O Labirinto Imaginário PDF
O Labirinto Imaginário PDF
O Labirinto Imaginário PDF
__________________________________________________________________________________
Resumo: O artigo tem como objetivo mostrar que o labirinto no somente a matriz arquetpica do
segredo, que alis possui uma forte relao com o mistrio e com o enigma, mas que o prprio segredo
do labirinto d a imaginar quer do ponto de vista mtico, quer do ponto de vista educacional: o
labirinto, ao funcionar como uma espcie de isco do desconhecido, suscita a curiosidade, a
impacincia daquele que no reservado quer penetrar seja para mudar o mundo, seja para se
transformar, seja apenas para satisfazer uma simples ou mesmo uma mrbida e pesada curiosidade.
Abstract: The article aims to show that the maze is not only the archetypal mother's secret, which
incidentally has a strong relationship with the mystery and the puzzle, but the secret of the labyrinth
itself gives to imagine from the point of view mythic or the educational point of view: the labyrinth,
to function as a kind of bait the unknown, arouses curiosity, impatience of one who wants to enter the
booth is to change the world, is to trans-form, if only to satisfy a simple or even a morbid curiosity
and heavy.
1
Este trabalho financiado por Fundos Nacionais atravs da FCT Fundao para a Cincia e a Tecnologia no
mbito do projeto PEst-OE/CED/UI1661/2011 do CIEd (Centro de Investigao em Educao/Instituto de
Educao/ Universidade do Minho, Braga Portugal). Este texto resultou de uma conferncia apresentada no
XVI Ciclo de Estudos sobre o Imaginrio, Recife (Brasil), de 18 a 21 de Outubro 2011, dedicado temtica do
Imaginrio e Dinmicas do Segredo.
2
Alberto Filipe Ribeiro de Abreu Arajo Obteve o seu Doutoramento em Educao, na rea de especializao
em Filosofia da Educao, no ano de 1994. Professor Catedrtico do Departamento de Teoria da Educao e
Educao Artstica e Fsica do Instituto de Educao da Universidade do Minho (Braga-Portugal)
78
Religare 10 (2), 78-97, setembro de 2013
antes mesmo da confrontao central com o Kernyi, diz-nos que o autor relacionou a forma
monstro. Expresso simblica que, em nossa labirntica com a oposio grega entre as categorias
opinio, corresponde ao aparecimento das de problema (aquilo que se deve resolver e, uma
civilizaes urbanas (), o novo tipo de labirinto vez resolvido, desaparece) e o mistrio (algo que
exige do heri um esforo de orientao e um resiste interpretao e que deve ser venerado, algo
artifcio de memria: podemos cham-lo labirinto que deve entrar e formar parte da nossa vida).
de vias mltiplas (1975: 105-106). portanto nesta oposio que reside o corao do
7
A dana configura adequadamente a ideia de mitologema labirntico, apreendendo a sua radical
suporte mtico-figural do mitologema do labirinto, instncia misteriosa-inicitica, isto , gnosiolgica e
dado que ela exprime de um modo profundo, pelo hermenutica (2006: 39). Tambm Raymond
seu movimento e gestualidade, a infinidade da Christinger, combinando as etimologias do
sequncia vida-morte-vida bem simbolizada pela labirinto-acha dupla e do labirinto-truia, salienta
espiral: o labirinto um mitologema de vida e de que um lugar onde algo se re-cria, por
renascimento, em cada morte tambm renasce, movimentos de rotao ou simplesmente por
especularmente tanto na forma como no contedo movimentos de idas e vindas, pela dana que servia
(Bologna, 2006: 27). Corrado Bologna, na sua para mimar e reactualizar uma nova criao, um
introduo edio espanhola do Labirinto de Karl novo nascimento espiritual ou fsico (1981: 95-96).
