Carne Ovina FINAL
Carne Ovina FINAL
Carne Ovina FINAL
Oportunidades de agregação de
valor à carne ovina
Da carcaça aos derivados cárneos
Embrapa
Brasília, DF
2022
3
Exemplares desta publicação podem ser adquiridos na:
Suplentes 1ª edição
Emanuelle Baldo Gaspar e 1ª impressão (2022): 1.000 exemplares
Jorge Luiz Sant’Anna dos Santos
ISBN 978-65-87380-85-8
CDD 636.31
664.92
Graciela Olivella Oliveira (CRB-10/1434) © Embrapa, 2022
4
Autores
Elen Silveira Nalério
Médica Veterinária, doutora em Ciência e
Tecnologia Agroindustrial, pesquisadora da
Embrapa Pecuária Sul, Bagé, RS
Citieli Giongo
Farmacêutica Industrial, mestre em
Engenharia Química, analista da Embrapa
Pecuária Sul, Bagé, RS
5
APRESENTAÇÃO
7
SUMÁRIO
Introdução 11
animais de descarte 36
Considerações finais 41
Referências 42
9
INTRODUÇÃO
A crescente demanda por carne ovina no apresenta características sensoriais como: aroma e
Brasil tem estimulado o desenvolvimento da ovino- sabor mais suaves, menor teor de gordura, alcan-
cultura voltada à produção de carne de qualidade çando um bom valor de mercado (Madruga, 2005).
(Viana et al., 2015; Balanço..., 2017). Segundo
Santos et al. (2011) com o aumento do poder Estima-se que ao redor de 57,1% da
aquisitivo da população e o incremento do abate produção ovina do estado do Rio Grande do
de animais precoces, surge um novo mercado Sul destinados ao abate não são cordeiros e sim,
para a ovinocultura. A ampliação da comerciali- animais pertencentes às categorias carneiros,
zação da carne ovina em nichos e seu papel como capões e ovelhas de descarte (Azambuja; Santos,
proteína substituta no mercado de carnes são 2019; Silva et al., 2013). Com isto, as estratégias
fatores que estimulam a demanda pelo produto de valorização da carne ovina devem cursar com a
(Viana et al., 2015). classificação de carcaças nos estabelecimentos de
abate para o correto direcionamento de mercado,
Historicamente, a carne ovina brasileira, que bem como pela elaboração de cortes especializa-
era considerada um subproduto e costumava ser dos para melhor destinação e aproveitamento das
consumida apenas nos estabelecimentos rurais ou carcaças, independentemente de raças e categorias.
comercializada de forma desorganizada, passou Segundo Brito et al. (2017) a avaliação e tipificação
a assumir uma posição de destaque na atividade de carcaças tornaram-se ferramentas-chave como
(Pereira Neto, 2004 citado por Viana et al., 2015). incentivo para o setor da ovinocultura, visando à
Contudo, o consumo interno brasileiro da carne bonificação para carcaças premium.
ovina ainda é baixo (em torno de 600 gramas/
per capita) em comparação aos demais tipos de Além da avaliação de carcaças, o proces-
carne e, ainda assim, representa uma demanda samento de carnes ovinas para a elaboração de
significativa, implicando na necessidade de impor- produtos industrializados ou pratos preparados é
tação do produto de mercados como o Uruguai uma das formas mais adequadas de aproveitamento
e Nova Zelândia (Viana et al., 2015; Brito et al., dos animais mais velhos ou fora dos padrões de
2017; Esturrari, 2017). qualidade, que por vários motivos não são adequa-
dos à produção de cortes padronizados (Sório,
Um dos problemas mais comuns para grande 2009). Neste contexto, a demanda por produtos
parte dos consumidores de carne ovina (além da práticos e de fácil preparo tem crescido conside-
falta de regularidade) é a ausência de diferencia- ravelmente em virtude dos hábitos e do estilo de
ção no comércio entre a carne de cordeiro e a vida da população, os quais demandam soluções
carne de animais mais velhos (p. ex.: carneiro e rápidas, porcionadas e de qualidade em termos
ovelha) (Brito et al., 2017). A carne de cordeiro de alimentação.
possui maior aceitabilidade pelo consumidor, já que
11
Os desafios da produção de carne elo da cadeia produtiva pode contribuir na
ovina não dependem somente dos produto- agregação de valor. Os dados aqui apresen-
res, mas também de frigoríficos (indústria) e tados são oriundos dos estudos realizados
do varejo, no sentido da adoção de práticas durante o Projeto “Aproveitamento integral e
que se comprometam com a oferta de um agregação de valor à carne de ovinos de dife-
serviço voltado para a qualidade do produto rentes categorias dos campos sul-brasileiros:
final (Gallo, 2007), de forma a conquistar e da avaliação in vivo à produção de derivados
fidelizar consumidores deste tipo de proteína. cárneos” (Aprovinos).
