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REVISTA B RASILEIRA

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PUBLICADA PELO INSTITUTO NACIONAL


DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS,
órgão dos estudos e pesquisas do Ministério da Educação e Cul-
tura, publica-se sob a responsabilidade do Instituto Nacional de
Estudos Pedagógicos, e tem por fim expor e discutir questões
gerais da pedagogia e, de modo especial, os problemas da vida
educacional brasileira. Para isso aspira congregar os estudiosos
dos fatos educacionais do país, e refletir o pensamento de seu
magistério. Publica artigos de colaboração, sempre solicitada;
registra resultados de trabalhos realizados pelos diferentes
órgãos do Ministério e pelas Secretarias Estaduais de Educa-
ção. Tanto quanto possa, deseja contribuir para a renovação
científica do trabalho educativo e para a formação de uma
esclarecida mentalidade pública em matéria de educação.

A Revista não endossa os conceitos emitidos em artigos


assinados e matéria transcrita.
REVISTA BRASILEIRA

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PUBLICADA PELO INSTITUTO NACIONAL


DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA

VOL. XL OUTUBRO-DEZEMBRO, 1963 N.° 92


INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
Diretor — Anísio Spinola Teixeira

CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS

Diretor Executivo — Péricles Madureira de Pinho


Diretor Adjunto — Joaquim Moreira de Sousa

Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério


Coordenador — Lúcia Marques Pinheiro

Divisão de Documentação e Informação Pedagógica


Coordenador — Elza Rodrigues Martins

Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais


Coordenador — Jayme Abreu

Divisão de Estudos e Pesquisas Sociais


Coordenadora Substituta — Úrsula Albersheim

Tôda correspondência relativa à REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS


PEDAGÓGICOS deverá ser encaminhada à redação — Rua Voluntários da
Pátria, nº 107, Botafogo — Rio de Janeiro — Estado da Guanabara — Brasil.
R E V I S T A B R A S I L E I R A
DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Vol. XL outubro-desembro, 1963 N° 92

SUMARIO

Págs.
Editorial 3

Estudos e debates:

Mestres de a m a n h ã — ANÍSIO S. TEIXEIRA 10


A educação em face da s e g u n d a revolução industrial — TOMÁS MAL-
DONAPO , 20
A significação da ciência no m u n d o contemporâneo — o problema
b r a s i l e i r o — J. LEITE LOPES 34
Admissão à universidade: análise de um projeto — VALNIB CHAGAS . . . 46

Documentação:

Aperfeiçoamento de professôres p r i m á r i o s — Inquérito promovido pelo


INEP 52
I I I R e u n i ã o I n t e r a m e r i c a n a de Ministros da E d u c a ç ã o 63
P r ê m i o "Ciência da E d u c a ç ã o " , 1963 66
Lei O r g â n i c a do E n s i n o — E s t a d o da B a h i a 71
E s t u d a n t e s para a medicina e médicos p a r a o Brasil — ALMEIDA JÚNIOR 104
Obstáculos ao planejamento educacional nos países em desenvolvimento
— JAYME ABREU 115

Conselho F e d e r a l de E d u c a ç ã o — seleção de estudos e pareceres . . . . 121

INFORMAÇÃO DO PAÍS 158

INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO 165

CRÍTICA DE LIVROS: GEIGER, P e d r o P i n c h a s — Evolução da rede urbana


brasileira (168); M A N N H E I M , KARL e STEWART, W. A. C. — An Intro-
duetion to the Sociology of Education (168); NOGUEIRA, Oraci —
Família e comunidade 170

ATRAVÉS DE REVISTIS E JORNAIS: MARTINS, Mário — O pica-pau verde-ama-


relo (172); WIESNER, J e r o m e B. — P l a n e j a m e n t o p a r a o ensino
tecnológico e científico (173); ABREU, J a y m e — A equivalência de
cursos na Lei de Diretrizes e Bases (177); DELANNOY, J e a n —
Educação, t r a b a l h o de equipe — II (181); C U N H A , N á d i a —
Aspectos estatísticos do ensino médio no Brasil (186); WALLON,
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

2 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS


Págs.
H e n r i — E d u c a ç ã o e Psicologia (190); MATTA, R a i m u n d o — Co-
m e n t á r i o s à Lei Orgânica do Ensino —• B a h i a 194

ATOS OFICIAIS: Dec. nº 52.267, de 17/7/1963 — Dispõe sôbre um programa


de educação de base e adota medidas necessárias a sua execução,
através das escolas radiofônicas nas áreas subdesenvolvidas do
Norte, Nordeste, Centro-Oeste e em outras áreas em desenvolvi-
mento do País, a ser empreendido pela Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (198); Dec. nº 52.456, de 10/9/1963 — Dispõe sôbre
a Comissão Supervisora do Plano dos Institutos (199); P o r t . nº
232, de 22/7/1963 — Autoriza a Diretoria do Ensino Superior a
instalar nos Estados serviços para registro de diplomas (201); P o r t .
nº 233, de 23/7/1963 — Dispõe sôbre a Comissão de Cultura Popular
(201); P o r t . nº 237, de 24/7/1963 — Institui na Diretoria do Ensino
Superior as Comissões de Matricula por Setores (202); P o r t . n°
269, de 14/8/1963 — Dispõe sôbre as Comissões Regionais de Cultu-
ra Popular (203); P o r t . nº 348-A, de 16/9/1963 — Baixa normas
para a expedição de registro de professor do ensino médio (203);
P o r t . nº 347, de 16/9/1963 — Aprova normas para a orientação e
assistência aos ginásios modernos pelas Diretorias do Ensino Se-
cundário, Comercial e Industrial 205
Editorial

L E I DE D I R E T R I Z E S — R E F O R M A DE BASE DA
EDUCAÇÃO N A C I O N A L

Quando, levado pelas melhores intenções, o mestre-escola per-


segue no aluno o erro, não atenta em que nem sempre o erro está
do lado de lá, no estudante, mas também do lado de cá, ou seja,
no professor, no programa, na organização da escola, na sistemática
do ensino, nas leis que o estruturam, nos vícios e embaraços da
comunidade a que serve. Dificilmente haverá processo mais capri-
choso do que o da educação: tendo como ponto de partida as relações
entre a geração madura e a jovem geração, ou entre a experiência
c a ignorância, decorrera de soluções empíricas, a que o progresso
das ciências pedagógicas fora impondo as recomendações de sua
convencida didática. Assim, entre as mais diversas modalidades,
correspondendo a objetivos tão diferenciados, a educação se desdobra
no mundo desde as sociedades primitivas às que pregam, em alto
grau, a tecnologia: oscila entre a educação espontânea e o cientifi-
cismo aplicado às técnicas da vida e da produção. Se as condições
de cada comunidade ou cultura já não impusessem diferenças subs-
tanciais nos processos educativos, haveria ainda a considerar, na
mesma comunidade, a concomitância de tantas teorias, em disputa
na sua aplicação e nos seus efeitos e — mais ainda — o fato de que
o mundo atravessa, em todos os seus quadrantes, uma fase de pro-
fundas transformações, caracterizando a expressão consagrada de
"civilização em mudança".
Nenhum setor reclamaria mais uma nova lei do que a educação.
Não que a lei por si produza o resultado mágico de um ensino per-
feito: êste depende do aparelhamento da escola, da formação do
mestre e da receptividade do meio. Porém a lei vale, menos pelo
que impõe, mais pelo que inspira, pelo que estimula e pelo que não
impede. Nela não se conterá a receita aplicável aos necessitados
de educação, como os doentes e são de saúde, sem que até hoje
a ciência e a arte da medicina pudessem ser contidas na letra fria
de um código. Porém, há o que esperar da lei. sobretudo o clima
harmonioso de competências funcionais para o desempenho das ati-
vidades Uma lei do ensino decorre de uma série de opções prefe-
renciais. Ou será uma lei uniforme, com vigência para todo o país,
4 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

solução abstrata acima das condições reais diferenciadas, ou cuidará


de ser a reguladora das atribuições nas esferas federal, estaduais e
municipais. Ou chamará ao poder público, com exclusivismo e arro-
gância, o monopólio do ensino, ou partilhará a educação pelo Estado,
família e sociedade, no recrutamento de todas as forças vivas, para
o fim comum. Ou fará da liberdade de ensino um caminho de
cooperação, a integrar um sistema de objetivos preconizado pelo
Estado, ou permitirá uma liberdade sem limites, mesmo que leve A
ineficácia e ao embuste. Ou tornará a lei um instrumento que tudo
prevê e a tudo dá pretensas soluções, à semelhança de um regula-
mento minucioso, ou traçará apenas as linhas gerais, tão seguras e
tão sábias que, permitindo tôda sorte de experiências em sua com-
plementação, não ponham em perigo nem a unidade formativa nem
a eficiência do ensino. Ou manterá, em seus dispositivos, a con-
ceituação clássica de uma educação baseada na tradição seletiva, ou
imprimirá rumos de franca democratização da escola. Ou ficará no
âmbito das finalidades ilustrativas, ou incluirá, desde logo, entre
os propósitos da educação, a adoção dos recursos da ciência e da
técnica, a fim de abrir à humanidade uma nova era de desenvolvi-
mento, conforto e valorização do homem. Opções sôbre opções,
obrigando o legislador a duas atitudes: a da prudência e a da não-
radicalização, uma e outra conseqüentes dos efeitos irrecuperáveis
do ensino sôbre as jovens gerações.
O legislador brasileiro teve de ater-se. antes de mais, aos pre-
ceitos da Constituição, quer na sua filosofia e sistemática política,
quer expressamente em matéria educacional. A autonomia dos Esta-
dos, o direito de educação, a obrigatoriedade do ensino primário, a
gratuidade, os fundos nacionais destinados ao ensino — têm suas
raízes no texto da Carta Magna, — como tôda constituição, fruto
de transigências, denominador comum de tendências e correntes, por
vezes antagônicas. Assim como a Constituição, a Lei de Diretrizes
e Bases, por ela preconizada, terá sofrido das mesmas contingências
de disciplinar a matéria em meio a tantas aspirações, não de maneira
abstrata, porém realisticamente diante do quadro de reivindicações
que, apesar dos pesares, se reflete no Congresso Nacional. Daí,
as reservas que alguns apontam àquela lei, em que pretendem ver
falta de unidade ou ausência de uma filosofia revolucionária. Tais
reparos improcedem. Se as contingências da elaboração não permi-
tiram texto mais preciso e orgânico e se, com relação a cada cor-
rente de idéias, existem transigências formais ou aparentes, em seu
todo se desenhou um admirável sistema público de fins, poderes
e meios, compatíveis com a realidade brasileira, na sua feição atual
e, ainda, nas suas tendências reformistas. Isso porque a lei em
questão não é uma lei fechada, uniforme, impositiva. de fórmulas
únicas, mas aberta, plural, permissiva de variantes e estimuladora
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de experiências. Pode e deve ser considerada, para o momento,


uma autêntica reforma de base — reforma em si pelas inovações de
estrutura que consagra e reforma em potencial pelas reformas que
estimula. A Lei de Diretrizes e Bases encerra pois o sentido substan-
cial da reforma, abrindo caminho a inúmeras reformas complemen-
tares. Nisso residem a sua sabedoria e as razões de sua sobrevi-
vência. Dentro dela, todas as aspirações podem encontrar acolhida.
Ê uma lei que muda e deixa abertas as portas para mudanças
maiores.
Senão, vejamos. Partindo da reafirmação dos preceitos cons-
titucionais — direito à educação e obrigatoriedade do ensino —
empreende de pronto a distribuição dos encargos entre os Poderes
Públicos e convoca a cooperação privada dentro dos princípios que
institui. Naquela distribuição, não há lugar para evasivas, pois, se
aos Estados confere a organização e administração de seus sistemas,
aponta ã União o dever supletivo de acudir tôda vez que se verifique
a insuficiência de recursos. A esse respeito, a lei não se contenta
com palavras e promessas: estabelece os fundos nacionais de ensino
primário, médio e superior, em igualdade de valores, para que a
ajuda federal vá do elementar ao universitário. À iniciativa privada
opõe as limitações contidas na estrutura geral. E a si reservou a
União quanto assegura unidade e quanto tem significação nacional:
o núcleo das disciplinas de grau médio e os currículos mínimos para
os cursos que habilitem ao exercício profissional em todo o país.
Ressalvado esse direito — que, em educação, por seus efeitos cívicos,
pode ser identificado com o exercício da soberania — a educação
è confiada aos Estados, aos municípios, às entidades particulares,
substituindo a imposição de um sistema único pela coexistência de
dezenas, centenas e, talvez mesmo, milhares de sistemas. Aos que
temem os excessos e perigos de tão generosa permissão de experiên-
cias, cabe ponderar com o perigo maior da generalização do negativo
em tudo quanto de errado, falso e ineficiente, houvesse na lei única
c uniforme. E cabe ponderar ainda com a grande verdade de que
a educação se virtualiza pelas experiências e pela concorrência —
aquelas cristalizando-se em sistemas, e esta resultando da competição
c estimulo das fórmulas diversas. Acrescente-se a isso — aliás de
boa doutrina — a possibilidade do ajustamento dos sistemas às con-
dições de cada comunidade. É o Brasil, do ponto-de-vista cultural
e social, não um continente maciço, como nos aponta o mapa. nas
suas ilusões físicas, mas um imenso arquipélago, a soma de "ilhas"
espalhadas pela terra, "ilhas" cercadas de um mar de ignorância,
de desprezo, de abandono, de quase total ausência humana. E cada
"ilha" .— cidade, vila, distrito, lugarejo, fazenda, entroncamento rodo-
viário — oferece um nível diferente no cômputo de seus recursos
materiais, econômicos e humanos, desde um progresso que, nas duas
6 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

metrópoles brasileiras, mede, em significação com as grandes metró-


poles do mundo, até as que mal nascem ao acaso, como fatalidade
social, ou se erguem, cercadas dos requisitos do urbanismo, como
a atrevida Brasília. Mais significativas que as variações urbanas.
são as variações rurais, e aos sociólogos menos atentos não passariam
despercebidas as diferenças frontais ou as nuanças peculiares de um
para outro grupo. A regência dessas "ilhas" constitui o desafio do
Brasil a si mesmo: desafio da terra e do homem à capacidade nacio-
nal de realizar-se. E, como as comunidades não são apenas diferen-
tes, mas são também comunidades que progridem em velocidades
desiguais, aquela regência não será a de quem pretende um coro
uníssono, porém os efeitos harmoniosos de um grande conjunto sin-
fônico, que pede a cada instrumento diferenciado a sua participação
no êxito orquestral. As "ilhas", integrantes do continente, células
vivas ou a vivificar, exigem terapêutica própria no que diz com a
educação e a cultura: são os sistemas. A liberdade que a nova lei
admite na formulação de sistemas públicos e privados vale pela espe-
rança de soluções acertadas: pelo menos, tentadas em função da
conjuntura definida em cada comunidade. Tanto exeqüível o ajus-
tamento, como os reajustamentos que se fizeram necessários. Impor-
ta dizer: uma reforma aberta permanentemente ao gênio inventivo
dos líderes educacionais. Nem por ser formada de ilhas e quase-
ilhas (que são as penínsulas), destituídas de um governo nacional,
a velha Grécia deixou de ser um dos capítulos mais fascinantes da
história, e o que nela repontou, como preciosa afirmação de sua uni-
dade, fora a cultura, tão marcante que nela nasceu para o mundo
a civilização européia, em flagrante diferenciação das culturas orien-
tais. O grande arquipélago brasileiro, de virtualidades tão expres-
sivas, aguarda o momento em que, pela inteligência de seus filhos.
sejam vivificadas todas as suas ilhas, anulado o mar da ignorãncia
e das ausências, e afirmado continente, como verdade social, cultural,
econômica e humana. Esse "milagre", que se poderá considerar a
réplica no século XX ou XXI do famoso milagre grego do V século
A.C., decorrerá do acordar de todas as suas energias, sob o impulso
dos estímulos cabíveis — longe de uniformidades que desmoronam,
identificado, entretanto, com a lição moderna de ecologia a serviço
da educação e da política. A Lei de Diretrizes e Bases, no seu
binômio unidade-descentralização, assegurará o equacionamento da
solução brasileira na pluralidade das experiências e fórmulas.
Os caminhos propiciados à universidade e à escola média nunca
foram tão promissores. Marcam modificações radicais, que empres-
tam à nova lei o caráter de uma lei de reforma fundamental, de
base, de estrutura, com o delineamento generoso de novas conquis-
tas. A autonomia universitária está implantada em têrmos genero-
sos, permitindo a variedade de composição, de disciplinas comple-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 7

mentares, de seleção de professôres e de tantas outras soluções ao


complexo âmbito das universidades. A ênfase atribuída à pesquisa
e ao treinamento profissional estão indicando que o ensino ali trans-
cenderá a rotina e 05 aspectos formais, para resultar da busca inces-
sante do conhecimento e de sua aplicação concomitante à prática da
carreira. A diversificação das unidades componentes — escolas,
institutos, departamentos — quebra a monotonia das universidades
agrupantes apenas dos cursos de direito, medicina, engenharia e filo-
sofia, para admitir tantas outras modalidades, como os vários ramos
da engenharia, a agronomia, a arquitetura, belas-artes, música, teatro,
urbanismo, jornalismo, diplomacia, administração, cinema, ruralismo,
artes industriais, biblioteconomia, museologia, turismo, serviço social.
farmácia, odontologia, veterinária, enfermagem, cooperativismo, e
quantas se façam necessárias. Apenas cinco dessas escolas bastam
para autorizar a constituição de uma universidade. E a tendência
às universidades especializadas está esboçada na lei: a universidade
rural, com predominância agrícola; a universidade tecnológica, com
predominância industrial; a universidade aprofundada nos estudos
do homem ou a que se dedicar mais aos temas econômicos, políticos
e sociais. Uma universidade em Petrópolis ou em Campina Grande
ou em Santa Maria não pode pautar-se pelo figurino da Universi-
dade do Brasil, nem da de São Paulo, nem da de Brasília, recla-
mando composição e organização peculiares. Assim, se na mesma
capital, como Rio de Janeiro, São Paulo ou Belo Horizonte, se mul-
tiplicam universidades, não será para o efeito da repetição, mas para
o da variedade, na composição, na orientação, na filosofia. A esses
aspectos, tão significativos, acrescenta-se o da participação dos estu-
dantes, temida por certos espíritos conservadores, enaltecida por mes-
tres e alunos, na mais arrojada experiência do efetivo diálogo que
deve existir nas escolas entre discente e docente, em todos os planos
possíveis, até o da administração. Essas e outras inovações não
poderiam ser instituídas e regulamentadas por uma lei uniformiza-
dora e centralista: de um lado, a variedade das condições; de outro
lado, a necessidade das experiências — aconselham, senão exigem,
a pluralidade das fórmulas. Eis por que a Lei de Diretrizes e Bases.
em sua sabedoria, admitiu que cada universidade propusesse, dentro
das normas que ela consagra, o seu Estatuto e que o Conselho Fede-
ral de Educação tivesse o encargo de apreciá-lo. O estatuto passará
a ser a lei individual de cada universidade. Diretrizes e Bases
desdobram-se, não numa reforma universitária, mas em trinta refor-
mas, ou sejam os trinta estatutos das atuais universidades. Reforma
gerando reformas.. .
O ensino médio, que, em sua maioria, se ministrava segundo o
currículo — pletórico e superado — do ginásio e colégio de humani-
dades, comumente designado como curso secundário — escancara
8 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

as suas possibilidades, democratiza-se, integra-se nos problemas do


tempo e do meio. Compreenderam, enfim, que, destinado à adoles-
cência, aquêle grau de ensino é, ao mesmo tempo, geral e vocacio-
nal: cuida da formação do homem e o inicia numa profissão ou
carreira. Perde seu caráter seletivo, apenas para filhos de abastados,
e perde também sua condição exclusiva de degrau ou acesso à uni-
versidade. Tem finalidade em si e, como estágio de formação (qual-
quer que seja a modalidade), admite a continuação dos estudos no
plano universitário. Tanto vale uma indagação na história — alar-
gamento da experiência no tempo — como a aquisição de uma técnica
científica, integração na contemporaneidade; tanto um texto literário
como uma nota musical; tanto o desenho que conduz à pintura
quanto o que conduz à indústria. Quem quer que realize sete anos
de estudos tem capacidade presumida para os cursos superiores.
Ê a formação da adolescência o curso secundário de feição acadê-
mica modernizada como o são o curso médio industrial, o comercial,
o agrícola, o normal e os de novas modalidades que, em tempo e
planos equivalentes, venham a ser criados, nas duas etapas — giná-
sio e colégio •— ou apenas na segunda. O colégio artístico começa
a ser organizado, quer para a música e teatro, quer pará as artes
plásticas. Além de destruir os preconceitos entre a antiga escola
secundária e a antiga escola profissional, refletidos na preferência
das famílias abastadas em favor da primeira, o atual ensino médio
c suficiente em si, proporcionando ao educando condições econômi-
cas e sociais, mesmo profissionais, sem fechar o prosseguimento dos
estudos. Considero esse um dos aspectos revolucionários da Lei de
Diretrizes e Bases, aspecto que requer amplo esclarecimento para
o aproveitamento dos seus resultados por parte dos educandos e
suas famílias. A escola de classe cede lugar à escola democrática:
o ensino abstrato cede lugar ao ensino realista.
Essa preocupação de associar à educação comum elementos capa-
zes de emprestar-lhe sentido econômico pela aquisição de técnicas,
começa, a bem dizer, na. escola primária, com a iniciação das artes
industriais nas últimas séries. De outro lado, a equivalência da
sexta série primária com a primeira série média representará passo
decisivo no carreamento de parcelas ponderáveis da população em
idade escolar para o nível médio de ensino. No grau elementar ou
no grau médio, há a considerar as recomendações freqüentes da lei
no sentido que a escola corresponda às peculiaridades de cada meio.
E aqui, de novo, do texto de uma lei, emergirão quantos sistemas
diferenciados na mais estimulante floração pedagógica de todos os
tempos. A Lei de Diretrizes e Bases multipticar-se-á em tantas
aplicações regionais e em tantos reajustamentos reclamados que o
sentido da reforma continua em sua marcha.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Em tudo e por tudo, a Lei de Diretrizes, sendo um estatuto


altamente renovador, é um convite a mudança e a ação, não pelo
gosto de variar, mas pela necessidade de ajustar-se. Nenhum empe-
nho mais nobre, ante a educação, do que o de perseguir, na plura-
lidade das fórmulas, a eficiência, pois que a todos avulta nesse setor
dramático a triste verdade de que o tempo perdido não se reconquista.
E o de propugnar igualmente pela melhoria das condições sociais e
econômicas através da ação renovadora da própria escola.

CELSO KELLY
Secretário do Conselho
Federal de Educação
Estudos e debates

MESTRES DE AMANHÃ

ANÍSIO S. TEIXEIRA
Diretor do INEP

Creio, no exame do tema que nos ocupa, que não me c u m p r e


e x p r i m i r apenas ansiedades e esperanças a respeito dos mestres de
a m a n h ã , mas p r o c u r a r antecipar, em face das condições e da situa-
ção de hoje, o que poderá ser o mestre dos dias vindouros. E e n t r e
os mestres buscarei, sobretudo, caracterizar os mestres do ensino
comum, do ensino destinado a todos, ou seja, na fase contemporâ-
nea, os mestres da escola p r i m á r i a e da escola secundária.
Deixarei de considerar o mestre de nível universitário, pois êste
não está a passar pelas mesmas m u d a n ç a s , q u e começam a atingir
o mestre da escola comum e, de certo m o d o , se está t a m b é m a
m u d a r , é m u i t o mais dentro de l i n h a que n ã o apresenta r a p t a r a
com a situação anterior, mas a desenvolve e aperfeiçoa.
É o mestre da escola elementar e da escola secundária que
está em crise e se vê mais p r o f u n d a m e n t e atingido e compelido a
m u d a r pelas condições dos tempos presentes. E por q u ê ?
P o r q u e estamos e n t r a n d o em u m a fase nova da civilização
c h a m a d a industrial, com a explosão c o n t e m p o r â n e a dos conheci-
mentos, com o desenvolvimento da tecnologia e com a extrema com-
plexidade conseqüente da sociedade m o d e r n a .
Na realidade, o nosso esforço pela educação do h o m e m , até
m u i t o recentemente, não chegou a ultrapassar os objetivos de
prepará-lo p a r a u m a sociedade m u i t o mais singela do que a socie-
d a d e h o d i e r n a . T o m a n d o o exemplo das sociedades desenvolvidas,
q u e chegaram, como no caso da América do Norte, a oferecer
educação a todos até os dezoito anos, a escola elementar e a secun-
dária constituíram-se em escolas intelectualmente desambiciosas, des-
tinadas a oferecer u m a educação capaz de formar os jovens p a r a
o convívio político, social e econômico de u m a sociedade de tra-
balho competitivo mas ao q u e se acreditava relativamente singela
e homogênea. A criação mais original da sociedade americana
nesse c a m p o foi a da comprehensive school de nível secundário,
com a flexibilidade dos seus currículos e a concentração na mesma

Conferência proferida em sessão do Conselho Internacional de Educação para


o Ensino, reunido no Hotel Glória do Rio de Janeiro, em agosto do corrente ano.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 11
escola de alunos os mais diversos nas aptidões, nas opções de estu-
do, na inteligência e nos objetivos escolares.
Esta escola, que resistiu ao severo estudo e análise de Conant,
representa, na realidade, u m a inovação em seus aspectos funda-
mentais. Constitui u m a antecipação, se considerarmos que sua
filosofia importa reconhecer certa u n i d a d e da cultura contempo-
rânea, a despeito de sua a p a r e n t e diversidade, e a equivalência
das diferentes carreiras a que se i r i a m devotar os seus alunos.
Correta, assim, na sua estrutura, não creio, e n t r e t a n t o , q u e
t e n h a conseguido r e a l m e n t e oferecer u m a educação à altura do
desafio dos nossos tempos. O que os nossos tempos p e d i a m era
u m a forte educação intelectual p a r a o jovem m o d e r n o , a despeito
das diferentes aptidões que possuísse, dos diferentes interesses que
revelasse e das diferentes carreiras a q u e se destinasse. A escola
compreensiva r e u n i u todos os jovens na mesma escola e, para lhes
d a r a impressão de u m a educação c o m u m , diluiu o conteúdo dos
diferentes programas, a fim de lhes emprestar u m a equivalência,
que só p o r essa diluição se fazia verdadeira.
E n t r e m e n t e s , q u e se passava com a civilização contempo-
r â n e a ? E n t r a v a ela em fase de desenvolvimento científico até
certo p o n t o inesperado, levando-a na indústria à automação, na
vida econômica a um grau espantoso de opulência e na vida política
e social a desenvolvimento de meios de comunicação de tal exten-
são e vigor que os órgãos de informação e de recreação se viram
s u b i t a m e n t e com o p o d e r de condicionar m e n t a l m e n t e o indivíduo,
transformando-o em joguete das forças de p r o p a g a n d a e algo de
passivo no c a m p o da recreação e do prazer.
O desenvolvimento c o n t e m p o r â n e o no c a m p o dos processos de
comunicação já foi c o m p a r a d o com o correspondente ao da desco-
b e r t a da imprensa, que gerou t a m b é m , conforme sabemos, um
p e r í o d o de certa degradação na difusão do conhecimento seme-
l h a n t e ao q u e se observa h o j e com a utilização dos meios de
comunicação em massa.
A v e r d a d e é que cada m e i o novo de comunicação, ao surgir,
n ã o p r o d u z i m e d i a t a m e n t e os resultados esperados mas, muitas
vezes, a difusão do que há de menos interessante, e m b o r a mais
a p a r e n t e m e n t e p o p u l a r , na cultura comum.
Não é apenas isto. Cada meio novo de comunicação alarga
o espaço d e n t r o do q u a l vive o h o m e m e t o r n a mais impessoal
a comunicação, exigindo, em rigor, do cérebro h u m a n o compreensão
mais delicada do valor, do significado e das circunstâncias em que
a nova comunicação lhe é feita.
Se p a r t i r m o s do p e r í o d o da simples comunicação oral de
pessoa a pessoa q u e se conheçam m u t u a m e n t e no p e q u e n o m e i o
local, p a r a a comunicação com o estranho e depois para a comu-
nicação escrita ainda e n t r e pessoas q u e se conheçam (correspon-
dência) e, a seguir, p a r a a comunicação escrita pelo texto e livro
12 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

e pelo j o r n a l , ainda locais, e, afinal, pelo telégrafo, pelo telefone,


pelo cinema, pelo r á d i o , pela televisão, pela comunicação estendida
a todo o planeta que faz s u b i t a m e n t e o h o m e m comum não apenas
o h a b i t a n t e de sua r u a , sua cidade, seu Estado, sua nação, mas
literalmente de t o d o o planeta e p a r t i c i p a n t e de u m a cultura n ã o
apenas local e nacional mas m u n d i a l , podemos ver e sentir o grau
de cultivo m e n t a l necessário p a r a lhe ser possível submeter a infor-
mação, q u e lhe é assim trazida de todo o m u n d o , ao crivo de sua
p r ó p r i a m e n t e , a fim de compreendê-la e absorvê-la com o mesmo
sentido de integração com que recebia a comunicação local e pes-
soal do seu p e r í o d o p a r o q u i a l de vida.
N ã o somente a comunicação se fêz assim universal no espaço,
como t a m b é m , com os novos recursos técnicos, se estendeu através
do t e m p o , p o d e n d o o h o m e m em u m a simples sessão de cinema
visualizar as civilizações ao longo da história, como sucede nos
grandes espetáculos m o d e r n o s em q u e a cultura antiga é apresen-
tada de forma n e m sequer sonhada pelos mais ambiciosos histo-
riadores do passado.
T ô d a essa imensa revolução dos meios de comunicação não
poderia deixar de criar, em sua fase inicial, antes a confusão do
que o esclarecimento, sobretudo p o r q u e esses meios n ã o foram
sequer conservados na posse dos grupos responsáveis pela educação
do h o m e m , como a escrita e a imprensa, por exemplo, de certo
m o d o se m a n t i v e r a m , mas se fizeram recursos para a p r o p a g a n d a
e a diversão comercializada, q u a n d o não p a r a o condicionamento
político e ideológico do h o m e m .
A educação p a r a êste período de nossa civilização ainda está
p a r a ser concebida e planejada e, depois disto, p a r a executá-la,
será preciso v e r d a d e i r a m e n t e um novo mestre, dotado de g r a u de
cultura e de t r e i n o q u e apenas começamos a imaginar.
Desde q u e surgiu a cultura escrita na história h u m a n a jamais
faltaram guardiães, t a n t o q u a n t o possível competentes, p a r a con-
servá-la e defender-lhe, por vezes excessivamente, a sua pureza.
Q u a n d o afinal surgiram as universidades, o engenho h u m a n o t u d o
fêz p a r a resguardar-lhes a l i b e r d a d e e a independência, a fim de
que o saber h u m a n o pelos que soubessem fosse conservado e
cultivado.
Ao ampliar-se a universidade pelas escolas de cultura comum
para todos, o p r e p a r o do mestre — ou seja, o guardião e trans-
missor da cultura — se fêz até o começo do nosso século com
razoável proficiência. T a n t o q u a n t o possível era êle o transmis-
sor de u m a cultura cuja significação e limites conhecia e, sobre-
t u d o , era o mais i m p o r t a n t e transmissor dessa cultura, estando
em seu p o d e r c o m a n d a r até certo p o n t o a formação do educando.
Com a expansão dos meios de comunicação, o mestre p e r d e u
êsse antigo p o d e r , passando a ser apenas um contribuinte p a r a
a formação do a l u n o , q u e recebe, em relativa desordem, p o r esses
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 13

novos meios de comunicação, imprensa, rádio e televisão, massa


incrível de informações e sugestões provenientes de u m a civilização
agitada p o r extrema difusão cultural e em acelerado estado de mu-
dança.
A Universidade conservou, a despeito de t u d o , um certo con-
trole dessa cultura e x t r e m a m e n t e difusa e em explosiva m u d a n ç a ,
graças à alta qualidade dos seus professôres e à vigorosa instituciona-
lização de sua independência e sua l i b e r d a d e , mas as escolas de
c u l t u r a geral do h o m e m c o m u m ficaram com os mestres p r e p a -
rados p a r a ministrar a cultura m u i t o mais simples e p a r o q u i a l
do século passado. Bem sei que o p r e p a r o destes mestres se
faz cada cada vez mais longo e nos países mais desenvolvidos
já está francamente exigindo graus universitários. A tarefa,
e n t r e t a n t o , é bem mais difícil e complexa.
R e c e n t e m e n t e , na I n g l a t e r r a , fêz-se u m a experiência de ensino
universitário — o colégio universitário de Keele, que me parece
merecer aqui uma referência. Como sabemos, o University College
of N o r t h Staffordshire surgiu em 1950, com a intenção de criar
um tipo novo de ensino universitário. Não irei descrever em
detalhe a experiência de Keele, mas apenas comentar o p r i m e i r o
ano de estudos desse novo colégio universitário, que constitui um
exemplo do tipo global de cultura que seria necessário ao h o m e m
m o d e r n o . O propósito desse ano inicial, c h a m a d o de fundamentos,
é o de rever, discutir e ilustrar os fundamentos, a herança, as
conquistas e os problemas da civilização ocidental. T o m o do re-
latório sôbre o progresso dessa experiência, no Educational Year-
book de 1959, a seguinte formulação dos objetivos desse p r i m e i r o
ano de estudos: O curso começa "levando os estudantes, pela
contemplação dos céus, à luz da astronomia e da física m o d e r n a ,
a um sentimento de espanto, maravilha e beleza. N ã o somente
o estudante de arte mas t a m b é m o cientista vê sob essa nova luz
a fé e os métodos do físico, n u m a súmula do progresso científico
a p a r t i r de Kepler, Galileu e Newton até as excitantes especulações
da m o d e r n a cosmologia. A c o m p a n h a n d o os passos da inquirição
h u m a n a desde a indagação de O l b e r t " P o r que é a noite e s c u r a ? "
até a teoria da criação contínua, sentir-se-á o estudante a r e p r o d u -
zir essa extraordinária aventura da m e n t e h u m a n a no seu esforço
de i m a g i n a r e descobrir a natureza do universo. Segue-se o geó-
logo com a descrição da história da terra d u r a n t e os 3.000.000.000
de anos ou mais que antecederam o aparecimento do h o m e m . O
geógrafo, depois, estuda o clima e os fatôres do meio a m b i e n t e .
O biólogo introduz os seres vivos e analisa as teorias da origem e
da evolução do h o m e m . Já aí os estudantes terão atingido a dose
de h u m i l d a d e suficiente p a r a apreciar as conquistas das primeiras
civilizações, que l h e serão apresentadas pelos professôres de saber
clássico, pelo filósofo, pelo teólogo e pelo historiador. D a í pros-
segue o curso i n t r o d u z i n d o o estudante na consideração dos carac-
terísticos e dos problemas da civilização ocidental n u m a era indus-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

trial conforme os vêem os historiadores, os geógrafos, os cientistas


políticos, os educadores e os economistas. A perspectiva já então
é a dos dias de hoje, projetada desse fundo histórico, a fim
de levar o estudante a sentir e apreciar os muitos e sérios proble-
mas q u e h o j e nos defrontam. A terceira p a r t e do curso se detém
n a s realizações criadoras do h o m e m — a língua, a l i t e r a t u r a , as
artes, a música, a a r q u i t e t u r a , as matemáticas, as ciências e a tecno-
logia e, p o r fim, o p r ó p r i o h o m e m e sua crença serão estudados
p o r filósofos, psicólogos, sociólogos, teólogos e biólogos."
Atrevo-me a considerar que êste deverá ser a m a n h ã o pro-
grama de educação comum do h o m e m m o d e r n o e não apenas, como
em Keele, a introdução aos estudos de nível superior. Com os
recursos técnicos modernos, estamos em condições de oferecer a
cada jovem, antes de t e r m i n a r o nível secundário de estudos um
q u a d r o da cultura contemporânea, desde os seus primórdios até
os p r o b l e m a s e complexidades dos dias presentes. N ã o teremos
todos os professôres especializados com que conta Keele p a r a a sua
experiência, m a s , com os recursos da televisão, do cinema e do
disco podemos levar todos os jovens a ver e ouvir, ou, pelo menos,
a ouvir, esses especialistas e, a seguir, com o professor da classe,
desdobrar, discutir e completar as lições que grandes mestres desse
m o d o l h e t e n h a m oferecido.
Mesmo assim, e n t r e t a n t o , será imensa a tarefa do professor
secundário e grande deve ser o p r e p a r o , p a r a que possa conduzir
o jovem nessa tentativa de d a r ã sua cultura básica a largueza, a
segurança e a perspectiva de u m a visão global do esforço do h o m e m
sôbre a terra.
Os meios m o d e r n o s de comunicação fizeram do nosso p l a n e t a
um p e q u e n i n o p l a n e t a e dos seus h a b i t a n t e s vizinhos uns dos
outros. P o r o u t r o lado, as forças do desenvolvimento t a m b é m nos
a p r o x i m a r a m e criaram problemas comuns p a r a o h o m e m con-
t e m p o r â n e o . T u d o está a i n d i c a r que não estamos longe de for-
mas internacionais de governo. Se a isto j u n t a r m o s a explosão
de conhecimentos e as m u d a n ç a s que os novos conhecimentos, com
as suas conseqüências tecnológicas, estão a trazer, podemos ima-
ginar até que p o n t o as forças do costume, dos hábitos e das velhas
crenças e preconceitos vão ser destruídas e q u a n t o vai o h o m e m
d e p e n d e r de sua cultura formal e consciente, de seu conhecimento
intelectual, simbólico e indireto, p a r a se conduzir dentro da nova
e desmesurada a m p l i t u d e de sua vida pessoal. São p o r t a n t o de
assustar as responsabilidades q u e a g u a r d a m o m e s t r e de a m a n h ã .
Sabemos o que se conseguiu, no passado, com a educação de grupos
seletos de estudantes. Alguns estabelecimentos de educação secun-
dária na E u r o p a — refiro-me sobretudo ao esforço de educação
seletiva acadêmica da F r a n ç a e da A l e m a n h a e à educação intelec-
t u a l e de caráter das english public schools — conseguiram dar,
em nível secundário, formação h u m a n a significativa para a com-
preensão das civilizações clássicas e do seu ideal de h o m e m culto.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

A nossa tarefa é hoje m u i t o mais difícil. P r i m e i r o , p o r q u e precisa-


mos fazer algo de semelhante p a r a todos e não apenas para alguns
e segundo p o r q u e já não estaremos m i n i s t r a n d o a cultura clássica
m a s a complexa, vária e, sob muitos aspectos, abstrusa cultura cientí-
fica m o d e r n a .
Diante dos novos recursos tecnológicos, ouso crer ser possível
a completa reformulação dos objetivos da cultura elementar e
secundária do h o m e m de h o j e e, em conseqüência, de alterar a
formação do mestre p a r a essa sua nova tarefa.
Que haverá já hoje que nos possa sugerir o q u e p o d e r á vir
a ser a escola de a m a n h ã ? P e r d o e m - m e que lhes l e m b r e as
transformações operadas nos grandes e m p r e e n d i m e n t o s que dirigem
a informação e as diversões m o d e r n a s : a imprensa, o cinema, o
r á d i o e a televisão. Entregues à iniciativa privada e dominados
pelo espírito de competição, o j o r n a l , a revista, a p r o d u ç ã o de
filmes e as estações de r á d i o e de televisão tornaram-se grandes servi-
ços técnicos e desenvolveram tipos de profissionais especializados, do-
tados de extrema virtuosidade, q u e se e m p e n h a r a m em se p ô r à
altura dos recursos tecnológicos e do grau de expansão da cultura
m o d e r n a . Algo de semelhante será o que irá suceder com a escola,
com a classe e com o professor. Se a biblioteca, de certo m o d o ,
já fizera do mestre um c o n d u t o r dos estudos do aluno e não
p r o p r i a m e n t e o transmissor da cultura, os novos recursos tecno-
lógicos e os meios audiovisuais irão transformar o mestre no
estimulador e assessor do estudante, cuja atividade de aprendizagem
deve guiar, orientando-o em m e i o às dificuldades da aquisição das
estruturas e modos de pensar fundamentais da cultura contempo-
rânea de base científica em seus aspectos físicos e h u m a n o s . Mais
do que o conteúdo do conhecimento em p e r m a n e n t e expansão,
cabe-lhe, com efeito, ensinar ao j o v e m aprendiz a a p r e n d e r os
métodos de pensar das ciências físico-matemáticas, biológicas e
sociais, a fim de habilitá-lo a fazer de tôda a sua vida u m a vida
de instrução e estudos.
Talvez se possa dizer, e m b o r a represente u m a grande sim-
plificação, q u e a educação até há pouco t e m p o oferecida pela esco-
la n ã o passou, no nível elementar, da aprendizagem das artes de
ler e escrever, como i n s t r u m e n t o de comunicação e de t r a b a l h o ,
seguida de u m a iniciação medíocre à vida cívica e política de
sua n a ç ã o ; no nível secundário, do p r e p a r o do adolescente p a r a
as ocupações que r e q u e r e m certo nível técnico e p a r a a continuação
dos seus estudos em nível s u p e r i o r ; e, no nível superior, do p r e p a r o
do profissional de nível superior e o do scholar ou pesquisador.
F o r a disto, há que n o t a r q u e as universidades se constituíram
elas p r ó p r i a s centros de pesquisa, de descoberta do conhecimento
e de sua expansão.
Ora, somente êste grupo ú l t i m o de pesquisadores está efetiva-
vamente de posse dos instrumentos e dos objetivos da cultura
16 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

científica em que estamos imersos e q u e nos conduz, sem dela


têrmos real e efetiva consciência. O p r ó p r i o scholar e pesquisador,
e m b o r a seja o m a i o r c o n t r i b u i n t e dessa cultura m o d e r n a , só rara-
m e n t e tem dela consciência a d e q u a d a , pois o grau de especialização
do seu t r a b a l h o o obriga a tal concentração de esforço e de inte-
resse, que lhe dificulta se não i m p e d e a visão global dessa cultura.
O fato contudo de estar mais e m p e n h a d o em descobrir, em
a u m e n t a r o saber do que no saber existente p r o p r i a m e n t e dito,
fá-lo o que há de mais p r ó x i m o em nossa sociedade do que deveria
ser cada um dos m e m b r o s dessa sociedade. Longe de m i m julgar
possível que cada um de nós venha a ser um pesquisador no sentido
acadêmico. Nem seria possível, n e m resolveria a dificuldade da
sociedade contemporânea.
De certo modo, o que estou a insinuar é talvez até mais a m p l o ,
e m b o r a não me pareça tão difícil. Se a experiência de Keele
pode constituir um exemplo do que se deveria fazer p a r a d a r
ao cidadão do nosso t e m p o a weltanschauung da c u l t u r a contem-
p o r â n e a , convém recordar q u e isto representaria somente a aquisi-
ção de u m a visão a d e q u a d a ao nosso t e m p o . E m b o r a extrema-
m e n t e i m p o r t a n t e , esta visão não lhe bastará, se dela n ã o emergir
a a t i t u d e c o propósito profundos de se fazer um eterno estudante,
cujo interesse p e r m a n e n t e e vivo seja o de a p r e n d e r s e m p r e e
mais. E nisto l e m b r a r á êle o pesquisador. Mas, e n q u a n t o êste
é um profissional e m p e n h a d o em um p e q u e n o c a m p o de conheci-
m e n t o e devotado a ampliá-lo, o cidadão c o m u m é um h o m e m
comum e m p e n h a d o em c o m p r e e n d e r e em agir cada vez mais
l ü c i d a m e n t e e mais eficientemente em sua ocupação e em sua vida
global, pois lhe c u m p r e sentir-se responsável pela sua sociedade.
Acaso já refletimos que, se considerarmos utópica essa aspiração,
teremos lavrado a nossa condenação à civilização científica que o
h o m e m está criando, m a s será incapaz de dirigir e c o m a n d a r . O
q u e nos leva a considerar utópica esta imaginada integração do
h o m e m com a sua criação científica é a situação ainda d o m i n a n t e
na educação oferecida pela escola.
H, G. Wells, um dos reconhecidos profetas dos p r i m e i r o s
t e m p o s de nosso século, proclamou, na década dos vinte, q u e nos
achávamos então em um p á r e o e n t r e educação e catástrofe. Já na
o u t r a década venceu a catástrofe, de que somente agora parece
vamos emergindo. Nosso otimismo, e n t r e t a n t o , não pode ser gran-
de, pois, se sentimos nos entendimentos recentes um alvorecer de
sabedoria política, o que p o r certo nos conforta, p o r o u t r o lado,
no c a m p o da educação, cumpre-nos registrar apenas alguns signi-
ficativos progressos no p r e p a r o de novos cientistas. Na educação
comum do h o m e m comum os progressos são os mais modestos. O
h o m e m c o m u m está c a m i n h a n d o p a r a ser o escravo como o enten-
dia Aristóteles, ou seja, o h o m e m que está na sociedade m a s não
é da sociedade. O progresso científico está na sela e conduz o
h o m e m n e n h u m de nós sabe p a r a onde.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 17
t
Ou melhor, todos sabemos, pois ninguém desconhece que, se
a educação é cada vez mais fraca, o anúncio e a propaganda são
cada vez mais fortes e nossa sociedade — sobretudo nos países
em que já se fêz afluente —• é uma sociedade cujo objetivo se
reduz ao de consumir cada vez maiores quantidades de bens
materiais. Conseguimos condicionar o homem para essa carreira
de consumo, inventando necessidades e lançando-o num delírio de
busca ilimitada de excitação e falsos bens materiais.
Ora, se o anúncio logrou obter isto, foi porque os meios de
influir e condicionar o homem se fizeram extremamente eficazes.
Não será isto uma razão para não considerar utópico o nosso
desejo de formar um homem capaz de ser responsável pela sua
sociedade e não o seu joguete, ou o seu escravo no sentido aristo-
télico?
Para isto, ouso pensar, o problema consistiria em formar um
mestre, esse mestre de amanhã, que fosse um pouco do que já
são hoje certos jornalistas de revistas e páginas científicas, um
pouco dos chamados por vezes injustamente popularizadores da
ciência, um pouco dos cientistas que chegaram a escrever de modo
geral e humano sôbre a ciência, um pouco dos autores de enciclo-
pédias e livros de referência e, ao mesmo tempo, mais do que
tudo isto. O mestre de amanhã teria, com efeito, de ser treinado
para ensinar basicamente as disciplinas do pensamento científico,
ou seja, a disciplina do pensamento matemático, a do pensamento
experimental, a do pensamento biológico e a do pensamento das
ciências sociais, e com fundamento nessa instrumentação da inteli-
gência contribuir para que o homem ordinário se faça um aprendiz
com o desejo de continuar sempre aprendendo, pois sua cultura não
só é intrinsecamente dinâmica mas está constantemente a mudar-lhe
a vida e a obrigá-lo a novos e delicados ajustamentos. Por que
não será impossível êste mestre? Porque são extraordinários os
recursos tecnológicos que terá para se fazer um mestre da civilização
científica, podendo para isto utilizar o cinema como forma descri-
tiva e narrativa e a televisão como forma de acesso a mestres maiores
que êle. O mestre seria algo como um operador dos recursos tecno-
lógicos modernos para a apresentação e o estudo da cultura moderna,
e como estaria, assim, rodeado e envolvido pelo equipamento e pela
tecnologia produzida pela ciência, não lhe seria difícil ensinar o
método e a disciplina intelectual do saber que tudo isso produziu
e continua a produzir. A sua escola de amanhã lembrará muito
mais um laboratório, uma oficina, uma estação de televisão do que
a escola de ontem e ainda de hoje. Entre as coisas mais antigas,
lembrará muito mais uma biblioteca e um museu do que o tra-
dicional edifício de salas de aulas. E, como intelectual, o mestre
de amanhã, nesse aspecto, lembrará muito mais o bibliotecário
apaixonado pela sua biblioteca, o conservador de museu apaixonado
pelo seu museu e, no sentido mais moderno, o escritor de rádio,

2
18 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

de cinema ou de televisão apaixonado pelos seus assuntos, o plane-


jador de exposições científicas, do que o antigo mestre-escola a
r e p e t i r nas classes um saber já s u p e r a d o .
Não se diga q u e estou a apresentar observações que somente
se aplicam às sociedades afluentes. O caso dos países subdesen-
volvidos n ã o é diverso, p o r q u e os recursos tecnológicos da p r o p a -
ganda e do anúncio t a m b é m já l h e chegaram e não lhe será possível
r e p e t i r a história dos sistemas escolares mas adaptar-se às formas
mais recentes da escola de hoje. Está claro que concretamente
seu p r o b l e m a é diverso. A sua luta não é ainda p a r a c o m a n d a r
a p r o d u t i v i d a d e mas para chegar à produtividade. A sua busca
pelos bens materiais é m u i t o mais imediata e dispensa os esforços
da Madison Avenue. P a r a d o x a l m e n t e , e n t r e t a n t o , o espírito do
anúncio e da p r o p a g a n d a lhe chegam antes de haver p o d i d o m u d a r
sua estrutura social para se fazer u m a sociedade científica de alta
produtividade. E, p o r isto mesmo, o anúncio ainda é mais tragi-
camente irônico. Somos pela p r o p a g a n d a condicionados p a r a
desejar o supérfluo, p a r á atender a necessidades inventadas, antes de
h a v e r atendido nossas reais necessidades.
T a m b é m , p o r t a n t o , haveremos de ter novas escolas e novos mes-
tres, embora v e n h a m ser eles aqui mais os iniciadores do m é t o d o
científico nas escolas do que os simples adaptadores das escolas das
sociedades afluentes já em pleno domínio da p r o d u ç ã o e do pro-
gresso científico.
Como m a r c h a m o s , e n t r e t a n t o , p a r a u m a situação idêntica,
cumpre-nos esforçar-nos p a r a q u e i m a r as etapas e construir a socie-
d a d e m o d e r n a com u m a escola ajustada ao t i p o de cultura q u e ela
representa.
Todas essas considerações nascem de u m a atitude de aceitação
do progresso científico m o d e r n o , de aceitação das terríveis m u d a n ç a s
que êste progresso está i m p o n d o à vida h u m a n a e da crença de q u e
ainda não fizemos em educação o que deveria ser feito p a r a pre-
p a r a r o h o m e m pará a época a que foi arrastado pelo seu p r ó p r i o
poder criador. Todo o nosso passado, nossos mais caros precon-
ceitos, nossos hábitos mais queridos, nossa agradável vida paro-
quial, t u d o isto se levanta contra o t u m u l t o e a confusão de u m a
m u d a n ç a profunda de cultura, como a que estamos sofrendo. A
mocidade contudo está a aceitar esta m u d a n ç a , é verdade que um
t a n t o passivamente, mas sem n a d a que l e m b r e a nossa inconfor-
midade. A m u d a n ç a , todos sabemos, é irreversível. Só conse-
guiremos restaurar-lhe a h a r m o n i a , se conseguirmos construir u m a
educação que a aceite, a ilumine e a conduza n u m sentido h u m a n o .
O desafio m o d e r n o é sobretudo êste: conseguir q u e todos os
homens a d q u i r a m a disciplina intelectual de p e n s a m e n t o e estudo
que, no passado, conseguimos dar aos poucos especialistas dotados
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 19

p a r a essa vida intelectual. O conhecimento e a vida a d q u i r i r a m


complexidade t a m a n h a q u e só u m a autêntica disciplina m e n t a l
p o d e r á ajudá-lo a se servir da ciência, a c o m p r e e n d e r a vida em
sua m o d e r n a complexidade e a m p l i t u d e e a dominá-la e submetê-la
a u m a ordem h u m a n a .
Ao alvorecer da vida de pensamento racional que deu origem.
a nossa civilização ocidental, os primeiros professôres tiveram em
Sócrates o seu mais significativo modêlo. Nada menos podemos
p e d i r hoje ao professor de a m a n h ã . Os mestres do futuro t e r ã o
de ser familiares dos métodos e conquistas da ciência e desde a
escola p r i m á r i a iniciar a criança e depois o adolescente na arte
s e m p r e difícil e hoje e x t r e m a m e n t e complexa de p e n s a r objetiva
e cientificamente, de utilizar os conhecimentos que a pesquisa l h e
está a trazer constantemente e de escolher e julgar os valores, com
que há de enriquecer a sua vida neste planeta e no espaço q u e está
em vésperas de conquistar. R e u n i n d o , assim, funções de p r e c e p t o r
e de sacerdote e p r o f u n d a m e n t e integrado na cultura científica, o
mestre do futuro será o sal da terra, capaz de ensinar-nos, a despeito
da complexidade e confusão m o d e r n a s , a arte da vida pessoal em
uma sociedade e x t r e m a m e n t e impessoal.
A EDUCAÇÃO EM FACE DA SEGUNDA
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
TOMÁS MALDONADO
Da Escola Industrial de Ulm

A educação, hoje, enfrenta problemas essencialmente novos.


Isto não significa nem que seus problemas tradicionais já tenham
encontrado uma solução favorável, nem, tampouco, como veremos
depois, que os novos problemas possam ser encarados independen-
temente dos tradicionais, ainda não resolvidos. Na realidade, as
preocupações atuais do pensamento pedagógico não implicam, neces-
sariamente, uma ruptura com preocupações mais antigas. Pelo
contrário, voltam a continuá-las — somente que sôbre um plano
anteriormente desconhecido.
Nos últimos tempos, a educação, tema quase sempre de inte-
resse efetivo para uns poucos e de interesse apenas retórico para
a maioria, tende a transformar-se num tema de interesse vital para
todos. É que o mundo se pôs em movimento, e já ninguém ignora
que, tão logo seja possível, a educação passará a desempenhar um
papel decisivo neste mundo em movimento. Pode-se dizer, sem
exagerar, que o futuro de nossa civilização industrial dependerá
do êxito ou fracasso das reformas que, a curto prazo, terão forço-
samente de levar-se a cabo no domínio do ensino, em geral, e do
universitário, em particular.
Mas, por que agora, precisamente, estas reformas? Por que
as insuficiências tão antigas da educação, por todos conhecidas e
por todos mais ou menos suportadas, assumem inesperadamente
êste caráter apocalíptico? Porque a aceitação resignada do estado
atual da educação se constituiu, para todos os países, em um luxo
demasiado caro e num risco demasiado grande. É evidente que os
atuais institutos de ensino já não podem responder com eficácia
às grandes exigências dinâmicas da vida social de nossos dias.
Pela primeira vez na história das idéias pedagógicas as atitudes
mais radicais e intransigentes, em relação à educação, já não são
assumidas, como outrora, por mestres rurais ou por intelectuais

íntegra da conferência proferida no Museu de Arte Moderna do Rio de


Janeiro, no ano de 1956, que agora divulgamos por sua atualidade e seu valor
intrínseco.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

sonhadores e utópicos, e sim, muitas vezes, pelos homens de Estado


e altos funcionários da educação oficial. Isto se explica porque o
processo de politização total da ciência e da técnica, processo que
a rivalidade entre os Estados Unidos e a União Soviética intensi-
ficou particularmente na última década, converteu a educação em
arma estratégica fundamental.
O fenômeno, à primeira vista, pode não parecer novo. Em
última instância, hão de nos dizer que a educação possuiu em
todas as épocas um. valor estratégico, pois, de um modo ou doutro,
ela serviu sempre como instrumento sutil de hegemonia ideológica.
Não obstante, a tese de que a educação é hoje uma arma estra-
tégica fundamental pode também ser compreendida de outro modo,
de um modo menos metafórico, mais literal e mais direto. 0 que
se deseja assinalar é que a educação superior é hoje uma colabo-
radora real da estratégia das grandes potências, ao ponto da efi-
ciência dos armamentos hoje depender da eficiência do ensino
distribuído na universidade.
Êste fato, não o ignoramos, preocupa e alarma os educadores.
Além disso, até agora os interesses pedagógicos nunca haviam sido
identificados com os interesses estratégicos. O mundo do mestre,
por assim dizer, tem sido sempre alheio ao mundo do soldado.
Contudo, a situação atual apresenta muito mais variantes e matizes
do que se pensa. Estamos convencidos, por exemplo, que esta
nova realidade, apesar de todos os aspectos negativos que nela é
possível denunciar, trará aspectos bastante positivos para o desen-
volvimento de uma concepção pedagógica progressista. O inte-
resse dos governos das grandes potências em lograr uma eficiência
máxima no domínio do ensino universitário, não pode ser indife-
rente aos educadores. Afinal de contas, os homens de Estado
chegaram, por outras razões, à mesma conclusão que os educadores:
n universidade é ineficaz e é necessário encarar a sua reforma.
Mas, poder-se-á realmente afirmar que a "universidade eficaz" dos
estrategistas é hoje a mesma que a dos educadores? Não nos
animaríamos a afirmá-lo. Digamos, apenas, que elas são semelhantes.
O objetivo imediato da "universidade eficaz" dos estrategistas é
cada dia formar um número maior e mais qualificado de sábios,
engenheiros e técnicos. Mas estes sábios, engenheiros e técnicos
não poderão ser, como até bem pouco, especialistas parciais, dogmá-
ticos e sem idéias próprias. O padrão humano do especialista, em
sua versão antiga, deixou de ser o personagem central e insubsti-
tuível no trabalho científico-tecnológico de nossos dias. As novas
tarefas de investigação e invenção exigem não só homens de conhe-
cimentos vastos e sólidos, como também., com independência de
juízo e espírito crítico, fantasia e capacidade criadora. Resulta,
pois, que para a obtenção do potencial destrutivo que a estratégia
22 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

necessita, h o j e se r e q u e r a colaboração de homens que se p o d e r i a m


definir como essencialmente construtivos, homens q u e l o g r a r i a m
satisfazer m u i t o facilmente o mais exigente ideal h u m a n i s t a . É
um p a r a d o x o , mas t a m b é m u m a esperança. É a esperança dos
educadores.
O p r o b l e m a a d q u i r i u nos Últimos anos, todavia, m a i o r
complexidade. Certos fatos tecnológicos revolucionários no domí-
nio da g r a n d e indústria, fatos em p a r t e derivados de exigências
militares, mas sem coincidir totalmente com elas, p r i n c i p i a r a m a
exercer u m a influência bastante apreciável sôbre os fatos educativos
autais. Referimo-nos ao que se convencionou c h a m a r a "segunda
revolução i n d u s t r i a l " , isto é, a automatização total dos meios de
produção.
0 advento da automatização — ou " a u t o m a ç ã o " , como outros
preferem dizer — assinala um m o m e n t o p a r t i c u l a r m e n t e crítico na
história das relações entre os homens e a natureza, os h o m e n s e as
m á q u i n a s , e os homens entre si. As formas sociais e culturais q u e
serviram até agora p a r a expressar e fixar o caráter destas relações,
deverão ser especialmente revistas nas próximas décadas.
A esta altura, certos esclarecimentos sôbre a natureza e sentido
da automatização se fazem necessários. Automatização, como se sabe,
é um vocábulo antigo, agora usado de m a n e i r a diferente. 0 mesmo
se p o d e dizer do automático. A t u a l m e n t e , afirmamos que é total-
m e n t e automático o mecanismo cujo processo de p r o d u ç ã o , desde a
e n t r a d a da matéria-prima até a saída do p r o d u t o confeccionado, p o d e
desenvolver-se sem a participação " d i r e t a " do h o m e m . A p r i m e i r a
revolução i n d u s t r i a l — m á q u i n a s de relojoaria e m á q u i n a s motrizes —
substituiu nossa m ã o e nossa força física no processo de p r o d u ç ã o ;
a segunda revolução industrial — m á q u i n a s de informação — substi-
t u i r á nossa inteligência e nossos sentidos. O resultado disto, pelo
menos em teoria, será u m a h u m a n i d a d e liberada, t a n t o física como
e s p i r i t u a l m e n t e , das tarefas mecânicas, das tarefas n ã o criadoras.
Até hoje, foram as p r o p r i e d a d e s dos materiais, das ferramentas e
dos mecanismos que i m p u s e r a m a lei e o r i t m o ao t r a b a l h o h u m a n o .
Com a automatização, possivelmente, mecanismos livres farão livre
o h o m e m . É difícil prever quais serão as atividades h u m a n a s n u m a
sociedade com meios de p r o d u ç ã o t o t a l m e n t e automatizados. T u d o
i n d u z a crer, contudo, que as artes e a reflexão filosófica alcançarão
no futuro u m a plenitude e extensão até agora desconhecidas. Pela
p r i m e i r a vez, a cultura será social.
Todavia, p a r a evitar um otimismo d e m a s i a d a m e n t e ingênuo,
desde já. advirtamos que a conquista da automatização não será fácil.
As dificuldades são hoje evidentes, p a r a todos. Um fato, ademais,
acrescenta p a r t i c u l a r d r a m a t i c i d a d e à situação: as dificuldades não
p o d e r ã o ser c o n t o r n a d a s ; em todos os casos deverão ser resolvidas.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 23

Na m a r c h a para a automatização não serão permitidos nem o retro-


cesso, n e m o a b a n d o n o , n e m a m u d a n ç a da rota. A automatização
é inevitável. Os países cujos meios de p r o d u ç ã o se acham sol)
controle da p r o p r i e d a d e privada, p r ò x i m a m e n t e enfrentarão proble-
mas de extrema gravidade. E n ã o há escolha possível. Se quisessem
não correr o risco da automatização, se tentassem manter-se fiéis à
p r i m e i r a revolução industrial, as conseqüências p o d e r i a m chegar a
ser m u i t o mais graves ainda. N e n h u m país, p a r a evitar o perigo
do desemprego, quererá deter o progresso tecnológico da p r ó p r i a
indústria, isto é, c o m p r o m e t e r seu p r ó p r i o poder de competição no
mercado internacional. Mas, por outro lado, a ameaça do desemprego
em massa é algo mais que um vaticínio — é um fato perfeitamente
possível. As confederações trabalhistas p r o p õ e m diferentes soluções.
W a l t e r R e u t h e r , presidente do sindicato americano dos trabalha-
dores em indústrias automobilísticas, p r o p õ e a semana de q u a t r o
dias. N a t Weinberg, consultor científico dessa mesma organização,
aconselha que as empresas paguem ao operário despedido um ano
de o r d e n a d o , como indenização, a fim de que êle possa p r o c u r a r um
novo emprego. Os grandes especialistas norte-americanos em temas
econômicos, os porta-vozes da teoria h a r m ô n i c a da economia e
finanças, julgam q u e somente pela planificação será possível passar
de u m a era tecnológica a outra, sem acidentes. Não obstante, q u a n d o
se e s t u d a m detalhes dêsses projetos de planificação, percebe-se de
imediato o seu caráter absolutamente abstrato. A realidade, a
r e a l i d a d e da indústria, não parece mostrar-se m u i t o dócil às tenta-
tivas de planificação. O certo é que a automatização já está em
m a r c h a , indiferente e até hostil a todos os planos que lhe q u e r e m
i m p o r . Os primeiros exemplos já existem: nos Estados Unidos, a
fábrica de granadas U. S. Industries, Inc., de Rockford ( I l l i n o i s ) ,
as oficinas F o r d de Cleveland, p a r a a p r o d u ç ã o de blocos de motor,
a p r o d u ç ã o de chassis pela G e n e r a l Eletric e vários d e p a r t a m e n t o s
da Westinghouse e R C A ; na Grã-Bretanha, a Standard Motor, de
Coventry; na A l e m a n h a Ocidental, as últimas realizações parcial
ou t o t a l m e n t e automáticas no c a m p o das escavadeiras gigantes, a
roda das m á q u i n a s pavimentadoras e das m á q u i n a s de empacota-
m e n t o , a r m a z e n a m e n t o e expedição. T a m p o u c o será possível deixar
de m e n c i o n a r os principais exemplos de automatização na União
Soviética: as centrais hidrelétricas de N i e p e r e Ordjonikidze. Ainda
que a União Soviética parecesse desconhecer a ameaça do desemprego
em massa, a criação recente do Ministério da Automatização leva
a crer que, t a m b é m ali, a segunda revolução i n d u s t r i a l criou
graves problemas de organização. "0 desenvolvimento da auto-
matização", queixava-se há pouco t e m p o um dirigente soviético,
"é de grande i m p o r t â n c i a p a r a o Estado, mas os ministérios e
d e p a r t a m e n t o s ministeriais dispensam p o u c a atenção a um pro-
b l e m a de tal i m p o r t â n c i a " .
24 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Pois, de fato, a era da automatização, com maiores ou menores


c o n t r a t e m p o s , com inquietações ou promissoras perspectivas, já foi
i n a u g u r a d a em todos os países altamente industrializados. O que
ainda s u r p r e e n d e é que, apesar de sua indiferença p a r a com os
possíveis riscos, esta formidável revolução não se esteja p r o d u z i n d o
súbita e sim p a u l a t i n a m e n t e . Mas, quais são os fatôres que hoje
r e t a r d a m a automatização? Um deles, sem dúvida, é a dificuldade
de r e a d a p t a ç ã o das fábricas, cujas dispendiosas instalações não-auto-
máticas a i n d a falta amortizar. Em geral, somente as indústrias mais
novas, ou as mais novas seções das indústrias antigas, não encontram
dificuldades neste sentido. P e n s a n d o b e m , elas constituem a van-
guarda da i n d ú s t r i a atual. Êste fator, e n t r e t a n t o , é transitório. N ã o
é difícil q u e , em poucos anos, a m a i o r p a r t e das empresas possa
estar em condições de se automatizar t o t a l m e n t e . Há o u t r o fator,
p o r é m , q u e se m o s t r a obstinadamente c o n t r á r i o a u m a solução
simples e a curto prazo. Referimo-nos ao p r o b l e m a da falta de
pessoal — sábios, engenheiros e técnicos — que possam r e s p o n d e r à
numerosa exigência de assistência científico-tecnológica que u m a
revolução desta natureza solicita. Dêste m o d o retornamos ao t e m a
inicial: a eficácia do ensino universitário.

II

Na A l e m a n h a , existe hoje um grande interesse pelos efeitos da


automatização n o c a m p o pedagógico. H á u m ano, H e l l m u t h Becker,
r e p r e s e n t a n t e j u r í d i c o da maioria dos institutos particulares de ensi-
no da A l e m a n h a , inaugurou a polêmica sôbre o t e m a em artigo
p u b l i c a d o na revista " M e r k u r " . "O recente processo de automa-
tização nos Estados Unidos", escreve Becker, " d e m o n s t r a q u e o
atual desenvolvimento tecnológico t e n d e a s u p e r a r a p r i m e i r a revo-
lução industrial. Como o Estado democrático m o d e r n o não p o d e
legitimar o desemprego tecnológico, em massa, e os m e m b r o s pro-
gressistas das confederações trabalhistas não serão maquinoclastas,
t u d o parece indicar que o atual desenvolvimento forçosamente
motivará u m a redução nas horas de t r a b a l h o , pelo mesmo s o l d o . . .
O dia de cinco horas ou a semana de q u a t r o dias, t a m b é m p a r a os
observadores cautelosos, seria inevitável d e n t r o de 10 ou 15 anos. Os
homens destinados a viver neste m u n d o freqüentam hoje a escola.
Os planos pedagógicos são sempre de longo alcance. Deveríamos,
h o j e , construir escolas p a r a homens que, possivelmente, disporão da
m e t a d e do seu t e m p o como t e m p o livre". Esse mesmo tema foi
debatido apenas há um mês p o r cerca de 500 mestres e pro-
fessôres alemães, delegados a um congresso realizado na cidade de
B a d H a r z b u r g . O sociólogo H e l l m u t h Schelsky, ativo p a r t i c i p a n t e
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do dito congresso, assinalou a necessidade de definir, agora e


u r g e n t e m e n t e , as bases de uma nova concepção pedagógica, q u e
levasse em conta as características prováveis de vida de u m a socie-
d a d e com meios de p r o d u ç ã o t o t a l m e n t e automatizados.
T a n t o as sugestões de Becker como as de Sclielsky são, em
linhas gerais, m u i t o justas. Sòmente um r e p a r o se llies p o d e fazer:
t e s t e m u n h a m u m a impaciência exagerada. Estamos de acordo q u e ,
objetivando a automatização, u m a reforma radical do ensino deve
ser encarada. De n e n h u m m o d o , contudo, sôbre como e q u a n d o
esta reforma deve ser encarada. É falso p r e t e n d e r educar agora
p a r a u m a sociedade futura, com t e m p o livre. Sem dúvida, o t e m p o
livre individual será o resultado da automatização, mas antes disso
devemos saber quem se encarregará de levar a automatização até
a p r á t i c a . Êste p r o b l e m a está m u i t o menos claro do que Becker
e Sclielsky supõem.
Na Grã-Bretanha, n u m a publicação do " D e p a r t a m e n t o de
Investigações Científicas e I n d u s t r i a i s " , aconselha-se o governo a
n ã o p r e c i p i t a r a automatização, pois a falta de técnicos t o r n a r i a
impossível um desenvolvimento favorável.
Esta advertência, a q u a l se poderia r e c r i m i n a r u m a p r u d ê n c i a
excessiva, se ajusta à realidade dos fatos. No fundo, a automati-
zação, como já o advertimos, será o resultado da atividade teórica e
prática de u m a m u l t i d ã o de técnicos, endurecidos nas mais severas
disciplinas, e n ã o de u m a m u l t i d ã o de personalidades areádicas,
aptas u n i c a m e n t e p a r a gozar as delícias do t e m p o livre. Na prática,
os artífices do t e m p o livre precederão os usufrutuários do t e m p o
livre. Os p r o d u t o r e s e os consumidores. Assim, o u t r a possibilidade
seria que a educação se propusesse a alcançar ambos os fins ao
mesmo t e m p o : formar o h o m e m de a m a n h ã e o de depois de a m a n h ã .
Isto é teoricamente justo, mas difícil de levar até a prática. O
p a d r ã o h u m a n o que a automatização necessita p a r a converter-se
em realidade, difere essencialmente daquele que convém a u m a
e s t r u t u r a social onde a automatização já é u m a realidade. É o
dilema de todos os dilemas. O êxito de u m a estrutura pedagógica,
que pretendesse conjugar ambas as reivindicações de formação
h u m a n a , é mais que improvável. Nosso ponto-de-vista, todavia, não
está livre de objeções. É possível exigir que o desenvolvimento
se c u m p r a em dois períodos, sobretudo q u a n d o o t e m p o disponível
p a r a o p r i m e i r o p e r í o d o será, segundo todas as previsões, extrema-
mente curto? A rigor, por dois períodos não se deveriam e n t e n d e r
dois sistemas, e sim, apenas, dois m o m e n t o s de um único sistema.
Esse sistema único teria de ser flexível, dinâmico e a d a p t á v e l ; em
outras palavras, capaz, q u a n d o as circunstâncias o exigissem, de
modificar com fluência seus p r ó p r i o s fins e métodos. Disto n ã o
se infira que somos partidários de u m a educação sem p l a n o , à
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mercê das mais diversas e imprevisíveis inspirações exteriores. Pelo


contrário, u m a concepção pedagógica coerente e orgânica deverá
constituir o esqueleto desse sistema único. Esta concepção não
existe. A i n d a n ã o foi formulada. Na realidade, um p r i m e i r o passo
seria averiguar se e n t r e as correntes pedagógicas atuais existem
elementos que possam integrar-se ou não nesta nova concepção.
Vejamos.
Existem duas correntes pedagógicas que em nossa época exer-
ceram e exercem grande influência: u m a é a humanista, de orien-
tação retrospectiva e filológica; outra, a pragmática, ativa e opera-
cional. É desnecessário que nos ocupemos aqui, mais u m a vez, da
p r i m e i r a dessas correntes. A doutrina h u m a n i s t a da educação tem
sido até agora a mais freqüentemente debatida e seus fundamentos
e propósitos são a m p l a m e n t e conhecidos. Em linhas gerais, e com
ligeiras variantes, ela constitui o f u n d a m e n t o de grande p a r t e das
universidades européias, de inspiração européia. P a r a nosso objetivo,
e n t r e t a n t o , i m p o r t a mais que façamos u m a análise d e t a l h a d a do
pragmatismo pedagógico. Advirtamos, de saída, q u e a palavra
pragmatismo é a q u i usada com um sentido m u i t o amplo. Sob esta
denominação a g r u p a m o s diferentes tendências pedagógicas que,
e m b o r a divergentes em muitos aspectos, coincidem todas na exal-
tação do fazer, da prática, da praxe, em suma, do " p r a g m a " , como
e l e m e n t o essencial da educação. P o r o u t r o l a d o , n ã o nos ocupa-
remos do p r a g m a t i s m o " e m geral", mas somente de duas das suas
principais manifestações: o pragmatismo norte-americano e o prag-
matismo soviético.
Os f u n d a m e n t o s teóricos do pragmatismo pedagógico norte-ameri-
cano devem ser buscados, como é sabido, na filosofia educacional
de J o h n Dewey. Isto n ã o significa q u e as escolas e universidades
norte-americanas exemplifiquem de um modo exato o p e n s a m e n t o
de Dewey. No fundo, Dewey foi um pedagogo de vanguarda e os
institutos de ensino aceitaram apenas os aspectos mais exteriores
e gerais, n e m s e m p r e os mais sutis de sua d o u t r i n a .
Dewey, i n s p i r a d o em William J a m e s , foi um dos primeiros a
lançar a divisa ativista do learning by doing: a p r e n d e r pela ação.
Foi t a m b é m um dos primeiros a defender a educação científica e
tecnológica, menos aceitada que tolerada nas universidades ame-
ricanas do p r i n c í p i o do século. Não obstante, Dewey, p o r motivos
polêmicos, viu-se m u i t o freqüentemente obrigado a refutar a impor-
tância dos aspectos quantitativos do saber. Em Problems of Men,
Dewey d i z : "A compreensão consiste em saber como funcionam
as coisas e como fazê-las. A compreensão, p o r sua natureza mesma,
se relaciona com a ação; assim como a informação por sua natu-
reza mesma se acha isolada da ação ou a ela vinculada por acidente,
apenas aqui e ali". Segundo Dewey, e n t ã o , i m p o r t a mais um h o m e m
dotado de compreensão que um h o m e m com informação.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 27

Esse ponto-de-vista foi, em d a d o m o m e n t o , revolucionário,


p o r q u e o p r i n c i p a l inimigo de tôda a educação progressista era a
teoria p u r a m e n t e idealista e verbal h e r d a d a do século X I X . Con-
t u d o , a influência dêste p r i n c í p i o nas escolas e universidades norte-
americanas, antes renovadora, transformou-se agora em um dos
elementos q u e mais c o n t r i b u e m p a r a dissociar a educação da vida.
Êste p r o b l e m a preocupa os h o m e n s de Estado e altos funcionários
da educação norte-americana. Os recentes inquéritos do New
York Times e do Newsweek p u s e r a m em evidência a situação
p a r t i c u l a r m e n t e crítica da educação nos Estados Unidos.
Em 8 0 % das escolas superiores o ensino das matemáticas n ã o
s u p e r a o nível da a r i t m é t i c a : em 9 5 % não se ensina física e em
8 5 % n ã o se ensina química. Sòmente 2% dos estudantes dos liceus
se o c u p a m da trigonometria, 4 , 3 % de física, 1 1 % de geometria e
2 4 % de álgebra. Apenas 1 6 % dos estudantes secundários seguem
cursos de e n g e n h a r i a , e destes, só 8% se d i p l o m a m . Norbert
W i e n e r , f u n d a d o r da cibernética e um dos principais teóricos da
automatização, escreve: "As matérias q u e formavam o u t r o r a o
p r i n c i p a l sustentáculo da educação, h a v e n d o p o r diversas razões
p e r d i d o a sua p o p u l a r i d a d e , são submetidas a ataques contínuos
p o r p a r t e do ensino e dos legisladores de cada Estado. Neste país
se crê, e s t r a n h a m e n t e , que a democracia implica u m a educação q u e
n ã o supera a capacidade mais l i m i t a d a . . . " Em outras palavras,
nos Estados Unidos se está t o m a n d o cada dia m a i o r consciência q u e ,
na o r d e m pedagógica, hoje n ã o p o d e haver compreensão sem infor-
m a ç ã o . E que informação não se a d q u i r e simplesmente por com-
preensão, senão através de um severo e disciplinado t r a b a l h o inte-
lectual. T u d o indica que o p r a g m a t i s m o pedagógico já n ã o p o d e
ser útil à nova etapa tecnológica q u e os Estados Unidos q u e r e m
iniciar.
Na U n i ã o Soviética, o fenômeno é bastante similar. O tipo de
p r a g m a t i s m o que d u r a n t e quase q u a r e n t a anos guiou a educação
soviética n ã o parece mostrar-se, em vários aspectos, m u i t o adaptável
às novas circunstâncias. Ali, t a m b é m , a educação está passando
p o r u m a profunda crise estrutural, p o r u m a revisão r a d i c a l de
seus fins e métodos. Ali, t a m b é m , a educação que se julgava m u i t o
ajustada aos fatos reais e às exigências sociais, parece haver p e r d i d o
o contato com a vida. Isto inquieta os dirigentes soviéticos. " G r a v e
defeito", dizia há pouco um deles, "é que o ensino está de algum
m o d o isolado da v i d a ; os alunos formados estão insuficientemente
p r e p a r a d o s p a r a a atividade prática. Q u a n t o ao n ú m e r o , devemos
estar satisfeitos. Mas devemos dispensar u m a séria atenção à quali-
dade da formação dos e s p e c i a l i s t a s . . . "
É i n d u b i t á v e l que o pragmatismo pedagógico, tanto liberal como
socialista, está em dificuldades. T a n t o norte-americanos como
russos s u b m e t e m a t u a l m e n t e seus p r ó p r i o s sistemas educativos a
28 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

severas críticas. No fundo, estas críticas estão dirigidas contra o


p r a g m a t i s m o pedagógico. Ambos os sistemas educativos, apesar
de suas diferenças profundas em alguns aspectos, têm coincidido
s e m p r e na exaltação dos valores práticos e objetivos da vida, na
definição empírica e operacional da v e r d a d e . É desconcertante que,
agora, russos e norte-americanos se queixem do mesmo m a l : o
divórcio e n t r e a educação e a vida. É que a tendência, p o r um lado,
do pragmatismo americano, a subestimar os aspectos teóricos do
saber, e a tendência do p r a g m a t i s m o soviético, p o r outro, a exigir
q u e os fatos se ajustem a pressupostos dogmáticos, t ê m i m p e d i d o
a educação de nos últimos anos a c o m p a n h a r as novas exigências
do presente desenvolvimento científico-tecnológico.
Os técnicos q u e levarão a cabo a segunda revolução industrial,
q u e facilitarão o advento da era da automatização, não p o d e r ã o
ser " p r á t i c o s " , somente interessados na conquista de objetivos ime-
diatos, n e m t a m p o u c o " p r á t i c o s " sem l i b e r d a d e interior e exterior
p a r a discutir com os outros os resultados de sua ação. Os novos
técnicos, em outras palavras, não p o d e r ã o ser n e m práticos ingênuos,
n e m práticos dogmáticos.
P o r q u e a crise da educação pragmática provém p r i n c i p a l m e n t e
de que ela n ã o logrou superar os problemas típicos da etapa cien-
tífica e técnica mais insuficiente. P r o b l e m a s tais como o conflito
e n t r e prática e p e n s a m e n t o teórico, e n t r e sentido comum e reflexão
científica, e n t r e especialismo e universalismo, p e r d e r a m totalmente
sua legitimidade em nossa época. Os acontecimentos tecnológicos
de maiores conseqüências práticas p a r a a vida individual e coletiva
dos homens de hoje — citemos apenas a liberação da energia nuclear
e o uso de mecanismos c o m p l e t a m e n t e automáticos — são resultados,
sem dúvida, da experiência, mas t a m b é m do p e n s a m e n t o teórico
mais abstrato.
P o r o u t r o lado, a idéia do especialista dos princípios do século,
do profissional q u e conhecia t o t a l m e n t e um domínio do saber, já n ã o
existe ou está próxima a desaparecer. N ã o é fato novo q u e
n i n g u é m p o d e h o j e p r e t e n d e r abarcar todas as informações e conhe-
cimentos acumulados em um domínio p a r t i c u l a r da ciência e da
técnica. Isto não ocorreu somente p o r q u e as informações e conheci-
m e n t o s t e n h a n i a u m e n t a d o n u m a m e d i d a que supera as possibili-
dades individuais h u m a n a s , mas t a m b é m p o r q u e a ciência e a técnica
mais avançadas r e f o r m a r a m a noção de especialidade. H o j e , pode-se
dizer q u e as disciplinas mais evoluídas são aquelas cujas explica-
ções mais essenciais se encontram fora dos seus p r ó p r i o s limites.
O mesmo pode-se dizer do especialista. O m e l h o r especialista é
aquêle que, em um d a d o m o m e n t o , p o d e deixar de o ser. Isto
n ã o deve ser i n t e r p r e t a d o no sentido de que o especialismo t e n d e a
se transformar em universalismo de t i p o h u m a n i s t a . Em nossos dias
o processo se c u m p r e de m o d o m u i t o diferente. Alberti e L e o n a r d o
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 29

d o m i n a r a m todo o saber de sua época. Não obstante, um fato de


t a l n a t u r e z a foi possível n ã o só p o r o b r a do gênio dêsses h o m e n s ,
como t a m b é m pela relativa estreiteza do saber renascentista. No
século X V I I I , os enciclopedistas, já incapazes de r e p e t i r a expe-
riência renascentista, viveram p o r um m o m e n t o a, ilusão de q u e u m a
s u m a mecânica de especialidades daria como resultado a totali-
zação do saber. " E m ti e p o r t i , Enciclopédia, o espírito h u m a n o " ,
escrevia D'Alembert, "'possui t u d o " . Contra esta tendência r e a g i r a m
os séculos X I X e X X , o p o n d o ao m i t o enciclopédico o m i t o do
especialismo. Na atualidade, tende-se a r e p e l i r t a n t o a noção
clássica do enciclopedismo como a noção clássica do especialismo,
mas, ao m e s m o t e m p o , a nova noção q u e hoje começa a a b r i r
c a m i n h o n ã o é alheia n e m a um certo t i p o de enciclopedismo n e m
a um. certo t i p o de especialismo. F a l a r de síntese seria b a n a l i z a r
o fenômeno. O que ocorre é que e n t r e enciclopedismo e especia-
lismo os limites já n ã o p o d e m ser claramente estabelecidos.
Os artífices da segunda revolução industrial, os sábios, enge-
n h e i r o s e técnicos q u e t o r n a r ã o possível a automatização, t e r ã o de
ser h o m e n s com conhecimentos ao m e s m o t e m p o gerais e a l t a m e n t e
especializados. É falso, então, p r e t e n d e r que a p r ó x i m a geração deva
ser educada p a r a u m a sociedade com t e m p o livre p a r a todos e p a r a
cada um. Pelo contrário, à próxima geração será exigido um
esforço de rendimento intelectual como a nenhuma outra antes o
foi exigido. A educação h u m a n i s t a defendeu o ideal do " h o m e m
i n s t r u í d o " ; a educação pragmática, o do " h o m e m prático, criador
e de ação". Os h o m e n s que farão a segunda revolução industrial
serão, pelo visto, práticos, criadores e de ação, m a s t a m b é m enorme-
m e n t e instruídos. Q u a n d o a automatização total se converter em
r e a l i d a d e , será chegado o m o m e n t o de alterar r a d i c a l m e n t e os fins
e os métodos da educação. N ã o agora, e sim então, ter-se-á de pla-
n e j a r a educação pará o tempo livre.

III
N ã o obstante, a m u d a n ç a de um sistema educativo p a r a o u t r o
n ã o p o d e r á ser i m p r o v i s a d a ; terá, pelo contrário, de obedecer
a um plano. Os educadores, como s e m p r e , devem t r a b a l h a r p a r a
o futuro. Desta vez, deveremos ter mais fantasia e previsão profé-
tica q u e de costume, se n ã o quisermos ser surpreendidos pela evolução
dos fatos.
Certas perguntas ingênuas, as mesmas q u e p r e o c u p a m o h o m e m
da r u a , hoje i n q u i e t a m a muitos de nós. A p r i m e i r a de t o d a s : em
u m a sociedade totalmente automatizada, que farão os homens com
o t e m p o livre? Melhor a i n d a : quais os pressupostos psicológicos
30 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

e intelectuais requeridos para q u e os h o m e n s saibam criar ocupações


favoráveis e q u e n ã o contrariem nos interesses do futuro cultural
e social da espécie? Não pretendemos d a r a q u i u m a resposta. A
resposta deverá ser o resultado de u m a a m p l a tarefa de colabo-
ração e n t r e educadores, sociólogos, higienistas, antropólogos, psicó-
logos e artistas. É difícil imaginar o u t r a forma, p o r q u e a respon-
sabilidade histórica da decisão será e n o r m e .
Mencionemos somente um exemplo e n t r e os muitos que se
p o d e r i a m citar p a r a ilustrar êste tema. As novelas de antecipação
científica — as sciences fictions —• nos asseguram com emocionante
ingenuidade que o h o m e m do futuro será dotado de una cérebro
imenso, isto é, de u m a hipertrofia das funções intelectuais. Não
obstante, os neurofisiólogos não o p i n a m da mesma m a n e i r a . A
preocupação atual dos neurofisiólogos é, pelo contrário, que o cérebro
h u m a n o na era da automatização possa p e r d e r algumas de suas
qualidades já adquiridas ou, p a r a dizé-lo na linguagem das novelas
de antecipação, que o cérebro h u m a n o , longe de a u m e n t a r , venha a
reduzir-se. Esta preocupação é legítima. A espécie h u m a n a , como
realidade psicofisiológica, é m u i t o m a i s frágil do que se supõe. A
história do cérebro parece quase demonstrá-lo. O h o m e m , afinal de
contas, alcançou o seu presente nível intelectual precisamente graças
às funções das quais a mecanização e a automatização se p r o p õ e m
a liberá-lo. Em outras palavras, o h o m e m conquistou sua huma-
n i d a d e através da manipulação da m a t é r i a e das atividades inte-
lectuais de cálculo, comando, controle, regulação, memória e organi-
zação. Os mecanismos assumiram todas essas tarefas.
O h o m e m reservou apenas u m a tarefa p a r a si: continuar inves-
tigando e inventando no domínio da ciência, da técnica, da filosofia,
da literatura e da arte. O p r o b l e m a que falta resolver é se esta
tarefa p o d e r á ser eficientemente d e s e m p e n h a d a no futuro sem o
t r e i n a m e n t o cerebral que as atividades agora cedidas aos mecanismos
p r e s s u p u n h a m . Grey Walther, o g r a n d e neurofisiólogo inglês,
escreve: "A sociedade pareceu refletir d u r a n t e algum t e m p o pela
sua diversidade, sua plasticidade e sua a d a p t a b i l i d a d e , a generosi-
dade do funcionamento c e r e b r a l ; a t u a l m e n t e , ela mais parece a cami-
n h o de degenerar em algo muito semelhante à medula espinhal, capaz
de receber instruções e instrumentos de coordenação, mas incapaz
de conceber u m a idéia original". Isto p o d e ser i n t e r p r e t a d o apenas
como u m a metáfora, mas, na realidade, é algo mais q u e u m a metáfora.
A sociedade futura deverá seguir refletindo a diversidade, a plasti-
c i d a d e e a a d a p t a b i l i d a d e cerebral, pois, se não o fizesse generosa-
m e n t e , a diversidade, a plasticidade e a a d a p t a b i l i d a d e cerebral
ficariam s u m a m e n t e comprometidas.
Esclarecemos, todavia, que, p a r a p o d e r d a r respostas a todas
essas indagações da educação de a m a n h ã e de depois de a m a n h ã ,
muitos novos institutos de ensino superior, institutos modelos, institu-
tos que possam c u m p r i r u m a função de pilotagem, terão de ser criados
o q u a n t o antes em todos os países.
Esses novos institutos se constituirão, preferentemente, à margem,
das universidades já existentes. T e n t a r m e l h o r a r as universidades
atuais é u m a tarefa legítima, mas seria errôneo imaginar que as univer-
sidades possam converter-se, sem mais n e m menos, nos institutos
modelos que os tempos exigem. A solução mais aconselhável é prosse-
guir com os esforços tendentes a m e l h o r a r as universidades, mas, ao
mesmo t e m p o , criar novos institutos que possam atuar independen-
t e m e n t e das universidades.
Mas, é justo — como o estamos fazendo — p r o p o r soluções "ge-
r a i s " p a r a a educação superior, sem levar cm conta as profundas
diferenças do desenvolvimento tecnológico nos vários países? Há
aquêles que pensam, com efeito, que reformas educacionais da na-
tureza que nós aconselhamos são urgentes nos países altamente in-
dustrializados, pois as conseqüências pedagógicas da automatização
são de interesse exclusivo dêsses países. Em outras palavras, a
automatização seria um tema artificial, sem bases objetivas, nos países
pouco ou n a d a industrializados; p o r conseguinte, t a m b é m os pro-
blemas educacionais que a automatização suscita. Apesar disso, os
principais estudiosos da automatização não partilhara dêste m o d o
de ver. O suíço Pollock, vinculado ao " I n s t i t u t o de Estudos Socio-
lógicos", de F r a n k f u r t , e o americano Leontief, de H a r v a r d , coincidem
na o p i n i ã o sôbre a importância da automatização também p a r a os
países cuja evolução tecnológica é ainda incerta e pouco desenvolvida.
Leontief, em particular, é m u i t o conhecido pela sua tese de q u e
é possível se passar à segunda revolução industrial sem se haver
ainda concluído, satisfatoriamente, a p r i m e i r a fase. Que nos seja
p e r m i t i d a aqui u m a citação extensa de Leontief:
"A nova tecnologia", diz o grande economista de H a r v a r d , "terá
provavelmente efeitos m u i t o mais revolucionários nos chamados paí-
ses subdesenvolvidos que nos Estados Unidos, ou em outras nações
de há m u i t o industrializadas. Escassez de capital e falta de u m a
força de t r a b a l h o , b e m e q u i p a d a e educada, têm sido os maiores
obstáculos a u m a r á p i d a industrialização das regiões atrasadas. Agora,
a p r o d u ç ã o automática, com suas exigências relativamente baixas
de capital e t r a b a l h o p o r u n i d a d e t e r m i n a d a , modificou radical-
m e n t e as perspectivas. Ao invés de t e n t a r elevar tôda a economia
com os métodos lentos e penosos do passado, um país industrial-
m e n t e incipiente poderia dar um salto d r a m á t i c o construindo um
r e d u z i d o n ú m e r o de projetos a u t o m á t i c o s . . . eles p r o p a g a r i a m u m a
nova o r d e m econômica. As refinarias de petróleo no Oriente P r ó -
ximo, a» siderúgicas construídas no Brasil depois da guerra, as
gigantescas fábricas fertilizadoras transformadas em realidade na
Índia — acrescenta finalmente Leontief — são exemplos de um
novo impulso nas regiões ainda não m u i t o desenvolvidas do m u n d o " .
32 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
C o m o se vê, a automatização n ã o é um t e m a de interesse apenas
p a r a u n s poucos países privilegiados, mas p a r a todos os países,
q u a l q u e r q u e seja o g r a u de sua evolução tecnológica. T a m p o u c o ,
p o r t a n t o , é de interesse restrito o t e m a das conseqüências pedagógi-
cas da automatização. É evidente q u e a reforma da educação su-
p e r i o r deverá ser iniciada em todos os países, inclusive aquêles em
q u e esta educação superior, p o r falta de desenvolvimento social,
i n d u s t r i a l e cultural, se encontra em estado e m b r i o n á r i o . Dissemos
q u e esta reforma consistirá, p o r um l a d o , no a p r i m o r a m e n t o das
universidades já existentes; p o r o u t r o , na criação de novos ins-
t i t u t o s , institutos modelos, q u e possam agir i n d e p e n d e n t e m e n t e das
universidades. Os institutos deverão ser de três classes:
1) Politécnicas de novo tipo — destinadas à formação de
sábios, técnicos e engenheiros aptos a satisfazer q u a n t i t a t i v a e
q u a l i t a t i v a m e n t e as exigências da nova etapa.
2) Escolas de readaptação profissional de novo tipo — orga-
nismos pedagógicos m u i t o ativos, q u e possam solucionar g r a n d e
p a r t e dos problemas de " i n s t a b i l i d a d e profissional", q u e o advento
das fábricas automáticas inevitavelmente provocará.
3) Escolas superiores de desenho industrial de novo tipo —
institutos o n d e seja possível estudar, t a n t o em seus aspectos tecno-
lógicos como culturais, os efeitos da automatização sôbre a forma
dos p r o d u t o s industriais.
N ã o vamos analisar, em seguida, as características gerais de
u m a politécnica d e novo t i p o , o u t a m p o u c o d e u m instituto d e
r e a d a p t a ç ã o profissional, limitando-nos apenas a focalizar u m a Es-
cola Superior de Desenho Industrial de Novo Tipo. E isto n ã o de
m a n e i r a abstrata, mas segundo u m exemplo concreto j á existente:
a " H o c h s h u l e fur Gestaltung", o mais jovem e polêmico dos ins-
titutos d e ensino superior d a A l e m a n h a Ocidental, i n a u g u r a d o h á
apenas um ano, nas proximidades da cidade de Ulm. Esta nova
escola — q u e , adiante, c h a m a r e m o s de "Escola S u p e r i o r de D e s e n h o "
— n ã o p r e t e n d e resolver a t o t a l i d a d e dos problemas q u e o atual
desenvolvimento tecnológico t r o u v e p a r a a educação, mas apenas
u m a p a r t e deles.
0 setor no qual a "Escola S u p e r i o r de D e s e n h o " está parti-
c u l a r m e n t e interessada é a educação de personalidades que possam
a t u a r com eficácia técnica e clara consciência de suas obrigações
p a r a com a sociedade no domínio c u l t u r a l m e n t e criador da pro-
dução industrial, tanto nos aspectos q u e t a n g e m à comunicação como
ao e q u i p a m e n t o . Em um instituto desta n a t u r e z a se manifestam
m u i t o c l a r a m e n t e os temas q u e até agora v í n h a m o s t r a t a n d o . A
"Escola S u p e r i o r de D e s e n h o " em U l m , está vinculada à t r a d i ç ã o
pedagógica do B a u h a u s , escola i n a u g u r a d a p o r W a l t e r Gropius em
1919, em W e i m a r , e fechada em 1932 pelos nazistas. O B a u h a u s foi
um dos experimentos pedagógicos de m a i o r significação e n t r e as
duas guerras e sua influência se estendeu pelo m u n d o inteiro. N ã o
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

obstante, seria falso supor que a "Escola Superior de Desenho", em


Ulm, queira ser uma repetição do antigo Bauhaus. O tempo que
separa os dois institutos não passou em vão. No aspecto didático,
o Bauhaus foi o resultado das correntes fundamentais da pedagogia
alemã do século XIX e princípios do XX. Do estudo dos textos
sôbre educação publicados pelo Bauhaus ou por personalidades a
êle vinculadas, se percebe claramente a influência, por um lado, do
"Kunsterziehungsbewegung", e por outro, do "Arbeitsschulebewe-
gung". O primeiro movimento exaltava o papel da arte na educação,
a arte como meio de liberação da subjetividade inata do homem, em
outras palavras, a educação pela expressão de si mesmo; o segundo
exaltava o papel altamente formador do trabalho prático e manual.
Esses dois elementos, expressionismo e estreito pragmatismo, são hoje
alheios ao pensamento pedagógico da "Escola Superior de Desenho",
de Ulm. A expressão de si mesmo foi substituída, por vigilante inte-
ligência crítica; o pragmatismo, por uma doutrina pedagógica onde
o fazer e o saber não são elementos opostos, senão coincidentes.
Por outra parte a preocupação científica, que esteve ausente quase
que por completo no antigo Bauhaus, é uma das principais pre-
ocupações na nova escola. Os problemas, por exemplo, do desenho
de produtos para a indústria já não podem ser encarados com
a mentalidade do designer de dez anos atrás. O desenhista não pode
prosseguir como até agora, um especialista em cosméticos para pro-
dutos industriais. A era da automatização reserva ao desenhista
tarefas socialmente muito mais importantes que a de "embelezar"
as formas produzidas em séries. Garner, um dos grandes investi-
gadores da automatização na Grã-Bretanha, dizia há pouco tempo:
"Nem sempre o engenheiro de produção é quem dirige o processo
de automatização. Em muitas indústrias é o desenhista do produto
que arca com esta responsabilidade."
A obtenção que uma coerência total entre a forma do produto
e os métodos eleitos para a sua produção, foi sempre um dos
principais problemas da indústria manufaturadora, mas é evidente
que, com o advento da produção automática, êste problema adqui-
rirá um caráter decisivo. No futuro, será muito mais difícil de-
finir onde termina a tarefa do engenheiro de produção e a do
desenhista do produto. Não obstante, a diferença entre uma poli-
técnica e uma escola superior de desenho deverá sempre existir.
No fundo, respondem a finalidades pedagógicas diferentes. O sábio,
o engenheiro e o técnico deverão sempre ser completados pelo de-
senhista. Isto é, por uma personalidade criadora cujos interesses
sejam os mesmos que os do sábio, do engenheiro e do técnico, mas
cuja atenção pará com o destino cultural das formas industriais seja
muito maior.
A SIGNIFICAÇÃO DA CIÊNCIA NO M U N D O
CONTEMPORÂNEO — O PROBLEMA BRASILEIRO*

J. LEITE LOPES
Do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas

A ciência tem sido chamada a desempenhar um papel decisivo


na vida de vários povos quando estes, em vários momentos da his-
tória, estiveram soh a ameaça de desafios e catástrofes.
O êxito da intervenção da ciência em cada caso dependeu de
dois princípios fundamentais, óbvios:
1) a ciência floresceu no país ao ponto de existirem homens ca-
pazes de contribuir para a solução dos problemas graves da
emergência;
2) as autoridades responsáveis tiveram a sabedoria de convocar
os cientistas e dar-lhes meios para a realização da tarefa.

II

Nos países atualmente avançados, onde nasceu o conhecimento


científico, o sentimento da importância da ciência cresceu gradual-
mente com o progresso material e intelectual. A contribuição da
mecânica, da física, da química para a revolução industrial, o de-
senvolvimento das ciências biológicas e da medicina experimental
para o combate às doenças, foram parte desse progresso. A invenção
e as aplicações empíricas das técnicas amalgamaram-se com as in-
vestigações científicas e ao lado das especulações filosóficas e da
cultura literária e artística, deram corpo e caracterizaram as civili-
zações modernas ao mesmo tempo que alicerçaram sua estrutura
econômica e seu desenvolvimento material.
O conhecimento da fauna e da flora, a exploração das riquezas
minerais — o saber transformá-las e utilizá-las — aparecem como

* Trabalho solicitado pelo Sr. Ministro da Educação e Cultura, em


dezembro de 1962.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 35

processos básicos do desenvolvimento histórico das civilizações mais


avançadas, que se ergueram, assim, lentamente, à custa da investi-
gação científica e da engenhosidade tecnológica. A civilização que
conhecemos no século XX —• à diferença das grandes civilizações
antigas — construiu sua vitalidade intelectual e seu poder material
graças à eclosão da ciência, da atitude científica que historicamente
desabrochou no século X V I I ' e se desenvolveu lentamente a princípio
afirmando-se na Revolução Industrial e influenciando, hoje, o destino
e o intercâmbio econômico e político dos povos.
Em verdade, foi só recentemente que os homens de governo, os
capitães de indústria, os economistas dos países mais avançados pas-
saram conscientemente a dar-se conta do papel da ciência no pro-
gresso, na expansão e pujança material dêsses países. A Primeira
e sobretudo a Segunda Guerra Mundial demonstraram às Forças
Armadas de tais países — dos Estados Unidos como da União So-
viética, dos países da Europa Ocidental e do Japão —• que a ciência.
o processo da descoberta e das invenções científicas, até as mais
abstratas, são vitais para a defesa e a própria sobrevivência nacional.
Mas estas sociedades possuíam o conhecimento científico permeado
em seu processo histórico. Possuíam uma tradição cultural que
constantemente o alimentava, que florescia nas universidades 2 e
que se refletia nos escalões inferiores do sistema educacional, cujas
portas se alargaram sob a pressão das necessidades e da agressivi-
dade do progresso. O crescimento populacional, a ambição e a
luta pelo aperfeiçoamento das condições de vida encarregaram-se
de utilizar o conhecimento científico, retirando-o dos laboratórios e

1 "Quase tudo o que distingue o mundo moderno dos séculos anteriores


pode ser atribuído à ciência, que realizou seus mais espetaculares triunfos no
século XVII. O Renascimento Italiano, embora não medieval, não é moderno;
é mais aparentado à melhor época da Grécia. O século XVI, absorto na teologia,
é mais medieval que o mundo de Maquiavel. O mundo moderno, no que se
refere às perspectivas mentais, começa no século XVII. Nenhum italiano do
Renascimento teria sido incompreensível a Platão ou Aristóteles; Lutero teria
horrorizado a Tomás de Aquino, mas não teria sido difícil a êste compreendê-lo.
Com o século XVII é diferente; Platão e Aristóteles, Tomás de Aquino e Occam
não poderiam ter compreendido Newton" (RUSSELL, Bertrand — A History of
western Philosophy, pág. 525, Simon and Schuster, New Y o r k ) .
2 "Não se sabe qual teria sido a evolução da ciência moderna, se o Estado
moderno não tivesse criado no Ocidente, impulsionado por motivos impregnados
de interesses práticos, como forma de vida da ciência, para o provimento das
cátedras nas universidades por êle fomentadas, um processo fundado no prêmio
público do esforço e do progresso sistemático, em lugar de um processo fundado
nos azares do personalismo". "Newton e Galileu foram professôres de univer-
sidade, o último até quando o Grão Duque de Toscana o chamou para o seu
lado. James Watt, que foi quem determinou a primeira aliança da mecânica
com a vida prática, motivando uma transformação nesta, foi também professor
universitário" (WEBER, A, Historia de Ia Cultura, pág. 376, Fondo de Cultura
Econômica, México).
36 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

das academias, p a r a o processo h u m a n o — d e m o n s t r a n d o a sua


significação social.
D u r a n t e e logo após a P r i m e i r a G u e r r a M u n d i a l , criaram-se os
primeiros órgãos governamentais p a r a p r o m o v e r e estimular a pes-
quisa científica •— nos Estados Unidos e no Canadá, em 1916, o Con-
selho Nacional de Pesquisas (National Research Council) ; na In-
glaterra, a i n d a em 1916, o D e p a r t a m e n t o de Pesquisas Científicae
e I n d u s t r i a i s ; na Itália, em 1923, o "Consiglio Nazionale delle Ri-
cerche". Na U n i ã o Soviética, nos primeiros anos após a revolução,
transformou-se a Academia de Ciências em órgão governamental de
planificação e realização de pesquisas, a b r a n g e n d o e criando u m a
vasta r e d e de institutos científicos.
A ciência passou, assim, a ser institucionalizada, tomou forma
como objeto sociológico, a ser considerado pelos governos, pelos
industriais, pelos economistas e planejadores, como força p a r á a
p r o d u ç ã o , o desenvolvimento m a t e r i a l e como base da defesa militar.
Na I n g l a t e r r a , criou-se, em 1959, o cargo de Ministro da Ciência,
s u b o r d i n a d o d i r e t a m e n t e ao P r i m e i r o Ministro.

III

E n q u a n t o o processo histórico do desenvolvimento da ciência


e da tecnologia t i n h a lugar em tais países, deixava êle de ocorrer
nos que h o j e chamamos povos sub desenvolvidos. Muitos destes,
como o Egito, a í n d i a , a Pérsia, t i n h a m , entretanto, construído
civilizações no passado. N ã o t e n d o ocorrido, nesses povos, p o r
vários fatôres, os processos da p r o c u r a do saber científico, o desen-
volvimento das técnicas e o seu reflexo na educação e na industria-
lização, faltou-lhes a alavanca fundamental p a r a realizarem o pro-
gresso nos t ê r m o s q u e caracterizam as civilizações m o d e r n a s .
U m a vez estabelecida a desigualdade, exerceram-se as forças
econômicas e políticas no sentido de acentuá-la.
De posse dos métodos da investigação científica — que sugerem
a inexistência de limitações ao progresso — aplicaram-se as forças
econômicas a impelir o desenvolvimento m a t e r i a l dos povos assim
equipados, recorrendo a todos os elementos necessários a esse de-
senvolvimento, inclusive a dominação econômica e política dos povos
atrasados.
Surgiu, assim, a ciência — e o seu p r o d u t o p a r a o desenvolvi-
m e n t o industrial, a tecnologia — como ura poderoso fator básico da
p r o s p e r i d a d e dos povos q u e hoje chamamos desenvolvidos e, em
conseqüência, a sua ausência, como um igualmente poderoso fator de
atraso —• e até de opressão — sôbre os povos despreparados.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 37

A falta da ciência, da educação científica e técnica, a ausência


dos métodos de p r o c u r a do saber científico, constituíram-se, assim,
sociologicamente, em i m e p e d i m e n t o , por p a r t e dos novos subdesen-
volvidos, para atingirem o progresso econômico e cultural no grau
e nos moldes em q u e os outros povos o atingiram. E como h o m e n s
de ciência, as universidades, os institutos científicos e os meios de
produção estão ligados à estrutura social, política e econômica dos
países a que pertencem, os frutos de suas atividades revertem, na-
t u r a l m e n t e , p a r a o maior desenvolvimento dêsses países.
Incapazes de aplicar os resultados universais da pesquisa cien-
tífica — despreparados p o r não a exercerem — ficam os povos sub-
desenvolvidos p r a t i c a m e n t e à mercê dos primeiros, e n q u a n t o neles
não se p r o d u z i r e m forças que lhes i m p o n h a m a estrutura a d e q u a d a
ao r á p i d o desenvolvimento.

IV

O crescimento da ciência no Brasil é exemplo do esforço


e m p r e g a d o p o r um p e q u e n o n ú m e r o de pesquisadores — dotados
da q u a l i d a d e universal de p r o c u r a r o saber novo — mas incompre-
endido dos líderes nacionais.
Da necessidade de médicos surgiram, no século passado, as pri-
meiras escolas de medicina. As calamidades públicas i m p u s e r a m a
criação pelo Govêrno dos primeiros institutos de pesquisa no Bra-
sil, separados das escolas superiores. A peste reinante em Santos
deu lugar, em 1899, ao Instituto B u t a n t ã de São P a u l o . A peste
no Rio de J a n e i r o ( " 0 Rio de J a n e i r o como é. H u m a vez e n u n c a
mais") p r o d u z i u , em 1900, o I n s t i t u t o Soroterápico Municipal, trans-
formado depois no atual Instituto Osvaldo Cruz. Da praga que
ameaçava a economia de São P a u l o —• a broca do café — resultou
o Instituto Biológico de São Paulo. 3
Mesmo neste setor, capaz de ferir a sensibilidade dos h o m e n s
de governo e dos políticos nacionais, o desenvolvimento científico
processou-se lentamente. Debeladas as calamidades públicas, conti-
n u a r a m a surgir h o m e n s de grande calibre científico no Brasil, mas
a ciência não se apresentava aos h o m e n s do p o d e r como um fator
positivo de transformações e de progresso em épocas normais, como
u m a necessidade social básica para o bem-estar do povo e o desen-
volvimento m a t e r i a l do país. Como a educação — mais ainda q u e
ela — a atividade científica era iniciativa de poucos e p a r a poucos.
Assim se expressou, em 1905, o biologista João Batista de Lacerda,

3 Cf. MARTINS, Tliales — "A biologia no Brasil", in As ciências no Brasil,


editada por Fernando de Azevedo, vol. II, Ed. Melhoramentos.
38 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Diretor do Museu Nacional: "Em geral, no Brasil, os homens que


se dedicam ao estudo e à ciência constituem uma espécie de nobre
proletariado (o grifo é nosso), vivendo de minguados vencimentos,
que mal chegam para um passadio modesto. Um ou outro, por
exceção, desprezando as frívolas grandezas do mundo e sentindo os
inefáveis prazeres que nele despertam as pesquisas da ciência, con-
forma-se com esta situação e aceita-a sem constrangimento". 4
Com um sistema educacional aberto apenas a uma ínfima fração
da população — ainda hoje — e com escolas superiores e universi-
dades, tardiamente fundadas, mal estruturadas e sem a dinâmica da
procura do conhecimento, destinadas a conferir diplomas aos filhos
das famílias privilegiadas — sem o estalo agressivo da inventividade
e da manipulação e descoberta das técnicas — permanecia ausente
do Brasil a atitude científica sociologicamente significativa. A fauna
e a flora do país eram pesquisadas por alguns cientistas estrangeiros,
atraídos pelo trópico desconhecido e deles resultaram os poucos dis-
cípulos e os cientistas nacionais que continuaram o trabalho, em
número socialmente desprezível.
A matemática, a física, a química, sem terem calamidades pú-
blicas a debelar, ficaram reduzidas a cursos nas escolas profissio-
nais superiores — na Academia Real Militar, de 1810, que se trans-
formou na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, em 1874, na Escola
de Minas de Ouro Preto, de 1875, e na Escola Politécnica de São
Paulo, fundada em 1896. E os poucos pesquisadores nesse domínio, 5
que surgiram até algumas décadas atrás, não tiveram meios nem am-
biente para estimular uma tecnologia local capaz de estudar proble-
mas que pudessem interessar ao desenvolvimento nacional.
Foi somente depois de 1930 que surgiram as Faculdades de Fi-
losofia, Ciências e Letras — significativamente as de São Paulo e do
Rio de Janeiro — as Escolas de Química e se multiplicaram, nos
últimos anos, as Escolas de Engenharia, criadas, entretanto, de cima
para baixo, sem — até hoje — o lastro da educação técnica popular.
Em todas as sociedades dotadas de um certo nível cultural sur-
gem cientistas e homens de saber. Mas a significação sociológica da
ciência e da tecnologia depende de um número crítico de cientistas
e técnicos que se deve reproduzir, crescer e afetar, por seus traba-
lhos. o desenvolvimento do país.
O baixo nível tecnológico do Brasil está documentado no recen-
seamento de 1950, segundo o qual apenas 1,15% dos trabalhadores
na indústria tinham educação técnica. 6 Segundo o mesmo recensea-

4 Ver Thales Martins, loc. cit.


5 Cf. Artigos de F. M. Oliveira Castro, Abraão de Morais, J. Costa Ribeiro,
em "As Ciências no Brasil", loc. cit.
6 OLIVEIRA, A. Barbosa de, e SÁ CARVALHO, J. Z. — A formação de pessoal de
nível superior e o desenvolvimento econômico, pág. 19 — CAPES, Rio de Janeiro
(1960).
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 39

m e n t o era 25.532 o n ú m e r o de engenheiros no país, correspondente


a um índice de cerca de 1 engenheiro p o r 2.000 habitantes, n ú m e r o
aquêle que inclui diplomados que não exercem a profissão ou que
têm funções administrativas. P a r a t ê r m o de comparação, em 1957,
nos Estados Unidos, o n ú m e r o de engenheiros e cientistas t r a b a l h a n d o
na indústria era 738.000 (cerca de dois terços do n ú m e r o t o t a l de
engenheiros e cientistas) sendo 528.000 engenheiros, 152.000 cien-
tistas e 58.000 administradores de atividades de ciência e engenharia.
Dêsses engenheiros e cientistas, cerca de um terço, isto é, 176.000
engenheiros e 50.600 cientistas se dedicavam, na indústria, em 1957,
a trabalhos de pesquisa e desenvolvimento. 7

Nos Estados Unidos, as universidades, assim como as fundações


q u e estimulam a pesquisa científica, foram, em geral, iniciativas
privadas de corporações, indústrias e h o m e n s de fortuna, impelidos
pela lei do imposto de renda que isenta de taxação as doações p a r a
a educação, a ciência e as artes.
O Conselho Nacional de Pesquisas dos Estados Unidos, fundado
em 1916 e associado à Academia Nacional de Ciências, de Washing-
ton, n ã o teve, provavelmente, o p a p e l de estímulo às pesquisas q u e
tiveram as fundações naquele país ou os órgãos de mesmo n o m e de
outros países.
F o i d u r a n t e e após a Segunda G u e r r a M u n d i a l q u e as atividades
científicas e as espetaculares aplicações militares e econômicas da
ciência t o m a r a m t a m a n h a i m p o r t â n c i a que vários órgãos foram cria-
dos ou reestruturados, com a finalidade de o r i e n t a r e coordenar a
ação do Govêrno F e d e r a l no c a m p o científico.
D u r a n t e a Segunda Guerra, a Divisão de Desenvolvimento e Pes-
quisa Científica (Office of Scientific Research and Development)
canalizava " e n o r m e s somas de d i n h e i r o p a r a as universidades, p a r a
os salários, e q u i p a m e n t o s e instalações de seus cientistas, a fim de
que pudessem, de m o d o mais r á p i d o e eficiente, realizar pesquisas
de valor potencial aos esforços m i l i t a r e s " dos Estados Unidos. 8
"Alteraram-se, assim, p r o f u n d a m e n t e , as relações do Govêrno F e d e r a l
com as universidades oficiais e p a r t i c u l a r e s " daquele país. 8 Fun-
ções análogas passaram a ter outros órgãos oficiais — os Institutos
Nacionais de Saúde (National Institutes of H e a l t h ) , a Divisão de
Pesquisas da M a r i n h a (Office of Naval R e s e a r c h ) , a Divisão de Pes-

7 National Science Foundation, 9th Annual Report, pág. 87, Washington,


D.C., 1959.
8 Ref. 7, p. VII.
40 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

quisas Científicas da Força Aérea (Air Force Office of Scientifie


R e s e a r c h ) , a Divisão de Pesquisas do Exército, e n t r e outras.
Em 1950, após cinco anos de debates e inquéritos, criou-se a
F u n d a ç ã o Nacional da Ciência (National Science F o u n d a t i o n ) como
órgão a u t ô n o m o , mas pertencente aos d e p a r t a m e n t o s executivos do
Govêrno F e d e r a l e s u b o r d i n a d o ao Presidente dos Estados Unidos.
Essa F u n d a ç ã o compõe-se de u m a J u n t a Nacional de Ciência (Natio-
nal Science B o a r d ) e de um Diretor n o m e a d o pelo P r e s i d e n t e da
R e p ú b l i c a , p o r proposta do Senado. Os vinte e q u a t r o m e m b r o s
da J u n t a são t a m b é m nomeados pelo P r e s i d e n t e , com a aprovação
do S e n a d o e do Diretor, d e n t r e personalidades eminentes em suas
especialidades. São escolhidos u n i c a m e n t e pelos t r a b a l h o s e ser-
viços realizados no seu c a m p o científico. A J u n t a reúne-se u m a
vez p o r ano e elege seis de seus m e m b r o s p a r a f o r m a r e m , com o
Diretor, o Comitê Executivo. São as seguintes as principais fina-
lidades da F u n d a ç ã o Nacional da Ciência: 1) desenvolver, estimu-
lar e c o o r d e n a r as pesquisas básicas e o ensino científico; 2) ini-
ciar e a p o i a r a pesquisa básica nas ciências matemáticas, físicas,
biológicas, médicas e na tecnologia; 3) a p e d i d o do Secretário de
Estado, iniciar trabalhos especiais de pesquisa relacionados com
a defesa n a c i o n a l ; 4) formar pesquisadores científicos; 5) avaliar
os p r o g r a m a s de investigação científica iniciados pelos Departa-
mentos (Ministérios) governamentais e coordenar os p r o g r a m a s da
F u n d a ç ã o com os formulados p o r grupos de pesquisadores do Go-
vêrno e de instituições p a r t i c u l a r e s ; 6) fomentar o i n t e r c â m b i o de
informações científicas e n t r e os h o m e n s de ciência dos Estados Uni-
dos e os de outros países: 7) m a n t e r um registro do pessoal cien-
tífico e técnico de tôda a Nação.

O P r e s i d e n t e dos Estados Unidos possui um Assistente Especial


p a r a a Ciência e a Tecnologia (Special Assistant to t h e P r e s i d e n t
for Science and T e c h n o l o g y ) .
P a r a coordenar as atividades científicas que afetam mais de
um ministério ou órgão federal, foi criado em 1959, o Conselho
F e d e r a l de Ciência e Tecnologia, presidido pelo Assistente Especial
do P r e s i d e n t e da República p a r a assuntos de ciência e tecnologia
e constituído de um representante de cada um dos seguintes De-
p a r t a m e n t o s (Ministérios) : da Agricultura, do Comércio, da Defesa,
da Saúde, Educação e Bem-Estar, do Interior, e da F u n d a ç ã o Na-
cional da Ciência, da Comissão de Energia Atômica e da Adminis-
tração N a c i o n a l da Aeronáutica e do Espaço. Êste Conselho Fe-
deral r e c o m e n d a ao Presidente as medidas necessárias ao plane-
j a m e n t o e à administração mais eficiente dos programas científicos
e tecnológicos do Govêrno F e d e r a l .
T a l é a superestrutura que c o m a n d a a alavanca científica do
complexo econômico, político e m i l i t a r dos Estados Unidos —
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

alavanca que já começa a transformá-lo no que foi recentemente


caracterizado como uma pós-civilização.9

VI

O poderio científico e tecnológico da União Soviética revelou-se


ao grande público, de forma espetacular, com as realizações, a
partir de 1957, no domínio espacial. Estas realizações, entretanto,
constituem um caso particular de um extraordinário desenvolvi-
mento no setor da pesquisa científica durante os últimos quarenta
anos. Em virtude da estrutura política que ali se construiu, esse
desenvolvimento foi conseqüência exclusiva das diretrizes e da ação
do Govêrno.
Assim escreve K. Galkin: 10 "Desde os primeiros dias de sua
existência, a jovem República dos Soviets se propôs aproveitar em
todos os sentidos os adiantamentos da ciência, da técnica e da
cultura para o bem do poyo".
E o próprio. fundador dessa República escrevia: "Sem a ori-
entação dos diversos ramos da ciência, da técnica e da experiência
dos especialistas, é impossível a transição ao socialismo". E ainda:
"Temos de aprender tôda a ciência e a técnica, todos os conheci-
mentos e a arte". 11
Já nos primeiros anos após a revolução de 1917, apesar das
dificuldades por que passava o país, duplicou-se o número de esta-
belecimentos e de estudantes universitários. E para atender à ne-
cessidade vital de formar, com rapidez, especialistas em grande
número, criaram-se faculdades operárias, destinadas a preparar tra-
balhadores para o ingresso nos centros de ensino superior.
Assim se pronunciou a primeira delegação de professôres de
países do Ocidente que visitou a União Soviética em 1925: "A mais
importante novidade na vida da escola superior é que vemos o ope-
rário como estudante nos centros de ensino superior. 0 proletariado
conquistou a escola superior e toma parte ativa no desenvolvimento
do trabalho de investigação científica". 12

9 "Iniciada por volta de 1650, a ciência começou a organizar-se em uma


comunidade de conhecimentos e deu lugar, novamente, a uma enorme aceleração
da velocidade de transformação. O mundo de 1650 é mais remoto de nós que
o mundo do Egito antigo. Existem, já, nos Estados Unidos e na Europa Ocidental
e, em menor grau, na URSS e em algumas outras partes do mundo, os inícios
da sociedade pós-civilizada — um estágio da humanidade tão diferente da civi-
lização quanto a civilização o é do estágio selvagem" (K. E. Boulding, After
civilization, what? in Bulletin of Atomic Scientists, vol. XVII, n.° 8, pág. 2, 1962).
10 GALKm, K. — La formación de científicos en ia URSS, Moscou, 1958,
Pág. 39.
11 Ref. 10. pág. 37.
12 Ref. 10, pág. 43.
42 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

E em 1954, verificava-se que, para cada milhão de habitan-


tes, diplomavam-se 286 engenheiros na URSS, 136 nos Estados Uni-
dos, 86 na Alemanha Ocidental, 82 na Suíça, 70 na França e 57 na
Inglaterra. Em 1959, avaliava-se em 30.000 o número de engenhei-
ros diplomados nos Estados Unidos e em 94.000 o número correspon-
dente na União Soviética.13 No relatório de 1960 da Fundação
Nacional de Ciência dos Estados Unidos afirma-se que esse número
na URSS é três vezes o dos Estados Unidos. 14
As pesquisas científicas são realizadas nas universidades e em
institutos dependentes da Academia de Ciências da URSS — funda-
da em 1725 por Pedro, o Grande, e reestruturada, após 1918, como o
órgão impulsionador e planificador da ciência. Criaram-se ainda
as academias de ciências das repúblicas federadas, bem como acade-
mias especializadas em certos setores científicos. Em 1957, a Aca-
demia de Ciências da URSS possuía uma rede de 2 756 institutos
científicos com um corpo de cerca de 240.000 cientistas. 15
O nível científico atingido em tão pouco tempo pela União
Soviética começou a ser objeto de estudo, sobretudo a partir de 1958,
pelos outros países avançados e contribuiu para induzir nos Estados
Unidos a uma ação mais direta e positiva por parte do Govêrno
Federal nesse domínio.
Assim começa o relatário da Fundação Nacional de Ciência dos
Estados Unidos, no ano de 1959: "Um sentimento de crise apoderou-
se dos Estados Unidos em conseqüência do lançamento do primeiro
satélite artificial pela URSS em outubro de 1957. No ano seguinte,
muitas pessoas, em todos os níveis do Govêrno e da vida particular,
procuraram modos de aceitar o desafio que — sentiam elas •— havia
sido lançado com tanta força ao país". 16
E no relatório do ano de 1960 da mesma Fundação escrevia-se:
"Como podem os Estados Unidos segurar a sua ciência contra o
empobrecimento, evitar que a sua tecnologia se torne de segunda
classe durante a segunda metade de um século caracterizado por
uma revolução científica e tecnológica ? Êste Décimo Relatório Anual
da Fundação Nacional da Ciência proporciona uma oportunidade
para reverem-se os programas da Fundação no sentido da promoção
da pesquisa básica e da educação nas ciências, no contexto mais
largo da resposta do Govêrno Federal a esse desafio. Os três fa-
tôres que devem ser considerados são os seguintes: 1) progresso

13 Ref. 10, pág. 95.


14 National Science Foundation, lOth Annual Report, pág. 111, Washington
P . C , 1960.
15 Les progrès de pouvoir sovietique depuis 40 ans, pág. 267, Moscou 1958.
16 Ref. 7, pág. 3.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 43

da pesquisa científica; 2) desenvolvimento do cientista; 3) saúde


e crescimento das instituições (o a m b i e n t e ) , em que a ciência é
ensinada e a pesquisa é realizada". 1 7

VII

Após a Segunda G u e r r a M u n d i a l , com a instalação no Brasil


das indústrias de base, surgiu um p r i m e i r o impulso, que se t o r n o u
t e m a de interesse público, p a r a a m a i o r industrialização e o desen-
volvimento econômico do país.
No ano de 1951, a Lei n.° 1.310 criou o Conselho Nacional de
Pesquisas do Brasil, como órgão do Govêrno F e d e r a l , s u b o r d i n a d o
d i r e t a m e n t e ao Presidente da República e destinado a estimular a
investigação científica e tecnológica e a controlar todas as ativida-
des referentes ao aproveitamento da energia atômica. Essa lei foi
conseqüência, em última análise, dos ecos, neste país, da b o m b a
atômica — u m a nova calamidade q u e p r o d u z i u , como já o-fizera
a l. a G u e r r a com outros países em 1916, a criação pelo Govêrno
de tão i m p o r t a n t e organismo p a r a as pesquisas científicas. No
mesmo ano, criou-se, s u b o r d i n a d a t a m b é m ao Presidente da Repú-
blica, a C a m p a n h a Nacional p a r a o Aperfeiçoamento do Pessoal de
Nível S u p e r i o r , a C A P E S , destinada a conceder bôlsas-de-estudo no
país e no exterior.
A ação dêsses dois órgãos foi positiva. O Conselho Nacional
de Pesquisas contribuiu p a r a r e a n i m a r e estimular vários institutos
de pesquisa nos setores da m a t e m á t i c a , da física, da química e das
ciências biológicas e geológicas, iniciando, no país, os estudos e
pesquisas relativas à energia atômica. Em 1956, criou-se a Comis-
são Nacional de Energia Nuclear.
P a r a l e l a m e n t e , fundaram-se novas escolas superiores e univer-
sidades. As medidas do Govêrno e da iniciativa privada p a r a o de-
senvolvimento econômico não e n c o n t r a r a m , e n t r e t a n t o , reflexo nas
universidades. Deixando p r a t i c a m e n t e de lado o p r o b l e m a básico
de receber o m a i o r n ú m e r o possível de estudantes, de armar-se com
cientistas, equipamentos e a d e q u a d a s condições de t r a b a l h o p a r a
promover a pesquisa, de um lado, e f o r m a r técnicos em n ú m e r o
cada vez maior, de outro lado, se têm voltado as administrações das
universidades p a r a a construção de prédios suntuosos, das c h a m a d a s
cidades universitárias.
É impressionante a estatística sôbre a formação dos tecnólo-
gos no B r a s i l : em 1960, diplomaram-se, e n t r e outros, nove enge-
nheiros de minas, cinco engenheiros "civis e de m i n a s " , vinte e um

17 Ref. 14, p. 3.
44 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

engenheiros "civis, de minas e metalurgia", trinta e três geólogos,


vinte e cinco engenheiros eletrônicos, onze engenheiros navais. 18
Com um sistema educacional fechado na base, nos níveis pri-
mário e secundário, formou-se um engarrafamento na produção de
técnicos de nível médio e de engenheiros, médicos e cientistas, no
nível superior, que impede o desenvolvimento autônomo do país.
Chegou-se, finalmente, a um estágio de transplantação de filiais de
indústrias estrangeiras no país, que dá uma aparência de progresso.
Mas essas indústrias limitam-se a realizar os projetos e plantas en-
viadas pelas matrizes e, assim, não estimulam a inventividade na-
cional. Nenhuma indústria no Brasil possui — ao que saibamos —
laboratórios de pesquisa científica e tecnológica, não contribuem
elas para as universidades e institutos científicos, e poucas são as
que possuem laboratórios de controle de rotina dos produtos.
0 verdadeiro desenvolvimento, entretanto, repousa também no
aperfeiçoamento e na invenção de produtos manufaturados, no flo-
rescimento paralelo ao crescimento industria] de uma tecnologia
nacional que se baseia, em última análise, em laboratórios de pes-
quisa e em cientistas que buscam conhecimentos novos.
Ao Govêrno tem faltado a iniciativa de enfrentar com resolu-
ção o problema educacional e de dinamizar a sua ação no setor da
ciência e da tecnologia.
Assim se expressou o Ministro da Educação em 1962: "A ver-
dade que envergonha a todos os educadores brasileiros e deve en-
vergonhar a todos os brasileiros, é que temos fracassado até agora,
da forma mais completa, no cumprimento de um dever mínimo que
todas as outras nações cumpriram, antes de alcançar o estádio de
desenvolvimento em que nos encontramos. É o fracasso no cum-
primento dos deveres elementares do Estado em matéria de edu-
cação". 19
No setor científico, numa época em que os grandes países di-
namizam os seus esforços e multiplicam os seus investimentos, o
Govêrno Brasileiro permitiu um alarmante declínio por parte da
ação do Conselho Nacional de Pesquisas. Sòmente nos primeiros
anos após a sua criação, despachava o presidente dêste órgãos com
o Presidente da República e com êle traçava as primeiros diretrizes
de uma política científica nacional. Como conseqüência do desin-
teresse do próprio Govêrno Federal por esse órgão, declinaram as
suas dotações orçamentárias, passando sua parcela de recursos de

18 LEITE LOPES, J. — The need of scientific training for engineers: pro-


blems and prospects in Brazil (Trabalho apresentado à Conferência sôbre as
Aplicações da Ciência e da Tecnologia às áreas menos desenvolvidas, Nações
Unidas, Genebra, fevereiro, 1963).
19 Discurso do Ministro Darcy Ribeiro, in Plano Nacional de Educação,
Rio de Janeiro, 1962.
0,3% para 0,1% do orçamento da União, de 1956 a 1961. No ano
de 1956, mantinha o Conselho Nacional de Pesquisas 86 bolsistas
em aperfeiçoamento no exterior. Em 1961, o número desceu a 30
bolsistas.20

VIII

Encontramo-nos, assim, perante um desafio: a distância que


nos separa, em 1962, dos países avançados é muito maior que há
vinte anos.
Em 1900, diante da ameaça das epidemias, compreendeu-se a
necessidade de agir.
Em 1962, a ameaça é igualmente grave: a da permanência da
nação em um estado crônico de subdesenvolvimento, a da incapaci-
dade de aproveitar os seus recursos naturais e as suas fontes de
energia em benefício de seu povo, a de um progresso aparente, a
de um desenvolvimento menor. Estamos diante da ameaça da epi-
demia da fome, da ignorância de muitos e da cultura importada
para poucos.
A solução dos problemas fundamentais do Brasil, na hora em
que vivemos, depende de muitos fatôres, de muitas medidas, de
muito esforço. Não depende somente da ciência e da tecnologia.
Mas depende também da ciência e da tecnologia desenvolvidas em
nosso país, como depende da educação técnica e científica em es-
cala maior.
Estamos perplexos diante da revelação nova de problemas an-
tigos — do despreparo educacional, tecnológico e científico do nosso
povo para verdadeiramente integrar o mundo contemporâneo.
Estou certo de que os homens da ciência do Brasil esperam
ser convocados para enfrentar o desafio e dar uma contribuição
socialmente significativa para essa integração.

20 A atuação do Conselho Nac. de Pesquisas em dez anos de trabalho,


Boletim Informativo, vol. I, n.° 1, pág. 7, Rio, 1962.
ADMISSÃO À UNIVERSIDADE: ANÁLISE
DE UM PROJETO *

VALNIR CHAGAS
Da Universidade do Ceará

O Sr. Ministro da Educação e Cultura, através de sua Assessoria


Parlamentar, solicita o pronunciamento dêste Conselho sôbre o
Projeto de Lei n.° 735/63, da Câmara dos Deputados, que "extingue
o Vestibular nas escolas superiores". O projeto apresenta dois as-
pectos que merecem consideração especial: (a) a extinção do Con-
curso de Habilitação e (b) a obrigatoriedade, que nele se estabelece
para o Poder Executivo, de criar estabelecimentos de ensino superior
em número que permita "atender, indistintamente, todos os que
venham a concluir os estudos de nível médio".
A transição entre a escola média 0 a superior inclui-se hoje
entre os problemas que mais preocupam os educadores do mundo
inteiro, à medida que se populariza o segundo grau do ensino em
conseqüência da generalização crescente da escola primária. Não
poucas soluções têm sido concebidas para esse efeito; e a que
maior aceitação encontrava, até há pouco, consistia em utilizar uma
fase "terminal" dos estudos de nível médio como preparatória para
a Universidade. Como típicos dessa orientação citamos o baccalau-
réat francês e, entre nós, os cursos complementares da reforma
Francisco de Campos.
De último, porém, reivindica-se para o ensino de segundo grau
uma autonomia de objetivos e métodos que já não se coaduna
com essa condição ancilar de mero "vestíbulo" da Universidade.
Daí que a nova tendência seja a de transferir a recuperação, orien-
tação e seleção dos candidatos para um ciclo básico dos cursos su-
periores. A forma que se vai impondo é a da Propedêutica fran-
cesa, plenamente vitorioso no Colóquio de Royaumont, promovido
pela Unesco para um debate internacional sôbre a admissão às
universidades. Naquele encontro, que se realizou em novembro
de 1961, o professor Frank Bowles considerou-a como "uma das ino-
vações mais importantes introduzidas nesse domínio", por consti-

* O presente trabalho constitui o Parecer n.° 324/63, aprovado pelo Con-


selho Federal de Educação, de que foi relator o professor Valnir Chagas.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

tuir "um indispensável complemento de formação e um precioso


recurso de orientação". 1
No Brasil, a articulação dos dois graus praticamente se tem
resumido a "exame vestibular" (1911-1931), "concurso de habilita-
ção" (1931-1942) ou "concurso vestibular" (1942-1961) — três no-
mes diversos para um mesmo fato, em que pese a eventuais mudan-
ças de sentido que não chegaram a modificar o processo. Houve,
é certo, a solução da reforma Campos e, de último, a proliferação
extra-oficial dos chamados "cursinhos". A primeira não chegou a
ser executada, senão em certos aspectos de forma que tornaram
ainda mais "acadêmica" a escola secundária; e os cursinhos não
passaram de ilusório estágio de adestramento para suprir em me-
ses, pelo ensaio de respostas típicas, o que o estudante não apren-
deu em sete anos.
Prova-o recente levantamento da CAPES, o de 1962, feito em
continuação aos estudos que desde 1954 realiza aquela Campanha
sôbre as condições de ingresso nos cursos superiores. 0 relatório
desse ano, referindo-se aos "cursinhos", declara que "o coeficiente
de aprovação dos que tiveram preparação especial não difere sig-
nificativamente do observado para os demais". 2 E nem poderia ser
de outra maneira, porquanto a verdade é que, salvo irrelevantes
exceções, o nosso Concurso de Habilitação não teve jamais o sentido
de real articulação entre o segundo e o terceiro graus escolares, e
sim o de distribuir vagas que, a partir da reforma Rocha Vaz (1925),
passaram inclusive a ser fixadas em números clausos.3
A rigor, portanto, o problema ainda não chegou a ser pedagó-
gico, porque é antes uma simples questão de oportunidades de es-
tudo: onde estas existem, as aprovações tendem a crescer; onde elas
escasseiam, aumentam os fracassos. A mesma pesquisa da CAPES
o demonstrou objetivamente, conforme se vê dêste tópico do seu rela-
tório:
"Como nos anos anteriores, os coeficientes de aprovação
nos diversos ramos variam na razão inversa da relação can-
didatos-vagas. Assim, nos oito ramos que apresentam coefi-
cientes de aprovação entre 70% e 80%, a média da relação
candidatos-vagas é de 0,54, o que eqüivale dizer que neles
havia duas vagas à disposição de cada candidato; nos quatro
cujo coeficiente de aprovação se situou entre 60% e 70%,

1 BOWLES, Frank — Exposição apresentada ao Colóquio de Royaumont.


In: Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, n.° 90. Rio de Janeiro, Instituto
Nacional de Estudos Pedagógicos, 1963; págs. 123, 130.
2 Exames Vestibulares de 1962. In: Boletim Informativo. Rio de Janeiro,
CAPES, 1963; pág. 109.
3 Cf. ABU-MEHHY, Nair Fortes — O Vestibular e a Lei. In: Revista Bra-
sileira de Estudos Pedagógicos, n.° 90.. Rio de Janeiro, INEP, 1963; pág. 234.
48 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

aquela relação é de 0,95; nos que aprovaram, respectiva-


mente, entre 50% e 60%, 40% e 50%, 30% e 40%, e
20% e 30% dos vestibulandos, a relação entre candidatos e
vagas foi 1,9; 2,0, 2,3; e 4,7".4

A Lei de Diretrizes e Bases situou-se exatamente nessa perspec-


tiva quando, na letra o do seu art. 69, definiu o Concurso de Habi-
litação como uma etapa de classificação e transferiu o delineamento
do respectivo processo para a autonomia de escolas e educadores.
Opondo, assim, o critério dinâmico de "classificabilidade" à alterna-
tiva estática de mera aprovação-reprovação, ensejou-se um continuo
ajustamento do concurso às possibilidades de matrícula de cada esta-
belecimento, como na realidade ocorre, e aos avanços da teoria e
técnica pedagógicas nesse campo.
Outro não foi, aliás, o entendimento firmado por êste Conselho
ao interpretar o mesmo dispositivo. As conclusões e recomendações
2, 3 e 4 do seu Parecer n.° 58/62 coincidem inclusive com a doutrina
do Colóquio de Royaumont, como se vê a seguir:
2. O concurso de habilitação tem por finalidade clas-
sificar os candidatos aos cursos superiores de graduação, no
limite das vagas fixadas em cada estabelecimento, e reunir
dados uniformes para a sua posterior observação e orien-
tação após a matrícula;
3. o concurso de habilitação é, assim, o estágio inter-
mediário de um processo de seleção a longo prazo que
principia na fase terminal da escola média e se conclui, em
relação aos estudos profissionais, no período inicial dos
cursos de graduação;
4. para atender esta nova característica do concurso
de habilitação, é de tôda conveniência que, ao estruturar
os cursos superiores de graduação, se adote o critério de es-
caloná-los em ciclos sucessivos de estudos, dos quais o pri-
meiro seja básico e, ao mesmo tempo, seletivo para o ciclo
profissional imediato de um curso ou de uma ordem de
cursos afins". 5

A verdade é que só será possível eliminar do concurso a idéia


de classificação quando se oferecerem vagas para a totalidade dos
estudantes que venham a concluir os estudos de segundo grau. Mas
o projeto "extingue" para e simplesmente o Concurso de Habilitação

4 CAPES — Id, ib., pág. 105.


5 CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO — Parecer n.° 58/62: Concurso de
Habilitação aos Cursos Superiores. In: Documenta n.° 4. Rio de Janeiro, C F .
E., 1962; págs. 67/68.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 49

e não o substitui p o r q u a l q u e r solução mais atual, como a do ciclo


básico, q u e assegure o trânsito e n t r e os dois graus do ensino e a
orientação dos alunos p a r a os cilos profissionais. O que nele se
p r o c u r a resolver é apenas o p r o b l e m a das vagas, estabelecendo p a r a
o P o d e r Executivo a obrigação de " c r i a r e instalar novas escolas de
ensino superior, a fim de p o d e r a t e n d e r indistintamente todos os
secundaristas".
Já n e m discutimos a delegação de poderes q u e aí se contém,
sabido como é que a criação de q u a l q u e r estabelecimento deve ser
feita p o r lei especial. O q u e pomos em dúvida é a conveniência e
a viabilidade da idéia em si mesma. O nascimento de u m a escola
s u p e r i o r é menos um ponto de p a r t i d a q u e um ponto de chegada,
um aboutissement, que pressupõe t o d o um processo de amadureci-
m e n t o social e cultural do meio. N ã o se improvisa experiência
u n i v e r s i t á r i a ; e sem um magistério qualificado, de pouca ou n e n h u m a
u t i l i d a d e serão os prédios q u e se construam, os equipamentos que se
instalem e as bibliotecas que se a d q u i r a m , q u a n d o haja recursos p a r a
tanto.
S u p o n h a m o s , ao menos p a r a a r g u m e n t a r , que esse pressuposto
fundamental seja atendido pela oferta de salários compensadores, boas
condições de t r a b a l h o e p r o g r a m a s sistemáticos de t r e i n a m e n t o .
Restará ainda saber até que p o n t o cada nova escola irá de fato
atender as necessidades locais ou regionais. P a r á isto não basta o
critério quantitativo, hoje m u i t o em voga, de fixar o n ú m e r o de
profissionais a p r e p a r a r p a r a u m a região em função de sua popu-
lação total. É preciso levar igualmente em conta a capacidade do
m e i o p a r a absorvê-los no presente e n u m futuro imediato.
Do contrário, ou a escola funcionará m a l , pela ausência de
estímulo a m b i e n t e ; ou n a o funcionará sequer, à falta de m e r c a d o
de t r a b a l h o p a r á os seus d i p l o m a d o s ; ou se limitará a fornecer
diplomas de m e r a qualificação social; ou simplesmente formará
profissionais p a r a outras regiões que já possam absorvê-los. Se
as três p r i m e i r a s hipóteses são mais conhecidas, no q u a d r o da tra-
dição educacional brasileira, a ú l t i m a t a m b é m n ã o é r a r a . Dos
2.290 novos médicos, p o r exemplo, que se inscreveram no Serviço
de Fiscalização da Medicina em São P a u l o , no q ü i n q ü ê n i o 1956-
1960, apenas 1.170 (46,7%) se h a v i a m d i p l o m a d o naquele Estado,
29 ( 1 , 3%) no estrangeiro e n a d a menos de 1.191 — p o r t a n t o 5 2 % ,
a maioria — p r o v i n h a m de outros estados da Federação Brasi-
leira. 6
Do que aí fica não se h á , p o r é m , de concluir pela total i m p r o -
cedência da segunda p a r t e do projeto. Em têrmos absolutos, a

6 ALMEIDA JÚNIOR, A., e outros — Os Profissionais de Nível Superior no


Estado de São Paulo. Os Médicos no Estado. São Paulo, Grupo de Trabalho
para Expansão do Ensino Superior, 1962 (mimeografado); pág. 3.

4
50 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

expansão do ensino superior — seja pela disseminação de ciclos


básicos, seja pelo aumento dos ciclos profissionais, seja enfim pela
criação concomitante de uns e outros —• constitui um nível de as-
piração que em nenhum instante deve estar ausente de nossas cogi-
tações. No momento, contudo, ela se faz em detrimento dos outros
graus escolares e tem, assim, profundas implicações políticas e pe-
dagógicas que não podem ser desprezadas.
Com efeito, os 65.344 jovens que concluíram o ciclo colegial,
em 1961, conforme dados oficiais,7 representavam menos de 6% da
população de dezoito anos, que não é inferior a 1.000.000 ;8 e destes
foram classificados 30.375, portanto mais de 46%, no "vestibular"
de 1962.9 Ora, se admitirmos como válidas para nós as compro-
vações do professor Conant, apenas 20% dentre eles teriam capa-
cidade para prosseguir estudos em terceiro grau.10 Assim, inevi-
tável será a conclusão de que a maioria já foi "aproveitada" como
que indevidamente, embora reconheçamos que essa prática por algum
tempo ainda terá de ser mantida e mesmo intensificada com mode-
ração. A necessidade imediata de profissionais qualificados, ante
uma matrícula universitária das mais baixas do mundo, torna os
que hoje concluem a escola média "por demais preciosos para que
os desperdicemos com muita largueza". 11
Mas o certo é que, necessários ou não, 03 excedentes da faixa
de nível acadêmico constituem verdadeiros privilegiados, ocupando
como estão os lugares de outros que a irregular distribuição da
renda e das oportunidades não permitiu chegassem aos umbrais da
Universidade. Pior, entretanto, é que dois terços do orçamento
federal destinado à Educação já são despendidos na manutenção
do ensino superior. Quer isto dizer que a solução do projeto só
viria ampliar tais distorções e agravar os males da estratificação
social, de que a escola no Brasil se tem feito poderoso instrumento.

7 MEC, SEEC — Sinopse Estatística do Ensino Médio, 1962. Rio de Janeiro,


1962; págs. 15, 19, 35.
8 CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS. — Bases para a Orga-
nização dos Fundos (A situação do ensino médico). Rio de Janeiro, CBPE, 1962
(mimeografado) ; pág. 5. Trata-se de estimativa que fizemos a partir do total de
4.351.855 habitantes para a população de 16 a 18 anos. Deixamos 3.351.855
para 16 e 17 anos e tomamos 1.000.000, portanto menos de 23%, para o grupo
etário de 18 anos.
9 MEC, SEEC — Sinopse Estatística do Ensino Superior, 1962. Rio de
Janeiro, 1963; pág. 6.
10 CONANT, James B. — The American High School Today, New York,
MacC-raw-Hill Book Company, Inc., 1959; págs. 20, 58. A média brasileira não
será jamais superior a 20%, considerando a correlação positiva existente entre
nível mental e nível de conhecimentos, que é função das oportunidades de
estado.
11 CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO — Id., ib., pág. 63.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 51

Afinal, a questão do ensino superior é apenas um caso do pro-


blema geral da Educação em todos os graus. A sua expansão será o
resultado da expansão da escola média, tal como o crescimento desta
será função do crescimento do ensino p r i m á r i o . Em última análise,
o incremento da matrícula na Universidade repousa no desenvolvi-
m e n t o da escola p r i m á r i a — comprovação que foi claramente deli-
neada na p r ó p r i a Lei de Diretrizes e Bases, através do que o professor
Anísio Teixeira d e n o m i n o u o " p r i n c í p i o da equalização".
Antecipando-nos ao estudo com que decerto nos b r i n d a r á S.S.,
diríamos que essa equalização se faz na lei em três p l a n o s : no plano
geográfico (art. 13) — pelo estabelecimento da ação "supletiva" do
Govêrno F e d e r a l "nos estritos limites das deficiências locais"; no
plano pedagógico (art. 92) — pelo nivelamento dos três graus
do ensino p a r a efeito de constituição dos " f u n d o s " de E d u c a ç ã o ; e
no p l a n o individual — pela definição da Educação como "direito
de t o d o s " e "obrigação do E s t a d o " (arts. 2.° e 3.°) ; pela "condenação
a q u a l q u e r t r a t a m e n t o desigual" (arts. 1.°, g; e 95, § 3.°) ; pela
preferência a t r i b u í d a ao "sistema público de ensino", visando a
garantir "o acesso à escola de m a i o r n ú m e r o possível de e d u c a n d o s "
(art. 93) ; pela concessão de recursos (bolsas e financiamentos) aos
" q u e d e m o n s t r e m necessidade e a p t i d ã o p a r a os estudos", "sob
condições de autenticidade e i m p a r c i a l i d a d e " que "assegurem opor-
t u n i d a d e s iguais p a r a t o d o s " (art. 9 4 : a, 6; § 3.°, 6) : e pela carac-
terização dos auxílios prestados aos estabelecimentos como assistên-
cia direta aos alunos (art. 95, § 2 . ° ) .
A criação indiscriminada de escolas superiores, q u e ora se pro-
põe, viria c o n t r a r i a r êste princípio nos três planos considerados:
no p l a n o geográfico, p o r q u e a m a i o r p a r t e dos "excedentes" se en-
contra precisamente nas comunidades mais desenvolvidas; no plano
pedagógico, p o r q u e viria agravar o desequilíbrio já existente e n t r e
o nível superior e os níveis p r i m á r i o e médio do e n s i n o ; e no
plano individual, p o r q u e , desatendida a equalização nos planos geo-
gráfico e pedagógico, as o p o r t u n i d a d e s de educação de terceiro grau
se t o r n a r i a m cada vez mais inatingíveis p a r a a grande maioria dos
que já agora não p o d e m sequer pleiteá-la.
Em conclusão, somos de parecer que o Projeto de Lei n.°
735/63, sôbre não conter real solução p a r a o p r o b l e m a do trânsito
e n t r e a escola média e a superior, viria interferir sem vantagem na
experiência da Lei de Diretrizes e Bases q u a n d o apenas se inicia a
sua execução.
Documentação

APERFEIÇOAMENTO DE PROFESSÔRES PRIMÁRIOS


Supervisionado pela Professora Lúcia Marques Pi-
nheiro, Coordenadora da Divisão de Aperfeiçoamento do
Magistério do Centro Brasileiro de Pesquisas educacio-
nais, o INEP promoveu em 1961 um Inquérito junto ao
magistério primário do Estado da Guanabara, cujos re-
sultados apresentamos a seguir:

A análise do levantamento rea- ção as sugestões dos professôres;


lizado pelo INEP, em colabora- 43%, que deve haver demonstra-
ção com a direção dos Cursos de ção prática dos recursos aconse-
Aperfeiçoamento do ITE (Insti- lhados; 2 1 % julgam indispensá-
tuto de Educação do Rio de Ja- vel a participação da turma nas
neiro), visando, em particular, ao aulas; e 13% se manifestam a
planejamento de Cursos de Aper- favor de reuniões de discussão.
feiçoamento e Especialização do Haverá, provavelmente, no Es-
Magistério, teve os seguintes re- tado da Guanabara, um número
sultados em torno dos quais tece- apreciável de professôres que se
mos algumas considerações: destacaram no ensino primário e
que poderiam realizar cursos de
grande interesse para o magisté-
I — Apreciação dos Cursos de rio desse grau. A falta, porém,
Aperfeiçoamento que vêm sendo de uma ficha de apreciação de
realizados cada um, que permita uma des-
pistagem dêsses elementos, terá
Consideram os professôres pou- impedido de contar com sua cola-
co satisfatória a orientação geral boração. O Estado se ressente,
dos cursos, por desligados dos também, de oportunidades de
problemas de escola primária. aperfeiçoamento de seu magisté-
Assim, 80% propõem que os rio, em outros Estados brasileiros
cursos sofram reforma no sentido e no estrangeiro.
de "tratar de assuntos práticos de Um número apreciável de pro-
interesse do professor primário"; fessôres sugeriu ainda que os
69% sugerem que as aulas "par- cursos deveriam ser dados em vá-
tam de problemas reais, apresen- rios locais, de modo a se torna-
tados pelos alunos e pelo profes- rem mais acessíveis aos que tra-
sor encarregado do curso"; 42% balham e residem longe do Ins-
opinam que os cursos devem ser tituto de Educação, e fossem eles
planejados levando em considera- distribuídos no centro da cidade,
nas zonas sul e norte, nas sedes c) Haja especialistas nas vá-
distritais e nas próprias escolas. rias matérias do ensino primário
no ITE, em determinados dias,
para atenderem aos que deles ne-
II — Causas das interrupções cessitam ( 4 5 % ) ;
dos Cursos d) Haja salas de exposição de
material didático ( 2 4 % ) ;
As razões mais freqüentes e) Seja feito um aperfeiçoa-
apontadas pelos professôres são: mento especial de certo número
falta de tempo (65%) e encargos de professôres, que passariam a
familiares (46%). Os motivos integrar o corpo docente de Esco-
apresentados no item anterior las de Demonstração, para obser-
reaparecem. É possível que a vação das professorandas (38%).
realização dos Cursos às 5as.-fei- Embora o inquérito não ti-
ras, apenas, seja uma das razões vesse cogitado de aperfeiçoamen-
que expliquem a resposta "falta to por meio de publicações, houve
de tempo" (aliada aos encargos quem as sugerisse como forma de
familiares, freqüentemente). É enriquecimento do seu preparo
assim que 46% de professôres se profissional, e como meio de
manifestam no sentido de que de- atender àqueles impossibilitados
veria haver cursos de aperfeiçoa- de freqüentar cursos. Até mes-
mento "nos vários dias da sema- mo foi lembrada a conveniência
na, em horários desencontrados de cursos por correspondência.
dos da Escola Primária". Pensamos, a esse respeito, que
A 5.a-feira, sendo o único dia seria interessante haver um ór-
útil de folga, o professor dedica-a gão técnico que respondesse a
a tôda uma série de providências consultas e dúvidas dos professô-
caseiras, familiares, etc, o que res, utilizando-se, para isso, de
lhe torna difícil assumir, nesse diferentes meios, tais como pu-
dia, um compromisso de longa blicação de boletms, revista peda-
duração. (Sendo apenas uma gógica e trabalhos especializados.
vez por semana, os cursos dura- Cremos ainda que, através
vam no mínimo um semestre.) destes e de outros recursos, deve-
ria ser levado aos professôres,
permanentemente, o pensamento
I I I — Sugestões do professorado das autoridades do ensino, a res-
peito de problemas de educação,
Além das sugestões já referidas em especial de administração es-
— de que os cursos sejam práti- colar, suas determinações, etc.
cos e em torno dos problemas da Estamos certos de que essa me-
Escola Primária — opina o ma- dida, por permitir aos professô-
gistério que: res melhor compreensão dos atos
a) Os professôres recém-no- de Administração, em seus prin-
meados recebam maior orienta- cípios e finalidades, traria o be-
ção ( 6 5 % ) ; nefício de uma participação mais
b) Haja cursos especiais de consciente, e portanto mais efi-
aperfeiçoamento para aquêles que caz, do magistério, na obra edu-
se iniciam na carreira ( 4 9 % ) ; cacional.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

IV — Dificuldades e interesses dos professôres, de que a maior


do professor dificuldade encontrada no início
da carreira é "lidar com crianças
Foram apresentados ao profes- desatentas, agressivas ou indisci-
sorado 26 itens, para auscultar plinadas".
seu interesse sôbre um plano de
aperfeiçoamento do professorado b) Seguem-se entre os assun-
em geral, e, em particular, para tos que despertariam maior inte-
seu aperfeiçoamento pessoal, nos resse (e, portanto, entre as maio-
anos de 1961 e 1962. res dificuldades do professor, por
êle diagnosticados):
Verificou-se, na maioria dos
casos, coincidência na ordem de 2.° lugar — Recursos práticos
escolha dos itens, o que, a nosso para o ensino da redação (apon-
ver, é elemento em favor da vali- tado por 50% do professorado).
dade dos resultados. As percen- 3.° lugar — Ensino de leitura
tagens de escolha dos itens que os no 1.° ano (47%).
professôres se revelaram decidi- 4.° lugar — Problemas do pro-
dos a estudar em 1961 ou 1962 fessor no 1.° ano (45%).
foram, como era de esperar, ge-
5.° lugar — Problemas de ma-
ralmente inferiores às que lhe
atribuíam como elemento para nejo de classe e de disciplina
um plano de aperfeiçoamento do (40%).
professorado, porque, no 1.° caso, 6.° lugar — Problemas dos pro-
estariam os professôres limitados fessôres de 4.° e 5.° anos, e Por-
por um período fixo e julgando tuguês: resolução de dúvidas in-
apenas quanto a seu caso parti- dicados por :35% do magistério,
cular, enquanto, no 2.°, aponta- cada um.
vam todos os assuntos de interes- Essas percentagens são alta-
se para os elementos do magisté- mente significativas, consideran-
rio, genericamente. do-se que representam sempre
As conclusões que apresentare- milhares de professôres. Das su-
mos a seguir se referem ao 1.° gestões apresentadas a menos es-
aspecto, isto é, ao plano de aper- colhida foi — Inglês, para leitu-
feiçoamento do professorado em ra de bibliografia profissional,
geral, no caso o mais significa- que, ainda assim, teve 10% de
tivo: indicações (o que corresponde ao
a) As maiores dificuldades interesse de cerca de 1 000 pro-
apontadas são relativas aos pro- fessôres) .
blemas infantis; a criança que Continuando a classificação
não aprende, a mentira, o furto, das escolhas feitas, temos:
a agressividade, a timidez etc. — 8.° lugar — Recursos pará me-
57% dos professôres julgam inte- lhorar o ensino da leitura na Es-
ressante incluir esses assuntos em cola Primária (28%).
cursos de aperfeiçoamento. 9.° lugar — Jogos e recursos
Essa percentagem vem confir- recreativos com aproveitamento,
mar a indicação, feita em outro inclusive, para o ensino das ma-
tópico do questionário, por 58% térias escolares (27%).
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 55

10.° lugar — Nova orientação É interessante verificar as di-


para o ensino de Gramática: Gra- ferenças de classificação dos as-
mática Funcional (26%). suntos no que diz respeito ao
11.° a 13.° — Ensino da divi- interesse que julgam os professô-
são (25%). res apresentarem para o magisté-
— Jogos e exercícios de fixa- rio em geral, e para cada um, em
particular.
ção em Matemática (25%).
— Organização de p r o v a s Os professôres julgam de mais
de verificação de aprendizagem interesse para aperfeiçoamento
(25%). dos outros de que para o deles
próprios:
14.° a 15.° — Organização de
material de ensino (24%). — Recursos para melhorar o
ensino da leitura na escola pri-
— Arte Infantil: teatro, dese-
mária.
nho e artes plásticas (24%).
— Jogos e exercícios de fixa-
16.° a 20.° — Moderna orien- ção em Matemática.
tação da geografia e recursos
para o ensino dessa disciplina na — Ensino da divisão.
Escola Primária (20%) e, com — Como melhorar o ensino das
idêntica percentagem: operações fundamentais com in-
— Como melhorar o ensino das teiros e decimais.
operações fundamentais com in- — Moderna orientação de Geo-
teiros e decimais. grafia e recursos para o ensino
dessa disciplina, na escola pri-
— Recursos audiovisuais na
mária.
Escola Primária.
— Revisão de programa de
— Interesses infantis. Ciências.
— Experiências simples a se-
rem realizadas na Escola Primá- Serão esses assuntos em que o
ria e outros recursos de ensino professor verifica que o ensino
das Ciências Naturais. está falhando, pelos resultados
das provas escolares.
21.° lugar — Organização de
programas de ensino (19%). Por outro lado, são melhor
classificados nas listas dos assun-
22.° lugar — Revisão do Pro- tos que o professor se propõe a
grama de Ciências (16%). estudar em 1961 ou 1962, mas
23.° lugar — Nova orientação julga que não interessarão tanto
de ensino da História e da cida- ao magistério em geral:
dania: instituições escolares e ou- — Arte Infantil: Teatro, De-
tros recursos (15%). senho e Artes Plásticas.
24.° lugar — Ensino de fra- — Organização de material de
ções (13%). ensino.
25.° lugar — Orientação de — Interesses infantis.
trabalho diversificado por gru- — Inglês, para leitura de bi-
pos (12%). bliografia profissional.
26.° lugar — Inglês, para lei- São geralmente, os dêste grupo,
tura de bibliografia profissional assuntos que revelam certo dese-
(10%). jo autêntico de renovação, que
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

os professôres experimentam, mas problemas reais de nossas crian-


não estão certos de que atinge o ças de classe média ou pobre, fa-
grupo todo do magistério pri- veladas, recém-emigradas, defi-
mário. cientes mentais provindas de am-
Aliás, é auspicioso assinalar o bientes conflituosos, sem assistên-
elevado número de professôres cia da família: sua vida, suas
que se pronunciam em favor de necessidades, seus interesses, que
assuntos que representam inte- deveriam constituir um dos prin-
resse de renovação, tais como: cipais focos de preocupação no
— Jogos e recursos recreativos preparo do professor. Em parte
com o aproveitamento, inclusive, serão o resultado da seleção dos
para o ensino das matérias esco- candidatos à matrícula nas Esco-
lares (27%). las de formação de professôres, a
— Nova orientação para o en- qual não leva em conta as apti-
sino de Gramática: Gramática dões e o gosto de lidar com crian-
Funcional (26%). ças, medidos em situações reais,
como já se realiza em Genebra.
— Arte Infantil: teatro, dese- por exemplo.
nho e artes plásticas (24%).
— Interesses infantis (20%). A seleção de candidatas ao ma-
— Moderna orientação de Geo- gistério com 11, 12 anos de idade,
grafia e recursos para ensino por mera escolha dos pais (e mes-
dessa disciplina na escola primá- mo aos 15 e 16 anos), por provas
ria (20%). que evidenciam, no máximo, inte-
ligência verbal e conhecimentos
— Experiências simples a se-
básicos (muitas vezes produto de
rem realizadas na escola primá-
pura dressage), em ocasião em
ria e outros recursos para o en-
que as aptidões e interesse não
sino das C i ê n c i a s Naturais
(20%). estão ainda, muitas vezes, defini-
dos, precisaria ser revista.
— Recursos audiovisuais na es-
Para atender ao problema, se-
cola primária (idem).
riam t a m b é m aconselháveis
— Nova orientação de ensino cursos de Sociologia de interesse
da História e da cidadania: ins- para os educadores (como o estu-
tituições escolares e outros re- do recente da favela carioca) e
cursos (15%). pequenos estudos sôbre a família
— Inglês (10%). dos escolares, sua vida fora da
Nesse e no item 7 se verifica escola, e a aquisição de técnicas
que o professor reputa sua maior de trabalho, como a de entrevista,
dificuldade a de se conduzir ade- por exemplo. Muitos professôres
quadamente na orientação das espontaneamente referem o inte-
crianças que apresentam proble- resse que teriam de melhor co-
mas de conduta ou de aprendiza- nhecer os pais dos alunos, o que
gem (os 2 itens apresentados muitas vezes realizam de maneira
a respeito indicam percentagens contraproducente, em oportuni-
de 58 e 57%), dificuldades que dade de queixas e reclamações.
sugeriram uma preparação em Respostas em outros itens dei-
Psicologia mais voltada para os xam entrever que os professôres
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 57

se sentem deficientes quanto ao ensino do 4.° e 5.° anos, séries


preparo em Matérias e Prática em que o programa está igual-
de Ensino, o que é natural, uma mente a exigir um reexame. (A
vez que o Estado não conta com reação dos professôres quanto à
boas Escolas de demonstração. dificuldade de cumprirem os pro-
Finalmente, estará concorren- gramas em turmas fracas, em
do para as altas percentagens al- geral, foi, aliás, apontada em ou-
cançadas nesse item uma sé- tro item do questionário.)
rie de condições administrativas, Em acréscimo às escolhas apre-
como programas uniformes e ex- sentadas, os professôres revelam
cessivos para as crianças menos dificuldades em obter bom ren-
capazes, reduzido período de au- dimento em problemas matemá-
las, ambientes desprovidos de re- ticos.
cursos para um trabalho eficiente, Todos esses fatos parecem con-
falta de orientação do professor. duzir à conclusão de que haveria
Essas condições são, aliás, aponta- vantagem de realizar uma prepa-
das nos esclarecimentos suplemen- ração mais profunda e em nível
tares que prestam nos questioná- mais alto do professor primário
rios, como veremos em outros e obter Centros de Demonstração
tópicos. de bom ensino, onde pudessem
É também importante notar a ver aplicados esses recursos mo-
dificuldade de o professor condu- dernos.
zir turmas de 1.° ano (45%), Não é suficiente observar uma
"ensinar leitura no 1.° ano" boa classe — a Escola é um todo,
(47%). Essa dificuldade é geral uma comunidade, com vida pró-
e leva, mesmo, boas escolas parti- pria, entrosada, e as relações
culares a só aceitarem alunos já entre as turmas, a coordenação
alfabetizados. dos trabalhos, o enriquecimento
O preparo do professor para do currículo em atividades fora
orientar turmas de primeiro ano, da classe são essenciais para que
em que o fracasso é ponderável o professor se integre no verda-
(consideradas as exigências do deiro sentido de sua obra. Reve-
programa) está a exigir um estu- laram os professôres, em todas as
do especial. Os estudos de Me- suas respostas, sede de um pre-
todologia da Linguagem e a Prá- paro mais prático, mais real, que
tica de ensino precisariam dar lhe desse mais segurança e, no
especial ênfase ao assunto, e seria item já citado, relativo à criação
recomendável que se preparassem de Escolas de Demonstração, com
folhetos de orientação. Parece, professôres especialmente prepa-
igualmente, necessário um rees- rados, foi ponderável a manifes-
tudo dos programas e exigências tação favorável dos professôres
para o 1.° ano, que leve em conta (quase 4.000 aprovariam a me-
as condições dos alunos, e, bem dida).
assim, um estudo completo da
O atual preparo do professor
situação.
em Matérias e Prática de Ensino
Igualmente se manifestam os e em Psicologia se ressente natu-
professôres sôbre os problemas de ralmente de falta de observações
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

58 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS


continuadas de trabalhos ricos de apenas opina que não devem eles
sugestões, e de prática supervisio- receber turmas de 1.° ano, fazen-
nada, mesmo depois de terminado do naturalmente a restrição de
o curso, como se vem realizando que sejam turmas normais).
no Rio Grande do Sul, depois da No item final, opinam no sen-
reforma do Ensino Normal. O tido de que deveria haver cursos
alto índice de manifestações a e s p e c i a i s de aperfeiçoamento
respeito da necessidade de orien- para os professôres que se iniciam
tação do professor recém-formado na carreira (49%) e que "parece
fala em abono dessa solução. muito importante que os profes-
A nosso ver, a formação do sôres recém-nomeados recebam
professorado no Estado deveria maior orientação". 65% do pro-
sofrer transformações radicais fessorado se pronuncia neste
em Centros de Preparo em que a item, percentagem só ultrapassa-
nota dominante fosse a Escola da pelos que pedem cursos mais
Primária. Do contrário, arrisca- práticos (80%).
se o professor de Escola Normal Na parte relativa à formação
a se afastar dos problemas do en- do magistério, julgam os profes-
sino elementar, e os alunos não sôres que:
serão suficientemente motivados 1) Nos cursos de formação, re-
para o estudo, no momento em lativos às matérias de ensino, de-
que têm todas as condições pará veria ser feita a análise dos
fazê-lo de maneira eficaz, só vin- assuntos dos programas, na parte
do a perceber que perderam a de conteúdo e de recursos de en-
oportunidade mais tarde, quando sino ( 5 1 % ) ; 1
é muito mais difícil realizá-lo. 2) os Cursos de Psicologia para
formação e aperfeiçoamento de
professôres primários devem tra-
V — A formação do magistério e
tar dos problemas que se apresen-
a assistência ao professorado
recém-formado tam aos professôres de classe,
obtidos por informação destes
(35%);
No item 8 do questionário, pro-
nuncia-se o professorado sôbre as 3) as professorandas que têm
maneiras como seria possível maior dificuldade na prática de
obter que fossem menores as difi- ensino deveriam ter oportunidade
culdades dos professôres ini- de participação maior na Escola
ciantes : Primária (35%) e
1) 53% julgam que deveriam 4) deve haver maior oportuni-
eles receber maior assistência, em dade de observação de aulas de
suas primeiras experiências de bons professôres pelas professo-
trabalho; 2) 47%, que deveria randas (35%).
haver orientadores nas escolas,
para atenderem aos professôres 1 Em pesquisa que está sendo
realizada, também no Estado da Gua-
novos; 3) 46%, que não se deve
nabara. por meio de entrevistas, 96%
dar aos professôres iniciantes as dos professôres se manifestaram a favor
turmas mais difíceis (mas 17% da medida.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Todas essas observações coinci- de orientar um número excessi-


dem no assinalar que o professor, vo de alunos, impede a coorde-
ao se formar, não tem a seguran- nação dos trabalhos na turma do
ça necessária e faz-se mister am- meio e esgota o professor;
pará-lo. b) dia escolar insuficiente —
Julgaríamos que uma solução o regime de 5 turmas impede um
a tentar (aproveitando sugestões trabalho educativo real, fazendo
de outros itens) seria criar um do professor um mero executor
certo número de escolas (novas, dos programas, com abandono da
de preferência) para estágio e parte de formação de hábitos e
demonstração. atitudes, impossíveis de se sedi-
Nessas escolas colocar-se-iam mentar, numa escola de ritmo
diretores especializados e orien- acelerado e objetivos ambiciosos;
tadores, estabelecendo-se um está- c) extensão e falta de flexibili-
gio, de 1 ano ou 2, conforme as dade dos programas, exigindo, de
possibilidades, já com turmas a crianças de diferentes capacida-
seu cargo, para as professoras des e de diferentes meios, os mes-
recém-formadas. As restantes mos padrões;
turmas de escola (digamos 50%) d) turmas excessivamente nu-
seriam entregues a professôres
merosas (com 40 c r i a n ç a s e
especialmente capazes e aperfei-
mais) ;
çoados e nelas fariam observações
as professorandas. Dessa manei- e) exigências freqüentes de
ra, as normalistas se impregna- participação em "Campanhas"
riam de uma boa atmosfera de diversas, muitas vezes inoportu-
trabalho, fariam relações com nas em relação ao trabalho já
bons professôres e teriam amparo planejado;
em suas primeiras experiências. f) falta de assistência e orien-
Teriam elas, nesse período, a con- tação técnica suficientes, as quais
dição de "estagiárias", sendo no- se fazem sentir, principalmente,
meadas, após o período fixado já, no início da carreira, assim como
com a experiência necessária em relação a casos especiais iso-
para tentar um bom trabalho. lados, ou ao trabalho com turmas
AE e S P ;
g) carência de ambiente ade-
VI — Condições administrativas quado e de material nas escolas,
que contribuem pará diminuir o desde o mais simples, como giz,
rendimento do ensino papel, lápis, tesouras, livros (so-
bretudo nas zonas mais pobres,
Convidados, em vários dos onde os alunos não os podem ad-
itens do questionário, a acrescen- quirir) até os de uso permanente,
tar observações e sugestões que como mapas, globos, material mí-
lhes parecessem úteis, opinaram nimo para o ensino de ciências,
os professôres que muito preju- suportes ou cavaletes para carta-
dicam os trabalhos as condições zes, etc.;
em que se processam, relativas a: h) necessidade de ocupar-se o
a) serviço cumulativo — que professor com encargos escolares,
dá ao professor responsabilidade tais como Caixa Escolar, Coope-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

rativa, Merenda, Biblioteca, Cen- Faremos, aqui, resumidamente,


tro Cívico, Serviço de Saúde, uma apresentação mais sistemáti-
Chefia de Núcleo, etc, que fre- ca do problema:
qüentemente desviam sua atenção 1) Num sistema escolar com
do trabalho de classe, no horário cerca de 10.000 professôres, difí-
escolar, afora o trabalho que mui-
cil se tornará uma atuação real-
tos deles lhes acarretam, no pró-
prio lar. Com um período redu- mente significativa se não se
zido de aulas, deve ainda sair de cuidar de obter um efeito de
sala o professor para superinten- acumulação nos esforços despen-
der a merenda, a venda na coope- didos, isto é, se cogitar do prepa-
rativa, ensaiar os alunos para fes- ro de elementos cujo valor, entu-
tas, experimentar nas crianças siasmo e posição assegurem uma
sapatos distribuídos pela Caixa rápida multiplicação desse es-
Escolar, etc, e vê seu trabalho forço.
freqüentemente interrompido por
crianças de outras turmas e por Assim, deveria h a v e r , num
auxiliares subalternos que vêm plano de aperfeiçoamento, a preo-
consultá-los sôbre assuntos relati- cupação de pôr a par das medidas
vos a essas comissões. mais aconselháveis, em seus se-
tores de atividades, os chefes de
Professôres há que, no início distrito, técnicos de educação,
de suas carreiras, a braços com orientadores de ensino e, em ge-
todos os problemas de adaptação,
ral, assessores técnicos dessas au-
encarregados de turmas difíceis,
toridades escolares, diretores de
recebem ainda várias comissões
escola, estudiosos dos problemas
para desempenhar. O assunto re-
quer estudo especial, pela sua de educação e encarregados de
alta relevância. planejamento, professôres para
Escolas de Demonstração para
O mesmo ocorre com relação ao professorandas e professôres em
diretor, cuja principal função
estágio de aperfeiçoamento, e os
seria — as autoridades em Admi-
professôres especializados para
nistração Escolar o confirmam —
completar o currículo dessas es-
tarefa, assoberbado com os encar-
gos administrativos e solicitações colas.
de inúmeros órgãos. Tais elementos seriam o foco
de irradiação das mudanças ne-
cessárias.
VII — Sugestões preliminares 2) Ao lado desse trabalho, pla-
para o aperfeiçoamento do nejado de maneira objetiva, ten-
magistério do em vista as funções a serem
preenchidas pelos profissionais
A propósito da reação dos pro- respectivos, se organizaria o aper-
fessôres aos vários tópicos do feiçoamento dos professôres pri-
questionário, já tecemos conside- mários de classe, atendendo às
rações sôbre algumas maneiras de sugestões que apresentarem, no
atender ao problema do aperfei- Inquérito em causa, e em horário
çoamento do professorado pri- desencontrado do da Escola Pri-
mário. mária.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 61

Esse aperfeiçoamento não se mínio da língua nacional e de


realizaria apenas por meio de uma língua estrangeira — de
cursos, mas de estágios, publica- preferência o Inglês, sem o qual
ções etc. é difícil acompanhar o movimen-
Abrangeria êle, por exemplo: to educacional que vai pelo
mundo.
a) Como estudar a situação dos
alunos que apresentam dificulda- Pará as Metodologias e os Pro-
des ao professor: — Em torno de blemas de manejo de classe, Cen-
c a s o s concretos, apresentados tros de Demonstração nos pare-
pelos professôres. Procurar-se-ia cem indispensáveis — observar o
não só dar a estes uma base psi- emprego de um recurso de ensino
cológica, como dotá-los de melho- é muito mais eficaz do que ouvir
res instrumentos de trabalho e falar a respeito. Além disso,
maior segurança pessoal. será talvez o único meio eficiente
de levar o professor a utilizar
b) Matérias de ensino: — Po- métodos globalizados de trabalho.
deriam ser experimentados cursos
intensivos e rápidos sôbre assun- Publicações sucintas seriam de
tos definidos, e não abrangendo a bom efeito, mostrando ao profes-
disciplina em geral. Assim se sor o interesse da administração
faria, por exemplo, um curso de por seu trabalho. O estímulo nos
1 mês ou 2 sôbre "Ensino de lei- parece a principal mola que falta
tura no 1.° ano" ou "Matemática no sistema escolar primário do
— ensino das 4 operações". Em Estado. Êle estará na depen-
ciências — naturais e sociais, se- dência do reconhecimento do mé-
riam interessantes cursos de con- rito para ascensão na carreira.
teúdo e estudo de recursos de É, aliás, de interesse da adminis-
ensino, em correlação. O profes- tração contar com os melhores —
sor não realiza, por exemplo, o em preparo, dedicação, persona-
ensino da Geografia da maneira lidade — para os cargos de maior
mais desejável — em torno de responsabilidade.
problemas do Brasil e visando a 3) Urge um entrosamento da
preparar cidadãos esclarecidos e administração do ensino com as
interessados — por não haver, Escolas de Formação do profes-
muitas vezes, estudado a matéria sorado primário — por meio de
com essa orientação. reuniões com os responsáveis dos
É importante atender ao inte- dois campos (incluindo professô-
resse do professor por todos os res), troca de sugestões, observa-
aspectos de renovação, entrosa- ção do trabalho dos alunos etc.
dos, porém, o mais possível. 4) Os cursos rápidos a que nos
Assim, por exemplo, preparar referimos poderiam ser em parte
material, dentro da disciplina a feitos nas Escolas e nas sedes dis-
que irá servir. O mesmo com re- tritais, deles se encarregando di-
lação aos recursos audiovisuais. retores ou assessores dos Chefes
E, igualmente, assistir o profes- de Distrito ou do D E P .
sor no que diz respeito à aquisi- O plano estará a depender das
ção de importantes instrumentos disponibilidades de pessoal e de
de trabalho, como o melhor do- seu preparo. Acreditamos, po-
62 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

rem, no idealismo do magistério seja dado ao programa o necessá-


para crer que haveria os que se rio nível.
encarregariam de atividades de Além dos dados obtidos pelo
aperfeiçoamento de seus colegas presente Inquérito, seria interes-
sem prejuízo de seu trabalho re- sante levar em conta, no planeja-
gular, nesse período de emergên- mento dos cursos, os resultados
cia. Será, porém, absolutamente das provas escolares e a opinião
necessário contar com elementos de pessoas experimentadas em
com preparo especial, para que ensino primário.
ni REUNIÃO INTERAMERICANA DE MINISTROS
DA EDUCAÇÃO
Reuniram-se em Bogotá, na primeira quinzena de
agosto último, os Ministros da Educação das repúblicas
americanas. Desse encontro resultou a «Declaração de
Bogotá», aprovada por 11 dos Ministros presentes, que di-
vulgamos juntamente com a declaração de voto da dele-
gação brasileira e o discurso do Ministro Paulo de Tarso:

A DECLARAÇÃO DE BOGOTÁ que sem uma ação positiva e


firme pará apressar em condições
"A terceira Reunião Interame- equitativas, o desenvolvimento
ricana de Ministros de Educação, econômico e social dos países dês-
considerando que o esforço em- te continente, tôda educação
preendido pelas nações america- orientada para tais fins seria re-
nas conforme o plano decenal da tardada, quando não desmentida,
Aliança Para o Progresso, a fim pela dolorosa desigualdade mate-
rial em que vivem amplos setores
de acelerar seu desenvolvimento
da população;
econômico mediante a aplicação e
o aprimoramento de seus sistemas e que na Conferência sôbre
educativos há de se realizar den- Educação e Desenvolvimento E-
tro dos caminhos que marcam conômico e Social reunida em
tôda obra autêntica de cultura os Santiago do Chile durante março
de 1962 se ratificou a resolução
ideais humanos de constante me-
dos povos americanos de contri-
lhoramento individual e social; buir através do seu desenvolvi-
que a colaboração dos povos mento educativo e ao seu pro-
dêste continente aspira não so- gresso econômico, a obra conjunta
mente estimular a prosperidade que o mundo exige, declara:
de cada um deles, mas aperfei- 1 — a cabal manifestação da
çoar em todos a liberdade e a de- personalidade cultural de cada
mocracia para oferecer, assim, povo é parte insubstituível e ina-
uma assistência crescente ao pro- lienável do patrimônio comum da
gresso, ao bem-estar e à paz do humanidade;
gênero humano; 2 — fundamentalmente, a edu-
que a carta da OEA (Organi- cação tem como objetivo a plena
zação dos Estados Americanos) realização do homem num am-
estabelece num dos seus parágra- biente de liberdade, de justiça e
fos essenciais que a educação dos de paz;
povos deve ser orientada para a |3 — para prosseguir êste pro-
justiça, a liberdade e a paz; pósito, a educação exige uma
64 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

ação geral tendente ao melhora- e explicou numa declaração de


mento efetivo de condições econô- voto que dava seu apoio às for-
micas e sociais de tôda a popu- mulações gerais, mas considerou
lação; necessário acrescentar que os or-
4 — dentro desta ação geral, a ganismos executores da Aliança
educação deve sustentar os valo- Para o Progresso devem ter em
res de liberdade e igualdade de conta sua inspiração revolucioná-
oportunidades que são, ao mesmo ria original, evitando entendi-
tempo, compromisso e honra da mento com grupos privilegiados
democracia; e procurando estimular as refor-
mas estruturais indispensáveis e
5 — a fim de sustentar estes
valores, precisa ser estimulada, inadiáveis.
nos educandos, juntamente com o Diz a declaração de voto da
respeito à personalidade humana, delegação brasileira:
a convicção de que a liberdade e
"A Aliança Para o Progresso
a justiça social são condições in-
separáveis e imprescindíveis de está diante da seguitne alternati-
uma convivência que possa asse- va histórica: busca apoio do povo
gurar, ao mesmo tempo, aos ho- ou pereee;
mens, um futuro de paz na digni- — dois anos depois da reunião
dade e, às nações, de uma colabo- de Punta del Este, não nos é pos-
ração construtiva na indepen- sível retroceder porque as trans-
dência ; formações sociais são hoje mais
6 — a educação para a demo- urgentes, o que nos leva a am-
cracia e o desenvolvimento da pliar o que foi afirmado e, prin-
ciência e cultura na paz impli- cipalmente, traduzir em atos con-
cam, por atingirem a vocação es- cretos e eficientes os objetivos
sencial dos países americanos, a assinados;
garantia sólida de progresso, em — ou cumprimos os compro-
sua vontade de contribuir para a missos que assumimos em Punta
civilização; del Este, ou nosso esforço con-
7 — como força de liberdade, junto de desenvolvimento não
de justiça, de paz, a escola deve beneficiará a nossos povos. Será
estimular a compreensão entre um mero instrumento de per-
todos os homens, a fim de robus- petuação de privilégios de mi-
tecer, sem rancores nem precon- norias que insistem em sobrepor
ceitos, a solidariedade intelectual seus interesses aos interesses
e moral de todos os povos. Bogo- nacionais;
tá, 10 de agosto de 1963".
— não é possível imaginar a
educação como alguma coisa abs-
trata, fora do tempo e lugar de-
A DECLARAÇÃO DE VOTO terminados. Temos de examiná-
DA DELEGAÇÃO BRASILEIRA la na América, onde grande parte
dos povos tendem para a revolu-
A delegação brasileira se abste- ção social, aspirando-a por meios
ve de assinar o documento acima, pacíficos e democráticos;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 65

— essa educação somente será cada país, a fim de superar as


válida se contar com o apoio do estruturas iníquas atuais.
povo, progressivamente organiza- A "declaração de voto" termi-
do e consciente de sua responsa- na dizendo que "com estas afir-
bilidade na criação da autêntica mações, a delegação do Brasil
História da América; externa a esperança de que a
— a cooperação internacional Aliança Para o Progresso consti-
no campo da educação só será tua um esforço na luta de liber-
eficaz se estiver ligada a planos tação de todos os povos subdesen-
globais de desenvolvimento de volvidos da América".
PRÊMIO "CIÊNCIA DA EDUCAÇÃO", 1963

A Fundação Moinho Santista que, desde alguns anos,


vem conferindo prêmios culturais a operários das ciências,
das letras e das artes, inseriu entre suas láureas, em
1963, a de «Ciência da Educação». As Comissões incum-
bidas do estudo do assunto, pois pará. esses prêmios não
há inscrição, bem como o Grande Júri da Fundação
assentaram em conferir a láurea ao Prof. Manoel Bergs-
trom Lourenço Filho, antigo professor primário, professor
de ensino normal e catedrático da Faculdade Nacional de
Filosofia, hoje neste cargo aposentado com o título de
«Professor Emérito», além. de ocupante de diversos postos
de administrador em sistemas de ensino estadual e no
Ministério da Educação. É de recordar-se que o Prof.
Lourenço Filho foi o diretor-fundador do Instituto Na-
cional de Estudos Pedagógicos, e fundador desta Revista,
sendo autor de numerosas obras pedagógicas, várias das
quais traduzidas em francês, inglês e espanhol.
Agradecendo a concessão do prêmio, na solenidade de
entrega realizada a 30 de setembro último, o Prof. Lou-
renço Filho pronunciou o discurso que transcrevemos a
seguir:

