Teoricas Superheterodino

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1- SISTEMAS DE TELECOMUNICAÇÕES

1.1 - INTRODUÇÃO
Para comunicar à distância o homem desnvolveu durante a século passado diversas tecnologias
suportadas na electrónica. Ao entrar no século XXI, as comunicações pessoais com o lançamento da
terceira geração de comunicações móveis permite a cada indivíduo com equipamento portátil e
ergonómico ter acesso a comunicações de voz dados e imagem de qualidade. O tempo das comunicações
em linha de vista por sinais luminosos ou não, ou por sinais de fumo ou sonoros há muito que pertence ao
passado. O maior impulso nas comunicações à distância deu-se quando foi possível prescindir de fios de
ligação – comunicações sem fios. O marco histórico que é usualmente citado como o início das
telecomunicações sem fios foi a comunicação transatlântica de sinais de rádio por Giuglielmo Marconi em
1901. As comunicações via rádio sofreram uma primeira fase de incremento acentuado na década de 50
após a invenção nos Bell Labs do transistor. Até ao final do século podemos ainda referir mais um marco
importante – o desenvolvimento da microelectrónica. Primeiramente, a microelectrónica permitia apenas
processar sinais com informação em baixa frequência (décadas de 60 e 70) mas mais tarde (décadas de
80 e 90) tornou-se comercialmente possível processar sinais de rádio frequência (frequência até algumas
centenas de MHz), microondas (até alguns GHz) e mais recentemente, ondas milimétricas (até algumas
centenas de GHz).
No presente texto, aborda-se a estrutura básica dos sistemas de telecomunicações sem fios via
rádio (vulgo sistemas de rádio frequência - RF) bem como os circuitos electrónicos mais usuais para
processar os sinais de alta frequência (frequências tipicamente superiores a alguns MHz). Quanto ao
processamento dos sinais de baixa frequência, existe um número elevado de livros de texto que se
dedicam a tal tema pelo que está fora do âmbito deste texto.
Em conformidade, os transreceptores, equipamento de transmissão e recepção de sinais eléctricos,
para sistemas de telecomunicações via rádio, podem ter um esquema em blocos elementar como o da
figura 1.1. A antena é a interface entre os circuitos de processamento de sinais guiados por condutores e o
espaço livre, meio que interliga os dois utilizadores que pretendem comunicar à distância.
Interface Interface
com Antena Antena com
utilizador utilizador

BB RF RF BB

Figura 1.1 – Esquema em blocos elementar dum transreceptor para sistema de telecomunicações

No transmissor a unidade de Banda de Base (BB) converte os sinais eléctricos básicos fornecidos
pelo utilizador através da unidade terminal (interface utilizador – transreceptor) num sinal composto de
1.2 Capítulo 1

acordo com uma dada forma de codificação. Em seguida, a unidade de Radio Frequência (RF) converte
este sinal num de alta frequência de acordo com as normas do serviço a utilizar (frequência e modulação) e
aplica-o á antena que é, como se referiu, a interface entre o transrecptor e o espaço livre por onde se
propaga o sinal electromagnético até ao destino.
Na recepção, o sinal complexo existente no espaço livre é captado pela antena (interface espaço
livre – transreceptor) e a sua componente que se pretende receber é filtrada e convertida para um sinal de
baixa frequência (BB) na unidade de RF. A unidade de BB recupera a informação inicialmente fornecida
pelo utilizador do emissor e aplica-a à unidade terminal por forma a ser fornecida ao utilizador do receptor.
Os circuitos que serão objecto de estudo neste texto são os incluidos na unidade de RF. A
complexidade desta unidade e da sua consepção deve-se essencialmente a três factores. Em primeiro
lugar, para se projectar circuitos de alta frequência é necessário ter conhecimentos interdisciplinares: teoria
da comunicação, propagação, microondas, arquitectura de transreceptores, normalização de sistemas de
comunicações, microelectrónica e materiais (condutores, isolantes e semicondutores). Como os sinais a
processar são inicialmente analógicos, mesmo que a modulção seja digital, e têm geralmente uma grande
gama dinâmica, há que ter em conta compromissos que têm em conta as características de ruído,
linearidade, frequência e ganho, sem esquecer o volume, peso, consumo e tensão de alimentação
nomeadamente quando se trata de transreceptores portáteis. Finalmente, como os componentes, mesmo
os passivos, não são ideais, há que ter em conta modelos completos incluindo efeitos parasitas, que só são
devidamente considerados utilizando-se ferramentas de projecto assistido por computador (CAD).
De seguida são apresentadas as configurações mais usuais para a unidade de RF dos
transrecptores.