12
Os valores agregados no
campo e no abate
13
Diversidade de carcaças ovinas
15
em todos os abatedouros-frigoríficos. Neste inte- pode ser observado nas Figuras 1 a 6 os distintos
rim, podemos exemplificar o caso do acabamento tipos de carcaças devem ter diferentes possibili-
de gordura em carcaças. O excesso ou falta de dades de aproveitamento. Consequentemente, a
gordura é indesejável na produção de carne, onde determinação da qualidade da carcaça perpassa
o excesso de gordura acumulada significa desper- pela classificação dessas, podendo-se utilizar parâ-
dício durante o toilet da carcaça e no preparo metros como o rendimento de cortes cárneos,
dos cortes para venda e consumo. Além disso, peso de carcaça, conformação, acabamento de
significa desperdício de alimentação e de tempo gordura, maturidade, escore de lesões, dentre
investido pelos produtores durante a terminação outros. Apresentamos as possibilidades de caracte-
dos animais. Já os níveis adequados de gordura rísticas a serem avaliadas nas carcaças nas Figuras
na carcaça contribuem positivamente para dimi- de 1 a 8.
nuir a perda de líquidos e evitar o encurtamento Importante salientar que os sistemas
das fibras musculares e escurecimento da carne de classificação podem ser mais interessantes
durante o processo de resfriamento, já que isto que os sistemas de tipificação de carcaças, que
ocorre em carcaças com escassez de gordura. simplesmente distinguem as carcaças por suas
Ademais, a gordura está associada com sabor, sucu- características sem separar a “melhor” da “pior”,
lência e maciez da carne (Monteiro, 2000). Como como acontece no caso da tipificação.
Efeito da raça no rendimento de carcaças ovinas
Na Tabela 1, apresentamos os dados médios com valor médio de 42,96%, apesar das distintas
de peso vivo, peso de carcaça quente e de rendi- aptidões produtivas das duas raças. Em face disso,
mentos de carcaça das raças Corriedale (dupla pode-se visionar oportunidades de valorização
aptidão para a produção de carne e lã) e Ideal (apti- de carcaças ovinas baseado na qualidade, inde-
dão para a produção de lã), onde se pode notar pendente da raça ou da aptidão produtiva, o que
que a raça não teve efeito sob o rendimento de poderia beneficiar os diversos setores da cadeia
carcaças e sim, a categoria animal. Observa-se que produtiva. Este fato é interessante especialmente
os animais da raça Corriedale apresentaram maior para a ovinocultura diversificada que encontramos
peso vivo (43,41 kg), quando comparados com os em nosso país - com animais voltados à produção
animais da raça Ideal (35,47 kg). A mesma tendên- de carne, leite, lã e peles – que gera carcaças com
cia pode ser verificada para o peso de carcaças padrões variados. Neste cenário, não seria neces-
com 19,07 e 15,11kg, respectivamente para a raça sário que o ovinocultor abrisse mão de genéticas
Corriedale e Ideal. É relevante observar que não consolidadas em suas propriedades para atender
houve diferenças significativas (P>0,05) para os às demandas de mercado.
