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POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA: UM ESTUDO SOBRE SUA


EFETIVAÇÃO NAS CINCO REGIÕES BRASILEIRAS1
BRAZILIAN POLICY FOR INCLUSIVE EDUCATION: ANALYSIS OF ITS IMPLEMENTATION IN THE
FIVE BRAZILIAN REGIONS

Cristina Cerezuela2
Nerli Nonato Ribeiro Mori3

Resumo: O presente texto tem como objeto de estudo a efetivação da política nacional da educação inclusiva.
Os dados apresentados são resultados de duas etapas de pesquisa: a primeira, refere-se à aplicação de um
questionário a 889 docentes da educação básica das 27 unidades federativas do Brasil; e, a segunda,
compreende um estudo de campo com observação direta das atividades e entrevista semiestruturada com
educadores de quinze escolas das cinco regiões brasileiras, desenvolvido por Dambros (2013), Fellini (2013),
Garcia (2015), Hessmann (2013) e Rodriguero (2013). O estudo discorre sobre a história da educação
especial dos primórdios da exclusão social aos movimentos internacionais que culminaram na reestruturação
política nacional. Apresenta a proposta de estrutura e funcionamento das salas de recursos multifuncionais
(SRM); e, com base nos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural, defende uma prática didática
metodológica com possibilidades de humanização do indivíduo, pela apropriação dos bens culturais
produzidos pelo homem. Por fim, analisa os pontos convergentes e divergentes do cenário inclusivo, nas
regiões brasileiras. Conclui que o processo da inclusão educacional está em desenvolvimento, que seus
avanços são consideráveis, mas ainda há um caminho longo a ser percorrido diante das condições objetivas de
sua efetivação, demandando um investimento político, social e econômico. A afinação do discurso com a
prática social depende da compreensão política e ética e do discernimento sobre o que compete a cada setor
da sociedade. É preciso incluir para além dos discursos inclusivos.
Palavras-chave: Educação Básica. Políticas de Educação Inclusiva. Teoria Histórico-Cultural. Atendimento
Educacional Especializado (AEE).

Abstract: The implementation of Brazilian policy on inclusive education is provided in current qualitative
research partaking of the project ‘Basic Education and Inclusion in Brazil’ prepared by the Education
Observatory of the Coordination for the Upgrading of Higher Education Personnel (CAPES). Data are the
result of two research stages. The first refers to the application of the questionnaire to 889 primary school
teacher in the 27 federal states of Brazil; the second comprises a field study with direct observation of
activities plus a half-structured interview with educators from 15 schools in the five Brazilian regions,
following Dambros (2013), Fellini (2013), Garcia (2015), Hessmann (2013) and Rodriguero (2013). Current
discussion comprises the history of special education, ranging from the start of social exclusion to
international movements and the Brazilian political restructuration. The essay presents the structure and
functioning of multifunctional resource class rooms. Foregrounded on the Historical and Cultural Theory, it
defends a didactic and methodological practice with the humanization of the subject concerned through the
appropriation of cultural goods produced. The convergent and divergent factors of the inclusion scenario in
the five Brazilian regions are analyzed. Results show that the process of educational inclusion is still being
developed, with considerable progress, even though a long trajectory still lies ahead for its full
implementation, requiring political, social and economic investments. Fine-tuning of the discourse with social
practice depends on political, ethical and discernment understanding on what each sector of society should
do. It´s better to include beyond inclusive discourses
Keywords: Basic education. Policy of inclusive education. Historical and cultural theory. Specialized
Educational Care.

1
Esta pesquisa faz parte do projeto ‘Educação básica e inclusão no Brasil’, coordenado pelasegunda autora e financiado pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES)/Observatório da Educação.
2
Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Professora da Educação Básica do Estado do Paraná
na modalidade Educação Especial. [email protected].
3
Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (USP). Professora Titular do
Departamento de Teoria e Prática da Educação e do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Estadual de
Maringá (UEM). [email protected].

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36 Política nacional de educação inclusiva: um estudo sobre sua efetivação nas cinco regiões brasileiras

INTRODUÇÃO paradigmas que ganharam tônus nas últimas


décadas do século XX. O sistema educacional
Como está se efetivando a política nacional brasileiro, desde sua gênese aos dias atuais,
de educação inclusiva no Brasil? Eis um configura-se em um espaço mantenedor das
questionamento que preocupa, de modo geral, à diferenças e desigualdades sociais, atendendo às
sociedade contemporânea, em especial, aos demandas da sociedade. Para Mészáros (2008), os
educadores; tanto aos profissionais que atuam na processos educacionais estão estreitamente
escola, e se ocupam com a prática da proposta ligados aos processos sociais. O Brasil, desde sua
quanto aos pesquisadores em educação, os quais colonização de exploração escravagista, responde
se debruçam sobre os pressupostos teóricos e à lógica do capital. A exigência de produção,
filosóficos da política educacional. consumo e lucro impera na determinação das
A importância de se discutir essa questão relações sociais e refletem nas dinâmicas
está relacionada à trajetória pela qual a educação escolares como uma forma de (re)produção das
inclusiva passou para se chegar à estrutura em que configurações dessa sociedade.
se encontra atualmente. A inclusão social e, por As diversas posturas sociais sobre as
decorrência, a inclusão educacional, é produto de diferenças dos indivíduos são classificadas em
debates sociais e luta pelo direto de igualdade quatro fases: exclusão, segregação, integração e
negado historicamente pela sociedade que é inclusão. A fase da exclusão predomina o
formada por classes antagônicas. Essa formação, extermínio e o abandono daqueles que não são
fundamentada na exploração do trabalho humano, considerados normais, quer de ordem física,
produz as desigualdades sociais e, por sensorial ou mental. Neste período, prevaleciam
decorrência, produz a exclusão material e a as explicações mitológicas e sagradas. Para
desigualdade de oportunidades. Mazzotta (2003), a ignorância das potencialidades
No contexto educacional atual, o tema está do desenvolvimento humano leva ao paradigma
em evidência porque, ao considerarmos que a de invalidez como imutável e, para além de não
escola forma o homem para cada época, ser útil, a pessoa denominada incapacitada é
discutimos como a inclusão repercute nas práticas considerada como um empecilho para as
pedagógicas e na dinâmica do contexto escolar atividades de sobrevivência e de desenvolvimento
que é modificada com as políticas inclusivas. da sociedade da época.
A fase da segregação é marcada pelo início
A TRAJETÓRIA HISTÓRICA E POLÍTICA do desenvolvimento das pesquisas na área médica
DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA a partir do século XIX. O avanço da ciência sobre
o assunto muda o pensamento exclusivo dando
Incluir é a palavra de ordem na atualidade. lugar à institucionalização segregadora. Com o
A educação inclusiva tem por objetivo atender aos argumento de proteger a pessoa com deficiência
alunos, em principal, aqueles que se encontram à da sociedade e vice-versa, são abertas inúmeras
margem do conhecimento, por sua diferença. Na casas assistenciais distantes dos povoados para
última década do século XX, as regras legislativas seus atendimentos, limitando-os ainda, ao estigma
brasileiras constitucionais e infraconstitucionais, de incapazes de viver em sociedade.
inspiradas em movimentos e estudos Inicialmente, com ênfase apenas na
internacionais e nacionais, impulsionaram um incapacidade de aprendizagem e convivência
processo de profundas transformações social dessas pessoas, a ‘era das
conceituais, no que tange os direitos das pessoas institucionalizações’ apresenta ações para com os
com deficiência. cuidados básicos para à sobrevivência das pessoas
O conceito de igualdade deve ser analisado que são encaminhadas a esses espaços. Com os
por dois aspectos: o formal e o material. O avanços de conhecimento quanto às capacidades
primeiro compreende o direito legal adquirido, de aprendizagem, são registradas as primeiras
isto é, a formalização da lei. O segundo refere-se experiências de educar as pessoas com
ao que está sendo efetivado na realidade prática. deficiência, podendo, esse período, ser
A transformação dos sistemas educacionais em considerado o início da Educação Especial.
sistemas educacionais inclusivos tem sido reflexo Por aproximadamente oito séculos vigora a
dos avanços na discussão e no entendimento do fase da segregação. Avanços significativos no
direito à igualdade e à diferença. Mudanças de entendimento da capacidade de aprender e se

