Trabalhadoras Domésticas - Ebook PDF

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TRABALHADORAS DOMÉSTICAS

Trilhas de desigualdade e invisibilidade social


Universidade Estadual da Paraíba
Prof. Antonio Guedes Rangel Junior | Reitor
Prof. Flávio Romero Guimarães | Vice-Reitor

Editora da Universidade Estadual da Paraíba


Luciano do Nascimento Silva | Diretor
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Presidente
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Fone/Fax: (83) 3315-3381 - http://eduepb.uepb.edu.br - email: [email protected]
Flávio Romero Guimarães

TRABALHADORAS DOMÉSTICAS
Trilhas de desigualdade e invisibilidade social

Campina Grande - PB
2018
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A reprodução não autorizada desta publicação, por qualquer meio,
seja total ou parcial, constitui violação da Lei nº 9.610/98.
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Revisão Linguística
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Elizete Amaral de Medeiros

Normalização Técnica
Antônio de Brito Freire
Jane Pompilo dos Santos

FONTE: Jean.Baptiste Debret, Um jantar brasileiro, 1927 -


Aquarela sobre papel 15,9 x 21,9cm.
Museu Chácara do Céu – Santa Teresa - Rio de Janeiro - Brasil.
Dedico este livro a Creuza Maria de Oliveira, pio-
neira do movimento organizado das trabalhadoras
domésticas brasileiras, agraciada com o Prêmio
Nacional de Direitos Humanos de 2003 no Bra-
sil, face à luta pela erradicação do trabalho infantil
doméstico.
Um dia o trabalho doméstico foi herança marcante
da escravidão.
Hoje, é um grito de liberdade.
Finalmente, a alforria.
SUMÁRIO

PREFÁCIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

PARA INÍCIO DE CONVERSA:


EMPREGADAS DOMÉSTICAS, QUEM? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

INSERÇÃO DAS EMPREGADAS DOMÉSTICAS NO


CONTEXTO SOCIAL BRASILEIRO 33 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

CARACTERÍSTICAS DAS EMPREGADAS DOMÉSTICAS:


ASSOCIADAS/SINDICALIZADAS E NÃO
ASSOCIADAS/NÃO SINDICALIZADAS DE
SEIS CIDADES BRASILEIRAS 43 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

QUANTO AO GÊNERO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

QUANTO A FAIXA ETÁRIA DAS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . . 51

ESTADO CIVIL DAS (OS) TRABALHADORAS (ES)


DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59

AUTO DECLARAÇÃO DE COR OU ETNIA DAS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 63 . . . . . . . . . . . .
CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS DAS FAMÍLIAS
DAS TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 71 . . . . . . . .

EXISTÊNCIA DE DEPENDENTES NAS FAMÍLIAS DAS


EMPREGADAS DOMÉSTICAS 71 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

NATUREZA DA ESCOLA DOS (AS) FILHOS (AS) DAS


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 77 . . . . . . . . . . . .

NÍVEL DE ESCOLARIDADE DAS TRABALHADORAS (ES)


DOMÉSTICAS (OS) 81. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

COTIDIANO LABORAL DAS TRABALHADORAS


DOMÉSTICAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
Atividade em exercício das (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
Motivação das trabalhadoras (es) domésticas (os) para a
escolha da profissão 92
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Tempo de serviço das trabalhadoras (es) domésticas (os) . . . . . 99


Atividade desenvolvida atualmente em relação à atividade
ajustada no início do contrato pelas (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os) 102
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Participação de cursos de capacitação pelas (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
Recebimento de mais de uma remuneração pelas (os)
trabalhadoras (es) domésticas (os) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107
Existência de aposentadoria entre as (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os) 110
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Recebimento de salário fixo desde o ingresso na profissão entre


as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os) 119 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Existência de carteira assinada desde o ingresso na profissão entre
as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os) 121 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Faixa salarial das (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
Renda familiar entre as (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131

FAMÍLIA VERSUS EMPREGO DOMÉSTICO . . . . . . . . . . . . . . . . 139

INTERFERÊNCIA NEGATIVA DO EXERCÍCIO


PROFISSIONAL NO CUIDADO COM A FAMÍLIA
ENTRE AS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139

CUIDADO DOS FILHOS NAS AUSÊNCIAS


MOTIVADAS PELO EMPREGO ENTRE AS (OS)
TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . 142

INCIDÊNCIA DE FALTA AO TRABALHO PARA


CUIDAR DA FAMÍLIA (FILHOS) PELAS (OS)
TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . 149

DESCONTO NO SALÁRIO PELOS PATRÕES EM


FACE DE FALTAS JUSTIFICADAS PELO CUIDADO
COM OS FILHOS PELAS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) 155
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

COMPENSAÇÃO DAS FALTAS AO TRABALHO


PELAS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
RELIGIOSIDADE E CONTEXTO LABORAL DAS
TRABALHADORAS DOMÉSTICAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161

RELIGIÃO DECLARADA PELAS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . 161

INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO NO EXERCÍCIO DA


PROFISSÃO PELAS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 166

CONDIÇÕES DE VIDA E ATIVIDADE LABORAL DAS


TRABALHADORAS DOMÉSTICAS 171 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

EXISTÊNCIA DE RESIDÊNCIA PRÓPRIA ENTRE AS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 171 . . . . . . . . . . .

LOCALIZAÇÃO DA RESIDÊNCIA EM RELAÇÃO


AO LOCAL DE TRABALHO ENTRE AS (OS)
TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . 174

TEMPO DO TRAJETO DE CASA ATÉ O LOCAL DE


TRABALHO PELAS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) 178
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

CONDIÇÃO DA RUA DE MORADIA DAS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . 181

DIVISÃO DAS DESPESAS DO LAR COM OUTROS


MORADORES ENTRE AS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) 183
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

RECURSOS DE INFRAESTRUTURA DAS


RESIDÊNCIAS DAS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 186
SITUAÇÃO DA MORADIA (CONJUGADA OU NÃO) DAS
(OS) TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 190 . . . .

EXISTÊNCIA DE JARDIM NAS RESIDÊNCIAS DAS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 196 . . . . . . . . . . .

EXISTÊNCIA DE QUINTAL NAS RESIDÊNCIAS DAS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 199 . . . . . . . . . . .

PROFISSÃO, PROFISSIONALIZAÇÃO E HERANÇA


FAMILIAR 203
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

FAIXA ETÁRIA DE INGRESSO NA PROFISSÃO


ENTRE AS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 203

APRENDIZADO DA PROFISSÃO ENTRE AS (OS)


TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . 208

VÍNCULO FORMAL ANTERIOR À PROFISSÃO


ENTRE AS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211

EXISTÊNCIA DE OUTROS MEMBROS DA FAMÍLIA NA


PROFISSÃO ENTRE AS (OS) TRABALHADORAS (ES)
DOMÉSTICAS (OS) 214 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

PARENTESCO DOS MEMBROS DA FAMÍLIA QUE


TRABALHAM NA MESMA PROFISSÃO ENTRE AS (OS)
TRABALHADORAS (ES) DOMÉSTICAS (OS) 216 . . . . . . . . . . .

PARA FIM DESTA CONVERSA:


ONDE CHEGAMOS? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219

REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 237
17

PREFÁCIO

Maria Esther Martínez Quinteiro1


Enrique Cabero Morán2

Son pocas las personas tan dinámicas, operativas, multiva-


lentes, y con una curiosidad científica tan plural y un rigor aca-
démico tal como los que muestra habitualmente el “bi-doctor” y
profesor de Derecho Flávio Romero Guimarães, Vicerreitor da
Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) en este momento,
tras haber acumulado gran experiencia en diversos e impor-
tantes cargos de gestión y como investigador. Así es el autor
de este libro titulado “Trabalhadoras domésticas: Trilhas de
desigualdade e invisibilidade social”, que hoy tenemos el honor
de prologar conjuntamente el Vicerrector de la Universidad de
Salamanca y Profesor Titular del Derecho de Trabajo Enrique
Cabero Morán y la profesora catedrática de la Universidad
Portucalense (UPT) portuguesa, tras su jubilación en la USAL,
Mª Esther Martínez Quinteiro.

1 Profesora catedrática de la Facultad de Derecho de la Universidad


Portucalense Infante don Henrique de Oporto en Portugal (UPT),
jubilada de la Universidad de Salamanca
2 Profesor Titular del Derecho del Trabajo y vicerrector de Promoción y
Coordinación de la Universidad de Salamanca.
18

Una obra que reproduce apenas una parte de la extensa tesis


doctoral, dirigida por nosotros dos, más amplia y con el formato
más rígido y complejo exigible para el caso, que el profesor
paraibano presentó en la ocho veces centenaria Universidad de
Salamanca en diciembre de 2016 y que tuvo en los miembros
del tribunal internacional que la juzgó la mejor de las acogi-
das. Para realizar esta segunda tesis suya, elaborada en el marco
del Programa de Doctorado de la Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca sobre “Estudios interdisciplinares
de género y políticas de igualdad”, Flávio Romero Guimarães
eligió un tema acorde con sus preocupaciones sociales y con su
probado compromiso con el entorno, de interés actual, estu-
diando cómo, y por qué, se produjo la Emenda Constitucional
nº 72, de 03 de abril de 2013 e y la Lei Complementar nº
150, de 02 de junho de 2015, las cuales equiparan los derechos
laborales de los empleados domésticos, en su mayoría mujeres,
con los de los demás trabajadores rurales y urbanos, reforma
legislativa que venía siendo demandada por las empleadas del
hogar sindicadas y apoyada por otros movimientos sociales y
que es positivamente valorada tanto por las primeras mencio-
nadas, como por las empleadas no sindicadas, beneficiarias de
los esfuerzos realizados por terceras personas más movilizadas
y organizadas, que desconocen.
La Reforma mencionada, cuyo impacto laboral empieza a
dejarse sentir, aunque no hay podido terminar de un plumazo
con todas las discriminaciones de las afectadas por ella, causó
recientemente una viva polémica los medios de comunicación
y en la Cámara de Diputados de Brasil, pero finalmente salió
adelante, impulsando un proceso de cambio inconcluso, que
afecta directamente a un gran número de mujeres y a la socie-
dad en su conjunto. El autor del libro adoptó, para el abordaje
19

de esta cuestión multifacética, una oportuna perspectiva inter-


disciplinar, como lo evidencia la parte de la misma reelabo-
rada y parcialmente recogida en el interesante trabajo que hoy
ofrece al público.
Desde la antedicha perspectiva, la publicación que el lector
tiene entre sus manos analiza la evolución, la situación pre-
sente y las perspectivas futuras de las trabajadoras domésticas
brasileñas, antaño esclavas y, tras la abolición de la esclavitud
en 1888, extraídas de las clases populares, mayoritariamente
pobres, negras, con una formación escasa o poco cualificada
y oportunidades laborales limitadas, un colectivo interrelacio-
nado con el de las madres (y los padres) de las clases medias o
acomodadas que dejan en sus manos el cuidado de la casa y de
la prole para descargarse de las fatigosas funciones del cuidado
inherentes al mantenimiento de la familia, o, en su caso, con-
tratan empleadas para poder ejercer una profesión remunerada
fuera de su hogar.
El autor del libro lanza sobre el colectivo investigado y los
colectivos con los que interacciona, una mirada caleidoscó-
pica, efectuada desde el Derecho, la Sociología y la Historia
y desde un doble enfoque, hoy difícilmente deslindable, por
interdependiente (aunque a veces se olvide): el de los Derechos
Humanos y el de género. Un enfoque que, aportando originali-
dad y novedad al estudio efectuado, y distinguiéndolo de otros
efectuados anteriormente, de carácter marcadamente descrip-
tivo en bastantes casos, comporta la atención a la dimensión
trasnacional del acontecer nacional, la cual cobra importancia
creciente, como factor concurrente, en la sociedad globalizada,
que es obligado traer a colación para explicar la etiología y
la naturaleza de la discriminación de las domésticas y de la
reforma legal efectuada para corregirla.
20

Sostiene en efecto Flávio Romero Guimarães en esta


monografía, que, no debiendo desestimarse la herencia ideo-
lógica del sistema esclavista brasileño, simplificador comodín
explicativo de todos los males en todos los tiempos, para enten-
der la explotación laboral y los abusos sufridos tras la aboli-
ción de la esclavitud por las trabajadoras del hogar, conviene
recordar que tales abusos fueron estimulados también por la
costumbre o las prácticas patriarcales importadas de Europa
por la burguesía colonizadora, lo que explica los componen-
tes de género compartidos y las similitudes detectables en el
trato dado por los empleadores a sus empleadas domésticas,
con diferencias de tiempo y grado, a ambos lados del Atlántico.
Asimismo hace notar el autor, con argumentos convin-
centes, que no es casual que la Propuesta y aprobación de la
Enmienda Constitucional familiarmente conocida por los
brasileños como “la PEC de las domésticas” coincida en el
tiempo con la aprobación del Convenio nº 189 sobre el Trabajo
Decente para las Trabajadoras y los Trabajadores Domésticos,
aprobado en Ginebra en la 100ª Reunión de la Conferencia
Internacional de la OIT, el 16 junio 2011, que entraría en vigor
finalmente el 05 de septiembre 2013.
Ciertamente Brasil es proclive a firmar y ratificar convenios
internacionales por razones de imagen, tanto como a desen-
tenderse de cumplirlos, por lo que resulta significativo que, tras
colaborar activamente en la elaboración del Convenio 189 de
la Organización Internacional del Trabajo, justamente en este
caso evitara ratificarlo, lo que escenifica una particular resisten-
cia a comprometerse a implementarlo en todos sus exigentes
términos. No por ello, sin embargo, dejaría de generar dicho
convenio, y las presiones de la OIT, expectativas y argumen-
tos legitimadores de la lucha contra la discriminación de las
21

domésticas, estimulando la organización de colectivos afecta-


dos o solidarios con su causa, convertidos en agentes internos
de presión, y movilizándolos con éxito. El profesor paraibano
subraya el impacto de esta acción.
No habiendo duda de que las leyes favorecen los cambios
más arriba señalados y de que éstas son también modificadas
por el desarrollo interno, hay casos, fuera de Brasil, que avalan el
particular potencial de la acción internacional para transformar
el sistema regulador de trabajo doméstico que se subraya en el
libro ahora prologado: Por ejemplo, Elena Desdentado Daroca
mantiene en un artículo titulado “Las reformas de la regulación
del trabajo doméstico por cuenta ajena em España”, publicado
en 2016, en el Vol 7, nº 1, de la Revista de Investigaciones
Feministas, referente a las reformas de 2012 en la materia efec-
tuadas por España (país que tampoco ratificó el Convenio 189
de la OIT), una explicación similar a la de Flavio Romero para
el caso brasileño.
Señalar la importancia de los estímulos internacionales,
no impide al autor del libro destacar la influencia de factores
endógenos derivados del desarrollo económico y cultural en la
modalidad imperante de contratación de empleadas domésti-
cas, cada vez más reacias a aceptar la condición de “internas”
convivientes al cien por cien con la familia y más proclives a
la búsqueda de contratación por horas, en la medida en que
aumenta, con la formación y las oportunidades laborales de las
jóvenes, su posibilidad de procurar la mejora de su baja con-
sideración social y de exigir condiciones menos duras y más
libertad de movimientos. Teniendo en cuenta la amplitud de
enfoques y factores explicativos de las transformaciones en
curso del sistema de trabajo doméstico en el Brasil de hoy, así
como la novedosa demostración de la importancia lograda
22

por el discurso internacional de los derechos humanos para la


renovación de dicho sistema, podemos concluir que estamos
ante un trabajo solido y maduro, sobre un asunto de innegable
interés social y actualidad, que recomendamos adquirir y leer
con calma.

Salamanca, 01 de mayo de 2017.


23

APRESENTAÇÃO

Luciano Albino3

A interdisciplinaridade pode, a princípio, ser abordada de


duas maneiras. A primeira, pelo trabalho intenso em uma área
do conhecimento, cujo empenho sobre certas questões pontuais
geram articulações com outras disciplinas ou temas. Em outras
palavras, a especialização, paradoxalmente, induz a interlocu-
ção, tendo em vista que a natureza da pesquisa científica con-
siste em não se esgotar, mas, ao contrário, na capacidade de
ampliar horizontes sobre os mesmos problemas. O segundo
modo possível de se construir uma análise interdisciplinar diz
respeito à articulação de várias frentes de conhecimento sobre
uma temática proposta.
Neste caso, mais do que misturar abordagens cognitivas,
exige-se o poder reflexivo para construir saberes pela maturi-
dade como o problema passou a ser lido a partir de múltiplos
olhares. Seja por um caminho ou por outro, para não cair na
vala da mediocridade ou ser tachado de trabalho superficial, o

3 Sociólogo, doutor em Sociologia e professor da Universidade Estadual


da Paraíba - UEPB.
24

texto interdisciplinar deve possuir, necessariamente, dois indi-


cadores que se identificam e combinam: erudição e experiência.
O livro do professor dr. Flávio Romero se encaixa no
segundo caso descrito. Sua experiência no campo acadêmico vai
da área da Saúde ao Direito, passando pelas Políticas Públicas
e Ciências Sociais, amadurecida, ainda mais, pelo trânsito na
gestão pública em várias situações, seja como Secretário de
Educação, seja no âmbito universitário como vice-Reitor da
Universidade Estadual da Paraíba. Tal leque de vivências lhe
credenciou para a elaboração de um pensamento, por natureza,
interdisciplinar. Isto fica evidente no caminho que trilhou para
abordar a questão do trabalho doméstico, com ênfase à questão
da invisibilidade social e o caso da desigualdade, próprias ao
universo das trabalhadoras desse setor no Brasil.
É possível identificar quatro pilares que fundamentam a
pesquisa e o texto como um todo. O primeiro, e mais impor-
tante, sem dúvidas, consiste na preocupação de ordem antro-
pológica a partir da qual a trabalhadora doméstica se insere no
mercado de trabalho brasileiro. Significa afirmar que, segundo
o estudo do professor Flávio Romero, o que nós temos neste
espaço resulta de uma herança do modus operandi particular ao
servilismo típico de nossa formação escravocrata.
Neste sentido, falar de trabalho doméstico, no Brasil, é uma
espécie de identificação de continuidades com esse passado
que, ao que parece, teima em não se desligar de nossas relações
mais comezinhas. A preocupação antropológica dá margem
para outro profundo debate a respeito dos direitos humanos e
fundamentais. Neste segundo pilar, pode-se perceber, mediante
dados quantitativos e reflexão apropriada, que o Brasil possui o
maior número de empregadas domésticas do mundo, cujo tra-
balho se caracteriza pela baixa remuneração, em muitos casos
25

abaixo do salário-mínimo, além de precárias condições de tra-


balho, assédio sexual e diversas outras formas de exploração.
O foco antropológico sobre a formação do Brasil e o desta-
que sobre os direitos humanos e fundamentais deram margem
para outra sensibilidade investigativa, notadamente a que diz
respeito a preocupações sobre gênero e raça, tendo em vista a
constatação empírica de que a quase totalidade da categoria é
formada por mulheres de maioria negra.
No quarto eixo que sustenta o livro, vê-se o cuidado com a
pesquisa empírica. O trabalho foi realizado a partir da coleta
de informações em sete capitais brasileiras, distribuídas em
todas as regiões do país e no Distrito Federal. Os dados obti-
dos sinalizam a capacidade de sindicalização das trabalhadoras
e de suas dificuldades, no que se refere a baixa escolaridade
e a precarização do trabalho, ainda muito definido no plano
informal. Nesta direção, os dados denunciam uma espécie de
obscuridade que camufla e torna bastante invisível o trabalho
de doméstica como atividade formal, muito por ser conside-
rado um serviço visceralmente atribuído ao cuidado, à afetivi-
dade dentro de casa. Portanto, visto culturalmente como uma
espécie de oposto em relação ao que se considera próprio e
pertinente à legislação trabalhista.
O livro do professor Flávio estimula o leitor para a refle-
xão sobre um país que se pretende moderno em várias fren-
tes, inclusive legal, mas que ainda se vê, em pleno século XXI,
atrelado a formas arcaicas e desumanas em relação ao trabalho.
Com a garantia de direitos às empregadas domésticas a partir
da Lei Complementar 150/2015, que produziu uma emenda
à Constituição de 1988, constatou-se a efervescência sobre
os debates relativos ao trabalho doméstico, tendo em vista o
26

afloramento de várias vozes da Casa Grande, revoltosas em


relação a tais garantias de direitos.
A leitura deste texto provoca, assim, o exercício retrorrefle-
xivo a respeito do Brasil e da atual conjuntura. Afirmo isto em
decorrência de estarmos, como país, nesta encruzilhada política
e cultural, pois demonstramos, tantas vezes e por diversas for-
mas, capacidade de gerar riqueza e modernização, ao mesmo
tempo em que estamos presos a práticas autoritárias que se
mostram ser mais presente do que passado.
A escravidão não é só herança, ela parece ter sido meta-
morfoseada. Temos tráfego de valores e práticas que teimam
em deixar na cova os direitos humanos, o trabalho doméstico
e tudo aquilo que esteja associado ao pobre. Temos, enfim, a
imensa capacidade de tornar invisíveis e reclusos os abandona-
dos desse modelo desigual de gerar riqueza.
O texto que segue nos induz, portanto, ao maior entendi-
mento da realidade estudada sobre as empregadas domésticas
no Brasil, não no intuito de se limitar a tal análise pontual, com
dados e mensurações compreensivas decorrentes, mas para a
necessidade de iluminar certas atitudes que, de tão comuns e
familiares, parecem não existir, como o tratamento opressor
que cotidianamente se reproduz sobre os invisíveis do Brasil.
Em síntese, constata-se neste trabalho o resultado do
empenho investigativo que elaborou pelo crivo da erudição e
da experiência, fruto da interdisciplinaridade peculiar do autor,
um livro que merece ser lido em suas linhas e provocações.
27

PARA INÍCIO DE CONVERSA:


empregadas domésticas, quem?

Nos últimos anos, a temática relativa à igualdade de gênero,


de raça e de etnia tem ocupado posição de realce na agenda
acadêmica, inclusive em diversos programas de pós-graduação
stricto sensu (mestrado e doutorado), cujos trabalhos monográ-
ficos conclusivos, encontram ampla difusão em revistas e perió-
dicos especializados. Certamente, estas discussões acadêmicas,
aliadas às mobilizações sociais, contribuíram para que houvesse
avanços no âmbito das políticas públicas.
Neste sentido, é oportuno destacar o conjunto de ações de
caráter afirmativo e as destacadas políticas universais que, gra-
dualmente, têm gerado ações decisivas com vistas à inclusão
de segmentos sociais, historicamente discriminados. Apesar
destes avanços, ainda existem imensos desafios a serem enfren-
tados para que se alcance uma sociedade igualitária. Os indica-
dores sociais, publicados periodicamente pelos órgãos oficiais
brasileiros, aliados aos relatórios de organismos internacionais,
evidenciam a enorme distância que separa homens e mulhe-
res, assim como negros e brancos. Tomando qualquer política
pública como referência, a exemplo da educação ou da saúde,
os dados põem à mostra uma realidade de desigualdade ainda
bastante desafiadora no país.
28

Neste cenário de desigualdades, se insere a categoria das


empregadas domésticas brasileiras. O trabalho doméstico,
levado a cabo na intimidade dos lares das famílias de classe
média e alta, é marcado pela predominância de mulheres
negras, de baixa escolaridade e pobres. Trata-se de um cená-
rio cujas raízes históricas têm relação com o período escravista
com forte influência, também, do modelo de estrutura familiar
adotado no Brasil, herdado das tradicionais famílias patriar-
cais e burguesas europeias. A relação laboral estabelecida entre
empregadas domésticas e patroas, oculta formas de remune-
ração e de relacionamento estruturadas num modelo bastante
estratificado de gênero, classe e cor que se estabelecem por
meio de vínculos de obrigação caracterizados pela subordi-
nação e pela opressão de indivíduos, muitas vezes mascaradas
pela ideologia do dever ou do prazer de servir. Ou seja, é uma
herança incontestável do modus operandi próprio do servilismo,
que permaneceu, durante séculos, como um retrato invisível
aos olhos da sociedade e dos gestores públicos, impondo à cate-
goria um alijamento em relação à integralidade dos direitos
laborais, garantidos aos demais trabalhadores urbanos e rurais.
As trabalhadoras domésticas, no pretérito e na atualidade,
ocuparam o mesmo lugar na sociedade, marcado pela invisi-
bilidade e pela desvalorização social. Logo, as antigas amas de
leite e mucamas, atualmente, assumem o papel de cozinheira,
governanta, lavadeira ou babá.
E por serem negras, os indicadores retratam a violência do
racismo: a categoria é formada, majoritariamente, por mulheres
negras que têm os piores salários e que convivem com condi-
ções de trabalho mais precárias. Portanto, a similaridade entre
o trabalho escravo na época do Brasil colônia e Império e o tra-
balho doméstico na atualidade é inequívoca. Esta comparação
29

se torna evidente, não somente no que se refere às atividades


laborais realizadas por ambos os grupos, em períodos históricos
bem distantes, como também pela semelhança física e social de
etnia, gênero e classe econômica.
Nas últimas duas décadas, ocorreram diversos avanços
no tocante à identidade e à cultura negra no contexto de um
processo de democratização e de renovação da vida política
brasileira que colocou a discriminação racial nas pautas de sin-
dicatos, de partidos políticos, de governos, de Organizações
Não-Governamentais (ONGS) e de segmentos da sociedade
civil, fato que se reflete na atenção midiática, que expressa uma
maior sensibilidade para com a realidade dos negros em nosso
país. Em certa medida, estes avanços se refletiram na conquista
de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas do Brasil.
Com a garantia recente dos direitos laborais integrais às
empregadas domésticas, por meio da Lei Complementar nº
150/2015, que fez uma emenda à Constituição Federal de
1988 (art.7º, Parágrafo Único), surge no cenário social uma
nova realidade: gradativamente, as “escravas domésticas” con-
temporâneas, foram substituídas por trabalhadoras domésticas,
com plenos direitos trabalhistas, equiparados aos demais traba-
lhadores urbanos e rurais.
De acordo com Delgado4 (2017), conceitualmente falando,
empregado doméstico é a pessoa física que presta, com pes-
soalidade, onerosidade e de forma subordinada, serviço de
natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à
família, em função e no âmbito desta.

4 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 16.ed.


São Paulo: LTr, 2017, 1696p.
30

Este livro revela parte da pesquisa de doutorado reali-


zada pelo autor na Universidade de Salamanca (Espanha), no
programa: “Estudios Interdisciplinares de Género y Políticas de
Igualdad”. Para o presente trabalho, fez-se um recorte com o
objetivo de analisar o perfil social e econômico das trabalhado-
ras domésticas no Brasil.
Quanto ao desenho metodológico, a pesquisa foi de natu-
reza interdisciplinar, com abordagem qualitativa e quantitativa
que adotou os métodos de procedimentos histórico, descritivo,
analítico e comparativo. No que se refere à técnica de pesquisa,
foi utilizado a observação direta extensiva e como instrumento
de coleta de dados um questionário semiestruturado, composto
por cinquenta questões, aplicado às domésticas sindicalizadas
(associadas) e às não sindicalizadas (associadas) de sete cidades
brasileiras, representativas das cinco Regiões do país. A amostra
foi de cinco entrevistadas integrantes da diretoria do sindicato
e/ou associação de trabalhadoras domésticas, cuja composição
é entre sete a dez membros e cinco entrevistas que não faziam
parte sequer como integrantes dos sindicatos.
Destaco, por oportuno, que este debate lança luzes sobre um
cenário ainda pouco estudado – o perfil social e econômico, as
condições de vida e contexto laboral das trabalhadoras domés-
ticas brasileiras. Pretende contribuir, estabelecendo interfaces
entre múltiplas áreas do conhecimento para desvendar um
contexto marcado por desigualdade, preconceito e invisibili-
dade social que têm caracterizado o cotidiano das trabalhado-
ras domésticas, ao longo dos séculos, aliás, desde a origem dessa
atividade no Brasil colônia. Sem pretensão de esgotar o tema,
espero que a leitura desse livro possa provocar os estudiosos
interessados a aprofundarem as suas pesquisas na academia,
desta forma contribuindo para que o avanço na conquista dos
31

direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas possa reverbe-


rar no cotidiano dessas profissionais, notadamente no sentido
de reverter um processo marcante de invisibilidade social e de
preconceito.
33

INSERÇÃO DAS EMPREGADAS


DOMÉSTICAS NO CONTEXTO
SOCIAL BRASILEIRO

Segundo ressalta o Relatório da Organização Internacional


do Trabalho (OIT), o trabalho doméstico é a forma de ocu-
pação de aproximadamente 52 (cinquenta e dois) milhões de
pessoas no mundo, sendo a maioria mulheres (83%), repre-
sentando 7,5% do emprego assalariado mundial. Apesar dessa
representatividade quantitativa, o relatório indica grande vul-
nerabilidade neste ramo de atividade, ressaltando que apro-
ximadamente 29,9%, dessas trabalhadoras estão excluídas da
legislação laboral nacional, 45% não têm direito a descanso
semanal ou férias anuais remuneradas e mais de um terço não
têm direito à proteção à maternidade5.
É importante destacar que, segundo estudo realizado
em 2012 pela OIT6, o trabalho doméstico ocupa um papel
de grande relevância, pois favorece a inserção de mulheres

5 ILO, Internacional Labor Office. Domestic workers across the word:


Global and regional statistics and the extend of legal protection.
Genebra: ILO, 2013.
6 OIT. Organização Internacional do Trabalho. Perfil do trabalho
decente no Brasil: um olhar sobre as unidades da Federação. Brasília:
OIT, 2012.
34

no mercado de trabalho. No entanto, apesar da trabalhadora


doméstica ter fundamental importância na cadeia de cuidados
requeridos na estrutura e na dinâmica das famílias, essas traba-
lhadoras constituem o elo mais frágil dessa cadeia, carecendo
de proteção social e de garantia plena de direitos laborais, bem
como de condições mais adequadas e dignas de trabalho.
Também de acordo com o já citado estudo, nessa catego-
ria de trabalho, o percentual de trabalhadores homens é baixo,
uma parcela considerável exerce a profissão de maneira infor-
mal, ou seja, sem carteira de trabalho assinada, obtendo baixo
rendimento, tendo acesso mínimo aos sindicatos e uma jornada
de trabalho bastante extensa, além de acumular essas atividades
com a dedicação de diversas horas diárias aos afazeres domésti-
cos em suas próprias residências, o que caracteriza a conhecida
jornada dupla.
Um dado que chama atenção do relatório citado anterior-
mente é o fato das trabalhadoras domésticas, à época, possu-
írem reduzida capacidade de investir em bens e serviços que
apoiem a execução das atividades domésticas e de cuidado.
Geralmente, residem em locais com precariedade na oferta de
serviços públicos, a exemplo da oferta de creches.
Outro dado marcante é a constatação de que a atividade
doméstica é uma ocupação em que não há a devida observân-
cia dos direitos humanos e dos direitos fundamentais inerentes
ao trabalho, sendo registrado, em muitos casos, a existência de
discriminação, preconceito e de assédio (moral e sexual).
Nesse cenário, o Brasil se destaca como sendo o país com
a maior população de trabalhadoras domésticas do mundo,
em número absolutos, constituindo um total de 7,2 milhões,
sendo 6,7 milhões de mulheres (17% do total de mulheres que
35

trabalham no país) e 504 mil homens, segundo o estudo citado,


que foi realizado em 117 (cento e dezessete) países do mundo.
Já de acordo com estudos do Departamento Intersindical
de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE)7, o
emprego doméstico no Brasil é uma atividade essencialmente
feminina e abriga uma das maiores categorias de trabalhado-
res. Pelos dados oficiais da citada pesquisa, estimava-se que em
2011 existiam no Brasil 6,6 milhões de pessoas ocupadas nos
serviços domésticos.
Deste total, o contingente de mulheres correspondia a
92,6%, ou seja, 6,1 milhões de trabalhadoras. Conforme os
dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - Pnad
do IBGE (2012), a mão de obra feminina dos serviços domés-
ticos teve um crescimento de 3,1%, no período de 2004 a 2011.
No período de 2009 a 2011, diminuiu em 9,06% o número
de mulheres empregadas no trabalho doméstico remunerado
(PED/DIEESE).
O serviço doméstico é o grupamento ocupacional que apre-
senta o menor rendimento médio, apesar do aumento de 46,0%
no rendimento dos trabalhadores domésticos de 2004 a 2011,
contra a elevação média de 30,8% dos demais ocupados. Em
todas as ocupações, com exceção do grupamento de “constru-
ção”, o rendimento médio dos homens é sempre maior do que
os das mulheres. Outro dado que revela o elevado grau de desi-
gualdade existente no mercado de trabalho, é o fato da remune-
ração média recebida pelas mulheres nas ocupações domésticas
ter sido inferior ao salário mínimo vigente para o período. Em

7 DIEESE. O emprego doméstico nos anos 2000. In: DIEESE. A situ-


ação do trabalho no Brasil. São Paulo: DIEESE, 2012.
36

2011, o salário mínimo era de R$ 545 (quinhentos e quarenta


e cinco reais) e as empregadas domésticas recebiam R$ 509,00
(quinhentos e nove reais).
Talvez essa seja uma das razões que expliquem a resistência,
notadamente da classe média, em aceitar o avanço dos direitos
trabalhistas para a categoria das trabalhadoras domésticas: a
elevação dos custos do trabalho doméstico, que muitos que-
riam evitar, reside exatamente na “zona de conforto”, historica-
mente construída, caracterizada pelos baixos salários auferidos
por essas trabalhadoras. No que se referem à cor, os dados do
estudo do DIEESE, revelam que o trabalho doméstico no
Brasil segue sendo exercido, majoritariamente, por mulheres
negras, como decorrência da histórica associação deste tipo de
atividade com a escravidão.
Atualmente, ainda existem “ranços” destas relações escra-
vagistas no emprego doméstico, posto que, frequentemente, há
registros de preconceito e desrespeito aos direitos humanos e
aos fundamentais nas relações de trabalho. As relações ainda
são marcadas por descaracterização do caráter profissional da
ocupação (traços marcantes de relação interpessoais e familia-
res). O emprego doméstico continua sendo uma das principais
possibilidades de inserção no mercado de trabalho das mulhe-
res pobres, negras, de baixa escolaridade e sem qualificação
profissional.
Segundo os estudos do DIEESE, em 2004, o maior per-
centual dos postos no grupamento ocupacional das empre-
gadas domésticas era ocupado por mulheres de 30 (trinta) a
39 (trinta e noves) anos de idade (27,2%). Em 2011, a maior
parcela (28,5%) passou a ser de mulheres na faixa etária de 40
(quarenta) a 49 (quarenta e nove) anos. No mesmo sentido,
37

cresceu o percentual de mulheres com 50 (cinquenta) anos ou


mais, passando de 13,7% (2004) para 21,9% (2011).
Entre as mulheres jovens (de 18 a 24 anos), o percen-
tual baixou de 16,8% (2004) para 9,3% (2011), numa clara
mudança de perfil que pode ser explicada por múltiplos fatores,
entre os quais o aumento do nível de escolaridade dos jovens, o
que implica na possibilidade de ocupação de outras atividades
socialmente mais valorizadas e com melhores remunerações e
mais formalizadas.
Esse fenômeno do envelhecimento das trabalhadoras
domésticas, com redução do número de trabalhadoras jovens,
notadamente na faixa etária dos 18 (dezoito) aos 24 (vinte e
quatro) anos, indica que a situação de pleno emprego tem se
alterado, abrindo outras alternativas profissionais às jovens de
um perfil socioeconômico bem definido que, historicamente,
seriam absorvidas, exclusivamente, pelo trabalho doméstico.
Neste sentido, o trabalho doméstico fica bem caracterizado
como a alternativa que subsiste para as mulheres negras, não
escolarizadas, e da faixa etária entre 25 (vinte e cinco) e 39
(trinta e nove) anos, segundo a reflexão do próprio DIEESE.
Conforme destaca Álvaro8 em importante estudo sobre
o trabalho doméstico e a desigualdade social, ocorreu uma
melhoria nos padrões educacionais da população brasileira
nos últimos anos, ressaltando: “As políticas de ampliação das
oportunidades na área de educação por parte do Estado têm
se traduzido num aumento dos anos de estudo, e esse resultado

8 ÁLVARO, Maria Angela Gemaque. Trabalho doméstico e desigual-


dade social. Enfoques - Revista dos Alunos do PPGSA, UFRJ, v.11.
n.1, mar., 2012, Online. p.109-132. Disponível em: http://www.enfo-
ques.ifcs.ufrj.br.
38

tem sido mais positivos entre a população feminina, cujo perfil


educacional vem superando o dos homens”.
A autora, no entanto, ressalta que apesar dos ganhos edu-
cacionais obtidos pelo conjunto da população feminina, as tra-
balhadoras domésticas apresentam um nível educacional bem
abaixo daquele verificado para o primeiro grupo. Ou seja, as
empregadas domésticas sequem sendo excluídas no conjunto
da população feminina.
Certamente, também é possível que estes dados reflitam o
impacto positivo dos diversos programas desenvolvidos pelo
Governo (Federal, Estadual, Distrital ou Municipal), nas mais
diversas áreas, que objetivam a melhoria das condições de vida
da população jovem, a exemplo do Programa Integrado de
Juventude (ProJovem), coordenado pela Secretaria Nacional
de Juventude e do Ministério do Trabalho e Emprego, que visa
ampliar o atendimento aos jovens entre 15 (quinze) e 29 (vinte
e nove) anos excluídos da escola e da formação profissional.
Este programa, criado a partir da integração de seis progra-
mas já existentes – Agente Jovem, Saberes da Terra, ProJovem,
Consórcio Social da Juventude, Juventude Cidadã e Escola de
Fábrica – funcionou nas modalidades ProJovem Adolescente,
ProJovem Urbano, ProJovem Campo e ProJovem Trabalhador
e, até o ano de 2009, capacitou aproximadamente 2 (dois)
milhões de jovens.
Com as capacitações, as jovens das camadas populares,
excluídas da escolarização e da profissionalização, passaram a
ter mais oportunidades de ingresso no mundo do trabalho, em
outras atividades laborais, diferentes dos empregos domésticos.
Isso pode explicar, portanto, a diminuição no percentual ocor-
rido entre 2004 e 2011, conforme citado anteriormente.
39

Em relação às mulheres mais velhas (com mais de 50 anos),


a realidade é refletida nos dados apresentados pelo DIEESE,
posto que as oportunidades de inserção diferentes do emprego
doméstico são bastante difíceis, notadamente pelo baixo nível
de escolaridade e de pouca qualificação dessas trabalhadoras.
Conforme se observa dos dados do DIEESE, ainda é alto o
percentual de empregadas domésticas analfabetas (14,1%) se
consideradas o total de mulheres negras e não negras. Este alto
percentual de analfabetismo das empregadas domésticas se
insere no contexto da realidade do país.
O Brasil é o oitavo país do mundo com maior taxa de anal-
fabetismo entre adultos, de acordo com dados do 11° Relatório
de Monitoramento Global de Educação para Todos, divulgado
em 29 de janeiro de 2014 pela Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). É impor-
tante destacar que a taxa de analfabetismo, observada na cate-
goria das empregadas domésticas (14.1%), supera em muito a
taxa de analfabetismo entre pessoas com 15 anos ou mais no
Brasil, que é de 8,6%.
Ainda na atualidade, a maioria das empregadas domésticas
sequer possui o Ensino Fundamental completo (09 anos de
escolarização). A baixa escolarização, portanto, é um indicador
que une as mulheres, sejam negras ou não negras. No entanto,
com base nos dados obtidos pelo DIEESE, a baixa escolaridade
é traço marcante da categoria das trabalhadoras domésticas:
48% têm ensino fundamental incompleto, classificação cor-
respondente a ser alfabetizado, mas sem escolarização. Assim,
a inserção desses sujeitos na atividade doméstica, se expressa
como uma das únicas alternativas para muitas mulheres negras
que não tiveram oportunidades de profissionalização e nem
uma formação escolar adequada. Há na pesquisa do DIEESE
40

um dado que chama especial atenção: a informalidade do setor.


