A Crise Ambiental Na Sociedade de Risco - Sidney Guerra
A Crise Ambiental Na Sociedade de Risco - Sidney Guerra
A Crise Ambiental Na Sociedade de Risco - Sidney Guerra
Sidney Guerra1
Resumo: Uma das questões mais alarmantes atualmente é a crise ambiental que
ocorre em nosso planeta. A sociedade global, apesar dos sinais de crise evidenciados,
continua a explorar de forma predatória os recursos naturais visando o crescimento
econômico. A suportabilidade natural da Terra está sendo ultrapassada gerando
riscos que afetam a vida e a qualidade de vida dos seres humanos. Infelizmente falar
em crise num mundo que há muito tempo perdeu a capacidade de causar alarme
parecem não despertar maiores interesses para que medidas efetivas sejam realmente
tomadas. Urge a mobilização da sociedade para reverter o quadro de destruição em
massa do planeta.
Palavras Chave: Meio Ambiente. Crise Ambiental. Sociedade de Risco
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Lex Humana, nº 2, 2009, p. 178 ISSN 2175-0947
I. Introdução
Até poucos anos atrás o estudo do ambiente não recebia muita atenção.
Todavia, esse cenário se alterou e essa mudança decorre, especialmente, dos
graves sinais da crise ecológica que se apresentam para a humanidade.
Para compreender a mudança de paradigma, necessário que sejam
levados em consideração dois processos concomitantes e interligados: o
desenvolvimento de uma consciência ambiental globalmente difundida e a
necessidade premente de formulação de políticas públicas de proteção ao
ambiente.
No mesmo ritmo em que a preocupação com questões ambientais se
tornou prioridade para setores sociais cada dia mais amplos, o ativismo verde
deixou o campo exclusivo das organizações não governamentais e ingressou
no debate político e econômico.
Nesse sentido é que são apresentados os novos paradigmas da
ecologia política que procura aproximar cada vez mais a problemática para
todos os segmentos da sociedade. São eles:
a) a ecologia, cultura global, diz respeito ao conjunto das atividades
humanas, à questão da relação entre o homem e a natureza, bem
como aos assuntos da cidadania. Uma vez que o projeto de domínio
e de posse da natureza é, ao mesmo tempo, um projeto de controle
do homem e da sociedade, a ecologia não poderá ser identificada,
sob a forma de “problema do ambiente”, com uma nova dimensão
da política, da ciência, da técnica, da economia e da cultura. Ela
deve, pelo contrário, permitir repensar estes diferentes domínios da
imaginação e da ação humanas, tanto nos seus fundamentos teóricos
como nas suas aplicações concretas;
b) os impasses da civilização atual baseiam-se, em última instância,
no dogma ocidental da expansão ilimitada dos desejos e das
necessidades. Sem procurar regressar a um estado “primitivo”
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Diante das incertezas e do medo, o que podemos fazer? Apenas nos conformar
com ele (medo) e com os sérios problemas que emergem no plano global em
matéria ambiental? Claro que não.
Caminhos alternativos têm sido propostos. Se fossem levados em
consideração os posicionamentos dos ecologistas, para compatibilizar as
aspirações materiais da humanidade com a preservação dos ecossistemas
naturais e a manutenção dos padrões mínimos de qualidade de vida, estes iriam
9 Idem, p. 73
10 Ib idem, p. 74
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tipo de vida.
A perda de solos férteis apresenta índices alarmantes. A cada ano, seis
milhões de hectares de terras produtivas se transformam em desertos e são
destruídos mais de onze milhões de hectares de florestas. Aproximadamente
10% das terras potencialmente férteis do planeta viraram desertos ou foram
aniquilados pela intervenção humana enquanto 25% estão em perigo.
