Apostila de Psicogênese Da Lingia Escrita

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PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 3
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LEITURA E DA ESCRITA ....................................................... 4
SURGIMENTO DA ESCRITA ................................................................................................ 4
MÉTODOS ALFABETIZADORES TRADICIONAIS ............................................................... 7
MÉTODOS SINTÉTICOS ...................................................................................................... 9
MÉTODOS ANALÍTICOS .................................................................................................... 12
CARTILHAS ALFABETIZADORAS ..................................................................................... 15
PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA: CONTRIBUIÇÕES PARA A ALFABETIZAÇÃO ... 17
UMA PERSPECTIVA INOVADORA .................................................................................... 18
REFERÊNCIAS CONCEITUAIS.......................................................................................... 18
O OLHAR CONSTRUTIVISTA ............................................................................................ 19
CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET ........................................................................................... 20
NÍVEIS DE LEITURA .......................................................................................................... 23
NÍVEIS DE ESCRITA .......................................................................................................... 24
A SONDAGEM .................................................................................................................... 33
INTERAÇÕES COMO INSTRUMENTO AUXILIADOR NA APRENDIZAGEM ..................... 34
INTERAÇÃO GRUPAL ........................................................................................................ 35
PROFESSOR MEDIADOR .................................................................................................. 36
AMBIENTE ALFABETIZADOR ............................................................................................ 37
CONSEQUÊNCIAS GERADAS PELA PESQUISA .............................................................. 39
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 42

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INTRODUÇÃO

Vamos agora estudar algumas contribuições da língua escrita no processo de


aquisição do sistema de escrita alfabética partindo do surgimento da escrita e
referencias conceituais, a literatura especializada, muitas vezes, tem apontado para
o fato de que parte dos educadores possui uma visão distorcida sobre qual deve ser
a posição do aluno, neste processo de aquisição do sistema de escrita alfabética,
desmerecendo a capacidade que este tem para assumir uma postura ativa, diante
do processo de leitura e escrita.
Diante disto, para efetivar o conhecimento sobre o sistema alfabético, o aluno
não precisa simplesmente de ensinamentos externos, mas sim de oportunidades
para colocar à prova suas próprias elaborações, acerca do sistema notacional. Desta
forma, justifica-se a relevância deste estudo, que buscou ressaltar a importância da
alfabetização, em um mundo letrado como o atual, considerando que, apesar de todo
este valor, há aqueles alunos que não conseguem dominar o sistema de leitura e
escrita, deste modo, o foco desta pesquisa buscou priorizar, mais do que o produto
final do percurso da alfabetização, o processo gradual percorrido pela criança. Da
mesma forma, torna-se pertinente acentuar que levar em conta como são
estruturados os pensamentos dos educandos sobre a leitura e a escrita é um aspecto
indispensável para se atingir o êxito educacional.

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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LEITURA E DA ESCRITA

SURGIMENTO DA ESCRITA

A leitura e a escrita são habilidades


muito importantes em um mundo letrado
como o atual, pois é a partir deste tipo de
comunicação que o ser humano se torna
capaz de registrar suas próprias
informações e ideias, assim como abstrair
novos conceitos através do pensamento de
outras pessoas, uma vez que
A escrita, sistema simbólico que tem um papel mediador na relação entre
sujeito e objeto de conhecimento, é um artefato cultural que funciona como suporte
para certas ações psicológicas, isto é, como instrumento que possibilita a ampliação
da capacidade humana de registro, transmissão e recuperação de ideias, conceitos,
informações (OLIVEIRA, et al. 2002, p.63).
Como se pode observar, os primeiros registros deram vazão a uma nova
maneira de se viver, abrindo caminhos para interações sociais e alargando o
conhecimento humano. A escrita serviu, ainda, como um dispositivo capaz de marcar
graficamente mensagens para uma comunicação a distância, assim como um
documento para resgatar concepções já adquiridas, pois, para Oliveira,
A escrita seria uma espécie de ferramenta externa, que estende a
potencialidade do ser humano para fora do seu corpo: da mesma forma que
ampliamos o alcance do braço com o uso de uma vara, com a escrita ampliamos
nossa capacidade de registro, de memória e de comunicação (2002, p.63).
Diante disso, pode-se deduzir que, a partir do momento que o ser humano
domina a escrita, este passa a expandir seus conceitos, por meio de registros, para
o meio no qual está inserido. Conforme salienta Barbosa, a escrita, [...] vai surgir pela
primeira vez no mundo antigo, num momento histórico caracterizado pelo
desenvolvimento simultâneo de uma série de elementos diversos, a que chamamos
civilização [...] Observando os fatores geográficos, sociais e econômicos que

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conduzem ao desenvolvimento de uma civilização, notamos que o complexo de


condições que se origina nesse momento histórico não poderia funcionar se não
existisse a escrita (1994, p.34).
Como se pode observar, para o autor, a civilização se expandiu junto ao
surgimento da escrita. Segundo o exposto, o notável desenvolvimento que aprimorou
a situação social da era só foi possível graças ao aparecimento dessa nova marca
gráfica. Ou seja, a evolução de uma civilização não seria possível sem os benefícios
e auxílios do registro, mas também, a escrita não se fortaleceria em um mundo não
civilizado. Vale salientar que, apesar de a comunicação escrita se estabelecer no
mundo antigo, na era pré-histórica já existia a preocupação do homem primitivo em
reproduzir mensagens e registrar conceitos originando o início de um sistema de
representação. Torna-se pertinente mencionar que o homem, através dos tempos,
vem buscando comunicar-se com gestos, expressões e com a fala. A escrita tem
origem no momento em que o homem aprende a comunicar seus pensamentos e
sentimentos por meio de signos (BARBOSA, 1994, p.34).
Nota-se, portanto, que antes da eclosão da civilização já surgiam indícios de
uma comunicação estabelecida simbolicamente. Graças a capacidade do homem em
transpor suas ideias em signos, emergiu-se assim, traços baseados na implantação
de uma unidade linguística que englobava um significante e um significado.
Gradativamente, o homem se empenhou em aperfeiçoar esses signos, objetivando
estabelecer uma comunicação clara que estivesse ao alcance de todos.
Diante da exigência de se instaurar uma comunicação compreensível, Cócco
e Hailer (1996, p.16) frisam que esta necessidade “[...] deu origem aos primeiros
pictogramas com intenção expressa de comunicar, embora esses desenhos
primitivos não assegurassem uma mensagem precisa para seus semelhantes”.
Percebe-se, assim, que na era pré-histórica, o homem aprendeu a comunicar
seus pensamentos e sentimentos reproduzindo traços gráficos. No entanto, tais
correspondências, muitas vezes, não transmitiam uma mensagem precisa para o
discernimento da comunicação, o que resultou uma preocupação em relação ao
aprimoramento da representação gráfica.
Ainda segundo os autores supracitados surgem, então, os primeiros
pictogramas, utilizados para representar palavras por meio de desenhos, atribuindo

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um significado para cada um deles. Aos poucos, estes sinais evoluíram para a escrita
cuneiforme, em que o significante não se assemelhava ao objeto descrito (CÓCCO;
HAILLER, 1996). Todavia, notou-se que estes sinais não eram suficientes para
expressar a imensidão de conceitos existentes.
Observa-se, portanto, que embora a
escrita tenha se evoluído neste período, seu
aperfeiçoamento ainda não dava conta de
expressar com totalidade as informações. A
partir disso, iniciou-se um processo de junção de
duas unidades de escrita para representar uma
terceira. O mesmo ocorreu com a representação
de gestos e outros tipos de analogias, todos com
a finalidade de especificar a mensagem
(CÓCCO; HAILLER, 1996, p.17).
Como se pode observar, houve a introdução de uma representação mais
elaborada para abranger a diversidade de objetos e pensamentos que há no mundo,
em que para se representar um conceito utilizavam-se duas unidades de escrita
diferentes que resultava na interpretação desse primeiro.
Contudo, segundo Cócco e Hailler (1996), ainda assim, ocorria certa
dificuldade em registrar palavras abstratas e nomes pessoais, que só pode ser
superada com uma notação gráfica da fala. Durante esse processo, progrediu-se a
escrita alfabética.
Diante desta constatação, observa-se que os desenhos iniciais se sofisticaram
até alcançar um sistema que envolvia elementos que correspondessem a fala, sendo
um marco de herança cultural. Logo, deduziu-se a importância da comunicação
estabelecida por meio de registros e os novos horizontes que esta expressão trouxe
para a vida humana.
Por mais que o ganho da viabilidade de representar a fala tenha sido uma
grande conquista, persistiu-se a necessidade de lapidar a escrita, da mesma forma
que houve a preocupação de todos usufruí-la em sua totalidade. A partir desta visão,
Emília Ferreiro e Ana Teberosky iniciam um estudo com o objetivo de desvendar
como a criança pensa, em relação ao sistema de escrita alfabética, uma vez que os

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métodos tradicionais existentes não se comprometiam em considerar este fato.


Sendo assim, as estudiosas passaram a repensar a prática escolar de alfabetização,
comparando a disparidade de crianças de classes sociais diferentes, focando o aluno
como um ser capaz de pensar sobre o mundo letrado em que se encontra,
independente de suas condições financeiras.

MÉTODOS ALFABETIZADORES TRADICIONAIS

Em contrapartida ao pensamento de Ferreiro e Teberosky (1999), o ensino


sobre leitura e escrita até o momento trazia um saber pré-fabricado, advindo dos
métodos alfabetizadores. Os educadores da época buscavam a melhor solução para
a aprendizagem de seus alunos, ou seja, o melhor método que garantisse um estudo
preciso e fragmentado, entretanto, o sucesso escolar de algumas crianças era
insatisfatório. Ferreiro e Teberosky acreditavam que, tradicionalmente, conforme
uma perspectiva pedagógica, o problema da aprendizagem da leitura e da escrita
tem sido exposto como uma questão de métodos. A preocupação dos educadores
tem-se voltado para a busca do “melhor” ou “mais eficaz” deles [...] (1999, p.21).

