Para Deus, todos os momentos do tempo esto presentes em sua atualidade. Ele
estabelece, portanto, seu projeto eterno de predestinao incluindo nele a resposta livre
de cada homem sua graa: De fato, contra teu servo Jesus, a quem ungiste,
verdadeiramente coligaram-se, nesta cidade, Herodes e Pncio Pilatos com as noes
pags e os povos de Israel,* para executar tudo o que, em teu poder e sabedoria, havias
predeterminado (At 4,27-28). Deus permitiu aos atos nascidos de sua cegueira, *a fim de
realizar seu projeto de salvao.
MORREU POR NOSSOS PECADOS SEGUNDO AS ESCRITURAS
601. Este projeto divino de salvao mediante a morte do Servo, o Justo * havia sido
anunciado antecipadamente na Escritura como um mistrio de redeno universal, isto ,
de resgate que liberta os homens da escravido e do pecado.* S.Paulo, em sua confisso
de f que diz Ter recebido secundun Scripturas * professa que Cristo morreu por nossos
pecados segundo as Escrituras*. A morte redentora de Jesus cumpre em particular a
profecia do Servo Sofredor.* Jesus mesmo apresentou o sentido de sua vida e de sua
morte luz do Servo Sofredor.* Aps a sua Ressurreio, ele deu esta interpretao das
Escrituras aos discpulos de Emas,* e depois aos prprios apstolos.*
AQUELE QUE NO CONHECERA O PECADO, DEUS O FEZ PECADO POR CAUSA DE NS
602. Por isso, S.Pedro pode formular assim a f apostlica no projeto divino de salvao:
Fostes resgatados da vida ftil que herdastes de vossos pais, pelo sangue precioso de
Cristo, como de um cordeiro sem defeitos e sem mcula, conhecido antes da fundao do
mundo, mas manifestado, no fim dos tempos, por causa de vs (1Pd 1,18-20). Os
pecados dos homens, depois do pecado original, so sancionados pela morte.* Ao enviar
seu prprio Filho na condio de escravo,* condio de uma humanidade decada e fadada
morte por causa do pecado*, Aquele que no conhecera o pecado, Deus o fez pecado
por causa de ns, a fim de que, por ele, nos tornemos justia de Deus (2Cor 5,21).
603. Jesus no conheceu a reprovao, como se Ele mesmo tivesse pecado.* Mas, no
amor redentor que sempre unia ao Pai,* nos assumiu na perdio de nosso pecado em
relao a Deus a ponto de poder dizer em nosso nome, na cruz: Meu Deus, meu Deus,
por que me abandonaste ? (Mc 15,34)* Tendo-o tornado solidrio de ns, pecadores,
Deus no poupou seu prprio Filho, mas o entregou por todos ns (Rm 8,32), a fim de
que fssemos reconciliados com Ele pela morte de seu Filho (Rm 5,10).
DEUS TEM A INICIATIVA DO AMOR REDENTOR UNIVERSAL
604. Ao entregar seu Filho por nossos pecados, Deus manifesta que seu desgnio sobre ns
um desgnio de amor benevolente que antecede a qualquer mrito nosso: Nisto consiste
o amor: no fomos ns que amamos a Deus, mas foi Ele quem nos amou e enviou-nos seu
Filho como vtima de expiao por nossos pecados (1 Jo 4,10).* Deus demonstra seu
amor para conosco pelo fato de Cristo Ter morrido por ns quando ramos ainda
pecadores (Rm 5,8).
605. Este amor no excluiu ningum. Jesus lembrou-o na concluso da parbola da ovelha
perdida: Assim, tambm, no da vontade de nosso Pai, que est nos cus, que um
destes pequeninos se perca (Mt 18,14). Afirma ele dar sua vida em resgate por muitos
(Mt 20,28); este ltimo termo no restritivo: ope o conjunto da humanidade nica
pessoa do Redentor que se entrega para salv-la.* A Igreja no seu seguimento dos
apstolos,* ensina que Cristo morreu por todos os homens sem exceo: No h, no
houve e no haver nenhum homem pelo qual Cristo no tenha sofrido.*
III. Cristo ofereceu-se a seu Pai por nossos pecados
TODA A VIDA DE CRISTO OFERENDA AO PAI
606. O Filho de Deus, que desceu do Cu no para fazer sua vontade, mas a do Pai que
enviou,* diz ao entrar no mundo:...Eis-me aqui... eu vim, Deus, para fazer a tua
vontade... Graas a esta vontade que somos santificados pela oferenda do corpo de
Jesus Cristo, realizada uma vez por todas (Hb 10,5-10). Desde o primeiro instante de sua
Encarnao, o Filho desposa o desgnio de salvao divino em sua misso redentora: Meu
alimento fazer a vontade daquele que me enviou a consumar sua obra (Jo 4,34) a
expresso de sua comunho de amor ao Pai: O Pai me ama porque ou a minha vida (Jo
10,17). O mundo saber que amo o Pai e fao como o Pai me ordenou ( Jo 14,31).
607. Este desejo de desposar o desgnio de amor redentor de seu Pai anima toda a vida de
Jesus,* pois sua Paixo redentora a razo de ser de sua Encarnao: Pai, salva-me
desta hora. Mas foi precisamente para esta hora que eu vim (Jo 12,27). Deixarei eu de
beber o clice que o Pai me deu ? (Jo 18,11). E ainda na cruz, antes que tudo fosse
consumado (Jo 19,30), ele disse: Tenho sede (Jo 19,28).
O COEDEIRO QUE TIRA O PECADO DO MUNDO
608. Depois de Ter aceitado dar-lhe o Batismo junto com os pecadores, * Joo Batista viu
e mostrou em Jesus o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo. * Manifesta,
assim, que Jesus s ao mesmo tempo o Servo Sofredor que se deixa levar silencioso ao
matadouro,* e carrega o pecado das multides, * e o cordeiro pascal, smbolo da redeno
de Israel por ocasio da primeira Pscoa. * Toda a vida de Cristo exprime sua misso:
Servir e dar sua vida em resgate por muitos.*
JESUS ABRAA LIVREMENTE O AMOR REDENTOR DO PAI
609. Ao abraar em seu corao humano o amor do Pai pelos homens, Jesus amou-os at
o fim (Jo 13,11), pois ningum tem maior amor do que aquele que d a vida por seus
amigos (Jo 15,13). Assim no sofrimento e na morte, sua humanidade se tornou o
instrumento livre e perfeito de seu amor divino, que quer a salvao dos homens. * Com
efeito, aceitou livremente sua Paixo e sua Morte por amor de seu Pai e dos homens, que
o Pai quer salvar: Ningum me tira a vida, mas eu a dou livremente(Jo 10,18). Da a
liberdade soberana do Filho de Deus quando Ele mesmo vai ao encontro da morte.*
NA CEIA, JESUS ANTECIPOU A OFERTA LIVRE DE SUA VIDA
610. Jesus expressou de modo supremo a oferta livre de si mesmo na refeio que tomou
com os Doze Apstolos * na noite em que foi entregue (Cor 11,23). Na vspera de sua
Paixo, quando ainda estava em liberdade, Jesus fez desta Ultima Ceia com seus apstolos
o memorial de sua oferta voluntria ao Pai * pela salvao dos homens: Isto o meu
corpo que dado por vs (Lc 22,19). Isto o meu sangue, o sangue da Aliana, que
derramado por muitos para remisso dos pecados (Mt 26,28).
611. A Eucaristia que instituiu naquele momento ser o memorial * de seu sacrifcio.
Jesus inclui os apstolos em sua prpria oferta e lhes pede que perpetuem. Com isso,
institui seus apstolos sacerdotes da Nova Aliana: Por eles, a mim mesmo me santifico,
para que sejam santificados na verdade (Jo 17,19).*
612. O clice na Nova Aliana, que Jesus antecipou na Ceia, oferecendo-se a si mesmo, *
aceita-o em seguida das mos do Pai em sua agonia no Getsmani, * tornando-se
obediente at a morte (F1 2,8). * Jesus ora: Meu Pai, se for possvel, que passe de mim
este clice... (Mt 26,39). Exprime assim o horror que a morte representa para sua
natureza humana. Com efeito, a natureza humana de Jesus, como a nossa, est destinada
Vida Eterna; alm disso, diversamente da nossa, ela totalmente isenta de pecado, *
que causa a morte; * mas ela sobretudo assumida pela pessoa divina do Prncipe da
Vida, * do vivente. * Ao aceitar em sua vontade humana que a vontade do Pai seja
feita, * aceita sua morte como redentora para carregar em seu prprio corpo os nossos
pecados sobre o madeiro (1Pd 2,24).
A MORTE DE CRISTO O SACRIFCIO NICO E DEFINITIVO
613. A morte de Cristo ao mesmo tempo o sacrifcio pascal, que realiza a redeno
definitiva dos homens* pelo cordeiro que tira o pecado do mundo,* e o sacrifcio da Nova
Aliana,* que reconduz o homem comunho com Deus* reconciliando-o com ele pelo
sangue derramado por muitos para remisso dos pecados*.
614. Este sacrifcio de Cristo nico. Ele realiza e supera todos os sacrifcios.* Ele
primeiro um Dom do prprio Deus Pai: o Pai que entrega seu Filho para reconciliar-nos
consigo.* ao mesmo tempo oferenda do Filho de Deus feito homem, o qual, livremente e
por amor,* oferece sua vida * a seu Pai pelo Esprito Santo,* para reparar nossa
desobedincia.
JESUS SUBSTITUI NOSSA DESOBEDINCIA POR SUA OBEDINCIA
615. Como pela desobedincia de um s homem todos se tornaram pecadores, assim,
pela obedincia de um s, todos se tornaro justos (Rm 5,19). Por sua obedincia at a
morte, Jesus realizou a substituio do Servo Sofredor que oferece sua vida em sacrifcio
expiatrio, quando carregava o pecado das multides, que ele justificava levando sobre
si o pecado de muitos.* Jesus prestou reparao por nossas faltas e satisfez o Pai por
nossos pecados.*
NA CRUZ, JESUS CONSUMA SEU SACRIFCIO
616. o amor at o fim* que confere o valor de redeno e preparao, de expiao e
de satisfao ao sacrifcio de Cristo. Ele nos conheceu a todos e amou na oferenda de sua
vida.* A caridade de Cristo nos compele quando consideramos que um s morreu por
todos e que, por conseguinte, todos morreram (Cor 5,14). Nenhum homem, ainda que o
mais santo, tinha condies de tomar sobre si os pecados de todos os homens e de
oferecer-se em sacrifcio por todos. A existncia em Cristo da Pessoa Divina do Filho, que
supera e, ao mesmo tempo, abraa todas as pessoas humanas, e que o constitui Cabea
de toda a humanidade, torna possvel seu sacrifcio redentor por todos.
617. Sua sanctissima passione in ligno crucis nobis iustificationem meruit _ Por sua
santssima Paixo no madeiro da cruz mereceu-nos a justificao, ensino o Concilio de
Trento,* sublinhando o carter nico do sacrifcio de Cristo como princpio de salvao
eterna*. E a Igreja venera a Cruz, cantando: O crux, ave, spes nica _ Salve Cruz,
nica esperana.*
NOSSA PARTICIPAO NO SACRIFCIO DE CRISTO
618. A Cruz o nico sacrifcio de Cristo, nico mediador entre Deus e os Homens.* Mas
pelo fato de que, em sua Pessoa Divina encarnada, de certo modo uniu a si mesmo todos
os homens, * oferece a todos os homens, de uma forma que Deus conhece, a
possibilidade de serem associados ao Mistrio Pascal.* Chama seus discpulos a tomar
sua cruz e a segui-lo,* pois sofreu por ns, deixou-nos um exemplo, a fim de que
sigamos seus passos.* Quer associar a seu sacrifcio redentor aqueles mesmos que so os
primeiros beneficirios dele. * Isto realiza-se de maneira suprema em sua Me, associada
mais intimamente do que qualquer outro ao mistrio de seu sofrimento redentor: *
Fora da Cruz no existe outra escada por onde subir ao cu.*
RESUMINDO
619. Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras ( 1 Cor 15,3).
620. Nossa salvao deriva da iniciativa de amor de Deus para conosco, pois foi Ele
quem nos amou e enviou seu Filho como vtima de expiao por nossos pecados (2 Cor
5,19).
621. Jesus ofereceu-se livremente por nossa salvao. Este Dom, ele o significa e o realiza
por antecipao durante a Ultima Ceia: Isto o meu corpo, que ser dado por vs (Lc
22,19).
622. Nisto consiste a redeno de Cristo: ele veio dar a sua vida em resgate por muitos
(Mt 20,18), isto , amar os seus at o fim (Jo 13,1), para que sejais libertados da vida
ftil que herdastes de vossos pais.*
623. Por sua obedincia de amor ao Pai, at a morte de cruz ( Fl 2,8), Jesus realizou sua
misso expiadora * do Servo Sofredor que justificar a muitos e levar sobre si as suas
transgresses *
PARGRAFO 3
JESUS CRISTO FOI SEPULTADO
624. Pela graa de Deus, Ele provou a morte em favor de todos os homens (Hb 2,9). Em
seu projeto de salvao, Deus dispos que seu Filho no somente morresse por nossos
pecados (1 Cor 15,3), mas tambm que provasse a morte, isto , conhecesse o estado
de morte, o estado de separao entre sua alma e seu corpo, durante o tempo
compreendido entre o momento em que expirou na cruz e no momento em que
ressuscitou. Este estado de Cristo morto o mistrio do sepulcro e da descida aos
Infernos. o mistrio do Sbado Santo, em que o Cristo depositado no tmulo* manifesta
o grande descanso sabtico de Deus* depois da realizao * da salvao dos homens, que
confere paz ao universo inteiro. *
CRISTO COM SEU CORPO NA SEPULTURA
625. A permanncia de Cristo no tmulo constitui o vnculo real entre o estado passvel de
Cristo antes da Pscoa e seu atual estado glorioso de Ressuscitado. a mesma pessoa do
Vivente que pode dizer: Estive morto, mas eis que estou vivo pelos sculos dos sculos
(Ap 1,18):
Deus ( o Filho ) no impediu a morte de separar a alma do corpo, segundo a ordem
necessria natureza, mas os reuniu novamente um ao outro pela Ressurreio, a fim de
ser ele mesmo em sua pessoa o ponto de encontro da morte e da vida, sustando nele a
decomposio da natureza, produzida pela morte, e tornando-se ele mesmo princpio de
reunio para as partes separadas. *
626. Visto que o Prncipe da vida que mataram * o mesmo Vivente que ressuscitou *
preciso que a Pessoa Divina do Filho de Deus tenha continuado a assumir sua alma e seu
corpo separados entre si pela morte: Pelo fato de que na morte de Cristo a alma tenha
sido separada da carne, a nica pessoa no foi dividida em duas pessoas, pois o corpo e a
alma de Cristo existiram da mesma forma desde o inicio na pessoa do Verbo; e na Morte,
embora separados um do outro, ficaram cada um com a mesma e nica pessoa do Verbo.*
NO DEIXARS TEU SANTO VER A CORRUPO
627. A Morte de Cristo foi uma Morte verdadeira enquanto ps fim `a sua existncia
humana terrestre. Mas, devido unio que a pessoa do Filho manteve com o seu corpo,
no estamos diante de um cadver como os outros, porque no era possvel que a morte
o retivesse em seu poder (At 2,24) e porque a virtude divina preservou o corpo de Cristo
da corrupo. * Sobre Cristo pode-se dizer ao mesmo tempo: ele foi eliminado da terra
dos vivos (Is 53,8) e Minha carne repousar na esperana, porque no abandonars
minha alma no Hodes, nem permitirs que teu Santo veja a corrupo (At 2,26-27).* A
Ressurreio de Jesus no terceiro dia (1 Cor 15,4; Lc 24,46) * foi a prova disso, pois se
pensava que a corrupo se manifestaria a partir do quarto dia.*
SEPULTADOS COM CRISTO...
628. O Batismo cujo sinal original e pleno a imerso, significa eficazmente a descida ao
tmulo do cristo que morre para o pecado com Cristo em vista de uma vida nova: Pelo
Batismo ns fomos sepultados com Cristo na morte, a fim de que, como Cristo foi
ressuscitado dentre os mortos pela glria do Pai, assim tambm ns vivamos vida nova
(Rm 6,4). *
RESUMINDO
629. Em benefcio de todo homem, Jesus experimentou a morte. * Foi verdadeiramente o
Filho de Deus feito homem que morreu e que foi sepultado.
630. Durante a permanncia de Cristo no tmulo, sua Pessoa Divina continuou a assumir
tanto a sua alma como o seu corpo, embora separados entre si pela morte. Por isso o
corpo de Cristo morto no viu a corrupo (At 12,37).
ARTIGO 5
JESUS CRISTO DESCEU AOS INFERNOS, RESSUSCITOU DOS MORTOS NO TERCEIRO DIA
631. Jesus desceu s profundezas da terra. Aquele que desceu tambm aquele que
subiu (Ef 4,9-10). O Smbolo dos Apstolos confessa em um mesmo artigo de f a descida
de Cristo aos Infernos e sua Ressurreio dos mortos no terceiro dia, porque em sua
Pscoa do fundo da morte que ele fez jorrar a vida: Cristo, teu Filho, que, retornado dos
Infernos, brilhou sereno para o gnero humano, e vive e reina pelos sculos dos sculos.
Amm. *
PARGRAFO 1
CRISTO DESCEU AOS INFERNOS
632. As freqentes afirmaes do Novo Testamento segundo as quais Jesus ressuscitou
dentre os mortos (1 Cor 15,20) * pressupem, anteriormente ressurreio, que este
tenha ficado na Morada dos Mortos. * Este o sentido primeiro que a pregao apostlica
deu descida de Jesus aos Infernos: Jesus conheceu a morte como todos os seres
humanos e com sua alma esteve com eles na Morada dos Mortos. Mas para l foi como
Salvador, proclamando a boa notcia aos espritos que ali estavam aprisionados. *
633. A Escritura denomina a Morada dos Mortos, para a qual Cristo morto desceu, de os
Infernos, o sheol ou Hades,* visto que os que l se encontram esto privados da viso de
Deus.* Este , com efeito, o estado de todos os mortos, maus ou justos,* espera do
Redentor _ o que no significa que a sorte deles seja idntica, como mostra Jesus na
parbola do pobre lzaro recebido no seio de Abrao. * So precisamente essas almas
santas, que esperavam seu Libertador no seio de Abrao, que Jesus libertou ao descer aos
infernos.* Jesus no desceu aos Infernos para ali libertar os condenados* nem para
destruir o Inferno da condenao,* mas para liberar os justos que o haviam precedido.*
634. A Boa Nova foi igualmente anunciada aos mortos...(Pd 4,6). A descida aos Infernos
o cumprimento, at sua plenitude, do anncio evanglico da salvao. a fase ltima da
misso messinica de Jesus, fase condensada no tempo, mas imensamente vasta em sua
significao real de extenso da obra redentora a todos os homens de todos os tempos e
de todos os lugares, pois todos os que so salvos se tornaram participantes da Redeno.
635. Cristo desceu, portanto, no seio da terra, * a fim de que os mortos ouam a voz do
Filho de Deus e os que a ouvirem vivam(Jo 5,25). Jesus, o Prncipe da vida,* destruiu
pela morte o dominador da morte, isto , o Diabo, e libertou os que passaram toda a vida
em estado de servido, pelo temor da morte (Hb 2,14-15). A partir de agora, Cristo
ressuscitado detm a chave da morte e do Hades (Ap 1,18), e ao nome de Jesus todo
joelho se dobra no Cu, na Terra e nos Infernos (F1 2,10). Um grande silncio reina hoje
na terra, um grande silncio e uma grande solido. Um grande silncio porque o Rei
dorme. A terra tremeu e acalmou-se porque Deus adormeceu na carne e foi acordar os que
dormiam desde sculos... Ele vai procurar Ado, nosso primeiro Pai, a ovelha perdida.
Quer ir visitar todos os que se assentaram nas trevas e sombra da morte. Vai libertar de
suas dores aqueles dos quais filho e para os quais Deus: Ado acorrentado e Eva com
ele cativa. Eu sou teu Deus e por causa de ti me tornei teu filho. Levanta-te, tu que
dormes, pois no te criei para que fiques prisioneiro do Inferno. Levanta-te dentre os
mortos, eu sou a Vida dos mortos.*
RESUMINDO
636. Na expresso Jesus desceu manso dos mortos, o smbolo confessa que Jesus
morreu realmente e que, por sua morte por ns, venceu a morte e o Diabo, o dominador
da morte (Hb 2,14).
637. O Cristo morto, em sua alma unida sua pessoa divina, desceu Morada dos Mortos.
Abriu as portas do Cu aos justos que o haviam precedido.
PARGRAFO 2
NO TERCEIRO DIA RESSUSCITOU DOS MORTOS
638. Anunciamo-vos a Boa Nova: a promessa, feita a nossos pais, Deus a realizou
plenamente para ns, seus filhos, ressuscitando Jesus (At 13,32-33). A Ressurreio de
Jesus a verdade culminante de nossa f em cristo, criada e vivida como verdade central
pela primeira comunidade crist, transmitida como fundamental pela Tradio,
estabelecida pelos documentos do Novo Testamento, pregada, juntamente com a Cruz,
como parte essencial do Mistrio Pascal. Cristo ressuscitou dos mortos. Por sua morte
venceu a morte, Aos mortos deu a vida.*
O evento histrico e transcendente
639. O mistrio da Ressurreio de Cristo um acontecimento real que teve manifestaes
histricas constatadas, como atesta o Novo Testamento. J S. Paulo escrevia aos Corntios
pelo ano de 56: Eu vos transmiti... o que eu mesmo recebi: Cristo morreu por nossos
pecados, segundo as Escrituras. Foi sepultado, ressuscitou ao terceiro dia, segundo as
Escrituras. Apareceu a Cefas, e depois aos Doze (1 Cor l5, 3-4).O apstolo fala aqui da
viva tradio da Ressurreio, que ficou conhecendo aps sua converso s portas de
Damasco. *
O TMULO VAZIO
640. Por que procurais entre os mortos QUELES QUE VIVE ? Ele no est aqui;
ressuscitou (Lc 24,5-6). No quadro dos acontecimentos da Pscoa, o primeiro elemento
com que se depara o sepulcro vazio. Ele no constitui em si uma prova direta. A
ausncia do corpo de Cristo no tmulo poderia explicar-se de outra forma. * Apesar disso,
o sepulcro vazio constitui para todos um sinal essencial. Sua descoberta pelos discpulos foi
a primeiro passo para o reconhecimento do prprio fato da Ressurreio. Este o caso das
santas mulheres, em primeiro lugar, * em seguida de Pedro. * O discpulo que Jesus
amava (Jo 20,2) afirma que, ao entrar no tmulo vazio e ao descobrir os panos de linho
no cho ( Jo 20,6), viu e creu. * Isto supe que ele tenha constatado, pelo estado do
sepulcro vazio, * que a ausncia do corpo de Jesus no poderia ser obra humana e que
Jesus no havia simplesmente retomado a vida terrestre, como tinha sido o caso de
Lzaro. *
AS APARIES DA RESSUSCITADO
641. Maria de Mgdala e as santas mulheres, que vinham terminar de embalsamar o corpo
de Jesus sepultado s pressas, devido chegada do Sbado, na tarde da Sexta-feira
Santa, * foram as primeiras a encontrar o Ressuscitado. * Assim as mulheres foram as
primeiras mensageiras da Ressurreio de Cristo para os prprios apstolos. * Foi a eles
que Jesus apareceu em seguida, primeiro a Pedro, depois aos Doze. * Pedro chamado a
confirmar a f de seus irmos,* v, portanto, o Ressuscitado antes deles, e baseada no
testemunho dele que a comunidade exclama: verdade ! O Senhor ressuscitou e
apareceu a Simo (Lc 24,34).
642. Tudo o que aconteceu nesses dias pascais convoca todos os apstolos, de modo
particular Pedro, para a construo da era nova que comeou na manh de Pscoa. Como
testemunhas do Ressuscitado, so eles as pedras de fundao de sua Igreja. A f da
primeira comunidade dos crentes tem por fundamento o testemunho de homens concretos,
conhecidos dos cristos e, na maioria dos casos, vivendo ainda entre eles. Estas
testemunhas da Ressurreio de Cristo* so, antes de tudo, Pedro e os Doze, mas no
somente eles: Paulo fala claramente de mais de quinhentas pessoas s quais Jesus
apareceu de uma s vez, alm de Tiago e de todos os apstolos.*
643. Diante desses testemunhos impossvel interpretar a Ressurreio de Cristo fora de
ordem fsica e no conhec-la como um fato histrico. Os fatos mostram que a f dos
discpulos foi submetida prova radical da paixo e morte na cruz de seu Mestre,
anunciada antecipadamente por Ele.* O abalo provocado pela Paixo foi to grande que os
discpulos ( pelo menos alguns deles) no creram de imediato na notcia da ressurreio.
Longe de ns falar de uma comunidade tomada de exaltao mstica, os Evangelhos nos
apresentam os discpulos abatidos, com o rosto sombrio (Lc 24,17) e assustados.* Por
isso no acreditaram nas santas mulheres que voltavam do sepulcro, e as palavras delas
pareceram-lhes desvario (Lc 24,11). * Quando Jesus se manifesta aos onze na tarde da
Pscoa, censura-lhes a incredulidade e a dureza de corao, porque no havia dado
crdito aos que tinham visto o Ressuscitado (Mc 16,14).
644. Mesmo confrontados com a realidade de Jesus ressuscitado, os discpulos ainda
duvidam,* a tal ponto que o fato lhes parece impossvel: pensam estar vendo um esprito.
* por causa da alegria, no podiam acreditar ainda e permaneciam perplexos (Lc 24,41).
Tom conhecer a mesma provao da dvida, * e quando da ltima apario na Galilia,
contada por Mateus, Alguns, porm duvidaram (Mt 28,17). Por isso, a hiptese segundo
a qual a ressurreio teria sido um produto da f ( ou da credulidade) dos apstolos
carece de consistncia. Muito pelo contrrio, a f que tinha na Ressurreio nasceu _ sob a
ao da graa divina _ da experincia direta da realidade de Jesus ressuscitado.
O ESTADO DA HUMANIDADE RESSUSCITADA DE CRISTO
645. Jesus ressuscitado estabelece com seus discpulos relaes diretas, em que estes o
apalpam * e com Ele comem. * Convida-os, com isso, a reconhecer que Eles um
esprito,* mas sobretudo a contatar que o corpo ressuscitado com o qual Ele se apresenta
a eles o mesmo que foi martirizado e crucificado, pois ainda traz as marcas de sua
Paixo. * Contudo, este corpo autntico e real possui, ao mesmo tempo, as propriedades
novas de um corpo glorioso: no est mais situado no espao e no tempo, mas pode
tornar-se presente a seu modo, onde e quando quiser, * pois sua humanidade no pode
mais ficar presa terra, mas j pertence exclusivamente ao domnio divino do Pai. * Pr
esta razo tambm Jesus ressuscitado soberanamente livre de aparecer como quiser:
sob a aparncia de um jardineiro * ou de outra forma (Mc 16,12), diferente das que
eram familiares aos discpulos, e isto precisamente para suscitar-lhes a f. *
646. A Ressurreio de Cristo no constituiu uma volta vida terrestre, como foi o caso
das ressurreies que Ele havia realizado antes da Pscoa: a filha de Jairo, o jovem de
Naim e Lzaro. Tais fatos eram acontecimentos miraculosos, mas as pessoas contempladas
pelos milagres voltavam simplesmente vida terrestre ordinria pelo poder de Jesus. Em
determinado momento, voltariam a morrer. A Ressurreio de Cristo essencialmente
diferente. Em seu corpo ressuscitado, Ele passa de um estado de morte para a outra vida,
para alm do tempo e do espao. Na Ressurreio, o corpo de Jesus repleto do poder do
Esprito Santo; participa da vida divina no estado de sua glria, de modo que Paulo pode
chamar a Cristo de o homem celeste.
A RESSURREIO COMO ACONTECIMENTO TRANSCENDENTE
647. S tu, noite feliz _ canta o Exsultet da Pscoa _, soubeste a hora em que Cristo da
morte ressurgia. * Com efeito, ningum foi testemunha ocular do prprio acontecimento
da Ressurreio, e nenhum Evangelista o descreve. Ningum foi capaz de dizer como ela
se produziu fisicamente. Muito menos sua essncia mais ntima, sua passagem a outra
vida, foi perceptvel aos sentidos. Como evento histrico constatvel pelo sinal do sepulcro
vazio e pela realidade dos encontros dos apstolos com Cristo ressuscitado, a Ressurreio
nem por isso deixa de estar no cerne do mistrio da f, no que ela transcende e supera a
histria. por isso que Cristo ressuscitado no se manifesta ao mundo, * mas os seus
discpulos, aos que haviam subido com ele da Galilia para Jerusalm, os quais so agora
suas testemunhas diante do povo (At 13,31).
II. A Ressurreio obra da Santssima Trindade
648. A Ressurreio de Cristo objeto de f enquanto interveno transcendente do
prprio Deus na criao e na histria. Nela, as trs Pessoas Divinas agem ao mesmo temo,
juntas, e manifestam a sua originalidade prpria. Ela aconteceu pelo poder do Pai que
ressuscitou (At 2,24) Cristo, seu Filho, e desta forma introduziu de modo perfeito sua
humanidade _ com seu corpo _ na Trindade. Jesus definitivamente revelado Filho de
Deus com poder por sua Ressurreio dos mortos segundo o Esprito de santidade (Rm
1,4). S. Paulo insiste na manifestao do poder de Deus890 pela obra do Esprito que
vivificou a humanidade morta de Jesus e a chamou ao estado glorioso de Senhor.
649. O filho opera, por sua vez, a prpria Ressurreio em virtude de seu poder divino.
Jesus anuncia que o filho do homem dever sofrer muito, morrer e, em seguida,
ressuscitar (sentido ativo da palavra)891. Alhures, afirma explicitamente: Eu dou a minha
vida para retom-la... Tenho poder de d-la e poder para retom-la (Jo 10,17-18). Ns
cremos... que Jesus morreu, em seguida ressuscitou (1Ts 4,14).
650. Os padres da igreja contemplam a Ressurreio a partir da Pessoa Divina de Cristo
que ficou unida sua alma e a seu corpo separados entre si pela morte: Pela unidade da
natureza divina, que permanece presente em cada uma das duas partes do homem, estas
se unem novamente. Assim, a Morte se produz pela separao do composto humano, e a
Ressurreio, pela unio das duas partes separadas892
III. Sentido e alcance salvfico da Ressurreio
651. Se Cristo no ressuscitou, vazia a nossa pregao, vazia tambm a vossa f
(1Cor 15,14). A Ressurreio constitui antes de mais nada a confirmao de tudo o que o
prprio Cristo e ensinou. Todas as verdades, mesmo as mais inacessveis ao esprito
humano, encontram sua justificao se, ao ressuscitar, Cristo deu a prova definitiva, que
havia prometido, de sua autoridade divina.
652. A Ressurreio de Cristo cumprimento das promessas do Antigo Testamento893 e do
prprio Jesus durante sua vida terrestre894. A expresso segundo as Escrituras895 indica
que a Ressurreio de Cristo realiza essas predies.
653. A verdade da divindade de Jesus confirmada por sua Ressurreio. Dissera Ele:
Quando tiverdes elevado o Filho do Homem, ento sabereis que EU SOU (Jo 8,28). A
Ressurreio do Crucificado demonstrou que ele era verdadeiramente Eu sou, o Filho de
Deus e Deus mesmo. S. Paulo pde declarar aos judeus: A promessa feita a nossos pais,
Deus a realizou plenamente para ns...; ressuscitou Jesus, como est escrito no Salmo
segundo: Tu s o meu filho, eu hoje te gerei (At 13,32-33)896. A Ressurreio de Cristo
est estreitamente ligada ao mistrio da Encarnao do Filho de Deus. o seu
cumprimento segundo o desgnio eterno de Deus.
654. H um duplo aspecto no Mistrio Pascal: por sua Morte Jesus nos liberta do pecado,
por sua Ressurreio Ele nos abre as portas de uma nova vida. Esta primeiramente a
justificao que nos restitui a graa de Deus897, a fim de que, como Cristo foi ressuscitado
dentre os mortos pela glria do Pai, assim tambm ns vivamos vida nova (Rm 6,4). Esta
consiste na vitria sobre a morte do pecado e na nova participao na graa898. Ela realiza
a adoo filial, pois os homens se tornam irmo de Cristo, como o prprio Jesus chama
seus discpulos aps a Ressurreio: Ide anunciar a meus irmos (Mt 28,10)899. Irmos
no por natureza, mas por dom da graa, visto que esta filiao adotiva proporciona uma
participao real na vida do Filho nico, que se revelou plenamente em sua Ressurreio.
655. Finalmente, a Ressurreio de Cristo _ e o prprio Cristo ressuscitado _ princpio e
fonte de nossa ressurreio futura: Cristo ressuscitou dos mortos, primcias dos que
adormeceram... assim como todos morrem em Ado, em Cristo todos recebero a vida
(1Cor 15,20-22). Na expectativa desta realizao, Cristo ressuscitado vive no corao de
seus fiis. Nele, os cristos experimentaram... as foras do mundo que h de vir (Hb 6,5)
e sua vida atrada por Cristo ao seio da vida divina900, a fim de que no vivam mais para
si mesmos, mas para aquele que morreu e ressuscitou por eles (2Cor 5,15).
RESUMINDO
656. A f na Ressurreio tem por objeto um acontecimento ao mesmo tempo
historicamente atestado pelos discpulos que encontraram verdadeiramente o Ressuscitado
e misteriosamente transcendente, enquanto entrada da humanidade de Cristo na glria de
Deus.

