Cultura

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CULTURA E SOCIEDADE

TEXTOS ADAPTADOS

PROFESSORES (AS)COLABORADORES
(AS):

Altamir Fernandes de Sousa


Carlos Roberto da Silva
Guilherme Caixeta Borges
Henrique Carivaldo de Miranda Neto
Maria da Penha Vieira Marçal
Maria de Fátima Silva Porto
Moacir Manoel Felisbino
Paulo Sérgio Moreira da Silva
Roberto Carlos dos Santos

PATOS DE MINAS
2015
Rua Major Gote, 808 – Bairro Caiçaras – Telefax: (34) 3823-0300 – Caixa Postal 85 – CEP 38702-054 – Patos
de Minas – MG
Site: www.unipam.edu.br

SUMÁRIO

MENSAGEM 4
PLANO DE ENSINO DE CULTURA E SOCIEDADE 5
TEMA 1 - O HOMEM E A CULTURA 11
1.1 O HOMEM: SER BIOLÓGICO E CULTURAL 11
1.2 A CULTURA: DEFINIÇÕES, CULTURA POPULAR E CULTURA ERUDITA 13
1.3 MULTICULTURALISMO, RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS, HISTÓRIA E CULTURA
AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA 19
1.4 INDÚSTRIA CULTURAL 27
TEMA 2- O CONHECIMENTO EM SEUS DIVERSOS ASPECTOS 31
2.1 OS QUATRO TIPOS DE CONHECIMENTO 32
2.2CORRELAÇÃO ENTRE CONHECIMENTO POPULAR E CONHECIMENTO
CIENTÍFICO 35
2.3 – CIÊNCIAS EXTAS x CIÊNCIAS HUMANAS 36
2.4- MÉTODO CIENTÍFICO 38
TEMA 3 – ÉTICA E IDEOLOGIA 41
3.1 MORAL E ÉTICA 42
3.2 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL 46
3.3 DEMOCRACIA, ÉTICA E CIDADANIA 49
3.4 IDEOLOGIA 55
TEMA 4 – MEIOS DE COMUNIÇÃO DE MASSA, TECNOLOGIA E NOVAS
MÍDIAS 61
4.1 OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA E SUAS CARACTERÍSTICAS 61
4.2 AS VELHAS E NOVAS MÍDIAS 68
4.3 COMUNICAÇÃO E TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO 70
4.4 MÍDIA E SOCIEDADE DE CONSUMO 73
TEMA 5 - REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E GEOPOLÍTICA 78
5.1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E TOYOTISMO78
5.2 GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO 82
5.3 A GLOBALIZAÇÃO E A GRISE FINANCEIRA MUNDIAL 87
5.4 REFLEXOS POLÍTICO-INSTITUCIONAIS, ECONÔMICOS E SOCIAIS DA
GLOBALIZAÇÃO NO BRASIL 94
TEMA 6: TRABALHO, MERCADO E RESPONSABILIDADE SOCIAL 11
6.1 EDUCAÇÃO E SOCIEDADE DO CONHECIMENTO 100
6.2 RELAÇÕES DE TRABALHO E O PERFIL DO PROFISSIONAL NO SÉCULO XXI
106
6.3 EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO 109
6.4 RESPONSABILIDADE SOCIAL: SETOR PÚBLICO, PRIVADO E TERCEIRO SETOR
111
TEMA 7 – GERAÇÃO Y 116
7.1 NOVAS TECNOLOGIAS E A NOVA GERAÇÃO DE TRABALHADORES DO
CONHECIMENTO (Y) 116
7.2 CONTEXTO HISTÓRICO DO NASCIMENTO DAS GERAÇÕES BABY BOOMERS,
X, Y E Z 118
7.3 O QUE A GERAÇÃO Y QUER E PRECISA NO TRABALHO 123
7.4 ESTRATÉGIAS E PROGRAMAS PARA GERENCIAR A GERAÇÃO Y 124
TEMA 8 - ECOLOGIA E BIODIVERSIDADE 133
8.1 NATUREZA E SOCIEDADE COMO ESPAÇO DE CIDADANIA 133
8.2 O MOVIMENTO ECOLÓGICO E POLÍTICAS PÚBLICAS 137
8.3 DESENVOLVIMENTO, SUSTENTABILIDADE SOCIAL E AMBIENTAL 143
8.4 CATÁSTROFES AMBIENTAIS E SOCIEDADE 146
TEMA 9 - RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO 133
9.1 CONFIGURAÇÕES DE GÊNERO NA SOCIEDADE ATUAL 152
9.2 MACHISMO E SEXISMO 155
9.3 FEMINISMO 160
9.4 DESIGUALDADE E DISCRIMINAÇÃO DA MULHER NA CULTURA E NA
SOCIEDADE BRASILEIRA 165
TEMA 10 - VIOLÊNCIA URBANA E RURAL 170
10.1 ORIGENS DA VIOLÊNCIA 171
10.2 DISCURSO MIDIÁTICO E A VIOLÊNCIA 178
10.3 POLÍTICAS PÚBLICAS E VIOLÊNCIA 181
10.4 MOVIMENTOS SOCIAIS 183
MENSAGEM

Caro(a) estudante,

saudações!

Esta apostila da disciplina CULTURA E SOCIEDADE é


composta por dez (10) temas selecionados por uma equipe de
nove (9) professores(as) colaboradores(as), os quais ministram a
referida disciplina em todos os cursos do Centro Universitário de
Patos de Minas – UNIPAM.
A seleção dos temas teve como diretriz as orientações
do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE,
que integra o Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Superior – SINAES, com o objetivo de verificar o rendimento dos
(as)alunos (as) dos cursos de graduação em relação aos
conteúdos programáticos, suas competências e suas habilidades
e, também, oferecer uma formação básica e geral sobre a
realidade e/ou sociedade onde atuará profissionalmente.
Os temas foram adaptados e padronizados para todos
os cursos, o que não impede que cada professor(a), ao ministrar
a disciplina em um curso específico, possa acrescentar a seu
modo, a seucritério e a seuponto de vista, outros textos
complementares em cada tema por meio de atividades diversas
que serão aplicadas durante o semestre letivo.
Seja muito bem-vindo (a) edesejamos que você tenha
um excelente aproveitamento!

Atenciosamente,

Professores (as) colaboradores (as).

4
5
PLANO DE ENSINO DE CULTURA E
SOCIEDADE

UNIPAM – CENTRO UNIVERSITÁRIO DE PATOS DE


MINAS

CURSO
ANO LETIVO PERÍODO CARGA HORÁRIA
SEMANAL
2015 4 h/a

Identificação da Disciplina: CULTURA E SOCIEDADE


Professor(a):

Ementa
Estudo de temas clássicos e contemporâneos essenciais para o
entendimento da configuração do mundo atual nas perspectivas
histórica, antropológica, sociológica e filosófica. Conhecimento
dos aspectos caracterizadores da formação étnico-racial e
cultural da sociedade brasileira.

Objetivos gerais
Desenvolver a capacidade de reflexão crítica por meio da
discussão e da análise dos principais temas relacionados às
áreas do saber histórico, filosófico, antropológico e sociológico.

Objetivos específicos
- Compreender o processo de constituição da cultura ocidental a
partir das matrizes da antiguidade clássica greco-romana.
- Analisar a geopolítica contemporânea, a partir das relações do
Brasil com o mercado internacional.
- Reconhecer aspectos relevantes da cultura contemporânea
para a formação profissional.

6
- Estimular a leitura, a interpretação e a produção de textos
relacionados às áreas do conhecimento humanístico.
- Estabelecer relações, comparações e contrastes em diferentes
situações.
- Compreender os aspectos caracterizadores da formação
étnico-racial e cultural brasileira.

Conteúdos de plano de ensino

1 O homem e a cultura
1.1 O homem: ser biológico e cultural
1.2 A cultura: definições, cultura popular e cultura erudita
1.3 Multiculturalismo, relações étnico-raciais, história e cultura
afro-brasileira e indígena
1.4 Indústria Cultural

2 O conhecimento em seus diversos aspectos


2.1 Tipos de conhecimento (religioso, vulgar, filosófico e
científico)
2.2 Senso comum X conhecimento científico
2.3 Ciências exatas/ ciências humanas
2.4 Método científico

3 Ética e Ideologia
3.1 Moral e ética
3.2 Ética geral e profissional
3.3 Democracia, ética e cidadania
3.4 Ideologia

4 Meios de comunicação de massa, tecnologia e novas


mídias
7
4.1 Os meios de comunicação de massa e suas características
4.2 As velhas e novas mídias
4.3 Comunicação e tecnologia de informação
4.4 Mídia e sociedade de consumo

5 Reestruturação Produtiva e geopolítica


5.1 Reestruturação produtiva e toyotismo
5.2 Globalização e Neoliberalismo
5.3 A globalização e a crise financeira mundial
5.4 Reflexos político-institucionais, econômicos e sociais da
globalização no Brasil

6 Trabalho, mercado e responsabilidade social


6.1 Educação e Sociedade do Conhecimento
6.2 Relações de trabalho e o perfil do profissional no século XXI
6.3 Empreendedorismo e inovação
6.4 Responsabilidade social: setor público, privado e terceiro
setor

7 Geração Y
7.1 Novas tecnologias e a nova geração de trabalhadores do
conhecimento (Y)
7.2 Contexto histórico do nascimento das gerações Baby
Boomers, X, Y e Z
7.3 O que a Geração Y quer e precisa no trabalho
7.4 Estratégias e programas para gerenciar a geração Y

8 Ecologia e Biodiversidade
8.1 Natureza e sociedade como espaço de cidadania
8.2 O movimento ecológico e políticas públicas
8
8.3 Desenvolvimento, sustentabilidade social e ambiental
8.4 Catástrofes ambientais e sociedade

9 Relações sociais de gênero


9.1 Configurações de gênero na sociedade atual
9.2 Machismo e sexismo
9.3 Feminismo
9.4 Desigualdade e discriminação da mulher na cultura e na
sociedade brasileira.

10 Violência urbana e rural


10.1 Origens da violência
10.2 Discurso midiático e a violência
10.3 Políticas públicas e violência
10.4 Movimentos Sociais

Atividades práticas supervisionadas


Os discentes farão leituras de ensaios científicos e artigos de
revistas selecionados pelo professor e assistirão a filmes, cuja
abordagem se refira à disciplina, com a finalidade de
reconhecer, interpretar e analisar os apontamentos teóricos
analisados nas aulas. Além disso, serão realizados trabalhos e
exercícios.

Metodologia
Pretende-se, mediante fundamentação teórica e recortes da
realidade, compreender e criticar as transformações
engendradas pelo homem na sociedade. As aulas serão
desenvolvidas sob a forma de exposições dialogadas,
seminários, análises de textos e filmes.
9
Recursos didáticos
Quadro, giz, datashow, filmes e livros e textos das obras
indicadas na referência bibliográfica.

Avaliação
Durante o semestre letivo, a nota do discente na disciplina será
composta pelos seguintes indicadores avaliativos:
a) Quarenta pontos distribuídos pelo docente da disciplina, em
exercícios, trabalhos e provas.
b)Vinte pontos distribuídos no Projeto Integrador.
c) Vinte pontos da Avaliação Colegiada.
d) Vinte pontos da Avaliação Integradora (AVIN)
Considerar-se-ão dois critérios, que não se excluem, para a
aprovação na disciplina, a saber:
a) Mínimo de sessenta pontos de aproveitamento, conforme
nota global da disciplina.
b) Mínimo de setenta e cinco por cento de frequência na
disciplina.

Referência bibliográfica básica

ARON, R. As etapas do pensamento sociológico. 7. ed. São


Paulo: Martins Fontes, 2008.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Lei nº 11.645, de
março de 2008. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, ...
a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira
e Indígena”. Brasília: SEPPIR/SECAD/INEP, 2005. Disponível em:
<
http://www.iteral.al.gov.br/legislacao/http___www.iteral.al.gov.br_
10
legsilacao_Lei-2011.465_-20de-202008.pdf/view>. Acesso em:
18 abr. 2011.
CHAUÍ, M. Convite à filosofia. 14. ed. São Paulo: Ática, 2011.
LARAIA, R. de B. Cultura: um conceito antropológico. 24. ed. Rio
de Janeiro: Rio de Janeiro, 2009.

Referência bibliográfica complementar

ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a


afirmação e a negação do trabalho. 5. ed. São Paulo: Boitempo,
2009.
ARANHA, M. L. de A. Filosofando: introdução à filosofia. 3. ed.
São Paulo: Moderna, 2009.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o ensino de História e Cultura Afro-
Brasileira e Africana. Brasília: SEPPIR/SECAD/INEP, 2005.
Disponível em:
<http://www.sinpro.org.br/arquivos/afro/diretrizes_relacoes_etnic
o-raciais.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2011.
BRASIL. Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003. Altera a Lei no
9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 09 jan. 2003.
Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm
>. Acesso em: 03 fev. 2011.
CARVALHO, J. M. de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 14.
ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.
COLEÇÃO. Os Pensadores. 5. ed. São Paulo: Nova Cultura,
1991.

11
MASI, D. D. A sociedade pós-industrial. São Paulo: Senac,
2003.
NILO, O. O que é violência. São Paulo: Brasiliense, 1983.
SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento
único à consciência universal. 7. ed. São Paulo: Record, 2001.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do
Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
VALLS, A. L. O que é ética. 9. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

12
TEMA 1 - O HOMEM E A CULTURA

1.1 O HOMEM: SER BIOLÓGICO E CULTURAL


1.2 A CULTURA: DEFINIÇÕES, CULTURA POPULAR E CULTURA
ERUDITA
1.3 MULTICULTURALISMO, RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS, HISTÓRIA
E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA
1.4 INDÚSTRIA CULTURAL

1.1 O HOMEM: SER BIOLÓGICO E CULTURAL

A cultura interfere no plano

Vimos, acima, que a cultura interfere na satisfação das


necessidades fisiológicas básicas. Veremos, agora, como ela
pode condicionar outros aspectos biológicos e até mesmo
decidir sobre a vida e a morte dos membros do sistema.
Comecemos pela reação oposta ao etnocentrismo, que
é a apatia. Em lugar da superestima dos valores de sua própria
sociedade, numa dada situação de crise os membros de uma
cultura abandonam a crença nas mesmas e, consequentemente,
perdem a motivação que os mantém unidos e vivos. Diversos
exemplos dramáticos deste tipo de comporta mento anômico
são encontrados em nossa própria história.
Os africanos removidos violentamente de seu
continente (ou seja, de seu ecossistema e de seu contexto
cultural) e transportados como escravos para uma terra
estranha, habitada por pessoas de fenotipia, costumes e línguas
diferentes, perdiam toda a motivação de continuar vivos. Muitos
foram os suicídios praticados, e outros acabavam sendo mortos
pelo mal que foi denominado de banzo. Traduzido como
saudade, o banzo é de fato uma forma de morte de corrente da
apatia.
Foi, também, a apatia que dizimou parte da população
Kaingang de São paulo, quando teve o seu território invadido
pelos construtores da Estrada de Ferro Noroeste. Ao perceberem
que os seus recursos tecnológicos, e mesmo os seus
sobrenaturais, eram impotentes diante do poder da sociedade
branca, estes índios perderam a crença em sua sociedade.
Muitos abandonaram a tribo, outros simplesmente esperaram
pela morte que não tardou.
Entre os índios Kaapor, grupo tupi do Maranhão,
acredita-se que se uma pessoa vê um fantasma ela logo
morrerá. O principal protagonista de um filme, realizado em
1953 por Darcy Ribeiro e Hains Forthmann, ao regressar de uma
13
caçada contou ter visto a alma de seu falecido pai
perambulando pela floresta. O jovem índio deitou em uma rede
e dois dias depois estava morto. Em 1967, durante a nossa
permanência entre os índios (quando a história acima nos foi
contada), fomos procurados por uma mulher, em estado de
pânico, quem teria visto um fantasma (añan). Confiante nos
poderes do branco, nos solicitou um “añan-puhan” (remédio
para fantasma). Diante de uma situação crítica, acabamos por
fornecer-lhe um comprimido vermelho de vitaminas, que foi
considerado muito eficaz, neste e em outros casos, para
neutralizar o malefício provocado pela visão de um morto.
É muito rica a etnografia africana no que se refere às
mortes causadas por feitiçaria. A vítima, acreditando
efetivamente no poder do mágico e de sua magia, acaba
realmente morrendo. Pertti Pelto descreve esse tipo de morte
como sendo conseqüência de um profundo choque
psicofisiológico: “A vítima perde o apetite e a sede, a pressão
sangüínea cai, o plasma sangüíneo escapa para os tecidos e o
coração deteriora. Ela morre de choque, o que é
fisiologicamente a mesma coisa que choque de ferimento na
guerra e nas mortes de acidente de estrada”. E de se supor que
em todos os casos relatados o procedimento orgânico que leva
ao desenlace tenha sido o mesmo.
Deixando de lado esses exemplos mais drásticos sobre
a atuação da cultura sobre o plano biológico, podemos agora
nos referir a um campo que vem sendo amplamente estudado: o
das doenças psicossomáticas. Estas são fortemente
influenciadas pelos padrões culturais. Muitos brasileiros, por
exemplo, dizem padecer de doenças do fígado, embora grande
parte dos mesmos ignorem até a localização do órgão. Entre nós
são também comuns os sintomas de mal estar provocados pela
ingestão combinada de alimentos. Quem acredita que o leite e
a manga constituem uma combinação perigosa, certamente
sentirá um forte incômodo estomacal se ingerir
simultaneamente esses alimentos.
A sensação de fome depende dos horários de
alimentação que são estabelecidos diferente em cada cultura.
“Meio-dia, quem não almoçou assobia”, diz um ditado popular. E
de fato, estamos condicionados a sentir fome no meio do dia,
por maior que tenha sido o nosso desjejum. A mesma sensação
se repetirá no horário determinado para o jantar. Em muitas
sociedades humanas, entretanto, estes horários foram
estabelecidos diferentemetne e , em alguns casos, o indivíduo
pode passar um grande número de horas sem se alimentar e
sem sentir a sensação de fome.

14
A cultura também é capaz de provocar curas de
doenças, reais ou imaginárias. Estas curas ocorrem quando
existe a fé do doente na eficácia do remédio ou no poder dos
agentes culturais. Um destes agentes é o xamã de nossas
sociedades tribais (entre os Tupi, conhecidos pela denominação
de pai’é ou pajé). Basicamente, a técnica de cura do xamã
consiste em uma sessão de cantos e danças, além da
defumação do paciente com a fumaça de seus grandes charutos
(petin), e a posterior retirada de um objeto estranho do interior
do corpo do doente por meio de sucção. O fato de que esse
pequeno objeto (pedaço de osso, insetos mor tos etc.) tenha
sido ocultado dentro de sua boca, desde o inicio do ritual, não é
importante. O que importa é que o doente é tomado de urna
sensação de alivio, e em muitos casos a cura se efetiva.
A descrição de uma cura dará, talvez, uma ideia mais
detalhada do processo. Após cerca de uma hora de cantar,
dançar e puxar no cigarro, o pajé recebeu o espirito.
Aproximando-se do doente que etava sentado em um banco, o
pajé soprou a fumaça primeiro sobre as própias mãos e, em
seguida, sobre o corpo do paciente. Ajoelhando-se junto a ele,
esfregou-lheo peito e o pescoço. A massagem era dirigida para
um ponto no peito do doente e o pajé esfregava as mãos como
se tivesse juntado qualquer coisa. Interrompia a massagem
para soprar a fumaça nas mãos e esfregá-las uma na outra,
como se quisesse livrá-las de uma substância invisível. Após
muitas massagens no doente, levantou-lhe os braços e encostou
seu peito ao dele. Queria assim passar o ymaé ( a causa da
doença, aquilo que um ser sobrenatural faz ao entrar no corpo
da vítima) do doente para o seu próprio corpo. Não o conseguiu
e voltou a repetir as massagens, dessa vez dirigidas para o
ombro. Aí aplicou a boca e chupou com muita força. Repetiu as
massagens e sucções, intercalando-as com baforadas de cigarro
e contrações como se fosse vomitar. Finalmente conseguiu
extrair e vomitar o ymaé, que fez desaparecer na mão. Nas
curas a que assistimos, os pajés jamais mostraram o ymaé que
extraiam dos doentes. Guardavam- nos por algum tempo dentro
da mão, livre do cigarro, para fazê-lo desaparecer após.
Explicavam, porém, à audiência a sua natureza, oque parecia
bastante. Dizem que os pajés mais poderosos o fazem, e
algumas pessoas guardam pequenos objetos que acreditam
terem sido retirados de seu corpo por um pajé.
LARAIA, Roque de Barros. A cultura interfere no plano biológico.
In. ____________, Cultura: um conceito antroplógico. Rio de
Janeiro: 19. ed. Jorge ZAHAR Editor, 2006. p. 75 -79.

15
1.2 A CULTURA: DEFINIÇÕES, CULTURA POPULAR E
CULTURA ERUDITA

A origem da palavra CULTURA - Alfredo Bosi

Uma definição da cultura hoje em dia se tornou


particularmente difícil, porque a cultura pode ser estudada de
vários pontos de vista e precisaríamos escolher uma perspectiva
para poder defini-la.
Como professor de língua portuguesa e pessoa que
sempre se dedicou ao estudo do que se chama de
Humanidades, eu gostaria de remontar ao primeiro significado
da palavra cultura na tradição romana. A palavra cultura é latina
e sua origem é o verbo colo. Colo significava, na língua romana
mais antiga, “eu cultivo”; particularmente, “eu cultivo solo”. A
primeira acepção de colo estava ligada ao mundo agrário, como
foi Roma antes de se transformar naquele império urbano que
nós conhecemos. Os romanos começaram efetivamente pela
agricultura. A palavra agricultura diz muito: “cultura do campo”.
Inicialmente, a palavra cultura, por ser um derivado de
colo, significava, rigorosamente, “aquilo que deve ser
cultivado”. Era um modo verbal que tinha sempre alguma
relação com o futuro; tanto que a própria palavra tem essa
terminação –ura, que é uma desinência de futuro, daquilo que
vai acontecer, da aventura. As palavras terminadas em –uro e –
ura são formas verbais que indicam projeto, indicam algo que
vai acontecer. Então a cultura seria, basicamente, o campo que
ia ser arado, na perspectiva de quem vai trabalhar a terra.
Esse significado material da palavra, relacionado com a
sociedade agrária, durou séculos; até que os romanos
conquistaram a Grécia e foram em parte helenizados. Nós
sabemos a extrema importância da cultura grega, da arte e da
filosofia grega para o desenvolvimento da cultura romana. E os
gregos tinham já uma palavra para o desenvolvimento humano,
que era paideia.
Paideia significava o conjunto de conhecimentos que se
devia transmitir às crianças – paidós (criança é paidós) – daí
Pedagogia, que é a maneira de levar a criança ao conhecimento.
Dessa raiz é que se criou paideia, que por volta do primeiro
século antes de Cristo, o momento forte da helenização de
Roma, passou para o Império Romano e carecia de uma
tradução em latim. Os romanos sabiam o que era paidéia, pois
os seus pedagogos eram escravos gregos que iam para a Itália;
alguns contratados e outros como escravos deveriam trabalhar
para os seus donos e tinham a função de ensinar grego e
retórica para os meninos das famílias patrícias.
16
Nessa altura, a Grécia também exercia a função de
“emprestar” palavras; começava-se a usar palavras gregas
frequentemente entre os romanos. Só que, por outro lado, o
nacionalismo romano também exigia que se traduzissem os
termos gregos. E qual era o paralelo que eles podiam fazer? Os
romanos não tinham nenhum termo que significasse “conjunto
de conhecimentos que deveriam ser transmitidos à criança”.
Mas, conhecendo a palavra paideia e não querendo
usá-la porque era uma palavra estrangeira, passaram a traduzi-
la por cultura. A palavra cultura passou do significado
puramente material que tinha em relação à vida agrária para
um significado intelectual, moral, que significa conjunto de
ideias e valores.
E é tardio isso, só a partir do primeiro século é que se
encontram exemplos da palavra nessa acepção; se a gente for
aos dicionários de latim compilados depois da época imperial,
encontramos cultura sempre definida em primeiro lugar como o
amanho do solo, o trabalho sobre o solo, ligado sempre ao verbo
colo e seus derivados, por exemplo: in-cola – aquele que mora
num certo lugar; inquilino – aquele que mora num lugar que não
é seu; colônia – lugar para onde se deslocam trabalhadores que
vão arar em outras terras. Culto vem do particípio passado de
colo (colo é o verbo, que tem um particípio passado: cultus), é
aquilo que já foi trabalhado. Depois, passou a ter um significado
espiritual-religioso. Aliás, entre parênteses, nós não sabemos se
o significado religioso foi anterior ou posterior ao significado
material. Agora, cultura certamente sabemos que passou de um
significado material para um significado ideal e intelectual.
Essas observações que estou fazendo, etimológicas,
poderão nos servir como um fio em nosso discurso, porque
ambos os significados sobreviveram nas línguas modernas.
Podemos falar na cultura do arroz, na cultura da soja, na cultura
do trigo, entendemos muito bem que é uma terra cultivada;
falamos em cultivo (palavra também derivada de colo) e mais
ainda, com frequência, usamos a palavra cultura na acepção
ideal, que é muito rica, porque traz dentro de si, na forma verbal
terminada em -ura, a ideia de futuro, de projeto.
Se tivéssemos que definir a palavra a partir dessas
considerações, teríamos uma riqueza de possibilidades, porque
a cultura, pensada como um conjunto de ideias, valores e
conhecimentos, traz dentro de si, em primeiro lugar, a dimensão
do passado. Muitos conhecimentos foram herdados de outras
gerações, não estamos começando do zero, muito pelo
contrário, cada ano que passa acumula mais conhecimento.
Cada vez mais a dimensão cumulativa, a dimensão de passado,
se impõe. É extraordinário como a nossa memória tem que ficar
17
cada vez mais enriquecida, porque o tempo passa e a memória
cresce proporcionalmente.
Sem dúvida nenhuma, a primeira ideia que temos
quando falamos em cultura é a de transmissão de
conhecimentos e valores de uma geração para outra, de uma
instituição para outra, de um país para outro; subsiste sempre a
ideia de algo que já foi estabelecido em um passado – que pode
ser um passado próximo ou um passado remoto.
Evidentemente, nossa cultura tecnológica tem proximidade com
a Revolução Industrial e com tudo o que veio depois, ao passo
que a cultura humanística deve remontar aos gregos e aos
romanos, há 2.000 ou 3.000 anos atrás. Não importa: seja um
passado recente, séculos XIX e XX, seja um passado remoto
(antes de Cristo, ou épocas arcaicas), sempre a palavra cultura
carrega dentro de si a ideia de transmissão de ideias e valores.
Mas, voltando à etimologia, cada vez mais nos
preocupamos com a outra dimensão, que é a dimensão do
projeto. Não basta que nós herdemos do passado todas essas
riquezas, é preciso que continuemos aprofundando certos veios;
se a cultura está sempre “in progress”, ela está sempre em fase
de desvios, ela não é algo estabelecido para sempre. Só as
culturas em decadência é que fixam, congelam, tal como a
cultura bizantina, que, dizem, durante mil anos repetiu as
fórmulas do Império Romano do Oriente; ou a cultura chinesa,
antes de a China entrar em contato com o mundo ocidental,
também codificou formas, comportamentos; a japonesa
também.
No mundo contemporâneo, ao contrário, cada vez
menos nos atemos à fixidez das fórmulas e cada vez mais (como
a cultura é um complexo de conhecimentos científicos, técnicos
etc., e não só históricos) nos preocupamos em criar projetos de
cultura; e cada vez mais, além desta criação, os nossos ideais
democráticos exigem uma socialização do conhecimento. Não só
cavar na matéria em si da cultura, mas também estendê-la na
linha da comunicação, na linha da socialização; e fazer com que
este bem seja repartido, distribuído, da maneira mais justa e
mais ampla possível, o que é próprio da sociedade democrática.
Disponível em:
<http://pandugiha.wordpress.com/2008/11/24/alfredo-bosi-a-
origem-da-palavra-cultura/> acessado em 05/02/2011.
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2006. p.
291-296.

Cultura

18
O mundo que resulta do pensar e do agir humanos não
pode ser chamado de natural, pois se encontra transformado e
ampliado por nós. Portanto, as diferenças entre pessoa e animal
não são apenas de grau, porque, enquanto o animal permanece
mergulhado na natureza, nós somos capazes de transformá-la,
tornando possível a cultura.
A palavra cultura tem vários significados, tais como
cultura da terra ou cultura de uma pessoa letrada, “culta”. Em
antropologia, cultura significa tudo que o ser humano produz ao
construir sua existência: as práticas, as teorias, as instituições,
os valores materiais e espirituais. Se o contato com o mundo é
intermediado pelo símbolo, a cultura é o conjunto de símbolos
elaborados por um povo. Dada a infinita possibilidade humana
de simbolizar, as culturas são múltiplas e variadas: são
inúmeras as maneiras de pensar, de agir, de expressar anseios,
temores e sentimentos em geral. Por isso mudam as formas de
trabalhar, de se ocupar com o tempo livre, mudam as
expressões artísticas e as maneiras de interpretar o mundo, tais
como o mito, a filosofia ou a ciência.
Nesse processo de transformação, vale lembrar que a
ação humana é coletiva, por ser exercida como tarefa social,
peal qual a palavra toma sentido pelo diálogo.
O mundo cultural é um sistema de significados já
estabelecidos por outros, de modo que, ao nascer, a criança
encontra o mundo de valores já dados, onde ela vai se situar. A
língua que aprende, a maneira de se alimentar, o jeito de se
sentar, andar, correr, brincar, o tom da voz nas conversas, as
relações familiares; tudo, enfim, se acha codificado. Até na
emoção, que nos parece uma manifestação tão espontânea,
ficamos à mercê de regras que educam desde a infância a nossa
expressão.
O corpo humano nunca é apresentado como mera
anatomia, a ponto de não se poder pensar em ‘nu’ natural: toda
pessoa já se percebe envolta em panos e portanto em
interdições pelas quais é levada a ocultar sua nudez em nome
de valores (sexuais, amorosos, estéticos) que lhe são ensinados.
Portanto, quando se desnuda, o faz a partir de valores,
transgredindo aqueles estabelecidos ou propondo outros novos.
Todas as diferenças existentes no comportamento
modelado em sociedade resultam da maneira pela qual são
organizadas as relações entre os indivíduos. É por meio delas
que se estabelecem os valores e as regras de conduta que
nortearão a construção da vida social, econômica e política.
Como fica, então, a individualidade diante do peso da
herança social? Haveria sempre o risco de o indivíduo perder
sua liberdade e autenticidade? Martin Heidegger, filósofo
19
alemão contemporâneo, alerta para o que chama de “mundo do
man”: man equivale em português ao pronome reflexivo se ou
ao impessoal a gente. Veste-se, come-se, pensa-se, não como
cada um gostaria de se vestir, comer ou pensar, mas como a
maioria o faz. Os sistemas de controle da sociedade aprisionam
o indivíduo numa rede aparentemente sem saída.
Assim como a massificação pode ser decorrente da
aceitação sem crítica de valores impostos pelo grupo social,
também é verdade que a vida a autêntica só pode ocorrer na
sociedade e a partir dela. Justamente aí encontramos o
paradoxo de nossa existência social. Como vimos, se o processo
de humanização se faz por meio das relações pessoais, será dos
impasses e confrontos surgidos nessas relações que a
consciência de si poderá emergir lentamente. O importante é
manter viva a dialética, a contradição fecunda de pólos que se
opõem, mas não se separam. Ou seja, ao mesmo tempo que nos
reconhecemos como seres sociais, também somos pessoas,
temos uma individualidade que nos distingue dos demais.
Portanto, a sociedade é a condição da alienação e da
liberdade; nela o ser humano pode ser perder, mas pode
também se encontrar. O sociólogo norte-americano Peter Berger
usa a expressão êxtase (ékstasis, em grego, significa ‘estar
fora’, ‘sair de si’) para explicar o ato possível de o indivíduo ‘ se
manter do lado de fora ou dar um passo para fora das rotinas
normais da sociedade’, o que permite o distanciamento crítico
do próprio mundo em que se vive.
O ‘sair de si’ representa um esforço para nos livrarmos
de convicções inabaláveis e portanto paralisantes. É a condição
para que, ao voltar de sua ‘viagem’, o ser humano se torne
melhor, menos dogmático ou preconceituoso. TOMAZI, Nelson
Dácio. Iniciação à Socilogia. 2. ed. São Paulo: Atual, 2000.
p.175-178.

Cultura: um conceito com várias definições

Se fôssemos tentar definir o conceito de cultura,


teríamos que procurar saber como ele surgiu. De acordo com o
sociólogo inglês Raymond Williams, a palavra vem do latim –
colere – e definia inicialmente o cultivo das plantas, o cuidado
com os animais e também com a terra (por isso, agricultura).
Definia, ainda, o cuidado com as crianças e sua educação; o
cuidado com os deuses (seu culto); o cuidado com os ancestrais
e seus monumentos (sua memória). Passando por todos esses
elementos, chegaríamos, finalmente, ao sentido mais comum
que o termo possui em nossa sociedade: o de que o homem que
tem cultura é um homem “culto”. É aquele que “cultiva” (no
20
sentido de desenvolver, praticar, cultuar) a inteligência, as artes
e o conhecimento presente nos livros.
Mas, se pensássemos em cultura apenas nesse sentido,
teríamos que perguntar: só quem lê muito, quem passou um
longo tempo na escola é que tem cultura? Somente o professor,
o intelectual, os profissionais de formação universitária? Mas e o
bóia-fria, o operário, o comerciante, estes não têm cultura?
Numa outra perspectiva, poderíamos responder que cultura é
cinema, pintura, teatro, as manifestações artísticas em geral.
Nesse caso, só os artistas é que teriam cultura? Mas e as festas
populares, as crenças, as chamadas tradições, seriam o que?
A maneira de agir, pensar e sentir de um grupo de
pessoas ou classe social seria ou não cultura? O “modo de ser”
dos brasileiros, como se costuma ouvir e dizer, tem algo a ver
com “cultura”, com “cultura brasileira”?
Antes de responder a essas perguntas, devemos partir,
especificamente, da compreensão do próprio conceito. Pensar
em cultura requer que se pense, inicialmente, em sua relação
com outros dois conceitos fundamentais: o de civilização e o de
história. Foi na Europa, a partir do século XVIII, que o conceito
de cultura passou a ser associado ao conceito de civilização.
Os pensadores do período, preocupados em estudar o homem e
a sociedade, pensavam a relação entre os conceitos de cultura e
de civilização de maneiras diversas, como nos mostra a filósofa
brasileira Marilena Chauí.
Segundo Chauí, o filosofo Rousseau (1712-78) definia a
cultura de maneira positiva. Para ele, um pensador para quem o
homem era naturalmente bom, cultura seria definida como
bondade natural, interioridade espiritual, imaginação,
solidariedade espontânea. A essa idéia positiva de cultura,
Rousseau opunha a idéia negativa de civilização. O conceito de
civilização era pensado como o aprisionamento da bondade
humana natural; aprisionamento que Rousseau acreditava dar-
se por meio de regras e convenções artificiais e exteriores ao
homem.
Já para Voltaire e Kant cultura e civilização
representavam ambas, o processo de aperfeiçoamento moral e
racional da sociedade, sendo a cultura a forma de avaliar o
estágio de progresso e desenvolvimento de uma civilização.
Para esses autores, portanto, não havia oposição entre cultura
como reino natural e civilização como reino do artificial. A
cultura seria, para eles, um conceito dinâmico e transformador
que definiria aquilo que é específico do ser humano, na sua
relação com a natureza e na construção de uma ordem humana
superior (civilizada). E, dessa forma, acabaria servindo para, ao
longo do tempo, distinguir os homens cultos (educados
21
intelectual e artisticamente) dos incultos e também para
comparar e classificar civilizações diferentes em mais ou menos
“civilizadas”.

Cultura Popular e Cultura Erudita

Cultura é uma construção humana e se opõe à


natureza, aquilo que não passa pelo trabalho do homem. Para
não deixar o conceito tão amplo, algumas divisões são criadas,
entre elas as de popular e erudita.
Fala-se em cultura popular e cultura erudita como se
houvesse um rio que separasse claramente as duas margens.
Este rio não existe, mas a divisão tem alguma utilidade
operacional. A cultura popular seria aquela que é produto de um
saber não institucionalizado, que não se aprende em colégios ou
academias; exemplo disso é o crochê, ou a culinária tradicional,
ou ainda a literatura de cordel. A cultura erudita, por outro lado,
pressupõe uma elaboração maior e por isso uma
institucionalização do saber. Isto é: o domínio da cultura erudita
passa não pela tradição familiar, mas por academias,
bibliotecas, conservatórios musicais, etc, que selecionam o
material e impõem regras rígidas e complexas elaborações.
Bach, na música, e Ingres, na pintura, são exemplos disso.
Evidentemente, os conceitos popular e erudito
escondem também uma valoração. Por muitos anos, a cultura
popular foi considerada inferior à erudita; e erudito mesmo era
aquilo que era europeu, de preferência francês, inglês ou
alemão. Os brasileiros eram os primos pobres, que tinham que
beber naquelas fontes para se curar de seu incurável atraso.
Esse pensamento foi se transformando ao longo dos anos,
graças às contribuições de autores que, dominando o saber
erudito, reconheciam o valor imenso da cultura popular (Gilberto
Freire, Mário de Andrade e Guimarães Rosa são alguns desses
autores).
Uma manifestação típica da cultura popular brasileira
(junto com a literatura de cordel) é a frase de parachoque de
caminhão, que condensa muito da experiência e do saber
popular. O bom humor do brasileiro, por décadas, foi
literalmente "veiculado" nos parachoques de caminhão. Em
estradas muitas vezes em péssimas condições, ficar atrás de um
caminhão tinha pelo menos uma vantagem: ler a frase do
parachoque. "A vida é um sutiã: a gente tem que meter os
peitos", por exemplo, tem mais força que um tratado acadêmico
sobre a importância do empreendedorismo!
A Mókpi está lançando neste mês de julho (de 2009) o
Baralho do Caminhoneiro, justamente porque acredita no valor
22
das manifestações populares. Como a "filosofia de
caminhoneiro" corria o risco de se perder (existe uma lei que
proíbe a colocação das frases no parachoque, porque elas
distraem a atenção dos motoristas que passam pelo caminhão),
a Mókpi está agora eternizando esta manifestação cultural no
Baralho do Caminhoneiro, para que as novas gerações
conheçam estas "pérolas" e respeitem os sábios anônimos que
as criaram.
Disponível em <http://mokpi.blogspot.com/2009/07/cultura-
popular-e-cultura-erudita.html> acesso: em 20 jan. 2011.

1.3 MULTICULTURALISMO, RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS,


HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA

Multiculturalismo

Hibridismo, diversidade étnica e racial, novas


identidades políticas e culturais: estes são termos diretamente
relacionados ao multiculturalismo. Se a diversidade cultural
acompanha a história da humanidade, o acento político nas
diferenças culturais data da intensificação dos processos de
globalização econômica que anunciam, segundo os analistas,
uma nova fase do capitalismo, denominada por autores como
Ernest Mandel de "capitalismo tardio" e por outros, como Daniel
Bell, de "sociedade pós-industrial". A despeito das querelas
acerca das origens dessa nova fase, o fato é que as discussões
acerca do multiculturalismo acompanham os debates sobre o
pós-modernismo e sobre os efeitos da pós-colonização na cena
contemporânea, o que se verifica de forma mais evidente a
partir dos anos 1970, sobretudo nos Estados Unidos. A
globalização do capital e a circulação intensificada de
informações, com a ajuda de novas tecnologias, longe de
uniformizar o planeta (como propalado por certas interpretações
fatalistas), trazem a afirmação de identidades locais e regionais,
assim como a formação de sujeitos políticos que
reivindicam, com base em garantias igualitárias, o direito à
diferença. Mulheres, negros (ou afro-americanos),
homossexuais, populações latino-americanas ("hispanos" ou
chicanos) e migrantes em geral se fazem presentes como atores
políticos com a marcação de diferenças de gênero, culturais e
étnicas. A cultura torna-se instrumento de definição de políticas
de inclusão social - as "políticas compensatórias" ou as "ações
afirmativas" - que tomam os diversos setores da vida social.
Cotas para minorias, educação bilíngue, programas de apoio aos
grupos marginalizados, ações antirracistas e antidiscriminatórias
são experimentadas em toda parte.
23
Primeiro, é conveniente esclarecer as diferenças entre
multiculturalismo, pluralismo, universalismo e relativismo. O
pluralismo é uma característica de sociedades livres, em que há
a convivência pacífica e respeitosa entre pensamentos
diferentes, atualmente encontrada nos Estados Democráticos de
Direito. Não se pode falar em um pensamento melhor que outro,
pois todos são dignos de respeito. O pluralismo combate o
pensamento único, o que contraria uma das tendências do
processo de globalização. O fenômeno da globalização não
admite diálogo ou outra opção; se é universal, não pode ser
local. Não existe alternativa possível, o mundo deve ser unipolar.
Pauta-se por uma ética individualista, mas sem liberdade para o
indivíduo seguir qualquer plano de vida. Há um único modelo a
ser seguido. A globalização como projeto político e econômico
transmuta-se no neoliberalismo (democracia + livre mercado) e
repercute na seara dos direitos humanos com o plano de
diminuição dos direitos sociais, econômicos e culturais, bem
como com a sobrevalorização dos direitos de propriedade. Não
existem mais pessoas ou cidadãos, mas clientes. O projeto
político mundial é conduzido conforme interesse de grandes
multinacionais.
A Constituição brasileira, em seu preâmbulo, assegura
a pluralidade da sociedade nacional.
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em
Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado
Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos
sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores
supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na
ordem interna e internacional, com a solução pacífica das
controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL (grifo
nosso).
O artigo 5º da mesma Carta assegura a liberdade de
pensamento, de opinião, de culto, de associação, de ofício, de
opção sexual, de casamento, de partido político etc. Sem
embargo, será que realmente o texto constitucional garante a
pluralidade em nosso país? Para garantir a pluralidade, para que
uma sociedade seja plural, as pessoas devem ter a capacidade
de optar por esse ou aquele modelo, e essa opção deve ser livre
e consciente. Liberdade de eleição todos temos, é inerente ao
ser humano. Entretanto, essa liberdade deve manifestar-se
como liberdade moral, que é a ética (opção) privada - de cada
indivíduo. Esta nem todos temos, pois deve ser livre e individual.
Aí entra o Estado, com a ética pública, para garantir que todos
24
teremos condições de optar, com a utilização de políticas de
isonomia, especialmente via garantia de direitos de segunda
geração, que são os direitos econômicos, sociais e culturais.
No multiculturalismo, existe a convivência em um país,
região ou local de diferentes culturas e tradições. Há uma
mescla de culturas, de visões de vida e valores. O
multiculturalismo é pluralista, como já se pode observar, pois
aceita diversos pensamentos sobre um mesmo tema, abolindo o
pensamento único. Há o diálogo entre culturas diversas para a
convivência pacífica e com resultados positivos a ambas.
O problema reside no fato de que o multiculturalismo
pode ser abordado de forma relativista e de forma universalista.
Há a abordagem relativista quando não se estabelecem critérios
mínimos para o diálogo entre culturas, isto é, tudo é aceito e
tudo é correto. O julgamento interno é mais importante do que o
julgamento externo (da sociedade internacional). Nessa
concepção do multiculturalismo, não se pode falar em direitos
humanos universais, pois cada cultura é livre para estabelecer
seus próprios valores e direitos. Não existe a possibilidade de
proteção internacional dos direitos humanos nessa visão.
O multiculturalismo também pode ser universalista, ou
seja, permitir a propagação e convívio de diferentes ideias,
desde que esteja estabelecido um denominador mínimo, comum
entre as partes para o início do diálogo (valores universais). Esse
mínimo a ser respeitado são os direitos humanos. No
universalismo, o julgamento externo sobrepõe-se ao interno.
Sinceramente, creio que cada cultura possui um peso que não
pode ser valorado, mas não vejo como deixar de estabelecer um
padrão mínimo para a convivência entre os povos. O relativismo
permite que sejam aceitas culturas que desejam aniquilar-se
umas com as outras, o que inviabiliza a paz. Com o relativismo,
a Declaração Universal de Direitos Humanos (1948) tem
diminuído seu peso, sua importância. As conquistas advindas
dela deixam de ter seu valor.
No multiculturalismo universalista, pode-se defender o
caráter geral da Declaração Universal de Direitos Humanos
(para todos, em qualquer nação, em qualquer tempo). Esta seria
a base para o convívio entre os povos. Imaginem se em um
condomínio não existissem regras de convivência, sobre como
possuir animais, sobre como jogar o lixo fora, sobre os horários
de festas etc. Imaginem se todas as atitudes de quaisquer
moradores fossem aceitas. Provavelmente os conflitos seriam
maiores. Como realizar intervenções humanitárias? No
relativismo o peso da soberania ganha novo fôlego na sociedade
internacional, podendo justificar inação dos agentes globais e
graves violações aos direitos humanos.
25
Assim, a defesa dos direitos humanos universais é
compatível com o pluralismo e com o multiculturalismo
universalista, mas é totalmente inviável em um ambiente de
multiculturalismo relativista. Pode-se dizer que é uma visão
ocidental e limitada, mas não vejo possibilidade em conciliar
toda e qualquer prática em nosso mundo. Não consigo ver como
aceitável ou com a possibilidade de me adaptar à circuncisão
feminina em diversos países da África do Norte, à discriminação
feminina em diversos países, à sacrifícios humanos etc. O direito
à diferença e o respeito às tradições culturais devem ter um
limite, e este limite são os direitos humanos.
Falar de tolerânciaem situações abusivas aos direitos
humanos é ser indiferente. A defesa do pluralismo não pode ser
deturpada, pois o ser humano precisa estar acima de qualquer
tradição ou prática. Essa deturpação me parece ser o
relativismo, que permite até a quebra do próprio relativismo, ao
permitir que uma cultura destrutiva ganhe espaço na sociedade
internacional e, com o tempo, destrua essa própria sociedade
por não seguir seus valores belicosos, acabando com o
multiculturalismo relativista (ldem p/ democracia s/ direitos
fundamentais).
Destaco que as concepções relativista e universalista
do multiculturalismo somente serão importantes quando
possuírem um objeto moral também importante, que são os
direitos humanos. Tradições e costumes que não afetam esse
catálogo mínimo de direitos não devem sofrer alteração por um
julgamento externo, o da sociedade internacional. Aí, prevalece
o entendimento do grupo social.
A palavra tolerância pode significar a preponderância
do meu pensamento sobre o do outro. Eu tolero o outro, eu o
aguento, eu o suporto. Os relativistas não admitem o termo
tolerância, pois afirmam que desiguala os conceitos e tradições,
com a existência de uma superior.
Garantir direitos mínimos, que são os direitos humanos,
é assegurar que todos terão liberdade moral (dignidade),
capacitando os indivíduos a que realizem seus planos de vida
com liberdade e consciência. Uma lista mínima de direitos não
me parece atentar contra identidades culturais deste ou daquele
povo. Creio ser plausível pelo menos uma regra mínima como
ponto de partida para o diálogo entre culturas: a de não
prejudicar terceiros. Parece-me que universalizar um direito tem
um peso muito forte na sociedade internacional, o que permite
tirar um pouco da carga desta expressão com a universalização
de um valor, que é o de respeito à dignidade humana, como
ocorre em quase todas as religiões do mundo. A partir daí pode-

26
se permitir que as mais diversas tradições culturais se
manifestem com toda plenitude e liberdade.
Universalizar, ao contrário do que pensam alguns
autores, não é uniformizar as ideias, criar um pensamento único.
Trata de levar a todo o planeta um marco mínimo de respeito
entre as mais diversas culturas, para que haja diálogo entre
elas. Esse diálogo deve ser produtivo, ao contrário do que
ocorreria com o relativismo, pois não haveria como chegar a um
mínimo de entendimento. A partir deste marco, que são os
direitos fundamentais, cada povo tem a máxima liberdade de
expressar suas tradições e crenças.
É verdade que a universalidade dos direitos humanos
tem sido utilizada no curso da história para justificar
intervenções imperialistas de alguns Estados em outros povos,
como ocorreu no colonialismo e no neocolonialismo, assim
como, mais recentemente, na invasão americana ao Estado
soberano do Iraque. Apesar disso, essas manipulações do Direito
devem ser vistas como patologias e não como o próprio Direito,
pois este tem como meta a convivência pacífica entre os povos,
com a proibição de excessos na seara internacional.
Confesso que se existisse a possibilidade de um diálogo
entre culturas em um marco relativista, eu seria relativista. Isso
poderia acontecer se eu acreditasse no caráter bom e pacífico
do ser humano, o que não é verdade. Se não houvesse a
possibilidade de que determinado povo fizesse o mal a outro
grupo ou indivíduo, não necessitaríamos de um catálogo mínimo
de direitos, pois a base já estaria pronta – respeito à dignidade
humana. Entretanto, não é isso que temos visto na história do
homem. Ao contrário, mecanismos artificiais de contenção do
homem têm sido desenvolvidos desde o seu aparecimento no
planeta, por intermédio da religião, da filosofia, da ciência e,
mais recentemente, do Direito. (Adaptado de Multiculturalismo e
direitos humanos, artigo de Marcus Vinícius Reis, disponível em
http://www.senado.gov.br/sf/senado/spol/pdf/ReisMulticulturalis
mo.pdf.)
Os efeitos dos debates sobre o multiculturalismo no
Brasil mereceriam uma discussão à parte, dada a sua
complexidade. País de raízes mestiças, e que não constitui
historicamente minorias que se organizam como comunidades
apartadas do conjunto - os migrantes assimilam à sociedade
nacional -, o Brasil parece ficar à margem dessas discussões até
a década de 1980, data do fortalecimento e visibilidade das
chamadas minorias étnicas, raciais e culturais. A pressão dos
novos atores sociais reverbera diretamente no texto da
Constituição de 1988, considerada um marco em termos da
admissão do nosso pluralismo étnico. Os efeitos dessas formas
27
renovadas de engajamento podem ser observados no campo da
produção artística, sobretudo da literatura fala-se em "escrita
feminina", em "vozes negras", homoerótico etc.). Na música
jovem, das periferias urbanas, define-se o espaço de uma
cultura negra: o funk, o rap, o hip hop. O campo das artes
visuais recebe o impacto dessas problemáticas - a experiência
das minorias aparece tematizada em um ou outro artista -, ainda
que pareça difícil localizar aí uma produção de cunho
multicultural com contornos definidos.

Relações étnico-raciais

É muito importante que as crianças e adolescentes do


Semi-árido tomem conhecimento de suas culturas locais, como
parte integrante da cultura da nação brasileira, que se
empenhem na sua valorização, sobretudo a partir das escolas
onde estudam, atendendo ao que determina a legislação
específica em vigor.
A Lei 10. 639/03, por exemplo, é da maior importância,
na medida em que altera a atual Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB), ao instituir a obrigatoriedade do
ensino da história e cultura afro-brasileira e africana no
currículo, em todos os sistemas e modalidades de ensino do
país.
Entre a população indígena, a luta maior é por uma
educação escolar diferenciada, que respeite a sua diversidade
cultural e lingüística, garantida pela Constituição de 1988 e pela
Resolução 03 da Câmara de Educação Básica – CEB, de
novembro de 1999.
Segundo o Censo Escolar de 2003, existem 149.311
estudantes indígenas que freqüentam a educação básica no
Brasil, em mais de 2000 escolas indígenas.
Indígenas e afro-brasileiros ainda são vistos na escola
de forma preconceituosa e estereotipada, ou seja, sem respeito
a suas características étnicas e culturais. Dois documentos
podem ajudar a comunidade e a escola a mudar essa visão, com
uma abordagem que garanta os direitos educacionais e culturais
dessas populações. Esses documentos são o Referencial
Curricular Nacional para as Escolas Indígenas – RCNEI e as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
étnico-raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-
brasileira e Africana.
As políticas públicas para o Semi-árido deverão estar
comprometidas com a superação das desigualdades raciais na
região, a partir da escola e de seus principais agentes –
professores e alunos – para que educação e cultura caminhem
28
juntas na promoção da igualdade e da justiça social.

História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena

A força da cultura de negros/ as e indígenas pode ser


vista em todos os momentos cotidianos da vida. Nos seus
modos diversos de falar, andar, comer, orar, celebrar e brincar,
estão inscritas as marcas civilizatórias desses povos que,
ancorados na dimensão do sagrado, celebram e respeitam a
vida e a morte, mantendo uma relação ética com a natureza. É
através destas formas cotidianas de se expressar e de ver o
mundo que indígenas e afro-brasileiros/as têm resistido
culturalmente na manutenção de sua história.
A importância de crianças e adolescentes,
independente da raça, etnia ou cor da pele, serem estimuladas
a reconhecer e valorizar as identidades culturais da sua região –
que podem estar presentes em quilombos, terreiros, aldeias,
bairros populares, assentamentos e outros territórios – é que
elas podem se orgulhar de que a cultura da sua localidade
integra a diversidade que caracteriza a cultura brasileira.
Cultura, como sabemos, é tudo que as pessoas lançam
mão para construir sua existência, tanto em termos materiais
como espirituais, envolvendo aspectos físicos e simbólicos. A
cultura é um patrimônio importante de um povo, porque resulta
dos conhecimentos compartilhados entre as pessoas de um
lugar, e vai passando e sendo recriada, de geração em geração.
É a cultura que nos diz em que acreditar, influencia os nossos
modos de ser e estar no mundo, de agir, sentir e nos relacionar
com o natural e o social.
Como são e como vivem as pessoas de cada município?
Como se relacionam com as culturas indígena e afro-brasileira?
Como lembram os antepassados, quais suas lutas para
sobreviver, seus valores, crenças, suas formas de lazer? As
culturas de origem africana e indígena possuem uma
diversidade enorme, mas, de modo geral, é possível identificar
algumas características bastante semelhantes. Trata-se de
povos que incluem crianças, jovens, adultos/ as, idosos/as,
preservam a vida natural e social, se organizam por meio da
participação coletiva, se juntam em torno de objetivos comuns...
Mas, os modos como vivenciam essas experiências variam
bastante. A dimensão sagrada é outra característica importante.
Possuem vários deuses e deusas – a lua, a água, o sol, as
plantas; acreditam no poder de cura desses elementos, sempre
relacionando corpo físico e espiritual.
Nestas sociedades, o ensinar/aprender está muito
presente. Historicamente, essas sociedades foram atingidas por
29
diversas formas de violência física e cultural, ameaças de
dissolução e deformação. Por isso, é tão importante trazer à
tona suas histórias e culturais, nem sempre valorizadas e
reconhecidas como deveriam.
Importante também é observar como as pessoas de
mais idade ou as envolvidas nas religiões de matriz africana e
indígena elaboram visões de mundo, a partir das suas vivências
e sentimentos. Isso é um legado, um patrimônio, uma herança,
“bens de família”, uma memória.
Ouvindo as histórias das pessoas mais velhas, se
conhecem mais as tradições, identifica-se um patrimônio que se
perpetuou e se recriou nos mais diversos contextos e situações.
Assim, independente da forma como são denominados ou se
autodenominam na região – negros/ as, índios/ as, caboclos/ as,
sertanejos – as influências indígenas e afro-brasileiras podem
estar presentes nas suas formas de ser e viver, embora isto nem
sempre seja explicitamente mencionado.

Identidade, Ancestralidade e Resistência: Marcas das


Culturas Indígenas e Afro-brasileiras no Brasil

Identidade indígena e identidade negra têm a ver com


as tradições desses povos, encontradas nas memórias, nas
manifestações artísticas e religiosas, muitas vezes recriadas ou
reinterpretadas em função dos contextos socioculturais onde
ocorrem. Assim, em cada região ou município, essas culturas
apresentam características distintas, que formam uma
identidade étnico-racial. Crianças e adolescentes no Semi-árido,
portanto, possuem identidades diferenciadas. Daí a necessidade
de procurar perceber as muitas formas como a identidade
indígena e a identidade negra se apresentam na cultura do
município.
A ancestralidade – respeito aos que existiram e aos que
virão – consiste numa relação equilibrada entre o passado, o
presente e o futuro, remetendo para a valorização das pessoas
que nos antecederam, suas lutas, suas histórias e o papel das
gerações atuais na continuidade de seus feitos, transmitindo a
um tempo futuro aquilo que fizeram e tiveram de melhor.
A resistência mostra o processo de luta pela
sobrevivência física e cultural dos povos indígenas e negros no
Brasil, por meio de práticas sociais, políticas, culturais e
religiosas, fazendo com que se mantivessem conhecimentos
ancestrais próprios que fortalecem a identidade étnico-racial.

Expressões Culturais Afro-Brasileiras e Indígenas

30
O selo Município Aprovado 2008 está dando visibilidade
às formas como indígenas de diversas etnias e afro-brasileiros,
em modos de vida também diferenciados, têm preservado suas
culturas, através de diversas expressões e linguagens,
destacando-se grupos de hip-hop, capoeira, blocos
carnavalescos, afoxés, maracatus, bumba-meu-boi, caboclinhos,
ternos de reis e muitos outros eventos, histórias, personalidades
da cultura brasileira, como exemplificado nos quadros a seguir.

 EVENTOS compreendem festas, festivais,


acontecimentos, apresentações teatrais, de dança, recitais,
poéticos, exposições de artes plásticas; bumba-meu-boi,
maracatus, reinados do congo, afoxés maculelê, ternos e folias
de reis, tambor-de-crioula, cantos de trabalho, ritos de
passagem, casamentos, cantorias, cordel, quadrilhas juninas,
sambas, que tenham a cultura negra e/ou indígena evidenciada.

 OFÍCIOS E MODOS DE FAZER são processos de


trabalho e produtos obtidos, próprios do município ou da região
e que são característicos do viver, celebrar, conviver, cuja
origem e história se baseiam nas civilizações indígenas e/ou
africanas. Estas expressões culturais podem ser encontradas
nas artes e no artesanato, na fabricação de instrumentos e
outros objetos de uso religioso, na culinária. São exemplos:
cerâmica, cestarias, cocares, pinturas corporais, ferramentas de
orixás, carranca, acarajé, panos-da-costa, penteados, trançados
e outros.

 MITOS, CONTOS, HISTÓRIAS são contados,


geralmente, pelas pessoas mais velhas, que conhecem a
história e a cultura e têm prazer de repassar aos que não
vivenciaram, os quais passam a conhecer e se orgulhar de seu
pertencimento étnico-racial. A memória cultural de uma
localidade é o maior bem que ela possui. É a tradição oral que
faz este bem circular, ganhar mundo, organizando a vida, as
ideias, mantendo e preservando a riqueza cultural de um povo.
Isto faz parte da cultura de cada localidade, mostrando o jeito
como as pessoas se relacionam, se vinculam ao passado e à
tradição, dando continuidade à existência. Nas culturas indígena
e negra, essas histórias são a forma principal de transmissão e
preservação do conhecimento e da sua cultura, que assim têm
resistido, com o passar do tempo, à massificação e suas
tendências uniformizantes e descartáveis.

 LUGARES E CONSTRUÇÕES são espaços

31
construídos ou naturais, como terreiros, territórios quilombolas,
aldeias e reservas indígenas, mercados, feiras, rios, cachoeiras,
praias, mangues, açudes, que traduzem a experiência afro-
brasileira e indígena no município e são testemunhos de
passagens importantes da história local.

 HISTÓRIAS DOS LOCAIS E DOS TERRITÓRIOS são


narrativas que contam um pouco da vida do município e /ou de
uma comunidade específica, resgatando suas origens, como
surgiu, se existe há muito tempo, quem foram seus pioneiros, se
já foi maior, se já pertenceu a outro município etc., além de
explanações sobre como o município se encontra atualmente e
também a história dos seus bairros, comunidades e distritos.

 LIDERANÇAS E PERSONALIDADES são pessoas


que têm um trabalho reconhecido por grande parte da
população. Geralmente, são grandes líderes religiosos, artistas,
com conhecimentos importantíssimos e enorme experiência de
vida, que se incubem de representar e cuidar de seu povo e
repassar os modos de celebração e de cura aprendidos de seus
ancestrais, como caciques, mães e pais de santo, pajés,
guerreiros e outros.

 INTITUIÇÕES, ENTIDADES E LOCAIS


representativas da população indígena e negra do município,
tais como: associações e grupos culturais ou comunitários –
filarmônicas, grupos de folguedos, danças populares –terreiros,
organizações não governamentais, etc. Esta área permite
perceber o grau de organização popular no município, quem são
as lideranças, o reconhecimento dos trabalhos realizados por
essas organizações.

 EXPRESSÕES E VOCÁBULOS locais e regionais são


expressões lingüísticas de origem indígena e africana que
permanecem no falar cotidiano do povo, sua linguagem
específica e seus mais diversos significados.

As formas de participação nessas expressões culturais


são mais coletivas que individuais. As atividades de
identificação, escolha e registro da expressão, fiéis a este
princípio de participação, envolverão professores e professoras,
alunos e alunas, lideranças culturais e religiosas, reconhecendo
o valor e a legitimidade, não só das expressões culturais, mas
das pessoas e civilizações que as geram.
Expressões culturais afro-brasileiras e indígenas

32
buscam fortalecer a identidade étnico-racial; promovem a auto-
estima e a autoconfiança de negros e negras e de indígenas;
têm forte relação coma memória e a tradição oral; resgatam
processos de luta e resistência, valorizam e mostram os feitos
dessas populações; trazem aspectos negados dessas culturas.