B + A = BA / B + E = BE
BALA / BEBÊ
A BALA É DO BEBÊ
O BEBÊ PEGOU A BALA

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Partindo deste pressuposto, deduz-se que a preocupação dos professores se


focava na procura de uma didática que o satisfizesse, sendo que o docente era
considerado o responsável pelo processo de ensino e aprendizagem. Em momento
algum o aluno era visto como o protagonista deste percurso. Segundo Morais,
Criados desde a antiguidade, mas, sobretudo, a partir do século XVIII, os
métodos tradicionais de alfabetização que conhecemos, apesar das diferenças que
aparentam, têm uma única e comum teoria de conhecimento subjacente: a visão
empirista/associacionista de aprendizagem (2012, p.27).
O autor quis retratar neste discurso que as metodologias seguiam
pensamentos diferentes, porém, enxergavam o meio como o informante que
interferia significativamente no êxito escolar, no qual o aprendiz a partir dos
conhecimentos, emitidos pelo educador, faria, então, associações de ideias.
Desta maneira, a aprendizagem é vista como um processo de simples
acumulação das informações recebidas do exterior, sem que o sujeito precisasse,
em sua mente, reconstruir esquemas ou modos de pensar, para poder compreender
os conteúdos (sobre letras e sons) que alguém (a escola, a professora) estava lhe
transmitindo (MORAIS, 2012, p.27).
Diante do exposto, nota-se que o aprendiz está posto sob uma entrega de
conhecimento fornecido pelo professor através de repetições e memorizações de
conteúdo didático. A aprendizagem era vista como um acúmulo de informações
recebidas do ambiente, sem que a criança necessitasse pensar e compreender

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aquilo que lhe era transmitido. As atividades propostas eram extremamente limitadas
e pouco reflexivas. Partindo desta ideia, deduz-se que o educador tradicional
acreditava que ele era a única fonte que forneceria conhecimento. Agindo assim
como um transmissor de informações.
Posto isto, os docentes lançavam mão de
alguns métodos alfabetizadores que, de acordo
com Ferreiro e Teberosky (1999), se dividem em
dois grupos. No primeiro, denominado métodos
sintéticos, a aprendizagem parte dos elementos
mínimos num processo que consiste em ir das
partes ao todo, e em contrapartida encontram-se
os métodos analíticos que se iniciam com unidades maiores e posteriormente estas
unidades são fragmentadas. Firma-se assim que a diferença de tais métodos se
centra na gênese do aprendizado, e terá sempre uma disputa sobre o que o aprendiz
deveria aprender inicialmente, unidades linguísticas menores ou maiores,
pressupondo a criança como passiva, que espera a escolha do professor que irá lhe
transferir o conhecimento de leitura e escrita.

MÉTODOS SINTÉTICOS

Seguindo a concepção de partir das unidades menores, os métodos de


marcha sintética se fundamentam na correspondência entre o oral e o escrito. Seu
processo consiste em iniciar o ensino partindo das unidades linguísticas mínimas, as
letras, e em uma evolução acumulativa, ir somando as partes para poder “codificar”
ou “decodificar” os elementos maiores, o texto. Segundo Feil no processo de
alfabetização contido neste método, ensina-se partindo das letras (ou sons) para a
criança formar sílabas e só mais tarde formar palavras, e, o pior, palavras que só tem
função de fixar as letras estudadas. São apresentadas de uma forma isolada. A
criança permanece horas repetindo uma letra, ou uma sílaba, até chegar a
memorização. Ler, para estes métodos, significa decifrar. Esses elementos (sons,
sílabas e até mesmo palavras) nada têm a ver com o sentido e, por outro lado,

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sabemos que o indivíduo que não souber o sentido das palavras e só souber decifrar
ainda não aprendeu a ler (1987, p.27).
Considera-se assim, que esta ideologia, dos métodos sintéticos, parte de
palavras que não apresentam função social, imaginando que a utilização desses
escritos usuais e de fácil memorização, seria a melhor maneira para as crianças
aprenderem, visto que esse método trabalha a repetição de elementos isolados. Por
se utilizar palavras carentes de sentido real, o aluno não consegue compreender
aquilo que decifra. Consequentemente, não há apelo à criatividade e ao raciocínio,
pois a criança trilha os caminhos pré-concebidos pelo educador.
Morais (2012) aponta que são encontrados dentro dessa perspectiva métodos
de soletração, que parte o ensino de leitura e escrita do nome das letras; fônico que
se inicia nos sons correspondentes às letras; e de silabação no qual se introduz,
inicialmente, as sílabas.
Deste modo, às crianças são ensinadas a leitura e escrita, a partir da
apresentação dos nomes ou dos sons das letras, ou das silabações para poderem
formar palavras, sempre levando em consideração uma ordem crescente de
dificuldade. Somente depois de algum tempo, elas entrariam em contato com
pequenos textos. Vale ressaltar que, por trás dos métodos alfabéticos (“B com A,
BÁ”, “B com E, BÉ” etc.) existe a crença de que o aprendiz já compreenderia que as
letras substituem sons e que, memorizando “casadamente” os nomes das letras, ele
poderia ler sílabas. Depois de aprender muitas sílabas, o principiante veria que,
juntas, elas formariam palavras e ...um dia ele leria textos (MORAIS, 2012, p.29).
Sob este discurso, o método alfabético centra-se em decorar as letras do
alfabeto e seus nomes, contudo o educando já deveria ter conhecimento de que cada
marca gráfica substitui uma pauta sonora, o que por sua vez não ocorre. Assim,
passando por um longo processo de repetições de leitura de sílabas, a criança
aprende que a junção destas constituem as palavras. A partir desse momento, é
introduzida à leitura de sentenças curtas e, somente em um momento posterior, há
o contato com pequenos textos.
Vale ressaltar que as maiores críticas a esse pensamento são centradas à
repetição dos exercícios, tornando o meio escolar tedioso e cansativo, além de não
considerar os conhecimentos do próprio aluno.

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Ao contrário do método alfabético, que parte do nome das letras, no método


fônico, firma-se o pensamento de que o ensino da leitura e da escrita deva partir dos
fonemas das letras. Capovilla e Capovilla apontam que, no método fônico, “A
habilidade de discriminar e manipular os segmentos da fala é um quesito fundamental
para a aquisição de leitura e escrita. ” (2002, p.88).
Diante desse argumento, a criança deveria dominar o som de cada
correspondência, agrupando-os de modo a formar sílabas. Desta maneira, somente
assim o aluno conseguiria ser capaz de alcançar o sistema de escrita alfabética.
Neste caso, seguindo os pensamentos de Alessandra G. S. Capovilla e
Fernando C. Capovilla (2002), o professor, deve explicitar ao educando não somente
o nome das letras, mas também os seus sons. A introdução das letras segue um
grau de dificuldade. Inicialmente, são apresentadas as vogais, por haver uma
semelhança do nome ao fonema. Posteriormente, mostram-se consoantes que são
de fácil pronuncia e regulares como F, J, M, N, V, e Z. Dando prosseguimento, são
ensinadas as consoantes de fácil pronúncia, mas que são irregulares, como L, S, R,
e X. Após o aprendizado das consoantes facilmente pronunciáveis, são introduzidas
as consoantes consideradas de emissão sonora mais difícil, como B, C, P, D, T, G e
Q. Por fim, os alunos aprendem o som da letra H e somente depois as letras K, W e
Y.
Como se pode perceber, o método não trabalha a sequência do alfabeto, pois
apresenta às crianças, inicialmente, as letras que são de fácil pronúncia para
posteriormente introduzir o aprendizado dos sons das letras mais complexas.
Decorados todos os fonemas, inicia-se a apresentação das sílabas. O método
introduz o texto de forma gradual à medida que a criança consiga adquirir uma boa
habilidade de fazer decodificações fonêmicas fluentemente (CAPOVILLA;
CAPOVILLA, 2002).
Observa-se, deste modo, que somente depois que os alunos conhecem cada
fonema, eles poderão juntá-los com a intenção de formar sílabas, já a leitura de
textos, só é efetivada a partir do instante que o educando se torna hábil à
decodificação de fonemas.
Em contraposição aos métodos já mencionados, de acordo com Morais, na
técnica silábica, [...] está a crença de que o aprendiz não só compreenderia que

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algumas poucas letras juntas substituem sílabas das palavras que falamos, mas que
ele acreditaria que coisas escritas apenas com duas letras poderiam ser lidas.
Decorando as sílabas e “juntando-as”, ele chegaria a ler palavras e ...um dia ele leria
textos (2012, p.29).
Entende-se, portanto, que os professores que faziam uso método silábico
acreditavam que o aluno deveria ser introduzido à memorização de letras e sílabas
através de exercícios repetitivos. Desta forma, o professor lança alguns exercícios
de fixação das famílias silábicas para, sucessivamente, formar palavras, sem
embasamento em algo concreto e real, crendo que o aprendiz traz, consigo, noções
de que uma sílaba formada com poucas letras pode ser lida. O trabalho escolar fica
preso à leitura destas famílias silábicas durante um bom tempo, até introduzir o uso
de frases pequenas com a mesma sonoridade. Somente depois, o discente teria
contato com pequenos textos, mesmo assim, tais escritos são formados por
repetições da mesma correspondência.
Subjacente a qualquer um desses métodos sintéticos, conclui-se, portanto,
que há a crença de que os educandos já teriam a capacidade de compreender as
unidades menores do sistema alfabético. Dessa forma, o professor impõe atividades
de cópias monótonas do gesto gráfico e memorização destes, gerando um acúmulo
exaustivo de informações.