1.2 – ARQUITECTURA DE TRANSRECEPTORES

1.2.1 - Introdução

Um transreceptor tem que exercer duas funções básicas: transmitir e receber sinais com
informação. É pois necessário evitar a interferência entre estas duas partes do transreceptor. Muitas vezes
a antena é partilhada e é necessário transmitir e receber simultâneamente (full-duplex). O último bloco
activo do emissor é o amplificador de potência (PA – power amplifier), que excita a antena com um sinal
de nível elevado, de acordo com o serviço em causa (frequência e alcance pertendido). Típicamente são
sinais com amplitudes da ordem dos Volt. O primeiro bloco activo dum receptor é o amplificador de baixo
ruído (LNA – low noise amplifier), projectado para amplificar sinais muito fracos sem adicionar ruído

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Electrónica das Telecomunicações
Capítulo 1 1.3

significativo. Os sinais na recepção são tipicamente da ordem dos microvolt. Há pois aqui um conflito
óbvio.
A separação emissor/receptor é usualmente garantida por filtros sintonizados às respectivas
frequências de emissão e recepção. O conjunto do filtro passa-banda de recepção (FPBdR) e do de
emissão (FPBdE) é denominado diplexer (Fig.1.2). Por um lado, o sinal do emissor deve ser todo
aplicado à antena para melhorar o rendimento do transreceptor e o efeito de carga do LNA não introduzir
distorção não linear ao amplificador de potência de saída. Por outro lado, deve evitar que o sinal do
emissor sature o amplificador de baixo ruído, que opera com baixos valores de polarização DC,
provocando a dessensibilização do receptor. Na prática consegue-se obter uma atenuação do sinal do
emissor de 20 a 30dB, na entrada do receptor (isolamento emissor receptor). No entanto, quanto maior é
a selectividade dos filtros, maior as perdas do diplexer. Frequentemente estas perdas podem ser de 2 a
3dB, o que significa que o amplificador de potência terá de entregar ao diplexer uma potência que pode
ser o dobro da radiada. Uma forma de evitar o uso do diplexer é impôr que não haja simultaneidade da
emissão e da recepção. Por exemplo, no sistema GSM, os periodos de emissão e recepção têm intervalos
de tempo de separação.
Antena

FPBdE emissor
Unidade
BB
FPBdR receptor
diplexer

Figura 1.2 – Interligação emissor/receptor por diplexer

Nos sistemas que utilizam esta técnica (half-duplex) a antena pode ser ligada ao emissor e
receptor através de um comutador de uma entrada e duas saídas (SPDT - single pole double through
switch). Na figura 1.3 bapresenta-se o esquema em blocos deste tipo de ligação. É usual obter-se
isolamentos emissor- receptor da ordem dos 20dB.
Antena
o emissor
Unidade
o comutador
BB
o receptor

Figura 1.3 – Interligação emissor/receptor por comutador SPDT

Os comutadores têm perdas que podem ser tipicamente de apenas algumas décimas de dB.

1.2.2 – Receptores

1.2.2.1 - Alvorada

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Maria João Rosário e João Costa Freire
1.4 Capítulo 1

Um receptor de radio-comunicações tem que captar o sinal de radio frequência existente no


espaço livre que é em geral muito fraco, pelo que é simultâneamente necessário eliminar sinais indesejáveis
(filtragem) e detectar a informação nele existente. A informação é introduzida no sinal de radio-frequência
sinusoidal através da variação (modulação) de uma das sua características proporcionalmente ao sinal de
banda de base (informação a transmitir). Consoante a característica que se varia (amplitude, fase ou
frequência) ter-se-à um determinado tipo de modulação. Um capítulo do presente texto é dedicado à
introdução dos diferentes tipos de modulação.
Consideremos um pouco de história das radio comunicações. Os primeiros recptores não tinham
amplificação (1900’s). O sinal de radio frequência (portadora), que transportava a informação na sua
amplitude (modulação de amplitude - AM) era captado pelo antena e aplicado a um circuito ressonante
com um detector de pico e auscultadores de alta impedância (figura 1.4).
Antena
detector
(galena)
RF z»
D
L C

