Sintese Ofiolitos
Sintese Ofiolitos
Geociências
Geosciences
Síntese sobre ofiolitos:
evolução dos conceitos
Synthesis about ophiolites: evolution of concepts
niart, em referência aos serpentinitos em cinturões montanhosos, submetidos contexto da teoria emergente da Tectô-
de mélanges. O termo foi redefinido em a processos de diferenciação in situ. nica de Placas. Essa analogia foi confir-
1821 e passou a designar uma suíte mag- Em seu artigo da Geological Socie- mada na Primeira Conferência Penrose
mática, composta por rochas ultramáfi- ty of America - Special Paper 62, Hess sobre ofiolitos, em 1972, com a definição
cas, gabro, diabásio e rochas vulcânicas, (1955) criticou o conceito de ofiolito uti- da sequência pseudoestratigráfica ideal
descritas na região dos Apeninos (Dilek, lizado por Steinmann (1927) enfatizando de um complexo ofiolítico, utilizando-se
2003a). Estudos iniciais, desenvolvidos “é confusa a relação entre os diversos o enxame de diques em lençol como mar-
previamente aos conceitos de Tectônica membros de uma sequência ofiolítica cador do processo de espalhamento de
de Placas, correlacionavam os complexos frente ao ciclo tectônico”. Fazendo uma fundo oceânico. Nessa época, o desen-
ofiolíticos a intrusões in situ dentro de correlação entre serpentinitos e perido- volvimento de ofiolitos ao longo das ca-
geossinclinais (e.g. Benson, 1926; Stein- titos do tipo-alpino (termo de Benson) deias meso-oceânicas (MOR) antigas era
mann, 1905, 1927). A síntese de Stein- aos processos orogênicos e de formação o modelo mais aceito pela comunidade
mann (1927), por exemplo, destacou a de montanhas, Hess (1955) argumentou geológica (ver detalhes em Dilek 2003a).
ocorrência, nas cadeias montanhosas do que os serpentinitos e as rochas da “Trin- Estudos geoquímicos de detalhe muda-
Mediterrâneo, de peridotito (serpentini- dade de Steinmann” eram comuns em ram essa visão no início da década de
to), gabro e diabásio/espilito em associa- arcos-de-ilha e que estes representavam 1970 e sugeriam a associação de magmas
ção com rochas sedimentares de fundo um estágio inicial no desenvolvimento de com zonas de subducção (ZSS). Miyashi-
oceânico (e.g. chert, argilito e calcário), um sistema montanhoso do tipo-alpino. ro (1973) relacionou a gênese do ofiolito
interpretando a sequência como derivada Segundo Dilek (2003a), Hess (1955) ad- de Troodos (Chipre) com processos de
de processos ígneos consanguíneos - ou vogava uma origem em um sistema de suprassubducção em sistema de arco-de-
produto de diferenciação magmática - arco-de-ilha para a associação máfico- ilha. O paradigma envolvendo a concei-
durante a evolução de eugeossinclinais. ultramáfica e peridotitos serpentinizados tuação de complexos ofiolíticos, entre-
Essa interpretação levou à formulação encontrados em sistemas orogênicos. tanto, somente permitiu definir ofiolitos
do conceito amplamente divulgado e Além disso, Hess (1955) sugeriu que a de zona de suprassubducção no início da
denominado “Trindade de Steinmann”, Cadeia Meso-Oceânica do Atlântico década de 1980. Estudos petrológicos
referente a uma sequência composta por representasse uma “orla de serpentina” e geoquímicos de ofiolitos mundiais ao
serpentinito - diabásio/espilito - chert. O desenvolvida como resultado de serpen- longo das décadas de 1980 e 1990 (e.g.