rendimentos de carcaças entre as raças estudadas,
17
Existe a tendência dos abatedouros frigorífi- A produção de ovinos deve ser focada na
cos em remunerar os produtores pelo rendimento qualidade de carcaças, independentemente da raça
de carcaças, contudo existe uma certa impreci- do animal, o que deve ser planejado e execu-
são da terminologia aplicada. É de conhecimento tado antes do envio dos animais para o abate. A
amplo e comum no ambiente acadêmico que o qualidade de carcaças pode ser definida comer-
rendimento é calculado dividindo-se o peso da cialmente a partir dos mercados-alvo para aquele
carcaça pelo peso vivo do animal, multiplicado por produto específico. Ou seja, depende do mercado
100, expressando o resultado em porcentagem. É para onde a carne será vendida – fato que ressalta
digno de nota que a mesma terminologia é utilizada a importância da comunicação entre os elos da
pelos frigoríficos para o pagamento pelos animais cadeia produtiva. Esta comunicação, poderia
fornecidos pelo produtor, no entanto, com signifi- cursar com a elaboração de um sistema de clas-
cado distinto. Em consulta a dois frigoríficos sob sificação de carcaças que leve em consideração
o tema foi relatado que o pagamento ao produ- as diferenças raciais e as diferentes categorias
tor pelo “rendimento de carcaças”, na verdade animais, resultando na oferta de cortes padroni-
é somente um índice usado como um indicativo zados para mercados específicos. Nas Figuras 1a 6
para efeito de comparação com o peso vivo. Não podemos visualizar a avaliação de carcaças ovinas
sendo usado para o pagamento, que é realizado das categorias cordeiro, borrego e descarte das
pelo peso de carcaça quente. raças Corriedale e Ideal e também algumas carac-
terísticas in vivo dos animais.
18
Nas Figuras 1 e 2 apresentam-se duas carca- deposição de gordura, os quais podem ser utili-
ças de cordeiro das raças Corriedale e Ideal, que zados na elaboração de produtos processados.
por serem leves, podem ser direcionadas para a Reforçamos a ideia de que a promoção e o forta-
obtenção de cortes primários, adequados para lecimento desta cadeia produtiva perpassam por
venda aos consumidores até mesmo na forma de todos os setores produtivos, iniciando no campo.
peças inteiras. Já nas Figuras 3 e 4 apresentamos Acredita-se que os produtores rurais compõem o
carcaças de borrego, com cortes mais pesados, elo mais importante desta cadeia e que sem seus
os quais podem ser customizados na forma de esforços para a produção animal, não teríamos a
cortes especializados, apresentados em embala- carne na mesa do consumidor, sendo legítimo que
gens a serem preparados de forma unitária. Nas este setor demande estratégias de valorização de
Figuras 5 e 6, carcaças de ovelhas de descarte, seus produtos e de seus esforços.
onde se observa cortes pesados e com grande
19
Valores agregados no campo e no abate
RAÇA
CORRIEDALE
CATEGORIA CORDEIRO
20
Valores agregados no campo e no abate
RAÇA
IDEAL
CATEGORIA CORDEIRO
21
Valores agregados no campo e no abate
RAÇA
CORRIEDALE
CATEGORIA BORREGO
22
Valores agregados no campo e no abate
RAÇA
IDEAL
CATEGORIA BORREGO
23
Valores agregados no campo e no abate
RAÇA
CORRIEDALE
CATEGORIA DESCARTE
24
Valores agregados no campo e no abate
RAÇA
IDEAL
CATEGORIA DESCARTE
25
A Progressão da deposição de gordura
conforme a categoria animal
C
Figura 7. Visualização do acabamento de gordura na altura
da 12ª costela de ovinos de distintas categorias para aferi-
ção da espessura de gordura subcutânea.
Figura 8. Medição da área de olho de lombo (AOL) e da espessura de gordura subcutânea (EGS) em um corte da
altura da 12ª costela de ovino.
26
Os valores agregados na
indústria
27
A importância do desenvolvimento de cortes e derivados
cárneos de origem ovina
29
Segundo Andrade (2017), estudando a Nesta ótica, os consumidores em geral
percepção do consumidor brasileiro de carne desconhecem o fato da existência de distintas
ovina, identificou-se que a falta de adequação deste
raças, com distintas aptidões produtivas, com
tipo de carne em situações de consumo do dia-a- distintas categorias de animais e que estes fatores
-dia pode ser uma barreira para o aumento da culminarão em distintas carcaças, com a conse-
ingestão da proteína, justificada pela ausência ouquente oferta diversificada de cortes cárneos. O
indisponibilidade de cortes porcionados nos pontosque fica evidente quando, no balcão do açou-
de venda. Ainda de acordo com a autora, 90,9% gue, os consumidores se sentem enganados pelo
dos entrevistados concordaram ser importante vendedor apresentar como sendo de cordeiro uma
no momento da compra de carne ovina o tipo de paleta com mais de 2kg. No entanto, desconhe-
corte (pernil, paleta, costeleta, steak, T-bone, etc.)