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desenvolver em sociedade e de forma produtiva objetivações da inclusão propõem programas que


dão espaço a uma nova fase, a da ‘integração’. visam à apropriação pelo educando do saber
Jannuzzi (2012) afirma que a integração tem acumulado pela humanidade; sua efetivação na
como princípio básico a ‘normalização’, isto é, prática é dificultada graças, entre outros fatores,
aceitar o outro como normal, oferecendo as pela precariedade do sistema político e
mesmas oportunidades e espaços dos demais. A educacional. A escola ainda está inacessível, tal
integração é caracterizada por três formas: a como a sociedade ainda é; e, as dimensões da
física, a social e a funcional. Entretanto, essa fase acessibilidade não são alcançadas em sua
não atinge seus propósitos, porque o educando, totalidade – arquitetônica, comunicacional,
apesar de ocupar o mesmo espaço, não pertence metodológica, instrumental, programática e
ao grupo. A integração pode ser considerada como atitudinal. Alguns estabelecimentos apresentam a
um grande avanço, mas ignora as possibilidades dimensão arquitetônica adequada para o acesso
concretas para sua efetivação. A ordem é a pessoa sem nenhuma restrição, mas falham na dimensão
adaptar-se às estruturas escolares e não o metodológica ou na comunicacional. De toda
contrário. O direito a ‘não segregação’ é um forma, não é possível vislumbrar uma escola que
progresso, mas limitar-se a esse argumento é uma seja acessível nas seis dimensões.
visão simplista. A tarefa histórica de transformar a
A integração não transforma sociedade excludente se caracteriza mais como
significativamente o quadro segregador, visto um discurso ideológico de base neoliberal, visto
pressupor que o indivíduo por determinação e que no argumento de ‘oportunidades iguais’, a
esforço pessoal se encaixe no sistema escolar. O sociedade perpetua de forma velada a realidade da
discurso da escola para todos disfarça a exclusão. Ao falhar na constituição do sujeito
estratificação social secular dos capazes e crítico e social, ela traz à tona as especificidades
incapazes, dos produtivos e improdutivos. Ao individuais como responsáveis por não alcançar o
permitir o ‘acesso’ das pessoas com deficiências pretendido. Ao refletirmos sobre qual trabalho
nos espaços ‘considerados de todos’, sem intelectual a inclusão demanda, nos deparamos
possibilitar os requisitos adequados para sua com o trabalho crítico no que se refere às práticas
permanência e desenvolvimento, enaltece o sociais e as políticas que o próprio sistema não
caráter segregador da sociedade capitalista. Dessa consegue realizar na história da educação
forma, camufla a ineficiência das obrigações brasileira.
políticas e sociais, culpabilizando o indivíduo em As normas estabelecidas pelo poder político
sua singularidade, por não conseguir se adequar a brasileiro retratam a influência dos fatos e valores
estruturação hegemônica. mobilizados em âmbito mundial. Os principais
Apesar de suas limitações, a fase da documentos que discutem o atendimento
integração foi um passo importante para a fase educacional especializado (AEE) das pessoas com
seguinte, a da inclusão. O quarto período histórico deficiência, TGD e AH/SD na sociedade, são: a
da trajetória educacional das pessoas com Resolução nº 2, de 11 de setembro de 2001; o
deficiências, transtornos globais do documento orientador Política Nacional da
desenvolvimento (TGD) e altas Educação Especial na Perspectiva da Educação
habilidades/superdotação (AH/SD) ainda está em Inclusiva, de 7 de janeiro de 2008 e sua
processo. A polêmica sobre o paradigma inclusivo consolidação por meio do decreto nº 6.571 de 17
está posta. Se por um lado a sociedade, não pode de setembro de 2008 e a Resolução nº 4 de 2 de
mais aceitar a ausência de atendimento de outubro de 2009. Documentos fundamentais para
qualidade na educação, por outro lado, o a transformação do entendimento da Educação
entendimento de que a inclusão superará as Especial na atualidade (BRASIL, 2001, 2008a,
mazelas que a história da Educação Especial e da 2008b, 2009).
Educação traz em seu bojo é uma visão redentora A Resolução nº 2 de 2001 institui as
de uma perspectiva que atende aos anseios da diretrizes nacionais para educação de alunos que
sociedade. De certa maneira, a história se repete apresentam necessidades educacionais especiais
com outra roupagem. Envoltos em um projeto de na educação básica, em suas etapas e
enfoque democrático, as políticas públicas modalidades. Os documentos, Política Nacional
inclusivas não progridem na prática para a de Educação Especial na Perspectiva da Educação
efetivação da democracia almejada. As Inclusiva, o Decreto nº 6.571 de 2008 e a

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38 Política nacional de educação inclusiva: um estudo sobre sua efetivação nas cinco regiões brasileiras