"Um jovem discípulo de Platão, queles que por mais longo tempo
que ia ser recebido no Jardim a tenham exercido.
de Academo, perguntou ao mes- Ou será um pouco ao inverso,
tre como deveria agradecer essa pelo que se deverá dizer que só
honra. "Com simplicidade, ami- os desambiciosos é que permane-
go, com simplicidade", foi a res- cem no magistério ? . . . Assim
posta. pelo menos pensava Bernard
A circunstância da idade do Shaw, quando levou uma de suas
discípulo não condiz, helas!, personagens a dizer: "Quem po-
com a de quem vos fala. Mas a de faz, quem não pode ensina".
do prudente conselho aplica-se à Sem dúvida que há boa dose de
situação em que me encontro, malícia nesse dito famoso, mas
sobretudo quando se tenha em também certa parcela de verdade.
vista a qualidade de que não me De qualquer modo, com a sim-
posso despir, a de velho mestre- plicidade de um mestre-escola,
escola. 0 ensino é uma função devo exprimir-vos, a todos, e de
votada à humildade, senão a das forma a mais límpida, meu enor-
idéias, a dos costumes. Normal- me reconhecimento. Primeiro,
mente reduz as aspirações da- aos altos órgãos diretores da
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 67

Fundação Moinho Santista por por dizer, por exemplo, que a


haverem admitido o setor "Ciên- beleza e a grandeza desta soleni-
cia da Educação" entre os de dade não estão propriamente nas
possível premiação êste ano, e realizações das pessoas a que
logo também às doutas Comissões toma por alvo, nesta ocasião,
que com tanta paciência logra- nem nas realizações de outras
ram encontrar algo de valioso pessoas, em outros anos. Mas,
entre as muitas coisas de menor sim, no alevantado programa da
préstimo que tenho produzido. entidade que aqui nos reúne, o
Depois, ao colendo Grande Júri, que é, em resumo, zelar pela con-
que lhes sancionou o veredicto. tinuidade e solidariedade da cul-
E, enfim, de modo particular, ao tura de nosso país.
Exmo. Dr. Alexandre Marcondes Claro que alguém poderia pro-
Filho, que acaba de saudar-me testar. Mas, em vão. O peda-
com tão generosas palavras. gogo voltaria à carga para dizer
E não será tudo. Devo agra- que a cultura é um fato social,
decer a velhos e novos amigos e que as personalidades aqui
pela carinhosa presença nesta so- chamadas a cada ano não repre-
lenidade — a meus mestres de sentam senão as marcas de um
outros tempos e a discípulos, complexo jogo, o do progresso
agora também m e u s mestres, cultural brasileiro, em vários
todos companheiros da mesma campos. E diria também que,
causa. quando as expressões da vida co-
Com essas poucas palavras, es- letiva se enriquecem e se diver-
taria completa a oração a ser sificam, novas realidades a serem
aqui pronunciada, desde que obe- estudadas se caracterizam, ou
decido o conselho do filósofo. velhas realidades sob novos as-
Mas isso só seria possível se, ao pectos ressurgem; e que, nesse
mestre-escola que me honro de caso, são procurados trabalhado-
ser, não aconpanhasse, como uma res que nesses domínios, bem ou
sombra, a figura do pedagogo... mal, se tenham aventurado.
Os pedagogos, não tenhais dú- Tal é o caso de que se possa
vida, representam no trato co- chamar "Ciência da Educação",
mum uma excelente casta de gen- domínio em que não me conside-
te, Mas, desde que se encontrem ro senão um velho e impenitente
em face de um auditório disposto aprendiz. Nas sociedades calmas
a ouvi-los, tornam-se execráveis. ou estáveis de outros tempos,
Por definição, seu trabalho é ex- não haveria por que tratar dessa
plicar coisas nem sempre fáceis especialidade. Bastaria a velha
de o serem. E, por deformação Pedagogia, no sentido de arte do
profissional, de explicá-las de- ensino, ou de sua tecnologia, den-
mais, racionalizando-as. Quer tro da qual todos sabemos o que
dizer, de pô-las em palavras e queremos, ainda que sem maior
fórmulas que só eles mesmos en- percuciência crítica.
tendem.
Nas sociedades atuais, já o
Se eu permitisse que tal peda- mesmo não se dá. A complexi-
gogo aqui falasse êle começaria dade da vida de hoje exige maior
68 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

esforço para que se compreenda a cada educador, pessoalmente,


o processo da educação e suas não deva caber certa escolha dos
condições; e, em sentido inverso, processos de seu próprio ofício.
faz-se necessário compreender a O que se quer dizer é que, pará
articulação dos fatos educacio- que êle o possa fazer de modo
nais com outros de muitos setores satisfatório, terá de estudar o
da vida social. Ou, para usar processo da educação em seu
de uma frase mais sonora, ainda mais complexo contexto, inclusi-
que menos precisa, quer-se hoje ve em suas condições e implica-
fazer da educação "um problema ções de ordem econômica, política
integral de cultura". Assim, de e cultural, em geral.
uma parte, quer-se a investiga-
Em certo sentido, tôda a vida
ção das condições operacionais
social interfere na ação educati-
da escola, a fim de que suas téc-
va, de forma construtiva ou con-
nicas permitam mais satisfatório traditória, pois que sua unidade
rendimento; e de outra, pro- é apenas uma construção simbó-
curam-se critérios menos imper- lica de nosso espírito. Até que
feitos para que esse rendimento ponto poderemos então admitir
chegue a ser racionalmente ava- que, intencionalmente, estejamos
liado. realmente educando ? . . .
Dentro de sua tecnologia, já É a esse ponto que os nascen-
vinha o pedagogo admitindo fun- tes estudos de uma Ciência da
damentação esparsa, que ia co- Educação estão procurando aten-
lher diferentes ramos da investi- der, por ampliação de certas in-
gação científica. Mas os critérios dagações a campos múltiplos de
para julgamento de seu trabalho, observação, especialmente com
a exigir em unidade, permane- emprego de métodos comparati-
ciam, como ainda agora em gran- vos. Que condições ecológicas,
de parte permanecem, oscilantes econômicas, políticas, morais, re-
e muito pessoais. Os fins mes- ligiosas — on se quisermos usar
mos da educação êle os estabele- de qualificativo mais abrangente,
cia, de modo axiomátivo, só per- que condições " antropológicas"
mitindo a investigação relativa a — poderão esclarecer as graves
modos e formas de operação. e sérias questões educacionais da
Afinal de contas, supunha-se hora presente ? . . . Até que pon-
que a educação pudesse ser ma- to para isso as instituições esco-
téria de simples exercício de lares, tais como as conhecemos,
nossa vontade, que se poderia poderão bastar e em que medida
pôr em marcha ou suspender, outros encargos educativos terão
como e quando se quisesse. Por de ser desempenhados por ou-
isso mesmo, entre os variados tras instituições?...
gêneros e espécies de produção, Bem se pode perceber que as
o trabalho educativo vinha sendo realidades a examinar para solu-
dos poucos, senão o único, em ção de todas essas graves ques-
que o produtor se arrogava o di- tões não correspondem apenas a
reito de decidir do valor do pro- um limitado setor de estudos,
duto . . . Não se quer dizer que mas a um grande conjunto de
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 69

problemas, a desafiar cientistas ano se tenham destinado, uma à


sociais, políticos e administra- Ciência da Educação, e outra
dores. também à Filosofia, aqui tão no-
Essa forma de propor a ques- bremente representada pelo emi-
tão está agora levantada no nente professor Leonardo Van
Brasil pela Fundação Moinho Acker.
Santista, com admitir êste ano a
concessão do prêmio "Ciência da Os cientistas fazem a ciência.
Educação", o qual, acreditamos, Os filósofos dizem como devam
periodicamente venha a ser repe- ser aplicadas as coisas científicas
tido, como nos demais setores e, ainda mais, como devam ser
ocorre. verificadas as bases lógicas do-
Desse modo, não se poderá di- trabalho da ciência, a sua coe-
zer que o pedagogo não tenha rência, a possibilidade de seu
razão em afirmar que a função desenvolvimento integral. À me-
desta egrégia entidade é essen- dida que o movimento científico
cialmente a de velar pela conti- cresce é que o pensamento filo-
nuidade e solidariedade da cul- sófico se renova; e é na medida
tura no país. E êle nos poderá também em que o pensamento
dizer, agora e também, que o filosófico se aperfeiçoa, que mais
possível progresso dos estudos e melhor ciência se vem a pro-
científicos de educação reclama duzir.
a evolução dos estudos de outros Eis aí, senhoras e senhores, a
e muitos campos, sem o entendi- dificuldade em atender ao pru-
mento dos quais, seja em relações dente conselho de Platão — pru-
de definição, seja nas relações de dente, sim, mas com alguns ris-
sua própria estrutura, o nosso cos também. É que a simplici-
processo educacional não chegará dade ordinariamente leva à con-
a ser suficientemente conhecido. fidencia. E confidenciar pode
Não se deverá concluir de tudo ser uma das melhores formas de
isso que os problemas relaciona- agradecer, como, igualmente, uma
dos com a educação possam ser das menos toleráveis. Confiden-
todos eles resolvidos no plano do ciando, para atender ao desejo
pensamento científico, como tal. de ser simples, tive de impor-vos
Existe uma técnica ou uma arte cogitações mais ou menos densas,
da educação exatamente porque, inoportunas neste momento em
como ação intencional, os empre- que apenas a emoção deveria
endimentos educativos buscam florir.
afirmar e renovar valores, assim É que, como dantes vos con-
admitindo opção entre objetivos, fessei, embora não seja mais que
escolha de certos caminhos, entre um mestre-escola, não me posso
muitos. Nem a Pedagogia, nem libertar da sombra do pedago-
a Ciência da Educação, por si go... A um e a outro, estou
mesmas, nesse sentido determi- certo, já tereis perdoado, porque
nam as finalidades últimas da em todas estas palavras haveis
educação. de ter sentido o meu desejo em
E não terá sido por mero efei- patentear-vos meu reconhecimen-
to do acaso que as láureas dêste to, e nada mais que isso.
70 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

E, aqui, a confidencia final: a tres-escolas e pedagogos. Pois,


distinção que ora recebo excede ilusòriamente ou não, eles vêem
de muito a tudo quanto eu pu- no estudo e, portanto, na conti-
desse aspirar por minhas ativi- nuidade da cultura, alguma coisa
dades no ensino e estudos teóri- em que encontram motivo para
cos da educação. Ela só se jus- envaidecer-se. Não podendo desde
tifica como estímulo a jovens es- logo "fazer", eles "ensinam".
tudantes de hoje, coisa que fun- Nisso residem sua glória e seu
damentalmente contenta a mes- martírio".
L E I O R G Â N I C A DO E N S I N O — E S T A D O DA B A H I A

O texto que ora divulgamos teve demorada tramita-


ção na Assembléia Legislativa. A proposição inicial data
da administração Anísio Teixeira na Secretaria de Edu-
cação da Bahia, durante o Govêrno Mangabeira. Após
sucessivas modificações em sua forma e estrutura, a Lei
foi sancionada e publicada no Diário Oficial do Estado
a 15 de outubro passado. Damos sua integra:

L E I ORGÂNICA DO ENSINO ção nos direitos e deveres da so-


ciedade e às múltiplas e variadas
Lei n.° 1 965, de . . . de Se- necessidades ocupacionais.
tembro de 1963. Parágrafo único. Para esse
0 Governador do Estado da fim, a escola:
Bahia, faço saber que a Assem- a) buscará prover, em seus ser-
bléia Legislativa decreta e eu viços, condições que, gradualmen-
sanciono a seguinte Lei: te, venham permitir aos indiví-
duos suprir as deficiências inatas,
bem como as do lar e da herança
social em relação aos demais gru-
TÍTULO I pos que compõem a comunidade;
Dos Serviços de Educação e Cultura b) ministrará educação inte-
gral, desdobrando-se para o aluno
em lar, ensino e vida, e, para a
CAPÍTULO I ,democracia, n u m a instituição
Dos Princípios e dos Métodos da promotora do desenvolvimento da
Educação e Cultura personalidade humana e de sua
participação na obra do bem co-
Art. l.° Os serviços de edu- mum e da igualdade fundamen-
cação e cultura, inspirados nos tal dos cidadãos;
princípios de liberdade e nos c) cuidará da difusão da cul-
ideais de solidariedade humana, tura por meio de serviços apro-
têm em vista oferecer a todos os priados para atender às necessi-
habitantes do Estado da Bahia, dades populares e ao preparo do
sem distinção de raça crença, indivíduo e da sociedade para o
convicção política, condição eco- domínio dos recursos científicos e
nômica ou social, oportunidades tecnológicos que lhe permitam
iguais para o desenvolvimento de utilizar as possibilidades e vencer
sua inteligência e personalidade a os obstáculos do meio;
fim de habilitá-los aos benefícios d) cultivará o respeito à digni-
da civilização, à plena participa- dade e às liberdades fundamen-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

tais do homem, a compreensão os métodos mais recomendáveis


dos direitos e deveres da pessoa de educação ativa e progressiva,
humana, do cidadão, do Estado, oferecendo aos alunos os meios
da família e dos demais grupos hábeis ao seu encaminhamento
sociais, para fortalecimento da para o trabalho e para a vida,
unidade nacional e solidariedade dentro do regime democrático;
internacional; e) no ensino primário, o desen-
e) observará, em cada um de volvimento do raciocínio e das
seus graus e ramos, os métodos atividades de expressão, e a inte-
mais eficazes em sua organização, gração do educando no meio físi-
em seu currículo, e em seus co e social;
cursos, visando sempre a adap- f) no ensino médio, a formação
tá-los às condições locais e apro- do adolescente, pela cultura ge-
veitar as experiências bem suce- ral e formação profissional;
didas em outros Estados da Fe- g) no ensino superior, a pes-
deração ou em outros Países. quisa, o desenvolvimento das
Art. 2.° Observados os princí- ciências, letras e artes e a forma-
pios fundamentais da Constitui- ção de profissionais de nível
ção Federal, da Lei de Diretrizes universitário.
e Bases da Educação Nacional, a
escola obedecerá, em sua organi-
zação e em seus métodos, aos se- CAPÍTULO II
guintes objetivos: Da obrigatoriedade escolar
a) formação integral e equilí-
brio da personalidade do aluno, Art. 3.° O ensino primário é
promovendo-lhe o desenvolvimen- obrigatório a tôda criança entre
to intelectual, bem como o profis- sete e doze anos e só será minis-
sional especializado, esportivo ou trado na língua portuguesa.
físico; Parágrafo único. Para dar
b) ensino de técnicas, conheci- cumprimento ao disposto neste
mentos, habilidades, atitudes e artigo, o Diretor de Educação e
ideais, tendo em vista que não Cultura promoverá o levantamen-
somente a preservação de valores to anual das crianças em idade
tradicionais, mas também o pro- escolar e incentivará, por todos os
gresso social, constituem sua fina- meios ao seu alcance, a freqüên-
lidade ; cia às aulas.
c) profundamente enraizada Art. 4.° Ficam os oficiais do
nas condições geográficas, histó- registro civil obrigado a remeter,
ricas e sociais do Estado e do em janeiro de cada ano, ao Dire-
País, não poderá esquecer, entre- tor da Educação e Cultura, na
tanto, que a natureza humana Capital e à mais alta autoridade
regional em seu estilo e em suas escolar do município, no interior,
formas, tem finalidades univer- a relção das crianças de sete anos
sais e visa à completa fraterni- de idade registradas no seu car-
dade humana; tório.
d) deverá ser instituição de Art. 5.° A autoridade escolar
aprendizagem prática, utilizando competente determinará a matrí-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 73

cula compulsória das crianças que ensino primário gratuito para os


as escolas comportarem. seus servidores e os filhos destes.
Parágrafo único. Enquanto a § 1.° Quando os trabalhadores
matrícula não fôr total, serão não residirem próximo ao local
preferidas, para a matrícula com- de sua atividade, essa obrigação
pulsória, as crianças que tiverem poderá ser substituída por insti-
menos recursos e forem sadias. tuição de bôlsas-de-estudo de
Art. 6.° Não poderá exercer igual valor ao das concedidas pelo
função pública, nem ocupar em- Estado.
prego em sociedade de economia § 2.° As empresas de que
mista ou empresa concessionária trata o presente artigo deverão
do serviço público, o pai ou res- fazer prova do cumprimento da
ponsável por crianças em idade obrigação aqui imposta, a fim de
escolar, sem fazer prova anual que possam:
da matrícula e freqüência desta, a) transacionar com os órgãos
em estabelecimento de ensino ou, da administração estadual, autar-
a juízo da autoridade competente, quia ou entidades de economia
de que lhe está sendo ministrada mista em que o Estado seja por-
educação no lar. tador da maioria das ações;
Parágrafo único. Constituem b) participar de concorrência
casos de isenção, além de outros pública ou coleta de preços pelos
previstos em lei, quando devida- mesmos órgãos e entidades;
mente comprovados: c) pleitear ou receber favores,
a) estado de pobreza dos pais benefícios ou quaisquer auxílios
ou responsáveis; do Estado.
b) insuficiência de escolas; § 3.° As empresas que não
cumprirem o disposto no presente
c) matrículas encerradas; artigo ficarão sujeitas a uma mul-
d) doença ou anomalia grave ta anual equivalente ao triplo da
da criança. despesa realizada com o custeio
Art. 7.° Os pais ou responsá- e manutenção de uma escola pa-
veis serão responsabilizados pela drão que atenda à população es-
freqüência da criança à escola, colar de seus empregados.
sob pena de multa de 10% sôbre Art. 9.° Os proprietários ru-
o salário mínimo regional, que rais, que não puderem manter
poderá ser elevado até 50%. escola primária para crianças re-
Parágrafo único. Em caso de sidentes em suas glebas, deverão
terceira reincidência, o Diretor facilitar-lhes a freqüência às es-
de Educação a Cultura represen- colas mais próximas ou propiciar
tará ao Ministério Público pará a instalação e funcionamento de
promover a suspensão do pátrio escolas em suas propriedades.
poder, na forma da legislação Art. 10. Compete ao Departa-
federal. mento Estadual de Educação e
Art. 8.° As empresas indus- Cultura, com a cooperação das
triais, comerciais e agrícolas, em autoridades locais de ensino,
que trabalham mais de cem pes- zelar pelo cumprimento das de-
soas, são obrigadas a manter o terminações dêste capítulo.
74 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

CAPÍTULO III Art. 14. Ao Diretor de Edu-


Da Educação nos Estabelecimentos cação e Cultura cabe proceder ou
Particulares de Ensino determinar a inspeção periódica
dos estabelecimentos particulares
Art. 11. Todo estabelecimento de ensino, para o fim da conser-
particular de ensino, de qualquer vação do reconhecimento, do re-
grau ou ramo de educação e cul- gistro e da classificação pedagó-
tura fica sujeito a reconhecimen- gica do estabelecimento.
to e registro, que serão gratuitos,
Art. 15. A classificação peda-
no Departamento Estadual de
gógica do estabelecimento será
Educação e Cultura.
feita pela verificação dos requi-
§ 1.° O reconhecimento das sitos mínimos e demais condições
instituições de grau primário e atingidas pelo mesmo.
médio dar-se-á segundo as condi- § 1.° São condições mínimas
ções estabelecidas pelo Conselho para autorização do funciona-
Estadual de Educação e Cultura mento e o registro sob regime de
desde que o estabelecimento ve- inspeção prévia, pelo Departa-
nha funcionando, regularmente. mento Estadual de Educação e
por mais de dois anos. Cultura:
§ 2.° O registro provisório a) idoneidade moral, profis-
dar-se-á paralelamente à autori- sional e técnica do diretor e do
zação de funcionamento, e o re- corpo docente;
gistro definitivo, ao reconheci-
mento. b) instalações satisfatórias, es-
pecialmente uma biblioteca de
§ 3.° O registro de estabeleci- caráter escolar destinada a servir
mento particular de ensino supe- de centro de estudo, pesquisa e
rior visará a fornecer ao Depar- prática bibliográfica a alunos e
tamento Estadual de Educação
professôres com capacidade e
e Cultura os elementos de es-
acervo proporcionais à matrícula
tatística.
registrada;
Art. 12. O registro e o reco- c) garantia de remuneração
nhecimento serão negados, sus- condigna aos professôres;
pensos ou cassados após processo
regular, sempre que o estabeleci- d) observância dos demais pre-
mento não houver satisfeito aos ceitos legais.
requisitos mínimos estabelecidos § 2.° As normas para obser-
ou faltar idoneidade à entidade vância dêste artigo e parágrafo
mantenedora, aos diretores ou aos serão fixadas pelo Conselho Es-
professôres, cabendo recurso para tadual de Educação e Cultura.
o Conselho Estadual de Educa- Art. 16. Os estabelecimentos
ção e Cultura. particulares reconhecidos expedi-
Art. 13. O magistério nos es- rão certificados de conclusão de
tabelecimentos particulares de en- séries e ciclos, e diplomas de con-
sino de grau médio só poderá ser clusão de curso.
exercido por professôres devida- Art. 17. Não haverá distinção
mente registrados no órgão com- de direitos entre os estudos reali-
petente. zados em estabelecimentos oficiais
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 75

e os realizados em estabelecimen- de adultos ou supletivas e a ex-


tos particulares reconhecidos. cepcionais.
Art. 18. Os exames realizados Parágrafo único. No sistema
em estabelecimentos particulares de ensino se atenderá a varieda-
serão fiscalizados pela autoridade de dos cursos, a flexibilidade dos
currículos e a articulação dos di-
competente.
versos grau e ramos.
Art. 19. Poderá o Diretor de
Art. 21. Para fins de exten-
Educação e Cultura, devidamente
são educativa e cultural, o Estado
autorizado pelo Conselho Esta-
manterá instituições que atinjam
dual de Educação, celebrar con- os vários grupos da comunidade.
vênio de inspeção e fiscalização
com diretor de estabelecimento Art. 22. Todas as instituições
de educação regular e de exten-
particular.
são cultural serão organizadas
§ 1.° Na hipótese de efetivar- pelo Conselho Estadual de Edu-
se o convênio de inspeção, ficará cação e Cultura, mediante pro-
o diretor do estabelecimento res- posta do Diretor de Educação e
ponsável por todos os atos de Cultura, na medida dos seus re-
inspeção, sem prejuízo da correi- cursos financeiros e das possibili-
ção periódica realizada pelo Di- dades do meio.
retor de Educação e Cultura ou Parágrafo único. O ensino po-
por sua determinação. licial-militar será regulado por
§ 2.° No caso de verificar-se lei especial.
qualquer irregularidade no esta- Art. 23. O ensino religioso
belecimento de ensino será denun- constitui disciplina dos horários
ciado o convênio e procedida a das Escolas Oficiais, é de matrí-
apuração da responsabilidade do cula facultativa, e será ministra-
diretor respectivo, para os fins do, sem ônus para os poderes pú-
,de direito. blicos, de acordo com a confissão
religiosa do aluno, manifestada
por êle, se fôr capaz, ou pelo re-
presentante legal ou responsável.
TÍTULO II
§ 1.° Na feitura do horário os
Do Sistema de Ensino diretores dos estabelecimentos
oficiais de ensino ficam na obri-
gação de assegurar aos alunos
CAPÍTULO I matriculados uma aula semanal
Do Sistema de ensino religioso.
§ 2.° Para que a matrícula
Art. 20. O Estado organizará seja realmente facultativa:
um sistema contínuo e progressi- a) os pais ou responsáveis, no
vo de escolas, compreendendo ato da matrícula, manifestarão o
maternais, infantis, primárias, de credo religioso do candidato me-
grau médio e superior e, parale- nor de 18 anos.
lamente, escolas que se destinem b) os pais ou responsáveis, que
à complementação das anterior- não desejarem a freqüência do
ímente mencionadas a educação aluno às aulas do ensino religioso,
76 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

deverão notificá-lo, por escrito, Conselho Estadual de Educação


ao diretor do estabelecimento. e Cultura, e à aplicação, em me-
c) se o aluno já tiver comple- lhoramentos escolares, de qual-
tado 18 anos de idade, caberá a quer saldo verificado em seu ba-
êle próprio decidir sôbre a matrí- lanço anual.
cula para o curso de religião. § 2.° Em caso de extinção da
§ 3.° A formação da classe fundação, o seu patrimônio rever-
pará o ensino religioso independe terá ao Estado.
de número mínimo de alunos. § 3.° Lei especial fixará as
§ 4.° O registro dos professô- normas da contribuição dessas
res de ensino religioso será reali- fundações, a organização de seus
zado perante a autoridade reli- conselhos diretores e demais con-
giosa respectiva. dições a que fiquem sujeitas.
§ 5.° As normas do ensino
religioso serão estabelecidas pelo
Conselho Estadual de Educação CAPÍTULO II
e Cultura, em convênio com auto-
ridade religiosa competente. Da Educação de Grau Primário
Art. 24. É obrigatória a prá-
tica de educação física nos cursos
SEÇÃO I
primário e médio, até a idade de
18 anos, devendo seu exercício ser Da Educação Pré-Primária
motivo de regulamento específico
do Conselho Estadual de Educa- Art. 27. A educação pré-pri-
ção e Cultura. mária destina-se aos menores até
sete anos e será ministrada em
Art. 25. Os cursos de grau
classes maternais e infantis, ane-
primário e médio, que funciona-
xas às escolas primárias ou em
rem à noite, a partir das 18 escolas independentes, condicio-
horas, terão estrutura própria, nada, preferentemente, sua insta-
inclusive, a fixação de número lação às necessidades reais do
de dias de trabalho escolar efeti- meio, decorrentes das condições
vo, segundo as peculiaridades de de trabalho feminino.
cada curso.
Art. 28. As empresas que te-
Art. 26. O ensino em todos os nham a seu serviço mães de me-
graus e ramos pode ser ministra- nores de sete anos, serão estimu-
do em escolas públicas, mantidas ladas a organizar e manter, por
por fundações, cujo patrimônio e iniciativa própria ou em coope-
dotações sejam provenientes do ração com os poderes públicos,
Poder Público, ficando o pessoal, instituições de educação pré-pri-
que nestas servir, sujeito, exclu- mária.
sivamente, às leis trabalhistas.
§ 1.° Essas escolas, quando de
ensino médio ou superior, podem SEÇÃO II
cobrar anuidades, ficando sem- Do Ensino Primário
pre sujeitas à prestação de contas
perante o Tribunal de Contas do Art. 29. O ensino primário
Estado, com o parecer prévio do tem por fim o desenvolvimento
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 77

do raciocínio e das atividades de Art. 34. O ensino primário


expressão da criança e a sua in- oficial será gratuito, devendo ser
tegração no meio físico e social. regulamentada pelo Conselho Es-
Art. 30. A escola primária, tadual de Educação e Cultura a
nos núcleos urbanos de mais de distribuição de material escolar,
três mil habitantes, constituirá o inclusive livros para os alunos
centro de iniciação cultural da reconhecidamente pobres.
comunidade, mantendo, sempre Parágrafo único. A duração
que possível, uma biblioteca de normal do período escolar será de
finalidade escolar e pública, au- -1 ou 8 horas, diárias, de 180 a 240
ditório para radiodifusão e cine- dias letivos, não incluindo o tem-
ma, e outros agentes de informa- po reservado a exames.
ções, cursos e serviços de exten- Art. 35. Para as crianças que
são cultural. iniciarem o curso primário de-
Parágrafo único. Nas escolas pois dos sete anos, serão formadas
isoladas, haverá, além da classe, classes especiais, e para os maio-
pequena biblioteca escolar e área res de doze anos, serão criados
suficiente para trabalhos agríco- cursos supletivos corresponden-
las e atividades sociais. tes ao seu grau de desenvolvi-
mento.
Art. 31. Nos centros de gran-
de densidade urbana, a escola Parágrafo único. O ensino su-
poderá distribuir suas funções pletivo terá organização parti-
entre a "escola-classe", na qual cularmente flexível quanto a
se ministrará o ensino propria- tempo, horário e programas, bus-
mente dito, e o parque escolar, cando adaptar-se às necessidades
onde se proporcionará a educa- e conveniências dos alunos.
ção física e sanitária, compreen-
dendo recreação e jogos, princí-
pios de higiene e nutrição, educa- CAPÍTULO III
ção artística e de artes indus- Da educação de grau médio
triais.
Art. 32. O ensino primário
SEÇÃO I
será ministrado no mínimo em
cinco séries anuais. Do ensino médio
Parágrafo único. O Conselho Art. 36. A educação de grau
Estadual de Educação e Cultura médio, em prosseguimento à mi-
poderá estender sua duração até nistrada na escola primária, des-
seis anos, visando à ampliação tina-se à formação de adoles-
dos conhecimentos do aluno e sua centes.
iniciação nas técnicas de artes Art. 37. O ensino médio será
aplicadas, adequadas ao sexo, à ministrado em dois ciclos, o gi-
idade e ao meio. nasial e o colegial, e abrangerá.
Art. 33. A apuração do rendi- entre outros, os cursos secundá-
mento escolar será feita segundo rios, técnicos e normais.
normas a serem estabelecidas Art. 38. Em cada ciclo haverá
pelo Conselho Estadual de Edu- disciplinas e práticas educativas,
cação e Cultura. obrigatórias e Optativas.
78 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Art. 39. O Conselho Estadual vista o período do trabalho es-


de Educação e Cultura fixará o colar ;
currículo nos estabelecimentos I I I — Formação moral e cívica
oficiais, atendendo, tanto quanto do educando, através de processo
possível, à necessária flexibili- educativo de trabalho escolar;
dade. IV — Atividades complemen-
Art. 40. O ingresso na primei- tares de iniciação artística;
ra série do primeiro ciclo dos V — Instituições de orientação
cursos de ensino médio depende educativa e vocacional em coope-
de aprovação em exame de admis- ração com a família;
são, em que fique demonstrada VI — Freqüência obrigatória,
satisfatória educação primária só podendo prestar exame final
desde que o educando tenha onze em primeira época, o aluno que
anos completos ou venha a alcan- houver comparecido, no mínimo,
çar essa idade no correr do ano a 75% das aulas dadas.
letivo.
§ 1.° O exame de admissão a Art. 43. Nos estabelecimentos
que se refere êste artigo, quanto oficiais de ensino médio, será re-
à estrutura das matérias, progra- cusada a matrícula ao aluno re-
mas e execução, será organizado provado mais de uma vez em
pelo Conselho Estadual de Edu- qualquer série.
cação e Cultura. Parágrafo único. O Conselho
§ 2.° Entre outros requisitos Estadual de Educação e Cultura
para a inscrição no exame de ad- promoverá estudos para atender
missão à primeira série do 1.° as necessidades de readaptação
ciclo dos cursos de ensino médio, dos repetentes, sobretudo, dos
exigir-se-á, para os menores de mencionados neste artigo.
treze anos, obrigatoriamente, o Art. 44. A apuração do rendi-
certificado de conclusão do curso mento escolar ficará a cargo dos
primário. estabelecimentos de ensino, aos
Art. 41. Para matrícula na quais caberá expedir certificados
primenra série do ciclo colegial, de conclusão de séries e ciclos, e
será exigida a conclusão do ciclo diplomas de cursos.
ginasial ou equivalente. § 1.° Na avaliação do aprovei-
Art. 42. Na organização do tamento do aluno preponderarão
ensino de grau médio serão obser- os resultados alcançados, durante
vadas as seguintes normas: o ano letivo, nas atividades esco-
I — Duração mínima do perío- lares, asseguradas ao professor,
do escolar; nos exames e provas, liberdade de
a) cento e oitenta dias de tra- formulação de questões, dentro
balho escolar efetivo, não incluin- do programa estudado, e autori-
do o tempo reservado a provas e dade de julgamento.
exames: § 2.° Os exames serão presta-
b) vinte e quatro horas sema- dos perante comissão examinado-
nais de aulas para o ensino de ra, formada de professôres do
disciplinas e práticas educativas. próprio estabelecimento, e, se êste
II — Cumprimento dos pro- fôr particular, sob fiscalização da
gramas elaborados, tendo-se em autoridade competente.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 79

Art. 45. Será permitida aos Art. 52. Entre as disciplinas e


educandos a transferência de um práticas educativas de caráter
curso de ensino médio para outro optativo no 1.° e 2.° ciclos será
ou de um estabelecimento para incluída uma vocacional, dentro
outro, inclusive de escola de país das necessidades e possibilidades
estrangeiro, mediante adaptações locais.
previstas no sistema de ensino.
Art. 53. No ciclo ginasial serão
Art. 46. O Diretor da escola
ministradas nove disciplinas.
deverá ser educador qualificado.
Art. 47. Cada estabelecimento Parágrafo único. Além das
de ensino médio disporá, em re- práticas educativas, não poderão
gimento ou estatutos, sôbre sua ser ministradas menos de cinco
organização, constituição dos seus nem mais de sete disciplinas, em
cursos e seu regimento adminis- cada série das quais uma ou duas
trativo disciplinar e didático. devem ser Optativas e de livre
Art. 48. O magistério nos esta- escolha do estabelecimento para
belecimentos de ensino médio só cada curso.
poderá ser exercido por professô- Art. 54. Nas duas primeiras
res registrados no órgão compe- séries do ciclo colegial, além das
tente. práticas educativas, serão ensina-
das oito disciplinas das quais uma
ou duas Optativas de livre esco-
SEÇÃO II lha pelo estabelecimento, sendo
Do ensino secundário no mínimo cinco e no máximo
sete em cada série.
Art. 49. O Ensino Secundário, § 1.° Deverá merecer especial
em prosseguimento ao primário atenção o estudo de Português,
com a variedade e a flexibilidade em seus aspectos lingüísticos, his-
necessárias, visará: tóricos e literários, constituindo-
a) dar educação geral aos ado- se disciplina obrigatória em todas
lescentes, de ambos os sexos, fa- as séries do ensino médio.
cultando-lhes condições para o
desenvolvimento equilibrado e li- § 2.° A terceira série do ciclo
vre de sua personalidade e pre- colegial será organizada com cur-
pará-lo para a vida dentro da rículo diversificado que vise ao
realidade baiana e brasileira; preparo dos alunos para os cursos
b) orientá-los e instruí-los para superiores, e compreenderá, no
o acesso aos cursos superiores. mínimo quatro e, no máximo, seis
Art. 50. O ensino secundário disciplinas, podendo ser minis-
admite variedade de currículos, trada em colégios universitários.
segundo as matérias Optativas que Art. 55. Será permitida a in-
forem preferidas pelos estabeleci- clusão de mais uma série no ciclo
mentos, na forma da lei. colegial, com estrutura a ser re-
Art. 51. O ensino secundário gulamentada pelo Conselho Esta-
será ministrado em dois ciclos: o dual de Educação e Cultura.
ginasial, com a duração de quatro Art. 5G. Nas diversas discipli-
séries anuais, e o colegial com a nas e práticas educativas dêsses
duração de três, no mínimo. cursos deverá merecer especial
80 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

destaque o estudo da realidade das disciplinas específicas de en-


brasileira e baiana, em parti- sino técnico quatro do curso gi-
cular, nos seus aspectos históri- nasial secundário, sendo uma op-
cos, socioculturais e geo-econômi- tativa.
cos. § 2.° O segundo ciclo incluirá.
além das disciplinas específicas
do ensino técnico, cinco do curso
SEÇÃO I I I colegial secundário, sendo uma
Do ensino técnico optativa.
§ 3.° As disciplinas Optativas
Art. 57. O ensino técnico, de serão de livre escolha do estabe-
grau médio, abrange os seguintes lecimento, dentre as relacionadas
cursos: pelo Conselho Estadual de Edu-
a) industrial; cação e Cultura.
b) agrícola; § 4.° Nas escolas que mante-
c) comercial. nham cursos técnicos, poderá ha-
ver, entre o primeiro e o segundo
Parágrafo único. Os cursos ciclos, um curso pré-técnico de
técnicos de nível médio não espe- um ano, onde serão ministradas
cificados nesta Lei, bem como os as cinco disciplinas do curso co-
referidos no artigo 64 e seus pa- legial secundário.
rágrafos, serão regulamentados § 5.° No caso de instituição
pelo Conselho Estadual de Edu- do curso pré-técnico, previsto no
cação e Cultura. parágrafo anterior, no segundo
Art. 58. Para fins de validade ciclo industrial, agrícola e comer-
nacional, os diplomas dos cursos cial poderão ser ministradas ape-
técnicos de grau médio serão re- nas as disciplinas específicas do
gistrados no Ministério da Edu- ensino técnico.
cação e Cultura. Art. 60. Os cursos comerciais
Parágrafo único. Para fins de deverão ter centros de aplicação
levantamento estatístico, os esta- das disciplinas técnicas em forma
belecimentos de ensino técnico de departamentos e escritórios-
que tenham sede no Estado, en- modêlo, para dinamização do en-
caminharão, anualmente, ao Con- sino funcional.
selho Estadual de Educação e At. 61. Os estabelecimentos de
Cultura, a relação dos diplo- ensino técnico poderão, além dos
mados. cursos referidos no artigo ante-
Art. 59. Os cursos industrial, rior, manter cursos de aprendiza-
agrícola e comercial serão minis- gem, básicos ou técnicos, bem
trados em dois ciclos: o ginasial, como cursos de artesanato e de
com a duração de quatro anos, e mestria.
o colegial, no mínimo, de três Parágrafo único. Será permi-
anos. tido, em estabelecimentos isola-
§ 1.° As duas últimas séries dos, o funcionamento dos cursos
do primeiro ciclo incluirão, além referidos neste artigo.
Art. 62. As escolas técnicas, SEÇÃO IV
além dos cursos de grau médio de Do ensino normal
formação, p o d e r ã o ministrar
Art. 65. O Ensino Normal,
cursos de especialização e de
ramo de ensino de grau médio.
aperfeiçoamento, abertos aos gra- destina-se a:
duados de nível colegial-téenico. a) prover a formação do pes-
Art. 63. A formação de pro- soal docente necessário às escolas
fessôres, para as disciplinas espe- primárias e pré-primárias;
cíficas do ensino médio-técnico, b) habilitar administradores,
será feita em cursos especiais de orientadores e supervisores esco-
educação técnica mantidos pelo lares e formar especialistas desti-
Centro de Estudos Educacionais nados aos estabelecimentos de
e Aperfeiçoamento do Professora- ensino primário e pré-primário;
do e por entidades federais. e) capacitar o professor primá-
rio a integrar-se no meio geográ-
Parágrafo único. As escolas fico, social e econômico, onde vier
técnicas de comércio, autorizadas a exercer suas atividades, para
pelo Conselho Estadual de Edu- que possa promover a melhor in-
cação e Cultura e com a orienta- tegração dos alunos nesse meio e.
-ão e supervisão do CEEAP ou assim, o desenvolvimento sócio-
de entidade federal poderão man- cultural da comunidade.
ter cursos de formação de profes-
sôres para os cursos de comércio Art. 66. O Ensino Normal será
de primeiro e segundo ciclos, na ministrado em três tipos de esta-
conformidade dêste artigo. belecimentos :
Art. 64. As empresas indus- a) Escola Normal de grau gi-
triais, comerciais e agrícolas são nasial, estabelecimento que no
obrigadas a ministrar, em coope- interior do Estado, ministrará
ração com o Estado, a aprendi- tão-sòmente o primeiro ciclo do
zagem de ofícios e técnicas de tra- Ensino Normal.
balho aos menores seus emprega- b) Escola Normal de grau co-
dos, dentro das normas estabeleci- legial, estabelecimento que, na
das pelo Conselho Estadual de Capital ou no Interior, ministra-
Educação e Cultura. rá curso de segundo ciclo normal.
em seguida ao ciclo ginasial, ou
§ 1.° Os cursos de aprendiza- ambos os ciclos do Ensino Nor-
gem industrial, agrícola e comer- mal.
cial terão de uma a três séries c) Instituto de Educação, que,
anuais de estudos. além do primeiro e do segundo
§ 2.° Os portadores de carta ciclos do Ensino Normal, mante-
de ofício ou certificado de con- rá os cursos de especialização de
clusão do curso de aprendizagem magistério primário e de habili-
poderão matricular-se mediante tação de administradores, orien-
exame de habilitação, nos giná- tadores e supervisores escolares.
sios de ensino técnico, em série § 1.° Os cursos de especializa-
adequada ao grau de estudos a ção e de habilitação, de que trata
que hajam atingido no curso re- êste artigo, estarão abertos aos
ferido. graduados em escolas normais de
82 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

grau colegial, exigindo-se para os escolas primárias de todo o Es-


cursos de orientadores, superviso- tado.
res e administradores escolares, Parágrafo único. Os educan-
estágio mínimo de três anos no dos que concluírem a quarta série
magistério primário. do primeiro ciclo do Ensino Nor-
mal, poderão ingressar na pri-
§ 2.° Entre as condições mí-
meira série do segundo ciclo, . . .
nimas exigidas para o funciona- vetado.
mento de Escola Normal de grau Art. 69. O certificado de curso
ginasial ou de grau colegial, e de de especialização, ministrado por
Instituto de Educação, incluir-se- Instituto de Educação ou equiva-
á o funcionamento de uma escola lente, é requisito para inscrição
primária anexa, destinada à prá- em concurso para o magistério
tica dos professorandos e, nos primário especializado do Estado.
Institutos de Educação, também Art. 70. Nos Institutos de
à experimentação de métodos e Educação p o d e r ã o funcionar
técnicas. cursos pedagógicos, de nível supe-
§ 3.° A administração do En- rior, para formação de professô-
sino promoverá a criação de Esta- res do Ensino Normal, com dura-
belecimentos de Ensino Normal, ção de 4 (quatro) anos, dentro
com características próprias para das normas estabelecidas para as
Faculdades de Filosofia, visando
atender à formação de professô-
à formação específica nas maté-
res e orientadores e supervisores rias técnico-pedagógicas do Ensi-
pará as escolas rurais primárias, no Normal.
que lhes preservem a integração
Art. 71. Na complementação
no meio.
das disciplinas obrigatórias pará
Art. 67. O primeiro ciclo do o Ensino Normal, o Conselho Es-
Ensino Normal, constituído no tadual de Educação e Cultura
mínimo de quatro séries anuais, deverá levar em conta a necessi-
a última das quais de caráter dade de serem escolhidas maté-
prático e de iniciação ao tirocínio rias que atendam às realidades
didático, em que serão ministra- socioculturais, geo-econômicas e
das, além das disciplinas obriga- históricas da Bahia, dentro da
tórias do curso secundário-gina- realidade brasileira, e às moder-
sial, as matérias de preparação nas técnicas de ensino.
pedagógica, habilitará regentes Parágrafo único. O estudo do
de ensino primário para as esco- Português será obrigatório em
las do interior do Estado, exceto todas as séries dos cursos de
para as cidades com mais de cinco Ensino Normal.
(5) mil habitantes.
Art. 68. O segundo ciclo de
Ensino Normal, constituído de, CAPÍTULO IV
no mínimo, três séries anuais, a Da educação de grau superior
última das quais de caráter prá- estadual
tico e de iniciação ao tirocínio di-
dático, habilitará professôres pri- Art. 72. O ensino superior
mários para o provimento das tem por objetivo a pesquisa, o
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

desenvolvimento das ciências, le- cia de professôres e alunos, bem


tras e artes, e a formação de pro- como a execução dos programas
fissionais de nível universitário. de ensino.
Art. 73. O ensino superior § 1.° Será privado do direito
será ministrado em estabeleci- de prestar exames o aluno que
mentos agrupados ou não em deixar de comparecer a um míni-
universidades, com a cooperação mo de aulas e exercícios previs-
de institutos de pesquisa e cen- tos no regulamento.
tros de treinamento profissional.
§ 2.° Nos estabelecimentos ofi-
Art. 74. Nos estabelecimentos ciais será recusada a matrícula ao
de ensino superior podem ser mi-
aluno reprovado mais de uma vez
nistrados os seguintes cursos:
em qualquer série ou conjunto de
a) de graduação, aberto à ma-
disciplinas.
trícula de candidatos que hajam
concluído o ciclo colegial ou § 3.° O estabelecimento deve-
equivalente, e obtido classificação rá promover ou qualquer interes-
em concurso de habilitação; sado poderá requerer o afasta-
b) de pós-graduação, abertos à mento temporário do professor
matrícula de candidatos que ha- que deixar de comparecer, sem
jam concluído o curso de gradua- justificação, a 25% das aulas e
ção e obtido o respectivo di- exercícios, ou não ministrar pelo
ploma ; menos 3/4 do programa da res-
e) de especialização, aperfei- pectiva cadeira.
çoamento e extensão, ou quais- § 4.° A reincidência do pro-
quer outros, a juízo do respectivo fessor na falta prevista no pará-
instituto de ensino, abertos a can- grafo anterior importará, para
didatos com preparo e requisitos fins legais, em abandono do
que vierem a ser exigidos. curso.
Art. 75. O programa de cada Art. 78. Os diretores de esta-
disciplina, sob forma de plano belecimentos serão nomeados pelo
de ensino, será organizado pelo Diretor de Educação e Cultura,
respectivo professor e aprovado com aprovação do Conselho Esta-
pela congregação do estabeleci- dual de Educação e Cultura, den-
mento. tre professôres catedráticos efeti-
Art. 76. Será observado, em vos em exercício, eleitos em lista
cada estabelecimento de ensino tríplice pela Congregação respec-
superior, na forma dos estatutos tiva, em escrutínios secretos, com
e regulamentos respectivos, o ca- o mandato de dois anos, permi-
lendário escolar, aprovado pela tindo-se-lhes a recondução por
congregação, de modo que o pe- duas vezes.
ríodo letivo tenha duração míni- Art. 79. As Universidades
ma de cento e oitenta dias de tra- criadas pelo Estado reger-se-ão
balho escolar efetivo, não incluí- pela Legislação Federal específi-
do o tempo reservado às provas e ca, enquanto não forem conferi-
exames. das as atribuições de que trata o
Art. 77. Será obrigatória, em art. 15 da Lei de Diretrizes e
cada estabelecimento, a freqüên- Bases da Educação Nacional.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDACÓGICOS

84 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDACÓGICOS


Art. 80. A transferência de
alunos para Universidade Esta-
CAPÍTULO VI
dual será regulamentada pelo
respectivo C o n s e l h o Univer- Da Assistência Social Escolar
Educativa
sitário.
Art. 81. O corpo discente terá Art. 86. Em cooperação com
representação, com direito a voto, outros órgãos ou não, incumbe ao
nas congregações e conselhos de- Secretário de Educação e Cultu-
partamentais, na forma dos esta- ra, técnica e administrativamente
tutos do estabelecimento. prover fiscalizar e estimular os
serviços de assistência social, mé-
dico-odontológica e de enferma-
CAPÍTULO V
gem aos alunos.
Da educação de excepcionais Art. 87. A assistência social
escolar será prestada nas escolas,
Art. 82. Paralelas às escolas sob a orientação dos respectivos
do sistema regular de ensino, fun- diretores, através de serviços que
cionarão escolas especiais destina- atendam ao tratamento dos casos
das a alunos física ou mentalmen- individuais, à aplicação de técni-
te diferentes. cas de grupo e à organização so-
Art. 83. A educação de excep- cial da comunidade.
cionais deve, no que fôr possível, Art. 88. As escolas deverão
enquadrar-se no sistema geral de manter instituições beneficentes,
educação, a fim de integrá-los na tais como Caixa Escolar, Coope-
comunidade. rativa Escolar e congêneres.
Art. 84. O ensino especial,
conforme os casos, poderá ser
CAPÍTULO VII
proporcionado em classes anexas
a estabelecimentos comuns ou em Da Orientação Educativa
institutos independentes.
Parágrafo único. O Estado Art. 89. A formação do Orien-
dará preferência, nos limites da tador de Educação será feita em
sua capacidade financeira, ao de- cursos especiais que atendam às
ferimento de bôlsas-de-estudo condições do grau, do tipo de
para crianças excepcionais, reco- ensino e do meio social a que se
nhecidamente pobres e residentes destinam.
em localidades que não tenham Art. 90. A formação de Orien-
escolas do tipo previsto no artigo tadores de Educação para o en-
82, desta Lei. sino médio será feita em cursos
Art. 85. Tôda iniciativa priva- especiais nas Faculdades de Filo-
da, considerada eficiente pelo sofia, abertos aos licenciados em
Conselho Estadual de Educação Pedagogia, Filosofia, Psicologia
e Cultura, e relativa à educação ou Ciências Sociais, bem como aos
de excepcionais, receberá dos po- diplomados em Educação Física
deres públicos tratamento espe- pelas escolas superiores de educa-
cial, mediante bôlsas-de-estudo, ção física e aos inspetores fe-
empréstimos e subvenções. derais de ensino; e a formação
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 85

de Orientadores de Educação Educativa com o objetivo de com-


para o ensino primário será feita plementar e suplementar os tra-
em curso especial nos Institutos balhos dos Serviços de Orientação
de Educação, abertos aos diplo- Educativa.
mados em professor primário. Art. 94. Para auxiliar a ação
§ 1.° Entre outras condições educativa, todos os estabelecimen-
exigir-se-á, para o ingresso nos tos de ensino primário e médio
cursos de que trata êste artigo, organizarão associações de pais e
estágio mínimo de três anos no professôres.
magistério do respectivo grau. Parágrafo único. As associa-
§ 2.° Os candidatos aos cursos ções de pais e professôres unir-se-
de Orientadores de Educação se- ão em Federação, a qual será con-
rão selecionados, a fim de que siderada como entidade de utili-
haja adequação entre a persona- dade pública.
lidade e a função.
§ 3.° Os cursos de formação
de Orientadores de Educação de- TÍTULO I I I
vem ter a duração mínima de um Do Govêrno e Administração dos
ano para o estudo das disciplinas Serviços de Educação e Cultura
necessárias ao exercício da fun-
ção, e mais um ano para o estágio
supervisionado. CAPÍTULO I
§ 4.° Excepcionalmente, o es- Do Departamento Estadual de
tágio supervisionado poderá ser Educação e Cultura
simultâneo ao curso, contanto que
seja feito em trezentas horas no Art. 95. O controle e adminis-
mínimo. tração dos serviços de educação e
Art. 91. A Orientação Educa- cultura do Estado competem ao
tiva é obrigatória em todos os es- Departamento Estadual de Edu-
tabelecimentos do ensino primá- cação e Cultura, organizado sob
rio e médio, tanto oficiais como forma . . . ( vetado) autônoma,
particulares. técnica, administrativa e finan-
ceiramente.
Art. 92. Os estabelecimentos
de ensino primário e médio man- Art. 96. Constituem o Depar-
terão, sempre que possível, além tamento :
dos orientadores, um ou mais a) o Conselho Estadual de
assistentes sociais, visando à for- Educação e Cultura como órgão
mação da equipe completa de deliberativo;
Orientação. b) o Diretor de Educação e
Art. 93. Será criada uma re- Cultura como órgão executivo.
partição que supervisionará e co- Art. 97. A Presidência do
ordenará os trabalhos de Orienta- Conselho Estadual de Educação e
ção Educativa nos estabelecimen- Cultura cabe ao Secretário de
tos do ensino de grau primário e Estado encarregado nos Negócios
médio, mantendo uma ou mais da Educação, que exercerá sôbre
equipes completas de Orientação os serviços de educação e cultura
86 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

a supervisão geral que lhe é atri- além do seu presidente, de seis


buída pela Constituição do Esta- membros nomeados pelo Governa-
do, de maneira a não interferir dor do Estado, dentre pessoas de
na vida administrativa dos di- reputação ilibada, . . . (vetado)
versos órgãos, competindo-lhe, com aprovação do Poder Legis-
precipuamente: lativo.
I — fiscalizar o fiel e exato § 1.° Na escolha dos membros
cumprimento da Lei Orgânica do do Conselho, o Governador do Es-
Ensino ; tado deverá assegurar adequada
II — velar pela boa marcha dos representação aos diversos graus
negócios de educação e ensino de de ensino e do magistério da capi-
acordo com as deliberações do tal e do interior e, singularmente,
Conselho; do magistério particular.
I I I — apresentar, anualmente, (vetado).
ao Governador do Estado, e por § 2.° Será ainda nomeado um
intermédio dêste, à Assembléia suplente para cada conselheiro,
Legislativa, completa exposição em condições idênticas às dispos-
sôbre os negócios da educação e tas neste artigo e no parágrafo
cultura; anterior.
IV — exercer o direito de voto § 3.° O suplente, salvo nas
nas reuniões do Conselho, nos substituições por impedimento
casos de desempate ou de vota- ocasional, completa o mandato do
ção secreta. conselheiro substituído, nos casos
Art. 98. No uso das atribui- de morte, renúncia ou destitui-
ções previstas nos números I e II ção.
do artigo anterior, cabe ao Secre- Art. 101. O mandato de con-
tário solicitar os inquéritos admi- selheiro será de seis anos, reno-
nistrativos previstos nos artigos vando-se os membros do Conselho
106 e 128. por um terço, de dois em dois
Art. 99. O Centro de Estudos anos, permitida a recondução por
Educacionais e Aperfeiçoamento uma só vez.
do Professorado, . . . (vetado) Art. 102. O Diretor de Educa-
assessorará o Conselho Estadual ção e Cultura, os ex-Secretários
de Educação e Cultura. de Educação e os Técnicos de
Educação do Estado participarão
das reuniões do Conselho, sem
CAPÍTULO II
direito a voto.
Art. 103. Compete ao Conselho
Do Conselho Estadual de Estadual de Educação e Cultura:
Educação e Cultura
a) elaborar seu regimento in-
terno a ser aprovado pelo Gover-
SEÇÃO I nador do Estado;
Da organização e competência b) aprovar, por proposta do
Diretor de Educação e Cultura,
Art. 100. O Conselho Estadual os regulamentos e a orientação do
de Educação e Cultura compõe-se, ensino oficial e particular, den-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 87

tro das limitações expressas na possam ser adotadas pelos estabe-


Constituição Federal, nas leis de- lecimentos de ensino;
correntes desta, na Constituição i) aprovar o projeto do Dire-
do Estado e na presente Lei; tor de Educação e Cultura sôbre
c) aprovar o planejamento in- a distribuição das disdiplinas
tegral da educação e cultura obrigatórias fixadas para cada
para o Estado, elaborado pelo curso do sistema de ensino de
Diretor de Educação e Cultura, grau médio, dando especial rele-
graduando sua execução de acor- vo ao ensino de Português;
do com seus recursos financeiros; j) permitir aos estabelecimen-
d) aprovar a organização, os tos de ensino de grau médio es-
cursos de estudos e os quadros de colher livremente até duas disci-
pessoal docente e administrativo plinas Optativas para integrarem
do Departamento Estadual de o currículo de cada curso, de
Educação e Cultura e das escolas acordo com o parecer do Diretor
oficiais de todos os graus e ramos, de Educação e Cultura;
bem como de qualquer das insti- 1) aprovar a estrutura própria
tuições suplementares ou comple- dos cursos de ensino primário e
mentares do sistema regular e de médio que funcionarem à noite, a
extensão da educação e cultura partir das 18 horas;
do Estado; m) fixar o número e o valor
e) aprovar as nomeações, pro- das bôlsas-de-estudo a serem con-
moções, aposentadorias, exonera- cedidas pelo Poder Público, de
ções ou demissões dos membros do acordo com o curso médio do
magistério e dos funcionários dos ensino nos municípios e com o
serviços de educação e cultura grau de escassez de ensino oficial
mantidos pelo Govêrno do Es- em relação à população em idade
tado; escolar;
f) aprovar os estatutos das n) organizar as provas de ca-
universidades e escolas isoladas pacidade a serem prestadas pelos
superiores, estaduais; candidatos a bolsas, sob condi-
g) fixar as normas e requisi- ções de autenticidade e imparcia-
lidade que assegurem oportuni-
tos para autorização de funciona-
dades iguais para todos;
mento, reconhecimento e inspe-
ção dos estabelecimentos de ensi- o) aprovar o regulamento de
no primário e médio, exceto os renovação anual das bolsas;
pertencentes à União; p) aprovar os critérios de
h) indicar duas ou mais disci- adaptação necessários à efetiva-
plinas obrigatórias para o siste- ção de transferência de alunos:
ma de ensino médio, aprovar o de estabelecimentos de ensino mé-
projeto do Diretor de Educação dio para outro; de um estabeleci-
e Cultura, definindo a amplitude mento de ensino médio para ou-
e desenvolvimento dos seus pro- tro, bem como de escola de país
gramas em cada ciclo, e relacio- estrangeiro;
nar as disciplinas e práticas edu- q) referendar a autorização de
cativas de caráter optativo que funcionamento de cursos ou esco-
88 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

las experimentais de grau pri- cc) indicar ao Governador de-


mário ou médio, com currículo Estado para remessa à Assem-
métodos e períodos escolares pró- bléia Legislativa, o quantum do
prios ; vencimento do Diretor de Educa-
r) aprovar a estrutura e orga- ção e Cultura, pelo período de
nização dos cursos de aprendiza- seu mandato, sob a forma de
gem agrícola, industrial e comer- múltiplo do salário-mínimo vi-
cial administradas por entidades gente ;
agrícolas, industriais e comer- dd) elaborar anualmente o pla-
ciais nos têrmos da legislação vi- no de aplicação dos auxílios fe-
gente, bem como a prestação de derais e apresentá-lo ao Conselho
contas dessas entidades;
Federal de Educação;
s) opinar sôbre a transferência
ee) delegar a Conselhos Muni-
de instituto de ensino superior de
cipais de Ensino a superinten-
um para outro mantenedor, na
dência do exercício da função de
forma do art. 114 da Lei n. 4 024, educação e ensino, nos respecti-
de 20-12-1961; vos municípios, nos têrmos do
t) conhecer dos recursos inter- artigo 118 da Constituição do Es-
postos pelos candidatos ao magis- tado;
tério estadual e decidir sôbre ff) autorizar o Diretor de Edu-
eles; cação e Cultura a utilizar no pa-
u) decidir sôbre o funciona- gamento de juros e amortização
mento de estabelecimentos isola- de operações de crédito para
dos de ensino superior estadual; construção, reconstrução e apa-
v) pronunciar-se sôbre os rela- relhamento de escolas, além dos
tórios anuais dos estabelecimen- recursos previstos no artigo 150,
tos referidos na alínea superior; os recursos destinados no orça-
x) aprovar a incorporação de mento à construção e reconstru-
escolas ao sistema estadual de ção de prédios . . . (vetado);
ensino; gg) julgar recursos de atos dos
z) aprovar o regimento ou es- Conselhos Municipais de Ensino;
tatuto dos estabelecimentos de hh) propor à Assembléia Legis-
ensino médio; lativa a reforma desta Lei e as
aa) aprovar as normas elabo- leis necessárias ao desenvolvimen-
radas pelo Diretor de Educação to dos seus princípios e dire-
e Cultura, para que seja cumpri- trizes.
do o disposto no art. 51 da Lei Parágrafo único. Dependem
n.° 4 024, de 20 de dezembro de de homologação do Secretário de
1961; Educação e Cultura os atos com-
bb) apresentar anualmente à preendidos nas letras "a", "c",
Assembléia Legislativa, por inter- " d " "h", " v " e "x".
médio do Govêrno do Estado, a Art. 104. Os conselheiros serão
proposta orçamentária da despe- remunerados por sessão em quan-
sa relativa à educação e cultura, tia a ser fixada, anualmente, pelo
correspondente às dotações orça- Secretário de Educação, e terão
mentárias do Estado; direito a transporte e diárias, ar-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

bitradas estas por aquêle titular, prazo não excedente a noventa


quando residirem no interior do dias.
Estado ou quando viajarem a § 2.° Suspenso o Conselheiro,
serviço do Conselho. assumirá o cargo o respectivo su-
Parágrafo único. As funções plente.
de conselheiro são consideradas Art. 107. Concluído o inqué-
de relevante interesse estadual, e rito, assegurada a instrução con-
seu exercício tem prioridade sô- traditória, o seu presidente reme-
bre quaisquer cargos públicos terá o respectivo processo ao Se-
de que sejam titulares os conse- cretário de Educação.
lheiros. § 1.° Se a conclusão do inqué-
rito fôr pela inculpabilidade do
Art. 105. O mandato do Con- acusado e o Secretário de Edu-
selheiro será considerado extinto cação também assim o julgar,
antes do seu término nos seguin- mandará arquivar o processo.
tes casos: § 2.° Se o Secretário de Edu-
a) morte; cação julgar ter sido qualquer
b) renúncia; conclusão contra a prova dos
c) doença que exija o afasta- autos, submetê-la-á, com o seu
mento por mais de dois anos; respectivo relatório, ao parecer
d) ausência por mais de três do Conselho.
sessões consecutivas, sem motivo Art. 108. Concluindo o Conse-
justificado; lho pela culpabilidade, o Gover-
e) procedimento incompatível nador do Estado demitirá o Con-
com a dignidade da função; selheiro.
f) condenação por crime co- Art. 109. Se no parecer o
mum ou de responsabilidade; Conselho eximir de culpa o
acusado, o Secretário mandará
g) exercício de atividade polí- arquivar o processo.
tieo-partidária.
Parágrafo único. Vetado.
Art. 106. Nos casos em que SEÇÃO II
haja indícios de que algum Con- Da elaboração das normas
selheiro tenha incorrido no dis- deliberativas
posto na letra " e " do artigo an-
terior, o Secretário de Educação Art. 110. As deliberações do-
promoverá investigação reserva- Conselho Estadual de Educação
da para apuração dos fatos. e Cultura compreenderão:
§ 1.° Confirmados que sejam a) regulamentos;
os indícios referidos no artigo b) regimentos;
anterior, solicitará o Secretário c) resoluções;
de Educação ao Governador do d) instruções;
Estado a instauração de inquéri-
e) atos administrativos.
to administrativo, sob a presidên-
cia de autoridade por êste nomea- Art. 111. Vetado.
da, pedindo, ao mesmo tempo, a Art. 112. O direito de modi-
suspensão do Conselheiro por ficação e emenda das proposições
90 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

será exercido pelo Conselho, por d) a extensão do ensino para


maioria absoluta de votos. menores, além do período obriga-
Art. 113. O Diretor de Educa- tório, e para adultos, através de
ção e Cultura poderá apresentar escolas, cursos de extensão, clu-
emendas à deliberação do Con- bes, bibliotecas e outros meios
selho. adequados à promoção e difusão
Art. 114. Na discussão das pro- da cultura física, científica, artís-
tica e de informações em geral;
posições não haverá relator. Re-
cebidas pelo Presidente do Con- e) a proteção do patrimônio
selho e distribuídas as cópias aos natural, artístico e histórico do
conselheiros, designará êle a data Estado;
do julgamento, com três dias, f) a organização das institui-
pelo menos, de interstício, no qual ções de extensão cultural;
poderão ser apresentadas emen- g) os casos omissos na presente
das escritas. Lei.
Parágrafo único. O julgamen- Art. 117. Os regulamentos de
to será iniciado com uma exposi- que trata o artigo anterior, serão
ção do Diretor de Educação e submetidos à aprovação do Go-
Cultura. vernador, por intermédio do Se-
Art. 115. As deliberações do cretário, acompanhado de exposi-
Conselho só entrarão em vigor ção de motivos.
depois de publicadas no Diário Parágrafo único. O silêncio do
Oficial, e só serão obrigatórias Governador, depois de quinze
trinta dias depois da publicação, dias a partir da entrada do
salvo os atos administrativos e regulamento na Secretaria do
aquêles que tiverem a data de vi- Govêrno, importará na aprovação
gência expressamente fixada. tácita, devendo o Conselho fazê-
lo publicar no Diário Oficial, com
Art. 116. Os regulamentos su- a assinatura de todos os seus
jeitos à aprovação do Governador componentes.
do Estado, segundo dispõe o § 3.°
do artigo 119 da Constituição do Art. 118. Negando o Governa-
Estado, deverão dispor sôbre: dor sua aprovação no todo ou em
a) a organização do Departa- parte, o Secretário submeterá ao
mento Estadual de Educação e parecer do Conselho as razões da
Cultura; recusa.
b) as linhas gerais de organi- § 1.° Não concordando o Con-
zação e administração dos estabe- selho com essas rec\isas, devolverá
lecimentos oficiais de ensino e o Secretário ao Governador o
das instituições de cultura; processo respectivo com minucio-
c) os requisitos mínimos, sob o sas razões da divergência.
aspecto educacional e técnico a § 2.° Recusando o Governador
serem exigidos dos estabelecimen- do Estado as razões do Conselho,
tos municipais ou particulares em fará a publicação do regulamen-
que se ministre um dos diferen- to, escoimado dos dispositivos a
tes graus de educação, salvo que negou aprovação.
quanto aos estabelecimentos par- Art. 119. Se, dos regulamentos
ticulares de ensino superior; aprovados, resultar serviço ou
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 91

cargo que acarrete despesa exce- ministração escolar, quanto no


dente à dotação orçamentária, o dos métodos.
dispositivo em questão só entrará
em vigor após a aprovação da
verba necessária pela Assembléia CAPÍTULO III
Legislativa. Do Diretor de Educação e Cultura
Art. 120. Sôbre os projetos de
regulamentos elaborados pelo Di- Art. 125. O Diretor de Educa-
retor de Educação e Cultura, o ção e Cultura será nomeado pelo
Conselho poderá solicitar parecer Governador do Estado, dentre
de especialistas, de dentro ou de três pessoas de notório saber em
fora do Estado, reunidos ou não questões de ensino e educação . . .
em comissão, bem como o de asso- (vetado), eleitas pelo Conselho
ciações educacionais. Estadual de Educação e Cultura,
com o mandato de quatro anos.
Art. 121. Os projetos de nor-
mas deliberativas de interesse § 1.° Cada Conselheiro votará
geral, elaborados pelo Diretor de em três nomes, em c é d u l a
Educação e Cultura, serão publi- única, dactilografada, conside-
cados, pelo menos um mês antes rando-se indicados, entre os que
de sua inclusão em pauta para obtiverem um mínimo de quatro
deliberação, a fim de o Conselho votos, os três mais votados.
colher sugestões a respeito. § 2.° Os escrutínios se repeti-
Art. 122. Os requisitos míni- rão na mesma reunião, até que o
mos a que se refere o item " c " , mínimo fixado no parágrafo an-
do artigo 116, serão elevados, pe- terior seja conseguido.
riodicamente à medida que o pro- Art. 126. A lista tríplice será
gresso do ensino no Estado assim encaminhada ao Governador por
o indicar. intermédio do Secretário de Edu-
Art. 123. As instruções do cação, trinta dias antes do térmi-
Conselho disporão sôbre: no do mandato, com especifica-
a) programas para as escolas ção do número de votos obtidos
primárias e médias mantidas pelo e o "curriculum vitae" dos três
Estado; indicados.
b) compêndios cuja adoção seja Art. 127. O Diretor de Edu-
recomendada às referidas escolas; cação e Cultura só poderá ser
c) regimentos disciplinando a reconduzido uma vez no máximo.
administração dos estabelecimen- Art. 128. O Diretor será desti-
tos oficiais de ensino do Estado tuído, nos seguintes casos:
e dos Municípios. a) condenação por crime co-
Art. 124. A orientação e regu- mum ou de responsabilidade;
lamento do ensino deverão pro- b) abandono do cargo por mais
porcionar a necessária flexibili- de trinta dias;
dade evitando-se moldes rígidos c) procedimento incompatível
que impeçam a experimentação com a dignidade da função;
adequada, tanto no domínio do d) não prestar ou prestar mal
currículo, dos programas e da ad- as contas de sua gestão;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

92 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS


e) n e g l i g ê n c i a ou inca- Parágrafo único. O Diretor
pacidade ; perceberá, por comparecimento a
f ) a t i v i d a d e polítieo-par- sessão do Conselho, quantia igual
tidária. à que perceberem os conselheiros.
§ 1.° A destituição do Diretor Art. 130. Compete ao Diretor
será declarada pelo Conselho Es- de Educação e Cultura:
tadual de Educação e Cultura, a) iniciativa própria de proje-
pelo voto de 5 (cinco) dos seus tos e estudos que habilitem o
membros, sendo a seguir organi- Conselho a desempenhar as fun-
zada a lista tríplice a ser enca- ções discriminadas no artigo 103 ;
minhada ao Governador do Es- b) executar as leis do ensino,
tado. bem como as deliberações do Con-
§ 2.° No caso da letra "a", a selho Estadual de Educação e
destituição se consuma desde que Cultura:
passe em julgado a sentença con- c) velar pela observância das
denatória. leis do ensino e pelo cumprimen-
§ 3.° Nos casos das letras to das Decisões do Conselho;
" b " , " c " e "f", a destituição será d) promover o desenvolvimento
precedida de inquérito adminis- e aperfeiçoamento do ensino ofi-
trativo, assegurada ao acusado cial e particular;
instrução contraditória. e) promover os estudos neces-
§ 4.° No caso da letra "e", sários à definição de amplitude
a destituição independe de inqué- e desenvolvimento dos programas
rito, mas, para tornar-se efetiva, dos cursos de grau médio dentro
exigirá fundamentação. de cada ciclo;
§ 5.° O inquérito a que se re- f) administrar os serviços de
fere o § 3.° será presidido por educação, ensino e cultura, exer-
um dos conselheiros, que, após cendo inclusive o poder discipli-
sua conclusão, o submeterá, como nar e administrativo sôbre todo
relator, à decisão do Conselho o pessoal docente, discente, téc-
Art. 129. O Diretor compare- nico e administrativo do Depar-
cerá obrigatoriamente às sessões tamento ;
do Conselho, competindo-lhe: g) nomear, promover, aposen-
I — organizar a agenda das tar, exonerar ou demitir, com
sessões de sua convocação; aprovação do Conselho e de
II — apresentar e justificar as acordo com o respectivo estatuto,
proposições; os membros do Magistério e os
I I I — opinar sôbre as emendas funcionários do Departamento
e sugestões dos conselheiros; Estadual de Educação e Cultura;
IV — apresentar emendas;
h) representar o Departamento
V — opinar sôbre os recursos
Estadual de Educação e Cultura
de atos dos Conselheiros Munici-
em Juízo ou fora dele;
pais do Ensino;
VI — prestar quaisquer escla- i) convocar o Conselho;
recimentos que lhe forem solici- j) definir a política educacio-
tados pelo Secretário de Educa- nal do Estado a ser aprovada
ção ou conselheiros. pelo Conselho;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

REVISTA BRASILEIRA DE çam atividade'' político-partidárioa


1) elaborar o planejamento in-
tegral e os planos complementa-
res de educação e cultura;
§ 2.° Caberá ao Conselho Es-
m) planejar e organizar a tadual de Educação e Cultura
rede escolar; examinar a composição dos Con-
n) fixar anualmente o número selhos Municipais de Ensino,
de professôres e determinar a principalmente no que diz respei-
distribuição do pessoal; to à capacitação de seus membros,
o) exercer sôbre os serviços de como preliminar para a delage-
educação e cultura, oficiais e par- ção de atribuições e fixação de
ticulares, as funções de superin- sua extensão.
tendência, orientação e fiscaliza- Art. 134. O Fundo do Ensino
ção; Municipal será instituído . . .
p) vetado; (vetado), nos Municípios, que re-
q) praticar todos os atos ne- ceberem a delegação de que trata
cessários ao bom funcionamento o artigo 132, com os recursos mu-
e desenvolvimento dos serviços de nicipais previstos no art. 169 da
educação e cultura. Constituição Federal, pela contri-
Art. 131. Vetado. buição do Fundo de Educação,
na medida das necessidades que
forem conferidas ao Conselho
CAPÍTULO IV Municipal de Ensino, e pelos
auxílios e doações concedidos por
Dos Conselhos Municipais de instituição de direito público e
Ensino
privado.
Art. 135. Para a delegação de
Art. 132. Na forma do artigo
atribuições ao Conselho Munici-
118 da Constituição do Estado, o
pal de Ensino e constituição do
Conselho poderá delegar a supe-
Fundo de Ensino Municipal, o
rintendência do exercício da
Conselho Estadual de Educação e
função de Educação e Ensino, no
Cultura poderá firmar convênio
Município em que assim julgar
com a Prefeitura, autorizado por
conveniente, a um Conselho Mu-
Lei Municipal em que se estabe-
nicipal de Ensino.
leçam as obrigações do Município
Parágrafo único. Para a de- no que diz respeito à autonomia
legação de que trata êste artigo cio Conselho Municipal de Ensi-
será condição preliminar o cum- no, nos têrmos da Carta de De-
primento, por parte do municí- legação, e a obrigatoriedade do
pio, do disposto no artigo 169 da recolhimento das dotações desti-
Constituição Federal: nadas ao Fundo de Ensino Mu-
Art. 133. Os Conselhos Muni- nicipal.
cipais de Ensino serão compostos Art. 136. Sob pena de revoga-
d e . . . (vetado) membros . . . (ve- ção da Carta de Delegação, o
tado), escolhidos entre pessoas de Conselho Municipal de Ensino
reputação ilibada e reconhecido deverá apresentar, até 15 de ju-
espírito público, que não exer- lho, a proposta orçamentária do
94 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

exercício seguinte e, até 30 de VII — auxílios e subvenções


janeiro de cada ano, a prestação concedidas pelo Govêrno Federal;
de contas do exercício anterior, VIII — dotações de particula-
pará exame e aprovação do Con- res e de instituições de direito
selho Estadual de Educação e público e privado;
Cultura.
IX — Taxa Escolar, na forma
Art. 137. Vetado. defenida nesta lei.
Art. 1.38. Vetado.
Parágrafo único. Para dar
§ 1.° Vetado.
cumprimento ao disposto neste
§ 2.° Vetado.
artigo, o Estado anualmente in-
§ 3.° Vetado.
cluirá em seu orçamento os re-
cursos destinados ao Fundo de
TÍTULO IV Educação.
Do Financiamento dos Serviços de Art. 140. Os r e c u r s o s de
Educação e Cultura Fundo de Educação, de origem
orçamentária estadual, serão re-
colhidos aos seus cofres, por
CAPÍTULO I trimestres, com a necessária ante-
cedência.
Do Fundo de Educação
Parágrafo único. O Estado
Art. 139. "O Funda de Educa- abrirá, no Banco do Fomento do
ção" será constituído pelos se- Estado da Bahia S. A., conta-
guintes recursos: corrente garantida até o limite
I — vinte por cento, no míni- do adiantamento trimestral, a
mo, da renda resultante dos im- favor do Departamento Estadual
postos estaduais de acordo com o de Educação e Cultura para ser
disposto no artigo 169 da Consti- movimentada pelo administrador
tuição Federal; do Fundo de Educação, e sempre
que o recebimento trimestral pre-
II — produto de todas as mul-
visto, neste artigo, não fôr feito
tas do Estado que não tiverem
dentro dos oito primeiros dias do
destino especial, das estabelecidas
tremestre.
nesta lei e de outras que venham
a ser estabelecidas para o cumpri- Art. 141. Sempre que o Esta-
mento das leis e regulamentos do não recolher, no prazo devido,
relativos aos serviços de educação os recursos a que se refere o ar-
e cultura; tigo 139, ficará o Govêrno do
I I I — Vetado. Estado obrigado a fazer opera-
IV — produto do adicional de ções de crédito por antecipação
dez por cento sôbre os impostos da receita para pagamento do
de sucessão causa mortis; pessoal e da manutenção dos
V — juros bancários prove- serviços.
nientes dos depósitos do Fundo Art. 142. O Secretário de
de Educação; Educação e Cultura será o admi-
VI — produto das rendas pro- nistrador do Fundo de Educação,
venientes da capitalização da re- função que exercerá dentro das
serva patrimonial; condições estabelecidas nesta lei.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 95

Art. 143. Ao Secretário de Art. 145. Os recursos do Fun-


Educação e Cultura, como admi- do de Educação serão aplicados
nistrador do Fundo de Educação, exclusivamente nos serviços de
ouvido o Conselho de Educação e educação e cultura, não podendo
Cultura, incumbe promover, por a despesa com funcionários admi-
todos os meios, o recolhimento dos nistrativos exceder de dez por
seus recursos, propor a criação cento da fixada para os funcio-
de outros, bem como, depois de nários técnicos e docentes, e a
aprovação da Assembléia Legisla- despesa total de pessoal ser su-
tiva, por alienação, troca ou per- perior a setenta por cento do or-
muta, melhorar as condições do çamento de custeio, correspon-
Fundo de Educação em relação dente a dotações orçamentárias
aos seus bens móveis e imóveis. dos referidos serviços.
Art. 144. Os recursos do Fun- Parágrafo único. Os recursos
do de Educação poderão ser pos- públicos destinados à educação
tos em conta-corrente, a render primária serão distribuídos em
juros no Banco de Fomento do" têrmos de equidade e de genera-
Estado da Bahia S. A., na parte lidade, de forma a propiciar às
que constituírem reserva patri- populações municipais oportuni-
monial, nos têrmos do parágrafo dades iguais, sendo vedada, sob
§ 5.° do artigo 119 da Constitui- pena de responsabilidade, destri-
ção do Estado, aplicados à com- buição que favoreça um municí-
pra de apólices, outros títulos pio em prejuízo dos outros.
públicos, ações de sociedade de Art. 146. Todos os prédios e
economia mista e paraestatais. terrenos das escolas e instituições
§ 1.° Nenhuma parcela dêsses públicas do ensino, educação e
recursos poderá ser aplicada, cultura constituirão patrimônio
mesmo provisoriamente, para fins do Fundo de Educação e terão,
. diversos dos previstos na Consti- pará isto, tombamento especial.
tuição e nesta Lei, sob pena de Art. 147. O Diretor de Edu-
responsabilidade solidária dos cação e Cultura poderá, ouvido o
funcionários que ordenarem ou Conselho, e com autorização do
executarem qualquer aplicação Governador do Estado, fazer ope-
indevida. rações de crédito para construção,
§ 2.° Os recursos patriominais reconstrução e aparelhamento de
escolas, utilizando os recursos es-
do Fundo de Educação e os pro-
pecialmente destinados a êste fim
venientes das rendas especiais
no orçamento do Departamento
previstas nesta Lei poderão ser
Estadual de Educação e Cultura.
empenhados até 80%, no paga-
mento dos juros e amortização de Art. 148. Vetado.
empréstimos contraídos p a r a Art. 149. O Conselho Estadual
aquisição de terrenos, construção de Educação e Cultura poderá
ou reconstrução de prédios esco- pedir colaboração de qualquer
lares e no aparelhamento das es- personalidade de influência so-
colas públicas e financiamento cial, cooperação, especialmente de
decorrente da cooperação finan- diretores ou membros de associa-
ceira da União. ções de classe, diretores de gran-
96 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

des empresas idôneas, represen- o) Auxílio às instituições par-


tantes de sociedades científicas ticulares de educação e de cul-
ou técnicas e outras, cuja contri- tura ;
buição venha a facilitar seus pro- p) Diversos.
pósitos. Art. 152. A proposta orçamen-
tária será acompanhada de fun-
damentação pormenorizada.
CAPÍTULO II Art. 153. A Secretaria da Fa-
Do orçamento zenda informará ao Diretor de
Educação e Cultura, em época
própria, o total dos recursos que
SEÇÃO I no ano seguinte poderão ser des-
Da apresentação da proposta tinados aos serviços de educação
orçamentária ao Govêrno e cultura, de acordo com a pre-
visão da receita e tendo em
Art. 150. A proposta orçamen- vista os limites mínimos das re-
tária a que se refere o item " b b " ceitas vinculadas de que trata o
do artigo 103 será encaminhada artigo 139.
ao Chefe do Executivo, dentro do
prazo que fôr fixado para os ou-
tros serviços do Estado. SEÇÃO II
Art. 151. As verbas constan- Da elaboração orçamentária
tes da lei orçamentária serão glo- interna
bais, correspondendo às seguintes
especificações: Art. 154. Publicada a lei or-
a) Departamento Estadual de çamentária do Estado e recebida
Educação e Cultura; do Departamento das Municipa-
b) Ensino Pré-Primário; lidades a relação das dotações
c) Ensino Primário; orçamentárias municipais desti-
d) Ensino Secundário; nadas ao Fundo de Educação, o
e) Ensino Técnico; Secretário de Educação e Cultu-
f) Ensino Normal; ra, até 1.° de fevereiro, submete-
g) Ensino Superior; rá ao Conselho Estadual de Edu-
h) Ensino de Excepcionais; cação e Cultura a proposta orça-
i) Ensino Supletivo; mentária interna dos serviços de
j) Pesquisa, estudos educacio- educação e cultura, incluindo na
nais e aperfeiçoamento do magis- receita, além das dotações orça-
tério e funcionários; mentárias estaduais e municipais,
1) Instituições oficiais de cul- todos os demais recursos pre-
tura ; vistos.
m) Serviço de difusão e exten- Parágrafo único. A proposta
são cultural; orçamentária de que trata êste
n) Auxílio aos municípios, com artigo será discriminada em ver-
observância do critério estipulado bas, obedecendo à técnica orça-
no parágrafo único do artigo 145 mentária vigente para o poder
,desta lei; público estadual ou a outra que
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 97

se julgar mais eficaz e útil para financeiro anterior, com especifi-


o serviço. cação minuciosa.
Art. 155. Pica o Departamento § 1.° Examinando a prestação
das Municipalidades obrigado a de contas, o Conselho Estadual
apresentar ao Departamento Es- de Educação e Cultura poderá
tadual de Educação e Cultura, pedir ao Diretor de Educação e
até 15 de janeiro de cada ano, a Cultura os esclarecimentos que
relação das dotações orçamentá- julgar necessários, e êste, se não
rias municipais de educação des- puder prestá-los no ato, pedirá
tinadas ao Fundo de Educação. prazo razoável para atendê-los.
Art. 156. A proposta orçamen- § 2.° Aprovada ou não a
tária será distribuída pelos Con- prestação de contas pelo Conselho
selheiros para apresentação de Estadual de Educação e Cultura,
emendas dentro do prazo de três será a mesma encaminhada jun-
dias, findos os quais, entrará em tamente com a resolução do Con-
pauta para deliberação em dis- selho, por intermédio do Gover-
cussão única. nador do Estado, ao Tribunal de
Art. 157. Aprovado o orça- Contas, pará julgamento.
mento, será êle publicado no § 3.° Se as resoluções do Con-
Diário Oficial do Estado, até 1.° selho Estadual de Educação e
de março. Cultura e do Tribunal de Contas
Parágrafo único. O exercício negarem aprovação, o Diretor de
financeiro começará a 1.° de ja- Educação e Cultura será desti-
neiro e terminará no último dia tuído, sem prejuízo das ações pe-
do mês de dezembro. nais e civis cabíveis.
Art. 158. Na execução do orça-
mento não poderá o Diretor de
Educação e Cultura, sem autori- TÍTULO V
zação da Assembléia Legislativa:
Dos Professôres e Funcionários e dos
a) praticar, em cada caso, es- Órgãos Colegiados
torno de verba orçamentária;
b) aplicar as receitas não in-
cluídas no orçamento interno do CAPÍTULO I
Departamento de Educação e
Dos Professôres e Funcionários
Cultura.
Art. 160. As funções de ma-
gistério, no ensino de grau pri-
SEÇÃO I I I mário e médio, só serão permiti-
Da Prestação de Contas das a professôres habilitados na
forma da lei e registrados no De-
Art. 159. Até o dia 1.° de fe- partamento Estadual de Educa-
vereiro de cada ano, o Diretor ção e Cultura.
de Educação e Cultura fará Art. 161. O magistério do en-
prestação de contas ao Conselho sino primário só poderá ser exer-
Estadual de Educação e Cultura cido por Professor Primário e
através de balanço definitivo da Regentes do Ensino Primário nos
receita e da despesa do exercício têrmos desta Lei.

7
98 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Art. 162. O magistério do en- Art. 166. Será gratificado o


sino médio só poderá ser exercido exercício de funções ou encargos
por Licenciados por Faculdades que importem em responsabilida-
de Filosofia, segundo os cursos de ou trabalho além dos ineren-
em que se diplomaram, nas con- tes a cada cargo ou função, na
dições da presente Lei, e : forma a ser estabelecida no esta-
a) nas cadeiras específicas do tuto dos professôres e funcioná-
curso normal, também, pelos di- rios do Departamento Estadual
plomados nos cursos de nível su- de Educação e Cultura.
perior ministrados pelos Institu- Art. 167. Nenhum professor
tos de Educação; ou funcionário poderá ser nomea-
b) nas cadeiras específicas dos do em caráter efetivo para o De-
cursos técnicos, pelos habilitados partamento Estadual de Educa-
nos cursos especiais de formação ção e Cultura sem que antes se
de professôres de ensino técnico; tenha habilitado em concurso es-
pecífico de provas e títulos, para
e) nas cadeiras não incluídas
neste artigo e em alíneas anterio- os cargos docentes e técnicos, e,
res, os habilitados na forma da apenas de provas, para os cargos
Lei. administrativos.
Art. 163. Os funcionários do Parágrafo único. Para o pro-
Departamento Estadual de Edu- vimento efetivo de cargos docen-
cação e Cultura serão classifica- tes, o Conselho Estadual de
dos em docentes, técnicos e admi- Educação e Cultura exigirá tam-
nistrativos, segundo as funções bém a prova de estágio.
que exerçam, e terão seus direitos Art. 168. Os cargos de Inspe-
e deveres fixados em estatuto tor de Ensino serão privativos
próprio, aprovado pelo Conselho dos professôres diplomados no
Estadual de Educação e Cultura, grau de ensino para que se desti-
onde se procurará atender às pe- nem, escolhidos em concurso de
culiaridades dos serviços. títulos e provas em que se verifi-
Art. 164. Os funcionários do- quem a habilitação técnica e pe-
centes, técnicos e administrativos dagógica, exigindo-se ainda do
do Departamento Estadual de candidato, pelo menos, três anos
Educação e Cultura terão garan- de experiência docente.
tias análogas às dos funcionários Art. 169. Os cargos de Orien-
públicos. tador Educativo, para o Ensino
Art. 165. Fica estabelecido o Primário e para o Ensino Médio,
princípio da remuneração pro- serão privativos dos diplomados
gressiva para os funcionários do- nessa profissão, dentro de cada
centes, técnicos e administrativos especialidade e registrados no
do Departamento Estadual de Departamento Estadual de Edu-
Educação e Cultura, na forma a cação e Cultura, na forma da Lei.
ser adotada em regulamentos, de Art. 170. O acesso aos demais
maneira a assegurar remuneração cargos técnicos do Departamen-
condigna e estímulo eficaz ao seu to Estadual de Educação e Cul-
constante aperfeiçoamento. tura será regulamentado pelo
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 99

Conselho Estadual de Educação tação secreta, anualmente, esco-


e Cultura, na forma d Lei. lherão seus respectivos chefes.
Art. 171. A direção de esta- Art. 174. Aos Departamentos
belecimento oficial de ensino só compete precipuamente dar uni-
poderá ser exercida por brasilei- dade didática aos programas, cor-
ro nato, funcionário efetivo, pro- relacionando os planos de curso
fessor registrado para o ensino e seus desenvolvimentos.
no grau mais elevado que possuir Art. 175. Em todo estabeleci-
o estabelecimeuto e tiver, . . . (ve- mento oficial de grau médio fun-
tado) experiência docente, e sen- cionará um Conselho Docente,
do registrado no Departamento constituído pelos Chefes dos De-
Estadual de Educação e Cultura. partamentos, e será presidido
§ 1.° Para a Direção do Esta- pelo Diretor do Estabelecimento
belecimento oficial de ensino mé- ou por seu substituto legal.
dio incorporado à Polícia Militar, Parágrafo único. Pará parte
exigir-se-á, além das condições integrante do Conselho Docente
dêste artigo, a de ser oficial su- um orientador educativo eleito,
perior daquela Corporação, indi- anualmente, pelos seus pares.
cado pelo Comando Geral.
Art. 176. Ao Conselho Docente
§ 2.° A concessão do registro compete, além de outras atribui-
de que trata o presente artigo
ções fixadas pelo Conselho Esta-
será regulamentada pelo Conse-
dual de Educação e Cultura:
lho Estadual de Educação e Cul-
tura, dentro dos requisitos aqui a) elaborar e reformar o re-
exigidos além de outros que jul- gimento interno do estabeleci-
gar convenientes. mento ;
Art. 172. O Departamento Es- b) indicar as disciplinas Opta-
tadual de Educação e Cultura tivas a serem adotadas pelo esta-
manterá cursos permanentes de belecimento, de acordo com as
aperfeiçoamento e atualização resoluções do Conselho Estadual
para professôres e funcionários, de Educação e Cultura sôbre
de freqüência obrigatória, na for- o assunto:
ma que dispuser o Conselho Es- c) orientar pedagogicamente
tadual de Educação e Cultura. todo trabalho escolar, sugerindo
ao Diretor as medidas que julgar
necessárias para o melhor desen-
CAPÍTULO II volvimento do ensino.
Dos órgãos Colegiados Art. 177. Nos estabelecimentos
oficiais de ensino médio onde
Art. 173. Picam criados, em haja Congregação não se aplica
todos os estabelecimentos oficiais êste Capítulo.
de ensino de grau médio, Depar- Art. 178. Os estabelecimentos
tamentos pedagógicos que reuni- particulares de ensino poderão
rão professôres de uma mesma adotar as disposições dos artigos
disciplina, ou disciplinas afins, e anteriores referentes ao Conselho
de prática educativa, que, em vo- Docente e aos Departamentos.
100 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

TÍTULO VI gial do curso secundário aos


maiores de dezenove anos.
Das Instituições Culturais
§ 2.° Os exames, de que trata
o presente artigo, serão regula-
CAPÍTULO ÚNICO mentados pelo Conselho Estadual
de Educação e Cultura e reali-
Art. 179. Para fins de exten- zados nos Estabelecimentos por
são cultural, o Estado estimulará êle indicados.
a criação de Instituições e pro- Art. 182. O Departamento Es-
moverá, nos limites de suas pos- tadual de Educação e Cultura
sibilidades, meios para o desen- instituirá e amparará serviços e
volvimento das ciências e artes. entidades que mantenham, na
Art. 180. As instituições de zona rural, escolas ou centros de
extensão cultural compreenderão, educação, capazes de proceder à
dentre outras, as seguintes: adaptação do homem ao meio e
ao estímulo de vocações e ativida-
a) Biblioteca: Públicas, Espe- des profissionais.
cializadas, Escolares e Infantis;
b) Serviços de Divulgação, Te- Art. 183. O exercício do ma-
le-rádio-Difusão, Cinema Educa- gistério de grau primário por
professor diplomado em outro
tivo e Difusão Cultural e Artís-
Estado será regulamentado pelo
tica:
Conselho Estadual de Educação
c) Teatros; e Cultura.
d) Museus;
Art. 184. O Estado estimulará
e) Parques escolares. a prática da educação musical
Parágrafo único. As bibliote- nos cursos primários e médios.
cas infanto-juvenis serão manti-
Art. 185. Será permitida a
das e instaladas segundo as dispo-
organização de cursos ou escolas
sições da Lei n. 1.262, de 9 de
experimentais, com currículos,
março de 1960, e legislação sub- métodos e períodos escolares pró-
seqüente. prios, dependendo seu funciona-
mento, para fins de validade
legal, de autorização do Conselho
TITULO VII Estadual de Educação e Cultura.
Disposições Gerais Art. 186. Os cursos de apren-
dizagem agrícola, industrial e co-
Art. 181. Aos maiores de de- mercial, admiaistrados por enti-
zesseis anos será permitida a ob- dades agrícolas, industriais e co-
tenção de certificado de conclu- merciais, nos têrmos da legisla-
são do ciclo ginasial do curso ção vigente, serão submetidos ao
secundário, mediante a prestação Conselho Estadual de Educação
de exames de madureza, após es- e Cultura.
tudos realizados sem observância Parágrafo único. Anualmente
de regime escolar. as entidades responsáveis pelo
§ 1.° Nas mesmas condições ensino de aprendizagem agrícola
permitir-se-á obtenção do certifi- industrial e comercial apresenta-
cado de conclusão do ciclo cole- rão ao Conselho Estadual de
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 101

Educação e Cultura o relatório ria da Fazenda e, cumulativa-


de suas atividades, acompanhado mente, às autoridades do Ensino
de prestação de contas. em cada Município.
Art. 187. Um "Livro de Hon- § 4.° O não recolhimento da
ra" do Fundo de Educação será TAXA ESCOLAR, cada mês, im-
criado para registro dos nomes plicará em multa variável de
de todos os que devem ser consi- Cr$ 1.000,00 a Cr$ 10.000,00, do-
derados seus beneméritos, por brada nos casos de reincidência
doações, legados, fundações de e nas proibições constantes das
qualquer espécie ou serviço de letras " a " a " c " , do § 2.° do art.
inestimável valor. 8.° desta Lei.
Art. 188. O poder público es- § 5.° Da renda resultante, ses-
tadual estimulará a colaboração senta por cento serão entregues
popular em favor das fundações aos Municípios, proporcionalmen-
e instituições culturais e educati- te à sua . . . (vetado) população,
vas de qualquer espécie, nível ou nos têrmos estabelecidos no regu-
grau, sem finalidades lucrativas, lamento desta Lei.
prestando-lhes ajuda financeira. § 6.° Os Municípios prestarão
Art. 189. Fica criada a TAXA contas, até 31 de dezembro de
ESCOLAR destinada à suple- cada ano, dos recursos recebidos
mentação do custeio do Ensino à conta da TAXA ESCOLAR
Profissional, devida pelas empre- que somente poderão ser aplica-
sas industriais, comerciais e agrí- dos em despesas de vencimentos
colas de qualquer natureza — de Professôres, onde inexistam
pessoas físicas ou jurídicas — escolas públicas estaduais ou elas
sujeitas a contribuição da Previ- sejam, a critério das autoridades
dência Social, inclusive as que se estaduais, insuficientes.
beneficiam com isenção de impos- Art. 190. Para os efeitos da
tos estaduais. cobrança da TAXA ESCOLAR
§ 1.° A TAXA ESCOLAR considera-se o capital subscrito e
incidirá sôbre a folha de paga- recursos, exceto os obrigatórios
mento de pessoal das referidas por lei.
empresas, da seguinte forma: Art. 191. Nos Municípios limí-
a) um por cento em relação trofes com outros Estados será
às empresas de capital até vinte permitida a organização do ensi-
milhões de cruzeiros; no normal, com currículos pró-
b) dois por cento em relação prios e ciclo equivalente ao ado-
às empresas de capital superior tado na cidade circunvizinha, su-
a vinte milhões de cruzeiros . . . jeito seu funcionamento a instru-
(vetado) ; ções julgadas oportunas e conve-
c) vetado. nientes, baixadas pelo Conselho
§ 2.° A TAXA ESCOLAR de Educação e Cultura.
será recolhida, mensalmente, com Art. 192. Nas Faculdades de
os impostos e taxas estaduais de- Filosofia e nos Institutos de Edu-
vidos pelas empresas. cação serão criados, para a for-
§ 3.° A fiscalização da TAXA mação de técnicos de educação,
ESCOLAR competirá à Secreta- cursos especiais a que terão aces-
102 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
so os titulares desse cargo, com à aprovação da Assembléia Le-
estágio mínimo de 3 anos no ma- gislativa.
gistério. Parágrafo único. Enquanto
Parágrafo único. Aos alunos não fôr aprovado o estatuto de
que concluírem o curso a que se que trata êste artigo, os funcio-
refere o presente artigo será fa- nários do Departamento Esta-
cultada matrícula na primeira dual de Educação e Cultura fi-
série das Faculdades ou dos Ins- carão submetidos ao Estatuto dos
titutos de Educação, desde que Funcionários Públicos Civis do
aprovados em concurso de ad- Estado.
missão. Art. 199. Os atuais funcioná-
Art. 193. A escola deverá exis- rios docentes, técnicos e adminis-
tir profusamente disseminada, trativos dos serviços de educação
atendendo sua localização à dis- e cultura serão transferidos ao
tribuição demográfica e à situa- Departamento Estadual de Edu-
ção econômica regional — . . . cação e Cultura.
Vetado. § 1.° Vetado.
§ 2.° É vedado aos funcioná-
TÍTULO V I I I rios referidos no presente artigo
exercer, sob regime de requisição
Disposições Transitórias ou de disposição, qualquer outra
função pública estranha ao servi-
Art. 194. Ficam transferidos ço de educação e cultura, salvo o
à subordinação do Departamento desempenho de cargos em comis-
Estadual da Educação e Cultura são, sob pena de perda do cargo.
todas as escolas civis, serviços e Art. 200. Os titulares de cargos
instituições de educação e cultu- públicos que forem extintos por
ra, de qualquer grau ou nature- se tornarem desnecessários, em
za, mantidos pelo Estado. face desta Lei, serão aproveitados
Art. 195. Vetado. em função análoga ou correlata.
Parágrafo único. Vetado. Art. 201. Durante o ano de
Art. 196. Fica o Secretário de 1963, o Conselho Estadual de
Educação e Cultura autorizado a Educação e Cultura fica autoriza-
p r a t i c a r . . . vetado — atos neces- do a estabelecer uma estrutura de
sários à constituição do Conselho emergência pará os vários graus
Estadual de Educação e Cultura de ensino, devendo, sempre que
e à sua instalação. julgar conveniente, tomar por
Art. 197. As primeiras nomea- analogia a legislação específica
ções de Conselheiro far-se-ão por Federal.
dois, quatro e seis anos. Art. 202. A regência de classe
Art. 198. O Diretor de Educa- de alfabetização, nas zonas ru-
ção e Cultura organizará, no rais, pode ser exercida, excepcio-
prazo máximo de noventa dias. a nalmente e a título precário, por
contar de sua posse, o estatuto pessoas não diplomadas em esco-
dos professôres e funcionários do las normais, devidamente habili-
Departamento Estadual de Edu- tadas, quando, a juízo do Diretor
cação e Cultura, a ser submetido de Educação e Cultura, o nume-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 103

ro de professôres não fôr sufi- trativas à rede escolar do ensino


ciente para atender à alfabetiza- médio, subordinados ao Departa-
ção. mento Estadual de Educação e
Parágrafo único. A autoriza- Cultura.
ção para regência de classe nos Art. 207. Os estabelecimentos
têrmos dêste artigo, só prevale- de ensino médio elaborarão seus
cerá pelo período máximo de dois regimentos, de acordo com as dis-
anos, salvo se o regente se posições desta Lei. dentro do
submeter a curso intensivo de prazo máximo de 60 (sessenta)
habilitação promovido pelo De- dias a partir de sua publicação.
partamento Estadual de Educa- Art. 208. O Poder Executivo,
ção e Cultura. dentro do prazo de 60 (sessenta)
Art. 203. Enquanto não houver dias, após a publicação desta Lei,
número bastante de professôres obedecendo aos limites dos crédi-
licenciados por Faculdade de Fi- tos constantes da lei orçamentá-
losofia, e sempre que se registre ria para o corrente exercício, pu-
essa falta, a habilitação para o blicará o orçamento analítico dos
exercício do magistério será feita serviços de educação e cultura
por meio de exame de suficiência. com a redistribuição dos recursos
financeiros correspondentes à
Art. 204. Enquanto não hou- nova estrutura da administração
ver número suficiente de profis- ora constituída.
sionais formados pelos cursos es-
peciais de educação técnica, po- Art. 209. O Poder Executivo
derão ser aproveitados, como no prazo de 90 (noventa) dias
professôres de disciplinas especí- depois da publicação desta Lei,
ficas do ensino médio técnico, remeterá à Assembléia Legislati-
profissionais liberais de cursos va o projeto de lei de reforma
superiores correspondentes ou administrativa da Secretaria de
técnicos diplomados na especia- Educação e Cultura para aten-
lidade. der às modificações estruturais
resultantes da Lei Orgânica do
Art. 205. Os alunos promovi- Ensino.
dos no ano letivo de 1962 à se- Art. 210. Esta Lei entrará em
gunda série do curso pedagógico vigor na data de sua publicação,
e os reprovados nesta, de acordo revogadas as disposições em con-
com a legislação anterior, con- trário.
cluirão o curso dentro dessa mes-
ma legislação, sem prejuízo das P A L Á C I O D O GOVÊRNO
adaptações que venham a ser DA ESTADO DA BAHIA, em
permitidas pelo Conselho Esta- . . . de setembro de 1963.
dual de Educação e Cultura. Ass.) — ANTÔNIO LOMAN-
Parágrafo único. O disposto TO JÚNIOR — Padre Luiz Pal-
neste artigo só terá vigência du- meira — Heitor Dias — Jorge
rante o ano letivo de 1963. Calinon — Aloysio Sanches —
Art. 206. Os atuais estabeleci- Francisco Cabral — Renato Me-
mentos de ensino médio ficam deiros Netto — Luiz Braga —
independentes entre si e se inte- Honorato Viana — Nelson Oli-
grarão, como unidades adminis- veira •— José Medrado.
ESTUDANTES PARA A MEDICINA E MÉDICOS
PARA O BRASIL

ALMEIDA JÚNIOR
Do Conselho Federal de Educação

Entre os 1.592 candidatos que m e s m o porque forçaram um


em fevereiro último bateram às pouco a lotação nacional da pri-
portas desta casa, a Escola Pau- meira série, que foi preenchida
lista de Medicina selecionou 80, com o excesso de 10%. Agora,
com o propósito de convertê-los, passados dois anos, já se nos
através de seis anos de curso, em apresenta um indício de que a
outros tantos médicos aptos a ser- desproporção se agravou, pois a
virem com eficiência a população Escola Paulista de Medicina,
de nosso país. Os demais inscri- como se viu, de cada 20 inscritos
tos ficaram do lado de fora: só aceitou um e recusou dezenove.
muitos foram os chamados, pou- Não será isso uma iniqüidade?
cos os escolhidos — tal como Não será, como se tem dito, negar
previra São Mateus, o Evange- a milhares de moços o direito de
lista. se prepararem para a profissão
que escolheram? Negar à popu-
lação menos favorecida o benefí-
cio de ter quem cuide de sua
Os vestibulares de medicina
saúde? Negar ao Brasil em geral
um dos recursos básicos para fa-
Análogo fenômeno ocorreu, por
zê-lo crescer, fortalecer-se e ser
certo, nas trinta e uma escolas
promovido, afinal, da categoria
médicas brasileiras, perante a
de nação subdesenvolvida?
maioria das quais terá sido enor-
me, como aqui, o excesso dos ins- A fim de responder, começarei
critos sôbre o total dos matri- por uma dúvida; — dúvida que,
culados. Em 1961 (ano a que se aliás, já não o é para os iniciados.
refere a estatística mais recente Terão, porventura, as 15.449 ins-
desta matéria) houve no país crições de 1961 correspondido de
15.449 inscrições para a medici- fato a igual número de candida-
na; mas, somente 2.158 candida- tos? Seguramente não. Basta
tos alcançaram matricular-se. De observar cada ano os anúncios
cada 15 inscritos, portanto, ape- dos "cursinhos", e ver nas listas
nas 2 lograram êxito, e isso relativas às diferentes escolas
onde os vestibulares se processa-
Aula inaugural da Escola Paulista ram, como se repetem os nomes
de Medicina, em 26-3-63. de uns tantos vencedores. É que,
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 105

por motivos óbvios, muitos can- ilusória impressão de que a moci-


didatos acham prudente concor- dade brasileira, depois de haver
rer a mais de um estabelecimen- sofrido rigoroso preparo nas es-
to. Essa pluralidade de inscri- colas secundárias, é frustrada nos
ções, que no Brasil se verifica seus desígnios pela mesquinhez
onde quer que a proximidade das da lotação do curso superior.
escolas o permita, ocorre de há Não creio que sob esse aspecto
muito na Inglaterra, pois ali, se- exista realmente mesquinhez em
gundo publicação recente, para o qualquer dos ramos do nosso en-
total de 70 mil inscritos no ano
sino universitário, parecendo-me,
de 1955, o número dos candida-
ao contrário, que em muitos deles
tos fora apenas de 31 mil. A
pluralidade de inscrições está é maior o número dos maus can-
também nos usos e costumes dos didatos, que entram, do que o
Estados Unidos, visto que, me- dos bons, que ficam de fora —
diante carta, o mesmo jovem se é que esta segunda hipótese
se apresenta simultaneamente a porventura se concretiza.
cinco, a dez, a quinze escolas. Esses vestibulares, cuja supres-
Daí decorre, portanto, uma pri- são às vezes se pleiteia a título
meira e importante redução a de inovação de caráter "progres-
fazer-se na censura endereçada sista", são absolutamente indis-
às escolas médicas do país, por pensáveis onde quer que exista,
sua lotação insuficiente. como no Brasil, o sistema do
numerus clausus, e se tenha, por
Outra parcela perturbadora do isso, o propósito de selecionar os
cálculo, representam-na os aven- melhores. Talvez aí — nessa
tureiros. Parcela volumosa no preocupação dos vestibulares,
Brasil, porque aqui a aventura marcada pelo verbo "selecionar",
não custa nada, é geralmente de esteja a causa da ojeriza que lhe
graça. Rapazes e moças que ca- votam alguns educadores "demo-
recem, intrinsecamente, de apti- cratas". Por que não comparam,
dões para o ensino superior, ou esses democratas, o ensino médi-
não estão preparados, mesmo co do século passado, onde não
assim se lançam afoitamente na havia limitação de matrícula,
refrega. Alguns deixam, naquilo com o ensino de nossos dias, a
que escrevem, a demonstração partir da época em que essa li-
irrecusável de sua insuficiência. mitação foi instituída? Uma das
Outros confessam essa insuficiên- últimas escolas a adotá-la foi a
cia com perfeita candura. Lem- Faculdade Nacional de Medicina
bro-me de um que escreveu da Universidade do Brasil. Ali,
assim: "Desculpe, professor, não o professor de Técnica Operató-
estou ainda em condições; vim só ria, depois de três anos de reite-
para conhecer o ambiente. Até o radas reclamações contra a falta
próximo ano, e muito obrigado." de espaço, a falta de material, a
Essas e outras circunstâncias falta de auxiliares e até mesmo a
menos divulgadas falseiam pejo- falta de cadáveres, declarou, em
rativamente as estatísticas dos março de 1952, que tinha no 4.°
vestibulares e dão ao público a ano 325 alunos, e que lhe era
106 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

"absolutamente impossível lecio- Mesmo sem grandes rigores de


nar a turma tão grande." B técnica, os vestibulares que se
concluiu: "Lavrando, pois, o meu realizam com seriedade selecio-
protesto contra a norma vigente nam e classificam os candidatos
de turmas excessivamente gran- de forma razoável. Cataloguei
des, lavo as mãos e declino de há poucos anos, na Faculdade de
tôda e qualquer responsabilidade Direito da Universidade de São
pelas más conseqüências que fa- Paulo, alguns pormenores da
talmente advirão." Aqui mesmo, vida escolar universitária de
na Escola Paulista de Medicina, trinta alunos de três vestibulares
em princípios de 1962, um dos diferentes, que haviam sido clas-
excelentes professôres do primei- sificados nos dez primeiros luga-
ro ano, cioso da eficácia de seu res das respectivas turmas. E
ensino, não concordou em que a comparei aquêles pormenores com
lotação da série inicial tivesse o os de trinta alunos das mesmas
aumento de 20 vagas, antes que turmas, classificados, porém, nos
lhe fosse prometido todo o mate- últimos lugares dos mesmos vesti-
rial necessário ao funcionamento bulares. Eis aqui os resultados
efetivo de suas aulas práticas. da apuração.

Fatos registrados Dos 30 melhores Dos 30 piores

1. Não comparecimento a exames 6 40


2. Exames em 2. a época 62 165
3. Reprovações 5 119
4. Desistênrias do curso 0 4
5. Anos perdidos 0 21
6. Notas distintas 152 10

Quase todos os contrastes re- são defeituosos. Ninguém o nega.


gistrados são, como se vê, bastan- Mas, ao passo que nas melhores
te evidentes. E o respectivo con- universidades estrangeiras o de
junto deixa claro que os melhores que se cogita é de aperfeiçoá-los,
alunos do grupo dos sessenta entre nós há quem fale em supri-
provinham quase sempre dos pri- mi-los ou em desnaturá-los.
meiros da classificação vestibular, Como suprimi-los, quando se sabe
ao passo que os piores provinham que o vestibular, além de sanear
em maioria dos últimos. Quanto preventivamente a primeira série
à vida profissional, cujos dados universitária, r e p r e s e n t a n o
seriam do maior interesse, não Brasil uma das poucas influên-
tive tempo ainda para investigá- cias corretivas a atuar sôbre as
la. Sei apenas que, dos trinta más escolas secundárias e as orga-
primeiros, um chegou a docente nizações fraudadoras dos exames
de ensino superior e outro ven- de madureza? Como suprimi-los,
ceu com brilho um concurso de se existe neste país a regra salu-
provas para o Ministério Público. tar do numerus clausus? E como
Nossos concursos vestibulares, substituir os vestibulares autên-
como também os dos países onde ticos por artifícios que viciem a
se adotam processos equivalentes, competição realmente democráti-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

ca que aquêles exames represen- ESTUDOS PEDAGÓGICOS 107


tam? Será pará instalarmos de imaginam, no estudo antecipado
novo, no limiar das faculdades, o de noções referentes ao curso
velho jogo das influências discri- profissional, e sim em uma sólida
minatórias? Não podemos, no preparação geral, abrindo hori-
Brasil, abrir mão dos vestibula- zontes para todos os quadrantes
res, nem mistificá-los, nem des- da cultura humana. A atitude
prezar seus veredictos, nem tam- oposta, que, através de seus ves-
pouco rebaixá-los a mínimos que tibulares, algumas escolas supe-
iludam os propósitos que lhes são riores estimulam, além de nociva
inerentes em sua qualidade de em si mesma, ainda se agrava
"concursos", e concursos "de ha- cada ano pela ascensão em espiral
bilitação". do nível das questões propostas.
Essa desarticulação entre os dois
Em matéria de vestibulares, a
graus do ensino — o secundário
Escola Paulista de Medicina tem
e o superior — vem de uns tem-
sido uma instituição pioneira,
inaugurando entre nós processos pos para cá anarquizando a ter-
modernos, de execução rápida e ceira série colegial em benefício
de fácil apuração. Foi pioneira dos "cursinhos". Por outro lado,
até mesmo na ingrata mas inde- a impulsão ascendente determina-
clinável missão de arrastar à da pela espiral e pelo especialis-
barra dos tribunais uma quadri- mo, está exaurindo os candidatos
lha de réus de indecorosa fraude mais sensíveis, ambiciosos de con-
nesses exames. Por outro lado, é quistar as primeiras posições.
digno de registro o fato de a Es- Não se estranhe, portanto, que,
cola haver convocado seguida- esgotados pelo esforço e pelas
mente, para a organização e o apreensões, alguns jovens de óti-
julgamento das provas, professô- ma qualidade, uma vez vencida a
res familiarizados com as disci- barreira de ingresso, também
plinas do concurso e com os pro- exaustos como o soldado de Ma-
gramas do ciclo colegial. Esta ratona, ou desmintam o prognós-
última providência deveria mes- tico lisonjeiro que a seu respeito
mo generalizar-se em nosso siste- se havia formulado.
ma universitário, pois traria con- Cuidemos, pois, de aperfeiçoar
sigo a vantagem de prevenir e humanizar os vestibulares bra-
certas distorções que não raro sileiros. O que importa na sele-
prejudicam a precisão e, portan- ção dos candidatos é verificar se
to, a justiça nos resultados de são equilibrados, se possuem in-
tais prélios. E facilitaria ainda teligência acima da média e se
uma outra, que se torna necessá- têm cultura geral satisfatória, em
ria, e que é a de conservar-se o nível de colégio. O simples ver-
contetido das provas vestibulares balismo e o virtuosismo, da memó-
sempre no âmbito dos conheci- ria, quando divorciados do equilí-
mentos gerais, peculiares ao curso brio mental, ou dos dotes da inte-
secundário. Sabe-se, com efeito, ligência, ou de uma integração
que a melhor base pará os estu- cultural autêntica, não interes-
dos profissionais de nível supe- sam nos candidatos ao estudo su-
rior não reside, como alguns pereior, especialmente neste ramo
universitário de tão elevada res-
108 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

ponsabilidade social, que é o da são de vários grupos que, por


Medicina. motivos diversos, postulam a su-
pressão da barreira vestibular,
Médicos para o Brasil junta-se o clamor dos que alegam
a insuficiência estatística de mé-
Examinei até aqui, necessaria- dicos no Brasil. Essa insuficiên-
mente à vol dóiseau, a questão cia é, por certo, real, e, a fim de
da seleção do material humano podermos melhor sopesá-la, recor-
com que a escola médica, equipa- demos uma das tabelas conven-
rada neste ponto a uma verda- cionais que correm mundo, e se-
deira usina, vai modelar os seus gundo as quais o valor da assis-
produtos. Agora, saltando para tência médica de cada país, ou
a outra extremidade, considere- região, melhora na medida em
mos o mercado de trabalho, onde que se reduz o número de habi-
o produto será utilizado. À pres- tantes por médico.

Qualidade da assistência Relação médico /habitantes

Ótima 1/1.000 ou menos


Boa 1/1.001 a 1/1.600
Medíocre 1/1.601 a 1/3.000
Péssima 1/3.001 on mais

No Brasil de 1959 havia para ainda estamos) em grande atraso


cada médico 1.836 habitantes, o em relação à Inglaterra, à Fran-
que eqüivale a dizer que, do pon- ça e à Austrália, que por volta
to-de-vista estatístico, nossa assis- de 1957 contavam, por médico,
tência médica não era péssima e pouco mais de mil habitantes. E
sim apenas medíocre; e até (po- fazíamos figura muito pior em
demos dizé-lo) quase boa. Está- face dos Estados Unidos, da Re-
vamos equiparados ao Chile, cuja pública Federal Alemã, da Tclie-
relação médico/habitantes era de co-Eslováquia e da Nova Zelan-
1/1867; e vencíamos a grande dia, cujos índices eram de um
maioria das repúblicas latino- médico para 700 e poucos habi-
americanas, que apresentavam, tantes.
de regra, índices médicos entre Seria grave a situação brasilei-
1/2.000 ( M é x i c o ) e 1/6.500 ra se, como me foi dito recente-
(Guatemala). Mas na própria mente, o ritmo de aumento de
América Latina perdíamos longe nossa população estivesse sendo
para os nossos bons vizinhos a mais rápido que o do aumento de
Argentina e o Uruguai, onde a médicos. Mas felizmente não é o
cada médico cabiam cerca de 850 que está acontecendo. Eis aqui os
habitantes. E estávamos (como índices de três épocas distintas:

Em 1946 1 médico para 3.033 habitantes


Em 1953 1 médico para 2.471 habitantes
Em 1959 1 médico para 1.836 habitantes
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 109

Como se vê, em 1946 estávamos tar índices médicos acima daquilo


ainda na faixa da assistência que o seu subdesenvolvimento
péssima; mas em 1953 atingíamos comporta. Abro neste passo um
a da assistência medíocre. E em rápido parêntese para perguntar:
1959, embora permanecêssemos — Será o Brasil um país "sub-
na mesma faixa da mediocridade, desenvolvido"? Com receio de
já nos havíamos avizinhado dos dizé-lo por mim mesmo, deixo o
limites com a assistência boa. encargo da resposta aos que me
O índice médico de cada país, ouvem; mas, a fim de ajudá-los,
ou das diferentes regiões de um forneço alguns dos traços que,
mesmo país, está sempre em cor- segundo Paulo Hoffmann, dire-
relação mais ou menos estreita tor do Fundo Especial das Na-
com os fatôres demográficos, eco- ções Unidas, caracterizam o fenô-
nômicos, sociais e culturais do meno. País subdesenvolvido, diz
país ou da região. Veja-se, por êle, é o que não possui um parque
exemplo, a correlação com a den- industrial suficiente, nem sufi-
sidade demográfica. A República cientes fontes de energia em ação.
de Israel, onde há 200 habitantes Escasseiam-lhe vias férreas, rodo-
por km2, tem um médico para 434 vias, telefones, serviços públicos
habitantes, creio que o melhor dignos desse nome. Tais coisas
índice do mundo. Na França, existem por vezes nas grandes
cuja densidade demográfica é de cidades, mas as outras regiões do
76 habitantes por km2, a propor- país vegetam no isolamento. São
ção é de 1/1.093; no Brasil, cuja raros os hospitais, raras as insti-
densidade demográfica é de 8
tuições de altos estudos; o anal-
habitantes, aquela proporção é de
fabetismo é regra generalizada.
1/1.836; e no Chile, com apenas
A riqueza do país se concentra
7,5 habitantes por km 2 , a referida
proporção é de 1/1.867. Igual- nas mãos de uns poucos, e esses
mente demonstrativo é o que poucos vivem na opulência tendo
acontece dentro dos países exten- ao redor de si a mais degradante
sos, quando se passa de uma re- miséria. Quase não há capitais
gião para outra. Os Estados a serem aplicados; e quem os
Unidos, oferecendo embora, em possui prefere aplicá-los no es-
conjunto, um dos melhores índi- trangeiro. As principais expor-
ces médicos do mundo (1 médico tações consistem em produtos na-
para 757 habitantes há seis anos turais e uns poucos artigos ma-
atrás), mostram os extremos nufaturados; mas freqüentemen-
desse índice nos dois Estados que te os lucros que elas proporcio-
constituem, de certo modo, extre- nam cabem a capitalistas estran-
mas também no grau de desen- geiros e não são investidos no
volvimento: o Estado de Nova país.
York tem 1 médico para 523 ha-
bitantes, o Estado de Dakota do Esse é o retrato genérico de
Sul tem 1 médico para 1.388 n a ç ã o subdesenvolvida; e já
habitantes. agora, ultrapassada a era idílica
do "Porque me ufano de meu
Os países subdesenvolvidos não país", ninguém terá dúvida em
apresentam, nem podem apresen- dizer que confere com êle o re-
110 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

trato do Brasil. A título de com- de 1/425, superior ao da Repú-


provação, é interessante referir blica de Israel. Por si só, como
que numa das páginas do traba- se vê, o índice médico não resolve.
lho do economista Paulo Hoff- Por outro lado, o índice médi-
mann, que estamos citando, apa- co, antes mesmo de poder ser
rece a fotografia de um menino causa de desenvolvimento, é o
de doze anos: chama-se F. da S., efeito de um mínimo de fatôres,
mora numa favela, e, enquanto os sem os quais êle permanecerá
pais trabalham fora, — o pai igual a zero. Comparando há
vendendo querosene e a mãe la- seis anos atrás a proporção de
vando roupa — F. da S., doente médicos dos municípios paulistas,
e em condições de esquálida ma- correspondente a 1953, foi-me fá-
greza, cuida sozinho dos sete cil verificar que, à medida que
irmãos mais novos. Quem o ar- cresce a tributação "per capita"
rancou da miséria, da doença e dos municípios (índice do desen-
da morte próxima, foi a filantro- volvimento econômico de cada
pia norte-americana, apesar de um), melhoram estatisticamente
viver êste menino na Cidade Ma- seus índices médicos. Eis aqui
ravilhosa, onde o índice médico é um quadro demonstrativo:

Media da trib. "per capita"


Municípios Hab. p. médico
(em cruzeiros)

Capital 6.102 751


12 municípios 2.000 1.163
21 municípios 1000 a 1200 2.038
29 municípios 300 a 350 6.251
26 municípios menos de 200 10.030

A propósito da atividade civi- relação ao médico, pois existem


lizadora da professora rural, es- pelo Brasil afora, não somente
crevíamos em 1936, quando diri- bairros da zona rural, mas tam-
gíamos o ensino paulista: " H á bém centros urbanos de nascimen-
bairros imaturos para a escola. to prematuro, ou de desenvolvi-
Antes de lhes nomearmos profes- mento retardado, que não pos-
sora, demos-lhes estradas, sanea- suem aquêle mínimo de requisitos
mento, casa de moradia e de aula; para a instalação e o exercício
criemos neles um mínimo de con- útil da profissão médica. Outros
dições materiais, para que o di- fatôres, além da presença do mé-
nheiro gasto com a escola possa dico, hão de estar funcionando
ser aproveitado, e o sacrifício da com êste, e mesmo antes que êste
professora, além de suportável, apareça.
tenha utilidade. Os serviços de Existe em tudo isso, como de-
viação, de engenharia sanitária, monstram os economistas, o livre
de obras públicas começarão; a jogo de inúmeras forças sociais,
escola ajudará a fazer o resto." entre as quais seria difícil, senão
Pode-se dizer a mesma coisa com mesmo impossível, apontar a de
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 111

maior importância. Nem mesmo ignorantes, e os seus pa-


de maior importância será o tão drões usuais de conduta,
falado fator econômico. Gunnar perniciosos à saúde, são le-
Myrdal, da Universidade de Sto- vados do Sul para o Norte.
colmo e ex-secretário da Comissão A saúde deficiente reduz as
Econômica da Europa, ao publi- oportunidades de elevação
car em 1944 alentado estudo econômica, e isso atua, em
sôbre a situação dos negros nos retorno, para limitar as
Estados Unidos, declarou: oportunidades de obter tra-
tamento médico adequado,
"O fator econômico — ou os conhecimentos neces-
que muita gente (sem falai- sários para que cada um
nos marxistas) erige em cuide devidamente de si
fator primário — não me- próprio."
rece esse prestígio. Em um
sistema interdependente de A propósito desta reciprocida-
causalidade dinâmica, não de de causas, ou "causalidade
existe causa primária, pois circular" (no dizer dos mestres),
cada fator é, por si, fator não posso deixar de estranhar
dos demais. O baixo padrão pela terceira vez uma afirmação
educacional, por exemplo, que, data venia, considero abso-
produz baixos salários e de- lutamente inaceitável, ouvida há
ficiências da saúde. Qual- cerca de três anos nesta mesma
quer dêsses três têrmos — sala "Leitão da Cunha" de nossa
economia, educação e saúde Escola. Ao pronunciar aqui eru-
— pode por sua vez ser con- dita conferência sôbre o ensino
siderado fator dos demais." superior e a pesquisa, um emi-
nente mestre visitante, em dado
Para dar maior realce à reci- momento, levantou os olhos do
procidade dos fatôres, eis ainda o texto que vinha lendo e proferiu
que afirma o reputado econo- mais ou menos estas palavras:
mista : " Há quem afirme que de-
" O ensino insuficiente vemos primeiro saturar de
dado aos negros, em parte escolas primárias o país in-
porque o baixo padrão eco- teiro e que só depois disto
nômico não lhes permite é que convém pensar no en-
manter os filhos na escola, sino superior e na pesquisa.
em parte porque as escolas Eu não penso assim, pois
para os negros, no Sul, são entendo que devemos pri-
de má qualidade, não so- meiro tratar de enriquecer
mente impede a formação o país e só depois dar a
de bons médicos, mas tam- todos educação primária."
bém conserva em nível ex-
tremamente baixo os conhe- A primeira tese, atacada pelo
cimentos relativos ao sanea- ilustre conferencista, pecava por
mento e à saúde. Práticas seu ingênuo simplismo, e consti-
mágicas ou supersticiosas tuiria uma negação da evolução
persistem entre os negros histórica e da própria realidade
112 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
contemporânea. Mas a tese opos- recursos (convém que se saiba)
ta, que o conferencista defendeu, já estão largamente ultrapassa-
e que propõe a qualquer nação dos. Em 1961 revelou-se que
subdesenvolvida primeiro enri- os gastos da União com o en-
quecer para depois educar o sino estavam assim distribuídos:
povo, é errada e, além de errada, ensino primário, 9% ; ensino mé-
é desumana. Em última análise, dio, 1 5 % ; ensino superior, 74%.
eqüivale a dizer: sacrifiquemos A custa de grande esforço, o or-
na ignorância, no trabalho em- çamento de 1962 pôde adotar
bruteeedor e na miséria, mais al- uma nova proporção: ensino pri-
gumas gerações, para que uns mário, 12% ; ensino médio, 15% ;
poucos continuem a capitalizar ensino superior, 73%. Mudança
estudos, a viver no conforto, a praticamente nula, como se vê.
enriquecer-se. Tese errada, em Mas veio por último o orçamento
face da lição dos economistas de 1963. Quanto a êste, discipli-
sôbre a causalidade circular, que nado que foi pela Lei de Diretri-
há pouco recordei. Tese desuma-
zes e Bases, teve que repartir em
na, que aconselha a frustrar o
três porções rigorosamente iguais
direito à educação atribuído à
a totalidade dos recursos da
imensa maioria, mas monopoliza-
do em benefício de uma minoria, União. Sob o novo critério, por-
cujo privilégio gera dêste modo a tanto, só cabem, em verdade, para
mais odiosa das discriminações. o ensino de nível universitário,
Ora pois: os que clamam pelo como verba federal, cerca de 18
aumento desarmônicamente acele- bilhões de cruzeiros. Isto posto.
rado no ritmo de produção de e visto que as despesas desse en-
profissionais de nível superior, sino já atingem, no presente ano,
antes que o país alcance condi- a mais de 30 bilhões, não nos
ções de absorvê-los e aproveitá- resta invocar, pará o caso, senão
los, estão, sem o saber, adotando a interferência do milagre.
a mesma tese errada e desumana Foi diante desse quadro deso-
que propõe, ao Brasil, primeiro lador que o Conselho Federal de
enriquecer e depois educar. Essa Educação, endereçando-se aos
afirmação, que postulo neste mo- altos poderes da República, hou-
mento, constitui a resposta à ve por bem recomendar:
pergunta feita logo no início "não se expanda o sistema
desta aula: "Iremos negar a mi- federal de ensino superior
lhares de jovens o direito de se além das universidades e
prepararem para a profissão que escolas isoladas existentes,
escolheram, especialmente quan- e intensifique o Ministério
do essa profissão é a de médico?" a ampliação de suas matrí-
Não, não devemos negá-lo (res- culas, a fim de que se obte-
pondo agora) e sim atender a nha, gradativamente, maior
esses jovens; mas, na medida em produtividade dos s e u s
que esse atendimento dependa do cursos."
erário, será preciso que êle se
contenha nos limites dos recursos Kepresentará isso, porventura,
disponíveis para isso. E esses uma manifestação de descaso no
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

tocante à preservação da saúde das, a criação de condições mate-


do povo brasileiro? Uma debili- riais e culturais que preparem o
tação intencional na trincheira ambiente para atrair os médicos
onde se trava a luta contra a —• essa multidão de médicos mais
doença? Não. O que há, na rea- ou menos represados nos grandes
lidade, é, em primeiro lugar, a centros, e alguns dos quais, bra-
convicção de que os milhões de cejando para a conquista do pão
crianças que vegetam sem escola de cada dia, equilibram-se com
— e também sem saúde — nas dificuldade na linha divisória en-
regiões menos desenvolvidas do tre a boa e a má conduta demar-
país, têm igualmente os seus di- cada pelo Código de Ética. E nao
reitos; e, em segundo lugar, o basta atrair, é preciso também
reconhecimento de que nem só fixar por prazo razoável. Mas,
petos m é d i c o s se combate a como consegui-lo se, segundo o
doença. depoimento de nossos melhores
Esta última afirmação consti- sanitaristas, mesmo os jovens que
tui, em verdade, a grande tese vão de boa vontade para os pe-
que precisa ser divulgada e com- quenos centros, logo desertam,
preendida. Tratei dela, em têr- pois nada encontram que os esti-
mos vagos, no meu primeiro tra- mule e os coadjuve: nem hospi-
balho de higiene social, elaborado tais acessíveis, nem postos de hi-
há 42 anos. Encarei-a de novo giene, nem auxiliares qualificados,
em várias épocas, mas especial- nem transporte, nem colaboração
mente em 1961, quando, no cum- da escola, nem compreensão dos
primento de encargo oficial, re- líderes locais, nem recursos pe-
cordei as considerações constan- cuniários para atenuar a miséria ?
tes de valioso opúsculo de 1935, Não, meus senhores! A ação
do professor Pedro de Alcântara, coercitiva da lei, que se pretende
e as do notável livro, sôbre Hi- invocar para o envio dos neófitos
giene Rural, de meu querido co- da profissão às zonas pouco ha-
lega de turma Prof. Samuel Pes- bitadas do interior do país, não
soa. E ainda agora, tive o prazer dará o resultado que se espera.
de ouvir brilhantes argumentos Esse resultado virá, entretanto, e
por ela, na aula inaugural da sem a necessidade de lei, se fo-
Universidade do Brasil, proferi- rem tomadas gradativamente me-
da em 5 do corrente pelo Prof. didas preparatórias ou simultâ-
Clementino Fraga Pilho, que neas, tais como a expansão dos
trouxe, em favor da mesma tese, sistemas rodoviário ou ferroviá-
a contribuição de sua inteligên- rio; a instalação de escolas que,
cia, o prestígio de seu nome e o além de alfabetizarem, eduquem
entusiasmo de sua mocidade. para a saúde; a convocação de
engenheiros sanitários, a forma-
Na presente conjuntura, embo- ção de equipes volantes de que
ra convenha, em certos pontos do participem, conforme o caso, o
país, acelerar a produção de mé- médico, o farmacêutico, o enfer-
dicos pelo cauteloso aumento da meiro, o técnico de laboratório, o
lotação das escolas existentes, o assistente social; e, ainda, a cria-
que mais importa, de fato, é no ção de hospitais regionais, a re-
que se refere às zonas mal servi-

a
114 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

forma da casa do homem do cam- ções. Quanto a isso, meus senho-


po, a proteção da água de beber, res, direi apenas, a título de en-
a guerra aos vectores de agentes cerramento desta já demorada
patogênicos, a instalação de exposição, que a classe médica
fossas sanitárias e, "the last but não deve jamais recuar de sua
not the least", a intensificação e atitude de respeito aos princípios
a diversificação da produção ve- humanitários que a têm norteado
desde as suas origens hipocráti-
getal e animal, a fim de que se
cas. Que cada novo médico, por-
possibilite fornecer à família do tanto, tomando por padrão os
campo uma melhor alimentação e, melhores modelos de todos os tem-
também, maior capacidade eco- pos, forme a sua consciência pro-
nômica. fissional própria e a ela se sub-
O quadro nosológico do subde- meta. É esse, aliás, segundo creio,
senvolvimento resiste aos artifí- o compromisso implícito no espí-
cios parciais que visem a masca- rito dos jovens que se matriculam
rar êste ou aquêle sintoma isola- numa escola de medicina: servir
do. O de que precisamos é ata- à humanidade sofredora. E num
car a enfermidade em suas pró- país como o Brasil, onde a popu-
prias raízes, ou seja, no conjunto lação infantil e juvenil represen-
de seus fatôres etiológicos. Êste ta carga excessiva para as gera-
tipo de tratamento não "tira a ções adultas, os poucos moços que
doença com a mão", como, segun- chegam à escola superior só con-
do se diz, fazem alguns remédios seguem esse privilégio à custa do
caseiros; mas estimula o organis- abandono de milhões de crianças
mo inteiro a reagir contra os e jovens que permanecem na
agentes que o agridem. Sendo, ignorância e são compelidos pre-
como é, uma terapêutica plurifa- maturamente aos trabalhos bra-
torial, é mais cara, mais demora- çais. Essa dívida para com as
da, mais difícil. Contudo, é a gerações assim sacrificadas, o es-
única realmente eficaz. tudante universitário brasileiro
Quanto à escassez de médicos — e sobretudo o futuro médico
no "interland" brasileiro, sinal de nosso país — deve comprome-
evidente de subdesenvolvimento, ter-se a minorá-la na ocasião
creio que devemos confiar menos oportuna, preparando-se através
na ação da lei do que na tera- do curso profissional — não ape-
pêutica geral que acabo de men- nas para ganhar a sua subsistên-
cionar, e da qual resultará, entre cia, mas ainda para desincumbir-
outros efeitos benéficos, até mes- se perante a comunidade nacional
mo o aprimoramento da consciên- da missão humanitária que livre-
cia profissional das novas gera- mente escolheu.
OBSTÁCULOS AO PLANEJAMENTO EDUCACIONAL
NOS PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO*

JAYME ABREU
Do C.B.P.E.

1) Dificuldades estruturais, por ciência, norteando a ação


conceituais, ideológicas. — A pri- planejada que utiliza modos de
meira dificuldade a superar para pensar que a caracterizam, vale
adoção e execução de uma política dizer, o pensamento objetivo, ana-
de planejamento educacional nos lítico, integrador, projetivo.
países em processo de desenvolvi- Ora, acontece que nas culturas
mento é a da antinomia entre o arcaicas os sistemas de participa-
que define a noção de planeja- ção que unem os seres e as coisas
mento e o que caracteriza estru- são insuscetíveis de verificação
turalmente as sociedades de cul- pelo pensamento racional e obje-
tura arcaica. tivo da ciência. O universo de
Intrinsecamente, a noção de significação dessa cultura não
planejamento não é outra senão corresponde aos mesmos têrmos
a da aplicação de métodos cientí- de significação (inteligibilidade,
ficos ao trato de fenômenos natu- finalidade, etc.) das sociedades
rais e sociais, com o propósito de modernas.
aumentar a capacidade de previ- Como sublinha M. François
são humana e de ensejar inter- P e r r o u x ("Industrialização e
venção no processo de desen- Desenvolvimento Econômico e
volvimento social, acelerando-o Social dos Países Subdesenvolvi-
ou modificando-o. dos") "numa cultura arcaica
Nas sociedades modernas, alta- tôda relação econômica é também
mente industrializadas, hâ uma uma relação mágica ou religiosa,",
permanente reconstrução de mo- ou ainda, citando J. Poirier, "o
dos de vida, normas, valores, pro- objeto aí é sempre e ao mesmo
cessos organizatórios, insolúveis tempo sujeito ou subjetividade".
pelo recurso à tradição e costu- As dificuldades conceituais de-
mes e para cuja solução é preciso correm de imprecisões freqüentes
apelar para a razão, expressada quanto ao significdo exato de
planejamento educacional.
* Trabalho apresentado à Reu-
Não há uma segura e dissemi-
nião da ONU sôbre Aplicação de
Ciência e Tecnologia em Beneficio de nada compreensão do que lhe é
Áreas menos Desenvolvidas. Publicado implícito, como seja, uma arti-
pela ONU em 17/10/62, Genebra. Suíça. culação a mais estreita possível
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

116 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS


entre fins e meios, um levanta- Não corresponderá à realidade
mento de dados com coordenação dizer-se que e s s e estereótipo
de sua significação, inter-relações atualmente esteja superado, tan-
e implicações educacionais, políti- to mais quanto é êle instrumento
cas, sociais, o estabelecimento de de resistência à mudança, de uti-
objetivos precisamente especifi- lização freqüente por classes do-
cados a serem atingidos em deter- minantes, interessadas na manu-
minados prazos, com hipóteses tenção do status quo.
2) Dificuldades decorrentes de
alternativas decorrentes e suas
uma conceituação tópica ou par-
conseqüências. cializante da realidade do pro-
É comum o equívoco entre re- cesso social. — Entre os conceitos
formas educacionais, com a fixa- categoriais aplicáveis ao entendi-
ção de objetivos da educação e de mento da realidade do processo
determinadas estruturas pedagó- social, há aquêle a que se poderia
gicas e planejamento educacional, chamar de tópico ou parciali-
com decisões em torno a opções zante.
educacionais a serem atingidas
a vário prazo, com estreita corre- Conceito oposto ao de totalida-
lação entre fins e meios e incor- de dialética do processo social
poração de uma visão coesiva e global, busca a pureza do dado
integradora das componentes do ou fato particular, puro, delimi-
processo. tado, circunscrito à particulari-
As dificuldades emergentes do dade, cancelado de conexões para
plano de ideologia política decor- fora, aceitando o existente sem-
rem da vigência, ainda bem con- pre c o m o local, momentâneo,
sistente, daquele estereótipo a que finito.
recentemente aludia M. Pierre Como exemplos dessa visão
Masse, em conferência feita em particularista, bastante presente
Londres (abril, 1961), sôbre "La em países vivendo ainda o estatu-
planification Française". "Je to político da colonização, com as
sais bien que, dans le mode occi- comunicações parciais e fragmen-
dentel, le mot Plan n'est pas un tárias decorrentes das desigual-
bon article de vente". dades e desintegrações do inci-
A adoção do planejamento em piente processo de industrializa-
escala nacional pelos planos qüin- ção, assinalam-se posições como as
qüenais soviéticos e pelo nacional- de constituir a classe dominante
socialismo, conduz, seja p e l o como fronteira referencial dos
medo irracional à palavra, seja problemas nacionais, como a de
pelo temor do desvio para um sobrevalorizar o regional em rela-
dirigismo estatal hipertrofiado, ção ao todo nacional, como a de
eliminador da chamada "livre acentuar hipertrofiadamente um
empresa", a que elites tradicio- problema específico como se fora
nais, com interesses investidos na supremo, seja êle educação, saú-
manutenção do "liberalismo eco- de, estradas, analfabetismo, por
nômico", tenham atitude de resis- arbítrios subjetivos desligados do
tência à adoção da ação plane- caráter configurador da catego-
jada. ria de totalidade.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 117

Dessa visão decorrem "planeja- mas ociosas de espoliação e para-


mentos" parciais do aparelho es- sitismo dos bens da comunidade.
colar, como se não funcionasse
3) Dificuldades inerentes às
êste como um sistema de vasos tensões do processo de desenvol-
comunicantes e, o que também é vimento. — Há uma tensão dia-
grave, "planejamentos" educacio- lética inerente ao proceso de de-
nais desligados de uma concepção senvolvimento entre o "tradicio-
de totalidade da realidade do nal" e o "emergente", pela trans-
processo social, global, desarti- formação qualitativa da realidade
culados em relação aos fatôres so- anterior, pela criação de novos
ciais e econômicos operantes no conteúdos da cultura, com a in-
país. dustrialização.
Assinalam-se então "planeja- Como sublinha Paul Baran, em
mentos" de expansão da escola "A Economia Política do Desen-
primária, sem qualquer articula- volvimento Econômico", "sempre
ção com o planejamento da ex- foi o desenvolvimento econômico
pansão dos níveis de ensino sub- marcado por choques mais ou me-
seqüentes, elaboram-se "planos" nos violentos, efetuou-se por on-
de extensão da escolarização ele- das, sofreu retrocessos e ganhou
mentar por "seis anos" a tôda terreno novo, nunca foi um pro-
população escolarizável sem qual- cesso suave e harmonioso, se des-
quer planejamento econômico dobrando, plàcidamente, ao longo
coincidente capaz de promover a do tempo e do espaço".
capacidade social de absorção dos Significa mudanças, comoções,
educados, sem nenhuma preo- rupturas qualitativas que não são
cupação com as tensões sociais simples acréscimos ou ajustamen-
advindas das expectativas não tos marginais de sobrevivência do
correspondidas de vida e empre- status quo.
gos urbanos, emergentes dos des- Há nele uma transposição do
locamentos rurais-urbanos esti- tradicional p a r a o emergente,
mulados. São ainda decorrência uma mudança qualitativa da
dessa visão tópica, alienada quan- consciência nacional.
to às necessidades do contexto É extremamente difícil a inser-
social global e ao planejamento ção no planejamento educacional
de uma hierarquia de prioridades dos novos conteúdos da cultura,
conseqüente, a criação de formas penoso o reajustamento do "for-
ornamentais do ensino, institu- mal" para o "real".
cionalizadoras do conhecimento Todas as forças de resistência
sociologicamente ocioso em rela- à mudança, expressão do imobi-
ção ao que seriam necessidades lismo substaneialista e estático,
básicas do desenvolvimento, so- procuram bloquear, como supér-
brecarregando orçamentos públi- fluas e mesmo perturbadoras,
cos com o preparo para ocupações quaisquer tentativas de planeja-
simbólicas de indefinível qualifi- mento enquanto expressão do
cação em relação ao exercício de consciente e deliberado propósito
atividades produtivas, socialmen- de influenciar no sentido de mu-
te úteis, alimentando,, assim, for- dar a ordem de coisas existente.
118 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Alimentam-se então falácias à ação seqüente e contínua de fle-


como as da imutabilidade dos pa- xíveis planos-perspectiva a mais
drões de valores, as do crescimen- longo prazo, esgotando-se a ação
to nacional espontâneo ou do pro- administrativa no puro imediatis-
cesso de expansão inconsciente. mo acidentalista de posições tó-
Há assim uma posição de luta picas de mera circunstância,
pelo afastamento das técnicas de concretizadas em projetos a curto
intervenção no processo social, prazo e medidas de emergência,
que precisariam ser mobilizadas propostas apenas para visíveis
para adaptar a herança cultural
efeitos imediatos.
às novas condições emergentes de
vida. Ademais é preciso considerar a
Torna-se assim extremamente instabilidade do poder político
difícil um planejamento educa- peculiar às sociedades arcaicas
cional coerente e coesivo em meio onde, freqüentemente, o exercício
às situações de tensão e conflito do poder é disputado e consegui-
entre motivações modernas e mo- do violentamente por grupos pre-
tivações arcaicas, em face à mul- datórios do mesmo, tal como su-
tiplicidade de conflitos e contra- cede na América Latina, onde
dições sociais ativas no período Merle King, em estudo sob o tí-
de transição para o desenvolvi- tulo de "Contribuição pará uma
mento que corresponde à fase da teoria da instabilidade do poder
"quase-nação" em via de se fazer e da política na América Latina",
nação, p e l a autodeterminação documenta trinta e uma deposi-
quanto à realização do seu proje- ções de governantes e presidentes,
to coletivo de ser. no período de 1945 a 1955.
4) Dificuldades resultantes de Sabendo-se como qualquer pro-
instabilidade política. — É da grama de planejamento educacio-
m e s m a essência do processo nal a longo prazo exige um míni-
de desenvolvimento econômico a mo de essencial estabilidade e de
existência de mutações profundas continuidade, sem o que fracassa
no número e na natureza das re- qualquer programação incorpo-
lações entre as classes sociais, rando calculabilidade e previsibi-
seja do ponto-de-vista de Status lidade, compreende-se o handicap
social, seja do de poder político que representa a instabilidade po-
como do de situação econômica. lítica dos países em processo de
desenvolvimento, em relação ao
Os ajustes decorrentes não se
planejamento educacional.
processam sem conflitos maiores
ou menores, conforme o grau de 5) Dificuldades da parte dos
rigidez de estrutura econômica e "Staffs" administrativos tradi-
das classes sociais, facilite ou di- cionais e da opinião pública. —
ficulte a rapidez da mudança exi- Como dificuldades à execução do
gida pelas mudanças tecnológica planejamento educacional nos
e ideológica. países em processo de desenvolvi-
Essa instabilidade de poder po- mento, não são nada irrelevantes
lítico reflete-se na ordem admi- as opostas pelos Staffs tradicio-
nistrativa, retirando viabilidade nais da administração pública.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 119

De modo geral, pela lei da jamento educacional nos países


inércia, por amor à comodidade em processo de desenvolvimento.
conservantista de velhas rotinas De modo geral, constituindo
sossegadas, vêem eles no "plane- esses países expressões de uma
jamento" um puro esnobismo ex- economia subsidiária, reflexa,
travagante e inoperante, amea- periférica, caudatária de outros
çador da tranqüilidade dos velhos centros ativos de poder econômi-
estilos e dos interesses investidos. co, têm eles todas as limitações
Essa atitude de resistência à próprias aos países ainda nesse
mudança é freqüentemente com- baixo nível de desenvolvimento.
partilhada por boa parte da opi- com debilidades estruturais de re-
nião pública que vê na atitude cursos técnico-financeiros.
de planejamento, pura fantasia Constitui sério problema a au-
intelectual, batizando com nomes sência de suficiente pessoal téc-
novos velhas coisas. nico, devidamente qualificado
para as tarefas interdisciplinares
Pequenos projetos de planeja-
do planejamento educacional, en-
mento, mais ou menos particula-
volvendo preliminarmente espe-
rizados e imediatistas do laissez
faire são então confundidos com cialistas em técnicas de pesquisa
os modernos princípios e técnicas nos campos da educação, estatís-
de planejamento em seus aspec- tica, demografia, economia, fi-
tos de amplitude social (over ali nanças, análises sociais, levanta-
planning), coordenação, integra- mentos de mercados e de força de
ção e previsibilidade a longo trabalho e, posteriormente, plane-
prazo. jadores aptos no metier.
Especialmente para c e r t o s
6) Dificuldades por distorções tipos de tarefa, jogando com
quanto ao conceito de planeja- prospeeções a mais longo prazo,
mento. — É bastante sensível a com o inter-relacionamento orgâ-
dificuldade oriunda da distorção nico de dados de preparação es-
da concepção de planejamento, colar considerada em função de
entendendo-o não como um pro- necessidades técnico - científicas
cesso criador, vivo, revisível, au- do desenvolvimento, trata-se de
toeorretivo, mas como um esque- tarefas a bem dizer sem prece-
ma confignrador e aprisionador dentes nos quadros locais e de
da realidade. não fácil utilização da coopera-
É perigoso o desvio da concep- ção técnica estrangeira, por pe-
ção do planejamento de um fle- culiaridades dos contextos sócio-
xível quadro orientador da ação culturais em causa.
para um roteiro descritivo, deta- 8) Dificuldades de organiza-
lhado, rigoroso, certo e preciso de ção. — A ausência de tradição
situações a anos de distância. quanto às tarefas de planejamento
educacional leva a problemas sé-
7) Dificuldade de ordem fi- rios quanto à implementação
nanceira e técnica — Não são de dêsses serviços
nenhum modo irrelevantes as di- Via de regra, não há defini-
ficuldades de natureza financei- ções suficientemente claras e pre-
ra e técnica antepostas ao plane- cisas quanto às atividades a serem
120 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

desempenhadas pelas agências de também assinaláveis duplicações


planejamento. de funções e esforços inteiramen-
Há uma certa fluidez imprecisa te descoordenados quando não
e vaga de conceitos quanto à exa- contraditórios e até antagônicos.
ta natureza e limites da ação pla- Registra-se também muitas ve-
nejada, gerando concepções, ora zes, na estrutura geral da admi-
hipertrofiadas, ora insuficientes, nistração pública dêsses países,
quanto aos seus objetivos, limites uma hipertrofia da concentração
e possibilidades. de poder em órgãos de meios
Há uma habitual ausência ou exercendo, freqüentemente, uma
deficiência de coordenação e arti- ditadura disjuntiva do normal
culação, no sentido horizontal funcionamento de órgãos de fins,
como vertical com agências ou- que sofrem um bloqueio externo
tras com as quais deveria haver altamente impeditivo de levarem
essa coordenação e articulação de a têrmo eficaz seus planos de
esforços e, não raramente, são ação.
CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO
Constam desta seleção pareceres aprovados nas sessões
do 3º trimestre do ano em curso.

CONCURSO PARA CATEDRÁTICO

Entendimento do art. 166, n.° VI, da Constituição


Parecer n.° 1/63, da Comissão de Legislação e Normas — Os
professôres Octavio Reis de Catanhede Almeida, Jorge Frederico de
Souza da Silveira, Durval Potyguara Esquerdo Curty e Rufino de
Almeida Pizarro, requereram sua nomeação como catedráticos efetivos
das cadeiras que regem interinamente na Escola de Engenharia da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, anteriormente
Escola Fluminense de Engenharia, federalizada pela Lei n.° 3.958,
de 13.9.1961:
O Parecer n.° 748/61, do antigo Conselho Nacional de Educação,
relatado por Dona Nair Fortes Abu-Mehry, concluía que era pos-
sível deferir os pedidos, em face de precedentes administrativos.
A conclusão desse parecer, entretanto, que opinava pelo deferimento
nos casos concretos, diverge da conclusão constante de minha decla-
ração de voto, nesses têrmos:
"Votei a seguinte conclusão: É esta Comissão de Pa-
recer, em face da jurisprudência anterior dêste Conselho.
que é possível o aproveitamento de concursos de catedrá-
ticos para investidura em outra Escola, em cadeira idêntica
ou mais compreensiva, relativamente àquela do concurso
anterior".

Essa colocação do problema repetia apenas em tese o princípio


adotado pela administração, com base em pareceres do Consultor
Geral da República, do Conselho Nacional de Educação e até em
decisões judiciárias, segundo o qual a prestação do concurso satisfaz
a exigência constitucional do art. 168, VI, da Constituição, não sendo
indispensável repeti-lo, para a nomeação em outra vaga.
Tal possibilidade, entretanto, apenas remove o obstáculo consti-
tucional, mas não cria, de modo algum, pará os postulantes, um
direito ao ser provido em vaga para a qual nao prestou o concurso
específico, e deixa subsistir, na decisão das pretensões individuais,
todo o conjunto das considerações de conveniência administrativa
que envolvem em cada situação. Por exemplo: se o concurso não
é recente ou se existem outros candidatos dispostos à competição e
numerosas outras ponderações, levarão a administração a preferir
a abertura de novo concurso à faculdade de aproveitar o antigo
para o provimento.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

O processo, com o parecer do Conselho, foi ainda submetido ao


exame da Consultoria Jurídica do Ministério, que discordou da con-
clusão do parecer quanto ao deferimento (minha conclusão não é
esta, como já ficou explicado), por admitir o aproveitamento do
concurso apenas no caso de transferência, em que o interessado
perde o cargo anterior, trasladando-se para outro, enquanto os
peticionários desejam a efetivação para acumular dois cargos, o que
aliás já fazem embora a título interino nas cátedras da escola
fluminense.
O ilustre Consultor Jurídico julgou oportuno reabrir o debate
sôbre a tese, colhendo-se previamente a orientação do Egrégio Con-
selho Federal de Educação. Esboçando as linhas gerais desse pro-
nunciamento, parece-nos o seguinte:
O art. 168, VI, da Constituição Federal estabelece que:
"para o provimento das cátedras, no ensino secundário
oficial e no superior oficial ou livre, exigir-se-á concurso
de títulos e provas".
Assim formulada a exigência, ela estará sempre satisfeita, uma
vez que o candidato tenha o concurso da cadeira, dêste que não
se infere imediatamente do texto a especificidade do concurso para
determinada vaga.
Utilizando essa indeterminação, a jurisprudência administrativa.
apoiada em pareceres de órgãos jurídicos superiores e até em
decisões dos tribunais, aplicou muitas vezes o princípio de apro-
veitar o concurso já realizado no provimento de vaga diversa.
Essa orientação pode mudar, até mesmo em forma programática,
desde que a administração entenda vincular-se ao princípio geral
de só aceitar os concursos para cada vaga, mas essa variação não
importa, nem precisa fundamentar-se, em inconstitucionalidade do
procedimento anterior. A simples margem de deliberação que resta
aos órgãos administrativos na execução das leis, de acordo com o
texto respectivo, permite-lhe alterar dentro dêsses limites os prin-
cípios ante-reguladores de seus atos, observando, está claro, a coe-
rência e a isonomia no tratamento dos casos semelhantes, dentro
do período de vigência das diferentes orientações.
No sistema até aqui adotado, ficava a administração com certa
liberdade casuística, para resolver em hipóteses concretas, pelos
critérios de conveniência, a abertura do concurso ou o aproveita-
mento de candidato já habilitado, enquanto que na aplicação defen-
dida pela Consultoria Jurídica, exclui-se essa flexibilidade, valendo
o concurso estritamente para cada vaga, salvo o caso de transfe-
rência.
Reaberto o debate, como solicita a ilustrada Consultoria Jurídica,
fica a administração, a nosso ver, em face das seguintes variantes,
que esquematizamos, tendo em vista a solução do presente processo:
1) continuar com a jurisprudência anterior, segundo a
qual é possível aproveitar concurso já realizado pelo can-
didato, para provê-lo em vaga da mesma cátedra;
2) alterar essa orientação administrativa, para declarar
que doravante somente serão considerados os concursos
feitos para cada cátedra.

Adotada que seja a segunda variante, acha-se, ipso facto, excluído


o deferimento da pretensão dos professôres da escola fluminense.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 123

Continuando no regime da primeira, surge então a necessidade de


estudar a conveniência do atendimento. As razões da Consultoria
valem como fundamentação da inconveniência do deferimento, ao
acentuar que se trata de acumulação, devendo-se ainda salientar que
a Escola foi criada em 1952, já em regime constitucional, e os pro-
fessôres admitidos como interinos, situação em que os encontrou a
federalização (Lei n.° 3.958, de 13/9/61). Não há, portanto, em jogo
nenhuma invocação de direito adquirido, cabendo à administração
livremente decidir se é mais conveniente instaurar o concurso para
o provimento dos cargos de que reconhecer para esse efeito concursos
anteriores, dos professôres interinos.
Nosso parecer é no sentido da inconveniência do atendimento
no caso concreto, 1
(A) José Barreto Filho, relator.

DECLARAÇÃO DE VOTO
Abgar Renault

O Parecer do nosso ilustre colega Barreto Filho é, como sempre,


límpido, brilhante, seguro, convincente. Dele não divergimos, nem
seria fácil que divergíssemos, pois apresenta duas soluções, ambas
aceitáveis, posto que ambas capazes, imediata ou remotamente, de
suscitar situações difíceis ou duvidosas, uma e outra com seus ele-
mentos favoráveis e desfavoráveis.
A primeira segue a linha de rumo da jurisprudência assim do
antigo Conselho Nacional de Educação como da administração federal
do ensino.
A segunda desvia-se dessa linha, atém-se rigorosamente à letra
da lei e fixa ponto-de-vista segundo o qual a cada cátedra deve
corresponder um concurso.
Aquela põe em linha de conta, acima de tudo, a consideração.
que parece legítima, de ser o objetivo do concurso a apuração de
competência, e essa competência já ter sido provada, e nos exatos
têrmos do art. 168, VI, da Constituição Federal, ou seja, mediante
a utilização do processo estabelecido no preceito citado, processo
cuja repetição seria ocioso e escusado exigir-se.
Argumenta-se que do dispositivo constitucional não se infere,
necessariamente, que o concurso deve ser exigido em cada caso de
cátedra vaga. Por outros têrmos: a prova de competência não
seria exigível mais de uma vez.
Pela segunda alternativa, o concurso é para a eventualidade do
preenchimento de cada cátedra e visa não apenas a apuração da
competência, senão que implica também, e necessariamente, a com-
petição ou, pelo menos, a possibilidade de competição, sim, pelo
menos a possibilidade, já que, se assim não fosse, não haveria con-
curso em que apenas um candidato se tivesse inscrito, pela razão
de que a competição deixaria de existir. Vale dizer: o simples
fato de haver sido aberto o concurso tornou possível a competição,
pois — graças a êle — se abriu oportunidade a todos quantos satis-
1 O último período do parecer acima, relativo à "inconveniência do atendi-
mento no caso concreto", resultou de um adendo, apresentado por ocasião dos
debates, razão pela qual as considerações dos votos em separado se baseiam apenas
o texto primitivo do parecer.
124 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

façam os preceitos legais de disputar a cátedra vaga, ao passo que,


na outra hipótese, se fecha, possivelmente, a porta a outros candi-
datos.
De outra parte, não será demasia afirmar uma vez mais a pre-
cariedade do processo de concurso, que, via de regra, é dominado
por circunstâncias sem nenhuma relação com os méritos do candidato
e o que menos apura, realmente, é o tipo de competência especia-
líssima expresso em têrmos de capacidade didática.
Não há a negar, porém, que, a despeito de tudo, num país como
o nosso, o concurso ainda se nos afigura ser não um processo idôneo,
mas o meio menos mau para selecionar os candidatos ao magistério
em geral.
Exerce, fundamentalmente, uma função depuradora inicial em
virtude das próprias exigências dos seus atos preparatórios. Talvez
não alcance mais do que isso, mas para o nosso meio já é, inegavel-
mente, de muita valia.
Em princípio, pois, não somos infenso à primeira solução apre-
sentada pelo ilustrado Conselheiro Barreto Filho em seu excelente
parecer, tanto mais quanto são numerosos os exemplos de catedrá-
ticos nomeados sem concurso anterior, no caso de muitas Faculdades
de Filosofia, Ciências e Letras, dada a sua condição de fundadores,
em razão de lei.
Se houvesse, em todos os casos, a segurança de que os candi-
datos seriam do valor intelectual e moral dos que subscrevem o
requerimento anexo, não haveria nenhum inconveniente para os
interesses do ensino em admitir-se para as vagas atuais a validade
de concursos realizados para outras cátedras. Não há, porém, tal
segurança, como não há tampouco a de que as cátedras serão efeti-
vamente exercidas pelos nomeados, em vez de o serem por assistentes
que, de resto — seja assinalado de passagem, — poderiam ser crite-
riosamente escolhidos e ministrar ensino de boa qualidade sob a
direção dos catedráticos.
Por outras palavras: entre atermo-nos rigorosamente à lei e a
ela refugirmos, desde que resguardados os interesses do ensino, nós
nos inclinaríamos pela segunda hipótese.
Mas, como não será possível ao Conselho decidir, em cada caso,
de maneira diferente, em conformidade com o julgamento que fizer
de cada candidato, o que nem sempre poderá ocorrer e, Conseguinte-
mente, será suscetível de eivar de parcialidade as suas decisões,
ficaremos com a segunda hipótese, deixando claro todavia que, no
caso vertente, não consideramos contrária, mas, ao revés, favorável
aos interesses do ensino a solução contida na primeira alternativa
do parecer do nosso eminente colega Barreto Filho.
(a) Abgar Renault

DECLARAÇÃO DE VOTO
Conselheiros Ajadil Lemos e
A. Almeida Júnior

1. Discordamos frontalmente da orientação adotada pelo ilustre


Relator, exceto na afirmativa de que não há, para os interessados,
nenhum direito adquirido em seu prol.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 125

2. No caso concreto, desnecessário será reportarmo-nos à polê-


mica sôbre a conveniência, ou não, de ser mantido o sistema de
cátedras vitalícias.
Trata-se, apenas, de opinarmos sôbre a viabilidade jurídica de
professôres catedráticos poderem ser investidos, nessa qualidade, em
cadeiras da mesma natureza por ato executivo, independentemente
de novo concurso de títulos e provas. O argumento suscitado é o
de que a exigência constitucional estaria satisfeita desde que os
interessados já têm, na espécie, concurso nas cadeiras pretendidas
e isto porque não se infere imediatamente do texto em causa a
especificidade do concurso para cada vaga.
Leia-se, uma vez mais, o art. 168, VI, do Código Federal: para
o provimento das cátedras, no ensino secundário oficial e no superior
oficial ou livre, exigir-se-á concurso de títulos e provas. Como dele
transluz, a exigência de concurso é imperativa, inarredável. Não
há nenhuma outra forma de provimento de cátedras, no sistema
vigente, que não a de prévia concursação de títulos e provas, para
cada vaga.
Para tranqüilizar o problema jurídico, o nosso eminente Conse-
lheiro Almeida Júnior teve oportunidade de pedir pareceres, todos
unânimes, dos insignes mestres Sampaio Dória, Waldemar Ferreira,
Miguel Reale (também subscrito por Mário Masagão), Washington
de Barros Monteiro e Anhaia de Mello, cujo inteiro teor nos permi-
timos pedir fique a êste incorporado, para publicação em anexo.
3. Sustenta-se que o concurso não é o método ideal de seleção
para o magistério. A verdade, todavia, parece ser a de que ainda
não se descobriu melhor nem de mais moralidade.
Jamais será jurídico sustentar-se que a aprovação em concurso
anterior passe a valer como o próprio concurso. A tôda evidência,
o concurso anterior constituirá apenas um dos títulos do candidato
ao provimento de nova cátedra. O preceito constitucional não se
satifaz com títulos, mas também quer provas, abrindo-se a demo-
crática oportunidade para todos e em a qual todos sejam iguais
perante a lei (arts. 141, § 1.°, e 184).
Ademais, a questão não é a de presumir-se a capacidade em
relação à dos demais concorrentes, para efeito de classificação e
adjudicação, ou não, da cátedra, levando em conta, inclusive, o padrão
cultural da faculdade onde tiver ocorrido a vaga.
4. Pede-se, nesta matéria, pela primeira vez, o pronunciamento
dêste Conselho.
Aqui, portanto, devemos falar como educadores mais que even-
tualmente juristas. Por certo, a melhor lição do educador é a do
exemplo. Digamos assim, menos ao Senhor Ministro que às novas
gerações de universitários, que o concurso de títulos e provas para
o provimento das cátedras, no Brasil de hoje, ainda é o sistema
de mais moralidade e menos sensível às seduções, de qualquer ordem,
que tentam debilitar ou defraudar a alta dignidade do Magistério.
Façamos ouvir essa voz, que nos é pedida, para que a Consti-
tuição seja, aqui, uma realidade viva e não um papiro esquecido
numa ordem jurídica a que não é lícito alegar ignorância para
descumprir a Lei.
Cumpra-se, pois, a Constituição na sua letra e no seu espírito.
Nem outro poderá ser o nosso conselho. (aa.) Ajadil de Lemos
e A. Almeida Júnior.
126 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

DECLARAÇÃO DE VOTO
Conselheiro Péricles Madureira de Pinho

1. O Conselho é consultado sôbre a possibilidade ou não de


serem aproveitados, em cátedras efetivas, professôres que as regem
interinamente em universidade federal e são titulares, por concurso.
dessas mesmas cátedras em outra universidade, também federal.
A controvérsia que se apresenta é em torno da extensão do art.
168, n.° VI, da Constituição Federal, que estabelece o princípio da
exigência de concurso de títulos e provas para o preenchimento das
cátedras, no ensino secundário oficial e superior, oficial ou livre.
2. Em casos tais, de simples consulta, é útil que se procure
fixar a natureza jurídica d ê s t e . órgão, já que os têrmos da Lei de
Diretrizes e Bases deixam margem a interpretações várias.
Há os que sustentam que o C . F . E . é um órgão de existência
externa ao Ministério e acima dele, desde que o art. 7.° da LDB diz
que o cumprimento das suas decisões, incumbe ao próprio Ministério.
Não nos parece, entretanto, que êste Conselho tenha tal posição.
É verdade que t e m competência regulamentar muito ampla, caben-
do-lhe desenvolver a política geral da educação, mas em quase todos
os itens de sua competência ela está subordinada à homologação do
Ministro do Estado. Os atos praticados pelo Conselho não são, desse
modo, atos de império e sim dão início a atos continuados, conforme
a classificação jurídica dos atos administrativos.
3. No caso dêste processo, como em tantos outros, nos cabe
apenas indicar solução, a ser submetida ao Ministro, deixando ainda
à própria Universidade tôda a liberdade para dizer da conveniência
e oportunidade das nomeações.
A declaração de voto dos eminentes professôres Ajadil Lemos
e Almeida J ú n i o r obedece, pura e simplesmente, ao dispositivo cons-
titucional invocado.
Os votos dos ilustres Conselheiros Barreto Filho e Abgar Renault,
por considerações diversas, concluem por u m a interpretação mais
ampla, admitindo que, u m a vez prestado concurso, obedecido está o
preceito da Constituição.
Todos estão acordes em que não há direito adquirido e os que
votaram favoravelmente ressalvam a necessidade de exame, em cada
caso, para resguardo dos interesses do ensino.
4. Não sendo o Conselho órgão do Poder Judiciário (conforme
oportuno e recente pronunciamento do ilustre conselheiro D. Cândido
Padim — Documenta n.° 13, pág. 31) e nos cabendo precipuamente
a elaboração de u m a política educacional, não há, a nosso ver, como
fugir ao exame de conteúdo da norma a ser aplicada e dos seus
resultados. Vivemos uma época em que a democracia deixou de ser
formal e estritamente jurídica para se transformar n u m regime
funcional e de progresso.
Edgar Faure, antigo Primeiro Ministro e figura altamente quali-
ficada do m u n d o intelectual da França, em recentíssimo trabalho
comemorativo da obra de J e a n Jacques Rousseau, define a ordem
jurídica atual como um novo contrato social. "O 1.° — diz êle —
é o contrato de segurança, o 2.° é um contrato de progresso". E
continua: "A concepção inicial de uma democracia é de uma demo-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

cracia jurídica; a nova concepção é de u m a democracia beneficiária".


(Le nouveau Contraí Social — "Monde Hebdomadaire", 18-24 abril.
1963).
Para os que entendem, como nós, que o regime de r e c r u t a m e n t o
do Magistério superior deve se adaptar às exigências da vida atual,
com a sua desbragada concorrência, a interpretação literal dos dispo-
sitivos da Constituição cede aos argumentos em favor dos que
opinaram por um entendimento menos rígido.
Não chegamos à sátira de Pontes de Miranda, que diz nos seus
comentários à Constituição:
"A União em verdade só se preocupa com o ensino superior,
organizado pelos piores métodos: no começo da vida, o candidato
faz a tese, submete-se a concurso, e de regra só se interessa pela
profissão de médico, advogado ou engenheiro, sem aquela ligação
entre ciência — que há de ser a do dia — e professorado. Não se
atraem grandes especialistas, que pudessem pôr em dia o ensino. A
cátedra significa prender-se a ciência, que se ensina, à eventualidade
de trinta anos de alguma mediocridade que com o prestígio político.
ou de família, "ganhou"o concurso. As exceções são raras, porque
supõem que o vencedor continue a dedicar-se à ciência" (Com. à
Constituição — Edição Borsoi de 1960, pág. 213, tomo VI).
Há, todavia, na candência dêsses comentários íntima relação com
a necessidade de u m a nova forma de acesso, dos mais capazes, às
cátedras universitárias, estimulando um trabalho científico cada vez
mais intenso, ao invés da mineralização a que chegou o regime das
cátedras vitalícias.
Estas considerações têm cabimento n u m parecer em que se
deixa à Universidade a escolha entre mestres já habilitados no atual
regime legal ou permitir o recrutamento de elementos outros que
porventura sejam também indicados para as cátedras vagas.
É um ensaio do sistema de livre escolha, que se não pode fazer
sem reforma constitucional, mas, a nosso ver, de todo desejável
para a reforma universitária, tão combatida por uns, tão exaltada
por outros.
São os motivos que nos levam a adotar o ponto de vista susten-
tado pela jurisprudência, segundo o qual é possível aproveitar con-
curso já realizado.
(a) P. M. Pinho

INTERPRETAÇÃO DO ART. 18 DA L . D . B .

Parecer n.° 91/63, C . L . N . , Aprov. em 9-5-1963 — O eminente


Conselheiro Brusa Neto consulta a Comissão de Legislação e Normas
sôbre o verdadeiro alcance do art. 18 da Lei de Diretrizes e Bases,
particularmente da expressão — aluno reprovado "mais de u m a vez
em qualquer série ou conjunto de disciplinas", nos estabelecimentos
oficiais.
Tratando-se de curso seriado, o enunciado vale por si mesmo.
impedindo que o aluno possa repetir a mesma série, mais de u m a
vez, em conseqüência de reprovação, de acordo com o sistema de
promoções adotado no estabelecimento. Quando estiver prevista a
promoção por dependência, e o aluno fôr promovido à série seguinte.
é claro que não se considera reprovado na série anterior.
128 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

A dificuldade reside mais na interpretação do que seja o "con-


junto de disciplinas", que não foi conceituado diretamente na lei.
Como, porém, não seja de admitir nela alguma coisa de supérfluo,
temos de precisar-lhe a intenção pesquisando outros dispositivos
que possam esclarecê-la.
A expressão "conjunto de disciplinas" sugere a idéia de um
sistema de estudos, reunindo ou agrupando disciplinas que não
constituem uma série normal realizada num mesmo estabelecimento.
A única hipótese que atende a esses requisitos é a que foi prevista
nos §§ 4.° e 5.° do art. 79, que dispõem:
§ 4.° — O ensino nas universidades é ministrado nos estabeleci-
mentos e nos órgãos complementares, podendo o aluno
inscrever-se em disciplinas lecionadas em cursos diver-
sos, se houver compatibilidade de horários e não se
verificar inconveniente didático, a juízo da autoridade
escolar.
§ 5.° — Ao Conselho Universitário compete estabelecer as con-
dições de equivalência entre os estudos feitos nos dife-
rentes cursos.

Ao lado do curso seriado, portanto, admitiu a lei a possibilidade,


que só pode ocorrer em Universidade, de vir o aluno a desenvolver
estudos mediante a inscrição em disciplinas lecionadas em cursos
diversos, em lugar de matricular-se numa série completa do mesmo
estabelecimento. Essas opções parceladas formarão, entretanto, um
conjunto sistemático, de acordo com as disposições reguladoras dos
estatutos ou regimentos e as condições de equivalência estabelecidas
pelo Conselho Universitário. O regime de aluno vai ficar assim
definido como um "conjunto de disciplinas" que êle escolheu para
aquêle ano letivo.
O aluno pode preferir essa modalidade de currículo, quer para
fins profissionais, isto é, para acumular créditos em disciplinas que
depois de reunidos bastem para lhe fornecer um diploma válido
para o exercício profissional, quer para fins puramente culturais.
Cabendo ao estatuto a equivalência de estudos feitos em diferentes
cursos, é da maior conveniência definir com precisão o sistema em
cada universidade, atendendo aos fins a que se propõe o aluno. No
caso de formação profissional, se o conjunto escolhido em cada
ano corresponder ao das disciplinas de uma série de curso de gra-
duação, embora a serem estudadas em cursos diversos, o problema
do art. 18 se reduz ao da promoção por série.
Quando não coincide ou o aluno pretende simplesmente fazer
um conjunto com finalidade cultural, seu regime deverá ser orga-
nizado pelas autoridades da escola, com observância do art. 18:
reprovado uma vez em qualquer disciplina, isto é, dentro do conjunto
adotado, terá oportunidade de escolher o mesmo ou outro conjunto
no ano seguinte e, se fôr reprovado novamente em qualquer disci-.
plina, sofrerá a eliminação prevista, (aa) José Barreto Filho, relator.
A. Almeida Júnior, Ajadil de Lemos, Abgar Renault.

OS CONSELHOS ESTADUAIS E A REMUNERAÇÃO


CONDIGNA DOS PROFESSÔRES
Parecer n.° 137/63, C . L . N . , Aprov. em 7-5-1963 — 1. A pro-
pósito da "remuneração condigna" dos professôres, a que se refere
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 129

o art. 16 da L.D.B., o digno Cons. J. Borges dos Santos, da Comissão


de Ensino Primário e Médio, formulou à Comissão de Legislação e
Normas a seguinte consulta:
"A quem é que compete fixar critérios de salário? Aos Con-
selhos Estaduais ou ao Ministério do Trabalho? Compete aos
•Conselhos Estaduais fixar somente as normas para a verificação da
existência de garantia de remuneração condigna, ou também o
critério de remuneração?"
2. A fim de respondermos à consulta, façamos um breve
retrospecto da matéria. A Consolidação das Leis do Trabalho (Dec-
lei n.° 5 425, de 1-5-43) estabelecia o seguinte:
"Art. 323. Não será permitido o funcionamento de estabeleci-
mento particular de ensino que não remunere condignamente os
seus professôres, ou não lhes pague pontualmente a remuneração
de cada mês.
Parágrafo único. Cumpre ao Ministério da Educação e Saúde
fixar os critérios para a determinação da condigna remuneração
aos professôres, bem como assegurar a execução do preceito esta-
belecido no presente artigo."
Com apoio nesse artigo e respectivo parágrafo, foram expedidas
pelo Ministério da Educação e Saúde sucessivas portarias, cada
uma das quais procurava aproveitar a experiência ensejada pela
portaria anterior e adaptar-se às mutações ocorridas na situação
econômico-financeira do país.
3. Sobrevindo a Constituição Federal de 1 946, e com ela novos
preceitos aplicáveis à matéria, iniciou-se controvérsia a respeito da
validade do parágrafo único do art. 323 da Consolidação das Leis
do Trabalho. E, conseqüentemente, a respeito também da vigência
das portarias ministeriais atinente à remuneração condigna dos
professôres. Para melhor entendimento do assunto, transcrevemos
os preceitos constitucionais de interesse para o caso:
"Art. 123. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar
os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores,
e as demais controvérsias oriundas de relações do trabalho, regidas
por legislação especial.
Art. 157. A legislação do trabalho e a da previdência social
obedecerão aos seguintes preceitos, além de outros que visem à
melhoria da condição dos trabalhadores:

XIII — reconhecimento das convenções coletivas de trabalho.


Parágrafo único. Não se admitirá distinção entre o trabalho
manual ou técnico e o trabalho intelectual, nem entre os profis-
sionais respectivos, no que concerne a direitos, garantias e bene-
fícios."
4. Diante dêsses imperativos constitucionais, o Supremo Tri-
bunal Federal (l. a Turma), em acórdão relatado pelo Ministro
Mário Guimarães, decidiu que:
"A intromissão de um Ministro de Estado na fixação de salário
poderia ser admissível ao tempo da Carta Política de 37. Hoje,
porém, em face dos princípios que disciplinam a separação de
poderes, não passaria de extravagância".
Por outro lado, diz ainda o v. acórdão, citando o art. 123 e o
art. 157, parágrafo único, ambos da Constituição Federal:
"Tudo quanto se refere a trabalho, quer manual, quer intelec-
tual, está presentemente cometido à Justiça Trabalhista. O art.

9
130 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

323, parágrafo único, da Consolidação perdeu todo vigor. Nem há


necessidade de declará-lo inconstitucional porque a Carta de 46 lhe
é posterior" (Recurso extraordinário n.° 21 233, acórdão de 30-7-1 953).
5. Estarão realmente revogadas todas as portarias ministeriais
baixadas com apoio no parágrafo único do art. 323 da Consolidação
das Leis do Trabalho? Inclusive a de n.° 204, que alguns consideram
ainda legítima, visto ser de data anterior à da Constituição de 1 946?
Contra os argumentos que sustentaram o v. acórdão relatado pelo
Ministro Mário Guimarães, houve numerosas objeções de juristas de
renome (V. C. Souza Neves. — "O Ensino Superior no Brasil", 1 955,
III v., págs. 683-692). Mas o fato é que a Justiça trabalhista não
demorou em aceitar a doutrina radical esposada naquele acórdão,
como se pode ver em alguns de seus arestos.
6. Assim, por exemplo, em sua sessão de 16-5-1 957, manifes-
tando-se sôbre o dissídio coletivo 3-1 956, suscitado entre uma fede-
ração de estabelecimentos de ensino e duas entidades de professôres,
o Tribunal Superior do Trabalho resolveu, mediante voto de desem-
pate,
"considerar procedente o dissídio, para, julgando insubsistente o
parágrafo único do art. 323 da Consolidação das Leis do Trabalho
após o advento da Constituição Federal, declarar derrogadas todas
as portarias emanadas do Ministério da Educação e Cultura" (D. O.
da Justiça, 17-5-1 957).
7. Mais recentemente, outra decisão, da mesma natureza, e de
igual sentido, chegou ao Supremo Tribunal Federal por via de
recurso extraordinário e foi ali acolhida por unanimidade. Eis o
que diz a respectiva "ementa" publicada em 18 de abril próximo
passado:
"Ementa — Salário de professôres. Revogação do art. 323 da
Consolidação das Leis do Trabalho pela Constituição de 1 946. Dife-
rença entre revogação e anulação. Na espécie o que se fêz foi acatar
o julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho em dissídio coletivo
do qual fora interposto recurso extraordinário sem efeito suspensivo".
Relator M. Luiz Galotti. Recorrente, João M . . . Recorrido —
Instituto Educacional "O Piracicabana". D. O. da Justiça, 18-4-1 963,
fls. 953.
8. Agora, afastadas que foram as portarias do Ministério da
Educação, como fixar os critérios para o cálculo do salário dos
professôres do magistério particular? Em primeiro lugar estão as
leis que se venham a promulgar, à vista do disposto no art. 157 da
Constituição da República, em sua alínea n.° I:
"Art. 157. A legislação do trabalho e a da previdência social
obedecerão aos seguintes preceitos, além de outros que visem à
melhoria da condição dos trabalhadores:
I — salário mínimo capaz de satisfazer, conforme as condições
de cada região, às necessidades normais do trabalhador e sua família."
9. Em segundo lugar vêm as convenções coletivas de trabalho,
previstas no mesmo art. 157, que determina o seguinte:
"XIII — reconhecimento das convenções coletivas de trabalho."
Tais convenções coletivas, ou "acordos salariais coletivos", ten-
dem a ganhar terreno em relação ao magistério; mas pressupõem a
existência de associações profissionais ou sindicais, conforme o pre-
visto no art. 159 da Constituição Federal.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 131

10. Em terceiro e último lugar está a Justiça do Trabalho,


cujas decisões, nos dissídios coletivos, poderão erigir-se em "normas
e condições do trabalho", segundo dispõe o § 2.° do art. 123 da
Constituição Federal:
"§ 2.° A lei especificará os casos em que as decisões, nos
dissídios coletivos, poderão estabelecer normas e condições de tra-
balho."
11. Como se vê, nos têrmos da Constituição Federal são três
as fontes de que podem provir os critérios ou normas para a "remu-
neração condigna aos professôres", de que trata a alínea "d" do
art. 16 da L.D.B.: o Poder Legislativo, os protocolos salariais e a
Justiça do Trabalho.
12. Aos Conselhos Estaduais de Educação (ou ao Conselho
Federal em relação às escolas vinculadas ao sistema federal), cabe
apenas isto, segundo o § 3.° do art. 9.°, combinado com o item "d"
do art. 16:
"fixar normas que lhe permitam assegurar-se de que o estabe-
lecimento particular, primário ou médio, que requer autorização ou
reconhecimento, ou que funciona sob qualquer dêsses dois regimes,
oferece "garantia" de remuneração condigna."
Quais serão essas garantias? Parece-nos difícil prevê-las todas;
mas as de maior importância são a capacidade financeira e o sistema
contratual adequado para atender ao pagamento da "remuneração
condigna", conforme fique conceituada pelos órgãos competentes, (aa)
A. Almeida Júnior, relator. Ajadil de Lemos, Abgar Renault, José
Barreto Filho.

SITUAÇÃO DA COMISSÃO NACIONAL DO LIVRO


DIDÁTICO EM FACE DA L.D.B.

Parecer n.° 145/63, C.L.N. Aprov. em 9-5-1 963 — 1. Por ofício


de 18-7-1 962, anexado ao Proc. n.° 108 781/58, a Sra. Lúcia Maga-
lhães sugeriu que, a respeito da Comissão Nacional do Livro
Didático, de que é Presidente, fosse ouvido o Conselho Federal de
Educação, para dizer da situação e atribuições daquela entidade em
face da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Atuando
em nome do senhor Ministro da Educação e Cultura, o represen-
tante de Sua Excelência no Estado da Guanabara aceitou e efetivou,
por despacho de 15-2-1 963, a proposta da Sra. Presidente.
2. A matéria submetida ao nosso exame, tratada inicialmente
no Dec.-lei n.° 1 006, de 30-12-1 938, e, a seguir, numa série de
outros atos legislativos e administrativos do poder central da Repú-
blica (fls. 22-23), consolidou-se finalmente do Dec.-lei n.° 8 460, de
26-12-1 945. É a respeito da validade desse decreto-lei, primeiro
em face da Constituição Federal de 1 946 e, a seguir, perante a
L.D.B., que nos cabe encarar a consulta.
3. Uma primeira arguição de inconstitucionalidade, formulada
contra o citado decreto-lei antes mesmo da promulgação da L.D.B.
(fl. 25), apoiou-se no art. 141 da Carta Magna vigente, artigo cujo
§ 5.° assegura "a livre manifestação do pensamento, sem que dependa
de censura", e declara que "a publicação de livros e periódicos não
dependerá de licença do poder público". Quanto a esse ponto, já
se manifestaram no processo, em defesa do decreto-lei, o sr. Consultor
132 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Jurídico e outro funcionário do M.E.C. (fls. 44 e 84), para dizerem,


em substância, que o que se autoriza, ou se impede, no caso, não
é a publicação do livro e sim o seu uso pela escola. De fato, o
mesmo princípio que permite recusar salas de aula sem luz, móveis
escolares inadequados ou professôres sem formação pedagógica, auto-
riza o poder público a obstar que o ensino da criança ou do adoles-
cente seja feito através de livros sem correção científica, sem gramá-
tica, sem higiene ou sem moral.
4. A segunda arguição contra o Dec.-lei n.° 8 460, somos nós
que a formulamos agora, e refere-se à sua incompatibilidade tanto
com a Constituição Federal como com a L.D.B. O citado decreto-lei
(já o dissemos) consolidou uma longa série de atos legislativos e
administrativos expedidos sob a vigência da Carta Constitucional de
1 937 e inspirados no mesmo espírito centralizador que presidiu à
elaboração da referida Carta. Esse elemento histórico faz prever,
desde logo, que a Comissão Nacional do Livro Didático, criada em
1 938 e retocada ano a ano segundo a orientação dominante, não
poderia ajustar-se à Constituição atual e, menos ainda, à L.D.B.,
nascidas ambas sob o signo da descentralização.
5. A Carta Magna de 1 946, opondo-se à de 1 937, restabeleceu
e ampliou, em matéria educacional, a autonomia das unidades fede-
radas, que a primeira Constituição republicana nos legara: "A União
organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios"; "os
Estados e o Distrito Federal organizarão os seus sistemas de ensino"
— declaram respectivamente os art. 170 e 171 da Carta de 1946. Se já
sob os regimes de 1 891 e de 1 934, menos descentralizadores que o
atual, cada Estado tinha poderes para aprovar ou recusar os livros
didáticos oferecidos às suas escolas primárias, é natural que sob o
regime de hoje retomem eles aquela prerrogativa e a estendam aos
livros de grau médio, cujas escolas vão passar inteiramente ao seu
controle.
6. A incompatibilidade entre o regime atual e a existência de
um órgão censor, de amplitude nacional, para a literatura didática,
torna-se mais evidente ainda se, a respeito dessa matéria, pusermos
em confronto a Constituição vigente e a L.D.B. Lembremo-nos de
que a ampla autonomia educacional, conferida hoje às unidades
federadas, sofre limitação de duas origens: primeiro, as que constam
do próprio texto constitucional; depois, as que a L.D.B. consigna.
Ora, nem na Constituição de 1 946, nem na L.D.B. existe qualquer
dispositivo que direta ou indiretamente aluda à literatura didática.
Donde dever-se aplicar ao caso a regra constante do § 1.° do art. 18
da Carta Magna vigente:
"§ 1.° Ao Estado se reservam todos os poderes que,
implícita ou explicitamente, não lhes sejam vedados por esta
Constituição."

