Processo Penal I Izimar Dalboni Cunha
Processo Penal I Izimar Dalboni Cunha
Processo Penal I Izimar Dalboni Cunha
PENAL I
autora
IZIMAR DALBONI CUNHA
1ª edição
SESES
rio de janeiro 2017
Conselho editorial roberto paes e gisele lima
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2017.
Sujeitos processuais 18
Sujeitos Principais 19
Sujeitos Secundários 26
3. Jurisdição e competência 87
Jurisdição Penal 88
Princípios ligados à jurisdição 90
Características da jurisdição 91
Prezados(as) alunos(as),
Este livro didático tem por objetivo fornecer a todos os alunos da Estácio um
material didático adequado ao Projeto Pedagógico do Cursos e ao Plano de Ensino
da disciplina.
O livro está estruturado em cinco capítulos, de acordo com o conteúdo do
Plano de Ensino e com a ordem em que os temas são tratados nos Planos de Aula,
diferindo um pouco da disposição no Código de Processo Penal, de forma a faci-
litar o estudo.
Como o Código de Processo Penal foi elaborado durante o regime ditatorial,
buscamos na elaboração da obra trazer para vocês uma visão garantista do Processo
Penal, em consonância com o Sistema Acusatório, adequando a interpretação dos
dispositivos legais ao prisma constitucional, adotando como norte os princípios
constitucionais e infraconstitucionais que sustentam o sistema acusatório, garan-
tindo que o acusado seja visto como sujeito de direitos e não como mero objeto
do processo.
Em cada capítulo, procuramos abordar os temas de forma crítica, com especial
destaque às questões mais controvertidas, trazendo tanto a posição doutrinária
quanto a jurisprudencial que predominam em nosso ordenamento jurídico.
O livro tem por finalidade, além de servir de guia para o estudo, contem-
plando todo o conteúdo, despertar a reflexão para que busquem se aprofundar na
matéria, despertando uma visão ética e crítica do processo penal.
Esperamos que você, estudante, aproveite esta obra e que os conhecimen-
tos nela contidos sirvam de base para a construção do seu conhecimento e sa-
ber jurídico.
Bons estudos!
capítulo •7
1
Introdução ao
Processo Penal
Introdução ao Processo Penal
Neste capítulo você terá uma visão do Processo Penal sob a ótica constitucio-
nal, pois é preciso que haja uma interpretação do Código de Processo Penal de acor-
do com os princípios estabelecidos na Constituição de 1988, pois o referido Código
foi promulgado em 1941, durante o Estado Novo que possuía como característica
o autoritarismo, sendo um regime político nada democrático. Embora o Código de
Processo Penal tenha passado por reformas, ainda traz em seu bojo diversos disposi-
tivos que não mais se coadunam com o Estado Democrático de Direito.
Você terá, também, a oportunidade de conhecer os sistemas processuais pe-
nais, além dos sujeitos envolvidos na relação processual e os princípios que nor-
teiam o desenvolver do processo.
Para finalizar o capítulo, seu estudo se voltará para a aplicação da Lei Processual
Penal no tempo e no espaço.
OBJETIVOS
• Compreender que o sistema jurídico é interligado e por isso o Processo Penal deve ser
estudado de forma conjunta dos direitos Constitucional e Penal;
• Atentar para as mudanças, interpretando e aplicando a Lei Processual Penal, considerando
o sistema garantista do Processo Penal Constitucional;
• Entender como funciona o direito de punir e o direito de perseguir a punição através dos
atos de persecução criminal e da ação penal;
• Conhecer os sujeitos processuais, suas funções, direitos, deveres, ônus e faculdades;
• Analisar e solucionar os casos concretos quanto à aplicação da Lei Processual Penal.
CURIOSIDADE
O Código de Processo Penal foi promulgado em 1941, durante o do Estado Novo, perío-
do político eminentemente ditatorial, compreendido entre 1937 a 1945, no qual o Brasil foi
capítulo 1 • 10
governado por Getúlio Vargas. Desse modo, nosso Código de Processo Penal foi inspirado
na legislação processual italiana do regime fascista.
Para começar seu estudo é necessário enfrentar uma questão que precisa ser
rediscutida: qual o fundamento do processo penal, por que existe e por que
temos necessidade dele?
Para responder esta questão é fundamental definir qual o paradigma de leitu-
ra do Processo Penal deve-se adotar: garantista ou utilitarista.
CONCEITO
Para Kuhn, paradigmas são “realizações científicas que geram modelos que, por perío-
do mais ou menos longo e de modo mais ou menos explícito, orientam o desenvolvimento
posterior das pesquisas exclusivamente na busca da solução para os problemas por elas
suscitados.” (KUHN, 1998,p.13)
capítulo 1 • 11
A partir da promulgação da Constituição de 1988, esses valores autoritários
do utilitarismo e do Código de Processo Penal tiveram de ser alterados, devendo-
se adotar a instrumentalidade garantista do Processo Penal Constitucional, eis que
a Constituição vigente trouxe para o ordenamento jurídico o mais amplo rol de
direitos e garantias fundamentais já antes visto.
Embora o Processo Penal tenha uma íntima relação com os delitos e com as
penas, não pode, numa visão garantista, pautada na Constituição, ser visto apenas
como meio para se aplicar a pena.
De acordo com o pensamento de Ferrajoli (2002), é necessária sempre a for-
mação de um juízo de certeza, através do devido processo legal, para que a pena
possa ser imputada. Se o juízo de certeza não for alcançado, em decorrência do
princípio do in dubio pro reo, deve o acusado ser absolvido, pois é muito mais gra-
ve a condenação de um inocente do que a absolvição de um culpado.
Você deve compreender o Processo Penal como o instrumento que serve de
limitador do poder punitivo e garantidor dos direitos e garantias fundamen-
tais, o que não significa, de modo algum, impunidade.
LEITURA
Dos Delitos e das Penas, livro de Cesare
Beccaria. Disponível em: <http://www.
ebooksbrasil.org/eLibris/delitosB.html>.
capítulo 1 • 12
Sistemas processuais penais
EXEMPLO
Se o réu, respondendo ao processo penal, é tratado como mero objeto do processo,
sendo de antemão considerado presumidamente culpado, sem as garantias para sua defesa,
o sistema processual adotado é o inquisitivo.
Sistema inquisitivo
COMENTÁRIO
Ao longo dos séculos, as estruturas do processo penal variaram de acordo com a ideo-
logia (punitiva ou libertária) adotada. Até meados do século XII prevaleceu o sistema acu-
satório que foi, aos poucos, sendo substituído pelo sistema inquisitivo que predominou até
o final do Século XVII e início do Século XIX. Por isso, Francisco Campos, trata de abolir as
garantias individuais dos acusados, para instituir maior eficiência e energia à ação repressiva
do Estado.
capítulo 1 • 13
Em sua essência o sistema inquisitivo, concentra nas mãos do juiz as funções
de acusar, defender e julgar. Para Lopes Jr., com base em Goldschimidt, trata-se
de um “erro psicológico: crer que uma mesma pessoa possa exercer funções tão
antagônicas como investigar, acusar, defender e julgar”. (LOPES JR., 2016, p. 42)
Nesse sistema, para a prevalência da ideologia repressivo-punitiva do Estado,
o processo é sigiloso; o juiz (ator do processo) pode gerir a prova (sistema da prova
tarifada) e o acusado, pelo simples fato de ser acusado, é presumidamente culpa-
do, sendo tratado como mero objeto do processo, sem direito ao contraditório e
à ampla defesa.
Sistema acusatório
REFLEXÃO
Como você viu anteriormente, é necessário que se faça uma interpretação dos dispositi-
vos legais conforme à Constituição. Assim, o referido artigo 156, I, CPP pode ser considera-
do passível de inconstitucionalidade? O Magistrado pode/deve aplicá-lo?
Por uma interpretação literal do artigo 156, I, CPP o magistrado poderia sim determinar
a produção de provas. Entretanto, numa interpretação conforme a Constituição, adotando-se
como sistema acusatório, o dispositivo não deve ser aplicado.
capítulo 1 • 14
De acordo com Ferrajoli (2002, p. 451/452) , o sistema acusatório tem como
características a separação rígida entre o juiz e acusação, a paridade entre acusação e
defesa, e a publicidade e a oralidade do julgamento. Por outro lado, são características
típicas do sistema inquisitivo a iniciativa do juiz em campo probatório, a disparidade
de poderes entre acusação e defesa e o caráter escrito e secreto da instrução.
Apesar das reformas processuais para adequar o Código de Processo Penal ao
sistema acusatório, instituído pela Constituição de 1988, algumas caraterísticas do
sistema inquisitivo ainda se encontram no corpo do referido diploma processual,
em especial no que tange à instrução probatória.
EXEMPLO
O art. 156, inciso I, com redação dada pela Lei 11.690 de 2008 possibilita ao juiz, de
ofício , a possibilidade de ordenar a produção de provas consideradas urgente e relevantes,
observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida, mesmo antes de ini-
ciada a ação penal.
ATENÇÃO
O que efetivamente distingue o sistema inquisitivo do acusatório, além da separação de
funções, é a gestão da prova pelas partes e não pelo juiz, pois dessa forma garante-se
a imparcialidade do juiz, fundamental no sistema acusatório.
Sistema Misto
No sistema misto há uma fase investigatória conduzida por um juiz com pode-
res inquisitivos (não se confunde, desse modo, com o inquérito policial, que possui
natureza administrativa, e é presidido pelo delegado de polícia), seguida de uma
fase acusatória, em que são assegurados todos os direitos do acusado como a ampla
defesa e o contraditório e a independência entre acusação, defesa e juiz.
Esse sistema, inaugurado, em 1908, com o Código de Processo Penal francês
(Code d’Instruction Criminelle), por isso, também chamado de Sistema Francês, é
na atualidade adotado em vários países da Europa e possui como característica
capítulo 1 • 15
marcante a existência do Juizado de Instrução, cuja fase preliminar instrutória é
presidida por um juiz.
Aury Lopes Jr. (2016, p. 45) critica a classificação tradicional de sistema mis-
to, entendendo ser uma visão “reducionista, na medida em que atualmente todos
os sistemas são mistos, sendo os modelos puros apenas uma referência histórica”.
(grifo do autor)
Para o referido autor, já que todos os sistemas processuais na atualidade são
mistos, é de suma importância a análise do “núcleo fundante para definir o predo-
mínio da estrutura inquisitória ou acusatória, ou seja, se o princípio informador é
o inquisitivo (gestão da prova nas mãos do juiz) ou acusatório (gestão da prova
nas mãos das partes). (LOPES JR., 2016, p. 45) (grifos do autor)
PERGUNTA
Qual o sistema adotado no Brasil? O que você acha?
Acusatório? Inquisitório?
capítulo 1 • 16
REFLEXÃO
Geraldo Prado, nos traz a seguinte reflexão:
Esquematizando
capítulo 1 • 17
CARACTERÍSTICAS DOS SISTEMAS PROCESSUAIS
Sistema da persuasão racional (“livre” con-
Sistema da prova tarifada (a confissão é a
vencimento motivado) todas as provas pos-
“rainha” das provas)
suem o mesmo valor
Presunção de culpabilidade do acusado Presunção de inocência do acusado
Sujeitos processuais
O Código de Processo Penal elenca nos artigos. 251 a 281 os sujeitos pro-
cessuais. Os sujeitos processuais podem ser principais, indispensáveis, essenciais
para a relação jurídico-processual e secundários, os que não são essenciais, ou seja,
não formam o núcleo mínimo da relação processual.
CONCEITO
Sujeitos processuais são todas as pessoas que participam do processo, dentre eles o
juiz, acusador, o acusado e seu defensor, o assistente da acusação, os auxiliares da Justiça.
ATENÇÃO
Não se deve confundir sujeitos com partes. No Processo Penal temos três sujeitos prin-
cipais: o juiz, o acusador e o acusado (réu) e apenas duas partes: o acusador e o acusado.
Esquematizando
Sujeitos Juiz
Principais
Partes
Sujeitos no Sujeito Ativo: Acusador
Processo (MP ou querelante)
Penal
Interessados
Sujeitos Assistente da Acusação
Secundários
Não Interessados
Auxiliares da Justiça
capítulo 1 • 18
Sujeitos Principais
Juiz
É o sujeito que atua no processo com a missão de prestar a jurisdição. Tem por
obrigação assegurar às partes o devido processo legal.
Para que o juiz atue no processo deve possuir capacidade funcional – ser
investido no cargo, que, em regra, ocorre através de concurso público de provas e
títulos; ter competência para a causa e não estar impedido, nem suspeito.
COMENTÁRIO
Como atos instrutórios, no Processo Penal, devemos entender a condução da AIJ, o
acolhimento ou não de pedido de diligências feito pelas partes, mas jamais a produção de
provas de ofício.
• Poderes e Deveres
De acordo com Cintra, Dinamarco e Grinover (2004, p. 294), o juiz possui
poderes de diversas ordens:
Como deveres, num Processo Penal, sob o prisma Garantista, o juiz tem como
dever primordial cumprir e fazer cumprir a Constituição, garantindo o contradi-
tório e a ampla defesa, a razoável duração do processo e de fundamentar todas as
suas decisões, além de tratar a todos, inclusive os acusados, com urbanidade.
capítulo 1 • 19
• Garantias e Prerrogativas
Para que o juiz possa atuar de forma independente e imparcial, a Constituição
de 1988, em seu art. 95 e incisos, traz o rol de garantias asseguradas aos juízes:
• Suspeição e Impedimento
De acordo com André Nicolitt, os juízes possuem capacidade especial, capa-
cidade esta cujo “exame está ligado aos processos em julgamento, nos quais o juiz
não pode estar impedido ou suspeito para atuar”. (NICOLITT, 2010, p. 230)
As causas de impedimento e de suspeição estão previstas nos arts. 252 e 254
do CPP, e serão analisadas em outro capítulo. Por ora, é importante entender que
estas causas podem macular a imparcialidade do julgador, o que inviabiliza sua
atuação.
Nas hipóteses de impedimento ou suspeição, o juiz deve, ex officio, se afastar,
remetendo os autos ao juízo substituto ou tabelar e, caso não o faça, as partes de-
vem arguir o impedimento ou a suspeição.
Das partes
capítulo 1 • 20
COMENTÁRIO
Como você pode observar, a Constituição não estabeleceu competência exclusiva ao
MP para a propositura da ação penal pública. O que significa que, em caso de desídia ou
inércia do Órgão Ministerial, o particular poderá propor a ação penal privada subsidiária da
Pública, conforme art. 5º, LIX da CRFB. Por outro lado, ao conferir competência privativa,
impediu a atuação de ofício do magistrado.
• Do Ministério Público
No Brasil, embora o Ministério Público represente o Estado na função de acu-
sar, este não faz parte do Poder Judiciário. De acordo com o art. 127 da CRFB/88,
o Ministério Público é uma instituição permanente e essencial à função jurisdicio-
nal do Estado, a quem compete a defesa da ordem jurídica, do regime democráti-
co e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. A Constituição determina,
em seu art. 129, I que compete, privativamente, ao Ministério Público promover
a ação penal pública.
CURIOSIDADE
Parquet é uma palavra da Língua Francesa que significa “assoalho”. No Direito, a desig-
nação “Parquet”, referindo-se ao Ministério Público tem origem na França, pois os procura-
dores do rei ficavam sobre o assoalho da sala de audiências e não sobre o estrado ao lado
do magistrado, como acontece atualmente.
Não é uma parte qualquer, porquanto age animado não por interesses privados, mas
por interesses públicos, coincidentes com os escopos da atividade jurisdicional (atua-
ção do direito material, pacificação social e asseguramento da autoridade no orde-
namento jurídico). Por isso se diz, com propriedade, que o Ministério Público exerce
acusação Pública, não mera acusação de parte. (CAPEZ, 2014, p. 227-228).
capítulo 1 • 21
EXEMPLO
Ao final da instrução probatória, se o Parquet entender que ficou demonstrado que o réu
não é o autor do fato criminoso que lhe foi imputado, não está obrigado a pedir a condenação,
embora tenha proposto a ação.
99 Princípios Institucionais
Você deve entender que, no Processo Penal, o Ministério Público possui re-
levante atuação, tendo em vista que não atua apenas como órgão acusador, que
expõe ao Estado-juiz a pretensão acusatória, mas também como fiscal da lei
(custus legis), pois é da nobre Instituição a função de zelar pela ordem jurídica,
preservando as garantias e direitos individuais. Dessa forma, não há Processo Penal
sem que haja a intervenção do Ministério Público, seja como órgão acusador, seja
como fiscal da lei.
capítulo 1 • 22
Na Ação Penal Pública, quando já recebida a denúncia é denominado réu ou
acusado. Na Ação Penal Privada é chamado de querelado. Já no Inquérito Policial
é tratado como suspeito, investigado ou indiciado.
Para figurar como sujeito passivo da relação processual é preciso o preenchi-
mento de alguns requisitos:
CAPACIDADE PARA SER Por toda e qualquer pessoa “pelo simples fato de ser
PARTE-ADQUIRIDA sujeito de direitos e obrigações”;
PERGUNTA
Quem pode ser réu no processo penal?
Como você pode observar, pode figurar como sujeito passivo no processo pe-
nal qualquer pessoa física maior de 18 anos.
PERGUNTA
A pessoa jurídica pode ser parte no processo penal?
capítulo 1 • 23
O parágrafo quinto do artigo 173, § 5º estabelece que “A lei, sem prejuí-
zo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá
a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua nature-
za, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a econo-
mia popular”.
Já o artigo 225, § 3º traz a possibilidade de sanção penal em crimes ambien-
tais: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, indepen-
dentemente da obrigação de reparar os danos causados”
No mesmo sentido, a Lei de Crimes Ambientais, Lei 9605/98, em seu artigo
3ª, parágrafo único. A referida Lei, inclusive, elenca em seus artigos 22, 23 e 24
as penas restritivas de direito a que está sujeita a pessoa jurídica pela prática de
conduta lesiva ao meio ambiente.
99 Direitos do acusado
No sistema acusatório o acusado é um sujeito de direitos e não mero objeto do
processo. Sendo assim, “o sistema processual tem como pilar o princípio do favor
rei, que vai nortear o estatuto do imputado a fim de protegê-lo diante da Estrutura
do Estado que contra ele se volta”. (NICOLLIT, 2010, p. 242).
Com base na dignidade da pessoa humana, pilar do Estado Democrático de
Direito, a Constituição, em seu art. 5º, LVII estabelece o princípio da não culpa-
bilidade ou presunção de inocência.
Por ser presumidamente inocente, todo e qualquer acusado tem o direito de
permanecer em silêncio (art. 5º, LXIII, CF/88); de não produzir provas contra si
mesmo (Nemo tenetur se detegere), ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LV,
CF/88) entre outros.
ATENÇÃO
Em decorrência da ampla defesa o acusado tem o direito de estar presente em todos os
atos processuais, e não o dever.
capítulo 1 • 24
REFLEXÃO
O art. 260 do CPP estabelece que “se o acusado não atender à intimação para o in-
terrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a
autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença”.
Pergunto a vocês: Podemos admitir a condução coercitiva do acusado?
Devemos entender que o referido dispositivo não foi recepcionado pela Constituição,
como bem esclarece Aury Lopes Jr. (2016, p. 578):
Ora, mais do que nunca, é preciso compreender que o estar presente no processo é
um direito do acusado, nunca um dever. Considerando que o imputado não é objeto
do processo e que não está obrigado a submeter-se a qualquer tipo de ato probatório
(pois protegido pelo nemo tenetur se detegere), sua presença física ou não é uma op-
ção dele. Há que se abandonar o ranço inquisitório, em que o juiz (inquisidor) dispunha
do corpo do herege, para dele extrair a verdade real...O acusado tem direito de silêncio
e de não se submeter a qualquer ato probatório, logo, está logicamente autorizado a
não comparecer. (LOPES JR., 2016, p. 578)
Quanto à condução do suspeito para prestar declarações em sede policial, a situação con-
figura-se mais grave, pois a pessoa se vê privada da liberdade de ir e vir sem ordem judicial.
CONCEITO
Herege - A origem da palavra se remete ao grego haíresis (αἵρεσις) e que tem uma
variação em latim haeresis, cujo significado é “capacidade de escolher”. Porém, a palavra
tomou a acepção de que ser herege é o mesmo que contrário a uma doutrina, ou seja, aquele
que não concorda com suas ideias e regras e que assim questiona certas crenças. O conhe-
cimento e uso da palavra herege e heresia ficou popularmente conhecida na Idade Média
durante o período da Inquisição implantado pela Igreja Católica. Disponível em: <https://
www.significadosbr. com.br/herege>.
capítulo 1 • 25
b) Do Defensor
No Processo Penal para que a ampla defesa se concretize, faz-se necessária a
defesa técnica, exercida por um profissional habilitado tecnicamente.
Por ser a defesa técnica imprescindível, o STF editou a Súmula 523 com o se-
guinte enunciado: “No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade ab-
soluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”.
A defesa técnica pode ser exercida por defensor constituído ou nomeado
pelo juízo.
O defensor constituído é aquele contratado pelo réu, cujo mandato é ou-
torgado por meio de procuração. Uma vez constituído, o advogado não pode
abandonar a causa a não ser por motivo imperioso, comunicando previamente ao
juiz – art. 265,CPP.
O defensor nomeado é tanto o Defensor Público quanto o advogado dati-
vo. Com a implantação da Defensoria Pública, a figura do advogado dativo só
ocorre nos Estados em que a Defensoria Pública não se faz presente em todas as
Comarcas. No Processo Penal não há a necessidade de comprovação da hipossu-
ficiência econômica para que o acusado seja patrocinado pela Defensoria Pública.
Pela leitura do art. 261, CPP podemos afirmar que a defesa técnica é indispo-
nível, por isso o defensor pode atuar no interesse de defesa do réu mesmo contra
sua vontade.
Sujeitos Secundários
Do Assistente da Acusação
Posição ocupada pelo ofendido ou seu representante legal (art. 268, CPP)
quando intervém no feito, ao lado do MP, no polo ativo da relação processual.
Sua atuação está atrelada à capacidade postulatória, ou seja, se o ofendido não
for advogado deverá estar assistido por um. Trata-se de um sujeito coadjuvante
interessado, pois tem interesse em assegurar seu direito à indenização pela prática
do crime.
capítulo 1 • 26
COMENTÁRIO
Apesar de não haver disciplina no CPP, acerca do “ Assistente de defesa”, deve-se en-
tender pela sua admissibilidade no processo penal , alicerçado no princípio da paridade de
armas, pois para que se possa assegurar um processo penal justo, imprescindível além da
igualdade a paridade de armas, daí a necessidade à defesa, de poderes similares àqueles
previstos em favor da acusação.
ATENÇÃO
Excepcionalmente pode-se admitir a assistência por pessoas jurídicas de direito público
ou privado, diante de interesse público.
EXEMPLO
A OAB poderá intervir como assistente quando advogado figurar como réu e o caso
desperte o interesse da classe de forma geral ou associações que atuem em defesa
do consumidor
capítulo 1 • 27
EXEMPLO
No processo de rito ordinário, a acusação pode arrolar até 08 testemunhas. No entanto,
ao oferecer a denúncia, o Ministério Público indicou apenas 05. Mesmo nessa hipótese, o as-
sistente não poderia arrolar as 03 testemunhas para completar o número máximo permitido,
pois o que importa não é o quantum, mas sim a via preclusiva, pois se um ato não é praticado
no momento oportuno, ocorre a preclusão do direito de praticar o ato.
• Admissibilidade
O art. 272, CPP estabelece que o MP deve ser ouvido previamente sobre
a admissibilidade do assistente da acusação. Por sua vez, o art. 273, CPP traz a
possibilidade de não admissão.
O entendimento que prevalece é de que a não admissibilidade só seria cabível
diante da falta de legitimidade.
ATENÇÃO
O art. 270, CPP veda a admissibilidade de corréu no mesmo processo como assistente
da acusação. Esta é uma regra necessária para se evitar a confusão processual de se ter
uma mesma pessoa ocupando posições antagônicas, pois há evidente risco de manipulações
ou fraudes.
EXEMPLO
Angorá, Caranguejo e Mineirinho praticam um roubo em determinado Caixa Eletrônico
de uma Agência Bancária. Visando obter maior lucro, Mineirinho e Caranguejo agridem, vio-
lentamente, Angorá com intenção de matá-lo. Mas o comparsa sobrevive. Posteriormente, é
oferecida a denúncia e os processos de roubo e tentativa de homicídio, por força da conexão,
são reunidos. Poderia Angorá se habilitar como assistente da acusação?
A resposta é negativa, pois com a unificação dos processos, Angorá é corréu no crime
de roubo e, nessa hipótese, incide a vedação constante do art. 270, CPP.
capítulo 1 • 28
Dos Auxiliares da Justiça
São sujeitos secundários que atuam no processo, mas não possuem interesse
na causa. São servidores públicos que exercem funções como as de escrivão, escre-
vente, oficial de justiça, dentre outros.
Há também aqueles que desempenham função pública em auxílio ao juiz
como os peritos e intérpretes.
CONCEITO
Princípios são as ideias fundamentais que constituem o arcabouço do ordenamento ju-
rídico, são os valores básicos da sociedade que podem, ou não, se constituir em normas
jurídicas. (CARVALHO, 2006, p.5).