geólogo australiano W.N. Benson (1926) tinização e deserpentinização de grandes Serri, 1981, Leterrier et al., 1982, Nico-
interpretava as ocorrências de peridotito volumes de peridotito. Esse modelo, co- las, 1989) demonstraram a importância
e serpentinito nas cadeias montanhosas nhecido como “Crosta do tipo-Hess”, dos fluidos derivados de zonas de supras-
como intrusões plutônicas em rochas se- sugeria que a maior parte da crosta oce- subducção no desenvolvimento dos mag-
dimentares dobradas de um sistema geos- ânica fosse composta por serpentinitos e mas ofiolíticos; antearco, arco embrioná-
sinclinal e utilizou o termo “Peridotitos que a interface entre a crosta serpentini- rio e retroarco se tornaram os ambientes
do tipo-alpino” para identificar a sequ- zada e o peridotito subjacente represen- tectônicos mais aceitos em uma zona de
ência ultramáfica. Essa interpretação, tasse a Descontinuidade Moho. suprassubducção (Dilek, 2003a, Moores,
no entanto, diferia daquela apresentada Em meados da década de 1960, o 2003, Pearce, 2003). Diversas conferên-
por Steinmann (1927) e propunha que reconhecimento de enxames de dique cias temáticas, ao longo dos últimos 30
Peridotitos do tipo-alpino não tivessem em lençol (sheeted dikes) extensionais, anos, foram fundamentais para entender
uma conexão espacial, temporal e gené- da existência de uma unidade mantélica as sequências ofiolíticas, incluindo os
tica com as rochas gabróicas, diabásicas refratária representada por peridotitos Simpósios de Troodos em 1979 e 1987
e vulcânicas (espilíticas) comumente en- com texturas de deformação de alta tem- (Panayiotou, 1980, Malpas et al., 1990),
contradas em uma associação ofiolítica. peratura, da câmara magmática fóssil a Conferência de Omã em 1990 (Peters
O termo peridotito do tipo-alpino, tam- (fossil magma chamber) em sequências et al., 1991) e a segunda Conferência
bém conhecido como termo de Benson, plutônicas e da natureza alóctone dos Penrose sobre ofiolitos e crosta oceânica
se propagou na literatura geológica, na ofiolitos foi essencial para a formulação - em conjunto com os resultados do Pro-
época, em referência aos corpos ultramá- do modelo de sequência ofiolítica e da grama Ocean Drilling - em 1998 (Dilek
ficos irregulares a elípticos que ocorriam análoga “crosta oceânica-ofiolítica” no et al., 2000).
tica. Pode apresentar espessura muito das aos diques. A unidade contém mapeáveis são comuns. Admitindo-se
variada e diversas vezes é cortado por gabros isotrópicos, correlacionáveis que ofiolito seja representante da litosfera
diques de diabásio. a intrusões tardias, e gabros acama- oceânica, ou seja, crosta oceânica e par-
- Sheeted dikes ou enxame de diques dados, muito comumente associados te do manto superior, o uso deste termo
em lençol, encontra-se em contato aos cumulados máfico-ultramáficos deveria ser independente da sua suposta
nítido com as rochas vulcânicas so- (cromita + plagioclásio + clinopiro- origem (Anônimos, 1972)”.
brejacentes, com espessuras métricas xênio) presentes na base da unidade. A definição da Conferência Penro-
a decamétricas. Os diques apresen- É importante ressaltar a presença de se não aborda os mecanismos de posicio-
tam composição toleítica e zonas de corpos intrusivos de composição pla- namento dos ofiolitos no continente. A
resfriamento assimétricas. É possível giogranítica (diorito a tonalito) asso- publicação não define um complexo ofio-
identificar, dentro da unidade, várias ciados às rochas gabróicas. lítico com base em ambientes tectônicos
gerações de diques de diabásio que se - Complexo ultramáfico, caracteristica- ou em sua origem ígnea. Moores (2002),
cortam mutuamente. mente remanescente de manto suboce- em síntese sobre os ofiolitos Pré-Rodí-
- Complexo máfico plutônico, domi- ânico, composto por proporções variá- nia, aponta problemas associados com
nantemente composto por rochas ga- veis de harzburgito, lherzolito e dunito, a sequência ofiolítica do tipo-Penrose;
bróicas. A transição deste complexo usualmente com textura tectônica meta- o principal é que a maioria dos comple-
com os sheeted dikes é marcada pelo mórfica (mais ou menos serpentinizada). xos não apresenta a sequência completa,
aumento das fatias de gabro associa- Contatos falhados entre unidades como prediz a definição de 1972.