MÉTODOS ANALÍTICOS

Não muito diferente dos métodos


sintéticos, os analíticos também priorizam o
professor como único conhecedor do processo
de ensino e aprendizagem sobre leitura e escrita.
No entanto, diferem-se por partir de elementos
maiores: textos, sentenças ou palavras, para,
posteriormente, subdividi-los nas unidades
menores: letras. Para Morais os métodos analíticos, [...] propõem que, por razões
de tipo perceptivo e motivacional, seria adequado começar com unidades maiores,

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que “têm significado” (palavras, frases, histórias), e, pouco a pouco, levar os alunos
a analisá-las, isto é, a “parti-las em pedaços menores” (2012, p.29).
Mediante essa constatação, deduz-se que os adeptos a esta concepção
pensavam que o trabalho com unidades maiores que tivessem um “sentido” traria um
envolvimento mais eficaz da criança com o objeto de ensino, mas vale acentuar que
este “sentido” carecia de temas reais. Posteriormente, os elementos mínimos, no
caso as letras, que constituem as palavras, as sentenças e os textos seriam
estudados pelas crianças.
Nicolas Adam apud Feil (1987) esclareceu em 1787 uma corrente de
pensamento contrária ao Método sintético, lançando as bases do Método Analítico.
Segundo seus pensamentos, a alfabetização deve partir do todo, para depois passar
para a decomposição, só que o todo para Adam era a palavra. Ele afirmava que,
quando alguém apresenta um objeto a uma criança, como, por exemplo, uma roupa,
nunca são retiradas a gola, a manga e os bolsos, para depois mostrar a roupa inteira.
É mostrado o conjunto completo e o nome da roupa.
Deste modo, pode-se notar que o pensamento de Adam em relação ao
processo de ensino de alfabetização, referia-se ao fato de possibilitar à criança o
contato com as palavras, para em seguida trabalhar as letras. Em 1818, as ideias de
Adam evoluíram através de Jacotot, o qual enunciou que o início do aprendizado de
leitura e escrita [...] não se limita na palavra. Ele vai além, afirmando que a
alfabetização deve partir de uma frase. Lança-se a frase (pois é ela que dá o
verdadeiro sentido da ideia) e analisa junto à criança os elementos, destacando o
mais importante, passando da análise para a síntese. (JACOTOT apud FEIL, 1987,
p.31).
Considera-se, assim, que, enquanto para Adam o ensino sobre leitura e
escrita inicia-se na palavra, Jacotot (apud FEIL, 1987) afirma que a alfabetização
deve ocorrer com base na frase, que será a geradora dos próximos estudos.
Conforme Morais (2012), partindo dessas divergências, os métodos analíticos
podem iniciar-se na palavra, na sentença ou nas historietas.
No método de palavração, o elemento mais focado em que se introduz o
ensino de leitura e escrita é a palavra. Morais (2012, p.30) menciona que, no método
de palavração, durante um longo período (por exemplo, um semestre letivo), os

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alunos são ensinados a identificar e copiar um repertório de palavras para, só depois,


começarem a partir as palavras em sílabas e as sílabas em letras ou fonemas.
Compreende-se, portanto, que os alunos passam a ter contato com vocábulos
que englobam todos os sons da língua e, depois da memorização de um certo
número de palavras, começam a fragmentar as elocuções. Morais ressalta que no
método de sentenciação, [...] a cada unidade didática ou lição, as crianças
memorizam (de modo a poder a identificar e copiar) sentenças completas, para, em
seguida, tratar isoladamente suas palavras e, depois, analisarem tais palavras em
partes menores (sílabas, letras) (2012, p.30).
Diante do exposto, nota-se que ao contrário do método de palavração que se
inicia nas palavras, o de sentenciação parte das sentenças, neste caso, frases que
são intencionadas para trabalhar a alfabetização, quase sempre desconectada da
realidade social de cada aluno.
Outro método trabalhado na metodologia analítica é o global ou dos contos,
que direciona um trabalho partindo de textos. Neste método, [...] a criança seria
exposta a narrativas artificiais (sem qualidade literária, escritas especificamente para
alfabetizar). O “grande todo”, o texto, seguiria, então, os passos do método anterior:
suas frases seriam trabalhadas isoladamente e, do interior das mesmas, seriam
selecionadas algumas palavras, cujas silabas ou relações fonema grafema seriam
enfocadas (MORAIS, 2012 p. 30).
Como se pode constatar, o método supracitado trabalha com textos, porém,
segundo o autor, carentes de qualidade, por serem narrativas curtas e artificiais,
especificamente escritas para a alfabetização de crianças. Após o trabalho com este
elemento, são focalizadas as frases, dentro das quais são retiradas palavras para
serem estudadas mais profundamente. Nas palavras as crianças aprendem as
sílabas e as letras.
Apesar das singularidades de cada
um dos métodos, vale acentuar que
existiam tanto educadores que se apoiavam
nos métodos sintéticos, quanto os que se
fundamentavam nos analíticos. Entretanto,
havia docentes que utilizavam as

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benevolências das duas metodologias, pois consideravam que, assim, alcançariam


o aprendizado de forma mais rápida e eficiente. Percebe-se que, em consequência
disso, não ocorria um seguimento didático, pois, ora se ensinava com os métodos
sintéticos, ora com os analíticos, ocasionando assim uma ruptura no aprendizado de
ambos.
Para facilitar ainda mais o trabalho educacional, nos métodos tradicionais de
alfabetização os educadores se apoiavam em cartilhas que serviam de referências
para lecionar. Este material era pré-fabricado sem considerar a realidade de cada
criança.

CARTILHAS ALFABETIZADORAS

As cartilhas eram livros que ditavam exercícios, de acordo com determinada


metodologia, para se ensinar a leitura e a escrita. De acordo com Barbosa, Cartilhas
são livros didáticos infantis destinados ao período da alfabetização. Daí seu caráter
transitório, limitando-se seu uso à etapa em que, na concepção tradicional da
alfabetização, a criança necessita dominar um mecanismo considerado de base na
aprendizagem da leitura e escrita (1994, p.54).
Entende-se, assim, que este material propunha o alicerce para o trabalho com
alfabetização, e o uso deste seria dispensado quando a criança se familiarizasse
com a leitura e escrita, uma vez que o mesmo foi criado apenas para esta etapa
inicial.
A cartilha apresenta um universo de leitura bastante restrito, em função
mesmo de seu objetivo: trata-se de um pré-livro, destinado a um pré-leitor. A cartilha
limita-se então ao ensino de uma técnica de leitura, entendendo-se essa técnica
como a decifração de um elemento gráfico em um elemento sonoro. É a iniciação da
criança ao mundo da escrita e, nessa iniciação, ela deve aprender a identificar os
sinais gráficos (letras, sílabas, palavras) e associá-los aos sons correspondentes. A
cartilha, coerente com os postulados das metodologias tradicionais, parte da crença
de que, ensinando-a a decodificar e codificar, a criança aprende a ler e escrever
(BARBOSA, 1994, p.54).

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Compreende-se, portanto, que este apoio didático se caracterizava


limitadamente, devido à crença de considerar a criança como um ser que ainda seria
incapaz de lidar com textos literários reais, pois precisava, antes, descobrir os
elementos da escrita e associá-los para, somente depois, ser introduzida ao mundo
letrado. Desta forma, esta iniciação prioriza um treino de repetição de sons e
memorização de conteúdos, reduzindo a leitura e escrita a um mero código de
transcrição da fala.
Sendo assim, as cartilhas posicionam o professor como o ator principal e
primordial no processo de ensino. O livro adota peculiaridades de cada metodologia
tradicional, podendo se encontrar cartilhas sintéticas e cartilhas analíticas
(BARBOSA, 1994).
Apesar das divergências entre as diferentes metodologias adotadas nas
cartilhas, todas seguem o mesmo sistema de escrita, em relação ao sistema oral,
partindo de uma visão em que o aprendizado provém do meio e das associações
realizadas por exercícios repetitivos.
As cartilhas sintéticas iniciam seu trabalho com os elementos menores da
língua, ou seja, com as letras ou sílabas. Conforme Barbosa estes informantes, [...]
Iniciam o processo pela apresentação das vogais [...] Passa-se a seguir para as
combinações das vogais com as consoantes, dirigindo-se então o ensino para o
estudo das “famílias silábicas” resultantes dessas combinações. As palavras surgem
da combinatória das famílias silábicas já conhecidas. Passa-se, enfim, para a fase
de fixação através de exercícios repetitivos. As cartilhas sintéticas propõem um
processo combinatório, em que elementos não significantes da língua vão se
somando até resultar em palavras; combinando-se as palavras surgem os textos
(1994, p.55).
Nota-se, assim, que este instrumento abrange uma sequência de exercícios
que começam da apresentação das vogais para que, em seguida, focalize as
combinações destas com as consoantes. As palavras serão estruturadas após o
trabalho das famílias silábicas e, a partir desse momento, emprega-se um
treinamento repetitivo para a decoração dos elementos envolvidos.
Em contraposição, as cartilhas analíticas procedem de elementos
significativos da língua, ou seja, das palavras ou frases. Estas cartilhas adotam

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procedimentos inversos ao das cartilhas sintéticas: partem dos elementos maiores


da língua (o “todo”, palavras em sentenças) e, através da decomposição, chegam
aos elementos menores (as “partes”, as sílabas). Esses elementos menores são
então sistematizados através dos exercícios de fixação (BARBOSA, 1994, p.55).
O enunciado dito pelo autor acentua que os procedimentos dessa cartilha
partem de elementos mais significantes, se comparado ao das cartilhas sintéticas,
no qual se inicia o estudo com as unidades maiores: o texto, as sentenças ou as
palavras, para posteriormente sintetizar estes elementos em correspondências
menores, ou seja, em letras.
A partir do estudo das cartilhas alfabetizadoras, pode-se até mesmo inferir
que, em nenhuma das cartilhas abordadas, transparece a função e o valor real de
comunicação da língua escrita, uma vez que não levam em conta a realidade de cada
educando, tornando o ensino da leitura e da escrita uniforme, cumulativo e
homogêneo.
Muitos educadores ainda acreditam que as cartilhas são suportes para o
ensino de leitura e escrita, entretanto, não compreendem que estas limitam tanto o
ensino como a aprendizagem dos alunos.
Percebe-se, portanto, que houve uma grande preocupação em torno do
objeto de ensino, ou seja, o conteúdo didático, no qual se gerou a ênfase ao melhor
método que seria capaz de alfabetizar a criança. Em nenhum desses momentos
houve a consideração sobre o fato de o aluno ser capaz de participar ativamente da
descoberta de novos conhecimentos sobre leitura e escrita. E foi a partir desta
constatação que Emília Ferreiro e Ana Teberosky se empenharam em compreender
como a criança estrutura seus pensamentos, em relação à escrita que a rodeia,
vendo o aluno como construtor de seu próprio conhecimento. Deste modo, as autoras
propõem um olhar pedagógico diferenciado daqueles existentes até o momento, com
a publicação do livro “Psicogênese da Língua Escrita”.

PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA: CONTRIBUIÇÕES PARA A


ALFABETIZAÇÃO

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UMA PERSPECTIVA INOVADORA


Em 1980, houve um renascimento sobre a questão de alfabetização, que até
então era considerada sem solução. Esta grande mudança foi ocasionada pela
publicação dos dados de uma pesquisa realizada por Emília Ferreiro e Ana
Teberosky, a “Psicogênese da língua escrita”, que indagava o fracasso escolar e
buscava compreender como eram elaborados os pensamentos das crianças, frente
à aprendizagem de leitura e escrita. Iniciou-se, assim, uma nova discussão que partia
do pressuposto de que o conhecimento do sujeito não se restringia apenas ao uso
de determinados métodos. Esta pesquisa surgiu na área pedagógica para
Destacar a validade de pensar no conhecimento já adquirido pelas crianças
independentemente da classe social a que pertenciam. Isso permitiu aos educadores
olhar para o objeto de conhecimento e para o processo de aprendizagem por um
novo ângulo. Era preciso dialogar com o aluno sobre o que ele sabia (WEISZ, 2012,
p.36).
Diante disto, compreende-se que a pesquisa surgiu com a intencionalidade de
repensar a prática escolar, levando em conta os conhecimentos dos educandos, visto
que estes já possuíam noções sobre a escrita que os rodeia. Desse modo, pode-se
até mesmo inferir que as autoras Ferreiro e Teberosky se opunham à didática
existente até o momento, a qual partia de um método pronto, a ser transmitido pelo
professor e adquirido pelo aluno, uma vez que esta era a concepção que imperava
no processo ensino aprendizagem. Para abrir esse novo olhar sobre este processo,
as autoras se apoiaram em concepções, já existentes, que viam o sujeito como um
ser capaz de construir ativamente seu próprio conhecimento a partir da elaboração
de hipóteses e interpretações acerca da leitura e da escrita.

REFERÊNCIAS CONCEITUAIS

Algumas referências podem ser interpretadas como bases da pesquisa de


Ferreiro e Teberosky. Pode-se ressaltar, assim, a relação deste estudo com a teoria
construtivista, visto que esta corrente estabelecia que o conhecimento deveria ser
construído através da relação entre o sujeito e o meio no qual está inserido.

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Faz-se pertinente mencionar, ainda, que em muitos momentos da pesquisa,


as estudiosas se apoiaram nos estudos de Jean Piaget, no qual fizeram uso das
concepções deste como complemento dos novos fundamentos que seriam
estabelecidos na Psicogênese da Língua Escrita.
Entende-se, portanto, que a ideia de se repensar a prática pedagógica, surgiu
a partir da reflexão das concepções do Construtivismo, assim como as de
Piaget, pois, desta forma, Ferreiro e Teberosky perceberam que as
metodologias adotadas pelos métodos tradicionais enxergavam o professor como o
centro do aprendizado, e não o aluno, como propõe os estudos supracitados.

O OLHAR CONSTRUTIVISTA

A pesquisa realizada por Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999), criticava a


prática pedagógica que considerava o educador como a única fonte geradora da
aprendizagem, uma vez que, ao seguir este pensamento, torna-se impossível ver o
aluno como o construtor de seu próprio conhecimento. Observa-se, assim, que as
estudiosas tiveram como base teórica o construtivismo, pois, este [...] é uma das
correntes teóricas empenhadas em explicar como a inteligência humana se
desenvolve partindo do princípio de que o desenvolvimento da inteligência é
determinado pelas ações mútuas entre o indivíduo e o meio. A ideia é que o homem
não nasce inteligente, mas também não é passivo sob a influência do meio, isto é,
ele responde aos estímulos externos agindo sobre eles para construir e organizar o
seu próprio conhecimento, de forma cada vez mais elaborada
(CONSTRUTIVISMO..., 2013, p.1).
Confirma-se, assim, que os pensamentos de Ferreiro e Teberosky (1999)
realmente seguem uma perspectiva construtivista, visto que partem dos princípios
básicos desta corrente, que são os de que o sujeito reage em resposta aos estímulos
que o envolve, ao qual pode construir seu conhecimento de maneira ativa. É
necessário acentuar que embora a “Psicogênese da língua escrita” tenha
concordância com o construtivismo, não deve ser rotulada por este.
Nota-se, portanto, que Ferreiro e Teberosky abriram um olhar construtivista
sobre o conteúdo escolar, no qual se objetivava esclarecer que o professor precisava

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considerar os conhecimentos de mundo, estes advindos das relações com o meio no


qual está inserido cada aluno.

CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET

O aluno, dentro de uma ótica construtivista, deveria ser visto como um sujeito
que busca ativamente a construção de seu próprio conhecimento, ou, nas palavras
de Piaget, [...] o sujeito cognoscente, o sujeito que busca adquirir conhecimento, o
sujeito que a teoria de Piaget nos ensinou a descobrir. O que quer isto dizer? O
sujeito que conhecemos através da teoria de Piaget é aquele que procura ativamente
compreender o mundo que o rodeia e trata de resolver as interrogações que este
mundo provoca. Não é um sujeito o qual espera que alguém que possui um
conhecimento o transmita a ele por um ato de benevolência. (FERREIRO;
TEBEROSKY, 1999, p. 29).
Pode-se observar que as autoras supracitadas se fundamentaram nos
estudos de Piaget, os quais postulavam que o conhecimento não era totalmente
intrínseco (mas também não era fornecido pelo meio, e sim gerado pela interação
entre sujeito e objeto), para focalizar que o aluno não é um ser passivo, pois constrói
seus pensamentos por meio da interação que estabelece com o ambiente. Deste
modo, compreende-se que há uma relação entre o olhar construtivista e as ideologias
de Piaget, posto que ambos apontam para o fato de o conhecimento não nascer
pronto, nem tampouco ser transmitido, mas sim, construído.
Ferreiro e Teberosky (1999), ao se apoiarem nos estudos de Piaget, expõem
que o sujeito constrói seu conhecimento a partir do instante que responde aos
estímulos provindos do mundo. Neste instante, tais estímulos são transformados
pelos sistemas de assimilação da criança.
Percebe-se, deste modo, que as estudiosas, em concordância com os
pensamentos de Piaget, acreditam que o conhecimento se constrói no momento em
que a criança reage aos diversos estímulos oferecidos pelo meio, visto que esta
situação, a qual resultará na construção do conhecimento, pode modificar-se por
meio dos esquemas de assimilação, que consiste em [...] uma integração à estruturas
prévias, que podem permanecer invariáveis ou são mais ou menos modificadas por

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esta própria integração, mas sem descontinuidade com o estado precedente, isto é,
sem serem destruídas, mas simplesmente acomodando-se à nova situação
(PIAGET, 1996, p.13).
Em síntese, nota-se que o indivíduo, ao receber novas informações provindas
do meio externo, adapta estes novos informantes aos já existentes em sua mente,
que por sua vez, podem ou não sofrer leves alterações devido a essa troca.
Piaget, além de conceituar os esquemas de assimilação, também definiu
outro esquema, este chamado acomodação, no qual se refere a “[...] toda
modificação dos esquemas de assimilação sob a influência de situações exteriores
(meio) aos quais se aplicam” (PIAGET, 1996, p.18).
Deste modo, compreende-se que, no processo de acomodação, o sujeito não
apenas recebe e assimila a informação, mas a transforma em função das novas
circunstâncias oferecidas pelo ambiente, acomodando-a.
Segundo Piaget apud Carretero (1997), o produto final da interação entre a
assimilação e a acomodação resulta a equilibração, que sucede quando se alcança
um equilíbrio entre as disparidades provindas da recente informação recebida, em
relação àquela que o sujeito já possuía no qual se acomoda.
Sendo assim, pode-se concluir que a equilibração, ocorre a partir do momento
que a criança estabiliza seus esquemas de assimilação e de acomodação, uma vez
que este ponto de equilíbrio possibilita à criança uma interação eficiente dela com o
meio.
Ferreiro e Teberosky ressaltam que o avanço no conhecimento, por parte das
crianças, [...] não será obtido se não através de um conflito cognitivo, isto é, quando
a presença de um objeto (no sentido amplo de objeto de conhecimento) não-
assimilável force o sujeito a modificar seus esquemas assimiladores, ou seja, a
realizar um esforço de acomodação que tenda a incorporar o que resultava
inassimilável (e que constitui, tecnicamente, uma perturbação) (1999, p.34).
Diante do exposto, verifica-se que o aprendizado somente se interioriza
quando o aluno, ao percorrer pela zona de conflito cognitivo, consegue acomodar e
reestruturar seus esquemas de assimilação e acomodação.
Compreende-se por conflito cognitivo uma perturbação que ocorre quando a
criança se depara com informações que não estão de acordo com seus