Para Alexy (2012 p.90), princípios são mandamentos de otimização, pois or-
denam que “algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilida-
des jurídicas e fáticas existentes”. Isso significa que a distinção entre princípios
e regras é qualitativa, pois os princípios podem ser satisfeitos em graus variados,
enquanto as regras são sempre satisfeitas ou não satisfeitas, ou seja, a regra traz a
determinação de se fazer exatamente o que ela determina.
capítulo 1 • 29
Princípio da Legalidade
A garantia do due process of law (devido processo legal) prevista no artigo 5º,
inciso LIV, da Constituição tem sua origem na Magna Carta, de 1215, assinada
pelo Rei João Sem- Terra,
O objetivo deste princípio é determinar que apenas mediante uma sequência de
procedimentos formais previamente positivados em lei, o cidadão poderá ter um di-
reito subjetivo restringido como forma de sanção por haver incorrido em ato ilícito.
REFLEXÃO
Mas será que basta seguir os procedimentos formais positivados em lei?
Podemos entender que não, pois o devido processo legal é mais do que isto, é a garantia
de um processo justo, asseguradas todas as garantias que veremos adiante.
capítulo 1 • 30
A reserva legal
A reserva legal impõe que certas matérias só podem ser tratadas através de lei,
sendo proibido o emprego de qualquer outra espécie normativa.
A CRFB assegura as garantias fundamentais abarcadas pela reserva legal em
seu art. 5º, incisos II e XXXIX.
Na norma infraconstitucional temos o art. 1º, CP que impõe que “não há
crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Na esfera criminal, o princípio da reserva legal está ligado a outros institutos
do Direito, tais como o conceito de crime, a anterioridade, a proporcionalidade,
limitando a esfera de atuação estatal para evitar arbitrariedades.
Princípio da proporcionalidade
Princípio do contraditório
capítulo 1 • 31
competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na
apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela”.
No processo penal é necessário que a informação e a possibilidade de reação
permitam um contraditório pleno e efetivo.
O direito de defesa vem expresso no art. 5º, LV, CF, juntamente com o con-
traditório. Quando a Constituição assegura a ampla defesa, entende-se que, para
observância desse comando, deve a proteção derivada da cláusula constitucional
abranger o direito à defesa técnica e o direito de autodefesa.
A defesa técnica
capítulo 1 • 32
De acordo com Fernandes (2005), a defesa técnica deve ser:
ATENÇÃO
Para que a ampla defesa se concretize não basta que haja formalmente a presença de
um defensor. A defesa precária, deficiente, inepta equipara-se à ausência de defesa.
A autodefesa
ATENÇÃO
A oportunidade para que o réu exerça seu direito de autodefesa é um dever e não pode
deixar de ser oferecida.
Princípio da Publicidade
capítulo 1 • 33
ATENÇÃO
A regra é a publicidade plena, ficando expressas as hipóteses em que se permite a
publicidade restrita: art. 5º, LX, CRFB e art. 792, §1º, CPP. Essas restrições, no entanto,
não se aplicam às partes.
De acordo com o art. 399, § 2º, CPP, instituído pela 11.719/08, o juiz que
presidir a instrução criminal, deve, em regra, ser o juiz prolator da sentença.
Entretanto, diante das exceções previstas no art 132, CPC/73, sem correspon-
dência no CPC em vigor, acabou sendo bastante mitigado.
O juiz situa-se entre as partes e acima delas (caráter substitutivo). O juiz im-
parcial é pressuposto para uma relação processual válida. Para assegurar essa im-
parcialidade, a Constituição Federal estipula garantias (artigo 95), prescreve ve-
dações (artigo 95, parágrafo único) e proíbe juízos e tribunais de exceção (artigo
5.º, inciso XXXVII).
Em determinados casos, a própria lei presume a parcialidade do juiz e impõe
as causas de Impedimento e de suspeição, que serão estudadas em oportunamente
em outro capítulo.
capítulo 1 • 34
ATENÇÃO
Tanto o impedimento como a suspeição devem ser reconhecidos ex officio pelo juiz, que
afastar-se voluntariamente de oficiar no processo, encaminhando-o ao seu substituto legal.
Se o juiz não agir de ofício poderão ser arguidos pelas partes o impedimento ou suspeição
na forma dos artigos 112 e 254 do Código de Processo Penal.
capítulo 1 • 35
o postulado do Promotor Natural é “uma garantia para a coletividade” e, portanto,
deve ser reconhecido e admitido.
COMENTÁRIO
Em 2016, no Julgamento do HC 126292/SP, de relatoria do Ministro Teori Zavasc-
ki, o STF em decisão fatídica , afasta o princípio constitucional da presunção de inocência,
admitindo a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado da sentença penal
condenatória, entendendo “a execução da pena na pendência de recursos de natureza ex-
traordinária não comprometeria o núcleo essencial do pressuposto da não culpabilidade, na
medida em que o acusado tivesse sido tratado como inocente no curso de todo o processo
ordinário criminal, observados os direitos e as garantias a ele inerentes, bem como respeita-
das as regras probatórias e o modelo acusatório atual.” – Informativo nº 814/STF
Tem por objetivo primordial garantir que o ônus da prova cabe a acusação e
não a defesa. As pessoas nascem inocentes, sendo este seu estado natural, razão
pela qual, para quebrar tal regra, torna-se indispensável que o Estado-acusador
evidencie, com provas suficientes, ao Estado-juiz a culpa do réu.
MULTIMÍDIA
Julgamento conjunto MC na ADC 43 e MC na ADC 44, em que houve mitigação da
presunção de inocência
• Pleno - STF admite execução da pena após condenação em segunda instância (1/2)
<https://www.youtube.com/watch?v=O_nTaXHJJls&t=3868s>.
capítulo 1 • 36
• Pleno - STF admite execução da pena após condenação em segunda instância (2/2)
<https://www.youtube.com/watch?v=dWnJ5vWKzzQ>.
INSTRUÇÃO CURSO DO
PROVA PROCESSUAL PROCESSO
Deve ser valorada em favor Inverte-se o ônus da pro- Excepcionalidade e a
do acusado; quando hou- va, ou seja, o réu não pre- necessariedade das
ver dúvida, interpretação do cisa provar que é inocen- medidas cautelares de
favor rei ou também deno- te, mas sim a acusação prisão.
minada de in dubio pro reo, precisa fazer prova de que
conforme informa o art. 386, ele é culpado.
VI do CPP.
capítulo 1 • 37
depende de critérios legais preestabelecidos. A avaliação ocorre segundo parâme-
tros críticos e racionais.
Esta liberdade não se confunde com arbitrariedade, pois o convencimento
do juiz não é livre, pois está adstrito ao conjunto probatório submetido ao crivo
do contraditório e deve ser motivado.
Exceção: os jurados, no Júri, não precisam fundamentar suas decisões, pois
para eles vigora o princípio da íntima convicção.
capítulo 1 • 38
Princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas
ATENÇÃO
Não apenas as provas ilícitas são inaceitáveis, mas todas as provas que dela derivarem
– provas ilícitas por derivação – de acordo com a “Teoria dos frutos da árvore envenenada”
(Theory of the fruits of poisonous tree) originária do Direito norte-americano.
EXEMPLO
Agentes policiais descobrem através de uma escuta telefônica sem ordem judicial a lo-
calização de uma “boca de fumo”. Dirigem-se ao local e apreendem drogas, armas e material
de endolação. Apesar do tipo penal previsto no art. 33 da Lei de Drogas ser considerado
crime permanente, configurando o estado de flagrante, o material apreendido não servirá
como prova, pois trata-se de prova ilícita por derivação, pois só se chegou até ele através da
escuta clandestina (prova ilícita).
capítulo 1 • 39
Entretanto, a teoria dos frutos da árvore envenenada não é absoluta, como
você pode observar no disposto no art. 157, § 1º, in fine.
Não evidenciado o nexo de causalidade entre a prova obtida de forma ilícita
e outras provas obtidas de forma independente, o sistema de contaminação não
se efetiva.
A prova absolutamente independente (independent source limitation) é uma
teoria coexistente à teoria dos frutos da árvore envenenada que preconiza que não
havendo vínculo entre as provas , não podemos falar em reflexos irradiando con-
taminação às provas que não derivaram da ilícita.
Na descoberta inevitável (inetivable discorery limitation), apesar de existir um
vínculo entre a prova ilícita e as outras provas, estas poderão ser admitidas, par-
tindo-se do pressuposto de que, hipoteticamente, se poderia chegar até a prova de
forma lícita.
O §2º do art. 157 diz: Considera-se fonte independente aquela que por si
só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução
criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.
O legislador chamou de prova independente o que, na verdade, é a descober-
ta inevitável.
ATENÇÃO
Majoritariamente, tem-se de admitido a prova obtida de forma ilícita, com base no princí-
pio da proporcionalidade, quando esta prova for a única capaz de demonstrar a inocência
do acusado.Távora e Alencar (2013, p. ) destacam que:
O conflito entre bens jurídicos tutelados pelo ordenamento leva o intérprete a dar pre-
valência àquele bem de maior relevância. Nesta linha, se de um lado está o jus puniendi
estatal e a legalidade na produção probatória, e o do outro o status libertatis do réu,
que objetiva demonstrar a inocência, este último bem deve prevalecer, sendo a prova
utilizada, mesmo que ilícita, em seu benefício.
Você deve entender, que como as teorias da fonte independente e da descoberta inevi-
tável flexibilizam a teoria dos frutos da árvore envenenada, o magistrado deve agir com muita
cautela ao aferir a interdependência entre as provas obtidas de forma ilícita e as demais.
capítulo 1 • 40
Aplicação da Lei Processual
A lei processual penal, uma vez inserida no mundo jurídico, tem aplicação
imediata, atingindo inclusive os processos que já estão em curso, pouco impor-
tando se traz ou não situação gravosa ao acusado, em virtude do princípio do
efeito imediato ou da aplicação imediata, conforme se depreende do artigo 2º
do CPP.
EXEMPLO
Com o advento da Lei 11.719/2008 houve uma alteração no art. 397, CPP, elencando
uma série de possibilidades de absolvição sumária. Assim, independente da data em que o
fato típico ocorreu, se antes ou depois da vigência da norma, diante de uma das hipóteses
presentes nos incisos do art. 397, CPP, o juiz deve (obrigação) absolver o acusado.
capítulo 1 • 41
ATENÇÃO
Deve-se ter especial atenção com o conteúdo das chamadas normas mistas ou híbri-
das, que tratam tanto do direito material quanto do direito processual, pois sendo favorável
ao acusado retroagirá.
EXEMPLO
O artigo 38 do CPP prevê que o ofendido tem o prazo decadencial (direito material) de
6 meses a contar do conhecimento da autoria para exercer o seu direito de queixa ou repre-
sentação. Caso haja uma alteração legislativa estabelecendo um prazo menor, a lei retroagirá
por ser mais benéfica, já que a decadência é uma causa extintiva da punibilidade – artigo
107, inciso IV do Código Penal.
EXEMPLO
Um Estado estrangeiro emite uma carta rogatória requerendo que determinado réu na
jurisdição estrangeira seja interrogado no Brasil, o interrogatório será realizado de acordo
com a norma processual brasileira - art.784, § 1º, CPP
capítulo 1 • 42
Interpretação da Lei Processual Penal
O uso da analogia
EXEMPLO
Dentre as causas de suspeição, no CPP, não está prevista a suspeição por motivo de
foro íntimo. Porém o juiz criminal pode ser declarar suspeito por tal motivo, aplicando, por
analogia o CPC.
Interpretação Analógica
capítulo 1 • 43
EXEMPLO
O art. 61, II, “c”, CP fala em “à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou
outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido”.
O outro recurso seria semelhante, análogo à “emboscada”, “à traição”, “à dissimulação”,
dificultando ou impossibilitando a defesa do ofendido.
Interpretação Extensiva
EXEMPLO
O artigo 254 do CPP traz as causas de suspeição aplicáveis ao Juiz que se estendem,
numa interpretação extensiva, por falta de previsão legal, aos jurados que compõem o Con-
selho de Sentença no rito do júri.
Caso Concreto
Ao final da instrução criminal ficando em dúvida se o acusado era culpado ou inocente,
o magistrado de ofício, com base no art. 156, II, CPP, determinou a produção de novas
diligências para colheita de provas que pudessem sanar sua dúvida. À luz do sistema
acusatório, agiu de forma adequada o magistrado?
ATIVIDADES
01. (MPDFT/2013 - Promotor de Justiça) Assinale a alternativa que NÃO SE AJUSTA à
doutrina do garantismo penal, em sua concepção clássica.
a) A interpretação da lei nunca é uma atividade exclusivamente recognitiva, mas é sempre
fruto de uma escolha prática a respeito de hipóteses interpretativas alternativas.
b) O problema do garantismo penal é elaborar técnicas no plano teórico, torná-las vinculan-
tes no plano normativo e assegurar sua efetividade no plano prático.
capítulo 1 • 44
c) Na aplicação da lei penal, o julgador, preocupado com a legitimação da atividade jurisdi-
cional e com a adesão social a seus atos, deve orientar suas decisões em conformidade
com o consenso geral da população.
d) O direito penal é necessário como técnica institucional de minimização da reação violen-
ta ao desvio socialmente não tolerado e como garantia do acusado contra os arbítrios, os
excessos e os erros conexos a formas não jurídicas de controle social.
e) As garantias penais não servem tanto para legitimar ou validar, senão mais para desle-
gitimar o abuso da potestade punitiva.
02. (FCC/ 215 – DPE – MA- Defensor Público) O modelo processual acusatório tem sido
entendido como o adequado a um Estado Democrático de Direito por ser o mais garantista.
Tem-se como um pressuposto estrutural e lógico do modelo a:
a) possibilidade de emendatio libelli e mutatio libelli.
b) existência de uma investigação prévia por delegado de polícia.
c) possibilidade da prova ser colhida pelo próprio juiz.
d) previsão legal de prisões processuais.
e) separação entre juiz e acusação.
03. (FCC/ 2016 - DPE-ES: Defensor Público) Com relação ao assistente de acusação no
processo penal:
a) o assistente de acusação somente poderá se habilitar na ação penal pública, condicio-
nada ou incondicionada.
b) é vedado ao assistente de acusação a indicação de assistente técnico nos exa-
mes periciais.
c) a intervenção do assistente de acusação é proscrita após o início da fase instrutória do
processo penal.
d) é vedado ao assistente de acusação arrazoar o recurso interposto pelo Ministério Públi-
co, devendo utilizar recurso próprio.
e) é garantido ao assistente de acusação o mesmo tempo para alegações finais orais
no procedimento
04. (CESPE/2016- PC-PE - Agente de Polícia) No que se refere à atuação do juiz, do Mi-
nistério Público, do acusado, do defensor, dos assistentes e auxiliares da justiça e aos atos
de terceiros, assinale a opção correta.
a) O acusado detém a prerrogativa de silenciar ao ser interrogado, mas esse direito pode
ser interpretado contra ele, consoante o aforismo popular: quem cala consente.
capítulo 1 • 45
b) Assegura-se ao acusado a ampla defesa e o contraditório, mas isso não lhe retira ple-
namente a autonomia de vontade, de sorte que poderá dispensar advogado dativo ou
defensor público, promovendo, por si mesmo, a sua defesa, ainda que não tenha condi-
ções técnicas para tanto.
c) O réu denunciado em processo, por coautoria ou participação, pode atuar como assis-
tente de acusação nesse mesmo processo se a defesa imputar exclusivamente ao outro
acusado a prática do crime.
d) No processo, o juiz exerce poderes de polícia — para garantir o desenvolvimento regular
e tolher atos capazes de perturbar o bom andamento do processo — e poderes jurisdi-
cionais — que compreendem atos ordinatórios, que ordenam e impulsionam o processo,
e instrutórios, que compreendem a colheita de provas.
e) Dados os princípios da unidade, da indivisibilidade e da independência funcional, não
se aplicam ao Ministério Público as prescrições relativas a suspeição e impedimentos
de juízes.
05. (UFMT/20169 - DPE-MT - Defensor Público) Quanto à eficácia temporal, a lei proces-
sual penal:
a) aplica-se somente a fatos criminosos ocorridos após a sua vigência.
b) tem aplicação imediata, sem prejuízo da validade dos atos já realizados.
c) vigora desde logo, tendo sempre efeito retroativo.
d) tem aplicação imediata nos processos ainda não instruídos.
e) não tem aplicação imediata, salvo para beneficiar o acusado.
RESUMO
Neste capítulo você pode compreender a importância de se fazer uma interpretação da
legislação processual penal sempre em conformidade com a Constituição, sua aplicação no
espaço e no tempo, aprendendo como deve ser a participação dos sujeitos processuais e a
importância da aplicação dos princípios para que possamos ter assegurada a instrumentali-
dade garantista. Estudou também os sistemas processuais, notando que a grande distinção
entres os sistemas inquisitivo e acusatório reside na figura do juiz: juiz ator (princípio inquisi-
tivo), juiz expectador (princípio acusatório).
capítulo 1 • 46
COMENTÁRIO
Caso Concreto
Apesar do Código de Processo Penal possibilitar que o juiz de ofício determine diligên-
cias, deve-se entender que à luz do Sistema Acusatório, o dispositivo legal deve ser lido em
conformidade com a Constituição. Assim, não agiu de forma adequada o juiz, posto que, por
não ser parte no processo, ao agir dessa forma, violou o princípio da imparcialidade do juiz.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Paulo: Malheiros, 2012.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
CARVALHO, L.G. Grandinetti Castanho de. Processo Penal e Constituição: Princípios
Constitucionais do Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Lúmen Júris, 2006
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 5 ed. São Paulo: RT, 2005
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002
GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio. 3 ed. Niterói- RJ: Impetus, 2008. p. 59)
KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 5 ed. Tradução: Beatriz Viana Boeira e
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LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. 4 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2009.
LOPES JR. Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal Fundamentos da Instrumentalidade
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______________. Direito Processual Penal. 13ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
NICOLITT, André. Manual de Processo Penal. 2 ed. , atual. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
PRADO, Geraldo. Sistema acusatório: a conformidade constitucional das leis processuais penais. 3ª
Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar. Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8 ed. rev. atual.
ampl. Salvador: Juspovdim, 2013.
capítulo 1 • 47
capítulo 1 • 48
2
A Investigação
Criminal e a Ação
Penal
A Investigação Criminal e a Ação Penal
Neste capítulo você compreenderá que para que haja a persecução penal é
necessária uma investigação prévia para que o titular do direito de ação tenha os
elementos mínimos que demonstrem a justa causa para a ação penal.
Aprenderá que, em regra, é através do Inquérito Policial que a investigação é
realizada, mas que existem outras formas de se apurar a prática do delito.
Você terá, também, a oportunidade de conhecer as espécies de ação penal, a
titularidade para propositura da ação, as condições da ação, compreendendo que
o Processo Penal é ramo do Direito Público, independente da iniciativa ser pública
ou privada.
Como último ponto a ser abordado no capítulo, seu estudo será acerca da ação
civil “ex delicto”.
OBJETIVOS
• Entender a atividade investigativa da polícia judiciária como início à persecução penal;
• Conhecer o procedimento inquisitivo da persecução penal, seus órgãos e as atribuições
da autoridade policial;
• Compreender o caráter instrumental do processo com relação ao direito penal e à aplica-
ção da pena, compatibilizando as normas infraconstitucionais ao atual sistema acusatório
de acordo com os princípios constitucionais que regem o nosso sistema processual penal;
• Adquirir conhecimento sobre propositura da ação penal pública e a sua titularidade, os
princípios regentes;
• Conhecer a titularidade e o prazo para propositura da ação penal privada, suas classifica-
ções e seus requisitos;
• Estabelecer as diferenças entre a ação penal pública e ação penal privada;
• Compreender a independência entre as ações cível e penal, bem como acerca da ação
indenizatória decorrente do ilícito penal.
capítulo 2 • 50
A Persecução Penal
A investigação criminal
PERGUNTA
Quem pode realizar a investigação criminal?
capítulo 2 • 51
Presidido pelo órgão do Ministério Público, visa colher
elementos para a propositura da ação civil pública de
INQUÉRITO CIVIL responsabilidade por danos causados ao meio ambien-
(LEI 7.347/85) te, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico.
LEITURA
Inteiro teor do Acórdão do julgamento do RE 593727, de relatoria do Ministro Gilmar
Mendes em que se discute em que se discute, à luz dos artigos 5º, LIV e LV; 129, III e VIII; e
144, IV, § 4°, da Constituição Federal, a constitucionalidade, ou não, da realização de proce-
dimento investigatório de natureza penal pelo Ministério Público. [-]. Disponível em: <http://
www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?inciden-
te=2641697&numeroProcesso=593727&classeProcesso=RE&numeroTema=184#>.
O Inquérito Policial
capítulo 2 • 52
Você pode perceber, pelo dispositivo legal que não é dado ao particular o
poder investigatório.
capítulo 2 • 53
CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL
Por exigência legal (art. 9º do CPP), os atos orais serão
ESCRITO reduzidos a termo.
• Notitia criminis
A notitia criminis consiste no conhecimento por parte da autoridade policial
de que um fato aparentemente criminoso ocorreu. A notitia criminis, em nosso
sistema jurídico, é facultativa em relação aos cidadãos, já que possuem a faculda-
de e não a obrigatoriedade de denunciar uma prática criminosa de que tenham
conhecimento.
CONCEITO
Notitia criminis “é o conhecimento pela autoridade, espontâneo ou provocado, de um
fato aparentemente criminoso. A ciência da infração penal pode ocorrer de diversas manei-
ras, e esta comunicação, provocada ou por força própria, é chamada de notícia do crime”.
(TÁVORA; ALENCAR, 2013, p. 115)
capítulo 2 • 54
Entretanto, a notitia criminis é obrigatória em relação ao agente público que
ao tomar conhecimento de fatos delituosos está obrigado a comunicar o fato à
autoridade competente.
A notitia criminis pode ser:
a) Espontânea ou imediata: a que se dá de maneira direta, por meios não
formais, através da atividade própria da polícia.
EXEMPLO
Através de uma notícia veiculada pela imprensa, a autoridade policial toma conhecimen-
to do encontro de um cadáver.
EXEMPLO
O Ministério Público toma conhecimento de um crime e requisita ao Delegado à abertura
do inquérito.
ATENÇÃO
A delação anônima por si só não enseja a abertura do Inquérito Policial, sendo
necessária uma averiguação prévia para saber se a notícia procede. Assim deve se ter muita
cautela, já que a CF em seu art. 5º, IV veda o anonimato.
capítulo 2 • 55
Neste momento é importante que você tenha uma noção da prisão em fla-
grante, que é uma das espécies de prisão cautelar. Entretanto, o estudo mais apro-
fundado será realizado quando estudarmos as medidas cautelares.
Por ora, é preciso apenas compreender quando há a situação de flagrante. O
artigo 302, CPP traz as situações de flagrante delito. De acordo com as possibili-
dades de ocorrência flagrante, a doutrina classifica-o nas seguintes espécies:
Banco Banco
P.M.
P.M.
É encontrado,
logo depois com
P.M.
instrumentos,
P.M.
armas e papéis
objetos que
façam presumir
ser ele o autor.
capítulo 2 • 56
EXEMPLO
a) Flagrante próprio – No momento em que João efetuava disparos de arma de fogo em
via pública, houve a chegada da polícia, efetuando-se a prisão.
b) Flagrante impróprio – Orelha e Narigão após efetuarem um roubo em uma casa loté-
rica, se evadem do local. A polícia é acionada e sai na direção apontada atrás dos meliantes.
Após três dias de ininterrupta perseguição são encontrados e presos em flagrante.
c) Flagrante presumido – Maria comunica, em sede policial, que foi vítima de furto de um
celular e um relógio. Na manhã, em sua ronda habitual, os policiais militares encontram um
sujeito com características semelhantes às informadas por Maria, sentado em um beco e, ao
fazerem a abordagem encontram em sua posse os objetos escritos pela vítima, efetuando
a prisão.
Abertura do Inquérito
• Crime de ação penal pública incondicionada- art. 5º, incisos I e II, CPP
a) art. 5º, I, CPP, de ofício:
A autoridade policial tem o dever de instaurar o inquérito policial, indepen-
dente de provocação, sempre que tomar conhecimento imediato e direto da ocor-
rência de um delito.
b) art. 5º, inciso II, primeira parte - Mediante requisição da autorida-
de judiciária ou do Ministério Público:
É necessário que a interpretação do dispositivo legal seja feita de forma restri-
tiva. Vejamos:
– Quanto ao Ministério Público, tomando conhecimento da ocor-
rência de um fato supostamente criminoso, se entender que não pos-
sui todos os elementos necessários para a propositura da ação penal,
deve requerer a abertura do Inquérito, solicitando as diligências que
entender necessárias.
capítulo 2 • 57
ATENÇÃO
Havendo a requisição do Ministério Público, o Delegado de Polícia deve de imediato
instaurar o IP, não podendo se recusar, pois o disposto no § 2º, art. 5º, CPP não se aplica à
requisição, referindo-se apenas ao requerimento do ofendido que veremos adiante.
capítulo 2 • 58
Nessa hipótese, o MP só poderá requisitar a instauração do IP se encaminhar
juntamente com a requisição a representação do ofendido.
ATENÇÃO
O prazo para oferecimento da representação é de 6 meses a contar do conhecimento da
autoria. Por tratar-se de prazo decadencial não será suspenso, nem interrompido.
