Aulas Práticas ID 13-17-03

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Ficha 12

6. O artigo 20.º do Decreto-Lei n.º X/2009, de 2 de junho, que estabelece o regime jurídico
da venda a prestaçõ es efetuada a consumidores, determina que “[e]m caso de
incumprimento do contrato de compra e venda pelo consumidor, o credor só pode invocar
a perda do benefício do prazo ou a resoluçã o do contrato se, cumulativamente, ocorrerem
as circunstâ ncias seguintes: a) A falta de pagamento de duas prestaçõ es sucessivas; b) Ter
o credor, sem sucesso, concedido ao consumidor um prazo suplementar mínimo de 15
dias para proceder ao pagamento das prestaçõ es em atraso, acrescida da eventual
indemnizaçã o devida, com a expressa advertência dos efeitos da perda do benefício do
prazo ou da resoluçã o do contrato”. Suponha que, em 2010, é introduzido um novo artigo
no Có digo Civil, que dispõ e o seguinte: “[v]endida a coisa a prestaçõ es, a falta de
pagamento de uma só prestaçã o que nã o exceda a oitava parte do preço nã o importa a
perda do benefício do prazo quanto à s restantes nem dá lugar à resoluçã o do contrato.”
Apó s o frigorífico de sua casa ter avariado, Antó nio, consumidor, adquire, a prestaçõ es, um
novo por 800 €. Tendo já deixado de pagar uma prestaçã o de valor superior a 1⁄8 do
preço, Antó nio está preocupado que o credor invoque a perda do benefício do prazo
quanto à s restantes prestaçõ es e lhe exija, de imediato, a totalidade do preço. O que lhe
diria?
A norma do có digo civil é uma norma geral aplicá vel a todas as vendas a prestaçõ es, pelo
que, ainda que sendo posterior, nã o revoga a norma constante do art.°20 do decreto lei X.
Isso mesmo decorre do art.7º n°3 segundo o qual a lei geral nã o revoga a lei especial
exceto se outra for a intençã o inequívoca do legislador. Intençã o essa que nã o tem, porém,
de ser expressa. Vale aqui, em princípio, a má xima "lei geral posterior nã o revoga lei
especial anterior". Poderíamos ser levados a crer que a lei geral por ser mais extensa
incluiria no seu âmbito a matéria da lei especial que assim ficaria revogada. Sabemos que
nã o é assim porque o regime geral nã o toma em consideraçã o as circunstâ ncias
particulares que justificaram a emissã o da lei especial. Por isso, nã o será a lei especial
afetada em razã o de o regime geral ter sido modificado salvo se houver uma intençã o
inequívoca do legislador no sentido de revogar o regime especial. Neste caso, a particular
circunstâ ncia que justifica a consagraçã o de um regime especial é a constataçã o de que o
consumidor é geralmente, na relaçã o com profissionais, a parte mais vulnerá vel, que
merece por isso especial proteçã o do direito. Ao caso de Antó nio, que é um consumidor é
aplicá vel o regime especial mais favorá vel. É verdade que Antó nio já deixou de pagar uma
prestaçã o. Contudo para que a perda de benefício do prazo ou da resoluçã o do contrato
possam ter lugar, a lei exige a verificaçã o cumulativa de duas circunstâ ncias: a falta de
pagamento de duas prestaçõ es sucessivas; e ter o credor sem sucesso concedido ao
consumidor um prazo suplementar mínimo de 15 dias para proceder ao pagamento de
prestaçõ es em atraso, acrescido da eventual indemnizaçã o devida, com a expressa
advertência dos efeitos da perda do benefício do prazo ou da resoluçã o do contrato. In
caso nã o ocorreu nenhuma das circunstâ ncias, assim Antó nio nada tem com que se
preocupar
7. Em 26 de outubro de 2009, A, legal representante da sociedade comercial X, Lda.,
confrontado com os efeitos da crise econó mica no setor da construçã o civil, decidiu
extinguir alguns postos de trabalho. Nesse sentido, propô s a B e C a celebraçã o de um
acordo de revogaçã o do contrato de trabalho, mediante o pagamento de 12.000,00€ a cada
um, o que os trabalhadores aceitaram. No entanto, cinco dias depois de ter assinado o
referido acordo de revogaçã o, B informou por escrito a entidade patronal de que se havia
arrependido e, por isso, fazia cessar unilateralmente o acordo revogató rio. Suponha que a
Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que revogou a Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, nã o
dispõ e sobre o prazo para o exercício do direito de o trabalhador fazer cessar
unilateralmente o acordo revogató rio.
a) Recebida a comunicaçã o, X fez saber a B que o mesmo nã o respeitou o prazo legal de
dois dias para a cessaçã o unilateral do acordo revogató rio, fixado no artigo 1.º, n.º 1 da Lei
n.º 38/96, de 31 de agosto, que havia sido revogado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto,
pelo que a cessaçã o nã o produzia quaisquer efeitos jurídicos. Terá X razã o?
Está em causa o problema da nã o repristinaçã o. A resposta à questã o é nã o. A revogaçã o
da lei 99/2003 pela lei 7/2009 nã o implica a repristinaçã o das soluçõ es anteriormente
consagradas pela lei 38/2006 nos termos do art.7º n°4 que nos diz que a revogaçã o da lei
revogató ria nã o implica o renascimento da lei anterior, salvaguardando-se os efeitos já
produzidos de entre os quais a revogaçã o de leis precedentes. Perante a inexistência de
prazo para a cessaçã o unilateral do acordo revogató rio ou se conclui que essa cessaçã o
deixou de ser permitida ou se conclui que existe uma disciplina legal quanto ao seu prazo a
ser preenchida nos termos gerais de integraçã o de lacunas. O legislador tem a
possibilidade de repristinar por lei nova uma lei já revogada e pode até atribuir efeito
retroativo a essa repristinaçã o.
b) A soluçã o seria a mesma caso a norma da Lei n.º 99/2003, que fixava o prazo para o
exercício do respetivo direito, tivesse sido declarada inconstitucional com força
obrigató ria geral, pelo Tribunal Constitucional?
Nã o, a soluçã o nã o era a mesma. Nos termos do art.281º da CRP haveria repristinaçã o da
lei 38/96. Enquanto a declaraçã o de inconstitucionalidade produz efeitos ex tunc (para o
passado) a lei revogató ria produz efeitos ex nunc (para o futuro). A lei revogató ria era
inconstitucional ou ilegal desde o início e por isso nã o revogou validamente a lei anterior.
Nenhuma destas hipó teses se confunde com o caso em que a lei nova remete para um caso
em que a lei já estava revogada ou que a vigência cessou por qualquer outro motivo. Nesse
caso a lei nova nã o repõ e em vigor a lei anterior apenas se apropria do conteú do da lei
revogada, passando esse conteú do a integrar a nova lei, mas nenhuns efeitos se poderã o
fundar na lei revogada.