A pesquisa avaliou de forma comparativa a evolução do traba-
lho doméstico no período compreendido entre 2004 e 2011.
Neste sentido, observou-se um movimento de redução no
número de trabalhadoras domésticas mensalistas, sem carteira
assinada. Em 2004 o percentual era de 57%. Já em 2011, este
percentual foi reduzido para 44%, sem o incremento propor-
cional de número de trabalhadoras domésticas mensalistas com
carteira assinada, que passou de 21,6% para 24,5%, no mesmo
período. O fato que merece destaque é que no mesmo período
houve um crescimento proporcional de diaristas, que passou de
21,4% para 30,6%, o que denota uma tendência já consolidada
de que as trabalhadoras domésticas mensalistas passaram a tra-
balhar como diaristas.
O DIEESE explica que diversos fatores sociais e culturais
têm contribuído para modificar o padrão de comportamento
não apenas das trabalhadoras domésticas, mas também das
próprias famílias de classe média e alta que ao longo da histó-
ria, foram beneficiárias desse tipo de serviço.
Neste sentido, destaca o DIEESE:

O crescimento do número de diaris-


tas aponta para uma mudança de perfil
do trabalho doméstico, mesmo antes da
ampliação da legislação. O aumento do
salário-mínimo, a diminuição do tamanho
das famílias, das residências e a incorpo-
ração de novos hábitos, entre outros fato-
res, podem ajudar a explicar parte dessas
mudanças.
41

Finalmente, outra consequência da informalidade, é a baixa


adesão das trabalhadoras domésticas ao sistema previdenciá-
rio. Pela pesquisa do DIEESE, apenas 34,9% das trabalhado-
ras domésticas contribuem para a Previdência Social, o que as
colocam à margem da rede de proteção do Estado nas situações
de doença, infortúnio e velhice. Certamente, essa realidade
deverá ser modificada com o advento da Lei Complementar
nº 150, de 01 de junho de 2015, que no art. 34 – II estabelece
como obrigação, o recolhimento mensal de contribuição previ-
denciária dos percentuais de 8% a 11% e de 8% para a empre-
gada doméstica e o empregador, respectivamente.
Para contribuir com a discussão sobre o tema, notadamente
no que se refere ao perfil social e econômico das trabalhado-
ras domésticas no Brasil, conforme detalhado na metodologia,
após a realização da pesquisa em 7 (sete) cidades brasileiras, a
saber; João Pessoa (Estado da Paraíba), Recife (Pernambuco)
e Salvador (Bahia) da Região Nordeste, Brasília (Distrito
Federal), da Região Centro-Oeste, Rio de Janeiro (Rio de
Janeiro), da Região Sudeste, Blumenau (Santa Catarina), da
Região Sul.
Finalmente, a cidade de Belém (Pará), da Região Norte,
apresentamos os resultados obtidos, que lançam luzes sobre a
temática em foco, ou reforçando os aspectos que já foram con-
solidados na literatura especializada ou trazendo à baila aspec-
tos ainda poucos evidenciados e/ou estudados.
43

CARACTERÍSTICAS DAS EMPREGADAS


DOMÉSTICAS: ASSOCIADAS/
SINDICALIZADAS E NÃO ASSOCIADAS
NÃO SINDICALIZADAS DE SEIS
CIDADES BRASILEIRAS

Quanto ao gênero

No presente estudo, o termo gênero se refere às diferenças


e relações socialmente construídas entre o sexo masculino e
feminino que variam substancialmente conforme a sociedade e
as culturas. Portanto, o termo gênero não pode ser tomado ou
substituído por “sexo” que se refere, exclusivamente, às diferenças
biológicas (anatomia do sistema reprodutivo) observadas entre
homens e mulheres. Estas diferenças quanto ao “sexo”, diferen-
temente do gênero, são universais e não mudam.
Assim, o gênero se caracteriza pelos diferentes papéis, res-
ponsabilidades, oportunidades e necessidades do sexo masculino
e feminino nas diversas áreas e nos múltiplos cenários sociais. O
termo gênero tanto pode ser referir aos papéis sociais com base
no sexo do indivíduo (papel de gênero) quanto a identificação
pessoal do próprio gênero, baseado numa consciência interna
(identidade de gênero). É conveniente recordar, apenas com o
propósito informativo, que em determinadas circunstâncias, o
44

sexo atribuído a um indivíduo e o seu gênero não se perfilam e


o indivíduo pode ser transgênero ou intersexual.
Considerando o objeto da presente pesquisa, a questão de
gênero tem uma importância fundamental na compreensão sobre
a construção da identidade das empregadas domésticas no Brasil.
Certamente, é necessário matizar que essa identidade está inti-
mamente associada com os papéis de gênero que essas mulheres,
majoritariamente negras e pobres, desempenharam na sociedade
brasileira, como decorrência de comportamentos adquiridos e
acumulados ao longo dos séculos, desde o período colonial, onde
atuavam como criadas, mucamas, amas de leite, etc.
É importante destacar que os papéis de gênero, objeto do
presente estudo, são afetados por diversos fatores, a exemplo
da idade, da classe socioeconômica, da cor/etnia, da religião ou
do ambiente geográfico, político, econômico e cultural, sendo
igualmente influenciados por relações de poder que determi-
nam aqueles que podem aceder e controlar recursos tangíveis
e intangíveis. Como resultado da pesquisa realizada, os dados
quanto ao gênero assim se apresentam.

A
45

Gráfico 1A/1B - Gênero das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas
(os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete
municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)

Fonte 1A/1B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Conforme se observa no Gráfico 1A, correspondente à


categoria das empregadas sindicalizados e/ou associadas, cons-
tata-se a predominância do gênero feminino em 100% das
entrevistadas nos municípios do Rio de Janeiro, Recife, João
Pessoa, Brasília e Belém, respectivamente. Na mesma catego-
ria, nos municípios de Salvador e Blumenau, o percentual de
entrevistados do gênero feminino foi de 80% e do sexo mascu-
lino foi de 20% do, respectivamente.
No que diz respeito ao gênero dos participantes não sin-
dicalizadas e/ou não associadas (Gráfico 1B) constata-se,
também, a predominância do gênero feminino em 100% dos
entrevistados dos municípios de Salvador, Rio de Janeiro,
46

Recife, João Pessoa e Belém, respectivamente. Por outro lado,


entre os entrevistados do município de Blumenau 80% é do
gênero feminino e 20% é do sexo masculino. Em relação ao
município de Brasília, os pesquisados se distribuíram em 60%
no gênero feminino e 40% do masculino.
Considerando a média de entrevistadas do gênero femi-
nino, nas duas categorias estudadas (empregadas sindicaliza-
das e/ou associadas ou não sindicalizadas e/ou não associadas),
obteve-se o mesmo percentual: 91.4%.
No trabalho intitulado: “Perfil dos Trabalhadores
Domésticos nas seis Regiões Metropolitanas investigadas pela
pesquisa mensal de emprego (Recife, Salvador, Belo Horizonte,
Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre)”, publicado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano
de 2006, demonstraram que o contingente de trabalhadores
domésticos se caracterizava pela predominância de mulheres
(94,3%).
Em nova pesquisa realizada pelo IBGE, seis anos após
o estudo anterior, os dados obtidos por meio da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada em
2013, demonstram que as/os trabalhadoras/es domésticas/os
são cerca de 6,4 milhões, sendo a grande maioria mulheres
(93% ou 5,95 milhões). Os dados obtidos tanto na presente
pesquisa quanto nos estudos realizados pelo IBGE/IPEA con-
firmam que no Brasil, a profissão de doméstica continua sendo
um dos principais meios de acesso ao trabalho ou à renda para
as mulheres, ressaltando que na presente pesquisa a coleta de
dados foi ampliada para municípios representativos das 05
(cinco) regiões brasileiras, com formações étnicas e culturais
diversas.
47

É importante ressaltar que os estudos também reforçam


que a construção da identidade social das empregadas domés-
ticas brasileiras está associada, necessariamente, à sua origem
no período escravocrata, onde a mulher, incluída no espaço
privado, era a única responsável pelos “afazeres” ou “tarefas”
da casa. Esses dados também põem em realce outra questão
importante, conforme destacam Guimarães et al.9, a saber:

Também agrega elementos à construção


identitária das empregadas domésticas,
aspectos relacionados com a divisão sexual
do trabalho - fruto de uma desigualdade
ontológica entre homens e mulheres que
se tornou mais complexa na sociedade
de classe pela sobreposição da exploração
masculina à exploração produtiva.

Neste mesmo sentido, o Relatório Anual Socioeconômico


da Mulher (RASEAM)10, publicado em 2015, destaca que a
divisão sexual do trabalho, que sobrecarrega as mulheres com
os afazeres domésticos e de cuidado, dificulta seu acesso e per-
manência no mercado de trabalho, bem como a sua ascensão
profissional. O citado relatório ressalta que o trabalho domés-
tico remunerado no Brasil tem passado por importantes e

9 GUIMARÃES, Flávio Romero Guimarães; AZEVEDO, Danielle


Almeida Gomes de; CAVALCANTE, Jéssica Priscila Santana; NETO,
João Luís de França. Retratos da desigualdade: identidade social e con-
dições de trabalho das empregadas domésticas no Brasil (2004-2013).
Revista Dat@venia, v.8, n.11. ISSN 1519-9916, 2015, p.9-19.
10 Relatório Anual Socioeconômico da Mulher - RASEAM. 1ª Impressão.
Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, março de 2015, 181p.
48

recentes transformações. Do ponto de vista legal e jurídico, a


aprovação da Emenda Constitucional nº 72/2013 vem corrigir
a desigualdade estrutural imposta ao segmento.
Na mesma direção deste avanço institucional, a Instrução
Normativa nº 110 do Ministério do Trabalho e Emprego, de
06 de agosto de 2014, dispõe sobre os procedimentos de fis-
calização do cumprimento das normas relativas à proteção ao
trabalho doméstico. Por outro lado, embora esta atividade con-
tinue sendo uma das principais ocupações entre as mulheres há
uma tendência de redução da proporção de mulheres emprega-
das no trabalho doméstico: somente entre 2011 e 2012, a pro-
porção de mulheres ocupadas no trabalho doméstico passou de
15,5% para 14,7%. A mão de obra total feminina dos serviços
domésticos registrou, no período de 2004 a 2011, crescimento
de 3,1%, de acordo com os dados da PNAD do IBGE.
Todavia, na comparação com a Pnad de 2009, cujos dados
constam do Anuário das Mulheres Brasileiras - publicação rea-
lizada em parceria do DIEESE11 com a Secretaria de Política
de Mulheres (SPM) em 2011 – percebe-se que no período 2009
-2011, diminuiu em 9,06% o número de mulheres empregadas
no trabalho doméstico remunerado. Além da constatação de
que o emprego doméstico no Brasil é uma ocupação predomi-
nantemente feminina, considero oportuno destacar que talvez
um dos grandes entraves históricos para a conquista de direitos
pelas trabalhadoras domésticas, esteja associada à visão, histo-
ricamente sedimentada na sociedade brasileira, de que as ati-
vidades levadas a cabo nas residências por estas pessoas, eram
muito mais uma situação de trabalho do que de emprego, no

11 DIEESE. Anuário das mulheres brasileiras. DIEESE. São Paulo:


DIEESE, 2011, 300p.
49

sentido legal da palavra, que pressupõe uma relação estável


entre empregador e pessoa empregada.
Assim, muito antes de ser um emprego legalmente forma-
lizado, o labor das trabalhadoras domésticas era visto como um
trabalho, ou seja, energia humana, predominantemente femi-
nina, que historicamente esteve presente na economia dos lares
brasileiros, conforme tarefas associadas a essa produção. Em
síntese, quando se faz uma abordagem econômica da energia
dispensada pelas trabalhadoras domésticas, nunca a associou à
criação de riqueza social, recebendo, neste sentido, pouca aten-
ção da teoria econômica e, portanto, não avançando nas garan-
tias dos direitos, conforme ocorreu com as demais categorias de
trabalhadoras urbanas.
Logo, opino que o trabalho doméstico no Brasil sempre foi
relegado a uma posição de desprestígio social. Mesmo quando
foi encarado como emprego, o que caracterizou a relação tra-
balhista nesta categoria foi a informalidade. Esse era o cená-
rio presente no país, até muito recentemente, quando os novos
direitos trabalhistas “obrigaram” os empregadores a assumirem
uma nova postura, face aos direitos doravante garantidos às
trabalhadoras domésticas. Sendo assim, se historicamente as
classes média e alta brasileiras, estavam numa zona de conforto
em que as tarefas das casas e das famílias, eram delegadas às
empregadas domésticas, cujos vínculos empregatícios, quando
existentes, estavam na esfera da informalidade, com o advento
das novas garantias trabalhistas, as trabalhadoras domésticas
passaram a ter outra visibilidade social, tornando vulnerável a
produção de conforto por meio do trabalho ou do emprego
doméstico, inclusive alterando regras fixadas em costumes e
tratativas privadas.
50

Neste novo cenário que se configura, não há espaço para


uma relação afetiva entre patroa e empregada, alicerçada na
subordinação, em que o trabalho doméstico era exercido por
mulheres predominantemente negras e de classe social desfa-
vorecida, que eram recompensadas por presentes ou favores.
Certamente, que neste novo cenário, as razões morais ou de
sentimento de dever e de gratidão não estão de todo aboli-
das – existem raízes históricas e culturais que persistem em
reproduzir estas relações simbólicas, ainda presentes na socie-
dade brasileira. O costume que as famílias brasileiras tinham
de manterem em suas casas pessoas por elas “protegidas”, desde
a meninice, num longo aprendizado dos ritos domésticos, vai
sendo substituído pela imposição do novo marco legal traba-
lhista que favoreceu às trabalhadoras domésticas.
Estas pessoas, oriundas, tantas vezes, dos ramos mais pobres
da mesma família a que prestam os seus “serviços” ou até de
outras, tornam-se mulheres de “confiança”, que na invisibili-
dade do lar, comandam, controlam ou vigiam todos os serviços
da casa, sendo “compensadas” pelo abrigo e pela alimentação.
Esse era o costume presente em todas as regiões do Brasil,
fruto direto das tradições escravistas do país e do modelo
de organização familiar que herdamos da Europa. Portanto,
a nova legislação trabalhista que garante direitos às traba-
lhadoras domésticas é uma nova abolição que imporá novas
regras nas relações entre empregadores (patroas) e empregados
(domésticas).
51

Quanto a faixa etária das (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os)

Considerando o contexto laboral das trabalhadoras domés-


ticas no Brasil, as reflexões tomando como referência a faixa
etária revelam aspectos importantes para se compreender as
mudanças no contexto laboral dessa categoria, notadamente
nas últimas décadas, especialmente quando se compara a inser-
ção dessas trabalhadoras no mercado de trabalho por faixa etá-
ria ou quando se analisa o contexto de novas oportunidades
de inserção em outras profissões, como decorrência das políti-
cas públicas de qualificação de mulheres jovens, levadas a cabo
pelo poder público. É neste sentido que serão abordados os
resultados que se seguem:

A
52

Gráfico 2A/2B - Faixa etária das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os) (A)
associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os)
em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)

Fonte 2A/2B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Considerando a variável da faixa etária, observou-se que


na categoria das domésticas sindicalizadas e/ou associadas
(Gráfico 2A), destacam-se as entrevistadas dos municípios de
Salvador e Brasília, onde 60% estão na faixa etária entre 30
(trinta) e 40 (quarenta) anos, 20% (entre 40 e 45 anos) e 20%
(entre 20 e 30 anos). No Rio de Janeiro e João Pessoa, 60% dos
(as) entrevistados (as) têm mais de 45 (quarenta e cinco) anos
e 40% das cariocas e das paraibanas estão entre 30 (trinta) e 40
(quarenta) anos.
Quanto aos (às) entrevistados (as) do município de Recife,
40% estão da faixa etária de mais de 45 (quarenta e cinco) anos
e entre 40 (quarenta) e 45 (quarenta e cinco) anos e 20% entre
53

30 (trinta) e 40 (quarenta) anos. Em Blumenau e Belém, 40%


dos (as) empregados (as) estão com mais de 45 (quarenta e
cinco) anos e 20% entre 40 (quarenta) e 45 (quarenta e cinco)
anos, 20% entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos e 20% entre 20
(vinte) e 30 (trinta) anos (para o primeiro município), enquanto
que, em Belém ainda se dividiu em 40% entre 20 (vinte) e 30
(trinta) anos e 20% entre 40 (quarenta) e 45 (quarenta e cinco)
anos.
No tocante a faixa etária dos participantes não sindicali-
zados ou não associados (Gráfico 2B), a amostra da grande
Recife se destaca com 100% dos entrevistados com mais de 45
(quarenta e cinco) anos. Nessa mesma faixa etária, nos muní-
cipios de Salvador e Rio de Janeiro, o percentual é de 40%,
enquanto que em Belém e Brasília, esse percentual é de apenas
20% do total da amostra. Para a faixa etária entre 30 (trinta) e
40 (quarenta) anos, no município do Rio de Janeiro, o percen-
tual obtido foi de 60%. Já nos municípios de Belém, Brasília,
Blumenau e Salvador na mesma faixa etária, o percentual foi de
40% dos (as) entrevistados (as). No município de João Pessoa,
os resultados foram distribuídos da seguinte forma: 60% na
faixa etária de mais de 45 (quarenta e cinco) anos, 20% entre 40
(quarenta) a 45 (quarenta e cinco) anos e 20% entre 30 (trinta)
e 40 (quarenta) anos. Nos municípios de Salvador, Brasília e
Belém, 20% dos entrevistados estão na faixa etária entre 40
(quarenta) e 45 (quarenta e cinco) anos. Para a faixa etária mais
jovem (20 a 30 anos), os municípios de Blumenau, Brasília e
Belém, apresentaram 20% dos entrevistados. Considerando a
média entre todos os municípios estudados, observou-se que
nas categorias dos (das) trabalhadores (as) sindicalizados (as)
ou associados (as) e dos (as) não sindicalizados (as) ou não
associados (as), a faixa etária predominante foi de mais de
54

45 (quarenta e cinco) anos, com percentuais de 42,9% e 40%,


respectivamente.
Tomando como referência os dados constantes no Relatório
das Desigualdades de Gênero e Raça, oriundo da PNAD/
IBGE 2013, que apresenta estatísticas descritivas que com-
põem um retrato atual da situação de brasileiros e de brasileiras
sob a perspectiva das desigualdades de gênero e de raça, a dis-
tribuição da população feminina ocupada em trabalho domés-
tico por faixa etária demonstra que de um total de 5.963, 976
domésticas brasileiras, na faixa etária de 30 (trinta) a 44 (qua-
renta e quatro) anos, existem 2.518, 296, o que corresponde a
42,2%, enquanto que na faixa etária de 45 (quarenta e cinco)
a 59 (cinquenta e nove) anos, existem 1.996,816 domésticas, o
que corresponde a 35,5%.
Estudo recente realizado por Chaves e Rockenbach12, anali-
sando a qualidade de vida no trabalho na cidade de Tucunduva
(RS), demostrou que com relação ao perfil biográfico e pro-
fissional das empregadas domésticas, 44% se encontram na
faixa etária de 34 (trinta e quatro) a 49 (quarenta e nove) anos.
Portanto, os dados obtidos na presente pesquisa para a faixa
etária de mais de 45 (quarenta e cinco) anos para as categorias
dos (das) trabalhadores (as) sindicalizados (as) ou associados
(as) e dos (as) não sindicalizados (as) ou não associados (as), -
42,9% e 40%, respectivamente, estão muito aproximados dos

12 CHAVES, Jaqueline; ROCKENBACH, Cláudia Werle. Análise


da qualidade de vida no trabalho – Um Estudo com Empregadas
Domésticas na Cidade de Tucunduva. Trabalho de Conclusão do
Curso. Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Rio
Grande do Sul – UNIJUI, 2015, 138p.
55

dados derivados dos estudos no PNAD/IBGE 2013, divulga-


dos no Relatório das Desigualdades de Gênero e Raça.
No que se refere à faixa etária das trabalhadoras domésti-
cas, o maior percentual desses postos de trabalho era ocupado
por mulheres de 30 (trinta) a 39 (trinta e nove) anos de idade
(27,2%), em 2004, ao passo que em 2011, a maior parcela des-
sas trabalhadoras estava na faixa etária de 40 (quarenta) a 49
(quarenta e nove) anos (28,5%). Também se observou o cres-
cimento percentual de mulheres no emprego doméstico com
50 (cinquenta) anos e mais, que subiu de 13,7%, em 2004,
para 21,9%, em 2011. Aliado ao crescimento da participação
de mulheres mais velhas no emprego doméstico, também se
observou a redução da proporção de jovens ocupadas na ati-
vidade, com o percentual diminuindo de 6,1% para 3,9% para
aquelas com idade entre 10 (dez) e 17 (dezessete) anos e de
16,8% para 9,3%, entre 18 (dezoito) e 24 (vinte e quatro) anos,
nos anos de 2004 e 2011.
Esses dados sugerem que as mulheres jovens têm buscado
alternativas para a inserção no mundo de trabalho. Essa modi-
ficação no perfil pode ser explicada por diversos fatores, entre
os quais o aumento da escolaridade das jovens, o que possibi-
lita a busca por ocupações socialmente mais valorizadas, com
melhores remunerações e mais formalizadas que o trabalho
doméstico.
Assim, evidencia-se o envelhecimento da categoria,
uma vez que para as mulheres com mais de 50 (cinquenta)
anos de idade as alternativas de uma inserção diferente do
emprego doméstico no mundo do trabalho, é bem mais difí-
cil, principalmente quando essas trabalhadoras têm baixa
escolaridade.
56

No mesmo sentido, o Departamento Intersindical de


Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE)13 divul-
gou em 2013 um importante estudo intitulado: “O emprego
doméstico no Brasil”, cujo principal objetivo foi apresentar o
perfil e as condições de trabalho das empregadas domésticas
da atualidade no Brasil. No citado estudo, foram utilizados
os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD) realizada pelo IBGE, comparando o período de
2004 e 2011 e os da Pesquisa de Emprego e Desemprego
(PED), feita pelo DIEESE, Fundação Seade, MTE e convê-
nios regionais nas regiões metropolitanas de Belo Horizonte,
Porto Alegre, Recife, Salvador, Fortaleza e São Paulo, além do
Distrito Federal para o ano de 2012.
O estudo divulgado pelo DIEESE enfatiza que ao lado
do crescimento da participação de mulheres mais velhas no
emprego doméstico, houve uma nítida redução da proporção de
jovens ocupadas na citada atividade, com o percentual caindo
de 6,1% para 3,9% para aquelas com idade entre 10 (dez) e 17
(dezessete) anos e de 16,8% para 9,3%, entre 18 (dezoito) e 24
(vinte e quatro) anos, nos anos de 2004 e 2011. Esses dados
deixam à mostra que as mulheres jovens têm buscado outras
formas de inserção no mundo de trabalho. Essa ressignificação
do perfil das empregadas domésticas, segundo as considera-
ções do estudo citado, pode ser explicada por diversos fatores,
entre os quais o aumento do nível de escolaridade das jovens,
o que favoreceu a busca por ocupações mais valorizadas social-
mente, com melhores remunerações e mais formalizadas que

13 DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos


Socioeconômicos. Emprego Doméstico no Brasil. Estudos e Pesquisas.
n.68. Agosto, 2013, 27p.
57

o trabalho doméstico. Assim, conclui o estudo do DIEESE,


“evidencia-se o envelhecimento da categoria, uma vez que para
as mulheres com mais de 50 (cinquenta) anos de idade as alter-
nativas de uma inserção diferente do emprego doméstico no
mercado de trabalho tornam-se mais difícil, principalmente
quando essas trabalhadoras têm baixo nível de escolaridade”.
Sobre estes aspectos, as pesquisadoras Brites e Picanço14, em
estudo recente, asseveram:

Do ponto de vista do mercado de trabalho,


essa redução implica na abertura de um
nicho ocupacional para as trabalhadoras
mais velhas, reduzindo a forma de recru-
tamento comum durante muitas décadas,
que procurava adolescentes meninas para
trabalhar como domésticas a título de ofe-
recer melhores oportunidades de vida e,
em alguns casos, escolarização. Essa reali-
dade vem mudando.

Penso que os estudos do DIEESE e os resultados da pre-


sente Tese deixam à mostra um novo cenário que se configu-
rou nas últimas décadas: a mudança do perfil das empregadas
domésticas e a inserção cada vez mais presente de mulheres
negras e de baixa renda em outras profissões que não exclusiva-
mente a de trabalhadoras domésticas, como fruto, por um lado,

14 BRITES, Jurema; PICANÇO, Felícia. O emprego doméstico no


Brasil em números, tensões e contradições: alguns achados de pesqui-
sas. Revista Latino-americana de Estudos do Trabalho, Ano 19, n.31,
2014, p.131-158.
58

da melhoria da escolaridade desses segmentos da população


brasileira e, por outro, das diversas possibilidades de qualifica-
ção para o mundo do trabalho que foram colocadas em mar-
cha por meio de políticas públicas, notadamente do governo
federal.
Também considero oportuno ressaltar que em face dos
novos arranjos sociais e das recentes conquistas trabalhistas
que favoreceram às trabalhadoras domésticas, a noção de “casa”
da patroa como lugar ou espaço social e simbólico, relacionado
com a identidade historicamente construída pelas empregadas
domésticas, também será modificada.
A “casa” da patroa, culturalmente concebida como “espaço”
de atuação das trabalhadoras domésticas, onde se reproduzia
uma relação afetiva, de dominação e de informalidade, passa a
ser o “lugar” de trabalho.
O trabalho recompensado com moradia e alimentação
será substituído pelo salário justo, ao qual se agregam todas as
demais vantagens trabalhistas, garantidas pela nova legislação
trabalhista.
Entendo até que as empregadas domésticas, em face dos
novos direitos, recentemente conquistados, irão experimentar
noções diversas de pertencimento em relação a “casa” da patroa.
Simbolicamente, deixarão de ocupar a posição de “mulheres de
confiança”, que transitavam invisíveis pelos múltiplos espaços
do lar, para ocuparem a posição de “trabalhadoras de confiança”,
às quais serão garantidos todos os direitos trabalhistas que lhes
foram historicamente negados.
59

Estado civil das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Considerando que o estudo tem como sujeitos as inte-


grantes da categoria de trabalhadoras submetidas a um pro-
cesso histórico de discriminação, de vulnerabilidade e de
invisibilidade social e que, majoritariamente, são mulheres
negras e de baixa renda, o estado civil favoreceu reflexões
interessantes, considerando que esta variável não poderia ser
analisada de forma isolada. Neste sentido, os resultados são
os seguintes:

A
60

Gráfico 3A/3B - Estado civil das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os) (A)
associadas (os)/sindicalizadas(os); e (B) não associadas(os)/não sindicalizadas (os)
em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)

Fonte 3A/3B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que se refere ao estado civil das trabalhadoras domésti-


cas sindicalizadas (Gráfico 3A), observa-se que nos municípios
do Rio de Janeiro e de Brasília, 80% das entrevistadas são sol-
teiras e 20% são casadas. Na região Nordeste, a distribuição por
estado civil é a seguinte: Salvador; 40% são solteiras ou casadas
e 20% são companheiras; em Recife, do total das entrevistadas
60% solteiras, 20% separadas e/ou divorciadas ou viúvas. Em
João Pessoa, 20% se declararam como separadas e/ou divorcia-
das, 40% são casadas ou solteiras.
Por outro lado, as entrevistadas de Blumenau se dividiram
em: 40% separadas ou divorciadas; e 20% são solteiras, viú-
vas ou companheiras. Em Belém 40% se declararam como
61

solteiras ou viúvas e 20% são separadas ou divorciadas. Quanto


ao estado civil das trabalhadoras domésticas não sindicalizadas
ou não associadas (Gráfico 3B), observa-se que no município
de Salvador 40% se declararam como companheiras ou soltei-
ras e 20% como casadas. No Rio de Janeiro, 40% se declara-
ram como casadas ou solteiras e 20% como companheiras. Em
Recife, 60% das entrevistadas se declararam como solteiras e
20% como companheiras ou casadas.
Em João Pessoa, 80% das domésticas são separadas (divor-
ciadas) e 20% companheiras. Já as entrevistadas de Blumenau
se dividem em: 40% viúvas ou casadas e 20% companheiras.
Em Brasília, 60% são casadas e 20% separadas (divorciadas)
ou companheiras. Finalmente, na cidade de Belém 40% são
casadas e 20% separadas (divorciadas), viúvas ou companhei-
ras. Ao se fazer a média do estado civil das (os) trabalhado-
ras (es) domésticas das sete cidades estudas, constatou-se que
em relação às sindicalizadas (os) ou associadas (os), 51,4% se
declararam como solteiras, 17,1% como casadas, 14,3% como
divorciadas e/ou separadas, 11,4% como viúvas e 5,7% como
companheiras.
Na mesma linha do presente estudo, Batista e Aranha15,
realizaram trabalho de pesquisa no âmbito do Grupo PET de
Serviço Social/UFS (Programa de Educação Tutorial), com o
objetivo de analisar a relação entre trabalho e gênero, tendo
como sujeitos da pesquisa as trabalhadoras domésticas sindica-
lizadas do município de Aracaju/SE.

15 BATISTA, Itamiris de Santana; ARANHA, Maria Lúcia Machado


Aranha. Trabalho doméstico e gênero: uma caracterização a partir das tra-
balhadoras domésticas de Aracaju/SE. Anais. VI Colóquio Internacional:
“Educação e Contemporaneidade”. São Cristovão/SE, 2012, p.1-16.
62

Em relação ao estado civil, as autoras constataram que a


grande maioria se declarou como solteira, representando 67%,
seguidos das casadas, com 20%; as separadas totalizaram 8%, e
as viúvas, 2%. 3% não informaram. Portanto, no que se refere
ao estado civil predominante, os resultados dos estudos no
município de Aracaju confirmam o resultado médio obtido na
presente pesquisa, considerando que na pesquisa de Alagoas
o percentual de solteiras era de 67%, enquanto que no estudo
realizado no presente estudo, foi obtido um percentual de
51,4% para o citado estado civil.
No trabalho conclusivo de Mestrado, Barbosa16 pesqui-
sando 11 empregadas domésticas sindicalizadas no município
de João Pessoa (Paraíba), ressalta que do total de questiona-
das, 45,5% se declararam como casadas, 36, 4% como soltei-
ras e 18,2% como separadas. Esses dados diferem daquele
conseguidos ao se fazer a média das sete cidades pesquisadas,
considerando que os dados do presente estudo foram: 51,4%
solteiras, 17,1% casadas e 5,7% companheiras. No que se refere
às trabalhadoras (es) domésticas (os) não sindicalizadas (os) ou
não associadas (os), 31,4% se declararam como casadas, 22,9%
como companheiras e 22,9% como solteiras.
Nestes dados, um aspecto chama especial atenção: o alto
percentual de domésticas não sindicalizadas ou não associadas
que se declararam no estado civil companheira em relação ao
percentual observado entre as (os) domésticas (os) sindicali-
zadas (associadas), cujo percentual foi de apenas 5,7%. Este

16 BARBOSA, Luciana Cândido. Trabalho doméstico: uma análise das


condições de trabalho das empregadas sindicalizadas do município de
João Pessoa – PB. Dissertação (Mestrado) – UFPB/CCHLA, João
Pessoa: [s.n.], 2013, 161p.
63

resultado sugere duas interpretações, a saber: ou as domésti-


cas não sindicalizadas (não associadas) não têm a devida com-
preensão da natureza da condição de companheira ou as (os)
domésticas sindicalizadas (os), em face do ativismo sindical,
têm a compreensão mais clara da condição de companhei-
rismo, do ponto de vista jurídico.
Certamente, estes dados podem sugerir que as domésticas
sindicalizadas, em face da própria mobilização política decor-
rente da atividade sindical, assumem de forma explícita a con-
dição de solteiras, mesmo quando possuem filhos (fato que se
constatou com a presente pesquisa). Ou seja, para estas trabalha-
doras a afirmação da condição de solteira e, consequentemente,
de mãe solteira, é uma forma de superar o preconceito que ainda
persiste em setores conservadores da sociedade brasileira.
Diferentemente, este preconceito talvez seja reforçado pela
resposta das domésticas não sindicalizadas que optaram por
se declararem como companheiras, ao invés de afirmaram a
condição de solteira (mãe solteira). Esta análise, no entanto,
decorre de uma mera dedução hipotética, carecendo de apro-
fundamento em outros estudos, a fim de confirmar esta conclu-
são sugerida no presente estudo.