Figura 1
Sequência ofiolítica completa de acordo
com a definição da Conferência Penrose
(Anônimos 1972), típica de centros de
espalhamento rápido (Moores, 2002).
Complexos ofiolíticos mostram tinção entre os ambientes de dorsal e de “Ofiolitos de zonas de suprassub-
grande variedade de estrutura interna, bacia marginal. Miyashiro (1973), com ducção (ZSS) apresentam características
pseudoestratigrafia e padrões geoquí- base em análises químicas de elementos geoquímicas de arcos-de-ilha mas a es-
micos, sugerindo distintos ambientes de maiores e traços de basaltos, argumenta- trutura da crosta oceânica evidencia que
geração. Ofiolitos se formam em diferen- va que o Ofiolito de Troodos (Chipre) te- foram formados pelo espalhamento do
tes estágios do “Ciclo de Wilson”, com ria sua origem associada a um ambiente assoalho diretamente acima da litosfera
subsequente incorporação nas margens de arco-de-ilha. Nessa mesma época, Pe- oceânica subductada. Este tipo ofiolí-
continentais por meio de eventos orogê- arce e Cann (1973) definiram diagramas tico difere do MORB nas sequências
nicos colisionais e/ou acrescionários (ob- de discriminação entre ofiolitos gerados mantélicas, na presença mais comum
ducção). É consenso entre os autores que em dorsais meso-oceânicas e em zonas de depósitos de cromita podiforme e na
os principais ambientes produtores de de suprassubducção, utilizando elemen- cristalização de clinopiroxênio anterior
crosta oceânica incluem dorsais meso- tos menores e traços (e.g. gráfico ternário ao plagioclásio, refletindo a abundância
oceânicas, bacias de arcos-de-ilha juve- Ti/100 vs. Zr vs. Yx3). Segundo Nicolas de wehrlito relativamente ao troctolito
nis, bacias de antearco e retroarco. e Boudier (2003), esses diagramas foram na sequência cumulática. A maioria dos
Conforme brevemente aborda- amplamente aplicados para a maioria mais bem preservados ofiolitos nos cin-
do no item 1 e aqui enfatizado, cadeias dos ofiolitos mundiais, sendo que o re- turões orogênicos é do tipo ZSS”.
meso-oceânicas eram tidas como o cen- sultado imediato foi a conclusão de que, Pearce (2003) aponta três ambien-
tro de geração de ofiolitos até a década pelo menos aparentemente, a maioria dos tes geradores de ofiolitos exclusivamente
de 1970. O conceito de formação de se- remanescentes oceânicos tinham origem do tipo ZSS: subducção sob uma dorsal,
quências ofiolíticas em bacias marginais em bacias marginais. O termo “ofiolitos subducção de uma dorsal com formação
foi primeiramente proposto por Dewey de suprassubducção” foi formalmente de ofiolitos em zonas de ante-arco e sub-
e Bird (1971 in Pearce 2003), por meio definido por Pearce et al. (1984), como ducção de uma dorsal com formação de
de critérios geológicos que faziam a dis- mostrado a seguir: ofiolitos na placa descendente. No pri-
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Síntese sobre ofiolitos: evolução dos conceitos
meiro e segundo casos, o espalhamento com o autor, os principais eventos podem - Ressurreição: posicionamento da sequ-
oceânico ocorre no antearco; no terceiro ser resumidos da seguinte maneira: ência ofiolítica em uma margem conti-
exemplo, o espalhamento ocorre na pla- - Nascimento: formação em uma zona de nental passiva.