890
Cf. Rm 6,4; 2Cor 13,4; Fl 3,10; Ef 1,19-22; Hb 7,16.
891
Cf. Mc 8,31; 9,9-31; 10,34.
892
S. Gregrio de Nissa, In Christi Ress., hom. I: PG 46,617B; cf. tambm DS 325; 359; 369; 539.
893
Cf. Lc 24,26-27; 44-48.
894
Cf. Mt 28,6; Mc 16,7; Lc 24,6-7.
895
Cf 1Cor 15,3-4 e o Smbolo niceno-constantinopolitano.
896
Cf. S1 2,7.
897
Cf. Rm 4,25.
898
Cf. Ef 2,4-5; 1Pd 1,3.
899
Cf. Jo 20,17.
900
Cf. Cl 3,1-3.
657. O sepulcro vazio e os panos de linho no cho significam por si mesmos que o corpo
de Cristo escapou s correntes da morte e da corrupo pelo poder de Deus. Eles
preparam os discpulos para o reencontro com o Ressuscitado.
658. Cristo, "primognito dentre os mortos" (Cl 1,18), o princpio de nossa prpria
ressurreio, desde j pela justificao de nossa alma901, mais tarde pela vivificao de
nosso corpo902.
ARTIGO 6
"JESUS SUBIU AOS CUS, EST SENTADO
DIREITA DE DEUS PAI TODO-PODEROSO"
659. "E o Senhor Jesus, depois de ter-lhes falado, foi arrebatado ao Cu e sentou-se
direita de Deus" (Mc 16,19). O corpo de Cristo foi glorificado desde o instante de sua
Ressurreio, como provam as propriedades novas e sobrenaturais de que desfruta a partir
de agora seu corpo em carter permanente903. Mas, durante os quarenta dias em que vai
comer e beber familiarmente com seus discpulos904 e instru-los sobre o Reino905, sua
glria permanece ainda velada sob os traos de uma humanidade comum906. A ltima
apario de Jesus termina com a entrada irreversvel de sua humanidade na glria divina,
simbolizada pela nuvem907 e pelo cu908, onde j est desde agora sentado direita de
Deus909 S de modo totalmente excepcional e nico Ele se mostrar a Paulo "como a um
abortivo" (1Cor 15,8) em uma ltima apario que o constitui apstolo910.
660. O carter velado da glria do Ressuscitado durante esse tempo transparece em sua
palavra misteriosa a Maria Madalena: "Ainda no subi para o Pai. Mas vai aos meus irmos
e dize-lhes: Eu subo para meu Pai e vosso Pai, para meu Deus e vosso Deus" (Jo 20,17).
Isso indica uma diferena de manifestao entre a glria de Cristo ressuscitado e a de
Cristo exaltado direita do Pai. O acontecimento ao mesmo tempo histrico e
transcendente da Ascenso marca a transio de uma para a outra.
661. Esta ltima etapa permanece intimamente unida primeira, isto , descida do cu
realizada na Encarnao. S aquele que "saiu do Pai" pode "retomar ao Pai": Cristo911
"Ningum jamais subiu ao cu, a no ser aquele que desceu do cu, o Filho do Homem"
(Jo 3,13)912 Entregue a suas foras naturais, a humanidade no tem acesso "Casa do
Pai"913, vida e felicidade de Deus. S Cristo pde abrir esta porta ao homem, "de sorte
que ns, seus membros, tenhamos a esperana de encontr-lo l onde Ele, nossa cabea e
nosso principio, nos precedeu"914.
662. "E, quando eu for elevado da terra, atrairei todos os homens a mim" (Jo 12,32). A
elevao na Cruz significa e anuncia a elevao da Ascenso ao cu. E o comeo dela.
Jesus Cristo, o nico Sacerdote da nova e eterna Aliana, no "entrou em um santurio
feito por mo de homem... e sim no prprio cu, a fim de comparecer agora diante da face
de Deus a nosso favor" (Hb 9,24). No cu, Cristo exerce em carter permanente seu
sacerdcio, "por isso capaz de salvar totalmente aqueles que, por meio dele, se
aproximam de Deus, visto que ele vive eternamente para interceder por eles" (Hb 7,25).
Como "sumo sacerdote dos bens vindouros" (LII' 9,11), ele o centro e o ator principal da
liturgia que honra o Pai nos Cus915
663. A partir de agora, Cristo est sentado direita do Pai: "Por direita do Pai entendemos
a glria e a honra da divindade, onde aquele que existia como Filho de Deus antes de
todos os sculos como Deus e consubstancial ao Pai se sentou corporalmente depois de
encarnar-se e de sua carne ser glorificada"916.
664. O sentar-se direita do Pai significa a inaugurao do Reino do Messias, realizao da
viso do profeta Daniel no tocante ao Filho do Homem: "A Ele foram outorgados o imprio,
a honra e o reino, e todos os povos, naes e lnguas o serviram. Seu imprio um
imprio eterno que jamais passar, e seu reino jamais ser destrudo" (Dn 7,14). A partir
desse momento, os apstolos se tornaram as testemunhas do "Reino que no ter fim"917
RESUMINDO

901
Cf. Rm 6,4.
902
Cf. Rm 8,11.
903
Cf. Lc 24,31; Jo 20,19.26.
904
Cf. At l0,41.
905
Cf. At l,3.
906
Cf. Mc 16,12; Lc 24,15; Jo 20,14-15; 21,4.
907
Cf. At 1,9; cf. tambm Lc 9,34-35; Ex 13,22.
908
Cf. Lc 24,51.
909
Cf. Mc 16,19; At 2,33; 7,56; cf. tambm S1 110,1.
910
CF. 1Cor 9,1; G1 1,16.
911
Cf. Jo 16,28.
912
Cf. Ef 4,8-10.
913
Cf. Jo 14,2.
914
MR, Prefcio da Ascenso I.
915
Cf. Ap 4,6-11.
916
S. Joo Damasceno, De fide orthodoxa, 4,2,2: PG 94, 1104D.
917
Smbolo niceno-constantinopolitano.
665. A ascenso de Cristo assinala a entrada definitiva da humanidade de Jesus no
domnio celeste de Deus, donde voltar918, mas que at l o esconde aos olhos dos
homens919.
666. Jesus Cristo, Cabea da Igreja, nos precede no Reino glorioso do Pai para que ns,
membros de seu Corpo, vivamos na esperana de estarmos um dia eternamente com Ele.
667. Tendo entrado uma vez por todas no santurio do cu, Jesus Cristo intercede sem
cessar por ns como mediador que nos garante permanentemente a efuso do Esprito
Santo.
ARTIGO 7
"DONDE VIR JULGAR OS VIVOS
E OS MORTOS"
I. Ele voltar na glria
CRISTO J REINA PELA IGREJA...
668. "Cristo morreu e reviveu para ser o Senhor dos mortos e dos vivos" (Rm 14,9). A
Ascenso de Cristo ao Cu significa sua participao, em sua humanidade, no poder e na
autoridade do prprio Deus. Jesus Cristo Senhor: possui todo poder nos cus e na terra.
Est "acima de toda autoridade, poder, potentado e soberania", pois o Pai "tudo submeteu
a seus ps" (Ef 1,20-22). Cristo o Senhor do cosmo920 e da histria. Nele, a histria do
homem e mesmo toda a criao encontram sua recapitulao921, sua consumao
transcendente.
669. Como Senhor, Cristo tambm a cabea da Igreja, que seu Corpo922. Elevado ao
cu e glorificado, tendo assim cumprido plenamente sua misso, Ele permanece na terra
em sua Igreja. A redeno a fonte da autoridade que Cristo, em virtude do Esprito
Santo, exerce sobre a Igreja923 Reino de Cristo j est misteriosamente presente na
Igreja"924 "germe e inicio deste Reino na terra"925.
670. Desde a Ascenso, o desgnio de Deus entrou em sua consumao. J estamos na
"ltima hora" (1Jo 2,18)926. "Portanto, a era final do mundo j chegou para ns, e a
renovao do mundo est irrevogavelmente realizada e, de certo modo, j est antecipada
nesta terra. Pois j na terra a Igreja se reveste de verdadeira santidade, embora
imperfeita."927 O Reino de Cristo j manifesta sua presena pelos sinais milagrosos928 que
acompanham seu anncio pela Igreja929.
.... A ESPERA DE QUE TUDO LHE SEJA SUBMETIDO
671. J presente em sua Igreja, o Reino de Cristo ainda no est consumado "com poder e
grande glria" (Lc 21,17)930 pelo advento do Rei na terra. Esse Reino ainda atacado pelos
poderes maus931, embora estes j tenham sido vencidos em suas bases pela Pscoa de
Cristo. Enquanto tudo no for submetido a ele932, "enquanto no houver novos cus e nova
terra, nos quais habita a justia, a Igreja peregrina leva consigo em seus sacramentos e
em suas instituies, que pertencem idade presente, a figura deste mundo que passa, e
ela mesma vive entre as criaturas que gemem e sofrem como que dores de parto at o
presente e aguardam a manifestao dos filhos de Deus"933. Por este motivo os cristos
oram, sobretudo na Eucaristia934, para apressar a volta de Cristo935, dizendo-lhe: "Vem,
Senhor"936 (Ap 22,20).
672. Cristo afirmou antes de sua Ascenso que ainda no chegara a hora do
estabelecimento glorioso do Reino messinico esperado por Israel937, que deveria trazer a
todos os homens, segundo os profetas938, a ordem definitiva da justia, do amor e da paz.
O tempo presente , segundo o Senhor, o tempo do Esprito e do testemunho939, mas
tambm um tempo ainda marcado pela "tristeza"940 e pela provao do mal941, que no
poupa a Igreja942 e inaugura os combates dos ltimos dias943. E um tempo de expectativa
e de viglia944.

918
Cf. At 1,11.
919
Cf. C1 3,3.
920
Cf. Ef 4,10; 1Cor 15,24.27-28.
921
Cf. Ef 1,10.
922
Cf. Ef 1,22.
923
Cf. Ef 4,11-13.
924
LG 3: AAS 57 (1965) 6.
925
LG 5: AAS 57 (1965) 8.
926
Cf. 1Pd 4,7.
927
LG 48.
928
Cf. Mc 16,17-18.
929
Cf. Mc 16,20.
930
Cf. Mt 25,31.
931
CI. 2Ts 2,7.
932
CI. 1Cor 15,28.
933
LG3 48.
934
Cf 1Cor 11,26.
935
Cf. 2Pd 3,11-12.
936
Cf 1Cor 16,22; Ap 22,17.
937
Cf At 1,6-7.
938
Cf. Is 11,1-9.
939
Cf. At 1,8.
940
Cf 1Cor 7,26.
941
Cf EI 5,16.
942
Cf 1Pd 4,17.
943
Cf 1Jo 2,18; 4,3; 1Tm 4,1.
944
Cf Mt 25,1.13; Mc 13,33-37.
O ADVENTO GLORIOSO DE CRISTO, ESPERANA DE ISRAEL
673. A partir da Ascenso, o advento de Cristo na glria iminente945, embora no nos
"caiba conhecer os tempos e os momentos que o Pai fixou com sua prpria autoridade" (At
1,7)946. Este acontecimento escatolgico pode ocorrer a qualquer momento947, ainda que
estejam "retidos" tanto ele como a provao final que h de preced-lo948.
674. A vinda do Messias glorioso depende a todo momento da histria949 do
reconhecimento dele por "todo Israel"950. Uma parte desse Israel se "endureceu" (Rm
11,25) na "incredulidade" (Rm 11,20) para com Jesus. S. Pedro o afirma aos judeus de
Jerusalm depois de Pentecostes: "Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, a fim de que
sejam apagados os vossos pecados e deste modo venham da face do Senhor os tempos de
refrigrio. Ento enviar ele o Cristo que vos foi destinado, Jesus, a quem o cu deve
acolher at os tempos da restaurao de todas as coisas, das quais Deus falou pela boca
de seus santos profetas" (At 3,19-21). E S. Paulo lhe faz eco: "Se a rejeio deles resultou
na reconciliao do mundo, o que ser o acolhimento deles seno a vida que vem dos
mortos?"951 A entrada da "plenitude dos judeus"952 na salvao messinica, depois da
"plenitude dos pagos"953, dar ao Povo de Deus a possibilidade de "realizar a plenitude de
Cristo" (Ef 4,13), na qual "Deus ser tudo em todos" (1Cor 15,28).
A PROVAO DERRADEIRA DA IGREJA
675. Antes do advento de Cristo, a Igreja deve passar por uma provao final que abalar
a f de muitos crentes954. A perseguio que acompanha a peregrinao dela na terra955
desvendar o "mistrio de iniquidade" sob a forma de uma impostura religiosa que h de
trazer aos homens uma soluo aparente a seus problemas, custa da apostasia da
verdade. A impostura religiosa suprema a do Anticristo, isto , a de um pseudo-
messianismo em que o homem glorifica a si mesmo em lugar de Deus e de seu Messias
que veio na carne956.
676. Esta impostura anticrstica j se esboa no mundo toda vez que se pretende realizar
na histria a esperana messinica que s pode realizar-se para alm dela, por meio do
juzo escatolgico: mesmo em sua forma mitigada, a Igreja rejeitou esta falsificao do
Reino vindouro sob o nome de milenarismo957, sobretudo sob a forma poltica de um
messianismo secularizado, "intrinsecamente perverso"958.
677. A Igreja s entrar na glria do Reino por meio desta derradeira Pscoa, em que
seguir seu Senhor em sua Morte e Ressurreio959 Portanto, o Reino no se realizar por
um triunfo histrico da Igreja960 segundo um progresso ascendente, mas por uma vitria
de Deus sobre o desencadeamento ltimo do mal961, que far sua Esposa descer do Cu962.
O triunfo de Deus sobre a revolta do mal assumir a forma do Juzo Final963 depois do
derradeiro abalo csmico deste mundo que passa964.
II. Para julgar os vivos e os mortos
678. Na linha dos profetas965 e de Joo Batista966, Jesus anunciou em sua pregao o Juzo
do ltimo Dia. Ento ser revelada a conduta de cada um967 e o segredo dos coraes968.
Ser tambm condenada a incredulidade culpada que fez pouco caso da graa oferecida
por Deus969. A atitude em relao ao prximo revelar o acolhimento ou a recusa da graa
e do amor divino970. Jesus dir no ltimo Dia: "Cada vez que o fizestes a um desses meus
irmos mais pequeninos, a mim o fizestes" (Mt 25,40).
Cristo Senhor da Vida Eterna. O pleno direito de julgar definitivamente as obras e os
coraes dos homens pertence a Ele enquanto Redentor do mundo. Ele "adquiriu" este
direito por sua Cruz. O Pai entregou "todo o julgamento ao Filho" (Jo 5,22)971. Ora, o Filho
no veio para julgar, mas para salvar972 e para dar a vida que est nele973. pela recusa

945
Cf. Ap 22,20.
946
Cf. Mc 13,32.
947
Cf. Mt 24,44; 1Ts 5,2.
948
Cf. 2Ts 2,3-12.
949
Cf. Rm 11,31.
950
Cf. Rm 11,26; Mt 23,39.
951
Cf. Rm 11,15.
952
Cf. Rm 11,12.
953
Cf. Rm 11,25; Lc 21,24.
954
Cf. Lc 18,8;Mt24,12.
955
Cf. Lc 21,12; Jo 15,19-20.
956
Cf. 2Ts 2,4-12; 1Ts 5,2-3; 2J0 7; 1Jo 2,18.22.
957
Cf. DS 3839.
958
Cf. Pio XI, enc. Divini Redemptoris condenando o falso misticismo" desta "contrafao da redeno dos humildes":
GS 20-21.
959
Cf. Ap 19,1-9.
960
Cf. Ap 13,8.
961
Cf. Ap 20,7-10.
962
Cf. Ap 21,2-4.
963
Cf. Ap 20,12.
964
Cf. 2Pd 3,12-13.
965
Cf. Dn 7,10; JI 3-4; Ml 3,19.
966
Cf. Mt 3,7-12.
967
Cf. Mc 12,38-40.
968
Cf. Lc 12,1-3; Jo 3,20-21; Rm 2,16; 1Cor 4,5.
969
Cf. Mt 11,20-24; 12,41-42.
970
Cf. Mt 5,22; 7,1-5.
971
Cf. Jo 5,27; Mt 25,31; At 10,42; 17,31; 2Tm 4,1.
972
Cf. JO 3,17.
973
Cf. Jo 5,26.
da graa nesta vida que cada um j se julga a si mesmo974, recebe de acordo com suas
obras975 e pode at condenar-se para a eternidade ao recusar o Esprito de amor976.
RESUMINDO
680. Cristo Senhor j reina pela Igreja, mas ainda no lhe esto submetidas todas as
coisas deste mundo. O triunfo do Reino de Cristo no se dar sem uma ltima investida
das potncias do mal.
681. No dia do juzo, por ocasio do fim do mundo, Cristo vir na glria para realizar o
triunfo definitivo do bem sobre o mal, os quais, como o trigo e o joio, tero crescido juntos
ao longo da histria.
682. Ao vir no fim dos tempos para julgar os vivos e os mortos, Cristo glorioso revelar a
disposio secreta dos coraes e retribuir a cada um segundo suas obras e segundo tiver
acolhido ou rejeitado sua graa.
CAPTULO III
CREIO NO ESPRITO SANTO
683. "Ningum pode dizer 'Jesus Senhor' a no ser no Esprito Santo" (1Cor 12,3). "Deus
enviou a nossos coraes o Esprito de seu Filho que clama: Abb, Pai!" (GI 4,6). Este
conhecimento de f s possvel no Esprito Santo. Para estar em contato com Cristo,
preciso primeiro ter sido tocado pelo Esprito Santo. E ele que nos precede e suscita em
ns a f. Por nosso Batismo, primeiro sacramento da f, a Vida, que tem sua fonte no Pai e
nos oferecida no Filho, nos comunicada intimamente e pessoalmente pelo Esprito
Santo na Igreja:
O Batismo nos concede a graa do novo nascimento em Deus Pai por meio de seu Filho no
Esprito Santo. Pois os que tm o Esprito de Deus so conduzidos ao Verbo, isto , ao
Filho; mas o Filho os apresenta ao Pai, e o Pai lhes concede a incorruptibilidade. Portanto,
sem o Esprito no possvel ver o Filho de Deus, e sem o Filho ningum pode aproximar-
se do Pai, pois o conhecimento do Pai o Filho, e o conhecimento do Filho de Deus se faz
pelo Esprito Santo977.
684. O Esprito Santo, por sua graa, primeiro no despertar de nossa f e na vida nova
que "conhecer o Pai e aquele que Ele enviou, Jesus Cristo"978. Todavia, ltimo na
revelao das Pessoas da Santssima Trindade. S. Gregrio Nazianzeno, "o Telogo",
explica esta progresso pela pedagogia da "condescendncia" divina:
O Antigo Testamento proclamava manifestamente o Pai, mais obscuramente o Filho. O
Novo manifestou o Filho, fez entrever a divindade do Esprito. Agora o Esprito tem direito
de cidadania entre ns e nos concede uma viso mais clara de si mesmo. Com efeito, no
era prudente, quando ainda no se confessava a divindade do Pai, proclamar abertamente
o Filho e, quando a divindade do Filho ainda no era admitida, acrescentar o Esprito Santo
como um peso suplementar, para usarmos uma expresso um tanto ousada... E por meio
de avanos e de progresses de glria em glria que a luz da Trindade resplender em
claridades mais brilhantes979.
685. Crer no Esprito Santo , pois, professar que o Esprito Santo uma das Pessoas da
Santssima Trindade, consubstancial ao Pai e ao Filho, "e com o Pai e o Filho adorado e
glorificado"980. por isso que se tratou do mistrio divino do Esprito Santo na "teologia"
trinitria. Aqui, portanto, s se tratar do Esprito Santo na "Economia" divina.
686. O Esprito Santo est em ao com o Pai e o Filho do incio at a consumao do
Projeto de nossa salvao. Mas nos ltimos tempos", inaugurados pela Encarnao
redentora do Filho, que ele revelado e dado, reconhecido e acolhido como Pessoa. Ento
este Projeto Divino, realizado em Cristo, "Primognito" e Cabea da nova criao, poder
tomar corpo na humanidade pelo Esprito difundido: a Igreja, a comunho dos santos, a
remisso dos pecados, a ressurreio da carne, a Vida Eterna.
ARTIGO 8
"CREIO NO ESPIRITO SANTO"
687. "O que est em Deus, ningum o conhece seno o Esprito de Deus" (1 Cor 2,11).
Ora, seu Esprito que o revela nos d a conhecer Cristo, seu Verbo, sua Palavra viva, mas
no se revela a si mesmo. Aquele que "falou pelos profetas"981 faz-nos ouvir a Palavra do
Pai. Mas, ele mesmo, ns no o ouvimos. S o conhecemos no momento em que nos
revela o Verbo e nos dispe a acolh-lo na f. O Esprito de Verdade que nos "desvenda" o
Cristo "no fala de si mesmo"982. Tal apagamento, propriamente divino, explica por que "o
mundo no pode acolh-lo, porque no o v nem o conhece", enquanto os que crem em
Cristo o conhecem, porque ele permanece com eles (Jo 14,17).
974
Cf. Jo 3,18; 12,48.
975
Cf. 1Cor 3,12-15.
976
Cf. Mt 12,32; Hh 6,4-6; 10,26-31.
977
Sto. Irineu, Demonstratio apostolica, 7.
978
Cf. Jo 17,3.
979
S. Gregrio Nazianzeno, Or. theol 5,26: PG 36.161C.
980
Smbolo niceno-constantinopolitano.
981
Smbolo niceno-constantinopolitano: DS 150.
982
Cf. Jo 16,13.
688. A Igreja, comunho viva na f dos apstolos, que ela transmite, o lugar de nosso
conhecimento do Esprito Santo:
- nas Escrituras que ele inspirou;
- na Tradio, da qual os Padres da Igreja so as testemunhas sempre atuais;
- no Magistrio da Igreja, ao qual ele assiste;
- na Liturgia sacramental, por meio de suas palavras e de seus smbolos, na qual o Esprito
Santo nos coloca em Comunho com Cristo;
na orao, na qual Ele intercede por ns;
- nos carismas e nos ministrios, pelos quais a Igreja edificada;
- nos sinais de vida apostlica e missionria;
- no testemunho dos santos, no qual ele manifesta sua santidade e continua a obra da
salvao.
I. A misso conjunta do Filho e do Esprito
689. Aquele que o Pai enviou a nossos coraes, o Esprito de seu Filho983, realmente
Deus. Consubstancial ao Pai e ao Filho, ele inseparvel dos dois, tanto na Vida intima da
Trindade como em seu dom de amor pelo mundo. Mas ao adorar a Santssima Trindade,
vivificante, consubstancial e indivisvel, a f da Igreja professa tambm a distino das
Pessoas. Quando o Pai envia seu Verbo, envia sempre seu Sopro: misso conjunta em que
o Filho e o Esprito Santo so distintos, mas inseparveis. Sem dvida, Cristo que
aparece, ele, a Imagem visvel do Deus invisvel; mas o Esprito Santo que o revela.
690. Jesus Cristo, ungido, porque o Esprito a uno dele, e tudo o que advm a
partir da Encarnao decorre desta plenitude984. Quando finalmente Cristo glorificado985,
pode, por sua Vez, de junto do Pai, enviar o Esprito aos que crem nele: comunica-lhes
sua glria986, isto , o Esprito Santo que o glorifica987. A misso conjunta se desdobrar
ento nos filhos adotados pelo Pai no Corpo de seu Filho: a misso do Esprito de adoo
ser uni-los a Cristo e faz-los viver nele:
A noo da uno sugere... que no existe nenhuma distncia entre o Filho e o Esprito.
Com efeito, da mesma forma que entre a superfcie do corpo e a uno do leo nem a
razo nem os sentidos conhecem nenhum intermedirio, assim imediato o contato do
Filho com o Esprito, tanto que, para aquele que vai tomar contato com o Filho pela f,
necessrio encontrar primeiro o leo pelo contato. Com efeito, no h nenhuma parte que
esteja privada do Esprito Santo. Por isso a confisso do Senhorio do Filho se faz no
Esprito Santo para os que a recebem, vindo o Esprito de todas as partes precedendo os
que se aproximam pela f988.
II. O nome, as denominaes e os smbolos do Esprito Santo
O NOME PRPRIO DO ESPRITO SANTO
691. "Esprito Santo", este o nome prprio daquele que adoramos e glorificamos com o
Pai e o Filho. A Igreja o recebeu do Senhor e o professa no Batismo de seus novos
filhos989:
O termo "Esprito" traduz o termo hebraico "Ruah", o qual, em seu sentido primeiro,
significa sopro, ar, vento. Jesus utiliza justamente a imagem sensvel do vento para sugerir
a Nicodemos a novidade transcendente daquele que pessoalmente o Sopro de Deus, o
Esprito divino990. Por outro lado, Esprito e Santo so atributos divinos comuns s trs
Pessoas Divinas. Mas ao juntar os dois termos, a Escritura, a Liturgia e a linguagem
teolgica designam a Pessoa inefvel do Esprito Santo, sem equvoco possvel com os
outros empregos dos termos "esprito" e "santo".
AS DENOMINAES DO ESPRITO SANTO
692. Ao anunciar e prometer a vinda do Esprito Santo, Jesus o denomina o "Parclito",
literalmente: aquele que chamado para perto de, "advocatus" (Jo 14,16.26; 15,26;
16,7). "Parclito" habitualmente traduzido por "Consolador", sendo Jesus o primeiro
consolador991. O prprio Senhor chama o Esprito Santo de "Esprito de Verdade"992.
693. Alm de seu nome prprio, que o mais empregado nos Atos dos Apstolos e nas
Epstolas, encontram-se em 5. Paulo as denominaes: o Esprito da promessa (61 3,14;
Ef 1,13), o Esprito de adoo (Rm 8,15; 61 4,6), o Esprito de Cristo (Rm 8,11), o Esprito
do Senhor (2Cor 3,17), o Esprito de Deus (Rm 8,9.14; 15,19; 1Cor 6,11; 7,40) e, em 5.
Pedro, o Esprito de glria (1Pd 4,14).
Os SMBOLOS DO ESPRITO SANTO

983
Cf. GI 4,6.
984
Cf. Jo 3,34.
985
Cf. Jo 7,39.
986
Cf. Jo 17,22.
987
Cf. Jo 16,14.
988
S. Gregrio de Nissa, De Spiritu Sancto, 16: Gregorii Nysseni opera, ed. W. W. Jaeger-H. Langerbeck, v.3/1, Leiden, 1958, pp. 102-103, PG 45,1321.
989
Cf. Mt 28,19.
990
Cf. Jo 3,5-8.
991
Cf. 1Jo 2,1.
992
Cf. Jo 16,13.
694. A gua. O simbolismo da gua significativo da ao do Esprito Santo no Batismo,
pois aps a invocao do Esprito Santo ela se torna o sinal sacramental eficaz do novo
nascimento: assim como a gestao de nosso primeiro nascimento se operou na gua, da
mesma forma tambm a gua batismal significa realmente que nosso nascimento para a
vida divina nos dado no Esprito Santo. Mas "batizados em um 50 Esprito" tambm
"bebemos de um s Esprito" (1 Cor 12,13): o Esprito , pois, tambm pessoalmente a
gua viva que jorra de Cristo crucificado993 como de sua fonte e que em ns jorra em Vida
Eterna994.
695. A uno. O simbolismo da uno com leo tambm significativo do Esprito Santo, a
ponto de tomar-se sinnimo de1e995. Na iniciao crist, ela o sinal sacramental da
confirmao, chamada com acerto nas Igrejas do Oriente de "crismao". Mas, para
perceber toda a fora deste simbolismo, h que retomar uno primeira realizada pelo
Esprito Santo: a de Jesus. Cristo ("Messias" a partir do hebraico) significa "Ungido" do
Esprito de Deus. Houve "ungidos" do Senhor na Antiga Aliana996: de modo eminente o rei
Davi997. Mas Jesus o Ungido de Deus de uma forma nica: a humanidade que o Filho
assume totalmente "ungida do Esprito Santo". Jesus constitudo "Cristo" pelo Esprito
Santo998. A Virgem Maria concebe Cristo do Esprito Santo, que pelo anjo o anuncia como
Cristo por ocasio do nascimento de1e999 e leva Simeo a vir ao Templo para ver o Cristo
do Senhor1000; Ele que plenifica o Cristo1001, o poder dele que sai de Cristo em seus
atos de cura e de salvao1002. E finalmente Ele que ressuscita Jesus dentre os mortos1003.
Ento, constitudo plenamente "Cristo" em sua Humanidade vitoriosa da morte1004, Jesus
difunde em profuso o Esprito Santo at "os santos" constiturem, em sua unio com a
Humanidade do Filho de Deus, "esse Homem perfeito... que realiza a plenitude de Cristo"
(Ef 4,13): "o Cristo total", segundo a expresso de Sto. Agostinho1005.
696. O fogo. Enquanto a gua significa o nascimento e a fecundidade da Vida dada no
Esprito Santo, o fogo simboliza a energia transformadora dos atos do Esprito Santo. O
profeta Elias, que "surgiu como um fogo cuja palavra queimava como uma tocha" (Eclo
48,1), por sua orao atrai o fogo do cu sobre o sacrifcio do monte Carmelo1006, figura do
fogo do Esprito Santo que transforma o que toca. Joo Batista, "que caminha diante do
Senhor com o esprito e o poder de Elias" (Lc 1,17), anuncia o Cristo como aquele que
"batizar com o Esprito Santo e com o fogo" (Lc 3,16), esse Esprito do qual Jesus dir:
"Vim trazer fogo terra, e quanto desejaria que j estivesse aceso!" (Lc 12,49). sob a
forma de lnguas "que se diriam de fogo" que o Esprito Santo pousa sobre os discpulos na
manh de Pentecostes e os enche de Si1007. A tradio espiritual manter este simbolismo
do fogo como um dos mais expressivos da ao do Esprito Santo1008 "No extingais o
Esprito" (1Ts 5,19).
697. A nuvem e a luz. Estes dois smbolos so inseparveis nas manifestaes do Esprito
Santo. Desde as teofanias do Antigo Testamento, a Nuvem, ora escura, ora luminosa,
revela o Deus vivo e salvador, escondendo a transcendncia de sua Glria: com Moiss
sobre a montanha do Sinai1009, na Tenda de Reunio1010 e durante a caminhada no
deserto1011; com Salomo por ocasio da dedicao do Templo1012. Ora, estas figuras so
cumpridas por Cristo no Esprito Santo. E este que paira sobre a Virgem Maria e a cobre
"com sua sombra", para que ela conceba e d luz Jesus1013. No monte da Transfigurao,
ele que "sobrevm na nuvem que toma" Jesus, Moiss e Elias, Pedro, Tiago e Joo
"debaixo de sua sombra"; da Nuvem sai uma voz que diz: "Este meu Filho, o Eleito,
ouvi-o sempre" (Lc 9,34-35). finalmente essa Nuvem que "subtrai Jesus aos olhos" dos
discpulos no dia da Ascenso1014 e que o revelar Filho do Homem em sua glria no Dia de
sua Vinda1015.
698. O selo um smbolo prximo ao da uno. Com efeito, Cristo que "Deus marcou
com seu selo" (Jo 6,27) e nele que tambm o Pai nos marca com seu se1o1016. Por
indicar o efeito indelvel da uno do Esprito Santo nos sacramentos do batismo, da
confirmao e da ordem, a imagem do selo ("sphragis") tem sido utilizada em certas