cem o fato de que existem animais com aptidão
e 86,5% acreditaram ser importante a comercia- para produção de carne, os quais são realmente
lização na forma refrigerada, contrastando com mais pesados e fornecem cortes maiores. Este é
os 36,4% que atestam a importância da carne ser um problema de falta de comunicação, que pode
comercializada congelada. Essa última é a princi- ser solucionado com boas estratégias de educação
pal forma de comercialização da carne ovina nos do consumidor e de marketing. Assim, a título de
dias de hoje. informação, na Tabela 2 apresentamos os pesos
médios de cortes primários obtidos a partir da
Alguns impasses no segmento dos consu- carcaça de animais das raças Corriedale (raça de
midores também devem ser desfeitos, como por dupla aptidão – carne e lã) e Ideal (raça de apti-
exemplo, o de que a carne de cordeiro é difícil dão para produção de lã) e das categorias cordeiro,
de preparar, precisando de um tempero espe- borrego e descarte.
cial, etc. O consumidor precisa saber que a carne
de cordeiro pode ser consumida grelhada como Você sabia?
um bife, ou feito como carne de panela, ou seja, A carne de cordeiros alimentados a pasto
maneiras práticas, rápidas e usualmente feitas com
outras carnes (Gallo, 2007). possui, em média, apenas 3% de gordura
(teor de gordura quantificado no lombo
ovino no músculo Longissimus sem gordura
subcutânea).
30
ns: diferença não significativa
Tabela 2. Pesos médios de cortes primários de carcaças das raças Corriedale e Ideal,
bem como das categorias cordeiro, borrego e descarte.
Costela e Lombo
Paleta Desvio 1 Desvio Pernil Desvio Desvio
Pescoço Desossado
(kg) Padrão Padrão (kg) Padrão Padrão
(kg) (kg)
Raça
Corriedale ns
2.12ª 0.77 3.14ª 1.47 3.39ª 1.16 1.15 1.07
(n=24)
b b b ns
Ideal (n=30) 1.59 0.54 2.65 1.40 2.67 1.02 1.03 0.97
Categoria
Cordeiro b c b b
1.45 0.45 2.33 1.30 2.41 0.55 0.52 0.15
(n=8)
Borrego b
1.87ª 0.91 2.83 1.52 3.05ª 1.40 1.21ª 0.97
(n=32)
Descarte a a a a
1.93 0.60 3.27 1.11 3.19 0.93 1.11 1.00
(n=14)
Médias
1.82 2.85 2.99 1.08
Gerais
1
pescoço inteiro. Médias com letras distintas na mesma coluna diferem entre si, considerando p<0,05 no teste de
médias Tukey.
ns: diferença não significativa
32
Apresentaremos a seguir (Figuras 9,10 e 11) algumas sugestões de direcionamento de carcaças,
mas é importante lembrar que há muitas outras possíveis de serem exploradas.
33
Novos produtos com valor agregado desenvolvidos pela Embrapa
Cada vez mais são demandadas alternativas cadeia produtiva da carne ovina, mas o maior
de aproveitamento para animais e/ou categorias de incentivo para resolvê-las virá do próprio inte-
animais que não atendam às exigências de mercado. resse do consumidor por este tipo de carne (Gallo,
Inclusive esse é um dos principais gargalos de 2007). Uma das formas pode justamente passar
produção do setor, da mesma forma que a falta pelo desenvolvimento de produtos processados,
de aproveitamento das vísceras comestíveis e de os quais têm como função fornecer ao consumi-
outros componentes considerados não-carcaça. dor novas experiências sensoriais, para paladares
No entanto, o desafio do setor produtivo, segundo e bolsos variados, fazendo com que a indústria de
Viana et al. (2015), reside em criar capacidade de produtos cárneos aproveite melhor a carne fora
oferta de produtos cárneos ovinos para diferentes dos padrões de qualidade estipulados por deter-
mercados, desde nichos altamente especializa- minados mercados (François, 2009). O que mais
dos a mercados de consumo em massa. Porém, se destaca no processamento da carne é a agrega-
os produtos diferenciados, incluindo os embuti- ção de valor ao produto com a utilização de cortes
dos são pouco conhecidos pelos consumidores que não são aproveitados para o consumo in natura,
entrevistados, o que demonstra a oportunidade gerando alternativas para a sua comercialização.
para a inovação tecnológica em novos produtos na Com isto, haverá maior estimulo à agroindustria-
cadeia da ovinocultura (Carvalho, 2012; Andrade, lização de produtos derivados, contribuindo para
2017). E, apesar da carne de cordeiro (animais a geração de empregos e aumentando a receita
jovens) ser a categoria animal mais valorizada e oferta de produtos disponíveis comercialmente
pelos consumidores, existe o (Sório, 2009).