Adaptado de: (Fonte:Selo UNICEF. Guia de orientação para os


municípios. Elaboração CEAFRO (Educação e profissionalização
para Igualdade Racial e de
gênero). Edição 2008. Pág. 6 à 17.)

1.4 INDÚSTRIA CULTURAL

A indústria cultural ou cultura de massa

A expressão “cultura de massa” foi muito usada,


principalmente pelos norte-americanos. Os sociólogos
americanos criaram a expressão mass culture, que foi moeda
corrente até os anos 1950. Nos anos 1950 falava-se em mass
communication, mass culture, muitos livros traziam esses
títulos. Mas na Europa, particularmente na Alemanha, com a
Escola de Frankfurt (Adorno, Horkheimer, filósofos marxistas)
implantou-se uma forte tendência humanista. Estes filósofos
eram críticos da cultura de massas e eles próprios,
sobretudo Adorno, julgaram que essa expressão era
inadequada, porque cultura de massas poderia dar a
impressão de que é uma cultura produzida pelas massas;
cultura de massas, como se as massas, que são alguma coisa
anônima, (massas de uma cidade, massas de um país – a
palavra “massa” já é por si anônima) produzissem cultura.

Indústria cultural

 Conceito formulado pelos filósofos alemães Adorno e


Horkheimer, em 1947.
 É fruto de uma sociedade capitalista industrializada,
onde até mesmo a cultura é vista como produto a ser
comercializado.
 É a exploração com fins econômicos e comerciais de
bens considerados culturais.
 Tudo que é produzido pelo sistema industrializado de
produção cultural (TV, rádio, jornal, revistas, etc) elaborado de
forma a influenciar, aumentar o consumo, transformar hábitos,
educar, informar, etc.

33
 I.C. tem como único objetivo a dependência e a
alienação dos homens. Ao maquiar o mundo nos anúncios que
divulga, ela acaba seduzindo as massas para o consumo de
mercadorias culturais.
 I.C. promove a resignação, manipula as distrações,
permanece ligada aos clichês ideológicos e chavões que
perpetuam os estereótipos e que são repetidas à exaustão.
Indústria cultural é o nome genérico que se dá ao
conjunto de empresas e instituições cuja principal atividade
econômica é a produção de cultura, com fins lucrativos e
mercantis. No sistema de produção cultural encaixam-se a
TV, o rádio, jornais, revistas, entretenimento em geral; que
são elaborados de forma a aumentar o consumo, modificar
hábitos, educar, informar, podendo pretender ainda, em alguns
casos, ter a capacidade de atingir a sociedade como um todo.
Desde a década de 1990, seis empresas transnacionais
tomaram conta de 96% do mercado mundial de música. No que
se refere ao cinema a situação é ainda mais chocante. Mais de
90% das telas norte-americanas só exibem filmes feitos no
próprio país. O americano comum, portanto, não conhece o que
se faz no estrangeiro. E o que se produz, na verdade, é pouco --
85% dos filmes exibidos em todo o planeta brotam de
Hollywood.
Para a filósofa Marilena Chauí, a indústria cultural
vende cultura. Para vendê-la, deve seduzir e agradar o
consumidor. Para seduzi-lo e agradá-lo, não pode chocá-lo,
provocá-lo, fazê-lo pensar, fazê-lo ter informações novas que o
perturbem, mas deve devolver-lhe, com nova aparência, o que
ele já sabe, já viu, já fez. A “média” é o senso comum
cristalizado que a indústria cultural devolve com cara de coisa
nova
Ela define a cultura como lazer e entretenimento,
diversão e distração, de modo que tudo o que nas obras de arte
e de pensamento significa trabalho da sensibilidade, da
imaginação, da inteligência, da reflexão e da crítica não tem
interesse, não “vende”. Massificar é, assim, banalizar a
expressão artística e intelectual. Em lugar de difundir e divulgar
a cultura, despertando interesse por ela, a indústria cultural
realiza a vulgarização das artes e dos conhecimentos.
É dentro deste contexto que ele formula o conceito de
Indústria Cultural que ocorre, pela primeira vez, em 1947, na
obra Dialética do Iluminismo, escrita em parceria com
Horkheimer, na qual defende que o Iluminismo, tido como um
esforço consciente de valorização da razão .

34
Indústria Cultural é a exploração, com fins comerciais
e econômicos, de bens considerados culturais, não só daqueles
criados unicamente para os fins citados, mas também daqueles
genuinamente culturais, como por exemplo, a festa dos bois
bumbás de Parintins (AM), que se descaracterizou a partir da
exploração econômica que a transformou numa indústria.
A Indústria Cultural é a indústria da cultura, indústria
stricto sensu. Nela, há classificação e padronização dos
consumidores através das distinções entre filmes A e B, por
exemplo, as quais não estão calcadas na realidade – são
artificiais: prevê-se, para todos, um tipo de arte a ser
“consumida”, assim, ninguém escapa.
A publicidade é, hoje, um exemplo forte da Indústria
Cultural porque ambas estão fundidas. A função de um
publicitário é fazer com que o consumidor compre aquilo que ele
não precisa com o dinheiro que ele não tem; ele, de fato,
consegue cumpri-la: quando produz uma propaganda, já sabe
qual público atingir porque pesquisou, anteriormente, suas
necessidades (que foram construídas por ele próprio). Deste
modo, o consumidor é o objeto da Indústria Cultural. A Indústria
Cultural extermina o que é particular, nega a particularização,
seja a cor, a composição, a arquitetura.
O que a Indústria Cultural fornece, de fato, é a vida
cotidiana, a verdadeira imagem do mundo tal qual ela se
apresente; ela promove a resignação que se quer esquecer
nela, estraga o prazer, manipula as distrações, permanece
voluntariamente ligada aos clichês ideológicos da cultura em
vias de liquidação, defende e justifica a arte física em confronto
com a arte espiritual, não tem substância e despersonaliza o
humano contra o mecanismo social.
O melhor sinônimo para Indústria Cultural é, hoje, a
globalização: processo de aceleração capitalista que vem
ocorrendo desde a Pré-história, mas que só recentemente
ganhou a velocidade da luz; pode criar uma civilização
genuinamente transnacional alimentada pela exposição à
tecnologia e pelas mesmas fontes de informação; possui um
tremendo potencial para solucionar os problemas do homem
contemporâneo e pode criar riquezas num ritmo alucinante.

Arte, Indústria Cultura e Educação

Quando a Indústria Cultural privilegia um produto


pseudo-artístico padronizado, calculado tecnicamente para
surtir efeitos determinados de modo a serem por todos
desejados e repetidos, na forma e na medida adequados a
garantir o poder e o lucro do sistema dominante.
35
Como consequência dessa massificação, podemos
considerar que o fato de se ter acesso somente à cultura de
massa acaba por não permitir ao indivíduo a aquisição do
conhecimento de outros aspectos culturais que expressam a
cultura do povo, seus valores e suas lutas. Em nosso entender, a
música é a expressão do pensar e do sentir das pessoas de
uma determinada época. Além de proporcionar prazer, ela
também pode informar e conscientizar. Portanto, para nós, esta
postura de consumo significa estar à margem da cultura como
um todo.
Adorno considera que a Indústria Cultural prostitui
os valores estéticos da arte, dando-lhe uma falsa imagem. A
música tornou-se um fundo convencionalmente necessário e
repetitivo. O público a escuta de forma infantil ou não a escuta.
Vemos que essa crítica é muito atual quando sintonizamos
qualquer emissora de rádio ou de televisão preocupadas, tão
somente, com o sentido mercadológico da arte musical. Os
ritmos e as letras das músicas são sempre idênticos, não
acrescentando absolutamente nada à nossa formação cultural e
como pessoa.
As implicações da chamada "música de mercado"
influenciam, tanto no aspecto cultural como no social, a
formação das crianças. De maneira especial, seduzem-nas
pela sensualidade das danças e das letras musicais,
acarretando um desenvolvimento precoce de aspectos da
sexualidade que atropelam, de alguma forma, seu
desenvolvimento afetivo. Isso sem falar em outros aspectos,
pois o vocabulário pobre e equivocado de muitas músicas acaba
por interferir, também, em seu processo de desenvolvimento
cognitivo. Veja este funk: “Mas se liga aí novinha, por favor tu
não se engane. Abre as pernas e relaxa. Que esse é o Bonde do
Inhame. Que esse é o Bonde do Inhame. Esse é o bonde dos cria
que enfogueta as novinhas. Esse é o bonde dos cria que
enfogueta as novinhas. Vai na treta do Nem que a Kátia tá
também eeemmm. Larga o inhame na Silvinha.”
No dizer de Adorno (1999, p. 67), a música atual, ao
invés de entreter, parece contribuir "para o emudecimento dos
homens, para a morte da linguagem como expressão, para a
incapacidade de comunicação".
A música de entretenimento preenche os vazios do
silêncio que se instalam entre as pessoas deformadas pelo
medo, pelo cansaço e pela docilidade de escravos sem
exigências. Assume ela em toda parte, e sem que se perceba, o
trágico papel que lhe competia ao tempo e na situação
específica do cinema mudo. A música de entretenimento serve
ainda e apenas como fundo.
36
A cultura popular individualizada

Feita a exposição dos três tipos de cultura, a erudita, a


popular e a de massa, é provável que o leitor esteja se
perguntando onde encaixar algumas produções culturais
como, por exemplo, a música de Caetano Veloso, Chico
Buarque e de Adoniran Barbosa, as peças de teatro de
Guarnieri ou o teatro de revista.
Trata-se da cultura popular individualizada, que se
caracteriza por ser produzida por escritores, compositores,
artistas plásticos, dramaturgos, cineastas, enfim,
intelectuais que não vivem dentro da universidade (e
portanto não produzem cultura erudita), nem são típicos
representantes da cultura popular (que se caracteriza pelo
anonimato) nem da cultura de massa (que resulta do trabalho
de equipe).
O criador individual sofre a influência de todas
essas expressões culturais e, "nessa luta, a obra é tanto
mais rica e densa e duradoura quanto mais intensamente o
criador participar da dialética que está vivendo a sua própria
cultura, também ela dilacerada entre instâncias 'altas',
'internacionalizastes' e instâncias populares".

Educar para qual cultura?

As diversas manifestações culturais são expressões


diferentes de uma sociedade pluralista, e não tem sentido
tecer considerações a respeito da superioridade de uma sobre
outra, o que leva à depreciação, quando a avaliação é feita
segundo parâmetros válidos para outro tipo de cultura.

37
TEMA 2 - O CONHECIMENTO EM SEUS DIVERSOS
ASPECTOS

2.1 TIPOS DE CONHECIMENTOS (RELIGIOSO, VULGAR,


FILOSÓFICO E CIENTÍFICO)
2.2 SENSO COMUM x CONHECIMENTO CIENTÍFICO
2.3 CIÊNCIAS EXATAS / CIÊNCIAS HUMANAS
2.4 MÉTODO CIENTÍFICO

Introdução

No processo de apreensão da realidade do objeto, o


sujeito cognoscente pode penetrar em todas as esferas do
conhecimento: ao estudar o homem, por exemplo, pode-se tirar
uma série de conclusões sobre a sua atuação na sociedade,
baseada no senso comum ou na experiência cotidiana; pode-se
analisá-lo como um ser biológico, verificando através de
investigação experimental, as relações existentes entre
determinados órgãos e suas funções; pode-se questioná-lo
quanto à sua origem e destino, assim como quanto à sua
liberdade; finalmente, pode-se observá-lo como ser criado pela
divindade, à sua imagem e semelhança, e meditar sobre o que
dele dizem os textos sagrados.
Apesar da separação metodológica entre os tipos de
conhecimento popular, filosófico, religioso e científico, estas
formas de conhecimento podem coexistir na mesma pessoa: um
cientista, voltado, por exemplo, ao estudo da física, pode ser
crente praticante de determinada religião, estar filiado a um
sistema filosófico e, em muitos aspectos de sua vida cotidiana,
agir segundo conhecimentos provenientes do senso comum.
Ao se falar em conhecimento científico, o primeiro
passo consiste em diferenciá-lo de outros tipos de conhecimento
existentes. Para tal, analisemos uma situação histórica, que
pode servir de exemplo.
Desde a Antiguidade, até aos nossos dias, um
camponês, mesmo iletrado e/ou desprovido de outros
conhecimentos, sabe o momento certo da semeadura, a época
da colheita, a necessidade da utilização de adubos, as
providências a serem tomadas para a defesa das plantações de
ervas daninhas e pragas e o tipo de solo adequado para as
diferentes culturas. Tem também conhecimento de que o cultivo
do mesmo tipo, todos os anos, no mesmo local, exaure o solo. Já
no período feudal, o sistema de cultivo era em faixas: duas
cultivadas e uma terceira "em repouso", alternando-as de ano
para ano, nunca cultivando a mesma planta, dois anos seguidos,
numa única faixa. O início da Revolução Agrícola não se prende
38
ao aparecimento, no século XVIII, de melhores arados, enxadas
e outros tipos de maquinaria, mas à introdução, na segunda
metade do século XVII, da cultura do nabo e do trevo, pois seu
plantio evitava o desperdício de deixar a terra em pousio: seu
cultivo "revitalizava" o solo, permitindo o uso constante. Hoje, a
agricultura utiliza-se de sementes selecionadas, de adubos
químicos, de defensivos contra as pragas e tenta-se, até, o
controle biológico dos insetos daninhos.
Mesclam-se, neste exemplo, dois tipos de
conhecimento: o primeiro, vulgar ou popular, geralmente típico
do camponês, transmitido de geração para geração por meio da
educação informal e baseado em imitação e experiência
pessoal; portanto, empírico e desprovido de conhecimento sobre
a composição do solo, das causas do desenvolvimento das
plantas, da natureza das pragas, do ciclo reprodutivo dos insetos
etc.; o segundo, científico, é transmitido por intermédio de
treinamento apropriado, sendo um conhecimento obtido de
modo racional, conduzido por meio de procedimentos científicos.
Visa explicar "por que" e "como" os fenômenos ocorrem, na
tentativa de evidenciar os fatos que estão correlacionados,
numa visão mais globalizante do que a relacionada com um
simples fato - uma cultura específica, de trigo, por exemplo.

2.1 OS QUATRO TIPOS DE CONHECIMENTO

Existem pelo menos quatro tipos fundamentais de


conhecimento, que são: o conhecimento popular (senso
comum), conhecimento religioso, conhecimento filosófico e
conhecimento religioso(teológico).Trujillo (1974, p.11)
sistematiza as características dos quatro tipos de conhecimento:

Conhecimento Popular Conhecimento Científico


Valorativo Real (factual)
Reflexivo Contingente
Assistemático Sistemático
Verificável verificável
Falível Falível
Inexato Aproximadamente exato

Conhecimento Filosófico Conhecimento Religioso


(Teológico)
Valorativo Valorativo
Racional Inspiracional
Sistemático Sistemático
Não Verificável Não Verificável
39
Infalível Infalível
Exato Exato

Conhecimento Popular

O conhecimento popular é valorativo por excelência,


pois se fundamenta numa seleção operada com base em
estados de ânimo e emoções: como o conhecimento implica
uma dualidade de realidades, isto é, de um lado o sujeito
cognoscente e, de outro, o objeto conhecido, e este é possuído,
de certa forma pelo cognoscente, os valores do sujeito
impregnam o objeto conhecido. É também reflexivo, mas,
estando limitado pela familiaridade com o objeto, não pode ser
reduzido a uma formulação geral. A característica de
assistemático baseia-se na "organização" particular das
experiências próprias do sujeito cognoscente, e não em uma
sistematização das idéias, na procura de uma formulação geral
que explique os fenômenos observados, aspecto que dificulta a
transmissão, de pessoa a pessoa, desse modo de conhecer. É
verificável, visto que está limitado ao âmbito da vida diária e diz
respeito àquilo que se pode perceber no dia-a-dia. Finalmente é
falível e inexato, pois se conforma com a aparência e com o que
se ouviu dizer a respeito do objeto. Em outras palavras, não
permite a formulação de hipóteses sobre a existência de
fenômenos situados além das percepções objetivas.

Conhecimento Filosófico

O conhecimento fIlosófico é valorativo, pois seu ponto


de partida consiste em hipóteses, que não poderão ser
submetidas à observação: "as hipóteses filosóficas baseiam-se
na experiência, portanto, este conhecimento emerge da
experiência e não da experimentação" (TRUJILLO, 1974.p. 12);
por este motivo, o conhecimento fIlosófico é não verificável, já
que os enunciados das hipóteses filosóficas, ao contrário do que
ocorre no campo da ciência, não podem ser confirmados nem
refutados. É racional, em virtude de consistir num conjunto de
enunciados logicamente correlacionados. Tem a característica
de sistemático, pois suas hipóteses e enunciados visam a uma
representação coerente da realidade estudada, numa tentativa
de apreendê-la em sua totalidade. Por último, é infalível e exato,
já que, quer na busca da realidade capaz de abranger todas as
outras, quer na definição do instrumento capaz de apreender a
realidade, seus postulados, assim como suas hipóteses, não são
submetidos ao decisivo teste da observação (experimentação).
Portanto, o conhecimento filosófico é caracterizado pelo esforço
40
da razão pura para questionar os problemas humanos e poder
discernir entre o certo e o errado, unicamente recorrendo às
luzes da própria razão humana. Assim, se o conhecimento
científico abrange fatos concretos, positivos, e fenômenos
perceptíveis pelos sentidos, através do emprego de
instrumentos, técnicas e recursos de observação, o objeto de
análise da filosofia são idéias, relações conceptuais, exigências
lógicas que não são redutíveis a realidades materiais e, por essa
razão, não são passíveis de observação sensorial direta ou
indireta (por instrumentos), como a que é exigida pela ciência
experimental. O método por excelência da ciência é o
experimental: ela caminha apoiada nos fatos reais e concretos,
afirmando somente aquilo que é autorizado pela
experimentação. Ao contrário, a filosofia emprega "o método
racional, no qual prevalece o processo dedutivo, que antecede a
experiência, e não exige confirmação experimental, mas
somente coerência lógica" (RUIZ, 1979, p. 110). O procedimento
científico leva a circunscrever, delimitar, fragmentar e analisar o
que se constitui o objeto da pesquisa, atingindo segmentos da
realidade, ao passo que a filosofia encontra-se sempre à procura
do que é mais geral, interessando-se pela formulação de uma
concepção unificada e unificante do universo. Para tanto,
procura responder às grandes indagações do espírito humano e,
até, busca as leis mais universais que englobem e harmonizem
as conclusões da ciência.

Conhecimento Religioso
O conhecimento religioso, isto é, teológico, apóia-se em
doutrinas que contêm proposições sagradas (valorativas), por
terem sido reveladas pelo sobrenatural (inspiracional) e, por
esse motivo, tais verdades são consideradas infalíveis e
indiscutíveis (exatas); é um conhecimento sistemático do mundo
(origem, significado, finalidade e destino) como obra de um
criador divino; suas evidências não são verificadas: está sempre
implícita uma atitude de fé perante um conhecimento revelado.
Assim, o conhecimento religioso ou teológico parte do princípio
de que as "verdades" tratadas são infalíveis e indiscutíveis, por
consistirem em "revelações" da divindade (sobrenatural). A
adesão das pessoas passa a ser um ato de fé, pois a visão
sistemática do mundo é interpretada como decorrente do ato de
um criador divino, cujas evidências não são postas em dúvida
nem sequer verificáveis. A postura dos teólogos e cientistas
diante da teoria da evolução das espécies, particularmente do
Homem, demonstra as abordagens diversas: de um lado, as
posições dos teólogos fundamentam-se nos ensinamentos de
textos sagrados; de outro, os cientistas buscam, em suas
41
pesquisas, fatos concretos capazes de comprovar (ou refutar)
suas hipóteses. Na realidade, vai-se mais longe. Se o
fundamento do conhecimento científico consiste na evidência
dos fatos observados e experimentalmente controlados, e o do
conhecimento filosófico e de seus enunciados, na evidência
lógica, fazendo com que em ambos os modos de conhecer deve
a evidência resultar da pesquisa dos fatos ou da análise dos
conteúdos dos enunciados, no caso do conhecimento teológico o
fiel não se detém nelas à procura de evidência, pois a toma da
causa primeira, ou seja, da revelação divina.

Conhecimento Científico

Finalmente, o conhecimento científico é real (factual)


porque lida com ocorrências ou fatos, isto é, com toda "forma de
existência que se manifesta de algum modo" (TRUJILO, 1974, p.
14). Constitui um conhecimento contingente, pois suas
proposições ou hipóteses têm sua veracidade ou falsidade
conhecida através da experiência e não apenas pela razão,
como ocorre no conhecimento filosófico. É sistemático, já que se
trata de um saber ordenado logicamente, formando um sistema
de idéias (teoria) e não conhecimentos dispersos e desconexos.
Possui a característica da verificabilidade, a tal ponto que as
afirmações (hip6teses) que não podem ser comprovadas não
pertencem ao âmbito da ciência. Constitui-se em conhecimento
falível, em virtude de não ser definitivo, absoluto ou final e, por
este motivo, é aproximadamente exato: novas proposições e o
desenvolvimento de técnicas podem reformular o acervo de
teoria existente.
Apesar da separação "metodológica" entre os tipos de
conhecimento popular, filosófico, religioso e científico, no
processo de apreensão da realidade do objeto, o sujeito
cognoscente pode penetrar nas diversas áreas: ao estudar o
homem, por exemplo, pode-se tirar uma série de conclusões
sobre sua atuação na sociedade, baseada no senso comum ou
na experiência cotidiana; pode-se analisá-lo como um ser
biol6gico, verificando, através de investigação experimental, as
relações existentes entre determinados órgãos e suas funções;
pode-se questioná-lo quanto à sua origem e destino, assim como
quanto à sua liberdade; finalmente, pode-se observá-lo como
ser criado pela divindade, àsua imagem e semelhança, e
meditar sobre o que dele dizem os textos sagrados.
Por sua vez, estas formas de conhecimento podem
coexistir na mesma pessoa: um cientista, voltado, por exemplo,
ao estudo da física, pode ser crente praticante de determinada
religião, estar filiado a um sistema Filosófico e, em muitos
42
aspectos de sua vida cotidiana, agir segundo conhecimentos
provenientes do senso comum.

2.2CORRELAÇÃO ENTRE CONHECIMENTO POPULAR E


CONHECIMENTO CIENTÍFICO

O conhecimento vulgar ou popular, às vezes


denominado senso comum, não se distingue do conhecimento
científico nem pela veracidade nem pela natureza do objeto
conhecido: o que os diferencia é a forma, o modo ou o método e
os instrumentos do "conhecer". Saber que determinada planta
necessita de uma quantidade "X" de água e que, se não a
receber de forma "natural", deve ser irrigada pode ser um
conhecimento verdadeiro e comprovável, mas, nem por isso,
científico. Para que isso ocorra, é necessário ir mais além:
conhecer a natureza dos vegetais, sua composição, seu ciclo de
desenvolvimento e as particularidades que distinguem uma
espécie de outra. Dessa forma, patenteiam-se dois aspectos:
 A ciência não é o único caminho de acesso ao
conhecimento e à verdade.
 Um mesmo objeto ou fenômeno - uma planta, um
mineral, uma comunidade ou as relações entre chefes e
subordinados - pode ser matéria de observação tanto para o
cientista quanto para o homem comum; o que leva um ao
conhecimento científico e outro ao vulgar ou popular é a forma
de observação.
Para Bunge (1976, p. 20), a descontinuidade radical
existente entre a Ciência e o conhecimento popular, em
numerosos aspectos (principalmente no que se refere ao
método), não nos deve fazer ignorar certa continuidade em
outros aspectos, principalmente quando limitamos o conceito de
conhecimento vulgar ao "bom-senso". Se excluirmos o
conhecimento mítico (raios e trovões como manifestações de
desagrado da divindade pelos comportamentos individuais ou
sociais), verificamos que tanto o "bom-senso" quanto a Ciência
almejam ser racionais e objetivos: "são críticos e aspiram à
coerência (racionalidade) e procuram adaptar-se aos fatos em
vez de permitir-se especulações sem controle (objetividade)".
Entretanto, o ideal de racionalidade, compreendido como uma
sistematização coerente de enunciados fundamentados e
passíveis de verificação, é obtido muito mais por intermédio de
teorias, que constituem o núcleo da Ciência, do que pelo
conhecimento comum, entendido como acumulação de partes
ou "peças" de informação frouxamente vinculadas. Por sua vez,
o ideal de objetividade, isto é, a construção de imagens da

43
realidade, verdadeiras e impessoais, não pode ser alcançado se
não ultrapassar os estreitos limites da vida cotidiana, assim
como da experiência particular; é necessário abandonar o ponto
de vista antropocêntrico, para formular hipóteses sobre a
existência de objetos e fenômenos além da própria percepção
de nossos sentidos, submetê-los à verificação planejada e
interpretada com o auxílio das teorias. Por esse motivo é que o
senso comum, ou o "bom-senso", não pode conseguir mais do
que uma objetividade limitada, assim como é limitada sua
racionalidade, pois está estreitamente vinculado à percepção e à
ação.

Características do Conhecimento Popular

"Se o ‘bom-senso’, apesar de sua aspiração à


racionalidade e objetividade, só consegue atingir essa condição
de forma muito limitada", pode-se dizer que o conhecimento
vulgar ou popular, latu sensu, é o modo comum, corrente e
espontâneo de conhecer, que se adquire no trato direto com as
coisas e os seres humanos: "é o saber que preenche nossa vida
diária e que se possui sem o haver procurado ou estudado, sem
a aplicação de um método e sem se haver refletido sobre algo"
(BABINI, 1957, p.21).
Para Ander-Egg (1978, p.13-14), o conhecimento
popular caracteriza-se por ser predominantemente:
 superficial, isto é, conforma-se com a aparência,
com aquilo que se pode comprovar simplesmente estando junto
das coisas: expressa-se por frases como "porque o vi", "porque o
senti", "porque o disseram", "porque todo mundo o diz";
 sensitivo, ou seja, referente a vivências, estados de
ânimo e emoções da vida diária;
 subjetivo, pois é o próprio sujeito que organiza suas
experiências e conhecimentos, tanto os que adquire por vivência
própria quanto os "por ouvi dizer";
 assistemático, pois esta "organização" das
experiências não visa a uma sistematização das idéias, nem na
forma de adquiri-las nem na tentativa de validá-las;
 acrítico, pois, verdadeiros ou não, a pretensão de
que esses conhecimentos o sejam não se manifesta sempre de
uma forma crítica.

2.3 – CIÊNCIAS EXTAS X CIÊNCIAS HUMANAS

Conceito de ciência

44
Diversos autores tentaram definir o que se entende por
ciência. Consideramos mais precisa a definição de Trujillo Ferrari,
expressa em seu livro Metodologia da ciência.
Entendemos por ciência uma sistematização de
conhecimentos, um conjunto de proposições logicamente
correlacionadas sobre o comportamento de certos fenômenos
que se deseja estudar: "A ciência é todo um conjunto de
atitudes e atividades racionais, dirigidas ao sistemático
conhecimento com objeto limitado, capaz de ser submetido à
verificação" (1974, p.8).
As ciências possuem:
a)Objetivo ou finalidade. Preocupação em distinguir
a característica comum ou as leis gerais que regem
determinados eventos.
b)Função, Aperfeiçoamento, através do crescente
acervo de conhecimentos, da relação do homem com o seu
mundo.
c)Objeto. Subdividido em:
 material, aquilo que se pretende estudar, analisar,
interpretar ou verificar, de modo geral;
 formal, o enfoque especial, em face das diversas
ciências que possuem o mesmo objeto material.

Classificação e divisão da ciência

A complexidade do universo e a diversidade de


fenômenos que nele se manifestam, aliadas à necessidade do
homem de estudá-los para poder entendê-los e explicá-los,
levaram ao surgimento de diversos ramos de estudo e ciências
específicas. Estas necessitam de uma classificação, quer de
acordo com sua ordem de complexidade, quer de acordo com
seu conteúdo: objeto ou temas, diferença de enunciados e
metodologia empregada.

45
Fonte: MARCONI, M. A.; LAKATOS, E.M. Fundamentos da
metodologia científica. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2003.p.75-81

Uma ciência exata é qualquer campo da ciência capaz


de expressões quantitativas e predições precisas e métodos
rigorosos de testar hipóteses, especialmente os experimentos
reprodutíveis envolvendo predições e medições quantificáveis.
Matemática, Estatística, Física, Química, assim como partes da
Biologia, Psicologia, e Economia podem ser consideradas
ciências exatas nesse sentido. O termo implica uma dicotomia
entre esses campos e outros, como as ciências humanas, que
possuem um caráter menos preciso.
As ciências exatas estão entre as mais antigas, desde a
antiguidade, o homem utiliza a matemática para resolver seus
problemas e organizar melhor a sua sociedade. Foram as
ciências exatas que proporcionaram que os antigos egípcios
construíssem as pirâmides, permitiu que os gregos erguessem
suas acrópoles e monumentos e também que o homem
realizasse a viagem espacial até a lua no século 20.
Embora do ponto de vista técnico, toda e qualquer
conhecimento produzido pela humanidade seja uma “ciência
humana”, a expressão Ciências Humanas em si refere-se
somente a aquelas ciências que tem o ser humano como seu
objeto de estudo ou então o seu foco. Em outras palavras, as
ciências humanas consistem nas profissões e as carreiras que
tratam primariamente dos aspectos humanos.
Basicamente são apoiadas na Filosofia (tentativa de
compreensão do homem e da sua sociedade), beleza (artes em
geral, relacionadas ao entretenimento ou a cultura) e
comunicação (questão da informação, questão da política e
questão da lingüística).
As ciências humanas, devido as suas bases, assim
como a condição humana em si, tem um caráter múltiplo: ao
mesmo tempo em que engloba características teóricas em
ramos tais como linguistica, gramática e filosofia, engloba
características práticas através do jornalismo, comunicação
social e direito e também engloba características subjetivas,
quando entra no ramo da arte.
Geralmente definida como uma ciência “não exata” e
de grande margem subjetiva, as ciências humanas são também
muito profundas, complexas e de grande importância na
sociedade, afinal sem matemática e engenharia não se pode
sobreviver, mas sem arte e sem compreensão do mundo,
também, não se pode viver.
As ciências humanas ou humanidades são as disciplinas
que tratam dos aspectos do homem como indivíduo e como ser
46
social, tais como a antropologia, história, sociologia, ciência
política, lingüística, pedagogia, economia, geografia, direito,
arqueologia, filosofia, teologia, psicologia entre outros.
(Adaptação de: <http://www.guiadacarreira.com.br/artigos>.
Acesso em: 22 jan.2011.

2.4- MÉTODO CIENTÍFICO

Todas as ciências caracterizam-se pela utilização de


métodos científicos; em contrapartida, nem todos os ramos de
estudo empregam estes métodos são ciências. Dessas
afirmações podemos concluir que a utilização de métodos
científicos não é da alçada exclusiva da ciência, mas não há
ciência sem o emprego de métodos científicos.
Assim sendo, o método é o conjunto das atividades
sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia,
permite alcançar o objetivo-conhecimentos válidos e
verdadeiros, traçando o caminho a ser seguido, detectando
erros e auxiliando as decisões do cientista.

Desenvolvimento histórico do Método

A preocupação em descobrir e, portanto, explicar a


natureza vem desde os primórdios da humanidade, quando as
principais questões referiam-se às forças da natureza, a cuja
mercê viviam os homens, e à morte. O conhecimento mítico
voltou-se à explicação desses fenômenos, atribuindo-os a
entidades de caráter sobrenatural. A verdade era impregnada de
noções supra-humanas e a explicação fundamentava-se em
motivações humanas, atribuídas a “forças” e potências
sobrenaturais.
À medida que o conhecimento religioso se voltou,
também, para a explicação dos fenômenos da natureza e do
caráter transcendental da morte, como fundamento de suas
concepções, a verdade revestiu-se de caráter dogmático,
baseada em revelações da divindade. É a tentativa de explicar
os acontecimentos através de causas primeiras- os deuses-,
sendo o acesso dos homens ao conhecimento derivado da
inspiração divina. O caráter sagrado das leis, da verdade, do
conhecimento, como explicações sobre o homem e o universo,
determina uma aceitação sem crítica dos mesmos, deslocando o
foco das atenções para a explicação da natureza da divindade.
O conhecimento filosófico, por seu lado, volta-se
para a investigação racional na tentativa de captar a essência
imutável do real, através da compreensão da forma e das leis da
natureza.
47
O senso comum, aliado à explicação religiosa e ao
conhecimento filosófico, orientou as preocupações do homem
com o universo. Somente no século XVI é que se iniciou uma
linha de pensamento que propunha encontrar um conhecimento
embasado em maiores garantias, na procura do real. Não se
buscam mais as causas absolutas ou a natureza íntima das
coisas; ao contrário, preocupa-se compreender as relações entre
elas, assim como a explicação dos acontecimentos, através da
observação científica aliada ao raciocínio.
Com o passar do tempo, muitas modificações foram
feitas nos métodos existentes, inclusive surgiram outros novos.
Para Bunge, (1980, p.25), “o método científico é a teoria da
investigação”. Esta alcança seus objetivos, de forma científica,
quando cumpre ou se propõe a cumprir as seguintes etapas:
a) descobrimento do problema ou lacuna num
conjunto de conhecimentos. Se o problema não estiver
enunciado com clareza, passa-se à etapa seguinte; se o estiver,
passa-se à subseqüente;
b)colocação precisa do problema, ou ainda a
recolocação de um velho problema, à luz de novos
conhecimentos (empíricos ou teóricos, substantivos ou
metodológicos);
c)procura de conhecimentos ou instrumentos
relevantes ao problema (por exemplo, dados empíricos,
teorias, aparelhos de mediação, técnicas de cálculo ou de
mediação). Ou seja, exame do conhecido para tentar resolver o
problema;
d)tentativa de solução do problema com auxílio
dos meios identificados. Se a tentativa resultar inútil, passa-
se para a etapa seguinte; em caso contrário, à subseqüente;
e)invenção de novas idéias (hipóteses, teorias ou
técnicas) ou produção de novos dados empíricos que prometam
resolver o problema;
f)obtenção de uma solução (exata ou aproximada)
do problema com auxílio do instrumental conceitual ou empírico
disponível;
g)investigação das conseqüências da solução
obtida. Em se tratando de uma teoria, é a busca de
prognósticos que possam ser feitos com seu auxílio. Em se
tratando de novos dados, é o exame das conseqüências que
possam ter para as teorias relevantes;
h)prova (comprovação) da solução: confronto da
solução com a totalidade das teorias e da informação empírica
pertinente. Se o resultado é satisfatório, a pesquisa é dada
como concluída, até novo aviso. Do contrário, passa-se para a
etapa seguinte;
48
i) correção das hipóteses, teorias, procedimentos
ou dados empregados na obtenção da solução incorreta.
Esse é, naturalmente, o começo da um novo ciclo de
investigação" (BUNGE, 1980, p.25). Fonte: MARCONI, M. A.;
LAKATOS, E.M. Fundamentos da metodologia científica. 5.
ed. São Paulo: Atlas, 2003.p.83-85.

49
TEMA 3 – ÉTICA E IDEOLOGIA

3.1 MORAL E ÉTICA


3.2 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL
3.3 DEMOCRADIA, ÉTICA E CIDADANIA
3.4 IDEOLOGIA

Introdução

Os valores

Todo mundo já ouviu falar no “jeitinho brasileiro”: poder, não


pode, mas sempre se dá um jeito... Certos “jeitinhos” parecem
inocentes ou engraçados, e às vezes até são vistos como sinal
de vivacidade e esperteza, por exemplo, quando se fura a fila
do ônibus ou do cinema. Ou, então, para pegar o filho na escola,
que mal há em parar em fila dupla?

Os valores podem ser estéticos, afetivos,


econômicos, religiosos, éticos, etc. Mas o que são valores?
Diante dos seres somos mobilizados pela nossa afetividade,
somos afetados de alguma forma por eles, porque nos atraem
ou provocam nossa repulsa.
Enfim, os valores resultam das relações que os seres
humanos estabelecem entre si e com o mundo em que
vivem. Por isso os valores são em parte herdados da cultura
e nossa primeira compreensão da realidade se funda no solo dos
valores da comunidade a que pertencemos. Esse fato talvez
nos faça concluir que tais experiências variam conforme o
povo e a época.
Os valores são, num primeiro momento, herdados
por nós. Ao nascermos, o mundo cultural é um sistema de
significados já estabelecidos, de tal modo que aprendemos
desde cedo como nos comportar à mesa, na rua, diante de
estranhos, como, quando, e quanto falar em determinadas
circunstâncias; como andar, correr, brincar; como cobrir o corpo
e quando desnudá-lo; qual o padrão de beleza; que direitos e
deveres temos. Conforme atendemos ou transgredimos os
padrões, os comportamentos são avaliados como bons ou
maus.
Para Durkheim, a Consciência coletiva “é o
conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média
dos membros de uma mesmasociedade”. A consciência
coletiva não se baseia na consciência dos indivíduos singulares
ou de grupos específicos, mas está espalhada por toda a
50
sociedade. Assim, a consciência coletiva não é o que um
indivíduo pensa, mas é o que a “sociedade pensa”.
É a consciência coletiva que irá impor as regras
sociais de uma sociedade; isto porque ao nascer, o indivíduo já
encontra a sociedade pronta e constituída em suas leis. Assim, o
direito, os costumes, as crenças religiosas não são
criados pelos indivíduos, mas pelas gerações passadas,
sendo transmitidas às novas através da Educação. Ex: proibição
de andar nus. Em síntese: não matar, não roubar, não andar
nu são normas comuns a todos os indivíduos que, por serem
comuns a todos, se convertem em leis morais que passam a
determinar a conduta das pessoas na sociedade. O
indivíduo não faz o que deseja e sim o que permite a moral
social de época e lugar dados.

3.1 MORAL E ÉTICA

A moral

Os conceitos de moral e ética, ainda que diferentes,


são com frequência usados como sinônimos. Aliás, a etimologia
dos termos é semelhante: moral vem do latim mos, moris, que
significa “costume”, “maneira de se comportar regulada pelo
uso”, e de moralis, morale, adjetivo referente ao que é “relativo
aos costumes”. Ética vem do grego ethos, que tem o mesmo
significado de “costume”.
No entanto, podemos estabelecer algumas diferenças
entre esses dois conceitos. A moral é o conjunto de regras de
conduta admitidas em determinada época ou por um grupo de
pessoas.
A ética ou filosofia moral é a parte da filosofia que se
ocupa com a reflexão a respeito das noções e princípios que
fundamentam a vida moral. Por exemplo, são questões éticas
indagar a respeito do que é o bem e o mal, o que são valores,
qual a natureza do dever.

Caráter histórico e social da moral

Neste texto, foi seguida de maneira livre a exposição de


Adolfo Sánchez Vasquez, no seu livro Ética. De início, podemos
definir a moral como o conjunto de regras que determinam o
comportamento dos indivíduos em um grupo social.
A fim de garantir a sobrevivência, o ser humano age
sobre a natureza transformando-a em cultura. Para que a ação
coletiva seja possível, são estabelecidas regras que organizam
as relações entre os indivíduos. É de tal importância a existência
51
do mundo moral que se torna impossível imaginar um povo sem
qualquer conjunto de regras. Uma das características humanas
fundamentais é a de sermos capazes de produzir interdições
(proibições). Segundo o antropólogo francês Lévi-Strauss, a
passagem da natureza à cultura, é produzida pela instauração
da lei, por meio da proibição do incesto. Assim, se estabelecem
as relações de parentesco e de aliança sobre as quais é
construído o mundo humano, que é simbólico.
Exterior e anterior ao indivíduo, há portanto a moral
constituída, que orienta seu comportamento por meio de
normas. Em função da adequação ou não à norma estabelecida,
o ato será considerado moral ou imoral.
O comportamento moral varia de acordo com o
tempo e o lugar, conforme as exigências das condições nas
quais as pessoas se organizam ao estabelecerem as formas de
relacionamento e as práticas de trabalho. À medida que essas
relações se alteram, exigem lentas modificações nas normas de
comportamento coletivo. Por exemplo, a Idade Média se
caracteriza pelo regime feudal, baseado na hierarquia de
suseranos, vassalos e servos. O trabalho é garantido pelos
servos, possibilitando aos nobres uma vida dedicada ao ócio e à
guerra. A moral cavalheiresca que daí deriva baseia-se no
pressuposto da superioridade da nobreza, exaltando a virtude
da lealdade e da fidelidade – suporte do sistema de suserania –
bem como a coragem do guerreiro. Em contraposição, o
trabalho é desvalorizado e restrito aos servos. Essa situação
tende a ser alterada com o aparecimento da burguesia, a qual
formada pelos antigos servos libertos, valoriza o trabalho e
critica a ociosidade.

Caráter pessoal da moral

Vamos agora ampliar a definição provisória dada


inicialmente. Mesmo considerando o caráter histórico e social da
moral, é preciso reconhecer que ela não se reduz à herança dos
valores recebidos pela tradição. À medida que a criança se
aproxima da adolescência, aprimorando o pensamento abstrato
e a reflexão crítica, ela tende a colocar em questão os valores
herdados.
A ampliação do grau de consciência e de liberdade, e
portanto de responsabilidade pessoal no comportamento moral,
introduz um elemento contraditório que irá, o tempo todo,
angustiar a pessoal: a moral, ao mesmo tempo que é o
conjunto de regras que determina como deve ser o
comportamento dos indivíduos do grupo, é também a livre e
consciente aceitação das normas. Isso significa que o ato só é
52
propriamente moral se passar pelo crivo da aceitação pessoal da
norma.
Portanto, o ser humano, ao mesmo tempo que é
herdeiro, é criador da cultura, e a vida moral irá se configurar
quando, diante da moral constituída, ele for capaz de propor a
moral constituinte, aquela que se realiza a cada experiência
vivida.
Nessa perspectiva, a vida moral se funda em uma
ambiguidade fundamental, justamente a que determina o seu
caráter histórico. Toda moral está situada no tempo e reflete o
mundo em que nossa liberdade se achada situada. Diante do
passado que o condiciona nossos atos, podemos nos colocar a
distância para reassumi-lo ou recusá-lo.
Por experiência própria, cada um sabe como isso é
penoso, a partir da descoberta de que normas adequadas em
determinado momento tornam-se obsoletas em outro e devem
ser alteradas. As contradições e o velho e o novo são vividas
quando as relações humanas exigem novo código de conduta.
Mesmo quando queremos manter as antigas normas, há
situações críticas enfrentadas devido à especificidade de cada
acontecimento.

Caráter social e pessoal da moral

A análise dos fatos morais nos coloca diante de dois


pólos contraditórios: de um lado, o caráter social da moral; de
outro, a intimidade do sujeito. Se aceitarmos unicamente o
caráter social da moral, sucumbimos ao dogmatismo e ao
legalismo. Isto é, ao caracterizar o ato moral como aquele que
se adapta à norma estabelecida, privilegiamos os regulamentos,
os valores dados e não discutidos. Nessa perspectiva, a
educação moral visa apenas inculcar nas pessoas o medo das
conseqüências da não-observância da lei.
Por outro lado, se aceitarmos como predominante a
interrogação do indivíduo que põe em dúvida a regra,
corremos o risco de destruir a moral: quando ela depende
exclusivamente da sanção pessoal, recai no individualismo, na
“tirania da intimidade” e consequentemente, no amoralismo, na
ausência de princípios. Ora, o ser humano “con-vive” com
pessoas, e qualquer ato seu compromete os que o cercam.
Portanto, é preciso considerar os dois pólos
contraditórios do pessoal e do social como uma relação
dialética, ou seja, uma relação em que se estabeleça o tempo
todo a implicação recíproca entre determinismo e liberdade,
entre adaptação e desadaptação à norma, aceitação e recusa da
interdição, a partir de princípios.
53
O aspecto social é considerado é considerado sob dois
pontos de vista. Em primeiro lugar, significa apenas a herança
dos valores do grupo, mas depois de passar pelo crivo da
dimensão pessoal, o social readquire a perspectiva humana e
madura que destaca a ênfase na intersubjetividade essencial da
moral. Isto é, quando criamos valores, não o fazemos para nós
mesmos, mas como seres sociais que se relacionam com os
outros.
Dessa forma, essa flexibilidade não deve ser
interpretada como defesa do relativismo em que todas as
formas de conduta são aceitas indistintamente. O professor José
Arthur Gianotti assim se expressa: “Os direitos do homem, tais
como em geral têm sido enunciados a partir do século XVIII,
estipulam condições mínimas do exercício da moralidade. Por
certo, cada um não deixará de aferrar-se à sua moral; deve,
entretanto, aprender a conviver com outros, reconhecer a
unilateralidade de seu ponto de vista. E com isto está
obedecendo à sua própria moral de uma maneira
especialíssima, tomando os imperativos categóricos dela como
um momento particular do exercício humano de julgar
moralmente”.

Estrutura do ato moral

A instauração do mundo moral exige consciência crítica,


que chamamos de consciência moral. Trata-se do conjunto de
exigências e das prescrições que reconhecemos como válidas
para orientar a escolha; é a consciência que discerne o valor
moral dos nossos atos. O ato moral é portanto constituído de
dois aspectos: o normativo e o fatual.
O normativo são as normas ou regras de ação e os
imperativos que enunciam o “dever ser”.
O fatual são os atos humanos enquanto se realizam
efetivamente.
Pertencem ao âmbito do normativo, regras como:
“Cumpra a sua obrigação de estudar”; “não minta”; “não mate”.
O campo do fatual é a efetivação ou não da norma na
experiência vivida. Os dois pólos são distintos, mas
inseparáveis. A norma só tem sentido se orientada para a
prática e o fatual só adquire contorno moral quando se refere à
norma.
O ato efetivo será moral ou imoral, conforme esteja de
acordo ou não com a norma estabelecida. Por exemplo, diante
da norma “não minta”, o ato de mentir será considerado imoral.
Convém lembrar aqui a discussão anterior a respeito do social e
do pessoal na moral. Nesse caso, estamos considerando que o
54
ato só pode ser moral ou imoral se o indivíduo introjetou a
norma e a tornou sua, livre e conscientemente.

Conclusão

O delicado tecido da moral diz respeito ao indivíduo no


mais fundo do seu “foro íntimo”, ao mesmo tempo que o vincula
às pessoas com as quais convive.
Embora a ética não se confunda com a política, elas se
relacionam necessariamente, cada uma no seu campo
específico. Por um lado, a política, ao estender a justiça social a
todos, permite que os indivíduos tenham condições de melhor
formação moral. Por outro lado, a formação ética é importante
para o exercício da cidadania, quando os interesses pessoais
não se sobrepõe aos coletivos.
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2005 p.
305-310

Os valores ou fins éticos

 Do ponto de vista dos valores, a ética exprime a


maneira como uma cultura e uma sociedade definem para si
mesmas o que julgam ser o mal e o vício, a violência e o crime
e, como contrapartida, o que consideram ser o bem e a virtude.
Todas as culturas consideram virtude algo que é o melhor como
sentimento, como conduta e como ação; a virtude é a
excelência, a realização perfeita de um modo de ser, sentir e
agir.

Os meios morais

 além do sujeito ou pessoa moral e dos valores ou fins


morais, o campo ético é ainda constituído por um outro
elemento: os meios para que o sujeito realize os fins.
 Costuma-se dizer que os “fins justificam os
meios”, de modo que, para alcançar um fim legítimo, todos os
meios disponíveis são válidos. No caso da ética, porém, essa
afirmação não é aceitável.
 No caso da ética, portanto, nem todos os meios são
justificáveis, mas apenas aqueles que estão de acordo com os
fins da própria ação. Em outras palavras, fins éticos exigem
meios éticos.
 A relação entre meios e fins pressupõe a idéia de
discernimento, isto é, que saibamos distinguir entre meios
morais e imorais, tais como nossa cultura ou nossa sociedade os
55
definem. Isso significa também que esse discernimento não
nasce conosco, mas precisa ser adquirido por nós e portanto, a
pessoa moral não existe como um fato dado, mas é criada pela
vida intersubjetiva e social, precisando ser educada para os
valores morais e para as virtudes de sua sociedade.

Ética ou filosofia moral

 Toda cultura e cada sociedade institui uma moral,


isto é, valores concernentes ao bem e ao mal, ao permitido e ao
proibido e à conduta correta e à incorreta, válidos para todos os
seus membros.
 No entanto, a simples existência da moral não
significa a presença explícita de uma ética, entendida como
filosofia moral, isto é, uma reflexão que discuta, problematize
e interprete o significado dos valores morais.
 A filosofia moral ou a disciplina denominada a ética
nasce quando se passa a indagar o que são, de onde vêm e o
que valem os costumes.
 Éthos significa na língua grega costume ou caráter. A
filosofia moral ou a ética nasce quando, além das questões
sobre os costumes, também se busca compreender o caráter de
cada pessoa, isto é, o senso moral e a consciência moral
individuais.
Em síntese: ÉTICA
 ciência sobre o comportamento moral dos homens
em sociedade. Sua função é explicar, esclarecer e investigar
uma determinada realidade.
 É a ciência que tem como objeto os juízos de valor
 A ética tem conteúdo universal e parte do princípio
da igualdade dos seres humanos e de seus direitos inalienáveis
à paz e ao bem-estar
 O cerne da ética universal transcende a todos os
sistemas de crenças e valores.
MORAL: “conjunto de normas, aceitas livre e
conscientemente, que regulam o comportamento individual dos
homens.” (Vasquez)
 manifesta-se nas diferentes sociedades. Sua função é
regulamentar as relações entre os indivíduos e entre estes e a
comunidade, contribuindo para a ordem social.
 A moral não é natural e resulta da ação do homem
enquanto ser histórico e social .

3.2 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

56
Muitos autores definem a ética profissional como
sendo um conjunto de normas de conduta que deverão ser
postas em prática no exercício de qualquer profissão. Seria a
ação "reguladora" da ética agindo no desempenho das
profissões, fazendo com que o profissional respeite seu
semelhante quando no exercício da sua profissão.
A ética profissional estudaria e regularia o
relacionamento do profissional com sua clientela, visando a
dignidade humana e a construção do bem-estar no contexto
sócio-cultural onde exerce sua profissão.
Ela atinge todas as profissões e quando falamos de
ética profissional estamos nos referindo ao caráter normativo
e até jurídico que regulamenta determinada profissão a
partir de estatutos e códigos específicos.
Assim temos a ética médica, do advogado, do biólogo,
do engenheiro de produção engenheiro químico, engenheiro
civil, contador etc.
Sendo a ética inerente à vida humana, sua
importância é bastante evidenciada na vida profissional, porque
cada profissional tem responsabilidades individuais e
responsabilidades sociais, pois envolvem pessoas que dela se
beneficiam.

Virtudes profissionais

Não obstante os deveres de um profissional, os


quais são obrigatórios, devem ser levadas em conta as
qualidades pessoais que também concorrem para o
enriquecimento de sua atuação profissional, algumas delas
facilitando o exercício da profissão.
Muitas destas qualidades poderão ser adquiridas
com esforço e boa vontade, aumentando neste caso o mérito do
profissional que, no decorrer de sua atividade profissional,
consegue incorporá-las à sua personalidade, procurando
vivenciá-las ao lado dos deveres profissionais.
Existe uma associação entre as virtudes: lealdade,
responsabilidade e iniciativa como fundamentais para a
formação de recursos humanos. Segundo Clauss Moller o
futuro de uma carreira depende dessas virtudes. O senso
de responsabilidade é o elemento fundamental da
empregabilidade. Sem responsabilidade a pessoa não pode
demonstrar lealdade, nem espírito de iniciativa [...]. Uma
pessoa que se sinta responsável pelos resultados da equipe
terá maior probabilidade de agir de maneira mais favorável aos
interesses da equipe e de seus clientes, dentro e fora da
organização.. Só pessoas que tenham auto-estima e um
57
sentimento de poder próprio são capazes de assumir
responsabilidade. Elas sentem um sentido na vida,
alcançando metas sobre as quais concordam previamente e
pelas quais assumiram responsabilidade real, de maneira
consciente.
Prossegue, citando a virtude da lealdade:
Um funcionário leal se alegra quando a organização
ou seu departamento é bem sucedido, defende a organização,
tomando medidas concretas quando ela é ameaçada, tem
orgulho de fazer parte da organização, fala positivamente
sobre ela e a defende contra críticas.
Lealdade não é sinônimo de obediência cega.
Lealdade significa fazer críticas construtivas, mas as
manter dentro do âmbito da organização. Significa agir com a
convicção de que seu comportamento vai promover os legítimos
interesses da organização. Assim, ser leal às vezes pode
significar a recusa em fazer algo que você acha que poderá
prejudicar a organização, a equipe de funcionários.
As virtudes da responsabilidade e da lealdade são
completadas por uma terceira, a iniciativa, capaz de colocá-las
em movimento.
Tomar a iniciativa de fazer algo no interesse da
organização significa ao mesmo tempo, demonstrar lealdade
pela organização. Em um contexto de empregabilidade, tomar
iniciativas não quer dizer apenas iniciar um projeto no interesse
da organização ou da equipe, mas também assumir
responsabilidade por sua complementação e
implementação.
Gostaríamos ainda, de acrescentar outras qualidades
que consideramos importantes no exercício de uma
profissão. São elas:

Honestidade: A honestidade está relacionada com a


confiança que nos é depositada, com a responsabilidade
perante o bem de terceiros e a manutenção de seus direitos. A
honestidade é a primeira virtude no campo profissional. É
um princípio que não admite relatividade, tolerância ou
interpretações circunstanciais.

Sigilo: O respeito aos segredos das pessoas, dos


negócios, das empresas, deve ser desenvolvido na formação de
futuros profissionais, pois trata-se de algo muito importante.
Uma informação sigilosa é algo que nos é confiado e cuja
preservação de silêncio é obrigatória.

58
Competência: Competência, sob o ponto de vista
funcional, é o exercício do conhecimento de forma
adequada e persistente a um trabalho ou profissão. Devemos
buscá-la sempre. O conhecimento da ciência, da tecnologia,
das técnicas e práticas profissionais é pré-requisito para a
prestação de serviços de boa qualidade.

Prudência: Todo trabalho, para ser executado, exige


muita segurança. A prudência, fazendo com que o profissional
analise situações complexas e difíceis com mais facilidade e de
forma mais profunda e minuciosa, contribui para a maior
segurança, principalmente das decisões a serem tomadas.

Coragem: Todo profissional precisa ter coragem, pois


"o homem que evita e teme a tudo, não enfrenta coisa alguma,
torna-se um covarde" (ARISTÓTELES, p.37). A coragem nos
ajuda a reagir às críticas, quando injustas, e a nos defender
dignamente quando estamos cônscios de nosso dever. Nos
ajuda a não ter medo de defender a verdade e a justiça,
principalmente quando estas forem de real interesse para
outrem ou para o bem comum.

Perseverança: Qualidade difícil de ser encontrada,


mas necessária, pois todo trabalho está sujeito a
incompreensões, insucessos e fracassos que precisam ser
superados, prosseguindo o profissional em seu trabalho, sem
entregar-se a decepções ou mágoas.

Compreensão: Qualidade que ajuda muito um


profissional, porque é bem aceito pelos que dele dependem, em
termos de trabalho, facilitando a aproximação e o diálogo, tão
importante no relacionamento profissional. Vê-se que a
compreensão precisa ser condicionada, muitas vezes, pela
prudência.

Humildade: O profissional precisa ter humildade


suficiente para admitir que não é o dono da verdade e que o
bom senso e a inteligência são propriedade de um grande
número de pessoas.

Otimismo: Em face das perspectivas das sociedades


modernas, o profissional precisa e deve ser otimista, para
acreditar na capacidade de realização da pessoa humana, no
poder do desenvolvimento, enfrentando o futuro com energia e
bom-humor.

59
TOMAZI, Nelson Dacio. Iniciação à Sociologia. 2. ed. São
Paulo: Atual, 2000. pag. 180-186

3.3 DEMOCRACIA, ÉTICA E CIDADANIA

O analfabeto Político
Bertold Brecht (1898-1956) - escritor, poeta e teatrólogo
alemão

“O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve,


não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não
sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões
políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o
peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil, que da
sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado
e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra,
corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais”.

O que é política?

Segundo Nicolau Maquiavel, em OPríncipe, política é


a arte de conquistar, manter e exercer o poder, o próprio
governo. Ainda existem algumas divergências sobre o tema,
para alguns, política é a ciência do poder e para outros é a
Ciência do Estado.
Se há alguma certeza nos tempos em que vivemos, é a
de que vivemos um momento de incerteza e desordem em
todas as atividades humanas: saber, poder, ética e valores.
Há uma tendência atual de menosprezar o papel da
política em nosso dia a dia e de elogiar o seu esquecimento,
dando mais importância à economia, à privatização da vida
pública, à religião, ao moralismo e à eficiência técnica. Este
pensamento é defendido pelos grandes empresários da
comunicação, reforçando a estratégia dos poderosos de manter
os cidadãos longe do exercício da política, principalmente os
jovens.
Acontece que a política não deixou de ser exercida em
momento algum. Ela apenas ganhou novos contornos e novos
espaços nas lutas pelas políticas afirmativas (inclusão, direito à
livre orientação sexual, etc), por exemplo.
Vivemos hoje em um momento em que a política é
questionada, pois, ela é sistematicamente confundida com
as ações dos políticos profissionais, principalmente, pelos
maus políticos.
60
Arendt nos diz que "A política baseia-se no fato da
pluralidade dos homens", portanto, ela deve organizar e
regular o convívio dos diferentes e não dos iguais.
Vejamos o que diz Hannah Arendt: ". Tarefa e
objetivo da política é a garantia da vida no sentido mais
amplo". Para ela, a tarefa da política esta diretamente
relacionada com a grande aspiração do homem moderno: a
busca da felicidade.
Não é fácil discutir a questão da política nos dias
de hoje. Estamos carregados de desconfianças em relação
aos homens do poder. Porém, o homem é um ser
essencialmente político. Todas as nossas ações são
políticas e motivadas por decisões ideológicas. Tudo que
fazemos na vida tem consequências e somos responsáveis por
nossas ações.
Nossa ação política está presente em todos os
momentos da vida, seja nos aspecto privado ou público.
Vivemos com a família, relacionamos com as pessoas no bairro,
na escola, somos parte integrantes da cidade, pertencemos a
um Estado e País.
Não podemos confundir que política é simplesmente
o ato de votar. Estamos fazendo política como tomamos
atitudes em nosso trabalho. Estamos fazendo política quando
exigimos nossos direitos de consumidor, quando nos indignamos
ao vermos nossas crianças fora das escolas sendo massacradas
nas ruas.
A política está presente cotidianamente em nossas
vidas: na luta das mulheres contra uma sociedade machista
que discrimina e age com violência; na luta dos portadores de
necessidade especiais para pertencerem de fato à sociedade.

O futuro da democracia

Rousseau foi quem melhor definiu o ideal da democracia, que


hoje está em conflito com as democracias reais: uma sociedade
só é democrática quando ninguém for tão rico que possa
comprar alguém e ninguém seja tão pobre que tenha de se
vender a alguém.

Analisada globalmente, a democracia oferece-nos duas


imagens muito contrastantes. Por um lado, na forma de
democracia representativa, ela é hoje considerada
internacionalmente o único regime político legítimo. Investem-se
milhões de euros e dólares em programas de promoção da
democracia, em missões de fiscalização de processos eleitorais,
e, quando algum país do chamado Terceiro Mundo manifesta
61
renitência em adotar o regime democrático, as agências
financeiras internacionais têm meios de o pressionar através das
condições de concessão de empréstimos. Por outro lado,
começam a proliferar os sinais de que os regimes democráticos
instaurados nos últimos trinta ou vinte anos traíram as
expectativas dos grupos sociais excluídos, dos trabalhadores
cada vez mais ameaçados nos seus direitos e das classes
médias empobrecidas.
Sondagens recentes feitos na América Latina revelam
que em alguns países a maioria da população preferiria uma
ditadura desde que lhe garantisse algum bem-estar social.
Acrescente-se que as revelações, cada vez mais freqüentes, de
corrupção levam à conclusão que os governantes legitimamente
eleitos usam o seu mandato para enriquecer à custa do povo e
dos contribuintes. Por sua vez, o desrespeito dos partidos, uma
vez eleitos, pelos seus programas eleitorais parece nunca ter
sido tão grande. De modo que os cidadãos se sentem cada vez
menos representados pelos seus representantes e acham que as
decisões mais importantes dos seus governos escapam à sua
participação democrática.
O contraste entre estas duas imagens oculta um outro,
entre as democracias reais e o ideal democrático. Rousseau foi
quem melhor definiu este ideal: uma sociedade só é
democrática quando ninguém for tão rico que possa comprar
alguém e ninguém seja tão pobre que tenha de se vender a
alguém. Segundo este critério, estamos ainda longe da
democracia. Os desafios que são postos à democracia no
nosso tempo são os seguintes. Primeiro, se continuarem a
aumentar as desigualdades sociais entre ricos e pobres ao ritmo
das três últimas décadas, em breve, a igualdade jurídico-política
entre os cidadãos deixará de ser um ideal republicano para se
tornar uma hipocrisia social constitucionalizada.
Segundo, a democracia atual não está preparada para
reconhecer a diversidade cultural, para lutar eficazmente contra
o racismo, o colonialismo e o sexismo e as discriminações em
que eles se traduzem. Isto é tanto mais grave quanto é certo
que as sociedades nacionais são cada vez mais multiculturais e
multiétnicas. Terceiro, as imposições econômicas e militares
dos países dominantes são cada vez mais drásticas e menos
democráticas. Assim sucede, em particular, quando vitórias
eleitorais legítimas são transformadas pelo chefe da diplomacia
norte-americana em ameaças à democracia, sejam elas as
vitórias do Hamas, de Hugo Chávez ou de Evo Morales.
Finalmente, o quarto desafio diz respeito às condições
da participação democrática dos cidadãos. São três as principais
condições: ser garantida a sobrevivência: quem não tem com
62
que se alimentar e alimentar a sua família tem prioridades mais
altas que votar; nãoestar ameaçado: quem vive ameaçado pela
violência no espaço público, na empresa ou em casa, não é livre,
qualquer que seja o regime político em que vive; estar
informado: quem não dispõe da informação necessária a uma
participação esclarecida, equivoca-se quer quando participa,
quer quando não participa. Pode dizer-se com segurança que a
promoção da democracia não ocorreu de par com a promoção
das condições de participação democrática. Se esta tendência
continuar, o futuro da democracia, tal como a conhecemos, é
problemático.
Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor
catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de
Coimbra (Portugal).