Auto declaração de cor ou etnia das (os) trabalhadoras


(es) domésticas (os)

Como dito, introdutoriamente, a categoria das trabalha-


doras domésticas tem um traço marcante quanto a questão
de gênero, de posição econômica e de etnia ou cor. Os estu-
dos desenvolvidos no presente trabalho realçaram aspectos
interessantes quando se comparam os resultados obtidos dos
questionários aplicados junto às trabalhadoras domésticas
64

sindicalizadas e não sindicalizadas, deixando em evidência,


claramente, um empoderamento positivamente diferenciado
quanto à autodeclaração de cor/etnia por parte das domésticas
sindicalizadas, o que favoreceu uma reflexão importante sobre
o tema, que passo a detalhar:

Gráfico 4A/4B – Autodeclaração da cor ou etnia pelas(os) trabalhadoras (es)


domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)
65

Fonte 4A/4B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Conforme se observa, quanto a declaração de cor ou de


etnia na categoria das trabalhadoras domésticas sindicaliza-
das e/ou associadas (Gráfico 1B), houve predominância da cor
negra nos municípios de Salvador, Rio de Janeiro e João Pessoa,
num percentual de 80% e de 100% em Recife, enquanto nos
mesmos municípios, as domésticas se declaram brancas ou par-
das em apenas 20% dos casos. Destaca-se o percentual decla-
rado de pardas em Belém (Pará), com um percentual de 60%,
respectivamente.
Quanto a autodeclaração de cor ou de etnia das partici-
pantes não associadas e/ou não sindicalizadas (Gráfico 1B),
observa-se que houve predominância para a cor negra em
Brasília (80%) e Belém (80%), enquanto a cor parda predo-
minou no Rio de Janeiro (60%), Recife (80%) e João Pessoa
(80%). Já em Blumenau, 40% das entrevistadas se declaram
como negras ou pardas. Ao se fazer a média da autodeclaração
de cor das 07 (sete) cidades pesquisadas, o resultado retrata um
dado extremamente interessante, a saber:
Entre as empregadas domésticas sindicalizadas ou asso-
ciadas, o percentual da autodeclaração da cor negra alcançou
65,7%, enquanto que a declaração como pardas se limitou a um
percentual de 20%. Já entre as entrevistadas não sindicalizadas
e/ou não associadas, os dados retratam um resultado que carece
de uma análise mais acurada: 48,6% se declaram como pardas
e 42,9% como negras.
66

O debate sobre classificação racial no Brasil constitui um


tema de investigação que, apesar de ter merecido a atenção de
vários estudiosos ao longo das décadas, a exemplo de Pinto17
e Rosemberg18 et. al., tem recebido maior visibilidade pública
nos últimos anos em decorrência da mobilização favorável e
contrária às ações afirmativas.
Os dados obtidos neste estudo demonstram diversas aná-
lises, vejamos: nas sete cidades investigadas, observam-se duas
categorias de empregadas domésticas associadas a um sindicato
da categoria, em detrimento de um grupo dessas profissionais
que não se inseriram no contexto sindical, o que denota diferen-
ças significativas no quesito autoidentificação de sua cor. Esse
reflexo do poder associativo traz claramente o empoderamento
da mulher negra a partir da conscientização amadurecida den-
tro das qualificações realizadas e cursos de aperfeiçoamento
existentes no movimento sindical que trabalha com a função
de referendar a autodeclaração de pertença racial.
É preciso afirmar que neste estudo, o termo raça é enten-
dido como conceito sociológico analítico, e que permite apre-
ender como, em diferentes contextos históricos, as pessoas
operam classificações sociais hierarquizadas com base em
atributos considerados raciais. Nesse sentido, o termo raça é

17 PINTO, Regina Pahim. O movimento negro em São Paulo: Luta e


Identidade. São Paulo, 1993 (Tese de Doutorado - Departamento de
Antropologia da FFLCH-USP), 280p.
18 ROSEMBERG, Fúlvia; PINTO, Regina; NEGRÃO, Esmeralda V.
A. A situação educacional de negros (Pretos e Pardos). (Relatório de
Pesquisa. Departamento de Pesquisas Educacionais/Fundação Carlos
Chagas). São Paulo, 1986.
67

compreendido como Guimarães19 aborda: “A realidade das


raças limita-se, portanto, ao mundo social”.
Por outro lado, ao politizar as desigualdades de gênero, o
feminismo transforma as mulheres em novos sujeitos políticos.
Essa condição faz com esses sujeitos assumam, a partir do lugar
em que estão inseridos, diversos olhares que desencadeiam
processos particulares subjacentes na luta de cada grupo em
particular.
É plenamente conhecida a distância que separa os negros e
os brancos no país no que diz respeito a posição ocupacional. O
movimento de mulheres negras vem pondo em relevo essa dis-
tância, que assume proporções ainda maiores quando o tópico
de gênero e raça é levado em consideração.
Nesse sentido, é importante destacar os ganhos obtidos
pela luta feminista no mercado de trabalho, em que pese se
constituírem em grandes avanços, não conseguiram dirimir as
desigualdades raciais que obstaculizam maiores avanços para as
mulheres negras nessa esfera.
Com respeito a essas questões, Sansone20 (1996) declara
que as propostas universalistas da luta das mulheres não só
mostram a sua fragilidade, como a impossibilidade de as rei-
vindicações que daí advém tornarem-se viáveis para enfrentar
as especificidades do racismo brasileiro.

19 GUIMARÃES, Antônio Sérgio Alfredo. Racismo e anti-racismo no


Brasil. São Paulo: Editora: 34, 1999, 238p.
20 SANSONE, Lívio. O sistema de classificação racial do Brasil que
muda. Afro. Ásia, n.18, 1996, p.165- 187.
68

Em estudo sobre  a Trajetória educacional e realização


socioeconômica das mulheres negras,  Lima21 afirma que se
torna evidente a constatação de que:

O fato de 48% das mulheres pretas [...]


estarem no serviço doméstico é sinal de
que a expansão do mercado de traba-
lho para essas mulheres não significou
ganhos significativos. E quando esta bar-
reira social é rompida, ou seja, quando as
mulheres negras conseguem investir em
educação numa tentativa de mobilidade
social, elas se dirigem para empregos com
menores rendimentos e menos reconheci-
dos no mercado de trabalho.

No caso das trabalhadoras domésticas, o projeto de serem


reconhecidas como membros da classe trabalhadora reelabora,
por um lado, vivências sobre questões de gênero, de raça, de
geração e até de classe e, por outro, redimensiona significados
de constructos do conhecimento feminista, como os de público
e privado. Certamente o sindicato trata de questões das situa-
ções de vivência dessas trabalhadoras no âmbito público e pri-
vado recorrendo à essencialidade de dimensões da reprodução,
como o trabalho doméstico e a desprivatização da casa, para o
processo de constituição da identidade feminina.

21 LIMA, Márcia. Trajetória educacional e realização sócio-econômica


das mulheres negras brasileiras.  Revista Estudos Feministas. IFCS/
UFRJ, v.3, n.2, 1995, p.489.
69

Voltando aos dados médios da autodeclaração de cor das


07 (sete) cidades estudadas, verificamos que quanto à etnia as
mulheres trabalhadoras associadas, respondem ao questionário
declarando-se majoritariamente como negras, diferentemente
das não associadas que reverberam serem pardas.
Além disso, observa-se que as empregadas não associadas
relativizam a cor, o que pode nos levar a crer na cristalização
influenciada pelos discursos da democracia racial e da cele-
bração da mestiçagem, difundido mais amplamente entre as
empregadas sindicalizadas. Na opinião de muitos pesquisado-
res, inclusive Beneduzi22 e Rocha e Rosemberg23, a mestiça-
gem coexiste muitas vezes com uma preferência pelo branco,
mesmo não sendo sempre explícita, como se revelou em seu
estudo “Sistema de classificação racial no Brasil que muda”,
quando muitos jovens diziam ter pais de cor mais clara do que
eles e preferiam por não utilizar os termos preto ou negro como
uma forma de respeito aos pais.
Se entre pesquisadores há consenso que esta relatividade
no uso da terminologia da cor reflete a situação das relações
raciais no Brasil, há, porém, divergência quanto ao significado
político desta terminologia. Opino que o variado uso dos ter-
mos representa uma classificação do próprio mundo do traba-
lho, em termos da cor. É importante salientar que no presente
estudo foram referidos os termos: amarelos, brancos, indígenas,
negros e pardos buscando resultados da autodeclaração aberta.

22 BENEDUZI, Luís F. Por um branqueamento mais rápido: identidade


e racismo nas narrativas do álbum do cinquentenário da imigração ita-
liana no sul do Brasil. Antítese, v.4 n.7, 2011, p.13-30.
23 ROCHA, Edmar, J. da; ROSEMBERG, Fúlvia. Autodeclaração de cor
e/ou raça entre escolares paulistanos(as). Cadernos de Pesquisa, v.37,
n.132, 2007, p.759-799.
71

CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS
DAS FAMÍLIAS DAS TRABALHADORAS
(ES) DOMÉSTICAS (OS)

O presente capítulo teve por objetivo entender as carac-


terísticas das famílias das empregadas domésticas, objeto do
presente estudo, a fim de traçar um caminho no sentido de
desvendar aspectos que poderiam evidenciar o contexto fami-
liar dessas trabalhadoras que, certamente, tem estreita relação
com o cotidiano laboral das domésticas. Portanto, os resultados
assim se expressam:

Existência de dependentes nas famílias


das empregadas domésticas

A
72

Gráfico 5A/5B - Existência de dependentes entre trabalhadoras (es) domésticas


(os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 5A/5B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto a existência de dependentes (Gráfico 5A), obser-


vou-se que, 100% dos entrevistados sindicalizados dos muni-
cípios de Salvador e de João Pessoa possuem dependentes.
Este dado chama especial atenção, considerando que ao cruzar
esta variável com os do estado civil, obtidos na presente pes-
quisa, verifica-se que na cidade de João Pessoa, 40% das (os)
entrevistados se declararam como solteiras (os). Portanto, este
resultado sugere que a presença de dependentes nessa catego-
ria pode estar relacionada com a condição de “mãe solteira” ou
de outros dependentes que não sejam necessariamente filhos
biológicos.
73

Nos municípios de Recife, Blumenau e Belém, os dados são


iguais, ou seja, 60% das entrevistadas informaram ter depen-
dentes e 40% declararam não ter dependentes. Nos municípios
do Rio de Janeiro e Brasília, os resultados são iguais: 80% das
entrevistadas declaram não ter dependentes e 20% que não têm
dependentes. Estes resultados estão em consonância com os
dados relativos ao estado civil, considerando que nestes dois
municípios o estado civil predominante foi de solteira, com um
percentual de 80%.
No que diz respeito à existência de dependentes entre as
(os) participantes não sindicalizadas (os) ou não associadas (os)
(Gráfico 5B), observa-se que 100% das (os) entrevistadas (os)
do Rio de Janeiro e de Recife possuem dependentes. Ao cruzar
este resultado com os obtidos na variável “estado civil”, surge
uma informação que merece realce. Quanto ao estado civil, no
município do Rio de Janeiro, do total das (os) entrevistadas
(os), 40% se declararam casadas, 20% informaram ter compa-
nheiros (as) e 40% informaram serem solteiras (os).
Portanto, este último dado (solteiras), sugere que ao se
obter 100% de respostas afirmativas na variável existência de
dependentes, ou houve equívoco na informação, ou as entrevis-
tadas podem ter dependentes na condição de “mães solteiras”
ou dependentes que não são, necessariamente, filhos biológicos.
Esta mesma interpretação se aplica ao município de Recife,
pois os dados relativos ao estado civil demonstraram que 60%
das entrevistadas se declararam como solteiras.
Nos municípios de Salvador e João Pessoa os dados são
iguais: 60% informaram não ter dependentes e 40% declara-
ram ter dependentes. Nos municípios de Blumenau e Brasília,
80% das (os) entrevistadas (os) declararam ter dependentes e
20% informaram que não tinham dependentes.
74

Estes dados estão em sintonia com os dados obtidos em


relação ao estado civil, pois nestes municípios as entrevistadas
somente se declararam como casadas, viúvas, separadas ou ter
companheiros. Finalmente, no município de Belém, 80% das
(os) entrevistadas (os) declararam não ter dependentes e 20%
informaram que tinham dependentes. Ao estabelecer a média
entre as 07 (sete) cidades estudadas (por categoria), se consta-
tou que no grupo das sindicalizadas ou associadas, o percentual
de domésticas com dependentes foi de 60%, enquanto que as
que declararam não ter dependentes, chegou a um percentual
de 40%. Já na categoria das não sindicalizadas ou não associa-
das, estes percentuais foram de 74,3% das que declararam ter
dependentes e de 25,7% que declararam não ter dependentes.
Há um dado que suscita maiores estudos por meio de
outras pesquisas. Quando se faz a média da existência de
dependentes por região do Brasil e de acordo com a categoria,
surgem dados bastante inusitados. Por exemplo, na categoria
das trabalhadoras domésticas sindicalizadas, a região Nordeste
(Salvador, Recife e João Pessoa) desponta como a que tem o
maior percentual de respostas sim (86,7%), enquanto que a
região Sudeste e Centro-Oeste, correspondente aos municípios
do Rio de Janeiro e Brasília, este percentual foi de apenas 20%.
Estes dados têm certa relação com os dados oficiais, coletados
pelo IBGE na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio,
publicada em 2001, que aponta a Região Nordeste como a que
apresente o segundo maior número de filhos por família, abaixo
apenas do Norte.
75

Gráfico 6 – Número médio de filhos por família.

No entanto, quando se faz a análise sobre os dados da cate-


goria das não sindicalizadas ou não associadas, não há relação
coerente com os dados apresentados no gráfico do IBGE, con-
siderando que na Região Nordeste o percentual de respostas
afirmativas quanto à existência de dependentes na família foi
de 60%, abaixo daqueles observados nas regiões Sudeste e Sul,
que foram de 100% e 80%, respectivamente.
Por outra parte, estes dados podem ter uma influência dos
números divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome do Brasil com base nas edições de
2003 a 2013 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) em 2013.
No citado levantamento, em 2003, a média de filhos por
família entre os 20% mais pobres do Nordeste (classe onde se
situam as trabalhadoras domésticas), os números foram reduzi-
dos de 2,73 em 2003 para 2,01 em 2013. É importante desta-
car que estes dados derrubam a tese de que as políticas sociais
76

implantadas pelo Governo Federal, a exemplo do Programa


Bolsa Família, estimulariam as famílias mais pobres do país
a aumentar o número de filhos para, assim, receberem mais
benefícios do programa.
Segundo a ministra do Desenvolvimento Social e Combate
à fome da época, Tereza Campelo, conforme destacou a jorna-
lista Paula Laboissière, da Agência Brasil, em matéria publi-
cada em 27 de março de 2015, os dados derrubam a tese de
que a política proposta pelo Programa Bolsa Família esti-
mula as famílias mais pobres do Brasil a aumentar o número
de filhos para receber mais benefícios. A repórter destacou na
citada matéria a fala da ministra Tereza Campello, que assim
se expressou:

[...] mesmo a redução no número de


filhos por família sendo um fenômeno
bastante consolidado no Brasil, as pes-
soas continuam falando que o número de
filhos dos pobres é muito grande. De onde
vem essa informação? Não vem de lugar
nenhum porque não é informação, é puro
preconceito.

Portanto, os dados da presente pesquisa quanto à existência


ou não de dependentes nas duas categorias estudadas (traba-
lhadoras domésticas sindicalizadas ou associadas e trabalhado-
ras domésticas não sindicalizadas ou não associadas), não são
conclusivos, com base nos dados oficiais do IBGE. Contudo,
sugere a realização de novas pesquisas, talvez focando a per-
gunta em relação ao número de filhos por família em cada
categoria.
77

Natureza da escola dos (as) filhos (as) das


trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 7A/7B - Natureza da escola dos filhos das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %)

Fonte 7A/7B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
78

Quanto a natureza da escola dos (as) filhos (as) das (os) tra-
balhadoras (es) sindicalizadas (os) ou associadas (os) (Gráfico
7A), observa-se que, 100% de todos as entrevistadas da pes-
quisa nos sete municípios, afirmaram que seus filhos estudam
em escola pública. No que diz respeito à natureza da escola
dos filhos de participantes não sindicalizados ou não associa-
dos (Gráfico 7B), observa-se que nos municípios de Salvador,
Rio de Janeiro e Brasília, 100% dos entrevistados informaram
que os filhos estudam em escola pública. Apenas nos municí-
pios do Rio de Janeiro e Blumenau, houve registro de matrí-
cula de filhos em escola privada. Assim, 80% responderam que
os filhos estudam em escola pública e 20% afirmaram que os
filhos estudam em escola privada.
No que se refere a esta variável de estudo e nas duas cate-
gorias, há de se destacar dois aspectos considerados relevantes:
todos (as) os (as) filhos (as) das (os) trabalhadoras (es) domés-
ticas (os) estão inseridos no processo formal de escolarização,
o que representa um dado extremamente significativo. Apesar
de não ser um dado que causa surpresa, considerando que os
dados educacionais recentes, divulgados pelo INEP/Censo
Escolar 201324, reforçam a tendência de adequação na distri-
buição das matrículas na educação básica, por modalidades e
etapas de ensino, que vem sendo observada desde 2007, refle-
tindo a melhoria nas políticas públicas da Educação, levadas a
cabo nos últimos anos.

24 INEP/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio


Teixeira. Censo Escolar da Educação Básica 2013: resumo técnico
/ Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira. – Brasília: O Instituto, 2014, 39p.
79

Não foi objeto da pesquisa, saber em que etapa ou modali-


dade da educação os filhos das trabalhadoras domésticas esta-
vam matriculados. Portanto, certamente, a depender da idade,
poderiam estar matriculados da Educação Infantil, no Ensino
Fundamental, no Ensino Médio, no Ensino Profissional ou
até no Ensino Superior. Assim, como também não é objeto da
presente pesquisa fazer um estudo aprofundado sobre o cená-
rio educacional do país, considero importante apresentar algu-
mas reflexões, face aos dados publicados pelo Censo Escolar
2013.
É importante destacar a ampliação nos últimos anos da
oferta da educação infantil, em especial na creche, que atende
às crianças de 0 (zero) a 3 (três) anos de idade, que apresen-
tou crescimento da ordem de 7,5%, de 2007 a 2013. Por outro
lado, também na Educação Infantil, houve a reorganização da
pré-escola, que atende crianças de 4 (quatro) e 5 (cinco) anos.
Com a implantação do ensino fundamental de 9 (nove) anos,
parte do público-alvo da pré-escola foi transferido para o 1º
ano do ensino fundamental, que passou a receber as crianças
com 6 (seis) anos de idade.
Outro aspecto percebido no Censo Escolar 2013, foi a con-
firmação da trajetória de expansão da matrícula na educação
profissional, com um crescimento das matrículas em 84,1% no
período. Esse comportamento está em sintonia com as políti-
cas e ações do Ministério da Educação, no sentido do fomento
ao fortalecimento, à expansão e à melhoria da qualidade da
educação profissional no País.
Segundo os mesmos dados do Censo Escolar 2013 do
INEP, a tendência atual mostra aumento no número de alunos
que conseguem ultrapassar os anos iniciais do ensino funda-
mental. Daí a queda na matrícula e a ampliação da demanda
80

para os anos finais dessa etapa de ensino. Entretanto, para os


anos finais, como a intensidade dessa dinâmica ainda não é a
mesma observada nos anos iniciais, o aumento no número de
concluintes do ensino fundamental se mostra discreto.
Finalmente, o que considero mais relevante é que os
dados obtidos na presente pesquisa estão em absoluta sintonia
com os dados do Censo Escolar 2013, considerando que dos
50.042.448 alunos matriculados nos 190.706 estabelecimentos
de Educação Básica do País, 41.432.416 (82,8%) estão vin-
culados às escolas públicas e 8.610.032 (17,2%) às escolas da
rede privada. As redes municipais são responsáveis por quase
metade das matrículas (46,4%), o equivalente a 23.215.052
alunos, seguida pela rede estadual, que atende a 35,8% do
total, 17.926.568 alunos. A rede federal, com 290.796 matrí-
culas, participa com 0,6% do total. Certamente, ressalto que o
expressivo percentual de filhos das trabalhadoras domésticas,
tanto sindicalizadas quanto não sindicalizadas, em escolas que
integram a Rede Pública de Ensino, não causa nenhuma estra-
nheza, considerando, inclusive, o baixo poder aquisitivo dessas
trabalhadoras que integram as camadas mais pobres da socie-
dade brasileira.
81

Nível de escolaridade das trabalhadoras (es)


domésticas (os)

Gráfico 8A/8B - Nível de escolaridade das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)
(A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas
(os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)

Fonte 8A/8B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
82

Quanto ao nível de escolaridade dos trabalhadores domés-


ticos sindicalizados (Gráfico 8A), os resultados foram distri-
buídos da seguinte forma: Salvador (60% médio incompleto
e 40% fundamental incompleto), Rio de Janeiro (60% médio
completo, 20% fundamental incompleto e 20% médio incom-
pleto), Recife (40% fundamental completo, 40% médio com-
pleto e 20% fundamental incompleto), João Pessoa (40%
fundamental completo, 40% médio incompleto e 20% superior
incompleto).
Em Blumenau (60% fundamental incompleto e 40% fun-
damental completo), Brasília (40% fundamental completo,
20% médio completo, 20% fundamental incompleto e 20%
médio incompleto) e Belém (60% médio completo, 20% fun-
damental completo e 20% médio incompleto).
Em relação ao nível de escolaridade dos trabalhadores
domésticos da categoria não associadas ou não sindicaliza-
das (Gráfico 8B), os resultados foram distribuídos da seguinte
forma: Salvador (80% médio completo e 20% médio incom-
pleto); Rio de Janeiro (40% fundamental completo; 40% médio
completo e 20% fundamental incompleto); Recife (40% médio
completo, 20% médio incompleto e 20% fundamental incom-
pleto, e 20% superior completo); João Pessoa (80% fundamen-
tal completo e 20% fundamental incompleto); Blumenau (40%
fundamental incompleto, 20% médio completo, 20% médio
incompleto e 20% fundamental completo); Brasília (80% fun-
damental incompleto e 20% fundamental completo); e Belém
(60% médio incompleto, 20% fundamental incompleto e 20%
sem escolarização).
Ao se fazer a média entre os municípios estudados e nas
duas categorias, observa-se que entre as trabalhadoras domés-
ticas sindicalizadas ou associadas, a distribuição percentual
83

média por nível de escolaridade é a seguinte: 22,9 % possuem


fundamental incompleto; 25,7 possuem fundamental com-
pleto; 22,9% possuem médio incompleto; 25,7% possuem
médio completo; e 2,9% possuem superior incompleto. Já entre
as trabalhadoras domésticas não sindicalizadas ou não associa-
das, os percentuais foram de 2,9% sem escolarização; 28,6%
que possuem fundamental incompleto; 22,9% que possuem
fundamental completo; 17,1% que possuem médio incom-
pleto; 25,7 que possuem médio completo; e 2,9% que possuem
superior completo.
O quadro geral nas duas categorias estudadas é de baixa
escolaridade, com certa melhoria em relação à categoria das
trabalhadoras domésticas sindicalizadas ou associadas. Ou seja,
ao se fazer a média entre as domésticas que possuem apenas o
fundamental incompleto e completo, encontrou-se o percentual
de 48,6% entre as domésticas sindicalizadas e de 51,5% entre
as não sindicalizadas ou não associadas. Já em relação ao ensino
médio (incompleto e completo), os percentuais médios encon-
trados foram de 48,6% entre as trabalhadoras domésticas sin-
dicalizadas e de 42,8% entre as domésticas não sindicalizadas.
Portanto, com base nestas médias apresentadas, é possível
asseverar que as trabalhadoras domésticas sindicalizadas pos-
suem uma sensível melhoria na formação escolar, considerando
que apresentam o menor percentual em relação ao ensino fun-
damental (48,6%) e o maior percentual das que cursam ou con-
cluíram o ensino médio (48,6%).
Outro dado que reforça essa sensível melhoria em rela-
ção às trabalhadoras domésticas sindicalizadas é que não se
encontrou, nas sete cidades estudadas, nenhuma resposta que
indicasse a não escolarização, dado registrado em 2,9% das tra-
balhadoras não sindicalizadas. Não há nenhum receio em dizer
84

que o fato das trabalhadoras domésticas sindicalizadas parti-


ciparem de atividades intensivas de mobilização, associadas
às ações de formação e/ou capacitação, termina por favorecer
uma melhor conscientização sobre a importância do processo
de escolarização em suas vidas.
De acordo com os dados apresentados pela revista Estudos
e Pesquisas do DIEESE25, publicado em 2013, sobre o emprego
doméstico no Brasil, com relação à escolaridade, a maioria das
trabalhadoras domésticas possui apenas o Ensino Fundamental
incompleto ou equivalente (alfabetizadas sem escolariza-
ção), cujo percentual foi de 48,9% em 2011. Por outra parte,
23,1% possuem o Ensino Fundamental Completo ou o Médio
Incompleto; 19,0% possuem o Ensino Médio Completo ou o
Superior Incompleto e 0,9% possui superior completo.
Um dado que chama especial atenção é que 7,5% das tra-
balhadoras domésticas brasileiras são analfabetas. A citada pes-
quisa informa que foi elevada também, a proporção daquelas
com Ensino Fundamental completo ou Médio incompleto
(23,1%). Ressalta o estudo que:

[...] a forte presença de domésticas ocu-


padas com baixos níveis de escolaridade
reflete, de certa maneira, o lugar que o tra-
balho doméstico ocupa na sociedade, visto
como atividade em que a mulher seria
“naturalmente apta” a desempenhá-la,
ou seja, não precisaria obter qualificação

25 DIEESE/Departamento Intersindical de Estatística e Estudos


Socioeconômicos. Estudos e Pesquisas. O emprego doméstico no
Brasil. n.68, ago., 2013, 27p.
85

profissional para essas atribuições, o que


fortalece a desmotivação e a desvaloriza-
ção dessas trabalhadoras.

De modo geral, os dados apresentados no estudo do


DIEESE indicam a melhoria do nível educacional da popu-
lação brasileira, e este resultado também aparece para as tra-
balhadoras domésticas. Entre 2004 e 2011, a proporção de
trabalhadoras domésticas com ensino fundamental completo
e médio incompleto cresceu de 20,4% para 23,1%. O maior
aumento (7,7%) foi registrado entre as domésticas ocupadas
com ensino médio completo ou superior incompleto, no mesmo
período. O estudo revela que o “aumento da escolaridade pode
permitir uma inserção em atividades dentro de segmento que
exijam maior qualificação (acompanhamento de idosos, babás,
na área da saúde, etc)”.
Ao se comparar os resultados da presente pesquisa com os
dados publicados pelo DIEESE relativo ao perfil das domés-
ticas no Brasil, observa-se que houve plena coerência, consi-
derando que também na presente pesquisa se demonstrou que
a maioria das trabalhadoras domésticas não sindicalizadas ou
não associadas possuía, apenas, o ensino fundamental incom-
pleto. Já entre as trabalhadoras domésticas sindicalizadas, o
maior percentual foi registrado para as que possuíam o funda-
mental completo e médio completo, com o mesmo percentual
(25,7%). Assim, a comparação da pesquisa realizada nesta Tese
com os dados do DIEESE, reforça a informação de que as tra-
balhadoras domésticas sindicalizadas apresentam uma sensível
melhoria na escolarização.
86

Cotidiano laboral das trabalhadoras (es) domésticas (os)

Atividade em exercício das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 9A/9B - Atividades em exercício das (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não
associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil –
2016 (valores em percentual %)26.

26 Nota: As entrevistadas dos municípios de Blumenau (Gráfico 8A e 8B)


e de Salvador (Gráfico 8B) assinalaram mais de uma opção.
87

Fonte 9A/9B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e Jurídico:


da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras domésticas
do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de Derecho de la
Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito às atividades desenvolvidas no exercício


do trabalho doméstico na categoria das domésticas sindicaliza-
dos ou associadas (Gráfico 9A), observa-se que 80% das entre-
vistadas de Salvador e de João Pessoa informaram que exercem
todas as tarefas domésticas e 20% informaram que atuam como
arrumadeira e cozinheira, respectivamente. Quanto às entre-
vistadas de Blumenau, 50% informaram que executam todos
os serviços domésticos, 25% disseram que atuam apenas como
cozinheiros, 12,5% afirmaram realizar a tarefa de arrumadeiras
e 25% informaram que atuam como babás.
Por outro lado, no Rio de Janeiro 40% disseram que são
arrumadeiras, 40% informaram que atual como cozinheira e
20% exercem todas os serviços do lar. No município de Recife,
60% informaram que executam todos os exercícios da casa,
20% disseram que são babás e 20% que são cozinheiras. Já em
Brasília, 40% das entrevistadas informaram que fazem todos
os serviços, 20% que são cozinheiras, 20% que arrumadeiras e
20% fazem outros serviços. No município de Belém, as entre-
vistadas responderam da seguinte forma: 60% exercem todos
os serviços da casa, 20% são babás e 20% são arrumadeiras.
Quanto à categoria das trabalhadoras domésticas não
associadas ou não sindicalizadas, as atividades em exercício
no trabalho (Gráfico 9B), as entrevistadas de Recife, Brasília
e Belém informaram em 80% que atuam em todos os servi-
ços domésticos e 20% como arrumadeira, babá e cozinheira,
88

respectivamente. Em Blumenau 58% das entrevistadas exer-


cem todas as atividades do lar, 14% são babás, arrumadeira e
cozinheiros, concomitantemente, enquanto que, em Salvador,
43% são cozinheiros, 29% exercem outras funções, 14% atuam
como babás e 14% como arrumadeiras. Já no município do Rio
de Janeiro, as entrevistadas informaram que exercem, em 50%
dos casos, todas as funções do lar, 33% são cozinheiras e 17%
arrumadeiras, enquanto que, em João Pessoa as entrevistadas
declararam que atuam em 60% em todos os serviços domésti-
cos e 40% atuam como cozinheiras.
Apesar de diferenças pouco significativas entre os dados
informados pelas duas categorias estudadas, no geral, observa-
se que as trabalhadoras domésticas, tanto as sindicalizadas
quanto as não sindicalizadas, informaram que atuam em
“todos os serviços domésticos”. Essa informação majoritária
reflete duas realidades: a primeira, de que as patroas (empre-
gadoras) historicamente optaram por contratar uma só pessoa
que fosse capaz de realizar todas as atividades da casa, ou seja,
cozinhar e arrumar, principalmente. Essa realidade esteve pre-
sente na grande maioria dos lares de classe média brasileira.
Aliás, quando uma família de classe média apresentava melhor
poder aquisitivo, uma forma de expressar socialmente esta situ-
ação, era contratar duas empregadas – uma cozinheira e outra
arrumadeira. No entanto, a situação majoritária de contratação
de uma só pessoa para dar conta de todo o serviço doméstico,
reflete um contexto de exploração laboral a que foram submeti-
das às empregadas domésticas, ao longo dos anos, no país. Para
uma pessoa negra, de baixa escolaridade e pobre, não restava
outra opção, a não ser se submeter a essa situação de exploração
laboral.
89

Outra realidade que os dados sugerem é de que, além de ser


uma forma de recrutamento profissional nitidamente explo-
ratório, o mercado de trabalho absorvia, mais facilmente, as
empregadas domésticas que apresentassem múltiplas habilida-
des, a exemplo de cozinhar e arrumar. Ou seja, contraditoria-
mente, a condição de melhor habilitada não dava a trabalhadora
uma diferenciação capaz de que a mesma fosse absorvida em
uma situação mais vantajosa. Ao contrário: a mais capacitada
era a mais explorada.
Um dado que chama atenção e que talvez reflita uma
mudança nesse cenário de exploração é observado quando se
consultam algumas agências de empregos para trabalhado-
ras domésticas, espalhadas pelo Brasil. Em vários destes sites
visitados, há uma clara divisão da categoria, face ao tipo de
atividade que desenvolvem. Ou seja, as agências oferecem o
trabalho de cozinheiras, arrumadeiras, copeiras, babás, etc. de
forma separada. Como exemplo, sugiro a consulta aos sites:
http://www.profissionaisdolar.com.br/nossos-servicos/, http://
www.agencialarfeliz.com.br/vagas-de-emprego-para-empre-
gadas-domesticas/, http://www.agencialarfeliz.com.br/.
No entanto, uma consulta ao SINE (site nacional de
emprego: http://www.sine.com.br/vagas-empregos/domes-
tica), se constata que as informações sobre o perfil da empre-
gada que se pretende contratar, reflete essa condição de pessoa
com múltiplas habilidades. Penso que vale a pena o registro de
alguns dos anúncios para contratação de trabalhadoras domés-
ticas, registrados no site do SINE, por exemplo:
90

Empresa: Confidencial
Salário: A combinar (Média salarial para Doméstica)
Cidade e Estado: Rio de Janeiro / RJ
Descrição: 1. Doméstica Barra da Tijuca. Empregada doméstica Barra
da Tijuca/ RJ quantidade de vagas: 2. Descrição da vaga: profissional
que saiba cozinhar, saiba fazer todo o serviço da casa, que tenha
disponibilidade para trabalhar de segunda a sexta e finais de semana
quando for solicitada (vai ganhar como extra) requisitos: ensino
fundamental, residir próximo à barra da tijuca e possuir referências.
Salário: R$1.300,00. Oferecemos: Vale-transporte; Carteira assinada;
Refeição no local.

Empresa: Residência
Salário: R$ 1000,00 Média salarial para Ajudante de Serviços
Domésticos
Cidade e Estado: Belo Horizonte / MG
Descrição: Casa com 2 idosos, sem criança. Cozinhar, arrumar casa,
lavar e passar roupa (poucas peças). Jornada de trabalho, 12x36. De 7
às 19 horas, dia sim dia não. É necessário saber lidar com idoso, apenas
um ônibus, bairro Ouro Preto. Enviar currículo e retrato p/ E-mail,
registro carteira como cuidadora de idoso.

Empresa: Confidencial
Salário: R$ 880,00 Média salarial para Ajudante de Serviços
Domésticos
Cidade e Estado: João Pessoa / PB
Descrição: Contrato empregada doméstica para os serviços gerais de
apartamento de 2 quartos no Bairro Cabo Branco - João Pessoa. A
interessada deve saber cozinhar/passar roupas. A jornada de trabalho é
de segunda a sábado totalizando 44 horas semanais. Carteira assinada
e todos os direitos previstos em lei.
Enviar currículo com e endereço para o contato do anúncio.
91

Empresa: Domestic help


Telefone: (11) 50839608
Salário: R$ 1.500,00 (Média salarial para Ajudante de Serviços Domésticos)
Cidade e Estado: São Paulo / SP
Descrição: Tudo relacionado à casa, lavar, passar, cozinhar trivial simples.

Empresa: Cursor Rh
Telefone: (51) 30625662
Salário: R$ 1300,00 Média salarial para Ajudante de Serviços Domésticos
Cidade e Estado: Porto Alegre / RS
Atividades: limpeza e organização geral da residência. Lavar, passar,
fazer café da manhã e almoço. Cozinhar para 4 pessoas. Horário: de
segunda a sábado horário a combinar. Requisitos: experiência na função
comprovada na carteira, disponibilidade de horários e residir próximo.
Interessados que atendam aos requisitos, comparecer com currículo,
carteira de trabalho no Cursor RH, rua Gen. Andrade Neves, 90/64 -
Centro - Porto Alegre. Ou encaminhar currículo com o nome da vaga.

Então, conforme se observa apenas nestes 05 (cinco) exem-


plos, os requisitos para a contratação de trabalhadoras domés-
ticas seguem privilegiando àquelas que possuem múltiplas
atividades, ou seja, que conseguem atender todas as necessida-
des de uma casa: cozinhar, arrumar, lavar e passar roupas, etc.
Enfim, é possível afirmar que ainda persiste a forma
de contratação de trabalhadoras com esse perfil. Inclusive,
face aos novos encargos decorrentes da entrada em vigor da
Emenda Constitucional nº 72/2013, regulamentada pela Lei
Complementar nº 150/2015, é possível que esse nível de exi-
gência seja ainda mais reforçado, talvez como reflexo do enten-
dimento presente no senso comum que afirma que agora as
trabalhadoras domésticas “ganham muito” e, portanto, deve
cuidar de todo o serviço da casa.
92

Motivação das trabalhadoras (es) domésticas (os) para


a escolha da profissão

Gráfico 10A/10B - Motivação para a escolha da profissão pelas (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)27.