7. A conclusão se impõe: aos Estados, e não ao poder central


é que cabe legislar sôbre livros didáticos. Quanto à União, deve
ela, no particular, cingir-se ao seu próprio sistema de ensino e ao
dos Territórios (art. 170 da Const. Fed.). Poderia a União, certa-
mente, ter chamado a si competência mais ampla, através da L.D.B.:
mas não o fêz. E andou bem não o fazendo, pois com isso mostrou
ter-se inspirado, não apenas na própria experiência brasileira de
federação, mas também na experiência das outras federações. Com
efeito, a Alemanha Ocidental, a Austrália, o Canadá, os Estados
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 133

Unidos, a Índia, a Suíça, a União Sul-Africana e a Iugoslávia não


possuem nenhum órgão central análogo à nossa Comissão Nacional
do Livro Didático: são os Estados-membros que decidem sôbre a
matéria, quando não são os órgãos municipais e até mesmo cada
escola ou cada professor por si (XXII Conferência Internacional da
Instrução Pública, Genebra, publicação n.° 203).
8. Justifica-se, todavia, a existência de um órgão da União que,
na área do sistema federal de ensino e na dos Territórios, aprecie
os livros escolares que lhe forem apresentados e, de modo geral
estimule o aprimoramento da literatura didática no país. (aa) A.
Almeida Júnior, relator. Abgar Renault, José Barreto Filho, Ajadil
de Lemos.

REGIME DE DEPENDÊNCIA EM ESCOLA DE


NÍVEL MÉDIO

Parecer n.° 170/63, C.E.P. e M. Aprov. em 10-5-1 963 — A con-


sulta do Inspetor Federal José Lourenço Kunz, de Porto Alegre,
transformada em consulta do Sr. Presidente do Conselho, versa sôbre
a legitimidade de promoção, com dependência, em escola de nível
médio. Tal regime, admitido pelo Regimento do Ginásio São Judas
Tadeu, de Porto Alegre, trouxe dúvidas ao referido Inspetor Federal,
principalmente pela possibilidade de transferência de alunos repro-
vados em escola que não admite a dependência, para outra que a
admite.
As principais dúvidas levantadas são de ordem jurídica e ética.
1. se tal procedimento (a transferência com promoção) não
fere um ato juridicamente perfeito e acabado, já que as disposições
do Regimento fazem lei entre as partes;
2. se o ato é conciliável com os princípios de ética que devem
informar as relações entre os estabelecimentos de ensino.
Importa, antes de tudo, ressaltar que as dimensões humanas do
processo educacional são de tal forma ricas e complexas que não
podem ser reduzidas aos estreitos limites de um contrato entre
partes. Não serão normas puramente jurídicas que lhe definirão as
exigências. A grande conquista da Lei de Diretrizes e Bases consiste,
exatamente, em ter oferecido a possibilidade de se colocar o centro
do processo educacional nos interesses autênticos do estudante e no
senso de responsabilidade do educador. A conseqüência decorrente
dêste espírito é o princípio, amplamente firmado por êste Conselho,
da autonomia da escola. Não uma liberdade arbitrária, mas a auto-
nomia orientada para o melhor desenvolvimento humano da criança
e do jovem.
Não se podem, por isso mesmo, estabelecer soluções rígidas e
uniformes mas, ao contrário, deve-se permitir que a equipe de educa-
dores de cada escola crie o sistema pedagógico julgado adequado
aos seus fins e por cuja aplicação se tornará responsável perante a
sociedade e os órgãos públicos encarregados de vigiar a observância
da Lei e certas cautelas que assegurem um mínimo de qualidade e
de segurança ao processo educacional.
É dentro de tais diretrizes que julgamos dever-se enquadrar o
objeto desta consulta.
134 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

O regime proposto cuida, sem dúvida, de solucionar situações


de exceção. A promoção com dependência, no nível médio, deve
constituir caso raro. Principalmente porque se trata da educação
de adolescente, cujo processo formativo requer maior regularidade
e continuidade. Não será admissível, portanto, quando importar em
desequilíbrio do processo de desenvolvimento do educando. E, mesmo
quando admissível, exigirá cuidados pedagógicos especiais, capazes
de promover o reajuste de uma fase deficiente da aprendizagem.
Por todas estas razões, opinamos favoravelmente à adoção do
regime de promoção com dependência, em escola de nível médio.
dentro das seguintes diretrizes:
1. não deveria haver dependência do 1.° para o 2.° ciclo, pois
esta segunda fase tem objetivos acentuadamente diversificados, nem
da última série do 2.° ciclo para um curso de nível superior; pela
mesma razão não seria admissível da 2.a série colegial para um
colégio universitário;
2. não deveria haver dependências em disciplinas cujo desen-
volvimento continua na série imediatamente seguinte;
3. em qualquer caso, a dependência só seria admissível em
uma só disciplina, pois a imaturidade do adolescente não lhe permite
maior sobrecarga;
4. o regime só seria admissível em escola que oferecesse con-
dições suficientes para se responsabilizar pela aplicação de processos
pedagógicos capazes de promover a recuperação do aluno dependente;
5. a adoção do regime deveria constar explicitamente do Regi-
mento da escola, aprovado pelo órgão competente;
6. as transferências de alunos, entre escolas de regimes diversos,
regem-se pelas normas gerais fixadas pelo órgão competente, ao qual
compete corrigir possíveis irregularidades.
No presente ano letivo, a adoção dêste regime não deveria ter
efeito retroativo, só vigorando nas escolas que o adotaram no início
do ano em seu Regimento, (aa) D. Cândido Padim, relator. José
Borges dos Santos, Pe. José de Vasconcelos, Faria Góis.

ADAPTAÇÃO DOS ALUNOS DA 6.a SÉRIE PRIMÁRIA

Parecer n.° 176/63, C.E.P. e M., aprov. em 6-6-1 963 — O Sr.


Cons.0 Ajadil de Lemos encaminha a êste Conselho consulta recebida
sôbre "as exigências ou normas, para que os alunos que concluíram
o 6.° ano primário, possam prestar exames, ingressando na 2.a série
do 1.° ciclo, de acordo com o parágrafo único do art. 36 da L.D.B.".
O parágrafo citado na consultaa é suficientemente explícito: "Ao
aluno que houver concluído a 6. série primária será facultado o
ingresso na 2. a série do 1.° ciclo de qualquer curso de grau médio,
mediante exame das disciplinas obrigatórias da l. a série" (os grifos
são nossos).
Cumpre apenas ressaltar as exigências decorrentes da própria
natureza do exame:
1. o candidato deve apresentar documento idôneo que prove
ter êle concluído, com proveito, a 6.a série primária em
escola que satisfaça às exigências dos arts. 16 e 26 da lei;
2. sendo, como é, exame de adaptação, deve ser feito na escola
para a qual o aluno se transfere;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 135

3. como para estes exames nada estabelece a L.D.B. de espe-


cial, julgo que se enquadram no dispositivo geral contido
no art. 39, ou seja, ficam "a cargo dos estabelecimentos de
ensino" e "serão prestados perante comissão examinadora.
formada de professôres do próprio estabelecimento, e, se
êste fôr particular, sob fiscalização da autoridade compe-
tente".

Estas normas se referem ao sistema federal de ensino, uma vez


que, para as adaptações, deverão respeitar-se as disposições com que,
em obediência ao art. 100 da L.D.B., os conselhos estaduais, nos
diversos sistemas de ensino, regularem a matéria, (aa) Pe. José de
Vasconcelos, relator. José Borges dos Santos, D. Cândido Padim,
Brusa Neto.

PLANO DE APLICAÇÃO DAS VERBAS VINCULADAS


AO C.F.E.

Parecer n.° 187/63, C. Especial, aprov. em 29-7-1 963 — O plano


de aplicação das verbas vinculadas a êste Conselho, para cumpri-
mento da atribuição que lhe fixou o art. 96 da L.D.B. foi aprovado
pelo Par. n.° 44/63, determinando que cada projeto específico de
estudos fosse submetido à aprovação dêste plenário.
O Sr. Secretário Geral, em informação ao Sr. Presidente do Con-
selho, encaminha agora dois projetos elaborados pelos técnicos em
estatística, os bacharéis Hélio Göpfort e Pedro Henrique P. Saint
Martin. A informação é do seguinte teor:
"1. De acordo com o Plano de distribuição das verbas orçamen-
tárias, sob consignação 3-1-07; 3-1-12 e 3-1-22, para atender
despesas decorrentes das atividades constantes do art. 96 da
Lei n.° 4 024, de 20-12-1 961, aprovado pelo Sr. Ministro da
Educação, apresento, junto, projeto referente à parte dos
itens I, III e IV, ou seja:
"Estudos relativos ao funcionamento dos sistemas escolares
e apuração do custo por aluno, para fins de avaliação da
sua produtividade, do ponto-de-vista quantitativo e quali-
tativo:
a) Em ensino Primário
b) Em ensino Médio
c) Em ensino Superior.
2. Trata-se, de início, de 2 trabalhos, tendo por finalidade
apresentar o custo do ensino no País, em 1 963 e os critérios
técnicos indispensáveis para os levantamentos ulteriores.
3. Primeiro trabalho:
a) Levantamento do custo do ensino, por aluno, nos graus
primário, médio e superior, no ano de 1 961, por Uni-
dades da Federação, segundo as despesas realizadas,
tomando-se por base as informações constantes dos
formulários SDC-01, 02, 03 e 04 do Serviço de Esta-
tística da Educação e Cultura do M . E . C ;
b) Crítica e análise dos resultados obtidos;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

c) Estudo da projeção 1 962 para 1 963 e 1 964.


Tempo previsto: 3 meses.
4. Segundo trabalho:
a) Decomposição analítica do custo;
b) Elementos necessários para o cálculo do custo. Esta-
tística existente no País referente ao custo do ensino»
sua qualidade e atualidade;
c) Consecução de elementos necessários para o cálculo e
análise do custo. Possibilidade de obtenção destes dados
através da Técnica de Amostragem; Vantagens e desvan-
tagens. Condições imprescindíveis para a adoção da
amostragem. Esquemas de amostragem que podem ser
adotados especificando qual o melhor, segundo as con-
dições de erro, tempo e custo da pesquisa.
Tempo previsto: 5 meses.
5. Serão os dois trabalhos realizados sob a responsabilidade de
Hélio Gõpfort e Pedro Henrique P. Saint Martin, bacharéis
em Ciências Estatísticas pela Escola Nacional de Ciências
Estatísticas e dispondo da colaboração do S.E.E.C.
6. Preço: Primeiro trabalho:
Cr$ 300.000,00 (trezentos mil cruzeiros), que deverão ser
pagos mensalmente em parcelas de Cr$ 100.000,00 (cem mil
cruzeiros).
Segundo trabalho:
Cr$ 500.000,00 (quinhentos mil cruzeiros), que deverão ser
pagos mensalmente em parcelas de Cr$ 100.000,00 (cem mil
cruzeiros).
7. A parte relativa ao funcionamento dos sistemas escolares
e avaliação da produtividade do ponto-de-vista qualitativo e
quantitativo constituirão estudos posteriores, baseados nos
trabalhos acima indicados, a serem feitos por especialistas
em educação, assessorados por técnicos estatísticos.
8. Solicito se digne V. Exa. submeter a plenário o presente
projeto, dentro de um programa de execução progressiva.
e, para tal, designar relator".

Ambos os projetos são, sem dúvida, de grande valia para o


levantamento de dados imprescindíveis aos estudos que a êste Con-
selho cabe elaborar para uma adequada avaliação do rendimento
quantitativo e qualitativo dos investimentos no setor de ensino.
Na realidade, porém, são apenas projetos preliminares, cujos
resultados permitirão o preparo de outro, de maior envergadura.
para uma aferição mais segura dos índices de custo do ensino nos
vários níveis.
A precariedade dos resultados do primeiro, aliás, já pode ser
prevista pelos formulários que têm sido utilizados pelo S.E.E.C. do
M.E.C, anexados a êste processo. É o que se tornou explícito e
público até mesmo em publicações desse Serviço sôbre despesas
com o ensino.
Justifica-se, no entanto, o levantamento dêsses dados existentes.
para que se tenha um conhecimento, ainda que sumário, da situação
efetiva no que se refere ao sistema de coleta de dados estatísticos
no setor de ensino.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 137

Sugerimos, apenas, que o encaminhamento do segundo projeto


apresentado incluísse contatos informais dos técnicos encarregados
com membros das Comissões de Ensino Primário e Médio e de
Ensino Superior dêste Conselho para eventuais sugestões.
Quanto às condições de tempo e do custo dos projetos, somos
de parecer que merecem aprovação dêste Conselho, (aa) D. Cândido
Padim, relator. De inteiro acordo, Péricles Madureira de Pinho.

REGISTRO DE PROFESSOR DO ENSINO MÉDIO

Parecer n.° 195/63, C.L..N., aprov. em 30-7-1 963, (Proc. n.°


19 044/51) — 1. 0 Senhor Ministro da Educação consulta se con-
tinua em vigor a legislação anterior à O L . D . B . , na parte referente a
candidatos que provem exercício de magistério em Faculdade de
Filosofia.
A consulta é feita com base em sugestão do Sr. Diretor do
Ensino Secundário, ao apreciar pedido do Professor Franco Lo Presti
Seminério (Proc. 19 044/51), tendo em vista a redação dos arts. 59 e
117 da L . D . B . , que não mais prevêem tal hipótese.
2. Êste Conselho já se pronunciou pela possibilidade de se
reconhecer valor aos diplomas expedidos por algumas sociedades
estrangeiras que m a n t ê m no Brasil cursos de línguas também estran-
geiras, e gozam de notória idoneidade. É o caso da Sociedade Bra-
sileira de Cultura Inglesa, da Alliance Française, do Instituto Cultural
Brasil-Estados Unidos, entidades que m a n t ê m convênios culturais e
expedem diplomas em combinação, respectivamente, com a Universi-
dade de Cambridge, a de Nancy e a de Michigan, desde que, após,
os interessados realizem o curso de didática perante Faculdade de
Filosofia oficial (Par. n.° 217, in Documenta 9/24).
3. No caso concreto, o interessado comprovou satisfazer, plena-
mente, os requisitos culturais e funcionais para a obtenção do seu
registro como professor de italiano (fls. 56).
4. Todavia, resta a indagação jurídica de saber se os registros
de professôres de ensino médio podem, ainda agora na vigência da
L . D . B . , continuar sendo feitos com fundamento nos demais requi-
sitos do Decr.-lei n.° 8 777, de 22 de janeiro de 1 946, que dispõe
sôbre o registro definitivo de professôres de ensino secundário.
Entendemos que sim. A L . D . B . não visou a disciplinar ma-
téria como essa que regula o registro de professôres. É verdade
que, nos seus arts. 59 e 117, traçou regras a esse tocante, que,
todavia, hão de ser entendidas como simples diretrizes de caráter
permanente. Não desceu a u m a regulamentação do assunto e. por
isso, não se há de proclamar que exauriu essa matéria.
Sendo assim, os casos de exceção visando a tal fim, admitidos
pela legislação anterior e não expressamente revogados pela L . D . B . ,
devem ter solução conforme o n u t u m da autoridade administrativa
competente, após acurado exame de cada caso. (aa) Ajadil de
Lemos, relator. José Barreto Filho, Abgar Renault.

OBRIGATORIEDADE DO ENSINO DE GRAU PRIMÁRIO

Parecer n.° 241/63, C . I i . N . , aprov. em 9-8-1 963 — A matéria


dos processos anexos é u m a só, consta de consultas — u m a das
138 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União, outra da Rede


Ferroviária Federal — e exige alta indagação, em virtude dos pre-
ceitos constitucionais nela envolvidos.
Parece-nos, entretanto, que poderia ser simplificada e. talvez,
resolvida satisfatoriamente, nos têrmos que passarei a expor:
O problema da obrigatoriedade do ensino de grau primário está
consignado em dois artigos da Constituição: 167, II, e 168. III,
abaixo transcritos:
"Art. 167. O ensino dos diferentes ramos... será ministrado
pelos poderes públicos"
I —
II — O ensino primário oficial é gratuito pará todos; o ensino
oficial ulterior ao primário se-lo-á para quantos provarem falta
ou insuficiência de recursos.
Art. 168. A legislação do ensino adotará os seguintes prin-
cípios:
I —
II —
III — as empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que
trabalhem mais de cem pessoas, são obrigadas a manter ensino
primário gratuito para os servidores e os filhos destes."

A nosso ver, os conteúdos dêsses dispositivos excluem-se reci-


procamente, em seus objetivos e em seus efeitos, isto é, o art. 167,
II, constitui a regra geral, o art. 168, II, é modalidade de aplicação
indireta da regra geral.
Pela regra geral, o Estado reservou a si a obrigação de ofe-
recer diretamente ensino gratuito, não a todas as crianças em
idade escolar, sem ressalva, senão apenas àquelas que não hajam
sido ou não venham a ser contemplados com o mesmo benefício
em virtude de outro preceito, que é a exceção.
Por esse outro preceito, o Estado atribuiu a mesma obrigação,
em certo caso, às empresas industriais, comerciais e agrícolas, as
quais não podem, para nenhum efeito, ser confundidas com agências
estatais e paraestatais.
A elas corre o dever de cumprir o dispositivo constitucional.
mantendo ensino primário gratuito "para os seus servidores e os
filhos destes".
A Rede Ferroviária Federal e as Empresas Incorporadas podem
ser havidas por empresas particulares, — o que parece legítimo à
vista dos têrmos da Constituição, cujo art. 168, III, não distingue
entre empresas particulares ou estatais e paraestatais, — e, nesse
caso, os servidores de uma e das outras, bem como os seus filhos
são ou devem ser atendidos, em virtude do mesmo dispositivo e
mediante o mesmo mecanismo — indireto.
A matéria parece-nos pacífica. Ainda que o não fosse, não
haveria falar em violação do § 1.° do art. 141 da Constituição
Federal, por força do qual todos são iguais perante a lei (como
se faz num dos pareceres anexos), porque, se as empresas viessem
a ser consideradas de natureza estatal ou paraestatal, aquêle ensino
seria ministrado — diretamente pelo próprio Estado, em escolas
por êle mantidas e por intermédio de professôres por êle recrutados
e por êle pagos.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 139

Concluindo, julgamos conveniente ficar consignado que o ponto


crucial, em face da Lei de Diretrizes e Bases, é êste: o assunto.
pela sua natureza, incide na competência dos Conselhos Estaduais
de Educação, cabendo a cada unidade federativa regulá-lo da ma-
neira que entender melhor, por intermédio daqueles órgãos, (aa.)
Abgar Renault, relator. José Barreto Filho, Ajadil de Lemos.
DECLARAÇÃO DE VOTO — Acompanhando, com o voto, as
conclusões do parecer do eminente Cons.0 Abgar Renault, desejo.
no entanto, salientar um aspecto do problema de aplicação de
recursos "na manutenção e desenvolvimento do ensino" (Const.,
art. 169 — L.D.B., art. 92).
Refiro-me ao orçamento das chamadas entidades paraestatais,
como é o caso, que se examina, da Rede Ferroviária Federal.
Cem autarquias, vinte e três sociedades de economia mista e quatro
empresas públicas manipulam recursos que, somados, atingem uma
cifra de Cr$ 2 trilhões, ou seja praticamente o dobro do Orçamento
da União para o ano próximo (Cf. Jornal do Brasil, 30-7-1 963,
pág. 6).
Sôbre êste "orçamento paralelo" não tem incidido, na dosagem
exigida pelas nossas condições, o desiderato do preceito constitu-
cional, na maioria dos casos, são dotações percentualmente míni-
mas, sem plano aparente, aplicadas dentro de critérios episódicos
ou mesmo políticos, no sentido pejorativo do têrmo.
Neste ano, repetidamente proclamado como "Ano da Educação".
seria louvável que os Poderes Públicos iniciassem o estudo de uma
fórmula jurídica que impusesse também a essas entidades, de forma
orgânica, mediante articulação com os programas da União e dos
Estados, a aplicação de maior parcela de seus recursos orçamen-
tários "na manutenção e desenvolvimento do ensino". Padre José
de Vasconcelos.

EQUIPARAÇÃO DE PROFESSÔRES DE ENSINO MÉDIO

Parecer n.° 260/63, C.E.P. e M., aprov. em 9-8-1 963 — Profes-


sôres de ensino técnico comercial, em exposição acolhida pelo
Senhor Presidente, dirigem-se a êste Conselho, para sugerir medidas
que visem a equiparar os professôres desse ramo de ensino de
grau médio aos do ensino secundário, possibilitando-lhes lecionar
disciplinas de cultura geral nos cursos secundários.
Justificam a sugestão com a equivalência dos diferentes cursos
de nível médio estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases.
É tranqüilo o entendimento de que, em face da nova lei, não
mais cabe distinção entre professôres de cultura geral dos diversos
cursos do ensino médio.
A L.D.B. fala somente em professor de ensino médio e apenas
distingue entre professôres de disciplinas de cultura geral e profes-
sôres de disciplinas específicas de ensino técnico. E para uns e
outros, determina um único caminho para a formação profissional
ou para a habilitação ao exercício do magistério (arts. 59, 117
e 118).
O registro de professor há de ser feito, agora, em disciplina
de ensino médio e não mais para efeitos em um só de seus ramos
(art. 98).
140 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Resulta claro, portanto, que na vigência da Lei de Diretrizes


e Bases a equiparação sugerida é legítima.
Mas, aos professôres do ensino comercial, invocando tratamento
de equidade com os professôres do ensino secundário, interessa
interpretar as disposições da L.D.B. como extensivas e aplicáveis
aos professôres já registrados na forma da legislação anterior.
Ouvida a êste propósito, a Diretoria de Ensino Secundário opina
que a aplicação plena do princípio da equivalência deverá ser
condicionada à unidade de critérios para o registro de professôres.
Entende, ainda, a Diretoria que a extensão do direito ao professor,
com registro anterior em outros ramos do ensino médio, de lecionar
no curso secundário, seja objeto de estudos individuais, atendida,
em cada caso, sempre que o professor disponha de condições de
formação que possibilite o registro de professor secundário.
Parece-nos, todavia, que, sem generalizar decisões que possam
ferir, em seus efeitos retroativos, disposições regulamentares vigentes
antes da L.D.B., a equiparação poderá ser deferida por equidade,
sempre que ocorrerem situações equivalentes e se verificar, pelo
M . E . C , que as provas dos exames de suficiência corresponderam
aos programas exigidos no ensino secundário.
Estas disposições deverão alcançar também os professôres dos
demais ramos do ensino médio, industrial, agrícola e normal, quando
em condições idênticas.
Outrossim, tudo aconselha a conveniência de serem abreviadas
as medidas necessárias para a unificação, em um só setor, e sob um
único título de professor de ensino médio, dos serviços de registro
de professôres atualmente existentes em diferentes órgãos do Minis-
tério da Educação e Cultura, (aa.) Brusa Neto, relator. Pe. José
Vieira de Vasconcelos, José Borges dos Santos, Celso Cunha, Abgar
Renault, D. Cândido Padim, Faria Góis.

ADAPTAÇÃO PARA TRANSFERÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR


Parecer n.° 206/63-A, C E . Su., E . P . e M., aprov. em 2-8-1 963 —
O eminente Conselheiro Brusa Neto, na sessão de março p.p., for-
mulou uma designação ao sr. Presidente dêste Conselho, solicitando
a indicação de relatores, um da Comissão de Ensino Médio e outro
da Comissão de Ensino Superior, "para, em estudo especial, exami-
narem as disposições do art. 100 da L.D.B., relativos a transferências
de alunos, com o fim de, posteriormente, serem expedidas normas
que instruam adequadamente sua aplicação no que respeita ao Sistema
Federal de Ensino e, eventualmente, no que possa interessar aos
sistemas estaduais".
As Câmaras de Ensino Superior e Médio, reunidas para o debate
do assunto, chegaram à conclusão de que era conveniente converter
0 sugerido Estudo Especial em parecer, uma vez que compete a
êste Conselho dispor sôbre as necessárias adaptações para trans-
ferências no âmbito do sistema federal de ensino e dos estabeleci-
mentos isolados de ensino superior, federais ou particulares.

I — ASPECTO LEGAL
1. Cumpre, antes de mais nada, acentuar que o art. 100 não é
o único a tratar da matéria; na L.D.B. há dois outros artigos que
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 141

versam expressamente sôbre transferência. Assim parece mais


conveniente estender a eles a matéria dêste estudo. Eis os artigos:
art. 41 — Será permitida aos educandos a transferência de
um curso de ensino médio para outro, mediante adaptação,
prevista no sistema de ensino.
art. 51, § 2.° — Os portadores de carta de ofício ou certifi-
cado de conclusão de curso de aprendizagem poderão matri-
cular-se, mediante exame de habilitação, nos ginásios de ensino
técnico, em série adequada ao grau de estudos a que hajam
atingido no curso referido.
art. 100 (dividido em itens, para maior clareza) — Será
permitida a transferência de alunos de um para outro estabe-
lecimento de ensino, inclusive de escola de país estrangeiro.
feitas as necessárias adaptações de acordo com o que dispu-
serem:
para o ensino médio os diversos sistemas de ensino
para as universidades federais .. os conselhos universitários
para as universidades particulares os conselhos universitários
para os estab. de ens. superior
federais o Conselho Federal de Educação
para os estab. de ens. superior
particulares o Conselho Federal de Educação
para as universidade estaduais .. os conselhos universitários
para os estab. de ens. superior
estaduais o Conselho Estadual de Educação

2. Cotejando os três artigos sob o ângulo do problema em


foco, importa ressaltar:
a) o art. 41 se refere a uma circulação de um curso de ensino
médio para outro reconhecido como de igual nível; já que o art.
100 faz surgir o problema da circulação de uma série para a seguinte
(ou para o restante da mesma, se durante o ano) no mesmo curso
de outro estabelecimento.
b) o art. 51, § 2.°, ao contrário, configura problema especial:
ensino técnico, além dos três cursos, paralelos e equivalentes de
grau médio (industrial, comercial e agrícola), pode manter cursos
de aprendizagem, que terão de uma a três séries anuais de estudo
(art. 51, § 1.°). A transferência de um curso destes para os
ginásios de ensino técnico não se processa apenas por "adaptações",
mas mediante "exame de habilitação", que indicará até mesmo "a
série adequada ao grau de estudos a que hajam atingido no curso
referido".
3. Com relação ao art. 100 convém ainda notar que, para o
ensino superior, a lei atribui sempre a conselhos a competência
de dispor sôbre transferências, ao passo que, no ensino médio, os
"diversos sistemas de ensino" disporão de acordo com as exigências
também diversas do meio.
Em resumo, parece a seguinte a competência dêste Conselho
na matéria:
I — Com relação ao ensino superior: dispor sôbre as adap-
tações a serem feitas pelo aluno que se transfere de um para
outro estabelecimento de ensino, inclusive de escolas de país estran-
geiro, quando o instituto que o recebe fôr estabelecimento isolado
•de ensino, federal ou particular.
142 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Esta competência decorre do fato que o C.F.E, supre, no caso.


o conselho universitário, nele inexistente.
II — No âmbito do ensino médio: estabelecer, para o sistema
federal de ensino, as adaptações necessárias e, ouvidos os órgãos
federais de ensino médio, as normas que devem reger as trans-
ferências.
Idêntica competência deverá caber aos conselhos estaduais de
educação para os estabelecimentos isolados de ensino superior
estaduais e municipais e para os institutos de ensino médio, oficiais
ou particulares, vinculados ao sistema estadual de ensino.

II _ ASPECTO PEDAGÓGICO
Impondo, porém, acentuar que, antes do aspecto legal, é indis-
pensável considerar os aspectos pedagógicos do problema transfe-
rência na vida escolar do aluno. Para que as adaptações e normas,
exigidas pelo art. 100 da L.D.B., se harmonizem com o contexto
legal e com a filosofia da lei, é preciso assentar alguns princípios
básicos:
1. A transferência é regime de exceção — Não pode prevalecer
sobre a regra geral. De acordo com as exigências de meio e com
plena liberdade, "cada estabelecimento de ensino disporá em regi-
mento ou estatutos sôbre a organização, a constituição de seus
cursos, e o seu regime administrativo, disciplinar e didático"
(art. 43). Nada de uniforme, nada de pré-moldado.
Seria lamentável, por isso, sacrificar esta riqueza de flexibili-
dade e variedade que a L.D.B. finalmente estendeu ao ensino
médio, para instalar o uniforme, com o fito de não criar dificuldades
ao aluno, em caso de transferência.
2. É problema educativo mais que problema legal — O que
verdadeiramente importa é descobrir e aplicar as melhores técnicas
indicadas para cada caso a fim de assimilar o aluno no novo
ambiente, reparando porventura o que lhe falta; e isto não é função
da lei, mas do magistério. Mais que regularizar, com luxo de
minúcias, as transferências, é preciso assistir aos transferidos.
3. É função da escola mais que dos sistemas de ensino — A
ela cabe, em última instância, não somente ajuizar da maturidade
do aluno que lhe bate às portas, mas até mesmo decidir, com
inteira liberdade, sôbre sua aceitação.
A transferência, reduzida a seu aspecto nuclear, se resume num
juízo de rendimento escolar anterior do aluno; deve ser estendida
a ela o crédito de confiança aberto pelo art. 39 aos estabeleci-
mentos de ensino, no capítulo da apuração do rendimento escolar.
Esta verificação se faz por critérios variados, já que ficou "a
cargo dos estabelecimentos de ensino". Pode, assim, não se tra-
duzir por notas decimais, mas por conceitos ou menções; mesmo
os números hão de ser interpretados à luz das normas contidas no
regimento do colégio, tendo em vista, entre outras coisas, a nota
estabelecida como mínimo para aprovação.
Dêste modo, para efeito de matrícula na série seguinte, o que
é essencial, num documento de transferência, é a declaração "apro-
vado", ou "reprovado"; a linguagem desta aprovação ou repro-
vação — nota, conceito, menção ou crédito — embora deva constar
no documento, para orientação da escola a que o aluno se transfere,
não pode ser por ela tomada isoladamente.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 143

4. Poderá parecer absurdo, à primeira vista, que o aluno repro-


vado, por exemplo, com 4,5 (quatro e meio) num colégio, trans-
fira-se e, por causa da diversidade de critérios existentes entre os
dois institutos, consiga aprovação em 2.a época com a mesmíssima
nota. No entanto é preciso atentar para os seguintes fatôres:
a) a nota, com os dados estatísticos, não deve ser tomada
materialmente, mas interpretada à luz de vários critérios. No
caso, deve ser lida no contexto do sistema adotado pela escola
para apuração do rendimento escolar;
b) para o caso específico da nota-limite, a aprovação ou repro-
vação não pode considerar-se operação aritmética, mas um julga-
mento pessoal, embora falível do professor. Tem importância
menor, no caso, a linguagem ou nota de que se reveste êste
julgamento;
c) nada exige, para o ensino médio, uniformidade neste setor
de notas, quando tanto o ensino elementar como o superior sempre
admitiram critérios variados.
5. Nos têrmos do art. 43, cabe aos estabelecimentos de ensino
médio regulamentar nos seus estatutos também os exames de
segunda época. Devem os colégios, neste como nos demais setores,
inspirar-se nos grandes princípios da lei e nas melhores doutrinas
pedagógicas, dando tratamento individual e cuidadoso aos vários
aspectos do problema, à ponderação dos resultados obtidos durante
o ano letivo e aos reais progressos revelados pelo aluno no
segundo exame, de modo a evitar dois extremos, condenáveis
ambos: frustrar a priori o exame pela ponderação demasiado rígida
das notas anteriores, ou fazer dele um examea de todo independente.
Nem se compreende um exame de 2. época (sob qualquer
denominação) que se realizasse poucos dias após a primeira, sem
possibilidade real de recuperação.
6. A relativa liberdade que a L.D.B. introduziu no campo das
transferências deve entender-se a serviço da eficácia pedagógica e
didática. Dêste modo, — salvo casos absolutamente inevitáveis. —
não se compreende, p. ex., transferência nos últimos meses do ano
letivo, com desastrosas conseqüências para o proveito intelectual
do aluno e possibilidade de grosseiras fraudes com vista à aprovação.
7. O problema da freqüência deve sempre ser cuidadosamente
focalizado, sobretudo nasa transferências durante o ano letivo ou
em caso de exames de 2. época, para os efeitos do art. 38, VI. A
freqüência à escola, em todos os graus de ensino, é uma das pre-
ocupações da L . D . B .
No ensino superior, sendo a freqüência regulada pelos regi-
mentos, devem as normas de transferência ter êste fato em consi-
deração.
Mesmo prescindindo do aspecto legal, a indicação da freqüência
do aluno no ano anterior, bem como os motivos da transferência
poderão ser elementos utilíssimos ao novo colégio na interpretação
das notas obtidas e na escolha dos métodos de adaptações a
empregar. (
8. A escola média é escola para todos — Êste postulado basilar,
que se torna dia a dia mais universal, tem conseqüências profundas
neste como em muitos outros setores. Tudo deve tender a não
criar obstáculos à circulação desembaraçada, entre as diversas escolas
e os vários ramos do ensino.
Nesta intenção, as normas gerais para adaptações no ensino
médio serão comuns a todos os ramos dêste grau, tendo sido ouvidos
144 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

representantes dos vários órgãos federais do ensino médio (secun-


dário, comercial, industrial, agrícola e normal).
Como conclusão, a Comissão de Ensino Primário e Médio, para
cumprimento do art. 100 da L.D.B., é de parecer que se sugiram,
para o sistema federal de ensino, as seguintes:

NORMAS PARA ADAPTAÇÃO NO ENSINO MÉDIO

1. É permitida a transferência de alunos de um para outro


estabelecimento de ensino congênere e de um para outro ramo de
ensino médio, feita adaptação ao currículo adotado pelo escola de
destino.
2. A escola que aceitar alunos transferidos com insuficiência
de estudos de disciplina de seu currículo, lhes dará assistência
necessária a uma adequada adaptação.
3. Cada estabelecimento disporá em regimento ou estatutos
sôbre a forma de adaptação, que deverá obedecer a normas flexíveis,
podendo adotar, entre outros, os seguintes critérios:
a) de créditos
b) de compromissos
c) de cursos paralelos
d) de aulas individuais

3.1. O sistema de créditos permitirá ao aluno ir sendo pro-


movido por disciplina isolada e poderá ser utilizado:
a) quando o estudo de uma disciplina puder ser feita indepen-
dentemente do de outras;
b) quando uma disciplina puder ser estudada independente-
mente de uma maior fundamentação anterior;
c) quando o estudo de uma disciplina fôr necessário para apri-
morar a formação do educando e completar o número das
matérias curriculares.

3.1.1. No sistema de créditos o aluno poderá ser matriculado


numa série e cursar disciplinas incluídas em séries anteriores.
3.1.2. No caso de o aluno cursar uma disciplina, por meio
de sistema de créditos para completar o número de matérias curri-
culares, é necessário que, além da verificação do aproveitamento,
seja computada a sua freqüência, a fim de que sejam preenchidas
todas as condições necessárias à obtenção do certificado de con-
clusão do ciclo.
3.2. O sistema de compromissos poderá ser adotado quando
as discrepâncias entre o tipo de ensino do qual provém o aluno
e o tipo ao qual se destina, são pequenas e podem ser sanadas a
curto prazo.
3.2.1. No sistema de compromissos o aluno poderá cumprir
determinadas tarefas que lhe serão atribuídas pelo professor. As
tarefas poderão compreender freqüências a certas aulas, leitura de
determinados livros, resolução de exercícios até que seu aproveita-
mento seja satisfatório e lhe permita prosseguir o estudo com bom
rendimento.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 145

3.3. Os cursos paralelos serão utilizados, principalmente, quando,


para a adaptação, fôr necessário ao aluno recuperar dois ou três
anos do estudo de uma matéria, até então ausente em seu currículo,
mas sem a qual não poderá prosseguir seus estudos no curso
atualmente freqüentado.
3.3.1. No caso de tais cursos serem ministrados por insti-
tuições especializadas, nelas Sòmente poderá ser estudada a parte
da matéria que corresponder ao programa de séries anteriores,
obrigando-se o estabelecimento a acompanhar o rendimento do aluno
com o fim de verificar se a adaptação se processa normalmente.
3.4. O processamento da adaptação poderá incluir aulas indi-
viduais.
4. Dos documentos de transferência deverá sempre constar o
sistema de apuração do rendimento escolar do colégio de origem.
5. Quando forem diversos esses processos de apuração do
rendimento escolar entre a escola de origem e a de destino, esta
levará em conta as notas obtidas naquela e fará a conveniente
adaptação, inclusive traduzindo em valores numéricos, se fôr o caso,
as que houverem sido atribuídas em forma de conceito, e vice-
versa.
6. Deve ainda o documento de transferência incluir elementos
suficientes, que permitam aplicar o que dispõe sôbre freqüência a
Lei de Diretrizes e Bases.
7. Nos ginásios de ensino técnico poderão matricular-se em
série adequada para prosseguimento dos estudos, os portadores de
carta de ofício ou certificado de conclusão de curso de aprendi-
zagem, de acordo com os conhecimentos demonstrados em exames
de habilitação.
8. Pode-se considerar promovido um aluno de curso de nível
médio, quando transferido para uma escola em cujo currículo, na
série que deveria repetir, inexiste a disciplina em que fora repro-
vado, devendo adaptar-se ao novo currículo, mediante processo
pedagógico de recuperação a critério da escola.
9. A transferência de alunos procedentes de cursos estran-
geiros de ensino médio, será feita para a série adequada, mediante,
adaptação, feita no próprio estabelecimento, das disciplinas não
•estudadas anteriormente e compreendidas:
a) entre as obrigatórias indicadas pelo Conselho Federal de
Educação;
b) entre as disciplinas específicas do ensino técnico corres-
pondente, quando fôr o caso.

Dentro destas normas cabe a mais ampla e a mais rica varie-


dade de métodos e processos. É possível que a experiência e o
tempo levem os colégios a procedimentos mais ou menos uniformes
nalguns pontos; mas esta uniformidade não deve nascer de deter-
minações oficiais, senão do consenso a que possam chegar, estudando
o problema, educadores e pais.
Como lembra com muito acerto o Cons. Anísio Teixeira, "se
alguma recomendação oficial deve ser feita, será a de encarecer a
necessidade de reuniões de professôres e diretores de escola, para
começarem a estudar o problema e propor as normas que lhes
parecerem mais plausíveis e corretas. Normas devem existir, mas

10
146 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

estabelecidas pelo consenso da experiência profissional e sujeitas às


renovações e mudanças que essa experiência profissional venha a
determinar. É de tôda a conveniência, para atendermos ao espírito
da lei, que se comece a dar ao educador, como tem o médico, a
necessária liberdade e autonomia na fixação das normas do processo
educativo". (Documenta n.° 2, pág. 22). (aa.) Pe. José de Vascon-
celos e Valnir Chagas, relatores. A. Almeida Júnior, D. Hélder
Câmara, Péricles Madureira de Pinho, F. J. Maffei, Clóvis Salgado,
Newton Sucupira, J. Borges dos Santos, Brusa Neto.

Parecer n.° 206-B/63, C E . Su. — Se é praticamente impossível,


como se demonstrou na parte A dêste parecer, lançar critérios
rígidos de adaptação para disciplinar a transferência de alunos
entre escolas de segundo grau, logo se pode avaliar a complexidade
que o problema assume em relação ao ensino superior. Afinal, em
que pese à "riqueza de flexibilidade e variedade que a lei estendeu
ao ensino médio", força é reconhecer que os seus estabelecimentos
somente gozam de inteira liberdade quando se trata de fixar normas
de verificação do rendimento escolar (art. 39) e incluir, nos respec-
tivos currículos, disciplinas complementares (art. 40, letra b) e
práticas educativas (art. 35), que, mesmo assim, devem ser esco-
lhidas de listas previamente elaboradas (art. 35, §§ 1.° e 2.°) para
cada sistema.
Daí por diante, o controle do Poder Público se faz sentir com
maior ou menor intensidade, embora sem mais reincidir na unifor-
midade asfixiante do regime anterior. Assim é que dos currículos
devem constar até cinco matérias comuns em âmbito nacional e
até duas em âmbito estadual (art. 35, § 1.°), com programas delimi-
tados em amplitude e desenvolvimento pelo Conselho Federal de
Educação ou por êste, nas cinco primeiras, e pelos respectivos
conselhos estaduais, nas de sua competência (art. 35, § 2.°, in fine).
A primeira e a segunda séries do ciclo ginasial são idênticas no
que se refere a essas disciplinas obrigatórias (art. 35, § 3.°); a
matrícula deve ser feita em regime seriado; e a freqüência, é
uniforme para todo o País (art. 38, alínea VI).
Enquanto isto, o ensino superior se desdobra em dezenas de
cursos das mais diversas durações, e não apenas em três linhas
gerais de estudos de sete anos. Certo, cada curso está subordinado
a um currículo mínimo comum. Entretanto, fixados como foram
esses mínimos de forma bastante genérica, às escolas cabe desdo-
brar-lhes as matérias em disciplinas e fixar a amplitude e o desen-
volvimento dos respectivos programas. Ademais, ao currículo
mínimo pode o estabelecimento acrescer não somente uma ou duas
disciplinas, como no ginásio ou colégio, porém tantas quantas julgue
necessárias ao tipo de formação que pretenda ministrar. A matrí-
cula da escola superior será feita por séries ou por disciplinas,
abrangendo trimestres, semestres ou anos letivos; a verificação do
rendimento escolar, bem como a fixação dos mínimos de freqüência,
constituem igualmente assunto regimental; e assim por diante.
É fora de dúvida que a esta multiplicidade de soluções corres-
ponderá, fatalmente, uma quantidade a rigor imprevisível de "casos"
que não poderão jamais ser resolvidos por disposições minuciosas
e lançadas a priori. Para que se tenha uma idéia da extensão e
variedade dos problemas que surgirão, vejamos algumas hipóteses
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 147

gerais dentre as que, doravante, a todo momento exigirão as mais


diversas adaptações:
1. a transferência é feita (a) após concluído o período letivo
ou, ao contrário, (b) ainda no decorrer dêste;
2. a escola que transfere funciona à base de semestres e a
que recebe escalona os estudos por anos letivos — ou
vice-versa;
3. a escola que transfere adota o sistema de matrícula por
disciplinas e a que recebe adota matrícula por séries ou
vice-versa;
4. a escola que transfere segue regime seriado e o aluno
depende de uma ou mais disciplinas para "confirmar" sua
promoção à série em que, na ocasião da transferência, se
acha "condicionalmente" matriculado;
5. o currículo mínimo recebeu tratamento diverso nas duas
escolas, variando quanto a um ou mais aspectos dentre os
representantes pelo desdobramento das matérias em disci-
plinas e pela ordenação destas (séries ou pré-requisitos),
assim como pela amplitude (número de semestres ou anos,
aulas semanais, etc...) ou pelo desenvolvimento dos res-
pectivos programas;
6. a escola que transfere não inclui em seu currículo nenhuma
matéria além do currículo mínimo, enquanto a que recebe
adota currículo complementar de uma ou mais disciplinas
— ou vice-versa;
7. ambas as escolas adotam currículos complementares e estes
são idênticos, porém as disciplinas que neles se incluem
variam em amplitude ou desenvolvimento dos seus progra-
mas, ou em ambos os aspectos;
8. as duas escolas adotam currículos complementares, mas as
respectivas disciplinas são diferentes no todo ou em parte;
9. o sistema de julgamento varia de uma para outra escola,
de modo que, por exemplo:
a) as verificações diferem em quantidade e na forma de sua
realização,
b) numa, a atribuição de notas se faz por letras ou menções,
na outra por meio de números,
c) mesmo quando seja comum o tipo de notação numérica,
uma emprega sistema decimal e outra adota sistema não-
decimal,
d) são diferentes os mínimos de aprovação, embora sejam
idênticos os dois sistemas de notação ou se mostre fácil a
conversão de um ao outro;
10. não coincidem os mínimos de freqüência exigidos nas duas
escolas.

Se cada caso concreto correspondesse sempre a uma única


hipótese, admitindo mesmo que se chegasse a prever todas elas,
talvez fosse possível, embora nunca se recomendasse, prescrever as
soluções respectivas. Entretanto, é de supor que só raramente
ocorram esses "casos simples", porquanto as escolas superiores, à
medida que tomam consciência da maior autonomia que a lei lhes
atribui, tendem a tornar-se cada vez mais "diferentes" umas das
148 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

outras. Daí que dentro em breve, senão já agora, a norma venha


a ser a da concorrência de várias hipóteses em casos que chama-
remos de complexos — como no exemplo seguinte:
O aluno J., filho de funcionário público removido, transferiu-se
em pleno período letivo (hipótese 1) da Faculdade em que
estava matriculado, condicionalmente, na segunda série do curso
de Pedagogia por depender de Psicologia Educacional na pri-
meira série (hip. 4).
A escola adota, portanto, o regime seriado (hip. 3) e escalona
os estudos por anos letivos (hip. 2). O seu currículo não vai
além do mínimo legal (hip. 6), abrangendo dois anos de Psico-
logia Educacional, dois de Sociologia, um de História da Edu-
cação um de Filosofia da Educação, dois de Administração
Escolar, um de Estatística e um de Introdução à Orientação
Educacional, ministrando em média três aulas semanais por
disciplina. O seu sistema de verificação de aprendizagem é o
de provas parciais e final; as notas são graduadas de 1 a 10,
sendo 4 o grau de aprovação (hip. 9); e a freqüência mínima
exigida é de 60% (hip. 10).
Por sua vez, a escola para onde se transferiu o aluno J. fun-
ciona à base de semestres (hip. 2) e adota o sistema de matrí-
cula por disciplinas (hip. 3). O seu currículo compreende o
mínimo (hip. 5) e uma parte complementar (hip. 6): o mínimo
está representado por 8 semestres de Psicologia da Educação,
3 de Sociologia Geral e Educacional, 3 de História da Educação,
3 de Administração Escolar, 2 de Filosofia da Educação, 1 de
Estatística e 2 de Biologia, enquanto a parte complementar
abrange 1 semestre de Cultura Brasileira, 2 de Currículos e
Programas e 2 de Técnicas Audiovisuais de Educação; a média
semanal de trabalho é de cinco horas por disciplinas. A ava-
liação do rendimento consta de quatro tipos diversos de verifi-
cação; as notas se representam pelas menções A, B, C, D, E,
sendo C a nota de aprovação (hip. 9); e a freqüência mínima
exigida é de 80%.

Por êste exemplo, que evidentemente não encerra um "caso"


dos mais "complexos", fácil é perceber quão artificiosa e falha
haveria de ser qualquer prefixação de critérios em que se preten-
desse abranger, com pormenores, todas as situações de transferência
que hão de surgir. Artificiosa, falha e sobretudo contrária à Lei
de Diretrizes e Bases, cuja tônica é a flexibilidade das soluções
com apoio numa crescente autonomia de escolas e educadores.
Admiti-la agora significaria reeditar as uniformizações de antes e
limitar cada vez mais a liberdade dos estabelecimentos, anulando
assim a regra geral para atender à exceção da transferência.
Ora, é preciso ter em vista que o princípio da autonomia signi-
fica, na lei, menos a opção tardia de um injustificável laissez faire
pedagógico do que o requisito indispensável da autenticidade recla-
mada pelas novas condições econômico-sociais da Nação. Antes, a
escola superior tinha a função em parte ornamental de qualificar,
pelo título, os membros de uma pequena elite a que preferencial-
mente se destinava. O ser bacharel, médico ou engenheiro, só por
exceção, constituía um pressuposto de saber, mas era sempre uma
segurança de prestígio; daí a equivalência não apenas legal como
principalmente social dos diplomas.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 149

Hoje, porém, o quadro já se apresenta bastante modificado.


Às profissões tradicionais de grau universitário vieram juntar-se
dezenas de outras cuja importância cresce dia a dia; o mercado
de trabalho expande-se e torna-se mais exigente; o homem do povo
assoma aos umbrais das escolas superiores e delas exige, na sua
filosofia inevitavelmente pragmática, uma formação que lhe assegure
prontas condições de trabalho e de êxito.
Em conseqüência, a validade nacional dos diplomas, que a nova
lei manteve, é apenas um dado inicial a ser confirmado ou infir-
mado por outros meios que já se empregam para a avaliação de
competência profissional; e e n t r e estes, como ocorre em muitos
países, impõe-se cada vez mais o chamado critério da "marca da
fábrica", que outro não é senão o da idoneidade do estabelecimento
de origem. As próprias escolas são pouco a pouco levadas a rever
os seus padrões de ensino, visando a um "produto" mais bem
caracterizado e ajustado ao nível e às solicitações do meio.
Até há pouco, entretanto, o maior obstáculo a essa escola com
personalidade própria era a legislação rígida e uniforme que pos-
suíamos; e justamente quando acabamos de vencê-lo, pelo menos
em grande parte, seria inconcebível que anulássemos tôda a con-
quista realizada, impondo a um estabelecimento os padrões de outro
menos categorizado apenas para "facilitar" as transferências. Aliás,
exatamente para que tal não ocorresse foi que, no artigo 100, a lei
previu de forma expressa as adaptações, isto é, o ajustamento do
aluno à e s t r u t u r a e aos padrões da nova escola, que o legislador
não mais admitiu fossem necessariamente iguais aos da primeira.
Satisfeita essa condição, que logicamente não admite exceções,
tornou-se a transferência incomparavelmente mais ampla e livre
do que antes, dela não se excluindo n e m os alunos provenientes
de instituições estrangeiras nem os das séries iniciais ou terminais
dos cursos, como ocorria no regime anterior.
Resta agora que os critérios a serem estabelecidos para as adap-
tações se ajustem de fato a esse novo espírito, implicando menos
a prescrição de receitas limitadoras que a sugestão de medidas
capazes de abreviar as mudanças que se fazem necessárias tam-
bém neste setor. É o que, como CONCLUSÃO dêste Parecer, pro-
curamos realizar no seguinte anteprojeto de:

RESOLUÇÃO N.° ...


Dispõe sôbre adaptação em transferência para
cursos mantidos por estabelecimentos isolados de
ensino superior federal ou particular.

O P R E S I D E N T E DO CONSELHO F E D E R A L DE EDUCAÇÃO,
tendo em vista o que decidiu o Conselho em sessão plenária de
agosto de 1 963, aprovando o Parecer n.° 206-B/63, para cumpri-
mento do art. 100 da Lei n.° 4 024, de 20 de dezembro de 1 961,

RESOLVE:

Art. 1.° As transferências de alunos matriculados em insti-


tuições de ensino superior nacionais ou estrangeiras para qualquer
ciclo, série ou nível dos cursos de graduação mantidos por estabe-
lecimentos congêneres federais ou particulares se farão mediante
adaptações, na forma da presente Resolução.
150 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Parágrafo único. Entende-se por adaptação, para os efeitos


dêste artigo, o conjunto dos trabalhos prescritos pelo estabeleci-
mento de destino com o objetivo de situar ou classificar, em relação
aos seus planos e padrões de estudo, um aluno transferido de
outra escola cuja estrutura didática seja diversa da sua no todo
ou em parte.
Art. 2.° Na elaboração dos programas de adaptação, serão
observados os seguintes princípios gerais:
I — Os aspectos quantitativos e formais do ensino — repre-
sentados por itens de programas, número de lições,
ordenação de disciplinas e outros semelhantes — não
devem superpor-se à consideração mais ampla da inte-
gração dos conhecimentos e habilidades inerentes ' ao
curso no contexto da formação cultural e profissional
do estudante.
II — A adaptação refere-se aos estudos feitos ao nível de
gradução, dela excluindo-se o Concurso de Habilitação
e quaisquer outras atividades antes desenvolvidas pelo
aluno para credenciar-se ao ingresso no curso.
III — Em nenhum processo de adaptação poderá ser dispensada
ou substituída qualquer matéria do currículo mínimo
fixado por êste Conselho, quando o curso corresponder
a profissão regulamentada.
IV — Não estão isentos de adaptação os alunos beneficiados,
por leis especiais, com o privilégio de transferência "em
qualquer época e independentemente da existência de
vaga".

Art. 3.° Aos princípios gerais contidos no artigo anterior


acrescentam-se os seguintes critérios especiais:
I — Quando o estabelecimento de que se transfere o estu-
dante não incluir em seu plano qualquer matéria além
do currículo mínimo fixado para o curso, e houver
currículo complementar na escola que o recebe, é obriga-
tório o estudo das respectivas disciplinas pela forma que
por esta vier a ser determinada.
II — Quando ambas as escolas incluírem matérias além do
currículo mínimo, sendo porém essas diferentes no todo
ou em parte, poderá o estabelecimento que recebe o
aluno exigir, em qualquer hipótese, o estudo de todas as
disciplinas do seu próprio currículo complementar ou,
como solução pedagogicamente mais recomendável, acre-
ditar o daquelas já cursadas que, a seu juízo, apresente
um equivalente valor formativo.
III — Quando inexistir currículo mínimo fixado para o curso,
por não corresponder êste a profissão regulamentada, os
critérios do item anterior poderão estender-se a todas as
disciplinas.
IV — Quando as disciplinas já cursadas pelo aluno, dentre as
resultantes do currículo mínimo e quaisquer outras que
sejam comuns, tiverem na escola que o transfere desen-
volvimento inferior ao exigido pela escola que o recebe,
poderá esta realizar a adaptação por meio de exames
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 151

especiais ou prescrevendo o estudo regular dos temas


ainda não vistos que sejam indispensáveis ao prossegui-
mento do curso.
V — Quando nas duas escolas não coincidirem os períodos
letivos, a seriação das disciplinas ou o sistema de pré-
requisitos, ou vários dêsses aspectos ao mesmo tempo,
recomenda-se a adoção, pelo estabelecimento que recebe
o aluno, de esquemas especiais de estudo que possibilitem
melhor aproveitamento do seu tempo e de sua capacidade
de aprendizagem.
VI — Quando forem prescritos estudos suplementares, no pro-
cesso de adaptação, poderão esses realizar-se através de
matrículas por disciplinas, mesmo na hipótese de que a
nova escola adote exclusivamente o regime seriado.
VII — Quando, em transferências que eventualmente se façam
durante o período letivo, o mínimo de freqüência exigido
pela escola de origem fôr inferior ao prescrito pelo novo
estabelecimento, prevalecerá o da primeira até a data em
que o aluno dela se haja desligado.
VIII — Quando permanecerem dúvidas quanto à situação defini-
tiva do estudante, na escola que o recebe, poderá esta
conceder-lhe matrícula condicional por um período de
observação e adaptação, com a assistência de professor-
orientador, findo o qual confirmará ou infirmará simples-
mente essa matrícula ou determinará, globalmente ou
por disciplinas, os níveis ou séries a que deva corres-
ponder a sua formação anterior.

Art. 4.° Os princípios e critérios estabelecidos nos artigos


2.° e 3.° aplicam-se a transferências que se façam para cursos afins,
quando esta hipótese fôr admitida pela escola.
Art. 5.° Cada estabelecimento deverá prever, em normas
especiais, as épocas regulares de recebimento de transferências, os
documentos a serem apresentados para esse fim, os órgãos compe-
tentes para promover e julgar as adaptações e as disposições neces-
sárias ao ajustamento desta Resolução às peculiaridades do seu
regime didático.
Parágrafo único. As normas expedidas na forma dêste artigo
serão comunicadas ao Conselho Federal de Educação e incorporadas
ao Regimento da escola na primeira oportunidade de sua reforma.
(aa.) Valnir Chagas, relator. A. Almeida Júnior, Clóvis Salgado,
Josué Montelo, Newton Sucupira.

APLICAÇÃO DE RECURSOS FINANCEIROS DA UNIÃO


NA MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO
DO ENSINO

Parecer n.° 207/63, C.L.N., aprov. em 6-8-1 963 — 1. Face a


inconteste relevância da obrigatoriedade da aplicação dos recursos
financeiros da União na manutenção e desenvolvimento do ensino,
pediu o Sr. Presidente dêste Conselho o pronunciamento da Co-
missão de Legislação e Normas.
152 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

2. O expediente v e m instruído de u m a informação do Secre-


tãrio-Geral, Professor Celso Kelly, e de um estudo da lavra do
Sr. Carlos de Sousa Neves.
3. A matéria está proficientemente versada e obteve a concor-
dância desta Comissão.
Em conseqüência, parece oportuno e bastante dar-se tais tra-
balhos como fazendo parte integrante dêste parecer, que lhes dá
assim sua chancela.
4. Outrossim, afigura-se-nos recomendável que êste Conselho,
no fiel exercício de suas altas finalidades, se dirija aos Exmos. Srs.
Presidente' da República, Ministro da Educação e Cultura e Ministro
da Fazenda, dando-lhes conhecimento dêste pronunciamento e pe-
dindo sua urgente consideração para os seguintes pontos conclu-
sivos:
a) a irredutibilidade absoluta do montante a ser aplicada
efetivamente, e não apenas orçado, no desenvolvimento do
ensino, em virtude do art. 169 da Constituição de 1 946 e,
ainda, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(de n.° 4 024, de 20 de dezembro de 1 961), a qual deter-
minou o aumento daquele montante para 12% da receita
tributária e de outras leis, igualmente anteriores ao Orça-
m e n t o vigente, que concederam auxílios ordinários a certos
estabelecimentos de ensino;
b) a possibilidade de serem excluídas desse montante as des-
pesas destinadas a outros fins, que não a manutenção e
desenvolvimento do ensino; e
c) a consideração suprema de que o ensino é matéria de sal-
vação pública, na sábia . expressão do Presidente Getúlio
Vargas, (aa.) Ajadil de Lemos, relator. A. Almeida Júnior,
José Barreto Filho.

CONTENÇÃO DE DESPESAS NO ANEXO


DO M . E . C . DO ORÇAMENTO PARA 1 963

(Estudo da Secretaria Geral do Conselho Federal de Educação)


Dispõe a Lei n.° 4 177, de 11-12-1 962, que "estima a receita e
fixa a despesa da União para o exercício financeiro de 1 963", no
art. 7.° e parágrafo único, que:
"O Poder Executivo fica autorizado a apresentar, no início
de 1 963, um plano de contenção das despesas Orçamentárias
que não sejam fixas de até 45% (quarenta e cinco por cento),
para aprovação pelo Congresso Nacional.
Parágrafo único. Fica entendido que, se no decurso do
exercício a arrecadação superar a receita prevista, poderão ir
sendo liberadas, proporcionalmente, as dotações incluídas no
Plano de Contenção".
Por outro lado, prevê a Constituição Federal de 1 946, no
art. 169, que:
"Anualmente, a União aplicará nunca menos de dez p o r
cento, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nunca
menos de vinte por cento da renda resultante dos impostos na
manutenção e desenvolvimento do ensino"
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 153

e a Lei n.° 4 024, de 20-12-1 961, que "fixa as diretrizes e bases


da educação nacional", no art. 92 e parágrafo 1.°, que:
"A União aplicará, anualmente, na manutenção e desenvol-
vimento do ensino, 12% (doze por cento), no mínimo, de sua
receita de i m p o s t o s . . .
Com nove décimos dos recursos federais destinados à edu-
cação, serão constituídos, em parcelas iguais, o Fundo Nacional
do Ensino Primário, o F u n d o Nacional do Ensino Médio e o
F u n d o Nacional do Ensino Superior."

Ora, em face do "Orçamento Federal de 1 963" e das dispo-


sições legais acima transcritas, temos:
Cr$
Renda tributária em 1 963 (previsão) 678.248.004.000,00
Orçamento do M . E . C , em 1 963 (geral) . . . . 96.003.974.970,00
Total das dotações enquadradas na "manutenção
e desenvolvimento do ensino nos têrmos do
art. 93, § 1.°, da Lei n.° 4 024/61:
10% da receita tributária 67.824.800.400,00
12% " " " 81.389.760.480,00
À vista do exposto, cogita-se de indagar se pode o referido
"plano de contenção de despesas" incidir sôbre o Anexo do Minis-
tério da Educação e Cultura, do Orçamento Geral da República, e
em quais rubricas e dotações e até que limites. É o que será
objeto da exposição abaixo, dentro do caráter sintético desta apre-
ciação.

Estabelece a Constituição Federal de 1 946, no art. 73, § 2.°, que


"O orçamento da despesa dividir-se-á em duas partes: uma
fixa, que não poderá ser alterada senão em virtude de lei
anterior; outra variável, que obedecerá a rigorosa especialização".

Comentando o preceito, diz Themistocles Brandão Cavalcanti


(A. Constituição Federal Comentada, Konfino, editor, 3. a edição,
1 956, vol. II, pág. 175):
"A despesa pública, sob o ponto-de-vista orçamentário, com-
preende u m a parte fixa e outra variável, a primeira alterável
apenas em virtude de lei anterior, a segunda obedecendo a um
critério de rigorosa especialização.
A parte variável compreende t a m b é m as despesas com o
pessoal variável, contratados, e t c , bem como a verba material,
de consumo, permanente, e outras despesas diversas".

Pontes de Miranda, interpretando o mesmo art. 73, § 2.°, da


Carta Magna (Comentários à Constituição de 1 946, 3. a edição, Borsoi,
1 960, tomo III, pág. 10), assim elucida o seu conteúdo:
" P a r t e fundada e parte flutuante do orçado. — Uma p a r t e
do orçado é consolidada, — é dita fundada; outra, flutuante.
A parte fundada não se volta a votar, porque já é lei, e só uma
lei a pode revogar. A Constituição não permite que se vote,
154 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

no orçamento, a revogação, nem que nela se faça modificação,


— só a lei anterior a êle tem tal direito. Isso não impede que,
d u r a n t e a feitura dele, se revogue, normalmente, em lei especial,
a lei que nele se atendia e a tempo se corrija a verba orça-
mentária. . . . Quanto à parte dita flutuante ou variável, a
Constituição só lhe exige a especialização rigorosa."

Vê-se, pois, que a parte fixa, ou consolidada, compreende tôda


despesa não só p e r m a n e n t e como a reservada, ou vinculada, a fins
vitais ou urgentes do Estado. F u n d a d a s são, assim, as percentagens
de 3% da receita de impostos, destinada pela Constituição Federal
(art. 198), para "obras e serviços de assistência econômica e social
do plano de defesa contra os efeitos da denominada seca do Nor-
deste", de 3% "para execução do plano de valorização econômica
da Amazônia", como t a m b é m a percentagem nunca inferior a 10
consagrada pelo art. 169 da mesma Carta Magna para "manutenção
e desenvolvimento do ensino". Consolidadas são ainda, além de
outras, as despesas previstas em "fundos especiais" para objetivos
também fundamentais da Nação.
Êste é t a m b é m o conceito de Aliomar Baleeiro ("Uma Intro-
dução à Ciência das Finanças", Revista Forense, 2. a edição, 1 958,
volume I, págs. 115-116):
"Quanto ao Brasil, no regime da Constituição de 1 946,
poder-se-ia estabelecer u m a classificação baseada no texto
supremo:
a) despesas fixas, subdivididas em: 1) constitucionais e
2) legais;
b) despesas variáveis.
As despesas fixas, segundo esse critério do direito positivo
brasileiro, seriam:
1.°) as constitucionais, isto é, as que o Congresso está vin-
culado a conceder por expresso dispositivo da Constituição,
como os subsídios dos membros do Poder Legislativo e Exe-
cutivo (arts. 47 e 86); o teto mínimo para os serviços de edu-
cação (art. 169); as condenações judiciais contra a Fazenda
Pública (art. 204); as dotações mínimas obrigatórias para as
zonas das secas do Nordeste, valorização da Amazônia e apro-
veitamento do vale do rio São Francisco (arts. 198 e 199 e
também art. 29 das Disposições Transitórias).
2.°) as legais, isto é, determinadas por lei, que só por via
destas podem ser alteradas (art. 73, § 2.°).
As despesas variáveis, pelo mesmo critério, são todas as
demais, autorizadas por créditos orçamentários ou extraordi-
nários e sujeitas à "rigorosa especialização", isto é, discriminação
para cada fim.
Uma diferença jurídica profunda, por suas conseqüências
práticas, distingue as despesas fixas e as variáveis, segundo
esse critério: as primeiras vinculam o Executivo a sua execução,
ao passo que as segundas não passam de meras autorizações,
entregues ao poder discricionário das autoridades públicas, que
são os juizes de sua conveniência, oportunidade ou exeqüibi-
lidade prática. P o r outro lado, o Congresso está vinculado a
expedir as leis e conceder os créditos p a r a as despesas consti-
tucionais."
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 155

Cabe, portanto, destacar que, enquanto a parte fixa é impera-


tiva, por força da Constituição e leis respectivas, a variável é
m e r a m e n t e autorizativa, em cada orçamento. Além disso, entre as
despesas fundadas, há que distinguir, como se viu, entre as deter-
minadas pela própria Constituição e as criadas por leis especiais.
A exegese dos enunciados não deixa dúvidas: assim como a
lei substantiva não pode ser alterada pela adjetiva, a Carta Magna
não pode ser modificada por simples lei ordinária. Carlos Maxi-
miliano, com sua autoridade (Hermenêutica e Aplicação do Direito,
Freitas Bastos, 7. a edição, 1 961) fulmina qualquer objeção a respeito:
"No Brasil e nos países de regime semelhante ao dos Es-
tados Unidos é mais vasto o campo de ação da crítica: além
da autenticidade, deve também a Constitucionalidade do dispo-
sitivo ser objeto de exame preliminar. Um preceito contrário
ao estatuto s u p r e m o não necessita de exegese, porque não
obriga a ninguém: é como se n u n c a tivesse existido".
Cumpre inquirir se foi prolator da norma o poder compe-
tente — Congresso, Presidente, Ministro, e t c ; . . . Desde que o
elaborador ultrapassou os limites das próprias atribuições, o
juiz nada interpreta; nega eficiência ao texto, porque não se
t r a t a de disposições válidas, e, sim, de um excesso de poder, a
que se não deve acatamento: nullus major defectus q u a m
defectus potestatis" (pág. 63)

P o r ser a Constituição também u m a lei, que tem apenas


mais força do que as outras às quais sobreleva em caso de
conflito..." (pág 379)

"Legis v i r t u s haec est: imperare, vetare, permittere, punire


— "é função da lei: ordenar, proibir, permitir, punir." Desta
frase de Modestino abrolhou a classificação das leis em impe-
rativas, proibitivas, permissivas e punitivas. A última categoria
não durou muito tempo; . . . Às três restantes houve quem
acrescentasse mais duas — interpretativas e s u p l e t i v a s . . . "
(pág. 271-272)

" . . . alguns autores só admitem duas categorias de normas:


imperativas ou preceptivas (leges coegentes) e permissivas.
dispositivas ou declarativas..." ( pag. 272)

"As leis imperativas, quando não têm apenas um caráter


proibitivo do que é contrário à injunção expressa, em regra só
prescrevem formalidades. Dividem-se estas em substanciais ou
essenciais, e secundárias ou acidentais. Da inobservância de-
corre a nulidade de pleno direito, quanto às primeiras; . . . "
(pág. 276)

Em face do exposto, conclui-se que o Orçamento, elaborado


pelo Poder Executivo (art. 87, item XVI, da Constituição) e votado
pelo Congresso Nacional (art. 65, ibidem), não pode alterar a parte
fixa particularmente as disposições que integram o corpo da própria
Carta Magna, sendo nula, como se viu, qualquer iniciativa nesse
sentido.
156 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Por isso, a modificação da "Lei de Meios", nos têrmos da


autorização legislativa, para atender a "planos de economia", neces-
sários por motivos urgentes e de força maior, não pode afetar a»
dotações orçamentárias vinculadas ao art. 169 do Estatuto supremo,
incluída entre as de direito público e para finalidade vital da Nação.
como seja a educação e cultura do povo. A parte variável, não
vinculada, flutuante no dizer de Pontes de Miranda, esta sim é que
parece não oferecer obstáculos jurídicos, e também por não atingir
os fins precípuos do Estado, mas predominantemente a atividade
meios.
Não obstante a juridicidade negada por muitos, inclusive por
Pontes de Miranda no trecho acima transcrito, que entendem não
poder uma lei especial, como a de Diretrizes e Bases da Educação,
ser modificada por outra orçamentária, e ainda mais por se tratar
de uma lei complementar à Constituição Federal, quando muito, a
título de colaboração do Ministério no Plano de Contenção, possa
o corte atingir o excesso de 10% (dez por cento) para 12% (doze
por cento), existente entre o texto da Constituição (art. 169) e o
art. 92 da Lei n.° 4 024/61.
Conseqüentemente, de qualquer forma, são intocáveis e irredu-
tíveis os recursos destinados a "manutenção e desenvolvimento do
ensino", como tal considerados apenas os específicos definidos no
art. 93 e § 1.° da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
(Êste trabalho foi elaborado pelo encarregado
do Setor de Jurisprudência, Sr. Carlos de Sousa
Neves, em maio de 1 963.)

EFETIVAÇÃO COMO PROFESSOR CATEDRÁTICO


Parecer n.° 208/63, C.L.N., aprov. em 1-8-1 963 — 1. O Sr.
Chefe do Gabinete do Sr. Ministro da Educação e Cultura encami-
nhou a êste Conselho o expediente em que pleiteia a efetivação do
Prof. AMARO SOARES QUINTAS como catedrático de História
Moderna e Contemporânea da Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras, da Universidade Católica de Pernambuco.
Desde logo, cumpre ressaltar que somente o Presidente da
República e o Ministro da Educação é que têm prerrogativa de
solicitar o pronunciamento do Conselho (L.D.B., art. 9.°, letra o).
Todavia, para não embaraçar a apreciação do assunto, chamo a mim
o patrocínio da consulta, para, a seguir, respondê-la.
2. A Diretoria do Ensino Superior e a Consultoria Jurídica do
M.E.C. já se pronunciaram a respeito, de modo erudito e exaus-
tivo (fls. 11-12 e 14-18), opinando pelo indeferimento.
3. Êste Conselho já tem deliberado sôbre o assunto, reafir-
mando, mais de uma vez, em orientação que já se vai tornando
pacífica, que, a partir da Constituição de 1 946 (art. 168, VI), só
há uma forma lícita de prover-se a cátedra universitária, seja no
ensino superior oficial ou livre: mediante concurso de títulos e-
provas.
4. Destarte, somos de parecer que não merece amparo a pre-
tendida efetivação, embora o parecer favorável do Conselho Técnico-
Administrativo daquela Faculdade, (aa.) Ajadil de Lemos, relator
A. Almeida Júnior, José Barreto Filho.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 157

EXAME DE MADUREZA NOS CURSOS BÁSICO E TÉCNICO

Parecer n.° 184/63, C.L.N., aprov. em 8-8-1 963 — Solicita o


Senhor Ministro de Estado da Educação e Cultura o pronuncia-
mento do Conselho Federal de Educação sôbre o Projeto de Lei
n.° 1 452/60, que faculta a prestação de exame de madureza aos
maiores de 18 anos, nos cursos básico e técnico do ensino comercial.
Sendo anterior à Lei de Diretrizes e Bases, o projeto antecipa
a assimilação de todos os cursos de nível médio, para o efeito do
exame de madureza, que veio a ser considerado no art. 99, combi-
nado com o art. 34 da referida lei, com a vantagem de ter diminuído
a idade de 18 para 16 anos no ciclo ginasial e de 21 para 19 anos
no ciclo colegial. O Projeto, portanto, é supérfluo e ultrapassado.
Razão não menos importante a desaconselhar o projeto reside
no fato da extensão dada ao exame de madureza utilizado pelo
mesmo pará assegurar direito ao exercício profissional, quando,
pela L.D.B., o citado exame é exclusivamente uma verificação da
maturidade intelectual do jovem para fins de realização de estudos
no nível colegial ou superior, como aliás ficou expressamente acen-
tuado no Par. n.° 74/62 dêste Conselho.
Não nos parece que o exame de madureza seja o indicado para
a verificação de capacidade profissional. Desempenharia mal tal
função e seria desviado da que lhe é própria.
Com a adoção da idéia, estaríamos voltando ao regime de pro-
fissionais provisionados, compreensível nos casos de carência de
graduados, mas com soluções já previstas na legislação em vigor.
Quanto à sua inconveniência intrínseca, além da crítica proce-
dente contida no parecer da Diretoria do Ensino Comercial, salien-
tamos a necessidade de não intervir na harmoniosa execução da
lei básica da educação com medidas parciais intercorrentes, que
perturbam a harmonia de sua sistemática, pelo menos por um
período prolongado, — que permita experimentar-lhe as conseqüên-
cias na evolução educacional; até que seja possível recomendar
com mais objetividade e segurança — possíveis modificações de
regime. Esse é um ponto-de-vista geral dêste Conselho, (aa.) José
Barreto Filho, relator. A. Almeida Júnior, Ajadil de Lemos.
INFORMAÇÃO DO PAÍS

MINISTRO INTERINO NA gas, Paulo de Góis, H. Mous-


PASTA DA EDUCAÇÃO E satché, Sílvio Fróis de Abreu.
CULTURA Amadeu Cúri, Antônio Couceiro
e Leite Lopes.
Em substituição ao Dep. Paulo Tomando esta iniciativa, há
de Tarso, foi designado para muito reclamada pelos cientistas,
exercer, interinamente, a Pasta o Brasil será o primeiro país
da Educação e Cultura o Dr. americano a ter todo o seu tra-
Júlio Sambaqui. balho científico-tecnólogico diri-
Diretor Geral de Administra- gido por um Ministério, já exis-
ção do Ministério, o novo Mi- tente na Inglaterra, RAU, Ale-
nistro é pessoa há longos anos m a n h a Ocidental e na índia. Na
ligada à Secretaria de Estado, União Soviética, tal como um
onde ocupou as funções de Di- Ministério, funciona a Academia
retor da Divisão de Orçamento, de Ciências.
antes de assumir a Direção Um dos idealizadores da cria-
Geral.
ção do Ministério da Ciência e
O Ministro designou o técnico Tecnologia, o Professor José
de educação José Carlos No- Leite Lopes, Diretor-Científico do
gueira Ribeiro para chefiar seu Centro Brasileiro de Pesquisas
gabinete. Físicas e conselheiro do CNPq,
abordado pela imprensa carioca.
MINISTÉRIO DE CIÊNCIA E expendeu esses conceitos:
TECNOLOGIA "A influência da ciência e da
tecnologia no desenvolvimento
A criação do Ministério da econômico é, hoje, reconhecida
Ciência e Tecnologia, sugerida em todo o mundo. Os países
por um grupo de cientistas ao avançados — e o são em razão
Ministro Amaral Peixoto, já está disto — compreendem o papel
incluída em têrmos concretos no básico da pesquisa científica e
anteprojeto da reforma adminis- tecnológica, e tomam medidas
trativa, e conta com o apoio do concretas para o desenvolvimento
Presidente João Goulart, segundo dessas atividades. No Brasil, o
êle próprio manifestou em reu- organismo encarregado da ma-
nião ministerial. téria é o Conselho Nacional de
Na Academia Brasileira de Pesquisas, criado em 1951. Ape-
Ciência e no CNPq foi consti- sar dos benefícios que trouxe
tuído um grupo de trabalho para aos institutos de pesquisas do
prestar assessoria ao Ministro País, êste órgão já não satisfaz
Amaral Peixoto, medida tomada às necessidade que o País re-
numa reunião extraordinária da clama para o seu desenvolvi-
qual participaram, e n t r e outros, mento, como a experiência dos
os cientistas A r t u r Moses, Pre- últimos anos o demonstrou.
sidente da entidade; Almirante Urge, assim, a criação de um
Álvaro Alberto, fundador do organismo que o substitua e que
CNPq; seu atual Presidente, Atos atenda ao estágio atual das ne-
da Silveira Ramos, Carlos Cha- cessidades neste setor. Deve ser
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 159

capaz de formular uma política partamento de Energia Nuclear


científica nacional, deve ser (em substituição à Comissão
politicamente prestigiado, possuir Nacional de Energia Nuclear),
autoridade científica e dispor de um Departamento de Treina-
recursos para executar todo o mento de Pessoal e Informação
seu programa. Científica, absorvendo a CAPES
e Cosupi. O Ministro de Estado
seria assessorado por um Con-
COORDENAÇÃO selho Nacional de Ciência e Tec-
nologia constituído por persona-
Lutam os cientistas para que lidades científicas, com funções
a política científica do País for- normativas e deliberativas. Cada
taleça a pesquisa científica e departamento poderia ser subdi-
amplie o campo do ensino cien- vidido em seções para execução
tífico, ao mesmo tempo em que das atividades do Ministério.
fortaleça a pesquisa tecnológica.
considerando as suas relações O Departamento Nacional de
com os programas de desenvol- Pesquisas Científicas poderia
vimento econômico. O Minis- abranger uma Divisão de Pes-
tério da Ciência e Tecnologia quisas Matemáticas e Astronô-
precisa funcionar em estreita micas, uma Divisão de Pesquisas
cooperação com os órgãos de Físicas, uma Divisão de Pesqui-
planejamento econômico; fazer sas Biológicas e uma Divisão de
inquéritos e levantamentos sôbre Ciências Sociais e Econômicas,
os institutos e as atividades cien- as quais atenderiam às neces-
tíficas e tecnológicas do País. sidades e às atividades do Minis-
correlacionando-as com as infor- tério, bem como de outros órgãos
mações estatísticas e econômicas. de cada especialidade dos demais
E, com base nestes dados, deve institutos e universidades do
coordenar as atividades do País País. Os demais departamentos
no setor, executando uma polí- teriam subdivisões correspon-
tica de desenvolvimento cientí- dentes.
fico e tecnológico.
Para o Ministério da Ciência
A lei de criação do Ministério e Tecnologia poderiam ser trans-
da Ciência e Tecnologia deveria feridos órgãos como o Observa-
consolidar a legislação esparsa tório Nacional, Instituto Osvaldo
no País sôbre as pesquisas cien- Cruz, Jardim Botânico, Museu
tíficas e tecnológicas, constituin- Nacional, Instituto de Pesquisas
do-se numa Lei de Diretrizes e da Amazônia, Instituto de Mate-
Bases da Pesquisa Científica e mática Pura e Aplicada, o Insti-
e Tecnológica. A êste Minis- tuto de Energia Atômica, o Ins-
tério passariam a pertencer todos tituto Nacional de Tecnologia e
os institutos científicos e tec- muitos outros. Alguns dos insti-
nológicos do Govêrno Federal, tutos e serviços poderão ter
distribuídos e muitas vezes mal apenas parte de suas seções
colocados em outros Ministérios transferidas para o Ministério.
e outros órgãos federais.
Argumentam os cientistas que
a criação do Ministério da Ciên-
ABSORÇÃO cia e Tecnologia não acarretará
gastos excessivos e nem ofere-
O Ministério da Ciência e cerá margem a empreguismo,
Tecnologia seria constituído, pois o novo órgão teria sua
entre outros, de um Departa- verba resultante da aglutinação
mento Nacional de Pesquisas de todas as instituições federais
Científicas, um Departamento de ou subvencionadas, e o seu corpo
Pesquisas Tecnológicas, um De- administrativo seria constituído
160 REVISTA BRASILEIRA DE

pelo pessoal dessas mesmas ins- laboratórios, aquisição de livros


tituições". e periódicos especializados, con-
A propósito da falta de recur- tratação de pesquisadores estran-
sos destinados à Ciência e Tec- geiros, realizações de simpósios
nologia no Brasil, o Presidente e outras reuniões científicas.
,do Conselho Nacional de Pes- atingiu o total de
quisas, Professor Atos da Sil- Cr$ 561.977.705,00.
veira Ramos, assim se mani-
festou: Não menos importante para
"O Conselho Nacional de Pes- o País é a atuação de seus
quisas, criado pela Lei n.° 1310, órgãos subordinados, tais como
de 15-1-51, tem como finalidade o Instituto Nacional de Pesqui-
promover e estimular o desen- sas da Amazônia, Instituto de
volvimento da investigação cien- Matemática Pura e Aplicada,
tífica e tecnológica em qualquer Instituto Brasileiro de Biblio-
domínio do conhecimento. Esses grafia e Decumentação, Instituto
objetivos, o Conselho procura de Pesquisas Rodoviárias e
alcançar através de bolsas e Grupo de Organização da Co-
auxílios, concedidos de acordo missão Nacional de Atividades
com normas estabelecidas em Espaciais, e até princípio de
Instruções publicadas e ampla- 1964, o Instituto de Energia
mente divulgadas entre pessoas Atômica, destinados não só à
,e instituições credenciadas para pesquisa de base, como à inves-
a execução de atividades expe- tigação tecnológica, à bibliogra-
rimentais. As bolsas do Conse- fia e às atividades espaciais.
lho são concedidas a pesquisa- Tem ainda em funcionamento o
dores, visando a assegurar-lhes Serviço do Sincrociclotron que
tranqüilidade financeira, capaz de se encontra à disposição de pes-
traduzir-se no desenvolvimento quisadores e estudiosos.
dos seus trabalhos de investi-
gação; e a recém-formados, ou As dificuldades que mais obs-
mesmo a alunos de cursos supe- táculos têm criado ao Conselho
riores, a fim de que a vocação Nacional de Pesquisas nos seus
para atividades científicas, neles 12 anos de profícua existência
identificada, possa afirmar-se. situam-se principalmente em dois
planos:
Os auxílios são destinados à
aquisição e instalação de equipa- 1.° — Insuficiência de dota-
mento, ao custeio de serviços ções orçamentárias;
de natureza técnica ou especia-
lizada, à contratação de pesqui- 2.° — Remuneração inadequada
sadores estrangeiros, a publica- dos cientistas e Profes-
ções científicas, a congressos e sôres Universitários.
outras reuniões, excursões e
missões científicas etc. A estru-
tura do Conselho reflete seu Mesmo que a muitos esta
campo de atuação, no trabalho afirmação pareça um tanto vazia
de amparo e estímulo à pesquisa de conteúdo acadêmico, parece-
científica. Pode-se afirmar que me que bem reflete a relativa
não existe no Brasil nenhuma lentidão da evolução da ciência
instituição, categorizada, que não num país de imensos recursos
tenha recebido auxílio do CNPq. naturais como o Brasil. Senão,
Assim, até o ano de 1962 foram vejamos: Quando se observam
distribuídas 3 503 bolsas, das as dotações orçamentárias dos
quais 671 utilizadas no exterior. países mais desenvolvidos e
A importância despendida em mesmo a de alguns em fase de
auxílio para equipamento de desenvolvimento, conclui-se, ine-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 161

vitàvelmente, que a recomenda- rem, como ocupam, posição de


ção determinada pela experiên- grande relevo e respeito na
cia é a de ser consignada à sociedade em que vivem, mas
Ciência e à Tecnologia, em qual- também por serem assim consi-
quer nação que pretenda alcançar derados pelas autoridades gover-
progresso real, uma percentagem nantes que lhes devem conferir,
nunca inferior a 1% de seu no seu código de precedência.
recolhimento bruto, ou melhor, uma posição compatível com o
que atinja 2 ou 3%, como é já mérito e responsabilidade de
praticada em diversos países. suas funções.
Posso, entretanto, assegurar que Se bem que vivendo uma
o atual Govêrno não subestima etapa em que enfrenta, um corte
a Ciência e a Tecnologia, mas, de 40% em suas dotações, de
pelo contrário, promove os mais acordo com o plano de conten-
sérios estudos que já se fizeram ção, o CNPq., sente, por parte
neste País, para assegurar uma do Govêrno, uma séria intenção
política científica que traduza de aprovar uma substancial me-
planejamento, execução, estímulo lhoria em seu orçamento para
e coordenação. Uma política 1964, como também com elevado
voltada para o desenvolvimento interesse do Excelentíssimo Se-
econômico e científico do País, nhor Presidente da República e
com alicerces sólidos na inves- de seu Ministro Especial para
tigação científica básica, indis- a Reforma Administrativa em
pensável para o progresso tec- estudar, assessorado diretamente
nológico. pelo CNPq o projeto de reforma
que dê ao órgão de cúpula da
A segunda dificuldade, a que Pesquisa Científica e Tecnoló-
se refere ao salário dos cientis- gica no Brasil a amplitude de
tas e dos professôres de nível atribuições e de prestígio que
superior, é de caráter traumatl- lhe compete.
zante, prejudicando qualitativa e
quantitativamente a produção Quanto aos salários de cien-
científica brasileira. Os efeitos tistas e professôres universitá-
negativos da má remuneração rios, o CNPq retomará, breve-
dos homens de ciência terão mente. sua campanha, iniciada
maior repercussão nas próximas em 1959, pela implantação do
gerações, que verão seus profes- regime de dedicação exclusiva.
sôres universitários e seus cien- agora nos moldes mínimos já
tistas selecionados, principalmen- estabelecidos no Estado de São
te entre aquêles que não con- Paulo mais evoluídos e justos do
seguiram alcançar os postos que os previstos na Lei n. 3.780,
altamente remunerados das gran- de 12-7-60, que restabeleceu o
chamado "tempo integral".
des empresas.
Há vários anos venho pre-
gando e trabalhando, ao lado
de muitos outros professôres. CENTROS FEDERAIS DE
no sentido de dar aos profis- EDUCAÇÃO
sionais da ciência e do magis-
tério superior uma posição digna Para cooperar no aperfeiçoa-
na sociedade em que vivem. mento do magistério, de acordo
Digna, através de um salário com a Lei de Diretrizes e Bases,
que os mantenha na posição o Ministério da Educação e Cul-
hierárquica que já lhes coube tura instituiu, em cada sede das
neste País, e que é desfrutada Inspetorias Secionais de Ensino
atualmente por seus pares de Secundário, uma unidade espe-
outras Repúblicas democratas cial, denominada "Centro Fede-
ou socialistas. Digna, por ocupa- ral de Educação e Cultura".
162 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Nesse sentido, a Diretoria de CONDIÇÕES DE TRABALHO'


Ensino Secundário tomou uma PARA ENSINO DE ALTA
série de providências visando à QUALIDADE
concretização de um plano de
ação que já foi enviado a todos Apresentando como tema de
os inspetores secionais para uma estudos "Condições de trabalho
tomada de conhecimento. para um ensino de alta quali-
dade", realizou-se no Hotel Glória
O projeto elaborado pelos se- do Rio de Janeiro, entre 7 e 13.
tores técnicos da DES se prende de agosto último, a XII Assem-
a dois pontos fundamentais: a) bléia de delegados da Confede-
entendimento dos inspetores se- ração Mundial de Organizações
cionais com os serviços especia- do Professorado (CMOP), que
lizados dos Estados e Municípios, reuniu representantes de 79
a fim de obter, no prazo de países.
trinta dias, a cessão de terrenos Na escolha do tema procurou-
com média de sete mil e qui- se atender ao fato de que o
nhentos metros quadrados no crescimento da população mun-
mínimo, em locais adequados, dial, a aceleração do progresso
para a representação federal no científico-tecnológico e a multi-
âmbito educacional e cultural; plicidade de meios de comuni-
b) entendimento com a Dele- cação aproximando indivíduos e
gacia Fiscal nos Estados, a fim nações impelem todos os países
de obter pronta liberação de a ampliar, em graus variáveis,
recursos orçamentários específi- os programas pedagógicos e mo-
cos, à base de dotações que per- dificar as estruturas de ensino,
mitam o reaparelhamento de visando proporcionar igualdade
Inspetorias Secionais, inclusive de oportunidades de educação e
ampliação, instalação e equipa- assegurar um ensino de quali-
mento. dade em todos os níveis.
Conforme as instruções envia- A Conferência ressaltou como
das aos Estados pela Diretoria requisito essencial para alcançar
de Ensino Secundário do MEC, ensino de alta qualidade a for-
os Centros Federais de Educação mação adequada de educadores
e Cultura obedecerão a uma capacitados, detendo-se no exame
linha arquitetônica uniforme, dos principais problemas que
podendo cada projeto, se assim afligem o magistério em sua
fôr necessário, ser adaptado à formação geral e profissional;
conformação e dimensões de seleção e aperfeiçoamento; remu-
terreno obtido dos Governos neração à altura de suas respon-
Estaduais e Municipais. Tôda sabilidades, aposentadoria e sis-
a assistência técnica abrangendo tema de previdência social para
o projeto, especificações, normas educadores.
contratuais, qualidade, material Também foi ressaltada a ne-
ou outras será fornecida pela cessidade de cursos de aperfei-
própria Diretoria do Ensino çoamento, informação e adapta-
Secundário do MEC. As obras, ção para professôres em exer-
segundo recomendação expressa cício, bem como o direito de
do professor Oliveira Lima, de- representação e participação das
verão ser feitas sob o regime associações profissionais na ela-
de administração, tendo em vista boração de programas pedagó-
que sua evolução se dará à me- gicos e planificação do ensino,
dida que forem consignados o respeito pela liberdade de
recursos específicos nos orçamen- associação, liberdade sindical e
tos da União. A construção o reconhecimento pelos poderes
destes Centros será efetuada por públicos das entidades da classe.
etapas, podendo, inclusive, ser
terminadas em partes. Outros problemas concernentes
ao magistério, como a garantia
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 163

de condições sociais desejáveis CMOP a organização de uma


ao desenvolvimento da criança, biblioteca de compêndios utili-
visando obter o máximo resul- zados em várias regiões do
tado na educação ministrada, mundo para consulta por edu-
foram também considerados, cadores, eruditos e pesquisadores.
estabelecendo-se que às organi- Considerou ainda a necessidade
zações do professorado compete da assistência e cooperação ativas
trabalhar para a consecução desse das nações desenvolvidas às
objetivo. nações ainda em desenvolvi-
mento, sempre que se faça
A XII Assembléia Geral so- respeitar devidamente sua cul-
licitou ao Comitê Executivo da tura e independência.

SIMPÓSIO DE EDUCAÇÃO ESPECIAL


Realizado em Brasília nos dias 11 e 12 de setembro
passado, por iniciativa da Profª Dorina Gouveia Norwill,
coordenadora da Campanha Nacional do Cego, do Minis-
tério da Educação, e com a participação de educadores
de todo o país, o Simpósio aprovou estas conclusões que
foram encaminhadas ao Ministro da Educação:

"1 — Lembrar que os excep- cialmente quando se trate de


cionais são elementos da coleti- aplicação dos fundos criados pela
vidade tão dignos de considera- Lei de Diretrizes e Bases da
ção como a maioria dos cidadãos Educação, em cumprimento ao
que corresponde aos padrões disposto nos artigos 88 e 89 da
normais e, por isso, os recursos referida lei.
disponíveis não podem ser
destinados unicamente a essa 5 — Incentivo à pesquisa de
maioria. nível superior, especializada,
2 — Criação, no Ministério da sôbre todos os aspectos da edu-
Educação e Cultura, de um orga- cação dos excepcionais (causas.
nismo nacional com a finalidade freqüência, métodos etc), que
normativa de pesquisa, treina- possam servir de retaguarda
mento e técnicas, planejamento científica aos profissionais que
e ajuda financeira aos programas cuidam da educação e reabilita-
de educação e reabilitação dos ção de tais deficientes.
excepcionais. 6 — Reconhecendo insuficiente
3 — Realização do censo na- o número de técnicos e profes-
cional dos excepcionais, medida sôres, recomenda o máximo
indispensável para que o poder incentivo e financiamento de
público possa conhecer a exten- cursos especializados, bôlsas-de-
são do problema, especialmente estudo, estágios, congressos no
no que diz respeito ao número Brasil e no estrangeiro etc, des-
de deficientes mentais, de audi- tinados à formação e aperfeiçoa-
ção, da visão e do aparelho loco- mento de técnicos nos múltiplos
motor (defeitos ortopédicos), setores abrangidos pela educação
para o que oferecem, como sub- especial, cujo objetivo final é a
sídio, a minuta de decreto em integração ao excepcional como
anexo. elemento ativo da comunidade.
4 — Estabelecer percentagem 7 — Incentivo e financiamento
fixa, destinada à educação espe- à criação e ampliação de órgãos
cial, em todos os planos de oficiais e particulares que se
financiamento da Educação, espe- dediquem à educação especial,
164 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

garantindo-lhes principalmente HUMANIZAÇAO DA RODOVIA


eficiente assistência t é c n i c a ,
quando necessária. Num programa conjunto de
8 — Realização sistemática de que participam o Ministério da
campanhas de esclarecimento Educação, o da Viação, Estados
destinadas a garantir cada vez da Federação e Municípios, vem-
mais a aceitação dos excepcionais se realizando um trabalho de
como membros integrantes da educação de base junto às popu-
comunidade, na família, na lações que se acham concentra-
escola e na sociedade. das ao longo das rodovias.
9 — A educação dos excepcio- Iniciando a experiência, foi
nais deve, sempre que possível, enviada uma equipe volante do
realizar-se em classes comuns. Departamento Nacional de Edu-
Os órgãos competentes deverão cação, composta de um Coorde-
oferecer todas as facilidades para nador — Dr. Fernando Duque
instalação de classes especiais, Estrada, de uma Assistente So-
escolas especiais, ensino itine- cial — Dra. Maria Stella Ramos,
rante, ensino domiciliar, na con- de uma Técnica de Educação —
formidade das necessidades de Prof.a Maria Olindina, de um
cada educando. dentista e um encarregado de
relações públicas.
10 —• É conveniente que os Foram visitadas oito cidades
poderes públicos baixem instru- do interior de Minas no período
ções para facilitar e tornar de uma semana, levando a equipe
efetivo o ingresso de excepcio- uma orientação nova às profes-
nais nas classes comuns. soras locais, abrangendo os as-
11 — Promover a admissão dos pectos pedagógico, social e sani-
excepcionais nos cursos comple- tário.
mentares primários, agrícolas, Durante o segundo semestre
industriais e de economia do- do ano em curso foram envia-
méstica, e outros oferecidos pelo das outras equipes, dando conti-
ensino profissional." nuidade ao trabalho iniciado.
INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO

A TECNOLOGIA NOS LICEUS mestres diplomados, um médico,


FRANCESES monitores de alfabetização, orga-
nização do lazer, ensino agrícola
A título experimental, a tecno- de base e de trabalhos de ofi-
logia foi introduzida no plano cina, assistentes sociais e opera-
de estudos da 4. a série dos liceus dores para os aparelhos audio-
técnicos e de grupos experimen- visuais.
tais compostos de liceus e colé-
gios vizinhos de estabelecimentos
técnicos. A iniciação tecnológica ESTATÍSTICAS EUROPÉIAS
começará pelo exame de meca-
nismo simples ou de pequenas Segundo estatísticas recentes,
máquinas que os alunos, depois a proporção professor-estudante
de as ter desmontado e remon- é a seguinte em alguns países
tado, deverão aprender a repre- da Europa: há 2,3 professôres e
sentá-las por um desenho téc- encarregados de cursos para 100
nico. Quatro horas por semana estudantes de ensino superior na
são destinadas à tecnologia — Itália; 3,1 na França; 4,8 na
duas horas reservadas ao dese- República Federal da Alemanha;
nho e duas à oficina. Os alunos 7,1 na Bélgica; 8,7 na Suíça e
terão a máxima liberdade a fim 11.4 na Inglaterra.
de desenvolver sua capacidade
criadora.
GRUPO DE "CIBERNÉTICA E
PEDAGOGIA" NA ALEMANHA
MISSÕES CULTURAIS
MEXICANAS Um grupo denominado "ciber-
nética e pedagogia" foi consti-
A educação de base é assegu- tuído recentemente no quadro
rada pelas missões culturais do conselho científico do Minis-
motorizadas que dispõem de tério da Educação. A criação
pessoal especializado e são do- desse grupo é o resultado dos
tadas de equipamento funcional seguintes fatos: 1) a utilização
e moderno que lhes permite da matemática nas ciências se
deslocar-se facilmente numa área faz em ritmo muito rápido e é
preestabelecida. Onze missões necessário estudar as leis desse
desse gênero funcionam atual- processo; 2) a cibernética já é
mente. Cada u m a tem três veí- utilizada na formação de cal-
culos a seu serviço: u m a unidade- culadores técnicos e no ensino
pilôto e duas unidades auxiliares programado; 3) novas profissões
equipadas de aparelhos audio- terão em breve estreitas ligações
visuais e material, de pequenas com a cibernética (engenheiros
oficinas e de grupos eletrógenos. eletrônicos, construtores de
de material agrícola e de cozi- autômatos, e t c ) ; 4) novas disci-
nha. Além do chefe, fazem plinas devem ser introduzidas
parte da missão motorizada nos programas (bases da auto-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

mação, pesquisa de dados, e t c ) ; ESTUDOS PEDAGÓGICOS


5) o resultado dessas conside- PLANO DE ESTUDOS NA
rações é que o pessoal docente UNIÃO SOVIÉTICA
se incumbirá de novas tarefas, Os programas escolares da es-
para as quais se deve p r e p a r a r cola de 8 anos foram elaborados
desde agora. de maneira a dedicar 43,2% do
horário ao ensino de humani-
dades (língua materna, literatura,
NOVOS PLANOS DE ESTUDOS história, Constituição da U.R.S.S.,
NA BULGÁRIA línguas estrangeiras, desenho,
música e canto); 35,1% às ma-
No decorrer do ano escolar térias científicas e matemáticas
1961-1962 um novo plano de es- (matemática, física, química, bio-
tudos foi estabelecido para a 9. a logia, geografia física, desenho
industrial); 15,2% a todos os gê-
classe das escolas politécnicas neros de aprendizagem do tra-
secundárias, compreendendo 2 balho e 6,5% à cultura física.
novas disciplinas: mecanização
da agricultura (2 horas por se- O horário da nova escola se-
mana) e desenho (1 hora por cundária divide-se da seguinte
maneira: 30% para humanidades
semana). As horas destinadas (literatura, história, sociologia,
a certas matérias foram igual- geografia econômica, línguas es-
mente aumentadas: matemática, trangeiras); 31,7% às matérias
desenho industrial, estudo de científicas e matemáticas (mate-
máquinas. Por outro l a d o , mática, física, química, biologia,
introduziu-se o aprendizado no astronomia, desenho industrial);
setor produtivo d u r a n t e 2 se- 33,3% às disciplinas técnicas
m a n a s , com 5 horas diárias, no gerais, à aprendizagem (teórica
fim do ano letivo. e prática), à produção e trabalho
produtivo; 5% à cultura física.
As escolas secundárias noturnas
ALFABETIZAÇÃO DE comportam um horário de 20
ADULTOS NOS ESTADOS horas semanais, das quais 15 são
dedicadas às matérias de cultura
UNIDOS geral, 2 horas ao aperfeiçoa-
mento profissional e 3 horas às
Com o apoio de 2 grupos na- consultas.
cionais — a Federação Geral de
Clubes Femininos e a Associação
Nacional de Educadores de Es- EDUCAÇÃO DE ADULTOS
colas Públicas para Adultos — NA ÍNDIA
o Gabinete de Educação contri-
bui para a alfabetização dos 8 O 3.° plano qüinqüenal adota-
milhões de adultos ainda iletra- do pelo Govêrno da índia em
dos nos Estados Unidos. Conta- 1961 acentuou a importância
se igualmente com a ajuda eficaz primordial da educação de adul-
de escolas públicas, colégios e tos, inclusive a alfabetização e
universidades, clubes femininos os esforços empregados visando
e todas as organizações nacionais transformar a e s t r u t u r a da vida
de trabalho comunitário p a r a comunitária. Algum progresso
eliminar definitivamente o anal- já foi obtido graças à criação
fabetismo. Um alfabeto "opera- de centros comunitários e de
cional" acaba de ser criado, salas de leitura n a s pequenas
assim como u m a série de 100 cidades, a organização de grupos
lições televisionadas para que de jovens e associações femini-
adultos possam aprender a ler nas, e ainda o novo impulso
e escrever. dado aos panchayats e às coope-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 167

rativas nas pequenas cidades. trabalhos práticos e complemen-


Em 1961, a proporção de alfabe- tada por conferências de espe-
tizados na população ainda não cialistas, de demonstrações e
atingia 24%. visitas técnicas, é oferecida tanto
a estudantes quanto a engenhei-
ros. Bolsas concedidas a alguns
CRÉDITOS DA N. A. S. A. estudantes facilitarão a continui-
PARA AS UNIVERSIDADES dade dos trabalhos de labora-
tório na F r a n ç a e no estrangeiro.
A N. A. S. A. (National Aero-
nautics and Space Administra-
tion) concedeu recentemente cré- NOVOS MÉTODOS DE
ditos no valor de 6,4 milhões SELEÇÃO NA DINAMARCA
de dólares a 5 universidades
americanas para a instalação do Operou-se u m a reforma radical
equipamento necessário ao ensi- no sistema educativo da Dina-
no das ciências e tecnologia marca, prevendo, além de outras,
espaciais. Estas subvenções, as u m a importante mudança nos
primeiras a estarem afetas às métodos de seleção para o ensino
pesquisas espaciais, são destina- secundário. Anteriormente, os
das à Universidade Berkeley alunos dinamarqueses que come-
(Califórnia), Universidade de çavam seu período de escolari-
Chicago, Instituto Politécnico dade obrigatória aos 7 anos para
Rensselaer, à Universidade do t e r m i n a r aos 14, passavam por
Estado de Iwoa e à Universidade exames de seleção aos 11 ou 12
de Stanford. anos. Considerando-se que esses
testes e r a m o início da escola
secundária, aquêles que e r a m
ESTUDOS ESPACIAIS NA mal sucedidos nos exames per-
FRANÇA maneciam na escola primária
até o fim da escolaridade obri-
Uma comissão de representan- gatória. Sob o novo sistema,
não haverá exame antes do tér-
t e s da Universidade e de diver- mino da escolaridade obrigatória
sas outras grandes escolas estu- e as escolas primárias vão efe-
dou, com a ajuda do centro tuar, elas mesmas, a seleção, ba-
nacional de estudos espaciais, a seando-se nos resultados obtidos
integração de um ensino de ciên- por aluno e encaminharão os
cias e técnicas espaciais no ter- melhores elementos para a escola
ceiro ciclo de estudos superiores média, rebatizada "escola real"
universitários e de grandes es- que freqüentarão durante dois
colas. Uma "opção espacial", anos antes de entrar no ginásio.
a b r a n g e n d o cursos, seminários,
CRÍTICA DE LIVROS

GEIGER, Pedro Pinchas — Evolução da uma obra que, por todos os títulos
rede urbana brasileira, Rio, t e n t r o está ao nível de grandes trabalhos do
Brasileiro de Pesquisas Educacionais, gênero publicados no estrangeiro.
1963, 462 págs. Mas êste é bem brasileiro, pelo autor,
pela matéria e pela abordagem, onde
Consultado a título particular, por métodos comprovados são aqui aper-
um grupo de economistas e sociólogos feiçoados e aplicados com autonomia
franceses, da nova geração, sôbre alguns e originalidade.
livros de consulta obrigatória acerca
Ninguém hoje poderá estudar o
dos problemas brasileiros, incluí entre
eles, o importante trabalho de Pedro desenvolvimento do Brasil sem consul-
Pinchas Geiger, "Evolução da Rede tar o livro de Pedro Pinchas Geiger.
Urbana Brasileira", porque o conside- O autor é licenciado pela Fac. Nac.
ro. de fato, um dos estudos mais sérios de Filosofia da Univ. do Brasil, geó-
ultimamente publicados, e de leitura grafo do Conselho Nac. de Geografia
rigorosamente indispensável, para uma e tem publicados já vários trabalhos
exata compreensão de alguns aspectos sôbre geografia econômica.
de nosso desenvolvimento.
PAULO DE CASTRO
Não há neste trabalho de pesquisa
feito em têrmos de ciência, escrito com
clareza e elgância, um capítulo supér-
M A N N H E I M , Karl e STEWART, W . A . C . ,
fluo ou desvinculado do conjunto; não
An Introduction to the Sociology of
há improvisação, mas uma sistemática
demonstração de teses; não há exces- Education, Routledge & Kegan Paul,
so de estatísticas. embora todas as Londres, 1962, 187 págs.
indispensáveis sejam de primeira mão
e de primeira ordem, desenvolvendo- Ao que se noticia, esta é a derra-
se o estudo por lances sucessivos até deira das obras póstumas de Mannheim.
chegar ao eapítulo final "Urbaniza- Nela, Stewart é menos do que o co-
ção e Industrialização", que, em pou- autor e mais do que simples editor:
cas páginas, representa como que uma selecionou, organizou e até recons-
síntese filosófica do livro, escrito por truiu notas ou apontamentos restantes
mão de mestre. de Mannheim, relativos à educação,
sem que tenha conseguido, devido ao
O trabalho de Pedro Pinchas Geiger
material escrito original — e como o
diz-nos bem como já saímos da fase
declara — impedir que êste livro se
do impressionismo na pesquisa, aná-
lise e crítica dos nossos grandes pro- mostre como a mais fragmentária das
blemas, como o desenvlvimento atinge obras póstumas dêste Autor.
as áreas intelectuais e como um bra- Como se sabe, o estudo sociológi-
sileiro, servindo-se de uma bibliogra- co da educação é dos que mais se
fia ao mesmo tempo vasta, séria e beneficaram dos interesses ao mesmo
rigorosamente selecionada, combinando tempo teóricos e pragmáticos de
isto com o estudo direto, a observação Mannheim. Focalizando a educação
pessoal, inquéritos conduzidos com como técnica social, evidenciou com
imensas dificuldades e, direi mesmo, profundidade as suas potencialidades
riscos, pode chegar à realização de inovadoras e concedeu-lhe posição das
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 169

mais relevantes dentre as fôrças de concepção da sociedade como sendo


controle suscetíveis de manipulação tôda ela, desse ângulo, uma situação
racional num processo deliberadamente educativa ("educative society"). Se-
provocado e dirigido de reconstrução gue-se uma análise sociológica de fatos
da ordem social. O reconhecimento da história e da filosofia da educação,
da grande contribuição de Mannheim evidenciando a sua vinculação à estru-
a êste campo de estudos independe de tura social. A dimensão psicossocial
críticas que lhe possam ser feitas — do processo educativo constitui objeto
aqui não discutidas — acerca do seu de vários capítulos destinados ao
diagnóstico da situação do mundo mo- estudo da aprendizagem e dos con-
derno e do decorrente reformismo ine- dicionantes socioculturais da persona-
rente à sua concepção da "sociedade lidade. Êste assunto toma, no livro,
democrática planificada", proposta extensão demasiada em face da ocupa-
como o "terceiro caminho", e de sín- da pelos demais temas, o que se expli-
tese, entre o laissez-faire de um lado caria facilmente pelo fragmentarismo
e, de outro, os totalitarismos da direita dêste trabalho. Três capítulos subse-
e da esquerda. qüentes versam (a aceitar-se o título
da seção que compõem) assuntos mais
"An Introduction to the Sociology especificamente sociológicos: cuidam,
of Education" pertence ao que se cha- respectivamente, das funções socializa-
maria segunda fase da carreira inte- doras dos grupos primários, do grupo
lectual de Mannheim. Trata-se da fase de ensino e do significado da socio-
era que se dedicou predominantemen- logia na formação intelectual do edu-
te ao estudo do processo de interven- cador. A última parte do livro (um
ção deliberada na realidade social c capítulo apenas) corresponde a uma
tomou, neste contexto, a educação tentativa de integração dos resultados
como um dos seus temas centrais de dos capítulos anteriores, tentativa essa
investigação. Neste sentido, a obra em fiel à posição mannheimiana segundo
questão coloca-se ao lado de "Man a qual à sociologia competem tarefas
and Society in an Age of Recons- integradoras no campo das ciências
truction", "Freedom. Power & Demo- humanas: "Nenhuma atividade on
cratic Planning" e "Diagnosis of Our pesquisa educacional é adequada, no
Time". Posta em confronto com presente estágio de tomada de cons-
outras obras do Autor, ela contém ciência, a menos que seja concebida
certa originalidade, ligada ao material em têrmos de uma sociologia de edu-
com que lida, mais maciça ou com- cação". Nessa última seção são ainda
pactamente educacional. Entretanto, retomadas concepções fundamentais do
no plano das interpretações mais am- pensamento mannheimiano melhor
plas não diz, a rigor, nada que já expostas em outros trabalhos mais
não tenha sido enunciado, e de melhor "acabados" e que informam, sem
modo, nos trabalhos do Autor ante- nunca serem suficientemente aprofun-
riormente publicados, particularmente dadas, o conteúdo todo da obra em
nos acima citados. Por isso, e nesta foco. E são retomadas em têrmos de
linha de apreriação comparativa, êste análise prospectiva, no plano do pen-
trabalho de sociologia da educação se samento planificador em que Mannheim
apresentaria como "obra menor" den-
tre as que levam o nome de Mannheim.
desenvolve suas reflexões " pela
Deixando de lado a "Introdução" investigação sociológica devemos des-
assinada por Stewart, o livro começa cobrir o que os fatos são e, de outro
por firmar o ponto-de-vista sociológico lado, o que deve ser feito a fim de
na bordagem da educação: à maneira produzirmos certos resultados". In-
de Durkheim, esta é entendida como felizmente, a "Introdução" de
processo social inclusivo, que assume Stewart é muito ligeira ao procurar
formas múltiplas e apresenta, analiti- explicitar conexões entre esta obra e
camente considerada, dupla dimensão as principais teses e preocupações
(psicossocial e sociocultural). Daí a mannheimianas.
170 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Obra menor no conjunto da pro- ratinguetá que fora objeto de um tra-


dução de Mannheim, "An Introduc- balho de Lucila Hermann), estudar-
tion to the Sociology of Education" se-ia agora um município que se man-
apresenta-se, no entanto graças à tivera à margem da onda dos cafèzais.
amplitude do pensamento do Autor A pesquisa estendeu-se de 1949 a
e não obstante limitações que con- 1956, utilizando o Autor tôda espécie
tenha, ligadas às condições de sua de técnicas na obtenção dos dados.
elaboração, — como um dos mais Para os históricos, foram consultadas
vigorosos e sugestivos trabalhos dentre as fontes impressas (livros, revistas,
os que, publicados em inglês, são por almanaques, coleções de jornais e de
seus autores intitulados obras especí- documentos em geral), pertencentes
ficas de sociologia da educação. Além tanto a arquivos oficais quanto priva-
disso, seu conteúdo não se acha, ao dos; completaram-nos entrevistas e his-
contrário do da maioria destas, por tórias de vida de pessoas idosas de
demais referido empiricamente a uma todas as camadas sociais. Os dados
realidade social particular e estranha que permitem formar idéia da fisiono-
à nossa, como em geral sucede com os mia sócio-econômica atual do municí-
compêndios e antologias norte-ameri- pio foram colhidos em estatísticas que
canos. Tendo em vista a necessidade figuram nos recenseamentos e outros
de expansão da literatura sociológica repositórios semelhantes, e por meio
no Brasil — seja por produção autóc- de amostragem sistemática de que se
tone, seja por incorporação, através de valeu o autor pará obter um levan-
tradução, de trabalhos estrangeiros tamento demográfico em 1949, na zona
selecionados criteriosamente — essa urbana, e em 1952 e 1956, na zona
outra característica dêste trabalho de rural. Completaram esses materiais
outros colhidos por meio de entrevis-
Mannheim aparece como mais uma das
tais, histórias de vida. depoimentos
suas qualidades que mereceria a aten-
pessoais de indivíduos de idades varia-
ção dos interessados na edição, entre
das e de todas as camadas sociais.
nós, de obras gerais de sociologia da
Assim, em 1956, estava o autor de
educação.
posse de importantíssima documenta-
Luiz PEREIRA ção, cuidadosamente recolhida, de cuja
elaboração surgiu o presente trabalho.
NOGUEIRA, Oraci — Família e Comu- Quis o autor que seu trabalho
nidade, um estudo sociológico de fosse "eminentemente histórico e so-
Itapetininga, Rio, Centro Brasileiro ciográfico", fazendo, pois. objetivo
de Pesquisas Educacionais, 1962, 541 magno a reconstrução da origem e
páginas, com ilustrações. do desenvolvimento do município, jun-
tamente com a descrição da sua reali-
Em 1947, iniciou o Autor uma dade sociológica atual. Para a zona
sondagem em diferentes municípios rural, assim se expressa: "percorrendo-
paulistas, visando à realização de fu- se o Município, em diferentes direções,
turo trabalho de pesquisa sociológica, ( . . . ) colhe-se a impressão de que, ou
e fixou sua escolha no de Itapetininga, nunca foi superada a miséria genera-
por motivos em sua maioria de ordem lizada constatada por Saint Hilaire, no
prática: facilidade de obtenção de primeiro quartel do século XIX. on
dados históricos, facilidade de comu- a ela se retornou, por tôda parte,
nicações com a Capital, que permitia depois de um efêmero surto de pros-
idas freqüentes para efetuar o trabalho. peridade"; proprietários ou não, os
As razões de ordem teórica também sitiantes, que formam 70% dos habi-
existiam: depois de terem sido estu- tantes rurais do município, moram em
dados no Estado de S. Paulo dois casas de sapê e piso de terra batida.
municípios por onde passara o ciclo caixotes fazendo as vezes de móveis,
do café (Cunha, cujas condições so- latas vazias substituindo o vazilhnme.
ciais Emílio Willems analisara, e Gua- O milho é produto plantado na maior
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 171

área do município, seguindo-se-lhe o do Estado no que toca a escolas públi-


arroz e o feijão; estas produções de cas de grau elementar e de grau médio.
cereais contribuem para definir o qua- Assim se explica por que uma cidade
dro econômico rural que é predomi- como esta conseguiu um nível apreciá-
nantemente agricultura de subsistência. vel de vida para seus moradores, muito
Contrastando com a penúria do embora a zona agrícola em que se
meio rural, a cidade apresenta certo localiza tenha ferido a atenção do A.
conforto. Dos domicílios urbanos, se- pelo seu atraso e pobreza.
gundo o censo de 1950, 50% eram Estas pequenas reflexões indicam
dotados de água corrente; 87% pos- a importância do material oferecido,
suíam luz elétrica; 95%, instalações sa- mostrando que a simples leitura aten-
nitárias. A área da cidade quadruplicou ta de suas páginas nos faz atinar com
de 1900 a 1950, e sua população se
explicações plausíveis de paradoxos
tornou 7 vezes maior. Inexplicável
como o acima apontado. Seria neces-
semelhante progresso, num município
sário. agora, que fosse efetuado um
de agricultura pobre e que se man-
levantamento dos problemas sociológi-
tém estagnada desde a época colonial,
cos que os diferentes aspectos regis-
conforme a reflexão do A. reproduzida
acima, não fossem duas circunstâncias trados vão sugerindo. Procurou o A.
importantes. Em primeiro lugar, sua furtar-se a qualquer interpretação ou
posição geográfica, que lhe deu função indagação mais profunda, buscando
conspícua com relação ao comércio de manter-se estritamente fiel ao seu pro-
animais e. mais tarde, em relação à pósito de nos apresentar um trabalho
defesa de território paulista, diante de sociográfico. Abarcou inegavelmente
-possíveis invasões procedentes do Sul. a grande maioria dos aspectos histó-
Em segundo lugar, o fato de ter sido ricos, sociais e econômicos, apresen-
berço do estadista Fernando Prestes, o tando o quadro completo de um mu-
qual desde cedo voltou suas vistas para nicípio, na sua dualidade urbana e
o desenvolvimento de seu arraial polí- rural. Oxalá outros trabalhos sérios,
tico. Assim, conseguiu localizar ali a e bem executados como êste, venham
primeira Escola Normal fundada para enriquecer mais a miúdo nossa biblio-
o interior, mantendo-se a cidade até teca de Ciências Sociais.
1930, como uma das mais favorecidas
MARIA ISAURA PEREIRA DE QUEIRÓS
ATRAVÉS DE REVISTAS E JORNAIS

O PICA-PAU VERDE-AMARELO obras de literatura infantil. Ao


contrário. Nenhum, mas nenhum
Mário Martins mesmo, escritor brasileiro teve
tanta fé na inteligência e no
Mesmo sem tempo, gente que patriotismo de seus jovens lei-
tem filho em colégio vez por tores. Nem houve entre nós
outra está obrigada a meter os quem mais despertasse no Brasil
olhos nos livros escolares da o gosto pela leitura e o inte-
meninada. Por mil razões, in- resse pelos costumes nacionais,
clusive para não ficar muito nossas tradições de família e
por fora, nas conversas de casa. pelos problemas básicos da Pá-
Cumpro, pois, como Deus é ser- tria. Em qualquer outro país,
vido, o que me toca no caso. escritor desse porte teria estátua
Sempre em déficit, confesso. em todas as cidades que pos-
Assim, só agora, quase no fim suíssem mais escolas do que
do ano, dei com aquêle trecho, cadeias públicas. Aqui, como se
na obra "Português — 4.a Série vê, pode haver escolas, mas
ginasial", de Domingos Pascoal persiste o tacanho espírito poli-
Cegalla, a propósito de Monteiro cial, inconformado por Lobato
Lobato: ter morrido fora do cárcere, a
"Infelizmente, quase todos os perseguir sua memória, a asper-
livros do criador do Jeca Tatu gir a infusão de cicuta da taça
hospedam idéias perniciosas e que lhe foi servida em vida pela
atrevidas afirmações de irreligio- Ditadura de Vargas.
sidade, contra as quais é opor- Era realmente Lobato um re-
tuno prevenir os jovens lei- belado contra a pasmaceira, a
tores." mediocridade, a venalidade e a
O exemplar que tive em mãos empáfia dos políticos e funcio-
já está na sétima edição e é, nários que carneavam o Brasil.
oficialmente, adotado no Pedro Seu pessimismo era contra esse
tipo de gente, nunca contra o
II. De êxito garantido, portan- País nem contra os seus legí-
to. De vendagem assegurada timos valores humanos. Nessa
pelo Estado. gente, por certo, não cria e aos
Temos, daí, o nosso Lobato seus crimes não silenciava. Foi,
apontado como um corruptor da aliás, por não se acomodar com
infância brasileira, com idéias aquêles que entravavam o de-
nocivas à formação de nossos senvolvimento nacional, e por
jovens em quase todos os seus não descrer de todos, que acabou
livros. Sei que a acusação não sendo vítima de uma das maiores
é inédita, embora ridícula e filha indignidades do Estado Novo:
de odientos sectarismos, quando Acreditando em Getúlio Vargas,
não de burrice chapada. Não com quem se correspondia, certa
supunha, porém, que estivesse feita lhe dirigiu uma carta de-
aprovada em nosso ensino oficial. nunciando a sabotagem contra o
Contra Lobato se pode alegar surgimento do petróleo nacional,
agnosticismo e certo pessimismo, campanha a que se encontrava
não contidos, entretanto, em suas dedicado de corpo e alma, nela
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 173

empregando todas as suas eco- quantidade suficiente exige a má-


nomias de editor e escritor. Era xima atenção em todos os países
o patriota a advertir a quem e é, aparentemente, um dos mais
cabia. Em missão apostolar. difíceis de resolver.
Não teve resposta da carta, mas No desenvolvimento sócio-eco-
uma ordem de prisão devida- nômico de todas as nações, o
mente sacramentada pelo famoso ensino geral e o treinamento es-
Tribunal de Segurança que o pecial constituem elementos-cha-
lançou em masmorra, forçando-o ve e exigem a atenção pessoal
ao exílio mais tarde, como um dos líderes políticos e dos plane-
réprobo. jadores. A educação não pode
Depois, as previsões petrolí- ser deixada para o fim, como já
feras de Monteiro Lobato se con- aconteceu em muitos casos, como
firmavam, bem como as revela- se não passasse de uma questão
ções que fizera sôbre os trustes secundária, a ser resolvida de-
internacionais. Por uma ironia pois de satisfeitas todas as outras
divina o ouro negro jorrou na necessidades.
Bahia, precisamente em um lu-
garejo que a Geografia regis- Conquanto variem, de país para
trava com o seguinte nome: Lo- país, os problemas específicos de
bato . . . educação e mão-de-obra, os prin-
Foi, pois, exclusivamente por cípios básicos do bom ensino
mão de Deus, a única homena- são q u a s e idênticos em tôda
gem a marcar o seu nome em parte.
luta tão grande e na qual fora Eis a l g u n s dos importantes
o grande precursor e mártir. papéis que, a meu ver, cabe à
Para os homens descuidados, educação desempenhar em qual-
entretanto, Monteiro L o b a t o quer nação. Primeiro, evidente-
morreu sendo apenas um conta- mente, deve colocar-se a neces-
dor de histórias para crianças. sidade de alfabetização g e r a l .
E, como se verifica, para certo Sem educação, não se forma um
tipo de homens mais vivos, con- grupo de cidadãos bem infor-
tador de histórias perniciosas mados; não se permite aos indi-
que cumpre afastá-las de nossa víduos desenvolverem plenamen-
juventude, já que a cicuta levou te suas aptidões; dar a qualquer
o seu autor sem que as suas agrupamento humano um sentido
obras tivessem o idêntico fim. de unidade, denominador comum
Como atestam, indiscutivelmente, (e com isso não me refiro ao
tanto a irrequieta Emília quanto conformismo); nem proporcionar
o circunspecto e judicioso Vis- um "dispositivo de busca e se-
conde de Sabugosa, a comprovar leção" que p e r m i t e aos mais
que não há reinado dos homens habilitados ocuparem seus devi-
que valha uma simples Reinação dos lugares, profissional, técnica,
né Narizinho. administrativa e politicamente
falando.
(Jornal do Brasil, Rio) O objetivo mais evidente do
ensino científico ou técnico, dêste
ponto-de-vista, é o de proporcio-
PLANEJAMENTO PARA O EN- nar às pessoas as aptidões ne-
SINO TECNOLÓGICO E CIEN-
TÍFICO cessárias para que funcione bem
uma sociedade moderna. A espe-
Jerome B. Wiesner * cialização é indispensável em
quase todos os setores, desde o
O problema de conseguir mão- funcionamento de uma usina
de-obra bem a d e s t r a d a e em hidrelétrica até o de um minis-
* Do Escritório de Ciência e Tecno- tério, desde o uso dos adubos
logia da Casa Branca. até a utilização do crédito ban-
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cario. Há centenas de aptidões Um deles é o conjunto de ati-


especiais que podem ser estra- tudes que o ensino de ciências
nhas à tradição de uma deter- pode ajudar a incutir nos alunos.
minada sociedade mas necessá- A ciência vem sendo a força
rias à introdução bem sucedida dominante que amolda nossas
de novas técnicas. vidas no presente século, não só
A esse respeito, v a l e dizer pelo que aprendemos, mas pelas
mais uma palavra. Muitas vezes. mudanças de atitude causadas
quando se fala em ensino, pre- pelo progresso da ciência.
sume-se tàcitamente que bastam Uma das principais lições da
alguns c u r s o s de treinamento ciência, por exemplo, é a de que
para produzir técnicos capazes o mundo que nos cerca é com-
de fazer funcionar um tipo de preensível e pode ser amoldado
máquina ou equipamento. para servir às necessidades do
Nesta última década, uma coisa homem. Além do mais, as ciên-
que aprendemos sem sombra de cias que estudam a conduta do
dúvida é que a moderna tecno- homem começam a dar-nos me-
logia não se p o d e transferir lhor entendimento a respeito de
i n t a c t a de um ambiente para nós mesmos, e isso, a longo
outro. Além disso, o ritmo do prazo, poderá concorrer para
progresso tecnológico é tão rápi- preencher as lacunas entre os
do que as p e s s o a s precisam diversos sistemas culturais e so-
estar aptas a ajustar-se sem difi- ciais de hoje.
culdade a situações novas. O ensino da ciência, portanto,
O que nos cumpre criar por pode produzir forte impacto sô-
meio da educação é um sentido bre a atividade do indivíduo em
de inovação e de capacidade in- relação ao seu meio, não só o
ventiva e uma certa flexibilidade meio físico como, muitas vezes,
ao enfrentar novas situações. o social e o político. As tradi-
Isso se torna necessário em todos cionais barreiras ao progresso —
os níveis do ensino, de modo que impedem o desenvolvimento'
que as novas técnicas possam material e social de uma socie-
adaptar-se a todos os meios e dade — não resistem às novas
que a própria sociedade possa atitudes incutidas pelo estudo das
contribuir para a criação da tec- ciências.
nologia e da organização de que Assim, o e n s i n o da ciência
precisa. pode constituir uma das maiores
Nos Estados Unidos, sabemos forças que contribuem para o
que há carências semelhantes no progresso, mas, vale assinalar,
ensino. Aliás, já pusemos em Sòmente se esse ensino fôr de
execução programas interessantes boa qualidade. Alguns dos mé-
destinados a aperfeiçoar a ins- todos "tradicionais" de ensinar
ciências quase não contribuíram
trução em engenharia e ciências para criar essa atitude mental
nas faculdades, além das escolas e, na verdade, pouco efeito sur-
primárias e secundárias. Já se tiriam.
iniciou também o cumprimento
de programas para adaptar novos O outro assunto digno de men-
materiais e n o v a s técnicas a ção é o fato de que o sistema
serem empregados na África, na de ensino em qualquer sociedade
Ásia, na América Latina e na deve representar o melhor es-
Europa. forço intelectual dessa sociedade,
à qual cabe assegurar que isso
Gostaria de chamar a atenção de fato acontece. Não vivemos
para dois outros papéis que o só para o progresso material:
ensino deve desempenhar nos precisamos, no fim de contas, de
setores da ciência e da tecno- sociedades que permitam a todos
logia. se realizarem plenamente. Esse
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s e n t i d o de realização precisa Não se trata simplesmente de


ocorrer em todos os níveis, mas adestrar um pequeno grupo de-
o ensino superior reveste-se de pessoas. Ao contrário, cumpre
especial importância porque esta- preparar uma boa equipe de cien-
belece as metas para o futuro tistas e engenheiros capazes de
de todo o sistema educacional e, entender o que há de mais novo
portanto, para o futuro da pró- em outros países e relacioná-lo
pria nação. com a situação em sua própria
Não se pode ter um sistema de terra.
ensino descuidado e, ao mesmo Os técnicos estrangeiros podem
tempo, ir ao encontro das futu- colaborar, mas alguém tem de
ras carências quando se trata de solicitar essa ajuda e essa pró-
progresso material e intelectual. pria solicitação pressupõe a exis-
Nisso, a ciência desempenha pa- tência, no país, de pessoas dota-
pel importantíssimo, porque a das de conhecimentos suficientes
pesquisa básica é um dos mais do problema. Subseqüentemente,
nobres esforços intelectuais do o técnico de outra nação preci-
homem; deixá-la de lado por sará estar em condições de co-
qualquer motivo — mas princi- municar suas idéias a outro que
palmente sob o pretexto de não as entenda, que possa modificá-
interessar ao progresso na nação las segundo as condições locais
— é, a meu ver, uma loucura. e que possa, então, pô-las em
Falei, até agora, dos requisitos execução.
do ensino em qualquer país, em O preparo de cientistas e en-
linhas gerais, e, portanto, de genheiros cabe, quase exclusiva-
alguns dos objetivos que cumpre mente, às universidades. Aqui,
aos governos levar em conta ao desejo reiterar que é um engano
decidir sôbre a forma, a natureza pensar-se que o problema pode
e o volume de seus investimentos ser resolvido inteiramente com
na educação do país, sobretudo o simples fato de se enviarem
na educação científica e tecnoló- técnicos para aperfeiçoamento no
gica. É claro que traduzir essas exterior. Não só fica muito caro,
idéias gerais em planos especí- como também os conhecimentos
ficos é tarefa extremamente di- por eles adquiridos nem sempre
fícil, e essa dificuldade varia de estão suficientemente relaciona-
país para país. dos com as necessidades do país.
Num país de recursos limita- De importância pelo m e n o s
dos, só se podem tolerar os mais igual é o fato de que a lide-
modernos materiais de ensino de rança intelectual, o exame crítico
ciências. Não deve haver um das questões em apreço, a busca
tipo de física, ou biologia, ou
química, ou matemática para os de soluções convenientes, a ado-
países maduros e outro tipo para ção de novas idéias, tudo isso
aquêles que lutam por erguer vem dependendo, tradicionalmen-
uma base científica para suas te, dos corpos docentes de gran-
economias. O melhor que há des universidades. Numa socie-
deve estar à disposição de todos. dade a que falte esse elemento
Todo sistema de ensino deve- faltará um ingrediente básico
ria incluir ciências e tecnologia para o progresso e a liberdade.
desde a escola primária, mas, No ano passado, vieram do
seja qual fôr a prioridade dada exterior, para estudar em facul-
nessa ou no ginásio, é preciso dades e universidades norte-ame-
encontrar recursos para um bom ricanas, cerca de 60.000 estudan-
sistema universitário. Sem êste, tes. O número já é grande e
não creio que uma nação possa esperamos que aumente. Além
produzir a mão-de-obra para uma disso, estamos criando programas,
sociedade complexa. em algumas de nossas universi-
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dades, com o intuito de dar mais Outra questão de normas, que


ênfase do que nunca aos proble- freqüentemente surge no estágio
mas técnicos das regiões menos do planejamento, é a melhor ma-
desenvolvidas, e isso contribuirá neira de criar um bom sistema
para que o adestramento recebido de ensino superior e de pesqui-
pelo estudante estrangeiro seja sas. Será aconselhável dar-se
mais estreitamente relacionado apoio a todas as universidades
com as condições de seu próprio já existentes, boas ou más, no
país. intuito de construir uma ampla
Entretanto, embora nos agra- e forte base? Ou conviria mais
dasse ver aumentar o número limitar o apoio aos centros que
de estudantes estrangeiros nos já tenham firmado sua compe-
Estados Unidos, acreditamos, ao tência e tomem atitudes acerta-
mesmo tempo, que esse número das com referência à pesquisa e
deveria representar apenas uma ao ensino em geral?
pequena percentagem do total de Nesse assunto, a experiência
universitários nos países de ori- dos Estados Unidos, e de muitos
gem. A educação no exterior outros países, merece ser citada:
só deverá continuar como fator é essencial dar-se a máxima
primordial do programa de fo- atenção aos centros realmente
mento ao ensino quando se tra- bons, permitindo-lhes expandir-se
tar de trabalhos de pesquisa da e adestrar um número cada vez
maior importância em laborató- maior de alunos. Qualquer outra
rios de primeira ordem. decisão resultaria, acredito eu.
A decisão de criar e manter num s i s t e m a universitário de
um sistema de universidades de segunda categoria.
primeira classe que ofereçam o Isso pode levar, evidentemente,
melhor ensino científico e tecno- a decisões extremamente difíceis,
lógico, seria extremamente lou- pois pode significar o desenvol-
vável, mas, uma vez feita, susci- vimento de um ou alguns centros
taria várias questões de ordem em uma parte do país, à exclu-
prática. são de outros. Assim mesmo.
É evidente que uma nação com creio que, com recursos limitados,
r e c u r s o s limitados não pode, e aliás mesmo com abundância
simplesmente, oferecer facilida- de recursos, esse é o melhor
des de ensino em todos os cam- caminho.
pos da ciência, e é dificílimo Os países mais adiantados po-
resolver quais os setores mais dem dar as melhores contribui-
importantes. As decisões terão ções dentro de seus próprios sis-
que ser guiadas pelo bom senso temas, se trabalharem rumo à
unido à compreensão dos pro- criação de grandes centros de
blemas locais. ensino. Esses países p o d e m
Talvez a melhor maneira de ajudar a outros, oferecendo ades-
abordar o assunto seja o estímulo tramento em alto nível, profes-
à pesquisa e ao ensino em ma- sôres traquejados, durante algum
térias mais estreitamente ligadas tempo, para colaborar direta-
ao desenvolvimento econômico, mente em programas de ensino
tais como a geofísica e as ciên- e pesquisa, e propiciando verbas
cias relacionadas com saúde pú-
blica e agronomia; e o fato de para equipamentos, textos etc.
estar um país disposto, com re- desde que o governo do país se
cursos limitados, a a t e n d e r a tenha comprometido a desenvol-
pedidos de universidades e indi- ver certas instituições.
víduos desejosos de realizar tra- Além disso, acordos de coope-
balhos avançados nas ciências ração entre universidades, como
mais teóricas, como a física e a os que atualmente existem entre
matemática. estabelecimentos de ensino supe-
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rior norte-americanos e cerca de Onde, assim, a equivalência?


100 congêneres em todas as par- Analisando esse p e r í o d o d e
t e s do mundo, podem propiciar educação brasileira, da igualdade
importante e estreito apoio, além formal dos cursos de estudo,
de assistência científica. escreve Anísio Teixeira: *
Ao concluir, repetirei mais u m a "A legislação dos últimos tem-
vez minha convicção de que o pos, uniformizando essa prepa-
ensino em geral e, especificamen- ração intelectual da forma mais
te, o ensino científico e tecno- rigorosa, obrigou as escolas, se-
lógico, são fatôres d a m a i o r j a m lá quais fossem os seus pro-
importância no desenvolvimento fessôres ou o local em que esti-
sócio-econômico de qualquer na- vessem, ou os objetivos a que
ção. Um bom sistema pedagó- visassem, a seguir o mesmo cur-
gico pode ser a flor do desen- rículo e o mesmo programa de
volvimento econômico, mas é ensino, o que determinava que
também a semente. (Diário de nem s e m p r e essa obediência
S. Paulo) fosse além do cumprimento for-
mal das condições estabelecidas
pela lei".
Gildásio Amado, em "Aplicação
A EQUIVALÊNCIA DE CURSOS do F u n d o Nacional do Ensino
NA L E I DE D I R E T R I Z E S E Médio", trabalho apresentado ao
BASES 1.° Encontro Nacional de Educa-
dores em Brasília, comentou do
Jayme Abreu seguinte m o d o essa distorção
brasileira na exegese do sentido
O conceito exato de equiva- de equivalência de cursos: "A
lência de cursos, filiado à correta lei de equivalência, sem dúvida
semântica da expressão equiva- de real importância por sua sig-
lente, isto é, valor igual, só muito nificação, não teve praticamente
lentamente vem permeando a a repercussão que deveria ter,
hermenêutica educacional brasi-
leira. porque se reduziu, em verdade,
a algumas possibilidades de adap-
Até bem pouco, equivalência tação de um para outro curso".
de cursos era entendida (ou mal Com o advento da Lei de Di-
entendida) c o m o identidade o u
igualdade formal de cursos, quan- retrizes e Bases da Educação é
to ao elenco de matérias e ao que começou verdadeiramente a
número de anos letivos, o que, se estabelecer, legalmente o en-
evidentemente, não era equiva- tendimento próprio do sentido de
lência, isto é, não se atribuía equivalência de cursos, cuja cor-
valor igual ao diferente. reta aplicação vai depender, to-
Como t í p i c a demonstração davia, fundamentalmente, dos
dessa distorção no exato enten- seus intérpretes.
dimento de expressão equiva- Com ela se instaurou no país
lência, tivemos o caso da Lei u m a nova era de liberdade peda-
1 821, de 12 de março de 1953, gógica e de consciência profis-
dita de "equivalência dos cursos sional, substituindo o cartorial
dos vários ramos do nível médio" "legalismo", formalista e buro-
e seu regulamento, desnaturados
para u m a lei de adaptação de crático, do período anterior.
cursos, ao exigir do candidato à
equivalência o exame daquelas • Anísio Teixeira — Nota introdu-
matérias que não se contivessem tória ao estudo: "As classes secundá-
no currículo do ramo do ensino rias experimentais. Balanço de uma
experiência em quatro anos de vi-
médio em que fora matriculado. gência".
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

No período desse "legalismo" valor equivalente, como via de-


cartorial, formalista e burocrá- acesso ao ensino superior.
tico, decidir sôbre a equivalência Joaquim de Faria Góis, tecen-
flexível de cursos, fossem eles do considerações sôbre a diversi-
de que nível fossem, era tarefa ficação flexível e equivalente dos
confiada à miopia de qualquer cursos de ensino médio, ensejada
burocrata, bastando conferir-se, pela Lei de Diretrizes e Bases,
no papel, os nomes das matérias mostra a latitude dessa orien-
eram os mesmos e iguais os anos
letivos. tação, ao assinalar: * "A Lei
de Diretrizes e B a s e s não sá
Se a s s i m não ocorresse, a previu a flexibilidade de tipos
"equivalência" estaria liminar- de escola secundária, como ad-
mente fulminada, com um tran- mitiu implicitamente a existên-
qüilo "não há o que deferir"...
cia de padrões diferentes, quan-
O verdadeiro, t o d a v i a , vale do estabeleceu que os sistemas
dizer, o real, o autêntico, o plás- de ensino são estaduais e a ins-
tico, o flexível, o qualitativo, o peção das escolas primárias e
diversificado equivalente, o que de nível médio caberá a cada
conta, em suma, no vivo pro- unidade da Federação (artigo
cesso educativo, não era sequer 47). Por outro lado, não dá a
objeto de cogitação. citada lei competência à União
Sòmente com a Lei de Dire- para a fixação de padrões para
trizes e Bases, sublinha ainda os Estados".
Anísio Teixeira, no trabalho men-
cionado, é que realmente se "veio Gildásio Amado, no trabalho
a tornar legal no país o conceito antes citado, também sublinha,
fundamental de que o aluno se na mesma ordem de considera-
educa ou aprende por diferentes ções: "Nesse campo a Lei de
caminhos, importando mais do Diretrizes e Bases abre certa-
que tudo o desenvolvimento da mente outras perspectivas. Não
aptidão intelectual e da capaci- só por englobar todos os ramos
dade de estudar e aprender por no mesmo captíulo, sob o título
si; educar é ensinar a aprender." de ensino médio, mas por outras
Pela Lei de Diretrizes e Bases, razões substanciais. Estabelece
realmente equivalência tanto
currículos integrados de matérias horizontal, admitindo circulação
diferentes, na escola secundária, franca, sem o obstáculo de pro-
têm sua equivalência reconheci- cessos formais de adaptação de
da; por ela, o estudo das maté- um para outro ramo, como ver-
rias obrigatórias da escola secun- tical, tornando elegíveis seus gra-
dária, feito em maior ou menor duados, também sem aquêle obs-
número de anos letivos, tem táculo, do primeiro para o se-
valor equivalente; por ela podem gundo ciclo e dêste para a Uni-
ser diferentes os programas e os versidade, sem qualquer discri-
p r o c e s s o s de verificação da minação".
aprendizagem, mais ou menos
exigentes, sem afetar o reconhe- Tudo isto assim por que, pela
cimento da equivalência dos re- Lei de Diretrizes e Bases, des-
sultados obtidos. taca Anísio Teixeira no trabalho
citado, se firmou o conceito de
Ainda pela Lei de Diretrizes que a liberdade pedagógica é
e Bases da Educação, em seu uma liberdade "que se disciplina
artigo 47, se prevê a existência pela experiência e pelo saber da
de ginásios e colégios técnicos experiência resultante", com "o
(industrial, agrícola, comercial)
de valor equivalente aos do en-
sino secundário, posssibilitando, * Joaquim de Faria Góis — Avaliação
de escolas de nível médio. Documento
assim, diferentes caminhos, de n.° 11, janeiro-fevereiro de 1963.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

tranqüilo reconhecimento de que da consciência profissional dos


o processo de ensino está ^ mais educadores, com plena equiva-
sujeito aos progressos da técnica lência de seus resultados aos
de ensinar e da consciência pro- obtidos nas escolas do modêlo
fissional do que a dispositivos pedagógico imposto por lei.
legais", por que, em verdade. O exato entendimento do sen-
"não se regula por leis, mas pela tido de equivalência de cursos
consciência profissional dos mes-- comporta, em sua aplicação, vá-
tres". rios ângulos de interpretação que
Na praxis, muito mais defini- lhe confiram, do mesmo passo,
dora da realidade concreta do latitude e autenticidade.
que formulações legais, já se
identificam alguns sinais promis- A questão de subordinação es-
sores de adesão do Ministério trita a anos letivos cumpridos,
da Educação e Cultura a uma por exemplo, não pode prevale-
interpretação congruente do sen- cer, p u r a e simplesmente, sem
tido de equivalência de cursos. maior exame, pois, se assim acon-
tecer, pode configurar-se a extra-
Tal é o caso, por exemplo, do vagante hipótese de cursos inten-
conceder equivalência de direito sivos, em tempo integral, nos
ao exercício profissional do ma- quais o aluno estudou maior nú-
gistério secundário de Inglês, em mero de horas letivas em menor
todo o território nacional, aos n ú m e r o de anos letivos, serem
portadores de diplomas de cursos inferiorizados em relação a cur-
superiores feitos inteiramente em sos onde o aluno estudou menor
Faculdade de Filosofia e aos di- n ú m e r o de horas letivas em
plomados pela Cultura Inglesa maior n ú m e r o de anos letivos.
com um ano de curso de Didá-
tica em Faculdade de Filosofia, Isto dando de barato que por
variando os dois tipos de curso p u r a comodidade administrativa,
não só quanto à e s t r u t u r a como sem qualquer suporte em funda-
quanto ao n ú m e r o de anos le- mentação científica na moderna
tivos. psicologia, se continue rotineira-
Outrossim, nos critérios de m e n t e aferindo o nível acadêmico
concessão de gratificação especial alcançado mediante apenas o
de nível universitário a Técnicos tabu do falso igualitarismo de
de Educação, não se vem escra- anos letivos cumpridos, quando
vizando o Ministério a critérios se sabe tranqüilamente o que são
exclusivistas, considerando equi- as enormes diferenças na velo-
valentes ao Bacharelado em Pe- cidade de rendimento escolar
dagogia, títulos como os de habi- mercê de talentos e aplicações
litação em concurso para a função individuais, extremamente desi-
ou mesmo provas internas para guais.
o desempenho da mesma, feitas Igualmente, a questão de exa-
posteriormente à nomeação. me dos programas cumpridos e
E, como demonstração máxi- onde foram cumpridos, com teor
ma de ampla homologação do mais ou menos elevado, é outra
sentido correto de equivalência situação que não pode ser su-
de cursos, tivemos a iniciativa bestimada em uma análise mais
da Diretoria do Ensino Secun- acurada dos vários aspectos en-
dário com as classes secundárias volvidos na equivalência de
experimentais em que, currículos, cursos.
programas, duração de períodos Aí, outro princípio educacional
letivos por matéria, processos de importante emerge para ser le-
verificação da aprendizagem etc. vado em consideração, como coro-
constituem matéria de inteira lário da equivalência, que é o que
liberdade pedagógica, a critério corresponde aos créditos das es-
180 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

colas onde foram ministrados os como corolário lógico dessa po-


cursos, e que começa a despon- sição será mister estudar e pôr
tar para a educação brasileira, em execução essas duas aplica-
mercê da atuação do Conselho ções decorrentes: avaliação e
Federal de Educação. acreditação de escolas; licença
Princípio que tem sua vigência para o exercício profissional.
prática no mecanismo de avalia- Sem isto, ter-se-iam inconve-
ção e acreditação de escolas, em nientes tão grandes quanto os
uso no sistema escolar norte- relativos à situação que vigorou
americano. até p o u c o , isto é, do falso e
Como, igualmente, da equiva- inautêntico conceito de igualda-
lência de cursos surge a cogi- de formal, à base de cursos
tação de medidas em torno à iguais apenas no nome das ma-
licença profissional, como habi- térias e nos períodos letivos.
litação, a posteriori, ao exercício Conceda-se equivalência ao di-
profissional. ferente, ao flexível, ao variado,
No sistema da avaliação e acre- desde que os padrões de quali-
ditação de escolas tem-se a adoção dades atingidos assim o justifi-
de normas que conduzem a asse- quem.
gurar a latitude de critérios de Porque, em verdade, conceder
equivalência do que é diferente, automaticamente equivalência a
variado e flexível, dentro da cursos ministrados numa peque-
real autenticidade qualitativa. na escola de interior, sem pro-
Escolas com cursos e progra- fessorado idôneamente seleciona-
mas diferentes terão resultados do, sem condições reais de ensino
reconhecidos como equivalentes em relação a cursos ministrados
se se eqüivalem nos créditos em escolas do país ou do estran-
qualitativos, graduando-se o valor geiro, de tradição acadêmica e
dêsses resultados de acordo com de rendimento comprovados, só
o nível de padrões de qualidade porque os nomes das matérias
atingido. coincidem e os períodos letivos
são os mesmos, será consagrar
Na equivalência a posteriori, a igualdade formal em detrimen-
isto é, na licença para o exer- to de equivalência real. (Correio
cício da profissão depois da for- do Senac, Rio)
mação acadêmica recebida, tem-
se o outro caminho para tornar
de valor equivalente cursos re-
cebidos em padrões diversos de
qualidade. EDUCAÇÃO, TRABALHO DE
Controvertida ainda, às vezes, EQUIPE (II) *
a legitimidade de sua aplicação, Jean Delannoy
corresponde todavia ela, a nosso
entender, à medida necessária
para tornar autêntico e não for-
mal o sentido de equivalência, O estabelecimento
em âmbito nacional, de cursos
de heterogêneo padrão qualita- A equipe dos professôres de
tivo. classes quanto mais estável, me-
lhores resultados ela pode alcan-
Já no exercício de várias pro- çar. Contudo, ela se modifica
fissões, entre nós, o consenso em um pouco de um ano para outro.
torno à imperiosidade de sua A nova equipe se organiza tanto
vigência vem sendo tranqüilo. mais facilmente, quando há espí-
Com a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação e a oportuna Traduzido de Cahiers Pédagogiques,
projeção do sentido autêntico de novembro, 1961, pela Prof.ª Marta
equivalência flexível de cursos, Albuquerque.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

REVISTA BRASILEIRA DE nossa equipe de aula com tanta


rito de cooperação no ginásio. indiferença como os viajantes
Aliás, o que vale para a classe, que, tendo assegurado seu lugar,
aplica-se também ao conjunto do partem numa condução. Nin-
estabelecimento: a boa interpre- guém nos apresenta uns aos
tação, o hábito do trabalho em outros, nada de reunião da
comum, o intercâmbio de tarefa equipe antes da entrada, as re-
aumentam a eficácia de cada um. lações humanas se reduzem à
No entanto, as condições admi- contabilidade dos horários e dos
nistrativas favorecem pouco a quadros de serviço. Alguns
criação dêste espírito de equipe alunos já chegaram, mas nada
no Ginásio. Os primeiros anos assinala o início das aulas. Mais
de exercício de um professor ainda: eles chegam com uma
deveriam ter por finalidade ensi- dose de boa vontade que logo
nar-lhe, entre outras coisas, se esvai; no primeiro dia, os
cooperar com os colegas. A esse jovens estudantes estão lá cha-
respeito, nada é mais decepcio- mejantes, e nada de professor.
nante do que a instabilidade Ao meio dia os pais perguntam:
permanente a que são submeti- O professor é bom? Que fêz
das, entre nós, os jovens pro- você? Nada, ficamos em ser-
fessôres adjuntos, auxiliares, de- viço.
legados, distribuídos de uma Conviria que se elaborasse
extremidade a outra da academia, uma psicologia da recepção, pois
sempre em mudança, sempre à esta situação é bastante delica-
procura de um quarto ou pron- da. Atualmente, nada se faz
tos a partir para algum lugar,
sem domínio fixo. Todos, sem nesse sentido, o que é de la-
dúvida, executam bem o traba- mentar.
lho, mas nem sempre se inte- No entanto, é inquietante pen-
gram nele, nem sempre fazem a sar nas cerimônias ridículas que
aprendizagem que é indispensá- um ministro poderá instituir no
vel ao jovem professor, ou seja, estilo das distribuições de prê-
seu introsamento na equipe. mios ou da saudação às cores do
Outra coisa aflitiva: a maneira tempo de Vichy. Nos colégios
de começar o ano escolar, cada ingleses, o dia começa pela prece.
um com seu horário determina- God save the King, os avisos,
do. Sabe-se que se entrará em etc: é geralmente, parece mera
contato com certa classe em tal formalidade, o que não impede
dia e h o r a . Anteriormente, que haja qualquer aspecto a
nossos alunos começavam o ano estudar. Minha opinião, bas-
escolar sem que soubéssemos de tante sentimental e à flor da
nada, sem que participássemos pele, é que um sociólogo de-
veria aprofundar-se no proble-
do acontecimento. O ano esco- ma, bloquear a necessidade, pro-
lar vende-se ao metro; abre-se curar meios naturais de solu-
não importa onde; corta-se den- cioná-los. Antigamente, havia
tro, vá, vire. Toma-se o horário formalidades mundanas: visitas
no dia fixado pelo ministro e do professor recém-nomeado,
o espoliamos desde o início e dia de recepção da esposa do
durante os nove meses. Com reitor, etc. É aborrecido, mas
que colegas vamos trabalhar? isso favorecia certos contatos.
Às vezes só vamos saber quinze Era preciso descobrir outra ma-
dias depois, por acaso, num en- neira, dentro de uma camara-
contro: "Ah, então! É você dagem franca, num estilo social
quem ensina história na classe diferente e conveniente a um
onde e n s i n o francês? Muito ensino muito mais democrático.
bem!" S o m o s engajados em A administração é geralmente
182 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

concebida como se fosse um Mas basta de detalhes. Sôbre


conjunto de compartimentos os recursos que o espírito de
estanques, jamais como vida ou equipe pode aplicar no estabe-
ação comuns. Cada um é alo- lecimento, será preciso mostrar-
jado no seu pequeno setor, os se absolutamente pessimista?
dias são semelhantes aos dias, Não, certamente, e isto por duas
as semanas às semanas. Por razões. Primeiro, porque exis-
vezes u m a tradição permanece, tem, apesar disso, elementos
a de São Carlos Magno, por positivos; em seguida, porque as
exemplo, e o Diretor deve en- lacunas só são explicáveis quan-
carregar-se de suprimi-la. Mas, ' do há alguém a ser advertido.
no conjunto, restringindo-se ao
regulamento, falta à vida uni-
versitária a flexibilidade de um
meio mais caloroso, o ambiente Intercâmbio do Serviços, Chefes
é parecido com uma sala de de Departamento
espera de estação ou de hospi-
tal. É u m a tradição administra- Os professôres, apesar disso,
tiva cartesiana ou antes napo- não ficam encerrados no seu
leônica, a da caserna. Acredita- egoísmo e na sua especialidade,
se que tudo funcionará bem se
fôr rotulado, previsto n u m es- mas ajudam-se mutuamente. O
quema regular. A uniformidade professor de física é de u m a
é a regra da Universidade. Seria condescendência e de u m a habi-
necessário tomar iniciativas, lidade inesgotáveis para impro-
deixar passar um pouco de ar visar um aparelho qualquer que
através da fina rede milimétrica o colega precise, ou r e p a r a r um
onde as administrações traçam projetor. O professor de his-
a curva de nossos dias e de tória empresta de boa vontade
nosso trabalho. Isso adquire seus mapas ao de latim que
especial importância n u m am- explica as guerras púnicas. O
biente destinado aos jovens. cinéfilo registra um documentá-
rio interessante e o requisito de
Se o ano começa mal, não cinemateca. Cada vez mais se
terminará melhor, êle se dis- instaura o sistema anglo-saxão
solve. Há u m a série de frus- do chefe de departamento. Tra-
trações, o motor se esfalfa. Nin- ta-se tão-sòmente da utilização
guém sabe se se trabalha ou
não. Diante da porta, os alunos dos créditos e da encomenda do
percebem que o professor não material; o responsável é desig-
está e sem dúvida não voltará nado, um pouco automaticamen-
mais. A esse respeito parece-me te, segundo a regra do mais
muito acertada a idéia de liberar velho no grau mais elevado.
as classes que o bacharelado e Pouco importa estarmos no co-
o B.E.P.C. já não podem reter: meço de u m a organização con-
seria desejável que o ano esco- cebida segundo o princípio dos
lar, feitas as revisões necessárias, átomos justapostos e que se
tivesse u m a conseqüência, u m a ignoram. O conselho de ensino
organização. Na escola primária, caminha no mesmo sentido, cabe
manda-se limpar a carteira, dis- a nós fazer com que não seja
por os lugares, classificar livros
e cadernos; s e r i a isto muito mera formalidade.
pueril para o secundário? No
fim da quarta série, pede-se os A Escola do Músculo —
cadernos de francês existentes Sindicato e Associação
desde o início do ginásio; faz-se
um pacote: eis o trabalho de
três anos. Eu gostaria de me estender
um pouco mais sôbre um hábito
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 183

que se estabeleceu com Biarritz das no estrangeiro uma coleção


com o nome irônico de Escola de documentos variados: teste-
do Músculo: trata-se de uma munhos individuais recolhidos
sessão semanal de ginástica pará em contatos com pessoas do país
professôres. Uma sessão, ou visitado, filmes, diapositivos, etc.
melhor dizendo, duas: uma para Tivemos assim relatórios sôbre
os homens, com o professor de a Grécia, a Iugoslávia, a Rússia,
educação física dos meninos, e Israel, etc. Essas entrevistas
uma para as senhoras, inteira- familiares servem, freqüente-
mente distintas, com a das me- mente, de ilustração às sessões
ninas. As senhoras, que são destinadas aos alunos.
dez ou doze, seguem as lições Falo do que se faz no meu
de educação física com serieda- ginásio porque o conheço bem;
de, são razoáveis e metódicas. mas e x i s t e m certamente e m
Os homens, quinze ou vinte, aí outros estabelecimentos outras
vão sobretudo, creio, para se
divertirem, para descansar: corre- formas de vida social interior:
se atrás da bola, brinca-se uns biblioteca circulante, grupo de
com os outros, ri-se como me- compras, etc. Seria interessan-
ninos. Os mais velhos podem te fazer um inventário dêsses
ter 45 ou 47 anos, os mais jovens recursos.
25 ou 27, sem contar os profes- Resta falar da vida sindical,
sôres do internato; diante deles, que parece de grande importân-
nós da velha guarda, já não cia para nossa matéria. É, efe-
podemos competir, estamos esfal- tivamente, no plano da profissão
fados: será necessário formar e de sua defesa que se apre-
logo duas equipes. Pouco im- sentam, talvez, as primeiras
porta: a sessão de sexta-feira,
onde somos todos jovens, é um ocasiões de contato entre todos
elemento a considerar na vida os adultos que trabalham n u m
social. estabelecimento de ensino: a
reunião sindical. Sòmente lá
Nós nos reunimos então no veremos sentados lado a lado o
campo de esportes do ginásio professor adjunto saído há pouco
e a primeira vez que os alunos do colégio, o professor agregado
nos viram aí, não cederiam por de longa tarimba, o professor
nada sua posição de espectador. do internato, o supervisor geral.
Depois se habituaram. Com Dessas entrevistas nasce o sen-
efeito, a figura de um de nós timento da solidariedade docente,
de short continua a fazê-los rir; que muitas vezes se refletirá
mas, na realidade, esse riso não n u m sentido reivindicativo, m a s
é isento de simpatia, e creio bem também desenvolverá um "espí-
que no fundo eles acham seus rito de grupo", u m a dignidade
professôres menos embrutecidos profissional, elementos positivos
do que supunham. O grupo para a boa marcha do estabele-
masculino encerra cada ano cimento. E, no entanto, só se
escolar com u m a festa ao ar fala na famosa reclassificação:
livre, para a qual, em agradeci- A reunião sindical, é também
mento, convidamos nossos pro- por vezes um círculo de estudos
fessôres de ginástica. pedagógicos; por exemplo, quan-
do um relatório deve ser des-
Algum tempo depois nos reu- cutido, tendo em vista o con-
niremos em outra ocasião: pres- gresso anual, ciclo de observação,
tação de contas das viagens. bacharelado, etc. Com ou sem
Como todo mundo, o pessoal razão u m a vida sindical pobre
universitário viaja mais do que me pareceria, para um estabe-
-antigamente e traz de suas esta-
184 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

lecimento, um sinal inquietante, quase sempre esta: porque era


ou pelo menos negativo. êle, porque era eu. Sou muito
apegado a meu ginásio, porque
nele encontro um espírito de
Perspectivas — Obstáculos equipe que tem certos acasos
felizes. Um deles é o efetivo
As iniciativas que acabo de dos mestres: vejo bem o que
referir, têm uma visão limitada. pode ser uma equipe de 30 pro-
Seria possível, no entanto, ultra- fessôres; não posso imaginar o
passá-las, bastaria começar o alcance da palavra de um diri-
ano por uma reunião amigável gente, responsável por um corpo
com todo o pessoal, para a qual docente de 150 membros.
todos seriam convidados, sem
exceção, desde os professôres do Por outro lado, as normas ad-
internato, até o porteiro, os ins- ministrativas limitam qualquer
petores, que têm papel relevante iniciativa. Nada é oficialmente
e que estão em contato com os previsto para a vida social do
alunos por uma infinidade de ginásio, com exceção, talvez, de.
questões materiais; se eles não um pátio, de um parlatório e
se associarem a nós, correrá o da sala do diretor, por vezes
risco de ter uma ação pouco também concebida para as re-
educativa. Nessa reunião é que cepções oficiais do Segundo Im-
se travaria conhecimento com pério. Se o ano tivesse início
os novos colegas e os membros por um aperitivo pedagógico e
da equipe de classe tomariam ou amigável de tomada de contato,
retomariam contato com eles. não seria preciso em certos casos
Cada um poderia receber, por pedir a cada participante que
exemplo, a lista completa das pleiteasse aumento sôbre seus
equipes de que f a r i a parte. duzentos francos, e ainda que
Assim, antes da chegada dos algum deles ridicularizasse o
alunos, os professôres já esta- ordenado, o efeito psicológico da
riam autoconscientes. reunião seria o mesmo.

Estou certo de que por meios Mas há o u t r o s obstáculos


análogos ou por outros, os nu- muito mais sérios ainda. No
merosos diretores pensam em dar início das aulas para conservar
mais dinamismo ao seu setor o mesmo exemplo — os admi-
de trabalho, tornando-o não Sò- nistradores e s t ã o em face de
mente um serviço bem adminis- alguns problemas insolúveis: há
trado, mas também uma equipe carteiras suficientes para aco-
orgânica à qual se sintam felizes modar todos os alunos, lugares
e orgulhosos de pertencer. E suficientes nas salas para pôr
sem dúvida, mesmo no quadro todas as cadeiras, estrados para
atual, por suas iniciativas, por cada professor? Compreende-se
sua ação pessoal, os diretores que o diretor relegue os modos
podem muito, mas é preciso não de acolhimento e o papel de
esquecer que eles se deparam anfitrião universitário que lhe
com obstáculos de tôda espécie. houvéssemos sugerido. É fácil
falar de psicologia da recepção,
De início nunca há entendi- o título faz pensar num hotel
mento. O pessoal do ginásio é de luxo; quando na realidade
um conjunto de individualida- um ginásio é apenas uma pensão
des originais, que podem con- muito movimentada, até que,
cordar ou não. Isso depende graças a um sistema de tempo
do temperamento, da idade; uma parcial, se torna uma espécie de
equipe feliz e ativa é como um residência, que vê desfilar cada
amigo, como um grande amor, dia duas séries de aula no mes-
o resultado de um encontro mo local. O problema quanti-
imprevisível; a explicação é
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 185

tativo põe-se nos mesmos têrmos administração demasiado rígida,


com referência à habitação e à uniforme, centralizada. De iní-
escolorização; a solução nos dois cio, seria preciso dar, no plano
casos tem sido a despersonali- financeiro, mais autonomia aos
zação. Realizar-se-á o jovem que diretores de estabelecimento,
dividirá sua mocidade entre a apoiando-se numa direção cole-
comunidade do colégio e sua gial, com um conselho interno
classe de 50 alunos? Dia virá ativo e responsável; os diretores
talvez em que os homens sa- poderiam agir de modo que um
berão, e, sobretudo, quererão ginásio fosse mais que uma sim-
encontrar uma solução humana ples justaposição atomizada de
para o problema da cidade; tal- professôres.
vez seja preciso esperar muito
tempo para que se afirme a
personalidade e se eduque tôda Três Etapas da Formação de
uma juventude para fazê-la viver Professôres
numa dimensão humana. Tudo
isso nos ultrapassa certamente Uma palavra, para terminar,
e Le Corbusier morrerá sem ter sôbre nossa preparação profis-
visto na França sua "cidade sional.
verde", mesmo assim não houve
tempo perdido. Quase sempre alguém se torna
professor porque gosta da mate-
Enfim é preciso ter em conta mática, espanhol ou latim, e sem
o estado de espírito dos profes- pensar objetivamente que êste
sôres, estado de espírito que se amor terá de se manifestar, no
prende à insuficiência da remu- final das contas, diante de uma
neração que recebeu. O mesmo classe de quarenta alunos. A
professor que passa, gratuita- primeira etapa da formação, a
mente, dias inteiros no seu labo- dos estudos para a universidade,
ratório a p r e p a r a r esse ou é unicamente consagrada à ma-
aquêle aparelho de projeção de téria de ensino; a existência dos
seu ginásio, não terá por nada alunos é lembrada na segunda
desejo de comparecer a uma reu- série, de instituição mais recente:
nião suplementar prevista pela o ano de estágio do C.A.P.E.S.
administração e que não será Mas há uma terceira etapa, que
gratificada. Para êle é uma consiste em descobrir que a pro-
questão de princípio sindical, e fissão abrange não apenas crian-
tom razão não se justifica o tra- ças, mas ainda colegas. Ne-
balho gratuito. O n í v e l de nhum de nós está só diante de
nossos ordenados e as condições seus alunos; outro professor os
de nosso trabalho não são favo- teve uma hora antes, em uma
ráveis a tais iniciativas. Nesta outra matéria, e um ano antes
questão, pode-se, quando muito, na mesma matéria; um outro os
sonhar, em se tratando de um terá uma hora depois e um ano
ginásio experimental, no qual os depois. A idéia do professor
professôres estariam submetidos cerceado num esplêndido isola-
a condições de trabalho parti- mento é utópica. Afirmações
culares e diferentes daquelas como esta: "Eu faço o que tenho
que conhecemos, ou então asso- de fazer e não me ocupo dos
ciar-se às idéias que o professor outros", é condenar-se em parte
canadense Mr. Wilfenberg expôs à inatividade e à limitação. Sò-
recentemente na revista Educa- mente quando, na classe e no
ção Nacional. Há na França estabelecimento, se conseguiu
professôres excelentes, mas seu integração numa equipe de tra-
rendimento pedagógico é dos balho, é que nos tornamos real-
mais fracos, em virtude de uma mente um professor. Enfim,
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

apesar das aparências e de uma uniforme em sua distribuição


tradição de independência mal pelo país, seria irreal conside-
compreendida, é talvez na comu- rarmos o fato como um todo,
nhão de um grupo atuante, que sem a análise desse crescimento
viveremos as mais gratas ale- em zonas configuradas à base
grias. de um critério cultural-econô-
mico.
P a r a isso analisaremos a si-
ASPECTOS ESTATÍSTICOS DO tuação nos Estados da Federação
que, por suas condições culturais
ENSINO MÉDIO NO BRASIL e econômicas, integram 3 zonas
Nadia Cunha bem definidas, a saber:

1) Norte-Oeste — com os se-


Analisando-se o crescimento guintes Estados e Territó-
estatístico do ensino médio bra- rios: Rondônia, Acre, Ama-
sileiro, de 1961 para 1962, à base zonas, R o r a i m a , Pará,
das Sinopses Estatísticas do En- Amapá, Maranhão, Mato
sino Médio, do MEC, verifica-se Grosso, Goiás e Brasília
que o total de matrículas subiu (DF).
de 1.308.044 para 1.469.361, sig-
nificando um aumento percen- 2) Nordeste — com os seguin-
tual de 11,9. tes Estados: Piauí, Ceará,
Note-se que esse crescimento Rio Grande do Norte, Pa-
assinalado representa já um pro- raíba, Pernambuco. Ala-
gresso em relação ao registrado goas, Sergipe e Bahia.
entre 1960 e 1961, quando o per-
centual de acréscimo foi de ape- 3) Sul — com os seguintes
nas 11,2, muito embora esteja Estados: Espírito Santo,
êste aumento muito aquém da Minas Gerais, Rio de Ja-
meta ideal de 28% ao ano, para neiro, G u a n a b a r a , São
alcançar uma escolarização, em Paulo, Paraná, Santa Cata-
1972, de 90% da população de rina e Rio Grande do Sul.
12 a 18 anos.
Se correlacionarmos o cresci- Com relação à primeira zona —
mento de matrículas ocorrido de Norte-Oeste — assinala-se um
1961 para 1962 (11,9%) com o registro de 83.847 matrículas em
crescimento da população esco- 1961 e de 95.345 em 1962, tendo
larizável, de 12 a 18 anos, que, havido portanto um a u m e n t o ab-
de 10.169.446 em 1961, passou soluto de 11.489 e relativo de
a 10.525.376 em 1962, verifica- 13,7%. A população escolarizável
mos que o acréscimo absoluto de 12 a 18 anos era em 1961 de
de 355.930 havido na população, 1.205.128, havendo um déficit de
corresponde a um crescimento matrícula de 1.121.281 em nú-
relativo de apenas 3,5%. meros absolutos, e o relativo
correspondente de 93%. Em
Sabemos, entretanto, que, mes- 1962, a população escolarizável
mo tendo o percentual de acrés- da mesma faixa etária cresceu
cimo de matrícula superado em para 1.247.307, sendo pois nesse
quase quatro vezes o percentual ano o déficit absoluto de matrí-
de crescimento da população culas de 1.151.962 e relativo de
escolar, acentua-se o déficit em 92,4%, o que significa ter havido
números absolutos entre popu- u m a baixa de déficit em relação
lação escolarizável e escolarizada, a 1961 de somente 0,6%.
neste nível de ensino. Em 1961 o total de matrícula
Uma vez que o crescimento de na zona do Nordeste abrangeu
• matrícula não ocorre de maneira 217.288, crescendo em 1962 para
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 187

240.856, ocorrendo um aumento zona um aumento absoluto da


absoluto de 23.568 e relativo de matrícula de 121.161 e relativo
10,8%. Nesta mesma zona havia de 12%. A população escolari-
em 1961 uma população escola- zável de 12 a 18 anos neste ano
rizável, de 12 a 18 anos, de de 1961 era de 5.967.775, sendo
2.996.543 com um déficit abso- o déficit absoluto de matrícula
luto da matrícula de 2.779.255 e portanto de 4.960.876 e relativo
relativo de 92,7%. A população de 83%. Em 1962 a população
desta mesma faixa etária cresceu escolarizável de 12 a 18 anos
em 1962 para 3.101.422 à taxa cresceu para 6.176.646, acusando
de crescimento de 3,5%, regis- um déficit absoluto de matrícula
trando-se um déficit absoluto de de 5.048.486 e relativo de 81,7%,
matrícula de 2.860.566 e relativo caindo o déficit percentual de
de 92,2%, verificando-se uma não mais que 1,3%.
baixa de déficit em relação ao
ano anterior de apenas 0,5%. Uma rápida análise da matrí-
cula nos diversos ramos de en-
Na zona Sul computou-se a sino médio nos dará u m a visão
matrícula de 1.006.899 em 1961, de como se distribuiu esse cres-
subindo a mesma em 1962 p a r a cimento nos anos de 1961 p a r a
1.128.160. Registrou-se n e s t a 1962.

