Para Todxs Natal Uma Introducao A Logica
Para Todxs Natal Uma Introducao A Logica
Para Todxs Natal Uma Introducao A Logica
NATAL
uma introdução à
lógica formal
Para Todxs
NATAL
uma introdução à
lógica formal
De P. D. Magnus
Tim Button
com acréscimos de
J. Robert Loftis
Robert Trueman
remixado e revisado por
Aaron Thomas-Bolduc
Richard Zach
adaptado, re-remixado, re-revisado e ampliado pelo
Grupo de Estudos em Lógica da UFRN
(GEL–Carolina Blasio)
1ª Edição
21/07/2022
UFRN ppgfil
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
Para Todxs Natal: uma introdução à lógica formal / P. D. Magnus, Tim But-
ton, Robert Loftis, Robert Trueman, Aaron Thomas-Bolduc, Richard Zach (auto-
res internacionais) ; Daniel Durante, Maria da Paz Nunes de Medeiros, Ricardo
Gentil de Araújo Pereira (autores nacionais organizadores); Tiago de Oliveira
Magalhães, Hudson Benevides, Jordão Cardoso, Paulo Benício Andrade Guima-
rães, Valdeniz da Silva Cruz Junior, Pablo Vinícius Medeiros da Silva, Gabriel de
Oliveira Brito, Jaboti Potiguara, Eryka Marillya Gilvanna Silva, Johnny Ricardo
Pinheiro, Roosewelt Muniz Marinho (autores nacionais colaboradores). — Na-
tal: PPGFIL, 2022.
457p.
ISBN: 978-65-995185-3-9
Este é um livro de autoria coletiva, distribuição livre e edição dinâmica que
pode, eventualmente, sofrer acréscimos, alterações e correções. Esta é a edição
de 21/07/2022.
RN/BSE-CCHLA CDU 16
A editoração gráőca deste livro foi produzida com base no código fonte
LATEX do livro (3), que está disponível em forallx.openlogicproject.org.
A nossa capa, inspirada na capa de Mark Lyall para o forallx: Cal-
gary, é de Maria da Paz Medeiros e Daniel Durante. Os arquivos LATEX
originais desta versão do Para Todxs: Natal estão disponíveis no GitHub
em:
https://github.com/Grupo-de-Estudos-em-Logica-da-UFRN/Para-Todxs-Natal
1 Argumentos 2
2 O alcance da lógica 8
3 Outras noções lógicas 29
vii
SUMÁRIO viii
V Interpretações 204
22 Extensionalidade 205
23 A verdade na LPO 215
24 Conceitos semânticos 228
25 Utilizando as interpretações 230
26 Inőnitas interpretações 238
IX Metateoria 388
Apêndices 429
Glossário 449
Prefácio
O principal objetivo da lógica é avaliar argumentos e separar os bons,
chamados válidos, dos maus, os inválidos. Um argumento é um grupo
de sentenças que corresponde à expressão linguística de um raciocí-
nio. Uma das sentenças, a conclusão, é o ponto őnal do raciocínio,
aquilo que se conclui. As outras, as premissas, são o ponto inicial, as
informações das quais se parte para chegar à conclusão. A ideia é que
os argumentos bons do ponto de vista lógico, os válidos, são aqueles
que expressam raciocínios infalíveis; raciocínios em que a conclusão a
que se chega está infalivelmente justiőcada a partir das premissas de
que se parte. A lógica enquanto disciplina busca caracterizar os raci-
ocínios infalíveis através de uma relação formal entre as sentenças dos
argumentos que os expressam: a consequência lógica. Esta relação não
depende do assunto sobre o qual as sentenças tratam e vigora entre as
premissas e a conclusão de todo argumento válido.
Vamos, no decorrer deste livro, examinar detidamente a relação de
consequência e aprender alguns dos principais métodos formais empre-
gados em sua abordagem. No entanto, para você ter uma primeira ideia
de onde está pisando ao iniciar seus estudos, vejamos aqui um exemplo
ilustrativo. Suponha que Virgínia more em Ponta Negra, mas que você
não saiba disso. De que modo você poderia őcar sabendo? Bem, você
pode őcar sabendo que Virgínia mora em Ponta Negra diretamente,
caso você venha a conhecer a casa de Virgínia, ou seu endereço, pelo
menos. Mas você pode também őcar sabendo indiretamente, através
da lógica. Suponha que você ouça trechos de uma conversa de Virgínia
com uma amiga, e que tenha ouvido as seguintes sentenças ditas por
ela:
1. Eu vou à praia de Ponta Negra a pé todas as manhãs.
2. Eu permaneço 30 minutos na praia todos os dias.
x
PREFÁCIO xi
Bem, você não ouviu Virgínia dizendo onde morava, mas se você co-
nhece Natal, você sabe que:
Então, se você juntar o que ouviu Virgínia dizer (1, 2 e 3) com o que
sabe sobre Natal (4), você conclui que:
onde o debate e a divergência são tão ou mais intensos que nas outras
áreas da őlosoőa.
Mas a lógica formal não é importante só para a őlosoőa. Ela tam-
bém tem papel privilegiado tanto na matemática quanto na ciência da
computação. Em matemática, as linguagens formais são usadas para
descrever não estados de coisas do “dia a diaž, mas estados de coisas
matemáticos. Os matemáticos também se interessam pelas consequên-
cias de deőnições e suposições e, para eles, também é importante esta-
belecer essas consequências (que eles chamam de “teoremasž) usando
métodos completamente precisos e rigorosos. A lógica formal fornece
esses métodos. Na ciência da computação, a lógica formal é aplicada
para descrever o estado e o comportamento dos sistemas computacio-
nais, tais como circuitos, programas, bancos de dados, etc. Os métodos
da lógica formal também podem ser usados para estabelecer as con-
sequências de tais descrições, como, por exemplo, se um dado circuito
está ou não livre de erros, ou se um programa faz o que se pretende que
ele faça, ou se um banco de dados é consistente, ou se algo é verdadeiro
a partir dos dados nele contidos.
Este livro está dividido em nove partes. A parte I introduz o assunto
e as noções da lógica de maneira informal, ainda sem utilizar uma lin-
guagem formal. As partes II, III e VI tratam da linguagem verofunci-
onal. Nesta linguagem as sentenças são formadas a partir de senten-
ças básicas através de certos termos (‘ou’, ‘e’, ‘não’, ‘se . . . então’) que
conectam sentenças mais simples de modo a formar outras sentenças
mais complexas. Noções lógicas, tais como a relação de consequência,
são discutidas de duas maneiras: semanticamente, usando o método
das tabelas de verdade (na Parte III) e demonstrativamente, usando
um sistema de derivações formais (na Parte VI). As partes IV, V e
VII lidam com uma linguagem mais complexa, a da lógica de primeira
ordem. Além dos conectivos da lógica verofuncional, esta linguagem
inclui também nomes, predicados, a relação de identidade e os quan-
tiőcadores. Esses elementos adicionais da linguagem a tornam muito
mais expressiva do que a linguagem verofuncional, e passaremos um
bom tempo investigando o quanto se pode expressar nela. As noções da
lógica de primeira ordem também são deőnidas tanto semanticamente,
através de interpretações (na Parte V), quanto demonstrativamente (na
Parte VII), usando uma versão mais complexa do sistema de derivação
formal introduzido na Parte VI. A Parte VIII discute uma extensão da
LVF (a lógica verofuncional) obtida a partir de operadores não vero-
funcionais para a possibilidade e a necessidade, conhecida como lógica
modal. A Parte IX abrange três tópicos avançados da LVF: o tópico das
PREFÁCIO xiv
Introdução
Informal à
Lógica
1
CAPÍTULO 1
Argumentos
O assunto da lógica é a avaliação de argumentos; a identiőcação dos
bons argumentos, separando-os dos maus. Um argumento é um
grupo de sentenças que exprime um raciocínio. Uma das sentenças,
chamada de conclusão, é o ponto őnal do raciocínio, e corresponde
àquilo que se conclui. As outras, chamadas de premissas, são o ponto
inicial do raciocínio e representam as informações das quais se parte
para chegar à conclusão. Um argumento, então, é algo como:
2
CAPÍTULO 1. ARGUMENTOS 3
1.1 Sentenças
Dissemos antes que os argumentos, foco central do interesse da lógica,
são conjuntos de sentenças que exprimem raciocínios. Mas raciocinar
é manipular informação. Por isso à lógica interessam apenas as senten-
ças capazes de carregar informação, que são exatamente aquelas que
podem ser verdadeiras ou falsas. Assumiremos, então, uma deőnição
de sentença que contempla apenas aquelas frases ou expressões que
podem ser verdadeiras ou falsas.
Essas sentenças, na maioria das vezes, expressam coisas que con-
tam como fatos, tais como “Kierkegaard era corcundaž ou “Kierkegaard
gostava de amêndoasž. Mas as sentenças da lógica também podem ex-
pressar coisas que nos parecem mais uma opinião do que um fato, tais
como “Amêndoas são saborosasž. Estas expressões de opinião também
são sentenças legítimas, no sentido lógico que estamos adotando aqui.
Em outras palavras, uma sentença não é desqualiőcada como parte le-
gítima de um argumento só porque não sabemos se ela é verdadeira ou
falsa, nem porque sua verdade ou falsidade é uma questão de opinião.
Não importa se sabemos, nem mesmo se é possível ou não saber se
a sentença é verdadeira ou falsa. Se a sentença for do tipo que pode
ser verdadeira ou falsa, então ela será uma sentença em nossa acep-
ção lógica e pode desempenhar o papel de premissa ou conclusão e
fazer parte de um argumento lógico. Essas sentenças, sobre as quais
cabe julgar se são verdadeiras ou falsas, são conhecidas como sentenças
declarativas.
Por outro lado, há expressões que seriam consideradas sentenças
por um linguista ou gramático, mas que não são sentenças declarativas
e portanto, não contam como sentenças na lógica, tais como:
premissas nem como conclusões. Se, por exemplo, você disser “não
estou com sonož em resposta à pergunta acima, sua resposta será uma
sentença no sentido lógico, porque diferentemente da pergunta, ela é
do tipo que pode ser verdadeira ou falsa. Geralmente, perguntas não
contam como sentenças, mas respostas contam.
‘Sobre o que é este curso?’ não é uma sentença (no nosso sentido).
Por outro lado, ‘Ninguém sabe sobre o que este curso trata’ é uma
sentença.
Exercícios
No őnal da maioria dos capítulos há uma seção com exercícios que
ajudam a revisar e explorar o material abordado. Fazer estes exercícios
é parte essencial e insubstituível do seu aprendizado. Aprender lógica
é como aprender a falar uma língua estrangeira, ou aprender a jogar
tênis, ou a tocar piano. Não basta ler e entender a teoria. A parte mais
importante do aprendizado é a prática.
Então, aqui está o primeiro exercício. Identiőque a conclusão em
cada um dos 4 argumentos abaixo.
CAPÍTULO 1. ARGUMENTOS 7
O alcance da
lógica
2.1 Validade e contraexemplo
No Capítulo 1, falamos sobre argumentos, ou seja, uma coleção de sen-
tenças (as premissas), seguidas por uma única sentença (a conclusão).
Dissemos que algumas palavras, tal como “portantož, indicam qual sen-
tença deve ser a conclusão. A palavra “portantož, é claro, sugere que
há uma conexão entre as premissas e a conclusão. A ideia é que um
argumento seja a expressão de um raciocínio cujo ponto de partida são
as premissas e o ponto de chegada é a conclusão. Por isso dizemos que
a conclusão segue-se ou é uma consequência das premissas.
A principal preocupação da lógica é exatamente esta noção de con-
sequência. A lógica enquanto disciplina constitui-se em um conjunto
de teorias e ferramentas que nos apontarão quando uma sentença se
segue de outras, ou seja, quando o raciocínio que parte das premissas
e chega à conclusão é um raciocínio infalível.
Pois bem, voltemos ao argumento apresentado no Capítulo 1:
Ou foi o mordomo, ou foi o jardineiro.
Não foi o mordomo.
.Û. Foi o jardineiro.
Não sabemos a que, exatamente, essas sentenças se referem. Talvez
você suspeite que “foiž signiőque “foi o autor de algum crimež não es-
peciőcado. Podemos imaginar, por exemplo, que esse argumento tenha
8
CAPÍTULO 2. O ALCANCE DA LÓGICA 9
Continuamos sem saber exatamente o que está sendo dito aqui, já que
não sabemos a que a palavra “foiž se refere. No entanto, você provavel-
mente concorda que esse argumento é diferente dos anteriores em um
aspecto importante. Mesmo que suas premissas sejam ambas verdadei-
ras, não é garantido que a conclusão também será. Ou seja, a verdade
das premissas não é garantia para a verdade da conclusão. Nós pode-
mos ver isso porque conseguimos conceber uma situação hipotética na
qual as premissas do argumento são verdadeiras e a conclusão é falsa.
Considere:
2.2 Situações
Dissemos que o que distingue os argumentos válidos dos inválidos é
que os primeiros não têm contraexemplo e os últimos têm. E dissemos
também que um contraexemplo é uma situação possível na qual as
premissas do argumento são verdadeiras e a conclusão é falsa. Mas
há ainda um elemento um pouco misterioso aqui. O que exatamente é
uma situação possível? Existem situações impossíveis? E o que signiőca
ser verdadeiro em uma situação?
Nosso primeiro esclarecimento é de vocabulário. Estamos usando
as expressões ‘situação’ e ‘situação possível’ como sinônimas. Então, no
nosso uso aqui neste livro, não existem situações impossíveis. Situações
são situações possíveis. Mas aőnal o que é uma situação?
Em linhas bem gerais uma situação é um estado de coisas possível,
ou seja, é um cenário hipotético, uma estória imaginada que descreve
um modo como o mundo poderia ser e que tem informação suőciente
para decidir se as sentenças de um argumento são verdadeiras ou falsas
nessa estória. Para descrever uma situação, além de apresentar o cená-
rio hipotético (a estória), precisamos também estabelecer o signiőcado
preciso de eventuais palavras ambíguas presentes nas sentenças. Já vi-
mos, na Página 10, um exemplo de situação. Tinhamos ali o seguinte
argumento:
Veja que esta situação é composta por (a) uma especiőcação do signiő-
cado da palavra “foiž, que é ambígua sem um contexto; e por (b) uma
estória. Com esses dois elementos, a situação conőgura-se em um ce-
nário hipotético que tem informação suőciente para decidir a verdade
ou falsidade das três sentenças do argumento. Conforme vimos, as
duas premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa, o que faz desta
situação um contraexemplo que comprova que o argumento é inválido.
Considere agora este outro argumento:
CAPÍTULO 2. O ALCANCE DA LÓGICA 14
com os seguintes sentidos: uma pessoa canhota tem mais habilidade com o lado esquerdo
do corpo do que com o direito. Uma pessoa destra tem mais habilidade com o lado direito
do corpo do que com o esquerdo. E se uma pessoa tem habilidades equivalentes com
os lados esquerdo e direito, esta pessoa não é nem canhota nem destra, é ambidestra.
Então se uma pessoa é canhota, ela não é destra. E se ela é destra, ela não é canhota.
CAPÍTULO 2. O ALCANCE DA LÓGICA 16
contou a estória está enganada, ou então que ela está mentindo. Essa
estória não pode ser real.
É isso mesmo o que fazemos na lógica. A estória da suposta si-
tuação 4 não descreve um estado de coisas possível, um modo como
o mundo poderia ser. Não é possível que o mundo seja do jeito que
essa estória descreve, porque de acordo com ela as sentenças ‘Jordão
é canhoto’ e ‘Todos os natalenses são canhotos’ são tanto verdadeiras
quanto falsas. Essa estória contém o que chamamos de contradições e,
por isso, extrapola os limites do que consideramos concebível para o
mundo.
Uma situação, conforme deőnimos, precisa representar uma possi-
bilidade legítima e concebível para o mundo, e a suposta situação 4
não faz isso. Ao conter contradições ela viola as regras do que é pos-
sível e por isso não é uma situação legítima; não é uma história, mas
apenas uma estória inconcebível e contraditória.
Isso nos deixa com algumas perguntas importantes. Quais são essas
regras do que é possível, que foram violadas pela suposta situação 4?
Como podemos saber o que é possível e o que não é possível? Como
se deőne os limites do que é concebível para o mundo?
Na situação 2, por exemplo, um meteorito caiu em Natal e como
consequência inexplicável desse fenômeno todas as pessoas nascidas
na cidade desde então são canhotas. Isso é bem esquisito e absurdo,
mas não rechaçamos a situação 2 como ilegítima ou inconcebível. Ela
foi considerada uma situação legítima. Já a suposta situação 4, onde
Jordão é canhoto e não é canhoto, e é destro e não é destro foi recusada
como ilegítima e inconcebível. Por que é concebível que a queda de
um meteorito faça com que todas as pessoas que venham a nascer nas
proximidades sejam canhotas, mas é inconcebível que uma pessoa seja
e não seja canhota?
Não temos respostas para todas estas perguntas. Na verdade não há
respostas unânimes para todas estas perguntas. Elas têm sido respon-
didas diferentemente por pesquisadores diferentes. O que você precisa
saber disso tudo é que podemos entender a lógica como a disciplina
que estuda exatamente estas regras do que é possível, do que conside-
ramos concebível. Ou seja, são as regras da lógica que estabelecerão
os limites do que pode őgurar nas situações. Qualquer situação, por
mais estranha que seja, que não viole princípios considerados lógicos,
será aceita como legítima e concebível. Serão inconcebíveis e inacei-
táveis apenas aquelas supostas situações cujas estórias violem algum
princípio lógico.
A principal tarefa dos lógicos é explicitar as regras que deőnem os
CAPÍTULO 2. O ALCANCE DA LÓGICA 17
Rocinante viaje mais rápido que a luz. Sendo aceitável, esse cenário
torna-se um contraexemplo para o argumento que, por isso, não será
considerado válido.
O que devemos fazer aqui? Se por um lado não faz muito sentido
admitir situações que violem as leis da natureza, já que parece que
elas nunca ocorrerão, por outro lado, proibir tais situações pode nos
limitar demais. Aőnal, nem sempre soubemos o que hoje sabemos. Os
conhecimentos que a ciência nos dá hoje, algum dia já foram cenários
hipotéticos que violavam as leis cientíőcas vigentes. Os lógicos preferem
deixar a ciência para os cientistas e aceitam como concebíveis situações
que violam as leis da natureza. Então, de um ponto de vista lógico, o
argumento acima da nave Rocinante é inválido, já que situações nas
quais a nave viaja mais rápido do que a luz são aceitáveis e constituem
contraexemplos para o argumento.
Se, no entanto, quisermos levar em consideração algumas das res-
trições da ciência em nossos raciocínios, sempre podemos acrescentar
as leis cientíőcas que nos interessam como premissas de nossos argu-
mentos. Por exemplo:
A espaçonave Rocinante levou 6 horas na viagem entre a estação
espacial Tycho e o planeta Júpiter.
Nada viaja mais rápido do que a luz (300.000 quilômetros por
segundo)
.Û. A distância entre a estação espacial Tycho e Júpiter é menor do
que 14 bilhões de quilômetros.
Temos agora um argumento válido, porque a segunda premissa proibe
explicitamente situações que violem o limite da velocidade da luz.
Suponha, agora, que os cenários hipotéticos sejam limitados pelos
nossos conceitos e pelo modo como eles se relacionam, e considere este
outro argumento:
Jussara é uma oftalmologista.
.Û. Jussara é uma médica de olhos.
Se estamos permitindo apenas cenários compatíveis com nossos concei-
tos e suas relações, então esse também é um argumento válido. Aőnal,
em qualquer cenário que imaginarmos no qual Jussara é uma oftalmolo-
gista, Jussara será uma médica de olhos, já que os conceitos de ser uma
oftalmologista e ser uma médica de olhos têm o mesmo signiőcado. Se,
no entanto, permitimos situações em que ser uma oftalmologista sig-
niőca algo diferente de ser uma médica de olhos, então é claro que a
premissa desse argumento pode ser verdadeira e a conclusão falsa.
CAPÍTULO 2. O ALCANCE DA LÓGICA 19
Padrão 1
A é um X ou um Y .
A não é um Y .
.Û. A é um X .
umas poucas palavras (as palavras lógicas) que descrevem a forma lógica das sentenças.