Figura 1.4 – Esquema em blocos dum receptor de radio simples a cristal

Com o invento dos tubos electrónicos é introduzida nos receptores amplificação. Na figura 15
apresenta-se o esquema do receptor regenerativo de Armstrong (1912). O nome advem da existência de
realimentação positiva dependente do acoplamento entre as bobinas L1 e L2 e que define o ganho.
Elevando o ganho foi possível obter simultâneamente elevada sensibilidade (alto ganho) e elevada
selectividade (alto factor de qualidade, Q>>). O tubo, devido à sua não linearidade, também funciona
como detector.
antena
tubo L2
RF

L1 C VKdc
VBdc

Figura 1.5 – Esquema dum receptor regenerativo

Mais tarde, o mesmo Armstrong (1922) propôe um receptor super-regenerativo que inclui um
amplificador de resistência negativa, que é obtida a partir de um tubo electrónico. Para evitar a saturação e
instabilidade, a resistência negativa é retirada do circuito periodicamente (figura 1.6).

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Electrónica das Telecomunicações
Capítulo 1 1.5

antena
RF des
modulador
R -R N
L C

oscilador

Figura 1.6 – Esquema dum receptor super-regenerativo

Este esquema é ainda hoje utilizado, mas só em sistemas que se pretende simples (um só
semicondutor) tais como telecomandados de brinquedos e portas. Uma das principais desvantagens é a
elevada radiação do sinal do oscilador de comando.
Sendo actualmente, o sinal proveniente da antena tipicamente da ordem dos -100dBm e
necessitando os circuitos de recuperação da informação (desmodulação ou detecção) de sinais da ordem
de 0dBm (este valor é fortemente dependente do tipo de modulação pelo que se deve entender como uma
mera indicação introdutória) um receptor terá de amplificar 100dB o sinal de radio-frequência, antes de o
detectar. Esta amplificação não pode ser obtida associando múltiplos andares sintonizados em cascata sem
se correr o risco de instabilidade (receptor sintonizado - figura 1.7). Para reduzir a instabilidade foi
introduzida a neutralização dos tubos, compensação da realimentação interna que será estudada no
capítulo dedicado a amplificadores lineares. Por outro lado, a saturação das bandas de frequência
utilizadas em comunicações sem fios leva à necessidade de ter receptores fortemente sintonizados. Por
exemplo, para seleccionar directamente um emissor de radio difusão em FM, frequência de cerca de
100MHz e separação de frequências de 100KHz, o factor de qualidade do filtro passa banda de selecção
do emissor tem de ser superior a 1000, o que não é fácil de obter, nomedamente em sistemas de pequena
dimensão, portáteis e de baixo custo. Outro inconveniente desta arquitectura é necessitar de se variar em
simultâneo a sintonia dos vários andares de amplificação (alinhamento do receptor) quando se pertende um
receptor de sintonia varável. A realimentação é também responsável pela interacção entre os diversos
filtros, dificultando o alinhamento.
Antena
Ampli RF Ampli RF Ampli RF Ampli BB

FPBd FPBd FPBd des terminal


frf frf frf
modulador

Figura 1.7 – Receptor sintonizado

Quer por estes motivos, quer devido a especificidades dos sistemas de modulação mais eficientes
hoje empregues (a modulação de amplitude é cada vez menos utilizada) a estrutura dos receptores é
actualmente bem mais complexa que a dos receptores pioneiros das figuras 1.4 a 1.6 ou do sintonizado da
figura 1.7.
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Maria João Rosário e João Costa Freire
1.6 Capítulo 1

1.2.2.2 - Heterodino

Para facilitar a sintonia do canal a receber e reduzir o ganho a uma só frequência foi proposto por
Armstrong em 1917 o conceito do receptor superheterodino (do grego heteros – outra, dynamis – força,
figura 1.8). Baseou-se Armstrong, no conceito usado por Pulsen e justificado por Fassender de
amostragem a frequência constante de um sinal DC para obter um sinal de frequência audio, detectando
assim um sinal CW.