993
Cf. Jo 19,34; 1Jo 5,8.
994
Cf. Jo 4,10-14; 7,38; Ex 17,1-6; Is 55,1; Zc 14,8; 1Cor 10,4; Ap 21,6; 22,17.
995
Cf. 1Jo 2,20.27; 2Cor 1,21.
996
Cf. Ex 30,22-32.
997
Cf. 15m 16,13.
998
Cf. Lc 4,18-19; Is 61,1.
999
Cf. Lc 2,11.
1000
Cf. Lc 2,26-27.
1001
Cf. Lc 4,1.
1002
Cf. Lc 6,19; 8,46.
1003
Cf. Rm 1,4; 8,11.
1004
Cf. At 2,36.
1005
Sto. Agostinho, Serm. 341,1,1: PL 39, 1493; ibid. 9,11: PL 39,1499.
1006
Cf. 1Rs 18,38-39.
1007
Cf. At 2,3-4.
1008
Cf. S. Joo da Cruz, A chama viva do amor.
1009
Cf. Ex 24,15-18.
1010
Cf. Ex 33,9-10.
1011
Cf. Ex 40,36-38; 1Cor 10,1-2.
1012
Cf. 1Rs 8,10-12.
1013
Cf. Lc 1,35.
1014
Cf. At 1,9.
1015
Cf. Lc 21,27.
1016
Cf. 2Cor 1,22; Ef 1,13; 4,30.
tradies teolgicas para exprimir o "carter" indelvel impresso por estes trs
sacramentos que no podem ser reiterados.
699. A mo. E impondo as mos que Jesus cura os doentes1017 e abenoa as
criancinhas1018. Em nome dele, os apstolos faro o mesmo1019. Melhor ainda; pela
imposio das mos dos apstolos que o Esprito Santo dado1020. A Epstola aos Hebreus
inclui a imposio das mos entre os "artigos fundamentais" de seu ensinamento1021. A
Igreja conservou este sinal da efuso onipotente do Esprito Santo em suas epicleses
sacramentais.
700. O dedo. "E pelo dedo de Deus que (Jesus) expulsa os demnios.1022 Se a Lei de Deus
foi escrita em tbuas de pedra "pelo dedo
de Deus" (Ex 31,18), a "letra de Cristo", entregue aos cuidados dos apstolos, " escrita
com o Esprito de Deus vivo no em tbuas de pedra, mas em tbuas de carne, nos
coraes" (2Cor 3,3). O hino "Veni, Creator Spiritus" (Vem, Esprito criador) invoca o
Esprito Santo como "dedo da direita paterna" (digitus paternae dexterae)1023
701. A pomba. No fim do dilvio (cujo simbolismo est ligado ao batismo), a pomba solta
por No volta com um ramo novo de oliveira no bico, sinal de que a terra de novo
habitvel1024. Quando Cristo volta a subir da gua de seu batismo, o Esprito Santo, em
forma de uma pomba, desce sobre Ele e sobre Ele permanece1025. O Esprito desce e
repousa no corao purificado dos batizados. Em certas igrejas, a santa Reserva
eucarstica conservada em um recipiente metlico em forma de pomba (o columbarium)
suspenso acima do altar. O smbolo da pomba para sugerir o Esprito Santo tradicional na
iconografia crist.
III. O Esprito e a Palavra de Deus no tempo das promessas
702. Desde o comeo at a "plenitude do tempo"1026, a misso conjunta do Verbo e do
Esprito do Pai permanece escondida, mas est em ao. O Esprito de Deus prepara a o
tempo do Messias, e os dois, sem serem ainda plenamente revelados, j so prometidos, a
fim de serem esperados e acolhidos quando se manifestarem. E por isso que, quando a
Igreja l o Antigo Testamento1027, procura nele1028 o que o Esprito, "que falou pelos
profetas" 1029, quer falar-nos a respeito de Cristo.
Por "profetas", a f da Igreja entende aqui todos aqueles que o Esprito Santo inspirou
para o anncio de viva voz e na redao dos livros sagrados, tanto do Antigo como do
Novo Testamento. A tradio judaica distingue a Lei (os cinco primeiros livros ou
Pentateuco), os Profetas (nossos livros denominados histricos e profticos) e os Escritos
(sobretudo sapienciais, em particular os Salmos)1030.
NA CRIAO
703. A Palavra de Deus e seu Sopro esto na Origem do ser e da vida de toda criatura1031:
Ao Esprito Santo cabe reinar, santificar e animar a criao, pois Deus consubstancial ao
Pai e ao Filho... A ele cabe o poder sobre a vida, pois, sendo Deus, ele conserva a criao
no Pai pelo Fi1ho1032.
704. "Quanto ao homem, Deus o modelou com as prprias mos [isto , o Filho e o
Esprito Santo] (...) e imprimiu na carne modelada sua prpria forma, de modo que at o
que fosse visvel tivesse a forma divina."1033
O ESPRITO DA PROMESSA
705. Desfigurado pelo pecado e pela morte, o homem continua sendo "a imagem de Deus,
a imagem do Filho, mas "privado da Glria de Deus"1034, privado da "semelhana". A pro-
messa feita a Abrao inaugura a Economia da salvao, no fim da qual o prprio Filho
assumir "a imagem"1035 e a restaurar na "semelhana" com o Pai, restituindo-lhe a
Glria, o Esprito "que d a vida.
706. Contra toda esperana humana, Deus promete a Abrao uma descendncia, como
fruto da f e do poder do Esprito Santo1036. Nela sero abenoadas todas as naes da
terra1037 Esta descendncia ser Cristo1038, no qual a efuso do Esprito Santo far "a

1017
Cf. Mc 6,5; 8,23.
1018
Cf. Mc 10,16.
1019
Cf. Mc 16,18; At 5,12;14,3.
1020
Cf At 8,17-19; 13,3; 19,6.
1021
Cf Hb 6,2.
1022
Cf. Lc 11,20.
1023
Em Dominica Pentecostes, Hymnus as I et II Vesperas: Liturgia horarum, v. 2, Tipografia Poliglota Vaticana, 1974, pp. 795 e 812.
1024
Cf. Gn 88-12.
1025
Cf. Mt 3,16 par.
1026
Cf. Gl 4,4.
1027
Cf. 2Cor 3,14.
1028
Cf. Jo 5,39.46.
1029
Smbolo niceno-constantinopolitano: DS 150.
1030
Cf. Lc 24,44.
1031
Cf. SI 33,6; 104,30; Gn 1,2; 2,7; Ecl 3,20-21; Ez 37,10.
1032
Liturgia bizantina, Troprio das matinais dos domingos do segundo modo.
1033
Sto. Irineu, Dem. ap., 11.
1034
Cf. Rm 3,23.
1035
Cf. Jo 1,14; FI 2,7.
1036
Cf. Gn 18,1 15; Lc 1,26 38.54 55; Jo 1,12 13; Rm 4,16 21.
1037
Cf. Gn 12,3.
1038
Cf. GI 3,16.
unidade dos filhos de Deus dispersos"1039. Ao comprometer-se por juramento1040, Deus j
se compromete a dar seu Filho bem-amado1041 e "o Esprito da promessa... que prepara a
redeno do Povo que Deus adquiriu para si"1042.
NAS TEOFANIAS E NA LEI
707. As Teofanias (manifestaes de Deus) iluminam o caminho da promessa, desde os
patriarcas at Moiss e de Josu at as vises que inauguram a misso dos grandes
profetas. A tradio crist sempre reconheceu que, nessas Teofanias, o Verbo de Deus se
fazia ver e ouvir, revelado e ao mesmo tempo "oculto" na Nuvem do Esprito Santo.
708. Esta pedagogia de Deus aparece especialmente no dom da Lei1043, a qual foi dada
como um "pedagogo" para conduzir o Povo a Cristo1044. Mas sua impotncia para salvar o
homem privado da "semelhana" divina e do conhecimento maior que ela d do pecado1045
suscitam o desejo do Esprito Santo. Os gemidos dos Salmos atestam isto.
No REINO E NO EXLIO
709. A Lei, sinal da promessa e da aliana, deveria ter regido o corao e as instituies do
povo nascido da f de Abrao. "Se ouvirdes minha voz e guardardes minha aliana... sereis
para mim um reino de sacerdotes e uma nao santa" (Ex l9,5-6)1046. Mas, depois de Davi,
Israel sucumbe tentao de tornar-se um reino como as demais naes. Ora, o Reino,
objeto da promessa feita a Davi1047, ser obra do Esprito Santo; ele pertencer aos pobres
segundo o Esprito.
710. O esquecimento da Lei e a infidelidade Aliana desembocam na morte: o Exlio,
aparentemente fracasso das Promessas, mas, na realidade, fidelidade misteriosa do Deus
salvador e incio de uma restaurao prometida, mas segundo o Esprito. Era preciso que o
Povo de Deus sofresse essa purificao1048; o Exlio j traz a sombra da Cruz no Projeto de
Deus, e o Resto dos pobres que volta de l uma das figuras mais transparentes da
Igreja.
A EXPECTATIVA DO MESSIAS E DE SEU ESPRITO
711. "Eis que vou fazer uma coisa nova" (Is 43,19): duas linhas profticas vo desenhar-
se, uma levando para a espera do Messias, a outra para o anncio de um Esprito Novo, e
ambas convergindo no pequeno Resto, O povo dos Pobres1049, que aguarda na esperana a
"consolao de Israel" e "a libertao de Jerusalm" (Lc 2,25.38).
Vimos anteriormente como Jesus realiza as profecias que lhe dizem respeito. Limitamo-nos
aqui quelas em que aparece mais a relao entre o Messias e seu Esprito.
712. Os traos do rosto do Messias esperado comeam a aparecer no Livro do Emanuel1050
("quando Isaias teve a viso da Glria" de Cristo: Jo 12,41), em especial em Is 11,1-2:
Um ramo sair do tronco de Jess,
um rebento brotar de suas razes:
sobre ele repousar o esprito do Senhor,
esprito de sabedoria e de inteligncia,
esprito de conselho e de fortaleza,
esprito de conhecimento e de temor do Senhor.
713. Os traos do Messias so revelados sobretudo nos cantos do Servo1051. Esses cantos
anunciam o sentido da Paixo de Jesus e indicam, assim, a maneira como ele derramar o
Esprito Santo para vivificar a multido: no partindo de fora, mas desposando nossa
"condio de escravo" (FI 2,7). Tomando sobre si nossa morte, ele pode comunicar-nos
seu prprio Esprito de vida.
714. por isso que Cristo inaugura o anncio da Boa Nova, fazendo sua esta passagem de
Isaias (Lc 4,l8-l9)1052:
O Esprito do Senhor est sobre mim,
porque ele me ungiu
para evangelizar os pobres;
curar aos de corao ferido;
enviou-me para proclamar a remisso aos presos,
e aos cegos a recuperao da vista,

1039
Cf. Jo 11,52.
1040
Cf. Lc 1,73.
1041
Cf. Gn 22,17-18; Rm 8,32; Jo 3,16.
1042
Cf. Ef 1,13-14; 613,14.
1043
Cf. Ex 19,20; Dt 1-11; 29-30.
1044
Cf. 61 3,24.
1045
Cf. Rm 3,20.
1046
1Pd 2,9.
1047
Cf. 2Sm 7; SI 88; Lc 1,32-33.
1048
Cf. Lc 24,26.
1049
Cf. SI 2,3.
1050
Cf. Is 612.
1051
Cf Is 42,1-9; Mt 12,18-21; Jo 1,32-34, e tambm Is 49,16; Mt 3,17; Lc 2,32 e, finalmente, Is 50,4-10 e 52,13-15; 53,12.
1052
Cf. Is 61,1-2.
para restituir a liberdade aos oprimidos
e para proclamar um ano de graa do Senhor.
715. Os textos profticos diretamente referentes ao envio do Esprito Santo so orculos
em que Deus fala ao corao de seu Povo na linguagem da promessa, com as tnicas do
"amor e da fidelidade"1053, cujo cumprimento 5. Pedro proclamar na manh de
Pentecostes1054. Segundo essas promessas, nos "ltimos tempos" o Esprito do Senhor
renovar o corao dos homens, gravando neles uma Lei Nova; reunir e reconciliar os
povos dispersos e divididos; transformar a criao primeira; e Deus habitar nela com os
homens na paz.
716. O Povo dos "pobres"1055 os humildes e os mansos, totalmente entregues aos
desgnios misteriosos de seu Deus, os que esperam a justia no dos homens, mas do
Messias finalmente a grande obra da misso escondida do Esprito Santo durante o
tempo das promessas para preparar a vinda de Cristo. a sua qualidade de corao,
purificado e iluminado pelo Esprito, que se exprime nos Salmos. Nesses pobres, o Esprito
prepara para o Senhor "um povo bem-disposto"1056.
IV. O Esprito de Cristo na plenitude do tempo
JOO, PRECURSOR, PROFETA E BATISTA
717. "Houve um homem enviado por Deus. Seu nome era Joo" (Jo 1,6). Joo "repleto
do Esprito Santo, ainda no seio de sua me" (Lc 1,15)1057, por obra do prprio Cristo que a
Virgem Maria acabava de conceber do Esprito Santo. A "visitao" de Maria a Isabel
tornou-se, assim, "visita de Deus ao seu povo"1058.
718. Joo "Elias que deve vir"1059: o Fogo do Esprito habita nele e o faz "correr adiante"
(na qualidade de "precursor") do Senhor que vem. Em Joo, o Precursor, o Esprito Santo
conclua a obra de "preparar para o Senhor um povo bem-disposto" (Lc 1,17).
719. Joo "mais do que um profeta"1060. Nele, o Esprito Santo conclui a tarefa de "falar
pelos profetas". Joo encerra o ciclo dos profetas inaugurado por Elias1061. Anuncia a
iminncia da Consolao de Israel, a "voz" do Consolador que vem1062 Como far o
Esprito de Verdade, "ele vem como testemunha, para dar testemunho da Luz" (Jo 1,7)1063.
Aos olhos de Joo, o Esprito realiza, assim, as "pesquisas dos profetas" e o "desejo" dos
anjos1064: "Aquele sobre quem vires o Esprito descer e permanecer o que batiza com o
Esprito Santo. Eu vi e dou testemunho de que ele o Filho de Deus... Eis o Cordeiro de
Deus" (Jo 1,33-36).
720. Finalmente, com Joo Batista o Esprito Santo inaugura, prefigurando-o, o que
realizar com e em Cristo: restituir ao homem "a semelhana" divina. O Batismo de Joo
era para o arrependimento, o Batismo da gua e no Esprito ser um novo nascimento1065.
"ALEGRA-TE, CHEIA DE GRAA"
721. Maria, a Me de Deus toda santa, sempre Virgem, a obra-prima da misso do Filho
e do Esprito na plenitude do tempo.
Pela primeira vez no plano da salvao e porque o seu Esprito a preparou, o Pai encontra
a Morada em, que seu Filho e seu Esprito podem habitar entre os homens. E neste sentido
que a Tradio da Igreja muitas vezes leu, com relao a Maria, os mais belos textos sobre
a Sabedoria'1066: Maria decantada e representada na Liturgia como o "trono da
Sabedoria".
Nela comeam a manifestar-se as "maravilhas de Deus" que o Esprito vai realizar em
Cristo e na Igreja.
722. O Esprito Santo preparou Maria com sua graa. Convinha que fosse "cheia de graa"
a me daquele em quem "habita corporalmente a Plenitude da Divindade" (Cl 2,9). Por
pura graa, ela foi concebida sem pecado como a mais humilde das criaturas, a mais capaz
de acolher o Dom inefvel do Todo-Poderoso. E com razo que o, anjo Gabriel a sada
como a "filha de
Sio": "Alegra-te"1067. E a ao de graas de todo o Povo de Deus, e portanto da Igreja,
que ela faz subir ao Pai no Esprito Santo em seu cntico1068, enquanto traz em si o Filho
Eterno.

1053
Cf. Ez 11,19; 36,25-28; 37,1-14; Jr 31,31-34; JI 3,1-5.
1054
Cf. At 2,17-21.
1055
Cf. SI 2,3; SI 22,27; 34,3; Is 49,13; 61,1 etc.
1056
Cf. Lc 1,17.
1057
Cf. Lc 1,41.
1058
Cf. Lc 1,68.
1059
Cf. Mt 17,10-13.
1060
Cf. Lc 7,26.
1061
Cf. Mt 11,13-14.
1062
Cf. Jo 1,23; Is 40,1-3.
1063
Cf. Jo 15,26; 5,33.
1064
Cf. 1Pd 1,10-12.
1065
Cf. Jo 3,5.
1066
Cf. Pr 8,1-9,6; Eclo 24.
1067
Cf. SI 3,14; Zc 2,14.
1068
Cf. Lc 1,46-55.
723. Em Maria, o Esprito Santo realiza o desgnio benevolente do Pai. E pelo Esprito Santo
que a Virgem concebe e d luz o Filho de Deus. Sua virgindade transforma-se em fe-
cundidade nica pelo poder do Esprito e da f1069.
724. Em Maria, o Esprito Santo manifesta o Filho do Pai tornado Filho da Virgem. Ela a
Sara ardente da Teofania definitiva: repleta do Esprito Santo, ela mostra o Verbo na
humildade de sua carne, e aos Pobres1070 e as primcias das naes1071 que ela o d a
conhecer.
725. Finalmente, por Maria o Esprito Santo comea a pr em Comunho com Cristo os
homens, "objetos do amor benevolente de Deus"1072, e os humildes so sempre os
primeiros a receb-lo: os pastores, os magos, Simeo e Ana, os esposos de Can e os
primeiros discpulos.
726. Ao final desta misso do Esprito, Maria torna-se a "Mulher", nova Eva, "me dos
viventes", Me do "Cristo total"1073. nesta qualidade que ela est presente com os Doze,
"com um s corao, assduos orao" (At 1,14), na aurora dos "ltimos tempos" que o
Esprito vai inaugurar na manh de Pentecostes, com a manifestao da Igreja.
O CRISTO JESUS
727. Toda a misso do Filho e do Esprito Santo na plenitude do tempo est contida no fato
de o Filho ser o Ungido do Esprito do Pai desde a sua Encarnao: Jesus o Cristo, o
Messias.
Todo o segundo captulo do Smbolo da f deve ser lido sob esta luz. Toda a obra de Cristo
misso conjunta do Filho e do Esprito Santo. Aqui mencionaremos somente o que diz
respeito promessa do Esprito Santo feita por Jesus e o dom do Esprito pelo Senhor
glorificado.
728. Jesus no revela plenamente o Esprito Santo enquanto Ele mesmo no glorificado
por sua Morte e Ressurreio. Contudo, sugere-o pouco a pouco, mesmo em seus ensina-
mentos s multides, quando revela que sua Carne ser alimento para a vida do
mundo1074. Sugere-o tambm a Nicodemos1075, Samaritana1076 e aos que participam da
festa dos Tabernculos'1077. A seus discpulos, fala dele abertamente a propsito da
Orao1078 e do testemunho que devero dar1079.
729. somente quando chega a Hora em que vai ser glorificado que Jesus promete a
vinda do Esprito Santo, pois sua Morte e Ressurreio sero o cumprimento da Promessa
feita aos Apstolos1080.
o Esprito de Verdade, o Parclito, ser dado pelo Pai a pedido de Jesus; Ele ser enviado
pelo Pai em nome de Jesus; Jesus o enviar de junto do Pai, pois ele procede do Pai. O
Esprito Santo vir, ns o conheceremos, Ele estar conosco para sempre, Ele permanecer
conosco; Ele nos ensinar tudo e nos lembrar de tudo o que Cristo nos disse, e dele dar
testemunho; conduzir-nos- verdade inteira e glorificar a Cristo. Quanto ao mundo,
confundi-lo- em matria de pecado, de justia e de julgamento.
730. Finalmente chega a Hora de Jesus1081: Jesus entrega seu esprito nas mos do Pai1082
no momento em que, por sua Morte, vencedor da morte, de maneira que, "ressuscitado
dos mortos pela Glria do Pai" (Rm 6,4), d imediatamente o Esprito Santo, "soprando"
sobre seus discpulos1083. A partir dessa Hora, a misso de Cristo e do Esprito passa a ser
a misso da Igreja: "Como o Pai me enviou, tambm eu vos envio" (Jo 20,21)1084.
V. O Esprito e a Igreja nos ltimos tempos
PENTECOSTES
731. No dia de Pentecostes (no fim das sete semanas pascais), a Pscoa de Cristo se
realiza na efuso do Esprito Santo, que manifestado, dado e comunicado como Pessoa
Divina: de sua plenitude, Cristo, Senhor, derrama em profuso o Espirito1085.
732. Nesse dia revelada plenamente a Santssima Trindade. A partir desse dia, o Reino
anunciado por Cristo est aberto aos que crem nele; na humildade da carne e na f, eles
participam j da comunho da Santssima Trindade. Por sua vinda,e ela no cessa, o
Esprito Santo faz o mundo entrar nos "ltimos tempos", o tempo da Igreja, o Reino j
recebido em herana, mas ainda no consumado:

1069
Cf. Lc 1,26-38; Rm 4,18-21; Gl 4,26-28.
1070
Cf. Lc 2,15-19.
1071
Cf. Mt 2,11.
1072
Cf. Lc 2,14.
1073
Cf. Jo 19,25-27.
1074
Cf. Jo 6,27.51.62-63.
1075
Cf. Jo 3,5-8.
1076
Cf. Jo 4,10.14.23-24.
1077
Cf. Jo 7,37-39.
1078
Cf. Lc 11,13.
1079
Cf. Mt 10,19-20.
1080
Cf. Jo 14,16-17.26; 15,26; 16,7-15; 17,26.
1081
Cf. Jo 13,1; 17,1.
1082
Cf. Lc 23,46; Jo 19,30.
1083
Cf. Jo 20,22.
1084
Cf. Mt 28,19; Lc 24,47-48; At 1,8.
1085
Cf. At 2,33-36.
Vimos a verdadeira Luz, recebemos o Esprito celeste, encontramos a verdadeira f:
adoramos a Trindade indivisvel, pois foi ela quem nos salvou1086.
O ESPRITO SANTO - O DOM DE DEUS
733. "Deus Amor" (1Jo 4,8.16), e o Amor o primeiro dom. Ele contm todos os demais.
Este amor, "Deus o derramou em nossos coraes pelo Esprito que nos foi dado" (Rm
5,5).
734. Pelo fato de estarmos mortos, ou, pelo menos, feridos pelo pecado, o primeiro efeito
do dom do Amor a remisso de nossos pecados. E a comunho do Esprito Santo (2Cor
13,13) que, na Igreja, restitui aos batizados a semelhana divina perdida pelo pecado.
735. Ele d, ento, o "penhor" ou as primcias" de nossa Herana1087: a prpria vida da
Santssima Trindade, que amar "como Ele nos amou"1088. Este amor (a caridade de 1Cor
13) o principio da vida nova em Cristo, possibilitada pelo fato de termos "recebido uma
fora, a do Esprito Santo" (At 1,8).
736. por este poder do Esprito que os filhos de Deus podem dar fruto. Aquele que nos
enxertou na verdadeira vida nos far produzir "o fruto do Esprito, que amor, alegria,
paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansido, autodomnio" (Gl 5,22-
23). "Se vivemos pelo Esprito", quanto mais renunciarmos a ns mesmos1089, tanto mais
"pelo Esprito pautemos tambm a nossa conduta"1090.
Por estarmos em comunho com Ele, o Esprito Santo toma-nos espirituais, recoloca-nos
no Paraso, reconduz-nos ao Reino dos Cus e adoo filial, d-nos a confiana de
chamarmos Deus de Pai e de participarmos na graa de Cristo, de sermos chamados filhos
da luz e de termos parte na vida eterna1091.
O ESPRITO SANTO E A IGREJA
737. A misso de Cristo e do Esprito Santo realiza-se na Igreja, Corpo de Cristo e Templo
do Esprito Santo. Esta misso conjunta associa a partir de agora os fiis de Cristo sua
comunho com o Pai no Esprito Santo: o Esprito prepara os homens, antecipa-se a eles
por sua graa, para atra-los a Cristo. Manifesta-lhes o Senhor ressuscitado, lembra-lhes
sua palavra, abrindo-lhes o esprito compreenso de sua Morte e Ressurreio. Torna-
lhes presente o mistrio de Cristo, eminentemente na Eucaristia, a fim de reconcili-los, de
coloc-los em comunho com Deus, a fim de faz-los produzir "muito fruto"1092.
738. Assim, a misso da Igreja no acrescentada de Cristo e do Esprito Santo, seno
que o Sacramento dela: por todo o seu ser e em todos os seus membros, a Igreja
enviada a anunciar e testemunhar, atualizar e difundir o mistrio da comunho da
Santssima Trindade (a ser tratado no prximo artigo):
Ns todos, que recebemos o nico e mesmo esprito, a saber, o Esprito Santo, unimo-nos
profundamente entre ns e com Deus. Pois embora sejamos numerosos separadamente e
embora Cristo faa com que o Esprito do Pai e o dele habite em cada um de ns, este
Esprito nico e indivisvel reconduz por si mesmo unidade os que so distintos entre si...
e faz com que todos apaream como uma s coisa nele mesmo. E, da mesma forma que o
poder da santa humanidade de Cristo faz com que todos aqueles em quem ela se encontra
formem um s corpo, penso que da mesma maneira o Esprito de Deus que habita em
todos, nico e indivisvel, os reconduz todos unidade espiritual1093.
739. Por ser o Esprito Santo a uno de Cristo, Cristo, a Cabea do Corpo, que o difunde
em seus membros, para aliment-los, cur-los, organiz-los em suas funes mtuas,
vivific-los, envi-los a testemunhar, associ-los sua oferta ao Pai e sua intercesso
pelo mundo inteiro. pelos sacramentos da Igreja que Cristo comunica aos membros de
seu Corpo o seu Esprito Santo e Santificador (a ser tratado na segunda parte do
Catecismo).
740. Essas "maravilhas de Deus", oferecidas aos crentes nos sacramentos da Igreja,
produzem seus frutos na vida nova, em Cristo, segundo o Esprito (a ser tratado na
terceira parte do Catecismo).
741. "O Esprito socorre a nossa fraqueza, pois no sabemos o que seja conveniente pedir;
mas o prprio Esprito intercede por ns com gemidos inefveis" (Rm 8,26). O Esprito
Santo, artfice das obras de Deus, o Mestre da orao (a ser tratado na quarta parte do
Catecismo).
RESUMINDO
742. "E, porque sois filhos, enviou Deus a nossos coraes o Esprito de seu Filho que
clama: Abb, Pai" (Gl 4,6).

1086
Liturgia bizantina, Troprio de Vsperas de Pentecostes, retomado nas Liturgias eucarsticas aps a comunho.
1087
Cf. Rm 8,23; 2Cor 1,22.
1088
Cf. 1Jo 4,1 1-12.
1089
Cf. Mt 16,24-26.
1090
Cf. GI 5,25.
1091
S. Basilio, Liber de Spiritu Sancto, 15,36: PG 32,132.
1092
Cf. Jo 15,5.8.16.
1093
S. Cinlo de Mexandria, Commentarius in Iohannem, 11,11: PG 74,561.
743. Desde o incio at a consumao do tempo, quando Deus envia seu Filho, envia
sempre seu Esprito: a misso dos dois conjunta e inseparvel.
744. Na plenitude do tempo, o Esprito Santo realiza em Maria todas as preparaes para a
vinda de Cristo no Povo de Deus. Pela ao do Esprito Santo nela, o Pai d ao mundo o
Emanuel, "Deus-conosco" (Mt ],23).
745. O Filho de Deus consagrado Cristo (Messias) pela uno do Esprito Santo em sua
Encarnao1094
746. Por sua Morte e Ressurreio, Jesus constitudo Senhor e Cristo na glria1095. De
sua Plenitude, derrama o Esprito Santo sobre os apstolos e a Igreja.
747. O Esprito Santo que Cristo, Cabea, derrama em seus membros constri, anima e
santifica a Igreja. Ela o sacramento da Comunho da Santssima Trindade e dos homens.
ARTIGO 9
"CREIO NA SANTA IGREJA CATLICA"
748. "Sendo Cristo a Luz dos Povos, este sacrossanto Snodo, congregado no Esprito
Santo, deseja ardentemente anunciar o Evangelho a toda criatura' e iluminar todos os
homens com a claridade de Cristo que resplandece na face da Igreja."1096 com essas
palavras que comea a "Constituio dogmtica sobre a Igreja" do Concilio Vaticano II.
Com isso, o Conclio mostra que o artigo de f sobre a Igreja depende inteiramente dos
artigos concernentes a Cristo Jesus. A Igreja no tem outra luz seno a de Cristo; segundo
uma imagem cara aos Padres da Igreja, ela comparvel lua, cuja luz toda reflexo do
sol.
749. O artigo sobre a Igreja depende tambm inteiramente do artigo sobre o Esprito, que
o precede. "Com efeito, aps termos mostrado que o Esprito Santo a fonte e o doador
de toda santidade, confessamos agora que foi Ele quem dotou a Igreja de santidade."1097
Segundo a expresso dos Padres, a Igreja o lugar "onde floresce o Espirito"1098.
750. Crer que a Igreja "santa" e "catlica" e que ela "una" e "apostlica" (como
acrescenta o Smbolo niceno-constantino-politano) inseparvel da f em Deus Pai, Filho e
Esprito Santo. No Smbolo dos Apstolos, fazemos profisso de crer em uma Igreja Santa
("Credo... Ecclesiam"), e no na Igreja, para no confundir Deus com suas obras e para
atribuir claramente bondade de Deus todos os dons que ele ps em sua Igreja1099.
PARGRAFO 1
A IGREJA NO DESGNIO DE DEUS
I. As denominaes e as imagens da Igreja
751. A palavra "Igreja" ["ekklsia", do grego "ekkalin" "chamar fora"] significa
"convocao". Designa assemblias do povo1100, geralmente de carter religioso. E o termo
frequentemente usado no Antigo Testamento grego para a assemblia do povo eleito
diante de Deus, sobretudo para a assemblia do Sinai, onde Israel recebeu a Lei e foi
constitudo por Deus como seu povo santo1101. Ao denominar-se "Igreja", a primeira
comunidade dos que criam em Cristo se reconhece herdeira dessa assemblia. Nela, Deus
"convoca" seu Povo de todos os confins da terra. O termo "Kyriaka", do qual deriva
"Church", "Kirche", significa "a que pertence ao Senhor".
752. Na linguagem crist, a palavra "Igreja" designa a assemblia litrgica1102, mas
tambm a comunidade local1103 ou toda a comunidade universal dos crentes1104. Esses trs
significados so inseparveis. "A Igreja" e o Povo que Deus rene no mundo inteiro. Existe
nas comunidades locais e se realiza como assemblia litrgica, sobretudo eucarstica. Ela
vive da Palavra e do Corpo de Cristo e se torna, assim, Corpo de Cristo.
OS SMBOLOS DA IGREJA
753. Na Sagrada Escritura, encontramos uma multido de imagens e figuras interligadas,
pelas quais a revelao fala do mistrio inesgotvel da Igreja. As imagens tiradas do
Antigo Testamento constituem variaes de uma idia de fundo, a do "Povo de Deus". No
Novo Testamento1105, todas essas imagens encontram um novo centro pelo fato de Cristo
tornar-se "a Cabea" deste povo1106, que , ento, seu Corpo. Em torno deste centro
agruparam-se imagens "tiradas ou da vida pastoril ou da vida dos campos, ou do trabalho
de construo ou da famlia e do casamento"1107.