MATRÍCULA NO ENSINO MÉDIO


1.° e 2.° Ciclos

Ramos de Ensino 1961 1962 Aumento

Secundário 960.489 1.074.813 11,9%


Comercial 209.733 231.978 10,6%
Normal 100.369 — 113.834 12,9%
Industrial 30.759 36.560 18,8%
Agrícola 6.694 7.176 7,2%

A partir de 1962 começaram matrículas caiu apenas de 87,1%


a existir estabelecimentos de en- em 1961 para 86%, ou seja do
sino médio em municípios que índice de apenas 1,1% e aten-
não os possuíam anteriormente. tando-se ainda para o índice
Assim na zona Norte-Oeste 58 3,5%, geralmente aceito, de au-
municípios passaram a ter esco- mento da população escolarizá-
las de nível médio, na zona do vel, conclui-se que mantida essa
Nordeste mais 107 e na zona taxa de progressão de aumento
Sul mais 9, sendo essa nova de matrícula, em breve será
situação base possível p a r a me- ela absorvida pela taxa de cres-
nores deficits futuros de escola- cimento da população. Se cal-
rização. cularmos o índice de crescimen-
Atentando para o insuficiente to populacional à base de 3,5%
índice de crescimento de matrí- ao ano, teremos dentro de 10
cula registrado em todo o país anos uma população de 12 a 18
em 1962, quando o déficit dessas anos de 14.840.000. Sabendo-se
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

por outro lado que o índice de mais 2/3 das matrículas da Cam-
matrícula cresceu de 1961 para panha de Educandários Gratui-
1962 de apenas 11,9%, vemos tos, cujo financiamento corres-
que êste índice representa me- ponde aproximadamente a 2/3
nos da metade do índice ideal de recursos públicos e 1/3 pri-
de 28%, que seria necessário para vados, representando esses 2/3:
atendermos a 90% da população cerca de 45.500 matrículas na
escolarizável que teremos em 10 sua escola secundária, teríamos,
anos. já em 1962, cerca de 593.360
Um outro aspecto interessante alunos freqüentando a escola
em relação ao aumento dos efe- secundária às expensas do poder
tivos da matrícula no ensino público e de 481.453 alunos fre-
médio, é o que ocorre no ensino qüentando a escola secundária
secundário: a diferença de ritmo pagos pelo particular.
de crescimento entre o ensino Vemos por aí que, contraria-
público e o privado. De 1961 para mente à impressão generalizada
1962, por exemplo, o crescimen- de que os gastos com a escola
to percentual registrado na ma- secundária brasileira estão prin-
trícula da escola pública foi de cipalmente a cargo da contri-
17%, ao passo que o registrado buição direta de particulares, na
na particular foi de 8,7% apenas. realidade o esforço público tem-
Na Guanabara, em 1961, o total se revelado atuante em propor-
de matrícula foi de 27.609 na ções apreciáveis, ensejando ao
escola pública, subindo no ano lado das bolsas concedidas, com
seguinte para 38.163 em núme-
ros absolutos e relativos de 30%. o crescimento de 17% de matrí-
No mesmo período de tempo a culas em seus estabelecimentos
escola particular registrou um de ensino de 1961 para 1962
aumento percentual de apenas contra o índice de crescimento
5%, tendo-se em vista as matrí- de matrícula da escola parti-
culas de 94.079 e 97.708 nos cular no mesmo período, que foi
anos de 1961 e 1962 respectiva- de apenas 8,5%, um crescimento
mente. relativo 100% maior que o do
setor privado.
Em São Paulo a matrícula na Fato também interessante a
escola secundária pública, cres- assinalar é o da transferência
cendo nestes dois anos de de matrícula da escola secun-
134.154 para 155.487, subiu 15%, dária para os demais ramos de
enquanto na escola particular a ensino, ao fim do 1.° ciclo. A
matrícula passou de 120.878 para análise da matrícula da 4.a série
128.852, representando um au- do 1.° ciclo do curso secundário
mento de apenas 7%. e da 1.ª série do 2.° ciclo dos
outros ramos, técnico e normal,
Os dados estatísticos em aná- evidencia o quanto tem a escola
lise revelam-nos ainda que em secundária funcionado como es-
1962 efetuaram-se 417.860 matrí- cola comum no 1.° ciclo, forne-
culas na escola secundária pú- cendo contingentes ao segundo
blica e 656.953 na escola secun- ciclo dos demais ramos.
dária particular. Deduzindo-se,
porém, em cálculo aquém da Pelo quadro a seguir, podemos
realidade, 130.000 bolsas pagas mostrar o que significa percen-
pelos cofres públicos federais, tualmente a matrícula nos dois
estaduais e municipais às esco- ciclos dos vários ramos do ensi-
las secundárias particulares e no médio.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 189

MATRÍCULA NOS DOIS CICLOS DO ENSINO MÉDIO


1962

RAMOS 1.º CICLO PROPORÇÃO ENTRE


2.º CICLO
OS DOIS CICLOS

Matrícula Percent. do Matrícula Percent. do 1.º Ciclo 2.º Ciclo


total total

Secundário . 936 541 83,5% 138 272 41% 7 1


Comercial .. 131 336 11,1% 100 642 31% 1,3 1
Industrial . 24 348 2,2% 12 212 3,6% 2 1
Agrícola . . . . 5 325 0,5% 1 851 0,4% 3 1
Normal 31 050 2,7% 82 784 24% 1 2,7

1 128 600 100% 335 761 100%

A m a c i ç a concentração de matrícula do curso secundário é


matrícula na escola secundária, apenas 38% maior do que a do
83,5% do total no 1.° ciclo cai curso Comercial.
para a metade no 2.° ciclo: 41%.
Por outro lado, a matrícula do O quadro a seguir nos dará
1.° ciclo do curso Comercial é em números absolutos uma visão
oito vezes menor que a matrí- da situação da matrícula na 4.ª
cula do secundário no mesmo série do primeiro ciclo e na 1.ª
ciclo, enquanto no colegial a série do segundo ciclo:

1961 1962
RAMOS
1.° CICLO-4. a S É R I E 2.° CICLO-lª SÉRIE

Secundário 129 154 85 141


Comercial 16 788 46 268
Normal 5 927 33 213
Industrial 2 740 5 827
Agrícola 655 872

Note-se que em todos os ramos, do atual processo de desenvol-


à exceção do secundário, regis- vimento e seus reflexos em
tra-se um aumento substancial nossa estrutura ocupacional se-
de matrículas da a 4.a série do 1.° jam as principais determinantes
ciclo para a l. série do 2.° dessa procura de capacitação
ciclo. Seria interessante apu- profissional ainda no nível
rar-se quanto da queda de ma- médio.
trícula no 2.° ciclo do secun- Aspecto significativo a notar
dário teria se redistribuído pelos nos dados estatísticos é ainda,
outros ramos de ensino. tal como ocorre em outros paí-
Será plausível admitir que as ses, como por exemplo os Es-
crescentes oportunidades de tra- tados Unidos, a crescente pre-
balho especializado decorrentes sença feminina no magistério
190 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

secundário. A Sinopse Estatís- das com os problemas do en-


tica de 1962 registra já uma sino — conseqüência de um
quase equivalência de docentes crescimento intelectualista em
de ambos os sexos no 1.° ciclo, ritmo acelerado. Seguramente,
onde para 26.237 professoras as dificuldades diferem para
existem 25.435 professôres. Já cada população, com seu nível
no 2.° ciclo a situação se mo- de evolução técnica, social e
difica havendo maciço predomí- cultural: não podem ser as mes-
nio masculino. mas quando se trata das que
Dois fatos interessantes reve- apenas emergem do analfabetis-
lam-nos ainda os dados estatís- mo ou que estão mergulhadas
ticos comentados: na exploração colonialista, ou
1) a proporção professor- das que estão ainda submetidas
aluno no 2.° ciclo do curso à exploração capitalista e à lei
Industrial público, onde, do lucro máximo: ou, enfim, da-
para 2.989 alunos, existem quelas cujo objetivo é desen-
727 professôres, isto é, a volver, em cada indivíduo, a
média de 4 alunos para maior quantidade de valores
1 professor; humanos de que seja capaz,
penhor de sua fidelidade e de
2) a persistência de um pre- sua dignidade.
domínio absoluto do sexo
feminino no corpo discen- Não obstante, não há entre
te do 2.° ciclo do ensino todos esses sistemas de educa-
normal, onde para 78.985 ção, de finalidades diferentes,
alunas existem apenas certas origens comuns que de-
3.799 alunos. vem ser descobertas na psico-
logia da criança e nas neces-
No que concerne à presença sidades do homem?
feminina quase absoluta no ma- Alfabetizar um povo de iletra-
gistério primário do país é fenô- dos não é somente ensinar a
meno mais ou menos comum a cada um de seus membros o
vários países; no que se refere uso dos sinais gráficos, é ao
à relação professor-aluno no mesmo tempo operar profunda
ensino Industrial público, deve- mutação em seus meios de in-
se entretanto concluir que infe- formação; e é levá-lo a con-
lizmente estas instituições vêm frontar, e mesmo a opor, o livro
ainda funcionando mais em têr- ou o jornal à tradição oral ou
mos de proporcionadores de ritual, ao imobilismo, o gosto
oportunidades de empregos do do novo, que ficará superficial
que de estabelecimentos, de edu- ou discordante se não assimila
cação de alunos, em número o que há de assimilável na
ainda tão reduzido para atender antiga cultura. Devem-se operar
às necessidades de industriali- sínteses entre as exigências da
zação do país. (Correio do vida moderna e os vestígios das
Senac, Rio) tendências e das experiências
ancestrais.
Oposições análogas são encon-
EDUCAÇÃO E PSICOLOGIA * tradas nas sociedades de tipo
contemporâneo. A n o v i d a d e
Henri Wallon está aqui de certa maneira em
estado permanente: é a técnica,
Em nossa época, todas as na- e ela não cessa de transformar
ções do mundo estão preocupa- a existência, quer pelos resul-
tados, quer por seus imperati-
* O presente trabalho foi dos últimos
vos; ela apaixona os espíritos,
elaborados pelo professor Wallon, que especialmente d e n u m e r o s a s
faleceu a 1.V12/1962. crianças. Qual deve ser sua
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 191

função na cultura do povo e, tuições é menos a de ensinar as


mais particularmente, no ensino? crianças do que de distribuí-las,
A resposta a essa questão é tão precocemente quanto possí-
oposta nos países sob regime vel em categorias, que prejulga-
capitalista e sob regime socia- riam — desde logo — seu futuro
lista. profissional e social. E para
Para tomar o e x e m p l o da isso, basta justapor um "ensino
França, onde a pressão das cir- curto", de perspectivas muito
cunstâncias põe na ordem do limitadas, a um ensino longo,
dia, desde a Primeira Guerra êste somente dando direito aos
Mundial, uma reforma do ensino, estudos superiores. Em lugar
esta patinha de projeto em pro- de organizar em cada estudante
jeto, que refletem, cada um, de as funções de concepção teórica,
maneira mais ou menos parcial, de realização técnica, de exe-
as necessidades da produção ou cução material, faz-se das três
a pretensão de constituir pela seções distintas, três espécies de
intelectualidade uma elite na formação para corresponder,
sociedade. Historicamente, a pensamos, às estruturas neces-
burguesia francesa, ascendendo sárias da indústria: a especiali-
à superioridade econômica, quis zação torna-se o objetivo; a psi-
se emancipar da tutela espiritual cologia do trabalho profissional
exercida pelo clero. Seus eru- tende a invadir a escola às ex-
ditos, seus moralistas f o r a m pensas da psicologia escolar.
buscar na antigüidade greco- Por seus métodos seletivos, essa
romana os modelos humanos, os psicologia do trabalho se arrisca
princípios de ação e de conduta a justificar divisões nocivas ao
que pudessem ser opostos aos
dos textos sagrados. É assim desenvolvimento polimorfo do
que suas origens fazem de nossa indivíduo e à pesquisa de suas
cultura uma cultura clássica, aptidões pessoais e fundamen-
voltada para o passado. Tendo tais.
facilitado a eclosão do espírito Se o fim da educação é desen-
laico e depois despida de sua
ponta agressiva contra a Igreja, volver ao máximo as virtuali-
a qual, ao contrário, adota como dades de cada um, é em cada
emoliente, como disciplina inte- um que se devem pesquisar as
lectual de educação, ainda que possibilidades de supremacia, de
seja assim considerada atual- compensação, de equilíbrio fun-
mente apesar de seus empobre- cionais. Longe de levar à dis-
cimentos sucessivos, ela conti- sociação funcional, é p r e c i s o
nua, para uma parte da opinião, facilitar as sínteses interfuncio-
como uma cultura de prestígio. nais mais enriquecedoras para a
atividade e para a personalidade
Na verdade, esse prestígio se do indivíduo. É o método que
liga menos às matérias ensina- tem a preferência dos educadores
das que à dificuldade de acesso nos países socialistas. A tríade
a êle, o que faz dele um instru- teoria-técnica-prática parece aos
mento de seleção para a elite educadores dêsses países ter
que deverá assumir as funções muito boa aplicação em peda-
de responsabilidade intelectual gogia, não como princípio de
no país. Porque a seleção, a diferenciação entre as crianças
constituição de categorias sociais e jovens, mas, ao contrário, como
distintas, parece ser uma ten- uma obrigação de organizar, para
dência constante do regime ca- cada um deles, todas as formas
pitalista e que, freqüentemente, possíveis de atividades, quer
repercute sôbre os projetos para sejam manuais ou intelectuais,
reorganizar as instituições de desde as manipulações até as
ensino. Poder-se-ia crer, por conceituais. Ao invés de fazer
vezes, que a tarefa dessas insti- delas atributos exclusivos, pro-
192 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

curam fazer com se completem nitiev reconheceu uma incapaci-


mutuamente. Seu objetivo é dade de distinguir dois sons de
realizar a educação integral pre- tonalidades diferentes, e nas
conizada por Marx sob o nome quais êle restabeleceu esse poder
de e d u c a ç ã o politécnica, que exercitando-as a reproduzir, pri-
deve pôr à disposição de todo meiro em uníssino, depois con-
ser humano tôda a cultura de secutivamente, sons os mais des-
seu tempo. providos possível de outras
características que não a da
É a essa pesquisa que corres- tonalidade. A ligação que uma
pondem as experiências realiza- audição discriminativa e x i g e
das nas escolas soviéticas sôbre entre a excitação acústica e os
a coordenação do ensino cientí- movimentos fonatórios não se
fico, com suas aplicações técni- produz espontaneamente; mas o
cas e os estágios nos estabele- fato de que essa ligação pode
cimentos de produção industrial.
Os problemas que surgem são ser obtida mostra bem que não
concernentes à melhor distribui- se trata de uma anomalia orgâ-
ção no tempo das lições e dos nica mas de uma falha da evo-
exercícios; são, relativos a diver- lução funcional.
sas matérias, mas solidários e Inversamente, podemos supor
suscetíveis de cooperar nos usos que um rico ambiente sonoro
de compreensão ou de combina- seja suscetível de estimular o
ção e de construção que delas mimetismo v o c a l , em idade
o estudante pode fazer. É assim muito precoce em que é parti-
que Ananiev mostra como, da cularmente eficaz, e de orientar
geometria à geografia, o estudo mais tarde os indivíduos para
do espaço se presta a aproxi- os gozos ou para a criação mu-
mações estimulantes para o es-
pírito do educando. sicais. Assim, as famílias de
músicos seriam explicadas mais
Mas, é sobretudo pelas sín- por uma ambiência favorável do
teses funcionais que o psicólogo que por bem improvável here-
se deve interessar. Desde o ditariedade biológica.
nascimento da c r i a n ç a , suas Uma observação de Leontiev
ações e reações são permeadas é da mais alta importância em
ou unidas por um processo cir- razão de seu alcance geral na
cular às situações, externas ou psicologia da criança: o resul-
subjetivas que as acompanham. tado procurado só é o b t i d o
Isso resulta dos circuitos asso- quando a criança se torna capaz
ciativos que as estruturas do de situar o som emitido numa
sistema nervoso utilizam eviden- série tonai compreendida nos
temente, mas que têm suas pró- limites de seu registro vocal.
prias estruturas funcionais, onde Construir uma série composta de
são registradas as experiências têrmos suficientemente homogê-
do indivíduo, as repetidas mais
freqüentemente ou as mais deci- neos para serem agrupados cor-
sivas de seu comportamento. responde a uma etapa marcante
Indo das mais elementares para do desenvolvimento intelectual,
as mais complexas, assim se mesmo que se trate apenas de
constitui um material de con- séries puramente empíricas. As
dutas disponíveis, na falta das mais precoces são as seqüências
quais podem aparecer graves sensoriais. Segundo W. Stern,
lacunas nas a t i v i d a d e s da que ensinou sucessivamente em
criança. Breslau e Hamburgo, as cores
das paisagens dessas duas cida-
Um bom exemplo dessas ca- des, sendo diferentes, as crian-
rências funcionais é o caso das ças de cada uma delas tinham
crianças que não podem apren- por base, em sua percepção das
der a cantar e nas quais Leo- cores, cores diferentes, e, assim,
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 193

o reconhecimento e a identifica- É esse gênero de temas que


ção de uma gravura mais cheia concernem às séries de referên-
de nuances se operava por con- cias necessárias ao conhecimento
trastes cada vez mais finos entre das coisas e à compreensão das
coloridos vizinhos. operações intelectuais que devem
Antes da disposição em série, preocupar os educadores, para
a criança é capaz apenas de evitar de inculcar aos alunos
fazer grupamentos binários: é o fórmulas de rotina esterilizantes
pensamento por pares, a pri- para o espírito. Trata-se de
meira f o r m a do pensamento, cultivar a criança, a partir de
cujos vestígios são ainda muito suas próprias raízes, que mer-
encontráveis nas crenças e na gulham em sua experiência coti-
linguagem dos primitivos. Antes diana e que a ligam não somente
de serem pensadas isoladamente a ela própria mas também a
e por eles próprios, os objetos, seu tempo. Entre a escola e
as impressões r e c e b i d a s das sua vida, seus hábitos, seus inte-
coisas, o são em relação a qual- resses cava-se um f o s s o que
quer outra coisa que as com- torna as crianças estranhas umas
pletam. O pensamento não é, às outras: daí os freqüentes fra-
afinal, essencialmente uma ativi- cassos atribuídos ao ensino e as
dade de estabelecer relações? acusações de indolência e de
São relações de coexistência, de instabilidade levantadas contra
reciprocidade, de aproximação, os estudantes, mas cuja aplica-
de contraste. Destas últimas, ção, repetidas vezes, pode ser
são particularmente freqüentes tenaz e prolongada quando a
as do tipo anões-gigantes. A atividade por eles realizada tem
criança parte voluntariamente de para eles uma significação.
idéias ou de imagens-limite e Desde antes da freqüência à
entre esses extremos elabora, escola, a criança constitui um
gradualmente, uma escala de di- estoque de ligações elementares
mensões aplicáveis às persona- que se arriscam a ficar incultas
gens reais de seu conhecimento. se o professor negligencia ex-
Se é verdade que os brinquedos plorá-las. Se essas ligações não
e os contos estão freqüentemente são realizadas e o educador des-
em relação com as funções em conhece sua existência, arrisca-se
curso de formação e de exer- a atribuir à deficiência de uma
cício, o sucesso mundial e dura- função superior as incapacidades
douro de Alice no país das ma- devidas a uma das suas compo-
ravilhas, essa história em que o nentes, eventualmente reeducá-
tamanho dos personagens varia, vel. Sem dúvida, nem sempre
não será porque corresponde a um professor pode proceder, por
uma fase de evolução da criança si m e s m o , a essa análise: é
na qual aparecem problemas função do psicólogo escolar
relativos à estatura dos indiví- assisti-lo nessa tarefa.
duos? Com a aceleração precipitada
Mas há séries que a criança das mudanças que as descober-
não p o d e r i a descobrir por si tas da humanidade produzem
mesma e que devem ser ensi- em suas condições de existên-
nadas: a dos números, por exem- cia, nos costumes e mesmo nos
plo. Num estudo, prestes a ser princípios do conhecimento, a
publicado, que fizemos em cola- colaboração da psicologia torna-
boração com Mme. Rachel San- se cada vez mais necessária aos
terey sôbre Pluralidade e nú- educadores. Não estamos mais
mero, constatamos que entre as nos tempos em que se pode
duas noções há etapas que a crer na perenidade de uma civi-
maioria das crianças não vence lização, na verdade absoluta de
antes dos 5 ou 6 anos. suas bases. O meio real em

13
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

que se banha a criança, desde para os problemas humanos.


sua mais tenra idade, deposita Custara u m a árdua batalha legis-
nela os traços de experiências lativa: mas valeria u m a guerra
que freqüentemente se furtam de idéias, n u m desafio ao futuro
às explicações ou às justifica- que a B a h i a visionava n u m
ções tradicionais. É preciso Brasil e m p l e n a florescência
saber descobrir em seu compor- restauradora do regime consti-
tamento as influências que ela tucional.
sofre, a imagem por vezes bar- "A função da educação e en-
roca que a criança faz de seu sino compete a o E s t a d o , n a
meio. É preciso saber reco- forma da Constituição Federal,
nhecer o que é devido ao con- incumbindo sua superintendência
teúdo das próprias experiências e direção ao Conselho Estadual
e o que deve ser atribuído às de Educação e Cultura, órgão
limitações intelectuais da crian- autônomo administrativa e fi-
ça e às suas compensações ima- nanceiramente, nos têrmos desta
ginativas. Para bem guiar u m a Constituição e da lei orgânica
criança é preciso bem compre- do ensino." (Art. 117, cap. II
endê-la. — (Diário de Notícias, da Constituição Estadual de
Rio). 2/8/1947.)
Assim, retirou a Constituição
baiana a atividade educacional
das malhas tumultuosas da ad-
COMENTÁRIOS A L E I ministração geral, isto é, âmbito
de uma Secretaria, alforriando-a
ORGÂNICA DO ENSINO da trama burocrática, para asse-
BAHIA gurar-lhe autogovêrno. Eis os
seus fundamentos:
Raimundo Matta
1) Um Conselho, integrado de
seis cidadãos de ilibada reputa-
O anteprojeto Anísio Teixeira ção, nomeados pelo Governador,
com aprovação da Assembléia,
A Constituição do Estado da tendo como presidente o Secre-
Bahia foi promulgada a 2 de tário de Estado "encarregado
agosto de 1947, trazendo no seu dos negócios da Educação", e
corpo de mandamentos a notável com seus mandatos renováveis
inovação que a inscreveria, de- pelo terço, de dois em dois
finitivamente, na história da anos."
educação brasileira e, quiçá, da 2) Um diretor de Educação,
América do Sul, como a pri- escolhido pelo Governador em
meira carta política estadual a lista tríplice a ser eleita d e n t r e
formular um sistema autônomo "pessoas de notório saber em
para a educação e a cultura. questões de ensino," e com
E r a o instituto do governo da mandato de 4 anos, detendo as
educação, separado do governo f u n ç õ e s d e administração d o
da política e das coisas públicas sistema estadual de ensino e
de administração geral. cultura, inclusive o poder disci-
Ainda que não totalmente o plinar, e nos têrmos da lei orgâ-
idealizado por Anísio Teixeira, nica e com a aprovação do Con-
o texto constitucional era a vi- selho d e n o m e a r , promover,
tória de uma ideologia educa- aposentar, exonerar ou demitir
cional por êle defendida ima- os membros do magistério e
nente na própria conceituação funcionários de serviços de edu-
democrática e que tem vicejado, cação e cultura.
lisonjeiramente, em latitudes de Completando essa delegação
civilizações mais avançadas, pela expressa, atribuiu-se ao Conse-
vivência de soluções adequadas lho "também, iniciativa para
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 195

propor à Assembléia Legislativa sôbre pontos fundamentais da


as Leis complementares" e t c . . . proposição.
o poder de baixar instruções; "O Govêrno e a administração
e, com aprovação do Governa- dos serviços de educação tive-
dor, regulamentos para a sua ram, como era de rigor, um
fiel execução etc. desenvolvimento maior. Além
Assim definidas a estrutura e de fixarem os deveres e atri-
as competências, assegurou a buições de novo organismo de
Carta Magna ao Conselho e ao direção de ensino e de cultura,
Diretor os fundamentos de sua procurou-se definir o campo de
autonomia de ação, instituindo sua ação regulamentar, deixan-
sobretudo a unificação do poder do-se para a flexibilidade dos
de decisão e do poder de exe- regulamentos e das instruções
cução, e inclusive da manipula- muito do que, por falta de um
ção dos meios financeiros e ma- órgão dessa n a t u r e z a , venha
sendo consagrado em lei, com
teriais e de pessoal, na instân- real prejuízo do espírito de en-
cia única dessa autonomia só saio e experimentação que deve
limitada pelo Poder Legislativo presidir a implantação e a ex-
ordinário. pansão dos serviços de educa-
Foi a inspiração dessa grande ção e cultura em nosso país."
vitória da ideologia democrática É que para o autor do ante-
de educação, que animou o go- projeto a lei não deveria ser
verno Mangabeira, na mensagem senão "um sistema de faculda-
encaminhada à Assembléia em des, dependendo a educação do
23 de outubro de 1947, isto é, que delas fizerem o magistério,
dois meses e vinte dias após a e os administradores do ensino.
promulgação da nossa Carta Arte e ciência como a medicina
Política, o anteprojeto de Lei e a engenharia, as fontes de
Orgânica do Ensino, justificada educação não estão nas Leis.
por concisa e confiante expo- mas na perícia, competência e
sição de motivos do Sr. Anísio visão dos seus servidores."
Teixeira, Secretário de Educação
do Estado. Tivessem — cremos — muitos
dos que se esforçaram no tra-
"Todo o anteprojeto — dizia balho estafante de adaptação do
o memorável documento — é projeto Anísio Teixeira — José
uma afirmação da confiança que Mariani, ao "espírito da Lei de
o Estado, em pleno renascimento Diretrizes" meditado (se lidos
democrático, deposita na institui- ou conhecidos) nesses notáveis
ção que, por excelência, anima pensamentos da exposição de
o povo para a conquista da motivos do Secretário de Edu-
igualdade fundamental entre os cação do Govêrno Mangabeira,
h o m e n s , a escola. Por isso e, talvez, outros fossem os re-
mesmo sublinha, com intencio- sultados de seu trabalho.
nal relevo o caráter político da
educação, que constitui o direito
dos direitos." O Epílogo de Uma Grande
0 anteprojeto era, assim, como Reforma
não poderia deixar de sê-lo, uma
tomada de posição em que não Tivessem vingado no Brasil
se fixava apenas o "caráter indi- do fim do século passado os
vidualista da educação, mas seu ideais educacionais propugnados
c a r á t e r social." Daí aquela nos Pareceres de Rui Barbosa,
"insistência por definições," que para a reforma do ensino, e
acentuava o Sr. Anísio Teixeira êste País estaria hoje numa
com particular ênfase, sobretudo situação de desenvolvimento
ao esclarecer os legisladores educacional invejável, porque
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

amadurecido o c o n s c i e n t e de e pedagógico, aquela construção


seus destinos históricos, sem o da filosofia de vida, em que o
perigo de transformar-se em mundo se lança. E, possivel-
presa fácil de aventureirismo mente, outras poderiam ser as
político e demagógico ou das coordenadas dos grandes debates
improvisações a que a sua ima- nacionais, que ecoam no vazio
turidade educacional o tem le- do próprio campo da educação,.
vado e podem levar ainda mais. em que formalmente todos se
Isto sobretudo, numa época em empenham, mas onde, realmen-
que a "guerra fria" tendo a te, nem todos podem encontrar
transplantar as disputas pela soluções adequadas para a rea-
sobrevivência mundial, dos cam- lidade do nosso subdesenvolvi-
pos de batalhas para os campos mento.
da produção econômica, e, des-
tes, para os campos de produção Não ouvindo Rui, retardamos
científica. É a era em que os o desenvolvimento educacional
povos se afirmam já não mais brasileiro; demorando em ouvir
apenas pela consciência cívica Anísio e ouvindo-o mal, para
do seu nacionalismo político ou justificar a não compreensão
econômico, mas também pelos lamentável das suas teses, a
ponto de ingênua ou enfatica-
valores que com ciência a passa mente as desfigurarmos, com
utilizar na reconstrução da sua pretensões de aperfeiçoá-las ou
filosofia de vida para ajusta- adaptá-las, deixamos de fazer,
mento imediato às conquistas na Bahia, a mais corajosa e no-
científicas e tecnológicas que, tável experiência educacional
diminuindo as distâncias no dêste século.
espaço e no tempo, alargaram,
de modo extraordinário e des- Estas considerações servem
concertante, seus corresponden- de preâmbulo, à guisa de toma-
tes categoriais no espírito hu- da de posição, para justificar os
mano. comentários que iremos desen-
volver, numa série de artigos,
E como a educação e o ensino sôbre a Lei Orgânica do Ensino
são fontes geratrizes da ciência, sancionada, parcialmente, pelo
a "guerra fria" da era atual Governador que lhe apôs alguns
está assumindo, cada vez mais, vetos. Esta lei, em que pese
o caráter de uma guerra fria a sua importância, fora votada,
de educação e ensino, já que em terceira discussão, ao apagar
os g r a n d e s povos líderes do das luzes da Legislatura passada,
mundo moderno não escondem isto é em março, mas somente
a grande corrida em que se 4 meses depois teve a sua re-
empenham nesse domínio. Tanto dação final em plenário, apesar
russos como americanos volta- de não publicado anteriormente
ram-se como jamais antes o seu "vencido." Tal irregulari-
fizeram, ou j a m a i s outros o dade legislativa é sem prece-
fizeram ou têm feito, para o dentes nos Anais brasileiros e
que se tem chamado no mundo baianos, conquanto marque o
ocidental o "pursuint of exce- encerramento de uma batalha
lence." de 16 anos para o processamento
da tão esperada r e f o r m a da
Tivéssemos, também vingado, educação que a Constituição de
no fim da década de 40 dêste 1947 consagrara nas suas linhas
nosso século, os ideais educa- gerais, num exemplo notável
cionais propugnados, defendidos para o Brasil.
e praticados, na B a h i a , por
Anísio Teixeira e nosso Estado É que uma reforma educa-
estaria hoje liderando no Brasil, cional baiano, inspirada num
com justo direito de procedên- lampejo de inteligência e nutri-
cia ideológica no campo político da pela mais corajosa afirmação
REVISTA BRASILEIRA DE

de princípios da Constituinte de ESTUDOS PEDAGÓGICOS 197


1947 e do Govêrno Otávio Man- primeira legislatura baiana se
gabeira, veio ter seu epílogo tentou formular, mas, tão-so-
tristonho, em 1963, como um mente uma grotesca confusão de
soldado desconhecido que tomba princípios indefinidos e contrá-
traiçoeiramente no front, ao con- rios entre si, como se demons-
trário de cair ante a intrepidez
dos adversários, em luta de trará sobejamente.
campo aberto. Daí que estes comentários
visam dois objetivos principais:
E os ideais educacionais de a) isentar o sr. Anísio Tei-
um homem que é respeitado e xeira das responsabilidades de
cultuado dentro e fora do País, uma reforma que só apenas
como uma das nossas maiores historicamente poderá ter seu
autoridades em educação, Anísio n o m e e esclarecer a opinião
Teixeira, foram melancòlicamen-
te postos de lado, como se algo pública sôbre os males das dis-
mais não merecessem na con- torções a que sempre nos leva
sideração dos que têm a res- o processo legislativo, em casos
ponsabilidade de zelar pelo re- semelhantes; b) definir uma po-
nome de nossa Terra. A ver- sição pessoal ante o problema
dade é que uma concepção digna da Lei Orgânica e os vetos, por
do gênio baiano terminou sen- um dever de ofício e consciên-
do transformada num emara- cia, para que amanhã não se
nhado caprichoso de dispositivos queira inquinar de omissão a
desencontrados e contraditórios, atitude que tomei diante da ma-
pretendendo à denominação de téria, quer como Superintendente
Lei Orgânica do Ensino. de Ensino Elementar, quer como
Fixar posição a respeito da Secretário de Educação, ainda,
Lei Orgânica é pois imperativo como jornalista e professor.
de consciência, para julgamento Para isso, começaremos por
das gerações futuras, sobretudo fazer um breve histórico do Ca-
tendo em vista protestar contra pítulo de Educação, na Consti-
a distorção do pensamento de tuição B a i a n a de 1947 para
Anísio Teixeira, além do mais fixar a g r a n d e contribuição
as incongruências dos remendos ideológica de Anísio Teixeira
ainda que ingênuas tentativas nos debates da Constituinte, fi-
de acomodação a conveniências xando a seguir os aspectos mais
atuais, implicam a completa notáveis da chamada Batalha
desfiguração de todo o sistema da Lei Orgânica do Ensino,
pioneiro e s i n g u l a r , por êle donde chegaremos às distorções
idealizado para a Bahia. do Projeto frente à Constituição
O projeto do sr. Anísio Tei- e frente ao espírito da Reforma,
xeira, enviado à Assembléia pelo o voto governamental, em seus
Governador Otávio Mangabeira, propósitos e conseqüências. E
era a súmula de um sistema é isso tudo que nos levará ao
coerente e definido; mas o que que a consciência de uma for-
dele resulta em têrmos de lei mação educacional autentica-
é um agregado de contradições, mente baiana considera como
em que não se identifica sequer "Epílogo Tristonho de uma
uma filosofia oposta, como na Grande Reforma". — (Diário de
Notícias, Salvador.)
ATOS OFICIAIS

DECRETO Nº 52.267 — DE 17 DE forem concedidas através de verbas


JULHO DE 1963 orçamentárias.
Dispõe sôbre um programa de edu- Art. 3º' A Conferência Nacional
cação de base e adota medidas dos Bispos do Brasil submeterá à
necessárias à sua execução atra- aprovação do Presidente da Repú-
vés de Escolas Radiofônicas nas blica, até 31 de janeiro de cada ano,
áreas subdesenvolvidas do Norte, o plano de trabalho a ser executa-
Nordeste. Centro-Oeste e em do pelo MEB no exercício seguinte,
outras áreas em desenvolvimento com a estimativa das despesas
do País a ser empreendido pela necessárias à sua realização.
Conferência Nacional dos Bispos § 1º A decisão do Presidente da
do Brasil. República será comunicada ao Mi-
nistério da Educação e Cultura e
aos demais órgãos cooperadores a
O Presidente da República, usando fim de que as dotações respectivas
das atribuições que lhe confere o sejam incluídas na proposta orça-
artigo 87, inciso I, da Constituição e mentária a ser enviada ao Congres-
Considerando a conveniência de so Nacional.
levar a Educação de Base e Cul- § 2º As verbas orçamentárias
tura Popular às populações das destinadas ao MEB serão liberadas
áreas em desenvolvimento, no País; bimensalmente, em cotas postas
Considerando a experiência adqui- à sua disposição no Banco do
rida e os excelentes resultados já Brasil S.A.
apresentados pelas Escolas Radio- Art. 4º Os Órgãos cooperadores
fônicas implantadas pelo Movimento mencionados no artigo 8'' ficam
de Educação de Base (MEB) da autorizados a utilizar, desde logo, as
Conferência Nacional dos Bispos verbas constantes do Orçamento
do Brasil, em vigor ou arroladas em restos a
pagar, originárias do Decreto n'
50.370, de 21 de março de 1961.
Decreta: Art. 5º As prestações de contas
Art. 1º O Govêrno Federal dará anuais deverão ser feitas, pela enti-
todo apoio ao Movimento de Edu- dade executora, aos órgãos compe-
cação de Base (MEB) da Confe- tentes.
rência Nacional dos Bispos do Art. 6º O MEB, através de seu
Brasil (CNBB), empreendido atra- Conselho Diretor, poderá solicitar
vés de Escolas Radiofônicas no ao Presidente da República a requi-
Norte, Nordeste, Centro-Oeste e em sição de funcionários federais e
outras áreas em desenvolvimento do autárquicos para serviços julgados
Pais. indispensáveis aos objetivos do Mo-
Art. 2º O MEB, na execução de vimento.
seu Plano qüinqüenal, deverá insta- Art. 7º Deverão estabelecer con-
lar Escolas Radiofônicas em expan- vênio com o MEB os órgãos públi-
são de ano para ano dentro das cos federais mencionados no artigo
possibilidades financeiras que lhe 8", cuja colaboração seja por aquêle
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 199

considerada necessária pará a exe- Art. 9» A CNBB poderá promo-


cução de seus programas e planos ver a personalidade jurídica do MEB.
de ação nas regiões mencionadas Art. 10. Em lista que lhe será
no art. 1* dêste decreto. apresentada pela entidade executora
Parágrafo único. Os convênios a do presente decreto, o Presidente da
que se refere êste artigo deverão República designará 25 membros
ser previamente submetidos à apro- pará compor o Conselho Nacional
vação do Presidente da República. de Representação e Consulta do
MEB.
Art. 8º Colaboração com o MEB
os seguintes setores da administra- Art. 11. O Presidente da Repú-
ção pública federal, dentro das suas blica designará pessoa de sua livre
possibilidades técnico-administrati- escolha para integrar o Conselho
vas de atendimento, mediante con- Diretor Nacional do MEB.
vênios a serem firmados: Art. 12. Dentro de 45 dias da data
a) O Ministério da Educação e da publicação dêste decreto, os
Cultura, especialmente através do Órgãos Cooperadores mencionados
Fundo Nacional de Ensino Primário no art. 8º deverão estabelecer ou
e pelos seus órgãos, sistemas, planos atualizar convênios com a UNBB
e campanhas, destinados a promo- para cumprimento dos objetivos do
ver a Educação de Base e a erradi- presente decreto.
cação do analfabetismo entre crian- Parágrafo único. A Secretaria
ças e adultos; Executiva de que trata o Decreto
46.386, de 7 de julho de 1959, ado-
b) O Ministério da Agricultura,
tará as providências necessárias à
especialmente pela Superintendência
efetivação das medidas indicadas
do Ensino Agrícola e Veterinário,
neste artigo.
pelo Serviço de Informação Agrí-
cola, pelo Departamento de Adminis- Art. 13. Este decreto entrará em
tração e pelo Departamento de vigor na data de sua publicação,
Promoções Agropecuárias; revogado o Decreto nº 50.370, de
c) O Ministério da Saúde, pelo 21 de março de 1961.
Departamento Nacional de Ende- Brasília, 17 de julho de 1963; 142º
mias Rurais, especialmente seu Ser- da Independência e 75º da Repú-
viço de Educação Sanitária, pelo blica.
JOÃO GOULART
Serviço Nacional de Educação
Sanitária e pelo Departamento Na- (Publ. no D.O. (le 22/7/1963)
cional da Criança;
d) O Ministério da Aeronáutica,
pelos Serviços de Transporte da
Força Aérea Brasileira; DECRETO N" 52.456 — DE 10 DE
e) O Ministério da Viação e SETEMBRO DE 1963
Obras Públicas, pelo Conselho Na- Dispõe sôbre a Comissão Sripervi-
cional de Telecomunicações, pelo
sora do Plano dos Institutos.
Departamento Nacional dos Correios
e Telégrafos, pelo Departamento
Nacional de Obras Contra as Secas, O Presidente da República, usando
pelo Departamento Nacional de das atribuições que lhe confere o
Obras e Saneamento; artigo 87, item I, da Constituição,
f) Serão considerados órgãos decreta:
operadores, ainda, a Superintendên- Art. 1º A Comissão Supervisora
cia do Desenvolvimento do Nordeste do Plano dos Institutos (COSUPI)
(SUDENE), a Superintendência da passará a ter dois objetivos funda-
Política Agrária (SUPRA), a Co- mentais :
missão do Vale de São Francisco a) colaborar com as Universi-
e a Superintendência do Plano de dades e Escolas Superiores do país
Valorização Econômica da Amazô- em seus planos de reestruturação
nia. e para o revigoramento de suas ati-
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vidades de ensino e pesquisa, a m p a - caráter temporário, poderá a


r a n d o núcleos nelas já existentes ou C O S U P I f i r m a r convênios de coo-
estimulando o s u r g i m e n t o de novos, peração financeira, visando à a m -
sempre que c o m p r o v a r disponibili- pliação do corpo docente, do equi-
dade de pessoal qualificado p a r a o p a m e n t o e instalação m a i s a d e q u a d a
ensino e a pesquisa e possibilidade de laboratórios das Escolas de
de constituírem, em curto prazo, E n g e n h a r i a que tiverem expandido
órgãos centralizados de atividades s u b s t a n c i a l m e n t e o n ú m e r o de alu-
científicas e didáticas, e n o s p o r série do ensino profissional
6) i n c r e m e n t a r a f o r m a ç ã o de ou diversificação de cursos.
tecnologos, especialistas e técnicos Art. 4º A C O S U P I poderá, a i n d a ,
auxiliares, a t r a v é s de medidas que assistir núcleos ativos já existentes,
se fizerem m a i s a p r o p r i a d a s ao sob a f o r m a de institutos ou não
substancial a u m e n t o do n ú m e r o de desde que disponham de pessoal
v a g a s nos cursos de e n g e n h a r i a e qualificado p a r a o ensino e a pes-
à elevação do p a d r ã o dos referidos quisa dentro dos campos de inte-
cursos. resse já definidos, e a s s e g u r e m
Art. 2° P a r a a l c a n ç a r o primeiro meios de c o n t i n u a r as atividades
objetivo, deverá a C O S U P I concen- q u a n d o cessar a cooperação da
t r a r e coordenar esforços e r e c u r s o s COSUPI.
financeiros, inclusive d e c o r r e n t e s de Art. 5º Os auxílios da C O S U P I
empréstimos externos, visando a só serão concedidos quando compro-
fortalecer setores do conhecimento v a d a a impossibilidade de a Uni-
que m a i s de perto i n t e r e s s a m ao versidade, a Escola ou instituição
plano de educação p a r a o desen- o u t r a realizar, com seus próprios
volvimento : Matemática, Química, recursos regulares, os p r o g r a m a s
Física, Biologia, Geologia e Econo- previstos.
mia.
Art. 6' Em qualquer caso, a co-
Art. 3º P a r a a consecução do se- operação p r e s t a d a pela COSUPI t e r á
gundo dos objetivos indicados no s e m p r e c a r á t e r temporário, cuja du-
artigo 1º, a C O S U P I favorecerá me- r a ç ã o d e v e r á ser estabelecida por
diante convênios com Universidades convênio, não podendo seus recursos
e Escolas de E n g e n h a r i a a criação cobrir despesas de m a n u t e n ç ã o ou
de " c e n t r o de formação básica", substituir os recursos regulares d a s
onde s e r á m i n i s t r a d o ensino corres- instituições assistidas.
p o n d e n t e ao ciclo básico dos cursos
de engenharia, com a finalidade de Art. 7º A COSUPI, d i r e t a m e n t e e
habilitar m a i o r n ú m e r o de alunos s u b o r d i n a d a ao Ministro de E s t a d o
p a r a ingresso aos cursos de E n g e - da E d u c a ç ã o e Cultura, será consti-
n h a r i a ou às Escolas Técnicas. t u í d a de um Superintendente, de um
§ 1* As entidades de ensino supe- Conselho de cinco membros, no-
rior .que f i r m a r e m convênio com a meados pelo P r e s i d e n t e da R e p ú -
C O S U P I p a r a a criação de " c e n t r o s blica, e de dois Secretários execu-
de formação básica", t e r ã o a res- tivos.
ponsabilidade do p r o g r a m a em â m - Art. 8º O Superintendente da
bito regional, podendo associar-se ao C O S U P I s e r á o Diretor do E n s i n o
convênio o u t r a s Escolas do mesmo Superior e t e r á as seguintes a t r i -
nível ou Escolas Técnicas da mes- buições:
m a região. a) executar a política definida
§ 2º A C O S U P I p r o c u r a r á sediar no art. 1º;
os centros de formação básica n a s b) presidir o Conselho;
regiões onde a d e m a n d a do m a t r í - c) r e p r e s e n t a r a COSUPI;
culas m a i s se vem fazendo sentir. d) f i r m a r convênios;
§ 3º Tendo, ainda, em vista o e) fiscalizar, com a ajuda do
aproveitamento de maior n ú m e r o Conselho e dos Secretários Executi-
dos alunos que concluírem o ciclo vos, a fiel aplicação dos recursos
de estudos nos cursos básicos, em distribuídos pela C O S U P I ;
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/) supervisionar os serviços téc- buições e considerando o que c o n s t a


nicos e a d m i n i s t r a t i v o s . do processo nº 93.892-62, resolve:
Art. 9º O Conselho, previsto no Artigo único — F i c a a D i r e t o r i a
a r t . 7º, s e r á ó r g ã o deliberativo e do E n s i n o Superior a u t o r i z a d a a
t e r á a s seguintes atribuições: promover a instalação, em E s t a d o s
o) estabelecer, em c a d a exercício, da F e d e r a ç ã o , de setores com a
dentro do o r ç a m e n t o previsto, os atribuição principal de, após exa-
planos p a r a aplicação dos recursos
m i n a r a regularidade da vida escolar
destinados à C O S U P I pelo Orça-
dos diplomados pelos estabelecimen-
mento d a União;
tos de ensino superior, processar o
b) estabelecer as n o r m a s p a r a
registro dos respectivos diplomas,
solicitações de auxílios, fixar prazos
p a r a seu recebimento e j u l g a m e n t o nos t ê r m o s da Lei.
e as condições a s e r e m estabeleci- Paulo de Tarso
das por convênios com as institui-
ções assistidas; (Publ. no D.O. de 5/8/C3)
c) concluir, até o dia 30 de m a r ç o
de c a d a ano, o plano de aplicação
p a r a os recursos disponíveis;
d) estabelecer, a t é o dia 15 de P O R T A R I A Nº 233, DE 23 DE
abril, p r o p o s t a de O r ç a m e n t o p a r a J U L H O DE 1963
o ano seguinte;
e) a p r e c i a r a utilização pelas en- Dispõe sôbre a Comissão de Cultu-
tidades dos auxílios que lhe foram ra Popular.
distribuídos no exercício anterior.
A r t . 10. Os Membros do Conse- O Ministro de E s t a d o da E d u c a -
lho terão m a n d a t o por dois (2) anos, ção e Cultura, no uso de s u a s a t r i -
renovável u m a vez, e seus serviços buições, resolve:
serão considerados relevantes. A Comissão de C u l t u r a Popular,
A r t . 11. A C O S U P I t e r á um Se- instituída pela P o r t a r i a Ministerial
c r e t á r i o executivo p a r a c a d a obje- nº 195, de 8 de julho de 1963, t e r á
tivo dos c o n s t a n t e s no a r t . 1º de âmbito nacional e destinar-se-á a
escolha do Conselho e incumbido de promover l e v a n t a m e n t o s e pesquisas
executar o p r o g r a m a d e t e r m i n a d o sôbre questões de n a t u r e z a cultural,
pelo Superintendente. a fixar n o r m a s de t r a b a l h o p a r á
A r t . 12. Ê s t e Decreto e n t r a r á em êste fim, a incentivar, desenvolver
vigor n a d a t a d e s u a publicação, e a p r i m o r a r a c u l t u r a popular, pre-
revogadas as disposições em con- servando, em c a d a região do país,
trário. as características que lhe são pró-
Brasília, em 10 de setembro de p r i a s e que deverão ser a p r o v e i t a d a s
1963; 142º da Independência e 75º como elementos i n t e g r a n t e s da edu-
d a República. cação de b a s e d a s populações locais.
JOÃO GOULART A Comissão de C u l t u r a P o p u l a r
Paulo de Tarso será i n t e g r a d a por cinco m e m b r o s
(Publ. no D.O. de 11/9/1063) designados por ato do Ministro, que
t a m b é m indicará o respectivo presi-
dente e o substituto eventual dêste.
P O R T A R I A Nº 232, DE 22 DE S u b o r d i n a d a ã Comissão de Cul-
J U L H O D E 1963 t u r a Popular, funcionará u m a Se-
c r e t a r i a Executiva, que t e r á a seu
Autoriza a Diretoria do Ensino Su- cargo a a d m i n i s t r a ç ã o de todas as
perior a instalar nos Estados ser- atividades da referida Comissão,
viços para registro dos diplomas. servindo a i n d a de órgão de ligação
e n t r e e s t a e as Comissões Regio-
O Ministro de E s t a d o da E d u c a - nais de C u l t u r a Popular, que forem
ção e Cultura, no uso de s u a s a t r i - instituídas.
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P a r á a realização das atribuições publicação, revogadas as disposições


que lhe competem, a S e c r e t a r i a E x e - em c o n t r á r i o .
cutiva compreenderá um Setor Paulo de Tarso
Administrativo e um Setor Técnico.
(Publ. no D.O. de 5/8/1963)
A S e c r e t a r i a E x e c u t i v a será diri-
gida por um Secretário Executivo
e os Setores por Assistentes Exe-
cutivos, todos designados pelo Mi- P O R T A R I A Nº 237, DE 24 DE
nistro. J U L H O DE 1963
As Comissões Regionais de Cul- Institui na Diretoria do Ensino Su-
t u r a P o p u l a r serão i n t e g r a d a s n o perior as Comissões de Matrícula
mínimo por três membros, represen- por Setores.
t a n t e s do Ministério da E d u c a ç ã o e
Cultura, das instituições de c u l t u r a
O Ministro de E s t a d o da E d u c a -
popular e das entidades universitá- ção e Cultura, no uso de suas a t r i -
rias locais, designados por a t o do buições,
Ministro, que i n d i c a r á o presidente,
Considerando a freqüência com
seu substituto eventual e o Secre- que, em certos setores do E n s i n o
t á r i o Executivo. Superior, o n ú m e r o de candidatos
Os planos de t r a b a l h o elaborados classificados em concursos de habi-
pela Comissão de C u l t u r a Popular, litação excede o das v a g a s ofereci-
com discriminação das despesas das à m a t r í c u l a em cursos de for-
previstas, serão submetidos à a p r o - mação profissional;
vação do Ministro.
Considerando que as imediatas ne-
Os recursos p a r a a m a n u t e n ç ã o cessidades do país em mão-de-obra
dos t r a b a l h o s da Comissão de Cul- de nível superior exigem o aprovei-
t u r a provirão de resíduos de exer- tamento m á x i m o dos candidatos
cícios a n t e r i o r e s e destaques dos mediante, inclusive, a diversificação
F u n d o s criados pela Lei nº 4.024, de dêsses cursos e a conseqüente a m -
20 de dezembro de 1961, os quais pliação das oportunidades de forma-
serão creditados em c o n t a especial ção de todas as modalidades profis-
no Banco do Brasil, sob a denomi- sionais r e q u e r i d a s pelo mercado de
nação "Comissão de C u l t u r a P o p u l a r t r a b a l h o , especialmente no que diz
— Ministério da E d u c a ç ã o e Cul- respeito às m e t a s estabelecidas pelo
tura". P l a n o Trienal de E d u c a ç ã o ;
A conta a que se refere o a r t i g o Considerando, por isso, a conveni-
a n t e r i o r s e r á m o v i m e n t a d a conjun- ência de mobilizar, p a r a esse efeito,
t a m e n t e , pelo Chefe do Gabinete do todos os setores do E n s i n o Superior
Ministro e pelo Secretário Execu- que estejam ou v e n h a m a ser re-
tivo. clamados por aquelas necessidades
A Comissão de Cultura P o p u l a r p r á t i c a s da comunidade,
d e v e r á elaborar e s u b m e t e r à a p r o - Resolve:
vação do Ministro, no prazo máxi- Art. 1º F i c a m instituídas, na Di-
mo de 30 dias, o seu R e g i m e n t o retoria do E n s i n o Superior, as Co-
I n t e r n o , no qual serão fixadas as missões de Matrícula por Setores
atribuições dos órgãos que a com- (CMPS), incumbidas d e :
põem, as suas relações com as Co-
I — P r o c e d e r a n u a l m e n t e a levan-
missões Regionais de C u l t u r a Po-
t a m e n t o da real capacidade de m a -
pular e a competência destas.
trícula em cursos de formação
Os m e m b r o s da Comissão de Cul- profissional m i n i s t r a d o s por estabe-
t u r a P o p u l a r não poderão i n t e g r a r lecimentos, a g r u p a d o s ou não em
as Comissões Regionais. universidade, e por órgãos coopera-
A presente P o r t a r i a Ministerial dores (art. 67, da Lei nº 4.024, de
e n t r a r á em vigor na d a t a de s u a 20 de dezembro de 1961);
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II — E s t i m a r a n a l i t i c a m e n t e o Art. 6' Os casos omissos serão


m o n t a n t e dos recursos de pessoal e decididos pelo Ministro da E d u c a ç ã o
de m a t e r i a l necessário à ampliação, e Cultura.
quando fôr o caso, do n ú m e r o de Paulo de Tarso
vagas oferecidas à m a t r í c u l a ; (Publ. no D.O. de 5/8/1961)
I I I — Estabelecer critérios, de
acordo com os princípios fixados P O R T A R I A Nº 269 — DE 14 DE
pelo Conselho F e d e r a l de Educação, AGOSTO DE 1963
p a r a a diversificação dos cursos em
função d a s d e m a n d a s de mão-de- Dispõe sôbre as Comissões Regio-
obra de nível superior pelo mercado nais de Cultura Popular.
de t r a b a l h o do país.
P a r á g r a f o único — P a r a os efei- O Ministro de E s t a d o da E d u c a -
tos dêste artigo, as C M P S levarão ção e Cultura, no uso de suas a t r i -
em conta, nos estabelecimentos de buições, resolve:
E n s i n o Superior e nos órgãos coope- Art. 1º Às Comissões Regionais,
radores: de C u l t u r a Popular, criada nos E s -
I — O pessoal docente disponível; tados, incumbe dirigir todos os
t r a b a l h o s de C u l t u r a P o p u l a r liga-
II — O regime de t r a b a l h o a que
dos ao Ministério, programando-lhes
esteja legalmente obrigado, inclusi-
as atividades, disciplinando a s u a
ve a divisão de t r a b a l h o de cada
execução e aplicando os recursos
cadeira ou disciplina, d e p a r t a m e n t o ,
que lhe forem destinados.
ou órgão equivalente;
I I I — As possibilidades de imedia- Art. 2º Aos Secretários Executi-
vos das Comissões Regionais de
ta aplicação do regime de dedicação
Cultura Popular caberá submeter
exclusive por p a r t e do pessoal do-
a n u a l m e n t e às m e s m a s o P l a n o de
cente;
T r a b a l h o , cuidar da sua realização.
IV — As instalações e equipamen-
propor a c o n t r a t a ç ã o do pessoal
tos que existem ou precisam de ser necessário e, em conjunto com m a i s
proporcionados; um m e m b r o da Comissão, movimen-
V — Outros elementos que se t a r os recursos financeiros.
faça mister considerar sistematica-
Art. 3º O P l a n o Anual das Co-
mente.
missões Regionais de Cultura Po-
Art. 2º H a v e r á tantas CMPS pular d e v e r á ser a p r o v a d o p e l a
quantos sejam os setores em que, Comissão Nacional de C u l t u r a P o -
a juízo do Diretor da Diretoria do p u l a r e homologado pelo Ministro
E n s i n o Superior, forem eventual- de E s t a d o , p a r a efeito de atribuição
m e n t e correlacionados, p a r a os efei- dos r e c u r s o s indispensáveis à s u a
tos do artigo 1", os cursos de gra- execução.
duação afins do E n s i n o Superior.
Art. 4º No prazo de 30 dias após
Art. 3º Cada C M P S será consti- a s u a constituição a Comissão R e -
t u í d a de t a n t o s m e m b r o s quantos gional d e v e r á a p r e s e n t a r à Comis-
sejam os estabelecimentos e órgãos são Nacional de C u l t u r a P o p u l a r o
cooperadores que do respectivo seu r e g i m e n t o interno.
setor estejam em causa.
Paulo de Tarso
Art. 4º Os t r a b a l h o s de c a d a (Publ. no D.O. de 16/8/1963)
CMPS serão presididos pelo Diretor
do E n s i n o Superior ou por quem,
no impedimento dêste, fôr escolhido P O R T A R I A Nº 348-A — DE 16 DE
pelos respectivos m e m b r o s . S E T E M B R O DE 1963
Art. 5º A convocação de c a d a Baixa normas para a expedição de
CMPS s e r á feita pelo Diretor da registro de professor do ensino
Diretoria do E n s i n o Superior, que médio.
solicitará dos estabelecimentos e
órgãos cooperadores em causa a O Ministro de E s t a d o da E d u c a -
designação dos seus r e p r e s e n t a n t e s . ção e Cultura, no uso de suas a t r i -
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

buições e de acordo com o que mento dos registros de professor de


dispõe o artigo 98 da Lei nº 4.024, ensino médio em tudo o que com-
de 20-12-1961, resolve: portar tratamento comum.
Art. 1' A expedição de registros § 2º Serão igualmente adotadas
de professôres de quaisquer ramos providências pelos órgãos, no sen-
do ensino médio obedecerá às nor- tido de que sejam unificados em um
mas gerais instituídas na presente só serviço comum, no âmbito re-
Portaria. gional, os trabalhos relativos à
Art. 2º Passam a denominar-se expedição de registros de professor
Registros de Professor de Ensino de ensino médio.
Médio os atuais registros de profes- Art. 4º O Ministério da Educação
sor de ensino secundário, de ensino e Cultura manterá registros de pro-
comercial e de ensino industrial, fessor de ensino médio:
assim como todos os demais que a) Para todas as disciplinas
forem ou venham a ser expedidos constantes dos planos de estudos das
para o exercício do magistério em Faculdades de Filosofia e a que
qualquer ramo do ensino médio. correspondam os estágios de curso
Parágrafo único. Os órgãos pró- realizado para obtenção do diploma
prios do Ministério da Educação e de licenciado;
Cultura promoverão a substituição b) para todas as disciplinas e
dos atuais registros de professôres práticas educativas constantes das
de que trata a presente Portaria, a relações expedidas pelo Conselho
fim de que passem a ter denomina- Federal de Educação e pelos Con-
ção constante neste artigo. selhos Estaduais de Educação;
Art. 3º A competência para a c) para todas as disciplinas cons-
expedição de instruções atinentes a tantes dos planos de estudos das
registros de professor de ensino mé- escolas de nível médio reconhecidas
dio caberá aos seguintes órgãos: pelos órgãos competentes;
a) Diretoria do Ensino Secundá- d) para o exercício profissional
rio, para as disciplinas e práticas de atividades técnico-pedagógicas
educativas denominadas de cultura previstas em Lei, recomendadas
geral e para as referentes a artes pelos Conselhos de Educação e exis-
e ciências; tentes nos planos de trabalho esco-
6) Diretoria do Ensino Indus- lar das escolas de nível médio.
trial, para as disciplinas e práticas Parágrafo único. Para o exercí-
educativas específicas de formação cio das atividades constantes da
técnica para atividades profissio- alínea "d" do presente artigo,
nais, de nível primário e secundá- exigir-se-á registro na Diretoria do
rio; Ensino Secundário, nas mesmas
c) Diretoria do Ensino Comer- condições estabelecidas para o exer-
cial, para as disciplinas e práticas cício do magistério de nível médio
educativas específicas de formação e de acordo com as instruções que,
técnica para atividades profissionais sôbre o assunto, forem baixadas pela
de nível terciário; referida Diretoria.
d) Departamento Nacional da Art. 5º Os portadores de diplo-
Educação, para as disciplinas que mas de universidades estrangeiras
correspondam à formação técnica poderão obter o registro de profes-
necessária ao exercício do magisté- sor de ensino médio, na forma das
rio primário, assim como para edu- normas que, sôbre o assunto, forem
cação física e outras disciplinas e adotadas pelo Conselho Federal de
práticas educativas não compreen- Educação.
didas nas alíneas precedentes. Art. 6º O exercício do magistério
§ 1» Os órgãos do Ministério da nas condições admitidas pelo artigo
Educação e Cultura, a que se refere 118 da Lei nº 4.024, de 20 de dezem-
o presente artigo, expedirão instru- bro de 1961, constituirá estágio a
ções conjuntas sôbre o processa- ser orientado pelas Diretorias do
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 205

Ensino, na forma das instruções que Ensino Secundário, Técnico e inclua


expedirem. o Normal e outros ensinos existen-
Art. 7' Além dos registros que tes ou que venham a existir no
habilitam ao exercício do magisté- âmbito do nível médio;
rio em escolas de nível médio, o considerando que o chamado giná-
Ministério da Educação e Cultura. sio moderno é tentativa de aplicar
por solicitação dos interessados, na Escola Secundária a experiência
expedirá registros especiais corres- do Ensino Técnico Industrial e Co-
pondentes a graus sucessivos de mercial e que só trabalho de con-
aperfeiçoamento técnico-cultural. junto das três Diretorias capacitará
Art. 8o Nos casos de abertura de o M.E.C, para esforço realmente
novas escolas médias no período válido;
que medear entre o início da ativi- considerando que cada uma das
dade magisterial e o exame de sufi- três Diretorias possui recursos, ex-
ciência a que se refere o artigo 117 periência e pessoal, que articulados
da Lei de Diretrizes e Bases da produzirão os resultados visados
Educação Nacional, o Ministério da com a política ministerial de im-
Educação e Cultura dará autoriza- plantação dos ginásios modernos;
ção precária para exercício do ma- considerando que o esforço con-
gistério na forma das instruções que junto do M.E.C, já foi unificado
se expedirem. através do Plano Trienal, não se
Art. 9º Esta Portaria entrará em justificando a disposição de esforços
vigor na data de sua publicação pelas Diretorias, que executarão no
revogadas as disposições em contrá- nível ministerial êste plano;
rio. considerando que embora não se
Paulo de Tarso justifiquem — no 1' ciclo do Ensino
(Publ. no D.O. de 2/10/1963) Médio — especializações profissio-
nais de Ensino Comercial e Indus-
trial, é de alto interesse educacional
inserir na Escola Secundária (1º
PORTARIA N' 347 — DE 16 DE ciclo) atividades características da
SETEMBRO DE 1963 moderna sociedade industrial;
considerando que o ginásio moder-
Aprova normas para orientação e no não é uma tentativa de profissio-
assistência aos ginásios modernos nalização do 1' ciclo médio, mas o
pelas Diretorias do Ensino Secun- aproveitamento — na Escola Média,
dário, Comercial e Industrial. geral e comum — da experiência
dos demais ramos de ensino, com
O Ministro de Estado da Educa- vista ao processo de desenvolvi-
ção e Cultura, no uso de suas atri- mento do País;
buições e considerando que o mais considerando, por fim, a proposi-
estreito entrosamento das três Di- ção conjunta apresentada ao Minis-
retorias que superintendem o ensino tro de Estado pelas Diretorias do
médio do País (D.E.S. — D . E . I . Ensino Secundário, do Ensino Co-
— D.E.C.) se faz necessário à efi- mercial e do Ensino Industrial sôbre
ciência do trabalho desenvolvido a necessidade de medidas adminis-
pelo M . E . C ; trativas que visem à integração cada
considerando que existem áreas vez maior das três Diretorias de
comuns na atuação das três Dire- Ensino Médio do Ministério, resolve:
torias, não se justificando superpo- Aprovar as seguintes normas des-
sição de planos e diretrizes; tinadas a orientar a assistência a
considerando a conveniência de ser dada pelas Diretorias do Ensino
serem as três Diretorias integradas Secundário, do Ensino Comercial e
num Departamento de Ensino Mé- do Ensino Industrial na implanta-
dio que abranja as áreas atuais do ção e orientação dos ginásios mo-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

dernos, previstos no P l a n o Trienal cialidade didática e n c a m i n h e os


de E d u c a ç ã o : alunos p a r a a s atividades p r i m á r i a s
1. A i m p l a n t a ç ã o dos ginásios e s e c u n d á r i a s (indústrias extrativas,
modernos c o n s t a n t e do P l a n o Trie- pecuária, a g r i c u l t u r a e indústria) e
nal de E d u c a ç ã o s e r á esforço c o m u m à Diretoria do E n s i n o Comercial o
das t r ê s Diretorias dirigido a tôda t r e i n a m e n t o de professôres cujas
rede escolar de g r a u médio no nível especialidades didáticas encami-
do 1º ciclo. nhem os alunos p a r á atividades ter-
2. N e s t e esforço c a b e r á à Dire- ciárias (serviços) t a n t o referentes
t o r i a de E n s i n o S e c u n d á r i o : ao 1º como ao 2º ciclo.
o) t r e i n a r os futuros diretores 4. As t r ê s Diretorias planejarão
dos ginásios modernos de modo a a t u a ç ã o c o m u m j u n t o aos estabele-
capacitá-los p a r a o r i e n t a r esta nova cimentos do ensino médio no 1º
f o r m a de escola m é d i a geral e ciclo (ginásios, ginásios comerciais,
comum; ginásios industriais e escolas nor-
b) t r e i n a r o pessoal técnico e m a i s regionais), dividindo entre si,
administrativo, compreendendo como de acordo com s u a s á r e a s específi-
t a l os orientadores pedagógicos e cas, os ônus e encargos decorrentes.
educacionais, incentivadores de ati-
vidades e x t r a c u r r i c u l a r e s e outros 5. Q u a n t o ao 2º ciclo, c a d a Dire-
p a r t i c i p a n t e s do processo educacio- t o r i a f a r á p l a n e j a m e n t o específico,
nal que não se e n q u a d r e m na deno- que se i n t e g r a r á n u m plano con-
minação geral de "professor"; junto quando se referir ao interesse
c) o r i e n t a r o aspecto didático do e s t u d a n t e em i n g r e s s a r em es-
(didática geral) do t r e i n a m e n t o pro- cola de nível universitário.
movido pela Diretoria do E n s i n o 6. A D i r e t o r i a do E n s i n o Comer-
Industrial, pela Diretoria do E n s i n o cial e a D i r e t o r i a do E n s i n o I n d u s -
Comercial, de modo a criar u m a trial criarão i m e d i a t a m e n t e s e t o r e s
á r e a c o m u m de e n t e n d i m e n t o e especiais p a r a o r i e n t a r as ativida-
planificação entre os professôres des novas decorrentes da i m p l a n t a -
das diversas disciplinas e p r á t i c a s ção dos ginásios modernos e da
educativas; supervisão de outros tipos de cursos,
d) t o m a r aí os problemas de de modo que todas as modalidades
t r e i n a m e n t o e orientação dos pro- de ensino de nível médio t e n h a m
fessôres de c u l t u r a geral em t ô d a e n t r a d a no 1º ciclo na forma de
á r e a do ensino médio do primeiro orientação vocacional e se c o n s t u a m
e segundo ciclos dos cursos secun- cursos profissionais e a u t ô n o m o s no
dários, comerciais e industriais e 2º ciclo.
de outros cursos existentes ou que 7. As despesas decorrentes da
v e n h a m a existir, Serviço Social e i m p l a n t a ç ã o dos ginásios modernos,
outras. exceto as de construção e equipa-
3. Caberá à D i r e t o r i a do E n s i n o m e n t o correrão por c o n t a d e u m
Comercial e à D i r e t o r i a do E n s i n o fundo c o m u m constituído pelas t r ê s
Industrial: Diretorias, com dotações provenien-
a) dividir e n t r e si o t r e i n a m e n t o t e s do P l a n o T r i e n a l de E d u c a ç ã o .
dos professôres de disciplinas e 8. A implantação dos ginásios
p r á t i c a s educativas que não se en- modernos, decorrendo d a exigência
q u a d r e m na denominação de cul- da Lei de Diretrizes e Bases da
t u r a geral (Artes Industriais, Téc- E d u c a ç ã o Nacional (art. 44, § 2º, que
nicas Comerciais, A r t e s F e m i n i n a s , d e t e r m i n a a presença de disciplinas
Enfermagem, Serviço Social e ou p r á t i c a s educativas vocacionais
outras); no curso secundário) visa a todo
b) caberá, especificamente, à Di- atual sistema escolar de ensino mé-
retoria do E n s i n o I n d u s t r i a l o trei- dio i n d e p e n d e n t e m e n t e dos objeti-
n a m e n t o de professôres cuja espe- vos próprios do P l a n o Trienal.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 207

9. As Três Diretorias orientarão educativas vocacionais a intensifi-


os sistemas estaduais de ensino cação e aprofundamento do estudo
médio no cumprimento desta deter- das disciplinas que conduzam o es-
minação legal, agindo para esse fim tudante a determinada escola supe-
na conformidade do planejamento rior de sua escolha.
para implantação do ginásio mo-
derno. Patilo de Tarso
10. Quanto ao 2º ciclo, entender-
se-á como disciplinas ou práticas (Publ. no DO. de 2/10/1963)
REVISTA BRASILEIRA

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PUBLICADA PELO INSTITUTO NACIONAL


DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA

VOL. XLI JANEIRO-MARÇO, 1964 N.° 93


REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS,
órgão dos estudos e pesquisas do Ministério da Educação e Cul-
tura, publica-se sob a responsabilidade do Instituto Nacional de
Estudos Pedagógicos, e tem por fim expor e discutir questões
gerais da pedagogia e, de modo especial, os problemas da vida
educacional brasileira. Para isso aspira congregar os estudiosos
dos fatos educacionais do país, e refletir o pensamento de seu
magistério. Publica artigos de colaboração, sempre solicitada;
registra resultados de trabalhos realizados pelos diferentes
órgãos do Ministério e pelas Secretarias Estaduais de Educa-
ção. Tanto quanto possa, deseja contribuir para a renovação
científica do trabalho educativo e para a formação de uma
esclarecida mentalidade pública em matéria de educação.

A Revista não endossa os conceitos emitidos em artigos


assinados e matéria transcrita.
REVISTA BRASILEIRA

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PUBLICADA PELO INSTITUTO NACIONAL


DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA

VOL. XLI JANEIRO-MARÇO, 1964 N.° 93


INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
Diretor — Anísio Spinola Teixeira

CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS


Diretor Executivo — Péricles Madureira de Pinho
Diretor Adjunto — Joaquim Moreira de Sousa

Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério


Coordenador — Lúcia Marques Pinheiro

Divisão de Documentação e Informação Pedagógica


Coordenador — Elza Rodrigues Martins

Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais


Coordenador — Jayme Abreu

Divisão de Estudos e Pesquisas Sociais


Coordenadora Substituta — Úrsula Albersheim

Tôda correspondência relativa à REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS


PEDAGÓGICOS deverá ser encaminhada à redaç&o — Rua Voluntários da
Pátria, nº 107, Botafogo — Rio de Janeiro — Estado da Guanabara — Brasil.
REVISTA B R A S I L E I R A
DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Vol. XLI Janeiro-março, 1964t N° 93

SUMARIO

Págs.

Editorial 3

Estudos e debates:

Plano e finanças da educação — ANÍSIO TEIXEIRA 6


Ginásio moderno — GILDÁSIO AMADO 17
A p r e p a r a ç ã o de candidatos a cursos superiores na G u a n a b a r a —
JAYME ABREU 31

A cooperação e n t r e a Universidade e a I n d ú s t r i a — JOAQUIM FARIA


GÓIS FILHO 49

Documentação:

Atividades do I N E P em 1963 52
I R e u n i ã o do Conselho F e d e r a l e Conselhos E s t a d u a i s de E d u c a ç ã o :
Recomendações 59
X X V I Conferência I n t e r n a c i o n a l de I n s t r u ç ã o Pública — Recomen-
dações nº 56: Dispõe sôbre orientação escolar e profissional;
n° 57: Dispõe sôbre c a r ê n c i a de professôres p r i m á r i o s 61

INFORMAÇÃO DO PAÍS 74

INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO 80

CRÍTICA DE LIVROS : CALDEIRA, Clóvis — Menores no meio rural (83);


NEIL, A. S. — Liberdade sem medo (84); UNESCO, — World Survey
of Education 86

ATRAVÉS DE REVISTAS E JORNAIS: Ciência e c u l t u r a — J . R . O P P E N H E I -


MER, (88); Criatividade: a nova dimensão educacional — RAIMUNDO
MATA (98); Colégio Universitário — NAIR FORTES A B U - M E R H Y (100);
A América L a t i n a — ESTÊVÃO P I N T O (109); O professorado nos
colégios de ensino geral na F r a n ç a — B. GTROD DE L'AIN 110
ATOS OFICIAIS: Dec. nº 52.797, de 31/10/1963 — Aprova o Regimento do
Serviço Nacional de Bibliotecas (116); Dec. n° 53.327, de 18/12/1963
— Cria, em caráter supletivo, as escolas primárias de fronteira
(122); Dec. n 9 53.324, de 18/12/1963 — Aprova o programa inten-
sivo de preparação da mão-de-obra industrial e dá outras provi-
dências (122); Dec. nº 53.325, de 19/12/Í963 — Institui o programa
de expansão do ensino tecnológico (123); Dec. nº 53.326, de
18/12/1962 — Autoriza a criação de escolas técnicas de hotelaria
e dá outras providências (124); Port. nº 582, de 26/11/1963 —
Dispõe sôbre o registro de cine-clubes (125); P o r t . nº 583, de
26/12/1963 — Dispõe sôbre imprensa estudantil 126
Editorial

EDUCAÇÃO E DESCENTRALIZAÇÃO

Neste ano e meio de aplicação da Lei de Diretrizes e Bases,


muito já se tem escrito sôbre suas disposições, dirimidas controvérsias
e clareados pontos obscuros.
Continua sendo matéria de dúvida a coexistência do sistema
supletivo federal com os sistemas estaduais. O limite de compe-
tência entre o Conselho Federal de Educação e os Conselhos
Estaduais não é difícil de traçar, mas a natureza e o sentido da
ação federal nos Estados merecem ainda cuidado e exame.
A tradição centralizadora nos persegue e surgem anteprojetos
complementares à Lei de Diretrizes e Bases que poderão dificultar
e retardar o sistema descentralizado que a L.D.B. procurou
instituir.
Nada mais difícil nos regimes políticos do que a conceituação
do Poder Executivo, do Poder Administrativo, e sua instituciona-
lização. As dificuldades de definição em têrmos jurídicos decorrem
da maior potencialidade do Executivo em relação aos outros dois
poderes, em que se subdivide a função governativa. Judiciário e
Legislativo têm a sua dinâmica mais disciplinada do que o Exe-
cutivo, o mais político dos três poderes pela intensidade do arbítrio
legal que a competência constitucional lhe atribui. As Câmaras
e os Tribunais funcionam dentro de normas rígidas e nítidas. A
ação administrativa depende não só da lei como das personalidades
que a exercem. Em estudo recente, o professor Afonso Arinos
de Melo Franco, recordando essa peculiaridade do Poder Executivo.
exemplificava com a Inglaterra ao passar das mãos vacilantes de
Neville Chamberlain para os punhos firmes de Winston Churchill.
Daí a necessidade de tôda a vigilância para se manterem o espí-
rito e o alcance do novo sistema educativo contidos na Lei de
Diretrizes e Bases.
A União, com o seu sistema supletivo, fundado na ajuda
financeira e na assistência técnica, tem uma importantíssima função
a desempenhar, que nada tem de competitiva com os Estados mas
representa uma cooperação fertilíssima, desde que bem entendida
e bem desempenhada.
O Plano de educação elaborado pelo Conselho Federal, e os
Planos Estaduais formulados pelos respectivos Conselhos, são, na
4 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

opinião do Prof. Lourenço Filho, a maior parcela da lei "como instru-


mento de ação política em geral e como instrumento de boa ação
administrativa".
Ê necessário, porém, nada venha a perturbar as tranqüilas
relações entre a União e os Estados, que resultarão, não só de leis
e regulamentos, mas do bom entendimento de políticos e adminis-
tradores.
A assistência técnica prevista pelo artigo 95, letra b, da L.D.B.,
será a contribuição mais específica que a União dará aos Estados,
com os serviços federais de aperfeiçoamento do magistério e o desen-
volvimento da pesquisa pedagógica em cada região.
O Prof. Anísio Teixeira, em apoio desta conclusão, acrescenta:
"Achando-se em condições de estudar e pesquisar todos os sistemas
estaduais, poderá (a União) levar a um a experiência do outro,
constituindo-se dêste modo, graças aos centros federais de aperfei-
çoamento do magistério, a bolsa de valores de tôda a educação
nacional e estendendo a cada um e a todos os benefícios da variada
e rica experimentação educacional de 22 sistemas de educação".
Note-se bem que o eminente educador fala em Centros Federais de
Aperfeiçoamento do Magistério. Não pode haver confusão, nem com-
petição, com a formação do magistério que deverá continuar a ser dos
Estados e ali apenas estimulada e aperfeiçoada pela ação federal,
com modelos e experimentações variadas. Nem o Estado deverá
se julgar desobrigado de preparar o magistério, função precipuamente
sua, nem a União deverá se propor substituí-lo e sim apenas assisti-lo
com medidas de aperfeiçoamento, experimentos e iniciativas de
caráter nitidamente complementar.
Não atinamos, pois, com o cabimento na sistemática da nova
lei de outros "Centros Federais de Educação", nos diversos Estados.
Tais Centros, nos esquemas que têm sido timidamente divulgados,
constituiriam verdadeiras Delegacias, não instaladas nem mesmo na
vigência da lei centralizadora da qual seriam peças naturais e indis-
pensáveis. Sôbre o assunto tivemos oportunidade de nos manifestar,
individualmente, em reunião no Ministério da Reforma Administra-
tiva. O anteprojeto, então apresentado, que continha a simples indi-
cação dos Centros Federais, foi por nós combatido sob o argumento
de que se pretende continuar uma política intervencionista nos
Estados, disfarçada em institucionalização da ajuda federal. Dis-
pensável é conhecer as funções que terão esses órgãos, cuja só
presença seria uma contradição com a nova ordem educacional.
A nosso ver, para que a função supletiva federal se desen-
volva salutarmente com os sistemas estaduais, prestigiando-os e
valorizando-os, não há por que sejam centralizados os serviços
federais e entregues a funcionários que disporão de tôda a máquina
para competir com a Secretaria de Educação do Estado.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 5

Defende-se a criação dos Centros com o argumento de que uma


ação uniforme dará maior eficiência à assistência financeira e técnica
da União. Voltemos, porém, às primeiras linhas destas notas, quando
consideramos o poder político da administração. É preciso bem
medi-lo para não haver ilusões quanto aos projetados Centros
Federais. Os Estados mais necessitados serão exatamente presa
fácil dessa nova fonte de poder, necessariamente contaminada pela
impureza da ação arbitrária e caprichosa.
A projeção administrativa federal nos Estados deverá ser, por
serviço, descentralizada, dominantemente de assistência técnica e
de cooperação com o Estado, sob a forma quiçá de missões educa-
cionais, junto às Secretarias de Estado da Educação, mas sem
qualquer institucionalização específica. Será a forma de preservar
uma influência exclusivamente técnica, despida de qualquer discri-
minação de ordem pessoal ou partidária.
Os Centros Federais de Treinamento (ou de Aperfeiçoamento)
do Magistério são, por definição, escolas complementares, que nada
têm a ver com aplicação de verbas, realização de obras, nomeação
de pessoas, instrumentos prediletos da ação política no sentido
vulgar e inferior da expressão.
No Conselho Federal temos defendido a tese da preservação
desse órgão de uma excessiva hipertrofia burocrática. Temos
sustentado que o Conselho preferencialmente deve utilizar os
serviços da Secretaria de Estado para realizar levantamentos, pes-
quisas, estatísticas, verificações, inspeções, etc. Organizar tais
serviços no próprio Conselho seria transformá-lo num superminis-
tério, ao invés do órgão técnico que êle deve ser. Analogamente,
parece-nos absurdo centralizar e burocratizar a ajuda da União aos
Estados, em matéria de educação. O assunto é por demais delicado
e frágil para que se possa submetê-lo à prova de fogo das compe-
tições pessoais. Não esqueçamos que, normalmente, o poder adminis-
trador é o mais político (no sentido nobre da expressão) e deve
assim estar o mais possível defendido das oportunidades de distorção
e erro. Ê o que dispõe de maior arbítrio legal (e nem falemos das
outras formas de arbítrio).
Por tudo isso a educação deve ter um sistema de segurança a
defendê-la do arbitrário e do político.

PÉRICLES MADUREIRA DE PINHO

Diretor do C.B.P.E.
Estudos e debates

PLANO E FINANÇAS DA EDUCAÇÃO

ANÍSIO S. TEIXEIRA

Da Universidade de Brasília

Na comunicação que me cabe fazer, neste primeiro encontro dos


representantes dos Conselhos Estaduais de Educação com o Conselho
Federal de Educação, cumpre-me acentuar quanto os serviços educa-
tivos, ao contrário do que por vezes se pensa, são grandes serviços
materiais a desafiar, em suas proporções, quaisquer outros serviços da
sociedade.
A escola, com efeito, compreende inversão econômica do mais
alto vulto em edificações e equipamento e emprega massa de pessoal
técnico e de serviço, numeroso e diversificado, em proporções supe-
riores, sem dúvida, durante a paz, aos próprios serviços de defesa
de um país. Em suas edificações, constitui um dos mais complexos
conjuntos, neles incluindo-se os elementos da residência humana, dos
serviços de alimentação e saúde, dos esportes e recreação, da biblio-
teca e museu, do teatro e auditório, oficinas e depósitos, sem falar
no que lhes é privativo, ou sejam as salas de aulas e os laboratórios.
A arquitetura escolar, por isso mesmo, inclui todos os gêneros de
arquitetura. É a escola, em verdade, o lugar para aprender, mas
aprender envolve a experiência de viver, e dêste modo todas as ativi-
dades da vida, desde as do trabalho até as de recreação e, muitas
vezes, as da própria casa.
Se, ao lado disto, considerarmos a população a que deve servir, ou
seja, todas as crianças de 6 a 12 anos, depois, sólida percentagem dos
que se acham entre os 13 e 18, no ensino médio, e, em proporção
substancial, os de 18 a 24 e ainda, por fim, percentagem que começa
a ser considerável de adultos, e tivermos em conta o exército de
professôres, técnicos de tôda ordem e pessoal necessários ao comando
e execução de tamanha atividade humana, podemos com segurança
reconhecer que se trata do mais alto e mais complexo serviço exis-
tente em qualquer sociedade organizada.
Para melhor o conhecermos, imaginemos o Brasil com seus 14
milhões de crianças a educar durante seis anos, mais pelo menos
5 milhões de adolescentes a educar por mais seis ou sete anos e,
pelo menos, meio milhão a estudar em universidades e instituições de
ensino pós-secundário. Com essa massa de pessoas presentes em
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 7

nosso espírito, idealizemos apenas üm dos elementos materiais p a r a


a construção desse m u n d o escolar, o das áreas de terrenos necessários
para oferecer a tais crianças, adolescentes e adultos condições de
aprendizagem, que já sabemos i m p o r t a m em n a d a menos do que
as de viver e t r a b a l h a r , em dias completos de esforço e a t i v i d a d e :
serão necessárias áreas p a r a os numerosos conjuntos de escolas pri-
márias e de escolas secundárias e p a r a os vastos complexos das uni-
versidades, que corresponderão a muitas cidades, onde virão estudar,
t r a b a l h a r , recrear-se e viver cerca de 20 milhões de brasileiros. E
não há no Brasil u m a cidade sequer que t e n h a tido o cuidado de
fazer, p o r lei, as reservas necessárias de terrenos p a r a um sistema
educacional a d e q u a d o .
Não é, e n t r e t a n t o , isto q u e mais desejo s u b l i n h a r senão a gran-
deza esmagadora do e m p r e e n d i m e n t o m a t e r i a l e h u m a n o que repre-
senta mas escolas, e m p r e e n d i m e n t o que supera em extensão o das
fábricas, o dos hospitais, o dos esportes e recreação, o dos teatros
o museus, o dos demais serviços públicos, o dos transportes e até o
do comércio. Sòmente talvez o volume das casas p a r á residência da
p o p u l a ç ã o será maior que o das escolas. Digo, talvez, p o r q u e se as
casas se fizerem apenas o lugar de dormir do cidadão m o d e r n o ,
t a m b é m as casas p o d e r ã o ocupar m e n o r espaço que o das escolas
com as áreas a d e q u a d a s à variedade de suas funções e atividades.
Serviço desse vulto e dessa complexidade n ã o é, pois, serviço
apenas de pessoal a crescer caprichosa e e s p o n t a n e a m e n t e , mas ser-
viço a exigir p l a n o , sistematização, divisão de t r a b a l h o e de res-
ponsabilidade, e mais q u e t u d o finanças adequadas. Se o país pre-
cisa de plano ferroviário, de p l a n o rodoviário, de planos urbanísticos,
de planos hospitalares, etc., e t c , m u i t o mais precisará de plano es-
colar. E p a r a o p l a n o , de finanças adequadas, sólidas e seguras.
São estes os dois aspectos que desejo e x a m i n a r em face da Lei de
Diretrizes e Bases, sob cuja égide a q u i nos r e u n i m o s . Creio q u e , pela
p r i m e i r a vez, temos u m a lei de educação que fere ambos os pontos.
Dedica a lei à m a t é r i a , com efeito, n a d a menos que um dos seus
títulos-, c o m p r e e n d e n d o cinco longos artigos, com quarenta e três
disposições em seus artigos, parágrafos, letras e alíneas. Não falta-
r a m assim n e m ênfase n e m mesmo certa abundância. Faltaram
contudo clareza e espírito de sistema.
U m a lei de educação é algo, e n t r e t a n t o , que não existe p o r si
mas flutua sôbre o m a r das instituições políticas e sociais da nação
e, sob esta luz, é q u e se há de considerar aquêles dispositivos e
interpretá-los.
Que dispõe a lei? Acompanhemo-la artigo p o r artigo: fixa o
montante dos recursos nas três órbitas de governo — m u n i c i p a l , esta-
dual e f e d e r a l ; distribui o m o n t a n t e federal em três fundos iguais de
ensino — p r i m á r i o , médio e s u p e r i o r ; o r d e n a q u e se elabore plano,
por prazo determinado, p a r a cada fundo; declara que os Estados, o
8 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Distrito F e d e r a l e os Municípios não podem solicitar auxílio da União


se não a p l i c a r e m o m í n i m o percentual previsto na Constituição
F e d e r a l p a r a a m a n u t e n ç ã o e desenvolvimento do e n s i n o ; ordena
q u e os recursos sejam aplicados preferencialmente no ensino público,
de acordo com planos estabelecidos pelo Conselho Federal e pelos
Conselhos Estaduais, de sorte que se assegurem acesso à escola do
maior n ú m e r o possível de educandos, melhoria progressiva do ensi-
no e aperfeiçoamento dos serviços de educação, desenvolvimento do
ensino técnico-científico e desenvolvimento das ciências, letras e a r t e s ;
define p a r a efeito de c u m p r i m e n t o do dispostivo constitucional o
q u e seja despesa de ensino, d a í excluindo as de assistência social e
hospitalar, as de auxílios e subvenções p a r a fins de assistência e
cultura e as decorrentes do art. 199 da Constituição e do Ato
de Disposições Transitórias. Isto nos arts. 92 e 93. Pelo art. 94,
cria o regime de bôlsas-de-estudos e o de financiamento de es-
tudos, d e t e r m i n a n d o que os quantitativos da União p a r a esse fim
sejam transferidos aos Estados, ao Distrito F e d e r a l e aos Territórios,
cujos conselhos devem organizar os serviços de bolsas fundados em
prova de capacidade. No art. 95, fixa a lei as formas de cooperação
financeira e n t r e a U n i ã o e os Estados, Municípios e particulares,
q u e c o m p r e e n d e r ã o subvenção direta, empréstimos e assistência
técnica e no art. 96 dispõe sôbre custo do ensino e as medidas
a d e q u a d a s p a r a ajustá-lo ao m e l h o r nível de p r o d u t i v i d a d e .

São, como se vê, dispositivos que i m p l i c a m colaboração e coope-


ração e n t r e as três áreas de governo — m u n i c i p a l , estadual e federal.
N ã o há, e n t r e t a n t o , algo de expresso com respeito à integração das
três áreas de ação n u m p r o g r a m a sistemático e comum. As refe-
rências a planos do Govêrno F e d e r a l e dos Governos Estaduais
deixam contudo claro q u e cabe ao a d m i n i s t r a d o r e ao político de
educação a r m a r as estruturas dos serviços educativos do país, p a r a o
efeito de distribuir e n t r e os três governos a imensa tarefa, oferecer
condições a d e q u a d a s à sua realização efetiva, t o r n a r possíveis o de-
senvolvimento dos planos de educação previstos e d a r sábia orien-
tação às suas finanças.
E m b o r a não haja disposição expressa que vede a atividade de
algum dos três governos em n e n h u m a área de educação, determi-
n a n d o o art. 11 da lei q u e a União, os Estados e o Distrito Federal
organizem os seus sistemas de ensino, o que parece indicar a existên-
cia de um sistema federal de ensino, similar aos dos Estados e
Municípios, o art. 13 dispõe que a União organizará o ensino público
dos Territórios e estenderá a ação federal supletiva a todo o país,
nos estritos limites das deficiências locais.
Deflui daí ser legítima a interpretação que confira aos Estados
o dever p r i m o r d i a l de organizar sistemas educacionais completos e
considere o da União supletivo aos dos Estados, com exceção dos
sistemas dos Territórios. Como ação supletiva, pois, é que a União
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 9

m a n t é m a p a r t e do ensino superior do país, algumas escolas médias


de demonstração e o ensino técnico, agrícola e agronômico. Além
dessa ação, cabe-lhe dar auxílio financeiro aos sistemas estaduais de
educação e oferecer assistência técnica, visando ao aperfeiçoamento
do magistério, à pesquisa pedagógica e à promoção de congressos e
seminários.
D e n t r o dessa interpretação, q u a n d o a lei dispõe que a União,
p o r intermédio do Conselho F e d e r a l de E d u c a ç ã o , elaborará o P l a n o
de Educação p a r a execução em prazo d e t e r m i n a d o , de referência a
cada um dos F u n d o s de Educação p o r ela criados respectivamente
p a r a o ensino p r i m á r i o , o médio e o superior, com obediência ao
princípio da preferência pelo sistema público de ensino (art. 93) e
nos limites das deficiências locais, torna-se claro que a lei subentende a
ação sinérgica das três ordens de a u t o r i d a d e — federal, estadual e
m u n i c i p a l — no d e s e m p e n h o dos respectivos deveres em face da
educação nacional. Os planos de educação federais — um p a r a
cada F u n d o , constituindo os três o P l a n o Nacional de Educação —
devem coordenar a ação nacional e articular-se com os planos es-
taduais de educação, a q u e a lei faz expressa referência e a ser elabo-
rados pelos Conselhos Estaduais de E d u c a ç ã o , os quais, p o r sua vez,
devem coordenar esforços municipais e com eles articular-se.
E n t r e as atribuições destes últimos, encontra-se, com efeito, a de
que cabe ao Município o levantamento das crianças do seu território
em i d a d e escolar e a sua convocação à matrícula aos 7 anos de
idade. Esta c h a m a d a das crianças, na órbita do m u n i c í p i o , u n e o
p o d e r m u n i c i p a l ao Estado, no c u m p r i m e n t o da obrigatoriedade es-
colar, e o Estado p o r sua vez vê-se articulado com o p o d e r da
União pelo direito de solicitar auxílio federal p a r a a m a n u t e n ç ã o
e desenvolvimento dos seus esforços q u a n t o à educação dos seus
habitantes, desde que p a r a tal fim já t e n h a utilizado os seus recursos
até os limites determinados pela Constituição e pela Lei de Diretrizes
e Bases.
Foi d e n t r o desse conceito de cooperação integradora que o Con-
selho Federal de Educação elaborou o P l a n o Nacional de Educação,
distribuído p o r três planos de aplicação dos recursos específicos de
cada F u n d o de Educação. Não se a c h a n d o elaborados os planos
estaduais de educação, e desconhecendo-se com precisão os "estritos
limites das deficiências locais" a que se refere expressamente a lei,
o p l a n o nacional constitui u m a formulação dos objetivos nacionais
da educação, nos três níveis de ensino, a indicação das prioridades
com que devem ser atendidos e o m é t o d o pelo qual o auxílio federal
p o d e r á ser concedido e deverá ser aplicado p a r a q u e aquêles objeti-
vos possam ser atingidos. Ao estabelecer esse m é t o d o , o Conselho
tomou conhecimento dos extraordinários contrastes econômicos e n t r e
os Estados, examinou os seus serviços educacionais do ponto-de-vista
estatístico, e fixou um princípio da mais alta relevância, ou seja, o
10 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

de q u e o auxílio é em 7 0 % inversamente proporcional à riqueza


per capita do Estado, e em apenas 3 0 % p r o p o r c i o n a l à p o p u l a ç ã o ,
p r o c u r a n d o , dêste m o d o , t o r n a r o auxílio federal um fator da gradual
e progressiva equalização dos recursos de educação em todos os
Estados Brasileiros. N i n g u é m deixará de perceber a i m p o r t â n c i a
desse princípio no que diz respeito à igualdade de oportunidades
educativas em tôda a nação.
Além disto, o plano nacional, ao indicar o m o d o de aplicação do
auxílio federal, q u a n t o ao ensino p r i m á r i o e m é d i o , estabeleceu as
n o r m a s p a r a a fixação do custo de educação e instituiu um sistema
de financiamento p a r a os investimentos a longo p r a z o dos serviços
educacionais. Trata-se de princípios de p l a n e j a m e n t o e organização
sem os quais esses serviços dificilmente p o d e r ã o desenvolver-se sa-
tisfatoriamente.
À vista do disposto no art. 93, que d e t e r m i n a que a aplicação
dos recursos de educação previstos na Constituição e na lei seja feita
de acordo com o plano federal, fazendo expressa referência t a m b é m
a planos estaduais, elaborados pelos respectivos Conselhos, de sorte
q u e se assegurem o "acesso à escola de m a i o r n ú m e r o possível de
educandos e a m e l h o r i a progressiva do ensino e o aperfeiçoamento
dos seus serviços", tornou-se possível considerá-los planos interde-
pendentes e complementares e, dêste modo, prever-se sua m ú t u a
articulação, com o estabelecimento de n o r m a s comuns de ação.
P o r essas n o r m a s estabelecidas pelo Conselho F e d e r a l foram fi-
xados p a r a o ensino p r i m á r i o e médio os limites com as despesas de
pessoal (até 7 0 % , do total d e s p e n d i d o ) , com a administração do
ensino (até 7% do t o t a l ) , com as de e q u i p a m e n t o e m a t e r i a l didático
( m í n i m o de 13%) e com as de prédio ( m í n i m o de 10% para con-
servação e c o n s t r u ç ã o ) . Em relação a estas últimas, ou seja, as
destinadas às edificações, recomenda o p l a n o federal que os recursos
atribuídos à construção de escolas v e n h a m a constituir um fundo
p a t r i m o n i a l p a r a o l a n ç a m e n t o de empréstimos a longo e curto p r a z o ,
ficando o m o n t a n t e a n u a l de 1 0 % das despesas globais da educação
adstrito ao p a g a m e n t o dos juros e amortizações de tais empréstimos.
Em vez de se p e r d e r nas minúcias e detalhes de projetos espe-
cíficos de educação, hoje t ã o em moda e tão necessários p a r a atender
requisitos de pedidos de auxílios internacionais, o c h a m a d o P l a n o
Nacional de Educação, elaborado pelo Conselho F e d e r a l de Edu-
cação, p r o c u r o u estabelecer as metas de crescimento impostas pela
lei p a r a os serviços escolares da nação e r e c o m e n d a r um conjunto de
princípios, normas ou critérios p a r a os planos estaduais de educação,
e cuja elaboração, como sugere a lei, deve levar em conta o
auxílio federal, q u e cabe aos Estados solicitar à União.
Competindo à União, com efeito, esse auxílio aos Estados, nos
limites de suas deficiências, cumpria ao Govêrno F e d e r a l indicar o
modo pelo qual esse auxílio financeiro l h e iria ser atribuído, a fim
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

de que as deficiências quantitativas ou qualitativas — ou seja o


acesso à escola do m a i o r n ú m e r o possível de educandos e a m e l h o r i a
progressiva do ensino nos têrmos do art. 93 da lei — pudessem ser
atendidas. Dêste m o d o , o plano nacional constitui o q u a d r o d e n t r o
do qual se irão elaborar os planos estaduais. Com a assistência
financeira, assegura-se o c u m p r i m e n t o da meta quantitativa e em
p a r t e da qualitativa — pois melhores recursos asseguram melhores
serviços — m a s será pela assistência técnica (art. 95, letra 6) a
ser prestada p o r m e i o dos serviços federais de aperfeiçoamento do
magistério e da pesquisa pedagógica, que a União irá d a r a sua
contribuição mais específica. Realmente, achando-se em condições
de estudar e pesquisar todos os sistemas estaduais, p o d e r á levar a
um a experiência do o u t r o , constituindo-se, dêste m o d o , graças aos
centros federais de aperfeiçoamento do magistério, a bolsa de va-
lores de tôda a educação nacional, estendendo a cada um e a todos
os benefícios da variada e rica experimentação educacional de vinte
e dois sistemas estaduais de educação.
Os Senhores Conselheiros Federais e Estaduais h ã o de p e r d o a r
q u e n ã o encerre esta exposição sem algumas considerações aparen-
temente óbvias, mas necessárias, sôbre os problemas que suscitam o
p l a n e j a m e n t o e o financiamento da educação. N ã o faltam os q u e
julgam difíceis e abstratos tais problemas, a exigirem estranhos refi-
namentos técnicos. Longe de m i m não reconhecer q u e os serviços
educacionais devidamente desenvolvidos em tôda sua extensão apre-
sentam dificuldades p a r a ajustá-los às delicadas situações de mão-de-
obra, de m e r c a d o de t r a b a l h o e da vida em constante renovação da
sociedade m o d e r n a .
Estamos, e n t r e t a n t o , em estágio b e m mais singelo. O que impor-
ta, entre nós, é sair do capricho, da desordem, do a r b í t r i o — justifi-
cáveis p o r q u e no passado n ã o t í n h a m o s o u t r o propósito senão o
de educar uns poucos p a r a as tarefas mais a p a r e n t e m e n t e necessárias
da vida pública e social do país — p a r a um p r o g r a m a de ação
ordenada e t a n t o q u a n t o possível sistemática, t e n d o em vista a
educação p r i m á r i a do " m a i o r n ú m e r o possível" de crianças brasi-
leiras em idade escolar, ou seja, q u a t r o a seis anos de estudos e n t r e
7 e 14 anos, a educação média de n ú m e r o substancial de jovens e n t r e
12 e 18 e a educação de nível superior a adultos a p a r t i r de 18 anos
em n ú m e r o suficiente p a r a a constituição dos q u a d r o s científicos e
profissionais da vida nacional, m a n t e n d o em todos esses programas
rigoroso critério de igualdade de o p o r t u n i d a d e s .
A idéia ou o propósito de agir planejadamente e não anàrqui-
camente corresponde, assim, a ordenar a nossa ação, levando em
conta as necessárias prioridades, a fim de gradual e sistematicamente
atingirmos certos objetivos quantitativos e qualitativos que t e n h a m
sido fixados. P a r a isto, é evidente que se fará necessário um mí-
n i m o de organização dos serviços educacionais, p a r a o efeito de
12 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

contarem eles com o p o d e r necessário de conduzir ação planejada.


Constituem assim pré-requisitos p a r a esta ação saber o q u e queremos
fazer, dispor de órgãos capazes de ação administrativa coerente e
sistemática, sem falsa divisão de meios e fins, em q u e os setores de
meios sejam incompetentes e os de fins impotentes, e reconhecer os
recursos de que dispomos p a r a delimitar os nossos planos. H a v e n d o
tais condições, os planos defluirão quase por si mesmos. Não exis-
t i n d o elas, podemos elaborar os planos mais perfeitos, que n a d a
se seguirá.
Qualquer atividade h u m a n a deficilmente terá êxito se não fôr
planejada. Temos de planejar o nosso dia, p l a n e j a r o nosso tra-
b a l h o , planejar a nossa diversão. Q u a l q u e r boa dona de casa sabe
o que acontecerá se não planejar o seu t r a b a l h o de direção da casa.
E nós, professôres, sabemos b e m o que é u m a aula não planejada.
E o diretor da escola, m e l h o r do q u e ninguém, o que será não ter
o t r a b a l h o escolar devidamente planejado. P l a n o , pois, não é ne-
n h u m a novidade n e m algo q u e somente estranhos especialistas em
planos saibam fazer. Aliás, o difícil é conceber alguém que seja
especialista em planos sem que seja especialista no que esteja plane-
j a n d o . E isto é q u e parece estar ocorrendo com a idéia de que agir
p l a n e j a d a m e n t e seja algo diverso de agir c o m p e t e n t e m e n t e . Ora,
serão competentes os q u e sabem planejar, mas n a d a saibam do que
estejam p l a n e j a n d o ? Deixaram, p o r acaso, de ser planejados os
sistemas escolares organizados no século passado e no começo dêste
século nas nações h o j e desenvolvidas? Está claro que não ignoro
que sabemos hoje m u i t o mais porque planejamos e o que planejamos.
Insistamos, p o r é m , e a isto apenas quero chegar, em q u e planejar é
um p r o b l e m a p r i m e i r o de poder. Depois, de querer. É indispensá-
vel que q u e m t e n h a o p o d e r queira planejar a sua ação. A seguir,
é um p r o b l e m a de competência e de m é t o d o . Especialistas apenas
em métodos de p l a n e j a m e n t o poderão ajudar os competentes mas n ã o
substituí-los. Contudo, o mais i m p o r t a n t e é que queira p l a n e j a r q u e m
tiver o p o d e r de dirigir a ação a ser planejada.
Vejamos como se p õ e o p r o b l e m a brasileiro do p l a n e j a m e n t o
educacional. P r i m e i r o , os recursos. Dispomos de 2 0 % da receita dos
municípios. De 2 0 % da receita dos Estados. De 12% da receita da
União. Há que saber, p r i m e i r o , se tais recursos se t o r n a r ã o de ver-
d a d e disponíveis. E q u e m t e m o p o d e r de dispor sôbre sua apli-
cação? No p l a n o m u n i c i p a l — comecemos p o r aí — - o Prefeito e
a Câmara dos Vereadores. Querem estas autoridades disciplinar a
sua p r ó p r i a ação e submeter-se a um p l a n o de t r a b a l h o ? Imaginemos
q u e t e n h a m a veleidade de fazê-lo. Mas, dirão, falta-lhes a técnica do
planejamento. Será isto v e r d a d e ? Pela Lei de Diretrizes e Bases
o p r i m e i r o dever do m u n i c í p i o é o levantamento, pelos nomes, pelas
famílias e pelos locais de residência, das crianças em idade escolar,
a fim de se proceder à c h a m a d a p a r a a m a t r í c u l a das crianças de
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 13

7 anos, na sede do m u n i c í p i o , nos distritos e em cada cidade, vila e


localidade do seu território. Tal levantamento criará um estado de
consciência no m u n i c í p i o e fornecerá os primeiros dados p a r a a lo-
calização das escolas e a avaliação do grau da deficiência local do
sistema. H a v e r á alguma dificuldade intransponível p a r a a efeti-
vação dessa m e d i d a ? Caso houvesse, seria impossível deixar de
l e m b r a r que ela não p o d e r á verificar-se casa haja cooperação
com as autoridades estaduais no m u n i c í p i o . Os oficiais de registro
civil deverão fornecer os dados relativos ao nascimento das crianças
e as autoridades deverão acolher as crianças chamadas à matrícula.
É evidente que só com esse serviço se terá estabelecido a necessária
articulação e n t r e as autoridades municipais e as estaduais.
Sejamos, contudo, realistas. N a d a disto se faz p o r q u e o pro-
blema escolar t e m baixa p r i o r i d a d e entre os problemas municipais.
E m b o r a isto esteja m u d a n d o , o p r i m e i r o problema n ã o é tanto o de
p l a n e j a m e n t o q u a n t o o de se assegurar essa p r i o r i d a d e . A lei já a
assegurou com a fixação do m í n i m o de um q u i n t o da receita p a r a
a educação. O p r o b l e m a , p o r t a n t o , é mais político do q u e verda-
deiramente técnico. Disposto o p o d e r m u n i c i p a l ao c u m p r i m e n t o
da lei e levado a efeito o levantamento das crianças em i d a d e escolar,
q u a l a dificuldade p a r a o plano? P r i m e i r o , conhecer os três sistemas
escolares existentes no m u n i c í p i o — o das suas p r ó p r i a s escolas, o
das escolas estaduais e o das escolas particulares. Isto posto, não
será difícil i m a g i n a r a localização de suas escolas sem duplicar as
demais. E dêste m o d o se terá iniciado o processo de ação coordenada
e n t r e as autoridades municipais e estaduais, que se sentirão inte-
grantes da c o m u n i d a d e e conscientes e parcipantes do e m p r e e n d i -
m e n t o comum. Até aí não haverá dificuldades técnicas intranspo-
níveis, sendo as maiores as do m a p a das circunscrições municipais,,
da localização das crianças pela residência e da fixação dos terrenos
a serem cedidos ou adquiridos p a r a a construção das escolas e a
dos projetos p a r a essas escolas, no que será lícito prever a coope-
ração e n t r e o governo estadual e os governos municipais.
P o r que, e n t r e t a n t o , soa, como algo de u t ó p i c o , movimento assim
tão óbvio p a r a o l a n ç a m e n t o das bases do p l a n o m u n i c i p a l , que irá,
com os seus elementos, integrar o p l a n o estadual? P o r dificuldades
técnicas? P o r falta de saber e competência? N ã o me parece.
Antes será p o r falta de articulação e n t r e os dois sistemas de ensino
— o m u n i c i p a l e o estadual —- mas, sobretudo p o r q u e n e m u m ,
nem outro têm o propósito de fazer obra planejada, sob o pretexto
de que os recursos não bastam p a r a isto e pelo motivo real de ser
mais interessante fazer obra ocasional, de demonstração, nos têrmos
modernos, p r o m o c i o n a l em q u e o m é r i t o individual do realizador
fique b e m acentuado. Se a obra fôr sistemática, metódica, planejada,
as coisas p e r d e r ã o esse feliz ar de milagre, de proeza e, além disto,
14 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

não beneficiarão as pessoas que desejamos servir mas indiscrimina-


damente a todos. Sei de municípios que construíram e mantêm gi-
násios e alguns bem suntuosos e outros até escolas superiores, antes
de cuidar do ensino primário para todos.
A primeira e maior dificuldade de ação planejada, de plane-
jamento educacional não é técnica mas de vontade, de propósito, de
aceitação da idéia e de sua institucionalização na vida das auto-
ridades municipais e estaduais. É, em realidade, política. É ne-
cessário que a obra do governo municipal, ou estadual, seja coman-
dada pelo interesse de todos e não pelo interesse de alguns. É ne-
cessário que o político local ou o político estadual reputem a ação
planejada mais útilmente política que a não planejada. E pará isto
nada poderá mais contribuir do que a presente ênfase em planeja-
mento, desde que não se esqueça que planejamento envolve mais que
tudo a vontade local, a vontade estadual e por último a vontade
federal, não logrando resultado qualquer planejamento de cúpula,
salvo quando representar esforço para a coordenação, articulação e
sistematização dessas três áreas de vontade.
Por tudo isto, é que considero importante êste encontro de auto-
ridades estaduais e federais. A Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação Nacional, sob vários aspectos, é uma lei de reforma básica.
A participação do Govêrno Federal nas três órbitas do ensino, com
fundos federais iguais, correspondentes no mínimo, cada um deles,
a 3,6% da receita federal, importará em mais do que dobrar muitos
Estados os recursos locais para a educação. Em face destes fundos,
torna-se possível organizar as finanças educacionais e elaborar os
planos estaduais à luz dos princípios, critérios e normas constantes
dos planos de auxílio federal e da própria Lei de Diretrizes e Bases.
Estabelecidos que fossem tais propósitos comuns, está claro que
ainda não ocorreria o milagre. Há que inventariar o sistema exis-
tente, calcular o custo do aluno segundo os critérios do plano fe-
deral e projetar sua expansão dentro desse custo, com as correções
que parecerem aconselháveis no sistema antigo e tendo em vista os
objetivos fixados na lei e no plano federal. Surgirá, porém, como
problema dominante, o do prédio escolar. Que se fará a respeito?
Estaremos aí diante do mesmo problema da casa nas áreas urbanas.
Muito poucos são os que podem construir com dinheiro à vista a
sua residência. Há que recorrer ao crédito. Qual o sistema escolar
que irá ter crédito para empréstimos? Aí é que parece ter suma
importância a constituição do fundo de empréstimo escolar. Dez
por cento do auxílio federal constituirão a soma inicial para esse
fundo. A eles se deverão juntar outros 10% da despesa global de
educação do Estado e, sempre que possível, dez por cento da des-
pesa de educação de cada município. Criado esse fundo, a emissão
de Obrigações Escolares se tornaria possível. Com tais apólices, ini-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 15

ciar-se-ia o processo de e m p r é s t i m o p o r subscrição local nos m u n i -


cípios, por subscrição geral no Estado e p o r depósito em bancos p a r a
empréstimos diretos. O p l a n o de construções em cada m u n i c í p i o
constituiria o p r o g r a m a p a r a o e m p r é s t i m o . Atrevo-me a a c r e d i t a r
que, se fôr e l a b o r a d o o plano de empréstimo com a devida correção
contra a inflação, essas obrigações p o d e r ã o constituir o q u e foram
as Caixas Econômicas antigas, o verdadeiro depósito das economias
populares. Sem institucionalizar-se esse regime de e m p r é s t i m o p a r a
as edificações escolares e a sua conservação, continuará a ser êste
p r o b l e m a tão aflitivo, que n e n h u m outro existirá. E d u c a r se fará
o exclusivo p r o b l e m a de construir escola. Políticos, educadores,
administradores se a t i r a r ã o a essa tarefa, p o r q u e somente ela criará
os beneméritos da educação. A d u r a , séria e h u m i l d e tarefa de orga-
nizar a escola, de aperfeiçoar-lhe o ensino e de conduzir a obra
de educação se constituirá obra irrelevante, p o r q u e a administração,
o governo, tôda a administração, todo o governo entrou a t r a b a l h a r ,
como se diz hoje, isto é, a construir. Construir n u n c a foi a tarefa
específica dos governos. As cidades transformam-se hoje cèleremente
com as casas de a p a r t a m e n t o s e as residências coletivas e nunca pas-
sou pela cabeça de alguém celebrizar algum governo por se ter
Copacabana feito o suntuoso b a i r r o que todos conhecemos. Quem
construiu C o p a c a b a n a ? A especulação imobiliária. Que é a espe-
culação imobiliária? O e m p r é s t i m o em período de inflação p a r a a
aquisição de imóveis. Estarei, por acaso, r e c o m e n d a n d o u m a impos-
sível especulação com prédios escolares? Jamais o faria. Mas
empréstimos p a r a construções escolares, sob p l a n o que efetivamente
oferecesse a segurança contra a inflação, parece-me algo até sábio.
E com isto, voltaríamos a olhar seriamente p a r a a organização esco-
lar. p a r a a m a n u t e n ç ã o do ensino, p a r a seu m e l h o r a m e n t o progres-
sivo, que, isto sim, é a o b r a que conta, embora não se possa fazer
sem que o p r é d i o se construa.
No conjunto de medidas que, dêste m o d o , se institucionalizariam
para a i m p l a n t a ç ã o e o funcionamento dos sistemas escolares, estaria
a correção de m u i t a s distorções, entre as quais não é a m e n o r a de
se p r o c u r a r fugir de um plano integrado e n t r e municípios e Estados
e, depois, e n t r e estes e o governo federal. Logo que assim se cogitar
do todo, melhorando-se o sistema escolar em conjunto, desaparecerá
a luta p o r determinados aspectos e com ela a possibilidade do en-
grandecimento pessoal pelos que se devotam a obras acidentais ou
a esforços p u r a m e n t e parciais em nosso grande esforço comum pela
educação nacional.
Não sairemos do acidental p a r a o planejado com o auxílio p u r o
e simples dos técnicos de p l a n e j a m e n t o , e m b o r a n ã o desconheça sua
ação educativa, mas, com o desenvolvimento de nossa m a t u r i d a d e
política e com a revelação, que ela nos t r a r á , de q u e agir p l a n e j a d a

2
16 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

e sistematicamente é agir politicamente e, talvez, a forma de colher


melhores resultados políticos. Adotadas as n o r m a s , princípios e cri-
térios do p l a n o nacional de educação, nos Municípios, nos Estados
e na União, abre-se um largo campo p a r a a atividade política coope-
r a r , sobretudo nos planos de empréstimos p a r a os prédios, da sua
localização, dos seus projetos e da sua e x e c u ç ã o . ' Lembremo-nos que
será t u d o isto o b r a cooperativa e complexa, em que o p o d e r e a ação
de líderes se fará e x t r e m a m e n t e necessária.
GINÁSIO MODERNO

GILDÁSIO AMADO

Do C.BP.E.

Até 1930, a organização do ensino brasileiro tinha em vista


quase só as camadas da sociedade financeiramente mais favorecidas.
A estas era acessível o ensino superior, que por seu turno dominava
o ensino secundário, concebido então como preparatório para as
academias. O próprio ensino primário, por seus programas e mé-
todos, acorrentava-se a êste sistema consagrado à conservação de
privilégios de uma minoria. A escola era homogênea, nos seus
fins, nos seus processos, em sua clientela. Impregnava-a o acade-
niicismo de um a outro extremo. Circunscrita a esses limites, suas
preocupações não iam além do domínio pedagógico puro e de uma
pedagogia sem complexidades, adequada a um tipo de ensino seletivo
e ornamental.
Com o crescimento do ensino primário e do ensino secundário,
em aceleração depois de 1930, foi que se acentuou no país o dualismo
educacional que na época já estava superado ou em fase de supe-
ração nos países mais adiantados.
Houve assim no Brasil, entre 1930 até hoje, um duplo movi-
mento. Um no sentido da democratização do ensino, de generali-
zação do ensino elementar e do ensino secundário; o outro, de reação
a êste, de caracterização de dois sistemas escolares, o do povo e o da
elite. A economia do país, em mudança, e suas conseqüências so-
ciais e políticas, forçavam a procura das escolas pelo povo. Ao
mesmo tempo consolidava-se a duplicidade de sistemas.
A educação primária estaria ao alcance e seria suficiente para
as classes populares; quando muito, se tivessem de ir adiante, a
elas reservar-se-iam cursos vocacionais ou profissionais que, mesmo
quando classificados como de segundo grau, eram realmente escolas
de educação pós-primária, terminal, com o caráter de preparo direto
e utilitário para o trabalho.
O ensino secundário guardaria suas características tradicionais.
Seria, como ainda acentuava a reforma de 1942, o ensino para a

Palestra efetuada na Associação Brasileira de Educação, em 29 de outubro


de 1963.
18 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

p r e p a r a ç ã o das individualidades condutoras, isto é, "dos homens


que deverão a n i m a r as responsabilidades maiores dentro da socie-
dade e da nação".
O dualismo vertical prolongava-se h o r i z o n t a l m e n t e . No primá-
rio, diferenciava-se o ensino público, acessível ao povo, e o ensino
privado, p a r a os q u e pudessem pagar anuidades. O p r i m e i r o , su-
perlotado, teve que reduzir horários e restringir atividades. O se-
gundo. mais desofogado, orientava-se d i r e t a m e n t e no sentido da pre-
paração p a r a o ginásio. Assim, o ensino p r i m á r i o p a r t i c u l a r dava
maiores possibilidades de ingresso no ensino m é d i o , tanto mais q u a n t o
sua clientela, por suas origens, por 6eu p a d r ã o de vida, pelo nível
do a m b i e n t e familiar, apresentava condições propícias p a r a enfren-
tar, com sucesso, as provas de admissão. Q u a n t o ao ensino médio,
esteve êle (e ainda está, em larga m a r g e m ) sob o d o m í n i o da idéia
de superioridade do ensino secundário tradicional. Êste tipo de ensi-
no foi, p o r m u i t o t e m p o , o c a m i n h o único p a r a as escolas superiores.
E r a a chave p a r a a conquista da situação nas classes dominantes.
Os outros tipos de ensino e r a m , p o r sua n a t u r e z a , curtos; q u e r o dizer,
p a r a aquêles cujo destino, d e t e r m i n a d o p o r condições de classe social,
seria, na m e l h o r hipótese, o e m p r e g o d i r e t o nas oficinas, nos balcões,
nos escritórios, etc.
A atitude dos governos brasileiros foi de grande interesse pelo
c h a m a d o ensino secundário, mas n ã o pela m a n u t e n ç ã o direta de es-
colas desse r a m o . O curso secundário era nacional. Escolas do
governo e particulares subordinavam-se a numerosas regras federais.
I m p u n h a o governo federal a esse t i p o de ensino exigências m u i t o
mais rigorosas q u e aos cursos profissionais. Fiscalização mais severa
das instalações e dos atos escolares. Controle m u i t o m a i o r da qua-
lificação do professorado. Diploma de F a c u l d a d e de Filosofia pas-
sou-se a exigir p a r a o ensino secundário. E r a dispensável p a r a o
ensino comercial, i n d u s t r i a l e agrícola. P a r a ensinar português,
história, geografia, m a t e m á t i c a , ciências, línguas vivas, no curso se-
cundário, era preciso ser d i p l o m a d o . Nos cursos profissionais, n ã o .
Desinteressando-se pela m a n u t e n ç ã o d i r e t a de escolas secundárias,
o governo central, e n t r e t a n t o , não recusava, ao contrário, distribuía,
em larga escala, verbas p a r a a sua m a n u t e n ç ã o ou criação. Não o
fazia, p o r é m , obedecendo a u m a política geral, ou, sequer, a um mé-
todo. E r a u m a distribuição de todo assistemática, e fragmentária, de
recursos, originada no Congresso, p o r iniciativas isoladas de seus
m e m b r o s . E, em sua m a i o r p a r t e (mais de 8 0 % ) p a r a o ensino par-
ticular, o que, a p a r de implicações com interesses eleitorais imedia-
tos, era um c o m p o r t a m e n t o que, conscientemente ou n ã o , favorecia
ou reforçava o dualismo. Beneficiavam-se aquêles que já t i n h a m
escola e, mais ainda, os que p o d i a m pagar o que lhes fosse cobrado.
Convergia quase t u d o , dessa forma, p a r a o grupo favorecido. Acen-
tuava-se a desigualdade, e não a igualdade de o p o r t u n i d a d e s . A
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 19

maior preocupação era m e l h o r a r a educação dos que já a p o d i a m ter.


E não, ou só s e c u n d a r i a m e n t e , a de a m p l i a r q u a d r o s , m u l t i p l i c a r
matrículas, oferecer novas o p o r t u n i d a d e s .
Sob essa forma de aplicação de recursos p a r a os que já gozavam
de benefícios, ou ainda, sob a da acentuação do prestígio, da impor-
tância, dos rigores do ensino secundário, em relação ao ensino pro-
fissional, participava o governo do processo de consolidação do dua-
lismo que, como já frisei, correu p a r a l e l a m e n t e ao movimento de
expansão da educação secundária, que as novas forças da sociedade,
a u m e n t a n d o ao r i t m o do progresso econômico, desencadearam.
Cresceu e x t r a o r d i n a r i a m e n t e o ensino. Estendeu-se às camadas
populares, que já não se contentavam com o ensino p r i m á r i o nem
com seus complementos vocacionais. Aspiravam ao ensino secundá-
rio. Os ramos profissionais, dêste desarticulados, não interessavam.
Essa separação i m p e d i u que se encaminhasse a massa de estudantes
p a r á os ensinos adequados às suas capacidades. Quase tôda foi le-
vada p a r a um ensino acadêmico que, hipertrofiando-se, teve que
ajeitar-se, acomodar-se a um p a d r ã o inferior.
Propósitos q u e se revelaram no sentido já n ã o diremos de fusão
mas de m a i o r identificação dos ramos, ou simplesmente de sua mais
fácil comunicação, e n c o n t r a r a m resistências e se a n u l a r a m ou des-
virtuaram.
Surge agora, com esse objetivo, o p r o j e t o dos ginásios modernos,
que constituem o t e m a desta palestra.
Antes, porém, de focalizá-los e, se possível, caracterizá-los, não
nos parece fora de propósito sintetizar aqui o que os povos mais
adiantados estão realizando ou p r o j e t a n d o na l i n h a dos mesmos
objetivos que a n i m a m essa tentativa brasileira.
Os Estados Unidos já apresentavam, no começo do século, um
sistema piíblico de educação, unificado e contínuo. Na E u r o p a , o
movimento de unificação iniciou-se p r o p r i a m e n t e depois da Pri-
meira Guerra Mundial. Só então, no velho continente, começaram a
ter repercussão profunda as idéias de educação universal, da igual-
d a d e de oportunidades educacionais, da distribuição dos privilégios
da educação na base da capacidade individual e não de posição
social e econômica.
Na Inglaterra, a lei Fisher (1918), elevando p a r a 14 anos a
obrigatoriedade da educação, a b r i u c a m i n h o p a r a a generalização
do ensino ulterior ao p r i m á r i o . Aos 11 anos, haveria o encami-
n h a m e n t o p a r a a escola pós-primária, seletiva ou n ã o seletiva, isto é,
p a r a a escola secundária tradicional ou p a r a as outras formas que,
depois da referida lei, se foram organizando, d i r e t a m e n t e por ini-
ciativa das autoridades locais da educação, sem legislação especial
sôbre a matéria, como o p e r m i t i a o r e g i m e descentralizado que
s e m p r e foi u m a das características do sistema inglês de educação.
20 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

E n t r e t a n t o , nessa fase do processo de ampliação das o p o r t u n i d a d e s


educacionais, evoluiu o sistema inglês de educação com a marca do
dualismo. Paralela à educação secundária tradicional, criava-se um
tipo de ensino posterior ao p r i m á r i o , que não eqüivalia ao segundo
grau. E r a u m p r o l o n g a m e n t o daquele. N e n h u m vínculo, n e n h u m a
p a r i d a d e e n t r e um o outro, o q u e a p r ó p r i a d e n o m i n a ç ã o dos novos
cursos (escolas p r i m á r i a s superiores) frisava. N e m era t a n t o como
reflexo do princípio de igualdade que se a b r i a m as novas oportuni-
dades. E r a m u i t o mais p o r imposição de fatôres econômicos. O
crescimento progressivo da indústria forçava a p r o c u r a de operários
instruídos. P a r a um c o m p l e m e n t o de educação, abrir-se-lhes-iam as
portas das escolas p r i m á r i a s superiores, que m i n i s t r a v a m elementar
a p r e n d i z a d o profissional com tinturas de cultura geral.
Com a Segunda G u e r r a M u n d i a l , acelerou-se o processo de mu-
dança. Mesmo antes, em 1939, elevava-se a obrigatoriedade escolar
a 15 anos. Mas, foi o Education Act, de 1944, q u e consagrou os
princípios q u e v i n h a m f e r m e n t a n d o a evolução educacional na Ingla-
terra. C o n f i r m a n d o a extensão da obrigoriedade escolar, e admi-
t i n d o mesmo que ela pudesse atingir, logo que o permitissem as con-
dições econômicas do país, aos 16 anos, unificava o Education Act o
sistema. Em vez de tipos distintos e fechados, com clientelas pró-
prias, recrutadas n ã o p o r critérios escolares m a s p o r critérios sociais,
as três ordens de ensino passariam a constituir fases, sucessivas e
contínuas, e com total equivalência horizontal.
Na França, o m o v i m e n t o de reforma seguiu as mesmas linhas
gerais. D u r a n t e a P r i m e i r a Guerra Mundial, foi lançada a proposta
da escola única. De 1929 a 1933, estabeleceu-se a gratuidade de
educação secundária. Em 1936, a idade da freqüência escolar obri-
gatória elevava-se de 13 a 14 anos. Mas, foi depois da Segunda
G u e r r a M u n d i a l q u e se definiram os rumos da reconstrução educa-
cional, na França. A i n d a em Argel, o governo francês traçava di-
retrizes gerais de reforma. Proclamava-se que a igualdade de opor-
tunidades educacionais era corolário dos princípios de justiça social
c de reconhecimento da dignidade h u m a n a . Em 1946, surgia o re-
latório Langevin, q u e acentuava a urgente necessidade de adaptar-se
a estrutura educacional à estrutura social " d a nova era da mecani-
zação, da utilização de outras fontes de energia, do desenvolvimento
dos meios de t r a n s p o r t e e comunicação, da concentração industrial,
do a u m e n t o da p r o d u ç ã o , do ingresso das m u l h e r e s na vida
econômica".
A reforma — são palavras do relatório — deve realizar, na me-
dida compatível com a diversidade das aptidões individuais, a igual-
d a d e de todas as crianças diante da educação, p a r a p e r m i t i r a cada
u m a , no interesse de todas, desenvolver p l e n a m e n t e sua personalidade.
O dualismo teria que ser substituído p o r um sistema u n o , divi-
dido em camadas horizontais, que permitissem o e n c a m i n h a m e n t o
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 21

dos alunos, q u a l q u e r q u e fosse sua origem, p a r a o gênero de estudos


que m e l h o r conviesse às suas aptidões. O ensino elementar, sem a
distinção a r b i t r á r i a de um ensino especial p a r a a clientela dos li-
ceus e colégios, continuar-se-ia, sem q u a l q u e r obstáculo, p o r um ciclo
de orientação de q u a t r o anos, com um ensino essencialmente de
cultura geral, segimido-se-lhe então ensinos mais ou menos espe-
cializados.
A n i m a v a m p r o f u n d a m e n t e o projeto Langevin a idéia de ensino
comum, com o grau de flexibilidade que permitisse alcançar a va-
r i e d a d e de aptidões, e a idéia de estabelecimentos comuns, que re-
cebessem todas as crianças, estabelecendo cedo, entre elas, "con-
tatos q u e c o n t r i b u i r i a m para a suficiente u n i d a d e da nação", pois
não seria " s e p a r a n d o a j u v e n t u d e em clãs estranhos uns aos outros
ou em categorias como a dos futuros manuais e a dos futuros inte-
lectuais que se faria nascer a compreensão m ú t u a " .
E r a , n a t u r a l m e n t e , d o m i n a n t e , nessa concepção de escola, o
princípio da orientação. Abolido, em conseqüência da extensão da
obrigatoriedade escolar, o exame de ingresso no ensino de segundo
grau, substituía-se esse processo b r u t a l e instantâneo de seleção pela
orientação lenta e contínua, baseada em critérios pedagógicos e ao
longo de um ciclo inteiro de estudos.
Tôda essa reformulação de um ensino, q u e era antes p a r a um
grupo restrito, rigorosa e a r b i t r a r i a m e n t e escolhido, e p a r a um t i p o
único de cultura, de base essencialmente intelectual, e que agora
seria p a r a todos, devendo levar em conta a natureza de cada u m ,
e com objetivos mais amplos, de iniciação à cultura geral, em todos
os seus aspectos, e de iniciação ou mesmo de p r e p a r o profissional,
exigia completa revisão de princípios e métodos pedagógicos. O en-
sino p a r a a cultura do espírito, através do t r e i n o m e n t a l , teria que
dar lugar a outras formas em que se equilibrassem os aspectos abstra-
tos e concretos, teóricos e práticos.
Vários projetos sucederam-se ao da Comissão Langevin, guar-
dando-lhe o sentido geral, embora com modificações que nem s e m p r e
eram superficiais. N e n h u m deles, p o r é m , logrou ser oficializado,
antes de 1961. As novas idéias pedagógicas, e n t r e t a n t o , t i v e r a m pe-
netração, p r i n c i p a l m e n t e através da experiência das "classes nouvel-
les". N a q u e l e ano, com fundamento na nova Constituição, o atual
governo decretou a reforma, que amplia para 16 anos a obrigato-
r i e d a d e escolar, cria o ciclo de observação (já não de q u a t r o , como
no projeto Langevin, mas de dois a n o s ) , tronco comum dos estudos
de grau médio.
Em resumo, todo o movimento educacional nas duas grandes
democracias européias, girava em t o r n o do princípio, que inspirava
a educação americana, da substituição do sistema d u p l o , baseado em
diferenças de classe, p o r um sistema integrado, fundado na igualdade
de oportunidades.
22 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

As dificuldades dessa integração encontram-se p r i n c i p a l m e n t e na


educação de grau médio. Nesse nível é que mais se opõem a tra-
dição e a renovação. E, em verdade, no regime de igualdade de
oportunidades, a educação do adolescente é p r o b l e m a e x t r e m a m e n t e
complexo. I g u a l d a d e de o p o r t u n i d a d e s não significa que a educação
deva ser a mesma p a r a todos; ao contrário, ela deve ser em grande
p a r t e diferenciada. O ensino deve p r e p a r a r p a r a as tarefas comuns,
p r o p o r c i o n a n d o os conhecimentos, idéias e ideais, que devem cons-
tituir o conteúdo c o m u m de que todos precisam p a r a , como partes
integrantes vivas da sociedade, d e s e m p e n h a r e m aquelas tarefas.
Mas, o ensino tem q u e considerar t a m b é m as capacidades, os interes-
ses, as ambições que, na adolescência, se afirmam e se diferenciam, e
p r o c u r a r conduzi-los no sentido que favoreça seu mais completo
desenvolvimento.
Aí é que está o p r o b l e m a . Como atender a essa d u p l a finalidade?
Como organizar um ensino ao mesmo t e m p o c o m u m e diferenciado,
p a r a todos os adolescentes? Tipos de escolas, formas de cursos,
currículos, processos de orientação? U m a escola com todos os
cursos ou escolas separadas?
A aproximação m a i o r dos cursos, q u a n d o não a completa fusão
de cursos e escolas, é tendência geral. O regime de ensinos sepa-
rados, mesmo nas nações menos desenvolvidas, o n d e ainda domina,
não se tem p o d i d o m a n t e r sem maiores ou menores concessões. É
a equivalência dos cursos: separados, n i t i d a m e n t e diferentes, mas
equivalentes, em seus efeitos formais. É u m a equivalência menos
formal, m a i o r semelhança de currículos e convergência de objetivos:
um ensino secundário menos acadêmico e um ensino profissional
menos utilitário. É mesmo a identificação parcial dos cursos: um
tronco comum.
Na América do N o r t e , a escola secundária de cursos gerais con-
tinua fortemente consolidada. Apesar das críticas que lhe são diri-
gidas, n ã o há perspectivas de m u d a n ç a do conceito de que ela é "a
realização do ideal americano do ensino ern u m a democracia".
Admite-se que ela n ã o esteja a t e n d e n d o satisfatoriamente a seu
objetivo fundamental de promover a u n i d a d e e a solidariedade social;
que as distinções de classe de fora da escola nela se refletem, afe-
t a n d o todas as suas atividades. Mas, afirma-se que esses problemas
não i m p l i c a m o fracasso do sistema. I n d i c a r i a m eles — é a opinião
de Conant — tão-sòmente que o p l a n e j a m e n t o da estrutura educa-
cional americana não t e m levado em conta, suficientemente, a so-
ciologia. Esse p l a n e j a m e n t o — diz o autor citado — se t e m firmado,
em p a r t e demasiado g r a n d e , na suposição de que não existem divisões
econômicas, políticas e religiosas, na sociedade americana, o que,
na maioria das comunidades, não é exato.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 23

A crítica m a i s constante ao sistema compreensivo é, p o r é m , a


de sua quase n u l a preocupação pelos estudantes de capacidade inte-
lectual superior. A idéia de escolas separadas, p a r a alunos de capa-
cidade diversa — são palavras de K a n d e l l — é t o t a l m e n t e repelida
pela convicção de que um sistema educacional democrático não p o d e
tolerar u m a segregação q u e promova a estratificação social ou inte-
lectual. Mas, diz Conant, não há razões q u e i m p e ç a m que os alunos
mais dotados t e n h a m u m a boa educação na escola secundária geral.
Existe u m a falsa antítese — é ainda Conant — na m e n t e de muitas
pessoas (educadores, inclusive) entre a educação p a r a todos e a edu-
cação p a r a os especialmente dotados. E a f i r m a : se se deseja que a
escola secundária pública americana continue a c u m p r i r sua missão,
deve eliminar-se tôda idéia de oposição entre essas duas funções.
Na I n g l a t e r r a , o n ú m e r o de escolas compreensivas é ainda limi-
tado. Generalizam-se elas no condado de Londres, p o r influência po-
lítica do p a r t i d o trabalhista, q u e ali domina há vários anos. Os
conservadores, e n t r e t a n t o , as combatem. Q u e r e m q u e as três moda-
lidades de ensino, grammar school, m o d e r n o e técnico se conservem
separadas, dirigindo-se os alunos p a r a esta ou aquela, segundo suas
aptidões diagnosticadas através de exame, testes, apreciação do
aproveitamento no curso p r i m á r i o , etc. Receiam q u e a grammar
school seja absorvida e a n u l a d a pela escola compreensiva.
E n t r e t a n t o , o u t r a política, q u e representa " u m compromisso
britânico e n t r e as duas ideologias", ganha adeptos em todo o país.
É o sistema de escolas multilaterais. Na impossibilidade de realizar
o t i p o perfeito de estabelecimento de ensino completo (escola com-
preensiva) , a experiência se desenvolverá, diz um dos comentadores,
provavelmente sob a forma de federações de escolas clássicas, mo-
dernas e técnicas, ou de grupos escolares pela geminação dos dois
primeiros ou dois últimos tipos. Cada u m a das partes do estabele-
cimento terá um diretor de estudos, mas o conjunto não deixará
de ser u m a só escola, que se reconstituirá nas h o r a s dos encontros
esportivos e, em geral, das atividades extraclasses.
O q u e divide mais a opinião inglesa, em t o r n o dos sistemas
compreensivos ou não, é o p r o b l e m a do e n c a m i n h a m e n t o , à e n t r a d a
no segundo grau. A escolha p r e m a t u r a ( p r o b l e m a que não existe
no sistema compreensivo) seria a negação do p r i n c í p i o da igualdade
de o p o r t u n i d a d e s . Aos 11 anos, as aptidões estão indefinidas. De-
t e r m i n a r o ensino certo, nessa fase, é impossível. E a escolha pre-
m a t u r a é fator de segregação econômica. 0 filho de família abas-
tada irá p a r a a grammar school; se logo não ingresse, p o d e esperar
o ano seguinte. O estudante p o b r e terá q u e seguir o ensino prático,
de curta duração.
0 r i t m o da reforma na França tem sido mais lento, p a r a o que
terá influído provavelmente o regime de centralização. Os novos
projetos, de 1959 e 1961 (êste convertido em lei) são potencialmente
24 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

ricos. Além da extensão da escolaridade obrigatória à idade de


16 anos, da ligação contínua do ensino elementar com os primeiros
anos do segundo grau (ciclo de observação), além do tronco comum
de todos os ensinos desse grau (gerais e técnicos), a d m i t e m e reco-
m e n d a m — e esta é u m a de suas mais i m p o r t a n t e s disposições — o
g r u p a m e n t o das diferentes formas de ensino da terceira e quarta
séries n u m mesmo estabelecimento, permitindo-se a passagem em
q u a l q u e r época de u m a p a r a outra, o q u e i m p o r t a prolongar de
certa forma o p e r í o d o de observação, além do q u e representa essa
r e u n i ã o dos ensinos na mesma escola como a p r o f u n d a m e n t o da
integração.
Destacamos da exposição de motivos ao projeto de 1959 (muito
semelhante ao de 1961) o trecho seguinte: " É , pois, ao mesmo
t e m p o , pela instituição de um tronco c o m u m e pela organização dos
diversos ramos do ensino diversificado em estabelecimentos comuns,
que o presente p r o j e t o t e n d e a abolir os preconceitos e as tradições
tão tenazes na h i e r a r q u i a dos estabelecimentos e das matérias, assim
como o cloisonnement social q u e caracteriza ainda o sistema escolar
francês.
No Brasil, não houve m u d a n ç a de grande i m p o r t â n c i a , depois
de 1930. Os ramos de ensino c o n t i n u a r a m estranhos uns aos outros.
T o d o movimento p a r a assimilá-los ou, simplesmente, p a r a lhes dar
equivalência, encontrou oposição, aberta ou surda, e foi r e d u z i d o a
proporções insignificantes, q u a n d o n ã o de todo anulado.
A experiência levada a efeito no antigo Distrito F e d e r a l , em
1932, p o r Anísio Teixeira, r e u n i n d o no mesmo ensino cursos secundá-
rios, normais, comerciais e industriais, n ã o p ô d e subsistir, apesar do
sucesso que obteve.
As reformas Campos e C a p a n e m a p r o c u r a r a m d a r ao ensino
secundário u m sentido menos propedêutico. Atribuíam-lhe d u p l a
finalidade de educação básica, t e r m i n a l , e de p r e p a r o p a r a estudos
superiores. T e o r i c a m e n t e , o ginásio teria o caráter de u m a segunda
etapa geral da educação. Mas, na prática, a estrutura do curso, in-
flexível, com um e n o r m e conjunto de matérias, todas obri-
gatórias, controriava aquêles pressupostos. A natureza seletiva do
curso n ã o se alterou. O ginásio n ã o deixou de ser um degrau p a r a
o nível seguinte, acessível a poucos, i n a d e q u a d o p o r seu a c e n t u a d o
academicismo, p o r seu terrível enciclopedismo, à maioria dos que,
em massa o p r o c u r a v a m . O ginásio representava o verdadeiro en-
sino. Os cursos profissionais e r a m "ensinos especiais". O ginásio
dava direito à m a t r í c u l a em q u a l q u e r segundo ciclo. Os cursos
básicos do ensino técnico, não.
E n t r e t a n t o , n ã o deixou de crescer a corrente que lutava (o seu
m a i o r líder é, sem dúvida, Anísio Teixeira) pela democratização do
ensino médio, reformado em seus métodos e processos, em seus cur-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 25

rículos, estreitamente vinculados ou mesmo fundidos seus ramos, re-


construído p a r a que pudesse ser, ao mesmo t e m p o , pela u n i d a d e de
conteúdo e multiplicidade de formas, o ensino p a r a todos, sem dis-
tinções outras que não fossem as determinadas pelas diferenças de
capacidades e tendências individuais.
Refletiu-se esse p e n s a m e n t o nos primeiros projetos da lei de
Diretrizes e Bases (1948), que acentuavam a necessidade de ser con-
siderado "o ensino m é d i o , como um todo, fugindo à antiga e anti-
democrática bipartição e n t r e profissões intelectuais e m a n u a i s , atra-
vés de u m a franca flexibilidade de todo o ensino m é d i o , garantida
por u m a série de articulações entre os diversos ramos que o consti-
t u e m e de articulações com o ensino superior".
Isso era ainda u m a p r i m e i r a aproximação. Estabeleciam-se
vínculos e n t r e os dois campos, mas conservando-os n i t i d a m e n t e sepa-
rados, como ainda hoje os m a n t é m a lei p r o m u l g a d a , embora n ã o
t a n t o como nos projetos primitivos.
H a v i a m amadurecido, e n t r e t a n t o , aquelas idéias no p e n s a m e n t o
da maioria dos educadores e dos p r ó p r i o s legisladores, que as inse-
r i r a m em lei, na c h a m a d a lei da equivalência (1953). O que esta
lei estabelecia era j u s t a m e n t e o que t i n h a m p r o p u g n a d o os elabora-
dores dos primeiros projetos das Diretrizes e Bases. A possibilidade
de promoção não só do p r i m e i r o ciclo secundário p a r a os segundos
ciclos dos outros anos, como o inverso, a passagem dos primeiros
ciclos destes ramos p a r a o colégio secundário. Mas, neste caso, ainda
com restrições que os regulamentos da lei agravavam, t o r n a n d o ,
pode-se dizer, inconsistente a equivalência. T e r i a que h a v e r aprova-
ção em exames das disciplinas que bastassem p a r a completar o ginásio.
Aos concluintes do segundo ciclo não secundário, p a r a efeito de inscri-
ção nos vestibulares, opunham-se restrições semelhantes. O que a lei
estabelecia não era, de fato. um regime de equivalência, já o obser-
vava J a y m e A b r e u , em 1953; e r a m possibilidades de adaptação.
Adaptação exigida só n u m s e n t i d o : dos cursos profissionais p a r a o
secundário. No sentido oposto, a passagem era i n t e i r a m e n t e livre.
Havia assim na lei da equivalência, ainda, um a b u n d a n t e resíduo da
concepção de dois ensinos de valores desiguais p a r a clientelas de
categorias distintas.
Em 1957, registra-se u m a iniciativa do Ministério da E d u c a ç ã o
que teve significação no processo de reorganização do ensino de se-
gundo grau. T r a m i t a v a no Senado um projeto de reforma do en-
sino secundário, que se originara na Câmara, d u r a n t e o longo período
em que ali esteve p a r a d o o projeto das Diretrizes e Bases. P r o -
pusemos ao ministro Clóvis Salgado q u e u m a comissão estudasse
aquela reforma. A comissão, de que fazíamos p a r t e , com Anísio,
Montojos e outros, sugeriu fosse proposta ao Senado a revisão do
projeto, p o r q u e "a reorganização do novo ensino secundário estava
a exigir alterações mais profundas que as nele preconizadas". As
26 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

principais propostas e r a m : a) a constituição do curso ginasial com


um tronco c o m u m de dois anos e um ensino diversificado na 3 . a e
4. a séries. Admitia-se, nesse ensino diversificado, a inclusão de dis-
ciplinas de iniciação técnica; b) completa equivalência dos vários
ramos de ensino. A passagem de um p a r a o o u t r o seria livre, isto é,
sem exames de adaptação. Esta far-se-ia p o r m e i o de cursos de
integração ou de reorientação nos p r ó p r i o s estabelecimentos em que
se matriculassem os alunos.
O tronco comum de que tratávamos, naquela ocasião, era limi-
tado ao ensino secundário, p o r q u e a reforma visava exclusivamente
a êste setor. Mas, dizíamos: q u a n d o da tramitação da lei de Dire-
trizes e Bases, a idéia será r e t o m a d a p a r a que os outros ramos do
ensino m é d i o a ela se a d a p t e m .
O Senado n ã o aceitou as sugestões, que, e n t r e t a n t o , foram incluí-
das depois na lei de Diretrizes e Bases. A idéia de tronco comum,
que a lei adotou, teve origem, p o r t a n t o , no t r a b a l h o daquela Co-
missão. Como, da mesma forma, as idéias, igualmente vitoriosas, da
inclusão no currículo ginasial de disciplinas de iniciação técnica e da
equivalência t o t a l dos cursos.
Ao mesmo t e m p o em que o ensino secundário fazia essas ten-
tativas de sair do rígido esquema em que fora aprisionado, de se
t o r n a r mais diferenciado, de até incluir disciplinas de iniciação
técnica, em outro setor do ensino m é d i o criavam-se condições legais
que lhe t e r i a m p e r m i t i d o evoluir no sentido de sua m a i o r identifi-
cação com o ensino secundário. Refiro-me à reforma do ensino
industrial, de fevereiro de 1959; sem dúvida u m a de nossas leis de
ensino mais i m p o r t a n t e s , mais ampla, mais renovadora, q u e a lei
de Diretrizes e Bases, n a q u e l e c a m p o . Ali, o ensino i n d u s t r i a l bá-
sico é concebido sem n e n h u m caráter de especialização profissional.
É um curso de educação geral — são palavras da lei — cujo objetivo
é a m p l i a r os fundamentos da cultura e explorar as aptidões do
e d u c a n d o , desenvolver suas capacidades, orientá-lo na escolha de
o p o r t u n i d a d e s de t r a b a l h o ou de estudos ulteriores. É um curso t ã o
geral como o ginásio secundário. N a d a mais é que u m a v a r i e d a d e
dêste.
Abria-se c a m i n h o , assim, p a r a q u e se reunissem e funcionassem
n u m só corpo aquêles dois ramos, variedades do mesmo ensino, com
os mesmos objetivos. P a r a q u e se eliminasse t u d o o q u e ainda os
separava, a começar pelas denominações. P a r a que se confundissem
i n t e i r a m e n t e suas áreas na administração geral e nas escolas. N ã o
havia mais razão p a r a que tivesse n o m e especial êste ou aquêle
curso. Nomes diferentes como ginásio secundário ou ginásio indus-
t r i a l a n u l a r i a m em grande p a r t e os efeitos integrativos a q u e a lei,
de certo, visava. A existência de u n i d a d e s escolares isoladas, umas
na área do ensino industrial, outras na do ensino secundário, have-
r i a m necessariamente de refletir e a l i m e n t a r os pressupostos de n ã o
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 27

igualdade de valor dos dois ensinos. F o i com o propósito de reduzir


q u a n t o possível esse inconveniente q u e à comissão i n c u m b i d a de re-
gulamentar os ginásios industriais propusemos (fevereiro de 1961)
que pudessem os cursos destes ginásios funcionar nas p r ó p r i a s escolas
secundárias, o que, além das vantagens educacionais, teria a de ser
u m a solução mais econômica. Aproveitar-se-ia a grande r e d e de
ginásios secundários, adaptando-os àquela finalidade. A sugestão foi
aceita, mas foram criados todos os obstáculos à sua efetivação. Per-
deu-se essa o p o r t u n i d a d e de fazer evoluir o ginásio brasileiro para o
ginásio geral, o p o r t u n i d a d e que agora ressurge com a iniciativa dos
ginásios m o d e r n o s .
As tendências no sentido da unificação do ensino consolidaram-se
depois de 1961. Acolheram-na os dois últimos governos.
A mensagem presidencial ao Congresso, em 1961, expressamente
traduzia política nesse sentido. F r i s a n d o que no ensino m é d i o residia
o p o n t o nevrálgico do p r o b l e m a educacional que no i n u n d o atual
enfrentam todos os países civilizados, e a c e n t u a n d o q u e já não se
pode compadecer a sociedade democrática com um sistema dual de
ensino, um supostamente intelectual, p a r a constituir etapa p r o p e -
dêutica ao ensino superior, e o u t r o de t i p o vocacional, destinado às
classes menos favorecidas, p u n h a em relevo a m e n s a g e m o prin-
cípio da i g u a l d a d e de o p o r t u n i d a d e s educacionais, em q u e todos
tivessem possibilidades de ascender aos níveis m a i s altos da escala
educacional, sem outras limitações que as oriundas de suas capa-
cidades e aptidões.
No p r o g r a m a de educação, apresentado à Conferência de San-
tiago do Chile, em m a r ç o de 1962, o governo brasileiro, depois de
acentuar a concentração de matrículas em currículos do tipo acadê-
mico, que constituem m e r o i n s t r u m e n t o de acesso a um curso su-
perior, incapaz de a t e n d e r aos poucos (30%) q u e concluem o curso,
dizia:
" T a l situação não se corrigirá com a expansão das escolas espe-
ciais agrícolas, industriais e comerciais, que p r e s e n t e m e n t e acolhem
reduzido n ú m e r o de alunos, em oposição às escolas de c u l t u r a acadê-
mica. Na realidade, tôda a estrutura do ensino m é d i o deve li-
bertar-se desse conceito dualista de educação supostamente humanís-
tica p a r a a elite e educação supostamente técnica e específica p a r a
o povo, característica das condições culturais do 6éculo XIV. É
característica de nosso século a universalização desta fase do ensino
p a r a o p r o l o n g a m e n t o da educação comum, visando a redistribuição
proporcional da p o p u l a ç ã o nas áreas comerciais, agrícolas e indus-
triais. É claro que essa escola m o d e r n a , e m b o r a e x t r e m a m e n t e di-
versificada, não exige currículos especificamente profissionais n e m
igualmente os supostos de cultura geral".
28 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Assim, o governo brasileiro, a p a r t i r de 1961, definia claramente


u m a política integrativa, p a r a o ensino médio. Em vez de escolas
dêste ou daquele r a m o , incentivava a instituição de ginásios inte-
grados. Naquela época, estava nos seus primeiros dias de aplicação
a Lei das Diretrizes e Bases. N ã o era nela que se calcava o projeto
dos ginásios m o d e r n o s , mas na legislação do ensino industrial, que
certamente n ã o p o d e r i a oferecer fundamentos p a r a o novo t i p o de
ensino, com a v a r i e d a d e de opções q u e por sua p r ó p r i a natureza
teria que abranger. A Lei de Diretrizes e Bases dar-lhe-ia funda-
mentos mais amplos, p r i n c i p a l m e n t e pela extensa variedade de cursos
q u e admite, com flexibilidade de currículos e facilidades de arti-
culação. Do ensino acadêmico aos de caráter a c e n t u a d a m e n t e prático
ou de iniciação profissional, u m a série de possibilidades curriculares
se oferecem a um t i p o de ginásio total, como é ou pelo menos de-
veria ser o v e r d a d e i r o ginásio m o d e r n o .
As características dos ginásios modernos esboçavam-se naquele
documento a que nos referimos. Seriam — dizia-se ali — educan-
dários integrados, destinados a m i n i s t r a r todos os cursos de nível
médio, p e r m i t i n d o ao aluno maior variedade de currículo e fa-
cilidades de p r e p a r a ç ã o profissional aos que não lograssem concluir
o curso e precisassem encaminhar-se p a r a o t r a b a l h o .
I n c o r p o r a d o ao P l a n o T r i e n a l de Educação, como u m a de suas
metas mais i m p o r t a n t e s , confirmava-se o projeto dos ginásios mo-
dernos, que ali recebiam caracterização, mais precisa, de educan-
dários orientados p a r a a educação p a r a o t r a b a l h o , p o r i n t e r m é d i o de
cursos comuns com opção p a r a prática de comércio, indústria ou
agricultura.
A expressão " p r e p a r a ç ã o profissional", da definição anterior, era
substituída pela "educação p a r á o t r a b a l h o " , c e r t a m e n t e mais
adequada.
Nos documentos complementares do Plano T r i e n a l relativos ao
assunto, alinhavam-se e n t r e os objetivos dos ginásios m o d e r n o s os
seguintes:
a) d a r a conhecer aos alunos os princípios científicos gerais e
o valor social e econômico da p r o d u ç ã o m o d e r n a ; b) desenvolver
atitudes e hábitos positivos em relação às atividades técnicas, a p a r t i r
do m a n e j o dos instrumentos mais simples da p r o d u ç ã o e do funcio-
n a m e n t o das e m p r e s a s ; c) eliminar q u a l q u e r antinomia e n t r e tra-
b a l h o intelectual e t r a b a l h o técnico, através da inclusão obrigatória
no currículo de práticas de t r a b a l h o , integrando-as com as matérias de
cultura geral.
Na l . a e 2. a séries, haveria iniciação nas práticas de t r a b a l h o .
O professor, especialmente p r e p a r a d o , identificaria as vocações, em
função das habilidades e interesses revelados pelos alunos. Inclui-
r i a m as práticas três ou mais técnicas e l e m e n t a r e s : artes gráficas,
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 29

trabalhos com m a d e i r a e elementos de cerâmica, na p r i m e i r a série;


trabalhos em m e t a l , eletricidade e noções de desenho técnico, na
segunda. Estas técnicas p o d e r i a m ser c o m p l e m e n t a d a s ou substituí-
das, p o r práticas de agricultura. P a r t e das tarefas administrativas
das oficinas deveria ser confiada aos alunos, que ao mesmo t e m p o
seriam levados a efetuar operações simples, como registro de en-
t r a d a e saída do m a t e r i a l , controle de custo e t c , o que daria
ensejo ao professor de apreciar vocações p a r a práticas de comércio.
Na 3 . a e 4. a séries, haveria p r o p r i a m e n t e iniciação p a r a o
trabalho. Em função das características regionais e locais, a escola
incluiria pelo menos duas das opções e, q u a n d o possível e acon-
selhável, as t r ê s : comércio, indústria e agricultura. Essa iniciação
teria em vista dar ao aluno "capacidade de a p r e n d e r a t r a b a l h a r " ;
não teria o caráter de t r e i n o profissional.
Esses dados são apenas um esboço de organização. Cabe, pelo
menos nos enunciados gerais do projeto, mais de u m a hipótese.
A mais longínqua, ao que me parece, é a do ginásio de cursos
gerais. N ã o que a lei a contrarie. Antes, ela dá m a r g e m a u m a
interpretação a m p l a dos ginásios modernos. P o r combinação das
disposições legais relativas ao ensino secundário e ao ensino técnico,
tôda u m a série de cursos tornar-se-ia possível, do t i p o acadêmico
aos de caráter pré-profissional. Conforme as inclinações dos alunos,
poderia variar o ensino das disciplinas gerais, no m á x i m o de 9,
exigindo p a r a o curso secundário, ao m í n i m o de 5, admissível nos
cursos técnicos. E, p a r a l e l a m e n t e , dar-se-ia ênfase m a i o r ou m e n o r
às práticas de t r a b a l h o , oferecendo não só destas como das disciplinas
gerais v a r i a d o elenco de opções.
Não creio que estejamos nesse c a m i n h o . Uma solução dessa
natureza exige recursos econômicos e pedagógicos acima das pos-
sibilidades atuais. Nem há m a t u r i d a d e de p e n s a m e n t o suficiente-
m e n t e generalizada, para realizá-la ou mesmo admiti-la.
N o u t r o extremo, estaria a hipótese de um currículo único, com
um conjunto fixo de disciplinas gerais e o b r i g a t o r i e d a d e das prá-
ticas de t r a b a l h o da p r i m e i r a à ú l t i m a série. T e r í a m o s , então, um
ginásio p a r a um fim d e t e r m i n a d o e não p a r a variados fins. P a r a
u m a certa clientela e não p a r a todos os tipos de alunos. Represen-
taria n ã o p r o p r i a m e n t e um ginásio novo, com u m a nova estrutura de
ensino. Nada mais seria em verdade que u m a forma de transição
entre os extremos acadêmico e profissional, q u a n d o n ã o , o que seria
pior, u m a soma, simples aposição de ensino especializado a ensino
geral, colocados um ao l a d o do outro sem as gradações, sem as flu-
tuações p r ó p r i a s da verdadeira diversificação do ensino baseado na
variedade de aptidões. P r o p o r c i o n a r i a um curso esquematizado, t ã o
sem m o b i l i d a d e como os q u e já existem. Seria além disso um ginásio
d e m e i o t ê r m o , u m ginásio p a r a estudantes m e d i a n a o u mediocre-
mente dotados.
30 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

E n t r e esses extremos, a nosso ver, deverão p r o c u r a r situar-se


os futuros ginásios m o d e r n o s brasileiros. Na 3. a e 4. a séries as prá-
ticas de t r a b a l h o n ã o seriam obrigatórias. Definidas as aptidões,
ainda que a p r o x i m a d a m e n t e , na l. a e 2.ª séries, o ensino das séries
finais deveria ser diferenciado, oferecendo formas com práticas de
t r a b a l h o , e outras sem elas, destinadas estas aos estudantes que reve-
lassem tendências p a r a estudos menos práticos ou mais abstratos.
Haveria, então, classes na 3. a e 4. a séries q u e i r i a m para as oficinas
ou p a r a as salas-escritórios ou p a r a os trabalhos agrícolas. E classes
sem essas atividades e, p o r t a n t o , com currículo de matérias de cultura
geral, que poderia a d m i t i r variações no sentido das ciências experi-
m e n t a i s ou das ciências sociais, etc.
Quando o projeto dos ginásios m o d e r n o s frisa o objetivo de
orientação p a r a o t r a b a l h o , o que me parece é q u e o inclui e n t r e
os objetivos gerais, considera a educação para o t r a b a l h o p a r t e da
educação geral, o que evidentemente não q u e r dizer que todo estu-
d a n t e de um ginásio deva ser iniciado p a r a o t r a b a l h o na indústria,
no comércio ou na agricultura. Está claro que isso seria u m a injus-
tificável limitação de objetivos. Um ginásio que exigisse obrigatória
e exclusivamente esse t i p o de ensino seria apenas mais u m a peça no
sistema de cursos separados. N e n h u m a contribuição efetiva t r a r i a
ao processo de unificação.
D e p e n d e r á a realização dos ginásios m o d e r n o s de inúmeros fatô-
res. Do p r e p a r o de professôres e diretores, do serviço de orientação
educacional, da compreensão dos pais. Sua adequação aos fins que
i n s p i r a r a m o projeto d e p e n d e r á sobretudo da u n i d a d e de pensamento
dos seus organizadores, dos planejadores e executores, da ação har-
mônica de administradores e educadores. Ora, essa u n i d a d e de fato
ainda não há. A reconstrução do ensino m é d i o , no sentido da inte-
gração de seus ramos, é p r o b l e m a estranho a vários setores adminis-
trativos, e é combatida aberta ou astuciosamente p o r outros. Vejamos
se o projeto conseguirá vencer as incompreensões e as resistências; se,
desta vez, daremos um passo r e a l m e n t e firme no ainda incerto, no
áspero caminho da democratização do ensino.
A PREPARAÇÃO DE CANDIDATOS A CURSOS
SUPERIORES NA GUANABARA

JAYME ABREU

Do C.B.P.E.

Quero agradecer ao meu prezado companheiro de trabalho,


Prof. Moreira de Sousa, as generosas palavras com que me distinguiu
e, do mesmo passo, explicar que só o atendimento aos imperativos da
amizade justifica minha presença hoje aqui.
Convocado ou, mais do que isto, intimado pelo nosso caro Presi-
dente da ABE a participar da série de palestras com que sua ini-
ciativa vem brindando nossa querida Associação, convertendo-a num
autêntico Fórum de debates sôbre a educação brasileira, que valeria
ser documentado em publicação, fiz-lhe sentir que o tema a ser ver-
sado não comportava, a esta altura, quanto a nós, mais do que
uma comunicação no estilo usual às notas prévias das sociedades
médicas.
É que a pesquisa bibliográfica e de observação direta que em-
preende sôbre o assunto, na Guanabara, com a nossa orientação, a
nossa assistente no CBPE, Prof.ª Nadia Cunha, e que deveria fun-
damentar esta exposição, não tem, até o momento, mais de 50% de
seu plano total de trabalho realizado.
Ainda assim, insistiu o Prof. Moreira de Sousa na data proposta
e por isso aqui estou conversando sôbre o assunto aquilo que já pode
ser conversado.

I. O mundo ignoto e abandonado dos "cursinhos"

Anísio Teixeira, certa feita, com a lucidez que lhe é própria,


disse do nosso chamado sistema educacional, que êle em verdade se
compunha de três sistemas declarados e estanques: o sistema do
sino primário, o sistema do ensino secundário, o sistema do ensino
superior. Se se quisesse levar mais longe esta análise, não seria
inexato dizer-se que o sistema do ensino secundário sequer é um todo

Palestra proferida na Associação Brasileira de Educação, em 2 de dezembro


de 1963.

3
32 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

integrado, u n o , coeso e articulado, composto q u e é de dois subsiste-


mas de características b e m diversas e circulação deficitária e emper-
r a d a : o subsistema do ginásio; o subsistema do colégio.
Condicionando os três sistemas expressos, havia ainda a funcio-
n a r como se fossem sistemas disfarçados e ocultos, p o r é m tremenda-
m e n t e atuantes nos r u m o s dos três sistemas declarados, mais dois
sistemas: o de p r e p a r o p a r a os exames de admissão à escola m é d i a ;
o de p r e p a r o ao e x a m e vestibular ao ensino superior.
Em total contradição com o q u e deve ser um sistema educacio-
nal, isto é, um conjunto pedagógico cujos estágios progressivos se
articulam n a t u r a l e h a r m o n i o s a m e n t e , o nosso c h a m a d o sistema edu-
cacional funciona n ã o apenas em têrmos de desarticulação, p o r é m ,
mais ainda, de oposição, de criação de b a r r e i r a s e n t r e os seus níveis.
T ã o extravagante pareceria a assertiva q u e seria o caso de dizer,
"não me atrevera a dizer t a n t o se m a i o r n ã o fora a prova do
que o dito".
Mas em verdade a prova entra pelos olhos de ver de q u a l q u e r
u m , não precisando ser especialista p a r a considerar e sentir o que
anualmente ocorre a respeito, nos grandes centros u r b a n o s do país.
No exame de admissão à escola secundária, p a r t i c u l a r m e n t e
q u a n d o se t r a t a de escolas públicas de prestígio, como p o r exemplo
o Colégio P e d r o IT, o q u e se vê h a b i t u a l m e n t e é a sua busca p o r
milhares e milhares de candidatos p a r a minguadas vagas em relação
ao n ú m e r o de p r e t e n d e n t e s e o conseqüente dizimar de alunos, glo-
sado em prosa e verso pela imprensa. Nos anos de 1962 e de 1963
habilitaram-se aos exames no externato, respectivamente, 11.500 e
15.000 candidatos, p a r a l o g r a r e m ingresso, respectivamente, 1.800 e
3.500. De m o d o geral constata-se p r o p o r ç ã o direta entre o resultado
dos exames e a relação vagas-candidatos, a evidenciar como não fun-
cionam em têrmos de um continuum n o r m a l m e n t e articulado esses
setores do ensino elementar e do ensino m é d i o .
Aliás essa desarmonia estrutural e n t r e a organização dêsses dois
níveis de ensino prossegue q u a n d o se considera a organização vigente
na escola p r i m á r i a , o n d e o aluno se defronta h a b i t u a l m e n t e com
um ou com poucos professôres e poucas matérias e aquela das pri-
meiras séries ginasiais, com o seu m u n d o de matérias e de professôres
especialistas de matérias.
É claro q u e essa a b r u p t a m u d a n ç a de 180 graus não p o d e ser
saudável à psicologia de ainda t í m i d o discente, saído quase s e m p r e
do regime de presença direta de um m a t r i a r c a d o envolvente p a r a o
m u n d o impessoal, a n ô n i m o , fragmentário, distante do m u n d o de es-
pecialistas que passa a defrontar.
Nos exames vestibulares é o que se sabe: em 1962, no Brasil, nos
dez principais ramos do ensino superior, p a r a 41.023 vagas na
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 33

1.ª série apresentaram-se 66.315 candidatos, logrando aprovação


apenas 26.752. É esta u m a prova, que a n u a l m e n t e se repete, da
desarticulação entre a escola m é d i a e o ensino superior, ainda que
seja u m a i m p r o p r i e d a d e falar-se dos exames vestibulares como um
t o d o único, tanto v a r i a m eles conforme a carreira e a escola que
se busque.
Mas p a r a carreiras ainda detentoras do m a i o r prestígio, u m a
tradicional — medicina — outra ascendente — engenharia — nas
grandes escolas o q u e ainda se sente é t a m b é m a completa desarti-
culação e n t r e as possibilidades e exigências p a r a ingresso nelas e o
que resulta da p r e p a r a ç ã o nas escolas médias. Reprova-se não em
função dos conhecimentos ou das potencialidades dos candidatos, mas
em função, essencialmente, do n ú m e r o de vagas.
Deve-se reconhecer, a b e m da verdade, em q u e pese à impor-
tância dêsses dois c h a m a d o s "sistemas ocultos" nas distorções de
nosso dito sistema educacional, que não se p o d e identificar u m a
preocupação dos responsáveis pela nossa educação, mais profunda,
mais contínua, mais operativa p a r a conhecer e solucionar esse estado
de coisas, no que t e n h a de i n a d e q u a d o e maléfico.
O Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais julgou i m p o r t a n t e
p r o c u r a r conhecer objetivamente o funcionamento mais íntimo da
p r e p a r a ç ã o que é feita nos dois ditos "sistemas disfarçados", mon-
t a n d o projetos para estudo, na G u a n a b a r a , seja da situação q u a n t o
aos vestibulares, projeto ora em curso, seja q u a n t o aos exames de
admissão à escola secundária, projeto que será c u m p r i d o em 1964.
U m a verificação segura queremos de logo ressaltar entre os
pressupostos que já se confirmam e aquêles q u e se infirmam, decor-
rentes da pesquisa q u e ora realizamos.
Os grandes preocupados, os grandes atuantes, enfrentando difi-
culdades e mesmo resistências sem conta, para buscar vencer as bar-
reiras do vestibular, são os p r ó p r i o s estudantes, seja como alunos
a expensas próprias de cursinhos particulares, seja pela atuação de
Diretórios Acadêmicos organizando e promovendo cursos, a n t e a indi-
ferença senão quase hostilidade dos responsáveis pelas escolas a q u e
pertencem.
É nessa mocidade tantas vezes injustamente vilipendiada pelos
beneficiários do status quo, com as alegações de vadiagem, desordem,
" c o m u n i s m o " o quejandas, que encontramos a mais viva preocupação
e atuação nesse grave problema, inclusive com u m a s u r p r e e n d e n t e
m a t u r i d a d e de pensamento e u m a honestidade de propósitos, que só
lhes faz h o n r a .
É um registro esse que se i m p õ e como expressão de fria
objetividade de análise de situações de fato, constantes do estudo
empreendido.
34 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Veja-se q u e p a r a as carreiras de m a i o r prestígio, nas grandes


escolas da G u a n a b a r a , como a Nacional de Medicina, a Nacional de
E n g e n h a r i a , a Nacional de Filosofia, a Nacional de Direito, a Nacional
de Economia, a Nacional de Química n ã o existe q u a l q u e r providência
dos seus responsáveis no sentido de auxiliar os alunos que a elas
se candidatam. Sequer funcionam Comissões de Admissão e Orien-
tação de Estudantes, articuladas com instituições de ensino médio.
É um p r o b l e m a com o qual, pelo visto, j u l g a m n a d a ter os seus
dirigentes a v e r ; os candidatos q u e b u s q u e m resolver seus problemas
como m e l h o r lhes parecer e cursos p a r a tal, os que existem, ou são
particulares ou de iniciativa do Diretório Acadêmico.
F a l a m o s do m u n d o ignoto e a b a n d o n a d o dos cursinhos. Em
verdade assim êle é, ignorado em sua existência, salvo pelos que
l h e vivem a realidade, desprezado pelos que o e n t e n d e m como u m a
chaga em nossa educação, desatentos a que são eles u m a decorrência
fatal dos defeitos de nosso pseudo-sistema de ensino. F u n c i o n a n d o
como instituições vivas e atuantes em nosso soi disant "sistema do
ensino", n ã o t ê m não só q u a l q u e r reconhecimento como conheci-
mento oficial de sua existência. V a l e m apenas pelo que p r o d u z e m
em resultados práticos. T ê m assim u m a certa n o t a de m a r g i n a l i d a d e
oficial ao a r r e p i o do p a p e l concreto que d e s e m p e n h a m na tentativa
de s u p r i r e m um elo no nosso sistema educacional. A atitude cientí-
fica a seu respeito n ã o poderia ser a vigente, de ignorância do que
significam sua existência e seu funcionamento pelos responsáveis p o r
nossa educação. Há q u e conhecê-los em sua gênese e em sua fisio-
logia. P o r q u e existem e como existem. Quais, na circunstância, seus
méritos e defeitos que sem dúvida os têm, estes ú l t i m o s tantas vezes
condicionados pelas i m p r o p r i e d a d e s do exame vestibular p a r a que
devem p r e p a r a r .
V a l e conhecê-los, m e l h o r diria, u r g e conhecê-los q u e m quer que
p r e t e n d a ter u m a informação razoável sôbre os fatos educacionais
i m p o r t a n t e s do país. Conhecê-los nas especificidades de sua dinâ-
mica, nas tipicidades do seu m o d o de operar, t ã o diferentes da
feição c o m u m às escolas institucionalizadas q u e deles se diria serem
u m o u t r o m u n d o . U m o u t r o m u n d o n a motivação, d e regra m u i t o
mais concreta e autêntica, de docentes e discentes. Um o u t r o m u n d e
na sua t ã o estrita e talvez fatal, embora pedagogicamente indesejável,
subordinação às exigências dos exames. Um o u t r o m u n d o em. alguns
aspectos da problemática discente. Um outro m u n d o na copiosa li-
t e r a t u r a pedagógica p a r a êle especificamente elaborada. Um o u t r o
m u n d o na v a r i e d a d e de situações nele existente, desde os grandes
cursos famosos e supercongestionados até os discretos microcursos,
p a r a r e m e d i a r falhas dos mesmos cursinhos. Um o u t r o m u n d o em q u e
a eficiência em relação aos fins propostos, aferida p o r alheios julga-
dores, é a condição única de sobrevivência e t a m b é m o c a m i n h o de
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 35

largo êxito empresarial. Um o u t r o m u n d o , o das aulas até nos domin-


o-os e o reino das apostilas. Um m u n d o q u e nao se p o d e ignorar
pelos defeitos que revele e pelas inspirações positivas que sugira.

Alguns aspectos da preparação de candidatos a cursos superiores


na Guanabara

Na pesquisa do C B P E a que aludimos, estão sendo utilizadas


conjugadamente as técnicas bibliográfica e de observação direta, no
que cabe a cada u m a delas. Ao lado do l e v a n t a m e n t o e estudo do
material bibliográfico existente, as técnicas de entrevista pessoal, com
os diretores dos cursos e de questionários aplicados à direção dos
cursos, a alunos e professôres, estes últimos p o r amostragem r e p r e -
sentativa, vêm sendo utilizadas.
T r a b a l h a n d o o m a t e r i a l já coligido, algumas observações interes-
santes já podem ser apresentadas, das quais p r o c u r a r e m o s fazer a
seguir um resumo de aspectos que se nos afiguram mais significativos.

II — A estrutura material dos "cursinhos"

J o g a n d o com os dados do levantamento que sem p r e t e n d e r ser


exaustivo abrangerá todavia a quase totalidade da situação existente
na G u a n a b a r a , identificamos, no ano de 1963, o funcionamento de
51 cursos de p r e p a r a ç ã o de candidatos a cursos superiores. Pelas
entidades m a n t e n e d o r a s e r a m esses cursos:
— particulares — 27
— de responsabilidade de diretórios acadêmicos................... — 14
— " " " faculdades — 10

51

Ao lado dêsses cursos t a m b é m devemos assinalar a existência


do II ciclo secundário do Colégio Piedade, e s t r u t u r a d o , nos seus três
anos, em têrmos de cursos pré-vestibulares.
Esses cursos, q u a n t o à sua localização, estariam assim divididos,
incluindo o Colégio P i e d a d e :
28 — na zona central da cidade
20 — " " sul
4 — " " norte

52
36 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Como fato digno de nota devemos destacar que, localizados ante-


r i o r m e n t e quase exclusivamente na zona central da cidade, hoje se
espraiam esses cursos, em n ú m e r o ponderável, seja pela zona sul,
como igualmente p e l a zona norte.
Cursos de prestígio e t r a d i ç ã o notórios, como os cursos Bahiensc,
COS e Ciências Médicas, já m a n t ê m inclusive filiais na zona sul e
na zona norte.
Como poderíamos definir a largos traços a morfologia dêsses
cursos? É ela em v e r d a d e m u i t o variada, desde os cursos densa-
m e n t e freqüentados, supercongestionados em suas salas de classe,
como seriam, e n t r e outros, os casos do COS, Bahiense, Ciências Mé-
dicas, Galloti K h e r i n g , Hélio Alonso até os "microcursos", apeli-
dados alguns deles, em gíria curiosa, de " q u e b r a - g a l h o " , onde fre-
q ü e n t e m e n t e se ministra um ensino quase individual, visando a r e m e -
diar problemas do ensino coletivo nos grandes cursos. Registramos
inclusive, como nota pitoresca, curso o n d e havia m a i o r n ú m e r o de
docentes que de discentes, como seria o caso do Curso Boechat, ao
lado de curso com um só professor p a r a todas as m a t é r i a s , como o
da F a c u l d a d e de Ciências Jurídicas do Rio de J a n e i r o . E n t r e esses
microcursos, inclusive os apelidados de " q u e b r a - g a l h o " , podemos citar
os cursos Magnus, CTG, Sorbonne, Boechat e Severo. P a r a que se
tenha idéia da diferença em o r d e m de grandeza com relação à ma-
trícula nesses cursos, assinale-se que oscilam de 5 e 10 até 700 alunos.
Alguns dêsses cursos t ê m instalações razoáveis, d i s p o n d o de salas,
carteiras, m a t e r i a l didático satisfatórios. Deve-se n o t a r todavia q u e
com a abolição das provas práticas no exame vestibular, alguns
dispõem do m a t e r i a l didático respectivo como se fora objeto de
museu, como é o caso do Curso São Salvador, q u e há longos anos
p r e p a r a os candidatos a medicina.
F r e q ü e n t e m e n t e encontramos cursos que funcionam pessimamente,
localizados em edifícios comerciais antigos, pouco asseados, em zonas
das mais m o v i m e n t a d a s e ruidosas do centro da cidade, em condições
as mais disfuncionais, muitas vezes sem acomodação sequer p a r a
todos os alunos, que se vêem obrigados a assistir às aulas de p é .
De m o d o geral, no caso dêsses cursos supercongestionados, exis-
tem, ao contrário do q u e sucede nas escolas secundárias, salas com
capacidade p a r a 90 e mais alunos.
Passemos agora a examinar como se d i s t r i b u e m os cursos p r é -
vestibulares, segundo os estabelecimentos de ensino s u p e r i o r p a r a os
quais p r e p a r a m , b e m como a esboçar u m a aproximação do n ú m e r o
de alunos respectivos.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Distribuição de alunos por cursos pré-vestibulares e mensalidades cobradas


— Guanabara — 1963

Número de Número de Mensalidades


Carreiras
Cursos Alunos Cr$

Engenharia, Arquitetura, Geolo-


gia, Ita 7 2 200 3.000,00 a 7.000,00
Medicina, Farmácia, Odontologia 11' 2 000 3.800,00 a 6.000,00
Direito 9 1 000 3.000,00 a 6.000,00
Filosofia 12 900 2.000,00 a 7.000,00
Ciências Econômicas, Contábeis
e Atuariais 7 1 000 2.000,00 a 5.000,00
Química 3 130 5.000,00 a 7.000,00
Administração Pública 1 75 1.700,00
Belas Artes 4 50 1.750,00 a 5.000,00
Biblioteconomia 1 50
Sociologia e Política 1 17 6.000,00
Serviço Social 4 110 2.500,00
Enfermagem 1 — Grátis
Diplomacia 2 —

Para que se tenha idéia da extensão dêsses cursos pré-vestibulares


na Guanabara, basta que se considere que em relação aos que alu-
dimos já nos foi possível identificar, faltando ainda alguns dados,
totais não inferiores a 7.600 alunos e a 500 professôres.
Numa aproximação ainda bastante grosseira, mas pela qual se
sente a extensão da corrida de obstáculos que são os exames vesti-
bulares, destaque-se que somente considerando esses 7.600 candidatos
freqüentando cursinhos, para eles se abrirão apenas cerca de 5.150
vagas, o que significa uma relação de 1,5 alunos para cada vaga,
relação que sobe para aproximadamente 1,9 alunos por vaga se
computarmos o contingente de candidatos que fazem o vestibular sem
cursinhos. Aliás não faz maior sentido no caso uma correlação global
dessa natureza, se se considerar a heterogeneidade das variáveis
existentes no universo analisado. Basta que se leve em conta que
as Faculdades de Filosofia, Serviço Social, Enfermagem, para as
quais há, no conjunto, mais vagas do que candidatos, vêm operando
com larga margem de capacidade ociosa, na relação vagas-número de
alunos matriculados, situação precisamente oposta à assinalável nas
Faculdades de Medicina e de Engenharia. No caso dessas duas car-
reiras, Medicina e Engenharia, teríamos na relação vagas-candidatos
uma proporção aproximada de seis candidatos para uma vaga em Enge-
38 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

n h a r i a e de dez p a r a u m a em Medicina, no total das várias faculdades,


n ã o só da G u a n a b a r a como de Niterói, p a r a o n d e t a m b é m se des-
tinam candidatos aqui p r e p a r a d o s . Em E n g e n h a r i a essa relação é
de 3 p a r a 1; em Direito, 1 p a r a 2,2; em Economia, 1 p a r a 2, dados
todos referentes a 1963. No q u e se refere ao custo mensal dêsses
cursinhos a oscilação é igualmente m u i t o g r a n d e . V a r i a m desde a
gratuidade total, aliás p o r nós assinalada apenas em dois casos, até
as mensalidades q u e vão de Cr$ 1.700,00 até Cr$ 7.000,00. De m o d o
geral, o p r e ç o dêsses cursos varia em relação direta com a difi-
culdade dos vestibulares respectivos, sendo assim os de Medicina,
E n g e n h a r i a e Diplomacia aquêles de mais altas mensalidades, quase
s e m p r e em t o r n o de Cr$ 6.000,00 e Cr$ 7.000,00.
À base dos dados que até o m o m e n t o conseguimos levantar, n ã o
seria exagerada u m a estimativa de gastos com esses cursos da ordem
de Cr$ 40.000.000,00 mensais, o que implicaria, se multiplicados por
10 meses (duração a p r o x i m a d a da maioria dos cursos) cerca de
Cr$ 400.000.000,00 p o r ano. Há cursos que devem perfazer u m a
receita mensal de Cr$ 5.000.000,00, o que, deduzidas despesas de
m a n u t e n ç ã o , ensejará saldo a l t a m e n t e c o m p e n s a d o r aos seus pro-
prietários, mesmo q u a n d o se t r a t e daqueles que r e m u n e r a m seus
professôres em bases inusitadas em relação aos padrões comuns, a
saber, CrS 2.700,00 o salário-aula.
Há cursos já de respeitável a n t i g ü i d a d e no métier, como o
São Salvador e o Galloti K h e r i n g com 26 anos de funcionamento ou
o Moseley com 2 1 , ao l a d o daqueles q u e se i n i c i a m em 1963, como os
da Escola Técnica de Botafogo, Miguel Couto, Curso Acadêmico
Rio Branco.
Cursos existem com sentido de p r e p a r a ç ã o n i t i d a m e n t e especiali-
zada, como seria o caso, p o r e x e m p l o , do H o r a c e Wells, voltado exclu-
sivamente p a r a Odontologia ou o do Curso Severo, dedicado somente
a Belas Artes, ao l a d o de cursos como o COS, do q u a l se poderia dizer
q u e funciona como u m a p e q u e n a universidade pré-vestibular, prepa-
r a n d o s i m u l t a n e a m e n t e p a r a E n g e n h a r i a , A r q u i t e t u r a , Ita, Medicina,
Farmácia, Filosofia, Belas Artes e Química.

III —• A Pedagogia dos Cursinhos

O que poderíamos dizer da pedagogia vigente nos cursinhos?


N ã o é fácil u m a definição em têrmos analíticos mais precisos em
função do m a t e r i a l de que até agora dispomos, que só nos enseja
u m a visão macroscópica do p r o b l e m a . Como, obviamente, esta si-
tuação pedagógica t e m vinculação direta e fatal ao professor, come-
cemos por algumas considerações sôbre a qualificação profissional
desse magistério. A i n d a u m a vez é situação de extrema variedade.
Nos casos de cursinhos particulares ou nos de cursos sob a respon-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 39

sabilidade dos dirigentes de Faculdades há p r e d o m i n â n c i a de ma-


gistério já mais e x p e r i e n t e e possuidor de títulos de habilitação
profissional mais específicos e expressivos. Nos casos de cursos
mantidos p o r diretórios acadêmicos o n d e as dificuldades a superar
são b e m mais ponderáveis, inclusive pelo propósito de modicidade
das taxas a serem cobradas, c o m u m e n t e os professôres são alunos das
p r ó p r i a s Faculdades, recrutados ou não p o r provas de seleção. No
que diz respeito ao p r o b l e m a de r e m u n e r a ç ã o docente, que t e m que
ser mais baixa nas condições em que funcionam os cursos de Dire-
tórios, registre-se q u e Cr$ 500,00 p o r h o r a de aula são menos de u m a
quinta p a r t e do q u e recebem professôres dos cursos mais afamados.
No questionário que propusemos aos professôres havia u m a per-
gunta fundamental p a r a definir o sentido da pedagogia p r e d o m i n a n t e
nos cursinhos. Estava assim r e d i g i d a : " A c h a q u e as exigências do
vestibular obrigam a um adestramento p a r a exame, ou p e r m i t e m
u m a aprendizagem r e a l ? " E m q u e pesem algumas incompreensões
q u a n t o às nítidas distinções a fazer entre " a d e s t r a m e n t o " no sentido
de chauffage, isto é, de conhecimento que se m e m o r i z a e se esquece
p o r q u e n ã o foi aprendido e u m a a p r e n d i z a g e m real, a maioria dos
professôres opinou no sentido de q u e aquilo que e r a m condicionados
a fazer, pelas exigências do vestibular, era adestramento para exame.
Em v e r d a d e , pelo que p u d e m o s sentir, observar, ouvir e ler, r e a l m e n t e
a pedagogia dos cursinhos n ã o é, e em certa m e d i d a n ã o poderia ser,
a da participação viva do discente no processo pedagógico. É essen-
cialmente o c a m p o das aulas expositivas, da filiação às apostilas que
constituem tôda u m a copiosa literatura pedagógica, p a r a êste fim
expressamente elaborada.
Ao lado disso há t r e i n a m e n t o intensivo dos discentes na solução
de problemas típicos, quais os exigidos em matérias como Matemática,
Física, Química, Biologia, a u m a base que b e m se p o d e r i a a p r o x i m a r
da q u e caracteriza a técnica do drill (instrução m i l i t a r ) . Devemos
t a m b é m destacar que há preocupação constante de uso de instru-
mentos de m e d i d a capazes de aferir o q u e foi a p r e n d i d o ou, na
maioria dos casos, m e m o r i z a d o .
Em função dessas verificações, muitas vezes semanais, às vezes
aos domingos, de retenção do conhecimento t r a n s m i t i d o ou endou-
t r i n a d o , é q u e o curso ganha prosseguimento. O a c o m p a n h a r pari-
passu, as c h a m a d a s questões típicas dos vestibulares p a r a t r e i n a r sua
solução é preocupação d o m i n a n t e . De m o d o geral o j u l g a m e n t o
dêsses professôres sôbre a escola secundária foi e x t r e m a m e n t e res-
tritivo, ainda que s u b l i n h a n d o certo grau de variação, conforme a
escola d o n d e proviesse o aluno. T a m b é m como índice significativo
da desarticulação e n t r e o ensino m i n i s t r a d o na escola média e as
exigências do vestibular, salientaram situações em que m a t é r i a fora
dos programas de ensino m é d i o ou, sendo, não é dada, entra como
m a t é r i a dos vestibulares.
40 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Q u a n t o às modificações que a Lei de Diretrizes e Bases poderia


trazer em relação à situação atual dos exames vestibulares, os depoi-
mentos foram de três t i p o s :
a — o dos que j u l g a m que a LDB abriu perspectivas mais fa-
voráveis a soluções do p r o b l e m a , com as virtualidades ense-
jadas pelos novos tipos de cursos de colégio ou pelos
colégios universitários;
b — o dos q u e o p i n a m no sentido de serem irrelevantes as
perspectivas trazidas pela L D B , em relação ao q u e está no
cerne d o p r o b l e m a ;
d — o dos q u e revelaram quase total desconhecimento das mo-
dificações trazidas pela L D B .

Q u a n t o às respostas à p e r g u n t a sôbre a razão de ser dos exames


vestibulares, sua eficiência como i n s t r u m e n t o de seleção de alunos
e pedido de sugestão q u a n t o a modificações das técnicas nele utili-
zadas, p o d e m elas ser assim a g r u p a d a s :
1) Razão de ser dos vestibulares — A minoria o p i n o u no sen-
tido de serem eles desnecessários p a r a quantos concluíssem
o ensino m é d i o . A maioria o p i n o u no sentido da necessidade
de sua m a n u t e n ç ã o , como i n s t r u m e n t o de seleção a carreiras
que h a b i l i t a m ao exercício profissional. P r a t i c a m e n t e a una-
nimidade conveio em q u e seria preciso um a u m e n t o substan-
cial de o p o r t u n i d a d e s de educação em nível superior, sem
o que seria inócuo q u a l q u e r outro esforço a respeito.
2) Eficiência do vestibular como instrumento de seleção de
alunos — A m i n o r i a dos ouvidos o p i n o u no sentido de que,
de m o d o geral, satisfaziam os processos de exame vestibular.
A m a i o r i a o p i n o u no sentido da sua i n i d o n e i d a d e técnica
como i n s t r u m e n t o de seleção, manifestando-se alguns violen-
t a m e n t e contra e n q u a n t o i n s t r u m e n t o de seleção, que, se-
gundo eles, seria feita às avessas, à base de extravagâncias
especiosas t i p o numerus clausus. que longe estavam de se-
lecionar os m a i s aptos. B o m n ú m e r o dêsses professôres
opinou pela preferência do sistema de "'classificação" ao
invés do de aprovação e reprovação, de m o d o a i m p e d i r o
funcionamento de faculdades com larga m a r g e m de capa-
cidade ociosa, preenchendo-se assim todas as vagas, inclusive
m i n i s t r a n d o as escolas cursos de r e c u p e r a ç ã o em matérias
básicas em q u e o classificado se revelasse mais fraco.
3) Modificação das técnicas do vestibular — Nesse aspecto,
devemos confessar q u e os depoimentos até agora colhidos
n ã o t r a z e m contribuições mais pensadas e fundamentadas à
solução do p r o b l e m a . O que se nota, como impressão global,
é mais u m a insatisfação com o sistema vigente do q u e a
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 41

proposição de meios idôneos p a r a sanar as falhas apontadas.


A nosso entender, dessas sugestões, duas se revelaram
dignas de m a i o r a p r e ç o :

l.ª a q u e l e m b r a a criação nos Estados de um único


vestibular, c o m u m às escolas do mesmo r a m o ,
o p t a n d o os alunos p o r aquelas q u e preferissem, con-
forme as classificações a l c a n ç a d a s ;
2 . a — a q u e sugere que nos instrumentos de m e d i d a usados
no vestibular sejam utilizados os mais aptos a
a p u r a r não apenas a informação já assimilada pelo
candidato mas t a m b é m suas potencialidades quanto
à capacidade de aquisição de novos conhecimentos,
aspecto esse que os testes de inteligência p o d e r i a m
a p r e c i a r ; q u a n t o à aferição do grau de conheci-
m e n t o , é alvitrada a adoção de testes de escolaridade,
capazes de p r o p o r c i o n a r u m a verificação segura e
não aleatória do domínio da m a t é r i a , como a que
p r o d u z e m três perguntas ao acaso.

Devemos s u b l i n h a r como apreciação final q u a n t o à situação


pedagógica dêsses cursinhos que, com a estrutura atual do nosso
ensino, p a r a carreiras com poucas vagas e numerosos candidatos, vêm
constituindo eles i n s t r u m e n t o indispensável.
Como demonstração dessa afirmativa, basta verificar-se, de
acordo com levantamento feito pela C A P E S , relativo ao ano de 1962,
q u e em São Paulo, G u a n a b a r a e Niterói respectivamente 85, 86,6 e
82% dos candidatos fizeram cursinhos p a r a vestibular de E n g e n h a r i a ;
esses totais foram c o r r e s p o n d e n t e m e n t e de 84,2, 89,4 e 85,7% em Me-
dicina. E q u a n t o aos resultados nos vestibulares p a r a essas carreiras
nesses Estados, em 1962, teriam sido os seguintes:

índices de aprovação segundo freqüência a cursinhos

Engenharia Medicina

Estados Aprovados Aprovados


Repro- Repro-
Com Sem vados Com Sem vados
Curso Curso Curso Curso

19 % 10,9% 70,1% 11,7% 5,2% 83.1%


Niterói 28 % 7 % 65 % 14,5% 7,5% 78 %
33,3% 12,4% 54,7% 15,4% 3% 81,6%
42 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

IV — A Clientela dos Cursinhos

A nota de variedade que tem sido uma constante, definidora das


situações encontradas neste estudo, atinge o máximo quando se con-
sidera a clientela dêsses cursinhos.
Efetivamente, trata-se de um todo altamente heterogêneo do
ponto-de-vista das variáveis: idade, condição social, situação escolar,
aproveitamento na 3. a série do II ciclo, revelado pela média global
obtida.
Comecemos pelas idades. A primeira observação de ordem geral
a fazer é a de que, em média, os candidatos são mais idosos do que
o eram não faz muito. Reflita-se a esse respeito que em vez dos
três anos em que era feita àquele tempo a escola secundária, é
ela hoje organizada em 7. A isto acrescente-se que, agravando-se a
desproporção vagas-candidatos, em certas escolas superiores, tornou-se
pouco freqüente o ingresso de candidatos na primeira tentativa.
Como outra razão de ser dessa idade maior dos candidatos não
se pode perder de vista o funcionamento das escolas superiores no-
turnas, destinadas de regra a uma população adulta que trabalha.
Dos dados já coligidos em nossa pesquisa, verifica-se assim uma
faixa com sensível dispersão etária começando com aquêles poucos
candidatos de 17 e 18 anos, fazendo simultaneamente a última série
do colégio e os cursinhos.
Segue-se uma faixa média, mais densa, entre os 19 e 23 anos,
insistindo em repetidos esforços pará ingressarem nas escolas de
Medicina e de Engenharia e depois, em menor extensão, as faixas mais
idosas, acima de 23 anos, essencialmente existentes nos cursos notur-
nos, visando a melhorar uma situação de trabalho já existente.
Esta situação de alunos menos jovens se assinala também nos
cursos de preparação para ingresso na carreira diplomática, freqüen-
tados por diplomados em nível superior ou por alunos desse mesmo
nível.
Para as faixas etárias mais jovens ocorre problema de difícil
solução, qual seja o da coincidência de prestação de serviço militar
com a preparação para os vestibulares, o que, quando coincide ser
o aluno ainda da 3. a série colegial, torna insolúvel o problema.
Menor é a variação no que se refere às condições de classe social
dos candidatos. Em primeiro lugar, há uma triagem feita pela es-
cola secundária que funciona no sentido de discriminação econômica
que alija candidatos que não conseguem escola pública. Em segundo
lugar, porque mesmo quando êste último fato ocorre — matrícula na
escola pública — a necessidade de ingressar imediatamente no tra-
balho afasta muitos dos candidatos potenciais ao ensino superior.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 43

Pode-se dizer, c o m p u t a d a s as informações constantes dos ques-


tionários preenchidos pelos alunos, que, salvo casos excepcionalíssimos,
tôda a clientela dos estabelecimentos do ensino p r i v a d o superior
pertence à classe alta e média-alta. Apenas nos candidatos às esco-
las públicas do ensino superior se e n c o n t r a m referências a profis-
sões dos pais q u e os identificam como integrantes das classes popu-
lares. Esta ú l t i m a situação foi p o r nós p a r t i c u l a r m e n t e assinalada
nos p r e t e n d e n t e s à Escola Nacional de E n g e n h a r i a e à F a c u l d a d e
Nacional de Filosofia. Q u a n t o à situação escolar dos candidatos, já
aí a área de variação volta a ser assinalável.
P a r a um d e t e r m i n a d o grupo de faculdades, como as de Enge-
n h a r i a , Ciências Econômicas (diurnas) e de Química, é freqüente
serem os candidatos ainda alunos da 3 . a série de colégio, t e n t a n d o o
vestibular pela l . a vez.
Já no caso dos alunos de cursinhos p r e p r a t ó r i o s p a r a Medicina,
os dados em nosso p o d e r revelam que a m a i o r i a deles t e n t a r á o
vestibular pela 2. a e 3. a vez. F a t o expressivo a assinalar é o de
que, m e s m o com seus notórios defeitos, a escola secundária vem-
se revelando p r e p a r a d o r a menos ineficaz do q u e são as escolas
técnicas de comércio de nível m é d i o em relação às exigências do
vestibular das faculdades de ciências econômicas.
Q u a n t o à questão de se h a b i l i t a r e m aos exames vestibulares
alunos que seriam a n a t a da escola m é d i a ou representantes dos
seus estratos menos qualificados intelectualmente, baseando-nos nas
médias globais apresentadas nas 3. a s séries colegiais, devemos dizer
que sua m a i o r incidência está e n t r e 6 e 7 o q u e significa u m a faixa
média de aproveitamento. Em m e n o r escala, registram-se as médias
globais 5, 8 e 9.

Julgamento da escola secundária e dos cursinhos

Na maioria absoluta dos casos houve j u l g a m e n t o dos alunos


m u i t o desfavorável à eficiência da escola secundária. De m o d o geral,
manifestaram-se no sentido de q u e o p r e p a r o obtido nos cursinhos
é m u i t o superior àquele q u e obtiveram na escola secundária. O prin-
cipal motivo que invocam p a r a tal é o de sua motivação ser m u i t o
m a i o r em relação aos objetivos q u e visam alcançar com a freqüência
aos cursinhos do q u e aquela que os levou a f r e q ü e n t a r a escola se-
cundária, o q u e em muitos casos fizeram apenas p a r a "obedecer aos
pais". É r e a l m e n t e fato digno de destaque o a m a d u r e c e r quase stí-
bito de um senso de responsabilidade em muitos dêsses alunos, talvez
pela intuição do que vale e n t r a r na faixa privilegiada do 1%, m u i t o
diferente d a q u e l e q u e confessam haver tido em relação a seus deveres
p a r a com a escola secundária.
44 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Como segundo motivo, revelam que o ensino m i n i s t r a d o nos


cursos é m u i t o mais objetivo e concreto em relação a finalidades
específicas visadas do que seria a vaga fluidez da dita cultura geral
enciclopédica, fornecida pela escola média. Isto n ã o implica
reconhecer que, em alguns casos, alunos n ã o houvessem f o r m u l a d o
restrições aos cursinhos, chegando mesmo a classificá-los como infe-
riores aos cursos recebidos na escola secundária. T a m b é m se d e v e
destacar que freqüentemente os professôres dos cursinhos merecem
j u l g a m e n t o m u i t o favorável dos seus alunos.