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conhecimentos prévios, e que, assim, geram um desafio que fará com que ela
reorganize seus pensamentos.
Torna-se pertinente estabelecer que, no instante do conflito cognitivo, o
educando pode cometer erros inconscientemente, pois, como afirmam Ferreiro e
Teberosky (1999), os erros ocorridos no processo de ensino-aprendizagem não se
dão por falta de conhecimentos, mas sim demonstram os saberes de cada criança.
Observa-se, assim, que o erro deve ser entendido como um apontamento dos
conhecimentos que cada criança carrega durante seu processo educacional e não
como insuficiência de determinado conhecimento.
Ferreiro e Teberosky relataram os “erros construtivos” e afirmaram que, na
teoria de Piaget, o conhecimento objetivo aparece como uma aquisição, e não como
um dado inicial. O caminho em direção a este conhecimento objetivo não é linear:
não nos aproximamos dele passo a passo, juntando peças de conhecimento umas
sobre as outras, mas sim através de grandes reestruturações globais, algumas das
quais são “errôneas” (no que se refere ao ponto final); porém, “construtivas” (na
medida em que permitem aceder a ele). Esta noção de erros construtivos é essencial
[...] Para uma psicologia piagetiana, é chave o poder distinguir entre os erros aqueles
que constituem pré-requisitos necessários para a obtenção da resposta correta
(1999, p.33).
Diante do exposto, frisa-se que o sujeito, para alcançar o produto final da
aprendizagem, passa por um caminho em que terá de reestruturar seus
conhecimentos prévios, mediante aos aprendidos, no qual essas reestruturações
podem manifestar-se de forma inadequada, porém construtivas, no sentido de
permitir, futuramente, o acesso à adequada. A partir desses conceitos, pode-se, até
mesmo, inferir que o educador precisa compreender e analisar os erros de seus
alunos e enxergá-los como um auxílio à sua prática docente, no processo de
alfabetização, visto que os “erros construtivos” podem servir de ponto de partida para
identificar os saberes já existentes, de seus alunos, assim como os que ainda
precisam ser internalizados.
Subentende-se, assim, que as autoras criticavam os métodos tradicionais,
pois baniam todos os erros dos educandos, sem percebê-los como um instrumente
norteador do processo de ensino-aprendizagem, uma vez que os educadores

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adeptos à metodologia tradicional não se preocupavam em analisar o pensamento


da criança, tal como as razões que a levavam a cometer determinado erro, o que,
por sua vez, permite a dedução de que esses professores não intervinham
significativamente, mediante o erro de seus alunos.
Ferreiro e Teberosky (1999) afirmam que os alunos passam por um processo
evolutivo na aquisição do conhecimento sobre leitura e escrita. Deste modo, a
pesquisa esclareceu, a partir de um novo ângulo, que alguns erros comuns às
crianças que ainda não efetivaram o sistema de escrita alfabética, nada mais eram
do que algo característico de determinada fase de leitura ou de escrita.
Pode-se observar, deste modo, que, a partir do momento que se constatou
que o erro construtivo contribui para a identificação dos conhecimentos dos alunos,
as pesquisadoras estabeleceram que alguns erros típicos de muitas crianças durante
o processo de alfabetização designam hipóteses, que os próprios alunos constroem
para entender o sistema de leitura e escrita.

NÍVEIS DE LEITURA

Ao analisar os erros das crianças no momento da leitura e da escrita, Ferreiro


e Teberosky detectaram que alguns erros ocorriam comumente, e que poderiam ser
considerados como característicos de diferentes níveis de leitura e de escrita.
As autoras (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999), em relação aos níveis de
leitura, ostentam algumas concepções cogitadas pelas crianças, no qual podem
emergir alguns exemplos de erros construtivos, tais erros estavam integrados em um
processo gradativo de compreensão do sistema de leitura, em que as crianças ao
percorrerem-no estruturam seus pensamentos de forma a dominarem este sistema.
Ferreiro e Teberosky expõem, sob um olhar evolutivo, que, de início, a criança,
mesmo sem saber ler, já apresenta conhecimentos prévios sobre o ato de leitura e
possui critérios, estes, por sua vez, bem elaborados, para admitir se uma marca
gráfica pode ou não ser lida, tais como: o de fazer uma dicotomia entre as figuras e
os escritos; o de hipotetizar uma exigência de “quantidade mínima de caracteres”; e
o de exigir uma “variedade de letras”.

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Pode-se observar, em relação aos critérios elaborados pelos alunos no


processo de compreensão de leitura, que o fato de a criança não estar, ainda,
alfabetizada, não significa que ela não formula hipóteses acerca do que se pode ler,
pois, como afirmam as pesquisadoras, quando é apresentado um texto ao aluno, ele
discerne o que é legível daquilo que não é, isto ocorre em situações como: quando
diferencia um desenho de um texto; quando estabelece a hipótese de que para uma
palavra ser lida, esta não pode ter poucas letras; e, por fim, que é necessário uma
variedade das letras que constituem as palavras.
Ferreiro e Teberosky (1999) apontam que, além dos critérios de diferenciar
desenho de texto, assim como o de estabelecer uma quantidade mínima de
caracteres e o de variedades gráficas, os alunos, de início, pensam que apenas os
substantivos estão escritos, deste modo, eles não consideram que verbos e artigos
também estejam grafados, e em seu conceito existem partes escritas em demasia.
Este percurso, gradativamente, tem seu término na ocasião em que os educandos
percebem que estas palavras que, para eles, estão sobrando, fazem parte de todo o
sistema de escrita.
Nota-se, portanto, que as crianças elaboram inferências com a intenção de
dominar o sistema de leitura. Vale acentuar, que as formulações criadas pelos
educandos são tipicamente provindas de seus pensamentos, uma vez que nenhum
adulto ensinaria a uma criança que somente os substantivos são escritos em um
texto. Acentua-se, assim, que indubitavelmente a tese de Ferreiro e Teberosky
manifestou uma inovação teórica, que trazia consigo a ideia de que a alfabetização
de leitura ocorria gradualmente.

NÍVEIS DE ESCRITA

Assim como ocorre no processo de leitura, o aprendizado da escrita também


se efetiva gradualmente, no qual os erros construtivos aparecem como
características específicas de cada etapa percorrida pelo aluno.
Segundo Ferreiro e Teberosky (1999), a evolução da escrita é marcada por
cinco níveis que levarão o aprendiz a se tornar alfabético. Para identificar as
características de cada nível, é necessário mencionar que os dados da pesquisa,

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realizada pelas autoras, foram obtidos através de uma exploração em que se


solicitava à criança que escrevesse seu próprio nome; um nome de alguém
conhecido; palavras de uso escolar e não escolar; assim como uma pequena oração.
No decorrer desta pesquisa, as crianças escreviam os pedidos, propostos por
Ferreiro e Teberosky, da forma como lhes parecessem melhor.
Percebe-se, deste modo, que os dados advindos da pesquisa de Ferreiro e
Teberosky, notificaram diferentes características de escrita produzidas pelas
crianças. Por meio da análise destas características, as estudiosas descobriram que
os alunos passam por uma evolução, até compreenderem como funciona o sistema
de escrita alfabética.
No primeiro nível, (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999) escrever é reproduzir os
traços típicos da escrita que a criança conhece. Devido a isto, todas as escritas se
assemelham muito entre si. Podem aparecer, no início deste nível, tentativas de
correspondência figurativa entre a escrita e o objeto referido. Outra característica é
a dificuldade momentânea de diferenciar desenho de escrita, chamada de fase
icônica. Pode-se mencionar que há uma tendência de a criança escrever por meio
de garatujas e, a partir do instante que o aluno entra em contato com o sistema escrito
e numérico, tende a misturá-los, no momento da escrita, no qual passa a inventar
novos símbolos para anotar as sentenças. Evidenciam-se, ainda, duas hipóteses que
os alunos formulam: as grafias são variadas e a quantidade destas diferem-se, entre
si. Vale acrescentar que estas hipóteses somente são formuladas quando a escrita-
modelo do educando é a de imprensa.
Observa-se, assim, que, no primeiro nível, o educando formula várias
hipóteses acerca do sistema de escrita alfabética. Dentre elas, vale ressaltar as
tentativas de correspondência figurativa, que ocorrem quando a criança imagina que
a grafia dos nomes é proporcional ao tamanho do objeto a ser representado; a
dificuldade, momentânea, por parte da criança, em diferenciar desenho de escrita.
Torna-se pertinente estabelecer, ainda, que o sujeito analisa que, para ler algo, o
texto precisa possuir uma quantidade considerável de letras e uma variedade destas,
pois a criança possui o conceito de que há uma quantidade mínima de caracteres
para que certa palavra seja lida, tal como a ideologia de que os elementos gráficos

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devem variar-se dentro do vocábulo. As figuras abaixo podem exemplificar alguns


aspectos do primeiro nível.
Figura 1, 2 e 3: Primeiro nível de escrita.

Fonte: (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p. 195-197).


Verifica-se, por meio da análise das figuras, que algumas crianças, ao
escreverem, fazem uso de garatujas (desenhos sem configuração), como explicita o
primeiro exemplo, em que se pode, até mesmo, inferir que, embora as elocuções se
assemelhem graficamente, o educando, ao dispor tais características, teve um
intento de estruturá-las diferentemente. Já o segundo exemplo mostra claramente a
indistinção que o educando possui entre a escrita e o desenho, no momento da
representação gráfica. O terceiro exemplo demonstra aquela criança que dispõe as
letras e os números que conhece, inventando conjuntamente novos símbolos, sem
considerar que o número não se integra ao sistema de escrita alfabética.
No segundo nível, conforme exposto por Ferreiro e Teberosky (1999), a
hipótese central é que, para ler coisas diferentes, deve haver uma distinção objetiva
nas escritas. As crianças formulam a hipótese de que há uma quantidade específica
e uma variedade de letras para se escrever uma palavra. Visto que as crianças não
conhecem muitas correspondências, elas tendem a dispor mais frequentemente as
letras que compõem seu nome, variando a sequência destas para representar
diferentes escritas.
Sendo assim, constata-se que as formas de grafismos deste nível são mais
definidas, se comparadas às do primeiro, pois, neste momento, sua representação
demonstra que a criança utiliza pensamentos mais elaborados para grafar uma
palavra. O avanço do conceito dos alunos referentes à notação das sentenças será
exemplificado nas figuras a seguir:

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Figura 4 e 5: Segundo nível de escrita

Fonte: (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p.203).


