Carlos Lamarca - o Guerrilheiro Apaixonado

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Brasil |  N° Edição:  1948 |  28.Fev.07 ‐ 10:00 |  Atualizado em 21.Abr.16 ‐ 16:40

O guerrilheiro apaixonado
As cartas escritas pelo capitão Carlos Lamarca à sua
amada Iara Lavelberg dias antes das trágicas mortes de
ambos, em 1971, revelam o lado passional de
revolucionário implacável.
Por Hugo Studart

Iara Iavelberg tinha o rosto lindo, a cabeça brilhante e o coração revolucionário. Era a musa da esquerda
brasileira em 1969, quando um capitão do Exército, Carlos Lamarca, desertou de armas em punho para se
tornar comandante da Vanguarda Popular Revolucionária, a VPR. Logo tombaria de encantos por Iara. A
paixão  do  capitão  pela  guerrilheira  virou  lenda  entre  a  intelectualidade  pátria,  nossa  melhor  versão  de
Tristão & Isolda ou de Garibaldi & Anita. Há 35 anos ambos, Lamarca & Iara, morreram nas mãos dos
militares. Caíram na Bahia, em locais e datas distintas. O que poucos sabem é que Lamarca deixou um
diário como legado, redigido durante seu exílio na caatinga baiana. São 39 trechos, redigidos entre 8 de

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julho e 16 de agosto de 1971 (um por dia), endereçados a Iara e obtidos por ISTOÉ através de um oficial
de alta patente. O diário é um documento singular. Os textos se parecem muito mais com uma longa lírica
romântica do que com registros racionais de um revolucionário. Guardam impressionante paralelo com as
cartas  da  revolucionária  alemã  Rosa  Luxemburgo  a  Leo  Jogiches,  onde  ela  discute  a  revolução,  mas
dedica­se principalmente a falar do amor colossal que sente pelo amante. Nas cartas de Lamarca, como
nas de Rosa, há trechos marxistas, mas os pontos fortes desse documento são as declarações de amor que
revelam o imaginário do nosso mais conhecido guerrilheiro:

– Neguinha, a fôrça da coletivização é espantosa, fico a imaginar uma fazenda coletiva – e me babo só de
pensar! (A grafia original foi mantida)

Lamarca  passou  seus  últimos  dias  escrevendo  para  a  amada.  Isso  se  tornara  uma  estranha  obsessão.
Alguns  trechos  dessas  cartas  vazaram  em  1980,  mas  eram  relacionados  às  convicções  ideológicas  do
capitão; nada sobre Iara. Os originais do diário se encontram até hoje em poder dos militares. Ainda são
considerados  documentos  “reservados”  das  Forças  Armadas.  ISTOÉ  teve  acesso  a  uma  cópia
datilografada pelos militares,  totalizando  41  páginas.  O  diário  começou  a  ser  escrito em resposta a uma
carta enviada pela guerrilheira.

MUSA Filha de família abastada, Iara mergulhou  
na militância política, mas destoava dos padrões 
tradicionais da esquerda

– Sonhei com você. Acordei num misto de alegria e tristeza – compreendi que te desejava. (...) Sinto­me
ôco. Esse estado não posso superar, o que posso fazer? No fim, um cocô atolado.

Em sua carta a Lamarca, lara cobra mais firmeza do amado, diz que ele deveria fazer­se respeitar mais
pelos  companheiros.  Em  sua  resposta,  o  capitão  se  esforça  para  mostrar  à  musa  sua  disposição
revolucionária e seu valor intelectual. Tece longas análises sobre a situação política na China, na Mongólia,
em Cuba, na Jordânia e no Paquistão. Em meio disso, desanda a escrever sobre o amor. Começa heróico,
em  idílio  marxista,  para  já  na  segunda  frase  revelar,  de  forma  sutil,  seu  grande  temor  –  o  de  que  Iara
termine nos braços de outro homem:

SEGREDOS A atual ministra Dilma Rousseff ouviu confissões de Lamarca

–  O  nosso  amôr  é  uma  realidade  que  veio  sendo  transformada  –  hoje  atinge  um  nível  nunca  por  mim
sonhado,  mas  vamos  continuar  transformando.  Sonho  com  êle  numa  fazenda  coletiva  –  juro  não  ser
ciumento e lutar junto contigo pela tua liberdade – e vou te amar mais intensamente, isto é possível, sinto
que é. Nosso amôr não está isolado na realização de nós dois, nem nos milhares de filhos que teremos, êle
nasceu e estará umbilicalmente ligado à Revolução e construção do Socialismo.