27 Nota: Exceto as entrevistadas dos municípios de Salvador e de Brasília


(Gráfico 9A), bem como do Rio de Janeiro (Gráfico 9B), não assinala-
ram mais de uma opção.
93

Fonte 10A/10B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto à motivação para a escolha da profissão pelas tra-


balhadoras domésticas sindicalizadas ou associadas (Gráfico
10A), os resultados foram distribuídos da seguinte forma: No
município de Salvador, 40% responderam que a escolha se
deveu a falta de experiência ou de formação para o exercício
de outra profissão; 40% responderam que gosta do que fazem;
e 20% atribuem à falta de oportunidade de ingressar em outro
emprego. No Rio de Janeiro, 62,5% afirmaram que a escolha se
deu pela falta de oportunidade de ingressar em outro emprego;
25% pela influência ou pela falta de formação para o exercí-
cio de outra profissão; 12,5% escolheram essa profissão por ser
comum entre os familiares; no município de Recife, 12% infor-
maram que optaram pela profissão pela falta de experiência ou
de formação para o exercício de outra profissão; 22% infor-
maram que a profissão é comum entre os familiares, que falta
oportunidade ou experiência para ingressar em outra profissão,
respectivamente.
Em João Pessoa e Blumenau, 30% e 29%, respectivamente,
informaram que a escolha se deu devido a falta de oportuni-
dade, 30% e 14% informaram que gostam do que fazem; 20%
e 29% afirmaram que optaram pela profissão em face da influ-
ência de amigos ou familiares, 10% e 14% consideram o que
fazem como algo importante e necessário à família e 10% e
14% a profissão é muito comum entre os familiares, respecti-
vamente; em Brasília 20% optaram pela profissão por conta da
94

influência dos amigos e familiares, enquanto que 40% informa-


ram que a escolha se deu pela falta de oportunidades ou pela
falta de experiência para exercer outra profissão; finalmente,
para as entrevistadas de Belém 66% informaram que a esco-
lha se deu pela falta de oportunidade de ingressar em outro
emprego, 17% pela falta de experiência ou de formação e 17%
atribuíram a outras variáveis.
Ao se fazer a média entre as 07 (sete) cidades pesquisa-
das, na categoria das trabalhadoras domésticas sindicalizadas,
observa-se que as respostas com maiores percentuais para jus-
tificar a escolha pela profissão foram: 38,5% para a falta de
oportunidade para ingressar em outra profissão; 19,2% para a
falta de experiência que favorecesse o ingresso em outras pro-
fissões; 12% afirmaram que a escolha se deu por gostarem do
que fazem e, finalmente, 8,3% para a escolha motivada por ser
uma profissão comum entre os familiares.
Quanto à motivação para a escolha da profissão pelas tra-
balhadoras domésticas não sindicalizadas ou não associadas
(Gráfico 10B), os resultados foram distribuídos da seguinte
forma: Em Salvador, 49% informaram que gostam do que
fazem; 17% disseram que optaram pela profissão pela falta de
experiência ou formação; 17% atribuem à falta de oportunidade
de ingressar em outro emprego e 17% informaram que a esco-
lha da profissão se deu pela influência de amigos ou familiares;
no município de Recife, 37,5% informaram que a escolha se
deu pela falta de oportunidade de ingressar em outro emprego;
37,5% consideram o que fazem como algo importante e neces-
sário para família e 25% a falta de experiência ou de forma-
ção para o exercício de outra profissão; no Rio de Janeiro, 80%
informaram que a escolha se deu pela falta de oportunidade e
20% pela influência de amigos ou familiares.
95

Na cidade de João Pessoa, 45% optaram pela profissão pela


falta de oportunidade; 22% pela falta de experiência; 11% infor-
maram que a profissão é comum entre familiares; 11% optaram
pela influência de amigos e 11% afirmaram que gostam do que
fazem. Em Blumenau, 43% informaram que optaram pela pro-
fissão em face da influência de amigos ou familiares; 28% pela
falta de experiência; 14% pela falta de oportunidade e 14% atri-
buem ao gosto pelo que fazem. Na cidade de Brasília 37% infor-
maram que a escolha se deu pela falta de oportunidade; 25%
pela falta de experiência, 25% consideram o que fazem como
importante e 12,5% gostam do que fazem); e por fim, na cidade
de Belém, 66% informaram que a escolha pela profissão ocorreu
pela falta de oportunidade e 17% pela falta de experiência.
Ao se fazer a média entre as 07 (sete) cidades pesquisadas,
na categoria das trabalhadoras domésticas não sindicalizadas
ou não associadas, observa-se que as respostas com maio-
res percentuais para justificar a escolha pela profissão foram:
42,4% para a falta de oportunidade para ingressar em outra
profissão; 16,7% para a falta de experiência que favorecesse o
ingresso em outras profissões; 12,4% afirmaram que a escolha
se deu por gostarem do que fazem e, finalmente, 16,8% para a
escolha motivada pela influência de familiares ou amigos.
Portanto, ao se fazer a análise comparativa das médias entre
as 07 (sete) cidades pesquisadas, nas duas categorias estudadas
(trabalhadoras domésticas sindicalizadas/associada e trabalha-
doras domésticas não sindicalizadas/não associadas), os per-
centuais de respostas predominantes correspondem às mesmas
respostas, a saber:

a) A falta de oportunidade para ingressar em outras profissões


foi a resposta com maior percentual, tanto na categoria das
96

domésticas sindicalizadas (38,5%), quanto na categoria das


não sindicalizadas;
b) Na sequência, aparece a resposta da falta de experiência para
ingressar em outra profissão como a segunda com maior per-
centual: 19,2% na categoria das trabalhadoras domésticas
sindicalizadas e 16,7% na categoria das não sindicalizadas;
c) Finalmente, com terceiro maior percentual entre as res-
postas, aparece a opção “por gostar do que fazem”, com
12,0% e 12,4% para a categoria das trabalhadoras domésti-
cas sindicalizadas e para a categoria das não sindicalizadas,
respectivamente.

Estes dados refletem o que a literatura especializada tem


registrado. No meu entendimento, as duas respostas predomi-
nantes se inter-relacionam para explicar a realidade da inserção
das trabalhadoras domésticas no mundo do trabalho no Brasil
e a dificuldade de ascensões verticais, decorrentes da inserção
em outras profissões, melhor valoradas pela sociedade.
Penso que a falta de oportunidade tem íntima relação com a
falta de experiências ou de formação para o ingresso em outras
profissões. Conforme visto anteriormente, um dos indicado-
res que caracterizam o perfil das domésticas no Brasil é exata-
mente a baixa escolaridade e a pouca capacitação.
Conforme destacado por Álvaro28:

No Brasil, as mulheres com nível inferior


de escolaridade, além de apresentarem
taxas bem menores de participação no

28 ÁLVARO, Maria Angela Gemaque. Trabalho doméstico e desigual-


dade social. Enfoque. v.11, n.1, mar., 2012, p.109-132.
97

mercado, têm poucas opções de escolha


de ocupações, restando-lhes assumir posi-
ções consideradas precárias, como é o caso
do trabalho doméstico, do trabalho não
remunerado ou do trabalho na produção
para o próprio consumo [...].

Sobre este fato, a autora citada enfatiza que essas três situ-
ações apresentam um forte caráter de gênero, expresso na
alta representatividade feminina que nele existe. Finalmente,
enfatizou que o trabalho doméstico assume uma posição des-
tacada entre as três posições, reunindo um quantitativo mais
significativo de mulheres, compreendendo 18,18% do contin-
gente feminino ocupado no Brasil urbano, conforme estudo
do Pnad-IBGE, 2009. A persistência dessa demanda por estes
serviços em países como o Brasil, aliado ao papel absorvedor
de mulheres de baixa renda, denota a relevância dos estudos na
perspectiva de desigualdade social e de gênero.
Apesar dessa realidade, é prudente não se deter somente
na caracterização das mulheres que vêm atuando nos serviços
domésticos. É importante, também, se focar nas modificações
e persistências em relação a este perfil, a fim de melhor com-
preender a realidade do mercado de trabalho das domésticas.
É importante destacar que de acordo com os dados divul-
gados Pnad-IBGE 2009, tanto na faixa etária de 10 (dez) a
17 (dezessete) anos, quanto na de 18 (dezoito) a 24 (vinte e
quatro) anos, há registro de queda contínua e expressiva de
meninas e mulheres ocupadas no trabalho doméstico, corres-
pondente a reduções de 9,7% e de 11%, respectivamente, no
período de 1999 a 2009.
98

Uma das hipóteses levantadas para explicar essa redução,


reside no aumento da escolaridade das jovens mulheres que,
com uma maior qualificação, optam por buscar outras possibi-
lidades de inserção no mercado de trabalho, em atividades dife-
rentes do trabalho doméstico, tão desvalorizado socialmente.
Resta claro que a possibilidade de ascensão das trabalha-
doras domésticas no país, está diretamente relacionada com a
melhoria da escolarização e com a capacitação técnica para o
exercício de outras profissões. É crescente, assim, o aumento
na quantidade de jovens mulheres de 18 (dezoito) a 24 (vinte
e quatro) anos disponíveis para o mercado de trabalho – ocu-
padas ou em busca de uma ocupação. Majoritariamente, estão
sendo absorvidas em outras profissões, diferentes do trabalho
doméstico, reforçando a ideia de que esse trabalho é cada vez
mais rechaçado pelas trabalhadoras domésticas no país.
No que se refere à escolarização, os dados oficiais, presen-
tes no Pnad-IBGE 2009, demonstram que há uma ampliação
do nível de escolaridade da população brasileira em geral. No
caso das trabalhadoras domésticas, esta escolarização saltou
de uma média de 4,7 anos de estudo (1999), para 6,1 anos
(2009), compreendendo um aumento médio de 1,4 anos de
estudo num prazo de uma década. Apesar desse avanço, esse
crescimento não só não foi capaz de aproximar a escolaridade
média das trabalhadoras domésticas daquela verificada para o
conjunto de mulheres ocupadas, como até ampliou esta desi-
gualdade, considerando que, entre 1999 e 2009, o conjunto de
mulheres trabalhadoras ampliou seu tempo médio de estudo
em 1,9 anos, passando de 7,4 (1999) para 9,3 (2009).
Entendo que as dificuldades das trabalhadoras domés-
ticas para inserirem-se no processo formal de escolarização,
derivam, justamente, da falta de garantia integral de direitos
99

laborais que as outras categorias de trabalhadores urbanos e


rurais. Certamente, que uma trabalhadora que sequer tinha
uma jornada de trabalho regulamentada, não apresente as mes-
mas condições potenciais de frequentar a escola. Além de uma
jornada injustamente ampliada, a trabalhadora ainda tinha que
dar conta das atividades de sua própria casa e do cuidado com
os familiares, geralmente num terceiro expediente.
Nesse cenário de dificuldades, não se poderia esperar dessa
categoria a mesma evolução no que se refere à melhoria da
escolarização, na proporção registrada na escolaridade média
das trabalhadoras em geral.

Tempo de serviço das trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
100

Gráfico 11A/11B - Tempo de serviço das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)
(A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas
(os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)29.

Fonte 11A/11B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Conforme se observa, face ao número das escalas de tempo


de serviço, num total de 08, a estrutura do Gráfico 11 foi alte-
rada em relação aos demais, figurando na legenda as cidades
pesquisadas, enquanto que as diversas escalas foram dispostas
no eixo das abscissas (vertical) e nas ordenadas (horizontal),
figuram os números de entrevistados, correspondentes aos per-
centuais citados no gráfico, por cidades (em cores diferentes).
No que se refere à questão do tempo de serviço, as (os)
entrevistadas (os) sindicalizadas (os) ou associadas (os),

29 Nota: Percentuais correspondentes aos municípios de acordo com a


legenda.
101

conforme se observa no Gráfico 11A, o percentual de domés-


ticas que atuam na profissão há mais de 19 (dezenove) anos,
por municípios pesquisados, se distribuem da seguinte forma:
Em Recife (80%); em João Pessoa (40%); no Rio de Janeiro
(40%); em Salvador (40%); e, finalmente, em Brasília (20%). Já
em relação às (aos) trabalhadoras (res) sindicalizadas (os) que
atuam na profissão entre 16 (dezesseis) e 19 (dezenove) anos,
os resultados foram: 20% em Salvador; 20% em Recife, 40%
em João Pessoa e 20% em Brasília; entre 13 (treze) e 16 (dezes-
seis) anos, só houve registro em Blumenau, com um percentual
de 20%. Entre 10 (dez) e 13 (treze) anos de tempo de serviços,
os resultados foram os seguintes: Salvador e Blumenau (40%)
e Rio de Janeiro (20%).
Ainda na mesma categoria, na escala entre 07 (sete) e 10
(dez) anos de tempo de serviço na profissão, os registros per-
centuais por cidade foram de: João Pessoa, Brasília e Salvador
com 20% das (os) entrevistadas (os); entre 4 (quatro) e 7 (sete)
anos de tempo de serviço, o percentual foi de 20%, para os
municípios de Rio de Janeiro, João Pessoa, Blumenau, Brasília
e Salvador. Entre 01 (um) e 04 (quatro) anos de tempo de ser-
viço, os registros percentuais por cidade, foram: Belém (60%) e
Rio de Janeiro, Blumenau e Brasília com 20%, concomitante-
mente; e, finalmente, para o tempo de serviço de menos de 01
(um) ano, não houve registro em nenhum dos municípios para
esta categoria.
Ao analisar os dados comparativos do tempo de serviço das
(os) trabalhadoras (res) domésticas (os) nas duas categorias –
sindicalizadas (A) e não sindicalizada (B), um primeiro dado
chama atenção: os maiores percentuais entre as domésticas
sindicalizadas ocorreram na escala de mais de 19 (dezenove)
anos de tempo de serviço, enquanto que na categoria das não
102

sindicalizadas, os maiores percentuais foram registrados na


escala de 4 (quatro) a 7 (sete) anos de tempo de serviço.
Entendo que o resultado da categoria das sindicalizadas era
previsível. A diretoria dos sindicatos das trabalhadoras domés-
tica é formada, majoritariamente, por domésticas aposentadas,
uma vez que, diferentemente das outras categorias de trabalha-
dores urbanos, a atuação sindical não está regulamentada, razão
pela qual as domésticas só atuam nos sindicatos da categoria,
caso estejam em plena atividade laboral, nos finais de semana
(no dia de folga) ou no terceiro expediente.
Certamente, que neste cenário, as atividades sindicais são
assumidas, predominantemente, por domésticas aposentadas,
portanto, com mais de 19 (dezenove) anos de tempo de serviço.

Atividade Desenvolvida Atualmente Em Relação À Atividade


Ajustada No Início Do Contrato Pelas (OS) Trabalhadoras (ES)
Domésticas (OS)

A
103

Gráfico 12A/12B - Atividades desenvolvidas de acordo com a contratação inicial


entre trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os);
e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil –
2016 (valores em percentual %)30.

Fonte 12A/12B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto às atividades desenvolvidas de acordo com a con-


tratação inicial, na categoria das trabalhadoras domésticas sin-
dicalizadas ou associadas (Gráfico 12A), observa-se que 100%
das entrevistadas do município de Salvador afirmaram que
SIM. Os entrevistados de João Pessoa, Brasília e Belém afir-
maram em 80% que SIM, enquanto que 20% afirmaram que
NÃO. Já nos municípios do Rio de Janeiro e de Blumenau,
60% responderam SIM e 40% afirmaram que NÃO. Para os

30 Nota: Exceto as entrevistadas do município de Recife (Gráfico 11A e


B), não responderam e/ou não souberam responder.
104

entrevistados do Recife, 50% confirmaram que SIM e 50%


afirmaram que NÃO.
No que diz respeito às atividades desenvolvidas de acordo
com a contratação inicial na categoria das trabalhadoras
domésticas não sindicalizadas ou não associadas (Gráfico 12B),
observa-se que os entrevistados dos municípios de Salvador,
Recife, João Pessoa e Brasília afirmaram em 100% dos casos
que SIM. Por outro lado, as entrevistadas do Rio de Janeiro
afirmaram em 60% que NÃO e 40% confirmaram que SIM,
enquanto que, em Blumenau 60% confirmaram que SIM e
40% afirmaram que NÃO. Já os resultados do município de
Belém evidenciaram em 80% com resposta SIM e 20% com
resposta NÃO.
Ao observar os resultados, nas duas categorias, a resposta
afirmativa apresenta maior percentual, na quase totalidade dos
municípios estudados, com exceção de Recife, na categoria das
sindicalizadas, e do município do Rio de Janeiro, entre as não
sindicalizadas. Portanto, na quase totalidade, a resposta é no
sentido de que as atividades desenvolvidas na atualidade cor-
respondem às atividades propostas no início do contrato.
É fácil de entender essa maioria de respostas SIM. Em
geral, a contratação é feita exigindo-se um perfil de trabalha-
dora doméstica que possa realizar todos os serviços da casa.
Essa é a regra predominante, conforme detalhamos ao ana-
lisar o Gráfico 08, relativo às atividades em exercício das (os)
trabalhadoras (os) domésticas (A) associadas/sindicalizadas; e
(B) não associadas/não sindicalizadas, nos 07 (sete) municí-
pios objeto do presente estudo, inclusive com a exemplificação
de anúncios de empresas especializadas em recrutamento de
domésticas, que deixam em evidência a exigência desse perfil
de múltiplas habilidades.
105

Participação de cursos de capacitação pelas (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os)

Gráfico 13A/13B - Participação em curso de capacitação pelas trabalhadoras (es)


domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)31.

31 Nota: Exceto as entrevistadas dos municípios de Recife e de João


Pessoa (Gráfico 12B), não responderam e/ou não souberam responder.
106

Fonte 13A/13B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto à participação em curso de capacitação pelas tra-


balhadoras domésticas sindicalizadas ou associadas (Gráfico
13A), observa-se que 100% das entrevistadas de Brasília res-
ponderam que NÃO participaram de cursos de capacitação. Já
nos municípios de Salvador, Rio de Janeiro, Blumenau e Belém,
80% afirmaram que NÃO participaram e 20% confirmaram
que participaram (SIM), concomitantemente. Para os municí-
pios de Recife e João Pessoa, os resultados foram iguais - 60%
afirmaram que NÃO participaram de capacitação, enquanto
que, 40% confirmaram que participaram (SIM).
No que se refere a participação em curso de capacitação
pelas trabalhadoras domésticas não sindicalizadas ou não asso-
ciadas (Gráfico 13B), observa-se que 100% das entrevistadas
do Rio de Janeiro, de Recife e de Belém responderam que
NÃO participaram. Para os municípios de Salvador e Brasília,
60% afirmaram que NÃO participaram e 40% confirmaram
que sim, concomitantemente. Para Blumenau, as entrevistadas
confirmaram em 60% que SIM e 40% que NÃO, enquanto
que, no município de João Pessoa 50% confirmaram que SIM
e 50% afirmaram que NÃO.
Ao se fazer a média dos percentuais obtidos nas duas ques-
tões para cada categoria e para todas as cidades pesquisadas,
observa-se que entre as trabalhadoras domésticas sindicaliza-
das, 77,1% das trabalhadoras domésticas afirmaram que não
participaram de curso de capacitação. Já entre as trabalhadoras
107

domésticas não sindicalizadas, o percentual foi de 72,9%. Os


resultados da presente pesquisa consolidam os dados apresenta-
dos na literatura especializada que expressam a baixa qualifica-
ção das trabalhadoras domésticas, sendo essa, inclusive, uma das
razões para a não inserção em outras profissões no mercado de
trabalho. Ao comparar os dados deste gráfico com os resultados
obtidos no Gráfico 10 que trata da motivação para a escolha
da profissão, há plena harmonia entre os resultados obtidos.
Conforme visto no Gráfico 10, a falta de experiência para
ingressar em outra profissão foi evidenciada como o segundo
maior percentual: 19,2% na categoria das trabalhadoras domés-
ticas sindicalizadas e 16,7% na categoria das não sindicalizadas.
Portanto, a explicação dos resultados do presente Gráfico
(11), tem nítida relação com os dados apresentados no Gráfico
10, uma vez que não tendo a oportunidade de realizar cursos
de qualificação, também lhes são tolhidas as possibilidades de
ingresso em outra profissão.

Recebimento de mais de uma remuneração pelas (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
108

Gráfico 14A/14B - Recebimento de mais de uma remuneração pelas


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %)32.

Fonte 14A/14B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto ao recebimento de mais de uma remuneração pelas


participantes sindicalizadas (Gráfico 14A), observa-se que as
entrevistadas de Recife e Brasília afirmaram em 100% dos
casos que NÃO recebiam outro salário, além do de domés-
tica, enquanto que, em Salvador, João Pessoa, Blumenau e
Belém, 80% afirmaram que NÃO recebiam e 20% que rece-
biam (SIM), respectivamente. Finalmente, no Rio de Janeiro,
as entrevistadas desta categoria confirmaram em 60% que

32 Nota: Exceto as entrevistadas do município do Recife (Gráfico 11A),


não responderam e/ou não souberam responder.
109

recebiam (SIM), enquanto que, 40% afirmaram que NÃO


recebiam outro salário.
Quanto à existência de mais de uma remuneração pelas tra-
balhadoras não sindicalizadas ou não associadas (Gráfico 14B),
observa-se que 100% das entrevistadas do Rio de Janeiro, de
Recife e de Brasília afirmaram que NÃO recebiam outro salário.
Já nos municípios de Salvador, João Pessoa, Blumenau e Belém,
80% afirmaram que NÃO recebem outro salário, enquanto que,
20% confirmaram que recebem (SIM). Conforme se observa a
maioria, nas sete cidades estudas e nas duas categorias, afirmou
que não recebia outro salário, diferente do recebido na condi-
ção de trabalhadora doméstica.
O ponto fora da curva, ou seja, o dado que foge da regra, se
refere ao Rio de Janeiro, na categoria das trabalhadoras sindi-
calizadas. A explicação se deve ao fato de que algumas entrevis-
tadas entenderam que qualquer valor agregado, fora do salário
recebido na condição de doméstica, representaria uma segunda
remuneração. No caso, algumas recebiam um dinheiro extra,
por fazerem docinhos ou picolé nos finais de semana ou por
venderem sanduiches naturais nas praias do Rio. Assim, esse
entendimento equivocado, repercutiu nos dados do gráfico, que
fogem da regra geral.
No caso, 60% afirmaram que recebiam uma segunda remu-
neração, correspondente a essas atividades eventuais de fim
de semana. Esse dinheiro agregado à renda familiar, de cará-
ter eventual, não se configura como remuneração. Assim, caso
tivessem sido esclarecidas em relação à pergunta, o resultado
teria sido, naturalmente, similar ao das outras cidades, nas duas
categorias.
110

Assim, os dados gerais evidenciam que a expressiva maio-


ria das trabalhadoras domésticas não recebe outra remunera-
ção, além da que recebe como doméstica. É fácil de entender
esse resultado. Como poderiam receber outra remuneração, na
medida em que trabalham dois expedientes, numa jornada que,
até recentemente, era abusiva?
De fato, elas podem até trabalhar no terceiro turno. No
entanto, o fazem, geralmente, para realizar as atividades de sua
própria casa, inclusive para se dedicar ao cuidado dos filhos e
demais familiares.

Existência de aposentadoria entre as (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os)

A
111

Gráfico 15A/15B - Existência de aposentadoria entre trabalhadoras (es) domésticas


(os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 15A/15B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito à existência de aposentadoria entre as


(os) participantes sindicalizadas (os) (Gráfico 15A), observa-
se que 100% dos trabalhadores do município de Salvador afir-
maram que não são aposentadas (os). Em Blumenau, Brasília
e Belém, 80% afirmaram que não são aposentadas e 20%
confirmaram que são aposentadas, respectivamente. Em João
Pessoa e no Rio de Janeiro 60% das (os) entrevistadas (os)
afirmaram que não são aposentadas e 40% confirmaram que
são aposentadas. No município do Recife, os dados foram os
mais divergentes da pesquisa nesta questão, uma vez que 80%
afirmaram que são aposentadas (os), e 20% afirmaram que não
são aposentadas.
112

Em relação à existência de aposentadoria na categoria das


empregadas domésticas não sindicalizadas (os) ou não asso-
ciadas (os) (Gráfico 15B), observa-se que 100% dos trabalha-
dores dos municípios de Recife, João Pessoa, Brasília e Belém
afirmaram que não são aposentadas; enquanto que 80% das
(os) entrevistadas (os) de Salvador, Rio de Janeiro e Blumenau
afirmaram que não são aposentadas (os) e 20% confirmaram
que são aposentadas (os). Conforme se observa, nas duas cate-
gorias estudadas, a maioria das trabalhadoras domésticas está
em plena atividade laboral, com exceção das sindicalizadas do
município de Recife, cuja maioria está aposentada (80%).
Os resultados desta questão têm relação direta com os
resultados obtidos na presente pesquisa para a questão da faixa
etária das domésticas integrantes das duas categorias (Gráfico
3A e 3B). Na questão apresentada no Gráfico 3A e 3B, os
dados obtidos confirmaram que a maioria das entrevistadas,
nas duas categorias estudadas (trabalhadoras/es sindicaliza-
das/os e não sindicalizadas/os), estava na faixa etária de mais
de 45 (quarenta e cinco) anos, com percentuais de 42,9% e
40%, respectivamente. Estes dados, conforme asseverei na dis-
cussão, estão em plena sintonia com os dados derivados dos
estudos no PNAD/IBGE 2013, divulgados no Relatório das
Desigualdades de Gênero e Raça. A correlação lógica entre as
duas questões é justificada da seguinte forma: como a maio-
ria está na faixa etária de mais de 45 (quarenta e cinco) anos
e há significativo percentual abaixo dessa faixa etária, era
esperado que as respostas quanto à questão da aposentadoria
fosse majoritariamente negativa, ou seja, como a maioria está
em plena idade ativa (produtiva), considerando a expectativa
de vida média da brasileira e o tempo de serviço necessário
para a aposentadoria, exigido das empregadas domésticas, os
113

percentuais de respostas quanto à aposentadoria estão plena-


mente coerentes.
Sobre a questão da aposentadoria na categoria das traba-
lhadoras domésticas, considero oportuno fazer algumas refle-
xões. Neste sentido, tomo como referência o importante estudo
publicado pelo Instituto de Pesquisas Econômica Aplicada
– Ipea33, no ano de 2014, que dedicou o primeiro capítulo à
Previdência Social, buscando inserir esta temática no contexto
da confluência entre política social no país e o mundo do traba-
lho, num recorte que foi do ano de 2012 até o primeiro semes-
tre de 2013.
Inicialmente, o citado estudo destaca que o quantitativo de
trabalhadoras domésticas contribuintes do Instituto Nacional
de Seguridade Social (INSS) se manteve estagnado, a partir de
2007, ressaltando que uma conclusão clara sobre este aspecto
carece de uma análise criteriosa dos dados. Neste sentido, o
questionamento sobre esta estagnação pode considerar duas
situações: a falta da ampliação de cobertura previdenciária para
as trabalhadoras domésticas ou se, alternativamente, a oferta
de trabalhadoras domésticas foi reduzida, como decorrência
do crescimento econômico e do incremento de oportunidades
para as mulheres de baixa renda, como já ressaltei em outro
momento deste trabalho. Talvez, a resposta esteja na reflexão
sobre os dados da PNAD.
Ou seja, é preciso entender por qual (ou quais) razão (ou
razões), a categoria das trabalhadoras domésticas apresentou
comportamento distinto das demais categorias e, por esta

33 IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Boletim de


Políticas Sociais: acompanhamento e análise. v.1, n.22. Cap.1, Jun.,
Brasília: IPEA, 2014, p.19-46.
114

razão, não ampliaram a cobertura previdenciária ou se essa


estagnação do número total de Contribuintes é compatível
com a expansão da cobertura previdenciária do estrato anali-
sado em decorrência da redução da oferta destes trabalhadores.
Inicialmente, o estudo destaca que três elementos podem
ter afetado o mercado de trabalho, com possíveis consequên-
cias sobre o perfil contributivo das empregadas domésticas.
Destaca o estudo:

Os dois primeiros com impacto sobre


a demanda de trabalho e o último sobre
a oferta. Primeiramente, observa-se no
Brasil ganho real do salário mínimo a
partir de 1999, seja sobre o nível geral de
preços, seja sobre o salário médio da popu-
lação. De fato, dados da Pesquisa Mensal
de Emprego (PME), do IBGE, indicam
que o salário mínimo representava menos
de um quinto do salário médio em 1999,
proporção que superou um terço em 2006
e que prossegue com tendência de alta,
ainda que com trajetória mais mode-
rada. Analisado de forma isolada, como o
salário mínimo é piso e farol salarial das
empregadas domésticas, sua elevação ten-
deria a retrair a demanda por seus serviços
ou então a gerar informalidade.
115

Ao enfatizar o segundo fato, o estudo ressalta:

[...] se refere à introdução de incentivos tri-


butários para contratação de empregadas
domésticas por meio da devolução inte-
gral da contribuição previdenciária patro-
nal nos termos da Lei nº 11.324/2006.

Há um conjunto de limitações nesta dedu-


ção tributária: somente uma empregada
doméstica por declaração, teto do salário
de contribuição igual a um salário mínimo
e necessidade de declaração de ajuste
anual no modelo completo. Esta última
restrição aponta para caráter regressivo do
incentivo tributário, dado que aqueles que
fazem declaração de imposto de renda no
modelo completo tendem a se posicionar
nos estratos mais elevados de renda. De
todo modo, ao menos do ponto de vista
conceitual, há redução do custo de contra-
tação para o empregador e, por consequ-
ência, incentivo à expansão do emprego e
da formalização no setor.

O estudo segue explicando que um último fator, de natu-


reza estrutural, relacionada à oferta de trabalho, também tem
relação com esse fato. Por uma primeira razão: o PIB per capita
mais elevado promove a redução do emprego doméstico, “cujo
mercado tende a ser maior em países de renda média e baixa
que em países ricos”.
116

Esta suposição tem direta relação com os dados admi-


nistrativos do Ministério da Previdência Social (MPS), que
demonstraram a estagnação do quantitativo das contribuintes
empregadas domésticas em meio a uma expansão generalizada
de cobertura na fase contributiva. Além disso, o crescimento
do PIB per capita na história recente do país foi acompanhado
pela redução do desemprego e pelo aumento do emprego for-
mal; além disso, favoreceu as camadas de renda mais baixas, nas
quais tendem a se inserir as trabalhadoras domésticas.
Este fenômeno indica a tendência de deslocamento das tra-
balhadoras domésticas para o setor de emprego formal. Com
isso, aumenta o poder de barganha das empregadas domésticas,
que passariam a ter mais facilidade de conseguir cobertura de
benefícios sociais, como consequência da relativa facilidade em
obter emprego formal, como consequência do aquecimento do
mercado de trabalho no período objeto do estudo. Um dado
que merece destaque, alicerçado na estatística descritiva, é a
mudança na composição do emprego doméstico entre diaristas
e trabalhadoras domésticas mensais (mensalistas) nas últimas
duas décadas.
Conforme explicitado no estudo do Ipea já citado, em
1992, 16% das empregadas domésticas brasileiras eram dia-
ristas. Esse percentual subiu para 30% em 2011. Certamente,
que essa mudança tem impacto sobre a densidade contributiva,
considerando que os autônomos (diaristas) tendem a ter menor
probabilidade de contribuir para a Previdência que emprega-
dos mensalistas.
Neste sentido, com a aprovação da Emenda Constitucional
nº 72/2013, regulamentada pela Lei Complementar nº
150/2015, é previsível que haja mudança nesse cenário – a ele-
vação dos custos de contratação das trabalhadoras mensalistas,
117

face ao conjunto dos direitos garantidos pela nova legislação


trabalhista, pode levar a que os empregadores optem pelo
serviço de diaristas, implicando no aumento da oferta desse
grupo, em detrimento da diminuição da oferta das empregadas
mensalistas.
Outro dado relevante, apresentado pelo estudo do Ipea,
demonstra que enquanto em 1992 apenas 20% dos mensalis-
tas contribuíam para o INSS, em 2011 este percentual mais
que dobrou, alcançando 41%, ainda que este percentual se situe
em um nível mais baixo, tendência semelhante se passou com
os diaristas. A participação das diaristas contribuintes para o
INSS subiu de 13% (1992) para 27% (2011), conforme apre-
sentado no estudo do Ipea.
O estudo conclui a contraposição entre a evolução da den-
sidade contributiva e os três elementos citados anteriormente
como fatos importantes do mercado de trabalho das emprega-
das domésticas, talvez coloque por terra a hipótese de contração
da demanda por empregos formais em decorrência da elevação
do salário mínimo. Ou seja, o custo de contratação da empre-
gada doméstica. Por uma razão simples: a elevação do custo de
contratação seria indutora da expansão da informalidade, fato
que não ocorreu. Aliás, este tem sido um dos principais avanços
da nova legislação laboral garantida às domésticas, a partir de
2013: o comportamento, o incremento da formalização e, con-
sequentemente, a diminuição da informalidade.
Finalmente, é importante destacar que o grande indutor do
incremento contributivo no período do estudo do Ipea, foi o
crescimento da atividade econômica no Brasil. Isso foi compa-
tível com a ideia da contração de oferta, pois uma maior geração
de emprego e renda amplia as oportunidades para migração do
trabalho doméstico para outras atividades.
118

Isso não somente favoreceu a redução da oferta como tam-


bém aumentou o poder de luta das trabalhadoras domésticas
para obtenção de empregos com cobertura previdenciária,
como decorrência da formalidade. Esse fenômeno, apesar de
ser relativamente recente no Brasil, não é nada diferente do
processo histórico verificado em outros países que passaram
por ciclos de crescimento econômico semelhante. O estudo
do Ipea, conclui que “a evidência estatística parece indicar que
houve retração de oferta que tornou compatível a elevação dos
custos salariais em conjunto com o crescimento da cobertura
previdenciária das trabalhadoras domésticas”.
Certamente,que após a aprovação da Emenda Constitucional
nº 72/2013, regulamentada pela Lei Complementar nº
150/2015, aliadas ao cenário de crise e de recessão por que
passa o Brasil, na atualidade, poderá alterar essa tendência, ape-
nas no que se refere ao aumento da contratação de diaristas em
detrimento das trabalhadoras mensalistas.
Quanto à questão da formalização dos contratos, creio que
esse aspecto seguirá com a tendência de aumento percentual,
considerando que as novas garantias trabalhistas estabelecem
pesadas multas aos empregadores que não assinarem a carteira
de trabalho dos empregados domésticos, conforme disposto na
Lei ordinária 12.964/2014, sancionada no dia 08 de abril pela
presidenta Dilma Rousseff e que entrou em vigor no dia 07 de
agosto de 2014.
119

Recebimento de salário fixo desde o ingresso na profissão entre as


(os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 16A/16B - Recebimento de salário fixo desde ingresso na profissão pelas


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %).

Fonte 16A/16B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016
120

Quanto ao recebimento de salário fixo desde ingresso na


profissão de participantes sindicalizados, observa-se no Gráfico
16A que 100% dos entrevistados dos municípios de Brasília e
Belém receberam salário desde o início de desempenho de suas
funções e os trabalhadores de Salvador e Recife afirmaram em
80% que não, enquanto que, 20% confirmaram que sim. Por
outro lado, Rio de Janeiro, João Pessoa e Blumenau confirma-
ram em 60% que sim e 40% afirmaram que não.
Em relação ao recebimento de salário fixo desde ingresso na
profissão do grupo não associado, observa-se no Gráfico 16B
que 100% dos entrevistados do município de João Pessoa rece-
beram salário desde o início de desempenho de suas funções e
os trabalhadores de Salvador, Rio de Janeiro, Recife, Blumenau
e Brasília afirmaram em 60% que não, enquanto que, 40% con-
firmaram que sim. Por outro lado, em Belém, os trabalhadores
afirmaram em 80% que sim e 20% afirmaram que não.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas sete
cidades e nas duas categorias, observa-se que entre as traba-
lhadoras domésticas sindicalizadas (A), a maioria (60%) res-
pondeu que havia recebido salário fixo desde o ingresso na
profissão, enquanto que 40% responderam de forma negativa.
Já entre as trabalhadoras domésticas não sindicalizadas (B),
apesar das diferenças percentuais, também prevaleceu à mesma
lógica: 54,3% informaram que receberam salário fixo desde o
ingresso na profissão e 45,7% responderam que não receberam
salário fixo desde o ingresso na profissão.
Há, portanto, uma discreta diferença de 8,6% em relação às
trabalhadoras sindicalizadas no que se refere ao recebimento
de salário fixo desde o ingresso na profissão, em comparação
com as trabalhadoras não associadas. Este percentual pode ser
atribuído à participação das mesmas nas mobilizações típicas
121

da entidade sindical, que lhes proporcionam uma tomada de


consciência mais efetiva em relação aos direitos trabalhistas.