CAPÍTULO 2. O ALCANCE DA LÓGICA 21
Argumento 2
Edna é uma matemática ou uma bióloga.
Edna não é uma bióloga.
.Û. Edna é uma matemática.
é um argumento cuja forma lógica também tem o padrão 1, onde subs-
tituímos ‘A’ por ‘Edna’, ‘X’ por ‘matemática’ e ‘Y’ por ‘bióloga’. Note
que esse argumento também é válido. Os argumentos 1, 2 e todos os
outros cuja forma lógica tem o padrão 1 são válidos. Considere agora
este outro argumento.
Argumento 3
Jussara é uma oftalmologista ou uma dentista.
Jussara não é uma dentista.
.Û. Jussara é uma médica de olhos.
Exercícios
A. Quais argumentos a seguir são válidos? Quais são inválidos?
1. Sócrates é um homem.
Todos os homens são repolhos.
.Û. Sócrates é um repolho.
2. Lula nasceu em Porto Alegre ou foi presidente do Brasil.
Lula nunca foi presidente do Brasil.
.Û. Lula nasceu em Porto Alegre.
3. Se eu acordar tarde eu me atrasarei.
Eu não acordei tarde.
.Û. Eu não me atrasei.
4. Lula é gaúcho ou mato-grossense.
Lula não é mato-grossense.
.Û. Lula é gaúcho.
5. Se o mundo acabar hoje, não precisarei acordar cedo ama-
nhã.
CAPÍTULO 2. O ALCANCE DA LÓGICA 28
Outras noções
lógicas
No Capítulo 2 apresentamos os conceitos mais importantes da lógica:
as noções correlatas de consequência e validade. Para deőni-las introdu-
zimos os conceitos de situação e contraexemplo. Não custa repetir: um
argumento é válido, bom do ponto de vista lógico, se a conclusão é
consequência das premissas. Isso ocorre quando ele não tem contra-
exemplo, ou seja, quando não existe situação em que todas as suas
premissas são verdadeiras e sua conclusão é falsa. Nesse caso, a infor-
mação da conclusão já está contida na informação das premissas e por
isso dizemos que as premissas garantem (ou justificam) a conclusão.
Existem, no entanto, outras deőnições importantes também deriva-
das da noção de situação que merecem nossa atenção. Apresentaremos
neste capítulo uma primeira versão delas, ainda em um contexto in-
formal. Mais adiante, nas próximas partes do livro, voltaremos a estas
deőnições e apresentaremos as suas versões formalizadas. Então, como
estamos em um contexto informal, no restante deste capítulo conside-
raremos como situações aceitáveis apenas aqueles cenários que respei-
tem nossos conceitos e a relação entre eles, com os quais deőnimos a
validade conceitual (p. 19).
3.1 Compatibilidade
Considere estas duas sentenças:
29
CAPÍTULO 3. OUTRAS NOÇÕES LÓGICAS 30
A lógica não consegue, sozinha, nos dizer qual dessas frases é ver-
dadeira. No entanto, é evidente que se a primeira sentença (B1) for
verdadeira, então a segunda (B2) deve ser falsa. Da mesma forma, se a
segunda (B2) for verdadeira, então a primeira (B1) deve ser falsa. Não
há cenário possível em que ambas as sentenças sejam verdadeiras jun-
tas. Essas sentenças são incompatíveis entre si, não podem ser ambas
verdadeiras ao mesmo tempo. Isso motiva a seguinte deőnição:
Equivalência necessária
Podemos também perguntar sobre as relações lógicas entre duas sen-
tenças. Por exemplo:
Isabel foi trabalhar depois de lavar a louça.
Isabel lavou a louça antes de ir trabalhar.
Essas duas sentenças são contingentes, pois Isabel poderia não ter la-
vado a louça, ou não ter ido trabalhar. No entanto, se uma delas for
verdadeira, a outra também será; se uma for falsa, a outra também será.
Quando duas sentenças têm sempre o mesmo valor de verdade em
todas as situações, dizemos que elas são equivalências necessárias.
Exercícios
A. Decida se cada uma das sentenças abaixo é verdade necessária,
falsidade necessária ou contingente.
1. Penélope atravessou a estrada.
CAPÍTULO 3. OUTRAS NOÇÕES LÓGICAS 33
Lógica
Verofuncional
ś LVF
36
CAPÍTULO 4
Primeiros
passos para a
simbolização
4.1 Validade em virtude da forma
Considere este argumento:
Chove lá fora.
Se chove lá fora, então Sheila está melancólica.
.Û. Sheila está melancólica.
e este outro também:
Márcia é uma sindicalista anarquista.
Se Márcia é uma sindicalista anarquista, então Sílvio é um ávido
leitor de Tolstoy.
.Û. Sílvio é um ávido leitor de Tolstoy.
Ambos os argumentos são válidos e não é difícil notar que eles com-
partilham uma estrutura comum, que pode ser expressada assim:
A
Se A, então C
.Û. C
37
CAPÍTULO 4. PRIMEIROS PASSOS PARA A SIMBOLIZAÇÃO 38
A ou B
não-A
.Û. B
não-(A e B)
A
.Û. não-B
Este argumento é inválido, pois é possível que uma coisa seja toda
verde e toda brilhante também. (Pode-se, por exemplo, pintar as unhas
com um elegante esmalte verde brilhante.) A validade do primeiro
argumento parece estar relacionada com a maneira como as cores (ou
as palavras-que-designam-cores) interagem. Mas, seja isso correto ou
não, não é simplesmente a forma daquele argumento que o torna válido.
A conclusão importante a ser tirada aqui é a seguinte: Na melhor
das hipóteses, a lógica verofuncional (LVF) nos ajudará a entender argumentos
válidos devido à sua forma.
CAPÍTULO 4. PRIMEIROS PASSOS PARA A SIMBOLIZAÇÃO 40
Conectivos
No capítulo anterior, propusemos simbolizar as sentenças básicas do
português através das letras sentenciais da lógica verofuncional (LVF).
Neste capítulo veremos como simbolizar as expressões ‘e’, ‘ou’, ‘não’,. . .
que normalmente ligam, conectam as sentenças. As suas simbolizações
na LVF são, por esta razão, chamadas de conectivos. Usaremos os
conectivos lógicos para criar sentenças complexas a partir de compo-
nentes atômicos. Existem cinco conectivos na LVF. A tabela a seguir os
resume e a explicação de cada um deles será dada nas seções seguintes.
5.1 Negação
Considere como nós poderíamos simbolizar estas sentenças:
41
CAPÍTULO 5. CONECTIVOS 42
¬M
S : O dispositivo é substituível
A sentença 4 agora pode ser simbolizada por:
S
Repare que a sentença da chave de simbolização é ligeiramente dife-
rente de 4, mas é evidente que elas têm o mesmo signiőcado, aőnal ser
substituível é poder ser substituído. Passando para a sentença 5, dizer
que o dispositivo é insubstituível signiőca que não é o caso que o dispo-
sitivo é substituível. Portanto, mesmo que a sentença 5 não contenha a
palavra ‘não’, nós a simbolizaremos da seguinte forma:
¬S
A sentença 6 pode ser parafraseada como ‘Não é o caso que o dis-
positivo seja insubstituível.’ E esta paráfrase pode novamente ser pa-
rafraseada como ‘Não é o caso que não é o caso que o dispositivo
seja substituível’. Portanto, podemos simbolizar essa sentença na LVF
como:
¬¬S
As sentenças 4 a 6 acima podem, então, ser simbolizadas como:
S : O dispositivo pode ser substituído.
¬S : O dispositivo é insubstituível.
¬¬S : O dispositivo não é insubstituível.
Mas é necessário termos cuidado quando lidamos com negações.
Considere:
7. Glória está feliz.
8. Glória está infeliz.
Se usamos como chave de simbolização
F : Glória está feliz
então podemos simbolizar a sentença 7 como ‘F ’. No entanto, seria um
erro simbolizar a sentença 8 como ‘¬F ’. Porque a sentença 8 diz que
Glória está infeliz. Mas isso não é o mesmo que ‘Não é o caso que Gló-
ria está feliz’. Glória pode, por exemplo, estar estudando lógica, e não
estar nem feliz nem infeliz, mas em um estado de plácida indiferença.
Como ‘estar infeliz’ não signiőca o mesmo que ‘não estar feliz’, então,
para simbolizar a sentença 8, precisamos de uma nova letra sentencial
da LVF.
As sentenças 7 e 8 acima são melhor simbolizadas na LVF como:
CAPÍTULO 5. CONECTIVOS 44
5.2 Conjunção
Considere estas sentenças:
9. Suzana é atleta.
10. Bárbara é artista.
11. Suzana é atleta e, além disso, Bárbara é artista.
S : Suzana é atleta.
B: Bárbara é artista.
(S ∧ B)
S : Suzana é atleta.
B: Bárbara é artista.
(S ∧B): Suzana é atleta e, além disso, Bárbara é artista.
(B 1 ∧ R)
(¬S 1 ∧ S 2 )
5.3 Disjunção
Considere as seguintes sentenças:
18. Fátima vai jogar videogame ou ela vai assistir TV.
19. Fátima ou Omar vão jogar videogame.
CAPÍTULO 5. CONECTIVOS 48
(¬S 1 ∨ ¬S 2 )
natural, é a seguinte: ‘Não é o caso de que você beberá refrigerante e não é o caso de que você
beberá suco’. Neste caso a simbolização da sentença utilizará a conjunção das negações
de cada uma das subsentenças e será: ‘(¬S 1 ∧¬S 2 )’. Mais adiante veremos que estas duas
simbolizações distintas da sentença 21 como ‘¬(S 1 ∨ S 2 )’ ou como ‘(¬S 1 ∧ ¬S 2 )’ são, de
uma perspectiva lógica, perfeitamente equivalentes na LVF.
CAPÍTULO 5. CONECTIVOS 50
((S 1 ∨ S 2 ) ∧ ¬(S 1 ∧ S 2 ))
5.4 Condicional
Considere as seguintes sentenças:
23. Se Oscar está em Caicó, então Oscar está no Rio Grande do
Norte.
24. Oscar está no Rio Grande do Norte apenas se Oscar está em
Caicó.
Vamos usar a seguinte chave de simbolização:
C : Oscar está em Caicó.
R: Oscar está no Rio Grande do Norte.
A sentença 23 tem aproximadamente esta forma: ‘se C, então R’. Usa-
remos um símbolo novo, ‘→’, para simbolizar essa estrutura ‘se. . . ,
então. . . ’. Deste modo, simbolizamos a sentença 23 como:
(C → R)
Então não parece verdade que ‘Oscar está no Rio Grande do Norte
apenas se Oscar está em Caicó’. Portanto, como 23 é verdadeira e
24 é falsa, elas não dizem a mesma coisa e não podem, por isso, ser
simbolizadas pela mesma sentença da LVF.
A sentença 24, na verdade, pode ser parafraseada como ‘Se Oscar
está no Rio Grande do Norte, então Oscar está em Caicó’. Podemos
simbolizá-la, então, como:
(R → C )
(C → R)
5.5 Bicondicional
Considere as sentenças:
29. Olavo é um asno apenas se ele for um mamífero.
30. Olavo é um asno se ele for um mamífero.
31. Olavo é um asno se e somente se ele for um mamífero.
Usaremos a seguinte chave de simbolização:
A3 : Olavo é um asno.
M3 : Olavo é um mamífero.
A sentença 29, conforme acabamos de ver na seção anterior, pode ser
simbolizada como:
(A 3 → M 3 )
A sentença 30, apesar de muito parecida, difere de 29 em um aspecto
bastante importante: o sentido do condicional. Ela pode ser parafra-
seada como: “Se Olavo é um mamífero, então Olavo é um asnož. Por-
tanto, pode ser simbolizada por:
(M 3 → A 3 )
A sentença 31 diz algo mais forte que tanto 29 quanto 30. Ela pode
ser parafraseada como “Olavo é um asno se Olavo for um mamífero,
e Olavo é um asno apenas se Olavo for um mamíferož. Esta paráfrase
nada mais é do que a conjunção das sentenças 29 e 30. Portanto, po-
demos simbolizá-la como:
((A3 → M3 ) ∧ (M3 → A3 ))
Nós chamamos uma sentença deste tipo de bicondicional, porque
corresponde ao condicional em ambas as direções.
Poderíamos simbolizar todos os bicondicionais dessa maneira. Por-
tanto, assim como não precisamos de um novo símbolo da LVF para
lidar com o ou exclusivo, também não precisamos de um novo símbolo
da LVF para lidar com os bicondicionais. Mas como o bicondicional
ocorre com bastante frequência, usaremos o símbolo ‘↔’ para ele. Po-
demos então simbolizar a sentença 31 como:
(A 3 ↔ M 3 )
CAPÍTULO 5. CONECTIVOS 53
32. Se você não comer toda a verdura, então não ganhará sobremesa.
33. Se você não ganhou sobremesa, então você não comeu toda a
verdura.
tritamente lógica a aőrmação do pai (a sentença 32) não o obriga a dar sobremesa à őlha
mesmo quando ela come toda a verdura. Mais adiante, com mais recursos, voltaremos
a este ponto e esclareceremos a questão.
CAPÍTULO 5. CONECTIVOS 55
34. A não ser que você saia do sol, você terá uma insolação.
35. Você terá uma insolação a menos que você saia do sol.
Ambas as sentenças signiőcam que, se você não sair do sol, então você
terá uma insolação. Com isso em mente, podemos simbolizá-las como:
(¬S → I )
(¬I → S )
Exercícios
A. Usando a chave a seguir, simbolize cada uma das 6 sentenças abaixo
na LVF.
C: Foi o cozinheiro.
D: A Duquesa está mentindo.
E: A Sra. Elsa foi assassinada.
F: A arma do crime foi uma frigideira.
Sentenças da
LVF
A expressão ‘as maçãs são vermelhas ou as jaboticabas são pretas’ é
uma sentença em português e a expressão ‘(M ∨ J )’ é uma sentença da
LVF. Embora não tenhamos em geral diőculdades em identiőcar uma
expressão como sendo ou não uma sentença do português, não há uma
deőnição formal que esclareça completamente o que conta como sen-
tença na língua portuguesa. Neste capítulo, no entanto, ofereceremos
uma definição completa do que conta como uma sentença da LVF. E
esse é um dos motivos pelos quais dizemos que uma linguagem formal
como a LVF é mais precisa do que uma linguagem natural como o
português.
6.1 Expressões
Vimos que há três tipos diferentes de símbolos na LVF:
Letras sentenciais: A, B, C, . . . , Z
com subíndices, se necessário: A 1, B 1, Z 1, A2, A 25, J 375, . . .
Conectivos: ¬, ∧, ∨, →, ↔
Parênteses: (,)
Deőnimos uma expressão da LVF como qualquer sequência de sím-
bolos da LVF. Pegue uma quantidade qualquer de símbolos da LVF e
61
CAPÍTULO 6. SENTENÇAS DA LVF 62
6.2 Sentenças
Obviamente, muitas expressões da LVF serão totalmente sem sentido.
Nós precisamos saber quando uma expressão da LVF constitui uma
sentença.
Letras sentenciais individuais tais como ‘A’ e ‘G 13 ’ devem, clara-
mente, contar como sentenças. (Nós as chamaremos de sentenças
atômicas.) Podemos formar sentenças adicionais a partir das senten-
ças atômicas usando os vários conectivos. Usando negação, podemos
obter ‘¬A’ e ‘¬G 13 ’. Usando conjunção, podemos obter ‘(A ∧ G 13 )’,
‘(G 13 ∧ A)’, ‘(A ∧ A)’ e ‘(G 13 ∧ G 13 )’. Também poderíamos aplicar ne-
gação repetidamente para obter sentenças como ‘¬¬A’, ou aplicar a
negação junto com a conjunção para obter sentenças como ‘¬(A ∧G 13 )’
e ‘¬(G 13 ∧ ¬G 13 )’. As combinações possíveis são inőnitas, mesmo co-
meçando com apenas essas duas letras sentenciais, e há inőnitas letras
sentenciais. Portanto, não faz sentido tentar listar todas as sentenças
uma por uma.
Em vez disso, descreveremos o processo pelo qual as sentenças po-
dem ser construídas. Considere a negação: dada qualquer sentença A
da LVF, ¬A é uma sentença da LVF. (Por que as fontes engraçadas?
Trataremos disso na Seção 8.3.)
Podemos fazer o mesmo para cada um dos outros conectivos da
LVF. Por exemplo, se A e B são sentenças da LVF, então (A ∧ B) é
uma sentença da LVF. Fornecendo cláusulas como essa para todos os
conectivos, chegamos à seguinte deőnição formal para uma sentença
da LVF:
((A ∨ B) ∧ C ))
Ela não começa com uma negação, então é preciso fazer a contagem
dos parênteses para aplicar o método. Se marcarmos cada símbolo de
CAPÍTULO 6. SENTENÇAS DA LVF 65
(1 (2A ∨ B)1 ∧ C )0
(A ∨ (B ∧ C ))
(1 A ∨ (2 B ∧ C )1 )0
(P ∧ (¬(R ∧ B) ↔ Q ))
CAPÍTULO 6. SENTENÇAS DA LVF 66
((((H → I ) ∨ Z ) ∧ ( J ∨ K )) ↔ (A ∨ B))
e a sentença
{[(H → I ) ∨ Z ] ∧ ( J ∨ K )} ↔ (A ∨ B)
Exercícios
A. Para cada uma das 8 expressões abaixo, decida (a) se ela é uma
sentença da LVF, estritamente falando; (b) se é uma sentença da LVF
quando permitimos as convenções sobre o uso de parênteses; (c) se ela
for uma sentença apontada em (a) ou em (b), indique seu conectivo
principal.
1. (A)
2. J 374 ∨ ¬ J 374
3. ¬¬¬¬F
4. ¬∧S
5. (G ∧ ¬G )
6. (A → (A ∧ ¬F )) ∨ (D ↔ E)
7. [(Z ↔ S ) → W ] ∧ [ J ∨ X ]
8. (F ↔ ¬D → J ) ∨ (C ∧ D)
Ambiguidade
na LVF
Em português as sentenças podem ser ambíguas, ou seja, podem ter
mais de um signiőcado. Existem muitas fontes de ambiguidade. Uma
delas é a ambiguidade lexical: uma sentença pode conter palavras que
têm mais de um signiőcado. Por exemplo, ‘banco’ pode signiőcar um
móvel que serve como assento ou uma instituição őnanceira. Assim,
posso dizer que ‘estava no banco aqui perto’, apontando para onde
estava sentado ou para a instituição őnanceira no outro lado da rua.
Dependendo da situação, um signiőcado diferente de ‘banco’ é preten-
dido e, portanto, a sentença expressa diferentes signiőcados.
Um tipo diferente é a ambiguidade estrutural. Isso ocorre quando uma
sentença pode ser interpretada de maneiras diferentes e, dependendo
da interpretação, um signiőcado diferente é selecionado. Um exemplo
famoso devido a Noam Chomsky é o seguinte:
68
CAPÍTULO 7. AMBIGUIDADE NA LVF 69
Exercícios
A. As seguintes sentenças são ambíguas. Dê chaves de simbolização
para cada uma e simbolize as diferentes leituras.
1. Haskell é observador de pássaros e gosta de observar grous.
2. O zoológico tem leões ou tigres e ursos.
3. A ŕor não é vermelha ou perfumada.
CAPÍTULO 8
Uso e menção
Temos, nesta Parte do livro, falado bastante sobre sentenças. Devemos,
por isso, fazer uma pausa para explicar um ponto importante e bastante
geral.
73
CAPÍTULO 8. USO E MENÇÃO 74
diz que uma certa expressão é a terceira mulher a governar o Rio Grande
do Norte. E isso é claramente falso. A pessoa com este nome é a terceira
mulher a governar o estado; não o próprio nome. Por outro lado, esta
sentença:
também diz algo falso: Fátima Bezerra é uma mulher, feita de carne e
osso, e não de letras. Um último exemplo:
8.3 Metavariáveis
Nós, no entanto, não queremos falar apenas sobre expressões específicas
da LVF. Queremos também poder falar sobre qualquer sentença arbitrária
da LVF. Nós, de fato, já őzemos isso na Seção 6.2, quando apresentamos
a deőnição indutiva de sentença da LVF. Usamos as letras maiúsculas
cursivas para fazer isso, a saber:
A, B, C, D, . . .