A cada ano, perdem-se 8,5 mihões de hectares de florestas tropicais pelo
desmatamento. Essa redução de floresta contribui para o aumento de 20% de
CO2 atmosférico, enquanto o uso de combustíveis fósseis é responsável pelos
80% restantes. Ao todo, são quase 25 milhões de toneladas de gás carbônico
lançados a cada ano na atmosfera decorrentes de atividades humanas. 13
De acordo com o que estabelece a Convenção das Nações Unidas
de Combate à Desertificação, a desertificação é definida como sendo a
degradação da terra nas zonas áridas, semi-áridas e sub-húmidas secas
resultantes de factores diversos tais como as variações climáticas e as
atividades humanas.
Com o avançar dos problemas relativos a desertificação, várias
outras expressões foram conceituadas para melhor entendimento da matéria,
a saber:
“Deserto: região de clima árido; a evaporação potencial é maior que a
precipitação média anual. Caracteriza-se por apresentar solos ressequidos;
cobertura vegetal esparsa, presença de xerófilas e plantas temporárias;
Desertificação: origina-se pela intensa pressão exercida por atividades
humanas sobre ecossistemas frágeis, cuja capacidade de regeneração é baixa;
Processo de desertificação: diz respeito a atividade predatória que irá
conduzir a formação de desertos;
Área de desertificação: é a área onde o fenômeno já se manifesta;
Área propensa à desertificação: área onde a fragilidade do ecossistema
favorece o processo de instalação da desertificação;
14 Disponível em www.ambientebrasil.com.br
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15 Idem
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risco de morte. 17
Sem embargo, de toda água existente no planeta 97,5% é salgada
e apenas 2,5% é doce sendo que esse percentual não está acessível para
o consumo humano. Então vejamos: dos 2,5% existentes de água doce,
2,493% encontram-se nas grandes geleiras e em regiões subterrâneas de
difícil acesso; 0,007% é que estão à disposição do consumo humano nos
continentes, tanto em rios quanto em lagos.
Além dos problemas acima apresentados em relação à quantidade
da água e má utilização do referido recurso, não se pode olvidar que a água
disponível tem-se apresentado com qualidade extremamente duvidosa.
Com efeito, apesar de sua grande importância, hodiernamente a água tem
sido utilizada de forma predatória ensejando uma verdadeira “crise da água”,
onde se observa em várias regiões do planeta pessoas que morrem por falta
do referido recurso.
Especialistas afirmam que a escassez da água de qualidade para o consumo
humano será o maior problema do século XXI e que irão afetar mais de dois
terços da humanidade nos próximos anos:
Estudo da ONU estima que problemas de abastecimento irão
afetar dois terços da humanidade por volta de 2025. O numero de
pessoas vivendo nas regiões com problemas graves ou crônicos
de falta de água quadruplicará nos próximos vinte e cinco anos,
ou seja, um terço da população mundial estará, de alguma forma,
passando sede. Nos países em desenvolvimento, apenas metade da
população tem acesso a água potável de boa qualidade. Na China,
125 milhões de pessoas não tem acesso à água potável; na Índia,
são cerca de 19% e na África do Sul, 30% da população total.18
A “distribuição de água” em termos planetários não ocorre de forma
equânime e isso também é fator de grande estresse e preocupação no plano
global. Para se ter a noção da gravidade dos fatos, da água doce existente
e disponível no mundo, o Brasil é detentor do correspondente a quase um
quinto (20%). Essa condição propicia a cada brasileiro a disponibilidade do
equivalente a 34 milhões de litros de água (em tese).
Nesse sentido, a escassez da água tornou um grave problema para
a humanidade ensejando a realização de vários congressos e reuniões no
plano internacional no intuito de buscar resultados favoráveis para esse sério
problema.
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20 Idem, p. 12
21 Ib Idem
22 Ib idem, p. 13
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industrial24.