Existência de carteira assinada desde o ingresso na profissão


entre as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 17A/17B - Carteira assinada no ingresso da profissão entre trabalhadoras


(es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas
(os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em
percentual %)
122

Fonte 17A/17B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito a formalização da assinatura da carteira


de trabalho ao ingressar na profissão, os dados das (os) par-
ticipantes sindicalizadas (os) (Gráfico 17A), demonstram que
o município de Recife apresenta a particularidade em relação
aos demais municípios, de apresentar um percentual de 100%
das (os) entrevistadas (os) respondendo negativamente, ou seja,
a totalidade das domésticas sindicalizadas, objeto da amostra
em Recife, não tiveram suas Carteiras de Trabalho assinadas
quando do ingresso na profissão.
Na mesma linha da particularidade, os municípios de
Belém e de Brasília também apresentam resultados que dife-
rem de todos os outros cinco municípios pesquisados nesta
categoria, pois os percentuais são majoritariamente positivos,
ou seja, 60% e 80% das (os) entrevistadas (os) de Brasília e
Belém, respectivamente, responderam que tiveram a carteira
assinada no ato do ingresso na profissão.
Na mesma categoria, nas cidades do Rio de Janeiro, de João
Pessoa e de Blumenau, 60% afirmaram negativamente e 20%
responderam afirmativamente. Em Salvador, os dados foram
inversos aos encontrados em Belém. Em Salvador, 80% das
(os) entrevistadas (os) responderam negativamente, enquanto
que 20% confirmaram que sim. Em Belém, os resultados foram
inversos – 80% (sim) e 20% (não). Quanto às (aos) entrevista-
das (dos) de Brasília, 60% confirmaram que sim e 40% afirma-
ram que não.
123

No que se refere à carteira de trabalho assinada no ingresso


da profissão, referente à categoria das (os) não associadas (as)
(Gráfico 17B), observa-se que 80% das (os) trabalhadoras (res)
domésticas (os) de Salvador, Recife, João Pessoa e Blumenau
afirmaram negativamente, enquanto que 20% responderam
positivamente. Nos municípios de Brasília e Belém, 60% res-
ponderam afirmativamente e 40% responderam negativa-
mente. No Rio de Janeiro, 60% dos declarantes da pesquisa
confirmaram que não e 40% afirmaram que sim.
Também na categoria das (os) trabalhadoras (res) não sin-
dicalizadas, se repete a mesma particularidade da categoria das
sindicalizadas, no que se refere aos municípios de Belém e de
Brasília, cujos resultados também diferem dos demais municí-
pios pesquisados nesta categoria. Nestas duas cidades, os per-
centuais também são majoritariamente positivos, com 60% das
(os) entrevistadas (os) respondendo que tiveram a carteira assi-
nada no ato do ingresso na profissão.
Ao se fazer a média entre os percentuais das sete cidades
pesquisadas, nas duas categorias, o percentual de respostas
negativas, é de 60% e 65,7% para as trabalhadoras domés-
ticas sindicalizadas e não sindicalizadas, respectivamente.
Estabelecendo a comparação entre as duas categorias, nota-se
que há um incremento no percentual de respostas negativas
(5,7%) na categoria das não sindicalizadas.
Apesar de ser um percentual pequeno, pode sugerir que o
fato de não estarem vinculadas às atividades de mobilização
típicas da atividade sindical, esta categoria não teve as mesmas
oportunidades de formação políticas que as da sindicalizadas
tiveram, razão pela qual o poder de convencimento é menor,
no momento de reivindicar ou exigir a assinatura da carteira
de trabalho.
124

Estes dados confirmam um aspecto predominante na


relação de trabalho das trabalhadoras domésticas – a infor-
malidade. Conforme reiterado em diversas oportunidades no
presente trabalho, o emprego doméstico segue sendo uma das
principais ocupações das mulheres brasileiras. Neste sentido,
destacam Costa34 et al. que:

Em 2013, cerca de 15% das mulheres


estavam empregadas como trabalhadoras
domésticas (equivalente a aproximada-
mente seis milhões de mulheres). Apenas
um pouco mais de um terço das trabalha-
doras domésticas está inserida em uma
relação de trabalho formalizada, com car-
teira de trabalho assinada.

As citadas autoras enfatizam que o percentual de trabalha-


doras domésticas mensalistas com carteira assinada, apresen-
tou um crescimento no período 2001-2013, com um aumento
significativo na formalização do emprego doméstico mensa-
lista (7 pontos percentuais) no último ano, de 2012-2013, exa-
tamente após a promulgação da EC no 72.
Ou seja, mesmo antes da regulamentação da citada
Emenda Constitucional, que somente ocorreu por meio da
Lei Complementar nº 150/2015, já se observou um primeiro
impacto positivo da nova lei trabalhista: a diminuição da
informalidade, como consequência, seguramente, das pesadas

34 COSTA, Joana Simões de Melo; BARBOSA, Ana Luiza Neves de


Holanda; HIRATA, Guilherme. Efeitos da ampliação dos direitos
Trabalhistas sobre as condições de Trabalho das empregadas domésti-
cas. Política em Foco – Mercado de Trabalho. n.60, abr., 2016, p.55-62.
125

multas aos empregadores que não assinarem a carteira de


trabalho dos empregados domésticos, estabelecidas pela Lei
ordinária 12.964/2014.

Faixa salarial das (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 18A/18B - Faixa salarial entre trabalhadoras (es) domésticas (os) (A)
associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os)
em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)
126

Fonte 18A/18B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito à faixa salarial das (os) participantes


sindicalizadas (os) (Gráfico 18A), observa-se que 100% das
(dos) trabalhadoras (res) das cidades de Salvador e João Pessoa,
recebem até 01 (um) salário mínimo, enquanto que em Recife,
para essa mesma faixa salarial, o percentual foi de 80%. Nesta
mesma cidade, 20% respondeu que recebe entre 01(um) a 02
(dois) salários mínimos. Nos municípios de Blumenau e de
Belém os resultados foram de 80% para a faixa salarial de 01
(um) a 02 (dois) salários mínimos, fato que chama atenção,
saindo do padrão majoritário do recebimento de até um salário
mínimo.
No Rio de Janeiro, os resultados foram os seguintes: se 40%
das respostas referentes à faixa de até um salário mínimo, 40%
para a faixa de 01 a 02 salários mínimos e 20% para a faixa de
03 (três) a 04 (quatro) salários mínimos. Em relação à faixa
salarial (Gráfico 18B) referente à categoria das (os) trabalha-
doras (res) não associadas (os), observa-se que 100% das (os)
entrevistadas (os) do município de Recife afirmaram que rece-
bem até 01 (um) salário mínimo.
Nos demais municípios, os resultados foram distribuídos
da seguinte forma: Salvador (40% recebem 01 (um) a 02 (um)
salários, 40% até 01 (um) salário mínimo e 20% recebem de 03
(três) a 04 (quatro) salários mínimos; Rio de Janeiro (60% rece-
bem até 01 (um) salário e 40% recebem de 01(um) a 02 (dois)
salários); João Pessoa (60% recebem de 01(um) a 02 (dois)
127

salários mínimos e 40% recebem até 1 (um) salário mínimo);


Em Blumenau (40% recebem de 03 (três) a 04 (quatro) salá-
rios, 40% recebem até 01 (um) salário e 20% recebem de 01
(um) a 02 (dois) salários); Brasília (40% recebem de 01 (um) a
02 (dois) salários, 40% recebem até 01 (um) salário e 20% rece-
bem de 03 (três) a 04 (quatro) salários mínimos); e, finalmente,
em Belém (60% recebem entre 01 (um) a 02 (dois) salários
mínimos, 20% recebem de 03 (três) a 04 (quatro) salários e
20% até 01 (um) salário mínimo).
Portanto, nas duas categorias estudadas, prevalece uma
maioria das (os) trabalhadoras (res) domésticas (os) recebendo
até um salário mínimo, apesar da particularidade dos municí-
pios de Blumenau (80%) e Belém (80%), na categoria das sin-
dicalizadas, e João Pessoa (60%) e Belém (60%), na categoria
das não sindicalizadas, que apresentam percentuais majoritá-
rios da faixa salarial de 01 (um) a 02 (dois) salários mínimos.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas duas
categorias e nas sete cidades estudadas, os resultados confir-
mam a análise anterior, posto que na categoria das sindicali-
zadas o percentual médio das domésticas que recebe até 01
(um) salário mínimo é de 57,1% e na categoria das não sindi-
calizadas, o percentual médio é de 48,6%, superior à soma das
demais faixas salariais, isoladamente. Ao refletir sobre os indi-
cadores econômicos que normalmente são associados aos ren-
dimentos de trabalho, a exemplo da produtividade e da jornada
de trabalho, se reforça a particularidade do trabalho doméstico.
Neste sentido, conforme pensamento predominante no
senso comum, considerando os citados indicadores, a tra-
balhadora doméstica é valorada de forma negativa, porque a
sua atividade laboral não gera valor e nem produz lucro. Para
reforçar a particularidade da profissão, outros fatores podem
128

ser indicados, a exemplo da dificuldade em precisar o horário


de trabalho, notadamente das trabalhadoras domésticas que
residem no local de trabalho, aliado ao fato de que parte da
remuneração é provida em forma de benefícios, a exemplo da
moradia e da alimentação e, em alguns casos inclusive, ao ves-
tuário e aos cuidados médicos.
No entanto, conforme destaca Sanches35, embora o traba-
lho doméstico não gere produtos ou serviços diretamente para
o mercado, permite a reprodução de uma força de trabalho que
será vendida no mercado. Destaca, ainda, que apesar do traba-
lho se realizar no espaço privado (interior dos lares), a atividade
desenvolvida é pública, considerando que tem relação com o
que ocorre no mercado de trabalho. Resta claro que esta defi-
nição negativa do trabalho doméstico tem servido para reforçar
a histórica invisibilidade da profissão, aliada a desvalorização
social, que têm impacto sobre a questão salarial. Neste sentido,
a citada autora destaca:

[...] em 2009, os trabalhadores domésticos


(homens e mulheres) apresentaram o mais
baixo rendimento entre os ocupados, equi-
valendo a 62,93% do rendimento dos tra-
balhadores por conta própria, o grupo com
o segundo menor rendimento médio men-
sal. As diferenças de rendimento de acordo
com o gênero são perceptíveis, estando
as mulheres em situação desfavorável em
quase todas as posições na ocupação [...].

35 SANCHES, Solange. Trabalho doméstico: desafios para o trabalho


decente. Estudos feministas, v.17, n.3, 2009, p.879-888.
129

Já a autora Álvaro36, tomando por base os resultados do


Pnad/IBGE 2009, ressalta que uma avaliação dos rendimen-
tos por faixa salarial das trabalhadoras domésticas no país,
tomando como referência três anos intercalados – 1992, 2001 e
2009 – demonstra uma melhoria nos anos situados nos extre-
mos. No entanto, entre 2001 e 2009, registrou-se a ocorrência
do aumento no percentual de trabalhadoras domésticas situ-
adas em faixas de renda mais baixas, ou seja, até um salário
mínimo.
Para a citada autora, a explicação para o baixo custo salarial
das trabalhadoras domésticas, deve tomar como referência os
aspectos estruturais das sociedades da América latina, tanto no
que se refere às estruturas de classe, raça e gênero, quanto tam-
bém na forma de desenvolvimento capitalista vigente nestas
sociedades.
Destaca, neste sentido, que entre os fatores estruturais que
tiveram reflexo no baixo preço do serviço doméstico, estaria às
poucas alternativas de trabalho assalariado para os setores mais
populares da sociedade, aliado ao significado social do serviço
doméstico predominante no modelo de desenvolvimento e de
subdesenvolvimento dos países latino-americanos que reper-
cutem na invisibilidade e na baixa valoração da categoria.
Os dados obtidos na presente pesquisa confirmam essa rea-
lidade que situa a categoria das trabalhadoras domésticas como
a que recebe os salários mais baixos, majoritariamente limitado
a 01 salário mínimo. O salário mínimo segue sendo a referên-
cia para a remuneração da categoria, com as devidas variações

36 ÁLVARO, Maria Angela Gemaque. Trabalho doméstico e desigual-


dade social. Enfoques. v.11. n.1, mar., 2012, p.109-132.
130

regionais, podendo variar conforme a tabela estadual. Para o


ano de 2016, o salário mínimo nacional passou a valer R$ 880
(oitocentos e oitenta reais). Segundo dados do último balanço
do IBGE, “o rendimento real da categoria das trabalhadoras
domésticas foi reduzido em 2,4%, no período de setembro a
novembro de 2015, comparado ao mesmo período de 2014”.
O salário médio recebido pelas trabalhadoras domésticas em
2015 foi de R$ 750 (setecentos e cinquenta reais). Ou seja, 19
(dezenove) reais a menos do que o recebido em 2014.
Outro dado que chama atenção no estudo do IBGE é o
que demonstra que a renda das trabalhadoras domésticas no
Brasil teve a maior queda registrada nos últimos quatro anos,
ou seja, desde 2012. Para os estudiosos da área, a crise econô-
mica por que passa o país é a responsável direta por esta queda,
considerando que impactou negativamente o orçamento de
grande parte das famílias, diminuindo a oferta de trabalhos
domésticos em todo o território nacional, notadamente, a par-
tir da metade de 2015, quando a crise se instalou de forma mais
crônica. Neste cenário de crise, os empregadores estão renego-
ciando a jornada de trabalho, visando reduzir o salário, durante
a recessão.
131

Renda familiar entre as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 19A/19B - Renda familiar entre trabalhadoras (es) domésticas (os) (A)
associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os)
em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 19A/19B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
132

Quanto a renda familiar das (os) participantes sindicalizadas


(os) (Gráfico 19A), observa-se que 100% dos entrevistados de
Salvador, a renda era de até 01 (um) salário mínimo. Na cidade
de Recife, a renda familiar é de 01 (um) a 02 (dois) salários
mínimos em 80% dos casos e de 01 (um) salário mínimo, num
percentual de 20%. Em João Pessoa, os resultados são inversos.
A renda familiar é de 01 (um) a 02 (dois) salários mínimos em
20% dos casos e de 01 (um) salário mínimo, num percentual de
80%. De acordo com as (os) entrevistadas (os), dos municípios
do Rio de Janeiro e de Belém apresentaram maior renda fami-
liar entre as cidades pesquisadas, nesta categoria.
No Rio de Janeiro, 40% das (os) trabalhadoras (res) afir-
maram que a renda familiar é de mais de 04 salários míni-
mos; 40% responderam que a renda familiar é de 01 (um) a 02
(dois) salários mínimos; enquanto que para uma renda de até
um salário mínimo, o percentual foi de 20%. Em Belém, 40%
apresentam uma renda familiar de até 04 (quatro) salários; 40%
responderam que a renda familiar é de 03 (três) a 04 (quatro)
salários e 20% que a renda familiar é de 01 (um) até 02 (dois)
salários mínimos.
Quanto à renda familiar da categoria das trabalhadoras (res)
domésticas (os) não associadas (os) (Gráfico 19B), observa-se
que 100% dos entrevistados do Rio de Janeiro recebem entre
01 (um) a 02 (dois) salários mínimos como renda familiar e em
Recife, 100% recebiam até 01 (um) salário mínimo, respectiva-
mente. Para as (os) entrevistadas (os) de Salvador e de Belém,
40% recebem renda familiar de 03 (três) a 04 (quatro) salários
e 60% recebem uma renda familiar entre 01 (um) a 02 (dois)
salários mínimos, respectivamente.
Em João Pessoa o resultado foi de 60% para os que pos-
suem renda familiar entre 01 (um) a 02 (dois) salários mínimos
133

e 40% para os que possuem esta renda de até 01(um) salário


mínimo. Em Brasília, os resultados foram de: 60% para as (os)
que possuem renda familiar entre 03 (três) a 04 (quatro) salá-
rios mínimos e 40% possuem renda familiar de 01 (um) a 02
(dois) salários mínimos. Finalmente, em Blumenau, 40% dos
entrevistados recebem até 01 (um) salário mínimo de renda
familiar, 20% recebem renda familiar de 01 (um) a 02 (dois)
salários, 20% recebem de 03 (três) a 04 (quatro) salários míni-
mos de renda familiar e 20% recebem mais de 04 (quatro) salá-
rios mínimos de renda familiar.
Ao se fazer a média entre os percentuais de cada faixa de
renda familiar nas sete cidades estudadas e não duas catego-
rias observa-se que na categoria das trabalhadoras domésticas
sindicalizadas, predominou a renda familiar de até um salá-
rio mínimo, com um percentual de 40%, seguido da faixa de
01 (um) a 02 (dois) salários mínimos de renda familiar, com
31,5%.
Em relação às trabalhadoras domésticas não sindicalizadas,
a média entre os percentuais de cada faixa de renda familiar
nas sete cidades estudadas, indicou a predominância da faixa de
renda familiar de 01 (dois) a 02 (dois) salários mínimos, com
um percentual de 45,7%, seguido da faixa de renda familiar de
até salário mínimo, com 25,7%.
Estes resultados apresentam coerência com os dados obti-
dos na presente pesquisa, referentes ao estado civil das traba-
lhadoras domésticas (Gráfico 4A e 4B). Senão, vejamos:

• Na categoria das trabalhadoras domésticas sindicalizadas,


no que se refere ao estado civil (Gráfico 4A), predomi-
naram as solteiras, com 51,4%, seguidas das divorciadas,
com 14,3% e das viúvas, com 11,4%. Com base nestes
134

dados, se explica a predominância da renda familiar de


até um salário mínimo, o que sugere que a citada renda
corresponde, apenas, ao salário recebido pela própria tra-
balhadora doméstica;
• Na categoria das trabalhadoras domésticas não sindica-
lizadas, diferentemente, no que se refere ao estado civil
(Gráfico 4B), predominaram as casadas, com 31,4%,
seguidas das companheiras, com 22,9%. Neste sentido, se
justifica a existência de uma renda familiar superior a 01
(um) salário mínimo, como se observa nos dados da pre-
sente pesquisa, ou seja, um percentual de 45,7% na faixa
de renda familiar de 01 (um) a 02 (dois) salários mínimos.
Estes dados sugerem, portanto, que à renda individual da
trabalhadora doméstica, deve ter sido agregada alguma
renda individual do esposo ou companheiro, compondo
uma renda familiar superior àquela auferida na categoria
das sindicalizadas.

Conforme destacam Pinheiro37 et al., apesar da baixa remu-


neração que recebem, a renda das trabalhadoras domésticas é
de suma importância para a composição da renda total de suas
famílias. Neste sentido, informam que em 2009, a renda das
trabalhadoras domésticas representava 39,8% da renda fami-
liar. Destacam, ainda, que esta participação é maior entre as

37 PINHEIRO, Luana; FONTOURA, Natália; PEDROSA, Cláudia.


Situação das trabalhadoras domésticas no país. In: CASTRO, Jorge
Abrahão de; ARAÚJO, Herton Ellery (org.). Situação Social
Brasileira: monitoramento das condições de vida 2. Brasília: Ipea,
2012, Cap.6, p.93-123.
135

trabalhadoras domésticas com carteira assinada (47,5%). As


citadas autoras ressaltam, ainda que:

Esta importância é ainda maior ao se per-


ceber que a renda do trabalho das ocu-
padas em geral (exclusive as domésticas)
[sic] respondia por 35,3% de suas rendas
familiares, o que demonstra que, apesar de
receberem renda bastante inferior às das
ocupadas, o salário destas trabalhadoras é
ainda mais decisivo para a manutenção de
suas famílias.

As autoras também fazem uma reflexão muito importante


sobre as condições de vida das trabalhadoras domésticas, enfa-
tizando que as baixas rendas ficam ainda mais visíveis quando
se observa que, em 2009, 37,6% dos domicílios que tinham
como chefes de família as (os) trabalhadoras (res) domésticas,
se encontravam abaixo da linha de pobreza, sendo que deste
total, 25,6% destes domicílios eram pobres, ou seja, que apre-
sentavam renda per capita de até meio salário mínimo, e 12,0%,
extremamente pobres, ou seja, cuja renda per capita não che-
gava a um quarto do salário mínimo.
É importante ressaltar, como dito pelas autoras, que em uma
década houve uma considerável diminuição nesse cenário. Ou
seja, enquanto que em 2009, 37,6% dos domicílios que tinham
como chefes de família as (os) trabalhadoras (res) domésticas,
se encontravam abaixo da linha de pobreza, em 1999, o percen-
tual era de 55,6%, sendo esta diminuição atribuída a um con-
junto de fatores, a exemplo do aumento da renda do trabalho
no período, pela valorização do salário mínimo, com impacto
136

na renda das trabalhadoras domésticas e, também, às políticas


de combate à pobreza por meio da transferência de renda, leva-
das a cabo pelo Governo Federal. Ao analisar essa realidade
até o ano de 2013, em interessante artigo, Mattei38, faz refe-
rência ao estudo “Prosperidade Compartilhada e Erradicação
da Pobreza na América Latina e Caribe”, realizado pelo Banco
Mundial.
O citado estudo informou que o percentual da população
vivendo em condições de extrema pobreza havia caído de 10%
para 4%, no período de 2002 a 2011, o que implica dizer que
no que se refere à população brasileira, aproximadamente 60%
da população passou a ter uma renda melhor, o que corres-
ponde, em números absolutos, a 25 (vinte e cinco) milhões de
brasileiros que deixaram a condição de extrema pobreza ou de
miséria absoluta.
Destaca o autor que “desde o início do novo milênio o país
vem reduzindo tanto a desigualdade de renda como os índices
de pobreza”, ressaltando, ainda, que:

Segundo o IPEA (2008), no período entre


2002-2007 a renda familiar per capita
no Brasil cresceu a uma taxa de 5,4% ao
ano, sendo que a renda das famílias mais
pobres cresceu mais comparativamente ao
crescimento da renda das famílias mais
ricas: 9% e 4%, respectivamente. Com isso,
assistiu- se uma expansão de acesso a uma

38 MATTEI, Lauro. Políticas sociais de combate à pobreza no Brasil.


Disponível em: <http://www.brasa.org/wordpress/wp-content/uplo-
ads/2015/07/Lauro-Mattei.pdf> Acesso em: 12 ago. 2016.
137

variedade de bens e serviços por parte das


camadas da população que historicamente
eram excluídas, fato que revela que tam-
bém a desigualdade em diversos tipos de
oportunidades vem se reduzindo. Esses
resultados produziram um efeito posi-
tivo sobre o Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH). Segundo o PNUD
(ONU) 3, o IDH do Brasil apresentou
um crescimento acumulado, entre 1980 e
2013, da ordem de 36,4%, representando
um aumento médio de 0,95%. Para esta
organização, esse foi o melhor desempe-
nho dentre todos os países da América
Latina e Caribe.

Certamente que esse cenário de ascensão social das camadas


menos privilegiadas da sociedade brasileira, notadamente na
última década, se aplica à categoria das trabalhadoras domésti-
cas, considerando que, como visto anteriormente, elas ocupam
exatamente estas posições na sociedade – mulheres pobres e de
baixa renda. Os dados da presente pesquisa, portanto, aportam
mais elementos à reflexão sobre as condições de vida das traba-
lhadoras domésticas.
139

FAMÍLIA VERSUS EMPREGO DOMÉSTICO

Interferência negativa do exercício profissional no


cuidado com a família entre as (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os)

A
140

Gráfico 20A/20B - Interferência na família da atuação profissional das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %)39.

Fonte 20A/20B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito à interferência do cuidado com a famí-


lia em relação à atuação profissional das participantes sindi-
calizadas (dos) (Gráfico 20A), observa-se que 100% das (dos)
entrevistadas (dos) dos municípios de Salvador, de Recife e do
Rio de Janeiro, responderam que não há interferência.
De outro modo, nos municípios de João Pessoa e de Belém,
60% das (dos) entrevistadas (dos) responderam negativamente,
enquanto que 40% confirmaram que sim. Por fim, as (os)
entrevistadas (os) dos municípios de Brasília e de Blumenau

39 Nota: Exceto as entrevistadas dos municípios de Salvador e de Recife


(Gráfico 19B), não responderam e/ou não souberam responder.
141

afirmaram, em 80% que o cuidado com a família não preju-


dicou as suas atividades, enquanto que 20% confirmaram que
sim, porém essas entrevistadas ressaltaram que qualquer ativi-
dade que os fizessem sair de casa, prejudicaria as atividades de
cuidado com a família.
Para a categoria das (dos) trabalhadoras (res) não associadas
(os) (Gráfico 20B), observa-se que 100% das (dos) entrevistadas
(dos) dos municípios de Salvador, Rio de Janeiro, Recife, Brasília
e Belém responderam negativamente, ou seja, não há nenhum
impacto das atividades do cuidado com a família em relação às
atividades levadas a cabo como trabalhadoras domésticas.
No município de João Pessoa, 80% afirmaram que não e
20% que sim, enquanto que em Blumenau, as (os) entrevistadas
(dos) afirmaram em 60% que não e 40% confirmaram que sim.
Ao se fazer a média entre as sete cidades pesquisadas e nas duas
categorias, sobre a interferência na atuação na família (cuidado
com os filhos e com a casa), nas atividades como trabalhado-
ras domésticas, os percentuais nas duas categorias foram muito
altos, com respeito às respostas negativas, ou seja, no sentido
de asseverar que não há interferência das atividades de casa e
da família no trabalho como doméstica. Na categoria das (dos)
sindicalizadas, o percentual de respostas negativas foi de 82,9%
e na categoria das (dos) não sindicalizadas, o percentual de res-
postas negativas foi de 91,5%.
Esse dado chama especial atenção, considerando, inclusive,
que as trabalhadoras domésticas geralmente se dedicam às suas
famílias e às suas casas no terceiro turno, caracterizando um
tempo de muitas horas diárias dedicadas aos serviços domés-
ticos, na própria casa ou na casa do seu empregador. Ou seja, a
sobrecarga de tempo deriva da necessidade de conciliar o tra-
balho com a vida familiar.
142

Cuidados dos filhos nas ausências motivadas pelo


emprego entre as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 21A/21B - Cuidado dos filhos na ausência das (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/
não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual
% correspondentes aos valores reais, conforme a constituição familiar das
entrevistadas – número de domésticas com filhos)
143

Fonte 21A/21B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Em relação ao Gráfico 21A e 21B, os percentuais apresenta-


dos correspondem aos valores reais decorrentes da composição
familiar das entrevistadas, ou seja, do número de trabalhadoras
domésticas que informaram ter filhos (as). Assim, com base
nesta explicação, os resultados são os seguintes:
No que se refere à categoria das trabalhadoras domésticas
sindicalizadas, conforme disposto no Gráfico 21A, na cidade de
Salvador, 60% informaram que deixam o(s) filho(s) sob os cui-
dados da avó e 40% que deixam com o(a) filho(a) mais velho(a).
No Rio de Janeiro, do total das entrevistadas, 50% afirmaram
que deixam o(s) filhos (as) com a sogra e 50% que deixam com
a avó. Em Recife, 67% informaram que deixam os filhos com a
avó e 33% que deixam com o marido ou companheiro.
Ainda na categoria A, na cidade de João Pessoa, do total
das entrevistadas que têm filhos (as), 20% informou que o(s)
deixa(m) com uma irmã dela; 20% que deixa com a sogra, 20%
deixam com a avó do (a) filho (a), 20% deixam com o marido
e 20% com um filho mais velho. Observa-se no que 100% das
entrevistadas que têm filhos no município de Blumenau rece-
beram apoio da avó das crianças, nos cuidados, motivados por
suas ausências.
Na cidade de Brasília, 50% das entrevistadas afirmaram
que deixam com uma irmã, 25% com a avó e 25% com outros
familiares (por exemplo, uma prima), enquanto que, na cidade
de Belém, as entrevistadas afirmaram em 50% dos casos que
144

deixam o(s) filho(s) com a avó e 50% informaram que deixam


com outros familiares.
Na categoria das participantes não sindicalizadas, conforme
disposto no Gráfico 21B, 100% das entrevistadas de Salvador
que têm filhos/dependentes afirmaram que os deixam com o
marido ou o companheiro. Nas demais cidades, os dados foram
os seguintes: no Rio de Janeiro, 67% das entrevistadas respon-
deram que deixam o(s) filho(s) com o marido ou companheiro e
33% informaram que o(s) deixa(m) com a avó; em Recife, 60%
das entrevistadas responderam que deixa(m) o(s) filho(s) com
a avó, 20% deixa(m) com uma irmã e 20% com uma vizinha.
Em João Pessoa, metade (50%) deixam os filhos com a sogra
e a outra metade (50%), deixa com a avó; em Blumenau 40%
das entrevistadas deixam o(s) filho(s) com a avó, 20% com a
irmã, 20% com o marido ou companheiro e 20% com um filho
mais velho; Na cidade de Brasília, 50% das entrevistadas res-
ponderam que deixam o(s) filho(s) com a irmã dela e 50% que
deixam com a avó; e, finalmente, no município de Belém 50%
deixam o(s) filho(s) com a avó, 25% com uma vizinha e 25%
com sua irmã.
Ao comparar os dados das duas categorias de entrevistadas
(sindicalizadas e não sindicalizadas), observa-se que o cuidado
com o(s) filho(s) na ausência das trabalhadoras domésticas,
motivada pelo exercício da profissão é, predominantemente,
assumido pelas avós, materna ou paterna. Estes dados também
guardam correlação com os dados da presente pesquisa, relati-
vos à existência de dependentes e ao estado civil das entrevis-
tadas, notadamente em relação à categoria das trabalhadoras
sindicalizadas. Senão, vejamos:
Quanto à existência de dependentes (Gráfico 6A), observou-
se que, 100% das entrevistadas sindicalizadas dos municípios
145

de Salvador e de João Pessoa possuem dependentes. Ao cruzar


esta variável com os do estado civil, verifica-se que na cidade
de João Pessoa, 40% das entrevistadas se declararam como sol-
teiras. Consequentemente, este resultado sugere que a presença
de dependentes nessa categoria pode estar relacionada com a
condição de “mãe solteira” ou de outros dependentes que não
sejam necessariamente filhos biológicos.
Essa hipótese se confirma em relação ao município de
Salvador, considerando que na presente questão, sobre a pessoa
com a qual a trabalhadora doméstica deixa o(s) filho(s) na sua
ausência, não se elenca o marido ou companheiro, o que sugere,
portanto, a condição de “mãe solteira”, pelo menos no que se
refere ao percentual de 40% das entrevistadas que possuem
dependentes e se declararam como solteiras.
Sobre a realidade das trabalhadoras domésticas, no que se
refere ao cuidado com os filhos, considero oportuno fazer algu-
mas reflexões sobre os contextos que, historicamente, demarca-
ram o cotidiano da categoria, que deixam em evidência, ainda
mais, as condições de precariedade a que foram submetidas
essas trabalhadoras no curso de tantos anos no país.
Diferentemente das mães das classes abastadas da socie-
dade brasileira, que contratam as trabalhadoras domésticas para
cuidarem dos seus filhos, essa mesma realidade não se aplica às
próprias domésticas que dependem de outros familiares, dos
filhos mais velhos, das avós dos seus filhos, da sogra ou até de
vizinhas, para cuidarem dos seus filhos, nas suas ausências.
Por outro lado, as trabalhadoras domésticas brasileiras
também não contam com o Estado nesse sentido, conside-
rando a precariedade na oferta das vagas da Educação Infantil
(Creche e Pré-Escola) nos sistemas públicos de Ensino. Assim
como em todas as classes sociais, o cuidado com os filhos é de
146

responsabilidade, predominantemente, das mulheres. Assim,


por exemplo, as empregadoras (patroas) que trabalham fora
de casa ou têm intensas atividades sociais, terminam por for-
çar a trabalhadora que cuida dos filhos (babá) a longas jorna-
das de trabalho, que podem alcançar até 50 (cinquenta) horas
semanais, numa afronta aos próprios limites definidos pela lei.
Acrescente a este fato, a circunstância especial das trabalhado-
ras domésticas/babás que dormem no próprio emprego.
Certamente que a ineficiência do Estado em ofertar as
vagas da Educação Infantil na devida proporção às demandas,
notadamente em relação às crianças filhas de trabalhadores de
baixa renda, a exemplo das empregadas domésticas, se confi-
gura como um fator que expõe, por um lado, a precariedade das
condições de vida das integrantes dessa categoria e, por outro,
as limitações que essas trabalhadoras têm no que se refere a
uma maior segurança em relação ao cuidado com os filhos em
suas ausências.
Destaco, por oportuno, que os cuidados com a primeira
infância, notadamente daquelas mais vulneráveis e em maior
desvantagem social, além de requerer uma visão integral da
criança, exige do Poder Público, a formulação de políticas de
equidade que possam contribuir para a superação das desigual-
dades, nesta fase delicada da infância.
O Relatório Educação para Todos do Brasil (Versão
Preliminar)40, correspondente ao período de 2000-2015, divul-
gado pelo Ministério da Educação em 2014 e que foi submetido
à apreciação popular com vistas ao acolhimento de contribui-
ções ao texto final, faz um balanço dos avanços obtidos nos

40 BRASIL, Ministério da Educação. Relatório Educação para Todos


no Brasil (Versão Preliminar). Brasília, 2014, 126p.
147

últimos quinze anos em relação às metas da Educação para


Todos, mas, também, deixa à mostra o tamanho do desafio a ser
enfrentado pelos entes públicos, pela sociedade e pela família,
no sentido de se garantir a educação pública, democrática e de
qualidade social a todos os brasileiros e brasileiras, conforme
preconiza a Constituição Federal de 1988. Explica o citado
relatório que de acordo com a Lei nº 9394/1996, que estabe-
lece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o Sistema
Educacional Brasileiro é estruturado em dois níveis: Educação
Básica e Educação Superior. A Educação Básica compreende
três etapas: a Educação Infantil, dividida em Creche (0-3 anos)
e Pré-Escola (4-5 anos), Ensino Fundamental (6-14 anos) e
Ensino Médio (15-17 anos).
Em 2009, por meio da Emenda Constitucional nº 59/2009, o
Brasil assumiu um desafio sem precedentes, que foi a ampliação
da faixa etária obrigatória, que passou de 6 (seis) a 14 (quatorze)
anos, para 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos, ficando estabele-
cido, ainda, que até 2016 seria obrigatória a matrícula de todas
as crianças de 4 (quatro) e 5 (cinco) anos na Pré-Escola. Este
desafio, por certo, implicará no aumento da Taxa de Frequência
à escola e a expansão das matrículas das crianças de 0 (zero) a
5 (cinco) anos (Educação Infantil), tornando ainda mais com-
plexa a realidade das Creches (0-3 anos), considerando que a
oferta de vagas para essa faixa etária é inferior a 25% no país.
Considerando as reflexões propostas neste estudo, o olhar
será focado à Educação Infantil, considerando que é nesta
etapa da Educação Básica que a criança requer maiores cui-
dados e, portanto, face à inexistência de oferta plena de vagas,
notadamente nas Creches, a situação das mães que integram as
camadas mais vulneráveis da sociedade, a exemplo das traba-
lhadoras domésticas, expõe a face mais precária.
148

De acordo com os dados do IBGE/Pnad, no período de


2000 a 2010, considerando a população de 0 (zero) a 5 (cinco)
anos, o atendimento escolar cresceu de 27,1% para 43,5% em
uma década, o que representa um avanço, decorrente das polí-
ticas públicas levadas a cabo pelos entes federados. No entanto,
enquanto que na faixa etária de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos (Pré-
Escola), a cobertura de vagas alcançou 78,2%, na faixa etária de
0 (zero) a 3 (três) anos (Creche), apesar dos esforços empreen-
didos pela política educacional, este percentual alcançou ape-
nas 21,2%. Certamente que o elevado percentual (78,8%) de
crianças de 0 (zero) a 3 (três) anos, desassistidas pelas creches,
não impacta, negativamente, o cuidado e a assistência pedagó-
gica dos filhos das mães integrantes das classes média e alta.
Para estas, existem vagas de sobra nos espaços educacionais
privados, cujas mensalidades são absolutamente inacessíveis às
trabalhadoras das camadas populares. As grandes prejudicadas,
portanto, são as crianças, filhas de mães de classes mais vulne-
ráveis socialmente. Estas crianças são as verdadeiras excluídas
dos necessários cuidados na primeira infância.
Assim, para as trabalhadoras domésticas, sujeitos da pre-
sente pesquisa, somente restam duas alternativas: ou brigar por
uma das poucas vagas disponíveis nas creches mantidas pelo
poder público municipal ou deixar o cuidado dos filhos sob a
responsabilidade de pessoas da família ou até de fora da paren-
tela, a exemplo de sogra ou vizinha. Estas condições adversas
para as mulheres das classes sociais mais vulneráveis, como a
falta de políticas públicas educacionais destinadas aos filhos
da mulher trabalhadora, aliadas à sobrecarga no cuidado com
os filhos dentro das famílias nas quais prestam seus serviços,
geram uma consequência que oprime de maneira particular-
mente cruel as mulheres trabalhadoras domésticas.
149

Com a aprovação da EC nº 72/3013, regulamentada pela


Lei Complementar nº 150/2015, espera-se que este cenário de
dificuldades seja gradativamente superado. Na verdade, algu-
mas garantias, decorrentes dos recentes avanços da legislação
trabalhista das trabalhadoras domésticas, desde a promulgação
da CF/1988, vêm ao encontro da condição de trabalhadora e
de mãe das integrantes dessa categoria, a exemplo do Salário-
família (por filho de até 14 (quatorze) anos incompletos ou
inválido de qualquer idade); da estabilidade no emprego desde
a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto;
da Licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário,
com duração de 120 dias (art. 7º, parágrafo único, Constituição
Federal); e, finalmente, do Auxílio-creche (assistência gratuita
aos filhos e dependentes desde o nascimento até 05 (cinco)
anos de idade em creches e pré-escolas).

Incidência de falta ao trabalho para cuidar da família


(filhos) pelas (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
150

Gráfico 22A/22B - Falta ao trabalho pela assistência à família pelas trabalhadoras


(es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas
(os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em
percentual % correspondentes aos valores reais, conforme a constituição familiar
das entrevistadas – número de domésticas com filhos.

