As Principais Concepções de Direitos Humanos em Disputa Na Sociedade Contemporânea

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Livro: Direitos Humanos e concepções contemporâneas

Capítulo fichado: As principais concepções de Direitos Humanos em disputa na


sociedade contemporânea

O autor começa o capítulo mostrando a busca pela efetivação dos direitos


humanos envolve interesse de classes sociais, que são distintos e diversos, levando a
uma luta social e conflito entre distintos sujeitos sociais, perspectivas políticas e
ideológicas, e inclusive por ações de poderes instituídos, que garantem esses direitos.
Assim este conceito possui várias dimensões, como a positivação, demanda por novos
direitos, interpretações distintas, particularidades sócio-históricas, e todas elas reúnem
potencialidades e limites, e devem ser apreciadas a luz de suas contradições.

Esta concepção tem duas matrizes, a base teológica e a laica, da ordem da defesa
do direito natural como algo próprio da esfera da razão. Ambas vão no sentido do
direito inerente ao homem, que todos nascem iguais perante a lei, e que haveria os
direitos naturais; tese essa apropriada pelos liberais, sendo consensual no debate sobre
os direitos humanos a preponderância destinada a direitos civis e políticos,
especialmente o que denominam direito à propriedade privada. Quando pensamos
direitos humanos, logo nos remetemos as reivindicações liberais, latente principalmente
na revolução francesa, e a força desta concepção sobrevive até os dias de hoje como o
cerne deste conceito, que foi alimentado por uma crítica da burguesia para o então
sistema vigente, o feudal, e “não se tratava de críticas morais: as formas como se
organizavam a vida, como transitavam mercadorias e dinheiro, como
determinados sujeito tinha acesso a privilégios não concedidos aos demais, como
era limitado o ir e vir das pessoas pelos territórios então já conhecidos, como se
mantinham o poder político nas mãos de algumas partes minoritárias da
sociedade, dentre outros fenômenos, eram o que dava substância a tal crítica.”
(posição no e book: 3936)

Assim tratava-se da vida concreta e real, um aspecto bastante materialista, como


a garantia de melhor meio de vida, acumulo de bens e riquezas, acesso a serviços e a
trabalhadores; o direito de ir e vir, por exemplo, tinha razões concretas, pois era preciso
ter trabalhadores a disposição para circular mais mercadorias e bens produzidos,
garantir sua venda e a obtenção de mais capital; de igualdade era o questionamento dos
privilégios feudais, e a carga horaria maçante de trabalho; assim, foi um processo
revolucionário, que buscava criar uma nova forma de sociabilidade que ultrapassaria o
território francês, e essa ideia interessava outros setores para além da burguesia,
especialmente os trabalhadores e camponeses, que só produziam riqueza sem vê-la
chegar até eles; por isso esses setores mais oprimidos, agarraram a causa, e não
abandonaram as suas bandeiras, querendo que todos os direitos anunciados fossem
efetivos, não só na lei, mas na vida concreta. Foi quando a burguesia teve que dar um a
esse processo, onde a Revolução já não seria mais de todos, passando de classe
revolucionaria para classe conservadora. Assim o que houve posteriormente foi um
discurso ideológico que justificava a ascensão de uma nova classe ao poder.