1094
Cf. Sl 2,6-7.
1095
Cf. At 2,36.
1096
LG 1: AAS 57 (1965) 5.
1097
Catech. R. 1,10,1.
1098
S. Hiplito, Trad. ap., 35.
1099
Cf. Catech. R. 1,10,22.
1100
Cf. At 19,39.
1101
Cf. Ex 19.
1102
Cf. 1Cor 11,18; 14,19.29.34.35.
1103
Cf. 1Cor 1,2; 16,1.
1104
Cf. 1Cor 15,9; Gl 1,13; Fl 3,6.
1105
Cf. Ef 1,22; Cl 1,18.
1106
Cf. LG 9.
1107
LG6.
754. "Com efeito, a Igreja o redil, do qual Cristo a nica e necessria porta1108. Ela
tambm a grei, da qual o prprio Deus prenunciou que seria o pastor1109. Suas ovelhas,
embora governadas por pastores humanos, so, contudo, incessantemente conduzidas e
alimentadas pelo prprio Cristo, Bom Pastor e Prncipe dos pastores1110, que deu sua vida
por suas ovelhas1111 "1112
755. "A Igreja a lavoura ou campo de Deus (1Cor 3,9). Nesse campo cresce a oliveira
antiga, cuja raiz santa foram os Patriarcas e em que foi feita e se far a reconciliao dos
judeus e dos gentios1113. Ela foi plantada pelo celeste Viticultor como vinha eleita1114. Cristo
a verdadeira Vide, que d vida e fecundidade aos ramos, quer dizer, a ns' que pela
Igreja permanecemos nele, sem o qual nada podemos fazer1115. "1116
756. "Com freqncia a Igreja tambm chamada de construo de Deus1117. O prprio
Senhor comparou-se pedra que os construtores rejeitaram e se tomou a pedra angular
(Mt 21,42 par.; At 4,11; 1Pd 2,7; 51118,22). Sobre este fundamento a Igreja construda
pelos apstolos1118, e dele recebe firmeza e coeso. Essa construo recebe vrios nomes:
casa de Deus1119a na qual habita sua famlia, morada de Deus no Esprito1120, tenda de
Deus entre os homens1121 e principalmente templo santo, que, representado pelos
santurios de pedra, louvado pelos santos Padres e, no sem razo, comparado na
Liturgia com a Cidade santa, a nova Jerusalm. Pois nela somos, nesta terra, como as
pedras vivas que entram na construo1122. E Joo contempla esta cidade santa que, na
renovao do mundo, desce do cu, de junto de Deus, adornada como uma esposa
enfeitada para seu esposo (Ap 2I,l-2).1123
757. "A Igreja chamada tambm de 'Jerusalm celeste' e 'nossa Me' (G1 4,26)1124. E
ainda descrita como a esposa imaculada do Cordeiro imaculado1125. Cristo 'amou-a e por
Ela se entregou, a fim de santific-la' (Ef 5,26); associou-a a si por uma aliana
indissolvel e incessantemente 'a nutre e dela cuida' (Ef 5,29)."1126
II. Origem, fundao e misso da Igreja
758. Para perscrutar o mistrio da Igreja, convm meditar primeiro sobre sua origem no
desgnio da Santssima Trindade e sobre sua realizao progressiva no curso da histria.
UM PROJETO NASCIDO NO CORAO DO PAI
759. "O Pai eterno, por librrimo e arcano desgnio de sua sabedoria e bondade, criou todo
o universo; decidiu elevar os homens comunho da vida divina", a qual chama todos os
homens em seu Filho:
"Todos os que crem em Cristo, o Pai quis cham-los a formarem a santa Igreja". Esta
"famlia de Deus" se constitui e se realiza gradualmente ao longo das etapas da histria
humana, segundo as disposies do Pai. Com efeito, "desde a origem do mundo a Igreja
foi prefigurada. Foi admiravelmente preparada na histria do povo de Israel e na antiga
aliana. Foi fundada nos ltimos tempos. Foi manifestada pela efuso do Esprito. E no fim
dos tempos ser gloriosamente consumada"1127
A IGREJA _ PREFIGURADA DESDE A ORIGEM DO MUNDO
760. O mundo foi criado em vista da Igreja", diziam os cristos dos primeiros tempos1128.
Deus criou o mundo em vista da comunho com sua vida divina, comunho esta que se
realiza pela convocao" dos homens em Cristo, e esta "convocao" a Igreja. A Igreja
a finalidade de todas as coisas1129, e as prprias vicissitudes dolorosas, como a queda dos
anjos e o pecado do homem, s foram permitidas por Deus como ocasio e meio para
desdobrar toda a fora de seu brao, toda a medida de amor que Ele queria dar ao mundo:
Assim como a vontade de Deus um ato e se chama mundo, assim tambm sua inteno
a salvao dos homens e se chama Igreja1130.
A IGREJA _ PREPARADA NA ANTIGA ALIANA
761. O congraamento do povo de Deus comea no instante em que o pecado destri a
comunho dos homens com Deus e a dos homens entre si. A convocao da Igreja por
assim dizer a reao de Deus ao caos provocado pelo pecado. Esta reunificao realiza-se

1108
Jo 10,1-10.
1109
Cf.Is 40,11;Ez 34,11-31.
1110
Cf. Jo 10,11; 1Pd 5,4.
1111
Cf. Jo 10,11-15.
1112
LG 6: AAS 57 (1965) 8.
1113
Rm 11,13-26.
1114
Mt 21,33-43 par.; cl. Is 5,lss.
1115
Cf. Jo 15,1-5.
1116
LG 6: AAS 57(1965)8.
1117
Cf. 1Cor 3,9.
1118
Cf. 1Cor 3,11.
1119
1Trn 3,15.
1120
Cf. Ef 2,19-22.
1121
Cf. Ap 21,3.
1122
Cf. 1Pd 2,5.
1123
LG 6: AAS 57 (1965) 8-9.
1124
Cf. Ap 12,17.
1125
Cf Ap 19,7; 21,2.9; 22,17.
1126
LG 2: AAS 57 (1965) 9.
1127
LG 2: AAS 57(1965)5-6.
1128
Hermas, Visiones pastoris, 2,41; cl. Aristides, Apol. 16,7: BP 11,125 Justino Apol., 2,7: CA 1,216-218 (PG 6,456).
1129
Cf. Sto. Epifnio, Panarion seu adversus LXXX haereses, 1,1,5: PG 41,181C.
1130
Clemente de A1exandria Paed., 1,6.
secretamente dentro de todos os povos: "Em qualquer nao, quem o teme e pratica a
justia lhe agradvel" (At 1O,35)1131.
762. A preparao longnqua da reunio do Povo de Deus comea com a vocao de
Abrao, a quem Deus promete que ser o pai de um grande povo1132. A preparao
imediata tem seus incios com a eleio de Israel como povo de Deus1133 Por sua eleio,
Israel deve ser o sinal do congraamento futuro de todas as naes1134. Mas j os profetas
acusam Israel de ter rompido a aliana e de ter-se comportado como uma prostituta1135.
Anunciam uma nova e eterna Aliana1136 "Esta Aliana Nova, Cristo a instituiu."1137
A IGREJA _ INSTITUDA POR CRISTO JESUS
763. Cabe ao Filho realizar, na plenitude dos tempos, o plano de salvao de seu Pai. Este
o motivo de sua "misso"1138 "O Senhor Jesus iniciou sua Igreja pregando a Boa Nova,
isto , o advento do Reino de Deus prometido nas Escrituras havia sculos."1139 Para
cumprir a vontade do Pai, Cristo inaugurou o Reino dos Cus na terra. A Igreja e o Reino
de Cristo j misteriosamente presente"1140.
764. "Este Reino manifesta-se lucidamente aos homens na palavra, nas obras e na
presena de Cristo."1141 Acolher a palavra de Jesus "acolher o prprio Reino"1142. O
germe e o comeo do Reino so o "pequeno rebanho" (Lc 12,32) dos que Jesus veio
convocar em torno de si, dos quais ele mesmo o pastor1143. Eles constituem a verdadeira
famlia de Jesus1144. Aos que assim reuniu em torno dele, ensinou uma "maneira de agir"
nova e tambm uma orao prpria1145.
765. O Senhor Jesus dotou sua comunidade de uma estrutura que permanecer at a
plena consumao do Reino. H antes de tudo a escolha dos Doze, com Pedro como seu
chefe1146. Representando as doze tribos de Israel1147, eles so as pedras de fundao da
nova Jerusalm1148. Os Doze1149 e os outros discpulos1150 participam da misso de Cristo,
de seu poder, mas tambm de sua sorte1151. Por meio de todos esses atos, Cristo prepara
e constri sua Igreja.
766. Mas a Igreja nasceu primeiramente do dom total de Cristo para nossa salvao,
antecipado na instituio da Eucaristia e realizado na Cruz. "O comeo e o crescimento da
Igreja so significados pelo sangue e pela gua que saram do lado aberto de Jesus
crucificado."1152 "Pois do lado de Cristo dormindo na Cruz que nasceu o admirvel
sacramento de toda a Igreja."1153 Da mesma forma que Eva foi formada do lado de Ado
adormecido, assim a Igreja nasceu do corao traspassado de Cristo morto na Cruz1154.
A IGREJA _ MANIFESTADA PELO ESPRITO SANTO
767. "Terminada a obra que o Pai havia confiado ao Filho para realizar na terra, foi enviado
o Esprito Santo no dia de Pentecostes para santificar a Igreja permanentemente."1155 Foi
ento que "a Igreja se manifestou publicamente diante da multido e comeou a difuso
do Evangelho com a pregao"1156. Por ser "convocao" de todos os homens para a
salvao, a Igreja , por sua prpria natureza, missionria enviada por Cristo a todos os
povos para fazer deles discpulos1157.
768. Para realizar sua misso, o Esprito Santo "dota e dirige a Igreja mediante os diversos
dons hierrquicos e carismticos"1158. "Por isso a Igreja, enriquecida com os dons de seu
Fundador e empenhando-se em observar fielmente seus preceitos de caridade, humildade
e abnegao, recebeu a misso de anunciar o Reino de Cristo e de Deus e de estabelec-lo
em todos os povos; deste Reino ela constitui na terra o germe e o inicio."1159
A IGREJA _ CONSUMADA NA GLRIA
769. "A Igreja... s ter sua consumao na glria celeste"1160 quando do retorno glorioso
de Cristo. At aquele dia, "a Igreja avana em sua peregrinao por meio das perseguies

1131
Cf. LG 9; 13; 16.
1132
Cf Gn 12,2; 15,5-6.
1133
Cf. Ex 19,5-6; Dt 7,6.
1134
Cf. Is 2,2-5; Mq 4,1-4.
1135
Cf. Os 1; Is 1,2-4; Jr 2 etc.
1136
Cf. Jr 31,31-34; Is 55,3.
1137
LG 9.
1138
Cf. LG 3; AG 3.
1139
LG 5.
1140
LG 3.
1141
LG 5.
1142
LG 5
1143
Cf. Mt 10,16; 26,31; Jo 10,1-21.
1144
Cf. Mt 12,49.
1145
Cf. Mt 5-6.
1146
Cf. Mc 3,14-15.
1147
Cf. Mt 19,28; Lc 22,30.
1148
Cf. Ap 21,12-14.
1149
Cf. Mc 6,7.
1150
Cf. Lc 10,1-2.
1151
Cf. Mt 10,25; Jo 15,20.
1152
LG 3.
1153
SC 5.
1154
Cf. Sto. Ambrsio, in Lc II, 85-89: Pl 15, 1583-1586.
1155
LG 4.
1156
AG 4.
1157
Cf. Mt 28, 19-20; AG 2; 5-6.
1158
LG 4.
1159
LG 5.
1160
LG 48
do mundo e das consolaes de Deus"1161. Aqui na terra, sabe que est em exlio, longe do
Senhor1162, e aspira ao advento pleno do Reino, "a hora em que ela ser, na glria, reunida
a seu Rei"1163. A consumao da Igreja e, por meio dela, a do mundo, na glria, no
acontecer sem grandes provaes. S ento "todos os justos, desde Ado, em seguida
Abel, o justo, at o ltimo eleito, sero congregados junto do Pai na Igreja universal"1164.
III. O mistrio da Igreja
770. A Igreja est na histria, mas ao mesmo tempo a transcende. E unicamente "com os
olhos da f"1165 que se pode enxergar em sua realidade visvel, ao mesmo tempo, uma
realidade espiritual, portadora de vida divina.
A IGREJA _ AO MESMO TEMPO VISVEL E ESPIRITUAL
771. "O Mediador nico, Cristo, constituiu e incessantemente sustenta aqui na terra sua
santa Igreja, comunidade de f, esperana e caridade, como um 'todo' visvel pelo qual
difunde a verdade e a graa a todos." A Igreja ao mesmo tempo:
_ "sociedade provida de rgos hierrquicos e Corpo Mstico de Cristo;
_ assemblia visvel e comunidade espiritual;
_ Igreja terrestre e Igreja enriquecida de bens celestes".
Essas dimenses constituem "uma s realidade complexa, em que se funde o elemento
divino e humano"1166.
Caracteriza-se a Igreja por ser humana e ao mesmo tempo divina, visvel, mas ornada de
dons invisveis, operosa na ao e devotada contemplao, presente no mundo e, no
entanto, peregrina. E isso de modo que nela o humano se ordene ao divino e a ele se
subordine, o visvel ao invisvel, a ao contemplao e o presente cidade futura, que
buscamos1167.
humildade! sublimidade! Tabernculo de Cedar e santurio de Deus; morada terrestre
e palcio celeste; casa de barro e sala rgia; corpo de morte e templo de luz; finalmente,
desprezo para os soberbos e esposa de Cristo! Es negra, mas formosa, filha de
Jerusalm; ainda que desfigurada pelo labor e pela dor do longo exlio, a beleza celeste te
adorna1168.
A IGREJA _ MISTRIO DA UNIO DOS HOMENS COM DEUS
772. na Igreja que Cristo realiza e revela seu prprio mistrio como a meta do desgnio
de Deus: "Recapitular tudo nele" (Ef 1,10). 5. Paulo denomina de "grande mistrio" (Ef
5,32) a unio esponsal entre Cristo e a Igreja. Por estar ela unida a Cristo como a seu
Esposo1169, a prpria Igreja tambm se torna mistrio1170. Contemplando nela o mistrio,
S. Paulo exclama: "Cristo em vs, a esperana da glria" (Cl 1,27).
733. Na Igreja, esta comunho dos homens com Deus pela "caridade que nunca passar"
(1Cor 13,8) a finalidade que comanda tudo o que nela meio sacramental ligado ao
mundo presente que passa1171 "Sua estrutura se ordena integralmente santidade dos
membros do corpo mstico de Cristo. E a santidade medida segundo o 'grande mistrio',
em que a Esposa responde com o dom do amor ao dom do Esposo."1172 Maria nos precede
a todos na santidade que o mistrio da Igreja como "a Esposa sem mancha nem
ruga"1173. Por isso, "a dimenso marial da Igreja antecede sua dimenso petrina"1174.
A IGREJA _ SACRAMENTO UNIVERSAL DA SALVAO
774. A palavra grega "mysterion" foi traduzida para o latim por dois termos: "mysterium"
e "sacramentum" - Na interpretao ulterior, o termo "sacramentum" exprime mais o sinal
visvel da realidade escondida da salvao, indicada pelo termo "mysterium". Neste
sentido, Cristo mesmo o mistrio da salvao: "Non est enim aliud Dei mysterium, nisi
Christus _ Pois no existe outro mistrio de Deus a no ser Cristo"1175. A obra salvfica de
sua humanidade santa e santificante o sacramento da salvao que se manifesta e age
nos sacramentos da Igreja (que as Igrejas do Oriente denominam tambm "os santos
mistrios"). Os sete sacramentos so os sinais e os instrumentos pelos quais o Esprito
Santo difunde a graa de Cristo, que a Cabea, na Igreja, que seu Corpo. A Igreja
contm, portanto, e comunica a graa invisvel que ela significa. neste sentido analgico
que ela chamada de "sacramento".

1161
Sto. Agostinho, De civ. Dei 18,51; cf. LG 8.
1162
Cf. 2Cor 5,6; LG 6.
1163
LG 5.
1164
LG 2.
1165
Catech. R. 1,10,20.
1166
LG 8.
1167
SC 2.
1168
S. Bernardo, Irz Canticum senflo 27,7,14: Opera, ed. J. Leclercq - C.H. Tabot H. Rochais, vol. 1, Roma, 1957, p.191.
1169
Cf. Ef 5,25-27.
1170
Cf. Ef 3,9-11.
1171
Cf. LG 48.
1172
MD 27.
1173
Cf. Ef 5,27.
1174
MD 27: AAS 80 (1988)1718, nota 55.
1175
Sto. Agostinho, Epistulale 187, 11,34: PL 33,845.
775. "A Igreja , em Cristo, como que o sacramento ou o sinal e instrumento da ntima
unio com Deus e da unidade de todo o gnero humano."1176 Ser o sacramento da unio
ntima dos homens com Deus o primeiro objetivo da Igreja. Visto que a comunho entre
os homens est enraizada na unio com Deus, a Igreja tambm o sacramento da
unidade do gnero humano. Nela, esta unidade j comeou, pois ela congrega homens "de
toda nao, raa, povo e lngua" (Ap 7,9); ao mesmo tempo, a Igreja "sinal e
instrumento" da plena realizao desta unidade que ainda deve vir.
776. Como sacramento, a Igreja instrumento de Cristo. "Nas mos dele, ela o
instrumento da Redeno de todos os homens"1177, "o sacramento universal da
salvao"1178, pelo qual Cristo "manifesta e atualiza o amor de Deus pelos homens"1179. Ela
" o projeto visvel do amor de Deus pela humanidade"1180, que quer que o "gnero
humano inteiro constitua o nico povo de Deus, se congregue no nico Corpo de Cristo,
seja construdo no nico templo do Esprito Santo"1181.
RESUMINDO
777. A palavra "Igreja" significa "convocao". Designa a assemblia daqueles que a
Palavra de Deus convoca para formarem o Povo de Deus e que, alimentados pelo Corpo de
Cristo, se tornam Corpo de Cristo.
778. A Igreja ao mesmo tempo caminho e finalidade do desgnio de Deus: prefigurada na
criao, preparada na Antiga Aliana, fundada pelas palavras e atos de Jesus Cristo,
realizada por sua Cruz redentora e por sua Ressurreio, ela manifestada como mistrio
de salvao pela efuso do Esprito Santo. Ser consumada na glria do cu como
assemblia de todos os resgatados da terra.1182
779. A Igreja ao mesmo tempo visvel e espiritual, sociedade hierrquica e Corpo Mstico
de Cristo. Ela una, formada de um elemento humano e um elemento divino. Somente a
f pode acolher este mistrio.
780. A Igreja no mundo presente o sacramento da salvao, o sinal e o instrumento da
comunho de Deus e dos homens.
PARGRAFO 2
A IGREJA - POVO DE DEUS, CORPO DE CRISTO,
TEMPLO DO ESPRITO SANTO
I. A Igreja - Povo de Deus
781. "Em qualquer poca e em qualquer povo aceito por Deus todo aquele que o teme e
pratica a justia. Aprouve, contudo, a Deus santificar e salvar os homens no
singularmente, sem nenhuma conexo uns com os outros, mas constitu-los num povo,
que o conhecesse na verdade e santamente o servisse. Escolheu, por isso, Israel como seu
povo. Estabeleceu com ele uma aliana e instruiu-o passo a passo... Tudo isso, porm,
aconteceu em preparao e figura para aquela nova e perfeita aliana que se estabeleceria
em Cristo... Esta a Nova Aliana, isto o Novo Testamento em seu sangue, chamando
de entre judeus e gentios um povo que junto crescesse na unidade, no segundo a carne,
mas no Esprito."1183
AS CARACTERSTICAS DO POVO DE DEUS
782. O Povo de Deus tem caractersticas que o distinguem nitidamente de todos os
agrupamentos religiosos, tnicos, polticos ou culturais da histria:
- Ele o Povo de Deus: Deus no pertence, como propriedade, a nenhum povo. Mas
adquiriu para si um povo dentre os que outrora no eram um povo: "Uma raa eleita, um
sacerdcio rgio, uma nao santa" (1Pd 2,9).
- A pessoa torna-se membro deste povo no pelo nascimento fsico, mas pelo "nascimento
do alto", "da gua e do Esprito" (Jo 3,3-5), isto , pela f em Cristo e pelo Batismo.
- Este povo tem por Chefe (Cabea) Jesus Cristo (Ungido, Messias); pelo fato de a mesma
Uno, o Esprito Santo, fluir da Cabea para o Corpo, ele "o Povo messinico.
- A condio deste povo a dignidade da liberdade dos filhos de Deus: nos coraes deles,
como em um templo, reside o Esprito Santo.
- "Sua lei o mandamento novo de amar como Cristo mesmo nos amou."1184 a lei "nova"
do Esprito Santo1185.
- Sua misso ser o sal da terra e a luz do mundo1186. "Ele constitui para todo o gnero
humano o mais forte germe de unidade, esperana e salvao.1187

1176
LG 1.
1177
LG 9.
1178
LG 48.
1179
GS 45,1.
1180
Paulo VI, discurso de 22 de junho de 1973.
1181
AG 7; cf. LG 17.
1182
Cf. Ap 14,4.
1183
LG 9.
1184
LG 9: AAS 57 (1965)13; cl. Jo 13,34.
1185
Cf. Rm 8,2; i;1 5,25.
1186
Cf. Mt 5,13-16.
1187
LG 9: AAS 57 (1965)13.
- Finalmente, sua meta "o Reino de Deus, iniciado na terra por Deus mesmo, Reino a ser
estendido mais e mais, at que, no fim dos tempos, seja consumado por Deus mesmo1188.
UM POVO SACERDOTAL, PROFTICO E RGIO
783. Jesus Cristo aquele que o Pai ungiu com o Esprito Santo e que constituiu
"Sacerdote, Profeta e Rei". O Povo de Deus inteiro participa dessas trs funes de Cristo e
assume as responsabilidades de misso e de servio que da decorrem1189.
784. Ao entrar no Povo de Deus pela f e pelo Batismo, recebe-se participao na vocao
nica deste povo, em sua vocao sacerdotal: "Cristo Senhor, Pontfice tomado dentre os
homens, fez do novo povo 'um reino e sacerdotes para Deus Pai'. Pois os batizados, pela
regenerao e uno do Esprito Santo, so consagrados para ser uma morada espiritual e
sacerdcio santo"1190
785. "O povo santo de Deus participa tambm da funo proftica de Cristo." Isso se
verifica de modo particular pelo sentido sobrenatural da f, que de todo o povo, leigos e
hierarquia, apegando-se "indefectivelmente f uma vez para sempre transmitida aos
santos"1191, e aprofunda a compreenso da mesma e torna-se testemunha de Cristo no
meio deste mundo.
786. O Povo de Deus participa finalmente da funo rgia de Cristo. Cristo exerce sua
realeza atraindo para si todos os homens por sua morte e Ressurreio1192. Cristo, Rei e
Senhor do universo, se fez servidor de todos, no veio "para ser servido, mas para servir e
para dar sua vida em resgate por muitos" (Mt 20,28). Para o cristo, "reinar servir"1193,
particularmente "nos pobres e nos sofredores, nos quais a Igreja reconhece a imagem de
seu Fundador pobre e sofredor"1194. O povo de Deus realiza sua "dignidade rgia" vivendo
em conformidade com esta vocao de servir com Cristo.
Todos os que renasceram em Cristo obtiveram, pelo sinal da cruz, a dignidade real e, pela
uno do Esprito Santo, receberam a consagrao sacerdotal. Por isso, no obstante o
servio especial do
nosso ministrio, todos os cristos foram revestidos de um carisma espiritual que os toma
membros desta famlia de reis e deste povo de sacerdotes. No ser, na verdade, funo
rgia o fato de uma alma, submetida a Deus, governar seu corpo? E no ser funo
sacerdotal consagrar ao Senhor uma conscincia pura e oferecer no altar do corao a
hstia imaculada de nossa piedade?1195
II. A Igreja - Corpo de Cristo
A IGREJA COMUNHO COM JESUS
787. Desde o incio, Jesus associou seus discpulos sua vida1196, revelou-lhes o Mistrio
do Reino1197, deu-lhes participar de sua misso, de sua alegria1198 e de seus
sofrimentos1199. Jesus fala de uma comunho ainda mais ntima entre Ele e os que o
seguiriam: "Permanecei em mim, como eu em vs... Eu sou a videira, e vs os ramos" (Jo
15,~5). E anuncia uma comunho misteriosa e real entre o seu prprio corpo e o nosso:
"Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele" (Jo
6,56).
788. Quando sua presena visvel lhes foi tirada, Jesus no deixou seus discpulos
rfos1200. Prometeu ficar com eles at o fim dos tempos1201, enviou-lhes seu Esprito1202. A
comunho com Jesus tornou-se, de certa maneira, mais intensa: "Ao comunicar seu
Esprito, fez de seus irmos, chamados de todos os povos, misticamente os componentes
de seu prprio Corpo"1203.
789. A comparao da Igreja com o corpo projeta urna luz sobre os laos ntimos entre a
Igreja e Cristo. Ela no somente congregada em torno dele; unificada nele, em seu
Corpo. Cabe destacar mais especificamente trs aspectos da Igreja-Corpo de Cristo: a
unidade de todos os membros entre si por sua unio com Cristo; Cristo Cabea do Corpo;
a Igreja, Esposa de Cristo.
"UM S CORPO"
790. Os crentes que respondem Palavra de Deus e se tornam membros do Corpo de
Cristo ficam estreitamente unidos a Cristo: "Neste corpo, a vida de Cristo se difunde por
meio dos crentes que os sacramentos, de forma misteriosa e real, unem a Cristo sofredor

1188
LG 9.
1189
Cf. RH18-21.
1190
LG 10.
1191
LG 12.
1192
Cf. Jo 12,32.
1193
LG 36.
1194
LG 8.
1195
S. Leo Magno, Serm. 4,1: PL 54,149.
1196
Cf. Mc 1,16-20; 3,13-19.
1197
Cf. Mt 13,10-17.
1198
Cf. Lc 10,17-20.
1199
Cf. Lc 22,28-30.
1200
Cf. Jo 14,18.
1201
Cf. Mt 28,20.
1202
Cf. Jo 20,22; At 2,33.
1203
LG 7.
e glorificado"1204. Isto particularmente verdade com relao ao Batismo, pelo qual somos
unidos morte e Ressurreio de Cristo1205, e com relao Eucaristia, pela qual,
"participando realmente do Corpo de Cristo", "somos elevados comunho com ele e entre
ns1206.
791. A unidade do corpo no acaba com a diversidade dos membros: "Na edificao do
corpo de Cristo, h diversidade de membros e de funes. Um s o Esprito que distribui
dons variados para o bem da Igreja segundo suas riquezas e as necessidades dos
ministrios"1207. A unidade do Corpo Mstico produz e estimula entre os fiis a caridade:
"Por isso, se um membro sofre, todos os membros padecem com ele; ou, se um membro
honrado, todos os membros se regozijam com ele"1208. Finalmente, a unidade do Corpo
Mstico vence todas as divises humanas: "Todos vs, com efeito, que fostes batizados em
Cristo, vos vestistes de Cristo. No h judeu nem grego, no h escravo nem livre, no h
homem nem mulher, pois todos vs sois um s em Cristo Jesus" (Gl 3,27-28).
"DESTE CORPO, CRISTO A CABEA"
792. Cristo " a Cabea do Corpo que a Igreja" (Cl 1,18). Ele o Princpio da criao e
da redeno. Elevado na glria do Pai, "Ele tem em tudo a primazia" (Cl 1,18),
principalmente sobre a Igreja, por meio da qual estende seu reino sobre todas as coisas.
793. Ele nos une sua Pscoa. Todos os membros devem esforar-se por se assemelhar a
ele "at Cristo ser formado neles" (GI 4,19). "Por isso somos inseridos nos mistrios de
sua vida, associamo-nos a suas dores como o corpo Cabea, para que, padecendo com
ele, sejamos com ele tambm glorificados."1209
794. Ele prov o nosso crescimento1210. Para fazer-nos crescer em direo a ele, nossa
Cabea1211, Cristo ordena em seu corpo, a Igreja, os dons e os servios pelos quais ns
nos ajudamos mutuamente no caminho da salvao.
795. Cristo e a Igreja, eis, portanto, o "Cristo total" ("Christus totus"). A Igreja una com
Cristo. Os santos tm uma conscincia bem viva desta unidade:
Alegremo-nos, portanto, e demos graas por nos termos tomado no somente cristos,
mas o prprio Cristo. Compreendeis, irmos, a graa que Deus nos concedeu ao dar-nos
Cristo como Cabea? Admirai e rejubilai, ns nos tomamos Cristo. Com efeito, uma vez
que Ele a Cabea e ns somos os membros,
o homem inteiro constitudo por Ele e por ns. A plenitude de Cristo , portanto, a
Cabea e os membros. O que significa isto: a Cabea e os membros? Cristo e a 1greja1212.
Redemptor noster unam se personam cum sancta Ecclesia, quam assumpsit, exhibuit -
Nosso Redentor mostrou-se como uma s pessoa com a santa Igreja, que ele assumiu1213.
Caput et membra sunt quasi una persona mystica Cabea e membros so como uma s
pessoa mstica1214.
Uma palavra de Sta. Joana d'Arc a seus juizes resume a f dos santos Doutores e exprime
o bom senso do crente: "Quanto a Jesus Cristo e Igreja, parece-me que so uma s
coisa e que no se deve fazer objees a isso"1215.
A IGREJA A ESPOSA DE CRISTO
796. A unidade entre Cristo e a Igreja, Cabea e membros do Corpo, implica tambm a
distino dos dois em uma relao pessoal. Este aspecto muitas vezes expresso pela
imagem do Esposo e da Esposa. O tema de Cristo Esposo da Igreja foi preparado pelos
Profetas e anunciado por Joo Batista1216. O Senhor mesmo designou-se como "o Esposo"
(Mc 2,19)1217. O apstolo apresenta a Igreja e cada fiel, membro de seu Corpo, como uma
Esposa "desposada" com Cristo Senhor, para ser com Ele um s Esprito1218. Ela a Esposa
imaculada do Cordeiro imaculado1219, a qual Cristo "amou, pela qual se entregou, a fim de
santific-la" (Ef 5,26), que associou a si por uma Aliana eterna e da qual no cessa de
cuidar como de seu prprio Corpo1220
Eis o Cristo total, Cabea e Corpo, um s formado por muitos... Seja a cabea a falar, seja
os membros, sempre Cristo quem fala. Fala desempenhando o papel da Cabea ["ex
persona capitis"], fala desempenhando o papel do Corpo ["ex persona corporis"].
Conforme o que est escrito: "Sero dois em uma s carne. Eis um grande mistrio:

1204
LG 7.
1205
Cf. Rm 6,4-5; 1Cor 12,13.
1206
LG 7.
1207
LG 7: AAS 57 (1965)10.
1208
LG 7.
1209
LG 7.
1210
Cf. Cl 2,19.
1211
Cf. Ef 4,11-16.
1212
Sto. Agostinho, Ev. Jo. 21,8.
1213
S. Gregrio Magno, Mor. praef. 6,14: CCL 143,19 (PL 75,525)
1214
Sto. Toms de Aquino, 5. Th. III, 48,2, ad 1.
1215
Joana d'Arc, in Actes du procs
1216
Cf. Jo 3,29.
1217
Cf. Mt 22,1-14; 25,1-13.
1218
Cf. 1Cor 6,15-16; 2Cor 11,2.
1219
Cf. Ap 22,17; Ef 1,4.5.27.
1220
Cf. Ef 5,29.
refiro-me a Cristo e Igreja" (Ef 5,31-32). E o Senhor mesmo diz no Evangelho: "J no
so dois, mas uma s carne" (Mt 19,6). Como vistes, h de fato duas pessoas diferentes, e
todavia elas constituem uma s coisa no amplexo conjugal. Na qualidade de Cabea ele se
diz "Esposo", na qualidade de Corpo se diz "Esposa"1221.
III. A Igreja - Templo do Esprito Santo
797. "Quod est spiritus noster, id est anima nostra, ad membra nostra, hoc est Spiritus
Sanctus ad membra Christi, ad corpus Christi, quod est Ecclesia - O que o nosso esprito,
isto , a nossa alma em relao a nossos membros, assim o Esprito Santo em relao
aos membros de Cristo, ao corpo de Cristo que a Igreja."1222 "A este Esprito de Cristo,
em princpio invisvel, deve-se atribuir tambm a unio de todas as partes do Corpo tanto
entre si como com sua Cabea, pois ele est todo na Cabea, todo no Corpo e todo em
cada um de seus membros."1223 O Esprito Santo faz da Igreja "o Templo do Deus Vivo"
(2Cor 6,16)1224:
"Com efeito, prpria Igreja que foi confiado o Dom de Deus. nela que foi depositada
a comunho com Cristo, isto , o Esprito Santo, penhor da incorruptibilidade, confirmao
de nossa f e escada de nossa ascenso para Deus. Pois l onde est a Igreja, ali tambm
est o Esprito de Deus; e l onde est o Esprito de Deus, ali est a Igreja e toda
graa"1225.
798. O Esprito Santo "o Princpio de toda ao vital e verdadeiramente salutar em cada
uma das diversas partes do Corpo"1226. Ele opera de mltiplas maneiras a edificao do
Corpo inteiro na caridade1227. pela Palavra de Deus, "que tem o poder de edificar" (At
20,32); pelo Batismo, por meio do qual forma o Corpo de Cristo1228; pelos sacramentos,
que proporcionam crescimento e cura aos membros de Cristo; pela "graa concedida aos
apstolos, que ocupa o primeiro lugar entre seus dons"1229; pelas virtudes, que fazem agir
segundo o bem; e, enfim, pelas mltiplas graas especiais (chamadas de "carismas"), por
meio das quais "torna os fiis aptos e prontos a tomarem sobre si os vrios trabalhos e
ofcios que contribuem para a renovao e maior incremento da Igreja"1230.
OS CARISMAS
799. Quer extraordinrios quer simples e humildes, os carismas so graas do Esprito
Santo que, direta ou indiretamente, tm uma utilidade eclesial, pois so ordenados
edificao da Igreja, ao bem dos homens e s necessidades do mundo.
800. Os carismas devem ser acolhidos com reconhecimento por aquele que os recebe, mas
tambm por todos os membros da Igreja, pois so uma maravilhosa riqueza de graa para
a vitalidade apostlica e para a santidade de todo o Corpo de Cristo, contanto que se trate
de dons que provenham verdadeiramente do Esprito Santo e que sejam exercidos de
maneira plenamente conforme aos impulsos autnticos deste mesmo Esprito, isto ,
segundo a caridade, verdadeira medida dos carismas1231.
801. neste sentido que se faz sempre necessrio o discernimento dos carismas. Nenhum
carisma dispensa da reverncia e da submisso aos Pastores da Igreja. "A eles em especial
cabe no extinguir o Esprito, mas provar as coisas e ficar com o que bom"1232 a fim de
que todos os carismas cooperem, em sua diversidade e complementaridade, para o "bem
comum" (1 Cor l2,7)1233.
RESUMINDO
802. "Cristo Jesus entregou-se a si mesmo por ns, a fim de remir-nos de toda iniquidade
e para purificar um povo que lhe pertence" (Tt 2,14).
803. "Vs sois uma raa eleita, um sacerdcio rgio, uma nao santa, o Povo de sua
particular propriedade" (1Pd 2,9).
Ingressa-se no Povo de Deus pela f e pelo Batismo. "Todos os homens so chamados a
fazer parte do Povo de Deus"1234, a fim de que, em Cristo, "os homens constituam uma s
famlia e um s Povo de Deus"1235.
805. A Igreja o Corpo de Cristo. Pelo Esprito e pela ao deste nos sacramentos,
sobretudo a Eucaristia, Cristo morto e ressuscitado constitui a comunidade dos crentes
como seu Corpo. Na unidade deste Corpo existe diversidade de membros e de junes.
Todos os membros esto ligados uns aos outros, particularmente aos que sofrem, so
pobres e perseguidos.