ca subductada (Figura 2). Ainda segundo subducção nascente ou reconfigurada. Shervais (2000) ressalta que esses
o autor, bacias de retroarco apresentam - Juventude: continuada fusão da cunha eventos, geralmente, progridem em or-
composições altamente variáveis, gradan- mantélica e acresção crustal. dem cronológica, mas que nem todos
do de MORB a ZSS, com todos os termos - Maturidade: início do vulcanismo do os ofiolitos de ZSS mostram os cinco
intermediários entre os dois extremos. arco semiestável, frequentemente de estágios evolutivos. Os estágios do “nas-
Uma síntese apresentada por Shervais caráter cálcio-alcalino, quando a sub- cimento” e da “juventude” são comuns
(2000) mostra o “ciclo de vida” de ofiolitos ducção está matura e estável. a todos os complexos, refletindo sua for-
do tipo ZSS, considerando a evolução e o - Morte: repentino término da subducção, mação original na placa superior de uma
posicionamento desses corpos. De acordo geralmente devido à colisão continental. zona de subducção.
OFIOLITOS DO OFIOLITOS DO
TIPO MORB TIPO ZSS
Margem oceânica
Subducção sob uma dorsal
Bacia de retroarco
Figura 2
Subducção de dorsal Sumário das principais características e
ambientes tectônicos associados a
ofiolitos do tipo MORB e ZSS
Subducção oblíqua
(modificado de Pearce, 2003).
Diversos esquemas de classificação das rochas ultramáficas e vulcânicas Um novo e moderno esquema clas-
de ofiolitos, com base em características máficas. A década de 1980 constitui um sificatório, proposto por Dilek (2003a),
petrológicas e geoquímicas, ambientes marco na história de classificação dos considera sete tipos específicos de ofioli-
tectônicos e padrão de posicionamento ofiolitos, sendo introduzido o conceito tos, levando-se em consideração os am-
das sequências no continente, foram de- de “ambiente tectônico” aos trabalhos bientes tectônicos de geração e os meca-
senvolvidos ao longo dos últimos trinta e publicados. Uma síntese cronológica dos nismos de posicionamento dos mesmos
cinco anos. Na década de 1970, os princi- principais modelos classificatórios, ante- em diferentes tipos de cinturões orogêni-
pais trabalhos levavam em consideração, riores àquele proposto por Dilek (2003a), cos (e.g. colisional versus acrescionário)
especialmente, a afinidade geoquímica é apresentada na Tabela 1. (Tabela 2).
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Síntese sobre ofiolitos: evolução dos conceitos
integra a sequência e (b) transformações Os elementos do grupo da platina racterísticas propícias para a forma-
ou adições que essas concentrações irão (EGP) se concentram nas rochas ígne- ção de depósitos do tipo sulfeto maciço
sofrer ao longo da história orogênica do as máficas e ultramáficas (Figura 3). hidrotermal-vulcanogênico (VHMS),
ofiolito, incluindo metamorfismo, defor- Todos elementos são, marcantemente, fontes de Cu, Zn ± Au (Figura 3). Es-
mação, hidrotermalismo, intemperismo e calcófilos e siderófilos; Os, Ir e Ru estão ses depósitos mostram acumulações es-
erosão. associados, como sulfetos ou ligas me- tratiformes de sulfetos formados pela
Uma síntese das principais minera- tálicas, e formam inclusões em cromiti- precipitação de fluidos hidrotermais em
lizações encontradas em uma sequência tos; Pt, Pd e Rh se concentram fora de- um ambiente submarino e ocorrem em
ofiolítica completa e ideal, de acordo com les como sulfetos. Na Faixa Brasília, em terrenos caracterizados pela presença
a definição da Conferência Penrose, é Abadiânia, em zonas de hidrotermalis- de rochas vulcânico-vulcanoclásticas e
apresentada a seguir. Na seção ultramá- mo, os teores de Au chegam a 8272ppb sedimentos associados (Sangster, 1998).