Contudo a estratégia burguesa de defensora dos direitos universais, não estava


imune às contradições de cada momento conjuntural, pois carregava em si própria,
elementos que seriam apropriados para argumentos de sua negação; os “injustiçados da
revolução”, que formavam um movimento de caráter popular, da então citada revolução,
e heterogêneo, formado por principalmente artesão, pequenos lojistas e profissionais da
classe médias e trabalhadores assalariados, sendo unificados pelo ódio comum a
nobreza e à burguesia rica, que não deixariam nada a esses segmentos. Do ponto de
vista teóricos que era mobilizado na Alemanha de então, Karl Marx ao debater com
Bruno Bauer sobre as concepções dos judeus na Alemanha, apresenta suas criticas a
perspectiva liberais, criticando a concepção de homem egoísta, burguês, que se expressa
mais inteiramente na sociedade civil, reino da vida empírica e privada (Netto, 2006, p.
10), e de cidadão como abstrato e dotado de moralidades, o teórico nega ambas em
nome do ser genérico que existe na relação social com outros seres, e portanto, acima do
individualismo reinante na sociedade burguesa; com isso, não há em Marx, uma
negativa dos direitos humanos, mas sim um critica a esse “humano”: “Esse homem, o
membro da sociedade civil, é agora a base, o pressuposto, do Estado político. É por ele
reconhecido como tal nos direitos do homem” (Marx, 2009, p.33 apud, RUIZ, 2015).

Já que elaboramos lá trás, o que o autor apresenta a uma crítica a liberdade e o


acumulo de bens, que serviria para ter mais trabalhadores livres e mais acumulo de
capital e propriedades, há a critica a segurança, elaborada por Marx, que presume que a
segurança e o conceito de polícia, tem para a sociedade a garantia de conservação de sua
pessoa, de seus direitos e de sua propriedade, com isso, a sociedade não se eleva a cima
de seu egoísmo, a segurança garante o asseguramento de seu egoísmo. Assim Marx
apresenta os aspectos contraditórios dos Direitos Humanos, afirmando além do já
demonstrado, que enquanto a segurança é declarada um direito do homem, a violação
do segredo da correspondência é publicamente posta na ordem do dia (e podemos fazer
um paralelo com hoje, onde nossas informações são induzidas a serem postas, e usada
para publicidades e indução a compra); a liberdade indefinida da imprensa, é aniquilada
quando ela compromete a liberdade pública, ou o poder do Estado. Portanto o direito a
liberdade deixa de ser um direito quando entra em conflito com a vida política.

Outro autor apresentado que contribui com o debate posto até aqui, é Trindade
(2002) que apresenta críticas aos documentos de 1789 e 1791, citando José Afonso da
Silva (1985, apud Trindade, ibid, p.55, apud, RUIZ, 2015) diz que o individuo da
Declaração de 1789 era abstraído, e alheio aos grupos sociais, às relações familiares e à
vida econômica, e desvinculado da realidade; e que a pretensão dos redatores de
reconhecer a igualdade como “de direito” e não como “de recurso”, abriu um debate
sobre a noção de igualdade, posteriormente levada no sentido socialista, radical, pelo
movimento operário. Trindade também cita os silêncios da Declaração, como o sufrágio
universal, a igualdade entre os sexos (o homem da declaração era realmente só o gênero
masculino), a não crítica ao colonialismo francês e europeu, a escravidão foi vituperada,
os direitos trabalhistas foram esquecidos, podendo dizer nas palavras do autor que “tão
importante quanto as ideias que a Declaração contém são as ideias que ela não contém”.
E o autor demonstra que para quem vê a história em retrospectiva (termo
constantemente usado por Eric Hobsbawn), não era de se esperar que os legisladores
burgueses, mesmo bebendo de fontes filosóficas iluministas, não iriam pavimentar uma
estrada jurídica que apontasse para uma futura, e real igualdade social, sendo ela a moda
da democracia ateniense, não visando responder as demandas de toda a população
francesa. Outro teórico que apresenta considerações sobre a Declaração de 1789 é
Noberto Bobbio (2004), onde ele diz que a Declaração conserva um eco do porque que
os homens, de fato, não nascem nem livres e nem iguais, só o eram em sua natureza,
porem essas ideias não são um dado de fato, mas sim uma utopia; não são uma
existência, mas um valor; não são um ser, mas um dever ser.