Resolução nº 4 de 2009 objetivam o acesso; a A EFETIVAÇÃO DAS POLÍTICAS


participação; e, a aprendizagem dos alunos com INCLUSIVAS NO BRASIL
deficiências, com TGD e com AH/SD nas escolas
regulares. Tanto a matrícula para os alunos quanto Os dados apresentados e analisados neste
a organização do AEE impactam a realidade estudo são resultados do trabalho do grupo de
concreta das escolas. O primeiro documento deu pesquisa Observatório da Educação (OBEDUC) e
como prazo de adequação entre sua publicação e originaram, além de outras produções científicas e
31 de dezembro daquele corrente ano, sendo participações em congressos, três dissertações de
obrigada a sua implementação a partir de 2002. mestrado, Dambros (2013), Fellini (2013) e
Desde então as escolas começariam a Hessmann (2013); e, três teses de doutorado
receber os alunos sem uma adequação em sua Cerezuela (2016), Garcia (2015) e Rodriguero
estrutura arquitetônica e, em principal, nos (2013).
aspectos pedagógicos. Todavia, o início da A pesquisa foi realizada em duas etapas, a
mudança deveria ser acionado. É ilusório esperar saber: na primeira, foi aplicado um questionário a
que as transformações nas bases organizativas e um grupo de 889 professores participantes de um
didáticas ocorressem neste curto espaço de tempo; Curso de Especialização em Atendimento
contudo, precisamos é urgente refletir sobre quais Educacional Especializado (AEE), ofertado na
condições materiais e humanas necessárias para a modalidade a distância pela Universidade Aberta
realização do processo inclusivo. do Brasil (UAB) e pela Universidade Estadual de
A educação como componente do Maringá (UEM); e, na segunda etapa, foi
macrossocial responde às demandas das relações realizado um estudo de campo com observação
que a sociedade produz. As contradições direta de atividades e entrevista semiestruturada
implícitas na consolidação das políticas inclusivas com professores das Salas de Recursos
exigem a observação sobre os interesses Multifuncionais (SRM) e gestores de escolas e
econômicos e sociais. Por um lado, a sociedade responsáveis pela educação da secretaria
pós-moderna apresenta uma crise e necessita municipal de educação especial de quinze
reorganizar-se economicamente, por outro lado, municípios, sendo três de cada uma das cinco
há indivíduos que foram excluídos da sociedade e regiões brasileiras.
lutam por seus direitos. É necessário ponderar a Em relação ao gênero dos educadores, os
quem a inclusão atende, isto é, o fenômeno e a dados revelam um expressivo percentual de
coisa velada. As políticas contemporâneas mulheres atuando como docentes. A
satisfazem os interesses de organismos predominância do sexo feminino no exercício do
internacionais, tais como: o Banco Mundial, a magistério (96% dos entrevistados), identificado
Organização para a Cooperação do por Dambros (2013), Fellini (2013), Garcia
Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a (2015), Hessmann (2013) e Rodriguero (2013)
Organização das Nações Unidas para a Educação, não retrata apenas um aspecto quantitativo; a
a Ciência e a Cultura (UNESCO). Na perspectiva profissão está associada ao universo feminino
neoliberal, o Estado transfere sua responsabilidade desde o início do século XIX, quando ocorre a
à sociedade. Ao fracassar na competência de oferta de formação gratuita para mulheres na
promover o bem social comum, em decorrência da escola normal. A relação desse diálogo com a
própria crise econômica mundial, surge a pesquisa se faz por dois motivos principais:
necessidade das privatizações e descentralizações. primeiro, por registrar um dado que corrobora
A esse respeito, a inclusão ocupa o status de com as análises sobre a estratificação profissional
reivindicações de direitos sociais enquanto que conforme o gênero e, segundo, analisar que essa
política e economicamente corroboram para a condição não se refere exclusivamente à docência
hegemonia dominante. Como política de Estado, o na área da educação especial.
AEE ocupa uma posição ideológica favorável para Quanto à formação dos educadores
equalizar as injustiças da sociedade capitalista, entrevistados, a pesquisa revela que 67% são
mas como se está efetivando na prática? pedagogos; 70% já apresentam pós-graduação,
predominando os cursos de especialização em
Educação Especial e Psicopedagogia. A Região
Sul, estudada por Garcia (2015), se destaca com

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81% dos professores entrevistados com essa básica e não pode ser visto somente como um
certificação. aluno da educação especial. Para evitar que a
Ao discutirmos sobre os números da aprendizagem seja responsabilidade apenas do
inclusão, identificamos com a pesquisa, um professor especializado é necessário o
equilíbrio aproximado entre as matrículas da planejamento conjunto do AEE pela equipe
educação especial em escolas exclusivas e classes pedagógica e uma aproximação entre os
especiais e as matrículas no contexto comum, no professores envolvidos com o aluno. Nesse
ano de 2007. De 654.606 alunos efetivos, 46% são quesito, a Região Centro-oeste, pesquisada por
alunos exclusivos da modalidade especial e 54% Hessmann (2013), se sobressai ao afirmar que lá
estão incluídos das classes comuns. Com a há uma efetiva articulação nas escolas
mudança de paradigma sobre atendimento desse investigadas.
aluno, em 2014 os índices se alteram da seguinte O papel do professor-pedagogo é
forma: o número de matrícula aumenta 26%, fundamental para a concretização da inclusão.
evoluindo para o total de 886.815 (oitocentos e Para tanto, ele deve ter em sua formação inicial e
oitenta e seis mil e oitocentos e quinze). E desta continuada subsídios para compreender o
totalidade, 78% são alunos incluídos no sistema processo e intervir na dinâmica escolar. A unidade
de ensino regular. entre o corpo docente e a equipe pedagógica
Algumas questões são relevantes no que se evitaria que o professor especializado tivesse
reporta a esses dados. O aumento do acesso à dificuldades em dialogar com o professor do
escola; a ampliação na identificação e diagnóstico; ensino comum. As escolas entrevistadas
e, as condições objetivas da escolarização do apresentam o diálogo como insatisfatório. Garcia
aluno com deficiências, TGD e ou AH/SD. As três (2015) relata que uma das professoras
premissas voltam-se para o mesmo enfoque: qual entrevistadas se queixa, constantemente, por ter de
a qualidade da educação modelada pela justificar e explicar aos professores do ensino
perspectiva inclusiva? comum sobre a importância de o aluno estar
Aumentar o acesso não significa garantir a inserido no contexto escolar, da necessidade de se
aprendizagem. Se pensarmos nas reflexões que trabalhar em parceria e, em principal, das
Garcia (2004) faz sobre os interesses que recaem possibilidades de aprendizagem do aluno.
sobre a educação inclusiva, entendemos que o Uma das professoras entrevistadas por
aumento do número de matrículas atende a Fellini (2013) na Região Nordeste se queixa que
proposta da UNESCO de reduzir a exclusão social as reuniões dificilmente ocorrem e isso dificulta
e educacional. Logo, quando verificamos o muito o trabalho do professor especialista. Não há
aumento dos índices de matrícula, é inegável o uma continuidade na discussão sobre as atividades
avanço quanto aos números e às demandas das a serem realizadas bem como na possibilidade de
agências econômicas. fazer um trabalho de conscientização dos
AS estatísticas da inclusão divulgadas não professores do ensino comum.
informam, no entanto, como está a aprendizagem. A articulação entre os professores é um dos
Não são discutidos o ingresso no mercado de aspectos que envolvem a prática pedagógica de
trabalho e o acesso ao ensino superior com as qualidade com vistas à inclusão. Contudo, não
mesmas probabilidades de inclusão. Nem podemos simplificá-la às subjetividades dos
precisamos almejar essa análise, de certa forma educadores. As pesquisas revelam circunstâncias
distante, basta analisar o que o IDEB das escolas concretas que dificultam a interação entre os
investigadas retrata sobre seus resultados, para docentes, entre elas, o conflito de horários e a
percebermos que as escolas não estão lotação em escolas diferentes que demandam
conseguindo atingir as metas estabelecidas. deslocamento dos professores, impossibilitando o
Inúmeros são os fatores que contribuem professor de atuar em tempo integral em uma
para a efetivação da inclusão, na mesma única escola. Consideramos esse último fator
proporção, são os fatores que obstaculizam o determinante para a interação entre os docentes,
processo. Sem dúvida, o percurso necessário para isto é, um professor especialista com 40 horas na
a prática inclusiva é o trabalho pedagógico com o mesma escola tem a possibilidade de conhecer e
envolvimento de toda a comunidade escolar. trocar ideias com todo o seu corpo docente, em
Como mencionamos, a perspectiva inclusiva principal, com o professor que atende o aluno no
introduz o conceito de que o aluno é da educação período contrário. Da mesma forma, o professor