A, B, (A → (Q ∧ R)), ¬¬(B 3 → Z ), . . .
e, da mesma forma, expressões como ‘(A∧ B)’ e ‘(A∨ B)’ também são
convencionalmente tomadas como abreviações para as expressões que
aőrmam explicitamente as concatenações que elas indicam.
Tabelas de
Verdade
79
CAPÍTULO 9
Tabelas de
verdade
características
Qualquer sentença da LVF é composta por letras sentenciais, possivel-
mente combinadas pelos conectivos sentenciais. O valor de verdade
de uma sentença composta depende apenas do valor de verdade das
letras sentenciais que a compõem. Para sabermos o valor de verdade
de ‘(D ∧ E)’, por exemplo, basta sabermos o valor de verdade de ‘D’ e
‘E’; exatamente do mesmo modo que saber o valor numérico de ‘x + y’
depende apenas de saber os valores numéricos de ‘x’ e ‘y’.
No Capítulo 5 nós apresentamos os cinco conectivos da LVF: ‘¬’,
‘∧’, ‘∨’, ‘→’, ‘↔’. O que precisamos fazer agora é explicar qual é o
tipo de operação que cada um deles faz com os valores de verdade.
Por conveniência, abreviaremos ‘Verdadeiro’ por ‘V’ e ‘Falso’ por ‘F’.
Mas, que őque bem claro, os dois valores de verdade que nos interessam
são o verdadeiro (a verdade) e o Falso (a falsidade). Os valores de
verdade não são letras!
80
CAPÍTULO 9. TABELAS DE VERDADE CARACTERÍSTICAS 81
A ¬A
V F
F V
A B A∧ B
V V V
V F F
F V F
F F F
Observe que a conjunção é uma operação simétrica. Ou seja, as tabelas
de verdade de A∧ B e de B∧ A são idênticas, têm os mesmos valores
de verdade em todas as linhas.
A B A∨ B
V V V
V F V
F V V
F F F
Como a conjunção, a disjunção também é simétrica. A tabela de ver-
dade de A∨ B é idêntica à de B ∨ A.
A B A→ B
V V V
V F F
F V V
F F V
O condicional, diferentemente da conjunção e disjunção, é um opera-
dor assimétrico. Você não pode trocar o antecedente pelo consequente
sem alterar o signiőcado da sentença, porque A → B tem uma tabela
de verdade muito diferente de B → A.
Apesar de estranha, a estipulação dada pela tabela acima não é de
todo arbitrária. Um modo de entendermos isso é pensarmos o seguinte:
quem sustenta que ‘Se A então B’, ou seja ‘(A → B)’ é uma sentença
verdadeira, está assumindo um único compromisso: o de que ‘B’ tem
que ser verdadeira sempre que ‘A’ for verdadeira. Se, por acaso, ‘A’ for
falsa, nenhum compromisso sobre a verdade ou falsidade de ‘B’ é assu-
mido. Por exemplo, se a professora diz a uma de suas alunas que se ela
tiver mais de dez faltas, então ela será reprovada, ‘(D → R)’, o único
compromisso que a professora está assumindo é que mais de dez faltas
reprova a aluna. Ao tomar esta sentença condicional como verdadeira,
a professora não está dizendo nada sobre o que acontece à aluna caso
ela não tenha mais do que dez faltas. Ou seja, se o antecedente do con-
dicional ‘D’ for falso (a aluna não tem mais de dez faltas), a aluna tanto
pode ser aprovada como reprovada, dependendo de seu desempenho
na disciplina. E nem a aprovação nem a reprovação da aluna falsiőcam
a aőrmação condicional da professora. Então, a única situação que fal-
siőca a sentença condicional é quando seu antecedente é verdadeiro e
seu consequente falso (segunda linha da tabela). Em todas as outras
situações (outras três linhas da tabela) a aőrmação condicional pode
ser sustentada sem qualquer quebra de compromisso e, por isso, deve
ser considerada verdadeira.
Conectivos
verofuncionais
10.1 A ideia da verofuncionalidade
Vamos introduzir uma ideia importante.
84
CAPÍTULO 10. CONECTIVOS VEROFUNCIONAIS 85
A C D
A B C D
neste caso, podemos ver que não é verdade que “se alguma forma é
cinza, então esta forma também é circularž. A őgura B corresponde a
um contraexemplo para a minha aőrmação, que seria, por isso, falsa.
Portanto, a seguinte instância de minha aőrmação tem que ser falsa:
· Se B é cinza, então é circular (antecedente V, consequente F)
Agora, lembre-se de que todos os conectivos da LVF são verofun-
cionais. Isso signiőca que os valores de verdade do antecedente e
consequente devem determinar exclusivamente o valor de verdade do
condicional como um todo. Assim, a partir dos valores de verdade
das quatro instâncias de minha aőrmaçãoÐque nos fornecem todas
2 Dorothy Edgington, ‘Conditionals’, 2006, em Stanford Encyclopedia of Philosophy
(http://plato.stanford.edu/entries/conditionals/).
CAPÍTULO 10. CONECTIVOS VEROFUNCIONAIS 88
Tabelas de
verdade
completas
Até agora, consideramos atribuir valores de verdade às sentenças LVF
apenas indiretamente. Dissemos, por exemplo, que uma sentença LVF
como ‘C ’ deve ter o mesmo valor de verdade que a sentença em portu-
guês ‘A praia de Copacabana őca no Rio de Janeiro’ (qualquer que seja
esse valor de verdade). Mas também podemos atribuir valores de ver-
dade diretamente às letras sentenciais da LVF. Podemos simplesmente
estipular que ‘C ’ deve ser verdadeira, ou estipular que deve ser falsa.
90
CAPÍTULO 11. TABELAS DE VERDADE COMPLETAS 91
H I (H ∧I )→H
V V
V F
F V
F F
Para calcular o valor de verdade da sentença completa ‘(H ∧ I ) → H ’,
primeiro copiamos os valores de verdade das letras sentenciais (lado
esquerdo do traço vertical da tabela abaixo), de cada linha, e os escre-
vemos abaixo das letras sentenciais na sentença (lado direito do traço
vertical da tabela abaixo):
H I (H ∧I )→H
V V V V V
V F V F V
F V F V F
F F F F F
Agora considere a subsentença ‘(H ∧I )’. Ela é uma conjunção, (A∧ B),
com ‘H ’ como A e ‘I ’ como B. A tabela de verdade característica para
a conjunção, que vimos no Capítulo 9, fornece as condições de verdade
para qualquer sentença no formato (A∧ B), qualquer que sejam as sen-
tenças A e B. Aquela tabela característica apenas indica o fato de que
uma conjunção é verdadeira se ambos os conjuntos (as subsentenças da
conjunção) forem verdadeiros. Nesse caso, nossos conjuntos são apenas
‘H ’ e ‘I ’. E ambos são verdadeiros na (e somente na) primeira linha
da tabela de verdade. Então, usando este fato, podemos preencher o
valor de verdade desta conjunção nas quatro linhas.
CAPÍTULO 11. TABELAS DE VERDADE COMPLETAS 92
A ∧B
H I (H ∧ I ) →H
V V V VV V
V F V FF V
F V F FV F
F F F FF F
Agora, a sentença completa que nos interessa aqui é um condicional
A → B, com ‘(H ∧ I )’ como A e com ‘H ’ como B. Então, para
preencher nossa tabela, usamos a tabela de verdade característica do
condicional, que estabelece que um condicional é falso apenas quando
seu antecedente é verdadeiro e seu consequente é falso. Por exemplo,
na primeira linha de preenchimento ‘(H ∧ I )’ e ‘H ’ são ambas verda-
deiras. Então, de acordo com a tabela característica, o condicional é
verdadeiro neste caso, e colocamos um ‘V’ na primeira linha, abaixo do
símbolo do condicional. Fazemos o mesmo procedimento nas outras
três linhas e obtemos o seguinte:
A →B
H I (H ∧ I )→H
V V V VV
V F F VV
F V F VF
F F F VF
O condicional é o conectivo principal da sentença, portanto, a coluna
de ‘V’s abaixo do condicional nos diz que a sentença ‘(H ∧ I ) → H ’
é verdadeira em todos os casos possíveis para os valores de verdade
de ‘H ’ e ‘I ’. Como consideramos todas as quatro valorações possíveis
para o par ‘H ’ e ‘I ’, podemos dizer que ‘(H ∧ I ) → H ’ é verdadeira
em todas as valorações.
Neste exemplo, não repetimos todas as inscrições de ‘V’ e ‘F’ em
todas as colunas de cada tabela que apresentamos. Porém, quando
de fato fazemos tabelas de verdade no papel, é impraticável apagar
colunas inteiras ou reescrever a tabela inteira em cada etapa. Embora
őque mais poluída (cheia de ‘V’s e ‘F’s), esta tabela de verdade quando
feita, de modo completo, sem apagar nada, őca da seguinte maneira:
H I (H ∧ I )→H
V V V VV V V
V F V F FVV
F V F FVV F
F F F FFVF
CAPÍTULO 11. TABELAS DE VERDADE COMPLETAS 93
[(C ↔ C ) → C ] ∧ ¬(C → C )
Sua tabela de verdade completa requer apenas duas linhas, porque exis-
tem apenas duas possibilidades: ‘C ’ pode ser verdadeira ou falsa. A
tabela de verdade para esta sentença őca assim:
M N P M ∧ (N ∨P )
V V V VV V VV
V V F VV V VF
V F V VV F VV
V F F VF F F F
F V V F F V VV
F V F F F V VF
F F V F F F VV
F F F F F F F F
Através desta tabela sabemos que a sentença ‘M ∧ (N ∨ P )’ pode ser
verdadeira ou falsa, dependendo dos valores de verdade de ‘M ’, ‘N ’ e
‘P ’. A segunda linha, por exemplo, nos mostra, que quando ‘M ’ e ‘N ’
são verdadeiras e ‘P ’ é falsa, a sentença ‘M ∧ (N ∨ P )’ é verdadeira. Já
a oitava linha nos mostra que quando ‘M ’, ‘N ’ e ‘P ’ são todas falsas, a
sentença completa também é falsa.
Uma tabela de verdade completa para uma sentença com quatro
letras sentenciais diferentes requer 16 linhas. Cinco letras, 32 linhas.
Seis letras, 64 linhas. E assim por diante. Para ser perfeitamente geral:
se uma tabela de verdade completa tiver n letras sentenciais diferentes,
ela deverá ter 2n linhas.
Para preencher as colunas abaixo das letras sentenciais de uma ta-
bela de verdade completa, que indicam as diversas valorações (a parte
do lado esquerdo do traço vertical da tabela), comece com a letra sen-
tencial mais à direita e preencha as linhas de sua coluna com valores
alternados ‘V’ e ‘F’, até completar o número total de linhas. Na pró-
xima coluna à esquerda, preencha-a de duas em duas linhas, alternando
entre dois ‘V’s, depois dois ‘F’s, até completar o número total de linhas.
Para a terceira letra sentencial, preencha sua coluna com quatro ‘V’s
seguidos de quatro ‘F’s. Isso gera uma tabela de verdade de 8 linhas
como a acima. Para uma tabela de verdade de 16 linhas, a próxima co-
luna de letras sentenciais deve ter oito ‘V’s seguidos de oito ‘F’s. Para
uma tabela de 32 linhas, a próxima coluna teria 16 ‘V’s seguidos por
16 ‘F’s e assim por diante.
Seguindo este procedimento, uma tabela para uma sentença como
(A ∧ B) ↔ (C ∨ ¬D)
CAPÍTULO 11. TABELAS DE VERDADE COMPLETAS 95
24 = 16
A B C D (A ∧ B) ↔ (C ∨ ¬D)
V V V V
V V V F
V V F V
V V F F
V F V V
V F V F
V F F V
V F F F
F V V V
F V V F
F V F V
F V F F
F F V V
F F V F
F F F V
F F F F
Bem, aproveite a ocasião e preencha todos os valores desta tabela de
verdade!
((A ∧ B) ∧ C )
(A ∧ (B ∧ C ))
A ∧B ∧C
é ambígua sobre qual é seu conectivo principal e não deve ser usada.
A mesma observação vale para as disjunções. As seguintes sentenças
são logicamente equivalentes:
((A ∨ B) ∨ C )
(A ∨ (B ∨ C ))
A ∨B ∨C
((A → B) → C )
(A → (B → C ))
Então, se escrevêssemos:
A →B →C
isto seria perigosamente ambíguo. Não usar parênteses neste caso seria
desastroso. Da mesma forma as sentenças abaixo também têm tabelas
de verdade diferentes:
((A ∨ B) ∧ C )
(A ∨ (B ∧ C ))
Então, se escrevêssemos:
A ∨B ∧C
Exercícios
A. Faça as tabelas de verdade completas para cada uma das seguintes
9 sentenças:
1. A→A
2. C → ¬C
3. (A ↔ B) ↔ ¬(A ↔ ¬B)
4. (A → B) ∨ (B → A)
5. (A ∧ B) → (B ∨ A)
6. [ ∨ B) ↔ (¬A ∧ ¬B)
¬(A ]
7. (A ∧ B) ∧ ¬(A ∧ B) ∧ C
8. [ ∧ B) ∧ C ] →
[(A ] B
9. ¬ (C ∨ A) ∨ B
B. Veriőque se as aőrmações sobre equivalência que acabamos de fazer
na Seção 11.3 estão de fato corretas. Ou seja, mostre que:
1. ‘((A ∧ B) ∧ C )’ e ‘(A ∧ (B ∧ C ))’ têm tabelas de verdade idênticas.
2. ‘((A ∨ B) ∨ C )’ e ‘(A ∨ (B ∨ C ))’ têm tabelas de verdade idênticas.
3. ‘((A ∨ B) ∧ C )’ e ‘(A ∨ (B ∧ C ))’ têm tabelas de verdade diferentes.
4. ‘((A → B) → C )’ e ‘(A → (B → C ))’ têm tabelas de verdade
diferentes.
Veriőque também se:
5. ‘((A ↔ B) ↔ C )’ e ‘(A ↔ (B ↔ C ))’ têm tabelas de verdade
idênticas ou diferentes.
C. Escreva tabelas de verdade completas para as cinco sentenças a
seguir e indique a coluna que representa os possíveis valores de verdade
da sentença completa.
1. ¬(S ↔ (P → S ))
2. ¬[(X ∧ Y ) ∨ (X ∨ Y )]
3. (A → B) ↔ (¬B ↔ ¬A)
4. [C ↔ (D ∨ E)] ∧ ¬C
5. ¬(G ∧ (B ∧ H )) ↔ (G ∨ (B ∨ H ))
1. (D ∧ ¬D) → G
CAPÍTULO 11. TABELAS DE VERDADE COMPLETAS 98
2. (¬P ∨ ¬M ) ↔ M
3. ¬¬(¬A ∧ ¬B)
4. [(D ∧ R) → I ] → ¬(D ∨ R)
5. ¬[(D ↔ O ) ↔ A] → (¬D ∧ O )
Conceitos
semânticos
No capítulo anterior, introduzimos a ideia de valoração e mostramos
como determinar o valor de verdade de qualquer sentença da LVF,
em qualquer valoração, usando as tabelas de verdade. Neste Capítulo,
apresentaremos alguns conceitos importantes em lógica e mostraremos
como usar tabelas de verdade para testar quando eles se aplicam ou
não.
Este é um capítulo muito importante, o mais importante sobre a
LVF. Além das deőnições dos conceitos e dos métodos sobre como
veriőcá-los através das tabelas de verdade, apresentaremos também
muitos esclarecimentos fundamentais sobre a lógica enquanto disci-
plina, sobre suas possibilidades e limites de aplicação. Leia com calma
e anote suas dúvidas para discuti-las com os monitores e o professor.
99
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 100
(H ∧ I ) → H
H I (H ∧ I )→H
V V V VV V V
V F V F FVV
F V F FVV F
F F F FFVF
A noção de tautologia é apenas um caso especial na LVF da noção
geral de verdade necessária. Isso porque existem algumas verdades
necessárias que não podem ser simbolizadas adequadamente na LVF.
Um exemplo é
2+2=4
Esta aőrmação é necessariamente verdadeira. Sua falsidade não faz sen-
tido, é impossível. No entanto, quando tentamos simbolizá-la na LVF, o
melhor que conseguimos fazer é atribuir-lhe uma letra sentencial. Mas
nenhuma letra sentencial sozinha é uma tautologia. Entretanto, mesmo
havendo muitas verdades necessárias como esta, cujas simbolizações na
LVF não são tautologias, quando uma simbolização aceitável na LVF de
alguma sentença em português for uma tautologia, podemos ter conő-
ança que essa sentença em português expressa uma verdade necessária.
Ou seja, as tautologias representam um subgrupo das verdades neces-
sárias: algumas verdades necessárias não são tautologias, mas todas as
tautologias são verdades necessárias.
De modo semelhante, temos também um representante na LVF para
a noção de falsidade necessária:
[(C ↔ C ) → C ] ∧ ¬(C → C )
12.2 Equivalência
Eis aqui uma noção bastante útil:
Essa noção já foi utilizada por nós na Seção 11.3, quando dissemos
que as sentenças ‘(A∧B)∧C ’ e ‘A∧(B ∧C )’ são equivalentes. Novamente,
é fácil testar a equivalência usando tabelas de verdade. Considere as
sentenças
¬(P ∨ Q ) e ¬P ∧ ¬Q
Será que elas são equivalentes? Para descobrir, construímos uma tabela
de verdade.
P Q ¬ (P ∨Q ) ¬P ∧ ¬Q
V V F VVV FVF FV
V F F VV F FVFVF
F V F F VV VF F FV
F F VF F F V F VV F
Repare nas colunas dos conectivos principais (destacadas em negrito):
a negação, na primeira sentença, e a conjunção, na segunda. Nas três
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 102
primeiras linhas, ambas são falsas. Na linha őnal, ambas são verdadei-
ras. Como em cada linha os valores são os mesmos, as duas sentenças
são equivalentes.1
12.3 Compatibilidade
No Capítulo 3, dissemos que as sentenças de um grupo são compa-
tíveis (conjuntamente possíveis) se for possível que todas elas sejam
conjuntamente verdadeiras (verdadeiras ao mesmo tempo, na mesma
circunstância). Também para esta noção podemos oferecer um repre-
sentante na LVF:
A∧B e ¬A ∧ B
são incompatíveis na LVF pois em nenhuma linha da tabela as senten-
ças são ambas verdadeiras.
A B A ∧B ¬A ∧B
V V V VV FVFV
V F VF F FVF F
F V F FV V F VV
F F FFF VF F F
¬L → ( J ∨ L) e ¬L sustentam J
Para fazer isso, basta fazer uma tabela de verdade completa para estas
três sentenças e veriőcar se há alguma valoração (ou seja, alguma linha
da tabela) em que ‘¬L → ( J ∨ L)’ e ‘¬L’ são ambas verdadeiras e ‘ J ’
é falsa. Se houver tal linha na tabela, então ‘¬L → ( J ∨ L)’ e ‘¬L’
não sustentam ‘ J ’. Caso contrário, quando não há uma tal valoração,
‘¬L → ( J ∨ L)’ e ‘¬L’ sustentam ‘ J ’. Vejamos:
J L ¬ L → ( J ∨ L) ¬L J
V V FVV V VV FV V
V F VF V V V F VF V
F V FVV F VV FV F
F F VF F F F F VF F
A única linha na qual ‘¬L → ( J ∨ L)’ e ‘¬L’ são ambas verdadeiras é
a segunda linha, e nessa linha ‘ J ’ também é verdadeira. Portanto, de
acordo com nossa deőnição, ‘¬L → ( J ∨ L)’ e ‘¬L’ sustentam ‘ J ’.
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 104
M : Foi o motorista
B: Foi a babá
M → ¬B
¬B
.Û. M
falsa. Ou seja, exatamente esta linha nos mostra que as premissas não
sustentam a conclusão.
A ideia central aqui é que as situações, os cenários hipotéticos, fun-
cionam como uma interpretação (uma estória) que usamos como fonte
de informação para atribuir valores de verdade às letras sentenciais
dos argumentos. O que este caso ilustra é que quando a situação é
um contraexemplo que invalida o argumento, então ela nos dará uma
valoração (uma distribuição de valores de verdade para as letras sen-
tenciais do argumento) na qual as premissas são todas verdadeiras, mas
a conclusão é falsa. Esta valoração garante, portanto, que as premissas
não sustentam a conclusão do argumento.
