A Família Na Psicoterapia Infantil - Uma Revisão Integrativa Das Abordagens Humanistas e Fenomenológicas
A Família Na Psicoterapia Infantil - Uma Revisão Integrativa Das Abordagens Humanistas e Fenomenológicas
A Família Na Psicoterapia Infantil - Uma Revisão Integrativa Das Abordagens Humanistas e Fenomenológicas
33208/PC1980-5438v0032n03A09
ISSN 0103-5665 599
Resumo
Este estudo teve como objetivo realizar uma revisão integrativa sobre a
produção científica brasileira a respeito da participação das famílias no pro-
cesso psicoterapêutico infantil dentre as abordagens inspiradas no pensamento
humanista e/ou fenomenológico. Foi realizada uma busca de artigos publica-
dos no período entre janeiro de 2008 e outubro de 2018 nas bases de dados
PEPsic e Capes, por meio de descritores que dessem conta da multiplicidade de
abordagens e nomenclaturas destas. Após a aplicação dos critérios de inclusão,
estabelecidos previamente, foram selecionados 11 artigos para análise. Na aná-
lise, os artigos foram divididos em duas categorias: uma contendo os estudos
que descrevem as percepções dos próprios psicólogos ou das famílias sobre o
assunto, e outra com aqueles que descrevem como ocorreu a atuação junto
aos responsáveis durante a psicoterapia infantil. Os resultados apontam para
uma concordância entre os estudos atuais e o arcabouço teórico, mostrando o
(1)
Psicóloga pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR), Mestranda do programa de pós-graduação em psicologia da
Universidade de Fortaleza (PPGP/UNIFOR), Fortaleza, CE, Brasil. email: [email protected]
(2)
Doutor em Psicopatologia e Psicanálise pela Université Paris Diderot (Paris VII), Professor do Curso de Graduação
em Psicologia da Universidade de Fortaleza (UNIFOR), Fortaleza, CE, Brasil. email: [email protected]
(3)
Pós-Doutora em antropologia médica pela Harvard Medical School, Doutora em psicologia clínica pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Professora do programa de pós-graduação em psicologia da Universida-
de de Fortaleza (PPGP/UNIFOR), Fortaleza, CE, Brasil. email: [email protected]
Esta pesquisa está vinculada ao projeto PQ-1D “Fenomenologia Clínica da Intersubjetividade no mundo vivido
(Lebenswelt) psicopatológico”, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Abstract
This study aimed at presenting an integrative review of the Brazilian scien-
tific production regarding the participation of families in the child psychothera-
peutic process among the approaches inspired by humanistic and/or phenom-
enological thinking. The PEPsic and Capes databases were searched for articles
published between January 2008 and October 2018, using descriptors that al-
lowed for the multiplicity of approaches and nomenclatures in those. After ap-
plying the inclusion criteria, which were previously established, 11 articles were
selected for analysis. For the analysis, the articles were divided into two catego-
ries: one containing the studies that describe the perceptions of the psychologists
themselves or of the families about the process, and another category with stud-
ies describing how was the participation of families in the child psychotherapy.
Results point to a concordance between the current studies and the theoretical
framework, showing how relevant the families’ participation is. It is suggested
that research and publications on the subject be expanded, in addition to invest-
ing in the qualification of children’s psychotherapists for this type of work, which
has not been much explored and proves to be an area that requires great attention
and improvement by psychologists.
Keywords: child psychotherapy; families; fathers and mothers; phenome-
nology; humanist psychology.
Resumen
Este estudio tuvo como objetivo realizar una revisión integrativa sobre la
producción científica brasileña acerca de la participación de las familias en el
proceso psicoterapéutico infantil entre los enfoques que poseen inspiración en
el pensamiento humanista y/o fenomenológico. Se realizó una búsqueda de ar-
tículos publicados en el período entre enero de 2008 y octubre de 2018 en las
bases de datos PEPsic y Capes, por medio de descriptores que dieran cuenta de la
Introdução
ma. Ainda que o psicodrama não seja considerado uma abordagem ligada direta-
mente ao movimento humanista e/ou fenomenológico em psicologia, para fins
deste estudo, incluímos essa abordagem por suas afinidades com esta perspectiva.
A escolha deste caminho visa, de um lado, a contemplar as perspectivas oriundas
da psicologia humanista – considerada a terceira força em psicologia, que sur-
ge na primeira metade do século XX no contexto norte-americano e tem como
principais representantes autores como Carl Rogers, Rollo May, Frederick Perls,
entre outros –, e, de outro, a lente fenomenológica – filosofia que surge no início
do século XX com Edmund Husserl e que tem fornecido, ao longo das décadas,
contribuições teórico-metodológicas para a clínica, além de ter influenciado e
estabelecido um diálogo com a psicologia humanista e de se apresentar como
método qualitativo de investigação empírica. Surgidas no período pós-guerra,
as perspectivas humanista e/ou fenomenológica inauguraram novas formas de se
entender o homem e serviram de base para o surgimento de propostas psicotera-
pêuticas voltadas para o público infantil.