Programas do ensino

Q u a n t o aos p r o g r a m a s de ensino ministrados nos cursinhos,


cotejados com aquêles dados na escola de 2.° grau, os julgamentos
dos alunos dividiram-se do seguinte m o d o :
a) os q u e afirmaram estar em m u i t o s casos versando, n o s
cursinhos, m a t é r i a n o v a ;
b) os q u e a f i r m a r a m q u e o que havia era um desenvolvimento-
mais a p r o f u n d a d o da mesma m a t é r i a estudada na escola se-
cundária;
c) os que n ã o assinalaram diferenças sensíveis nos desenvolvi-
mentos dos p r o g r a m a s nos cursinhos e nas escolas de nível
médio.

Julgamento de fatôres para sucesso no exame vestibular

Na quase t o t a l i d a d e dos casos e n t r e os fatôres c o n h e c i m e n t o ,


sorte e proteção, q u a n t o aos que seriam mais i m p o r t a n t e s p a r a êxito
no vestibular, a p o n t a r a m os alunos conhecimento como sendo o fator
decisivo, a c o m p a n h a d o a m u i t a distância p o r sorte e a i n d a mais
r e m o t a m e n t e p o r proteção. Essa escolha demonstra um saudável es-
p í r i t o de confiança no valor intelectual e b o a expectativa q u a n t o
ao funcionamento das instituições, sem influência de fatôres m e n o s
desejáveis.

Razões de escolha da profissão

São s u m a m e n t e interessantes as respostas dadas à p e r g u n t a do


questionário sôbre q u e fatôres teriam levado à escolha da profissão.
No q u e diz respeito a u m a correlação m a i o r e n t r e a profissão dos
pais e a escolhida pelos filhos, não a podemos assinalar.
Q u a n t o às influências reveladas p a r a a escolha, é curioso regis-
t r a r que no caso de candidatos a Medicina e Direito encontramos
expressa u m a filiação m a i o r ao que se p o d e r i a c h a m a r de motivos
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 45

altruístas, de solidariedade h u m a n a , quais fossem os de fazer b e m


ao p r ó x i m o , defender os oprimidos e e t c ; no g r u p o de candidatos a
E n g e n h a r i a , Economia, Química etc. encontramos explicitada m a i o r
conexão com u m a motivação de natureza mais pragmática, no sentido
de serem profissões de futuro, seja pessoal, seja p a r a o país.
Nesse aspecto de orientação p a r a a escolha da profissão podemos
sentir em muitos casos a necessidade do funcionamento de Serviços
de Orientação Profissional. No caso do Colégio P i e d a d e , o n d e o
funcionamento dos cursos de colégio voltados p a r a o vestibular du-
r a n t e 3 anos enseja a existência de serviços dessa natureza, a quase
totalidade dos alunos ouvidos manifestou-se p l e n a m e n t e convencida
da necessidade de receberem orientação desse t i p o , salvo os que
imaginaram tivesse ela p o d e r compulsório. Essa providência pelo
menos atenuaria situações como as de arriscar um ou mais vesti-
bulares ao mesmo t e m p o , " p o r serem mais fáceis" ou a de t e n t a r
carreiras indiferenciadamente, " p o r não haver outra à m ã o " .

V — Síntese Final

Cremos que os meus pacientes ouvintes já se t e r ã o convencido,


pela exposição feita, de que não foi g r a t u i t a m e n t e q u e a classificamos
como u m a simples nota prévia sôbre o assunto. Na altura em que
se encontra a pesquisa de c a m p o q u e a f u n d a m e n t a basicamente,
não poderíamos chegar a conclusões m a i s minuciosas, q u e serão
objeto do t r a b a l h o definitivo a cargo de nossa assistente, Prof.ª , Nádia
Cunha. Em t o d o caso a reflexão q u e nos p r o p o r c i o n o u a leitura da
p a r t e bibliográfica do assunto, conjugada ao m a t e r i a l de pesquisa
de c a m p o coletado, nos p e r m i t e , sem t e m o r a maiores leviandades,
chegarmos já a certas observações que não cremos v e n h a m a ser pos-
t e r i o r m e n t e informadas.
Em p r i m e i r o lugar, vale destacar a d e s p r o p o r ç ã o e n t r e a alta
importância do assunto, que de t ã o óbvia prescinde de maiores
demonstrações, e o cuidado efetivo que a êle t e m sido dispensado
pelos responsáveis p o r nossa educação.
Trata-se nem mais n e m menos do p r o b l e m a de a b r i r as portas da
nossa universidade com a a m p l i t u d e e adequação necessárias àquelas
q u e em função de seus méritos e na m e d i d a das necessidades de
desenvolvimento do país, deverão constituir os q u a d r o s de suas múlti-
plas elites intelectuais. N ã o p o d e m assim p e r d u r a r os atuais pro-
cessos restritivos p o r iníquas discriminações sócio-econômicas e com
uso de instrumentos de seleção inidôneos ou insuficientes, tecnica-
m e n t e . I g u a l m e n t e não p o d e p e r d u r a r a distorção de considerar o
vestibular um fim em si m e s m o , q u a n d o êle não é mais do que meio
adjetivo, em relação à essência do p r o b l e m a que é o da formação dos
quadros de nível superior exigidos pelo país.
46 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

O p r i m e i r o p r o b l e m a a ser posto seria o da pertinência da


m a n u t e n ç ã o dos exames vestibulares ou o do livre ingresso dos can-
didatos portadores de certificados de conclusão de cursos de nível
médio. Considerando q u e as carreiras de nível superior dão prer-
rogativas de exercício profissional que, se n ã o correspondem a u m a
autêntica h a b i l i t a r ã o , p o d e m ser exercidas contra terceiros e a invia-
bilidade universal de tôda a p o p u l a ç ã o escolar fazer estudos de nívei
s u p e r i o r , talvez (fazemos a afirmação com reservas) não acessíveis a
mais de 20% dessa p o p u l a ç ã o , parece-nos pacífico dever ser m a n t i d o
o processo de seleção de candidatos.
E m assim reconhecendo, n ã o implica n ã o p r o c l a m a r m o s pre-
missa fundamental, básica, essencial que está no cerne do assunto,
sem cuja solução todas as medidas alvitradas serão inócuas, meros
paliativos diversionistas: a necessidade p r e m e n t e , inadiável de aumen-
tar nossas oportunidades de escolarização em nível superior, apare-
l h a n d o as instituições p a r a fazê-lo sem prejuízo da qualidade do
ensino ministrado.
No que respeita aos processos e técnicas de seleção de candidatos,
cremos q u e as posições a seguir enunciadas são dignas ao menos de
atenção e de estudo.
Acreditamos que o sistema de concurso de classificação até atin-
gir o limite m á x i m o das vagas oferecidas é e v i d e n t e m e n t e mais indi-
cado do que o sistema de exames com aprovação e reprovação dos can-
didatos. Mesmo q u a n d o houvesse menos candidatos do que vagas
esse concurso de classificação deveria ser feito p a r a a p u r a r e r e m e d i a r
falhas comprometedoras dos classificados.
Assim, q u a n d o alguns dos candidatos classificados revelassem
deficiências em m a t é r i a s básicas, seriam obrigados a fazer, p o r ini-
ciativa da F a c u l d a d e , cursos de aperfeiçoamento nelas. Com essa
providência se evitaria persistisse a situação inaceitável de faculdades
q u e o p e r a m com n ú m e r o de alunos m u i t o abaixo de suas disponibi-
lidades de vagas, como fruto da política r e p r o v a d o r a nos exames
vestibulares.
Q u a n t o às medidas a serem t o m a d a s p a r a que êste acesso de
alunos aos cursos de nível s u p e r i o r se processe de f o r m a adequada,
cremos ser t r a n q ü i l o que o p r o b l e m a inicialmente haveria de remon-
tar à escola de nível m é d i o , d o n d e p r o v ê m os alunos.
Seria indispensável o funcionamento dos serviços de Orientação
Educacional e de O r i e n t a ç ã o Profissional, esta ao nível do II ciclo,
como importantes i n s t r u m e n t o s auxiliares de observação e acon-
selhamento p a r a u m a decisão t ã o grave, individual e socialmente,
q u a l a da escolha da profissão. A i n d a no c a m p o da escola m é d i a
haver-se-ia de p r o c u r a r classificá-la não p o r critérios p u r a m e n t e for-
mais de igualdade de cursos, mas p o r critérios fidedignos de apuração
de equivalência de padrões reais de eficiência. Os certificados de
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 47

conclusão de curso emitidos p o r essas escolas t e r i a m , p a r á efeito dos


exames vestibulares, valores p o n d e r a d o s diferentemente.
Aflorando agora assunto que comporta b o a m a r g e m de contro-
vérsia, que é o da questão do p r e p a r o p a r a ingresso em cursos supe-
riores dever ser preferencialmente m i n i s t r a d o em colégios universi-
tário?, como um ciclo básico dos cursos superiores, como se admitiu
no Colóquio de R o y a u m o n t , ou em colégios de escolas m é d i a s ;
cremos que, em p r i n c í p i o , p a r a preservar certos aspectos de u n i d a d e
de objetivos e métodos do ensino m é d i o , essa p r e p a r a ç ã o , como u m a
de suas finalidades, deveria ser realizada em seu â m b i t o , o q u e não
excluiria aprioristicamente experiências de funcionamento de colé-
gios universitários, previstos inclusive na L D B , em q u e pesem aos
justos temores de virem a ser instrumentos de privilégio de p e q u e n a s
minorias e de p e r t u r b a ç ã o de finalidades essenciais à escola de se-
gundo grau. Cremos ser teoria pedagógica válida a de q u e cada
nível de ensino deve p r e p a r a r basicamente p a r a obetivos próprios e
c o m p l e m e n t a r m e n t e p a r a acesso ao nível superior.
Seria assim evidentemente necessário estudar como, q u a n d o e
com q u e grau de variação se deveria equacionar o p r o b l e m a p a r a
atendê-lo devidamente na escola média, sem prejuízo dos funda-
mentais aspectos concomitantes de ministradora de cultura geral que
lhe são próprios.
Cremos t a m b é m que substanciais modificações nas técnicas de
seleção de candidatos deveriam ser introduzidas. A nosso entendi-
mento, ao l a d o da aplicação de testes de escolaridade das matérias
constantes do vestibular, de realização de entrevistas, testes de nível
m e n t a l propondo-se à aferição do Q.I. do candidato e testes de conhe-
cimentos gerais deveriam ser t a m b é m utilizados. Com a adoção con-
j u n t a dêsses instrumentos de m e d i d a , ter-se-ia u m a área de apreciação
mais inclusiva e possivelmente menos falível dos fatôres que devem
contar p a r a a seleção visada. T a m b é m , i n t r o d u z i d o o sistema de
avaliação de escolas, os resultados obtidos em escolas de nível médio
e n t r a r i a m como elemento a ser c o m p u t a d o , c o m p l e m e n t a r m e n t e , no
j u l g a m e n t o do candidato. É jogando p o n d e r a d a m e n t e com todos
esses resultados que se processam as College Entrance nos Estados
Unidos.
Medida q u e nos parece b e m inspirada é igualmente aquela su-
gerida p o r responsáveis pelas Faculdades de Medicina de S. P a u l o ,
de adoção do vestibular único p a r a faculdades do m e s m o r a m o , fi-
cando os alunos com direito de o p t a r e m p o r elas de acordo com
a o r d e m de classificação que alcançassem.
Assinale-se que nessa o p o r t u n a sugestão foi incluído o restabele-
cimento de prova q u e não entendemos p o r q u e teria sido supressa,
qual seja a prova prática, em cadeiras como Química, Física e
Biologia.

4
48 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

No âmbito do ensino superior o funcionamento de "Comissões


de Admissão e Orientação de Estudantes" em estreita ligação com
as escolas médias seria a medida, a nosso ver, mais aconselhável.
Uma observação emergente do trabalho de pesquisa empreendido
queremos finalmente fazer, especialmente endereçada àqueles que
simplistamente se limitam a apodar, invectivar os cursinhos ao invés
de buscarem a compreensão de sua etiologia: enquanto perdurar a
estrutura do nosso soi disant sistema de educação, existirão êles
como uma necessidade inelutável.
Estas são as despretensiosas considerações que nos permitimos
propor a exame do ilustre auditório, almejando possam ter elas
aquêle sentido de comunicação e não de comunicado, sôbre o qual
tão sabiamente nos adverte o companheiro Presidente desta casa.
A COOPERAÇÃO ENTRE A UNIVERSIDADE E A INDÚSTRIA

JOAQUIM FARIA GÓIS FILHO

Do Cons. Fed. de Educação

Na medida em que a tecnologia e os imperativos de aumento de


produtividade ganham extensão em um país, amplia-se nele a uti-
lização de engenheiros e, em conseqüência, multiplicam-se as matrí-
culas nas escolas que os formam.
Tal conjunção de circunstâncias está a sugerir uma integração
cada vez maior entre a escola e a fábrica.
Várias fórmulas de elaboração têm sido ensaiadas, com sucesso,
em vários países, entre os quais se inclui a ajuda que pode ser dada
pela experiência de homens de empresa na administração da escola
e na organização dos cursos. Algumas das fórmulas dessa colabo-
ração vão a seguir alinhadas:
a — participação efetiva de homens de empresa nos conselhos
de administração das escolas de engenharia;
b — participação de técnicos especializados das empresas na
elaboração dos planos, programas, e t c ;
c — colaboração financeira das empresas na ampliação ou apri-
moramento de certos setores de ensino de seu interesse;
d — realização de pesquisas por ação conjunta de escolas e
empresas interessadas;
e — participação direta de técnicos de empresas no ensino, nos
assuntos especializados, na qualidade de professôres tempo-
rários, visitantes, etc.

Outra modalidade de colaboração é a que assegure contato dos


estudantes com problemas vivos da produção industrial, através de
visitas, estágios dirigidos, empregos em fábricas e pela alternância
pelos alunos entre o ensino e um período de trabalho em estabe-
lecimentos industriais.
Para a efetivação desse contato alude-se, com freqüência, aos
estágios dirigidos.
O estágio em que o estudante apenas observa o que se passa
nas diferentes seções de uma fábrica parece não ser satisfatório, nem
mesmo quando precedido de um plano geral e seguido de relatório.
50 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Os técnicos e gerentes das fábricas são homens ocupados, sem t e m p o


p a r a ouvir dúvidas ou pedidos de esclarecimentos dos estudantes e
prestá-los com a d e q u a d a minúcia. P o r outro lado, a especialização
m a r c a n t e de certos tipos de p r o d u ç ã o n e m sempre oferece a variedade
de oportunidades de observação de que o estagiário está necessitando.
Ainda outro p o n t o focalizado é o relacionado com o q u e espera
do estágio. Visão ao vivo de problemas científicos e técnicos ensi-
nados na escola? P r á t i c a tecnológica de teorias a p r e n d i d a s em aulas
e em livros? Visão analítica e ao mesmo t e m p o global do pro-
cesso de p r o d u ç ã o industrial? Observação da organização do tra-
b a l h o ? Problemas d o r e n d i m e n t o d o t r a b a l h o h u m a n o ? P r o b l e m a s
de gerência e de supervisão? P r o b l e m a s de investimento? Proble-
mas de m e r c a d o s ? P r o b l e m a s de custos de p r o d u ç ã o ? N ã o é fácil
obter estágios, mesmo b e m planejados e orientados, observações e
aprendizagens em todos os pontos acima e em tantos outros. P a r a a
observação de alguns deles, seriam necessários estágios n ã o em u m a ,
mas em várias empresas, assistidos p o r especialistas destacados p a r a
tal fim.
P a r e c e que a experiência de professôres e administradores de
alguns países industrializados é no sentido de restringir o estágio a
objetivos mais limitados. Muitos a c h a m inviável que os estudantes
treinem d u r a n t e os estágios como se fossem engenheiros. A aprendi-
zagem possível nessa fase é a das tarefas de operários ou dos auxiliares
que os engenheiros dirigem.
O u t r o p r o b l e m a de elevada freqüência é o do estudante de en-
genharia q u e estuda e t r a b a l h a p o r necessidade de sua manutenção.
N e m sempre o seu emprego está relacionado com os seus estudos,
mesmo q u a n d o engajado em firma industrial. P o r sua vez o emprego
i m p e d e a freqüência regular às aulas e o estágio em outras empresas.
Acreditamos que os cursos " s a n d u í c h e " foram organizados p a r a
fazer face a todas essas realidades. Nestes, como é sabido, os alunos
são todos empregados em algumas fábricas, m e d i a n t e acordo especial.
Os jovens freqüentam a escola e as empresas em h o r á r i o s alternados,
um período cheio, de semanas ou meses, em cada. Na escola estu-
d a m o dia inteiro e na fábrica recebem p a r a executar tarefas p r ó p r i a s
de operários.

Os objetivos principais do sistema:


a — assegurar um salário regular a estudantes sem prejuízo de
freqüência às a u l a s ;
b — a p r e n d e r processos de p r o d u ç ã o ;
c — a p r e n d e r a receber e a executar o r d e n s ;
d — a p r e n d e r a conviver e a c o m p r e e n d e r o m e i o fabril.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 51

P o r esse c a m i n h o estão os estudantes a p r e n d e n d o a conduzir ser-


viços e os problemas de t r a b a l h o h u m a n o , m a t é r i a difícil de ser
ensinada em sala de aula.
A indiístria se caracteriza p o r ser o m u n d o das m á q u i n a s e de
elevado n ú m e r o de h o m e n s . Pelo menos p o r e n q u a n t o , no que se
refere a aglomeração h u m a n a . O conhecimento de m á q u i n a s p o d e
a escola de engenharia ministrar, m o r m e n t e dos princípios e leis
básicos que presidem a sua estrutura, sua construção e seu funciona-
m e n t o . Os seus livros, laboratórios e usinas-pilôto p o d e m mostrar o
essencial, neste t e r r e n o . Mais difícil à escola é ensinar tôda a gama
de ações e reações do h o m e m sôbre as m á q u i n a s e sôbre os outros
homens q u e povoam a fábrica. E n t r e t a n t o , cabe ao engenheiro
conhecer êste capítulo do saber, t a n t o q u a n t o o outro, dado que vai
planejar e conduzir o t r a b a l h o h u m a n o . Talvez resida neste ponto
a m a i o r contribuição da cooperação indústria-escola.
D a í t a m b é m as recomendações, h o j e numerosas em muitos países,
no sentido da atenção pelos engenheiros e a cultura humanista, em
p a r a l e l o com os de caráter tecnológico.
O sistema é um pressuposto de que o estudante de engenharia deve
receber da escola, sobretudo, os fundamentos q u e l h e p e r m i t a m con-
t i n u a r e s t u d a n d o e a p r e n d e n d o pela vida afora as técnicas que estão
sendo renovadas c o n t i n u a m e n t e .
E é depois de f o r m a d o , como auxiliar ou assistente de um en-
genheiro e x p e r i m e n t a d o , que começará a t r e i n a r em funções de en-
genharia p r o p r i a m e n t e ditas.
Convém deixar assinalado que o regime " s a n d u í c h e " traz consigo,
inclusive, a grande vantagem de p e r m i t i r a duplicação da matrícula
da escola, d a d o o regime de alternância a q u e acima nos referimos,
desde que se reduza um pouco o p e r í o d o a n u a l de férias.
Muitas são as hipóteses focalizadas q u a n t o à época do estágio,
entre as quais anotamos as q u e o a d m i t e m desde o início dos cursos,
ou só após a sua p a r t e fundamental ou só d u r a n t e as férias,
ou d u r a n t e u m a p a r t e do dia, ou d u r a n t e t o d o o dia, com aulas
à noite, etc.
A v e r d a d e é que, como ocorre em outros casos, não há u m a so-
lução idêntica p a r a todas as escolas. Cada u m a deve ser bastante
livre e possuir organização flexível q u e p e r m i t a estudar e ensaiar
soluções, até fixar-se na que lhe fôr mais a d e q u a d a ou possível.
F o r m a valiosa de ligação e n t r e a escola de engenharia e a indús-
tria reside na realização de cursos de pós-graduação. Após a primeira
graduação, ingressa o j o v e m engenheiro nos degraus iniciais de sua
carreira na fábrica. Após alguns anos, descoberto seu verdadeiro
c a m i n h o e as suas preferências, r e t o r n a à escola p a r á um ano ou mais
de a p r o f u n d a m e n t o de estudos, visando à conquista de melhores
postos. Infelizmente ainda são esparsos as práticas de tais cursos,
em nosso meio, salvo os casos de estudos de aperfeiçoamento em
universidades estrangeiras, mas freqüentes nos últimos dez anos.
Documentação

ATIVIDADES DO INEP EM 1963

Do documento apresentado pelo Dire- de acordo com as necessidades in-


tor Substituto do INEP, Dr. Péricles dividuais e as necessidades sócio-
Madureira de Pinho, ao Ministro
Sambaquy, expondo as realizações do
econômicas das regiões por êle
INEP e Centros de Pesquisas Educa- atendidas;
cionais no ano de 1963, extraímos d) análise e prática da fun-
esta súmula:
ção de Supervisor e elaboração
de planos de supervisão a serem
CURSOS DE TREINAMENTO E realizados nas localidades onde
APERFEIÇOAMENTO DO bolsistas deverão trabalhar, orien-
MAGISTÉRIO tando, pelo menos, 10 professôres
não diplomados.
1. Curso de Formação de Pro- O currículo do Curso com-
fessóres-Supervisores preende: Fundamentos da Edu-
cação, Currículo e Supervisão,
Os Cursos de Formação de
Linguagem, Matemática, Estudos
Professôres-Supervisores f o r a m
Sociais e Ciências Naturais, Re-
previstos no Plano Nacional de
creação e Jogos, Arte Infantil,
Educação e sua realização está
Artes Industriais e Música na
disciplinada no Plano Trienal de
Escola Primária e a parte prática
Educação.
recebe especial ênfase.
O objetivo dêsses cursos é dotar
Estava programado, para o cor-
o País de um grupo de profes-
rente ano, a formação de 1.500
sôres capazes de orientar regen-
tanto, em conseqüência da redu-
tes leigos do magistério primário,
ção de mais 50% das verbas des-
já em exercício, em localidades
tinadas ao INEP, somente se pôde
que não dispõem de professôres
proporcionar treinamento a 800
diplomados em número suficiente
prof essôres-superviso res.
para atender ao total de crianças
em idade escolar. Em Salvador, o curso está sen-
do realizado no Centro Regional
Essa preparação a ser realizada
em 6 meses, compreende: de Pesquisas Educacionais, de
julho a dezembro. Suas ativida-
a) o estudo dos objetivos da
des se estão desenvolvendo em
escola primária, como instituição
essencialmente educativa; regime de tempo integral, em dois
turnos, sendo um destinado a
b) conhecimento de novas aulas e estudo dirigido e outro a
técnicas de ensino, inclusive re-
observação e prática nas Escolas-
cursos audiovisuais;
Classe e na Escola-Parque do
c) elaboração de programa de Centro Educacional Carneiro Ri-
aperfeiçoamento do magistério
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 53

beiro e no Centro de Recursos mero de bolsistas é de 115, sendo


Audiovisuais. 51 do Ceará e 64 de Pernambuco.
Estão freqüentando o curso 90 A prática desenvolve-se nas Esco-
bolsistas: 62 da Bahia, 14 de las Primárias do Estado.
Alagoas e 14 de Sergipe. No Rio Grande do Sul, os
Na Guanabara, o curso se ini- cursos realizam-se em Porto Ale-
ciou em julho, no Centro Bra- gre (38 bolsistas), em Pelotas
sileiro de Pesquisas Educacionais, (28 bolsistas) e em Santa Maria
onde são realizadas as aulas e se- (43 bolsistas). Funcionam em
ininários com estudo dirigido; as dois turnos: das 8 às 11 horas e
observações e prática estão sendo
das 14 às 19 horas, diariamente.
feitas no Centro Experimental de
Das 109 bolsistas, 58 são do Esta-
Educação Primária do I N E P
(Escola Guatemala), devendo es- do de Santa Catarina e 51 do
tender-se a escolas rurais do Esta- próprio Estado.
do. Os 51 bolsistas distribuiram- Em Goiás, os cursos tiveram
se nesta ordem: Paraíba — 24; início em agosto para 77 bolsistas
Rio Grande do Norte — 15, Pará do próprio Estado, na cidade de
— 11, Piauí — 1. Inhumas, próximo de Goiânia.
No Espírito Santo, o curso está Em Mato Grosso, os cursos se
sendo realizado, desde junho, no iniciaram em 16 de agosto para
Centro Educacional de Colatina, professôres do próprio Estado, no
em regime de internato. Centro de Treinamento do Ma-
Participam do curso 61 bolsis- gistério, em Cuiabá, no bairro de
tas, sendo 33 do Espírito Santo, Coxipó, com 37 bolsistas.
17 do Piauí, 5 do Amazonas, 3 do Em São Paulo, os cursos pro-
Acre e 3 do Maranhão. gramados para professôres foram
Em Minas Gerais, os cursos, iniciados com 92 bolsistas, assim
que se processam em Ibirité (Fa- distribuídos: Maranhão — 13,
zenda do Rosário) e Belo Hori- Ceará — 16, Paraíba — 6 , Para-
zonte, foram respectivamente ini- ná — 57.
ciados em abril e maio do cor-
rente ano e programados para 2. Cursos de Especialistas em
um total de 137 bolsistas, em re- Educação
gime de internato. Estão sendo
treinados 81 bolsistas: 11 do Es- Ainda no CRPE de São Paulo,
tado do Rio de Janeiro e 70 de o INEP realiza no corrente ano os
Minas Gerais; em 12 de setembro cursos a seguir relacionados:
foi iniciado o terceiro curso com
56 professôres provenientes de
Especialistas em Educação
Mato Grosso, instalado no Horto,
bairro de Belo Horizonte. Êste curso decorre de uma de-
Em Pernambuco (Recife), os cisão tomada na Reunião de Mi-
cursos vêm sendo ministrados no nistros de Educação realizada sob
Centro Regional de Pesquisas o patrocínio da UNESCO, em
Educacionais do I N E P e o nú- Lima, em 1957, e compreende,
54 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

além de bolsistas brasileiros, edu- Especialistas em Recursos


cadores latino-americanos custea- Audiovisuais
das as despesas pelo Ministério
das Relações Exteriores. Curso realizado no Centro Re-
gional de Pesquisas Educacionais
Iniciado em março, deve pro- de São Paulo, com a finalidade
longar-se até dezembro e de seu de preparar pessoal capaz de di-
currículo consta, após um perío- fundir e desenvolver, nos Estados,
do introdutório de preparação ge- junto às Secretarias de Educação
ral de "Fundamentos da Educa- ou em Centros de Recursos Audio-
ção", especialização em Adminis- visuais, estes modernos recursos
tração Escolar e Formação de de ensino.
Professôres. A preparação, em tempo inte-
Estão freqüentando o curso 18 gral, feita em pequenos grupos,
bolsistas brasileiros e 18 latino- tendo em vista a intensidade da
americanos. parte prática, abrange no ano
corrente bolsistas dos Estados da
Bahia (1), Brasília (1), Espírito
Pesquisas em Educação Santo (1), Goiás (1), Mara-
nhão (1), Minas Gerais (1), Pará
(II Seminário para Treinamento (1), Paraíba (1), Paraná (2),
de Pessoal) Pernambuco (1), Rio Grande do
Sul (1), São Paulo (1), Sergipe
O Curso, realizado no Centro (1) e Ceará (1).
Regional de Pesquisas Educacio-
nais, destina-se a preparar pes- 3. Treinamento de Pessoal em
quisadores em Educação para Planejamento Educational
Centros de Pesquisas e para asses-
sorar os Secretários de Educação Êste curso teve início no cor-
rente ano e suas atividades de-
dos Estados, nos levantamentos
correram do Convênio recente-
básicos e estudos necessários à mente firmado entre o MEC, a
orientação de administradores e UNESCO e a UNICEF, ratificando o
professôres, na resolução dos pro- Plano Mestre de Operações para
blemas educacionais. um Programa de Auxílio Técni-
Os bolsistas são em número co e Financeiro atinente aos
de 38, a s s i m discriminados: aspectos básicos do Plano Trienal
Amazonas (1), Bahia (3), Bra- de Educação.
sília (1), Ceará (1), Espírito Em face dêste convênio, foram
Santo (4), Paraná (3), Pernam- instalados os seguintes Centros
buco (2), Rio Grande do Nor- de Treinamento do Magistério:
te (3), Goiás (2), Mato Gros-
so (2), Minas Gerais (4), Rio — Inhumas — Goiás — Coorde-
Grande do Sul (3), Estado do nação Estadual: Prof.a Sônia
Rio de Janeiro (1), São Pau- Seabra
lo (3), Pará (2), Maranhão (1) Os trabalhos de instalação do
e Paraíba (2). Centro compreenderam: compra
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 55

de todo o material necessário aos sôres supervisores. Êste curso e


alojamentos, cozinha, copa, refei- todas as demais atividades do
tório, lavanderia, suites de trei- Centro estão sediados em um
namento, salas de aula e depen- amplo prédio localizado no dis-
dências administrativas; escolha trito de Coxipó da Ponte, na ci-
do corpo docente; escolha do pes- dade de Cuiabá, o qual, após as
soal administrativo; recrutamento obras de adaptação já programa-
e seleção dos bolsistas; comple- das, abrigará eonfortàvelmente
mentação dos prédios. todos os bolsistas e professôres.
A construção e a complemen- O prédio foi construído pelo
tação dos prédios esteve a cargo Ministério do Interior e Justiça
do Govêrno do Estado de Goiás, há cerca de 10 anos, destinando-se
através da SUPLAN, que os entre- a abrigar menores abandonados,
gou no tempo previsto, completa- não tendo sido utilizado para êste
mente acabados. fim.
O curso de professôres supervi- Não obstante, a situação do
sores teve início a 9 do mês de prédio não foi definida quanto à
agosto, congregando 10 professô- sua utilização pelo Ministério da
res e 77 bolsistas. Dos professô- Educação e Cultura. Aguarda-se
res, 8 são oriundos do Estado de a solução de expediente encami-
Minas Gerais, colocados à dispo- nhado ao Senhor Ministro do
sição do projeto por gentileza da Interior e Justiça e a tramitação,
Secretaria de Educação e Cultura pelo Congresso, de projeto de lei
daquele Estado. que define esta pendência.
O programa das atividades foi Em face das dificuldades de
organizado de modo a oferecer se obter professôres (docentes)
aos bolsistas amplas oportunida- para o Centro de Treinamento,
des de prática de supervisão em transferimos parte do curso para
escolas primárias locais. Para- Belo Horizonte, onde funciona
lelamente, foi planejado e já sob a responsabilidade do Centro
entrou em execução um programa Regional de Pesquisas Educacio-
de entrelaçamento entre a comu- nais do INEP.
nidade e o Centro, de modo que Os bolsistas estão, assim, dis-
êste se torne, num futuro pró- tribuídos em dois grupos: 37 em
ximo, um núcleo de irradiação da treinamento no Centro em Cuiabá
cultura pedagógica a todos os pro- (Coxipó da Ponte) e 56 em trei-
fessôres da região. namento no CRPE de Belo Hori-
Os professôres são normalistas, zonte (Horto).
com, pelo menos, três anos de
experiência docente e prática em
OUTROS CURSOS
três graus de ensino primário.
Centro Regional de Pesquisas
— Cuiabá — Mato Grosso — Educacionais de São Paulo
Coordenação Estadual: Neste Centro estiveram em
Prof.ª, Ângela Jardim Botelho treinamento, sob a supervisão do
Neste Centro desenvolve-se um Prof. Staney Applegate, técnico
pragrama de formação de profes- em educação da UNESCO, 10 pro-
56 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

fessôres do Estado de Goiás e 4. Programa de Assistência


10 do Estado de Mato Grosso. Brasileiro-Americana ao
Os primeiros, coordenados pela Ensino Elementar.
Prof.ª Clara Alterman Colotto e
os segundos pela Prof. a Anne O PABAEE foi criado pelo Con-
Marie Davée Guimarães. vênio assinado em 11 de abril
A esses professôres, de confor- de 1956 entre os Governos Bra-
midade com suas aptidões, foram sileiro e Americano, com os se-
ministrados cursos de supervisão, guintes objetivos:
planejamento educacional e Es- a) treinar supervisores de en-
pecialistas em recursos audio- sino primário e professôres de es-
visuais. colas normais e de cursos de
aperfeiçoamento de professôres;
Centro Regional de Pesquisas b) produzir, adaptar e distri-
Educacionais da Bahia buir materiais didáticos a serem
usados no treinamento de profes-
Estiveram em treinamento nes- sôres ;
te Centro, com bôlsas-de-estudo
providas pelo FISI, 91 professôres c) selecionar professôres com-
normalistas, sendo 78 no Curso petentes, a fim de enviá-los aos
de Supervisores e 13 no Curso Estados Unidos da América do
de Treinamento de Professôres Norte para treinamento em Edu-
Primários. cação Elementar.
Atualmente, o programa está
sendo dirigido tendo em vista a
Total de Bolsistas preparação de professôres para
Os professôres em treinamento os Centros de Treinamento do
nos Centros mencionados, supri- Magistério, instituído no Plano
dos com bolsas do FISI, atingiu a Trienal e destinados à formação
um total de 281, assim distribuí- de professôres primários, super-
dos, por Estado de origem dos visores de ensino e diretores de
bolsistas: escolas primárias.
As atividades do PABAEE se ini-
— Mato Grosso — 10 em São ciaram em 7 de agosto de 1957,
Paulo, 37 em Cuiabá, 56 em no Instituto de Educação de Belo
Belo Horizonte. Horizonte. Desde então o MEC,
através do INEP, vem custeando,
— Goiás — 10 em São Pau- de acordo com o Convênio refe-
lo, 77 em Inhu- rido, todas as despesas do Pro-
mas grama no Brasil, no que concerne
a pessoal, material e auxílio aos
— Bahia •— 62 em Salvador bolsistas dos vários Estados da
— Sergipe — 15 em Salvador Federação, e, ainda, no que se
refere a passagens dos professôres
— Alagoas — 14 em Salvador brasileiros que vão aperfeiçoar-se
Total — 281 bolsistas nos Estados Unidos, anualmente.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 57

Em 1963, no primeiro curso, Cestaria e se destina apenas à


foram treinados 84 professôres formação de professôres.
com bolsas do INEP, e no segundo Estes dois cursos formarão 67
estão sendo aperfeiçoados 91. professôres e 38 supervisores de
A partir de 5 de setembro Artes Industriais.
último, nos têrmos do próprio
Convênio, passou a integrar o
CRPE de Minas Gerais, sob a di- 6. Curso de Aperfeiçoamento de
reção da Coordenadora da Divi- Professôres para Crianças
são de Aperfeiçoamento do Ma- Excepcionais
gistério do mesmo Centro. Tem por fim proporcionar a
professôres dos vários Estados da
5. Cursos de Artes Industriais Federação oportunidade de obser-
vação e estudo de crianças ex-
Prosseguindo o trabalho, inicia- cepcionais. Está sendo realizada
do há 10 anos, com a formação na Associação de Pais e Amigos
de professôres e supervisores de dos Excepcionais, no Estado da
Artes Industriais, atividades da Guanabara, e freqüentado por
5. a e 6. a séries primárias, o que, 10 professôres dos Estados de:
pela Lei de Diretrizes e Bases da Alagoas (1), Pernambuco (1),
Educação Nacional, terá amplo Espírito Santo (1), Minas Ge-
desenvolvimento, o INEP progra- rais (2), Paraná (3), Rio Gran-
mou, para o ano corrente, a for- de do Sul (2).
mação de 97 professôres de Artes
Industriais procedentes dos vá- 7. Cursos na Escolinha de Arte
rios Estados da Federação e que
estão sendo treinados no Rio e em Realizado na Escolinha de Arte
São Paulo. do Brasil, neste Estado, com o
Os bolsistas do curso do Rio se fim de estimular iniciativas e dar
especializarão em algumas das se- aos professôres interessados em
guintes técnicas: Cestaria, tra- arte na educação possibilidade de
balhos em Couro, Desenho, Carto- trabalho de pesquisa para entro-
nagem, Cerâmica, trabalhos em samento de novas experiências na
Metal e Madeira, Tapeçaria, Es- escola, vem sendo freqüentado
tamparia, execução de Fantoches, por 14 bolsistas: Amazonas (1),
Tecelagem, Mosaico, Esmaltação a Piauí (2), Ceará (5), Pernam-
fogo, Artes Gráficas, Encaderna- buco (1), Alagoas (1), Bahia (2),
ção e Douração. Êste curso visa Paraná (1) e Rio Grande do
tanto a formação de professôres Sul (1).
de Artes Industriais como de Su-
pervisores.
8. Curso de Língua e Literatura
O curso de São Paulo inclui
desenho, Modelagem, trabalhos em Curso realizado no Centro Bra-
Madeira e Metal, Escovaria, Car- sileiro de Pesquisas Educacionais
tonagem, trabalhos em Couro e com o objetivo de melhorar o pre-
58 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

paro dos professôres de Língua e Gerais (1), São Paulo (1), Es-
Literatura, de Escolas Normais, tado do Rio (1) e Rio Grande
propiciando condições pará for- do Sul (1).
mação mais satisfatória dêsses
profissionais nas Facilidades de
Filosofia. 9. Cursos Avulsos
Iniciado em 1962 com 9 bolsis-
tas, para ser ministrado em dois Canto Orfeônico — 1; Mestre
anos, prosseguiu em 1963 com de Banda — le Estágio na Es-
7 bolsistas de: Bahia (3), Minas cola Guatemala — 1.
REUNIÃO DO CONSELHO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO E CONSELHOS ESTADUAIS

No último trimestre de 1963, o Con- tados e dados e pesquisas diretas


selho Federal de Educação promo- a seu alcance.
veu uma reunião com os Conselhos
Estaduais, realizada nesta capital na 3. a Os Estados e os Municí-
l . a quinzena de novembro. Após pios deverão adotar, para solu-
os debates sôbre competência, inter- ção de medidas de mútuo inte-
câmbio, planejamento e problemas resse em matéria de ensino, a fór-
do ensino, foram adotadas as seguin-
tes sugestões, a serem consideradas
mula dos convênios, cada qual
pelas a u t o r i d a d e s e d u c a c i o n a i s : inspirado efetivamente nas ne-
cessidades e possibilidades locais,
l. a Os Estados, o Distrito Fe- guardando, sempre que possível,
deral e os Territórios promoverão, os preceitos de unidade adminis-
trativa.
nos têrmos do art. 28 da Lei de
Diretrizes e Bases, o levantamento 4. a Esses convênios terão, den-
anual do registro das crianças em tre outros, os seguintes objetivos
idade escolar, dentro do primeiro preferenciais:
trimestre de cada ano, utilizan- a) o estudo, em conjunto, das
do-se de recenseamento escolar e necessidades do município em en-
de registro civil, bem como de sino primário e médio, dentro
quaisquer outros dados estatísti- das metas do Plano Nacional de
cos do I.B.G.E, e dos municípios. Educação, e o atendimento a essas
necessidades pelo Estado, pelo
2. a Á chamada anual da po- Município e pela iniciativa pri-
pulação escolar de sete anos para vada, concluindo por indicar o
matrícula na escola primária, nos déficit escolar efetivo, a ser con-
têrmos do art. 29 da Lei de Di- siderado pela União, mediante o
retrizes e Bases. auxílio que lhe proporcionará o
Plano Nacional de Educação;
Para esse chamamento, poderá
servir de modêlo o Edital baixado b) a designação de um dire-
pela Secretaria de Educação do tor de grupo estadual, com fun-
ções de diretor de ensino no mu-
Estado da Guanabara, instituindo
nicípio, ou de uma junta inte-
os atestados de isenção. grada também por elemento mu-
Autoridade municipal utilizará nicipal para a coordenação das
os dados estatísticos coordenados atividades educacionais no muni-
pelo I.B.G.E., o levantamento da cípio, sem quebra de sua auto-
população escolar feito pelos Es- nomia ;
60 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

c) a elaboração até agosto de e) a previsão de programas


cada ano pelos Conselhos Esta- de construção de prédios escola-
duais dos respectivos planos es- res, com o concurso das três esfe-
taduais, compreensivos das ativi- ras da administração pública,
dades a cargo dos Estados e Mu- mediante financiamento a longo
nicípios, integrados também pela prazo.
atividade dependente de auxílio 5. a A próxima Reunião do
da União; Conselho Federal de Educação
d) o estudo em cada municí- com Representantes dos Conse-
pio do custo do ensino, considera- lhos Estaduais considerará, em
das as unidades federais, esta- seu temário, o programa de cons-
duais, municipais e particulares, trução de prédios escolares e as
para o efeito do art. 96 da Lei de modalidades de financiamento dos
Diretrizes e Bases: serviços de educação.
XXVI CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DE
INSTRUÇÃO PÚBLICA

Reunida em Genebra em sua 26. a ses- a maioria das pessoas não pudesse
são, de 1.º a 12 de julho de 1963, escolher uma profissão conforme
por convocação da Unesco e do Bu-
rean Internacional de Educação, a seus interesses e aptidões e não
Conferência adotou as seguintes re- experimentasse a satisfação de
comendações, dirigidas aos Ministé- vencer nessa profissão,
rios de Instrução Pública:
que o conceito de orientação
está evoluindo e é considerado
Recomendação n.° 56 hoje como esforço contínuo, es-
treitamente ligado à ação educa-
ORIENTAÇÃO ESCOLAR E tiva da escola,
PROFISSIONAL
o acréscimo constante dos efe-
A Conferência Internacional tivos escolares e a necessidade de
de Instrução Pública, conside- oferecer conselhos individuais aos
derando alunos desde a idade em que co-
que a orientação escolar e pro- meçam a tomar consciência de
fissional deve permitir a cada suas responsabilidades perante a
um o completo desenvolvimento comunidade a que serão chamados
de suas aptidões, o uso total de a se integrar e participar como
sua capacidade e a expansão de membros úteis,
sua personalidade, que a orientação será mais efi-
que essa orientação se torna caz na medida em que se apoiar
indispensável, uma vez que, pela num conhecimento mais profundo
elevação do nível de conhecimen- da criança, observada durante pe-
tos e qualificações, se deseja sa- ríodo suficientemente longo nos
nar as dificuldades criadas pelo diversos aspectos de seu compor-
aceleramento da evolução técni- tamento e diferentes etapas de
ca, econômica e social, e a assegu- seu desenvolvimento,
rar a utilização racional do con- que a orientação pode constituir
junto dos recursos humanos, laço entre a escola e o trabalho,
que o desenvolvimento da so- influenciar a estrutura, a orga-
ciedade não estaria assegurado se nização do conteúdo do ensino, e
Estas recomendações foram traduzidas do Bulletin du Bureau International
d´Education, n.° 148, 3.° trimestre de 1963, por Heloisa Guimarães Monteiro, de
nossa redação.
62 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

contribuir para o sucesso do pla- fissional, de 6 de junho de 1962,


nejamento econômico e social do pela Conferência Geral desse mes-
país, mo órgão, e a recomendação re-
que o adulto pode sentir-se em lativa ao ensino técnico e profis-
certos momentos de sua carreira sional, de 11 de dezembro de 1962
profissional, diante da obrigação da Conferência Geral da Unesco.
de mudar de rumo ou desejar ainda as diversas recomenda-
adquirir qualificação mais ele- ções e resoluções adotadas sôbre
vada, plano não governamental focali-
que as possibilidades de ampliar zando um ou mais aspectos da
a orientação, apesar de tudo, es- orientação escolar e profissional,
tão ligadas ao avanço do ensino que, a despeito de aspirações se-
e do desenvolvimento econômico melhantes, países diferentes de-
e social do país considerado e suas vem dar a esse problema soluções
diversas regiões, diversas,
que a orientação escolar e pro- submete aos Ministérios de Ins-
fissional não poderá ser eficaz trução Pública dos diferentes paí-
sem que antes se assegure a gra- ses a seguinte recomendação:
tuidade do ensino, a ajuda ma-
terial aos alunos desde que ne-
cessária, e ausência de tôda dis- Natureza da orientação escolar
criminação racial, social ou qual- e profissional
quer outra,
1. As autoridades responsáveis»
que muitas das recomendações se encontram hoje em presença
feitas ultimamente pela Confe- dos vários sistemas ou concepções
rência Internacional de Instrução de orientação escolar e profissio-
Pública, especialmente a de n.° 25, nal; esses sistemas, embora ateu-
que dispõe sôbre o desenvolvi- dendo a preocupações e necessi-
mento dos serviços de psicologia dades diversas, podem, sob certos
escolar e a Recomendação n.° 49 aspectos, se influenciar e mesmo
concernente ao recrutamento c se completar reciprocamente; por
formação de quadros técnicos e conseguinte não devem ser con-
científicos, adotadas respectiva- siderados incompatíveis; no mo-
mente a 28 de junho de 1948 e mento de fazer sua escolha, os
5 de julho de 1954, focalizam me- países podem tomar em conside-
didas relativas ao desenvolvi- ração as características próprias
mento da orientação escolar o aos principais sistemas existentes.
profissional, a saber:
além disso, a recomendação re- a) sistema de orientação pro-
ferente à orientação e conselhos fissional extra-escolar, que se ba-
profissionais, aprovada a 8 de seia numa vasta experiência em
junho de 1949 pela Conferência alguns países;
Geral da Organização Internacio- b) o sistema que apoia o pro-
nal do Trabalho, a recomendação grama do ensino sôbre informação
que dispõe sôbre a formação pro- e orientação profissionais, sem re-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 63

correr a serviços especiais e que Princípios Gerais


se inspira na concepção de ensino
que favorece a iniciação ao tra- 3. Qualquer que seja o siste-
balho e dá ao aluno consciência ma de orientação adotado atual-
de suas responsabilidades futuras mente pelas autoridades respon-
com respeito à sociedade; sáveis, é necessário considerar
alguns princípios gerais aplicá-
c) o sistema que dá um cará- veis às diversas situações.
ter de orientação à estrutura do
4. A orientação deve permitir
ensino de segundo grau, com pri-
ao indivíduo resolver os proble-
meiro ciclo compreendendo clas-
mas resultantes da escolha de seus
ses de observação e orientação que
estudos e sua profissão, esforçan-
levam a estudos diferenciados ao
do-se em determinar por dife-
nível do 2.° ciclo; êste sistema se
rentes meios quais são seus inte-
harmoniza com a existência de
resses e capacidades, tanto inte-
serviços de orientação escolar e
lectuais como físicas, ensinando-
profissional alheios à escola mas
lhes a se conhecer e informando-
que com ela participam dessa
Ihes sôbre as profissões e estudo3
orientação;
a que se dedicam.
d) o sistema de orientação es-
colar e profissional contínua, es- 5. A orientação deve, por
truturado sob forma de serviços outro lado, considerar a evolução
de consultas e de conselhos que social e econômica do país e as
seguem os alunos no seu desen- necessidades atuais e futuras da
volvimento físico e intelectual, sociedade, garantindo a liberdade
ajuda-os a resolver suas dificulda- de escolha do indivíduo, isto é,
des pessoais e guia-os nas deci- ser responsável tanto em relação
sões que serão chamados a tomar a si mesmo quanto à sociedade.
futuramente. 6. É dever de cada país pre-
2. Na escolha de um sistema ver uma orientação escolar e pro-
de orientação escolar e profissio- fissional e encorajar os alunos de
nal as autoridades responsáveis todos os graus a se beneficiarem
deverão ter em conta os diversos de seus conselhos; o ensino deve
fatôres, dos quais convém assina- oferecer número suficiente de
lar particularmente: opções para que cada um, a qual-
a) a estrutura do sistema es- quer momento, possa escolher um
colar, suas modalidades atuais e caminho correspondente a seus
possibilidades de mudanças; interesses e capacidades.
b) medidas já adotadas sôbre 7. É conveniente assegurar a
o assunto; gratuidade dos serviços de orien-
c) meios materiais ou outros tação escolar e profissional ampa-
de que disponha o país para ge- rada pelos serviços públicos, de
neralizar essa orientação; maneira que as pessoas desejosas
d) características da vida eco- de a eles recorrerem não se en-
nômica e social do país, o grau contrem impedidas por considera-
já alcançado e o que se propõe ções de ordem econômica; uma
atingir no seu desenvolvimento. ajuda financeira poderá ser con-
64 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

cedida a serviços de orientação, 13. Os testes de psicologia


de iniciativa particular, sem fins aplicada destinados a medir o ní-
lucrativos. vel de inteligência e a descobrir
8. Cabe às autoridades esco- as aptidões e os interesses de-
lares assumir em primeiro lugar vem ser cientificamente elabora-
a responsabilidade pela orienta- dos, suficientemente variados e
ção; quanto à orientação profis- adaptados para se considerar as
sional, devem as autoridades es- características do país e seus di-
colares entrar em contato com as ferentes níveis sociais e culturais.
autoridades de que dependem os 14. Em qualquer sistema de
serviços do trabalho e da indús- orientação escolar e profissional,
tria, dos assuntos sociais, da ju- a avaliação do desenvolvimento e
ventude, etc. das possibilidades do adolescente
deve ser baseada não somente
9. Qualquer que seja o siste-
pelo que foi revelado nos testes
ma em vigor, convém estabelecer
psicológicos mas também pelos
órgão consultivo permanente com-
resultados dos testes de conheci-
preendendo representantes das
mentos gerais, do trabalho esco-
partes interessadas.
lar, dados do exame médico e por
10. Meios suficientes devem informações de ordem familial e
ser previstos, permitindo a expan- social; a colaboração dos pais é
são progressiva do sistema de indispensável.
orientação a todos os jovens, em
15. A adoção da ficha cumu-
todas as regiões, rurais e urbanas,
lativa do aluno durante tôda a
e aos diversos níveis de ensino.
sua escolaridade com indicações
11. Os países que ainda não sôbre seus progressos nos estudos
dispõem de recursos necessários e comportamento é indispensável
para organizar um sistema gene- desde que a cargo de educadores
ralizado de orientação devem ten- experientes; essa documentação
tar a experiência em certo nú- deve permanecer confidencial e
mero de centros ou escolas-pilôto, não pode ser utilizada para outros
que podem servir de modêlo e se fins.
estender gradualmente pelo país. 16. Em qualquer sistema de
orientação é essencial prever uma
Processos e técnicas de orientação série de entrevistas pessoais para
12. Qualquer que seja o sis- ganhar a confiança do adoles-
tema adotado, é essencial que a cente e seus pais; essas entrevis-
orientação se baseie no estudo e tas também ajudarão ao adoles-
na observação de cada indivíduo, cente a se conhecer melhor e a
considerando-se todos os aspectos compreender as oportunidades
de sua personalidade, de seu de- que se lhes oferecem.
senvolvimento intelectual, físico 17. Nesses sistemas é essencial
e afetivo, de seus resultados esco- conceder maior importância à in-
lai-es e circunstâncias familiais e formação sôbre as profissões e
sociais que exercem influência sôbre os estudos a que se dedi-
sôbre seu comportamento. cam; esta informação, que inte-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 65

ressa tanto aos alunos como aos logia e suas aplicações, ciências
pais, deve ser integrada no sis- econômicas ou sociais e problemas
tema de orientação escolar e pro- de educação, do trabalho e da
fissional e feito em colaboração juventude, podendo contar com
com serviços especializados; deve auxílio de pessoas de qualificação
ser dada à escola e divulgada menos elevada.
amplamente através de folhetos,
palestras, filmes, pelo rádio, pela 22. Nos países onde a infor-
televisão e pela imprensa. mação e orientação profissionais
são integradas no ensino, convém
18. Com o intuito de facilitar que, em cada escola, um ou mais
a orientação, atividades práticas membros do corpo docente sejam
preparatórias ;\ vida profissional formados em face dêste trabalho
podem ser organizadas na esco- e estejam suficientemente infor-
la e, eventualmente, completadas mados sôbre as profissões e seus
por visitas ou estágios nas em- caminhos de acesso; além disso,
presas. lições sôbre os princípios, métodos
19. A despeito das dificulda- e prática da orientação escolar e
des inevitáveis que isto comporta, profissional devem estar incluídos
é conveniente encontrar meios de no programa de formação de
seguir os alunos orientados; tal mestres.
controle será útil não só aos inte- 23. Nos países em que a orien-
ressados, mas contribuirá para a tação constitui elemento sepa-
avaliação e aperfeiçoamento sis- rado do programa do ensino,
máticos e contínuos dos métodos apesar de algumas vezes confiada
de orientação; estes trabalhos de- a alguns professôres, convém que
vem ser confiados a serviços de estes sejam devidamente prepa-
pesquisa adequados, rados para essa tarefa especiali-
zada; deve-se assegurar uma dis-
Pessoal encarregado da orientação tribuição equilibrada entre sua
função de conselheiro e de mes-
20. Em tôda parte onde técni- tre, de maneira que possam consa-
cas psicológicas são empregadas grar tempo suficiente a cada uma
para a orientação escolar e pro- dessas funções.
fissional, é conveniente confiar a
aplicação a pessoas titulares de 24. Os especialistas em orien-
uma qualificação em psicologia tação devem sempre exercer sna
(pessoas portadoras de títulos em tarefa em colaboração contínua
psicologia) e com estudos de ní- com o corpo docente, com o mé-
vel superior. dico, o psicólogo e o assistente
social ligados à escola.
21. Desde que existam servi-
ços de orientação escolar e pro- 25. No quadro de um 1.° ciclo
fissional operando fora da escola, de ensino secundário concebido
deve-se confiar a responsabilidade como ciclo de orientação, é indis-
a pessoas com estudos de nível pensável que o pessoal responsá-
superior e que possuam formação vel conheça as diversas técnieas
especializada no campo da psico- necessárias a assegurar o enca-
66 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

minhamento dos alunos pelos es- de desenvolvimento do seu sis-


tudos diferenciados do 2.° ciclo. tema de orientação, têm interesse
26. Os métodos de orientação em considerar a experiência dos
e informação escolar e profissio- outros; é preciso, pois, facilitar
nal devem ser constantemente re- tanto o intercâmbio de publica-
novados e atualizados, podendo o ções, contatos pessoais por inter-
pessoal encarregado da orienta- médio de visitas recíprocas, como
ção contar com os meios necessá- conferências, estágios de estudos
rios e oportunidades de aperfei- ou cursos reunindo pessoas dos
çoamento. diferentes países interessados nes-
ses problemas.
27. Por tôda parte onde os
31. D e v e - s e recomendar o
serviços de orientação escolar e
prosseguimento de estudos com-
profissional necessitem do em-
parados, ressaltando as semelhan-
prego de pessoal especializado
ças e diferenças entre os sistemas
não pertencente ao corpo docente,
atuais de orientação; enfim, per-
conviria adotar estatutos regula-
mitindo o esclarecimento da si-
mentando as modalidades da pro-
tuação, êste gênero de pesquisas
fissão e fixando remuneração
poderá sugerir a introdução de
desse pessoal especializado, le-
úteis aprimoramentos nos siste-
vando-se em conta a preparação
mas existentes.
e os títulos exigidos para o exer-
cício da função.
28. As autoridades e organi- Aplicação
zações especializadas responsáveis
pelos serviços de orientação esco- 32. Convém que o texto da
lar e profissional devem elaborar presente recomendação seja obje-
regras de ética profissional estabe- to de vasta difusão por parte dos
lecendo normas para o cumpri- ministérios de instrução pública,
mento de suas funções e relações das autoridades escolares, dos
de ordem profissional. centros de documentação pedagó-
gica, das associações internacio-
nais e nacionais de orientação
Ação Internacional profissional, de pais ou professô-
29. Os países que não dispõem res, e t c ; a impreasa pedagógica.
de recursos financeiros e de pes- oficial ou particular, deve pro-
soal qualificado para assegurar a curar difundir amplamente esta
organização ou o desenvolvimento recomendação junto aos serviços
da orientação escolar e profissio- interessados, pessoal administra-
nal deveriam receber a ajuda de tivo e do ensino, e público em
outros países ou organizações in- geral.
ternacionais sob a forma de assis- 33. Nos países em que se jul-
tência técnica, abrangendo espe- gue necessário, os ministérios de
cialistas, bôlsas-de-estudo e de instrução pública são convidados
viagem, material, créditos, etc. a encarregar os órgãos competen-
30. Todos os países, indepen- tes de proceder a diversos tra-
dentemente da natureza ou grau balhos, por exemplo:
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 87

a) examinar a presente reco- que na maioria dos países em


mendação e comparar seu conteú- pleno desenvolvimento, os pro-
do com o estado de direito e de fessôres primários desempenharão
fato existente em seu país; tarefas importantes no que con-
b) considerar as vantagens e cerne à expansão das comunida-
inconveniências da eventual apli- des situadas em zonas rurais,
cação de cada um dos artigos que que urge analisar a fundo as I
ainda não estão em vigor; causas diversas e as característi-
e) adaptar cada artigo à si- cas da falta de mestres nos países
tuação do país, caso sua aplicação em que isto ocorre,
seja julgada útil; o grau das necessidades educa-
d) enfim, propor as disposi- tivas e o desenvolvimento contínuo
ções e medidas de ordem prática dos efetivos escolares que se ma-
que assegurem a aplicação do arti- nifestam em todos os países do
go considerado. mundo,
34. Os centros regionais da que, entre as medidas a tomar
Unesco são convidados a facilitar, na luta contra a carência de pro-
com a colaboração dos ministérios fessôres primários, convém dar
interessados, e na medida de suas prioridade às que apresentam me-
posses, o exame desta recomenda- nos falhas do ponto-de-vista da
ção e sua adaptabilidade às ca- qualidade do ensino,
racterísticas regionais. recomendações anteriores, prin-
cipalmente as de n.° 36, 37 e 55,
adotadas nas 16. a e 25. a sessões
Recomendação n.° 57 e relativas, respectivamente, à
formação do professor primário,
situação desse pessoal docente e
CARÊNCIA DE PROFESSÔRES aperfeiçoamento dos mestres em
PRIMÁRIOS exercício,
A Conferência, considerando que, a despeito de aspirações
que a falta de professôres pri- semelhantes, países diferentes de-
mários e a crise de recrutamento vem contribuir de maneiras di-
que dela resulta se fazem sentir versas para a solução do pro-
na maioria dos países, blema em questão,
que esta carência não somente
constitui um obstáculo ao desen- submete aos ministérios de ins-1
volvimento quantitativo da escola trução pública dos diferentes paí-
mas também afeta perigosamente ses a seguinte recomendação:
a qualidade do ensino,
que a crise de recrutamento Estudo das causas
para o nível de ensino primário
acarreta graves conseqüências a 1. As medidas tomadas para
todos os países e principalmente remediar a falta de professôres
àqueles que ainda não atingiram primários devem basear-se em da-
o período da escolaridade obri- dos objetivos resultantes de pes-
gatória, quisas e estudos científicos con-
68 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

sagrados às causas econômicas, assim, convém avaliar até que


sociais e culturais que determi- ponto a crise de recrutamento
nam essa necessidade e também está ligada ao índice de natali-
as vantagens e inconvenientes li- dade e aos movimentos da popu-
gados a cada solução, particular- lação e enfrentar as conseqüên-
mente no que concerne à utilidade cias da evolução demográfica
prática e oportunidade dessas ulterior.
medidas. 7. Nos países em que o prin-
2. Nos países onde esta ca- cípio da escolaridade obrigatória
rência é geral, e sobretudo na- não é integralmente aplicado, tais
queles em que isto constitui gra- estudos deverão determinar em
ve ameaça ao desenvolvimento e que grau esta carência pode im-
à eficácia do ensino de 1.° grau, pedir ou retardar a realização
é indispensável proceder a estu- dessa medida.
dos desse gênero, usando a con- 8. Quanto aos países em que
tribuição dos órgãos interessados. o prolongamento da escolaridade
3. Nos países que dispõem de obrigatória constitui uma das
um ou mais órgãos encarregados causas determinantes da carência
do planejamento do ensino, são de professôres primários, devem
esses departamentos os mais indi- eles empreender a análise das
cados para empreender ou pôr em necessidades de professôres.
execução tais estudos visando à
9. As condições de vida dos
aplicação das medidas que se
professôres e sua remuneração
impõem.
são muitas vezes insuficientes e
4. Dada a complexidade do com freqüência consideradas uma
problema, os estudos sôbre a na- das causas principais da falta de
tureza e evolução da necessidade mestres; assim, devem-se iniciar,
de professôres primários não se o mais cedo possível, estudos que
limitariam à pesquisa das causas permitam comparar a situação cie
de ordem puramente escolar, mas professôres primários com a de
considerariam outros fatôres que membros de outras profissões que
possam ser igualmente originários tenham qualificações e responsa-
dessa carência. bilidades equivalentes.
5. Além disso, deve-se pro- 10. A carência de mestres po-
curar definir o caráter perma- de ser notada de maneira desi-
nente ou passageiro de cada uma gual em um mesmo país, devendo
das causas assim apuradas, rela- ser encarado o estudo de sua dis-
ções entre elas e o sentido prová- tribuição seja por regiões ou por'
vel de sua evolução: tendência a zonas, urbanas ou rurais, e mesmo
se agravarem, a se estabilizarem no interior de cada uma dessas
ou a se extinguirem. zonas; além disso, convém deter-
6. A situação demográfica cons- minar se esta carência é de maior
titui um dos pontos essenciais em ou menor incidência em rela-
que se deve apoiar qualquer es- ção ao elemento masculino ou
tudo prévio sôbre o problema; feminino.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 69

11. Cabe investigar outros ca- sociais e profissionais do pessoal


sos que, sem se enquadrarem de docente, contribuindo assim para
modo geral nos itens enumerados, o reconhecimento do valor dos
possam desempenhar papel impor- professôres primários perante a
tante na crise de recrutamento coletividade.
por que passam certos países, 15. Além disso, em tôda parte
tais como o prolongamento da du- onde esse regulamento e as con-
ração dos estudos dos candidatos dições de previdência social (se-
ao magistério, a diminuição do guro médico, seguro de vida,
efetivo das classes, redução das condições de aposentadoria, etc.)
horas de serviço, o desejo de se- realçam a situação desfavorecida
guir cursos superiores, a trans- do pessoal docente em relação a
ferência de professôres primários outras categorias de serviços pú-
para outras funções, outros graus blicos, convém extinguir, na me-
ou tipos de ensino e também dida do possível, essa desigual-
outras ocupações. dade prejudicial.
16. Nos países em que a ca-
Medidas destinadas a melhorar rência de professôres primários é
a situação dos mestres mais acentuada no meio rural ou
regiões isoladas, deve-se oferecer
12. Enquanto os professôres aos professôres rurais vantagens
primários de alguns países não compensadoras: abonos especiais.
conhecem as condições de vida à limitação da permanência nas re-
altura de suas qualificações e res- giões isoladas ou insalubres, fa-
ponsabilidades, será necessário cilidades de moradia e abasteci-
atender às dificuldades de recru- mento, gratuidade de meios de
tamento ou de desinteresse pelo transporte, de serviços de assis-
magistério; também, dentre as tência médica para a família, fa-
medidas propostas convém garan- cilidade de internato e educação
tir que a situação material seja para os filhos, autorização de
pelo menos tão boa quanto a dos cultivar parte do terreno perten-
membros da comunidade que te- cente à escola, etc.
nham a mesma formação e res-
ponsabilidades equivalentes.
13. A melhoria da situação Medidas para facilitar a
material dos professôres se justi- formação de mestres
fica aos olhos dos responsáveis 17. Manter o equilíbrio entre
pelo financiamento da educação, as necessidades atuais e futuras
para os quais a afluência esco- quanto ao número de professôres
lar constitui, de agora em dian- e as possibilidades de garantir a
te, elemento fundamental intima- formação regular deve ser preo-
mente ligado ao desenvolvimento cupação constante das autorida-
econômico e social dos povos. des escolares; principalmente nos
14. É indispensável que todos países em que a carência de mes-
os países estabeleçam normas re- tres é conseqüência da introdu-
lativas às condições econômicas, ção, generalização e o prolonga-
70 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

mento da escolaridade obrigató- a c e s s o a estudos pedagógicos,


ria, convém iniciar a criação e o quer em escolas normais notur-
desenvolvimento progressivo de nas, centros de formação funcio-
estabelecimentos de formação in- nando com horário apropriado.
dispensáveis ao reforço de pessoal cursos por correspondência ou
qualificado que será necessário rádio, exercícios práticos, está-
no futuro. gios, seminários, demonstrações ;
18. Essa falta se fazendo sen- todas as facilidades devem estar
tir, na maioria das vezes, em zo- ajustadas pelas companhias em-
nas rurais, que se criem estabe- pregadoras, com a colaboração
lecimentos de formação nessas re- eventual das autoridades escolares
giões, devendo seus programas a esta categoria de candidatos ao
considerar as características do ensino primário.
meio sem, entretanto, serem infe- 21. Bom meio de faroverer o
riores, em dimensões e qualidade, recrutamento de candidatos seria
aos estabelecimentos situados em a concessão de ajuda material aos
áreas urbanas; onde não houver a alunos-mestres: gratuidade de es-
possibilidade de se criarem tais tudos e material, bolsas, redução
estabelecimentos, constituir-se-iam de preços ou gratuidade para
equipes móveis de inspetores es- internato, abono a fim de com-
colares para facilitar a formação pensar a falta de rendimentos.
e o aperfeiçoamento dos mestres
rurais ou daqueles em exercício
Medidas urgentes para a
nas áreas de difícil acesso.
formação mais rápida, aper-
19. Onde o magistério não feiçoamento e recrutamento
atraia número suficiente de can- de professôres
didatos, devem as autoridades
responsáveis pelo recrutamento 22. Apesar das lacunas evi-
de alunos-mestres, as associações dentes que apresenta, a formação
profissionais e os próprios mes- acelerada ou de urgência deve
tres, organizar campanhas que ser adotada em alguns países
tornem mais conhecidas as ca- como solução provisória até que
racterísticas da profissão; pode- se completem os quadros; é pre-
se recorrer à difusão de publica- ciso ainda encorajar os professô-
ções, palestras, conferências, arti- res assim formados a completarem
gos na imprensa, emissões radio- sua preparação interiormente.
fônicas e de televisão, visitas a 23. Na medida do possível, as
escolas e, mesmo, curtos períodos condições de admissão de candi-
de estágio para os futuros mes- datos à formação de urgência não
tres, com a colaboração eventual devem ser inferiores às requeri-
de serviços de orientação profis- das para os estabelecimentos de
sional. regime normal.
20. Convém seguir com inte- 24. É pelo período de estudos
resse as experiências feitas em que a formação dita de urgência
alguns países visando facilitar pode diferir dos estudos pedagó-
aos trabalhadores e empregados o gicos de tipo corrente, convindo
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 71

diminuir a duração prevista o res devem escolher a fórmula que


menos possível. melhor convenha a seu país:
cursos regulares, cursos de férias.
25. Atenção especial deve ser
por correspondência, seminários,
dada à elaboração do plano de es-
estágios, demonstrações, etc.; to-
tudos e de programas de cursos
das as facilidades organizadas vi-
acelerados; escolha rigorosa de sando oferecer aos professôres a
matérias e de seu conteúdo per- oportunidade de aperfeiçoamento
mitirá eliminar os conhecimentos sem prejudicar, no entanto, o re-
considerados secundários conser- crutamento regular de mestres.
vando apenas o essencial do que
deve conferir valor a esta prepa- 29. Os professôres que fize-
ração intensiva; dadas as difi- rem curso de formação de urgên-
culdades inerentes a esta espécie cia de nível equiparado ao dos
de preparação, convém que ela cursos regulares devem se benefi-
seja confiada a professôres parti- ciar dos mesmos estatutos e salá-
cularmente qualificados e expe- rios dos mestres qualificados; os
rientes, tanto do ponto-de-vista que. não atingirem o mesmo nível
cultural como didático. dos cursos regulares mas que
26. Em muitos casos, as auto- compensem suas deficiências em
ridades escolares foram obrigadas cursos de aperfeiçoamento, deve-
a recorrer a professôres sem a rão ter os mesmos direitos; os
menor preparação profissional; mestres sem prévia formação pro-
mas esta medida de exceção é fissional que, durante o seu exer-
apenas temporária, sobretudo em cício. freqüentem com proveito os
p a í s e s que podem dispor de cursos de formação para eles or-
outros meios para sanar essa ca- ganizados devem usufruir de es-
rência de professôres. tatutos e remuneração equivalen-
27. Uma vez provada a neces- tes aos de professôres regulares
sidade absoluta de se recorrer a qualificados.
esse tipo de professôres, cuidado
especial deve ser tomado na es-
Medidas diversas
colha dos candidatos; é sempre
indispensável que eles tenham, 30. Desde que exista forte de-
pelo menos, boa cultura geral e sequilíbrio entre as possibilidades
que se submetendo a prova de de recrutamento de professôres
aptidões pedagógicas, sintam-se de ambos os sexos, medidas apro-
atraídos pelo ensino; os interes- priadas (campanhas de propagan-
sados deverão ter a possibilidade da, por exemplo) devem ser to-
de se formar ou se aperfeiçoar no madas visando cessar esse incon-
decorrer do exercício a fim de veniente. Entre essas medidas
adquirir as qualificações necessá- figura a possibilidade de oferecer
rias e atingir o nível profissional às professoras casadas o direito
requerido. de continuar em seu posto ou re-
28. Para a formação de mes- tomá-lo se, por acaso, o abando-
tres ainda sem preparação pro- naram; convém permitir, se hou-
fissional, as autoridades escola- ver interesse, a transferência de
72 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

um posto para outro mais pró- 35. A exemplo de muitos paí-


ximo de sua residência ou do tra- ses, os cursos noturnos para adul-
balho do marido. tos devem ser confiados a profes-
sôres de ensino primário, median-
31. O aproveitamento de mes-
te um abono especial que contri-
tres aposentados, na medida em
buirá para a melhoria de sua si-
que seu estado de saúde e equi-
tuação material, sendo dada pre-
líbrio psicológico o permita, é
ferência aos professôres primários
uma das contribuições indicadas
em exercício.
para a solução do problema; nos
países carentes de professôres em 36. Nos países em que exista
que a aposentadoria é dada rela- a tendência de generalizar com
tivamente cedo, deve-se procurar rapidez a escolaridade primária,
persuadir esses professôres a con- a necessidade de recorrer a me-
tinuarem no serviço ativo. didas especiais, como o aumento
do número de alunos por classe
32. Algumas providências de ou por professor, a redução do
organização escolar que contri- horário de presença dos alunos na
buam para o melhor aproveita- escola ou a adoção do sistema de
mento do pessoal disponível de- classes alternadas, estas provi-
vem ser adotadas onde pareçam dências devem ser consideradas
indicadas; reorganização da rede provisórias em face dos inconve-
escolar, reagrupamento de peque- nientes que daí possam resultar,
nas escolas desde que os meios de tanto para os alunos, como para
transporte ou a criação de inter- os professôres.
natos o permita, criação de es-
colas de mestre único, onde o efe-
tivo escolar não exija a presença Colaboração internacional
de dois ou três professôres, ado-
ção do ensino misto, caso a pre- 37. Tôda assistência técnica e
sença de um professor e uma pro- financeira capaz de permitir a
fessora não se justifique. abertura de novos estabelecimen-
tos de formação de professôres
33. Havendo extrema necessi- primários constitui um dos meios
dade, deve-se dar aos professôres mais eficazes no combate à falta
primários especializados no ensi- de mestres, especialmente nos paí-
no de uma só matéria os meios ses em que a escolaridade obriga-
de completar sua formação para tória ainda não se realizou.
que possam transmitir conheci- 38. Convém que as organiza-
mentos gerais. ções internacionais de educação
34. Para remediar a falta de como a Unesco possam continuar
professôres deve-se buscar a apli- a experiência já tentada com su-
cação de novos métodos de ensino cesso nos países em desenvolvi-
que exijam menor número de mento que lutem com o problema,
professôres do que os métodos colocando à sua disposição, quan-
tradicionais, como, por exemplo, do solicitados, técnicos e especia-
o sistema de monitores e instru- listas encarregados de estudar o
ção programada. assunto nos seus diversos aspectos
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 73

e sugerir as providências a serem sadas, centros de documentação


adotadas; a organização de cursos pedagógica, associações interna-
de aperfeiçoamento para mestres cionais e nacionais de pais e mes-
insuficientemente qualificados e tres, e t c ; a imprensa pedagógica
produção de material didático oficial ou particular deve desem-
adaptado às necessidades dos paí- penhar papel importante na di-
ses considerados devem constar fusão desta recomendação junto
do programa de atividades a aos serviços interessados, pessoal
cargo dêsses especialistas, assim administrativo e do ensino, e
como colocar à disposição dêsses também junto ao público em
países uma documentação refe- geral.
rente às experiências realizadas
41. Nos países em que se jul-
por outros.
gue necessário, os ministérios de
39. A assistência técnica deve instrução pública são convidados
se empenhar sobretudo no aper- a encarregar os órgãos competen-
feiçoamento de professôres e na tes de proceder a diversos tra-
fórmula capaz de dar, a cada um balhos, por exemplo:
dêsses países a solução para o a) examinar a presente reco-
provimento de suas próprias ne- mendação e comparar seu conteú-
cessidades; apesar das vantagens do com o estado de direito e de
inegáveis das trocas internacio- fato existente em seu país;
nais de professôres nos casos em b) considerar as vantagens e
que se faça necessário o contrato inconveniências da eventual apli-
de professôres estrangeiros, esta cação de cada um dos artigos que
medida deve ser acompanhada do ainda não estão em vigor;
desenvolvimento da formação dos c) adaptar cada artigo à si-
professôres nacionais a fim de tuação do país, caso sua aplicação
evitar que o país dependa estri- seja julgada útil;
tamente de assistência exterior. d) enfim, propor as disposi-
ções e medidas de ordem prática
que assegurem a aplicação do
Aplicação da presente artigo considerado.
recomendarão
42. Os centros regionais da
40. É necessário que o texto Unesco são convidados a facili-
desta recomendação seja objeto tar, com a colaboração dos minis-
de divulgação por parte dos mi- térios interessados, e na medida
nistérios de instrução pública, das de suas posses, o exame desta re-
autoridades escolares de nível de comendação e sua adaptabilidade
ensino mais diretamente interes- às características regionais.
INFORMAÇÃO DO PAÍS

FILMES PARA A EDUCAÇÃO anos todos os conceitos da física


moderna, de modo a levar os
Dando seqüência a sua progra- alunos nos anos ulteriores a
mação, o Instituto Nacional do aprofundar o que já aprenderam,
Cinema Educativo do M.E.C, pro-
duziu em 1963 cerca de 18.000 desde que possuirão conhecimen-
metros de cópias de filmes, abran- tos mais adiantados de matemá-
gendo tópicos diversos do currí- tica, habilitando-se a resolver
culo secundário. Além dos filmes problemas mais difíceis.
de 16 mm. preparou o INCE uma A principal vantagem que êste
série de diafilmes versando temas sistema oferece é de ordem psi-
de ciência, história, arte, econo- cológica, pois mantém o interesse
mia e literatura. Editou-se novo e o entusiasmo do aluno. Além
Catálogo com a relação completa
dos documentários educativos. do mais, a física evolui tão rapi-
Professôres, estabelecimentos de damente e tantos conhecimentos
ensino e entidades culturais inte- lhe são acrescidos que se torna
ressadas podem dirigir-se à Fil- imprescindível estabelecer uma
moteca do INCE (Praça da Re- física básica e dar aos alunos
pública, 141-A — 2.° andar — meios de desenvolvê-la, manten-
Rio — GB.) O Serviço de Em- do-os atualizados com as conquis-
préstimo estende-se também aos tas da ciência.
Estados.
EDUCAÇÃO DE BASE NO
NOVOS MÉTODOS DE ENSINO NORDESTE PELA SUDENE
DA FÍSICA
Através de convênios firmados
No ano de 1963, a Universi- com os governos estaduais do
dade Católica do Rio promoveu Nordeste, a Sudene vem exe-
com êxito um curso de verão cutando um programa de ensino
para professôres de física de todo primário e de educação de base,
o Brasil, utilizando o sistema visando alfabetizar até 1967 tôda
adotado pelo Physical Science a população entre 7 e 14 anos e,
Study Commitee dos Estados no mesmo prazo, reformar 30%
Unidos. O curso procura atua- das salas de aula ora existentes.
lizar o ensino da matéria, abar- Prevê-se, também, a alfabetização
cando 80% de sua conceituação. de 80% da população adulta das
No campo universitário, o obje- zonas urbanas e rurais da região
tivo é ensinar nos dois primeiros até 1970.

INSTITUÍDA A 6.a SÉRIE PRIMÁRIA

Foi recentemente instituídaa por os candidatos não habilitados


decreto presidencial a 6. série aos exames de admissão ao
primária a fim de beneficiar ginásio do Colégio Pedro II e
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

congêneres. Apreciando a ini-a O ideal seria que a escola pri-


ciativa do Govêrno, a Prof. mária proporcionasse curso em
Lúcia Marques Pinheiro, téc- horário integral, em benefício
nica de educação do INEP, dos próprios alunos, para melhor
expendeu estes conceitos: rendimento de seus estudos e
para evitar que as crianças fi-
Em alguns países da Europa quem desocupadas a maior parte
e das Américas, os cursos são do dia, na rua, com grave risco
mais demorados, em média 7 pará sua formação moral. Con-
anos para o primário e 10 para tudo, por falta de verbas para a
o ginasial. Em nosso país, con- manutenção de mais salas de aula,
forme o Estado, o primário era o ensino tem que ser ministrado
de 4 ou 5 anos, com aulas diá- mesmo em horários limitados,
rias de 4 horas e meia, às vezes para atender a grande número
3, tempo insuficiente para me- de alunos.
lhor aproveitamento dos estudos, Pelo decreto assinado na se-
apesar da boa-vontade de profes- gunda-feira, o MEC fica autori-
sôres e alunos. Esse tempo, du- zado a promover convênio com
rante 5 anos, eqüivaleria pratica- escolas do ensino primário e
mente a 3 anos se as aulas fos- médio, da Guanabara, para a
sem ministradas em horário in- constituição, mediante custeio dea
tegral. bôlsas-de-estudo, de turmas de 6
O projeto inicial do Ministério série primária, destinadas à ma-
da Educação e Cultura, por ini- trícula de candidatos não habili-
ciativa do INEP, previa o fun- tados nos exames de admissão ao
cionamento do 5.° e 6.° anos em curso ginasial do Colégio Pedro
horário integral, parte dedicada II e congêneres. Na impossibili-
a estudos de Matemática, Portu- dade de criação dessas séries em
guês e Ciências Naturais e So- estabelecimentos já existentes, o
ciais, e outra parte ocupada com Ministério da Educação e Cultura
artes industriais, atividades de promoverá sua instalação em
biblioteca, auditório e outras próprio da União ou, ainda, em
extraclasses, dando aos alunos prédios particulares de associa-
hábitos de trabalho, para forma- ções familiais sob a forma de
ção integral, e não apenas inte- ginásios da comunidade.
lectual. O valor das bôlsas-de-estudo
O decreto recém-assinado bene- integrais e de complementação
ficiará, também, os Estados, que será fixado no ato do convênio,
economizarão a quota de Educa- cuja fiscalização caberá à Dire-
ção destinada a cada criança. De toria do Ensino Secundário, por
acordo com a Lei de Diretrizes intermédio das Inspetorias Se-
e Bases, a medida permitirá o cionais, assegurando-se ainda a
acesso ao 2.° ano ginasial, motivo modicidade do ensino e remune-
por que no convênio entre o ração condizente do pessoal do-
MEC e estabelecimentos de en- cente e administrativo. As me-
sino primário e médio da Guana- didas previstas serão aplicadas
bara, fica mencionada a 6.a série nos demais Estados e Territórios
primária como equivalente ao 1.° da Federação dentro dos limites
ano ginasial. das deficiências locais.

ALMEIDA JÚNIOR, PROFESSOR EMÉRITO

Em reunião efetuada a 16 de cina da Univ. de São Paulo


dezembro passado, a Congre- concedeu ao Prof. Antônio de
gação da Faculdade de Medi- Almeida Júnior o título de
76 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Professor Emérito pelo notável rica sementeira representada


trabalho que realizou a ser- desde 1913 pela Faculdade de
viço da educação, da cultura Arnaldo Vieira de Carvalho, já
e da ciência médica do país. começara a enriquecer São Paulo
Agradecendo, o homenageado com sua excelente produção.
proferiu esta oração: Mas, sobrara a medicina legal!
Onde achar quem a quisesse?
Havia, é certo, Flamínio Favero,
"Lanço um olhar para o meu o jovem mestre que vencera com
passado, cuja extensão já é do galhardia na disputa da sucessão
domínio público. E pergunto a de Oscar Freire. E havia o sele-
mim mesmo como aconteceu que cionado de seus brilhantes assis-
um menino nascido de família tentes. Todos, porém, submeti-
pobre em modesta vila do inte- dos ao vínculo do tempo integral.
rior de São Paulo; desajeitado Outros existiam, certamente; mas,
por natureza, tímido por tempe- como de costume, a ninguém
ramento, arisco para a vida so- interessava essa modesta cátedra
cial, e jamais ajudado por padri- do curso médico, a despeito de
nhos políticos, tenha chegado um ter ela, no Brasil, coberto de
dia, faz agora trinta anos, a cate- glória imorredoura o grande
drático de uma das escolas mé- Nina Rodrigues.
dicas brasileiras da mais alta
categoria, e dela venha receber Foi então (suponho eu) que
agora, em reunião solene, o título o fundador da nova Escola se
de professor emérito. recordou de que na Academia
do largo de São Francisco já
Começo por tranqüilizar a andava a lecionar, nesse tempo,
assistência. Embora esse exórdio um médico da Faculdade de Ar-
faça desconfiar de autobiografia, naldo, formado na turma de 1921,
não vai haver autobiografia. Uma e que conquistara naquela Aca-
autópsia, meus senhores — e uso demia, em 1928, mediante con-
aqui a expressão "autópsia" no curso de títulos e provas, a si-
sentido etimológico de exame de tuação de livre-docente de me-
si mesmo — uma autópsia pra- dicina legal. Foi a esse outro
ticada na presença de pessoas discípulo de Oscar Freire, a esse
amigas, poderia agradar ao nar- profissional de inclinações menos
cisismo de quem a realizasse; exclusivas; mais precisamente,
mas seria fastidiosa para aquêles foi a mim (pois era eu o livre-
que, por dever de amizade, se docente em causa) que se dirigiu
resignassem a ouvi-la. Entremos, o fundador da Escola Paulista
pois, direta e exclusivamente, no de Medicina. Ouvi com espanto
exame do meu caso com a Es- o seu convite, e recusei-o. Re-
cola Paulista de Medicina. cusei-o por achar (como ainda
Em 1933, Otávio de Carvalho, acho) temerário aquêle empre-
em crise de exaltação que poderia endimento. Mas Otávio de Car-
parecer delirante se não reve- valho nao é homem que recue
facilmente. Argumentou; e, dian-
lasse apenas a legítima expres- te dos nomes a que aludiu, das
são de sua capacidade de inicia- cifras que mencionou e dos cál-
tiva, resolveu fundar uma escola culos que fêz; diante sobretudo
de medicina na Capital paulista- de sua inexaurível capacidade de
E começou por organizar-lhe a persuasão, acabei concordando.
futura congregação — uma con- Concordei especialmente porque
gregação que, segundo dizia, se no último momento êle apelou
impusesse desde logo pela inte- para a fórmula mágica que na-
gridade moral e capacidade cien- quele ano de 1933 hipnotizava os
tífica de cada um de seus ele- paulistas: era tudo, disse êle, era
mentos. Tudo correu bem en- tudo para o bem de São Paulo;
quanto se tratava das cadeiras "Pro São Paulo fiant eximia".
básicas ou das clínicas, pois a
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 77

Cerrei fileiras, pois, ao lado prejuízo e sim um benefício,


dos demais professôres da nova concretizado êste na possibilidade
Escola; e no devido tempo ini- de contato de nossos alunos
ciei as minhas aulas. Tive como com a imensa variedade de fatos
auxiliar, na qualidade de assis- médico-legais daquele prestigioso
tente, esse profissional de extra- instituto.
ordinário valor, esse homem de Na categoria de disciplina fun-
caráter sem jaca que é o Dr. damental da cadeira, não poderia
Joaquim Vieira Filho, já então estar ausente a ética profissio-
médico legista de longa expe- nal. Tanto mais que, de cinco
riência, cirurgião dos mais repu- anos para cá, os dois elementos
tados e, poucos anos depois, docentes de Medicina Legal —
livre-docente da cadeira, mediante o Dr. Vieira Filho e eu — fomos
concurso. membros do Conselho Regional
Para o ensino da minha disci- de Medicina, cujos arquivos vie-
plina em nossa Escola, poder-se-á ram a ser para nós um inesgo-
dizer, parafraseando o pai da tável repositório de clínica de-
Medicina, que a arte era longa, ontológica. A leitura desse do-
o tempo breve, os recursos ma- cumentário, de que cada página
teriais escassos, e moderado o fora vivida por nós através dos
interesse dos alunos. Quanto a debates do Conselho, oferece uma
essa moderação, havia exemplos visão panorâmica dos tipos de
no passado- Em princípios do infrações ocorrentes no Estado, e
século dezenove Roberto Chris- até mesmo uma idéia a" respeito
tinson inaugurou na Universidade de sua distribuição regional. In-
de Edimburgo o ensino da me- fere-se por ali que, entre nós
dicina legal. Vieram ouvi-lo no como no resto do mundo, aquelas
primeiro dia alunos de medicina infrações se incrementam na
e alunos de direito; mas, à me- proporção em que cresce a den-
dida que as aulas prosseguiam, sidade médica da região. É um
aumentava na sala o número dos dos sintomas da concorrência de
juristas e diminuía, até reduzir-se estilo comercial, o sinal denun-
a zero, o dos jovens esculápios. ciador da luta pela vida, quando
Não pretendo discutir agora os os que concorrem ou lutam não
fatôres que podem levar a essa levavam consigo, ao entrar na
situação. Registro simplesmente profissão, freios morais suficien-
o fato de que, mais felizes do temente robustos para os dete-
que Christinson, sempre tivemos rem em face das tentações.
auditório: eu, nas aulas com que
abrangia os temas fundamentais Um outro fenômeno também
da disciplina, e meu digno com- merece registro, e esse é a ten-
panheiro, Dr. Vieira Filho, nas dência, por ora apenas bruxo-
demonstrações e atividades prá- leante, no sentido de confundir
ticas de sua competência. os interesses econômicos da cate-
goria médica com os interesses
No que tange a essas demons- morais da profissão: estes, de
trações, apraz-me assinalar um caráter imperativo e universal;
pormenor significativo. Dada a aquêles, transigíveis e variáveis
carência de instalações próprias, no tempo e no espaço. Se bem
a parte de autópsias teria sido que não se possa estabelecer, no
prejudicada se não houvéssemos caso, nenhuma fronteira rigorosa,
contado com a liberalidade, que o fato é que os interesses ma-
nunca nos faltou, do Instituto teriais não podem sobrepor-se
Médico-Legal do Estado, cujos aos de natureza moral e nem
sucessivos diretores sempre fran- sequer equiparar-se a eles. Trata-
quearam a nossa cadeira tudo se de noção básica de que todo
quanto ali nos pudesse ser útil. moço deve impregnar-se antes de
De sorte que, em virtude da- receber seu diploma. E é um
quela carência, tivemos, não um dos ônus — se não fôr o maior
78 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

— da profissão médica- Essa buída aos mestres de nossa Es-


profissão pode dar renome, fama cola, durante os vinte anos ante-
e glória. Pode enriquecer. Pode riores. Mesmo assim, continua-
polarizar a gratidão da clientela, vam combatendo na trincheira.
a gratidão da cidade, do País, E combatendo sem desfalecimen-
do mundo inteiro. Mas exige um to. Tudo isso porque o espírito
compromisso prévio: o de certa que aqui vem prevalecendo desde
dose de renúncia aos interesses a fundação até hoje, é o da
materiais, em face de situações, curiosidade científica, o da auto-
objetivadas sobretudo pelo perigo crítica, o da cooperação, o da
à vida ou à saúde de outrem. renovação didática- Nunca o da
É por isso, meus senhores, que ambição do ganho.
não consegui até agora conven-
cer-me de que também aos mé- Pois bem: essa nobre atitude
dicos aproveita o direito de greve, dos professôres tem influído
quando entre os efeitos dessa greve sôbre o próprio corpo discente
se inclua, por exemplo, o aban- para fazê-lo compreensivo e pro-
dono dos postos de assistência penso a colaborar com os esfor-
em cuja atuação repouse a tran- ços da Escola. Nossos alunos,
qüilidade pública. Tranqüilidade saibam os de fora, quando vistos
pública apenas, não! Mais do que de longe são iguais ao tipo co-
isso, pois da ausência do médico mum do universitário brasileiro:
no seu posto poderá resultar um gostam do "trote" ao calouro,
dano à saúde ou mesmo a pró- cultivam a vaia com certo vir-
pria morte do paciente eventual- tuosismo, publicam jornais hu-
mente forçado a procurar socorro. moristas, escrevem lemas parti-
Reivindique o médico os seus di- dários nos muros exteriores, e
reitos; reclame contra os abusos esperam salvar o País desde que
do poder ou contra a iniqüidade: consigam eleger seu candidato à
mas não abandone o posto a que presidência do Centro Acadêmico.
serve antes que lhe dêem subs- Devo acrescentar ainda que, como
tituto. É o que me parece certo. sei de ciência certa, alguns, para
E é, aliás, felizmente, a atitude recuperarem o sono perdido em
tradicional da classe médica em suas vigílias, dormem nas aulas
nosso País. teóricas. Contudo, à hora de
reagir pelo bom nome da Escola
A iniciação na atitude de re- — o que quer dizer pelo bom
núncia aos proventos materiais nome do ensino — reagem como
em favor do cumprimento de um se fossem um só.
dever indeclinável, os médicos Foi o que se viu exatamente
formados pela Escola Paulista de há um ano, em junho de 1962.
Medicina hão de tê-la recebido, Estávamos, de Norte a Sul do
não apenas nas aulas de deonto- País, em plena rebelião acadê-
logia, mas também através do mica deflagrada sob o pretexto
exemplo de seus professôres. de uma confusa reforma univer-
Desde a fundação do estabeleci- sitária, cuja base seria a repre-
mento, em 1933, até a sua fede- sentação dos estudantes calculada
ralização em 1956, todo o pes- na proporção de um terço da
soal docente da casa trabalhou, congregação. Mas a palavra se-
mais por amor ao ofício do que rena e objetiva do diretor Marcos
pelo valor da remuneração pe- Lindenberg — um diretor que
cuniária. Foi o que demonstrou, não teme dialogar com os estu-
em patético relatório de 1953, o dantes e tem tato para fazê-lo
então diretor da casa, Prof. Jairo — levou os moços a debater o
Ramos, num expressivo confron- problema, a refletir e a tomar
to entre o que percebiam na a sua própria deliberação: pug-
época os professôres do ensino nar, sim, como os outros, pela
oficial e a irrisória quantia atri- reforma universitária prevista na
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 79

lei; mas não através da greve, Senhoras e senhores!


da violência ou da desordem. E É êste, por certo, meu último
disseram ainda uma vez a sua pronunciamento em atmosfera
confiança num melhor entrosa- acadêmica, e sob o revestimento
mento entre professôres e estu- das insígnias do magistério —
dantes. dessa nobre profissão que foi,
Esses alunos de junho de 1952 durante mais de meio século, o
(entre os quais figuravam os de meu enlevo e o meu estímulo.
minha última turma nesta Es- Do magistério, principalmente
cola) fizeram-se nesse dia mes- do magistério, fiz o ganha-pão
tres de seus colegas do Brasil para mim e para os meus. Nele
inteiro; mestres, talvez, de mui- encontrei o tipo de trabalho a
tos mestres de então; mestres que mais se afeiçoou o meu tem-
até (por que não dizé-lo?) de peramento, e pelo qual me foi
altas autoridades da época, que dado servir ao País em que
não haviam conseguido ler com nasci. Foi êle para mim, tam-
sabedoria o texto da reforma. bém, a fonte de alegria interior
Meus senhores! Espero que o em que me refugiava nos maus
título que hoje me é outorgado momentos da vida. Dele me des-
não me afaste, antes me apro- peço, portanto, com profunda
xime ainda mais da Escola Pau- saudade.
lista de Medicina. E, ao dizer Em relação à Escola Paulista
esse nome — Escola Paulista de de Medicina, entendo que em
Medicina — encaro o conjunto nosso encontro de contas preva-
de seus mestres de todos os lecerá meu débito para com ela.
graus, de seus servidores admi- Aqui pude fortalecer velhas ami-
nistrativos, de seus alunos de zades e fazer amizades novas;
todos os tempos. E envolvo pude ampliar meus conhecimen-
também a Escola de Enfermeiras tos e inspirar-me para o aper-
do Hospital São Paulo, com a feiçoamento de minhas técnicas
qual colaborei durante muitos didáticas. Aqui, enfim, pude ex-
anos, primeiro ao lado de Madre perimentar o prazer de sentir-me
Dominecq, depois ao lado de integrado numa equipe de ho-
Madre Áurea; Escola que tantas mens cultos, dignos e laboriosos,
vezes me homenageou e que teve que trabalham empenhadamente
para mim o mérito excepcional pelo bem da comunidade e para
de aproximar-me ainda mais da- o constante desenvolvimento da
quele que foi sempre meu bom ciência.
e carinhoso amigo, o saudoso A todos, pois, expresso nesta
arcebibspo de São Paulo, dom oportunidade minha imperecível
José Gaspar d'Affonseca. gratidão".
INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO

CÍRCULOS DINAMARQUESES para o mês. Os temas principais


DE EDUCAÇÃO POPULAR são: a escola, a religião nacio-
nal, a família, a cidade, os re-
Existem atualmente 65 círculos cursos naturais, artesanato local,
vias e meios de comunicação,
de educação popular na Dina- relações políticas internas e ex-
marca. São instituições parti- ternas.
culares que contam com o auxí-
lio governamental para remune-
ração do corpo docente, manu- ARQUITETURA E EDUCAÇÃO
tenção dos prédios e material NOS ESTADOS UNIDOS
didático. Aceitam estudantes
maiores de 18 anos, sendo que As escolas públicas norte-ame-
muitos deles recebem ajuda fi- ricanas estão sendo construídas
nanceira calculada à base do visando adaptar a arquitetura às
salário familiar. Os cursos de exigências da pedagogia moderna.
inverno têm a duração de 5 O Laboratório de Planejamento
meses, enquanto os de verão, 3 de Escolas da Universidade de
meses. F r e q ü e n t e m e n t e u m a es- Stanford fixou quatro princípios
cola se especializa em agricul- básicos para os edifícios esco-
tura, movimento cooperativo, lares: flexibilidade, diversidade
esportes, e organização dos cír- no t a m a n h o das salas, condições
culos. Além dos assuntos espe- p a r a equipamentos eletrônicos e
cializados, há matérias comuns uso múltiplo de instalações per-
a todos os círculos, tais como: manentes, como, por exemplo,
história, literatura, línguas es- os auditórios. De acordo com
trangeiras, psicologia e educação esses princípios, a Escola Ele-
cívica. Seu objetivo é despertar o m e n t a r Belaire, de San Ângelo,
interesse pelos problemas sociais no Texas, foi construída em
e humanos, questões políticas e forma circular, composta de oito
internacionais ou ainda desen- salas de aula dividida por pa-
volver a ação social. redes móveis.
O objetivo" primordial da ado-
ção das novas técnicas de arqui-
"CENTROS DE INTERESSE" tetura para estabelecimentos edu-
MOTIVANDO O ENSINO cacionais é, sem dúvida, o de
facilitar o ensino e torná-lo mais
O ensino das três primeiras agradável.
classes primárias no Laos baseia-
se, de agora em diante, no mé- A ESCOLA OITO-MAIS-TRÊS
todo dos "centros de interesse". NA UNIÃO SOVIÉTICA
Exercícios de observação, lições
da língua materna (escrita, oral De acordo com informações das
e leitura), desenho, cálculo e, na autoridades escolares na União
medida do possível, geografia, Soviética, o ensino secundário
história, ciências naturais, moral, passará por grande transforma-
religião desenvolvem-se em torno ção. Durante a escolaridade obri-
do centro de interesse escolhido gatória de 8 anos (escola da
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 81

massa) a criança adquire não EDUCAÇÃO CINEMATO-


somente boa educação geral, mas GRÁFICA DA J U V E N T U D E
prepara-se, também, física e psi-
cologicamente para o trabalho. Representantes de dezesseis
Nos três últimos anos, dois países europeus e americanos
terços seriam dedicados à edu- tomaram parte em uma confe-
cação geral e um terço a adquirir rência internacional sôbre edu-
ofício ou profissão. Além desse cação da juventude para a apre-
caminho, outras opções são ofe- ciação de filmes e programas
recidas: o aluno poderá ingressar televisionados, que teve lugar em
em u m a escola técnica para tra- Leangkollen, Oslo, de 7 a 13 de
balhadores altamente especializa- outubro de 1962. As recomen-
dos ou, n u m a terceira escolha, dações votadas no final dos tra-
entrar, para um colégio secun- balhos dispõem, entre outras,
dário especial técnico, que não sôbre a necessidade de integrar
seria estritamente técnico m a s a "educação cinematográfica"
também um colégio médico de 3 (screen education) em programas
ou 4 anos de curso; daí, já um escolares e sua inclusão nas ati-
assistente de hospital, rumaria, vidades extraclasses.
após esse treino, para o r a m o
de especialista de "média qualifi-
cação". Terminados esses estu- A TÉCNICA INVENTA O
dos, estariam os alunos prontos "MESTRE-ROBOT"
a se submeter a exames de ad-
missão nos estabelecimentos de Um técnico húngaro criou um
g r a u mais elevado (universida- "mestre-robot" capaz de dar
de), de acordo com a sua espe- lição, acompanhada de música e
cialização. ilustrada com projeções, e de
propor questões ao auditório. O
A maior flexibilidade na estru- mecanismo disto é simples: com-
tura do ensino secundário visa põe-se de um magnetofone que
formar número mais elevado de reproduz a voz, um fundo musi-
especialistas nos diversos setores. cal e um "robot" projetor, que
funciona sob comando, surgindo
então ilustrações na pequena tela-
FORMAÇÃO TÉCNICA A máquina lança também as
I N T E N S I V A NO MÉXICO perguntas e três sugestões para
as respostas. A pessoa interro-
Atendendo às necessidades do gada indica a resposta correta
país em técnicos semiqualifica- pressionando um botão, e o
dos, o Ministério da Educação "mestre-robot" anota o número
adotou um programa de forma- de respostas certas da pessoa
ção técnica intensiva de duração interrogada, depois continua sua
variável entre dezoito meses e lição...
dois anos para milhares de jo-
vens que não podem prosseguir
os estudos secundários ou supe- "CLASSES DE M E R " NA
riores após o término do ensino FRANÇA
primário. Os cursos propostos
têm sido escolhidos em razão de Aproveitando o exemplo das
sua utilidade imediata nos do- "classes de neige", as compa-
mínios da indústria e da agri- nhias marítimas francesas ado-
cultura, principalmente as indús- taram interessante sistema no
trias mecânicas e elétricas, a seu programa de transformação
pecuária e a administração. Pre- dos navios disponíveis em navios-
param-se atualmente os instru- escola. Na estação apropriada
tores encarregados da formação esses navios lançam-se ao m a r e
dos professôres destes cursos fazem escalas nos portos esco-
técnicos intensivos. lhidos por seu valor educativo.
82 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

O TEATRO NA EDUCAÇÃO grado, aprovou-se o primeiro abe-


cedário musical para crianças -em
A Universidade de Teatro das idade pré-escolar.
Nações promoveu, de janeiro a
julho de 1963, a terceira série
dos cursos anuais sob o patro- EDUCAÇÃO E NÍVEL MENTAL
cínio do Instituto de Teatro In- NA GRÃ-BRETANHA
ternacional, compreendendo qua-
tro setores diferentes que tratam O sistema educacional da Grã-
Bretanha está passando por fase
do teatro em geral. Participaram de completa reformulação. O
dêsses cursos cerca de 250 estu- relatório recentemente publicado
dantes. Constam do programa as e que trata da educação de
seguintes matérias: o teatro com- crianças de capacidade média ou
pleto, o teatro épico, as tendên- inferior, e n t r e as idades de 13 a
cias do teatro de vanguarda, o 16 anos, intitulada "Half our
teatro nos países em desenvolvi- F u t u r e " (Metade do nosso Fu-
mento, o teatro como fator edu- turo) é exemplo notório. Com
cativo e o teatro a serviço da a afirmação de que "todas as
paz. crianças devem ter igual oportu-
nidade de desenvolver sua inte-
ligência, seus talentos e habili-
ABECEDARIO MUSICAL ADO- dades ao máximo", as primeiras
TADO NA UNIÃO SOVIÉTICA providências são tomadas no sen-
tido de enfrentar pelo menos
Em reunião de musicólogos e alguns dos problemas analisados
pedagogos realizada em Lenin- pela Comissão Newson.
CRÍTICA DE LIVROS

CALDEIRA, Clóvis — Menores no Meio "Inquérito sôbre Trabalho e Escola-


Rural, Rio, Centro Brasileiro de rização de Menores na Agricultura",
Pesquisas Educacionais. 1960, 190 baseado em sucinto questionário
págs. (publicado em apêndice), preenchido
por agentes de estatística locais
Há livros que são felizes en- (funcionários do IBGE), destinado
quanto lançadores de temas relevan- a apreender algumas características
tes tanto do ângulo teórico quanto da situação dos menores da zona
do prático, mas cujo mérito princi- rural de mais de uma centena de
pal não vai muito além disso por municípios: "idade em que os me-
deficiências sérias que apresentam nores geralmente começam a tra-
quanto à exploração dos problemas balhar", "serviços que os menores
por eles próprios formulados. Tal. executam", se "os menores traba-
é o caso da obra em apreço, que lham de preferência com a família
poderia constituir-se numa contri- (ou) por conta própria", "mês ou
buição bastante valiosa ao estudo meses em que é mais intensa a uti-
de dois "grandes problemas brasi- lização do trabalho dos menores"
leiros" atuais — o agrário e o edu- "fase ou fases da atividade agrícola
cacional — focalizados a partir da (capinas, colheitas, etc.) em que
condição econômica, social e cultu- mais se utiliza a mão-de-obra dos
ral dos menores no meio rural. menores", "salário mais freqüente
que recebem os menores quando
Na primeira — e melhor — parte trabalham por conta própria", se "é
do livro, o Autor nos oferece, com habitual o deslocamento temporário
caráter introdutório. uma visão de menores para alguma atividade
panorâmica da situação do menor industrial", "razões por que os me-
ruricola, para tanto recorrendo a nores faltam às aulas", etc.
cifras censitárias, informes e reco-
mendações da Organização Inter- Como se nota, tais quesitos in-
nacional do Trabalho, etc. Sempre cidem sôbre aspectos cruciais do
preocupado com as diferenças entre problema que o Autor se propõe
o "mundo desenvolvido" e o "subde- investigar. Do ponto-de-vista dos
senvolvido", trata da composição requisitos mínimos de uma pesquisa
etária e das migrações das popula- empírica os dados colhidos são,
ções rurais; das taxas de participa- porém, muito precários devido a sua
ção dos menores no contingente duvidosa validade, pois as respostas
economicamente ativo ligado ao ao questionário utilizado dependem,
setor primário de atividades; das em sua maioria, do "ôlho-metro" dos
condições de moradia, alimentação. agentes de estatística locais toma-
trabalho e escolarização dêsses me- dos como os únicos informantes. E,
nores; e das limitações legais e sua ainda no plano estritamente técnico.
efetivação deficiente ao emprego cabe destacar que o tom de genera-
dos menores naquelas atividades. lidade conferido às perguntas não
O restante do livro versa especi- é, absolutamente, adequado ao re-
ficamente sôbre a realidade brasi- gistro dos dados indispensáveis ao
leira. Em sua segunda seção — a conhecimento empírico dos fenôme-
mais longa e também a mais vulne- nos abordados pelo questionário. A
rável — expõe os resultados de um má impressão que, pelos motivos
84 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

expostos, o "Inquérito" deixa no Neill desenvolve-se em sete capítu-


leitor fica minorada pela terceira e los, subdivididos em vários tópicos
última parte do livro — "Pesquisa que nos relatam não só a organiza-
entre Famílias Rurais na Área de ção intrínseca e extrínseca de Sum-
Colatina" (Espírito Santo) — efe- merhill desde a idéia que a fundou.
tuada entre dez famílias desse muni- mas, sobretudo, nos falam esmiuça-
cípio, "a fim de que ao estudo sôbre damente do que tem sido a arrojada
trabalho e escolarização de menores experiência pessoal desse educador.
no meio rural brasileiro não fal-
tasse uma nota mais viva, capaz de Absolutamente convicto de que
imprimir-lhe maior autoridade". Na a educação progressiva, que veio re-
verdade, esta ligeira "pesquisa de novar os princípios pedagógicos, na
campo" apenas indica o início do primeira metade do sec. XX, não
caminho a ser seguido para que o atingiu os seus objetivos educativos
tema do livro possa ser convenien- integralmente, porque não substi-
temente investigado. tuiu, como devia, a autoridade pela
liberdade. A. S. Neill concebe um
Em suma, as graves deficiências sistema educacional onde a autori-
ligadas às dimensões técnicas da dade "manifesta" ou "anônima"
pesquisa comprometeram demais, e fosse totalmente abolida. Dessa
infelizmente, o esforço do Autor, idéia nasceu Summerhill. Escola
que chega a concretizar-se positiva- sui generis, que acolhe uma média
mente apenas como exploração preli- de quarenta alunos por ano e fun-
minar de um problema importante. ciona em regime de internato, sob
Como se registrou no princípio, o governo dos próprios alunos; é
êste é o grande mérito da obra em deles que emanam todas as decisões.
foco. Das limitações desta o Autor
parece estar mais consciente do que Em Summerhill, portanto, a li-
declara expressamente. Ressalte-se, berdade é absoluta. Divididos em
contudo, que não se trata de esperar pequenos grupos, de acordo com a
outra proposição da questão: há de idade (que varia dos 5 aos 16 anos),
se concordar com o Autor quanto ao os alunos são os verdadeiros "donos"
fato de que "a rigorosa colocação da escola; porém, o espantoso é
do problema do menor na agricul- que isso não leva à anarquia. Se-
tura exigiria uma análise da estru- gundo a afirmação de seu idealiza-
tura de classes da sociedade rural" dor, ali "todos têm direitos iguais"
— em outras palavras, um estudo e (o que é de pasmar!) ninguém
das relações sociais de produção ultrapassa os limites dos seus pró-
vividas direta ou indiretamente por prios direitos.
mais da metade da população brasi- Concordemos ou não com a ati-
leira. tude pedagógica assumida por Neill
Luis PEREIRA há já quarenta e dois anos, não po-
demos deixar de reconhecer que
Summerhill é, talvez, a experiência
mais radical que até agora já se
NEIL. A. S. — Liberdade sem Medo, fêz em matéria de orientação edu-
trad. de Nair Lacerda, São Paulo. cativa.
Ibrasa, 1963, 357 págs.
Nitidamente orientado pela con-
cepção freudiana do homem (e daí
Em bem cuidada tradução de a supervalorização da liberdade se-
Nair Lacerda, temos agora em lín- xual que o marca), Neill criou e
gua portuguesa o relato minucioso desenvolveu um método pedagógico
do que está sendo a falada experiên- cuja idéia fundamental é a educação
cia pedagógica da Escola Summer- isenta do medo, da imposição ou do
hill, fundada na Inglaterra, na aldeia autoritarismo do adulto. Dentro de
de Leiston, em 1821, por A. S. Neill. suas diretrizes metodológicas o alu-
Precedido por um criterioso pre- no adquire, antes de mais nada, o
fácio de Erich Fromm, o livro de direito e a possibilidade de desen-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

volver livremente, sem coações nem vir que nessa ousada experiência
sugestões, a sua personalidade. Não muita coisa existe de positivo, de
é obrigado nunca a assistir às aulas; aceitável para uma verdadeira re-
pode deixar de freqüentá-las durante novação educacional. Senão, veja-
anos se assim o desejar. Todavia, mos: — Neill não perde de vista
assegura o A., as crianças acabam que o objetivo último da educação
procurando as lições e o serem pri- é a felicidade do ser humano, isto
vadas delas é olhado como castigo. é. a integração da personalidade do
Pelo que se pode concluir da lei- educando no processo vital.
tura dêste surpreendente livro, Neill Descrê da educação puramente
parte do princípio "rousseauniano" intelectual que não permite o de-
de que "o homem é bom; a socie- senvolvimento emocional e artístico
dade é que o deforma". Neill acre- do indivíduo. Daí a sua sistemática
dita na bondade natural da criança oposição a todo sistema educacional
e na sua potencialidade positiva. que tenda a provocar uma dissocia-
Daí a liberdade total que lhe é con- ção entre cérebro e sentimentos,
cedida em Summerhill, liberdade do dissociação que redundaria, segundo
tal maneira radical que difícil se êle. nas neuroses do homem contem-
nos torna crer que realmente esteja porâneo. (Aqui, entretanto. Neill
produzindo os frutos positivos de por vezes parece cair no extremo
que nos fala o A. oposto e subestimar "a compreensão
Fundando essa escola onde as intelectual do mundo", como diz
crianças teriam "a liberdade de Fromm, "preferindo-lhe a compreen-
ser elas próprias", Neill, para são artística e emocional").
reagir contra a escola dogmática e Neill chama ainda a atenção
autoritária do passado, cai (se não para a aplicação dos princípios psi-
incorremos em erro) no extremo cológicos à educação (o que, acredi-
oposto: renuncia "inteiramente à tamos, nunca deveria ser esquecido
disciplina, à direção, à sugestão, ao por professor algum), lembrando
treinamento moral e à instrução re- que as solicitações às reações e ao
ligiosa". acreditando firmemente interesse da criança devem forçosa-
que "se fôr entregue a si própria, mente corresponder ao seu estado
sem sugestão alguma ela se desen- psíquico para que dêem frutos posi-
volverá tanto quanto fôr capaz de tivos.
se desenvolver".
Abole sistematicamente a dis-
Na verdade, não acreditamos que ciplina e o castigo aplicados dog-
todas as crianças poderiam receber maticamente, pois tal procedimento
uma educação livre como a de Sum- entrava o harmonioso desenvolvi-
merhill, pois nem todas possuem mento psíquico da criança. É, pois,
em potencial, aquêle "gênio cria- através do amor, do interesse pelo
dor" de que nos fala o A. e assim aluno que o professor deverá corri-
nem todas poderiam, por si só, sem gir-lhe os erros.
sugestão alguma do adulto, encon-
trar o caminho certo para chegarem Como vemos, estes são pontos
ao desenvolvimento integral de sua fundamentais em qualquer organiza-
personalidade. Escolher caminhos ção educacional e deles Neill não
é muito difícil, mesmo para nós. se afasta. A par, todavia, dessas
adultos: que dirá para uma crian- atitudes que nos parecem plena-
ça. .. Entretanto Neill acredita mente razoáveis e lógicas sentimos
nisso firmemente e terá razões que o apontar de certa incoerência in-
não nos cabe discutir aqui. terna no seu método pedagógico.
Desde o início do livro o A. não nos
Porém, deixando de lado esse P esconde que não está absolutamente
outros radicalismos que espantam satisfeito com a sociedade de hoje
e que chegam mesmo a fazer sorrir (e quem o está?), apontando nela
cèpticamente a professôres e orien- muitos e muitos defeitos a que
tadores educacionais, temos de con- poderíamos levantar objeções. Mas
86 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

isso enfim não vem ao caso. O que balho educacional de outros povos,
resulta dessa atitude anti-social é a dos problemas e das particularida-
já citada incoerência. Pois se Neill des dos sistemas escolares de deze-
(como o diz textualmente em vários nas de países. Ela é a terceira de
trechos) não procura educar as uma série iniciada em 1955, e foi
crianças para ajustá-las ao meio preparada de acordo com a resolu-
social, à ordem existente no mundo ção (1.22) adotada pela Conferência
em que vivem, como pode pretender Geral da UNESCO, em sua décima
(e diz que o consegue) educá-las sessão. realizada em novembro-
apenas para serem seres humanos dezembro de 1958, em Paris. Essas
felizes? Aqui está o ponto vital da três obras constituem o "único tra-
incoerência apontada: poderia o balho padrão de referência que for-
homem realizar plenamente o seu nece, em forma sistemática, des-
destino humano sem achar-se inte- critiva e estatística, informações
grado na sociedade em que vive? sôbre a educação em todos os países
Contrariamente à opinião do A., e territórios do mundo".
julgamos que não. Deixemos de O primeiro volume da série
parte os casos de exceção. World Survey of Education, publi-
Porém, concordando ou não in- cado em 1955, apresenta um quadro
teiramente com as posições assumi- geral dos vários graus e ramos dos
das por Neill, não duvidamos de sistemas escolares dos vários países.
que a leitura desta curiosa expe- O segundo volume, publicado em
riência será de grande valor para 1958, é dedicado principalmente ao
todos aquêles que têm a seu cargo ensino elementar, além de fornecer
tarefas educativas. Para todos nós informações complementares que
que nos preocupamos com a orien- possibilitam situá-lo melhor no con-
tação dos jovens, "Summerhill" texto geral. O terceiro volume, ela-
(título original de "Liberdade sem borado sob orientação semelhante
Medo") é um livro que faz pensar. aos dois anteriores, além do estudo
dos sistemas escolares de um modo
NELLY NOVAIS COELHO geral, apresenta uma análise mais
minuciosa e mais profunda do en-
sino médio. Consta de duas partes
precedidas de um prefácio, das con-
UNESCO, World Survey of Educa- venções adotadas, além de uma subs-
tion III — Secondary Education, tanciosa introdução, redigida pelo
Paris, 1961, 1482 págs. Secretariado da UNESCO. Ela visa
a facilitar ao leitor a utilização da
Uma das maiores dificuldades obra e a adverti-lo a respeito das
encontradas por todos aquêles que cautelas que devem ser tomadas ao
se dedicam ao estudo da Educação se pretender realizar quaisquer com-
Comparada consiste na obtenção de parações ou generalizações relativas
material informativo atualizado e aos vários países. São também
que inspire confiança. Notadamen- apresentados os objetivos, os prin-
te, sôbre os sistemas e as realiza- cípios obedecidos na organização do
ções educacionais dos vários países. trabalho, uma visão geral dele. além
de esclarecimentos relativos aos dia-
A publicação acima indicada, gramas e glossários, às tábuas e
cujas qualidades e grande utilidade sumários estatísticos.
seria praticamente impossível res-
saltar numa simples resenha, preen- Na primeira parte, o Secreta-
cherá, sem dúvida, uma grande la- riado da UNESCO procurou "traçar
cuna na bibliografia pedagógica. um quadro de conjunto e resumir
Prestará inestimáveis serviços a as tendências e os problemas atuais
professôres e estudantes de Educa- do ensino". Compreende oito capí-
ção Comparada e de Administração tulos :
Escolar, e a todos os que se inte- I. "Survey da educação no
ressem pelo conhecimento do tra- mundo, de 1953 a 1957", em que são
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 87

oferecidos um sumário e dados esta- abrange a maior parte da obra ou.


tísticos sôbre o movimento escolar mais precisamente, 1322 de suas
em geral, no período considerado. 1482 páginas. Essas duzentas mo-
II. "População em idade esco- nografias foram escritas ou revistas
lar e população escolarizada", refe- por autoridades escolares dos vários
países dos Estados membros da
rente às relações entre a população UNESCO.
escolarizável e a população escola-
rizada, com interessantes e úteis Os elementos descritivos dos
tabelas e diagramas. capítulos sôbre o sistema escolar de
III. "O progresso da educação cada país se referem principalmente
média desde 1930", que oferece um às características gerais dêsses sis-
levantamento quantitativo da evo- temas; ao desenvolvimento da edu-
lução do ensino médio d© 1930 a cação média, em que se incluem
1957. elementos sôbre a sua administra-
ção, supervisão e financiamento;
IV. "Tendências da mudança aos tipos de escola média, às suas
educacional", apresentando o con- tendências e problemas; e ã. biblio-
teúdo e a evolução qualitativa do grafia. Os diagramas sôbre os sis-
ensino médio, principalmente no temas escolares constituem impor-
que se relaciona com as suas mu- tantes elementos de recorrência.
danças de estrutura e de organiza- Muitas vezes apresentam os nomes
ção. das escolas na linguagem oficial ou
V. "A expansão do ensino de nacional, acompanhados de um glos-
segundo grau", onde são feitas. sário em inglês. As tabelas estatís-
entre outras, referências sôbre o ticas oferecem dados sôbre escolas.
estabelecimento de novos sistemas professôres e alunos por grau e tipo
sôbre a expansão das oportunidades de escola, de 1953 a 1957, inclusive.
educacionais e a estratificação das Acrescentem-se ainda as tabelas
escolas na Europa. sôbre finanças educacionais.
VI. "A transição do primeiro Nesta excelente obra, lamenta-
pará o segundo grau", dando espe- mos apenas algumas imprecisões de
cial relevância aos problemas de terminologia. Reconhecemos tam-
articulação do grau elementar com bém que seus planejadores deveriam
o grau médio. ter sido mais vigilantes em relação
à rigorosa observância de normas
VII. "Tendências do currículo gerais que permitissem descrições e
da escola média", em que se estuda dados mais fidedignamente compa-
a evolução e a organização do cur- ráveis. Não duvidamos, contudo,
rículo da escola média principal- das dificuldades de tal empreendi-
mente com relação às realizações mento e louvamos o muito que já
científicas e tecnológicas, e ao desen- foi feito pela UNESCO. Certamente.
volvimento de uma sociedade demo- em trabalhos futuros cada vez mais
crática. se atingirá o rigor de precisão, à
VIII. "Periódicos dedicados ao medida que se aperfeiçoam as expe-
ensino de grau médio", que consiste riências de pesquisas e os estudos
na indicação, por país. de uma dessa louvável instituição, que é a
bibliografia de periódicos sôbre ensi- UNESCO, por todos os títulos digna
no médio. da confiança dos educadores do
A segunda parte apresenta es- mundo inteiro, com inestimáveis con-
tudos sôbre os sistemas escolares tribuições.
nacionais de duzentos países e MOYSÉS BREJON
ATRAVÉS DE REVISTAS E JORNAIS

CIÊNCIA E CULTURA mais vitais e mais vivas de hoje é


precisamente fornecer o instrumental
J. R. Oppenheimer para a mudança rápida. Muitas
coisas há que confluem para trazer
Vivemos num mundo diferente, esta alteração na vida do homem.
marcado por enormes e irreversíveis sendo entre elas, provavelmente, a
mudanças, ocorridas no espaço de mais decisiva a própria ciência.
uma geração. Vivemos numa época Usarei esta palavra num sentido
onde nosso conhecimento e com- lato, significando as ciências natu-
preensão da natureza se faz num rais. as ciências históricas e todos
ritmo inigualado, mais amplo e mais aquêles conhecimentos, em relação
profundo; onde os problemas da aos quais os homens podem conver-
aplicação destes conhecimentos às sar objetivamente entre si. Não
necessidades e esperanças humanas tornarei a repetir a distinção entre
são novos e só parcialmente escla- ciência como esforço para pesquisar
recidos por nosso passado histórico. e entender o mundo, de um lado. e
ciência, em suas aplicações tecno-
De fato, nas sociedades tradicio- lógicas, como esforço para realizar
nais, tem sido sempre a grande algo de útil com o conhecimento
função da cultura conservar as adquirido, de outro lado. É preciso,
coisas um tanto estáveis, quietas e entretanto, certo cuidado, pois, ao
imutáveis. Tem sido a função da chamarmos esta época de "época
tradição assimilar uma época a da ciência" incorreremos em mais
outra, um episódio a outro, até um de um tipo de simplificação. Ao
ano a outro. Tem sido a função da falarmos hoje em dia em ciência, é
cultura explicitar o sentido, discri- provável estarmos pensando no bio-
minando os traços constantes ou logista com seu microscópio ou no
recorrentes da vida humana, sôbre físico com seu ciclotron, mas é quase
os quais se falou, em dias mais certo que grande parte daquilo que
tranqüilos, como de "verdades eter- ainda não é matéria de um estudo
nas". bem sucedido virá a sê-lo mais tarde.
Nas sociedades mais primitivas, Penso têrmos hoje sob pesquisa
segundo os antropologistas, a prin- provavelmente apenas pequena parte
cipal função do rito, da religião, da do terreno, que se franqueará às
cultura, é, defato, quase a de sustar ciências daqui a um século. Penso
a mudança. É fornecer ao orga- no crescimento consideravelmente
nismo social o que a vida fornece. rápido em muitos setores da biologia,
como de modo mágico, ao organis- e. agourento embora não sem espe-
mo vivo, uma espécie de homeostase. ranças. no fato de ser o homem uma
uma capacidade de permanecer in- parte da natureza acessível ao es-
tato, de responder muito pouco às tudo.
óbvias convulsões e alterações do
mundo ao redor. A razão desta notável passagem
de um mundo lento, mundo quase
Hoje em dia, a cultura e a tra- estático, para o mundo em que vi-
dição assumiram uma finalidade vemos. é o caráter cumulativo, a
intelectual e social muito diferente. segurança e a riqueza do que se
A principal função das tradições descobriu sôbre a natureza. E ver-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 89

dade que se transcende êste plano da habilidade, da tecnologia, quanto


ao entrarmos em outras esferas da da aprendizagem da execução das
experiência. Aquilo que é verda coisas. Quando alguém aplica isto
deiro na escala da polegada ou do à situação humana e lastima-se de
centímetro pode não ser na escala que realizamos grandes progressos
de um bilhão de anos-luz; pode não em automação, processamento de
ser nem na escala do centésimo dados e pesquisa espacial, não se
bilionésimo de centímetro; perma- realizando, entretanto, progresso
nece, porém, verdadeiro onde é pro- moral comparável, está com isto de-
vado. Dêste modo, tudo que se des- monstrando uma total incompreen-
cobre acrescenta-se ao que já ante- são quanto à diferença entre estas
riormente era conhecido, enriquece-o duas espécies de progresso. Não
e dispensa ser refeito. Êste caráter quero dizer que o progresso moral
essencialmente cumulativo e Irrever- é impossível; mas não é, de modo
sível de apreender as coisas é o algum, automático. Retrocesso mo-
signo da ciência. Significa Isto que ral, como vimos na nossa época, ê
na história do homem as ciências igualmente possível. O regresso
provocaram mudanças que não po- cientifico não é compatível com a
dem ser afastadas nem desfeitas prática continuada da ciência.
Permitam-me citar dois diferentes
exemplos. Muito se discute sôbre a E fato verdadeiro, e nós nos
supressão das bombas atômicas orgulhamos de que assim seja, que
Gosto desta conversa, mas não nos a ciência é internacional e que real-
devemos iludir. Façamos o que mente é a mesma (com diferenças
quisermos com as bombas atômicas, mínimas de ênfase) no Japão, na
o mundo, porém, não será o mesmo. França, nos Estados Unidos e na
exatamente porque não é passível Rússia. A cultura, porém, não é
de eliminação o conhecimento de internacional; na verdade sou da-
sua fabricação. Ela está aí, e todos queles que esperam não venha a
nossos arranjos para vivermos na sê-lo nunca, num certo sentido, e
nova era tem que levar em conta que a influência do nosso passado a
6ua virtual onipresença, bem como de nossa história que é diferente da
que ninguém pode mudar tal fato de outros povos por suas razões pró-
Exemplo diferente: nunca teremos prias, se fará esntir e não se perderá
ilusão sôbre a centralidade e impor- numa homogeneidade total. Não
tância do nosso habitat físico, agora posso subscrever o ponto-de-vista de
que sabemos alguma coisa da posi- serem ciência e cultura coextenslvas,
ção do mundo no sistema solar e de serem a mesma coisa com nomes
sabemos que há centenas de bilhões diversos; e não posso subscrever a
de sóis na nossa galáxia e centenas opinião de ser a ciência algo útil,
de bilhões de galáxias ao alcance dos embora essencialmente desvinculado
grandes telescópios do mundo. da cultura. Penso que vivemos
Nunca mais podemos basear a dig- numa época que encontra poucos
nidade da vida do homem no espaço paralelos na história, onde existem
e no tempo, no caráter especial do problemas práticos de instituições
lugar onde êle vive. humanas, como o de tornarem-se
elas obsoletas e inadequadas, proble-
mas do intelecto e do espírito, os
Há mudanças irreversíveis; assim quais, se não são mais difíceis que o
é que o caráter cumulativo fornece eram em outras épocas, são diferen-
paradigma a alguma coisa que é tes, e também difíceis. Talvez possa
sob outros aspectos, muito mais oferecer uma sinopse do que sejam
questionável: a idéia do progresso estes problemas. Relacionam-se com
humano. Não se pode duvidar que, o fato de ter acontecido a revolução
nas ciências, a única direção de cres- científica no momento em que se
cimento é o progresso. E isto ver- deu o crescimento característico das
dadeiro tanto do conhecimento do ciências com sua peculiar estrutura
fato. quanto da compreensão da interna; com a conexão entre a des-
natureza, quanto do conhecimento
90 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

coberta nas ciências e as idéias plicados e sutis, e o fizeram, embora


gerais dos homens em questões que pouco tenham escrito a respeito
não se vinculam diretamente às Possivelmente não fizeram a revo-
ciências; com a liberdade e necessi- lução científica por causa de algu-
dade nas ciências, e com a questão ma falha quanto à comunicabilidade.
do caráter criativo e aberto (sua Formavam uma sociedade pequena
infinitude); com o rumo que deve- e talvez não houvesse bastante gente
mos tentar seguir para trazer coe- interessada no assunto.
rência e ordem à nossa vida cultu- Num tema de história, não pode
ral, fazendo o que é próprio para mos indicar uma causa única,
um grupo de intelectuais, de artistas precisamente por ser o aconteci-
de filósofos, professôres, cientistas. mento, em si, único: não se podo
estadistas, a fim de ajudar a remo- fazer um teste, para verificarmos se
delar a sensibilidade e as institui- estamos certos. Contudo, afigura-se-
ções, que pedem que as remodele rae que aquilo de que a ciência
mos, se quisermos sobreviver. necessitava não estava presente na
Não é questão simples responder civilização chinesa, era totalmente
por que a revolução científica se ausente na civilização indiana, e
deu em certo momento. Todos os também ausente na civilização greco-
historiadores de peso concordariam romana. Era necessária uma idéia
em ter ela começado no fim da de progresso não restrita a uma
Idade Média ou inicio da Renas- "compreensão melhor", porque esta
cença, e em ter sido muito lenta a idéia tinham-na também os gregos.
princípio... Tôda cultura impor- Foi preciso uma idéia de progresso
tante possuiu curiosidade, reflexão. mais ligada à condição humana, a
contemplação e pensamento. "Conhe- qual é expressa, à excelência, pela
cer as causas das coisas" foi sempre segunda parte da famosa dicotomia
almejado pelos sábios, e sempre pro- cristã: fé e obras; a idéia de que a
curado pelas sociedades sábias. Em melhoria da condição humana, sua
tôda cultura de peso houve gênio civilidade, têm sentido, de que todos
inventivo. Se atentarmos na cultura temos uma responsabilidade e um
grega e nos subseqüentes períodos dever para com o homem. Penso
helenístico e romano, é particular- que foi quando esta idéia básica
mente desnorteante o não se ter sôbre a condição humana, que com-
dado, então, a revolução científica. plementa os outros aspectos tem-
Os gregos descobriram algo sem porais da religião, se robusteceu e
o que o mundo contemporâneo frutificou, entre os séculos XIII e
não seria o que é: a idéia de prova. XV, com a redescoberta dos cien-
de necessidade lógica, a idéia de tistas, filósofos e matemáticos do
que uma coisa implica noutra. Sem mundo antigo, aí então se iniciou a
isto a ciência é praticamente im- era científica. Durante o século
possível, porque não existindo uma XVII havia um punhado de homens
estrutura quase rígida de correlação empenhados em desenvolver o co-
e necessidade, não existe meio de» nhecimento humano ou "conheci-
apuraqão e correção do erro, de mento útil" (como se dizia então)
localização do ponto errado quando daí resultando a formação da Royal
aconteça alguma coisa inesperada e Society e das Academias, onde as
adversa. E isto foi o que os gregos pessoas podiam dialogar, trazendo
tiveram desde muito cedo em sua para o desenvolvimento da ciência
história. Eram curiosos e inventi- aquêle indispensável elemento do
vos, não experimentaram na escala trabalho em comum, da comunica-
dos dias modernos, mas realizaram bilidade, da correção por uns dos
muitas experiências; tinham (como urros dos outros e reciprocamente.
só ultimamente aprendemos a apre- da admiração pela habilidade dos
ciar) alto grau de sofisticação téc- outros, criando-se. assim, então, as
nica e tecnológica. Eram capazes primeiras comunidades verdadeira-
de fazer instrumentos muito com- mente científicas.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICAS 91

Pouco antes de Newton. Hobbes o tempo. Seu conhecimento e seu


escreveu: "As ciências são pequeno poder mudam, não, porém, a alta
poder; porque não eminente, e daí qualidade que o torna grande. Não
não serem admiradas por qualquer nos parece que alguém seja melhor
homem, nem por um só. mas por que Kepler e Newton, como também
poucos e nestes, só quanto a poucas nao achamos que alguém seja me-
coisas. Porque a Ciência é de tal lhor que Sófocles, nem alguma dou-
natureza, que ninguém pode com- trina seja melhor que o Evangelho
preender o que seja, mas tal como segundo São Mateus. Contudo, po-
a experiência cautelosa a atingiu. demos medir as coisas e isto tem
Artes de uso público como fortifi- sido feito. Pode-se medir quantas
cações, fabricação de máquinas, pessoas trabalham nas questões
outros instrumentos de guerra, por- científicas: podemos contá-las. Pode-
que eles servem à defesa e à vitória, se notar quanto tem sido publicado.
constituem poder". Estes dois critérios mostram
Foi o século seguinte que colocou uma duplicação do conhecimento
a ciência num contexto de fraterni- científico em cada dez anos. Casi-
liade, e até de irmandade universal. miro calculou que se a "Physical
Foi êste século que encorajou a Review" continuasse a crescer tão
opinião política igualitária, permis- rapidamente como entre 1945 e 1960
siva, pluralística, liberal, tudo aqui- ela pesaria mais do que o mundo
lo, enfim, a que a palavra "demo- no próximo século. Em quinze anos,
crático" é hoje justa e exatamente n volume dos químicos abstratos
aplicada. O resultado é que o tinha quadruplicado; na biologia as
mundo científico de hoje é também mudanças são ainda mais rápidas.
muito amplo; um mundo aberto, Hoje, se você conversar sôbre cien-
onde, de fato, nem todo o mundo tistas (querendo se referir com isso
faz tudo, onde nem todo o mundo a pessoas que dedicaram suas vidas
é cientista ou primeiro ministro, mas à aquisição de novos conhecimen-
no qual lutamos com energia contra tos), verá então que 93 por cento
a arbitrária exclusão de pessoas de de nós ainda estamos vivos. Este
quaisquer obras, de qualquer deli- crescimento consideravelmente rápi-
beração, ou pronunciamento, de do mantido por mais de dois séculos
qualquer responsabilidade para os significa, sem dúvida, que homem
quais seus interesses ou suas habili- algum aprendeu enquanto menino
dades as impelem. O resultado é mais que pequena fração daquilo
que nos defrontamos com nossos que êle virá a saber como adulto
povos problemas, criados pelas con- em seu próprio domínio.
seqüências práticas da tecnologia, e Há muitos pontos que devemos
com as grandes conseqüências inte- ter em mente. Alguém poderia pen-
lectuais da ciência em si, no con- sar que, se estamos publicando tanto,
texto de um mundo de dois ou três se-lo-á trivial. Julgo que isto não é
milhões de pessoas, uma sociedade verdadeiro: tôda comunidade cientí-
enorme para a qual as instituições fica de pessoas sadias se protegeria
não foram, em verdade, planejadas. contra isto: porque temos que ler o
Temos diante de nós um mundo que é publicado. O argumento de
onde o crescimento é característico não permitir o acúmulo de triviali-
não só das ciências, mas da econo- dades, de coisas sem importância e
mía, da tecnologia, de todas as insti- já conhecidas, que nada acrescentam
tuições humanas. Ninguém pode ao já sabido, é todo poderoso.
abrir um jornal sem constatar as
conseqüências. O segundo ponto é podermos
afirmar que cada coisa nova apren-
O crescimento científico pode dida torna desinteressante o já co-
ser medido por certo número de nhecido, que se esquece tão rapida-
maneiras, mas é importante não mente quanto se aprende. Em parte,
encambulhar as coisas. A excelência isto é verdadeiro: sempre que há
do cientista não muda muito com uma nova compreensão, um novo e
92 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

importante elemento de ordem, uma para estudo, de maneira superficial


"nova teoria" ou uma "nova lei da e generalizada, muito do cue existo
natureza", e então muito do que em matéria de ciência, abrindo mão
antes era considerado isoladamente da competência, do domínio, da pro-
ganha ligação e conexidade e se fundidade, da penetração. A razão
torna, de certo modo, implícito e de dar ênfase a tudo isto está em
simplificado. Contudo não se pode que os valores culturais da vida da
esquecer o que veio antes, pois ciência radicam quase todos num
habitualmente o significado do que estudo penetrante: aqui estão as
é descoberto em 1962 é encontrado novas técnicas, as lições difíceis, aa
em têrmos de descobertas de 1955 escolhas reais, as grandes desco-
ou 1950 ou mais cedo ainda. Com bertas, os grandes desapontamentos.
base nos têrmos destas coisas é que
se fazem as novas descobertas, que Tôda ciência desenvolve-se a
se originam os instrumentos que nos partir do senso comum, da curiosi-
dão as novas descobertas, que se dade, da observação, da reflexão.
originam os conceitos mediante os Começa-se depurando a observação
quais chegamos às descobertas e as palavras de alguém, e explo-
novas, que se originam a linguagem rando e avançando um pouco mais
e a tradição. longe do que ocorre na vida
Um terceiro ponto: ao conside- diária. Nesta novidade há surpre-
rarmos o futuro de alguma coisa sas; muda-se a maneira de pensar
que duplica cada dez anos, virá o sôbre as coisas para obter-se aco-
tempo em que isto deva parar, modação às surpresas; então a velha
exatamente como a "Physical Re- maneira de pensar pode tornar-se
view" não pode pesar mais que o tão incômoda e imprópria, que se
globo. Sabemos que haverá um conclui haver necessidade de uma.
ponto de saturação, e provavelmente mudança, recriando-se, assim, a ma-
a um nível mais alto que o atual; neira de pensar acerca desta parte
virá o tempo em que a taxa de da natureza. Aprende-se, destarte.
crescimento da ciência não seja a dizer o que se fêz, o que se achou
igual à atual, sendo, entretanto, a e como ser paciente e esperar pelos
quantidade de conhecimentos até en- outros para ver se também acham
tão acumulada muito maior que a as mesmas coisas, bem como a re-
existente. Semelhante taxa de cres- duzir a uma medida insignificante o
cimento sugere que, do mesmo modo elemento vital de ambigüidade habí
como o profissional que quer per- tualmente dominador na palavra
manecer profissional deve viver uma humana. Vivemos sendo ambíguos.
vida de estudo contínuo, também não esclarecendo coisas por dispen-
possamos encontrar uma pista para sarem elas ser esclarecidas, suge-
o comportamento em geral do inte- rindo mais de uma coisa, por mo-
lectual em relação a seus próprios tivo de a co-presença delas na
interesses e aos de seus colegas em memória poder ser uma fonte du
campos de certo modo diversos. beleza. Mas, em se tratando de
Pela maneira mais prática poderá ciência, a ambigüidade cessará ao
chegar a uma escolha: poderá con- chegarmos ao cerne. Aí teremos
tinuar a estudar em seu próprio que contar ao companheiro o que
campo de uma maneira profunda. fizemos em têrmos inteligíveis para
detalhada e com todo o conheci- êle porque êle foi preparado para
mento possível, de forma a obter compreendê-los, e contamos-lhe. pre-
acesso a tudo concernente a seu cisamente, o que achamos e como o
assunto. Mas, então, não terá um fizemos. Se êle não entende, vamos
campo muito largo. Seu conheci- visitá-lo e ajudá-lo; caso êle não
mento será altamente especializado, entenda, voltamos para casa, e ten-
embora seja muito profundo e com- taremos novamente. E assim SR
pleto naquele determinado campo. estabelece a firmeza e a solidez da
Pode êle, diferentemente, escolher
ciência.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 93

O que se passa e n t ã o ? Estu- n o v a m e n t e n u m a g r a n d e rede. O


dando as diferentes p a r t e s da n a t u - conhecimento que cresce desta ma-
reza, exploram-se, com diferentes n e i r a e x t r a o r d i n á r i a é inerente e
instrumentos, a s s u n t o s diversos, e inevitavelmente muito especializado.
tem-se u m a ramificação do que, em Ê êle diferente p a r a o físico, o
algum momento, foi conversa astrônomo, o microbiologista, o
comum, senso comum. C a d a r a m o de- matemático. H á conexões, h á mui-
senvolve novos i n s t r u m e n t o s , idéias, t a s vezes esta m ú t u a interdepen-
palavras p r ó p r i a s p a r a descrever dência. Mesmo na física, onde luta-
aquela porção do m u n d o da n a t u - mos com energia p a r a impedir que
reza. Essa estrutura semelhante a as diferentes p a r t e s do nosso t r a -
u m a árvore, com r a m o s saindo do balho se dispersem (de t a l modo
tronco comum da experiência pri- que um companheiro fique a p a r
mordial c o m u m dos homens, t e m de u m a coisa e outro de outra, não
r a m o s em todos os sentidos, não podendo conversar e n t r e si) n ã o
mais ligados pela m e s m a questão, alçançamos inteiro sucesso, a p e s a r
n e m pelas m e s m a s palavras, n e m de u m a paixão muito forte pela uni-
pelas m e s m a s técnicas. dade. As tradições da ciência são
A u n i d a d e da ciência, a p a r t e do tradições especilizadas, é esta s u a
fato de t e r ela s u a origem na vida força, que consiste em u s a r e m elas
ordinária do homem, não é u m a as palavras, as imagens, os concei-
unidade mediante dedução de u m a tos. as teorias que estão de acordo
p a r t e da outra, nem r e s u l t a n t e do com seus a s s u n t o s ; eles não se des-
fato de se e n c o n t r a r u m a identi- g a s t a r a m pela t e n t a t i v a de se aco-
dade entre u m a p a r t e e o u t r a (di- m o d a r e m a o u t r a ordem de coisas.
g a m o s e n t r e genética e topologia São as tradições especializadas
p a r a dar dois exemplos impossíveis, que dão enorme impulso e poder ã
onde há, na realidade, a l g u m a co- experiência científica. Isto t a m -
nexão). E s t a unidade consiste e m bém serve ao problema do ensino
duas coisas: em primeiro lugar e e explicação das ciências. Quando
mais destacadamente, u m a ausência obtemos a l g u m resultado geral mui-
de desarmonia. Assim podemos to poderoso, que ilumina u m a g r a n d e
falar da vida em t ê r m o s de propó- porção do m u n d o da natureza, é pela
sito, a d a p t a ç ã o e função, m a s não v i r t u d e d a s u a generalidade n o sen-
e n c o n t r a m o s e n t r e os seres vivos
tido lógico, de jeito a a b r a ç a r u m a
t r a p a ç a s a r m a d a s com as leis da
enorme q u a n t i d a d e de experiência;
física e da química. E n c o n t r a m o s
nos seus conceitos e na s u a t e r m i n o -
e, espero, e p c o n t r a r e m o s u m a h a r -
logia é t ã o a l t a m e n t e especializada,
monia total, e e n t r e objetos dife-
rentes, mesmo t ã o r e m o t o s como que se t o r n a quase ininteligível p a r a
genética e topologia, u m a ocasional aquêles que não t r a b a l h e m naquele
ligação m ú t u a e ajuda. Eles proje- campo. As g r a n d e s leis da física
t a m luz um sôbre o o u t r o : t ê m algo de hoje (que n ã o descrevem t u d o
a ver um com o o u t r o : m u i t a s vezes, ou nós quedaríamos sem t r a b a l h o ,
as maiores coisas n a s ciências ocor- m a s que classificam, ordenam, quase
r e m quando d u a s descobertas dife- t u d o o observado pela experiência
rentes, feitas em diferentes campos, h u m a n a de todo dia, acerca do
revelam t e r t a n t o em comum, que m u n d o físico) não podem ser for-
p a s s a m a ser exemplos de u m a des- m u l a d a s em t ê r m o s razoavelmente
coberta a i n d a maior. definidos sem um longo período de
cuidadosos estudos. E isto é verda-
A imagem não é a de u m a série deiro, por comparação, em outros
organizada d e fatos, n a qual c a d a assuntos.
um procede, de certo modo, de um
fato fundamental. Ê a n t e s a ima- Constituem-se, então, n e s t a s es-
gem de um ser vivo como u m a árvo- pecialidades, comunidades profissio-
re. tendo como a s á r v o r e s r a m o s nais das diversas ciências. São elas
que crescem juntos e se s e p a r a m íntimas, t r a b a l h a m muito unidas,
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conhecem-se mutuamente pelo mun- filosofia. Há alguma verdade neste


do afora. Estão sempre excitadas, exemplo. (*)
algumas vezes ciumentas, mas em Se as descobertas da ciência
geral satisfeitas quando um membro devem ter um efeito honesto no
da comunidade faz uma descoberta. pensamento humano e na cultura.
Penso, por exemplo, que aquilo que precisam elas ser compreensíveis.
chamamos agora "psicologia" um Isto provavelmente só será verda-
dia será, talvez, muitas ciências, deiro nos primórdios de uma ciên-
que haverá muitas comunidades di- cia. quando se fala de coisas próxi-
ferentes praticando estas ciências. mas da experiência comum. Algu-
que conversarão entre si, cada uma mas das grandes descobertas do
na sua própria profissão e na sua século são chamadas de Relatividade
própria maneira. Estas comunida- e Incerteza, e ao ouvirmos estas
des especiais ou "guilds" são uma palavras podemos pensar: "esta é a
experiência comovente para aquêles maneira como me senti esta manhã:
que delas participam. Tem havido eu estava relativamente confuso e
muitas tentações para se descobri- bastante inseguro". Esta não é, em
rem analogias pará ela sem outras absoluto, uma noção das questões
atividades humanas. Ouve-se muito técnicas ou das lições envolvidas
dizer: "se os físicos podem traba- nestas grandes descobertas.
lhar juntos em países de diferentes
culturas, de diferentes políticas, de Penso que a razão da hipótese
diferentes religiões, mesmo em países de Darwin ter tido tal impacto foi.
que são obviamente de políticas em parte, por se tratar de uma coisa
hostis, não será êste um meio de simples em têrmos de vida comum.
trazer o mundo à união?" Não podemos falar acerca de des-
cobertas contemporâneas no terreno
Os hábitos especializados das da biologia com esta espécie de lin-
ciências têm sido até certo ponto guagem, ou nos referindo apenas às
transladados pelos artifícios das coisas que já experimentamos.
universidades para outros trabalhos, Assim, penso que os grandes
para a filosofia e a arte. Existe resultados da ciência em estimular
uma "filosofia técnica" que é filo- e enriquecer a vida filosófica e os
sofia como arte, existe para os Interesses culturais se confinam
artistas e os críticos. No meu modo necessariamente aos primeiros tem-
de ver quaisquer que sejam as van- pos do desenvolvimento de uma
tagens que tenham estes trabalhos ciência. Há ainda outra qualifica-
para preparar "ferramentas profis- ção. As descobertas só terão real-
sionais". eles constituem profundo mente ressonância e mudarão o
engano, e, ainda mais, profunda sub- modo de pensar dos homens, quando
versão das verdadeiras funções da alimentem alguma necessidade ou
folosofia e da arte, pois estas têm esperança pré-existentes na socieda-
por finalidade o problema humano de. Penso que as reais fontes de
em geral, e se dirigem não a todo Iluminismo, um tanto alimentadas
mundo, mas a qualquer um, e não pelos acontecimentos científicos da
Sòmente a especialistas. época vieram na redescoberta d03
clássicos, da teoria política clássica,
É claro que nos defrontamos
aqui com problemas formidáveis de
comunicação, e de divulgação. É (•) Em muitos exemplos dados, in-
um imenso trabalho de ensinar em cluem-se geralmente Newton e Darwin.
Newton não é um exemplo muito bom,
todos os nivela. porque se observarmos com atenção,
Muitas vezes se pensou que as ficaremos impressionados pelo fato de
que, no sentido do Iluminismo, no sen-
grandes descobertas da ciência ao tido de casar a fé no progresso cien-
acontecerem, em certo momento, na tífico e na razão do homem cem a
vida dos homens, afetam as suas crença no progresso político e na secu-
larização da vida humana, o próprio
atitudes no que se refere a seu Newton em nada era newtoniano. Seus
lugar na vida, suas opiniões, sua sucessores sim é que foram.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 95

talvez sobretudo da dos Estóicos. quão necessário é o conteúdo da


A fome do século XVII de crer no ciência; quanto ela é alguma coisa
poder da razão, o desejo de derrubar que somos livres de não encontrar;
a autoridade, de secularizar, de uma quanto é alguma coisa que poderia
concepção otimista da condição hu- ser de outro modo. O que radica,
mana, utilizou-se de Newton e de é certo, na questão de como poder-
suas descobertas como ilustração de mos usar as palavras "objetivida-
algo em que já se acreditava pro- de" e "verdade". Quando achamos
fundamente, e que nada tinha a ver algumas coisas, inventamos ou en-
rom a lei da gravidade e com as leis contramos? Somos, é certo, livres
do movimento. A fome com a qual — não na nossa tradição e nossa
o século dezenove se utilizou de Dar- prática, e numa extensão individual-
win tem muita vinculação com a mente limitada — de decidir para
crescente atenção à história e à mu- onde olhar na natureza e como
dança, junto com uma grande von- olhá-la, quais as questões a pôr, com
tade de naturalizar o homem, de quais instrumentos e com qual pro-
identificá-lo com o mundo da natu- pósito. Mas em nada somos livres
reza, que já existiam muito tempo quanto a estabelecer o que achamos.
antes de Darwin, e que, portanto, O homem pode, certamente, ser livre
o acolheram como bem-vindo. de inventar a idéia do quantum de
Vi um exemplo neste século, luz, de neutrino, de massa, como
quando o grande físico dinamarquês fêz Newton (e foi retomado e
Niels Bohr encontrou na teoria do redefinido). Mas assim o tendo
quantum (ao ser ela desenvolvida feito, não fomos livres quanto a
há trinta anos) êste traço notável: achar que outra coisa não é senão
consiste na descrição de um sistema zero. Somos livres para iniciar
atômico, só que muito menos com- alguma coisa. Somos livres no
pleta do que no caso de se tratar modo de nos acercarmos, mas a
de objetos em grande escala. Te- solidez daquilo de que é constituído
mos certa escolha quanto aos traços o mundo informa esta liberdade com
do sistema atômico que queremos uma resposta necessária. Isto é
estudar e medir, e quanto aos que assim, porque as interpretações
devem ser abandonados, mas não ontológicas da palavra "objetivo"
temos a opção de realizá-los todos. pareceram inúteis, e ainda a usa-
Esta situação que todos nós reco- mos para significar clareza, falta de
nhecemos sustentou em Bohr sua ambigüidade, eficiência na maneira
opinião, por longo tempo mantida, de comunicar-nos nossos achados
sôbre a condição humana, isto é, Assim, em ciências, proposições
que há maneiras mutuamente exclu- universais, usando a palavra "tudo"
sivas de usar nossas palavras, nossas ou "todo" sem restrições, raramente
mentes, nossas almas, qualquer das aparecem. Em tôda investigação e
quais é aberta para nós, mas que ampliação de conhecimento somos
não podem ser combinadas: manei- levados a uma ação; em tôda ação
ras, por exemplo, de preparar-se somos levados a uma escolha; e em
para agir e de entrar numa busca cada escolha somos levados a uma
introspectiva das razões da ação. perda, a perda do que não fizemos.
Esta descoberta não penetrou, penso Deparamos com isto nas mais sim-
eu, na vida cultural em geral. Gos- ples situações. Deparamos com isto
taria que o tivesse feito; é um bom na percepção, onde a possibilidade
exemplo de alguma coisa que pode- de perceber coexiste com a de igno-
ria ser de importância, caso pudes- rar muitas outras coisas paralelas.
se ser compreendida. Deparamos com isto na fala, onde
Einstein disse, certa feita, que a possibilidade de uma linguagem
uma teoria física não era determi- compreensível reside no fato de não
nada pelos fatos da natureza, porém, se prestar atenção a muita coisa que
pra uma invenção livre da mente anda em geral entre as ondas sono-
humana. Isto levanta a questão de ras no ar. O significado é atingido
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

a troco do desprezo de algumas com o passado. Queremos encon-


coisas. Deparamos com isto também trar algo novo, mas não demasiado
na idéia de complementação (aqui novo. E quando falhamos nisto, que
em forma aguda) como um reco- se fazem as grandes descobertas.
nhecimento de que a tentativa de Parece-me que todos estes temas
se fazer qualquer espécie de obser- - a origem da ciência, os padrões
vação sôbre determinado sistema de seu crescimento, sua estrutura
atômico exclui outros. Temos a reticular ramificada, sua crescente
liberdade da escolha, mas não pode- alienação da compreensão comum do
mos escapar ao fato de. fazendo homem, sua liberdade, o caráter do
algumas coisas excluirmos outras. sua objetividade e de sua abertura
Em têrmos práticos, isto signi- — são de importância para as rela
fica, sem dúvida, que nosso saber é ções entre a ciência e a cultura
finito e nunca poderá abranger tudo. Creio que podem e devem ser mais
Há sempre muito que perdemos. robustas, mais íntimas e mais frutí-
muito de que não podemos estar feras do que o são hoje.
conscientes, porque a própria ação Aqui não estou pensando no
de apreender, de ordenar, de encon- assunto popular de "cultura d»
trar unidade e sentido, o próprio massa". Ao tratar dêste assunto
de falar sôbre alguma coisa, signi- parece-me que se deve ser crítico.
fica deixar muita coisa de lado. porém, acima de tudo, humano:
Façamos a pergunta: Poderia não se deve ser um esnobe; deve-se
ter a mesma física outra civilização ser tolerante e quase terno. E um
haseada na vida em outro planeta novo problema; não se pode espe-
muito semelhante ao nosso na sua rar resolvê-lo com os métodos da
capacidade de manter a vida? Não Atenas de Péricles. Nos problemas
te pode formar uma idéia quanto de cultura da massa e, acima de
a saber se teriam a mesma física tudo, da massa média, não se trata
ou não. Poderíamos estar falando primariamente da questão de ausên-
acerca de questões, na verdade, di- cia de qualidade. O trabalhador
versas. Isto faz nosso mundo aberta modesto da Europa ou da América
e sem limites. Eu tinha um amigo tem provavelmente ao seu alcance
Sanscritista na Califórnia que cos- música melhor e maior quantidade
tumava dizer brincando que se de boa música, arte boa e boa lei-
houvesse alguma vantagem na ciên- tura, do que jamais tiveram seus
cia seria muito mais fácil um homem predecessores. Antes parece que as
ser culto hoje em dia do que na ge- boas coisas se perdem em tal cor-
ração passada. Isto porque êle pen- rente de coisas pobres, que o nível
sava que o mundo estava fechado. de barulho é tão alto que algumas
das condições para apreciar a
Os motivos que nos fazem esco- qualidade estão ausentes. Não se
lher uma série de questões, um come bem a não ser com fome
determinado ramo de pesquisa em exige-se uma certa frugalidade para
detrimento de outro são inerentes a melhor cozinha: e algo disto não
às tradições científicas. Nas ciên- anda certo com a massa média. Mas
cias desenvolvidas, cada homem tem êste não é meu problema por agora.
apenas uma limitada oportunidade
de liberdade para modelá-las ou Antes penso vagamente no que
alterá-las: embora elas próprias podemos chamar de comunidade
não sejam totalmente determinadas intelectual: artistas, filósofos, esta-
pelos achados da ciência. Partici- distas, professôres, homens de várias
pam muito do caráter estético. As profissões, poetas, cientistas. Este
palavras que usamos: simplicidade. é um grupo aberto, sem linhas rígi-
elegância, beleza, indicam que não das segregando dele aquêles que
é só em busca de conhecimento que julgam pertencer a êle. Ê uma fac-
nos movemos, mas também de co- ção crescente de todas as pessoas.
nhecimento que possua ordem, har- Está encarregada do grande dever
monia. e que apresente continuidade de alargar, preservar e transmitir
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 97

nosso conhecimento e nossas habili- aprofundamento da justiça e da vir-


dades, e, de certo, nossa compreen- tude, e o poder de enobrecimento
são das inter-relações, prioridades de nossa linguagem comum. Tor-
compromissos, injunções, que aju- namo-nos, por êste motivo, menos
dam os homens a lidar com suas homens. Nunca na história do
alegrias, tentações, tristezas, e com homem floresceram como hoje as
sua limitação, e com sua beleza. tradições especializadas. Temos
Tal como as ciências o fazem em nossas belezas particulares. Mas
larga escala, algumas destas coisas naqueles altos empreendimentos em
se referem à "verdade proposicio- que o homem alcança força e pene-
nal", por exemplo, a proposições que tração através da qualidade pública
dizem "se você faz isto e aquilo, e social nós empobrecemos. Temos
você verá isto e aquilo"; estas são fome de nobreza, de palavras e atos
"objetivas" e podem ser checadas de valor que harmonizem simplici-
e contra-checadas; embora seja dade e verdade. Nesta carência
sábio duvidar de tempo em tempo, vejo alguma relação com os grandes
há sempre modos de se pôr um fim problemas públicos e resolvidos:
ã dúvida. Isto é o que se passa com sobrevivência, liberdade, fraterni-
RS ciências. dade.
Nesta comunidade há outras Nesta carência eu vejo a respon-
espécies de pronunciamentos, que sabilidade que a comunidade inte-
"dão enfâse a um tema" de prefe- lectual tem para com a história e
rência a declararem um fato. Podem seus semelhantes: uma responsabili-
ser pronunciamentos de conexão ou dade que constitui condição neces-
relação ou importância, ou podem sária para se refazerem as institui-
ser de um modo ou de outro, pro- ções humanas tal como precisam elas
nunciamentos de compromisso. Para ser refeitas, para que haja paz, para
eles a palavra "certeza" que é uma que se possam praticar mais inte-
norma naturalmente aplicável às gralmente todos aquêles compromis-
ciências, não é muito sensata — sos éticos, sem os quais não pode-
profundidade, firmeza, universali- remos viver verdadeiramente como
dade, talvez mais — contudo, cer- homens. Pode isto significar para
teza, que se obtém pela verificação a comunidade intelectual um esforça
não é o principal critério na maio- muito maior do que no passado. A
ria das obras de um filósofo, um comunidade crescerá, mas penso
pintor, um poeta ou um dramaturgo. que a qualidade e valor daquilo que
Pois estes não são, no sentido que fazemos também precisam crescer.
expliquei, "objetivos". Entretanto. Penso, de fato, que com a crescente
pará qualquer verdadeira comuni- riqueza do mundo e a possibilidade
dade, para qualquer sociedade digna de que ela não seja tôda usada para
dêste nome, preciso é que tenha um fazer novos cometimentos, haverá
elemento de comunidade, qual de na verdade real lazer e que o grande
ser comum, de ser pública, de ser compromisso para com êste lazer
relevante e de significação pará o deva ser que mais fortemente una-
homem, não necessariamente para mos a linguagem e a compreensão
todo mundo, mas certamente não entre os membros de nossa comu-
apenas para especialistas. nidade.
Muito me preocupou o fato de Quanto a êste ponto, julgo que
têrmos perdido habilidade de con- todos temos que preservar nossa
versar um com o outro, de aumen- competência nas nossas próprias
tar nossa cultura comum e mútua profissões, a fim de preservar o que
compreensão, neste mundo de mu- conhecemos intimamente, a fim de
dança e de crescimento científico. preservar nossa mestria. Isto re-
E assim é que sofreu o setor públi- presenta, em verdade, nossa única
co de nossas vidas, aquilo que man- âncora na honestidade. Precisamos
temos e temos em comum, tal como também aceitar os outros tipos de
sofreram a iluminação nas artes, o vidas complementares, não int.imi-
98 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

dados delas nem as desprezando revelados pelos testes de inteligência


(como muitos o fazem hoje em até agora usados. Certa acentuação
relação às ciências naturais e mate- formal de aplicação, a supervalora-
máticas). De início, temos que; ção do tempo de reação e a unifor-
aprender novamente, sem desprezo midade de respostas dêsses testes,
com paciência a conversar com os sáo ampliados geralmente, na situa-
outros, e devemos ouvir. ção comum de aprendizado escolar,
resulta.ndo que grande número de
(Cadernos Brasileiros. Rio» indivíduos de pensamento divergente
sejam prejudicados.
Descobriram os psicólogos da
CRIATIVIDADE: A NOVA criatividade, que todo esse mecanis-
mo força uma estrita "conformida-
DIMENSÃO EDUCACIONAL de" (convergência), o que, em linhas
Raimundo Mata gerais, é muito valorizado na orga-
nização escolar. A exigência de
atendimento a padrões e standards
Há uma nova dimensão educa- de rendimento, "fechados" em limi-
cional que os recentes estudos da tes de expectativa restrita, — quando
psicologia educacional têm posto em muito variada admitindo duas ações
evidência, nas suas implicações com entre certo e errado, ainda que sob
o mundo moderno; a criatividade. a aparência das "respostas múlti-
As pesquisas da criatividade toma- plas" — é desestimulante e, mesmo,
ram intensidade a partir de 1950. repressora da criatividade.
depois que Guilford, presidente da
Associação Americana de Psicologia. No entanto, a criatividade é uma
chamou a atenção pará essa dimen- dimensão valiosa no processo educa-
são da personalidade, até então cional, numa época em que todo o
objeto das preocupações dos educa- mundo se enfrenta com problemas
dores, em sua relação com o apren- críticos, exigindo soluções variadas.
dizado estético, mas pouco relacio- para o que a escola deve preparar
nada aos interesses do aprendizado os que terão de encontrar tais solu-
geral. ções. Assim, como a ciência tende
a mostrar que não há somente os
As investigações de Getzel e "dois lados da questão", o contra e
J a c k s o n (na Universidade de o favor da tradição dialética, mas
Chicago), resultaram no aperfeiçoa- que o homem, pelo seu poder cria-
mento de um teste de criatividade. dor, é capaz, e deve ser estimulado.
que está provocando sérios abalos de criar variadas formas para en-
na tradição das medidas de previsi- frentar-se com os variados problemas
bilidade escolásticas, firmada nos a soluções que o mundo atual lhe
testes de Q. I. e de aptidões atí exige, a educação deve abandonar
agora em uso. Sidney Parnes (da o acento exagerado da, "conformi-
Universidade de Buffalo) acentua dade" que tem explorado o "pensa-
mesmo que "A performance cria- mento convergente", e desenvolver
tiva", como medida pelos testes do o Dotencial da criatividade, caracte-
Getzel e Jackson é de implicação rístico do "pensamento divergente".
decisiva pará a educação, como nôvo
critério de seleção educacional. Daí, em têrmos da prática edu-
cacional, a importância da desco-
Os estudos da criatividade estão berta dos "divergentes" que anual-
revelando que certos comportamen- mente são sacrificados pela padro-
tos intelectuais que a tradição esca- nização da eficiência escolar, quando
lar às vezes, até, considerava "nega- planejada sem pensar no valor da
tivos", servem para identificar o tipo imaginação, da originalidade, da
de "pensamento divergente", carac- criatividade. Estes valores até bem
terizado por traços de flexibilidade pouco só eram relacionados com
mental", "influência ideacional" aspectos estéticos do currículo, —
"grande originalidade", nem sempre artes, trabalhos manuais, literatura
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

— quando, na verdade, são funda- de preparação do professor, pará


mentais a todos os campos da ativi- que possa enfrentar os alunos de
dade humana, quer no ponto-de-vista tipo de "pensamento divergente"
científico-cultural, quer do ponto- sem frustrá-los. Antes, estes eram
de-vista pragmático-social. eliminados pelo próprio valor nega-
Da mesma sorte, muitos compor- tivo concedido à divergência, em si
tamentos "divergentes" que eram mesma entendida como não adapta-
interpretados em têrmos de desajus- ção aos standards da expectativa
tamentos emocionais, olhados pelas escolar, favorecendo assim o pensa-
suas conseqüências ou causas apa- mento convergente que leva ã "con-
rentes, deixavam de ser relacionados formidade".
como efeito da mesmice e da rotina E esse é o sentido da observa-
escolares, da padronização, enfim, da ção de que "incidentalmente as
"conformidade" com esquemas pre- pesquisas sugerem que as crianças
viamente estabelecidos pelos profes- altamente criativas (divergentes)
sôres, na repetição de conhecimentos são muitas vezes antipatizadas pelos
estagnados. Esses comportamentos professôres...." Por quê? Cada um
passaram, agora, a ser melhor ana- que medite nisso e ponha a sua mão
lisados, em função dos valores da na consciência.
criatividade. Outra implicação importante,
Disso resultou que já se vem dos estudos da criatividade, é a de
procurando estruturar situações de que as pesquisas estão revelando
aprendizado que estimulem o desen- tratar-se, em muitos aspectos, de
volvimento da "fluência ideacional" traço ou traços aprendidos. Diz
e sobretudo da "flexibilidade men- Maltzman (Universidade da Cali-
tal", significando esta última, como fórnia) ..."a originalidade é uma
acentua Guilford (Factors that aid forma aprendida de comportamento
and hinder creativit.v — T. C. Re- que não difere em princípio de
cords Fevereiro de 1962): "uma mu- outras formas do comportamento
dança de espécie — uma mudança operativo".
de sentido, interpretação ou uso de
alguma coisa, uma mudança de Confirma Sidney Parnes, já ci-
entendimento de uma tarefa, uma tado anteriormente: "As perspec-
modificação na estratégia no fazer tivas têm demonstrado que o com-
alguma tarefa, ou uma mudança na portamento criativo é aprendido, e
direção do pensamento, que pode isso tem motivado o surgimento de
significar uma nova interpretação cursos cm solução criativa dos pro-
do objeto". blemas". Eqüivale dizer que não
estava errado Guilford, quando, em
Não há dúvida de que a dimen- 1950, sugeriu a hipótese de que
são da criatividade, transplantada "como qualquer outro comporta-
para o campo educacional, importa mento o. atividade criadora prova-
em revisão de planos e sobretudo velmente representa muitas habili-
de métodos de trabalho, tanto em dades aprendidas".
relação ao currículo, quanto ao
"processo do aprendizado". Mas, Isto é pois importante pará o
sobretudo importa a reformulação mundo de hoje, que é um mundo
do que se concebe como "produto de competição criadora. Vivemos a
do aprendizado", de que nem sempre era da ciência, de inventos e desco-
se dão conta os que falam e dis- bertas sucessivas que, numa reação
cutem a psicologia do aprendizado. em cadeia-, provocam novos inventos
E o que é mais importante: como e novas descobertas, a cada mo-
a. concepção da criatividade impõe mento. E é para êste mundo que
uma maior latitude reacional no a educação tem de cumprir seu
comportamento, do qual se infere desideratum fundamental, com re-
o "produto do aprendizado", essa lação às crianças e aos jovens.
reformulação atinge a Didática. Daí a oportunidade da adver-
impondo, sobretudo, nov03 esquemas tência de Paul Davis, no Journal of
100 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Higher Education (número 23/1962) sopesadas, a fim de encontrarmos


de que a profissão do magistério os meios adequados para alcançar
terá de tornar-se mais científica os fins propostos pela Lei.
pela diminuição da ênfase dada à Não é difícil compreender que
memória (como fator convergente) a Reforma Universitária, no sentido
e maior valor ao pensamento cria- pedagógico, tem que começar pelo
tivo (fatôres divergentes), pois a ensino primário e pelo médio, pois
"capacidade criadora do indivíduo o ensino superior é, ao mesmo tem-
tem sido freqüentemente reprimida po, causa e efeito do ensino que lhe
pela educação, e de tal sorte, que antecede.
êle já nem pode mesmo reconhecer
seu próprio potencial criativo". — De modo algum podemos pensar
(Diário de Noticias, Salvador). em alargar a rede de ensino médio
sem que tenhamos tomado as devi-
das precauções em formar, em nível
universitário, o professorado que
COLÉGIO UNIVERSITÁRIO vai servi-lo; de igual modo, a prio-
ridade para o ensino primário não
Nair Fortes Abu-Merhy pode significar apenas aumento de
prédios, salas de aula e turmas, mas
principalmente de pessoal qualifi-
I — INTRODUÇÃO cado para ministrar o ensino, pes-
Só quem não se deu conta do soal que se forma em nível médio,
caráter eminentemente renovador da havendo aspirações no sentido de
Lei de Diretrizes e Bases da Edu- que essa formação se faça em nível
cação Nacional poderá implantar, de superior.
imediato, um Colégio Universitário. Tal como se apresenta o pano-
De há muito se vinha reclaman- rama educacional brasileiro, a escola
do a restauração do Colégio Univer- primária ainda não recruta tôda a
sitário, instituído entre nós pela população escolarizável, não abran-
Reforma Francisco Campos, para gendo senão cerca de 50%, em média.
estabelecer passagem mais natural Desse grupo chega ao nível médio
do nível médio ao superior. O contingente pouco expressivo, e ínfi-
grande entusiasta dessa instituição, mo, ao nível superior. Entretanto,
Ernesto de Sousa Campos, muito os métodos didáticos do nível ele-
trabalhou para seu desenvolvimento. mentar, desenvolvidos em função de
Depois do interregno da Reforma um currículo padronizado, têm dado
Capanema, que o abolira, cogitou-se ênfase ao ensino verbalístico, pro-
do mesmo problema, quando da curando, desde então, uma prepara-
oportunidade da Reforma do Ensino ção remota para o superior. Basta
Médico, coordenada pelo então Di- atentar na preocupação com defi-
retor do Ensino Superior, professor nições e dissertações sôbre temas
Jurandir Lódi. Ali se previa o curso gerais. No nível médio, o acento
vestibular, com duração de um ano, que se tem dado à cultura geral
seguido do exame de admissão à decorre do fato de considerar-se
escola superior. Tal Reforma não essa fase meramente preparatória
se converteu em lei e agora deixou para o nível superior. Assim, o cur-
de ter objetivo em face da LDBEN, rículo predominante é o de humani-
que enseja uma reformulação com- dades. Os métodos didáticos não
pleta tanto do nível médio quanto procuram identificar os interesses
do superior ao prever o Colégio próximos dos estudantes e, portanto,
Universitário. não lhes abrem perspectivas de com-
preensão do seu mundo atual, nem
Agora, que já se reconhece que os habilitam a nele ajustar-se me-
nada se deve fazer em matéria edu- lhor, proporcionam-lhes um círculo
cacional sem cuidadoso planeja- mais amplo de fatos ou conceitos,
mento, considerações de várias preparando-os para o supremo teste
ordens deverão ser examinadas e
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

em que se constitui o e x a m e vesti- Serviço de Orientação Educacional


bular. e Vocacional.
Verifica-se, assim, que esse exa- Com esses dados, está o admi-
me t e m exercido influência das mais nistrador habilitado a elaborar o
poderosas n a orientação geral dos Orçamento, n a p a r t e que s e refere
cursos que lhe antecedem, m a s a i n d a a despesas do curso.
não teve forças p a r a m u d a r a n a t u -
reza das séries iniciais do c u r s o D e n t r o dessas perspectivas, va-
superior. mos a b o r d a r a l g u n s pontos que nos
p a r e c e m dignos de m a i o r reflexão.
P a r a que seja r e a l m e n t e equa-
cionado o problema do exame
vestibular, t e m o s que e x a m i n a r a II — FINALIDADES E OBJETI-
verdadeira função do Colégio Uni- VOS NO COLÉGIO UNIVERSI-
versitário, s e n d o p o r t a n t o impres- TARIO
cindível que a r e g u l a m e n t a ç ã o do
exame se apoie na e s t r u t u r a do Admite-se, de há muito, que a
curso. principal finalidade do Colégio Uni-
Na elaboração do plano p a r a a versitário é o r i e n t a r o e s t u d a n t e do
organização desse Colégio, devemos nível médio p a r a o superior, isto é,
t e r sempre presente que todo plane- estabelecer a a r t i c u l a ç ã o perfeita e
j a m e n t o é um continuum. Proces- n a t u r a l de um nível p a r á outro. É
nesse sentido que se u s a o t ê r m o
sados os estudos de b a s e p a r a a
"habilitação". Isso e s t á c l a r a m e n t e
e s t r u t u r a ç ã o do Colégio, projetado
expresso no projeto de lei, a que me
e criado, c o m e ç a r á êle a funcionar.
referi, sôbre a r e f o r m a do ensino
À medida que se vão desenvol-
médico: "O c u r s o vestibular se des-
vendo s u a s atividades, os desvios do t i n a a p r e p a r a r os alunos p a r a as
p l a n e j a m e n t o vão sendo corrigidos. provas de nível de conhecimento
À luz dos seus r e s u l t a d o s v a m o s exigidas no concurso de admissão."
orientar o r e p l a n e j a m e n t o p a r á fases Ali se c h a m a curso vestibular o
sucessivas. As fases constitutivas que a lei hoje d e n o m i n a curso do
do processo a d m i n i s t r a t i v o não são Colégio Universitário, e de exame
estanques; antes, interpenetram-se. de admissão, o a t u a l vestibular. Não
P a r a que se e s t r u t u r e o Colégio se pode p r e t e n d e r que essa habili-
Universitário, torna-se imprescindí- tação seja no sentido de t e r m i n a r
vel fixar, em primeiro lugar, quais um conjunto de estudos que sirvam
são os seus objetivos próximos den- de imediato p a r a u m a profissão.
t r o do prazo de funcionamento que Temos que rejeitar, no t r a n s c o r r e r
lhe é reservado a n u a l m e n t e . Tais do curso médio, a p r e d o m i n â n c i a da
função propedêutica sôbre as de-
objetivos têm que relacionar-se,
m a i s ; parece, e n t r e t a n t o , fora de
o b r i g a t o r i a m e n t e com a clientela,
dúvida que, no â m b i t o do Colégio
que é a m a t é r i a - p r i m a da adminis-
Universitário, a função propedêutica
t r a ç ã o . E m função dêsses elementos
deve s u p e r a r as demais. Aliás, é
principais é que se b u s c a m os meios. claro o § 2º do a r t . 46 da L D B E N :
O primeiro deles é o p a r q u e escolar
— o edifício com seu equipamento "A t e r c e i r a série do ciclo cole-
adequado. O segundo refere-se ao gial s e r á o r g a n i z a d a com. currículo
r e c r u t a m e n t o e ã seleção do corpo diversificado, que vise ao preparo
docente, em função do curriculo que dos alunos para os cursos superio-
se elaborou. É o corpo docente quem res e compreenderá, no mínimo,
vai fazer a p r o g r a m a ç ã o do ensino q u a t r o e, no máximo, seis discipli-
e dar-lhe a orientação devida. H a - nas, podendo ser m i n i s t r a d a em
v e r á serviços auxiliares: u n s a d m i - colégios universitários". (Grifo
nistrativos, que p e r m i t a m o desen- nosso).
rolar da r o t i n a ; outros, assistenciais Esse aspecto t o r n a o Colégio
e, finalmente, técnicos, como o Universitário u m a p r e p a r a ç ã o b e m
102 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

marcada pará o nível superior e num curso que corresponda às suas


dificulta, se não impossibilita, o adptidões. Dadas as nossas min-
funcionamento dessa classe como guadas reservas didáticas, temos
equivalente a uma classe terminal que selecionar, dentre os capazes,
que conduza a uma profissão de os melhores, aquêles que têm mais
nível médio. A menos que o Colégio possibilidades de êxito nos estudos
Universitário funcionasse após a e, de certo modo, na profissão a que
conclusão do nível médio, parece que os mesmos conduzem.
se criarão problemas complexos Impõe-se, assim, não somente um
entre as finalidades dos cursos mé- Serviço de Orientação Educacional
dios, pelo menos os de natureza e Vocacional, como setores que per-
técnica, e as do Colégio Universitá- mitam perfeita integração desse ser-
rio, conforme aliás já tive oportuni- viço com o corpo docente.
dade de chamar atenção no artigo
"O Vestibular e a Lei". O Colégio Universitário, ao re-
crutar para determinado curso, vai
Se se tiver como assente que os ter decisiva importância pará a sele-
alunos, que vêm tendo acentuada ção da profissão a que o curso leva,
formação técnica, buscam os cursos salvo se se modificar a estrutura
superiores que se orientam no mes- do curso superior, estabelecendo-se
mo sentido, sempre lhes faltará um ciclo inicial, básico, que permita
perspectivas das questões mais articulação dentro de uma esfera
amplas, oferecidas pelo estudo de comum a diversos cursos.
matérias de cunho geral. Mas se Um terceiro objetivo é o de
os alunos, advindos de cursos técni- exercer direção sôbre o ensino mé-
cos, quiserem modificar completa- dio que antecede essa série terminal
mente a direção de seus estudos, e, de tal forma, que o Colégio Uni-
ingressando em curso superior que versitário acabe por exigir certas
não guarde a menor afinidade com condições desse ensino. Abrir-se-ão
a sua preparação anterior, então oportunidades para que cada Uni-
tais problemas se tornarão mais versidade acredite determinados es-
complexos. tabelecimentos de ensino médio.
Se os cursos superiores com- Como se sabe, as Universidades
preendessem um ciclo de matérias americanas usam o sistema de acre-
básicas, permitindo o alargamento ditation, segundo o qual cada um só
da cultura geral, como o que oferece recebe alunos de escolas médias
o "College" americano, estas ques- (high-school) que lhes mereçam
tões deixariam de existir. Entre- confiança.
tanto, temos que encarar a nossa Se encararmos o ensino médio
realidade educacional e projetarmos que está em fase de profunda trans-
para ela. formação com a Lei, observamos
Assim, um dos objetivos do Co- que há um anseio de renovação di-
légio Universitário é habilitar o dática. Fala-se muito em estudo
estudante a cursar o nível superior. dirigido e alguns estabelecimentos
Não é uma função que surge aí, proclamam tê-lo organizado, mas só
pois todo o sistema deve orientar-se poderemos aceitar a implantação
nesse sentido, embora não de ma- desse regime em estabelecimento que
neira exclusiva como o vinha fazen- ofereça as condições básicas para
do o curso secundário. Todo ensino que êle se desenvolva (biblioteca.
deve ter, ao mesmo tempo, uma gabinetes, laboratórios, professôres
finalidade própria, que com êle se preferentemente de tempo integral).
exaure, e outra que permita pro- Um quarto objetivo é a intro-
longá-lo até que se alcance a espe- dução paulatina do estudante do
cialização. nível médio no meio universitário,
O segundo objetivo é o de sele- mediante contato com o ambiente
cionar, antes do mais, o estudante, que, sob diversos aspectos, tem que
a fim de colocar o indivíduo capaz diferenciar-se do nível médio.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 103