A perspectiva marxista abriu um campo de interpretações sobre as relações


sociais, e junto a ela os Direitos humanos; tantos outros intelectuais, sejam eles
marxistas ou não, de diferentes áreas do conhecimento, concordam que para alcançar a
potencialidade humanas se deve negar a ordem capitalista, como diz Wilde (2003), seja
comunismo, socialismo ou qualquer outro nome que se de, transformar a propriedade
privada em bem públicos, substituir a competição pela cooperação, ha de restituir a
sociedade sua condição própria de organismo sadio, e de bem estar material,
devolvendo a vida e sua base natural; pois a propriedade privada, continua o autor,
prejudicou o individualismo, confundindo o que o individuo é, para o que ele possui,
colocando em foco o lucro em cima do aperfeiçoamento, o ter sobre o ser, a verdadeira
perfeição dohomem não reside no que ele tem, e sim o que ele é, com isso a
propriedade privada esmagou o verdadeiro individualismo e criou um individualismo
falso. “Mas o que resta registrar nesta seção é que o acumulo de lutas contra as
contradições do discurso liberal e a realidade existente na sociedade capitalista, à
luz dos questionamentos marxianos e marxistas, foi fazendo surgir uma concepção
alternativa à liberal no que diz respeito aos direitos humanos” (Posição do ebook
4121)

Foi nesta onda teórica que a revolução mexicana e a russa de 1917, previram em
suas constituições conceitos de seguridade social; e em 1966 o bloco dos países
socialista, em um evento em Nova York , defenderam que não deveria haver distinções
entre a qualidade, a quantidade, a previsão, a garantia e a implementação de direitos,
mesmo que não fosse possível no contexto um pacto internacional, mas a força do bloco
desses países e seus aliados não passou em branco, como por exemplo, o Pacto
Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, nos artigos 6° e 7°,
reconhece como campo dos Direitos Humanos as condições de trabalhos e salários mais
justos, fruto das lutas de trabalhadores que viam seus direito reconhecidos como
Direitos Humanos, mesmo que alguns não existam na realidade, porem esses
reconhecimentos alimentam, incentiva e legitimam as lutas dos trabalhadores em busca
de melhore condições e vida digna.

O sistema vigente, que foi consolidado principalmente depois da Guerra Fria, o


liberalismo lutava por reconhecer uma hierarquia a supremacia dos direitos civis e
políticos, elaborando uma antítese aos direitos econômicos, sociais e culturais, onde se
trava uma síntese posterior, paralisando o debate que foi elaborado em uma conjuntura
distante e completamente diferente, deixando de perceber que a história evolui,
principalmente pelos movimentos e lutas dos sujeitos(as) trabalhadores; e negando
também o acerto apontado pela Resolução da Conferência de Viena, em 1993, onde
estabelece os direitos dos seres sociais são indivisíveis, inter-relacionados,
interdependentes. O que o autor defende certeiramente, é que para acessar condições de
vida, ou construir uma “verdadeira democracia” nem que pelos modos burguês, no
século XXI implica articular diversos direitos, como por exemplo, o direito ao voto, que
no Brasil é obrigatório, implica em ter acesso ao direito a educação e informação, para
conseguir ter a percepção dos funcionamentos do sistema políticos, e assim conhecer de
fato as convicções do candidato que ira escolher nas urnas, o que é algo que não se
consolida, pois além da escolha pessoal se da muitas vezes por uma “fama” que o
candidato carrega, ou acaba sendo uma escolha aleatória (pegando o primeiro santinho
que acha na rua), e muitas vezes, depois da eleição, nem se lembra mais que candidato
votou; tem vários deste tipo de exemplo no mesmo sentido, como o direito a educação
implicando em politicas publicas para a qualidade desta educação, que requer
qualidades e direitos trabalhistas aos professores; ou seja, todo direito reivindicado,
desencadeia uma gama de “sub direitos”, para que essa reivindicação seja efetivada.