Antena Ampli RF
LNA misturador Ampli IF Ampli BB

FPBd FPBd FPBd des


frf frf fif terminal
modulador

oscilador
local flo

Figura 1.8 – Receptor superheterodino

Ao desviar o espectro do sinal com informação, centrado em frf (portadora) para uma frequência
intermédia fif entre frf e a do sinal de banda base (baixa frequência – 0 a fbb), pode-se introduzir a maior
parte da amplificação necessária antes da desmodulação, a uma frequência mais baixa, e portanto mais
fácil de realizar por mais longe da frequência máxima de operação dos componentes electrónicos
disponíveis. Este desvio ou conversão de frequência, é conseguido à custa dum misturador de frequência
(MX – mixer) e um oscilador local (LO – local oscilator), dois novos blocos. O oscilador fornece um
sinal de frequência fixa comandado pelo operador do receptor. Quanto ao misturador, embora existam
muitos tipos de topologias para o realizar vamos considerar, nesta fase introdutória, que é um multiplicador
de sinais.

Por outro lado, caso se pretenda um receptor de sintonia variável, é possível introduzi-la apenas
nos circuitos sintonizados em frf e no oscilador local flo fazendo a selectividade mais intensa à fif com filtros
fixos. Voltando ao exemplo do receptor de radio difusão em FM, para frf = 100MHz e fif = 10.7MHz, a
selecção de canais afastados de 100KHz já só exige filtros com Q˜100 em torno de uma frequência 10
vezes mais baixa, 10.7MHz em vez de 100MHz, portanto tecnologicamente mais fáceis de realizar. Em
princípio, os filtros de RF podem ser dispensados se não existirem sinais interferentes na proximidade de
frf.
No entanto, não há bela sem senão, e o receptor superheterodino introduz um novo problema: a
frequência imagem.

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Electrónica das Telecomunicações
Capítulo 1 1.7

Se em tensão se tem na entrada e no oscilador local vrf=Vrfm cosωrft e vol=Volm cosωolt,


respectivamente, à saída do misturador/multiplicador tem-se:

[ ( ) (
v fi = V rfm cosω rf t × Volm cosω olt = 12 Vrfm V rfm cos ω rf + ω ol t + cos ω rf − ω ol t )] (1.1)

Como só se pretende ter um sinal com uma frequência mais baixa (ffi= frf-fol) o termo soma gerado na
multiplicação, tem de ser filtrado. Para um multiplicador perfeito o filtro pode ser um passa baixo com
frequência de corte compreendida entre frf-fol e frf+fol. No entanto, em circuitos reais, é usual ter-se um
filtro passa banda centrado em ffi=frf-fol. Ao conjunto misturador/filtro é usual chamar-se conversor de
frequência.
Se na entrada do receptor estiver presente, além do sinal desejado frf, um sinal de frequência fim=
2fol-frf, denominado sinal imagem (IM) do sinal de RF, dado por vrf=Vim m cosωimt, ter-se-á na saída do
misturador, por analogia com (1.1):

[ ( )
v fi = Vimm cosω imt × Volm cosω ol t = 12 Vimm V olm cos 3ω ol − ω rf t + cos ω ol − ω rf t ( )] (1.2)

Atendendo a que cos(x)=cos(-x) verifica-se que o sinal presente à saída do misturador tem duas
componentes à mesma frequência mas uma dependente do sinal imagem e outra dependente do sinal de
RF. Qualquer filtragem convencional não é capz de separar os dois sinais. Há pois que evitar a presença
de sinais imagem na entrada do misturador. Por este motivo é fundamental a existência do ou dos filtros de
entrada sintonizados em RF (figura 1.8) que terão assim uma função adicional à de selecção do sinal de
RF, que é a de rejeição do sinal imagem, que não é atenuável após a mistura. No capítulo dedicado ao
estudo de misturadores de frequência apresentar-se-á algumas topologias que permitem teóricamente o
anulamento de alguns dos sinais indesejáveis, nomeadamente do sinal imagem (conversores com rejeição
de frequência imagem). A utilização deste tipo de circuitos permite aligeirar as especificações dos filtros de
RF mas aumanta a complexidade do conversor de FI.