Cidadania: o sentido tradicional

Um dos sentidos mais atuais da cidadania nasce com o


Estado moderno, quando a burguesia contrapõe ao antigo
sistema de privilégios feudais. O liberalismo institui a igualdade
jurídica (todos os cidadãos possuem direitos e deveres iguais);
por outro lado, as classes sociais constituem um sistema
marcado pela desigualdade. Assim, todos os cidadãos são
considerados iguais do ponto de vista jurídico e formal. Mas, na
realidade, a nação apresenta-se dividida em classes.
Que proposta de educação do cidadão pode resultar
dessa forma de compatibilização entre cidadania e classes
sociais? A educação do cidadão, entendida tradicionalmente
como integração ou adaptação do indivíduo à sociedade,
tem como pressuposto a aceitação da ordem social vigente. As
desigualdades inerentes ao sistema são consideradas
naturais e mesmo inevitáveis, atribuídas às diferenças quanto
às capacidades e funções desempenhadas pelos indivíduos. A
educação como mecanismo de ascensão social.
Dentro da visão burguesa e conservadora que
enfatiza a integração á ordem social, a educação para a
cidadania visa, basicamente, tornar o indivíduo consciente
de seus direitos edeveres. Tal interpretação supõe um
cidadão passivo, ao qual compete o conhecimento de
direitos e deveres pré-determinados no âmbito do poder
jurídico constituído, cabendo-lhe apenas cumpri-los. Fica
excluída a alternativa do cidadão tornar-se sujeito ativo no
processo de elaboração de seus direitos, questionar os princípios
em que estes se assentam ou indagar a que interesses eles
servem.

63
Um novo sentido de “educar para a cidadania”

Nas últimas décadas, no Brasil, assistiu-se a uma nova


articulação da relação entre cidadania e classes sociais a
partir da prática dos movimentos sociais que procuraram
tornar efetivas as promessas de igualdade formalmente contidas
no conceito de cidadania. Fruto de um processo de lutas,
assistiu-se à ampliação dos direitos dos cidadãos. Sobre
essa base, é possível pensar numa outra direção a questão da
educação como preparação para o exercício da cidadania.
Do interior da luta dos movimentos sociais brotou uma
nova noção de cidadania, pela qual se rompe com a idéia
de que ela seja uma outorga do Estado para concebê-la
como processo histórico de luta, o que quer dizer que as
classes populares e não mais o Estado, constituem o sujeito na
construção da cidadania.
Embora a nova noção de cidadania, que eclode no
Brasil nos anos 1990, tenha em comum a velha visão liberal a
manutenção da noção de direitos, esta noção é redefinida ,
passando a assentar-se sobre o princípio do “direito a ter
direitos”. Isso implica alargar o âmbito tradicional do acesso e
implementação efetiva dos direitos previamente definidos em
lei, lançando-se na criação e invenção de novos direitos, como
fruto de lutas específicas.
A nova noção de cidadania só se tornou possível a
partir da constituição do cidadão – sujeito de direitos – como um
sujeito social ativo, abrindo um canal de lutas para os
excluídos da cidadania.
Construir a cidadania de baixo para cima implica
romper com a idéia tradicional de que seu conteúdo seria
determinado pela relação do individuo com o Estado, para
promover sua articulação no âmbito da própria sociedade civil.
O ponto de partida é a realidade e adesigualdade de
classes.
Sob esta ótica, a cidadania deixa de ser pensada como
um estado ou condição para converter-se em estratégia
política. Isso parece e permite transcender a simples idéia do
cidadão como sujeito de direitos e deveres previamente
definidos pelo sistema político, para concebê-lo como agente
capaz de aplicar os meios de que dispõe na construção de novos
conteúdos para a cidadania.
Tal processo de construção ativa e social da
cidadania coloca em novas bases o princípio da educação
como preparação para o exercício da cidadania. Já não
basta formar o educando para tomar consciência dos seus
direitos e deveres, formulação que no passado parecia suficiente
64
para que a escola desse conta da questão da cidadania.; Às
novas concepções políticas deve corresponder uma
reinterpretação da educação como preparação para o exercício
da cidadania , na qual a própria noção de escolarização precisa
ser revista.
É necessário que a formação que tem como alvo a
autonomia do indivíduo, a construção de uma subjetividade
capaz de pensar, decidir e agir por conta própria constitui o
horizonte educativo que melhor corresponde ao ideal de uma
cidadania ativa.
O educador e filósofo, Luckesi, sustenta que os fins
políticos da prática educativa devem visar ao desenvolvimento e
independência de cada cidadão. Mas deve ser construída e a
escolarização pode contribuir para tanto, desde que promova
um processo ativo de assimilação da cultura, pelo qual os
conteúdos culturais adquiridos devem servir não como mero
padrão de conduta, mas como base com a qual o educando
interage e sobre a qual constrói a si mesmo de forma ativa.

Conclusão

A construção da cidadania não se processa dentro da


escola, mas no âmbito da sociedade civil. O que se espera da
escola é a “preparação para a cidadania” que pode ser
interpretada em dois sentidos bem distintos. Ou a educação
resigna-se a promover a adaptação do indivíduo à ordem social
tal mo ela existe, formando o cidadão passivo e obediente aos
direitos e deveres que emanam do alto, das instâncias jurídico-
políticas do Estado ou ela decide enfrentar o desafio de formar
sujeitos autônomos, capazes de pensar por conta própria e de
acionar estratégias políticas que os levem a atuar criativamente
na invenção de novos espaços democráticos.
A cidadania pode ser pensada e analisada em duas
dimensões: como condição legal e como atividade desejável.
Condição legal: cidadania é reconhecida como o
pertencimento a uma comunidade política na qual os indivíduos
são portadores de direitos. Para o liberalismo, a questão da
cidadania aparece associada à noção de direitos (liberdade,
igualdade perante a lei e direito à propriedade e dos direitos de
nação (soberania nacional e separação dos poderes). Quem
era o cidadão? O homem esclarecido para escolher seus
representantes, com conhecimento de causa e era ainda, um
proprietário de terras ou imóveis.
Locke (1632-1704) no século XVII – defende os
“direitos naturais inalienáveis” (direito à vida, à liberdade de
pensamento e de movimento (de ir e vir) e à
65
propriedade( sabemos hoje que eles não são direitos naturais,
mas sim direitos históricos; surgiram como demandas da
burguesia em ascensão contra o clero e os aristocratas); de
tendências liberais justifica a diferenciação de direitos entre
trabalhadores e burguesia, pois para ele o trabalhador é
incapaz de ter idéias sublimes e seria incapaz de pensar; sua
ação é desordeira e ameaçaria a ordem. Este pensamento muda
no século XVIII.
 Contribuição T.H. Marshall (sociólogo inglês) – deve
se distinguir três dimensões na construção histórica da
cidadania: a civil, a política e a social. (ele tem uma visão
otimista), baseando-se na história da Grã-Bretanha (texto
clássico Cidadania e classe social, de 1949). É indiscutível que
essa ordem cronológica, do modo “clássico” não se reproduziu
do mesmo modo em um grande número de países, entre os
quais o Brasil. (tal definição de Marshall é considerada vaga e
obscura). Cidadania, para Marshall é a participação integral do
indivíduo na comunidade política.
Século XVIII – criaram condições para o
desenvolvimento da CIDADANIA CIVIL: direito à liberdade de
expressão, de pensamento e de religião. Ou seja, direitos
necessários à liberdade individual: liberdade de ir e vir,
liberdade de expressão, pensamento e fé, o direito à
propriedade.
XVIII – A educação volta a ser pensada pelas classes
dirigentes como mecanismo de controle social. Adam Smith,
justifica a necessidade da educação, devido à divisão do
trabalho. Seria competência do Estado facilitar à população a
importância do aprendizado mínimo às necessidades do
capital: saber ler, contar, apreender rudimentos de geometria,
pois povo instruído seria ordeiro, obediente a seus superiores –
propõe o cidadão passivo.
Século XIX – permitiu o desenvolvimento da
CIDADANIA POLÍTICA: direitos políticos, o direito à
participação do exercício do poder, como membros de um
organismo investido de autoridade político ou como eleitores de
tais membros.. A cidadania se dirige a todos, inclui as massas,
mas para disciplina-las e domesticá-las. Os direitos sociais
não são conquistados, são outorgados pelo Estado.
Século XX – condições para a construção da
CIDADANIA SOCIAL: extensão da cidadania para a esfera
social mediante o desenvolvimento dos direitos sociais e
econômicos (o direito à educação, ao bem-estar, à saúde, ao
trabalho, etc).
Novas acepções ao conceito de cidadania. O projeto
burguês enfatizará a questão dos direitos dos indivíduos, menos
66
como direitos e mais como deveres. Deveres para com o Estado
e este passa a regulamentar os direitos dos cidadãos e a
restringi-los ou cassa-los, em determinadas conjunturas
históricas. A questão da cidadania deixa de ser conquista da
sociedade civil e passa a ser competência do Estado.
Os direitos civis e políticos são chamados direitos
de primeira geração; os sociais, de segunda geração.
Na segunda metade do século XX surgiram os
direitos de terceira geração, que tem como titular não o
indivíduo, mas os grupos humanos, como o povo, a nação,
coletividades étnicas, minorias discriminadas. Os direitos
humanos, o direito das mulheres, o direito ao desenvolvimento,
direito à paz, direito ao meio ambiente. Entre esses direitos da
terceira geração estariam também os “novos movimentos
sociais”, como direitos relativos a interesses difusos, direito do
consumidor, direito à ecologia, direito à qualidade de vida,
direito da terceira idade, direito das crianças, etc.
 esse tipo de interpretação estabelece uma relação
entre cidadania e posse de direitos: ser cidadão significa ser
portador de uma série de direitos.
 Essa concepção limita a cidadania a um conjunto
de atributos formais (o reconhecimento de direitos comuns) e
restringe e condiciona as possibilidades e os alcances da ação
cidadã.
 Redução do campo da cidadania a uma questão
meramente jurídica e acaba condenando a condição cidadã à
esfera da lei e ao compromisso por respeita-la.
Atividade desejável: a cidadania exige uma
dimensão mais substancial e radical. A posse de direitos deve
combinar-se como uma série de atributos e virtudes que fazem
dos indivíduos cidadãos ativos em consonância e mais além do
que a lei lhes concede.
 o exercício da cidadania se vincula ao campo da
“ética cidadã” – aqui a cidadania é considerada uma dimensão
que excede o meramente formal (a esfera dos direitos
legalmente reconhecidos) para vincular-se de forma indissolúvel,
a um tipo de ação social e de possibilidades concretas para a
realização dos atributos que a definem.
 Aqui a cidadania é construída socialmente como um
espaço de valores, de ações e de instituições nas quais se
garantem condições efetivas de igualdades que permitem o
mútuo reconhecimento dos sujeitos como membros de uma
comunidade de iguais.
 A cidadania é o exercício de uma prática política e
fundamentada em valores como a liberdade, a igualdade, a
67
autonomia, o respeito à diferença e às identidades, a
solidariedade, a tolerância. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda.
Filosofando – Introdução à Filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna,
2003.

3.4 IDEOLOGIA

Ideologia: um conceito polêmico

O conceito de ideologia foi criado por Destutt de


Tracy, filósofo francês, no final do século XVIII: a ideologia
deveria ser compreendida como “ciência das idéias”,
assemelhando-se às ciências naturais. Partia-se da crença na
razão (própria do espírito iluminista do século XVIII).
Raymond Williams (marxista) afirma que o conceito
de ideologia pode ser definido, basicamente, de acordo com
três concepções básicas:
1. Como sistema de crenças de uma classe ou
grupo social. Nessa concepção estariam incluídos os valores,
idéias e projetos de um grupo ou classe social específicos.
2. Como sistema de crenças ilusórias – o que se
costuma chamar de “falsa consciência”. Essas crenças ilusórias,
baseadas em critérios impossíveis de ser comprovados,
contrastariam com o conhecimento verdadeiro ou científico.
3. Como o processo geral de produção de significados e
idéias.
Conforme Williams, as duas primeiras conotações serão
as mais encontradas no pensamento marxista, vertente que se
destacou no estudo da ideologia.
No livro A ideologia alemã, Marx e Engels
apresentarão os três elementos básicos que caracterizarão sua
compreensão da sociedade capitalista e sua definição de
ideologia (definição, como veremos, fortemente apoiada nas
duas concepções destacadas por Williams). Esquematicamente,
esses três elementos são:
 Separação – resultante da afirmação da divisão da
vida humana em duas instâncias específicas: a
infraestrutura, que é a esfera da produção material, e a
superestrutura, esfera da produção das idéias. De maneira
muito simplificada, podemos dizer que a infraestrutura se
compõe da economia (a produção dos bens necessários à
sobrevivência dos homens) e a superestrutura se constitui da
moral, do direito, da política e das artes.

68
 Determinação –domínio estabelecido pela
infraestrutura sobre a superestrutura. Serão as relações de
produção que irão determinar (definir) a organização social
– as formas de comportamento e de convívio entre os homens.
São as relações de produção que os homens estabelecem entre
si, as quais dependem, por sua vez, das relações desses homens
com os meios de produção – terra, máquinas, matérias-
primas, fábricas, força de trabalho.
 Inversão – elemento constitutivo fundamental do
conceito de ideologia, considerada distorção da realidade.
Isto é, ela aparece para os homens de maneira inversa àquilo
que é na realidade. Nesse contexto, o conhecimento científico,
ou saber real, será o elemento capaz de desmascarar a
ideologia, recolocando o mundo de cabeça para cima,
mostrando a realidade tal como ela é.
Para compreender a sociedade capitalista a partir
dessas três relações (separação, determinação e inversão)
estabelecidas por Marx e Engels, não podemos tomá-las como
formas imutáveis e inquestionáveis. No que diz respeito à
definição de ideologia, por exemplo, é fundamental que se note
que, ao longo do tempo, os próprios autores acabaram
relativizando a conotação mistificadoraque inicialmente
deram ao conceito (essa relativização aparece no prefácio de
Para a crítica da economia política, escrito por Marx, em 1859).
Além disso, eles também relativizaram a questão da
determinação estrita da esfera econômica (infraestrutura) sobre
a superestrutura (em cartas que escreveu a outros pensadores,
Engels reconheceu certo grau de independência – ou
autonomia relativa – da superestrutura diante da
infraestrutura). É preciso que se diga finalmente que, ao longo
do tempo, os elementos destacados por Marx e Engels serão
questionados, reinterpretados ou aprimorados por outros
pensadores (inclusive e principalmente os de linha marxista), o
que comprova não serem esses elementos formas congeladas e
irretocáveis de compreensão da realidade.

Ideologia e classe social: classe dominante, ideias


dominantes

Marx e Engels afirmam, em A ideologia alemã, que as


ideias dominantes de uma época são as ideias da classe
então dominante. Poderíamos deduzir a partir desse
pressuposto que, para manter sua dominação, interessa a essa
classe fazer com que os seus próprios valores sejam aceitos
como certos por todas as demais classes sociais. Expliquemos:

69
conforme Marilena Chauí, o discurso ideológico se caracteriza
exatamente por pretender anular a diferença entre o pensar, o
dizer e o ser, criando uma lógica que consiga unificar
pensamento, linguagem e realidade, obtendo a identificação de
todos os sujeitos sociais com uma imagem particular
universalizada: a imagem da classe dominante.
Surge daí “um corpo de representações e normas
através do qual os sujeitos sociais e políticos” (as classes
sociais) “se representarão a si mesmos e à vida coletiva”. Para
Chauí, é exatamente esse “o campo da ideologia no qual
esses sujeitos explicam as formas de suas relações sociais,
econômicas e políticas; a origem da sociedade e do poder
político; explicam as formas ‘corretas’ ou ‘verdadeiras’ de
conhecimento e ação; justificam, através de ideias gerais (o
Homem, a Pátria, o Progresso, a Família, a Ciência, o Estado), as
formas reais da desigualdade, dos conflitos, da exploração e da
dominação como sendo, ao mesmo tempo, ‘naturais’ (isto é,
universais e inevitáveis) e ’justas’ (ponto de vista dos
dominantes) ou ‘injustas’ (ponto de vista dos dominados”.
O Estado tem como funçãoocultar os conflitos e
antagonismos que exprimem a existência das contradições
próprias de uma sociedade dividida em classes – classes que se
encontram em luta permanente. A ideologia veiculada pelo
Estado oferece a essa sociedade uma imagem que anula a luta,
a divisão e a contradição; uma imagem da sociedade como
idêntica, homogênea e harmoniosa. E é por isso que ela se
mantém. Além disso, elabora a imagem de um Estado que
representa a sociedade como um todo. Segundo Chauí, a
ideia de que o Estado representa toda a sociedade e de que
todos os cidadãos estão representados nele é uma das grandes
forças para legitimar a dominação dos dominantes (isto é,
para fazer com que essa dominação seja aceita como norma,
legal, justa).
Não se pode negar que, com o passar do tempo, o
conceito de ideologia acabou adquirindo um caráter pejorativo.
Por um lado, a prática de associá-lo exclusivamente à
classe dominante parece fazer com que se interprete que
essa classe possui domínio total sobre o conjunto da sociedade.
Mas não podemos negar a importância do conceito
de ideologia para compreender a sociedade. Podemos não
concordar com a idéia da existência de uma única ideologia –
uma ideologia dominante – capaz de exercer sobre o conjunto
da sociedade uma dominação total e completa,
homogeneizando-a, padronizando-a. Entretanto, não podemos
negar a existência de uma ideologia – certamente
composta de elementos de várias ideologias – que
70
caracteriza a sociedade capitalista, é veiculada a todo momento
pelos meios de comunicação de massa, aparece nos
acontecimentos comuns do nosso cotidiano e visa influenciar o
nosso comportamento.
Nesse sentido, poderíamos procurar refletir sobre como
a transmissão ou a reprodução dessa ideologia se dá. Um
debate polêmico, que surgiu nos anos 1970 entre os
estudiosos da questão, ocorreu com a publicação do livro
Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado, do pensador
marxista francês Louis Althusser. Para esse autor, instituições
como o aparato estatal (órgãos governamentais), os meios de
comunicação de massa, a religião e principalmente a escola
seriam responsáveis pela reprodução da ideologia
dominante entre os membros da sociedade capitalista.
Segundo Althusser, a escola funcionaria como um aparelho
ideológico de Estado, assegurando a reprodução e a
qualificação da força de trabalho, e simultaneamente adaptando
os indivíduos à ordem social, ao inculcar-lhes as formas de
justificação, legitimação e ocultação das diferenças e do conflito
de classes.
Posteriormente, sua interpretação foi questionada:
as instituições, em geral, e o aparelho escolar, em particular,
seriam simultaneamente duas coisas: lugar da reprodução da
ideologia, sim, mas igualmente de reflexão crítica. Desse
modo, o caráter contraditório de nossa sociedade
apareceria no interior de todas as instituições, que seriam,
simultaneamente, arenas de reprodução (por isso,
aparelhos ideológicos de Estado), mas também de luta; da
tentativa de camuflagem das injustiças sociais, mas também da
consciência de sua real existência. ARANHA, Maria Lúcia Arruda
de. Filosofando – introdução à Filosofia. 3. ed. São Paulo:
Moderna, 2003. pag. 60-68

O discurso não-ideológico

A ação e o pensamento humanos nunca se acham


totalmente determinados pela ideologia. Sempre haverá
espaços de crítica e fendas que possibilitem a elaboração do
discurso contra-ideológico. Não é simples, no entanto, o
trabalho de desvelamento do real, porque a ideologia penetra
em setores insuspeitados: na educação familiar e escolar, nos
meios de comunicação de massa, nas igrejas, nas indústrias,
impedindo de todas as formas a flexibilidade entre o pensar e o
agir, determinando a repetição de fórmulas prontas e acabadas.

71
Por outro lado, exatamente nesses mesmos espaços
que veiculam a ideologia é que poderá ser iniciado o
processo de conscientização.

A ideologia em ação

a) a ideologia na escola
Por volta dos anos 1970, teóricos franceses passaram
a admitir que a escola não é equalizadora, mas reprodutora
das diferenças sociais. Segundo alguns desses pensadores, o
próprio funcionamento da escola repetiria a estrutura
hierarquizada do sistema, reproduzindo as relações
autoritárias existentes fora dela. Em decorrência dessas
concepções pessimistas a respeito da atuação da escola, outros
estudiosos passaram a investigar o caráter ideológico da
produção da literatura infanto-juvenil e dos livros didáticos.
A partir dessa análise, porém, não devemos
generalizar apressadamente, reduzindo a escola e o material
didático em instrumentos de ideologia, por ser uma posição por
demais redutora. Além disso, as boas escolas são críticas do
sistema e cada vez mais buscam aproximar ensino e vida.
Sempre haverá na escola e nos livros, a possibilidade de
professores, autores e alunos inventarem práticas que se
tornem críticas da inculcação ideológica.
A escola é um espaço possível de luta, de denúncia
da domesticação e de procura de soluções criativas.
b) A ideologia nas histórias em quadrinhos
Os quadrinhos são um fenômeno característico da
indústria cultural e têm sua principal divulgação no século 20,
quando começam a aparecer nas publicações diárias dos jornais.
Além da função de entretenimento e lazer, representantes
que são de uma nova linguagem artística.
Nossa abordagem do tema parte da reflexão acerca
daambiguidadede toda produção cultural: ao mesmo tempo
que serve à consciência, pode servir à alienação; tanto ao
conhecimento como à escamoteação da realidade; tanto pode
ser criativa como paralisadora.
Os chilenos Ariel Dorman e Armand Mattelart
defenderam a tese de que a leitura das histórias em quadrinhos
não era tão inocente assim como se pensava. Fizeram
impiedosa crítica aos quadrinhos ao denunciarem a
ideologia subjacente aos quadrinhos, nos quais as
histórias escamoteiam os conflitos, transmitem uma
visão deformada do trabalho e levam à passividade
política. Para eles, na maioria das histórias em quadrinhos,
a sociedade aparece como una, estática e harmônica e a
72
“ordem natural” do mundo é quebrada apenas pelos vilões,
que, encarnando o mal, atentam geralmente contra o
patrimônio (roubo de bancos, jóias e caixas-fortes). A defesa da
legalidade dada e não-questionada é feita pelos “bons”, com a
morte dos “maus” ou com a integração desses à norma
estabelecida.
c) Outros espaços de ação ideológica
A ideologia se faz presente nos mais diversos campos
de atuação. Um deles é a propaganda. Tudo bem que
possamos entender a propaganda como uma maneira de
divulgar ao provável consumidor a variedade e a qualidade do
que é produzido, o que por sinal é muito bem-feito pelas
competentes agências de propaganda.
A propaganda não vende apenas produtos, mas
também ideias. Compramos o “sonho americano”, o desejo de
“subir na vida”, os estilos de vida, as convicções políticas e
éticas que de certa forma são veiculadas nos comerciais. Isso
sem falar nas campanhas de governos ou no marketing dos
candidatos a qualquer cargo público.
Outro espaço possível de ação da ideologia é o da
mídia. A imprensa falada e escrita é formadora de
opinião, o que representa algo positivo, desde que, numa
sociedade plural, tenhamos acesso a diversos veículos de
informação a fim de poder comparar a diversidade de
posicionamentos e então assumir uma posição crítica pessoal.
As distorções ocorrem quando a empresa jornalística
determina o que deve ser considerado notícia; quando é
manipulada por meio de recursos linguísticos. Da mesma forma,
quando são utilizados adjetivos carregados de juízos de valor,
como “baderneiros”, “perturbadores da ordem” ao noticiar uma
greve.
A diferença entre a informação ideológica e a não-
ideológica é que a primeira impede a pluralismo, veicula
interesses e se transforma em instrumento de poder. Já a
informação não-ideológica está aberta à discussão e dispõe de
espaços para opiniões diversificadas.

COMO VIMOS, A IDEOLOGIA ESTÁ PRESENTE NO


COTIDIANO, NA PROPAGANDA, NA MÍDIA, NAS ATIVIDADES
QUE JULGAMOS INÓCUAS, COMO LER QUADRINHOS,
ASSISTIR À TELEVISÃO, LER JORNAIS E REVISTAS, BEM
COMO EM INSTITUIÇÕES ÀS QUAIS CONFIAMOS A NOSSA
FORMAÇÃO E A DE NOSSAS CRIANÇAS: A ESCOLA.
CONTUDO, PRECISAMOS LEMBRAR QUE A TAREFA DE CADA
UM QUESTIONAR ESSE DISCURSO, ONDE ELE EXISTE, A
PARTIR DA VIVÊNCIA CONCRETA, DA PROCURA POR
73
TEORIAS QUE NOS LEVAM A APRENDER A ANALISAR O
MUNDO AO NOSSO REDOR, DO TRABALHO CRÍTICO QUE
EMPREENDEMOS AO CONSTRUIR NOSSA EXISTÊNCIA.

74
TEMA 4 – MEIOS DE COMUNIÇÃO DE MASSA,
TECNOLOGIA E NOVAS MÍDIAS

4.1 OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA E SUAS


CARACTERÍSTICAS
4.2 AS VELHAS E NOVAS MÍDIAS
4.3 COMUNICAÇÃO E TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO
4.4 MÍDIA E SOCIEDADE DE CONSUMO

4.1 OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA E SUAS


CARACTERÍSTICAS

Introdução

Origem do termo: o termo originou-se da combinação do


termo inglês MASS com o termo latino MEDIA = MASSA + MEIO
= Meio de Comunicação de Massa ou simplesmente MÍDIA.

Massa

Do inglês mass, que vem do grego μᾶζα; termo que era


empregado para conceituar a composição da pasta compacta e
de textura consistente de um tipo de bolo de cevada. No campo
da física o termo foi empregado para definir a medida
quantitativa da resistência de um objeto denominada de massa
inercial ou a quantidade de matéria de um corpo. No campo das
Ciências Sociais e da Teoria da Comunicação o termo está
vinculado a multidão, grupo de pessoas ou agregado social de
natureza comum que se caracteriza por um estado elementar,
com um grau ínfimo de coesão entre indivíduos do grupo
configurando, assim, uma totalidade indistinta de seres
facilmente manipuláveis e influenciáveis. No âmbito dos meios
de comunicação o termo está associado às multidões
impactadas pelos meios de comunicação, assumindo, portanto,
o sentido de conjunto de pessoas ou elementos em que: a) o
número de pessoas que expressam opiniões é
incomparavelmente menor do que os das que as recebem. A
massa é, portanto, uma coleção abstrata de indivíduos,
recebendo impressões e opiniões já formadas e veiculadas pelos
meios de comunicação de massa; b) a estrutura organizacional
da comunicação pública impede ou dificulta a resposta imediata
e efetiva às opiniões externadas publicamente; c) as
autoridades controlam ou fiscalizam os canais por meio dos
quais a opinião se transforma em ação; d) os agentes
institucionais têm maior penetração, influência e poder de
persuasão sobre a massa reduzindo-a à condição de mera
75
espectadora passiva. A massa, ainda vulgarmente chamada de
povo ou rebanho, não tem autonomia, impossibilitando, assim, a
formação de opinião independente através da discussão, do
debate, da interação e da troca.

Mídia

Do inglês midia, que vem do latim media, plural de


medium, que significa meio ou forma. No Brasil, usa-se mais
comumente a palavra mídia, derivada da pronúncia inglesa -
ainda que alguns gramáticos brasileiros prefiram a forma latina,
media, a qual também é usada preferencialmente em Portugal.
Ao usar-se a forma latina deve ter-se em conta que é uma
palavra estrangeira, o que implica a sua grafia em itálico ou
entre aspas e sem acento, e que esta palavra se encontra já no
plural, devendo escrever-se os media e pronunciar-se os média.

Definição: O termo meio de comunicação, refere-se ao


instrumento ou à forma de conteúdo utilizados para a realização
do processo comunicacional. Quando referido a comunicação de
massa, pode ser considerado sinônimo de mídia.
Meios de comunicação de massa, também chamados
de MMC, ou simplesmente mídias são os meios ou canais de
comunicação usados na transmissão de mensagens emitidas por
uma fonte determinada visando atingir a um grande número de
receptores. Nas relações sociais de comunicação diária, os
meios de comunicação de massa mais comuns são os jornais, as
revistas, o rádio, a televisão e, o mais recente, a internet. As
obras de Cinema, de Teatro e de outros tipos de Artes (shows,
performances, bestsellers) também se tornaram meios de
comunicação de massas, mas artísticos. Entretanto, outros
meios de comunicação, como o telefone, não são massivos e
sim individuais (ou interpessoais).
A utilização dos meios de comunicação de massa
implica organizações geralmente amplas, complexas, com
grande número de profissionais e extensa divisão do trabalho. A
empresa jornalística, por exemplo, envolve o trabalho de
diretores, jornalistas, redatores, fotógrafos, diagramadores,
ilustradores, câmeras, gráficos etc. O fato de a manutenção de
um órgão de comunicação de massa ser bastante onerosa faz
com que essas empresas dependam dos imperativos de
consumo (máxima circulação, no caso de livros e filmes;
garantia de audiência e venda de publicidade, no caso dos

76
jornais, revistas, rádio e televisão) para sobreviver ou se
expandir.
Uma segunda característica básica dos meios de
comunicação de massa é o fato de que eles necessariamente
empregam máquinas na mediação da comunicação: aparelhos e
dispositivos mecânicos, elétricos e eletrônicos possibilitam o
registro permanente e a multiplicação das mensagens impressas
(jornal, revistas, livro) ou gravadas (disco, rádio) em milhares ou
milhões de cópias. A produção, transmissão e recepção das
mensagens audiovisuais (rádio, TV) precisa de milhares ou
milhões de aparelhos receptores.
Outra característica típica dos meios de comunicação
de massa é a possibilidade que apresentam de atingir
simultaneamente uma vasta audiência, ou, dentro de breve
período de tempo, centenas de milhares de ouvintes, de
telespectadores, de leitores. Essa audiência, além de
hetereogênea e geograficamente dispersa, é, por definição,
constituída por membros anônimos para a fonte, ainda que a
mensagem esteja dirigida especificamente para uma parcela
determinada de público (um só sexo, uma determinada
geração).
Os meios de comunicação de massa/mídias podem ser
classificados em:
 Sonoros: rádio, podcast, telefone viva-voz.
 Escritos: jornais, diários e revistas.
 Audiovisuais: televisão, cinema.
 Multimídia: diversos meios simultaneamente.
 Hipermídia: NTICs, CD-ROM, TV digital e internet, que
aplica a multimédia (diversos meios simultaneamente, como
escrita e audiovisual) em conjunto com a hipertextualidade
(caminhos não-lineares de leitura do texto, como abas, caixas,
links etc.).

Meio e Canal

Meio de Comunicação não se confunde com canal, que


se refere ao aparato tecnológico utilizado para realizar o
processo da comunicação, incluindo a transmissão de
informação (geralmente, idéias humanas). Dependendo das
características do meio utilizado, pode-se transmitir ou
armazenar informação, ou ambos os processos, conforme está
exemplificado a seguir:
 Fala, discurso, gestos, telefone
 Stone scores, gravações de áudio e vídeo, discos
rígidos
 Papel, cartas
77
 Meios de Comunicação de Massa: pronunciamentos,
jornais, revistas, cinema, televisão, rádio, websites, CDs, DVDs,
videocassetes
 Mídia interativa: jogos de computador, jogos online,
videogame, edutainment, televisão interativa
 A Internet é um híbrido entre Comunicação de Massa
e Comunicação Interpessoal
 Em Arte, um meio significa o material e o suporte
usados pelo artista: pintura, madeira, mármore, aço etc.
Por metonímia, a indústria e as empresas que
produzem conteúdo de notícias e de entretenimento são
geralmente denominadas osmedia ou a mídia (da mesma forma
como a indústria de notícias é denominada a imprensa). No final
do século XX, tornou-se lugar-comum este uso no singular ("A
mídia é...") em lugar do tradicional plural; em Portugal, não
obstante, é preferido o termo no plural, os media (concordando
em número com o termo latino que é plural).

Tipos de Comunicação

A comunicação é um processo por meio do qual a


informação é codificada e transmitida por um emissor a um
receptor, instantaneamente ou a médio prazo, através de um
canal. A comunicação é, portanto, um processo pelo qual se
atribui significado a algo ou a alguma coisa para , em seguida,
fazer a transmissão deesse contéudo numa tentativa de criar
um entendimento compartilhado.
Na organização do processo comunicacional existe um
vasto emaranhado de redes de comunicação que vão se
entrelaçando. Estas, sob diversas formas e em diferentes
direções, percorrem a estrutura no seu conjunto: Comunicação
pessoal/impessoal; Comunicação descendente/ascendente;
Comunicação lateral/diagonal; Comunicação
escrita/comunicação oral.
A Comunicação não pode ser dissociada da sua relação
custo/eficácia, uma vez que as ferramentas, mecanismos e
procedimentos usados pelos meios de comunicação de massa
para chegar até as massas são muito onerosos, reclamam
investimentos vultuosos e envolvem uma complexa teia de
recusros tecnológicos e humanos. Daí a premente necessidade
que os MCM têm de alcançar e influenciar o maior número
possível de pessoas, em diferentes espaço e num espaço de
tempo exíguo, a fim de obter resultados rápidos que são
convertidos em cifras ou valores correlatos, como status, fama,
projeção social etc. Aplica-se aqui a equação matemática do
mercado de capital: Quando maior for a produção em menor
78
tempo, com uma demanda elevada, menor será o valor final do
produto, pois seu custo é diluído na produção em larga escala.
Vivemos formas diferentes de comunicação, que
expressam múltiplas situações pessoais, interpessoais, grupais e
sociais de se conhecer, sentir e viver, que são dinâmicas, que
vão evoluindo, modificando-se, modificando-nos e modificando
os outros. Vejamos a seguir as formas mais comuns.
A Comunicação Aparente: É um processo de
"comunicação" em que as pessoas falam e respondem, sem
prestarem verdadeiramente atenção ao outro e ao que ele está
dizendo. Cada um precisa "desabafar", ter alguém com quem
conversar. Se a necessidade é forte e de ambas as partes, a
"comunicação" se transforma num diálogo animado, mas "de
surdos", porque cada um fala de si, extravasam suas ideias,
sentimentos, necessidades sem prestar atenção ou procurar
entender o que o outro está dizendo.
A Comunicação Superficial: É uma interação limitada,
com trocas previsíveis sobre temas socialmente definidos e com
limites preestabelecidos – culturalmente ou pelos grupos e
indivíduos. São trocas de mensagens sobre assuntos específicos
e que não expõem muito a intimidade de cada um, por exemplo
sobre futebol ou fofocas de pessoas ou artistas, em reuniões
sociais, festas, bate-papos. Fala-se animadamente, mas sem
interação pessoal, sem revelar o eu profundo a não ser neste
campo específico; isto é, emite-se uma opinião “aparentemente
pessoal”, mas sobre o outro e nunca sobre si mesmo. São
processos úteis de manutenção dos vínculos dentro de um
grupo ou comunidade, mas que pouco revelam dos indivíduos,
porque estes se escondem, não querem se expor ou o fazem
somente em outros espaços mais restritos.
A "Comunicação" Autoritária: É uma troca ou interação
dentro de um sistema fechado, onde se expressam relações de
poder, de dominação. É uma troca desigual – em que um fala e o
outro assente – baseada no poder econômico, político,
intelectual ou religioso. É uma fala em que aquele que tem
algum poder procura dominar o outro, impor seus pontos de
vista, controlar. O outro se transforma em mero "receptor",
destinatário e só pode concordar com o emissor.

Evolução histórica

Para alguns, os primeiros meios de comunicação de


massa foram os livros (principalmente os livros didáticos), que
79
existem há muito séculos. Mas, normalmente, a difusão da mídia
se deu no século passado. Em tal período não havia a idéia de
que a difusão da informação da parte da mídia poderia ocorrer
em tempo real, mas que deveria haver um intervalo de tempo
limitado entre a emissão da mensagem e a sua recepção.
No curso do século XX, o desenvolvimento e a
expansão capilar dos meios de comunicação de massa seguiram
o progresso científico e tecnológico. De fato, os meios, além de
serem meios para veicular as informações, são também os
objetos tecnológicos com os quais o usuário interage.
O avanço da tecnologia permitiu a reprodução em
grande quantidade de materiais informativos a baixo custo. As
tecnologias de reprodução física, como a imprensa, a gravação
de discos de música e a reprodução de filmes seguiram a
reprodução de livros, jornais e filmes a baixo preço para um
amplo público. Pela primeira vez, a televisão e a rádio
permitiram a reprodução eletrônica de informações.
Os meios eram (pelo menos na origem) baseados na
economia de reprodução linear: neste modelo, um obra procura
render em modo proporcional ao número de cópias vendidas,
enquanto ao crescer o volume de produção, os custos unitários
decrescem, aumentando a margem de lucro. Grandes fortunas
foram acumuladas devido à indústria da mídia.
Se, inicialmente, o termo "meios de comunicação de
massa" se referia basicamente a jornais, rádio e televisões, no
final do século XX a internet também entrou fortemente no
setor. Para alguns, também os telefones celulares já podem ser
considerados uma mídia.
O jornal foi o primeiro meio de comunicação de massa
criado pelo homem: originário dos documentos informativos dos
navegadores do século XVI, esse meio originalmente impresso
tomou a forma que tem hoje em 1836, na França; o jornal, hoje,
também tem a forma falada (imprensa falada), no rádio, e a
forma televisiva (imprensa televisada). Veracidade,
imparcialidade, objetividade e credibilidade são as qualidades
que garantes o sucesso de um jornal. A base do jornalismo é a
notícia, seu objeto e seu fim (o resto é secundário). A função
principal da linguagem nesse meio de comunicação é a
referencial ou informativa. Para que o receptor tenha acesso à
mensagem veiculada por esse meio, é preciso que ele saiba ler
e escrever, ou seja, pertencer a uma parcela privilegiada da
sociedade (elite).
O rádio ainda é o meio de comunicação mais popular
que existe já que para ter acesso às mensagens que ele veicula
o receptor não precisa ler e escrever: o rádio é um meio que se
utiliza da linguagem verbal oral, a linguagem que todos os
80
ouvintes sabem usar desde que aprenderam a falar.
Praticamente quase toda a população de uma localidade possui
um aparelho de rádio. Os primeiros inventos que possibilitaram
a concretização do rádio como meio de comunicação de massa
também datam do século XIX. As primeiras emissoras de rádio
norte-americanas datam de 1920 e as do Brasil, entre 1922-25,
tendo seu clímax nos anos 30. A “voz” do rádio, bem como seus
musicais, programas de auditório, o rádioteatro e até seus
comerciais serão posteriormente absorvidos pela televisão.
A televisão surgiu nos anos 40 nos Estados Unidos e
,nos anos 50, no Brasil. É um “liquidificador cultural”, pois é
capaz de diluir Cinema, Teatro, Música, Dança, Literatura etc.,
num só espetáculo, além de ser um meio de entretenimento.
Para Muniz Sodré, esse que é o meio de comunicação mais
poderoso, aquele que mais influencia o receptor, portanto o
meio mais persuasivo que existe, é responsável por uma relação
social abstrata, passiva e modeladora dos acontecimentos: o
receptor recebe a mensagem pronta através de imagens que
consome imediatamente, sem que haja tempo de refletir sobre
elas. Tais imagens atingem o inconsciente do receptor, que
passa a ter suas idéias condicionadas àquelas recebidas através
da TV. Em suma, como se diz popularmente, é um meio que “faz
a cabeça” do receptor , de tal forma que ele nem perceba isso:
ele obedece e cumpre “suas ordens” sem se dar conta. Além
disso, é um veículo de comunicação que nada exige do receptor
em termos de esforços e de conhecimentos: não é preciso saber
ler e escrever, basta girar um botão (o que não requer prática
nem habilidade) para se ter acesso à sua programação, que
também não é da escolha do receptor, mas sim uma
programação imposta a ele pelas emissoras. Muniz Sodré a
chama de “visitadora da família “e diz que não é o receptor
quem assiste à televisão, mas sim é ela que assiste a ele”. No
Brasil, as emissoras de TV são essencialmente comerciais, tendo
apenas uma emissora cultural: a TV Cultura. Dessa forma, a TV
é o mais eficiente balcão de anúncios dos produtos nacionais e
estrangeiros que, devido à força persuasiva desse meio, são
consumidos desesperadamente pelos telespectadores, até
mesmo os produtos que não tenham qualquer utilidade para ele.
Como tudo que a TV lança ou vende vira moda, e como o
telespectador deseja estar sempre na moda, ele adere a essa
moda sem pestanejar.
A Internet tornou-se o mais novo e mais eficaz meio de
comunicação de massa. Por isso, ainda é o menos abrangente,
já que para ter acesso a ele, é preciso ter um computador, uma
placa de “fax modem”, uma linha telefônica e um provedor de
acesso. As necessidades de tais ferramentas implicam em
81
gastos financeiros relevantes, que imensa parcela da sociedade
não despende.
Sempre que um novo meio de comunicação surge, o
otimismo da democratização dos meios de comunicação toma
conta daqueles que a desejam. Essa democracia, porém, só será
possível no dia em que mudanças políticas diminuírem a
distância entre os indivíduos que têm e os que não têm a
informação, retirando do controle comunicacional os poderosos
de sempre, pois se os novos meios de comunicação tiverem os
mesmos donos dos meios existentes, eles serão tão
tendenciosos quanto eles. Além de veicular um “saber comum”
tendencioso e conveniente à manutenção da classe dominante
no exercício do poder, os meios de comunicação são criticados
(principalmente a TV) por nivelarem tal conhecimento “por
baixo”, utilizando uma linguagem “pobre”, visando o
“empobrecimento” da mensagem original. A cultura advinda dos
meios de comunicação de massa é chamada CULTURA DE
MASSA, opondo-se à cultura de elite, que é de alto nível, de
qualidade, advinda dos meios intelectuais da sociedade, aquela
que só vai dominar no dia em que toda a sociedade tiver maior
escolaridade, em que a Educação for prioridade: aquela que leva
qualquer sociedade a pertencer ao PRIMEIRO MUNDO.

Grupos de mídia (media) de grande relevância: No Brasil

 Grupo Abril - fundado por Victor Civita inclui as


revistas "Veja", "Exame", "Claudia", "Superinteresante" e
"Playboy", além das Editoras Ática e Scipione e a programadora
MTV.
 Grupo Bandeirantes de Comunicação o maior grupo
de rádio do país, duas redes abertas de TV, três canais
segmentados, dois jornais, uma operadora de TV por assinatura
e o portal eBand.
 Diários Associados - fundado por Assis
Chateaubriand, é um dos maiores complexos de comunicação
da América Latina reunindo 15 jornais - incluindo Correio
Braziliense e Diário de Minas, 12 emissoras de rádio, 8
emissoras de televisão (mídia trazida para o Brasil pelos
Associados em 1950 através da TV Tupi), 9 portais incluindo o
UAI e 5 sites.
 Grupo Estado de São Paulo - inclui o jornal O Estado
de São Paulo e a Rádio Eldorado
 Grupo Folha da Manhã - inclui o jornal Folha de
S.Paulo e o portal de internet Universo Online (UOL)
 Organizações Globo - inclui hoje a mais bem
estruturada e arrojada rede de televisão; Rede Globo de
82
Televisão, a programadora de TV paga GloboSat, a Globo.com, a
produtora de cinema GloboFilmes, os jornais O Globo, Extra e
Diário de São Paulo e o Sistema Globo de Rádio.
 Central Record de Comunicação – Hoje, a TV Record
cobre todo o Brasil e, através da Record Internacional, está
também em aproximadamente 150 países. O grupo também
possui o portal R7, Rádio Record AM, Rede Família de Televisão,
Rádio Guaíba AM/FM, Rádio Sociedade da Bahia, Rede Aleluia de
Rádio e os jornais “Correio do Povo” (RS) e “Hoje em Dia” (MG).
 Grupo RBS - Rede Brasil Sul (RBS) inclui a RBS TV em
SC e RS, o Canal Rural e a TVCOM. Os jornais Zero Hora, Diário
Catarinense, A Notícia, Jornal de Santa Catarina, Diário Gaúcho,
Pioneiro, Diário de Santa Maria e o Hora de Santa Catarina. As
rádios Rede Gaúcha Sat, Rede Atlântida, Itapema FM, Cidade FM,
Farroupilha AM, Rural AM, CBN Diário e CBN 1340. Na internet o
Grupo RBS possui o portal ClicRBS e de sites como o Guia da
Semana, ObaOba, Agrol, hagah, desejomania, Pense Imóveis,
Pense Carros, Portal Mobi e o Eu Comparo. Além da editora RBS
Publicações, da gravadora Orbeat Music e da Fundação Maurício
Sirotsky Sobrinho. Enfim, a RBS conta com oito jornais, sete
portais de Internet, três emissoras locais de televisão, uma
operação para o mercado rural, uma gravadora, 24 emissoras
de rádio e uma empresa de mobile marketing, a pontomobi.
Além disso, possui 18 emissoras de televisão afiliadas à Rede
Globo, além de quatro novas em implantação, tornando-se a
maior rede regional da América Latina. A rádio Rede Gaúcha Sat
possui 110 emissoras afiliadas em nove estados brasileiros.
 Grupo Silvio Santos – O Sistema Brasileiro de
Televisão (SBT) é o negócio mais expressivo no ramo de
comunicações, mas o GSS também está presente na TV por
assinatura através da TV Alphaville e da TV Cidade e em
diversos outros setores de varejo à agricultura, passando por
cosméticos, alimentos, produção teatral e bancos.

4.2 AS VELHAS E NOVAS MÍDIAS

Mídia tradicional tenta censurar novas mídias


Por Najla Passos, no sítio Carta Maior – 09 de novembro
de 2011

Em debate na Câmara dos Deputados sobre liberdade de


expressão, militantes de novas mídias criticam autoritarismo de
veículos tradicionais de imprensa, que reagiriam apelando para
censura de que se sentem ameaçados. Aprovação de marco civil
da internet e de novo marco regulado para radiodifusão é
considerada fundamental para garantir pluralidade.
83
No Brasil, a exemplo do que ocorre na economia e no
social, o cenário é desigual também no campo das
comunicações. De um lado, os veículos tradicionais da imprensa,
comandados por uma meia dúzia de famílias, se armam de
todos os meios possíveis para manter o controle exclusivo e
absoluto da agenda pública. E, para isso, cometem os mais
variados excessos, incluindo aí alguns crimes, como destruir a
reputação de pessoas sem provas ou sequer indícios. Do outro
lado, cidadãos comuns que só recentemente, com a
popularização das novas mídias, alçaram o status de produtores
de conteúdo, lutam para consolidarem o legítimo direito à
manifestação de opinião e pensamento, a despeito das
investidas conservadoras que impõem multas milionárias a
blogueiros, tuiteiros e demais internautas produtores de
conteúdo mais progressista e irreverente.
As velhas mídias são os meios de comunicação
tradicionais, como os jornais, revistas, TVs e rádios e as novas
mídias são as que nasceram no bojo da internet: sites, blogs e
microblogs, dentre outras.
Segundo o jornalista e deputado Emiliano Jose (PT-BA),
membro da coordenação da Frente Parlamentar em Defesa da
Liberdade de Expressão e Democratização da Comunicação “Há
uma luta política em andamento entre as velhas mídias e as
novas mídias. As velhas mídias, que também se utilizam das
novas e estabelecem a propriedade cruzada em tudo, estão
profundamente incomodadas com essas últimas”.
Emiliano José participou ativamente, no dia 09 de
novembro de 2011, da audiência pública convocada pela
Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos
Deputados para debater as decisões e disputas judiciais que
afetam a liberdade de expressão, especialmente dos
comunicadores que atuam nas novas mídias.
O professor da Universidade Federal de Minas Gerais
Túlio Vianna, iniciou a discussão lembrando aos presentes que
não existe direito absoluto. “O modelo brasileiro tende a tolerar
opiniões divergentes, mas impõe limites. Não há liberdade plena
de informação”, explicou.
Entretanto, segundo ele, o que a prática vem
demonstrando é a utilização de leis criadas para outros fins para
penalizar cidadãos comuns que estão apenas exercendo seu
legítimo direito à opinião. Exemplo é o processo contra os dois
jornalistas que criaram o site de sátira ao jornal Folha de S.
Paulo, chamado “Falha de S. Paulo”.
A Folha acionou judicialmente esses internautas, com
base na Lei de Patentes, que deveria servir para a defesa da
84
propriedade intelectual. “Essa lei não foi criada para impedir a
liberdade de expressão, muito menos a paródia, a sátira e a
crítica, mas foi acatada para penalizar os jornalistas”, critica o
professor Túlio Viana.
Outro exemplo, segundo o professor, é a lei de apologia
ao crime, utilizada para criminalizar os defensores da
legalização da maconha que, além de uma marcha, na cidade
de São Paulo, matinham um site da campanha. “Reivindicar a
modificação de uma lei não é incitação ao crime, mas nem
sempre a Justiça entende isso corretamente”.
A jornalista e secretária-geral do Centro de Estudos da
Mídia Alternativa Barão de Itararé, Renata Vicentini Mielli,
afirmou que as novas tecnologias de comunicação criaram um
novo paradigma na sociedade atual. “Até bem pouco tempo
atrás, o agente social responsável por fazer a mediação da
agenda pública eram os grandes meios de comunicação. Agora,
um novo agente entrou em jogo. As novas mídias permitiram
mais pluralidade, mais diversidade na discussão da esfera
pública”, diz.
As novas mídias constituídas de blogs, microblogs,
redes sociais, pequenos sites e uma série de atores atuam na
internet permitindo a distribuição e a organização da informação
de forma mais ágil e democrática. “Isso, de alguma maneira,
diminuiu o monopólio das grandes empresas de comunicação
como mediadores da agenda pública. O poder dos grandes
veículos não foi sepultado, mas foi diluído. E eles não querem
perder esse poder. Por isso, desqualificam esse pólo alternativo
de comunicação ou exercem pressão econômica sobre eles,
através da via judicial”, afirma Renata Mielli.
Segundo ela, o fenômeno é mundial. Nos EUA, só em
2007, processos contra blogueiros movimentaram US$ 17,4
milhões. No Brasil, os valores também assustam. No caso do site
“Falha de S. Paulo”, a justiça estipulou multa diária de R$ 5 mil.
“Como dois jornalistas, assalariados, vão pagar uma multa
dessas? O objetivo é calar as vozes dissonantes”, questiona ela.
A jornalista afirma ainda que processos civis e criminais
contra blogueiros estão pipocando no mundo inteiro e não é
diferente no Brasil. Só o jornalista Paulo Henrique Amorim é alvo
de 37 processos. “É preciso cuidado para não virarmos
sociedade do patrulhamento, do policiamento. Devemos ser
uma sociedade da liberdade. E a comunicação é um direito
humano”, acrescenta.
Para ela, é urgente que se aprove o marco civil da
internet. O projeto de lei está parado justamente na Câmara dos
Deputados, esperando a constituição de comissão especial para

85
avaliar o tema. A jornalista avalia que é urgente também a
definição de um novo marco regulador para a radiodifusão.
“Não é possível que se discuta as questões da
comunicação de forma fatiada. Isso permite que as empresas
coloquem no movimento social, que sempre defendeu a
liberdade de expressão, a pecha de serem novos censores da
sociedade. Regra não é censura. A sociedade precisa entender
isso."
O deputado Emiliano José acrescentou que a distinção
entre fatos e opiniões não é algo muito simples: não há
jornalismo sem interpretação em nenhum momento. “A
organização do fato comporta opinião, mas há alguma
diferenciação entre as duas coisas, e o jornalismo brasileiro tem
caminhado numa direção."
Ele lembrou que as novas mídias, ao mesmo tempo em
que permitem maior democratização na produção de conteúdos,
também ajudam a trazer à tona velhos preconceitos que
resistem nas entranhas da sociedade brasileira, com ocorreu no
episódio do câncer do ex-presidente Lula. Ele acha que a velha
mídia brasileira é um partido político que conspira contra os
governos petistas, de caráter popular e democrático.
Segundo o deputado, a velha mídia demite jornalistas
que usam as novas mídias para manifestar suas opiniões, como
aconteceu, por exemplo, com Maria Rita Khel, que elogiou o
impacto da bolsa família na vida das famílias pobres brasileiras
e acabou demitida do jornal O Estado de S. Paulo. “Isto sim é
censura”, afirma.
Ele defendeu a regulamentação da mídia, incluindo
novas e velhas. “As novas mídias têm uma responsabilidade
social e política muito grande porque representam novas vozes,
novos atores políticos. Ninguém faz o que quer. Precisamos ter
direito de resposta. A sociedade também precisa ser protegida
dos erros dos jornalistas, sejam elas das novas e velhas mídias.”
Disponível
em:http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm
?materia_id=18931Acesso em: 07 ago. 2012

4.3 COMUNICAÇÃO E TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO

A nova mídia e a comunicação de massa na era da


informação
Por Lázaro Lamberth

A partir do desenvolvimento industrial alavancado a


partir do século XIX, os meios de comunicação de massa (MCM),
em todo o mundo, entraram em um processo de
86
desenvolvimento sem precedentes. Apenas no século XX,
invenções como o rádio e a tevê tornaram-se as principais
mídias de massa que o mundo já viu. Porém, com o advento da
computação, o avanço exacerbado das novas tecnologias,
sobretudo a internet, revolucionou o mundo das comunicações e
trouxe novos estilos de mídia para a sociedade contemporânea.
Numa tentativa de refletir tais questões e estabelecer o
que seria uma nova mídia do início do novo século, o americano
Wilson Dizard Jr., especialista em tecnologia e comunicação,
aborda em A Nova Mídia – a comunicação de massa na era da
informação, o impacto das atuais tecnologias sobre as antigas e
o que se pode esperar da chamada hibridização midiática e
convergência tecnológica para a qual o mundo se encaminha.
O presente ensaio consiste em uma reflexão sobre a
nova mídia e a comunicação de massa na era da informação e
suas implicações sociais e econômicas na atualidade, tendo por
base a argumentação central do autor nos textos selecionados.
Inicialmente, há um resumo crítico sobre os argumentos
principais trabalhado pelo autor no decorrer do texto,
estabelecendo prováveis paralelos entre o modelo americano,
que é o objeto de análise no texto, e o modelo brasileiro.
Wilson Dizard Jr. inicia sua abordagem associando a
comunicação de massa à tecnologia à mudança. Tendo em vista
que avanço é algo intrínseco à tecnologia, tal relação acarreta
transformações em todas as esferas da sociedade. A nova mídia
nada mais e que um fenômeno ou tendência mundial de uma
forma de mídia onde todos os componentes híbridamente se
convertem para o mesmo fim, tendo em comum a computação
e a internet como principais tecnologias. Tal contexto
tecnológico midiático ocasiona mudanças em sentido técnico,
político e econômico no cenário mundial da mídia de massa.
Técnico no sentido da adaptação das mídias às novas
perspectivas impostas pela digitalização; político no que se
refere às leis e regulamentos de qualquer esfera governamental;
e, econômico no sentido da concentração do poder dentro dos
grandes conglomerados de mídia.
Ao analisar o surgimento e desenvolvimento da internet
como mídia de massa a partir da década de 90 — com o objetivo
de descrever seu impacto inicial e examinar seu potencial nos
padrões de mídia no início do século XXI — Dizard propõe
reflexões acerca do que se pode esperar das atuais e já
consideradas defasadas mídias tradicionais, tendo em vista que
a computação e a internet são tecnologias em constante
processo de desenvolvimento. Podemos prever com certeza o
que o futuro reserva para o rádio, tevê e mesmo a imprensa?
Até que ponto o avanço tecnológico satisfaz as necessidades de
87
cada cidadão? Conforme bem problematizado, “a pergunta
decisiva é como todas essas possibilidades podem nos
beneficiar numa democracia pós-industrial mais complexa.”
(DIZARD, 2000, pág. 15).
Tais questionamentos se justificam quando, apesar de
todo avanço e vantagens em termos de acessibilidade,
flexibilidade e interatividade, a digitalização ainda não chega a
todas as classes e camadas sociais. O chamado analfabetismo
digital, que separa cada vez mais aqueles que têm dos que não
tem, é algo que precisa ser tratado urgentemente, sob pena do
princípio primordial da cibercultura tornar-se questionável. Sobre
isso, Dizard (2000) avalia: “A continuar a atual tendência, os
primeiros dominarão totalmente os recursos de informação de
que todos necessitam para sobreviver e prosperar, e os
segundos se tornarão um lumpemproletariado (facção
desprezível e degradada do proletariado) pós-industrial,
relegados ao entretenimento irracional e outras trivialidades. A
garantia de acesso eqüitativo aos recursos de informação de
última geração parece ser a questão mais urgente que
enfrentamos à medida que penetramos no padrão da nova
mídia.” (2000, pág. 15)
O que se percebe das considerações contidas no texto é
que embora o autor utilize o modelo norte-americano de mídia
eletrônica de massa como objeto de estudo em sua análise, o
que ocorre nos EUA em termos de MCM e novas tecnologias
pode ser aplicado em todo o mundo, inclusive ao Brasil.
A rápida sucessão do avanço tecnológico tira das
camadas sociais a percepção do atual cenário de mudança e a
emergência de novos padrões de mídia eletrônica de massa e
pessoal divide a opinião dos especialistas em comunicação
quanto ao futuro da cibercultura e das comunicações na era da
informação massiva e excessiva. Há quem acredite que teremos
uma sociedade democrática, onde todos serão agentes
receptores e produtores de informação. A blogosfera, o
jornalismo cidadão e a interatividade digital são algumas das
expressões vistas com bons olhos pelos integrados da
comunicação. Para os apocalípticos, porém, estamos à caminho
do fim, do desconexo, principalmente porque a cultura de massa
disseminada pelos mídia introduz conceitos, dita valores e muda
a maneira de ser e de agir de milhões de pessoas, acentuando
ainda mais a disparidade e segregação social e digital que
separa o mundo entre os que têm acesso à comunicação e ao
poder e os que, por não estar incluídos ao ciberespaço, ficam
alienados do desenvolvimento proporcionado pelas novas
tecnologias. O mais provável que ocorra é que, no futuro não
muito distante, estaremos em algum ponto entre os dois
88
extremos, pois, apesar de todas as disparidades existentes, não
se pode negar as inúmeras possibilidades criadas pela
cibercultura e da internet como nova mídia e nova forma de
conhecimento.
Outro ponto argumentado que convêm algumas
observações tem a ver com o aspecto político legal das novas
tecnologias da comunicação. Assim como ocorre nos EUA, no
Brasil, a defasada legislação não contempla as atuais mídias
eletrônicas. O sistema legislativo de comunicação brasileiro
ainda encontra-se regido por uma Lei de Imprensa sancionada
em plena repressão do Regime Militar, especialmente sobre os
meios de comunicação de massa.
Como se não bastasse a obsolescência das leis que
regem o sistema brasileiro de comunicações em não
contemplar, entre outras coisas, as atuais mídias eletrônicas de
massa; a natureza autoritária e centralizada no processo de
outorga de licenças e disparidade entre o que está na legislação
e o que acontece na prática, podem ser sinalizados como alguns
dos problemas existentes na legislação brasileira que refletirão
no futuro bem próximo em como o estado intervirá nos
problemas ético-legais envolvendo a nova mídia.
Outra tendência norte-americana que também pode ser
aplicada ao caso brasileiro é que, em decorrência do avanço
mundial e a convergência das novas tecnologias da
comunicação, atrelados ao fenômeno da globalização, os
chamados “conglomerados de mídia” concentram a propriedade
no setor das comunicações em todo o mundo, resultando na
consolidação e emergência de um pequeno grupo de
megaempresas mundiais.
Tal processo de oligopolização, como um novo padrão
universal, é comparado por estudiosos do setor como o biológico
processo de sinergia que, em tese, trabalha com o pressuposto
de que a interação de duas unidades “produz algo maior do que
a soma de suas duas partes”. No campo das comunicações, isso
equivale à junção e ação coordenada de várias empresas,
visando uma maior eficiência na atuação das mesmas. Embora
positivo e contemporâneo do ponto de vista da eficiência e da
dinâmica que o setor das comunicações demanda, tal processo
acarreta conseqüências e mudanças estruturais que afetam não
só a economia de um país, como também a democrática
inserção de outros segmentos no setor envolvido.
Analisando o contexto brasileiro, LIMA (2001) diz que “o
novo padrão universal vem assumindo no Brasil feições
particulares” uma vez que possui como principais
características: 1) o inalterado domínio do setor das
comunicações por grupos familiares e/ou políticos; 2) a entrada
89
das igrejas no setor das comunicações e 3) o fortalecimento da
posição hegemônica da Rede Globo. No contexto externo, Dizard
(2000) aborda o exemplo do empresário australiano naturalizado
americano Rupert Murdoch, diretor-geral da News Corporation,
que, através de uma administração “inteligente e ambiciosa”,
conseguiu uma série de aquisições bem sucedidas de empresas
do ramo das comunicações, sendo o proprietário, atualmente,
de um dos maiores conglomerados de mídia do mundo.
Pode-se concluir com base nas abordagens de Wilson
Dizard Jr em A Nova Mídia, que a tendência mundial para o novo
século no contexto da nova mídia é a convergência das atuais
tecnologias da comunicação na produção e distribuição de
informações propiciada pela computação, digitalização e
internet. Tal convergência reconfigura o padrão até então
adotado pelas mídias tradicionais, acirrando severa competição
na indústria midiática.
Em face das incertezas sobre o que o futuro nos
reserva, uma das conseqüências do atual modelo adotado pela
mídia de massa é a fusão de grandes empresas de
comunicação, o que se repete em todo o mundo, sob a
justificativa da chamada sinergia. Por mais absurdo que tal
probabilidade represente para a democracia mundial, estamos
indo em direção ao previsto mais ainda desconhecido.
O que mais assusta, porém, é que embora a tendência
de monopólio se concretize a cada estudo realizado no setor, o
assunto vem sendo relegado a segundo plano no campo das
ciências políticas e sociais. Uma vez que o processo de
globalização e a convergência das mídias tornam a sociedade
cada vez mais dependente da comunicação midiática, não se
pode, sob hipótese alguma, minimizar a importância de sanções
políticas no campo das comunicações, sob pena de ser ter
seriamente ameaçado o direito à liberdade de expressão no
mundo. Fonte:DIZARD, Wilson. A nova mídia – a comunicação
de massa na era da informação. Tradução: Antonio Queiroga e
Edmond Jorge. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2000. 324 p.

