Livro Neoliberalismo
Livro Neoliberalismo
Livro Neoliberalismo
Eficiencia e equidade
Os eixos centrais da economia pública são a
eficiência e a equidade. A eficiência é
sempre uma questão positiva. A equidade é
sempre na questão normativa.
A conflitualidade existente entre a eficiência
e equidade torna a concepção de políticas
públicas uma questão delicada, demasiado
assente em valores e ideologias e dando
pouca atenção aos conhecimentos
científicos.
Rawls e o Estado Social e
Nozick e o Estado Mínimo
Rawls apresentou uma defesa neocontratualista e
altamente sofisticada da justiça social,
implicando uma visão alargada da igualdade de
oportunidades e da distribuição do rendimento e
da riqueza. Nozick postula uma alternativa
assente em direitos individuais de propriedade
que funcionam como um entrave moral a todas
as formas de distributivismo.
Se o pensamento de Rawls pode ser lido como
uma justificação do estado social, o de Nozick
consiste numa defesa explícita de um estado
mínimo que não procura corrigir as desigualdades
sociais
O egoísmo ético de base
biológica como fundamento
Nozick sempre fora seduzido pela tradição libertaria
americana, especialmente através da obra e do
pensamento de Ayn Rand. Esta autora fazia assentar
a defesa do libertarismo num egoísmo ético de base
biológica. Segundo Rand, é o próprio ―direito à
vida‖ dos organismos racionais que leva a uma ideia
de liberdade como não interferência de carácter
absoluto e, daí, ao estado mínimo como aquele tipo
de estado que melhor assegura essa liberdade de
carácter negativo. Mantendo embora o ideário
libertarista de Rand, Nozick considera que o seu
biologismo não fornece uma base sólida para a
defesa do estado mínimo e que este necessita de
uma justificação diferenciada.
Anarquia
A primeira questão que um autor libertário
como Nozick tem de enfrentar é
precisamente a de saber se o estado se
justifica de todo, ou se seria preferível a sua
ausência, isto é, a anarquia no sentido
político, não etimológico. A primeira parte de
Anarquia, Estado e Utopia trata
precisamente deste problema. Embora sem
antecipar toda a riqueza da argumentação
nozickiana, importa aqui esboçar o essencial
do argumento que conduz à preferência
pelo estado mínimo em relação à anarquia.
Dtos morais pré-políticos
Nozick propõe-nos uma experiência mental que
consiste em imaginar o estado de natureza de Locke,
no qual não existe ainda estado civil mas apenas
indivíduos dotados de direitos morais pré-políticos. Este
ponto de partida é absolutamente fulcral na economia
do pensamento nozickiano e não seria possível
entender a sua obra política sem nele atentar. Como
escreve Nozick , ―os indivíduos têm direitos e há coisas
que nenhuma pessoa ou grupo lhes pode fazer (sem
violar os seus direitos). Estes direitos são de tal maneira
fortes e de grande alcance que levantam a questão do
que o estado e os seus mandatários podem fazer, se é
que podem fazer alguma coisa.”
Estado da natureza
Os direitos pré-políticos em Nozick devem ser
vistos, na linha de Locke, como uma decorrência
do direito à propriedade de si mesmo. Cada
indivíduo é dono de si próprio — e não
propriedade de outrem — e isso implica o direito
à vida, à liberdade de fazer o que quiser consigo
mesmo, com o seu corpo e os seus talentos
pessoais, e ainda o direito aos haveres ou à
propriedade no sentido mais estrito, na medida
em que ela esteja de acordo com a justiça). Se
partirmos, então, de um estado de natureza com
indivíduos dotados de direitos concebidos em
termos de autopropriedade, será que em algum
momento será necessário o estado mínimo?
O Mecanismo da mão invisível
Para responder a esta questão, Nozick parte da
constatação, já feita por Locke, de que o estado de
natureza encerra em si uma considerável insegurança. Os
indivíduos dotados de direitos morais não têm qualquer
entidade à qual recorrer caso esses direitos sejam violados.
Por isso só podem fazer justiça pelas próprias mãos ou, na
linguagem lockiana, são os próprios a ter o direito de
executar a lei da natureza que protege a propriedade
individual. Será então necessário ultrapassar a instabilidade
que daqui decorre. A solução encontrada por Locke era a
celebração de um contrato social que permitia legitimar as
instituições do estado civil. Nozick segue uma estratégia algo
diferente. Prefere recorrer ao contrafactual de uma
evolução hipotética a partir do estado de natureza e sem
recurso ao artifício do contrato, mas tendo em conta o valor
moral dos direitos individuais. Por outras palavras, pensa que,
partindo do estado de natureza formado por indivíduos
proprietários de si mesmos, haveria um deslizamento natural
para algo diferente e que, através de um mecanismo de
―mão invisível‖, daria lugar ao estado civil.