COMENTÁRIO
Decadência
Para CAPEZ (2007,p. 569), “a decadência está elencada como causa de extinção da
punibilidade, mas, na verdade, o que ela extingue é o direito de dar início a persecução penal
em juízo. O ofendido perde o direito de promover a ação e provocar a prestação jurisdicional
e o Estado não tem como satisfazer seu direito de punir”, ou seja, “a decadência não atinge
diretamente o direito de punir, pois este pertence ao Estado e não ao ofendido; ela extingue
apenas o direito de promover a ação ou de oferecer a representação”.
Procuração com poderes especiais: É aquela na qual se estabelece o poder para a prática
de determinado ato específico, ou seja, deve conter expressamente o fim a que se destina.
capítulo 2 • 59
CONCEITO
Termo Circunstanciado: Nos crimes de menor potencial ofensivo, não há abertura de
Inquérito Policial, nem a lavratura do APF. Nesses casos é lavrado o termo circunstanciado
que consiste em um breve relato dos fatos, com a qualificação dos envolvidos, devendo con-
ter as informações necessárias para o eventual oferecimento denúncia.
I. Deslocamento ao local
Atividade regular da polícia, diante de um fato delituoso, devendo ser pre-
servado o local até a chegada dos peritos, ou seja, é o primeiro ato a ser praticado
para que o local onde ocorreu o fato seja isolado e preservado, já que é uma das
principais fontes de informação acerca da dinâmica dos fatos.
capítulo 2 • 60
V. Oitiva do indiciado
A autoridade policial deve ouvir o suspeito, aplicando no que couber as regras
do interrogatório judicial, devendo-se respeitar todas as garantias e direitos pre-
vistos, tanto na Constituição quanto no CPP. O termo de depoimento deve ser
assinado por duas testemunhas.
PERGUNTA
Pode haver condução coercitiva do suspeito ou indiciado?
COMENTÁRIO
Entendemos não ser possível à condução coercitiva nem na fase processual- art. 260,
CPP, quanto mais na fase investigatória, pois ao indiciado e ao acusado é assegurado o di-
reito ao silêncio e de não produzir provas contra si mesmo. Assim, a condução coercitiva, seja
na fase pré-processual quanto na processual é flagrantemente inconstitucional.
capítulo 2 • 61
VIII. Identificação criminal
A identificação criminal foi regulamentada pela Lei 12037/2009, sendo es-
pécies a identificação datiloscópica, fotográfica e coleta de material genético (Lei
12654/12).
Em regra, o civilmente identificado não poderá ser identificado criminalmen-
te, salvo nas situações legais previstas.
• Reconstituição do crime
O art. 7º, CPP trata da reconstituição do crime. Para sua realização é neces-
sário observar seus limitadores: a) não contrariar a moralidade (que deve abarcar
não só a moral pública, mas também a inviolabilidade da honra e da imagem) e
a ordem pública; b) o direito assegurado constitucionalmente no art. 5º, LV e no
art. 82 da CADH – Convenção Americana de Direitos Humanos – de não pro-
duzir provas contra si mesmo, nem declarar-se culpado.
• Incomunicabilidade do preso
O art. 21, CPP prevê a incomunicabilidade do preso. Todavia com o advento
da Constituição de 88, há duas correntes sobre o tema:
1ª CORRENTE 2ª CORRENTE
Entende que o art. 21, CRFB foi tacita- Entende que o art. 136, § 3º, CRFB não
mente revogado por força do art. 136, revogou o art. 21, CPP, pois no estado
§3º, IV, CRFB – se numa situação de de normalidade todas as garantias estão
exceção não é permitida, não poderia ser asseguradas, não causando nenhum pre-
diante da normalidade. juízo ao preso, o que não ocorre no esta-
do de exceção, em que há supressão das
garantias individuais.
Para André Nicolitt (2010, p. 97), o art. 5º, incisos LXII e LXIII, afasta
qualquer dúvida interpretativa à incomunicabilidade, pois é garantido ao preso
como direito fundamental a assistência familiar e do advogado
capítulo 2 • 62
Encerramento do Inquérito
PERGUNTA
Há inconstitucionalidade?
COMENTÁRIO
Na prática, trata-se de um controle administrativo com a finalidade de se evitar que o
inquérito se prolongue indefinidamente, o que configura verdadeiro abuso, já que há prazo
previsto em lei tanto para o encerramento do IP, quanto para o oferecimento da denúncia.
Em alguns Estados, como no Rio de Janeiro, essa prática foi abolida, sendo o IP remetido
diretamente ao Ministério Público.
Indiciado preso - O prazo é de 10 dias, Lei de drogas – 30 dias para o réu preso e
contados a partir do dia seguinte à 90 dias para o solto , podendo haver dupli-
data da efetivação da prisão. cação pelo juiz mediante pedido justificado
– art. 51, Lei 11.343/06.
O art. 10, § 3º, CPP admite a prorro- A Lei Orgânica da Justiça Federal estabele-
gação por igual período. ce o prazo de 15 dias para o réu preso – Lei
5.010/66, art. 66.
capítulo 2 • 63
99 Da baixa para diligências
Ao receber o inquérito Policial concluído, se o Ministério Público entender
que há necessidade de diligências imprescindíveis ao oferecimento da denúncia,
pode requerer a devolução do inquérito à delegacia para que estas sejam realizadas,
conforme dispõe o art. 16, CPP.
Diligências imprescíndiveis
“São somente aquelas que buscam os indícios de autoria ou a materialidade do fato”.
(NICOLITT, 2010, p. 100)
capítulo 2 • 64
99 Arquivamento implícito do inquérito
Majoritariamente, tanto o entendimento jurisprudencial quanto doutrinário
é de que não há arquivamento implícito em nosso ordenamento jurídico, já que
não há previsão legal para tanto e o art. 28 do CPP exige que o pedido de arqui-
vamento de inquérito seja expresso e fundamentado.
Por outro giro, alguns doutrinadores entendem que se deve buscar um me-
canismo para estabilizar a situação do indiciado, razão pela qual vislumbram três
espécies de ocorrência de arquivamento implícito:
MULTIMÍDIA
1. A questão do arquivamento implícito do Inquérito Policial. Vídeo disponibilizado pela TV
Justiça – Programa Saber Direito
<https://www.youtube.com/watch?v=TS9Z33FJTJM>.
capítulo 2 • 65
99 Desarquivamento do inquérito
A atribuição para desarquivar o Inquérito Policial é do Ministério Público.
Surgindo fatos novos, deve a autoridade policial representar neste sentido, mos-
trando-lhe que existem fatos novos que podem dar ensejo a nova investigação.
CONCEITO
Fatos novos seriam novas provas, que já existiam, mas não foram produzidas no momen-
to oportuno, ou aquelas que surgiram somente após o arquivamento do IP.
PERGUNTA
A decisão de arquivamento do inquérito faz coisa julgada?
A questão é controvertida.
Em regra, a decisão de arquivamento faz coisa julgada formal, pois nem
existe processo. Assim surgindo novas provas, o inquérito poderá ser reaberto.
No entanto, há entendimento no sentido de que, se a decisão revolve o mé-
rito, ela alcança o status de coisa julgada material, quando o fundamento da
decisão for com base na atipicidade da conduta ou na extinção da punibilidade.
capítulo 2 • 66
Características
De acordo com Capez (2014, p. 162) possui como características ser um di-
reito autônomo, abstrato, subjetivo e púbico. Autônomo porque não se confunde
com o direito material a ser tutelado; abstrato, pois “independe do resultado final
do processo”; subjetivo, “pois o titular pode exigir do Estado-Juiz uma prestação
jurisdicional” e público, “pois a atividade jurisdicional que se invoca é de nature-
za pública”.
ATENÇÃO
A grande maioria dos doutrinadores brasileiros entendem que na ação de iniciativa pri-
vada ocorre no polo ativo da relação uma substituição processual, verdadeira legitimação
extraordinária, pois o querelante estaria postulando em nome próprio um direito alheio –
direito de punir do Estado (ius puniendi do Estado). Para Aury Lopes Jr. (20016, p. 196) isso
não está correto, pois na realidade o Estado “exerce o poder de punir no processo penal não
como acusador, mas como juiz.” , enquanto o Ministério Público e o querelante “exercem a
pretensão acusatória, ou seja, o poder de acusar”. Desse modo, não é adequado se falar em
substituição processual.
capítulo 2 • 67
b) Interesse de agir: Na concepção civilista, o interesse de agir se pauta no
binômio utilidade/ necessidade, que torna-se difícil de ser aplicado no pro-
cesso penal, já que este é marcado pelo princípio da necessidade que impõe
que para se chegar a pena o processo é “o caminho necessário e imprescin-
dível, até porque o Direito Penal somente se realiza no processo”. (LOPES
JR., 2016, p. 192). Para o autor, o interesse de agir, no processo penal,
se configura na prática de um fato aparentemente criminoso (fumus
commissi delicti), resultando na necessidade do processo para o exercício do
ius puniendi do Estado.
c) Possibilidade Jurídica do pedido: Quanto a esta condição, tanto
Eugênio Pacelli quanto Aury Lopes Jr. fazem uma crítica em se adotar a
concepção civilista no processo penal. O pedido, na ação penal, é sempre
de condenação. Assim, a possibilidade jurídica do pedido é, na realidade,
a possibilidade de punibilidade concreta, ou seja, é a possibilidade de se
poder aplicar a pena caso a decisão seja de condenação. Assim, “presente
a causa de extinção de punibilidade, como a prescrição, a decadência, a
renúncia [...], a denúncia ou queixa deverá ser rejeitada ou o réu absolvido
sumariamente, conforme o momento em que seja reconhecida”. (LOPES
JR., 2016, p. 196)
d) Justa causa: É a existência de indícios mínimos de autoria e materia-
lidade, ou seja, é o suporte probatório mínimo, sem o qual ninguém pode
ser processado criminalmente.
capítulo 2 • 68
• Trânsito em julgado da sentença que, por motivo de erro ou impedimento,
anule o casamento, no crime de induzimento a erro essencial ou ocultamento de
impedimento – art. 236, parágrafo único do CP
Visto a teoria geral da ação penal, passaremos agora ao estudo das espécies de
ação penal.
No processo penal, há dois tipos de ação: a de iniciativa pública e a de incia-
tiva privada.
ATENÇÃO
Toda ação penal é pública. A classificação em pública ou privada é dada pela titularidade
da iniciativa. Será pública quando a titularidade para a propositura for do Ministério Público;
será privada quando a titularidade for do ofendido ou de quem tenha qualidade para repre-
sentá-lo, chamado querelante.
MULTIMÍDIA
A condenação - O filme é baseado na história real de Kenny Waters que foi condenado,
em 1983, à prisão perpétua por um bárbaro assassinato em Massachusetts (EUA). Betty
Anne, convencida de que o irmão é inocente, sem dinheiro para pagar um advogado cursa
Direito para assumir a causa e reverter a decisão. Disponível na Netflix.
capítulo 2 • 69
ATENÇÃO
O art. 26 do CPP não foi recepcionado pela nova ordem constitucional, não existindo
a possibilidade de as autoridades policiais ou judiciais iniciarem a ação penal ex offício nas
contravenções penais.
COMENTÁRIO
Mitigação: Transação penal (art. 98, I, CF c/c art. 76 da Lei 9.099/95).
A doutrina crê que, neste caso, estar-se-ia aplicando o princípio da discricionariedade
regrada, em que o MP teria discricionariedade para dispor da Ação Penal, mas somente em
algumas hipóteses legalmente previstas.
capítulo 2 • 70
PRINCÍPIO DA A ação penal, quer seja pública ou privada, deve ser
INTRANSCENDÊNCIA proposta a quem se imputa a prática do delito.
EXEMPLO
Caso haja crime contra o patrimônio cometido por descendente contra ascendente, ou
vice-versa, em que penda reconhecimento de paternidade no juízo cível, deverá o juízo crimi-
nal suspender o processo, pois pode ser que, uma vez reconhecido o parentesco, incida uma
escusa absolutória, disposta no art. 181, II do CP, não podendo ter a condenação criminal.
capítulo 2 • 71
• Titular do direito da representação
A titularidade do direito de representação é do ofendido ou de seu represen-
tante legal, caso seja menor ou incapaz. Pode o direito de representação também
ser exercido por procurador com poderes especiais (art. 39, caput, CPP).
ATENÇÃO
Cessa a legitimidade do representante legal a partir de zero hora do dia em que o menor
completar 18 anos, ou seja, quando o ofendido completa a maioridade civil.
ATENÇÃO
Para a contagem do prazo, como a decadência é norma de direito material, aplica-se o
art. 10, CP, incluindo-se o dia do começo e excluindo-se o final.
Observações:
• O prazo não contará para o menor, nem para o mentalmente incapaz, en-
quanto não cessar a incapacidade; pois não se pode falar em decadência de um
direito que não se pode exercer. Assim, o prazo fluirá apenas para o representante
legal, caso saiba quem é o autor da infração.
• Com o advento do Código Civil de 2002, os artigos arts. 34 e 50, parágrafo
único, CPP, estão tacitamente revogados, pois o menor completando a maioridade
é legitimado exclusivo, cessando a legitimidade do representante legal, não ocor-
rendo mais a legitimidade concorrente, mas o enunciado da Súmula 594, STF
continua válido.
capítulo 2 • 72
EXEMPLO
Caso um adolescente, contando com 16 anos, e seu representante legal tenham co-
nhecimento de um crime contra a honra do menor, o prazo decadencial para o representante
legal, contará a partir da ciência da autoria do fato, mas para o menor contará a partir do mo-
mento em que completar 18 anos. Assim, se o representante legal não fez a representação,
o menor poderá fazer, se o crime não estiver prescrito.
capítulo 2 • 73
relação à lesão corporal de qualquer natureza, a ação será pública incondicionada,
não sendo necessária a representação.
ATENÇÃO
Exercido o direito de queixa pela primeira das pessoas inseridas no art. 32, CPP, as
demais se acham impedidas de fazê-lo, somente assumindo a ação no caso de abandono do
querelante, desde que o façam no prazo de 60 dias.
capítulo 2 • 74
Na ação privada, a decisão de prosseguir ou não com a
ação é do ofendido. É decorrência do princípio da oportu-
PRINCÍPIO DA nidade. A parte poderá dispor do conteúdo do processo
DISPONIBILIDADE até o momento do trânsito em julgado da sentença con-
denatória, por meio do perdão ou perempção (arts. 51 e
60, CPP).
Pública Privada
capítulo 2 • 75
• Ação penal privada personalíssima
– A titularidade é atribuída única e exclusivamente ao ofendido; não há
exercício da ação pelo representante legal, nem há sucessão por morte ou
ausência, pois trata-se de um direito personalíssimo e intransmissível.
Assim, falecendo o ofendido, aguarda-se até a extinção da punibilidade.
– Há apenas uma hipótese em nosso ordenamento jurídico, que é aque-
la prevista no art. 236 CP (induzimento a erro essencial ou ocultação
de impedimento).
COMENTÁRIO
Como a titularidade precípua é do MP, este atua como interveniente adesivo obrigató-
rio, podendo, inclusive, retomar a ação para si, conforme dispõe o art. 29, CPP.
ATENÇÃO
Esses institutos não se aplicam a ação penal privada subsidiária da pública, tendo em
vista que nesse tipo de ação há uma substituição extraordinária para a propositura da ação
que é de iniciativa pública.
capítulo 2 • 76
poder renunciar ao seu direito de queixa, não pode escolher dentre seus ofensores
aqueles que quer processar- art. 48, CPP.
CONCEITO
Por renúncia e perdão tácito deve-se entender, respectivamente, a prática de um ato
incompatível com a vontade de exercer o direito de ação ou de prosseguir com a ação.
EXEMPLO
Maria ofereceu queixa crime em face de Pedro e João. No decorrer do processo, Maria
fez as pazes com Pedro e decidiu perdoá-lo. O perdão se estendeu também a João. Intima-
dos na forma do art. 58, CPP para manifestarem-se sobre o aceite, João recusou o perdão.
Desse modo, a ação continuou em face de João e, em relação a Pedro, a punibilidade foi
julgada extinta.
capítulo 2 • 77
DECADÊNCIA PRESCRIÇÃO PEREMPÇÃO
Só ocorre nos crimes de Pode ocorrer tanto nas
Só ocorre nos cri-
ação penal privada e nos cri- ações penais públicas (con-
mes de ação penal
mes de ação penal pública dicionadas ou não) quanto
privada (exclusiva ou
condicionada à representa- nas ações penais privadas
personalíssima).
ção do ofendido (6 meses). (não importando a espécie).
Processual
Ao renunciar Estende-se
contra 1 agressor aos demais
capítulo 2 • 78
• A denúncia, a queixa e o aditamento
A denúncia é a peça acusatória inaugural da ação penal pública incondiciona-
da e condicionada – art. 24, CPP, enquanto a queixa-crime é a peça exordial da
ação penal de iniciativa privada.
• Requisitos da denúncia e da queixa – art. 41, CPP
a) Descrição do fato em todas as suas circunstâncias: A descrição deve
ser precisa, não se admitindo a imputação vaga e imprecisa. Havendo con-
curso de agentes, a denúncia deve especificar a conduta de cada um dos
coautores e partícipes.
b) Qualificação do acusado ou fornecimento de dados que possibili-
tem sua identificação: Qualificar é apontar o conjunto de qualidades pelas
quais se possa identificar o denunciado.
c) Classificação jurídica do fato: A correta classificação do fato impu-
tado não é requisito essencial da denúncia, pois não vincula o juiz, que
poderá dar àquele definição jurídica diversa (emendatio libelli).
d) Rol de testemunhas: O arrolamento de testemunhas é facultativo.
Entretanto, o momento adequado é o da propositura da ação – art. 41,
CPP, sob pena de preclusão.
e) Pedido de condenação: Na ação penal pública não precisa ser expres-
so, bastando que esteja implícito na peça, enquanto na ação penal privada
deve ser expresso sob pena de perempção – art. 60, inciso III, CPP.
f ) O endereçamento da petição: O endereçamento equivocado não im-
pede o recebimento da denúncia, tratando-se de mera irregularidade saná-
vel com a remessa dos autos ao juízo competente.
g) O nome, o cargo e a posição funcional do denunciante
h) A assinatura: A falta de assinatura não invalida a peça, se não houver
dúvidas quanto à sua autenticidade.
capítulo 2 • 79
• Aditamento da denúncia e da queixa pelo Ministério Público
No que tange à ação penal de iniciativa pública, não há nenhuma contro-
vérsia quanto ao aditamento da denúncia pelo MP, já que o órgão ministerial é o
titular do direito de ação. O aditamento pode ser de caráter objetivo, quando sur-
gem novos fatos durante a instrução ou subjetivo, quando se toma conhecimento
de que havia outro ou outros autores.
CONCEITO
“Aditar significa acrescentar, adir, adicionar, agregar algo que faltava. Aditar a ação penal
significa acrescentar algo à imputação”. (NICOLITT, 2010, p. 135)
ATENÇÃO
Na ação penal privada subsidiária da pública, poderá haver aditamento da queixa, já que
a própria lei traz expressamente esta previsão- art. 29, CPP.
capítulo 2 • 80
As responsabilidades civil e penal são independentes entre si (art. 935, CC),
entretanto se do ilícito penal restarem prejuízos de ordem material ou moral para
a vítima, seus herdeiros ou dependentes ou para terceiros, estará caracterizado o
dever de indenizar (arts. 186, 187 e 927, CC).
O art. 91, I do CP prevê como efeito genérico e automático da sentença cri-
minal o dever de indenizar, mesmo que não haja referência expressa na sentença.
No mesmo sentido é o art. 63 do CPP, que assegura à vítima, ao seu represen-
tante legal ou aos seus dependentes o direito de executar no juízo cível a sentença
penal condenatória transitada em julgado.
A sentença penal condenatória irrecorrível é um título executivo judicial no
juízo cível (art. 63, CPP, e arts. 515- VI, CPC/15), podendo o ofendido executar
a sentença para obter a reparação pelos danos sofridos, sem a necessidade da ação
de conhecimento.
• Titularidade
A legitimidade da ação civil ex delicto pertence ao ofendido, a seu representan-
te legal, ou aos herdeiros daquele.
• O dever de indenizar
Observe que toda sentença penal condenatória gera o dever de indenizar, pois
foi reconhecida a existência do delito e a autoria, o que não significa que toda
sentença absolutória não gere direito à indenização. Algumas sentenças absolu-
tórias fazem coisa julgada no cível, impedindo a indenização; outras não fazem
coisa julgada no cível, permitindo o ajuizamento da ação de conhecimento para
reparação do dano.
Observe o quadro a seguir.
capítulo 2 • 81
A sentença absolutória que reconhecer: não haver provas da existência do fato
(art. 386, VI); não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal (art.
386, V); existirem provas que isentem o réu de pena (art. 386, VI); quando hou-
ver fundada dúvida sobre a existência de circunstâncias que excluam o crime (art.
386, VI); não existir prova suficiente para a condenação (art. 386, VII);
ATENÇÃO
Excludente de ilicitude e obrigatoriedade de reparar
• Regra: Faz coisa julgada no cível o reconhecimento de causa excludente de ilicitude (art.
23 do CP), pois são atos lícitos também na esfera cível (art. 188, I e II do CC).
• Exceções:
a) Estado de necessidade agressivo, aquele em que o agente sacrifica bem de terceiro
inocente, devendo indenizá-lo. O agente poderá ingressar com ação regressiva contra
aquele que provocou a situação de perigo – arts.929 e 930, caput, CC.
b) Em caso de legitima defesa, nos casos em que, por erro na execução, vem a ser
atingido terceiro inocente, este terá direito à indenização contra quem o atingiu. Aquele
que agiu em legítima defesa, por sua vez, poderá ingressar com ação regressiva contra
seu agressor- art. 930, parágrafo único, CC.
Caso Concreto
Sérgio e Frenando são indiciados em Inquérito Policial pela prática do crime de roubo
em uma joalheria no Rio de Janeiro. Concluído o inquérito este foi remetido ao Ministério
Público que, entendendo estar presente a justa causa ofereceu denúncia em face de
Sérgio, silenciando quanto à Fernando. A denúncia foi recebida pelo juiz na forma como
foi proposta.
Pergunta-se: Trata-se a hipótese de arquivamento implícito? Aplica-se a Súmula 524
do STF?
capítulo 2 • 82
ATIVIDADES
01. (CESPE/2016 - PC - Escrivão de Polícia Substituto) Acerca de aspectos diversos perti-
nentes ao IP, assinale a opção correta.
a) O IP, em razão da complexidade ou gravidade do delito a ser apurado, poderá ser pre-
sidido por representante do MP, mediante prévia determinação judicial nesse sentido.
b) A notitia criminis é denominada direta quando a própria vítima provoca a atuação da
polícia judiciária, comunicando a ocorrência de fato delituoso diretamente à autorida-
de policial.
c) O indiciamento é ato próprio da autoridade policial a ser adotado na fase inquisitorial.
d) O prazo legal para o encerramento do IP é relevante independentemente de o indiciado
estar solto ou preso, visto que a superação dos prazos de investigação tem o efeito de
encerrar a persecução penal na esfera policial.
e) Do despacho da autoridade policial que indeferir requerimento de abertura de IP feito
pelo ofendido ou seu representante legal é cabível, como único remédio jurídico, recurso
ao juiz criminal da comarca onde, em tese, ocorreu o fato delituoso.
02. (FUNCAB/2016) - PC-PA - Delegado de Polícia Civil) Sobre ação penal é correto afir-
mar que:
a) a ação penal privada, em certos casos é personalíssima, só podendo o delegado de
polícia instaurar inquérito, exclusivamente, no caso de requerimento do próprio ofendido.
b) na ação penal subsidiária da pública, quando o querelado deixa de comparecer aos atos
do processo, ocorre a perempção.
c) quanto ao exercício, classifica-se em pública incondicionada, condicionada a represen-
tação do ofendido ou a resolução do Ministério da Justiça.
d) na ação penal privada o querelante tem legitimidade ordinária.
e) a ação penal pública rege-se pelos princípios da obrigatoriedade e disponibilidade, en-
quanto a privada rege-se pela oportunidade e indivisibilidade.
03. (VUNESP/2013 - TJ-SP- Juiz A ação penal somente pode ser proposta contra quem se
imputa a prática da infração penal. Outra pessoa, ainda que tenha obrigações de caráter civil
decorrentes do delito, não pode ser incluída na ação, isto em função do princípio da:
a) obrigatoriedade.
b) indisponibilidade.
c) intranscendência.
d) oficialidade.
capítulo 2 • 83
04. (VUNESP/2017- TJM-SP- : Escrevente Técnico Judiciário) Sobre a ação penal, é cor-
reto afirmar:
a) não será admitida ação privada nos crimes de ação pública, ainda que esta não seja
intentada no prazo legal.
b) ao ofendido, ou a quem tenha qualidade para representá-lo, caberá intentar a ação penal
pública que dependa de representação do ofendido.
c) a queixa contra qualquer dos autores do crime somente obrigará o processo de todos
nos casos de crimes hediondos.
d) o prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias, contado da
data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15
dias, se o réu estiver solto ou afiançado.
e) o Ministério Público poderá desistir da ação penal apenas nos casos em que as provas
sejam de difícil produção.
05. (UFMT/2016 - TJ-MT - Analista Judiciário – Direito) Sobre a ação civil, assinale a afir-
mativa INCORRETA.
a) A ação de ressarcimento de danos poderá ser proposta no juízo cível contra o autor do
crime e, se for o caso, contra o responsável civil.
b) A decisão que julgar extinta a punibilidade não impedirá a propositura da ação civil.
c) O despacho de arquivamento do inquérito não impedirá a propositura da ação civil.
d) Intentada a ação penal, o juiz da ação civil não poderá suspender o curso desta até o
julgamento definitivo daquela.