É por isso que podemos dizer, como őzemos no quadro acima, que
se as premissas de um argumento sustentam sua conclusão, então o
argumento é válido. Quando as premissas sustentam a conclusão, sa-
bemos, pela deőnição de sustentação, que não existe valoração na qual
suas premissas são verdadeiras e sua conclusão é falsa. Mas se não
existe tal valoração, não pode haver nenhuma situação que a gere, ou
seja, o argumento não tem contraexemplo. E se um argumento não tem
contraexemplo, ele é válido!
Em resumo, a noção de sustentação é um representante na LVF
da noção de validade. Ela nos dá uma maneira de usar a LVF para
testar a validade de (alguns) argumentos em português. Primeiro nós os
simbolizamos na LVF e em seguida usamos as tabelas de verdade para
testar se suas premissas, A1, A2, . . . , An sustentam sua conclusão C. Se
elas sustentam, então podemos conőar que o argumento é válido.2
2 O termo original em inglês para a noção que denominamos por ‘sustentação’ é en-
tailment, que costuma ser traduzido ao português como ‘implicação’ ou ‘acarretamento’.
Ou seja, quando nós dizemos neste livro que A1, A2, . . . , An sustentam C, a maioria dos ou-
tros livros diriam que A1, A2, . . . , An implicam (ou acarretam) C. O termo ‘implicação’, no
entanto, é ambíguo e confunde a relação entre premissas e conclusão em um argumento
válido, com a relação entre antecedente e consequente dada pelo operador condicional
da LVF, ‘→’, que muitas vezes é chamado de ‘implicação material’ ou mesmo apenas
de ‘implicação’. Mas esta confusão é um equívoco. A relação entre premissas e conclu-
são de um argumento válido é diferente da relação entre antecedente e consequente de
um condicional verdadeiro, conforme veremos mais detalhadamente na Seção 12.7. Já o
termo ‘acarretamento’ pode sugerir que há uma conexão causal entre as premissas e a
conclusão de um argumento válido, que as premissas levam a ou produzem a conclusão.
Mas isso também é um equívoco. Não é preciso que haja qualquer relação causal ou de
produção entre as premissas e a conclusão de um argumento para que ele seja válido.
Para evitar estas más interpretações, preferimos usar o termo pouco comum ‘sustenta-
ção’. É importante, no entanto, que você saiba que aquilo que estamos chamando de
‘sustentação’, outros livros chamam de ‘acarretamento’ ou ‘implicação (estrita)’.
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 107
1. Olga tem quatro patas. Logo Olga tem mais de duas patas.
Para simbolizar esse argumento na LVF precisamos de duas letras sen-
tenciais diferentesÐtalvez ‘Q ’ e ‘D’Ða primeira para a premissa e a
outra para a conclusão. É óbvio que ‘Q ’ não sustenta ‘D’, para ver
isso, basta considerarmos a valoração em que ‘Q ’ é verdadeira e ‘D’ é
falsa. No entanto, o argumento original em português é claramente vá-
lido. Não é possível que a premissa seja verdadeira (Olga tenha quatro
patas) e a conclusão falsa (Olga não tenha mais de duas patas). Há,
então, uma clara discrepância entre as situações (cenários hipotéticos)
e as valorações, pois a valoração em que ‘Q ’ é verdadeira e ‘D’ é falsa
não corresponde a nenhum cenário concebível.
Considere agora esta segunda sentença:
2. João não é careca nem não-careca.
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 109
¬C ∧ ¬¬C
3. Não é o caso que se deus existe, então ela atende a preces que
pedem o mal.3
D: deus existe.
M : deus atende preces que pedem o mal.
Com esta chave, a simbolização mais natural na LVF da sentença 3
seria:
¬(D → M )
Acontece que ‘¬(D → M )’ sustenta ‘D’ (novamente, veriőque isso com
uma tabela de verdade). Ou seja, o argumento
¬(D → M )
.Û. D
é um argumento válido. Mas, por outro lado, o argumento correspon-
dente em português
Não é o caso que se deus existe, então ela atende a preces que
pedem o mal.
.Û. Deus existe.
3 Sim, estou me referindo a deus com letra minúscula e no gênero feminino. Por que
não?
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 110
4. Se deus existe, então ela não atende a preces que pedem o mal.
Com a mesma chave, a simbolização da sentença 4 őca:
D → ¬M
D → ¬M
.Û. D
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 111
¬D
.Û. D → ¬M
e
¬D
.Û. D → M
E o que eles dizem é que se os ateístas têm razão, se deus não existe,
então ela tanto atende quanto não atende a preces que pedem o mal.
Qualquer condicional cujo antecedente é a suposição da existência de
deus
(D → . . .)
é sustentado pela aőrmação de sua não existência
¬D
Dado que uma sentença condicional é falsa apenas quando seu ante-
cedente é verdadeiro e seu consquente é falso, podemos reescrever a
observação 2.
Isso, de fato, indica uma aproximação entre ‘⊨’ e ‘→’. Mas esta
aproximação de modo algum iguala as duas noções. Há diferenças
fundamentais entre elas. Um exemplo nos ajudará aqui. Considere a
seguinte sentença:
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 114
Podemos dizer que aőrmar 6 signiőca o mesmo que dizer que o mundo
real corresponde a uma situação que gera uma valoração na qual
‘(D ∧ V ) → P ’ é verdadeira. Ou seja, na valoração gerada pelo mundo
real não ocorre que ‘D ∧V ’ é verdadeira e ‘P ’ é falsa. Isso, dada nossa
chave de simbolização, signiőca que no mundo real não acontece jamais
de ser domingo e Mariana estar viva, mas ela não ir à praia. A verdade
de 6 signiőca que Mariana é extremamente sistemática em suas idas
à Praia, que Mariana jamais deixou e, enquanto viver, jamais deixará
de ir à Praia aos domingos. Chova ou faça sol. Esta é uma aőrmação
bastante forte sobre Mariana, mas enquanto aceitarmos a simbolização
proposta, é exatamente isso que signiőca dizer que a sentença original
5 é verdadeira.
Por outro lado, aőrmar ‘D ∧ V ’ ⊨ ‘P ’ (ou seja, que ‘D ∧V ’ sustenta
‘P ’) signiőca algo muito mais forte ainda que isso. Signiőca o mesmo
que dizer que não apenas na valoração gerada pelo mundo real, mas
em nenhuma valoração ‘D ∧V ’ é verdadeira e ‘P ’ é falsa. Ou seja, signi-
őca o mesmo que dizer que ‘(D ∧V ) → P ’ é uma tautologia. Isso, dada
nossa chave de simbolização, signiőca que em todas as alternativas con-
cebíveis ao mundo real, em todos os cenários hipotéticos imagináveis,
não acontece jamais de ser domingo e Mariana estar viva, mas ela não
ir à praia. Esta não é apenas uma aőrmação bastante forte sobre Ma-
riana, é uma aőrmação bastante forte sobre como o mundo pode ser.
Enquanto aceitarmos a simbolização proposta, aőrmar ‘D ∧ V ’ ⊨ ‘P ’ é
aőrmar que o mundo não pode ser de um modo tal que Mariana, es-
tando viva, não vá a praia em um domingo. E isso signiőca aőrmar
que a sentença original 5 é uma verdade necessária (ver deőnição na Se-
ção 3.2): é verdadeira em todas as situações; é impossível que não seja
verdadeira.
Então, dada uma simbolização aceitável, esta outra diferença funda-
mental entre ‘⊨’ e ‘→’ pode ser assim resumida em termos mais gerais:
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 115
Exercícios
A. Examine as tabelas de verdade que você fez como resposta ao Exer-
cício 9 do Capítulo 11 e determine quais sentenças são tautologias,
quais são contradições e quais são contingências (ou seja, nem tauto-
CAPÍTULO 12. CONCEITOS SEMÂNTICOS 116
1. A→AeA↔A
2. ¬(A → B) e ¬A → ¬B
3. A ∨ B e ¬A → B
4. (A → B) → C e A → (B → C )
5. A ↔ (B ↔ C ) e A ∧ (B ∧ C )
G. Determine se as sentenças de cada uma das cinco coleções abaixo
são compatíveis ou incompatíveis na LVF, usando, em cada caso, uma
tabela de verdade completa.
1. A ∧ ¬B, ¬(A → B), B → A
2. A ∨ B, A → ¬A, B → ¬B
3. ¬(¬A ∨ B), A → ¬C , A → (B → C )
4. A → B, A ∧ ¬B
5. A → (B → C ), (A → B) → C , A → C
Atalhos nas
tabelas de
verdade
Com a prática, produzir tabelas de verdade se tornará uma atividade
simples para você. Ao fazer os exercícios do capítulo anterior você
deve ter notado que, apesar de ser trabalhoso e um pouco monótono,
preencher tabelas de verdade não é uma atividade assim tão difícil. É
uma espécie de contabilidade lógica. Muito mais difícil do que preen-
cher tabelas de verdade é produzir boas simbolizações e reŕetir sobre a
adequação ou não das simbolizações com relação aos argumentos ori-
ginais. Vamos, neste capítulo e no próximo, facilitar um pouco mais as
coisas com as tabelas de verdade, fornecendo alguns atalhos permitidos
em seu preenchimento.
119
CAPÍTULO 13. ATALHOS NAS TABELAS DE VERDADE 120
P Q (P ∨Q )↔ ¬ P
V V V V V F FV
V F V V F F FV
F V F V V VVF
F F F F F F VF
A tabela acima, quando não reescrevemos os valores de verdade abaixo
das letras sentenciais do lado direito do traço vertical, pode ser preen-
chida, de modo mais abreviado, como:
P Q (P ∨Q )↔ ¬ P
V V V FF
V F V FF
F V V VV
F F F FV
Você também sabe com certeza que para uma disjunção ser verdadeira,
basta que um de seus disjuntos seja verdadeiro. Portanto, se em uma
certa linha da tabela de verdade você encontrar um disjunto verdadeiro,
não há necessidade de calcular o valor de verdade do outro disjunto
para saber que a disjunção é verdadeira naquela linha.
O conectivo principal da sentença da tabela de verdade abaixo é
uma disjunção. Um dos disjuntos é apenas uma negação e o outro uma
sentença bem mais complexa. Pouparemos trabalho se preenchermos
a coluna do disjunto mais simples primeiro. Fazendo isso, só precisa-
remos calcular os valores de verdade do disjunto mais complexo nas
linhas em que o disjunto mais simples tem valor falso. Veja:
P Q (¬P ∨ ¬ Q ) ∨ ¬ P
V V F FF FF
V F F VV V F
F V − VV
F F − VV
Apenas para registrar, colocaremos um traço ‘−’ na coluna do conec-
tivo principal da sentença ou subsentença que não precisa ser calculada.
Eis outro atalho. Você também sabe com certeza que para uma
conjunção ser falsa, basta que um dos conjuntos seja falso. Portanto,
se você encontrar um conjunto falso, não há necessidade de descobrir
o valor de verdade do outro conjunto. Assim, também com as conjun-
ções você pode poupar trabalho se calcular os valores de verdade dos
conjuntos mais simples, conforme o exemplo abaixo ilustra:
CAPÍTULO 13. ATALHOS NAS TABELAS DE VERDADE 121
P Q ¬ (P ∧¬Q ) ∧ ¬ P
V V − FF
V F − FF
F V V F VV
F F V F VV
O condicional também tem atalhos semelhantes. Duas possibilidades
distintas garantem a verdade do condicional: quando o consequente
é verdadeiro sabemos que o condicional é verdadeiro; e quando o an-
tecedente é falso, sabemos também que o condicional é verdadeiro.
Então, também com as sentenças condicionais, pouparemos trabalho
se preenchermos primeiro a coluna da subsentença mais simples. Os
dois exemplos abaixo ilustram as duas possibilidades de atalho para o
condicional:
P Q ((P →Q ) →P )→P
V V − V
V F − V
F V V F V
F F V F V
e
P Q P → ((Q →P )→Q )
V V V − V
V F F V F
F V V −
F F V −
Repare que ‘((P → Q ) → P ) → P ’ é uma tautologia. Ela, de fato, é um
exemplo da Lei de Peirce, assim chamada em homenagem ao őlósofo e
lógico Charles Sanders Peirce.
¬L → ( J ∨ L), ¬L .Û. J
J L ¬ L → ( J ∨L) ¬L J
V V − − V
V F − − V
F V − F F
F F V F F V F
A tabela de verdade não tem linhas ruins, portanto as premissas sus-
tentam a conclusão e o argumento é válido.
Vamos fazer mais um exemplo e veriőcar se o seguinte argumento
é válido
A ∨ B, ¬(A ∧ C ), ¬(B ∧ ¬D) .Û. (¬C ∨ D)
No primeiro estágio, calculamos o valor de verdade da conclusão.
Como se trata de uma disjunção, ela será verdadeira sempre que qual-
quer disjunto for verdadeiro, então aceleramos um pouco as coisas ali,
calculando o valor de verdade de ‘¬C ’ apenas nas linhas em que ‘D é
falso. Feito isso, podemos então ignorar a maioria das linhas, exceto
as poucas nas quais a conclusão é falsa.
A B C D A∨B ¬ (A ∧C ) ¬ (B ∧ ¬ D) (¬C ∨ D)
V V V V − − − V
V V V F V F V − F F
V V F V − − − V
V V F F − − − V V
V F V V − − − V
V F V F V F V − F F
V F F V − − − V
V F F F − − − V V
F V V V − − − V
F V V F V V F F VV F F
F V F V − − − V
F V F F − − − V V
F F V V − − − V
F F V F F − − F F
F F F V − − − V
F F F F − − − V V
Podemos ver na tabela que o argumento é válido. Ela não tem linha
ruim, em que todas as premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa.
Mesmo com a maioria dos valores não preenchidos, tudo o que é ne-
cessário para vermos este fato está na tabela. Examine-a com calma e
certiőque-se disso. Nossos atalhos nos ajudaram a poupar muito traba-
lho. Se tivéssemos preenchido toda a tabela, teríamos escrito 256 ‘V’s
ou ‘F’s. Como usamos atalhos, escrevemos apenas 37.
Exercícios
A. Usando atalhos, determine se cada uma das nove sentenças abaixo
é uma tautologia, uma contradição ou uma contingência.
1. ¬B ∧ B
2. ¬D ∨ D
3. (A ∧ B) ∨ (B ∧ A)
4. ¬[A → (B → A)]
5. A ↔ [A → (B ∧ ¬B)]
6. ¬(A ∧ B) ↔ A
7. A → (B ∨ C )
8. (A ∧ ¬A) → (B ∨ C )
9. (B ∧ D) ↔ [A ↔ (A ∨ C )]
CAPÍTULO 14
Tabelas de
verdade
parciais
Nem sempre precisamos das informações de todas as linhas de uma
tabela de verdade. Às vezes, apenas uma ou duas linhas bastam.
(U ∧ T ) → (S ∧ W )
125
CAPÍTULO 14. TABELAS DE VERDADE PARCIAIS 126
S T U W (U ∧T )→ (S ∧W )
S T U W (U ∧T )→ (S ∧W )
V F F
Para que o antecedente ‘(U ∧ T )’ seja verdadeiro, as sentenças ‘U ’ e
‘T ’ devem ser ambas verdadeiras. Então, também preenchemos isso
na tabela:
S T U W (U ∧T )→ (S ∧W )
V V VVV F F
Agora, apenas precisamos tornar ‘(S ∧ W )’ falsa. Para fazer isso, pelo
menos uma das partes da conjunção ‘S ’ e ‘W ’ deve ser falsa. Podemos
tornar ambos ‘S ’ e ‘W ’ falsos, se quisermos; ou apenas o primeiro, ou
apenas o segundo. Tanto faz. Tudo o que importa é que a sentença
completa seja falsa nessa linha. Esta multiplicidade de opções apenas
indica que a sentença é falsa em mais de uma linha da tabela de verdade
completa. Então, escolhendo arbitrariamente uma dessas três opções,
concluímos assim a tabela:
S T U W (U ∧T )→ (S ∧W )
F V V F VVV F FF F
CAPÍTULO 14. TABELAS DE VERDADE PARCIAIS 127
O que obtivemos foi uma tabela de verdade parcial que mostra que
‘(U ∧ T ) → (S ∧ W )’ não é uma tautologia. Em outras palavras, mos-
tramos que existe uma valoração na qual ‘(U ∧ T ) → (S ∧ W )’ é falsa.
Esta valoração está explicitada na única linha da tabela que foi preen-
chida, e é caracterizada pelos seguintes valores de verdade das letras
sentenciais: ‘S ’ é falsa, ‘T ’ é verdadeira, ‘U ’ é verdadeira e ‘W ’ é falsa.
S T U W (U ∧T )→ (S ∧W )
V
Esta é uma sentença condicional (seu conectivo principal é um condi-
cional) e sabemos que um condicional é verdadeiro tanto se seu an-
tecedente for falso, quanto se seu consequente for verdadeiro. Temos
duas opções para trabalhar. Escolhemos arbitrariamente a primeira:
vamos fazer o antecedente deste condicional ‘(U ∧ T )’ falso. Como o
antecedente é uma conjunção, basta que tenha um conjunto falso, para
que seja falsa. Também de modo arbitrário, sem qualquer motivo espe-
cíőco, vamos tornar ‘U ’ falsa. Fazendo isso, podemos atribuir qualquer
valor de verdade às outras letras que a sentença completa será falsa.
Então completamos a tabela assim:
S T U W (U ∧T )→ (S ∧W )
F V F F F FVVFF F
Esta tabela parcial mostra que a sentença ‘(U ∧ T ) → (S ∧ W )’ não é
uma contradição porque ela mostra que na valoração em que ‘S ’ é
falsa, ‘T ’ é verdadeira, ‘U ’ é falsa e ‘W ’ é falsa, a sentença condicional
é verdadeira.
Validade. Para mostrar que um argumento é válido (ou que suas pre-
missas sustentam a conclusão), devemos mostrar que não há valoração
na qual todas as premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa. Isso
requer uma tabela de verdade completa, porque temos que mostrar que
isso não ocorre em nenhuma linha da tabela.
No entanto, para mostrar que um argumento é inválido (ou que
suas premissas não sustentam a conclusão), devemos mostrar que existe
uma valoração na qual todas as premissas são verdadeiras e a conclusão
é falsa. Uma tabela de verdade parcial com apenas uma linha será
suőciente para isso. Basta que nesta linha as premissas sejam todas
verdadeiras e a conclusão seja falsa.
Veja abaixo um resumo sobre que tipo de tabela de verdade é ne-
cessária nos diversos testes:
Teste Sim Não
A sentença é tautologia? completa uma linha
A sentença é contradição? completa uma linha
A sentença é contingente? duas linhas completa
As sentenças são equivalentes? completa uma linha
As sentenças são compatíveis? uma linha completa
O argumento válido? completa uma linha
As premissas sustentam a conclusão? completa uma linha
CAPÍTULO 14. TABELAS DE VERDADE PARCIAIS 129
Exercícios
A. Use tabelas de verdade completas ou parciais (conforme o que for
apropriado) para determinar se as sentenças de cada um dos oito pares
abaixo são ou não logicamente equivalentes:
1. A, ¬A
2. A, A ∨ A
3. A → A, A ↔ A
4. A ∨ ¬B, A → B
5. A ∧ ¬A, ¬B ↔ B
6. ¬(A ∧ B), ¬A ∨ ¬B
7. ¬(A → B), ¬A → ¬B
8. (A → B), (¬B → ¬A)
B. Use tabelas de verdade completas ou parciais (conforme o que for
apropriado) para determinar se as sentenças de cada um dos seis gru-
pos abaixo são ou não compatíveis:
1. A ∧ B, C → ¬B, C
2. A → B, B → C , A, ¬C
3. A ∨ B, B ∨ C , C → ¬A
4. A, B, C , ¬D, ¬E, F
5. A ∧ (B ∨ C ), ¬(A ∧ C ), ¬(B ∧ C )
6. A → B, B → C , ¬(A → C )
C. Use tabelas de verdade completas ou parciais (conforme o que for
apropriado) para determinar se cada um dos cinco argumentos abaixo
é válido ou inválido:
[ ]
1. A ∨ A → (A ↔ A) .Û. A
2. A ↔ ¬(B ↔ A) .Û. A
3. A → B, B .Û. A
4. A ∨ B, B ∨ C, ¬B .Û. A ∧ C
5. A ↔ B, B ↔ C .Û. A ↔ C
D. Para cada uma das dez sentenças abaixo, decida se ela é uma tau-
tologia, uma contradição ou uma sentença contingente. Justiőque sua
resposta em cada caso com uma tabela de verdade completa ou, quando
for apropriado, parcial.