Fonte 22A/22B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quando questionadas se nos últimos dois anos, precisa-


ram faltar ao trabalho para prestar assistência à família (filhos),
as participantes sindicalizadas (Gráfico 22A), responderam
da seguinte forma: 100% das entrevistadas de Recife e de
Blumenau confirmaram que sim e 100% dos trabalhadores do
Rio de Janeiro afirmaram que não. Por outro lado, 60% das
entrevistadas dos municípios de Brasília e de Belém afirmaram
que não, enquanto que, 40% confirmaram que sim. No muni-
cípio de Salvador, 60% confirmaram que sim e 40% afirmaram
que não e em João Pessoa, os entrevistados confirmaram em
80% que sim e 20% afirmaram que não.
151

Em relação à categoria das trabalhadoras domésticas não


sindicalizadas ou não associadas (Gráfico 22B), observa-se
que 100% das entrevistadas do Rio de Janeiro afirmaram que
não, enquanto que, em Salvador 50% afirmaram que não e
50% confirmaram que sim. Em Recife, as entrevistadas res-
ponderam em 80% que não e 20% que sim. Em João Pessoa,
80% confirmaram que sim, enquanto que, 20% afirmaram que
não. Finalmente, em Blumenau (60%), Brasília (33%) e Belém
(40%) confirmaram que sim e 40%, 67% e 60% das entrevista-
das não sindicalizadas responderam que não, respectivamente.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas sete
cidades pesquisadas e nas duas categorias estudadas – trabalha-
doras domésticas sindicalizadas (A) e não sindicalizadas (B), os
resultados foram:

• 60% das trabalhadoras domésticas sindicalizadas respon-


deram de forma afirmativa, ou seja, faltaram ao emprego
nos últimos dois anos para prestar assistência à família
(filhos);
• 59,8% das trabalhadoras domésticas não sindicalizadas
responderam de forma negativa, ou seja, não faltaram ao
emprego nos últimos dois anos para prestar assistência à
família (filhos).

Ao se estabelecer uma relação comparativa entre esta per-


gunta e a anterior, que questionou as entrevistadas sobre com
quem elas deixavam os filhos quando das suas ausências moti-
vadas pelo trabalho, os dados permitem a seguinte análise:
Se nas duas categorias de entrevistadas (sindicalizadas
e não sindicalizadas), observou-se que o cuidado com o(s)
filho(s) na ausência das trabalhadoras domésticas, motivada
152

pelo exercício da profissão era, majoritariamente, assumido


pelas avós, materna ou paterna, e que esse resultado evidencia
que as trabalhadoras domésticas contam com apoio cotidiano
para o cuidado com os filhos, por que as respostas na presente
pergunta foram diametralmente opostas?
Opino que o resultado sugere que as trabalhadoras domés-
ticas não sindicalizadas, mesmo em face da necessidade de fal-
tar ao trabalho para cuidar de familiar (filho) em situações de
enfermidade, por exemplo, optam por não faltar ao trabalho,
e isso se dá pela falta de consciência e de capacidade de luta.
Assim, se submetem ao fato de irem trabalhar, mesmo com
algum familiar (filho) carecendo de maior atenção e cuidado.
Ou seja, as trabalhadoras domésticas não sindicalizadas temem
perder os seus empregos, como decorrência das faltas.
Diferentemente, as trabalhadoras domésticas sindicaliza-
das, mesmo tendo o suporte de familiares e de pessoas de fora
da parentela para cuidar dos filhos em suas ausências, o que em
tese também poderia ocorrer em caso de enfermidade, optam
por faltar ao trabalho quando surge a necessidade de cuidados
especiais. Essa decisão, certamente, sugere que duas explicações
possíveis: o empoderamento político que as fazem mais deter-
minadas quando do confronto com as empregadoras (patroas)
e a capacidade de luta, decorrente da mobilização sindical.
A legislação brasileira, não estabelece nenhum tipo de
abono de faltas na situação do empregado doméstico faltar ao
trabalho para prestar assistência a familiar (filho) em situação
de enfermidade. Neste sentido, as ausências consideradas jus-
tificadas pela CLT estão dispostas no Art. 473 e não incluem
a ausência para acompanhamento de filho enfermo, inclusive
para levá-lo ao médico.
153

No máximo, a legislação acolhe a possibilidade de falta jus-


tificada da própria trabalhadora doméstica, em face de enfer-
midade. No entanto, o Estatuto da Criança e Adolescente
estabelece como dever do tutor, do pai, da mãe ou do respon-
sável a assistência aos filhos, cabendo aos estabelecimentos de
atendimento à saúde proporcionar as condições para a perma-
nência em tempo integral de um dos pais ou do responsável,
quando da internação de criança.
Portanto, não existindo uma previsão legal específica para
servir de base na argumentação da trabalhadora doméstica
junto à empregadora (patroa), o Estatuto da Criança pode se
prestar a esta função, sendo usado como amparo legal à situa-
ção, em sentido genérico.
Em muitas categorias, a convenção coletiva de trabalho dis-
ciplina essa situação, permitindo a licença do empregado remu-
nerada ou não, impondo limites às faltas. O Tribunal Superior
do Trabalho, por meio do Precedente Normativo nº 95, apli-
cou aos dissídios coletivos a seguinte cláusula: “Assegura-se o
direito à ausência remunerada de 01 (um) dia por semestre ao
empregado, para levar ao médico filho menor ou dependente
previdenciário de até 06 (seis) anos de idade, mediante com-
provação no prazo de 48 (quarenta e oito) horas”. Entretanto,
não havendo convenção coletiva que disponha sobre a situação
em apreço, não existe nenhuma lei que obrigue o empregador
(patroa) a conceder licença ou remunerar a ausência do empre-
gado que acompanha filho menor doente, inclusive para levá-lo
ao médico ou prestar cuidado em caso de internação hospitalar.
Não existindo nenhuma previsão legal, disposta em con-
venção coletiva de trabalho, a forma de fazer o enfrentamento
da situação é buscar a negociação direta com a empregadora
(patroa), o que implica na necessidade de boa capacidade
154

argumentativa por parte da empregada doméstica. Em geral, o


que ocorre nestes casos é a compensação das horas de ausências
ao trabalho em outro dia, a fim de que não ocorram prejuízos
no salário da trabalhadora doméstica. O empregador (patroa)
também pode adotar uma política de abono de faltas, respei-
tando um limite mensal ou semestral, como forma de discipli-
nar essa relação na ausência da legislação.
De qualquer forma, o que se admite como regra de bom
senso, é que não se deve considerar a ausência para o cuidado
do filho doente como falta funcional para efeito de aplicação
de punição. Assim, ante a inexistência de requisito legal que
regulamente o assunto, a capacidade de negociação da traba-
lhadora doméstica assume uma posição de relevância. E, certa-
mente, as trabalhadoras domésticas sindicalizadas, em face do
natural processo de politização a que são sujeitas, estão mais
instruídas para o enfrentamento da situação.
Os dados da presente pesquisa sugerem exatamente isso: de
um lado, que a maioria das trabalhadoras domésticas não sindi-
calizadas (59,8%) não falta ao trabalho, mesmo ante a situação
de enfermidade de familiar (filho), fato que talvez se explique
pelo temor de perder o emprego ou pela falta de empodera-
mento político.
Por outro, que a maioria das trabalhadoras domésticas sin-
dicalizadas (60%), falta ao trabalho quando em situações que
exigem maiores cuidados de familiares em situações temporá-
rias de enfermidade, exatamente pela explicação oposta: não
temem perder o emprego e possuem maior capacidade de luta,
como consequência do maior empoderamento político, decor-
rente da atividade sindical.
155

Desconto no salário pelos patrões em face de faltas


justificadas pelo cuidado com os filhos pelas (os)
trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 23A/23B - Desconto de faltas no salário pelos patrões das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e
(B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil –
2016 (valores em percentual % correspondentes aos valores reais, conforme a
constituição familiar das entrevistadas – número de domésticas com filhos).
156

Fonte 23A/23B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quando se perguntou às trabalhadoras domésticas sindica-


lizadas, se os patrões descontaram a falta motivada pela ausên-
cia ao trabalho para cuidar de familiar (filho) enfermo (Gráfico
23A), observa-se que 100% das entrevistadas de Salvador e
Recife afirmaram que sim, enquanto que, no Rio de Janeiro
100% afirmaram que não. Em Brasília e Belém, 75% afirma-
ram que não e 25% confirmaram que sim, enquanto que, para
Blumenau, 60% confirmaram que sim e 40% afirmaram que
não. Finalmente, as entrevistadas de João Pessoa afirmaram em
80% que não, enquanto que, 20% confirmaram que sim.
No Gráfico 23B, observa-se que 100% das entrevistadas não
associadas de todos os municípios afirmaram que os patrões
não descontaram a falta no salário, exceto para os entrevistados
de Blumenau, em que, 75% confirmaram que sim e 25% afir-
maram que não.
Os dados estão em sintonia com os apresentados na per-
gunta anterior (23A e 23B). Ou seja, na categoria das sindicali-
zadas, ao se fazer a média entre os percentuais das sete cidades,
observa-se que a maioria (53%) respondeu negativamente. No
entanto, não foi um percentual muito expressivo, em se com-
parando com a média entre as sete cidades de respostas afir-
mativas (47%). Esse resultado confirma a explicação sugerida
na questão anterior, ou seja, mesmo sabendo das consequências
das faltas, as sindicalizadas preferem assumir o risco e falta ao
trabalho para prestar assistência à familiar enfermo (filho).
157

A diferença pouco significativa entre respostas afirmativas


e negativas na categoria das trabalhadoras domésticas sindi-
calizadas reforça a explicação sugerida na situação da questão
anterior: as sindicalizadas têm maior capacidade de argumen-
tação ou de empoderamento político para enfrentar a situação.
Diferentemente, na categoria das trabalhadoras domésticas
não sindicalizadas o resultado obtido na presente questão era o
previsível, quando comparado ao constatado na questão ante-
rior. Ou seja, se a maioria das trabalhadoras não sindicalizadas
não falta ao trabalho para prestar assistência ao familiar (filho)
enfermo, conforme constatado na questão anterior (59,8%) não
era de se esperar que houvesse predominância de descontos de
faltas, na presente questão.

Compensação das faltas ao trabalho pelas (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
158

Gráfico 24A/24B - Compensação das faltas pelas trabalhadoras (es) domésticas


(os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual
% correspondentes aos valores reais, conforme a constituição familiar das
entrevistadas – número de domésticas com filhos).

Fonte 24A/24B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto às faltas no trabalho das participantes sindicaliza-


das, o Gráfico 24A, apresenta os resultados da pesquisa quanto
à compensação das faltas com horas compensadas nos outros
dias. Observa-se que 100% das trabalhadoras domésticas do
Rio de Janeiro responderam que não. Por outro lado, Salvador,
Blumenau, Brasília e Belém afirmaram em 60% que não e 40%
que sim, respectivamente. No município de João Pessoa, 25%
confirmaram que sim e 75% que não, enquanto que, em Recife
50% afirmaram que não e 50% confirmaram que sim.
159

O Gráfico 24B apresenta os resultados da pesquisa quanto


à compensação das faltas em nos outros dias trabalhados, 100%
das trabalhadoras domésticas da categoria das não associadas
de todos os municípios afirmaram que sim, exceto, no Recife
e em Belém, em que, 75% e 60% afirmaram que não e 25%
e 40% confirmaram que sim, respectivamente. Esses resulta-
dos corroboram com o número de declarantes de filhos e/ou
dependentes. Mais uma vez, os dados decorrentes das respos-
tas a esta questão apresentam correlação com os resultados das
duas questões anteriores. Senão, vejamos:

• Na categoria das trabalhadoras domésticas não sindica-


lizadas, o percentual médio obtido, a partir dos resulta-
dos das sete cidades pesquisadas, demonstra que 59,3%
das trabalhadoras dessa categoria responderam negativa-
mente. Ou seja, a maioria informou que não houve com-
pensação de faltas em face das ausências motivadas pela
necessidade de cuidar de familiar (filho) enfermo.
• Nesta categoria, 60% das trabalhadoras informaram que
faltavam ao trabalho para prestar essa assistência e 53%
informaram que as faltas não eram descontadas.
• Portanto, se as faltas não foram descontadas, era de se
esperar que houvesse compensação da falta com horas
trabalhadas a mais nos outros dias. No entanto, o per-
centual de 59,3% obtido na presente questão, deixa em
evidência que essa compensação não se efetivou. Por qual
razão? Talvez pela mesma explicação sugerida nas duas
questões anteriores: a maior capacidade de argumentação
ou de empoderamento político das sindicalizadas;
• Diferentemente, no caso das trabalhadoras domésticas
não sindicalizadas, o resultado dessa questão corrobora os
160

dados obtidos nas duas questões anteriores: se as trabalha-


doras não faltam (59,8%), se as faltas não são descontadas
porque não existiram (89,3%), não há o que registrar no
que se refere à compensação de faltas (90,7%).

Assim, os dados referentes às três últimas questões para a


categoria das trabalhadoras não sindicalizadas, analisados con-
juntamente, sugerem a explicação da falta de capacidade argu-
mentativa, da falta de empoderamento político e do temor em
perder o emprego, em face das faltas.
161

RELIGIOSIDADE E CONTEXTO
LABORAL DAS TRABALHADORAS
DOMÉSTICAS

Religião declarada pelas (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os)

A
162

Gráfico 25A/25B - Religião das(os) trabalhadoras (es) domésticas (os) (A)


associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os)
em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 25A/25B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto à religião das participantes sindicalizadas (Gráfico


25A), observa-se que 80% das entrevistadas dos municípios do
Recife, João Pessoa e Brasília seguem a religião católica. Em
Recife, 20% são umbandistas ou seguem o candomblé. Em João
Pessoa, 20% seguem a religião evangélica e 20% segue a doutrina
espírita. Para as entrevistadas do Rio de Janeiro, 60% se declara-
ram como católicas e 40% que pertencem a outras denominações.
Os resultados dos municípios de Salvador foram distribu-
ídos da seguinte forma: 40% se declararam evangélicos, 20%
como pertencentes a outras denominações, 20% como cató-
licos. Em Blumenau, 60% informaram pertencer à religião
evangélica, 20% a religião espírita e 20% a religião católica;
163

finalmente, em Belém, 60% se declararam como católicas e


40% como evangélicas, concomitantemente.
No Gráfico 25B, observa-se que 100% das entrevistadas não
associadas de Recife, afirmaram que pertencem à religião cató-
lica. Por outro lado, 60% das entrevistadas dos municípios do
Rio de Janeiro, de Brasília e de Belém declaram-se ser católicas
e 40% fazem parte da igreja evangélica. As entrevistadas de João
Pessoa e de Blumenau, responderam em 60% dos casos que são
evangélicas. No entanto, 40% dos entrevistados de João Pessoa
declaram-se umbandistas, enquanto que, em Blumenau 20% são
católicas e 20% espíritas. Por fim, em Salvador 60% das entre-
vistadas são católicas e 40% pertencem à religião evangélica.
Ao fazer a média entre os percentuais encontrados nas sete
cidades e nas duas categorias, observa-se que na categoria das
trabalhadoras domésticas sindicalizadas, os percentuais obtidos
foram: católicas (57,1%), evangélicas (22,9%), espíritas (5,7%),
umbandistas/candomblé (2,9%) e outras denominações (8,6%).
Já entre as trabalhadoras domésticas integrantes da cate-
goria das não sindicalizadas ou não associadas, os resultados
foram: católicas (45,7%), evangélicas (34,3%), espíritas (2,9%),
umbandistas/candomblé (14,3%) e outras denominações
(2,9%).
Logo, nas duas categorias, a maioria das trabalhadoras
domésticas se declara como católicas, seguida das que se decla-
ram como evangélicas.
Da análise dos dados, alguns chamam atenção, por exemplo:

• O alto percentual de trabalhadoras não sindicalizadas que


se declararam como umbandistas/candomblé apenas nos
municípios de Salvador e de João Pessoa, representando
164

um percentual de 14,3%, considerando a média entre os


resultados das sete cidades pesquisadas. Diferentemente
da categoria das sindicalizadas ou associadas, cujo per-
centual para esta expressão religiosa, foi de apenas 2,9%,
considerando a média entre os resultados das 07 (sete)
cidade;
• Considerando os dados obtidos na presente pesquisa em
relação à autodeclaração de cor (Gráfico 5A), onde 65,7%
das trabalhadoras domésticas sindicalizadas se declararam
como negras, era de se esperar que houvesse um percen-
tual maior de entrevistadas se declarando como adeptas
das religiões de matriz africana, a exemplo da umbanda
e do candomblé, considerando a íntima relação histórica
entre estas expressões religiosas e a negritude;
• Outro dado que chama atenção é a de que somente na
cidade de Blumenau a religião evangélica predominou
sobre a católica, com percentual de 60%, nas duas cate-
gorias estudadas. Apesar dos dados oficiais do Censo
IBGE/2010 informar que 67,97% da população da
cidade se declaram como católicos e 25,7% como evan-
gélicos. Pode ser que este alto percentual de evangélicos
nas duas categorias estudadas na presente pesquisa possa
ser um maior reflexo da história da formação da cidade,
colonizada no início por alemães, de tradição religiosa
protestante.
165

Quadro 1 – Estatística religiosa

Religião Percentual Número

Católicos 67,97% 210 011

Evangélicos 25,7% 79 400

Sem Religião 2,71% 8 389

Espíritas 1,48% 4 568


Fonte: IBGE, 2010.

De acordo com os dados do IBGE/Censo/2010, quanto


à Religião, a população brasileira é predominantemente
cristã (87%), com a seguinte distribuição: 64,6% (catolicismo
romano), 22,2% (protestantismo), 8% (sem religião) e 2%
(espiritismo).
Certamente, como herança da colonização portuguesa, a
religião católica foi considerada por muitos séculos como a
religião oficial do Estado. Essa realidade mudou apenas com
a Constituição da República de 1891, que instituiu a laicidade
no Estado brasileiro. Apesar dessa previsão legal de um Estado
laico, de fato, o catolicismo manteve, por séculos, certa hege-
monia sobre as demais expressões religiosas, como marcantes
na sociedade brasileira.
Depois do catolicismo, os movimentos básicos das diversas
denominações do protestantismo (adventistas, batistas, lutera-
nos, presbiterianos, por exemplo) se difundiram com bastante
celeridade no país, também estando presentes outras expressões
religiosas, como o espiritismo, fundado na França por Allan
Kardec em 1857 e que no Brasil ganhou a maior expressão
quantitativa, com mais de 3 (três) milhões de adeptos. Também
166

são fortes no Brasil as denominadas expressões religiosas aní-


micas, como a umbanda, o candomblé e as tradições indígenas.
Um fenômeno tem chamado atenção nas últimas décadas,
que é o enorme aumento das denominadas igrejas neopentecos-
tais, o que reduziu o número de adeptos tanto da Igreja Católica
quanto das religiões de matriz afro-brasileiras, conforme regis-
trado no último censo do IBGE. Assim, os dados quanto à
religião, obtidos na presente pesquisa estão em harmonia com
os dados censitários oficiais do IBGE/2010 que registram a
predominância de católicos, seguidos de evangélicos.

Influência da religião no exercício da profissão


pelas (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
167

Gráfico 26A/26B - Influência da religião no exercício laboral das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %)41.

Fonte 26A/26B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito à influência da religião no exercício


profissional das participantes sindicalizadas (Gráfico 26A),
observa-se que 100% das entrevistadas de João Pessoa respon-
deram negativamente. No Rio de Janeiro, Blumenau e Belém os
resultados foram iguais: 80% afirmaram que não e 20% respon-
deram que sim. Em Recife, 75% das entrevistadas confirmaram
que sim e 25% afirmaram que não. Por fim, os resultados para
Brasília e Salvador foram: 60% responderam que não e 40%
afirmaram que sim.

41 Nota: Exceto as entrevistadas dos municípios do Recife (Gráfico 25A) e de


João Pessoa (Gráfico 25B), não responderam e/ou não souberam responder.
168

O Gráfico 26B traz informações sobre as respostas à ques-


tão da influência da religião na atividade laboral, pelas traba-
lhadoras domésticas não sindicalizadas. Observa-se que 100%
das entrevistadas de Recife e do Rio de Janeiro afirmaram que
não, enquanto que, em Salvador e Blumenau 80% afirmaram
que não e 20% confirmaram que sim. Em Brasília, os resultados
foram 60% respondendo afirmativamente e 40% respondendo
negativamente. Em Belém, 60% responderam negativamente e
40% responderam negativamente. Finalmente, para as entre-
vistadas do município de João Pessoa, 50% confirmaram que
sim e 50% afirmaram que não.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas sete
cidades estudadas e nas duas categorias, observa-se que pre-
dominou a resposta negativa. Na categoria das trabalhadoras
domésticas sindicalizadas, 69,3% afirmaram que não havia
influência da religião na sua atuação profissional. Já entre as
trabalhadoras domésticas não sindicalizadas, esse percentual
foi um pouco maior (72,9%), sem representar uma diferença
muito significativa em relação ao percentual das trabalhadoras
sindicalizadas.
Certamente, esses percentuais não estão em sintonia com
os estudos, notadamente na área das Ciências Sociais, que evi-
denciam a influência ou a contribuição da religião na forma-
ção e até na conformação de algumas estruturas sociais. Em
recente estudo, Brito e Maciel42 analisam a relação entre reli-
gião, gênero e trabalho no âmbito do emprego doméstico. Ao

42 BRITO, Cleiton Ferreira Maciel; MACIEL, Jeanne Mariel Brito de


Moura. Na casa do “Senhor”? O papel da religião nas relações de tra-
balho do emprego doméstico. Revista Relicário. Uberlândia, v.2, n.4.
jul./dez. 2015, p.145-153.
169

lançar as bases hipotéticas do estudo, os autores afirmam que


a dimensão religiosa, num primeiro momento, funciona como
uma espécie de névoa, que não permite a distinção entre as
questões próprias das relações de trabalho, daquilo que estaria
vinculado à religião fora do emprego, como expressões de soli-
dariedade, de informalidade, entre outras.
Para os citados estudiosos, esse cenário inicial, termina por
levar “à casa do empregador, práticas sociais características da
casa do Senhor” (destaque dos autores).
Fazendo referência hipotética a um segundo momento, os
autores destacam: “[...] em um segundo momento, as situações
do dia a dia do trabalho dissipam esse enevoamento, e a distin-
ção fica à mostra. Nessa etapa, a religião funciona como pro-
cesso dialético, configurando-se enquanto fonte de legitimação
e de resistência no emprego”, “[...] o emprego doméstico está
envolto pela questão da afetividade, onde as mulheres que dele
vivem têm de satisfazer as expectativas emocionais daqueles
para os quais elas trabalham”.
Estas reflexões dos autores sugerem que as respostas, pre-
dominante negativas, nas duas categorias estudadas na presente
pesquisa, sobre a questão da influência da religião no exercício
profissional, também podem ser decorrentes de similar pro-
cesso de enevoamento, que reflete, ainda, a força da afetividade,
como um componente determinante na estruturação da rela-
ção do emprego doméstico.
Essa afetividade, portanto, perpassa pela questão religiosa,
que neste caso, funciona como mais um componente deste pro-
cesso de enevoamento, que torna ainda mais forte e complicado
separar essa afetividade (e religiosidade) da efetiva racionali-
dade sobre a relação própria do emprego. Concordo com os
170

citados autores e entendo que as hipóteses por eles lançadas se


aplicam à reflexão sobre os dados apresentados no Gráfico 26A
e 26B da presente pesquisa.
Neste sentido, para reforçar a anuência ao pensamento dos
autores citados, destaco a seguinte fala deles:

Confundem-se, com base na religião, a


afetividade com a efetividade do emprego,
vendo esta última como consequência
“natural” da primeira, ou seja, como se
o emprego não estivesse dentro de uma
racionalidade própria, de relação de traba-
lho, mas ligado a um tipo de vínculo esta-
belecido a priori pela religião.

[...] por lidar com emoções, com afetivi-


dade, com relações de amizade, a empre-
gada(o) passa a ter maior probabilidade
de execução de inúmeras tarefas, o que do
ponto de vista conceitual seria razoável
tratar como uma polivalência do emprego
doméstico.

Penso que no momento em que as trabalhadoras domésticas,


integrantes das duas categorias estudadas na presente pesquisa,
responderam que não havia influência da religião sobre as suas
atividades profissionais, reforçaram o denominado processo de
enevoamento, que não lhes permitiu enxergar para além dessa
cortina de névoa, limitando-as a expressar uma opinião super-
ficial, alicerçada da relação de afeto, que a própria religião dela
se apropria, para sedimentar uma relação de trabalho atípica e
pouco racional.
171

CONDIÇÕES DE VIDA E ATIVIDADE


LABORAL DAS TRABALHADORAS
DOMÉSTICAS

Existência de residência própria entre as (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
172

Gráfico 27A/27B - Residência própria entre as (os) trabalhadoras (es) domésticas


(os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)

Fonte 27A/27B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que se refere à questão de ter ou não residência própria, na


categoria das trabalhadoras domésticas sindicalizadas (Gráfico
27A), observa-se que 100% das entrevistadas do município do
Recife possuem residência fixa/própria. Por outro lado, 60%
das entrevistadas do Rio de Janeiro, de Blumenau e de Brasília
não têm residência própria e moram de aluguel ou dividem a
casa com familiares, enquanto que, 40% confirmaram que têm
residência própria. Em Salvador, 80% do das trabalhadoras não
possuem residência própria e 20% confirmaram que sim. Em
João Pessoa, os resultados são inversamente proporcionais: 80%
confirmaram que sim, e 20% afirmaram que não.
173

No Gráfico 27B, apresentam-se os dados sobre residên-


cia própria, da categoria das trabalhadoras não sindicalizadas.
Observa-se que 100% dos entrevistados do município do Rio
de Janeiro possuem residência fixa/própria, enquanto que, em
João Pessoa 40% confirmaram que sim e 60% afirmaram que
não. Sob outra perspectiva, 80% dos entrevistados de Salvador
afirmaram que não e 20% confirmaram que sim, enquanto que,
em Blumenau e Belém 60% afirmaram que não e 40% con-
firmaram que sim. Por outro lado, em Recife e Brasília, 80 e
60% confirmaram que sim e 20 e 40% afirmam não possuir
residência própria.
Ao se fazer a média entre os percentuais de cada resposta
nas duas categorias e nas sete cidades estudadas, observa-se
que entre as trabalhadoras domésticas sindicalizadas, 48,6%
responderam que possuem casa própria, enquanto que na cate-
goria das trabalhadoras não sindicalizadas, o percentual das
que possuem casa própria, alcança 55,7%. Não se trata de uma
diferença significativa entre uma categoria e outra. Pouco mais
da metade, na melhor das condições, possui casa própria.
174

Localização da residência em relação ao local de


trabalho entre as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 28A/28B - Localização da residência em relação ao local de trabalho das


(os) trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %).

Fonte 28A/28B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
175

No Gráfico 28A, o tempo de trajeto de casa até o traba-


lho das trabalhadoras sindicalizadas, afirmaram em 100% das
entrevistadas de Salvador que moram em bairros distantes do
centro, enquanto que, em Recife as entrevistadas responderam
que morar próximo ao centro. Para os demais municípios os
resultados foram distribuídos da seguinte forma: Rio de Janeiro
(60% bairro distante do centro e 40% próximo ao centro);
João Pessoa (75% distante do centro e 25% centro da cidade);
Blumenau (60% bairro próximo ao centro, 20% moram no cen-
tro da cidade e 20% bairros distante do centro); Brasília (50%
moram distante do centro e 50% próximo do centro); e Belém
(80% distante do centro e 20% bairro próximo do centro).
Na categoria das trabalhadoras domésticas não sindicaliza-
das (Gráfico 28B), observa-se que 100% das entrevistadas de
Salvador e de Blumenau moram distante do local de trabalho,
enquanto que, 100% dos entrevistados de João Pessoa afirma-
ram que moram em bairro próximo ao centro. No município
do Rio de Janeiro, 60% responderam que moram em bairro
distante do centro e 40% moram em bairro próximo ao centro.
Em Brasília, 60% das entrevistadas responderam que moram
próximo do local de trabalho, 20% informaram que mora
em bairro distante e 20% que moram perto centro da cidade.
Finalmente, em Belém, 60% responderam que moram próximo
ao local de trabalho e 40% das entrevistadas de Belém moram
em bairros distantes do centro.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas duas
categorias e nas sete cidades pesquisadas, observa-se que entre
as trabalhadoras domésticas sindicalizadas, quanto à localiza-
ção da residência em relação ao centro (local de trabalho), os
resultados foram: 55% responderam que moram distante do
centro; 38,6% afirmaram que moram em bairro próximo ao
176

centro; e apenas 6,4% responderam que moram no centro. Na


categoria das trabalhadoras domésticas não sindicalizadas, os
resultados foram os seguintes: 57,1% responderam que moram
em bairro distante do centro; 40% residem em bairro próximo
ao centro; e apenas 2,9% responderam que moram no cen-
tro. Os resultados nas duas categorias, apesar das diferenças
em termos percentuais, evidenciam o mesmo quadro em rela-
ção à localização da residência das trabalhadoras domésticas:
a maioria, nas duas categorias, mora em bairros distantes do
centro (ou do local de trabalho) e uma minoria mora no centro.
Estes dados evidenciam mais uma realidade que reforça as
condições de precariedade e de dificuldade para o exercício da
profissão da categoria. Certamente, ao morarem distante do
centro e/ou do local de trabalho, as trabalhadoras domésticas
são submetidas a mais uma situação de estresse laboral, uma
vez que para darem conta da jornada de trabalho diária, que
começa, geralmente, entre 7 (sete) e 8 (oito) horas da manhã,
essas trabalhadoras necessitam sair de casa muito cedo, a fim de
chegar no local de trabalho no horário acordado no contrato.
Soma-se a este fato, a questão das condições precárias da malha
de transporte público no Brasil.
Os baixos percentuais de trabalhadoras domésticas que
moram no centro, evidenciam uma realidade já esperada: por
pertencerem a uma classe social de baixa renda, poucas tra-
balhadoras domésticas teriam condições de arcar com o ônus
de morar nos centros da cidade, onde, geralmente, as residên-
cias são bem mais valorizadas que as dos bairros distantes, com
impacto direto no valor do aluguel, por exemplo.
Conforme enfatizei anteriormente, com a aprovação da
Lei Complementar nº 150, de 2015, que regulamentou a EC
n° 72/2013, os trabalhadores domésticos passaram a gozar de
177

novos direitos. Alguns desses direitos passaram a ser garantidos


logo após a edição da lei, a exemplo do adicional noturno, dos
intervalos para descanso e alimentação, por exemplo. Outros
direitos só passaram a ser garantidos, a partir de outubro de
2015, a exemplo do FGTS, do seguro-desemprego e do salário
família.
Antes da nova regulamentação dos direitos laborais das
trabalhadoras domésticas, a categoria já tinha direito ao vale-
transporte, que visava atender essas trabalhadoras nas suas
necessidades diárias de deslocamento do local de residência
para o trabalho, inclusive no retorno, na forma da Lei 7.418/85,
sendo uma concessão obrigatória desde 18 de janeiro de 1987,
data da publicação do Decreto nº 95.247. O empregador
poderá ser desobrigado de conceder o vale, caso disponibilize
um transporte próprio para favorecer o deslocamento da traba-
lhadora ou se a mesma renunciar ao benefício.
É importante destacar que este benefício é custeado pelo
empregado, na parcela equivalente a 6% (seis por cento) de seu
salário básico, e, pelo empregador no percentual correspon-
dente a diferença a ser paga, quando o valor do deslocamento
seja superior ao percentual descontado do empregado.
Assim, o vale-transporte não tem natureza salarial e nem
é incorporado à remuneração do empregado, para quaisquer
efeitos. Também não se constitui em elemento para cálculo da
contribuição previdenciária.
Um aspecto chama atenção e serve de argumento para jus-
tificar a situação de precariedade das trabalhadoras domésticas.
Como o vale-transporte é descontado do próprio salário dessas
trabalhadoras, muitas preferem renunciar ao benefício, a fim de
não ter o desconto de 6% (seis por cento) nos seus vencimentos.
178

Para tanto, preferem se deslocar caminhando, todos os dias,


das suas residências aos locais de trabalho, o que representa
mais um fator de estresse laboral. Se de transporte público,
geralmente, as trabalhadoras saem de casa muito cedo para
chegarem aos locais de trabalho no horário estabelecido no
contrato, imagine o horário que têm que sair para ir ao local de
trabalho, caminhando.

Tempo do trajeto de casa até o local de trabalho


pelas (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
179

Gráfico 29A/29B - Tempo de trajeto de casa até o local de trabalho das (os)
trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %).

Fonte 29A/29B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto ao tempo de deslocamento de casa até o local de


trabalho, as respostas das participantes sindicalizadas (Gráfico
29A), se distribuem da seguinte forma: No município de
Blumenau, 60% das entrevistadas levam entre uma e duas horas,
enquanto que, as demais (40%), tardam menos de uma hora.
Em, Brasília 80% levam entre uma e duas horas e 20% tar-
dam entre duas e três horas para chegar ao local de trabalho.
As entrevistadas de Salvador, 80% responderam que demoram
menos de uma hora para se deslocarem ao local de trabalho
e 20% que tardam entre uma e duas horas. Em João Pessoa,
75% informaram que tardam menos de uma hora para fazer
esse percurso e 25% que tardam entre uma e duas horas. Já na
180

cidade de Belém, 80% informaram que tardam entre uma e


duas horas e 20% que demoram menos de uma hora. Quanto
ao Rio de Janeiro, 50% informaram que levam entre uma e duas
horas, 25% entre três e quatro horas e 25% levam entre duas
e três horas. Finalmente, no município do Recife, 40% fazem
o percurso entre uma e duas horas ou entre duas e três horas,
enquanto que 20% das entrevistadas levam menos de uma hora.
No Gráfico 29B, ainda sobre o tempo de trajeto de casa até
o local de trabalho, na categoria das trabalhadoras domésti-
cas não associadas, observa-se que 100% das entrevistadas dos
municípios de João Pessoa e de Belém, tardam entre uma e
duas horas para realizarem esse trajeto.
Em Salvador, Rio de Janeiro e Brasília, 80% das traba-
lhadoras tardam entre uma e duas horas, enquanto que, 20%
fazem esse deslocamento em menos de uma hora. Na cidade
de Recife, 80% demoram menos de uma hora e 20% entre três
e quatro horas e, finalmente, no município de Blumenau 60%
levam menos de uma hora, 20% entre uma e duas horas e 20%
levam duas e três horas para se deslocarem ao local de traba-
lho. Os resultados obtidos nesta questão estão em consonância
com os dados da questão anterior, que se referia ao local da
residência das trabalhadoras domésticas em relação ao local de
trabalho e/ou ao centro da cidade. Ao se fazer a média entre
os percentuais obtidos nas duas categorias e nas sete cidades
estudadas, observa-se que a maioria tarda entre uma e duas
horas para se deslocar das suas residências ao local de traba-
lho, ou seja, 42,1% e 65,7% das entrevistadas das categorias
das sindicalizadas e das não sindicalizadas, respectivamente,
responderam desta forma, o que está em consonância com os
dados da questão anterior, que majoritariamente constatou que
a maioria das trabalhadoras domésticas morava em bairros dis-
tantes do centro e/ou do local de trabalho.
181

Condição da rua de moradia das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 30A/30B - Condição da rua de moradia das (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 30A/30B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
182

Quanto à condição da rua de moradia das participantes


sindicalizadas (Gráfico 30A), observa-se 80% das entrevista-
das dos municípios do Recife, João Pessoa e Blumenau moram
em ruas com calçamento, 20% moram em ruas de terra batida e
20% em ruas com asfaltamento. No Rio de Janeiro, 80% moram
em ruas com asfalto e 20% moram em ruas com calçamento.
Em Salvador, 60% moram em ruas asfaltadas, 20% com cal-
çamento e 20% em terra batida. Já em relação às entrevistadas
do município de Brasília, 40% moram em rua de terra batida,
20% com calçamento e 40% com asfaltamento. Em Belém,
60% moram em rua com calçamento, 20% em terra batida e
20% com asfalto.
No Gráfico 30B, se expressam os resultados sobre a con-
dição da rua de moradia das trabalhadoras não associadas.
Observa-se 100% das entrevistadas do município do Recife
moram em rua de terra batida. Por outro lado, nos municípios
de Blumenau e de Belém, 80% das entrevistadas moram em
ruas com calçamento e 20% em rua de terra batida, enquanto
que, no Rio de Janeiro, 80% moram em bairros com asfalto e
20% em ruas calçadas. Para os municípios de Salvador e de
João Pessoa, 40% moram em ruas com asfaltamento, 40% em
ruas com calçamento e 20% em ruas de terra batida, já para
os entrevistados de Brasília, 40% moram em ruas com calça-
mento, 40% com asfaltamento e 20% em ruas de terra batida.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas sete
cidades e nas duas categorias de trabalhadoras, observa-se que
a maioria mora em residências cujas ruas possuem calçamentos
– 51,4% (sindicalizadas) e 42,9% (não sindicalizadas), seguidas
das residências em ruas asfaltadas – 31,4% (sindicalizadas) e
25,7% (não sindicalizadas).
183

Esses resultados sugerem que as residências das trabalha-


doras domésticas, apesar de majoritariamente se localizarem
em bairros distantes, conforme observado na questão especí-
fica anterior, estão em bairros com uma estrutura boa, no que
se refere às condições das ruas (calçadas ou asfaltadas). Neste
sentido, se forem somados os percentuais de ruas calçadas e
asfaltadas, chegam-se a resultados bastante expressivos: 82,8%
(sindicalizadas) e 68,6% (não sindicalizadas), o que reforça o
comentário anterior sobre as boas condições de infraestrutura
das ruas onde mora a maioria das trabalhadoras domésticas
pesquisadas.