RESUMO
Ao final deste capítulo, você deve ter percebido que para que haja a propositura da ação
penal são necessários os indícios de autoria e materialidade (justa causa). Geralmente a
investigação para reunir os elementos necessários é feita através do Inquérito Policial. Entre-
tanto este não é indispensável, pois há outras formas de investigação.
A seguir, passamos ao estudo da ação penal. Ficou claro que, independente da iniciativa
– pública ou privada – a ação penal é pública e haverá sempre a intervenção do Ministério
Público, seja na qualidade de parte (acusador) ou na qualidade de custus legis. Você a opor-
tunidade de verificar os princípios que regem a ação penal e as diferentes espécies de ação
penal e suas peculiaridades.
capítulo 2 • 84
Ao final, o estudo se voltou para a ação civil ex delicto, pois toda vez que há dano a uma
pessoa, surge o dever de indenizar. A ação civil ex delicto possibilita a reparação do dano sem
a necessidade de ação de conhecimento no cível, entrando diretamente na fase da execução
já que a sentença condenatória é um título executivo judicial. Pode verificar, também, que
muitas vezes, mesmo com uma sentença de absolvição, é possível a reparação dos danos
no juízo porque nem todo ilícito civil é ilícito penal, ou seja, a conduta praticada pode não ser
crime na esfera penal, mas pode ser um ilícito na esfera cível.
COMENTÁRIO
Caso Concreto
Há duas correntes:
Por uma corrente, aplica-se o verbete 524 do STF, tratando-se de hipótese de arqui-
vamento implícito subjetivo. No momento em que a denúncia foi oferecida em face apenas
de Sérgio e o juiz não exerceu a fiscalização do princípio da obrigatoriedade da ação penal
pública, nos termos do art. 28 do CPP, deu-se o arquivamento implícito do IP em relação
à Fernando. Logo para que haja o aditamento somente com o surgimento de novas provas.
Para a outra corrente, não existe arquivamento implícito no ordenamento jurídico brasilei-
ro. Para que haja arquivamento é necessário requerimento expresso do MP fundamentando
o seu pedido no art. 395 do CPP, e a manifestação do juiz acerca desse pedido, aplicando
o art 28 do CPP. Sendo assim, não haverá arquivamento implícito, não cabendo invocar o
verbete 524 do STF. O MP poderá aditar a denúncia a qualquer momento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 11. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. Vol. 1
LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
NICOLITT, André. Manual de Processo Penal. 2 ed. atual. Rio de Janeiro: Eselvier, 2010.
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 7 ed. rev., ampl.,atua
capítulo 2 • 85
capítulo 2 • 86
3
Jurisdição e
competência
Jurisdição e competência
Neste capítulo, como você já conhece toda estrutura da ação penal, o órgão
com atribuição para propositura, bem como a aplicação dos princípios consti-
tucionais pertinentes, você aprenderá a forma de organização do Estado, enten-
dendo o exercício da Jurisdição como forma de solucionar os conflitos. A seguir
compreenderá como se define a competência para o julgamento da causa em razão
do lugar, da matéria e das pessoas, bem como quais são as causas que modificam
a competência.
OBJETIVOS
• Compreender a estrutura do Poder Judiciário;
• Compreender e aplicar os princípios ligados à jurisdição;
• Compreender as regras de competência para o exercício da jurisdição criminal;
• Entender os critérios que definem a competência;
• Conhecer as causas modificadoras da competência;
• Analisar e solucionar os casos concretos quanto à determinação da competência.
Jurisdição Penal
CONCEITO
“A jurisdição penal, monopolizada pelo Estado, realiza, portanto, a relevante função de
aplicação do Direito Penal aos fatos violadores de bens, direitos e valores reconhecidos pelo
corpo social, na exata medida e proporção previamente indicadas na lei (Eugênio Pacel-
li,2012, P.194).
capítulo 3 • 88
Embora a jurisdição seja una, é possível perceber em sua organização verdadei-
ros sistemas integrados e autônomos de órgãos jurisdicionais.
Em outras palavras, com a finalidade de operacionalizar melhor a forma de
administração da Justiça, há uma repartição de competência, pois a CF em seu
art. 5º, LIII estabelece que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela
autoridade competente”.
Pelo art. 92, CRFB, podemos notar uma organização através de sistemas in-
tegrados de justiça, que classificam-se em:
• Justiça Comum e Justiça Especial (especializada);
• Justiça Federal e Justiça Estadual.
CNJ
Legendas
Justiça Federal Justiça Comum
Justiça Estadual Justiça Especializada
COMENTÁRIO
Embora a Emenda 45 tenha incluído o CNJ no - inciso I-A do art. 92, o CNJ tem com-
petência administrativa e não competência jurisdicional. (art. 103-B § 4º, CF)
capítulo 3 • 89
Princípios ligados à jurisdição
capítulo 3 • 90
Características da jurisdição
CONCEITO
A competência é “a medida e o limite da jurisdição, dentro dos quais o órgão judicial
poderá dizer o direito”. (CAPEZ, 2014, p. 259)
capítulo 3 • 91
Classificação da competência
Como podemos extrair da leitura do art. 69, há ainda outros fatores que in-
fluenciam na fixação da competência, como a distribuição, a conexão e a continên-
cia e a prevenção (art. 69, incisos IV, V e VI, CPP), como você estudará adiante.
A competência pode ser originária ou recursal.
Em regra, o processo penal se inicia no primeiro grau de jurisdição (compe-
tência originária) podendo, através dos recursos chegar aos Tribunais Regionais
Federais e aos Tribunais de Justiça (competência recursal). Estes tribunais jul-
gam, em sede recursal, tanto a matéria de fato como de direito.
Pode-se levar a causa aos Tribunais Superiores para a garantia da uniformiza-
ção em toda a nação e ao STF, para salvaguardar a Constituição. Em sua compe-
tência recursal, os Tribunais Superiores só julgam matéria de direito.
Todos os Tribunais, de 2º grau como os Superiores, possuem, também, deter-
minada pela Constituição, competência originária, nessa hipótese julgam maté-
ria de fato e de direito.
capítulo 3 • 92
a) Competência da Justiça Militar
A Justiça Militar Federal tem competência para julgar os militares integrantes
da Forças Armadas: Exército, Marinha e Aeronáutica, além de civis pela prática de
crimes considerados militares.
CONEXÃO
Código Penal Militar.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-leiDel1001.htm>.
• Seja uma conduta tipificada no Código Penal Militar, pois somente assim teremos
um crime militar;
• Esteja presente uma daquelas situações descritas no art. 9º do Código Penal Mili-
tar;
• Por fim, a jurisprudência tem (buscando claramente restringir a competência da
Justiça Militar) passado a exigir uma situação de interesse militar. Isso porque a atuação
da Justiça Militar deve ser excepcional somente nos casos de “efetiva violação de dever
militar ou afetação direta de bens jurídicos as Forças Armadas”. Trata-se de construção
jurisprudencial de natureza subjetiva, que deve ser analisada caso a caso. (grifos do
autor)
EXEMPLO
Um oficial da Aeronáutica, fardado, chega em casa e surpreende sua esposa em situação
íntima com outro homem. Agride ambos com artefatos de uso das Forças Armadas, causan-
do lesões corporais de natureza grave. Pergunta-se, trata-se de crime militar?
capítulo 3 • 93
A resposta é negativa: apesar da previsão legal do crime de lesão corporal no Código
Penal Militar, a hipótese não se enquadra no art. 9º, do referido Código e não há situação de
interesse militar, devendo o oficial ser julgado na Justiça Comum.
Súmula 53, STJ: Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar civil acusado
de prática de crime contra instituições militares estaduais.
Para se fixar a competência deve-se ter especial atenção aos crimes que estão
previstos tanto no Código Penal como no Código penal Militar.
Vamos analisar algumas situações e verificar a solução.
• Hipótese 1: Uma viatura, sai em perseguição e acaba atropelando um civil,
causando-lhe lesões corporais.
• Hipótese 2: O Policial Militar, conduzindo a viatura, sai em perseguição
e acaba batendo com o veículo, causando lesões no colega de farda que estava ao
seu lado.
Súmula 6, STJ: Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar delito decor-
rente de acidente de trânsito envolvendo viatura da polícia militar, salvo se autor e vítima
forem policiais militares em situação de atividade.
capítulo 3 • 94
ATENÇÃO
O crime de abuso de autoridade tem previsão legal apenas na Lei 4.898/65, por isso
está afastada a competência da Justiça Militar Federal ou Estadual, mesmo que cometido por
militares em atividades, devendo o julgamento ocorrer na Justiça Comum.
capítulo 3 • 95
requisitos previstos art. 2°, da Lei 7.170/1983 - a motivação política e a lesão
real ou potencial aos bens juridicamente tutelados.
Como a leitura do dispositivo não pode ser extensiva e nem se pode fazer
uso da analogia, as sociedades de economia mista estão fora da competência
da Justiça Federal.
A competência da Justiça Federal, pelo interesse que há na adequada presta-
ção do serviço, abarca os crimes que envolvem o servidor público no exercício da
função (crime propter officium).
Súmulas Aplicáveis
Súmula 42, STJ. Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar as cau-
sas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em
seu detrimento.
Súmula 147, STJ. Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados
contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função.
Súmula 208. STJ. Compete à Justiça Federal processar e julgar o prefeito municipal
por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal.
Súmula Aplicável
Súmula 522, SFT. Salvo ocorrência de tráfico com o exterior, quando, então, a compe-
tência será da Justiça Federal, compete à Justiça dos estados o processo e o julgamen-
to dos crimes relativos a entorpecentes.
LEITURA
• STJ – IDC n 01/PA, julgado em 08/jun./2005- Caso Irmã Dorothy Stang.
• STJ – IDC 02/PB, julgado em 27/out/2010. Caso Manoel Mattos.
capítulo 3 • 96
Aury Lopes Jr (2016, p. 277) afirma que a fórmula vaga e imprecisa das “cau-
sas relativas a direitos humanos”, pode gerar violação aos princípios da legalidade
e do juiz natural. (2016,p. 277).
Inciso VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determina-
dos por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira.
Súmulas Aplicáveis
Súmula 62.STJ. Compete à Justiça Estadual processar e julgar o crime de falsa anota-
ção na Carteira de Trabalho e Previdência Social, atribuído à empresa privada.
Súmula 165.STJ. Compete à Justiça Federal processar e julgar crime de falso teste-
munho cometido no processo trabalhista.
EXEMPLO
Crime de tráfico internacional de drogas, mesmo que investigado pela Polícia Estadual, a
competência para julgar o HC será do juiz federal.
Deve-se, para aplicar este dispositivo, levar em conta não apenas a autoridade
coatora, mas também a competência para julgamento da matéria criminal.
LEITURA
CC 118503 / PR CONFLITO DE COMPETÊNCIA 2011/0183730-7 - Disponível em:
<http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre= conflito+de+compet%EAn-
cia+crime+a+bordo+de+navios&&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true>.
capítulo 3 • 97
O entendimento jurisprudencial consolidado é de que a competência só será
da Justiça Federal, quando o crime ocorrer a bordo de embarcações com potencial
para viagens internacionais.
Inciso X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro...
Neste inciso, você deve compreender que “a conduta de ingressar ou permane-
cer ilegalmente no país, em si mesma, não é tipificada como crime, tendo natureza
de infração de cunho administrativo, a merecer reprimenda desta natureza. O
que será apreciado na Justiça Criminal Federal são as infrações penais perpetradas
para a consecução da permanência ou do ingresso irregular no Brasil. (TÁVORA;
ALENCAR, 2013, p. 258)
Inciso XI - a disputa sobre direitos indígenas.
Súmula Aplicável
Súmula 140 – STJ. Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime em
que o indígena figura como autor ou vítima.
CONCEITO
Foro é “o território dentro de cujos limites o órgão ou o grupo de órgãos jurisdicionais
exerce a jurisdição. No primeiro grau de jurisdição os territórios são chamados de ‘comarca’,
capítulo 3 • 98
na Justiça Estadual, ‘zonas’ na Justiça Eleitoral e nas demais ‘seções judiciárias’, ‘subseções
judiciárias’ ou ‘circunscrições judiciárias’”. (NICOLITT, 2010, p. 190).
EXEMPLO
Vamos analisar algumas situações?
a) Alguém é vítima de atropelamento na cidade de Bom Jardim- RJ é conduzida para
um hospital com mais recursos em Nova Friburgo-RJ, onde vem a falecer. Nessa hipó-
tese, qual o juízo e o foro competente para julgar o crime de homicídio culposo?
capítulo 3 • 99
Trata-se de um crime plurilocal, no qual os atos executórios ocorreram em um local (Bom
Jardim) e o resultado em outro (Nova Friburgo). Pela regra do art. 70, CPP, o processo
deveria tramitar em Nova Friburgo. No entanto, pelo entendimento que prevalece, já que
todos os atos ocorreram em Bom Jardim e apenas o evento “morte” em Friburgo. Assim, por
tratar-se de homicídio doloso a competência é da Justiça Comum Estadual da Comarca de
Bom Jardim, pois foi lá que se esgotaram todos os atos lesivos, adotando, no caso, a teoria
da atividade.
Como estamos diante de um crime que ocorreu à distância, aplicamos a regra do art. 70,
§ § 1º e 2º, CPP. Nesse caso, o Juízo competente será uma das Varas de Tribunal do Júri,
por tratar-se de homicídio doloso, da Comarca de Cuiabá, onde se deu o resultado morte –
art. 70, § 2º, CPP.
EXEMPLO
João e Maria residiam em Santos-SP e foram passar a “Lua de Mel” em Veneza, na Itália.
Lá chegando se desentenderam e João, então, matou Maria. Qual o foro e o juízo competen-
te para processar e julgar João.
capítulo 3 • 100
No caso, aplica-se a regra da extraterritorialidade do art. 7º, inciso II, alínea b, do Có-
digo Penal. De acordo com o art. 88, CPP, o local para o julgamento será São Paulo Capital,
tendo em vista que o último local de residência no Brasil era Santos. Assim, tratando-se de
homicídio doloso, João será julgado em uma das Varas de Tribunal do Júri da Comarca de
São Paulo Capital.
EXEMPLO
Em um voo doméstico, sem conexão, o avião partiu de Natal-RN para Porto Alegre-RS.
Durante o voo um passageiro agride outro, causando sérias lesões corporais. Por isso, o
piloto sai de sua rota e pousa no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. Onde o passageiro
agressor será julgado?
Nesse caso, a competência será de uma das varas criminais da Justiça Estadual (já que
a aeronave não tinha potencial para viagens internacionais, conforme vimos) da Comarca do
Rio de Janeiro, local onde o avião pousou após a prática do crime – art. 89, CPP.
capítulo 3 • 101
mares interiores, golfos, baías e portos; o mar territorial; o espaço aéreo e o terri-
tório nacional por extensão.
Mar Territorial
O art. 1ª da Lei 8617/93 estabelece que “o mar territorial brasileiro compreende uma
faixa de doze milhas marítima de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral
continental e insular, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhe-
cidas oficialmente no Brasil”.
Espaço Aéreo
“O espaço aéreo de um país é a porção da atmosfera que se sobrepõe ao território des-
se país, incluindo o território marítimo, indo do nível do solo, ou do mar, até 100Km de
altitude, onde o país detém o controle sobre a movimentação de aeronaves”.
Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Espa%C3%A7o_a%C3%A9reo>.
capítulo 3 • 102
Divisão do espaço aéreo brasileiro
FL245
capítulo 3 • 103
EXEMPLO
Um navio de bandeira Italiana está fazendo a rota de Cruzeiros em águas brasileiras,
o que é muito comum no verão. Partiu do Porto de Santos-SP com destino de retorno à
Itália. No trajeto, ainda em mar territorial brasileiro, um dos passageiros efetua furtos em
várias cabines.
Qual o juízo e o foro competente para processo e julgamento?
Nesse caso, como se trata de navio com capacidade para viagens internacionais, a com-
petência será da Justiça Federal – art. 109, IX, CF. Como o último porto de partida foi o de
Santos-SP, a competência será de uma das Varas Federais de Santos – art. 90, CPP.
REFLEXÃO
Nas embarcações (navios e aeronaves) de bandeira estrangeira quando em território
brasileiro, sempre incidirá a lei brasileira?
A resposta é negativa, se a embarcação estiver apenas passando pelo território brasilei-
ro, sem reflexos externos que atinjam a paz, a segurança e a ordem nacional, ou seja, sem ne-
nhum interesse brasileiro, mesmo reconhecendo que o crime ocorreu em território nacional,
o Brasil não irá julgar, observando o direito de passagem inocente, previsto no art. 3° da Lei
8.617/1993, bem como no Decreto 66.520/1970, que promulgou a Convenção de Tóquio,
aprovada pelo Decreto-lei 479, de 1969.
capítulo 3 • 104
domicílio ou residência do réu. Trata-se de uma opção, que pode ou não ser exer-
cida, de acordo com a conveniência- art. 73, CPP.
Esta faculdade, entretanto, não é possível nas ações penais privadas subsi-
diárias da pública, cuja titularidade, em essência, originalmente, é do MP, sendo
aplicada somente nas ações privadas exclusivas e personalíssimas.
Ainda em relação à competência ratione loci, temos três súmulas que devem
ser observadas, duas delas, uma do STF e outra do STJ, em relação ao crime de
estelionato na modalidade de emissão dolosa de cheque sem fundo, a outra em
relação ao crime de descaminho e contrabando:
capítulo 3 • 105
Quando incerto o limite territorial entre duas ou mais jurisdi-
ART. 70, §3º ções, e a infração tenha sido praticada em suas divisas;
COMENTÁRIO
A prerrogativa de função não é um privilégio da pessoa, mas uma garantia para o in-
teresse público de ver certas autoridades processadas por órgãos de maior categoria que
gozariam, em tese, de maior independência e isenção perante a autoridade processada, por
isso a Constituição consagrou diversas competências por prerrogativa de função.
capítulo 3 • 106
Antes de você aprender quais são as funções que garantem a prerrogativa de
função, é necessária uma análise da questão temporal, ou seja, verificar em que
momento alguém tem, passa a ter ou deixa de ter a prerrogativa.
PERGUNTAS
Questões importantes – de quem é a competência?
• Se alguém comete um delito antes de ser investido no cargo e depois toma posse?
• Se o delito é praticado durante o exercício do mandato eletivo ou depois de investido no
cargo que está exercendo e perde o cargo ou mandato antes da sentença?
• Se pratica o delito após acessado o exercício do cargo ou mandato?
capítulo 3 • 107
ATENÇÃO
Nos crimes de improbidade administrativa, não existe prerrogativa de função, por isso os
agentes detentores de cargo ou função pública serão processados e julgados na Justiça do
primeiro grau de jurisdição.
LEITURA
• ADIN 2797/DF – Relator Min. Sepúlveda Pertence, julgada em 15/09/2005 – Disponível
em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=395710>.
• AP 333/PB – Relator Min Joaquim Barbosa, julgada em 05/12/2007– Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=519979>.
• AP 396/ RO – Relatora Min. Cármen Lúcia, julgada em 28/10/2010 – Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=622288>.
capítulo 3 • 108
• Competência do STF – A Constituição em seu art. 102, I, “b” e “c”
estabelece que a Corte é competente para julgar nas infrações penais comuns
o Presidente da República, o Vice-presidente da República, os membros do
Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador Geral da República
e por infrações penais comuns e por crimes de responsabilidade os Ministros de
Estado e os Comandantes das Forças Armadas. A competência do STF prevalece
sobre qualquer outra.
• Competência do STJ – Em seu art. 105, I, “a”, a Carta Magna estabelece
a competência do STJ para julgamento por crimes comuns dos Governadores dos
Estados e do Distrito Federal e por crimes comuns e de responsabilidade os de-
sembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados, os membros dos Tribunais de
Conta, dos Tribunais Regionais Federais, Eleitorais e do Trabalho, além de outras
pessoas. A competência do STJ prevalece sobre qualquer outra, salvo, é claro, a
do STF.
• Competência dos Tribunais de Justiça – Serão julgados pelos Tribunais
de Justiça ao qual estão vinculados, por crimes comuns, os Juízes de Direito e
os membros do Ministério Público. Entretanto, tratando-se de crime eleitoral, a
competência será do TRE, de acordo com art. 96, III, CF.
• Competência dos Tribunais Regionais Federais – Este Tribunal é com-
petente, na dicção do art. 108, I, “a”, CF para o julgamento por crimes comuns,
os juízes federais, militares e do trabalho, bem como os membros do Ministério
Público da União. A ressalva é a mesma dos TJs, se for crime eleitoral, competên-
cia do TRE.
• Deputados Estaduais – Possuem a prerrogativa de serem julgados por cri-
mes comuns pelo mais alto Tribunal ao qual estejam vinculados. Embora não
haja expressamente norma constitucional tratando da prerrogativa de função dos
Deputados Estaduais, o entendimento do Supremo é de que a expressão contida
no art. 27, § 1º, “inviolabilidade e imunidade”, abrange, por simetria, a prerroga-
tiva de função dos parlamentares. Assim, se o crime for de competência da Justiça
Estadual – o TJ; da Justiça Federal – o TRF, da Justiça Eleitoral – o TRE.
• Prefeitos – O art. 29, X da Constituição é pouco representativo em relação
ao alcance da prerrogativa de função dos prefeitos, estabelecendo apenas que o
julgamento pelo Tribunal de Justiça. Porém, de acordo com a Súmula 702, STF
“a competência do TJ para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência
da Justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá
ao respectivo tribunal de segundo grau". Assim, se a competência for da Justiça
Federal, será julgado no TRF; se da Justiça Eleitoral, no TRE.
capítulo 3 • 109
• Vereadores – Não possuem prerrogativa de função, de acordo com a
Constituição Federal, apenas imunidade parlamentar – art. 29, VII, no exercício
da função e na circunscrição do Município onde exerce a função.
Súmulas Aplicáveis
Súmula 208 do STJ: "Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal
por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal".
Súmula 209 do STJ: "Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por des-
vio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal".
EXEMPLO
Se o Vice-governador de um determinado Estado comete um homicídio será julgado pelo
Tribunal do Júri, tendo em vista que sua prerrogativa de função é estabelecida unicamente
na Constituição Estadual.
capítulo 3 • 110
No julgamento do HC 83583, a Ministra Ellen Gracie , relatora, entendeu
que não haveria nenhuma ofensa ao princípio do juiz natural , o corréu que não
possui prerrogativa de função ser julgado pelo Tribunal de Justiça competente para
o julgamento do corréu com a prerrogativa, aplicando o verbete da Súmula 704,
STF, "não viola as garantias do juízo natural da ampla defesa do devido processo
legal a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prer-
rogativa de função de um dos denunciados".
Em outra decisão, no HC 69325-3, o entendimento foi no sentido de que
havendo em relação a um dos corréus a prerrogativa de foro como tal definida
constitucionalmente, não afasta, quanto ao outro corréu, o juiz natural revelado
pela alínea "d" do inciso XXXVIII do artigo 5º da CF, ocorrendo, desse modo,
a cisão processual.
Este parece ser o melhor entendimento, já que as regras processuais de cone-
xão e continência não são absolutas, podendo ser afastadas, enquanto a norma
constitucional, por outro, como garantia fundamental, deve prevalecer sobre a
norma processual.
Você deve observar, ainda, que se houver conexão entre crime eleitoral e crime
doloso contra a vida, haverá a cisão processual, pois a competência do Júri é cons-
titucional, prevalecendo sobre as disposições contidas em leis ordinárias.
PRERROGATIVA DE COMPETÊNCIA
FUNÇÃO
Presidente e vice-presiden- Crimes comuns e doloso contra a vida - STF
te da República Crimes de responsabilidade-Senado Federal
capítulo 3 • 111
PRERROGATIVA DE COMPETÊNCIA
FUNÇÃO
Crimes comuns e dolosos contra a vida-STJ
Governador de Estado Crimes de responsabilidade – depende da Constitui-
ção Estadual
Da modificação da competência
A conexão
capítulo 3 • 112
várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pes-
soas, umas contra as outras.
Este dispositivo legal, engloba três situações distintas.
EXEMPLO
Em uma manifestação para protesto contra a reforma da Previdência que começou de
forma pacífica, com a participação de centenas de pessoas, alguém mais exaltado incita os
demais a invadirem o Senado Federal. Outro resolve atirar pedras contra a Polícia, enquanto
outra pessoa resolve incendiar um ônibus; outros, aproveitam o tumulto e começam a furtar.
EXEMPLO
Cinco pessoas se reúnem e combinam que irão efetuar um roubo em determinada agên-
cia bancária, para que o roubo possa se concretizar precisam de veículos e, em dias diferen-
tes, furtam dois veículos e, finalmente, efetuam o roubo.
capítulo 3 • 113
EXEMPLO
As brigas entre torcidas organizadas de futebol, muito comuns na saída dos estádios.
Já no inciso II, do art. 76, temos outra forma de conexão, deixando de lado
a ideia de intersubjetividade, pois nessa hipótese o crime pode ser praticado por
uma única pessoa. Aqui o caráter é objetivo, pois a ideia é que um crime oculte
o outro ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas.
Trata-se da conexão objetiva ou teleológica.