1. A → ¬A
2. A → (A ∧ (A ∨ B))
CAPÍTULO 14. TABELAS DE VERDADE PARCIAIS 130
3. (A → B) ↔ (B → A)
4. A → ¬(A ∧ (A ∨ B))
5. ¬B → [(¬A ∧ A) ∨ B]
6. ¬(A ∨ B) ↔ (¬A ∧ ¬B)
7. [(A ∧ B) ∧ C ] → B
[ ]
8. ¬ (C ∨ A) ∨ B
[ ]
9. (A ∧ B) ∧ ¬(A ∧ B) ∧ C
10. (A ∧ B)] → [(A ∧ C ) ∨ (B ∧ D)]
E. Para cada uma das dez sentenças abaixo, decida se ela é uma tau-
tologia, uma contradição ou uma sentença contingente. Justiőque sua
resposta em cada caso com uma tabela de verdade completa ou, quando
for apropriado, parcial.
1. ¬(A ∨ A)
2. (A → B) ∨ (B → A)
3. [(A → B) → A] → A
4. ¬[(A → B) ∨ (B → A)]
5. (A ∧ B) ∨ (A ∨ B)
6. ¬(A ∧ B) ↔ A
7. A → (B ∨ C )
8. (A ∧ ¬A) → (B ∨ C )
9. (B ∧ D) ↔ [A ↔ (A ∨ C )]
10. ¬[(A → B) ∨ (C → D)]
1. A → A, ¬A → ¬A, A ∧ A, A ∨ A
2. A → ¬A, ¬A → A
3. A ∨ B, A → C , B → C
4. A ∨ B, A → C , B → C , ¬C
5. B ∧ (C ∨ A), A → B, ¬(B ∨ C )
6. (A ↔ B) → B, B → ¬(A ↔ B), A ∨ B
7. A ↔ (B ∨ C ), C → ¬A, A → ¬B
8. A ↔ B, ¬B ∨ ¬A, A → B
9. A ↔ B, A → C , B → D, ¬(C ∨ D)
10. ¬(A ∧ ¬B), B → ¬A, ¬B
H. Para cada um dos dez argumentos abaixo, decida se ele é válido
ou inválido. Use tabelas de verdade completas ou parciais (conforme
o que for apropriado) para justiőcar sua resposta em cada caso:
1. A → (A ∧ ¬A) .Û. ¬A
2. A ∨ B, A → B, B → A .Û. A ↔ B
3. A ∨ (B → A) .Û. ¬A → ¬B
4. A ∨ B, A → B, B → A .Û. A ∧ B
5. (B ∧ A) → C , (C ∧ A) → B .Û. (C ∧ B) → A
6. ¬(¬A ∨ ¬B), A → ¬C .Û. A → (B → C )
7. A ∧ (B → C ), ¬C ∧ (¬B → ¬A) .Û. C ∧ ¬C
8. A ∧ B, ¬A → ¬C , B → ¬D .Û. A ∨ B
9. A → B .Û. (A ∧ B) ∨ (¬A ∧ ¬B)
10. ¬A → B, ¬B → C , ¬C → A .Û. ¬A → (¬B ∨ ¬C )
1. A ↔ ¬(B ↔ A) .Û. A
2. A ∨ B, B ∨ C , ¬A .Û. B ∧ C
3. A → C , E → (D ∨ B), B → ¬D .Û. (A ∨ C ) ∨ (B → (E ∧ D))
4. A ∨ B, C → A, C → B .Û. A → (B → C )
5. A → B, ¬B ∨ A .Û. A ↔ B
PARTE IV
Lógica de
Primeira
Ordem ś LPO
132
CAPÍTULO 15
Elementos
fundamentais
da LPO
15.1 A necessidade de ‘olhar dentro’ das sentenças
Considere o seguinte argumento, que é obviamente válido em portu-
guês:
Samir é um lógico.
Todos os lógicos usam chapéus ridículos.
.Û. Samir usa chapéus ridículos.
Repare que todas as sentenças deste argumento são atômicas, ou seja,
não são compostas por sentenças mais simples ligadas por conectivos
verofuncionais. Por isso qualquer chave de simbolização para o argu-
mento na LVF seria semelhante a esta:
L: Samir é um lógico.
T : Todos os lógicos usam chapéus ridículos.
R: Samir usa chapéus ridículos.
Sob esta chave nosso argumento őca simplesmente:
L,T .Û. R
133
CAPÍTULO 15. ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA LPO 134
‘ é um cachorro’
‘ é uma advogada’
“Beto é um cachorrož
“Kaline é uma advogadaž
C (b)
‘Beto é um cachorro’
Da mesma forma, podemos fazer o predicado ‘A’ da LPO simbolizar o
predicado do português ‘ é uma advogada’. Neste caso a expres-
são
A(k )
simbolizará a sentença do português
‘Kaline é uma advogada’
‘existe um cachorro’
CAPÍTULO 15. ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA LPO 136
15.2 Nomes
Em português, um termo singular é uma palavra ou frase que se refere a
uma coisa, pessoa ou lugar específicos. A palavra ‘cachorro’, por exem-
plo, não é um termo singular, porque existem muitos cachorros e a
palavra ‘cachorro’ não se refere especiőcamente a nenhum deles. Já a
palavra ‘Beto’ é termo singular, porque se refere a um vira-lata espe-
cíőco. Da mesma forma, a expressão ‘o cachorro de Felipe’ também
é um termo singular, porque se refere a este mesmo pequeno vira-lata
especíőco.
Os nomes próprios são um tipo particularmente importante de termo
singular. Eles são expressões que selecionam indivíduos sem descrevê-
los. O nome ‘Emília’ é um nome próprio; e o nome, por si só, não diz
nada sobre Emília. Certamente, alguns nomes são tradicionalmente da-
dos a meninos e outros são tradicionalmente dados a meninas. Quando
‘Ivani’ é usado como um termo singular, você pode achar que se refere
a uma mulher. Mas você pode estar cometendo um erro. ‘Ivani’ pode
ser nome de um homem, pode nem ser o nome de uma pessoa, mas de
um gato, ou de uma gata, ou uma tartaruga.
Na LPO, os nomes são letras minúsculas de ‘a’ a ‘r ’. Podemos adi-
cionar índices numéricos se quisermos usar a mesma letra para nomes
diferentes. Aqui estão alguns termos singulares distintos da LPO:
(Apesar disso, é sim permitido que uma única coisa tenha mais de um
nome diferente.)
Como na LVF, utilizaremos chaves de simbolização também na
LPO. Um primeiro elemento, então, que nossas chaves de simbolização
da LPO devem conter são os nomes. Vamos utilizá-las para relacionar
nomes da LPO com termos singulares (nomes próprios e descrições)
do português. Uma chave de simbolização da LPO pode, por exemplo,
apresentar a seguinte conexão entre nomes próprios do português e
nomes da LPO:
e : Emília
g : Glória
m: Marcelo
15.3 Predicados
Os predicados mais simples são propriedades de indivíduos. São coisas
que você pode dizer sobre um objeto. Aqui estão alguns exemplos de
predicados em português:
é um cachorro
estudou őlosoőa na UFRN
Um raio caiu em
Em geral, você pode pensar nos predicados como as coisas que se com-
binam com os termos singulares para formar sentenças completas. Ou
seja, ao combinar o predicado ‘ é um cachorro’ com o termo sin-
gular ‘Beto’, obtemos a sentença completa ‘Beto é um cachorro’. Por
outro lado, você pode começar com as sentenças e criar predicados a
partir delas, removendo termos singulares. Considere, por exemplo, a
sentença ‘Viviane pegou emprestado o carro de Nelson’. Ao remover
um termo singular desta sentença, podemos obter qualquer um dos três
predicados diferentes abaixo:
pegou emprestado o carro de Nelson
Viviane pegou emprestado o carro de
Viviane pegou emprestado de Nelson
Os predicados na LPO são letras maiúsculas de A a Z , com ou sem
índices numéricos. Podemos apresentar uma chave de simbolização
para predicados assim:
B(x): x está bravo
CAPÍTULO 15. ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA LPO 138
B(e )
15.4 Quantificadores
Estamos agora prontos para introduzir os quantiőcadores. Considere
estas sentenças:
4. Todos estão alegres.
CAPÍTULO 15. ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA LPO 139
No entanto, isso diria apenas que Emília, Glória e Marcelo estão ale-
gres. Mas não é isso exatamente o que queremos dizer com a sentença
4. Queremos dizer que todos estão alegres, mesmo aqueles a quem
não demos nome. Para fazer isso, utilizaremos o símbolo ‘∀’, que é
chamado de quantificador universal.
Um quantiőcador deve ser seguido sempre por uma variável. Na
LPO, as variáveis são as letras minúsculas de ‘s ’ a ‘z ’, em itálico, com
ou sem índices numéricos. Podemos, assim, simbolizar a sentença 4
como:
∀x A(x)
A variável ‘x’ funciona como um tipo de marca que reserva um lugar. A
expressão ‘∀x’ grosso modo signiőca que você pode escolher qualquer
coisa e colocá-la como ‘x’. A expressão que a segue, ‘A(x)’, indica,
desta coisa que você escolheu, que ela está alegre.
Deve-se ressaltar que não há qualquer razão especial para usarmos
‘x’ em vez de alguma outra variável. As sentenças ‘∀x A(x)’, ‘∀y A(y)’,
‘∀z A(z )’ e ‘∀x 5A(x 5 )’ usam variáveis diferentes, mas todas são simboli-
zações logicamente equivalentes da sentença 4.
Para simbolizar a sentença 5, introduzimos mais um símbolo novo:
o quantificador existencial, ‘∃’. Assim como o quantiőcador uni-
versal, o quantiőcador existencial também requer uma variável. A sen-
tença 5 pode ser simbolizada por:
∃x B(x)
Enquanto ‘∀x B(x)’ deve ser lida como ‘para todo x, x está bravo’,
‘∃x B(x)’ deve ser lida como ‘existe algo, x, tal que x está bravo’. Aqui
também a variável serve apenas para reservar um espaço; poderíamos
facilmente simbolizar a sentença 5 por ‘∃z B(z )’, ‘∃w 256 B(w 256 )’, ou
com qualquer outra variável.
Mais alguns exemplos ajudarão. Considere estas outras sentenças:
∀x ¬B(x)
∃x ¬A(x)
¬∀x A(x)
15.5 Domínios
Dada a chave de simbolização que estamos usando, ‘∀x A(x)’ simboliza
‘Todos estão alegres’. Mas quem está incluído neste todos? Em portu-
guês, quando usamos sentenças como esta, geralmente não queremos
dizer com elas todos que estão atualmente vivos. Certamente também
não queremos dizer todos que já estiveram vivos ou que um dia vive-
rão. Normalmente, queremos dizer algo mais modesto, tal como: todos
CAPÍTULO 15. ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA LPO 141
está em Paris. Mas nosso domínio contém apenas a Torre Eiffel. Por-
tanto, com essa chave de simbolização, ∀x P (x) signiőca o mesmo que
a sentença ‘a Torre Eiffel está em Paris’ e por isso deveria ser dessa
forma parafraseada em português.
B(q )
e a sentença 10 como:
¬B(q )
Problemas surgem quando nos perguntamos se essas sentenças são ver-
dadeiras ou falsas.
Uma opção é dizer que a sentença 9 não é verdadeira, porque não
há nenhuma Quimera. Mas se a sentença 9 for falsa porque se refere
a algo inexistente, então a sentença 10 deve, pelo mesmo motivo, ser
falsa também. No entanto, isso signiőcaria que B(q ) e ¬B(q ) seriam
ambas falsas. Mas dadas as condições de verdade da negação, este
CAPÍTULO 15. ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA LPO 143
não pode ser o caso. Sabemos que se A é falsa, então ¬A deveria ser
verdadeira.
O que, então, devemos fazer? Como resolver este problema? Uma
outra opção é dizer que a sentença 9 é sem sentido, porque fala sobre
uma coisa que não existe. Mas o sentido de uma expressão não deveria
depender da existência das coisas referidas na sentença. Por exemplo,
quando um ateu e um crente discutem sobre a existência de deus, am-
bos entendem o sentido das aőrmações sobre as características de deus
(onipotência, onisciência,...) e é justamente porque entende o sentido
das descrições sobre deus que o ateu aőrma que ele não existe. Ele
acha que não deve haver um ser com tais características.
Além disso, se uma sentença só tem sentido quando seus termos
têm referência, ‘B(q )’ seria uma expressão signiőcativa na LPO em al-
gumas interpretações (ou seja, com algumas chaves de interpretação),
mas não seria signiőcativa em outras. Isso, no entanto, tornaria nossa
linguagem formal refém de interpretações (chaves de simbolização) par-
ticulares. Mas uma vez que nós estamos interessados na forma lógica,
nós queremos considerar a força lógica de uma sentença como ‘B(q )’
de modo independente de qualquer interpretação especíőca. Se ‘B(q )’
às vezes fosse signiőcativa e às vezes sem sentido, não poderíamos fazer
isso.
Esse é o problema dos termos sem referência. Trataremos dele mais
tarde (no Capítulo 19, p. 181.) Por ora vamos resolver este problema
simplesmente proibindo termos sem referência e exigindo que cada
nome da LPO designe a algo no domínio. Então, se quisermos sim-
bolizar argumentos sobre criaturas mitológicas, devemos deőnir um
domínio que as inclua. Essa opção é importante se quisermos conside-
rar a lógica de estórias őccionais. Podemos simbolizar uma sentença
como ‘Sherlock Holmes morava na rua Baker, número 221B’, desde
que aceitemos incluir personagens őctícios como Sherlock Holmes em
nosso domínio.
CAPÍTULO 16
Sentenças com
um
quantificador
Já temos à nossa disposição todas as peças da LPO. Simbolizar senten-
ças mais complicadas será apenas uma questão de saber qual o caminho
certo para combinar predicados, nomes, quantiőcadores e conectivos.
Fazer isso de modo competente é uma arte e, como todas as artes, só
a adquiriremos com bastante prática.
144
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 145
D(x))’ for verdadeira para esse objeto. Ou seja, ‘∃x(M (x) → D(x))’
é verdadeira se alguma moeda não estiver sobre a mesa ou for uma
moeda de dez centavos. Claro que há uma moeda que não está sobre
a mesa: há moedas em muitos outros lugares. Portanto, é muito fácil
que ‘∃x(M (x) → D(x))’ seja verdadeira. Um condicional geralmente
será o conectivo natural a ser usado com um quantiőcador universal,
ao passo que um condicional no escopo de um quantiőcador existencial
tende a dizer algo muito fraco. Como regra, não coloque condicionais
no escopo dos quantiőcadores existenciais, a menos que você tenha
certeza de que precisa de um.
Embora talvez isso ainda não seja óbvio para você, essas duas sentenças
são logicamente equivalentes. (Isso se deve à equivalência lógica entre
¬∀x A e ∃x¬A, mencionada no Capítulo 15, junto com a equivalência
entre ¬(A → B) e (A∧ ¬B).)
A sentença 4 pode ser parafraseada como: ‘Não é o caso de que há
alguma moeda de 10 centavos no meu bolso’. Isso pode ser simbolizado
por:
¬∃x(B(x) ∧ D(x))
Mas a sentença 4 também pode ser parafraseada como: ‘Qualquer coisa
no meu bolso não é uma moeda de dez centavos’ e, em seguida, pode
ser simbolizada por:
∀x(B(x) → ¬D(x))
Novamente, as duas simbolizações são logicamente equivalentes; am-
bas são simbolizações corretas da sentença 4.
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 147
E a sentença 6 por:
∃x(M (x) ∧ L(x))
Pode ser tentador pensar que a sentença 5 sustenta a sentença 6. Ou
seja, poderíamos pensar que é impossível que todo macaco conheça
a linguagem de sinais, sem que também ocorra que algum macaco
conheça a linguagem de sinais. Mas isso seria um erro. É possível
que a sentença ‘∀x(M (x) → L(x))’ seja verdadeira mesmo quando a
sentença ‘∃x(M (x) ∧ L(x))’ é falsa.
Como isso pode ser possível? A explicação surge quando avalia-
mos a verdade ou falsidade destas sentenças assumindo como hipótese
uma situação em que macacos não existem. Se não houvesse macacos
(no domínio), então ‘∀x(M (x) → L(x))’ seria vacuamente verdadeira:
sem macacos no domínio, você não consegue ‘pegar’ um macaco que
não conhece a linguagem dos sinais: qualquer que seja o elemento do
domínio no lugar de x, ‘M (x)’ será falsa e, portanto, (M (x) → L(x))
será verdadeira. Por outro lado, sob esta mesma hipótese de não haver
macacos (no domínio), a sentença ‘∃x(M (x) ∧ L(x))’ seria falsa.
Então ‘∀x(M (x) → L(x))’ não sustenta ‘∃x(M (x) ∧ L(x))’ e usamos
este mesmo raciocínio para concluir que a sentença 5 não sustenta a
sentença 6.
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 148
domínio: os animais
M (x): x é um macaco.
L(x): x conhece a linguagem de sinais.
G (x): x é uma geladeira.
que não são satisfeitos por nada, que admitimos também, como consequência disso, a
convenção de que uma sentença como ‘todo unicórnio tem apenas um chifre’ é verda-
deira (no mundo real). Ela é verdadeira simplesmente porque não existem unicórnios
e, portanto, nada que existe será um contraexemplo para a sentença, ou seja, nada que
existe será um unicórnio que não tenha apenas um chifre. Mas as coisas nem sempre
foram assim. Quando Aristóteles propôs seu sistema lógico, ele não admitia a hipótese
de predicados vazios e, por isso, nenhuma sentença era vacuamente verdadeira. Como
consequência disso, na Lógica Silogística de Aristóteles (sobre a qual, mais adiante neste
livro, falaremos um pouco), a sentença 5 sustenta a sentença 6. Esta característica da
lógica aristotélica que é divergente da LPO é chamada de importação existencial.
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 149
∀x E(x)
Agora não podemos mais simbolizar a sentença 7 como ‘∀x E(x)’, pois,
dado nosso domínio mais abrangente, esta sentença é uma simboliza-
ção para ‘toda pessoa ou planta tem um espinho’. A sentença 7 deve,
então, ser simbolizada como:
∀x(R(x) → E(x))
∀x(B(x) → T (x))
domínio: pessoas
S (x): x é sanfoneiro.
P (x): x é popular.
d : Dominguinhos
∃xS (x) → P (d )
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 152
A sentença 12, por sua vez, pode ser parafraseada como: ‘Para toda
pessoa x, se x for um sanfoneiro, então x é popular’. Ou, em portu-
guês mais natural, pode ser parafraseada por ‘Todos os sanfoneiros são
populares’. E deve, portanto, ser simbolizada como:
domínio: pessoas
S (x): x é um(a) sanfoneiro(a).
P (x): x é popular.
d : Dominguinhos
l : Larissa
∀x S (x) → S (l )
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 153
∀x(S (x) → S (l ))
∀x(S (x) → S (l ))
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 154
H (a)
Reŕita com calma nesta simbolização e veja como ela formaliza ade-
quadamente o argumento, de acordo com a chave de simbolização pro-
posta.