4.4 MÍDIA E SOCIEDADE DE CONSUMO

Novas Mídias, Tecnologia e Sociedade de Consumo


Por André Kadow - 7 de abril de 2010.

É certo que a Internet junto com as novas mídias


(mobile, proximity marketing etc.) estão se tornando coisas
totalmente diferentes do que muitos acreditavam ser há tempos
atrás. No nascimento dos browsers gráficos, pensava-se que as
novas formas de comunicação seriam o advento de uma
90
comunicação 1 para 1 e todos os conceitos de mídia em massa
sofreriam mudanças radicais. Outros mais pessimistas
pensavam que as “velhas” mídias como televisão e jornais iriam
simplesmente desaparecer em algum momento. Claro que nada
disso aconteceu, até hoje.
As mídias mais antigas, como nos ensina a história,
simplesmente não desaparecem com a chegada de novas. Elas
mudam. Do outro lado, como foi o caso da Internet, que no
começo se apropria de métodos e técnicas de comunicação dos
meios tradicionais, para logo em seguida criar sua própria
metodologia e cultura, tudo de acordo com as novas
possibilidades abertas pela tecnologia que cresce a passos
exponenciais. Em algum ponto, estas novas características
encontram seu espaço dentro da mídia tradicional, ao passo que
esta se adapta para os novos tempos de interatividade.
A idéia de interação em um modelo 1 x 1 surge logo no
começo da criação da Internet e continua forte hoje em dia,
enquanto estudos das diferenças dos indivíduos no mundo
virtual tem se mostrado extremamente úteis, o conceito de uma
comunicação de 1 para X, X para 1 e de X para X é o que move
toda as interações atuais. Afinal um dos conceitos básicos da
Internet é cria um ambiente onde indivíduos que estão social e
geograficamente dispersos, podem interagir e colaborar.

Novas formas de comunicar

Em praticamente todos os artigos sobre o impacto das


novas tecnologias e mídias na forma de comunicação uma coisa
é certa: as divisões tradicionais das mídias estão desaparecendo
rapidamente.
Os limites entre comunicação em massa e uma relação
interpessoal, propaganda e relações públicas, marketing direto
etc. estão cada vez mais difíceis de perceber e até conceitos
comumente usados estão perdendo o seu sentido de utilização.
Se uma pessoa faz um post recomendando determinado produto
em um site como a Amazon, por exemplo, isto é uma
comunicação em massa ou extremamente pessoal? Se uma
empresa cria uma comunidade para se discutir determinado
produto, isto é marketing ou alguma outra coisa? Claramente
está cada vez mais complicado descrever e entender o porque
das coisas se esta análise for feita de maneira individualizada.
Um bom ponto de partida é deixar de lado todos os
novos termos, modismos e afins para se perguntar: Por que
usamos essas novas mídias?
A possibilidade de interação com um número antes
inimaginável de pessoas, abre as portas para inúmeras e
91
valiosas oportunidades de negócios, novas idéias e troca de
informações. Um dos pontos centrais neste tipo de movimento
(redes sociais, softwares livres etc.) é a participação voluntária
das pessoas. Então para qualquer movimento em rede, a chave
é: como criar e fazer crescer uma página, blog ou qualquer coisa
do tipo, na qual as pessoas realmente queiram participar e
interagir entre si.
Se cada um resolver participar solitariamente, o
resultado final será apenas a prevalência de suas convicções,
crenças e vontades. Na verdade, é muito mais complicado do
que isso. Em um ambiente social, como grupos ou comunidades,
os indivíduos tomam decisões em conjunção com as decisões de
outros, o que cria uma dinâmica social extremamente complexa,
como é o caso da criação de um software livre, por exemplo.
Quantas pessoas estão na comunidade? Quantos são ativos?
Quantos estão apenas aproveitando dos benefícios e não
contribuem com nada?
A vontade de cada pessoa se comunicar depende
também do que os outros fizeram ou estão fazendo, além de
outros fatores que afetam (positivamente e negativamente) a
motivação de cada um. Num ambiente deste, em que todo
mundo responde para todo mundo, a menor mudança no fluxo
das interações pode determinar o destino de um produto, uma
pessoa ou até um partido político, como foi sabiamente
explorado por Obama na sua campanha eleitoral, em que foi
eleito para Presidente do EUA, em 4 de novembro de 2008.
Examinar todo o processo social envolvido, requer um estudo
micro (individual) e macro (interação entre indivíduos) e como
ambos estão relacionados e espero que os próximos estudos
façam a ponte entre os dois mundos.

Sociedade de consumo

Sociedade de consumoé um termo utilizado em


economia e sociologia, para designar o tipo de sociedade que se
encontra numa avançada etapa de desenvolvimento industrial
capitalista e que se caracteriza pelo consumo massivo de bens e
serviços, disponíveis graça a elevada produção dos mesmos.
O conceito de sociedade de consumo está ligado ao de
economia de mercado e, por fim, ao conceito de capitalismo,
entendendo economia de mercado aquela que encontra o
equilíbrio entre oferta e demanda através da livre circulação de
capitais, produtos e pessoas, sem intervenção estatal.

Definição

92
A expressão Sociedade de Consumo designa uma
sociedade característica do mundo desenvolvido em que a
oferta excede geralmente a procura, os produtos são
normalizados e os padrões de consumo estão massificados. O
surgimento da sociedadede consumo decorre directamente
do desenvolvimento industrial que a partir de certa altura, e
pela primeira vez em milénios de história, levou a que se
tornasse mais difícil vender os produtos e serviços do que
fabricá-los. Este excesso de oferta, aliado a uma enorme
profusão de bens colocados no mercado, levou ao
desenvolvimento de estratégias de marketing extremamente
agressivas e sedutoras e às facilidades de crédito quer das
empresas industriais e de distribuição, quer do sistema
financeiro.

As principais características da sociedade de consumo


são as seguintes:

 Para a maioria dos bens, a sua oferta excede a


procura, levando a que as empresas recorram a estratégias de
marketing agressivas e sedutoras que induzem o consumidor a
consumir, permitindo-lhes escoar a produção.
 A maioria dos produtos e serviços estão
normalizados, os seus métodos de fábrica baseiam-se na
produção em série (no modelo fordista) e recorre-se a
estratégias de obsolescência programada que permita o
escoamento permanente dos produtos e serviços.
 Os padrões de consumo estão massificados e o
consumo assume as características de consumo de massas, em
que se consome o que está na moda apenas como forma de
integração social.
 Existe uma tendência para o consumismo (um tipo de
consumo impulsivo, descontrolado, irresponsável e muitas vezes
irracional).

Críticas: Negativas

Uma das críticas mais comuns sobre a sociedade de


consumo é a que afirma se tratar de um tipo de sociedade que
se "rendeu" frente às forças do sistema capitalista e que, por
tanto, seus critérios e bases culturais estão submetidos as
criações postas ao alcance do consumidor. E neste sentido, os
consumidores finais perderiam as características de indivíduos
para passarem a ser considerados uma massa de consumidores
que se pode influir através de técnicas de marketing,

93
inclusive chegando a criação de "falsas necessidades"
entre eles. Do ponto de vista ambiental, a sociedade de
consumo se vê como insustentável, posto que implica um
constante aumento da extração de recursos naturais, e do
despejo de resíduos, até o ponto de ameaçar a capacidade de
regeneração da natureza desses mesmos recursos
imprescindíveis para a sobrevivência humana.
Em economia internacional, diz-se que o modelo
consumista faz com que as economias dos países pobres se
dediquem em satisfazer o enorme consumo das sociedades
mais desenvolvidas, o que os fazem deixar de satisfazer suas
próprias necessidades fundamentais, como por exemplo a
alimentação e saúde da população, pois o mercado faz com que
a maioria dos recursos sejam destinados a satisfazer a quem
pagar mais. Os enfoques anteriores se combinam ao mostrar
que, se a maioria da população mundial alcançar um nível de
consumo similar ao de países industrializados, recursos de
primeira ordem se esgotariam em pouco tempo, o que envolve
sérios problemas econômicos, éticos e políticos.
Por último, uma das maiores críticas a sociedade de
consumo, vem de quem afirma que esta converte as pessoas a
simples consumidores que encontram o prazer no mero
consumo por si só, e não pela vontade de possuir o produto.
Infelizmente, um impacto desta sociedade de consumo
ao meio ambiente e a sociedade em geral é sem dúvida a rápida
obsolescência dos equipamentos causando hoje na sociedade o
que conhecemos como lixo tecnológico.

Positivas

Para alguns defensores, a sociedade de consumo é


consequência do alto desenvolvimento que chegou a
determinadas sociedades e se manifesta no incremento da
renda nacional. Por sua vez, possibilita que um número cada vez
maior de pessoas adquiram bens cada vez mais diversificados,
desta forma, facilitando o acesso a uma maior quantidade e
qualidade de produtos por uma parte maior da sociedade, se
estaria produzindo uma maior igualdade social.

O Capitalismo e a Sociedade de Consumo

Nas últimas décadas houve um aumento significativo


do consumo em todo mundo, provocado pelo crescimento
populacional e, principalmente, pela acumulação de capital das
empresas que puderam se expandir e oferecer os mais variados
94
produtos, conjuntamente com os anúncios publicitários que
propõe o consumo a todo o momento. Chamamos de consumo
o ato da sociedade de adquirir aquilo que é necessário a sua
subsistência e também aquilo que não é indispensável, ao ato
do consumo de produtos supérfluos, denominamos consumismo.
Para suprir as sociedades de consumo, o homem
interfere profundamente no meio ambiente, pois tudo que o
homem desenvolve vem da natureza, aqui nesse contexto é o
palco das realizações humanas. Através da força de trabalho o
homem transforma a primeira natureza (intacta) em segunda
natureza (transformada). É a natureza que fornece todas
matérias primas (solo, água, clima energia minérios etc)
necessárias às indústrias.
O modelo de desenvolvimento capitalista, baseado em
inovações tecnológicas, em busca do lucro e no aumento
contínuo dos níveis de consumo, precisa ser substituído por
outro, que leve em consideração os limites suportáveis na
natureza e da própria vida.
O planeta já mostra sinais de esgotamento, um
exemplo disso é a escassez de petróleo que é um recurso não
renovável, e sua utilização corresponde a 40% da energia
consumida no mundo, tendo em vista a sua importância no
cenário mundial a situação é preocupante pois alguns estudos
mostram que o petróleo existente será suficiente por mais 70
anos.
Os problemas ambientais diferem em relação aos
países ricos e pobres, a prova disso é que 20% da população é
responsável pela geração da maior parte da poluição e esse
percentual é similar ao percentual da população que possui as
riquezas do mundo. Enquanto essa população vive em altos
níveis de consumo, outra grande maioria, cerca de 2,4 bilhões
de pessoas, não possui saneamento, 1 bilhão não tem acesso a
água potável, 1,1 bilhão não tem habitação adequada e 1 bilhão
de crianças estão subnutridas.

95
TEMA 5 - REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E
GEOPOLÍTICA

5.1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E TOYOTISMO


5.2 GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO
5.3 A GLOBALIZAÇÃO E A CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
5.4 REFLEXOS POLÍTICO-INSTITUCIONAIS, ECONÔMICOS E
SOCIAIS DA GLOBALIZAÇÃO NO BRASIL

5.1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E TOYOTISMO

A crise do modelo de produção taylorista/fordista e a


emergência do toyotismo1
Márcia Naiar Cerdote Pedroso2

“O mundo atual parece, mais do que nunca, um mundo


convulsionado. Profundas transformações tecnológicas
revolucionam o modo de produzir nossa vida material, com
enormes implicações sobre a organização da produção e do
trabalho; nossos modos de vida e de organização social são
violentamente modificados”. (Márcia de Paula Leite).

Nos últimos anos, particularmente a partir da década


de 1970, o mundo passou a presenciar uma crise do sistema
de produção capitalista. Após um período próspero de
acumulação de capitais, o auge do fordismo e do keynesianismo
das décadas de 1950 e 1960, o capital passou a dar sinais de
um quadro crítico, que pode ser observado por alguns
elementos como: a tendência decrescente da taxa de lucro
decorrente do excesso de produção; o esgotamento do padrão
de acumulação taylorista/fordista 3 de produção; a
desvalorização do dólar, indicando a falência do acordo de
Bretton Woods; a crise do WelfareState ou do “Estado de Bem-
Estar Social”; a intensificação das lutas sociais (com greves,
manifestações de rua) e a crise do petróleo que foi um fator que
deu forte impulso a esta crise.

1
Trabalho apresentado como requisito de avaliação da disciplina "Globalização e Política", no curso de
especialização em Pensamento Político Brasileiro da UFSM, no 2º semestre de 2004. Orientado pelo Prof. Dr.
Holgonsi Siqueira. Página da web: http://www.angelfire.com/sk/holgonsi/marcia.html
2
Bacharel em Economia e Pós-graduanda em Pensamento Político Brasileiro pela Universidade Federal de Santa
Maria.
3
Taylorismo – Conjunto das teorias para aumento da produtividade do trabalho fabril, elaboradas pelo engenheiro
norte-americano de Frederick Winslow Taylor (1856-1915): simplificar ao máximo a produção, tornando as
operações únicas e repetitivas. Fordismo – Conjunto de métodos de racionalização da produção elaborados pelo
industrial norte-americano Henry Ford (1863-1947) que aprimora os princípios de Taylor em seu modelo. Para
diminuir os custos, a produção deveria ser em massa, a mais elevada possível, e aparelhada com tecnologia capaz de
desenvolver ao máximo a produtividade por operário. (Sandroni, 1998).
96
Esta “crise estrutural do capital” impulsionou,
principalmente nos anos 1980 e 1990, uma gama de
transformações sócio-históricas que afetam das mais diversas
formas a estrutura social. Nestas condições o sistema capitalista
vai buscar várias formas de restabelecer o padrão de
acumulação. Neste sentido é que se insere a implementação de
um amplo processo de reestruturação do capital, com vistas a
recuperar o seu ciclo produtivo, o que afetou fortemente o
mundo do trabalho, promovendo alterações importantes na
forma de organização da classe dos trabalhadores assalariados.
Neste contexto, o modelo de produção
taylorista/fordista, que vigorou na grande indústria ao longo
do século XX, particularmente a partir da segunda década,
mostra-se em decadência. Harvey (2002) salienta que a base do
método de produção de F. W. Taylor e Henry Ford era a
separação entre gerência, concepção, controle e execução. O
que havia em especial em Ford e que em última análise
distingue o fordismo do taylorismo era o seu reconhecimento
explícito de que produção em massa significava consumo em
massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho,
uma nova política de controle e gerência do trabalho, em suma,
um novo tipo de sociedade democrática e racionalizada. Em
muitos aspectos, as inovações de Ford eram mera extensão de
tendências bem-estabelecidas, ele fez pouco mais do que
racionalizar velhas tecnologias e uma detalhada divisão do
trabalho pré-existente.
Ford lançou as bases de um sistema em que os próprios
trabalhadores – até então vistos como mão-de-obra a ser usada
no limite de suas potencialidades – deveriam ser considerados
também como consumidores. Assim, em síntese, podemos
afirmar que o sistema taylorista/fordista caracteriza-se pelo:
padrão de produção em massa, objetivando reduzir os custos de
produção, bem como ampliar o mercado consumidor; produção
homogeneizada e enormemente verticalizada obedecendo à
uniformidade e padronização, onde o trabalho é rotinizado,
disciplinado e repetitivo; parcelamento das tarefas, o que
conduzirá o trabalho operário à desqualificação.
Em linhas gerais, nos anos 70 se evidenciou a crise
do fordismo norte-americano. E as mobilizações que haviam
movimentado as instituições de poder desde o final da década
de 60, rebelando-se contra aquele padrão de trabalho e de vida
não conseguiram impor alternativa. Nesta medida, o
enfraquecimento da resistência dos trabalhadores foi um fator
importante para abrir caminho ao movimento do capital. Desta
forma, os desdobramentos da crise da década de 70 englobam

97
mudanças fundamentais, que se tornam evidentes com o
esgotamento do padrão fordista. Nas palavras de Antunes:
Como resposta à sua própria crise, iniciou-se um processo de
reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político
de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento
do neoliberalismo, com a privatização do Estado, a
desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem
do setor produtivo estatal, da qual a era Thatcher-Reagan foi
expressão mais forte; a isso se seguiu também um intenso
processo de reestruturação da produção e do trabalho, com
vistas a dotar o capital do instrumental necessário para tentar
repor os patamares de expansão anteriores (Antunes, 2002, p.
31).
Neste momento inicia-se uma mutação no interior do
padrão de acumulação, visando alternativas que dessem um
novo dinamismo ao processo produtivo que dava sinais de
esgotamento. O capital iniciou um processo de reorganização de
suas formas de dominação, não só reorganizando em termos
capitalistas de produção, mas também buscando a gestão da
recuperação de sua hegemonia nas diversas esferas da
sociabilidade4.
Intensificam-se as transformações no processo
produtivo, através do avanço tecnológico, da constituição de
formas de acumulação flexível e dos modelos alternativos ao
binômio taylorismo/fordismo, no qual se destaca especialmente
o modelo toyotista5 ou modelo japonês. O toyotismo assume e
desenvolve novas práticas gerenciais e empregatícias tais como
just in time/kanban6, controle de qualidade total e engajamento
estimulado. Elas surgem como uma nova via de racionalização
do trabalho, centradas na produção enxuta7 (também
denominada lean production), adequadas a uma nova ordem do
capitalismo mundial.

4
“Fez isso, por exemplo, no plano ideológico, por meio do culto de um subjetivismo e de um ideário fragmentador
que faz apologia ao individualismo exacerbado contra as formas de solidariedade e de atuação coletiva e social”
(Antunes, 2002, p. 48).
5
“A expressão surgiu em função dos novos métodos da produção de veículos propostos pelos engenheiros Eiji
Toyoda e Taiichi Ohno, da Toyota Motor Company: após uma minuciosa análise dos métodos de produção em massa
das indústrias Ford, buscavam-se meios de economizar recursos de produção, de organizar uma produção enxuta,
visando as grandes fábricas povoadas de centenas e centenas de trabalhadores” (Silva, 2002, p.73).
6
O just in time – princípio do estoque mínimo - é um instrumento de controle da produção que busca atender a
demanda da maneira mais rápida possível e minimizar os vários tipos de estoque da empresa (intermediários, finais e
de matéria-prima) (Leite, 2003). Kanban – placas que visualizam – Funciona segundo um sistema de placas ou senhas
de comando para reposição de peças e de estoque, estabelecendo um fluxo de informações que emite instruções
especificando a quantidade exata de peças necessárias (Antunes, 2002).
7
Silva (2002) explica que a produção enxuta caracteriza-se pela eliminação de custos decorrentes de desperdícios
causados pelo uso inadequado de equipamento, peças e componentes defeituosos e pela polivalência dos
trabalhadores – uma das novas e fundamentais características do novo mercado de trabalho – em contraposição à
extrema especialização dos trabalhadores sob o fordismo. Com isso tem fim boa parte das necessidades de pessoal de
gerência, revisão técnica e controle de qualidade, ao mesmo tempo em que se exigem estoques menos volumosos,
capazes de fácil distribuição e com grandes vantagens de estocagem. É o sistema just in time.
98
Na observação de Chesnais (1996, p. 35), “em cada
fábrica e em cada oficina, o princípio de ‘lean production’, isto é,
sem ‘gordura de pessoal’ tornou-se a interpretação dominante
do modelo ‘ohnista’ japonês de organização do trabalho”. No
final das últimas décadas o toyotismo assume uma posição de
objetivação universal tornando a flexibilidade8 num valor
universal para o capital.
De acordo com Alves (2000), as condições originárias
do toyotismo partem da lógica do “mercado restrito”, surgindo
sob a égide do capitalismo japonês dos anos 1950,
caracterizado por um mercado interno débil. Por isso tornou-se
adequado, em sua forma de ser, às condições do capitalismo
mundial dos anos 1980, caracterizado por uma crise de
superprodução que coloca novas normas de concorrência. Foi o
desenvolvimento (da crise) capitalista que constituiu, no
entanto, os novos padrões de gestão da produção de
mercadoria, tal como o toyotismo.
As economias de escala buscada na produção fordista
de massa foram substituídas por uma crescente capacidade de
manufatura e uma variedade de bens a preços baixos em
pequenos lotes. As economias de escopo substituem as
economias de escala9.
Numa análise feita pelo sociólogo Coriat, que
apreendeu com perspicácia os nexos contingentes do novo
modo de racionalização do trabalho, ele coloca que:

(...) o toyotismo procurou responder à interrogação,


posta pelo capital diante das condições do mercado
japonês dos anos 50 (e que é, de certo modo, posta sob
o capitalismo mundial na crise de superprodução): o
que fazer para elevar a produtividade quando as
quantidades não aumentam? O que impulsionou – e
impulsiona – o toyotismo, em seu aspecto ontológico
foi, e ainda é, ‘buscar origens e naturezas de ganhos de
produtividade inéditas, fora dos recursos das economias
de escala e da padronização taylorista e fordista, isto
na pequena série e na produção simultânea de
produtos diferenciados e variados (Coriat, apud Alves,
2000, p. 37).

8
Harvey (2002) mostra que a “acumulação flexível” é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo.
Ela sustenta-se na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho e dos produtos e dos padrões de
consumo. Caracterizando-se pelo surgimento de novos setores de produção, novos mercados acompanhados da
intensificação da inovação comercial, tecnológica e organizacional.
9
As economias de escala são caracterizadas pela produção em massa de bens homogêneos, utiliza-se de grandes
estoques, os produtos defeituosos ficam ocultados nos estoques e a produção é voltada para os recursos, enquanto
que, as economias de escopo são caracterizadas pela produção em pequenos lotes de uma variedade de tipos de
produtos, produção sem estoques, rejeição imediata de peças com defeito e a produção é voltada para a demanda
(Harvey, 2002).
99
O novo método de gestão da produção,
impulsionado, em sua gênese sócio-histórica pelo Sistema
Toyota, tornou-se adequado à nova base técnica da produção
capitalista vinculada a Terceira Revolução Industrial que exige
novas condições de concorrência e de valorização do capital a
partir da crise dos anos 1970.
Este é um período de mudanças na estrutura produtiva,
uma fase de transição denominada de pós-fordismo. Sendo os
aspectos mais decisivos desta fase o aumento da flexibilidade
em escala global, a mobilidade de capital e a liberdade para
colonizar e mercantilizar praticamente todas as esferas,
destruindo-se as fronteiras sociais e espaciais relativamente
fixas e gerando-se uma descentralização da produção. Porém,
sobre a transição do fordismo para o pós-fordismo devemos
evitar pronunciamentos que supõem a idéia de que as
características do fordismo tenham sido eliminadas nos dias
atuais. Ao contrário, elas afirmam a complexidade das condições
presentes que envolvem a contínua existência de características
básicas do fordismo.
Até mesmo Ohno e Krafcik, proponentes dos novos
métodos de produção, reconheceram que é mais importante
insistir sobre as continuidades do que sobre as rupturas do
toyotismo com relação ao taylorismo/fordismo. De certo modo o
toyotismo conseguiu superar alguns aspectos predominantes da
gestão de produção da grande indústria do século XX inspiradas
no taylorismo e fordismo, que instauraram a parcelização e a
repetitividade do trabalho.
Mas, por trás da intensificação do ritmo do trabalho que
existe no toyotismo, persiste uma nova repetitividade do
trabalho. Alves (2000, p.11) denomina este cenário de “‘o novo
complexo de reestruturação produtiva’ que envolve um sistema
de inovações tecnológico-organizacionais no campo da produção
capitalista”. Este processo ocorre sustentado nas novas políticas
de gestão/organização do trabalho fundadas na “cultura da
qualidade” e numa estratégia patronal que visa a cooptar e
neutralizar todas as formas de organização e resistência dos
indivíduos. São políticas que por um lado, “incluem” uma elite
neste novo padrão que está sendo gestado e, por outro,
“excluem” - através do desemprego e das formas precária de
contratação/subcontratação.
É importante ressaltar que, o atual processo de
reestruturação produtiva não vem se produzindo no âmbito
especifico de qualquer país ou região, mas vem se produzindo
no contexto de um conjunto de transformações que ocorrem em
nível mundial desde meados dos anos 1970. Isto significa
reconhecer este processo dentro do contexto da globalização
100
econômica, o que implica, portanto, reconhecer a presença de
um processo mundial de transformações.
A emergência desta Nova Era conduzida pelos
impactos do toyotismo promove uma série de alterações
decisivas na estrutura de classe, ocorrendo uma fragmentação
da classe trabalhadora, cujos principais aspectos sociais são o
desenvolvimento, por um lado, de uma subproletarização
tardia10,e, por outro, do desemprego estrutural. Com base
nestes pressupostos posso dizer que esta seja uma das
principais características do novo perfil do mundo do
trabalho que coloca novas provocações para o trabalho
assalariado.
Portanto, as últimas décadas assistiram - sobretudo a
partir da crise dos anos 1970 – a uma profunda
reestruturação do sistema capitalista, que pode
caracterizar-se por aspectos como a globalização da
economia, a utilização massiva das novas tecnologias nos
sistemas produtivos, a reestruturação organizacional e a
renovação das técnicas de administração das empresas,
incrementos fortes na produtividade do trabalho e que buscam
níveis cada vez mais sofisticados da formação da força de
trabalho.
Como afirma Castells (2005), o trabalho humano há
décadas vem sendo transformado, primeiro a mecanização,
depois a automação, sempre provocando debates semelhantes
sobre questões relacionadas à demissão de trabalhadores,
“desespecialização” versus “reespecialização”, “produtividade”
versus “alienação”, “controle administrativo” versus “autonomia
dos trabalhadores”.
Assim, podemos concluir afirmando que estamos
diante de um intenso processo de transformação do mundo
do trabalho, com a emergência de novos modelos de
produção, acompanhados do crescente avanço tecnológico.
Desta forma, assistimos a construção de uma nova ordem
econômica, na qual o conhecimento assume um papel
primordial. Esse novo momento redimensiona a demanda de
trabalho e afeta diretamente os trabalhadores. Estamos,
portanto, no limiar de um novo processo histórico.

5.2 GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO

10
A subproletarização tardia é constituída pelos trabalhadores assalariados em tempo parcial, temporários ou
subcontratados, seja na indústria ou nos serviços interiores (ou exteriores) à produção do capital. Deste modotende a
predominar o que alguns sociólogos e economistas denominam “informalização” nas relações de trabalho (Alves,
2001).
101
O que é Globalização?
(Fonte: http://orbita.starmedia.com)

Chama-se globalização, ou mundialização, o


crescimento da interdependência de todos os povos e países da
superfície terrestre. Alguns falam em “aldeia global”, pois
parece que o planeta está ficando menor e todos se conhecem
(assistem a programas semelhantes na TV, ficam sabendo, no
mesmo dia, o que ocorre no mundo inteiro).
Um exemplo: “Você vê, hoje, uma indústria de
automóveis que fabrica um mesmo modelo de carro em
montadoras de 3 países diferentes e os vende em outros 5
países. As empresas não ficam mais restritas a um país, seja
como vendedora ou produtora.”

Globalização

1. “Mundialização” – Crescimento da interdependência


de todos os povos.
2. “Aldeia global” – Notícias, produtos, programas de
TV, Internet.
3. Na história da humanidade:
3.1. Império Chinês, povos egípcios, romanos (estradas)
3.2. Expansão marítima portuguesa – novos
fornecedores e consumidores
3.3. Século XIX – Imperialismo ou Neocolonialismo -
Superprodução – Europeus, EUA e Japão – Continentes Africano e
Asiático
3.4. Década de 70 – “Globalização”
4. Características
4.1. Diminuição (eliminação) de impostos sobre
importações
4.2. Fortalecimento de grupos internacionais ( Mercosul,
Comunidade Europeia etc)
4.3. Aceleração do tempo
4.4. Circulação da informação
4.5. Variedade de produtos, marcas e serviços
4.6. Abertura da economia e globalização – processos
irreversíveis
5. Problemas
5.1. Desemprego – crescer o suficiente para absorver a
mão de obra disponível
5.2. Aumento da distância e da dependência
tecnológica
6. Reflexos
6.1. Necessidade de aprimoramento constante
102
6.2. Familiaridade com novas tecnologias
6.3. Idiomas (inglês)
6.4. Não ficar restrito à determinada função

A História da Globalização

Tendo uma visão apenas da globalização econômica, a


história, vamos encontrá-la já muito antes do Império Romano. A
globalização aparece na constituição do Império Chinês; na
civilização egípcia, que manteve o domínio de todo o continente
africano; Na Grécia, que apesar das cidades-estado, que mesmo
independentes, viam uma globalização da economia. O que os
romanos fizeram foi organizar, por meio de leis, a globalização
da economia. Os gregos descobriram o direito. Mas é em Roma
que o direito surge como instrumento de poder, pois só assim os
romanos poderiam organizar e controlar o Estado. Além disso,
com a expansão territorial, os romanos se veem obrigados a
construir uma rede de estradas, que possibilitou a
comercialização e a comunicação entre os diversos povos.
Porque os portugueses se lançaram às grandes
descobertas? Não só para se proteger dos mouros espanhóis,
mas também para procurar novas rotas comerciais de
globalização. Nesses séculos (XIV e XV), ocorreu um
descompasso entre a capacidade de produção e de consumo. O
resultado disso. era uma produtividade baixa e a falta de
alimento para abastecer os núcleos urbanos. Enquanto a
produção artesanal não tinha um mercado consumidor, a
solução para esses problemas estava na exploração de novos
mercados, capazes de fornecer alimentos e metais e, ao mesmo
tempo, aptos a consumir os produtos artesanais europeus.
Outro exemplo que temos, é do século XIX, chamado de
Imperialismo ou Neocolonialismo. Ocorreu quando a economia
europeia entrou em crise, pois as fábricas estavam produzindo
cada vez mais mercadorias em menos tempo, assim, com uma
superprodução, os preços e os juros despencaram. Na tentativa
de superar a crise, países europeus, EUA e Japão buscaram
mercados para escoar o excesso de produção e de capitais.
Cada economia industrializada queria mercados cativos,
transformando o continente Africano e Asiático em centro
fornecedor de matéria prima e consumidores de produtos
industrializados, gerando, com isso, um alto grau de exploração
e dependência econômica.
Podemos comparar essa dependência econômica e
exploração com os dias de hoje, pois é difícil de acreditar na

103
possibilidade de os países desenvolvidos serem generosos com
os demais, os emergentes e subdesenvolvidos.
Já no final dos anos 70, os economistas começaram a
difundir o conceito de globalização, usada para definir um
cenário em que as relações de comércio entre os países
fossem mais frequentes e facilitadas. Depois, o termo passou a
ser usado fora das discussões econômicas.
Assim, as barreiras comerciais entre os países,
começaram a cair, com a diminuição (a eliminação) de impostos
sobre importações, o fortalecimento de grupos internacionais
(como o Mercosul ou a Comunidade Europeia) e o incentivo do
governo de cada país à instalação de empresas estrangeiras em
seu território.

O Dia-a-dia da Globalização

Para se ter ideia desse processo, saiba que, nos anos


60, somente cerca de 25 milhões de pessoas viajavam de avião
de um país para outro, por ano. Hoje em dia, esse número subiu
para cerca de 400 milhões. As ligações telefônicas entre os EUA
e a Europa, atualmente, chegam a 1 bilhão por ano. Em 1980, o
volume dos investimentos de residentes de um país nos
mercados de capitais (compra de ações de empresas) de outros
países, atingia a quantia de 120 milhões de dólares; em 1990,
dez anos depois, esse valor já atingia a casa dos 1,4 trilhões de
dólares, Isso quer dizer que as economias nacionais estão se
desnacionalizando em ritmo acelerado, pois os norte-
americanos possuem ações ou títulos de propriedades no Japão,
na Europa e na América Latina; japoneses investem em
empresas norte-americanas ou coreanas, alemães compram
ações de firmas russas ou tailandesas etc.
A Globalização está associada a uma aceleração do
tempo. Tudo muda mais rapidamente hoje em dia. E os
deslocamentos também se tornaram muito rápidos: o espaço
mundial ficou mais integrado.
Em 1950, eram necessários 18 horas para um avião
comercial cruzar o oceano Atlântico, fazendo a rota NY-Londres.
Em 1990, essa rota era feita em somente 3 horas, por um avião
supersônico, e até o final do século, esse tempo vai se reduzir
ainda mais.
Em 1865, quando o presidente dos EUA, Abraham
Lincoln, foi assassinado, a notícia levou 13 dias para chegar à
Europa. Hoje em dia, bastam apenas alguns segundos para uma
notícia qualquer cruzar o planeta, seja por telefone, seja por fax,
pelas redes de TV, por mensagens telefônicas, pela Internet etc.
104
Vantagens e Desvantagens - Prós e Contras

A abertura da economia e a globalização são


processos irreversíveis, que nos atingem no dia-a-dia, das
formas mais variadas e temos de aprender a conviver com isso,
porque existem mudanças positivas para o nosso cotidiano e
mudanças que estão tornando a vida de muita gente mais difícil.
Um dos efeitos negativos do intercâmbio maior entre os diversos
países do mundo é o desemprego que, no Brasil, vem batendo
um recorde atrás do outro.
No caso brasileiro, a abertura foi ponto fundamental no
combate à inflação e para a modernização da economia e, com
a entrada de produtos importados, o consumidor foi beneficiado:
podemos contar com produtos importados mais baratos e de
melhor qualidade e, essa oferta maior, ampliou, também, a
disponibilidade de produtos nacionais com preços menores e
mais qualidade. É o que vemos em vários setores, como
eletrodomésticos, carros, roupas, cosméticos, e, em serviços,
como lavanderias, locadoras de vídeo e restaurantes. A opção
de escolha que temos hoje é muito maior.
Mas a necessidade de modernização e de aumento da
competitividade das empresas produziu um efeito muito
negativo, que foi o desemprego. Para reduzir custos e poder
baixar os preços, as empresas tiveram de aprender a produzir
mais com menos gente. Incorporaram novas tecnologias e
máquinas. O trabalhador perdeu espaço e esse é um dos
grandes desafios que, não só o Brasil, mas algumas das
principais economias do mundo têm hoje pela frente: crescer o
suficiente para absorver a mão-de-obra disponível no mercado.
Além disso, houve o aumento da distância e da dependência
tecnológica dos países periféricos em relação aos desenvolvidos.
A questão que se coloca, nesses tempos, é como
identificar e aproveitar as oportunidades que estão surgindo de
uma economia internacional cada vez mais integrada.

Cidadão Globalizado

Com todas essas mudanças no mercado de trabalho,


temos que tomar muito cuidado para não perder espaço. As
mudanças estão acontecendo com muita rapidez. O cidadão,
para segurar o emprego ou conseguir, também, tem de se
manter em constante atualização, ser aberto e dinâmico. Para
sobreviver nesse mundo novo, precisamos estar em sintonia
com os demais países e, também, aprendendo coisas novas
todos os dias.
105
Ser especialista em determinada área, mas não ficar
restrito a uma determinada função, porque ela pode ser extinta
de uma hora para outra. É preciso atender a requisitos básicos,
como o domínio do computador, de outros idiomas e, mais do
que tudo, é preciso não ter preconceito em relação a essas
mudanças.

Introdução ao neoliberalismo
(Fonte: www.suapesquisa.com/geografia/neoliberalismo.htm)

Podemos definir o neoliberalismo como um conjunto de


idéias políticas e econômicas capitalistas que defende a não
participação do estado na economia. De acordo com esta
doutrina, deve haver total liberdade de comércio (livre
mercado), pois este princípio garante o crescimento econômico
e o desenvolvimento social de um país.
Surgiu na década de 1970, através da Escola
Monetarista do economista Milton Friedman, como uma solução
para a crise que atingiu a economia mundial em 1973,
provocada pelo aumento excessivo no preço do petróleo.

Características do Neoliberalismo (princípios básicos):

- mínima participação estatal nos rumos da economia


de um país;
- pouca intervenção do governo no mercado de
trabalho;
- política de privatização de empresas estatais;
- livre circulação de capitais internacionais e ênfase na
globalização;
- abertura da economia para a entrada de
multinacionais;
- adoção de medidas contra o protecionismo
econômico;
- desburocratização do estado: leis e regras econômicas
mais simplificadas para facilitar o funcionamento das atividades
econômicas;
- diminuição do tamanho do estado, tornando-o mais
eficiente;
- posição contrária aos impostos e tributos excessivos;
- aumento da produção, como objetivo básico para
atingir o desenvolvimento econômico;
- contra o controle de preços dos produtos e serviços
por parte do estado, ou seja, a lei da oferta e demanda é
suficiente para regular os preços;

106
- a base da economia deve ser formada por empresas
privadas;
- defesa dos princípios econômicos do capitalismo.

Críticas ao neoliberalismo

Os críticos ao sistema afirmam que a economia


neoliberal só beneficia as grandes potências econômicas e as
empresas multinacionais. Os países pobres ou em processo de
desenvolvimento (Brasil, por exemplo) sofrem com os resultados
de uma política neoliberal. Nestes países, são apontadas como
causas do neoliberalismo: desemprego, baixos salários,
aumento das diferenças sociais e dependência do capital
internacional.

Pontos positivos

Os defensores do neoliberalismo acreditam que este


sistema é capaz de proporcionar o desenvolvimento econômico
e social de um país. Defendem que o neoliberalismo deixa a
economia mais competitiva, proporciona o desenvolvimento
tecnológico e, através da livre concorrência, faz os preços e a
inflação caírem.

5.3 A GLOBALIZAÇÃO E A GRISE FINANCEIRA MUNDIAL

Globalização e seus (des)caminhos

O termo “globalização” foi utilizado pela primeira vez


em 1985, em um trabalho de Theodore Levitt denominado “A
globalização dos mercados”. Com esse termo pretendia-se
caracterizar as grandes transformações ocorridas na esfera
econômica mundial nos anos que se seguiram ao colapso da
ordem bipolar, com uma notável expansão do capitalismo no
contexto do desaparecimento das economias de planejamento
centralizado.
“Os povos de Porto Alegre e os povos de Davos - New
York se batem pela globalização. Qual globalização? Os
poderosos, e por isso são poderosos, se apropriaram da palavra
globalização e lhe impuseram uma significação que serve a
seus interesses. É o processo mundial de homogeneização do
modo de produção capitalista, de globalização dos mercados e
das transações financeiras, do entrelaçamento das redes de
comunicação e do controle mundial das imagens e das
informações. A lógica que a preside é a competição de todos
com todos”. (Leonardo Boff)
107
Quem se globalizou?

Aqui, surge a pergunta: quem se globalizou? Primeiro,


os principais agentes econômicos do mundo de hoje, que são os
conglomerados transnacionais. Inicialmente, nós os
denominamos “firmas multinacionais”. Depois, descobrimentos
que não eram “multinacionais”, mas transnacionais. E que
também não eram “firmas”, mas conglomerados de firmas. Se
considerarmos o tecido produtivo do Brasil, veremos que a
grande maioria das empresas que operam no país não são entes
globais: são entes nacionais, regionais ou locais. Mas alguns
grandes agentes se globalizaram, e são eles os principais atores
desse processo. Globalizaram-se também os principais fluxos
econômicos: os fluxos comerciais, os fluxos de investimento
produtivo, os fluxos financeiros. Globalizaram-se os
mercados. E – muito importante para nossa discussão –
globalizaram-se os padrões. Isso é muito relevante para a
discussão sobre a relação entre globalização e território, porque
os agentes locais acabam assimilando esses padrões, usando
esses padrões, e eles vão-se tornando cada vez mais
disseminados pelo mundo afora.
Se observarmos o perfil locacional de um grande
conglomerado global, veremos que o comando está
centralizado na matriz, a gestão estratégica está lá, a inovação
tecnológica está lá, mas a operação se encontra descentralizada
por vários lugares. E isso é que dá o tom da relação entre
globalização e território. Um exemplo que eu gosto de citar é
o de uma entrevista que li com o PDG da Nike. O jornalista
perguntou-lhe quantos milhões de pares de tênis a Nike
produzia. E ele respondeu que a Nike não produzia tênis;
produzia “emoção”. A “emoção” de calçar um Nike – isto é, o
marketing – está centralizada nos Estados Unidos. E eles gastam
muito mais com marketing do que com o processo produtivo. O
processo produtivo está na Ásia, está descentralizado, porque a
indústria de calçados, no fundo, é uma indústria de montagem,
e, em toda indústria de montagem, o custo da mão-de-obra é
um elemento determinante.
Então o processo produtivo ocorre onde o custo da
mão-de-obra é mais barato. Quem produz o tênis Nike são
milhares de pequenas empresas situadas na Ásia. A corporação
compra esses tênis e agrega “emoção”. Aí, quem compra o tênis
Nike compra junto a “emoção” de poder usar um calçado de
700, 800 reais, que na verdade, pelo custo material de
produção, não vale isso.

108
A reorganização do espaço mundial

O comando do processo está na tríade Estados


Unidos – Japão – UniãoEuropéia. Então, ao contrário do que
muitas vezes se afirma, os grandes condutores do processo têm
nome e endereço. E, neste ponto, não se trata mais apenas dos
conglomerados transnacionais, mas também dos países a eles
associados – países que detêm o maior peso relativo nas
decisões tomadas no cenário mundial.
A seguir, vêm os países médios, que tentam influir em
sua inserção. Alguns o conseguem; outros não. Um exemplo de
país que consegue é a China. A China consegue por vários
motivos. Primeiro, porque é um país milenar. Já era uma
potência antes do avento do capitalismo, um dos lugares que
tinham desenvolvido de maneira mais expressiva as forças
produtivas. Com a colonização perdeu espaço, foi dominada e
virou a “casa da mãe joana”: sucessivamente ocupada, ou seja,
lugar onde todo mundo manda. Aí ocorreu a revolução e a China
passou por uma importante fase de autonomia. Este é o
segundo motivo de seu sucesso atual. Uma das coisas que mais
me impressionou foi uma entrevista a que assisti no dia da
morte de Mao Tse tung (1976). O repórter chegou junto de um
velhinho que estava chorando na beira da calçada e perguntou:
“o que Mao legou à China?” O velhinho não falou de socialismo.
Ele disse: “Mao recolocou a China de pé”. Ou seja, com o
trancamento, a China deixou de ser a casa da mãe joana e
passou a se sentir dona de seu próprio destino. E aí está o
terceiro motivo: o processo de reinserção da China ocorre num
estágio muito avançado da globalização e está sendo conduzido
sob o comando do Partido Comunista Chinês. Isso assegura uma
reinserção muito mais autônoma do que a de países como o
Brasil, que também é de porte médio, mas engatou no
processo de globalização no século XVI, como colônia de
exploração, e tem, até hoje, uma enorme dificuldade de atuar
com soberania.
Por último, vêm os países pequenos, que lutam com
enormes dificuldades para influir em sua inserção. Portanto, a
leitura do mapa-múndi atual continua sendo a leitura de quem
manda mais e quem manda menos. Porém, ao contrário do que
prega o discurso hegemônico, que tenta apresentar a
globalização como um processo inexorável, ao qual temos de
nos submeter, este é um processo contraditório e não uma
tendência unidirecional. Até porque a globalização é um
processo social e não há processo social inexorável. É um
processo hegemônico, sem dúvida. Mas há distintas

109
possibilidades de relacionamento entre os distintos territórios e
o movimento de globalização.

Homogeneização e diferenciação

Outro ponto importante é que, na era da globalização,


os territórios admitem pelo menos duas leituras.
Uma leitura é feita pelos agentes globais, para os
quais os territórios são meros “palcos de operação”. Quando
abrem o mapa-múndi para traçar suas estratégias, os países, as
regiões, os municípios são para eles meros palcos de operação.
Pensam nas vantagens ou desvantagens de realizarem suas
operações neste ou naquele território. Mas existe uma outra
leitura. E esta é feita pelas populações de cada lugar, para as
quais os territórios são, acima de tudo, construções sociais.
Apesar da uniformização crescente, cada território do mundo
tem seu ambiente natural, seu processo histórico de ocupação,
seus valores. O que existe hoje é resultado de um longo e
complexo processo histórico.
Essas duas leituras conflitantes produzem uma tensão
entre o global e o local, pois o global é fonte de
homogeneidade e os territórios são lócus de especificidades. O
Brasil é um país que tem história, que possui um território, que
construiu nele uma sociedade. E isso tudo não pode ser reduzido
a simples palco de operação. Ademais, cada lugar do Brasil é
diferente.
O Brasil possui três heranças principais, quando
visto pela ótica do regional. A primeira herança é ser um país de
dimensão continental que, como já disse, engatou na
economia mundial como espaço primário exportador. Isso deixou
marcas muito importantes – entre elas, o forte contraste entre a
faixa litorânea e a região central.
A segunda é a diversidade regional. O país
estruturou-se sobre um território que comporta seis biomas: o
bioma amazônico, o bioma do cerrado, o bioma da caatinga,
entre outros. Em cima dessa natureza diversa, estruturam-se
pólos produtivos também diversos: o açúcar num canto, o ouro
em outro, o café em outro, o algodão em outro, a
industrialização em outro... cada um deixou sua marca. Então, o
Nordeste açucareiro ficou muito diferente do Sudeste cafeeiro.
Cada região misturou à sua maneira os ingredientes indígenas,
europeus e negros. E isso gerou uma maravilhosa diversidade
cultural, que, do meu ponto de vista, é um dos maiores
patrimônios do Brasil. Na era da globalização intensa, estamos
redescobrindo o Brasil.

110
A terceira herança é a herançada desigualdade. É
uma herança pesada, que cresceu muito no século XX, quando o
país engatou na globalização industrial. Então, nossa herança de
desigualdade produziu, realmente, dois Brasis. Edmar Bacha
chamou de “Belíndia”. E essa desigualdade se reproduz nas
várias escalas. Se analisarmos a região metropolitana de Recife,
lá encontraremos duas Recifes. Essas são as heranças. Agora,
vejamos suas modificações recentes.
Uma coisa importante da inserção do Brasil na
globalização industrial foi que ela integrou o mercado
brasileiro. No período primário exportador, se produzia aqui e
realizava fora. Com a indústria, passamos a produzir aqui e
realizar aqui. Para isso, foi preciso integrar fisicamente o
mercado brasileiro: criar uma malha urbana, uma malha viária,
uma malha de telecomunicação. Hoje, em Oeiras, no Piauí, se
compra, via internet, um artigo fabricado em Porto Alegre, no
Rio Grande do Sul e, dois dias depois, recebe-se o produto em
sua casa. Isso é uma enorme diferença em relação ao Brasil do
passado. E um de nossos grandes trunfos diante das
corporações transnacionais. Quando desembarcam aqui, elas
não vêm atrás de uma plataforma de exportação, mas do
próprio mercado brasileiro, que está integrado desde metade do
século passado. Uma parte dessa conquista tem que ser
creditada a Juscelino, porque foi ele que começou a fazer as
ligações verticais da malha viária do país. Antes, só havia
ligações horizontais: do interior para a costa, da zona produtora
para o porto exportador. Juscelino estabeleceu nova lógica: no
meio do território, colocou Brasília, e fez a Belém-Brasília, fez a
Rio-Bahia, ou seja, criou as condições materiais para integração
do mercado.
Com o tempo, ocorreu não apenas a circulação das
mercadorias, mas também a circulação do capital. Três
agentes se engajaram nesse processo. As transnacionais, por
certo. Mas também o capital nacional e o Estado brasileiro.
Grandes empresas brasileiras, que nasceram e se
desenvolveram em uma região, instalaram filiais em outras, isso
foi muito importante. O desembarque da Vale do Rio Doce no
Pará mudou o Pará. O desembarque da Petrobrás na Bahia
mudou a Bahia. E eram empresas estatais. Isso promoveu a
gradual redução da concentração econômica no Sudeste.
Os dados mostram que no período JK, a concentração
cresceu; no período do “milagre econômico”, a concentração
cresceu. Ela começou a decrescer a partir do 2º PND, quando
vários investimentos foram feitos em outros lugares do Brasil e
isso deu início a um processo de desconcentração. A crise veio,
bateu muito forte em São Paulo, até hoje São Paulo tem 2
111
milhões de desempregados – e outros lugares do Brasil
começaram a se destacar.

Crise financeira mundial de 2008


11/09/2008 – Emir Sader – Le Monde Diplomatique Brasil
setembro 2008

Desequilíbrios estruturais do capitalismo atual

A atual crise econômico-financeira internacional se insere no


marco de um ciclo longo recessivo, do qual o capitalismo não
logrou sair desde seu início, em meados da década de setenta
do século passado. Sem essa inserção, fica difícil a apreensão
do caráter dessa crise, das conseqüências que pode produzir e
do cenário que deve surgir depois dela.

Os ciclos e as crises

O capitalismo vive, pela própria natureza do seu


processo de reprodução, articulado por ciclos, curtos e longos.
Estes coordenam os ciclos curtos, numa perspectiva expansiva,
se a curva das subidas e descidas das oscilações curtas
apontam para cima, recessiva, se para baixo, conforme a teoria
do economista russo Kondratieff, retomada teórica e
historicamente por Ernst Mandel.
No segundo pós-guerra, o capitalismo viveu sua
“idade de ouro”, segundo Eric Hobsbawn, em que coincidiram
virtuosamente a maior expansão concomitante das grandes
economias capitalistas – Estados Unidos, Alemanha, Japão -, do
chamado “campo socialista”, dirigido pela União Soviética, e por
economias periféricas, como o México, a Argentina, o Brasil, com
seus processos de industrialização dependente. A economia
capitalista não deixou de apresentar seus ciclos curtos de crise,
mas cada novo ciclo retomada a expansão e empurrava a
economia para patamares cada vez mais altos.
Foi um ciclo longo expansivo comandado por grandes
corporações internacionais de caráter industrial e comercial,
apoiada por um sistema financeiro em expansão e por grandes
transformações na produção agrícola. Um modelo hegemônico
regulador – ou keynesiano ou de bem-estar, conforme se
queira chamá-lo – incentivava os investimentos produtivos,
tendia a fortalecer a demanda interna de consumo, promovia o
fortalecimento dos Estados nacionais e a proteção de suas
economias.
As crises, como é típico no capitalismo, expressavam
processos de super-produção ou de sub-consumo – conforme se
112
queira chamá-las -, refletindo o desequilíbrio estrutural desse
sistema entre sua – reconhecida já por Marx no Manifesto
Comunista – enorme capacidade de expansão das forças
produtivas, mas que se chocam constantemente com sua
incapacidade de distribuir renda na mesma medida daquela
expansão.
Na sua fase final, o ciclo longo expansivo do segundo
pós-guerra viu esse excedente, resultado acumulado da
defasagem entre produção e consumo se transformar em capital
financeiro – os chamados euro-dólares, que foi aproveitado por
países como o Brasil, para reciclar seu modelo econômico,
diversificando sua dependência externa e favorecendo a
retomada da expansão econômica interna, ainda antes do final
do ciclo longo expansivo. Este fator – o golpe militar ainda no
ciclo expansivo – diferenciou o cenário econômico brasileiro do
dos outros países da região, em que as ditaduras coincidiram
com recessão, por já se darem no ciclo longo recessivo do
capitalismo internacional.
Que características teve o final desse ciclo e o inicio do
novo, de caráter recessivo? Tendo triunfado o diagnóstico de que
a estagnação econômica se devia ao excesso de
regulamentações, o novo modelo se centrou na
desregulamentação, de que as privatizações, as aberturas para
o mercado externo, as políticas de “flexibilização laboral”, de
ajuste fiscal, foram expressões.
Duas consequências mais importantes dever ser
recordadas aqui, para entendermos o caráter da crise atual e
seus efeitos para os países latino-americanos. A primeira, o
gigantesco processo de transferência de capitais do setor
produtivo para o especulativo que a desregulamentação
promoveu em escala nacional e internacional. Livre de travas, o
capital migrou maciçamente para o setor financeiro e, em
particular, para o setor especulativo, onde obtêm muito mais
lucros, com muito maior liquidez e com menos ou nenhuma
tributação para circular.
Configurou-se assim, no modelo neoliberal, a
hegemonia do capital financeiro, sob a forma do capital
especulativo, fazendo com que mais de 90% dos movimentos
econômicos se dêem não na esfera da produção ou do comércio
de bens, mas na compra e venda de papéis, nas Bolsas de
Valores ou de papéis das dívidas públicas dos governos.
Promoveu-se a financeirização das economias, o
que significa, em primeiro lugar, a financeirização dos Estados,
cujo primeiro e maior compromisso passa a ser o pagamento
das dívidas, isto é, a reserva de recursos mediante o chamado
“superávit primário” e a transferência maciça e sistemática de
113
recursos do setor produtivo para o capital financeiro. Grandes
grupos econômicos têm à sua cabeça, um banco ou uma
instituição financeira, costumam ganhar mais nos investimentos
financeiros que naqueles que deram origem às empresas que os
compõem. Grande quantidade de pequenas e médias empresas
entraram em processos de endividamento, dos quais não
conseguem sair. Outras, assim como consumidores, não se
atrevem a buscar empréstimos, pelo medo ao endividamento,
com as altas taxas de juros.
O capital financeiro passou a ser o sangue que corre
pelas economias dos países, definindo o metabolismo que as
preside. Um capital que tem na volatilidade, na sua extrema
liquidez, um elemento essencial, inerente, aquele que permite
deslocar-se rapidamente para onde pode ter maiores vantagens
e, ao mesmo tempo, lhe atribui um grande poder de pressão,
diante da fragilidade das economias que dependem
estruturalmente dele.

A crise atual e suas consequências

A crise anterior da economia norte-americano se deu


em 2000, quando se desvanecia a ilusão de que a “nova
economia” permitiria que o capitalismo não sofresse mais suas
crises cíclicas, seja porque a informática permitira prevê-las e
permitir que foram evitadas, seja porque novas demandas,
como as de computadores, gerariam, da mesma forma que no
caso dos automóveis, o lançamento anual de novos modelos,
que estenderiam cada vez mais a demanda. Naquele momento,
o papel do mercado norte-americano no mundo seguia sendo
determinante no mundo, transferindo os efeitos da sua recessão
para o resto da economia mundial.
Desta vez a crise norte-americana se dá em um
cenário internacional modificado. A continua expansão de países
emergentes – entre eles, sobretudo a China e a Índia, mas
também países latino-americanos, que mantêm ritmos
constantes de crescimento, entre os quais particularmente o
Brasil e a Argentina – amortece a diminuição da demanda dos
EUA e, pela primeira vez, a recessão da economia norte-
americana não tem efeitos diretos e devastadores sobre a
economia mundial.
Porém, como essa crise se vê agravada com o aumento
dos preços dos produtos agrícolas e a continuada crise do
petróleo, constituindo-se, na verdade em um triple crise, seus
efeitos são mais profundos e extensos do que apenas uma crise
cíclica da economia norte-americana. São afetadas então não
apenas as exportações para os Estados Unidos, mas também os
114
importadores de energia e de produtos agrícolas, lista que, em
uma ou outra proporção, afeta a todos os países do mundo.
No entanto, como todo fenômeno de um sistema
marcado pela extrema desigualdade de riqueza e de poder entre
regiões e países e dentro de cada país, os efeitos das crises não
são igualmente repartidos entre todos. Há ganhadores e
perdedores, algozes e vítimas.
Como a crise está em pleno desenvolvimento, seus
alcances não podem ainda ser julgados em toda sua plenitude e
se dão pugnas para ver quem consegue extrair vantagens,
quem trata de perder menos, ainda não é possível saber com
precisão os danos em toda sua extensão e quem arcará com
eles. É certo que o mundo sairá modificado desta crise até
mesmo porque toca em três pontos nodais das relações
econômicas e de poder atuais: dinheiro, energia e comida. No
entanto, as estruturas de poder, de produção e de distribuição
de riqueza reinantes, garantem resultados absolutamente
diferenciados para distintas regiões e países como efeito das
crises.
Na combinação entre aumento dos preços do petróleo,
dos produtos agrícolas e diminuição da demanda dos EUA e da
Europa, os países mais pobres, que somam a grande maioria da
África, da Ásia e da América Latina, perderão claramente, com
fortes pressões recessivas, déficit na balança comercial e
aumento do endividamento. Os países exportadores de petróleo
e de produtos agrícolas com altas mais significativas, terão suas
situações minoradas, mas as pressões inflacionárias não
poupam a nenhum país e, com elas, as políticas recessivas
voltam a ganhar peso.
Para a América Latina, os efeitos são mais pesados e
diretos para os países que seguem dependendo mais
fortemente do comércio com os Estados Unidos, o México, a
América Central e o Caribe, em primeiro lugar. Em segundo
lugar, os países com pautas exportadoras menos valorizadas ou
aqueles que tiveram seu ciclo de expansão econômica
excessivamente voltada para as exportações, em particular as
economias mais abertas, entre elas as que têm tratados de livre
comércio com os Estados Unidos, como o Chile, o Peru, além dos
já mencionados México, Costa Rica e outros países centro-
americanos e caribenhos. Relativamente menos afetados devem
ser os países com pautas exportadoras mais diversificadas –
seja nos produtos, seja nos mercados -, como o Brasil, em parte
a Argentina, e os que participam dos processos de integração
regional – seja o Mercosul, seja a Alba. Para estes, as crises são
uma oportunidade especial para acelerar e intensificar os

115
processos de integração, de comércio, assim como nos planos
financeiro e energético.
Seja pela combinação das crises, seja porque afeta
profundamente os Estados Unidos, no momento em que, pela
primeira vez, seu peso na economia mundial decresce, o mundo
e a América Latina em particular, terão fisionomias distintas,
seja acelerando transformações já em andamento, seja dando
inicio a novas dinâmicas, passadas as crises – cujas durações e
profundidades, ainda não podem ser medidas com toda
precisão. Fonte: Emir Sader é jornalista, sociólogo e professor da
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e
coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da UERJ.

5.4 REFLEXOS POLÍTICO-INSTITUCIONAIS, ECONÔMICOS E


SOCIAIS DA GLOBALIZAÇÃO NO BRASIL

O Brasil e a globalização
Brasil quer a Integração Comercial de toda a América do
Sul

O ano de alargamento do Mercosul - essa poderia ser a


manchete de síntese da evolução do ConeSul em 1996, se fosse
verdade o que a imprensa brasileira noticiou nos últimos meses.
Interpretando de forma simplista- e errada- os tratados
formados pelo Chile e Bolívia com o Mercosul. O ano de
alargamento do Mercosul - essa poderia ser a manchete de
síntese da evolução do ConeSul em 1996, se fosse verdade o
que a imprensa brasileira noticiou nos últimos meses.
Interpretando de forma simplista - e errada - os tratados
formados pelo Chile e Bolívia com o Mercosul, jornais e
televisões noticiaram a adesão dos dois ao bloco sub-regional
liderado pelo Brasil e Argentina.
Isso não aconteceu, pelo menos por enquanto. Mas foi
dado o primeiro passo nessa direção: o Chile e a Bolívia
firmaram tratados de associação, o que significa que, sem aderir
ao bloco, eles passam a aceitar regras de tarifas comerciais
reduzidas no intercâmbio com os integrantes do tratado de
Assunção de 1991. O passo adiante não aponta para o
alargamento do Mercosul por agregações sucessivas, mas para
o desenvolvimento de um processo mais complicado, que os
diplomatas brasileiros apelidaram de estratégia do building
blocks.
O Chile esnobou o Mercosul até a pouco. "Adios,
Latinoamérica", chegou a trombetear uma manchete de EL
Mercurio, o principal diário de Santiago, resumindo uma política
voltada para a Bacia do Pacífico e uma estratégia de integração
116
do Nafta. As coisas mudaram. A solicitação de adesão à zona de
livre comércio liderada pelos EUA esbarrou no colapso financeiro
mexicano de dezembro de 1994. Escaldados, os parlamentares
americanos negaram a tramitação rápida da solicitação no
Congresso e as negociações continuam a se arrastar. Além
disso, a abertura comercial que se espraia pela América Latina
repercutiu sobre o intercâmbio externo chileno, puxando-o de
volta para o subcontinente.
A Bolívia solicitou, em julho de 1992, a adesão gradual
ao Mercosul. O gradualismo boliviano está orientado para
controlar um obstáculo político e diplomático: o país faz parte do
Pacto Andino e Tratado de Assunção não permite a entrada de
integrantes de outras zonas de comércio. Mas, no terreno da
economia e da geografia, a Bolívia está cada vez mais colada ao
Mercosul. O acordo recente para fornecimento de gás natural e
construção de um gasoduto Brasil-Bolívia vale mais que as
filigranas jurídicas que bloqueiam a adesão imediata. E as
perspectivas de cooperação de todos os países do Cone Sul
tendem a abrir duas saídas oceânicas regulares para a Bolívia,
cuja história está marcada pela perda de portos de Atacama, na
Guerra do Pacífico (1879-83).
Não é provável que o Chile ingresse plenamente no
atual Mercosul, e Santiago não quer perder suas vantagens
comerciais no intercâmbio com o Nafta e a Bacia do Pacífico. A
Bolívia não pretende deixar o Pacto Andino entrar no Mercosul, e
o Chile, com melhores razões, não pretende desistir do ingresso
no Nafta. O horizonte com o qual trabalham os diplomatas
brasileiros é o da articulação gradual do Mercosul com os países
e blocos comerciais vizinhos, com vistas á formação de uma
Associação de Livre Comércio Sul-Americana (Alcsa).
Essa é a estratégia do buiding-blocks. A sua meta
consiste em criar, a partir de um grande bloco comercial na
América do Sul, a plataforma ideal para negociar a integração
pan-americana com a superpotência do Norte. É por isso que o
Brasil não tem pressa nas conversações destinadas à formação
de uma super zona de livre comércio das três Américas, que
foram lançadas pelo ex-presidente dos EUA, George Bush, em
1990.