Esses quatro objetivos conjuga- processava no pressuposto de que


dos formam o arcabouço para a o simples exame adaptava um curso
articulação do nível médio com o a outro. Em última análise, a adap-
superior, que constitui a grande fina- tação significava exame de validação
lidade do Colégio Universitário. do curso secundário, tanto mais que
Voltemos nossa atenção para o legislador exigia, no exame vesti-
quem vai ocupar o centro dessa bular, o programa do curso secun-
instituição. dário. Parece evidente que o legis-
Assistimos, em todo o planeta, a lador foi coerente, pois sempre se
uma explosão demográfica, e nosso teve como necessária uma cultura
país é dela teatro. Sem cuidarmos geral antes da especialização do
de alargar as oportunidades educa- nível superior. Se quisermos ins-
cionais, não sairemos do subdesen- tituir, como estamos fazendo, a
volvimento econômico, pois êste é ao multilateralidade de cursos médios
mesmo tempo causa e efeito do sis- com equivalência para ingresso ao
tema escolar. superior, teremos que encontrar um
Essas oportunidades educacio- ponto, no sistema escolar, para alar-
nais só podem ser abertas mediante gar as perspectivas do estudante, de
sadia política de educação. modo a não criarmos "uma máqui-
Atualmente, abre a Lei caminho na armazenadora de conhecimentos
para uma multiplicidade de cursos, específicos", ao inves de "um homem
sôbre os quais dispôs explicitamente capaz de compreender as perspecti-
no nível médio, quanto às modali- vas amplas da profissão que esco-
dades já sistematizadas pela Refor- lheu", como sagazmente observou.
ma Capanema, cuja regulamentação recentemente, o professor Válter
ampliou, fazendo surgir, dentro Leser.
delas, vários tipos. A maior trans- Essa equivalência de cursos é
formação incidiu realmente sôbre o agora muito ampla, tais as oportuni-
curso secundário, que se disciplinou dades de transferência oferecidas
em quatro direções. pela LDBEN (artigo 41). Verifi-
A Lei enseja a possibilidade de cando-se as modalidades de nível
os Conselhos Estaduais regulamen- médio regulamentadas e cm vias de
tarem todo e qualquer ensino médio o ser, bem como as variantes que
por ela não abrangido, o que poderá cada uma pode comportar, viremos
acarretar a sistematização de vários a ter possibilidade de combinações.
cursos existentes entre nós, inclu- O exame não será o meio de adap-
sive os que se criaram como de tação de um curso a outro, a não
emergências. Pará isso, torna-se ser no caso de matérias em que se
imprescindível que, no planejamento, exigem habilidades específicas (dac-
sejam utilizadas medidas do mer- tilografia, taquigrafia, por exemplo),
cado atual de trabalho regional e mas ensejará a experiência de sis-
de seu crescimento, conforme sabia- tema de créditos e todo e qualquer
mente já recomendara o professor recurso adequado para recuperação
Joaquim Faria Góis Filho, no opús- ou reorientação do estudo.
culo "Produtividade, aspecto educa-
cional". O assunto foi minudentemente
A equivalência completa entre estudado por uma Comissão reunida
os cursos médios para efeito de ma- na Campanha de Aperfeiçoamento e
trícula no superior acaba de ser Difusão do Ensino Secundário, da
implantada, de maneira definitiva, qual tive a honra de participar, do
pela Lei de Diretrizes e Bases da que se originou a Circular nº 9, de
Educação Nacional. 17 de julho de 1962, da Diretoria do
A articulação, em nível médio, Ensino Secundário.
embora date das Reformas Capane- Por outro lado, a articulação
ma, nunca surtiu os efeitos que dela vertical poderá ser feita de diversas
hoje se reclamam, uma vez que se maneiras dentro dessa pluralidade
104 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

de caminhos abertos no nível médio, presso e divulgado entre estudantes


sendo facultado ao estudante, em do nível médio, esclarecendo os se-
qualquer fase do curso, passar de guintes pontos:
uma a outra modalidade.
1. localização de nossas escolas
superiores e cursos que ofere-
III — A CLIENTELA cem, sua duração e títulos que
conferem;
É evidente que, mesmo tomadas
as medidas apropriadas, que estão 2. regime de trabalho de cada uma
consubstanciadas naquela Circular, — horários, número de trabalhos
com o fim de uma adaptação que práticos, e t c ;
resguarde a formação do estudante, 3. quais as Universidades que man-
a unidade do trabalho e a eficiência têm Colégio Universitário e que
escolar, chegará ao Colégio Univer- espécie de curso oferecem, uma
sitário, com o correr dos tempos, vez que tudo indica que o Colé-
uma clientela muito diversificada, gio abrangerá apenas modalida-
não somente quanto às aptidões e des que conduzam a seus cursos;
interesses, como também quanto a 4. que contribuições terá que fazer
seu cabedal de conhecimentos. o candidato, em que casos e con-
Impor-se-á, como primeiro passo, a dições;
sua identificação, para que se pro- 5. de que modo poderá habilitar-se
ceda a uma seleção que possibilite a bolsas (quais são, quem as
uma classificação própria. distribui, seu montante e suas
condições);
Essa identificação deve iniciar-
se muito antes de efetivar-se a ma- 6. quais as aptidões especiais exi-
trícula no Colégio Universitário. A gidas em cada carreira e quais
administração dêste deverá começar as contra-indicações;
por imprimir uma ficha contendo 7. qual o mercado regional de tra-
claros a serem preenchidos pelos balho, quer para o exercício di-
candidatos, visando a colher infor- reto da profissão, quer pará a
mes gerais sôbre eles. Os estudan- pesquisa, quer para o magistério,
tes ficaram alertados, por todas as quer como constelação de um
formas possíveis, já no segundo grupo profissional mais amplo;
semestre da 2" série, que devem ser 8. qual o número de profissionais
preenchidas tais fichas e encami- reclamados, em cada região,
nhadas às Universidades em que os para cada especialidade, e qual
candidatos pretenderem matrícula. o número existente;
Haverá encarregados especializados 9. todo e qualquer esclarecimento
para o estudo dessas fichas, que que facilite a escolha do curso,
examinem, a par das exigências por parte do estudante.
curriculares do estudante, suas aspi-
rações, sua situação econômica. A Se os candidatos se familiarizas-
ficha deve ser planejada de tal for- sem com essa literatura, estariam
ma que ofereça uma série de infor- muito mais aptos a enfrentar o tra-
mações a respeito do postulante, balho do Colégio Universitário, in-
inclusive sua possibilidade de pagar clusive pará compreender seus obje-
ou não os estudos, as razões pelas tivos, e para realizar uma escolha
quais escolhe tal ou qual Universi- mais adequada.
dade, e por que pretende seguir tal É necessário conhecer o nível de
ou qual curso. A análise de tais expectação dos estudantes quanto
dados deve ficar ao cuidado do Ser- aos cursos, enquanto a Universidade
viço de Orientação Educacional e deverá estabelecer o que ela espera
Vocacional. Por outro lado, o Mi- dos estudantes. Como esses ficarão
nistério da Educação e Cultura de- apenas um ano nessa instituição, é
veria projetar material a ser im- preciso que, após o exame de sua
escolaridade, aliada ao estudo de
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

s u a s perspectivas em relação ã que h a j a m concluído o ciclo colegial


provável carreira, se proceda ao ou equivalente, e obtido classificação
primeiro teste de seleção, p a r a m e d i r em concurso de habilitação".
o quociente intelectual, não se de- Como os cursos secundários e
vendo admitir, como candidato a técnicos t ê m dois ciclos c h a m a d o s
curso superior, e s t u d a n t e que não ginasial e colegial, que significação
t e n h a alcançado certo Q . I . a ser t e r á essa p a l a v r a "equivalente"?
fixado pela equipe p r ó p r i a do Ser- Administrar-se-ão cursos não subor-
viço de Orientação E d u c a c i o n a l e dinados à a d m i n i s t r a ç ã o geral dos
Vocacional. Em seguida, aplicar- sistemas escolares?
se-ão testes de personalidade. Con-
jugados os resultados, poderão ser Se o critério de equivalência é
classificados os e s t u d a n t e s segundo o relativo à m a t u r i d a d e do estudan-
os cursos a que se d e s t i n a m e o te, admite-se que, como n o r m a geral,
r e g i m e do t r a b a l h o a que devem os estudos da m e s m a extensão p r o -
e s t a r sujeitos. S e r á t a r e f a demo- porcionam as m e s m a s possibilidades,
r a d a e reclama u m a boa equipe de embora variem as m a t é r i a s deles
psicólogos e orientadores que asses- constitutivas. Passa-se, então, a
sorem o a d m i n i s t r a d o r escolar. admitir que todos os cursos de sete
anos de d u r a ç ã o média equivalem-se
N ã o sendo m a i s exigido exame p a r a o efeito de m a t r í c u l a no nível
a l g u m de a d a p t a ç ã o p a r a que jovem, superior.
t e r m i n a d o curso médio qualquer,
ingresse na 3» série de outro de n a - A i n t e r p r e t a ç ã o do Conselho
t u r e z a completamente distinta, ha- F e d e r a l de E d u c a ç ã o , no substan-
v e r á muito problema de ajustamento, cioso P a r e c e r nº 58/62, foi que "o
q u e só poderá ser solucionado me- concurso de habilitação e s t á aberto,
d i a n t e a d e q u a d a classificação, acar- i n d e p e n d e n t e m e n t e de a d a p t a ç ã o , a
r e t a n d o diferenciação de currículos todo e s t u d a n t e que haja concluído
ou, pelo menos, de p r o g r a m a s , de o ciclo colegial ou equivalente de
r e g i m e de trabalho, etc. curso reconhecido como de nível
médio". (Grifo nosso). Logo, é
A Lei nº 1.821, de 12-3-1953, com necessário o reconhecimento do
a liberal r e g u l a m e n t a ç ã o de que foi curso como tal, pelo órgão próprio
objeto, deu equivalência p a r a a m a - dos diversos sistemas escolares.
t r í c u l a no curso superior, aos cursos
secundários completos, técnicos do Assim, q u a n d o o egrégio C.F.E.,
ensino comercial, industrial ou agrí- em tese, declara que a questão de
cola (com duração de sete anos) e equivalência deve ser solucionada
normal, com a m e s m a d u r a ç ã o de pelo próprio estabelecimento do
7 anos ou de nível idêntico admitido ensino superior a que se c a n d i d a t a
pela legislação dos E s t a d o s e do o estudante, "nos t ê r m o s da legis-
D i s t r i t o F e d e r a l (6 anos), bem como lação v i g e n t e " ( P a r e c e r nº 65 e
o curso de seminário de nível equi- 66/62), parece referir-se à própria
valente pelo menos ao secundário, e L D B E N e não à Lei nº 1.821, con-
realizado por estabelecimento idôneo. siderando-se essa c o m p l e t a m e n t e re-
vogada.
A equivalência, a d m i t i d a pela
L D B E N , a b r a n g e os cursos médios Esclarecidos esses pontos, cum-
nela especificados: os por ela regu- pre voltar a nossa atenção p a r a o
l a m e n t a d o s (artigo 47), os que vie- ambiente onde s i t u a r t ã o variados
r e m a ser r e g u l a m e n t a d o s pelos clementes.
sistemas estaduais de educação
(parágrafo único do a r t . 47).
IV — AS INSTALAÇÕES
A lei d e t e r m i n a no a r t . 69, q u e :
"Nos estabelecimentos de ensino O edifício que a Universidade
superior podem ser m i n i s t r a d o s os colocará à disposição do Colégio
seguintes cursos: a) de graduação, Universitário l i m i t a r á o n ú m e r o de
a b e r t o s à matrícula de candidatos estudantes. Daí dizer-se que h a v e r á
106 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

um pré-vestibular para preencher A principal vantagem é a existência


tais vagas. de prédio planejado para Colégio.
Todas as nossas Universidades Entretanto, entre as desvantagens,
aspiram a um "Campus". Atual- coloca-se, em primeiro plano, o fato
mente, porém, a maior parte delas de tratar-se de estabelecimento que
possui escolas situadas em diferen- visa a permitir a iniciação à prática
tes partes. Cumpre, pois, decidir pedagógica. Embora possa ser mui-
se o Colégio Universitário vai ser to bem supervisionado, parece que
uma instituição centralizada ou se é contra-indicado dar ao Colégio
vai anexar-se a cada escola. Pa- Universitário o caráter de campo de
rece ter sido intenção do legislado-- experimentação, pois se trata de
a criação de um Colégio unificado, série crucial. A não ser que os pro-
tanto assim que não deu aos esta- fessôres da Universidade assumam
belecimentos isolados o direito de a responsabilidade integral dessa
criá-lo. Certamente teve receio de série e que os alunos-mestres coad-
assemelhá-lo a um curso pré-vesti- juvem apenas em aspectos práticos,
bular com as características dos nada aconselha esta série lhes seja
tradicionalmente criados. Perma- entregue.
necerá o problema de articulação De qualquer maneira, não pode
dos cursos nos estabelecimentos a administração furtar-se ao exame
isolados, tema que foge ao objetivo dessa questão.
dêste artigo. De modo geral, há que atentar
Sendo uma série tão rica de no espírito da Lei, que é o de fazer
significação, as classes não podem o Colégio Universitário o ponto ideal
constituir-se de muitos alunos, não de articulação de um nível escolar
devendo a matrícula exceder a 30, com outro mais alto, sem prejuízo
máximo que não deveria mesmo ser da formação humana.
atingido. Não poderá haver mais As instalações devem, assim,
de dois turnos, para que, enquanto atender a todos os requisitos de
um se beneficia das aulas, o outro higiene do trabalho escolar e possi-
esteja em estudo nas instalações bilitar a atividade individual dos
adequadas. estudantes num ambiente enrique-
Não vamos insistir sôbre a ne- cido de instrumental adequado, sem
cessidade de um excelente equipa- o que ficará limitada e até anulada
mento. a ação didática,
A Biblioteca merecerá especial
cuidado, não somente pela sua orga-
nização, quanto pela sua adminis- V — CORPO DOCENTE
tração. Já amadurecemos para uti- Afora a questão já levantada no
lização de biblioteconomistas, que artigo anterior, surgirá, de início, a
dinamizam esse setor. relativa à qualificação do professor
Os métodos didáticos, reclaman- mais conveniente para o Colégio
do demonstração constante, necessi- Universitário. Caberá entregar o
tam apoiar-se nos recursos audio- curso aos cuidados de professorado
visuais, razão por que devem ser secundário ou de nível superior?
previstas salas-ambiente e almoxa- Essa questão poderia parecer aca-
rifado com numerosos apetrechos de ciana a quem tem prerrogativas,
demonstração, afora os Laboratórios pela lei, para lecionar em curso mé-
e Gabinetes, destinados às ciências dio, cuja série terminal se realiza
experimentais. em Colégio Universitário. Embora
Acredito que êste seja o ponto o professor secundário deva ter for-
de mais difícil preenchimento. Tal- mação em nível superior, parece
vez se pudesse utilizar o Colégio de mais indicado que, nessa fase, atue
Aplicação, existente na maior parte o professor de nível superior. E
de nossas Universidades. Isto apre- que os estudantes já se vão iniciar
sentará vantagens e inconvenientes. no trato de métodos de ensino su-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 107

perior. Por outro lado, o estudante cialistas, que formulem provas obje-
está na ante-sala da Universidade tivas, problemas ou questões com
e deverá ir conhecendo seus futu- antecedência, para que sejam bem
ros professôres, não já de chôfre, propostas, mimeografando-as para
como altos especialistas no nível distribuição na hora. Esse proce-
profissional. dimento poderia acarretar a padro-
Parece estar sendo esse o en- nização das questões no exame
tendimento do legislador. Atual- vestibular, o que traria várias van-
mente transita no Parlamento o tagens, uma das quais seria clas-
projeto de Lei nº 3.715-61, "que sificar o aluno para todos os
dispõe sôbre o salário-mínimo dos estabelecimentos congêneres, ficando
professôres do ensino particular e a critério do candidato a escolha
dá outras providências", em que se dentro das vagas, em relação à sua
procura estabelecer uma relação classificação.
entre salário de magistério parti- Nada, porém, nesse sentido já
cular e salário-mínimo. Nesse pro- se realizou entre nós, que aconselhe
jeto fixa-se o salário de professor a fazer uma experiência desse tipo.
de ensino superior em igualdade de Parece prudente, agora, que cada
condições com o do curso pré-vesti- estabelecimento poderá desenvolver
bular que, agora, é o do Colégio seus próprios procedimentos, deixar
Universitário. que eles atuem com liberdade, para
De fato, nessa fase, devem me- que dessa experiência nos advenha
recer preferência os professôres um entendimento comum, embora
mais experimentados e que tenham não unificador. Essa a grande
atuado tanto no âmbito do ensino vantagem da autonomia universi-
médio quanto no do superior, ou tária. Sendo também diferentes os
apenas neste. padrões de ensino das nossas es-
colas superiores, é claro que devem
Mesmo que se admitam pontos- variar as condições de ingresso. Se
de-vista contrários aos aqui expen- não podemos nivelar para cima, não
didos, êste problema não pode ser devemos fazê-lo para baixo. Sò-
posto de lado sem exame minucioso mente o tempo fará despontar, atra-
sôbre as inferências de um ou de vés de análises minuciosas, os meios
outro procedimento. Daí é que se de ir elevando cada vez mais o
pode partir para o recrutamento e nível médio e o superior.
a seleção do professorado desse
Curso. As Congregações dos estabele-
Há, porém, um ponto delicado cimentos de nível superior estão
a ser debatido. Em geral, quem certamente atentas a esse problema
leciona julga seus alunos, pois é no e o discutirão, sob ângulos mais
trato dêsses que se tornam conhe- amplos que os aqui apresentados,
cidos certos aspectos da sua parti- considerando as peculiaridades re-
cipação nas atividades escolares. gionais.
Para colocarmos, porém, os es- O certo, porém, é que do êxito
tudantes do Colégio Universitário da seleção adequada do corpo do-
em igualdade de condições com os cente dependerá a do destino do
provenientes de outros estabeleci- Colégio Universitário.
mentos, como determina a LDBEN Desse professorado será esco-
(§ 3º, art. 79), impõe-se, a meu ver, lhido o diretor do Colégio Univer-
o exame por banca diferente da- sitário, que deve possuir qualifica-
quela que lecionou. Na legislação ções especiais, pois de sua capaci-
anterior, mesmo quando havia o dade administrativa dependerá, em
Colégio Universitário, era proibido muito, o êxito da instituição. Um
participar da banca examinadora dos pontos em que será decisiva a
quem tivesse lecionado o aluno. Há sua orientação é o que se refere
mesmo quem advogue que os exa- à seleção adequada da matéria
mes sejam processados por espe- constitutiva do curso.
108 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

cursar uma ou outra matéria que


VI — CURRÍCULO vise a equilibrar a sua escolaridade-
anterior.
Dada a variedade de clientela
que chegará a essa terceira série, Isso não constitui problema fá-
surgirá o problema de saber como cil, donde a necessidade de ser
equilibrar os seus conhecimentos. equacionado muito antes de se ini-
ciarem as atividades escolares.
O currículo vai depender da
natuerza do exame e o exame de- Os estabelecimentos terão liber-
penderá do currículo. Se o exame dade de escolher a forma de seu
procurar medir certa qualidade de vestibular, logo terão o direito de
conhecimentos em determinadas ma- organizar o seu currículo.
térias que se consideram, tradicio- Mesmo aquêles que se preo-
nalmente, indispensáveis à inicia- cuparem mais em medir a capa-
ção nos estudos superiores, certa- cidade de aprender do que o
mente nem todos estarão aptos a aprendido, não podem considerar
fazer o curso no mesmo período indispensável certo lastro básico de
de tempo. Nem se deveria correr conhecimentos, pois tôda a cultura
o risco de promover o curso para se constitui numa escala ascendente
todos em um ano apenas. Os que e, sem o domínio de certos funda-
fracassarem terão razões de sobra mentos, o curso superior se tornaria
para lamentar o tempo perdido. ininteligível. Êste ponto certamente-
Para eles teria sido melhor uma merecerá exame acurado para que,
programação da 3" série em dois procurando corrigir os procedimen-
anos. tos rígidos do passado, não venha-
mos a cair em erros opostos e mais
De acordo com a LDBEN, a graves.
3ª série do ciclo colegial será orga-
nizada com currículo diversificado, Há mesmo os que advogam a
que vise ao preparo dos alunos eliminação do vestibular. A Lei,
para os cursos superiores, abran- nesse particular, foi explícita, exi-
gendo, no mínimo, 4 e, no máximo, gindo a sua realização. Entretanto,
6 disciplinas (§ 2º, art. 46). a forma do exame ficará a cargo
de cada estabelecimento — e, nesse
Admite-se que essa organização, ponto, o egrégio Conselho Federal
para determinadas universidades, de Educação foi preciso no Parecer
se centralizará em 6 tipos de cur- nº 58-62.
rículo:
Há quem julgue que o exame
1. Para medicina, farmácia, não precisa incidir em matérias do
odontologia, enfermagem, história curso, sendo suficientes provas de
natural, nutrição, veterinária. seleção com critérios mais amplos.
2. Para engenharia, física, quí- Os que desejam que a Universi-
mica industrial, estatística, mate- dade esteja aberta a todos, sem
mática, agronomia, agrimensura, necessidade de qualquer exame, pelo
ciências contábeis e atuariais. menos estarão de acordo que, no
3. Para direito, serviço social, nível superior, se façam classes de
pedagogia, ciências sociais, psico- recuperação. Ninguém, em sã cons-
logia, geografia, história, jornalis- ciência, pode dizer que os cursos
mo, ciências econômicas. médios estão preparando realmente
4. Para letras. alunos para cursarem nível supe-
rior. A experiência docente revela-
5. Para artes. nos, até, que muitos aprovados em
Conforme a proveniência do es- exame vestibular deviam voltar ao
tudante e a sua exata classificação, nível médio. Se não devemos evitar
deve a administração proporcionar o exame vestibular, esse não deve
meios para que os estudantes, em- ser organizado de tal forma que
bora matriculados numa classe dife- procure impedir os capazes de pros-
renciada, tenham oportunidade de seguirem curso de nível superior.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 109

Mesmo com a forma atual do exa- em língua espanhola — começa


me, admite-se tratamento diferente, por estudar a impropriedade da ex-
como as conhecidas propostas da pressão "América Latina" surgida
Pontifícia Universidade Católica do no século XIX, em face da reação
Rio Grande do Sul, veiculadas no dos novos países americanos contra
número 18 da Revista "Educação as duas mães-pátrias das quais aca-
e Ciências Sociais", 1961, Rio, e a bavam de libertar-se. A França, a
maneira de tabular os resultados, esse tempo o paradigma dos liber-
como proposta pelo professor Wag- tadores e caudilhos, era conside-
ner W. Martins, da Universidade rada a campeã por excelência da
de São Paulo, no seu trabalho "Sis- cultura latina. Cultura a que o
tema de Versão Analítica de Notas Brasil se achava associado por sua
e Classificações aplicado aos Exa- língua e por muitos dos seus cos-
mes Vestibulares". tumes.
Esses estudos tendiam a classi- Por América Latina, como se
ficar todos os capazes e aproveitar sabe, entendem-se os países de lín-
os melhores dentro dos limites das gua espanhola e portuguesa. Po-
vagas fixadas. Evitaria uma se- der-se-ia, então, creio eu, dar-lhe
gunda chamada, que não deve mais a denominação de Ibero-América;
ter sentido dentro do conceito atual mas acontece que se inclui nessa
do exame e que, além do mais, designação geral o Haiti, cuja lín-
perturba, de maneira grave, o início gua é a francesa.
do ano letivo nos estabelecimentos Lewis Hanke chama a atenção
de ensino superior. O retardamen- do leitor para um dos mais graves
to, agora, do início das aulas, acar- problemas da América Latina —
retará, segundo a LDBEN, o adia- sua instabilidade. Tal instabilidade
mento do término do ano letivo, deve-se, como salienta Crouzet, à
para que se desenvolvam 180 dias estrutura antidemocrática da socie-
de aulas, o que trará uma série de dade, ausência de classe média nu-
problemas administrativos, de difí- merosa, à miséria e ignorância das
cil tratamento. massas. Uma situação de instabili-
dade que engendra o caudilhismo
Muitos transtornos seriam evi- e ainda hoje não desapareceu, como
tados se já houvesse uma orienta- o atestam as perturbações ocorri-
ção educacional através de todo o das recentemente na Argentina, no
sistema escolar. Não se pode mais Equador, nas Honduras, na Guate-
adiar a existência de tal serviço mala, na República Dominicana e
no âmbito do Colégio Universitário. na Venezuela. Na Venezuela, por
— (Diário de Notícias, Rio). exemplo, em menos de dois anos
houve sete golpes-de-estado. Mais
de quatorze milhões de índios (nu-
merosos vivendo em situação arcai-
A AMÉRICA LATINA ca) e outros tantos negros ou mes-
Estêvão Pinto tiços agravam a situação. Wagley,
quando pesquisou as causas de algu-
mas "barreiras" à educação, na
Há cerca de quatro anos, Lewis América em geral, chegou à con-
Hanke publicou interessante ensaio clusão de que algumas delas são
sôbre a América Latina, que foi, devidas a preconceitos raciais (na
posteriormente, tal o seu valor e América Anglo-saxônia) e outras
atualidade, divulgado por uma das são devidas a preconceitos sócio-
nossas melhores revistas de cultura.l econômicos (na América Latina).
Lewis Hanke — de quem tomei Ao subdesenvolvimento da América
conhecimento, pela primeira vez, Latina estão ligados problemas re-
em 1939, através de outro ensaio,
2 — Gilberto Freyre — Vida y obra
1 — Revista Brasileira de Estudos — Bibliografia — Antologia, New York,
Políticos, de Belo Horizonte. 1939; com fotografias e ilustrações.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

ferentes às suas condições geográ- Um aspecto, esquecido por Le-


ficas e às suas estruturas econô- v/is Hanke, seria o que o Bouillon
micas. E não sabemos se são causa e Sorlin denominam de "a perso-
ou efeito de tal subdesenvolvimento nalidade do latino-americano", ou
a desonestidade administrativa, a melhor, a originalidade do pensa-
corrupção, os orçamentos deficitá- mento latino-americano, expresso
rios, a política financeira desastrosa, das obras de José Luís Borges (ar-
a incompetência dos governantes, os gentino), de Jorge Icaza (equatoria-
desperdícios ou gastos excessivos, no), de Rômulo Gallegos (venezuela-
no), de Gilberto Freyre, de José Lins
o empreguismo, o regime do pisto- do Rego, de Jorge Amado e de
lão e do coronelismo, o analfabetis- tantos outros. E isso sem falar na
mo, o superurbanismo, a alimenta- arte de Niemeyer, de Villa-Lôbos,
ção defeituosa, o banditismo e os de Portinari, de Rivera e de Orozco,
abusos do capitalismo nacional e para citar apenas alguns exemplos.
estrangeiro. Não devemos esquecer, final-
Lewis Hanke chama a atenção mente, que o Novo Mundo tem sido
para as palavras de uma das maio- o asilo dos perseguidos e degreda-
res autoridades em assuntos latino- dos por crimes ideológicos. E tam-
americanos: Guy Inman. Segundo bém não olvidemos que na América
Guy Inman, o mundo dificilmente em geral ocorreram muitas inven-
irá buscar na América Latina "li- ções modernas — o descaroçador
derança em democracia, organiza- de algodão, o freio de ar compri-
ção, negócios, ciência e rígidos va- mido, a vulcanização da borracha,
lores morais"; a América Latina, o lampião a gás, o ferro elétrico,
entretanto, vem contribuindo para o aspirador de poeira, a geladeira,
o mundo industrializado e mecani- o fogão a óleo, o fonógrafo, a lâm-
zado naquilo "que se refere ao pada de filamento. Acrescentem-se
valor do indivíduo, ao lugar da a essa lista o bote-a-vapor (Fulton),
amizade, ao uso do lazer, à arte o telégrafo eletromagnético (Mor-
da conversação, às atrações da vida se), o aeroplano (Santos-Dumont),
intelectual, à igualdade das raças, a máquina de escrever (Thurber),
à base jurídica da vida internacio- o pára-raios, a fechadura de segu-
nal, ao posto do sofrimento e da rança (Yale), o microfone (Edison),
contemplação". Em suma, àquilo várias vitaminas, a vacina anti-
"que não é prático" ou "à impor- poliomielítica, o celulóide, o nylon,
tância das pessoas sôbre as coisas a linotipia, o leite condensado, as
e as normas". Outra grande con- lentes bifocais, a terramicina, a
tribuição da América, já salientada máquina registradora, etc. — (Jor-
por Afrânio Peixoto, teria sido o nal do Comércio, Recife).
milho (eqüivale ao trigo na Europa
e ao arroz na Ásia), a batata (de
origem andina), o tabaco, o cacau
e o chocolate (naturais do México), O PROFESSORADO NOS COLÉ-
o feijão, a farinha de mandioca, o GIOS DE ENSINO GERAL NA
cautchuc, a coca (bolívio-peruvia- FRANÇA
na), o mate (nativo nos Pampas),
o guaraná (da Amazônia), o ananás B. Girod de L'Ain
o sapoti, a goiaba, o araçá, a jabu-
ticaba, o jenipapo, o caju, o mara-
cujá, a mangaba, a pitanga, a cas- Os Colégios de Ensino Geral
tanha (do Pará). O carmim ou (ex-cursos complementares) vivem
ruge vem da cochinilha mexicana; há alguns anos um período de
a baunilha é a "alma perfumada" extraordinária expansão. Eles aco-
dos doces de sobremesa. Muitas
dessas riquezas são exclusivas da Traduzido do Le Monde de Paris
(seleção hebdomadária de 4 a 10 de
América Latina. julho de 1963) por Heloísa Guimarães
Monteiro, de nossa redação.
REVISTA BRASILEÍRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

lheram neste ano 710.000 alunos do maternal ao fim da escolaridade


contra 207.000 em 1950. A pro- nos colégios (classe de troisième).
gressão é mais rápida ainda que Reafirmou, nas noções votadas du-
a dos liceus, que contam atualmente rante seu congresso de julho de
com 1.100.000 alunos contra 409.000 1962, a seguinte declaração:
em 1950. "Ser professor antes de ser es-
Mas o que são esses Colégios pecialista. As escolas normais de-
de Ensino Geral? Estabelecimen- vem ser o ambiente de formação
tos de 2' grau, anexos a escolas comum, abrangendo inicialmente
primárias, regidos sempre pela Lei todos os níveis. Os Colégios de
de 30 de dezembro de 1886, onde Ensino Geral constituem um pro-
os mestres são obrigatoriamente longamento natural da escola pri-
professôres vindos do ensino pri- mária e devem, assim, conservar a
mário e tendo alguns recebido for- leveza dos antigos cursos comple-
mação complementar. mentares, suas estreitas ligações
com a escola primária, as famílias,
o bairro, o meio social..."
I. A UNIDADE DO CORPO DE Essa posição é baseada em ra-
PROFESSÔRES zões morais e também táticas. Os
militantes do Sindicato Nacional de
Há vários anos, é fato conhe- Professôres Primários insistem no
cido, a situação é insustentável. valor dos métodos pedagógicos do
Os ministros sucessivos, após ma- ensino primário, e na importância
nifestarem a intenção de modificá- que se dá ao trabalho global da
la, prudentemente suspenderam, criança. Acreditam, e não estão
mais uma vez, o andamento do errados, que as crianças não são
projeto, quando se convenceram de bem guiadas nas pequenas classes
que teriam pela frente a oposição dos liceus e que as provenientes
total da mais poderosa organização de meios mais modestos não podem,
de mestres, o Sindicato Nacional de muitas vezes, ser sustentadas por
Professôres Primários (S.N.I.). M. suas famílias e se desorientam em
Fouchet, após ter também hesitado contato com tantos professôres sem
e recebido várias vezes os dirigen- tempo de conhecê-las.
tes desse Sindicato, decidiu-se a
agir. Um projeto dos estatutos dos Por outro lado, todos os diri-
Colégios de Ensino Geral, elabo- gentes do sindicato são antigos
rado pelos estabelecimentos inde- professôres primários de reigões ru-
pendentes das escolas primárias, rais onde os Colégios de Ensino
recebeu no Conselho Superior de Geral não eram efetivamente, há
Educação Nacional a aprovação de poucos anos, mais do que simples
diferentes sindicatos, com exceção anexos da escola primária. "O
do S.N.I.; um projeto de estatuto Sindicato Nacional de Professôres
pessoal deve ser preparado até o Primários, dizem seus próprios
fim do ano. Enfim, uma circular membros, estará perdido assim que
que acaba de ser enviada aos rei- encontrar um citadino a sua fren-
tores e inspetores de academia mo- te". O que não deixa de ser para-
difica profundamente o processo de doxal, uma vez que a maioria dos
recrutamento e o sistema de forma- estudantes de hoje reside nas ci-
ção dos futuros professôres dos dades.
Colégios de Ensino Geral. Enfim, essa unidade do corpo
docente dá a sua organização uma
supremacia no meio da Federação
DO MATERNAL AO GINÁSIO de Educação Nacional que con-
grega todos os sindicatos autôno-
O Sindicato Nacional de Pro- mos de mestres (exceto do supe-
fessôres Primários defende sempre rior). Usufruindo de um quase
a tese de unidade do corpo docente monopólio da representação dos

8
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

mestres, o Sindicato, graças às inu- donado seus estudos há alguns anos,


meráveis comissões paritárias, dis- devem, e esta é uma tarefa árdua,
põe de um poder realmente consi- realizar estudos propedêuticos e
derável, especialmente para nomea- outros de pedagogia na escola nor-
ções e promoções. mal. Em certos departamentos, o
O secretário geral do sindi- horário de pedagogia é tal que os
cato — M. Dênis Forestier, foi o alunos dispõem de tem muito redu-
exemplo marcante durante anos — zido para freqüentar a faculdade.
discutia em pé de igualdade com A tese do Sindicato havia triun-
o ministro e tinha, às vezes, mais fado: é preciso ser professor de
autoridade do que êle junto às di- classe primária para chegar à esses
retorias. centros; a parte teórica do exame
Mas, infelizmente, o Sindicato. é distinta da propedêutica, que não
depois de lutar desde antes da é indipensável.
guerra por uma reforma democrá- A lealidade, isto é, a necessi-
tica do ensino, no decorrer dos dade de professôres revelada pelos
últimos anos usou seu prestígio Colégios de Ensino Geral, já co-
para manter sua hegemonia. meçou a demolir esses muros pa-
cientemente levantados. Decreto
de 23 de agosto de 1961 autorizou
MUROS P A C I E N T E M E N T E os alunos-mestres das escolas nor-
LEVANTADOS mais primárias a entrar direta-
mente nesses centros de formação
Essa obstinação em recusar sem haver, anteriormente, dirigido
admitir que a prodigiosa expansão uma classe. Mas devem, pará obter
dos ensinamentos de 2' grau não o título, passar esses três ou dois
mais permitia a manutenção das anos no ensino primário. Na ver-
fronteiras de outros tempos, ou de dade, esta disposição não foi apli-
distinções contrastantes entre pro- cada. Todavia esses normalistas,
fessôres primários e secundários, sempre em virtude da unidade do
provocou profundo mal-estar na corpo de professôres primários, de-
Federação de Educação Nacional vem, para se diplomar, ainda que
e suscitou a criação de uma orga- tenham obtido o certificado de
nização rival — o Sindicato Na- aptidão ao professorado dos colé-
cional dos Colégios. Ainda assim.
a influência do Sindicato Nacional gios de ensino geral, apresentar o
de Professôres Primários era indis- certificado do término dos estudos
cutida porque foi promulgado a 21 normais e certificado de aptidão ao
de outubro de 1960 decreto criando ensino elementar. Por outro lado,
um "certificado de aptidão peda- esse acesso direto de normalistas
gógica para os colégios de ensino aos centros de formação, autoriza-
geral". do prudentemente pelo decreto feito
a título transitório, não oferece
Para a elaboração desse certi- senão aos alunos-mestres admitidos
ficado, um segundo texto da mes- numa ampla convocação, o primei-
ma data criou, em cada academia, ro concurso de ingresso nas escolas
um centro regional de formação, normais (nível do 1* colegial). Esta
onde somente têm acesso os pro- oportunidade é negada aos recrutas
fessôres primários que já exerce- do 2º concurso (depois da segunda
ram suas funções "em uma classe parte do «baccalauréat»* e bem
durante o período mínimo de 3 anos entendido, aos bacharéis não nor-
(dois, se têm o certificado de pro-
pedêutica)". malistas.
A escolaridade de 2 anos nestes
centros foi restabelecida em um * N. da R. — O "baccalauréat" no
ano, a título transitório, e por mo- sistema escolar francês 6 o exame Que
tivo de carência de professôres. se realiza apôs a conclusão dos estudos
de nível muito médio, cujo certificado
Esses candidatos, tendo então aban permite o acesso às escolas superiores.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 113

Essas disposições, que reduzem Os portadores do propedêutico


consideravelmente o recrutamento foram convidados pelo Ministério
de professôres dos Colégios de En- a apresentar suas candidaturas aos
sino Geral, são suprimidas pela reitores antes de julho próximo.
nova circular. Podem ser igualmente candidatos
os titulares desse diploma, já enga-
jados na vida ativa, por exemplo,
II. NOVO CORPO DOCENTE auxiliares em exercício nos liceus.
Esses propedeutas serão nomeados
"Será preciso em futuro próxi- professôres-substitutos para estar
mo, segundo informação do minis- em conformidade com a lei em
tério de educação nacional, recrutar vigor, e receberão por esse título
5 mil professôres por ano pará os um salário mensal de cerca de 500
Colégios de Ensino Geral". A fim francos a fim de realizar durante
de atingir esse objetivo — recru- 1 ano a formação complementar.
tam-se atualmente 3 mil professô-
res por ano — e para aperfeiçoar
sua formação teórica e pedagógica, PROPEDÊUTICA
novas medidas são anunciadas em OBRIGATÓRIA
circular que acaba de ser enviada Atualmente os professôres pri-
aos reitores e inspetores de acade- mários titulares ou os alunos-mes-
mia. Eis as principais disposições tres que preparam o professorado
que devem ser aplicadas em opor- de C.E.G. são obrigados a prosse-
tunidade próxima: guir apenas em escolas superiores
os estudos de propedêutica e podem,
mesmo se fracassam, ser nomeados
MAIOR ACESSO AOS CENTROS e registrados nos C.E.G. O Mi-
DE FORMAÇÃO nistério acredita que uma lacuna
dessa natureza tem conseqüências
O Decreto de 21/10/60, que criou desagradáveis, principalmente quan-
em cada academia um centro de to ao envio aos centros de forma-
formação para professôres de C.E.G., ção de professôres que não parecem
limitou o acesso aos mestres que aptos a ensinar nas classes do
exerceram sua profissão durante 3 ginásio, durante o período de esco-
anos em escola primária. A cir- laridade nesses colégios.
cular prevê a admissão de todos os A partir do reinicio do próximo
alunos-mestres, desde que tenham ano letivo os professôres ou alunos-
entrado na escola normal, no 1º mestres que entrarem nos centros
ano colegial (classe de seconde) ou "deverão durante o 1» ano se con-
no terceiro ano (depois da segunda sagrar com prioridade à prepara-
parte do "baccalauréat"). Os estu- ção do certificado de propedêutica".
dantes bem sucedidos em exame de Em caso de fracasso não poderão
propedêutica científica ou literária ter acesso ao professorado de C.E.G.
poderão também ser admitidos. São
oferecidos a esses estudantes qui- No centro da academia de Pa-
nhentos lugares — além dos 4 mil ris, anexo à escola normal de Auteil,
previstos para as outras categorias. as percentagens de êxito em pro-
pedêutica são muito superiores às
Esta disposição deveria entrar registradas para os estudantes:
em vigor no ano passado, como 90% em letras, mais de 70% em
anunciou M. Capelle, diretor geral ciências. Essas percentagens são
da organização e dos programas mais fortes, e isto é o mais impor-
escolares em maio de 1962. No tante, para os professôres que re-
entanto, M. Suidreau voltou atrás tomam seus estudos — eles têm
diante da forte oposição do Sindi- de 23 a 35 anos de idade — que
cato Nacional d© Professôres Pri- para os alunos-mestres que não os
mários. interromperam.
114 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Mas êstes índices são freqüente- Trata-se do início de uma trans-


mente inferiores na província e não formação do professorado dos Co-
atingem, às vezes, a 20%. Eis por légios de Ensino Geral que toma
que as medidas transitórias deverão consciência, com grande atraso, da
forçosamente ser adotadas se não sua evolução: de simples prolonga-
se tem a intenção de impedir o mento da escola primária torna-
acesso aos C.E.G. a numerosos ram-se estabelecimentos secundários.
professôres de mérito.l E preciso imediatamente assi-
Todavia, a preparação ao pro- nalar que modificar também radi-
pedêutico realiza-se apenas em cur- calmente um decreto por uma cir-
sos por correspondência. Experiên- cular é pouco legal: não se esconde
cias devem ser tentadas a partir isso ao Ministério. Não nos parece
do reinicio das aulas em várias que o Sindicato Nacional de Pro-
faculdades: a de letras de Nancy, fessôres Primários queira travar
por exemplo, onde será organizado uma batalha jurídica que teria,
um sistema de ensino por corres- entretanto, tôda a oportunidade de
pondência e rádio associado a se- vencer. Aliás, em parte devido a
ções agrupadas de trabalhos prá- suas objeções, é que um novo de-
ticos, método que permitirá aos creto não está ainda pronto; êle
professôres titulares o preparo ao será submetido ao Conselho Supe-
propedêutico, continuando, se pre- rior de Educação Nacional após o
ferirem, a seguir a classe e con- período letivo a se iniciar em se-
servar seu alojamento. Será preciso, tembro. Mas é sôbre o conteúdo
sem dúvida, esperar sua generali- que o Sindicato intenciona protes-
zação pará extinguir uma prática tar. "Nós não somos totalmente
chocante e pouco de acordo com
o interesse dos alunos: nomeações de acordo, declarou-nos seu secre-
por antigüidade dos professôres de tário geral, M. Desvallois. O que
classes primárias nos C.E.G. é essencial para um futuro pro-
fessor de C.E.G. é possuir métodos
pedagógicos da escola primária,
onde se familiarizou com essas ati-
PROLONGAMENTO DA vidades. A obtenção da propedêu-
FORMAÇÃO tica não é necessária nem boa. O
Apesar de ter sido fixada em que é preciso é desenvolver a for-
2 anos a escolaridade nos centros mação pedagógica."
de formação, a título transitório Em compensação o Sindicato
foi reduzida a 1 ano. Nacional dos Colégios é favorável
A circular prevê que depois do à reforma: "É bom que os pro-
primeiro ano consagrado ao pro- fessôres se aprimorem no ensino
pedêutico os alunos-mestres e estu- superior, disse-nos o secretário
dantes farão um segundo ano de- geral, M. Silbert. O recrutamento
dicado à formação pedagógica pará de estudantes possuidores do pro-
o 1» ciclo e também uma instrução pedêutico é uma excelente medida.
complementar: estudo, principal- O professorado dos C.E.G. não
mente, de programas dessas dife- deve ser um privilégio reservado
rentes classes. Êste segundo ano, aos professôres primários. Além
em caráter provisório, foi reduzido disso, não nos parece inteiramente
a 6 meses para os professôves indispensável reger uma classe pri-
titulares em exercício numa classe mária para tornar-se professor de
durante pelo menos dois anos. C.E.G.: em que o conhecimento
do método global prepara a ensinar
1. Esses, aliás, têm a possibilidade fie, a física? E preciso ensinar a esses
até 1966 e nos têrmos do Decreto de 23 futuros professôres uma iniciação
de agosto de 1961, ser nomeados pro- à pedagogia dos adolescentes, bem
fessôres de C.E.G. "por aptidões diferente da que é usada para as
pessoais" e sem passar pelos centros de crianças".
formação.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 115

Esta última razão nos parece ção não pode ser senão transitória.
particularmente importante. Pode-se imaginar os atritos que
O emprego de métodos primá- suscitará nos futuros colégios poli-
rios para alunos de 11 a 15 anos valentes do lº ciclo, a coexistência
tem graves inconvenientes. Não de duas categorias de professôres.
será o uso do ditado e cálculos No Ministério, como em muitos
impostos freqüentemente pelos pro- sindicatos, a orientação é dada de
fessôres, à maneira que fazem com acordo com o seguinte sistema:
as crianças, uma das causas da formação em tempo igual mas
intensa evasão escolar? Esses mé- de natureza diferente. Havia, ao
todos devem, além do mais, ser lado de licenciaturas especializadas
reformulados pará a escola primá- atuais, licenciaturas plurivalentes
ria, cuja tendência foi profunda- (uma literária e outra cientifica).
mente transformada: ao invés de Nos estabelecimentos polivalentes,
dar às crianças uma bagagem mí- os professôres especializados terão
nima de conhecimentos, deve pre- a seu cargo os alunos mais bem
parar o maior número possível ao dotados para os estudos abstratos,
prosseguimento dos estudos. enquanto os professôres plurivalen-
tes se incumbirão dos outros.3 Tal
O Sindicato Nacional de Pro- fórmula reclama, evidentemente, a
fessôres Primários insiste, e com igualdade de salários para as duas
razão, sôbre os valores fundamen- categorias de mestres. Na Ingla-
tais da escola primária — conhe- terra, contrariamente a todas as
cimento da criança, vigilância de nossas tradições, os salários-base
seu desenvolvimento, — mas que dos professôres de ensino secundá-
não se podem transmitir nos C.E.G. rio são idênticos, apenas acrescidos
por simples imitação de métodos. de complementação salarial ajus-
As escolas normais têm uma longa tada aos titulos e qualificações
e rica tradição pedagógica. Pare- pedagógicas: um professor especia-
cem inclinadas, junto com as facul- lizado no ensino de crianças inadap-
dades, ao ensino teórico, a fim tados pode ter uma remuneração
de dispensar uma formação nova igual à de um professor coberto de
e mais completa destinada aos fu- diplomas.
turos professôres de C.E.G.
primários e secundários, é favorável a
essa reforma e propôs, na última reu-
PERSPECTIVAS nião do Conselho Superior da Função
Pública, fixar a remuneração dos pro-
Não se trata de uma etapa que fessôres de C.E.G. em nível interme-
diário entre a de professôres primários
consista em criar um corpo inter- e de liceus. Atualmente a remunera-
mediário, pelo nível de conhecimen- ção destes é ligeiramente superior à dos
tos e salários, entre professôres professôres primários.
primários e de liceus.2 Esta solu- 3. Atualmente há, como titulares,
33.000 professôres nos liceus clássicos
e modernos, 2G.000 nos C.E.G. Há
2. O Sindicato Gera! de Educação nas escolas maternais e elementares
Nacional, que representa os professôres 1.15.000 professôres primários titulares.
ATOS OFICIAIS

DECRETO N.º 52.797 — DE 31 b) Estimular a criação de bi-


DE OUTUBRO DE 1963 bliotecas públicas e, especialmen-
te, de sistemas regionais de
Aprova o Regimento do Serviço bibliotecas;
Nacional de Bibliotecas do c) Colaborar na manutenção
M.E.C. dos sistemas regionais de biblio-
tecas;
O Presidente da República, d) Promover o estabelecimen-
usando da atribuição que lhe to de uma rede de informações
confere o artigo 87, item I, da bibliográficas que sirva a todo
Constituição, decreta: o Território Nacional;
Art. 1o Fica aprovado o Re- e) Contribuir por meio de
gimento do Serviço Nacional de bôlsas-de-estudo para o aperfei-
Bibliotecas do Ministério da Edu- çoamento técnico de bibliotecá-
cação e Cultura a que se refere rios e documentaristas de todo
o Decreto n.° 51.223, de 22 de o País.
agosto de 1961.
Art. 2° Êste decreto entrará Art. 2.° Para atingir seus ob-
jetivos, o SNB deverá exercer
em vigor na data de sua publi- as seguintes atividades sem pre-
cação, revogadas as disposições juízo de outras que vierem a
em contrário. ser postas em prática, nos têrmos
Brasília, 31 de outubro de 1963; dêste Regimento:
142.° da Independência e 75.° da o) Promover a realização de
República. convênios entre o Ministério da
JOÃO GOULART Educação e Cultura e os Go-
Júlio Furquim Sambaquy vernos Estaduais e Municipais,
bem como entre o Ministério e
entidades públicas e privadas para
instalação e manutenção de ser-
REGIMENTO DO SERVIÇO viços regionais de bibliotecas;
NACIONAL DE BIBLIOTECAS b) Colaborar com as biblio-
tecas e entidades interessadas
CAPÍTULO I
pará manutenção de um Sistema
de Aquisição Planificada, de
Das Finalidades e Competência acordo com as conveniências do
estudo e da pesquisa nas dife-
Art. 1.° O Serviço Nacional rentes regiões do País;
de bibliotecas (SNB), criado, no c) Incentivar a permuta de
Ministério da Educação e Cul- publicações entre as bibliotecas;
tura, diretamente subordinado ao d) Contribuir para a organi-
Ministro, pelo Decreto n.° 51.223, zação e edição de catálogos cole-
de 22 de agosto de 1961, tem por tivos que registrem as coleções
finalidade: mais importantes de livros, pe-
a) Incentivar as diferentes riódicos, manuscritos, mapas,
formas de intercâmbio bibliográ- estampas, músicas, filmes e mi-
fico entre as bibliotecas do País; crofilmes existentes no Brasil;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 117

e) Incentivar trabalhos de são, pelo Presidente da Repú-


catalogação cooperativa e de cata- blica por indicação do Ministro
logação centralizada; de Estado mediante proposta do
/) Promover a organização de Diretor-Geral do SNB.
coleções básicas para crianças, § 1.° Os Diretores de Divisão
jovens e adultos, para facilitar e o Diretor da Biblioteca terão,
a organização de bibliotecas mu- cada um, um assessor, um secre-
nicipais e escolares; tário e um auxiliar escolhidos
gr) Oferecer assistência técnica dentre os servidores públicos fe-
através de cursos especiais ou derais.
por meio da concessão de bôlsas- § 2.° Os Chefes das Seções
de-estudo para as escolas de Bi- auxiliares dos Diretores de Di-
blioteconomia e Documentação visão do SNB serão designados
do País e para aperfeiçoamento e dispensados pelos respectivos
no estrangeiro; Diretores de Divisão.
h) Editar ou auxiliar a edição § 3.° Os Chefes das Seções
de obras de interesse pará a que integrarem as divisões do
Biblioteconomia, Bibliografia e SNB serão designados e dispen-
Documentação. sados pelo Diretor-Geral do SNB,
Parágrafo único. Na realização mediante indicação dos Diretores
das suas tarefas o SNB deverá das respectivas Divisões.
manter estreito intercâmbio com § 4.° Os cargos de chefia da
outros órgãos do Ministério da Seção de Composição e Edição
Educação e Cultura a fim de do DCC da Seção de Organização
obter integral assistência e cola- de Coleções e Cooperação da
boração dêsses órgãos para os DIC, da Seção de Cooperação
serviços regionais de Bibliotecas Técnica da DAT e das seções da
que venham a existir no País- Biblioteca serão privativos de
servidores diplomados em Biblio-
teconomia.
Art 5.° Os órgãos que inte-
CAPÍTULO II gram o SNB funcionarão coor-
denados em regime de colabo-
Da Organização ração orientados e superintendi-
dos pelo Diretor-Geral do SNB.
Art. 3° O SNB terá a se-
guinte constituição:
a) Divisão de Catálogo Cole- CAPÍTULO III
tivo (DCC);
b) Divisão de Intercâmbio de Da Competência dos Órgãos
Catalogação (DIC);
c) Divisão de Assistência Téc- Art. 6.° A Divisão do Catá-
nica (DAT); logo Coletivo (DCC) tem por
d) Biblioteca (Bt); objetivo desenvolver entre as
e) Secretaria. bibliotecas existentes no País
O SNB será dirigido por um estreita cooperação a fim de que
Diretor-Geral, nomeado em co- sejam plenamente utilizadas as
missão pelo Presidente da Repú- coleções bibliográficas e de do-
blica por indicação do Ministro cumentação reunidas cabendo-lhe,
de Estado. portanto, a promover a aplicação
no País de um sistema de aqui-
Parágrafo único. O Diretor- sição planificada; incentivar o
Geral do SNB terá dois asses- empréstimo entre bibliotecas;
sores, um secretário e um auxi- promover a permuta de publi-
liar, todos de sua livre escolha. cações entre as bibliotecas bra-
Art. 4.° Os Diretores da Di- sileiras; prestar informações sô-
visão serão nomeados, em comis- bre a localização das obras dese-
118 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

jadas para estudos e pesquisas, Art. 11. Ao Laboratório de


editar, periodicamente, Catálogos Reprografia cabe realizar os tra-
Coletivos Nacionais em colabora- balhos necessários à reprodução
ção com os Catálogos Coletivos de documentos de interesse para
existentes no País. o Ministério e especialmente para
Art. 7.° A Divisão do Catá- o Serviço Nacional de Biblio-
logo Coletivo compreende: tecas.
a) Seção de Pesquisas e Infor- Art. 12. A Divisão de Inter-
mação; câmbio de Catalogação (DIC)
b) Seção de Permutas e Inter- tem por objetivo incentivar o
câmbio; desenvolvimento de sistemas de
catalogação cooperativa no País,
c) Seção de Composição e considerando em prioridade a
edição; Bibliografia Brasileira Corrente;
d) Laboratório de Repro- colaborar na composição da Bi-
grafia. bliografia da América Latina
Art. 8.° A Seção de Pesqui- (BAL); tomar as medidas neces-
sas e Informações (SPI) com- sárias para a adoção pelas edi-
pete: toras brasileiras, públicas e pri-
I — Informar sôbre a situa- vadas, do sistema de "Cataloga-
ção na fonte"; promover catalo-
ção das coleções bibliográficas e gação e preparação de coleções
de documentação existentes no bibliográficas destinadas à orga-
País; nização de serviços regionais de
II — Promover a localização bibliotecas públicas e de biblio-
de obras necessárias a estudos e tecas escolares.
pesquisas;
Art. 13. A Divisão de Inter-
III — Difundir o Sistema de câmbio de Catalogação (DIC)
Aquisição Planificada, prestando- compreende:
lhe coiaboração técnica.
a) Seção de Seleção e Aqui-
Art. 9.° A Seção de Permuta sição (SSA);
e Intercâmbio (SPEI) compete: b) Seção de Organização de
I — Incentivar o intercâmbio Coleções e de Cooperação (SOC).
de publicações entre as bibliote-
cas do País; Art. 14. À Seção de Seleção
II — Divulgar listas das publi- e Aquisição compete:
cações que possam ser permu- I — Selecionar coleções tipo,
tadas, bem como as solicitações de acordo com as finalidades a
de publicações desejadas; que se destinarem;
III — Contribuir para aquisi- II — Selecionar, em colabora-
ção de obras que se destinem a ção com a Biblioteca, e adquirir
completar coleções existentes. as publicações destinadas ao Ser-
viço Nacional de Bibliotecas;
Art. 10. À Seção de Compo-
sição e Edição compete: III — Adquirir coleções previa-
I — Colecionar exemplares de mente selecionadas, para serem
catálogos coletivos publicados no doadas às Prefeituras Municipais,
Brasil e no estrangeiro; para organização de serviços re-
gionais de bibliotecas.
II — Colaborar na edição de
catálogos coletivos de livros, pe- Art. 15. À Seção de Organi-
riódicos, manuscritos, músicas, zação de Coleções e de Coopera-
gravuras, filmes, traduções etc; ção cabe:
III — Contribuir para a orga- I — Promover a preparação
nização de catálogos coletivos das coleções destinadas à orga-
nas instituições em que conve- nização de sistemas regionais de
nha êste tipo de trabalho. bibliotecas;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 119

II — Colaborar com os editores Art. 17. A Divisão de Assis-


da Bibliografia da América La- tência Técnica (DAT) compre-
tina; ende:
III — Colaborar com as edi- a) Seção de Bolsas e Treina-
toras brasileiras para a adoção mento (SBT);
do Sistema de catalogação na b) Seção de Cooperação Téc-
fonte; nica (SCT).
IV — Contribuir para manu- Art. 18. À Seção de Bolsas e
tenção, no País, de sistemas de Treinamento (SBT) compete:
catalogação cooperativa; I — Promover o treinamento
V — Editar catálogos corres- do pessoal destinado aos Servi-
pondentes a coleções básicas indi- ços Regionais de Bibliotecas;
cadas pelo SNB; II — Conceder bôlsas-de-estudo,
VI — Compilar e divulgar a no país e no estrangeiro, a bi-
relação das publicações editadas bliotecários pará realização de
pelo Ministério da Educação e cursos especiais;
Cultura. III — Promover reuniões de
Art. 16. A Divisão de Assis- estudo para planejamento de tra-
tência Técnica tem por objetivo balhos de cooperação entre bi-
auxiliar a organização de Servi- bliotecas;
ços Regionais de Bibliotecas Pú- IV — Promover a edição de
blicas e Escolares em todo o obras de Biblioteconomia, Biblio-
País; promover acordos do Mi- grafia e Documentação;
nistério da Educação e Cultura V — Conceder auxílios finan-
com os Estados e Municípios ceiros pará realização de pesqui-
para organização de Serviços sas e estudos no campo da Bi-
regionais de bibliotecas e para bliografia, Biblioteconomia e Do-
criação e organização de biblio- cumentação.
tecas urbanas e rurais; manter Art. 19. À Seção de Coope-
cursos intensivos para treina- ração Técnica (SCT) compete:
mento de pessoal que esteja a
serviço de bibliotecas municipais I — Promover a organização,
escolares do interior, onde não no País, de Serviços Regionais
existam escolas de Bibliotecono- de Bibliotecas;
mia; conceder bôlsas-de-estudo II — Promover a utilização,
para formação e especialização pelas bibliotecas municipais, de
de bibliotecários e comentaristas; bibliotecas ambulantes, para que
facilitar a aquisição pelas biblio- possam estender os seus serviços
tecas públicas, ou Serviços Re- a tôda a população do município;
gionais de Bibliotecas, de cole- III — Examinar os processos
ções bibliográficas devidamente de solicitação de auxílios para
catalogadas e preparadas, para informar sôbre a conveniência e
constituição dos fundos iniciais condições em que devem ser
de bibliotecas públicas e esco- atendidos pelo Ministério.
lares; contribuir para utilização Art. 20. A Biblioteca, que será
de bibliotecas ambulantes em constituída, principalmente, por
todo o País; promover a edição obras de referência, de Bibliote-
de obras de Biblioteconomia, conomia, de Bibliografia e Do-
Bibliografia e Documentação, cumentação, deverá servir às ne-
para difusão de sistemas moder- cessidades do Serviço Nacional
nos entre . os bibliotecários e de Bibliotecas e às do Ministério
documentaristas do País; custear da Educação e Cultura.
pesquisas para o desenvolvi- Parágrafo único. A Biblioteca
mento das técnicas modernas de do SNB deverá servir como depo-
informações bibliográficas. sitária das publicações editadas
120 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

pelo Ministério e como centro bibliografias, índices analíticos,


de informações para os órgãos etc.
do Ministério.
Art. 24. À Secretaria do SNB
Art. 21. A Biblioteca com- compete:
preende: I — Realizar os serviços de
o) Seção de Catalogação e administração geral que se fize-
Classificação (SCC); r e m necessários à consecução
b) Seção de Referência e Em- das finalidades do SNB;
préstimo (SRE). II — Coordenar os trabalhos
de correspondência do SNB.
Art. 22. Ã Seção de Catalo-
gação e Classificação compete:
I —. Colaborar com a Seção
de Seleção e Aquisição da Di- CAPÍTULO IV
visão de Intercâmbio de Catalo-
gação, na seleção das obras a Das Atribuições dos Servidores
serem incluídas no acervo da
Biblioteca do SNB; Art. 25 Ao Diretor-Geral do
II — Manter intercâmbio de SNB compete:
publicações com instituições edu- I — Orientar dirigir e coorde-
cacionais e culturais, brasileiras n a r os trabalhos do SNB;
e estrangeiras;
II — baixar normas gerais de
I I I — Registrar, classificar, ca- trabalho para todo o Serviço;
talogar e preparar para emprés-
timo as coleções da Biblioteca; I I I — Despachar com o Minis-
t r o de Estado;
IV — Catalogar, classificar e
preparar para empréstimo as IV — Baixar portarias instru-
coleções de livros a serem doadas ções e ordens de serviço;
pelo SNB; V — Designar os servidores
V — Elaborar e m a n t e r os re- do SNB;
gistros e catálogos necessários; VI — Propor ao Ministro de
VI — Promover a encaderna- Estado a nomeação dos Diretores
ção e conservação do acervo bi- das Divisões do SNB;
bliográfico do SNB. VII — Reunir periodicamente
as autoridades que lhe forem
Art. 23. À Seção de Referên- subordinadas a fim de assentar
cia e Empréstimo (SRE) com- providências ou discutir assuntos
pete: de interesse do serviço;
I — Promover a adequada uti- V I I I — Designar servidores do
lização das coleções da Biblio- SNB para inspecionar ou prestar
teca; serviços de assistência técnica a
II — Atender aos pedidos de bibliotecas fora do Distrito Fe-
informações que forem feitos à deral;
Biblioteca; IX — Determinar ou autorizar
I I I — Realizar o empréstimo a execução de serviços fora da
de publicações; sede;
IV — Colaborar com as outras X — Propor ao Ministro de
bibliotecas brasileiras, procurando Estado a designação do seu subs-
desenvolver o empréstimo-entre- tituto eventual;
bibliotecas; XI — Delegar competência aos
V — Organizar os registros e seus subordinados imediatos para
catálogos necessários aos seus praticarem atos de sua alçada;
trabalhos; X I I — Designar e dispensar
VI — Promover a divulgação seu Secretário, seus Assessores e
das coleções reunidas através de seu Auxiliar de Gabinete;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 121

X I I I — Determinar a instala- X I I I — Prorrogar ou antecipar


r ã o de processo administrativo. o expediente dos servidores que
Art. 26. Aos Diretores de lhes forem subordinados;
Divisão compete: X I V — Propor as alterações
I — Orientar e fiscalizar os de lotação que julgar necessárias
trabalhos dos órgãos sob sua ao órgão sob sua direção;
direção e representá-los nas re- XV — Determinar a execução
lações com terceiros; de serviço externo e fora da
II — Assinar o expediente do sede;
órgão sob sua direção e o que XVI — Expedir boletins de
lhe fôr atribuído por delegação merecimento dos servidores que
de competência; lhe forem imediatamente subor-
I I I — Resolver os assuntos da dinados;
competência dos órgãos sob sua XVII — Aprovar a escala de
direção e opinar sôbre os que férias dos servidores em exercí-
dependerem de decisão superior; cio nos órgãos sob sua direção;
IV — despachar com o Diretor XVIII — Elogiar os servidores
do SNB; que lhes são subordinados e apli-
V — Organizar conforme as car-lhes penas disciplinares, inclu-
necessidades do serviço t u r m a s sive a de suspensão até 15 dias;
de trabalho com horário espe- XIX — Reunir periodicamente
cial; os chefes que lhes forem subor-
VI — Baixar portarias, instru- dinados a fim de assentar pro-
ções e ordens de serviço; vidências ou discutir assuntos de
interesse do serviço;
VII — Propor ao Diretor-Geral
do SNB a admissão ou dispensa XX — Autorizar a expedição
dos chefes das seções que inte- de certidões;
g r a m a Divisão sob a sua direção, XXI — Aprovar e encaminhar
bem como de seus secretários, a proposta orçamentária dos
assessores e auxiliares, quando órgãos sob sua direção;
fôr o caso; XXII — Apresentar anualmen-
V I I I — Distribuir pelas res- te ao Diretor-Geral do SNB rela-
pectivas dependências o pessoal tório das atividades dos órgãos
lotado no órgão sob sua direção sob sua direção.
e fixar-lhe o horário de trabalho,
respeitadas as disposições legais
vigentes;
IX — Manter o Diretor-Geral CAPÍTULO V
do SNB informado quanto ao Das Substituições
andamento dos trabalhos em exe-
cução nos órgãos sob sua di-
reção; Art. 27. Serão substituídos
X — Autorizar despesas e re- automaticamente em seus impe-
quisitar pagamentos e adianta- dimentos eventuais:
mentos à conta dos créditos orça- I _ O Diretor-Geral do SNB
mentários e adicionais movimen- pelo Diretor de Divisão de sua
tados pela Divisão; indicação designado pelo Minis-
XI — Encaminhar ao Departa- tro de Estado;
mento de Administração do Mi- II — Os Diretores de Divisão
nistério da Educação e Cultura por servidores designados pelo
comprovações dos adiantamentos Diretor-Geral do SNB indicados
concedidos à conta dos créditos; pelos respectivos Diretores;
X I I — Requisitar transportes I I I — Os ocupantes de funções
de pessoal e material sob sua gratificadas de chefia por servi-
«direção; dores designados pelas mesmas
122 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

autoridades competentes para vênios, instalação das unidades


designação dos titulares dessas escolares e ao seu funcionamento,
funções. que deverá iniciar-se em feve-
Art. 28. Os casos omissos que reiro de 1964.
envolvam matéria regimental Art. 3.° O Ministério da Guerra,
serão resolvidos pelo Ministro o Ministério da Marinha e o Mi-
de Estado. nistério da Aeronáutica darão a
cooperação que lhes fôr solici-
tada, por quem de direito, para
o planejamento e a realização
CAPÍTULO VI dos objetivos dêste decreto.
Art. 4.° Dos convênios cons-
Das Disposições Transitórias tarão as normas de estruturação
dos cursos e admissão de docen-
Art. 29. Até que sejam cria- tes, de acordo com as conve-
dos os cargos em comissão pre- niências, possibilidades e neces-
vistos pelo arts. 3.° e 4.° dêste sidades regionais.
Regimento as atribuições que lhes Art. 5.° As despesas decorren-
são correspondentes serão exer- tes da execução dêste decreto
cidas por funcionários designa- correção à conta de recursos con-
dos na forma do Regimento, aos signados ao Fundo Nacional do
quais será atribuída pelo Minis- Ensino Primário, no Orçamento
tro de Estado gratificação espe- da União-
cial a título de representação. —
Júlio Furquim Sambaquy- Art. 6.° Êste decreto entrará
em vigor na data de sua publi-
(Publ. no D.O. de 4/11/19G3) cação, revogadas as disposições
em contrário.
Brasília, em 18 de dezembro
DECRETO N.° 53.327 — DE 18 de 1963; 142.° da Independência
e 75.° da República.
DE DEZEMBRO DE 1963
João GOULART
Cria, em caráter supletivo, as Júlio Furquim Sambaquy
escolas primárias de fronteira. (Publ. no D . O . de 19/12/1963)
O Presidente da República,
usando da atribuição que lhe
confere o art. 87, inciso I, da DECRETO N.° 53.324 — DE 18
Constituição Federal, decreta: DE DEZEMBRO DE 1963
Art. 1.° O Ministério da Edu-
cação e Cultura, por intermédio Aprova o Programa Intensivo de
do Departamento Nacional de Preparação da Mão-de-Obra
Educação, em caráter supletivo Industrial e dá outras provi-
e em convênio com os governos dências.
dos Estados, Territórios e órgãos
federais encarregados do desen- O Presidente da República,
volvimento e fiscalização das usando da atribuição que lhe
zonas limítrofes, criará escolas confere o artigo 87, item I, da
ao longo das fronteiras nacionais, Constituição, decreta:
destinadas a dar educação fun-
damental às populações locais. Art. 1.° Fica aprovado, no Mi-
nistério da Educação e Cultura,
Art. 2.° O Ministério da Edu- o Programa Intensivo de Prepa-
cação e Cultura tomará as pro- ração da Mão-de-Obra Industrial,
vidências necessárias ao imediato que será realizado com a parti-
planejamento da rede de escolas cipação das escolas de ensino
de fronteiras, assinatura de con- técnico-industrial, de associações
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 123

estudantis, de empresas indus- b) Substancial aumento de


triais, de entidades públicas e número de vagas nos cursos de
de entidades classistas de empre- engenharia;
gados e de empregadores. c) O melhor aproveitamento
Art. 2.° Será responsável pelo da juventude brasileira na ad-
Programa de que trata êste De- missão a esses cursos;
creto a Diretoria do E n s i n o In- d) Diversificação dos cursos
dustrial do Ministério da Edu- no ciclo profissional, ligados dire-
cação e Cultura, através de u m a tamente ao desenvolvimento in-
Coordenação Nacional e de Coor- dustrial;
denações Regionais. e) Concentração e coordena-
ção de esforços e recursos finan-
Art. 3.° As despesas com a ceiros, inclusive os decorrentes
execução do Programa Intensivo de empréstimos externos, desti-
de Preparação da Mão-de-Obra nados aos fins mencionados neste
Industrial correrão à conta de artigo.
dotações do Fundo Nacional de
Ensino Primário e do F u n d o Na- Art. 2.° Para a consecução de
cional de Ensino Médio- seus objetivos, o PROTEC pro-
moverá a criação de Centros
Art. 4.° O Ministro da Educa- onde se ministrará o ensino
ção e Cultura baixará os atos e correspondente ao ciclo básico
tomará as providências necessá- dos cursos de engenharia-
rias à execução dêste decreto.
Art. 3.° Os Centros de forma-
Art. 5.° Êste decreto e n t r a r á ção básica serão criados median-
em vigor na data de sua publi- te convênios com as Universida-
cação, revogadas as disposições des ou Escolas de Engenharia,
em contrário. ou por ação direta do PROTEC.
Brasília, em 18 de dezembro Art. 4.° As seguintes diretrizes
de 1963; 142.° da Independência gerais deverão ser obedecidas
e 75.° da República. quanto aos cursos patrocinados
JOÃO GOULART pelo PROTEC:
Júlio Furquim Sambaquy a) Os Centros de formação
básica serão criados nas regiões
(Publ. no D.O. de 19/12/1963) onde a demanda justificar o au-
mento substancial de matrículas;
b) O processo de admissão
deve assegurar o aproveitamento
DECRETO N.° 53.325 — DE 18 máximo dos candidatos;
DE DEZEMBRO DE 1963 c) Após a admissão, serão os
alunos encaminhados a um plano
Institui o Programa de Expansão de estudo que vise a suplemen-
do Ensino Tecnológico. tar seus conhecimentos na área
em que não tiverem revelado
O Presidente da República, preparo satisfatório;
usando da atribuição que lhe d) Aos alunos que tenham
confere o artigo 87, item I, da concluído com aproveitamento o
Constituição, decreta: curso básico será assegurado o
Art. 1.° Fica instituído, no Mi- acesso ao ciclo profissional das
nistério da Educação e Cultura, Escolas de Engenharia ou nos
o PROTEC, Programa de Ex- cursos especializados da forma-
pansão do Ensino Tecnológico, ção de cientistas e pesquisadores;
com a finalidade de promover: e) Aos alunos que não con-
a) A graduação de maior cluírem o ciclo básico será ofe-
n ú m e r o de especialistas e técni- recida a oportunidade de pros-
cos auxiliares nos diferentes seguir seus estudos nas Univer-
ramos da engenharia e da tecno- sidades, nas Escolas Técnicas ou
logia em geral; nos próprios Centros de forma
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

a ser-lhes propiciada a formação fixar normas para o seu funcio-


em outros cursos, de acordo com Mamento, elaborar os orçamentos,
os conhecimentos adquiridos; distribuir e controlar a aplicação
f) Os Centros procurarão dar dos recursos e controlar a exe-
assistência aos alunos no sentido cução dos planos.
da orientação vocacional. Art. 12. O pessoal docente, téc-
Art. 5.° As entidades de ensino nico e administrativo do PROTEC
superior que firmarem convênio será admitido por contratos, que
com o PROTEC terão a respon- se regerão pela legislação tra-
sabilidade do programa em âm- balhista ou mediante aquisição
bito regional, podendo participar de servidores públicos e autár-
do convênio outras Escolas do quicos.
mesmo nível ou Escolas Téc- Art. 13. Os recursos para a
nicas da mesma região. execução do que dispõe êste de-
Art. 6.° As Universidades e creto serão provenientes de do-
Escolas que firmarem convênio tações orçamentárias globais do
com o PROTEC receberão auxílio Ministério da Educação e Cultura,
para a execução do programa assim como de convênios cele-
previsto no presente decreto. brados com entidades públicas e
Art. 7.° O PROTEC realizará privadas.
convênio, igualmente, para a ex- Art. 14- Êste decreto entrará
pansão do ensino no ciclo pro- em vigor na data da publicação,
fissional, tendo em vista o apro- revogando-se disposições em con-
veitamento dos alunos proceden- trário.
tes dos cursos básicos criados na Brasília, D. F. em 18 de de-
forma dêste decreto. zembro de 1963; 142.° da Inde-
Art. 8.° O PROTEC será admi- pendência e 75.° da República.
nistrado por uma Superinten- JoÁo GOULART
dência vinculada à Diretoria do
Ensino Superior, gozando de Júlio Furquhn Sambaquy
autonomia didática, financeira e (Publ. no D.O. de 19/12/1963)
administrativa-
Art. 9.° São órgãos de admi-
nistração da Superintendência o
Conselho de Administração, pre- DECRETO N.° 53.326 — DE 18
sidido pelo Diretor do Ensino DE DEZEMBRO DE 1963
Superior e o Superintendente
Executivo, contratado pelo Con- Autoriza a criação de escolas téc-
selho de Administração. nicas de hotelaria e dá outras
Art. 10. O Conselho de Admi- providências.
nistração será integrado pelo
Diretor do Ensino Superior, o O Presidente da República,
Diretor do Ensino Industrial, o usando da atribuição que lhe
Superintendente do PROTEC, um confere o artigo 87, item I, da
representante da Confederação Constituição Federal, decreta:
Nacional de Indústria e dois
membros nomeados pelo Presi- Art. 1.° Fica o Ministério da
dente da República, por indicação Educação e Cultura, por inter-
do Ministro da Educação. médio de sua Diretoria do En-
sino Comercial, autorizado a
Art. 11. Caberá à Superinten- criar nos principais centros do
dência elaborar os planos de ex- País, como unidades do sistema
pansão do ensino tecnológico, federal de ensino, escolas técni-
realizar os estudos e inquéritos cas de hotelaria.
indispensáveis à ampliação das § 1.° Inicialmente, serão cria-
matrículas, escolher as regiões das duas unidades para a for-
onde serão criados os Centros, mação de profissionais em hote-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 125

laria e atividades similares, uma Educação Extra-Escolar do De-


na cidade de São Paulo e outra partamento Nacional de Educa-
no Rio de Janeiro. ção, e
§ 2.° As unidades escolares considerando o desenvolvimen-
criadas deverão manter cursos to que vem alcançando no país
de formação de primeiro e de a rede de cine-clubes;
segundo ciclos, além dos cursos considerando a valiosa contri-
de aperfeiçoamento e de conti- buição que essas organizações
nuação ou práticos reclamados oferecem e podem oferecer em
pelos mercados locais de trabalho. prol da formação cultural dos
§ 3.° A Diretoria do Ensino grupos que delas participam;
Comercial poderá firmar convê- considerando que a Divisão de
nios com entidades especializa- Educação Extra-Escolar já está
das e com órgãos sindicais de realizando um trabalho de pes-
empregados e empregadores do quisa para conhecer a organi-
ramo de turismo, hotéis e simi-
lares, pará a organização, insta- zação e os serviços que os cine-
lação e manutenção de escolas clubes prestam ao estudante e
técnicas de hotelaria- à população em geral;
Art. 2.° A manutenção das uni- considerando ser da competên-
dades escolares em causa será cia dos poderes públicos ampa-
feita por contribuições previstas rar e estimular atividades cul-
nos orçamentos da União, de turais desse gênero;
entidades autárquicas e de socie- considerando, finalmente, que
dades de economia mista. para o governo amparar tais
Art. 3.° As despesas decorren- organizações deve conhecer a
tes da execução dêste decreto estrutura e o funcionamento das
correrão à conta de recursos mesmas,
orçamentários consignados ao Resolve:
Fundo Nacional do Ensino Mé-
dio, neste e no próximo exer- Art. 1.° Fica instituído, na
cício. Divisão de Educação Extra-Es-
Art. 4.° A Diretoria do Easino colar do Departamento Nacional
Comercial submeterá à aprova- de Educação, o registro de cine-
ção do Ministro da Educação e clubes que, sem objetivo de
Cultura o regimento das escolas lucro, visem ao desenvolvimento
criadas, logo que se lhes asse- cultural de seus membros.
gurar sede adequada. Art. 2.° São condições do re-
Art. 5.° Êste decreto entrará gistro de cine-clubes:
em vigor na data de sua publi- a) manter programa periódico
cação. de atividades;
Brasília. 18 de dezembro de b) enquadrar em sua progra-
1963; 142.° da Independência e mação filmes nacionais e outros
75.° da República. sôbre temas de interesse social,
JOÃO GOULART
científico e artístico;
c) realizar debates, palestras
Júlio Furquim Sambaquy e cursos sôbre cinema.
(Publ. no D.O. de 19/12/1963) Parágrafo único- Para efeti-
vação do registro devem ser
apresentados os seguintes ele-
PORTARIA N.° 582 — DE 26 mentos:
DE NOVEMBRO DE 1963 a) ofício ao Diretor da Di-
Dispõe sôbre o registro de cine- visão de Educação Extra-Escolar,
clubes. solicitando inscrição;
b) certidão de registro da
O Ministro de Estado da Edu- entidade mantenedora ou do pró-
cação e Cultura, tendo em vista prio cine-clube no Cartório das
as finalidades da Divisão de Pessoas Jurídicas;
126 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

c) Estatuto da entidade man- de Educação, o registro de órgãos


tenedora e Regulamento do cine- de imprensa estudantil e de cur-
clube, ou Estatuto dêste; sos extra-escolares que visem ao
d) certidão da ata de posse preparo técnico e cultural do
da diretoria da entidade mante- estudante para o desempenho
nedora ou do cine-clube (reno- de lides relacionadas com o jor-
vável em cada período); nalismo estudantil.
e) endereço do cine-clube e Art. 2.° Serão registrados os
nome e endereço do seu diretor; seguintes tipos de órgãos de
imprensa estudantil:
f) número de sócios ou mem- a) quanto à entidade mante-
bros do cine-clube. nedora: I — mantido por enti-
Art. 3.° Os auxílios a cine- dade estudantil representativa;
clubes, através da Divisão de II — mantido por entidade estu-
Educação Extra-Escolar ou da dantil especializada (literária,
Campanha de Assistência ao Es- social, esportiva, etc); III —
tudante (CASES), só serão con- mantido por empresa jornalística
cedidos àqueles que efetuarem estudantil ou cooperativa de es-
registro, na forma da presente tudantes;
portaria. b) quanto à feição material:
JÚLIO FURQUIM SAMBAQUY I — jornal ou revista impressos;
II — jornal ou boletim mimeo-
( P u b l . no D.O. de 2 4 / 1 2 / 1 9 6 3 ) grafado; III — jornal mural;
c) quanto à finalidade: I —
opinativo-informativo geral; II
— especializado (literário, cien-
PORTARIA N.° 583 — DE 26 tífico, etc); III — informativo-
DE NOVEMBRO DE 1963 estudantil (boletim).
Art. 3.° Os cursos serão es-
Dispõe sôbre a Imprensa Estu- truturados com programas que
dantil. visem a dar o conhecimento
técnico-jornalístico e a cultura
O Ministro de Estado da Edu- básica essenciais ao exercício de
cação e Cultura, tendo em vista atividades de imprensa estu-
as finalidades da Divisão de dantil-
Educação Extra-Escolar do De- Art. 4.° Dos recursos desti-
partamento Nacional de Edu- nados ao incentivo e amparo à
cação, e imprensa estudantil só serão
considerando que os resultados concedidos auxílios aos órgãos
da pesquisa sôbre imprensa estu- e cursos registrados na Divisão
dantil que está sendo realizada de Educação Extra-Escolar.
pela referida Divisão recomendam Art. 5.° O Diretor da Divisão
maior incentivo e amparo a êste de Educação Extra-Escolar expe-
êste tipo de atividade extra-escolar dirá normas complementares
que em muito contribui para a sôbre a matéria.
boa formação do jovem, Art. 6.° Ficam revogadas as
Resolve: disposições em contrário.
Art. 1.° Fica instituído, na JÚLIO FURQUIM SAMBAQUY
Divisão de Educação Extra-Es-
colar do Departamento Nacional ( P u b l . no D.O. de 24/12/1963)
REVISTA BRASILEIRA

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

M I N I S T É R I O DA EDUCAÇÃO E CULTURA
INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

VOL. XLI ABRIL-JUNHO, 1964 N.° 94


REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS, órgão dos
estudos e pesquisas do Ministério da Educação e Cultura,' publica-se sob a
responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, e tem por
fim expor e discutir questões gerais da pedagogia e, de modo especial, os
problemas da vida educacional brasileira. Para isso aspira congregar os estu-
diosos dos fatos educacionais do país, e refletir o pensamento de seu magis-
tério. Publica artigos de colaboração, sempre solicitada; registra resultados de
trabalhos realizados pelos diferentes órgãos do Ministério e pelas Secretarias
Estaduais de Educação. Tanto quanto possa, deseja contribuir pará a reno-
vação científica do trabalho educativo e para a formação de uma esclarecida
mentalidade pública em matéria de educação.

A Revista não endossa os conceitos emitidos em artigos assinados e


matéria transcrita.
REVISTA BRASILEIRA

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

M I N I S T É R I O DA E D U C A Ç Ã O E C U L T U R A
INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
ATOS OFICIAIS: Dec. n." 53.464, de 21/1/64 — Regulamenta a Lei n." 4.119, de
27/8/62, que dispõe sôbre a profissão de psicólogo (266); Dec. n.° 53.531,
de 5/2/64 — Dispõe sôbre a execução e fiscalização áos convênios
referentes ao Plano Trienal de Educação e sôbre norma para elaboração
dos planos de aplicação dos recursos respectivos (269): Dec. 53.932.
de 26/5/64 — Altera dispositivos dos Dec. n.°s 29.741, de 11/7/51, 50.737,
de 7/6/61, 51.146, de 5/8/61, 49.355, de 28/11/60, 51.405, de 6/2/62,
52.456, de 16/9/63 e 53.325, de 18/12/63, reunindo num só órgão a
CAPES, COSUPI e PROTEC (269); Port. n.° 7, de 23/1/64 — Institui
a Comissão de Assessoramento, Documentação e Informação das Fa-
culdades de Filosofia (271); P o r t . n.° 46, de 31/1/64 — Especifica
os objetivos do Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-obra
Industrial (272); P o r t . n.° 49, de 31/1/64 — Aprova normas gerais
elaboradas pelo CFE que regulamentam o exame de suficiência ....................... 274
Editorial

DA EDUCAÇÃO D E P E N D E O RESGATE
DE CONDIÇÕES SOCIAIS INJUSTAS

"Ao receber das mãos de V. EXª, Senhor Professor Anísio Teixeira, o


cargo de Diretor do INEP, para cujo exercício fui convocado pela honrosa
confiança do Govêrno da República, tenho bem nítida a consciência das
responsabilidades que assumo perante a educação nacional, e não subestimo
as dificuldades com que irei defrontar-me.
Núcleo de uma rede de órgãos de estudo e pesquisas, de documentação
e informação, de criação e aperfeiçoamento de técnicas de ensino, tem o INEP
também funções de singular relevo na fixação da política e dos planos de
educação e essas funções crescem de importância na fase em que se implanta,
e consolida a reforma educacional mais extensa, mais profunda e mais séria
que já se tentou no pais.
A maior conquista da hei de Diretrizes e Bases não está em haverem
os Estados alcançado, finalmente, a autonomia em todos os domínios da edu-
cação. A independência reciproca entre os órgãos centrais e os órgãos locais
de governo, pelos quais se distribui o poder público, já é da essência do próprio
regime federativo, e a Federação sempre foi, entre nós, uma grande aspiração
política e uma grande necessidade nacional.
O significado principal da Lei de Diretrizes e Bases é constituído pelo
fato de que, ligada ao princípio de autonomia, a norma da flexibilidade que
se lhe associou procura assegurar não apenas a libertação dos Estados em
relação à União, mas, também, tanto quanto possível, a emancipação dos
sistemas escolares, em relação ao poder político e, dentro de cada sistema, a
alforria de todas as instituições de ensino.
Subordinadas apenas aos mínimos, reputados essenciais e suficientes para
garantir a unidade nacional, oferecem-se-nos agora as condições de autodeter-
minação e de liberdade de movimentos para promover a organização de siste-
mas de ensino, que ensejem formas de educação acessíveis a todos os indi-
víduos, ajustáveis às condições de cada um e adequadas às peculiaridades das
diferentes áreas geoeconômicas.
Se lançarmos nos campos que se oferecem à educação um olhar de
humanismo cristão, os horizontes se iluminam e mais nítida se descortina a
transcendência de sua finalidade. Ela não interfere apenas nas coisas do

Discurso do Prof. Carlos Pasquale no ato de transmissão do cargo de Diretor


do INEP, realizado a 28 de abril último, no Palácio da Cultura, com a presença
de educadores, congressistas, administradores e funcionários da casa.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

homem, nos bens de que o homem se utiliza, mas atinge o próprio homem,
abrindo-lhe, ou não, em tôda a plenitude, os caminhos naturais de sua
realização integral e do seu aperfeiçoamento individual.
Do êxito que a obra da educação alcançar, através da espontânea diver-
sidade de formas e variedade de processos, dependerá a consecução dos mais
altos objetivos que se impõem à Democracia: a segurança da liberdade, o bom
desempenho de todo cidadão na comunidade a que pertence, a garantia das
ftanquias individuais, e o resgate das condições sociais injustas.
Em face da organização descentralizada e diversificada dos serviços do
ensino, o INEP constituirá o instrumento de coordenação nacional que, reco-
lhendo, analisando e difundindo os resultados das experiências, que se ensaiam
nas várias Unidades da Federação, promoverá, pela troca de informações, o
intercâmbio das idéias que há de contribuir para tornar mais fecunda a obra
de renovação educativa do país.
Não poderá ser ignorada, nesse trabalho, a contribuição prestada pelo
ensino de livre iniciativa, não apenas porque, em muitos casos, chega a ser
numericamente superior ao mantido pelos Poderes Públicos, como também,
porque, na autorizada observação do eminente Professor Almeida Júnior, "as
instituições educativas particulares, mais livres do formalismo burocrático, mais
propensas a inovar, mais plásticas, desempenham, em tôda parte, o papel de
vanguardeiras da experimentação, quebrando, com isso, a monotonia da escola
padronizada e abrindo caminhos inétidos à evolução pedagógica".
Aliás, para o educador isento, o ensino é um só: não se define pela
natureza, oficial ou privada, da escola que o ministra, mas se distingue, apenas,
pela qualidade, boa ou má, dos resultados que oferece.
à luz da documentação pedagógica coligida, dos estudos e das pesquisas
feitas, a ação do INEP há de desdobrar-se em valiosas contribuições para a
definição da política educacional, a elaboração de planos de educação e de
programas de trabalho, procurando proporcionar, a uns e outros, base cien-
tífica e unidade de pensamento e de ação,
Como salientou o Ministro Flávio Suplicy de Lacerda, a situação educa-
cional do pais ê das mais graves e a solução dêste problema fundamental,
prometida ao povo desde a implantação da República, não pode ser procras-
tinada ainda uma vez mais, e está a exigir de todos os brasileiros ação ampla,
pronta e vigorosa.
A ninguém — e menos ainda aos que têm qualquer parcela de atribuição
nas searas do ensino —• ê licito omitir-se ou negligenciar. Onde e quando
quer que se lhe oferecer oportunidade ou forma de agir, deverá concorrer
com seu esforço individual para que não se percam, diluída no limbo do
analfabetismo e da ignorância, consideráveis parcelas das novas gerações de
brasileiros, os bens mais preciosos com que a Nação pode contar para o seu
desenvolvimento econômico e social.
Por outro lado, diante da flagrante desproporção que existe entre a gran-
deza do empreendimento, que nao conhece limites, e a escassez dos meios
materiais e humanos de que dispomos para realizá-lo, torna-se imperioso que
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 133

a aplicação dos recursos destinados à educação se faça com segurança e auste-


ridade, equacionada, sempre, em têrmos de poupança e eficácia.
Impõe-se, assim, uma política construtiva de patrióticos intuitos e inteli-
gente colaboração, a que, por certo, ninguém negará apoio e que, valendo-se
de todas as boas contribuições existentes, permita entrosá-las e completá-las
no decidido propósito de se obter o maior e melhor rendimento para o esforço
comum, na firme deliberação de eliminar desperdícios, inclusive os que resul-
tam da superfluidade das iniciativas, da redundância das providências e da
dispersão de energias.
Ao suceder ao eminente Prof. Anísio Teixeira, que aqui continuou a obra
iniciada pelo ilustre Prof. Lourenço Filho e prosseguida pelo saudoso Murilo
Braga, educadores que deixaram, nesta Casa, o acervo de realizações em que
se encontram impressos os traços indeléveis de suas marcantes personalidades
e dos seus próprios métodos de trabalho, as naturais dificuldades de direção
do INEP apresentam-se, pará mim, bastante agravadas, de modo especial nesta
fase em que a sua estrutura e os seus trabalhos devem ajustar-se às condições
de desecntralização e de flexibilidade impostas pela Lei de Diretrizes e Bases.
De minha parte, para o exercício do cargo, pouco trago, e êste
pouco eslá no desejo de ser útil, na disposição ao trabalho, na consciência
das responsabilidades, na autenticidade dos princípios, na fidelidade às tra-
dições cristãs e aos ideais democráticos que inspiraram a formação da nossa
Pátria, perenes valores éticos que hão de conduzi-la a seus radiosos destinos.
As esperanças de bem servir eu as deposito na orientação esclarecida que
receberei do Sr. Ministro da Educação, na co-participação dedicada dos servi-
dores do INEP e dos Centros Regionais, que lhe são subordinados e, também,
na colaboração desinteressada de todos quantos, educadores ou não, contribuem
para a obra da educação nacional, muitos dos quais me honram e me esti-
mulam com a sua presença a êste ato."
Estudos e debates

METODOLOGIA DAS PESQUISAS EDUCACIONAIS


OCTAVIO MARTINS
DO C.B.P.E.

INTRODUÇÃO

Ao ser convidado pelo Prof. Luís Alves da Guarda para realizar


a 9.a palestra do curso sôbre atualidades pedagógicas, sugeri que,
muito mais útil que uma palestra, seria a realização de uma sessão de
debates sôbre texto distribuído com antecedência aos participantes.
É êste o motivo da apresentação das presentes notas, originalmente
elaboradas em 1956 para uma das cadeiras do Curso de Técnica de
Ensino, da Diretoria Geral do Ensino do Exército, adaptadas em 1958
e traduzidas para o espanhol como base de um curso para alunos pós-
graduados na Faculdad de Filosofia da Universidad Nacional de Assun-
ción, e agora aqui reproduzidas com algumas modificações. Sua prévia
distribuição aos participantes do curso torna dispensável e apresentação
verba], sob forma de palestra, de um resumo dos temas nela contidos.
Realmente, seria, a meu ver, uma inutilidade repetir verbalmente, de
modo forçosamente menos metódico e evidentemente muito incom-
pleto, aquilo que o leitor poderá estudar, muito mais cômoda e eficien-
temente, com a leitura das notas.
Por outro lado, o debate oral de temas propostos pelos assistentes
pode ser de grande utilidade sob vários aspectos: pode esclarecer
pontos obscuramente expostos (ao autor, parece sempre claro aquilo
que escreve, o que nem sempre ocorre com o leitor) ; pode fornecer
informações complementares sôbre tópicos apenas esboçados no texto,
ou nele não incluídos; sobretudo, pode mostrar como os princípios
gerais do método se aplicam a casos concretos, e isto será especial-
mente proveitoso se esse caso concreto fôr uma pesquisa em fase de
planejamento ou execução por algum dos estudantes ou professôres
inscritos no curso.
Portanto, é aqui feito um veemente apelo aos participantes para
que tragam a debate suas dúvidas, as observações colhidas ou as falhas
verificadas em seus próprios trabalhos (on nos trabalhos que tiverem
ocasião de acompanhar ou estudar), a maneira pela qual tentaram

Palestra realizada em curso extraordinário de extensão universitária, promovido


pela Universidade Rural — Km 47, nos meses de outubro e novembro de 1963.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

ou conseguiram c o n t o r n a r as dificuldades e n c o n t r a d a s ; tudo isto será


elemento de grande u t i l i d a d e p a r a o proveito real que se possa t i r a r
da r e u n i ã o , à q u a l p o d e m ser trazidos problemas referentes t a m b é m
a pesquisas de n a t u r e z a não educacional, pois os aspectos gerais do
m é t o d o i n d e p e n d e m da natureza do m a t e r i a l em estudo, que influi
u n i c a m e n t e sôbre as técnicas especializadas de t r a b a l h o . Basta l e m b r a r
neste sentido que a análise da variância, m é t o d o estatístico de largo
emprego nas pesquisas educacionais, foi devolvida p o r Sir Ronald
Fisher em suas experimentações agronômicas em R o t h a m s t e d .
P a r a incentivar esse tipo de debate r e a l m e n t e útil, terei ocasião
de sugerir, q u a n d o a o p o r t u n i d a d e se apresentar, alguns temas para
discussão, q u e poderão dar lugar a meditações, consultas à bibliografia
a d e q u a d a , discussão prévia com colegas e finalmente a formulação de
um p r o b l e m a específico a ser apresentado a d e b a t e .
E, p a r a começar, sugiro a q u i o seguinte t e m a : P o r que estudar
metodologia das pesquisas educacionais n u m a universidade rural? Não
seria mais útil estudar a metodologia das pesquisas agronômicas e,
q u a n t o às pesquisas educacionais, limitar-se a aplicar os resultados
obtidos pelos especialistas em pedagogia?

CIÊNCIA E PESQUISA CIENTÍFICA

Em sentido amplo, a palavra ciência eqüivale a q u a l q u e r tipo de


c o n h e c i m e n t o . É o sentido que tem, p o r exemplo, na frase: " Ê l e não
teve ciência do q u e se havia passado na véspera." E n t r e t a n t o , a pala-
vra é hoje m u i t o mais freqüentemente e m p r e g a d a no sentido que se
dava, antes do século 19, à locução filosofia natural, usada p o r exemplo
p o r Newton no título de sua o b r a fundamental (Philosophiae Natu-
ralis Principia Mathematica) : o do conhecimento sistemático das leis
que regem os fenômenos n a t u r a i s .
Neste sentido p a r t i c u l a r i z a d o da palavra, n ã o constitui ciência o
conhecimento dos nomes e datas de nascimento de todos os reis de
F r a n ç a , ou dos nomes e pesos atômicos de todos os elementos químicos,
embora neste último caso se trate de informação indispensável à solu-
ção de muitos p r o b l e m a s científicos: a ciência t r a t a do geral e não
do particular, ou de casos isolados. Note-se p o r é m que o sábio nisso
Mendelcyev, e s t u d a n d o as relações e n t r e os pesos atômicos dos ele-
mentos e suas p r o p r i e d a d e s químicas, formulou u m a série de leis que,
posteriormente elaboradas e relacionadas a descobertas em setores
paralelos, veio a constituir u m a das teorias d o m i n a n t e s da ciência
q u í m i c a . O conhecimento dos pesos atômicos n ã o constituiu, no caso,
ciência, mas apenas m a t e r i a l p a r a estudo científico.
U m a das características da ciência é seu caráter c u m u l a t i v o : hoje,
um cientista, ou até mesmo um estudante, p o d e m u i t a s vezes resolver
com facilidade certos p r o b l e m a s que n ã o p o d e r i a m ter sido sequer
abordados p o r A r q u i m e d e s , Galileu o u Newton, e n q u a n t o u m
escultor de nossos dias não é capaz de p r o d u z i r obras mais belas que
136 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

as de Praxíteles ou de Miclielangelo. Mas, para que cada acréscimo


ao conhecimento científico da humanidade possa ser feito de modo a
contribuir como elemento de uma estrutura coerente e harmoniosa, é
necessário que esse acréscimo seja sòlidamente apoiado em conheci-
mentos anteriores, e que tenha, por sua vez, solidez suficiente para
que nele se possam apoiar novos conhecimentos.
Tal é o papel da pesquisa científica. Ela é a ponta de lança da
ciência, empenhada na conquista de novos territórios a integrar o
domínio do conhecimento humano e constitui, sem dúvida, o interesse
primordial de todo verdadeiro cientista. É atividade que requer dotes
especiais da parte do pesquisador — o interesse pelos novos conheci-
mentos, o respeito escrupuloso pela verdade, a capacidade criadora
aliada ao controle da imaginação — e exige também a paciente obser-
vância dos métodos de trabalho que se têm mostrado frutíferos nas
mãos daqueles que têm feito progredir a ciência.
Ao encarar-se a ciência como atividade, deve-se estabelecer certa
distinção, de um lado, entre os representantes do renascimento cien-
tífico e os que sistematizaram as linhas mestras da ciência clássica, e,
de outro lado, os cientistas do século 19 e especialmente os do atual.
No primeiro caso, a ciência era sobretudo a ocupação de gênios, de
pessoas que sentiam imperiosa atração pela ciência, ou de espíritos
cultos que dedicavam seu ócio a esse campo de singular interesse.
Atualmente, se há exemplo de todas essas tendências, a ciência está
se tornando cada vez mais uma profissão, e o trabalho individual, que
a princípio dominava quase exclusivamente, está sendo substituído, na
maioria dos campos, pelo trabalho regular realizado em equipe. Por
isso se torna cada vez mais necessária a sistematização dos trabalhos
de investigação científica, isto é, o estabelecimento de normas de
trabalho que constituem a metodologia das pesquisas científicas. Note-
se todavia que, embora necessária nas atuais condições, essa codifi-
cação das regras de trabalho foi desde cedo uma preocupação de cien-
tistas e filósofos: a publicação do Novum organum, de Bacon, precedeu
de mais de uma década a do Diálogo sôbre os dois sistemas do mundo,
de Galileu.
De modo geral, todo trabalho de investigação científica com-
preende sempre as seguintes fases: a identificação de um problema
ou de uma questão a resolver ou explicar; a formulação de uma
hipótese tendente a resolver o problema ou dar explicação à questão
formulada; a verificação da validade dessa hipótese ou da realidade
das conseqüências que dela se podem deduzir.
O papel da hipótese é essencial na ciência. Sua aceitação nunca
é, contudo definitiva. Sujeita a sucessivas verificações, vai se consoli-
dando pouco a pouco e, aliada em geral a outras no mesmo terreno,
passa a formar uma teoria de maior ou menor generalidade. Nunca,
porém, está isenta de sofrer revisão ou alteração em face de novos
fatos que com ela possam entrar em contradição. O melhor exemplo
dessa evolução é o corpo de princípios que formam os fundamentos
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

da mecânica clássica; as confirmações repetidas de sua validade nos


mais variados terrenos de aplicação pareciam cada vez mais torná-la
isenta de q u a l q u e r dúvida, q u a n d o certos fenômenos observados em
fins do século passado e princípios do atual v i e r a m alterá-la, no sentido
de q u e passou a ser considerada, não uma d o u t r i n a de validade uni-
versal, mas caso p a r t i c u l a r de um sistema mais a m p l o constituído pela
teoria da r e l a t i v i d a d e .
* * *
Até a q u i , falamos em pesquisa científica de m o d o g e r a l . A pes-
quisa educacional não deve ser e n t e n d i d a senão como a pesquisa
científica no c a m p o dos fenômenos de natureza educacional. Cabe,
e n t r e t a n t o , advertir que, na literatura educacional americana (indubi-
tavelmente a mais rica neste s e t o r ) , a expressão educational research
é c o m u m e n t e e m p r e g a d a p a r a designar, não só a pesquisa científica
p r o p r i a m e n t e dita, como t a m b é m estudos de natureza histórica e
surveys, isto é, levantamentos de situações ou de aspectos educacionais
de m a i o r ou m e n o r generalidade. Não se p o d e desconhecer o valor q u e
tais estudos p o d e m apresentar para solução de determinados problemas
de educação, mas é opinião do autor das presentes notas que não lhes
cabe legitimamente a designação de pesquisa e que essa generalização
do conceito deve ser evitada pelas confusões a que p o d e d a r l u g a r .
Não q u e r isto dizer que estudos históricos ou levantamentos de
d e t e r m i n a d a s situações não possam constituir pesquisas educacionais
ou partes integrantes de u m a pesquisa educacional.
Mas isto, q u a n d o seu propósito, t r a n s c e n d e n d o o estudo de casos
particulares, fôr o do estabelecimento de relações gerais e n t r e fenô-
menos educacionais, com caráter de leis, ou pelo menos de sistemati-
zações que possam ser tidas como esboços de l e i s .

Leituras Sugeridas
Dentre as referências abaixo, as precedidas de um asterisco são
leituras preferenciais.
K a r l P e a r s o n . The, Grammar of Science, 1900.
H e n r i P o i n c a r é . La Science ar l´Hypothèse, 1906.
* H e n r i P o i n c a r é . La Valeur de la Science, 1912.
W. Ostwald. Esquisse d´une Philosophie des Sciences, 1912.
P. F. T h o m a s e o u t r o s . De Ia Méthode dans les Sciences ( l , a e
2. a s é r i e ) , 1909-1911.
* Stanley Jevens. The Principies of Science, 1924.
K e l l e y . Scientific Method: Its Function in Research and Edu-
cation, 1932.
* Bernal. The Social Functions of Science, 1937.
* C o n a n t . On Understanding Science, 1947.
C h u r c h m a n . The Theory of Experimental Inference, 1948.
*
F r e e d m a n . The Principies of Scientific Research, 1950.
B e r n a r d B a r b e r . Science and the Social Order, 1953.
138 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PASSOS ESSENCIAIS NO DESENVOLVIMENTO


DE UMA PESQUISA EDUCACIONAL
As regras que se seguem não são resultado de teorias ou de medi-
tações a priori sôbre a m a n e i r a de conduzir as pesquisas. Representam
apenas a sistematização do q u e em essência vem sendo praticado pelos
pesquisadores competentes, e f o r a m organizadas com base no estudo
crítico de suas publicações. Essas regras não devem ser tomadas como
n o r m a s absolutas, e outros autores t ê m apresentado a matéria sob
forma diferente. Sua finalidade é sobretudo a de servir de base à
análise crítica dos trabalhos publicados, b e m como a de orientar a
realização de t r a b a l h o s futuros.
Com estas reservas, os passos essenciais no desenvolvimento de uma
pesquisa educacional p o d e m ser relacionados do seguinte m o d o :
1. Escolha e definição do p r o b l e m a .
2. Análise dos estudos anteriores sôbre o assunto.
3. F o r m u l a ç ã o dos objetivos principais c secundários da pesquisa.
4. P l a n e j a m e n t o do t r a b a l h o a executar para atingir os objetivos
visados.
5. Execução do plano de t r a b a l h o .
6. Análise dos r e s u l t a d o s .
7. F o r m u l a ç ã o das conclusões.
8. Redação do relatório da pesquisa.

E m b o r a de m o d o sumário, cada um dos itens acima será analisado


nas seções seguintes do presente t r a b a l h o . Essa análise será acompa-
n h a d a de referências bibliográficas que p e r m i t i r ã o estudo mais apro-
fundado dos vários assuntos pelos que p r e t e n d e m dedicar-se a traba-
lhos de pesquisa.
Antes de e n c e r r a r a seção, cabe explicar um ponto que não deve
ter passado despercebido n u m a leitura a t e n t a .
C o m p a r a n d o o esquema a q u i apresentado com o que foi dito na
seção anterior sôbre o t r a b a l h o de investigação científica, o leitor
p o d e r á legitimamente p e r g u n t a r o n d e se encontra, d e n t r e os passos
citados, a formulação de hipóteses, aspecto a p o n t a d o como essencial.
A resposta é q u e esse aspecto está i m p l i c i t a m e n t e contido nos itens 2
e 3, ou às vezes já no item 1. R e a l m e n t e , a finalidade essencial da
análise dos estudos anteriores é a de verificar se já foi encontrada solu-
ção p a r a o p r o b l e m a (caso em q u e n ã o teria sentido o prosseguimento
da pesquisa, salvo a título de verificação ou confirmação) ou, em caso
contrário, a de buscar sugestões p a r a a formulação de hipóteses ten-
dentes a explicar as dúvidas ou a p o n t a r soluções p a r a o p r o b l e m a
inicial. A formulação dos objetivos da pesquisa tem j u s t a m e n t e em
vista encontrar os meios de p ô r à prova essas hipóteses. Às vezes,
p o r é m , o p r o b l e m a a resolver é constituído pela verificação de u m a
hipótese que se apresenta ao espírito do investigador como explicação
de fatos observados no desenrolar de trabalhos de rotina, no manuseio
de dados relativos à educação, ou surgida por algum o u t r o m o t i v o .
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

1. ESCOLHA E DEFINIÇÃO DO PROBLEMA

Quem m i l h a no c a m p o da educação está a cada passo e n c o n t r a n d o


problemas que r e q u e r e m solução. Não é, p o r é m , q u a l q u e r p r o b l e m a
encontrado que justifica a realização de u m a pesquisa p a r a resolvê-lo.
Muitos p o d e m ser pueris ou d e m a n d a r apenas um pouco de reflexão
p a r a que se encontre solução razoavelmente a d e q u a d a , c uma pesquisa,
por menor que seja, r e q u e r t e m p o e dedicação por p a r t e do pesquisador
que muitas vezes é pessoa a l t a m e n t e qualificada, cuja capacidade não
deve ser desperdiçada com questões sem i m p o r t â n c i a . Certas pesquisas
r e q u e r e m considerável dispêndio de t e m p o , t r a b a l h o e d i n h e i r o , que
não devem ser gastos levianamente, no p r ó p r i o interesse da ciência.
pois e n q u a n t o esses recursos são empregados em questões de impor-
tância não essencial, outras de maior relevância ficam à espera de
solução.
A p r i m e i r a coisa a fazer q u a n d o se pretende iniciar uma pesquisa
é, pois, verificar-se a i m p o r t â n c i a teórica ou prática do assunto, se jus-
tifica ou não o t r a b a l h o : não se deve gastar cera com maus refuntos.
A escolha do assunto de u m a pesquisa é questão de natureza filo-
sófica e não científica, que só o bom senso e a experiência podem con-
venientemente orientar. E um ponto em que o pesquisador iniciante,
m u i t a s vezes em dificuldade p a r a formar juízo a d e q u a d o , tem m u i t o
a lucrar buscando o parecer de pessoas de maior experiência em cuja
opinião possa confiar.
Uma vez que se t e n h a chegado à conclusão de que o p r o b l e m a
é realmente digno de estudo, está-se apenas no limiar da tarefa. P a r a
que se possa pensar em começar a pesquisa, é necessário que o pro-
blema seja claramente d e f i n i d o : em outras palavras, é necessário pôr
o p r o b l e m a em equação, o que constitui u m a fase m u i t o i m p o r t a n t e
do t r a b a l h o : na Evolução da Física, Einstein, r e p e t i n d o , aliás, o que
muitos já t i n h a m observado, afirmou q u e "a formulação de um pro-
blema é muitas vezes mais essencial que sua solução".

Referências para leitura e estudo

Os três últimos livros abaixo indicados são tratados da mais alta


importância p a r a todos os que se quiserem dedicar às pesquisas educa-
cionais. O livro de W h i t n e y tem t r a d u ç ã o espanhola de José Savé,
editada em Barcelona sob o título Elementos de investigación. As refe-
rências às páginas dessa obra são relativas à edição americana, seguidas
entre parêntesis das páginas correspondentes da edição e s p a n h o l a .

F r e e d m a n . Principies of Scientific Research, p. 89-93.


B a r r . Educational Research and Appraisal, cap. ii, p. 16-50.
* W h i t n e y . Elements of Research, cap. iii. p. 82-161 ( p . 63-86) .
* G o o d . Methodology of Educational Research, cap. ii, p. 31-103.
140 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Temas para debates

Considere os problemas abaixo e outros que lhe possam o c o r r e r .


A q u a l deles deveria ser d a d a preferência p a r a ralização de u m a pes-
quisa pelo D e p a r t a m e n t o de Ciências Pedagógicas da Universidade
R u r a l do Brasil?
1. Qual a eficiência relativa dos diversos métodos de ensino da
leitura ?
2. Quais os melhores métodos p a r a formação de professôres do
ensino agrícola?
3. Quais os inelhores métodos de seleção p a r a ingresso de alunos
nas universidades?
4. Como utilizar os métodos audiovisuais n u m a universidade
rural?

2. ANÁLISE DOS ESTUDOS ANTERIORES

U m a vez identificado e definido um p r o b l e m a q u e r e a l m e n t e


mereça ser estudado, o segundo passo a d a r é verificar o q u e já se sabe
sôbre o assunto. Do contrário, correr-se-ia o risco evidente de empreen-
der grandes esforços p a r a verificar no final ter-se descoberto a pólvora,
isto é, que o p r o b l e m a já havia sido resolvido a n t e r i o r m e n t e de m o d o
satisfatório.
Os meios adequados p a r a identificar as fontes bibliográficas e os
melhores meios de utilizá-las constituem um conjunto de técnicas da
m a i o r importância para o pesquisador e p a r a a estudante com g r a n d e
prejuízo p a r a a eficiência do estudo. Considerado o assunto do ponto-
de-vista do pesquisador no c a m p o da educação, talvez a m e l h o r obra
de referência e orientação sôbre o p r o b l e m a seja a de C a r t e r Alexander,
e m b o r a d e leitura pouco a t r a e n t e . Não conheço e m p o r t u g u ê s n e n h u m
t r a b a l h o análogo que possa r e c o m e n d a r .
Até época relativamente recente, estávamos no Brasil quase com-
p l e t a m e n t e desprovidos de bibliotecas e recursos bibliográficos p a r a
q u a l q u e r t r a b a l h o sério sôbre educação, a ponto de ser m u i t o mais
fácil p a r a um brasileiro conhecer os trabalhos estrangeiros sôbre deter-
m i n a d o assunto que os trabalhos brasileiros, realizados às vezes na
p r ó p r i a instituição de que o pesquisador fazia p a r t e . De u n s vinte anos
p a r a cá, tivemos melhorias acentuadas neste setor, convindo assinalar
a criação do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação (do
Conselho Nacional de Pesquisas) e a publicação pelo I N E P , a p a r t i r
de 1954, da Bibliografia Brasileira de Educação. Esta, e m b o r a defi-
ciente sob alguns aspectos de sua orientação e execução, p o d e p r e s t a r
relevantes serviços ao p e s q u i s a d o r .
Como publicações estrangeiras, p o d e m ser citados o excelente Edu-
cation Index (publicação mensal que registra a literatura corrente,
classificada por títulos, assuntos e autores, além de cumulações trimes-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
trais, anuais e trienais), o Psychological Abstracts, que contém sumá-
rios do que é publicado sôbre êste importante campo da educação, e
a bibliografia crítica de L´Année Psychologique, que aparece atual-
mente em dois volumes semestrais, cobrindo a literatura internacional
(livros e artigos importantes de revistas) .
Como foi dito acima, por meio da análise dos estudos anteriores
sôbre o problema que se quer investigar, pode-se verificar por vezes
que sua solução já foi total ou parcialmente obtida, o que elimina ou
restringe a necessidade de novo trabalbo sôbre o assunto.
De qualquer modo, mesmo que o problema a estudar seja real-
mente novo (o que muito raramente acontece), o estudo de trabalhos
anteriores sôbre a questão e outras correlatas é sempre de utilidade
para a formulação precisa dos objetivos a alcançar, bem como para
obtenção de idéias e sugestões sôbre a maneira de tratar o problema
ou de evitar erros ou deficiências em que tenbam porventura incidido
outros investigadores.
É durante esta fase do trabalho — cuja importância nunca será
demais salientar — que o pesquisador tem as melhores oportunidades
de formular as hipóteses explicativas da questão em estudo, ou de
alterar ou retificar hipóteses anteriormente formuladas.
Seja dito de passagem que esta capacidade de modificar pontos-de-
vista anteriores, por mais sedutores que se apresentem inicialmente,
é um dos reqviisitos essenciais de todo aquêle que se pretende dedicar
a trabalhos de pesquisa. Sua ausência pode prejudicar irremediavel-
mente as possibilidades de sucesso de muitas pessoas por outros aspectos
excepcionalmente dotadas para a ciência.

Referências

* Carter Alexander. How to Locate Educational Information and


Data.
Good. Methodology of Educational Research, cap. iii, p. 104-184.
Whitney. Elements of Research, cap. iv, p. 162-193 (p. 87-97) .

O estudante deve ainda se familiarizar com a maneira de consultar


obras como o Education Index, Psychological Abstracts, Bibliografia
Brasileira de Educação e a seção bibliográfica de UAnnée Psycholo-
gique e de outras revistas e anuários que publiquem bibliografias de
educação.

Tema para debates

Quais seriam as modificações a aconselhar na organização da


Bibliografia Brasileira de Educação para que se tornasse um instru-
mento de maior utilidade nos trabalhos de pesquisa educacional?
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

3. FORMULAÇÃO DOS OBJETIVOS DA P'ESQUISA

Uma vez analisados os antecedentes do p r o b l e m a e estudados os


pontos em que os trabalhos anteriores p o d e m contribuir p a r a esclarecer
a questão em estudo, está o investigador cm condições de f o r m u l a r os
objetivos da pesquisa, ou, em outros têrmos, de definir quais os latos
que deverá observar ou quais as experiências que deverá realizar a fim
de p ô r à prova a validade das hipóteses formuladas como explicação
do p r o b l e m a considerado.
A escolha e definição inicial do problema são feitas em têrmos
gerais; constituem apenas a delimitação do campo de e s t u d o . Os obje-
tivos da pesquisa, pelo contrário, devem ser formulados com tôda a
nitidez e precisão, sendo conveniente apresentá-los sob forma de itens
ou perguntas em têrmos claros e b e m delimitados. Em essência cons-
tituem u m a reformulação dos vários aspectos i m p l i c i t a m e n t e contidos
no p r o b l e m a original, mas já modificados em face do exame dos estados
anteriores sôbre o assunto.
Esses objetivos p o d e m ser definitivos ou provisórios, pois d u r a n t e a
fase de p l a n e j a m e n t o do t r a b a l h o p o d e ficar evidenciada a impossibi-
lidade de se obter, com os meios disponíveis, respostas a d e q u a d a s a
algumas das questões que se desejaria e x a m i n a r . Mesmo q u a n d o não
se t r a t e de impossibilidade por falta de meios, alguns dos aspectos não
essenciais do p r o b l e m a p o d e m ser postos de lado em favor da brevi-
dade do t r a b a l h o ou da economia nas despesas. P o d e t a m b é m ocorrer
situação inversa: o p l a n e j a m e n t o do t r a b a l h o pode indicar que, com
u m a p e q u e n a variação do plano original ou modificação na amostra
com q u e se pretendia t r a b a l h a r , certas questões não originalmente
consideradas p o d e r i a m ser resolvidas sem a u m e n t o de t e m p o ou tra-
b a l h o , isto é, de graça. É evidente que em tal situação os objetivos da
pesquisa devem ser ampliados, matando-se assim mais de um coelho
com a mesma c a j a d a d a .

Leitura recomendada
B a r r . Methodology, cap. iv, p. 185-201.

4. PLANEJAMENTO DO TRABALHO
Não seria possível, n u m a apresentação resumida como a presente,
dar indicações d e t a l h a d a s sôbre a maneira de p l a n e j a r u m a pesquisa
educacional. Isto é assunto que só a experiência p r ó p r i a pode ensinar,
o que n ã o i m p e d e que muitas sugestões e ensinamentos possam ser
colhidos pelo estudo e análise da experiência alheia, donde a impor-
tância fundamental, para a formação do pesquisador, da leitura de
t r a b a l h o s realizados por investigadores e x p e r i m e n t a d o s .
Na presente exposição, não se poderá fazer mais que indicar algu-
mas das condições gerais que o pesquisador deverá ter em vista. Antes
de mais nada, o pesquisador deve conhecer os métodos gerais de tra-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

balho no terreno a que se dedica. Quando a pesquisa é de natureza


histórica, deve saber como encontrar e utilizar os documentos que
podem esclarecer o assunto em pauta; quando é de natureza experi-
mental, ou quando inclui o levantamento de uma situação existente,
deve saber como encontrar ou construir e utilizar os instrumentos de
trabalho, sejam questionários, entrevistas, testes, aparelhos de medida
ou observação, etc. Se os elementos com que tem de jogar são de natu-
reza numérica, deve conhecer suficientemente estatística para poder
condensar os dados, interpretá-los e deles tirar inferências válidas.
Nunca é demais insistir sôbre a necessidade de conhecimentos de infe-
rência estatística, sem os quais, mesmo uma pessoa naturalmente incli-
nada a ordenar logicamente o pensamento, se arrisca a cair num dêsses
dois erros: ou apresentar como válidas conclusões que os dados não
justificam plenamente ou (o que às vezes é mais nocivo) deixar de
extrair dos dados todas as conclusões que eles estão em condições de
fornecer. O conhecimento da teoria da inferência estatística e das téc-
nicas de planejamento das experiências (design of experiments) é
sempre útil e por vezes de surpreendente vantagem para economia e
simplicidade do trabalho experimental.
Não bastam, porém, ao pesquisador essas qualidades lógicas e esses
conhecimentos de natureza científica. Qualidades de natureza admi-
nistrativa são também muitas vezes indispensáveis, pois, por maiores
que sejam os recursos disponíveis de pessoal, material, tempo e di-
nheiro, esses têm limites e o pesquisador deve poder enquadrar seu
trabalho no âmbito das possibilidades a seu dispor. Independente-
mente da largueza dos recursos disponíveis (e, quase sempre, esses
recursos ficam aquém do desejável), eles não devem ser malbaratados,
no próprio benefício da investigação científica e independentemente
de outras condições de natureza social.
O planejamento deve portanto incluir, não só o desenvolvimento
teórico-científico do trabalho a realizar, como a previsão do tempo em
que poderá ser realizado, do pessoal a ser empregado (que em certos
casos deve ser especialmente treinado para o tipo de trabalho a exe-
cutar), do material e instrumentos necessários, dos questionários, testes
ou outros elementos a elaborar, bem como uma série de providências
outras que às vezes podem assumir grande complexidade. Evidente-
mente, o plano deve conter um orçamento das despesas, com previsão
de eventuais, assuntos bem difíceis de predizer numa fase de rápida
inflação, como a que atravessamos no momento.
O plano de trabalho deve ser tão exato e detalhado quanto pos-
sível, e o pesquisador deve procurar obedecê-lo conscienciosamente. Isto
não quer dizer que, uma vez fixado, deve ser considerado como uma
camisa-de-fôrça a prejudicar a própria realização da pesquisa em face
de uma situação inesperada. Entretanto, qualquer modificação do plano
original deve ser feita com plena consciência de suas conseqüências e,
evidentemente, sem prejuízo dos objetivos essenciais do trabalho.

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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

pará verificar se de fato representam as informações desejadas. Q u a n d o


isto não se dá, cabe estudar até que p o n t o eles p o d e m merecer con-
fiança e que limitações devem ser consideradas na sua utilização e
i n t e r p r e t a ç ã o . É r e a l m e n t e m u i t o r a r o , salvo nas pesquisas educacionais
de â m b i t o reduzido, que todo o t r a b a l h o se tenha desenvolvido rigoro-
samente segundo o plano t r a ç a d o .
Q u a n d o , p o r q u a l q u e r circunstância, alguns resultados ficarem
total ou parcialmente prejudicados, dever-se-á ter a coragem de a d m i t i r
o fato e, se necessário, rejeitar esses resultados e recomeçar o t r a b a l h o .
T a l procedimento é, e n t r e t a n t o , r a r a m e n t e necessário q u a n d o o t r a b a l h o
foi sòlidamente planejado e conscientemente e x e c u t a d o ; em muitos
casos, o prejuízo será apenas parcial e o t r a b a l h o p o d e r á ser aprovei-
t a d o com determinadas reservas ou limitações que devem ser claramente
i n d i c a d a s . Em n e n h u m caso, p o r é m , devem passar sem referência explí-
cita as irregularidades ou defeitos ocorridos na realização do t r a b a l h o .
A interpretação dos dados numéricos necessita em geral de sua
prévia condensação e da organização de q u a d r o s estatísticos ou gráficos.
O pesquisador deve conhecer as técnicas de estatística descritiva p a r a
isto necessárias, e as indicações a seguir p o d e m ser de u t i l i d a d e .

Referências para estudo e consulta


McNemar. Psychological Statistics.
Walker. Elementary Statistical Methods.
W a l k e r e D u r o s t . Mathematical Tables, their Structure and Use.
Eva N i c k . Estatística e Psicometria.
Yule e K e n d a l l . Introduction to the Theory of Statistics. (Há tra-
dução espanhola e brasileira) .
Croxton e C o w d d e n . Applied General Statistics (Idem) .
G o o d . Methodology, cap. xi, p. 594-630.

7. FORMULAÇÃO DAS CONCLUSÕES


As conclusões constituem o resultado final do t r a b a l h o : são as
respostas às perguntas formuladas como objetivo da pesquisa, e todo
o t r a b a l h o i n t e r m e d i á r i o só tem sentido como meio de chegar a êste
f i m ; n a d a é preciso acrescentar p a r a t o r n a r evidente o cuidado que
deve presidir a sua formulação.
Elas devem conter t u d o q u e de essencial tiver sido e n c o n t r a d o
como resultado (positivo ou negativo) da investigação, c n a d a devem
conter q u e não seja p l e n a m e n t e f u n d a m e n t a d o pelo p r ó p r i o t r a b a l h o
r e a l i z a d o . Esses dois requisitos, e m b o r a fundamentais, são freqüente-
m e n t e esquecidos e o que aparece então sob o título de conclusões são
afirmações mais ou menos vagas, que às vezes não extraem do t r a b a l h o
aquilo que de útil êle poderia dar, e que outras vezes são constituídas
de proposições gerais que p o d e r i a m ter sido formuladas i n d e p e n d e n t e -
m e n t e do t r a b a l h o r e a l i z a d o . Conclusões assim apresentadas são sufi-
cientes p a r a que se julgue da incompetência do a u t o r ; p o r é m , recente-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

m e n t e , li coisa mais espantosa em relatório de um pesquisador traba-


l h a n d o n u m de nossos mais r e p u t a d o s institutos de pesquisa educa-
cional: u m a conclusão f o r m u l a d a em sentido d i a m e t r a l m e n t e oposto
àquele que seus p r ó p r i o s resultados a p o n t a v a m .
As conclusões, como ficou dito, n a d a devem conter além do que
os resultados justificam p l e n a m e n t e , mas isto não q u e r dizer que, além
das conclusões p r o p r i a m e n t e ditas, não possam ser acrescentadas gene-
ralizações ou idéias novas, sugeridas em alguma das fases da pesquisa,
mas não p o r ela f u n d a m e n t a d a s de m o d o positivo. Tais sugestões são
sempre interessantes e p o r vezes importantíssimas. 0 q u e se deve evitar.
t e r m i n a n t e m e n t e , é dá-las como conclusões e não como o que de fato são.
Cabe ainda assinalar que as conclusões devem ser formuladas do
m o d o mais claro e conciso possível; o autor não deve esquecer que,
q u a n d o o leitor está apenas interessado em ter u m a idéia geral do
t r a b a l h o , m u i t a s vezes se limita à leitura das conclusões e só q u a n d o
estas despertam interesse especial é que se dá ao t r a b a l h o de ler o
restante da exposição.

Leitura recomendada
Good. Methodology, cap. xii, p. 631-647.

8. REDAÇÃO DO RELATÓRIO DA PESQUISA


Um t r a b a l h o de pesquisa só p o d e ser considerado concluído coiu
a publicação do respectivo r e l a t ó r i o . R e a l m e n t e , n i n g u é m faz u m a
pesquisa simplesmente pelo p r a z e r de fazê-la, e p a r a que ela possa ser
utilizada é indispensável e l a b o r a r e divulgar um relatório expositivo,
contendo t u d o que de essencial foi feito e e n c o n t r a d o .
Várias recomendações devem ser feitas sôbre o p r e p a r o de rela-
tórios de pesquisas. Seu estilo deve ser claro, sóbrio e direto e evitar
ambigüidades e adjetivação e x a g e r a d a . O título deve indicar com exa-
tidão a finalidade essencial da pesquisa e não apenas o c a m p o geral
de t r a b a l h o . (Isto é i m p o r t a n t e p a r a fins bibliográficos, pois um título
que não informe sôbre o conteúdo exato do t r a b a l h o pode passar sem
o u t r o exame pelos q u e mais interessados estariam em conhecer o pro-
blema estudado.)
O conteúdo deve ser dividido logicamente em capítulos ou seções
cujos títulos ou subtítulos devem dar u m a visão geral do conjunto e
facilitar a localização de q u a l q u e r tópico de interesse. Todos os passos
essenciais da pesquisa devem estar fielmente relatados, sendo conve-
niente expor mesmo as dificuldades encontradas e as tentativas infru-
tíferas levada a cabo, o que p o d e ser de muita utilidade no planeja-
m e n t o de futuros t r a b a l h o s sôbre o mesmo assunto ou assuntos
correlatos.
A exposição do histórico do p r o b l e m a e as referências a trabalhos
anteriores devem ser breves, sobretudo q u a n d o se trata de campo rela-
tivamente b e m c o n h e c i d o . Os objetivos formulados devem ser explici-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

tamente apresentados, cabendo pelo menos uma rápida justificação dos


itens considerados. Quando o método de trabalho é de emprego cor-
rente, poderá ser dispensada uma justificação de sua escolha e as
circunstâncias de sua aplicação podem ser omitidas ou muito abrevia-
das, fazendo-se apenas referência às fontes onde podem ser encontrados
maiores esclarecimentos; mas isto não dispensa indicações precisas de
quaisquer alterações das normas habituais nem de quaisquer circuns-
tâncias peculiares ao caso estudado.
Quando, por outro lado, fôr empregado um método original ou
fôr feita uma alteração radical em método tradicional, há necessidade
de uma exposição do assunto suficientemente detalhada para que se
possa julgar da validade do método e da conveniência de seu emprego.
Isto constitui, de um lado, uma justificativa da orientação adotada, e,
de outro, uma informação que pode ser de grande utilidade para
quem desejar de futuro adotar método semelhante.
Todos os dados fundamentais obtidos devem ser apresentados e,
quando de natureza numérica, de preferência resumidos em quadros
estatísticos, ilustrados quando necessário por meio de gráficos. (Os
quadros estatísticos e gráficos, quando de grandes dimensões c nume-
rosos, devem ser apresentados de preferência em apêndices. Êste pro-
cesso, além de evitar interrupções na leitura do texto, facilita as refe-
rências e é mais econômico e conveniente do ponto-de-vista da
dactilografia e tipografia) .
Todo relatório de pesquisa deve terminar com um resumo geral
do trabalho, sendo indicado apresentar esse resumo também em uma
ou duas línguas estrangeiras de larga divulgação, atualmente, sobretudo
no campo da educação, sendo de grande vantagem a apresentação pelo
menos em inglês do resumo da pesquisa.
A bibliografia deve ser apresentada de preferência em apêndice.
Não deve constituir um enfeite para demonstrar a erudição do autor,
e sim uma relação das obras citadas no texto, cuja finalidade é a de
permitir ao leitor, caso assim o deseje, conferir as afirmações contidas
no relatório ou conhecer melhor os fundamentos em que se baseia.
A Sociedade Brasileira de Normas Técnicas e o Instituto Brasileiro de
Bibliografia e Documentação estudaram a padronização das citações
bibliográficas. Essas normas, em parte pelo excesso de tecnicismo,
são sistematicamente desobedecidas nos sentidos mais diversos pelos
pesquisadores brasileiros.

Leituras recomendadas
* Cardasco — Research and Report Weiting.
Reis — Preparo de artigos técnicos.
* Good — Methodology, cap. xiii, p. 648-678.
* Whitney — Elements of Research, cap. xvi, p. 359-388.
Barr — Educational Research, apêndice A, p. 335-343.
Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação — Norma-
lização da Documentação no Brasil.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Temas para debate

Em vários pontos do presente trabalho foram sugeridos alguns


temas para debates. Entretanto, os temas de maior interesse seriam os
constituídos por casos concretos de pesquisas realizadas, que poderiam
ser analisadas sob um ou mais dos aspectos tratados nas presentes
normas. Melhor ainda seria o debate sôbre dúvidas ou dificuldades
encontradas no planejamento ou realização de alguma pesquisa ainda
em andamento. Além das vantagens didáticas do exemplo da aplicação
das normas gerais a um caso concreto, poder-se-ia porventura evitar
algum erro ou deficiência do tipo das que freqüentemente ocorrem em
trabalhos de principiantes e não raramente em trabalhos de pesquisa-
dores veteranos.
SUBSÍDIOS ESTATÍSTICOS SÔBRE A MATRÍCULA
DA POPULAÇÃO ESCOLAR

JOÃO TORRES JATOBÁ e outros


Do Ser. de Estatística da Educ. e Cultura

APRESENTAÇÃO

O Serviço de Estatística da Educação e Cultura, com o propósito


de acelerar a marcha do PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO que
veio, efetivamente, fixar um marco de alta relevância no desenvolvi-
mento do País, apresenta os dados estatísticos básicos que servirão à
concretização da matrícula de tôda a população escolar de 7 a 11 anos
de idade, com o respectivo professorado diplomado, a ser executado até
1970, de acordo com as metas educacionais estabelecidas pelo Conselho
Federal de Educação.
O emprego de Regiões Geo-econômicas, ao invés das Fisiográficas,
permitiu melhor confronto entre as Unidades que as compõem, em
virtude de maior homogeneidade quanto ao grau de desenvolvimento.
Na oportunidade, a fim de facilitar o raciocínio dos técnicos inte-
ressados no presente trabalho, fica estabelecido que:
a) taxa de escolarização ou simplesmente taxa, é a relação per-
centual entre a população escolarizanda e a população esco-
larizável;
b) ponto desejado, valor desejado ou taxa desejada é a meta
educacional que fixa em 100% a matrícula de tôda a popu-
lação escolar de 7 a 11 anos de idade até 1970 e foi obtida
segundo a fórmula:
1
(td/to) , onde
n-1
td é á taxa desejada em 1970
to é a taxa observada em 1960;

O presente trabalho foi elaborado por João Torres Jatobá, Pedro Henrique
Saint Martin, Maria da Clória Cunha Ribeiro da Cruz e Noèmia Brandão de
Perdigão, da equipe de Estudos e Análises.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

c) ponto esperado, valor esperado, taxa esperada representa o


crescimento médio vegetativo dos valores observados da taxa
de escolarização e foi obtido pelo ajustamento de uma expo-
nencial.

Convém frisar que, onde não haja indicação, o presente trabalho


refere-se somente à faixa da população de 7 a 11 anos de idade.
Com mais esta parcela de informações, a primeira de uma série
de 3, espera o Serviço de Estatística da Educação e Cultura estar cola-
borando "no esforço máximo do Govêrno de proporcionar educação
ao povo".

TENDÊNCIA DA TAXA DE ESCOLARIZAÇÃO

1. População escolarizando,
Em 1960, estavam matriculadas 4.895.313 crianças de 7 a 11 anos
de idade, o que representava 54% da população escolarizável, isto é,
cerca de 4.200 mil permaneciam fora da escola.
Dessas crianças, 72,3% encontravam-se matriculadas nas escolas da
Região Sul, enquanto as Regiões Norte-Oeste e Nordeste abrangiam
1.354.466, sendo 8,5% na Norte-Oeste e 19,2% da Nordeste.
Mas o que ressalta aos olhos do pesquisador é o contraste acen-
tuado existente entre a Região Sul e as Regiões Norte-Oeste e Nordeste,
no tocante à taxa de escolarização. Enquanto a primeira oferecia esco-
larização a cerca de 68% de crianças, na Região Norte-Oeste essa taxa
caía para 32,5 e na Nordeste para 36,6. O resumo seguinte proporciona
melhor confronto entre as regiões geo-econômicas citadas acima, com
os valores observados da taxa de escolarização no período 1954/60.

TAXA DE ESCOLARIZAÇÃO
REGIÕES
GEO-ECONOMICAS
1954 55 56 57 58 59 1960

BRASIL 43,8 45,2 47,6 49,3 51,6 52,2 54,0


27,9 28,2 29,3 30,7 31,8 32,9 32,5
27,2 28,2 31,3 32,2 34,3 34,3 36,6
Sul 56,5 58,3 60,4 62,6 65,2 65,9 67,9

Admitindo-se que não ocorra nenhum fator estranho, no caso a


interferência decisiva do Govêrno em virtude da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, o Brasil alcançaria a taxa de 77,8% de
escolarização em 1970 e isto devido à Região Sul, pois as demais,
embora possuam menos da metade (41%) da população escolarizável
152 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

de todo o País, estariam aquém da média brasileira. Com o Plano


Nacional de Educação, as metas pretendidas pelo Govêrno para 1970
são de 100% para todas as Unidades da Federação, conforme resumo
abaixo, onde estão confrontados, segundo as regiões, os valores espe-
rados e desejados da taxa de escolarização até 1970.

BRASIL NORTE- NORDESTE SUL


OESTE
ANOS Taxa Taxa Taxa Taxa
Espe- Dese- Espe- Dese- Espe- Dese- Espe- Dese-
rada jada rada jada rada jada rada jada

1961 56,5 57,2 34,3 36,1 38,8 40,5 70,6 70,5


62 58,5 60,6 35,4 40,2 40,7 44,7 72,8 73,2
63 60,6 64,2 36,5 44,8 42,8 49,4 75,1 76,0
64 62,8 68,1 37,6 50,0 44,9 54,6 77,5 78,9
65 65,1 72,4 38,8 55,9 47,2 60,4 79,9 82,0
66 67,4 77,0 40,0 62,7 49,5 66,8 82,5 85,3
67 69,9 82,1 41,2 70,3 52,0 73,8 85,1 88,7
68 72,4 87,5 42,5 78,9 54,6 81,7 87,8 92,3
69 75,0 93,5 43,8 88,8 57,4 90,3 90,6 96,0
1970 77,8 100,0 45,1 100,0 60,3 100,0 93,4 100,0

A fim de dar cumprimento a tais metas o Govêrno, inicialmente,


deverá matricular em suas escolas cerca de 740 mil crianças no fim do
ano letivo de 1963, de acordo com o resumo seguinte:

POPULAÇÃO ESCOLARIZADA
ANOS
Metas Acréscimo
educacionais anual
.........................................................
1962.. ......................................................... 5 635 392 (1)
63.. ......................................................... 6 375 556 740 164
64.. ......................................................... 6 978 988 603 432
65.. ......................................................... 7 651 051 672 063
66.. ......................................................... 8 402 173 751 122
67.. ......................................................... 9 235 734 833 561
68..
......................................................... 10 168 131 932 397
.........................................................
69.. 11 212 015 1 043 884
1970 12 385 483 1 173 468

(1) Valor da taxa de escolarização esperada. — (2) Acréscimo anual mais déficit existente.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 153

2. Professorado
P a r á atender a êste acréscimo de escolares, é óbvio que o n ú m e r o
de professôres será forçosamente a u m e n t a d o c o p l a n o estabelece que
o sistema escolar deverá contar com professôres diplomados até 1970.
À p r i m e i r a vista, n ã o considerando a localização do professor em área
u r b a n a ou r u r a l , o p l a n o apresenta-se exeqüível logo de i m e d i a t o , se,
em vez de 28,4, a m é d i a atingir 35 alunos p o r professor, segundo o
resumo abaixo:

PROFESSORAS
NORMALISTAS ALUNOS/PROFESSOR
REGIÕES (%)

1962 1903 1962 1963

BRASIL 55,3 100,0 28,4 35,0


Norte-Oeste 26,3 100,0 30,8 35,0
Nordeste 38,5 100,0 30,4 35,0
Sul 62,5 100,0 27,5 35,0

Na tabela imediata, pode-se constatar que, p a r a o Brasil, o pro-


fessorado p r i m á r i o existente em 1962, na razão de 28,4 alunos/professor,
ultrapassa o necessário p a r a o a t e n d i m e n t o da p o p u l a ç ã o escolarizanda
em 1963, na razão de 35 alunos p o r professor.

PROFESSORES DIPLOMADOS

Segundo os cursos
ANOS de formação
Total Acréscimo
anual

1962 110 514'


63 109 295 36 432 36 432 182 159 71 6452
64 119 633 39 882 39 882 199 397 17 238
65 131 159 43 722 43 722 218 603 19 206
66 144 032 48 015 48 015 240 062 21 459
67 158 325 52 776 52 776 263 877 23 815
68 174 312 58 103 58 103 290 518 26 641
69 192 207 64 069 64 069 320 345 29 827
1970 212 323 70 774 70 774 353 871 33 526
1 2
55,3% dos 199 729 professôres existentes, na razão de 28,4 alunos/professor. — Acréscimo
anual mais déficit existente.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Em fins de 1963, o acréscimo de professôres diplomados será da


ordem de 71.645, mas o aproveitamento do pessoal não normalista, por
meio de cursos especiais sob a orientação do INEP, poderá suprir tal
déficit sem criar sérios problemas de ordem econômica e social. Quanto
aos demais anos, embora o número dos que concluem o curso normal
seja suficiente para atender à demanda, é notório que somente cerca
de 50% * têm ingresso no magistério. A outra metade, embora tenha
ocupado os bancos das escolas normais, cuja função precipua é a de
preparar o professorado primário, desloca-se para outros setores de
atividade completamente diferentes da de magistério, como funciona-
lismo público, atividades domésticas, estudantes de filosofia, comer-
ciários, e t c , cabendo aqui um estudo por parte dos órgãos governa-
mentais, a fim de corrigir tal distorção nesse ensino técnico-profissional.
A tabela seguinte exprime melhor o que foi dito ao confrontar as con-
clusões de curso no ensino normal e o acréscimo anual de professôres
normalistas, no decênio 1951/60.

Conclusões PROFESSORAS
de curso NORMALISTAS
ANOS no ensino
normal Total Acréscimo
anual

1951 10 777 65 474


1952 12 994 68 996 3 522
1953 14 829 73 167 4 171
1954 16 235 78 041 4 874
1955 18 164 82 027 3 986
1956 19 364 90 611 8 584
1957 20 156 97 137 6 526
1958 21 347 105 605 8 468
1959 21 356 113 616 8 011
1960 22 714 122 581 8 965

Outro aspecto relevante observado por êste Serviço é o comporta-


mento da relação alunos-por-professor nas áreas urbana e rural. A priori
supõe-se que, devido à dispersão existente na zona rural, o número de
alunos por professor seja menor do que na urbana. Entretanto, tal
suposição não foi constatada e sim a sua recíproca. A única explicação
plausível para essa ocorrência é devido ao mesmo falo da vasta extensão
da zona rural que obriga as crianças e adolescentes a se deslocarem
muitos c muitos quilômetros, convergindo para determinados locais
que possuam condições para o ensino — as áreas escolares.

* Sistema Educacional Cearense e 2.° Plano de Obras Gabinete de Admi-


nistração e Planejamento, do Rio Grande do Sul.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 155

Durante o período estudado (1951/60) verificou-se que decrescia


a razão alunos-por-professor, tanto na zona urbana quanto na rural,
principalmente na última e acentuadamente na Região Nordeste, con-
formo o resumo seguinte e o estudo correspondente à Região citada:

ÁREA URBANA ÃREA RURAL

ANOS Alunos Alunos


Profes- Alunos/ Profes- Alunos/
matri- matri-
sôres professor sôres professor
culados culados

1951 2 213 282 73 802 30,0 1 677 874 48 117 34,9


1952 2 301 770 77 347 29,8 l 733 178 51 109 33,9
1953 2 429 851 81 687 29,7 l 782 554 54 188 32,9
1954 2 607 728 88 550 29,4 1 876 092 59 405 31,6
1955 2 774 549 94 623 29,3 1 997 798 64 166 31,1
1956 3 032 248 104 206 29,1 2 151 656 68 548 31,4
1957 3 223 113 110 672 29,1 2 263 357 73 304 30,9
1958 3 471 083 120 206 28,9 2 351 824 77 777 30,2
1959 3 693 255 130 739 28,2 2 111 138 80 778 29,8
1960 3 869 777 140 452 27,6 2 528 337 84 934 29,8

Observa-se na tabela acima que, na zona urbana, o acréscimo de


alunos e de professôres foi, respectivamente, de 74,9 e 90,4% e, na
zona rural, 50,7 e 76,5%. Várias hipóteses poderiam ser formuladas.
como crescimento excessivo de professôres, fuga de alunos, e t c , contudo,
tais conjeturas serão deixadas aos economistas e técnicos de educação.
Êste Serviço pretendeu, apenas, apresentar os dados estatísticos indis-
pensáveis à boa execução do PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO e
indicar, embora superficialmente, que devem ser empregados trata-
mentos diferentes para a zona urbana e para a rural.
PERSPECTIVAS PARA A ESCOLA MÉDIA
NO DESENVOLVIMENTO BRASILEIRO
JAYME ABREU
Do C.B.P.E.

1 — Não é por acaso que a extensão da escolarização comum obri-


gatória ao nível médio é o fato educacional novo, característico do
nosso século.
Vários condicionantes sócio-culturais assim o determinaram, entre
eles: "explosão" demográfica, democracia (com a expansão da classe
média e ascensão social das classes populares), ciência, tecnologia, indus-
trialização, urbanização.
A escola elementar, cuja generalização seria a tônica educacional
do século XIX, será incapaz, por si só, de fornecer os esquemas de
referência e as tecnicalidades exigidos pela civilização democrática,
industrial, urbana, refinadamente complexa, do nosso tempo.
2 — Evidentemente, as formas para realização desse fato social
novo em expansão incoercível, implicaram perplexidades no que
diz respeito à fixação de objetivos e modos de operação: faltava-lhes
o apoio de uma tradição inexistente.
Daí, ser muito mais pacífica ou, pelo menos, muito menos contro-
vertida a problemática do ensino elementar e do ensino superior com
endereços e finalidades bem mais assentes.
O consenso em torno dos objetivos e do "modus-operandi" dêsses
níveis de ensino tem sido, em têrmos, mais fácil de estabelecer do que
no nível do ensino médio.
3 — Em que pesem essas perplexidades, intrínseca seja a novidade
de concepção do ensino médio, seja a multiplicidade de seus propósitos
nem sempre facilmente conciliáveis, a força de agentes propulsores
inelutáveis determinou que o seu crescimento em têrmos relativos supe-
rasse, de regra, seja o do ensino elementar, seja o do ensino superior,
chegando mesmo, por vezes, a exceder proporcionalmente o crescimento
da população escolarizável correspondente.
4 — Entre esses agentes propulsores figuram aquêles que consti-
tuem situações do processo de desenvolvimento.
O grupo novo de estudiosos da educação do ângulo de "investi-
mento em capital humano", para usar a expressão de Bert Hoselitz, da
Universidade de Chicago, examinou a fundo o problema da rentabili-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS


d a d e econômica da educação como agente do progresso técnico e chegou
a conclusões que r e p r e s e n t a m u m a revisão total de velhos estereótipos
sôbre o t e m a .
5 — Assim é q u e o Prof. A r t h u r Lewis, entre outros, depois de sua
experiência como conselheiro do governo de G h a n a e de p e r i t o das
Nações Unidas, reviu conceitos expressos em seu conhecido livro A
Teoria do Desenvolvimento Econômico, passando a conceder impor-
tância p r i o r i t á r i a ao ensino de segundo grau em relação ao ensino pri-
m á r i o no q u e concerne às exigências do desenvolvimento econômico.
6 — De m o d o idêntico se manifestou B e r t Hoselitz (Algumas
reflexões sôbre a economia da educação nos países subdesenvolvidos)
q u a n d o s u b l i n h o u : " o desenvolvimento d o ensino p r i m á r i o t e m efeito,
em p r i m e i r o lugar, sôbre o nível de consumo de u m a população, mais
do que sôbre as relações de p r o d u ç ã o " ; "o desenvolvimento da instru-
ção p r i m á r i a r e p e r c u t e mais sôbre o nível de consumo, do q u e sôbre a
capacidade p r o d u t i v a de u m a sociedade".
Em se t r a t a n d o do ensino " s u p e r i o r ao p r i m á r i o " , afirma todavia
Hoselitz q u e "seja q u a l fôr o seu conteúdo, êle acrescenta algo à capa-
cidade d e ganho d e u m i n d i v í d u o " .
"Consideramos pois o ensino s u p e r i o r " (ao p r i m á r i o ) "como sendo
meio de a u m e n t a r a produtividade daqueles que o r e c e b e m , represen-
t a n d o todas as despesas feitas p a r a esse ensino, privadas ou públicas,
um verdadeiro investimento em capital humano".
7 — Se a expansão do ensino m é d i o tem nas exigências do desen-
volvimento econômico inequívoco fator de p r o p u l s ã o , igualmente o
i m p u l s i o n a m nessa expansão as motivações da educação em sua básica
dimensão de bem cultural, no sentido de contribuir p a r a fazer do indi-
víduo m e l h o r pessoa, m e l h o r elemento de família e da sociedade. São
dimensões que a escola e l e m e n t a r , ainda q u e de seis anos ou mesmo
mais, já n ã o p o d e p r o p o r c i o n a r com suficiente p l e n i t u d e , na sociedade
a l t a m e n t e complexa, n a d a simples, de nosso t e m p o .
8 — Considerando ainda o assunto do ângulo da organização peda-
gógica geralmente vigente no ensino, aí estará mais o u t r o fator condi-
cionante da expansão do ensino m é d i o : além de objetivos outros que
l h e são intrínsecos, p r ó p r i o s , é nos seus q u a d r o s q u e se p r e p a r a a quase
totalidade do magistério da escola p r i m á r i a ; é de suas fileiras que saem
os futuros integrantes dos q u a d r o s de nível superior de um p a í s . Assim,
a expansão dos ensinos e l e m e n t a r e superior há de estar condicionada,
necessariamente, à expansão do ensino médio, por seu p a p e l de matriz
dos seus q u a d r o s docentes e discentes.

SITUAÇÃO DO ENSINO MÉDIO BRASILEIRO

9 — I n t e g r a n t e , senão do m u n d o desenvolvido, d a q u e l e "terceiro


m u n d o " em q u e se processa a e t a p a do desenvolvimento a q u e W. W.
Rostow, em seu esquema em The Stages of Economic Growth, deno-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

mina de fase de "pré-condições para o arranco", não poderia ficar o


Brasil inatingido por essa "poussée", a bem dizer universal de expansão
do ensino médio.
10 — E não se pode afirmar que ela, em têrmos, não o tenha
atingido.
Tomando como ponto de referência, na década de 1951 a 1960, os
aspectos quantitativos do problema, vale dizer, números, cifras dentro
dos quadros da educação institucionalizada no Brasil, ver-se-á que,
quanto ao crescimento proporcional, o ensino médio teria sido aquêle
que mais cresceu, em relação aos outros níveis de ensino.
11 — As matrículas no ensino médio teriam se expandido de pouco
mais de 100% contra pouco menos de 100% no ensino superior e em
torno de 75% no ensino primário.
Sem dúvida, porém, esses índices perderão sentido se desligados de
um contexto de referência que lhes dê significado.
Entre eles, o do crescimento demográfico da faixa etária corres-
pondente, dos 12 aos 18 anos, cujo incremento andou, no decênio em
causa, pela casa dos 30%.
12 — Essa contrasteação, isto é, aquela emergente do cotejo entre
o crescimento demográfico e as oportunidades de escolarização corres-
pondentes, poderia conduzir a considerações otimistas, se não se levasse
em conta que, na situação presente, sequer chegamos a ter escolarizados
12% da população em idade de escola média.
Em verdade esta percentagem chega a nos ser constrangedora se
cotejada com os índices de escolarização em nível médio de países dêste
mesmo continente, como a Argentina e o Uruguai, onde atinge a algo
mais de 30% ou mesmo do Chile e da Venezuela, bem mais expressivos
do que os índices brasileiros.
13 — A prosseguirem os ritmos atuais de expansão do nosso ensino
médio e da população nele escolarizável, algumas décadas, não menos
de três, terão que decorrer para que nossa escola média forneça em
quantidade razoável os suprimentos de recursos humanos exigíveis por
nossa atual estrutura ocupacional.
14 — Note-se que nessa correlação que estamos buscando estabe-
lecer entre contingentes humanos fornecidos pela escola média e exi-
gências da estrutura ocupacional do país, estaremos jogando, quanto
a esta última, com dados do Censo de 1950.
Por esses dados, 39% da população econômica ativa do Brasil se
encontrava em atividades secundárias e terciárias, daqueles 35% da
população total que constituíram a população economicamente ativa
do país.
Ora, mesmo sem dar o necessário desconto quanto ao impacto da
industrialização crescente sôbre o aumento das atividades secundárias e
terciárias, seria necessário algo mais do que triplicar os atuais quadros
de matrículas do ensino médio, elevá-los em torno de quatro milhões
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 159

de alunos (quarenta por cento, aproximadamente, da faixa etária cor-


respondente), para que o suprimento de recursos humanos pela escola
média guardasse razoabilidadc em relação às exigências do ritmo atual
de nosso desenvolvimento. Para mantê-lo; não para acelerá-lo, note-se.
15 --- No cômputo dêsses dados da matrícula mínima necessária
no ensino médio para não frear, para não constituir ponto de estran-
gulamento quanto ao ritmo da expansão econômica e cultural do país,
é necessário não perder de vista outro aspecto da maior importância.
Um dos índices da eficiência de uma escola é aquêle a que os norte-
-americanos denominar de "school retention rate", isto é, a taxa de
retenção dos alunos pela escola até a conclusão do curso.
Ora, essa taxa na escola média do Brasil é baixíssima, não andando
em mais do que 30%, na vida escolar de uma geração.
Evidentemente será mister fazê-la crescer ponderàvelmente, o que
não é simples todavia, dadas as condicionantes sociais e pedagógicas que
atuam no problema.
16 — Do ângulo da presença quantitativa do nosso ensino médio
em relação às exigências sócio-econômicas do país, ainda há outras
situações, outros problemas significativos a considerar.
Vem sendo êle, tipicamente, um ensino apenas urbano e de classe
média. Atente-se a que em 1960, 1.358 municípios dos 3.000 então exis-
tentes no Brasil não possuíam (e vários não tinham condições culturais
de possuir) qualquer estabelecimento de ensino médio.
É necessário, evidentemente, expandir-lhe a área de penetração
geográfica e social, com o devido resguardo da qualidade, para que se
o converta numa contrafação.
Ainda em 1960, três Estados, São Paulo, Guanabara e Minas Gerais
concentravam 53,2% do seu corpo discente e 51% do seu corpo docente.
Essa macroconcentração necessita de ser diluída com a atixação suple-
tiva da União, no desempenho do seu papel de atenuadora de desníveis
de desenvolvimento entre os vários Estados da Federação.
17 — Ainda no terreno das quantificações, vem-se assinalando nele
uma queda progressiva do predomínio maciço da escola secundária, em
relação aos outros ramos de ensino. Se não distinguimos os dois ciclos
do ensino médio, o que nos parece irrealístico por se tratar de universos
sensivelmente diferentes em clientela e propósitos, aí então ainda seria
absorvente o predomínio da escola secundária, refletido nos seguintes
dados (1960) .
1.° ciclo — Ensino Secundário, 83,5%; Ensino Comercial, 1 1 % ;
Ensino Normal, 3 % ; Ensino Industrial. 2%;; e Ensino Agrícola,
0,5%.
Passando-se todavia para o segundo ciclo, sofre esse quadro a subs-
tancial alteração a seguir demonstrada:
2.° ciclo — Ensino Secundário, 41,4%; Ensino Comercial, 31,0%;
Ensino Normal, 24%; Ensino Industrial, 3% : e Ensino Agrícola,
0,6%.

3 — 34 901
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

18 — A análise dessas cifras evidencia tendência a nosso ver sau-


dável, q u a l seja a da escola secundária, com currículos flexíveis e oferta
de opções constituir-se, basicamente, na grande escola c o m u m , de cul~
tura geral, do primeiro ciclo.
É que, p o r todos os aspectos, n ã o faz sentido a presença de escolas
de nível m é d i o p r e m a t u r a m e n t e especializadas em sua estrutura peda-
gógica ao nível do primeiro ciclo.
19 — P a r a concluir essas considerações q u a n t o à presença quanti-
tativa da escola m é d i a brasileira no universo escolar do país, assinale-se,
cm t ê r m o s de 1960, q u e a cada aluno da escola m é d i a c o r r e s p o n d i a m
7 na p r i m á r i a , a cada dez alunos seus, um na s u p e r i o r .
Como ilustração, assinale-se que nos Estados Unidos da América do
Norte a cada aluno na escola m é d i a corresponde um na p r i m á r i a e a
cada três na escola m é d i a , um na s u p e r i o r .
Como p r o p o r ç ã o e n t r e os dois ciclos da escola m é d i a brasileira,
registram-se 3,5 alunos no 1.° ciclo p a r a 1 no 2.° ciclo.
20 — No que diz respeito à participação das despesas públicas
totais com a m a n u t e n ç ã o do ensino, dados disponíveis em relação ao
p e r í o d o 1948/56 m o s t r a m q u e t e m ela oscilado e n t r e 25 e 30,8% no
ensino m é d i o com a u m e n t o n o m i n a l de despesas, nesse p e r í o d o , de
3 5 % , superior aos 2 1 % d o ensino p r i m á r i o .

NATUREZA E QUALIDADE DO ENSINO MÉDIO

21 — Feitas essas sumárias considerações p r e l i m i n a r e s , indispen-


sáveis a que se sinta o p r o b l e m a em o r d e m de grandezas, analisemos
alguns aspectos relativos à n a t u r e z a e q u a l i d a d e desse ensino m é d i o , no
que tenham de mais importante.
22 — E v i d e n t e m e n t e , a expansão de nossa escola m é d i a se teria
processado, grosso m o d o , algo i m p r o v i s a d a m e n t e nos processos, vacilan-
t e m e n t e nos objetivos, deficientemente na q u a l i d a d e , p o r isto q u e
correspondeu ao fenômeno de m u d a n ç a no contexto sócio-econômico
brasileiro.
Assim, aquela velha escola secundária, i m p o r t a d a e algo defor-
m a d a , do h u m a n i s m o clássico, em q u e a erudição e o b r i l h o verbal
e r a m as grandes metas, nascida no p e r í o d o pré-industrial e pré-tecno-
lógico de nossa civilização e e n t e n d i d a apenas como via de acesso ao
ensino superior, teve de ser revista em todos os seus fundamentos ao
i m p a c t o das m u d a n ç a s na sociedade nova a que devia servir, ao influxo
de u m a nova clientela heterogênea nas origens sociais e nos interesses
c que a buscava, em sua m a i o r i a , como um fim em si m e s m o .
23 — Quase inevitavelmente, deficiências m a r c a r a m o atropelo da
multiplicação de prédios, professôres, e q u i p a m e n t o s improvisados, tan-
tas vezes ao r i t m o de movimentos "assistencialistas" demagógicos; cur-
rículos inviáveis pelo seu enciclopedismo foram estabelecidos como
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

tentativa frustra de acomodação entre o velho e o n o v o ; perplexidades


e dificuldades aconteceram na assimilação de novos objetivos, processos,
métodos, técnicas.
As exigências de u m a nova civilização industrial, conduzindo a u m a
ascensão e participação firadiialmente ativa e responsável das camadas
populares nos r u m o s da vida nacional, levam à necessidade de prepa-
ração de múltiplos q u a d r o s e múltiplas elites que, evidentemente, u m a
exclusiva escola de letras sozinha não podia r e a l i z a r .
24 — A nova escola m é d i a t a m p o u c o se p o d e r i a esgotar no propó-
sito definidor de " p r e p a r a d o r a de individualidades condutoras", que
lhe a t r i b u i u u m a das tíltimas reformas educacionais do país, já depois
da revolução de 1930.
N e m p o d e r i a igualmente sustentar mais essa velha escola sua rigi-
dez u n i f o r m e ; seu enciclopedismo; seu exclusivo apreço aos talentos
verbais; sua alienação cm relação à c o m u n i d a d e ; sua submissão ante
modelos de teóricos, impostos de fora p a r a d e n t r o ; seu pretenso inte-
lectualismo exclusivista; sua estreita política de r e c r u t a m e n t o aristo-
crático dos seus q u a d r o s .
25 — E p o r q u e já n ã o p o d i a subsistir n u m a abismai defasagem
em relação aos objetivos da nova sociedade a que devia atender, come-
çou a m u d a r , ainda q u e com aquela lentidão tão peculiar ao campo do
ensino institucionalizado, sempre em atraso em relação às m u d a n ç a s
no processo social. Mas m u d o u e não tão pouco, com a equivalência
legal dos ramos de ensino de nível m é d i o ; com as possibilidades de
m a i o r presença responsável da escola no processo escolar; com a gra-
dual concessão de a u t o n o m i a ao p o d e r local ao invés da submissão
passiva ao p o d e r c e n t r a l ; com as possibilidades de redução e de flexi-
bilidade dos currículos; com a variedade dos processos de verificação
de a p r e n d i z a g e m ; com a incipiente consideração do qualitativo como
indispensável ao processo e d u c a t i v o .

ESBOÇO DE UMA PROGRAMAÇÃO

26 — Assim consideradas as realidades expostas nas linhas de ex-


pansão e de m u d a n ç a , q u e caminhos se poderia p r e t e n d e r esboçar,
sujeitos ao indispensável teste da praxis, como indicados a balizar o
crescimento de nossa escola m é d i a , integrada como fator do processo
de desenvolvimento nacional?
No que concerne à expansão quantitativa, já a b o r d a m o s prelimi-
n a r m e n t e a m e t a a alcançar, p a r a que não venha ela a constituir ponto
de estrangulamento em nosso processo de desenvolvimento.
E ela, no que concerne aos quantitativos globais a serem atingidos
em prazos fixados, aquela mesma em t o r n o da q u a l assumiu o Brasil
reiterados compromissos em reuniões internacionais de educação, aque-
la mesma constante do P l a n o Nacional de Educação elaborado pelo
Conselho F e d e r a l de E d u c a ç ã o .
162 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Todo o problema estará no processo de implementação dessa meta


que só pode ou só deve ser expressão da ação racionalmente planejada,
como fruto do esforço solidário de agentes públicos e privados da edu-
cação institucionalizada.
Todos os ingredientes intrínsecos à ação racionalmente planejada,
da racionalidade dos gastos à propriedade e rentabilidade do investi-
mento hão de ser necessariamente pesados e sopesados.
No que se relaciona aos tipos de escola média que urge desenvolver
e a uma aproximação dos respectivos quantitativos, o problema é mais
delicado, carecendo de estudos mais detalhados, que estão ainda por
fazer. O mesmo Plano do Conselho Federal de Educação, quando pro-
põe as metas a serem atingidas pelo ensino médio brasileiro, tratou
desse ensino como um todo. Será, evidentemente, necessário ir além,
pois, no segundo ciclo, há de ser êle diversificado.
Com a ressalva prévia da necessidade de estudos fundamentados
abrangendo levantamento de fatos mais concretos e das decorrentes
implicações, cremos todavia que num primeiro esquema se poderiam
conter algumas hipóteses preliminares, que estudos mais aprofundados
confirmariam ou infirmariam.
Em estudo feito com o Professor Robert J. Havighurst,. Professor
de Educação da Universidade de Chicago e observador familiarizado
com a educação brasileira, chegamos a elaborar um esboço preliminar
para as linhas de expansão renovadora do ensino médio brasileiro.
Dois tipos de escola média eram nele previstas: Escolas Compreen-
sivas ou Integradas de Ensino Médio; Escolas Especializadas.
Nas primeiras se promoveriam, sôbre a mesma base física e direção
unificada, educação geral (em cursos e classes comuns), programas
eletivos ou opcionais para habilidades práticas e programas mais avan-
çados em matérias acadêmicas. Em cada núcleo urbano de 5.000 habi-
tantes e para cada grupo de 25.000 habitantes nas grandes cidades, seria
criado um Centro compreensivo do ensino médio. A tônica dos cursos
eletivos seria dada conforme a sua localização em áreas industrializadas
ou agrícolas. A especialização estrutural de cursos diferenciados adviria
só no 2.° ciclo. Nas áreas rurais se preveria o regime de internato ou
semi-internato para alunos aptos, de cidades circunvizinhas.
Nas segundas, isto é, nas escolas médias especializadas, a saber,
secundária, industrial, comercial, agrícola, normal poder-se-ia tentar
uma programação mais ou menos assim:
a) primeiro ciclo: educação geral comum a todas elas, com diver-
sificações apenas de algumas atividades eletivas, reservada a especiali-
zação de cursos ao segundo ciclo;
b) desenvolver, para aproximadamente 40% da população esco-
larizável de 12 a 18 anos, tipos de moderna escola secundária acadê-
mica, nos quais se concedesse bastante ênfase aos estudos de ciências
naturais e sociais;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

c) desenvolver, para cerca de 30% da população escolarizável


correspondente, escolas de ensino industrial, comercial e normal, pre-
parando para o magistério primário e para atividades comerciais e
industriais de nível médio;
d) organizar, modernizada que fosse a estrutura agrária brasi-
leira, o ensino de agricultura de nível médio, capacitando-o a receber
aproximadamente 10% da população escolar de nível médio;
e) atender a 20% da população escolar de nível médio nos Cen-
tros Educacionais de Nível Médio (Escolas Compreensivas) ;
f) expandir cursos do tipo dos ministrados pelo SENAI e SENAC,
fornecendo boa cultura ao nível do 1.° ciclo do ensino médio e preparo
técnico para atividades industriais e comerciais.

Três anos já decorridos da publicação desse estudo, algumas re-


flexões e observações posteriores nos conduziram a algumas conside-
rações adicionais a esse primeiro esquema. São elas, esquemàticamente:
a) no ensino industrial: necessidade de estudos para definir a
proporção de escolas ministrando cultura geral, como o preparo técnico
realizado fora delas, mediante convênio de cooperação com indústrias
e a proporção daquelas ministrando simultaneamente cultura geral e
preparo técnico, êste complementado embora com estágios na indústria;
b) no ensino comercial: necessidade de estudos para apurar se,
e em que medida, sua organização curricular no segundo ciclo contri-
buiria para possível desvantagem dos seus alunos no paralelo com
aquêles provindos da escola secundária quanto à cultura geral (em
têrmos gerais) e prejudicaria, por excessivamente ambiciosa e cumula-
tiva, ou por inoportunidade, a cultura técnica visada;
c) no ensino médio: necessidade de estudos sôbre a conveniência
de adoção simultânea de uma escola média "terminar', de sete ou mais
anos preparando os quadros médios do país, indispensáveis e pratica-
mente inexistentes, com uma outra de seis anos não "terminal", finda
a qual o aluno estaria apto e obrigado a ingressar em amplos Colégios
Universitários ou em Cursos Pré-Universitários, intermediários e adap-
tativos à transição entre os ensinos médio e superior, para fazer a sua
preparação especializada ao ingresso nos quadros do ensino superior.
Claro que baveria intercomunicação entre essas duas escolas, nada
impedindo Outrossim que, concluída a escola média "terminal", bus-
casse o aluno o caminho de ingresso no ensino superior.
Logicamente, idéias como as acima afloradas estariam a exigir
mais estudos, pensamento, observação, análises e também debates mais
aprofundados.
E X A M E E R E D E F I N I Ç Ã O DO C O N C E I T O DE C Á T E D R A
NO ENSINO SUPERIOR

PAULO ERNESTO TOLLE


Do Cons. Est. de Educação de S. Paulo

"É preciso, de fato, que as universidades e as escolas


s u p e r i o r e s . . . r e e x a m i n e m e redefinam o conceito de
cátedra, visando e n r i q u e c e r esta última em seu conteiído
e a t e n u a r a rigidez de suas fronteiras p a r a o fim de se
incluírem, ao lado do catedrático, outros tipos de do-
c e n t e s . . . " (Prof. A . d e Almeida J ú n i o r ) .

A CÁTEDRA NA CONSTITUIÇÃO E NA LEI DE DIRETRIZES E BASES


1. E n t r e outras disposições, vetou o P r e s i d e n t e da República o art. 75
da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e, c o e r e n t e m e n t e ,
o art. 1 1 3 . O Congresso m a n t e v e o p r i m e i r o veto, p o r é m rejeitou o
segundo.
Em seu texto definitivo, a L . D . B . faz referência a " c á t e d r a " ou
a " c a t e d r á t i c o " em três artigos: o já citado art. 113, q u e contém dispo-
sição transitória, relativa aos concursos p a r a p r o v i m e n t o de cátedras
com inscrições já encerradas na data da vigência da lei; o art. 76, que
m a n d a escolher " d e n t r e os professôres catedráticos efetivos em exer-
cício" os diretores dos estabelecimentos oficiais de ensino superior
(federais) ; e o art. 80, que na alínea " d " do seu § 2.° inclui, na con-
ceituação de autonomia administrativa das Universidades, a faculdade
de " n o m e a r catedráticos ou indicar, nas universidades oficiais, o can-
d i d a t o aprovado em concurso, p a r a nomeação pelo g o v e r n o " .
2. Cátedra, no ensino superior — oficial ou livre, será s e m p r e provida
p o r concurso de títulos e p r o v a s : m a n d a - o a Constituição brasileira,
art. 168, item V I .
3. Mestres de r e n o m e têm defendido, com b r i l h a n t i s m o , a " c á t e d r a "
e o " c a t e d r á t i c o " , do ponto-de-vista j u r í d i c o . Raros, no e n t a n t o , são
os argumentos de o r d e m educacional q u e se têm oposto às i n ú m e r a s
críticas feitas à estruturação do ensino tendo a cadeira como u n i d a d e
universitária básica — e u n i d a d e perfeita — " t h e inonad of w h i c h Fa-
culties are constructed", na frase de A t c o n . 1 N a d a de valor transcen-
1
Rodolf P. Atcon, "The American Latin University — a key for an integrated
approach to the coordinated social, economic and educational development of Latin
America", in Die Deutsche Universitate Zeitung, 2/1962, Frankfurt) .
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 165

dental será realizado em larga escala na universidade latino-americana,


afirma o autor citado, a menos que e até que o monopólio da " c a d e i r a "
seja q u e b r a d o " .
4. Grifamos, no trecho transcrito, aquilo q u e r e a l m e n t e p o d e o sis-
tema «le cátedras apresentar de prejudicial — r e u n i ã o de professôres
a que Atcon c h a m a "aliança de lordes soberanos", e em que cada um
deles "holds the chair for life", n a d a p o d e n d o acontecer, em seu campo
profissional, sem que assim o diga ou o p e r m i t a , do q u e resulta, para
citar como exemplo u m a cátedra de Química Orgânica em Escola de
F a r m á c i a , ser êle " m o r e t h a n Just t h e only teacher of organic chemistry.
F o r ali purposes, be is organic c h e m i s t r y " . É o privilégio exclusivo
sôbre um assunto, em u m a escola, o que deve ser e l i m i n a d o .
Mas, h a v e r á necessidade de e m e n d a constitucional p a r a eliminar
o obstáculo? Será, o privilégio, inerente à figura do catedrático? Que é,
afina], c á t e d r a ?

O PONTO-DE-VISTA DO CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO

1. A cátedra no ensino superior, m a t é r i a de i n ú m e r a s discussões antes


da elaboração do projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional e d u r a n t e sua t r a m i t a ç ã o no Congresso, continua a empolgar
a atenção dos e d u c a d o r e s .
Um breve exame dos t r a b a l h o s do Conselho F e d e r a l de Educação
revela que aquêle órgão de cúpula do ensino no país, após exaustivo
debate sôbre o p r o b l e m a , t o m o u p r u d e n t e posição de receptividade às
novas (no Brasil) idéias a respeito da organização da carreira docente,
sem opor-se frontalmente ao tradicional sistema de " c á t e d r a s " , deixando
às universidades e escolas superiores isoladas •—• mais u m a vez lhes
prestigiando a a u t o n o m i a — a opção e n t r e as duas orientações e, m e s m o ,
sua conciliação.
2. Extensa nota trata do assunto, nas páginas 5 a 32 do n.° 13 (Abril
de 1963) de Documenta, publicação do Conselho F e d e r a l de E d u c a ç ã o .
T e n t a r e m o s resumi-la:

a) Em 5-3-1963 foi aprovado o P a r e c e r n.° 6 3 / 6 3 , da Comissão


de Ensino Superior, relativo ao Regimento da F a c u l d a d e de Ciências
Econômicas de São Leopoldo, o n d e o corpo docente abrangeria duas
classes — a dos professôres " c o n t r a t a d o s " e a dos auxiliares de e n s i n o .
O parecer sugeria revisão - e inclusão da figura do professor catedrá-
tico, "a menos que os arts. . . . não signifiquem uma opção pelo sistema
de "cadeiras" ou "cátedras".

2
"Como o contrato é simples forma de admissão, em vez de posto de hierar-
quia docente, conviria que essa classificação fosse revista".
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

C o n t r a o i t e m citado v o t a r a m os conselheiros A l m e i d a J ú n i o r e
A j a d i l d e Lemos, p o r e n t e n d e r e m q u e n ã o p o d e h a v e r opção e n t r e
a d o t a r ou n ã o o sistema de c á t e d r a s , a seu ver o b r i g a t ó r i o .
b) E m longo p r o n u n c i a m e n t o , c o n t r á r i o a o e n t e n d i m e n t o d a q u e -
les dois m e m b r o s do Conselho, a f i r m o u o conselheiro M a u r í c i o R o c h a
e Silva n a d a existir na Lei de Diretrizes e Bases q u e " i n s t i t u a taxativa-
m e n t e a o b r i g a t o r i e d a d e do sistema de c á t e d r a s e, ipso jacto, da cate-
goria do seu o c u p a n t e , o professor c a t e d r á t i c o . . . N ã o é contra a exis-
tência de c á t e d r a s , o n d e f o r a m elas estabelecidas, q u e me insurjo, é
c o n t r a essa a b s u r d a e descabida o b r i g a ç ã o de se i n s t i t u i r o r e g i m e de
c á t e d r a s e m todas a s u n i v e r s i d a d e s e escolas i s o l a d a s " 3 . . .
Sugeria, o D r . R o c h a e Silva, a adoção de d a d o c r i t é r i o , q u a n t o à
exigência da categoria de professor c a t e d r á t i c o vitalício, no escalona-
mento da carerira do magistério.4

c) Em P a r e c e r n.° 260, o Conselheiro Clóvis Salgado afirmou q u e


"a lei n ã o exige e x p r e s s a m e n t e o c a t e d r á t i c o nas escolas privadas e

3
Disse, também, o Professor Maurício Rocha e Silva: "Todos os artigos em
que se encontrava a idéia de cátedra como unidade básica de ensino superior,
foram sabiamente v e t a d o s . . . e o veto a c o l h i d o . . . O caput do art. 74, vetado,
dizia apenas o seguinte: "O ensino das disciplinas obrigatórias... será ministrado
por professor catedrático... "Ora, é precisamente um artigo redigido dessa ou de
maneira análoga o que falta à lei para tornar o cargo de professor catedrático
obrigatório nas carreiras de magistério de todas as universidades ou escolas iso-
l a d a s . . . " . E mais adiante: "O argumento fundamental de que c o m . . . isso se
procura preservar a liberdade de ensino é um mito ou mero sofisma, que só tinha
algum sentido quando a cátedra se confundia com o catedrático: a cátedra era o
catedrático... Hoje, a cátedra estendeu-se e se transformou no Departamento. Em
muitos dêsses Departamentos trabalham 10 a 20 pessoas, entre assistentes, auxiliares
de ensino e professôres adjuntos. Ora, o que se entende por liberdade de cátedra
aplica-se apenas a um único indivíduo, o catedrático onipotente. Todos os outros
devem seguir documente a batuta do catedrático... Vetando o art. 7 4 . . . o Senhor
Presidente da República quis deixar claro q u e . . . no caso de haver cátedras, serão
preenchidas por concurso de títulos e provas e só aquêles que vencerem tais
maratonas receberão o título de professor catedrático vitalício".
4
" I . A exigência será feita pará os Estatutos das Universidades oficiais
federais, que devem obrigatoriamente possuir professôres catedráticos, dentre os
quais serão escolhidos os Diretores de Faculdades, de acordo com o art. 76 da
Lei de Diretrizes e Bases.
I I . As Universidades que se organizarem na base de Fundações, terão a facul-
dade de introduzir nos Estatutos a categoria de Professor Catedrático e serão livres
de fazê-lo, cabendo a êste Conselho tão-somente verificar a legitimidade do processo
proposto para sua escolha, de acordo com o preceito constitucional do concurso
de títulos e provas.
I I I . As Universidades privadas e Escolas isoladas gozarão da mesma liber-
dade constante do inciso II desta Indicação.
IV. Quando constar dos Estatutos ou Regimentos das Universidades e Escolas
isoladas referidas nos incisos II e III, a categoria de Professor Catedrático, o Con-
selho Federal de Educação zelará para que constem dos referidos documentos os
processos adotados para a escolha daquele titular, o qual gozará da vilaliciedude
nos têrmos do art. 168 da Constituição F e d e r a l " .
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
oficiais dos Estados e Municípios. Torna-o indispensável à escolha do
Diretor das escolas oficiais federais. Assim, indiretamente o exige nessas
escolas" 5 .
d) Contra as opiniões dos Conselheiros Rocha e Silva e Clóvis
Salgado manifestou-se o Professor Almeida Júnior, em Parecer n.° 3,
de 1963,° transcrevendo trechos das opiniões que sôbre o assunto,
obtivera dos professôres Waldemar Ferreira, Miguel Reale (subscrito
pelo professor Mário Mazagão), Washington de Barros Monteiro e pelo
livre docente José Luiz de Anhais Melo.
e) Em novas considerações, o conselheiro Maurício Rocha e Silva,
depois de indagar da razão de ser de um Conselho Federal de Educa-
ção, constituído de educadores, "se os assuntos podem ser resolvidos
com uma simples consulta a um advogado de renome", lembrava que
a vitaliciedade se refere ao indivíduo e não à escola; c apontava o
conflito entre a idéia de Departamento e a de Cátedra;
f) O conselheiro D. Cândido Padim criticou a argumentação
baseada apenas em argumentos jurídicos, pois "o Conselho Federal
de Educação não é um tribunal de justiça" e assim, "desde que um
dispositivo legal apresenta um mínimo de dúvidas, possibilitando on
permitindo duas interpretações, o que deve prevalecer neste Conselho
é o atendimento das reais necessidades do ensino"; e propôs que se
distinga a situação das Faculdades oficiais e a das outras.
A matéria continuou em discussão, constando da ordem do dia da
reunião do mês seguinte, abril, o Parecer n.° 3/63, da Comissão de
Legislação e Normas, de autoria do Conselheiro Almeida Júnior, a
que já aludimos, contido nas páginas 15 a 27 do citado n.° 13 de

Tratando do '"departamento", entende o Dr. Clóvis Salgado que. "para o


perfeito funcionamento... a direção de um chefe eleito pelos seus pares, profes-
sôres não catedráticos, é a forma mais aconselhável. A direção confiada ao cate-
drático vitalício corre os riscos da tirania e da rotina". São as seguintes as con-
clusões do conselheiro, no seu parecer: "1.°) O catedrático deve existir, por força
de lei, nos estabelecimentos oficiais federais, de ensino superior. Essa exigência
não exclui a possibilidade do provimento interino da cátedra por professôres con-
tratados, não catedráticos. A oportunidade da abertura dos concursos para o provi-
mento efetivo é da competência das escolas. 2.°) O catedrático existirá ou não nos
estabelecimentos privados, e nos oficiais estaduais e municipais, de ensino superior,
os quais organizarão o corpo docente em seus estatutos e regimentos. Se figurar
o professor catedrático, sua escolha seguirá as normas legais específicas. Se excluído,
os diversos postos de carreira docente deverão ser galgados por sistema de mérito,
previsto nos estatutos e regimentos".
"Qual foi, realmente, o efeito visado pelo veto ao artigo7S?... O Presi-
dente reconhece... que deve haver concurso... pará o provimento efetivo da
cátedra... mas discorda da idéia de se fixar uma "forma" única de concurso.
O veto propôs ao Congresso (e o Congresso aceitou) que não houvesse "forma"
única e sim "diversidade de procedimento". De fato, suprimida a disciplina que
o art. 75 minudenciara, a formulação desse procedimento se transferiu para a
competência das universidades, mercê de sua autonomia".
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Documenta.7 Esse parecer foi aprovado na sessão de 6-6-1963, contra


o voto do Conselheiro Maurício Rocha e Silva.
3. Em o n.° 16 de Documenta — julho de 1963 encontra-se emenda
ao referido Parecer n.° 3/63, aprovada contra os votos dos conselheiros
Almeida Júnior, Francisco Maffei, J. Barreto Filho e Ajadil de Lemos.
De acordo com essa emenda, os estabelecimentos de ensino superior
não oficiais poderão organizar-se sem a criação de cátedras. 8
Alude, ainda a emenda a anteriores experiências, autorizadas
pelo Conselho, relativamente à carreira do professorado.
A busca de informes sôbre tais permissões nos levou ao conheci-
mento do caso da Universidade de Brasília, que constitui exemplo
bastante significativo da orientação seguida pelo Conselho Federal no
tocante ao problema dos catedráticos.
Está no Parecer n.° 152, das Comissões de Legislação e Normas
e de Ensino Superior, firmado pelo conselheiro Valnir Chagas, relator,
e subscrito pelos conselheiros Clóvis Salgado, Josué Monteiro, Ajadil
de Lemos e A. Almeida Júnior. Os dois últimos, como estamos lem-
brados, haviam votado contra o Parecer n.° 63/63 relativo à Faculdade
de Ciências Econômicas de São Leopoldo, e contra a emenda ao Pa-
recer n.° 3/63.
Foi a Universidade de Brasília instituída como fundação 9 e teve
seu Estatuto publicado a 19-12-1962.10
Dispõe a lei de criação, em seu art. 15:
"Os estatutos da Universidade organizarão a carreira do
magistério, escalonando os diversos cargos e os graus univer-
sitários correspondentes, observando, quanto ao provimento
efetivos das cátedras, o concurso de títulos e provas".
7
"Abordemos agora o ponto nevrálgico do debate: a questão de saber se
o inciso VI do art. 168 da Constituição Federal obriga, ou não, as escolas supe-
riores brasileiras a se organizarem sob a forma de '"cátedras", — cátedras essas
a serem providas por concurso. O Conselheiro Rocha e Silva diz que não obriga.
Quanto a mim, depois de demorada reflexão e, sobretudo, depois de ter ouvido
a palavra dos mestres, digo que obriga".
8
"Considerando que a Lei de Diretrizes e Bases, em seu art. 76, só prevê
a necessidade da instituição de "Professôres catedráticos" nos estabelecimentos
oficiais federais de ensino superior; Considerando que o texto do inciso VI do
art. 168 da Constituição se limita a disciplinar o provimento das cátedras; Consi-
derando que já se manifestam no meio universitário brasileiro evidentes anseios
no sentido de se empreenderem novas experiências em relação à carreira de pro-
fessor universitário, algumas já autorizadas por êste Conselho: Somos de parecer
que os estabelecimentos de ensino superior não oficiais poderão instituir, para a
carreira de Professor, modalidade própria, julgada idônea por êste Conselho ou
pelo órgão competente para a aprovação de seu regimento".
Cabe observar que, embora o parecer, no seu parágrafo conclusivo, mencione
os estabelecimentos "não oficiais", em geral, o primeiro dos "consideranda" se
refere explicitamente aos estabelecimentos oficiais federais, únicos a que a lei
impõe a instituição de "professôres catedráticos".
9
Lei n.° 3.998, de 15-12-1961.
10
Diário Oficial, pp. 12.999-13.003.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

O Estatuto não faz, em n e n h u m de seus artigos, q u a l q u e r refe-


rência a professor c a t e d r á t i c o . 1 1 Tão-sòmente no título V I I I —• "Das
Disposições transitórias", o art. 92 p r e v ê :

"Os casos omissos no presente Estatuto serão resolvidos


pelo Conselho Diretor, que t a m b é m decidirá sôbre o início da
execução do disposto no art. 15, in fine, da Lei n.° 3.998, de
15 de d e z e m b r o de 1 9 6 1 " .

Pois b e m : as Comissões de Legislação e N o r m a s e de Ensino Su-


p e r i o r do Conselho F e d e r a l de Educação, no citado P a r e c e r n.° 152,
depois de m e n c i o n a r que as n o r m a s estabelecidas pela Lei n.° 4.024,
de 20-12-1961 foram observadas de m o d o geral, a l u d e m aos artigos que
"disciplinam a carreira do magistério sem incluir a figura do catedrá-
tico", e ao acima transcrito art. 92, o qual, como vimos, a t r i b u i ao
Conselho Diretor da Universidade o poder de decidir sôbre o início
da execução do dispositivo legal relativo às cátedras, e assim c o n c l u e m :

"O p a r c e l a m e n t o dêste dispositivo resulta, parece-nos, da


idéia mais geral que é mesmo a tônica do E s t a t u t o : a institui-
ção de um p e r í o d o de funcionamento e x p e r i m e n t a l em q u e se
colherão elementos p a r a as soluções mais definitivas da se-
g u n d a e t a p a . N a d a a o p o r . Com ressalva das restrições apre-
sentadas, somos pela aprovação do Estatuto da Universidade
de Brasília".

4. Evidencia-se que, n ã o obstante os pareceres dos abalizados juris-


consultos em q u e se a p o i a r a m os opositores do conselheiro Maurício
R o c h a e Silva, resolveu o Conselho F e d e r a l de E d u c a ç ã o l i m i t a r aos
estabelecimentos oficiais federais a instituição de cátedras, c mesmo
em instituição como a Universidade de Brasília, criada pelo Govêrno
F e d e r a l , p e r m i t i r a procrastinação, por t e m p o i n d e t e r m i n a d o , do pro-
vimento d e c á t e d r a s .

A MANIFESTAÇÃO DE JURISCONSULTOS FAVORÁVEL AOS CATEDRÁTICOS

1. E n c o n t r a m o s nas páginas 36 a 46 do n.° 15 de Documenta ( J u n h o


de 1963), os pareceres dos Doutores W a l d e m a r F e r r e i r a , Miguel Reale,
W a s h i n g t o n de Barros Monteiro e José Luiz de A n h a i s Melo.
2. P a r a o professor W a l d e m a r F e r r e i r a , a Constituição exige concurso
de títulos e provas no ensino superior oficial ou livre, q u e n ã o pode ser

11
O Título VI, "Dos Corpos Universitários", contém apenas dois capítulos
— "Do Corpo Docente", com 11 artigos, e "Do Corpo Discente", com 2 artigos;
o primeiro trata da carreira do magistério e dos cargos que esta compreende.
170 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

dispensado, não devendo, pois, q u a l q u e r escola superior brasileira


prover suas cátedras p o r o u t r a f o r m a . 1 2
Em seu parecer, o conspícuo jurista afirma o que não é negado
por n i n g u é m : que cátedra pressupõe concurso; que só m e d i a n t e apro-
vação em concurso p o d e alguém ser c a t e d r á t i c o ; que professor cate-
drático, n o m e a d o p o r concurso, é vitalício.
A d m i t e , no e n t a n t o , haja, no ensino superior, professor não cate-
d r á t i c o : "assistente, colaborador, ou o que possa ser". Nem p o d e r i a
deixar de o fazer, pois o p r ó p r i o texto constitucional, tantas vezes
invocado em abono do sistema de cátedras, prevê, no ensino superior,
a existência de "cargos de m a g i s t é r i o " . 1 3
A n t e r i o r m e n t e à Constituição de 1946, as " c a d e i r a s " da Escola
Nacional de Educação Física da Universidade do Brasil e r a m providas
por "extranumerário mensalista".14
P o s t e r i o r m e n t e ao início da vigência da Constituição, o Decreto
n . ° 27.426, de 14-11-1949, r e g u l a m e n t a n d o a Lei n.° 775, de 6-8-1949,
q u e dispõe sôbre o ensino de enfermagem, previu que o ensino seria
m i n i s t r a d o p o r professôres contratados (art. 20, 1) em relação a ma-
térias que constituem cadeiras privativas (art. 5.° e art. 40) .
T a m b é m posterior à Constituição é a classificação dos cargos pú-
blicos federais, e n t r e os quais se incluem, além dos de professor cate-
drático, os de "professor de ensino superior", "assistente de ensino
superior", " i n s t r u t o r de ensino s u p e r i o r " e "professor de ensino agrí-
cola".15
Não há, pois, i m p e d i m e n t o de o r d e m constitucional, ou de lei. à
existência, no magistério superior, de cargos com denominação dife-
r e n t e da de "professor c a t e d r á t i c o " .