O sinal imagem é assim denominado já que se encontra localizado no eixo das frequências como
uma imagem do sinal de RF sendo o OL o espelho (figura 1.9).

ffi
ffi

ffi fim fol frf f

Figura 1.9 – Frequência imagem em receptores superheterodinos

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Maria João Rosário e João Costa Freire
1.8 Capítulo 1

Relativamente ao exemplo das expressões (1.1) e (1.2) tem-se: frf= fol+ffi e fim= fol-ffi. Para afastar
a frequência imagem da banda do sinal a receber há pois que usar uma frequência intermédia elevada. No
entanto, esta opção dificulta a filtragem do canal, ao aumentar o factor de qualidade exigido ao filtro de
canal. Há pois que se ter um compromisso na escolha da frequência intermédia: para uma frequência
intermédia baixa tem-se uma filtragem do canal mais fácil; enquanto que para uma frequência intermédia
elevada se tem uma filtragem do sinal imagem mais fácil (figura 1.10).

filtro RF filtro RF
filtro FI filtro FI
canal adjacente
pouco atenuado

ffi fim fol frf f ffi fim fol frf f

Imagem quase suprimida vestígio da imagem canal adjacente

(a) (b)

Figura 1.10 – Receptor superheterodino com (a) frequência intermédia elevada e (b) baixa

Para receber canais de RF afastados de 100KHz numa banda de 80 a 120MHz com um receptor
de FI de 10.7MHz pode-se utilizar um OL variável de 69.5 a 109.5MHz (injecção inferior) ou de 90.5 a
130.5MHz (injecção superior). Se no primeiro caso o oscilador local tem uma frequência mais baixa, no
segundo a gama de variação precentual da frequência é menor. (40/89,5% em vez de 40/110,5%). Será
assim dependente da tecnologia a empregar a escolha do tipo de injecção do OL. Em ambos os casos o
OL tem gamas de valores dentro da banda de RF. Para se evitar esta situação deve-se ter uma largura de
banda atribuida ao serviço de comunicações, inferior à frequência intermédia. Não é este o caso do
exemplo atrás apresentado, nem da maioria dos sistemas de telecomunicações.

Para evitar ter a frequência do OL dentro da banda a captar e reduzir o problema da IM utiliza-se
por vezes um superheterodino com FI superior à RF. Obviamente esta solução é viável para bandas de
baixa frequência (abaixo de VHF) onde actualmente se dispõe com facilidade de dispositivos
semicondutores com muito ganho e baixo custo.

Um dos problemas práticos dos receptores superheterodinos, quando há pouco isolamento entre
os portos do misturador, nomeadamente do porto de OL para o porto de RF, é o sinal do OL, que é
várias ordens de grandeza superior ao de RF, chegar à antena com intensidade suficiente para ser radiado,
introduzindo interferências em receptores que se encontrem na vizinhança (radiação do OL). Este
problema será tratado no capítulo dedicado a misturadores de frequência, quando se referir o isolamento.
Por outro lado, o sinal do OL também pode chegar ao amplificador de frequência intermédia com
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Electrónica das Telecomunicações
Capítulo 1 1.9

amplitude suficiente para o saturar, levando à dessensibilização do receptor, como se verá no capítulo
dedicado à influência das não linearidades na operação dos sistemas de comunicações.

1.2.2.3 – Heterodino de conversão múltipla

Para obviar ao problema da selecção de uma FI nem muito elevada (difícil selecção de canal) nem
muito baixa (difícil rejeição da IM) pode-se recorrer a superheterodinos com multiplas conversões. O caso
mais vulgar é o da dupla conversão, duas frequências intermédias: a primeira FI é elevada para se facilitar
a rejeição da IM e a segunda baixa para facilitar a selecção do canal (figura 1.11). Na 1ªFI faz-se já uma
pré-selecção de canal para reduzir sinais indesejáveis.

Antena Ampli RF misturador Ampli 1ª FI misturador Ampli 2ª FI


LNA 1ª FI 2ª FI Ampli BB

FPBd FPBd FPBd FPBd FPBd


frf frf frf desmodulador terminal
fif1 fif2

rejeiçao de IM pré-selecção de selecção de canal


selecção de banda canal
1º oscilador 2º oscilador
local f lo1 local flo1

Figura 1.11 – Receptor superheterodino de dupla conversão

Se é difícil a construção de um oscilador de frequência variável à 1ªFI opta-se por fazer a selecção
de canal apenas na 2ª FI sendo portanto o 2º OL o variável. Tal é o caso, por exemplo, dos sitemas de
recepção de televisão via-satélite, onde a banda é de cerca de 1GHz em torno de 11GHz, e a 1ªFI é de
cerca de 1GHz (0.4 a 1.4GHz). Em vez de se projectar um VCO a 11GHz, projecta-se a 1GHz. Note-se
que, no entanto, a gama de varição precentual é muitas vezes superior (mais de 300% em vez de cerca de
10%).

