VENTURINI Linguistica Aplicada No Ensino Da Lingua Portuguesa
VENTURINI Linguistica Aplicada No Ensino Da Lingua Portuguesa
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Boa leitura!
sumário
Primeiras palavras
Referências
1. Primeiras palavras
Na disciplina Linguística Aplicada, estuda-se a linguagem em uso
em situações de interação, do que se pode dizer que como disciplina
ela está do lado oposto de Saussure e Chomski, segundo Hammes e
Cerutti-Rizzardi (2011). Isso ocorre porque Saussure concebe a língua
como sistema, excluindo o sujeito de todo o processo e Chomski atrela
a aprendizagem de língua à competências e desempenho, entendendo
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O fio condutor da disciplina é, portanto, o ensino de língua ma-
terna, mais especificamente, discussões que envolvam “[...] problemas
linguísticos socialmente relevantes em se tratando da apropriação da
modalidade escrita por alunos brasileiros [...]” (HAMMES e CERUT-
TI-RIZZARDI, 2011, p. 12). No desenvolvimento da disciplina, vamos
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Além de apresentar e discutir as concepções de língua/linguagem
como determinantes dos objetivos, da modalidade de gramática a ser
trabalhada e, consequentemente, as atividades de ensino aprendizagem
a serem praticadas a partir de cada tomada de posição do professor,
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2. Concepções de língua/linguagem e
ensino de Língua Portuguesa
O ensino de gramática é uma das grandes preocupações daqueles que
trabalham com ensino ou com a Linguística Aplicada, entendida como a
relação entre a teoria Linguística e aprendizagem de língua. De acordo com
Neves (2003), quando se fala em gramática é salutar pensar de que gramática
se está falando, qual o tratamento que é dado a ela e que gramática ensinar
na escola. Junto a essas questões, a pesquisadora destaca a relação da Lin-
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V às situações de usos.
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Figura 2 – Irandé Antunes: foco no ensino de língua
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V Foto: A autora.
Foto: A autora.
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Essa concepção de linguagem demanda que sejam seguidas regras
lógicas, por entender que elas contribuem para a organização do pen-
samento e, como consequência, da escrita e da fala. Seguimos o des-
taque dado por Antunes (2007) e referendamos que as gramáticas não
são inocentes, principalmente, quando priorizam o falar culto, prati-
cado pelas classes mais elitizadas. Nessa perspectiva, vale sublinhar, as
regras regem o falar e o escrever.
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3. Contraposição à normatização e
ao ensino centrado em regras
Além de Neves (2002, 2003, 2010), de Antunes (2007), de Perini
(1997), de Possenti (1999) e de Bagno (2001a, 2001b, 2007) há outros
pesquisadores que se contrapõem ao ensino normativo e discutem ou-
tras possibilidades de ensino de língua, já não diríamos, de ensino de
gramática. Possenti (1996), mesmo parecendo, pelo título do livro – Por
que (não) ensinar Gramática na Escola, que defende o não-ensino, desta-
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cognitiva apontada pelo autor consiste no equívoco de pensar que “[...]
cada falante ou grupo de falantes só pode aprender e falar um dialeto
(ou uma língua). [...] a defesa e dos valores ‘populares’ suporia que o
povo só fala formas populares.” (POSSENTI, 1996, p. 19).
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Outro ponto destacado pelo autor como fundamental é o de que
o ensino de gramática que está na escola é aquele pautado em regras e
não na pesquisa ou nos interesses das comunidades, do que se entende
que há um ponto comum entre Perini e Neves (2003), pois ela destaca,
muito enfaticamente, a falta de reflexão sobre a língua no processo de
ensino-aprendizagem de língua materna. Segundo a autora, a criança
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No primeiro livro mencionado, já no título o autor mostra a qual
gramática refere-se quando fala no Português e questiona se é brasilei-
ro. Para o pesquisador, ensinar o Português “[...] é transmitir – cons-
ciente ou inconscientemente – uma ideologia linguística que prega a
incompetência da grande maioria dos brasileiros em falar ‘a língua de
Camões’, que acusa todos eles de contribuírem para a ‘ruina do idioma’”
(BAGNO, 2001a, p. 9). Essa postura em relação ao idioma, segundo
o autor, promove a humilhação dos cidadãos, além disso “Esmaga a
autoestima dos cidadãos”. O Português, em detrimento do brasileiro,
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formulação das regras, que mudam, assim como mudam os sujeitos.