Estado Ultramínimo
Nozick imagina que os indivíduos começam por
organizar-se em associações protetoras com vista a
garantir a sua própria segurança. Esta é uma primeira
forma concertada de defesa dos direitos individuais.
Mas, como os membros das associações protetoras
não podem dedicar-se a tempo inteiro a essa
proteção, a tendência é para a divisão do trabalho e
a profissionalização destas associações. Ou seja, as
associações protetoras iniciais dão origem a empresas
encarregadas de proteger os seus clientes. No entanto,
não está ainda ultrapassada a instabilidade do estado
de natureza. As associações protetoras transformadas
em empresas entram em concorrência e conflito.
A lógica do mercado da proteção leva então ao
desaparecimento das mais fracas e ao triunfo das
mais fortes. Em última instância, esta lógica conduz
ao surgimento de uma associação protetora
profissionalizada dominante. Para melhor proteger
os seus clientes, esta associação dominante
anuncia publicamente que punirá todos aqueles
que atentarem contra os direitos dos seus clientes.
Desta forma, a agência dominante assegura em
termos práticos, na famosa expressão de Max
Weber, o ―monopólio da violência autorizada‖.
Nesta fase, estamos já na presença do estado civil
ou, melhor dizendo, daquilo que Nozick intitula
―estado ultramínimo‖.
Dinâmica da Complexidade
A própria teoria da complexidade explica que
qualquer dinâmica em rede acaba sempre por
levar ao domínio de alguns sobre todos.
O próprio Platão já via isso na democracia, como
um estado intermédio entre a anarquia e a tirania
A dinâmica em rede do feudalismo levou à Paz
de Vestefália (1648) e ao Estado Absoluto.
Cerca de 60% das sociedades cotadas nas bolsas
em todo o mundo são controladas por cerca de
800 investidores, segundo um estudo recente
Estado mínimo e segurança
Porém, se a agência protetora dominante coloca entraves
à ação dos independentes, i.e., dos não clientes, tem o
dever moral de os compensar. Essa compensação surge
mediante o fornecimento de serviços de proteção a todos
os indivíduos dentro de uma determinada área
geográfica. Este último aspecto constitui a segunda parte
da definição weberiana do estado. Assim, quando todos
os que se encontram dentro de um determinado território,
delimitado por fronteiras, estão protegidos por uma
entidade que detêm o monopólio da violência autorizada,
estamos finalmente na presença do estado mínimo. Este
pode garantir satisfatoriamente os direitos individuais ao
proteger todos os indivíduos contra o uso indevido da
força, o roubo, a fraude e o incumprimento dos contratos.
A instabilidade inicial do estado de natureza está
resolvida, com vantagem para a segurança dos direitos
dos indivíduos.
Teoria da titularidade
A experiência mental descrita permite estabelecer
que um estado mínimo é preferível à anarquia, na
medida em que protege melhor a autopropriedade
individual. No entanto, a maior parte das filosofias
políticas contemporâneas — e, em especial, a
rawlsiana — servem para justificar um estado com
funções alargadas, em nome da justiça social ou
distributiva. Por isso Nozick dedica a segunda parte
de Anarquia, Estado e Utopia a refutar a
necessidade de um estado mais extenso do que um
estado mínimo mediante a defesa de uma teoria da
justiça de cariz libertarista e alternativa face ao
distributivismo rawlsiano. Nozick designa a sua
própria visão como ―teoria da titularidade‖.
Teoria da titularidade
A teoria da titularidade diz respeito às posses,
ou haveres, dos indivíduos, isto é, à
propriedade no sentido estrito e mais
comum. Coloca-se então a questão: em que
circunstâncias têm os indivíduos direito aos
seus haveres (ou não)? Nozick considera que
a teoria da titularidade responde a esta
questão abarcando três aspectos diferentes:
a justiça na aquisição, a justiça na
transferência e, finalmente, a rectificação da
injustiça.
Vamos agora percorrer brevemente cada
um destes três aspectos.
Aquisição inicial
Qualquer pessoa tem direito a qualquer haver alvo
de uma aquisição inicial desde que, por essa
aquisição, não tenha infringido os direitos individuais
de outrem. Isso implica certamente que a aquisição
não pode ser conseguida através do uso da força
ou do roubo, por exemplo. Mas a legitimação da
aquisição está também dependente da chamada
―restrição lockiana‖. Esta implica que aquele que
adquire — por exemplo, um terreno que antes não
pertencia a alguém — deixe o mesmo e
suficientemente bom para os outros. No entanto, a
formulação de Locke, feita num tempo em que o
mundo por descobrir parecia inesgotável e não
faltava terra para todos, é actualizada por Nozick
de um modo peculiar.
