O Pensamento Político de Viktor Frankl
O Pensamento Político de Viktor Frankl
O Pensamento Político de Viktor Frankl
Resumo. Este artigo pretende discutir os aspectos mais relevantes do pensamento político de Viktor Emil
Frankl, cujo trabalho reflete os desafios fundamentais do século XX. Ao longo da investigação, enfatizamos o
esforço de Frankl em preservar a dignidade humana contra o sociologismo, e, também, contra a manipulação
e instrumentalização do poder político, discutindo também os quatro sintomas da neurose coletiva atual:
atitude existencial provisória, atitude fatalista diante da vida, pensamento coletivista e fanatismo. Como
conclusão, chegamos a analisar o compromisso político de Frankl, profundamente influenciado por um forte
imperativo ético, que leva a sua defesa do monantropismo, a ideia da unidade da humanidade.
Abstract. This paper aims to discuss the most relevant aspects of Viktor Emil Frankl’s political thought, whose
work reflects the fundamental challenges of the 20th Century. Throughout the investigation, we’ve stressed
Frankl’s effort to preserve human dignity against sociologism, and also against manipulation and
instrumentalization by the political power, also discussing the four symptoms of the current collective
neurosis: provisional existential attitude, fatalistic attitude towards life, collectivist thinking, and fanaticism.
As a conclusion, we came to analyze Frankl’s political commitment, deeply influenced by a strong ethical
imperative, which leads to his defense of Monantropism, the idea of the unity of mankind.
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1Listadas no sítio online do Viktor Frankl Institute de Viena o pensador vienense refletiu que, se é verdade que há um
(http://www.viktorFrankl.org/e/institute_wwE.html), acesso movimento logoterapêutico, este se constitui como um
em 07/07/2015. movimento pelos direitos humanos (Frankl, 2011, p. 207).
2 Foi, provavelmente, em conta do pioneirismo de Frankl na
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3 Ensaio incluído no volume “Aspectos do Drama artigo “Tempos Sombrios: Karl Jaspers e a Culpa Alemã”
Contemporâneo”, das obras completas de Jung, pela Editora (Medeiros, 2012).
Vozes (1988). 5 Segundo dados da própria Editora Beacon Press. Disponível
4 Também é digna de nota a obra de Karl Jaspers sobre o em: http://www.beacon.org/Mans-Search-for-Meaning-
tema. Para um aprofundamento deste tópico, sugere-se o P1048.aspx .Acesso em 10/10/2015.
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6 Compreensão derivada da formulação “quasi-neurosis” recurso retórico que Frankl afirma que as câmaras de gás
(Frankl, 2004), na qual o prefixo latino “quasi” tem o sentido nasceram não apenas nos gabinetes ministeriais de Berlim,
comparativo de “como que”, “a modo de”. mas também nos laboratórios e salas de aula de cientistas e
7 A primeira edição de “Theorie und Therapie der Neurosen” pensadores niilistas (Frankl, 2003b, p. 45). Para ele, a neurose
data de 1956. coletiva, ao invés de ser uma consequência da guerra, pode
8 Como veremos, Frankl também denunciou – servindo-se de bem ser uma de suas causas. É por isso e nesse contexto que
uma refinada psicologia política – as relações de cumplicidade o vienense relata a existência de quatro traços psicológicos
entre o vazio existencial (enquanto forma privada de niilismo) disfuncionais que têm relação direta com a forma pela qual a
e o interesse totalitário, anunciando a necessidade de uma ideologia do nacional-socialismo se desenvolveu.
psico-higiene coletiva, contra uma coletiva que, certamente,
teria impactos políticos e sociais. Não é por mero neurose
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9 “Se chamarmos de “coletivo” tudo que se opõe ao pensamento coletivista leva a uma valoração coletivista, o
verdadeiro sentido de “comunidade”, torna-se evidente que padrão de medida passa a ser a utilidade social, ficando de
todo sociologismo se baseia, no fundo, num pensamento fora a dignidade pessoal” (Frankl, 1978, p.223).
coletivista. Digamos, de passagem, que nos casos em que o
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10“Desde Kant o pensamento europeu soube pronunciar-se pessoas que trabalham foram em grande parte
com clareza pela autêntica dignidade do homem: o próprio transformadas em simples meios, degradadas a meios da vida
Kant disse, na segunda formulação do seu imperativo econômica. O trabalho não era mais meio para um fim, para
categórico, que cada coisa tem o seu valor, o homem, porém, a vida – um meio de vida, mas antes o homem e sua vida, sua
tem dignidade – o homem não deve jamais tornar-se meio energia vital, sua força de trabalho eram meios para um fim”
para um fim. Mas já na ordem econômica da última década as (Frankl, 1990, p. 63).
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11Bom conhecedor da teoria marxista, Frankl foi filiado ao sociologismo (Frankl, 1990, p. 116). Na época, suas longas
Partido Socialista em sua juventude e, em 1924, chegou a ser conversas com os colegas, além de discutir a questão Freud e
presidente da união dos estudantes socialistas da Áustria, Adler, também buscavam debater as alternativas entre Marx
confessando que chegara a flertar com a tentação do e Lenin.
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12 Ainda que existam possibilidades de valor que prescindam Com efeito, assim como o caráter único e peculiar só confere
da orientação à comunidade, tal como se depreende dos valor ao pequeno fragmento do mosaico em relação ao todo
valores vivenciais: “Nomeadamente, sempre que se trata do respectivo, assim também o sentido do “caráter de algo
que nós classificamos como valores vivenciais, nenhuma muito único” de qualquer personalidade humana reside
validade pode reclamar o padrão do útil para a comunidade” exclusivamente no que ela significa em ordem a um todo
(Frankl, 2003, p. 136). superior. Desta maneira, o sentido da existência pessoal,
13 “Quando mais um homem é diferenciado, tanto menos enquanto pessoal, o sentido da pessoa humana enquanto
corresponde à norma – quer no sentido de média, quer no de personalidade, está numa referência que lhe ultrapassa os
ideal; mas é pelo preço desta normalidade ou idealidade que limites, apontando para a comunidade; na sua orientação
adquire a sua individualidade. No entanto, o significado desta para a comunidade, transcende-se a si mesmo o sentido do
individualidade é sempre orientado e referido à comunidade. indivíduo” (Frankl, 2003, pp. 114-115, grifos nossos)
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BIBLIOGRAFIA
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Frankl, V. E (1990). A questão do sentido em psicoterapia. Campinas: Papirus.
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SOBRE O AUTOR
Ivo Studart Pereira: Possui graduação em Psicologia (2007), mestrado (2009) e doutorado (2017) em Filosofia
pela Universidade Federal do Ceará. É tradutor e pesquisador da obra do psiquiatra e filósofo austríaco Viktor
Emil Frankl. Atualmente, trabalha como psicólogo no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Ceará (IFCE), além de ser membro efetivo do Conselho Científico da Associação Brasileira de Logoterapia e
Análise Existencial (Gestão 2017-2018).
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