1221
Sto. Agostinho, En. in Psal. 74,4.
1222
Sto. Agostinho, Serm. 268,2: PL 38,1232.
1223
Pio XII, enc. Mystid corporis: DS 3808.
1224
Cf. 1Cor 3,16-17; Ef 2,21.
1225
Sto. Irineu, Adv. haer. 3,24,1.
1226
Pio XII, enc. Mystici Corporis: DS 3808.
1227
Cf. EI 4,16.
1228
Cf. 1Cor 12,13.
1229
LG 7.
1230
LG 12; cl. AA 3.
1231
Cf. 1Cor 13.
1232
LG 12.
1233
Cf. LG 30; CL 24.
1234
LG 13.
1235
AG 1.
807. A Igreja este Corpo do qual Cristo a Cabea: ela vive dele, nele e por ele,' ele vive
com ela e nela.
808. A Igreja a Esposa de Cristo: ele a amou e entregou-se por ela. Purificou-a com seu
sangue. Fez dela a Me fecunda de todos os filhos de Deus.
809. A Igreja o Templo do Esprito Santo. O Esprito e como a alma do Corpo Mstico,
princpio de sua vida, da unidade na diversidade e da riqueza de seus dons e carismas.
810. "Desta maneira a Igreja universal aparece como 'um povo que traz sua unidade' da
unidade do Pai. "1236
PARGRAFO 3
A IGREJA UNA, SANTA, CATLICA
E APOSTLICA
811. "Esta a nica Igreja de Cristo que, no Smbolo, confessamos una, santa, catlica e
apostlica."1237 Esses quatro atributos, inseparavelmente ligados entre si1238, indicam
traos essenciais da Igreja e de sua misso. A Igreja no os tem de si mesma; Cristo
que, pelo Esprito Santo, d a sua Igreja o ser una, santa, catlica e apostlica, e
tambm ele que a convida a realizar cada uma dessas qualidades.
812. S a f pode reconhecer que a Igreja recebe estas propriedades de sua fonte divina.
Mas as manifestaes histricas delas constituem sinais que falam tambm com clareza
razo humana. "A Igreja - lembra o Conclio Vaticano 1 - em razo de sua santidade, de
sua unidade catlica, de sua constncia invicta, ela mesma um grande e perptuo motivo
de credibilidade e uma prova irrefutvel de sua misso divina."1239
I. A Igreja una
"O MISTRIO SAGRADO DA UNIDADE DA IGREJA"1240
813. A Igreja una por sua fonte: "Deste mistrio, o modelo supremo e o princpio a
unidade de um s Deus na Trindade de Pessoas, Pai e Filho no Esprito Santo"1241. A Igreja
una por seu Fundador: "Pois o prprio Filho encarnado, prncipe da paz, por sua cruz
reconciliou todos os homens com Deus, restabelecendo a unio de todos em um s Povo,
em um s Corpo"1242. A Igreja una por sua "alma": "O Esprito Santo que habita nos
crentes, que plenifica e rege toda a Igreja, realiza esta admirvel comunho dos fiis e os
une to intimamente em Cristo, que ele o princpio de Unidade da Igreja"1243. Portanto,
da prpria essncia da Igreja ser una:
Que estupendo mistrio! H um nico Pai do universo, uni nico Logos do universo e
tambm um nico Esprito Santo, idntico em todo lugar; h tambm uma nica virgem
que se tornou me, e me agrada cham-la Igreja1244
814. Contudo, desde a origem, esta Igreja una se apresenta com uma grande diversidade,
que provm ao mesmo tempo da variedade dos dons de Deus e da multiplicidade das
pessoas que os recebem. Na unidade do Povo de Deus se congregam as diversidades dos
povos e das culturas. Entre os membros da Igreja existe uma diversidade de dons, de
encargos, de condies e de modos de vida; "na comunho eclesistica h,.
legitimamente, Igrejas particulares gozando de tradies prprias"1245. A grande riqueza
desta diversidade no se ope unidade da Igreja. Todavia, o pecado e o peso de suas
conseqncias ameaam sem cessar o dom da unidade. Assim, o apstolo tem de exortar
a conservar a unidade do Esprito pelo vnculo da paz" (Ef 4,3).
815. Quais so estes vnculos da unidade? "Sobre tudo isso [est] a caridade, que o
vnculo da perfeio" (Cl 3,14). Mas a unidade da Igreja peregrinante tambm
assegurada por vnculos visveis de comunho:
_ a profisso de uma nica f recebida dos Apstolos;
_ a celebrao comum do culto divino, sobretudo dos sacramentos;
_ a sucesso apostlica, por meio do Sacramento da Ordem, que mantm a concrdia
fraterna da famlia de Deus1246.
816. "A nica Igreja de Cristo (...) aquela que nosso Salvador, depois de sua
Ressurreio, entregou a Pedro para que fosse seu pastor e confiou a ele e aos demais
Apstolos para propag-la e reg-la... Esta Igreja, constituda e organizada neste mundo
como uma sociedade, subsiste na ("subsistit in") Igreja Catlica governada pelo sucessor
de Pedro e pelos Bispos em comunho com ele"1247:

1236
S. Cipriano apud LG 4.
1237
LG 8.
1238
Cf. DS 2888.
1239
DS 3013.
1240
UR 2.
1241
UR 2.
1242
GS 78,3.
1243
UR 2.
1244
S. Clemente de Alexandria, Paed. 1,6.
1245
LG 13.
1246
Cf.UR2;LG 14;CIC,cn.205.
1247
LG 8.
O Decreto sobre o Ecumenismo, do Conclio Vaticano II, explicita: "Pois somente por meio
da Igreja catlica de Cristo, 'a qual meio geral de salvao', pode ser atingida toda a
plenitude dos meios de salvao. Cremos que o Senhor confiou todos os bens da Nova
Aliana somente ao Colgio Apostlico, do qual Pedro o chefe, a fim de constituir na terra
um s Corpo de Cristo, ao qual necessrio que se incorporem plenamente todos os que,
de alguma forma, j pertencem ao Povo de Deus"1248
AS FERIDAS DA UNIDADE
817. Na realidade, "nesta una e nica Igreja de Deus, j desde os primrdios, surgiram
algumas cises, que o Apstolo censura com vigor como condenveis. Dissenses mais
amplas nasceram nos sculos posteriores. Comunidades no pequenas separaram-se da
plena comunho com a Igreja catlica, por vezes no sem culpa de homens de ambas as
partes"1249. As rupturas que ferem a unidade do Corpo de Cristo (distinguem-se a heresia,
a apostasia e o cisma1250) no acontecem sem os pecados dos homens:
'Ubi peccata sunt, ibi multitudo, ibi schismata, ibi haereses, ibi discussiones. Ubi autem
virtus, ibi singularitas, ibi unio, ex quo omnium credentium erat cor unum et anima una. _
Onde esto os pecados, a est a multiplicidade (das crenas), a o cisma, ai as heresias, a
as controvrsias. Onde, porm, est a virtude, a est a unidade, a a comunho, em fora
disso, os crentes eram um s corao e uma s alma."'1251
818. Os que hoje em dia nascem em comunidades que surgiram de tais rupturas "e esto
imbudos da f em Cristo no podem ser argidos de pecado de separao, e a Igreja
catlica os abraa com fraterna reverncia e amor... Justificados pela f recebida no
Batismo, esto incorporados em Cristo, e por isso com razo so honrados com o nome de
cristos e merecidamente reconhecidos pelos filhos da Igreja catlica como irmos no
Senhor"1252.
819. Alm disso, "muitos elementos de santificao e de verdade1253 existem fora dos
limites visveis da Igreja catlica": "A palavra escrita de Deus, a vida da graa, a f, a
esperana, a caridade, outros dons interiores do Esprito Santo e outros elementos
visveis"1254. O Esprito de Cristo serve-se dessas igrejas e comunidades eclesiais como
meios de salvao cuja fora vem da plenitude de graa e de verdade que Cristo confiou
Igreja catlica. Todos esses bens provm de Cristo e levam a Ele1255 e chamam, por eles
mesmos, para a "unidade catlica"1256.
RUMO UNIDADE
820. A unidade, "Cristo a concedeu, desde o inicio, sua Igreja, e ns cremos que ela
subsiste sem possibilidade de ser perdida na Igreja catlica e esperamos que cresa, dia
aps dia, at a consumao dos sculos"1257. Cristo d sempre sua Igreja o dom da
unidade, mas a Igreja deve sempre orar e trabalhar para manter, reforar e aperfeioar a
unidade que Cristo quer para ela. Por isso Jesus mesmo orou na hora de sua Paixo, e no
cessa de orar ao Pai pela unidade de seus discpulos:..... Que todos sejam um. Como tu,
Pai, ests em mim e eu em ti, que eles estejam em ns, a fim de que o mundo creia que
tu me enviaste" (Jo 17,21). O desejo de reencontrar a unidade de todos os cristos um
dom de Cristo e convite do Esprito Santo1258.
821. Para responder adequadamente a este apelo, exigem-se:
_ uma renovao permanente da Igreja em uma fidelidade maior sua vocao. Esta
renovao a mola do movimento rumo unidade1259;
_ a converso do corao, "com vistas a viver mais puramente segundo o Evangelho"1260,
pois a infidelidade dos membros ao dom de Cristo que causa as divises;
_ a orao em comum, pois a converso do corao e a santidade de vida, juntamente
com as preces particulares e pblicas pela unidade dos cristos, devem ser consideradas a
alma de todo o movimento ecumnico e, com razo, podem ser chamadas de ecumenismo
espiritual"1261;
_ o conhecimento fraterno recproco1262;
_ a formao ecumnica dos fiis e especialmente dos presbteros1263;
_ o dilogo entre os telogos e os encontros entre os cristos de diferentes Igrejas e
comunidades1264;

1248
UR3.
1249
UR 3.
1250
Cf. CIC, cn. 751.
1251
Orgenes, Hom. in Ezech.9,1.
1252
UR 3.
1253
LG 8.
1254
UR 3, cl. LG 15.
1255
Cf. UR3.
1256
LG 8.
1257
UR 4.
1258
Cf. UR 1.
1259
Cf. UR 6.
1260
UR 7.
1261
UR 8.
1262
Cf. UR 9.
1263
Cf. UR 10.
1264
Cf. UR 4; 9; 11.
_ a colaborao entre cristos nos diversos campos do servio aos homens1265
822. A preocupao de realizar a unio "diz respeito Igreja inteira, fiis e pastores"1266.
Mas preciso tambm "ter conscincia de que este projeto sagrado, a reconciliao de
todos os cristos na unidade de uma s e nica Igreja de Cristo, ultrapassa as foras e as
capacidades humanas". Por isso depositamos toda a nossa esperana "na orao de Cristo
pela Igreja, no amor do Pai por ns e no poder do Esprito Santo"1267.
II. A Igreja santa
823. "A Igreja... , aos olhos da f, indefectivelmente santa. Pois Cristo, Filho de Deus,
que com o Pai e o Esprito Santo proclamado o 'nico Santo', amou a Igreja como sua
Esposa. Por ela se entregou com o fim de santific-la. Uniu-a a si como seu corpo e
cumulou-a com o dom do Esprito Santo, para a glria de Deus."1268 A Igreja , portanto,
"o Povo santo de Deus"1269, e seus membros so chamados "santos"1270.
824. A Igreja, unida a Cristo, santificada por Ele; por Ele e nele torna-se tambm
santificante. Todas as obras da Igreja tendem, como seu fim, " santificao dos homens
em Cristo e glorificao de Deus"1271. na Igreja, que est depositada "a plenitude dos
meios de salvao "1272. E nela que "adquirimos a santidade pela graa de Deus"1273.
825. "J na terra a Igreja est ornada de verdadeira santidade, embora imperfeita."1274 Em
seus membros, a santidade perfeita ainda coisa a adquirir: "Munidos de tantos e to
salutares meios, todos os cristos, de qualquer condio ou estado, so chamados pelo
Senhor, cada um por seu caminho, perfeio da santidade pela qual perfeito o prprio
Pai"1275
826. A caridade a alma da santidade qual todos so chamados. Ela "dirige todos os
meios de santificao, d-lhes forma e os conduz ao fim "1276:
"Compreendi que a Igreja tinha um corpo, composto de diferentes membros, no lhe
faltava o membro mais nobre e mais necessrio (o corao). Compreendi que a Igreja
tinha um Corao, e que este Corao ARDIA de AMOR. Compreendi que s o amor fazia
os membros da Igreja agirem, que, se o Amor viesse a se apagar, os Apstolos no
anunciariam mais o Evangelho, os Mrtires se recusariam a derramar seu sangue...
Compreendi que O AMOR ENCERRAVA TODAS AS VOCAES, QUE O AMOR ERA TUDO,
QUE ELE ABRAAVA TODOS OS TEMPOS E TODOS OS LUGARES... EM UMA PALAVRA, QUE
ELE ETERNO!"1277
827. "Mas enquanto Cristo, 'santo, inocente, imaculado', no conheceu o pecado, mas veio
apenas para expiar os pecados do povo, a Igreja, reunindo em seu prprio seio os
pecadores, ao mesmo tempo santa e sempre necessitada de purificar-se, busca sem cessar
a penitncia e a renovao. "1278 Todos os membros da Igreja, inclusive seus ministros,
devem reconhecer-se pecadores1279. Em todos eles o joio do pecado continua ainda
mesclado ao trigo do Evangelho at o fim dos tempos1280. A Igreja rene, portanto,
pecadores alcanados pela salvao de Cristo, mas ainda em via de santificao.
A Igreja santa, mesmo tendo pecadores em seu seio, pois no possui outra vida seno a
da graa: vivendo de sua vida que seus membros se santificam; subtraindo-se vida
dela que caem nos pecados e nas desordens que impedem a irradiao da santidade dela.
E por isso que ela sofre e faz penitencia por essas faltas, das quais tem o poder de curar
seus filhos, pelo sangue de Cristo e pelo dom do Esprito Santo1281.
828. Ao canonizar certos fiis, isto , ao proclamar solenemente que esses fiis praticaram
heroicamente as virtudes e viveram na fidelidade graa de Deus, a Igreja reconhece o
poder do Esprito de santidade que est em si e sustenta a esperana dos fiis, propondo-
os como modelos e intercessores1282. "Os santos e as santas sempre foram fonte e origem
de renovao nas circunstncias mais difceis da histria da Igreja."1283 Com efeito, "a
santidade a fonte secreta e a medida infalvel de sua atividade apostlica e de seu el
missionrio"1284.
829. "Enquanto na beatssima Virgem a Igreja j atingiu a perfeio, pela qual existe sem
mcula e sem ruga, os cristos ainda se esforam por crescer em santidade, vencendo o
pecado. Por isso elevam seus olhos a Maria"1285: nela, a Igreja j a toda santa.

1265
Cf. UR 12.
1266
UR 5.
1267
UR 24.
1268
LG 39.
1269
LG 12.
1270
Cf. At 9,13; 1Cor 6,1; 16,1.
1271
SC 10.
1272
UR 3.
1273
LG 48.
1274
LG 48.
1275
LG 11.
1276
LG 42.
1277
Sta. Teresinha do Menino Jesus, Ms. autob. B 3v.
1278
LG 8; cf. UR 3; 6.
1279
Cf. 1Jo 1,8-10.
1280
Cf. Mt 13,24-30.
1281
SPF 19.
1282
Cf. LG 40; 48-51.
1283
Cf 16,3.
1284
Cf 17,3.
1285
LG 65.
III. A Igreja catlica
QUE QUER DIZER "CATLICO"?
830. A palavra "catlico" significa "universal" no sentido de "segundo a totalidade" ou
"segundo a integralidade". A Igreja catlica em duplo sentido.
Ela catlica porque nela Cristo est presente. "Onde est Cristo Jesus, est a Igreja
catlica."1286 Nela subsiste a plenitude do Corpo de Cristo unido sua Cabea1287, o que
implica que ela recebe dele "a plenitude dos meios de salvao"1288 que ele quis: confisso
de f correta e completa, vida sacramental integral e ministrio ordenado na sucesso
apostlica. Neste sentido fundamental, a Igreja era catlica no dia de Pentecostes1289 e o
ser sempre, at o dia da Parusia.
831. Ela catlica porque enviada em misso por Cristo universalidade do gnero
humano1290.
Todos os homens so chamados a pertencer ao novo Povo de Deus. Por isso este Povo,
permanecendo uno e nico, deve estender-se a todo o mundo e por todos os tempos, para
que se cumpra o desgnio da vontade de Deus, que no incio formou uma s natureza
humana e finalmente decretou congregar seus filhos que estavam dispersos... Este carter
de universalidade que marca o Povo de Deus um dom do prprio Senhor, pelo qual a
Igreja Catlica, de maneira eficaz e perptua, tende a recapitular toda a humanidade com
todos os seus bens sob Cristo Cabea, na unidade do seu Esprito1291.
CADA IGREJA PARTICULAR "CATLICA"
832. "Esta Igreja de Cristo est verdadeiramente presente em todas as legtimas
comunidades locais de fiis que, unidas a seus pastores, so tambm elas, no Novo
Testamento, chamadas 'igrejas'... Nelas os fiis so reunidos pela pregao do Evangelho
de Cristo, nelas se celebra o mistrio da Ceia do Senhor... Nessas comunidades, embora
muitas vezes pequenas e pobres, ou vivendo na disperso, est presente Cristo, por cuja
virtude se constitui a Igreja una, santa, catlica e apostlica."1292
833. Entende-se por Igreja particular, o que , em primeiro lugar, a diocese (ou a
eparquia), uma comunidade de fiis cristos em comunho na f e nos sacramentos com
seu Bispo ordenado na sucesso apostlica1293. Essas Igrejas particulares "so formadas
imagem da Igreja universal; nelas e a partir delas que existe a Igreja catlica una e
nica"1294.
834. As Igrejas particulares so plenamente catlicas pela comunho com uma delas: a
Igreja de Roma, "que preside caridade"1295. "Pois com esta Igreja, em razo de sua
origem mais excelente, deve necessariamente concordar cada Igreja, isto , os fiis de
toda parte."1296 "Com efeito, desde a descida a ns do Verbo Encarnado, todas as Igrejas
crists de toda parte consideraram e continuam considerando a grande Igreja que est
aqui [em Roma] como nica base e fundamento, visto que, segundo as prprias
promessas do Salvador, as portas do inferno nunca prevaleceram sobre ela."1297
835. "Guardemo-nos bem, no entanto, de conceber a Igreja universal como sendo a
somatria, ou, se se preferir diz-lo, a federao mais ou menos anmala de Igrejas
particulares essencialmente diversas. No pensamento do Senhor, a Igreja, universal por
vocao e por misso, que, ao lanar suas razes na variedade dos terrenos culturais,
sociais e humanos, se reveste em cada parte do mundo de aspectos e de expresses
exteriores diversas."1298 A rica variedade de disciplinas eclesisticas, de ritos litrgicos, de
patrimnios teolgicos e espirituais prprios das Igrejas locais "mostra mais
luminosamente a catolicidade da Igreja indivisa, por sua convergncia na unidade"1299.
PGINAS: 241 298
QUEM PERTENCE IGREJA CATLICA?
Todos os homens, pois, so chamados a esta catlica unidade do Povo de Deus, que
prefigura e promove a paz universal. A ela pertencem ou so ordenados de modos diversos
quer os fiis catlicos, quer os outros crentes em Cristo, quer, enfim, os homens em geral,
chamados salvao pela graa de Deus1300.
So incorporados plenamente sociedade, que a Igreja, os que, tendo o Esprito de
Cristo, aceitam a totalidade de sua organizao e todos os meios de salvao nela
institudos e em sua estrutura visvel regida por Cristo por meio do Sumo Pontfice e dos

1286
Sto. Incio de Antioquia, Smyrn., 8,2.
1287
Cf. Ef 1,22-23.
1288
AG 6.
1289
Cf. AG 4.
1290
Cf. Mt 28,19.
1291
LG 13
1292
LG 26.
1293
Cf. CD 1: AAS 58 (1966) 677; CIC, cn. 368-369; CCEO, cn.177,1.178.311,1.312.
1294
LG 23.
1295
Sto. Incio de Antioquia, Rom. 1,1.
1296
Sto. Irineu, Ad. haer. 3,3,2: retomado pelo Conc. Vaticano l: DS 3057.
1297
S. Mximo Confessor, Opusc.: PG 91, 137-140.
1298
EN 62.
1299
LG 23.
1300
LG.13
Bispos se unem com Ele pelos vnculos da profisso de f, dos sacramentos, do regime
eclesistico e da comunho. Contudo no se salva, embora esteja incorporado Igreja,
aquele que, no preservando na caridade, permanece dentro da Igreja com o corpo, mas
no com o corao1301.
Por muitos ttulos a Igreja sabe-se ligada aos batizados que so ornados com o nome
cristo, mas no professam na ntegra a f ou no guardam a unidade da comunho sob o
Sucessor de Pedro1302. Aqueles que crem em Cristo e foram devidamente batizados
esto constitudos em certa comunho, embora no perfeita, com a Igreja catlica.1303.
Com as Igrejas ortodoxas, esta comunho to profunda que falta bem pouco para que
ela atinja a plenitude que autoriza uma celebrao comum da Eucaristia do Senhor1304.
A IGREJA E OS NO - CRISTOS
Os que ainda no receberam o Evangelho tambm se ordenam por diversos modos
ao Povo de Deus.1305
A relao da Igreja com o Povo Hebreu. A Igreja, Povo de Deus na Nova Aliana,
descobre, ao perscrutar seu prprio mistrio, seus vnculos com o Povo Hebreu1306 a
quem Deus falou em primeiro lugar1307. Ao contrrio das outras religies no-crists, a f
hebraica j resposta revelao de Deus na Antiga Aliana. ao Povo Hebreu que
pertencem a adoo filial, a glria, as alianas, a legislao, o culto, as promessas e os
patriarcas, dos quais descende Cristo, segundo a carne (Rm 9,4-5), pois os dons e o
chamado de Deus so sem arrependimento (Rm 11,29).
De resto, quando se considera o futuro, o povo de deus da Antiga Aliana e o novo
Povo de Deus tendem para fins anlogos: a espera da vinda ( ou da volta) do Messias. Mas
o que se espera , do lado dos cristos, a volta do Messias, morto e ressuscitado,
reconhecido como Senhor e Filho de Deus, e do lado dos hebreus, a vinda do Messias
cujos traos permanecem encobertos ---, no fim dos tempos, espera esta acompanhada do
drama da ignorncia ou do desconhecimento de Cristo Jesus.
As relaes da Igreja com os muulmanos. Mas o plano de salvao abrange
tambm aqueles que reconhecem o Criador. Entre eles, em primeiro lugar, os
muulmanos, que professando manter a f de Abrao, adoram conosco o Deus nico,
misericordioso, juiz dos homens no ltimo dia.1308.
O vnculo da Igreja com as religies no-crists primeiramente o da origem e do
fim comuns do gnero humano;

Com efeito, todos os povos constituem uma s comunidade. Tm uma origem comum,
visto que deus fez todo o gnero humano habitar a face da terra. Tm igualmente um
nico fim comum, Deus, cuja providncia, testemunhos de bondade e planos de salvao
abarcam a todos, at os eleitos se reunirem na Cidade Santa1309.
A Igreja reconhece nas outras religies a busca, ainda nas sombras e sob imagens,
do Deus desconhecido, mas prximo, pois Ele quem d a todos vida, respirao e tudo
mais, e porque quer que todos os homens sejam salvos. Assim, a Igreja considera tudo o
que pode haver de bom e de verdadeiro nas religies como uma preparao evanglica
dada por Aquele que ilumina todo homem para que, finalmente, tenha vida1310.
844.Em seu comportamento religioso, porm, os homens mostram tambm limitaes e
erros que desfiguram neles a imagem de Deus:
Muitas vezes os homens, enganados pelo Maligno, se enganaram em seus pensamentos e
trocaram a verdade de deus pela mentira, servindo criatura mais que ao Criador, ou
vivendo e morrendo sem Deus neste mundo, se expem ao extremo desespero 1311
845. para reunir novamente todos os seus filhos que o pecado dispersou e desgarrou -
que o Pai quis convocar toda a humanidade da Igreja de seu Filho. A Igreja o lugar em
que a humanidade deve reencontrar sua unidade e sua salvao. Ela o mundo
reconciliado1312. Ela esse navio que navega bem neste mundo ao sopro do esprito
Santo com as velas da Cruz do Senhor plenamente desfraldadas1313. Segundo outra
imagem cara aos Padres da Igreja, ela figurada pela Arca de No, a nica que salva do
dilvio1314.
FORA DA IGREJA NO H SALVAO
1301
LG.14
1302
LG.15
1303
UR.3
1304
Paulo VI, discurso de 14 de Dezembro de 1975; cf. UR. 13-18
1305
LG. 16
1306
Cf. NA.
1307
MR, Sexta-feira santa 13: orao universal VI.
1308
LG. 16; cf. NA 3
1309
NA 1.
1310
G. 16; cf. NA 2; EN 53.
1311
LG. 16;
1312
Sto. Agostinho Serm. 96,7,9: PL 38,588.
1313
Sto Agostinho Ambrsio, Virg. 18,119: Sancti Ambrosio Eepiscopi Mediolanensis opera, v. 14/2, Milo Roma,1989, p. 96 (PL 16297).
1314
Cf. 1Pd 3,20-21.
846.Como entender essa afirmao, com freqncia repetida pelos Padres da Igreja?
Formulada de maneira positiva, ela significa que toda salvao vem de Cristo- Cabea por
meio da Igreja, que seu Corpo:

Apoiado na Sagrada Escritura e na Tradio, [ o Conclio] ensina que esta Igreja peregrina
necessria para a salvao. O nico mediador e caminho da salvao Cristo, que se nos
torna presente em seu Corpo, que a Igreja. Ele, porm, inculcado com palavras
expressas a necessidade da f e do batismo, ao mesmo tempo confirmou a necessidade da
Igreja, na qual os homens entram pelo Batismo, como que por uma porta. Por isso podem
salvar-se aqueles que, sabendo que a Igreja catlica foi fundada por Deus por meio de
Jesus Cristo como instituio necessria, apesar disso no quiserem nela entrar ou nela
preservar1315.
Esta afirmao no visa queles que, sem culpa desconhecem Cristo e sua Igreja:
Aqueles, portanto, que sem culpa ignoram o evangelho de Cristo e sua Igreja, mas
buscam a Deus com corao sincero e tentam, sob o influxo da graa, cumprir por obras a
sua vontade conhecida por meio do ditame da conscincia podem conseguir a salvao
eterna1316.
Deus pode, por caminhos dele conhecidos, levar f todos os homens que sem culpa
ignoram o Evangelho. Pois sem f impossvel agradar-lhe1317. Mesmo assim, cabe
Igreja o dever e tambm o direito sagrado de evangelizar1318 todos os homens.
A MISSO UMA EXIGNCIA DA CATOLICIDADE DA IGREJA
O mandato missionrio. Enviada por Deus s naes para ser o sacramento
universal da salvao, a Igreja, em virtude das exigncias ntimas de sua prpria
catolicidade e obedecendo ordem de seu fundador, esfora-se para anunciar o Evangelho
a todos os homens.1319
Ide, portanto, e fazei que todos os povos se tornem discpulos, batizando-os em
nome do Pai, do Filho e do Esprito Santo e ensinando-os a observar tudo quanto vos
ordenei. E eis que estou convosco todos os dias, at a consumao dos sculos (Mt
28,19-20).
A origem e o escopo da misso. O missionrio do Senhor tem sua fonte ltima no
amor eterno da Santssima Trindade: A Igreja peregrina , por sua natureza, missionria.
Pois ela se origina da misso do Filho e da misso do Esprito Santo, segundo o desgnio de
Deus Pai1320. E o fim ltimo da misso no outro seno fazer os homens participarem da
comunho que existe entre o Pai e o Filho em seu esprito de amor1321.
851. O motivo da misso. do amor de Deus por todos homens que a Igreja sempre tirou
a obrigao e a fora de seu el missionrio: Pois o amor de Cristo nos impele... (2Cor
5,14)1322.
Com efeito Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da
verdade (1Tm 2,4). Deus quer a salvao de todos pelo conhecimento da verdade. A
salvao est na verdade. Os que obedecem moo do Esprito de verdade j esto no
caminho da salvao; mas a Igreja, a quem esta verdade foi confiada, deve ir ao encontro
de seu anseio, levando-lhes a mesma verdade. Ela tem de ser missionria porque cr no
projeto universal de salvao.
852. Os caminhos da misso. O Esprito Santo o protagonista de toda a misso
eclesial.1323. ele quem conduz a igreja pelos caminhos da misso. esta misso, no
decurso da histria, continua e desdobra a misso do prprio Cristo, enviado a evangelizar
os pobres. Eis por que a Igreja, impelida pelo Esprito de Cristo, deve trilhar a mesma
senda de Cristo, isto , o caminho da pobreza, da obedincia, do servio e da imolao de
si at a morte, da qual Ele saiu vencedor por sua Ressurreio1324. assim que o sangue
dos mrtires uma semente de cristos1325
Mas em sua peregrinao no ignora a Igreja o quanto se distanciam entre si a
mensagem que ela profere e a fraqueza humana daqueles aos quais o Evangelho foi
confiado1326.Somente avanando pelo caminho da penitncia e da renovao1327 e pela
porta estreita da Cruz1328 o povo de Deus pode estender o Reino de Cristo1329. Com efeito,
assim como Cristo consumou a obra da redeno na pobreza e na perseguio, assim a

1315
LG 14
1316
LG 16; cf DS 3866-3872
1317
Cf. Hb 11,6.
1318
AG 7.
1319
AG 1.
1320
AG 2.
1321
Cf. RM 23
1322
Cf. AA 6; RM 11.
1323
RM 21.
1324
AG.5
1325
Tertuliano, Apol., 50,13; CCL 1,171 (PL 1,603)
1326
GS 43,6
1327
LG 8;cf. LG 15.
1328
AG. 1
1329
CF. RM 12 20.
Igreja chamada a seguir o mesmo caminho, a fim de comunicar aos homens os frutos da
salvao1330.
Por sua prpria misso, a Igreja caminha com a humanidade inteira. Experimenta
com o mundo a mesma sorte terrena; como o fermento e a alma da sociedade humana a
ser renovada em Cristo e transformada na famlia de Deus1331. O esforo missionrio
exige, pois, a pacincia. Comea pelo anncio do Evangelho aos povos e aos grupos que
ainda no crem em Cristo1332, prossegue no estabelecimento de comunidades crists que
sejam sinais da presena de Deus no mundo1333 e na fundao de Igrejas locais1334;
encaminha um processo de inculturao para encarnar o Evangelho nas culturas dos
povos1335; e no deixar de conhecer tambm fracassos. Quanto aos homens, sociedades
e povos, apenas gradualmente os atinge e penetra, e assim os assume na plenitude
catlica1336.
A misso da Igreja exige o esforo rumo unidade dos cristos.1337.
Efetivamente, as divises entre cristos impedem a Igreja de realizar a plenitude da
catolicidade que lhe prpria naqueles filhos que, embora lhe pertenam pelo batismo,
esto separados da plena comunho com ela. No s isso, mas tambm para a prpria
Igreja se torna tanto mais difcil exprimir, na realidade de sua vida a plena catolicidade sob
todos os aspectos1338.
A tarefa missionria implica um dilogo respeitoso com os que ainda no aceitam o
Evangelho1339.Os fiis podem tirar proveito para si mesmos deste dilogo, aprendendo a
conhecer melhor tudo o quanto de verdade e de graa j se achava entre as naes,
numa como que secreta presena de Deus1340. Se anunciam a Boa Nova aos que a
desconhecem, para consolidar, completar e elevar a verdade e o bem que deus difundiu
entre os homens e os povos e para purific-los do erro e do mal, para a glria de Deus, a
confuso do demnio e a felicidade do homem1341.
IV. A Igreja apostlica
. A Igreja apostlica por ser fundada sobre os apstolos, e isto em um trplice
sentido:
ela foi e continua sendo construda sobre o fundamento dos apstolos (Ef

sem a todo o rebanho no qual o esprito Santo os constitura para apascentar a Igreja de
Deus. Constituram, pois, tais vares e administraram-lhes, depois, a ordenao a fim de
que, quando eles morressem, outros homens ntegros assumissem seu ministrio1342.
862. Assim como permanece o mnus que o Senhor concedeu singularmente a Pedro, o
primeiro dos apstolos, a ser transmitido a seus sucessores, da mesma forma permanece
o mnus dos Apstolos de apascentar a Igreja, o qual deve ser exercido para sempre pela
sagrada ordem dos Bispos. Eis por que a Igreja ensina que os bispos, por instituio
divina, sucederam aos apstolos como pastores da Igreja, de sorte que quem os ouve,
ouve a Cristo, e quem os despreza a Cristo e aquele por quem Cristo foi enviado.1343
O APOSTOLADO
Toda a Igreja apostlica na medida em que, por meio dos sucessores de S. Pedro e
dos apstolos, permanece em comunho e de f com a sua origem. Toda a Igreja
apostlica na medida em que enviada ao mundo inteiro; todos os membros da Igreja,
ainda que de formas diversas, participam deste envio. A vocao crist tambm por
natureza vocao do apostolado. Denomina-se apostolado toda a atividade de Corpo
Mstico que tende a estender o reino de Cristo a toda a terra1344.
Sendo Cristo enviado pelo Pai a fonte e a origem de todo apostolado da Igreja,
evidente que a fecundidade do apostolado, tanto o dos ministros ordenados como o dos
leigos, depende de sua unio vital com Cristo1345. De acordo com as vocaes, os apelos da
poca e os dons variados do Esprito Santo, o apostolado assume as formas mais diversas.