EXEMPLO
O autor do homicídio, após matar a sua vítima, decide ocultar o cadáver, na intenção de
que o crime anterior (homicídio) não fosse descoberto.
EXEMPLO
Para que se possa provar a ocorrência do crime de receptação é necessário primeiro
demonstrar que o furto ocorreu.
Da continência
CONCEITO
“É o vínculo que une vários infratores a uma única infração ou a ligação de várias infra-
ções por decorrerem de conduta única, ou seja, resultarem do concurso formal de crimes,
capítulo 3 • 114
ocasionando a reunião de todos os elementos em processo único”. (TÁVORA; ALENCAR,
2013, p. 284)
EXEMPLO
Quando dois ou mais agentes se unem para matar uma determinada pessoa.
O art. 78, CPP estabelece uma série de regras para definir de quem será
a competência.
• Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência,
serão observadas as seguintes regras.
I. No concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdi-
ção comum, prevalecerá a competência do júri;
II. No concurso de jurisdições da mesma categoria.
a) Preponderará a do lugar da infração, à qual for cominada a pena
mais grave;
b) Prevalecerá a do lugar em que houver ocorrido o maior número
de infrações, se as respectivas penas forem de igual gravidade;
c) Firmar-se-á a competência pela prevenção, nos outros casos;
III. No concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará a de
maior graduação;
IV. No concurso entre a jurisdição comum e a especial, prevalecerá esta.
capítulo 3 • 115
ATENÇÃO
Antes de aplicar o art. 78 deve ser observar se, tratando-se de continência, o crime é
continuado, pois o critério, nesse caso, será o da prevenção – art. 71, CPP.
capítulo 3 • 116
5. Alguns dos crimes é da competência do Tribunal do Júri- art. 74, § 1º, CPP?
Caso a resposta seja positiva, incide o art. 78, I, CPP.
Se nenhum delito for da competência do Júri, passa-se ao inciso II do art. 78,
que é o último a ser considerado.
Somente quando tivermos um conflito entre juízes, igualmente competentes
em razão da matéria e pessoa, ou seja, da mesma categoria, é que devemos analisar
os incisos, esses sim, rigorosamente na ordem em que aparecem.
Vamos então analisar as alíneas do art. 78, inciso II:
EXEMPLO
Afonso praticou, em São Bernardo do Campo, um crime de roubo – art. 157, CP. Em
Congonhas do Campo praticou dois furtos – art. 155,CP. Qual o juízo competente para pro-
cessar e julgar Afonso?
Respondendo às perguntas na ordem que vimos anteriormente, você chega à conclusão
que a competência para julgar Afonso é da Justiça Comum Estadual. Resta saber, agora, em
que local será processado e julgado. Considerando que o crime de roubo é o que tem a pena
mais grave, todos os crimes, aplicando a regra do art. 78, II, “a”, o agente será julgado numa
das varas criminais de São Bernardo do Campo onde ocorreu o crime cuja pena é mais alta.
Havendo empate na alínea “a”, o juiz em cuja cidade tiver sido praticado o
maior número de crimes será o competente, ou seja, se todos os crimes forem
apenados com igual gravidade.
capítulo 3 • 117
Se no exemplo anterior, o autor tivesse praticado um único furto em São
Bernardo do Campo e dois furtos em Congonhas do Campo, a competência seria
do juízo de Congonhas, pois foi o local onde ocorreram maior número de infrações.
Será competente aquele juiz que primeiro tiver recebido a denúncia ou prati-
cado algum ato decisório na fase pré-processual.
EXEMPLO
Pedrão praticou dois furtos em São Gonçalo, dois em Itaboraí e dois em Niterói. O Minis-
tério Público da Promotoria Criminal de Niterói requereu a prisão preventiva e o Juiz da 3ª
Vara Criminal da Comarca de Niterói atendeu ao requerido, decretando a prisão preventiva.
Nessa situação o Juízo competente para o julgamento é o da 3ª Vara Criminal da Comarca
de Niterói, pois foi o primeiro a se manifestar.
Diante das explicações que você acabou de estudar, Aury Lopes Jr. (2016, p.
312) sugere que o art. 78 do CPP deva ser lido conforme as perguntas que anali-
samos , ou seja, em uma ordem inversa ao que está disposto, iniciando pelo inciso
IV (verificar se é da competência da Justiça Especializada); inciso III (verificar se
alguém tem foro privilegiado; verificar se algum crime é da competência da Justiça
Federal); inciso I (verificar se algum crime é da competência do tribunal do Júri);
inciso II ( significa que, não se enquadrando nos outros incisos, todos os juízes
são de mesma graduação, aplicando as alíneas na ordem em que estão previstas).
ATENÇÃO
Se tiverem sido praticados diversos crimes conexos em diversas cidades e erroneamente,
tiver sido instaurado em cada cidade um processo pelo delito lá praticado, deverá o juiz com com-
petência , de acordo com os critérios estudados, avocar os demais processos para fazer valer a
regra de julgamento simultâneo, salvo se já estiverem com sentença definitiva – art. 82, CPP - .
capítulo 3 • 118
CONCEITO
Sentença definitiva é aquela proferida pelo magistrado com a resolução da causa, signi-
ficando que o juiz exauriu sua jurisdição, não importando que esteja pendente de recurso e
que ainda não tenha ocorrido o trânsito em julgado.
• Da cisão processual
Apesar da existência da conexão ou continência, a lei estabelece algumas hipó-
teses em que deverá ocorrer a separação de processos.
Essa separação pode ser obrigatória ou facultativa.
• Separação obrigatória
As hipóteses encontram-se no art. 79 do Código de Processo Penal:
I. No concurso entre a jurisdição comum e a militar.
Já estudamos anteriormente que a Justiça Militar não julga crime comum
conexo, quer cometido pelo militar, quer por terceiro. O crime militar é julgado
na Justiça Especial e o comum na Justiça Comum.
Súmula Aplicável
Súmula 90 do STJ: O civil é julgado pela justiça comum e o militar pela justiça castrense.
capítulo 3 • 119
§ 1º) Cessará, em qualquer caso, a unidade do processo, se, em rela-
ção a algum corréu, sobrevier o caso previsto no art. 152.
Assim, havendo dois ou mais réus, se sobrevier doença mental a qualquer deles
durante o tramitar da ação, ficará esta suspensa em relação ao doente, prosseguin-
do em relação aos demais.
ATENÇÃO
Ocorre também separação obrigatória do processo quando há dois ou mais réus e é
aplicada a suspensão condicional do processo em relação a um deles, hipótese em que a
instrução continua quanto aos demais (art. 89 da Lei n. 9.099/95).
• Separação facultativa
As hipóteses de separação facultativa estão localizadas no art. 80 do Código
de Processo Penal “quando as infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias
de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e
para não lhes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo relevante o juiz
reputar conveniente a separação”.
capítulo 3 • 120
Pela leitura do art. 80, você pode perceber que o legislador estabeleceu três
situações distintas:
1. Quando as infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de tem-
po ou de lugar diferentes – Desde que estas circunstâncias prejudiquem o
andamento processual.
2. Quando houver um número excessivo de réus - Esta circunstância
pode prejudicar substancialmente o andamento regular do feito, bastan-
do imaginar, por exemplo, que cada um dos 30 acusados pode arrolar até
8 testemunhas.
3. Para não prolongar a prisão dos réus – Esta hipótese aplica-se, por
exemplo, se for instaurado incidente de dependência toxicológica em re-
lação a um dos réus, pois a realização do exame pode ser demorada e pre-
judicar a prolação de sentença relativa ao comparsa em relação ao qual a
instrução já poderia ter sido encerrada.
Na parte final do artigo 80, o legislador deixou a critério do juiz a cisão. Nesse
caso, o juiz decidirá a respeito da separação levando em conta a conveniência para
o bom andamento da ação penal, desde que não haja ofensa às normas legais e
constitucionais.
Desclassificação e competência
capítulo 3 • 121
Da perpetuatio jurisdicionis
De acordo com o art. 81, CPP, caso haja reunião de processos por força da
conexão ou continência, se o juiz absolver o réu por um dos crimes ou desclas-
sificar para outro que não seja de sua competência, continuará competente em
reunião aos demais processos.
Vamos retomar um exemplo visto anteriormente:
Afonso praticou, em São Bernardo do Campo, um crime de roubo – art. 157,
CP. Em Congonhas do Campo praticou dois furtos – art. 155,CP. Nesse caso
ocorreu a conexão com base no art. 78, II, “a”.
Caso o juiz absolva Afonso pela prática do roubo, permanecerá competente
para julgar os dois furtos.
capítulo 3 • 122
Caso Concreto
Marcos Paulo, juiz Federal, em comunhão de desígnios com seu secretário, no dia
20/01/2016, no município de Campinas/SP, pratica o delito descrito no art. 312 do
CP, tendo restado consumado o delito. Diante do caso concreto, indaga-se:
a) Qual o Juízo com competência para julgar o fato?
b) Caso fosse crime doloso contra a vida, como ficaria a competência para o jul-
gamento?
ATIVIDADES
01. (Analista - TRE/PR/CESPE/2012) A respeito da competência, considere:
I. O foro competente do caso de tentativa é o do local em que o delito iria se consu-
mar.
II. Não sendo conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo domicí-
lio ou residência do réu.
III. A competência será determinada pela conexão e implicará reunião dos processos,
mesmo que um ou alguns deles já tenham sido julgados.
02. Juíz Substituto - TJ/ES/CESPE/2011 -Adaptada) Assinale a opção correta com rela-
ção a competência no âmbito do direito processual penal.
a) Compete à justiça estadual processar e julgar crimes contra a propriedade intelectual
quando não praticados em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de
suas entidades autárquicas e empresas públicas, ainda que os produtos tenham sido
adquiridos no exterior.
b) Compete à justiça castrense processar e julgar crime de homicídio culposo decorrente
de acidente automobilístico em que acusado e vítima sejam militares, ainda que não se
encontrem em serviço nem estejam em local sujeito à administração militar ou atuando
em razão da função.
c) Tratando-se de delito praticado por policial militar, compete à justiça militar a decretação
da perda da função pública, como efeito secundário da condenação, ainda que a ação
penal não se refira a crime militar.
capítulo 3 • 123
d) A Emenda Constitucional n. 45 inovou o ordenamento jurídico brasileiro ao atribuir à
Justiça do trabalho competência para processar e julgar ações penais.
e) O STJ é competente para apreciar pedido de aplicação de lei nova mais benigna a
qualquer momento, e não apenas no exercício de sua competência funcional (originária
ou recursal).
capítulo 3 • 124
c) as assertivas I e III estão incorretas.
d) as assertivas I, II, III e IV estão corretas.
e) todas as assertivas estão incorretas.
RESUMO
Neste capítulo você pode compreender o que é a Jurisdição Criminal, seus princípios, co-
nhecendo a seguir as regras que determinam de quem será a competência para o processo e
julgamento das ações penais, em decorrência da matéria, do local e das pessoas. Conheceu
as causas que ensejam a unidade de julgamento, bem como as possibilidades, mesmo diante
da conexão e da continência em que pode ocorrer a separação dos processos.
COMENTÁRIO
Caso Concreto
a) Considerando que Marcos Paulo, em concurso com seu secretário cometeram o crime
de peculato, e que Marcos Paulo possui prerrogativa de função, art. 108, I, “a”, da CF, o
magistrado e seu secretário serão julgados pelo Tribunal regional Federal ao qual o juiz está
vinculado, pois a jurisdição mais graduada do Tribunal predomina sobre a jurisdição menos
capítulo 3 • 125
graduada do 1º grau, fazendo com que também o funcionário seja julgado pelo Colegiado,
art. 78, III do CPP.
b) A questão gera divergências. Há duas orientações acerca do tema.
A primeira tese é no sentido de que o juiz será julgado pelo Tribunal Regional Federal - art.
108, I, “a”, da CF, enquanto seu secretário será submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri
- art.5º, XXXVIII da CF. É que ambas as competências têm assento na Constituição, devendo
os processos serem separados, não podendo a lei ordinária, alterar regra constitucional.
O segundo posicionamento é no sentido de que por força da continência - 77, I do CPP-
haverá unidade de processo e julgamento prevalecendo a competência do Tribunal regional
federal, de acordo com o art.78,III do CPP.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. 4 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2009.
_______________. Direito Processual Penal. 13ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
NICOLITT, André. Manual de Processo Penal. 2 ed. , atual. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar. Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8 ed. rev.
atual. ampl. Salvador: Juspovdim, 2013.
capítulo 3 • 126
4
Medidas cautelares
e liberdade
Medidas cautelares e liberdade
Neste capítulo, como você já terá a oportunidade de conhecer as medidas cau-
telares que podem ser decretadas pelo juiz no curso da investigação e do processo.
Dentre as medidas cautelares pessoais, você estudará as prisões cautelares ou pro-
cessuais, bem como as demais medidas cautelares diversas da prisão, compreen-
dendo que por se tratarem de medidas cautelares devem estar presentes além do
fumus comissi delicti e do periculum libertatis, todos os demais requisitos legais que
ensejam estas medidas, tendo sempre em mente que a prisão é a última ratio do
direito. A seguir estudará a liberdade provisória e deve compreendê-la, não como
mera faculdade a sua concessão, mas como um direito subjetivo daquele que pode
estar sofrendo ou na iminência de sofrer a privação da liberdade.
OBJETIVOS
• Compreender que durante o processo a prisão tem uma finalidade específica que não é a
aplicação da pena, mas sim a garantia da eficácia do processo e de futura execução da pena;
• Compreender os limites e a validade da prisão em flagrante;
• Analisar os pressupostos e requisitos da prisão preventiva;
• Compreender porque esta prisão é a base para as demais prisões cautelares;
• Distinguir os limites da aplicação da prisão temporária;
• Distinguir as hipóteses de liberdade provisória, relaxamento de prisão e revogação de pri-
são cautelar;
• Identificar hipóteses de cabimento das diferentes modalidades de liberdade provisória em
casos concretos.
Da prisão
capítulo 4 • 128
processuais, que devem ser revestidas do caráter excepcional, que será o objeto de
estudo neste capítulo.
Antes de estudar as várias espécies de prisão cautelar, é necessária uma breve
análise dos princípios, requisitos e caraterísticas ligados a esta modalidade de prisão.
LEITURA
MANZANO, Luís Fernando de Moraes. Da prisão, das medidas cautelares e da liber-
dade provisória segundo a Lei Nº 12.403/11. Disponível em: <http://www.esmp.sp.gov.
br/revista_esmp/index.php/RJESMPSP/article/viewFile/27/16>.
capítulo 4 • 129
Em relação ao periculum in mora, o termo se adequa às cautelares reais, pois
“a demora na prestação jurisdicional possibilita a dilapidação do patrimônio do
acusado”. Já nas cautelares pessoais, “o fator determinante não é o tempo, mas a
situação de perigo pela conduta do imputado”. (LOPES JR., 2016, p. 600).
Assim, no processo penal teremos como pressupostos das medidas cautelares:
EXEMPLO
O art.282, § 2º, CPP estabelece que “as medidas cautelares poderão ser decretadas
pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação
criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministé-
rio Público.
Não se pode fazer uma interpretação de modo que o juiz possa decretar de ofício qual-
quer medida cautelar durante a investigação, pois essa pró-atividade do magistrado não
se coaduna com o sistema acusatório e nem com os princípios constitucionais, como já
estudado.
capítulo 4 • 130
Características das prisões cautelares
capítulo 4 • 131
Prisão em flagrante
A prisão em flagrante está prevista no art. 5º, LXI e regulamentada nos arts.
301 a 310, CPP.
A doutrina diverge quanto à natureza jurídica da prisão em flagrante.
Há doutrinadores, como Capez e Afrânio Silva Jardim, que entendem que a
prisão em flagrante tem natureza cautelar/processual.
Para alguns autores, como Aury Lopes Jr., a prisão em flagrante não é uma
modalidade de prisão cautelar, mas pré-cautelar, porque não possui por finalidade
assegurar o resultado final de um processo, mas apenas deixar aquele que foi detido
à disposição do juiz para que este decida ou não pela aplicação de uma medida
cautelar.
Para outros, como Tourinho Filho e Nestor Távora, trata-se de um ato com-
plexo, pois tem dois momentos distintos: a prisão captura, de natureza adminis-
trativa, que pode ser efetuada sem ordem judicial e a prisão-encarceramento, de
natureza processual, quando se faz a comunicação ao juiz.
Impróprio
Próprio Presumido
Forjado Esperado
Flagrante próprio
capítulo 4 • 132
Esta modalidade de flagrante é aquela em que o sujeito é surpreendido pra-
ticando o delito. Nesse caso, a prisão em flagrante pode evitar a consumação do
delito. Este tipo de flagrante demonstra bastante credibilidade já que o agente está
praticando o iter criminis.
EXEMPLO
Os agentes são presos no exato momento em que se preparam para sair da agência
bancária onde efetuaram o roubo.
EXEMPLO
Os vizinhos acionam a polícia por ouvir disparos de arma de fogo e quando a polícia che-
ga encontra o agente de posse da arma, ao lado da vítima já morta.
Flagrante impróprio
Está previsto no inciso III do art. 302, CPP. Também denominado de irreal
ou quase flagrante.
capítulo 4 • 133
“§ 1º) Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu quando:
a) Tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora
depois o tenha perdido de vista;
b) Sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu te-
nha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em
que o procure, for no seu encalce”.
CURIOSIDADE
A crendice de que é de 24 horas o prazo entre a prática do crime e a prisão em flagrante
não tem lógica, já que não há um limite temporal para a captura do agente, iniciada a perse-
guição. O prazo de 24 horas é para comunicar a prisão ao juiz.
O terceiro requisito legal, “faça presumir ser o autor da infração”, vai de en-
contro ao princípio da presunção de inocência. Feito este alerta, tem-se entendido
que essa circunstância se caracteriza quando o suposto agente é encontrado com
objetos usados na prática criminosa ou fruto desta.
EXEMPLO
Após furtar o celular de uma pessoa, o agente sai correndo, mas é perseguido por popu-
lares e pela polícia, sendo encontrado duas horas depois com o referido aparelho telefônico.
Flagrante presumido
capítulo 4 • 134
Também chamado de flagrante ficto, está previsto no inciso IV do art. 302,
CPP.
Distingue-se essencialmente do flagrante impróprio porque aqui não há a per-
seguição, mas o agente é localizado nas circunstâncias mencionadas na lei, de
modo que a situação fática leve à conclusão de que pode ser ele autor do delito.
Embora se admita que o encontro pode ser casual, doutrinadores com Lopes
Jr. alertam que o encontro deve ser causal, ou seja, é necessário que se esteja à
procura do agente.
O lapso temporal, nessa hipótese de flagrante, pode ser um pouco mais elásti-
co, já que encontrar não exige o curto prazo que a perseguição exige.
EXEMPLO
Alguém rouba um veículo, mediante emprego de arma de fogo e, horas depois, é parado
numa blitz policial conduzindo o veículo e na posse da arma utilizada na prática criminosa.
As outras modalidades de flagrante que você estudará a seguir não estão pre-
vistas no CPP, mas deve-se dar especial atenção a elas, para que se possa averiguar
se há ilegalidade, ou não, na prisão em flagrante.
Flagrante preparado
capítulo 4 • 135
EXEMPLO
A polícia tem conhecimento que determinado sujeito vende documentos falsos. Um de
seus agentes entra em contato com o falsário e encomenda o documento, marcando um
local para a realização do negócio. No momento da celebração do acordo com a entrega o
dinheiro e o recebimento do documento efetuam o flagrante.
Flagrante esperado
EXEMPLO
Através de uma investigação policial em que foi autorizada a quebra do sigilo telefônico,
policiais descobrem que os meliantes planejam efetuar um roubo em determinada agência
bancária em certo dia. Nesse dia, dirigem-se ao local, se ocultam e esperam que a ação se
inicie para prender em flagrante.
Flagrante forjado
Ocorre quando se forja, se cria uma situação fática de flagrante para tentar
legitimar a prisão, ou seja, são forjadas provas para justificar a prisão. Essa moda-
lidade de flagrante é ilegal pela inexistência do crime. Os agentes públicos podem
responder por abuso de autoridade. Se o flagrante for forjado pelo particular, este
poderá responder pelo delito de denunciação caluniosa.
capítulo 4 • 136
EXEMPLO
Numa revista pessoal ou no veículo, os próprios agentes policiais colocam drogas na
mochila daquele que está sendo revistado, forjando a situação de flagrante.
Flagrante diferido
EXEMPLO
A polícia descobre a existência de um ponto de venda de drogas e passa, então, a mo-
nitorar os agentes e o movimento, aguardando para realizar a prisão em flagrante com o
objetivo de prender maior número de agentes e apreender maior quantidade de provas.
capítulo 4 • 137
• Da prisão em flagrante e as várias modalidades de crime
Em regra, é possível a prisão em flagrante em todos os tipos de crime. Porém,
você deve ficar atento a algumas situações especiais:
a) Crimes de ação penal privada ou condicionada à representação
Admitem a prisão captura, mas o auto de prisão só pode ser lavrado mediante
requisição do ofendido ou seu representante legal ou mediante representação.
b) Homicídio e lesão corporal culposa na direção de veículo automotor
O art. 301, Lei 9503/97 veda a prisão em flagrante se o responsável prestar
socorro à vítima.
c) Infrações de menor potencial ofensivo
O ato da prisão em flagrante é possível, mas não será lavrado o auto de prisão,
mas sim o termo circunstanciado.
d) Crime permanente
De acordo com o art. 303, CPP, a prisão em flagrante é possível enquanto
não cessada a permanência.
A Constituição em seu art. 5º, inciso XI permite a violação domiciliar, a
qualquer hora do dia ou da noite, em caso de flagrante delito, mesmo sem auto-
rização judicial.
No caso de tráfico ilícito de entorpecentes, o art. 33 da Lei 11.343/06 traz
um tipo múltiplo em que várias condutas são consideradas crime permanente. O
entendimento jurisprudencial que prevalece no STF e no STJ é de que há o estado
de flagrante delito e, por isso, o domicílio pode ser violado e a busca e a apreen-
são ser realizada mesmo sem ordem judicial. Nicolitt (2010, p. 441) ao tratar do
tema entende que essa posição não é a mais adequada, pois para ele “a situação de
flagrante delito significa visibilidade material do delito”. Por visibilidade mate-
rial do delito, você deve se entender que existir uma percepção mínima de que o
crime existe. Para ele, essa falta de visibilidade da existência do crime implicaria na
violação do domicílio e haveria uma ilicitude na apreensão da droga.
CONCEITO
Crime permanente “ "é aquele crime cuja consumação se alonga no tempo, dependente
da atividade do agente, que poderá cessar quando este quiser (cárcere privado, sequestro)".
(BITENCOURT, 2004, p.194)
capítulo 4 • 138
Outro ponto controvertido diz respeito ao flagrante preparado nas hipóteses
de crime permanente. Observe a seguinte situação: Policiais disfarçados fingem
querer comprar drogas e induzem o agente a vendê-la. Se este já tinha em sua pos-
se ou em depósito a droga, a situação em flagrante já existia e a prisão será válida.
Mas, se por outro lado a pessoa que foi induzida a fornecer a droga, procurou
uma forma de obtê-la para efetuar a venda, estamos diante da hipótese de crime
impossível e o flagrante será ilegal.
e) Crime continuado
A continuidade delitiva é uma ficção jurídica prevista no art. 71, CP.
Como cada uma das ações delituosas constitui crime, o agente poderá ser preso
em flagrante.
f ) Crimes habituais
Esses crimes exigem a prática reiterada e com habitualidade da conduta des-
crita no tipo penal.
Bittencourt explica que “é inadmissível a tentativa, em razão da habitualidade
ser característica dessa infração penal”. (Tratado de Direito Penal, 2006, v. 4, p.
281.)
Nessa linha de raciocínio, não é viável definir-se quando o agente está come-
tendo a infração ou quando acabou de cometê-la, pois um ato isolado não confi-
gura o ilícito penal por não estar caracterizada a habitualidade.
Assim, a corrente majoritária entende que não há prisão em flagrante por
crime habitual.
Há outra linha que sustenta a possibilidade do flagrante delito, em crimes ha-
bituais como o curandeirismo, pois em certas situações, como, por exemplo, na
conduta daquele que monta um consultório médico, sem possuir diploma e licença
e está a atender um paciente e há muitos outros na sala de espera. Nessa hipótese,
ao atender todos estaria consumado o delito, mas ao ser interrompido o iter criminis
houve a tentativa. Aceitando-se essa hipótese, poderia haver a prisão em flagrante.
Dos sujeitos do flagrante
O art. 301 do CPP dispõe que qualquer do povo pode prender em fla-
SUJEITO grante delito, enquanto as autoridades policiais e seus agentes devem
ATIVO fazê-lo. Por isso, quanto à efetivação do flagrante pelo sujeito ativo, a
doutrina passou a classificar o flagrante em obrigatório e facultativo.
capítulo 4 • 139
É a pessoa que foi detida em situação de flagrante. Em regra, qual-
quer pessoa pode ser presa em flagrante. No entanto, certas pessoas,
SUJEITO em decorrência da função pública exercida, da sua conduta ou da
PASSIVO menor gravidade do delito não poderão ser presas em flagrante ou
poderão ser presas em flagrante apenas em situações excepcionais.
Observe o quadro a seguir.