Suponha, em seguida, que queiramos simbolizar o argumento
abaixo:
Exercícios
A. Abaixo estão as quinze őguras da famosa Lógica Silogística, pro-
posta por Aristóteles na Grécia Antiga, com os nomes que cada őgura
recebeu dos lógicos medievais. Cada uma destas ‘őguras’, veremos
mais adiante neste livro, é um argumento válido na LPO:
1. Barbara. Todo G é F. Todo H é G. Portanto: Todo H é F.
2. Celarent. Nenhum G é F. Todo H é G. Portanto: Nenhum H é F.
3. Ferio. Nenhum G é F. Algum H é G. Portanto: Algum H não é F.
4. Darii. Todo G é F. Algum H é G. Portanto: Algum H é F.
5. Camestres. Todo F é G. Nenhum H é G. Portanto: Nenhum H é F.
6. Cesare. Nenhum F é G. Todo H é G. Portanto: Nenhum H é F.
7. Baroko. Todo F é G. Algum H não é G. Portanto: Algum H não é F.
8. Festino. Nenhum F é G. Algum H é G. Portanto: Algum H não é F.
9. Datisi. Todo G é F. Algum G é H. Portanto: Algum H é F.
10. Disamis. Algum G é F. Todo G é H. Portanto: Algum H é F.
11. Ferison. Nenhum G é F. Algum G é H. Portanto: Algum H não é F.
12. Bokardo. Algum G não é F. Todo G é H. Portanto: Algum H não é F.
13. Camenes. Todo F é G. Nenhum G é H. Portanto: Nenhum H é F.
14. Dimaris. Algum F é G. Todo G é H. Portanto: Algum H é F.
15. Fresison. Nenhum F é G. Algum G é H. Portanto: Algum H não é F.
domínio: pessoas
C (x): x sabe a combinação do cofre
E(x): x é um(a) espiã(o)
V (x): x é vegetariano(a)
h: Horácio
i : Ingrid
domínio: os animais
CAPÍTULO 16. SENTENÇAS COM UM QUANTIFICADOR 158
Relações e
quantificação
múltipla
Todas as sentenças que consideramos até agora requeriam um único
quantiőcador e continham apenas predicados simples, unários, com
lugar para uma única variável. Mas a LPO őca muito mais poderosa
quando utilizamos predicados com lugar para muitas variáveis em sen-
tenças com múltiplos quantiőcadores. As inovadoras ideias gerais e o
primeiro desenvolvimento sistemático da LPO foram propostos Gottlob
Frege, em 1879; mas Charles S. Peirce também merece créditos por suas
contribuições.
159
CAPÍTULO 17. RELAÇÕES E QUANTIFICAÇÃO MÚLTIPLA 160
ama
está à esquerda de
está em dívida com
pegou emprestado de
ama
Se a preenchermos com um mesmo termo individual, digamos, ‘Guto’,
obteremos uma sentença, mas se a preenchermos com termos indivi-
duais diferentes, digamos, ‘Guto’ e ‘Nico’, obteremos uma sentença
diferente. E se colocarmos estes mesmos termos, mas em outra ordem,
obteremos uma terceira sentença diferente. Cada uma das sentenças
abaixo, por exemplo, tem um signiőcado bastante diferente do das ou-
tras:
CAPÍTULO 17. RELAÇÕES E QUANTIFICAÇÃO MÚLTIPLA 161
A(g, n)
A(g, n) ∧ ¬A(n, g )
A(n, g )
É fato que esta paráfrase despreza a diferença de tom entre voz ativa e
voz passiva; mas essas nuances de tom são todas, sempre, perdidas na
CAPÍTULO 17. RELAÇÕES E QUANTIFICAÇÃO MÚLTIPLA 162
Isso signiőca que ambas, ‘C (g, n)’ e ‘A(n, g )’, simbolizam a sentença
‘Nico ama Guto’. Da mesma forma, ‘C (n, g )’ e ‘A(g, n)’ ambas sim-
bolizam ‘Guto ama Nico’. Como, infelizmente, o amor pode não ser
correspondido, essas são aőrmações muito diferentes.
A moral é simples. Quando lidamos com relações, ou seja, predica-
dos com mais de um lugar, precisamos prestar muita atenção à ordem
dos lugares.
∀x∃y A(x, y)
∃y∀x A(x, y)
Usando, mais uma vez, nossa tática de fazer atalhos, isso se torna:
[ ]
∀x x é dono de cachorro → ∃y(y é dono de cachorro ∧ A(x, y))
Isso mostra que nenhuma variável está sendo forçada a servir a dois
senhores (quantiőcadores) simultaneamente!
A sentença 11 é ainda mais complicada. Nós primeiro a parafrase-
amos como:
Para qualquer x que seja amigo de um dono de cachorro, x
é dono de um cachorro do qual um amigo de x também é
dono.
E usamos nossa tática de atalhos para transformá-la em:
[
∀x x é amigo de um dono de cachorro →
]
x é dono de um cachorro do qual um amigo de x também é dono
CAPÍTULO 17. RELAÇÕES E QUANTIFICAÇÃO MÚLTIPLA 167
Writings, ed. Patricia Springborg, Cambridge University Press, 1996, pp. 9–10.
CAPÍTULO 17. RELAÇÕES E QUANTIFICAÇÃO MÚLTIPLA 169
isto é,
∀x(H (x) → ∀y(M (y) → S (x, y)))
outra interpretação é que alguns homens são superiores a algumas mu-
lheres,
∃x(H (x) ∧ ∃y(M (y) ∧ S (x, y))).
Esta última é uma aőrmação verdadeira, mas a seguinte aőrmação tam-
bém é
∃y(M (y) ∧ ∃x(H (x) ∧ S (y, x)))
(algumas mulheres são superiores a alguns homens), de modo que “não
seria uma grande descobertaž. De fato, uma vez que a rainha é superior
a todos seus súditos, é mesmo verdade que uma mulher é superior a
todo homem, ou seja,
Exercícios
A. Utilize a seguinte chave de simbolização para simbolizar na LPO
cada uma das quinze sentenças abaixo.
domínio: todos os animais
J (x): x é um jacaré
M (x): x é um macaco
R(x): x é um réptil
Z (x): x vive no zoológico
A(x, y): x ama y
a: Amadeu
b: Bela
c: Clara
domínio: doces
C (x): x contém chocolate.
M (x): x contém caramelo.
A(x): x contém açúcar.
B(x): Berenice já provou x.
G (x, y): x é mais gostoso que y.
domínio: pessoas
D(x): x dança forró.
M (x): x é mulher.
H (x): x é homem.
F (x, y): x é őlho(a) de y.
I (x, y): x é irmã(o) de y.
e: Emerson
j: Jane
p: Patrick
Identidade
Considere a sentença e chave de simbolização seguintes:
domínio: pessoas
D(x, y): x deve dinheiro a y
p: Paulo
173
CAPÍTULO 18. IDENTIDADE 174
f : Dr. Ferreira
A sentença 5 pode agora ser simbolizada simplesmente como
p=f
Esta última sentença contém a expressão ‘¬x = p’, que pode parecer
um pouco estranha, porque o símbolo que vem imediatamente após o
‘¬’ é uma variável, e não um predicado. Mas isso não é um problema.
Estamos simplesmente negando a expressão ‘x = p’. A expressão ‘¬x =
CAPÍTULO 18. IDENTIDADE 175
Seja ‘h’ um nome para Hasina na LPO. Todas estas sentenças podem
igualmente ser parafraseadas como ‘Ninguém diferente de Paulo deve
dinheiro a Hasina’, que, por sua vez, pode ser simbolizada por:
∀x(D(x, h) → x = p)
Há, no entanto, uma sutileza aqui. Você acha que quando aőrmamos
qualquer uma das sentenças 6–9 acima estamos assumindo que Paulo
deve dinheiro a Hasina? Parece óbivio que sim! Todas elas aőrmam
que Paulo deve dinheiro à Hasina e acrescentam a isto o fato de que
ninguém mais deve dinheiro à Hasina. Então, ao aőrmar qualquer
uma destas sentenças nos comprometemos com a aőrmação de que
Paulo deve dinheiro a Hasina. Agora pense um pouco sobre as duas
alternativas de simbolização que propusemos para estas sentenças. Se
ninguém no domínio deve dinheiro a Hasina, elas serão verdadeiras ou
falsas? Ambas serão verdadeiras.1 É o velho ‘problema’ das sentenças
1 Só na próxima Parte do livro veremos em todos os detalhes a explicação de por que
estas sentenças são verdadeiras quando ninguém deve dinheiro a Hasina, ou seja, quando
nenhum elemento ‘x’ do domínio satisfaz ‘D(x, h)’. Então não se preocupe muito com
isso agora. Mas, caso você esteja curioso, a ideia geral é a seguinte. Quando nenhum
elemento ‘x’ do domínio satisfaz ‘D(x, h)’, então ‘D(x, h)’ será falsa para qualquer valor de
‘x’. Então a conjunção ‘(¬x = p ∧ D(x, h))’ também será falsa, porque tem um conjunto
falso, e a formalização com o existencial, ‘¬∃x(¬x = p ∧ D(x, h))’, será verdadeira, já
que está negando uma falsidade. A formalização com o universal também é verdadeira
porque o condicional ‘(D(x, h) → x = p)’ será verdadeiro, já que, para qualquer valor de
‘x’, o antecedente é falso; e, portanto, ‘∀x(D(x, h) → x = p)’ será verdadeira.
CAPÍTULO 18. IDENTIDADE 176
D(p, h) ∧ ∀x(D(x, h) → x = p)
ou, alternativamente:
∃yD(y, h) ∧ ∀x(D(x, h) → x = p)
Incluir a identidade na LPO signiőca tratá-la como um conceito lógico,
tanto quanto o são a negação, o condicional, os quantiőcadores e de-
mais conectivos. Ao pertencer à LPO, sua interpretação őca őxada e
não pode variar. Ou seja, a linha da chave de simbolização especiőcada
anteriormente e o signiőcado que deőnimos para a identidade őcam im-
plícitos e őxos em toda chave de simbolização, seja ela qual for. Não
incluir a identidade na LPO, por sua vez, não nos retira a possibilidade
de simbolizar adequadamente as sentenças acima. Poderíamos propor
um predicado para a identidade e simbolizar essas sentenças. A dife-
rença é que não seríamos obrigados a adotar o signiőcado único da
identidade, deőnido na LPO. A ideia aqui é que domínios muito dife-
rentes poderiam requerer identidades ligeiramente diferentes. Não há
consenso sobre se a identidade é ou não parte da lógica, nem mesmo
da própria LPO. Há um vibrante debate acadêmico sobre esta questão
com interessantes argumentos dos dois lados. Neste livro optamos por
incluir a identidade como parte da LPO.
18.3 Há no máximo. . .
Considere agora as seguintes sentenças:
2 Quando, por exemplo, x = z = 1 e y = 2 é verdade que ‘¬x = y ∧ ¬y = z ’.
CAPÍTULO 18. IDENTIDADE 178
18.4 Há exatamente. . .
Podemos agora considerar declarações de quantidades precisas, como:
15. Há exatamente um caju.
16. Existem exatamente dois cajus.
CAPÍTULO 18. IDENTIDADE 179
Mas talvez seja mais simples parafrasear a sentença 15 como: ‘Há uma
coisa x que é um caju e qualquer coisa que for um caju é o próprio x’.
Pensado desta forma, podemos simbolizá-la como:
[ ]
∃x C (x) ∧ ∀y(C (y) → x = y)
Exercícios
A. Explique, com suas palavras, por quê:
Descrições
definidas
Considere as seguintes sentenças
1. Nivaldo é o traidor.
2. O traidor estudou na UFRN.
3. O traidor é o delegado.
‘o traidor’
que, em todas elas, tem a função de se referir a um certo indivíduo
único do domíno, através de uma descrição que o deőne (ser o traidor).
A sentença 3 tem ainda uma outra expressão do mesmo tipo:
‘o delegado’
‘um traidor’
181
CAPÍTULO 19. DESCRIÇÕES DEFINIDAS 182
U (t )
U ( x T (x))
ι
E esta sentença, assim como a anterior, também será falsa, dado que
‘R(x)’ é falso para todo elemento do domínio.
A análise de Russell nos ajuda a perceber que não há qualquer
problema no fato de que tanto 4 quanto 5 sejam ambas falsas, porque,
apesar das aparências, uma sentença não é a negação da outra. A
sentença 5 nega apenas um dos conjuntos que compõem a sentença 4 e
ambas são falsas simplesmente porque nenhum elemento do domínio
é rei da França.
A sentença 5 faz o que os lógicos convencionaram chamar de nega-
ção interna da sentença 4. Por outro lado, uma sentença que nega toda
a sentença 4 e que deveria ser verdadeira, já que 4 é falsa, seria:
6. Não é o caso que o atual rei da França é careca
que tais sentenças não deveriam ser consideradas falsas.2 Em vez disso,
o que ocorre é que ambas falham igualmente em atender uma pressu-
posição que faz parte de seus signiőcados: a pressuposição de que há,
no domínio, um e apenas um indivíduo que satisfaz ‘F ’. De acordo
com Strawson, quem profere qualquer uma destas duas sentenças não
está afirmando que existe um e apenas um ‘F ’, está pressupondo isso. A
única aőrmação (ou declaração) que a sentença ‘o F é G ’ faz é a de que
este pressuposto único ‘F ’ é um ‘G ’. Para que esta declaração seja um
evento comunicativo bem sucedido, a pressuposição de que existe um
e apenas um ‘F ’ tem de ser satisfeita. Quando ela não é satisfeita, ou
porque não há qualquer ‘F ’, ou porque há mais de um, o proferimento
de ‘o F é G ’ ou de ‘o F não é G ’ é uma comunicação mal sucedida e
por isso não deveria ser considerada nem como verdadeira, nem como
falsa.
Se concordarmos com Strawson, precisaremos revisar nossa lógica.
Pois, conforme veremos na próxima Parte do livro, assim como na LVF,
na LPO também existem apenas dois valores de verdade (o Verdadeiro
e o Falso), e toda sentença tem de ter um desses dois valores, não
havendo qualquer outra alternativa.
Mas é possível, também, discordarmos de Strawson. Ele está ape-
lando para algumas intuições linguísticas, mas não está claro que elas
sejam muito robustas. Onde őca, exatamente, a fronteira entre o que
uma sentença diz e o que ela pressupõe? Qual o fundamento e a justiő-
cativa para uma tal distinção?
Keith Donnellan levantou um segundo tipo de preocupação que,
de um modo bem geral, vem à tona quando consideramos um caso de
identidade equivocada.3 Imagine a seguinte cena. Dois homens estão
em uma esquina: um homem extremamente alto bebendo em uma lata
de cerveja; e um homem bem mais baixo bebendo em uma lata de
refrigerante. Ao vê-los, Manuela aőrma com espanto:
tos.4 Ir além nos levaria a águas őlosóőcas profundas, o que não é nada
mal, mas neste momento nos distrairia de nosso objetivo principal aqui
de aprender lógica formal. Então, por ora, enquanto estivermos ocu-
pados com a LPO, seguiremos a análise de Russell das descrições deő-
nidas. Ela certamente é uma análise defensável, além de ser o melhor
que podemos oferecer, sem a exigência de uma revisão signiőcativa da
lógica.
Exercícios
A. Utilize a seguinte chave de simbolização para simbolizar na LPO
cada uma das sete sentenças abaixo.
domínio: pessoas
S (x): x sabe a combinação do cofre.
E(x): x é uma espiã.
V (x): x é vegetariana.
C (x, y): x conőa em y.
h: Hortênsia
i : Isadora
V (x): x é um valete.
M (x): x é um homem com o machado.
C (x): x é caolho.
J (x): x é um curinga.
baralho, verá que estes valetes são desenhados de peről. Só um olho deles aparece
desenhado. Enquanto os outros dois valetes, de paus e de ouros, são desenhados de
frente, com os dois olhos.
6 O homem com o machado é o rei de ouros, porque no desenho do baralho, se você
reparar bem, verá que ele é o único rei que segura um machado. Os outros seguram
espadas.
CAPÍTULO 19. DESCRIÇÕES DEFINIDAS 192
Sentenças da
LPO
Agora que já aprendemos como simbolizar sentenças do português na
LPO, őnalmente chegou a hora de deőnir rigorosamente a noção de
uma sentença da LPO.
20.1 Expressões
Existem seis tipos de símbolos na LPO:
Predicados e Relações A, B, C, . . . , Z ,
ou com subíndices, quando necessário A1, B 1, Z 1, A 2, A25, J 375, . . .
Nomes a, b, c, . . . , r ,
ou com subíndices, quando necessário a1, b 224, h7, m 32, . . .
Variáveis s, t, u, v, w, x, y, z ,
ou com subíndices, quando necessário x 1, y 1, z 1, x 2, . . .
Conectivos ¬, ∧, ∨, →, ↔
Parênteses ( , )
Quantificadores ∀, ∃
Relação de Identidade =
193
CAPÍTULO 20. SENTENÇAS DA LPO 194
a, b, x, x 1, x 2, y, y 254, z
D F (a)
x =a G (x, a, y)
a =b G (a, a, a)
F (x) S (x 1, x 2, a, b, y, x 1 )
F (x)
G (a, y, z )
S (y, z, y, a, y, x)
(G (a, y, z ) → S (y, z, y, a, y, x))
∀z (G (a, y, z ) → S (y, z, y, a, y, x))
F (x) ∧ ∀z (G (a, y, z ) → S (y, z, y, a, y, x))
∃y(F (x) ∧ ∀z (G (a, y, z ) → S (y, z, y, a, y, x)))
∀x∃y(F (x) ∧ ∀z (G (a, y, z ) → S (y, z, y, a, y, x)))
20.3 Sentenças
É importante lembrarmos que o objetivo principal da lógica é avaliar se
os argumentos são válidos ou não. E os argumentos são compostos por
CAPÍTULO 20. SENTENÇAS DA LPO 197
Exercícios
A. Em cada uma das seis fórmulas abaixo, para todas as variáveis,
identiőque as ocorrências livres e ligadas.
1. ∃x L(x, y) ∧ ∀y L(y, x)
2. ∀x A(x) ∧ B(x)
3. ∀x A(x) ∧ ∃x B(x)
4. ∀x(A(x) ∧ B(x)) ∧ ∀y(C (x) ∧ D(y))
5. ∀x∃y[R(x, y) → ( J (z ) ∧ K (x))] ∨ R(y, x)
6. ∀x 1 (C (x 2 ) ↔ L(x 2, x 1 )) ∧ ∃x 2 L(x 3, x 2 )
B. Dentre as seis fórmulas do exercício acima, apenas uma é uma sen-
tença. Qual? E por quê?
CAPÍTULO 21
Ambiguidade
na LPO
No Capítulo 7 discutimos o fato de que sentenças em português po-
dem ser ambíguas e observamos que isso não ocorre com sentenças da
LVF. Uma aplicação importante disso é que a ambiguidade estrutural
das sentenças em português pode frequentemente, e de forma útil, ser
corrigida usando diferentes simbolizações. Uma outra fonte comum de
confusão é a ambiguidade de escopo, onde a frase em português não deixa
claro qual palavra lógica deve estar no escopo de qual, o que permite
múltiplas interpretações.
Na LPO, todo conectivo ou quantiőcador tem um escopo bem deter-
minado, então em qualquer sentença sempre está explícito se um deles
ocorre ou não no escopo de outro. Vamos ilustrar essa característica
a partir de alguns exemplos onde podemos contrastar a LPO com a
língua portuguesa.
Consideremos o estereótipo
∀x(E(x) → M (x))
199
CAPÍTULO 21. AMBIGUIDADE NA LPO 200
¬∀x(E(x) → M (x))
mas também poderíamos querer dizer
∀x(E(x) → ¬M (x))
Se compararmos as duas formalizações anteriores, veremos que a
diferença nos dois signiőcados da sentença ambígua depende da rela-
ção de escopo entre ‘¬’ e ‘∀’. Na primeira, ‘∀’ está no escopo de ‘¬’,
enquanto na segunda ocorre o contrário.
Claro, também podemos alternativamente simbolizar as duas leitu-
ras usando quantiőcadores existenciais, obtendo respectivamente:
∃x(E(x) ∧ ¬M (x))
¬∃x(E(x) ∧ M (x))
G (x): x é um gato;
B(x): x é brincalhão;
J (x): x é jovem.
Exercícios
A.
Cada uma das seguintes sentenças é ambígua. Forneça chaves de
simbolização e expresse formalmente as leituras possíveis.
Explique a situação.