1330
LG 8
1331
GS 40, 2.
1332
Cf. RM 42-47
1333
AG 15.
1334
Cf. RM 48-49
1335
Cf. RM 52-54
1336
AG 6
1337
Cf. RM
1338
UR 4
1339
Cf. RM 55
1340
AG 9
1341
AG 9
1342
LG; Cf. S. Clemente de Roma, Cor 42; 44.
1343
LG 20
1344
AA 2
1345
Cf. Jo 1,5; AA 4.
Mas sempre a caridade, haurida sobretudo na Eucaristia, que como que a alma de
todo apostolado1346.
865. A Igreja una, santa, catlica e apostlica em sua identidade profunda e ltima,
porque nela que j existe e ser consumado no fim dos tempos o Reino dos cus, o
Reino de Deus1347, que veio na Pessoa de Cristo e cresce misteriosamente no corao dos
que lhes so incorporados, at sua plena manifestao escatolgica. Ento todos os
homens remidos por ele, tornados nele santos e imaculados na presena de Deus no
Amor1348, sero reunidos como o nico Povo de Deus, a Esposa do Cordeiro1349, a
Cidade Santa descida do Cu, de junto de Deus, com a Glria de Deus nela1350, e a
muralha da cidade tem doze alicerces, sobre os quais esto nomes dos doze Apstolos do
Cordeiro (Ap 21,14).
RESUMINDO
866. A Igreja una: tem um s Senhor, confessa uma s f, nasce de um s Batismo,
forma um s Corpo, vivificado por um s Esprito, em vista de uma nica esperana.1351,
no fim da qual sero superadas todas as divises.
867. A Igreja santa: o Deus Santssimo seu autor; Cristo, seu Esposo, se entregou por
ela para santific-la; o Esprito de santidade a vivifica. Embora congregue pecadores, ela
imaculada (feita) de maculados (ex. maculatis immaculata). Nos santos brilha a
santidade da Igreja; em Maria esta j a toda santa.
868. A Igreja catlica: anuncia a totalidade da f; traz em si e administra a plenitude dos
meios de salvao; enviada a todos os povos; dirige-se a todos os homens; abarca todos
os tempos; ela , por sua prpria natureza, missionria1352.
869. A Igreja apostlica: est construda sobre fundamentos duradouros: Os doze
Apstolos do Cordeiro1353, ela indestrutvel1354; infalivelmente mantida na verdade;
Cristo a governa por meio de Pedro e dos demais apstolos, presentes em seus
sucessores, o Papa e o colgio dos Bispos.
870. A nica Igreja de Cristo, que no Smbolo confessamos una, santa, catlica e
apostlica... subsiste na Igreja catlica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos bispos
em comunho com ele, embora fora de sua estrutura visvel se encontrem numerosos
elementos de santificao e de verdade.1355
PARGRAFO 4
OS FIIS DE CRISTO- HIERARQUIA, LEIGOS, VIDA CONSAGRADA

871. Fiis so os que, incorporados a Cristo pelo Batismo, foram constitudos em povo de
Deus e, assim, feitos participantes, a seu modo, do mnus sacerdotal, proftico e rgio de
Cristo, so chamados a exercer, seguindo a condio prpria de cada um, a misso que
Deus confiou para a Igreja cumprir no mundo.1356
872.Entre todos os fiis de Cristo, por sua regenerao em Cristo, vigora, no que se
refere dignidade e atividade, uma verdadeira igualdade, pela qual todos, segundo a
condio e os mnus prprios de cada um, cooperam na construo do Corpo de
Cristo.1357
873. As prprias diferenas que o Senhor quis estabelecer entre os membros de seu Corpo
servem sua unidade e sua misso. Pois, embora exista na Igreja diversidade de
servios, h unidade de misso. Cristo confiou aos apstolos e a seus sucessores o mnus
de ensinar, de santificar e de governar em seu nome e por seu poder. Os leigos, por sua
vez, participantes do mnus sacerdotal, proftico e rgio de Cristo, compartilham a misso
de todo o povo de Deus na Igreja e no mundo1358. Finalmente, em ambas as categorias
[hierarquia e leigos] h fiis que, pela profisso dos conselhos evanglicos, se consagram,
em seu modo especial, a Deus e servem misso salvfica da Igreja; seu estado, embora
no faa parte da estrutura hierrquica da Igreja, pertence, no obstante, sua vida e
santidade1359.
I. A constituio hierrquica da Igreja
POR QUE O MINISTRIO ECLESIAL?
874. O prprio Cristo a fonte do ministrio na Igreja. Instituiu-a, deu-lhe autoridade e
misso, orientao e finalidade:

1346
AA3
1347
Cf. Ap 19,6.
1348
Cf. Ef 1,4
1349
Cf. Ap 21,9
1350
Cf. Ap. 21,10-11.
1351
Cf. Ef 4,3-5
1352
AG 2.
1353
Cf. Ap 21,14.
1354
Cf. Mt 16,18
1355
LG 8
1356
cic, cn. 204, 1; cf LG 31
1357
CIC CAN. 208; Cf. LG 32
1358
AA 2.
1359
CIC, cn. 207, 2.
Para apascentar e aumentar sempre o Povo de Deus, Cristo Senhor instituiu em sua Igreja
uma variedade de ministrios que tendem ao bem todo o Corpo. Pois os ministros que so
revestidos do sagrado poder servem a seus irmos para que todos os que formam o Povo
de Deus... cheguem salvao.1360
875. Como poderiam crer naquele que no ouviram? E como poderiam ouvir sem
pregador? E como podem pregar se no forem enviados? (Rm 10,14-15). Ningum,
nenhum indivduo, nenhuma comunidade pode anunciar a si mesmo o Evangelho. A f
vem da pregao (Rm 10,17). Ningum pode dar a si mesmo mandato e a misso de
anunciar o Evangelho. O enviado do Senhor fala e age no por autoridade prpria, mas em
virtude da autoridade de Cristo; no como membro da comunidade, mas falando a ela em
nome de Cristo. Ningum pode conferir a si mesmo a graa; ela precisa ser dada e
oferecida. Isto supe ministros da graa autorizados e habilitados da parte de Cristo. Dele,
os bispos e presbteros recebem a misso e a faculdade (o poder sagrado) de agir na
pessoa de Cristo-Cabea, os diconos, a fora de servir o Povo de Deus na diaconia da
liturgia, da palavra e da caridade, em comunho com o bispo e seu presbtero. A tradio
da Igreja chama de sacramento este ministrio, pelo qual os enviados de Cristo fazem e
do, por dom de Deus, o que no podem fazer nem dar por si mesmos. O ministrio da
Igreja conferido por um sacramento especfico.
876. Intrinsecamente ligado natureza sacramental do ministrio eclesial est o seu
carter se servio. Com efeito, inteiramente dependentes de Cristo, que d misso e
autoridade, os ministros so verdadeiramente servos de Cristo1361, imagem de Cristo
que assumiu livremente por ns a forma de servo (FI 2,7). J que a palavra e a graa de
que so ministros no so deles, mas de Cristo, que lhas confiou aos outros, eles se faro
livremente servos de todos1362.

877. Igualmente, da natureza sacramental do ministrio eclesial que exista um carter


colegial. Efetivamente, desde o incio de seu ministrio o Senhor Jesus insistiu os Doze, os
germes do Novo Israel e ao mesmo tempo a origem da sagrada hierarquia1363. Escolhidos
conjuntamente, so tambm os enviados conjuntamente, e sua unio fraterna estar a
servio da comunho fraterna de todos os fiis; esta unio ser como um reflexo e um
testemunho da comunho das pessoas divinas1364. Por isso, todo bispo exerce seu
ministrio dentro do colgio episcopal, em comunho com o Bispo de Roma, sucessor de S.
Pedro e chefe do colgio; os presbteros exercem seu ministrio dentro do presbtero da
diocese, sob a direo de seu Bispo.
878. Finalmente, da natureza sacramental do ministrio eclesial que haja um carter
pessoal. Se os ministros de Cristo agem em comunho, agem tambm sempre de maneira
pessoal. Cada um chamado pessoalmente Tu, segue-me(Jo 21,22)1365 para ser, na
misso comum, testemunha pessoal, assumindo pessoalmente a responsabilidade diante
daquele que d a misso, agindo em sua pessoa e em favor de pessoas: Eu te batizo
em nome do Pai..., Eu te perdo....
879. O ministrio sacramental na Igreja um servio exercido em nome de Cristo, que
tem carter pessoal e forma colegial. Isto verifica-se nos vnculos entre o colgio episcopal
e seu chefe, o sucessor de Pedro, e na relao entre a responsabilidade pastoral do Bispo
por sua Igreja particular e solicitude comum do colgio episcopal pela Igreja Universal.
O COLGIO EPISCOPAL E SEU CHEFE, O PAPA
880. Cristo, ao instituir os Doze, instituiu-os maneira de colgio ou grupo estvel, ao
qual preps Pedro, escolhido dentre eles1366. Assim como, por disposio do senhor, S.
Pedro outros apstolos constituem um nico colgio apostlico, de modo semelhante o
Romano Pontfice, sucessor de Pedro, e os Bispos, sucessores dos Apstolos, esto unidos
entre si.1367.
881. Somente Simo, a quem deu o nome de Pedro, o senhor constituiu em pedra de sua
Igreja. Entregou-lhes as chaves da mesma1368; instituiu-o pastor de todo o rebanho1369.
Porm, o mnus de ligar e desligar, que foi dado a Pedro, consta que tambm foi dado ao
colgio dos apstolos, unidos a seu chefe.1370. Este ofcio pastoral de Pedro e de outros
Apstolos faz parte dos fundamentos da Igreja e continuado pelos Bispos sob o primado
do Papa.
O Papa, Bispo de Roma e sucessor de S. Pedro, o perptuo e visvel princpio e

1360
LG 18.
1361
Cf. RM 1,1.
1362
Cf. 1 Cor 9,19
1363
AG 5.
1364
Cf. Jo 17,21-23.
1365
Cf MT 4,19. 21; Jo 1,43
1366
LG 19
1367
LG 22; Cf. CIC, Can. 330
1368
Cf. Mt. 16,18-19
1369
Cf. Jo 21,15-17
1370
LG 22
fundamento da unidade, quer dos Bispos, quer da multido dos fiis1371. Com efeito o
Pontfice Romano, em virtude de seu mnus de Vigrio de Cristo e de Pastor de toda a
Igreja, possui na Igreja poder pleno, supremo e universal. E ele pode exercer sempre
livremente este seu poder.1372.
883. O colgio ou corpo episcopal no tem autoridade se nele no se considerar includo,
como chefe, o Romano Pontfice. Como tal, este colgio tambm ele detentor do poder
supremo e pleno sobre a Igreja inteira. Todavia, este poder no pode ser exercido seno
com o consentimento do Romano Pontfice1373.
884. O colgio dos Bispos exerce o poder sobre a Igreja inteira, de forma solene, no
Conclio Ecumnico.1374. No pode haver Conclio Ecumnico que, como tal, no seja
aprovado ou pelo menos reconhecido pelo sucessor de Pedro.1375
885. Enquanto composto de muitos, este Colgio exprime a variedade e a universalidade
do povo de Deus e, enquanto unido sob um s chefe, exprime a unidade do rebanho de
Cristo.1376
886. Os Bispos individualmente so o visvel princpio e fundamento da unidade em suas
Igrejas particulares.1377. Nesta qualidade, exercem sua autoridade pastoral sobre a
poro do povo de Deus que lhes foi confiada1378, assistidos pelos presbteros e pelos
diconos. Todavia, como membros do colgio episcopal, cada um deles participa da
solicitude por todas as Igreja1379, solicitude esta que exercem primeiramente governando
bem sua prpria Igreja como uma poro da Igreja universal, contribuindo, assim, para o
bem de todo o Corpo Mstico, que tambm o Corpo das Igrejas1380.Esta solicitude
estender-se- particularmente aos pobres1381, aos perseguidos por causa da f, assim
como os missionrios que atuam em toda a terra.
887. As Igrejas particulares vizinhas e de cultura homognea formam provncias
eclesisticas ou conjuntos mais amplos, denominados patriarcados ou regies1382. Os
Bispos desses conjuntos podem reunir-se em snodos ou em conclios provinciais. Da
mesma forma, as Conferncias Episcopais podem, hoje em dia, contribuir de forma
mltipla e fecunda para que o esprito colegial se realize concretamente.1383
O MNUS DE ENSINAR
888. Os Bispos, junto com os presbteros, seus cooperadores, tm como primeira tarefa
anunciar o Evangelho de Deus a todos os homens1384, segundo a ordem do Senhor1385.
So os arautos da f, que levam a Cristo novos discpulos, os doutores autntico da f
apostlica, providos da autoridade de Cristo.1386
889. Para manter a Igreja na pureza da f transmitida pelos apstolos, Cristo quis conferir
sua Igreja uma participao em sua prpria infalibilidade, ela que a Verdade. Pelo
sentido sobrenatural da f, o Povo de Deus se atm indefectivelmente f, sob a guia
do Magistrio vivo da Igreja1387.
890. A misso do Magistrio est ligada ao carter definitivo da Aliana instaurada por
Deus em Cristo com seu Povo: deve proteg-lo dos desvios e dos afrouxamentos e
garantir-lhe a possibilidade objetiva de professar sem erro a f autntica. O ofcio pastoral
do Magistrio est, assim, ordenado ao cuidado para que o Povo de Deus permanea na
verdade que liberta. Para executar este servio, Cristo dotou os pastores do carisma de
infalibilidade em matria de f e de costumes. O exerccio deste carisma pode assumir
vrias modalidades.
891. Goza desta Pontfice Romano, chefe do colgio dos Bispos, por fora de seu cargo
quando, na qualidade de pastor e doutor supremo de todos os fiis e encarregado de
confirmar seus irmos na f, proclama, por um ato definitivo, um ponto de doutrina que
concerne f ou aos costumes... A infalibilidade prometida Igreja reside no corpo
episcopal quando este exerce seu magistrio supremo em unio com o sucessor de Pedro,
sobretudo em um Conclio Ecumnico1388. Quando por seu Magistrio supremo, a Igreja
prope alguma coisa a crer sendo revelada por Deus1389 e como ensinamento de Cristo,
preciso aderir na obedincia da f a tais definies1390. Esta infalibilidade tem a mesma
extenso que o prprio depsito da Revelao divina1391.

1371
LG 23
1372
LG 22; Cf CD 2; 9.
1373
LG 22; Cf CIC, cn. 336
1374
CIC, cn 337, 1.
1375
LG 22.
1376
LG22.
1377
LG 23.
1378
LG 23.
1379
Cf. CD 3.
1380
LG 23.
1381
Cf. GL 2,10
1382
Cf. Canon dos Apstolos 34.
1383
LG 23
1384
PO 4.
1385
Cf. Mc 16,15.
1386
LG 25.
1387
Cf. LG 12, DV 10.
1388
Cf. Vaticano I: DS 3074
1389
DV 10.
1390
LG 25.
1391
Cf. LG 25.
892. A assistncia divina tambm dada aos sucessores dos apstolos, ao ensinarem em
comunho com o sucessor de Pedro e, de modo particular, com o Bispo de Roma, Pastor
de toda a Igreja, quando, mesmo sem chegar a uma definio infalvel e sem se
pronunciar de forma definitiva, prope no exerccio do magistrio ordinrio um
ensinamento que leva a uma compreenso melhor da Revelao em matria de f e de
costumes. A este ensinamento ordinrios os fiis devem ater-se com religioso obsquio do
esprito [eique religioso obsquio adhaerere debent]1392, o qual, embora se distinga do
assentimento da f, o prolonga.
O MNUS DE SANTIFICAR
O Bispo tem, tambm a responsabilidade de ministrar a graa do sacerdcio
supremo1393, em particular na Eucaristia, que ele mesmo oferece ou da qual garante a
oblao pelos presbteros, seus cooperadores. Pois a Eucaristia o centro da vida da Igreja
particular. O Bispo e os presbteros santificam a Igreja por sua orao e seu trabalho, pelo
ministrio da palavra e dos sacramentos. Santificam-na por seu exemplo, no agindo
como senhores daqueles que vos concebem por sorte, mas, antes, como modelos do
rebanho (1Pd 5,3). assim que chegam, com o rebanho que lhes est confiado, vida
eterna1394.
O MNUS DE REGER
Os Bispos dirigem suas Igrejas particulares como vigrios e delegados de Cristo
com conselhos, exortaes e exemplos, mas tambm com autoridade e com poder
sagrado1395, o qual, porm, devem exercer para edificar, no esprito de servio que
caracteriza o de seu Mestre1396.
Este poder, que exercem pessoalmente em nome de Cristo, um poder prprio,
ordinrio e imediato; em seu exerccio, porm est submetido regulamentao ltima da
autoridade suprema da Igreja.1397. Todavia, no se devem considerar os Bispos como
vigrios do Papa, cuja autoridade ordinria e imediata sobre toda a Igreja no anula, ao
contrrio, confirma e defende a deles. Esta deve ser exercida em comunho com toda a
Igreja, sob a condu

Sob o nome de leigos, entendem-se aqui todos os cristos, exceto os membros das
Sagradas Ordens ou do estado religioso reconhecido na Igreja, isto , os fiis que,
incorporados a Cristo pelo Batismo, constitudos em Povo de Deus e a seu modo feitos
participantes da funo sacerdotal, proftica e rgia de Cristo, exercem, em seu mbito, a
misso de todo o Povo cristo na Igreja e no mundo.1398.
A VOCAO DOS LEIGOS
especfico dos leigos, por sua prpria vocao, procurar o Reino de deus
exercendo funes temporais e ordenando-as segundo Deus... A eles, portanto, cabe de
maneira especial iluminar e ordenar de tal modo todas as coisas temporais, s quais esto
intimamente unidos, que eles continuamente se faam e cresam segundo Cristo e
contribuam para o louvor do Criador e Redentor.1399.
A iniciativa dos cristos leigos particularmente necessria quando se trata de
descobrir, de inventar meios para impregnar as realidades sociais, polticas e econmicas
com as exigncias da doutrina e da vida crist. Esta iniciativa um elemento normal da
vida de Igreja.
Os fiis leigos esto na linha mais avanada da vida da Igreja: graas a eles a Igreja o
princpio vital da sociedade humana. Por isso, especialmente eles devem ter uma
conscincia sempre mais clara no somente de pertencerem `a Igreja, isto , a
comunidade dos fiis na terra sob a direo do Chefe comum, o Papa, e dos Bispos em
comunho com eles. Eles so a Igreja1400.
Uma vez que, como todos os fiis, os leigos so encarregados por Deus do
apostolado em virtude do Batismo e da Confirmao, eles tm a obrigao e gozam do
direito, individualmente ou agrupados em associaes, de trabalhar para que a mensagem
divina da salvao seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta
obrigao ainda mais presente se levarmos em conta que somente por meio deles que
os homens podem ouvir o evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a

1392
LG 25.
1393
LG 26.
1394
LG 27.
1395
Cf. Lc 22,26-27.
1396
LG 27.
1397
LG 27.
1398
LG 31.
1399
LG 31.
1400
Pio XII, discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por Joo Paulo II
ao deles to necessria que sem ela o apostolado dos pastores no pode, o mais das
vezes, obter seu pleno efeito1401.
A PARTICIPAO DOS LEIGOS NO MNUS SACERDOTAL DE CRISTO
Os leigos, em virtude de sua consagrao a Cristo da uno do Esprito Santo,
recebem a vocao admirvel e os meios que permitem ao Esprito produzir neles frutos
sempre mais abundantes. Assim, todas as suas obras, preces e iniciativas apostlicas, vida
conjugal e familiar, trabalho cotidiano, descanso do corpo e da alma, se praticados no
Esprito, e mesmo as provaes da vida, pacientemente suportadas, se tornam hstias
espirituais, agradveis a Deus por Jesus Cristo (1Pd 2,5), hstias que so piedosamente
oferecidas ao Pai com a oblao do senhor na celebrao da Eucaristia. assim que os
leigos consagram a Deus o prprio mundo, prestando a Ele, em toda parte, na santidade
de sua vida, um culto de adorao.1402
De maneira especial, os pais participam do mnus de santificao quando levam
uma vida conjugal com esprito cristo e velando pela educao dos filhos1403.
Se tiverem as qualidades exigidas, os leigos podem ser admitidos de maneira estvel
aos ministrios de leitores e de aclitos1404. Onde a necessidade da Igreja o aconselhar,
podem tambm os leigos, na falta de ministros, mesmo no sendo leitores ou aclitos,
suprir alguns de seus ofcios, a saber, exercer o ministrio da palavra, presidir s oraes
litrgicas, administrar o Batismo e distribura sagrada Comunho de acordo com as
prescries do direito.1405
SUA PARTICIPAO NO MNUS PROFTICO DE CRISTO
Cristo... exerce seu Mnus proftico no somente por meio da hierarquia... mas
tambm por meio dos leigos, fazendo deles testemunhas e provendo-os do senso da f e
da graa da palavra1406.
Ensinar algum para lev-lo f a tarefa de cada pregador e at de cada carente1407.
Os leigos exercem sua misso proftica tambm pela evangelizao, isto , o
anncio de Cristo feito pelo testemunho da vida pela palavra. Nos leigos, esta
evangelizao... adquire caractersticas especficas e eficcia peculiar pelo fato de se
realizar nas condies comuns do sculo1408.
Este apostolado no consiste apenas no testemunho da vida: o verdadeiro Apstolo
procura as ocasies para anunciar a Cristo pela palavra, seja aos descrentes... seja aos
fiis1409.
906. Os leigos que forem capazes e que se formarem para isto podem tambm dar sua
colaborao na formao catequtica1410, no ensino das cincias sagradas1411 e atuar nos
meios de comunicao social1412.
De acordo com a cincia, a competncia e o prestgio de que gozam, tm o direito ]
e, s vezes, at o dever de manifestar aos pastores sagrados a prpria opinio sobre o que
afeta o bem da Igreja e, ressalvando a integridade da f e dos costumes e a reverncia
para com os pastores, e levando em conta a utilidade comum e a dignidade das pessoas,
dem a conhecer essa sua opinio tambm a outros fiis.1413
SUA PARTICIPAO NO MNUS RGIO DE CRISTO
Por sua obedincia at a morte1414, Cristo comunicou a seus discpulos o dom da
liberdade rgia, para que venam em si mesmos o reino do pecado, por meio da sua
abnegao e vida santa1415.
Aquele que submete seu prprio corpo e governa sua alma, sem deixar-se submergir pelas
paixes, seu prprio senhor ( dono de si mesmo): pode ser chamado rei porque capaz
de reger sua prpria pessoa; livre e independente e no se deixa aprisionar por uma
escravido culposa1416.
Alm disso, com foras conjugadas, que os leigos sanem as instituies e condies
do mundo, caso estas incidem ao pecado. E isto de tal modo que todas essas coisas se
conformem com as normas da justia e, em vez de a elas se opor, antes favoream o

1401
Cf. LG 33.
1402
LG 34; Cf. LG10.
1403
CIC, cn. 835,4.
1404
Cf. CIC, cn 230, 1.
1405
CIC, cn 230,3
1406
LG 35.
1407
Santo Tomas de Aquino, S. Th. 3,71, 4, ad 3.
1408
LG. 35
1409
AA 6; Cf. Ag 15.
1410
Cf. CIC, cn 774; 776; 780.
1411
Cf. CIC, Can. 229.
1412
Cf. CIC, cn. 822, 3.
1413
CIC, cn 212,3.
1414
Cf. Fl 2,.8-9.
1415
LG 36.
1416
Sto. Ambrsio, Psal. 118,14,30: Pl. 15,1403-A.
exerccio das virtudes. Agindo dessa forma impregnaro de valor moral a cultura e as
obras humanas.1417.
Os leigos podem tambm sentir-se chamados ou vir a ser chamados para colaborar
com os prprios pastores no servio da comunidade eclesial, para o crescimento e a vida
da mesma, exercendo ministrios bem diversificados, segundo a graa e os carismas que o
Senhor quiser depositar neles.1418.
Na igreja, os fiis leigos podem cooperar juridicamente no exerccio do poder de
governo1419. Isto se diz de sua presena nos conclios particulares1420, nos snodos
diocesanos1421, nos conselhos pastorais1422, do exerccio do encargo pastoral de uma
parquia1423; da colaborao nos conselhos de assuntos econmicos1424; da participao
nos tribunais eclesisticos1425, etc.
Os fiis devem distinguir acuradamente entre os direitos e os deveres que lhes
incubem enquanto membros da Igreja e os que lhes competem enquanto membros da
sociedade humana. Procuraro conciliar ambos harmonicamente entre si, lembrados de
que em qualquer situao temporal devem conduzir-se pela conscincia crist, uma vez
que nenhuma atividade humana, nem mesmo nas coisas temporais, pode ser subtrada ao
domnio de Deus1426.
Assim, todo leigo, em virtude dos dons que lhes foram conferidos, ao mesmo
tempo testemunha e instrumento vivo da prpria misso da Igreja pela medida do dom de
Cristo (Ef 4,7)1427.
III. A vida consagrada
914. O estado de vida constitudo pela profisso dos conselhos evanglicos, embora no
pertena estrutura hierrquica da Igreja, est, contudo, firmemente relacionado com sua
vida e santidade.1428.
CONSELHOS EVANGLICOS, VIDA CONSAGRADA
Os conselhos evanglicos, em sua multiplicidade, so propostos a todo discpulo de
Cristo. A perfeio da caridade qual todos os fiis so chamados comporta para os que
assumem livremente o chamado vida consagrada a obrigao de praticar a castidade no
celibato pelo reino, a pobreza e a obedincia. profisso desses conselhos em um estado
de vida estvel reconhecido pela Igreja que caracteriza a vida consagrada a Deus1429.
916.O estado da vida consagrada aparece, portanto, como uma das maneiras de conhecer
uma consagrao mais ntima, que se radica no Batismo e se dedica totalmente a
Deus1430. Na vida consagrada, os fiis de Cristo se propem, sob a moo do Esprito
Santo, seguir a Cristo mais de perto, doar-se a Deus amado acima de tudo e,
procurando alcanar a perfeio da caridade a servio do reino, significar e anunciar na
Igreja a glria do mundo futuro1431.
UMA GRANDE RVORE, DE MLTIPLOS RAMOS
917.Disso resultou que, como numa rvore frondosa e admiravelmente variegada na
seara
do senhor e isto em virtude do germe divinamente plantado -, floresceram as diversas
modalidades da vida solitria ou comum, assim como as vrias famlias, as quais vo
aumentando tanto para proveito dos prprios membros quanto para o bem de todo o
Corpo de Cristo1432.
Desde os primrdios da Igreja existiram homens e mulheres que se propuseram, pela
prtica, pela prtica dos conselhos evanglicos, seguir a Cristo com maior liberdade e
imit-lo mais de perto, e levaram, cada qual a seu modo, uma vida consagrada a Deus.
Dentre ele, muitos, por inspirao do Esprito Santo, ou passaram a vida na solido ou
fundaram famlias religiosas, que a religiosas, que a Igreja, de boa vontade, recebeu e
aprovou com sua autoridade.1433
919.Os Bispos ho de empenhar-se sempre em discernir os novos dons de vida
consagrada

1417
EN. 73.
1418
CIC, cn. 129,2.
1419
Cf. CIC, cn. 443,4.
1420
Cf. CIC, cn. 463,1-2
1421
Cf. CIC, cn 511-512.536.
1422
Cf. CIC, cn. 517,2.
1423
Cf. CIC, cn 492, 1; 437;
1424
Cf. CIC, cn. 1421,2.
1425
LG 36.
1426
LG33.
1427
LG44.
1428
Cf. LG 42-42; Pc 1.
1429
Cf. LG 42-43; PC 1.
1430
Cf. PC 5.
1431
Cf. CIC, cn. 573.
1432
LG. 43
1433
PC 1.
confiados pelo Esprito Santo sua Igreja; a aprovao de novas formas de vida
consagrada reservada S Apostlica1434.
AVIDA EREMTICA
920.Embora nem sempre professem publicamente os trs conselhos evanglicas, os
eremitas, por uma separao mais rgida do mundo, pelo silncio da solido, pela assdua
e penitncia, consagram a vida ao louvor de Deus e salvao do mundo1435.
Os eremitas mostram a cada um este aspecto interior do mistrio da Igreja, que a
intimidade pessoal com Cristo. Escondida aos olhos dos homens, a vida do eremita
pregao silenciosa daquele ao qual entregou sua vida, pois tudo para Ele. um
chamado peculiar a encontrar no deserto, precisamente no combate espiritual, a glria do
Crucificado.
AS VIRGENS E AS VIVAS CONSAGRADAS
Desde os tempos apostlicos, virgens1436, e viuvas cristas1437, chamadas pelo Senhor a
apegar-se a Ele partilha em uma liberdade maior de corao, de corpo e de esprito,
tomaram a deciso, aprovada pela Igreja, de viver respectivamente no estado de
virgindade ou de castidade perptua por causa do reino dos Cus (Mt 19,12)
Emitindo o santo propsito de seguir a Cristo mais de perto, [as virgens] so
consagradas a Deus pelo Bispo diocesano segundo o rito litrgico aprovado, misticamente
desposadas com Cristo, Filho de Deus, e dedicadas ao servio da Igreja.1438. Por este rito
solene (Consecratio virginium), a virgem constituda pessoa consagrada, sinal
transcendente do amor da Igreja a Cristo, imagem escatolgica desta Esposa do Cu e da
vida futura1439.
Acrescentada s outras formas de vida consagrada1440, a ordem das virgens constitui a
mulher que vive no mundo (ou a morja) na orao, na penitncia, no servio a seus
irmos e no trabalho apostlico, conforme o estado e os carismas respectivos oferecidos a
cada uma1441. As virgens consagradas podem associar-se para guardar mais fielmente seus
propsito1442.
A VIDA RELIGIOSA
Nascida no Oriente nos primeiros sculos do cristianismo1443e vivida nos institutos
canonicamente erigidos pela Igreja1444, a vida religiosa se distingue das outras
modalidades de vida consagrada pelos aspecto cultural, pela profisso pblica dos
conselhos evanglicos, pela vida fraterna levada em comum, pelo testemunho da unio de
Cristo com a Igreja1445.
A vida religiosa faz parte do mistrio da Igreja. um dom que a Igreja recebe de seu
senhor e que oferece como um estado de vida permanente ao fiel chamado por Deus na
profisso dos conselhos. Assim, a Igreja pode ao mesmo tempo manifestar o Cristo e
reconhecer-se como esposa do Salvador. A vida religiosa convidada a significar, em suas
variadas formas, a prpria caridade de Deus, em linguagem de nossa poca.
Todos os religiosos, isentos ou no1446, so contados entre os cooperadores do
Bispo diocesano em seu ministrio pastoral1447. A implantao e a expanso missionria da
Igreja exigiram a presena da vida religiosa sob todas as suas formas desde os incios da
evangelizao1448. A histria atesta os grandes mritos das famlias religiosas na
propagao da f e na formao de novas Igrejas, desde as antigas instituies monsticas
e as ordens medievais at as congregaes modernas.1449.
OS INSTITUTOS SECULARES
Instituto secular um instituto de vida consagrada no qual os fiis, vivendo no
mundo, tendem perfeio da caridade e procuram cooperar para a santificao do
mundo, principalmente a partir de dentro.1450.
Por uma vida perfeita [= perfeitamente] e inteiramente consagrada a [esta]
santificao1451, os membros desses institutos participam da tarefa de evangelizao da
Igreja, no mundo e a partir do mundo1452, onde sua presena age guisa de um