A sociedade de risco apresenta como característica a geração
inevitável de riscos que não podem ser controlados e/ou conhecidos de
maneira satisfatória a partir de processos decisórios. Beck assinala cinco
grandes aspectos para se discutir a sociedade de risco, a saber:
a) Os riscos produzidos escapam à percepção sensorial
direta. Permanecem invisíveis até seu conhecimento pela
sociedade ou que fujam ao controle. Os riscos passam a
ser socialmente construídos, modificados, dramatizados ou
minimizados de acordo com o conhecimento, elevando-se
a importância da mídia de massa e das profissões legais e
científicas responsáveis pela definição dos riscos;
b) os riscos não respeitam necessariamente as desigualdades
sociais da modernidade simples, isto é, classes, gênero,
etnias, e em determinado momento atingem aqueles que os
fabricaram ou os que lucram com sua ocorrência;
c) os riscos não quebram a lógica do mercado, ao contrário,
surgem mercados especializados no gerenciamento e na
mitigação dos riscos;
d) os conhecimentos sobre os riscos e as catástrofes
ambientais ganham contornos políticos;
e) as catástrofes e os riscos socialmente reconhecidos
ganham força política.25
Vale acentuar ainda duas fases no estudo da sociedade de risco:
a que corresponde a um estágio em que os efeitos e as auto-ameaças são
sistematicamente produzidas, mas que não se tornam questões públicas ou o
centro de conflitos políticos (sociedade de risco residual); a que surge quando
32 Idem, p. 30
33 GIDDENS, Anthony, op. cit., p. 33
34 TREVISAL, Joviles Vitório, op. cit., p. 81 - 82
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vazamentos, incêndios;
i) riscos que decorrem da miséria, do desemprego, da
subnutrição, da ausência de água potável, de esgoto, da falta
de tratamento do lixo;
j) riscos sociais e afetivos, decorrentes das crises de
relacionamento, interpessoais, matrimoniais, de educação
dos filhos;
l) riscos ambientais.
Nesse estudo que tem por objetivo analisar a crise ecológica na sociedade de
risco, deve ter destaque o ponto relativo ao risco ambiental.
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reverter os danos.
Na América Latina, vários ecossistemas tendem a desaparecer, ou
serem drasticamente reduzidos. No Brasil especialmente, a própria Amazônia,
segundo os cientistas, poderá ser substituída por uma vegetação característica
de cerrados (savana brasileira). Recifes de coral (estes importantíssimos para
a reprodução de várias espécies marinhas) também tendem a desaparecer, já
que consistem em colônias que suportam baixíssima variação climática.
Caso a demanda por recursos naturais e os índices de degradação ambiental
permaneçam nas taxas atuais, é possível que, em poucos anos, os dados do
relatório sejam considerados extremamente “amenos”... Aliás, isso aconteceu
já na sua apresentação, quando cientistas foram acusados de suavizar os reais
impactos das mudanças climáticas previstos para os próximos 50 anos. 40
Não se pode olvidar que os riscos, especialmente em matéria ambiental,
possuem algumas especificidades que anunciam a modernização reflexiva.
A começar pela idéia de que os riscos ambientais não estão limitados
a um determinado tempo e espaço, isto é, seus efeitos podem ser sentidos
com maior incidência ao longo dos anos e alcançar vários Estados-nação,
fazendo com que tenhamos, de fato, um problema no plano global.
Assim, em relação a espacialidade, impende assinalar que o risco
ambiental não está adstrito a um determinado espaço. Ao contrário, os efeitos
que são produzidos são de natureza transnacional. Existem vários casos que
podem demonstrar bem essa realidade, qual seja a da não observância das
fronteiras quando da ocorrência de uma lesão ao ambiente. Evidencia-se, por
exemplo, o problema da emissão dos gases poluentes, responsáveis também
pelo aquecimento global. Como visto, a emissão dos gases poluentes
contribuem para o denominado “efeito estufa” que produzirá efeitos em
termos planetários.
Outro problema que tem sido discutido em vários foros internacionais
é pertinente a poluição transfronteiriça e a produção do lixo tóxico, ou seja,
40 Disponível em www.ciranda.net
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41 LEITE, Jose Rubens Morato; AYALA, Patrick de Araújo, op. cit., p. 26-27.
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V. Considerações finais
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Lex Humana, nº 2, 2009, p. 211 ISSN 2175-0947
passa a humanidade.