PARTE V
Interpretações
204
CAPÍTULO 22
Extensionali-
dade
A lógica verofuncional (LVF) recebeu este nome porque todos os seus
conectivos são verofuncionais, ou seja, são funções de verdade. Dizer
que um conectivo da LVF, a conjunção (∧) por exemplo, é uma função
de verdade, é dizer algo análogo ao que os matemáticos dizem quando
aőrmam que a adição (+) é uma função numérica. A adição é uma
função numérica porque ela leva números em números através de uma
operação. Por exemplo, em ‘2 + 3’, a adição (+) toma dois números
como argumentos (o 2 e o 3) e através de uma operação os leva a
um número (o 5) que é o resultado da adição de 2 com 3. Suponha
agora que ‘A’ é verdadeira e ‘B’ é falsa. A conjunção ‘A ∧ B’ faz algo
análogo ao exemplo da adição. Ela toma dois valores de verdade como
argumentos, o ‘V’ (de ‘A’) e o ‘F’ (de ‘B’) e os leva a um valor de
verdade, o ‘F’, que é o resultado da conjunção ‘A ∧ B’.
Assim, tudo que conseguimos fazer com a lógica verofuncional
(LVF) é mapear sentenças em valores de verdade especíőcos. Nós po-
demos fazer isso diretamente, quando, por exemplo, estipulamos que a
sentença ‘P ’ é verdadeira. Mas nós também podemos (e é isso o que
em geral fazemos) mapear sentenças a valores de verdade de modo
indireto, através de chaves de simbolização, tais como:
205
CAPÍTULO 22. EXTENSIONALIDADE 206
O ponto que queremos enfatizar é que a LVF não consegue lidar com
diferenças de signiőcado que vão além de meras diferenças no valor da
verdade.
não estamos dizendo com isso que o predicado da LPO tem o mesmo
significado do predicado em português. Estamos simplesmente estipu-
lando algo como o seguinte:
Assim, em particular:
‘ é Daniel Durante’
‘ é um professor de lógica que torce para o Alecrim’
têm signiőcados muito diferentes!
O ponto aqui é que a LPO não nos fornece nenhum recurso para
lidar com nuances de signiőcado. O único modo no qual dois predi-
cados da LPO podem ser distintos um do outro é sendo verdadeiros
de coisas diferentes. As coisas das quais um predicado é verdadeiro
são conhecidas como a extensão desse predicado. Nós dizemos que a
LPO é uma linguagem extensional porque ela reduz os predicados
a suas extensões. Ou seja, não conseguimos, com a LPO, exprimir as
diferenças de signiőcado entre predicados que tenham a mesma exten-
são.
Apenas para őxar este ponto importante, vejamos mais um exem-
plo. Considere a seguinte chave de simbolização:
domínio: seres vivos
R(x): x é um animal racional
P (x): x é um primata com polegar opositor
Zila Mamede
o número π
todas as cordas Sol de violão já fabricadas
Estes objetos listados não têm nada em comum. Mas isso não importa.
A lógica não se importa com o que nos parece como “naturalž ou “se-
melhantež. Munidos com esta interpretação de ‘H (x)’, suponha que
agora adicionamos os seguintes nomes à nossa chave de simbolização:
m: Zila Mamede
d : Dilma Rousseff
p: o número π
Então, ‘H (m)’ e ‘H (p)’ serão ambas verdadeiras, nesta interpretação,
mas ‘H (d )’ será falsa, já que Dilma Rousseff não estava entre os objetos
estipulados para a extensão do predicado.
22.3 Relações
A noção de extensão de predicados de um lugar não é muito difícil de
entender, mas as coisas őcam um pouco mais confusas quando lidamos
com predicados de muitos lugares, ou seja, com relações. Considere a
seguinte chave de simbolização:
tuguês aumentado) e estão sendo utilizados. Por isso estão sem aspas. Por outro lado,
‘x’ e ‘y’ em ‘A(x, y)’ são símbolos da LPO e estão sendo mencionados. Por isso estão entre
aspas simples. Conőra o Capítulo 8, p. 73.
CAPÍTULO 22. EXTENSIONALIDADE 209
⟨Lenin, Marx⟩
⟨Maria Bonita, Lampião⟩
⟨Lampião, Maria Bonita⟩
l: Lenin
m: Marx
b: Maria Bonita
p: Lampião
Com estes nomes,
B(l, m)
será verdadeira, pois o par
⟨Lenin, Marx⟩
faz parte da nossa lista explícita da extensão de ‘B(x, y)’. Por outro
lado,
B(m, l )
será falsa, pois
⟨Marx, Lenin⟩
CAPÍTULO 22. EXTENSIONALIDADE 210
B(b, p) e B(p, b)
A(a) ↔ A(b)
B(a) ↔ B(b)
R(a, a) ↔ R(b, b)
R(a, a) ↔ R(a, b)
R(c, a) ↔ R(c, b)
∀x R(x, a) ↔ ∀x R(x, b)
distinguir certos objetos que nos aparecem indistinguíveis mas que são,
na realidade, distintos. O seguinte exemplo é um tanto artiőcial, mas
nos ajuda a entender como nossa linguagem pode ser inadequada para
perceber certas distinções. Considere a seguinte interpretação (chave
de simbolização):
domínio: Bertrand Russell, Bruno Vaz
a: Bertrand Russell
b: Bruno Vaz
· Qualquer predicado que considerarmos não será verdadeiro
para nenhum elemento do domínio.
22.5 Interpretações
Na LVF deőnimos uma valoração como qualquer atribuição de ver-
dade e falsidade às letras sentenciais. Na LPO, vamos deőnir uma
interpretação como consistindo dos seguintes elementos:
· a especiőcação de um domínio;
· a deőnição de um valor de verdade para cada letra sentencial que
considerarmos;
· a atribuição de exatamente um objeto no domínio para cada
nome que considerarmos;
· para cada predicado de um lugar que considerarmos, uma espe-
ciőcação das coisas do domínio para as quais o predicado deve
ser verdadeiro (sua extensão);
· para cada predicado de n lugares que considerarmos, uma es-
peciőcação das sequências ordenadas de n coisas do domínio
CAPÍTULO 22. EXTENSIONALIDADE 213
4 3
1 2
4 3
A verdade na
LPO
Não custa nada relembrar aqui que o objetivo principal do estudo da
lógica é avaliar argumentos, separando os válidos dos inválidos. E
também não custa nada relembrar que um argumento é válido quando
suas premissas justiőcam sua conclusão, ou seja, quando não é possível
haver uma situação em que suas premissas sejam todas verdadeiras,
mas sua conclusão seja falsa. Então, antes de sermos capazes de avaliar
argumentos na LPO, precisamos ser capazes de ligar as sentenças da
LPO a situações em que poderemos avaliar se elas são verdadeiras ou
falsas.
Na LVF, esta ponte que nos possibilita interpretar sentenças simbo-
lizadas em situações nas quais elas serão verdadeiras ou falsas é dada
pelas chaves de simbolização, juntamente com as valorações. Através
de uma chave de simbolização, a verdade ou falsidade das sentenças
em português nas diversas situações transforma-se na verdade ou falsi-
dade das sentenças simbolizadas na LVF nas diversas valorações. Uma
chave de simbolização liga situações distintas a valorações distintas que
correspondem às diversas linhas das tabelas de verdade, nas quais as
sentenças da LVF são verdadeiras ou falsas. E a consideração dos valo-
res de verdade das sentenças em todas as valorações possíveis, feita nas
tabelas de verdade, nos possibilita avaliar a validade dos argumentos.1
No caso da LPO, esta ponte entre as sentenças simbolizadas e as
1 Se quiser relembrar os detalhes deste processo na LVF, releia a Seção 12.4, p. 103.
215
CAPÍTULO 23. A VERDADE NA LPO 216
· um domínio do discurso;
· uma atribuição (direta ou indireta) de valores de verdade para
cada letra sentencial;
· a deőnição de uma referência, no domínio, para cada nome;
· a deőnição (direta ou indireta) de uma extensão para cada pre-
dicado e relação.
▷ sentenças atômicas:
· C (b)
· A(r, j )
· Q
▷ sentenças cujo operador principal é um conectivo sentencial:
· C (b) ∧ Q
· A(r, j ) → ∀x C (x)
· ¬Q
▷ sentenças cujo operador principal é um quantiőcador:
· ∃x C (x)
· ∀x(A(x, j ) → C (x))
· ∃x∃y(A(x, y) ∧ A(y, x))
‘C ′ é verdadeira
porque Simona Talma é mesmo uma artista potiguar. A interpretação
nos dá aqui uma especiőcação indireta através da sentença em portu-
guês ‘Simona Talma é uma artista potiguar’. A letra sentencial terá o
mesmo valor de verdade desta sentença.
Por outro lado,
‘D ′ é falsa
‘F (a)’ é verdadeira
‘F (b)’ é falsa
porque ‘b’ nomeia Simona Talma, que não é uma őlósofa.
Por őm, se a sentença atômica for uma relação seguida de uma
sequência ordenada de nomes, tal como ‘R(a, b)’, ela será verdadeira
apenas se o par ordenado dos indivíduos nomeados por ‘a’ e ‘b’,
⟨Aristóteles, Simona Talma⟩, estiver na extensão do predicado ‘R(x, y)’.
Em nossa interpretação esta extensão é deőnida indiretamente através
da relação
· ‘a = b ∨ F (a)’ é verdadeira
porque ainda que ‘a = b’ seja falsa, ‘F (a)’ é verdadeira
· ‘¬a = b’ é verdadeira
porque ‘a = b’ é falsa
∀x∃y L(x, y)
Não conseguimos aplicar esta ideia aqui, porque o que segue o quantiő-
cador não é um predicado, mas a expressão quantiőcada ‘∃y L(x, y)’. E
as interpretações não têm cláusulas que indicam se ‘∃y L(x, y)’ é verda-
deira de tudo no domínio. As cláusulas das intepretações especiőcam
apenas a referência de nomes e a extensão de predicados e relações.
Para tentar corrigir isso poderíamos então sugerir que ‘∀x∃y L(x, y)’
deve ser verdadeira em uma interpretação se e somente se ∃y L(a, y)
for verdadeira para todo nome a da interpretação. E, de modo si-
milar, diríamos que ∃y L(a, y) é verdadeira se e somente se L(a, b)
for verdadeira para algum nome b. Então, juntando estes dois passos,
‘∀x∃y L(x, y)’ seria verdadeira em uma interpretação se e somente se
L(a, b) for verdadeira para todo nome a e algum nome b presentes na
interpretação.
Infelizmente, isso também não funciona. Para entender por que,
basta observar que na interpretação de nossos exemplos (p. 217), ape-
nas duas pessoas têm nome, mas o domínio comporta todas as pessoas
nascidas antes do ano 2020.
Uma terceira ideia, então, é a seguinte. Mesmo que uma interpreta-
ção não tenha nomes para todos os indivíduos do domínio, ela poderia
ter. Ou seja, podemos estender uma interpretação qualquer, de modo
a que todos os elementos do domínio tenham nomes. Antes de pros-
seguir com a deőnição, vejamos alguns exemplos de como isso pode
funcionar.
CAPÍTULO 23. A VERDADE NA LPO 222
Em nossa interpretação privilegiada (p. 217) ‘∃x R(b, x)’ deve ser
verdadeira. Aőnal, certamente há no domínio alguém que nasceu de-
pois que Simona Talma. Dani Cruz (uma outra artista potiguar) é uma
dessas pessoas. De fato, se estendermos temporariamente nossa inter-
pretação adicionando o nome ‘c ’ para se referir a Dani Cruz, então
‘R(b, c )’ será verdadeira nessa interpretação estendida. E este fato cer-
tamente deve ser suőciente para assegurar que ‘∃x R(b, x)’ é verdadeira
na nossa interpretação original, já que ele indica que há pelo menos
uma pessoa no domínio (Dani Cruz) que nasceu depois de Simona
Talma.
Na nossa interpretação, ‘∃x(F (x) ∧ R(x, a))’ também deve ser ver-
dadeira. Aőnal, no domínio, certamente há alguém que foi őlósofo e
nasceu antes de Aristóteles. Sócrates é uma dessas pessoas. De fato, se
estendermos nossa interpretação, com um novo nome, ‘d ’, que denota
Sócrates, então ‘F (d ) ∧ R(d, a)’ será verdadeira nessa interpretação es-
tendida. Novamente, isso certamente é suőciente como garantia de que
‘∃x(F (x) ∧ R(x, a))’ é verdadeira na interpretação original (não esten-
dida), já que isso indica que há pelo menos uma pessoa no domínio
(Sócrates) que é őlósofo e nasceu antes de Aristóteles.
Já a sentença ‘∀x∃y R(x, y)’ deve ser falsa em nossa interpretação.
Aőnal, certamente há uma última pessoa que nasceu antes do ano 2020
começar. Não sabemos quem é esta pessoa, mas podemos, mesmo as-
sim, estender a interpretação para que um nome novo, ‘e ’, denote exa-
tamente esta pessoa. E fazendo isso, qualquer que seja o indivíduo do
domínio ao qual um outro nome novo ‘f ′ se reőra, a sentença ‘R(e, f )’
seria falsa. De fato, não importa quem seja a referência do nome ‘f ’, sa-
bemos que ‘R(e, f )’ será falsa, já que ‘e ’ denota a última pessoa nascida
em 2019. Esse fato é certamente suőciente para garantir que ‘∃y R(e, y)’
é falsa na interpretação estendida. E isso, por sua vez, é certamente
suőciente como garantia de que ‘∀x∃y R(x, y)’ é falsa na nossa interpre-
tação original.
Se você entendeu esses três exemplos, ótimo. É isso que importa.
O que temos que fazer, agora, é fornecer uma deőnição precisa dessas
ideias, que exprima as condições de verdade para sentenças quantiőca-
das. Para isso precisamos de mais notação em nossa metalinguagem.
A expressão:
A(x)
será usada para denotar na metalinguagem uma fórmula que contenha
pelo menos uma ocorrência livre da variável x. Ou seja, há uma ou
mais ocorrências de x em A que estão fora do escopo de qualquer ‘∀x’
CAPÍTULO 23. A VERDADE NA LPO 223
A(c)
∀y∃x(R(y, x) ↔ F (x))
∀yA(y)
A(y)
refere-se genericamente a
∃x(R(y, x) ↔ F (x))
que é uma fórmula com uma ocorrência livre da variável ‘y’. Se substi-
tuímos esta ocorrência livre de ‘y’ por um nome, digamos, ‘e ’, obtemos
a sentença:
∃x(R(e, x) ↔ F (x))
Esta sentença nada mais é do que uma instância de substituição de
∀y∃x(R(y, x) ↔ F (x))
I[d /c]
Para őcar claro: tudo o que estamos fazendo aqui é formalizar (de
um modo bastante preciso) a ideia intuitiva de que para que uma sen-
tença quantiődada universalmente seja verdadeira, todos os objetos do
domínio precisam satisfazê-la; e para que uma sentença quantiőcada
existencialmente seja verdadeira, basta que um objeto do domínio a
satisfaça.
Finalmente, vale notar que o conceito de um objeto satisfazer uma
fórmula com uma variável livre também pode ser estendido a fórmulas
com mais de uma variável livre. Por exemplo, se tivermos uma fórmula
A(x, y) com duas variáveis livres x e y, podemos dizer que um par de
objetos ⟨a, b⟩ satisfaz A(x, y) se e somente se A(c, d) for verdadeira
na interpretação estendida por dois nomes c e d, onde c é o nome de
a e d é o nome de b. Assim, por exemplo, ⟨Sócrates, Platão⟩ satisfaz
R(x, y), pois, já que Sócrates nasceu antes de Platão, R(c, d ) é verdadeiro
na interpretação:
Para fórmulas atômicas, tais como F (x) e R(x, y), os objetos ou sequên-
cias de objetos que as satisfazem são exatamente a extensão dos predi-
cados que as constituem. Mas a noção de satisfação também se aplica
a fórmulas não atômicas. A fórmula F (x) ∧ R(x, b), por exemplo, é sa-
tisfeita por todos os őlósofos que nasceram antes de Simona Talma. A
ideia de satisfação aplica-se até mesmo a fórmulas envolvendo quantiő-
CAPÍTULO 23. A VERDADE NA LPO 226
Exercícios
A. Considere a seguinte interpretação:
· O domínio compreende apenas Benedita e Clayton
· ‘A(x)’ é verdadeira para ambos, tanto Benedita quanto Clayton
· ‘B(x)’ é verdadeira apenas para Benedita
· ‘N (x)’ não é verdadeira nem para Benedita nem para Clayton
· ‘c ’ refere-se a Clayton
Para cada uma das nove sentenças seguintes, determine se ela é verda-
deira ou falsa nesta interpretação.
1. B(c )
2. A(c ) ↔ ¬N (c )
3. N (c ) → (A(c ) ∨ B(c ))
4. ∀x A(x)
5. ∀x¬B(x)
6. ∃x(A(x) ∧ B(x))
7. ∃x(A(x) → N (x))
8. ∀x(N (x) ∨ ¬N (x))
9. ∃x B(x) → ∀x A(x)
1. H (c )
2. H (e )
3. M (c ) ∨ M (e )
4. G (c ) ∨ ¬G (c )
CAPÍTULO 23. A VERDADE NA LPO 227
5. M (c ) → G (c )
6. ∃x H (x)
7. ∀x H (x)
8. ∃x ¬M (x)
9. ∃x(H (x) ∧ G (x))
10. ∃x(M (x) ∧ G (x))
11. ∀x(H (x) ∨ M (x))
12. ∃x H (x) ∧ ∃x M (x)
13. ∀x(H (x) ↔ ¬M (x))
14. ∃x G (x) ∧ ∃x¬G (x)
15. ∀x∃y(G (x) ∧ H (y))
1 2
3 4 5
Para cada uma das doze sentenças seguintes, determine se ela é verda-
deira ou falsa nesta interpretação.
1. ∃x R(x, x)
2. ∀x R(x, x)
3. ∃x∀y R(x, y)
4. ∃x∀y R(y, x)
5. ∀x∀y∀z ((R(x, y) ∧ R(y, z )) → R(x, z ))
6. ∀x∀y∀z ((R(x, y) ∧ R(x, z )) → R(y, z ))
7. ∃x∀y ¬R(x, y)
8. ∀x(∃y R(x, y) → ∃y R(y, x))
9. ∃x∃y(¬x = y ∧ R(x, y) ∧ R(y, x))
10. ∃x∀y(R(x, y) ↔ x = y)
11. ∃x∀y(R(y, x) ↔ x = y)
12. ∃x∃y(¬x = y ∧ R(x, y) ∧ ∀z (R(z, x) ↔ y = z ))
CAPÍTULO 24
Conceitos
semânticos
Oferecer uma deőnição precisa de sentença verdadeira na LPO foi um
pouco complicado, mas agora que terminamos, podemos deőnir várias
noções lógicas importantes. Elas serão muito parecidas com as deőni-
ções que oferecemos para a LVF. No entanto, lembre-se de que agora
elas se referem a interpretações, e não mais a valorações.
Continuaremos a usar o símbolo ‘⊨’ na LPO da mesma forma que
o utilizamos na LVF. Assim:
A1, A2, . . . , An ⊨ C
signiőca que não há interpretação na qual A1 , A2 , . . . , An sejam todas
verdadeiras e C seja falsa. Consequentemente,
⊨A
signiőca que A é verdadeira em todas as interpretações, ou seja, que é
impossível que A seja falsa.
As outras noções lógicas que vimos, também têm deőnições corres-
pondentes na LPO. Aqui estão elas:
228
CAPÍTULO 24. CONCEITOS SEMÂNTICOS 229
⊨ ¬A
A1, A2, . . . An ⊨ C
A1, A2, . . . An ⊭ C
A⊨ B e B⊨ A
Utilizando as
interpretações
25.1 Validades e contradições
Suponha que queremos mostrar que
∃x A(x, x) → B(d )
230
CAPÍTULO 25. UTILIZANDO AS INTERPRETAÇÕES 231
Lembre-se de que queremos que ‘∃x A(x, x)’ seja verdadeira; portanto,
queremos que algum indivíduo do domínio relacione-se consigo mesmo
através de ‘A’. Podemos então propor a seguinte extensão para a rela-
ção ‘A’:
A(x, y): x está no mesmo país que y
domínio: Fortaleza
d : Fortaleza
A(x, y): x está no mesmo país que y
B(x): x é a capital do Ceará
∀x S (x) e ∃x S (x)
CAPÍTULO 25. UTILIZANDO AS INTERPRETAÇÕES 232
comprova que ‘∃x S (x)’ e ‘∀x S (x)’ não são logicamente equivalentes,
já que a primeira sentença é verdadeira e a segunda é falsa nessa inter-
pretação.