Nos circuitos com modulação digital, situação que se tende a generalizar nos sistemas mais
recentes, tal como os de comunicações pessoais, utiliza-se na desmodulação e processamento em banda
base, sinais em quadratura. Estes sinais são normalmente gerados na segunda conversão, mas também o
podem ser na primeira. Por vezes, a segunda conversão pode já ser efectuada no domínio digital. Tem-se
então um receptor de FI digital (figura 1.12).

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Maria João Rosário e João Costa Freire
1.10 Capítulo 1

multiplicador
FPBx
Antena Ampli RF misturador Ampli 1ª FI 2ªFI I
LNA 1ª FI

Gerador
FPBd FPBd FPBd Conversor
Sinusoide
frf frf fif1 AD digital

rejeiçao de IM pré-selecção de
selecção de banda canal FPBx
1º oscilador 2ªFI Q
multiplicador
local f lo1

Figura 1.12 – Receptor superheterodino de dupla conversão com segunda mistura digital

Esta solução exige no entanto conversores analógico-digitais de alto desempenho. A frequência de


operação tem de ser alta, para se reduzir o problema da IM; a gama dinâmica tem de ser alta para
compensar os efeitos do desvanecimento, multipercurso; o ruído tem de ser muito baixo já que o sinal na
primeira FI é ainda só da ordem da centena de milivolt.

1.2.2.4 – Homodino, de conversão directa ou de FI-zero

Porque não se constroi um superheterodino com FI nula, isto é, se utiliza no circuito da figura 1.8
um OL de frequência idêntica à do sinal de RF a captar? No caso do sinal ser de modulação de amplitude
(AM), de banda lateral dupla (DSB) ou simples (SSB) está-se perante um desmodulador como se analisa
no capítulo dedicado à modulação.

Na figura 1.13 (a) apresenta-se o esquema em blocos dum receptor de conversão directa simples
e na 1.13 (b) o dum receptor de quadratura, que gera dois sinais de baixa frequência idênticos mas em
quadratura. Tal solução é necessária na esmagadora maioria dos receptores actuais que usam modulação
de frequência ou de fase digital.

Antena
misturador

FPBd FPBd
FPBx des modulador terminal
frf frf
Ampli BB
Ampli RF oscilador Ampli bx freq
local flo=f rf
LNA

(a)
Antena
misturador

FPBd FPBd
FPBx
frf frf

Ampli RF
oscilador
LNA local f lo=frf des modulador terminal
Desfasador de
quadratura 90º
Ampli bx freq
equilibrado Ampli BB
equilibrado
FPBx

misturador

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Electrónica das Telecomunicações
Capítulo 1 1.11

(b)
Figura 1.13 – Receptor de conversão directa (a) simples e (b) de quadratura

Esta topologia é simples, no entanto, no estado actual da tecnologia, apresenta o inconveniente de


ser muito susceptível à interferência de sinais contínuos: tensões residuais DC. Estas tensões podem saturar
os andares que seguem o misturador.

As tensões residuais contínuas podem ser geradas no misturador pelos termos de ordem par das
não linearidades, como se verá no capítulo dedicado ao estudo do efeito das não-linearidades em circuitos
electrónicos. Podem também surgir devido à mistura do OL, o sinal mais forte num conversor de
frequência, com ele próprio (auto-conversão), já que o isolamento entre os portos de OL e RF do
misturador não é perfeito, devido à realimentação capacitiva indesejada existente nos dispositivos
semicondutores e através do substrato, em circuitos híbridos ou monolíticos de alta frequência.

Na presença de auto-conversão variável no tempo as tensões residuais deixam de ser contínuas e


podem ser confudidas com o sinal (sinal de baixa frequência). Tal situação verifica-se, por exemplo,
quando há radiação do OL (mau isolamento OL-RF) e este é reflectido por objectos em movimento em
relação ao receptor (situação frequente em comunicações móveis) e captado pela antena deste.