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Figura 5 – Marcos Bagno: repensando a língua e o ensino
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V Foto: A autora. V
Em Dramática da Língua Portuguesa: tradição gramatical, mídia
& exclusão social, Bagno (2001 b), fala da Gramática Tradicional, do
senso comum e do preconceito linguístico. Retoma Geraldi (2002) e
Possenti (1996) para criticar a defesa que eles fazem do ensino da gra-
mática normativa, sinalizando que não é a norma culta que resolve os
problemas da sociedade, dizendo que o que está em jogo é a transfor-
mação da sociedade, “[...] pois enquanto vivermos numa estrutura so-
cial cuja existência mesma só é possível com desigualdades profundas,
todas as tentativas de promover a ascensão social dos marginalizados
não passam de mitificação [...]” (BAGNO, 2001 b, p. 95).
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Em outra direção, Coracini (2009) entende que, na aquisição da
língua e no estudo dela, está sempre atrelada cultura, pois uma língua
ocorre juntamente com outras línguas e com outros discursos. Desse
modo, não há língua pura e isso significa que as palavras são atraves-
sadas por outras palavras. Com isso, Coracini discute a impossibilida-
de de trabalhar com a gramática normativa, com regras pré-concebi-
das, tendo em vista a relação da prática linguareira entre outros, quais
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Trata-se, segundo Venturini (2012, p. 76), da gramática
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sustentam os efeitos de sentidos, que possibilitam mais de uma leitura,
mas não qualquer uma.
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4. Língua como instrumento de
comunicação
A concepção de linguagem como instrumento de comunicação,
como meio objetivo de organizar a enunciação, tal como é definida
por Benveniste (1989) entende a língua como código, mais especifica-
mente, como um conjunto de signos que se combinam segundo regras,
por meio das quais o sujeito falante transmite mensagens a um emis-
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sor. O código deve ser dominado pelos falantes para que a comunica-
ção se efetive. Nessa concepção, a língua é vista como código, atende à
finalidade comunicacional, tida como um ato social por envolver pelo
V menos duas pessoas, que, de acordo com Travaglia (1997, p. 22) “[...] é
necessário que o código seja utilizado de maneira semelhante, pré-es-
tabelecida, convencionalizada.” O sistema linguístico, funcionando no
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ato comunicacional, é percebido como um fato externo à consciência
individual e independente dela. O objeto de estudo, nessa concepção,
é a língua como código virtual, isolado de sua utilização – na fala (nos
termos de Saussure) ou no desempenho (na terminologia de Chomsky).
Foto: A autora.
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Um dos exemplos de gramática descritiva é a de Perini (1995).
Nessa obra ele reflete sobre a língua e a descreve. Outro exemplo,
mais centrado na gramática comunicativa é de Travaglia (2003), dis-
cutindo a comunicação e as formas de escrever de um modo e do
outro. Nessa obra, o autor mostra que aprender a língua, a partir de
nomenclaturas, não é sinônimo de usar/trabalhar/comunicar-se. As
nomenclaturas, nessa perspectiva, interessam aos linguistas, mas não
aos falantes da língua.
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utilizadas. Nesse tipo de ensino, a língua materna tem papel relevante
por ser a que o aluno mais conhece. Sua validade pauta-se na crença
de que o falante precisa saber algo da instituição linguística de que se
utiliza, do mesmo modo que precisa saber de outras instituições so-
ciais, para melhor atuar na sociedade. O ensino prescritivo existe não
só a partir das gramáticas descritivas, mas também no trabalho com as
gramáticas normativas. A diferença é que o trabalho com a gramática
normativa atende somente à variedade culta e a gramática descritiva
abrange todas as variedades, dando destaque à oralidade.