81
Religare 10 (2), 78-97, setembro de 2013
jovens dados em sacrifcio ao Minotauro) e e, por fim, o segredo define-se pelo verbo
de um estado (Atenas). Tambm no escapar com um imaginrio do enrugado
menos verdade que o mesmo autor alerta (1998: 244-248). Tambm a este respeito,
que a traio do segredo, se pode resvalar Corinne Blanchaud e Violaine Houdart-
para o drama, para a destruio, tambm Merot apontam para a distino entre a
pode causar alegria, ainda que no limite o trilogia segredo-enigma-mistrio:
segredo por definio no deva ser trado, A resoluo do enigma pode fazer-se
mesmo que a tentao de o fazer seja independentemente de uma qualquer
confisso. Um enigma no se confia,
grande, porque ao risco exterior de ser resolve-se. Quanto ao mistrio, ele
descoberto junta-se o risco interior de se pode eventualmente esclarecer-se,
descobrir que ele se assemelha mas no supe nem um detentor do
fascinao do vazio (Simmel, 1991: 46)11. mistrio, nem um depositrio. S o
segredo exige esta trade entre
detentor, depositrio e terceiro
1.2. Da natureza do segredo excludo. [] Em que que o
Segredo, enigma, mistrio so segredo, enquanto ele supe uma
conceitos unidos por uma relao circulao de palavra reticente,
semntica que convm ao smbolo, para mesmo interdita, concerne em
uns, ao mitologema, para outros, do primeiro lugar criao literria e
qual o papel que desemprenha a
labirinto e dos problemas de decifrao criao para permitir ao segredo de se
que ele coloca: qual o segredo do revelado sem se tornar portanto um
labirinto? Qual o enigma que ele encerra? segredo divulgado ou trado (2009:
Qual o mistrio que o envolve? Ainda 7-9).
que Pierre Brunel fale da relao existente
entre a trilogia referida, todavia tal no o Atendendo igualmente origem
impede de fazer corresponder aos verbos etimolgica do conceito segredo provm
que definem cada um dos seus do acusativo latino secretum que significa
componentes uma diferente modalidade de separado, solitrio, retirado,
imaginrio, a saber: o mistrio define-se isolado e escondido e subjacentemente
pelo verbo fugir com um imaginrio reenvia para os verbos anteriormente
evanescente; o enigma define-se pelo enunciados por Pierre Boutang12 , ns
verbo picar com um imaginrio do desafio
12
Secreto / segredo < proveniente do latim
secretum (pronncia: skrtum): provm do
11
Para conhecer a natureza sociolgica do segredo, acusativo latino secretum, na forma neutra do
nomeadamente para melhor compreender que todos adjetivo secretus, -a, -um (derivado do verbo latino
os momentos inerentes ao papel sociolgico do secerno, -is, .-ere, secrevi, secretum, que significa
segredo so de natureza individual, ou seja que o separar, escolher, distinguir, apartar, retirar do
segredo um momento de individualizao de espao pblico, ou seja, da gora da
primeira importncia (p. 47), veja-se George comunicao); por sua vez, o verbo secerno
Simmel, Secret et socits secrtes, 1991, derivado de se [= prefixo que indica separao,
especialmente p. 7-73, de que destacamos: Le afastamento, privao] + o verbo simples cerno, -is,
secret met une barrire entre les hommes, mais il -ere, crevi, cretum que significa separar, discernir,
veille en mme temps la tentation de la briser para distinguir claramente, selecionando o que se afigura
le bavardage ou laveu qui accompagne la vie importante ou no, conveniente ou no, digno de
psychique du secret comme un son harmonique. interesse ou no, merecedor de ser ou no ser
Cest pourquoi la signification sociologique du partilhado com os outros, de ser objeto de sigilo...;
secret ne trouve sa mesure pratique, son mode de o verbo cerno tem a mesma raiz de crisis (crise) e
ralisation que dans laptitude ou la tendance des de crtica (atitude de discernimento distintivo,
sujets le garder, cest--dire dans leur rsistance discriminativo e seletivo) e de discerno, -is, -ere (=
ou leur faiblesse face la tentation de le trahir. Le discernir, distinguir). O caso etimolgico por
jeu de ces deux intrts opposs, celui de dissimuler excelncia, na evoluo do latim para o portugus,
et celui de dvoiler, fai natre des colorations, des o acusativo. Ora, a forma de acusativo do
fatalits qui traversent tout lechamp des interactions particpio adjetival latino secretus, -a, -um
humaines (1991: 46). (derivado do verbo secerno [< se + cerno], -is, -
85
Religare 10 (2), 78-97, setembro de 2013
86
Religare 10 (2), 78-97, setembro de 2013
CAMPBELL, Joseph (1991). O Poder do IV. Trad. par Anahita Bianquis. Paris: Les
Mito. Trad. de Carlos Felipe Moiss. 2 Belles Lettres.
Reimp.. So Paulo: Editora Palas Athena. DOOB, Penelope Reed (1994). The idea of
CAMPBELL, Joseph (2007). O Heri de the labyrinth: from classical antiquity
Mil Faces. Trad. de Adail Ubirajara through the Middle Ages. Ithaca: Cornell
Sobral: S. Paulo: Cultrix/Pensamento. University Press.