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40 Política nacional de educação inclusiva: um estudo sobre sua efetivação nas cinco regiões brasileiras

do ensino comum pode entrar em contato com as desafios que vão além dessa organização
produções que os alunos realizam no AEE sem estrutural; para desenvolver os aspectos políticos e
necessitar da mediação de outros profissionais ou filosóficos desse paradigma é necessário o debate
de outros recursos. Essa condição de trabalho participativo dos profissionais da educação. É
favorece a comunicação direta entre os nesta lógica que devemos enfocar a
profissionais. institucionalização do AEE no PPP, na discussão
A pesquisa também observa a presença de e incorporação coletiva no interior da escola. Mas
profissionais não docentes decisivos para a como isso ocorre de fato? Como se dá a
efetivação da inclusão. As regiões apresentam elaboração do PPP nas reuniões e formações
diferenciadas nomenclaturas a esse profissional: pedagógicas? São reflexões que apresentam
agente de apoio, auxiliares de desenvolvimento respostas subjetivas justificadas pela dinâmica de
infantil, serviços gerais. Segundo Hessmann cada unidade escolar. Eis aqui um nó a ser
(2013), esse profissional auxilia os alunos, quando desatado: aproximar a prática cotidiana real das
necessário, nas atividades de alimentação, discussões teóricas no que diz respeito à
locomoção e higienização. Dambros (2013) indica consolidação da educação como um todo. E, em
que duas escolas na Região Norte duas escolas especial, neste contexto, da educação inclusiva.
não possuem o profissional, mas apresentam Em relação à organização, observamos que
alunos que demandariam o apoio. Esse dado uma escola da Região Norte não informa como
revela uma contradição entre o discurso político sistematiza as atividades a serem realizadas pelos
de investimento para a inclusão com o que está alunos; duas escolas da Região Centro-oeste
sendo realizado na prática. Se o aluno não possui informam planejá-las semestralmente.
todo o atendimento necessário para atender suas Consideramos esse intervalo muito longo frente
especificidades, ele não está sendo incluído no ao dinamismo da aprendizagem e do
sistema. desenvolvimento da criança. As reflexões
Fellini (2013) identifica que apenas uma convergem para o mesmo ponto: a contribuição
escola não apresenta profissionais não docentes; do trabalho pedagógico para a efetiva inclusão.
uma das escola conta, inclusive, com uma equipe Não pode ser qualquer prática de ensino, e sim,
multiprofissional, uma situação única em relação uma prática fundamentada numa análise crítica da
às escolas investigadas nas cinco regiões. O sociedade e perspectiva de aprendizagem dos
envolvimento dos profissionais da saúde é um alunos do AEE.
avanço na discussão da inclusão. Entretanto, Ao tomar como base os estudos de Barroco
somente a presença desses profissionais não é (2012) e Mori (2016) defendemos que a função da
garantia de um atendimento de qualidade. É escola é ensinar, por esse propósito é necessário
necessário o conhecimento das especificidades buscar meios diferentes para socializar o
dos alunos e como apoiar a vida diária, bem como conhecimento e promover que o aluno se aproprie
a comunicação com os demais educadores de dele. Nesta perspectiva, a superação da visão
como proceder em diferenciadas situações. integradora de socializar o indivíduo com os
Com relação ao Projeto Político Pedagógico demais alunos e com o ambiente dá espaço para a
(PPP), observamos que apenas sete escolas socialização do saber. Como desenvolver um
investigadas (46%) apresentam a sala do AEE em trabalho crítico diante das representações
seus projetos. As demais não estão em estabelecidas de incapacidade e impotência? É
conformidade com a política ou não informam possível atender o aluno com qualidade e
esse dado. Na Região Nordeste uma gestora se promover a apropriação do seu saber científico?
recusou a fornecer o PPP, uma ação pouco A adaptação dos materiais e do currículo
democrática, uma vez que esse documento é um pode ser uma resposta a esses questionamentos.
retrato da escola e dos pressupostos que norteiam Entendemos por adaptação curricular todas as
sua prática pedagógica e, por isso mesmo, deve modificações que promovam o acesso ao
ser público. currículo. Elas podem ser de pequeno ou grande
Conforme os estudos de Rodriguero (2013), porte, e em nível individual ou coletivo. O
na Região Sudeste duas escolas apresentam o material adaptado para atender as especificidades
AEE, mas seus PPPs não estão adequados à nova do aluno pode proporcionar situações de
política. A transição para a educação inclusiva aprendizagem em igualdade. Quando oferecemos
proposta pelas políticas públicas apresenta um recurso tecnológico ou uma mediação

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pedagógica que socialmente compensa a algumas atividades que não poderiam ser
deficiência, iniciamos a prática inclusiva. Manter desenvolvidas no AEE, entre elas: inúmeras
o aluno na sala sem proporcionar as devidas atividades prontas reproduzidas para os alunos,
adaptações que favoreçam a aprendizagem é atividades que envolvam a fixação e a
perpetuar sua condição de desigualdade. memorização (ranços da pedagogia tradicional),
Superar a visão biológica organicista do ou até mesmo, repetição das atividades que o
aluno e buscar recursos diferenciados de ensinar é aluno já realiza no ensino comum.
o principal desafio do professor do AEE. Como Sobre essa questão, Hessmann (2013)
efetivar esses princípios? O que a literatura observaem sua pesquisa queos alunos
apresenta como alternativa viável de consolidação matriculados em anos diferentes do ensino comum
dos espaços inclusivos? Como assumir o papel de realizam a mesma atividade. Em nosso
mediador entre o aluno e o conhecimento diante entendimento, o espaço e a carga horária do AEE
de obstáculos históricos? Acreditamos que nem a são oportunidades caras para avançar no
literatura, nem as conclusões obtidas pelo grupo desenvolvimento da criança, que não podem ser
OBEDUC podem responder a contento as desperdiçadas com atividades que não sejam
questões suscitadas. É possível, no entanto, fazer direcionadas especificamente para cada aluno.
uma aproximação da teoria com o desejado, do Nas palavras de Vygotsky (2007, p. 38), “[...] o
ideal com o real. único bom ensino é o que se adianta ao
Como discute barroco (2012),na escola se desenvolvimento”. Para tanto, não basta
realiza a transformação das funções cognitivas identificar o nível de desenvolvimento em que a
elementares para funções psicológicas superiores criança se encontra, é preciso mediar esse
(FPS). Para isso, é necessário o professor do AEE processo na zona de desenvolvimento próximo
se instrumentalizar com recursos e estratégias (ZDP), porque as crianças podem ter o mesmo
diferenciadas para promover a formação dos nível de desenvolvimento real, mas diferentes
conceitos científicos nos alunos. ZDP.
Há a necessidade pedagógica e, porque não A prática pedagógica precisa ser planejada
dizer também social, de abandonar as atividades com exclusividade para cada aluno. Algumas
reprodutoras e mecanicistas que não agregam atividades até podem servir para mais de um
muito aos processos de desenvolvimento da aluno, mas a mediação não. Esta se obriga a ter
criança, quiçá o desenvolvimento da coordenação como direção, em específico, o desenvolvimento
motora. O auxílio do material concreto, das individual. Barroco (2012, p. 291) destaca a “[...]
experiências visuais e, até mesmo os jogos, importância da linguagem como meio de
auxiliam no início do processo pedagógico, mas comunicação e como recurso ao desenvolvimento
devem ser empregados como um meio, não como do psiquismo regulado pelas FPS”. Para Luria
um fim. Requisitar ações mais complexas é buscar (1994) e Vigotski (2001) a linguagem é essencial
formas de revolucionar o pensamento da no processo de generalização e formação dos
criança.Vygotsky (2007) prova a importância da conceitos, isto é, as formas mais complexas da
superação de atividades apoiadas no visual. Ao atividade consciente.
relatar um estudo realizado com crianças com Para provocar de forma intencional e
deficiência intelectual, o autor conclui consciente esse desenvolvimento, o professor ao
identificar o nível de desenvolvimento que a
[...] que um sistema de ensino baseado criança se encontra emprega a palavra como
exclusivamente em meios visuais, e que ‘matéria prima’, extraindo o caráter prático, visual
excluísse tudo quando respeita ao e imediato do processo e assim, assumindo seu
pensamento abstrato, não só não ajuda a caráter abstrato e generalizador. Ao explorar as
criança a superar sua capacidade natural,
ideias e respostas do aluno o professor
mas na realidade consolida tal incapacidade,
dado que ao insistir sobre o pensamento especialista,
visual elimina os germes do pensamento
abstrato nestas crianças (VYGOTSKY, [...] deve encaminhar, portanto, sempre de
2007, p. 38). situações de emprego de recursos
psicológicos mais simples àquelas que
requerem maior complexidade, requisitando
Os argumentos sobre exigir da criança algo
da criança que empregue, intencional e
para além do que ela já sabe nos faz refletir sobre