12
" . . . Em nenhuma escola de ensino superior... a ninguém assiste direito
para ser provido em qualquer de suas cátedras sem que se submeta... a con-
curso... Esse concurso é que dá ingresso... aos professôres catedráticos. Professor
sem concurso poderá ser assistente, colaborador ou o que possa ser. Professor
catedrático, não... Em face do art. 168. n.° VI, da Constituição Federal... não
pode... dispensar quaisquer escolas... de prover as suas cátedras, senão por con-
curso... ninguém... poderá ser professor catedrático... sem ser aprovado em
concurso... Não pode ser negada a vitaliciedade a quem, por concurso... tenha
sido provido em cadeira do ensino superior"...
13
Constituição, art. 96: "É vedado ao juiz: I — exercer... qualquer outra
função pública, salvo o magistério secundário ou superior"... Art. 185: "É vedada
a acumulação... exceto a prevista no art. 96, n.° I, e a de dois cargos de magis-
tério ou a de um destes com outro técnico"...
14
Decreto-lei n.° 1.212, de 174-1939. modificado pelo Decreto-lei n.° 7.781,
de 26-7-1945. que deu ao art. 15 a seguinte redação: "Art. 15. As cadeiras d e . . .
serão providas por extranumerário mensalista. admitido nos têrmos da legislação
vigente. — Parágrafo único. Os professôres admitidos na forma dêste artigo con-
sideram-se investidos das mesmas atribuições conferidas aos professôres catedráticos
em geral".
15
Lei n.° 3.780, de 12-7-1960.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

3. O insigne mestre e ilustre m e m b r o do Conselho E s t a d u a l de Edu-


cação, Professor Miguel R e a l e , afirma q u e a conclusão de q u e é facul-
tativa a criação de c á t e d r a s pressupõe " u m a exegese estrita do a r t . 168,
n.° V I , da Constituição F e d e r a l , ao a r r e p i o da i n t e r p r e t a ç ã o t r a d i c i o n a l -
m e n t e d o m i n a n t e . 1 6 "O r e g i m e das c á t e d r a s vitalícias", prossegue o
Professor R e a l e , " r e p r e s e n t a u m a opção p o r u m sistema institucional
de ensino, f u n d a d o em exigências a q u e o legislador quis a t e n d e r " . 1 '
Verificamos q u e nosso professor Miguel R e a l e parece a d m i t i r a
existência, no m a g i s t é r i o superior, de outros professôres além dos cate-
dráticos (as c á t e d r a s são "os cargos docentes fundamentais") —• o q u e
p r o c u r a m o s sustentar n o c o m e n t á r i o a o p a r e c e r d o professor W a l d e m a r
F e r r e i r a — m a s q u e , ao m e s m o t e m p o , p a r e c e r e s e r v a r ao catedrático
o direito à l i b e r d a d e de c á t e d r a . A q u i , ousamos discordar, data venia.
T r a t a n t o dos princípios q u e a legislação do e n s i n o a d o t a r á , o artigo
168 da Constituição a l u d e , no i t e m V I , ao p r o v i m e n t o das cátedras e
à vitaliciedade dos catedráticos a d m i t i d o s p o r c o n c u r s o . Exigência de
concurso e d i r e i t o à vitaliciedade estão a b r a n g i d o s no m e s m o i t e m . Em
o u t r o item, no e n t a n t o , o de n.° V I I , do m e s m o a r t i g o , é g a r a n t i d a a
liberdade de cátedra.
Não se c o n f u n d e m vitaliciedade e l i b e r d a d e de c á t e d r a . À p r i m e i r a
só terá direito o professor c a t e d r á t i c o , a d m i t i d o p o r concurso de títulos
e p r o v a s . " Mas " l i b e r d a d e d e c á t e d r a " só p o d e ser e n t e n d i d a como

10
"Nenhum corpo docente pode ser estruturado sem que no alo constitutivo
da entidade universitária fiquem claramente previstos os seguintes pressupostos:
a) criação de cátedras, ou seja, de cargos docentes fundamentais, destinados a serem
ocupados por professôres ein caráter vitalício, com liberdade de pesquisa e ensino;
h) provimento... mediante c o n c u r s o ; . . . c) caráter provisório do exercício da
cátedra por quem não se tenha tornado titular graças a concurso; d) obrigatoriedade
de concurso'"... (Os grifos não são do original).
17
" . . . como sejam: a) garantia de vitaliciedade aos membros do corpo
d o c e n t e . . . a fim de serem postos a cobro de perseguições políticas e ideológicas,
em salvaguarda da liberdade de cátedra;... b) obrigatoriedade de concurso...
evitando-se as escoliias de mero favor ou simpatia; c) . . . em se tratando de
entidades mantidas pelos cofres p ú b l i c o s . . . a necessidade de uma forma de seleção
que atenda ao princípio constitucional segundo o qual "os cargos públicos são
acessíveis a todos os brasileiros". (Os grifos não são do original.)
18
Alaim de Almeida Carneiro, em trabalho publicado na Revista de Direito
Administrativo, vol. 13, 1948, pp. 507-313 ("Os funcionários públicos e a Consti-
tuição — art. 187"), mostra que a associação cátedra-vitaliciedade. necessária no
passado e cabível ainda no regime constitucional de 1934, não mais se compreende
a partir da carta de 1937, que institui a estabilidade dos funcionários. Escreve êle:
"A nova Constituição, e n t r e t a n t o . . . reproduziu os preceitos referentes à estabili-
dade. insertos no diploma de 1937, e os de vitaliciedade de 1934! Por certo, os
defensores da prerrogativa antidemocrática reproduzirão os argumentos repelidos
por Bentham: a vitaliciedade é essencial para assegurar a independência da cátedra.
A isso se poderá responder que, com o mesmo argumento, seria de conceder a
vitaliciedade a inúmehos outros servidores públicos por cuja independência fun-
cional não é menos necessário zelar. Acresce considerar que, com esse objetivo,
a medida seria inoperante. De que vale a conservação do cargo sem a inamovibili-
dade, a irredutividade de vencimentos e a imunidade disciplinar?"
172 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

l i b e r d a d e de ensino, e n ã o é só o catedrático que a ela faz j u s . Seria


monstruoso a d m i t i r que o catedrático interino, e p o r t a n t o ainda n ã o
vitalício, ou o professor c o n t r a t a d o p a r a regência de cadeira, n ã o
dispusesse daquela prerrogativa indispensável ao exercício do magis-
tério, q u e é essa l i b e r d a d e , l i m p i d a m e n t e definida como a que tem o
professor p a r a " a d o t a r os métodos pedagógicos q u e lhe p a r e ç a m mais
conveniente e esposar, na m a t é r i a q u e ensina, doutrinas científicas de
sua convicção". 1 9
À l i b e r d a d e de cátedra t ê m direito n ã o só o o c u p a n t e eventual da
cátedra, como t a m b é m o docente, o assistente, o professor associado,
o funcionário público t i t u l a r de cargo, não cátedra, de professor de
ensino superior, e mais "o que possa ser" o professor n ã o c a t e d r á t i c o .
Exercício de função de magistério e l i b e r d a d e de cátedra são, estas
sim, expressões que "conjugam-sc n u m a indissolúvel".
Incluímos em a n t e r i o r transcrição parcial do parecer do p r e c l a r o
Dr. Miguel Reale, sua referência à exigência de concurso como cum-
p r i m e n t o do princípio constitucional segundo o q u a l "os cargos públicos
são acessíveis a todos os brasileiros" (art. .184) .
Concordamos p l e n a m e n t e , e acrescentamos, o que nos parece opor-
tuno, que a mesma Constituição de 1946 exige que "A p r i m e i r a inves-
t i d u r a em cargo de carreira e em outros que a lei d e t e r m i n a r efe-
tuar-se-á m e d i a n t e c o n c u r s o " . .. Concurso é, pois, a salutar m e d i d a
que visa instituir o sistema do m é r i t o c abolir o nepotismo, no provi-
m e n t o de qualquer cargo de carreira, b e m como em outros cargos que
a lei determinar. Ora, a estruturação de uma carreira do professorado
de ensino superior é u m a das condições que se nos afiguram indispen-
sáveis ao a p r i m o r a m e n t o do estrutura universitária b r a s i l e i r a ; criada
que seja a carreira do professor, sem a qualificação " c a t e d r á t i c o " , a
investidura inicial se fará, p o r m a n d a m e n t o constitucional, m e d i a n t e
c o n c u r s o ; e se fôr j u l g a d o necessário novo concurso p a r a o acesso de

10
Já tivemos oportunidade de citar, em reunião da Câmara de Ensino Su-
perior do Conselho Estadual de Educação de São Paulo, o Parecer n.° 393/49, do
antigo Conselho Nacional de Educação, assinado em 14-1049 pelos conselheiros
Cesário de Andrade, relator, A. Almeida Júnior e João Carlos Machado: "O con-
ceito de liberdade sempre foi relativo, nunca absoluto, de sorte que o legislador
nunca o teria tomado além de sua interpretação jurídica, que a tem como um
bem, que deve ser gozado por todos nos limites traçados pelo direito alheio. Não
pode ser amparada a liberdade quando o seu uso fere os princípios jurídicos esta-
belecidos e causa, por conseguinte, um mal, quer individual, quer coletivo. Não
seria, portanto, dado ao professor, em nome da liberdade, o direito de servir-se de
sua cátedra para pregar ideologias não só contrárias às instituições políticas do
país, como ofensivas à moral social. Abusa também, da liberdade, o professor, que
pretende subjugar os seus alunos a seu exclusivo modo de pensar, porque a liber-
dade que lhe é assegurada é a de adotar os métodos pedagógicos que lhe pareçam
mais convenientes, e esposar, na matéria que ensina, doutrinas científicas de sua
convicção". (In, Carlos Souza Neves, Ensino Superior no Brasil, vol. IV, p. 218) .
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

uma o u t r a categoria, 2 0 tal exigência se p o d e incluir na lei que orga-


nizar a c a r r e i r a , ou em o u t r a que assim o d e t e r m i n a r .
P r o p o r q u e se aceite, em escola superior oficial federal, a criação
de cargos de magistério com denominações diferentes, ao lado dos de
professor c a t e d r á t i c o ; ou que se faça funcionar instituição de ensino
superior, n ã o federal, com um q u a d r o docente em que inexista a figura
do catedrático, — n ã o significa a b o n d o n o do sadio sistema de seleção
e admissão m e d i a n t e concurso. Assim, q u a n d o o Conselheiro Dr. Reale
diz q u e haveria "fraude à lei, se se cogitasse de criar cargos com todos
os requisitos das " c á t e d r a s " , n o t a d a m e n t e q u a n t o aos estipêndios e van-
tagens, m a s se evitando tal designação p a r a evitar-se o concurso que a
Constituição exige" — concordamos prazerosamente com o preclaro
mestre, e apressamo-nos a declarar que não defendemos essa "fraude
à lei", q u e aceitamos, inclusive no caso de instituições particulares, o
concurso exigido pela Constituição e que, no caso de estabelecimentos
oficiais é, mesmo, m a n d a m e n t o constitucional para os cargos de carreira
e outros q u e a lei d e t e r m i n a r . E esclarecemos que, " c r i a r cargos com
todos os requisitos das " c á t e d r a s " , n o t a d a m e n t e q u a n t o aos estipêndios
e vantagens", não constitui, necessariamente, intuito de "evitar-se o con-
curso q u e a Constituição e x i g e " .
O professor Reale, depois de transcrever os dois períodos que inte-
gram o i t e m VI do art. 168 da Consituição, e de dizer que eles "con-
jugam-se n u m a u n i d a d e lógica indissolúvel, fazendo corresponder à
obrigatoriedade do concurso a prerrogativa da vitaliciedade", assevera
q u e "reforça-se esse b i n ô m i o "concurso-vitalidade", q u a n d o se pensa
q u e se l h e confere a alta responsabilidade da l i b e r d a d e de cátedra, q u e
é um apanágio da d e m o c r a c i a " . . .
Já fizemos ousados r e p a r o s à contradição existente em o u t r o
b i n ô m i o — " d e m o c r a c i a " e "monopólio-da-liberdade-de-ensino-pelo-
catedrático".
Transcrevemos, q u a n t o à vitaliciedade, trechos de lúcido comen-
tário de A l a i m de A l m e i d a C a r n e i r o . Cabem, no e n t a n t o , algumas
ponderações adicionais.
A Constituição federal (art. 188, n.° I) assegura aos funcionários
efetivos, n o m e a d o s p o r concurso, a estabilidade depois de dois anos de
exercício.21
O u t r o preceito constitucional já citado, o n.° V I I , do art. 168, asse-
gura a l i b e r d a d e de c á t e d r a .

20
Por exemplo, de instrutor a professor-assistente; dêste, a professor asso-
ciado; dêste, a professor pleno.
21
Oswaldo Aranha Bandeira de Melo, na Revista de Direito Administrativo,
vol. 22, out.-dez.-1950, pp. 507-513, cita a lição de Pontes de Miranda (Comentários
à Constituição de 1946, vol. IV, p. 148), segundo a qual o texto constitucional
mencionado é de aplicação aos funcionários estaduais e municipais.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

E n t e n d e m o s , como já foi dito, que a l i b e r d a d e de cátedra se estende


ao professor não catedrático; e que êste, q u a n d o n o m e a d o , p o r concurso,
p a r a cargo de magistério, está nesse respeito suficientemente assegurado
em sua imprescindível i n d e p e n d ê n c i a no exercício da docência.
De fato, a única diferença e n t r e a situação daquele professor e a
de um catedrático é que êste, p o r q u e vitalício, p e r d e r á o cargo somente
em v i r t u d e de sentença judicial (art. 189, I) e n q u a n t o o p r i m e i r o ,
p o r q u e estável, p o d e r á p e r d e r o c a r g o : a) em virtude de sentença j u d i -
ciária; b) no caso de se extinguir o cargo ( q u a n d o ficará em disponibi-
lidade r e m u n e r a d a até o seu obrigatório aproveitamento em o u t r o cargo
de natureza e vencimentos compatíveis com os do que ocupava) ; c) no
caso de ser d e m i t i d o , m e d i a n t e processo administrativo em que se l h e
t e n h a assegurado a m p l a defesa (Constituição, art. 189, II e parágrafo
ú n i c o ) . Mais: ainda que d e m i t i d o , se o ato de demissão fôr invali-
d a d o p o r sentença, será aquêle professor, não catedrático, reintegrado
(art. 1 9 0 ) .
Onde estará, então, o cerceamento à independência de um professor
que age de conformidade com a lei e observando o conceito de l i b e r d a d e
constante do já citado P a r e c e r 393/49 do antigo Conselho Nacional de
Educação?
Ainda o ínclito professor Reale considera que o preceito constitu-
cional do art. 168, n.° VI, " p r o v é m em linha reta do art. 158 da Consti-
tuição de 1934, cujo teor é u m a diretriz segura p a r a a m e l h o r com-
preensão do preceito ora vigente". 2 2
Muito a contragosto incidimos, de novo, no atrevimento de divergir
do m e s t r e . Não vemos, no preceito constitucional vigente, derivação
direta do correspondente artigo da Constituição F e d e r a l de 1934. Ao
contrário, quer-nos parecer que, e n q u a n t o aquela englobava, no caput
de seu art. 158, todos os cargos de magistério oficial, a Carta de 1946,
no item VI do art. 168, circunscreve-se ao caso do p r o v i m e n t o de
cátedras, q u e n ã o constituem todos os cargos de magistério oficial.
4. O professor Washington de Barros Monteiro cita Tristão de Ataíde,
que em artigo asseverou tratar-se, o concurso, de instituição obsoleta,
em vigor apenas nos países subdesenvolvidos, e n ã o mais existente em
países de sistema educativo b e m o r g a n i z a d o . E logo acrescenta: "Entre-
t a n t o , em nosso meio, como l e m b r o u o mesmo autor, d a d o o péssimo
sistema do pistolão e do favoritismo, perigosa seria a abolição imediata
do concurso. Instalar-se-ia o sistema de livre nomeação, patrocinada
p o r certos próceres políticos c que é aquêle que m e l h o r se presta à
transformação do magistério em refúgio de incapazes".

22
Constituição de 1934, art. 158: "É vedado a dispensa do concurso de títulos
e provas no provimento dos cargos do magistério oficial;... § 1.°. Podem, todavia,
ser contratados, por tempo certo, professôres de nomeada, nacionais e estrangeiros;
§ 2.°. Aos professôres nomeados por concurso para os institutos oficiais cabem as
garantias de vitaliciedade nos cargos"...
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 175

L e m b r a , mais a d i a n t e , q u e "a Constituição F e d e r a ] de 16 de j u l h o


de 1934, art. 158, ia ao extremo de vedar expressamente a dispensa de
concurso no p r o v i m e n t o dos cargos do magistério oficial" (o grifo não
é do o r i g i n a l ) . 2 3
Parece-lhe certo que no ensino superior, " . . . em face da Consti-
t u i ç ã o . . . o ingresso dos professôres far-se-á indeclinàvelmente através
de concurso de títulos e provas", n ã o p o d e n d o a lei o r d i n á r i a "estabe-
lecer discriminações e n t r e as escolas e ater-se a diferentes critérios de
r e c r u t a m e n t o e investidura, a i n d a que sob qualificação diversa dos
docentes".
E n t e n d e haver í n t i m o e n t r e l a ç a m e n t o das idéias "ensino por pro-
fessôres catedráticos, admitidos m e d i a n t e concurso, com vitalicicdade
e l i b e r d a d e de c á t e d r a " e afirma que, se hão reunidos todos ou elimi-
n a d o um dêsses elementos, "cai p o r terra todo o plano sôbre o q u a l se
estuturou o e n s i n o . . . superior, oficial ou l i v r e " . 2 4
Afirma o ilustre j u r i s c o n s u l t o : " N ã o i m p o r t a o n o m e q u e se l h e
queira dar, mas q u e m prelecione do alto de u m a cátedra em caráter
p e r m a n e n t e , em escola superior, é professor c a t e d r á t i c o " . E mais
a d i a n t e : "nas escolas superiores, a ars docendi só p o d e ser desempe-
n h a d a por professôres catedráticos, credenciados p o r concurso de títulos
e p r o v a s . N ã o é possível condescender com docentes admitidos p o r
outra forma, e m b o r a sob qualificação d i f e r e n t e " .
Como o professor Miguel Reale q u e r o concurso p a r a que se evitem
"as escolhas de m e r o favor ou simpatia", t a m b é m ao professor Wash-
ington de Barros Monteiro r e p u g n a "o péssimo sistema do pistolão e
do favoritismo" q u e levaria "à transformação do magistério em refúgio
de incapazes". Apressamo-nos, mais u m a vez, a nos filiar à corrente
que almeja a instituição exclusiva do sistema do m é r i t o — não, p o r é m ,
sem l e m b r a r que a a u t o n o m i a universitária pode ser e em certos casos

23
Parece o ilustre jurista admitir, por um momento, que a Constituição de
1946 não vai ao extremo de exigir o concurso para todos os cargos do magistério
oficial.
Vai além o Prof. Barros Monteiro: "Uma vez que a Constituição exige a
presença de todos os elementos colocados no mesmo pé de igualdade, não é pos-
sível condescender-se com a dispensa de um deles, como o da liberdade de cátedra,
ou o de provimento mediante concurso, ou o de prelecionamento por professôres
não catedráticos". E diz ainda: " . . . seria uma burla o processo de investimento
que, para fugir à exigência do concurso, desse à cátedra ou a seu titular denomi-
nações diferentes das usuais"... Na parte final de seu parecer: "Não posso aderir
à idéia de que às Universidades organizadas sob a forma de Fundações, às Univer-
sidades Livres e às Escolas superiores isoladas, assistirá o direito de optar entre
instituir, ou não o cargo de professor catedrático, tornando-se obrigatório o concurso
apenas se afirmativa fôr a solução. Conquanto a Lei de Diretrizes... seja realmente
omissa sôbre a exigência do concurso... aí está o texto constitucional, na sua ampli-
tude e clareza, a compreender indistintamente todas as escolas superiores federais
ou estaduais, públicas ou particulares, ainda que organizadas sob a forma de
fundações".

4 — 34 901
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já é estruturada de forma a evitar aquêle perigo de "nomeação patro-


cinada por certos próceres políticos": se a nomeação depender apenas
de critérios de seleção instituídos e aplicados pelas Congregações ou
por outros órgãos de direção universitária, estão afastados aquêles
"certos próceres políticos". Mas, insistimos, não há obrigatória corre-
lação entre professor-não-catedrático e admissão-sem-concurso.
A insistente referência ao concurso não tem qualquer relação com
o problema que estamos procurando enfocar — o da possibilidade e
legalidade da existência de cargos de magistério empregando "denomi-
nações diferentes", sem que com isso se procure "fugir à exigência de
concurso" e assim configurar "burla no processo de investidura".
O insigne professor da Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo, mais radical que os outros jurisconsultos ouvidos, nega a
existência, no ensino superior, de outros elementos que não os cate-
dráticos. E afirma que a constituição exige a presença dos elementos
— cátedra, concurso, vitaliciedade, liberdade de cátedra — não podendo
qualquer um deles ser dispensado.
Em nosso humilde entender, ao contrário, a ars docendi pode e é
desempenhada por outros professôres além dos catedráticos, e a Cons-
tituição não só não o proíbe, como o prevê, mesmo, ao empregar, em
disposições diferentes, as expressões "professôres catedráticos" e "cargos
de magistério". 25
A liberdade de cátedra, já procuramos esclarecer, é assegurada a
todo o magistério — aos catedráticos efetivos, aos catedráticos interinos
ainda não vitalícios, aos regentes de cátedras (contratados) e aos demais
professôres. Na Lei de Diretrizes e Bases, o artigo que se relaciona com
o inciso VII do art. 168 da Constituição é o art. 4.°, no Título III ("Da
liberdade do ensino"), e que diz: "É assegurado a todos, na forma da
lei, o direito de transmitir seus conhecimentos". E o art. 71 da L . D . B .
estabelece que o programa de cada disciplina, sol) a forma de plano de
ensino, será oragnizado pelo respectivo professor. Não é à cadeira, mas
à disciplina, e não é ao professor catedrático, mas ao professor da dis-
ciplina, que a lei alude.
A interpretação do eminente jurista levaria a interpor graves obs-
táculos a tôda a estrutura preconizada na Lei de Diretrizes e Bases, no
tocante à organização dos currículos. Se apenas o currículo mínimo é

25
Edmundo Lins Neto, Consultor Jurídico do Ministério da Educação e Cul-
tura, em Parecer n.° 537/950, de 154-1950, escreveu: "Estabelece a Constituição
que "para o provimento das cátedras exigir-se-á c o n c u r s o " . . . Quer isto dizer que
as cátedras só podem ser providas, isto é, providas definitivamente, por concurso
de títulos e provas. Tanto é assim, que a parte final do artigo fala em "vitalicie-
dade" dos professores admitidos por concurso de títulos e provas, prevendo, dêste
modo, a contrario sensu, a possibilidade da admissão de outras espécies de pro-
fessôres (interinos, contratados, etc.) que não sejam vitalícios, que não ocupem,
em definitivo, a cátedra". (Carlos Souza Neves, op. cit., vol. 4, p. 319.)
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fixado pelo Conselho Federal de Educação, 26 cabendo aos estabeleci-


mentos de ensino desdobrar as matérias constitutivas do currículo; e
se a escolha c a modificação da parte complementar dos currículos se
incluem na faculdade da autonomia didática das Universidades, a exi-
gência de catedráticos para todas as matérias importaria em dificultar
a alteração do currículo quando se pretendesse criar matérias novas 27
e em impossibilitar a supressão de matérias que o progresso tenha tor-
nado obsoletas. 28
5. No parecer do Professor José Luiz de Atibaia Mello, é citada a
opinião de Themístocles Brandão Cavalcanti, de que o preceito da nova
Constituição "fechou desde a sua vigência, o ingresso no magistério, por
outro meio que o concurso de títulos e provas".
Concordando, afirma o Dr. Anhaia Melo que não há outro tipo
de investidura no ensino superior, que não o de cátedras.
O texto citado, de Themístocles Cavalcanti, se insere em parágrafo
no qual o constitucionalista patrício alude aos catedráticos já exis-
tentes, nomeados sem concurso, antes da vigência da nova Constituição.
Aliás, o professor Anhaia Melo transcreve todo o parágrafo, onde a
linha de raciocínio parece ser a de que o fechamento do ingresso "no
magistério" por outro meio que não o concurso, não diz respeito a
qualquer função de magistério, e sim ao provimento das cátedras.
Quanto à afirmação de que só existe investidura, no ensino supe-
rior, pela cátedra, parece não encontrar corroboração nos fatos e na
legislação, anterior e posterior à Lei Magna de 1946. 29
Opina o Dr. Anhaia Melo no sentido de que "há entre cátedra e
concurso uma ligação de ordem jurídico-constitucional inarredável"
(a ênfase é do original) . E declara que não vê "como se possa disjungir
as duas condições, a cátedra e a vitaliciedade, mesmo porque só o vita-
26
Mesmo nesse currículo mínimo fixo se admitem modificações, segundo o
princípio de que a flexibilidade é imprescindível à adequação do ensino à constante
evolução do conhecimento.
27
Exemplo do entrave, temos na Lei n.° 1.303, de 31-12-1950, que foi neces-
sária para que se criasse, na Faculdade Nacional de Filosofia, um cargo de pro.
fessor catedrático, corresponde à cadeira antes inexistente, de Física Nuclear.
Também por lei — a de n.° 2.311, de 3-9-1954, foi instituída em todas as Faculdades
de Filosofia do país a cadeira de "Etnografia Brasileira e Língua Tupi", dispondo
o art. 2.° dessa lei que, "Enquanto o Poder Executivo não enviar mensagem ao
Congresso Nacional solicitando a criação dos respectivos cargos, os lugares de pro-
fessor dessa disciplina serão exercidos mediante contrato"... Conforme o art. 3.°,
"Uma vez criados os cargos, serão eles providos mediante concurso"
A menos que adotado o oneroso critério de colocar em disponibilidade os
catedráticos das matérias eliminadas.
29
Além de leis e decretos que citaremos adiante, lembramos que o Decreto
n.° 35.956, de 2-8-1954, regulamentando os artigos 188 a 193 da Lei n.° 1.713, de
28-10-1952, definiu, no art. 4.°, cargo de magistério como aquêle "que tem como
atribuição principal e permanente lecionar em qualquer grau ou ramo de ensino,
legalmente previsto".
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lício tem a liberdade de cátedra. Não se pode admitir a liberdade de
cátedra para alguém que não seja vitalício, (o grifo não é do original)
E prossegue o insigne j u r i s t a : "O concurso é n o r m a e n t r e nós p a r a o
funcionalismo, que não se dirá p a r a um funcionalismo a l t a m e n t e téc-
nico e especializado como a classe dos professôres u n i v e r s i t á r i o s " .
A ligação " d e o r d e m jurídico-constitucional i n a r r e d á v e l " , existente
e n t r e cátedra e concurso, não é privativa da cátedra, como já pro-
curamos d e m o n s t r a r : está presente, com a mesma força, no p r o v i m e n t o
de q u a l q u e r cargo público de c a r r e i r a .
Concordamos que não "se possa disjungir as duas condições, a
cátedra e a vitaliciedade", q u e estão vinculadas no n.° VI do art. 168
da Constituição.
Data venia, p o r é m , n ã o nos parece válida a ilação de que, em
h a v e n d o concurso, há c á t e d r a ; n e m podemos aceitar a asserção de que
só o vitalício t e m a l i b e r d a d e de c á t e d r a ; como t a m b é m n ã o é certo
q u e só por concurso se a d q u i r e vitaliciedade.
6. De todo o exposto, t i r a n t e as afirmações de que a ars docendi só
p o d e ser d e s e m p e n h a d a p o r professôres catedráticos, e de q u e n ã o se
a d m i t e a l i b e r d a d e de cátedra p a r a alguém q u e n ã o seja vitalício,
parece não haver divergências insuperáveis e n t r e os luminosos pare-
ceres dos grandes jurisconsultos citados e o e n t e n d i m e n t o q u e obscura-
m e n t e vimos nos esforçando p o r e x p o r :
1.° — tôda cátedra do ensino superior oficial ou livre será provida
p o r concurso de títulos provas, segundo o m a n d a m e n t o da Consti-
tuição, art. 168, V I ;
2.° — todo estabelecimento oficial federal de ensino superior deve
ser dirigido por professor catedrático efetivo em exercício, n o m e a d o
na forma prevista no art. 75 da Lei de Diretrizes e Bases da E d u c a ç ã o
Nacional;
3.° — todo cargo público de magistério organizado em carreira,
ou criado ou regulado p o r lei o r d i n á r i a que assim o d e t e r m i n e , será
provido p o r concurso, segundo o art. 186 da Constituição;
4.° — não h á , na Constituição, na Lei de Diretrizes e Bases ou
em q u a l q u e r o u t r a disposição legal vigente, m a n d a m e n t o contrário à
criação de cargos ou funções docentes nos estabelecimentos de ensino
superior oficiais ou particulares, com denominação e características
diferentes das do "professor catedrático".

CADEIRA, MATÉRIA E DISCIPLINA

1. A instituição da cátedra — "was originally intended to protect t h e


t e a c h e r from t h e a r b i t r a r y incursions of a totalitarian executive"
(Rudolf Atcon, op. cit.) .
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A vitaliciedade do magistério é de nossa tradição administrativa,


escreve A. de Almeida Carneiro. 3 0
2. 0 decreto-com-fôrça-de-lei n.° 19.851, de 11-4-1931, dispondo sôbre
o ensino superior no Brasil, vincula a ''cátedra" à "disciplina" e per-
mite a existência de "cargo", de professor catedrático, para qualquer
das disciplinas. 31
Outro ato de igual força jurídica e da mesma data, o Decreto
n.° 19.852, tratou da organização da Universidade do Rio de Janeiro.
Na forma de seu art. 27, o curso de bacharelado em Direito compreen-
deria diversas "matérias", entre as quais Direito Civil, Direito Penal,
Direito Comercial, Direito Judiciário Civil e Direito Administrativo.
Poderia a Congregação instituir o ensino de outras "matérias" e au-
mentar o número de cadeiras (art. 30) ; mas, ressalvado o disposto no
art. 30, o ensino do Direito Civil se faria em quatro "cadeiras", o do
Direito Penal, o do Direito Comercial e o do Direito Judiciário Civil,
em duas; e o de cada uma das outras matérias, em uma cadeira
(art. 28) . Para cada "cadeira" haveria um "professor catedrático"
(art. 3 1 ) .
Neste caso, a "matéria" pode compreender uma "cadeira" ou mais
de uma, o que poderia levar à inferência de que, por exemplo, no caso
do Direito Civil, o fato de a "matéria" ser dada em quatro "cadeiras"
significaria que a cada uma das cadeiras corresponderia uma "disci-
plina", constituída por parte do Direito Civil.
No entanto, no Regulamento da Faculdade de Direito da Univer-
sidade do Rio de Janeiro, aprovado pelo Decreto n.° 23.609, de
20-12-1933, a mesma relação de matérias enunciadas no citado art. 27
do Decreto 19.852 é apresentada como relação de disciplinas (art. 3.°),
havendo, pois, para a mesma "disciplina" (Direito Civil) quatro
"cadeiras".
Ainda, a Lei n.° 114, de 11-11-1935, transferiu do curso de douto-
rado para o de bacharelado as "cadeiras" de Direito Romano e de
Direito Privado Internacional; a Lei n.° 176, de 8-1-1936 estabeleceu,
no curso de bacharelado, a "cadeira" de Direito Industrial e Legislação
do Trabalho; e o Decreto-lei n.° 2.629, de 27-9-1940 desdobrou a "disci-
plina" Direito Público Constitucional em duas (Teoria Geral do Estado

" . . . A lei de 11 de agosto de 1827 já declarava os professôres "proprie-


tários" de suas cadeiras... Acresce considerar que ao tempo daquela primeira lei,
não tendo sido ainda outorgado um "Estatuto" aos funcionários públicos, nem
fixado o conceito de estabilidade, foi aquêle o recurso encontrado para assegurar
a situação funcional dos professôres"... (v. nota 1 8 ) .
31
Art. 5 1 : "Para a inscrição ao concurso de professor catedrático o candi-
d a t o . . . deverá: I — apresentar d i p l o m a . . . de instituto onde se ministre ensino da
disciplina a cujo concurso se p r o p õ e " . . . Art. 57: "O provimento no cargo de
professor catedrático de qualquer das disciplinas"...
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e D i r e i t o C o n s t i t u c i o n a l ) , c o n s t i t u i n d o , c a d a u m a d a s disciplinas, o b j e t o
d e u m a cadeira e s p e c i a l , e c r i a n d o - s e , e m c o n s e q ü ê n c i a , o s r e s p e c t i v o s
cargos d e p r o f e s s o r c a t e d r á t i c o .
Volta-se, assim, a e m p r e g a r c o m o sinônimos os vocábulos " m a t é r i a
e disciplina".
Na Escola P o l i t é c n i c a , d i s p u n h a o D e c r e t o n.° 19.852, de 1931,
s e r i a m p r o v i d a s p o r p r o f e s s ô r e s c a t e d r á t i c o s a s cadeiras e n u m e r a d a s
n o a r t . 136 ( e n t r e a s q u a i s , C á l c u l o i n f i n i t e s i m a l , F í s i c a , p r i m e i r a ca-
deira, Física, segunda c a d e i r a ) , acrescentando-se que a " m a t é r i a " de
c a d a cadeira o u a u l a c o n s t a r i a d e p r o g r a m a a p r o v a d o ( a r t . 139) .
Neste caso, "matéria' é o conteúdo da cadeira.
O emprego indistinto de "cadeira" ou "disciplina" ressurge no
R e g u l a m e n t o da Escola Politécnica (Decreto n.° 20.865, de 28-12-1931),
s e g u n d o o q u a l p o d e m os professôres c o n t r a t a d o s ser i n c u m b i d o s da
r e g ê n c i a do e n s i n o de q u a l q u e r d i s c i p l i n a (art. 141) .
A equivalência absoluta dos vocábulos "cadeira" e " m a t é r i a " é
encontrada, t a m b é m no Decreto n.° 19.852, em outros preceitos.32
N ã o s o m e n t e nos citados d e c r e t o s de 1931 e nos q u e os modifi-
c a r a m , c o m o t a m b é m em m u i t o s outros e n c o n t r a m o s o e m p r e g o indis-
c r i m i n a d o dos três têrmos — " c a d e i r a " , " m a t é r i a " , "disciplina", ora
com extensão maior, quase eqüivalendo ao que n o r m a l m e n t e se contém
n u m departamento de ensino, ora no mais restrito sentido, correspon-
dendo a uma parte delimitada de um ramo de uma ciência.33

32
"Art. 225. Além do estudo das cadeiras... os alunos realizarão... excursões
e visitas que interessem à natureza dos cursos que seguirem... Art. 237. Consti-
tuem o Curso de Pintura e Escultura as seguintes cadeiras: . . . C r í t i c a . . . Gra-
v u r a " . . . Também no Decreto n.° 22.897, de 6-7-1933, que o modificou na parte
referente à Escola Nacional de Belas Artes: '"A matéria, cujo ensino será minis-
trado nas cadeiras de qualquer dos c u r s o s . . . deverá constar de um programa revisto
e a p r o v a d o " . . . (art. 1.°, § 6 ) . "As cadeiras... s e r ã o . . . t e ó r i c a s . . . teórico-prá-
t i c a s . . . p r á t i c a s " . . . (art. 2.°). "Os programas de ensino das cadeiras... (ficarão)
sujeitos... às seguintes delimitações de assuntos e distribuição de matérias: I —
Matemática superior: Geometria analítica, Cálculo diferencial, Cálculo integral,
Nações de cálculo gráfico" (art. 7.°j.
33
Citaremos apenas alguns: a) Decreto-lei n.° 7.988, de 22-9-1945, sôbre o
ensino de ciências econômicas e de ciências contábeis e atuariais, dá o nome de
"disciplina" a "Complementos de matemática" e a "História econômica", por
exemplo. Mas a Lei n.º 1.401, de 31-7-1951, modificou-o e dispõe que "A atual
cadeira de História Econômica passará a denominar-se História Econômica Geral
e do Brasil e deverá ser ministrada como disciplina autônoma"; b) Decreto-lei
n.° 9.617, de 28-8-1946 e Decreto n.° 21.964, de 18-10-1946. o primeiro criando cargos
de professor catedrático, o segundo esclarecendo que aquêles cargos correspondem
às cadeiras que enumera (ex: Mecânica Racional, Grafo-Estatística) ; c) a Lei
n.° 775, de 6-8-1949 e o Decreto n.° 27.426, de 14-11-1949, que a regulamentou,
ambos relativos ao ensino da enfermagem, que compreende diversas disciplinas.
umas privativas e outras não, sendo a Congregação constituída, entre outros, pelos
professôres das cadeiras privativas e por representantes da9 cadeiras não priva-
tivas; d) finalmente, a Lei n.° 2.311, de 3-9-1954, que instituiu a cadeira de "Etno-
grafia Brasileira e Língua T u p i " e determinou que até a criação dos respectivos
cargos fossem os lugares de professôres dessa disciplina exercidos mediante contrato.
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3. N o antigo Conselho N a c i o n a l d e E d u c a ç ã o , vários p a r e c e r e s tra-


t a r a m dêste assunto. C i t a r e m o s apenas os que a f i r m a m q u e :

a) p o d e h a v e r m a i s d e unia disciplina e m u m a s ó c a d e i r a . 3 4
h) p o d e h a v e r u m a única disciplina n u m a s ó c á t e d r a ; 3 5
c) disciplina é a m a t é r i a l e c i o n a d a . 3 8

4. Consultores j u r í d i c o s t ê m sido c h a m a d o s p a r a o p i n a r a r e s p e i t o .
E n t r e o u t r o s p a r e c e r e s se d e s t a c a m :

a) o do D r . E d m u n d o L i n s Neto, do M i n i s t é r i o da E d u c a ç ã o ,
c o n t r á r i o ã p r e t e n s ã o de professor da F a c u l d a d e de Ciências Econô-
micas da U n i v e r s i d a d e do R i o G r a n d e do Sul, de o c u p a r dois cargos
p o r q u e d e s d o b r a d a sua c a d e i r a ; 3 7
b) o do D r . Carlos Medeiros Silva, Consultor G e r a l da R e p ú b l i c a ,
sôbre o exercício de d u a s cadeiras na m e s m a F a c u l d a d e , favorável por-
q u e houve d e s d o b r a m e n t o . 3 8
5. Cabe t a m b é m a transcrição de trechos do j u l g a m e n t o , p e l o T r i -
b u n a l F e d e r a l de Recursos, do m a n d a d o de segurança n.° 1.292, do R i o
G r a n d e d o Sul, sôbre a c u m u l a ç ã o d e c á t e d r a s .
Segundo o M i n i s t r o A r t u r M a r i n h o , r e l a t o r , o i m p e t r a n t e era p r o -
fessor da c a d e i r a de "Ciência das F i n a n ç a s e P o l í t i c a F i n a n c e i r a " na

34
Parecer n.° 224/1949: " . . . p a r e c e . . . não existir dúvida sôbre a legalidade
da reunião de mais de uma disciplina em uma só cadeira... Quanto ao fato de
pertencerem tais cadeiras a cursos diferentes, também não parece haver qualquer
dúvida, pois numerosos são os exemplos que podem ser citados, a começar pela
própria Escola Nacional de Engenharia, onde cadeiras nas condições acima men-
cionadas são ensinadas em cursos diferentes (civil, eletricidade, industrial) . In
Carlos Souza Neves, Ensino Superior no Brasil, 1954, vol. 4.
35
Parecer n.° 321/40: "A disciplina "Patologia Cirúrgica" figurava... entre
as obrigatórias. Havendo o titular dessa cátedra... obtido sua disponibilidade,
deliberou a Congregação extinguir o ensino daquela d i s c i p l i n a " . . . In Carlos
Souza Neves, op. e loc. cit.
36
Parecer n.° 303/50: " D e acordo com o Parecer n.° 15/47 entende-se que
"disciplina é a matéria lecionada, podendo ser ministrado o conhecimento de que
ela é objeto em uma ou muis cadeiras". Destarte, quem faz o concurso para uma
disciplina pode ser provido indistintamente em qualquer das cadeiras em que ela
é ensinada. Por isso é que a lei (§ 4.° do art. 3.° da Lei 444) permite que se
realize um único concurso para provimento de mais de uma cadeira da mesma
disciplina") . in C. Souza Neves, op. e loc. cit.
Parecer n.° 12/1954: " . . . Em virtude de lei estadual... à cátedra do inte-
ressado, que continuou una, imposta foi também a obrigação de lecionar, a mais,
"Legislação Tributária e Fiscal". Foi imais um ônus que se impôs a um só cargo.
Com a federalização, foi essa cátedra (Prática de Processo Civil e Comercial) des-
dobrada. .. (grifamos) .
' Parecer de 19-7-1951, sôbre requerimento de professor de Faculdade de
Odontologia e Farmácia, em que pedia nomeação para a cátedra de "Patologia e
Terapêutica, 2. a parte", já ocupando a cátedra de "Patologia e Terapêutica, l. a parte:
" . . . Em face do art. 185 da Constituição, não há acumulação proibida no exercício
simultâneo da mesma disciplina, quando desdobrada em mais de uma cátedra e
ministrada em séries diferentes" ( C . Souza Neves, op. loc. cit.).
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Faculdade de Economia e Administração da Universidade de Porto


Alegre. Federalizada a escola, foi a cadeira desdobrada e o impetrante
optou pela de Política Financeira. Consta do voto do Ministro relator:
"O desdobramento da cadeira... deu lugar a que o re-
corrente mantivesse sua posição de professor catedrático de
Ciências das Finanças, sem prejuízo a direitos s e u s . . . A ca-
deira antiga, antes, se apresentava como um só cargo; depois,
com o desdobramento, a situação passou a ser a de dois cargos
distintos. Não há direito à acumulação".

Em seu voto, disse o Ministro Cândido Lobo (vencido) : " . . . no


meu tempo de Faculdade... Carvalho de Mendonça era professor no
3.° e no 4.° anos, de cadeiras diferentes dentro do Direito Civil, mas
autônomas... Se se criasse uma cadeira de Direito Civil no 5.° ano,
seria ou não seria êle o catedrático indicado?"
6. De todo o exposto, parece lícito afirmar que, inexistindo na legis-
lação, na jurisprudência e na prática administrativa, um conceito único
e delimitado de "cátedra", esta poderá ter a definição que se vier a
convencionar.

CÁTEDRA E DEPARTAMENTO

1. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ao tratar, no


art. 78, do Corpo Discente, permite que os alunos tenham represenação
"nos conselhos departamentais das universidades e escolas superiores
isoladas".
Em estudo especial sôbre "Conselhos Departamentais e Departa-
mentos", o insigne professor A. Almeida Júnior salienta que a matéria
principal do art. 78 não é a representação dos estudantes, e sim a rela-
tiva ao conselho departamental, "expressão... pouco conhecida entre
nós". 3 9
Alude o conselho Dr. A. Almeida Júnior ao Decreto-lei n.° 8.393,
de 17-12-45, que introduziu "o estímulo de que proveio a aceitação do
"departamento" no sentido norte-americano, 40 ao Decreto n.° 20.445,
de 22-1-1946, que aprovou o Estatuto da Universidade do Brasil 41 e à
39
In Documenta n.° 12, Março de 1963, p. 10 e segs.: "A LDB manda que
haja conselhos departamentais. Ora, para que estes possam existir, será necessário
que haja departamentos".
40
O art. 24, ao traçar os limites da autonomia da Universidade do Brasil,
estipulava q u e : " h ) as Faculdades e Escolas serão organizadas em departamentos,
constituído o professorado em quadros de uma carreira de acesso gradual e su-
cessivo; i) os departamentos serão dirigidos por um Chefe, escolhido dentre os
respectivos professôres catedráticos por proposta do diretor e designação do Reitor".
41
"Art. 42. A direção e administração de escolas e faculdades serão exercidas
pelos seguintes órgãos: a) Congregação; b) Conselho Departamental; c) Diretor".
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definição de "departamento" aprovada em 1962" pela Congregação da


prestigiosa Escola (Politécnica, da Universidade de São Paulo) . 4 2
2. Criticando o sistema universitário latino-americano, Atcon ao tratar
da organização departamental, dá primeiro seu conceito de departa-
mento: reunião, numa única organização universitária, de matérias
idênticas ou relacionadas, ficando sob tal unidade funcional todos os
membros do corpo docente ligados àquelas matérias. Nessa organiza-
ção, "first comes tbe logical conception of a functional unit, and then
teachers, curricula, classe and Students are built around or adapted
to it". 4 3
3. Na lei de criação da Universidade de São Paulo 44 e nos primeiros
estatutos da USP 45 já encontrávamos as ferramentas necessárias à cons-
trução de departamentos universitários e à conceituação de cátedras
comuns a mais de uma Escola.
E os vigentes Estatutos da mesma Universidade também revelam
a possibilidade de romper-se com a tradicional separação das Facul-
dades em compartimentos estanques. 48

42
"Departamento é a unidade didático-científico-administrativa constituída pela
reunião de cátedras afins e de suas disciplinas e demais serviços auxiliares".
43
Rudolph P. Atcon, op. cit. Enquanto que nesse sentido o departamento é
"a Cooperative venture" e nele todos os integrantes "are all associated and inter-
dependem", na América Latina o departamento é uma aliança de lordes soberanos,
onde cada uma das matérias, "loosely connected... is tauglit by an independem
"catedrático". Little can be done collectively to eliminate unnecessary duplication
or undesirable overlap".
44
Decreto estadual n.° 6.283, de 25-1-1934, art. 47, letra " c " : "criação de
cursos comuns, que atendam às necessidades de alunos de diferentes Faculdades,
Escolas ou Institutos".
45
Estatutos da Universidade de São Paulo (de julho 1934): "Art. 110. É
permitido que a mesma cadeira ou parte dela sob a regência do mesmo professor
seja comuum a mais de um Instituto Universitário. § 1.° Quando a mesma matéria,
ou parte dela, fôr lecionada separadamente, em mais de um instituto, e houver
equivalência de programa e de grau, é facultado aos alunos fazer o curso em
qualquer destes, mediante aquiescência do Conselho Universitário, ouvido o Con-
selho Técnico-Administrativo do Instituto onde o aluno preferir fazer o curso.
§ 2.° Vagando, em um Instituto, cadeira que tenha correspondente em outro, o
Conselho Universitário poderá propor a extinção de uma delas, ouvidas as respec-
tivas Congregações".
46
Decreto estadual n.° 40.346, de 7-7-1962: "Art. 44. São órgãos da admi-
nistração dos estabelecimentos de ensino superior: . . . II — O Conselho Técnico-
Administrativo (C.T.A.) poderá ser substituído por um Conselho Departamental,
constituído por professôres catedráticos eleitos pela Congregação, dentre os repre-
senantes de cada Departamento. Art. 60. Os Departamentos constituem-se de
cátedrasou disciplinas autônomas, afins. Art. 61. Por proposta das respectivas
Congregações, poderão constituir-se em Departamentos, nos Institutos Universi-
tários, cátedras e disciplinas autônomas, afins, de diversos estabelecimentos de
ensino superior".
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

E s t á , assim, a p a r e l h a d a a U n i v e r s i d a d e , p a r a e v i t a r q u e n e l a se
c o n f u n d a a a u t o n o m i a de cada I n s t i t u t o com desvinculação t o t a l dos
respectivos grupos p r o f i s s i o n a i s . 4 ' Basta a adoção da m e d i d a preconi-
zada no art. 61 dos Estatutos da U S P , p a r a se i m p l a n t a r o sistema de-
p a r t a m e n t a l 4 8 q u e a i n d a m a i s a d e q u a d a m e n t e está definido do Regi-
m e n t o da F a c u l d a d e do Ciências Médicas dos H o s p i t a i s da S a n t a Casa
de Misericórdia de São P a u l o . 4 9 a p r o v a d o pelo Consellio F e d e r a l de
E d u c a ç ã o em 2-3-1963. 5 0

4. Na U n i v e r s i d a d e do Brasil, conforme o citado t r a b a l h o do P r o -


fessor A l m e i d a J ú n i o r , b e m como na U n i v e r s i d a d e de São P a u l o , cujos
estatutos vigentes m e n c i o n a m o s , a chefia de um d e p a r t a m e n t o cabe
s e m p r e a um c a t e d r á t i c o , e o conselho d e p a r t a m e n t a l é c o n s t i t u í d o p o r
catedráticos.

47
Atcon, op. cit., dá o exemplo de uma Escola de Agronomia, onde se cria
um "departamento" de biologia, com as cadeiras tradicionais de biologia animal,
biologia vegetal, botânica e zoologia. Aparentemente acertada a orientação, na
realidade o departamento trata daqueles assuntos e orienta seus trabalhos exclusiva-
mente para a preparação de um grupo de estudantes — os de agronomia — e não
para o desenvolvimento daqueles campos da ciência independentemente de sua
aplicação à agronomia.
48
Êste, ainda recentemente, foi objeto de consideração de parte da Comissão
Especial para Promover a Programação e o Desenvolvimento da Educação, da
Ciência e da Cultura na América Latina ("La educación superior en America
Latina", publicação da Organização dos Estados Americanos, por Ismael Rodriguez
Bou, Washington, janeiro de 1963). Destacamos desse estudo: Las facultades, en
su mayoria, son dentro de las próprias universidades, lo que en sus origines se
decia de las universidades, un imperium in império. No existe un concepto integral
del funcionamiento universitário... Este deficiente sistema de organización trae
consecuencias adversas a las instituciones: se repiten cursos, se duplican las escasas
facilidades de laboratório, de equipo, de professores; surgen y se fomentan rivali-
dades improduetivas". Entre diversos trabalhos citados na publicação, destaca-se o
de T. Keith Glennan, Ray E. Bolz e Rex Hopper, "Engineering Education in Latin
America", no qual os autores insistem que não basta a união física dos institutos
de uma universidade: "La localization y operación de las distintas facultades dentro
de la propia Universidade en forma que cada una de ellas sea autosuficiente
atui en las nuevas Ciudades Universitárias, anula lo que a nuestro juicio
constituye el concepto fundamental de una Universidad — un grupo de "scholars"
y educadores que se comunican y trabajan juntos. Los esfuerzos pará
congregar fisicamente las varias facultades de una Universidad no perecen
estar acompanados por una integración de los cuerpos docentes, que asegure
el desarrolo vigoroso en áreas de interés mutuo, esto es. matemáticas, fisica, e t c . "
49
"Art. 7.° O Departamento deverá ser entendido como uma reunião de
disciplinas afins e formado por uma equipe de docentes integrados num plano que
apresente unidade didático-científico-adminislrativa de ação e pensamento; § 1.° Os
docentes de cada Departamento dividirão entre si, por deliberação coletiva, as
tarefas do Departamento".
50
In Documenta 14/1963, p. 2-1. Disse o D r . Maurício Rocha e Silva, conse-
lheiro relator: "Não creio que se possa encontrar uma definição mais feliz da
essência de um D e p a r t a m e n t o " . . .
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 185

Já na Universidade de Brasília, cuja lei de criação alude ao provi-


m e n t o efetivo de cátedras, a chefia de d e p a r t a m e n t o não é privativa
de professor catedrático. 5 1
E o conceito de "conselho d e p a r t a m e n t a l " como r e u n i ã o de repre-
sentantes de d e p a r t a m e n t o s diferentes, t a m b é m n ã o é imposto por lei,
n a d a obstando a que se defina como tal a r e u n i ã o dos m e m b r o s de
um único d e p a r t a m e n t o , segundo a prática seguida em universidades
norte-americanas.
5. Do ponto-de-vista legal, por conseguinte, não nos a p a r t a m o s , no
Brasil, pelo menos potencialmente, da evolução q u e se verifica até
mesmo no Velho M u n d o , de onde se origina o sistema de catedrático 5 2
6. Parece lícita, pois, a afirmação de que não há q u a l q u e r óbice a
q u e u m a universidade ou um estabelecimento de ensino superior, no
Brasil, institua d e p a r t a m e n t o s cuja chefia se atribua a um professor
n ã o catedrático, ou mesmo, d e p a r t a m e n t o s de que se exclua a figura
do c a t e d r á t i c o .

EM CONCLUSÃO

1. A Constituição brasileira, e n t r e os princípios q u e fixa p a r a a legis-


lação do ensino, inclui a regra de que se exigirá concurso de títulos e
provas p a r a o provimento das cátedras, e assegura aos professôres,
assim admitidos, a vitaliciedade. T a l princípio se aplica ao ensino
secundário oficial e ao ensino superior, oficial ou livre.
O n d e houver um cargo de "professor catedrático", em estabeleci-
m e n t o de ensino secundário oficial, ou em q u a l q u e r estabelecimento
de ensino superior, tal cargo há de ser p r e e n c h i d o na forma prescrita
no art. 168, n.° VI, da Constituição.
Mas a Constituição não ordena q u e existam apenas professôres
catedráticos. E n ã o conceitua " c á t e d r a " .
Nos q u a d r o s do funcionalismo público federal, há cargos de " p r o -
fessor de ensino superior", "assistente de ensino s u p e r i o r " e o u t r o s . 5 3

Estatuto da Universidade de Brasília, aprovado pelo Decreto n.° 1.872, de


12-12-1962, arts. 54 e 58 combinados com os de n.os 72 a 82 e 92 in fine.
52
Segundo Atcon (op. cit.), na Europa o "herr professor" vem sendo relegado
a "chairman" permanente de sua cadeira departamentalizada, adotando-se, de fato.
"the U.S. concept of a Department whose many capable members are second to
none in both preslige and ability to distribute ainong themselves the general work
load of the entire department".
53
A Lei n.° 3.780, de 12-7-1960, inclui entre os "Grupos Ocupacionais", o
do "Magistério", que compreende as classes "Professor Catedrático", "Professor
de Ensino Superior", "Assistente de Ensino Superior", "Instrutor de Ensino Su-
perior", "Professor de Ensino Industrial Técnico".
186 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

2. A vitaliciedade não é privilégio do catedrático, pois a ela também


têm direito os magistrados, os ministros do Tribunal de Contas e os
titulares de ofício de justiça, conforme dispõe o art. 187 da Constitui-
ção. Nem tampouco se condiciona, a vitaliciedade, ao concurso, pois
os Ministros do Tribunal de Contas não são nomeados por concurso
e são vitalícios.
Pode haver liberdade de cátedra sem vitaliciedade; esta, de outro
lado, por si só, não basta para assegurar aquela liberdade, que pode
ser em muitos casos cerceada por outros meios, tais como as restrições
de recursos de pessoal e material.
A liberdade de cátedra, como princípio expresso em o n.° VII do
art. 168, é assegurada pela Constituição com o sentido de liberdade de
ensino.
3. O concurso não é próprio apenas ao provimento da cátedra, pois
a Constituição o exige para ingresso em qualquer carreira do serviço
público.
O concurso de títulos e provas para provimento de cátedras não
está sujeito a um padrão obrigatório, podendo ser regulamentado
segundo os interesses do ensino e conforme critérios diferentes para
diferentes tipos de cátedras. Êle pode, no que diz respeito às provas,
incluir defesa de tese, prova escrita, prova prática e prova didática, mas
é o regulamento de cada Escola que determina quais daquelas provas
são necessárias, 54 assim como de que forma se ponderarão as notas
atribuídas aos títulos c às provas. 5 5
Pode, portanto, o concurso ser organizado de forma a dar-se mais
ênfase a um ou a outro tipo de provas, a um ou a outro gênero de
títulos, consoante os objetivos a atingir, isto é, as características que
deve possuir um professor, para o ensino em dado campo profissional.
54
Decreto n.° 19.851, de 114-1931, art. 53, e seu parágrafo único, disposições
legais não revogadas até hoje. Também os antigos Estatutos da Universidade de
São Paulo (aprovados pelo Decreto estadual n.° 6.533, de 4-7-34 dispunham:
"Art. 86. O concurso de provas constará d e : 1) defesa de tese; 2) prova escrita;
3) prova prática; 4) prova didática. Parágrafo único: O regulamento de cada
Instituto determinará quais das provas, referidas neste artigo, são necessárias ao
provimento do cargo de professor catedrático".
55
Em 1937, o Conselho Nacional de Educação foi consultado sôbre se a
anterior aprovação do Parecer 35/1935 (sôbre critério para ponderação de notas
em concurso para cátedras, "na falta de preceito legal explícito ou implícito")
firmara diretriz geral a ser seguida por todas as universidades, importava em padrão
federal, ou se o Regulamento Interno de uma Faculdade poderia desviar-se dessa
diretriz ou padrão. A resposta consta do Parecer n.° 32/1937: a resolução só
importaria em padrão federal se transformadas em lei, podendo, pois, o Regula-
mento Interno desviar-se do padrão federal, desde que aprovado pelo Conselho
Universitário e desde que não desobedecendo ao parágrafo único do art. 9.° do
Decreto 19.851 ("nas universidades... quaisquer modificações... só poderão ser
efetivadas mediante sanção dos respectivos governos, ouvido o Conselho Nacional
de E d u c a ç ã o " ) . In Carlos de Souza Neves, Ensino Superior no Brasil, vol. 1,
pp. 424427. Ver, também, a nota n.° 6, neste trabalho.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

4. No ensino superior, o currículo mínimo e a duração dos cursos


são fixados pelo Conselho Federal de Educação, mas o programa de
cada disciplina será organizado pelo respectivo professor, conforme
prescrevem os artigos 70 e 71 da Lei de Diretrizes e Bases. A lei, por-
tanto, atribui a competência para a elaboração de programa da disci-
plina ao professor que a ministra — não ao professor catedrático.
A "matéria" a ser ensinada pode ser desdobrada em tantas "disci-
plinas" semestrais ou anuais quantas sejam necessárias .56 Os esta-
belecimentos podem desdobrar as matérias constitutivas do currí-
culo em disciplinas até trimestrais, agrupando-as em cadeiras ou
departamentos. 57
Está, pois, se não eliminado, ao menos contornado, onde existir,
quando existir — o privilégio do catedrático de dispor soberana-
mente sôbre o assunto da cadeira. Esse privilégio se pode restringir,
pois, aos casos em que o cargo de catedrático qualifica a disciplina
correspondente. 58
5. Pode o instituto de ensino superior organizar-se em departamentos
e nestes incluir outros docentes além dos catedráticos porventura exis-
tentes. Pode também incluir mais de um catedrático no mesmo depar-
tamento. Como pode organizar departamento sem nenhum catedrático.
A coexistência do "professor catedrático" com o "professor titular"
ou "professor pleno" 59 e os demais docentes de uma carreira do magis-
tério (instrutor-professor assistente-professor associado), é impres-
cindível nas escolas superiores oficiais federais, e será necessária
nas demais escolas que não se decidam a declarar "em extinção" seu
quadro de catedráticos, extinguindo os cargos à medida que vagarem.
Mas essa existência sinmltânea de "professôres catedráticos" c "pro-
fessôres plenos", com igual posição hierárquica, será possível desde que
a escola se organize em departamentos e a estes dê estrutura nos moldes

56
Parecer n.° 307/63, Cons. Fed. Educ, 3-10-63, Documenta n.° 20, p. 10.
57
"Normas sôbre currículo", C.F.E., Documenta n.° 8, p. 87.
58
Já observamos que há "cadeiras" que abrangem diversas disciplinas, como
a de "Matemática superior: Geometria analítica, Cálculo diferencial, Cálculo inte-
gral, Noções de cálculo gráfico". Em memorial apresentado há alguns meses ao
Conselho Estadual de Educação de São Paulo, o Professor Lucien Lison, diretor
da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, se refere ao con-
traste entre o moderno conceito de "departamento" e o sistema ainda vigente
entre nós, que permite a existência de "cátedras" tais como "Complementos de
matemática elementar", "Complementos de Física" e "Introdução à História". Ou,
como já mencionamos, numa Faculdade de Farmácia e Odontologia, uma cátedra
de "Patologia e Terapêutica, l. a parte" e outra cátedra de "Patologia e Terapêu-
tica, 2. a parte".
59
Correspondente ao "full professor". Expressão empregada no Instituto Tec-
nológico de Aeronáutica, escola de engenharia que funciona desde 1947 sem nenhum
professor catedrático, e que desde 1950 se organiza em departamentos correspon-
dentes aos grandes setores da engenharia e das ciências básicas.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

da existente, p o r exemplo, no I n s t i t u t o Tecnológico de Aeronáutica 6 0


ou, como já foi m e n c i o n a d o , na F a c u l d a d e de Ciências Médicas dos
Hospitais da Santa Casa de Misericórdia de São P a u l o .
6. " C á t e d r a " de "professor c a t e d r á t i c o " é, p o r t a n t o , o cargo público,
com denominação p r ó p r i a , criado p o r lei, provido p o r concurso de
provas e títulos, e vitalício.
Com denominação p r ó p r i a —• q u e não tem seguido critério uni-
forme, e que p o d e ser simplesmente a de "professor catedrático", sem
q u a l q u e r referência a disciplina, a m a t é r i a , a assunto, ou mesmo a
c a m p o profissional.
7. E m síntese:

— A correção das deficiências e defeitos i m p u t a d o s , no ensino


universitário brasileiro, ao "sistema de catedráticos", n a o exige modi-
ficação da Constituição n e m da Lei de Diretrizes e Bases da E d u c a ç ã o
Nacional.
— A extirpação dos males decorrentes da existência de institutos
universitários, funcionando em c o m p a r t i m e n t o s estanques, com a dupli-
cação de serviços e a monopolização, p o r alguns catedráticos, de deter-
m i n a d o s setores do ensino, n ã o d e p e n d e de nova legislação.
8. Não transfiramos — nós, professôres universitários —• aos legis-
ladores, responsabilidade q u e nos cabe, c p a r a d e s e m p e n h o da q u a l
estamos p l e n a m e n t e a p a r e l h a d o s .

60
Em abril de 1962, a Congregação daquele Instituto aprovou trabalho elabo-
rado por unia sua comissão especial, para encaminhamento ao Presidente do Con-
selho Federal de Educação, em resposta a circular enviada pelo CFE sôbre a estru-
turação do currículo. À consulta sôbre " d e que modo a escola julgaria conveniente
distribuir em cátedras e disciplinas as matérias de um curso, a fim de que fossem
asseguradas a flexibilidade e inter-relação das matérias componentes do currículo",
respondeu-se:
. . . '"A s o l u ç ã o . . . é a do funcionamento da escola em base departamental, em
que grandes setores da engenharia e das ciências básicas estão a cargo de departa-
m e n t o s . . . cujas funções se resumem no seguinte:
1) reunião de um grupo de professôres... que se mantêm atualizados através
da pesquisa e da atividade de pós-graduação...
2) manutenção de laboratórios... para o desenvolvimento das atividades de
pesquisa e ensino nos níveis de pré e pós-graduação;
3) ministração dos vários cursos, distribuídos entre os professôres do depar-
tamento. . . ;
4) recrutamento de recém-formados, e sua preparação e desenvolvimento na
carreira acadêmica através de estudos pós-graduados e de pesquisas...
Garante-se, assim, um funcionamento dinâmico, envolutivo e coordenado em
que, a par da continuidade das atividades departamentais, se verifica contínua revi-
talização do corpo docente.. . e contínua renovação do currículo pelo afluxo de
idéias novas. Não há ligação indissolúvel entre uni professor e a matéria a seu
cargo, eliminando-se, assim, o interesse da manutenção de uma determinada dis-
ciplina". ..
Documentação

POLÍTICA EDUCACIONAL DO PRESIDENTE CASTELO BRANCO

Em discurso proferido na Universidade tigação diuturna consegue o ho-


do Ceará a 23 de julho último, definiu mem nova visão do mundo que o
o Pres. Castelo Branco as linhas mes-
tras da ação do Govêrno no campo cerca.
educacional, anunciando o propósito Bem compreendestes que a Uni-
de "criar condições a fim de propor- versidade moderna tem o seu di-
cionar escolas a tôda a população em namismo nas atividades de inves-
idade escolar", bem como ampliar as
oportunidades educacionais no ensino tigação. E foi por assim entender
médio e superior visando promover a que vos empenhastes na instala-
inadiável preparação de pessoal quali- ção e equipamento dos vossos ins-
ficado para atender ao surto de desen- titutos de pesquisa, aos quais está
volvimento do País. Damos a íntegra
desse pronunciamento: certamente reservada função tão
importante quanto a das escolas
"Estou sumamente grato às sau- superiores. Também não des-
dações com que me distinguistes. curastes o aperfeiçoamento do
Até por que, acompanhando há Magistério e, através de cursos de
muito as vossas atividades, tão pós-graduação, estágios em cen-
importantes no cenário do pensa- tros mais avançados, ou participa-
mento, sei bem quanto significam ção em seminários de estudo, ten-
como lídima expressão da nossa des conseguido constante aumento
gente, sempre tão interessada e de conhecimentos dos vossos pro-
presente nos problemas da cultura. fessôres .
Por isso mesmo é sôbre aspectos Na realidade, sois a semente
da educação que vos venho falar. caída em boa terra. Havendo en-
São ainda novas as Universida- contrado uma tradição de cultura,
des Brasileiras. Apareceram quan- que tem as suas raízes nos tempos
do muitas das suas congêneres, em coloniais, não foi difícil à vossa
outros países, já eram centenárias. Universidade, dentro de adequado
Tão curta existência, no entanto, e progressista planejamento, pola-
não impede que a do Ceará já rizar iniciativas da maior impor-
tenha imprimido forte marca na tância para tôda a vida do Estado.
comunidade a que serve. Sei estar Refiro-me não apenas àquelas re-
numa casa, onde ao lado da cul- lativas às boas letras, à ciência, ou
tura clássica, vivem numerosos à tecnologia, mas também às que
institutos de pesquisa, todos volta- se destinam a influir diretamente
dos para útil e fecundo trabalho na recuperação econômica do Es-
de ampliação de conhecimentos, tado, através de eficientes planos
certos de que somente pela inves- de industrialização.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Assim, graças ao vosso trabalho Agora, decorridos dois meses de


e às vossas realizações, granjeastes Govêrno, posso anunciar as linhas
justo e crescente prestígio, que se mestras de sua ação no campo
reflete em todos os setores de ati- educacional, ação que obedecera a
vidade do Ceará. E nao seria exa- zeloso, eficiente e correto emprego
gero dizer que, havendo passado dos recursos que serão destinados
as fronteiras do Estado, o vosso à execução de um plano objetivo
renome já constitui patrimônio de confiado a uma estrutura adminis-
todo o Nordeste. trativa atualizada e desburocrati-
zada. O pensamento da descen-
Não é, portanto, uma lisonja re- tralização presidirá o encaminha-
conhecer que a vossa Universidade mento desse programa, que forta-
constitui hoje o mais alto luzeiro lecerá a Federação antes amea-
da terra da luz. çada pela permanente intromissão
Li num dos vossos documentos do Govêrno Federal em assuntos
que não desejais ser a Torre de da competência estadual, como
Marfim, mas a Torre de Vigia, nos ensinos primário e secundário.
donde acompanhe o processo evo-
lutivo da sociedade brasileira, PLANEJAMENTO
incutindo nos cidadãos a cons-
Por certo a interdependência
ciência dos valores necessários à
crescente dos diversos problemas
formação de uma cultura autên- de ordem educativa torna cada vez
tica. Nenhum lugar, pois, mais mais imperioso o planejamento
adequado do que êste para um conjunto da educação. Cumpre,
golpe de vista sôbre o pobre pa- pois, que os seus múltiplos e com-
norama da educação nacional. plexos aspectos sejam hierarquiza-
É do conhecimento de todos a dos pela sua relevância, desde o
grave e lamentável situação que a imperioso dever da universalização
Revolução encontrou no setor da do ensino primário obrigatório e
educação, onde o Poder Público gratuito até a inadiável preparação
não pecou apenas pela omissão, de pessoal qualificado para aten-
mas também pela complacência e, der ao surto do desenvolvimento
por vezes, pela ação deletéria. Era no País.
com a própria orientação, com o Nenhum problema mais grave
apoio ostensivo e, mais do que do que o dêste ensino, pois o
isso, com a ajuda perdulária do Brasil não pode continuar a apre-
Ministério da Educação e Cultura, sentar-se entre as nações com mais
que se desenvolvia uma obra de de trinta milhões de analfabetos.
agitação e subversão. Relegar ao analfabetismo metade
Abandonaram-se programas e das novas gerações eqüivale a per-
planejamentos: esqueceram-se dermos metade de precioso ele-
compromissos e metas nacionais e mento com que poderemos contar
internacionais seguramente defi- para o progresso econômico, cul-
nidos, e ingressou-se num clima de tural e social. Governos anteriores
irresponsabilidade, que conduzia já assumiram compromissos inter-
ao aviltamento da educação bra- nacionais no sentido de proporcio-
sileira . nar escolas a tôda a nossa popu-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

ESTUDOS PEDAGÓGICOS 191


lação em idade escolar. Agora A medida, com pequeno ônus
vamos criar condições para que tal para as empresas, duplicará os re-
objetivo seja alcançado. É o que cursos do ensino primário, colo-
prometemos hoje solenemente pe- cando à disposição dos Estados,
rante a Nação, que não mais su- ainda neste exercício, se aprovada
porta ser enganada na observância pelo Congresso, cerca de cinqüen-
dos direitos mais sagrados do povo. ta bilhões de cruzeiros, possibili-
tando a matrícula de um e meio
SALÁRIO-EDUCAÇÃO
milhão de crianças. Certamente,
Nao desconhecemos o que êle nenhuma empresa deixará de re-
representa. E o País necessita conhecer que a contribuição é irre-
compreender o quanto vai ser exi- levante em face dos benefícios
gido de determinação, idealismo e proporcionados, inclusive em re-
cooperação. Impõe-se assegurar lação ao ritmo do trabalho e à pro-
meios para que, até 1970, sejam dutividade.
construídas no território nacional No ensino primário preocupa,
aproximadamente cem mil salas essencialmente, a criança. Mas,
de ensino primário, para cerca de paralelamente, dar-se-á solução ao
seis milhões de crianças. Onde, problema do adulto analfabeto, a
porém, buscar recursos para esta fim de que se integre completa-
obra ciclópica? Mesmo somadas, mente numa sociedade que o tem
todas as disponibilidades da União, abandonado e desrespeitado.
dos Estados e dos Municípios são
insuficientes para atender ao vulto ENSINO MÉDIO
da tarefa. Para obter os recursos
No ensino médio, tão deficiente
necessários, pretende o Govêrno a quanto o primário, pensa o Govêr-
colaboração das empresas priva- no proporcionar bem maiores opor-
das, cuja responsabilidade, solidá- tunidades educacionais. Dever-
ria na educação dos seus servido- se-á, inclusive, suprimir as discri-
res e dos seus filhos é princípio minações entre o ensino de tipo
constitucional. Recorremos ao sa- acadêmico e os ramos que prepa-
lário-educação, para assegurar a ram para as várias atividades tec-
tôda criança ao menos a posi- nológicas, indispensáveis ao de-
bilidade de freqüentar a escola senvolvimento do país. Quem po-
primária. É o mínimo que se pode derá separar a prosperidade da
querer. Grã-Bretanha das suas trezentas
Assim, com fundamento na escolas de tecnologia, adestrando,
Constituição e na Lei de Diretri- anualmente, 30 000 novos técni-
zes e Bases da Educação Nacional, cos? Nem podemos esquecer esta
o Govêrno proporá ao Congresso observação do Dr. Lenihan, ilus-
a instituição do salário-educação, tre educador: "O cientista, o tec-
que representará, em última aná- nologista e o técnico são, no todo,
lise, a participação de tôda a co- produtos do sistema educacional,
munidade na solução do seu pro- não do sistema industrial no qual
blema mais fundamental e mais têm a esperança de trabalhar".
grave. Observação que representa a res-

5 — 34 901
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

posta aos que imaginam dever a tiva autêntica e democrática no


industrialização caminhar à frente desenvolvimento e concretização
da formação dos que irão servir, do Plano Nacional de Educação.
quando a verdade é justamente o Êste, aliás, é da responsabilidade
oposto: os técnicos forçam, inevi- e elaboração do Conselho Federal
tavelmente, o desenvolvimento e de Educação, do qual esperamos
a industrialização. seja não só a sentinela vigilante na
Muito se tem falado, nos últimos defesa da Lei, mas guarda avan-
tempos, em reforma universitária. çada, para prever perigos, auscul-
tar obstáculos e propiciar as vitó-
Contudo, nem sempre os propó-
rias que, no campo educacional, o
sitos têm sido os alardeados, que
Conselho, o Ministério e o Govêr-
apenas escondem a criação de um
no devem alcançar para salva-
clima de agitação incompatível
guarda da democracia e da edu-
com os melhores objetivos. Aliás,
cação no Brasil.
entre as metas educacionais do
Govêrno está a revisão da estru- Uma palavra especial dirijo aos
tura universitária, a começar pelo educadores do Brasil. Palavra que
estatuto do Magistério. é de agradecimento e estímulo.
Na medida das suas possibilidades,
Uma sucessão de federalizações o Govêrno procurará corresponder
sobrecarregou o Erário do País à dedicação dos educadores, pro-
impedindo-o de atender a alguns porcionando aos Estados maiores
setores onde se faz reclamada a recursos, que, em parte, deverão
sua assistência. Em Estados que beneficiar os que se dedicam à
estão longe de haver solucionado educação da infância e da juven-
os problemas de ensino primário e tude. Do mesmo modo que incen-
médio, vemos Universidades bas- tivará as iniciativas destinadas a
tante dispendiosas. Assim, somen- criar novas oportunidades para o
te quando provada a imperiosa aprimoramento do magistério atra-
necessidade, autorizará o Govêrno vés de cursos, estágios e bôlsas-de-
a criação de escolas superiores. estudo.
Insistirá, principalmente, na orien- Também reconhece o Govêrno
tação da Lei de Diretrizes e Bases, a valiosa contribuição da iniciativa
que preconiza a formação de fun- privada para a educação nacional.
dações e autarquias para atender Onde chegou o homem civilizado,
ao ensino superior, do mesmo mo- veio atrás dele o educador. Seja
do que exigirá dos cursos oficiais como missionário da fé e da ins-
superiores, sem prejuízo da sua trução, seja como idealista, mas
eficiência, admissão de número sempre com o mesmo propósito de
maior de jovens, a fim de vermos romper as cadeias da ignorância.
diminuído o alto custo de cada Assim, para quantos se entreguem
estudante superior, anualmente. ao mister de ensinar, não há dis-
Face a tantos problemas de vital tinção entre escola oficial e escola
importância para o País, o Govêr- privada, pois não somente o pres-
no deseja que o Ministério da Edu- creve a Constituição, mas também
cação e Cultura exerça, orgânica o exige a consolidação da demo-
e eficazmente, a sua ação suple- cracia brasileira.
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A JUVENTUDE deve haver uma boa medida, um


equilíbrio. Assim como há de im-
Outrossim, a ação do Govêrno perar na Universidade o regiona-
deverá estender-se à comunidade lismo, com o pé na terra, para po-
estudantil. Não se contesta aos der partir para concepções univer-
moços das escolas superiores que sais, também há de existir a dis-
se adestram para assumir, em bre- ciplina, que forma o espírito pú-
ve, postos de atuação e orientação blico e a mútua compreensão entre
o direito, e, mais do que o direito, mestres e estudantes.
o dever de tomarem conhecimento
Nuns e noutros tem a Universi-
dos problemas nacionais. É mes-
dade as suas verdadeiras bases.
mo recomendável que a mocidade
Aquêles são os instrumentos de
sinta e viva esses problemas, no
que se vale para despertar o inte-
momento em que se apresentam e
resse dos alunos e transmitir-lhes
desenvolvem. É uma tomada de
os conhecimentos que reclamam
consciência que há de ser feita
para a sua formação. Os últimos
pelos moços no campo da apren-
são a sua própria finalidade. Im-
dizagem e nos têrmos adequados
prescindível, portanto, que ambos
à sua condição de cidadãos em
se entendam em têrmos perfeita-
fase de formação.
mente democráticos. Se ao pro-
Nesse ponto é flagrante que pre- fessor não cabe fazer proselitismo
cisamos entender-nos melhor. com o objetivo de impor idéias ou
Uma universidade não é um cam- ideologias, ao estudante compete
po neutro freqüentado pelos que não ficar a serviço de qualquer
têm gosto pelas delícias intelec- grupo, servindo por vezes de jo-
tuais, nem é apenas centro de for- guete nas mãos dos que desejam
mação de profissionais liberais, ou a subversão. É preciso não marcar
de pesquisadores e professôres. É a vida do estudante de hoje, pos-
muito mais do que isso. Repre- sivelmente o dirigente de amanhã,
senta um organismo vivo, em per-
com a vinculação à subversão, à
manente e recíproca comunicação
com os anseios e aspirações popu- corrupção, ou à vadiagem onerosa
lares, que deve atender ou corri- dos falsos movimentos estudantis.
gir, quando necessário. Daí haver Para se iniciar nas refregas da de-
notado Amoroso Lima ser "uma mocracia, basta que êle se arregi-
ilusão pensarmos em ter universi- mente nas suas agremiações. Acre-
dades modelares, em um País de- dito nos professôres universitários
sorganizado e caótico". Aliás, já do Brasil e sei que eles entendem
que vos lembrei o nome do ilustre a Universidade como instituição
educador, não deveremos esquecer de cultura e de pesquisa cuja inde-
as palavras que, em 1952, proferia pendência é imprescindível preser-
contra a "perigosa tendência de var. E um longo convívio com
infiltrar a Universidade de preo- jovens de todas as regiões do País
cupações políticas, especialmente permite-me confiar sem reservas
entre o corpo discente, que poderá em nossa juventude. Esta con-
ser amanhã completamente desas- fiança é ainda mais firme quando
trosa". É que ai, como em tudo, se trata de moços despontando
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pará a vida pública e que anseiam Não terminarei sem vos assegu-
exercer a profissão difícil de se- rar que tudo quando disse está
rem homens. Confiança tanto ungido pela emoção de vos falar
mais necessária quando antevemos dêste recanto da Pátria comum e
as imensas responsabilidades que que, nas minhas mais longínquas
assumiro ao substituir os que têm recordações, está sempre marcado
hoje os encargos do Govêrno e as pela visão de pessoas, de lugares,
tarefas do desenvolvimento do e acontecimentos, que se ligam
País, do bem-estar do povo e da profundamente à admirável terra
paz social. cearense".
SALARÍO-EDUCAÇÃO PARÁ O ENSINO PRIMÁRIO

I. EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

Atendendo a dispositivos constitucionais endidos nas faixas etárias em que


e da Lei de Diretrizes e Bases de Edu- incide a obrigatoriedade da esco-
cação, foi encaminhado ao Sr. Ministro
da Educação, pelo Diretor do NEP, larização, destina-se, obviamente,
Prof. Carlos Pasquale. o Oficio n.° a atender apenas às respectivas
166, de 19-5-64. relativo ao Salário- despesas da manutenção.
-Educação a ser pago pelas empresas
industriais, comerciais e agrícolas, ten- 2. A Constituição, ao estatuir
do em vista a escolarização dos filhos que o ensino primário é obriga-
dos empregados na faixa de 7 a 11 tório (art. 168, I) e que o ensino
anos, aplicando-se os recursos daí re-
sultantes no desenvolvimento da rede
primário oficial é gratuito para
de escolas primárias do sistema oficial. todos ( a r t 168, I I ) , parece come-
Divulgamos essa documentação, cons- ter todo o ônus da manutenção
tante da exposição de motivos e o desse ensino aos poderes públicos.
anteprojeto de lei que originaram a
mensagem enviada ao Congresso Na- 3. Outro preceito constitucio-
cional: nal (art. 168, I I I ) , contudo, ao
determinar que "as empresas in-
Senhor Ministro: dustriais, comerciais e agrícolas,
Tenho a honra de submeter à em que trabalhem mais de cem
consideração de Vossa Excelência pessoas, são obrigadas a manter
anteprojeto de lei que institui o ensino primário gratuito para os
salário-educação e dá outras pro- seus servidores e os filhos destes",
vidências . transfere o ônus, no que tange aos
empregados e aos dependentes de
1. O salário-mínimo-familiar
empregados das médias e grandes
instituído pela Constituição (arti-
empresas, às próprias empresas.
go 157, I ) , entendido como salário
destinado a garantir ao trabalha- 4. A norma contida no art. 168,
III, da Constituição implica, sem
dor o mínimo imprescindível para
dúvida, na afirmação de princípio
manter e educar os membros da
de caráter mais geral, qual seja o
família, não está assegurado em da responsabilidade solidária da
tôda a plenitude pela Lei n.° 4.266, atividade econômica na obra da
de 3 de outubro de 1963. O salá- educação nacional. Em face das
rio-família que essa lei estipula em gravíssimas deficiências que ainda
uma mesma importância, em re- se observam no setor de ensino
lação a todos os filhos até 14 anos primário (50% da população de
de idade, estejam ou não compre- mais de 15 anos é analfabeta e 47%
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das crianças de 7 a 11 anos se en- é tanto menor para as empresas


contram sem escolas) não há por- que empreguem menos de cem
que não estender essa co-respon- pessoas, quanto mais reduzido fôr
sabilidade a todas as empresas, o quadro de seu pessoal. Essas
qualquer que seja o número de empresas deverão, então, optar,
empregados, uma vez que o ônus quase que necessariamente, pela
será sempre proporcional ao grau forma de custeio de serviços ou-
de desenvolvimento e, portanto, à tros de ensino.
capacidade econômica de cada 8. Não deixando de preservar
uma. a continuidade das formas de
5. Atribuindo às empresas a ação já existentes, inclusive o fi-
obrigatoriedade de "manter" en- nanciamento de um sistema de
sino primário gratuito, o preceito bôlsas-de-estudo em escolas man-
constitucional não estatui que elas tidas pela inciativa particular, nos
próprias, necessariamente, o "mi- casos em que essas formas de ação
nistrem". Isso parece tanto mais venham a ser julgadas realmente
procedente quando se confronta o satisfatórias, o anteprojeto de lei
inciso em apreço com o que se lhe institui a quota ou salário-educa-
segue na sistemática do art. 168, ção, a ser pago pelas empresas, em
IV — "As empresas industriais e relação aos filhos de seus empre-
comerciais são obrigadas a minis- gados em idade escolar, e cujo
trar, em cooperação, aprendizagem produto reverterá, em princípio,
aos seus trabalhadores menores, para o desenvolvimento do siste-
pela forma que a lei estabelecer, ma oficial de ensino primário.
respeitados os direitos dos profes- 9. O valor do salário-educação
sôres". é estabelecido em relação ao custo
6. Consagrando, nor outro local presumível do ensino primá-
lado, o princípio da liberdade de rio oficial, calculado esse custo de
ensino (art. 167), que assegura à conformidade com critérios adota-
iniciativa particular o direito de dos pelo Plano Nacional de Edu-
ministrar o ensino dos diferentes cação, aprovado pelo Conselho
ramos, "respeitadas as leis que o Federal de Educação. Admitindo-
regulem", a Constituição oferece se que: a) se atribua ao professor
às empresas, enquadradas no in- das classes de ensino primário
ciso III do art. 168, dois caminhos remuneração equivalente a um e
para o cumprimento da obrigação meio salário-mínimo; b) as des-
que lhes é imposta: a organização pesas com a remuneração do pro-
e manutenção de escolas próprias fessor correspondam a 70% do
ou o custeio de outros serviços de custo total da manutenção desse
ensino primário. ensino, sendo os 30% restantes re-
7. Estendido, porém, o vínculo presentados pelas despesas de li-
da responsabilidade a todas as em- vros e material escolar (13%), pré-
presas, qualquer que seja o núme- dio e equipamento (10%), direção
ro de seus empregados, a possibi- e supervisão do ensino (7%); c) a
lidade da organização e manuten- matrícula média por classe seja de
ção de serviços próprios de ensino 30 alunos, o custo mensal per ca-
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pita do ensino primário, em cada 13. A contribuição assim fi-


região do país, será dado pela xada (2% do salário-mínimo) será
fórmula: arrecadada pelos Institutos de
Previdência Social a que as em-
presas estiverem vinculadas. De-
pois de deduzida a comissão de
meio por cento, relativa às despe-
10. O salário-educação assim sas de arrecadação, os Institutos
determinado (7% do salário-míni- recolherão as contribuições arre-
mo) será devido pelas empresas cadadas em cada Unidade da Fe-
em relação a todos os filhos de deração ao Banco do Brasil, cre-
empregados em idade de escola- ditando-as ao respectivo Fundo
rização obrigatória. Em face das Estadual de Ensino Primário, ou,
possibilidades que as condições na inexistência dêste, à Secretaria
sócio-econômicas do país oferecem de Educação, em conta vinculada
no momento, o anteprojeto de lei ao "Desenvolvimento do Ensino
fixa, inicialmente, a escolarização Primário".
obrigatória para as faixas etárias 14. Estatui o anteprojeto que
compreendidas entre 7 — 11 anos. os recursos provenientes do salá-
rio-educação serão aplicados de
11. À semelhança do que
acordo com planos aprovados pe-
ocorre com o salário-família insti-
los Conselhos Estaduais de Edu-
tuído pela Lei n.° 4.266, de 3 de
cação, determinando, Outrossim,
outubro de 1963, o custeio do sa-
que nos três primeiros anos de
lário-educação será feito pelo sis-
vigência da lei, pelo menos ses-
tema de compensação coletiva,
senta por cento dêsses recursos
isto é, o de rateio entre as empre-
serão destinados à construção e
sas, por força do qual cada em-
equipamento de salas de aula.
prêsa participará com uma contri-
buição fixa por empregado, indis- 15. Procurando preservar, co-
tintamente, sem consideração pelo mo já se assinalou, a continuidade
respectivo estado civil ou número de outras formas de cumprimento
de filhos em idade escolar. do art. 168, III, da Constituição,
estabelece o anteprojeto que fica-
12. Posto que, de acordo com
rão isentas das contribuições rela-
as estimativas atuariais realizadas
tivas ao salário-educação as em-
pelo Ministério do Trabalho e da
presas que mantenham serviços
Previdência Social, e com os índi-
ces etários aplicados ao Censo de próprios de ensino ou sistema de
1960, correspondem a cada 100 ati- bôlsas, um e outro julgados satis-
vos, filiados aos diversos Institutos fatórios por ato da administração
de Previdência Social, 30 menores estadual de ensino, aprovado pelo
de 7 a 11 anos de idade, a contri- Conselho Estadual de Educação.
buição relativa a cada empregado 16. O anteprojeto dispõe ape-
ativo deverá ser, então, 30% do nas sôbre a contribuição das em-
salário-educação, isto é, presas para a manutenção do en-
sino primário comum, determi-
nando que a exigência do ensino
primário supletivo para os empre-
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gados adultos será cumprida na Por sua vez, a aplicação dos re-
forma da legislação estadual. cursos, fazendo-se através da am-
17. Contando-se, em 1962, em pliação dos serviços públicos de
4.800.960 o número de segurados ensino, não implicará, igualmente,
ativos das diversas instituições da na necessidade de criação de no-
Previdência Social e dado que o vos órgãos da administração esco-
salário-mínimo mensal médio vi- lar. Nesses têrmos, a totalidade
gente nas diversas regiões corres- dos recursos será aplicada no de-
ponde a Cr$ 36.000,00, a arreca- senvolvimento dos próprios servi-
dação anual do salário-educação, ços de ensino.
calculada à base dêsses dados, 20. A contribuição percentual
orçaria em (Cr$ 36.000,00 x 0,02 devida pelas empresas não incidirá
x 4.800.960 x 12 = sôbre o total da respectiva folha
Cr$ 41.480.294.400,00). de pagamento, mas sôbre o valor
Em virtude do aumento do resultante da multiplicação do
número de filiados aos Institutos número total de seus empregados
de Previdência Social, que se vêm pelo salário-mínimo local. De
fazendo nestes últimos anos, à ra- acordo com dados que figuram em
zão de cerca de 300.000 por ano, estudo publicado por Conjuntura
não será exagerado estimar-se que Econômica — dezembro de 1963
a arrecadação anual do salário- — págs. 54/56, pode-se calcular
-educação atingiria cerca de cin- que a incidência do salário-educa-
qüenta bilhões de cruzeiros. ção sôbre a folha de pagamento
A arrecadação prevista ultrapas- do pessoal das empresas será em
saria a totalidade dos recursos que, média de 1,33%, oscilando entre os
no presente Exercício, nos têrmos limites de 0,72% a 2%.
da Lei de Diretrizes e Bases (ar- 2 1 . Note-se, Outrossim, que as
tigo 92 e §§), caberia ao Fundo medidas preconizadas pelo ante-
Nacional do Ensino Primário. projeto não acarretarão ônus no-
18. Ainda com base nas esti- vos às empresas que empreguem
mativas atuariais já referidas, po- mais de cem pessoas, pois, estas,
de-se admitir que a contribuição obrigadas pelo imperativo consti-
das empresas, prestada pela forma tucional, já vêm concorrendo, em-
estabelecida pelo anteprojeto, en- bora geralmente sem plano, atra-
sejará anualmente recursos para o vés de formas várias e de provi-
custeio total do ensino primário dências episódicas, para a manu-
de mais de 1.500.000 alunos, ele- tenção do ensino primário.
vando praticamente de 30% o 22. Cabe, ainda, observar que
número de crianças de 7 a 11 anos as medidas determinadas pelo an-
matriculadas atualmente. teprojeto para assegurar a partici-
19. Cumpre ressaltar que, em pação geral das empresas no
face da forma prevista para arre- custeio do ensino primário dos fi-
cadação dos recursos, a instituição lhos de seus servidores consultam
do salário-educação far-se-á sem os princípios de justiça distributiva
a necessidade de criação de qual- e atendem, em medida mais ade-
quer organismo novo e sem a quada, às prementes necessidades
nomeação de nenhum funcionário. da educação nacional.
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23. Não será, também, ocioso nistério, tendo recebido não ape-
lembrar que às próprias empresas nas o apoio, mas, também, a valio-
reverterão, afinal, os frutos do sa colaboração dos ilustres mem-
surto de desenvolvimento que o bros que estiveram presentes aos
salário-educação irá imprimir aos trabalhos: Prof. Jucundino Fur-
efetivos do ensino primário, pois, tado — Chefe do Gabinete, Prof.
como ninguém contesta, a educa- Leônidas Sobrino Porto — Diretor
ção fundamental, pela qualificação Geral do Departamento Nacional
do trabalho, repercute sempre sô- de Educação, Prof. Gildásio Ama-
bre a produtividade e, pela eleva- do — Diretor do Ensino Secundá-
ção do padrão de extensas cama- rio, Prof. Armando Hildebrand —
das da população, não deixa ja- Diretor do Ensino Industrial e
mais de concorrer para o fomento Prof. Lafayette Belford Garcia —
do consumo. Diretor do Ensino Comercial.
24. Devemos, finalmente, res- Aproveito a oportunidade pa-
saltar que, consoante as diretrizes ra apresentar a Vossa Excelência
firmadas por Vossa Excelência, o protestos de estima e alta conside-
anteprojeto de lei foi examinado ração.
pela Comissão de Coordenação CARLOS PASQUALE
Técnico-Administrativa dêste Mi- Diretor do INEP

II. ANTEPROJETO DE LEI N.°

Institui o "salário-educação" e dá outras providências.

O Congresso Nacional, tendo de qualquer condição, na idade


em vista o disposto nos arts. 157, indicada no art. 1.°.
n.° I, e 168, n.° III, da Constitui- Art. 3.° O custeio do "salário-
ção Federal, decreta: -educação" será feito mediante o
Art. 1.° O "salário-educação", sistema de compensação, cabendo
instituído por esta lei, será devido a cada empresa, qualquer que seja
pelas empresas vinculadas à Pre- o número e o estado civil de seus
vidência Social, em relação a todo empregados, recolher, para esse
empregado, como tal referido na fim, ao Instituto ou Institutos de
Consolidação das Leis do Traba- Aposentadoria e Pensões, a que
lho, qualquer que seja o valor e a estiver vinculada, a contribuição
forma de sua remuneração e na que fôr fixada em correspondência
proporção do respectivo número com o valor da quota percentual
de filhos em idade de escolariza- referida no art. 2.°.
ção obrigatória. § 1.° A contribuição de que
Art. 2.° O "salário-educação" trata êste artigo corresponderá à
será estipulado sob a forma de percentagem incidente sôbre o
quota percentual, calculada sôbre valor do salário-mínimo multipli-
o valor do salário-mínimo local. cado pelo número total de empre-
arredondado êste para o múltiplo gados da empresa, observados os
de mil seguinte, por filho menor, mesmos prazos de recolhimento,
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sanções administrativas e penais e tivamente feitas em importância


demais dados estabelecidos com não inferior às contribuições que
relação às contribuições destinadas seriam devidas na forma do ar-
ao custeio da Previdência Social. tigo 3.°.
§ 2.° As contribuições recolhi- Art. 5.° Com o recolhimento do
das, nos Estados, no Distrito Fe- "salário-educação", instituído por
deral e nos Territórios, deduzida a esta Lei, ou por ato da adminis-
parcela de meio por cento relativa tração estadual de ensino baixado
às despesas de arrecadação, serão nos têrmos do art. 4.º, considerar -
depositadas pelos Institutos de se-á atendido, pela empresa, em
Aposentadoria e Pensões no Banco relação aos filhos de seus servido-
do Brasil S/A a crédito do Fundo res, o estatuído no art. 168, n.° III,
Estadual do Ensino Primário, ou, da Constituição Federal.
na inexistência dêste, da Secretaria Parágrafo único. O disposto no
de Educação, em conta vinculada art. 168, n.° III, da Constituição
ao "desenvolvimento do ensino Federal será cumprido pelas em-
primário". presas industriais, comerciais e
§ 3.° Os recursos, de que trata agrícolas, em relação aos seus pró-
êste artigo, serão aplicados, nos proprios servidores, na forma da
Estados e no Distrito Federal, de legislação estadual.
acordo com planos aprovados pe- Art. 6.° O recolhimento do sa-
los respectivos Conselhos Esta- lário-educação, por parte dos pro-
duais de Educação e, nos Territó- prietários rurais, que não puderem
rios, de conformidade com os cri- manter escolas primárias, para as
térios que forem baixados pelo crianças residentes em suas glebas,
Conselho Federal de Educação. não os exonera do cumprimento
Art. 4.° Ficarão isentas do re- do estatuído no art. 32 da Lei
colhimento da contribuição, de n.° 4.024, de 20 de dezembro de
que trata o art. 3.°, as empresas 1961.
comerciais, industriais e agrícolas Art. 7.° Ficam assim fixados.
que mantiverem serviço próprio pelo período de três anos, as ida-
de ensino primário (Constituição des e os valores relativos a esta
de 1946, art. 168, n.° III) ou que Lei:
instituírem sistema de bolsa (Lei
n.° 4.024, de 20 de dezembro de 1) 7 a 11 anos a idade de esco-
1961, art. 31, § 1.°), um e outro, larização obrigatória a que
em têrmos julgados satisfatórios se refere o art. l.°;
por ato da administração estadual 2) sete por cento para cada
de ensino, aprovado pelo Conselho quota percentual a que se
Estadual de Educação. refere o art. 2.°;
Parágrafo único. A isenção de 3) dois por cento para a con-
que trata êste artigo, concedida tribuição de que trata o
pelo prazo de um ano, será reno- art. 3.°, § 1.°.
vada mediante comprovação da
regularidade das providências rea- § 1.° Durante o mesmo período
lizadas pelas empresas, dos resul- de três anos, os planos de que
tados obtidos e das despesas efe- trata o § 3.° do art. 3.°, destinarão,
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obrigatoriamente, pelo menos ses- remuneração devida aos empre-


senta por cento dos recursos para gados .
a construção e equipamento de Art. 9.° Esta Lei entrará em
salas de aula. vigor a partir do primeiro dia do
§ 2.° Se, findo o período previsto mes que se seguir ao decurso de
neste artigo, não forem revistos as trinta dias, contados da data de
idades e os valores nele fixados, sua publicação.
continuarão a vigorar até que isso Art. 10. O Poder Executivo
se venha a efetuar. expedirá a regulamentação desta
Art. 8.° As quotas de "salário- Lei.
-educação" não se incorporarão, Art. 11. Revogam-se as dispo-
para nenhum efeito, ao salário ou sições em contrário.
I CENSO ESCOLAR NACIONAL
Na l . a Reunião conjunta do Conselho regado da Comunicação "Problemas do
Federal e Conselhos Estaduais de Edu- Ensino Primário". Iniciando pela lei-
cação, realizada no Rio em novembro
tura das Conclusões do seu trabalho,
de 1963, coube ao Prof. Almeida Jú-
nior, relatando problemas do ensino salientou o relator que para a efetivação
primário, recomendar o levantamento dos propósitos da Lei de Diretrizes e
anual das crianças em idade escolar, Bases, em relação ao ensino primário,
a partir de 1964. No mesmo sentido, impõe-se desde já: 1.°) que a admi-
o Cons. Carlos Pasquale comunicou a
aprovação pelo Cons. Estadual de São nistração do ensino nos Estados, Distrito
Paulo do Recenseamento Escolar e do Federal e Territórios promova, a partir
Convênio Estadual de Educação, sendo de janeiro de 1964, o levantamento
afinal adotada a recomendarão do anual do registro das crianças em idade
Prof. Almeida Júnior ao terminar o
escolar ( a r t . 2 8 ) ; 2.°) que cada mu-
encontro. Em maio de 64, a Secre-
taria de Educação promove o Censo nicípio realize, em princípios de 1964
Escolar Estadual e o Ministério da a chamada da população escolar de
Educação toma providências para a 7 anos de idade, para matrícula, a ela
realização do Censo em todo o País, acrescentando, se possível, das crianças
com ofício do Ministro Flávio Suplicy
de Lacerda ao Presidente do IBGE de 7 a 10 anos ainda fora da escola
propondo a assinatura de convênio. ( a r t . 2 9 ) ; 3.°) que cada município,
A apresentação desse documentário por si ou em convênio com o Estado,
está aqui distribuída em três partes: inicie ou intensifique a construção de
I. O Censo na reunião dos Conselhos
prédios para as suas escolas primárias,
de Educação; I I . O Censo Escolar na
Guanabara; I I I . Providências iniciais e 4.°) que a União coopere financeira-
do Ministério. mente com os Estados e os municípios
para a compra, construção ou reforma
I - O CENSO NA REUNIÃO DOS de prédios escolares destinados ao ensino
CONSELHOS D E EDUCAÇÃO primário".

Na reunião conjunta do Conselho Fe- • • •


deral de Educação com os Conselhos
Estaduais (GB — novembro, 1963), Sôbre o assunto, o Conselheiro Carlos
consta da "ata da sessão sôbre o ensino Pasquale, do Estado de São Paulo, apre-
primário": * sentou a seguinte comunicação:
"Às 15 horas do dia 12 de novem- " E m relação à matéria em apreço,
bro de 1963, sob a presidência do apraz-nos comunicar que o Consellio
Prof. Deolindo Couto, teve início a de Educação do Estado de São Paulo
sessão especial dedicada ao ensino pri- já aprovou, em princípio, a realização
mário. Tomou lugar à mesa o Cons. 0 de duas providências que reputamos de
federal Antônio Almeida Júnior, encar- grande alcance e oportunidade.

* Documenta n.° 21 (2. a parte, p. 64)


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São elas o Recenseamento Escolar do educacional, a atingir até 1970, são, no


Estado e o Convênio Estadual de En- âmbito do ensino primário, seis anos de
sino. escolaridade para todos os brasileiros, e,
A necessidade da realização do Re- no campo do ensino médio, o aumento
censeamento Escolar comprova-se facil- do número de oportunidades educacio-
mente . nais de doze, que são atualmente, para
A LDB determina (art. 93) que os trinta alunos por mil habitantes.
recursos a que se refere o art. 169 da A programação das tarefas necessá-
Constituição Federal serão aplicados rias ao alcance das metas preestabele-
preferencialmente na manutenção e de- cidas requer, por sua vez, o exato conhe-
senvolvimento do sistema público de cimento de, entre outros, os seguintes
ensino, de acordo com os planos esta- elementos fundamentais: a) número
belecidos pelos Conselho Federal e pe- de crianças e jovens em idade escolar;
los Conselhos Estaduais de Educação. b) estado de desenvolvimento do sis-
Em face da disposição expressa da tema educacional existente, e c) defi-
LDB, os planos de educação tornaram- ciências, desvios e erros dos serviços
se, finalmente, em nosso país, uma existentes em relação aos objetivos pre-
necessidade imperiosa, "inarredável". tendidos .
O planejamento da educação não se O recenseamento escolar nos dará a
fará, porém, sem a prévia formulação conhecer, de pronto, os elementos
de uma política educacional e sem a apontados, e, em relação ao primeiro,
segura programação das tarefas neces- isto é, à população em idade escolar
sárias para a consecução de um ou mais com um grau de exatidão incompara-
objetivos da política adotada. velmente maior do que o obtido pelas
Formular uma política educacional, atualizações do Censo Demográfico de
observa J. Roberto Moreira, é "tanto 1960 ou por estimativas de outra
determinar as necessidades de educação natureza.
como definir os ideais que devem orien- Ainda recentemente, pará oferecer
tar a satisfação dessas necessidades; alguns elementos básicos ao Plano de
logo, é necessária a pesquisa do dese- Emergência do Ministério da Educação
jado e do desejável". e Cultura, então em elaboração, o INEP
A política educacional pode ter dife- procedeu ao levantamento do déficit de
rentes graus de extensão e de profun- matrículas e de salas de aula nas cida-
didade. No aspecto da extensão ela des, vilas e zonas rurais dos distritos e
pode considerar objetivos imediatos e dos municípios.
mais distantes, tendo em vista as neces- Trata-se de um levantamento refe-
sidades culturais, políticas e econômicas rente aos dados de 1960 e feito à base
nacionais. No aspecto de profundidade, da matrícula-população da faixa etária
busca determinar os limites possíveis e de 7 a 14 anos, para o qual serviram
gradativos dos diferentes setores educa- de fontes o Boletim PE/3/1960 do Ser-
tivos e sua relação de importância com viço de Estatística da Educação e Cul-
respeito aos objetivos considerados no tura, e a Sinopse Preliminar do Censo
aspecto extensivo. Demográfico de 1960, do IBGE.
De acordo com os solenes compro- "Esse levantamento, acentua o pró-
missos firmados em Punta Del'Este e prio INEP, ressentindo-se embora de
em Santiago, as metas da nossa política várias limitações (urgência de prazo,
204 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

omissão de elementos fundamentais não damente para um órgão novo das possi-
computados ainda pela estatística, uso bilidades e recursos do Conselho Esta-
de estimativas grosseiras para a obten- dual de Educação.
ção da população escolarizável), que Não podemos, porém, considerá-lo
terão afetado seus resultados, provavel- inexeqüível, quando nos lembramos que
mente com significativa margem de o Estado de São Paulo já o realizou uma
erro, foi utilizado, apesar de tudo, por vez, com pleno êxito.
ser a única fonte disponível sôbre o Ocorreu isso em 1920, quando o Es-
assunto e cujos dados resultantes ser- tado contava apenas 4,5 milhões de
viriam, pelo menos, como ponto de habitantes.
partida e de referência inicial para no- O Recenseamento Escolar, então rea-
vos e mais seguros estudos". lizado, visava saber, "com segurança e
Confrontando-se os resultados do le- verdade":
vantamento do déficit de salas de aula
a) quantas eram as crianças de 6
no Estado de São Paulo feito pelo INEP a 12 anos analfabetas; b) onde se
com o realizado pelo Fundo Estadual achavam elas; c) quais as condições
de Construções Escolares, verifica-se dêsses locais.
que a margem de que aquêles resultados
Por uma feliz coincidência para os
foram afetados, em virtude provavel-
bons resultados dêste primeiro encontro
mente da omissão de elementos funda-
de Conselhos de Educação, a chefia do
mentais, de que pudemos dispor na Recenseamento Escolar Paulista de 1920
esfera estadual, é realmente muito foi exercida pelo ilustre relator do tema
grande, atingindo freqüentemente cerca desta sessão, o eminente Conselheiro
de 100% e até mais dos valores apu- Almeida Júnior, que nos poderá prestar
rados . seu autorizado depoimento sôbre o tra-
A promoção da realização do Recen- balho, que, não obstante a precariedade
seamento Escolar do Estado não foge dos meios de comunicação de que o
à competência do Conselho de Edu- Estado dispunha àquela época, foi rea-
cação de São Paulo, pois a êste in- lizado em apenas 81 dias, pois tal foi
cumbe, nos têrmos da lei que o insti- o espaço de tempo que decorreu entre
tuiu, "promover e realizar estudos sôbre a ordem de execução do serviço (18 de
o sistema estadual de ensino, adotando junho) e a publicação dos resultados
e propondo medidas que visem à sua (7 de setembro).
expansão e aperfeiçoamento (art. 4.°, Nos têrmos da Resolução aprovada
XV)". pelo Conselho Estadual de Educação
Por sua vez, as Normas Regimentais (20-10-1963), o Recenseamento Escolar
do Conselho cometem à Comissão de do Estado deverá ser realizado no iní-
Elaboração do Plano Estadual de Edu- cio do próximo ano letivo, segundo bases
cação: "a) realizar, reunir e coordenar e critérios a serem sugeridos pela Co-
estudos e levantamentos relativos à de- missão de Elaboração do Plano Estadual
finição de política educacional, fixação de Educação.
de objetivos e determinação de priori- Afigura-se-nos que os objetivos do
dades no âmbito do sistema estadual de próximo Recenseamento Escolar pode-
ensino" (art. 2 2 ) . rão ser um pouco mais ambiciosos do
A realização do Recenseamento Es- que os de 1920, a fim de que o levan-
colar pode parecer obra temerária, nota- tamento abranja as áreas de ensino
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primário e médio, determinando, por a revelação do déficit de vagas nas es-


exemplo: a) situação escolar da popu- colas primárias deve ser feito pelo re-
lação de 5 a 18 anos ou, pelo menos, censeamento escolar e não pela chamada
de 6 a 14 anos; b) a situação da rede da população escolar.
de escolas de primeiro e segundo graus; A chamada da população escolar de
c) as condições dos locais desprovidos 7 anos visa, nos expressos têrmos da lei,
de escolas de ensino primário e médio. à matrícula dessas crianças, e, não à
Feito o recenseamento, disporá o constatação da possibilidade de efeti-
Conselho Estadual de Educação de vá-la. A chamada há de ser, por conse-
um quadro de realidade para programa- guinte, ato posterior à verificação e à
ção de realizações que correspondam às eliminação do déficit de vagas e de
necessidades de crescimento no sentido escolas.
escolar e no sentido populacional, de Acresce ponderar, finalmente, que o
forma que a educação primária atinja recenseamento terá a virtualidade de
tôda a população em idade correspon- de marcar o início das atividades do
dente e se amplie até 6 anos de estudos. Consellio Estadual de Educação, por
O recenseamento constituirá, ainda, o uma providência da mais alta significa-
ponto de partida para o cumprimento ção para o planejamento da educação
dos artigos 28 e 29 da LDB, que visam em bases reais e ecoará, em todas as re-
precisamente garantir a obrigatoriedade giões do Estado, como uma clarinada
dêsses estudos mínimos por parte de destinada a despertar a consciência pú-
todos os brasileiros, dispõem sob o le- blica para os problemas do ensino.
vantamento anual do registro das A segunda providência sugerida — a
crianças em idade escolar, do incentivo realização do Convênio Estadual de
e da fiscalização da freqüência às aulas Ensino — justifica-se igualmente.
(da competência do Estado) e sôbre
Ao dispor que, anualmente, a União
a chamada anual da população escolar
aplicará nunca menos de 10%, e os Esta-
de 7 anos de idade, para matrícula na
dos, o Distrito Federal e os Municípios,
escola primária (da competência do
nunca menos de 20% da renda resul-
Município).
tante de impostos na manutenção e de-
Pelo recenseamento, poderão ser senvolvimento do ensino, a Constituição
também determinadas, com precisão, da Bepública estabelece, claramente, a
nas áreas de pouca densidade demo- responsabilidade solidária das três esfe-
gráfica, quais são os proprietários ru- ras da Administração Pública na reali-
rais que, não podendo manter escolas zação desse serviço fundamental para a
primárias para as crianças residentes em Nação.
suas glebas, estão obrigados, nos têrmos
A LDB, reiterando, de certo modo,
do art. 32 da LDB, a facilitar-lhes a
a responsabilidade das administrações
freqüência às escolas mais próximas, ou
estaduais e municipais, não só estabe-
propiciar a instalação e funcionamento
lece que "os Estados, o Distrito Fe-
de escolas públicas em suas proprie-
deral e os Municípios se deixarem de
dades .
aplicar a percentagem prevista na Cons-
Divergindo, data venia, de um dos tituição Federal, para manutenção e
pontos da Indicação da douta Câmara desenvolvimento do ensino, não poderão
de Ensino Primário e Médio do Egrégio solicitar auxílio da União para esse fim
Consellio Federal de Educação aos par- (art. 92, § 2.°), como discrimina as
ticipantes desta reunião, pensamos que despesas que podem ser consideradas
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como "despesas de ensino" ( a r t . 9 3 , cursos federais, estaduais e municipais,


§§ 1.° e 2 . ° ) . destinados à manutenção do ensino, e
A fim de que o esforço comum apre- opinar sôbre os respectivos convênios de
sente o maior rendimento possível, im- ação interadministrativa" (art. 4.°,
põe-se, por outro lado, a formulação de III).
normas e planos de ação interadminis- Processado o recenseamento, conhe-
trativa, que, delimitando a esfera de cidos seus resultados e despertada a
competência de cada órbita da Admi- consciência pública local para os pro-
nistração, evitem os gastos supérfluos e
blemas de ensino, a ocasião será propí-
os desperdícios, que resultam da redun-
cia para a lavratura do Convênio Esta-
dência de providências e da dispersão
dual de Ensino destinado a fixar os
de iniciativas.
têrmos gerais da ação administrativa do
A L D B fixa a atribuição da União
Govêrno Estadual e dos governos muni-
e dos Estados no setor educacional, e
cipais, relativamente ao mesmo objetivo.
os planos de aplicação de recursos fe-
derais elaborados já na vigência dêsse O Convênio Estadual de Ensino
diploma legal delimitam a forma e a abrirá amplos caminhos para uma con-
extensão da ação supletiva do Govêrno jugação de esforços e poderia regular,
Federal. entre outras, as seguintes questões:
Já o mesmo não ocorre com as atri- a) organização, em cada município
buições dos municípios em relação ao ou distrito, do cadastro escolar, com o
E s t a d o . Quem quer que examine o objetivo de permitir a chamada da po-
modo pelo qual os municípios aplicam pulação escolar e tornar efetiva a obri-
os recursos destinados ao ensino, certi- gatoriedade da matrícula e da freqüên-
ficar-se-á da absoluta necessidade do
cia escolar;
estabelecimento de normas que entrosem
a atuação municipal com as iniciativas b) emprego harmônico dos recursos
do Govêrno Estadual. estaduais e municipais destinados à
manutenção do ensino;
Não obstante a Constituição do Es-
tado de São Paulo determine que "po- c) elaboração, para cumprimento
derá o Estado estabelecer convênios progressivo, de um plano de construção,
com os municípios que prefiram entre- aparelhamento e conservação de pré-
gar-lhe, no todo ou em parte, os re- dios escolares;
cursos obrigatoriamente destinados à d) planejamento dos serviços de
educação, a fim de empregá-los no ensino de modo que a rede de escolas
ensino estadual local" ( a r t . 122), o primárias satisfaça às necessidades da
certo é que essa faciddade em nenhuma população, com observância da norma
única vez teve possibilidade de efeti- da Constituição Estadual, estabelecendo
var-se nestes 16 anos de vigência da que "o Estado distribuirá equitativa-
carta constitucional paulista. mente, pelo seu território, escolas secun-
Animada, sem dúvida, do propósito dárias, profissionais e agrícolas, podendo
de corrigir a situação apontada, a Lei fazê-lo em colaboração com os municí-
n.° 7.940, de 7-6-1963, que instituiu o pios diretamente interessados";
Conselho Estadual de Educação confe- e) instituição de serviços auxiliares
riu a êste órgão a competência d e : — realmente eficientes — d e : 1) trans-
"propor critérios gerais e sugerir me- porte escolar intermunicipal, para as
didas para aplicação harmônica dos re- crianças da zona que nao comporte a
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instalação de classe de ensino primário; zando de recenseamento escolar e do


2) transporte escolar intermunicipal, registro civil bem como de quaisquer
para estudantes de escolas dos vários outros dados estatísticos do IBGE e dos
ramos de ensino médio, que residam em municípios.
município cujas condições de desenvol- 2.° A chamada anual da população
vimento não justifiquem a criação do
escolar de 7 anos de idade, para ma-
estabelecimento de ensino do gênero;
trícula na escola primária, nos têrmos
f) instituição de serviços auxiliares do art. 29 da Lei de Diretrizes e Bases.
e de serviços de assistência social.
Para esse chamamento, poderá servir
Quanto mais nos aprofundamos no de modêlo o Edital baixado pela Secre-
exame das providências apontadas — taria de Educação do Estado da Gua-
Recenseamento Escolar do Estado e nabara, instituindo os atestados de-
Convênio Estadual de Ensino — tanto
isenção.
mais nos convencemos de que elas re-
presentam os passos fundamentais para A autoridade municipal utilizará os
o planejamento e para a execução de dados estatísticos coordenados pelo
um programa de eficientes realizações IBGE, o levantamento da população
no campo educacional. escolar feito pelos Estados e dados e
pesquisas diretas ao seu alcance.
Cabe a essa l . a Reunião Conjunta
3.° Os Estados e os Municípios deve-
decidir sôbre se essas medidas devem
rão adotar, para solução de medidas de
ser indicadas ao Conselho Federal e aos
mútuo interesse em matéria de ensino,
Conselhos Estaduais de Educação, para
a fórmula dos convênios, cada qual ins-
a adoção em outras Unidades da F e -
pirado efetivamente nas necessidades e
deração, de acordo com as possibilida-
possibilidades locais, guardando, sempre
des de cada uma e com a eventual
que possível, os preceitos de unidade
colaboração de recursos federais" ••.
administrativa.
4.° Esses convênios terão, dentre ou-
tros, os seguintes objetivos preferenciais:
Indicação sôbre sugestões
a) o estudo, em conjunto, das ne-
Na reunião do Conselho Federal de cessidades do município em ensino pri-
Educação com os Representantes dos mário e médio, dentro das metas do
Conselhos Estaduais, após os debates Plano Nacional de Educação, e o aten-
sôbre competência, intercâmbio, plane- dimento a essas necessidades pelo Esta-
jamento e problemas de ensino, foram do, pelo Município e pela iniciativa
formuladas as seguintes sugestões, a se- privada, concluindo por indicar o déficit
rem consideradas pelas autoridades escolar efetivo, a ser considerado pela
competentes: • • União, mediante o auxílio que lhe pro-
1.° Os Estados, o Distrito Federal e porcionará o Plano Nacional de Edu-
os Territórios promoverão, nos têrmos cação;
do art. 28 da Lei de Diretrizes e Bases, b) a designação de um diretor de
o levantamento anual do registro das um grupo estadual, com funções de di-
crianças em idade escolar, dentro do retor de ensino no município, ou de
primeiro trimestre de cada ano, utili- uma junta integrada também por ele-

* Idem, p. 77 e seguintes.
** Idem. pp. 155 e 156.

6 — 34 901
208 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

mento municipal para a coordenação de 2. De acordo com o art. 29 da Lei


atividades educacionais, por município, de Diretrizes e Bases da Educação Na-
sem quebra de autonomia municipal; cional, a Secretaria de Educação e Cul-
c) a elaboração, até agosto de cada tura expediu os Editais de 4 de d e -
ano, pelos Conselhos Estaduais, dos zembro de 1962, e de 4 de novembro
respectivos planos estaduais, compreen- de 1963, que fazem a chamada da po-
sivos das atividades a cargo dos Estados pulação escolar para a matrícula na
e Municípios, integrados também pela escola primária.
atividade independente de auxílio da 3. O art. 28 da mesma Lei deter-
União; mina que a Administração estadual de
d) o estudo em cada município do ensino proceda ao levantamento anual
custo do ensino, consideradas as unida- do registro das crianças em idade es-
des federais, estaduais, municipais e colar.
particulares, para o efeito do a r t . 96 4. A realização anual do censo es-
da Lei de Diretrizes e Bases; colar na Guanabara constitui providên-
e) a previsão de programas de cons- cia indispensável para a fiel execução
da obrigatoriedade da educação pri-
trução de prédios escolares, com o con-
mária .
curso das três esferas da administração
pública, mediante financiamento a longo 5. A efetivação do censo deve caber
prazo. aos serviços públicos do ensino estadual
que deverão planejá-lo e mobilizar o
5.° A próxima Reunião do Conselho
pessoal recenseador, assinalando os altos
Federal de Educação com Representan-
objetivos da tarefa a empreender.
tes dos Conselhos Estaduais considerará,
Isto posto:
em seu temário, o programa de constru-
ções de prédios escolares e as modali- O Secretário de Estado de Educação
dades de financiamento dos serviços de e Cultura, dando cumprimento à Lei
educação. n.° 4.024, de 20 de dezembro de 1961,
que fixa as Diretrizes e Bases da Edu-
II - O CENSO ESCOLAR NA cação Nacional, e ao Decreto Estadual
GUANABARA n.° 808, de 9 de janeiro de 1962, que
tornou compulsório o ensino primário
Para sua execução, a Secretaria de no Estado da Guanabara,
Educação expediu portaria e instruções
destinadas ao recenseador: RESOLVE:

PORTARIA " N " SED n.° 4 - DE 17 1. Fica instituído no Estado da


DE F E V E R E I R O DE 1964 Guanabara o censo das crianças em
idade escolar.
Institui o censo das crianças em idade 1 . 1 . O censo escolar abrangerá ;ts
escolar no Estado da Guanabara. crianças de 5 a 14 anos de idade.
O Govêrno do Estado da Guanabara, 2. O planejamento e a execução do
cumprindo a Constituição Federal e o censo escolar ficarão a cargo do Depar-
a r t . 27 da Lei de Diretrizes e Bases da tamento de Educação Primária, do De-
Educação Nacional, tornou compulsório partamento de Educação Média e Su-
o ensino primário em seu território e perior, do Instituto de Pesquisas Edu-
regulamentou a sua obrigatoriedade cacionais e do Serviço de Estatística,
através do Decreto Estadual n.° 808, de com a colaboração dos demais órgãos da
9 de janeiro de 1962. Secretária de Educação c Cultura.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 209

3. A Secretaria de Educação e Cul- IDENTIFICAÇÃO D O


tura promoverá, anualmente, a atuali- RECENSEADOR
zação do censo da população infantil
A apresentação do formulário a ser
em idade escolar.
pfeenchido identifica automaticamente
4. A participação nos trabalhos do
o recenseador. Recomenda-se, todavia,
censo escolar será considerada serviço
a levar consigo uma carteira de iden-
público relevante.
tidade pessoal, funcional ou profissio-
5. Ao magistério primário oficial
nal, ou uma carteira de estudante, que
que participar do censo escolar ficam
será apresentada quando fôr solicitada.
asseguradas as seguintes vantagens:
a) pontos para efeito de remoção,
ATITUDE DO RECENSEADOR
correspondentes ao número de crianças
e de domicílios recenseados; Procure despertar o interesse e a sim-
b) prorrogação de dez ( 1 0 ) dias do patia do informante. Seja cortês e im-
período de férias escolares, de acordo parcial ao efetuar a entrevista. Escla-
com o critério a ser estabelecido pelo reça, com boa vontade, os propósitos
Departamento Primário, sem prejuízo do do Censo. Mesmo no caso de ser rece-
número total anual de dias de aula. bido com desconfiança ou visível má-fé,
não discuta: argumente com clareza e
6. O Departamento de Educação
serenidade, procurando lançar mão de
Primária baixará as normas complemen-
todos os recursos conciliatórios. Lem-
tares e tomará providências necessárias
bre-se de que o nosso interesse é obter
ao perfeito cumprimento do disposto
informações válidas, e que o êxito do
nesta Portaria.
censo dependerá da boa vontade e co-
FLEXA Ribeiro
operação de cada informante.
Secretário de Educação
Em alguns casos, será necessário,
INSTRUÇÕES GERAIS com habilidade, conter a excessiva lo-
quacidade de pais que pretendam apro-
QUEM DEVE PRESTAR
veitar a ocasião para consultas ou escla-
INFORMAÇÕES
recimentos alheios aos objetivos do
Todos os pais ou responsáveis por censo.
crianças entre 5 e 14 anos de idade
são obrigados a prestar as informações CONHECIMENTO DO
solicitadas no formulário. Está sendo FORMULÁRIO
realizada uma campanha de esclareci-
mento junto aos pais e responsáveis, Familiarize-se com o instrumento de
alertando-os sôbre a data de realização coleta, lendo atentamente estas instru-
do censo e solicitando a sua cooperação. ções. Examine cuidadosamente o for-
mulário e a folha de controle a serem
C O N H E C I M E N T O DO SETOR preenchidos. Lembre-se de que é SUA
CENSITÁRIO a tarefa de orientar o informante. Você
deverá estar capacitado a solucionar
Estude cuidadosamente o setor que
quaisquer dúvidas que, porventura,
lhe foi confiado, inteirando-se dos seus
apareçam por ocasião da coleta.
limites e das condições que lhe são pe-
culiares, a fim de que possa tomar me- Participe das reuniões relativas ao
didas que facilitem e apressem a coleta censo e não se acanhe de pedir esclare-
de dados. cimentos. Não se esqueça de que, uma
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vez em ação, você deve seguir as ins- por setor os logradouros a serem recen-
truções dêste manual sem interpreta- seados conforme consta da folha des-
ções particulares ou modificações pes- tinada à discriminação dos locais;
soais . — o 3.° número designa os domicílios
recenseados e deverá ser atribuído de
PREENCHIMENTO DO acordo com a ordem em que fôr rea-
FORMULÁRIO
lizada a coleta dos dados. Êste número
O formulário deve ser preenchido de ordem deve ser idêntico ao consig-
com clareza, pelo rccenseador, com base nado na folha de controle. Inicie a nu-
nas informações prestadas pelo pai ou meração com 001 correspondente ao
responsável. Em hipótese alguma, po- primeiro domicílio recenseado e prossi-
derá ser deixado na residência do in- ga utilizando sempre três algarismos
formante . (por exemplo, o 4.° domicílio visitado
Preencha o formulário com letra le- receberá o número 004; o 25.° domicílio
gível. Lembre-se de que qualquer ine- receberá o número 025, etc.).
xatidão ou falha poderá vir a anular
os resultados de seu esforço. Para maior Observe no formulário os seguintes
clareza, utilize caneta esferográfica. quesitos:
Todas as informações devem ser re-
gistradas nos espaços reservados para • RESIDÊNCIA
esse fim. Marque, portanto, com um X Registre o nome do local, especifi-
apenas os quadrinhos correspondentes cando se é rua, avenida, travessa, largo,
às informações obtidas. Complemente, e t c , bem como o número do prédio, da
se necessário, com outras informações
dependência, o bairro e o número do
escritas por extenso nas linhas adequa-
telefone, se houver.
das.
Procure obter todas as informações EXEMPLO: Rua Conselheiro Lafayette
solicitadas. Não deixe em branco ne- n.° 29, apt. 402, Copacabana -
nhum tópico. Se de todo fôr impossível Tel. 27-2292.
obter determinada informação, assinale
o fato nas linhas destinadas às obser- Na hipótese de não existirem estes
vações . dados, procure registrar indicações que
Mesmo que alguma resposta lhe pa- permitam localizar o domicílio da me-
Teça inexata ou deficiente, não a altere lhor forma possível.
por conta própria. Procure obter do
informante a necessária complementação. EXEMPLO: Morro do Cantagalo s/n.°
— Copacabana.
NUMERAÇÃO DO
FORMULÁRIO Não existindo telefone na residência,
especifique o número de outro aparelho
O formulário deverá ser numerado
em que pode ser encontrado o respon-
pelo recenseador, obedecendo às se-
sável (vizinho, local de trabalho, e t c . ) .
guintes recomendações:
Se de todo fôr impossível apurá-lo, faça
— o 1.º número corresponderá ao
um traço horizontal indicando ausência.
Distrito Educacional;
— o 2.° número corresponderá ao se- EXEMPLO: Avenida do Comércio,
tor que lhe foi confiado. Entendem-se n.° 33, casa II.
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• DATA DE NASCIMENTO — se a família estiver ausente, pro-


cure saber a data provável do re-
Se o responsável ignorar a data (dia,
torno. Faça a coleta em outra
mês e a n o ) , procure saber o ano apenas
ocasião, se a família retornar ainda
ou a idade presumida do menor, con-
dentro do prazo fixado para o
signando-a nas observações.
censo;
— se a ausência fôr apenas de horas,
• NOME DO PAI OU DA MÃE
procure saber do vizinho ( s ) ou
Declare adiante do nome do pai ou do síndico (porteiro) a hora pro-
da mãe, quando os mesmos forem igno- vável de ser encontrado o morador
rados ou falecidos: ignorado — falecido. (exemplo: mães de família que tra-
balham fora);
• O N D E ESTUDA — o agente recenseador deverá envi-
Se o responsável declarar que a crian- dar todos os esforços no sentido
ça estuda em casa, procure apurar o de colher as informações, voltando
motivo e consigne nas observações. ao domicílio, se necessário, para
obtè-las;
• INCAPACIDADE FÍSICA — na absoluta impossibilidade de
Entende-se por fisicamente incapaz estabelecer contato com o respon-
a criança paralítica, cega, surda, por- sável ou pessoa credenciada até o
fim do prazo previsto para o re-
tadora de doença infecto-contagiosa ou
censeamento, deverá consignar
de anomalia física.
esse fato na folha de dontrôle.
Declare, adiante, o tipo de enfermi-
dade ou doença no caso de a criança ser b) Na hipótese de o informante igno-
doente ou sofrer de alguma incapacidade rar a resposta a determinadas per-
física. guntas, não sendo êle pai, mãe ou
responsável pela criança, anote,
• INCAPACIDADE MENTAL também, na folha de controle, a
hora provável em que possa ser
Entende-se por mentalmente incapaz encontrada a pessoa mais bem ca-
a criança profundamente retardada: pacitada para prestar declarações,
imbecil ou idiota. e volte para obtè-las.
c) Domicílios coletivos: hotéis, pen-
• NOME DO INFORMANTE
sões, orfanatos, casas de cômodos,
Registre o nome da pessoa que pres- asilos.
tou as declarações.
A coleta de dados deverá proces-
sar-se normalmente, neles devendo
INSTRUÇÕES PARA CASOS
ser considerados: quartos, porões,
ESPECIAIS
alpendres, sótãos, e t c .
a) Na hipótese de não ser encontrado
o informante: d) Filhos da empregados domésticos.

— procure saber se o domicílio está Deverão ser recenseados na re-


desabitado ou se a família está sidência dos patrões, se aí residirem
ausente; efetivamente. Caso contrário, de-
— se estiver desabitado, lance "vago" verão ser recenseados em sua pró-
na folha de controle; pria residência.
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F O L H A DE CONTROLE DISTRIBUIÇÃO E E N T R E G A DO
MATERIAL DO CENSO
UTILIZAÇÃO DA FOLHA DE
CONTROLE Os formulários e folhas de controle
serão distribuídos pelo Departamento
Registre, no espaço destinado a de Educação Primária aos Diretores de
"logradouro", além do nome ou indi- Divisão de Educação das Regiões Ad-
cação correspondente à discriminação ministrativas e, por estes, aos Chefes dos
do Setor, se é zona urbana ou não, Distritos Educacionais que lhes são su-
favela, morro urbanizado ou não. bordinados e aos quais compete realizar
a distribuição do material aos recensea-
A l. a coluna corresponde ao "número dores, assim como a atribuição de
de o r d e m " . Inicie a numeração com setores.
001 no 1.° domicílio visitado e siga as-
O material do censo consta do se-
sim até o final do trabalho. Não in- guinte:
terropa esta seqüência mesmo que mude
de logradouro, pois assim teremos auto- a) Formulário destinado à coleta do
maticamente as informações necessárias censo;
para a avaliação do seu trabalho. b) Folha de controle;
a
A 2. coluna corresponde ao "número c) Folha contendo a distribuição
do domicílio e dependência". Anote as dos logradouros onde cada equi-
indicações devidas e, em casos especiais pe de coletores irá trabalhar e
da ausência de número, outra informa- que delimita o setor a seu cargo.
ção que possibilite a localização, como:
próximo ao número, rua ou km tal, etc. Uma vez terminada a coleta, os dados
deverão ser entregues à Chefia do Dis-
A 3 . a coluna corresponde ao "nome trito Educacional que fará o controle
do informante". Quando o informante do material e a triagem das fichas de
não fôr responsável pelo domicílio, re- crianças matriculadas e não matricula-
gistre a condição do mesmo. Exemplo: das.
empregada, filho, vizinho ou outra no
gênero. III - PROVIDÊNCIAS INICIAIS DO
a
A 4. coluna diz respeito ao total das MINISTÉRIO
crianças de 5 a 14 anos recenseados
Em exposição de motivos ao Ministro
no domicílio. Flávio Lacerda, o Prof. Carlos Pasquale
fundamentou a oportunidade da reali-
A 5. a coluna se destina a anotar os
zação do Censo, havendo então o Minis-
números dos questionários utilizados. tro oficiado ao Presidente do IBGE pro-
Exemplo: 0 0 1 / 4 — no caso de serem pondo o convênio. Seguem esses do-
4 crianças. cumentos:

A 6. a coluna será preenchida apenas 1. EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS AO


com um X no caso de não haver crian- MINISTRO DA EDICAÇÃO
ças de 5 a 14 anos.
1. Ao determinar que a União apli-
A 7. a coluna servirá para anotações cará, anualmente, nunca menos de
diversas: dia e hora provável de ser dez por cento, e os Estados, o Distrito
encontrado o morador, domicílio vago, Federal e os Municípios nunca menos
etc. de vinte por cento da receita de im-
REVISTA BRASILEIRA DE

postos na manutenção e desenvolvimento lece, em matéria de política educacio-


do ensino (art. 169), a Constituição nal, as seguintes metas quantitativas a
estabelece a responsabilidade solidária atingir até 1970:
das três órbitas da Administração Pú-
a) Ensino Primário, matrícula até a
blica na obra da educação nacional.
quarta série de 100% da popula-
2. O preceito constitucional, já por
ção escolar de 7 a 11 anos de
si, impõe, obviamente, a formulação de
idade e matrícula nas quinta e
normas e a elaboração de planos de ação
sexta séries de 70% da população
interadministrativa, que demarquem a
escolar de 12 a 14 anos;
esfera de competência de cada uma das
b) Ensino Médio, matrícula de 70%
órbitas do Poder Público no setor do
da população escolar de 11 e 12
ensino.
a 14 anos nas duas primeiras
3. A Lei de Diretrizes e Bases da séries do ciclo ginasial; matrícula
Educação Nacional (Lei n.° 4 . 0 2 4 , de de 50% da população escolar de
20-12-1961), determina, por sua vez, 13 a 15 anos nas duas últimas
que "os recursos, a que se refere o séries do ciclo ginasial e matrí-
a r t . 169 da Constituição, serão apli- cula de 30% da população escolar
cados, preferencialmente, na manuten- de 15 a 18 anos nas séries do
ção e desenvolvimento do ensino pú- ciclo colegial;
blico, de acordo com os planos estabe-
c) Ensino Superior, expansão da
lecidos pelo Conselho Federal e pelos
matrícula até a inclusão, pelo
Conselhos Estaduais de Educação"
menos, de metade dos que ter-
(art. 9 3 ) .
minam o curso colegial.
4. Em face da citada disposição da
Lei de Diretrizes e Bases, os planos de
E as seguintes metas qualitativas:
educação tornaram-se, finalmente, em
nosso país, uma necessidade "inarredá- a) Além de matricular tôda a popu-
vel" e inadiável. lação em idade escolar primária,
5. Qualquer que seja o tipo de pla- deverá o sistema escolar contar,
nejamento pelo qual se queira optar até 1970, com professôres primá-
(planejamento de educação integrado, rios diplomados, sendo 20% em
ou não, no planejamento geral das ati- cursos de regentes, 60% em cur-
vidades do Estado; planejamento inte- sos normais e 20% em cursos de
gral ou parcial da educação; planeja- nível pós-colegial;
mento que parta da órbita local para b) As duas últimas séries, pelo me-
atingir a nacional, ou vice-versa), o nos, do curso primário ( 5 . a e
planejamento da educação requer sem- 6. a séries) deverão oferecer dia
pre a prévia formulação de uma política completo de atividades escolares
educacional e a segura programação das e incluir no seu programa o en-
tarefas necessárias para a consecução de sino, em oficinas adequadas, das
um ou mais objetivos da política ado- artes industriais;
tada . c) O ensino médio deverá incluir
6. O Plano Nacional de Educação, em seu programa o estudo diri-
aprovado pelo Conselho Federal de Edu- gido e estender o dia letivo a
cação (1962), fundado em solenes seis horas de atividades escolares,
compromissos firmados pelo Brasil em compreendendo estudos e práti-
Punta Del'Este e em Santiago, estabe- cas educativas;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

d) O ensino superior deverá contar, zação do Censo e consignem dotações


pelo menos, com 30% de profes- para esse fim.
sôres e alunos de tempo integral. 11. Realizado o Censo Escolar, dispo-
remos de quadros de realidades, à vista
7. A programação das tarefas neces- dos quais as administrações estaduais
sárias para alcançar os objetivos visados poderão elaborar planos e programas
requer, por sua vez, que sejam conhe- que correspondam efetivamente à ne-
cidos, com segurança, os seguintes ele- cessidade de crescimento, tanto no sen-
mentos fundamentais: tido populacional como no sentido es-
colar. Ã luz dêsses planos e programas,
a) número de crianças e jovens em poderá ser planejada e programada com
idade escolar; eqüidade a ação assistencial e supletiva
b) estudo de desenvolvimento do que a União deve exercer nos têrmos
sistema escolar; constitucionais (art. 170 e parágrafo
único) e legais (artigos 93, 94 e 95 da
c) deficiências, desvios e erros dos
Lei de Diretrizes e Bases).
serviços existentes em relação aos
objetivos pretendidos. 12. O Censo Escolar constitui, ainda,
providência preliminar para o cumpri-
8. O primeiro dos citados elementos, mento de preceitos da Lei de Diretrizes
isto é, a população em idade escolar, e Bases (artigos 28, 29 e 32) que, no
pode ser-nos dado pelo Censo Escolar sentido de garantir a obrigatoriedade do
com um grau de exatidão incompara- ensino primário, dispõem, respectiva-
velmente maior do que o obtido por mente, sôbre:
atualizações do Censo Demográfico de
a) o incentivo e a fiscalização da
1960 ou por estimativas de outra na-
freqüência às aulas (da compe-
tureza .
tência dos Estados);
9. A Primeira Reunião do Conselho
b) a chamada anual da população
Federal de Educação com os Conselhos
escolar de sete anos de idade,
Estaduais de Educação, realizada no para matrícula na escola primária
Rio de Janeiro, em novembro de 1963, (da competência dos Municí-
aprovou a indicação de ser realizado o pios );
Censo Escolar do Brasil como passo
c) a obrigação imposta aos proprie-
fundamental para o planejamento da tários rurais de manter escolas
educação. primárias para as crianças resi-
10. Dentro da estrutura do Ministério dentes em suas glebas ou, na
da Educação e Cultura, incumbem ao impossibilidade de fazê-lo, pro-
INEP as providências para a promoção piciar a instalação e funciona-
do Censo Escolar. O Senhor Ministro mento de escolas públicas em
da Educação e Cultura já aprovou a suas propriedades ou, então, fa-
iniciativa e autorizou os convênios, a cilitar a freqüência das crianças
serem celebrados com os Estados para às escolas mais próximas.
a aplicação dos recursos globais do
Fundo Nacional do Ensino Primário e 13. Note-se, finalmente, que os traba-
do Fundo Nacional do Ensino Médio, lhos do recenseamento das crianças e a
que lhes so consignados no Orçamento pronta divulgação dos dados do Censo
do Exercício de 1964, prevejam a reali- Escolar não poderão deixar de contri-
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

buir pará alertar a consciência de cada atingir a nacional, ou vice-versa), o


comunidade para os próprios problemas planejamento da educação requer sem-
da educação e para estimular o concurso pre a prévia formulação de uma políti-
dos elementos locais ao encaminhamento ca educacional e a segura programação
das soluções mais adequadas. das tarefas necessárias pará o consecu-
ção de um ou mais objetivos da política
adotada.
4. O Conselho Federal de Educação,
2. OFÍCIO DO SU. MINISTHO DA fundado em solenes compromissos fir-
EDUCAÇÃO AO PRESIDENTE DO IBCE mados pelo Brasil em Punta Del'Este
e em Santiago, já estabeleceu, em ma-
Brasília, 8 de junho de 1964 téria da política educacional, as metas
quantitativas e qualitativas a atingir até
Senhor Presidente: 1970, nos setores do ensino primário,
Ao estatuir que a União, os Estados, médio e superior.
o Distrito Federal e os Municípios apli- 5. A programação necessária para al-
carão anualmente determinadas percen- cançar os objetivos visados requer,
tagens das respectivas receitas de im- agora, por sua vez, que sejam conhe-
postos na manutenção e desenvolvimen- cidos, com segurança, os seguintes ele-
to do ensino (art. 169), a Constituição mentos fundamentais: a) número de
estabelece a responsabilidade solidária crianças e jovens em idade escolar;
das três órbitas da Administração Pú- b) estudo do desenvolvimento do sis-
blica na obra da educação nacional e tema escolar; c) deficiências, desvios
impõe, conseqüentemente, a elaboração e erros dos serviços existentes em re-
de plano de ação interadministrativa, lação aos objetivos pretendidos.
que demarquem a esfera de competên-
cia de cada uma delas no setor do 6. Atendendo a que o primeiro dos
ensino. citados elementos, isto é, a população
em idade escolar, pode ser-nos dado
2. Determinando, por sua vez, que pelo Censo Escolar com um grau de
"os recursos, a que se refere o art. 169 exatidão incomparavelmente maior do
da Constituição, serão aplicados, prefe- que o obtido por atualizações e esti-
rencialmente, na manutenção e desen- mativas fundadas no Censo Demográ-
volvimento do ensino público, de acordo fico de 1960, a Primeira Reunião do
com os planos estabelecidos pelo Con- Conselho Federal de Educação com os
selho Federal e pelos Conselhos Esta- Conselhos Estaduais de Educação, rea-
duais de Educação" (art. 93), a Lei lizada em novembro de 1963, aprovou
de Diretrizes e Bases da Educação Na- indicação em que recomenda a promo-
cional (Lei n.° 4.024, de 20-12-1961) ção do Censo Escolar do Brasil como
torna inarredável a necessidade da ela- passo fundamental para o planejamento
boração de planos de educação. da educação.
3. Qualquer que seja o tipo de pla- 7. Realizado o Censo Escolar, dispo-
nejamento pelo qual se queira optar remos de quadros de realidades, à vista
(planejamento de educação integrado, dos quais as administrações estaduais
ou não, no planejamento geral das ati- poderão elaborar planos e programas
vidades do Estado; planejamento inte- que correspondam efetivamente à ne-
gral ou parcial da educação; planeja- cessidade de crescimento, tanto no sen-
mento que parta da órbita local para tido populacional como no sentido
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escolar. À luz dêsses planos e progra- e reservem os recursos considerados


mas, poderá ser planejada e programada necessários para esse fim.
com eqüidade a ação assistencial e su- 1 1 . É claro, porém, que, embora possa
pletiva que a União deve exercer nos contar com a colaboração dos sistemas
têrmos constitucionais (art. 170 e pa- escolares dos Estados e dos Municípios,
rágrafo único) e legais (artigos 93, 94 com um total de duzentos mil professô-
e 95 da Lei de Diretrizes e B a s e s ) . res, o Ministério da Educação e Cultura
necessita, para a promoção e realização
8. O Censo, podendo servir de sub-
do Censo Escolar, da cooperação do
sídio para o cadastro e o alistamento Instituto Brasileiro de Geografia e Es-
escolares, constitui, ainda, providência tatística, cuja participação é imprescin-
preliminar para o cumprimento de pre- dível em qualquer das fases do Censo,
ceitos da Lei de Diretrizes e Bases (ar- e, de modo especial, no planejamento
tigos 28 e 2 9 ) , que, no sentido de ga- dos trabalhos, coleta dos dados e apu-
rantir a obrigatoriedade do ensino ração dos resultados.
primário, dispõem, respectivamente, sô-
1 2 . Nas condições expostas, permito-
bre o incentivo e a fiscalização da
-me sugerir a Vossa Excelência a con-
freqüência às aulas (da competência
veniência de ser constituída, desde logo,
dos Estados) e a chamada anual da
uma comissão com o fim especial de
população escolar de sete anos de ida-
estudar e propor os têrmos do convênio,
de, para matricula na escola primária
em que se estabeleçam as bases e a
( d a competência dos Municípios).
forma de participação do Ministério da
9. É de notar-se, finalmente, que os Educação e Cultura e do Instituto Bra-
trabalhos de recenseamento das crianças sileiro de Geografia e Estatística na
e a pronta divulgação dos dados do realização do Censo Escolar.
Censo Escolar não poderão deixar de
1 3 . Na hipótese de Vossa Excelência
contribuir para alertar a consciência de
anuir com a sugestão, peço venia para
cada comunidade para os próprios pro-
propor que a aludida comissão seja
blemas de educação e para estimular
constituída por um representante da Se-
o concurso dos elementos locais para
cretaria-Geral do Conselho Nacional de
o encaminhamento das soluções mais
Estatística desse Instituto, pelo Diretor
adequadas.
do Instituto Nacional de Estudos Peda-
10. Atendendo ao que me representou gógicos e pelo Diretor do Serviço de
a Comissão de Assistência Técnico-Ad- Estatística da Educação e Cultura, que
ministrativa dêste Ministério, determi- são os órgãos dêste Ministério que têm
nei que os convênios que, dentro de atribuições mais diretamente ligadas
breves dias, serão assinados com os Es- com os objetivos em p a u t a .
tados para a aplicação dos recursos glo-
Valendo-me do ensejo, reitero a Vossa
bais do Fundo Nacional do Ensino
Excelência os protestos de meu alto
Primário e do Fundo Nacional do En-
apreço.
sino Médio, que lhe são consignados no
Orçamento dêste Exercício, prevejam ( a ) Flavio Suplicy de Lacerda
a realização do Censo Escolar do Brasil Ministro da Educação e Cultura
CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO
Seleção de pareceres aprovados nos
primeiros meses do corrente ano.

A T O INSTITUCIONAL E COMPETÊNCIA DO C O N S E L H O

Parecer n.° 104/64, aprovado em 28-4-64. — O Conselho Federal de Educação


foi convocado, extraordinariamente, pelo Senhor Ministro de Estado da Educação
e Cultura, para tomar conhecimento e decidir sôbre 3 casos de intervenção em
Universidades.
Por distribuição do Sr. Presidente ad hoc desta Comissão de Legislação e
Normas, Conselheiro Dom Cândido Padin, incumbe-me relatar a situação nova que
se criou na competência do Conselho em face do Ato Institucional emanado do
Comando Supremo da Revolução e publicado no Diário Oficial da República de
11 de abril p. passado.
Pelo aludido Ato é mantida, em princípio, a Constituição de 1946, com as
modificações constantes do mesmo ato.
É aforismo corrente em direito que a institucionalização de tôda revolução, ao
criar uma situação de fato, se transforme em situação de direito, estabelecendo
um novo ordenamento jurídico.
Os atos do governo revolucionário anteriores à posse do atual Presidente da
República entram na categoria dos fatos consumados para os quais não há nem
controle jurisdicional nem invocação de dispositivos jurídicos da ordem anterior.
A competência do Conselho Federal de Educação terá de se subordinar at)
art. 8." do Ato Institucional que dispõe: "os inquéritos e processos visando apuração
de responsabilidades pela prática de crime contra o Estado ou seu Patrimônio e
a ordem política e social, ou de ato de guerra revolucionária, poderão ser instaurados
individual ou coletivamente".
É que dêsses inquéritos poderão ser apurados atos e situações caracterizadas
por artigos outros do mesmo Ato Institucional.
Evidentemente a autonomia universitária garantida pela Constituição e con-
sagrada na Lei de Diretrizes e Bases estará condicionada às limitações do direito
especial que nos rege no momento — êste Conselho já poderia suspendê-la na
forma do art. 84 da L.D.B. Ante a nova situação jurídica tem êle de observar
os seguintes princípios gerais:

I — As situações juridicamente configuradas pelo Ato Institucional constituem


fato consumado cuja apreciação escapa à competência dêste Conselho.
II — Sòmente a partir da data em que êste Conselho toma conhecimento na
forma da lei de processos que contenham matéria aludida no item anterior, instau-
ra-se a competência normal do Conselho.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

III — Nos procedimentos dessa natureza ter-se-ão em vista a celeridade, con-


veniência e oportunidade inerentes a cada caso, sem prejuízo da liberdade de inves-
tigação imposta pela responsabilidade do Conselho na sua apreciação.
(a) Cândido Padin, O . S . B . , Presidente; Péricles Mtidurcira Pinho, relator;
Newton Sucupira, Clóvis Salgado e Josué Montello.

REGULAMENTAÇÃO DE EXAME DE SUFICIÊNCIA

Parecer n.° 354/63, C. Especial, aprov. em 3-12-1963. — Em resposta à consulta


formulada pela Secretaria-Geral e encaminhada pelo Sr. Presidente, sôbre matéria
constante do art. 117 da L.D.B., o Par. 175/63 da C. E. Su. encarecia a necessidade
de o Conselho baixar instruções regulamentando o exame de suficiência estabelecido
pelo artigo mencionado, propondo que fosse constituída uma Comissão encarregada
de estudar o assunto. Fundamentava-se o parecer nas seguintes razões:

1) Com a rejeição do veto presidencial aposto às expressões finais do art. 117,


ficou revogada a Lei 2 340, de 19-2-1955 c, assim, tornadas insubsistentes as por-
tarias e instruções decorrentes da mesma lei c que regulavam, em seus detalhes,
o processo e os efeitos do exame de suficiência.
2) Tratando-se de medida destinada a assegurar a expansão do ensino médio
em face da escassez de professôres diplomados por faculdades de filosofia não se
justifica que tais exames fiquem subordinados aos critérios que as faculdades achem
por bem estabelecer. Esta, aliás, foi uma das razões que inspiraram o veto presi-
dencial. Além disso, a experiência do regime instituído pelo Dec.-leí 8.777, de 1946,
determinando que os exames de suficiência se processassem em faculdades de filo-
sofia, muito deixou a desejar em seus resultados práticos, conforme demonstrou o
Par. 175/63. Daí a necessidade de se fixarem critérios gerais a que deve subme-
ter-se a realização destes exames tendo em vista a finalidade para que foram criados.
3) Por determinar a Lei que o exame de suficiência seja realizado em facul-
dades de filosofia oficiais, não está excluída, necessariamente, a hipótese de sua
regulamentação. Por sua natureza e destinação, êste exame, que é um exame de
estado, transcende a esfera de competência própria das faculdades de filosofia e
sua regulamentação se impõe não somente quanto ao processo de sua realização,
mas também no diz respeito aos seus efeitos legais.
4) Finalmente, sendo das atribuições do Conselho "adotar ou propor modifi-
cações e medidas que visem à expansão e aperfeiçoamento do ensino" (art. 9,
letra m), cabe-lhe fixar normas gerais regulando o exame de suficiência por se tratar
de matéria educacional de expansão do ensino médio.
Designada a Comissão pelo Sr. Presidente, foi elaborado o seguinte projeto de
regulamentação que submetemos à apreciação do Plenário.
Art. 1.° Para o exercício do magistério em estabelecimentos de ensino médio
localizados onde não houver, em número suficiente, professôres licenciados em facul-
dades de filosofia e sempre que se registre essa falta, será concedido registro àqueles
que forem habilitados em exame de suficiência nos têrmos do art. 117 da Lei de
Diretrizes e Bases.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 219

Parágrafo único. Para determinar as regiões ou cidades que ainda não possuem
número suficiente de professôres legalmente habilitados, o Ministério da Educação
fará periodicamente levantamento das necessidades de professôres nas diversas
regiões do País, para o que poderão prestar contribuição os Conselhos Estaduais
de Educação.
Art. 2.° O Conselho Federal de Educação, visando a atender a todas as regiões
do país, indicará anualmente as Faculdades de Filosofia oficiais, ou as unidades
universitárias equivalentes, onde poderão realizar-se exames de suficiência.
§ 1.° Nos Estados onde houver mais de uma, as faculdades oficiais serão esco-
lhidas, levando-se em conta, também, sua distribuição pelas diferentes regiões do
Estado.
§ 2.° Sempre que necessário, as Faculdades poderão contratar, para os exames
de suficiência, professôres devidamente habilitados, bem como deslocar as Comissões
Examinadoras para onde melhor possam atender à demanda de candidatos.
Art. 3.° O certificado de suficiência habilita o candidato ao exercício do
magistério na localidade para a qual foi requerido o exame, como nas demais em
que se verifique a carência de licenciados.
Art. 4.° Os candidatos inscritos em exame de suficiência poderão ser autori-
zados a lecionar enquanto aguardam a realização dos exames, podendo ser pror-
rogada essa autorização por mais um ano no caso em que o candidato resolver
adiar a prestação do exame.
Parágrafo único. Os alunos das Faculdades de Filosofia, quando estejam
matriculados na 3 . a série, ou em nível equivalente no sistema de matrícula por
disciplina, terão, dois anos, direito de lecionar, quer como treinamento, quer para
suprir a carência de professôres.
Art. 5.° Serão oferecidos cursos de preparação e orientação para o exame
de suficiência pelos órgãos competentes do Ministério da Educação.
§ 1.º Cursos semelhantes poderão ser organizados pelas Secretarias da Edu-
cação, Faculdades de Filosofia ou outras entidades devidamente habilitadas.
§ 2.° Os candidatos inscritos poderão prestar o exame de suficiência sem que
hajam freqüentado os cursos mencionados neste artigo.
Art. 6.° O exame de suficiência constará de duas partes: a) verificação de
conhecimentos na disciplina que o candidato pretende ensinar; b) verificação da
capacidade didática.
Art. 7.° As entidades referidas no artigo 2.° e em seus parágrafos, que decidam
realizar exames de suficiência, deverão publicar os programas respectivos com ante-
cedência de um ano, pelo menos, da realização dos exames.
§ 1.° Os programas devem abranger globalmente a matéria de cada disci-
plina, necessária ao seu ensino em nível médio.
§ 2.° O prazo a que se refere êste artigo poderá ser reduzido para os exames
de suficiência que se realizem no ano de 1964.
Art. 8.° Haverá exames de suficiência distintos para o 1.° e o 2.° ciclos de ensino
de grau médio, sendo a suficiência colegial válida para ambos os ciclos.
Art. 9.° O mesmo candidato poderá submeter-se a exame de suficiência para
o ensino de três disciplinas no máximo.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Art. 10. Na avaliação de qualquer prova escrita e no julgamento de provas


orais ou práticas, será levada em conta a capacidade de expressão vernácula do
candidato.
Art. 11. Os critérios de julgamento serão previamente estabelecidos pelos exa-
minadores, devendo o resultado do exame ser traduzido pela menção "habitado"
ou "não habilitado".
Art. 12. Para inscrição no exame de suficiência deve o candidato apresentar
os seguintes documentos:

a) prova de identidade
b) de nacionalidade
c) de idade mínima de 21 anos
d) quitação com o serviço militar, quando brasileiro
e) de idoneidade moral, atestada por duas pessoas que exerçam atividades
educacionais ou por autoridade competente
f) sanidade física e mental atestada por serviço médio oficial
g) comprovante,fornecido pela Inspetoria Secional, ou órgão equivalente, de
que não existem, na região, professôres legalmente habilitados pará o ensino
da disciplina.
h) prova de conclusão de ciclo ginasial ou equivalente.

Parágrafo único. Excepcionalmente poderá ser dispensada a exigência da


letra h desde que o candidato documente nível equivalente de conhecimentos.
Art. 13. As Faculdades de Filosofia, depois de realizados os exames de sufi-
ciência, fornecerão aos candidatos os respectivos certificados de habilitação para os
devidos fins. (a) Newton Sucupira, relator, Valnir Chagas, P. J. Vasconcellos.

MAGISTÉRIO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS

Parecer n.° 371/63, C.E.P. e M., aprov. em 6-12-1963. - O Sr. Presidente


dêste Conselho encaminha à Câmara de Ensino Primário e Médio a seguinte con-
sulta: — "a uma pessoa hábil e capaz de ministrar uma Prática Educativa será
obrigatoriamente exigido o registro de Professor" ?
Esta consulta toca só num dos pontos importantes da L.D.B. e enseja opor-
tunidade para uma reflexão mais cuidadosa sôbre o assunto.

I — NATUREZA DAS PRÁTICAS EDUCATIVAS

Não é das mais felizes a nomenclatura empregada pela lei para êste setor da
escola média: genérica, imprecisa, prestando-se ao mal-entendido de que estas
atividades sejam necessariamente vinculadas à área da execução. E, embora corri-
gida pelo adjetivo para assinalar que devem completar o processo educativo, a
palavra não diz de tôda a variedade e riqueza de função que a L . D . B . lhe atribuiu.
"A terminologia usada pela L.D.B. na denominação dos componentes do
currículo, embora com algumas falhas, obedeceu ao sentido comum das palavras,
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 221

em uso até agora entre nós. Costuma-se denominar disciplinas às atividades esco-
lares destinadas à assimilação de conhecimentos sistemáticos e progressivos, dosados
certos endereços.
As práticas educativas, por outro lado, abrangendo as atividades que devem
atender às necessidades do adolescente na ordem física, artística, cívica, moral e
religiosa, colocam o acento principal na maturação da personalidade, com a for-
mação dos hábitos correspondentes, embora necessitem também da assimilação de
certos conhecimentos". (Cf. Par. n.° 131/62 — Doe. 7, pág. 4 3 ) .
"As disciplinas — acrescenta o Par. n.° 214/63 — visam, antes de tudo, a uma
finalidade informativa. Ao passo que as práticas educativas visam antes de tudo a
uma finalidade formativa. As primeiras são por natureza teóricas, embora alcancem
resultados práticos. As segundas são de natureza prática, embora alcancem resul-
tados teóricos e exijam conhecimentos doutrinários.
As primeiras, quer obrigatórias, quer Optativas, têm os seus campos mais clara-
mente delimitados. Quanto às segundas, também obrigatórias ou Optativas, obe-
decem a um critério mais elástico e variam segundo a orientação de cada estabele-
cimento ou método de ensino. ( . . . ) Umas e outras, entretanto, serão indispen-
sáveis à plenitude do processo educativo, segundo a própria conceituação da
L . D . B . " . (Doe. 17-18, pág. 6 8 ) .
Cabe-nos apenas acentuar que o supracitado Par. n.° 131/62 não deseja por
certo insinuar que as práticas educativas estejam todas contidas, em seus limites,
nas exigências dos arts. 22 e 38. Muito ao contrário. Há tôda uma gama de ativi-
dades outras que serão vantajosamente incorporadas na educação da juventude,
tendo em vista a expansão e expressão da personalidade, a integração da escola no
meio, a pesquisa vocacional e a educação para o lazer, como passaremos a examinar.

II — FINALIDADES DAS PRÁTICAS EDUCATIVAS

Quaisquer que sejam estas finalidades, importa ressaltar, antes de mais nada,
a unidade orgânica que se deve preservar no processo educativo destinado à for-
mação do adolescente. Dir-se-ia que a L.D.B. teve mais presente esta preocupação
de unidade no capítulo do ensino médio do que no do elementar. Com efeito,
enquanto o art. 25, definindo as finalidades do ensino primário, enumera em sepa-
rado as várias atividades que o devem compor e os fins a atingir, o art. 33 afirma
simplesmente que a educação de grau médio se destina à "formação do adolescente".
Esta unidade, no entanto, não impede que consideremos aspectos distintos das
práticas educativas na escola média.

1. Práticas educativas, elemento de expansão e expressão do educando.

O eminente Cons.0 Alceu Amoroso Lima, falando da atividade teatral no citado


Par. 214/63, enquadrava-a entre as práticas educativas, acrescentando a seguinte
motivação:
"Não se trata de ministrar conhecimentos definidos para informação da
inteligência, mas de desenvolver o senso de responsabilidade individual, o
espírito de comunidade, o hábito da comunicação com o público, a prática do
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diálogo, o desembaraço de atitudes, o fortalecimento da memória, a empostação


correta da voz, o alargamento do gosto estético e da cultura geral, em suma,
a formação da personalidade total".

Com pequenas variantes acidentais, esta motivação se aplica às práticas educa-


tivas em geral e é talvez a mais importante de suas finalidades no currículo da
escola média.

2. Práticas educativas, elemento de orientação vocacional.

É conseqüente natural da primeira finalidade apontada, já que na expansão


e expressão da personalidade pode o educador colher os indícios vocacionais mais
seguros.

"Como são inúmeras as tendências e vocações dos alunos, — já acentuava


o Par. n." 18/62 — deveriam ser inúmeras também as possibilidades de opção
dentro da atividade escolar; mas a lei reconhece sensatamente que nem sempre
é possível na prática esta riqueza, em colégios pequenos e em lugares de
poucos recursos. Creio que sobretudo nestes casos as práticas educativas, que
são mais variadas e flexíveis, e que refletem melhor as necessidades ocupacionais
do meio, poderão resolver o problema do vocacional no ensino". (Doc. 2,
pág. 3 3 ) .

3. Práticas educativas, elemento de integração no meio.

Entendemos a integração, tão insistentemente inculcada na L . D . B . , não como


um confinamento que isole o educando do país e do mundo, mas como ambientação,
que valorize, aproveite e projete os elementos da comunidade no processo educativo
dos alunos.
A escola encontrará no ambiente as melhores inspirações para a escolha das
práticas educativas, que, dando relevo à cultura regional, preservação usos e costumes
típicos, artesanatos tradicionais (como rendas de bilro, modelagem popular, uten-
sílios de pedra-sabão) e outras manifestações culturais e folclóricas; nada impede
até que a escola, com as devidas cautelas, sirva-se de entidades idôneas, já estabe-
lecidas no local, para a ministração de algumas destas práticas, cujo ingresso na
escola a rigidez das leis educacionais anteriores não incentivava devidamente.
Em alguns lugares tem-se visto misturarem-se na escola alunos e pais inte-
ressados em práticas educativas peculiares à região, como a avicultura em certas
regiões do noroeste paulista. Êste interesse e esta presença dos pais é o mais
eloqüente testemunho da integração da escola no ambiente.

4. Práticas educativas, elemento de formação para o lazer.


À medida que cresce a automatização, na indústria como nos utensílios domés-
ticos, diminuem as horas de trabalho e, conseqüentemente, são maiores os períodos
de repouso. Uma das maiores questões sociais de nossos dias é esta: — como
empregar êste tempo? "A única resposta possível é que às duas categorias de tra-
balho e recreação (ou descanso), deve ser acrescentada uma terceira, a do lazer"
(Cf. Raymont: Educação Moderna, Ed. Fundo de Cultura, pág. 3 8 ) .
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A distinção é de Aristóteles. "Trabalho, diz êle, é uma coisa feita não pelo
amor do trabalho cm si mesmo, mas como meio para alcançar outro fim; recreação
é descanso do trabalho; o lazer, ao contrário, é uma coisa nobre, a mais nobre da
vida, é a ocupação em algo por amor a isso".
As práticas educativas, o lado da expansão da personalidade, da manifestação
e do cultivo do vocacional e da integração no meio, devem proporcionar aos
adolescentes uma boa educação para o lazer.

I I I — EXIGÊNCIAS PARA MINISTRAR AS PRÁTICAS EDUCATIVAS

Depois destas considerações, indispensáveis como fundamentação, devemos


entrar propriamente no mérito da consulta em pauta.

1. Exigênias técnicas e pedagógicas.

"Na Inglaterra", lembra Ravmont, "experiência e senso comum são conside-


rados equipamento suficiente para uma autoridade educacional" (op. cit. pág. 6 8 ) .
O Prof. Schelling, da Universidade do Pennsylvania, num delicioso volume sôbre
educação, começa prevenindo seus leitores que nunca estudou "educacionalmente"
a criança, nunca preparou um papa de estatísticas pedagógicas. Principalmente
nunca mediu coisa alguma. Não é pedagogo, nem nada difícil e técnico. É simples-
mente "um professor que amou seu trabalho no seu tempo, c deleitou-se na com-
panhia dos seus a l u n o s " . . .
Diria também que ao mestre de práticas educativas não se exija senão que
ame seu trabalho e goste da companhia dos alunos; por outras palavras, que tenha
qualidades humanas, ao lado da competência profissional.
Naturalmente poderão surgir problemas pedagógicos: como aproveitar, na escola,
conhecidos elementos locais (fico a lembrar o saudoso Mestre Vitalinol), autênticos
artistas mais que simples artesãos, mas desprovidos de qualquer tirocínio didático?
A escola poderá remediá-lo com a presença de um educador qualificado ao lado
do artesão, para suprimir-lhe as possíveis deficiências, ou instituindo, de forma
permanente, a figura de um coordenador de práticas educativas.

2. Exigências legais.

No entanto, a consulta quer saber se a esta pessoa, "hábil e capaz" será obri-
gatoriamente exigido o registro de professor". Se por "registro de professor" se
entender uma burocracia complicada e formal, a resposta é negativa. Mas, pará
felicidade nossa, só em alguns testes as respostas têm que ser sim ou não, e vai nisso
o maior de seus defeitos.
O artigo chamado a exame é o 59, da L . D . B . :

"A formação de professôres para o ensino médio será feita nas Faculdades
de Filosofia, Ciências e Letras e a de professôres de disciplinas específicas de
ensino médio técnico, em cursos especiais de educação técnica".

7 — 34 901
224 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Somos de opinião que os orientadores ou mestres de práticas educativas não


se enquadram rigidamente neste artigo, pelos seguintes motivos:
a) o artigo acima não modificou substancialmente, a não ser no seu inciso
final, as exigências anteriores, consignadas na Lei Orgânica. Ora, o Dec.-lei 8.777,
de 22-1-1946, que regulamentava o registro de professôres de grau médio, só
dispunha sôbre registro de "disciplinas";
b) o contexto do próprio art. 59 da L.D.B. se refere a disciplinas mais do
que a práticas; tanto assim que, após falar de professôres para o "ensino médio",
acrescenta que, para as "disciplinas específicas" no ensino médio técnico, os pro-
fessôres se formarão em cursos especiais de educação técnica;
c) em nenhum artigo da L.D.B. se organiza ou restringe a lista de práticas
educativas que a escola pode escolher; têm elas assim o âmbito mais largo. Dêste
modo, não há possibilidade de formação em cursos regulares das faculdades de
filosofia por exemplo para todas as atividades regionais típicas, que convém pre-
servar e que a escola pode eleger como práticas do seu currículo;
d) a formação pedagógica e didática, utilíssima e recomendável, se fará
gradualmente "dentro das necessidades e possibilidades locais" (art. 44, § 2.°),
nas próprias escolas, em cursos volantes promovidos pelo M.E.C, ou organizados
nas faculdades da região;
e) naturalmente, quando há cursos específicos no setor das práticas educa-
tivas escolhidas, deve-se dar preferência aos que tenham tais cursos, como acentuou
o Par. 214/63 sôbre o professor de atividade teatral, parecer várias vezes citado
aqui. Assim, práticas como dactilógrafo, técnicas comerciais, e t c , poderão requerer
no professor a qualificação exigida pelo art. 59 da lei. Mas ainda nestes casos
cumpre evitar tôda rigidez formal no processo de autorização, a fim de não afastar
elementos que seriam de grande valia para a escola.
Como conclusão das considerações acima, a Câmara de Ensino Primário e
Médio aprovou o seguinte Parecer: 1. Salvo o caso da educação física, não são
idênticas as exigências legais pará os professôres de "disciplinas" e para os de
"práticas educativas".
2. Havendo cursos específicos no setor das práticas educativas escolhidas pela
escola, os titulares de diplomas tenham a preferência para o magistério, (aa.) Pe.
José de Vasconcellos, Presidente da C.E.P. e M. Anísio Teixeira, Celso Cunha.

SÔBRE O ALCANCE DO § 1.° DO ART. 35 DA LEI


DE DIRETRIZES E BASES

Parecer n.° 393/63, C. L. N., aprov. em 11-12-1963. - No ofício n.° 123,


datado de 1.° de outubro de 1963, o Conselho Estadual de Educação da Guanabara,
pelo seu Vice-Presidente, formula a seguinte consulta:
"As disciplinas obrigatórias complementares e a relação das Optativas propostas
pelos Conselhos Estaduais têm valor exclusivamente para os respectivos sistemas
estaduais ou têm um alcance regional, obrigando a todos os estabelecimentos da
unidade federativa cm que exerce o Conselho sua competência, inclusive os que
optarem pelo Sistema Federal de Ensino? Nossa opinião é que as indicações dos
Conselhos Estaduais, nesse particular, têm um alcance regional, obrigando indis-
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tintamente estabelecimentos filiados aos seus respectivos sistemas ou ao Sistema


Federal. As disciplinas complementares e Optativas não obedeceriam, assim, a um
critério de sistemas, mas a um critério regional, geográfico. Por esse caminho a
Lei de Diretrizes c Bases garantiria, pará o ensino médio, a unidade na variedade
ou a variedade na unidade, figurando as cinco disciplinas de âmbito nacional,
indicadas pelo Conselho Federal, como garantidoras da unidade e as complemen-
tares e Optativas dos Conselhos Estaduais como asseguradoras da variedade. Estas
constituiriam a nota regional dos estabelecimentos de ensino médio c visariam a
atender aos interesses culturais específicos de cada unidade da Federação".
Em resumidos têrmos, o que deseja saber o Conselho Estadual de Educação
da Guanabara é se a escolha das disciplinas obrigatórias complementares e a escolha
das disciplinas Optativas, uma e outra feitas ou que vierem a fazer-se por intermédio
dos Conselhos Estaduais de Educação, obrigam apenas aos estabelecimentos esta-
duais ou alcançam também os filiados ao sistema federal.
Tomando por base da nossa argumentação o art. 20 da Lei de Diretrizes e
Bases, que preceitua:

"Na organização do ensino primário e médio, a lei federal ou estadual


atenderá à variedade de métodos de ensino e formas de atividade escolar,
tendo-se em vista as peculiaridades da região e de grupos sociais",

entendemos, preliminarmente, merecer o resguardo mais cuidadoso o princípio ou


espírito que informa esse dispositivo, de correlação íntima entre a educação e o
meio. Entendemos, Conseguintemente, que a execução da lei, nesse ponto crucial,
implicará, por sua vez e necessariamente, a adoção do ponto-de-vista de que o
preceito contido no § 1.° do art. 3.°,

"Ao Conselho Federal de Educação compete indicar, para todos os sistemas


de ensino médio, até cinco disciplinas obrigatórias, cabendo aos conselhos esta-
duais de educação, completar o seu número e relacionar as de caráter optativo
que podem ser adotadas pelos estabelecimentos de ensino",

é amplo, não contém ressalvas nem exceções, e, assim, as escolhas de disciplinas


feitas pelos Conselhos Estaduais de Educação, destinadas a completar o curriculum
da escola secundária, devem obrigar não apenas aos estabelecimentos filiados aos
sistemas estaduais, senão também aos filiados ao sistema federal.
Fique claro que, quando escrevemos "estabelecimentos filiados aos sistemas
estaduais" e "filiados ao sistema federal" significamos as situações atuais e as
futuras, isto é, os estabelecimentos hoje filiados a qualquer dos dois sistemas e os
que a qualquer deles vierem a filiar-se.
Fique também claro que a competência dêste Conselho, na exceção consagrada
no art. 13 da Lei de Diretrizes e Bases se estende igualmente às disciplinas
complementares.
Ponto controverso é o dos estabelecimentos mantidos pelo governo federal.
Rigorosamente examinado, parece-nos que eles são alcançados, porque o dispositivo
legal não distingue os estabelecimentos pelas entidades mantenedoras, e o intérprete
fica, ipso jacto, impedido de distinguir.
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Convém considerarmos as conseqüências administrativas que poderão advir do


cumprimento do preceito legal assim entendido e, até antes delas, a exeqüibilidade
pura e simples do seu cumprimento em relação aos estabelecimentos do governo
federal com sede nos Estados.
Tomemos o caso do Colégio Pedro II: não são apenas suas tradições, seu
regime, sua posição que ponderaremos: é também o fato de que êle tem um
regimento aprovado pelo governo federal, que lhe deu estrutura e funcionamento
especiais.
No relativo às questões gerais, isto é, que interessam aos estabelecimentos
atingidos pelo dispositivo legal, poderão surgir indagações acerca da situação em
que ficará a direção de estabelecimento que, embora filiado ao sistema federal,
será forçado a incluir no seu curriculum disciplinas indicadas por um órgão estadual.
Igualmente, poderá ser objeto de interrogação: em que regime de fiscalização
incidirá, sob esse aspecto, o estabelecimento? Se êle estiver filiado (ou vier a
filiar-se) ao sistema federal, sob que autoridade fiscalizadora ficará esse ponto?
São pequenas dificuldades, naturais na instauração de qualquer regime novo
e facilmente demovíveis com um pouco de boa vontade, de compreensão e de
espírito público.
É importante não olvidar que a opção dos estabelecimentos de ensino de grau
médio, prevista no art. 110 da Lei de Diretrizes e Bases, se fará exclusivamente
para efeitos de fiscalização e reconhecimento.
Seja dito, de passagem, que a fiscalização terá de modificar-se em sua con-
ceituação, em sua ação, que passará a ser de assistência e orientação pedagógica,
nos seus efeitos — o que virá tomar menos graves as questões administrativas,
notadamente divergências, fricções e atritos, que poderão surgir entre autoridades
de esferas diferentes.
Aliás, motivos dessa natureza não haveriam de impedir que a lei viesse a
ser cumprida.
Se vier a prevalecer a interpretação proposta, que se nos afigura a correta,
o princípio de que o curriculum se compõe: a) de um núcleo comum de disci-
plinas c b) de um grupo de disciplinas variáveis, se aliará eficazmente ao princípio
da regionalização da escola exposto com tanto brilho, embora com tão apertada
síntese, pelo ilustre Secretário-Geral dêste Conselho em seu parecer de fls. 3, e ao
da variedade na unidade, previstos, respectivamente, nos arts. 35 e 12 da Lei de
Diretrizes e Bases.

Conclusão

As disciplinas obrigatórias, bem como as Optativas, de escolha dos Conselhos


Estaduais de Educação, destinadas a completar o curriculum da escola de grau
médio, nos têrmos do § 1.° do art. 35 da Lei de Diretrizes e Bases, prevalecem
igualmente para os estabelecimentos particulares daquele grau, filiados ou que
vierem a filiar-se ao sistema federal.
Tal é a resposta que êste Conselho deve dar ao ofício que deu origem ao
presente processo, (aa.) Abgar Renault, relator. Pe. José de Vasconcellos, J. Borges
dos Santos.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 227

E F E I T O S DA LICENCIATURA

Parecer n.° 15/64, C. E. Su., aprov. pelo Plenário em 30-1-1964. — Sob forma
de consulta encaminhada a êste Conselho pelo Sr. Presidente, o Diretor da Facul-
dade de Filosofia "Cristo Rei", de São Leopoldo, Rio Grande do Sul, solicita os
seguintes esclarecimentos:

1) se continua ainda em vigor, com a fixação dos novos currículos mínimos, a


Port. Min. n.° 478, de 8-6-1954 que dispõe sôbre o registro dos licenciados por
Faculdades de Filosofia para o exercício do magistério no surso secundário;
2) se os alunos que iniciaram os cursos sob a vigência dos currículos anteriores
gozam, ainda, dos direitos conferidos pela Portaria supracitada.
Trata-se, evidentemente, de matéria da maior relevância educacional, inte-
ressando diretamente o ensino secundário, e que está a exigir o pronunciamento
dêste Conselho. Em face das modificações introduzidas no conteúdo e estrutura
dos Cursos das Faculdades de Filosofia e tendo-se em vista as normas atuais de
organização dos currículos da escola de segundo grau, não resta dúvida que a
Port. n.° 478 está inteiramente desatualizada. Urge, portanto, que se estabeleçam
novos critérios para a regulamentação da habilitação profissional dos cursos das
Faculdades de Filosofia, o que, certamente, é da competência do Conselho.
A primeira regulamentação da matéria em causa se deve ao Dec.-lei n.° 1.190,
de 4-4-1939 que deu organização à Faculdade Nacional de Filosofia. O art. 51
desse decreto assim determinava: "A partir de 1.° de janeiro de 1943 será exigido:
a) para o preenchimento de qualquer cargo ou função do magistério secundário
ou normal, em estabelecimento administrado pelos poderes públicos ou por entidades
particulares, o diploma correspondente ao curso que ministre o ensino da disciplina
a ser lecionada. "No entanto, somente em 1946 é que o exercício do magistério
da escola secundária recebia sua regulamentação precisa e efetiva com o Dec.-lei
n.° 8 777 que dispunha sôbre o registro definitivo dos professôres de ensino secun-
dário. Permaneceu o critério adotado anteriormente no Dec.-lei n.° 1.190, segundo
o qual cada curso habilitaria ao magistério de sua disciplina ou disciplinas especí-
ficas. Respondendo a uma consulta sôbre o número de disciplinas em que pro-
fessôres de ensino secundário poderiam registrar-se, o Par. 205/46, do antigo Con-
selho Nacional de Educação, e da autoria do Prof. Lourenço Filho, baseando-se
no Dec.-lei 8.777, assim esclarecia: 'Em várias seções da Faculdade de Filosofia
a licença só habilita ao ensino de uma única disciplina (Matemática, Química,
Filosofia, por exemplo), em outras habilita em duas disciplinas (Geografia e His-
tória); excepcionalmente, em três (Letras Clássicas)".

Esse regime persistiu até 1954 quando foi baixada a Port. 478 que, contra-
riando os princípios estabelecidos nos decretos-lei já mencionados, e aos quais faz
referência, ampliou consideravelmente a faixa de habilitação profissional dos cursos,
seja para atender à escassez de professôres, seja com o fim de criar maiores oportu-
nidades para certos cursos de reduzida procura. Mas a falta de um critério siste-
mático deu lugar a que alguns cursos fossem contemplados com liberalidade em
detrimento de outros que se viram, por assim dizer, esvaziados dos seus objetivos
próprios. Além disso, foi permitido aos licenciados de alguns cursos registrar-se em
matéria que não figurava sequer em seus currículos. Enquanto o curso de História
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habilitava exclusivamente ao ensino de História, outros cursos, como Ciências Sociais,


Filosofia e Pedagogia, habilitavam igualmente ao magistério daquela disciplina.
Cinco cursos, por exemplo, davam direito ao registro em Matemática. O curso de
Letras Clássicas perdia sua razão de ser como preparação específica de professôres
de Portugês e Latim, uma vez que o curso de Letras Neolatinas, além de suas
disciplinas próprias, Francês e Espanhol, habilitava também ao ensino daquelas
matérias.
Vê-se, portanto, que a mencionada Portaria deve ser substituída, não somente
em virtude dos novos princípios decorrentes da Lei de Diretrizes e Bases mas
também pela necessidade de se estabelecerem critérios mais sistemáticos na habili-
tação profissional dos cursos das Faculdades de Filosofia.
O problema na legislação anterior se encontrava de certo modo simplificado,
desde que os currículos das Faculdades eram praticamente idênticos e as matérias
da escola secundária as mesmas cm todos os estabelecimentos do País. Com o
advento da Lei de Diretrizes e Bases modificou-se substancialmente a situação.
A liberdade que agora possuem as facultades de complementar os currículos acarre-
tará, sem dúvida, sua diversificação. Existem cursos aos quais se conferiu ampla
liberdade, como o de Filosofia, por exemplo, onde foi determinado do currículo
mínimo apenas o núcleo básico das matérias filosóficas, pertencendo à escola a
iniciativa de escolher as duas ciências que devem integrá-lo.
Por sua vez, na escola secundária, a exemplo do que ocorre no primeiro ciclo,
de suas nove disciplinas, quatro serão escolhidas pelos Estados e pelo próprio esta-
belecimento. Daí resultará, certamente, aumento considerável do número de disci-
plinas que podem figurar no currículo da escola média. Por conseguinte, a varie-
dade dos currículos, tanto nas Faculdades de Filosofia como no ensino médio, nos
obriga a adotar novos critérios mais compatíveis com as novas estruturas curriculares
e as exigências do ensino.
O ideal seria que cada curso habilitasse somente ao ensino de sua matéria
ou matérias específicas. Mas é evidente que em face da carência de professôres
e da crescente expansão do ensino médio não poderíamos permitir-nos semelhante
rigor. Nas condições atuais da educação brasileira devemos admitir que se amplie
a faixa de habilitação profissional dos cursos, contanto que se obedeça a critérios
sistemáticos, evitando-se o esvaziamento de alguns cursos em benefício de outros,
como o fêz a Port. 478. Assim sendo, adotaríamos os seguintes princípios de
regulamentação:

1) em primeiro lugar, o ponto de partida seria o currículo mínimo, embora


com isto não se deva eliminar, pura e simplesmente, a possibilidade de se levar em
conta sua complementação;
2) de acordo com um critério geralmente admitido nos Estados Unidos de
se conceder certificado de ensino ao "major" e ao "minor", cada curso daria direito
ao registro em sua matéria principal ou especifica e na ou nas matérias comple-
mentares mais importantes;
3) seria permitido ao licenciado ensinar matérias afins a seu curso, a título
precário, nos casos de falta de professôres legalmente habilitados;
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 229

4) conforme o caso o registro valeria para os dois ciclos ou seria restrito


apenas ao primeiro ciclo;
5) não seria concedido ao licenciado em um só curso o registro em mais
de três disciplinas.

Estabelecidos esses princípios gerais, sugerimos a regulamentação seguinte:


a) aos licenciados em Filosofia — registro em Filosofia e Psicologia, Sociologia
ou Estudos Sociais e História, se cada uma dessas matérias figurar no currículo;
b) aos licenciados em Matemática — registro em Matemática, Física e Desenho
Geométrico;
c) aos licenciados em Física — registro em Física, Matemática e Química;
d) aos licenciados em Química — registro em Química, Física e, no primeiro
ciclo, Matemática;
e) aos licenciados em História Natural — registro em Ciências Físicas e
Biológicas, Biologia, Mineralogia e Geologia no segundo ciclo;
f) aos licenciados em Geografia — registro em Geografia e Estudos Sociais,
desde que figure em seu currículo, Antropologia Cultural e Sociologia;
g) aos licenciados em História — registro em História e Organização Social
e Política Brasileira e, ainda, Estudos Sociais desde que figure em seu currículo,
Sociologia ou Antropologia Cultural;
h) aos licenciados em Ciências Sociais — registro em Sociologia, Estudos
Sociais, Organização Social e Política Brasileira, Elementos de Economia e Geo-
grafia Humana;
i) aos licenciados em Letras — registro em Português e Literatura de Língua
Portuguesa e mais uma língua estrangeira com a respectiva literatura, conforme
ficou estabelecido no Par. 2 8 3 / 6 2 que fixou o currículo mínimo de Letras;
j) aos licenciados em Pedagogia — registro em Sociologia ou Estudos Sociais,
Psicologia e as matérias pedagógicas dos cursos de formação de professôres do
ensino primário;
k) aos licenciados em Psicologia — registro em Psicologia, em todos os seus
ramos;
1) aos licenciados cm Desenho — registro em Desenho, Iniciação às Artes
e Artes Industriais.

