Luto Como Experiência Vital
Luto Como Experiência Vital
Luto Como Experiência Vital
Nesta segunda parte, inicio com a pergunta: Por que não intervir?
Uma objeção à oferta de assistência ao enlutado está no fato de nem
sempre ela ser necessária, sobretudo para pessoas que contam com boa rede
de apoio psicossocial, por amigos, pessoas de sua comunidade, familiares.
Pode também diminuir a auto-estima e o senso de eficácia daqueles que têm
recursos de enfrentamento adequados. Um sub-texto dessa oferta de
intervenção diz que há certas formas de luto que são inaceitáveis e precisam
ser resolvidas – ou removidas – o mais depressa possível. Ou seja: parâmetros
e expectativas culturais têm peso na qualificação de alguns tipos de luto e
podem estigmatizar o enlutado.
Cabe ressaltar, sempre que se discutir a intervenção a ser ou não
oferecida, a importância de se buscar o equilíbrio entre a prática, como
elemento gerador de problemas de pesquisa, e aquele que a pratica, ou seja, o
profissional que requer treinamento adequado e criterioso. Além disso, o
diálogo entre prática e pesquisa, sendo estimulado, permite que a prática seja
descrita, avaliada e examinada, para que se tenha uma comunicação da
evidência para a prática e da prática para as evidências. Espera-se que o
profissional contribua com atributos pessoais como empatia, crença no
propósito de seu trabalho, boa vontade, generosidade, além de conhecimento
teórico, habilidades, competências clínicas. Por outro lado, o profissional deve
estar sempre atento às avaliações críticas de seu trabalho, submetendo-se a
supervisão e aceitando possibilidades de ampliar conhecimentos. Este aspecto,
da formação e experiência do profissional, pode responder em parte à objeção
pela intervenção, se não for efetivada por aquele adequadamente preparado
para esse fim.
Se avaliarmos com cuidado a condição do enlutado, podemos nos
deparar com aqueles que não necessitam de psicoterapia nos moldes
tradicionais e que podem se beneficiar de intervenções de outra ordem, como:
acompanhamento para que desenvolvam novas rotinas diárias, integrando
habilidades e competências. Bons hábitos devem ser estimulados, como
alimentação adequada, boas horas de sono, atividade física (CHEN, GILL,
PRIGERSON, 2005).
. O apoio afetivo e social nunca será excessivamente valorizado nestas
circunstâncias, e o enlutado pode buscar a companhia de amigos empáticos,
ou mesmo buscar novos relacionamentos, sobretudo no caso daqueles que se
encontram afastados de suas fontes de satisfação e reconhecimento afetivo.
Wagner, Knaevelsrud, e Maercker (2006) realizaram estudo comparativo
entre um grupo de pacientes enlutados que estiveram em psicoterapia
especificamente voltada para luto e um grupo de enlutados que estiveram em
psicoterapia não especializada. Os resultados mostram que aqueles em
psicoterapia especializada obtiveram melhores resultados, em menos tempo,
resultados esses que se mantiveram quando feito o acompanhamento após 6
meses do término do processo.
Por outro lado, há evidências de que, quanto mais complicado o luto,
haverá maiores chances de que a terapia leve a bons resultados (SCHUT,
STROEBE, VAN DEN BOUT, TERHEGGEN, 2001; JORDAN e NEIMEYER,
2003). Não se pode perder de vista que a intervenção com pessoas enlutadas
atinge os três níveis de prevenção. Na intervenção primária, o objetivo é
trabalhar com todos os enlutados, avaliar suas condições, recursos,
possibilidades de resiliência. Na prevenção secundária, o foco se dirige mais
especificamente aos enlutados em risco e na prevenção terciária, objetiva-se
trabalhar com enlutados que apresentem reações de luto complicado.
Podemos dizer, portanto, que as intervenções com pessoas enlutadas
devem ser dirigidas para pacientes com riscos sociodemográficos e
circunstanciais (pessoas sem apoio familiar, social e financeiro, que vivem
sozinhas ou que vivem um luto em conseqüência de mortes violentas,
traumáticas ou em massa, como assassinato ou suicídio). Também vale
verificar de perto a situação de mães e esposas, sobretudo se a relação com o
falecido tiver características de dependência. Aqueles que apresentem ideação
suicida devem ser considerados prioridade, seguidos por aqueles que
apresentavam transtornos psiquiátricos prévios à perda. Pessoas que tenham
sofrido abuso ou negligência parental na infância se beneficiam muito da
terapia para o luto (PARKES, 2006).
I ntervenções no período de luto antecipatório, em uma perspectiva de
cuidados paliativos, têm se mostrado importantes para aceitação da morte, ter
a oportunidade de se despedir, resolver questões pendentes de forma a não
deixar em aberto pontos de arrependimento, e, por fim, resultam em boa
qualidade do ajustamento e da resposta à perda (FONSECA, 2004, KISSANE e
LICHTENTAL, 2008; WEITZNER, 1999).
Do ponto de vista da fundamentação teórica para as intervenções com
enlutados, temos destacado aquelas que se utilizam de teoria do apego
(PARKES, 2006), da terapia cognitiva (MALKINSON, 2007), da construção de
significado (NEIMEYER, 2001, NEIMEYER, 2001, THOMPSON e JANIGIAN,
1988, WALSH, 1998; NADEAU, 1997).
Muitas são as possibilidades de intervenção com pessoas enlutadas, no
âmbito familiar, comunitário, para lidar com sobreviventes e pessoas com
Transtorno de Stress Pos-Traumático. Para este capítulo, dado o objetivo de
apresentar algumas idéias no eixo diagnóstico-intervenção, não nos pareceu
apropriado aprofundar, além do exposto. O leitor terá possibilidades de ampliar
seus conhecimentos a partir das referências bibliográficas aqui urilizadas, que
o remetem para novas pesquisas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
JORDAN, J.R E NEIMEYER, R.A. Does grief counseling work? Death Studies,
Volume 27, Issue 9 November 2003 , pp 765 - 786
KISSANE, D.W e LICHTENTHAL, W.G. Family focus grief therapy; from
palliative care into bereavement. In STROEBE, M.S., HANSSON, R.O.,
SCHUT, H. e STROEBE, W. Handbook of Bereavement Research and
Practice; advances in theory and intervention. American Psychological
Association, Washington, 2008.
KLASS, D. e WALTER, T.. Processes of grieving: how bonds are continued. In:
Meaning Reconstruction and the experience of loss, NEIMEYER, Robert (ed.),
Washington DC: American Psychological Association, 2001.
KOVÁCS, M.J. (1996). Vida e morte: Laços da existência. São Paulo, Casa do
Psicólogo.
PARKES, C.M (1998). Luto. Estudos sobre a perda na vida adulta. São Paulo,
Summus.