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42 Política nacional de educação inclusiva: um estudo sobre sua efetivação nas cinco regiões brasileiras

autonomamente, funções psicológicas seu desenvolvimento cognitivo e amplia a sua


superiores, apoiadas na linguagem verbal visão e modos de ação sobre e com o mundo.
(BARROCO, 2012, p. 296). Para o entendimento das questões teóricas
que envolvem a aprendizagem e o
O processo pedagógico do mais simples ao desenvolvimento bem como para o planejamento
mais complexo mediado pela linguagem permite e organização das atividades pedagógicas
ao professor atuar na ZDP e promover o direcionadas para a especificidade de cada aluno,
desenvolvimento. Como a SRM pode atender de é primordial que o professor tenha uma carga
forma individual ou em pequenos grupos de horária destinada para esta finalidade. Dessa
acordo com as especificidades dos alunos, esta maneira, a formação continuada é uma opção de
mediação além de ser possível de ser realizada ampliar a discussão e aprofundar os
pode estabelecer e fortalecer vínculos positivos conhecimentos adquiridos na graduação.
entre o aluno e o professor e entre o aluno e o Conforme a pesquisa de Dambros (2013),
conhecimento. Outra questão importante é que por Fellini (2013), Garcia (2015), Hessmann (2013) e
meio dessa mediação é possível exigir do aluno a Rodriguero (2013), os professores entrevistados
realização da atividade, respeitando seu ritmo e apresentam a formação inicial adequada, e estão
sua apropriação. atendendo à legislação. Entretanto, ressaltamos a
É uma mediação direcionada com vistas à configuração e a frequência da formação
formação do conceito científico pelo aluno, que na continuada, fatores importantes para aprofundar a
ausência da intervenção do professor, talvez não fundamentação teórica e relacioná-la ao cotidiano
consiga fazê-lo. Não é abreviar o processo, concreto.
oferecendo-lhe as respostas, é provocar-lhe o A práxis se dá mediante uma atuação crítica
pensamento, a interpretação e a compreensão diante das dinâmicas escolares. Faz parte do
sobre o assunto estudado. O resultado esperado é financiamento da educação a mantenedora
que nesse processo o aluno não apenas se aproprie subsidiar uma formação continuada de qualidade.
do conhecimento, mas também compreenda como Os momentos de estudo possibilitam repensar a
planejar seu pensamento, generalizando as educação bem como as práticas pedagógicas para
estratégias para os demais assuntos escolares. se alinhar à perspectiva inclusiva.
Quando o aluno entende a linguagem como uma Para que a formação continuada cumpra sua
forma de organizar o pensamento, dá um salto função de capacitar os profissionais da educação
qualitativo em seu processo de aprendizagem. com qualidade, ela precisa atender as
Para Vigotski (2001), a linguagem interna se necessidades políticas de formação no âmbito
transforma em função mental interna que subsidia nacional, e também, as necessidades da escola.
o pensamento. Esse é um fator positivo da descentralização: com
ela as unidades escolares ou os setores regionais
Todas as funções psicointelectuais da educação têm a independência na programação
superiores aparecem duas vezes no decurso
e organização de sua formação. Todavia, essa
do desenvolvimento da criança: a primeira
vez nas atividades coletivas, nas atividades autonomia não pode ser considerada no aspecto de
sociais, ou seja, com funções interpsíquica; responsabilidade social ou individual. O
a segunda, nas atividades individuais, como investimento financeiro compete à mantenedora,
propriedades internas do pensamento da mas as discussões de cunho político pedagógico
criança, ou seja, como funções devem ser centradas na e pela escola.
intrapsíquicas (VYGOSTKY, 2007, p. 38- As escolas investigadas pontuam um dado
39). importante: a formação não contempla todos os
professores de forma sistematizada. Dambros
Ao requisitarmos da criança que ela (2013) observa que nas escolas da Região Norte
explique como chegou à solução da atividade, os documentos oficiais do município contemplam
estamos impelindo a internalização do a formação, mas não detalham a sua realização.
pensamento e sua expressão. A linguagem Conforme Fellini (2013), na Região Nordeste uma
empregada tanto pelo aluno quanto pelo professor, escola disponibiliza dois professores para
torna-a capaz de utilizar a informação verbal a fim participar de cursos com o compromisso de
de conduzir uma nova ação; agora, de forma repassá-los aos demais educadores. Um fator que
modificada. Esse processo mediado impulsiona certamente implica na qualidade da formação.