CANTEINS, Jean (1994). Ddale et ses DURAND, Gilbert (1984). Les Structures
uvres. Paris : ditions Maisonneuve & Anthropologiques de lImaginaire.
Larose. Introduction larchtypologie gnrale.
CASTRO, Federico Gme R. de (2002). 10e d.. Paris: Dunod.
Navegar en el Laberinto. In BENITO, DURAND, Gilbert (1985). Permanences &
Agustn Escolano ; DAZ, Jos Mara Metamorphoses du Labyrinthe. In
Hernndez (Coords.). La Memoria y el LAMBERT, Jean-Clarence (Sous la dir.
Deseo. Cultura de la escuela y educacin de). Le Labyrinthe. Forme. Mtaphore.
deseada. Valencia: tirant lo blanch, pp. Paris-Lisbonne: Centre Culturel
495-517. Portugais/Fondation Calouste Gulbenkian,
CHEVALIER, Jean ; GHEERBRANT, pp. 9-12. [Colquio organizado, em Maio
Alain (1994). Dicionrio dos Smbolos. de 1984, no quadro do Festival do
Trad. de Cristina Rodriguez e Artur Labirinto, em Paris, no Centro Cultural da
Guerra. Lisboa: Teorema. Fundao Calouste Gulbenkian]
CHEVALIER, Jean ; GHEERBRANT, DURAND, Gilbert (1994). LAlogique du
Alain (2005). Dictionnaire des Symboles. Mythe. Religiologiques, n 10, 27-47.
Paris : Robert Laffont.. DURAND, Gilbert (1998). Perenidade,
CIRLOT, Juan-Eduardo (1981). Derivaes e Desgate do Mito. In
Diccionario de smbolos. Barcelona: CHAUVIN, Danile (Textos reunidos por).
Editorial Labor S. A. Campos do Imaginrio. Trad. de Maria
CHRISTINGER, Raymond (1971). Le Joo Batalha Reis. Lisboa: Instituto Piaget,
Voyage dans lImaginaire. Genve: Mont- pp. 91-118.
Blanc. DURAND, Gilbert (1998a). O Imaginrio,
CHRISTINGER, Raymond (1981). Le Lugar do Entre-Saberes. In CHAUVIN,
voyage dans limaginaire. Paris: Stock + Danile (Textos reunidos por). Campos do
Plus. Imaginrio. Trad. de Maria Joo Batalha
DANCOURT, Michle (2002). Ddale et Reis. Lisboa: Instituto Piaget, pp. 231-244.
Icare. Mtamorphoses dun mythe. Paris: DURAND, Gilbert; SUN, CHAOYING
CNRS ditions. (2002). Mythe, thmes et variations. Paris:
DETIENNE, Marcel ; VERNANT, Jean- Descle de Brouwer.
Pierre : (1974). Les Ruses de lintelligence. DURRBACH, F. (1904). Minotaurus. In
La mtis des Grecs. Paris: Flammarion. DAREMBERG, Ch ; SAGLIO, Edm (sous
DIEL, Paul (1966). Le Symbolisme dans la la dir. de). Dictionnaire des Antiquits
Mythologie Grecque. 2e d. Paris : Payot Grecques et Romaines. Tome 3 (Vol. 2).
(Petite Bibliothque Payot). Paris : Librairie Hachette, pp. 1933-1934.
DIETZSCH, Steffen (2000). Das Labyrinth ELIADE, Mircea (1976). Initiation, rites,
Denken more geometrico demonstrata ?. socits secrtes. Paris : Gallimard.
In RTTGERS, Kurt ; SCHMITZ- ELIADE, Mircea (1977). Tratado de
EMANS, Monika (Herausgegeben von). Histria das Religies. Trad. de Natlia
Labyrinthe. Philosophische und Antunes e Fernando Tomaz. Lisboa:
literarische Modelle. Essen Die Blaue Edies Cosmos.
Eule, pp. 63-73. ELIADE, Mircea (1979). Imagens e
DIODORE DE SICILE (1997). Mythologie Smbolos. Trad. de Maria Adozinda
des Grecs. Bibliothque Historique. Livre Oliveira Soares. Lisboa: Arcdia.