Lavratura do APF
Na realidade, neste momento é feita Comunicação da Prisão
Apresentação do preso uma ata declarando resumidamente a Deve ser comunicada
Imediatamente após a razão da prisão, as circunstâncias da imediatamente a prisão e o
detenção, o preso deve ser apresentação do preso e quais as local onde se encontra o preso,
apresentado à autoridade providências tomadas, anexando-a ao Juíz, ao MP, à família do
policial aos depoimentos prestados preso - art. 306, CPP
capítulo 4 • 140
REFLEXÃO
Na oitiva do conduzido é imprescindível a presença do advogado?
O entendimento que vem prevalecendo é pela admissibilidade da presença do defensor,
mas, no entanto, por ser o inquérito um procedimento de caráter inquisitorial, não seria im-
prescindível sua presença.
Em 2016, a Lei 13.245 alterou a Lei 8906/94 – Estatuto da Advocacia – estabelecendo
em seu art. 7º, inciso XXI, que é direito do advogado “assistir a seus clientes investigados
durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo inter-
rogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e
probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no
curso da respectiva apuração. Sendo assim, a presença do advogado é imprescindível.
ATENÇÃO
A Lei 13.257, de 8 de março de 2016, acrescentou o parágrafo 4º ao art. 304, esta-
belecendo que “da lavratura do auto de prisão em flagrante deverá constar a informação
sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome
e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa”.
A obrigatoriedade de fazer constar estas informações no Auto de Prisão em Flagrante
deve-se à possibilidade, em caso de requisição ou representação pela conversão da prisão
em flagrante em prisão preventiva do juiz determinar a prisão preventiva domiciliar.
Da Prisão Preventiva
É uma modalidade de prisão processual que só pode ser decretada pelo juiz,
fundamentadamente, se estiverem presentes os requisitos expressamente previstos
em lei.
Como se trata de uma medida cautelar, pressupõe a coexistência do fumus
comissi delicti, decorrente da presença da prova da existência do crime e do indício
suficiente de autoria (art. 312, segunda parte, do CPP), e do periculum libertatis,
derivado da garantia da ordem pública, da garantia da ordem econômica, da con-
veniência da instrução criminal e da aplicação da lei penal (art. 312, primeira
parte, do CPP).
capítulo 4 • 141
• Situações que ensejam a decretação da prisão preventiva
Após as alterações trazidas pela Lei n. 12.403/2011, a decretação da prisão
preventiva pode se verificar em três situações:
a) Quando o autor da infração tiver sido preso em flagrante e o juiz,
ao receber a cópia do auto no prazo de 24 horas da prisão, convertê-la
em preventiva.
Pedro Lenza (p.280) entende que, nesse caso, não é necessário requerimento
do Ministério Público ou representação da autoridade policial, conforme se de-
preende da própria leitura do art. 310 do CPP.
Este, porém, não é o entendimento que prevalece. O juiz não pode ex officio,
na fase investigativa, converter a prisão em flagrante em preventiva, pois isto con-
figuraria uma verdadeira ofensa ao princípio acusatório.
O Juiz não está adstrito ao pedido feito pelo Delegado ou pelo MP e, desse
modo, só deve decretar a prisão preventiva se concluir que são inadequadas ou
insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão, previstas nos arts. 319 e
320 do CPP.
capítulo 4 • 142
flagrante (liberdade provisória com imposição da cautelar), quer esteja solto. Em
qualquer caso, o descumprimento da medida justificará a substituição por outra, a
cumulação com outra medida ou, em último caso, a decretação da prisão preven-
tiva (art. 282, § 4º, do CPP).
• Pressupostos e fundamentos
Pela leitura do art. 312, CPP, você pode perceber que um dos requisitos para a
decretação da prisão preventiva é a prova da existência do crime e indícios de autoria,
que configura o que chamamos de justa causa, configurando o fumus commissi delicti.
Não se trata de um juízo de mera possibilidade, mas sim de um juízo de probabilidade.
Além da probabilidade do cometimento do delito, é necessário observar se há
perigo, decorrente do estado de liberdade do sujeito passivo, para a ordem pública,
econômica, financeira, para a conveniência da instrução criminal ou para a aplica-
ção da pena, configurando o periculum libertatis – art. 312, CPP.
ATENÇÃO
“A probabilidade significa a existência de uma fumaça densa, a verossimilhança [...] de to-
dos os requisitos positivos[...]que significam prova de que a conduta é aparentemente típica,
ilícita e culpável. Além disso, não podem existir requisitos negativos do delito”, como causas
excludentes de ilicitude e de culpabilidade. (LOPES JR., 2016, p. 649)
capítulo 4 • 143
b) Conveniência da instrução criminal
O que se busca nessa hipótese é a garantia da produção das provas, impedindo
que o acusado destrua documentos, ameace testemunhas, intimide os peritos etc.
Não basta a alegação, deve-se demonstrar que efetivamente o réu está atrapalhan-
do o desenrolar do processo.
c) Garantia de aplicação da lei penal
O objetivo aqui é evitar a fuga do agente, assegurando a eficácia da sentença
penal. O risco de fuga não pode ser presumido, devem ser demonstradas as cir-
cunstâncias concretamente. Assim, o simples fato do acusado ter condição econô-
mica abastada não é suficiente como indicativo da fuga, não servindo de funda-
mento para a decretação da prisão.
d) Garantia da ordem econômica
Essa hipótese foi acrescentada pela Lei 8.884/1994 (Lei Antitruste), tendo
por finalidade coibir os abusos à ordem econômica, isto é, evitar a continuidade,
pelo agente, da prática novos delitos que afetam a ordem econômica.
LEITURA
Crise de identidade da "ordem pública" como fundamento da prisão preven-
tiva, POR Aury Lopes Jr e Alexandre Morais da Rosa – disponível em: <http://www.
conjur.com.br/2015-fev-06/limite-penal-crise-identidade-ordem-publica-fundamen-
to-prisao-preventiva>.
capítulo 4 • 144
• Condições de admissibilidade
O art. 313, CPP estabelece as condições de admissibilidade a serem obser-
vadas, além dos pressupostos e fundamentos do art. 312, CPP. Assim a prisão
preventiva só é admitida:
a) Nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima
superior a 4 anos.
A prisão preventiva, como regra, abarca os crimes dolosos mais gravosos, cuja
pena é superior a 4 anos, excluindo-se os crimes dolosos menos graves, os crimes
culposos e as contravenções penais.
b) Se houver condenação anterior por crime doloso, com sentença transi-
tada em julgado.
Esta condição possibilita a prisão preventiva, mesmo na hipótese de crimes
com pena máxima inferior a 4 anos, desde que haja uma sentença penal condena-
tória por crime doloso transitada em julgado e esteja dentro do lapso temporal de
5 anos para os efeitos da reincidência.
c) Se o crime envolver violência doméstica ou familiar contra a mulher,
criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa deficiente, quando houver
necessidade de garantir a execução de medidas protetivas de urgência.
Deve-se fazer uma leitura bastante cuidadosa do dispositivo, tendo como
regra que o crime deve ser doloso com pena superior a 4 anos e uma análise com
base da razoabilidade para verificar se há necessidade da prisão para a eficácia da
medida protetiva concedida.
d) Quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando
esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la.
Deve-se, nessa situação, a prisão preventiva ser empregada com muita cautela,
observadas as questões da identificação criminal. Identificando o sujeito, a prisão
deve ser imediatamente revogada.
ATENÇÃO
Para que haja a possibilidade de decretação da prisão preventiva deve ser feita uma
análise conjunta dos pressupostos, fundamentos e condições de admissibilidade, faltando
um desses requisitos não é cabível a prisão preventiva.
capítulo 4 • 145
REQUISITOS
PRESSUPOSTOS
FUNDAMENTOS PERICULUM CONDIÇÕES DE
FUMUS COMMISSI
LIBERTATIS ADMISSIBILIDADE
DELICTI
1. Que o crime seja do-
1. Indícios de autoria. 1. Garantia de ordem Pública. loroso com pena máxima
Art. 312, CPP Art. 312, CPP, caput superior a 4 anos - art.
313, I, CPP
5. Descumprimento de medida
cautelar antes imposta.
Art. 312, parágrafo único, CPP
capítulo 4 • 146
PERGUNTA
De que forma é possível perceber que a prisão é necessária?
ATENÇÃO
Afrânio Silva Jardim afirma que a prisão decorrente da sentença condenatória constitui
verdadeira execução penal provisória, com o que discorda Marcellus Polastri, afirmando que
o caso é de prisão cautelar.
capítulo 4 • 147
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Figura 4.2 –
Hipóteses
capítulo 4 • 148
através de documentos, como a certidão de nascimento nas hipóteses dos incisos
I, III, V e VI ou perícia médica nas hipóteses dos incisos II, III (parte final) e IV.
Trata-se de modalidade de prisão cautelar revestida de caráter humanitário.
ATENÇÃO
Como modalidade de prisão cautelar, todos os requisitos exigidos para a decretação da
prisão preventiva devem ser observados.
Prisão temporária
CURIOSIDADE
A lei de prisão temporária foi criada através da Medida Provisória 111 de 24/11/89, o
que a torna formalmente inconstitucional por violação ao art. 22, I c/c art. 62, § 1º, I, “b”, e
o simples fato de ter sido convertida em lei não a torna constitucional.
• Hipóteses de cabimento
Nos termos do art. 1º, da Lei n. 7.960/89, caberá prisão temporária:
capítulo 4 • 149
II. Quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos
necessários ao esclarecimento de sua identidade.
Quanto ao indiciado não ter residência fixa, Tavares e Alencar (2013, p. 596)
destacam que a medida cautelar “só tem cabimento em razão de sua estrita neces-
sidade, sendo o simples fato de o indivíduo não ter residência fixa insuficiente para
decretar a medida. Queremos crer que a justificação da prisão temporária neste
caso só é possível se houver um risco efetivo do agente fugir”.
Quanto à falta de identificação civil, o que ainda é muito comum no interior
do Brasil, bastaria para solucionar a questão a identificação criminal, não sendo
necessária a segregação.
• Prazos de Duração
Em regra, a prisão temporária é decretada pelo prazo de cinco dias, o qual
pode ser prorrogado por outros cinco dias, em caso de extrema e comprovada
necessidade, conforme o art. 2º da Lei 7960/89.
Nos casos de crime hediondo e equiparados, o prazo da prisão temporária é de
trinta dias, o qual pode ser prorrogado por outros trinta dias, nos termos do art.
2º, § 3º, da Lei 8072/90.
capítulo 4 • 150
A não libertação do preso após o exaurimento do prazo constitui modalidade
específica do crime de abuso de autoridade (art. 4º, i, da Lei n. 4.898/65).
A autoridade policial não pode soltar o indiciado antes do término do prazo
da prisão temporária.
Caso ela entenda que não mais se justifica a manutenção no cárcere deve soli-
citar ao juiz que revogue a prisão.
Como medida cautelar cabível apenas na fase da investigação, não pode a
prisão temporária, em nenhuma hipótese, ser decretada ex officio pelo magistrado.
Da audiência de Custódia
Embora a reforma processual penal, realizada pela Lei 12.403/2011 tenha al-
terado o sistema da prisão cautelar, possibilitando ao juiz a aplicação de medidas
cautelares alternativas para se evitar a prisão daqueles que, constitucionalmente, são
presumidamente inocentes, a prisão cautelar, caracterizando, da forma como vem
sendo aplicada, uma antecipação da pena, ainda está longe de ser a última ratio.
De acordo com o último relatório divulgado pelo Ministério da Justiça, atra-
vés do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN, de
junho de 2014, o Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo,
com aproximadamente 607.731 presos, sendo que cerca de 250.213 são presos
provisórios, ou seja, presumidamente inocentes.
Em janeiro de 2015, o CNJ – Conselho Nacional de Justiça – implantou o
projeto “Audiência de Custódia”, “com o objetivo de combater a cultura do encar-
ceramento em massa existente no Brasil”, a fim de “garantir o contato pessoal da
pessoa presa com um juiz após sua prisão em flagrante” (MARQUES, 2016, p. 10).
Diante deste quadro caótico em relação ao sistema prisional brasileiro, em
setembro de 2015 foi concedida medida cautelar na ADP 347, conhecida como
a ADPF do “estado de coisas inconstitucional”, em que o STF decidiu que todos
os juízes e tribunais, com fundamento “no art. 9.3 do Pacto de Direitos Civis e
Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, realizas-
sem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento
do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados
do momento da prisão”(STF - ADPF 347).
Apesar da obrigatoriedade da implantação da “Audiência de Custódia”, lem-
brando que o prazo de noventa já expirou há quase dois anos, efetivamente ainda
não foi plenamente implantada e aplicada.
capítulo 4 • 151
Importante você lembra que o Brasil é signatário da Convenção Americana
de Direitos Humanos (CADH) , o Pacto de San José da Costa Rica – cujo
artigo 7.5 estabelece que:
Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora à presença de
um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito
de ser julgada em um prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que
prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem
o seu comparecimento em juízo.
capítulo 4 • 152
Pelo teor do parágrafo único, podemos afirmar que a audiência de custódia está assegu-
rada para todas as pessoas que são presas em flagrante em todo o Estado do Rio?
Parece mais lógico afirmar, por circunstâncias óbvias que não, que somente aquelas que
forem presas na Capital ou expandido o alcance da norma, na região Metropolitana, terão o
direito assegurado.
Daí você pode partir para outro questionamento: e a inviolabilidade do direito à igualdade,
à liberdade assegurada no art. 5º, da Constituição? E o princípio do juiz natural? Mas a reso-
lução vai além na ofensa à Constituição.
Veja o art. 6º: “Aberta a audiência, o preso será ouvido a respeito das circunstâncias da
prisão e suas condições pessoais, manifestando se, em seguida, o MP e defesa, se presentes
ao ato”.
Como assim, “se presentes ao ato”? Pode se fazer audiência sem a presença do Ministé-
rio Público e do defensor (defesa técnica)?
Marcello Polastri Lima (216, p. 136) comentando o referido artigo afirma que:
Ora, pelo exame do dispositivo, vê-se que tanto a defesa como o próprio Ministério
Público não precisariam estar presentes ao ato de audiência de custódia, pois só se
manifestariam na audiência “se presentes ao ato”. Retoma assim, a resolução do Rio
de Janeiro, o sistema inquisitivo do medievo, pois, pela letra da mesma, o juiz poderá
realizar a audiência sem presença das partes, só ele e o preso, agindo, portanto, de
ofício ao decretar uma medida cautelar, como se isso fosse possível em vista da Cons-
tituição e do próprio Código de Processo Penal.
Nitidamente há uma ofensa ao princípio acusatório, tendo em vista que o juiz não pode,
de acordo com o art. 282, § 2º CPP, decretar de ofício a conversão do flagrante em prisão
preventiva ou decretar outra medida cautelar sem a requisição do Ministério Público, titular
da ação penal – art. 129, I, CF.
Além disso, o Rio de Janeiro é o único Estado que não estipulou um prazo para a apre-
sentação do preso para a audiência de custódia, conforme destaca Gustavo Badaró:
O artigo 2º, caput, limita-se a estabelecer que o preso será apresentado “sem de-
mora”, ao juiz. De todos os tribunais que disciplinaram em atos normativos internos a
Audiência de Custódia, o Rio de Janeiro foi o único que não adotou um prazo cronolo-
gicamente definido, limitando-se a repetir os termos do artigo 7.5 da CADH. Toda e
qualquer prisão cautelar deve estar sujeita ao princípio da legalidade, e a utilização de
uma expressão sem contornos precisos aumenta a discricionariedade, o que se mostra
uma opção criticável (BADARÓ, 2015).
capítulo 4 • 153
Esta breve explanação da resolução do TJ/RJ foi para que você pudesse refletir acerca
da importância de uma legislação federal regulamentando a matéria, que como norma pro-
cessual penal teria eficácia imediata e ex tunc, significando que todos os que se encontram
acautelados teriam que ser conduzidos à presença do juiz para a audiência de custódia.
O Projeto de Lei 554/2011 do Senado Federal, já remetido à Câmara dos Deputados, prevê alte-
ração do § 1º, art. 306, CPP, instituindo a audiência de custódia, que poderá ter a seguinte redação:
§ 1º No prazo máximo de vinte e quatro horas depois da prisão, o preso deverá ser
conduzido à presença do juiz competente, ocasião em que deverá ser apresentado o
auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas e, caso o au-
tuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.
Como você pode observar, o dispositivo exige um juiz competente, estabelece o prazo
máximo de 24 horas e a assistência de defensor, o que possibilita o exercício do contraditório.
De acordo com Lopes Jr. (2016, p. 637-638), a audiência de custódia “não se limita aos
casos de prisão em flagrante, senão que terá aplicação em toda e qualquer prisão, detenção
ou retenção (dicção do art. 7.5 da CADH), sendo portanto exigível na prisão temporária e
também na preventiva”.
Deve-se concordar com o autor, tendo em vista que a audiência tem por objetivo avaliar
se efetivamente é necessário o decreto prisional, garantindo-se o mesmo tratamento a todos
como forma de humanização do processo.
capítulo 4 • 154
que decreta a prisão temporária sem fundamentação e a prisão que se torna ilegal
com o passar do tempo, como o excesso de prazo de duração na prisão preventiva.
CONCEITO
A palavra relaxamento significa unicamente uma via de controle da legalidade da prisão,
independentemente da modalidade, não se restringindo à hipótese de flagrante delito, em-
bora a sua aplicação prática, em regra, ocorra em relação a esta. (PACELLI, 2012, p. 579)
O art. 5º, LXVI, por sua vez, prevê a liberdade provisória, sem fiança e com
fiança, abarcando os casos em que a prisão em flagrante, embora formalmente
legal, se mostra desnecessária.
A prisão preventiva quando deixa de existir os motivos que a ensejaram perde
a finalidade e deve ser revogada. art. 316, CPP.
Você deve estar se perguntando: como saber se o pedido é de relaxamento, de
liberdade provisória ou de revogação? Tenha sempre em mente:
EXEMPLO
Prisão preventiva decretada em decorrência de flagrante forjado – ilegalidade – relaxa-
mento de prisão.
Ausência dos requisitos (fundamentos, pressupostos e condições de admissibilida-
de) arts. 312 e 313 que ensejam a prisão preventiva – falta de necessidade – liberda-
de provisória.
A prisão preventiva foi decretada porque o acusado ameaçava as testemunhas. A prova
foi devidamente colhida – perda do motivo – revogação da prisão.
capítulo 4 • 155
Embora os três institutos conduzam à liberdade do acusado no curso do pro-
cesso, o efeito prático entre eles é distinto:
A distinção parece banal, mas na realidade tem grande diferença prática. Por exemplo,
o relaxamento de prisão restabelece a liberdade plena, sem vinculação ou compro-
missos, enquanto a liberdade provisória traz uma série de limitações [...] concedida a
liberdade provisória, quebrada a fiança ou descumprida uma das obrigações impostas
(arts. 327 e 328, CPP) a prisão se restabelece. Ao contrário, uma vez revogada a
prisão (art. 316, CPP), nova prisão preventiva só poderá advir se surgirem novos fatos
(risco para a instrução ou para aplicação da lei penal) que a justifiquem. (NICOLITT,
2010, p. 453)
Da liberdade provisória
capítulo 4 • 156
fiança, por ser economicamente hipossuficiente. Já que não seria justo, por violar
as garantias constitucionais e processuais, negar a liberdade provisória a quem não
pode pagar a fiança.
Caso descumpra qualquer medida imposta, ocorrerá a quebra da fiança.
c) Com fiança e com vínculos de comparecimento a todos os atos do pro-
cesso (art. 327 do CPP), de não mudança de residência e de não ausência
desta por mais de oito dias (art. 328 do CPP).
O efeito do descumprimento das obrigações impostas, como já visto, é a que-
bra da fiança.
O instituto da fiança
A fiança, por sua natureza cautelar, só poderá ser arbitrada se houver a neces-
sidade. Caso não haja, a regra, estando ausentes os requisitos da prisão preventiva,
é a liberdade provisória sem fiança. Trata-se de um direito subjetivo do indiciado e
não de uma faculdade do juiz, conforme se depreende do art. 321, CPP.
CONCEITO
A fiança é uma contracautela, de caráter patrimonial que tem por objetivo garantir a
efetividade dos atos processuais, além de ser um fator inibidor da fuga
capítulo 4 • 157
O art. 350, CPP traz a possibilidade, quando o indiciado não tem condi-
ções econômicas de arcar com a fiança, do juiz conceder a liberdade provisória
sem fiança. O delegado pode valer-se deste dispositivo e conceder a liberdade
provisória sem fiança? Não. O delegado, nessa hipótese, deve representar ao juiz
para que este conceda a liberdade provisória sem fiança, sujeitando o indiciado às
obrigações legais dos arts, 227 e 228, CPP.
Já que que estamos fazendo uma reflexão, vamos a mais alguns questionamentos.
– Na hipótese do art. 322, CPP, pode a autoridade policial deixar
de arbitrar a fiança, mantendo o réu acautelado?
Se entender que na situação real, há motivos que justifiquem a decretação da
prisão preventiva, poderá deixar de arbitrar a fiança, devendo representar ao juiz
para conversão do flagrante em prisão preventiva.
– Pode o delegado de polícia representar pela concessão de liber-
dade provisória sem fiança, mas vinculada, mesmo em crimes cuja
pena ultrapassa 4 anos?
Embora não possa conceder de ofício liberdade provisória sem fiança, enten-
dendo que não estão presentes os requisitos que ensejam a prisão preventiva, não
há nada que o impeça de representar ao juiz para que este conceda a liberdade sem
fiança, aplicando as obrigações legais e as medidas cautelares do art. 319, CPP.
LEITURA
1. HC nº 2243294-31.2016.8.26.0000/SP. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/
dl/jurisprudencia-liberdade-provisoria.pdf>.
2. TJ-SP reverte prisão em caso em que delegado pediu liberdade de investigada,
por Brenno Grillo. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2017-mar-14/tj-sp-reverte-
prisao-delegado-liberdade-re>.
• Do valor da fiança
A fiança é fixada em salários mínimos, e seu valor tem limite mínimo e máxi-
mo fixado, de acordo com a autoridade que a arbitra, conforme previsão do art.
325 e incisos do CPP.
Se a autoridade for o Delegado de Polícia, o valor gravita entre um (01) a
cem (100) salários mínimos. Se for o Juiz, esse valor fica entre dez (10) e duzen-
tos (200) salários mínimos.
capítulo 4 • 158
Dependendo da situação econômica do indiciado, a fiança pode ser dispen-
sada, diminuída em até 2/3 ou majorada em até 1000 vezes – art. 325, § 1º e
incisos, CPP.
Para determinar o valor da fiança você deve observar dois pontos a serem con-
trabalançados: de um lado a gravidade do crime; de outro, a condição econômica
do imputado, ou seja, dentro dos valores mínimo e máximo , deve se observar
esse parâmetro para que não seja fixado um valor exorbitante para aquele que
não pode pagar, pois, assim, se estaria negando o direito a responder o processo
em liberdade; nem irrisório, a ponto de não significar nada para aquele que pos-
sui condições, não pode ser simplesmente “um pago e estou livre”, é necessário o
caráter coercitivo.
• Obrigações do afiançado
A liberdade provisória mediante fiança, além da exigência da contrapartida fi-
nanceira, sempre condiciona o afiançado a cumprir uma série de obrigações, como
comparecimento perante a autoridade, toda vez que for intimado para os atos do
inquérito e da instrução; a proibição de mudar de residência, sem prévia permissão
do juiz, além de poder se aplicar uma ou mais medidas cautelares previstas no art.
319, CPP.
capítulo 4 • 159
O art. 324, CPP elenca as hipóteses de vedação da fiança a partir de critérios
subjetivos inerentes ao acusado.
Na hipótese do inciso I, ao quebrar a fiança, o agente quebrou também a con-
fiança, pois deixou de cumprir com as obrigações impostas.
No inciso II, é vedada a fiança na prisão civil do devedor de alimentos, pois a
prisão, nessa situação, é uma forma de coerção para que o pagamento dos alimen-
tos ocorra, por óbvio não se coaduna com a fiança para livrar-se. Quanto à prisão
militar, deve-se respeitar o que dispõe o Código Penal Militar.
Em relação ao inciso IV, já que o III está revogado, pode-se dizer que num
determinado contexto a prisão preventiva seja efetivamente necessária, não se coa-
dunado com a fiança, por serem excludentes.
• Da quebra da fiança
O art. 341, CPP elenca as circunstâncias que acarretam a quebra da fiança. A
quebra da fiança pode ser definida como uma “sanção processual imposta (apenas)
pelo Judiciário àquele que rompeu com o laço de confiança. Para que a quebra seja
determinada, acreditamos que o afiançado deve ser ouvido, respeitando-se o contradi-
tório e oportunizando eventual justificativa. (TAVARES, ALENCAR, 2014, p. 660).
A quebra injustificada da fiança importa, de acordo com o art. 343, CPP, em
perda da metade do valor, mas não implica, obrigatoriamente, em decretação da
prisão preventiva. O juiz deve analisar a situação com cautela, podendo optar por
outra medida cautelar menos gravosa.
• Da perda da fiança
Por ser uma medida de contracautela, a fiança destina-se a vincular o acusado
à efetividade do processo. Se não se apresenta para cumprir a pena, a lei penal
não poderá ser aplicada, perdendo, por isso, a fiança – art. 344, CPP. A perda da
fiança só pode ser decretada pelo juiz.