fica, os depósitos de cromita, geralmen- e os de EGP, até 252ppb (e.g., Suita et Cerca de 20% dos depósitos mundiais do
te, localizam-se na base da sequência de al., 2004). Os ofiolitos ricos em EGPs tipo VHMS estão encaixados em sequ-
cumulados, sob a forma de camadas, ou são os formados por altas taxas de fu- ências ofiolíticas, com origem em cadeias
como pods (cromita podiforme), na sequ- são mantélica, que originam magmas meso-oceânicas e, subordinadamente,
ência harzburgítica – que pode estar tec- boniníticos (e.g. zonas de suprassub- em zonas de subducção intraoceânicas e
tonizada ou não (Paixão, 2009; Figura ducção). Neste caso, os platinóides se bacias de retroarco. Guias de exploração
3). Depósitos de asbestos estão associa- concentram na cristalização por proces- de depósitos VMS em ofiolitos incluem:
dos a fraturas preenchidas por crisotila sos magmáticos. Os ofiolitos formados (a) identificação de um estrato vulcâni-
nos peridotitos mantélicos serpentiniza- por taxa de fusão mantélica insuficien- co submarino; a presença de pillow la-
dos e podem alcançar espessuras de de- te para liberar os EGPs são os do tipo vas e de sedimentos químicos deve ser
zenas de metros. Níquel e cobalto ocor- MORB, como Lizard - Cornwall, Rei- confirmada na área de prospecção; e (b)
rem como resultado de enriquecimento no Unido. Minerais do grupo da plati- alguma evidência de atividade exalativa
supergênico nas rochas ultramáficas, na (MGP) também são encontrados nos deve ser observada. Camadas ou lentes
formando grandes depósitos econômicos ofiolitos e compreendem fases magmáti- de chert devem ser estudadas com base
- Ni laterítico em Cuba e Nova Caledônia cas, como laurita (RuS2), sulfetos de Pt e em elementos com assinatura geoquími-
e Co laterítico em Bou Azzer-Marrocos, Pd e liga Os-Ir (Prichard, 2004). ca exalativa, tais como Mn, Fe, Ba, Zn e
por exemplo. Complexos ofiolíticos exibem ca- Pb (Sangster, 1998).
Figura 3
Coluna esquemática de uma seção
ofiolítica evidenciando a distribuição
dos principais depósitos minerais
(Castroviejo, 2004, Prichard, 2004,
Suita et al., 2004).
O Proterozoico Superior é repre- ção de bacias oceânicas Pan-Africanas- do Pacífico; um segundo pico impor-
sentado por três grandes pulsos de gera- Brasilides (e.g. oceano Moçambicano), tante, na geração de ofiolitos, diz res-
ção de ofiolitos - ca. 700 Ma, 780-740 como resultado da quebra do supercon- peito ao Cretáceo Superior (ca. 90 Ma,
Ma e 860-820 Ma. Os complexos asso- tinente Rodínia e na configuração do dominantemente ofiolitos Tethyanos).
ciados a esse período concentram-se na Gondwana Ocidental (Dilek, 2003a,b; Pulsos ofiolíticos de segunda ordem
América do Sul, África e Arábia, menos Stern, 2008). são observados nos períodos Permiano
na Europa Central e Oriental, no Cáu- No Fanerozoico, o pulso ofiolíti- Superior-Triássico Inferior (ca. 250-230
caso Inferior, na Ásia Central e noroes- co mais importante situa-se no perío- Ma), Devoniano Inferior-Siluriano (ca.
te da Índia. Nos cinturões afroarábico e do entre 180-140 Ma, quando foram 440-400 Ma) e Cambriano Superior-
na América do Sul, os ofiolitos neopro- formados os ofiolitos Tethyanos, Cari- Ordoviciano Inferior (500-460 Ma)
terozoicos estão relacionados à evolu- benhos e alguns associados ao Círculo (Dilek 2003b).