De acordo com as imagens expostas, pode-se observar que os dois
exemplos expressam que, devido às crianças conhecerem poucas
correspondências, há a necessidade de a criança utilizar-se das mesmas letras
(aquelas que conhece) alternadamente, para não escrever palavras iguais, pois
possui a hipóteses de que, para se escrever coisas diferentes, as palavras não
podem ser idênticas. Vale pontuar que, apesar do avanço, se comparado ao primeiro
nível, o educando ainda nota números e inventa grafismos para delinear as palavras.
Segundo Ferreiro e Teberosky (1999), o terceiro nível é caracterizado pela
tentativa de dar um valor sonoro a cada uma das letras que compõe a escrita
produzida pela criança. Neste nível, o aluno dá um salto qualitativo: cada letra vale
por uma sílaba, uma vez que esta letra pode ser representada com um valor sonoro
estável, ou não. Caso o aluno não empregue o valor sonoro convencional para cada
letra, segue-se, durante a representação escrita do educando, a exigência de se
dispor uma letra para notar uma sílaba. Entretanto, há também outras crianças que,
além de escreverem as palavras com a preocupação de quantificá-las corretamente,
atribuem o valor sonoro convencional a cada letra representada, em suas escritas.
Compreende-se, portanto que o terceiro nível de escrita pode ser subdividido
em duas hipóteses distintas, a primeira é caracterizada por crianças que escrevem
silabicamente, porém, ao grafar, dispõem letras aleatoriamente, sem relevar os
valores sonoros designados a cada uma destas para representar as palavras
notadas. A segunda hipótese é definida por crianças que também se preocupam em

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quantificar corretamente as palavras grafadas, no entanto, atentam-se em atribuir o


valor sonoro convencional de cada letra constituída na palavra a ser escrita.
Ferreiro e Teberosky apontam que, no terceiro nível de escrita, a criança
progride qualitativamente, visto que o avanço, [...] consiste em que: a) se supera a
etapa de uma correspondência global entre a forma escrita e a expressão oral
atribuída, para passar a uma correspondência entre partes do texto (cada letra) e
partes da expressão oral (recorte silábico do nome); mas, além disso, b) pela primeira
vez a criança trabalha claramente com a hipótese de que a escrita representa partes
sonoras da fala (1999, p.209).
Diante do exposto, cabe salientar que, para a criança chegar a este nível, ela
avançou significativamente, em relação aos níveis precedentes, pois não havia, até
então, a noção de que a escrita é uma representação da fala e que, para cumprir o
sistema alfabético, ela deveria dispor de letras que correspondessem ao som da
palavra notada. Um exemplo disso são as próximas imagens.

Figura 6 e 7: Terceiro nível de escrita.

Fonte: (MORAIS, 2012, p.59).

A partir dessas figuras, compreende-se que a primeira imagem exemplifica a


escrita de uma criança que não atribui um valor sonoro convencional às suas
representações, pois se preocupa apenas com questões quantitativas. Por outro
lado, o segundo exemplo aponta a notação de um aluno que se preocupa com a
qualidade de seus grafismos, isto é, atribui um valor sonoro convencional a seus
escritos.

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O quarto nível de escrita é uma passagem do nível 3 ao nível 5 (FERREIRO;


TEBEROSKY, 1999), caracterizada por grandes conflitos, pois, neste momento, a
criança percebe que estabelecer uma letra para cada sílaba não é suficiente para
representar uma palavra e assim, começa a dispor mais letras, tornando a tarefa
muito complexa, devido ao fato de implicar uma reflexão mais sofisticada, acerca da
palavra a ser notada.
Percebe-se, deste modo, que o quarto nível, é uma etapa relevante, no
processo evolutivo de compreensão de escrita, por ser caracterizado pelos conflitos
que o aluno irá enfrentar no momento da escrita. Cócco e Hailler em relação ao
quarto nível de escrita exposto por Ferreiro e Teberosky, dispõem que o quarto nível,
Por se tratar de um nível intermediário, é mais uma vez um momento
conflitante, pois a criança precisa negar a lógica do nível silábico. Ninguém consegue
ler o que ela escreve e, nesse momento, ela se vê sem saída. Isso acontece
principalmente quando ela usa só as vogais, porque a mesma combinação de letras
serve para escrever uma porção de palavras (1996, p.42).
Diante do exposto, percebe-se que o sujeito, para chegar ao quinto nível de
escrita, passa por um grande conflito, este típico do quarto nível, ocasionado pelo
fato de o aluno começar a compreender que uma letra não é suficiente para escrever
uma sílaba, negando, assim, suas hipóteses antes estruturadas. Pode-se dizer que
essa nova concepção surge principalmente quando o aprendiz repara que, ao
escrever diferentes palavras, estas podem apresentar-se iguais, visto que há o
costume de se grafar apenas as vogais, por serem entonadas com mais
vigorosidade. A próxima imagem notificará com mais clareza as características do
quarto nível de escrita.
Figura 8: Quarto nível de escrita

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Fonte: (MORAIS, 2012, p.64).

A figura exemplifica a representação gráfica de uma criança que se encontra


no quarto nível de escrita. Nota-se que o exemplo exposto pela figura demonstra a
escrita de uma criança que descobriu a necessidade de se dispor mais letras para
representar uma sílaba. Sendo assim, este nível implica uma etapa em que o
aprendizado das correspondências grafema-fonema precisa ser refletido de forma
mais aprimorada.
Ferreiro e Teberosky (1999) acentuam o quinto nível como o ponto final da
evolução da escrita. Neste instante, o aluno se torna alfabético, visto que já
compreendeu que cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores sonoros
menores que a sílaba.
Sendo assim, pode-se compreender que o processo evolutivo, descrito por
Ferreiro e Teberosky, se encerra no momento em que o educando alcança o quinto
nível e se torna alfabético. Vale enunciar que esta etapa final se resume ao
aprendizado do aluno sobre questões conceituais da escrita. A partir deste instante,
o aluno irá se deparar com dificuldades tipicamente ortográficas, pois, [...] não
podemos confundir “ter alcançado uma hipótese alfabética de escrita” com “estar
alfabetizado”. A passagem da primeira condição à seguinte deverá ser, em nosso
ponto de vista, o resultado de um cuidadoso processo de ensino-aprendizagem,
agora não mais (ou principalmente) de aspectos conceituais do sistema alfabético,
mas, sim, das convenções som-grafia [...] (MORAIS, 2012, p.65).
Com base nas ideias de Morais, pode-se concluir que, embora o sujeito tenha
alcançado o quinto nível de escrita, este, descrito por Ferreiro e Teberosky, existe,

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nesta ocasião, uma nova preocupação quanto à autonomia desse aluno, no


momento da escrita, em relação às regras ortográficas. A imagem a seguir
exemplifica uma escrita produzida por uma criança que se encontra no quinto nível.

Figura 9: Quinto nível de escrita

Fonte: (MORAIS, 2012, p.65).

Como se pode perceber, esta criança já compreendeu o sistema notacional


da palavra, entretanto apresenta um erro comum em relação às regras ortográficas,
visto que um aluno recém-alfabético ainda não possui muitas habilidades
grafofônicas e isso só será alcançado com uma autonomia mínima de leitura.
Enfim, pode-se notar, que Ferreiro e Teberosky, ao realizarem a pesquisa que
fundamentou a Psicogênese da Língua escrita (tese das autoras sobre como se inicia
o processo de ensino aprendizagem de leitura e escrita), possibilitaram o surgimento
de um pensamento reflexivo, por parte dos educadores, sobre como o aluno reage,
sob os estímulos do meio, para compreender os conceitos que regem o sistema
notacional.
Vale pontuar que Ferreiro e Teberosky se embasaram, durante a estruturação
da “Psicogênese da Língua Escrita”, nos estudos de Piaget quanto às fases de
desenvolvimento humano, visto que os níveis do processo de compreensão de leitura
e escrita, apontados pelas autoras, se assemelham às características típicas de cada
estágio de desenvolvimento descrito por Piaget, uma vez que estes estágios, se
dividem em; Sensório-motor (0 aos 2 anos)[...] um sujeito que começa a conhecer-
se enquanto fonte ou mesmo enquanto senhor de seus movimentos[...] Pré-
operatório (2 a 7 anos) [...] passagem das condutas sensório motoras para as ações
conceituais[...] Operações concretas (7 a 11 anos) [...] é aquele em que se atinge o

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equilíbrio geral das operações “concretas”, além das formas parciais já equilibradas
desde o primeiro nível[...] Operações Formais (a partir dos 12 anos)[...] consiste em
poderem elas realizar-se sobre hipóteses e não somente sobre objetos[...](PIAGET,
2002, p. 7 à 54)
A partir destes estudos, compreende-se que Ferreiro e Teberosky se
fundamentaram nos estágios de desenvolvimento de Piaget, posto que o
conhecimento de mundo adquirido pelo contato do aluno com o meio, citado pelas
autoras, ocorre no momento em que o sujeito se percebe como autor e ator de seus
movimentos a fim de conhecer o outro (objeto) que está a sua volta, construindo,
assim, o conhecimento por meio da interação que estabelece com o mundo que o
rodeia. Pode-se destacar, ainda, que as características de cada nível de leitura e de
escrita, os quais a criança percorre até tornar-se alfabética, só se estabelece,
primeiramente, graças ao fato de a criança poder construir conceitos, como descreve
o estágio pré-operatório. Torna-se pertinente mencionar, ainda, que, durante o
processo de compreensão da alfabetização, a criança passa por reestruturações e
estabilizações das operações concretas, visto que somente depois da equilibração
dessas operações a criança poderá utilizar-se de operações mais elaboradas e
abstratas, uma vez que, neste momento, se preocupará com questões hipotéticas
para compreender um objeto de conhecimento. Sendo assim, percebe-se que foram
inúmeras as contribuições dos estudos de Piaget, às concepções de Ferreiro e
Teberosky.
Torna-se pertinente enunciar, ainda, que os níveis de escrita relatados por
Ferreiro e Teberosky são conhecidos, popularmente, como pré-silábico, no qual se
caracteriza pelos dois primeiros níveis; silábico, este envolvendo aspectos do terceiro
nível; silábico alfabético, em que se seguem as peculiaridades do quarto nível e
alfabético, sendo, por fim, o quinto e último nível desta evolução (FERREIRO, 1992).
As estudiosas se destacaram na área pedagógica por terem focalizado os
pensamentos das crianças, em relação à leitura e escrita, no decorrer do processo
de alfabetização, no qual se percebe que, neste processo, a criança passa por níveis
gradativos de escrita e leitura. Cabe, neste momento, ao professor, saber detectar
em qual destes níveis o educando se encontra, para, posteriormente, utilizar tais
informações como norteadoras de sua prática educacional.