Depois escorrega a falar de solidão.

–  Quando  estou  longe  de  você,  tudo  muda.  É  outro  mundo,  falta  aquele  calor  que  só  emana  de  você
mesma – fico imaginando e me delicio com tua lembrança, tôda viva, junto de mim.

–  Continuo  então  aguardando  ansiosamente  a  oportunidade  de  te  encontrar,  olhar  dentro  de  teus  olhos
lindos  (perguntadores  e  atentos  olhos),  te  abraçar,  te  beijar  (queridinha)  e  amar.  Já  vi  que  não  sei  mais
passear, só após a guerra poderemos passear – qualquer pedaço de rua, ainda teremos, é visto por mim
taticamente como um campo de luta.

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ROMANCE José Dirceu, então líder estudantil, foi namorado de Iara

Ele chegou a cometer dois poemas socialistas. O suor e as lágrimas e Isolado. Este último começa assim:

– Ouço ao longe/ um campona cantar/ triste, lamentos/ risos de crianças/ no rio se banhando/ fim de tarde,
de/ trabalho/ Gritos de mãe,/ filho chamando.

Depois de 30 dias no sertão, longe de lara, Lamarca está enlouquecido de solidão. De dia, discute com os
companheiros sua necessidade psicológica de reencontrar lara. E registra tudo no diário:

– Sonhando com você, acordo no meio da noite e volto a sonhar. Sonhei com você até nas vias de fato,
pode?  Ora,  porque  o  sonho?  Necessidade  sexual  não  pode  ser  só,  já  sonhei  inclusive  nêsse  nível  com
você. Como, até mesmo dormindo contigo sonhei, só posso concluir que a minha cuca é mais complicada
do que eu pensava.

PORTADOR César Benjamim deveria entregar  
as cartas a Iara. Foi preso sem cumprir a missão

Lamarca  e  Iara  se  conheceram  em  abril  de  1969,  dois  meses  depois  de  ele  desertar  do  Exército.  Foi
paixão fulminante. Ele era casado e tinha dois filhos. Nascido em 1937 no morro do Estácio, no Rio de
Janeiro, era filho de um sapateiro e de uma dona­de­casa. Adolescente, já se mostrava disciplinado nos
hábitos, do tipo que mantém o sapato engraxado e o uniforme engomado. Casou­se com a própria irmã de
criação, Maria Pavan. Foi criado na moral proletária; depois adestrado no moralismo da caserna; por fim,
na ortodoxia stalinista. Jamais gostou da dialética socialista – era, como se diz, um “homem de ação”.

Ela  nasceu  em  1944,  em  uma  abastada  família  de  judeus  paulistanos.  Casou­se  em  1960,  aos  16  anos,
com  Samuel  Halberkon,  um  médico  da  comunidade.  Separou­se  três  anos  depois  e  aderiu  à  militância
política. Estudou psicologia na Universidade de São Paulo e virou professora. Era alta, loira, tinha os olhos
claros, grandes, e um rosto com sardas. Vaidosa, cuidava muito bem do corpo, dos cabelos e das roupas,
hábitos  inusitados  para  a  esquerda  da  época.  Separada,  passou  a  exercitar  o  amor  livre  e  as  relações
fugazes – entre seus namorados, o então líder estudantil José Dirceu. Era o comportamento comum entre
as elites em Paris, Ipanema e Jardins. Chamava­se revolução sexual e fazia parte do contexto de libertação
da mulher.

Tornou­se  público  na  VPR  que  a  relação  extraconjugal  incomodava  o  capitão.  Confessava  aos
companheiros uma enorme culpa por ter arrumado outra depois de submeter a família ao exílio em Cuba.
Mas  logo  começaram  a  viver  juntos.  Passaram  dez  meses  trancados  em  aparelhos  clandestinos.  O
romance  foi  testemunhado  pela  guerrilheira  Vanda,  codinome  de  Dilma  Rousseff,  hoje  ministra  da  Casa
Civil. “Eu e Lamarca lavamos muitos pratos juntos”, revela Dilma a ISTOÉ. “Era nessas horas que ele me
fazia inconfidências sobre sua paixão por Iara.”