Doponto de vista brasileiro podemos citar como áreas


que ganharam impulso:
• Automobilística; Geração de energia;
Telecomunicações; Serviços.

Enquanto que os setores mais prejudicados são:


117
• Agricultura; Têxtil; Borracha; Calçados.

A outra faceta do processo de Globalização está na


indústria. Tomem-se as dez maiores corporações
mundiais:
1. Mitsubishi; 2.Mitsui;3. Itochu; 4.Sumimoto; 5.General
motors; 6.Marunbeni;7. Ford; 8. Exxon; 9. Nissho 10. Shell;

Estas empresas faturam 1,4 trilhões de dólares, o que


equivale ao PIB conjunto de:
•Brasil; México; Argentina; Chile; Colombina; Peru;
Uruguai; Venezuela.

Metade dos prédios, máquinas e laboratórios desses


grupos e mais da metade de seus funcionários em unidades for
do país de origem e 61% do seu faturamento é obtido em
operações no estrangeiro.
A força dessas corporações e sua atuação geográfica
mudaram o enfoque do jogo econômico. No passado, quem fazia
as grandes decisões econômicas eram os fovernas. Agora são as
empresas e estão decidindo basicamente o que, como. quando e
onde produzir os bens e serviços utilizados pelos seres
humanos.
Para conseguir preços melhores e qualidade de mais
alta tecnologia em sua guerra contra os concorrentes, as
empresas cortaram custos. Isto é, empregos, e ainda
aumentaram muito os seus índices de automação, liquidando
mais postos de trabalho.
Nos estudos economistas, deu-se o nome de
"desemprego estrutural" a essa tendência. O desemprego
estrutural é um processo cruel porque significa que as fábricas
robotizadas não precisam mais de tantos operários e os
escritórios podem dispensar a maioria de seus datilógrafos,
contadores e gerentes. Ele é diferente do desemprego que se
conhecia até agora, motivado por recessões, que mais cedo ou
mais tarde passavam.
Os economistas apontam no desemprego estrutural um
paradoxo do sistema de Globalização. Ele se ergueu para
produzir coisas boas e baratas, vendidas numa escala
planetária, fabricadas em grande parte por robôs, que são
orientados por computadores. Mas por cortar o emprego das
pessoas e sua renda não terá para quem vender seus carros
reluzentes e seus computadores multimídia.
Segundo os críticos, a outra nota ruim da Globalização
está no desaparecimento das fronteiras nacionais. Os governos
não conseguem mais deter o movimento do capital
118
internacional. Por isso, seu controle sobre a política econômica
interna está se esgarçando. A quebra mexicana no final de 1994
é o exemplo mais marcante dessa perda de controle. Assim que
o governo desvalorizou o peso frente ao dólar, os investidores
sacaram vários bilhões aplicados no país e o México precisou de
um pacote de socorro do FMI e do governo estadunidense. Os
governos também estão perdendo a capacidade de proteger o
emprego e a renda das pessoas. Se um país estabelece uma
legislação que protege e encarece o trabalho, é provavelmente
excluído da lista de muitos projetos de investimento.
Há, enfim, uma perda de controle sobre a produção e
comercialização de tecnologia, o que nos tempos da Guerra Fria,
seria impensável. Naquela época, a tecnologia estava ligada à
soberania dos países.

TEMA 6: TRABALHO, MERCADO E RESPONSABILIDADE


SOCIAL

6.1 EDUCAÇÃO E SOCIEDADE DO CONHECIMENTO


6.2 RELAÇÕES DE TRABALHO E O PERFIL DO PROFISSIONAL NO
SÉCULO XXI
6.3 EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO
6.4 RESPONSABILIDADE SOCIAL: SETOR PÚBLICO, PRIVADO E
TERCEIRO SETOR

Introdução

Trabalho: Atividade Humana

O que é o trabalho? Como podemos definir essa


atividade? O trabalho, segundo o pensador Karl Marx, coloca
frente a frente o homem e a natureza, ou seja, o trabalho é uma
atividade que medeia à relação homem e natureza por ser uma
prática que aproxima um do outro, provocando transformações
materiais e espirituais.
O trabalho para além da transformação da natureza,
esse algo é o planejamento, a pré-ideação, em outras palavras,
o ser humano constrói seu objeto - tendo por base o mundo
material - primeiro na sua mente, isto é, cria a idéia do objeto,
planeja como construí-lo e depois materializa sua idéia, executa
a atividade prática-transformadora da natureza com
consciência.

119
Essa atividade laboral também transforma o próprio ser
que trabalha, em outros termos, essa atividade transforma a
natureza e, ao mesmo tempo, transforma o homem, ou melhor,
quando o homem produz objetos ele se autoproduz.

História do Trabalho

A concepção de trabalho sempre esteve ligada a uma


perspectiva negativa. A palavra “trabalho” deriva
etimologicamente do vocabulário latino tripaliare do substantivo
tripalium, aparelho de tortura formado por três paus, ao qual
eram atados os condenados e que também servia para manter
presos os animais difíceis de ferrar. Daí a associação do trabalho
com tortura, sofrimento, pena, labuta.
Na Antiguidade grega, o trabalho manual é
desvalorizado por ser feito por escravos, enquanto as pessoas
da elite, desobrigadas de se ocuparem com a própria
subsistência, dedicam-se ao “ócio digno”, que, para os gregos,
significa a disponibilidade de gozar do tempo livre e cultivar o
corpo e o espírito. Não por acaso, a palavra grega scholé, da
qual deriva “escola”, significava inicialmente “ócio”. Para Platão,
por exemplo, a finalidade das pessoas livres é justamente a
“contemplação das ideias”, na medida em que a atividade
teórica é considerada mais digna, por representar a essência
fundamental de todo ser racional.
Também a Roma escravagista desvaloriza o trabalho
manual. É significativo o fato de a palavra negotium indicar a
negação do ócio: a ênfase posta no trabalho como “ausência de
lazer” o distingue do ócio, prerrogativa das pessoas livres.
Na Idade Média, Santo Tomás de Aquino procura
reabilitar o trabalho manual, dizendo que todos os trabalhos se
equivalem, mas, na verdade, a própria construção teórica de seu
pensamento calcada na tradição grega, tende a valorizar a
atividade contemplativa. Muitos textos medievais consideram a
ars mechanica (arte mecânica ou trabalho mecânico) uma ars
inferior.
Na idade Moderna, a situação começa a se alterar: o
crescente interesse pelo trabalho justifica-se pela ascensão dos
burgueses, vindos de segmentos de antigos servos,
acostumados ao trabalho manual, que compram sua liberdade e
dedicam-se ao comércio.
A burguesia nascente procura novos mercados,
estimulando as navegações. No século XV os grandes
empreendimentos marítimos culminam com a descoberta de
outro caminho para as Índias e das terras do Novo Mundo. O
interesse prático em dominar o tempo e o espaço faz com que
120
sejam aprimorados os relógicos e a bússola. Com o
aperfeiçoamento da tinta e do papel e a descoberta dos tipos
móveis, Gutenberg inventa a imprensa. Todas essas mudanças
indicam a expectativa com relação a novas formas do agir e do
pensar humanos, às quais se acrescentam, no século seguinte, s
revoluções do comércio e da ciência.
Como se vê, está ocorrendo uma mudança de enfoque
na relação entre o pensar e o fazer. Enquanto na Idade Média
uma hierarquia privilegia o saber contemplativo em detrimento
da prática, no Renascimento e na Idade Moderna dá-se a
valorização da técnica, da experimentação, do conhecimento
alcançado por meio da prática.

Nascimento das fábricas

Na passagem do feudalismo para o capitalismo,


ocorrem marcantes transformações na vida social e econômica,
como o aperfeiçoamento das técnicas e a ampliação dos
mercados. O capital acumulado torna possível a compra de
matérias-primas e de máquinas, obrigando muitas famílias, que
desenvolviam o trabalho doméstico nas antigas corporações e
manufaturas, a disporem de seus instrumentos de trabalho e,
para sobreviver, a venderem sua força de trabalho em troca de
salário.
Com o aumento da produção, aparecem os primeiros
barracões das futuras fábricas, onde os trabalhadores são
submetidos a uma nova ordem, a da divisão do trabalho com
ritmo e horários preestabelecidos. O fruto do trabalho deixa de
pertencer aos trabalhadores e a sua produção passa a ser
vendida pelo empresário, que retém os lucros. Está ocorrendo o
nascimento de uma nova classe: o proletariado.
No século XVIII, a mecanização do setor da indústria
têxtil sofre impulso extraordinário na Inglaterra, como
aparecimento da máquina a vapor, que aumenta
significativamente a produção de tecidos. Outros setores se
desenvolvem, como o metalúrgico; também no campo se
processa a revolução agrícola.
No século XIX, o resplendor do progresso não oculta a
questão social, caracterizada pelo recrudescimento da
exploração do proletariado e das condições subumanas de vida.
A nova classe é submetida a extensas jornadas de trabalho, de
dezesseis a dezoito horas, sem direito a férias, sem garantia
para velhice, doença e invalidez. As condições de trabalho nas
fábricas são insalubres, por serem elas escuras e sem higiene.
Embora todos sejam mal pagos, crianças e mulheres
são arregimentadas como mão de obra mais barata ainda. Os
121
trabalhadores moram em alojamentos inadequados e apertados,
nos quais não se consegue evitar a promiscuidade.
Em decorrência desse estado de coisas, surgem no
século XIX os movimentos socialistas e anarquistas, que
denunciam a exploração e propõem formas para a modificação
das relações de produção.

A flexibilização da produção

Com a implantação da tecnologia avançada da


automação, da robótica, da microeletrônica, surgem novos
padrões de produtividade, a partir das décadas de 1970 e 1980.
A tendência nas fábricas é de quebrar a rigidez do fordismo,
caracterizada pela linha de montagem e produção em série,
centrado na produção em massa. Destaca-se a atuação da
fábrica de automóveis Toyota, no Japão, ao criar novo método de
gerenciamento que passou a ser conhecido como toyotismo.
Essa revolução administrativa adaptou-se melhor à
economia global e ao sistema produtivo flexível, evitando a
acumulação de estoques ao atender aos pedidos à medida da
demanda, com planejamento a curto prazo. Privilegia-se agora o
trabalho em equipe, a descentralização da iniciativa, com maior
possibilidade de participação e decisão, além da necessidade da
polivalência de mão de obra, já que o trabalhador passa a
controlar diversas máquinas ao mesmo tempo.
Além disso, como a flexibilização depende da demanda
flutuante, algumas tarefas são encomendadas a empresas
“terceiras” subcontratadas. Essa terceirização atomiza os
empregados, antes unidos nos sindicatos, o que provocou seu
enfraquecimento no final da década de 1980, repercutindo
negativamente na capacidade de reivindicação de novos direitos
e manutenção das conquistas realizadas. Os temores mais
frequentes dessa nova geração de trabalhadores da era da
automação são o desemprego e o excesso de trabalho
decorrente do “enxugamento” realizado pelas empresas em
processo de “racionalização” de atribuição de tarefas.

A sociedade pós-industrial

A partir de meados do século XX, surge o que


chamamos de sociedade pós-industrial, caracterizada pela
ampliação dos serviços (setor terciário). Isso não significa que os
outros setores tenham perdido importância, mas que as
atividades agrícolas e industriais também dependem do
desenvolvimento de técnicas de informação e comunicação.

122
A mudança de enfoque descentraliza a atenção, antes
voltada para a produção (capitalista versus operário), e
orientando-se agora para a informação e o consumo. A atividade
da maioria dos trabalhadores se encontra nos escritórios,
ampliada por uma comunicação ágil, instantânea, veiculada em
âmbito mundial pela expansão da Internet.
Desde as décadas de 1980 e 1990, outra tentativa em
direção à ética e à qualidade de vida está na efetiva ampliação
das empresas do terceiro setor, assim chamadas por não serem
gestadas nem pelo setor governamental ( o Estado) nem pelo
mercado econômico, que visa lucros. Trata-se das organizações
não governamentais (ONGs) que representam uma forma de
atuação privada, mas com funções públicas e sem fins
lucrativos. Tais instituições ocupam-se de atendimento de
causas coletivas e sobrevivem de doações, que são aplicadas
nas atividades-fins e no pagamento dos especialistas
contratados.

6.1 - EDUCAÇÃO E SOCIEDADE DO CONHECIMENTO

Inovação no contexto da Sociedade do Conhecimento

Na sociedade do conhecimento, o elemento


diferenciador na atividade produtiva é o próprio conhecimento,
sendo que as matérias primas passam a ter uma conotação
secundária. Nessa sociedade produziram-se também outras
grandes mudanças nos âmbitos social, econômico e produtivo.
Entre elas, a mudança no modo de comunicação, derivada do
surgimento da internet e das tecnologias de digitalização de
documentos. A comunicação passa a ser processada de “muitos
para muitos", facilitando a disseminação de informações e a
socialização do conhecimento.
Fortes investimentos em pesquisa e desenvolvimento
feitos pelas organizações e promovidos geralmente pelos
governos dos países desenvolvidos, e o intercâmbio de fluxos de
informação entre países além de bens e capitais, entre outros,
são fatores preponderantes nessa nova sociedade.
Todos esses fatores dão suporte e facilitam a criação de
conhecimento, o bem mais apreciado nesta época. A inovação
é vista como uma vantagem competitiva pelas organizações e,
consequentemente, investimentos em pesquisa e
desenvolvimento de produtos são realizados, para se criar
conhecimento, o principal insumo do processo inovativo.
A inovação é entendida no contexto da sociedade do
conhecimento, identificando sua relação com o conhecimento,

123
as novas tendências empresariais frente a ela, e os novos papéis
que os governos têm para fomentar esse processo.

A Sociedade do Conhecimento

A sociedade do conhecimento é compreendida como


aquela na qual o conhecimento é o principal fator
estratégico de riqueza e poder, tanto para as organizações
quanto para os países. Nessa nova sociedade, a inovação
tecnológica ou novo conhecimento, passa a ser um fator
importante para a produtividade e para o desenvolvimento
econômico dos países.
A sociedade de conhecimento é então posterior à
sociedade industrial moderna, na qual matérias primas e o
capital eram considerados como o principal fator de produção.
Essa nova sociedade é impulsionada também por contínuas
mudanças, algumas tecnológicas como a Internet e a
digitalização, e outras econômico-sociais como a globalização.

Características da sociedade do conhecimento

Quando se observa a sociedade pelo prisma


histórico percebe-se, que do ponto de vista econômico, pode-
se visualizar várias fases tais como: da sociedadeagrícola,
na qual a terra e a mão de obra foram os fatores
preponderantes para determinar o nível de desenvolvimento;
sociedadeindustrial, na qual o capital e o trabalho passam a
ser forças motrizes do desenvolvimento econômico e na
sociedadedoconhecimento, na qual o conhecimento passa a
ser o fator essencial do processo de produção, geração de
riquezas e desenvolvimento dos países. O conhecimento se
tornou a principal força produtiva, os produtos da atividade
social não são mais produtos de trabalho cristalizado, mas de
conhecimento cristalizado. O valor de troca das mercadorias não
é determinado pela quantidade de trabalho social nelas
contidas, mas pelo conteúdo de conhecimento, de informações
e de inteligências gerais. Assim, o capital humano passa a fazer
parte do capital da empresa, os trabalhadores pós-fordistas
entram no processo de produção com toda a sua bagagem
cultural.
Assim, entre as principais características da
sociedade do conhecimento, encontram-se as seguintes:
A - Os produtos são valorados pelo conhecimento
neles embutido. Assim, o poderio econômico das organizações e
dos países está diretamente relacionado ao fator conhecimento.

124
B - A pesquisa científica tornou-se fundamental para
o desenvolvimento dos países.
C - A criação de conhecimento
organizacionaltornou-se um fator estratégico chave para as
organizações, sendo fonte de inovação e vantagem competitiva.
D - O conhecimento, a comunicação, os sistemas e
usos da linguagem tornaram-se objetos de pesquisa cientifica e
tecnológica, sendo o estado um agente estratégico para o
desenvolvimento científico.
E - Os fluxos de informação e conhecimento entre
países, são acrescentados aos fluxos de capital e de bens já
existentes, tornando-se uma economia transnacional.
F - Ocorreu uma mudança no paradigma de
comunicação, a lógica comunicacional de “um para muitos" foi
substituída pela de “muitos para muitos", impulsionado pelo
surgimento da Internet como meio de disseminação de
informações e pelas novas tecnologias motivadas pela
digitalização de documentos.
Dávila Calle, Guillermo Antonio e Da Silva, Edna Lucia, 2008.
Inovação no contexto da sociedade do conhecimento. Revista
TEXTOS de La CiberSociedad, 8. Temática Variada.

Escola, sociedade da informação e o novo mundo do


trabalho (Ligia leite)

O mundo contemporâneo apresenta mudanças que


afetam todos os setores da sociedade, inclusive a educação.
Compreendemos que passamos de uma sociedade cuja base
tecnológica era analógica para uma vida digital, como nos
afirma Negroponte (1995). Essa desafiadora situação exige
novas capacidades mentais, habilidades gerais de comunicação
e maior capacidade de abstração, num reduzido espaço de
tempo. As pessoas e as instituições devem adaptar-se a esta
nova situação, passando a rever, métodos de ensinar e
aprender, tanto na escola como no trabalho. A sociedade global,
que nos é imposta, objetiva um agir e pensar padronizados.
Conclui-se que neste quadro que se apresenta,
resultam mudanças que deslocam as estruturas das sociedades
modernas e de suas instituições. A escola, enquanto instituição
local, que pelas novas tecnologias pode inserir-se globalmente,
não poderia deixar de acompanhar estas transformações.
Dentro deste contexto, objetivamos refletir sobre o
papel da escola, a integração da tecnologia no processo ensino
aprendizagem e a pensar sobre a formação de um educando
integrado na sociedade da informação e capaz de sobreviver
neste Novo Mundo do Trabalho.
125
A escola no contexto atual

Tornou-se urgente fazer com que a escola seja parte


integrante do futuro que por agora se configura, resignificando o
seu papel, estabelecendo uma relação prazerosa entre o
conhecimento e o saber, desenvolvendo a comunicação, o
pensamento crítico e trabalhando no sentido de levar o
educando a resolver situações problemas, num processo
dinâmico de construção do conhecimento.
Para que se realize um trabalho novo, há necessidade
de mudanças na escola. Pretto (2000) aponta alterações de
currículo, programas, materiais didáticos, estrutura
administrativa e arquitetônica, para que a escola possa
enfrentar os novos desafios que lhe são colocados. Além de
centro mediador da informação, ela deve ser o centro facilitador
do acesso das comunidades carentes às novas tecnologias.
Complementaria o seu papel transformando-se em espaço da
discussão, da crítica, da sistematização das informações que
estariam disponíveis dentro e fora da escola.
Por estar inserida nas mudanças por que passa a
sociedade, a escola, segundo Alencar (2001: 44) apresenta-se
como aparelho ideológico, cujas transformações se fazem de
forma mais lenta. "mais ainda assim, decisiva". Dessa forma, o
papel da escola passa a ser de fundamental importância para a
configuração deste novo cidadão que, na urgência, nós,
educadores, precisamos ajudar a formar.

A sociedade da informação e o novo mundo do trabalho

Vivendo na cibercultura torna-se necessário considerar


a posição de Castells (2003) ao se referir à Internet como a
transformação tecnológica que resume o conjunto de
transformações da sociedade da informação, ressaltando que
tudo que é significativo hoje passa pela Internet e que as
pessoas que não têm acesso a ela permanecem excluídas do
que é importante, assim sendo, não se pode aceitar que o
professor permaneça afastado da Internet e que esta tecnologia
não esteja presente na sala de aula da cibercultura.
Numa sociedade em transformação, a internet,
juntamente com as tecnologias de telecomunicação, contribui
para que o aluno aprenda a conviver com a diversidade,
portanto, ela se apresenta como um potencial para produzir
mudança social revolucionária na educação e na sociedade. Se
pensarmos na Internet como uma tecnologia que possibilita o
desenvolvimento de um ambiente de aprendizagem baseado na
126
construção de conhecimento, sua presença em situações de
aprendizagem, oportuniza aos sujeitos-aprendentes ter mais
condições para desenvolver sua própria aprendizagem, pois esta
tecnologia permite que eles se tornem participantes ativos na
busca de conhecimento, definindo suas necessidades de
aprendizagem, encontrando informações, construindo suas
próprias bases de conhecimento e compartilhando suas
descobertas.
Navegar na Internet pode ser um processo de busca de
informações que podem ser transformadas em conhecimento,
gerando um rico ambiente interativo facilitador e motivador de
aprendizagem, bem como pode ser um dispersivo e inútil coletar
de dados sem relevância que não agregam qualidade
pedagógica ao uso da rede. Assim, cabe ao professor,
profissional responsável pelo planejamento, desenvolvimento e
avaliação dos processos de aprendizagem sob responsabilidade
da escola, orientar os alunos no uso da Internet de modo que os
conduza ao processo de construção do conhecimento.

Reflexões finais

De acordo com Moran (2002), os modelos de educação


tradicional não nos servem mais, porém, a função primordial da
escola continua sendo a mesma: o ensino, tendo a questão
pedagógica na base de todos os esforços para a melhoria da sua
qualidade. Porém, a escola precisa re-significar o seu papel
estabelecendo uma relação prazerosa entre o conhecimento e o
saber, transformando-se em um lugar de produção e não apenas
apropriação de conhecimento e cultura. Deve procurar
desenvolver a comunicação, a memória, o pensamento crítico e
trabalhar no sentido de levar o educando a resolver situações-
problema em todos os níveis: os que aparecem no trabalho
escolar, os que pertencem ao gerenciamento de questões
diárias e os sociais, os que encontramos na interação com as
outras pessoas. E o trabalho com a imagem, através do vídeo e
do computador pode possibilitar a concretização dessas
possibilidades.
A escola não deve dispensar nenhum meio de
comunicação, mas integrá-los, utilizando-se de novos
procedimentos e entre eles inclui-se a aprendizagem
cooperativa, a pesquisa, o trabalho com projetos.
Parece-nos premente continuar mudando a educação,
porém, esta ação deve ser contínua e fruto da reflexão de
professores e alunos, e não uma imposição do sistema
educacional. Este novo professor deve desenvolver novas
competências e habilidades em seus alunos, tornando-os
127
capazes de sobreviver num mundo globalizado e fazendo-os
perceberem-se como construtores das suas próprias histórias,
capazes de aprender a aprender, numa atualização constante,
na qual a imagem da TV, do vídeo e do computador têm papel
significativo.
Finalizando com Dowbor (2001), é preciso que a
educação mobilize a sua força na reconstrução de uma
convergência entre o potencial tecnológico e os interesses
humanos. Somente articulando dinâmicas mais amplas, que
extrapolam a sala de aula poderá a educação realizar mais este
novo modelo de alfabetização tecnológica, que permitirá a
permanência e sobrevivência dos nossos alunos neste Novo
Mundo do Trabalho. Fonte:
http://br.monografias.com/trabalhos/escola-sociedade-
informacao-mundo-trabalho/escola-sociedade-informacao-
mundo-trabalho2.shtml

Educação, cidadania e ética

A educação deve ser entendida como fator de


realização da cidadania, com padrões de qualidade da oferta e
do produto, na luta contra a superação das desigualdades
sociais e da exclusão social. Nesse sentido, a articulação da
escol com o mundo do trabalho torna-se a possibilidade de
realização da cidadania, pela incorporação de conhecimentos,
de habilidade técnicas, de novas formas de solidariedade social,
de vinculação entre trabalho pedagógico e lutas sociais pela
democratização do Estado.
No contexto da sociedade contemporânea, a
educação pública tem trípliceresponsabilidade: ser agente
de mudanças, capaz de gerar conhecimentos e desenvolver a
ciência e a tecnologia; trabalhar a tradição e os valores
nacionais ante a pressão mundial de descaracterização da
soberania das nações periféricas; preparar cidadãos capazes de
entender o mundo, seu país, sua realidade e de transformá-lo
positivamente.
Essas possibilidades indicam, complementarmente,
três objetivos fundamentais que devem servir de base para
a construção de uma educação pública de qualidade no
contexto atual: preparação para o processo produtivo e para a
vida em uma sociedade técnico-informacional, formação para a
cidadania crítica e participativa e formação ética.
A preparação para o processo produtivo e para
a vida em uma sociedadetécnico-informacional envolve a
necessidade de a escola preparar para o mundo do trabalho e
para formas alternativas de trabalho, tendo em vista a
128
flexibilização que caracteriza o processo produtivo
contemporâneo e a adaptação dos trabalhadores às complexas
condições de exercício de sua profissão. Isso implica que a
educação escolar deverá centrar-se:
 na formação geral, cultural e científica que permita a
diversidade/integração de conhecimentos básicos da ciência
contemporânea e de habilidades técnicas que fundamentam os
novos processos sociais e cognitivos;
 na preparação tecnológica e no desenvolvimento de
saberes, habilidades e atitudes básicas que caracterizam o
processo de escolarização, incluindo as qualificações do novo
processo produtivo, como compreensão da totalidade do
processo de produção, capacidade de tomar decisões, fazer
análises globalizantes, interpretar informações de toda natureza,
pensar estrategicamente e desenvolver flexibilidade intelectual;
 no desenvolvimento de capacidades cognitivas e
operativas encaminhadas para um pensamento autônomo,
crítico e criativo. Tal desenvolvimento está intimamente
relacionado à auto-socioconstrução do conhecimento, com a
ajuda pedagógica do professor.
A formação para a cidadania crítica e
participativa diz respeito a cidadãos-trabalhadores capazes de
interferir criticamente na realidade para transformá-la, e não
apenas para integrar o mercado de trabalho. A escola deve
continuar investindo para que se tornem críticos e se engajem
na luta pela justiça social. Deve ainda entender que cabe aos
alunos se empenhar, como cidadãos críticos, na mudança da
realidade em que vivem e no processo de desenvolvimento
nacional e que é função da escola capacitá-los para que
desempenhem esse papel. Cidadania hoje significa, usando a
expressão do italiano Mário Manacorda, dirigir ou controlar
aquele que dirigem, e, para que isso ocorra, o aluno precisa ter
as condições básicas para situar-se competente e criticamente
no sistema produtivo. Nesse sentido, a preparação para a vida
social é exigência fundamental, especialmente porque um dos
pontos fortes da chamada sociedade pós-moderna é a
emergência de movimentos localizados, baseados em interesses
comunitários mais restritos, no bairro, na região, nos pequenos
grupos, organizados em associações civis, entidades não-
governamentais, etc. A preparação para a vida social é
exigência educativa para viabilizar o controle não estatal sobre o
Estado, mediante o fortalecimento da esfera pública não estatal.
Constata-se que muitos movimentos sociais atuais tendem a
dispensar a intermediação político-partidária para a conquista
de seus objetivos, seja por inoperância deste canal, seja pela

129
hostilidade com que setores da opinião pública encaram os
políticos profissionais. É preciso aliar a atuação dos movimentos
localizados não-governamentais com as formas convencionais
de representação política. Daí a necessidade de a escola
preocupar-se com o desenvolvimento de competências sociais
como relações grupais e intergrupais, processos democráticos e
eficazes de tomada de decisões, capacidades
sociocomunicativas de iniciativa, de liderança, de
responsabilidade, de solução de problemas, etc.
A formação ética é um dos pontos fortes da escola
do presente e do futuro. Trata-se de formar valores e atitudes
diante do mundo da política e da economia, do consumismo, do
individualismo, do sexo, da droga, da depredação ambiental, da
violência e, também, das formas de exploração que se mantêm
no capitalismo contemporâneo. Segundo o filósofo alemão
Habermas, é possível reabilitar a sociedade no âmbito da
esfera pública, de modo que as pessoas possam participar das
decisões não por imposição, mas por uma disposição de dialogar
e de buscar consenso, com base na racionalidade das ações
expressa em normas jurídicas compartilhadas. A emancipação
objetiva de todas as formas de dominação torna-se possível se
os indivíduos desenvolverem capacidades de aprendizagem
baseadas em uma prática comunicativa. A escola pode auxiliar
no desenvolvimento de competências comunicativas que
possibilitarão diálogo e consenso baseados na razão crítica.
Para que os indivíduos possam compartilhar de uma
situação comunicativa ideal, recomenda-se:
 investimento na capacidade do indivíduo de situar-se
em relação aos outros, de estabelecer relações entre objetivos,
pessoas e idéias;
 desenvolvimento da autonomia, isto é, indivíduos
capazes de reconhecer nas regras e nas normas sociais o
resultado do acordo mútuo, do respeito ao outro e da
reciprocidade;
 formação de indivíduos capazes de ser interlocutores
competentes, expressar suas idéias, desejos e vontades, de
forma cognitiva e verbal, incluindo a perspectiva do outro (nível
de informações, de intenções e outros);
 capacidade de dialogar.

6.2 RELAÇÕES DE TRABALHO E O PERFIL DO


PROFISSIONAL NO SÉCULO XXI

A formação profissional no século XXI: desafios e dilemas


– Edna Lúcia

130
O século XXI chegou e vem marcado com algumas
características: o mundo globalizado e a emergência de uma
nova sociedade que se convencionou chamar de sociedade do
conhecimento. Tal cenário traz inúmeras transformações em
todos os setores da vida humana. O progresso tecnológico é
evidente, e a importância dada à informação é incontestável.
O mundo globalizado da sociedade do
conhecimento trouxe mudanças significativas ao mundo do
trabalho. O conceito de emprego está sendo substituído pelo de
trabalho. A atividade produtiva passa a depender de
conhecimentos, e o trabalhador deverá ser um sujeito criativo,
crítico e pensante, preparado para agir e se adaptar
rapidamente às mudanças dessa nova sociedade.
O diploma passa a não significar necessariamente
uma garantia de emprego. A empregabilidade está relacionada à
qualificação pessoal; as competências técnicas deverão estar
associadas à capacidade de decisão, de adaptação a novas
situações, de comunicação oral e escrita, de trabalho em
equipe. O profissional será valorizado na medida da sua
habilidade para estabelecer relações e de assumir liderança.
Para Drucker, "os principais grupos sociais da sociedade do
conhecimento serão os 'trabalhadores do conhecimento"',
pessoas capazes de alocar conhecimentos para incrementar a
produtividade e gerar inovação.
Na perspectiva do trabalho na sociedade do
conhecimento, a criatividade e a disposição para capacitação
permanente serão requeridas e valorizadas. As tecnologias de
informação e comunicação estão modificando as situações de
trabalho, e as máquinas passaram a executar tarefas rotineiras
em substituição aos seres humanos. Neste ambiente de
mudanças, "a construção do conhecimento já não é mais
produto unilateral de seres humanos isolados, mas de uma
vasta colaboração cognitiva distribuída, da qual participam
aprendentes humanos e sistemas cognitivos artificiais".
Nesta conjuntura, em que a mudança tecnológica é a
regra, buscar condições para ancorar a preparação do
profissional do futuro requer uma estratégia diferenciada. Este
profissional deverá interagir com máquinas sofisticadas e
inteligentes, será um agente no processo de tomada de decisão.
Além disso, o seu valor no mercado será estimado com base em
seu dinamismo, em sua criatividade e em seu
empreendedorismo. Todas esses fatores evidenciam que só a
educação será capaz de preparar as pessoas para enfrentar os
desafios dessa nova sociedade.

131
Além disso, segundo De Masi, existem alguns valores
emergentes, nesta nova sociedade, que merecem ser levados
em consideração quando tratamos de formação e educação
profissional. Um deles é a intelectualidade (valorização das
atividades cerebrais em detrimento às atividades braçais); outro
é a criatividade (tarefas repetitivas e chatas serão feitas pelas
máquinas); outro é a estética (o que distingue hoje não é mais
a técnica, e sim a estética, o design). Para este autor, ainda, a
subjetividade, a emotividade, a desestruturação e a
descontinuidade também são valores importantes e, por isso,
deverão, também, estar na mira dos processos educativos do
futuro.
Esta realidade parece apontar para uma educação
básica e polivalente que valorize a cultura geral, a postura
profissional, a ética e a responsabilidade social.
A UNESCO, que nos dá as dicas de algumas
competências e conhecimentos desejados, ou seja, oito
características do trabalhador do século XXI:
1. Ser flexível e não especialista demais
2. Ter mais criatividade do que informação
3. Estudar durante toda a vida
4. Adquirir habilidades sociais e capacidade de
expressão
5. Assumir responsabilidades
6. Ser empreendedor
7. Entender as diferenças culturais
8. Adquirir intimidade com as novas tecnologias

O mundo do trabalho na sociedade do conhecimento


Sociedade informacional

Uma nova sociedade está surgindo e é expressa das


mais diferentes formas como sociedade da pós-informação
(NEGROPONTE), sociedade de inteligências coletivas (LEVY),
sociedade pós-industrial (DE MASI) e sociedade do
conhecimento.
Muito precisa é a definição sociedade informacional,
baseada em um modo de desenvolvimento específico em que as
informações, sua geração, processamento e transmissão,
tornam-se as fontes fundamentais de produtividade e poder na
sociedade (CASTELLS).
Essas novas terminologias expressavam uma das
maiores reviravoltas sócio-econômicas da história, sem falar nas
consequências políticas e relativas à reorganização do Estado.
Tudo isso porque há ganho de eficiência e uma mudança de

132
processos que representa o surgimento de novas formas de
fazer as coisas.
A nova economia está nas ideias, no conhecimento, na
inteligência. Por isso, capital e trabalho ficam menos
antagônicos, pois o verdadeiro capital passa a ser o capital
intelectual.

Novas relações de trabalho no século XXI

Discutir as mudanças que estão ocorrendo no mundo


e a sua influência nas várias estruturas da sociedade e das
organizações é cada vez mais um assunto pertinente. Estamos
vivendo uma transição nas relações de trabalho em decorrência
da evolução dos processos produtivos. E nisto as tecnologias
tiveram papel fundamental buscando responder ao desafio de
produzir sempre mais com menos trabalho.
Ainda vivemos numa sociedade em que grande parte
da vida das pessoas adultas é dedicada ao trabalho. Constrói-se
hoje uma sociedade na qual montante significativo do tempo
das pessoas será dedicado a outra atividade, mais criativa.
Essa é uma transição que se materializa na busca de
novas formas de inventar e difundir um novo tipo de
organização capaz de elevar a qualidade de vida e de trabalho e
ao mesmo tempo promover a felicidade das pessoas. Ora, a
história nos mostra (e o nosso dia a dia) que o trabalho foi
sempre visto como um problema e a partir daí, criou-se, inovou-
se e investiu-se em tecnologia para criar mecanismos que
minimizassem esse problema.

Educação e habilidades para o trabalho

É por isso que a nova sociedade, e sua busca de


eficiência e mudança de processos, trouxe alto ganho de
produtividade e com ele o aumento do desemprego.
Aparentemente, não haveria nova indústria para substituir os
empregos perdidos. Deve surgir e está surgindo um novo perfil
de atividades que podem absorver a função dos velhos
processos.
De qualquer forma, hoje os postos de trabalho estão
escassos, e por motivos diversos. O crescimento econômico tem
sido anêmico e, sem crescimento, não há trabalho. Por outro
lado, as necessidades humanas são infinitas (não esqueça o
enorme aumento da população) e, por isso, a demanda sempre
existirá.
O que parece cada vez mais óbvio é o descompasso
entre a oferta de novos empregos e a capacidade das pessoas
133
para eles. As oportunidades estão aí. Mesmo assim, muitas
vagas estão vazias pelo mundo afora. Isso mostra que, mesmo
havendo postos de trabalho, a sociedade necessita de pessoas
preparadas para preenchê-los. Resta, portanto, implementar
uma educação arrojada, ininterrupta e abrangente. É preciso
uma qualificação para a era da informação.
Um profissional deve hoje assumir um outro perfil,
privilegiando:
 Flexibilidade
 Gerenciar risco
 Lógica do raciocínio
 Conhecimento de línguas
 Saber trabalhar em equipe
 Habilidade para lidar com pessoas
 Iniciativa e criatividade
 Liderança
 Aprendizado contínuo
 Multifuncionalidade

Como deve ser, então, o profissional do futuro?


Philip Kotler, em seu o livro Marketing para o século XXI,
aponta que os Profissionais do futuro devem ter os seguintes
atributos, que eu gostaria de discorrer um pouco sobre cada um
deles:
1- Os Profissionais do futuro têm que ser
competentes– Os mercados não perdoarão o amadorismo.
Chega de improvisação, do chamado “jeitinho brasileiro”!
2- Os profissionais do futuro devem ser bem-
educados– Isto significa que devemos ser cavalheiros,
diplomáticos, finos no trato, elegantes, conhecedores de
etiquetas e cordiais. Sim, quem não atentar para estas coisas
estão fora de sintonia com as novas leis de mercado.
3- Os Profissionais do futuro devem ser bem-
humorados –Um toque de humor, de alegria, faz bem a
qualquer ambiente. É bom ter cuidado, porém, com as piadas!
Estas, quando bem empregadas produzem bem estar na
maioria, mas quando mal utilizadas, podem comprometer
qualquer negócio.
4- Os Profissionais do futuro devem ser
confiáveis e honestos- Como isto serve para todas as áreas,
tenho esperança de que a sociedade brasileira consiga
mecanismos para viabilizar o judiciário e este venha punir
nossos políticos corruptos, que levam para os paraísos fiscais
boa parte das nossas riquezas! O fato é que não haverá espaço,
no mercado, em todos os segmentos, para o desonesto.

134
5- Os Profissionais do futuro serão responsáveis–
Assumir os seus atos, agir com responsabilidade, tomar decisões
abalizadas, trabalhar com dados que sedimentem as decisões,
são características desse Profissional que os mercados
necessitam. Só uma observação: esse futuro já chegou!

6.3 EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO

Características do Comportamento Empreendedor

Dificilmente uma pessoa tem todas as características


de comportamento empreendedor em perfeito equilíbrio porque
essas características não são herdadas, mas sim aprendidas ao
longo da vida, com experiências de trabalho, determinação e
estabelecimento de metas pessoais desafiadoras.
Se você é uma pessoa obstinada, persistente e está o
tempo inteiro buscando informações para melhorar e aumentar
seus negócios, será meio caminho andado.
No jogo dos negócios é muito importante que você
identifique suas reais características empreendedoras, pois um
grande número de pessoas tem buscado iniciar negócios
próprios, sem, no entanto, apresentar comportamento
adequado.
É importante estar consciente de quais são suas
qualidades e suas deficiências. Uma análise de suas
experiências práticas, capacidade e personalidade ajudarão a
enfrentar qualquer situação.

Características de Comportamento Empreendedor

1. Busca de oportunidades e iniciativa


Faz as coisas antes de solicitado, ou antes, de ser
forçado pelas circunstâncias; Age para expandir o negócio em
novas áreas, produtos ou serviços; Aproveita oportunidades fora
do comum para começar um negócio, obter financiamentos,
equipamentos, terrenos, local de trabalho ou assistência.
O empreendedor é alguém que está sempre buscando
novas oportunidades. Observando o ambiente, costuma ter
idéias que possam ser transformadas em negócios e as coloca
em prática.

2. Persistência
Age diante de um obstáculo; Age repetidamente ou
muda de estratégia a fim de enfrentar um desafio ou superar
um obstáculo; Assume responsabilidade pessoal pelo
desempenho necessário para atingir metas e objetivos.
135
3. Comprometimento
Faz sacrifícios pessoais ou despende esforços
extraordinários para completar uma tarefa; Colabora com os
empregados, colaboradores e parceiros ou se coloca no lugar
deles, se necessário, para terminar um trabalho; Esmera-se em
manter os clientes satisfeitos e coloca em primeiro lugar a boa
vontade em longo prazo, acima do lucro em curto prazo.

4. Exigência de qualidade e eficiência


Encontra maneiras de fazer as coisas melhor, mais
rápido ou mais barato; Age de maneira a fazer coisas que
satisfazem ou excedem padrões de excelência; Desenvolve ou
utiliza procedimentos para assegurar que o trabalho seja
terminado a tempo ou que o trabalho atenda a padrões de
qualidade previamente combinados.

5. Correr riscos calculados


Avalia alternativas e calcula riscos deliberadamente;
Age para reduzir os riscos ou controlar os resultados; Coloca-se
em situações que implicam desafios ou riscos moderados.

6. Estabelecimento de metas
Estabelece metas e objetivos que são desafiantes e
que têm significado pessoal; Define metas de longo prazo,
claras e específicas; Estabelece objetivos de curto prazo,
mensuráveis.

7. Busca de informações
Dedica-se pessoalmente a obter informações de
clientes, fornecedores e concorrentes; Investiga pessoalmente
como fabricar um produto ou fornecer um serviço; Consulta
especialistas para obter assessoria técnica ou comercial.
Conversar com clientes, fornecedores e concorrentes é essencial
para posicionar melhor sua empresa no mercado.

8. Planejamento e monitoramento sistemáticos


Planeja dividindo tarefas de grande porte em
subtarefas com prazos definidos; Revisa seus planos
constantemente, levando em conta os resultados obtidos e as
mudanças circunstanciais; Mantém registros financeiros e
utiliza-os para tomar decisões.
Para se tornar um empreendedor bem-sucedido é
preciso que você aprenda a planejar. Por isso, é indispensável
que você aprenda a fazer um planejamento de suas ações
futuras.
136
9. Persuasão e rede de contatos
Utiliza estratégias deliberadas para influenciar ou
persuadir os outros; Utiliza pessoas-chave como agentes para
atingir seus próprios objetivos; Age para desenvolver e manter
relações comerciais.

10. Independência e autoconfiança


Busca autonomia em relação a normas e controles de
outros; Mantém seu ponto de vista, mesmo diante da oposição
ou de resultados inicialmente desanimadores; Expressa
confiança na sua própria capacidade de complementar uma
tarefa difícil ou de enfrentar um desafio.
Fonte: <http://super.abril.com.br/ciencia/sucesso-
584272.shtml>

6.4 RESPONSABILIDADE SOCIAL: SETOR PÚBLICO,


PRIVADO E TERCEIRO SETOR

A função social da empresa sob a ótica do


desenvolvimento sustentável
Bruna Medeiros David de Souza
Advogada, Pós-graduanda em Direito Civil pela Faculdade de
Direito Milton Campos.
A função social da propriedade privada é um princípio
consagrado na Constituição brasileira de 1988, que, em seu
artigo 170, preceitua que “a ordem econômica, fundada na
valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da
justiça social, observado, dentre outros, o Princípio da Função
Social da Propriedade”.
O princípio da função social da empresa busca
estabelecer um equilíbrio entre a nova ordem econômica social
e as idéias do liberalismo clássico, mesclando elementos de
ambos. Diante dessa nova concepção, o lucro, por si só, não é
mais um elemento capaz de justificar a existência de uma
empresa. A missão das companhias privadas não é somente
gerar lucro; este é uma recompensa justa e legítima a ser
recebida pelos investidores, que aceitaram correr o risco de
aplicar seu capital em um empreendimento produtivo.
Outra forma de atuação empresarial que se coaduna
com a função social da empresa é a busca pelo desenvolvimento
sustentável. Exerce função social a empresa que utiliza os
recursos naturais de forma justa e reduz ao mínimo o impacto
de suas atividades no meio ambiente.

137
Responsabilidade sócio-ambiental é a “forma de gestão
que se define pela relação ética e transparente da empresa com
todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo
estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o
desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando
recursos ambientais e culturais para as gerações futuras,
respeitando a diversidade e promovendo a redução das
desigualdades sociais”.
Bem assim, o respeito às leis trabalhistas e aos
interesses dos empregados também demonstram o princípio da
função social pautando as relações da empresa com seus
empregados. Tal forma de atuação empresarial prevê, além da
observância aos direitos trabalhistas, respeito à dignidade dos
trabalhadores, em seus diversos aspectos.
Uma empresa realiza sua função social com a opção por
ações que promovam a dignidade da pessoa humana, como a
valorização do trabalho, a busca do pleno emprego e a redução
das desigualdades sociais.
Hoje, os consumidores estão mais exigentes e
demonstram preocupação com o futuro do nosso ambiente, o
que tem alterado seu comportamento ao adquirir um produto.
Dá-se preferência hoje aos ecologicamente sustentáveis, que
não agridem a natureza, sem se esquecer da qualidade.
Empresas de diferentes atividades estão tentando se adaptar a
essa nova realidade, e atender a essa nova busca do
consumidor.
A atuação empresarial, em relação aos consumidores,
também deve ser orientada pelo princípio da função social. O
Código de Defesa do Consumidor determina a responsabilidade
empresarial pela prestação de serviços e pela qualidade dos
produtos, reconhecendo a função social da empresa ao
estabelecer finalidades sociais e proteção aos interesses do
consumidor (CDC, art.51).
A questão da responsabilidade social tem sido tema
recorrente no mundo dos negócios. Há uma crescente
preocupação por parte das empresas brasileiras em
compreender seu conceito e dimensões e incorporá-los à sua
realidade. Muitas empresas já se mobilizaram para a questão e
estruturaram projetos voltados para uma gestão socialmente
responsável, investindo na relação ética, transparente e de
qualidade com todos os seus públicos de relacionamento.
Essas iniciativas, apesar de apresentarem resultados
positivos, representam, na maioria das vezes, ações pontuais e
desconectadas da missão, visão, planejamento estratégico e
posicionamento da empresa e, consequentemente, não

138
expressam um compromisso efetivo para o desenvolvimento
sustentável.
Em muitos casos, as empresas brasileiras acabaram por
associar responsabilidade social à ação social,seja pela via do
investimento social privado, seja pela via do estímulo ao
voluntariado. Esse viés de contribuição, embora relevante,
quando tratado de maneira isolada, coloca o foco da ação fora
da empresa e não tem alcance para influenciar a comunidade
empresarial a um outro tipo de contribuição, extremamente
importante para a sociedade: a gestão dos impactos ambientais,
econômicos e sociais provocados por decisões estratégicas,
práticas de negócio e processos operacionais. Para que se
compreenda esta abordagem mais ampla, que podemos chamar
de sustentabilidade empresarial, é necessário que se conheça
previamente o conceito de desenvolvimento sustentável.
O conceito de responsabilidade social empresarial traz,
ainda, a questão da relação da empresa com seus diversos
públicos de interesse, conforme expresso na definição do
Instituto Ethos: “Responsabilidade social empresarial é a forma
de gestão que se define pela relação ética e transparente da
empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e
pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o
desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando
recursos ambientais e culturais para as gerações futuras,
respeitando a diversidade e promovendo a redução das
desigualdades sociais”.
Dito de outra maneira, espera-se cada vez mais que as
organizações sejam capazes de reconhecer seus impactos
ambientais, econômicos e sociais e, a partir desse pano de
fundo, construam relacionamentos de valor com os seus
diferentes públicos de interesse, os chamados stake-holders –
público interno, fornecedores, clientes, acionistas, comunidade,
governo e sociedade, meio ambiente, entre outros. Embora já
haja diversos exemplos de práticas de gestão socialmente
responsável, a inserção da sustentabilidade e responsabilidade
social às práticas diárias de gestão ainda representa um grande
desafio para grande parte da comunidade empresarial brasileira.
A associação desses conceitos à gestão dos negócios deve
necessariamente expressar o compromisso efetivo de todos os
escalões da empresa, de forma permanente e estruturada.
Do exposto conclui-se que, diante da nova ordem
constitucional, toda empresa deve pautar sua atuação de acordo
com o Princípio da Função Social da Empresa, não visando
unicamente o lucro, mas também o atendimento dos interesses
socialmente relevantes, buscando um equilíbrio da economia de

139
mercado com a supremacia dos interesses sociais previstos na
Constituição Federal.
Fonte:<http://direito.newtonpaiva.br/revistadireito/docs/convida
dos/13_convidado_bruna.pdf

A influência da responsabilidade social empresarial no


setor público
Uzias Ferreira Adorno Jr. 09/10/2011

O artigo discute as aplicações e benefícios que o


conceito de responsabilidade social prevê a nova gestão pública
para responder adequadamente às necessidades e exigências
da sociedade civil que hoje representa para as instituições do
Estado. Isto levará o último a assumir um comportamento
socialmente responsável, tanto internamente como
externamente, de modo a alcançar um nível de "qualidade ética
sustentável" e um acordo com os novos desafios dos serviços
públicos em todo o mundo.
Normalmente, o conceito de responsabilidade social
tem sido limitado às ações desenvolvidas pelas empresas,
referindo-se, em particular, os efeitos e o impacto que estas
atividades possam ter sobre o ambiente para eles.
No entanto, a responsabilidade social tem uma
aplicação muito mais ampla, abrangendo não só o ambiente
externo de uma organização, mas também dentro da
organização, em todas as ações, atitudes e comportamentos dos
indivíduos no exercício das suas funções normais, como um
valor na cultura organizacional.
A abordagem da responsabilidade social das
empresas coloca a necessidade de uma gestão organizacional
baseada em princípios e valores, a fim de desenvolver um
relacionamento ético e transparente com as partes internas e
externas que a organização possui. Essa relação é expressa
como uma preocupação constante para o impacto gerado no
âmbito das atividades principais e fins declarados na sua missão
e visão, e fornecer feedback para cada um dos sistemas de
gestão de uma instituição.
Além disso, a reforma da administração pública tem
desenvolvido importantes processos de modernização da
governança, incorporando técnicas de gestão numerosas do
setor privado, além de fazer investimentos significativos em
equipamentos, infraestrutura e treinamento de servidores.
Nesse cenário, o governo emerge para novos desafios
resultantes dos processos de globalização e desenvolvimento da
sociedade do conhecimento. Estes mostrar ao público a
necessidade de respeitar e tomar novos direitos, tais como a
140
não discriminação, equidade, diversidade, autonomia e
participação.
Portanto, os desafios usuais que deve assumir o
governo de qualquer Estado, na implementação de políticas
públicas que visem efetivamente questões como a pobreza,
criminalidade, desemprego, exclusão, saúde ou educação, bem
deve incorporar questões de gênero e intersetoriais, porque
estes dois aspectos são parte dos impactos e das condições que
devem conceber e implementar políticas e programas de
governo que devem ser executados para atender às demandas
emergentes.

Aplicação da responsabilidade social na administração


pública
É possível associar a responsabilidade social com a
governança em matéria de ética pública, probidade
administrativa, especialmente no caso do governo, com o qual
tanto os servidores e as instituições devem desenvolver seu
respectivo serviço civil, em conformidade com sua missão.
A este respeito, a responsabilidade social apresenta
critérios importantes para fortalecer a ética e a probidade no
serviço público, por exemplo, cultura organizacional, associada
com a responsabilização ou prestação de contas
(accountability), relatórios de sustentabilidade, códigos de ética,
gestão do relacionamento com partes interessadas, entre outras
práticas que fortaleçam um comportamento socialmente
responsável de uma organização.
Assim, a necessidade de reforçar a consciência dos
efeitos e impactos das ações e decisões são implementadas na
sociedade em geral, é uma das principais razões para levantar
como viável e necessária para aplicar o modelo de
responsabilidade social corporativa em governança, não só para
reforçar o empenho e conhecimento dos serviços e instituições
governamentais em geral, mas também dos servidores públicos
em relação à assunção de um conjunto de valores e princípios
relacionados com um comportamento socialmente responsável,
a nível individual.
Outro elemento que pode reforçar um comportamento
socialmente responsável é a accountability e a transparência -
expressa através do pleno acesso à informação, por exemplo, a
publicação de relatórios de sustentabilidade ou gestão de contas
públicas.
É evidente que, por si só, a transparência e a
responsabilidade tornam-se características distintivas da gestão
pública, porém tornam-se também os indicadores de
comportamento socialmente responsável, com outros elementos
141
descritos neste trabalho. Por isso, é importante não considerar
como sinônimo de transparência e responsabilidade, a
responsabilidade social, porque os primeiros são a expressão de
um aspecto específica do processo de gestão e tomada de
decisão em uma organização (a avaliação e controle, por
exemplo). Já a responsabilidade social, em vez disso, deverá
abranger e ultrapassar todas as etapas e atividades de gestão
de uma organização.
Estas são condições essenciais para desenvolver a
gestão dos serviços públicos, adequada ao cenário atual,
definido pelo processo de globalização e, em especial, o
desenvolvimento da sociedade do conhecimento. Esta
procura de instituições do Estado para o desenvolvimento
contínuo de uma atitude mais responsável e comportamento
aberto no acesso à informação e conhecimento sobre os
resultados alcançados e, sobretudo, em relação ao uso
adequado dos recursos, claramente expressando um
comportamento socialmente responsável.
Responsabilidade está relacionada à necessidade de
transparência com que os serviços públicos devem agir em
relação aos cidadãos, não somente em matéria de acesso à
informação, mas também nos resultados obtidos por instituições
públicas no cumprimento da sua missão, em que "a criação de
mecanismos institucionais de controle e supervisão [...]
institucionalizada a prática social relacionada à responsabilidade
democrática da administração pública [...] exige a existência de
sistemas políticos e administrativos, com um elevado grau de
legitimidade política e eficiência administrativa".
No entanto, as ações de responsabilidade e
transparência não são eficazes em si mesmas, se houver uma
sociedade civil ativa e vigilante para estar alerta e comunicar
qualquer irregularidade. (artigo adaptado pelo prof. Altamir
Fernandes).
Fonte:<http://www.administradores.com.br/informe-
se/artigos/a-influencia-da-responsabilidade-social-empresarial-
no-setor-publico/47145/>

142
TEMA 7 – GERAÇÃO Y

7.1 NOVAS TECNOLOGIAS E A NOVA GERAÇÃO DE


TRABALHADORES DO CONHECIMENTO (Y)
7.2 CONTEXTO HISTÓRICO DO NASCIMENTO DAS GERAÇÕES
BABY BOOMERS, X, Y E Z
7.3 O QUE A GERAÇÃO Y QUER E PRECISA NO TRABALHO
7.4 ESTRATÉGIAS E PROGRAMAS PARA GERENCIAR A GERAÇÃO Y

Introdução

Juventude:
“Nossa juventude adora o luxo, é mal educada, caçoa da
autoridade e não tem o menor respeito pelos mais velhos.
Nossos filhos hoje são verdadeiros tiranos. Eles não se levantam
quando uma pessoa idosa entra, respondem a seus pais e são
simplesmente maus.” (Sócrates 470-399 a. C.).
“Não tenho mais nenhuma esperança no futuro do nosso País se
a juventude de hoje tomar o poder amanhã, porque essa
juventude é insuportável, desenfreada, simplesmente
horrível.”Hesíodo (720 a.C)
“Nosso mundo atingiu seu ponto crítico. Os filhos não ouvem
mais seus pais. O fim do mundo não pode estar muito longe.”
(Sacerdote do ano 2000 a.C.)
“Essa juventude está estragada até o fundo do coração. Os
jovens são malfeitores epreguiçosos. Eles jamais serão como a
juventude de antigamente. A juventude de hoje não será capaz
de manter a nossa cultura.” (Descoberta nas ruínas da
Babilônia (atual Bagdá). 4000 anos de existência.)

Nada mudou!

Um Estudo das Gerações: os comportamentos, valores


de vida, expectativas com relação ao futuro mudam de forma
considerável e, mundialmente a cada 20 anos...
Pela primeira vez as empresas estão lidando com
diferenças de mais de 40 anos de idade... e esta diferença
vai crescer ainda mais...

7.1 NOVAS TECNOLOGIAS E A NOVA GERAÇÃO DE


TRABALHADORES DO CONHECIMENTO (Y)

Motivações e valores

É bom lembrar que os conceitos de motivação e


valores pertencem à geração X e até mesmo à anterior, ou
143
seja, foram concebidos por gerações que trocaram uma
concepção mecanicista do trabalho por uma mais aberta, na
qual o trabalho não é só uma forma de sobreviver
economicamente, mas fonte de satisfação e desenvolvimento
pessoal. É possível, portanto, que esses termos não se apliquem
à geração Y.
Por sua vez, o cenário de trabalho de hoje é
especialmente complexo, por conta de alguns fenômenos:
 A idade de aposentadoria aumentou. Ao mesmo
tempo, as empresas não valorizam os profissionais mais velhos.
 Faltam profissionais em vários setores.
 Um fator de diversidade é acrescido com a imigração e
a crescente incorporação das mulheres nas empresas.
 Em muitas organizações, as horas de trabalho e a
pressão são muito altas, o que dificulta a conciliação entre
vida profissional e pessoal.
 Os trabalhadores têm mantido ou reduzido seu
poder aquisitivo; os benefícios empresariais e os salários da
alta direção, porém, aumentaram extraordinariamente.
Devido ao ambiente em que cresceram, os Y são
pessoas com iniciativa e grande capacidade de resolver
problemas, e seu estado mental diante das opções e desafios
costuma ser: “Por que não?”. Desenvolvem-se bem em espaços
criativos, nos quais suas iniciativas possam render frutos e
seus esforços individuais por conquistar objetivos sejam
reconhecidos. Os jovens dessa geração são mais
individualistas que os das anteriores e reivindicam a
autonomia em suas opiniões e atuações, situando seu
âmbito pessoal acima das considerações de ordem laboral ou
social.
Os Y parecem não se importar muito com uma
questão-chave para as gerações anteriores: a promoção. A
rotação não os assusta (a situação do mercado lhes permite
isso) e, apesar de se motivarem a escalar posições, não é tanto
pelo que estas representam em poder, mas porque implicam
reconhecimento e maior possibilidade de colocar em marcha
suas iniciativas. Por isso, podem rechaçar promoções que
resultem em perda da qualidade de vida.
Os integrantes da geração Y têm um acesso à
informação que nunca existiu. Isso é tão importante que
provocou uma verdadeira mudança de paradigma no
consumo. Quando um Y vai comprar um celular, por exemplo, é
possível que saiba mais de suas características técnicas que o
próprio vendedor. E também terá consultado todos os blogs e
fóruns para saber a opinião de outros consumidores. O fato é
que esse jovem terá a mesma atitude quando comparecer a
144
uma entrevista de emprego. Sabe o que quer, conhece o setor e
a empresa, leu notícias a respeito dela. Além disso, a facilidade
com que o candidato pode ter acesso à informação sobre o
mercado de trabalho faz com que se abram diante dele
muitas e diversas alternativas, e ele pulará de uma para outra
se as respostas não o convencerem.
No entanto, podemos nos aventurar a algumas
conclusões:
 São filhos de seu tempo, pós-modernos. Estão
imersos em preocupações ecológicas e se interessam pelos
problemas sociais, sobre os quais estão sempre
informados.
 Como são geralmente jovens, mostram-se abertos a
novas correntes ideológicas e são sensíveis à injustiça.
Aqui há uma grande pergunta para fazer: a formação
que recebem das instituições de ensino e as experiências de
trabalho os levarão a pender para um lado ou para o outro, ou
seja, eles vão exacerbar o peso do valor econômico em sua vida
ou integrá-lo a um contexto moral e social mais amplo?
Diante disso, três aspectos parecem ser fundamentais
para gerenciar esses jovens:
 Um clima cosmopolita que os atraia, geralmente
cidades populosas, em que possam usar o inglês como meio
comum de expressão, com acesso às artes, ao lazer e aos
esportes, além de instituições de ensino de prestígio.
 Expectativas de carreira tão motivadoras
quanto a remuneração, assim como um tipo de trabalho
igualmente motivador, que ofereça desafios constantes.
Garantia de autonomia profissional. As tarefas lhes
devem ser delegadas e eles precisam ter poder para trabalhar.
Os Y costumam se dar muito bem em equipe.

7.2 CONTEXTO HISTÓRICO DO NASCIMENTO DAS


GERAÇÕES BABY BOOMERS, X, Y E Z

Geração Baby Boomers – nascidos entre 1946 e 1964

Baby Boomers é uma definição genérica para crianças


nascidas durante uma explosão populacional - Baby Boom em
inglês, ou, em uma tradução livre, Explosão de Bebês.
Em geral, a atual definição de Baby Boomers, se refere
aos filhos da Segunda Guerra Mundial, já que durante a
guerra houve uma explosão populacional.
Normalmente, são as pessoas nascidas no final da
década de 1940, se consideram como Baby Boomers os
nascidos entre 1946 e 1964, separados em duas gerações:
145
Podemos determinar as seguintes características
para a Geração de Baby Boomers:
 Possui renda mais consolidada.
 Tem um padrão de vida mais estável.
 Prefere qualidade a quantidade.
 Não se influencia facilmente por outras pessoas.
 É firme e maduro nas decisões
Enfim, sua atitude típica: “Só se vive uma vez, então
aproveite” e para subir na vida é preciso trabalhar muito; seus
empregos eram para a vida toda e a carreira era linear; eles
trabalham mais tempo e se aposentam mais tarde.