• Da cassação da fiança
Ocorre nos termos dos artigos 338 e 339 quando se percebe, depois de ar-
bitrada, que a fiança era incabível. Lembre-se de que fiança e liberdade provisória
são institutos distintos e que a cassação da fiança, por si só, não acarreta a prisão
do agente. Nesse caso, o valor deve ser integralmente restituído ao acusado.
• Do reforço da fiança
Tavares e Alencar (2014, p.662) entendem que “O bem prestado em fiança
deve corresponder ao valor fixado para a sua concessão durante toda a persecução
capítulo 4 • 160
penal. Desta forma, o reforço é a necessidade de implementar a fiança”, ou seja,
há uma necessidade de complementação do valor, quando o valor fixado não for
suficiente ou quando ocorrer a perda do valor econômico, conforme disposto no
art. 340, CPP.
Por lógico, a oportunidade para que seja complementada a fiança deve ser
garantida, além de se observar o binômio necessidade do reforço e possibilidade
econômica do afiançado.
Caso o reforço não seja feito, a fiança torna-se sem efeito e pode acarretar a
prisão – art. 340, parágrafo único, CPP.
• Destinação da fiança
Em caso de condenação, se o réu se apresenta para cumprir a pena, o valor
dado em garantia, após o abatimento das custas, multas e indenizações, é a ele
devolvido - art. 336, caput.
Quando a decisão for de absolvição, a fiança perde o efeito e todo o valor dado
em garantia é devolvido ao liberto - art. 337, caput.
Ocorrendo a prescrição da pretensão (art. 110 do CP), após o trânsito em jul-
gado de sentença condenatória, o valor da fiança seguirá o destino essa sentença,
sendo devolvido apenas o que restar – art. 336, parágrafo único.
Da mesma forma, se ocorrer a extinção da punibilidade antes do trânsito em
julgado da sentença condenatória ou pedido de arquivamento do inquérito poli-
cial, haverá, se fixado na sentença, o valor de indenizar, pois a extinção da punibi-
lidade não afeta a pretensão indenizatória.
• Crimes hediondos
A Lei 8072/90 em seu art. 2º, II vedava a liberdade provisória, o que sempre
gerou enorme divergência quanto à sua constitucionalidade.
Com o advento da Lei 11.464/07 e a alteração legislativa não se proíba a
concessão de liberdade provisória para quem fosse preso em flagrante pela prática
de crime hediondo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e terrorismo, o que
não significa que a concessão da liberdade provisória é obrigatória, já que, estando
presentes os requisitos da prisão preventiva, esta poderá ser decretada.
capítulo 4 • 161
• Tráfico ilícito de entorpecentes
A Lei 11343/11, prevê em seu art. 44 que “os crimes previstos nos arts. 33,
caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça,
indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em res-
tritivas de direitos”.
Entretanto essa vedação à liberdade provisória era incompatível com o dispos-
to na Lei 11.464/07.
No julgamento do HC 104339/SP, o Supremo Tribunal Federal, numa in-
terpretação conforme à Constituição, entendeu que a expressão “liberdade pro-
visória” contida no caput do art. 44 da Lei de Drogas era inconstitucional, pois
estabelecia um tipo de regime prisional provisório obrigatório, no qual a liberdade
seria uma exceção e não a regra , não havendo mais nenhuma restrição à sua
concessão.
• Estatuto do desarmamento
O artigo 21 do Estatuto do desarmamento – Lei 10826/03, foi declarado
inconstitucional no julgamento da ADIN 3112-1, em 02/05/2007, por ser pelos
motivos já analisados, flagrantemente inconstitucional.
capítulo 4 • 162
A aplicação dessas medidas deve ser priorizada, utilizando-se a prisão preven-
tiva como último recurso.
De acordo com Aury Lopes Jr. (2016, p. 674/675) essas medidas podem
ser aplicadas:
Nos crimes dolosos cuja pena máxima é superior a 4 anos e exista o fumus commissi
delicti e o periculum libertatis, poderão ser utilizadas as medidas cautelares diversas ou,
se, inadequadas e insuficientes, a prisão preventiva;
Nos crimes dolosos cuja pena máxima é inferior ou igual a 4 anos e exista o fumus
commissi delicti e o periculum libertatis, somente poderá haver decretação de medida
cautelar diversa;
Nos crimes dolosos cuja pena máxima é inferior ou igual a 4 anos e exista o fumus
commissi delicti e o periculum libertatis e exista uma das situações do art. 313, II ou
III, CPP.
Da mesma forma que não é cabível a prisão preventiva para crimes culposos,
não deve caber medida cautelar diversa.
Os mesmos princípios, que você já estudou – jurisdicionalidade, motivação,
provisionalidade, provisoriedade, proporcionalidade e excepcionalidade - que se
aplicam às prisões cautelares devem também ser aplicados às medidas alternativas.
• Momento de aplicação
As medidas cautelares são passíveis de aplicação a qualquer tempo, tanto na
fase investigatória como na processual.
Como a lei não prevê prazo de durabilidade da medida, é necessário se obser-
var que não perdurar se cessados os motivos que a ensejaram. Portanto, a dilação
no tempo depende do fator necessidade.
Dependendo do caso concreto, a cautelar poderá ser substituída ou cumulada
com outra, ou mesmo revogada, caso não mais se faça necessária, não havendo
impedimento, caso haja necessidade, de sejam novamente aplicadas.
Podem, também, ser aplicada em conjunto com a liberdade provisória,
no momento da homologação da prisão em flagrante pelo juiz, como medida
de contracautela.
capítulo 4 • 163
Como a periodicidade é aberta, fica a critério do juiz estabelecer se o compa-
recimento deve ser semanal, quinzenal, mensal, mas tem-se adotado, em regra, o
comparecimento mensal.
Para a fixação da periodicidade deve-se agir com razoabilidade, de forma a não
prejudicar a rotina de trabalho do indivíduo, e adequada a sua condição pessoal.
II. Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando,
por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado
permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
A vedação não pode ser dissociada de fatos, há de haver certa revestida de
plausibilidade. Não pode ser uma proibição ampla e generalizada, pois acarretaria
severas restrições ao seu direito de ir e vir e convivência social.
III. Proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela
permanecer distante;
Observe que a proibição não é apenas em relação ao contato físico, veda-se
qualquer tipo de contato – telefônico, e-mail, whatsapp etc.
A proibição deve o critério da proporcionalidade, guardando relação com o
fato delituoso, para se evitar a violência físico-psíquica.
capítulo 4 • 164
(não é suficiente mera conjectura, mas possibilidade concreta da prática de novas
infrações caracterizada pelo histórico/circunstâncias dos fatos e/ou pelos antece-
dentes do infrator). Em face do status de inocência, e por ser mera suspensão, o
subsídio continuará sendo provido” (TÁVORA; ALENCAR, 2013, p. 669).
VII. Internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes pra-
ticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem
ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver
risco de reiteração;
Busca-se com esse dispositivo uma medida cautelar de segurança. O grande
problema é o que já ocorre nas medidas de segurança, a falta de limitação do prazo
para a internação. Além disso, a urgência da medida impede um exame de insa-
nidade cauteloso, decreta-se a medida pela aparência e quando, tempos depois o
exame é realizado, constata-se que não havia nenhum perigo. Deve-se entender,
que essa medida deve ser evitada, até porque se o réu tornou-se inimputável du-
rante o tramitar da ação, esta ficará suspensa e a medida terá que ser revogada, sob
pena de tornar definitiva uma medida cautelar.
capítulo 4 • 165
Caso concreto
Flávio foi preso em flagrante delito por estar portando três papelotes de cocaína, que
alegou ser para uso próprio, nas proximidades de uma casa noturna.
Conduzido à Delegacia, o Delegado lavrou o APF, indiciando Flávio pela prática do crime
previsto no art. 33 da Lei 11.343/06, representando ao juízo pela conversão da prisão
em flagrante em prisão preventiva.
O advogado de Flávio ajuizou junto à 1ª Vara Criminal de Nova Friburgo pedido de li-
berdade provisória, que foi negado sob o argumento de que o art. 44 da Lei de Drogas
veda a concessão de liberdade provisória e este crime ser considerado inafiançável nos
termos do art. 5º, XLIII, da Constituição, sem indicação fundamentada dos requisitos do
art. 312, CPP, que ensejam a prisão preventiva.
Agiu de forma adequada o magistrado? Justifique sua resposta.
ATIVIDADES
01. (Juiz Substituto - TJ!MG!2009) Marque a alternativa CORRETA. A liberdade provisória
pode ser concedida no caso de:
a) Prisão em flagrante.
b) Prisão preventiva.
c) Prisão em flagrante viciado.
d) (Prisão temporária.
capítulo 4 • 166
03. Assinale a opção correta.
a) Os conceitos de flagrante preparado e esperado se confundem.
b) A prisão em flagrante delito somente poderá ser realizada dentro do período de 24h,
contadas do momento em que se inicia a execução do crime.
c) O estado de flagrante delito é uma das exceções constitucionais à inviolabilidade do
domicílio, nos termos da Constituição Federal.
d) No flagrante esperado a prisão é ilegal.
04. Como se sabe, a prisão processual (provisória ou cautelar) é a decretada antes do trân-
sito em julgado de sentença penal condenatória, nas hipóteses previstas em lei. A respeito
de tal modalidade de prisão, é correto afirmar que:
a) Em nosso ordenamento jurídico, a prisão processual contempla as seguintes modalida-
des: prisão em flagrante, preventiva, temporária, por pronúncia e em virtude de sentença
condenatória recorrível.
b) A prisão temporária tem como pressupostos a existência de indícios de autoria e prova
da materialidade, e como fundamentos a necessidade de garantia da ordem pública, a
conveniência da instrução criminal, a necessidade de garantir a futura aplicação da lei
penal e a garantia da ordem pública.
c) A prisão temporária não poderá ser decretada de ofício pelo Juiz.
d) São requisitos da prisão preventiva a sua imprescindibilidade para as investigações do
inquérito policial e o fato de o indiciado não ter residência fixa ou não fornecer elemen-
tos necessários ao esclarecimento de sua identidade.
capítulo 4 • 167
d) Em regra, a prisão temporária deve ter duração máxima de cinco dias. Tratando-se, no
entanto, de procedimento destinado à apuração da prática de delito hediondo, tal prazo
poderá estender-se para trinta dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e
comprovada necessidade.
RESUMO
Neste capítulo, você teve a oportunidade de conhecer as espécies de prisão cautelar
existentes em nosso ordenamento jurídico. Estudou as várias espécies de flagrante e pode
observar que o juiz só pode convertê-lo em prisão preventiva se houver representação do de-
legado ou requisição do MP. Compreendeu que para a decretação de uma medida cautelar,
seja ela restritiva da liberdade ou uma medida alternativa, os requisitos e pressupostos da
prisão preventiva devem estar presentes, sob pena de tornar a medida ilegal. Pode analisar
o instituto da liberdade provisória, compreendendo que a lei não pode vedar a sua conces-
são por ser flagrantemente inconstitucional. Viu também a importância da edição de uma
lei federal que regulamente a Audiência de Custódia, para que seja assegurado ao detido
de forma igualitária todos os seus direitos, evitando-se o abuso de prisões desnecessárias.
COMENTÁRIO
Caso concreto
De acordo com o entendimento que vem prevalecendo, não agiu corretamente o magis-
trado, pois a liberdade provisória indeferida com fundamento na vedação contida no art. 44
da Lei n.11.343/06, sem a presença das hipóteses do artigo 312 do Código de Processo
Penal não pode ser admitida. Quanto à inafiançabilidade, diante dos princípios da presunção
de inocência e do devido processo legal, não pode e não deve constituir causa impeditiva
da liberdade, até porque o que a lei proíbe é o arbitramento da fiança e não a concessão da
liberdade provisória.
Jurisprudência sugerida: HC 104339/SP – julgado em: 10/05/201. Relator
Ministro Gilmar Mendes .Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProces-
soAndamento.asp?numero=104339&classe=HC&origem=AP&recurso=0&tipoJulgamen-
to=M>.
capítulo 4 • 168
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MARQUES, Mateus. Sobre a implantação da audiência de custódia e a proteção de direitos
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Rodrigo (org.) Audiência de custódia: da boa intenção à boa técnica. E-book. Porto Alegre:
FMP, 2016. Disponível em: < http://www.fmp.edu.br/downloads/e-books/e-Book-AUDIENCIA_DE_
CUSTODIA.pdf> Acesso em 06. Mar.2017.
NICOLITT, André. Manual de Processo Penal. 2 ed, atual. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
PAIVA, Caio. Audiência de custódia e o processo penal brasileiro. Florianópolis: Empório do
Direito, 2015. p. 29.
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar. Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8 ed. rev.
atual. ampl. Salvador: Juspovdim, 2013.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, 2003. v.II/. p. 509.
capítulo 4 • 169
capítulo 4 • 170
5
Questões e
processos
incidentes
e medidas
assecuratórias
Questões e processos incidentes e medidas
assecuratórias
OBJETIVOS
• Entender que as questões prejudiciais condicionam o julgamento do mérito;
• Resolver o conflito de jurisdição (competência) entre os juízos, sejam positivos ou negati-
vos, indicando o órgão superior competente para a solução;
• Verificar que entre as causas de inimputabilidade, a doença mental gera a absolvição do
acusado, mas pelo sistema vicariante adotado pelo código penal, caberá a aplicação de me-
dida de segurança;
• Compreender que a dependência toxicológica do acusado pode influenciar na prática do
ato infracional, razão pelo qual não se deve aplicar pena privativa de liberdade, mas sim trata-
mento de recuperação da dependência química e como deve funcionar a perícia;
• Entender que o processo penal deve servir, também, como proteção ao interesse da vítima
garantindo, à mesma, efetividade em futura indenização pelos danos causados pelo autor do
fato infracional;
• Aplicar os princípios processuais constitucionais quando da incidência das medidas asse-
curatórias, identificando eventuais vícios.
capítulo 5 • 172
Eugênio Pacelli, (2017, p. 299) nos ensina que:
Podem ser decidias tanto na jurisdição penal, como São sempre decididas pelo juízo
na extrapenal, a depender do caso em concreto. criminal.
capítulo 5 • 173
Questões prejudiciais
PREJUDICIAIS
QUANTO AO SISTEMA
QUANTO AO CARÁTER QUANTO AO EFEITO
DE SOLUÇÃO
NÃO
HOMOGÊNEA HETEROGÊNEA ABSOLUTA RELATIVA DEVOLUTIVA
DEVOLUTIVA
CONCEITO
As questões prejudiciais dizem respeito, essencialmente, ao mérito da causa, influindo,
diretamente, na natureza da sentença a ser proferida pelo juiz. Assim, o resultado conferido
às questões prejudiciais, na medida em que refletirá na tipicidade da conduta, levará o juiz
a proferir uma sentença necessariamente absolutória (se atípico o fato) ou o possibilitará
exarar decisão condenatória (caso seja típica a conduta praticada e estejam presentes os
demais elementos configuradores da ilicitude e da culpabilidade) ( AVENA, 2017, p. 308).
capítulo 5 • 174
(tipicidade), resolvem-se no próprio juízo criminal, de forma quase que automáti-
ca, na ocasião da sentença”. (AVENA, 2017, p. 310)
Por sua vez, as questões prejudiciais heterogêneas ou perfeitas são as que
são julgadas fora da jurisdição da causa principal, isto é, “a respectiva solução
judicial, como regra, não é da competência do Juiz Criminal, e sim da jurisdição
cível”. (PACELLI, 2017, p. 300)
EXEMPLO
1. No curso de ação penal privada por crime de calúnia, é oposta à exceção da verdade
pelo querelado. Assim, antes de decidir pela condenação ou pela absolvição, obrigatoria-
mente o juiz deverá analisar a procedência ou não da exceção citada, pois se a exceção for
capítulo 5 • 175
procedente, a conduta do querelado será atípica, pois considerada verdadeira a afirmação
que motivou a instauração do processo criminal, o que implicaria na absolvição do querelado.
Nesta hipótese, estamos diante de uma questão prejudicial homogênea não
devolutiva.
2. Alguém, denunciado por bigamia, alega que o primeiro casamento foi nulo. Nesse caso,
a suspensão do processo criminal é obrigatória até a decisão definitiva no juízo cível quanto
à validade do primeiro matrimônio, não importando se já existe ou não ação civil de nulidade
de casamento deduzida naquela esfera.
Trata-se de uma questão prejudicial heterogênea devolutiva absoluta.
3. O acusado foi denunciado por estelionato, sob a forma de venda de coisa alheia como
própria. Em sua defesa, alega ter adquirido a propriedade do bem alienado pelo decurso do
tempo, informando a existente ação de usucapião ajuizada no juízo cível. Nesse caso, o juízo
criminal terá a faculdade de suspender ou não o processo penal, já que o objeto da questão
prejudicial não concerne ao estado das pessoas.
Como se observa, é uma questão prejudicial heterogênea devolutiva relativa.
QUESTÃO PROCESSO
PREJUDICIAL PRINCIPAL
capítulo 5 • 176
• Da Suspensão obrigatória do processo
Satisfeitos tais pressupostos o juiz penal determinará, de ofício, ou a requeri-
mento das partes, a suspensão do curso do processo penal, com arrimo no art. 94
do CPP, remetendo as partes ao juízo cível, a fim de que providenciem a solução
da questão. Enquanto o juízo cível não resolver a controvérsia, o processo penal
ficará estacionário.
• Da Prescrição
Não correrá o prazo prescricional nesses casos, conforme art. 116, CP. Após
a determinação pelo juiz do prosseguimento da ação, o prazo prescricional volta a
fluir de onde parou.
• Da Intervenção do MP
Uma vez suscitada a prejudicial, o juiz penal, se a reputar séria e fundada,
remeterá as partes ao juízo cível, para que procurem uma solução.
A regra do parágrafo único do art. 92 indica que o MP poderá intervir no
feito apresentando a ação civil ou dando continuidade à mesma, caso o crime seja
de ação penal pública e seja necessária a sua intervenção
Em caso de ação penal privada, somente a parte poderá propor ação no cível e
dar-lhe regular andamento, não o Ministério Público, de acordo com o dispositivo
legal. No entanto, a questão vem gerando controvérsia doutrinária:
Neste caso, há duas correntes: uma, no sentido de que nada há a ser feito, pois a lei
prevê a legitimação ministerial para o impulsionamento da ação civil apenas quando
o crime apurado for sujeito à ação penal pública. Outra, no sentido de que, caso seja
necessário, poderá o querelante (particular) ajuizar ação civil para discutir, o mais breve
possível, a questão prejudicial obrigatória que importou em suspensão do curso da
ação penal. Embora não concordemos com esta última posição, reconhecendo um
certo paradoxo permitir ao querelante, como particular, imiscuir-se em ação de estado
pertinente à pessoa do réu, entendemos, também, não ser razoável que permaneça a
ação penal privada suspensa indefinidamente, caso o acusado, simplesmente, omita-
se em promover as providências cabíveispara o desiderato da ação cível visando à
capítulo 5 • 177
decisão da questão prejudicial que motivou a suspensão da lide penal, ainda mais le-
vando em conta que se está diante de hipótese de suspensão obrigatória. Pensamos,
assim, que mesmo em se tratando de crimes de ação penal privada deve ser facultado
ao Ministério Público promover a ação civil ou dar prosseguimento à que tiver intenta-
do o réu no caso de sua inércia em fazê-lo. Afinal, não se pode ignorar que o Parquet
intervém na ação penal privada na condição de fiscal da lei, manifestando-se em to-
dos os seus termos. Logo, possui interesse em evitar manobras protelatórias do réu.
Quanto à circunstância de ser explícito o art. 92, parágrafo único, do CPP, autorizando
apenas ao Ministério Público tomar a iniciativa lá prevista quando se tratar de crime
de ação pública, pensamos que, na atualidade, deve-se deixar de lado o preciosismo
linguístico, pois acima disso está o interesse maior na efetiva realização da política
criminal, evitando-se a impunidade do querelado. (AVENA, 2017, p. 312)
• Da suspensão do processo
Atendidos os pressupostos o juiz poderá (faculdade) suspender o curso da ação
penal, determinando, na mesma decisão, um prazo dentro do qual o processo
deverá ficar paralisado.
capítulo 5 • 178
Caso não seja a controvérsia dirimida pelo juízo cível no prazo apontado pelo
juiz criminal, este poderá dilatar o prazo, desde que observe não ter sido o excesso
de prazo causado pelas partes.
• Da Prescrição
Também não correrá a prescrição enquanto o processo estiver suspenso, à
espera da decisão do cível.
• Da intervenção do MP
O membro do MP que estiver oficiando no processo-crime, em se tratando
de crime de ação pública, e com escora no §3º do art. 93 do CPP, estará legiti-
mado a intervir imediatamente na causa cível, a fim de promover-lhe o melhor
andamento.
• Recurso
O §2º, do art. 93 do CPP dispõe que não caberá recurso do despacho que
denegar a suspensão do processo. Caberá, porém, recurso em sentido estrito do
despacho que determinar a suspensão (art. 581, XVI, CPP).
capítulo 5 • 179
ATENÇÃO
Tratando-se da suspensão obrigatória, caso o juiz não determine a suspensão, tratando-
se de crime punido com pena de prisão, pode-se impetrar habeas corpus; se o crime não for
punido com pena de prisão, em observação à Súmula 693, STF, pode-se fazer manejo do
mandado de segurança
Das exceções
Art. 396-A. Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que
interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas
pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação quan-
do necessário.
§1º. A exceção será processada em apartado, nos termos dos art. 95 a 112, deste
Código.
capítulo 5 • 180
A doutrina classifica as exceções, de acordo com seus efeitos em dilatórias
ou peremptórias.
EXCEÇÕES
DILATÓRIAS PEREMPTÓRIAS
São aquelas que dilatam o curso do São aquelas que, quando opostas e
processo, sem contudo extinguir o acolhidas, extinguem, encerram o
processo, como as exceções de processo, como a listipendência, a coisa
suspeição, impedimento e incompetência do julgada e a ilegitimidade da parte.
juízo.
ATENÇÃO
O acolhimento da exceção de ilegitimidade da parte, embora encerre o processo, não
impede a propositura de nova ação, como ocorre nas exceções de litispendência e coisa
julgada, que além de encerrar o feito, impedem, se acolhidas, a propositura de nova ação.
De acordo com Pacelli (2017, p. 304), “as causas de suspeição dizem respeito
a fatos e circunstâncias, subjetivos ou objetivos, que, de alguma maneira, podem
afetar a imparcialidade do julgador na apreciação do caso concreto”; o mesmo
raciocínio deve ser feito em relação às causas de impedimento.
Em relação às causas de suspeição, previstas no art. 254, CPP, Pacelli (2017,
p. 304) esclarece que estas causas “configuram situações da realidade externa ao
processo levado ao conhecimento do juiz”, ou seja, “em todas as situações, a ra-
zão da suspeição decorrerá de fato, evento, circunstâncias e convicções pessoais
cuja origem esteja fora do processo judicial em que se questiona a imparcialidade
do juiz.
capítulo 5 • 181
EXEMPLO
Se o juiz for inimigo capital do réu ou amigo íntimo da vítima (art. 254, I, CPP) , este fato,
que é externo ao processo, o torna suspeito para o julgamento porque afeta a sua imparcia-
lidade e, consequentemente, o sistema acusatório.
No que diz respeito às causas de impedimento – arts. 2512 e 253, CPP, estas
“referem-se a fatos e/ou circunstâncias atinentes e intimamente ligados ao próprio
processo submetido inicialmente à jurisdição do juiz”, ou seja, “a influência dos
fatos e/ou circunstâncias refere-se diretamente ao processo”, não é externo ao pro-
cesso, como na suspeição. (PACELLI, 2017, p. 304).
EXEMPLO
Se o juiz era membro do Ministério Público e logo após o oferecimento da denúncia era
investido no cargo de juiz e designado para atuar na vara criminal em que o processo tramita,
deve se dar por impedido, na forma do art. 252, II, CPP, pois essa circunstância refere-se
diretamente ao processo.
capítulo 5 • 182
O art. 98, CPP estabelece que “quando qualquer das partes pretender recusar
o juiz, deverá fazê-lo em petição assinada por ela própria ou por procurador com
poderes especiais, aduzindo as suas razões acompanhadas de prova documental ou
do rol de testemunhas”.
Por tratar-se de uma arguição severa, o entendimento jurisprudencial que tem
prevalecido é de que se exige a procuração com poderes especiais mesmo para os
assistidos da defensoria Pública.
Nesse sentido:
Interposta a exceção:
a) O juiz pode acolhê-la, reconhecendo a sua suspeição. Nessa hipótese
afasta-se do feito, remetendo o processo ao juiz tabelar, seu substituto, de
acordo com as normas de organização judiciária.
b) O juiz não reconhecendo sua suspeição, discordando das razões da par-
te excipiente, mandará processar a exceção em autos apartados, apresentan-
do resposta em três dias (art. 100, CPP), podendo indicar provas e arrolar
testemunhas, remetendo os autos ao Tribunal em 24 horas.
capítulo 5 • 183
ATENÇÃO
O juiz pode e deve reconhecer de ofício sua suspeição ou impedimento, através de deci-
são fundamentada, remetendo o processo ao juiz substituto.
Esquematizando:
Embora não haja previsão expressa no CPP, o art. 145, § 1º do CPC, pode
ser usado por analogia para que o juiz criminal se declare suspeito por motivo de
foro íntimo, sem precisar declarar o motivo que o torna suspeito.
capítulo 5 • 184
Outros sujeitos passivos da exceção
O CPP estabelece que, além do juiz de 1º Grau, outros sujeitos podem ser
arguidos de suspeitos.