7. Ofiolitos no Brasil
Os remanescentes oceânicos bra- nente. Ofiolitos mais antigos, de idades predominantemente, representados por
sileiros, em sua grande maioria, ocor- mesoproterozoica e paleoproterozoica, rochas metaultramáficas e/ou metamáfi-
rem nas faixas orogênicas brasilianas, ocorrem na Faixa Sunsás-Aguapeí, ao cas, plutônicas, acamadadas ou maciças,
registrando o consumo dos oceanos no sul do Cráton Amazônico, e no Terre- eventualmente com corpos de cromita
Neoproterozoico, e estão associados a no Alto Moxotó, na Província Borbore- podiforme, nodular ou disseminada. São
ambientes colisionais do tipo continen- ma, respectivamente (Figura 4; Suita et corpos alóctones, desmembrados, peque-
te - arco-de-ilha e continente - conti- al., 2004). Os ofiolitos brasileiros são, nos a muito pequenos, tectonicamente
Figura 4
Localização das associações ofiolíticas
nas faixas móveis brasileiras
(Suita et al., 2004).
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Gláucia Nascimento Queiroga et al.
intercalados com sequências metavulca- Nd dessas rochas indicam valores iniciais primeiras (Paixão, 2009). No ofiolito do
no-sedimentares ou metassedimentares. de εNd positivos (+1,8 a +6,3). Estudos Quatipuru, pods de cromitito métricos
Geralmente, esses corpos exibem meta- geocronológicos U-Pb em zircões de pla- estão hospedados nas rochas ultramá-
morfismo de fácies xisto verde a anfibo- giogranito oceânico evidenciam idade de ficas e associam-se, espacialmente, com
lito, sendo raros os de grau metamórfico cristalização magmática de 646 ± 3 Ma. diques mantélicos. Ocorrências menores
mais alto (e.g. eclogitos e retroeclogitos Essa idade indica a época de geração de de lateritas enriquecidas em elementos
localizados nas regiões de São Sebastião crosta oceânica na bacia Macaúbas, pre- do grupo da platina (EGP) também são
do Paraíso e Pouso Alegre, sul de Minas cursora do Orógeno Araçuaí (Queiroga relatadas por alguns autores (e.g. Suita et
Gerais; Suita et al., 2004; Pinheiro & et al., 2007, Queiroga, 2010). al., 2004).
Suita, 2009). No setor central da Faixa Brasília, Na Faixa Ribeira, setor central da
As sequências ofiolíticas mais co- ocorrem corpos metaultramáficos com Província Mantiqueira, os restos ofio-
nhecidas do Brasil ocorrem nas faixas cromititos podiformes (e.g. Abadiânia, líticos estão representados por rochas
Araçuaí, Brasília, Araguaia e Ribeira Morro do Feio e Cromínia), que pos- metamáficas dos grupos São Roque e
(Figura 4). Na Faixa Araçuaí, remanes- suem anomalias de platina e/ou ouro em Açungui, com assinaturas desde assoa-
centes de rochas de assoalho oceânico zonas de cisalhamento e hidrotermalis- lho oceânico a toleítos de arco-de-ilha e
têm sido descritos na literatura geológi- mo (Suita et al., 2004). Na porção sul da idades U-Pb entre 628 e 608 Ma (Suita
ca desde 1990. O mais completo desses Faixa Araguaia, ocorre um dos mais im- et al., 2004). Maiores detalhes sobre os
registros é o ofiolito de Ribeirão da Fo- portantes e mais bem estudados ofiolitos complexos ofiolíticos do Brasil e respec-
lha - São José da Safira, uma associação brasileiros, o Complexo Quatipuru. Tra- tivos potenciais metalogenéticos podem
tectonicamente desmembrada, composta ta-se de um ofiolito com extensão de 40 ser encontrados na síntese apresentada