O  diário  revela  o  conflito  entre  esses  dois  mundos  tão  distantes,  mas  ligados  pela  fé  na  revolução.  O
encontro  entre  Lamarca  e  Iara  foi  um  choque  social,  cultural  e  político.  A  relação  enfrentou  pressões
dentro da VPR e das demais organizações marxistas, quase todos condenando aquele amor. No início de
1970 os dois começaram o treinamento militar. Caçados pelo Exército, espalharam­se pelas ruas do País
cartazes com fotografias dos dois e os seguintes dizeres: “Bandidos terroristas procurados pelos órgãos de
Segurança Nacional.” Lamarca escreveu no diário:

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PRECOCE Aos 16 anos, Iara se casou com Samuel Halberkon

– Sem você tudo teria desabado, e não sei como me encontraria perante a mim mesmo. Aprendi a lutar
com você, e posso estar todo errado e estar fraquejando nessa luta. Mas quero que você compreenda que
quero lutar, vou lutar pelo relacionamento.

No  início  de  1971,  a  VPR  já  estava  completamente  destruída,  com  seus  militantes  mortos,  presos  ou
exilados.  Os  farrapos  da  organização  foram  incorporados  a  uma  outra,  o  MR­8,  Movimento
Revolucionário Oito de Outubro. Lamarca foi rebaixado a militante de base e enviado para se esconder no
interior  da  Bahia.  Iara  foi  alçada  à  cúpula  da  nova  organização  e  alocada  em  Salvador.  O  capitão  tinha
fama  de  ser  intelectualmente  despreparado.  A  imagem  de  Iara,  ao  contrário,  era  a  de  ser  o  cérebro  do
casal.  Talvez  por  essa  razão  ele  tenha  tentado  exibir  dotes  intelectuais  ao  redigir  em  seu  diário  análises
sobre a conjuntura econômica e a política internacional.

Em Salvador, Iara morava num apartamento com o militante Félix Escobar Sobrinho, 20 anos mais velho.
A  idéia  era  um  disfarce  de  pai  e  filha.  Lamarca  começou  a  escrever  seu  diário  logo  depois  que  soube,
através daquela carta da amada, que ela morava com outro. Demonstra no diário que, desde o início, ficou
com ciúmes. Primeiro tenta se mostrar compreensivo. Depois escreve sobre a distância e as necessidades
físicas de ambos; chega a liberar Iara para novos relacionamentos.

– A tua situação é terrível, e a sua necessidade afetiva muito grande, e se não houver possibilidade de nos
encontrarmos mais, tenho de abrir mão do nosso relacionamento no que se refere a você – dar a você a
liberdade  de  relacionar  com  outro  companheiro.  No  nível  que  atingiu  o  meu  amôr,  não  posso  admitir  a
possibilidade  de  me  relacionar  com  outra  pessoa,  nunca  mais,  mas  a  minha  estrutura  é  diferente  da  tua,
posso viver só com você na cuca.

–  Tenho  que  admitir  as  suas  necessidades  efetivas  e  comparar  com  o  que  a  realidade  está  aos  poucos
mostrando para nós o que mais tarde será inexorável o aumento de suas necessidades. Não quero estar
sendo um puto com você – entenda neguinha, por favor. Sinto­me um cocô sem poder te ajudar.

Mas Lamarca promete, de sua parte, manter a fidelidade para todo o sempre. Era, em verdade, somente
sua tática inicial para não parecer um porco chauvinista:

– Não te preocupes que não existirá nunca uma cabrita. Te respeito muito e sou feliz por ser o teu amor;
sinto  saudade  de  tudo  e  me  alimento  das  lembranças,  penso  adoidadamente  em  ti  –  é  impressionante  –
nunca pensei amar tanto.

