Gestão de Resíduos Sólidos Na Indústria de Beneficiamento de Arroz
Gestão de Resíduos Sólidos Na Indústria de Beneficiamento de Arroz
Gestão de Resíduos Sólidos Na Indústria de Beneficiamento de Arroz
Ana Paula Fleig Saidelles, Ana Júlia Teixeira Senna, Rosane Kirchner, Gabriele Bitencourt
Resumo: Atualmente, a dimensão ambiental está adquirindo, cada vez mais, importância nas
ações das organizações e da sociedade. Hoje, os produtos são freqüentemente idealizados,
produzidos, comercializados e consumidos levando em conta os impactos gerados em cada
processo da cadeia produtiva orizícola. Uma grande preocupação deste setor é com os resíduos
sólidos gerados na indústria de beneficiamento do arroz. Por isso, este trabalho tem como
objetivo identificar os resíduos sólidos oriundos de uma agroindústria beneficiadora de arroz e
propor melhorias para a sua destinação. Essa pesquisa foi realizada em uma agroindústria
beneficiadora de arroz, localizada no município de São Sepé/RS, no período entre os meses de
abril a junho de 2010. O mapeamento adotado segue uma observação estruturada. Foram
identificados no mapeamento vinte e um tipos de resíduos resultantes do processo, sendo os que
foram observados em maior quantidade a cinza e a casca de arroz. O diagnóstico realizado
permite a empresa conhecer melhor o seu funcionamento, propor melhorias e fazer uma revisão
periódica dos resíduos sólidos gerados no processo produtivo. Por fim, se propôs estratégias para
o redirecionamento dos resíduos minimizando problemas ambientais.
1. INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, as organizações estão buscando minimizar os impactos ambientais
causados pelo homem utilizando estratégias ambientais sustentáveis como forma de
diferenciação e agregação de valor (Dias, 2009; Senna & Lhamby, 2010). Com a escassez das
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Os resíduos são produzidos e, quando não são bem destinados, podem levar a destruição de
paisagem, fauna e flora. Uma das formas de minimizar os impactos é a preservação dos recursos
naturais ou a reutilização de resíduos.
O resíduo industrial, depois de gerado, necessita de destino adequado, pois, além de criar
potenciais problemas ambientais, os resíduos representam perdas de matérias primas e energia,
exigindo investimentos significativos em tratamentos para controlar a poluição. A indústria de
alimentos produz vários resíduos de alto valor de (re)utilização (Pelizer et al., 2007).
No processo produtivo das indústrias existe uma grande diversidade de resíduos formados que
podem poluir o solo, a água e o ar. Sendo assim, é importante observar o tipo de resíduo gerado
pela indústria e qual seu poder impactante ao meio ambiente (Ferreira, 2010).
Muitas indústrias associaram as questões ambientais aos seus processos produtivos, através
dos denominados Sistemas de Gestão Ambiental (SGA) (Silva & Amaral, 2004). O sucesso do SGA
de uma indústria depende da relação entre os aspectos ambientais ligados aos processos de
produção, aos produtos e aos serviços (Nicolella et al., 2004).
O SGA deve ser implantado de forma integrada ao gerenciamento global de uma organização
pública ou privada. A ação do SGA não deve ocorrer de forma isolada do gerenciamento da
empresa. O meio ambiente não deve ficar restrito a uma sala, departamento ou conjunto de
pessoas que atuam de forma isolada na empresa, mas permear toda a organização. Isto evidencia
a importância estratégica que a dimensão ambiental está assumindo nas organizações
(Albuquerque, 2010).
Nas empresas, a gestão dos resíduos, é considerada uma atividade complexa que contempla
desde o mapeamento dos resíduos gerados até a verificação da viabilidade técnica e econômica
de prevenir e minimizar a geração de cada resíduo, segregá-lo, classificá-lo, identificá-lo e
armazená-lo de forma adequada até o transporte e a destinação final (Andrade & Chiuvite, 2004).