elevado potencial Neste sentido, esforços foram envergados
de exploração durante a execução do projeto APROVINOS para
e de lucra- estabelecer estratégias de valorização deste tipo
tividade da de carne e também para verificar a percepção dos
carne ovina de consumidores sobre os produtos desenvolvidos.
animais velhos, Apresentamos a seguir alguns achados durante
principalmente a esses estudos.
partir do seu processamento industrial. Um primeiro fato alarmante que ficou
O aproveitamento de carcaças e de carnes evidenciado nos estudos sobre percepção do
de ovinos com este perfil para o desenvolvimento consumidor de carne ovina é a estimativa de que
de produtos permite vislumbrar a possibilidade 12% da população brasileira nunca comeu carne
de agregação de valor às matérias-primas com ovina (Andrade et al., 2018), o que corresponde
baixo valor comercial (Nalério; Giongo, 2017). dizer que aproximadamente 25,1 milhões de brasi-
Inúmeras são as dificuldades encontradas pela leiros nunca provaram esta proteína.
38
Em outro estudo (Minuzzi et al., 2016b), diferentes níveis, a fim de gerar um produto com
observou-se que os consumidores que não alta agregação de valor e de boa aceitabilidade
consumiam carne ovina justificaram o fato por pelo consumidor. Após o desenvolvimento das
considerarem este tipo de proteína de sabor muito formulações cuja matéria-prima foi de retalhos
forte, possivelmente relatando experiências prévias de carne ovina, combinados com distintos teores
com carne ovina de animais mais velhos, como de gordura ovina e suína (5% ou 10% de gordura
ovelhas e/ou carneiros. Isso reforça a ideia de que de cordeiro; 5% ou 10% de gordura suína adicio-
há um grande mercado a ser explorado, tanto de nada) e da avaliação sensorial por consumidores,
carne ovina in natura, quanto de derivados cárneos. identificou-se que não houve diferença estatística
O desenvolvimento de produtos derivados pode entre as diferentes formulações, com média geral
ser uma estratégia interessante para o alcance de de 6,9 pontos em escala hedônica de 9 pontos,
novos consumidores de carne ovina, utilizando sendo todas bem aceitas pelos consumidores.
a carne de animais mais velhos e ou as vísceras. Consequentemente, conclui-se que o produto
Neste sentido, foram desenvolvidos durante o teria espaço no mercado consumidor, além de
projeto APROVINOS produtos tipo presuntos ser uma opção para agregação de valor e também
crus, copas, bacons (oveicon), mortadela, apre- para ampliar as opções de produtos processa-
suntado, patê de fígado com ervas finas, linguiças, dos de carne ovina para
hambúrgueres, dentre outros. Todos à base de os consumidores, uma
carne ovina, com enfoque no aproveitamento inte- vez que atendem
gral de carcaças e de animais mais velhos. aos requisitos legais
Para analisar as oportunidades de mercado microbiologicamente,
e a possível agregação de valor de alguns dos aos parâmetros físi-
produtos desenvolvidos, realizou-se estudos para co-químicos e de
verificar a aceitabilidade e intenção de compra dos aceitabilidade, resul-
consumidores frente aos novos derivados cárneos. tando, portanto, em
De forma geral, as informações foram acessadas produtos nutritivos e
por meio de testes sensoriais, seguidos de avalia- seguros (Acosta et al.,
ção por questionários. 2014).
Durante o abate e desossa surgem muitas Outro produto desenvolvido foi o bacon
aparas de carne como o resultado da toalete de ovino (Oveicon) feito a partir de cortes da barriga ou
carcaças e de cortes, dando origem a retalhos costela e lombo de ovinos não-cordeiros. Por meio
de carne, que podem ser utilizados no desen- de um questionário, avaliou-se a oportunidade de
volvimento de produtos cárneos. Com isso foi mercado para o produto, além de verificar a possí-
desenvolvida uma formulação de linguiça fres- vel agregação de valor. Observou-se bom potencial
cal ovina através da utilização de retalhos de de inserção do produto no mercado, já que os
carne obtidos a partir do abate de cordeiros, entrevistados apresentaram interesse em adqui-
testando a adição de gordura ovina ou suína em rir e experimentá-lo. Além disto, mostraram-se
39
dispostos a pagar R$ 7,14 por 100 formulações de copa ovina desenvolvidas no
g do produto, frente aos R$ 4,76 projeto APROVINOS foram remodeladas para
atualmente pagos pelo bacon se ajustar a esta tendência. Os produtos foram
suíno (Minuzzi et al., avaliados por 202 consumidores em Porto Alegre
2016b). No teste de e no Rio de Janeiro de forma cega ou não, variando
aceitação utilizou- a defumação (defumado versus não defumado) e
-se escala hedônica teor de sal (4,5% vs. 3,4%), e comparado com
de 9 pontos, com 112 duas amostras de copa suína comerciais.