Uma solução óbvia para o problema das tensões residuais contínuas é utilizar após o conversor um
filtro passa-alto com frequência de corte muito baixa. No entanto, muitos dos espectros de banda base
dos sistemas de comunicações actuais que usam modulação digital têm muita energia perto de DC. Para
obviar esta limitação, tem que se escolher na emissão um código para a modulação que tenha um espectro
reduzido em muito baixa frequência, próximo de zero. Esta solução é mais viável em sistemas com canais
de banda larga, como o DECT (∆fcanal =??MHz), no entanto em GSM (∆fcanal =200kHz) não será
aconselhável.

Em sistemas TDMA é possível utilizar os intervalos de tempo entre tramas para cancelar os efeitos
das tensões residuais. Por exemplo, pode-se carregar um condensador com a tensão residual à entrada do
amplificador que poderia ser saturado e subtrai-se durante a trama seguinte. Na figura 1.14 apresenta-se
um circuito simples de cancelamento por este processo. O interruptor S fecha durante os intervalos de
tempo entre tramas para carregar com a tensão residual presente à saída do filtro passa-baixo. Assim,
durante a recepção de tramas, a tensão à entrada do amplificador de baixa frequência é igual à tensão à
saída do filtro menos a tensão residual armazenada no condensador, estando o interruptor S aberto.

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Maria João Rosário e João Costa Freire
1.12 Capítulo 1

Antena Ampli bx freq


misturador
C
FPBd FPBd
FPBx des modulador terminal
frf frf
S
Ampli BB
Ampli RF oscilador
local flo =f rf
LNA

Figura 1.14 – Promenor do cancelamento das tensões residuais num receptor TDMA de conversão directa

A selecção de canal neste tipo de receptores pode ser efectuada de uma das seguintes formas: (1)
logo após a mistura e antes da amplificação; (2) após a amplificação mas antes da conversão analógica
digital; ou (3) após esta conversão (filtro digital). Na figura 1.15 apresentam-se os esquemas em blocos
parciais destas 3 soluções.

FPBd Conversor FPBd Conversor Conversor FPBd


canal Anal-Dig canal Anal-Dig Anal-Dig canal
Ampli canal Ampli BB Ampli BB
equilibrado equilibrado equilibrado

(a) (b) (c)


Figura 1.15 – Topologias de desmodulação de sinais digitais: selecção de canal por filtro analógico com (a) amplificação
de canal ou (b) amplificação de banda base total e (c) selecção de canal por filtro digital.

Quando é utilizada a solução da figura 1.15 (a) o componente mais crítico é o filtro que ao atenuar
os sinais indesejáveis que podem ser intensos, tem de ser linear e não introduzir muito ruído por forma a
que o amplificador possa ter alguma não-linearidade e ganho elevado, e o conversor possa ter uma gama
dinâmica não muito elevada (tipicamente 4 ou 8 bits). Quando a solução empregue é a da figura 1.15 (b) o
amplificador terá de ser bem mais linear do que no caso anterior pelo que por vezes tem ganho não muito
elevado o que pode obrigar a utilizar outro amplificador após a filtragem para reduzir a influência do ruído
do conversor. Quanto à terceira solução, figura 1.15 (c), ela exige o recurso a conversores analogico-
digitais de alta linearidade e gama dinâmica, e baixo ruído. O nível de ruído gerado no conversor tem de
estar bem a baixo do nível do sinal de entrada.

1.2.3 – Emissores

1.2.3.1 - Introdução

Da descrição das mais usuais arquitecturas de receptores, verificou-se haver muitas soluções,
usualmente dependente a solução a empregar da frequência de trabalho, tipo de modulação, largura de

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Electrónica das Telecomunicações
Capítulo 1 1.13

banda de canal versus afastamento entre canais, etc. . . No entanto, nos emissores são muito menos o
número das especificações a cumprir, pelo que há apenas um número bem mais reduzida de topologias
básicas. Não há que ter cuidados especiais com selectividade, rejeição de sinais indesejáveis e nível de
ruído.

As funções principais dum emissor são, modulação de uma portadora com um ou mais sinais com
informação, conversão da portadora modulada num sinal de alta frequência de acordo com a banda
atribuida ao serviço em causa e amplificação de potência para atingir um nível de sinal radiado suficiente
para a cobertura pertendida. Para cumprir devidamente esta última função há que ter muita atenção na
linearidade dos circuitos que a realizam. Realça-se em particular que, nos sistemas multi-canal, há que
obedecer a especificações muito rígidas para evitar interferências inter-canal. Para uma boa gestão
energética, os sinais têm níveis diferentes, consoante a distância ao utilizador, o que dificulta a redução das
interferências.