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A SONDAGEM

Para identificar os níveis de escrita e de leitura, as autoras arquitetaram um


instrumento para avaliar os conhecimentos dos alunos.
Telma Weisz (2012) comentou que o instrumento elaborado por Ferreiro e
Teberosky, que, posteriormente, foi denominado como sondagem diagnóstica, é uma
ferramenta que identifica o nível de escrita e de leitura das crianças, a partir da qual
o educador poderá analisar as produções espontâneas do aluno.
Deste modo, pode-se atentar que, além das autoras salientarem que os alunos
passam por uma evolução no processo de ensino aprendizagem de leitura e escrita,
elas também elaboraram uma maneira de identificar em qual nível de compreensão,
do sistema de escrita alfabética, a criança se localiza. Faz-se necessário pontuar
que, durante a sondagem diagnóstica, a criança irá realizar suas produções sem o
auxílio do professor, para que, deste modo, ela consiga expor, através da escrita,
seus pensamentos, no que concerne ao sistema de escrita alfabética.
Vale acentuar que a sondagem diagnóstica ocorre por meio de uma entrevista
realizada pelo professor com o aluno. Ferreiro, ao narrar a experiência que vivenciou
durante sua pesquisa, sobre o processo de alfabetização, esclarece que em cada
entrevista propusemos às crianças quatro palavras dentro de um dado campo
semântico (nomes de animais, de alimentos, etc.), com uma variação sistemática no
número de sílabas (palavras de uma a quatro sílabas) (1992, p.88).
Pode-se estabelecer, deste modo, que a sondagem diagnóstica é realizada a
partir da escolha de palavras que envolvam um determinado tema e que variem na
quantidade de sílabas. Torna-se pertinente frisar que, de nada adianta o docente
aplicar uma sondagem adequadamente se não souber interpretá-la e fazer uso das
informações que provém dessa interpretação. Cabe, deste modo, ao professor, o
difícil dilema de analisar coerentemente os dados obtidos por meio da sondagem, tal
como identificar a periodicidade no qual se deve aplicá-la, para que consiga
acompanhar o percurso de seus educandos, no processo de compreensão de leitura
e escrita, visando proporcionar condições necessárias para o avanço de cada um
deles.

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INTERAÇÕES COMO INSTRUMENTO AUXILIADOR NA APRENDIZAGEM

Ao aprofundar-se nos estudos referentes ao pensamento da criança, durante


o processo de alfabetização, Ferreiro e Teberosky atribuem grande importância às
interações que a criança estabelece com o meio, como auxílio, na efetivação da
aprendizagem sobre leitura e escrita.
Desta forma, nota-se que as interações assumem um papel significativo na
contribuição da busca do aluno pelo objeto de conhecimento, posto que, “Através
das interações adulto-adulto, adulto-criança e crianças entre si, criam-se as
condições para a inteligibilidade dos símbolos” (FERREIRO, 1992, p.59).
Observa-se, portanto, que a autora citada atribui grande importância às
interações, para o êxito no processo de ensino e aprendizagem sobre leitura e
escrita, pois, afirma que as trocas de conhecimento, geradas pela interação, são
efetivadas, não somente na relação do professor com o aluno, mas também entre os
adultos envolvidos no processo de alfabetização, visto que estas relações podem ser
concebidas pelo contato do professor com a família dos educandos, tal como com
outros educadores. Vale ressaltar que as crianças se beneficiam do conhecimento
umas das outras, a partir do momento que o professor oportuniza situações
favoráveis para a interação mútua de seus alunos. Um autor de grande destaque,
que pode ter servido de base a esses conceitos, foi Vygotsky que, segundo Marta
Kohl de Oliveira, postulava que, [...] à dimensão sócio-histórica do funcionamento
psicológico humano está sua concepção da aprendizagem como um processo que
sempre inclui relações entre indivíduos. Na construção dos processos psicológicos
tipicamente humanos, é necessário postular relações interpessoais: a interação do
sujeito com o mundo se dá pela mediação feita por outros sujeitos (2002, p. 56).
Confirma-se, deste modo, que Vygotsky considerava extremamente
importante a interação do sujeito aprendiz com o mundo em que está inserido, no
qual as relações que esse sujeito terá, servirão como um auxílio ao seu próprio
desenvolvimento.

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INTERAÇÃO GRUPAL

Visto que as interações, no âmbito escolar, favorecem o desenvolvimento dos


alunos, pode-se acentuar que a relação entre aluno-aluno serve como um
instrumento de apoio ao professor, pois as crianças, neste momento, são mediadoras
de seus próprios conhecimentos. Vale ressaltar que, durante essa relação, ambos
os alunos podem avançar em seus conhecimentos sobre leitura e escrita, uma vez
que os aprendizes trocam informações positivas, entre si, que acarretarão a
mediação de um novo aprendizado.
A partir do olhar construtivo sob a interação aluno-aluno, destaca-se a
Interação Grupal, a qual pode ser descrita por uma interação que, [...]constitui uma
fonte de conflitos, visto que as crianças utilizam suas próprias hipóteses para
assimilar a informação do meio, e as põem à prova ao confrontá-las com as hipóteses
de outros, nem sempre idênticas às suas (FERREIRO; PALACIO, 1987, p.125).
Deste modo, observa-se que, por meio da interação grupal, o educando utiliza
os conhecimentos que possui para assimilar as informações advindas do meio, no
qual as ideias da criança são confrontadas, uma vez que, no momento da escrita,
suas representações não se assemelham, fazendo-a reestruturar seus pensamentos
quanto ao sistema de escrita alfabética.
Segundo Ferreiro e Palacio (1987), para a formação adequada das interações
grupais, o professor deve conhecer e se basear nos níveis de leitura e escrita de
seus alunos, expostos por Ferreiro e Teberosky, para que, deste modo, o educador
consiga agrupá-los, seguindo a exigência de que os níveis, de cada integrante do
grupo, estejam próximos. Vale acentuar que o agrupamento entre alunos, em níveis
distantes, não se torna produtivo, uma vez que a discrepância entre os
conhecimentos não permite o avanço dos aprendizes, pois aquele que se encontra
em uma etapa inferior tende a agir passivamente em um ato de recepção e não de
reconstrução de conhecimento, posto que, somente quando o aluno reconstrói as
informações recebidas pela interação com outra criança, é que conseguirá gerar o
conhecimento referente à leitura e escrita.
De forma sucinta, pode-se concluir que a troca de informações, provindas da
relação mútua entre as crianças, faz com que ambas progridam significativamente,

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no percurso do domínio do sistema de escrita alfabética. Pode-se, deste modo, inferir


que, a partir do instante que o aluno avançar em suas hipóteses de leitura e escrita,
há a necessidade de se remanejar os agrupamentos entre os educandos, posto que
os níveis de leitura e escrita se assemelham após o avanço dos envolvidos. Isto
posto, cabe ressaltar que essa interação grupal precisa ser repensada, para
possibilitar, novamente, o conflito entre seus pensamentos, objetivando, assim, um
novo progresso. Como se pode notar, neste caso, o professor assume uma postura
de líder, que deverá analisar como serão separados os agrupamentos, para que seus
alunos sejam beneficiados por este instrumento.

PROFESSOR MEDIADOR

A interação grupal é de extrema importância para a busca do aluno ao


conhecimento sobre leitura e escrita. Outra interação relevante, que gera a mediação
do conhecimento, é a relação do aluno com seu professor. Visto que o professor
assume uma postura imprescindível no processo de ensino sobre leitura e escrita,
Oliveira enuncia que Vygotsky preocupa-se particularmente (entretanto mais do que
Ferreiro, a meu ver) com a importância da intervenção pedagógica intencional para
que ocorra o processo de alfabetização, de domínio do sistema de leitura e escrita
[...] A mediação de outros indivíduos é essencial para provocar avanços no domínio
desse sistema culturalmente desenvolvido e compartilhado ( 2002, p.65).
Compreende-se, assim, que, para o professor tornar-se mediador do
conhecimento, ele necessita intervir ativamente, junto aos alunos, no processo de
compreensão do sistema de leitura e escrita. Vale ressaltar que o educador precisa
saber o momento em que deve intervir, para que esta mediação não se torne
repressiva, como ocorre nos métodos tradicionais. Em relação ao fato de Oliveira
afirmar que Vygotsky atribuía mais importância às intervenções pedagógicas do que
Ferreiro, cabe salientar que o estudioso dedicou mais tempo à pesquisa do
“professor” do que Ferreiro. Porém, a autora não menospreza esse agente
alfabetizador; o que ocorre é que seu foco na pesquisa se limitou a verificar como se
estrutura o pensamento do sujeito na construção dos conhecimentos que abrangem
o domínio da língua escrita. Ferreiro salienta a necessidade de a criança estar em

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contato com a escola, posto que [...] é muito o que a escola pode fazer para ajudar
as crianças, especialmente aquelas cujos pais, analfabetos ou semianalfabetos, não
possam transmitir-lhes um conhecimento que eles mesmos não possuem. O
professor é quem pode minorar esta carência, evitando, porém, ficar prisioneiro de
suas próprias convicções: as de um adulto já alfabetizado. Para ser eficaz, terá que
adaptar seu ponto de vista ao da criança (1992, p.60-61).
Deste modo, pode-se perceber que Ferreiro atribui ao professor um papel de
suma importância, no processo de alfabetização sobre leitura e escrita. Todavia, a
autora ressalta que o educador não deve agir embasado no pensamento de que ele
irá transmitir os conhecimentos que já possui, sobre os conceitos do sistema
notacional, aos seus alunos. A estudiosa aponta que o docente deve se submeter ao
ponto de vista de uma criança que ainda não compreendeu o sistema conceitual da
leitura e da escrita, para, deste modo, prosseguir com sua prática pedagógica.