provadores não treina- Os resultados mostraram que em ambas
dos, em ambientes controlados, em dois locais as condições experimentais, as amostras de copa
diferentes de avaliação. O produto apresen- avaliadas, tanto as suínas, como as ovinas, não dife-
tou nota média de aceitação de 8,15 pontos e riram consideravelmente no que tange ao sabor. A
42,98% dos julgadores afirmaram que compra- defumação e alto teor de sal aumentaram significa-
riam o produto frequentemente. Isso demonstra tivamente a percepção hedônica dos consumidores
o grande potencial de agregação de valor que o de copa ovina. Os resultados indicam oportuni-
desenvolvimento deste produto pode trazer para dades positivas para a copa ovina no mercado
a cadeia produtiva da carne ovina (Minuzzi et al., brasileiro e que o desenvolvimento de produtos
2016a), indicando que o oveicon possui boa possi- cárneos curados de alta qualidade, adaptados para
bilidade de comercialização caso seja inserido no atender as demandas dos consumidores, repre-
mercado (Minuzzi et al., 2016b). senta uma opção interessante para agregar valor à
Para promover o aproveitamento de fíga- carne de ovinos mais velhos (Andrade et al., 2018).
dos de ovinos foi desenvolvida uma formulação de Esses dados indicam também que há uma infini-
patê de fígado ovino. Apesar deste tipo de matéria- dade de alternativas para o desenvolvimento de
-prima não ser de preferência dos consumidores, produtos cárneos e que os processos tecnológicos
o produto foi avaliado positivamente no teste de que enfoquem em saudabilidade podem ser uma
aceitação ao receber uma nota média de 7,88, estratégia interessante para o desenvolvimento de
onde 30% gostaram muitíssimo e 40% gostaram produtos cárneos, já que podem trazer benefícios
muito; somente 2% não gostaram/nem desgosta- potenciais tanto à indústria
ram. Já no teste de intenção de compra, pôde-se da carne quanto para
observar a grande possibilidade de compra deste a saúde pública.
produto, onde 26% comprariam sempre, 44%
comprariam frequentemente, 20% comprariam
ocasionalmente e 8% comprariam raramente
(Rodrigues et al., 2015).
Além disso, de forma a atender as atuais
macrotendências em alimentação, no que tange
à saudabilidade, bem como a atitude positiva
dos consumidores em relação à redução de sal,
40
Considerações Finais
41
Referências
ACOSTA, R. A. M.; NALÉRIO, E. S.; GIONGO, C.; TORBES, I. P.; BORGES, L. D.; SANTOS, C. M.
dos. Aceitação de linguiça fina frescal ovina produzida a partir de carne de descarte e diferentes
teores e tipos de gordura. In: SALÃO INTERNACIONAL DE ENSINO, EXTENSÃO E PESQUISA,
6., 2014, Bagé. Anais... Bagé: Unipampa, 2014.
ANDRADE. J. C. de; NALÉRIO, E. S.; GIONGO, C.; BARCELLOS, M. D.; ARES, G.; DELIZA,
R. Consumer sensory and hedonic perception of sheep meat coppa under blind and informed
conditions. Meat Science, v. 137, p. 201-210, Mar. 2018.
AZAMBUJA, M. R.; SANTOS, D.V. Potencialidade de ovinos para abate no Rio Grande do
Sul. Disponível em: http://www2.agricultura.rs.gov.br/uploads/1294316495Potencialidade_de_
ovinos_para_abate_no_RS.pdf. Acesso em: 8 mar. 2019.
BALANÇO 2017 perspectivas 2018: ovinos e caprinos. Brasília, DF: CNA, 2017. Disponível em:
https://www.cnabrasil.org.br/assets/arquivos/ovinos_caprinos_balanco_2017.pdf. Acesso em: 30
out. 2018.