Shakespeare  já  afirmava  que  o  curso  do  verdadeiro  amor  nunca  foi  sereno.  Rosa  Luxemburgo,  por
exemplo, passou 15 anos cobrando de Leo Jogiches casamento burguês e filhos. Quando, por fim, Rosa
se cansou da espera e iniciou um relacionamento com outra pessoa, o amante enlouqueceu de ciúmes e
ameaçou matá­la. Por muito menos, Lamarca também perdeu o controle emocional. Em suas anotações,
de dia, é compreensivo.

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–  Não  sei  explicar  toda  essa  imensa  necessidade  –  o  importante  é  que  existe.  Sei  que  a  presença  é
necessária,  que  lutaremos  pelas  oportunidades  de  estarmos  juntos,  mas,  enquanto  separados  PELO
TEMPO QUE FOR, EM QUALQUER SITUAÇÃO – VOCÊ É MINHA MULHER – só você, sempre.

De noite, tortura­se de ciúmes:

–  Falei  em  abertura  pelo  seu  lado  (do  meu  não  admito,  nem  existirá  nunca  condições)  do  nosso
relacionamento  –  que  é  observado  –  e  como  última  hipótese;  pode  ser  um  puta  ciúme  meu  de  existir
alguém cumprindo a minha função.

Na  anotação  de  13  de  agosto,  o  guerrilheiro  faz  “autocrítica”  e  admite  estar  sofrendo  de  “machismo”  e
“autoflagelação”. Revela que decidira discutir politicamente com os companheiros uma forma de burlar a
segurança para se encontrar com Iara (“Preciso de você, eis a realidade”). Por fim, em 16 de agosto de
1971, em sua última anotação, ele decide acabar com a tormenta, pelo menos na sua imaginação, da forma
mais conservadora possível:

– Peço a você que não se abra diante de conversa mole de ninguém – o relacionamento com todos os
companheiros deve ser político e não sentimento e outros bichos. Tome cuidado.

O  diário  jamais  chegou  à  destinatária.  Foi  entregue  pelo  capitão  ao  militante  João  Lopes  Salgado,
codinome “Fio”, e depois foi repassado ao militante César Queiroz Benjamim, o “Menininho”, na época
com 17 anos. Em 21 de agosto, escondido no Rio de Janeiro, Benjamim passou um telegrama para Iara,
sem  saber  que  já  estava  morta.  Minutos  depois,  foi  abordado  por  uma  blitz  da  PM,  entre  as  praias  de
Ipanema e Leblon. Estava num Fusca, com três outros militantes. Benjamim escapou durante a revista. No
Fusca,  ficaram  os  companheiros  e  uma  maleta  com  roupas,  uma  arma  e  um  envelope  lacrado.  “Eu  não
sabia que o diário estava no envelope”, relata Benjamim, que foi candidato a vice­presidente da República
na  chapa  de  Heloísa  Helena.  “Só  sabia  que  deveria  entregar  um  envelope  para  a  Iara.”  O  Exército  já
descobrira que o capitão da guerrilha se escondia na Bahia, mas não tinha idéia do local exato. Ao receber
o diário, os militares concluíram, pelas anotações, as coordenadas prováveis do esconderijo. Eis as últimas
linhas de Lamarca, uma promessa que não poderia cumprir.

– Te amo, te adoro. Segue esta carta impregnada de amor – vou te ver nem que seja a última coisa da
minha vida e mil beijos do teu amor.

Jamais se veriam novamente. Iara Iavelberg foi encontrada a 20 de agosto, em um apartamento da Pituba,
Salvador. Segundo os militares, quando se viu cercada, conseguiu escapar para o apartamento vizinho e
trancou­se no banheiro de empregada. O Exército estava esvaziando todo o prédio para iniciar a caçada.
Então,  uma  criança  do  edifício  voltou  para  pegar  um  brinquedo  e  viu  Iara  se  escondendo.  Assustada,
avisou  os  militares.  A  versão  oficial  é  a  de  que  Iara  teria  dado  um  tiro  no  próprio  peito,  aos  27  anos,
enquanto um soldado tentava arrombar a porta do banheiro. Sua família, contudo, levanta a hipótese de ela
ter sido executada. “Há fotos, laudos e depoimentos de que ela não se matou”, afirma Mariana Pamplona,
sobrinha de Iara e roteirista de um documentário em produção, Suicídio?, sobre a tia.

