Textualidades Seriadas Entre A Repetição, A Regularização e o Deslocamento - Dias
Textualidades Seriadas Entre A Repetição, A Regularização e o Deslocamento - Dias
Textualidades Seriadas Entre A Repetição, A Regularização e o Deslocamento - Dias
lingüística
2019: 55-74
Recibido: 23.02.2019 | Aceptado: 08.11.2019
Cristiane Dias*
Universidade Estadual de Campinas - Unicamp
Resumen
La comunicación en un sentido amplio fue resignificada por lo digital y por sus dis-
positivos (smartphones, e-readers, aplicaciones, redes sociales, etc.). Esta resignificación
se vincula al lenguaje, la escritura, la lectura y al texto. ¿Cómo leemos y escribimos con
esos dispositivos? ¿Con qué textualidades nos encontramos, hoy, en nuestra sociedad y
qué efectos producen en nuestra relación con los sentidos? Para reflexionar sobre estos
cambios, este artículo propone trabajar la noción de “textualidades seriadas”, sustentada
en el análisis discursivo del proceso de textualización de los memes, inscritos en una
“cultura de las series”. El objetivo del artículo es comprender cómo las “textualidades
seriadas” producen, por medio de la reformulación, el efecto de la repetición y de la
regularización del sentido.
*
É doutora em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas. É pesquisadora
do Laboratório de Estudos Urbanos (Labeurb/Nudecri-Unicamp). Atua como professora
permanente no Programa de Pós-Graduação em Divulgação Científica e Cultural (PPG-
DCC - LABJOR/IEL). É membro associado do Laboratório Pléiade - Paris 13. Desenvolve
pesquisa sobre o discurso digital, refletindo sobre a questão do sujeito e da produção de
sentidos; e sobre cidade, tecnologia e circulação do conhecimento. Email : crisdias@unicamp.
br.
55
56 Textualidades seriadas: entre a repetição, a regularização e o deslocamento, o caso dos memes
Abstract
Communication in its broad sense has been re-signified by everything that is digital
(smathphones, e-readers, applications, social networks, etc). This re-signification con-
cerns language, writing, reading and text. How do we read and write with these devices?
What textualities do we face today in our society and what effects do they produce on our
relationship with the senses? To reflect on these changes, this article proposes to work
on the notion of “serial textualities”, based on the discursive analysis of the process of
textualization of memes, enrolled in a “series culture”. The purpose of the article is to
understand how “serial textualities” produce, by means of reformulation, the effect of
repetition and regularization of meaning.
1. Introdução
A “cultura das séries”, tal como apontou Silva (2014), se constitui a partir de
condições de produção específicas relativas ao surgimento de uma forma narrati-
va, de um contexto tecnológico digital, e por fim, de uma sociedade de consumo.
A noção de forma material, como apontei anteriormente, diz respeito à questão
da forma sem destacá-la das condições históricas de sua produção, nesse caso,
a das tecnologias digitais e da sociedade de consumo. É sobre esse aspecto que
gostaria de me debruçar, no sentido de mostrar como língua e história se consti-
tuem materialmente na forma de distintas textualidades. Mas é preciso mostrar
também que “a relação da língua com a história não é perfeitamente articulada”,
isso porque “o texto vai-se abrir para as diferentes possibilidades de leituras que
mostram que o processo de textualização do discurso se faz com “falhas”, com
“defeitos”” (Orlandi, 2001:64), a isso chamamos equívoco. Vejamos um exemplo.
No ano de 2015 um grupo de forró brasileiro lançou a música chamada “Sex-
tou”. O neologismo, que significa algo como “diversão, chegou a sexta-feira”, vi-
ralizou com uma versão da música feita pelo cantor Wesley Safadão. A partir daí
a #sextou passou a ser largamente utilizada pelos brasileiros nas redes sociais,
inclusive em muitos memes. Em 2018, porém, ela foi bloqueada na rede social
Instagram porque estrangeiros a confundiram com a expressão sex-to-U= sex to
you, que em inglês significa “sexo para você”, o que produziu uma grande quan-
tidade de postagens de pornografia no Instagram.
É interessante observar que, nesse caso, as distintas possibilidades de leitura da expres-
são “sextou”, em línguas diferentes, produzem para a mesma forma material sentidos di-
versos. Em outros termos, diremos que o processo de textualização do discurso na forma
material “sextou” se fez com falha, equívoco, por causa da relação da língua com a história,
com a memória histórica. Nesse sentido, “o equívoco é constitutivo da discursividade”, uma
vez que a falha da língua se inscreve na história para significar.
Figura 1. Captura de tela do exemplo notável do meme Barbie e Ken Cidadãos do bem.
Fonte: #MUSEUdeMEMES
Estrutura da repetição
“só eu que não x?”
“só você”.
y
z
w
.....
5. Escrita corpográfica
não se trata de uma imagem qualquer, mas de uma imagem que está ligada dire-
tamente ao discurso digital pela sua formulação, circulação e constituição (Orlan-
di, 2001). Termos que, de modo específico, vinculam-se ao digital já foram eleitos
pelo Oxford em anos anteriores como palavras do ano. Em 2013, foi a palavra
selfie. Em 2012, GIF, sigla que ganhou o estatuto de palavra, foi incluída no re-
ferido dicionário como verbo. Podemos, assim, dizer que o digital se apresenta na
base da produção discursiva das palavras que se destacaram ao longo dos últimos
anos. (Costa 2016: 90)
O digital tem, pois, produzido outras formas de relação do sujeito com a lin-
guagem, isso porque, mais do que uma tecnologia, ele é um processo discursivo
que tem efeitos nas práticas linguístico-discursivas, nos processos de significa-
ção. Nessa perspectiva, a noção de corpografia vai trabalhar a relação língua/
escrita, considerando sua dimensão afetiva numa escrita corpográfica, como po-
demos verificar no exemplo a seguir.