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comunicacionais inseridos em tempos, sociedades e culturais distintas.
5. Língua/linguagem como
processo de interação
A concepção de linguagem como forma ou processo de interação
vê a linguagem como um lugar de interação humana, de interação
comunicativa que ocorre por meio da produção de sentido entre inter-
locutores, em uma dada situação de comunicação e em um contexto
sócio-histórico e ideológico. Os usuários da língua ou interlocução in-
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tenha necessidade delas.
Segundo Travaglia (1997), o objetivo do ensino produtivo é desen-
volver a competência comunicativa, que resulta em novas habilidades
de uso da língua. Esse ensino visa, especificamente, o desenvolvimen-
to de novas habilidades e inclui atividades de ensino produtivo, que
prioriza o domínio da norma culta e da variedade escrita dessa varian-
te. O trabalho com a variedade culta é considerado produtivo, tendo
em vista que quando o aluno entra para a escola não tem, em tese,
nenhuma habilidade relativa à variedade escrita.
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gência para que ele possa explicar os fenômenos linguísticos e não cair
no extremo de entender que tudo, transformando o ensino de língua
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em uma prática sem planejamento e sem sustentação teórica.
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6. O ensino de língua portuguesa:
deficiências e alternativas para
mudar paradigmas
Pensar o ensino de língua Portuguesa significa pensar numa rea-
lidade que permeia todos os atos cotidianos, mais precisamente, a
realidade da linguagem, que nos acompanha em todas as esferas da
vida, do âmbito privado ao público. É impossível pensar a vida sem
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equívocos e as alternativas para mudar paradigmas. A argumentação,
em torno dessas duas perspectivas, ancora-se em reflexões e conceitos
desenvolvidos por Geraldi (2202), Possenti (1996), Neves (2010), Peri-
ni (1995), Travaglia (1997), Marcuschi (2005), Fiorin (1996), Orlandi
(2002), Bagno (2001 a, 2001 b, 2007) e Antunes (2007), entre outros.
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Foto: A autora.
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primeira deficiência sem apontar para a premissa apontada por Possenti
(1996), de que cabe à escola ensinar aquilo que o aluno não sabe. Não
é fácil saber o que aluno não sabe, mas abordando a língua a partir de
variados tipos de textos, concebendo-a em movimento – em uso –, tra-
zendo para a sala de aula as modalidades orais e escritas, numa pers-
pectiva sociointeracional, contempla-se o desenvolvimento de várias
competências, entre elas, a de sujeito-leitor, que numa ótica discursiva
é também produtor do texto. A língua em uso é enfocada tendo como
base os gêneros textuais ou discursivos definidos por Marcuschi (2005,
p. 19) como “[...] fenômenos históricos, profundamente vinculados à
vida cultural e social como práticas sócio-históricas.” Com isso oportu-
niza-se ao aluno a autonomia em relação à leitura, à produção textual
e à oralidade – uma das modalidades da língua em uso, marcada por
implícitos, não-ditos, por silêncios e interdições que lhe são inerente
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Bagno (2001 b) destaca que o ensino da norma padrão na escola
justifica-se pelo fato dessa modalidade ter valores que não podem ser
negados – em sua estreita associação com a escrita. Esses conheci-
mentos representam a cultura valorizada e prestigiada, de que todos
os falantes têm direito de se apoderar para se integrar, de pleno, di-
reito na produção/condução/transformação da sociedade de que fazem
parte. No entanto, a norma-padrão independe das aulas de gramática
tradicional, das regras a serem decoradas, da memorização de concei-
tos incompletos que não dão conta da língua em funcionamento. O
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V Para fazer isso é necessário dar maior espaço aos gêneros textuais
(o maior número possível) e de variedades de língua: rurais, urba-
nas, formais, informais, cultas, não cultas. Na argumentação, o autor
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destaca a importância do Projeto Norma urbana culta (NURC), que
documentou aspectos das falas cultas urbanas das principais capitais
brasileiras para, a partir desse corpus, ajustar o ensino de língua por-
tuguesa, em todos os graus, a uma realidade linguística concreta, evi-
tando a imposição indiscriminada de uma norma histórico-literária
resultante do tratamento prescritivo.