94
Religare 10 (2), 78-97, setembro de 2013
ELIADE, Mircea (1981). Mythe. Approche labrinto : o labirinto como reflexo linear de
dune dfinition. In Bonnefoy, Yves (sous uma ideia mitolgica , que a edio
la dir. de). Dictionnaire des Mythologies et espanhola compreende a trad. de
des Religions des Socits Traditionnelles Labyrinth-Studien. Labyrinthos als
et du Monde Antique. Paris, Flammarion, Linienreflex einer mythologischen Idee. In
pp. 138-140. KERNYI, Karl (Hg.). Werke in
ELIADE, Mircea (1996). Histoire des Einzelausgaben. Bd.1. Mnchen: Albert
Croyances et des Ides Religieuses. I. De Langen-Georg Mller, 1966, pp. 226-273
lge de la pierre aux mystres dEleusis. que reenvia para a obra de 1941, tambm
Paris: Payot. intitulada Labyrinth-Studien. Labyrinthos
FICK, Nicole (1992). La mtamorphose als Linienreflex einer mythologischen Idee
initiatique. In MOUREAU, Alain (tudes (Um estudo sobre o labirinto. O labirinto
rassembls par). Linitiation. Les Rites como reflexo linear de uma ideia
dAdolescence et les Mystres. Actes du mitolgica). Amsterdam/Leipzig:
Colloque International de Montpellier, 11- Akademische Verlagsanstalt Pantheon]
14 Avril 1991. Tome I. Montpellier: KERNYI, Kroly (2002). Gli Di e glo
Universit Paul-Valry, pp. 271-292. Eroi della Grecia. Il raconto del mito, la
FREITAS, Lima de (1975). O Labirinto. nascita della civilt. Trad. di Vanda
Lisboa: Arcdia. Tedeschi. Milano: Il Saggiatore.
FRONTISI-DUCROUX, Franoise (2000). LERAN, Giorgio (2010). Arianna. Storia
Ddale, mythologie de lartisan en Grce di un mito. 2 ed. Roma: Carocci.
Ancienne. Paris : La Dcouverte. LVQUE, Pierre (2003). Dans les Pas
GARCA, scar Martnez (2006). Teseo. des Dieux Grecs. Paris: Tallandier.
Las Aventuras del Hroe del Laberinto. LIPOVETSKY, Gilles; SERROY, Jean
Madrid: Aguilar. (2010). A Cultura-Mundo. Resposta a uma
GENNARI, Mario (1997). Storia della sociedade desorientada. Trad. de Victor
Bildung. Formazione delluomo e storia Silva. Lisboa: Edies 70.
della cultura in Germania e nella MOSCATO, Maria Teresa (1998). Il
Mitteleuropa. Brescia: La Scuola. Sentiero nel Labirinto. Miti e metafore nel
GENNARI, Mario (2005). Filosofia della processo educativo. Brescia: Editrice La
formazione delluomo. Milano: Bompiani. Scuola.
GOSSEREZ, Laurence (2009). Une figure MEZZADRI, Bernard (2004). Le mythe,
antique du logos et du mythos: le objet tabou ?. Europe, n 904-905, 3-7. [N
labyrinthe. Cahiers de lEchnox, vol. 17, especial dedicado ao Mythe et Mythologie
236-252. dans lAntiquit Grco-Romaine]
GUSDORF, Georges (1984). Mythe et MOUREAU, Alain (tudes rassembles
Mtaphysique. Paris : Flammarion. par) (1992). LInitiation. Les Rites
HBNER, Kurt (1985). Die Wahrheit des dAdolescence et les Mystres. In Actes du
Mythos. Mnchen: C. H. Beck. Colloque International de Montpellier, 11-
IERAN, Giorgio (2010). Arianna. Storia 14 Avril 1991. Montpellier: Universit
di un mito. Roma : Carocci. Paul-Valry.
JEANMAIRE, H. (1939). Couroi et OTERO, Luis Miguel Martinez (1991). El
Courtes. Essai sur lducation spartiate et Laberinto. Barcelona: Ediciones Obelisco.
sur les rites dadolescence dans lantiquit PEYRONIE, Andr (1998). Ariadne. In
hellnique. Lille : Bibliothque BRUNEL, Pierre (Org.). Dicionrio de
Universitaire. Mitos Literrios. Trad. de Carlos
Kernyi, Karl (2006). En el laberinto. Sussekind et al.. 2 ed.. Braslia/Rio de
Trad. de Brigitte Kiemann y Mara Janeiro: Editora Universidade de
Condor. Barcelona : Ediciones Siruela. [O Braslia/Jos Olympio Editora, pp. 82-88.
1 captulo, intitulado Estudos sobre o
95
Religare 10 (2), 78-97, setembro de 2013
97