Sendo assim, a análise dos memes pode alargar a compreensão das textuali-
dades seriadas. A problemática produzida por Pêcheux (1999), a partir de Pierre
Achard, sobre a memória nos dá ancoragem teórica para tanto.
“entram para o hall da fama” e outras que seguem no cotidiano, validadas pelos
sujeitos conectados, ou seja, são palavras datadas, que caem em desuso, como
se se pudesse controlar o léxico de uma língua para impedir certos sentidos, por
decreto.
Pelo fato de ter sido um meme que teve bastante repercussão em pouco tempo,
redes sociais de empresas começaram a utilizá-lo. Em vez de ser a confirmação do
sucesso do meme, essa apropriação acabou se tornando o que “mataria” o meme,
de acordo com um post do Buzzfeed.7
8. Conclusão
Notas
1
http://www.museudememes.com.br/
2
Tradução minha. “L’observation de la même matérialité empirique ne laisse pas voir
(méconnaît) la diversité de la matérialité historique. Dans la perspective discursive
nous proposons de définir la langue par sa forme matérielle et non comme forme abs-
traite.”
3
Tradução minha. “L’observation de la même matérialité empirique ne laisse pas voir
(méconnaît) la diversité de la matérialité historique. Dans la perspective discursive
nous proposons de définir la langue par sa forme matérielle et non comme forme abs-
traite.”
4
Tradução minha. “À l’existence verticale, interdiscursive d’un système de formation
des énoncés assurant au discours la permanence structurelle d’une répétition, répond
Referências
Bauman, Z. 2001. Modernidade líquida. (Plínio Dentzien, Trad.). Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editora. Obra original publicada em 2000.
Costa, G. 2016. “A palavra do ano é uma imagem”, In: Fragmentum 48. 89-103. Disponível
em: https://periodicos.ufsm.br/fragmentum/article/view/23308/15107
Coelho, A. 2012.“Brace Yourselves, Memes are Coming” - Formação e
Divulgação de uma Cultura de Resistência através de Imagens da Internet. Dissertação
Mestrado em Mestrado em Divulgação Científica e Cultural, Universidade Esta-
dual de Campinas, São Paulo.
Courtine, J. J. 2016. Que objeto para a Análise de discurso?, in Conein B.; Courtine J.J,
Gadet F.; Marandin, J.M.; Pêcheux, M.. (orgs.) Materialidades discursivas. 9-335.
Campinas: Editora da Unicamp.
Courtine, J. J. 1981. “Quelques problèmes théoriques et méthodologiques en analyse
du discours, à propos du discours communiste adressé aux chrétiens”, in: Lan-
gages 62. 9-128. Disponível em: https://www.persee.fr/doc/lgge_0458-726x_1981_
num_15_62_1873.
Dias, C. 2018. Análise do discurso digital: sujeito, espaço, memória e arquivo. Campinas:
Pontes.
Dias, C. 2009. “A escrita como tecnologia de linguagem”, in: Scherer A. ; V. Petri & C.
Dias (orgs.) Tecnologia de linguagem e produção de conhecimento, Coleção Hipers@
beres, 7-17. Santa Maria : PPGL.
Dias, C. 2008. Da corpografia: língua e escrita na materialidade digital”. Santa
Maria: PPGL: UFSM.
Foucault, M. 2000. O que é um autor ? 4ta ed. (António Fernando Cascais e Eduardo Cor-
deiro, trad). Lisboa : Passagens. Obra original publicada em 1969.
Muniz, C. 2018. “Rir de si nas redes sociais: memes e autoderrisão”, in Discurso & Socie-
dad 12(3). 412-424.
Orlandi, E. 2014. “Discursos e museus: da memória e do esquecimento”, in Entremeios 9.
1-8
Orlandi, E. 2009. O que é linguística? 2da ed. São Paulo: Brasiliense.
Orlandi, E. 2006a. “História das ideias x história e vida. Entrevista com Eni Orlandi”, in
Fragmentum 7. 11-51 Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/fragmentum/arti-
cle/view/6349/3855.
Orlandi, E. 2006b. “Análise de discurso: conversa com Eni Orlandi”, in Teias 7 (13-14). 1-7
Orlandi, E. 2001. Discurso e texto. Campinas: Pontes.
Orlandi, E. 1998. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 2da ed.
Petrópolis: Vozes.
Orlandi, E. 1996. “La langue brésilienne (des effets de la colonisation sur la langue)”, in
Linx 8. 41-50. Disponível em: https://journals.openedition.org/linx/1139
Paveau, M.A. 2015. Linguagem e Moral. (Ivone Benedetti, trad.). Campinas: Editora da
Unicamp.
Pêcheux, M. 1999. Papel da memória. In. Achard, P. et al. Papel da memória. (José Horta
Nunes, Trad.) Campinas: Pontes. p. 49-57.
Pêcheux, M. 1995. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. (Eni Orlandi
et. al., trad.) 2da ed. Campinas: Editora da Unicamp.
Robin, R. 2016. A memória saturada. (Greciely Costa; Cristiane Dias, trad).
Campinas: Editora da Unicamp.
Silva, M. V. B. 2014. “Cultura das séries: forma, contexto e consumo de ficção seriada na
contemporaneidade”, in: Galaxia 27. 241-252.
Torres, C. C. 2017a. O discurso mêmico na construção de novas formas de linguagem sobre
divulgação científica através de mídias sociais. Dissertação de mestrado, Univer-
sidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem, Campinas, SP.
Torres, C. C. 2017b. “Aplicatização da memória: memória plástica digital”, in:
Entremeios 15. 357-367