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para casa.” Nesses dois exemplos temos dois eventos de linguagem:
o emprego do artigo definido e indefinido e o uso do presente do
subjuntivo e do presente do indicativo. No primeiro caso, trata-se de
qualquer carro e no segundo, de um carro identificado. Em relação
ao verbo levar, o presente do subjuntivo indica uma ação condicional,
esporádica e o segundo, de uma ação costumeira.
Ainda a esse respeito, Neves (2006) salienta que colocar como ob-
jeto de investigação a língua em uso é ter presente que a utilização da
linguagem e a produção de texto se fazem na interação e que observar
os usos linguísticos é rejeitar o tratamento ingênuo e fácil que homo-
geneíza o funcionamento da língua, desconhecendo que algumas clas-
ses são explicadas no limite da oração, mas outras só são resolvidas no
funcionamento discursivo-textual (por exemplo a referenciação), uma
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instrução de busca que transcende os limites da estruturação sintática.
A segunda tese subjacente nos trabalhos dos autores citados e com
os quais comungamos é: ao professor compete preparar as bases de um
ensino cientificamente embasado e operacionalizável, indo além das
teorias em direção à prática. Essa segunda premissa é importante, mas
se constitui em uma das deficiências no ensino da língua. Segundo
Fiorin (1996), uma das perversões do ensino da língua é a não aplica-
ção das teorias linguísticas no trabalho pedagógico. O professor como
estudioso e pesquisador que é, deve ser, juntamente com o aluno e
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O livro didático, talvez seja um mal necessário, diante das circuns-
tâncias atuais. No entanto cabe ao professor analisá-lo para saber se o
livro tem coerência teórica e se as atividades propostas estão de acor-
do com a teoria que sustenta o seu fazer pedagógico. Cabe-lhe saber
também, se não há mistura de teorias, que evidenciam contradição,
especialmente nas atividades propostas. Além disso, frequentemente
o professor necessita modificar a forma de abordar o conhecimento.
Essa modificação é chamada de transposição didática. Na escola, os
objetos do conhecimento – o saber científico ou as práticas sociais –
convertem-se em objeto de ensino, em conteúdo curricular. Para fazer
isso, o professor precisa, evidentemente, conhecer a teoria e fazer os
recortes necessários, de acordo com as competências descritas na pro-
posta pedagógica.
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O conhecimento teórico é necessário também, pois não há como
sustentar uma visão teórica de língua como prática social se as ativida-
des do livro didático adotado priorizam exercícios de preencher espa-
ços, questões fechadas de compreensão textual ou textos que não con-
templam os mais diversos gêneros textuais ou discursivos. Em relação
ao posicionamento teórico do professor, só para exemplificar, citamos
a abordagem dos gêneros no trabalho com a língua. Os equívocos co-
meçam com o nome, alguns autores utilizam gênero textual e outros,
gênero discursivo. O professor precisa optar por uma terminologia ou
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A abordagem da língua como prática sociointerativa pressupõe
que também a produção textual se constitui numa interlocução, em
que são criadas situações reais de interação. Por exemplo, escrever uma
carta para o professor, solicitando que sejam realizados trabalhos, no
lugar da prova. Isso porque, o sujeito-autor tem que ter o que dizer,
a quem dizer, como dizer e razões para dizer, constituindo-se como
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Referências
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V PERINI, M. Sofrendo a gramática: ensaios sobre a linguagem. São Paulo: Ática, 1997.
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TRAVAGLIA, L. C. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de 1o e 2o graus. São Paulo, Cortez,
1997.
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Jun/2019