Geração X – nascidos entre 1965 e 1980

Os integrantes da Geração X têm sua data de


nascimento localizada, aproximadamente, entre os anos 1960
e 1980. A Geração X é formada pelos filhos da Geração Baby
Boomers, formada logo após a Segunda Guerra Mundial e pelos
pais da Geração Y.
Os integrantes da geração X são as pessoas
nascidas entre meados dos anos 60 e início dos 1980.
Essa geração viveu momentos importantes na política: a
Guerra Fria, a Perestroika precipitando a queda do Muro de
Berlim. Foi a época dos últimos líderes, como Mikhail
Gorbatchov, Ronald Reagan, Margareth Thatcher...
As pessoas X não vêem o êxito da mesma forma que
seus pais. Ao contrário, nutrem certo cinismo e desilusão
em relação aos valores deles. São mais céticas, mais
difíceis de atingir pelos meios de comunicação e marketing
convencionais. É a geração da MTV, do Nirvana, das Tartarugas
Ninjas.
Preferem um estilo de vida que lhes dê status, dinheiro
e poder.
Do ponto de vista social, alguns acontecimentos
marcaram essa geração, entre eles o aparecimento da
AIDS, em 1981. Essa doença provocou um posicionamento
ideológico de dimensões muito relevantes, provavelmente
nunca associado a uma enfermidade, tendo assim grande
influência na mudança de pautas de comportamento da
geração seguinte.
Diante de tal panorama de incerteza e sensação de
mudança, não é de estranhar que, ao ir ao cinema, esses jovens
tenham assistido a Blade Runner (1982), um dos maiores
expoentes do movimento cultural conhecido como cyberpunk. A
atual geração Y possivelmente desconhece que as origens
ideológicas de alguns de seus ícones culturais, como Matrix,
146
venha diretamente dessa visão apocalíptica e obscura, própria
da evolução do movimento punk.
Entre as principais características dos indivíduos da
geração X, encontramos:
 Busca da renda mais consolidada.
 Maturidade e escolha de produtos de qualidade.
 Busca por seus direitos.
 Respeito à família menor que o de outras gerações.
 Procura de liberdade.

Geração Y – nascidos entre 1981 e 1995

A Geração Y, ao contrário do que muitos pensam, não


se refere exatamente a uma legião de adolescentes, mas sim a
uma "determinada" geração, nascida entre os anos 1980 e
1990. São os filhos da Geração X e netos dos Baby Boomers.

Quem são os integrantes da geração Y?


 Nascidos na década de 1980 e 90.
 Entrando no mercado de trabalho, os mais velhos
chegando aos 25 anos.

Propósito:
 Satisfação imediata de seus anseios e sonhos e uma
vida com significado.
Como é uma geração relativamente nova, ainda não
há uma conceituação clara das características desta geração, a
não ser pelo fato que nasceram em um mundo que estava se
transformando em uma grande rede global. A Internet,
emails, redes de relacionamento, recursos digitais, fizeram
com que a geração Y fizesse milhares de amigos ao redor do
mundo, sem ao menos terem saído da frente de seus
computadores.
Não há acordo entre os estudiosos a respeito da data
exata de início e fim desta geração. Alguns voltam alguns anos e
ultrapassam os anos 70. Outros dizem que a geração Y se
manteve até 2010. O que há em comum, no entanto são os
novos hábitos voltados à comunicação e obtenção da
informação instantânea.
Também são chamados de Millennials por serem a
geração da mudança do milênio. A definição foi criada pelo
Advertising Age. Uma revista de publicidade e propaganda
norte-americana, que definiu, em 1993, os hábitos de
consumo dos adolescentes da época. Como eram filhos dos
integrantes da Geração X, se achou óbvio, que esta nova
geração fosse chamada pela próxima letra do Alfabeto.
147
Histórico Familiar
 Filhos de pais dedicados à carreira;
 Pais “culpados” pela pouca dedicação à família;
 Pais com o pensamento: “Quero propiciar para o meu
filho o que eu não tive”;
 Filhos cuidados, nutridos e programados para
inúmeras atividades desde muito cedo;
 Pouca hierarquia entre pais e filhos;
 Injeções de autoconfiança

Contexto Mundial:
 Fast-food: tudo rápido e ao alcance
 globalização
 Não existe distância
 Revolução tecnológica
Entre as principais características dos indivíduos da
Geração Y, encontramos:
 Estão sempre conectados;
 São divertidos, empolgados e gostam de
desafios;
 Procuram informação fácil e imediata;
 Preferem computadores a livros;
 Preferem e-mails a cartas;
 Digitam ao invés de escrever;
 Vivem em redes de relacionamento
(principalmente Facebook);
 Compartilham tudo o que é seu: dados, fotos,
hábitos;
 Eles querem empregos com combinam seu
estilo de vida e suas necessidades;
 Eles não separam a vida pessoal do trabalho, ou
seja, para eles a vida é uma só;
 Estão sempre em busca de novas tecnologias.

Em síntese, as características da Geração Y:

a) Preparados para superar desafios;


 Vencedores; Responsáveis; Valorizam a
empregabilidade e não a fidelidade.

b) Esperançosos:
 Otimistas; Acreditam no futuro e no seu papel nele;
Local de trabalho desafiante e agradável; Colaborativos e
sociáveis; Criativos e inovadores; Divertidos.

148
c) Orientados para metas e realizações:
 Traçam metas ousadas, altas expectativas;
 Foco e multitarefas;
 Aprendem rapidamente;
 Dispostos a correr riscos; iniciativa;
 Têm pressa de construir a carreira;
 Lidam muito bem com as mudanças;
 Compromisso com atingimento de objetivos.

d) Consciência cidadã:
 Pensam no bem maior; ambiente sustentável;
 Engajados em questões de responsabilidade
social;
 Transparência;
 Idealistas;
 Equilíbrio entre trabalho e vida pessoal como
obrigação.

e) Inclusivos:
 Trabalho em equipe;
 Poder coletivo;
 Justiça no ambiente de trabalho;
 Diversidade é norma;
 Não têm protocolos de hierarquia

Geração Z

Formada por indivíduos constantemente conectados


através de dispositivos portáteis e, preocupados com o meio
ambiente, a Geração Z não tem uma data definida. Pode ser
integrante ou parte da Geração Y, já que a maioria dos autores
posiciona o nascimento das pessoas da Geração Z entre 1990 e
2009.

Estado de Minas, 10/02/2011 - Belo Horizonte MG


Geração Z: tudo é para agora
Gleysse Gonçalves de Paula - Psicóloga, neuropsicóloga e coordenadora do curso de
pós-graduação em terapia cognitiva comportamental da Faculdade de Ciências
Médicas de Minas Gerais
Eles cresceram em noção é exatamente esta propósitos, nossas
meados dos anos 90, e, justamente por isso, crenças, nossos objetivos.
rodeados pelas inovações existe uma necessidade, Não somente a Geração Z
tecnológicas – como a cada vez mais latente, da depende dessa nossa
internet e o celular. Sua execução de atividades
mudança de conduta, mas
149
personalidade é ditada simultâneas e a cobrança também o nosso próprio
pelo ritmo da tecnologia. por uma produção mais organismo.
Assim são os jovens da eficaz.
chamada Geração Z – o Ledo engano daqueles que
aqui e agora. Ao Vivemos em uma aldeia
acreditam que, ao deixar
analisarmos suas global, onde a informação
características subjetivas e circula em uma velocidade
de se conduzir pela
suas relações muito maior do que agilidade da
interpessoais, percebemos poderíamos imaginar. Isso produtividade, estará a
que os filhos dessa tudo ocasiona, não caminho do sucesso.
geração apresentam somente nos jovens da Quanto mais o indivíduo
dificuldades em Geração Z, mas em todos promove o processo de
compreender a si mesmos. nós, esta sensação de “autoabandono”, mais o
Seus projetos de vida, impulsividade, organismo se organiza em
anseios e suas impaciência, intolerância e uma tentativa de
necessidades reais são individualismo. Não autoproteção. Assim, em
difíceis de ser planejamos mais as nossas
vez de se edificar como
identificados. Satisfazem- vidas e, assim, não
se de maneira muito conseguimos identificar, indivíduo produtivo, há
particular e efêmera. Não exatamente, o que uma organização de uma
entendem a importância almejamos. Como educar, falsa estabilização, o que é
da manutenção das se pouco nos conhecemos perceptível com as
relações e vivem de hoje em dia? O ser sensações e sentimentos
maneira operacionalizada, humano é dotado de de insegurança, as
sob o substrato do processos cognitivos incertezas, a dor do vazio,
digitalizado, das urgências complexos (raciocínio, o comer compulsivo, a
momentâneas. São planejamento, organização ansiedade e a necessidade
individualistas, de estratégia, capacidade imanente de sempre fazer
imediatistas e, de mudança, de
mais... Eis o momento da
principalmente, não adaptação, de tomada de
projetam e tampouco decisão) e está reorganização. Visualiza-se
planejam o futuro. caminhando, o instante da promoção do
progressivamente, em autoconhecimento, ou
Pensar nas possíveis direção ao automatismo. É seja, de conhecer o modo
consequências possível afirmar, inclusive, como cada indivíduo
provenientes das escolhas que talvez estejamos percebe, identifica,
dessa geração é abandonando a nossa conecta-se com o que
extremamente capacidade de identificar, acredita e como
preocupante. Por isso, perceber, conduzir e estabelece essa conjunção
todos nós, pais e gerenciar o nosso próprio
de potencialidade e
educadores, devemos caminho e, desta maneira,
estar preparados. Saber pouco podemos fazer
possibilidades com o
lidar com as expectativas, pelos nossos jovens. mundo que o cerca. A
anseios e desejos desses Ficamos satisfeitos com partir das trocas reais
jovens é o nosso grande pequenas ações imediatas entre ser humano
desafio. Desde a década do dia a dia. Poucos integrado e a articulação
de 80 – com a crescente paramos para pensar... do modo de funcionar no
inserção da tecnologia em Neste sentido, creio que mundo que se configura a
nossas vidas –, chegou o momento para “proatividade” e produção
vivenciamos um nos conectarmos com nós eficaz. Faz-se urgente
redimensionamento na mesmos, nossos andar no ritmo contrário –
noção de tempo. Há quem
por nós mesmos e pela
diga, inclusive, que ele
Geração Z.
150
passa rápido demais. A

7.3 O QUE A GERAÇÃO Y QUER E PRECISA NO TRABALHO

Quem é a geração Y – Pilar Garcia Lombardia

Pela primeira vez na história do mercado de trabalho,


as organizações estão acolhendo pessoas cujas idades cobrem
um espectro de mais de 40 anos. Essa tendência vai
aumentar na próxima década, devido ao necessário
prolongamento dos anos de trabalho motivado pela escassez
de profissionais.
É necessário identificar um conjunto de vivências
históricas compartilhadas – obviamente, de caráter
macrossocial – que determina alguns princípios de visão de
vida, contexto e, certamente, valores comuns. Sob essa
lógica, podemos afirmar que estamos em um momento em que
quatro gerações trabalham e convivem nas empresas, cada uma
com aspirações e contratos psicológicos diferentes com o
empregador.

Geração Y

A nova geração abrange os nascidos nos anos 1980


e 90. Os mais velhos estão chegando aos 25; os mais jovens
acabam de sair da adolescência. É a geração dos Power Rangers
e da internet, da variedade, das tecnologias que mudam
contínua e vertiginosamente.
Os membros dessa geração são considerados
independentes, autossuficientes, honestos, empreendedores e
seguros em relação ao que sabem e ao que querem. São vistos
como profundos conhecedores da tecnologia e a utilizam como
principal aliada no processo de aprendizagem e obtenção de
informação
A geração Y só conhece a democracia. Não deixam
de se surpreender com o fato de que a geração anterior tenha
sobrevivido sob a tirania de poucas redes de televisão, sob
controle governamental estrito, e com telefones pregados na
parede.
Na geração Y não ocorreu uma ruptura social
evidente; não houve Woodstock nem maio de 1968. Os Y são
silenciosos e contundentes, parecem saber exatamente o que
querem. Eles não reivindicam: executam a partir de suas
151
decisões, dos blogs e dos SMS. Não polemizam nem pedem
autorização: agem. Enquanto os X enfrentam o mundo
profissional com relativo ceticismo, os Y adotam uma visão mais
esperançosa. Seu alto nível de formação os torna mais
decididos. Sua atitude diante da hierarquia é cortês, mas não
de estrito respeito ou amor/ódio, como a das gerações
anteriores.
A integração dos Y às empresas está sendo
especialmente complicada. Suas expectativas são novas e
eles se consideram “a geração excluída”. Chegaram ao mundo
em clima de mudança, transformação e certo desassossego
político.
Esses jovens, além de ver televisão, começaram a
dar seus primeiros passos com os computadores de seus pais ou
irmãos: a tecnologia nunca vai ser um problema para eles. Cerca
de 91,6% dos que têm entre 16 e 24 anos são usuários da
internet, porcentagem que cai para 63,4% no caso das pessoas
entre 35 e 44 anos. Já se acostumaram ao bombardeio de
imagens, à informação imediata e visual, à realidade em
3D. Não desenvolveram a paciência e a laboriosidade, e sim o
“já” e o “agora”. Não aprenderam a desfrutar um livro, uma vez
que podem obter a mesma informação em minutos, com um
clique. É uma geração de resultados, não de processos.
Outra diferença importante: se as gerações
anteriores se caracterizavam por receber as mensagens, as
modas, a música de modo uniforme, a Y, ao contrário,
destaca-se pela diversidade. Não que a geração Y não tenha
nenhuma tribo ou subgrupo. Ela tem, sim. É a elite urbana,
que, de alguma forma, cristaliza seus valores e estilos de vida:
são os CBP (cosmopolitan business people, ou pessoas de
negócios cosmopolitas). A globalização está criando um
coletivo social transversal, situado em todo o mundo (ou quase
todo), com traços homogêneos, independentemente da
origem cultural, racial ou geográfica.
Características comuns diferenciam essa tribo de
outros coletivos. Entre as mais significativas estão:
 Costumam conhecer vários idiomas.
Concretamente, seu inglês é fluente, mesmo não sendo sua
língua materna.
 Seu nível de educação é alto. Têm pós-graduação
(MBA ou mestrado) ou especialização em alguma instituição de
ensino superior de prestígio.
 São solteiros ou casados com poucos filhos. Às vezes,
o casal também é um CBP. Suas famílias tendem à instabilidade.
 A rede de amizades e conhecidos está
distribuída por todo o mundo ou em região ampla. Raça,
152
nacionalidade e religião são secundárias. Os laços profissionais
ou de gostos pessoais é que contam.
 No mercado de trabalho, possuem experiências
multinacionais.
 Têm gostos variados, em que sobressaem os
esportes, as artes, a leitura e, sobretudo, as viagens.
 O manejo das novas tecnologias é inerente a seu
cotidiano - tanto profissional como pessoal.
 Buscam carreiras brilhantes, altos salários

7.4 ESTRATÉGIAS E PROGRAMAS PARA GERENCIAR A


GERAÇÃO Y

Conselhos para atrair, reter e gerenciar colaboradores y

O que os atrai?
 Seus critérios de decisão entre diferentes ofertas de
emprego são: estabilidade, equilíbrio entre vida
profissional e pessoal e nível salarial adequado.
 Valorizam e representam a diversidade.
 Tendem a pensar no curto prazo. (Lembre-se de
que, como têm amplo acesso à informação, possivelmente têm
várias alternativas a escolher).
O que esperam como remuneração?
Para eles, remuneração está relacionada com
resultados. Geralmente têm expectativas de alta
remuneração, para manter elevado padrão de vida.
O que os reterá?
 Consideram fundamentais a responsabilidade
individual e a liberdade para tomar decisões.
 Crêem mais na co-decisão do que na hierarquia.
 Pedem flexibilidade de tempo e espaço para manter
sua esfera privada.
 Querem que seu estilo de vida e sua forma de
enfocar o trabalho sejam respeitados.
 Não é fácil despertar neles um sentido de fidelidade à
empresa “para a vida toda”.
O que oferecem às empresas?
 Alto nível de formação.
 Iniciativa e criatividade.
 Resultados.

Alguns aspectos para reflexão

A convivência de diversas gerações no mercado


de trabalho, como hoje está acontecendo, implica, de saída, a
153
necessidade de incorporar a inovação, a criatividade e a
flexibilidade nas tarefas próprias da gestão de pessoas.
Se a situação já não fosse complexa em si, uma análise mais
profunda exigiria ter em conta outras variáveis que também
afetam a questão.
As mulheres da geração X, que em grande medida
entraram de forma maciça no mercado de trabalho e de
modo relevante (mas não maciço) ocuparam postos de
direção, fizeram-no sem modelos, na maioria dos casos. Essas
profissionais abriram caminho, mas seguramente tiveram de
pagar um preço alto, dedicando-se menos à família. As
mulheres da geração Y provavelmente vão rechaçar esse
modelo, e agora se fala de conciliação de agendas,
igualdade e flexibilidade. Serão capazes de construir um
novo modelo que concilie vida profissional e pessoal?
E as grandes perguntas: que traços marcarão os
integrantes da geração seguinte? O que vão aprender a partir da
variedade de modelos, atitudes e comportamentos que
compõem o meio sociocultural em que estão crescendo? Como a
geração Y vai reagir se a – vamos chamá-la assim – geração Z
desbancá-la antes do tempo, como ela fez com a geração X?
Pirâmide da Motivação Geração Y
1. SIGNIFICADO
2. RESPONSABILIDADE
3. O AMBIENTE DE TRABALHO
4. ENVOLVIMENTO NO TRABALHO
5. O SIGNIFICADO DA REMUNERAÇÃO
6. ACOMPANHAMENTO E RECONHECIMENTO
7. RELAÇÃO COM NORMAS, REGRAS E SUBORDINAÇÃO FUNCIONAL

1. Significado
 Tudo tem um porquê; dá sentido para tudo o que faz;
 Pouco treino com processos cognitivos. Não são
leitores de obras literárias mais densas;
 Não são adeptos da instrução formal.
Empresas e Gestores:
 Liderança deverá dar direcionamento, clareza de
objetivos;
 Liderança deve ajudá-los a serem daqui a 10 anos
homens mais plenos, complexos, profundos e maduros. Muitas
empresas estão instituindo o papel de mentores/tutores;
 Invista em desenvolvimento e capacitação. Mas se
esforce para que os conhecimentos adquiridos sejam aplicados;
 Crie comunidades de aprendizagem, blogs internos de
liderança, programas via satélite, videoconferência, Podcasts,
etc;
 Edutainment (educação com entretenimento);
154
 Utilize o trabalho em equipe e tecnologia (wikipédia,
google, publicações on line, multitarefas, ipods.

2. Responsabilidade
 Responsável com aquilo que lhe é atribuído;
 A empresa não é o único foco dele, responsabiliza-se
por tudo que tem significado para ele.
Empresas e Gestores:
 Ofereça horário flexível, oportunidade de trabalhar em
casa;
 Reveja políticas de concessão de férias e licenças por
períodos prolongados;
 A Xerox já está usando um slogan “auto-expressão”
para descrever o perfil dos candidatos que busca. E são
incentivados a proporem mudanças e novas soluções;
 Invista em programas de voluntariado.

3. O ambiente de trabalho
 Alegre, descontraído, espírito leve;
 Não importa com hierarquia;
 O sobrenome corporativo não exerce fascínio sobre
eles;
 Trabalhar com pessoas com as quais se identificam;
 Aparência informal.
Empresas e Gestores:
 Diversão, humor e até uma pitada de tolice;
 Irreverência tornará o ambiente mais atrativo;
 Forneça várias oportunidades às equipes;
 Algumas empresas já estão contratando grupos de
amigos;
 Seja criativo para celebrar, happy-hour,
confraternizações;
 Não descuide da comunicação.

4. Envolvimento no trabalho
 Não tem paciência para coisas longas e demoradas;
 Quer tentar coisas novas; “Respeite as nossas ideias”;
 Necessidade de arriscar-se;
 Não tem problemas em falhar, em recomeçar,
aprender com os erros;
 Fiel a seus projetos e não à empresa.
Empresas e Gestores
 Empresas estão indo antes às universidades;
 Estimulem-os a resolver problemas complexos;
 Quebrem os planos e programas das empresas em
projetos;
155
 Dê direcionamento e acompanhe;
 Coloquem-os em mais de um projeto;
 Liberdade para EXPERIMENTAR;
 Utilize o erro como processo de aprendizagem;
 Nos programas de estágios e trainees diversifique
ainda mais as áreas para que eles sejam mais expostos e
tenham mais desafios;
 Projetos fora do país de origem “chance de conhecer
outros países”.

5. O significado da remuneração
 Gratificação instantânea: não lida bem com promessas
futuras;
 Gosta de “ganhar” premiações, viagens, promoções;
 Preocupa-se com benefícios e Previdência Privada;
 Recompensa x competência;
 Ele não está disposto a esperar muito tempo para
uma promoção: planejamento de carreira mais transparente.
Empresas e gestores
 Reveja políticas de bônus anuais e semestrais;
 Una aprendizado com fazer dinheiro;
 Implemente programas de incentivos mensais com
prêmios, viagens, etc.;
 Na Microsoft os funcionários agora revisam metas de
carreira duas vezes ao ano com o superior imediato;
 A GE passou a oferecer progressão salarial aos
participantes de seu programa de trainee;
 Pense num cardápio de benefícios e deixem que façam
opções.

6. Acompanhamento e reconhecimento
 Demanda muito feedback;
 Gosta de autonomia;
 Movido a elogios; Adora ser reconhecido;
 Ambicioso.
Empresas e Gestores:
 Implante cultura do feedback imediato e avaliação 360
on-line;
 Não avalie aparência e gostos pessoais;
 Invista tempo em reconhecimento;
 Liderança forte que seja exemplo, propõe metas,
apoie, inspire, acompanhe e avalie continuamente;
 Proporcione reconhecimento e não necessariamente
um cargo;
 O salário é importante, mas o reconhecimento é vital
para permanência deles.
156
7. Relação com normas, regras e subordinação funcional
 Insubordinados;
 Ele se subordina a vínculos e não a cargos;
 Não se adapta a regras muito rígidas;
 Critério de julgamento é a consciência e não a
obediência;
 Informal; questionador; independente;
 Respeita e gosta de ser respeitado;
 Abordam com informalidade até o presidente da
empresa.
Empresas e Gestores:
 Não o engesse com normas e regras “bobas”,
principalmente com aquelas rígidas e exageradamente formais;
 Sentirá melhor em ambientes mais informais;
 Algumas empresas estão treinando lideranças para
lidarem com eles;
 Sejam flexíveis, adote procedimentos mais informais
com relação à aparência;
 Sem perder a essência, revisite práticas e
comportamentos.

Marca geração Y

Insubordinados; Impacientes; Imediatistas; Infiéis;


Flexíveis; Inovadores; Inteligentes; Autoconfiantes; Aceitam bem
diversidade e mudanças.

Dez características da Geração Y

A Geração Y são os jovens nascidos nas décadas de


1980 e início de 90. Esta época foi representada por inovações
tecnológicas e quebra de tradicionais paradigmas familiares.
Isso acabou por moldar as seguintes características.
01 - “Tecnocriação”: Desde jovens foram expostos à
tecnologia. Brinquedos, eletrodomésticos, celulares, etc… fizeram
e ainda fazem parte de suas vidas e, portanto, são completamente
familiarizados com estes aparelhos.
02 - Sem Manual de Instruções: Tendem a dispensar o
uso de manuais de instruções, ou utilizá-los em segundo caso. Os
“apertadores de botão” dessa época costumam aprender o
manuseio e funções das coisas com a boa e velha técnica da
tentativa e erro, o mesmo é aplicado para descobertas e
aprendizados.
03 - Tudo para Ontem: A necessidade de que tudo
aconteça no menor espaço de tempo possível é uma das
157
características mais visíveis, principalmente, pelos nascidos
anteriormente a esta época (Geração X). A impaciência acaba, em
muitas vezes, até mesmo prejudicando a Geração Y, sendo
discriminada por outras gerações. Um estudo da consultoria
americana Rainmaker Thinking revelou que 56% dos profissionais
da Geração Y querem ser promovidos em um ano. Por tal, hoje
em dia a expectativa de permanência destes inquietos em uma
empresa é de um a quatro anos.
04 – Idioma: Falam fluentemente a linguagem digital e,
na falta de palavras para se expressarem, termos novos são
criados como os verbos inexistentes Twittar, Googlar, Taguear,
Bugar, entre outros. Sendo também, os criadores do “Internetês”.
05 - O que Comem: Normalmente, preferem comidas
rápidas e fáceis de serem preparadas e consumidas, porém, isso
não quer dizer que não estejam atentos à saúde ou cientes de que
estão prejudicando-a.
06 - Hierarquia Horizontal: Insubordinação é uma
palavra forte e errônea a ser dedicada à Geração Y, mas
infelizmente, é comumente utilizada para denominar as tentativas
desses indivíduos de conquistar espaço e respeito perante uma
organização, seja ela familiar ou corporativa. A necessidade de
participar e se sentirem parte de um sistema, fazem com que eles
se imponham e reivindiquem suas posições.
07 - Qualidade de Vida: Talvez uma das
particularidades mais admiráveis da Geração Y perante as
anteriores Baby-Boomer e Geração X, seja a contínua busca por
uma vida prazerosa e agradável. A vida profissional e particular
está cada vez mais homogênea, impulsionadas e exercidas pela
expectativa da auto realização. A pesquisa da Fundação Instituto
de Administração (FIA/USP) realizada com cerca de 200 jovens de
São Paulo, revelou que “99% dos nascidos entre 1980 e 1993 só se
mantêm envolvidos em atividades que gostam, e 96% acreditam
que o objetivo do trabalho é a realização pessoal”.
08 - Devoradores de Informação: Também conhecidos
como a “Geração Multitarefas”, são perfeitamente capazes de
assimilar e consumir diversos tipos de informações
simultaneamente. É fácil de encontrá-los ouvindo músicas,
conversando em um messenger, conferindo seus e-mails,
interagindo com seus perfis nas redes sociais e ainda fazendo um
relatório para o trabalho, tudo ao mesmo tempo.
09 – Ego: São normalmente confiantes, gostam de ser
desafiados e não se mantém realizando atividades que lhes
pareçam “sem sentido”, por muito tempo. O respeito desta
geração somente pode ser adquirido por meio de conquista e
nunca por imposição, sendo assim, não respeitam autoridades e

158
superiores simplesmente por seus títulos, mas sim por admiração
e simpatia.
10 – Voláteis: Profissionalmente, a Geração Y é
conhecida por não possuir fidelidade com marcas,
produtos/serviços e mesmo suas corporações. Ao se sentirem
desconfortáveis, desvalorizados, desmotivados, ou simplesmente
terem uma oportunidade mais atraente em vista, saem em busca
de novas experiências, sem maiores dificuldades.

Geração Y chega ao mercado de trabalho

Trabalhar com jovens é um desafio constante. Cada geração é


fruto da educação que recebeu de seus pais e também da
interação com o ambiente e a sociedade.
Por Alexandra Periscinoto, www.administradores.com.br

Trabalhar com jovens é um desafio constante. Cada


geração é fruto da educação que recebeu de seus pais e
também da interação com o ambiente e a sociedade. Nos
últimos anos, o mundo vem passando por diversas revoluções,
que alteraram profundamente o comportamento das pessoas. O
surgimento da internet e a revolução digital, por exemplo,
trouxeram avanços sem precedentes. No mundo do trabalho,
isso traz um desafio interessante: começam a chegar ao
mercado os jovens que cresceram regidos pelos bits e bytes do
mundo digital. Chamados de geração Y, esses jovens têm menos
de 30 anos e possuem características muito próprias - e o
choque cultural acontece quando passam a ser comandados
pelo pessoal de outras gerações.
Mais do que evitar conflitos, ter uma política de
recursos humanos que entenda a geração Y pode trazer um
excelente ganho de produtividade. Moldados pelo imediatismo
da internet, a geração Y necessita de estímulos para desafiá-la a
oferecer o que tem de melhor: a ousadia, a criatividade, a
facilidade para realizar tarefas múltiplas e o espírito
questionador. Algumas dessas características, inerentes no
espírito dos jovens, foram levadas ao paroxismo pelo mundo
contemporâneo. De um lado, seus pais, libertários da década de
60, que viveram a utopia do "é proibido proibir", estimularam ao
máximo o espírito contestador dos jovens. O acesso fácil às
informações, trazido pela internet, temperou o caldo de cultura.
O resultado é que, para extrair ao máximo as potencialidades
dessa talentosa geração, é necessário abrir-se ao diálogo. Fazê-
los entender é muito mais producente do que simplesmente
mandar. Para essa geração, a hierarquia não é um argumento-
fim. Sem contar a falta de formalidade desses jovens, cuja
159
educação sempre privilegiou a individualidade - e suas
manifestações.
Outra característica marcante dos jovens da geração Y
é a capacidade de realizar diversas tarefas ao mesmo tempo.
Não surpreende mais encontrar um deles falando ao celular,
digitando no MSN e assistindo tevê, enquanto come um
sanduíche. Ao mesmo tempo em que isso comprova as
habilidades multifacetadas necessárias para conseguir equilibrar
diversas atividades, muitas vezes esse aspecto também vem
junto com a dificuldade de esperar a concretização de um
projeto de longo prazo. A tendência a dispersar a concentração
não é algo incomum. Para fugir dessa armadilha e buscar a
maior produtividade da geração Y, uma das alternativas é, por
exemplo, dividir um projeto mais longo em etapas mais curtas,
com metas e prazos predeterminados, cujos resultados podem
ser obtidos com maior rapidez.
Com características tão peculiares, principalmente para
a geração anterior - que teve de se adaptar, à marra, às
modernidades tecnológicas, e para quem o mundo digital não é
o habitat natural, é compreensível que surjam dificuldades na
comunicação entre eles. No call center, por exemplo, que é
provavelmente o setor da economia que mais emprega jovens,
esse desafio é permanente. Mas, também, muito gratificante,
pois essa nova geração induz à renovação e traz um espírito de
inovação às empresas - e ambas as características são a alma
da sobrevivência, no longo prazo, de qualquer negócio. As
empresas precisam rever seus treinamentos e sistemas de
mensuração de resultados, para melhor refletir o mundo
contemporâneo e os jovens que ajudarão a construir o futuro.
*Alexandra Periscinoto é presidente da empresa de call center
SPCOM, que tem mais de 4 mil funcionários - a imensa maioria
com menos de 30 anos.

Geração Y vai dominar força de trabalho


Por Roberta Prescott - 05/06/2008

Em entrevista, Don Tapscott adianta as dificuldades


que as empresas vão enfrentar para conciliar suas necessidades
com as dos jovens
Dinâmica e imersa em tecnologia, a nova geração de
profissionais, chamada geração Y, representa um desafio para a
TI das empresas. Atender aos anseios destes jovens sem
comprometer a segurança e as políticas das companhias é um
problema que cabe aos CIOs solucionar.
Em entrevista exclusiva à InformationWeek Brasil e
IT Web, Don Tapscott, diretor da New Paradigm e co-autor de
160
Wikinomics e de outros dez livros, desenha como estes jovens
mudam o ambiente de trabalho das companhias.
InformationWeek Brasil - Como você define a
geração Y (ou net)?
Don Tapscott - Nascidos entre 1977 e 1997, a geração
net é a primeira leva de jovens totalmente imersa na
interatividade, hiperestimulação e ambiente digital.
Globalmente, eles representam um quarto da população do
mundo e daqui a pouco vão dominar a força de trabalho,
consumo e política.
IWB - Como estes jovens vão mudar a maneira
que as companhias trabalham?
Tapscott - Eles têm a expectativa de um ambiente de
trabalho inovador, com flexibilidade de horário, mobilidade e um
processo de tomada de decisão muito ágil. Eles ficarão
frustrados se encontrarem um ambiente de controles rígidos e
que os digam como é melhor que eles façam o trabalho deles. O
velho modelo de "recrutar, gerenciar e manter" os empregados
não funciona mais.
IWB - Qual é o impacto da entrada desta geração
para a TI das companhias?
Tapscott - Muito grande. Esta geração nasceu em bits
e está completamente confortável com tecnologia. Eles querem
o estado da arte da tecnologia e de ferramentas de colaboração,
tais como wikis e mensagens instantâneas, que os ajudam para
trabalhar. Quando convém, eles anseiam por trabalhar desde
outras localidades, em casa, por exemplo, e esperam que as
tecnologias estejam disponíveis nestas localizações remotas.
IWB - Qual tipo de novos valores a geração Y traz
para as companhias?
Tapscott - Os jovens pensam e se relacionam de forma
diferente, e estão dispostos a trabalhar em um ambiente de
constantes mudanças. Ainda que os integrantes da geração net
sejam confidentes, criativos, independentes e tenham mente
aberta, eles tendem a ser um grande desafio para gerenciar.
Eles demandam novas oportunidades para aprender e
responsabilidade, querem feedbacks instantâneos, primam por
balancear a vida profissional e pessoal e anseiam por
relacionamentos fortes no ambiente de trabalho. Por isto, as
companhias precisam alterar sua cultura de gestão destes
jovens, sem, no entanto, perder o respeito com as necessidades
dos outros funcionários. Se cultivado propriamente, esta
geração traz vantagens para organização no que se refere à
inovação e competitividade.
IWB - Nos Estados Unidos já é nítido o impacto
desta geração nas companhias?
161
Tapscott - Sim, os representantes mais velhos da
geração net estão agora com uns 31 anos de idade e já
impactaram bastante em como as companhias operam. O CEO
da Deloitte me disse que a leva atual de jovens recrutados são
os mais produtivos da história da organização. As empresas que
não saciarem as necessidades desta geração verão seus novos
empregados se frustrarem e saírem.

162
TEMA 8 - ECOLOGIA E BIODIVERSIDADE

8.1 NATUREZA E SOCIEDADE COMO ESPAÇO DE CIDADANIA


8.2 O MOVIMENTO ECOLÓGICO E POLÍTICAS PÚBLICAS
8.3 DESENVOLVIMENTO, SUSTENTABILIDADE SOCIAL E
AMBIENTAL
84 CATÁSTROFES AMBIENTAIS E SOCIEDADE

8.1 NATUREZA E SOCIEDADE COMO ESPAÇO DE


CIDADANIA
Por Maurício Waldman

Apenas recentemente a cidadania ambiental ingressou


no temário de interesse de grupos, povos e classes sociais. Sua
proeminência junto ao cenário social é tão recente quanto a
própria questão ambiental, que passou a reclamar as atenções
da sociedade global apenas nas últimas décadas do século XX,
arrastando neste movimento uma série de questões com ela
relacionadas.
Originalmente restrita ao movimento ambientalista, a
questão ambiental está hoje em dia pautada como tema
obrigatório nos mais diversos segmentos de opinião. Esta
assertiva evidencia-se pelo próprio fato de o meio ambiente
marcar presença na agenda dos chefes de Estado, organizações
não governamentais (ONGs), populações tradicionais, grupos
rurais e urbanos, sindicatos, empresas, associações
comunitárias e administrações públicas.
O motivo principal de a luta pela preservação da
natureza ter conquistado tamanha magnitude é a crise
socioambiental sem precedentes que atinge o planeta. Ressalve-
se que, nessa assertiva, pouco há de drástico.
Indiscutivelmente, a crise ambiental da modernidade inscreve-
se juntamente com o elenco de questões fundamentais a serem
enfrentadas pelo conjunto da humanidade.
Esta crise é de tal ordem que poucos colocam em
dúvida que a biosfera esteja integralmente ameaçada.
Considera a australiana Lorrairie Elliott, especialista em Ciências
Políticas na área ambiental: caso algo não seja feito nos
próximos anos, corre-se o risco real de presenciarmos uma
espécie de "ponto de não-retorno ambiental", pelo que a
estarrecedora situação que hoje conhecemos seria apenas o
preâmbulo de desastres iminentes ainda mais aterradores.
Ao contrário do passado, quando as crises ambientais
eram geralmente sucedidas pela revitalização do entorno
natural circundante, a crise atual não sugere nenhuma
recuperação posterior ao esgotamento dos ciclos biológicos dos
163
ecossistemas. Em outras palavras, coloca-se como fato objetivo
a possibilidade da extinção total da vida no planeta Terra.
A realidade contemporânea pressupõe, pois, redobrada
atenção relativamente ao entendimento da questão ambiental
em toda sua complexidade. Diante da magnitude dos problemas
ecológicos, a rediscussão minuciosa dos paradigmas que têm
orientado a humanidade nos últimos séculos impõe-se de modo
indiscutível. É com base nessa conjuntura que podemos melhor
compreender uma noção como a de cidadania ambiental. A
noção de cidadania ambiental é indissociável de uma
contextualização social e cultural, em qualquer plano,
perspectiva ou sistema de relações.
Neste sentido, recordemos primeiramente que a noção
de cidadania é, em geral, avaliada na ótica do cidadão no
tocante às possibilidades e potencialidades que este pode ou
poderia desfrutar no seu relacionamento com o Estado e com a
sociedade no seu sentido mais amplo. A cidadania associar-se-ia
a um modo de vida visceralmente regrado pela existência em
comunidade, evidente na própria origem da palavra, decorrente
do latim civitas, isto é, cidade.
Ora, um dado básico para discutirmos as implicações de
uma cidadania ambiental é que o meio ambiente se configura
como um direito difuso, isto é, não dispõe de um corpo
específico. O objeto do interesse difuso, nas palavras do jurista
Paulo Affonso Leme Machado, "é sempre um bem coletivo,
insuscetível de divisão, a satisfação de um interessado implica
necessariamente a satisfação de todos".
Desta máxima, pode-se concluir que estamos diante de
um enfoque bem mais complexo do que os colocados pelos
demais movimentos sociais. Assim, se a questão feminista
confunde-se com um corpo mulher; a questão do negro, com
aqueles definidos como pertencentes à raça negra; e outras
tantas temáticas confundem-se com corpos específicos; a
questão ambiental confunde-se com todos esses corpos
simultaneamente e ao mesmo tempo, e aponta para a
superação de todos esses corpos isoladamente.
Isto posto, a noção de cidadania ambiental, ao
universalizar direitos específicos e especificar direitos
universais, sugere uma ampliação radical da noção mais
costumeira de cidadania tal como esta tem frequentado
discursos e mobilizações sociais. Retomando uma dita que, em
dado contexto, estaria restrita ao movimento ecologista e hoje
traduz uma demanda da sociedade humana mundial, "o
ambientalismo referenda-se numa perspectiva que esposa
bandeiras abrangentemente globais".

164
É em função desses arrazoados que a nocão de
cidadania ambiental solicita novos paradigmas, indispensáveis
para uma releitura do mundo. Ressalve-se que muitos dos
problemas ambientais do mundo atual originaram-se da forma
como a representação da natureza terminou construída no
imaginário social do mundo europeu a partir da Idade Moderna.
Assim sendo, a revisão do entendimento tradicional da relação
homem-natureza coloca-se como uma prioridade para a
construção da noção de cidadania ambiental.
Vários dos aspectos pertinentes ao imaginário
ambiental da modernidade seriam passíveis de uma leitura
crítica, sendo a reavaliação dessas nuanças essencial para a
requalificação da relação historicamente estabelecida com o
meio ambiente. E, naturalmente, essa preocupação também
está colocada quando o foco das nossas atenções é a questão
da cidadania ambiental no Brasil, país que, ao lado de um
portentoso patrimônio natural, exibe índices alarmantes de
depredação da natureza.

Construindo a cidadania ambiental

Uma vez realizado o diagnóstico, reservemos algumas


palavras para as potencialidades incorporadas pelo
desenvolvimento de uma cidadania com recorte ambiental no
nosso país, que, ao contrário do que é dito por muitos, tem
registrado avanços notáveis nas últimas décadas.
Um decisivo passo para a difusão do ambientalismo foi
seu transbordamento para outros movimentos sociais que
perceberam nas reivindicações ambientalistas um vínculo
orgânico com as causas que advogavam. O histórico das lutas
ambientais desenvolvidas no território brasileiro a partir dos
anos 1980 foi decisivo, em muitos cenários, para conquistas
sociais reais, redundando na reapropriação do ambiente de vida
de muitas das populações tradicionais.
Este seria o caso dos vastos seringais da Amazônia
transformados, em razão de resistência popular, em Reservas
Extrativistas legalmente reconhecidas como de usufruto
exclusivo das populações locais. A luta das nações indígenas
pela demarcação das suas terras, a das populações caiçaras no
referente a direitos de pesca, a dos ribeirinhos pela manutenção
dos vitais ciclos hidrológicos dos rios são outros eventos
marcantes de uma vasta relação de conquistas obtidas pelas
populações tradicionais, motivo de justificado orgulho para o
conjunto do povo brasileiro.
Um pouco mais tarde, diversos outros segmentos da
sociedade brasileira igualmente incorporaram a bandeira
165
ambientalista. Particularmente os sindicatos urbanos passaram
a somar positivamente na direção do apelo ecológico,
incorporando o meio ambiente na pauta de suas preocupações.
Paralelamente às reivindicações salariais, o movimento sindical
incluiu na sua agenda de negociações a preocupação com a
qualidade ambiental nos ambientes de trabalho, ultrapassando
o patamar meramente economicista que caracterizara por
décadas sua atuação.
A preocupação com a questão ecológica, centrada num
primeiro momento no chamado "mundo do trabalho", expandiu-
se, contribuindo para alicerçar a visão de que apenas com
mudanças estruturais será possível reequilibrar o ambiente de
vida para o conjunto da sociedade. Um mundo melhor não será
alcançado apenas com maiores ganhos salariais, mas
principalmente com maior qualidade de vida.
Outro aspecto importante foi à difusão do conceito de
"responsabilidade ambiental", inseparável da noção congênere,
que é a própria cidadania ambiental. Conforme afiançamos, o
meio ambiente diz respeito a um bem coletivo, não podendo, a
qualquer pretexto, desvincular-se desse paradigma. Desta
forma, nada mais coerente do que uma visão abrangente de
cidadania, configurada em responsabilidades compartilhadas
difundidas nos mais diversos recortes sociais, políticos e
econômicos.
Nesta concepção participativa, podemos identificar três
esferas de atuação conjunta que são indispensáveis para
qualquer ação efetiva de conservação da natureza e de
objetivação da cidadania ambiental. A primeira refere-se à
administração pública, exercida em três diferentes níveis - o
federal, o estadual e o municipal. A segunda corresponde à
sociedade, que conta com uma grande diversidade de
interlocutores. Na esfera da sociedade, temos a atuação das
escolas, das comunidades de bairro, das igrejas, dos sindicatos,
dos movimentos urbanos e rurais, das universidades, assim
como das empresas, que podem ser de capital privado e ter
uma estratégia de atuação de interesse público, nesta incluindo
as preocupações ambientais. A terceira esfera materializa-se em
âmbito individual, com o cidadão atuando no espaço da sua
casa, do seu bairro, do seu local de emprego e assim por diante.
Salientemos que, por princípio, responsabilidade
compartilhada ou é deste modo objetivada - ou seja, torna-se
concreta pela criação de parcerias sociais entre esses três
níveis, que interagem e, por sinergia, atuam conjuntamente
para a resolução dos problemas ambientais -, ou então
simplesmente ela não existe. Não adianta apenas uma dessas
esferas agir isoladamente, pois é preciso articular ao máximo,
166
por meio de uma atuação conjunta e coordenada, estes três
níveis nas intervenções em prol da conservação da natureza de
modo a objetivar uma gestão ambiental eficiente.
O grande problema gerado pelo insucesso das
iniciativas preocupadas com os problemas ambientais é que
estas geram prejuízos muito mais amplos do que em qualquer
outra estratégia de atuação, pois, como frisamos, o meio
ambiente diz respeito ao conjunto de cidadãos... Assim sendo,
ao reclamar as atenções de uma sociedade compreendida na
acepção mais generalizada possível, a implantação de medidas
concretas de conservação da natureza termina por reclamar
outras leituras do cenário político-institucional.
Um deles refere-se ao aparelho de Estado. Com relação
ao poder público, é necessário que o Estado disponha de
capacidade de intervenção consiga estabelecer políticas
públicas, estratégias de urbanização e pactos políticos dos mais
diversos. Um aspecto fundamental é que o poder público deve
manter interação constante com a sociedade, o que também
solicita uma sociedade consciente e cidadãos participantes
capacitados a cobrar do Estado as suas atribuições, e, por
conseguinte, reforçá-lo. Isso porque a questão ambiental não se
resolve com um Estado fraco, mas sim reclama um Estado
atuante.
Naturalmente, essa colocação entra em confronto com
muitos dos primados neoliberais que foram prestigiados nos
mais diversos espaços no nosso país ao longo dos últimos anos.
Pois é o momento de se rever esta posição. Na realidade, quem
considerar que um "Estado mínimo" (isto é, fraco) vai resolver a
questão ambiental está fazendo o jogo da degradação
ambiental. Que para as empresas inescrupulosas seja ótimo um
Estado desregulamentado, e que, portanto, fiscalize menos, se
trata de uma evidência óbvia, que dificilmente poderia ser
contestada.
A sociedade é outra alavanca do avanço da cidadania
ambiental e, com certeza, é a esfera que tem brindado o mundo
com uma pródiga e envolvente série de experiências bem-
sucedidas. É o caso das cooperativas de reciclagem que
despontam em condomínios, escolas e associações comunitárias
da periferia; são os sindicatos que agregam às reivindicações
tradicionais itens como qualidade de vida e segurança no
trabalho; este também seria O caso das experiências de
educação ambiental, desenvolvidas com ou sem beneplácito
institucional por professores e estudantes, e muitas vezes de
modo espontâneo.
Quanto ao nível individual, embora uma esfera
essencial, é em muitas ocasiões objeto de interpretação
167
preconceituosa por conta das aferições que observam
exclusivamente no "social" a ferramenta básica na direção das
"transformações maiores". Porém, independentemente deste
parecer, o fato é que o nível individual é da maior importância e
não pode, a qualquer pretexto, ser desmerecido por uma
estratégia ambiental, até porque a cidadania ambiental tem nos
indivíduos seu suporte objetivo. Ademais, parcela ponderável
dos impactos no meio ambiente tem origem na ação e nos
procedimentos rotineiros dos indivíduos.
A noção de cidadania ambiental pressupõe e o
estabelecimento de uma relação mais harmoniosa com a
natureza, Essa postura deve estar presente em toda a extensão
da vida cotidiana, com cada cidadão exercitando sua
responsabilidade ambiental em toda ocasião que estiver
manipulando bens e materiais, buscando a finalidade mais
ecológica possível em cada atitude adotada no seu dia-a-dia e
com consciência do impacto que os mais simples procedimentos
podem provocar no meio natural.
A conjuntura que hoje vivemos sugere que a
humanidade volte a envolver-se com a natureza, em exata
oposição ao que o desenvolvimento propõe. Como salienta o
filósofo José de Ávila Aguiar Coimbra, "a escolha é nossa: formar
uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou
arriscar a nossa destruição e da diversidade da vida.
Portanto, passemos imediatamente e com todo o fervor
possível a nos envolver com a construção da cidadania
ambiental séria, justa e conseqüente, Não só o Brasil agradece,
como a Terra inteirinha também!
REFERÊNCIA: WALDMAN, M. Natureza e sociedade como
espaço de cidadania. In: PINSKY. J.; PINSKY. C. B. (Org.). História
da cidadania. São Paulo: Contexto, 2003. p. 545-561.

8.2 O MOVIMENTO ECOLÓGICO E POLÍTICAS PÚBLICAS

A humanidade, particularmente a sociedade ocidental,


sempre se caracterizou por intensos conflitos intergrupais.
Interesses individuais e/ou segmentados, sobrepondo-se sobre
os interesses de bem-estar coletivo. Sentindo-se prejudicadas
em seus direitos fundamentais e muitas vezes enfraquecidas
como indivíduos e como cidadãs, as pessoas se juntam como
forma de se fortalecerem. A História está repleta de episódios de
confronto em diferentes épocas e lugares. Esses confrontos, no
entanto, têm, no mínimo, um ponto em comum: a união de
esforços para conquista de algo de extensão coletiva que
favoreça também e principalmente o individual.

168
Assim, no século XIX, os trabalhadores europeus se
reuniram em sindicatos contra a miséria e a exploração imposta
pelos industriais. Essas lutas aproximaram-se de seus objetivos
nas primeiras décadas do século XX, quando os trabalhadores
conquistaram significativos direitos trabalhistas: jornada de
trabalho de oito horas, férias de trinta dias, semana de trabalho
de cinco dias, salário-desemprego, aposentadoria por invalidez,
entre outros. Consolidados esses direitos, eles foram
incorporados pelo Estado. Ao tomarem-se política oficial, esses
direitos escaparam do domínio dos trabalhadores. Numa época
em que se acreditava (intelectuais de esquerda e trabalhadores)
que a única forma de promover justiça social era mudando o
modo de produção de capitalista para socialista, há quem diga
que a incorporação dos direitos trabalhistas, pelo Estado,
constitui-se num meio de consolidação do sistema vigente
naqueles países - o capitalista.
Menos oprimida pela miséria e pela exploração do
trabalho, porém sem o controle das conquistas coletivas, a
população européia, em meados da década de 1960, passa
então a reivindicar melhoria de qualidade de vida. Não mais
criticam o modo de produção, mas o modo de vida. A condução
lotada que os leva ao trabalho, o rio poluído que deteriora o
lazer, as ruas sujas que enfeiam a cidade, a assistência médica
e educacional de baixa qualidade, os parques e jardins mal
cuidados, a dificuldade em obter moradias.
Dessa forma, o cotidiano ganha expressão muito
significativa e surgem os movimentos sociais em defesa de
causas pontuadas. Por isso é que os movimentos ecológicos são
tão diversificados: atuam contra extinção de animais, poluição
da água, do solo e do ar, desmatamento, queimadas,
desertificações, extrativismo mineral predatório, uso
indiscriminado de agrotóxicos, etc., etc., etc. Mas esses
movimentos não se limitam apenas às causas diretamente
ligadas às relações do homem com a natureza. Eles atuam em
todos os setores do agir humano. Embora quem lute pelo direito
à terra e por condições econômicas viáveis de produção e
comercialização (como camponeses e ex-camponeses
expropriados), pelo direito à moradia e/ou pelo direito às
diferenças (negros, mulheres, minorias étnicas, homossexuais,
entre outros), não se autodenomine ambientalista, há sempre
uma forma de os simpatizantes das causas ecológicas
identificarem possibilidades de participação, já que defendem,
com a mesma valoração, os princípios da dignidade humana e a
não-agressão ao equilíbrio da natureza. Assim, os movimentos
sociais surgem principalmente para denunciar condições sociais
degradantes, reivindicando direitos mais equitativos.
169
As atrocidades das duas Guerras Mundiais, a disputa
ideológica das duas potências - EUA e ex-URSS - se
materializando em guerras irracionais, corno a do Vietnã, por
exemplo, e as inovações tecnológicas associadas a padrões
culturais consumistas expandidos pelo globo terrestre que
levaram à intensa exploração dos recursos naturais, tornaram-se
a base dos movimentos ecológicos na Europa, espalhando-se
pelos Estados Unidos e Canadá e ganhando adeptos em todo o
mundo.
A primeira síntese mundial dessas ações aconteceu em
Estocolmo. Suécia, em 1972, quando foi realizada a I
Conferencia Internacional sobre o Meio Ambiente, coordenada
pela ONU. Longe de resolver os problemas estruturais, a
iniciativa constituiu-se num importante ponto de divulgação e
num marco para esta temática em todo o mundo. De lá pra cá
vários encontros vêm sendo realizados e, mesmo distante de
soluções plausíveis, têm conseguido aumentar a sensibilização
de populares, governantes e até mesmo de empresários.
Em 1992, no Rio de Janeiro, aconteceu a II Conferência
Internacional sobre Meio Ambiente, promovida pela ONU pautou
questões como:
• Clima da Terra
• Preservação das florestas tropicais
• Biodiversidade
• Criação de um fundo internacional para financiar as
decisões finais da Conferência.
Alguns anos depois, a maior parte dos países ainda não
vivificaram os compromissos assumidos durante o encontro,
porém crescem ações político-sociais em favor do cumprimento
desses compromissos. As mais recente investidas contra a
natureza, provocadas pela intensificação das transações
comerciais entre os países, recoloca, apaixonados em ações
concretas em favor da natureza ecológica e humana.

O estado brasileiro e a questão ambiental

Durante as décadas de 1950, 1960 e 1970, o mundo


viveu uma euforia desmedida em relação ao desenvolvimento
econômico. Havia uma expansão sem precedentes, tanto nos
países desenvolvidos como em vários subdesenvolvidos, da
industrialização, da urbanização e dos mercados. Entretanto,
nesse panorama de crescimento econômico rápido, as
intervenções humanas na natureza ou no meio ambiente,
também se aceleraram. A apropriação, a utilização e o
desperdício de recursos naturais se aprofundaram. O modelo de

170
desenvolvimento econômico adotado escancarava a sua face de
destruição e deterioração ambiental.
Foi nesse cenário que começaram a surgir as primeiras
previsões alarmistas da destruição ambiental. Como
consequência, a ONU realizou, em 1972, a primeira Conferência
das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, na cidade
de Estocolmo, capital da Suécia, seguida de outras, nos anos
seguintes.
Também como resultado do alarme mundial em torno
das questões ambientais foram criadas diversas ONGs
(organizações não-governamentais) voltadas ao estudo e
prevenção dos problemas ecológicos.
Somente a partir de 1981, o Brasil passou a dispor de
um instrumento legal de proteção do meio ambiente. A Lei
6.938/81, estabeleceu a Política Nacional do Meio Ambiente.
Antes desta lei, o Ministério Público estava desarmado para
intervir nas questões ambientais. Faltava-lhe base legal. Com
essa lei a lacuna foi preenchida.
Também em 1981, foi criado o Sistema Nacional de
Meio Ambiente (Sisnama), constituído pelos seguintes órgãos:
Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente – o órgão
superior do sistema, cuja função é assessorar o presidente da
República; é o órgão consultivo e deliberativo do Sistema
Nacional do Meio Ambiente- SISNAMA, foi instituído pela Lei
6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente, regulamentada pelo Decreto 99.274/90."O Conselho
hoje é o espaço democrático que recepciona as diferenças de
opinião e pensamento e que também representa o ideal de luta
pela consolidação da democracia dos últimos 30 anos. É o
espaço legítimo para a mudança do meio ambiente no país!".
(Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira abril/2011). Seman
(Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República,
órgão central do sistema, ao qual estava vinculado o Ibama
(Instituto Brasileiro de Meio Ambiente), criado em 1989.
A Constituição do Brasil de 1988, em seu artigo 225,
coloca a questão ambiental na forma que se segue: “Todos têm
direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
O Ministério do Meio Ambiente (MMM) MMA), criado
em novembro de 1992, tem como missão promover a adoção de
princípios e estratégias para o conhecimento, a proteção e a
recuperação do meio ambiente, o uso sustentável dos recursos
naturais, a valorização dos serviços ambientais e a inserção do
desenvolvimento sustentável na formulação e na
171
implementação de políticas públicas, de forma transversal e
compartilhada, participativa e democrática, em todos os níveis e
instâncias de governo e sociedade.
A Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe
sobre a organização da Presidência da República e dos
ministérios, constituiu como área de competência do Ministério
do Meio Ambiente os seguintes assuntos:
I- política nacional do meio ambiente e dos recursos
hídricos;
II - política de preservação, conservação e utilização
sustentável de ecossistemas, e biodiversidade e florestas;
III - proposição de estratégias, mecanismos e
instrumentos econômicos e sociais para a melhoria da qualidade
ambiental e o uso sustentável dos recursos naturais;
IV - políticas para a integração do meio ambiente e
produção;
V - políticas e programas ambientais para a Amazônia
Legal; e
VI - zoneamento ecológico-econômico.
Fonte: Ministério do Meio Ambiente (MMM)

As conferências em defesa do meio ambiente

Estocolmo-72: a tomada de consciência

Os impactos ambientais são causados por modelos de


desenvolvimento, tanto o capitalista como o socialista. Todos
esses impactos foram provocados porque a natureza era vista
apenas como fonte de matérias-primas e lucros.
O alerta foi dado no início da década de 1970. Em 1972,
foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre Homem e o
Meio Ambiente, em Estocolmo (Suécia). Nesse encontro,
nasceram as primeiras polêmicas sobre o antagonismo entre
desenvolvimento e meio ambiente. Nesse mesmo ano, uma
entidade formada por importantes empresários, chamada Clube
de Roma, encomendou ao prestigiado Massachusetts Institute of
Technology (MIT), Estados Unidos, um estudo que ficou
conhecido como Desenvolvimento Zero.
Tal estudo alertava o mundo para os problemas
ambientais globais causados pela sociedade urbano-industrial e
propunha o congelamento do crescimento econômico como
única solução para evitar que o aumento dos impactos
ambientais levasse a uma tragédia ecológica mundial.
Obviamente, essa era uma péssima solução para os países
subdesenvolvidos, que mais necessitavam de crescimento

172
econômico para promover as melhorias de qualidade de vida da
população.
A Conferência de Estocolmo-72, como ficou conhecida,
foi marcada pela polêmica entre os defensores do
“desenvolvimento zero”, basicamente representantes dos países
industrializados, e os defensores do “desenvolvimento a
qualquer custo”, representantes dos países não industrializados.
A proposta dos países ricos era congelar as desigualdades
socioeconômicas vigentes no mundo; a dos países pobres,
implementar uma rápida industrialização de alto impacto
ecológico e humano.
Na época, a crise econômica mundial dos anos 1970,
provocada em parte pelo choque do petróleo, colocou questões
econômicas mais urgentes para os governantes do mundo
inteiro se preocuparem. Somente no início dos anos 1980, a
polêmica desenvolvimento x meio ambiente seria retomada.
Em 1983, a Assembleia Geral da ONU indicou então a
primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, para
presidir uma comissão encarregada de estudar o tema. Em
1987, foi publicado pela Comissão Mundial sobre o Meio
Ambiente e o desenvolvimento da ONU um estudo denominado
Nosso futuro comum, mais conhecido como Relatório
Brundtland. Esse estudo, que defendia o desenvolvimento para
todos, buscava um equilíbrio entre as posições antagônicas
surgidas na Estocolmo-72.
Tentando conciliar desenvolvimento e preservação do
meio ambiente, surgiu pela primeira vez a concepção de
desenvolvimento humano sustentável. A ONU elaborou a
seguinte definição: “A razão de ser do desenvolvimento é o
ser humano, que o gera. Por isso, o desenvolvimento
deve ter três atributos básicos: desenvolvimento das
pessoas, aumentando suas oportunidades, capacidades,
potencialidades e direitos de escolha; desenvolvimento
para as pessoas, garantindo que seus resultados sejam
apropriados equitativamente pela população; e
desenvolvimento pelas pessoas, isto é, alargando a
parcela de poder dos indivíduos e comunidades humanas
durante sua participação ativa na definição do processo
de desenvolvimento do qual são sujeitos e beneficiários.
E são duas as qualidades indissociáveis ao
desenvolvimento: ser equitativo e sustentável. Ambas
manifestam-se na forma como se dá sua construção e na
distribuição de seus resultados, entre os membros das
presentes e futuras gerações. Logo, a sustentabilidade
do desenvolvimento é política, social, cultural,
econômica e, não menos importante, ambiental –
173
entendendo-se por ambiente os serviços e recursos
naturais que dão suporte ao processo de
desenvolvimento humano, no presente e no futuro. O
processo de desenvolvimento que atenda estes atributos
e tenha estas qualidades será denominado
Desenvolvimento Humano Sustentável (DHS).