Os  militares  a  mantiveram  por  um  mês  na  geladeira  do  IML  de  Salvador.  Só  depois  que  o  capitão  foi
morto os pais de Iara foram avisados. O Exército não deixou que um rabino fizesse a lavagem ritual do
corpo, a tahara. Entregou­a em caixão lacrado. Somente a família foi autorizada a comparecer ao enterro.
Havia o temor de que a esquerda roubasse o corpo para transformá­lo em estandarte. É possível, também,
que se tentasse evitar uma contestação à versão oficial de suicídio. lara passou 32 anos enterrada na ala
dos  suicidas  do  cemitério  judaico  do  Butantã,  em  São  Paulo.  Samuel  Iavelberg,  irmão  de  Iara,  tentou
removê­la para outro local em 1997, mas os rabinos impediram. “Isso incomodava muito meus pais, eles
eram  muito  religiosos”,  relata  Samuel.  “Mas  para  mim  o  essencial  é  que  não  prevalecesse  a  vontade  da
ditadura.” Em setembro de 2003, por ordem da Justiça, Iara foi exumada. Os rabinos tentaram protelar
alegando que seria profanação. Foi preciso ameaçá­los de prisão. Em junho de 2005, o corpo de Iara foi
finalmente enterrado na ala sagrada do cemitério, ao lado dos pais.

Lamarca  soube  da  morte  da  amada  dias  depois.  Perdeu  a  vontade  de  prosseguir  na  luta.  Já  havia
caminhado em fuga cerca de 300 quilômetros pelo sertão baiano, ao lado do companheiro José Campos
Barreto, o Zequinha. Foi encontrado em 17 de setembro por uma patrulha comandada pelo major Nilton

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Cerqueira, depois deputado federal e secretário de Segurança do Rio de Janeiro. Os comandantes torciam
para  que  resistisse  à  prisão  e  não  voltasse  vivo.  Contudo,  de  acordo  com  um  militar  que  participou  do
episódio,  as  ordens  do  Centro  de  Informações  do  Exército  eram  para  prendê­lo  vivo.  A  idéia  era  mais
tarde  desaparecer  com  o  corpo  de  Lamarca  e  vazar  o  boato  na  esquerda  de  que  ele  seria  um  agente
infiltrado. Contudo, Cerqueira decidiu atender ao desejo da tropa.

O capitão da guerrilha estava desanimado, fraco, desnutrido e doente. Foi encontrado dormindo debaixo
de uma árvore. Zequinha ainda tentou reagir; morreu na fuga. Lamarca ficou no chão. O major e o capitão
mantiveram  então  um  rápido  diálogo.  Cerqueira  indagou  pelo  nome:  “Capitão  Carlos  Lamarca!”,
identificou­se. A seguir perguntou onde estariam sua mulher e filhos: “Em Cuba”, respondeu. A última das
perguntas:  “Você  sabe  que  é  um  traidor  do  Exército  brasileiro?”  Lamarca  não  respondeu,  segundo
Cerqueira.  De  acordo  com  um  militar  que  acompanhou  os  acontecimentos,  a  desfeita  de  Lamarca  teria
sido pior. Balançou os ombros e braços, no gesto de quem quer dizer “e daí?”, e tentou se levantar dando
as costas à patrulha. Terminou fuzilado no chão, aos 33 anos, pelo major Cerqueira. Segundo a autópsia,
no estômago e nos intestinos do capitão Lamarca só havia capim. Da aventura, só restaram as mensagens
jamais entregues à musa inspiradora.

– Uma coisa é absoluta, inexorável – você é minha mulher – e isso é o que de mais lindo me aconteceu na
vida. Se é antidialético crêr no absoluto, no eterno, eis­me, nesse caso um antidialético ferrenho. Saudade
imensa, muito amor; seu só teu.

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21/04/2016 ISTOÉ Independente ­ Brasil

PUBLICADO  NA EDIÇÃO
1948

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"Se eu criar tumulto, o senhor
chama a Polícia Federal para
me tirar do voo, certo? Pois
finja que eu criei confusão e
peça que me prendam"
Osmar Terra, deputado federal, em conversa
com o comandante do avião ao descobrir que
embarcara em um voo errado

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