1.2.3.2 – Modulação em alto nível

Nomeadamente em sistemas de modulação em amplitude (AM) é possível amplificar


independentemente o sinal da portadora a modular e o sinal de banda base que a vai modular, efectuando-
se a modulação já com sinais de nível elevado. Por vezes o sinal modulante é colocado em série com a
alimentação do próprio amplificador de potência que assim tem função dupla. Na figura 1.16 apresenta-se
um esquema em blocos deste tipo de emissores.

Antena
Ampli
RF

FPBd FPBd FPBd


modulador
frf frf frf

oscilador Ampli Pot


local f lo=frf saída
trans FPBx FPBx
dutor fbb fbb

Ampli bx freq

Figura 1.16 – Emissor com modulação em alto nível

1.2.3.3 – Conversão directa

Se a modulação é feita logo à frequência a emitir, isto é, o oscilador local a modular funciona à
frequência de RF diz-se que o emissor é de conversão directa. Na figura 1.17 apresentam-se dois
emissores com este tipo de arquitectura. O caso simples (a) é vulgarmente utilizado em emissores de

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Maria João Rosário e João Costa Freire
1.14 Capítulo 1

frequência modulada (FM) analógica e o caso com modulação em quadratura (b) em emissores de
modulação digital nomeadamente de fase (PSK – phase shift key).

bb I
Antena Antena

VCO 90º
FPBd FPBx FPBd FPBx
frf frf frf frf

Ampli Pot Ampli Pot


bb
bb Q

(a) (b)
Figura 1.17 – Emissores de conversão directa (a) simples e de (b) quadratura

Estes emissores têm um problema comum que é provocado pelo ruído injectado no oscilador
local, VCO ou fixo, pelo amplificador de potência que funciona à mesma frequência. Este ruído é
transmitido por radiação ou através do circuito impresso ou integrado (substrato) consoante a tecnologia
empregue. Uma forma de o reduzir é gerar o sinal da portadora numa sub-harmónica e multiplicá-lo em
frequência posteriormente (figura 1.18a) ou gerá-lo a partir de dois osciladores cujas saídas são
posteriormente misturadas (figura 1.18b). No caso da figura 1.18a a modulação terá de ter em conta que a
largura de banda também é afectada pela multiplicação de frequência. Este assunto voltará a ser abordado
no capítulo sobre modulação e desmodulação.

Antena bb I
VCO Antena
frf/n
90º
FPBd FPBx FPBd FPBx
Xn frf frf f1 f1+f2=frf
frf frf

Ampli Pot f2 Ampli Pot


bb
bb Q

(a) (b)
Figura 1.18 – Emissores de conversão directa com OL a frequência difrente de RF: (a) simples com OL em sub-harmónica
e de (b) quadratura com OL desviado (off-set)

A ligação do emissor e receptor à antena, se comum, é feita através de um diplexer ou comutador,


como se referiu na introdução. Os comutadores têm tipicamente perdas da ordem das décimas de dB
enquanto que os diplexers, nomeadamente quando os filtros têm de ser muito selectivos, têm perdas de
alguns dB, podendo mesmo ser da ordem dos 3dB (meia potência). Conclui-se assim que será de evitar,
em sistemas em que se pretende emiter potências muito elevadas, usar diplexers pois o amplificador de

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Electrónica das Telecomunicações
Capítulo 1 1.15

potência terá uma potência muito mais elevada que a emitida nominalmente e portanto mais difícil será
filtrar a emissão de sinais indesejáveis e reduzir a interacção com os OLs.

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Maria João Rosário e João Costa Freire
1.16 Capítulo 1

1.2.3.4 – Conversão dupla

Finalmente, apresenta-se os emissores de conversão dupla que podem ser considerardos como o
equivalente dos receptores super-heterodinos de dupla conversão. É inicialmente modulada uma portadora
a uma frequência intermédia FI e só depois o sinal modulado é convertido no sinal de RF através de um
misturador de frequência (figura 1.19).

bb I
Antena

90º
FPBd FPBd FPBx
ffi frf frf
ffi
Ampli Pot

bb Q

Figura 1.19 – Emissor de conversão dupla

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Electrónica das Telecomunicações

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