Esta concepção do conceito aqui trabalhado, tem esta denominação que é


provavelmente referida a um evento tido como um marco histórico no debate sobre os
Direitos Humanos, na Conferencia Mundial de Direitos Humanos realizada em Viena
em 1993, onde foi aprovado que os Direitos Humanos são considerados universais,
indivisíveis, interdependentes e inter-relacionado, contrapondo as concepções liberais e
socialistas, onde algumas modalidades do direito se sobrepõe a outra. O termo
contemporâneo pode estar ultrapassado, já que acontecimentos no final do século, e as
intervenções que distintos sujeitos fazem sobre o termo, e vemos que esse debate na
capital austríaca, vinha se construindo desde Nova York, em 1966. “Um dos limites
desta concepção também está relacionado ao contexto da Guerra Fria. Ao fazer
avançar as concepções liberal e socialista de direitos humanos então em disputa
aberta na seara dos debates sobre o tema, as resoluções de Viena não conseguiram,
contudo, apontar uma superação que pudesse ser qualificada de dialética quanto
aos limites anteriores” (Posição 4234)

O autor salienta que uma conferencia que decide aspectos da sociabilidade, e


tratamento dos sujeitos que compõe nações que tem particularidades, não pretende
elaborar detalhadamente o que entendem por cada direito, pois trate de um processo de
negociação em busca de uma cooperação internacional, e vale lembrar, que houve
avanços muito influenciado pelas duas grandes guerras mundiais. Porém nem tudo deixa
de ser expresso no documento. O autor nos apresenta alguns exemplos para demonstrar
os limites, primeiro com o fenômeno da pobreza no mundo, no parágrafo 14 diz: “A
existência de situações de pobreza inibe o pleno e efetivo exercício dos direitos
humanos; a comunidade internacional deve continuar atribuindo alta prioridade a
medidas destinadas a aliviar e finalmente eliminar situações dessa natureza”
(Mazzuoli [org.], 2005, p. 531; apud. Ruiz, 2015). O texto fala por si só, que a única
preocupação da comunidade internacional é com situações de extrema pobreza, o que
não abarca os problemas da pobreza em si, somente a situação extrema.

Outro exemplo, saúda os países em desenvolvimento que tomaram medidas para


superar seus problemas, contudo, essa saudação se dá a um determinado leque de
medidas, que já nos anos 90 eram tidos como neoliberais, vejamos o trecho: “A
Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reafirma que os países menos
desenvolvidos que optaram pelo processo de democratização e reformas
econômicas, muitos dos quais situam-se na África, devem ter o apoio da
comunidade internacional em sua transição para a democracia e para o
desenvolvimento econômico.” (Mazzuoli [org.], 2005, p. 530; apud Ruiz, 2015), e
posteriormente não se fala em abdicar de dividas externas, somente em aliviar. Dividas
externas essas que foi proporcionada por um colonialismo e neo colonialismo europeu,
que bagunçou as estruturas de territórios estabelecidos em nome de uma civilidade.

Outro aspecto do pacto, se dá em elaborações conflitantes com a perspectivas de


países como os Estados Unidos, chocando principalmente com o cerco econômico a
Cuba, as posturas imperialistas dos EUA em relação ao Iraque, Afeganistão, Porto Rico
e entre outros, vejamos o trecho: “Considerando as importantes mudanças em curso
no cenário internacional e as aspirações de todos os povos por uma ordem
internacional baseada nos princípios consagrados na Carta das Nações Unidas,
incluindo a promoção e o encorajamento do respeito pelos direitos humanos e
pelas liberdades fundamentais de todas as pessoas e o respeito pelo princípio dos
direitos iguais e da autodeterminação dos povos em condições de paz, democracia,
justiça, igualdade, Estados de Direito, pluralismo, desenvolvimento, melhores
padrões de vida e solidariedade.” (Ibid., p. 525-526, grifo nosso). É fato que os
aspectos que dão origem ao conceito de Direitos Humanos permanecem presentes no
documento, expressando ao mesmo tempo uma disputa existente na Assembleia, que da
origem a Declaração e o Programa de Ação de Viena, fazendo conflito como o sistema
hegemônico de produção, que não efetiva direitos em perspectiva universal,
interdependentes, indivisíveis e inter-relacionadas.
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