AMBIENTE ALFABETIZADOR
As interações que a criança estabelece, seja com o professor, ou, até mesmo,
com outras crianças, fornecem informações resultantes da resposta, dos alunos, aos
estímulos externos. Deste modo, torna-se pertinente enunciar que o ambiente na
sala de aula pode oferecer interações construtivas, do aluno com o meio no qual será
alfabetizado. Desta forma, o ambiente escolar deve se organizar em função de propor
melhores condições, para que as crianças consigam elaborar e comprovar suas
hipóteses, acerca de como se estrutura a leitura e a escrita.
Taylor, Blum e Logsdon apud Teberosky e Colomer (2003) enfatizam que um
ambiente rico em cultura letrada deve oferecer às crianças situações de contato com
os suportes de linguagem escritas que contenham diversos textos da vida cotidiana
dos aprendizes, como rótulos, parlendas, logotipos, assim como os suportes (que
geralmente não são muito frequentes nos lares das crianças) como livros, atlas,
enciclopédias, dicionário. Vale ressaltar que os materiais deste ambiente
alfabetizador podem se constituir, ainda, de textos e objetos produzidos pelas
próprias crianças e que, também, estejam ao alcance delas, pois de nada adiantaria
promover um espaço, com todos estes suportes escritos, se tais elementos não
estiverem constantemente acessíveis aos alunos. Cabe, então, ao professor, atentar-

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se à importância da disponibilidade da criança à manipulação dos materiais da sala


de aula.
Deste modo, nota-se que, no ambiente alfabetizador, as crianças colocam à
prova seus conceitos, referentes ao sistema de escrita alfabética, uma vez que os
materiais acessíveis (desde que sejam significativos à vida social da criança) darão
apoio para os educandos verificarem se o pensam sobre a leitura e a escrita é
verdadeiro ou não, o que permitirá que possam avançar ou efetivar suas concepções.
Torna-se necessário salientar a significância de estarem dispostos na sala de aula
os trabalhos dos alunos, visto que, deste modo, os educandos podem visualizar suas
produções, tal como verificar seus avanços, por meio destas.
Ainda conforme os autores supracitados (Taylor; Blum; Logsdon, 1986, apud
Teberosky; Colomer, 2003) destacam-se dois fatores de suma importância que o
educador deve levar em conta, ao organizar um ambiente alfabetizador. O primeiro
se refere à qualidade do material a ser exposto na sala. O segundo relaciona-se ao
tempo de exposição do material em sala de aula. Quanto ao primeiro fator, acentua-
se que os docentes precisam desenvolver critérios de seleção de materiais que
despertam o interesse dos alunos, afinal o ambiente não é importante por si só, mas
para e pelo sujeito. Em relação ao segundo fator, este designado pela duração dos
objetos em classe, vale ressaltar que quando os materiais escritos são permanentes,
no decorrer do ano letivo, isto pode ser um sinal de que estes suportes não foram
utilizados nas aulas, o que lhes atribui um valor decorativo. Em contrapartida, quando
há mudança de material, no ambiente da sala de aula, nota-se um indicador de
sucessão de atividades.
Observa-se, assim, que o ambiente contribui significativamente, no avanço
dos alunos em relação ao aprendizado, posto que, quando há uma intencionalidade,
por parte do professor, em dispor na sala de aula materiais que estejam de acordo
com a necessidade de seus educandos, esses materiais resultarão no
desenvolvimento das crianças, referente ao processo de compreensão sobre a
leitura e a escrita. Vale acentuar a importância de se modificar os materiais
disponíveis em sala de aula, uma vez que, quando alternados, possibilitam o contato
com diferentes escritos, o que, por sua vez permite à criança vivenciar situações de
extrema relevância, para a efetivação do processo de alfabetização.

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Ferreiro e Teberosky atribuem grande importância ao ambiente alfabetizador,


todavia acentuam que “[...] não é o ambiente que alfabetiza, tampouco o fato de
pendurar coisas escritas nas paredes que produz por si um efeito alfabetizador”
(1999, p.8).
Assim, criar um ambiente alfabetizador significa organizar a sala com
materiais que favoreçam a aquisição do conhecimento, sobre a leitura e a escrita. O
ato de dispor materiais que não oferecem como objetivo o contato com a realidade
social das crianças se torna inadequado à busca de um espaço mediador de
aprendizagem, visto que o papel do ambiente alfabetizador é incentivar o interesse
das crianças pela leitura e escrita de forma natural.

CONSEQUÊNCIAS GERADAS PELA PESQUISA

A “Psicogênese da língua escrita”, sob uma ótica construtivista, comprova a


capacidade de o aluno ser o ator principal de seu próprio processo de compreensão
de leitura e escrita, o que, por sua vez, deslocou o foco da prática pedagógica,
sustentada nos métodos alfabetizadores tradicionais, que desconsiderava o
pensamento subjetivo do aluno. Tal perspectiva, adotou a ideologia de que a criança
é um sujeito ativo, capaz de construir seu próprio conhecimento, mediante a
interação com o meio no qual se encontra.
Nas palavras de Telma Weisz, pode-se verificar o quanto Emília Ferreiro e
Ana Teberosky demonstraram que [...] a mão que escreve e o olho que lê estão sob
um comando de um cérebro que pensa sobre a escrita que existe em seu meio social
e com a qual toma contato através da sua própria participação em atos que envolvem
o ler ou o escrever, em práticas sociais mediadas pela escrita (1999, p.8).
Compreende-se, assim, que a criança, antes mesmo de chegar à escola,
carrega de suas vivências sociais uma bagagem de conhecimentos referentes à sua
cultura letrada. Deste modo, o aluno deve ser visto sob um ângulo no qual ele seja o
construtor de seu próprio conhecimento.
Apesar do avanço que a educação percorreu após a publicação dos estudos
realizados por Ferreiro e Teberosky, esta concepção foi interpretada
equivocadamente por alguns educadores, que entenderam a proposta das

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pesquisadoras como um sinalizador de que o aluno deveria ser livre, pois aprenderia
tudo sozinho. Morais exprime que a [...] má apropriação da teoria da psicogênese [...]
teriam levado à conclusão de que não era preciso ensinar, de modo sistemático e
planejado, a escrita alfabética, porque os alunos espontaneamente a aprenderiam
participando de práticas de leitura e produção de textos (2012, p.24).
Observa-se, portanto, que, por questões interpretativas inadequadas, a teoria
de Ferreiro e Teberosky foi compreendida como uma abertura ao ensino, sem metas
impostas, pois havia a crença de que os alunos dariam conta de aprender todo o
sistema da língua escrita naturalmente. As autoras, realmente, enunciaram que a
criança é capaz de construir seu próprio conhecimento; todavia, lançaram luz à
questão de que, para alcançar a aprendizagem sobre a leitura e a escrita, os alunos
passam por um processo marcado por diversas interações que o auxiliam. Deste
modo, o aprendiz não poderia, por si só, dominar o sistema notacional.
Ferreiro (1992) ressalta que muitas questões foram levantadas, neste sentido,
de que a criança aprenderia tudo sozinha. Uma delas se refere ao papel do professor,
mediante ao fato de os alunos já possuírem um repertório sobre a compreensão da
escrita. Em resposta a esta indagação, a autora afirma que sua pesquisa não
menospreza o papel da escola e do professor, já que os considera como
imprescindíveis, mas atribui-lhes o legado de propiciar condições favoráveis, para
que as crianças descubram por si mesmas os enigmas do sistema notacional.
Vale ressaltar ainda que, apesar da má compreensão da pesquisa, esta
trouxe avanços à prática pedagógica, em razão de lançar uma educação exclusa da
ditadura dos métodos tradicionais. Weisz salienta que as pesquisas de Emília
Ferreiro e colaboradores romperam o imobilismo lamuriento e acusatório e
deflagraram um esforço coletivo de busca de novos caminhos. Deslocando a
investigação do “como se ensina” para o “como se aprende”, Emília Ferreiro
descobriu e descreveu a psicogênese da língua escrita e abriu espaço – agora sim –
para um novo tipo de pesquisa em pedagogia. Uma pedagogia onde a compreensão
do papel de cada um dos envolvidos no processo educativo muda radicalmente. Suas
ideias, quando levadas a prática, produzem mudanças tão profundas na própria
natureza das relações educacionais, alteram de tal maneira as relações do poder
pedagógico que, sonho ou não, é inevitável acalentar a ideia de que esta revolução

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conceitual sobre a alfabetização acabe levando a mudanças profundas na própria


estrutura escolar (1992, p.6).
Em suma, Weisz exprime, sucintamente, toda a revolução ocasionada pela
publicação da Psicogênese da língua escrita, que, de fato, deslocou o foco do como
se ensina para o modo como se aprende, ou, em outras palavras, expôs o caminho
que cada criança percorre, em busca da compreensão do sistema de escrita,
ressaltou a necessidade de o educador observar e considerar as subjetividades de
seus educandos. Dessa forma, este novo olhar permite ao docente refletir sobre seus
conceitos, quanto ao processo de ensino aprendizagem. Todavia, apesar de todos
esses benefícios, existem aqueles educadores que não acolhem as ideologias
dispostas nesta perspectiva, o que traz à tona a dúvida de se os professores, na
realidade escolar, oportunizam ao aluno situações de ensino-aprendizagem de
alfabetização que o leva a construir seu próprio conhecimento, de forma ativa e
autônoma.

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