Divisão das despesas do lar com outros moradores


entre as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
184

Gráfico 31A/31B - Divisão das despesas do lar com algum outro familiar das (os)
trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %).

Fonte 31A/31B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito à divisão das despesas do lar com outros


membros da família, na categoria das trabalhadoras domésticas
sindicalizadas (Gráficos 31A), observa-se que 60% das entre-
vistadas em Salvador, João Pessoa, Blumenau e Belém não divi-
dem ou não têm com quem dividir e 40% divide as despesas
do lar. No Rio de Janeiro e em Recife, 60% confirmaram que
dividem as despesas e 40% não dividem com mais ninguém sua
despesa. Em Brasília, 80% das entrevistadas afirmaram que não
dividem as despesas e 20% dividem as despesas familiares.
Quanto às despesas do lar (Gráficos 31B) na categoria das
trabalhadoras domésticas não sindicalizadas, observa-se que
185

100% das entrevistadas Belém dividem as despesas com mais


alguém. Os percentuais das que dividem as despesas do lar com
outros membros foi de 75% (Salvador), 80% (Rio de Janeiro),
60% (Blumenau) e 75% (Brasília) e das que não dividem as
despesas do lar, os percentuais nas citadas cidades, respectiva-
mente, foram de 25%, 20%, 40% e 25%. Em Recife, 75% não
dividem as despesas do lar com ninguém e 25% dividem essas
despesas. Finalmente, em João Pessoa, 60% não dividem as
despesas, enquanto que 40% dividem as despesas do lar com
outros membros.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas sete
cidades e nas duas categorias, observa-se que entre as traba-
lhadoras sindicalizadas, 57,1% responderam que não dividem
as despesas com outro membro, enquanto que entre as traba-
lhadoras não sindicalizadas essa média atingiu o percentual de
apenas 35%.
Mais uma vez, os dados obtidos na presente pesquisa
expressam consonância entre si. Neste caso, os dados dessa
questão têm direta relação com o Estado Civil das trabalha-
doras domésticas (Gráfico 4A e 4B). Na categoria das traba-
lhadoras domésticas não sindicalizadas, a maioria é solteira
(51,4%), existindo, ainda, percentuais expressivos de divorcia-
das (14,3%) e viúvas (11,4%). Neste contexto, é mais do que
justificável que nesta categoria as respostas à presente questão
sejam, predominantemente, negativas, ou seja, de que não divi-
dem as despesas do lar com outra pessoa.
Já entre as trabalhadoras domésticas não sindicalizadas,
a situação também tem relação com o Estado Civil, uma
vez que a maioria das trabalhadoras dessa categoria é casada
(31,4%) ou companheira (22,9%), o que corresponde a 54,3%
de mulheres que possuem esposo ou companheiro, com os
186

quais dividem as despesas do lar. Esta questão também esta-


belece relação de consonância com a pergunta relativa à Renda
Familiar (Gráfico 19A e 19B), considerando que entre as tra-
balhadoras domésticas sindicalizadas, predominou a renda de
até um salário mínimo (40%), enquanto que entre as trabalha-
doras não sindicalizadas, predominou a renda familiar de 01
(um) a 02 (dois) salários mínimos (45,7%), razão pela qual se
estabelece a correlação: a renda familiar é maior entre as traba-
lhadoras domésticas não sindicalizadas que são casadas ou que
têm companheiros e que, portanto, têm com quem dividir as
despesas do lar.

Recursos de infraestrutura das residências das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
187

Gráfico 32A/32B - Recursos de infraestrutura das residências das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %).

Fonte 32A/32B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto aos recursos de infraestrutura das residências das


entrevistadas sindicalizadas (Gráfico 32A), as variáveis foram
avaliadas no contexto geral. Dessa forma, os resultados foram
distribuídos da seguinte forma: todas as entrevistadas dos dife-
rentes municípios possuem residências com energia elétrica e
água encanada.
No que se refere ao esgotamento sanitário, apenas os muni-
cípios de Salvador, Rio de Janeiro e Recife possuem em 100%
das residências beneficiadas, segundo as entrevistadas. Nos
demais municípios ( João Pessoa, Blumenau, Brasília e Belém),
a trabalhadoras declararam que as residências são beneficia-
das com esgotamento sanitário em 60%, 40%, 60% e 20% dos
188

casos, respectivamente. Por outro lado, apenas em João Pessoa


(20%), Blumenau (20%) e no Rio de Janeiro (80%), das entre-
vistadas declararam possuir gás encanado em suas residências.
No tocante aos recursos de infraestruturas das residências
das entrevistadas da categoria das não associadas (Gráfico
32B), cada variável foi avaliada no contexto geral.
Os resultados foram distribuídos da seguinte forma: Salvador
(100% das casas com energia elétrica, água encanada e esgota-
mento sanitário e 20% das trabalhadoras que possuem residên-
cias com gás encanado); Rio de Janeiro (100% das residências
com esgotamento sanitário, água encanada, energia elétrica, res-
pectivamente, e 80% com residência com gás encanado); Recife
(100% possuem residências com água encanada e energia elétrica
e 60% esgotamento sanitário); em João Pessoa (100% das resi-
dências das trabalhadoras estão beneficiadas com energia elétrica
e água encanada; e 80% possuem esgotamento sanitário).
Em Blumenau (100% possuem água encanada e energia
elétrica e 80% possuem esgotamento sanitário); em Brasília
e Belém, 100% das entrevistadas responderam que suas resi-
dências possuem água encanada e energia elétrica, sendo que,
as trabalhadoras de Brasília afirmaram em 40% dos casos que
têm residência beneficiada com esgotamento sanitário. Chama
atenção o fato de que entre as trabalhadoras domésticas não
sindicalizadas de Belém, não houve nenhum registro de que as
residências estão beneficiadas com esgotamento sanitário.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas sete
cidades e nas duas categorias, observa-se que em 100% dos
casos, tanto entre as trabalhadoras domésticas sindicalizadas
quanto entre as não sindicalizadas, as respostas foram no sen-
tido de informar que as residências possuíam água encanada e
energia elétrica.
189

No que se refere ao esgotamento sanitário, na categoria das


sindicalizadas, o percentual das residências que possuem esse
benefício foi de 68,6%, enquanto que entre as não sindicaliza-
das, o percentual foi de 54,3%.
Os dados deixam em evidência uma primeira conclusão: a
de que mesmo morando próximo ao local de trabalho ou em
bairros distantes, as trabalhadoras domésticas residem em casas
beneficiadas com água encanada e energia elétrica, além de que
o percentual de casas beneficiadas com esgotamento sanitário
foi superior a 50%, nas duas categorias.
Certamente, é possível estabelecer uma relação de con-
sonância entre os resultados obtidos nesta questão e àqueles
observados na questão que tratava das condições das ruas em
que se situavam as casas das trabalhadoras domésticas (Gráfico
30A e 30B). Na questão anterior, entre as sindicalizadas, obser-
vou-se um percentual de 82,8% de residências localizadas em
ruas asfaltadas ou calçadas. Já entre as não sindicalizadas, esse
percentual foi de 68,6%. Estes percentuais têm relação direta
com aqueles obtidos em relação à presença de esgotamento
sanitário nas residências, considerando que uma das condições
prioritárias no Brasil para se executar os serviços do calçamento
ou de asfaltamento de uma rua, é a existência de saneamento
básico (esgotamento sanitário).
Assim, se confirma o percentual menor (54,3%) de casas
contempladas com esgotamento sanitário entre as residên-
cias das domésticas não sindicalizadas, comparando-se com o
percentual obtido entre as sindicalizadas (68,6%), justamente
porque é na categoria das não sindicalizadas que se constata o
menor percentual (68,6%) de residências localizadas em ruas
calçadas ou asfaltadas, comparando-se com o percentual obtido
entre as trabalhadoras sindicalizadas (82,8%).
190

Situação da moradia (conjugada ou não) das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 33A/33B - Condição de moradia (conjugada ou não conjugada) das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B)
não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016
(valores em percentual %).

Fonte 33A/33B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
191

Quanto à condição de moradia das trabalhadoras domés-


ticas sindicalizadas (Gráfico 33A), observa-se que 100% das
entrevistadas de Salvador e de Belém afirmaram que moram
em casas não conjugadas. 80% das entrevistadas do Rio de
Janeiro, de Brasília e de Blumenau residem em moradias não
conjugadas, enquanto que, 20% confirmaram que residem em
casas conjugadas.
No município de Recife, 80% das trabalhadoras moram em
casas conjugadas e 20% moram em residências não conjuga-
das. Em João pessoa, 60% moram em casas conjugadas e 40%
moram em residências não conjugadas. A condição de mora-
dia das trabalhadoras domésticas não associadas (Gráfico 33B)
se apresenta em 100% das entrevistadas de Salvador, morando
em casas conjugadas. Para os demais municípios os resultados
foram distribuídos da seguinte forma: Rio de Janeiro (60% sim
e 40% não); Recife (75% não e 25% sim); João Pessoa (50% sim
e 50% não), Blumenau (60% não e 40% sim); Brasília (60% sim
e 40% não); e por fim, Belém (80% não e 20% sim).
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas sete
cidades e nas duas categorias, os resultados demonstram que
entre as trabalhadoras domésticas da categoria das sindicaliza-
das, a maioria (71,5%) reside em moradia não conjugada. Já entre
as domésticas não sindicalizadas, o percentual das que residem
em casas não conjugadas, é de apenas 49,3%. Isoladamente, os
dados não sugerem nenhum tipo de conclusão. No entanto, ao
se refletir sobre as condições de moradia nas principais cidades
do Brasil, é possível sugerir algumas conclusões.
No que se refere às condições de moradia, uma das marcas
do Brasil é a presença das favelas ou aglomerados subnormais,
denominação utilizada oficialmente pelo IBGE no Censo
Demográfico 2010. As favelas representam a face mais cruel
192

da má distribuição de renda e do déficit habitacional do país,


tendo surgido como consequência da contínua migração das
populações rurais para os espaços urbanos, notadamente das
grandes cidades, em busca de trabalho.
Além desse aspecto histórico, o crescimento dos domicílios
em favelas, com o passar dos anos, também se deveu a inope-
rância do poder público em garantir políticas habitacionais,
capazes de oferecer à população, notadamente de baixa renda,
condições dignas de moradia. Registra a historiografia que as
favelas surgiram no final do século XIX como primeiros assen-
tamentos destinados aos africanos, razão pela qual passaram a
ser denominadas de “bairros africanos”, por serem os espaços
urbanos ocupados por ex-escravos, sem teto, sem trabalho e
sem terra. As favelas modernas começaram a surgir na década
de 1970, como decorrência do denominado êxodo rural, ante-
riormente citado.
De acordo com dados oficiais do IBGE/2010, aproximada-
mente 11,4 milhões de pessoas (6% da população) viviam em
favelas (aglomerados subnormais), distribuídas em 6.329 fave-
las em todo o país, localizadas em 323 dos 5.565 municípios
existentes no Brasil. Ainda conforme os dados do IBGE/2010,
as capitais com maior proporção de habitantes morando em
favelas foram Belém com 53,9% vivendo nesse tipo de aglo-
meração urbana, Salvador com um percentual de 26,1%, São
Luís com um percentual de 24,5% e Recife (23,2%). As duas
maiores capitais do país, São Paulo e Rio de Janeiro, têm 11% e
22% da população morando em favelas, respectivamente.
Por isso, de acordo com os dados do IBGE/2010, das seis
cidades com maior proporção de habitantes vivendo em aglo-
merados subnormais (favelas), quatro delas foram objeto de
estudo na presente pesquisa. Neste sentido, apresento o quadro
193

abaixo, estruturado a partir dos dados do Censo IBGE/2010,


com os dados relativos às sete cidades pesquisadas nesta Tese,
a saber:

Tabela 1 – População residente em aglomerados subnormais nas cidades


pesquisadas em relação à população total (valores em %)

População residente
Região Proporção em relação
em aglomerados
Metropolitana à população total
subnormais
Belém 1.131,368 53,9%
Salvador 931.662 26,1%
Recife 852.700 23,2%
Rio de Janeiro 1.702,073 14,4%
João Pessoa 101.888 8,5%
Blumenau 23.131 7,52%
Brasília (DF) 137.072 3,7%
Fonte: IBGE/2010 (Adaptado).

Inicialmente, observando os dados da tabela, um aspecto


chama especial atenção e justifica a raiz histórica das favelas
(aglomerados subnormais), originadas das primeiras comuni-
dades de ex-escravos. Neste sentido, Salvador, Recife, Rio de
Janeiro e João Pessoa tiveram uma influência marcante do perí-
odo escravista brasileiro, razão pela qual é de se supor que as
favelas, ainda hoje, tenham a maioria de habitantes negros.
Neste contexto, também é sugerível a presença marcante de
trabalhadoras domésticas residindo nestes aglomerados sub-
normais, considerando que a maioria das mulheres que inte-
gram a categoria é negra e de baixo poder aquisitivo.
194

Conforme dito anteriormente, os dados do Gráfico 33A


e 33B, isoladamente, não permitem uma análise mais acu-
rada. No entanto, apenas um dado, referente ao município de
Salvador, pode deixar em evidência, de forma mais clara, que
as entrevistadas, nas duas categorias, podem ter interpretado a
questão da “moradia conjugada” de formas distintas: ou consi-
deraram como residências conjugadas os apartamentos típicos
dos conglomerados habitacionais construídos pelo Governo
Federal, por meio do Programa “Minha Casa, minha vida”;
ou as unidades habitacionais típicas dos aglomerados subnor-
mais (favelas) ou, ainda, as residências construídas sem muro
de separação, coladas umas nas outras, típicas dos bairros mais
suburbanos ou periféricos das cidades brasileiras.
Essa multiplicidade de opções justifica, inclusive, os dados
de Salvador, em que 100% das trabalhadoras domésticas sin-
dicalizadas responderam que residem em moradias não con-
jugadas, enquanto que entre as não sindicalizadas, exatamente
100% responderam o contrário, ou seja, que moram em casas
conjugadas (será que todas moram em residenciais construídos
pelo programa do Governo Federal, anteriormente citado?).
Assim, penso que pode haver alguma relação entre as médias
dos percentuais obtidos para esta questão nas duas categorias e
as médias resultantes da questão relativa às condições de mora-
dia, no que se refere a estrutura das ruas em que as residências
estavam construídas (Gráfico 30A e 30B).
Como informado anteriormente, 82,8% das trabalhadoras
domésticas sindicalizadas responderam que moram em resi-
dências construídas em ruas que são calçadas ou asfaltadas. Na
questão atual, relativa à situação de morar ou não em casa con-
jugada, 71,5% dessas trabalhadoras, responderam que moram
em casas que não são conjugadas, o que pode sugerir que essa
195

maioria pode viver em conglomerados habitacionais constru-


ídos por meio de políticas públicas, do Governo Federal, com
ou sem apoio dos Estados e municípios, estruturados em vilas
habitacionais, de casas separadas, por uma razão: é condição
imprescindível para a concessão dessas residências, que as mes-
mas sejam dotadas de condições básicas de infraestrutura, den-
tre as quais se destacam o calçamento e o asfaltamento.
A mesma correlação se pode fazer em relação à categoria
das não sindicalizadas. Na questão relativa à questão da estru-
tura das ruas em que estão construídas as casas em que moram
68,6% informaram que moram em casas situadas em ruas cal-
çadas ou asfaltadas e 50,7% na mesma categoria, informaram
que moram em casas conjugadas. Ou seja, neste caso, é pos-
sível que estas trabalhadoras tenham entendido a questão de
casas conjugadas como as casas típicas dos bairros periféricos
das cidades brasileiras, ou, ainda, os apartamentos residen-
ciais construídos por meio de políticas públicas, dos Governos
Federal, com ou sem apoio dos Estados e municípios, estru-
turados em conjunto habitacionais (prédios) de apartamentos,
também pela mesma razão que sugeri na categoria anterior: é
condição imprescindível para a concessão desses apartamentos,
que os prédios correspondentes se situem em ruas dotadas de
condições básicas de infraestrutura, dentre as quais se destacam
o calçamento e o asfaltamento.
196

Existência de jardim nas residências das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 34A/34B - Existência de jardim na moradia das (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %)

Fonte 34A/34B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
197

No que diz respeito à existência de jardim na casa das par-


ticipantes sindicalizadas (Gráfico 34A), observa-se que nos
municípios de Salvador e de Brasília 100% das trabalhadoras
domésticas afirmaram que possuem jardins em suas casas. Para
o Rio de Janeiro, Recife, João Pessoa e Blumenau, 60% dos
entrevistados afirmaram que não possuem casas com jardins,
enquanto que, 40% confirmaram que sim, concomitantemente.
Quanto ao município de Belém, 80% dos entrevistados afir-
maram que não possuem casas com jardim e 20% confirmaram
que possuem casas com jardim.
No Gráfico 34B, apresentam-se os resultados quando a exis-
tência de jardim na casa das entrevistadas não associadas. Neste
sentido, observam-se nos municípios de Salvador, Brasília e
Belém, 100% das entrevistadas informaram que possuem casas
sem jardins. No Rio de Janeiro, 80% responderam que possuem
casas sem jardim e 20% que informaram que em suas casas há
jardim. Em Recife, 50% das entrevistadas responderam afirma-
tivamente e 50% responderam negativamente. Em João Pessoa,
75% das entrevistadas responderam que moram em casas sem
jardim e 25% responderam que moram em casas com jardim.
Em Blumenau, 60% informaram que possuem jardins em suas
casas e 40% possuem casas com jardins.
Ao se fazer a média dos percentuais de cada resposta nas
duas categorias e nas sete cidades, observa-se que majoritaria-
mente, tanto entre as trabalhadoras domésticas sindicalizadas
quanto entre as não sindicalizadas, o maior percentual (74,3% e
67,9%) foi de resposta negativa, ou seja, nas casas onde residem
não há jardim, o que guarda relação com a questão anterior,
considerando que em geral, nas casas conjugadas localizadas
nos bairros periféricos ou nos apartamentos construídos pelos
198

programas governamentais do Poder Público, notadamente


federal, não há jardins.
Com a informação obtida nesta questão, é provável que o
percentual de 71,5% de respostas negativas dadas pelas traba-
lhadoras domésticas sindicalizadas na questão anterior, relativa
à conjugação ou não da casa em que vivem com outra residên-
cia, reforça a suposição de que elas vivem em casas de conjunto
habitacionais ou em casas simples de bairros periféricos, sem
conjugação com outras casas e que, ao mesmo tempo, são casas
que não possuem jardins.
Esta mesma consideração pode ser feita em relação às tra-
balhadoras domésticas associadas, posto que na questão ante-
rior, relativa à conjugação ou não da casa em que moram com
outra (s) casa (s), 49,3% responderam negativamente e 50,7%
responderam positivamente. Já na presente questão, 67,9%
informaram que vivem em casas sem jardim. Neste caso, além
das suposições de que elas podem viver em casas de conjunto
habitacionais ou em casas simples de bairros periféricos, sem
conjugação com outras casas e que, ao mesmo tempo, em casas
que não possuem jardins, soma-se a possibilidade de que elas
morem em casas conjugadas, mas com a presença de jardins,
como pode ocorrer com certas estruturas de casas de conjuntos
habitacionais construídas pelo Poder Público ou em casas de
bairros periféricos das cidades.
199

Existência de quintal nas residências das (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 35A/35B - Existência de quintal na casa das (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 35A/35B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
200

Quanto à existência de quintal na casa das participantes


sindicalizadas (Gráfico 35A), observa-se que 80% das entre-
vistadas de João Pessoa e de Belém, confirmaram que possuem
casas com quintal e 20% afirmaram que não possuem casas com
quintal. Nos municípios do Rio de Janeiro, Recife, Blumenau
e Brasília 60% das entrevistadas afirmaram que não possuem
jardim em suas residências, enquanto que, 40% confirmaram
que possuem jardim em suas casas. Em Salvador 80% das tra-
balhadoras não possuem jardins em suas casas e 20% possuem
jardins na extensão de suas casas.
No que se refere à existência de quintal na casa da categoria
das trabalhadoras domésticas não associadas (Gráfico 35B), na
cidade de Recife, 100% das entrevistadas responderam positi-
vamente. No Rio de Janeiro o percentual das trabalhadoras que
informaram que vivem em casas que possuem quintal, foi de
80%, enquanto que 20% informaram que vivem em casas sem
quintal. Em Blumenau com 60% confirmaram que vivem em
casas com quintal e 40% que vivem em casas sem quintal. Em
Salvador, 60% informaram que vivem em casas sem quintal e
40% que moram em casas com quintal. Em João Pessoa, 75%
afirmaram que vivem em casas sem quintal e 25% em casas
com quintal. Finalmente, em Brasília e Belém, 60% das entre-
vistadas informaram que vivem em casas com quintal e 40%
que vivem em casas sem quintal, respectivamente.
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos nas duas
categorias e nas sete cidades, observa-se que 51,4% das traba-
lhadoras domésticas sindicalizadas responderam que vivem em
casas que não têm quintal. Já entre as domésticas não sindicali-
zadas, o percentual maior (55%) foi para a resposta afirmativa,
ou seja, a maioria de todas as trabalhadoras não sindicaliza-
das das sete cidades mora em casas com quintal. Fazendo uma
201

correlação com a questão anterior, relativa à existência ou não


de jardins nas casas em que residem, observa-se que entre as
trabalhadoras sindicalizadas 51,4% vivem em casas sem quintal
e 74,3% em casas sem jardim.
Entre as domésticas não sindicalizadas, 55% vivem em
casas com quintal, mas com 67,9% dos casos, sem jardim. Os
dados das duas questões, tomados conjuntamente, sugerem
as hipóteses elencadas anteriormente, ou seja, as trabalhado-
ras domésticas das duas categorias podem viver em casas de
conjunto habitacionais, em casas simples de bairros periféricos,
com ou sem conjugação com outras casas ou, finalmente, que
morem em casas conjugadas, com ou sem a presença de jardins
e quintais, como pode ocorrer com certas estruturas de casas de
conjuntos habitacionais construídas pelo Poder Público ou em
casas de bairros periféricos das cidades.
203

PROFISSÃO, PROFISSIONALIZAÇÃO E
HERANÇA FAMILIAR

Faixa etária de ingresso na profissão entre as (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
204

Gráfico 36A/36B - Faixa etária que ingressou na profissão trabalhadora doméstica


entre trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os);
e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil –
2016 (valores em percentual %).

Fonte 36A/36B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto à questão relativa à faixa etária em que começou a


trabalhar, na categoria das participantes sindicalizadas (Gráfico
36A), observa-se que 80% das entrevistadas da capital parai-
bana, João Pessoa, começaram a trabalhar como domésticas
entre de 10 (dez) a 15 (quinze) anos e 20% afirmaram que
ingressaram na profissão de doméstica com mais de 30 (trinta)
anos de idade. Para os demais municípios, as respostas foram
distribuídas da seguinte maneira: em Salvador, 40% responde-
ram que ingressaram na profissão entre 15 (quinze) a 20 (vinte)
anos; 40% começaram a trabalhar como domésticas entre 10
(dez) a 15 (quinze) anos; e 20% responderam que ingressaram
na profissão com mais de 30 (trinta) anos de idade.
205

No Rio de Janeiro, 60% informaram que ingressaram na


profissão entre 20 (vinte) a 25 (vinte e cinco) anos de idade;
20% responderam que começaram a trabalhar como domésti-
cas entre 25 (vinte e cinco) a 30 (trinta) anos; 20% responde-
ram que começaram a trabalhar na profissão entre 10 (dez) a
15 (quinze) anos. Em Recife, 40% das entrevistadas responde-
ram que ingressaram na profissão entre 20 (vinte) a 25 (vinte
e cinco) anos; 40% responderam que ingressaram entre 15
(quinze) a 20 (vinte) anos; e 20% que começaram a trabalhar
como domésticas entre 10 (dez) a 15 (quinze) anos.
Em Blumenau, 60% das trabalhadoras responderam que
ingressaram na profissão entre 10 (dez) a 15 (quinze) anos e
40% que começaram a trabalhar como domésticas entre 15
(quinze) a 20 (vinte) anos. Em Brasília, 50% afirmaram que
ingressaram na profissão entre 15 (quinze) a 20 (vinte) anos;
25% que ingressaram entre 10 (dez) a 15 (quinze) anos e 20%
que começaram a trabalhar como domésticas entre 20 (vinte) a
25 (vinte e cinco) anos. Finalmente, na cidade de Belém, 60%
afirmaram que começaram a trabalhar entre 20 (vinte) a 25
(vinte e cinco) anos; 20% que ingressaram na profissão entre 25
(vinte e cinco) a 30 (trinta) anos; e 20% começaram a trabalhar
como domésticas com mais de 30 (trinta) anos.
Na categoria das trabalhadoras domésticas não associa-
das (Gráfico 36B), os resultados foram os seguintes: Em
Salvador, 40% responderam que ingressaram na profissão
entre 15 (quinze) a 20 (vinte) anos; 40% que foi entre10 (dez)
e 15 (quinze) anos; e 20% que começaram a trabalhar como
domésticas com mais de 30 (trinta) anos. No Rio de Janeiro,
80% informaram que ingressaram na profissão com mais de 30
(trinta) anos; 20% que começaram a trabalhar entre 10 (dez) e
15 (quinze) anos.
206

Na cidade de Recife, 40% informaram que ingressaram na


profissão entre 15 (quinze) a 20 (vinte) anos; 40% que foi entre
10 (dez) a 15 (quinze) anos; e 20% que começaram a trabalhar
como domésticas entre 20 (vinte) a 25 (vinte e cinco) anos.
Em João Pessoa, 60% informaram que ingressaram na profis-
são entre 10 (dez) a 15 (quinze) anos; 20% que foi entre 15
(quinze) a 20 (vinte) anos; e 20% que começaram a trabalhar
como domésticas com mais de 30 (trinta) anos.
Em Blumenau, 80% responderam que ingressaram na pro-
fissão entre 15 (quinze) a 20 (vinte) anos e 20% que foi entre 25
(vinte e cinco) a 30 (trinta) anos. Em Brasília, 100% das entre-
vistadas responderam que começaram a trabalhar na profissão
entre15 (quinze) e 20 (vinte) anos. Finalmente, em Belém, 40%
afirmaram que ingressaram na profissão entre 20 (vinte) a 25
(vinte e cinco) anos; 20% que foi entre 25 (vinte e cinco) a 30
(trinta) anos; e 20% que começaram a trabalhar entre 10 (dez)
a 15 (quinze) anos de idade.
Uma análise inicial dos resultados, nas duas categorias
estudadas, deixa à mostra que o ingresso na profissão se deu
com pouca idade, refletindo a realidade amplamente contex-
tualizada na bibliografia especializada e até nos dados oficiais,
notadamente do IBGE.
Ao se fazer um recorde comparativo, a partir da média
obtida dos percentuais de cada categoria e para cada uma das
cidades, face às faixas etárias propostas, os resultados descor-
tinam, ainda mais, a realidade do ingresso na profissão com
pouca idade, senão vejamos:

• Na categoria das trabalhadoras domésticas sindicaliza-


das, a maioria (35%), ingressou na carreira entre 10 (dez)
e 15 (quinze) anos de idade, seguida da faixa etária de
207

20 (vinte) a 25 (vinte e cinco) anos (26,4%) e da faixa de


15 (quinze) a 20 (vinte) anos (24,3%). Ao se somar as
duas faixas etárias correspondentes às idades mais jovens
(de 10 a 20 anos de idade), o percentual foi de 59,3%,
o que demonstra, de forma clara, que também na pre-
sente pesquisa, o ingresso na profissão ocorre com pouca
idade. Entre as sindicalizadas, chama especial atenção o
alto percentual de trabalhadoras que ingressaram entre
10 (dez) e 15 anos (quinze) (35%);
• Na categoria das trabalhadoras domésticas não sindi-
calizadas, a maioria (40%) ingressou na profissão entre
15 (quinze) e 20 (vinte) anos de idade, seguida daque-
las que ingressaram entre 10 (dez) e 15 (quinze) anos
(25,7%). Também nessa categoria, se reflete a realidade
do ingresso na profissão em tenra idade, reforçando os
dados que são divulgados na bibliografia especializada e
pelo órgão responsável pelos Censos Demográficos no
país. Entre as não sindicalizadas, também chama especial
atenção o alto percentual de trabalhadoras que ingressa-
ram entre 10 (dez) e 15 (quinze) anos (25,7%).
208

Aprendizado da profissão entre as (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

Gráfico 37A/37B - Apreensão da profissão de doméstica pelas (os) trabalhadoras (es)


domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não
sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 37A/37B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
209

Quando se perguntou às participantes sindicalizadas com


quem aprenderam o oficio de doméstica, conforme se observa
no Gráfico 37A, os resultados foram os seguintes: Em Salvador,
50% das entrevistadas afirmaram que aprenderam a profissão
com uma amiga e 50% que aprenderam a profissão sozinha. No
Rio de Janeiro 80% com uma amiga e 20% em casa. Por outro
lado, no Recife 50% aprenderam com uma amiga e 50% apren-
deram sozinhas mesmo e João Pessoa 40% aprenderam com
uma amiga, 40% aprenderam sozinhas e 20% com o patrão
ou patroa. Para Blumenau, 40% aprenderam com amiga, 40%
sozinhas e 20% com o patrão. Em Brasília, os resultados foram
distribuídos da seguinte forma: 20% com o patrão, 60% apren-
deram a profissão em casa, e 20% sozinhas. Em Belém 40%
sozinhas, 40% com o patrão (patroa) e 20% com uma amiga.
Em relação à categoria das trabalhadoras domésticas não
sindicalizadas, observa-se no Gráfico 36B, que as respostas
foram distribuídas da seguinte forma: Em Salvador, 40% res-
ponderam que aprenderam a profissão sozinha, 40% afirmaram
que aprenderam com outras pessoas, diferentes das citadas; e
20% responderam que aprenderam a profissão com uma amiga.
No Rio de Janeiro, 60% responderam que aprenderam sozi-
nha, 20% com outras pessoas (prima) e 20% com uma amiga.
No município de Recife, 40% afirmaram que aprenderam com
outras pessoas, 20% com uma amiga, com o patrão (a patroa)
ou sozinha, respectivamente.
Em João Pessoa, 40% responderam que aprenderam a
profissão com outras pessoas (mãe), 20% aprenderam com o
patrão (a patroa), em casa ou sozinhas, respectivamente. Em
Blumenau, 60% responderam que aprenderam sozinhas e 40%
com outras pessoas (com vizinhos). Em Brasília, 60% res-
ponderam que aprenderam com outras pessoas diferentes das
210

citadas na pesquisa e 20% com uma amiga ou sozinha, res-


pectivamente; e, finalmente, em Belém, 40% responderam que
aprenderam a profissão sozinha, 40% que aprenderam com
outras pessoas e 20% aprenderam com patrão (patroa).
Ao se fazer a média entre os percentuais obtidos para cada
resposta, nas duas categorias e nas sete cidades estudadas,
observa-se que entre as trabalhadoras sindicalizadas o maior
percentual foi daquelas que aprenderam a profissão com uma
amiga (40%), seguidas das que aprenderam sozinhas (34,3%),
das que aprenderam com a patroa (14,3%) e das que aprende-
ram em casa (11,4%).
Fazendo a mesma média com a categoria das trabalhado-
ras domésticas não sindicalizadas, os resultados obtidos foram:
a maioria afirmou que aprendeu com outras pessoas diferen-
tes das citadas (40%), seguidas das que aprenderam sozinhas
(34,3%), das que aprenderam com uma amiga (11,3%) e das
que aprenderam a profissão com o patrão (patroa) (8,6%).
Portanto, nas duas categorias, predominou as que apren-
deram a profissão com uma amiga, sozinhas ou com outras
pessoas diferentes das citadas na pesquisa (uma prima, a mãe,
uma vizinha, etc.). Os dados da presente questão possuem
consonância com os resultados obtidos na questão exposta no
Gráfico 13A e 13B, que trata da participação ou não dessas
trabalhadoras em cursos de capacitação.
Conforme exposto na discussão do Gráfico 13A e 13B,
77,1% das trabalhadoras domésticas sindicalizadas não par-
ticiparam de curso de capacitação, enquanto que 72,9% das
trabalhadoras domésticas não sindicalizadas, responderam que
nunca participaram de curso de capacitação. Ao se analisar
esses resultados, ficam mais do que evidente que as domés-
ticas aprenderam a profissão por meio de contato com outras
211

pessoas próximas, de alguma amiga ou com as próprias patroas.


Esse aspecto também reforça a baixa capacitação das trabalha-
doras que integram a categoria das domésticas, uma vez que o
aprendizado não se deu por meio de treinamentos ou cursos de
formação específicos, e sim, por meio da transferência infor-
mal de conhecimentos, de habilidades ou de competências, de
outras pessoas, para elas.
A presente questão também guarda consonância com a
questão relacionada com a faixa etária em que ingressaram na
profissão, objeto da exposição no Gráfico 36A e B. Conforme
analisado naquela oportunidade, entre as trabalhadoras sin-
dicalizadas, 59,3% ingressou na profissão entre 10 (dez) a 20
(vinte) anos de idade. Já entre as trabalhadoras não sindica-
lizadas, 65,7% ingressaram na profissão na citada faixa etária.
Portanto, é pouco provável que em tão tenra idade, estas pes-
soas tenham participado de algum tipo de capacitação.

Vínculo formal anterior à profissão entre as (os)


trabalhadoras (es) domésticas (os)

A
212

Gráfico 38A/38B - Existência de vínculo empregatício formal anterior à


profissão de doméstica entre trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas
(os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete
municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 38A/38B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

No que diz respeito à existência formal de trabalho anterior


ao emprego de doméstica, os resultados para a categoria das
participantes sindicalizadas (Gráfico 38A), foram os seguintes:
Em Recife, 100% dos entrevistados responderam que não tive-
ram vínculo trabalhista formal anterior ao emprego de domés-
ticas. Em Salvador e no Rio de Janeiro, 80% afirmaram que não
tiveram, enquanto que, 20% confirmaram que sim.
Nos municípios de Blumenau, Brasília e Belém, 60% dos
entrevistados afirmaram que não e 40% confirmaram que sim.
Finalmente, 60% dos entrevistados de João Pessoa afirmaram
que não, enquanto que, 40% afirmaram que sim. Na catego-
ria das não associadas (Gráfico 38B), os resultados observados
213

foram: Em João Pessoa, 100% das entrevistadas responde-


ram que não tiveram vínculo anterior. Em Recife e no Rio de
Janeiro, 80% afirmaram que não, enquanto que, 20% confirma-
ram que tiveram vínculo trabalhista anterior. Nos municípios
de Salvador, Blumenau e Brasília, 60% das entrevistadas afir-
maram que não e 40% confirmaram que sim, enquanto que, em
Belém 60% confirmaram que sim e 40% afirmaram que não.
À vista disso, os dados gerais demonstram que a maioria das
trabalhadoras domésticas das duas categorias estudadas, não
teve vínculo empregatício formal, anterior ao trabalho como
domésticas.
Para confirmar esse dado genérico, se fez a média entre
os percentuais obtidos nas duas categorias e nas sete cidades,
obtendo o seguinte resultado: 68,6% das trabalhadoras domés-
ticas sindicalizadas responderam que não tiveram vínculo
empregatício formal anterior ao trabalho como domésticas. Já
na categoria das trabalhadoras não sindicalizadas, o percentual
das que responderam que não tiveram vínculo trabalhista for-
mal anterior ao trabalho como domésticas, foi de 71,4%. Os
dados da presente questão também guardam relação de coe-
rência com a questão da faixa etária em que ingressaram na
profissão, objeto de análise no Gráfico 36A e B.
Conforme analisado naquela oportunidade, entre as traba-
lhadoras sindicalizadas, 59,3% ingressou na profissão entre 10
(dez) a 20 (vinte) anos de idade. Já entre as trabalhadoras não
sindicalizadas, 65,7% ingressaram na profissão na citada faixa
etária. É pouco provável que com uma idade tão baixa, estas pes-
soas possam ter tido algum tipo de vínculo empregatício formal,
anterior ao trabalho como domésticas, inclusive porque a legis-
lação brasileira não permite o contrato de trabalho formal para
menores de idade, salvo os casos excepcionais, previsto em Lei.
214

Existência de outros membros da família na profissão


entre as (os) trabalhadoras (es) domésticas (os)
A

Gráfico 39A/39B - Existência de outros membros da família que trabalham entre


trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/sindicalizadas (os); e (B) não associadas
(os)/não sindicalizadas (os) em sete municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 39A/39B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.
215

No Gráfico 39A, apresentam-se os dados relativos à exis-


tência de outros familiares que trabalham como empregada
doméstica na categoria das trabalhadoras domésticas sindica-
lizadas. Observa-se que 100% das entrevistadas de João Pessoa
e de Recife confirmaram que possuem familiares trabalhando
como domésticas. Nos municípios de Salvador, do Rio de
Janeiro e de Blumenau 60% responderam que sim e 40% afir-
maram que não. Em Brasília, 80% responderam que sim e 20%
afirmaram que não. Já as entrevistadas de Belém afirmaram em
60% que não possuem outros familiares atuando como domés-
ticas e 40% confirmaram que sim, que tem outros familiares
atuando no mesmo ofício.
Em relação às participantes não associadas (Gráfico 39B),
observa-se que 100% das entrevistadas de João Pessoa e de
Recife, confirmaram que possuem outros familiares traba-
lhando como domésticas, enquanto que, em Salvador, 100%
dos entrevistados afirmaram que não possuem familiares atu-
ando na mesma profissão. No município de Blumenau os resul-
tados foram evidenciados em 60% negativamente, enquanto
que, 40% confirmaram que sim.
Para os municípios do Rio de Janeiro, Brasília e Belém os
resultados foram: 60% afirmaram que sim e 40% afirmaram
que não. Numa visão geral, observa-se que nas duas categorias,
as respostas predominantes foram positivas, ou seja, que pos-
suem outros familiares atuando como domésticas. Ao se fazer
a média entre os percentuais obtidos nas duas categorias e nas
sete cidades, observa-se que 71,4% das trabalhadoras sindica-
lizadas responderam que possuem outros familiares atuando
como domésticas. Já entre as trabalhadoras não sindicalizadas,
o percentual foi de 60%.
216

Estes dados confirmam o que está amplamente difundido


na bibliografia especializada que indicam que por ser uma pro-
fissão majoritariamente ocupada por mulheres negras, de baixa
renda e de pouca escolaridade, é comum que seja um trabalho
característico do núcleo familiar, inclusive por falta de opor-
tunidades. Desde a origem da profissão no período colonial e
até recentemente, era comum que as trabalhadoras domésticas
fossem recrutadas em famílias do interior, fora da parentela dos
patrões. Em muitos dos casos, as empregadas já traziam con-
sigo filhas pequenas que, na maioria das vezes, permanecia na
casa em que trabalhavam as mães, terminando por “herdar” a
profissão delas.