Uma das primeiras etapas é o mapeamento da geração de resíduos, que deve ser realizado no
formato de tabelas, identificando e caracterizando os resíduos gerados em cada setor e sua
destinação de forma generalizada (Andrade & Chiuvite, 2004).
Em particular, a indústria de alimentos produz uma série de resíduos com potencial valor de
reutilização. O setor orizícola destaca-se entre os setores que tem demonstrado preocupação com
o meio ambiente e têm adotado medidas visando a redução dos impactos ambientais decorrentes
das externalidades do sistema produtivo.
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No Brasil, segundo Vieira & Carvalho (1999), o arroz é consumido, principalmente, na forma de
grãos inteiros, como produto de mesa, sendo mais conhecidos três tipos de produtos: o arroz
integral (descascado), o arroz branco (polido) e o arroz parboilizado, os quais são oriundos do
arroz em casca e obtidos por diferentes processos de pós-colheita que geram mudanças físicas,
químicas e estruturais nos grãos.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Neste trabalho adotou-se a observação estruturada que, segundo Malhotra (2001), é uma
técnica de observação em que o pesquisador define claramente os comportamentos a serem
observados e os métodos pelos quais serão avaliados. No caso desta pesquisa, realizaram-se as
observações no período compreendido entre os meses de abril a junho de 2010. Neste período,
procedeu-se a identificação dos resíduos gerados na indústria de processamento de arroz.
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Setor de
Latas de tinta ½ tonel ao mês Alumínio
pintura Diário Sólido
Todos os
Resíduo orgânico 40 m³ Compostos orgânicos
setores Diário Sólido
Plástico, metal não ferroso
(chumbo, cádmio, berílio,
Todos os
2 m³ mercúrio), vidro, borracha,
setores
Tecnológico placas eletrônicas (ouro,
Anual Sólido
platina, prata, paládio
Fonte: Dados coletados, 2010.
A seguir, será descrita a seqüência das etapas compreendidas desde a recepção da carga (do
arroz úmido com casca) na indústria até a expedição do produto final beneficiado (Figura 1).
30 Etapa. Recepção na moega: Após a pesagem e a análise dos grãos, a carga será descarregada
em “moegas de recepção”. Através de ”elevadores de caneca” o produto será transportado para
as caixas reguladoras de fluxo, para a pré-limpeza e silo pulmão (local de armazenamento
temporário dos grãos).
40 Etapa. Pré-limpeza: Após os grãos passam para pré-limpeza que tem como objetivo retirar as
impurezas através de equipamentos como peneiras e ventiladores e preparar os grãos para a
secagem. Após a pré-limpeza os grãos são depositados nos “silos pulmão”. O principal resíduo
identificado nesta parte do processo foi poeira.
60 Etapa. Limpeza: Para complementar a retirada de poeira e outros produtos leves o grão
passa por um “flutuador” (equipamento que completa a retirada de poeira). Na seqüência passa
pela máquina de “trieur” para separação dos grãos quebrados.
A separação dos “marinheiros”, que retornam para o descascador quantas vezes forem
necessárias até a perda da casca, será realizada em equipamentos baseados na diferença de
densidade, já que a densidade dos grãos aumentam após ser descascado. Encerrando o processo
de descascamento, obtêm-se o grão esbramado que pode ser comercializado na forma de arroz
integral ou ser submetido ao processo de brunimento e polimento. Os resíduos considerados
nesta parte do processo foram às cascas.
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90 Etapa. Seleção: Após o brunimento, o arroz passa pelo processo de seleção, que consiste na
separação de fragmentos e de grãos com defeitos melhorando a qualidade do produto e,
conseqüentemente, elevando o preço na comercialização. Nesse processo serão removidos as
matérias estranhas ou fragmentos que não foram retirados na limpeza, através de peneiras e
“trieurs”. Nesta seleção será classificado o arroz de acordo com o grupo, subgrupos, classes e
tipos.