BECKER, T. Consumer perception of fresh meat quality: a framework for analysis. British Food
Journal, v. 102, n. 3, p. 158-176, Apr. 2000.
BRITO, F. L. L.; SILVA, B. P. A.; SANTOS, A. P. P.; JUNIOR, A. C. M.; ALVES, L. G. F. Situação do
mercado da carne ovina no Brasil. Anais da Semana do Curso de Zootecnia: SEZUS, v. 11, n. 1,
2017. Disponível em: https://www.anais.ueg.br/index.php/sezus/article/view/9345/6894. Acesso em:
14 ago. 2019.
42
CARVALHO, R. B. Potencialidades dos mercados para os produtos derivados de caprinos e
ovinos. Disponível em: http://atividaderural.com.br/artigos/4f7b556526852.pdf. Acesso em: 3 mar.
2012.
GALLO, S. B. O mercado da carne ovina. Apta Regional: pesquisa & tecnologia, v. 4, n. 1, jan./jun.
2007.
HUISMAN, A.; BROWN, D. J. Genetic parameters for ultrasound scan and wool traits at yearling
and hogget age in Merino sheep. Proceedings of the Association for the Advancement of
Animal Breeding and Genetics, v. 16, p. 32-35, Jan. 2005.
MINUZZI, S. W.; GIONGO, C.; PADILHA, A. P.; ALMEIDA, V. B.; NALÉRIO, E. S.; COSTA, R. J.
Oportunidade de mercado e de agregação de valor para produto tipo bacon desenvolvido a partir
43
de carne ovina - oveicon. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE
ALIMENTOS, 25.; CIGR SESSION 6 INTERNATIONAL TECHNICAL SYMPOSIUM, 10., 2016,
Gramado. Alimentação: árvore que sustenta a vida: anais. Gramado: SBCTA Regional, 2016a.
Food: the tree that sustains life. 901.
MINUZZI, S. W.; GIONGO, C.; PADILHA, A. P.; ALMEIDA, V. B.; COSTA, R. J.; NALÉRIO, E. S.
Aceitação e intenção de compra de produto tipo bacon desenvolvido com carne ovina - oveicon. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE ALIMENTOS, 25.; CIGR SESSION
6 INTERNATIONAL TECHNICAL SYMPOSIUM, 10., 2016, Gramado. Alimentação: árvore que
sustenta a vida: anais. Gramado: SBCTA Regional, 2016b. Food: the tree that sustains life. 887.
NALÉRIO, E. S.; GIONGO, C. Ciência e tecnologia de carnes: presunto cru ovino. Bagé:
Embrapa Pecuária Sul, 2017. 8 p. (Embrapa Pecuária Sul. Comunicado técnico, 94).
RODRIGUES, D. G.; VIEIRA, H. R.; COSTA, R. J. da; NALÉRIO, E. S.; GONÇALVES, A. V.;
COUTO, M. B. do. Elaboração de patê de fígado ovino como potencial agregador de valor a
subprodutos do abate ovino. In: SIMPÓSIO DE ALIMENTOS, 9., 2015, Passo Fundo. Anais... Passo
Fundo: Universidade de Passo Fundo, 2015.
SANTOS, D. V.; AZAMBUJA, R. M.; VIDOR, A. C. Dados populacionais do rebanho ovino gaúcho.
A Hora Veterinária, ano 31, n. 185, p. 41-44, jan./fev. 2011.
SILVA, A. P. S.; SANTOS, D. V.; KOHEK JUNIOR, I.; MACHADO, G.; HEIN, H. E.; VIDOR, A. C.
M.; CORBELLINI, L. G. Ovinocultura do Rio Grande do Sul: descrição do sistema produtivo e dos
principais aspectos sanitários e reprodutivos. Pesquisa Veterinária Brasileira, v. 33, n. 12, p.
1453-1458, 2013.
SÓRIO, A. Sistema agroindustrial da carne ovina: o exemplo do Mato Grosso do Sul. Passo
Fundo: Méritos, 2009. 109 p.
VIANA, J. G. A.; MORAES, M. R. E.; DORNELES, J. P. Dinâmica das importações de carne ovina no
Brasil: análise dos componentes temporais. Semina: Ciências Agrárias, v. 36, n. 3, p. 2223-2234,
2015. Suplemento 1.
44