1434
Cf. CIC, cn. 605.
1435
CIC, cn. 603, 1.
1436
Cf. 1Cor 7,34-36.
1437
Cf. Joo Paulo II, VC 7: AAS 88(1996) 382.
1438
CIC, cn. 604, 1.
1439
OCV, praenotanda l.
1440
CIC, cn. 604, 1.
1441
OCV, praenotanda 2.
1442
Cf. CIC, cn. 604,2.
1443
Cf. UR 15.
1444
Cf. CIC, cn. 573.
1445
Cf. CIC, cn. 607.
1446
Cf. CIC, cn. 591
1447
Cf. CD 33-35.
1448
Cf. AG 18;40.
1449
RM 69.
1450
CIC, cn. 710
1451
Pio XII, const. Ap Provida Mater
1452
Cf. CIC, cn. 713,2
fermento1453. Seu testemunho de vida crist visa organizar as coisas temporais de
acordo com Deus e impregnar o mundo com a fora do Evangelho. Eles assumem por
vnculos sagrados os conselhos evanglicos e mantm entre si a comunho e a
fraternidade prprias de seu modo de vida secular1454.
AS SOCIEDADES DE VIDA APOSTLICA
s formas diversas de vida consagrada acrescentam-se as sociedades de vida
apostlica, cujos membros, sem os votos religiosos, buscam a finalidade apostlica prpria
de sua sociedade e, levando vida fraterna em comum, segundo o prprio modo de vida,
tendem perfeio da caridade pela observncia das constituies. Entre elas h
sociedades cujos membros assumem os conselhos evanglicos por meio de algum vnculo
determinado pelas constituies1455.
CONSAGRAO E MISSO: ANUNCIAR O REI QUE VEM
Entregue a Deus supremamente amado que pelo Batismo j estava consagrado a ele
assim consagrado mais intimamente ao servio divino e dedicado ao bem da Igreja. Pelo
estado de consagrao a Deus, a Igreja manifesta Cristo e mostra como o Esprito Santo
age nela de maneira admirvel. Os que professam os conselhos evanglicos tm, pois, por
misso primeiramente viver sua consagrao. Mas enquanto dedicados, em virtude da
prpria consagrao, ao servio da Igreja tm obrigao de se entregar, de maneira
especial, ao missionria no modo prprio de seu instituto1456.
Na Igreja - ela como sacramento, isto , o sinal e o instrumento da vida de Deus-, a
vida consagrada aparece como um sinal peculiar do mistrio da redeno. Seguir e imitar a
Cristo mas de perto, manifestar mais, profundamente presente a seus
contemporneos, no corao de Cristo. Pois os que esto nesta via mais estreita
estimulam seus irmos por seu exemplo, do este testemunho brilhante de que o mundo
no pode ser transfigurado e oferecido a Deus sem o esprito das bem-aventuradas1457.
Seja este testemunho pblico, como no estado religioso, ou mais discreto, ou at
secreto, o advento de Cristo permanece para todos os consagrados a origem e a
orientao de sua vida:
Como o povo de Deus no possui aqui na terra morada permanente, o estado
religioso manifesta j aqui neste mundo a todos os crentes a presena dos bens celestes,
d testemunho da vida nova e eterna adquira pela redeno de Cristo, prenuncia a
ressurreio futura e a glria do Reino celeste1458.
RESUMINDO
Por instituies divina, h entre os fiis na Igreja ministros sagrados, que no direito
so tambm chamados clrigos; os outros fiis so tambm denominados leigos. H
finalmente, fiis que pertencem a uma ou outra das duas categorias e que, pela profisso
dos conselhos evanglicos, se consagram a Deus e servem, assim, misso da Igreja1459.
Para anunciar a f e para implantar seu Reino, Cristo envia seus apstolos e seus
sucessores. D-lhes participao em sua misso. De Cristo recebem o poder de agir em
seu nome.
O Senhor fez de S. Paulo o fundamento visvel de sua Igreja. Entregou-lhes suas
chaves. O Bispo da Igreja de Roma, sucessor de S. Pedro, a cabea do colgio dos
Bispos, Vigrio de Cristo e, aqui na terra pastor da Igreja1460.
O Papa tem, por instituio divina, poder supremo, pleno, imediato e universal na
cura das almas1461.
Os Bispos, estabelecidos pelo Esprito Santo, sucedem aos Apstolos. So, cada um
por sua parte, princpio visvel e fundamento da unidade em suas Igrejas particulares1462).
Ajudados pelos presbteros, seus cooperadores, e pelos diconos, os Bispos tm o
ofcio de ensinar autenticamente a f, de celebrar o culto divino, sobretudo a Eucaristia, e
de dirigir suas Igrejas como verdadeiros pastores. A seu ofcio pertence tambm a
solicitude por todas as Igrejas, com o Papa e sob a direo dele.
Sendo a caracterstica do estado leigo viver em meio ao mundo e aos negcios
seculares, so eles chamados por Deus a exercer seu apostolado no mundo guisa de
fermento, graas ao vigor de seu esprito cristo.1463.
Os leigos participam do sacerdcio de Cristo; cada vez mais unidos a ele,
1453
PC 11.
1454
Cf. CIC, cn. 713.
1455
CIC, cn. 731, 1.2
1456
CIC, cn 783; cf. RM 69.
1457
LG 31.
1458
LG 44.
1459
CIC, cn. 207, 1.2.
1460
CIC, cn 331.
1461
CD 2.
1462
LG 23.
1463
AA2.
desenvolvem a graa do Batismo e da Confirmao em todas as dimenses da vida
pessoal, familiar, social e eclesial e realizam, assim, o chamado santidade, dirigido a
todos os batizados.
Graas sua misso proftica, os leigos so tambm chamados a serem testemunhas
de Cristo em tudo, no meio da comunidade humana1464.
Graas sua misso rgia, os leigos tm o poder de vencer o imprio do pecado em si
mesmos e no mundo., por sua abnegao e pela santidade de sua vida1465.
A vida consagrada a Deus caracteriza-se pela profisso pblica dos conselhos ]
evanglicos de pobreza, de castidade e de obedincia em um estado de vida permanente
reconhecido pela Igreja.
945. Entregue a Deus supremamente amado, aquele que pelo Batismo j havia sido
destinado a Ele encontra-se, no estado de vida consagrada, mais intimamente votado ao
servio divino e dedicado ao bem de toda a Igreja.
PARGRAFO 5
A COMUNHO DOS SANTOS
Depois de ter confessado a santa Igreja catlica, o Smbolo dos Apstolos
acrescenta a comunho dos santos. Este artigo , de certo modo, uma explicao do
anterior: Que a Igreja, se no a assemblia de todos os santos?1466. A comunho dos
santos precisamente a Igreja.
Uma vez que todos os crentes formam um s corpo, o bem de uns comunicado aos
outros... Assim, preciso crer que existe uma comunho dos bens na Igreja. Mas o
membro mais importante cristo, por ser a Cabea... Assim, o bem de Cristo
comunicado a todos os membros, e essa comunicao se faz por meio dos sacramentos da
Igreja.1467 Como esta Igreja governada por um s e mesmo Esprito, todos os bens que
ela recebeu se tornam necessariamente um fundo comum.1468.
O termo comunho dos santos tem, pois, dois significados intimamente interligados:
comunho nas coisas santas (sancta) e comunho entre as pessoas santas (sancti).
Sancta sanctis! ( o que santo para os que so santos): assim proclama o
celebrante na maioria das liturgias orientais no momento da elevao dos santos dons,
antes do servio da comunho. Os fiis (sancti) so alimentados pelo Corpo e pelo Sangue
de Cristo (sancta), a fim de crescerem na comunho do esprito Santo (Koiononia) e de
comunic-la ao mundo.
A comunho dos bens espirituais
Na comunidade primitiva de Jerusalm, os discpulos mostravam-se assduos ao
ensinamento dos Apstolos, comunho fraterna, frao do po e s oraes (At 2,42).
A comunho na f. A f dos fiis a f da Igreja, recebida dos Apstolos, tesouro
de vida que se enriquece ao ser compartilhado.
A comunho dos sacramentos. O fruto de todos os sacramentos pertence a todos os
fiis. Com efeito, os sacramentos, e sobretudo o Batismo, que a porta pela qual se entra
na Igreja, so igualmente vnculos sagrados que os unem a todos e os incorporam a Jesus
Cristo. A comunho dos santos a comunho operada pelos sacramentos... O nome
comunho pode ser aplicado a cada sacramento, pois todos eles nos unem a Deus...
Contudo, mais do que a qualquer outro, este nome convm Eucaristia, porque
principalmente ela que consuma esta comunho1469.
A comunho dos carismas. Na comunho da Igreja, o Esprito Santo distribui
tambm entre os fiis de todas as ordens as graas especiais para a edificao da
Igreja1470. Ora, cada um recebe o dom de manifestar o Esprito para a utilidade de todos
(1Cor 12,7)
Punham tudo em comum (At 4,32) Tudo o que o verdadeiro cristo possui, deve
consider-lo como um bem que lhe comum com

o procura seu prprio interesse (1 Cor 13,5)1471. O menor dos nossos atos praticado na
caridade irradia em benefcio de todos, nesta solidariedade com todos os homens, vivos ou
mortos, que se funda na comunho dos santos. Todo pecado prejudica esta comunho.

1464
GS 43,4.
1465
Cf. LG 36.
1466
Nicetas, Expl. Symb. 10: PL 52,871B
1467
Sto. Toms de Aquino, Symb. 13.
1468
Catech. R. 1.10,24.
1469
Catech. R. 1.10,24.
1470
LG 12.
A comunho entre a Igreja do Cu e a da terra
Os trs estados da Igreja. At que o Senhor venha em sua majestade e, com ele,
todos os anjos e, tendo sido destruda a morte, todas as coisas lhe forem sujeitas, alguns
dentre os seus discpulos peregrinam na terra; outros, terminada esta vida, so
purificados; enquanto outros so glorificados, vendo claramente o prprio Deus trino e
uno, assim como .1472
Todos, porm, em grau e modo diverso, participamos da mesma caridade de Deus e do
prximo e cantamos o mesmo hino de glria a nosso Deus. Pois todos quantos so de
Cristo, tendo o seu Esprito, congregam-se em uma s Igreja e nele esto unidos entre
si1473.
A unio dos que esto na terra com os irmos que descansam na paz de Cristo de
maneira alguma se interrompe; pelo contrrio, segundo a f perene da Igreja, v-se
fortalecida pela comunicao dos bens espirituais.1474.
A intercesso dos santos. Pelo fato de os habitantes do Cu estarem unidos mais
intimamente com Cristo, consolidam com mais firmeza na santidade toda a Igreja. Eles
no deixam de interceder por ns ao Pai, apresentando os mritos que alcanaram na
terra pelo nico mediador de Deus e dos homens, Cristo Jesus. Por conseguinte, pela
fraterna solicitude deles, nossa fraqueza recebe o mais valioso auxlio1475.
No choreis! Ser-vos-ei mais til aps a minha morte e ajudar-vos-ei mais eficazmente do
que durante a minha vida1476.
Passarei meu cu fazendo bem na terra1477.
A comunho com os santos. Veneramos a memria dos habitantes do cu no
somente a ttulo de exemplo; fazemo-lo ainda mais para corroborar a unio de toda a
Igreja no Esprito, pelo exerccio da caridade fraterna. Pois, assim como a comunho entre
os cristos da terra nos aproxima de Cristo, da mesma forma o consrcio com os santos
nos une a Cristo, do qual, como de sua fonte e cabea, promana toda a graa e a vida do
prpria Povo de Deus1478.
Ns adoramos Cristo qual Filho de Deus. Quanto aos mrtires, os amamos quais discpulos
e imitadores do Senhor e, o que justo, por causa de sua incomparvel devoo por seu
Rei e Mestre. Possamos tambm ns ser companheiros e condiscpulos seus1479.
A comunho com os falecidos. Reconhecendo cabalmente esta comunho de todo o
corpo mstico de Jesus Cristo, a Igreja terrestre, desde os tempos primevos da religio
crist, venerou com grande piedade a memria dos defuntos(...) e, j que um
pensamento santo e salutar rezar pelos defuntos para que sejam perdoados de seus
pecados (2 Mc 12,46), tambm ofereceu sufrgios em favor deles.1480. Nossa orao por
eles pode no somente ajud-los, mas tambm tornar eficaz sua intercesso por ns.
... na nica famlia de Deus. Todos os que somos filhos de Deus e constitumos uma
nica famlia em Cristo, enquanto nos comunicamos uns com os outros em mtua caridade
e num mesmo louvor Santssima Trindade, realizamos a vocao prpria da Igreja.1481.
RESUMINDO
A Igreja comunho dos santos: esta expresso designa primeiro as coisas
santas (sancta) e antes de tudo a Eucaristia, pela qual representada e realizada a
unidade dos fiis que, em Cristo, formam um s corpo1482.
Este termo designa tambm a comunho das pessoas santas (sancti) em Cristo, que
morreu por todos, de sorte que aquilo que cada um faz ou sofre em Cristo e por ele
produz fruto para todos.
Cremos na comunho de todos os fiis de Cristo, dos que so peregrinos na terra,
dos defuntos que esto terminando a sua purificao, dos bem-aventurados do cu,
formando, todos juntos, uma s Igreja, e cremos que nesta comunho o amor
misericordioso de Deus e de seus santo est sempre escuta de nossas oraes.1483
PARGRAFO 6
MARIA ME DE CRISTO, ME DA IGREJA
Depois de termos falado do papel da Virgem Maria no mistrio de Cristo e do esprito,

1471
Cf. 1Cor 10,24.
1472
LG 49.
1473
LG 49.
1474
LG 49.
1475
LG 49.
1476
S. Domingos Morimbundo a seus irmos, cf. Jordo da Saxnia, Lib., 93.
1477
Sta. Terezinha do Menino Jesus, Verba
1478
LG. 50.
1479
S. Policarpo, Mart. 17.
1480
LG 50.
1481
LG 51.
1482
LG 3.
1483
SPF 30.
convm agora considerar o lugar dela no mistrio da Igreja. Com efeito, a Virgem
Maria(...) reconhecida e honrada como a verdadeira Me de Deus e do redentor. (...) Ela
tambm verdadeiramente Me dos membros [de Cristo] (...), porque cooperou pela
caridade para que na Igreja nascessem os fiis que so os membros desta Cabea.1484
(...) Maria, Me de Cristo, Me da Igreja.1485
A maternidade de Maria com relao Igreja
TOTALMENTE UNIDA A SEU FILHO...
O papel de Maria para com a Igreja inseparvel de sua unio com Cristo, decorrendo
diretamente dela (dessa unio). Esta unio de Maria com seu Filho na obra da salvao
manifesta-se desde a hora da concepo virginal de Cristo at sua morte.1486. Ela
particularmente manifestada na hora da paixo de Jesus:
A bem-aventurada Virgem avanou em sua peregrinao de f, manteve fielmente sua
unio com o Filho at a cruz, onde esteve de p no sem desgnio divino, sofreu
intensamente junto com seu unignito. E com nimo materno se associou a seu sacrifcio,
consentindo com amor na imolao da vtima por ela gerada. Finalmente, pelo prprio
Jesus moribundo na cruz, foi dada como me ao discpulo com estas palavras: Mulher, eis
a teu filho (Jo 19, 16-27)1487
Aps a ascenso de seu Filho, Maria assistiu com suas oraes a Igreja
nascente1488.Reunida com os apstolos e algumas mulheres, vemos Maria pedindo,
tambm ela, com suas oraes, o dom do Esprito, o qual, na Anunciao, a tinha coberto
com sua sombra1489
...TAMBM EM SUA ASSUNO...
Finalmente, a Imaculada Virgem, preservada imune de toda mancha da culpa
original, terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma glria celeste.
E para que mais plenamente estivesse conforme a seu Filho, Senhor dos mais plenamente
estivesse conforme a seu Filho, Senhor dos senhores e vencedor do pecado e da morte, foi
exaltada pelo Senhor como rainha do universo.1490 A Assuno da Virgem Maria uma
participao singular na Ressurreio de seu Filho e uma antecipao da ressurreio dos
outros cristos:
Em vosso parto, guardastes a virgindade; em vossa dormio, no deixastes o mundo,
me de Deus: fostes juntar-vos fonte da vida, vs que concebestes o Deus vivo e, por
vossas oraes, livrareis nossas almas da morte1491.
... ELA NOSSA ME NA ORDEM DA GRAA
Por sua adeso total vontade do Pai, obra redentora de seu Filho, a cada moo do
esprito Santo, a Virgem Maria para a Igreja o modelo da f e da caridade. Com isso, ela
membro supereminente e absolutamente nico da Igreja1492, sendo a realizao
exemplar (typus) da Igreja1493.
Mas seu papel em relao Igreja e a toda a humanidade vai ainda mais longe. De
modo inteiramente singular, pela obedincia, f, esperana e ardente caridade, ela
cooperou na obra do Salvador para a restaurao da vida sobrenatural das almas. Por esse
motivo ela se tornou para ns me na ordem da graa.1494
Esta maternidade de Maria na economia da graa perdura ininterruptamente, a partir
do consentimento que ela fielmente prestou na anunciao, que sob a cruz resolutamente
manteve, at a perptua consumao de todos os eleitos. Assunta os cus, no abandonou
este mnus salvfico, mas, por sua mltipla intercesso, continua a alcanar-nos os dons
da salvao eterna. (...) Por isso, a bem-aventurada Virgem Maria invocada na Igreja
sob os ttulos de advogada, auxiliadora, protetora, medianeira.1495
A misso materna de Maria em favor dos homens de modo algum obscurece nem
diminui a mediao nica de Cristo; pelo contrrio, at ostenta sua potncia, pois todo o
salutar influxo da bem-aventurada Virgem (...) deriva dos superabundantes mritos de
Cristo, estriba-se em sua mediao, dela depende inteiramente e dela aufere toda a sua
fora.1496
Com efeito, nenhuma criatura jamais pode ser equiparada ao Verbo encarnado e
Redentor. Mas, da mesma forma que o sacerdcio de Cristo participado de vrios modos,
seja ministros, seja pelo povo fiel, e da forma que indivisa bondade de Deus realmente

1484
LG 53, citando Sto. Agostinho, virg. 6: PL 40,399.
1485
Paulo VI, discurso de 21 de novembro de 1964.
1486
LG 57.
1487
LG 58.
1488
LG 69.
1489
LG 59.
1490
LG 59; cf. a proclamao do dogma da Assuno da bem-aventurada Virgem Maria pelo Papa Pio XII em 1950: DS 3903.
1491
Liturgia bizantina, Troprio da Festa da Dormio {15 de agosto}.
1492
LG 53.
1493
LG 63.
1494
LG 61.
1495
LG 62.
1496
LG 60.
difundida nas criaturas de modos diversos, assim tambm a nica mediao do redentor
no exclui, antes suscita nas criaturas uma variegada cooperao que participa de uma
nica fonte
O culto da Santssima Virgem
Todas as geraes me chamaro bem-aventurada(Lc 1,48): A piedade da Igreja
para com a Santssima Virgem intrnseca ao culto cristo1497. A Santssima Virgem
legitimamente honrada com um culto especial pela Igreja. Com efeito, desde remotssimos
tempos, a bem-aventurada Virgem venerada sob o ttulo de Me de Deus, sob cuja
proteo os fiis se refugiam suplicantes em todos os seus perigos e necessidades. (...)
Este culto (...) embora inteiramente singular, difere essencialmente do culto de adorao
que se presta ao Verbo encarnado e igualmente ao Pai e ao Esprito Santo, mas favorece
poderosamente1498, este culto encontra sua expresso nas festas litrgicas dedicadas
Me de Deus1499 e na orao mariana, tal como o Santo Rosrio, resumo de todo o
Evangelho1500.
Maria - cone escatolgico da Igreja

Depois de termos falado da Igreja, de sua origem, de sua misso e de seu destino, a
melhor maneira de concluir voltar o olhar para Maria, a fim de contemplar nela (Maria) o
que a Igreja em seu mistrio, em sua peregrinao da f, e o que ela (Igreja) ser na
ptria ao termo final de sua caminhada, onde a espera, na glria da Santssima e indizvel
Trindade, no-comunho de todos os santos1501, aquela que a Igreja venera como a Me
de seu Senhor e como sua prpria Me:
Assim como no cu, onde j est glorificada em corpo e alma, a Me de Deus representa e
inaugura a Igreja em sua consumao no sculo futuro, da mesma forma nesta terra,
enquanto aguardamos a vinda do Dia do Senhor, ela brilha como sinal da esperana
segura e consolao para o Povo de Deus em peregrinao1502.
RESUMINDO
Ao pronunciar o fiat (faa-se) da Anunciao e ao dar seu consentimento ao
Mistrio da Encarnao, Maria j colabora para toda a obra que seu Filho dever realizar.
Ela a Me onde Ele Salvador e Cabea do Corpo Mstico.
Depois de encerrar o curso de sua vida terrestre, a Santssima Virgem Maria foi
elevada em corpo e alma glria do Cu, onde j participa da glria da ressurreio de
seu filho, antecipando a ressurreio de todos os membros de seu corpo.
Cremos que a Santssima Me de Deus, nova Eva, Me da Igreja, continua no Cu
sua funo materna em relao aos membros de Cristo.1503
ARTIGO 10
CREIO NO PERDO DOS PECADOS
O Smbolo dos Apstolos correlaciona a f no perdo dos pecados com a f no
Esprito Santo, mas tambm com a f na Igreja e na comunho dos santos. Foi dando o
Esprito Santo a seus apstolos que Cristo ressuscitado lhes conferiu seu prprio poder
divino de perdoar os pecados: Recebi o Esprito Santo. Aqueles a quem perdoardes os
pecados, lhes sero perdoados; aqueles a quem os retiverdes, lhes sero retidos (Jo 20,
22-23)
(A Segunda Parte do catecismo tratar explicitamente do perdo dos pecados pelo
Batismo, pelo sacramento da Penitncia e pelos outros sacramentos, sobretudo a
Eucaristia. Por isso basta aqui evocar sucintamente alguns dados bsicos).
Um s Batismo para o perdo dos pecados
Nosso Senhor ligou o perdo dos pecados f e ao Batismo: Ide por todo o mundo e
proclamai o Evangelho a toda criatura. Aquele que crer e for batizado ser salvo(Mc
16,15-16). O Batismo o primeiro e principal sacramento do perdo dos pecados, porque
une a Cristo morto por nossos pecados, ressuscitado para nossa justificao1504, para que
ns tambm vivamos vida nova (Rm 6,4)
No momento em que fazemos nossa primeira profisso de f, recebendo o santo
Batismo que nos purifica, o perdo que recebemos to pleno e to completo que no nos
resta absolutamente nada a apagar, seja do pecado original, seja dos pecados cometidos
por nossa prpria vontade, nem nenhuma pena a sofrer para expi-los. (...) Contudo, a
graa do Batismo no livra ningum de todas as fraquezas da natureza. Pelo contrrio,

1497
MC 56.
1498
LG 66.
1499
Cf. SC 103.
1500
Cf. MC 42.
1501
LG 69.
1502
LG 68.
1503
SPF 15.
1504
Cf. Rm 4,25
ainda temos de combater os movimentos da concupiscncia, que no cessam de arrastar-
nos para o mal.1505
Neste combate contra a inclinao para o mal, quem seria suficientemente forte e
vigilante para evitar toda ferida do pecado? Se, portanto, era necessrio que a Igreja
tivesse o poder de perdoar os pecados, tambm era preciso que o Batismo no fosse para
ela o nico meio de servir-se dessas chaves do reino dos Cus, que havia recebido de
Jesus Cristo: era preciso que ela fosse capaz de perdoar as faltas a todos os penitentes,
ainda que tivessem pecado at o ltimo instante de sua vida1506.
pelo sacramento da Penitncia que o batizado pode ser reconciliado com Deus e
com a Igreja:
Os Padres da Igreja com razo chamavam a Penitncia de um Batismo laborioso1507. O
sacramento da Penitncia necessrio para a salvao daqueles que caram depois do
Batismo, assim como o Batismo necessrio para os que ainda no foram regenerados1508.
O poder das chaves
Depois de sua ressurreio, Cristo enviou seus Apstolos para anunciar a todas as
naes o arrependimento em seu Nome, em vista da remisso dos pecados (Lc 24,47).
Este ministrio da reconciliao (2 Cor 5,18), os Apstolos e seus sucessores no o
exercem somente anunciando aos homens o perdo de Deus merecido para ns por Cristo
e chamando-os converso e f, mas tambm comunicando-lhes a remisso dos
pecados pelo Batismo e reconciliando-os com Deus e com a Igreja graas ao poder das
chaves recebidas de Cristo:
A Igreja recebeu as chaves do Reino dos Cus para que se opere nela a remisso dos
pecados pelo sangue de Cristo e pela ao do Esprito Santo. nesta Igreja que a alma
revivem, ela que estava morta pelos pecados, a fim de viver com Cristo, cuja graa nos
salvou 1509
No h pecado algum, por mais grave que seja, que a Santa Igreja no possa perdoar.
No existe ningum, por mau e culpado que seja, que no deva esperar com segurana
seu perdo, desde que seu arrependimento seja sincero.1510 Cristo, que morreu por todos
os homens, quer que, em sua Igreja, as portas do perdo estejam sempre abertas a todo
aquele que recua o pecado1511.
A catequese empenhar-se- em despertar e alimentar nos fiis a f na grandeza
incomparvel do dom que cristo ressuscitado concedeu sua Igreja: a misso e o poder de
perdoar verdadeiramente os pecados, pelo ministrio dos apstolos e de seus sucessores:
O Senhor quer que seus discpulos tenham um poder imenso: quer que seus pobres
servidores realizem em seu nome tudo o que havia feito quando estava na terra1512.
Os presbteros receberam um poder que Deus no deu nem aos anjos nem aos arcanjos.
Deus sanciona l no alto tudo o que os sacerdotes fazem aqui embaixo1513
Se na Igreja no existisse a remisso dos pecados, no existiria nenhuma esperana,
nenhuma perspectiva de uma de uma vida eterna e de uma libertao eterna. Damos
graas a Deus, que deu sua Igreja tal dom1514.
RESUMINDO

O Credo relaciona o perdo dos pecados com a profisso da f no Esprito Santo.


Com efeito, Cristo ressuscitado confiou aos Apstolos o poder de perdoar os pecados
quando lhes deu o Esprito santo.
O Batismo o primeiro e o principal sacramento para o perdo dos pecados: une-nos
a Cristo morto e ressuscitado e nos d o Esprito Santo.
Pela vontade de Cristo, a Igreja possui o poder de perdoar os pecados dos batizados
e o exerce por meio dos Bispos e dos presbteros de maneira habitual no sacramento da
Penitncia.
Na remisso dos pecados, os presbteros e os sacramentos so meros instrumentos
dos quais nosso Senhor Jesus Cristo, nico autor e dispensador de nossa salvao, se
apraz em se servir para apagar nossas iniquidade e dar-nos a graa da justificao.1515
ARTIGO 11

1505
Catech. R. 1,11,3.
1506
Catech. R. 1,11,4.
1507
S. Gregrio Nazianzeno, Or., 39,17: PG 36,356A.
1508
Conc. De treno: DS 1672.
1509
Sto. Agostinho, Serm. 214,11: PL 38, 1071-1072.
1510
Catech. R. 1,11,5.
1511
Cf. Mt 18,21-22.
1512
Sto. Ambrsio, De Penitentia 1,8,34: CSEL 73,135-136 (PL 16,476-477).
1513
S. Joo Crisstomo, Sac. 3,5: PG 48, 643A.
1514
Sto. Agostinho, Serm. 213,8: PL 38, 1064
1515
Catech. R. 1,11, 6
CREIO NA RESSURREIO DA CARNE
O Credo cristo- profisso de nossa f em Deus Pai, Filho e Esprito Santo, e em sua
ao criadora, salvadora e santificadora- culmina na proclamao da ressurreio dos
mortos, no fim dos tempos e na vida eterna.
Cremos firmemente- e assim esperamos que, da mesma forma que Cristo ressuscitou
verdadeiramente dos mortos, e vive para sempre, assim tambm, depois da morte, os
justos vivero para sempre com Cristo ressuscitado e que Ele os ressuscitar no ltimo
dia1516. Como a ressurreio de Cristo, tambm a nossa ser obra da Santssima Trindade:

Se o Esprito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos habita em vs, aquele que
ressuscitou Cristo Jesus dentre os mortos dar vida tambm aos vossos corpos mortais,
mediante seu Esprito que habita em vs (Rm 8,11)1517.
O termo carne designa o homem em sua condio de fraqueza e de
mortalidade1518. A ressurreio da carne significa que aps a morte no haver somente
a vida da alma imortal, mas que ao mesmo os nossos corpos mortais (Rm 8,11)
readquiriro vida.
Crer na ressurreio dos mortos foi, desde os incios, um elemento essencial da f
crist. Fiducia christianorum ressurrectio mortuorum; illam credentes, summus A
confiana dos cristos a ressurreio dos mortos; crendo nela, somos cristos1519:
Como podem alguns dentre vs dizer que no h ressurreio dos mortos? Se no h
ressurreio dos mortos, tambm Cristo no ressuscitou. E, se Cristo no ressuscitou,
vazia a nossa pregao, vazia tambm a vossa f. Mas no! Cristo ressuscitou dos
mortos, primcias dos que adormeceram ( 1 Cor 15,12-14.20).
A Ressurreio de Cristo e a nossa
REVELAO PROGRESSIVA DA RESSURREIO
A ressurreio dos mortos foi revelada progressivamente por Deus a seu povo. A
esperana na ressurreio corporal dos mortos foi-se impondo como uma conseqncia
intrnseca da f em um Deus criador do homem inteiro, alma e corpo. O criador do cu e
da terra tambm aquele que mantm fielmente sua aliana com Abrao e sua
descendncia. nesta dupla perspectiva que comear a exprimir-se a f na ressurreio.
Nas provaes, os mrtires macabeus confessam:
O Rei do mundo nos far ressurgir para uma vida eterna, a ns que morremos por suas
leis (2 Mc 7,9). desejvel passar para a outra vida pelas mos dos homens, tendo da
parte de Deus as esperanas de ser um dia ressuscitado por Ele ( 2 Mc 7,14)1520.

Os fariseus1521 e muitos outros contemporneos do Senhor1522 esperavam a


ressurreio. Jesus a ensina com firmeza. Aos saduceus que a negam, ele responde: No
por isto que errais, desconhecendo tanto as Escrituras como o poder de deus?
(Mc12,24). A f na ressurreio baseia-se na f em Deus, que no um Deus dos mortos,
mas dos vivos (Mc 12,27).
Mais ainda: Jesus liga a f na ressurreio sua prpria pessoa: Eu sou a ressurreio
e a vida (Jo 11,25). Jesus mesmo quem, no ltimo dia, h de ressuscitar os que nele
tiverem criado1523 e que tiverem comido seu corpo e bebido seu sangue.1524. Desde j, Ele
fornece um sinal e um penhor disto, restituindo a vida a certos mortos1525, anunciando com
sua prpria ressurreio, que no entanto ser de outra ordem. Deste acontecimento nico
Ele fala como do sinal de Jonas1526, do sinal do templo1527: anuncia sua ressurreio, que
ocorrer no terceiro dia depois de ser entregue morte1528.
Ser testemunha de Cristo ser testemunha de sua ressurreio (At 1,22)1529,
ter comido e bebido com Ele aps sua ressurreio dentre os mortos (At 10,41). A
esperana crist na ressurreio est toda marcada pelos encontros com Cristo
ressuscitado. Ressuscitaremos como Ele, com Ele e por Ele.
996. Desde o incio, a f crist na ressurreio deparou com imcompreenses e
oposies1530. Em nenhum ponto a f crist depara com mais contradio do que em torno

1516
Cf. Jo 6,39-40.
1517
Cf. 1Ts 4,14; 1Cor 6,14; 2 Cor 4,14; FI 3,10-11.
1518
Cf. Gn 6,3; SI 56,5; Is 40,6.
1519
Tertuliano, Res., 1,1.
1520
Cf. 2Mc 7,29; Dn 12,1-13.
1521
Cf. At 23,6.
1522
Cf. Jo 11,24.
1523
Cf. Jo 5,24-25; 6,40.
1524
Cf. Jo. 6,54.
1525
Cf. Mc 5,21-43; Lc 7,11-17; Jo 11.
1526
Cf. Mt 12,39.
1527
Cf. Jo 2,19-22.
1528
Cf. Mc 10,34.
1529
Cf. At 4,33.
1530
Cf. At 17,32; 1Cor 15,12-13.
da ressurreio da carne.1531. Aceita-se muito comumente que depois da morte a vida da
pessoa humana prossiga de um modo espiritual. Mas como crer que este corpo to
manifestamente mortal possa ressuscitar para a vida eterna?
DE QUE MANEIRA OS MORTOS RESSUSCITAM?
. Que ressuscitar? Na morte, que separao da alma e do corpo, o corpo do
homem cai na corrupo, ao passo que sua alma vai ao encontro de Deus, ficando
espera de ser unida novamente a seu corpo glorificado. Deus, em sua onipotncia,
restituir definitivamente a vida incorruptvel a nossos corpos, unindo-os nossas almas,
pela virtude da Ressurreio de Jesus.
998. Quem ressuscitar? Todos os homens que morreram: Os que tiveram feito o bem
(sairo) para uma ressurreio de vida; os que tiveram praticado o mal, para uma
ressurreio de julgamento (Jo 5,29)1532.
999. De que maneira? Cristo ressuscitou com seu prprio corpo: Vede as minhas mos e
os meus ps: sou eu! (Lc 24,39). Mas ele no voltou a uma vida terrestre. Da mesma
forma, nele todos ressuscitaro com seu prprio corpo, que tm agora1533; porm, este
corpo ser transfigurado em corpo de glria1534, em corpo espiritual (1 Cor 15,44):
Mas, dir algum, como ressuscitam os mortos? Com que corpo voltam? Insensato! O que
semeias no readquire vida a no ser que morra. E o que semeias no o corpo da futura
planta que deve nascer, mas um simples gro de trigo ou qualquer outra espcie.
(...) Semeando corruptvel, o corpo ressuscita incorruptvel(...) os mortos ressurgiro
incorruptveis. (...) Com efeito, necessrio que este ser corruptvel revista a
incorruptibilidade e que este ser mortal revista a imortalidade (1Cor 15,35-37. 42.52-53).
Este como ultrapassa nossa imaginao e nosso entendimento, sendo acessvel s
na f. Nossa participao na Eucaristia, no entanto, j nos d um antegozo da
transfigurao de nosso corpo por Cristo:
Assim como o po que vem da terra, depois de ter recebido a invocao de Deus, no
mais po comum, mas Eucaristia, constituda por duas realidades, uma terrestre e a outra
celeste, da mesma forma os nossos corpos que participam da Eucaristia no so mais
corruptveis, pois tm a esperana da ressurreio.1535.
Quando? Definitivamente no ltimo dia (Jo 6,39-40.44.54; 11,24); no fim do
mundo1536. Com efeito, a ressurreio dos mortos est intimamente associada parusia
de Cristo:
Quando o Senhor, ao sinal dado, voz do arcanjo e ao som da trombeta divina, descer do
cu, ento os mortos em Cristo ressuscitaro primeiro (1 Ts 4,16).
RESSUSCITADOS COM CRISTO
Se verdade que Cristo nos ressuscitar no ltimo dia, tambm verdade que, de
certo modo, j ressuscitamos com Cristo. Pois, graas ao Esprito Santo, a vida crist e, j
agora na terra, uma participao na morte e na ressurreio de Cristo:
Fostes sepultados com Ele no Batismo, tambm com Ele ressuscitastes, pela f no poder
de Deus, que o ressuscitou dos mortos.
(...) Se, pois, ressuscitastes com Cristo, procurai as coisas do alto, onde Cristo est
sentado direita de Deus (C1 2,12; 3,1).
Unidos a Cristo pelo Bat8ismo, os crentes j participam realmente na vida celeste de
Cristo ressuscitado1537, mas esta vida permanece escondida com Cristo em Deus (C1
3,3). Com ele nos ressuscitou e fez-nos sentar nos cus, em Cristo Jesus (Ef 2,6).
Nutridos com seu Corpo na Eucaristia, j pertencemos ao Corpo de Cristo. Quando
ressuscitarmos, no ltimo dia, ns tambm seremos manifestado com Ele cheios de
glria (C13,3).
Enquanto aguardam esse dia, o corpo e a alma do crente participam desde j da
dignidade de ser de Cristo; da a exigncia do respeito para com seu prprio corpo, mas
tambm para com o de outrem, particularmente quando este sofre:
O corpo para o Senhor, e o Senhor para o corpo. Ora, Deus, que ressuscitou o senhor,
ressuscitar tambm a ns por seu poder. No sabeis que vossos corpos so membros de
Cristo?
(...) No pertenceis a vs mesmos. (...) Glorificai, portanto, a Deus em vosso corpo (1Cor
6,13-15.19-20).
Morrer em Cristo Jesus

1531
Sto. Agostinho, En. In. Psal. 88,2,5.
1532
Cf. Dn 12,2
1533
Cf. IV Conc. Lateranense: DS 801.
1534
Cf. Fl 3,21.
1535
Sto. Irineu, Ad. Haer. 4,18,5: SC 100,610-612 (PG 7,1028-1029).
1536
LG 48.
1537
Cf. Fl 3,20.
Para ressuscitar com Cristo preciso morrer com Cristo, preciso deixar a manso
deste corpo para ir morar junto ao Senhor( 2Cor 5,8). Nesta partida1538 que a morte,
a alma separada do corpo. Ela ser reunida a seu corpo no dia da ressurreio dos
mortos1539.
A MORTE
E diante da morte que o enigma da condio atinge seu ponto mais alto.1540.
Em certo sentido, a morte corporal natural; mas para a f ela na realidade salrio do
pecado (Rm 6,23)1541. E, para os que morreram na graa de Cristo, uma participao na
morte do Senhor, a fim de poder participar tambm de sua Ressurreio.1542.
A morte o termo da vida terrestre. Nossas vidas so medidas pelo tempo, ao longo
do qual passamos por mudanas, envelhecemos e, como acontece com todos os seres
vivos da terra, a morte aparece como o fim normal da vida. Este aspecto da marca mostra
nossas vidas com um carter de urgncia: a lembrana de nossa mortalidade serve para
recordar-nos de que temos um tempo limitado para realizar nossa vida:
Lembra-te de teu Criado nos dias de tua mocidade (...) antes que o p volte donde veio, e
o sopro volte a Deus, que o concedeu (Ecl 12,1. 7).
A morte conseqncia do pecado. Intrprete autntico das afirmaes da Sagrada
Escritura1543 e da tradio, o magistrio da Igreja ensina que a morte entrou no mundo por
causa do pecado do homem1544. Embora o homem tivesse uma natureza mortal, Deus o
destinava a no morrer. A morte foi, portanto, contrria aos desgnios de Deus criador
entrou no mundo como conseqncia do pecado1545. A morte corporal, qual o homem
teria sido subtrado se no tivesse pecado1546, assim o ltimo inimigo do homem a ser
vencido ( 1 Cor 15,26).
A morte transformada por Cristo. Jesus, o Filho de Deus, sofreu tambm Ele a
morte, prpria condio humana. Todavia, apesar de seu pavor diante dela1547, assumiu-a
em um ato de submisso total e livre vontade de seu Pai. A obedincia de Jesus
transformou a maldio da morte em beno1548.
O SENTIDO DA MORTE CRIST
Graas a Cristo, a morte crist tem um sentido positivo. Para mim, a vida Cristo,
e morrer lucro (Fl 1,21). Fiel esta palavra: se com Ele morremos, com Ele viveremos
(2Tm 2,11). A novidade essencial da morte crist est nisto: pelo Batismo, o cristo j
est sacramentalmente morto com Cristo, a morte fsica consuma este morrer com
Cristo e completa, assim, nossa incorporao a ele em seu ato redentor.
bom para mim morrer em (eis) Cristo Jesus, melhor do que reinar at as extremidades
da terra. a Ele que procuro, Ele que morreu por ns: Ele que quero, Ele que
ressuscitou por ns. Meu nascimento aproxima-se. (...) Deixai-me receber a pura luz;
quando tiver chegado l, serei homem.1549.
Na morte, Deus chama o homem a si. por isso que o cristo pode sentir, em
relao morte, um desejo semelhante ao de S. Paulo: O meu desejo partir e ir estar
com Cristo (Fl 1,23); e pode transformar sua prpria morte em um ato de obedincia e de
amor ao Pai, a exemplo de Cristo1550.
Meu desejo terrestre foi crucificado; (...) h em mim gua viva que murmura e que diz
dentro de mim: Vem para o Pai1551.
Quero ver a Deus, e para v-lo preciso morrer1552.