por rochas metamáficas e metaultramá- km e largura variável entre 600 metros por Suita et al. (2004) e nos trabalhos de
ficas encaixadas em pacotes de xistos a 2,4 km, com orientação preferencial Strieder e Nilson (1992), Navarro e Za-
pelíticos com intercalações de meta- a N-S e algumas inflexões nas direções nardo (2005) e Pinheiro & Suita (2008),
chert sulfetado, diopsidito e formações NE-SW e NW-SE, que originam um as- para os complexos da Faixa Brasília; Pe-
ferríferas bandadas, metamorfisados pecto sigmoidal em mapa. É constituído, drosa-Soares et al. (1998) e Queiroga et
em fácies anfibolito. As características predominantemente, por serpentinitos al. (2007), para os ofiolitos do Orógeno
petrográficas e geoquímicas das rochas com um envelope de listwanito – asso- Araçuaí; Tassinari et al. (2001), para o
metamáficas e metaultramáficas indicam ciação de finas camadas de talco-clorita ofiolito da Faixa Ribeira; e Paixão et al.
afinidade ofiolítica e origem em ambiente xisto e espessas camadas de rocha sílico- (2008) e Paixão (2009), para o Comple-
de fundo oceânico. Dados isotópicos Sm- hematítica que predominam sobre as xo Quatipuru – Faixa Araguaia.
Figura 5
Localização do ofiolito Voykar -
Montes Urais Polares, Rússia
(ofiolito em destaque na figura;
modificado de Pertsev et al. 2003).
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Síntese sobre ofiolitos: evolução dos conceitos
A B C
Figura 6
Perfil geológico ao longo do rio Lagortaju,
na seção-tipo do ofiolito Voykar.
A) Peridotito serpentinizado.
D E B) Piroxenito.
C) Gabro.
D) Dolerito/diabásio com
fenocristais de plagioclásio
orientados por fluxo magmático.
E) Plagiogranito datado pelo
método U-Pb (LA-ICP-MS).
- Dolerito/diabásio: correlacionável à intuito de se obterem dados mais con- e 1,09, típicas de grãos derivados de ro-
seção subvulcânica da sequência ofio- fiáveis, foi coletada amostra de plagio- chas magmáticas. Levando-se em con-
lítica. Enfatiza-se a presença de bolsões granito para datação pelo método U-Pb sideração os cristais mais concordantes
e vênulas de plagiogranito encaixados LA-ICP-MS (Figura 6). Foram analisa- (< 10% de discordância), conclui-se que
em rochas doleríticas isotrópicas. dos 16 spots em 16 cristais de zircão com a idade 206Pb/238U de 427 ± 7 Ma é a
Dados isotópicos Sm-Nd – rocha tamanho médio de 100 µm, límpidos e melhor aproximação para o evento de
total, na sequência máfico- ultramáfica, com poucas inclusões. Os cristais anali- cristalização magmática das amostras de
disponíveis para o maciço, indicam um sados possuem conteúdos de U e Th no plagiogranito e, consequentemente, para
período de cristalização em cerca de 387 intervalo entre 11-356 ppm e 4-390 ppm, a geração de crosta oceânica no setor po-
± 34 Ma (Saveliev et al., 1999). Devido respectivamente, com razões 232Th/238U lar dos Montes Urais - Rússia (maiores
à falta de precisão dessa datação e com relativamente altas, variando entre 0,24 detalhes em Queiroga et al., 2010).
9. Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq pela aos Institutos Geológicos de Moscou e da ção científica e realização do trabalho de
bolsa de doutorado da primeira autora e República de Komi (Rússia) pela coopera- campo no Maciço Voykar, Urais Polares.
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Síntese sobre ofiolitos: evolução dos conceitos
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