Brunidores Farelo
Recepção Fornalha Cinza
Polimento
Pesagem Armazenamento em
silos metálicos
Amostragem Seleção
Beneficiamento
Selecionadora
Análise Impurezas eletrônica
Máquina de limpeza
convencional de ar a
Descarregamento peneiras
Classificação em
em moegas grupo, subgrupo,
classe e tipos
Flutuadores
Caixa reguladora
do fluxo
Embalagem
Trieur
Pré-limpeza Poeira
Empacotamento Plástico/
Peneira e enfardamento arroz
cilíndrica
Máquinas de ar e
peneiras planas
Empilhamento
Separador de de fardos
pedra e metal
Casca/
Secagem primária grãos de
Expedição
arroz
Descascadores Casca
Secador
intermitente
Máquina
densimétrica
A seguir, será apresentada a destinação dos resíduos gerados pela agroindústria de arroz
estudada:
d) Estopas com óleo lubrificante: são armazenadas em lixeiras. A empresa contrata uma
prestadora de serviços que dá a destinação final do resíduo corretamente.
e) Graxas: são armazenadas em tonel. A empresa contrata uma prestadora de serviços que
dá a destinação final do resíduo corretamente.
h) Fios elétricos: são armazenados em caixas de papelão. A empresa contrata uma prestadora
de serviços para a destinação final do resíduo corretamente.
m) Madeira: o que pode ser reaproveitado a empresa utiliza no setor de marcenaria, já o que
não pode mais ser reutilizado é depositado no pátio da empresa para posteriormente ser
encaminhado a uma empresa prestadora de serviços que será responsável pela destinação
final do resíduo corretamente.
p) Pilhas: são armazenadas em garrafas pet. A empresa contrata uma prestadora de serviços
que realiza a destinação final do resíduo corretamente.
Uma agroindústria que beneficia alimentos produz uma série de resíduos, alguns altamente
impactantes, com alto valor de reutilização, que podem ser utilizados na manufatura de outros
produtos e, também, como insumo no processo produtivo, possibilitando a logística reversa. Isto
possibilita uma minimização dos impactos ambientais causados no ambiente e, também, uma
maior eficiência econômica da empresa.
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Segundo Della et al. (2005), para cada tonelada de arroz em casca, 23% correspondem a casca,
e 4% correspondem a cinzas. Isso evidencia o problema ambiental causado pelo excesso da casca
de arroz que precisa ser destinada.
Alguns autores reutilizam esse resíduo obtendo filme polimérico (Ferreira, 2005) que são
utilizados em aparelhos ópticos e semicondutores como componentes ativos na proteção de
cobertura e na produção de bioinseticida a base de Bacillus thuringiensis (Pelizer, 1997).
Com a combustão da casca do arroz nas fornalhas para geração de energia tem-se a cinza como
principal resíduo. A maior parte deste resíduo gerado pela agroindústria é reutilizado nas lavouras
como adubo. Segundo Dias (2011) este resíduo não deve ser descartado diretamente no meio am-
biente.
Para alguns autores, a cinza pode ser utilizada na indústria cerâmica principalmente como
matéria prima na fabricação de vidros, refratários, tubos cerâmicos, isolantes térmicos, abrasivos
e na construção civil como componente em cimentos, concretos e argamassas (Della et al., 2006) e
também como fonte de nutrientes para a produção de aveia em solos arenosos (Silva, 2005).
Quadro 1. Síntese dos resíduos sólidos gerados na indústria debeneficiamento de arroz, destino e
proposição de alternativa de destinação sugerida pela literatura
Resíduo Destino dado pela indústria de Proposição de alternativa de
beneficiamento de arroz estudada destinação sugerida pela
literatura
Casca de arroz fornalha; produtores e empresas de energia elétrica; compostagem
avicultura
Cinza adubo Indústria cerâmica; Construção
civil;
Embalagem de produtos prestadora de serviços
químicos
Estopa com óleo lubrificante prestadora de serviços
Graxa prestadora de serviços
Filtro de óleo prestadora de serviços
Fios elétricos prestadora de serviços
Impurezas Retornam ao beneficiamento
Lâmpadas fluorescentes prestadora de serviços
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4. CONCLUSÕES
A reutilização dos resíduos possibilita uma redução do impacto ambiental causado e também
uma economia decorrente da redução dos custos de produção.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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