Eu no morro, entro na vida1553.


A viso crist da morte1554 expressa de forma privilegiada na liturgia da Igreja:
Senhor, para os que crem em vs, a vida no tirada, mas transformada. E, desfeito
nosso corpo mortal, nos dado, nos cus, um corpo imperecvel1555.
A morte o fim da peregrinao terrestre do homem, do tempo de graa e de

1538
Cf. Fl 1,23
1539
Cf. SPF 28.
1540
GS 18.
1541
Cf. Gn 2,17.
1542
Cf. Rm 6,3-9; Fl 3,10-11
1543
Cf. Gn 2,17; 3,3; 3,19; Sb 1,13; Rm 5,12; 6,23
1544
Cf. DS 1511
1545
Cf. Sb 2,23-24.
1546
GS 18.
1547
Cf. Mc 14,33-34; Hb 5,7-8.
1548
Cf. Rm 5,19-21.
1549
Sto. Incio de Antioquia, Rom. 6,1-2.
1550
Cf. Lc 23,46.
1551
Sto. Incio de Antioquia, Rom. 7,2.
1552
Sta. Tereza de Jesus, Poesia, 7.
1553
Sta. Teresinha do Menino Jesus, Lettre.
1554
Cf. 1Ts 4,13-14.
1555
MR, Prefcio dos defuntos.
misericrdia que Deus lhe oferece para realizar sua vida terrestre segundo o projeto divino
e para decidir seu destino ltimo. Quando tiver terminado o nico curso de nossa vida
terrestre1556, no voltaremos a outras vidas terrestres. Os homens devem morrer uma s
vez (Hb 9,27). No existe reencarnao depois da morte.
A Igreja nos encoraja preparao da hora de nossa morte (Livra-nos, Senhor, de
uma morte sbita e imprevista: antiga ladainha de todos os santos), a pedir Me de
Deus que interceda por ns na hora de nossa morte( orao da Ave-Maria) e a entregar-
nos a S. Jos, padroeiro da boa morte:
Em todas as tuas aes, em todos os teus pensamentos deverias comportar-te como se
tivesses de morrer hoje. Se tua conscincia estivesse tranqila, no terias muito medo da
morte. Seria melhor evitar o pecado que fugir da morte. Se no ests preparado hoje,
como o estars amanh? 1557.
Louvado sejais, meu Senhor, por nossa irm, a morte corporal, da qual homem algum
pode escapar. Ai dos que morreram em pecado mortal, felizes aqueles que ela encontrar
conforme a vossa santssima vontade, pois a segunda morte no lhes far mal1558.
RESUMINDO
Caro salutis est cardo (A carne o eixo da salvao)1559. Cremos em Deus,
que o criador da carne; cremos no Verbo feito carne para redimir a carne; cremos na
ressurreio da carne, consumao da criao e da redeno da carne.
Pela morte, a alma separada do corpo, mas na ressurreio Deus restituir a vida
incorruptvel ao nosso corpo transformado, unindo-o novamente nossa alma. Assim como
Cristo ressuscitou e vive para sempre, todos ns ressuscitaremos no ltimo dia.
1017. Cremos na verdadeira ressurreio desta carne que possumos agora.1560 Contudo,
semeia-se no tmulo um corpo corruptvel, ele ressuscita um corpo incorruptvel1561, um
corpo espiritual ( 1 Cor 15,44).
1018. Em conseqncia do pecado original, o homem deve sofrer a morte corporal,
qual teria sido subtrado se no tivesse pecado.
1019. Jesus, o filho de Deus, sofreu livremente a morte por ns em uma submisso total e
livre vontade de deus, seu Pai. Por sua morte ele venceu a morte, abrindo, assim, a
todos os homens a possibilidade da salvao.
ARTIGO 12
CREIO NA VIDA ETERNA
O cristo, que une sua prpria morte de Jesus, v a morte como um caminhar ao
seu encontro e uma entrada na Vida Eterna. Depois de a Igreja, pela ltima vez,
pronunciar as palavras de perdo da absolvio de Cristo sobre o cristo moribundo, sel-
lo pela ltima vez com uma uno fortificadora e dar-lhe o Cristo no vitico como alimento
para a virgem, diz-lhe com doce segurana estas palavras:
Deixa este mundo, alma crist, em nome de Pai todo-poderoso que te criou, em nome de
Jesus Cristo, o Filhe do Deus vivo, que sofreu por ti, em nome do Esprito Santo que foi
derramado em ti. Toma teu lugar hoje na paz e fixa tua morada com Deus na santa Sio,
com a Virgem Maria, Me de Deus, com So Jos, os anjos e todos os santos de Deus. (...)
Volta para junto de teu Criador, que te formou do p da terra. Que na hora em que tua
alma sair de teu corpo se apresentam a teu encontro Maria, os anjos e todos os santos.
(...) Que possas ver teu Redentor face a face1562 (...).
O Juzo Particular
A morte pe fim vida do homem como tempo aberto ao acolhimento ou recusa
da graa divina manifestada em Cristo1563. O Novo Testamento fala do juzo principalmente
na perspectiva do encontro final com Cristo na segunda vinda deste, mas repetidas vezes
afirma tambm a retribuio imediatamente depois da morte, de cada um em funo de
suas obras e de sua f. A parbola do pobre Lzaro1564 e a palavra de Cristo na cruz ao
bom ladro1565, assim como outros textos do Novo Testamento1566, falam de um destino
ltimo da alma1567, que pode ser diferente para uns e outros.

Cada homem recebe em sua alma imortal a retribuio eterna a partir do momento

1556
LG 48.
1557
Imitao de Cristo, 1,23,5-8, ed. T. Lupo, Citt del Vaticano, 1982, p.70
1558
S. Francisco de Assis, Cntico das criaturas.
1559
Tertuliano, Res. 8,2.
1560
DS 854.
1561
Cf. 1Cor 15,42.
1562
RM, Rito de exquias, Encomendao da alma.
1563
Cf. 2Tm 1,9-10.
1564
Cf. Lc 16,22
1565
Cf. Lc 23,43
1566
Cf.2Cor 5,8; Fl 1,23; Hb 9,27; 12,23.
1567
Cf. Mt 16,26
da morte, num Juzo Particular que coloca sua vida em relao vida de Cristo, seja por
meio de uma purificao1568, seja para entrar de imediato na felicidade do cu1569, seja
para condenar-se de imediato para sempre.1570
No entardecer de nossa vida, seremos julgados sobre o amor.1571
O CU
Os que morrem na graa e na amizade de Deus, e que esto totalmente purificados,
vivem para sempre com Cristo. So para sempre semelhantes a Deus porque o vem tal
como ele (1Jo 3,2), face a face (1Cor 13,12)1572:
Com nossa autoridade apostlica definimos que, segundo a disposio geral de Deus, as
almas de todos os santos mortos antes da Paixo de Cristo(...) e de todos os outros fiis
mortos depois de receberem o santo Batismo de Cristo, nos quais no houve nada a
purificar quando morreram, (...) ou ainda, se houve ou h algo a purificar, quando depois
de sua morte, tiverem acabado de faz-lo, (...) antes mesmo da ressurreio em seus
corpos e do juzo geral, e isto desde a ascenso do Senhor e Salvador Jesus Cristo ao cu,
estiveram, esto e estaro no Cu, no Reino dos Cus e no paraso celeste com Cristo,
admitidos na sociedade dos santos anjos. Desde a paixo e a morte de Nosso Senhor Jesus
Cristo, viram e vem a essncia divina com uma viso intuitiva e at face a face, sem a
mediao de nenhuma criatura.1573
Essa vida perfeita com a Santssima Trindade, essa comunho de vida e de amor
com ela, com a Virgem Maria, os anjos e todos os bem-aventurados, denominada o
Cu. O Cu o fim ltimo e a realizao das aspiraes mais profundas do homem, o
estado de felicidade suprema e definitiva.
Viver no Cu viver com Cristo1574. Os eleitos vivem nele, mas l conservam
ou melhor, l encontram sua verdadeira identidade, seu prprio nome1575.
Vita est enim esse cum Christo; ideo ubi Christus, ibi vita, ibi regnum Vida , de fato,
estar com Cristo; a onde est Cristo, a est a vida, a est o Reino1576.

Por sua Morte e Ressurreio, Jesus Cristo nos abriu o Cu. A vida dos bem-
aventurados consiste na posse em plenitude dos frutos da redeno operada por Cristo,
que associou sua glorificao celeste os que creram nele e que ficaram fiis sua
vontade. O cu a comunidade bem-aventurada de todos os que esto perfeitamente
incorporados a Ele.
Este mistrio de comunho bem-aventurada com Deus e com todos os que esto em
Cristo supera toda compreenso e toda imaginao. A Escritura fala-nos dele em imagens:
vida, luz, paz, festim de casamento, vinho do Reino, casa do Pai, Jerusalm celeste,
Paraso. O que os olhos no viram, os ouvidos no ouviram e o corao do homem no
percebeu, isso Deus preparou para aqueles que o amam( Cor 2,9)
Em razo de sua transcendncia, Deus s poder ser visto tal como quando Ele
mesmo abrir seu mistrio contemplao direta do homem e o capacitar apara tanto. Esta
contemplao de Deus em sua glria celeste chamada pela Igreja de viso beatfica:
Qual no ser tua glria e tua felicidade: ser admitido a ver a Deus, ter a honra de
participar das alegrias da salvao e da luz eterna na companhia de Cristo, o Senhor teu
Deus(...) desfrutar no Reino dos Cus, na companhia dos justos e dos amigos de Deus, as
alegrias da imortalidade adquirida1577.
Na glria do Cu, os bem-aventurados continuam a cumprir com alegria a vontade
de Deus em relao aos outros homens e criao inteira. J reinam com Cristo; com Ele
reinaro pelos sculos dos sculos (Ap. 22,5)1578.
A purificao final ou Purgatrio
Os que morrem na graa e na amizade de Deus, mas no esto completamente
purificados, embora tenham garantida sua salvao eterna, passa, aps sua morte, por
uma purificao, a fim de obter a santidade necessria para entrar na alegria do Cu.
A Igreja, denomina Purgatrio esta purificao final dos eleitos, que

1568
Cf. Conc. de Lio II, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 856; Conc. de Florena, Decretum pro Graecis: DS 1304; Conc. de Trento, 25 sesso, Decretum de purgatorio:
DS 1820.
1569
Cf. Conc. de Lio II, Profesio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 857; Joo XXII, Ne super his: DS 991; Bento XII Benedictus Deus: DS 1000-1001; Conc. de Florena, Decretum
pro Graecis: DS 1305.
1570
Cf. Conc. de Lio II, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 858; Bento XII, Benedictus Deus: DS 1002; Conc de Florena, Decretum pro Graecis: DS 1306.
1571
S. Joo da Cruz, Avisos y sentencias 57: Biblioteca Mstica Carmelitana, v. 13, Burgos, 1931, p. 238.
1572
Cf. Ap. 22,4.
1573
Bento XII, Benedictus Deus: DS 1000; cf. LG 49.
1574
Cf. Jo 14,3; Fl 1,23; Ts 4,17.
1575
Cf. Ap. 2,17.
1576
Sto. Ambrsio, Luc. 10,121: PL 15, 1834A.
1577
S. Cipriano, Epstula 58,10: CSEL 3/2,665( 56,10: PL4, 367-368).
1578
Cf. Mt 25,21.23.
completamente distinta dos castigo dos condenados. A Igreja formulou a doutrina da f
relativa ao Purgatrio sobretudo no Conclio de Florena1579 e de Trento1580. Fazendo
referncia a certos textos da escritura1581, a tradio da Igreja fala de um fogo purificador:
No que concerne a certas faltas leves, deve-se crer que existe antes do juzo um fogo
purificador, segundo o que afirma aquele que a Verdade, dizendo, que, se algum tiver
pronunciado uma blasfmia contra o Esprito Santo, no lhe ser perdoada nem no
presente sculo nem no sculo futuro (Mt 12,32). Desta afirmao podemos deduzir que
certas faltas podem ser perdoadas no sculo, ao passo que outras, no sculo futuro1582.
Este ensinamento apoia-se tambm na prtica da orao pelos defuntos, da qual j a
Santa Escritura fala: Eis por que Ele (Judas Macabeu) mandou oferecer esse sacrifcio
expiatrio pelos que haviam morrido, a fim de que fosse, absolvidos de seu pecado (2Mc
12,46). Desde os primeiro tempos, a Igreja honrou a memria dos defuntos e ofereceu
sufrgios em seu favor, em especial o sacrifcio eucarstico1583, a fim de que, purificados,
eles possam chegar viso beatfica de Deus. A Igreja recomenda tambm as esmolas, as
indulgncias e as obras de penitncia em favor dos defuntos:
Levemo-lhes socorro e celebremos sua memria. Se os filhos de J foram purificados pelo
sacrifcio de seu pai1584, por que deveramos duvidar de que nossas oferendas em favor dos
mortos lhes levem alguma consolao? No hesitemos em socorrer os que partiram e em
oferecer nossas oraes por eles1585.
O Inferno
No podemos estar unidos a Deus se no fizermos livremente a opo de am-lo.
Mas no podemos amar a Deus se pecamos gravemente contra Ele, contra nosso prximo
ou contra ns mesmos: Aquele que no ama permanece na morte. Todo aquele que odeia
seu irmo homicida; e sabeis que nenhum homicida tem a vida eterna permanecendo
nele (1Jo 3,14-15). Nosso Senhor adverte-nos de que seremos dele se deixarmos de ir ao
encontro das necessidades graves dos pobres e dos pequenos que so seus irmos1586.
Morrer em pecado mortal sem ter-se arrependido dele e sem acolher o amor
misericordioso de Deus significa ficar separado do Todo-Poderoso para sempre, por nossa
prpria opo livre. E este estado de auto-excluso definitiva da comunho com deus e
com os bem-aventurados que se designa com a palavra inferno.
Jesus fala muitas vezes da Geena, do fogo que no se apaga1587, reservado
aos que recusam at o fim de sua vida crer e converter-se, e no qual se pode ao mesmo
tempo a alma e o corpo1588. Jesus anuncia em termos graves que enviar seus anjos, e
eles erradicaro de seu reino todos os escndalos e os que praticam a iniquidade, e os
lanaro na fornalha ardente (Mt 13,41-42), e que pronunciar a condenao: Afastai-
vos de mim, malditos, para o fogo eterno! (Mt 25,41).
O ensinamento da Igreja afirma a existncia e a eternidade do inferno. As almas dos
que morrem em estado de pecado mortal descem imediatamente aps a morte aos
infernos, onde sofrem as penas do inferno, o fogo eterno1589. A pena principal do inferno
consiste na separao eterna de Deus, o nico em que o homem pode ter a vida e a
felicidade paras as quais foi criado e s quais aspira.
As afirmaes da Sagrada Escritura e os ensinamentos da Igreja acerca do Inferno
so um chamado responsabilidade com a qual o homem deve usar de sua liberdade em
vista de seu destino eterno. Constituem tambm um apelo insistente converso: Entrai
pela porta estreita, porque largo e espaoso o caminho que conduz perdio. E muitos
os que entram por ele. Estreita, porm, a porta apertado o caminho que conduz vida.
E poucos so os que o encontram (Mt 7,13-14).
Como desconhecemos o dia e a hora, conforme a advertncia do senhor, vigiemos
constantemente para que, terminado o nico curso de nossa vida terrestre, possamos
entrar com ele para as bodas e mereamos ser contados entre os benditos, e no sejamos,
como servos maus e preguiosos, obrigados a ir para o fogo eterno, para as trevas
exteriores, onde haver choro e ranger de dentes1590.
Deus no predestina ningum para o inferno1591, para isso preciso uma averso
voluntria a Deus (um pecado mortal) e persistir nela at o fim. Na Liturgia Eucarstica e
nas oraes cotidianas de seus fiis, a Igreja implora a misericrdia de Deus, que quer
que ningum se perca, mas que todos venham a converter-se (2Pd 3,9):

1579
Cf. DS 1304.
1580
Cf. DS 1820; 1580.
1581
Por ex. 1Cor 3,15; 1Pd 1,7.
1582
S. Gregrio Magno, Dial. 41,3: SC 265,148 (4,39 PL 77, 396).
1583
Cf. DS 856.
1584
Cf. J 1,5.
1585
S. Joo Crisstomo, Hom. in. 1Cor 41,5: PG 61, 594-595.
1586
Mt 25,31 46.
1587
Cf. Mt 5,22.29; 13,42.50; Mc 9,43-48.
1588
Cf. Mt 10,28.
1589
Cf. DS 76; 409; 411; 801; 858; 1002; 1351; 1575; SPF 12.
1590
LG 48.
1591
Cf. DS 397; 1567
Recebi, Pai com bondade, a oferenda de vossos servos e de toda a vossa famlia; dai-nos
sempre a vossa paz, livrai-nos da condenao e acolhei-nos entre os vossos eleitos1592.
O Juzo Final
A ressurreio de todos os mortos, dos justos e dos injustos (At 24,15), anteceder
o Juzo Final. Este ser a hora em que todos os que repousam nos sepulcros ouviro sua
voz e sairo: os que tiverem feito o bem, para uma ressurreio de vida; os que tiverem
praticado o mal, para uma ressurreio de julgamento ( Jo 5,28-29). Ento Cristo vir
em sua glria, e todos os anjos com ele. (...) E sero reunidas em sua presena todas as
naes, e Ele h de separar os homens uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas
dos cabritos sua esquerda. (...) E iro estes para o castigo eterno, e os justos iro para a
Vida Eterna (Mt 25,31-33.46).
diante de Cristo - que Verdade- que ser definitivamente desvendada a verdade
sobre a relao de cada homem com Deus1593. O Juzo Final h de revelar at as ltimas
conseqncias o que um tiver feito de bem ou deixado de fazer durante sua vida terrestre:
Todo o mal que os maus praticam registrado sem que o saibam. No dia em que
Deus no se calar (SI 50,3), voltar-se- para os maus: Eu havia, dir-lhes-, colocado
na terra meus pobrezinhos para vos. Eu, seu Chefe, reinava no cu direita do meu Pai,
mas na terra os meus membros passavam fome. Se tivsseis dado aos meus membros,
vosso dom teria chegado at a Cabea. Quando coloquei meus pobrezinhos na terra, os
constitu meus tesoureiros para recolher vossas boas obras em meu tesouro; vs, porm,
nada depositastes em suas mos, razo por que nada possus junto a mim.1594.
O Juzo Final acontecer por ocasio da volta gloriosa de Cristo. S o Pai conhece a
hora e o dia desse Juzo, s Ele decide de seu advento. Por meio de seu filho, Jesus Cristo,
Ele pronunciar ento sua palavra definitiva sobre toda a histria. Conheceremos ento o
sentido ltimo de toda a obra da criao e de toda a economia da salvao, e
compreendemos os caminhos admirveis pelos quais sua providncia ter conduzido tudo
para seu fim ltimo. O Juzo Final revelar que a justia de deus triunfa de todas as
injustias cometidas por suas criaturas e que seu amor mais forte que a morte.1595.
A mensagem do juzo Final apelo converso enquanto Deus ainda d aos
homens o tempo favorvel, o tempo da salvao (2Cor 6,2). O Juzo Final inspira o
santo temor de Deus. Compromete com a justia do reino de Deus. Anuncia a bem-
aventurada esperana (Tt 2,13) da volta do senhor, que vir para ser glorificado na
pessoa de seus santos e para ser admirado na pessoa de todos aqueles que creram ( 2Ts
1,10).
A esperana dos cus novos e da terra nova
No fim dos tempos, o reino de Deus chegar sua plenitude. Depois do Juzo
Universal, os justos reinaro para sempre com Cristo, glorificados em corpo e alma, e o
prprio universo ser renovado:
Ento a Igreja ser consumada na glria celeste, quando chegar o tempo da ressurreio
de todas as coisas, e com o gnero humano tambm o mundo todo, que ser intimamente
ligado ao homem e por meio dele atinge sua finalidade, encontrar sua restaurao
definitiva em Cristo1596.
Esta renovao misteriosa, que h de transformar a humanidade e o mundo, a
Sagrada Escritura a chama de cus novos e terra nova (2Pd 3,13)1597. Ser a realizao
definitiva do projeto de deus de reunir, sob um s chefe, Cristo, todas as coisas, as que
esto no cu e as que esto na terra (Ef 1,10).
Neste universo novo1598, a Jerusalm celeste, Deus ter sua morada entre os
homens. Enxugar toda a lgrima de seus olhos, pois nunca mais haver morte, nem
luto, nem clamor, e nem dor mais. Sim!
As coisas antigas se foram! (Ap 21,4)1599.
Para o homem, esta consumao ser a realizao ltima da unidade do gnero
humano, querida por Deus desde a criao e da qual a Igreja peregrinante era como o
sacramento1600. Os que estiveram unidos a Cristo formaro a comunidade dos remidos, a
cidade santa de Deus (Ap 21,2), a Esposa do Cordeiro (Ap 21,9). Esta no ser mais
ferida pelo pecado, pelas impurezas1601, pelo amor-prprio, que destroem ou ferem a
comunidade terrestre dos homens. A viso beatfica, na qual Deus se revelar de maneira

1592
MR, Cnon Romano 88.
1593
Cf. Jo 12,48.
1594
Sto. Agostinho, Serm. 18,4,4: PL 38,130-131.
1595
Cf. Ct 8,6.
1596
LG 48.
1597
Cf. Ap. 21,1.
1598
Cf. Ap 21,5.
1599
Cf. Ap 21,27.
1600
LG 1.
1601
Cf. Ap 21,27.
inesgotvel aos eleitos, ser a fonte inexaurvel de felicidade, de paz e de comunho
mtua.
Quanto ao cosmos, a Revelao afirma a profunda comunidade de destino do mundo
material e do homem:
Pois a criao em expectativa anseia pela revelao dos filhos de Deus (...) na esperana
de ela tambm ser libertada da escravido da corrupo (...) Pois sabemos que a criao
inteira geme e sofre as dores de parto at o presente. E no somente ela, mas tambm
ns, que temos as primcias do Esprito, gememos interiormente, suspirando pela redeno
de nosso corpo (Rm 8,19-23).
Tambm o universo visvel est, portanto, destinado a ser transformado, a fim de
que o prprio mundo, restaurado em seu primeiro estado, esteja, sem mais nenhum
obstculo, a servio dos justos, participando de sua glorificao em Cristo
ressuscitado1602.
Ignoramos o tempo da consumao da terra e da humanidade e desconhecemos a
maneira de transformao do universo. Passa certamente a figura deste mundo deformada
pelo pecado, mas aprendemos que Deus prepara uma nova morada e nova terra. Nela
reinar a justia, e sua felicidade ir satisfazer e superar todos os desejos de paz que
sobem aos coraes dos homens1603.
Contudo, a expectativa de uma terra nova, longe de atenuar, deve impulsionar em
vs a solicitude o pelo aprimoramento desta terra. Nela cresce o corpo da nova famlia
humana que j pode apresentar algum esboo do nono sculo. Por isso, ainda que o
progresso terrestre se deva distinguir cuidadosamente do aumento do reino de cristo, ele
de grande interesse para o Reino de Deus, na medida em que pode contribuir para melhor
organizar a sociedade humana.1604.
Com efeito, depois que propagamos na terra, no Esprito do Senhor e por ordem
sua, os valores da dignidade humana, da comunidade fraterna e da liberdade, todos estes
bons frutos da natureza e de nosso trabalho, ns o encontramos novamente, limpos,
contudo, de toda impureza, iluminados e transfigurados, quando Cristo entregar ao Pai o
reino eterno e universal.1605. Deus ser, ento, tudo em todos (1Cor 15,28), na Vida
Eterna:
A vida, em sua prpria realidade e verdade, o Pai que, pelo Filho e no Esprito Santo,
derrama sobre todos, sem exceo, os dons celestes. Graas sua misericrdia tambm
ns, os homens, recebemos a promessa indefectvel da Vida Eterna1606.
RESUMINDO
Cada homem, em sua alma imortal, recebe sua retribuio eterna a partir de sua
morte, em um Juzo Particular feito por Cristo, juiz dos vivos e dos mortos.
Cremos que as almas de todos os que morrem na graa de Cristo constituem o
povo de Deus para alm da morte, a qual ser definitivamente vencida no dia da
ressurreio, quando essas almas sero novamente unidas a seus corpos.1607.
Cremos que a multido daquelas que esto reunidas em torno de Jesus e de Maria
no paraso forma a Igreja do Cu, onde na beatitude eterna vem a Deus tal como Ele , e
onde esto tambm, em seus graus diversos, associados com os santos anjos ao governo
divino exercido pelo Cristo na glria, intercedendo por ns e ajudando nossa fraqueza por
sua solicitude fraterna1608.
Os que morrem na graa e na amizade de Deus, mas no esto totalmente
purificados, embora seguros de sua salvao eterna, passam depois de sua morte por uma
purificao, a fim de obter a santidade necessria para entrar na alegria de Deus.
Em virtude da comunho dos santos, a Igreja recomenda os defuntos
misericrdia de Deus e oferece em favor deles sufrgios, particularmente o santo sacrifcio
eucarstico.
Seguindo o exemplo de Cristo, a Igreja adverte os fiis acerca da triste e
lamentvel realidade da morte eterna1609, denominada tambm de inferno.
A pena principal do inferno consiste na separao eterna de Deus, o nico em quem
o homem pode ter a vida e a felicidade para as quais foi criado e s quais aspira.
A Igreja ora para que ningum se perca: Senhor, no permitais que eu jamais seja

1602
Sto. Irineu, Ad. Haer. 5,32.1.
1603
GS 39,1.
1604
GS 39,2.
1605
GS 39,3; cf. LG 2.
1606
S. Cirilo de Jerusalm, Catech ill. 18,29: PG 33,1049.
1607
SPF 28.
1608
SPF 29.
1609
DCG 69.
separado de vs1610. Se verdade que ningum pode salvar-se a si mesmo, tambm
verdade que Deus quer que todos seja salvos (1Tm 2,4_), e que para Ele tudo
possvel (Mt 10,26).
A santssima Igreja romana cr e confessa firmemente que no dia do juzo todos os
homens comparecero com seu prprio corpo diante do tribunal de Cristo para dar contas
de seus prprios atos.1611.
No fim dos tempos, o reino de Deus chegar sua plenitude. Ento, os justos
reinaro com Cristo para sempre, glorificados em corpo e alma, e o prprio universo
material ser transformado. Ento Deus ser tudo em todos ( 1 Cor 15,28), na Vida
Eterna.
AMEM
O Credo, como tambm o ltimo livro da Sagrada Escritura1612, termina com a
palavra hebraica amen. Ela encontra-se com freqncia no fim das oraes do Novo
Testamento. Tambm a Igreja conclui suas oraes com o amm.
Em hebraico, a palavra amem est ligada mesma raiz da palavra crer. Esta raiz
exprime a solidez, a confiabilidade, a fidelidade. Assim compreendemos porque o amm
pode ser dito da fidelidade de Deus para conosco e de nossa confiana nele.
No profeta Isaas encontramos a expresso Deus de verdade, literalmente Deus
do amm, isto , o Deus fiel s suas promessas: Todo aquele que quiser ser bendito na
terra querer ser bendito pelo Deus do amm (Is 65,16). Nosso Senhor emprega com
freqncia o termo amm1613, por vezes em forma duplicada1614, para sublinhar a
confiabilidade de seu ensinamento, sua autoridade fundada na verdade de Deus.
O amm final do Credo retoma e confirma, portanto suas primeiras palavras: eu
creio. Crer dizer amm s palavras, s promessas, aos mandamentos de Deus,
confiar totalmente naquele que o Amm de infinitivo amor e de fidelidade prefeita. A
vida crist de cada dia ser, ento, o amm ao eu creio da profisso de f de nosso
Batismo:
O teu Smbolo seja para ti como um espelho. Olha-te nele para veres se crs tudo o que
declaras crer e alegra-te cada dia por tua f.1615.
O prprio Jesus Cristo o Amm (Ap 3,14). Ele o Amm definitivo do amor
do pai por ns; assume e consuma nosso Amm ao Pai: todas as promessas de Deus,
com efeito, tm nele (Cristo) seu sim; por isso, por Ele que dizemos amm a Deus para
a glria de Deus (2Cor 1,20).
Por Cristo, com Cristo, em Cristo,
a vs, Deus Pai todo-poderoso,
na unidade do Esprito Santo,
toda honra e toda glria,
agora e para sempre.
AMM1616

1610
MR Oratio ante Communionem, 132, Tipografia Poliglota Vaticana, 1970, p. 474.
1611
Ds 859; cf. Ds 1549.
1612
Cf. Ap 22,21.
1613
Cf. Mt 6,2.5.16.
1614
Cf. Jo 5,19.
1615
Sto. Agostinho, Serm. 58,11,13: PL 38,399.
1616
MR Doxologia post precem euchariusticam, Tipografia Poliglota Vaticana, 1970, pp. 455.460.464.471.

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