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CEREZUELA; MORI 43

Quais condições objetivas são necessárias para o aprendizagem e de seu desenvolvimento. A


profissional repassar os conhecimentos com ele unidade em termos de entendimento das
trabalhados? Não é considerada a subjetividade de especificidades do aluno possibilita o
cada um, que determina a apropriação e planejamento intencional e assertivo para sua
entendimento do conteúdo? Ao delegar ao escolarização.
profissional repassar os conceitos teóricos e Das quinze escolas observadas, onze
técnicos apropriados em um determinado curso, relatam ações que envolvem o diálogo entre os
além de precarizar a formação, pode gerar educadores em momentos de reuniões, formação
cobranças indevidas sobre o produto final. continuada ou até mesmo em planejamento das
A lógica reducionista de que a formação do atividades ou socialização dos resultados. Na
professor é a responsável pela qualidade da mesma proporção, o inverso ocorre. Uma das
educação descarta as complexas relações que dificuldades que os professores do AEE pontuam
permeiam o universo educacional. Questionamos de forma significativa é a resistência dos
a responsabilidade do investimento na educação professores do ensino comum na efetivação da
como um todo e as relações concretas em que o inclusão. Essa resistência se expressa de
professor desenvolve seu trabalho, todavia, diferentes formas, entre elas: transferir a
reafirma o valor da formação continuada, mas responsabilidade para o professor do AEE,
ressalta a preocupação coletiva no processo. A evitando ou não concluindo as propostas
determinação que um grupo de professores forme discutidas, não exigindo do aluno incluso
os demais dificulta as chances de avanços respostas de desempenho de acordo com suas
coletivos, beneficiando um avanço individual e capacidades – um indicativo de exclusão, pois o
com o ônus de uma responsabilidade que não lhe aluno não é percebido como pertencente ao grupo
cabe. – e também, a não aceitação do aluno em sala.
A política de ‘menos Estado’ também é Professores entrevistados afirmam ser comum
apresentada por Rodriguero (2013). Uma das tentar convencer os colegas sobre as
escolas da Região Sudeste, os professores são possibilidades de aprendizagem e
orientados a buscarem formação particular, com desenvolvimento do aluno público-alvo do AEE e
grandes possibilidades de o educador recorrer ao da necessidade de uma metodologia diferenciada.
setor privado. Outro nó sobre o tema a ser A questão pode ser analisada sob diferentes
desatado: enquanto proposta política a formação aspectos, um deles é a questão da transferência da
continuada pressupõe a melhoria da escola e não responsabilidade e ‘boa vontade social’ esperada
do professor de forma isolada. da sociedade para atender as políticas neoliberais.
Os dados coletados pelas pesquisas de Há uma expectativa de que o professor, na
Dambros (2013), Fellini (2013), Garcia (2015), limitação de seu exercício profissional, vá suprir
Hessmann (2013) e Rodriguero (2013) retratam as falhas do Estado ao que lhe compete e tornar o
questões importantes sobre a efetivação da aluno incluso. São ignorados vários fatos, tais
inclusão. Apesar das características intrínsecas de como: muito professores não apresentam lotação
cada região, as escolas apresentam pontos em uma única escola, muitas vezes sua jornada de
convergentes tanto nas ações efetivas quanto nas trabalho é dividida em diferentes estabelecimentos
dificuldades enfrentadas. de ensino; muitos professores nem se encontram
Um aspecto identificado como positivo para no dia-a-dia escolar; o número de docente é
o avanço da perspectiva inclusiva é a articulação inferior à demanda; há ausência de profissionais
entre educadores do AEE e do ensino comum. Em não docentes para auxiliar nas atividades de
sua contradição, esse aspecto também se locomoção, higiene e alimentação do aluno no
configura na principal queixa apresentada pelos contexto educacional. A frequente falta de
entrevistados. profissional Tradutor e Intérprete da Língua
A perspectiva inclusiva institui o conceito Brasileira de Sinais (TILS) impossibilita a
de que o aluno público-alvo da educação especial comunicação, desprovendo o aluno de todo o
é um aluno da educação básica, não mais um benefício da linguagem em sua função social e no
aluno segregado de uma modalidade de ensino. desenvolvimento das FPS. Todos esses elementos
Ao se tornar um aluno da escola, todos os refletem e determinam as relações concretas do
profissionais da educação que se relacionam com cotidiano escolar, isto é, as contradições da
ele devem participar do processo de ensino, ‘exclusão inclusiva’ ou da ‘inclusão excludente’.

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44 Política nacional de educação inclusiva: um estudo sobre sua efetivação nas cinco regiões brasileiras

Por outro lado, também observamos a pesquisas relatam que algumas famílias não
questão da formação do professor para o compreendem a função do AEE e não se
atendimento do aluno. Este quesito interfere empenham na frequência e acompanhamento dos
significativamente na efetivação da inclusão, a alunos. Rodriguero (2013) analisa que isso
postura mediadora entre o conhecimento e o
aluno, entre o aluno do AEE e o professor do [...] sem dúvida, dificulta a continuidade no
ensino comum, entre ele e os demais profissionais trabalho dos professores e, certamente,
da escola, bem como o planejamento reflete-se no processo de aprendizado e
sistematizado e direcionado são ações desenvolvimento do aluno, ao mesmo
tempo, leva-nos a pensar na hipótese de que
profissionais que requerem formação teórica e
os atendimentos do AEE estão
metodológica para sua execução. A qualidade da subordinados não apenas às determinações
formação e a práxis no cotidiano concreto da das políticas que os preconizam e orientam,
escola são grandezas diretamente proporcionais. mas à escola, entendida como instituição
As contradições sociais obstaculizam a que deve promover acessibilidade,
consolidação de uma escola que possa oportunizar adaptação curricular, capacitação de
equidade para a aprendizagem e o recursos humanos, superação das barreiras
desenvolvimento do aluno. Mesmo porque, esse é atitudinais, o que já se constitui algo
o discurso ideológico proferido em diversos bastante complexo. Não bastasse isto,
momentos da história da educação. A escola vista alunos e familiares ainda estão
subordinados a questões culturais e
como a redentora da sociedade, mascara a
sociofinanceiras, ao conhecimento e
realidade e inverte a sua compreensão culminando valorização do AEE, à confiança de que o
na acentuação das desigualdades sociais. Todavia, AEE fará diferença no desenvolvimento da
o profissional com formação adequada apresenta, criança [...] (RODRIGUERO, 2013, p. 142).
em tese, melhores chances de entender as
determinações externas que alteram as dinâmicas O compromisso da família faz a diferença
escolares de forma crítica. Urge instrumentalizar o no desempenho do aluno como um todo. No
profissional da educação para pensar crítica e ensino comum, pelas limitações do próprio
ativamente a realidade escolar, buscando no contexto, às vezes ele não recebe todo o
desempenho de sua função a consciência política atendimento necessário, e pelas suas faltas no
e pedagógica do ato de ensinar. AEE não há sequência de qualidade no
Uma proposta política viabilizadora da atendimento. Garcia (2015, p. 155) analisa que:
inclusão deve levar em conta o número de alunos
em sala. Uma escola investigada da Região Dentre as causas mais frequentes da
Centro-oeste ressalta que os alunos público-alvo ausência dos alunos na SRM estão: falta de
da educação especial são matriculados no ensino compromisso e credibilidade da família no
comum, respeitando o limite de no máximo dois trabalho desenvolvido e no aprendizado do
alunos por sala, e a sala que recebe os alunos aluno, distância e falta de disponibilidade
podem ter no máximo vinte alunos. Essa medida da família para transportá-los até a escola
no contraturno. Neste impasse, o educando
amplia o investimento na educação. Turmas com
com deficiência, muitas vezes, não é
número reduzido implicam em mais salas de trabalhado no ensino regular e nem no AEE
aulas, mais profissionais contratados e mais com a intensidade que necessita. Acaba
recursos financeiros. São necessidades que sendo privado da apropriação do
divergem da política neoliberal do Estado conhecimento científico do qual tem direito.
Mínimo.
A frequência do aluno na SRM é um fator No que se refere às questões de
decisivo para a efetivação da proposta inclusiva. infraestrutura, as escolas revelam que a falta de
Os dados revelam que é uma dificuldade transporte público gratuito, ou a falta de refeição
enfrentada de valor significativo, seis escolas aos alunos (ações que evitariam o deslocamento
pontuam que a infrequência dos alunos durante a troca de períodos) interferem na
compromete a sua escolarização. Entre as causas frequência dos alunos no horário oposto. Nas
possíveis para a não assiduidade podemos escolas da Região Norte, devido ao clima de altas
mencionar a de origem social e a de ordem temperaturas, a ausência de ambientes
política econômica. Sobre as causas sociais, as climatizados implica no desgaste físico de