Assim é que a morte de pessoas inocentes; as balas perdidas; a
violência pela violência; o abandono de crianças em orfanatos e de idosos
em asilos; a falta de sentimento e compaixão com o próximo; a indiferença
com as enfermidades, guerras e catástrofes e com todos os demais problemas
que afetam o planeta parecem não sensibilizar mais o comportamento do ser
humano.
Vive-se um grande paradoxo: a solidão numa aldeia global. De fato,
tudo que não esteja diretamente voltado ao problema ou interesse particular
acaba sendo descartado ensejando a criação de uma verdadeira sociedade de
risco... . Risco que se manifesta nos problemas ambientais.
Nesse diapasão, Oliveira assevera que em razão da individualização47
pela qual se atinge a política globalizada, também está presente nos
problemas ecológicos. Suas conseqüências não são assuntos apenas do
interesse daqueles que detém um saber especializado ou das altas cúpulas
governamentais, mas reclamam a participação da parte de todo indivíduo,
exigindo posturas que interfiram até mesmo no seu próprio estilo de vida48.
O que provocará resistências não só dos setores menos modernizados, talvez
habituados a seculares práticas degradantes do meio-ambiente, mas, com
certeza, com muito mais intensidade, o que nos deixa bastante céticos, dos
setores mais beneficiados pelos avanços da modernidade, que terão que abrir
47 BECK, Ulrick, op. cit., p. 60. “Todas as coisas consideradas perda, perigo,
desperdício e decadência na estrutura esquerda-direita da política burguesa, coisas
como preocupação com o eu e as perguntas: quem sou eu? o que eu quero? para onde
estou indo?, em suma, todos os pecados originais do individualismo conduzem a um
tipo diferente de identidade do político: a política de vida-e-morte”.
48 No mesmo diapasão, BECK, Ulrich, op. cit., p. 61: “ As questões de um
longínquo mundo de fórmulas químicas explodem com uma seriedade mortal nos
recônditos mais internos da conduta da vida pessoal como as questões do eu, da
identidade e da existência, e não podem ser ignoradas”. E mais adiante, “Agora, o
microcosmo da conduta da vida pessoal está inter-relacionado com o macrocosmo
dos problemas globais, terrivelmente insolúveis”
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Lex Humana, nº 2, 2009, p. 212 ISSN 2175-0947
mão do exagerado consumo, conforto e lucro que são o sentido das suas
vidas.49
Isso pode ser demonstrado pelo atual uso dos recursos naturais do planeta
que já excedem em quase 50% a capacidade da biosfera, considerando-se
o consumo de alimentos, materiais e energia. No ano de 2000, no Living
Planet Report, verificou-se que se cada ser humano no planeta consumisse
os recursos naturais e emitisse dióxido de carbono nos níveis dos cidadãos
norte-americanos, franceses ou alemães, seriam necessários mais dois
planetas terra com os recursos equivalentes ao estágio da época, de nosso
planeta.50 No mesmo sentido, a contribuição de Anthony Giddens:
Enfrentar as ameaças advindas do dano aos ecossistemas
da Terra provavelmente demandará respostas globais
coordenadas em níveis muito distantes da ação individual.
Por outro lado, essas ameaças não serão eficazmente
combatidas a menos que haja uma reação e uma adaptação
da parte de todo indivíduo. Mudanças generalizadas de
estilo de vida, junto com uma diminuição da importância
atribuída à contínua acumulação econômica, serão quase
certamente necessárias se quisermos minimizar os riscos
ecológicos hoje à nossa frente.51
Infelizmente falar em crise num mundo que há muito tempo perdeu a
capacidade de causar alarme, os problemas relacionados ao ambiente listados
acima, devidamente comprovados por cientistas, parecem não despertar
maiores interesses para que medidas efetivas sejam realmente tomadas para
reverter quadro tão adverso. Urge a mobilização da sociedade para reverter o
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Referências bibliográficas
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