Rio-92: perspectivas para o futuro

A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio


Ambiente e Desenvolvimento, realizada em1992 no Rio de
Janeiro, reuniu chefes de Estado da maioria dos países do
mundo, além de milhares de representantes de organizações
não governamentais (ONGs), numa conferência paralela. Esse
encontro, que na fase preparatória teve como subsídio o
Relatório Brundtland, definiu uma série de resoluções, visando
alterar o atual modelo consumista de desenvolvimento para
outro, ecologicamente mais sustentável.
O objetivo fundamental era tentar minimizar os
impactos ambientais no planeta, garantindo, assim, o futuro das
próximas gerações. Segundo o Relatório da CMMAD da ONU: “O
desenvolvimento sustentável é aquele que atende às
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de
as gerações futuras satisfazerem suas próprias necessidades”.
Para atingir tal fim, foram elaboradas duas convenções (uma
sobre biodiversidade, outra sobre mudanças climáticas),
uma declaração de princípios e um plano de ação.
O plano de ação, mais conhecido como Agenda 21, é
um ambicioso programa para a implantação de um modelo de
desenvolvimento sustentável em todo o mundo durante o século
21. Esse objetivo, entretanto, requer volumosos recursos e
os países desenvolvimentos comprometeram-se a
canalizar 0,7% de seus PIBs. Com o objetivo básico de
fiscalizar a aplicação da Agenda 21, foi criada a Comissão de
Desenvolvimento Sustentável (CDS). O órgão, sediado em Nova
York e vinculado à ONU, agrega 53 países membros, entre os
quais o Brasil. Os países desenvolvidos, contudo, não estão
cumprindo o compromisso, com raras exceções, como os países
nórdicos.
A Convenção sobre Biodiversidade e a Convenção
sobre Mudanças Climáticas têm como agente financiador um
organismo denominado GEF (Global Environment Facility) ou
Fundo para o Meio Ambiente Global. Criado em 1990, o GEF é
dirigido pelo Banco Mundial e recebe apoio técnico e científico
dos Programas das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(Pnud) e para o Meio Ambiente (Pnuma).
174
A Convenção sobre Biodiversidade traçou uma série
de medidas para a preservação da vida no planeta. Em vigor
desde 1993, essa convenção tenta frear a destruição da fauna e
da flora, concentradas principalmente nas florestas tropicais, as
mais ricas em biodiversidade.
A Convenção sobre Mudanças Climáticas, em vigor
desde 1994, estabeleceu várias medidas para diminuir a
emissão de poluentes pelas indústrias, automóveis e outras
fontes poluidoras, com o objetivo de impedir a destruição da
camada de ozônio, o agravamento do efeito estufa, o avanço da
desertificação, etc. Nessa convenção, foi assinado o Protocolo de
Kyoto (Japão), visando à redução da emissão de poluentes na
atmosfera.
Esse Protocolo tem como objetivo firmar acordos e
discussões internacionais para conjuntamente estabelecer
metas de redução na emissão de gases-estufa na atmosfera,
principalmente por parte dos países industrializados, além de
criar formas de desenvolvimento de maneira menos impactante
àqueles países em pleno desenvolvimento.
Diante da efetivação do Protocolo de Kyoto, metas de
redução de gases foram implantadas, algo em torno de 5,2%
entre os anos de 2008 e 2012. O Protocolo de Kyoto foi
implantado de forma efetiva em 1997, na cidade japonesa de
Kyoto, nome que deu origem ao protocolo. Na reunião, oitenta
e quatro países se dispuseram a aderir ao protocolo e o
assinaram, dessa forma, comprometeram-se a implantar
medidas com intuito de diminuir a emissão de gases.
As metas de redução de gases não são homogêneas a
todos os países, colocando níveis diferenciados de redução para
os 38 países que mais emitem gases, o protocolo prevê ainda a
diminuição da emissão de gases dos países que compõe a União
Europeia em 8%, já os Estados Unidos em 7% e Japão em 6%.
Países em franco desenvolvimento como Brasil, México,
Argentina, Índia e, principalmente, China, não receberam metas
de redução, pelo menos momentaneamente.
O Protocolo de Kyoto não apenas discute e implanta
medidas de redução de gases, mas também incentiva e
estabelece medidas com intuito de substituir produtos oriundos
do petróleo por outros que provocam menos impacto. Diante
das metas estabelecidas, o maior emissor de gases do mundo,
Estados Unidos, desligou-se em 2001 do protocolo, alegando
que a redução iria comprometer o desenvolvimento econômico
do país.

8.3 DESENVOLVIMENTO, SUSTENTABILIDADE SOCIAL E


AMBIENTAL
175
A evolução da terra modelou o desenvolvimento das
categorias dos reinos tanto vegetal como animal. Assim, os
organismos mais complexos e mais especializados de todos, as
plantas, os insetos e os vertebrados de sangue quente dominam
hoje a terra. Os referidos em último lugar incluem,
naturalmente, uma população humana em crescimento que, ano
após ano, exerce um maior impacto sobre toda a biosfera.
Embora o homem e seus associados mais próximos
(plantas e animais domésticos, ratos, pulgas e bactérias
patogênicas) apresentem sobre a terra uma distribuição muito
ampla, cada área continental tende a ter a sua própria flora e
fauna.
Entramos recentemente num novo século, mas
também entramos em um novo mundo em que as colisões entre
as nossas necessidades e a capacidade da Terra para as
satisfazer estão a tornar-se acontecimentos diários. Recursos
que se acumularam ao longo de uma quantidade enorme de
tempo geológico estão a ser consumidos apenas no tempo de
uma vida humana.
A natureza tem muitos limites que descobrimos
apenas quando já é demasiado tarde. No nosso mundo
acelerado, apenas descobrimos que os ultrapassamos depois de
o termos feito, restando pouco tempo para ajustes. Sabe-se a
partir de civilizações mais antigas que os indicadores principais
de declínio econômico foram de caráter ambiental, não
econômico. Primeiro foram-se as árvores, depois o solo e,
finalmente, a própria civilização.
O mundo está no que os ecologistas designam por
modo “além dos limites-e-em colapso”. A procura excedeu
inúmeras vezes no passado a produção sustentável dos
sistemas naturais. As florestas estão a ver diminuir a totalidade
de sua área à escala mundial. Os níveis freáticos estão a baixar
em muitos países. As emissões de dióxido de carbono (CO2)
excedem, por toda a parte, a capacidade da sua absorção e
processamento pelo ambiente.
Em 2002, uma equipe de cientistas liderada por
Mathis Wachernagel, que dirige atualmente o Global Footprint
Network, concluiu que as procuras coletivas da humanidade
ultrapassaram por volta de 1980 a capacidade regenerativa da
Terra. O seu estudo, publicado pela U.S. National Academy of
Sciences, estimou que as procuras em 1999 excederam essa
capacidade em 20%. Esta diferença, que cresce cerca de 1% ao
ano, é agora maior. Estamos a satisfazer as procuras atuais
delapidando as riquezas naturais da Terra e criando as
condições para o declínio e colapso.
176
Fazemos parte de um equilíbrio natural cada vez mais
sensível às alterações humanas. O uso inadequado dos recursos
naturais, e a necessidade de adequação da natureza à nós e não
de nós mesmos levou nosso planeta a um estado de
emergência. O que distingue as populações humanas das outras
é o poder que exercemos no ambiente.
Há uma divisão na História entre os séculos XV e XVI,
que é caracterizado pelos descobrimentos, pela reforma e outros
importantes movimentos, porém, foi a partir do século XVIII que
se atinge o ápice revolucionário do cenário político e concentra
ao desenrolar da Revolução Industrial.
No século XX com o desenvolvimento das instituições
sociais modernas e a globalização, criaram para os seres
humanos a oportunidade de desfrutarem de forma mais segura
e gratificante do que qualquer outra época. Porém, com todo
este desenvolvimento econômico, tecnológico e industrial houve
profundas diferenças ressaltadas durante o caminho.
O avanço tecnológico, as comunicações e a
globalização apenas evoluíram um modelo cultural tornando-o
mais atual e moldado às novas necessidades mundiais. Mas é
claro a ruptura ou aceleração para um novo patamar, uma
diferenciação do que já havia sento aplicado a várias décadas.
Como forma de facilitar o acesso a produtos, foi
amplamente difundida a partir da Segunda Guerra Mundial o uso
de produtos descartáveis. Algo tão simples como produtos
embalados, fáceis de manusear e jogar fora, não se imaginou a
situação delicada que estavam criando.
Na atualidade, relações entre embalagens e produtos
são automáticas, se você faz o uso devido do produto, irá jogar
a embalagem no lixo. Em um passado bem próximo existiam
fraldas de pano, toalhas para toalete, vasilhames de vidro para
refrigerantes e cervejas. Objetos que na atualidade foram
facilmente substituídos por fraldas descartáveis, toalhas de
papel, embalagens de plástico ou alumínio para bebidas. O
preço da evolução e da facilidade de comercialização destes
produtos foi alto, cada vez mais é atribuído regiões próximas as
cidades para desfazer destes detritos, algo que a natureza não
conseguirá retomar ao estado inicial na qual foi retirada.
Os produtos utilizados para a composição de
embalagens e descartáveis nem sempre são biodegradáveis (a
maioria não são). As substâncias químicas despejadas
diariamente, toneladas e mais toneladas, em aterros sanitários
ou espaços à céu aberto, são grandes cargas para o meio
antrópico e natural, que não irão se decompor facilmente. Fala-
se muito sobre o reaproveitamento destes “lixos”, porém é

177
insuficiente pela grande quantidade e diversidade de produtos
fabricados.
Nos países em desenvolvimento a exemplo o Brasil
existem diversas usinas de reciclagem e cooperativas de
catadores de lixo, que buscam em seu trabalho o
reaproveitamento de embalagens e metais que são jogados fora
pela maioria da população, sendo selecionados e reaproveitados
para venda às industrias metalúrgicas, celuloses, entre outras.
Apesar de o Brasil ser o grande líder em reciclagem
falha-se muito em dinamizar os processos, de acordo com IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Brasil é
recordista mundial em reciclagem de latas de alumínio (89% em
2003, contra 50% em 1993). A reciclagem de papel subiu de
38,8% em 93 para 43,9% em 2002. Já o indicador Coleta
seletiva de lixo mostra números incipientes no País. Somente 2%
do lixo produzido no país é coletado seletivamente. Apenas 6%
das residências são atendidas por serviços de coleta seletiva,
que existem em apenas 8,2% dos municípios brasileiros.
O potencial de reciclagem é muito maior do que o
praticado. Apenas 2% de todo o lixo reciclável recebe alguma
forma de tratamento pelas Usinas de Reciclagem, o restante irá
para aterros, o que representa uma perda de capital e aumento
exponencial da poluição.
No Brasil, a cada ano são desperdiçados
aproximadamente R$ 4,6 bilhões (quatro bilhões e seiscentos
milhões de reais) porque não se recicla tudo o que poderia, de
acordo com o Compromisso Empresarial para Reciclagem
(Cempre), estes são os números da reciclagem:

Material O Brasil recicla


Vidro 5% das embalagens
Papel/papelão 36%
Plástico/filme (sacolas de
15%
supermercados)
PET (embalagens de refrigerantes) 15%
Óleo 18%
Latas de aço 35%
Pneu 10%
Tabela 1 – Composição do lixo reciclado no Brasil (Cempre)

A reutilização e a reciclagem dos dejetos residenciais e


industriais tornam-se necessária pela escassez de recursos
naturais. O avanço do consumo e crescimento econômico traz a
busca por padrões de vida conhecidos pelo desperdício e pela
facilidade na compra de mercadorias.
178
O grande contraponto da relação com o desperdício é a
renovação dos recursos naturais, que não ocorre evidentemente
na mesma velocidade que se desgasta. O tempo para se formar
um ecossistema é estipulado em décadas, séculos, e para
destruí-los, dias e até mesmo horas. Torna-se um pesadelo
pensar que em nome do desenvolvimento fez com que
degradasse grande parte da biodiversidade terrestre, e assim,
não houve avanço da diversificação natural, e sim retrocesso.
O crescimento do consumo, e a voracidade que se
encontra a destruição de recursos naturais em prol do mesmo,
se deve ao aumento populacional. Cada vez mais pessoas têm
acesso a bens de consumo, que necessitam de recursos para
serem produzidos, é um ciclo constante, que torna a reutilização
e reciclagem pouco eficaz na recuperação e prevenção das
reservas naturais.
Thomas Malthus defendia a tese que enquanto o
crescimento populacional é exponencial, a alimentação depende
de recursos fixos que somente poderá aumentar caso cultivem
mais e novas terras. Em certo ponto este modelo é válido, pois
se considerar que até 1800 a população global era de 1 bilhão
de habitantes, e foi apenas necessário um século para dobrar a
população, e apenas no século XX fez-se notar que esta
quantidade triplicou para 6 bilhões de habitantes, não houve em
nenhum momento aumento de terras, continua-se vivendo no
mesmo planeta. Apesar deste grande aumento populacional os
avanços tecnológicos permitiram aumentar o volume produtivo
em menores espaços, possibilitando assim acesso aos alimentos
mesmo com o crescimento demográfico acelerado.
A preocupação de Malthus com a fome mundial é
coerente, dada a crescente natalidade em países em
desenvolvimento como Índia e China. O aumento da população
nestes países podem a qualquer tempo extrapolar a capacidade
de gerar recursos alimentares. Este crescimento demográfico
apresenta uma sobrecarga não só para o ambiente natural,
como também para o meio físico.

8.4 CATÁSTROFES AMBIENTAIS E SOCIEDADE

Industrialização, urbanização e impactos ambientais:


alguns exemplos (Melhem)

O processo de industrialização moderno, iniciado na


Inglaterra em meados do século XVIII e posteriormente
propagado para outros países, deu início a uma cada vez maior
intervenção humana na natureza que se prolonga até os dias
atuais, através da Segunda Revolução Industrial, em alguns
179
países e da Terceira Revolução Industrial ou Tecnológica, em
outros.
A industrialização, acompanhada da urbanização,
causou grandes impactos ambientais nas cidades em que se
processou com maior intensidade. Convém ressaltar, no
entanto, que eles também foram e são verificados em meios
ambientes afastados das cidades, em decorrência da construção
de grandes empreendimentos de engenharia, como usinas
hidrelétricas, termoelétricas e termonucleares, da exploração
mineral, da construção de ferrovias e rodovias, sempre
motivadas pela própria industrialização (sem considerar os
impactos causados pela agricultura, pecuária, caça e pesca).

A – Indústria e poluição das águas

A poluição das águas realizada pelas indústrias é


causada sobretudo pelos compostos orgânicos e inorgânicos. Os
compostos orgânicos compreendem principalmente os
combustíveis fósseis (petróleo, carvão mineral e gás natural).
Dentre eles, o petróleo tem sido o maior causador da poluição
ambiental.
Os acidentes com os navios petroleiros e a falta de
manutenção de equipamentos de terminais de petróleo e
oleodutos têm causado sérios danos ao meio ambiente. No
Brasil, com alguma frequência, ocorrem vazamentos nos
terminais petrolíferos de Angra dos Reis e em Santos. Despejado
no mar, o petróleo forma uma camada superficial que provoca
diversos danos.
O carvão mineral, usado como fonte de energia
principalmente nas usinas termoelétricas e na indústria
siderúrgica, é o responsável por grandes emissões de CO2
(dióxido de carbono) e de monóxido de carbono, contribuindo
para a ocorrência do efeito estufa, ilhas de calor e chuvas
ácidas.
Os compostos inorgânicos, formados principalmente
pelos metais pesados como o mercúrio (o único metal líquido), o
estanho, o cobre, o cádmio e o chumbo, são utilizados por vários
ramos industriais: papel, petroquímica, refinarias de petróleo,
siderúrgicas, cosméticos, químicas, farmacêuticas e outros. São
emanados durante o processo industrial e muitas vezes são
despejados nos rios, sob a forma de resíduos industriais.
Um exemplo claro de poluição e contaminação por
mercúrio é o do garimpo do ouro, como o que ocorre no Vale do
Rio Tapajós, no Pará. O mercúrio é utilizado para separar o ouro
do cascalho do rio. O ouro aglutina-se com o mercúrio e é então
180
aquecido até que se separe deste. No aquecimento, 55% do
mercúrio evapora-se, sendo respirado pelo garimpeiro. Os
restantes 45% são jogados no rio e se misturam com a matéria
orgânica que serve de alimento para os peixes, que se
contaminam e, por sua vez, acabam contaminando o homem
que os consome.
O mercúrio pode provocar lesões nos rins, no tubo
digestivo e no sistema nervoso central. Os sintomas
apresentados pela pessoa contaminada incluem tontura,
palpitação, dor de cabeça, tumores, insônia, dificuldades no
falar, ouvir e comer.
O chumbo é muito comum no lixo industrial, sendo mais
agressivo no ar do que na água. Pode causar lesões cerebrais,
anemia, diminuição da capacidade intelectual e tremores.

B – Chuva ácida: suas causas, condicionantes humanos e


fisiográficos e alguns impactos ambientais

A Mata Atlântica nas encostas da Serra do Mar


pertencentes a Cubatão está parcialmente destruída. Além do
avanço da população que, por falta de moradia, aí constrói seus
barracos, isso se deve também à chuva ácida, fenômeno
causado sobretudo pelas emissões resultantes da queima de
combustíveis fósseis. O dióxido de enxofre, lançado no ar
atmosférico pelas indústrias e o óxido de nitrogênio, proveniente
de diversos combustíveis fósseis e dos veículos motorizados,
combinam-se com o hidrogênio presente na atmosfera e
transformam-se em ácido sulfúrico e em ácido nítrico. Ocorrendo
a condensação na atmosfera, esses compostos ácidos chegam à
superfície através da precipitação, provocando corrosão e
queima da mata.
Conhecida em Cubatão como “chuva que queima”, a
chuva ácida, ao assolar nesgas da mata, apenas inicia um
processo de destruição ambiental. O solo desnudado (sem a
cobertura vegetal) desliza e provoca avalanchas, que soterram
rios e vales, disso decorrendo inundações e grandes danos à
vida animal e vegetal na terra, nos rios e lagos.
A ocorrência e a intensidade das chuvas ácidas no
Brasil são inferiores às que se observam em outras regiões do
globo, como o leste do Canadá e o nordeste dos Estados Unidos.

C – Efeito estufa, urbanização e o crescente uso dos


veículos automotores

Outro problema sério, causado com a contribuição dos


poluentes industriais é o efeito estufa. Além da poluição
181
atmosférica proveniente das chaminés das indústrias, outros
fatores colaboram para sua ocorrência: as queimadas (de
florestas e cerrados), as termoelétricas e os gases expelidos
pelos veículos automotores, os quais produzem gás carbônico.
Como sabemos, uma estufa é construída com paredes e
teto de vidro, pois, sendo um isolante térmico, este permite a
entrada de raios solares, mas impede que o calor se evada, o
que mantém o ambiente interno aquecido.
A atmosfera terrestre produz efeito semelhante. Parte
do calor emitido para a Terra pelo Sol fica retida na atmosfera,
que não permite que ela se disperse para suas camadas mais
elevadas. Assim, a atmosfera impede que a Terra perca
totalmente o calor que recebe durante todo o dia, caso contrário
as noites seriam muito frias, e funciona, então, como uma ‘capa’
de proteção térmica para a Terra, muito importante para manter
todo o planeta com temperatura equilibrada.
Entretanto, ao longo do tempo tem havido um acúmulo
muito grande de gases na atmosfera terrestre e
consequentemente uma retenção maior de calor, o que tem
preocupado os cientistas e a população mundial, pois a
temperatura da Terra pode aumentar mais.
Quais são as razões e as consequências disso? Os gases
lançados na atmosfera, principalmente o gás carbônico, o
metano, os clorofluorcarbonos e o óxido de nitrogênio, possuem
a propriedade do vidro da estufa. Deixam penetrar a luz e
impedem a saída do calor. Este seria, para os estudiosos, o fator
determinante do aumento da temperatura da atmosfera, o qual
poderá trazer sérias consequências, como a alteração da flora e
da fauna de todo o planeta, o derretimento de grandes massas
de gelo das regiões polares e a consequente elevação do nível
das águas dos oceanos, podendo ocorrer, por exemplo, o
desaparecimento de muitas cidades litorâneas e o bloqueio da
saída dos rios para o oceano, causando grandes inundações,
além de seus desdobramentos (o alagamento de terras
agrícolas, problemas para a navegação e para as hidrelétricas,
etc).
D – Redução da camada de ozônio

Outro problema ambiental de caráter global foi a


gradativa redução da camada de ozônio, que atingiu proporções
preocupantes nas duas últimas décadas, mas passou a ser
controlada a partir de 1996. Esse gás é encontrado numa faixa
de 10 a70 km de altitude, mas sua maior concentração ocorre a
mais ou menos 25 km. Ele tem um papel fundamental na
regulação da vida na Terra, ao filtrar a maior parte dos perigosos
raios ultravioleta emitidos pelo Sol. Sabe-se que esses raios
182
podem causar no homem, entre outros problemas, câncer de
pele e perturbações da visão. Além disso, provocam a
diminuição da velocidade da fotossíntese dos vegetais e são
perigosos para os animais e para o plâncton marinho, à medida
que interferem em seus mecanismos de reprodução.
Já são bastante conhecidos os responsáveis pela
destruição da camada de ozônio: os gases CFCs
(clorofluorocarbonos), usados como fluídos de refrigeração em
geladeiras e aparelhos de ar condicionado, como solventes, nas
embalagens de aerossóis e nas espumas plásticas. Além dos
CFCs, outros produtos químicos foram responsabilizados:
compostos bromados (extintores), tetracloreto de carbono
(extintores e solventes) e clorofórmio de metila (solvente).

TEMA 9 - RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO

9.1 CONFIGURAÇÕES DE GÊNERO NA SOCIEDADE ATUAL


183
9.2 MACHISMO E SEXISMO
9.3 FEMINISMO
9.4 DESIGUALDADE E DISCRIMINAÇÃO DA MULHER NA CULTURA
E NA SOCIEDADE BRASILEIRA

Introdução

A construção ou formação de homens e mulheres é


realizada por meio da educação e socialização, e essa
construção é denominada de gênero. Na sociedade brasileira
essa construção se caracteriza por um tratamento diferenciado
entre homens e mulheres baseada nas diferenças sexuais, na
desigualdade e na subordinação da mulher.
Além da mulher, existem outros grupos de pessoas que
são também discriminados, por não se adequarem ao modelo
patriarcal construído e estabelecido como superior e de poder
em nossa sociedade. Esses grupos são compostos pelos
homossexuais masculino e feminino, transexuais e outros
indivíduos de orientação sexual diversa.
Desse modo, as definições de masculinidade, de
feminilidade e as questões de gênero estão presentes em todas
as nossas relações cotidianas, nas diversas classes sociais e
etnias, pois o gênero é social e histórico.
A desigualdade e a exclusão são percebidas em todos
os espaços da sociedade e nos âmbitos econômico, político,
social e cultural.
À mulher foram atribuídas as denominadas “tarefas
domésticas”, um exemplo da tirania masculina, da divisão
sexista, da dominação, do poder e do seu enquadramento à
esfera do lar. O espaço público e político foi reservado somente
para os homens. Ainda hoje, em diversas áreas profissionais,
percebe-se uma diferenciação salarial entre a mulher e o
homem, ou seja, o salário da mulher é menor que o do homem,
apesar de exercer a mesma função no trabalho.
A discriminação entre os homossexuais masculino e
feminino ou outros considerados diferentes são, também,
práticas cotidianas em nossa sociedade, onde percebe-se a falta
de tolerância e respeito com o outro designado como
“diferente”.
Assim, as relações de gênero abordam as interações
entre as definições do que é o masculino e o feminino e as
funções ou papéis estabelecidos para o homem e a mulher.
O estudo do gênero, portanto, vem contribuir para o
entendimento e reconhecimento da importância das relações
sociais, suas diferenças, variações e mudanças na cultura, na
sociedade, e em nossas próprias relações com o “outro”.
184
E, o mais importante, é que contribua para se buscar
uma sociedade com práticas de relações de gênero
caracterizadas pela alteridade, pelo respeito e pelo direito à
diferença.

Exclusão e Minorias
Fonte: APOSTILA FORMAÇÃO GERAL E ESPECÍFICA-2009. 2 /
Tecnologia em Gestão de Recursos Humanos

O conceito "exclusão começou a ser usado pelas


ciências sociais em meados da década de 80, especialmente
após a crise dos Estados e paradigmas socialistas". A exemplo
de muitos outros conceitos, tais como: "movimento",
"revolução", "massa", etc, este também foi emprestado de
outras ciências. Sua origem vem da lógica da matemática,
especificamente, da teoria dos conjuntos, segundo a qual
"forma-se conjunto com os elementos iguais". Portanto,
pertencer ou não, estar incluído ou excluído depende do
elemento ser igual ou diferente ao conjunto dos elementos
predominantes.
Essa ideia da lógica da matemática, para as ciências
sociais tem sido um achado. O conceito é um instrumento para
explicar de maneira clara, objetiva, precisa e didática o
fenómeno que ocorre no mundo da globalização. A sociedade
determinada, organizada e regida pela lógica do mercado é dc
natureza excludente. Há na sua essência a mesma lógica
inspiradora, "ordenadora" e "fundante" da teoria dos conjuntos.
Como chave hermenêutica, o conceito exclusão nós
permite enterder e explicar um fenômeno extremamente
situado no seio da sociedade contemporânea, o qual, os velhos
conceitos da teoria marxista, tais como: "luta de dasses",
"dominação", "exploração", "oprimidos" ou "empobrecidos", não
conseguiam atingir essa complexidade. Em geral, esses
conceitos tinham uma forte influência de uma concepção
economicista dos conflitos sociais. Por sua vez, o conceito
exclusão nos permite perceber as diversas formas de se excluir
na sociedade. A exclusão não ocorre apenas por motivos
económicos, mas também, por motivos políticos, culturais,
étnicos, religiosos, etários, sexuais, etc. De qualquer maneira,
há no conceito uma forte carga política de denúncia. O conceito
não é neutro, ingénuo ou inofensivo. Ele, entre outras coisas,
denúncia uma situação de conflito e desigualdade. A exclusão é
decorrente de uma lógica perversa que determina as relações
sociais. No conceito está Implícito o outro aquele que faz
exclusão, o vencedor. Os excluídos são seres concretos,
185
historicamente derrotados e humilhados, à margem da vida
social, descartáveis, quase sem perspectivas de vida. São os
pobres, miseráveis, Indigentes, desempregados, doentes,
portadores de deficiências, índios, negros, gays, lésbicas, etc, os
que não tem acesso ao mercado, emprego, previdência,
educação, saúde, terra, moradia e qualquer direito fundamental.
São aqueles aos quais se lhes nega sistematicamente a
ddadanla.
Os excluídos têm na luta pela cidadania não só uma
nova estratégia, mas um novo paradigma. A luta pela cidadania
é a luta pelos direitos iguais. Isso, não só tem inspirado e
mobilizado os excluídos, mas, assim dc tudo, tem nos permitido
refletir sobre os fundamentos de uma nova sociedade baseada
no direito igual entre os diferentes. Partimos do pressuposto de
que as diferenças são naturais e não podem ser eliminadas e
que o direito é uma condição civilizatória. Isto fica claro quando
passamos a entender que a luta das mulheres pelos direitos
iguais, não é uma luta para ser igual aos homens.
A natureza as fez diferentes. Elas não podem, nem
querem ser igual aos homens. Elas querem ter direitos iguais,
para preservar, inclusive, suas diferenças. A mesma coisa
podemos refletir acerca de todos os diferentes: estrangeiros,
índios, negros, pessoas com deficiência, etc. Este paradigma é
radicalmente contrário à lógica da exclusão. Segundo ele, há
uma diferença substancial entre ser e ter. Somos seres
diferentes, mas mesmo na diferença podemos TER direitos
iguais.
Assim a luta dos excluídos pela cidadania é também
uma luta contra todo e qualquer discurso, politica ou estratégia
de inclusão. A luta pela cidadania é a luta pela erradicação de
toda e qualquer forma de exclusão. Ela é uma luta radical,
contrária à lógica e às políticas compensatórias, onde os que
praticam a exclusão, a fim de aliviar as consequências da
mesma, são capazes de crias cotas, para incluir um e outro, mas
não são capazes de pensar nem lutar pela erradicação da
exclusão. Incluir significa admitir que haja exclusão. As políticas
de inclusão pressupõem um direito tutelado. O problema é quem
diz: "Vamos induir" e quem decide sobre que critério, princípios,
abrangências e valores se incluem a quem dentro de quê? Dc tal
maneira que, a luta por uma nova sociedade pressupõe de fato
a erradicação de toda c qualquer forma de exclusão.

9.1 CONFIGURAÇÕES DE GÊNERO NA SOCIEDADE ATUAL

Identidade de gênero

186
Na sociedade, identidade de género se refere ao género
em que a pessoa se identifica (i.e, se ela se identifica como
sendo um homem, uma mulher ou se ela vê a si como fora do
convencional), mas pode também ser usado para referir-se ao
género que certa pessoa atribui ao indivíduo tendo como base o
que tal pessoa reconhece como indicações depapol social de
género (roupas, corte de cabelo, etc). Identidade do género de
base é geralmente formada por três anos de idade e é
extremamente difícil mudar depois disso.1^
Do primeiro uso, acredita-se que a identidade de
género se constitui como fixa e como tal não sofrendo variações,
independente do papel social de género que a pessoa se
apresente.
Do segundo, acredita-se que a identidade de género
possa ser afetada por uma variedade de estruturas sociais,
incluindo etnicidade, trabalho, religião ou irreligião, e família.

Identidade de gênero - além do superficial


Martin Van Maele. 1905

Na vasta maioria dos casos não há qualquer dificuldade


em determinar sexo e género. A grande maioria dos seres
humanos são considerados ou homens ou mulheres. Antes do
século 20 o sexo de uma pessoa era determinado apenas pela
aparência da genitália, mas quando passou-se a entender
cromossomos e genes, estes passaram a ser usados para
determinar o sexo. Normalmente, homens possuem genitália
masculina e, um cromossomo X e um Y; e mulheres possuem
genitália feminina e possuem dois cromossomos X. Entretanto
algumas pessoas se consideram fora destas categorias, e alguns
possuem combinações de cromossomos, hormônios, e genitália
que não seguem as definições típicas de "homem'' e "mulher".
Estudos recentes sugerem que um em cada cem indivíduos
podem ter um sexo atípico.
O caso em que se torna mais fácil de entender a
necessidade de distinguir sexo e oênero é quando a genitália
externa é removida - quando tal caso ocorre por acidente ou por
intento deliberado, a libido e a habilidade de expressar uma
atividade sexual sofrem alterações, mas não por esta razão o
indivíduo deixa de considerar-se como garoto ou homem. Um
caso como este é reportado em Sexo Trocado ("As The Nature
Made Him") de John Colapinto. Este livro detalha a persistência
da identidade de género masculina e a adesão a um papel social
de género masculino de uma pessoa cujo pênis foi totalmente
destruído logo após o nascimento devido a uma circuncisão mal
feita, e que foi então subsequentemente redesignado pela
187
construção de uma genitália feminina. Assim, o termo
"identidade de género" não tem necessariamente relação com o
sexo do individuo através da análise da genitália externa, dos
genes ou dos cromossomos.

Variantes na identidade de gênero

Algumas pessoas sentem que sua identidade de


gênero não corresponde com seu sexo biológico, sendo
identificadas por pessoas transexuais ou pessoas intersexo em
algumas situações. Como a sociedade insiste que os indivíduos
devem seguir a maneira de expressão social (papel social de
gênero) baseada no sexo estas pessoas sofrem uma pressão
social adicional.
Por outro lado existem também indivíduos
transqêneros em que a identidade de gênero não está conforme
a norma social dos dois gêneros macho/fêmea,
idependentemente de terem ou não concordância com o sexo
biológico com a maioria das suas manifestações de género
social.
No caso das pessoas intersexo, alguns indivíduos
podem possuir cromossomos que não correspondem com a
genitália externa. Isso devido desequilíbrios hormonais ou outros
fatores incomuns durante os períodos críticos da gestação. Tais
pessoas podem parecer para as outras como sendo de um
determinado sexo, mas podem reconhecer a si mesmas como
pertencendo a outro sexo.
As razões para variantes da identidade de gênero não
são claras. Isso tem sido causa de muita especulação, mas
nenhuma teoria psicológica foi considerada consistente. Teorias
que assumem uma diferenciação no cérebro são ainda recentes
e difíceis de provar, porque no momento requerem uma análise
destrutiva das estruturas cerebrais inatas, que são bastante
pequenas.
Nas últimas décadas se tornou possível redefinir o
sexo cirurgicamente. Uma pessoa que não tenha concordância
entre a sua identidade de gênero e características biológicas
pode, então, buscar estas formas de intervenção médica para
que seu sexo biológico seja correspondente com a identidade de
gênero. Alternativamente, algumas pessoas mantêm a genitália
com a qual nasceram, mas adotam um papel social de género
que é congruente com a percepção que possuem de sua
identidade de gênero!

Relação entre identidade de gênero e papel social de


género
188
A percepção da diferenças entre os sexos ocorre na
infância,Martin Van Maele. 1905
O termo relacionado, "papel social de género" possui
dois significados que em casos individuais podem ser
divergentes: Primeiro, o papel social de género de uma pessoa
pode ser a totalidade de formas no qual uma pessoa pode
expressar sua identidade de género. Segundo, o papel social de
género das pessoas pode ser definido pelo tipo de atividades
que a sociedade determina como apropriada para indivíduos que
possuam determinado tipo de genitália externa.
Há provavelmente tantas formas e complexidades de
identidades sexuais e identidades de género como há seres
humanos, e há um igual número de formas de trabalhar as
identidades de género na vida diária. As sociedades, entretanto,
tendem a designar alguns tipos de papeis sociais aos indivíduos
"machos", e algumas classes de papeis sociais para indivíduos
"fêmeas" (macho e fêmea na percepção social dos sexos).
Muitas vezes a conexão entre identidade de género e papel
social de género não é clara. Simplificando, há não-ambíguos
"machos" humanos e não-ambígua "fêmeas" humanas que se
sentem claramente como homens ou mulheres mas que não se
comportam socialmente de forma convencionalmente masculina
ou feminina.
E para concluir, como muito têm defendido estudiosos
em biologia e sociologia: "O sexo entre as orelhas é mais
importante que o sexo entre as pernas".

Diferentes visões sobre identidade

Existem diversos fatores que envolve a formação de


identidades, como a diferença entre os diversos tipos de
identidade. A primeira das identidades a considerada primordial
é a identidade de género homem ou mulher, pois queira ou não
as pessoas já rotulam as outras diante disso. Portanto diferentes
tipos de identidade são produto da construção da sociedade e
da história onde mantém se a relação de poder de acordo com o
modelo essencialista. onde a identidade vem da biologia, o que
você é, é resultado da sua genética e a ciência vai de acordo
com esse modelo.
Há também o modelo de construtivismo em que a
identidade é construída, transformada, pois não existem
identidades que não passaram por mudanças ao longo dos anos
e quando isso ocorre ela muda de acordo como é vista e
interpretada pelos outros. Pois as transformações sociais são
tão alarmantes quanto as tecnológicas, politicas e económicas,
189
então as identidades que encontram se em comflito então no
interior dessas transformações.
Hoje em dia os conflitos são mais identitários (religião,
cultura), em vez de ideológicos (comunismo, capitalismo), como
já foi um dia.
Portanto, atualmente existem inúmeras formas de
identidade e essas apesar de serem muitas vezes contraditórias
elas acabam se cruzando e podem até se completarem.

6.2 MACHISMO E SEXISMO

O que é ser mulher? O que é ser homem?


Subsídios para uma discussão das relações de gênero
O que é ser mulher? O que é ser homem? Por
que mulheres e homens vivem em condições de
desigualdade? Por que se diz que algumas coisas são de
mulheres e outras de homens? Por que as mulheres são
consideradas inferiores e vivem situações de injustiça por
serem mulheres?
Conceito de gênero
O conceito de gênero procura explicar as relações
entre mulheres e homens. Ele surgiu após muitos anos de
luta feminista e de formulação de várias tentativas de
explicações teóricas sobre a opressão das mulheres.
O conceito de gênero foi trabalhado inicialmente pela
antropologia e pela psicanálise, situando a construção das
relações de gênero na definição das identidades feminina e
masculina.
Esse conceito coloca claramente o ser mulher e ser
homem como uma construção social, a partir do que é
estabelecido como feminino e masculino e dos papéis
sociais destinados a cada um. Por isto, gênero, um termo
emprestado da gramática, foi a palavra escolhida para
diferenciar a construção social do masculino e feminino do sexo
biológico.
A expressão "gênero" começou a ser utilizada
justamente para marcar que as diferenças entre homens e
mulheres não são apenas de ordem física, biológica. Ou
seja, falar de relações de gênero é falar das características
atribuídas a cada sexo pela sociedade e sua cultura. A
diferença biológica é apenas o ponto de partida para a
construção social do que é ser homem ou ser mulher. Sexo é
atributo biológico, enquanto gênero é uma construção social e
histórica. A noção de gênero, portanto, aponta para a dimensão
das relações sociais do feminino e do masculino.

190
As contribuições do conceito de gênero

1º) Ao afirmar a construção social dos gêneros,


coloca que as identidades e papéis masculino e feminino
não são um fato biológico, vindo da natureza, mas algo
construído historicamente e que, portanto, pode ser
modificado.
2º) As relações de gênero estruturam o conjunto das
relações sociais. Os mundos do trabalho, da política e da
cultura também se organizam conforme a inserção de
mulheres e homens, a partir de seus papéis masculinos e
femininos.
3º) Gênerosupera as antigas dicotomias entre
produção e reprodução, público e privado e mostra como
mulheres e homens estão ao mesmo tempo em todas
essas esferas, só que a partir de seu papel masculino ou
feminino.

Surgimento do conceito de gênero.

O termo gênero começou a ser utilizado por


teóricas e estudiosas de mulheres e do feminismo, no final
da década de 70. Naquele momento, o movimento
feminista ressurgia com força em todo o mundo,
provavelmente por influência da onda revolucionária que
percorrera a Europa, a China, a América Latina e EUA, no final
da década de 60, com os grandes movimentos estudantis e a
contestação dos papéis e comportamentos sexuais.

A construção social da desigualdade de gênero

As pessoas nascem bebês machos e fêmeas e


são criadas e educadas conforme o que a sociedade
define como próprio de homem e de mulher: Os adultos
educam as crianças marcando diferenças bem concretas entre
meninas e meninos. A educação diferenciada dá bola e
caminhãozinho para os meninos e boneca e fogãozinho para
as meninas, exige formas diferentes de vestir.
Educados assim, meninas e meninos adquirem
características e atribuições correspondentes aos considerados
papéis femininos e masculinos. As crianças são levadas a se
identificarem com modelos do que é feminino e masculino para
melhor desempenharem os papéis correspondentes.
Usamos a expressão relações de gênero para deixar
bem claro que as desigualdades entre homens e mulheres
são construídas pela sociedade e não determinadas pela
191
diferença biológica entre os sexos. Elas são uma
construção social, não determinada pelo sexo.
A partir da consolidação do capitalismo, existe a idéia
de que ocorre uma divisão entre as esferas pública e
privada, sendo que a esfera privada é considerada como o
lugar próprio das mulheres, do doméstico, do cuidado. A
esfera pública é considerada como o espaço dos homens, dos
iguais, da liberdade, do direito.
Nessa compreensão, o papel feminino tradicional
estabelece a maternidade como principal atribuição das
mulheres e, com isso também o cuidado da casa e dos
filhos, a tarefa de guardiã do afeto e da moral na família. Ela é
uma pessoa que deve sentir-se realizada em casa. O homem
típico é considerado o provedor, isto é, o que trabalha fora,
traz o sustento da família, realiza-se fora de casa, no
espaço público. Para uma mulher, ainda é considerado mais
adequado ser meiga, atenciosa, maternal, frágil, dengosa, e
do homem, o que ainda se espera, é que tenha força,
iniciativa, objetividade, racionalidade.
Esse modelo de vida, em que os homens trabalham
fora e as mulheres só fazem o trabalho doméstico, nunca
existiu, de verdade, desse jeito. Na realidade, só uma parcela
muito pequena de mulheres vive essa situação.
As mulheres negras, por exemplo, sempre
trabalharam fora de casa, primeiro como escravas e depois
na prestação de serviçosdomésticos ou como vendedoras
ambulantes, circulando por muitos espaços públicos. Para as
mulheres camponesas, o que é chamado de cuidar da casa
esconde o trabalho na roça, a produção de artesanato, o
cultivo da horta e a criação de animais, trabalho que produz
mercadorias, cuja venda contribui para o sustento da família.
Além disso, nas cidades, muitas mulheres vivem sozinhas
com seus filhos e são as principais responsáveis por sua
manutenção. E muitas, muitas outras trabalham fora e dividem
com o marido o sustento da casa.

Divisão sexual do trabalho

As relações de gênero são sustentadas e estruturadas


por uma rígida divisão sexual do trabalho. O papel masculino
idealizado é de responsabilidade pela subsistência econômica
da família e a isso corresponde designar o trabalho do
homem na produção. A atribuição do trabalho doméstico
designa as mulheres para o trabalho na reprodução: ter
filhos, criá-los, cuidar da sobrevivência de todos no cotidiano.

192
O que se observa é que essa divisão entre trabalho
reprodutivo e produtivo não é tão real assim. Há homens
trabalhando no campo da reprodução e há muitas mulheres na
produção.
No entanto, o mito que designa um tipo de trabalho
para cada gênero influencia o real. No caso das mulheres, a
tentativa é sempre de considerar o trabalho realizado fora da
casa como uma extensão do seu papel de mãe. As mulheres
se concentram em atividades consideradas tipicamente
femininas como serviço doméstico, professoras,
enfermeiras, assistentes sociais. Em 1990, 30% das
mulheres que se declararam como trabalhadoras na pesquisa do
IBGE eram empregadas domésticas, costureiras e professoras
primárias.

Desigualdade e pobreza

Como os homens é que são considerados os


provedores da família, o trabalho profissional das
mulheres é sempre visto como complementar às suas
"responsabilidades" domésticas, estas, sim, sua verdadeira
ocupação. A partir dessa idéia, surgem várias conseqüências
negativas para as mulheres. A primeira é a de que os
salários delas podem ser baixos, já que o que elas ganham é
visto como suplementar: Quem não se lembra do Maluf dizer
que o problema das professoras de São Paulo não era o
salário baixo, mas serem mal-casadas?
O resultado disso é uma enorme desigualdade na
distribuição dos recursos e do poder na sociedade, entre
homens e mulheres. Segundo a ONU, as mulheres executam
2/3 do trabalho realizado pela humanidade, recebem 1/3 dos
salários e são proprietárias de 1 % dos bens imóveis. Dos quase
1,3 bilhão de miseráveis do mundo, 70% são mulheres.

Sexualidade

A sexualidade é uma questão bastante complexa.


Podemos dizer que a sociedade tenta impor normas que
refletem o que se considera mais correto de acordo com os
papéis sexuais definidos pela construção dos gêneros. Por isso, o
controle da sexualidade das mulheres, o controle da função
procriativa e a criminalização do aborto fazem parte da
opressão das mulheres. Dessa forma, a vivência da
sexualidade foi desde vários séculos rodeada por tabus e
mitos, que têm como ponto em comum, considerar pecado,
193
desvio, doença, exagero, falta de pudor e até mesmo crime, as
manifestações da sexualidade feminina.
A partir disso, as mulheres em geral têm vivido sua
sexualidade de acordo com os padrões impostos como os
mais corretos, considerando o papel social de esposas
"honestas" e mães dedicadas que lhes é destinado. Outras
vivem como "profanas" e, portanto, indignas de respeito: são
"as piranhas, as usadas, as fáceis, as putas". Uma das formas
de definição desse modelo passou pelo estabelecimento de um
duplo padrão do que é ou não correto em relação à sexualidade.
Para os homens, a ideia da virilidade é sinônimo de
muitas relações sexuais, de preferência com muitas
mulheres diferentes. As mulheres, ao contrário, devem viver a
sexualidade em função da reprodução, negando o prazer. A
repressão à sexualidade feminina em boa parte se dá pelo
desconhecimento do corpo e pela imposição de regras rígidas do
que significa ser uma mulher "honesta".

Violência contra as mulheres

A violência contra as mulheres expressa a


demonstração de poder dos homens e a ideia de que as
mulheres são objeto de posse. É uma forma de reproduzir
e manter o machismo e de dizer o tempo todo que a mulher é
inferior: Esse tipo de violência se manifesta de muitas
maneiras: espancamento, insultos, ameaças, estupros,
assédio, assassinatos, mas também em formas sutis de
desqualificação das mulheres, como quando alguém diz que
uma mulher é boa profissional, "apesar de ser mulher".
Em 2006, a luta contra a violência doméstica ganha a
Lei Maria da Penha. Lei 11.340 decretada pelo Congresso
Nacional e sancionada pelo ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio
Lula da Silva, em 7 de agosto de 2006; dentre as várias
mudanças promovidas pela lei está o aumento no rigor das
punições das agressões contra a mulher quando ocorridas no
âmbito doméstico ou familiar. O caso nº 12.051/OEA, de
Maria da Penha Maia Fernandes, foi o caso homenagem à lei
11.340. Ela foi espancada de forma brutal e violenta
diariamente pelo marido durante seis anos de
casamento. Em 1983, por duas vezes, ele tentou assassiná-
la, tamanho o ciúme doentio que ele sentia. Na primeira
vez, com arma de fogo, deixando-a paraplégica, e na segunda,
por afogamento. Após essa tentativa de homicídio ela tomou
coragem e o denunciou. O marido de Maria da Penha só foi
punido depois de 19 anos de julgamento e ficou apenas

194
dois anos em regime fechado, para revolta de Maria com o
poder público.
Em razão desse fato, o Centro pela Justiça pelo Direito
Internacional e o Comitê Latino-Americano de Defesa dos
Direitos da Mulher (Cladem), juntamente com a vítima,
formalizaram uma denúncia à Comissão Interamericana de
Direitos Humanos da OEA, que é um órgão internacional
responsável pelo arquivamento de comunicações decorrentes de
violação desses acordos internacionais.
Essa lei foi criada com os objetivos de impedir que os
homens assassinem ou batam nas suas esposas, e proteger os
direitos da mulher.

Família
A sociedade estabelece um modelo-padrão de
família, no qual se espera que todas as pessoas se enquadrem.
O modelo considerado ideal de família em nossa sociedade é
chamado mononuclear, ou seja, constituído por um núcleo que
são o pai, a mãe e as filhas ou filhos, de preferência poucos,
melhor ainda se forem um casal.
A família é considerada o lugar de socialização das
crianças, o lugar onde se criam e se educam. Na atualidade
pós-moderna, existe uma profunda crise da família
mononuclear.

A reprodução do machismo

Como mães e professoras, as mulheres muitas vezes


reproduzem o machismo e as ideias dominantes na sociedade,
que pregam a suposta inferioridade das mulheres em
relação aos homens. Não podemos nos esquecer de que as
ideias dominantes na sociedade são dominantes justamente
porque estão na cabeça da maioria dos homens e das mulheres
também. Essas ideias são repetidas à exaustão na família, na
escola, nas igrejas, nos meios de comunicação.

Meios de comunicação

Os meios de comunicação têm se posicionado de


maneira contraditória quanto às mulheres. Por um lado,
abrem espaço para uma maior discussão sobre a condição
feminina, Atualmente os meios têm dado alguma cobertura
para a discussão sobre o aborto. Por outro lado, como a mídia
não defende interesses homogêneos, também trata as
mulheres nas propagandas, nas telenovelas, no
noticiário, de forma a reforçar seu papel tradicional.
195
O tratamento é diferenciado conforme o público que os
meios querem atingir. Os programas mais informativos da
televisão, por exemplo, são apresentados em horários menos
nobres. Nas novelas, que são os programas mais assistidos, as
mulheres são tratadas de forma muito estereotipada,
mesclada com alguns momentos mais críticos. Nos programas
de humor, praticamente não há momentos críticos, só
repetição das ideias dominantes mesmo: mulher interesseira,
loura burra, sogra horrenda.
As revistas femininas, vendidas às centenas de
milhares por mês, permanecem em assuntos estereotipados:
moda, beleza, decoração, culinária, como cuidar dos
filhos e como agarrar, agradar e conservar o seu homem.
São raros os artigos que saem das ideias dominantes. Nas
revistas ditas masculinas, o corpo das mulheres é exposto ao
desfrute, transformando-as de pessoas em objeto sexual.

Gênero e cidadania

Outro aspecto importante relacionado ao gênero é o da


cidadania. Como sabemos, as mulheres foram por muito
tempo excluídas de direitos como, por exemplo, freqüentar a
escola, votar, ter propriedades, trabalhar sem
autorização do marido ou pai. Isso ocorria por uma série de
razões. A estrutura familiar contribuía para barrar a
participação feminina na vida pública porque necessitava das
mulheres na esfera privada, cuidando dos filhos e da casa.
Nas últimas décadas, muita coisa já mudou; no
entanto, embora até o aspecto legal já tenha sido alterado, a
realidade ainda apresenta muitas discriminações ligadas ao
gênero.

9.3 FEMINISMO

Muitas faces do feminismo no Brasil

O conceito de feminismo aqui utilizado parte do


princípio de que o feminismo é a ação política das mulheres.
Engloba teoria, prática, ética e toma as mulheres como
sujeitos históricos da transformação de sua própria
condição social. Propõe que as mulheres partam para
transformar a si mesmas e ao mundo.

As mulheres nos movimentos


196
A presença das mulheres na cena social brasileira nas
últimas décadas tem sido inquestionável. Durante os 21 anos
em que o Brasil esteve sob o regime militar, as mulheres
estiveram à frente nos movimentos populares de oposição,
criando suas formas próprias de organização, lutando por
direitos sociais, justiça econômica e democratização.
As mulheres estiveram presentes nas lutas
democráticas e, simultaneamente, mostraram e têm
demonstrado que diversos setores se inserem diferentemente
na conquista da cidadania.
As mulheres - novas atrizes -, ao transcenderem seu
cotidiano doméstico, fizeram despontar um novo sujeito social:
mulheres anuladas emergem como inteiras, múltiplas. Elas
estavam nos movimentos contra a alta do custo de vida,
pela anistia política, por creches.
Criaram associações e casas de mulheres, entraram nos
sindicatos, onde reivindicaram um espaço próprio.
O movimento de mulheres que aparece durante os
anos 70 rompeu com uma tradição segundo a qual as mulheres
manifestavam publicamente valores tradicionais e
conservadores, como ocorreu com a Marcha da Família com
Deus pela Liberdade, que precede o golpe militar (BLAY, 1987).
O movimento de mulheres nos anos 70 trouxe uma nova versão
da mulher brasileira, que vai às ruas em defesa de seus
direitos e necessidades e que realiza enormes manifestações
de denúncia das desigualdades.
O movimento feminista que reapareceu no Brasil
a partir de meados dos anos 70 teve algumas características
dos movimentos que surgiram na Europa e nos Estados Unidos
nos anos 60.
O ano de 1975 é freqüentemente citado como aquele
em que os grupos feministas reapareceram nos principais
centros urbanos. Naquele ano, quando muitas vozes
dissidentes eram sistematicamente silenciadas pelos militares
brasileiros, a proclamação da Década da Mulher pelas Nações
Unidas ajudou a legitimar demandas incipientes de igualdade
entre homens e mulheres. As mulheres souberam aproveitar a
brecha e organizaram encontros, seminários, conferências,
principalmente nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo.
Os primeiros grupos feministas criados na década
de 1970 nasceram com o compromisso de lutar tanto pela
igualdade das mulheres como pela anistia e pela
abertura democrática. Muitas mulheres passaram a dirigir sua
atuação, por intermédio dos grupos recém-criados, para lutas
em bairros e comunidades das periferias urbanas, da Igreja
197
católica, em clubes de mães, associações de vizinhança, onde
donas de casa e mães se reuniam, organizavam-se e
mobilizavam-se por questões do cotidiano.
Os grupos feministas e os movimentos populares de
mulheres proliferaram durante os anos 70 e início dos 80. As
comemorações do Dia Internacional da Mulher se
constituíram em momentos-chave para a organização de
fóruns das mulheres, articulando protestos públicos contra
a discriminação de sexo e uma agenda de reivindicações,
consolidando uma coordenação de mulheres e laços de
solidariedade.

Anos 90: uma explosão

A década de 1980 foi marcada pela reconstrução


das instâncias da democracia liberal: reorganização
partidária, eleições para os diversos níveis, reelaboração da
Constituição do país, eleições presidenciais etc.
Assim, o movimento feminista, a partir de 1981, ficou
mais complexo em sua organização e mais diverso
ideologicamente. Com a reorganização partidária, Muitas
mulheres privilegiaram a atuação nos partidos.
A partir de então, apareceu uma nova militante nos
partidos políticos, a feminista, e nestes espaços o tema
mulher tornou-se alvo de debate, item obrigatório dos
programas e plataformas eleitorais dos partidos progressistas,
como resultado da visibilidade que as questões das mulheres
ganharam, trazidas pelos seus movimentos.
Uma outra consequência foi a tentativa de incorporar
suas reivindicações nas políticas sociais do Estado por
iniciativa das militantes feministas nos partidos. São criadas
instâncias com a finalidade de pensar e propor políticas
públicas, que remetem à questão da igualdade/diferença:
igualdade de direitos e condições diferentes de exercer estes
direitos.
Os anos 90 também se caracterizaram pela
introdução de novas temáticas: as ações afirmativas, as
cotas mínimas de mulheres nas direções dos sindicatos,
partidos políticos e, mais recentemente, nas listas de
candidaturas aos cargos legislativos, como medidas para
superar a quase ausência das mulheres nesses ambientes.
Recentemente, a luta pelo direito das mulheres ao
aborto tem sido alvo de muitos debates e reportagens na
grande imprensa. Esse é um velho tema das feministas, mas no
Brasil só após a democratização tem envolvido em maior
número as mulheres.
198
Dia Internacional das Mulheres – mulheres na luta por
justiça

Origens da data

A referência histórica principal da instituição do Dia


Internacional da Mulher é a II Conferência Internacional das
Mulheres Socialistas em 1910, em Copenhague, na Dinamarca,
quando Clara Zetkin, dirigente do Partido Social Democrata
Alemão, propôs a resolução de instaurar oficialmente um
dia internacional das mulheres. Nessa resolução, não se faz
nenhuma alusão ao dia 8 de março.
A versão mais popularizada é uma homenagem às
129 operárias têxteis que durante uma greve, no dia 8 de março
de 1857, em Nova York, morreram queimadas na fábrica onde
trabalhavam quando reivindicavam redução da jornada de
trabalho e aumento salarial. Os donos da empresa teriam sido
os responsáveis pelo incêndio criminoso.

Diferentes versões

Para a pesquisadora canadense Renée Cote, os


verdadeiros fatos e datas das misteriosas origens do 8
de março, até hoje confusas, maquiadas e esquecidas, não há
fontes históricas que registrem essa greve, e sim uma
série de lutas das mulheres para se firmarem.
Outra versão para a escolha do 8 de março está na
ligação dessa data com a participação ativa das operárias
russas em ações que desencadearam a Revolução russa de
1917. Naquele ano, uma ação das operárias realizada no dia 8
de março – no calendário ocidental foi o fato político que
precipitou o início das ações revolucionárias que tornaram
vitoriosa a Revolução Russa.
Em Petrogrado, explodiu uma greve de tecelãs e
costureiras. Contrariando a decisão do partido, que defendia
que aquele não era o momento ideal para a mobilização, 90 mil
trabalhadoras saíram às ruas exigindo paz e alimento. A
manifestação foi considerada o estopim da revolução.
Apesar de diferentes, as versões guardam entre si a
semelhança da histórica reivindicação feminina por melhores
condições de trabalho e vida. Evidenciam também que as
mulheres historicamente estiveram nas lutas sociais em todo o
mundo.

Luta no Brasil
199
No Brasil, a luta feminista conquista manifestação
expressiva no Ano Internacional da Mulher, comemorado
em 1975 e que refletiu de forma positiva no movimento de
mulheres, instaurando definitivamente o 8 de março como data
integrante da agenda de luta dos movimentos sociais e
organizações de trabalhadores do país. A partir de então,
grupos e entidades feministas se organizaram ou ganharam
força para encaminhar as atividades. Grandes manifestações
promovidas por mulheres organizadas em partidos, sindicatos e
outras entidades passaram a tomar as ruas.

100 anos de conquistas das mulheres

Entrada no mundo do trabalho, direito ao voto,


mudança de comportamento, pílula anticoncepcional, liberdade
sexual e afetiva, divórcio, luta por melhores salários e por
igualdade de direitos. Tudo isso começou há cem anos pelas
mãos das primeiras feministas que lideraram greves, revoltas e
desafiaram a sociedade.

Hoje, as mulheres fazem suas próprias escolhas, são


autônomas, independentes e capazes de assumir
qualquer tarefa. As mulheres conquistaram a liberdade,
embora ainda haja um longo caminho a ser trilhado para uma
sociedade mais justa e igualitária para todos.

Emancipação feminina

A luta das mulheres teve seu auge na década de


1960, no mundo ocidental, quando o movimento conquistou
espaço público e político e fortaleceu os demais
movimentos de emancipação. A década foi marcada pela
efervescência das lutas sociais pela democracia, contra a
guerra, o racismo e o capitalismo. As mulheres tinham suas
próprias bandeiras e lideraram a luta pela igualdade de direitos.
Todos queriam mudar o mundo e elas conseguiram.
Um das conquistas, foi o voto, a chamada à
consciência da cidadania. Em 1932, a mulher brasileira já tinha
o direito de escolher os candidatos nas eleições. Mas tudo
foi fruto da luta das sufragistas da época como Chiquinha
Gonzaga, que teve um papel fundamental nesse processo.
Apesar da conquista do voto nos anos 1930, a mulher
brasileira começou a sair do mundo doméstico somente a partir
dos anos 1940 e 50. O feminismo brasileiro só ganhou força
nos anos 1970, com os movimentos sexistas (das mulheres
200
contra os homens) e legalistas (que lutavam por direitos no
campo jurídico). O feminismo começou radical, uma forma de
enfrentamento entre homens e mulheres. Com o tempo, ele foi
encontrando o seu caminho através da vivência no movimento.
Nos anos 1980, começamos a compreender que a igualdade só
viria de fato com a transformação da sociedade, quando todos
tiverem direito à terra, ao trabalho e a melhores condições de
vida.
Os anos de 1975 a 1985 foram declarados pela ONU –
Organização das Nações Unidas – como a Década da Mulher. Foi
nesse período que o movimento feminista do Brasil teve um
grande desenvolvimento e seguiu avançando nas décadas
seguintes.
Na década de 1980,questões sobre direitos civis
também ganharam espaço na discussão da constituinte
brasileira. As questões femininas foram tratadas de forma
especial e a constituição foi bastante cidadã em termos de
direitos da mulher.

Principais conquistas das mulheres

1910 - A Conferência Internacional na Dinamarca estabelece o 8


de março como o “Dia Internacional da Mulher”, em
homenagem às mulheres que morreram numa fábrica têxtil em
Nova York, em 1857. A data foi oficializada pela ONU em 1975.
1932 – o voto feminino foi definitivamente conquistado no
Brasil.
1962 – O Código Civil Brasileiro, de 1916, é alterado
concedendo o direito das mulheres trabalharem fora do lar sem
a autorização do marido ou do pai e, em caso de separação do
casal, o direito à guarda do filho.
1988 – Com o “lobby do batom as mulheres incluíram 122
emendas na Constituição Federal Brasileira. A partir daí,
direitos como licença maternidade, políticas contra a
discriminação no mercado de trabalho e maior igualdade
entre homens e mulheres começam a valer.
1995 – Realizada a IV Conferência Mundial das Nações Unidas
sobre a Mulher em Pequim, China,que marcou o reconhecimento
definitivo do papel econômico e social da mulher.
1996 – Instituído o sistema de cotas, na legislação eleitoral,
obrigando os partidos políticos a inscreverem no mínimo
30% de mulheres em suas chapas proporcionais.
2006 – Lei Maria da Penha
2010 – entra em vigor a lei que amplia a licença maternidade
para seis meses.

201
Trabalho de casa? Trabalho de mulher?

Já é lugar comum se comentar sobre a ampliação da


participação das mulheres no mercado de trabalho. Afinal,
hoje, elas formam 43,6% da força de trabalho no Brasil.
Mas muito pouco se fala sobre o outro lado da moeda: o
trabalho dentro de casa, aquelas tarefas que são
indispensáveis no cotidiano.
Quando comparamos o número de horas dedicados ao
trabalho doméstico realizado por homens e mulheres. Segundo
dados da PNAD (Pesquisa Nacional de amostra de Domicílios),
em 2008, trabalhando fora, as mulheres dedicam até 25 horas
semanais aos afazeres domésticos. Os homens registram em
média 10 horas semanais com o trabalho doméstico.
Além das atividades realizadas na própria casa,
como cuidar da alimentação, do vestuário, da limpeza da
casa, atender as necessidades das crianças, nesses
afazeres também se incluem as atividades relacionadas ao
acompanhamento da saúde, o cotidiano da escola, a
atenção aos familiares idosos etc.
Mas, mesmo tendo, em média, uma jornada menos
longa no trabalho remunerado, a jornada total de trabalho das
mulheres é significativamente mais extensa que a dos homens.
Uma das principais razões das desigualdades entre
mulheres e homens em relação ao emprego e renda decorre do
fato de serem mulheres consideradas as responsáveis pelas
tarefas domésticas, pelo cuidado com as crianças e a família.

9.4 DESIGUALDADE E DISCRIMINAÇÃO DA MULHER NA


CULTURA E NA SOCIEDADE BRASILEIRA

Gênero e exclusão social

A exclusão que atinge a mulher se dá, às vezes,


simultaneamente, pelas vias do trabalho, da classe, da
cultura, da etnia, da idade, da raça, e, assim sendo, torna-
se difícil atribuí-la a um aspecto específico desse fenômeno, em
vista de ela combina vários dos elementos da exclusão social.
A exclusão social remonta à antiguidade grega, onde
escravos, mulheres e estrangeiros eram excluídos, mas o
fenômeno era tido como natural.
A exclusão, em sua essência, é multidimensional,
manifesta-se de várias maneiras e atinge as sociedades de
formas diferentes, sendo os países pobres afetados com
maior profundidade. Os principais aspectos em que a exclusão
se apresenta dizem respeito à falta de acesso ao emprego, a
202
bens e serviços, e também à falta de segurança, justiça e
cidadania. Assim, observa-se que a exclusão se manifesta
no mercado de trabalho (desemprego de longa duração), no
acesso à moradia e aos serviços comunitários, a bens e
serviços públicos, à terra, aos direitos etc.
A exclusão social da mulher é secular e diferenciada.
É sabido que o fenômeno da exclusão não é específico da
mulher, mas atinge os diferentes segmentos da sociedade.
A exclusão é gerada nos meandros do econômico, do político e
do social, tendo desdobramentos específicos nos campos da
cultura, da educação, do trabalho, das políticas sociais, da etnia,
da identidade e de vários outros setores.