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.1, p. 35-48, Janeiro/Abril 2016


CEREZUELA; MORI 45

professores e alunos, comprometendo a qualidade Entre os avanços e dificuldades analisadas


das aulas e a frequência dos alunos. Duas escolas pelas pesquisadoras, podemos sintetizar, de
investigadas, uma da Região Centro-oeste, e outra acordo com Dambros (2013), que há progresso no
da Região Sudeste, apresentam uma alternativa: as entendimento da educação especial; contudo, é
escolas oferecem almoço aos alunos para que seja necessário trabalhar na qualidade da inclusão
possível otimizar o tempo e evitar evasões ao instalada. Para a investigadora da Região Norte
programa.
Toda possibilidade de inclusão identificada [...] esse avanço não acompanhou, em
pelas pesquisas pode servir de reflexão e debate muitos casos, a qualidade de ensino nas
no interior de qualquer unidade escolar, na escolas inclusivas. Permanece ainda a visão
tentativa de redimensionar uma prática que de uma educação para a satisfação das
necessidades básicas de aprendizagem,
apresenta resultados pedagógicos positivos. Desse
visão essa oriunda do neoliberalismo.
modo, um aspecto positivo realizado pela Região Prioriza-se o desenvolvimento de atitudes,
Sul, a qual merece destaque, refere-se às medidas valores e habilidades sociais e,
antecedentes ao encaminhamento do aluno para o especificamente, para a educação de alunos
AEE, e o atendimento dos alunos que não fazem com NEE, muitas vezes, o atendimento não
parte do público-alvo da educação especial em se desvincula de uma postura assistencial.
outros programas de apoio educacional. Com essa De forma geral, tanto a educação especial,
medida, há uma preocupação com o aluno que não quanto o ensino regular se encontram na
apresenta as especificidades, não permitindo que posição de secundarizar a ciência e a
ele ocupe vaga das SRM e também não apropriação conceitual. Salvo iniciativas
isoladas e precursoras que podem ser
negligenciando os necessitados de apoio
constatadas no atendimento educacional de
pedagógico. alunos ao longo da história brasileira
O diferencial, apresentado pelo estudo de (DAMBROS, 2013, p. 114).
Garcia (2015), constitui-se em uma queixa
alarmante denunciada pelas demais escolas Trabalhar na proposta de uma unidade e
pesquisadas por Dambros (2013), Fellini (2013), qualidade para a educação inclusiva ainda é um
Hessmann (2013) e Rodriguero (2013): alunos desafio que demanda investimento na formação
sem as especificações do AEE estão sendo inicial e continuada do professor e também em
atendidos nas SRM. Assim, o sistema é inflado, consciência política e ética para desvincular os
sobrecarregando o professor especialista; vagas princípios assistencialistas para dar espaço ao
são indevidamente ocupadas e desloca-se para o desenvolvimento educacional do aluno.
professor uma ‘cobrança’ para a resolução de um Fellini (2013, p. 155) traz informações
problema que não lhe cabe. Nessa perspectiva, a importantes no que diz respeito às dificuldades
inclusão não se consolida em duplo sentido; enfrentadas e produzidas na Região Nordeste: as
primeiro porque não inclui o aluno que necessita escolas investigadas nessa região atendem à
e, segundo, porque atende um aluno que não é da legislação no quesito acessibilidade.
sua especificidade. O que fazer a esse respeito?
Como contornar a situação enquanto coletividade? Diante da análise acurada dos resultados e
Quais investimentos são necessários para do cotejamento da realidade vista nas
minimizar uma questão tão significativa? Afinal, escolas estudadas com o preconizado na
o professor do AEE não pode abarcar a legislação pertinente, concluímos que na
responsabilidade. Na outra ponta desse nó está o prática, a educação inclusiva não tem
professor do ensino comum que não se encontra suprido a demanda de atendimento aos
apto para atender esse aluno. Entre uma ponta e alunos com NEE. As políticas públicas
estabelecidas em sua maioria exigem
outra existe um aluno excluído, fruto de uma
aplicabilidade e atribuem responsabilidades,
sociedade globalizada e fetichizada, atendendo mas diante da atual conjuntura, não
aos interesses diversos e às vezes de cunho subsidiam o acesso e a permanência desses
questionável. Os alunos que não se encaixam nos alunos, muito menos direcionam e
padrões de normalidade formam uma parcela de conduzem a formação de nossos alunos para
cidadãos que, por meio da escola, perpetuam sua a hominização.
expropriação cultural, à margem da sociedade.

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46 Política nacional de educação inclusiva: um estudo sobre sua efetivação nas cinco regiões brasileiras