Método
Resultados
Relatos de sessões/intervenções
fornecidas maiores informações sobre o manejo clínico, mas sim a respeito da teoria
e da convergência entre as duas abordagens. Promover o engajamento das famílias
nos processos de diagnóstico e intervenção foi um dos fatores citados como dificul-
tadores do processo psicoterapêutico. A gestalt-terapia é apontada como abordagem
cujas bases se fundamentam, dentre outras teorias, na fenomenologia. As autoras
apoiaram-se na visão humanista na diferenciação entre a psicologia e as demais áre-
as, nas equipes multidisciplinares.
O estudo de Pajaro e Andrade (2018) relata o processo psicoterápico de
uma criança, tendo como objetivo apresentar a leitura fenomenológica do de-
senho como metodologia de trabalho na psicoterapia. Para isso, foi realizado
um estudo de caso, utilizando como método a pesquisa documental dos diários
de campo da psicoterapeuta e dos desenhos do cliente. As autoras descrevem
como foram realizadas as leituras fenomenológicas de sete desenhos da criança
e apontam de que forma este método pode refletir nas intervenções clínicas em
gestalt-terapia. São abordados atendimentos com a mãe, que tinham o objetivo
de favorecer nela o acolhimento ao sofrimento da criança. Fala-se em “acompa-
nhamento contínuo”, porém sem especificar a periodicidade, os participantes e as
características do manejo clínico nessas sessões.
Discussão
logo infantil, pois está ali pela criança, conhece suas dores e é porta-voz dela.
Porém, o reconhecimento de que os próprios pais e mães têm suas histórias,
suas dores e justificativas pessoais para o seu comportamento (Axline, 1986),
e a aceitação de que criticar e julgar os pais não é nosso papel (Aguiar, 2005)
pode contribuir para entendê-los como colaboradores do processo, ainda que
comumente não saibam como fazê-lo. O discurso comum e consensual acerca
da necessidade da participação da família na psicoterapia destoa da aparente
dificuldade em situá-los nesse processo.
Não foram encontrados estudos que abordem a percepção das próprias
crianças sobre a participação de suas famílias no processo terapêutico, o que surge
como um paradoxo, já que na psicoterapia infantil, o principal foco é na criança.
Considerou-se importante verificar como as sessões familiares ou conjuntas são
entendidas pela criança. Ainda que se reconheça a dificuldade para o desenvolvi-
mento desse tipo de pesquisa, é fundamental que ela seja ouvida para que estraté-
gias efetivas sejam desenvolvidas.
No que diz respeito à categoria “Relatos de sessões/intervenções”, foram
identificados estudos que abordam a participação das famílias no processo psi-
coterapêutico em diferentes fases da psicoterapia. No entanto, eles não especifi-
cam claramente como ocorre esse trabalho. Dois estudos (Wechsler et al., 2014;
Bittencourt e Böing, 2017) que não se concentraram em descrever como ocor-
reu o acompanhamento às famílias informaram, ainda, que houve dificuldades
relacionadas a esse aspecto, sem informar quais. Os demais estudos trouxeram
descrições de sessões com os responsáveis, manejo técnico e suporte teórico, com
indicações de técnicas e fazendo reflexões. Apesar de restritos em quantidade, per-
cebe-se a diversidade das intervenções propostas, com possibilidades de atuação
junto às famílias individualmente, em grupo ou em sessões conjuntas. Os estudos
encontrados relatam experiências em coerência com as abordagens pesquisadas,
preservando o foco no benefício da criança, o seu sigilo e o entendimento que
seus problemas fazem parte de um contexto mais amplo, do qual é dependente.
Esse tipo de estudo pode servir de inspiração para a prática, além de oferecer
apoio ao psicólogo infantil que, de acordo com Costa e Dias (2005), pode viven-
ciar sentimentos de frustração, solidão e impotência em relação à atuação com as
famílias das crianças. O compartilhamento de experiências por meio do relato de
outros psicólogos pode contribuir para diminuir a solidão profissional citada por
essas autoras, já que chegaram em sua pesquisa à percepção de que existem poucos
psicólogos infantis que atuam segundo as abordagens estudadas (gestalt-terapia,
psicodrama e abordagem centrada na pessoa).
Considerações finais
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