A reprodução da exclusão social feminina

As relações entre homens e mulheres, ao longo


dos séculos, mantêm caráter excludente. São assimiladas de
forma bipolarizada, sendo designada à mulher a condição de
inferior, que tem sido reproduzida pela maioria dos
formadores de opinião e dos que ocupam as esferas de poder
na sociedade. Aristóteles afirmava que a mulher é fêmea em
virtude de certas características: é mais vulnerável à piedade,
chora com mais facilidade, é mais afeita à inveja, à lamúria,
à injúria, tem menos pudor e menos ambição, é menos digna
de confiança, é mais encabulada. Os ideólogos burgueses
destacaram sua inclinação natural para o lar e a educação
das crianças. Nesse sentido, Rousseau vê a mulher como
destinada ao casamento e à maternidade. Kant a considera
pouco dotada intelectualmente, caprichosa indiscreta e
moralmente fraca. Sua única força é o encanto. Sua virtude é
aparente e convencional.
Esses são alguns dos atributos imputados à mulher,
que reforçam a base da exclusão do feminino na sociedade
e cuja reversão tem tomado longo tempo das feministas na sua
busca por construir conceitos de eqüidade entre os dois sexos.

A tradicional exclusão da mulher na esfera do trabalho

O preconceito de inferioridade designado ao sexo


feminino, durante séculos – através da religião, das leis,
da escola e da família, onde, cotidianamente, a própria
mulher reproduz a superioridade masculina através da educação
familiar ou informal – é apropriado, inclusive, pelo capital e
reproduzido nas relações de trabalho pelo mesmo sistema
capitalista.

203
No mercado, dada a sua condição de mulher (paciente,
obediente, dedicada etc.), vende a sua força de trabalho a
preço mais baixo: o seu trabalho é considerado ajuda no
orçamento familiar; concentra as atividades em setores
extensivos do doméstico, a exemplo da educação, saúde,
assistência social, enfermagem e têxtil.

1968: O ANO QUE NÃO TERMINOU

Maio francês de 1968

 1968: ano mítico – ponto de partida para uma série


de transformações políticas, éticas, sexuais e
comportamentais, que afetaram as sociedades da época de
uma maneira irreversível.
 Foi o marco para os movimentos ecologistas,
feministas, das ONGs e dos defensores das minorias e
dos direitos humanos
 sufocados por um mundo burocratizado e repressivo:
jovens queriam lutar pela liberdade de viver de uma forma
diferente
 Defendia a liberalização dos costumes: imprensa
feminina discutia a sexualidade
 Henry Weber (líder estudantil 1968) “No plano da
autoridade, era a famíliapatriarcal. O marido era todo
poderoso, a mulher não tinha o direito de abrir uma conta no
banco. Era uma sociedade de outra idade. No plano da moral era
a velha moral católica, repressiva e as relações fora do
casamento eram muito mal vistas. A homossexualidade era
considerada quase uma doença...
 Para Zuenir Ventura “a sociedade brasileira era
muito autoritária; havia uma dominação muito grande do
homem sobre a mulher; do professor sobre o aluno; do
marido sobre a mulher; pai sobre o filho e 1968 mexeu com tudo
isso, ou seja, com este esquema rígido.
 Cidades universitárias: regulamentos para separar
rapazes das garotas; livros eram censurados (os eróticos); filmes
proibidos
 Legião de estudantes universitários e colegiais:
desenvolvimento de uma “cultura própria” – música, moda
(jeans e minissaia) e linguagem
 Geração “baby boom” aspirava= liberdade,
autonomia e emancipação

O que foi a rebelião estudantil no maio francês de 1968?


204
- Reitoria proibiu que os rapazes visitassem as moças
em seus dormitórios
-Daniel Cohn-Bendit liderou uma manifestação contra o
reitor e esta foi reprimida pela polícia
- Conflitos no Quartier Latin e a Sorbonne é fechada
- Passeatas estudantis
- “noite das barricadas” (10/5/68) = rapazes e moças
jogam nos policiais paralelepípedos e estes utilizam gás
lacrimogêneo
- Greves gerais: estudantes + operários
 Revolução sexual: motor de 1968. O termo
"revolução sexual" é comumente usado para descrever o
movimento sócio-político testemunhado entre meados dos anos
1960 e início dos anos 1970.
Foi no auge de 1968 que as proibições caíram por terra.
Os códigos morais, religiosos e econômicos que reprimiam os
impulsos de homens e mulheres foram contestados. A
combinação de protestos estudantis, movimentos Contracultura
e contraceptivos levou à liberação sexual. As conquistas dessa
revolução sobreviveram, mas seu valor ainda é contestado.

Legado de 1968:
a)expansão do movimento feminista
b)mudanças no “modelo familiar” e o lugar da criança
na sociedade (pais passaram a manter um diálogo com os filhos)
c) liberação sexual

Conquistas da revolução sexual


 princípio do tratamento de doenças sexualmente
transmissíveis
 uso de métodos contraceptivos como a pílula e a
camisinha
 igualdade no seio da família
 mudanças nas relações entre homens e mulheres
 liberação das mulheres
 mobilização dos movimentos homossexuais
 início de uma maior comercialização e
mercantilização da sexualidade através da pornografia
 relaxamento da censura

A emancipação feminina e a Revolução Sexual

Durante a Segunda Guerra Mundial, com a Europa


praticamente rendida às forças alemãs, a Inglaterra teve que
205
suportar um brutal esforço de guerra. A maior parte dos homens
estava na frente de combate, mas o país não podia parar. Assim
as mulheres tomaram o lugar dos homens nas fábricas, nos
estaleiros, a conduzir comboios ou a operar máquinas. A
indústria bélica estava mais ativa que nunca e eram as
mulheres que construíam os tanques, as armas e os aviões. Com
os homens fora eram elas que agora tomavam o lugar deles.
Depois da guerra nada voltou a ser como dantes. Se
precisaram delas naquela altura de crise não era agora que as
mulheres iam permitir que as relegassem de novo para segundo
plano.
A verdadeira revolução feminina começou quando
Katherine Mccormick e Margareth Sanger desafiaram e
financiaram o cientista Gregory Pincus para que criasse uma
pílula contra a gravidez que fosse fácil de usar, eficiente e
barata.
O trabalho de Pincus deu frutos e em 1957 era
aprovada a venda do Enovid-10, um contraceptivo oral vendido
como um medicamento para complicações menstruais. Só a 18
de Novembro de 1960 seria abertamente aprovada a sua venda
como método contraceptivo.
Com a pílula a mulher estava agora livre para viver
em pleno a sua sexualidade sem o receio de engravidar. A
generalização do uso do contraceptivo oral não foi fácil, perante
a resistência da igreja e da sociedade machista, muitas
mulheres foram obrigadas a tomá-lo à revelia dos próprios
maridos.
Em 1967, apenas alguns meses antes do início dos
protestos do Maio de 1968, era aprovada a venda da pílula em
França.
A pílula foi a grande invenção que permitiu a
libertação da mulher e conduziu à grande revolução sexual
que levou ao Maio de 68 e ao "Verão do Amor".
Em 1969 a revolução sexual e a contestação à guerra
do Vietnã atingiam o seu auge com três dias de amor, paz e
música, em Woodstock, uma pequena localidade rural do Estado
de Nova Iork.

A revolução sexual de 1968 – Renata Rios

Entre os anos 60 e 70 se passou a revolução sexual.


O auge desta foi em 1968, o ano das mudanças de maneira
geral. Em vários aspectos esse ano transformou o mundo, desde
questões políticas até lutas feministas como a pelo direito ao
uso da pílula. O estopim da luta ocorreu em Maio de 68,
quando alunos da universidade de Nanterre lutaram pelo direito
206
de dormir no mesmo dormitório homens e mulheres. As
mudanças comportamentais se propagaram por todo mundo.
A luta pela liberdade tinha várias finalidades, dentre
elas igualar os direitos de homens e mulheres, criar um clima de
aceitação. O sexo passou a ser algo banal, houve uma tentativa
de acabar com o tabu que o assunto carregava.
Enquanto as feministas lutavam pelo direito aos
métodos contraceptivos outros grupos lutavam pelo direito
de existir, os homossexuais é um exemplo desses grupos. A
discriminação e a repressão era muito presente e com a
revolução os reprimidos avistaram a chance de se impor a
sociedade.
Temas como o uso da pílula também entrou na
revolução. As mulheres lutavam pelo direito à escolha de ter ou
não filhos, assim deixariam de ser objetos sexuais, que por
acaso produziam herdeiros, e poderiam passar a ser parte do
mercado de trabalho. A escolha viria em um momento muito
oportuno uma vez que uma das justificativas para a não
empregar as mulheres era o longo período que a mulher se
ausentava a cada gravidez.
A mulher ganhou espaço no mercado de trabalho e
agora tentava, apesar da discriminação remanescente,
caminhar com as próprias pernas.
A revolução sexual não conseguiu tudo que se
propôs, mas foi responsável por grandes avanços. Devido a
maior liberdade perdeu-se boa parte da vergonha de se abordar
temas relacionados ao sexo, isso não só contribuiu para uma
maior comercialização de coisas relacionadas ao sexo como
também permitiu o inicio do tratamento de DSTs. A revolução
trouxe a liberdade para se usar métodos contraceptivos, como a
pílula e a camisinha. As mudanças na relação homem mulher, a
igualdade nas famílias, as conquistas feministas e homossexuais
também são um avanço. Mas talvez em curto prazo a maior
conquista para a época foi o relaxamento da censura, que
permitiu uma maior mobilização pelo fim da ditadura e a volta à
democracia.

207
TEMA 10 - VIOLÊNCIA URBANA E RURAL

10.1 ORIGENS DA VIOLÊNCIA


10.2 DISCURSO MIDIÁTICO E A VIOLÊNCIA
10.3 POLÍTICAS PÚBLICAS E VIOLÊNCIA
10.4 MOVIMENTOS SOCIAIS

Violência

O que é violência? Segundo o Dicionário Houalss,


violência é a "ação ou efeito de violentar, de empregar força
física (contra alguém ou algo) ou intimidação moral contra
(alguém); ato violento, crueldade, força". No aspecto jurídico, o
mesmo dicionário define o termo como o "constrangimento
físico ou moral exercido sobre alguém, para obrigá-lo a
submeter-se à vontade de outrem; coação".
Já aOrganização Mundial da Saúde (OMS) define
violência como "a imposição de um grau significativo de dor e
sofrimento evitáveis". Mas os especialistas afirmam que o
conceito é muito mais amplo e ambíguo do que essa mera
constatação de que a violência é a imposição de dor, a agressão
cometida por uma pessoa contra outra; mesmo porque a dor é
um conceito muito difícil de ser definido.
Para todos os efeitos, guerra, fome, tortura,
assassinato, preconceito, a violência se manifesta de várias
maneiras. Na comunidade internacional de direitos humanos, a
violência é compreendida como todas as violações dos direitos
civis (vida, propriedade, liberdade de ir e vir, de consciência e
de culto); políticos (direito a votar e a ser votado, ter
participação política); sociais (habitação, saúde, educação,
segurança); económicos (emprego e salário) e culturais (direito
de manter e manifestar sua própria cultura). As formas de
violência, tipificadas como violação da lei penal, como
assassinato, sequestros, roubos e outros tipos de crime contra a
pessoa ou contra o patrimônio, formam um conjunto que se
convencionou chamar de violência urbana, porque se manifesta
principalmente no espaço das grandes cidades. Não é possível
deixar de lado, no entanto, as diferentes formas de violência
existentes no campo.
A violência urbana, no entanto, não compreende
apenas os crimes, mas todo o efeito que provocam sobre as
pessoas e as regras de convívio na cidade. A violência urbana
Interfere no tecido social, prejudica a qualidade das relações
sociais, corrói a qualidade de vido das pessoas. Assim, os crimes
estão relacionados com as contravenções e com as incivllldades.
208
Gangues urbanas, plxações, depredação do espaço público, o
trânsito caótico, as praças malcuidadas, sujeira em período
eleitoral compõem o quadro da perda da qualidade de vida.
Certamente, o tráfico de drogas, talvez a ramificação mais
visível do crime organizado, acentua esse quadro, sobretudo nas
grandes e problemáticas periferias.
Hoje, no Brasil, a violência, que antes estava presente
nas grandes cidades, espalha-se para cidades menores, à
medida que o crime organizado procura novos espaços. Além
das dificuldades das instituições de segurança pública em
conter o processo de interiorização da violência, a degradação
urbana contribui decisivamente para ele, já que a pobreza, a
desigualdade social, o baixo acesso popular à justiça não são
mais problemas exclusivos das grandes metrópoles. Na última
década, a violência tem estado presente em nosso dia-a-dia, no
noticiário e em conversas com amigos. Todos conhecem alguém
que sofreu algum tipo de violência. Há diferenças na visão das
causas e de como superá-las, mas a maioria dos especialistas no
assunto afirma que a violência urbana é algo evitável, desde
que políticas de segurança pública e social sejam colocadas em
ação. É preciso aluar de maneira eficaz tanto em suas causas
primárias quanto em seus efeitos. É preciso aliar políticas sociais
que reduzam a vulnerabilidade dos moradores das periferias,
sobretudo dos jovens, à repressão ao crime organizado. Uma
tarefa que não é só do Poder Público, mas de toda a sociedade
civil.

Vida urbana e rural (Fonte:APOSTILA FORMAÇÃO GERAL E


ESPECÍFICA / TGRH-2009.2).

Vida urbana diz respeito a vida que se desenvolve no


interior dos grandes centros urbanos, das grandes cidades,
principalmente nas grandes capitais. Vida rural refere-se a vida
do campo. Uma importante observação de diferenciação
colocada por Sorokin e Zimmermann diz respeito ao tamanho
das comunidades, já que as comunidades rurais seriam menores
(embora o termo menores Já traga consigo problemas novos de
definição), sua população seria mais homogénea que a urbana
cultural e socialmente. No rural haveria também menos
mobilidade social. A Interaçâo entre os Indivíduos no mundo
rural, devido a restrição do tamanho do grupo, é mais direta e
concreta, as pessoas conhecem mais "intimamente" seus
interlocutores. Existe uma pessoalidade nas relações em
oposição à impessoalidade que reina nas relações urbanas.
Finalmente, há a questão da complexidade: o rural seria menos
complexo que o urbano.
209
10.1 ORIGENS DA VIOLÊNCIA

Violência urbana

Ao descrever o estado de natureza, Hobbes afirmou


que, numa situação em que "os homens vivem sem outra
segurança senão a que lhes pode ser oferecida por sua própria
força", a vida do homem é "solitária, pobre, sórdida,
embrutecida e curta". A violência urbana, em sua expressão
mais exacerbada, aproxima-se dessa condição que idealmente
existiria antes do pacto de proteção mútua, fundamento da
sociedade e do estado.
Violência urbana é a expressão que designa o
fenómeno social de comportamento deliberadamente
transgressor e agressivo, apresentado pelo conjunto dos
cidadãos ou por parte deles, nos limites do espaço urbano. Tem
qualidades que a diferenciam de outros tipos de ação violenta
praticados por pessoas ou grupos de pessoas e se desencadeia
em consequência das condições de vida e convívio no espaço
urbano. Sua manifestação mais evidente são os altos índices de
criminalidade grave; a mais constante é a infração dos códigos
elementares de conduta civilizada.
Fenômeno disseminado em todas as grandes cidades, a
violência urbana é determinada localmente por valores sociais,
culturais, econômicos, políticos e morais de umasociedade. Com
a uniformização dos comportamentos típica do final do século
XX, o entanto, ela incorpora modelos copiados dos países de
maior influência na esfera internacional. As populações de
países subdesenvolvidos, por exemplo, aprendem e reproduzem,
muitas vezes com pequenas modificações, padrões culturais de
procedimento violento originários dos Estados Unidos, como a
formação de gangues de rua, a pichação de paredes e a
expressão artística que tem a violência como tema.
As manifestações mais extremadas da violência urbana
ocorrem em sociedades nas quais há uma tradição cultural de
violência e profundas divisões raciais, sociais e económicas,
como nos Estados Unidos. Marcaram a década de 1990, por
exemplo, as cenas dos motins que sacudiram Los Angeles
depois que um júri, formado de brancos, absolveu quatro
policiais brancos acusados de espancar um negro. Iniciada em
Los Angeles, a revolta se estendeu por diversas grandes cidades
americanas e atingiu especialmente os bairros centrais, em que
se concentra a população negra pobre. Nos dias de tumulto,

210
dezenas de pessoas foram mortas em espancamentos, incêndio
de carros e saque de estabelecimentos comerciais.
A violência urbana é grande também em países em que
funcionam mal os mecanismos de controle social, político e
jurídico pelo estado, que detém o monopólio do exercício
legítimo da coerção. Em países como o Brasil, de instituições
frágeis, profundas desigualdades econômicas e de classe, e uma
tradição cultural de violência, a realidade do cotidiano dos
habitantes das grandes cidades é violenta. São frequentes os
comportamentos criminosos graves, como assassinatos,
linchamentos, assaltos, tráfico e drogas, tiroteios entre
quadrilhas rivais e corrupção, além do desrespeito sistemático
às normas de conduta social estabelecidas pelos códigos legais
ou pelo costume.
Uma das causas do crescimento da violência urbana no
Brasil é a aceitação social da ruptura constante das normas
jurídicas e o desrespeito á noção de cidadania. A sociedade
admite passivamente tanto a violência dos agentes do estado
contra as pessoas mais pobres quanto o descompromisso do
indivíduo com as regras de convívio. Ficam impunes o uso da
tortura pela polícia como método de investigação; a ocupação
de espaços públicos por camelos e donos de carros; as infrações
de trânsito; a incompetência administrativa; a imperícia
profissional; a negligência causadora de acidentes e o
desrespeito ao consumidor. Entre os cidadãos habituados a
esses comportamentos, encontram eco as formas violentas de
fazer justiça, como a pena de morte, e mesmo o fuzilamento
sumário, linchamentos e castigos físicos. É frequente a
aprovação popular da punição violenta sem julgamento,
especialmente se entre as vítimas se encontram presidiários ou
ativistas políticos.

A face da violência urbana: questões atuais


Caio César Santos Gomes

Segundo o Aurélio (dicionário da língua portuguesa),


violência é: "ato violento ou ato de violentar". Numa definição
mais opulenta do termo, entende-se por violência a prática de
um comportamento agressivo, por parte de um indivíduo que
causa dano a outro ser vivo, ou até mesmo objeto e se
materializa através do uso excessivo da força física e/ou
mecanismos que causam dano físico. Trata-se de um
comportamento agressor e transgressivo que resulta em um

211
grave problema social que vem desencadeando-se ao longo dos
tempos.
A violência se personifica de diversas formas e pode ser
caracterizada igualmente: violência contra a mulher, violência
moral, violência sexual, violência contra a criança e o idoso,
entre outras. Cabe salientar que essas diversas formas de
violência podem ser observadas em vários espaços, sendo o
meio urbano o mais propicio para o desencadear destes atos.
Destarte, todo esse conjunto de violências pode ser inserido no
âmbito da violência urbana.
Fenômeno disseminado em grandes cidades, a violência
urbana é determinada por valores culturais, sociais, económicos,
políticos e morais de uma sociedade. De forma mais específica,
pode-se associar alguns problemas e práticas que contribuem
como o crescimento da violência urbana: desestrutura familiar,
desemprego, tráfico de drogas, discussões banais, entre outros.
Hoje, a violência urbana não é uma preocupação
exclusivamente brasileira, mas sim uma questão que preocupa
tanto os países em desenvolvimento como os desenvolvidos.
Todavia engana-se quem acredita que o fenômeno da
violência urbana está restrito aos grandes centros. Esse
problema pode ser observado também em pequenos centros
urbanos, em todo o país, onde recentemente as manchetes dos
jornais mostram um aumento no número de assaltos, homicídios
e outros atos de violência, o que deixa as populações locais
apreensivas. Isso comprova que a violência tem tomado
proporções gigantescas e atualmente é configurada como um
"morbus social" que carece de uma solução urgente.
Como consequências da violência urbana, podemos
citar inúmeros exemplos de atrocidades cometidas diariamente,
noticiadas pelas redes de televisão, rádios, jornais e revistas,
como: sequestros e assaltos nas grandes metrópoles, estupros
de crianças, assassinatos em série, entre outros, que causam
pavor na sociedade. Alguns exemplos são o caso do garoto João
Hélio, (ocorrido em 2007) que foi arrastado vivo por um carro na
periferia do Rio de Janeiro e até hoje causa indignação na
população e mais recentemente os casos do assassinato da
menina Isabela Nardoni pelo pai e madrasta, e o caso do
sequestro de Eloá que teve sua vida interrompida pelo
namorado agressor.
Além da consequência social, cabe salientar ainda a
consequência económica que a violência urbana gera aos cofres
públicos, uma vez que, na tentativa de amenizar os problemas
resultantes da violência, investimentos que poderiam ser
aplicados em políticas de promoção do bem-estar social,
acabam sendo "aplicados" em segurança.
212
Na tentativa de descortinar a face da violência urbana e
suas causas e consequências, percebe-se que este é um
problema que nos últimos anos têm transbordado os limites dos
grandes centros urbanos, e atinge cada vez mais, pequenas
cidades do interior do país. Cabe lembrar também que o
problema da violência urbana não é uma exclusividade do Brasil
ou dos países subdesenvolvidos, ou seja, até mesmo nos países
com melhores padrões económicos e com melhores indicadores
sociais a violência urbana é uma realidade que ganha cada dia
mais espaço. A solução para o problema da violência urbana
envolve não apenas a questão da segurança pública, mas
também questões como melhoria do sistema de educação,
moradia, oportunidades de emprego entre outros fatores e
requer uma grande mudança nas políticas públicas e na
sociedade como um todo.Caio César Santos Gomes - Graduado
em História - Universidade Tiradentes(UNIT). Pós-graduando em
Ensino de História: novas abordagens - Faculdade São Luís de
França (FSLF).

As principais razões da violência no campo (Fonte:


CONTAG-Confederação nacional dos trabalhadores rurais
/Informe da Sec. de Reforma Agrária e Meio Ambiente da
CONTAG).

a) A concentração da terra

A violência no campo no Brasil está diretamente


vinculada à concentração da terra e do poder. A
concentração fundiária no Brasil é uma das maiores do
mundo. Menos de 50 mil proprietários rurais possuem áreas
superiores a mil hectares e controlam 50% das terras
cadastradas. Cerca de 1% dos proprietários detém 46% de
todas as terras. Segundo dados do INCRA, existem cerca de
100 milhões de hectares de terras ociosas no Brasil. Ao
mesmo tempo, mais de quatro milhões e meio de famílias
de trabalhadores e trabalhadoras rurais não possuem terra
e vivem num estado de pobreza extrema.
A concentração de terra está diretamente
relacionada como a concentração do poder.
Os poucos donos das terras, que sempre receberam
privilégios e exerceram influência sobre as instancias do
Estado brasileiro, além de se sentirem donos da natureza e
com isso explorá-la até à exaustão, também se comportam
como se fossem donos das pessoas, especialmente as mais
pobres. Em nome de seus interesses pessoais, financeiros e
políticos, os latifundiários exploram, escravizam, ameaçam,
213
torturam e matam aqueles e aquelas que ousam lutar
contra seus privilégios.
A concentração fundiária brasileira, que tem sua
origem na colonização feita pelos Portugueses, foi sendo
aprimorada ao longo dos séculos, apoiada pelas políticas
governamentais que sempre privilegiaram o latifúndio em
detrimento da realização da reforma agrária ou da
agricultura familiar. Atualmente, o modelo agrícola
embasado no agronegócio monocultor e voltado para a
exportação, se expande rapidamente. Fazendeiros,
madeireiros, grandes plantadores da soja, de algodão, cana
de açúcar, etc, em nome da modernidade e da
produtividade, avançam sobre terras públicas, áreas
indígenas, áreas ocupados por populações tradicionais e
posseiros, ribeirinhos e outros. No afã de ampliar suas
terras, acirram os conflitos no campo e produzem a
violência das mais variadas formas como a super
exploração no trabalho e o trabalho escravo, a grilagem das
terras, os crimes ambientais, os espancamentos,
sequestros, ameaças e os assassinatos.

b) A impunidade

A outra grande razão para a violência no campo no


Brasil é, sem dúvida a impunidade. A impunidade é uma
importante cúmplice da violência e traz para a cena, além
da não penalização dos responsáveis pelos crimes, uma
situação de atemorização da população e de impotência das
autoridades.
Para se ter uma ideia da gravidade da situação de
impunidade no campo, basta que se analise os dados
registrados pela CPT - Comissão Pastoral da Terra,
constatando que durante os últimos 20 anos foram
assassinados mais de 1.385 trabalhadores rurais, lideranças
e ativístas ligados aos movimentos sociais de luta pela terra
e pela reforma agrária no Brasil. Destes casos, somente 77
foram julgados, com a condenação de apenas 15 mandantes
e 65 executores. 523 destes assassinatos aconteceram no
estado do Pará e lá, apenas 10 casos foram a julgamento,
com a condenação de 5 mandantes e 8 executores Mesmo
assim, todos os executores condenados fugiram da cadeia.
Três fazendeiros, condenados como mandantes de
assassinatos de sindicalistas estão em liberdade, pois um
cumpre sua pena em prisão domiciliar e os outros dois
aguardam julgamento de recursos em liberdade há dois
anos, devido à parcialidade e morosidade da Justiça.
214
O massacre de Eldorado de Carajás, (onde 17
trabalhadores sem terra foram assassinados pela polícia), é
um exemplo de como a Justiça age no tratamento dos
crimes contra os trabalhadores e trabalhadoras rurais. Dos
154 acusados levados ao banco dos réus, apenas dois
comandantes da tropa foram condenados.
Outro caso emblemático da impunidade ó o do
assassinato de Margarida Maria Alves, presidente do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, no
Estado do Paraíba. Ela foi assassinada por defender os
direitos dos trabalhadores e trabalhadoras das plantações
de cana de açúcar da região. Após mais de 20 anos, com o
julgamento adiado por 06 vezes, o tribunal absolveu o
fazendeiro Zito Buarque, acusado pelo assassinato.
Ainda como reflexo da situação de impunidade,
existem atualmente 145 pessoas ameaçadas de morte,
segundo dados parciais da CPT. São trabalhadores rurais
sem terra, acampados, assentados e agricultores familiares,
dirigentes sindicais, funcionários públicos, agentes
pastorais, religiosos, índios, quilombolas entre outros. No
estado do Pará, há uma 'Lista dos marcados para morrer",
onde constam nomes de dirigentes sindicais, políticos e
lideranças locais, em uma lista elaborada pelos fazendeiros
da região para serem eliminados pelos jagunços. O mais
triste é que, apesar das inúmeras denúncias feitas às
autoridades municipais, estaduais e federais, as ameaças
estão sendo cumpridas e a lista, só não diminui porque no
lugar dos assassinados, novas vítimas em potencial são
incluídas na relação, sem que os culpados sejam punidos
pelos seus crimes.

As principais características da violência no campo

a)É seletíva

Apesar da violência dos latifundiários vitimar


qualquer um que se oponha a seus interesses, ela atinge,
principalmente, às pessoas que tenham poder de influência
e de formação de opinião sobre as comunidades. Por isso,
dizemos que ela é seletiva, pois suas principais vítimas são
os dirigentes sindicais, lideranças sociais, agentes pastorais
e comunitários, religiosos, parlamentares, advogados, etc.
É importante destacar que a organização para os
crimes envolve uma tabela de preços para as vítimas.
Quanto mais influente for a liderança a ser eliminada, mais

215
alto é o valor a ser pago pelo seu assassinato, mesmo que
estes sejam irrisórios.

b)É Institucional

Uma outra característica da violência no campo é a


sua institucionalidade. Quase sempre, as ações de
repressão às lutas que geram as agressões e desrespeito
aos direitos humanos são apoiadas pelos organismos do
Estado, em especial as polícias. A interpretação das leis e
as determinações do poder judiciário, colocando o direito à
propriedade acima do direito à vida e à sobrevivência, na
maioria das vezes, corrobora e sustenta as ações dos
demais poderes, que não exitam em colocar o aparato
público a favor dos latifundiários e contra os trabalhadores
e trabalhadoras rurais. Para exemplificar, registra-se que
nos anos de 2003 e 2004, mais de 70 mil famílias sem terra
foram vítimas de despejos, ordenados pelo Poder Judiciário
e executados violentamente pela polícia militar.

c)É organizada

Apesar da ocorrência de fatos isolados, a violência


no campo está ligada às organizações formais ou informais
dos latifundiários. São criados consórcios, associações,
união de ruralistas, etc, como formas de se estabelecer
"redes' de financiamento para os assassinatos e de proteção
para as propriedades rurais contra a ação dos trabalhadores
e trabalhadoras rurais, especialmente os sem terra. Estas
organizações se valem da contratação e manutenção de
milícias privadas e de advogados e promovem a compra de
armas, dentre outras ações Ilegais. É comum, também, a
criação e "empresas de seguranças", que na verdade são
empresas de fachada para dar um caráter de legalidade à
contratação de pistoleiros para as fazendas.

Conclusão

A principal exigência para se conter a violência e a


violação aos direitos humanos no campo é a realização de
uma Reforma Agrária ampla e massiva. Esta política precisa
ser, efetivamente, uma ação prioritária do governo,
garantindo recursos humanos e financeiros e qualificando a
legislação e os instrumentos administrativos para assegurar
a agilidade e eficiência das ações. Só com a democratização
da terra será possível democratizar o poder e por um fim à
216
truculência, intolerância e ganância dos latifundiários que
colocam o direito à terra acima do direito à vida e à
cidadania.
É preciso que, de imediato, sejam tomadas medidas
efetivas como a conclusão dos processos de
desapropriação, o impedimento dos despejos ilegais e
arbitrários, a retomada das terras públicas invadidas por
grileiros destinando-as aos projetos de assentamento, a
ampliação dos recursos para a erradicação do trabalho
escravo e a manutenção do Cadastro de Empregadores,
conhecido como "Lista Suja", além da suspensão dos planos
irregulares de manejo florestal. Também é indispensável
que o Congresso Nacional cumpra o artigo 51 das
Disposições Constitucionais Transitórias determinando a
revisão das doações, vendas e concessões de terras
públicas no país e que coloque em pauta para aprovação
imediata a proposta de Emenda Constitucional que confisca
as terras onde se explora o trabalho escravo.
É urgente, também, que o poder judiciário priorize o
julgamento dos crimes contra os trabalhadores e
trabalhadoras rurais e de outras lideranças no campo.Para
por um fim à impunidade é fundamental concluir com
rapidez os inquéritos de todos os casos pendentes, levar a
julgamento e manter presos todos os culpados pelas
atrocidades cometidas contra os trabalhadores e
trabalhadoras rurais de todo o Brasil.
Em 2003, foi divulgado o Plano Nacional de Reforma
Agrária: Paz. Produção e Qualidade de Vida no Meio Rural,
pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário que verificou
um crescimento de 71 % das ocupações de terras em 2003,
em comparação a dados de 2002. Entre os anos 1990 e
2002, no Brasil, ocorreram cerca de 8.980 casos de
violência no campo.
Segundo a Comissão Pastoral da Terra - CPT -, no
período de 1985 a 2002, foram registrados no Brasil cerca
de 1300 casos de assassinatos de trabalhadores rurais,
técnicos, líderes sindicais, religiosos e até advogados. De
todos os casos registrados, somente 121 foram condenados.
Entre os mandantes dos crimes, aqueles que
indicam ou contratam um matador de aluguel, somente 14
foram julgados. Dos executores, somente 96 foram julgados
e 58 condenados. Referente à luta pela reforma agrária,
entre 1985 e 2002, cerca de 6.330 trabalhadores foram
presos.
Em 2003, no início do primeiro mandato do
presidente Lula, naquele período, o assassinato executado
217
contra.os trabalhadores rurais cresceu 69,8 % em
comparação a 2002. As ordens de despejos atingiram
35.297 famílias. O número de prisões também elevou-se a
140,5 %.
No ano de 2004, segundo dados da CPT, houve um
aumento de 10,8% nas prisões, das quais envolveram 421
trabalhadores rurais. Dentre as ocorrências de violência no
meio rural, o assassinato da Irmã Dorothy Stang, na cidade
de Anapu , estado de Pará, repercutiu em todo o mundo.
O assassinato ocorreu em 12 de fevereiro de 2005,
Irmã Dorothy era uma defensora religiosa da reforma
agrária e das questões ambientais no Norte do Brasil.
Depois de seu assassinato, sete dias depois, mais quatro
trabalhadores rurais foram assassinados na mesma região.
Considerando a história do Brasil, a violência no
campo herda traços sociais e estruturais de nossa
tradicional concentração fundiária e de nossas condições
atuais. Segundo o INCRA - Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária- na região amazônica, há propriedades
do tamanho do estado do Sergipe.
Em março de 2009, o Conselho Nacional de Justiça,
através da Portaria 491, criou o Fórum de monitoramento de
conflitos fundiários rurais e urbanos. O primeiro fórum
ocorreu em Campo Grande, estado do Mato Grosso do Sul.
O fórum pretendeu estabelecer debates e soluções
dos conflitos que ocorrem em todo o Brasil e, em grande
escala, na região Norte. Sabe-se que a violência rural está
relacionada à escravidão e semi-escravidão rural, à briga
por posse de terra, conflitos com as oligarquias estaduais,
tradicionais e o movimento dos sem-terra.

10.2 DISCURSO MIDIÁTICO E A VIOLÊNCIA

[...] Enquanto processo de constituição de uma


sociedade democrática, a participação popular por meio de suas
manifestações é um fato legítimo e inquestionável. Não há como
pensar a sociedade sem manifestações, mas a imprensa
privilegia determinados segmentos sociais em detrimento aos
movimentos populares e de suas lutas e reivindicações. O
descaso com o qual a imprensa, diga-se aqui a grande mídia,
vem tratando esses eventos revela uma visão ideológica que
desmerece a participação popular.
Dentre os vários tipos de movimentos, o que encontra
dificuldades na suaação e relação com a ideologia midiática do
sistema político e econômico dominante são os movimentos
revolucionários, ou seja, aqueles que lutam por mudanças mais
218
rápidas e drásticas dentro da sociedade, pois procuram alterar a
totalidade do sistema social existente. Eles esbarram em
interesses de classes antagônicas, muitas vezes até camufladas
em governos autoritários, que abafam os desejos de reformas. A
mídia se torna um veículo de propaganda ideológica junto à
opinião pública.
Com isto comprova-se que os movimentos sociais não
são invenções das classes populares, dos capitalistas ou mesmo
de intelectuais, eles nascem da insatisfação por parte de
determinada classe ou grupo social. Significa uma rebeldia
coletiva, um protesto diante do confronto ideológico entre um e
outro segmento social. Tomam medidas de mudança tomadas
pelas sociedades em conjuntos concordantes que podem causar
revoluções na realidade dos indivíduos.
HOBSBAWN (1995) ao tratar sobre as relações sociais,
relata que,“enquanto existem classes dominantes que
defendem o consenso hegemônico, outras resistem e
interpretam a sociedade como construída por sujeitos históricos
inseridos em grupos sociais distintos.”
Sob este aspecto, a organização da sociedade civil, as
manifestações populares e os movimentos sociais,
principalmente aqueles que assumem uma posição mais
emancipatória, que lutam pela transformação social, pelo fim da
exclusão e das injustiças sociais, confrontam-se com a lógica
capitalista e a difusão do projeto neoliberal. Aí a significante
parcela de participação da organização midiática como principal
arma de luta ideológica que são os meios de comunicação, para
impedir que os movimentos sociais avancem.
E de se lembrar também que os movimentos sociais
existem desde os tempos remotos e estão presentes em todas
as sociedades, vinculados a um determinado contexto histórico,
organizados e unidos por aspirações concretas orientadas para
uma mudança da sociedade.
Os movimentos sociais de cunho popular estão muito
presentes na
História do Brasil. Desde as rebeliões dos escravos, as
lutas operárias, ligas camponesas, até o MST, a luta pela
democracia, Os Sem-Teto e muitos outros. Para entender a
multiplicidade e ações específicas dos movimentos sociais
populares e suas consequências, repercussões ou resultados nas
ultimas trinta décadas no Brasil, é necessário compreender
parte da complexidade dos movimentos sociais. As lutas
indígenas, negros e mulheres, os sem-teto e sem-terra, os
portadores de deficiências, movimentos humanitários, culturais
e ecológicos, manifestações operárias e políticas poderão ser
compreendidos a partir da das ações antagônicas ao
219
capitalismo, mesmo assumindo, cada um desses atores
coletivos, sua estratégia peculiar de organização e de luta.
Os movimentos sociais populares, expressando as
contradições da sociedade capitalista, estão relacionados ou
mediados, com as contradições de classe. Daí os movimentos
serem fatos minimizados, justamente por mobilizarem a
população em várias partes do país. Em sua maioria foram e até
mesmo são violentamente reprimidos pelas forças dos governos.
A memória histórica tem sido descaracterizada para dar lugar a
uma visão de que quem dispõe de condições e de capacidade
para dirigir e governar são sempre minorias proprietárias e elites
intelectualizadas, monopolizadoras dos meios de comunicação e
informação - mentalidade que permanece até os dias atuais e só
contribui para manter a acomodação e o autoritarismo.
Segundo Betinho, em sua obra Como se Faz Uma
Análise de Conjuntura enfatiza que

“existem duas leituras possíveis dos acontecimentos e


dois modos diferentes de ler a conjuntura: a partir da
situação ou do ponto de vista do poder dominante (a
lógica do poder), e a partir da situação ou do ponto de
vista dos movimentos populares, das classes
subordinadas ou da oposição do poder dominante”
(SOUZA. 1984, p.15).

Os meios de comunicação, na forma em que existem


hoje, dificilmente darão espaço para a expressão ou a
constituição de interesses que ameacem as estruturas básicas
do capitalismo. Com isso, a situação é delicada para os
movimentos sociais, cada vez mais criminalizados pelo
pensamento único da Grande Mídia.
Mas, ao tentar incriminar os movimentos sociais, a
classe dominante, através dos meios midiático, enquadra os
fatos como acontecimentos como pensamentos da sociedade
como um todo. A ideologia dominante é colocada como um
conjunto de ideias consensuais de todos os indivíduos da
sociedade. Pretende com isso ganhar o apoio, principalmente de
setores da classe média, utilizando os meios de comunicação
procurando incriminar os movimentos sociais e seus líderes. A
sociedade acaba por se convencer e levar em consideração que
o ato de lutar por um direito torna-se um crime contra a ordem
social.
A mídia torna-se também cada vez mais importante
influência no processo de criminalização dos movimentos
sociais, enquanto instância de controle informal. Este meio
ideológico, em geral, busca desqualificar, ou ainda,"satanizar"
as ações dos movimentos, colocando-os como algozes,
220
responsabilizando-os pela intransigência, intolerância e
violência. Acontece um descredenciamento dos movimentos
sociais, apresentando-os como grupos subversivo-
revolucionários, arruaceiros, desordeiros e criminosos, muitas
vezes com teor terrorista. A denúncia distorcida e as falsas
acusações tornam-se atualmente as atitudes mais comuns que a
grande mídia utiliza para “demonizar” os movimentos sociais,
tratando-os como insignificantes,irresponsáveis, que atentam
contra as leis do mercado e trazem prejuízos para a economia e
a ordem pública. Irados editoriais, grandes manchetes, fotos
provocadoras, noticias exageradas, produções novelistas,
literárias, colunas e o jornalismo tendencioso buscam fazer
constantes críticas aos movimentos sociais, tratando-os de
subversivos, revolucionários entre outros “títulos” ora dados.
Substitui a notícia das razões das manifestações pelos
confrontos com a polícia. Conhece-se um movimento a partir do
confronto. Os movimentos sociais só tornam-se notícias quando
a polícia entra em confronto com eles. É por isso que muitos os
rejeitam sem conhecê-los. Por outro lado, o discurso da
manutenção da ordem social e a ideologia dominante
retransmitido pela mídia fazem esconder as injustiças sociais, a
concentração de renda, as desigualdades sociais e a
manutenção do poder e do sistema capitalista.
Diga-se hoje no Brasil, o papel da imprensa na
divulgação dos movimentos sociais é bastante recente,
destacando-se principalmente nas duas últimas décadas do
século XX, que vem enquadrando os movimentos sociais nas
seus noticiários vinculados a eventos rotineiros perturbadores
da ordem. Nota-se principalmente a incansável procura pela
deformação do MST.
Esta atribuição de estereótipos aos movimentos sociais,
de certa forma, retira a culpa daqueles que detêm o poder.
Tendo em conta que uma das representações do poder se dá por
meio do discurso, transmitida aos sujeitos sociais pela mídia.
Marx, ao afirmar que a comunicação somente é alcançada
quando se torna práxis social, contrapõe-se a poderosa mídia,
que se considera “formadora de opinião política, econômica,
social, cultural” determinando, com seu poder, o que devemos
pensar, sentir e falar. Sua relação com os movimentos sociais é
um dos fatores de desligitimação dos mesmos e um instrumento
do capitalismo para a retomada do projeto neoliberal no Brasil.
Assim, se apresenta uma verdadeira intimidação cultural e
social sobre as grandes maiorias. Levam-nos à interiorização da
ideologia deste pensamento único, consumista e neoliberal, nas
consciências das populações.
E todo este gigantesco poder da mídia está, por inteiro,
221
nas mãos do grande capital transnacional. Os movimentos
sociais não são meramente abstratos. Eles são constituídos por
sujeitos: homens e mulheres. A mídia, ao criminalizar um
movimento popular, criminaliza os sujeitos nele inseridos. Um
dos efeitos mais terríveis do neoliberalismo brasileiro tem sido o
que Marilena Chauí chama de “esfacelamento dos movimentos
sociais e populares” que foram os grandes sujeitos históricos e
políticos dos anos 70, 80 e 90 e continuam sendo até hoje.
O expediente de criminalização e as práticas de
violência contra os trabalhadores e trabalhadoras rurais sem-
terra revelam o caráter de um Estado ainda preso a um modelo
social e político autoritário que, de um lado relaciona entre os
seus objetivos e fundamentos: a dignidade da pessoa humana, a
erradicação da pobreza e da marginalização. E de outro,
mantém os seus excluídos afastados das políticas públicas que
deveriam assegurar aqueles mesmos fundamentos e, o que é
pior, usa para isso o direito penal como resposta para contenção
das demandas sociais.
Embora muitos movimentos sociais tenham lutado com
o intuito de promover transformações na realidade de
desigualdades sociais que o país ainda enfrenta, a força
burguesa utiliza-se das estruturas do Estado e da mídia de
grande porte para manter esta situação de dominação de
classes. O atual processo de criminalização dos movimentos
sociais está pautado no discurso neoliberal de manutenção da
ordem.
Atualmente a chamada “grande mídia” continua
operando de forma camuflada, mas sob outro foco: não apenas
de reproduzir a ideologia política do Estado, mas sob domínio da
propaganda e defensiva da ideologia dominante e subordinada a
lógica do mercado.

10.3 POLÍTICAS PÚBLICAS E VIOLÊNCIA


Fonte:APOSTILA FORMAÇÃO GERAL E ESPECÍFICA / TGRH-2009.2

Política pública é um conceito de política e da


administração que designa certo tipo de orientação para a
tomada de decisões em assuntos públicos, políticos ou coletivos.
Embora, políticas públicas seja um conceito oriundo
dessas duas áreas, vêm sendo utilizadas na mais variadas áreas.
Isso porque ele permite estudar o espaço social antes da
implementação. Para tanto, torna-se necessário a montagem de
equipe transdisclplinar, pois um projeto de política pública,
necessariamente deve permitir a transversalidade, além de
222
estabelecer um diálogo consencioso entre as partes (Ferreira
2008).
Entende-se por Políticas Públicas "o conjunto de ações
coletivas voltadas para a garantia dos direitos sociais,
configurando um compromisso público que visa dar conta de
determinada demanda, em diversas áreas. Expressa a
transformação daquilo que é do âmbito privado em ações
coletivas no espaço público" (Guareschi, Comunello, Nardini &
Hoenisch, 2004, pág. 180).
Para José-Matias Pereira política pública compreende
um elenco de ações e procedimentos que visam à resolução
pacífica de conflitos em torno da alocação de bens e recursos
públicos, sendo que os personagens envolvidos nestes conflitos
são denominados "atores políticos".
Existem diferenças entre decisões políticas e políticas
públicas. Nem toda decisão política chega a ser uma política
pública. Decisão política é uma escolha dentre um leque de
alternativas, já política pública, que engloba também a decisão
política, pode ser entendida como sendo um nexo entre a teoria
e a ação. Esta última está relacionada com questões de
liberdade e igualdade, ao direito à satisfação das necessidades
básicas, como emprego, educação, saúde, habitação, acesso à
terra, meio ambiente, transporte etc.

Demandas Comuns em Políticas Públicas

Demandas novas - Para Maria das Graças Rua, no


artigo Análise de Políticas Públicas, correspondem àquelas que
resultam do surgimento de novos atores políticos ou novos
problemas.
Demandas recorrentes: Também segundo Graças
Rua são aquelas que expressam problemas não resolvidos ou
mal resolvidos.
Demandas reprimidas: Ainda segundo Graças Rua,
são aquelas constituídas sob um estado de coisas ou por não-
decisão.

Tipos de Políticas Públicas


a) distributivas;b) redistributivas;c) regulatórias.

Fases ou Ciclo das Políticas Públicas


a) formação da agenda;b) formulação;c) implementação;d)
monitoramento; e) avaliação.

Atores em Políticas Públicas

223
Os atores políticos são as partes envolvidas nos
conflitos.
Esses atores ao atuarem em conjunto após o
estabelecimento de um projeto a ser desenvolvido onde as
estão claras as necessidade e obrigações das partes chegam a
um estágio de harmonia que viabiliza a política pública.
(Ferreira, 2008)

Atores Públicos:
Políticos Eleitos;Burocratas;Tecnocratas,etc.

Atores Privados:
Empresários;Trabalhadores,etc.

10.4 MOVIMENTOS SOCIAIS

Em linhas gerais, o conceito de movimento social se


refere à ação coletiva de um grupo organizado que objetiva
alcançar mudanças sociais por meio do embate político,
conforme seus valores e ideologias dentro de uma determinada
sociedade e de um contexto específicos, permeados por tensões
sociais. Pode objetivar a mudança, a transição ou mesmo a
revolução de uma realidade hostil a certo grupo ou classe social.
Seja a luta por um algum ideal, seja pelo questionamento de
uma determinada realidade que se caracterize como algo
impeditivo da realização dos anseios deste movimento, este
último constrói uma identidade para a luta e defesa de seus
interesses. Torna-se porta-voz de um grupo de pessoas que
se encontra numa mesma situação, seja social, econômica,
política, religiosa, entre outras.
Cada sociedade ou estrutura social teria como
cenário um contexto histórico (ou historicidades) no qual, assim
como também apontava Karl Marx, estaria posto um conflito
entre classes, terreno das relações sociais, a depender dos
modelos culturais, políticos e sociais. Assim, os movimentos
sociais fariam explodir os conflitos já postos pela estrutura
social geradora por si só da contradição entre as classes, sendo
uma ferramenta fundamental para a ação com fins de
intervenção e mudança daquela mesma estrutura.
Para Alain Touraine, os movimentos sociais são a
ação conflitante dos agentes das classes sociais (luta de
classes). Já para Manuel Castells, movimentos sociais são
sistemas de práticas sociais contraditórias de acordo com a
ordem social urbana/rural, cuja natureza é a de transformar a
estrutura do sistema, seja através de ações revolucionárias ou

224
não, numa correlação classista e em última instância, o poder
estatal.
Segundo Scherer-Warren, pode-se, portanto, concluir
que a sociedade civilé a representação de vários níveis de
como os interesses e os valores da cidadania se organizam em
cada sociedade para encaminhamento de suas ações em prol de
políticas sociais e públicas, protestos sociais, manifestações
simbólicas e pressões políticas. Num primeiro nível,
encontramos o associativismo local, como as associações
civis, os movimentos comunitários e sujeitos sociais envolvidos
com causas sociais ou culturais do cotidiano, ou voltados a
essas bases, como são algumas Organizações Não-
Governamentais (ONGs). Para citar apenas alguns exemplos
dessas organizações localizadas: núcleos dos movimentos de
sem-terra, sem-teto, empreendimentos solidários, associações
de bairro, etc. As organizações locais também vêm buscando se
organizar nacionalmente e, na medida do possível, participar de
redes transnacionais de movimentos (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra, Movimento dos Catadores de
Lixo, Movimento Indígena, Movimento Negro, etc.), ou através
de articulações inter-organizacionais. o movimento negro
(contra racismo e segregação racial), o movimento estudantil, o
movimento de trabalhadores do campo, movimento feminista,
movimentos ambientalistas, da luta contra a homofobia,
separatistas, entre outros. Alguns destes movimentos possuem
atuação centralizada em algumas regiões (como no caso de
movimentos separatistas na Europa). Outros, porém, com a
expansão do processo de globalização (tanto do ponto de
vista econômico como cultural) e disseminação de meios de
comunicação e veiculação da informação, rompem fronteiras
geográficas em razão da natureza de suas causas, ganhando
adeptos por todo o mundo, a exemplo do Greenpeace,
movimento ambientalista de forte atuação internacional.
Dessa forma, para além das instituições democráticas
como os partidos, as eleições e o parlamento, a existência dos
movimentos sociais é de fundamental importância para a
sociedade civil enquanto meio de manifestação e
reivindicação.
A existência de um movimento social requer uma
organização muito bem desenvolvida, o que demanda a
mobilização de recursos e pessoas muito engajadas. Os
movimentos sociaisnão se limitam a manifestações públicas
esporádicas, mas trata-se de organizações que
sistematicamente atuam para alcançar seus objetivos políticos,
o que significa haver uma luta constante e em longo prazo
dependendo da natureza da causa. Em outras palavras, os
225
movimentos sociais possuem uma ação organizada de caráter
permanente por uma determinada bandeira.
Observa-se que as mobilizações na esfera pública
são fruto da articulação de atores dos movimentos sociais
localizados, das ONGs, dos fóruns, mas buscam transcendê-los
por meio de grandes manifestações na praça pública,
incluindo a participação de simpatizantes, com a finalidade de
produzir visibilidade através da mídia e efeitos simbólicos para
os próprios manifestantes (no sentido político-pedagógico) e
para a sociedade em geral, como uma forma de pressão política
das mais expressivas no espaço público contemporâneo. Alguns
exemplos ilustram essa forma de organização, incluindo
vários setores de participantes: a Marcha Nacional pela Reforma
Agrária, de Goiânia a Brasília (maio de 2005), foi organizada por
articulações de base como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o
Grito dos Excluídos e o próprio MST e por outras, transnacionais,
como a Via Campesina.
A luta pela cidadania e O Fórum Social Mundial
(FSM) bem como outros fóruns e redes transnacionais de
organizações têm sido espaços privilegiados para a articulação
das lutas por direitos humanos em suas várias dimensões
sociais. Assim, através dessas articulações em rede de
movimento observa-se o debate de temas transversais,
relacionados a várias faces da exclusão social, e a demanda de
novos direitos. Essa transversalidade na demanda por direitos
implica o alargamento da concepção de direitos humanos e a
ampliação da base das mobilizações.

Movimentos sociais nos anos 1960 E 1970

01 - Movimento Hippie
Os "hippies" eram parte do que se convencionou
chamar movimento de contracultura dos anos 1960 tendo
relativa queda de popularidade nos anos 70 nos EUA,
embora o movimento tenha tido muita força em países
como o Brasil somente na década de 70. Uma das frases
associada a este movimento foi a célebre máxima "Paz e
Amor" (em inglês "Peace and Love") que a qual criticava
o uso de armas nucleares.
Bandeiras: questões ambientais, a prática de nudismo,
e a emancipação sexual eram idéias respeitadas
recorrentemente por estas comunidades.
Adotavam um modo de vida comunitário, tendendo
a uma espécie de socialismo-anarquista ou estilo de vida
nômade e à vida em comunhão com a natureza, negavam
o nacionalismo e a Guerra do Vietnã, bem como todas as
226
guerras, abraçavam aspectos de religiões como o
budismo, hinduismo, e/ou as religiões das culturas
nativas norte-americanas e estavam em desacordo com
valores tradicionais da classe média americana e das
economias capitalistas e totalitárias. Eles enxergavam o
patriarcalismo, o militarismo, o poder governamental, as
corporações industriais, a massificação, o capitalismo, o
autoritarismo e os valores sociais tradicionais como
parte de uma "instituição" única, e que não tinha
legitimidade.
Nos anos 1960, muitos jovens passaram a
contestar a sociedade e a pôr em causa os valores
tradicionais e o poder militar e econômico. Esses
movimentos de contestação iniciaram-se nos EUA,
impulsionados por músicos e artistas em geral. Os hippies
defendiam o amor livre e a não-violência. Como grupo, os
hippies tendem a viver em comunidades coletivistas ou
de forma nômade, vivendo e produzindo
independentemente dos mercados formais, usam cabelos
e barbas mais compridos do que era considerado
"elegante" na época do seu surgimento. Muita gente não
associada à contracultura considerava os cabelos
compridos uma ofensa, em parte por causa da atitude
dos hippies, às vezes por acharem "anti-higiênicos" ou os
considerarem "coisa de mulher".
Os Hippies não pararam de fazer protestos contra a
Guerra do Vietnã, cujo propósito era acabar com a guerra. A
massa dos hippies eram soldados que voltaram depois de ter
contato com os indianos e a cultura oriental que, a partir desse
contato, se inspiraram na religião e no jeito de viver para
protestarem.

02 - Movimento Feminista
O feminismo alterou principalmente as perspectivas
predominantes em diversas áreas da sociedade ocidental, que
vão da cultura ao direito. As ativistas femininas fizeram
campanhas pelos direitos legais das mulheres (direitos de
contrato, direitos de propriedade, direitos ao voto), pelo direito
da mulher à sua autonomia e à integridade de seu corpo, pelos
direitos ao aborto e pelos direitos reprodutivos (incluindo o
acesso à contracepção e a cuidados pré-natais de qualidade),
pela proteção de mulheres contra a violência doméstica, o
assédio sexual e o estupro, pelos direitos trabalhistas, incluindo

227
a licença-maternidade e salários iguais, e todas as outras formas
de discriminação.
Desde a década de 1980, as feministas argumentaram
que o feminismo deveria examinar como a experiência da
mulher com a desigualdade se relaciona ao racismo, à
homofobia, ao classismo e à colonização. No fim da década e
início da década seguinte as feministas ditas pós-modernas
argumentaram que os papeis sociais dos gêneros seriam
construídos socialmente, e que seria impossível generalizar as
experiências das mulheres por todas as suas culturas e histórias.

03 -Movimento Estudantil
O movimento estudantil é um movimento social da
área da educação, no qual os sujeitos são os próprios
estudantes. Caracteriza-se por ser um movimento policlassista e
constantemente renovado - já que o corpo discente se renova
periodicamente nas instituições de ensino.
Contemporaneamente, destacam-se os movimentos
estudantis da década de 1960, dentre os quais os de maio de
1968), na França. No mesmo ano, também se registraram
movimentos em vários outros países da Europa Ocidental, nos
Estados Unidos e na América Latina. No Brasil, o movimento
teve papel importante na luta contra o regime militar que se
instalou no país a partir de 1964, como por exemplo nas Diretas-
Já e pós-ditadura, no Impeachment de Collor (1992), com o
movimento dos cara-pintadas.

Os Movimentos Sociais no Brasil

A análise dos movimentos sociais no Brasil revelam


forte enfoque teórico oriundo do marxismo, sejam eles
vinculados ao espaço urbano e/ou rural. Tais movimentos,
quando se referiam ao espaço urbano possuíam um leque
amplo de temáticas como por exemplo, as lutas por creches, por
escola pública, por moradia, transporte, saúde, saneamento
básico etc. Quanto ao espaço rural, a diversidade de temáticas
expressou-se nos movimentos de bóias-frias (das regiões
cafeeiras, citricultoras e canavieiras, principalmente), de
posseiros, sem-terra, arrendatários e pequenos proprietários.
Cada um dos movimentos possuía uma
reivindicação específica, no entanto, todos expressavam as
contradições econômicas e sociais presentes na sociedade
brasileira.

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01 -Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra –
MST
OMovimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra,
também conhecido pela sigla MST, é um movimento social
brasileiro de inspiração marxista cujo objetivo é a implantação
da reforma agrária no Brasil. Teve origem na aglutinação de
movimentos que faziam oposição ou estavam desgostosos com
o modelo de reforma agrária imposto pelo regime militar,
principalmente na década de 1970, o qual priorizava a
colonização de terras devolutas em regiões remotas, com
objetivo de exportação de excedentes populacionais e
integração estratégica. Contrariamente a este modelo, o MST
declara buscar a redistribuição das terras improdutivas.
Uma das atividades do grupo consiste na ocupação
de terras improdutivas como forma de pressão pela reforma
agrária, mas também há reivindicação quanto a empréstimos e
ajuda para que realmente possam produzir nessas terras. Para o
MST, é muito importante que as famílias possam ter escolas
próximas ao assentamento, de maneira que as crianças não
precisem ir à cidade e, desta forma, fixar as famílias no campo.

02 -Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) surgiu


em 1997 da necessidade de organizar a reforma urbana e
garantir moradia e a todos os cidadãos. Está organizado nos
municípios do Rio de Janeiro, Campinas e São Paulo. É um
movimento de caráter social, político e sindical. Em 1997, o MST
fez uma avaliação interna em que reconheceu que seria
necessária uma atuação na cidade além de sua atuação no
campo. Dessa constatação, duas opções de luta se abriram:
trabalho e moradia.
Atualmente, o MTST é autônomo em relação ao MST,
mas tem uma aliança estratégica com esse.

03 -Movimento nacional dos Direitos Humanos – MNDH


Ditadura nunca mais: por que?
A história brasileira é marcada por longos períodos de
exceção vividos sob ditaduras civis-militares e por breves
períodos democráticos. O atual período democrático é o mais
duradouro e consistente. Ele sucede, não esqueçamos, a
recente ditadura civil-militar que emudeceu o Brasil por 20
anos, de 1º de abril de 1964 a 1985.
Mas, por que ditadura nunca mais? O que cabe a uma
democracia que sucede a uma ditadura? Estas não são
perguntas. São questões. Por isso, queremos menos responder a
elas e mais ajudar a refletir sobre elas.

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O povo brasileiro sabe o que significou a ditadura
militar nas suas vidas. Famílias que perderam seus filhos ainda
esperam para enterrá-los. Pessoas que foram torturadas ainda
esperam para poder dizer quem foram seus algozes. Vozes
ainda têm dificuldade de dizer com força o que pensam por
terem medo de serem reprimidas. A tortura segue sendo prática
sistemática em delegacias e presídios. Esta é a herança da
ditadura. Vítimas que sofreram e ainda sofrem a injustiça, que
ainda esperam pela possibilidade de dizer sua palavra e ver a
verdade proclamada. Vítimas que ainda esperam por justiça.
A democracia é preferível a qualquer ditadura não por
outro motivo senão porque permite que memória e verdade
sejam constitutivas da justiça como realização de condições
para a efetivação da dignidade humana. A justiça exige o
reconhecimento das injustiças e de suas vítimas, que sofreram a
injustiça. Sem isso, a justiça é vazia. Mas, sem que as próprias
vítimas possam dizer sua palavra, sua verdade, recorrendo à
memória dos fatos que as levaram à situação de vitimização,
não há justiça. O querer justiça como memória e verdade
das vítimas é um direito das próprias vítimas, mas não só, ele
também é de todos os seres humanos, até porque esta é a
forma efetiva de engajar a todos/as para que não sejam
produzidas novas vítimas. Por isso, o direito à memória, à
verdade e à justiça se constitui num dos direitos humanos
mais basilares das sociedades democráticas. O nunca mais a
todo e qualquer tipo de violação de direitos, a todo tipo situação
que produz vitimas, a todo tipo de inviabilização do humano, é a
expressão positiva do querer um mundo justo e humanizado
para todas e cada uma das pessoas.
Por isso faz sentido a Comissão Nacional da
Verdade, criada pela Lei nº 12.528, de 18/11/2011. Ela poderá
ser um espaço capaz para construir a verdadeira verdade sobre
o período da ditadura civil-militar brasileira e, por outro, para
desconstruir algumas das verdades repetidas – nem tão
verdadeiras assim – pelos que têm pavor de verdades que não
sejam as deles próprios. Ela não terá alcance para fechar o tripé,
pois dela não se poderá esperar justiça. Mas, se ela for capaz de
produzir verdades com base na memória das vítimas,
certamente abrirá caminho para que venha também a justiça.
Por isso, ela é um grande recurso para que a democracia
gere condições a fim de que, em uníssono, a sociedade
brasileira diga: ditadura, nunca mais! Democracia, sempre, e
com direitos humanos!

Fórum Social Mundial – FSM

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O Fórum Social Mundial (FSM) é um evento
altermundialista organizado por movimentos sociais de diversos
continentes, com objetivo de elaborar alternativas para uma
transformação social global. Seu slogan é:“Um outro mundo é
possível”.
É um espaço internacional para a reflexão e
organização de todos os que se contrapõem à globalização
neoliberal e estão construindo alternativas para favorecer o
desenvolvimento humano e buscar a superação da dominação
dos mercados em cada país e nas relações internacionais.

Obs.: Referências bibliográficas e webliográficas: todas


as referências ou fontes usadas para a elaboração deste
material encontram-se junto aos textos.

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