Ficha 13

1. A e B sã o proprietá rios de terrenos confinantes, separados por um muro que é comum a


ambos. Apó s dez anos de convivência pacífica, surgiu uma desavença entre os dois
vizinhos, motivada pelo facto de B ter aberto cavidades no muro comum até metade da sua
espessura e nelas ter encastrado pilares de ferro e cimento, tudo sem o consentimento do
vizinho, exigido pelo artigo 1372.º CC e nã o excluído, na opiniã o de A, pelo artigo 1373.º,
n.º 1 CC, que apenas se refere a traves e barrotes, e nã o a vigas. Em tribunal, B alega,
porém, que a situaçã o concreta se enquadra nos objetivos do artigo 1373.º, n.º 1 CC, que
visa permitir ao proprietá rio edificar no seu terreno, aproveitando o muro comum,
argumentando ainda que o artigo apenas se refere a traves ou barrotes porque aquelas
eram as técnicas construtivas mais habituais na altura em que o Có digo foi elaborado.
Quem terá razã o?
1. Verifica-se uma divergência de interpretaçã o do art.1373º n°1 CC. Por interpretaçã o
entende-se a atividade do jurista destinada a fixar o sentido e o alcance com que a norma
deve valer. Sem dú vida que nã o houve qualquer de entre os sentidos possíveis, sendo a lei
um instrumento de conformaçã o e ordenaçã o da vida social, dirigida a uma generalidade
de pessoas e a uma série indefinida de casos, deve procurar extrair-se dela um sentido que
valha para todas as pessoas e para todos os casos. Deve fixar-se um sentido decisivo da lei
que garante um mínimo de uniformidade de julgados. Para atingir tal objetivo é
fundamental a obediência a um conjunto de critérios e diretivas orientadores da atividade
do intérprete a que se dá o nome de Hermenêutica jurídica ou metodologia de
interpretaçã o. A Hermenêutica jurídica define os objetivos da interpretaçã o prevalecendo
hoje a orientaçã o objetivista atualista e aponta igualmente os elementos interpretativos
que deverã o ser utilizados conjuntamente, elemento literal e elemento ló gico, que se
divide em histó rico, sistemá tico e teleoló gico. Que é a prevalência da ratio legis que
conduzirá ao resultado a interpretaçã o (declarativa, restritiva, extensiva).
No nosso caso recorre-se exclusivamente ao elemento gramatical de interpretaçã o,
fazendo uma interpretaçã o declarativa da norma. Plena interpretaçã o entre o sentido
atribuído à norma e as palavras da lei. A faz uma interpretaçã o literal, isto é, muito cingida
ao texto. Extrai das palavras o sentido que elas mais naturalmente comportam. B parte do
elemento gramatical, mas vai mais longe complementando-o com o elemento teleoló gico
(razã o de ser da lei). A ratio legis do 1373 é permitir ao proprietá rio edificar ou constituir
no prédio que lhe pertence com aproveitamento da parede ou muro comum sem entraves
do vizinho, coproprietá rio do muro. Pouco ou nada relevante a técnica de construçã o
empregue. B faz uma interpretaçã o atualista da norma. Á data em que a norma foi
elaborada a técnica mais habitual eram as traves e os barrotes, mas o sentido da lei nã o se
deve manter imutá vel, antes deve evoluir com o evoluir da vida. B chega a uma
interpretaçã o extensiva segundo a qual o texto da lei "traves e barrotes" fica aquém do seu
espírito. A forma verbal adotada peca por defeito pois diz menos que aquilo que deveria
dizer. Deve-se alargar o sentido do texto fazendo corresponder a letra da lei ao espírito da
lei. Parece que no caso B terá razã o, cabendo na norma a interpretaçã o extensiva que dela
faz. No seu caso a construçã o com recurso a vigas embora nã o se encontre diretamente
abrangido pela letra da lei, encontra-se no seu espírito.

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