As críticas são acirradas em relação ao próprio autor ao asseverar que essas


trabalho pedagógico e a infraestrutura das escolas funções, cuja origem é social, só passam a
estudadas na Região Nordeste. Os professores do existir no indivíduo ante as relações
AEE reclamam da pouca aceitação por parte dos mediadas com o mundo externo, ou seja,
dependem não apenas do meio, mas
professores do ensino regular e da adaptação
também das condições objetivas das
precária e insuficiente de atividades. mediações que acontecem na escola.
Hessmann (2013, p. 144) ao estudara
Região Centro-oeste conclui que: A escola determinada pela sociedade
capitalista reflete diretamente sobre os resultados
Esse cenário nos leva a concluir que não há,
a ela impostos. De forma contraditória, o exigido
pelo menos até o limite dessa pesquisa, uma
preocupação pelo órgão maior em nível é negado pelas condições objetivas. No decorrer
nacional de supervisionar ou mesmo avaliar da análise, percebe-se que a escola avança nas
como está a aplicação e a implantação da conquistas, mas muito desse avanço é fruto do
política inclusiva. Equipar salas de aula e trabalho de professores que apresentam
adequar o espaço físico da escola não competência teórica e ética no desempenho de sua
garante a inclusão escolar. É preciso que o função.
sistema como um todo seja transformado de Ao estudar a Região Sul, Garcia (2015)
modo intencional. também pontua sobre as dificuldades essenciais
Defendemos que uma política educacional das escolas e considera que há muito a avançar,
deve se preocupar com aprendizagem dos
apesar de ainda apresentar um quadro positivo em
alunos. Para isso é necessário investimentos
na formação teórico-metodológica dos relação a outras regiões. Sobre a organização dos
professores, pois estes são os grandes documentos legais e a proposta de atendimentos
responsáveis por esse fazer da educação diferenciados, a autora conclui que:
uma educação que não apenas divida espaço
físico, mas que dê condições aos alunos de A inclusão em termos legais está ocorrendo
se apropriarem do conhecimento e que leve nas escolas pesquisadas, ou melhor, há
à formação da consciência. situações de inclusão que têm trazido
benefícios às crianças, sobretudo devido à
O paradigma integrador permanece nas relação estabelecida com seus pares,
relações do cotidiano escolar, ora de forma velada possibilitando o desenvolvimento de
funções complexas do pensamento dessas
ora revelada, nas atitudes diárias de diferentes
crianças. Todavia foi dada apenas a largada.
ordens. A formação profissional de qualidade Cremos que o olhar deve ser de otimismo
pode contribuir para a superação do resquício ao que vem sendo realizado, construído,
histórico, que apesar de ter auxiliado no processo porém com perspectiva de novas
é considerado vencido pelas novas discussões. realizações que caminhem para a ‘inclusão
Na pesquisa sobre a Região Sudeste de fato’. Os deficientes partilham da
Rodriguero (2013, p. 208) afirma: condição e dos anseios comuns a todo ser
humano não só na educação, como nas mais
O que se observa, contudo, delineado por distintas ocasiões de sua vida. Humanizar-
este contexto, é a escola comum, que deve se em conjunto com todos requer de nós
receber e escolarizar os alunos que educadores o discernimento de que a escola
constituem o público alvo do AEE, tem uma função essencial (GARCIA, 2015,
estabelecida e organizada sobre bases p. 251-252, grifo do autor).
altamente excludentes, que se colocam
como obstáculo à efetivação de uma Garcia (2015) e Rodriguero (2013)
educação inclusiva. Sob tais condições, a destacam a existência de ações isoladas de
escola, responsável por oportunizar a professores para promovera aprendizagem e
formação das funções complexas de desenvolvimento do aluno,que fazem a diferença
pensamento descritas por Vygotski (1997), para aquele aluno que está sendo atendido.Essas
funções especificamente humanas que
ações individuais contrastam, no entanto, com a
possibilitam ao indivíduo dominar os
procedimentos e os modos culturais da falta de um movimento escolar no sentido de
conduta, acaba por não cumprir esta meta. construção coletiva do sistema inclusivo.
Seu descumprimento é explicado pelo

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CEREZUELA; MORI 47

CONCLUSÃO dos limites e possibilidades da educação em sua


totalidade. A educação como está posta não
A educação formal é a condição para o apresenta possibilidades de resolver a questão da
desenvolvimento humano; todavia, não basta o exclusão, tão pouco a recente educação na
indivíduo estar matriculado e frequentando a perspectiva inclusiva. Ao tomarmos como
escola. Para aprender e se desenvolver, é essencial referência a teoria Histórico-Cultural,
que o aluno seja atendido em suas especificidades, evidenciamos alguns aspectos que nos ajudam a
com recursos e metodologias diferenciados. O firmar a tese de que o AEE pode se constituir em
conhecimento adquirido na escola modifica e serviço e espaço privilegiados para auxiliar na
desenvolve os processos cognitivos efetivação da inclusão. A apropriação do
redimensionando as funções psicológicas que conhecimento pelo aluno pode revolucionar seu
passa de elementares para superiores. Com base desenvolvimento e ser instrumento de sua
na Teoria Histórico-Cultural é por meio da relação emancipação, mas isso ocorrerá mediante a ação
mediada com o meio externo que o indivíduo se do professor. Obviamente não estamos nos
apropria do saber, cabendo ao professor buscar referindo a somente o professor especializado; a
estratégias para transformar esse saber em inclusão implica em ações coletivas da
conteúdo. Ensinar o aluno é enfrentar o desafio de comunidade escolar, da sociedade e do Estado. O
transformar o significado coletivo para um sentido AEE é um aspecto a ser considerado e não o
individual. determinante de seu sucesso ou fracasso.
O aluno com deficiências, TGD ou AH/SD O processo da inclusão educacional está em
percorre o mesmo caminho de desenvolvimento desenvolvimento, alguns elementos estão
dos demais alunos. Sob essa perspectiva, as SRM consolidados, outros ainda demandam
apresentam possibilidades de desenvolver um investimentos político, social e financeiro de
trabalho pedagógico individual e/ou coletivo que forma urgente. Os avanços são consideráveis, mas
permite ao professor identificar o nível de ainda há um longo caminho a ser percorrido para
desenvolvimento real de cada aluno, respeitando que a inclusão educacional se efetive. As
sua diversidade, seu ritmo de aprendizagem e discussões devem ocupar um espaço central nas
valorizando as capacidades. Assim, defendemos a relações concretas do interior da escola. Para
Teoria Histórico-Cultural como uma alternativa Sawaia (2001, p. 8), ao analisarmos a inclusão,
viável para fundamentar o processo de ensino, precisamos entender a exclusão em suas diferentes
aprendizagem e desenvolvimento. A mediação das dimensões qualitativas: “[...] dimensão objetiva da
atividades propostas deve primar pela superação desigualdade social, a dimensão ética da injustiça
das respostas mecânicas e reprodutivistas e a dimensão subjetiva do sofrimento”. Nesta
alcançando ações planejadas e criativas. Apostar proposta que a educação é ‘convocada’ a
no potencial de aprendizagem do aluno, participar, existem fatores que não podem ser
desnaturalizando suas características biológicas negligenciados, entre eles: a superação da visão
como um impedimento, é humanizar. apenas clínica para a compreensão das
O AEE consiste em um instrumento do deficiências, TGD e AH/SD; a superação da
processo inclusivo, é mais um recurso a ser segregação e do assistencialismo consequência da
empregado para dirimir os efeitos de uma visão de impotência e incapacidade generalizada
sociedade excludente. Focar o resultado das do sujeito, e em principal, a compreensão de que
propostas inclusivas condicionados ao esse indivíduo pode aprender e se desenvolver de
desempenho desse serviço de forma isolada é uma forma inter e intrapessoal compensando social e
visão positivista e limitada sobre as dimensões culturalmente os aspectos biológicos da
que determinam a escola. A responsabilidade da deficiência.
efetivação da inclusão implica no entendimento Compreender o indivíduo como um ser
do coletivo. A sociedade não pode ser eximida de histórico, cultural e social com suas condições
sua responsabilidade na produção da exclusão objetivas e subjetivas, por si só, justifica o
material e cultural, quer na diversidade ou na investimento para a consolidação da inclusão. Não
diferença humana. obstante, ampliando a respeitada citação de
A teoria marxiana nos ensina que o macro Mészáros (2008) – é preciso educar para além do
define o micro. Explicar os limites e as capital – sintetizamos, é preciso incluir para além
possibilidades da inclusão exige o entendimento dos discursos inclusivos.

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.1, p. 35-48, Janeiro/Abril 2016


48 Política nacional de educação inclusiva: um estudo sobre sua efetivação nas cinco regiões brasileiras

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Santa Catarina, Florianópolis, 2004.

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.1, p. 35-48, Janeiro/Abril 2016

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