De acordo com o art. 103, CPP podem se declarar suspeitos, impedidos os
Ministros dos Tribunais Superiores (STF, STJ) e os desembargadores dos Tribunais
de 2º Grau, ou contra eles ser oposta a exceção.
O art. 104 traz a suspeição do membro do Ministério Público, pois “atuando
como parte ou como custos legis, exige-se dos membros do Ministério Público a
atuação desvinculada de motivações de ordens subjetiva e objetiva”, conforme
dispõe o art. 258, CPP (AVENA, 2017, p. 325). Nessa hipótese, o juiz ouvirá o
Promotor de Justiça e decidirá, podendo antes admitir a produção de provas no
prazo de três dias. Dessa decisão não se admite recurso.
ATENÇÃO
O art. 107, CPP dispõe que “Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos
atos do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal”.
Embora haja uma contradição na norma, pois de um lado o delegado pode se declarar
suspeito e de outra a parte não pode arguir a suspeição, o entendimento que prevalece é no
sentido que expõe Pacelli (2017, p. 307): “A razão de ser da norma é que a autoridade policial
não exerce atividade jurisdicional, que vem a ser o objeto da tutela das apontadas exceções”.
capítulo 5 • 185
À luz da Constituição, não nos parece coadunar o referido dispositivo com o preceito
constitucional da ampla defesa e, nem tampouco, com o próprio CPP, pois este traz a possi-
bilidade de arguição de suspeição dos peritos, intérpretes, serventuários ou funcionários da
justiça, que também não exercem função jurisdicional.
capítulo 5 • 186
O art. 109 do CPP autoriza que o juiz declare a incompetência, em qual-
quer momento, seja incompetência relativa, seja incompetência absoluta. Dessa
foram, diferentemente do Processo Civil, a Súmula 33 do STJ não é aplicada ao
Processo Penal.
Procedimento
capítulo 5 • 187
Das exceções de litispendência, de ilegitimidade da parte e de coisa julgada
Da exceção de litispendência
ATENÇÃO
A exceção de litispendência é somente em relação aos processos em curso ao mesmo
tempo, simultâneos. Caso sejam instaurados dois inquéritos policiais, o meio cabível para
extinguir o segundo inquérito é o habeas corpus trancativo.
Esta exceção tem por finalidade garantir a regularidade dos requisitos indis-
pensáveis ao exercício da ação penal, especificamente no que se refere à legitimi-
dade ativa e passiva.
A exceção abrange a ilegitimidade ad causam (o ofendido a ajuíza ação penal
de iniciativa pública) e a ilegitimidade ad processum (o menor figurando como
réu no processo penal).
O reconhecimento da ilegitimidade de parte acarreta a anulação do processo
desde o início (art. 564, II, do CPP).
capítulo 5 • 188
É possível o oferecimento de outra denúncia ou queixa, desde que sanado o
equívoco anterior, salvo se tiver ocorrido a decadência ou a prescrição.
LEITURA
Sugestão de Leitura: A Coisa Julgada
No Processo Penal Brasileiro Como Ins-
trumento de Garantia de Paulo Rangel.
EXEMPLO
Num processo em que o ofendido propõe ação penal privada subsidiária da pública sem
que o prazo do Ministério Público tenha se esgotado é parte ilegítima para a propositura da
capítulo 5 • 189
ação. Reconhecendo a ilegitimidade da parte, o juiz extingue o processo sem análise de mé-
rito. Expirado o prazo recursal, essa decisão transita formalmente em julgado. Nada impede,
porém, que o ofendido, ofereça nova queixa, se o Ministério Público não oferecer a denúncia
no prazo previsto.
EXEMPLO
O ofendido, num crime de ação penal privada, ofereceu a queixa após expirado o prazo
legal. O acusado em sua defesa, preliminarmente, alega que ocorreu a decadência, pugnando
pela extinção da punibilidade. O juiz acolhe o pedido, declarando extinta a punibilidade pela
ocorrência da decadência – art. 107, IV, CP. Embora o juiz não tenha analisado o mérito,
condenando ou absolvendo o acusado, esta decisão fará coisa julgada formal e material,
pois a extinção da punibilidade tem força de mérito, impedindo que nova ação seja proposta.
capítulo 5 • 190
Do procedimento dessas exceções
Dos recursos
capítulo 5 • 191
De acordo com Pacelli (2017, p 311):
Quer se trate de conflito entre competências territoriais, quer se trate de conflito en-
volvendo a competência em razão da matéria ou aquela fixada por prerrogativa de
função, o incidente é o mesmo, tratado no Código de Processo Penal como caso de
conflito de jurisdição. Já a Constituição Federal adota terminologia distinta, preferindo
referir-se aos conflitos de competência (art. 105, I, e, CF), independentemente da
matéria neles veiculada.
A controvérsia a que alude o citado dispositivo (art. 114, II) é aquela a respeito exata-
mente dos critérios de fixação de competência a partir da constatação da existência
da conexão ou da continência, caso do disposto no art. 78 do CPP, bem como dos
capítulo 5 • 192
dispositivos constitucionais pertinentes, quando se tratar da aplicação das regras do
juiz natural.
Do mesmo modo que em relação à unidade de juízo e à reunião de processos, a con-
trovérsia poderá surgir também sobre a necessidade de separação de processos, en-
volvendo casos de separação obrigatória ou facultativa, conforme o disposto nos arts.
79 a 82 do CPP. Poderá surgir até mesmo acerca da existência ou não de conexão e/
ou continência, do que resultaria a separação ou a necessária reunião dos processos.
É aí que se fará necessária a solução judicial do conflito, mediante a aplicação das
regras procedimentais do Código de Processo Penal e das normas constitucionais
relativas à competência para o julgamento do denominado conflito de jurisdição ou
conflito de competência. (PACELLI, 2017, p. 312)
capítulo 5 • 193
Não há que se falar em conflito de jurisdição entre o STF e qualquer tribunal,
pois o STF, de acordo com o art. 117 do CPP poderá se valer do incidente da
avocatória para restabelecer sua competência, sempre que exercida por qualquer
outro órgão jurisdicional.
No entanto, a Constituição Federal traz a previsão de procedimento distinto,
previsto no art. 102, I, CF, que é a reclamação, que também pode ser utilizado
pelo STJ – art. 105, I, f, CF, atualmente regido pelos artigos 988 a 993, do
Código de Processo Civil.
Legitimidade e Procedimento
De acordo com o art. 115, CPP, o conflito de competência poderá ser reque-
rido pela parte interessada, pelos membros do Ministério Público e pelos juízes,
mediante representação. A requisição ou a representação deve conter a exposição
dos fundamentos de fato, devendo ser juntados os documentos que comprovam
a alegação.
Tratando-se de conflito negativo, de acordo com o art. 116, § 1º, CPP, o
conflito pode ser suscitado nos próprios autos. Tratando-se de conflito positivo, a
atuação deve ser em autos apartados e distribuído o feito, o relator pode imediata-
mente determinar a suspensão do processo - art. 116, §2º, CPP.
Após serão requisitadas e prestadas as informações pelas autoridades judiciá-
rias em conflito, e, após, ouvir o Ministério Público, o tribunal resolverá o inci-
dente – arts. 116, §§ 3º, 4º e 5º, CPP.
De acordo com o art. 116, § 6º, CPP, “proferida a decisão, as cópias necessá-
rias serão remetidas, para a sua execução, às autoridades contra as quais tiver sido
levantado o conflito ou que o houverem suscitado”.
Do conflito de atribuição
capítulo 5 • 194
pelas autoridades conflitantes, sejam elas autoridades do Judiciário, sejam mem-
bros do Ministério Público”.
Em outras palavras, se a atividade for tipicamente jurisdicional, teremos um
conflito de competência, ao passo que se for meramente administrativa, teremos
um conflito de atribuição.
Neste tópico você vai estudar os incidentes processuais que necessitam ser
dirimidos no decorrer do processo.
capítulo 5 • 195
Do incidente de falsidade
ATENÇÃO
O incidente de falsidade não se refere ao documento que constitui o objeto material do
crime, arts. 297 e seguintes, CP, mas sim aqueles documentos como meio probatório que
possam interferir na apreciação da causa.
O documento que constitui o objeto material da infração “deve, necessariamente, ser
periciado, independentemente da arguição por parte da defesa, para fins de comprovação da
existência do crime, não como incidente, mas como questão principal, ligada à própria
materialidade do delito” (Pacelli, 2017, p. 329). (Grifo nosso)
Procedimento:
• A falsidade será arguida por escrito, sendo o requerimento assinado pela
própria parte, ou por procurador com poderes especiais e dirigido ao juiz da causa
principal.
capítulo 5 • 196
• O juiz intimará a parte contrária para que no prazo de 48horas se manifeste
sobre o incidente, contestando ou não a impugnação do documento.
• Caso a parte confesse a falsidade, mesmo assim deverá o juiz, de ofício,
determinar a produção de diligências para a sua averiguação.
• Caso haja a contestação, o juiz intimará as partes para que cada uma, no
prazo de 03 dias, prove as suas alegações, a não ser que as provas com as quais as
partes desejem fortalecer as suas alegações sejam grafoscópicas (art. 174 do CPP),
cuja produção demande de tempo.
• Colhidos os elementos de prova, deverá o juiz prolatar a decisão, que será
recorrível via recurso em sentido estrito (art. 581, XVIII do CPP).
• Com o trânsito em julgado, será desentranhado dos autos o documento
falso, caso seja verdadeiro, ali permanecerá.
IMPORTANTE
Faz coisa julgada material a decisão prolatada no incidente? O que acha?
Conforme regra do art. 148 do CPP, a decisão prolatada no processo de apuração de
falsidade documental não faz coisa julgada material em ulterior processo penal ou civil, mas
formal, ou seja, a decisão é precária, com força apenas para aqueles autos em que se avalia
a força probante do documento.
Tanto é assim que pode haver a aplicação no disposto no art. 145, IV,CPP: “se reco-
nhecida a falsidade por decisão irrecorrível, mandará desentranhar o documento e remetê-lo,
com os autos do processo incidente, ao Ministério Público”.
capítulo 5 • 197
• Legitimados para instaurar o incidente - art. 149, CPP:
O juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público; defensor ou cura-
dor do acusado; ascendente, descendente, irmão ou cônjuge.
COMENTÁRIO
Por tratar-se de evidente interesse público, há entendimentos de que o rol não é taxativo.
Nesse sentido:
O rol de legitimados anteriormente mencionado não é (nem pode ser) taxativo, diante
do evidente e eminente interesse público na apuração de tal questão. Por isso, pare-
ce-nos perfeitamente possível que qualquer pessoa interessada, sobretudo aquelas
sob cujos cuidados ou guarda (ainda que informal) esteja o acusado (ou indiciado),
está autorizada a provocar a instauração do incidente de insanidade mental. (PACELLI,
2017, p. 330)
• Procedimento
Instaurado o incidente em autos apartados, o juiz dará curador ao réu; o pro-
cesso ficará suspenso, podendo haver diligências de urgência, as partes apresentam
os quesitos, o perito tem, em regra 45 dias para apresentação do laudo, podendo
ser prorrogado. Com a apresentação do laudo, os autos que estavam apartados
serão apensados ao processo principal.
• Do resultado do exame e seus efeitos
O resultado do exame pode ser em três sentidos:
a) O acusado não tem qualquer comprometimento mental.
Efeito: O processo retoma seu curso normal, sendo realizada a ins-
trução, para, ao final, haver uma decisão de mérito, condenando ou
absolvendo o acusado.
b) O acusado era, ao tempo da infração, inimputável (total ou parcialmente)
Efeito: Prosseguimento do feito, com nomeação de curador para
decidir sobre a aplicação de medida de segurança (art. 96 e seguin-
tes do CP). Nessa hipótese, temos duas situações distintas:
capítulo 5 • 198
1. O acusado era ao tempo da infração inimputável (incapacidade total) em que incide
o art. 26, caput, CP, isentando o réu de pena, significando que não poderá ser con-
denado. Sendo assim, o acusado será absolvido, de acordo com o art. 386, VI, CPP,
podendo ser a absolvição própria (sem a imposição de medida de segurança) ou impró-
pria (com a imposição de medida de segurança), de acordo com o art. 386, parágrafo
único, inciso III, CPP.
2. O acusado era ao tempo da infração semi-imputável, ou seja, possuía uma capaci-
dade parcial de discernimento, aplicando-se o art, 26, parágrafo único, CP, que deter-
mina uma redução de pena de um a dois terços, caso haja a condenação.
ATENÇÃO
O entendimento majoritário é de que esta medida ofende o princípio da presunção de
inocência- art. 5º, LVII, CF, pois há uma constrição da liberdade sem que haja uma conde-
nação. Podendo-se afirmar que o referido dispositivo não foi recepcionado pela constituição.
Portanto, não se pode mais impor a internação do acusado em manicômio judicial ou esta-
belecimento similar.
capítulo 5 • 199
ATENÇÃO
De acordo com entendimento jurisprudencial já consolidado a medida de segurança não
pode perdurar mais do que limite de pena privativa de liberdade imposta.
• Recursos
Da decisão que rejeita a instauração do incidente não cabe recurso. Todavia, é
cabível é a impetração de habeas corpus contra ela.
Caso a insanidade ocorra durante a execução, da decisão que converte a pena
privativa de liberdade em medida de segurança, o recurso é o de agravo na execu-
ção - art. 197, LEP.
Art. 45. - É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, pro-
veniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão,
qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Art. 46 - As penas podem ser reduzidas de um terço a dois se, por força das circuns-
tâncias previstas no artigo 45 desta lei, o agente não possuía ao tempo da ação ou da
omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se
de acordo com esse entendimento.
capítulo 5 • 200
Entretanto, de acordo com entendimento do STJ, não é a mera constata-
ção da dependência química do acusado suficiente para afastar de imediato sua
imputabilidade:
Art. 45- Parágrafo único. Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial,
que este apresentava, à época do fato previsto neste artigo, as condições referidas no
caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminhamento para
tratamento médico adequado.
capítulo 5 • 201
Do incidente de restituição de coisas apreendidas
Busca é a diligência que se faz para encontrar o que se procura, havendo êxito,
procede-se à apreensão. Daí o nome: busca e apreensão.
É bastante comum que durante o inquérito policial ou o processo penal que
objetos sejam apreendidos. Esses objetos (coisas) apreendidos devem seguir o in-
quérito ou o processo enquanto tiverem relevância – art. 11 e art. 118, CPP, pois
pode haver necessidade, por exemplo, da realização de uma perícia. Não sendo
mais necessários e não se tratando de objeto ilícito poderão ser restituídos a quem
de direito, surgindo assim o incidente para a restituição de coisas apreendidas.
A restituição de coisa apreendida está prevista no CPP, arts. 118 a 124, e
também Lei Antidrogas e na Lei de Lavagem de Capitais.
O art. 119, CPP veda a restituição em algumas hipóteses.
Caso as coisas apreendidas façam parte do rol do art.91, II, “a” do CP (ins-
trumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, por-
te, uso ou detenção constitua fato ilícito), havendo sentença condenatória, com
trânsito em julgado, passarão para a União, que as venderá em leilão público,
remetendo tais valores ao Tesouro Nacional (art. 121, c/c 133, CPP).
Caso haja sentença absolutória, de impronúncia ou extinção de punibilidade,
os objetos descritos pela regra do art, 91, II, “a” e “b” do CP não poderão ser
restituídos, salvo se pertencerem a lesado ou terceiro de boa-fé.
Se os instrumentos do crime não se amoldarem à alínea “a” do inc. II do art.
91, CP, nada impedirá que sua restituição se dê ao criminoso e, com muito mais
sentido, ao lesado ou possuidor de boa-fé.
capítulo 5 • 202
EXEMPLO
Caso alguém venha a praticar um homicídio com uso de arma de fogo, para que esta seja
devolvida, necessário se faz saber se o autor tinha seu registro e se a sentença foi absolutó-
ria, em caso positivo, é possível a restituição, desde que o juiz oficie o Sinarm, conforme art.
10 do Estatuto do Desarmamento - Lei. 10.826/03.
capítulo 5 • 203
b) Não haver dúvida quanto ao direito do reclamante;
c) Não haja sido feita a apreensão em poder de terceiro de boa-fé.
Não estando presentes as condições acima citadas, o pedido deverá ser feito à
autoridade judicial - art. 120, § 4º, CPP. Em ambos os casos, deverá ser ouvido
o MP - art. 120, §3º, CPP.
• Do recurso
Tratando-se de uma decisão que resolve o mérito do incidente, com força de
definitiva, o recurso cabível é o de apelação, com fulcro no art. 593, II, CPP.
capítulo 5 • 204
Do sequestro de bens
capítulo 5 • 205
• Dos embargos
O art. 129 refere-se àquele terceiro que é senhor e possuidor dos bens seques-
trados que não têm nenhuma relação com o acusado ou com o crime.
O terceiro a que se refere o art. 130, II é aquele que adquiriu onerosamente
os bens pelo preço de mercado, agindo de boa-fé.
Ao acusado cumpre demonstrar que os bens sequestrados não possuem ne-
nhuma relação com a infração penal.
Deve-se levar em consideração que à defesa nos embargos também devem ser
asseguradas todas as garantias de ampla defesa e contraditório, não se limitando
apenas aos fundamentos dos dispositivos legais, já que o art. 5º, LIV, CF prevê
que ninguém será privado de sua liberdade e de seus bens sem o devido processo
legal, sendo assegurados a todos os litigante e aos acusados em geral, o contraditó-
rio e a ampla defesa - art. 5ª, LV, CF.
O parágrafo único do artigo 130, CPP estabelece que “não poderá ser pronun-
ciada decisão nesses embargos antes de passar em julgado a sentença condenatória”.
De acordo com Aury Lopes Jr., trata-se de uma situação grave e complicada, pois a
lei estabelece uma suspensão obrigatória dos embargos até o trânsito em julgado da
sentença proferida no processo principal. Para o referido autor, seguindo o pensa-
mento de Tourinho Filho, o parágrafo único do artigo 130 não pode ser aplicado
ao artigo 129, devendo, nessa hipótese, os embargos serem julgados de plano, pois
“seria manifestamente injusto e desproporcional que perdurasse a constrição em re-
lação a alguém que nada tem a ver com o crime”. (LOPES JR., 2006, p. 728).
• Do levantamento do sequestro
O sequestro poderá ser levantado nas seguintes hipóteses:
99 Se a ação penal não for proposta no prazo de 60 dias a contar da efetivação
da medida;
99 Se o terceiro a quem foi transferido o bem prestar caução que assegure a
aplicação do disposto no art. 91, II, b, CP;
99 Se for julgada extinta a punibilidade ou absolvido o réu com sentença
transitada em julgado.
ATENÇÃO
Por tratar-se de medida cautelar, o sequestro pode ser revogado ou substituído a qual-
quer tempo.
capítulo 5 • 206
Tratando-se de sentença condenatória, conforme a regra do art. 133 do CPP,
transitada em julgado a sentença, o juízo determinará de ofício, ou a pedido da parte,
a avaliação e venda dos bens sequestrados em leilão público, sendo o dinheiro apurado
destinado ao Tesouro Nacional, o que não couber ao lesado ou terceiro de boa-fé.
EXEMPLO
A moto roubada constitui o corpo de delito, pois é objeto direto do crime. Nesse
caso, a medida cabível é a busca e a apreensão.
A moto adquirida com o dinheiro oriundo do tráfico de entorpecentes é produto
do crime, assim a medida adequada é o sequestro do bem.
Especialização de hipoteca
capítulo 5 • 207
“A hipoteca tem como alvo unicamente o patrimônio do suposto autor do fato crimino-
so, em atenção à sua responsabilidade civil. E por isso poderá recair sobre quaisquer
imóveis, desde que suficientes para garantir a futura recomposição patrimonial dos
danos, bem com o pagamento das custas e despesas processuais”. (PACELLI, 2017,
p. 325)
Do Arresto
capítulo 5 • 208
Se os bens arrestados forem coisas fungíveis e que se deterioram facilmente,
devem ser avaliados e levados a leilão, sendo o valor apurado depositado judicial-
mente, na forma do art. 137, § 1º, CPP.
Caso concreto
Gabriela está sendo processada porque, segundo a denúncia, teria praticado delito de
roubo. Há prova segura nos autos para se afirmar que a ré era imputável no momento
do delito. No entanto, após o recebimento da denúncia, mas antes da resposta à acusa-
ção, sobreveio à ré, no cárcere, doença mental comprovada em incidente de insanidade
mental, procedimento que suspendeu o curso do processo. Após a homologação das
conclusões dos peritos no incidente de insanidade mental, o juiz competente determi-
nou que o processo retomasse seu curso.
Em seguida, a DP apresentou resposta à acusação e o magistrado absolveu suma-
riamente a ré, impondo-lhe medida de segurança, uma vez que a doença mental que
a tornou inimputável era a única tese da defesa. Nessa situação, à luz do CPP, agiu
acertadamente o magistrado ao determinar o prosseguimento do processo e, ao final,
decretar a absolvição imprópria da acusada nos termos do pedido da defesa? Justifique
sua resposta.
Defensoria Pública – DPE/PE – CESPE/ 2015 – Adaptada
capítulo 5 • 209
ATIVIDADES
01. (Juiz Substituto - TJ!PI!CESPE/2012)- Assinale a opção correta a respeito de questões
e processos incidentes.
a) A decisão que acolhe incidente de falsidade documental faz coisa julgada em prejuízode
ulterior processo penal ou civil.
b) Viola o princípio do juiz natural o julgamento proferido na pendência de exceção de
suspeição do magistrado sentenciante.
c) A exceção de incompetência do juízo pode ser oposta, verbalmente ou por escrito,
noprazo de defesa.
d) Sendo o inquérito mero procedimento administrativo, não se pode opor suspeição às
autoridades policiais nem devem elas declarar-se suspeitas.
e) No CPP, as causas de impedimento e suspeição de magistrado judicial estão dispostas
de forma apenas exemplificativa.
capítulo 5 • 210
03. (Delegado de Polícia - AP/2010/FGV). Relativamente ao tema medidas assecuratórias,
analise as afirmativas a seguir.
I. O depósito e a administração dos bens arrestados ficam sujeitos ao regime do pro-
cesso civil.
II. Quando os bens arrestados forem coisas fungíveis e facilmente deterioráveis, serão
avaliados e levados a leilão público, depositando-se o dinheiro apurado, ou entregues
as coisas ao terceiro que as detinha, se este for pessoa idônea e assinar termo de res-
ponsabilidade.
III. Das rendas dos bens móveis arrestados poderão ser fornecidos recursos arbitrados
pelo juiz para a manutenção do indiciado e de sua família.
Assinale:
a) se somente a afirmativa I estiver correta.
b) se somente a afirmativa II estiver correta.
c) se somente a afirmativa III estiver correta.
d) se somente as afirmativas II e III estiverem corretas.
e) se todas as afirmativas estiverem corretas.
05. (Técnico da Procuradoria - Sem Especialidade- PGE-RO- FGV 2015) Luciana foi de-
nunciada pelo Ministério Público pela prática de um crime de furto de energia. O juiz em
atuação na Vara Criminal em que corre a ação penal é irmão do pai de Luciana. Ademais, o
serventuário da Justiça que atuaria na hipótese é devedor da acusada em razão de contrato
de locação. Considerando a situação narrada, é correto afirmar que:
a) o juiz deverá reconhecer seu impedimento, enquanto o serventuário poderá atuar na
ação penal;
b) o juiz deverá reconhecer sua suspeição, enquanto o serventuário poderá atuar na
ação penal;
capítulo 5 • 211
c) tanto o serventuário quanto o juiz poderão atuar na ação penal;
d) o juiz deverá reconhecer seu impedimento e ao serventuário são aplicáveis as prescri-
ções sobre suspeição do magistrado;
e) o juiz deverá reconhecer sua suspeição e ao serventuário são aplicáveis as prescrições
sobre suspeição do magistrado.
RESUMO
Neste capítulo você teve a oportunidade de compreender vários institutos que buscam
assegurar um processo justo, com a atuação imparcial do juiz, assegurando ao acusado as
garantias fundamentais. Aprendeu que. em certas situações, é necessária a determinação
das medidas assecuratórias visando não só a garantia da prova, mas também, a garantia de
uma indenização ao lesado pela responsabilidade civil em decorrência do ilícito penal, além
do estudo dos incidentes processuais.
COMENTÁRIO
Caso concreto
Neste caso, não agiu corretamente o magistrado, tendo em vista que a doença mental
sobreveio à infração. Assim, nos termos do art. 152, CPP, o processo deverá ficar suspenso
até que haja o restabelecimento da acusada, sob pena de violação do princípio da ampla
defesa.
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capítulo 5 • 212
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TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar. Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8 ed. rev.
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GABARITO
Capítulo 1
01. C 04. C
02. E 05. C
03. A
Capítulo 2
01. C 04. D
02. A 05. D
03. C
capítulo 5 • 213
Capítulo 3
01. B 04. B
02. A 05. D
03. C
Capítulo 4
01. A 04. C
02. D 05. D
03. C
Capítulo 5
01. C 04. B
02. E 05. D
03. E
capítulo 5 • 214
ANOTAÇÕES
capítulo 5 • 215
ANOTAÇÕES
capítulo 5 • 216