Parentesco dos membros da família que trabalham


na mesma profissão entre as (os) trabalhadoras (es)
domésticas (os)

A
217

Gráfico 40A/40B - Parentesco dos membros da família que trabalha como


doméstica entre trabalhadoras (es) domésticas (os) (A) associadas (os)/
sindicalizadas (os); e (B) não associadas (os)/não sindicalizadas (os) em sete
municípios do Brasil – 2016 (valores em percentual %).

Fonte 40A/40B: GUIMARÃES, Flávio Romero. Recortes Socioeconômico e


Jurídico: da invisibilidade social à conquista de direitos laborais pelas trabalhadoras
domésticas do Brasil. 2016. 429 f. Tese (Doutorado em Direito) – Facultad de
Derecho de la Universidad de Salamanca, Salamanca, Espanha, 2016.

Quanto ao parentesco do familiar que também trabalha


como doméstica, na categoria (A) das participantes sindicali-
zadas, conforme disposto no Gráfico 40A, os resultados foram
os seguintes: Em Salvador (60% mãe; 20% sobrinha; e 20%
filha); no Rio de Janeiro (40% irmã; 40% mãe; e 20% tia); em
Recife (40% tia; 20% sobrinha; 20% irmã; e 20% mãe); em João
Pessoa (40% tia; 20% avó; 20% irmã; e 20% mãe); em Brasília
e Blumenau (40% irmã; 40% tia; e 20% avó); e, finalmente, em
Belém (50% sobrinha e 50% mãe).
No Gráfico 40B, apresenta o grau de parentesco familiar dos
membros que também trabalham como domésticas, conforme
218

respostas das entrevistadas não associadas, a saber: No Rio


de Janeiro 100% informaram que o parentesco é de irmã; em
Recife (60% mãe; 20% tia; e 20% irmã); em João Pessoa (20%
sobrinha; 20% irmã; 20% tia e 40% mãe); em Blumenau (50%
mãe e 50% irmã); em Brasília (40% irmã 40% tia; e 20% avó);
e em Belém (20% avó, irmã, tia e mãe, respectivamente). Em
Salvador, entre as sindicalizadas, não há parentes que atuam
também como domésticas.
Ao se estabelecer a média entre os percentuais alcançados
por cada resposta, duas categorias e nas cidades pesquisadas,
observa-se que entre as trabalhadoras domésticas sindicaliza-
das os maiores percentuais foram para mãe (27,1%), seguidos
de tia (25,7%) e irmã (22,9%). Em relação às domésticas não
sindicalizadas, os resultados foram: irmã (35,7%), mãe (24,3%)
e tia (14,3%). Logo, apesar das diferenças entre os percentu-
ais, predominaram nas duas categorias, o parentesco com irmã,
mãe e tia.
Assim, os dados da presente questão guardam relação de
coerência com a questão anterior e evidencia, mais uma vez,
que a profissão de doméstica é característica do núcleo de
parentela, cujos membros pertencem, geralmente, a uma famí-
lia de baixa renda, com pouca escolaridade e, na maioria, com-
posto por negros, para os quais não há muitas oportunidades
no mercado de trabalho, fora das vagas de domésticas. Assim,
não causa nenhuma surpresa, o fato das trabalhadoras, nas
duas categorias, terem feito referência à presença de sobrinhas,
filhas, irmãs, tias, mães e avós, desempenhando a mesma ativi-
dade laboral.
219

PARA FIM DESTA CONVERSA:


ONDE CHEGAMOS?

No presente estudo, no que se refere à construção da iden-


tidade das trabalhadoras domésticas no Brasil, se reforça o
pensamento predominante na bibliografia especializada que
associa a profissão às tradições escravistas do país, sendo as
“Casas Grandes” do período colonial o berço que acolheu, com
todas as suas características de subordinação e de dominação,
às mucamas e criadas, primeiras representantes do que viriam a
se tornar, posteriormente, as trabalhadoras domésticas no país.
No entanto, também teve forte impacto nesta construção da
identidade das trabalhadoras domésticas no Brasil, a influên-
cia do modelo de organização familiar burguesa e patriarcal
que herdamos da Europa. No que se refere ao gênero pre-
dominante entre os sujeitos da pesquisa, nas duas categorias
estudadas (empregadas sindicalizadas e/ou associadas ou não
sindicalizadas e/ou não associadas), predominou, majoritaria-
mente o gênero feminino, que confirma os dados oficiais do
IBGE/PNAD/2013. Portanto, é possível asseverar que profis-
são de doméstica continua sendo um dos principais meios de
acesso ao trabalho ou à renda para as mulheres, notadamente
as negras, de baixa renda e de pouca escolaridade. Embora esta
atividade continue sendo uma das principais ocupações entre
as mulheres há uma tendência de redução da proporção de
220

mulheres empregadas no trabalho doméstico: somente entre


2011 e 2012, a proporção de mulheres ocupadas no trabalho
doméstico passou de 15,5% para 14,7%, fato que se justifica
pela progressiva melhoria na qualificação e escolarização das
mulheres mais jovens que, assim, passam a ingressar no mundo
do trabalho em outras profissões, mais valorizadas socialmente.
Os dados apresentados na presente obra demonstraram que
a faixa etária predominante entre os sujeitos pesquisados (tra-
balhadoras sindicalizadas e não sindicalizadas), foi a de mais
de 45 anos, o que tem certa consonância os dados derivados
dos estudos no PNAD/IBGE 2013, divulgados no Relatório
das Desigualdades de Gênero e Raça. De acordo com o citado
relatório, que apresenta estatísticas descritivas que compõem
um retrato atual da situação de brasileiros e de brasileiras sob
a perspectiva das desigualdades de gênero e de raça, a distri-
buição da população feminina ocupada em trabalho domés-
tico por faixa etária demonstra que de um total de 5.963, 976
domésticas brasileiras, na faixa etária de 30 a 44 anos, existem
2.518, 296, o que corresponde a 42,2%, enquanto que na faixa
etária de 45 a 59 anos, existem 1.996,816 domésticas, o que
corresponde a 35,5%.
Evidenciou-se no estudo o envelhecimento da categoria,
uma vez que para as mulheres com mais de 50 anos de idade
as alternativas de uma inserção diferente do emprego domés-
tico no mundo do trabalho é bem mais difícil, principalmente
quando essas trabalhadoras têm baixa escolaridade, ao passo
que também sugere que as mulheres jovens têm buscado alter-
nativas para a inserção no mundo de trabalho, o que foi favo-
recido, entre outros fatores, pelo aumento da escolaridade das
jovens, o que possibilita a busca por ocupações socialmente
221

mais valorizadas, com melhores remunerações e mais formali-


zadas que o trabalho doméstico.
No que refere ao estado civil das trabalhadoras domésticas
das sete cidades estudas, constatou-se que em relação às sindi-
calizadas ou associadas, a maioria se declarou como solteiras
e a minoria como companheiras. No grupo das trabalhadoras
domésticas não sindicalizadas ou não associadas, a maioria
de declarou como casadas, sendo bem alto o percentual das
que se declararam como companheiras, o que merece desta-
que conclusivo. Estes resultados sugerem duas interpretações
conclusivas, a saber: ou as domésticas não sindicalizadas (não
associadas) não têm a devida compreensão da natureza da con-
dição de companheira ou as domésticas sindicalizadas, face ao
ativismo sindical, têm a compreensão mais clara da condição
de companheirismo, do ponto de vista jurídico. Também suge-
rem que as trabalhadoras sindicalizadas, como decorrência da
própria atividade sindical, assumem de forma firme a condi-
ção de solteiras, mesmo quando possuem filhos (fato que se
constatou com a presente pesquisa). Ou seja, para estas traba-
lhadoras a afirmação da condição de solteira e, consequente-
mente, de mãe solteira, é uma forma de superar o preconceito
que ainda persiste em setores conservadores da sociedade bra-
sileira. Diferentemente, este preconceito talvez seja reforçado
pela resposta das domésticas não sindicalizadas que optaram
por se declararem como companheiras, ao invés de afirmaram
a condição de solteira (mãe solteira).
Em relação à questão da autodeclaração de cor, entre as
empregadas domésticas sindicalizadas ou associadas, o per-
centual relativo da cor negra alcançou 65,7%, enquanto que a
declaração como pardas se limitou a um percentual de 20%. Já
entre as entrevistadas não sindicalizadas e/ou não associadas,
222

os dados retratam um resultado que sugeriu uma análise mais


acurada: 48,6% se declaram como pardas e 42,9% como negras.
Conclui-se que as trabalhadoras sindicalizadas assumem de
forma clara a condição de mulheres negras, o que não ocorre
entre as trabalhadoras não sindicalizadas, que, muitas vezes, se
declaram como pardas, quando na realidade, são negras.
Sugiro que essa diferença é um reflexo do poder associa-
tivo que favorece, claramente, o empoderamento da mulher
negra, a partir da conscientização amadurecida dentro das qua-
lificações realizadas e cursos de aperfeiçoamento existentes no
movimento sindical que trabalha com a função de referendar a
autodeclaração de pertença racial.
Com os dados obtidos na pesquisa, se concluiu que a maio-
ria das trabalhadoras domésticas, das duas categorias, possuem
filhos e que estes dependentes estudam em escolas públicas.
No que se refere à escolaridade dos sujeitos da pesquisa, con-
clui-se que o quadro geral nas duas categorias estudadas é de
baixa escolaridade, com certa melhoria em relação à catego-
ria das trabalhadoras domésticas sindicalizadas ou associadas.
Ou seja, ao se fazer a média entre as domésticas que possuem
apenas o fundamental incompleto e completo, encontrou-se o
percentual de 48,6% entre as domésticas sindicalizadas e de
51,5% entre as não sindicalizadas ou não associadas. Já em rela-
ção ao ensino médio (incompleto e completo), os percentuais
médios encontrados foram de 48,6% entre as trabalhadoras
domésticas sindicalizadas e de 42,8% entre as domésticas não
sindicalizadas. Portanto, com base nestas médias apresentadas,
é possível concluir que as trabalhadoras domésticas sindica-
lizadas possuem uma sensível melhoria na formação escolar,
considerando que apresentam o menor percentual em relação
223

ao ensino fundamental (48,6%) e o maior percentual das que


cursam ou concluíram o ensino médio (48,6%).
Outro dado que reforça essa sensível melhoria em relação às
trabalhadoras domésticas sindicalizadas é que não se encontrou,
nas sete cidades estudadas, nenhuma resposta que indicasse a
não escolarização, dado registrado em 2,9% das trabalhadoras
não sindicalizadas. Os resultados obtidos na presente pesquisa,
quanto à escolaridade das trabalhadoras domésticas, confir-
mam os dados apresentados pelo DIEESE (2013), em que a
maioria das trabalhadoras domésticas possui apenas o Ensino
Fundamental incompleto ou equivalente (alfabetizadas sem
escolarização), cujo percentual foi de 48,9% e com o Ensino
Fundamental Completo ou o Médio Incompleto, o percentual
foi de 23,1%.
No presente estudo também se conclui que as trabalhado-
ras domésticas, majoritariamente, apesar de diferenças pouco
significativas entre os dados informados, atuam em “todos os
serviços domésticos”, ou seja, cuidam da casa (arrumadeira),
cozinham, cuidam de crianças, lavam e passam roupas, etc.
Essa conclusão reflete uma realidade presente na grande
maioria dos lares da classe média brasileira, que é opção das
patroas (empregadoras) pela contratação de uma só pessoa que
seja capaz de realizar todas as atividades da casa, numa clara
evidência de um contexto de exploração e de condição precá-
ria de trabalho. Para uma pessoa negra, de baixa escolaridade
e pobre, não restava outra opção, a não ser se submeter a essa
situação de exploração laboral.
É possível concluir, ainda, que persiste no mercado de traba-
lho o recrutamento de trabalhadoras domésticas com esse per-
fil de diversas habilidades. Também sugere que em decorrência
224

dos novos encargos sociais decorrentes da entrada em vigor da


Emenda Constitucional nº 72/2013, regulamentada pela Lei
Complementar nº 150/2015, é possível que esse nível de exi-
gência seja ainda mais reforçado, talvez como reflexo do enten-
dimento presente no senso comum que afirma que agora as
trabalhadoras domésticas “ganham muito” e, portanto, devem
cuidar de todo o serviço da casa. Na pesquisa também se con-
clui que, na quase totalidade, as atividades desenvolvidas na
atualidade correspondem às atividades propostas no início do
contrato. Ao abordar a questão da motivação para a escolha
da profissão de doméstica, conclui-se que nas duas categorias
o maior percentual foi para a resposta relativa à falta de opor-
tunidade para ingressar em outra profissão, seguida da falta de
experiência que favorecesse o ingresso em outras profissões.
Quanto a esse aspecto, se conclui que as duas respostas pre-
dominantes se inter-relacionam para explicar a realidade da
inserção das trabalhadoras domésticas no mundo do trabalho
no Brasil e a dificuldade de ascensões verticais, decorrentes da
inserção em outras profissões, melhor valoradas pela sociedade.
Ao analisar os dados comparativos do tempo de serviço das
trabalhadoras domésticas, nas duas categorias (sindicalizadas
e não sindicalizada), os resultados demonstraram que as tra-
balhadoras com mais tempo de serviço integram a Categoria
A (sindicalizadas), o que sugere uma única conclusão possí-
vel: a diretoria das associações ou dos sindicatos é formada por
mulheres aposentadas, ou seja, com mais de 19 anos de serviço.
Com base nos resultados obtidos em relação à participação das
trabalhadoras domésticas em cursos de capacitação, foi possível
concluir que nãos duas categorias, mais de 70% das profissio-
nais nunca participaram de cursos especializados, o que está
em consonância com os resultados da literatura especializada
225

que expressam a baixa qualificação das trabalhadoras domés-


ticas no país, sendo essa, inclusive, uma das razões para a não
inserção dessas trabalhadoras em outras profissões no mercado
de trabalho.
Nas sete cidades estudas e nas duas categorias (A e B), a
partir dos dados obtidos na pesquisa, foi possível concluir que
a maioria das trabalhadoras não recebe outro salário, diferente
do recebido na condição de trabalhadora doméstica e que a
maioria das trabalhadoras domésticas está em plena ativi-
dade laboral, com exceção das sindicalizadas do município
de Recife, cuja maioria está aposentada (80%), estando estes
últimos dados em consonância como os resultados obtidos na
presente pesquisa para a questão da faixa etária das domésticas
integrantes das duas categorias.
Em relação ao recebimento de salário fixo desde o ingresso
na profissão, os dados levantados na pesquisa, levam a con-
clusão de que a maioria, nas duas categorias estudadas (A e
B), respondeu que havia recebido salário fixo desde o ingresso
na profissão, constatando-se, também, uma discreta diferença
(8,6%) em relação às trabalhadoras sindicalizadas no que se
refere ao recebimento de salário fixo desde o ingresso na profis-
são, em comparação com as trabalhadoras não associadas. Este
percentual pode ser atribuído à participação das mesmas nas
mobilizações típicas da entidade sindical, que lhes favorecem
uma tomada de consciência mais efetiva em relação aos direitos
trabalhistas.
No que se refere à assinatura da Carteira de Trabalho já
no início do emprego, nas duas categorias, a partir dos dados
da pesquisa, se conclui que a maioria (mais de 60%) não teve
assegurada essa formalização contratual no tempo próprio. Ao
se fazer a comparação entre as duas categorias, observou-se
226

um incremento no percentual de respostas negativas (5,7%)


na categoria das não sindicalizadas. Apesar de ser um percen-
tual pouco significativo, pode sugerir que o fato de não estarem
vinculadas às atividades de mobilização típicas da atividade
sindical, as integrantes da categoria B não tiveram as mesmas
oportunidades de formação política que as da sindicalizada (A)
tiveram, razão pela qual o poder de convencimento é menor,
no momento de reivindicar ou exigir a assinatura da carteira
de trabalho.
Em relação à faixa salarial das trabalhadoras domésticas,
nas duas categorias estudadas, prevaleceu maioria recebendo
até um salário mínimo, apesar da particularidade dos municí-
pios de Blumenau e de Belém, na categoria das sindicalizadas,
e de João Pessoa e de Belém, na categoria das não sindicaliza-
das, que apresentam percentuais majoritários da faixa salarial
de 1 a 2 salários mínimos.
Ao refletir sobre os indicadores econômicos que normal-
mente são associados aos rendimentos de trabalho, a exemplo
da produtividade e da jornada de trabalho, se reforça a par-
ticularidade do trabalho doméstico. Neste sentido, conforme
pensamento predominante no senso comum, considerando os
citados indicadores, a trabalhadora doméstica é valorada de
forma negativa, porque a sua atividade laboral não gera valor
e nem produz lucro, razão pela qual os seus salários são sem-
pre mais baixos que aqueles pagos aos demais trabalhadores
urbanos. As conclusões da presente pesquisa, neste particular,
confirmam a realidade que situa a categoria das trabalhadoras
domésticas como a que recebe os salários mais baixos, majo-
ritariamente limitado a 1 salário mínimo. Portanto, o salá-
rio mínimo segue sendo a referência para a remuneração da
227

categoria, com as devidas variações regionais, podendo variar


conforme a tabela estadual.
No tocante à renda familiar, com base nos dados obtidos na
pesquisa, conclui-se que na categoria das trabalhadoras domés-
ticas sindicalizadas, a renda familiar é de até 1 salário mínimo,
inferior à faixa predominante na categoria das trabalhadoras
domésticas não sindicalizadas (de 1 a 2 salários mínimos).
Também se conclui que estes resultados estão em consonância
com os dados relativos ao estado civil, considerando que entre
as trabalhadoras domésticas sindicalizadas, predominaram as
solteiras, o que explica a predominância da renda familiar de
até um salário mínimo, corresponde, portanto, ao salário rece-
bido pela própria trabalhadora doméstica.
Como entre as trabalhadoras domésticas não sindicaliza-
das, predominaram as casadas, se justifica a existência de uma
renda familiar superior a um salário mínimo, se concluindo,
neste sentido, que à renda individual da trabalhadora domés-
tica, deve ter sido agregada alguma renda individual do esposo
ou do companheiro, compondo uma renda familiar superior
àquela auferida na categoria das sindicalizadas.
Sobre a interferência da atividade de doméstica na atuação
na família (cuidado com os filhos e com a casa), os dados obti-
dos levam à conclusão de que segundo a maioria das trabalha-
doras, nas duas categorias, não há interferência das atividades
de casa e da família no trabalho como doméstica. Com relação
ao cuidado com os familiares (filhos) nas ausências das domés-
ticas, os dados enfatizam que esta tarefa é assumida, majorita-
riamente, pelas avós.
O estudo conclui, também, que diferentemente das mães
das classes privilegiadas da sociedade brasileira, que contratam
228

as trabalhadoras domésticas para cuidarem dos seus filhos,


essa mesma realidade não se aplica às próprias domésticas que
dependem de outros familiares, dos filhos mais velhos, das avós
dos seus filhos, da sogra ou até de vizinhas, para cuidarem dos
seus filhos, nas suas ausências.
Observou-se, também, que a maioria das trabalhadoras
domésticas sindicalizadas respondeu que faltou ao emprego
nos últimos dois anos para prestar assistência à família (filhos),
enquanto que entre as trabalhadoras domésticas não sindica-
lizadas, a maioria respondeu que não faltou ao emprego nos
últimos dois anos para prestar assistência à família (filhos). A
partir dos dados apresentados, se conclui que as trabalhadoras
domésticas não sindicalizadas, mesmo tendo a necessidade de
faltar ao trabalho para cuidar de familiar (filhos) em situações
de enfermidade, por exemplo, optam por não faltar ao trabalho,
e isso se dá pela falta de consciência e de capacidade de luta.
Assim, se submetem ao fato de irem trabalhar, mesmo
com algum familiar (filho) carecendo de maior atenção e cui-
dado. Ou seja, as trabalhadoras domésticas não sindicalizadas
temem perder os seus empregos, como decorrência das faltas.
Diferentemente, as trabalhadoras domésticas sindicalizadas,
mesmo tendo o suporte de familiares e de pessoas de fora da
parentela para cuidar dos filhos em suas ausências, o que em
tese também poderia ocorrer em caso de enfermidade, optam
por faltar ao trabalho quando surge a necessidade de cuidados
especiais.
No presente estudo se conclui que esse fato se deve ao
empoderamento político das trabalhadoras sindicalizadas que
as fazem mais determinadas quando do confronto com as
empregadoras (patroas) e a capacidade de luta, decorrente da
mobilização sindical, o que explica, inclusive, o risco que as
229

sindicalizadas assumem quanto à falta ao trabalho para pres-


tar assistência à familiar enfermo (filho), que sequer a maioria
informou compensar em outro dia. Quanto à religião, a partir
dos dados coletados, a maioria das trabalhadoras domésticas
das duas categorias pesquisadas, é católica, seguida das que se
declaram como evangélicas.
No estudo se conclui que não houve uma correlação entre
a questão da autodeclaração de cor e a questão da religião,
considerando que uma vez que a maioria das trabalhadoras
domésticas se declarou como negra, era de se esperar que até
por questões de natureza histórica e cultural, houvesse um per-
centual mais expressivo de adeptas das religiões de matriz afri-
cana, a exemplo da Umbanda e do Candomblé, considerando
a íntima relação histórica entre estas expressões religiosas e
a negritude. Na pesquisa também se chegou à conclusão que
somente na cidade de Blumenau a religião Evangélica pre-
domina sobre a Católica, apesar dos dados oficiais do Censo
IBGE/2010 informar que 67,97% da população da cidade se
declaram como Católicos e 25,7% como evangélicos, pode ser
que este alto percentual de evangélicos nas duas categorias
estudadas na presente pesquisa possa ser um maior reflexo da
história da formação da cidade, colonizada no início por ale-
mães, de tradição religiosa protestante. Ainda em relação ao
aspecto religioso, com base nos dados obtidos na pesquisa, se
conclui que a maioria das trabalhadoras domésticas informou
que não havia influência da religião na sua atuação profissional.
O trabalho conclui que esses percentuais não estão em sintonia
com os estudos, notadamente na área das Ciências Sociais, que
evidenciam a influência ou a contribuição da religião na forma-
ção e até na conformação de algumas estruturas sociais.
230

Pelos resultados coletados, observa-se que entre as traba-


lhadoras domésticas sindicalizadas, 48,6% responderam que
possuem casa própria, enquanto que na categoria das traba-
lhadoras não sindicalizadas, o percentual das que possuem
casa própria, alcança 55,7%. Conclui-se, neste sentido, que não
se trata de uma diferença significativa entre uma categoria e
outra. A conclusão marcante é a de que pouco mais da metade
das trabalhadoras pesquisadas, na melhor das condições, possui
casa própria e que estas residências, na maioria dos casos, e nas
duas categorias, estão situadas em bairros distantes do centro
(ou do local de trabalho). Se conclui que esta realidade reforça
as condições de precariedade e de dificuldade para o exercício
da profissão da categoria, uma vez que morando distante do
centro e/ou do local de trabalho, as trabalhadoras domésticas
são submetidas a mais uma situação de estresse laboral, por
terem que sair muito cedo das suas residências para chegar ao
local de trabalho no horário normalmente estabelecido, fato
que é reforçado quando os dados coletados na presente pes-
quisa levam a conclusão que a maioria das entrevistadas das
duas categorias, tarda entre uma e duas horas para se deslocar
das suas residências ao local de trabalho.
Ao avaliar alguns aspectos das condições de moradia das
trabalhadoras pesquisadas, foi possível concluir que a maioria
mora em residências cujas ruas possuem calçamentos, segui-
das das residências com ruas asfaltadas, o que sugere que as
residências das trabalhadoras domésticas, apesar de majorita-
riamente se localizarem em bairros distantes, os mesmos pos-
suem uma estrutura boa, no que se refere às condições das ruas
calçadas ou asfaltadas. Ao analisar a questão das despesas com-
partilhadas ou não entre as trabalhadoras domésticas e outros
supostos membros da família, a partir dos dados coletados, se
231

conclui que as trabalhadoras sindicalizadas, responderam que


não dividem as despesas com outro membro, enquanto que
entre as trabalhadoras não sindicalizadas o percentual de res-
postas neste sentido foi muito menor, fato que se explica ao se
fazer a correlação desta pergunta com o Estado Civil das traba-
lhadoras domésticas. Na categoria A, a maioria é solteira, exis-
tindo, ainda, percentuais expressivos de divorciadas e viúvas.
Neste contexto, é possível concluir que as respostas a presente
questão sejam, predominantemente, negativas, ou seja, de que
não dividem as despesas do lar com outra pessoa. Conclusão
diferente ocorre entre as trabalhadoras domésticas não sindica-
lizadas, uma vez que a maioria das trabalhadoras dessa catego-
ria é casada ou companheira, o que sugere que as despesas são
compartilhadas com o esposo ou o companheiro.
Com base nos dados obtidos na pesquisa, se conclui que em
100% dos casos, tanto entre as trabalhadoras domésticas sin-
dicalizadas quanto entre as não sindicalizadas, as mesmas resi-
dem em casas que possuem água encanada e energia elétrica.
No que se refere ao esgotamento sanitário, nas duas categorias,
o percentual de casas beneficiadas com esgotamento sanitário
foi superior a 50%. Ao fazer referência à questão da moradia
(em casa conjugada ou não), os resultados levam à conclusão
de que na categoria das sindicalizadas, a maioria reside em
moradia não conjugada, enquanto que entre as domésticas não
sindicalizadas, o percentual das que residem em casas não con-
jugadas, é de menos da metade. Assim, isoladamente, os dados
não sugerem nenhum tipo de conclusão. No entanto, buscando
compreender melhor os dados, se fez uma reflexão sobre as
condições de moradia nas principais cidades do Brasil, nota-
damente estabelecendo correlações entre os dados obtidos e a
presença no Brasil das favelas ou dos aglomerados subnormais,
232

denominação utilizada oficialmente pelo IBGE no Censo


Demográfico 2010, que levaram à conclusão de que não houve
por parte das entrevistadas uma compreensão nítida sobre a
que se referia à denominação “casa conjugada”, razão pela qual
seria sugerível incluir nessa terminologia, diversos tipos de
moradia, inclusive as construídas pelos programas habitacio-
nais, vinculados ao Governo Federal.
Ainda analisando aspectos que caracterizam as condições
de moradia das trabalhadoras pesquisadas, os dados coletados
levaram à conclusão que a maioria reside em casas que não
possuem jardim, o que guarda relação com a questão anterior,
considerando que em geral, nas casas conjugadas localizadas
nos bairros periféricos ou nos apartamentos construídos pelos
programas governamentais do Poder Público, notadamente
federal, não há jardins. Com a informação obtida nesta questão,
é provável que o percentual de 71,5% de respostas negativas
dadas pelas trabalhadoras domésticas sindicalizadas na questão
anterior, relativa à conjugação ou não da casa em que vive com
outra residência, reforça a suposição de que elas vivem casas de
conjunto habitacionais ou em casas simples de bairros periféri-
cos, sem conjugação com outras casas e que, ao mesmo tempo,
são casas que não possuem jardins e nem quintais (no caso da
categoria A), considerando que a maioria das domésticas não
sindicalizadas mora em casas com quintal.
Com base nestes dados, se conclui que, supostamente, as
trabalhadoras podem viver em casas de conjunto habitacionais
ou em casas simples de bairros periféricos, sem conjugação
com outras casas e que, ao mesmo tempo, em casas que não
possuem jardins ou quintais, somando-se a isso a possibilidade
de que elas morem em casas conjugadas, mas com a presença
de jardins, como pode ocorrer com certas estruturas de casas de
233

conjuntos habitacionais construídas pelo Poder Público, ou em


casas de bairros periféricos das cidades. No tocante à faixa etá-
ria em que houve o ingresso na profissão, foi possível concluir
que se deu com pouca idade, refletindo a realidade amplamente
contextualizada na bibliografia especializada e até nos dados
oficiais, notadamente do IBGE.
Ao se fazer um recorde comparativo, a partir da média
obtida dos percentuais de cada categoria e para cada uma das
cidades, face às faixas etárias propostas, os resultados descor-
tinam, ainda mais, a realidade do ingresso na profissão com
pouca idade. Os resultados levam a conclusão de que na cate-
goria das trabalhadoras domésticas sindicalizadas, a maioria,
ingressou na carreira entre 10 e 15 anos de idade, seguida da
faixa etária de 20 a 25 anos e da faixa de 15 a 20 anos. Entre
as sindicalizadas, chamou especial atenção o alto percentual de
trabalhadoras que ingressaram entre 10 e 15 anos (35%). Na
categoria das trabalhadoras domésticas não sindicalizadas, os
dados levam à conclusão de que a maioria ingressou na profis-
são entre 15 e 20 anos de idade, seguida daquelas que ingressa-
ram entre 10 e 15 anos.
Também nessa categoria, se refletiu a realidade do ingresso
na profissão com pouca idade, reforçando os dados que são
divulgados na bibliografia especializada e pelo órgão respon-
sável pelos Censos Demográficos no país. Entre as não sindi-
calizadas, também chamou especial atenção o alto percentual
de trabalhadoras que ingressaram entre 10 e 15 anos (25,7%).
Entre as trabalhadoras sindicalizadas, no que se refere à ques-
tão relativa ao aprendizado da profissão, os resultados susci-
tam a conclusão de que o maior percentual foi daquelas que
aprenderam a profissão com uma amiga, seguidas das que
234

aprenderam sozinhas, das que aprenderam com a patroa e das


que aprenderam em casa (11,4%).
Na categoria B, a conclusão foi de que a maioria aprendeu
a profissão com outras pessoas diferentes das citadas, seguidas
das que aprenderam sozinhas, das que aprenderam com uma
amiga e das que aprenderam a profissão com o patrão (patroa).
Portanto, nas duas categorias, predominou as que aprenderam
a profissão com uma amiga, sozinhas ou com outras pessoas
diferentes das citadas na pesquisa (uma prima, a mãe, uma vizi-
nha, etc.). Neste sentido, considerando os resultados das duas
categorias, conclui-se que há consonância dos mesmos com os
dados que tratam da participação ou não dessas trabalhadoras
em cursos de capacitação. Pelos dados coletados na presente
pesquisa, mais de 70% das trabalhadoras nunca participaram
de curso de capacitação específica, razão pela qual se justifica
que tenham apreendido a profissão por meio de contato com
pessoas do cotidiano, a exemplo de uma amiga, da patroa, de
outras pessoas e até sozinhas.
Essa conclusão reforça a questão da baixa capacitação das
trabalhadoras que integram a categoria das domésticas, uma
vez que o aprendizado não se deu por meio de treinamentos
ou cursos de formação específicos, e sim, por meio da transfe-
rência informal de conhecimentos, de habilidades ou de com-
petências, de outras pessoas, para elas. Também se concluiu na
presente pesquisa que a maioria das trabalhadoras domésticas
das duas categorias estudadas, não teve vínculo empregatício
formal, anterior ao trabalho como domésticas que este fato
guarda relação de coerência com a questão da faixa etária em
que ingressaram na profissão, pois, conforme analisado, entre
as trabalhadoras sindicalizadas e não sindicalizadas, 59,3% e
65,7%, respectivamente, ingressaram na profissão entre 10 a
235

20 anos de idade. Portanto, é possível concluir que é pouco


provável que com uma idade tão baixa, estas pessoas possam
ter tido algum tipo de vínculo empregatício formal, anterior ao
trabalho como domésticas.
Com base nos dados obtidos na pesquisa, também se che-
gou à conclusão que nas duas categorias – A (71,4%) e B (60%),
a maioria possui outros familiares atuando como empregadas
domésticas, o que confirma o que está amplamente difun-
dido na bibliografia especializada que indica que por ser uma
profissão majoritariamente ocupada por mulheres negras, de
baixa renda e de pouca escolaridade, é comum que seja um
trabalho característico do núcleo familiar, inclusive por falta de
oportunidades para que possam ingressar em outros postos de
trabalho.
Ao identificarem os parentes que também atuam como
trabalhadoras domésticas, os dados levam à conclusão de que
o parentesco, entre as trabalhadoras sindicalizadas, foi de mãe
(24,3%), seguido de tia e de irmã, com o mesmo percentual
(22,9%). Entre as trabalhadoras não sindicalizadas, os paren-
tescos predominantes foram de irmã (36,5%), seguido de mãe
(25%) e de tia (15%).
Por fim, registro que tanto os resultados decorrentes da
revisão bibliográfica, do aporte teórico de diversos estudiosos,
associados aos resultados da pesquisa aplicada em 07 (sete)
cidades do Brasil, inclusive na análise de conteúdo das questões
subjetivas, me leva a concluir que, apesar das conquistas decor-
rente da nova legislação trabalhista brasileira (EC nº72/2013,
regulamentada pela Lei Complementar nº 150/2015), não põe
um ponto final nos desafios da categoria no que diz respeito
ao enfrentamento da desvalorização e da invisibilidade social.
Se por um lado, as trabalhadoras domésticas conquistam uma
236

equiparação de direitos trabalhistas sem precedentes na histó-


ria do país, por outro lado, a luta deverá continuar no que se
refere à superação e/ou ruptura de uma realidade histórico-cul-
tural e social, que coloca a profissão de domésticas no centro de
uma relação social, marcada por fortes indicadores de gênero,
de classe e de raça. A conquista dos direitos recentes não repre-
senta um ponto final - é, apenas, um ponto de reticências. A
conversa não se encerra com este livro. A conversa segue com
novos contextos e novos protagonistas.
De minha parte, expresso o contentamento por apresentar
este trabalho, ainda maior quando posso afirmar que ele foi
fruto de um trabalho realizado por vários meses, no contato
direto com as trabalhadoras domésticas, sindicalizadas ou não
sindicalizadas. Foi um processo longo e intenso, permeado pelo
contato com múltiplas histórias de vidas, marcadas por afli-
ções, alegrias, tristezas, prantos e muita luta – que promoveu
avanços.
Na condição de pesquisador, desde o olhar tantas vezes frio
da academia, posso ressaltar que este convívio com mulheres
trabalhadoras que protagonizaram a escrita de mais uma página
na história secular de luta em prol da conquista plena de direi-
tos laborais, fazer essa pesquisa foi uma oportunidade única
de inestimável aprendizado. Num contexto de discriminação
e de invisibilidade social, essas mulheres valentes souberam
construir-se no processo – se fizeram fortes, pelas vozes fir-
mes nos múltiplos espaços políticos. A nova Lei que garantiu a
integralidade dos direitos laborais às trabalhadoras domésticas
brasileiras é uma nova carta de alforria que demarca um novo
tempo – de maior valorização e de mais visibilidade social.
237

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Sobre o livro

Projeto Gráfico e Editoração Leonardo Araujo


Design da Capa Erick Ferreira Cabral
Imagem da Capa Pixabay
Revisão Linguística Antonio de Brito Freire
Normalização Técnica Antonio de Brito Freire

Impressão Gráfica Universitária da UEPB


Formato 15 x 21 cm
Mancha Gráfica 10,5 x 16,5 cm
Tipologias utilizadas Adobe Caslon Pro 12 pt

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