O registro correspondente às Licenciaturas de Física, Química e História


Natural inclui também Iniciação à Ciência. Os licenciados em Pedagogia e Ciências
Sociais poderão ensinar História, a título precário, desde que se verifique falta
de professôres registrados naquela matéria. Nas mesmas condições o licenciado
cm História Natural poderá ensinar Química, desde que figure no seu currículo
a disciplina até então existente de Complementos de Química. Ao licenciado cm
Letras, para obter registro noutra língua estrangeira, basta cursar as disciplinas
correspondentes àquela língua e respectiva literatura, de acordo com o plano da
escola.
Em qualquer hipótese, nenhuma disciplina poderá ser objeto de registro quan-
do não houver sido estudada ao longo do curso, pelo menos em dois anos letivos.
( a a . ) A . Almeida Júnior, Presidente da C E . S u . , Newton Suupira, relator.
INFORMAÇÃO DO PAÍS

CENTRO DE INTEGRAÇÃO rica é acompanhada de estágios


EMPRÊSA-ESCOLA a cargo de assistentes sociais. Com
as organizações que desejarem, o
Por iniciativa das classes produ- Instituto manterá quatro tipos de
toras de São Paulo e com apoio do convênio: 1. O Instituto elabora
Ministério da Educação por suas o currículo e os programas, fornece
diretorias do ensino industrial e os professôres, instrutores, moni-
comercial, instalou-se na capital tores e os serviços gerais com as
paulista o Centro de Integração instalações respectivas, de acordo
Emprêsa-Escola em sessão solene com o pedido da organização pro-
realizada no Instituto de Educação motora; 2. O currículo e o pro-
Caetano de Campos, no mês de grama já são fornecidos pela or-
junho. ganização promotora, estando a
Definindo as finalidades do cargo do Instituto os professôres.
CIEE, afirmou seu presidente, Se- instrutores, monitores, serviços ge-
nhor H. Boilesen, que o que se visa rais e as instalações; 3. O Insti-
"dentro dos mais modernos concei- tuto fornece os monitores e os
tos de capitalismo e democracia é serviços gerais, ficando tudo mais
estabelecer novo instrumento de por conta da organização; 4. O
vinculação entre a empresa e a co- Instituto semente oferece as ins-
munidade, da qual não deve aquela talações, com os serviços gerais
ser uma excrescência, mas consti- para que a organização promotora
tuir uma das suas expressões mais desenvolva o curso.
atuantes". Desde 1957, vem a Confederação
De acordo com o plano de ação, dos Círculos Operários, juntamen-
os estudantes de nível médio e su- te com a PUC, realizando anual-
perior realizarão estágios nas em- mente dois cursos para formação
presas paulistas depois de have- de líderes operários com ramifica-
rem adquirido segura preparação ções em nove capitais. Foram mi-
teórica. nistrados até agora 27 cursos a
turmas de 40 alunos. Os dois cur-
CURSOS DE FORMAÇÃO sos referidos — Popular de Prepa-
OPERARIA NA PUC ração Trabalhista e Intensivo de
Formação de Líderes — visam a
Encontra-se em fase de instala- orientar os trabalhadores para a
ção na Universidade Católica do liderança social e sindical de
Rio o Instituto Superior de For- acordo com a doutrina cristã. O
mação Operária, com sede na Rua primeiro deles pretende suscitar
Alm. Alexandrino, 149 — Santa vocações para militantes traba-
Tereza. Sob a orientação do Pa- lhistas, por meio de conhecimentos
dre Veloso, assistente eclesiástico teóricos e práticos, e selecionar
da Confederação Nacional dos Cír- alunos para o segundo curso, pelas
culos Operários, o Instituto conta seguintes avaliações: repetições e
desde já um corpo docente debates diários; testes psicotécni-
constituído de especialistas nas cos; provas escritas de português,
matérias relacionadas com a for- legislação do trabalho, previdên-
mação e o aperfeiçoamento dos cia social, história e geografia do
trabalhadores. A informação teó- Brasil, relações humanas, noções
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de economía política e questões latino-americanos e a Unesco para


sociais. Por sua vez, o Curso de a intensificação do referido Pro-
Formação de Líderes, cujas aulas jeto; 5. Programa e Planos do
teóricas são ministradas pela ma- Projeto Principal para o biênio
nhã e as práticas à tarde a tra- 1965-1966.
balhadores aprovados no curso an- O presidente da Reunião foi o
terior e premiados com bôlsa-de- Professor Anísio Teixeira, chefe da
estudo que lhes permite afastar- delegação brasileira, que ao insta-
se do trabalho durante o período lá-la pronunciou o seguinte dis-
de instrução, consta das seguintes curso :
matérias: noções de economia po- "Cabe-me a honra de dirigir aos
lítica, noções de direito constitu- Delegados das Nações amigas dêste
cional, legislação do trabalho, po- Continente a saudação cordial do
lítica democrática, política inter- Govêrno Brasileiro e os votos mais
nacional, questões sociais, moral, afetuosos de boas-vindas. O Brasil
oratória, marxismo e comunismo, muito particularmente, se alegrou
contabilidade, técnica de jorna- ao ver-se escolhido para sede desta
lismo . reunião da Unesco, cujos esforços
pela mobilização da América Lati-
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO na para completar a obra da edu-
GANHA NAVIO PARA PESQUISA cação elementar compulsória cons-
tituem motivos de nosso profundo
O Instituto de Pesquisas Ocea- reconhecimento.
nográficas da Universidade de São Muitos talvez dos que hoje aqui
Paulo foi recentemente beneficiado se acham entre nós ainda se recor-
com a aquisição pelo governo do dam do calor com que René Maheu,
Estado de um navio oceanográfico, diretor-geral da Unesco, julgou do
orçado em 1 bilhão de cruzeiros. A seu dever dirigir, há alguns anos,
Universidade será amplamente fa- na reunião conjunta, em Lima, da
vorecida neste setor de pesquisa
com esta compra, já que além de Organização dos Estados America-
outras vantagens científicas irá nos e da Unesco, aquela tocante
contribuir decididamente para o advertência às elites latino-ameri-
incremento da pesca no país. canas com que a todos comoveu.
Advertiu-nos de que não podería-
V REUNIÃO DO COMITÊ CON- mos, sem perigo para a própria
SULTIVO INTERGOVERNAMEN- segurança de nossos países, retar-
TAL DO PROJETO PRINCIPAL dar mais o cumprimento do pri-
DA UNESCO meiro dos deveres políticos, ou se-
ja, o da integração social dos nos-
No período de 3 a 6 de março sos povos em um sistema de edu-
último, estiveram reunidos no Ho- cação que a todos unisse numa
tel Nacional de Brasília delegações consciência comum da cultura
de 23 países integrantes do Comitê nacional.
Consultivo Intergovernamental do Vários anos já decorreram desde
Projeto Principal da Unesco, sôbre que se pronunciou essa advertên-
extensão e melhoria da educação cia histórica e aqui hoje nos en-
primária na aAmérica Latina. Tra- contramos, novamente reunidos,
ta-se da 5. reunião do Comitê, ainda em torno desse problema,
cujo temário ficou assim constituí- sob a mesma liderança da Unesco,
do: 1. Desenvolvimento do Pro- para refletirmos mais uma vez sô-
jeto Principal sôbre extensão e bre a gravidade de nossa situação.
melhoria da educação primária na Os fatos, os duros fatos nada mais
América Latina, a partir da última fizeram do que confirmar a ad-
reunião, desdobrando-se em ativi- vertência lúcida do diretor-geral
dades dos países e da Unesco; da Unesco.
2. Avaliação do Projeto Principal; O estado de transição e de crise
3. O Centro Regional de Constru- apenas esboçado por ocasião da
ções Escolares e o Projeto Princi- reunião de Lima agravou-se em
pal; 4. Recomendações aos países todos os nossos países, salvo aquê-
232 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

les poucos que conseguiram levar VISITA-NOS PROFESSOR


o esforço escolar de suas Nações DE OXFORD
a t é os limites da educação univer-
sal compulsória, e agora nos deba- A convite do D e p a r t a m e n t o Cul-
temos n a s convulsões da explosão t u r a l do I t a m a r a t i , esteve entre
de expectativas, que então se p r e - nós em princípios de abril o P r o -
via, e que hoje nos ameaça de sub- fessor Max Beloff, titular das ca-
versão, por faltar-lhe o controle deiras de administração pública e
e a direção que semente a cons- política internacional da Universi-
ciência educada, ou seja, reflexiva, dade de Oxford.
pode d a r - n o s . Em sua breve permanência no
Muito aprendemos no curso des- Brasil, o ilustre visitante p r o n u n -
tes anos p a r a compreendermos a ciou u m a série de conferências no
eloqüência profética de René Instituto Rio Branco, Fundação
Maheu e despertarmos. Sob essa Getúlio Vargas e Escola Superior
inspiração, a Unesco levantou a de G u e r r a sôbre os temas "Evolu-
situação educacional de todos os ção da Commonwealth", "O Estudo
países do m u n d o . Estudos econô- da Política I n t e r n a c i o n a l " e " P r o -
micos e sociais, fundados em fatos blemas do Govêrno P a r l a m e n t a r " .
e números, interpretados com l u - O Prof. Beloff é autor de vários
cidez e imaginação, iluminaram a trabalhos de política internacional,
consciência de nossos povos e t o - destacando-se os seguintes: "Polí-
dos hoje nos deparamos entregues tica exterior e o processo demo-
a esforços de planejamento e de crático" e "Novas dimensões da
organização que nem sequer antes política exterior".
prevíamos. A nossa reunião visa
proceder a u m a avaliação de todo COLÉGIO UNIVERSITÁRIO
esse esforço e ajudar-nos a incre- NO ESTADO DO RIO
m e n t á - l o . A Unesco aqui está
presente como a grande força Em iniciativa pioneira, a Univer-
catalítica de tôda essa fecunda sidade Federal do Estado do Rio
fermentação. abriu as matrículas p a r a o "Colé-
gio Universitário" que corresponde
O Govêrno de meu País, pelo seu à 3. a série colegial e se constitui
Presidente e pelo seu Ministro da em curso propedêutico à escola
Educação, impossibilitados de aqui superior, tornando assim dispensá-
estar presentes, pediu-me p a r a veis os cursinhos pré-vestibulares.
t r a n s m i t i r aos altos funcionários
da Unesco, organização promotora O Colégio compreende quatro
desta reunião, e aos Delegados dos seções: a de ciências médicas, que
países da América, que acorreram congrega os candidatos às facul-
ao seu chamado, a segurança de dades de medicina, farmácia,
sua mais estreita cooperação e a odontologia, enfermagem e veteri-
saudação mais reconhecida. n á r i a ; a de engenharia p a r a as d i -
versas especialidades do campo; a
Vai a Unesco ajudar-nos a p e n - de ciências jurídicas, filosofia e
sar, a pesquisar e a descobrir, por arte para os candidatos às escolas
meio do diálogo entre as Nações de direito, filosofia e belas-artes;
do Continente, as soluções p a r a o a de ciências sociais p a r a os c a n -
nosso grande problema comum da didatos às escolas de serviço social
educação primária, base e chave e ciências econômicas.
p a r a o próprio problema de de-
senvolvimento nacional. Os votos LEOPOLD NACHBIN: PRÊMIO
do Govêrno Brasileiro são, neste MOINHO SANTISTA DE
momento, os mais calorosos p a r a a MATEMÁTICA
eficácia de nossa reunião, que fi-
camos a dever à liderança escla- Contemplado som a láurea que
recida e ao sentimento de missão é distribuída a n u a l m e n t e aos ex-
que tão alto caracterizam a Orga- poentes da cultura e da ciência
nização p a r a a educação, a ciência brasileiras, o Prof. Nachbin, ao r e -
e a cultura das Nações Unidas". ceber o prêmio no Auditório da
REVISTA BRASILEIRA DE

Federação das Indústrias do Esta- No Brasil, porém, ainda preva-


do de São Paulo, em setembro de lece a impressão de que a Mate-
1962, prestou importante depoi- mática não realiza progressos nem
mento sôbre os estudos de mate- tem maior importância; de que os
mática no Brasil, que agora divul- matemáticos são pessoas que tra-
gamos pelo seu valor de subsídio: balham isoladamente, possuem
temperamentos bizarros, maneiras
Acho que êste prêmio, outorgado distraídas e cabeleiras desgrenha-
pela primeira vez no setor das das; de que os matemáticos neces-
ciências matemáticas, não o foi sitam apenas de lápis, papel, um
propriamente à minha pessoa, mas canto sossegado e, talvez, uma bi-
à Matemática brasileira. Explico- blioteca, que não precisa ser com-
me melhor. Vejo neste prêmio um pleta, sendo supérfluas as facili-
primeiro reconhecimento público, dades de amplo intercâmbio de
de grande repercussão nacional nos informações, de contatos pessoais
mais variados setores de nossa vi- freqüentes, ou de laboratórios con-
da, da importância da Matemática cedidos a outros setores científicos.
nos tempos modernos, do mérito Os que são informados através da
das aplicações de suas idéias a ou- propaganda dos jornais, hoje vol-
tros ramos do conhecimento hu- tada mais para as ciências bioló-
mano, do valor do método mate- gicas e físicas, não sabem que as
mático em face dos problemas da grandes realizações científicas e
natureza e do homem. tecnológicas de nossa era se ba-
seiam no emprego intenso da Ma-
Constitui êste prêmio, ora con- temática, sobretudo por meio das
cedido a um matemático, um estí- calculadoras eletrônicas de grande
mulo invulgar aos jovens que se memória e rapidez.
iniciam em suas aspirações profis-
sionais, os quais, doutra forma, po- Os nossos jovens de real talento
deriam ser atraídos pelas carreiras desconhecem a existência da car-
tradicionalmente mais importan- reira matemática, suas inúmeras
tes, mas que virão a seguir as suas possibilidades e os seus múltiplos
vocações matemáticas se eventos atrativos. Torna-se necessária, a
como o desta solenidade, além de meu ver, uma verdadeira campa-
outros, chamarem a atenção da nha de esclarecimento da opinião
juventude estudiosa para a exis- pública e da mocidade estudantil,
tência da carreira científica, para apontando-lhes, através de filmes
a importância do espírito matemá- educativos, conferências elucidati-
tico na época que atravessamos, vas e leituras amenas, o que é a
para as oportunidades profissionais carreira matemática e quais as
e de realização individual que hoje suas perspectivas, o que é a Ma-
se oferecem aos interessados pelas temática moderna e quais são as
ciências matemáticas no mundo suas aplicações. Tal campanha
inteiro, onde há uma demanda deve ser feita, sistematicamente,
crescente de matemáticos compe- no nível do ensino secundário, sem
tentes, dado o enorme desenvolvi- o que tardaremos muito a formar
mento da Matemática pura e apli- o número de professôres de Mate-
cada, no setor da pesquisa, como mática e pesquisadores que neces-
também no do ensino. sitamos, em nível secundário e
universitário, para os centros de
Alguns ramos da ciência têm já pesquisa pura e aplicada nos mais
um prestígio retumbante perante diversos setores.
as altas autoridades administrati- Nos países em que a Matemática
vas e universitárias e a opinião é mais avançada, como os Estados
pública em geral: é o caso das Unidos da América, a França e a
ciências biológicas, que dizem res- União Soviética, os matemáticos
peito à sobrevivência dos indiví- colaboram diretamente no desen-
duos; sendo, igualmente, o caso volvimento e no atendimento das
das ciências físicas, sobretudo após necessidades da Administração, da
o advento da bomba atômica. Astronomia, da Biologia, da Cien-
234 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

cia Espacial, das Ciências Sociais, nesse período foi fruto do trabalho
da Cristalografia, da Economia, iniciado em 1934, na Faculdade de
da Energia Nuclear, da Estatística, Filosofia, Ciências e Letras da Uni-
da Física, da Geodésia, da Logís- versidade de São Paulo, que é o
tica, da Meteorologia, da Progra- berço da atual escola matemática
mação, da Química, da Tecnolo- brasileira e que, ainda hoje, é a
gia, e t c , de modo que a inexistên- melhor instituição de ensino uni-
cia, no Brasil, de um grupo versitário no país, no setor mate-
numeroso de matemáticos bem mático .
formados prejudica esses diversos Há que ressaltar, também, a
setores. criação, em 1952, na cidade do Rio
Com vistas ao treinamento de de Janeiro, do Instituto de Mate-
um número grande de jovens ma- mática Pura e Aplicada (IMPA)
temáticos e ao melhor aproveita- do Conselho Nacional de Pesquisa,
mento de nossos talentos, é que o qual adquiriu justa reputação
vemos com grande esperança o como centro nacional de treina-
surgimento da Universidade de mento de matemáticos e deu pro-
Brasília, organizada em novos jeção internacional ao nosso país
moldes, na qual todo o ensino bá- no setor da pesquisa, exercendo
sico ou especializado e a pesquisa uma atividade irradiante de co-
em Matemática serão feitos no laboração com as diversas univer-
Instituto Central de Matemática, sidades brasileiras.
de modo a não haver a separação Como fruto desse esforço de mais
tradicional e inflexível, nos está- de uma geração, contamos hoje
gios iniciais da carreira, entre os alguns matemáticos de real
candidatos à Matemática e os as- talento, verdadeiramente entrosa-
pirantes às outras profissões. dos com o processo de expansão
Sôbre essa nova experiência uni- das fronteiras do conhecimento
versitária a ser feita em Brasília, matemático atual, que publicam
concentram-se hoje os olhares suas pesquisas e seus livros nas
idealistas, os olhares curiosos, e os mais famosas revistas e coleções
olhares críticos dos professôres. internacionais, dando contribuições
estudantes e administradores de à Matemática que são do conheci-
nosso país. Almejemos todos que mento dos melhores especialistas
a nova Universidade de Brasília, antes mesmo da sua divulgação
que nasceu dos esforços prolonga- impressa. Entre tais matemáticos
dos de um grupo de trabalho que brasileiros, não posso deixar de sa-
aspirava realizar numa nova ins- lientar o nome de meu caro amigo
tituição aquilo que não pôde con- Maurício Matos Peixoto, meu co-
cretizar em nossas universidades lega dos bancos escolares da Uni-
tradicionais, venha a ser um exem- versidade do Brasil, cujas pesqui-
sas em equações diferenciais de-
plo de trabalho e organização, a ram-lhe justa reputação interna-
emular e estimular os nossos de- cional, segundo pude testemunhar
mais centros. repetidas vezes.
Se, de um lado, é verdade que
a Matemática brasileira se encon- O futuro da Matemática brasi-
tra ainda em sua infância, por ou- leira depende vitalmente do apoio
tro lado já conseguimos formar que os nossos órgãos governamen-
vários matemáticos competentes, tais, como a CAPES, a COSUPI, o
alguns de projeção internacional Conselho Nacional de Pesquisas e
em suas especialidades. A semente a Comissão Nacional de Energia
do verdadeiro espírito matemático Nuclear, derem a homens de real
foi lançada entre nós e germinou. talento e com genuínas qualidades
de liderança que já formamos. O
Em breves palavras, podemos que importa é que os nossos me-
dizer que a atual escola matemá- lhores matemáticos disponham de
tica brasileira data de 1930, apro- todos os recursos de que carecem,
ximadamente, tendo apenas cerca pois dêsses líderes e da irradiação
de 30 anos. O que logramos fazer de suas atividades é que dependem
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

verdadeiramente o ensino e a pes- ser realizada, através da multipli-


quisa em Matemática, em todos os cação dos meus esforços, ao lado
níveis. dos meus amigos, com os quais
Na minha carreira, como pro- tenho a sorte de contar e privar,
fessor universitário no Brasil, tive para algum dia ver implantada no
que enfrentar dificuldades que se Brasil uma escola matemática.
me afiguraram como insuperáveis Temo que isso demorará e não
e que atingiram as raias da injus- será para os meus anos de pes-
tiça, mas tive a sorte de encontrar quisador produtivo, de modo que
muita gente justa e amiga. Não não tenho certeza se virei a tra-
quero recordar agora o que é tris- balhar no Brasil, no seio de uma
te, pois êste ano de 1962 tem sido atmosfera intensa e estimulante,
de excepcional alegria profissional como as que conheço de outros
para mim. centros, entre eles Paris e Prin-
ceton. Não importa, pois na expec-
De um lado, no plano interna- tativa do nosso progresso mate-
cional, tive a honra de receber um mático, propus-me a experiência
convite da Comissão Organizadora de pautar as minhas decisões, no
do Congresso Internacional de que toca à nossa Matemática, por
Matemáticos, para realizar em uma preocupação de absoluto res-
agosto último, em Estocolmo, na peito à verdade, sem lançar mão
Suécia, uma das conferências es- daquilo que outros chamam de as-
peciais desse Congresso, onde fui túcia. A meu ver, a busca da ver-
solicitado a expor certos progres- dade é uma das mais poderosas
sos recentes em Análise, parti- formas de astúcia.
cularmente os meus próprios re- Termino esta breve oração ex-
sultados de pesquisa, que datam de ternando os meus mais sinceros
1959 a 1961, sôbre as álgebras to- agradecimentos às instituições
pológicas de funções diferenciáveis brasileiras que mais me ampara-
e sôbre a aproximação polinomial ram, tornando possível a minha
ponderada, os quais considero co- carreira: refiro-me, particular-
mo cs meus melhores trabalhos. mente, à Academia Brasileira de
Por outro lado, no plano nacional, Ciências, ao Centro Brasileiro de
tomei conhecimento da decisão, Pesquisas Físicas, ao Instituto de
muito honrosa para mim, da ou- Matemática Pura e Aplicada do
torga à minha pessoa do Prêmio Conselho Nacional de Pesquisas e
Moinho Santista para 1962, no se- à Universidade do Brasil. A honra
tor da Matemática. dêste momento cabe não a mim,
Vejo, nesses dois eventos singu- mas à minha família, aos meus
lares em minha vida como pesqui- mestres, aos meus colegas e discí-
sador e que foram motivo de indis- pulos, que me ajudaram a manter
farçável júbilo para mim, não ape- um espírito de luta por um ideal
nas um reconhecimento e uma re- a atingir. À Fundação Moinho
compensa por um esforço já rea- Santista, a essas instituições bra-
lizado, mas sobretudo, um estímulo sileiras, a todos esses amigos e à
significativo aos meus ideais de minha família, aqui deixo o tes-
matemático e à minha integral temunho de minha mais profunda
gratidão.
dedicação a uma tarefa que resta

INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO
MUDANÇAS NAS ESCOLAS da-se uma reforma do plano de
PÚBLICAS DE NOVA IORQUE estudos que permita aos pro-
fessôres desenvolver o espírito de
O novo superintendente de esco- iniciativa e experimentação; o en-
las públicas de Nova Iorque decidiu sino deverá concentrar-se nas cri-
descentralizar a administração es- anças superdotadas, sem esquecer
colar em 25 seções urbanas. Estu- aquelas que parecem retardadas
236 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

em virtude, principalmente, das ESTADOS UNIDOS: EFETIVO


condições sociais de suas famílias. ESCOLAR POR MESTRE
Considera-se, também, u m a nova
fórmula de organização do t r a b a - No outono de 1957, a média de
lho escolar: a instrução individua- alunos por mestre nas escolas p r i -
lizada, ensino programado, e t c . m á r i a s e secundárias públicas era
Por outro lado, um orçamento que de 26,2. No outono de 1962, essa
prevê a construção de 37 novos média correspondia a 25,7. Neste
prédios escolares p a r a 1965 foi período, a média de alunos por
submetido às autoridades. mestre, na escola primária, passou
de 29,1 a 28,5 e, na escola secun-
FORMAÇÃO DE TÉCNICOS dária, de 21,3 a 21,7.
POLIVALENTES EM
MADAGASCAR ENSINO E SERVIÇO MILITAR
No ano escolar 1962-1963, o setor NA FRANÇA
de ensino técnico aplicou o pro- O Ministério da Cooperação aca-
g r a m a de formação polivalente ba de expor as condições em que os
nos centros de aprendizagem. Esta jovens franceses podem, de agora
formação, que não impede a p r e - em diante, efetuar p a r t e do serviço
paração de operários especializados militar como professôres em p a í -
nas cidades, deve permitir aos j o - ses africanos ou u l t r a m a r i n o s . A
vens que a seguem, d u r a n t e 4 anos, 17 de setembro de 1963, 23 jovens
o preparo às múltiplas tarefas que professôres p a r t i r a m p a r a ensinar
enfrentarão no meio r u r a l . Após n a s Antilhas d u r a n t e o serviço m i -
estágio eventual de formação com- l i t a r . Novas equipes de recrutas
plementar, poderão buscar qualifi- d a r ã o prosseguimento a essa ino-
cações profissionais mais especia- vação.
lizadas.
COMPREENSÃO INTERNACIONAL
GLOBOS LUNARES PARA
ESTUDANTES Os delegados à Conferência
Uma fábrica de Moscou está Anual da Federação de Professôres
construindo globos lunares p a r a Australianos, realizada em princí-
e s t u d a n t e s . A face invisível da lua pios de 1963, l a n ç a r a m apelo aos
pode ser representada graças às mestres de todo o m u n d o convi-
fotografias tiradas pelos satélites dando-os a reexaminar os progra-
lançados ao espaço. m a s de estudos e organização es-
colar, visando melhor formação de
ESCOLA NORMAL SUPERIOR NA cidadãos e de suas responsabilida-
COSTA DE MARFIM des internacionais. Por exemplo,
os serviços de educação devem le-
A escola normal superior do var os alunos a: 1) compreender
Abidjan foi aberta em 1962. Consta a história de seu país e sua forma
de 3 seções: a) a primeira é de- de governo; 2) apreciar os valores
dicada à formação de professôres culturais e ideologias políticas de
de colégios de ensino geral, com outros países; 3) reconhecer a
21 alunos no 1.° ano e 8 no 2.° (que importância da compreensão i n -
e n t r a r a m diretamente p a r a esta ternacional entre os povos.
série após um ano de propedêu-
tica) ; b) a segunda destina-se a ESTATÍSTICAS ESCOLARES
formar inspetores primários, com NA BÉLGICA
19 alunos não bacharéis cursando
série preparatória e 9 alunos b a - Em 1961-1962, a segunda série de
charéis em série normal; c) a h u m a n i d a d e s contava 14.940 alu-
terceira p r e p a r a r á professôres de nos, 6.778 do regime francês e
2.° ciclo. Os alunos a c o m p a n h a m , 8.162 do regime holandês; destes,
como informação complementar, 5.593 freqüentavam escolas oficiais
cursos do centro universitário do e 9.347, escolas particulares;
Abidjan. 16.985 alunos assistiam às classes
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

finais de humanidades e o total jornalismo, química, física e ins-


de certificados concedidos foi de tituto de ciências, foram abertos
15.974. Em 1962-1963, 8.952 estu- atraindo grande número de estu-
dantes se inscreveram pela p r i - dantes.
meira vez como estudantes regu-
lares no 1.° ano de estabelecimen- EDUCAÇÃO DE ADULTOS PELO
tos de ensino superior, um pouco RADIO E TELEVISÃO
mais da m e t a d e dos efetivos p r o - NA INGLATERRA
venientes de h u m a n i d a d e s e esco- A BBC difundiu no outono de
las normais, enquanto o n ú m e - 1963 diversas emissões radiofôni-
ro total de inscrições no ensino cas e de televisão no programa de
universitário era de 40.571. O educação de adultos. Um curso
número de alunos em tempo i n t e - pela televisão intitulado "a ciência
gral é de 35.450, sendo 24,27% em do homem", t r a n s m i t e noções de
medicina e farmácia, 13,96% em biologia; u m a série de dez lições
ciências comerciais, 13,49% em ilustradas ensina, sob o título
ciências, 13,04% em filosofia e le- E=mc 3 , a teoria da relatividade.
Sôbre artes plásticas realizaram-se
tras, 12,11% em ciências aplicadas, dez palestras focalizando a pintura
8,02% em direito, 6,13% em ciên- européia. Outros programas foram
cias sociais, políticas e econômicas, organizados com lições elementares
3,97% em pedagogia e psicologia. de italiano, costura, educação fí-
Em 10 anos, o número de e s t u d a n - sica, completando a série de t r a n s -
tes passou de 21.999 a 35.450, isto missões da BBC para educação de
é, aumentou de 6 1 % . adultos.

ESTATÍSTICAS UNIVERSITÁRIAS DICIONÁRIO EUROPEU


NO CHILE DE PEDAGOGIA
Segundo o Instituto Chileno de Peritos do Conselho de Coope-
Pesquisas Estatísticas, o número ração Cultural, um dos órgãos es-
de inscrições nos cursos universi- pecializados do Conselho da Eu-
tários aumentou cerca de 73% e n - ropa, reunidos em j u n h o de 1963
tre setembro de 1961 e julho de em Viena, planejaram a organiza-
1963. Novos estabelecimentos, e n - ção de um vocabulário pedagógico
tre os quais escolas superiores de a ser usado na Europa.
CRÍTICA DE LIVROS

WAGLEY, Charles — An introthiction to culo XX? Por que escapamos — a des-


Brazil; New York & London, Colum- peito das lutas pela independência, dos
tumultos de nossa emancipação política,
bia University, 1964, 322 págs. das crises de nossa evolução econômica.
das desigualdades de nosso desenvolvi-
Desde a sua descoberta, o Brasil tem
mento social e das lutas pela defesa, inte-
sido objeto de curiosidade e estudo de
gração e expansão territorial — de todo
eminentes homens de cultura e de espi-
e qualquer divisionismo, para não dizer
rito de outros países. A nossa Brasiliana
balcanização, característico do movimento
conta, talvez, com tantos autores estran-
de emancipação da América espanhola?
geiros quantos nacionais. No longo esforço
Ouso acreditar que isto devemos ao fato
de introspecção em que todos nós brasi-
de havermos sido e até hoje sermos antes
leiros estamos imersos, sentimo-nos sem
um Império que um Estado, governado
dúvida extremamente ajudados pela visão
por poderes centrais, que lembram, para
mais desprendida e por isto mais objetiva
dizé-lo brutalmente, os do governo da
do observador estrangeiro. Nos tempos
Roma Imperial sôbre o seu extenso terri-
presentes, poucos autores poderiam como
tório .
Charles Wagley, pelo treino profissional.
A supremacia do poder político não
pela longa experiência e pela penetração
se estabeleceu no Brasil como uma gradual
de espírito, dar-nos uma interpretação do
evolução de poder local, mas caracteri-
Brasil. E outra coisa não é o que nos
zou-se sempre como imposição de poder
oferece êle agora neste admirável livro,
central sôbre a ordem tradicional social
ao mesmo tempo simples e profundo, es-
e econômica. Dêste modo. constituiu-se
crito como uma livre meditação sôbre a
sempre como um poder imperial e não
nossa terra, meditação apenas possível
como a natural emergência da soberania
graças aos longos anos de estudo. reflexão
popular.
e afetuosa identificação com o país.
Se considerarmos o Brasil como um
Ao ler-lhe os originais, disse-lhe logo império, como um poder metropolitano
que me senti seu discípulo, que muito central e um sistema colonial interno
aprendera ali, que nada poderia acrescen- periférico, muitas das nossas dificuldades
tar, mas, se me permitisse, não teria de interpretação da sua "misteriosa" uni-
dúvida em apresentar algo como um dade caem por terra. Essa "unidade" passa
"aparte" às suas considerações sôbre o a explicar-se em grande parte como resul-
"mistério" da legendária unidade do tado da apatia, impotência, subordinação
Brasil, a despeito dos seus extraordinários e atraso das áreas periféricas em face das
contrastes e de sua extrema diversidade. áreas metropolitanas.
Sem dúvida, tudo leva a crer que essa Efetivada durante o período de colo-
unidade decorre da unidade de língua, nização externa e consolidada pelo regime
consideravelmente uniforme em tôda a de colonização interna, a nossa unidade
imensa extensão geográfica, do singular não sofreu nenhum sério abalo nem muito
e eficaz cuidado português de isolar-nos menos fratura, exatamente devido à pro-
durante os três séculos de colonização e funda desigualdade econômica que põe o
do caráter relativamente pacifico de nossa Sul, industrial e rico, a cavaleiro do Norte,
expansão territorial, em virtude da fra- arcaico e pobre.
gilidade das culturas indígenas, rapida- A chamada Revolução de 1930 poderia
mente destruídas ou assimiladas. Como ter-se desenvolvido como a revolução de
pôde, entretanto, essa unidade ser man- integração nacional, ao longo de linhas
tida ao longo do século XIX e do sé- que lembrariam a Guerra de Secessão dos
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 239

Estados Unidos, se essa revolução não São Paulo e de Minas Gerais repartiram
tivesse sido esmagada pelo movimento de entre si o poder federal e exerceram até
contra-revolução, que se sucedeu à apa- 1930 o comando político da nação. Com
rente derrota de São Paulo, no seu levante a cisão entre eles e a aliança de Minas
contra o poder central. Foi a rendição Gerais ao Estado do Rio Grande do Sul,
política desse poder às forças conserva- sobreveio a Revolução de 1930, provocando
doras da nação que manteve o Brasil em a Instabilidade política conseqüente de
suas linhas tradicionais e restaurou o um período ditatorial que Sòmente se
sentido de Império do governo da Repú- encerra em 1946, com uma nova Consti-
blica Brasileira. tuição, em que se restabelece o poder
Com efeito, desde a Independência, da União em linhas semelhantes em mui-
tos aspectos à situação reinante ao tempo
em 1822, nada mais havíamos feito do
de Império, lembrando os estados agora
que transferir o poder da Metrópole
as antigas províncias sob o comando do
estrangeira para a Metrópole nacional, poder econômico e político extremamente
conservando o sentido colonizador do go- ampliado do governo federal.
verno central. Aos que estão familiari-
zados com a história das províncias, ao Essa concepção do Estado Brasileiro
tempo do Império, e depois dos estados, como poder Imperial sôbre as culturas lo-
ao tempo da República, será impossível cais das províncias, hoje estados, é que
evitar a comparação das autoridades im- permitiu manter-se a unidade política
periais e depois das autoridades federais dentro da extrema diversidade cultural de
aos procônsules romanos. Verificava-se todo o país. Tal natureza Imperial do
sempre entre a autoridade e o povo a governo central, que se transferiu da Co-
mesma distância social e a mesma pro- lônia para o Império e dêste para a Re-
funda Incompreensão que deveria carac- pública, retardou, sem dúvida, o desen-
terizar a autoridade colonizadora. Episó- volvimento global do país, mas, por outro
dios de levantes populares nas cidades, ao lado, permitindo e mesmo promovendo o
tempo do Império, e, talvez ainda mais desenvolvimento desigual e particular de
eloqüentemente, episódios de fanatismo certas zonas de hegemonia e contendo as
religioso, já na República — nenhum mais demais, operou como que uma superor-
famoso do que o de Canudos, imortali- dem para a manutenção da integridade
zado por Euclides da Cunha — foram nacional.
tratados pela autoridade central do go- Graças a esse processo de retarda-
verno brasileiro do mesmo modo por que mento causado pela natureza colonizadora
semelhantes Incidentes seriam resolvidos do governo central pôde o Brasil atra-
pelas autoridades romanas no Oriente vessar o possível período de desmembra-
Médio. A ordem política era uma ordem mento e chegar à época contemporânea,
externa, "federal", de cúpula, sob cuja quando o progresso da tecnologia das
proteção e domínio viviam os povos pro- comunicações e dos transportes Já per-
vinciais, com os seus costumes, hábitos e mite enfrentar os problemas de desenvol-
tradições, substancialmente semelhantes vimento global sem perda da unidade
devido à unidade de língua e aos três política. Ninguém poderá dizer se a divisão
séculos de calculada e planejada unifor- do Brasil não teria ocorrido se o avião e
mização imposta pelo domínio português. os meios de comunicação não tivessem
Com a proclamação da República, chegado a tempo de mantê-lo unido, a
concedeu-se autonomia às províncias, despeito de seu desenvolvimento desigual
agora estados à maneira da federação nor- e contrastante. A observação que assim
te-americana. Mas, enquanto a fe- ouso ajuntar à análise lúcida e percucien-
deração nos Estados Unidos resultava da te de Charles Wagley em relação ao "mis-
limitação dos direitos originários dos tério" da unidade brasileira não escapa
estados, os quais subsistiam sempre que a certo aspecto paradoxal.
não expressamente transferidos, no Brasil A nossa unidade resultou, no passado,
os direitos dos estados foram outorgados de uma estrutura colonial interna, que
pela União. Encerra-se essa verdadeira retardou o desenvolvimento global e con-
experiência política nos primeiros qua- teve o país atrasado em face de sua região
renta anos da república. Na prática, con- em desenvolvimento, impedindo qualquer
sistiu a experiência no estabelecimento fragmentação; e, no futuro, em face do
da hegemonia dos dois estados mais im- desenvolvimento global ora iniciado, será
portantes sôbre a União. Os Estados de mantida graças aos novos meios de co-

8 — 34 901
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

municação e de transporte, que Já agora contexto social, têm elas que atender a
tornam plenamente exeqüível o desenvol- padrões culturais e aos reclamos da co-
vimento material de nações de tipo con- munidade que, de modo geral, são os de
tinental como o Brasil. Se o retarda- criar o ambiente propício ao desenvolvi-
mento do nosso desenvolvimento nao mento adequado de personalidades, ao
tivesse ocorrido, ou nos desmembraría- mesmo tempo que distribuir essa clien-
mos, ou realizaríamos a nossa integração tela pelos diversos níveis profissionais
com a violência que marcou a integração existentes no meio.
política e a expansão territorial dos Es- Salienta, em primeiro plano, que
tados Unidos. Ficamos unidos porque cumpre analisar a sociedade em que atua
éramos atrasados e seremos unidos porque a escola e, por conseguinte, o sistema es-
hoje os meios tecnológicos permitem o colar, Indagando de sua filosofia, para
desenvolvimento pacífico de nações de que se firmem princípios que fundamen-
porte continental. tam os planos educacionais à luz dos quais
Nao desejo encerrar êste rápido co- se criam as estruturas capazes de realizar
mentário sem renovar a Charles Wagley os objetivos tidos como válidos.
a gratidão de um brasileiro por mais êste As realidades da vida escolar, no sen-
livro, que tanto nos ajuda a ver e sentir tido amplo, são as do processo educativo,
a nossa realidade e a formar a consciên- envolvendo aluno e mestre, matéria e mé-
cia nacional, sem o que não poderíamos todo, bem como todo e qualquer recurso
dirigir o movimento de nossa emancipação auxiliar para que aquêles elementos pas-
econômica, mantendo íntegro o nosso sem a operar de maneira eficiente. São,
caráter nacional. afinal, os mesmos elementos abrangidos
ANÍSIO TEIXEIRA pela didática, mas com perspectiva dife-
rente .
LOURENÇO F I L H O , Manuel Bergstrõm — A administração escolar cria o am-
Organização e Administração Esco- biente em que atua a didática e vai
acompanhando as fases desta, inclusive
lar, São Paulo, Melhoramentos, 1963, na apuração final do seu rendimento. O
288 páginas. administrador, em última análise, julga
o processo didático.
Ainda não se deu realce necessário
Considerados os elementos com que
ao livro que, no final de 1963, o Pro-
trabalha, a administração escolar tem que
fessor Lourenço Filho publicou, Organi-
forçosamente utilizar-se de todas as ma-
zação e Administração Escolar, e em que
térias pedagógicas: da filosofia educacio-
apresenta conceitos, princípios e instru-
nal, para extrair o sentido da educação;
mentos de análise, de maneira concisa e
da política educacional, para colocar os
segura, preenchendo uma grande falha
objetivos dentro da época da atuação;
na nossa literatura didática.
da psicologia educacional, para entender
No prefácio, o autor traça, com pre- o educando e saber conduzi-lo da maneira
cisão, o delineamento da obra, mostrando mais apropriada e, ainda, para ater-se às
a complexidade da matéria, uma vez que limitações e as diferenciações de cada um,
a administração escolar abrange vários dentro da seqüência do seu desenvolvi-
segmentos de um todo e o próprio todo: mento e amadurecimento paulatino,
o sistema escolar. guiando-se pelas chamadas leis da apren-
O que há de peculiar na administração dizagem que condicionam a organização
escolar, em relação a qualquer outro do trabalho escolar; da sociologia educa-
campo de administração, é que, nela, a cional, para investigar não somente o
clientela que produz é da mesma natu- nível de expectação da comunidade, como
reza substancial do produto, isto é, é os seus reais interesses, conduzindo o
matéria ativa. Não se trata, assim, de área trabalho escolar para servir a uma deter-
em que possamos adaptar princípios de minada polis; enfim, todas as demais
administração industrial, a não ser os naquilo em que elas ajudam a coligir
que se refiram as relações humanas. dados e a interpretá-los, de modo que
No capítulo I, mostra os diferentes se crie o mecanismo mais aperfeiçoado
aspectos da matéria do livro. Como ponto para obter resultados dignos de esforços
básico, ressalta o objetívo comum das e previamente fixados no planejamento.
escolas ou, antes, o objetivo geral da edu- Isso é que faz com que a administração
cação que elas prosseguem. Inseridas no escolar se torne interdisciplinar.
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O autor preferiu separar a estrutura- se verifique pela obra a sua posição. Trata
ção (organização) da gestão (adminis- da necessidade de dar uma fundamenta-
tração), justificando, com segurança, seu ção teórica para os esquemas de reali-
ponto-de-vista. zação prática, objetivando a eficiência no
Coloca, como fim precípuo da admi- seu duplo sentido. Não perde, porém, a
nistração escolar, a "eficiência", como oportunidade para dar seguro roteiro a
alias o é em qualquer gênero de admi- quem pretenda aprofundar-se no campo
nistração: obter o máximo rendimento teórico.
com o mínimo de esforço e o menor gasto No capítulo III, com o sugestivo titulo
de dinheiro, desde que o produto seja da — "Os administradores escolares em
mais alta qualidade que se possa alcançar ação", um dos mais originais do livro,
com os recursos utilizados. faz o estudo do "comportamento admi-
Na empresa industrial, o preço está nistrativo", estabelecendo a distinção en-
condicionado ao produto. Na empresa tre atividades operativas e não operativas
escolar, só se pode admitir que se deseje no campo escolar. Mostra os níveis de
obter de cada um a mais perfeita for- ação administrativa, que se ligam a aluno
mação dentro das limitações que cada e professor, professor e órgão estruturado,
um oferece (diferenças Individuais) e focalizando, neste, o tipo de organização,
segundo os recursos que foram postos ao seja em forma linear, seja a de assesso-
alcance do administrador, tanto os hu- ramento (funcional ou de "staff"). Em
manos (educadores) quanto os materiais seguida, expõe situações concretas com
(equipamento), que dependem, é claro, que se defrontam os administradores em
das finanças escolares. ação, separando o processo administrativo
nas suas fases primordiais:
De modo geral, a melhoria do padrão
cia eficiência, ensina Henry Mlller, se planejar e programar;
apresenta sob duas formas: dirigir e coordenar;
1 — aumento quantitativo: maior comunicar e inspecionar;
produção no mesmo tempo de trabalho controlar e pesquisar.
ou a mesma produção em menos tempo
de trabalho ou menos tempo de trabalho Para cada uma dessas fases, indica
por unidade produzida; princípios gerais, ao mesmo tempo que
2 — aumento qualitativo, que signi- salienta normas, entre as quais transcreve
fica ou melhor resultado ou mais rapidez as do clássico tratadista Arthur Moehl-
ou mais precisão. mann.
É claro que, no âmbito escolar, temos Conclui, daí, que as tarefas funda-
que encarar as duas formas, sobretudo mentais do organizador e administrador
em nosso país, onde os anseios por uma se resumem em duas: informar e decidir.
escola única ainda não estão sendo aten- Ao tratar de "Sistema de Ensino",
didos pela maior parte dos Estados. no capítulo IV, focaliza-o de dois
No capitulo II, depois de justificar ângulos: o da filosofia política e o da
porque adota a expressão "organização e ação política, mostrando que o instru-
administração" em vez de apenas "admi- mento de expressão política é a legislação,
nistração", o autor retraça as teorias ge- que trata de conceituar e hierarquizar,
rais sôbre o campo, divldindo-as em três chegando a indicar princípios de sua
grupos: as clássicas, as intermediárias e hermenêutica.
as novas, colocando-se no movimento Ressalta a importância da legislação
destas, pois que elas dão mais ênfase ao no planejamento geral dos sistemas, apre-
"comportamento administrativo" do que sentando um esquema das "relações entre
ao "processo", em abstrato. os preceitos ou normas de legislação e
São elas que "sistematizam idéias e decisões administrativas", com indicação
métodos de ação e modos de ver que o das partes e funções respectivas.
homem desenvolveu, experimentou, aper- Destaca normas gerais para o plane-
feiçoou e acumulou através das idades, jamento dos sistemas de ensino e pará
na luta em busca da intelectuallzação do identificação de princípios de estruturação
esforço", conforme diz bem Georges didática.
Valois. Pecha êste capítulo o estudo da evo-
Não se sente preocupação do autor lução do conceito de sistema nacional de
em se situar dentro de teorias, embora ensino.
242 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Como pontos doutrinários até ai expe- Transcreve as recomendações do Se-


didos destacam-se três: minário de Chicago quanto aos pontos:
1. a eficiência impõe a necessidade a) autonomia universitária;
de coordenação no trabalho cooperativo; b) extensão da universidade;
2. a autoridade deve ser distribuída c) missão da universidade;
em várias esferas e níveis; d) formação geral e especialização;
3. o comportamento administrativo e) planificação e tecnologia.
deve guiar-se por princípios nas várias
áreas de estruturação e gestão. Nesses três últimos capítulos, o autor
esboça, de maneira segura, a questão dos
Entra, nos capítulos seguintes, a ob- objetivos que condicionam o planeja-
jetivar essas teorias nos campos do ensino mento, pois é partindo do que se pretende
de primeiro, de segundo e de terceiro alcançar num determinado momento his-
graus. tórico de uma dada comunidade, que se
No capítulo V, passa a delimitar o pode Investigar o problema de selecionar
que entende por ensino primário, seus os melhores meios para alcançar os obje-
objetivos e a clientela a que serve, abor- tivos. Isso determinará a estrutura e
dando problemas específicos dessa área, condicionará as relações humanas, isto é,
tanto os de organização quanto os de os elementos que vão interatuar para se
administração. alcançar o produto, sempre lembrados de
A seguir, no capítulo VI, tratando dos que o educando é ser ativo e, sem sua
mesmos problemas do ensino de segundo cooperação, é Impossível alcançar os re-
grau. chama atenção para o atual pro- sultados pretendidos.
blema de alteração de objetivos na escola Sua idéia constante é a de que "os
média, transcrevendo as oportunas reco- objetivos sociais não podem ser fixados
mendações feitas, em 1962, por especia- por critérios estranhos à compreensão da
listas no campo, que se reuniram no vida cultural, por sua própria natureza
Chile, sob os auspícios da Organização móvel e flutuante", tornando difícil iden-
dos Estados. Americanos. tificá-los.
Apresenta a organização de uma es- Dentro do esquema de trabalho que
cola de segundo grau, oferecendo exce- adotou, estuda as questões gerais de ad-
lente esquema a fls. 145, em que se vêem ministração nos órgãos de gestão: coor-
as relações de coordenação, de assistência, denação, controle geral e avaliação dos
de cooperação e de ensino. resultados, sempre lembrado de que o
O ponto mais importante dêste capí- que, nesse campo, se produz são serviços
tulo é, sem dúvida, o que se relaciona e não mercadorias.
oom as piodiflcações dos objetivos Ho No capítulo VIII, retomando o pon-
ensino médio. to-de-vista de que a escola está em In-
Sempre fiel ao ponto-de-vista de que tima conexão com a sociedade, examina
a escola só se compreende Inserida em as relações entre vida econômica e edu-
determinada estrutura social, delineia os cação do povo e aborda os aspectos de
movimentos modernos que condicionam educação e economía em função das ne-
a transformação da escola. cessidades do povo ou, pelo menos, das
No capítulo VII, aprecia as linhas ge- suas aspirações. É esse nível de expectação
rais de Organização e Administração do que entre nós está crescendo, reclamando,
ensino superior, o chamado ensino de hoje, o povo uma escola que seja adequa-
terceiro grau. da a seus fins.
Caracterizando os tipos atuais i a s Tratando do problema de finanças
Universidades, engloba-os em três: públicas, indica os fundamentos gerais
a) o das Universidades da Europa para elaboração orçamentária, fazendo
continental, inclusive a URSS; substanciosa análise que esclarece a re-
lação entre proposição de objetivos e
b) o das Universidades norte-ameri-
meios materiais para sua realização. É
canas;
muito comum o estabelecimento de obje-
c) o das Universidades inglesas. tivos desejáveis sem a focalização dos
Discute o problema das Universidades. possíveis ou realizáveis dentro da limi-
destacando uma das suas questões funda- tação dos recursos financeiros. Isso tem
mentais: a do profissionalismo versus comprometido. todo e qualquer plano de
formação geral. educação.
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Termina o capítulo com um esquema CHAIA, Josephina — A educação brasi-


(fls. 194) dos pontos que o administrador leira. índice sistemático da legislação
deve considerar no cálculo do custo uni- (1808 a 1889), 3 vols. Boletim n.° 1
tário do ensino, que conduz à avaliação da Cadeira de Administração Escolar
das despesas gerais com o mesmo. e Educação Comparada da Fac. de
Com isso termina a primeira parte do Filosofia de Marília, São Paulo, 1963.
livro e passa a examinar, na segunda.
problemas de organização e administração A pesquisa que se faz em nosso país
escolar no Brasil, começando pela análise nas chamadas ciências humanas, tem no
da matéria em nossa Constituição e na elenco de limitações que lhe dificultam
Lei de Diretrizes e Bases da Educação o progresso em desejável escala, dois im-
Nacional, que transcreve, e da qual faz pedimentos bastante sérios: — a ausência
segura apreciação crítica e ainda oferece. de bibliografias críticas e a de repertórios
no capitulo XI, indicações para o pros- de leis comentadas.
seguimento dessa análise. Retrata, a Em diferentes oportunidades temos
fls. 253 e 257, a estrutura geral do ensino feito sentir a consideração que votamos
e as grandes linhas de administração do por essa espécie de trabalho preliminar,
ensino depois do advento da citada lei. geralmente desdenhado pelo cientista mais
Finaliza o livro capítulo atualizado ambicioso de nome e de títulos, que não
sôbre o "Estudo e o Ensino da Organi- vê na fase da coleta e da coleção um
zação e Administração Escolar" no Brasil, estágio digno de suas preocupações, mas
inclusive oferecendo Bibliografia sôbre que bem sabe ser ela indispensável a
problemas abrangidos pela matéria. In- qualquer plano de investigação cientifica
dica, enfim, todo esforço que entre nós mais expressivo ou de pretensões mais
se tem feito no desenvolvimento dessa altas.
especialização. Com o pensamento voltado para essas
Conclui por chamar atenção para o situações, entregamo-nos já há algum
desenvolvimento dêsses estudos que fun- tempo à elaboração de algumas tentati-
damentam tôda a ação renovadora da vas, que constituem mesmo nossas pri-
escola brasileira. Sua mensagem eqüivale meiras experiências nesse sentido, isto é.
a dizer que a Lei de Diretrizes e Bases uma bibliografia crítica de interesse para
da Educação Nacional só se aplicará legi- a história da cidade de Campinas, já em
timamente em seu sentido profundo fase de publicação e, em colaboração com
quando estiver preparado um quadro a autora do livro que ora resenhamos.
adequado para interpretá-la e aplicá-la dois repertórios comentados de leis. sôbre
convenientemente em todos os níveis de a escravidão negra no Brasil e sôbre uso
ação do administrador. e propriedade da terra também em nosso
Magnífica obra de síntese, traçando pais, ambos ainda em preparo.
as linhas gerais da organização e admi- Mas. efetivamente, estamos até agora
nistração escolar, êste livro interessará muito distantes de atingir o quantum
tanto a professôres quanto a alunos de satis de inventários críticos que satisfa-
Faculdades de Filosofia e Escolas Normais, çam a demanda dos estudiosos.
quanto a administradores escolares dos No campo específico das leis, os pou-
vários níveis, bem como a qualquer estu- cos trabalhos coletores que conhecemos,
dioso de pedagogia. foram realizados quase sempre por ini-
Deve ser considerado como um dos ciativa oficial, visando interesses mais
esteios pará auxiliar a implantação dos imediatos, particularmente no campo do
sistemas estaduais de educação, no sentido Direito Administrativo. Êste é, mais ou
em que agora devem estruturar-se, ofere- menos, o caso das coletâneas que reuni-
cendo ampla matéria para reflexão sôbre ram as disposições legais relativas ao
a problemática de cada nível de ensino. açúcar, ao café, aos índios ou à imigração
A experiência do Professor Lourenço estrangeira, para citarmos apenas as que
Filho, como administrador escolar, a sua conhecemos e que constituem hoje rari-
vasta cultura pedagógica, a sua intimidade dades bibliográficas de indiscutível uti-
com o processo educativo em vários níveis lidade para o pesquisador que se debruce
de ação, permitiram-lhe escrever esta sôbre esses temas.
obra, que está destinada a prestar rele-
O trabalho que é objeto dêste registro,
vantes serviços à educação nacional.
e cujos dois primeiros tomos acabam de
NAIR FORTES ABU-MERHY ser lançados, representa amplo e exaus-
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tlvo Inventario, que permitirá não só uma singular pertinácia, se remetesse a um


reunião comentada, metódica e sis- trabalho quase desalentador, do qual es-
temática das leis relativas à educação tes volumes são o primeiro mas, temos
brasileira, como também será doravante certeza, não o único resultado.
Instrumento indispensável à consulta de
todo aquêle Interessado no estudo da Alinhavando algumas anotações que
cultura brasileira. titula como Introdução do seu trabalho,
demora-se a autora em transcrever opi-
Resultado de um labor, cujas propor- niões de diferentes historiadores para
ções da Investigação podemos facilmente Justificar a Importância da carta regia
avaliar, êste índice revela também a ri- do príncipe D. João, abrindo os portos
gorosa preocupação da exatidão nos textos do Brasil às nações amigas, na qual vê
e citações, cuidado esse que, como nos a "nossa primeira lei". A maneira com
mostra a autora, nem sempre esteve pre- que foi feita essa Justificação e, afinal,
sente na cogitação dos escritores que, ela própria,, não se casam com os propó-
costumando recorrer a textos legais, fa- sitos e o próprio título principal que deu
zem-no entretanto de segunda e terceira ao conjunto de índices reunidos, a não
mão, transcrevendo ou referindo-se erra- ser que a autora procurasse mostrar, o
damente aos dispositivos de lei, ou, o que que não faz, a Importância direta ou
é pior, chegando até a alterá-los na sua indireta da referida Carta Regia para a
irresponsabilidade. Educação Brasileira, expressão que con-
A estas dificuldades todas que se fina e define os objetivos do código ora
antojam ao estudioso das disposições dado ao público.
legais brasileiras, a professora J. C. res-
Restaria, ainda, como sugestão, a
ponde com o modêlo de organização fun-
autora considerar a possibilidade de, em-
cional que presidiu o seu trabalho, em
bora com muito maior trabalho, tanto
cujo terceiro volume, ainda não lançado,
pelas proporções que a pesquisa assumirá
encontrará o leitor as indicações mais.
como pela dispersão enorme das fontes,
úteis para a rápida localização do dispo-
tentar como complementação necessária
sitivo desejado, quais sejam: cronologia
para a compreensão do processo educa-
e enumeração da legislação de 1808 a 1899,
cional brasileiro, a reunião metódica e
índices remissivos, do número de ordem,
sistemática dos textos de leis que as auto-
cronológico dos assuntos (por ano e em
ridades metropolitanas e coloniais pro-
ordem alfabética), alfabético de assuntos
mulgaram nos séculos XVI, XVII e XVIII,
e onomástico, além do cuidado que teve
e que jazem espalhados pelos acervos dos
de remeter o leitor a todos os textos mo-
arquivos portugueses e brasileiros, repou-
dificadores das leis que sofreram alteração.
sando nos mais diversos tipos de misce-
É, portanto, uma obra de consulta lãneas, que eram como se chamavam as
permanente e obrigatória, para o uso de reuniões, mais ou menos arbitrárias, de
autoridades, estabelecimentos de ensino, textos de leis, além naturalmente das
professôres e alunos, pesquisadores e estu- corporíficações mais racionais que estão
diosos em geral da educação nacional. nas Ordenações do Reino e nas chamadas
Tendo nascido o seu interesse pelas Leis Extravagantes, etc. É claro que, no
leis, como confessa na Introdução, da caso da reunião dessas normas vigentes
displicente observação do que elas pos- no período colonial, o que será realmente
suiam aparentemente apenas de anedó- válido, é conseguir os próprios textos,
tico e episódico, a autora chegou entre- dada a dispersão das fontes e a dificul-
tanto a alcançar o riquíssimo campo de dade do seu acesso.
Investigação que elas representam,
o que aliás foi um passo pará que, com JOSÉ ROBERTO DO AMARAL LAPA
ATRAVÉS DE REVISTAS E JORNAIS

EDUCAÇÃO, PRÉ-REQUISITO PARÁ O DESENVOLVIMENTO

Assumindo a direção da CAPES {Coorde- dizer, básica e graduada. Os meios para


nação do Aperfeiçoamento do Pessoal a atuação desta força graduada se
de Ensino Superior) já com a nova obtêm através dos estabelecimentos de
reestruturação, a Prof." Suzana Gon- ensino e treinamento, apropriadamente
çalves proferiu êste discurso: escolhidos e estrategicamente distribuídos
nos pontos chaves das diversas regiões
"O novo órgão criado, englobando do País. O problema da formação efetiva
organismos Já existentes, ou seja, a antiga e eficiente de pessoal pós-graduado está
CAPES a COSUPI e o PROTEC. numa condicionado a uma sistemática objetiva,
larga visão de política educacional pará que parta, e não os exclua, em sua con-
o desenvolvimento, supõe planejamento e, sideração prévia, dos dados da realidade
era conseqüência, coordenação entre as brasileira. Assim sendo, para maior pro-
atividades específicas do Ministério da veito dêste esforço, seria aconselhável
Educação e Cultura e os órgãos de pro- usar ao máximo as facilidades existentes
gramação orientadores das diretrizes só- no País antes de encaminhar elementos
cio-econômicas, na visão geral da política para a última etapa da especialização, em
instituições estrangeiras.
do governo. Isto resulta da compreensão
de que a educação é investimento e, por- O entrosamento e a eqültativa dis-
tanto, pré-requisito fundamental para o tribuição das possibilidades nacionais em
desenvolvimento. Os deficits constatados têrmos de equipamento, daria, certamen-
na infra-estrutura educacional brasileira, te, oportunidade de maior rentabilidade
levam a impossibilidade de atendimento dos recursos disponíveis, aplicando-os
vocacional de todos os capazes, no plano através de uma política criteriosa, visando
do ensino. Sobretudo, tendo-se em vista a unificação de esforços e evitando, em
uma política global de desenvolvimento, conseqüência, duplificações inúteis e
o potencial humano é essencialidade bá- concorrências descabidas. Um país ca-
sica pará execução dessa política. Neste rente de recursos não pode desperdiçá-los,
sentido, a preocupação de ampliar o nú- mesmo que o seja em benefício de ini-
mero de vagas possíveis, nos quadros dos ciativas louváveis.
organismos existentes, é um problema de
Há que se ponderar o imperativo de
maior oportunidade. Embora exija um
organicidade, como elemento fundamen-
critério seguro e prudenclal em sua solu-
tal de multiplicação de recursos, por força
ção. O objetivo que se tem em vista é
de sua Judiciosa aplicação. O esforço pela
ajudar o Brasil nesta fase imperiosa de
educação no Brasil exige, como funda-
tomada de consciência do esforço indis-
mento básico, a sua racionalização, tendo
pensável para a aceleração de seu processo
como conseqüência um método de desen-
evolutivo. Para isso, é necessária a capa-
volvimento orgânico, construtivo e pro-
citação de pessoal, ou seja, o atendimento
gressivo, isto é, a partir da infra-estrutura
às exigências de seu aperfeiçoamento.
até o limite máximo de especialização
Mas êste pessoal qualificado tem que ser
científica mais avançada. Para se atingir
colocado em todas as estratificações de
êste objetivo, como medida preliminar.
uma estrutura racional de educação, de
se apresenta o levantamento das necessi-
forma a atender a uma preparação obje-
dades de pessoal de nível superior para
tiva do potencial científico, com sentido,
o atendimento do mercado de trabalho,
pois, de preparação concatenada, vale
quer em têrmos quantitativos, quer em
246 REVISTA BRASILEIRA DE

têrmos qualitativos. Estabelecido o qua- dentro de uma visão integral de plane-


dro numérico de conhecimentos e pro- jamento, tanto mais se impõe quanto os
fissões, chegar-se-ia à fixação das dispo- recursos capazes de atender o mínimo
nibilidades existentes e dos deficits a ser, necessário representam um sacrifício co-
em conseqüência, cobertos. A síntese das mum, exigindo de quantos recebam uma
necessidades sócio-econômicas das regiões parcela de responsabilidade para a con-
brasileiras, em função dos programas de cessão dos objetivos ligados ao plano da
desenvolvimento nacional, seria base in- educação nacional, uma consciência lú-
dispensável para indicação dos critérios cida, escrupulosa e vigilante".
a serem estabelecidos, para melhor aten-
dimento aos problemas das áreas especi- CULTURA DO POVO
ficas do País. Levando-se em conta a
hierarquia e as prioridades decorrentes do Yolanda Bettencourt
balanço de necessidades, poder-se-iam 1. Campo e conceito da cultura popular
traçar normas paia subvenções e bolsas
subordinando-as a critérios que assegu- Num país como o Brasil em que o
rem o máximo de rentabilidade do acrés- analfabetismo atinge 50,6% da população
cimo de conhecimento fornecido e do adulta e, em que, de cada 100 crianças
diferencial de rendimento que pode ser que iniciam o curso primário, Sòmente 30
alcançam a 3.ª série com todas as con-
obtido pelo beneficiamento, emprestando-
seqüências de ignorância, atraso profissio-
se, assim, ã educação, o caráter de inves-
nal que isto pode acarretar, poderíamos
timento. Em país de economia ainda pensar que a cultura tenha evidente-
altamente dependente do setor primário, mente diante de si duas tarefas a cum-
há que se pensar, também, no atendi- prir que lhe indicariam de imediato seu
mento das necessidades de pessoal quali- campo:
ficado, em nível superior, para uma
política de produtividade agrícola. 1. De um lado, uma tarefa supletiva:
O ensino superior no Brasil ainda suprir as deficiências do ensino (falta de
é um privilégio de um pequeno grupo. escolas ou impossibilidade prática de
Assim sendo, deve ser encarado, objeti- cursá-las, além da sua freqüente inade-
vamente, dentro de uma concepção polí- quação ou sua inoperância) para dar ao
tica norteada pelas exigências da justiça povo os instrumentos primordiais e indis-
social. Nesta perspectiva, os que recebem pensáveis de defesa e de luta pela vida,
têm compromissos a cumprir pará com a através da:
comunidade que os beneficiou. Os can-
didatos às bolsas devem ser selecionados, • alfabetização de adultos
nao apenas por suas qualidades de apti- • educação de base
dão mas também pelo interesse de exer- • orientação profissional.
cício posterior de atividades ligadas aos
estudos e pesquisas a que se propõem. 2. De outro lado, pulando a forma-
Não seria, pois, descabida a exigência de ção escolar propriamente dita (primária,
comprovação do programa de atividades secundária, superior), criar um disposi-
que pretendem exercer, depois de quali- tivo de prolongamento da cultura, atra-
ficados. Formar homens não é apenas vés de:
desenvolver personalidades individuais, • cine-clubes
mas fornecer-lhes instrumentalidade de • tele-clubes
conhecimentos capaz de torná-los aptos • cursos e conferências
a compreender e a agir sôbre o sistema • grupos de teatro
social do qual participam. Num país em • corais
transformação, num país em que o im- • agrupamentos esportivos
perativo do desenvolvimento é tarefa que • atividades manuais (encadernação,
diz respeito à harmonia social e à digni- etc.) ou artísticas (cerâmica, te-
dade humana, a missão das elites adquire celagem, etc.) .
uma força essencialmente dinâmica e
uma dimensão de responsabilidade impos-
Nessas duas tarefas — suprir e com-
tergável. A política de desenvolvimento
pletar — estaria encerrado o campo da
supõe segura e, se possível, audaciosa
cultura popular, com todas as variantes
concepção da programação dos planos de
e nuanças que a diferença dos ambientes
educação. A racionalização dos esforços,
e das possibilidades ditariam?
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Colocar assim o problema seria pecar O pensamento comunitário, a teoria


pela base. Seria considerar a cultura co- e a prática das sociedades coletlvistas, o
mo uma aquisição gradativa do conhe- aprofundamento da consciência histórica,
cimento, uns de caráter prático, outros trouxeram á cultura uma modificação
mais teóricos — ou ainda, uns direta- não apenas quantitativa (pará um maior
mente úteis outros de aprimoramento, número), mas qualitativa: é o conceito
(cultura, ornamento do espirito), que vão mesmo de cultura que se modifica pela
do B-A, BA e a aprendizagem de cuidados visão do homem concreto, ou, para reto-
elementares de higiene, até à iniciação marmos uma expressão já consagrada, do
nas últimas descobertas científicas. Tal "homem em situação".
conceito, essencialmente acadêmico e O homem, e especialmente o adulto,
burguês, está na origem da criação das é uma pessoa Inserida num contexto
Universidades Populares, na Europa, em de que não se pode desligar, que
fins do século passado. A Revolução constitui uma série de condiciona-
Francesa e o socialismo trouxeram uma mentos, que lhe propõe problemas
reivindicação cultural: o direito de todos que deve enfrentar e resolver. Tem uma
os homens ao sufrágio universal. Mas família, exerce uma profissão, vê-se a
tal reivindicação cultural não ia além braços com despesas para as quais tem ou
do desejo de participar da cultura dos não o dinheiro necessário, possui amigos
privilegiados, ou seja da cultura aristo- e conhecidos, participa de um meio, de
crática. As Universidades Populares tive- uma classe, de um bairro, de uma cidade,
ram. então, por fim, levar ao povo um de um país. ouve rádio, vê a televisão
pouco dos ensinamentos adquiridos nos através dos quais (além dos jornais) tem
bancos das escolas e universidades, de notícias do mundo. Em vez, portanto, da
que êle era excluído. Tentativa generosa. figura vertical que propúnhamos mais
sem dúvida, e que teve os seus frutos, acima, poríamos o homem no centro de
mas que era essencialmente paternalista, um círculo que constitui o seu condicio-
pois os que sabiam (intelectuais e estu- namento, ou, se preferirmos, o seu meio
dantes) iam transmitir aos que não sa- (que o leva a pensar e agir de tal ou tal
biam (operários), iam "levar-lhes a cul- maneira), dando-se a esta expressão,
tura". Tratava-se para uns, exclusiva- meio, o sentido mais largo possível, que
mente, de dar, pará outros de receber. vai desde as suas condições pessoais de
Podemos sublinhar a Idéia de verticali- saúde até a notícia que lhe chega das
dade existente nesse conceito de cultura viagens cósmicas.
popular — decorrente do conceito de Diríamos então que o homem partici-
cultura simplesmente. pa de um meio, mas não sabe analisá-lo.
Nesse caso, tanto mais conhecimentos Resultados: explicações mágicas para
tem um homem — isto é, tanto mais doenças (mau olhado), atitude passiva
possibilidade teve de pôr dentro de sua diante da colheita fracassada, fatalismo,
cabeça a soma de conhecimentos que se alienação nas formas sociais ("vida de
amontoa fora dela — tanto mais culto pobre é assim mesmo", "todo mundo faz
será... assim"), ou religiosos ("a vontade de
Tal conceito deriva de uma visão Deus"), ausência de participação política,
individualista e estática do homem, cujas e outros tantos que todos os dias obser-
possibilidades se trata de desenvolver e vamos .
aprimorar para êle. isolado do contexto Deseja compreender, melhorar de rida,
de seu tempo e dos outros homens. Isto desenvolver-se mas não sabe orientar-se.
tem como resultado freqüente dificultar- Algumas conseqüências: vai procurar
lhe a comunicação com seus semelhantes, solução nas macumbas, nos "messias"
distanciando-o deles, fazendo dele um religiosos ou políticos (o que possibilita
"separado", condição muitas vezes culti- a demagogia); orientar-se para a litera-
vada por êle e respeitada pelos outros tura "sentimental" ou pornográfica,
como sinal de grandeza (não é o que se quando lê, em detrimento da literatura
dá tantas vezes com os nossos Intelectuais de certa qualidade; procura o "vistoso"
que uma certa formação e concepção de de preferência ao sólido ou ao sóbrio, em
seu papel deformaram, prendendo-os num matéria de casa, de decoração ou de
circulo estreito de "capelinha", fazendo- vestuário.
os tomar tôda critica por uma antipatia
Quer comunicar a sua experiência,
pessoal, e t c , e t c ? ) .
mas não sabe exprimir-se.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Algumas conseqüências: timidez di- chamaríamos de positivo e negativa —


ante dos patrões, dos "doutores", dos podem ser fruto de um mesmo esclareci-
estudantes, dos que falam bonito, acei- mento e coexistir, como Vimos, no mes-
tação de soluções que não estáo de acordo mo homem.
com suas convicções ou interesses, medo Mas não é função da cultura popular
do ridículo, falta de confiança em si. fazer política, substitulndo-se aos parti-
É comum vermos diagnosticar essas dos e aos sindicatos (veremos mais adian-
deficiências (que em outro nível talvez, te como isso é uma das dificuldades que
e com outras manifestações, todos encon- vamos encontrar no Brasil), mas sim
tramos dentro de nós como "Ignorância" preparar-lhes e acompanhar-lhes o tra-
ou "falta de educação". Há pois uma re- balho pelo debate e esclarecimento de
lação direta entre a situação do homem, certas questões e pelo despertar de cons-
a sua maneira de reagir a essa situação, ciências (o aspecto político sendo um
e a sua "cultura". Mas cultura não é dos aspectos fundamentais dessa cons-
mais então considerada como uma acumu- cientização) . A ação puramente política
lação de conhecimentos, mas como a se fará no seio do partido ou do sindicato
capacidade de dar uma resposta pessoal que, infelizmente, entre nós e não apenas
e justa aos condicionamentos (os conhe- no Brasil — não percebem ainda a im-
cimentos passam a ter valor de melo — portância dessa democratização do saber
e meio necessário — e não mais de fim), (que não consiste em fazer repetir slogans
o que pode traduzir-se da seguinte ma- e arregimentar a massa em nome de al-
neira : gumas Idéias que se lhe incutem) sem
1) SENTIR O SEU MEIO (tomar a qual não pode haver real democratização
do poder. Poderíamos dizer que sem um
consciência) : homens — fatos — situa-
trabalho paralelo de cultura, o partido
ções.
ou o sindicato podem tornar-se instru-
2) COMPREENDÊ-LO (ser capaz de mentos de massificação do povo (de que se
analisar): causas — conseqüências — beneficiam alguns dirigentes e demagogos
comparação com outros lugares e outras em proveito próprio), como também sem
épocas (sentido de evolução, primeiro partidos válidos e realmente populares e
passo para o sentido histórico — desco- sem sindicatos de fato representativos dos
berta de leis que fazem com que o mesmo interesses da classe, o trabalho de cultura
efeito se reproduza dentro de determina- popular corre o risco de cair no vácuo
das condições. ou de limitar-se grandemente em seus
3) PODER AGIR, dentro de um plano objetivos.
e escolhendo seus meios de ação (não
há cultura popular sem perspectiva de 2. Janeiro da cultura popular
transformação do melo e dos condiciona-
mentos) . Se aceitarmos tudo o que acima foi
dito, é fácil compreendermos que tal con-
Compreendida assim, a cultura po- ceito de cultura popular terá conseqüên-
pular é eminentemente política no sen- cias determinadas sôbre:
tido de levar o homem a situar-se dentro
da "cidade", a ser um elemento ativo, — espiriío que a inspira
com os outros, para a promoção do bem — o conteúdo a transmitir
comum. Como diz J. Dumazidier, "ela — os métodos a empregar.
parte da vida para voltar à vida. Não
mais Sòmente para a interpretar mas Para cada um destes itens deixaremos
pará transformar o homem e a sociedade". apenas algumas indicações.
Ela pode, então, levar o homem a O ESPÍRITO: sendo "democratização
colaborar, a inserir-se conscientemente do saber", uma das características da
num processo de desenvolvimento (ado- cultura popular e dos que trabalham
tando, por exemplo, tais técnicas agrícolas, nela, é não fazer paternalismo. Suscitar
dentro de um plano geral de moderni- líderes do próprio meio, criar um clima
zação da agricultura, como o da SUDENE) em que todos tenham a possibilidade de
ou, e às vezes ao mesmo tempo, numa se fazer ouvir e de ser levados em conta
luta que tenha por fim combater os con- (nesse sentido é difícil conceber-se um
dicionamentos de atraso (organizando-se, verdadeiro trabalho de cultura popular
por exemplo, contra o latifúndio, nos sin- num regime puramente totalitário, quer
dicatos rurais). As duas atitudes, — que porque êle teria interesse em cortar-lhe
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

as asas, quer porque se apoderaria dele — Já que a função primordial é des-


como de um ótimo instrumento de pro- pertar a consciência e a iniciativa do
paganda. Dificil também que em tal tra- meio, ou incentivá-la, utilizar tudo o que
balho colaborem pessoas de tipo autori- possa levar a isso: divisão de responsabi-
tário ou desejosos de conservar uma lidades, trabalho em equipe, participação
sociedade de privilégios). na direção, do trabalho, nas despesas,
auto-sugestão, etc.
O CONTEÜDO, ou, em linguagem aca-
— Evitar, quanto possível, os métodos
dêmica, a matéria: os assuntos, as inicia-
clássicos de cursos, palestras, conferên-
tivas, as ações empreendidas. Estarão
cias, substituindo-os pelo círculo cultural,
sempre ligados à vida do grupo local e
as discussões em grupo (técnica de base
partirão dos elementos de base que lhe
na educação de adultos), os clubes de
oferece a tradição cultural daquele grupo
leitura, os cinejornais. Neste capitulo,
ou daquela regl&o (crenças, costumes,
um material audiovisual é importante:
artesanatos, danças, canções, folclore em
gravador, vitrola, aparelho de projeção,
geral). Como exemplo bem próximo de
gráficos, mapas, fotografias, imagens, jor-
nós, ainda que muito lateral, parece-nos
nal-mural etc. Organizar também visitas
que seria melhor levar em novela "Eles
"in loco" para verificação dos problemas
não usam black-tie", de Guarnieri, do que
(visita a uma fábrica, a uma fazenda.
"Mãe Coragem", de Brecht, por mais
e t c ) , preparando-se primeiro um roteiro
"mensagem" que tenha êste último: a
de inquérito que oriente a observação, e
linguagem e a "maneira" (brechtiana)
fazendo-se depois o relatório e a discussão
não são Imediatamente acessíveis e não
sôbre o que foi observado.
têm raízes dentro de nós.
OS MÉTODOS, que por serem ins- (Gostaríamos de deixar aqui consig-
trumentos apenas, não deixam de ter um nado um exemplo que nos parece muito
valor primordial que muitas vezes despre- ilustrativo. No Rio de Janeiro, a diretoria
zamos, no nosso temperamento e forma- de um curso noturno de alfabetização que
ção pouco afeitos a métodos. reunia sobretudo reservistas, rapazes en-
tre 18 e 20 anos, imaginou o seguinte:
— Em primeiro lugar, é necessário um alfabetizar à base de manchetes de jornais.
mínimo de espírito e de observação so- Cada dia, tomava a manchete mais inte-
ciológicas. Antes de estabelecermos um ressante, recortava-a, punha-a sôbre o
programa ou um plano, precisamos de quadro-negro, fazia o trabalho de alfabe-
dados preciosos (e não de impressões) tização propriamente dito: reconheci-
sôbre a composição, as necessidades, os mento das letras, dos sons, soletração,
recursos e as aspirações do meio a ser e t c . . . Depois, inevitavelmente, a man-
trabalhado. Sem isso não pode haver chete trazia a discussão. No dia do jogo
aquêle "enraizamento" de que falamos Brasil x Espanha, no Chile, durante o
mais acima e que provoca uma ressonân- campeonato mundial de futebol, a con-
cia. Precisamos conhecer os elementos do versa começou por saber por quem esta-
meio e os pontos de apoio que êle nos riam torcendo os chilenos, o que deu
oferece (organizações já existentes, clu- margem a situar no mapa o Chile, o
bes, pontos de reunião, interesses, e t c ) . Brasil, a Espanha, e dar uma explicação
A entrevista com pessoas do bairro ou sôbre colonização da América Latina, ver-
da cidade é importante (embora nem dadeira aula de geografia e história, feita
sempre possamos esperar delas imediata- sobretudo à base de perguntas e palpites
mente uma consciência clara de suas dos alunos, e a partir de um jogo de
necessidades) . Isto mesmo quando conhe- futebol! Assim, aos poucos iam saindo
cemos o lugar e pertencemos a êle, jul- todos os assuntos que preocupavam a
gando conhecê-lo "como a palma de turma: o que é comunismo, o que é ca-
nossas mãos". A utilização de técnicas pitalismo, como são os EUA e a URSS,
de avaliação dos resultados também é dando margem a se fazer verdadeiros
necessária, assim como a revisão constante círculos culturais... num curso de alfa-
e objetiva, feita em comum e levada em betização !)
conta para o planejamento de novas ati- Muito mais teria a ser dito neste ca-
vidades (é comum reincindlrmos nos mes- pítulo dos métodos. Aliás, uma simples
mos erros por que nos contentamos em enumeração, como a que acabamos de fa--
constatar sem nos preocupar efetivamente zer, não significa nada. Seria preciso
em corrigi-los) . têrmos, como em todos os países onde
250 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

existem organizações e movimentos de mentos que, conscientizados pela cultura


cultura popular, e como já faz entre nós popular, desejassem ter uma ação mais
o MEB, estágios para a formação de ani- decidida e mais direta para a modificação
madores de cultura popular. É claro, no da estrutura social "impedlente" de que
entanto, que nao se pode tratar adulto. falávamos no Item acima. (Haveria muito
como criança (é apenas sôbre Isso que que refletir em comum sôbre: cultura
queríamos chamar a atenção), aplicando popular e sindicatos; cultura popular e
simplesmente em cultura popular aquilo Ligas Camponesas; cultura popular e par-
que a pedagogia nos ensina. Na Iugoslá- tidos políticos).
via, estão tentando fixar as grandes li- 3. O Item 2 pode levar-nos a duas
nhas de uma "andragogia", como chamam tentações: uma, de querer suprir as fa-
essa ciência do homem adulto que traz lhas existentes, dando como finalidade à
consigo uma experiência rica de vida cultura popular e criação de sindicatos,
(coisa que a criança não tem), embora a ação político-partidária. A outra, de
muitas vezes difusa, sôbre a qual deve- pôr a cultura popular a reboque ou a
remos apoiar-nos para fundamentar qual- serviço de uma ideologia: nesse caso, ela
quer trabalho. passaria a ser apenas um chamariz ou o
veículo de slogans (há um debate já aber-
3. Problema com que se defronta a to entre aquêles que estão com a mão
cultura popular na massa, alguns considerando que o es-
sencial no momento é arregimentar a
Gostaríamos de acrescentar aqui ain- massa para a "revolução" que trará novas
da algumas rápidas notas sôbre alguns estruturas onde "só então" será possível
problemas com que se defronta a cultura fazer um real trabalho de cultura popu-
popular no Brasil. Se o fazemos é porque lar) . É de utilidade que êste problema
nos parece Imprescindível a tomada de seja amplamente debatido para evitar
consciência de fatôres que vêm dificultar tanto a abstenção como a confusão. O
o nosso trabalho. Além de nos ajudar a ideal seria que os campos ficassem mais
enfrentá-los, essa tomada de consciência delimitados — e as suas correlações ínti-
poderá tornar-nos mais realistas, conhe- mas — pela existência de partidos, ou
cedores dos nossos limites, e não atribuin- movimentos como a Ação Popular para
do apenas à nossa "incompetência" o fra- que pudesse dar-se à cultura popular o
casso, parcial ou total, das iniciativas seu verdadeiro campo.
generosas.
4. Outra dificuldade é a escassez en-
1. Dificuldades trazidas pela própria
tre nós de uma rede associativa, e até
estrutura social: devemos levar em conta
de um espírito associativo ou de uma tra-
a "indisponlbllldade" que traz a preo-
dição associativa que oferecesse um su-
cupação premente do pão cotidiano, as
porte a um trabalho de cultura popular.
preocupações materiais imediatas, o can-
É o que acontece em países como a França
saço trazido pelo trabalho inumano, pela
ou a Bélgica em que as Casas da Juven-
duração e desconforto dos transportes,
tude (Maisons de Jeunes), os Albergues
pela subnutrição e doenças. Falta às ve-
da Juventude (Alberges de Jeunesse), as
zes aquêle mínimo de energia física e de
Casas do Povo (Maisons du Peuple), os
disponibilidade interior para poder inte-
Centros Rurais (Foyers Ruraux), as co-
ressar-se por outra coisa que não seja
operativas, os clneclubes são os canais
o cotidiano Imediato de que se deve dar
naturalmente Indicados (trata-se então
conta, e uma ou outra forma de evasão
de rejuvenescer os métodos, de modificar
como o futebol, as novelas de rádio, etc.
o espirito) da cultura popular. Entre nós,
2. Ausência, ou falta de conforto e quase tudo está por criar, faltando-nos
de progresso, de partidos políticos, e de os centros de inervação que tornam multo
sindicatos realmente independentes como mais fácil uma difusão do conteúdo e dos
órgãos de classe, com os quais se pudes- métodos.
se colaborar (os militantes partidários 5. Relacionado com o item prece-
ou sindicais, sendo, em princípio, um dente, encontramos a total despreocupa-
excelente terreno Já trabalhado e disposto, ção dos poderes públicos (em todos os
necessitando inclusive, para uma ação níveis: municipal, estadual ou nacional)
mais eficaz, de constituir grupos de es- pará quem a "valorização do homem"
tudos, cursos, debates, etc.) ou para os ainda é uma expressão eleitoreira e de-
quais se pudesse encaminhar aquêles ele- magógica, pará quem a educação dos
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

adultos se resume na alfabetização feita Todo êste capitulo das "dificuldades"


em câmara lenta, ou nos cursos noturnos oferece margem para amplos debates. Nem
de público Incerto e exausto; e de métodos foi outra a nossa Intenção. Não os apre-
antiquados. Seja dito aqui de passagem sentamos aqui como "imposslbilidadea"
que se o MCP de Recife, que se tornou nem nos pronunciamos num julgamento
definitivo. São problemas que, segundo
um movimento pioneiro para o qual todos
nos parece, deveriam ser o objeto de uma
estão de olhos voltados e onde muitos reunião de responsáveis pela cultura po-
outros movimentos de cultura popular pular no Brasil, a fim de serem debatidos
têm ido procurar inspiração, é porque não apenas em teoria, mas na base de
teve na sua base o apoio e a ajuda con- experiências concretas e, multas vezes,
creta da Prefeitura do Recife. Em geral dolorosas. — (PaiueZ Brasileiro, Rio, ja-
partimos de um punhado de gente de boa neiro de 1964.)
vontade, sem um tostão, sem uma insti-
tuição de apoio, sem material, sem possi-
NOVAS TÉCNICAS PARA FORMAÇÃO
bilidades de ter permanentes, para um
empreendimento que exige local, tempo, DE OPERÁRIOS
possibilidade de fazer estágio, material Manuel Bagrichevsky
audiovisual e outros.
6. Temos ainda como dificuldade a £ sempre de tôda conveniência e re-
nossa habitual dispersão, ou nossos par- comendada, de quando em vez, uma aná-
ticularlsmos que ainda agravam a situa- lise detalhada das normas, técnicas ou
ção descrita no item precedente. É difícil rotinas de trabalho ou funcionamento de
o entrosamento do que Já existe, a cola- tôda ou de uma parcela do sistema opera-
boração, porque divergimos imediata- cional dos diversos setores de atividade
mente em questão de ideologia (o que humana.
prova talvez que nos serviços demasia- A revisão do estabelecido é válida nao
damente da cultura popular, ou que a somente para as atividades empresariais
vemos assim, como um meio apenas de privadas, mas também para atividades
veicular as nossas idéias), ou de métodos, atribuídas ao Estado: higiene, educação,
em vez de procurarmos a maneira de nos alimentação, transporte, etc.
completarmos, ou de acharmos um ter- É provável que, em conseqüência
reno comum onde, pelo menos até certo dessa revisão, sejam apontados caminhos
ponto do caminho, pudéssemos caminhar mais eficientes, mais produtivos ou mais
juntos. humanos na obtenção dos resultados de-
7. Enfim, há dificuldade real e que sejados.
vem-se fazendo sentir: a distância exis- Em nosso Pais, onde o desenvolvi-
tente entre os primeiros animadores da mento nas diversas áreas econômicas se
cultura popular (seus propulsores), recru- processa em ritmo acelerado, em explo-
tados geralmente no melo dos "privile- sões; onde a população aumenta anual-
giados" que conseguiram estudar, e o mente uns 3,5%, e onde a consciência
povo. Distância que cria dificuldades até de uma vida melhor desperta em todas
de linguagem, de entendimento mútuo, as camadas, é premente a necessidade de
além do perigo de um certo paternalismo modificação dos sistemas e métodos clás-
("levar cultura ao povo") ou de uma im- sicos e convencionais de administração
posição de idéias, elaboradas por quem dos organismos responsáveis pela manu-
tem uma "cultura superior", e transmi- tenção e realização das atividades ou
tidas a pretexto de "Politização", mas não serviços sociais, e em última instância,
nascidas e vinculadas à situação concreta, de todos os setores responsáveis pelo bem-
real, do povo por quem deviam ser des- -estar social.
cobertas. Talvez não com a sistematização, Uma das recomendações da 45." Con-
a linguagem, a lógica, das nossas inter- ferência Internacional do Trabalho, rea-
pretações, mas idênticas no fundo e cor- lizada em 1961, com referência ao capítulo
rendo no mesmo sentido. Perigo ainda "Formação Profissional", foi taxativa:
de uma "importação" da cultura que faz "Tudo o que se realizou há 20 anos, exige
tábua rasa da cultura existente (ex.: ci- que hoje seja reexaminado inteiramente,
dade x campo) para impor assuntos, pa- em todos os seus aspectos".
drões, interesses, que não têm raízes na A potencialidade de uma nação se as-
população local. senta nos bens que possui: matéria-pri-
252 REVISTA BRASILEIRA DE

ma, meios de transporte, maquinaria, Se recorrermos a dados estatísticos,


equipamentos, etc., e sobretudo na po- verificaremos que uma percentagem mí-
tencialidade humana. A capacidade da nima do número de trabalhadores aprende
obtenção dos bens materiais de um país, a exercer as tarefas que executam em
está diretamente ligada à capacidade da escolas e que, ao contrário, a maioria as
sua mão-de-obra. aprendeu no exercício de suas funções.
Para que essa formação se processe
Uma mão-de-obra capaz é o mais va- de maneira conveniente, racionalmente,
lioso fator de produtividade. Mas a quem atingindo todos os empregados em seus
pertence a responsabilidade do preparo diversos escalões hierárquicos ou de ca-
e aprimoramento dessa mão-de-obra? tegorias funcionais, é necessário que a
Cremos que essa responsabilidade per- empresa aceite a idéia de que, se ela já
tence ao Estado, às empresas privadas de existe em função de uma necessidade da
atividades produtivas e aos organismos comunidade, tem também que assumir
representativos da mão-de-obra. Quais- uma parcela na responsabilidade de pro-
quer que sejam as atribuições de cada porcionar ao seu pessoal os conhecimentos
que não trouxe ao ingressar na empresa
uma, é essencial que se frise, todas devem
e imprescindíveis ao seu bom funciona-
participar das Iniciativas, dos planos di-
mento.
retores e da execução, de comum acordo.
Sòmente uma política de ação conjunta Esta atitude, a de treinar, sem dúvida,
poderá atingir resultados satisfatórios, beneficiará o seu pessoal, dotando-lhe de
tanto no que se refere ao campo social, melhores conhecimentos profissionais,
como ao econômico. adaptando o homem ao homem, o homem
Não podendo o Estado executar dire- ao trabalho, o trabalho ao homem, con-
tamente essa formação, por não poder dições capazes de melhorar a produção.
atingir a imensa variedade de ocupações Se por um lado estas capacitações podem
existentes nas atividades primárias, se- proporcionar maiores possibilidades de
cundárias e terclárlas, nem poder estar acesso ao pessoal, em contrapartida a
atuando detalhadamente nas soluções das empresa se beneficiará com o maior ren-
necessidades específicas de cada empresa, dimento dos mesmos.
principalmente se levarmos em conta que (Correio da Manhã, Rio, 16-2-64.)
a aprendizagem é um processo dinâmico
e contínuo, pode, no entanto, atuar de
forma geral, como órgão legislativo, edi- O ENSINO DE CIÊNCIAS NO CURSO
tando leis reguladoras sôbre problemas de SECUNDÁRIO
formação de mão-de-obra, promovendo
estudos e planejamentos sôbre os recursos Gustavo Lessa
humanos do país, para as necessidades A palavra ciências é aqui empregada
imediatas e futuras, proporcionando ou
no sentido restrito de "ciências físicas e
criando condições para o aumento da
naturais", consideradas global, ou sepa-
cultura ou educação geral do povo; das
pesquisas científicas, tecnológicas, etc. radamente.
Estas notas são o resultado de uma
Como já foi dito, a imensa variedade pesquisa sumária que fiz na literatura
de ocupações econômicas existentes (esti- pedagógica a meu alcance, sôbre os se-
ma-se para a indústria em umas 40.000) guintes problemas: a) qual a diretriz
aliada às múltiplas técnicas de trabalho, geral capaz de habilitar o professor se-
à grande diversificação de equipamentos, cundário de ciências a distinguir entre
aos recursos econômicos das empresas, o que deve ser ensinado e o que não deve
torna impossível que uma mão-de-obra ser ensinado; b) qual o conceito real de
adequada seja preparada por um sistema "ciência geral", isto é, de ciências física;
central e uniforme de forma a satisfazer e naturais globalizadas.
às exigências peculiares de cada empresa.
Não se pode, por exemplo, ter a velei- O que deve ser ensinado
dade de querer que a escola profissional Existem obras diversas, em várias lín-
dê os conhecimentos tecnológicos que a guas, sôbre os métodos de ensinar ciên-
empresa utiliza nas suas atividades de cias. A literatura, porém, é muito mais
trabalho. Daí o papel que a empresa re- mesquinha sôbre o que ensinar. Dir-se-á
presenta como a grande escola que pre- que existem Inúmeros compêndios para
para o pessoal de que ela necessita. uso de estudantes, e cada um destes re-
REVISTA BRASILEIRA DE

presenta uma exemplificação de um de- se habitua a comer laranjas num lugar


terminado ponto-de-vista sôbre o que se vai morar em outro onde elas não exis-
deve ensinar. Mas refiro-me à conceitua- tem. Estuda o abastecimento de água
ção do problema e à sua discussão. Na numa cidade e vai morar onde só existem
minha pesquisa, foi em estudos ameri- poços. Mais importante do que essas ob-
canos que encontrei mais explícita a teo- servações me parece ser a seguinte:
ria relacionada com o assunto. O trabalho "A lista de coisas especificas a
básico sôbre o ensino das ciências, nos serem ensinadas é tremendamente
Estados Unidos, é o que foi Study of extensa. E. H. Frost descobriu que é
Education, em 1932, e publicado sob o preciso saber 399 coisas a fim de cuidar
titulo "A program for teaching science", de um automóvel " (pág. 8).
na Parte I do Thirty-first Yearbook da E mais adiante: "Ao passo que o nú-
Sociedade. mero de coisas específicas de natureza
A comissão rejeita o ponto-de-vista de científica a serem feitas em qualquer
que o ensino das ciências no grau ele- comunidade é excessivamente vasto,
mentar e no secundário deve ser baseado os princípios científicos nelas envol-
Sòmente no conhecimento das aplicações vidos são poucos. Sòmente uma dúzia
dos princípios científicos. Cumpre ir ad- de princípios serve de base às 399 ope-
quirindo Idéias e conceitos progressiva- rações necessitadas pelos cuidados com
mente mais amplos, através de experiên- um automóvel. Compreenda o aluno
cias, a fim de poder interpretar outros os poucos e simples princípios envol-
fatos: vidos em uma adequada seleção de
alimentos e êle os aplicará tanto na
"A compreensão de princípios e
China como na sua cidade natal . . .
generalizações deriva da associação de
Parece, pois, aconselhável Incutir no
idéias que se desenvolvem através de aluno uma tal compreensão dos prin-
experiências" (pág. 42). O discente cípios importantes da ciência e tanto
(Zeorner) atinge a compreensão fun- exercício (drill) na resolução de pro-
cional de um princípio quando ad- blemas ocorrentes nas situações vitais
quire capacidade para associar com que êle se tornará adestrado na invo-
esse princípio as Idéias provindas de cação de tais princípios e na sua apli-
suas experiências subseqüentes, rela- cação quando precisar deles, na vida,
cionadas com o mesmo, e quando é para resolver os seus problemas espe-
capaz de aplicar o princípio a situa- cíficos". (pág. 9 ) .
ções práticas. Pode-se dizer que os
objetivos da educação científica são
constituídos por princípios e genera- A exigência do exercício (âríll) na
aplicação dos princípios é reiterada por
lizações que se ramificam o mais am-
Downing, o qual (como tôda a comissão,
plamente possível nos negócios hu-
aliás) é avesso ao ensino predominante-
manos (that ramify most widely into mente teórico. Citando pesquisas experi-
human affairs)" (pág. 43). mentais de Schafer, diz:
É evidente a inspiração deweyana, "Há pequena correlação entre a
nesses conceitos. No relatório, eles não capacidade para expor (to state) um
estão justificados convenientemente: pa- princípio de ciência e a capacidade
rece que os autores os consideram pos- pará aplicá-lo a soluções de proble-
tulados. Mas um dos membros da comis- mas. Para adquirir a última é preciso
são relatora, o Prof. Elliot Downing, escre- muito exercício na solução de proble-
vendo depois, em 1934, um livro Intitulado mas". (pág. 9).
An introduction to the teaching of
science (University of Chicago Press) O Prof. Frota Pessoa, que possui tanto
ensina que é impossível lidar com todas o conhecimento teórico como o prático
as múltiplas aplicações da ciência ofe- do ensino de biologia, adota plenamente
recidas pelo ambiente. Em primeiro lugar, o ponto-de-vista de Downing. Diz êle
êste ambiente é extremamente variável no estudo que nos apresentou, referindo-se
no espaço e no tempo. Uma criança que à redação de cada capítulo nos compên-
dios da matéria:
O presente artigo foi anteriormente "O tema central nao deve ser
divulgado na revista Educação, n.º 46, postulado de Início. É preciso, pri-
editada pela Associação Brasileira de Edu-
cação, Rio. meiro, criar o problema, de que o
254 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

aluno muitas vezes nem tem cons- À luz da concepção exposta pelos
ciência. Cada capitulo deve, de inicio, membros da Comissão organizada pela
criar uma Interrogação no espírito do National Society for Study of Education,
aluno. A curiosidade habilmente des- fica Indicado o caminho para uma adap-
pertada tem enorme íôrça motivadora, tação local (e até Individual, se possível)
e esta íase inicial de colocar-se o pro- dos programas. Os princípios, as genera-
blema é parte indispensável do pro- lizações científicas são universais, as
cesso de pensamento clentííico (cf. aplicações, cujo número é Infinito, variam
Dewey, Como Pensamos). Prosseguirá multo conforme o ambiente. Já em 1927,
o texto favorecendo o raciocínio do o célebre relatório da Comissão Hadow
aluno pela apresentação de novos fa- The education of the adolescent, ao tratar
tos, pela divisão das dificuldades, até do ensino das diversas matérias do currí-
a conclusão que atinge em cheio o culo secundário, Insistia na necessidade
princípio em estudo. Segue-se a etapa de diferenciar o ensino de ciências nas
dedutiva, em que se examinam novas áreas Industriais e agrícolas. Nas pri-
aplicações do princípio o casos parti- meiras :
culares" (grifo m e u ) .
" deve ser devotada atenção
Os professôres estrangeiros de ciências especial à física e mecânica elemen-
que vêm ao Brasil têm manifestado a sua tares, e as lições devem ser baseadas
no maquinismo e no equipamento
surpresa diante da capacidade que têm
usados na Indústria local", ao passo
os nossos estudantes de expor os princí- que, nos distritos agrícolas, "o curso
pios e da sua incapacidade de aplicá-los em física e mecânica elementares
aos fenômenos da vida comum. Essa dis- pode ser Ilustrado, em parte ao me-
paridade é a marca inconfundível da nos, com ceifadelras, atadeiras, ascen-
educação verbalista. O Professor Paulo sores, tratores e outros exemplos de
Sawaya, em uma aula Inaugural do curso maquinismo agrícola, ou ainda com
de férias para professôres secundários, batedeiras mecânicas, separadores, ex-
patrocinado pela Faculdade de Filosofia, tratores de mel e coisas semelhantes".
Ciências e Letras da Universidade de São Acentua, entretanto, que o essencial
Paulo e pela Secretaria de Educação do nas escolas rurais é prover os funda-
mesmo Estado, diz: mentos para um curso de biologia
elementar, relacionado especialmente
"Há, ninguém nega, completo com horticultura e agricultura.
divórcio entre o ensino de ciência e (pág. 223).
a. vida prática do estudante. O ver-
balismo daquele ensino, a falta de Mais recentemente, em 1950, um outro
objetividade, o desinteresse do pro- educador britânico, W. L. Sumner, da
fessor, são, entre outras, as causas Universidade de Nottingham, em seu livro
principais da precariedade desse en- The Teaching of Science, ratifica a mes-
sino. Nossos alunos dos ginásios e
ma Idéia, ao falar de programas:
colégios não relacionam o funciona-
mento dos aparelhos de rádio e tele- "Acima de tudo deve ser frisado
visão com o estudo de eletromagne- que cada professor deve elaborar o seu
tlsmo e das ondas hertzianas que próprio programa, tendo em mente as
fazem nos seus cursos; estão longe de sugestões mínimas esboçadas no Re-
entender como funciona a campainha latório Hadow, porquanto Sòmente êle
elétrica de sua casa, ou como conhece os seus alunos e o distrito
foi feita a instalação elétrica do em que vivem", (pág. 53).
próprio quarto de dormir, para
não falarmos das relações entre
Voltando agora à questão dos prin-
a instalação da água corrente na sua
cípios que devem ser ensinados: é claro
habitação e as leis de hidrodlnãmica,
que decoraram e não entenderam. que, aceito o ponto-de-vista da Co-
Raros, rarissimos, os estudantes de missão americana, seria extremamente
história natural que possuem coleções útil um acordo sôbre a seleção deles.
de minerais, de Insetos, ou se dão ao Tal acordo resultaria da consideração
trabalho de organizar um pequeno aprofundada do assunto sob o ponto-
herbário". -de-vlsta científico, educacional e social.
Vários pesquisadores já tinham feito nos
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Estados Unidos Investigações sôbre as É claro que o valor educativo do


questões perguntadas pelas crianças e ensino das ciências não se acha Sòmente
sôbre as generalizações contidas em tra- em fazer o indivíduo adquirir uma com-
tados científicos, em compêndios e em preensão teórica e prática dos fenômenos
outras publicações. A própria Comissão que se passam em seu corpo e no am-
ousou compilar uma lista de 28 "prin- biente, e em torná-lo assim capaz de se
cípios e generalizações" (acho a expressão adaptar a esse ambiente ou de modificá-
defeituosa, porque "generalização" é mais lo. Todos os educadores frisam a impor-
ampla do que "principio") que devem tância de fazê-lo adquirir "atitudes cien-
servir de gula na seleção de objetivos es- tíficas". Diz o relatório americano acima
pecíficos para o ensino de ciências na citado:
escola elementar e na secundária. Uma
crítica que lhe foi feita é não ter ela "Ela (a Comissão) reconhece que
deixado bem clara a distinção que deve os objetivos do ensino da ciência são
haver no ensino dos dois graus referidos. constituídos por uma compreensão
funcional das generalizações mais
Pará dar uma idéia de quais são as amplas da ciência e pelo desenvolvi-
generalizações preconizadas, basta citar as mento de atitudes cientificas associa-
seguintes: "O sol é a principal fonte de das" (pág. 57) .
energia da terra"; "A matéria e a energia
não podem ser criadas ou destruídas, mas
A respeito do que são "atitudes cien-
podem ser mudadas de uma forma pará
tíficas" o relatório cita as conclusões de
outra"; "As espécies têm sobrevivido por
um estudo realizado por um dos mem-
causa de adaptações e ajustamentos às
bros da Comissão Francis Curtis, as quais
condições em que vivem"; "As distâncias
definem tais atitudes da seguinte forma
no espaço parecem extremamente vastas
(faço aqui apenas um resumo):
quando comparadas com as distâncias na
terra"; "As mudanças químicas e físicas I — Convicção da existência de rela-
são manifestações de mudanças de ener- ções universais entre causa e efeito;
gia"; "A energia radiante viaja em linha II — Uma viva curiosidade em relação
reta através de um meio uniforme"; e t c , às razões dos acontecimentos, conjungada
etc. com idéias de observação cuidadosa, de
Como diz a própria Comissão, a lista coleta paciente de dados, de uso também
por ela elaborada "é Incompleta e neces- cuidadoso dos dados coligidos por outrem,
sita posterior refinamento" (pág. 53) . de persistência na procura de explicações;
Mesmo depois de esses melhoramentos se- III — Hábito de adiar respostas, de
rem Introduzidos, é claro que, tratando-se, modo a dar tempo à reflexão, à conside-
na quase totalidade dos casos, de gene- ração das opções possíveis, ao planeja-
ralizações amplíssimas, seria um grave mento;
erro usá-las como títulos de capítulos em
obra de "Ciência geral", ou de física, de IV — Hábito de pesar as provas, para
química e biologia especializadas. Haveria verificar a sua pertinência e solidez;
uma tendência à decoração papagueada. V — Respeito pelo ponto-de-vista
Generalizações de tal amplitude precisam alheio e espírito aberto às provas que
ser assimiladas através de múltiplas apli- surgirem.
cações. Elas poderiam constituir o fio de Tais atitudes não podem ser con-
Ariadne para que os autores de compên- quistadas integralmente por um método
dios e os professôres fossem construindo de ensino em que o professor (ou o com-
a seqüência das generalizações menos pêndio) conserva o aluno como especta-
amplas que, reunidas, lhes dão funda- dor, embora gulando-o da experiência aos
mento. princípios e destes a novas aplicações. É
Semelhante trabalho não parece ter verdade que uma boa lição acompanhada
sido ainda realizado sob o ponto-de-vista de demonstrações constitui já um progres-
teórico. Sob o ponto-de-vista prático, o so sensível sôbre o ensino puramente
que os compêndios mais modernos pro- verbal.
curam realizar é a dupla marcha dos fa- Como uma reação contra esse ensino,
tos para as generalizações, e das genera- surgiu na Inglaterra, na penúltima década
lizações para os fatos. E isto conduz a do século passado, o método da redesco-
um outro aspecto importante da questão, berta, também chamado "heurístico", do
que passo a expor. qual foi principal pregoeiro o Professor

9 — 34 901
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Armstrong. Esse método, aliado ao dedu- ao geral, a menos que, depois, possa-
tivo, seria o Ideal, se houvesse tempo pará mos reverter o processo e descer do
íazer cada aluno percorrer as rotas que geral ao particular, subindo e des-
os sábios Já trilharam, antes de obterem cendo como os anjos na escada de
o resultado desejado. Jacob" (pág. 61).
Na prática, o principal recurso peda- Sem dúvida devido ao peso dessas e
gógico íicou sendo o dedutivo. Diz de outras reflexões do mesmo teor os
Downing na obra Já citada: compêndios americanos de ciência, se
procuram suscitar no aluno o interesse
"O processo indutivo é o método indutivo por meio de perguntas seguidas
usado pelo descobridor. Na base de de experiências, não se contentam com
íatos, êle generaliza e revela princípios isto e, ao fim de cada capitulo, colocam
e leis. O processo dedutivo é o que problemas para os quais não trazem solu-
é usado principalmente pelo homem ções. Isto obriga o aluno ao esforço de-
que aplica a ciência por êle sabida à dutivo.
solução de situações problemáticas"
(pág. 81). "É a prática nesse processo Vejamos, por exemplo, o compêndio
dedutivo de pensar que é mais neces- chamado Everyday science, da autoria de
sitada pelo consumidor da ciência, Otis Caldwell e Francis Curtis (êste foi
pelo homem que está adquirindo um dos membros da Comissão da National
ciência para aplicá-la na sua vida Society). No capítulo primeiro, sôbre "A
diária. Poucos de nossos discípulos natureza do ar", vêm perguntas desta na-
vão tornar-se produtores de ciência, tureza: "Tem o ar peso?"; "Toma o ar
descobridores de novas leis, mas todos espaço?"; Existe ar no solo?"; "Existe ar
se destinam a fazer aplicações das leis na água?"; etc., etc. A cada uma delas
segue-se experiência esclarecedora. Agora,
que conhecem às situações pro-
no fim do capítulo, vêm problemas como
blemáticas que envolvem a ciência"
os seguintes, para os quais a solução só
(pág. 86). aparece no livro-chave para o professor:
"Por que não se tem podido medir a al-
Já antes de Downing havia dito mais tura exata da atmosfera?" "Por que re-
ou menos a mesma coisa, e com muito bentam nas altitudes mais elevadas balões
mais autoridade, o notável matemático e que são mandados o mais alto possível
loglsta britânico Alfred North Whitehead, com instrumentos de registro?"; "Às vezes
em seu magnífico capítulo sôbre "Tech- os oleados pegam fogo por si mesmos.
nical education and its relation to science Como explicar essa combustão espontâ-
and llterature", publicado, a princípio, nea?", etc.
em 1917, e depois republicado em um livro
com o titulo The aims of education, donde Esse é o sistema usado em todo o livro,
extraio os seguintes trechos: como em geral nos compêndios america-
nos. É verdade que Downing deseja coisa
"A lógica da descoberta consiste ainda melhor. Êle acha que colocar os
no pesar de probabilidades, no descar- problemas próximos à lei é indicar ao
tar de detalhes considerados de pouca estudante a solução. Chega a preconizar
Importância, no pressentimento das que se proponham problemas miscelâneos
regras gerais conforme as quais ocor- ao fim do curso de uma dada ciência, ou
rem os acontecimentos, e na verflca- mesmo ao fim do estudo das várias ciên-
ção de hipóteses por meio de experi- cias (pág. 86) . Parece-me que podem ser
mentos adequados. É a lógica indu- feitas as seguintes objeções a esse ponto-
tiva. de-vista: de um lado, a colocação de
A lógica do descoberto é a dedução verdadeiros problemas perto da exposição
dos acontecimentos especiais, que, sob das leis não suprime o trabalho de re-
certas circunstâncias, sucederiam em flexão, porque o aluno tem sempre de
obediência às leis presumidas da na- procurar o nexo entre uns e outros; de
tureza. Assim, quando as leis são outro lado, a colocação dele ao fim do
descobertas ou presumidas, sua utili- curso, ou mais remotamente, concentraria
zação depende inteiramente da lógica o referido trabalho só em determinadas
dedutiva. Sem a lógica dedutiva, a épocas espaçadas da vida estudantil, e,
ciência seria inteiramente inútil, É assim, teria efeitos poucos duráveis. Que
um jogo estéril ascender do particular dizem os entendidos?
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

O certo é que o processo usual em Conforme foi dito acima, a idéia havia
nossos compêndios de enunciar a lei ou sido importada dos Estados Unidos, onde
princípio e de se limitar a trazer em se- a sua evolução começou já nos fins da
guida uma ou duas experiências compro- primeira década dêste século. O seu de-
vantes, ou de agir em sentido inverso, senvolvimento se beneficiou do desenvol-
colocando as experiências primeiro e a vimento da "Júnior high school", que vi-
generalização depois, tanto se assemelha sava criar, no curso secundário, uma es-
ao método dedutivo e indutivo de ensinar pécie de ciclo intermediário de três anos
como o ovo ao espeto. Verdade é que o entre a escola primária de seis anos e
segundo processo estimula a curiosidade a "sênior high school", também de três
do aluno e, nas mãos de um bom profes- anos. A "júnior", além de outros conhe-
sor, pode levar à fixação do conhecimento. cimentos fundamentais, visa dar ao ado-
Mas por si só a sua Influência na criação lescente, em uma disciplina sob o nome
de "atitudes científicas" e mesmo na de "general science", uma compreensão
aprendizagem é restrita. dos fenômenos físicos, químicos e bioló-
gicos que se passam em seu ambiente,
Uma contrafação não muito rara, entre bem como das leis que os regulam. Os
nós, do método dedutivo é a colocação, fenômenos geográficos, históricos, cívicos
no fim de capítulos, de questões ou exer- e outros semelhantes são Integrados em
cícios, que pedem simples definições já "estudos sociais", e as noções de aritmé-
contidas no texto. Êste diz, por exemplo, tica, álgebra, geometria e trigonometria
o que é uma substância simples e o que são estudadas como "matemáticas".
é uma substancia composta. O questio-
nário pergunta: "Que é substância sim- Cumpre dizer que a Integração nos
ples?", "Que é substância composta?" dois últimos campos não encontrou a
Realmente, se papagaios soubessem ler, aceitação ampla concedida á "general
esse processo seria o ideal pará eles. science". Em todo caso, a extensão da
idéia é defendida vigorosamente por vários
O que é "ciência geral" educadores. Fora dos argumentos provin-
dos da psicologia da aprendizagem que
Em 1931, introduziu-se, por decreto, podem ser aduzidos em seu favor, há uma
em todos os estabelecimentos de ensino vantagem visível no fato de o aluno, emer-
secundário do Brasil a fusão de noções gido da escola primária, não ter de lidar
de física, de química e de biologia numa com um número grande de professôres e
cadeira única, que foi Intitulada nessa de matérias. Os defensores da reforma
época de "ciências físicas e naturais", e Langevin em França insistem neste ponto.
mais tarde, passou a chamar-se simples- Na "sênior high school" americana,
mente de "ciências naturais". embora as matérias se desintegrem para
Não havia entre nós compêndios sôbre o estudo, a vantagem acima apontada
o assunto. Os estrangeiros, quer dizer, os persiste, devido às opções. Pode-se estu-
americanos, pois era nos Estados Unidos dar física, sem estudar química, e vice-
que a Idéia vinha sendo ensaiada, não se versa. O mesmo quanto à história e geo-
avistavam nas livrarias, conforme verifi- grafia. Presume-se que a globalização
quei então. Ainda sobrariam provavel- atingida na "júnior" suprirá as deficiên-
mente dedos nas mãos se alguém fosse cias provindas da rejeição de um assunto.
contar com eles o número de professôres Conhecida a liberdade que têm os
nossos que antes tinham ouvido falar na estados e até as cidades americanas para
integração referida. organizar os seus sistemas de ensino, é
O programa organizado em 1931 o foi de ver que a descrição acima é puramente
por professor conhecedor do assunto e era esquemática. Ainda há numerosas escolas
incomparavelmente superior ao que vigora secundárias de quatro anos, sucedendo a
atualmente. Mas a sua derrocada poste- elementares de oito. Nelas procura-se
rior, sem protestos, foi mais uma prova conjugar o ensino globalizado nos últimos
de que os meios educacionais do país anos da elementar com o dos primeiros
estavam pouco preparados para aceitar a anos da secundária. Em outras comuni-
inovação. A nossa história administrativa dades está sendo ensaiado o sistema da
encerra exemplos sem número da futili- escola primária de seis anos e da secun-
dade de tentar implantar novas concepções dária de oito, absorvendo esta dois anos
simplesmente através de dispositivos ofi- do chamado "Júnior College", antes uni-
ciais lacônicos. versitário.
258 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Voltemos ao problema específico da das ciências especiais oferecidas na


"general science". A Comissão de Natio- escola secundária, cada tópico repre-
nal Society enumera oito causas que le- sentando uma organização lógica de
varam à sua introdução. Vamos destacar uma ciência especial" (pág. 203).
delas sobretudo as que dizem respeito ao
conteúdo: Esta é a situação que persiste entre
nós. Basta ver o programa atual. Exceto
"(1) o tremendo crescimento das quanto aos problemas estudados sob a
escolas secundárias e o caráter cos- epígrafe de água, de ar e de solo, todas
mopolita da população escolar que fa- as divisões de tal programa podem ser fa-
zem da escola secundária uma segunda cilmente classificados na física, ou na
escola para a educação das massas; química, ou na biologia. Vejamos agora
(2) os avanços sempre crescentes as divisões preconizadas pela Comissão
da ciência pura e aplicada, que mais Americana:
e mais pedem do futuro cidadão um
entendimento e uma adaptação ao "A determinação dos ajustamen-
ambiente, modificado pelas descober- tos específicos desejáveis em relação
tas e invenções científicas do homem; aos aspectos do ambiente que são mais
(3) o programa inadequado de significativos na vida diária oferece
instrução científica na escola elemen- a possibilidade tanto de uma organi-
tar, que falhou na preparação de zação prática de uma série de cursos
rapazes e moças para viver inteligen- de ciências para o período de três anos
temente no ambiente moderno; em consideração, quanto de uma defi-
(4) o caráter formal, abstrato das nição de uma série de objetivos atin-
ciências especiais e o relativo decres- gíveis. De acordo com os compêndios
cimento resultante, na matricula nes- e programas recentes para ciência
ses assuntos especializados geral, uma base defensável para a de-
terminação de ajustamentos específi-
(7) o tremendo fosso entre o cos parece ser provida por aspectos
estudo da natureza na escola elemen- do ambiente exemplificados nos se-
tar e as ciências especiais da escola guintes materiais, fenômenos e forças:
secundária, com a resultante falta de alimentos, água, ar, vestuário, mate-
provisão de um curso de transição riais de construção combustíveis, vida
entre os dois tipos de cursos de ciên- vegetal, vida animal, calor, luz, ele-
cias, tão amplamente diversos; tricidade, som, máquinas, tempo, cli-
ma, céu, crosta da terra, solo (grifo
(8) os objetivos renovados da
meu).
educação secundária e as novas dou-
Cada um dêsses aspectos princi-
trinas da psicologia educacional, que
pais do ambiente nos apresenta mul-
tornam imperativo uma mudança das
tas situações problemáticas exigindo
ciências especiais, formais, para uma
ajustamentos. Assim fazemos certos
organização e uma técnica de instru-
ajustamentos mentais e práticos aos
ção que permitam aos alunos resol-
alimentos; por exemplo, (1) alguns
verem os problemas científicos asso-
de nós estamos empenhados na pro-
ciados com o ajustamento aos vários
dução de alimentos; (2) selecionamos
aspectos do ambiente, e desenvolverem
substâncias no mercado; (3) prepa-
a sua capacidade para procedimentos
ramos alimentos para uso; (4) sele-
científicos, através de situações de
cionamos um regime conveniente ou
aprendizagem tão próximas quanto
pedimos ao perito que o faça; (5) pre-
possível da vida real (pág. 195).
servamos alimentos; e (6) ajudamos
Como era natural, no começo do mo- na conservação do abastecimento ali-
vimento para a criação dos cursos de mentar. Estes são apenas alguns dos
"ciência geral", houve confusão sôbre o ajustamentos específicos que o cidadão
modo de entender esses cursos. A Co- inteligente faz relativamente a esse
missão nota: aspecto do ambiente" (pág. 198).
"A Comissão advoga para os graus
"Entre os primeiros cursos sôbre sete, oito e nove um programa inte-
ciências gerais encontramos alguns grado de três anos de estudo de ciên-
que eram pouco mais do que uma cia, organizado não na base de uma
combinação das partes elementares ou mais ciências, mas antes na base
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

de grandes tópicos, problemas ou uni- BRADO DE ALERTA DA


dades, relacionados com os problemas
UNIVERSIDADE DO BRASIL
significativos que surgem de nossas
experiências diárias" (pág. 194).
ANTÔNIO CALLADO
O leitor interessado em ver como tem
sido resolvido o problema na prática, íarla O Brasil, à primeira vista, assusta:
bem em consultar os sumários do conteú- mais de 70 milhões de pessoas que se
do de três recentes compêndios: Everyday desentendem em português. As idéias que
Science, por Otis W. Caldwell e Francis por aí existem. Já que as colhemos da
D. Curtis, publicado por Ginn and Co., experiência de outros povos e não da
era 1952; Basic Science, por J. Darell nossa, são como a vitória-régia amazônica:
Bernard e Lon Edwards, publicado por baitas, espalhafatosas, mas de raízes com
The MacMillan Co., em 1951; An introãuc- precário contato com o lodo do fundo.
tion to science, por E. N. da C. Andrade Se houver correnteza, desatracam e so-
e Julian Huxley, publicado por Basis mem. E jâ que a vitória-régia apareceu
Blackwell, em 1936. aqui, cabe perguntar: por que não tomou
Comparando-se esses sumários, vê-se ela o nome de Leopoldina, Amélia ou
que em todos os três é visível o cuidado Isabel em lugar de assumir o nome da
de: a) colocar o aluno diante de vários Rainha Vitória da Inglaterra? Porque
aspectos do ambiente e não diante de nenhum cientista biasileiro viu a origi-
vários capítulos das ciências especializa- nalidade da planta, ou soube classificá-la.
das; b) evitar a terminologia técnica A lista daqueles que, no século XIX, se
peculiar a essas ciências. Lendo-se os apaixonaram sucessivamente pela irupê,
livros, percebe-se, além disto, o entusias- mais tarde vitória-régia, é de um anti-
mo que podem suscitar no adolescente nacionalismo de estarrecer: Bonoland,
pelas onipresentes aplicações da ciência. D'Orbigny, Poepig, Schomburgk, Haenke
Dão-lhe a chave para um mundo mara- (que caiu de joelhos na canoa e agradeceu
vilhosamente regulado pelas leis naturais. aquela flor a Deus) e finalmente Lind-
Entre nós, o programa com a sua ter- ley, que em 1837 carimbou a irupê ou
minologia técnica extraída dos capítulos forno-de-jaçanã com o slnete imperial de
das ciências especializadas, dá a senha Victoria Regina.
para o ingresso no verbalismo. E os com- Assim a vitória-régia, símbolo das
pêndios, em geral, a recebem Jubilosa- cabeçorras de Rui Barbosa que produzi-
mente. Espero ter a oportunidade para mos de quando em quando e que bolam
um dia lazer deles uma análise completa. sem maiores conseqüências sôbre o rio
Mas acho que todo brasileiro, quer seja escuro da nacionalidade, tem nome bri-
pai ou não, quer seja professor ou não, tânico, como a louça Wedgewood ou o
contanto que se Interesse pelo futuro do guarda-chuva Briggs.
seu pais, deveria adquirir alguns exem- Isto nos leva a uma espécie de deses-
plares, e lê-los em horas vagas. Então perado consolo. O caos brasileiro é prin-
compreenderá, por que, segundo um emi- cipalmente falta de preparo, de educação.
nente professor da Faculdade de Filosofia Todos os nossos problemas e nossa notória
de São Paulo, se forma em nossos ado- timidez diante da História vêm daí. Cin-
lescentes um reflexo condicionado de qüenta por cento de analfabetos e cin-
revolta contra os estudos das ciências. qüenta por cento de mal-educados não
Cumpre notar que, dos três livros dão paia formar um povo. Somos um
acima mencionados, o dos dois eminentes jardim-de-infância, atemorizado pelos
sábios britânicos, Andrade e Huxley, não bedéis armados e que só anseia pela hora
obedece a cânones didáticos, não coloca de recreio: carnaval, praia, feriados.
problemas nem no começo, nem no fim
de cada capítulo. É um livro de vulgari- AS DUAS PRESSÕES
zação, que visa despertar interesse tanto
no escolar como no adulto. Mas contém Há felizmente quem esteja pensando
um. tal abundante e escolhido manancial em têrmos de educação, enquanto o Brasil
de exemplos da aplicação dos princípios mais uma vez pensa que se cura em
científicos e é escrito em uma linguagem têrmos de revolução. Cercado de um de-
tão maravilhosamente simples que qual- dicado grupo de professôres da Universi-
quer professor poderá dele extrair pro- dade do Brasil, o Professor Jorge Felipe
blemas de grande interesse. Kafurl, catedrático da Escola de Enge-
260 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

nharla e da Faculdade Nacional de Ciên- a mesma quantidade de pão. Assim, à


cias Econômicas, já completou seu estágio medida que cresce, o Brasil emburrece.
Inicial da Reforma da Universidade do Estamos agora no estágio que Kafuri de-
Brasil. nomina da escala de massa, iniciado em
Kafuri levou um ano a fazer seu Es- 1940, e que se expande no mesmo ritmo
tudo para a Elaboração de um Regimento "mais do que geométrico", que é o da
Analítico da Universidade, um ano em expansão demográfica. Vivemos a grande
que nao trabalhou nos seus interesses crise da universidade apertada entre duas
particulares à frente de um escritório de pressões: a da demanda de matrículas dos
economistas. Trabalhou de graça. Mas diz que querem estudo superior e a da de-
agora, claramente, que nao se lançará ao manda de profissionais e técnicos por
segundo estágio do Regimento Analítico parte do país que se quer desenvolver.
se o Govêrno não aceitar a seguinte pre-
missa: educação é um investimento de UNIVERSIDADE PARA O
base, é o investimento de base. DESENVOLVIMENTO
Não adianta ter idéias flutuantes sô-
O plano Kafuri exige que a Universi-
bre educação. Kafuri, começando pela
dade (como tôda a educação do Brasil,
Universidade, encarou-a como uma em-
aliás) seja tratada como um problema de
presa que precisa ser eficiente, uma em-
Investimento. Não a vê como um luxo,
presa que tem de produzir pessoas edu-
uma platônica formação de doutores.
cadas em massa. Uma empresa assim
Vincula a Universidade ao desenvolvi-
custa caro e depende de estudos acurados mento nacional como vincularia a Pe-
como o que fêz êle. Já estava, aliás, trobrás ou a grande siderurgia. Na rea-
pronto e entregue o Regimento Analítico lidade, jamais teremos os grandes em-
quando vimos duas manifestações do preendimentos nacionais no nível em que
espirito ligeiro da nossa gente. Nas suas os sonhamos sem o investimento prévio
reformas o Presidente João Goulart, em na educação.
matéria de ensino, só falava contra a vlta-
liciedade da cátedra, como se isto é que A demanda de profissionais liga-se
emperrasse tudo, e na sua Aula Inaugural estreitamente ao desenvolvimento do
da Faculdade de Filosofia o Professor San- País, que nada teve de uniforme. Resu-
mindo aqui a tese de Kafuri, vemos um
tiago Dantas alinhou, sem qualquer refe-
Brasil de crescimento desequilibrado, de
rência ao estudo de Kafuri, suas idéias
espaços geográficos defasados nos índices
pessoais sôbre educação. Quando se tra-
do seu desenvolvimento. Esses espaços
balha de graça um ano inteiro para pro-
podem ser divididos em A, do tipo dinâ-
duzir uma espécie de arcabouço Industrial
mico, em regime de desenvolvimento ace-
para a fabricação de brasileiros cultos lerado; B, de tipo ainda dinâmico mas
espera-se pelo menos o respeito de uma de desenvolvimento moderado; C, de tipo
leitura do trabalho executado. estacionárlo, e D, vazio, e que abrangem,
Logo na primeira página do Estudo, com ou sem descontinuidade áreas das
Kafuri publica o gráfico dramático, aqui regiões Centro, Sul, Norte-Nordeste e
reproduzido. A verdadeira explosão popu- Centro-Oeste. A dlssimetria entre esses
lacional do Brasil, que ascendeu de espaços, que se reflete em tudo, pode ser
17 milhões de habitantes em 1900 a 71 mi- dividida em dissimetrias principais, que
lhões em 1960, lança vagas cada vez maio- são quatro:
res aos portões dos estabelecimentos de
ensino. Mas não correspondeu ao cres- 1) A que incide sôbre a densidade do
cimento demográfico o crescimento dêsses capital já instalado na indústria, princi-
palmente a de base e a pesada, que indi-
estabelecimentos. O que acontece é que
cam a pujança da infra-estrutura indus-
se sentam cada vez mais alunos, na trial. O desnível, aqui, do espaço A para
mesma sala, diante do mesmo professor. o B é imenso. Quanto ao espaço C, não
Enquanto em 1940 uma série possuía consegue sequer sair do ponto morto. Só
de 25 a 30 alunos, atualmente possui cerca a Sudene, no dizer de Kafuri, era a espe-
de 600. Na casa cada vez mais cheia rança de que finalmente houvesse a de-
corta-se, em fatias cada vez mais finas, colagem .
REVISTA BRASILEIRA DE

2) A que incide sôbre a capacidade OS ESPAÇOS UNIVERSITÁRIOS


de investir e de poupar. No espaço A
são altos os dois índices. O produto in- A conclusão inevitável é que não há
dustrial interno desse espaço expandiu-se lugar no Brasil pará a Universldade-pa-
com uma taxa que ombreia com as das drão. Nossas universidades teráo de re-
nações mais fortes. Foram criados e fletir a diversidade dêsses espaços. "Cada
atraídos investimentos que resultaram um deles reclama, para a interpretação
na ampllaçáo de antigos setores e criação e resolução de sua problemática, uma
de novos, importantes e de alta tecnologia,
como a comercialização do minério de inteligência organizada, capaz de orientar,
ferro, a siderurgia, a metalurgia do alu- conduzir e racionalizar o processo do seu
mínio, a industrialização do petróleo e crescimento. Essa inteligência corporifi-
derivados, indústrias químicas, farmacêu- ca-se, precisamente, na instituição das
ticas, mecânicas e elétricas, complexos de universidades, instituição que, em ra-
indústria automobilística e de construção zão da funda dissimetria daqueles
naval e até mesmo a fase inicial mas espaços, não pode ser a mesma para to-
firme de implantação da energia nuclear. dos. Muito embora venham a impregnar-
(Esse magnífico esforço, é bom não se de um conteúdo comum de brasili-
esquecer, representa uma tremenda de- dade, as instituições universitárias deverão
manda de técnicos às Universidades. E, receber estruturas adequadamente dife-
como veremos adiante, o espaço A, dentro renciadas em função das realidades do
do Brasil, e as nações industrializadas, meio a que 6e destinem, como deverão
lá fora, tendem a sugar o pouco talento adotar estratégias diretamente vinculadas
que se produz no Pais inteiro.) às problemáticas dos respectivos espaços".
3) A terceira dissimetria refere-se ao
Emprego. No espaço A a ocupação — O Estudo para a Elaboração de um
próxima do pleno emprego, o que, empres- Regimento Analítico da Universidade, que
tando ao trabalhador posição dominante Kafuri fêz, baseado por sua vez no estudo
no mercado de trabalho, leva à valorização preliminar intitulado Diretrizes para Re-
do salário. No extremo oposto do espa- forma do Universidade do Brasil, se ocupa
ço C, em que o estado é de subemprêgo exclusivamente da Universidade do Brasil
e desemprego generalizados, domina o por duas razões principais. A primeira
patrão, o empreendedor, o que leva à é que, embora sem se constituir em uni-
depressão salarial. Diz Kafuri: "Situações versidade-padrão, na sua própria estru-
tão diversas de emprego determinam
efeitos diferentes nos quadros da vida tura e eficiência ela pode ser um padrão
econômica, social, cultural e mental das e uma Inspiração para todas as outras:
respectivas comunidades, cujas aspirações, como funcionamento e não como ditadora
sem denominador comum, as conduzem à de um programa de ensino que seria
formação de pensamento, atitude e com- Irreal em outros espaços. A segunda é
portamento político também radicalmente que ela tem a amplitude do espaço A.
distintos". Às suas portas se exerce, com uma força
4) A quarta dissimetria, ligada às irreprimível, aquela pressão dupla dos que
anteriores, incide sôbre a grande indus- querem cultura e dos que querem con-
trialização, especialmente com referência sumir cultura pará desenvolver o Pais.
à infra-estrutura de base. É um grau
elevado no espaço A e débil no espaço C, Não percamos tempo, aqui, em In-
dominado pela agricultura latifundiária, vestigar por que o Brasil não teve até
de baixa produtividade, e da agricultura hoje uma Universidade no desejável mo-
de subsistência, com algumas variedades dêlo clássico das grandes universidades
de matérias-primas e produtos destinados européias e norte-americanas, ou, menos
à exportação. No cotejo do comércio com
ainda, em saber se os portugueses foram
os demais espaços, o espaço C está de-
samparado. Importador de produtos In- ou não culpados originalmente de não
dustriais dos outros espaços, não agüenta têrmos uma tal universidade. O fato é
uma relação de trocas em regime livre. que, preocupados pela ausência entre nós
É um espaço dependente, inerme. Os ou- de Oxford ou Cambridge, Bolonha, Yale
tros criam as situações enquanto êle as ou a Sorbonne (a francesa, ca va sans
sofre. dire) tendemos a pensar em universidade
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em têrmos arquitetônicos, de grandes de empresa e um investimento de base


edifícios. Mas não é criando o arcabouço para a produção maciça de homens de
arquitetônico de uma cidade universitária saber, está apenas cuidando de dar ao
que vamos finalmente criar nosso espi- País os meios de formar o homem brasi-
rito universitário. A ditadura de Getúlio leiro inteligente e livre, que é o objeto
Vargas quis Impingir ao Brasil uma uni- de qualquer grande Universidade. O in-
versidade de pedra por fora e de fascismo glês, o francês e o alemão do anedotárío
por dentro, nos moldes das de Madri e popular são produtos da educação que
Roma de então. A ressaca dêsses tempos receberam. O russo de hoje e o russo de
é a Cidade Universitária da Ilha do antes da Revolução de 1917 são produtos
Fundáo, onde só funciona a Escola de de dois tipos de educação. Com a desor-
Engenharia. A pomposa Universidade Ru- ganização do nosso ensino e a mesqui-
ral do antigo Km 47 até hoje vive das nhez das verbas empregadas na educação
paredes de pedra e tem mais professôres estamos aquém, muito aquém da forma-
do que alunos, o que não tem maior im- ção de um tipo de gente. A tarefa da
portância porque os professôres em geral Universidade não é só ensinar coisas. É
não dão aula. A Faculdade Nacional de formar, dentro da sua autonomia, da sua
Filosofia, em boa hora criada para formar independência em relação a qualquer Go-
professôres secundários, desencaminhou-se vêrno, um tipo de pessoa que se afirme,
para virar uma espécie de curso de ad- entre suas mil variedades, como uma con-
missão à política. Com professôres apenas tribuição nossa à criatura humana. Mas
visitantes e alunos quase moradores, per- para isto é preciso a Universidade ser
deu suas características básicas de serie- encarada como indústria de base, consu-
dade e disciplina. A segunda grande ins- mindo, como nos Estados Unidos, na
tituição universitária do Pais, a Univer- União Soviética, na Grã-Bretanha uma
sidade de São Paulo, conta cerca de me- percentagem substancial do Produto Na-
tade dos alunos que possui a Universidade cional Bruto.
do Brasil. Esta, como organização e senso
de responsabilidade em relação ao País,
deve liderar. E, sem desprezar paredes OS INSTITUTOS E FACULDADES
e a eventual aglomeração de estabeleci-
mentos universitários, deve pensar antes O Estudo para a Elaboração de um
de mais nada na essência da Universi- Regimento Analítico da Universidade
dade. trata de inovar os Institutos, os Estabe-
lecimentos de Ensino ou Faculdades e a
Quando Kafuri, no seu Estudo, se Universidade propriamente dita. Esta úl-
ocupa do que chama Arquitetura do sis- tima parte, a síntese do que deve ser a
tema universitário, está pensando na Universidade, jamais surgirá se o atual
"forma, composição e proporções relativas Govêrno do Marechal Castelo Branco não
dos organismos universitários. É um pro- ler o Estudo já feito e implementá-lo.
blema técnico, em cuja base se coloca o Kafuri, o sério grupo universitário que
critério da eficiência". E uma eficiência lhe entregou as Diretrizes e todos os pro-
multo mais complexa. Se é possível e fessôres da Universidade, que ora estudam
mesmo inevitável assemelhar as institui- linha por linha o plano Kafuri, não se
ções universitárias a um "complexo de dedicaram à Reforma Universitária como
indústrias de base, a Universidade, no a um exercício intelectual. Se o Govêrno
concerto de seus fins intelectuais, artísti- não agir, o Pais continuará por desasnar
cos e morais não é uma indústria. Se e em breve o nosso desenvolvimento pa-
prepara cientistas e técnicos, seu fim é rará por completo, no ponto em que se
a formação do homem na plenitude de achar.
seu esplendor intelectual, moral e cívico". Os Institutos, que devem preparar os
Se citamos, do severo estudo de Kafuri, candidatos às faculdades e se ocupar dos
uma das poucas frases de sabor literário cursos de pós-graduação, são poucos e
é porque ela nada tem de literária. pobres na Universidade atual. Para aten-
Quando Kafuri reclama e exige para a der ã demanda nacional de cientistas e
Universidade do Brasil uma constituição técnicos é preciso ampliar os existentes
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e criar vários Institutos novos, que se Quanto às escolas, faculdades ou es-


destinem às atividades de caráter espe- tabelecimentos de ensino que aí estão,
culativo, orientadas para o progresso das padecem de uma centralização que as
ciências, das técnicas, das artes ou das estrangula. É o "sistema indiferenciado
letras; às de caráter educacional, voltadas descrito no Estudo de Kafuri: "uma ad-
para a formação básica pré-profissional, ministração integralmente centralizada
para o aperfeiçoamento e a especialização num diretor do estabelecimento e numa
pós-graduaçáo e para a difusão da cultu- secretaria administrativa; um só corpo de
ra; e, finalmente, às de caráter pragmá- professôres pará o ensino direto das di-
tico, de estudos e pesquisas sôbre o desen- versas disciplinas aos alunos das diferen-
volvimento das chamadas economias tes séries; uma organização departamen-
setoriais bem definidas, como siderurgia, tal reduzida, na prática, a uma ficção
petróleo, metais. Aqui Já temos o Ins- estatutária e regimental". O resultado
tituto como um órgão vivo de progresso, dessa paralisia é que "a eficiência mar-
chegando até o ponto em que ocupe nos ginal, quer da administração quer do
seus quadros cientistas e tecnólogos em- ensino, é decrescente com a massa cres-
pregados nas entidades ou empresas per- cente de alunos". O fato é que "existe,
tinentes ao respectivo setor econômico. O do ponto-de-vista operacional, um lote
instituto beneficiará tal ou qual setor ótimo de alunos, a partir do qual cada
com seus conhecimentos, montando com novo discente que lhe fôr agregado de-
eles setores-pllôto de pesquisa e demons- terminará o declínio, em regime rapida-
tração, e colhendo de volta o benefício mente decrescente, da eficiência didática,
da verdadeira prática em grandes labo- da eficiência escolar, da eficiência admi-
ratórios e indústrias. Os Institutos devem nistrativa. Nestes têrmos, se o problema
participar ativamente no planejamento da universidade se configura como um
de programas públicos ou coletivos de problema de massa, cada estabelecimento
promoção do desenvolvimento nas ativi- de ensino, conservando sua estrutura
dades do setor a que se prendam, para lndiferenciada, arrisca-se, na escala de
que, dando real sentido à Universidade, massa, a degradar o ensino e a instaurar
orientem, conduzam e racionalizem o o caos administrativo. As escolas e facul-
processo desse desenvolvimento. dades tradicionais, tangidas pelas pressões
da demanda, Já de há muito ultrapassa-
Os institutos terão um duplo papel ram os limites de suas capacidades óti-
da mais alta importância: prepararão o mas. Com o adicional dos chamados
acesso de candidatos às faculdades e excedentes, vêem-se ameaçadas de sub-
completarão, depois da faculdade, os co- mersão". Como dizem os três autores
nhecimentos ali adquiridos. Assim, as americanos de The University and the
faculdades formarão o profissional comum New Word, "seguindo-se o principio de
a ser polido pelos institutos no curso de que uma esquadra será tão lenta quanto
pós-graduação. Veja-se o caso tal como seus navios mais lentos, vê-se também
aplicado ao ensino da Medicina, em pare- que se amesquinham os padrões à medida
cer, de 1962, dos Professôres Maurício que aumenta o número de estudantes.
Rocha, Clóvis Salgado e Deolindo Couto; Esse amesqulnhamento é inevitável nas
"A Idéia dominante foi estabelecer um salas de aula, já que é virtualmente uma
currículo correspondente à formação do lei acústica que quanto maior fôr o grupo
médico comum (...) treinado nas clinicas a que se dirige o professor, menos sutil
mais gerais e com noções indispensáveis pode o professor ser. Matizes possíveis
sôbre as especialidades. Assim preparado, numa aquarela precisam dar lugar a efei-
estará habilitado a ser o clinico-geral dos tos que só são possíveis num cartaz".
pequenos centros, o médico do bairro, o
médico da família ( . . . ) . Sôbre essa base O remédio à indiferenciação que nos
comum, erguem-se os cursos de pós-gra- domina as faculdades só pode ser uma
duação, nos quais se preparam os sani- dupla descentralização, didática e admi-
taristas e os numerosos especialistas em nistrativa, Intimamente conjungadas em
ramos médicos, cirúrgicos e de labora- cada estabelecimento de ensino. O mal
tório". não reside na vitaliciedade de cátedra

10 — 34 901
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

como tal, num país em que há vitalicie- dos países desenvolvidos, que precisam
dade de tudo. A vitallcledade de cátedra, cada vez mais dos peritos, dos técnicos,
aliás, surgiu como defesa da autonomia dos especialistas para dirigirem suas so-
do professor diante do ditador, uma ciedades livres e prósperas, nós nao só
espécie de imunidade no tempo de Var- produzimos cientistas e técnicos mais
gas. Catedráticos rotineiros sem dúvida ordinários devido ao excesso de alunos
emperram multa coisa, mas serào forçados em relação aos meios de ensino, como
a dividir sua autoridade com a dos mes- ainda exportamos, ou deixamos que firmas
tres de disciplinas afins, dentro da Refor- estrangeiras empreguem aqui uma parte
ma da Universidade. A criação dos Depar- substancial dos melhores cérebros que
tamentos cuidará deles. conseguimos formar.
Para descentralizar didática e admi- Dentro do Brasil o espaço A espolia,
nistrativamente a Universidade é preciso: dessa forma, os demais; os Estados Uni-
"definir o lote ótimo do ponto-de-vista dos nos espoliam como espoliam a Grã-
da eficiência no tríplice sentido adminis- Bretanha; dentro do Mercado Comum os
trativo, didático e escolar; instituir o mais industrializados espoliam os outros.
Departamento como unidade básica mas É uma espécie de lei da selva cultural,
efetiva da administração setorial e de sofisticada, impossível de combater, já
ensino de uma classe de disciplinas, redu- que os espoliados vão produzir mais em
zida em número; instituir, com apoio nos estruturas mais adiantadas, vão ganhar
dois elementos anteriores, a unidade-es- mais, vão até mesmo se realizar de ma-
cola; transformar, por fim, cada estabe- neira mais adequada e profunda. É uma
lecimento de ensino numa pluralidade drenagem amável esta que suga o talento
orgânica de unidades-escola. Dentro das do mundo para as ilhas mais Venturosas.
linhas que ora se sugere acreditamos ser Mas, pará os países subdesenvolvidos que
possível conciliar o problema da escala não souberam reagir criando aqui o ta-
de massa com os imperativos de eficiência lento necessário ao desenvolvimento e o
entendida no seu mais amplo sentido". desenvolvimento esclarecido que dê con-
dições de realização a esse talento — é
BRAIN-DRAIN o fim. Na Conferência de Planejamento
Sanitário da Mills Bank Foundation che-
O breve apanhado que aí fica do tra- gou-se à conclusão de que só nessa co-
balho de Jorge Felipe Kafurl tem apenas lheita de talentos já prontos, colhidos no
a intenção de levar o Govêrno, as auto- pé da retorcida árvore dos países subde-
ridades educacionais e as classes produ- senvolvidos, os países investidores se
toras do Pais (que devem investir capital pagavam do Investimento.
na educação em lugar de se formarem Não vá agora o Supremo Comando
em clubes reacionários de bebedores de Militar amarrar uma bola de chumbo na
uísque, que é coisa excelente mas tem canela de cada talento brasileiro para
hora) a lerem e meditarem sôbre o ver- que só trabalhe para a Petrobrás ou a
dadeiro brado de alarme que está dando Vale do Rio Doce. Faça a Reforma de
a Universidade do Brasil. Em palestra não Kafuri. Esprema os privilegiados para que
só com Kafurl como ainda com os pro- soltem dinheiro na educação do povo, a
fessôres Eulália, Bruno Lobo e Paulo de quem tanto temem e sabem muito bem
Góis discutimos o fenômeno que os ingle- por quê. Na reforma Kafurl a educação
ses batizaram de brain-drain e para o não é flor na lapela de ninguém. Não
qual em breve teremos cunhado uma é nem mesmo um floraço espetacular
expressão brasileira. bolando num silêncio de igarapé. É san-
A rocha final, o cristalino, o fundo gue e osso. É educação para o desenvol-
do abismo que divide o mundo indus- vimento, para civilizar êste País que vive
trializado do mundo subdesenvolvido a procurar o regaço das Forças Armadas,
reside na educação e tem seu aspecto País hábil, cauteloso, tlmorato como se
mais trágico na drenagem do talento dos fosse um velho Império. País cansado de
subdesenvolvidos para os desenvolvidos. audácias que nunca teve. É mais do que
Enquanto o proletário vai desaparecendo tempo de educar o bruto.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 265

POPULAÇÃO Finalmente, a partir de 1940, instala-se o


período da grande expansão. A demanda
O aumento da população e o esforço de matrículas entra em escala de massa.
de desenvolvimento do Brasil sujeitam as Séries onde se Instruíam 25 ou 30 alunos
universidades a dois tipos de pressão: a recebem agora 600. Aumenta a fome de
dos que se matriculam em número cada saber, mas não aumenta o alimento: na
vez maior, para adquirir cultura, e a dos mesma mesa acanhada o mesmo pão é
empreendimentos em busca de talento, cortado em fatias cada vez mais finas
pois precisam consumir cultura. O exame para um número cada vez maior de co-
do período que vai de 1870 a 1960 revela mensais. É a grande crise da universidade
que a população brasileira cresce em e a grande crise do Brasil. Não existe
ritmo mais do que geométrico, ritmo planejamento, não há milagre político
explosivo, originando três estágios de que possa tornar grande uma Nação onde
expansão. No primeiro, lento, que cinqüenta por cento são analfabetos e
termina em 1920, a demanda de matrí- cinqüenta por cento mal-educados. Ou o
culas é reduzida. No segundo estágio, o
Govêrno faz da educação uma Indústria de
de transição, que vai até 1940, intensifi-
base ou continuaremos a ser, pelo porvir
ca-se a demanda de matrículas, forçam-se
os portões das universidade, praticamente afora, o País do futuro.
imóveis diante da explosão demográfica. (Jornal do Brasil, Rio, 26-4-64) .
ATOS OFICIAIS
DECRETO N.° 53.464 — DE 21 DE 4) Os atuais possuidores do título
JANEIRO DE 1964 de Doutor em Psicologia e de Doutor em
Psicologia Educacional, bem como aquê-
Regulamenta a Lei n.º 4.119, de 27-8-1962, les portadores do título de Doutor em
que dispõe sôbre a profissão de psicó- Filosofia, em Educação ou em Pedagogia
logo. que tenham defendido tese sôbre assunto
concernente à Psicologia.
O Presidente da República, usando das
atribuições que lhe confere o art. 87, 5) Os funcionários públicos efetivos
Item I da Constituição, decreta: que, em data anterior ao dia 5 de setem-
bro de 1962, tenham sido providos em
TÍTULO I cargos ou funções públicas, sob as deno-
minações de Psicólogo, Psicologista ou
Do Exercício Profissional Psicotécnico.
Art. 1.º É livre em todo o território 6) Os militares que, em data ante-
nacional o exercício da profissão de psi- rior ao dia 5-9-1962, tenham obtido diplo-
cólogo, observadas as exigências previstas mas conferidos pelo Curso criado pela
na legislação em vigor e no presente De- Portaria n.º 171, de 25 de outubro de
creto. 1949, do Ministério da Guerra.
Parágrafo único. A designação profis- 7) As pessoas que, até o dia 5 de
sional de psicólogo é privativa dos habi- setembro de 1962, já tenham exercido por
litados na forma da legislação vigente. mais de cinco anos, atividades profissio-
Art. 2.o Poderão exercer a profissão de nais de psicologia aplicada.
psicólogo: Art. 3.» Condição indispensável para
1) os possuidores de diploma de psi- o exercício legal da profissão de Psicólogo
cólogo expedido no Brasil por Faculdade é a obtenção prévia do registro profissio-
de Filosofia oficial ou reconhecida nos nal de Psicólogo na Diretoria do Ensino
têrmos da Lei n.° 4.119, de 27 de agosto Superior do Ministério da Educação e
de 1962. Cultura.
2) Os diplomados em Psicologia por Parágrafo único. Os portadores de
Universidade ou Faculdade estrangeiras diplomas, expedidos por estabelecimentos
reconhecidas pelas leis do pais de origem, de ensino superior, deverão providenciar
cujos diplomas tenham sido revalidados o devido registro do seu diploma no Mi-
de conformidade com a legislação em nistério da Educação e Cultura.
vigor.
Art. 4.» São funções do psicólogo:
3) Os atuais portadores de diploma 1) Utilizar métodos e técnicas psico-
ou certificado de especialista em Psico- lógicas com o objetivo de:
logia, Psicologia (Educacional, Psicologia
Aplicada ao Trabalho expedidos por esta- o) diagnóstico psicológico;
belecimento de ensino superior oficial ou b) orientação e seleção profissional;
reconhecido, com base nas Portarias Mi- c) orientação pslcopedagógica;
nisteriais n.» 323, de 13-5-1946, e n.° 274, d) Solução de problemas de ajusta-
de 11-7-1961, após estudos em cursos re- mento .
gulares de formação de psicólogos, com 2) Dirigir serviços de psicologia em
duração mínima de quatro anos, ou estu- órgãos e estabelecimentos públicos, autár-
dos regulares em cursos de pós-graduação, quicos, paraestatais, de economía mista e
com duração mínima de dois anos. particulares.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 267

3) Ensinar as cadeiras ou disciplinas Parágrafo único. Nas Universidades em


de psicologia nos vários níveis de ensino, que existam serviços Idôneos e equivalen-
observadas as demais exigências da legis- tes aos previstos na letra b, a Faculdade
lação em vigor. de Filosofia poderá cumprir a exigência
4) Supervisionar profissionais e alu- prevista no citado item pela apresentação
nos em trabalhos teóricos e práticos de de um convênio que lhe permita a utili-
psicologia. zação eficiente dêsses serviços.
5) Assessorar, tecnicamente, órgãos e Art. 8.° As Faculdades de Filosofia que
estabelecimentos públicos, autárquicos, mantinham Curso de Graduação em.
paraestatais, de economia mista e par- Psicologia na data da publicação da Lei
ticulares. n.» 4.119, de 27 de agosto de 1962, terão o
prazo de noventa dias, a partir da publi-
6) Realizar perícias e emitir parece- cação dêste Decreto, para requerer ao
res sôbre a matéria de psicologia. Govêrno Federal o respectivo reconheci-
mento.
TÍTULO II
§ 1.º Os cursos de Graduação não
Da Formação enquadrados nas especificações dêste ar-
tigo deverão requerer dentro de noventa
Art. 5.° A formação em Psicologia dias, a partir da data da publicação dêste
far-se-á nas Faculdades de Filosofia na Decreto, seu reconhecimento.
forma da legislação vigente e dêste Re- § 2.º Os cursos que não tiverem seus
gulamento. pedidos de reconhecimento encaminhados
Art. 6.º As Faculdades de Filosofia dentro desse prazo estarão automatica-
poderão instituir Cursos de Graduação de mente proibidos de funcionar, estenden-
Bacharelado e Licenciado em Psicologia e do-se esta proibição àqueles a que fôr ne-
de Psicólogo. gado o reconhecimento.
Parágrafo único. As disciplinas le- Art. 9.º Os Cursos de pós-graduação
cionadas em outros Cursos da Faculdade em Psicologia e em Psicologia Educacio-
ou da Universidade e que sejam as mes- nal, regulamentados pelas Portarias Mi-
mas do currículo dos Cursos de Bacha- nisteriais n.o 328, de 13 de maio de 1946.
relado e Licenciado em Psicologia e de e n.º 274, de 11 de julho de 1961, não
Psicólogo poderão ser ministradas em poderão admitir matrículas iniciais a
comum. partir de 1967.
Art. 7.° A autorização para o fun- Parágrafo único. As mesmas disposi-
cionamento e o reconhecimento legal dos ções deverão ser obedecidas pelos Cursos
Cursos de Psicologia processar-se-á em de Especificação ou pós-graduação em
consonância com os preceitos gerais da Psicologia que não se enquadrem neste
Lei n.° 4.024, de 20 de dezembro de 1961, artigo.
e as determinações por ela não revogadas Art. 10. Os Cursos de Bacharelado,
do Decreto-lei n.° 421, de 11-5-1938, e do Licenciado e Psicólogo deverão obedecer
Decreto-lei n.° 2.076, de 8-3-1940, comple- ao currículo mínimo e duração fixados
tados pelas seguintes exigências expressas de acordo com a Lei n.° 4.024, de 20-12-61,
na Lei n.» 4.119, de 27-8-1962: pelo egrégio Conselho Federal de Edu-
cação.
a) As Faculdades de Filosofia que
solicitarem a autorização para o funciona- TÍTtTLO I I I
mento de um dos Cursos de Psicologia
deverão fornecer provas de sua capaci- Da Vida Escolar
dade didática, apresentando um corpo Art. 11. O candidato à matricula no
docente devidamente habilitado em todas Curso de Bacharelado deverá satisfazer
as disciplinas de cada um dos Cursos, cuja todas as condições exigidas para a matrí-
instalação fôr pleiteada por elas; cula em qualquer um dos Cursos da Fa-
b) As Faculdades, ao requererem au- culdade de Filosofia.
torização para o funcionamento do Curso Art. 12. Os atuais alunos dos Cursos
de Psicólogo, deverão possuir serviços clí- mencionados no artigo 8.» e em seu § 1.º
nicos e serviços de aplicação à Educação e poderão prosseguir o Curso, passando a
ao Trabalho, abertos ao público, gratuitos obedecer às adaptações que êste tenha
ou remunerados, de acordo com o tipo de sofrido com o reconhecimento, desde que
formação que pretendam oferecer nesse suas matrículas tenham sido regularmente
nível de Curso. processadas.
268 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Art. 13. Os alunos matriculados nos Pslcologista ou Psicotécnico, garantlndo-


Cursos de que trata o artigo 9.º e seu lhea o exercício dos cargos e das funções
parágrafo único poderão prosseguir o respectivas, assim como as vantagens daí
Curso obedecendo ao currículo originai decorrentes.
até o prazo previsto neste Regulamento. Art. 21. Os portadores do título de
Art. 14. Os alunos que tiverem Doutor, obtido em Faculdade de Filosofia,
cursado em nível superior, no Brasil ou e que tenham defendido tese sôbre tema
no estrangeiro disciplinas constantes do especifico de Psicologia, ao requererem o
currículo dos Cursos de Psicologia, pode- registro profissional de Psicólogo, deverão
rão ser dispensados dessas disciplinas, Instruir a petição com os seguintes do-
desde que obtenham parecer favorável dos cumentos :
órgãos técnicos da Faculdade aprovado a) Carteira de Identidade;
pelo Conselho Universitário no caso de b) Prova de quitação com o serviço
Universidades, e pela Diretoria do Ensino militar;
Superior do Ministério da Educação e c) Título Eleitoral;
Cultura, no caso de estabelecimentos d) Diploma de Doutor devidamente
isolados. registrado na Diretoria do Ensino Superior
Parágrafo único. A dispensa de dis- do MEC;
ciplinas será, no máximo, de 6 (seis) no e) Um exemplar da tese de douto-
Curso de Bacharelado, de 2 (duas) no ramento .
de Licenciado e de 5 (cinco) no de Psi- Parágrafo único. Os títulos de Dou-
cólogo . tor, obtidos mediante concurso de cátedra
Art. 15. De acordo com a amplitude ou de livre docência serão válidos para
das dispensas referidas no artigo anterior, o mesmo fim, desde que acompanhados
os Cursos de Bacharelado e de Psicólogo dos documentos exigidos neste artigo e
poderão ser abreviados, respeitada a du- de uma declaração da Faculdade de que
ração mínima de dois anos em cada Curso. a cadeira a que se refere o concurso foi
a de Psicologia ou a de Psicologia Edu-
TÍTULO IV cacional .
Art. 22. A Diretoria do Ensino Su-
Dos Diplomas perior do Ministério da Educação e Cul-
Art. 16. Ao aluno que concluir o tura encaminhará os requerimentos e sua
Curso de Bacharelado será conferido o respectiva documentação à Comissão de
diploma de Bacharel em Psicologia. que trata o artigo 23 da Lei n.° 4.119, a
fim de que a mesma emita parecer jus-
Art. 17. Ao aluno que concluir o
tificado.
Curso de Licenciado será conferido o di-
§ 1.º O parecer de que trata êste
ploma de Licenciado em Psicologia.
artigo deverá ser homologado pelo Diretor
Art. 18. Ao aluno que concluir o do Ensino Superior;
Curso de Psicólogo será conferido o di- | 2.° Homologado o parecer, no caso
ploma de Psicólogo. de ser o mesmo pela concessão do registro.
Art. 19. Os portadores de diplomas providenciará a Diretoria do Ensino Supe-
expedidos por Universidades ou Faculda- rior o efetivo registro profissional de Psi-
des estrangeiras que não sejam equiva- cólogo do requerente, a fim de que pro-
lentes aos nacionais, poderão completar duza seus efeitos legais.
sua formação em estabelecimentos oficiais Art. 23. Os casos omissos neste De-
ou reconhecidos. creto serão resolvidos pela Diretoria do
Ensino Superior do Ministério da Educa-
TÍTULO V ção e Cultura.
Das Disposições Gerais e Transitórias Art. 24. Êste Decreto entrará em
vigor na data de sua publicação, revoga-
Art. 20. As Diretorias do Pessoal dos das as disposições em contrário.
Ministérios, das Autarquias e de quaisquer Brasília (DF), em 21 de janeiro de
outros órgãos da administração federal, 1964; 143.º da Independência e 76.º da
estadual ou municipal, apostilarão os tí- República.
tulos de nomeação dos servidores que te- JOÃO GOULART
nham sido providos, em data anterior ao Júlio Furquim Sambaquy
dia 5 de setembro de 1962, em cargos ou
funções sob a denominação de Psicólogo, (Publicado no DO. de 24-1-1964)
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

DECRETO N.° 53.531 — DE 5 DE Art. 2.º A Comissão de Controle e


FEVEREIRO DE 1964 Execução dos Convênios compor-se-á de
três (3) membros designados pelo Presi-
Dispõe sôbre a execução e fiscalização dos dente da República, sendo um indicado
convênios referentes ao Plano Trienal pelo Govêrno do Estado ou Território e
de Educação e sôbre norma pará ela- os demais pelo Ministério da Educação
boração dos planos de aplicação dos e Cultural; e será assessorada por técnicos
recursos respectivos. do Ministério da Educação e Cultura, di-
rigidos por engenheiro ou arquiteto de
O Presidente da República, usando da reconhecida experiência.
atribuição que lhe confere o artigo 87, Art. 3.º O Ministério da Educação e
Inciso I, da Constituição Federal, e Cultura regulamentará a forma de ação,
Considerando que a União, através do o funcionamento, as atribuições e a com-
Ministério da Educação e Cultura, aplica petência do órgão cuja instituição êste
anualmente somas vultosas na execução decreto autoriza.
de obras e na aquisição de equipamento, Art. 4.º Dos recursos atribuídos pelo
em cooperação com entidades públicas e Plano Trienal de Educação a cada uni-
privadas; dade da Federação, 40% (quarenta por
Considerando que o Ministério da cento), no mínimo, serão destinados à
Educação e Cultura não possui, até agora, suplementação dos salários dos profes-
nas diversas unidades da Federação, ór- sôres.
gãos de fiscalização ou informação do Art. 5.º Êste decreto entrará em vi-
emprego de tais recursos, não obstante a gor na data de sua publicação, ficando
Lei lhe impor esse dever; revogadas as disposições em contrário.
Considerando que essa circunstância, Brasília, em 5 de fevereiro de 1964;
além de não habilitar o Ministério da Edu- 134.» da Independência e 76.º da Repú-
cação e Cultura a avaliar os resultados da blica.
execução de seus programas, é motivo de
JOÃO GOULART
retardamento na execução dos convênios
Júlio Furquim Sambaquy
assinados com entidades de direito público
ou de direito privado, importando, muitas (Publicado no D.O. de 6-2-1964)
vezes, na paralisação de obras durante
longo tempo;
DECRETO N.º 53.932 — DE 26 DE
Considerando que a experiência indi- MAIO DE 1964
ca ser Indispensável a criação de órgãos,
em cada unidade da Federação, incumbi- Altera dispositivos dos Decretos números
dos da fiscalização das obras, da aquisição 29.741, de 11 de julho de 1951, 50.737,
dos equipamentos escolares e de controle de 7 de junho de 1961, 51.146, de 5 de
financeiro na aplicação dos recursos, seja agosto de 1951, 49.355, de 28 de no-
qual fôr a fonte de origern; vembro de 1960, 51.405, de 6 de feve-
Considerando que passou a ser neces- reiro de 1962, 52.456, de 16 de setembro
sário, â vista das disposições do Decreto de 1963, e 53.325, de 18 de dezembro
n.o 53.470, de 22 de janeiro de 1964, des- de 1963, reunindo num só órgão a
tinar parcela dos recursos previstos no CAPES, COSUPI e PROTEC.
Plano Trienal de Educação à suplemen-
tação dos salários dos professôres primá- O Presidente da República, usando da
rios estaduais, decreta: atribuição que lhe confere o art. 87, in-
Art. 1.» Fica o Ministério da Edu- ciso I, da Constituição Federal, decreta:
cação e Cultura autorizado a instituir em Art. 1.° A Campanha Nacional de
cada Estado ou Território, uma comissão Aperfeiçoamento de pessoal de Nível Su-
pará controle e execução dos convênios perior (CAPES), de que tratam os Decre-
que visem à aplicação dos recursos con- tos números 29.741, de 11 de Julho de
signados ao Plano Trienal de Educação. 1951, 50.737, de 7 de Junho de 1961 e
Parágrafo único. Os recursos desti- 51.146, de 5 de agosto de 1961, órgão da
nados à assistência técnica continuarão a Presidência da República; a Comissão
ser aplicados diretamente pelos órgãos Supervisora do Plano dos Institutos
próprios do Ministério da Educação e (COSUPI), de que tratam os Decretos nú-
Cultura. meros 49.355, de 28 de novembro de 1960,
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

51.405, de 6 de fevereiro de 1962, e 52.456, setores de cohecimento que mais de perto


de 16 de setembro de 1963, órgão do Mi- interessam aos planos de educação su-
nistério da Educação e Cultura; e o perior.
Programa de Expansão do Ensino Tecno- Art. 4.º Os auxílios concedidos pela
lógico (PROTEC), de que trata o Decreto CAPES visando à complementação de re-
n.o 53.325, de 18 de dezembro de 1963, cursos dos Centros de Treinamento para
órgão do Ministério da Educação e Cul- o cumprimento de programas específicas
tura, ficam reunidos na Coordenação do de formação de pessoal ou desenvolvi-
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Su- mento de novos centros terão sempre
perior (CAPES), subordinada diretamente caráter temporário, estabelecendo-se, em
ao Ministro da Educação e Cultura e que cada caso, convênio com as Instituições
poderá regulamentar atividades e apro- contempladas de sorte que através recur-
vará regimentos Internos. sos regulares previstos nos orçamentos das
Art. 2.º A CAPES terá como objetívo mesmas seja assegurada a continuidade
a formulação e execução de programas de seu funcionamento.
anuais de trabalho, orientados com os se- Parágrafo único. Em qualquer caso
guintes propósitos: a cooperação prestada não deverá cobrir
1 — aperfeiçoamento de pessoal de despesas de manutenção ou substituir os
nível superior, promovido em função das recursos regulares das Instituições assis-
propriedades ditadas pelas necessidades tidas.
do desenvolvimento econômico e social do Art. 5.º A CAPES será orientada por
país; um Conselho Deliberativo integrado por
2 — colaboração com as Universidades 9 membros designados pelo Presidente da
e Escolas Superiores do país, proporcio- República, pelo prazo de 3 anos e me-
nando-lhes assistência técnica no sentido diante Indicação do Ministro da Educação
da melhoria dos seus padrões de ensino e e Cultura.
de pesquisa; § 1.º Dois dos nove membros do
Conselho são considerados membros na-
3 — apoiar Centros de Pesquisa e
Treinamento Avançado, que possam cola- tos' o Diretor da Diretoria do Ensino
borar em programas de formação e ades- Superior do Ministério da Educação e
tramento de pessoal graduado e estimular Cultura e o Presidente do Conselho Na-
a formação de centros da mesma natureza cional de Pesquisas.
de que seja carente o país; § 2.º A Presidência do Conselho ca-
berá ao Ministro da Educação e Cultura,
4 — coordenar, respeitada a autono- sendo seu substituto eventual o Diretor
mia das Universidades, os planos nacio- da Diretoria do Ensino Superior.
nais de expansão de matrículas nas áreas
em que haja maior demanda, facilitando, Art. 6.º Competirá ao Conselho De-
ainda, o suprimento de recursos adicio- liberativo :
nais ou extraordinários que se façam 1 — definir a política da organização
necessários ao cumprimento dêsses mes- e aprovar as suas normas de trabalho;
mos planos; 2 — aprovar anualmente os planos de
5 — a realização de levantamentos, trabalho organizados pelos seus órgãos
estudos e pesquisas sôbre os problemas técnicos;
envolvidos em seu campo de ação; 3 — examinar e aprovar projetos de
6 — a administração das bôlsas-de- trabalho específicos que lhe sejam sub-
estudo oferecidas pelo Govêrno Brasileiro metidos;
a elementos estrangeiros para cursos de 4 — aprovar a concessão de bôisas-
graduação e pós-graduação no Brasil; de-estudo no pais e no estrangeiro;
7 — a promoção de encontros de pro- 5 — aprovar os planos de aplicação
fessôres e pesquisadores visando a elevar
dos recursos;
ce padrões de ensino e difundi-los por
todo o pais. 6 — aprovar a proposta orçamentária
anual;
Art. 3.» Para alcançar os objetivos
referidos no artigo 2.», deverá a CAPES 7 — exercer a superior jurisdição da
concentrar e coordenar esforços e recursos entidade.
financeiros, inclusive decorrentes de em- Art. 7.º A execução das deliberações
préstimos externos visando a fortalecer do Conselho Deliberativo estará a cargo
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 271

de um Diretor Executivo e de cinco Se- PORTARIA N." 7 — DE 23 DE


cretários encarregados, respectivamente, JANEIRO DE 1964
dos seguintes setores:
1 — Programa Universitário e Centros Instituti a Comissão de Assessoramento,
de Treinamento; Documentação e Informação das Fa-
2 — Programa dos Quadros Técnicos culdades de Filosofia.
e Científicos;
3 — Serviço de Estudos, Levantamen- O Ministro de Estado da Educação e
tos e Documentação; Cultura no uso de suas atribuições,
4 — Serviço de Bôlsas-de-Estudo; e Considerando que o sistema Integrado
5 — Secretaria Administrativa. de ensino e pesquisa estatuído pela Lei
n.º 4.024, de 20 de dezembro de 1961, Im-
Parágrafo único. O Diretor Executivo
plica necessariamente reformulações dos
e os Secretários serão de livre escolha do elementos estruturais e funcionais do En-
Ministro da Educação e Cultura. sino Superior brasileiro;
Art. 8.º O Diretor Executivo proporá
ao Conselho Deliberativo todas as medidas Considerando que, dos estudos reali-
Julgadas indispensáveis ao seu funciona- zados no Simpósio sôbre a Estrutura das
mento, Inclusive a requisição de servido- Faculdades üe Filosofia, reunido em Bra-
res públicos civis, na forma da legislação sília no mês de fevereiro do corrente ano
em vigor. ressaltou a necessidade inadiável de con-
siderar a posição que as Faculdades de
Art. 9.º Os dirigentes dos órgãos da
Filosofia, Ciências e Letras devem legi-
administração pública, das autarquias e
timamente assumir no sistema do Ensino
das sociedades de economia mista deverão
Superior, quer mediante o restabeleci-
íacilltar o afastamento de seus servidores
mento dos objetivos multifuncionais que
selecionados para os programas de aper-
estão na sua origem, quer mediante uma
feiçoamento previstos neste Decreto.
redefinição de seu papel em face das es-
Art. 10. Passarão ao Patrimônio da trutras renovadas;
CAPES todos os bens de qualquer natureza Considerando que qualquer dos têrmos
pertencentes à atual Campanha de Aper- dessa alternativa reveste especial Impor-
feiçoamento de Pessoal de Nivel Superior, tância para a Identificação das condições
à COSUPI e ao PROTEC. institucionais necessárias à formação de
Parágrafo único. A Divisão de Ma- pesquisadores, cientistas e técnicos, seja
terial do Ministério da Educação e Cul- por melo de Faculdades de Filosofia res-
tura providenciará a lavratura dos têrmos tabelecidas segundo o plano original, que
que forem Imprescindíveis para efetivar a Inclui funções de ministrar cursos básicos
transferência do acervo material das en- das universidades e de preparar pessoal
tidades que integrarão o novo órgão. de alto nível, seja mediante o desdobra-
Art. 11. As dotações consignadas no mento delas em unidades autônomas,
orçamento geral da União (1964), em fa- tendo-se em vista sempre, num e noutro
vor da atual Campanha de Aperfeiçoa- caso a existência de órgãos centrais ou
mento de Pessoal de Nivel Superior, para básicos;
a COSUPI e o PROTEC serão aplicadas, Considerando que o Conselho Federal
no corrente exercício, através da CAPES, de Educação, ao conceituar o concurso
obedecidos os planos já aprovados pelos de habilitação como "o estágio interme-
órgãos ora extintos, desde que ratificados diário de um processo de seleção a longo
pelo Conselho Deliberativo previsto no prazo, que principia na fase terminal da
Art. 5.° dêste decreto. escola média e se conclui, em relação aos
Parágrafo único. A proposta orça- estudos profissionais no período Inicial
mentária para 1965 deverá ser devidamen- dos cursos de graduação", indica a con-
te corrigida. veniência de serem escalonados de tal
Art. 12. Êste decreto entrará em vi- forma os cursos de graduação que o seu
gor na data de sua publicação, revogadas primeiro ciclo seja básico;
disposições em contrário. Considerando, além disso, que em face
do número crescente de candidatos ao
Brasília, 26 de maio de 1964; 143.» da Ensino Médio e da perspectiva de que esse
Independência e 76.º da República. número se elevará consideravelmente até
H. CASTELLO BRANCO 1970, com a execução do Plano Nacional
Flávio Lacerda de Educação, impõe-se fornecer professo-
272 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

res de Ensino Médio formados pelas Fa- VII — estudo da conveniência de di-
culdades de Filosofia, em número bastante versificar os cursos de Licenciatura em
para satisfazer às progressivas demandas mais de um ciclo;
que os reclamam; VIII — incremento da matrícula, in-
Considerando, ainda mais, as suges- clusive por melo de concursos de habi-
tões, feitas durante o Simpósio de Bra- litação que proporcionem sistemas de
silia, no sentido de se diversificarem tipos opções vocacionais;
de professôres secundários, não só em re- IX — proposição de critérios de Ins-
lação aos dois ciclos do Ensino Médio peção para efeitos de autorização e reco-
como também a dois grupos de séries do nhecimento, em função das peculiarida-
primeiro ciclo; des regionais e sub-regionals da demanda
Considerando também a relativa di- da mão-de-obra e das disponibilidades de
versidade de situações entre as Faculda- pessoal, equipamentos e Instalações.
des de Filosofia, Integrantes de universi- Art. 3.º Ficam designados como mem-
dades e as isoladas; bros da CADIFF o Diretor da Diretoria
Considerando Igualmente a necessi- do Ensino Superior que presidirá seus
dade duma Identificação das Faculdades trabalhos, e os seguintes professôres de
de Filosofia segundo as peculiaridades e Faculdades de Filosofia; Clemente Honó-
possibilidades regionais a que correspon- rio Parentes Fortes, Gilberto Osório de
dem no País, resolve: Andrade, Laerte Ramos de Carvalho, Nair
Art. 1.º Fica Instituída, na Diretoria Abu-Merhy, Newton Sucupira e Valnlr
do Ensino Superior, uma Comissão de As- Chagas.
sessoramento, Documentação e Informa- Parágrafo único. O Diretor da Dire-
ção das Faculdades de Filosofia (CADIFF), toria do Ensino Superior poderá designar
com a atribuição, Inclusive, de sugerir quem o substitua eventualmente na pre-
um plano de formação de professôres sidência dos trabalhos.
do Ensino Médio dentro das previsões Art. 4.º O convocação de cada reu-
do Plano Nacional de Educação. nião da CADIFF será feita pelo Diretor
Art. 2.º Para o desempenho de suas da Diretoria do Ensino Sueprior.
atribuições a CADIFF procederá em fun- Art. 5.° Os casos omissos serão re-
ção dos seguintes propósitos fundamen- solvidos pelo Ministério da Educação e
tais: Cultura. — Júlio Furquim Sambaquy.
I — determinação da posição que as (Publicado no D.O. de 23-2-1964) .
Faculdades de Filosofia ocupam nas áreas
de Influência regional e sub-reglonal das
PORTARIA N.° 46 — DE 31 DE
redes urbanas do país;
JANEIRO DE 1964
II — consideração das diferentes si-
tuações das Faculdades de Filosofia Inte- Especí/ica os objetivos do Programa In-
grantes de Universidades e das Isoladas; tensivo de Preparação da Mão-de-Obra
Industrial.
III — Levantamento em cada Facul-
dade de Filosofia das reais condições que O Ministro de Estado da Educação e
nela se verifiquem para o desenvolvimento Cultura, de acordo com o art. 4.» do De-
doutras funções além da de formar pro- creto n.° 53.324, de 18 de dezembro de
fessôres do Ensino Médio; 1963, que aprovou o Programa Intensivo
IV — Inventário dos cursos ministra- da Preparação da Mão-de-Obra Industrial,
dos nas Faculdades de Filosofia, verifi- resolve:
cação das demandas regionais e sub-re- Art. l.o O Programa Intensivo de
gionais de professôres do Ensino Médio Preparação da Mão-de-Obra Industrial
e efetivo estímulo a instalação dos novos terá como objetivo:
cursos reclamados por essas demandas.
a) especializar, retreinar e aperfei-
V — estímulo do Intercâmbio docente çoar o pessoal empregado na Indústria:
e discente, nos âmbitos regional e lnter- b) habilitar novos profissionais para
regional, se a forma. Inclusive de cursos a Indústria;
intensivos; c) preparar pessoal docente, técnico
VI — avaliação da oportunidade de e administrativo para o ensino Industrial,
unificar o ensino básico para dois ou bem como Instrutores e encarregados de
mais cursos de graduação; treinamento de pessoal na indústria.
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Art. 2.° Para atingir esses objetivos Art. 7.° A Coordenação Nacional que
o Programa promoverá: será desempenhada pelo Diretor do En-
a) a capacitação das empresas In- sino Industrial, terá Assessôres-técnlcos e
dustriais para ministrarem o treinamento setores de coordenação de Planejamento.
do seu próprio pessoal e, especialmente, de Controle e de Divulgação, bem como
o do menor aprendiz; serviços de Administração e Contabilidade.
b) a capacitação das escolas Indus- Art. 8.° Haverá uma ou mais Coorde-
triais federais, estaduais, municipais, do nações Regionais em cada unidade da
Serviço Nacional de Aprendizagem In- Federação, de acordo com a amplitude das
dustrial e particulares relativamente a atividades do Programa no Estado.
pessoal, instalações, equipamento e mate- Art. 9.» Compete à Coordenação Na-
rial didático para que melhor possam cional:
contribuir para a formaçáo, aperfeiçoa-
mento, retreinamento e especialização da a) planejar o Programa para todo o
mão-de-obra industrial; território nacional;
b) supervisionar a execução do Pro-
c) a seleção, elaboração, preparo e
grama;
Impressão do material didático necessário
aos cursos; c) designar os Coordenadores Regio-
d) a divulgação orientada de infor- nais e os auxiliares técnicos e adminis-
mações técnicas relacionadas com o pre- trativos da Coordenação Nacional;
paro da mão-de-obra industrial; d) promover a distribuição dos re-
e) levantamentos, pesquisas e do- cursos necessários à execução do Programa
cumentação sôbre mercado de trabalho. às Coordenações Regionais;
e) efetuar o controle contábil da
Art. 3.º Na execução do Programa, aplicação dêsses recursos;
levar-se-á em conta: /) elaborar, Imprimir e distribuir o
o) a potencialidade e necessidade da material didático a ser utilizado nos
Indústria de formar a própria mão-de-obra cursos;
dentro do trabalho; g) firmar convênios de Interesse na-
b) a utilização racional da capaci- cional para a realização de levantamentos,
dade total das escolas federais de ensino estudos de mercado, confecção de mate-
Industrial, das escolas estaduais, munici- rial didático, colocação profissional e
pais, do SENAI e particulares; cursos especiais;
c) o desejo do trabalhador de aper- h) estabelecer normas técnicas e ad-
felçoar-se e especlalizar-se, ensejando-lhe ministrativas de trabalho para a execução
condições de realizá-lo em suas horas do Programa.
disponíveis. Art. 10. Compete à Coordenação Re-
Art. 4.o Será o Programa executado gional :
por instituições educacionais e por em- a) realizar levantamento das neces-
presas industriais, mediante convênio, e, sidades da indústria da região, estabele-
em casos excepcionais, diretamente pelas cendo as áreas de maior prioridade;
Coordenações Regionais.
b) levantar as disponibilidades de
Art. 5.° A execução do Programa escolas e empresas para a realização do
dar-se-á por melo de: Programa e determinar o equipamento
a) treinamento dentro das empresas suplementar necessário;
Industriais; c) fazer o recrutamento e cooperar
b) cursos Intensivos ou regulares em no treinamento dos instrutores;
escolas técnicas, industriais e de apren- d) firmar com escolas, empresas,
dizagem; entidades federais, Estados, Prefeituras
c) cursos por correspondência; Municipais e SENAI, convênios pará a
d) cursos volantes; realização do treinamento, cursos, está-
e) aprendizagem programada; gios e demais atividades do Programa;
f) seminários, reuniões de estudo, e) distribuir o material didático para
levantamentos, pesquisas e trabalhos prá- os cursos;
ticos. /) realizar a divulgação e a propa-
Art. 6.º O Programa Intensivo de ganda dos cursos e do Programa;
Preparação da Mão-de-Obra Industrial g) promover a aquisição ou adquirir
será administrado por uma Coordenação diretamente o equipamento suplementar
Nacional e por Coordenações Regionais. necessário;
274 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

h) realizar diretamente, em casos sôres nas diversas regiões do País, para


especiais, cursos em escolas ou empresas, o que poderão prestar contribuição os
cursos por correspondência, cursos volan- Conselhos Estaduais de Educação.
tes e seminários de estudos; Art. 2.° O Conselho Federal de Edu-
i) acompanhar e fiscalizar a execução cação, visando atender todas as regiões do
do Programa na área; país, indicará anualmente as Faculdades
j) efetuar pagamentos e comprovar de Filosofia oficiais, ou as unidades uni-
as despesas; versitárias equivalentes, onde poderão
l) assinar ou visar certificados e di- realizar-se exames de suficiência.
plomas;
§ 1.º Nos Estados onde houver mais
m) proceder à avaliação dos resul-
tados alcançados ao final de cada curso e de uma, as Faculdades oficiais serão es-
ao final do Programa Intensivo; colhidas, levando-se em conta, também,
a sua distribuição pelas diferentes regiões
n) organizar e manter em funciona-
mento serviço de colocação e acompanha- do Estado.
mento dos profissionais diplomados; § 2.º Sempre que necessário, as Fa-
culdades poderão contratar, para os exa-
o) designar os auxiliares técnicos e
mes de suficiência, professôres devida-
administrativos pará os serviços da coor-
denação Regional; mente habilitados, bem como deslocar as
Comissões Examinadoras para onde me-
p) constituir conselhos consultivos
lhor possam atender à demanda de can-
da comunidade para a orientação do Pro-
grama . didatos.
Art. 3.° O certificado de suficiência
Art. 11. Esta portaria entrará em habilita o candidato ao exercício do ma-
vigor na data de sua publicação. — Júlio gistério na localidade para a qual foi
Furquim Sambaquy. requerido o exame, como nas demais em
(Publicado no D.O. de 17-2-1964). que se verifique a carência de licenciados.
Art. 4.º Os candidatos inscritos em
PORTARIA N.o 49 — DE 31 DE exame de suficiência poderão ser autori-
JANEIRO DE 1964 zados a lecionar enquanto aguardam a
realização dos exames, podendo ser pror-
Aprova normas gerais elaboradas pelo CFE rogada essa autorização por mais um ano
que regulamentam o exame de sufi- no caso em que o candidato resolver adiar
ciência. a prestação do exame.
Parágrafo único. Os alunos das Fa-
O Ministro de Estado da Educação culdades de Filosofia, quando estejam
e Cultura, usando de suas atribuições, matriculados na 3.* série, ou em nível
resolve: equivalente no sistema de matrícula por
Aprovar as seguintes normas gerais, disciplina, terão, por dois anos, direito
elaboradas pelo Conselho Federal de Edu- de lecionar, quer como treinamento, quer
cação e destinadas a regulamentar o exa- para suprir a carência de professôres.
me de suficiência, para efeito de registro Art. 5.º Serão oferecidos cursos de
de Professôres e exercício do magistério: preparação e orientação para o exame de
Art. 1.º Para o exercício do magis- suficiência pelos órgãos competentes do
tério em estabelecimentos de ensino mé- Ministério da Educação e Cultura.
dio localizados onde não houver, em § 1.º Cursos semelhantes poderão ser
número suficiente, professôres licenciados organizados pelas Secretarias da Educação,
em Faculdades de Filosofia e sempre que Faculdades de Filosofia ou outras enti-
se registre essa falta, será concedido re- dades devidamente habilitadas.
gistro àqueles que forem habilitados em § 2.º Os candidatos inscritos poderão
exame de suficiência nos têrmos do ar- prestar o exame de suficiência sem que
tigo 117 da Lei de Diretrizes e Bases. hajam freqüentado os cursos mencionados
Parágrafo único. Para determinar as neste artigo.
regiões ou cidades que ainda não possuem Art. 6.º O exame de suficiência cons-
número suficiente de professôres legal- tará de duas partes: a) verificação de
mente habilitados, o Ministério da Edu- conhecimentos na disciplina que o candi-
cação e Cultura fará periodicamente dato pretende ensinar; b) verificação da
levantamento das necessidades de profes- capacidade didática.
ESTUDOS PEDAGÓGICOS 275

Art. 7.º As entidades referidas no Art. 12. Para inscrição no exame de


artigo 2.º e em seus parágrafos, que deci- suficiência deve o candidato apresentar
dam realizar exames de suficiência, de- os seguintes documentos:
verão publicar os programas respectivos a) prova de identidade;
com antecedência de um ano, pelo menos, b) de nacionalidade;
da realização dos exames. c) de idade mínima de 21 anos;
5 1.º Os programas devem abranger d) quitação com o serviço militar,
globalmente a matéria de cada disciplina, quando brasileiro;
necessária ao seu ensino em nível médio. e) de Idoneidade moral, atestado por
§ 2.º O prazo a que se refere êste duas pessoas que exerçam atividades edu-
artigo poderá ser reduzido para os exames cacionais ou por autoridade competente;
de suficiência que se realizem no ano de f) sanidade física ou mental ates-
1964. tada por serviço médico oficial;
Art. 8.º Haverá exames de suficiência g) comprovante, fornecido pela Ins-
distintos para o 1.° e o 2.» ciclos de en- petoria Seccional, ou órgão equivalente,
sino de grau médio, sendo a suficiência de que não existem, na regiáo, professôres
colegial válida para ambos os ciclos. legalmente habilitados para o ensino da
disciplina;
Art. 9. O mesmo candidato poderá h) prova de conclusão de ciclo gi-
submeter-se a exame de suficiência para nasial ou equivalente.
o ensino de três disciplinas no máximo.
Parágrafo único. Excepcionalmente
Art. 10. Na avaliação de qualquer poderá ser dispensada a exigência da le-
prova escrita e no julgamento de provas tra h, desde que o candidato documente
orais ou práticas, será levada em conta nível equivalente de conhecimentos.
a capacidade de expressão vernácula do Art. 13. As Faculdades de Filosofia,
candidato. depois de realizados os exames de sufi-
Art. 11. Os critérios de Julgamento ciência, fornecerão aos candidatos os res-
serão previamente estabelecidos pelos pectivos certificados de habilitação para
examinadores, devendo o resultado do os devidos fins. — Júlio Furquim Sam-
exame ser traduzido pela menção "habi- baquy.
litado" ou "não habilitado". (Publicado no D.O. de 12-2-1964) .
COMPOSTO E IMPRESSO NAS
OFICINAS DO SERVIÇO GRÁFICO
DO IBGE, NO MÊS DE ABRIL DE
MIL NOVECENTOS E SESSENTA
E CINCO, 2 8 . ° DA CRIAÇÃO DO
INSTITUTO E 400.° DA
FUNDAÇÃO DA CIDADE
DO RIO DE JANEIRO.

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