Restrição lockiana
No pensamento nozickiano, a restrição lockiana
passa a significar que qualquer aquisição é
moralmente permissível desde que não prejudique
seja quem for. Esta interpretação da ―restrição‖ é
extremamente plástica e permite justificar, por
exemplo, a aquisição de recursos naturais até agora
inexplorados, ou, para dar outro exemplo
particularmente significativo, a apropriação de
patentes médicas por tempo indefinido (para além
daquilo que permite o próprio direito internacional).
Com efeito, quem acede a um novo recurso a que
ninguém conseguia antes aceder, ou cria uma
patente que ninguém antes tinha criado, não está a
prejudicar alguém, não está a deixar alguém pior, e
por isso tem o direito pleno ao seu haver.
Transferências justas explicam
desigualdade
Porém, a maior parte dos haveres dos indivíduos não
provém de aquisições iniciais mas antes de processos de
transferência (contratos de compra e venda, doações,
heranças, etc.). Mais uma vez, os indivíduos têm direito
aos haveres que resultam de transferências nas quais
não houve violação de direitos individuais nem
desrespeito da restrição lockiana. Ou seja, desde que
essas transferências tenham sido conscientes e
voluntárias e não prejudiquem alguém. Esta ideia tem
largo alcance, na medida em que as enormes
desigualdades nos haveres dos indivíduos e famílias
resultam de uma multiplicidade de transferências ao
longo do tempo das suas vidas, ou mesmo ao longo das
gerações. Se esses processos de transferência foram
justos, então nada há a objectar às disparidades sociais
que daí resultam.
Correcção
O terceiro aspecto da teoria da titularidade consiste na
necessidade de estabelecer algum princípio de rectificação
sempre que os haveres de alguém não resultaram de
aplicações sucessivas da justiça na aquisição e da justiça na
transferência. Ou seja, se se verificar, por exemplo, que os
haveres de alguém resultaram de roubos ou aquisições
ilegítimas no passado, então será necessário rectificar. Este
princípio aplica-se individualmente, mas também em termos
mais alargados. Por exemplo, Nozick pensa que os índios
americanos deviam ser devidamente indemnizados pelas
terras que lhes foram roubadas pelos colonos brancos. Outro
exemplo, relativamente recente, de aplicação rectificativa
poderia ser a devolução aos judeus do ouro roubado pelos
nazis.
Castigo
Os três aspectos da teoria da titularidade apontam para a
principal característica distintiva desta teoria da justiça dos
haveres: o seu cariz histórico. Aquilo que cada indivíduo detém
a justo título depende do que aconteceu no passado e ao
longo do tempo. Ou seja, se aquilo que os indivíduos possuem
decorre da justiça na aquisição e nas transferências, então é
efectivamente justo. Se, por outro lado, se detecta no passado
alguma aquisição ou transferência injusta, ela deve ser
rectificada. Mas Nozick resiste à consequência mais radical do
seu pensamento que consistiria em sustentar que, face ao
desconhecimento do passado, sobretudo remoto, seria mais
justo aplicar um princípio rectificador geral — mediante, por
exemplo, uma distribuição igualitária dos haveres — e
começar tudo de novo. Do meu ponto de vista, esta
conclusão é consequente com o próprio pensamento de
Nozick. Mas ele sabe bem que a suspeição genérica sobre o
passado e o respectivo remédio rectificativo equivaleria a uma
espécie de socialismo, ainda que temporário, e considera
claramente excessivo “introduzir o socialismo como castigo
pelos nossos pecados”
Conclusão
Uma caracterização mais analisada da teoria da titularidade
teria de levar à sua contraposição face a outras teorias a que
estamos mais habituados e que, contrariamente à teoria
nozickiana, têm carácter teleológico ou estabelecem padrões
distributivos que caberia ao estado introduzir na sociedade. A
teoria teleológica standard é o utilitarismo. O seu objectivo é a
maximização do bem-estar social. Ao invés desta teoria, e de
outras do mesmo tipo, a teoria da titularidade não pretende
alcançar qualquer resultado final específico. A justiça depende
do que aconteceu no passado e não de qualquer resultado
final que se pretenda atingir no futuro.
A teoria padronizada clássica, por sua vez, é aquela que diz
que uma distribuição de bens materiais deve depender de
qualquer qualidade pessoal, como por exemplo o mérito, ou a
vida virtuosa. Ora, a teoria da titularidade não estabelece
qualquer padrão a criar politicamente e, pelo contrário,
considera que a imposição desses padrões distributivos conduz
o estado a interferir indevidamente na liberdade dos cidadãos.
A liberdade, diz Nozick, é contrária à imposição de padrões por
parte do estado social, sejam quais forem esses padrões.
Nudge
Entre o paternalismo e o liberarismo
A regulação e a alteração de contexto
O Paternalismo libertário como solução de
Obama para o combate aos principais males
sociais e implementação das políticas
públicas