1 2
∀x∃y R(y, x)
∃x∀y R(x, y)
.Û. ∀x∃y R(x, y)2
e
∃x∀y R(x, y)
∃x∀y¬R(x, y)
.Û. ¬∃x∃y∃z (¬y = z ∧ (R(x, y) ∧ R(z, x)))
do domínio que satisfaz a fórmula existencialmente quantiőcada. Ou seja, cada uma des-
tas sentenças é do tipo ∃x A(x) e cada testemunha indicada corresponde a um indivíduo
c do domínio para o qual A( c) é verdadeira na interpretação.
2 Esta sentença não está entre os exemplos acima, porque ela é falsa em nossa
interpretação. Para perceber isso basta notar que o indivíduo 3 é uma contratestemunha, ou
seja, é um elemento do domínio que não satisfaz a fórmula quantiőcada universalmente.
CAPÍTULO 25. UTILIZANDO AS INTERPRETAÇÕES 236
Exercícios
A. Mostre que cada uma das seguintes sete sentenças não é nem uma
validade (necessidade lógica) nem uma contradição.
1. D(a) ∧ D(b)
2. ∃x T (x, h)
3. P (m) ∧ ¬∀x P (x)
4. ∀z J (z ) ↔ ∃y J (y)
5. ∀x(W (x, m, n) ∨ ∃yL(x, y))
6. ∃x(G (x) → ∀y M (y))
7. ∃x(x = h ∧ x = i )
1. J (a), K (a)
2. ∃x J (x), J (m)
3. ∀x R(x, x), ∃x R(x, x)
4. ∃x P (x) → Q (c ), ∃x(P (x) → Q (c ))
5. ∀x(P (x) → ¬Q (x)), ∃x(P (x) ∧ ¬Q (x))
6. ∃x(P (x) ∧ Q (x)), ∃x(P (x) → Q (x))
7. ∀x(P (x) → Q (x)), ∀x(P (x) ∧ Q (x))
8. ∀x∃y R(x, y), ∃x∀y R(x, y)
9. ∀x∃y R(x, y), ∀x∃y R(y, x)
Raciocinando
sobre uma
infinidade de
interpretações
26.1 Validades e contradições
Para mostrar que uma sentença não é uma validade basta apresen-
tarmos uma única interpretação na qual a sentença é falsa. Mas para
mostrar que uma sentença é uma validade, não é suőciente propor dez,
cem, nem mesmo mil interpretações nas quais a sentença é verdadeira.
Uma sentença é uma validade apenas se for verdadeira em todas as in-
terpretações; e há inőnitas delas. Precisamos ser capazes de raciocinar
sobre todas elas, e não conseguiremos fazer isso lidando com elas uma
de cada vez!
Raciocinar sobre todas as inőnitas interpetações pode soar uma
tarefa impossível. Mas não é. Algumas vezes nem é tão complicado.
Veja como podemos mostar que a sentença ‘R(a, a) ∨ ¬R(a, a)’ é uma
validade:
238
CAPÍTULO 26. INFINITAS INTERPRETAÇÕES 239
· que uma sentença é uma contradição; pois isso requer que ela
seja falsa em todas as interpretações.
· que duas sentenças são logicamente equivalentes; pois isso requer
que elas tenham o mesmo valor de verdade em todas as interpre-
tações.
· que algumas sentenças são incompatíveis; pois isso requer que
não haja interpretação na qual todas essas sentenças sejam ver-
dadeiras; ou seja, que, em toda interpretação, pelo menos uma
dessas sentenças seja falsa.
1 Usamos aqui o fato de que as condições de verdade para os conectivos também se
Pode ser útil comparar esta tabela com a que apresentamos para
a LVF no őnal do Capítulo 14, p. 128. A principal diferença está no
fato de que a LVF diz respeito a tabelas de verdade, enquanto a LPO
lida com interpretações. Essa diferença, no entanto, é profundamente
importante, uma vez que as tabelas de verdade têm sempre uma quan-
tidade őnita de linhas, de modo que uma tabela de verdade completa
é um objeto relativamente tratável. Por outro lado, sempre existem
inőnitas interpretações diferentes para cada sentença, de modo que o
raciocínio sobre todas as interpretações pode ser um assunto profun-
damente complicado.
PARTE VI
Dedução
Natural para
a LVF
243
CAPÍTULO 27
A ideia de
dedução
natural
No Capítulo 2, dissemos que um argumento é válido se e somente se
não existe nenhuma situação na qual todas as premissas são verda-
deiras e a conclusão é falsa. Posteriormente, apresentamos as tabelas
de verdade para as sentenças da LVF, onde cada linha de uma tabela
completa corresponde a uma valoração. E vimos que uma tabela de
verdade conjunta para todas as sentenças de um argumento fornece
um modo direto de veriőcar se ele é válido ou não: basta examinar
se existe alguma linha na qual as premissas são todas verdadeiras e a
conclusão é falsa.
Entretanto, tabelas de verdade não nos dão necessariamente muito
insight. Considere os dois seguintes argumentos na LVF:
P ∨ Q, ¬P .Û. Q
P → Q, P .Û. Q
244
CAPÍTULO 27. A IDEIA DE DEDUÇÃO NATURAL 245
A1 → C 1 .Û. (A 1 ∧ A2 ∧ A3 ∧ A 4 ∧ A 5 ) → (C 1 ∨ C 2 ∨ C 3 ∨ C 4 ∨ C 5 )
Para veriőcar a validade deste argumento, você pode usar uma tabela
de verdade com 1024 linhas. Se você őzer isto corretamente, então
você verá que não existe nenhuma linha na qual todas as premissas
são verdadeiras e a conclusão seja falsa. Assim, você saberá que o
argumento é válido (como já mencionamos antes, existe um sentido
no qual você não saberá por que o argumento é válido). Mas agora
considere:
As regras
básicas da
LVF
Neste capítulo, apresentaremos um sistema em dedução natural para
a LVF. Para cada conectivo, teremos regras de introdução, que nos
permitem provar uma sentença que tenha esse conectivo como ope-
rador lógico principal, e regras de eliminação, que nos permitem
provar algo a partir de uma sentença que tenha esse conectivo como
operador lógico principal.
247
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 248
¬(A ∨ B) .Û. ¬A ∧ ¬B
Os primeiros elementos de qualquer prova sempre são as premissas do
argumento. Neste caso escrevemos:
1 ¬(A ∨ B)
n ¬A ∧ ¬B
1 A∨B
2 ¬(A ∧ C )
3 ¬(B ∧ ¬D)
n ¬C ∨ D
O que temos que fazer agora é entender cada uma das regras que po-
deremos utilizar neste caminho entre as premissas e a conclusão. Estas
regras estão divididas de acordo com os conectivos lógicos.
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 249
28.2 Reiteração
A primeira regra é tão incrivelmente óbvia que é surpreendente que
nos importemos com ela. Ela diz que uma sentença que já foi escrita
em alguma linha anterior pode ser copiada (reiterada) em uma linha
posterior. Por exemplo:
Se você já mostrou alguma coisa ao longo de uma prova, a regra de
reiteração permite você repeti-la em uma nova linha. Por exemplo:
4 A∧B
.. ..
. .
10 A∧B R4
m A
A Rm
28.3 Conjunção
Vamos supor que queremos mostrar que Louis é reservado e leal. Um
modo óbvio para fazer isto seria como segue: primeiro mostramos que
Louis é reservado, em seguida mostramos que Louis é leal. Depois
colocamos essas duas demonstrações juntas para obter a conjunção.
Nosso sistema de dedução natural captura essa ideia diretamente.
No exemplo dado, podemos adotar a seguinte chave de simbolização:
R: Louis é reservado
L: Louis é leal
Se, por exemplo, estamos fazendo uma prova onde obtivemos ‘R’ na
linha 8 e ‘L’ na linha 15, podemos em qualquer linha subsequente es-
crever ‘R ∧ L’ da seguinte maneira:
8 R
15 L
R ∧L ∧I 8, 15
Note que cada linha de nossa prova ou deve ser uma suposição, ou
deve ser justiőcada por alguma regra. Citamos aqui ‘∧I 8, 15’ para indi-
car que esta linha foi obtida pela regra da introdução da conjunção (∧I)
aplicada às linhas 8 e 15. Poderíamos igualmente obter a conjunção
com a ordem invertida:
8 R
15 L
L ∧R ∧I 15, 8
m A
n B
A∧ B ∧I m, n
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 251
m A∧ B
A ∧E m
e igualmente,
m A∧ B
B ∧E m
Esta é uma prova muito simples, entretanto ela mostra como po-
demos encadear regras de prova em provas mais longas. A propósito,
note que ao investigar esse argumento com uma tabela de verdade seria
necessário 256 linhas, enquanto que nossa prova formal requer apenas
quatro linhas.
Vale a pena ver um outro exemplo. Na Seção 11.3, vimos que o
seguinte argumento é válido:
A ∧ (B ∧ C ) .Û. (A ∧ B) ∧ C
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 253
1 A ∧ (B ∧ C )
1 A ∧ (B ∧ C )
2 A ∧E 1
3 B ∧C ∧E 1
4 B ∧E 3
5 C ∧E 3
1 A ∧ (B ∧ C )
2 A ∧E 1
3 B ∧C ∧E 1
4 B ∧E 3
5 C ∧E 3
6 A∧B ∧I 2, 4
7 (A ∧ B) ∧ C ∧I 6, 5
1 A
2 A∧A ∧I 1, 1
28.4 Condicional
Considere o seguinte argumento:
Se Jane é inteligente, então ela é rápida.
Jane é inteligente.
.Û. Ela é rápida.
m A→ B
n A
B →E m, n
1 R
1 R
2 L
Note que não estamos reivindicando, na linha 2, ter provado ‘L’ a partir
da linha 1, assim não escrevemos nela qualquer justiőcativa para a su-
posição inicial na linha 2. No entanto, precisamos destacar que é uma
suposição adicional. Fazemos isto traçando uma linha sob ela (para
indicar que ela é uma suposição), recuando-a com uma linha vertical
adicional (para indicar que ela é adicional).
Com essa suposição extra posta, estamos prontos para usar a regra
∧I. Assim, podemos continuar nossa prova:
1 R
2 L
3 R ∧L ∧I 1, 2
1 R
2 L
3 R ∧L ∧I 1, 2
4 L → (R ∧ L) →I 2–3
i A
j B
A→ B →I i – j
P → Q, Q → R .Û. P → R
1 P →Q
2 Q →R
3 P
1 P →Q
2 Q →R
3 P
4 Q →E 1, 3
5 R →E 2, 4
6 P →R →I 3–5
1 A
2 B
3 B R2
4 B →B →I 2–3
1 A
2 B
3 B R2
4 B →B →I 2–3
5 B tentativa imprópria
de invocar →E 4, 3
1 A
2 B
3 C
4 A∧B ∧I 1, 2
5 C → (A ∧ B) →I 3–4
6 B → (C → (A ∧ B)) →I 2–5
1 A
2 B
3 C
4 A∧B ∧I 1, 2
5 C → (A ∧ B) →I 3–4
6 B → (C → (A ∧ B)) →I 2–5
7 C → (A ∧ B) tentativa imprópria
de invocar →I 3–4
Isso seria terrível. Se tivéssemos dito que Ana é inteligente, você não
seria capaz de deduzir que, se Carla é inteligente (simbolizada por ‘C ’)
então ambas Ana é inteligente e a rainha Bela estava feliz. Mas isso é
exatamente o que essa prova sugeriria, se fosse permissível.
O problema essencial é que a subprova que começou com a supo-
sição ‘C ’ dependia crucialmente do fato de termos assumido ‘B’ como
uma suposição na linha 2. Mas na linha 6, descartamos a suposição ‘B’.
Fazer isso é o mesmo que parar de perguntar sobre o que podemos con-
cluir se também assumirmos ‘B’ como suposição adicional. Por isso,
tentar justiőcar a linha 7 com a subprova das linhas 3 − 4 é uma espécie
de trapaça, porque a suposição adicional ‘B’ que estava em vigor nas
linhas 3 e 4, não está mais em vigor na linha 7, já que foi descartada na
linha 6. Assim estipulamos, como antes, que uma subprova só pode ser
citada em uma linha se ela não ocorrer dentro de outra subprova que
já esteja fechada nessa linha. A tentativa desastrosa da prova viola esta
estipulação. A subprova de linhas 3–4 ocorre dentro de uma subprova
que termina na linha 5. Portanto, não pode ser invocada na linha 7.
Abaixo mais um exemplo de aplicação imprópria de regra:
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 261
1 A
2 B
3 C
4 B ∧C ∧I 2, 3
5 C ∧E 4
6 B →C tentativa imprópria
de invocar →I 2–5
28.6 Bicondicional
As regras para o bicondicional serão como versões de via de mão dupla
das regras para o condicional. Para provar ‘F ↔ G ’, por exemplo, você
deve ser capaz de provar ‘G ’ a partir da suposição ‘F ’ e provar ‘F ’ a
partir da suposição ‘G ’. A regra de introdução do bicondicional (↔I)
requer, portanto, duas subprovas. Veja:
i A
j B
k B
l A
A↔ B ↔I i – j , k –l
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 262
m A↔ B
n A
B ↔E m, n
e igualmente:
m A↔ B
n B
A ↔E m, n
28.7 Disjunção
Vamos supor que Louis seja reservado. Então Louis é reservado ou
leal. Aőnal, dizer que Louis é reservado ou leal é dizer algo mais fraco
do que dizer que Louis é reservado.
Vamos enfatizar esse ponto. Suponha que Louis seja reservado.
Disso se segue que Louis é ou reservado ou vegetariano. Igualmente,
disso se segue que ou Louis é reservado ou estudante. Também Igual-
mente se segue que ou Louis é reservado ou a lua é redonda. Muitas
dessas são inferências estranhas, mas não há nada logicamente errado
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 263
com elas, mesmo que eles violem todos os tipos de normas implícitas
de conversação.
Munido com tudo isso, apresentamos as regras de introdução da
disjunção:
m A
A∨ B ∨I m
m A
B∨ A ∨I m
1 M
2 M ∨ ([(A ↔ B) → (C ∧ D)] ↔ [E ∧ F ]) ∨I 1
m A∨ B
i A
j C
k B
l C
C ∨E m, i – j , k –l
1 (P ∧ Q ) ∨ (P ∧ R)
2 P ∧Q
3 P ∧E 2
4 P ∧R
5 P ∧E 4
6 P ∨E 1, 2–3, 4–5
A ∧ (B ∨ C ) .Û. (A ∧ B) ∨ (A ∧ C )
1 A ∧ (B ∨ C )
2 A ∧E 1
3 B ∨C ∧E 1
4 B
5 A∧B ∧I 2, 4
6 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C ) ∨I 5
7 C
8 A ∧C ∧I 2, 7
9 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C ) ∨I 8
10 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C ) ∨E 3, 4–6, 7–9
Não se assuste se você acha que não seria capaz de fazer essa prova.
A habilidade de fazer novas provas vem com a prática, e abordaremos
algumas estratégias para construir provas no Capítulo 29. A questão
principal nesta fase é se, olhando a prova, você pode reconhecer que
ela está em conformidade com as regras que estabelecemos. Fazer isso
envolve apenas ser capaz de percorrer todas as linhas de uma prova e
veriőcar se elas estão corretamente justiőcadas de acordo com as regras
apresentadas.
m ¬A
n A
⊥ ¬E m, n
i A
j ⊥
¬A ¬I i – j
Pode haver tantas linhas quantas você desejar entre i e j . Para ver
essa regra na prática e como ela interage com a negação, considere
esta prova:
1 D
2 ¬D
3 ⊥ ¬E 2, 1
4 ¬¬D ¬I 2–3
i ¬A
j ⊥
A PI i – j
tivo, pois não possui premissas autônomas que contenham ‘¬’, apenas
uma subprova com uma suposição da forma ¬A. Por outro lado, ¬E
tem uma premissa da forma ¬A: é por isso que ¬E elimina ‘¬’, mas a
regra PI não.1
Usando ¬I, fomos capazes de dar uma prova de ¬¬ D a partir de D.
Usando PI, podemos ir na outra direção (com essencialmente a mesma
prova).
1 ¬¬D
2 ¬D
3 ⊥ ¬E 1, 2
4 D PI 2–3
m ⊥
A ⊥E m
1 Existem lógicos que não aceitam a regra PI, mas aceitam ¬E. Eles são chamados de
intuicionistas. Os intuicionistas não aceitam nossa suposição básica de que cada sentença
tem um dos dois valores de verdade, verdadeiro ou falso. Eles também acham que ‘¬’
funciona diferentemente. Para eles, uma prova do ‘⊥’ a partir de A garante ¬ A, mas
uma prova do ‘⊥’ a partir de ¬ A não garante que A, mas apenas ¬¬ A. Portanto, para
eles, A e ¬¬ A não são equivalentes.
2 O nome latino para esse princípio é ex contradictione quod libet, “da contradição,
qualquer coisaž.
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 269
Exercícios
A. As duas “provasž a seguir estão incorretas. Explique quais são os
seus erros.
3 Existem lógicos que rejeitam a regra de explosão. Eles não aceitam que de uma
contradição tudo se segue. Esses lógicos e seus sistemas são, de modo abrangente,
chamados de paraconsistentes. Um dos pioneiros nos estudos da paraconsistência é o
brasileiro Newton da Costa, com seus trabalhos do início dos anos de 1960. Não há
consenso entre eles sobre quais são as principais motivações para a rejeição da regra de
explosão. Um grupo radical acredita que a realidade contém contradições, e que portanto
não temos motivos para rejeitá-las, nem para assumir que tudo se segue delas. Esses
paraconsistentes radicais são conhecidos como dialeteístas e o őlósofo Graham Priest é
um de seus principais representantes. Um outro grupo rejeita a regra de explosão com
base na ideia de que se B se segue de A, então deve haver uma conexão relevante entre
A e B. Mas não há conexão relevante entre ‘⊥’ e um sentença arbitrária B. Por isso
eles rejeitam a regra de explosão. As lógicas propostas por esse grupo são chamadas
de lógicas relevantes e dois de seus proponentes mais representativos são os lógicos Nuel
Belnap e Alan Anderson.
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 270
1 (¬L ∧ A) ∨ L
2 ¬L ∧ A
3 ¬L ∧E 3
4 A ∧E 1
5 L
6 ⊥ ¬E 3, 5
7 A ⊥E 6
8 A ∨E 1, 2–4, 5–7
1 A ∧ (B ∧ C )
2 (B ∨ C ) → D
3 B ∧E 1
4 B ∨C ∨I 3
5 D →E 4, 2
1 P ∧S 1 A→D
2 S →R 2 A∧B
3 P 3 A
4 S 4 D
5 R 5 D ∨E
6 R ∨E 6 (A ∧ B) → (D ∨ E)
CAPÍTULO 28. AS REGRAS BÁSICAS DA LVF 271
1 ¬L → ( J ∨ L)
2 ¬L
3 J ∨L
4 J
5 J ∧ J
6 J
7 L
8 ⊥
9 J
10 J
Construindo
provas
Não existe uma receita simples para encontrar provas e não há substi-
tuto para a prática. Aqui, entretanto, apresentaremos algumas regras
práticas e estratégias a serem lembradas.
272
CAPÍTULO 29. CONSTRUINDO PROVAS 273
usar a suposição A.
Se seu objetivo for provar uma conjunção, um condicional ou uma
sentença negada, você deve começar trabalhando dessa maneira, do
őm para o começo. Descreveremos o que você deve fazer em cada um
desses casos em detalhes.
1 P1
..
.
k Pk
..
.
n A
..
.
m B
m+1 A∧ B ∧I n, m
n A
..
.
m B
m+1 A→ B →I n–m
n A
..
.
m ⊥
m+1 ¬A ¬I n–m
Para aplicar a regra ¬I, temos que iniciar uma subprova com a supo-
sição A; a última linha da subprova tem que ser ⊥. Vamos citar a
subprova e usar ¬I como regra.
Aconselhamos a trabalhar do őm para o começo, o máximo que
puder. Assim, se você está trabalhando do őm para o começo para
provar A → B e construiu uma subprova com o objetivo de provar B,
olhe agora para a sentença B. Se ela for uma conjunção, por exemplo,
trabalhe do őm para o começo e insira na subprova os dois conjuntos
dessa conjunção, etc.
..
.
n A
n+1 A∨ B ∨I n
n A∧ B
n+1 A ∧E n
n+2 B ∧E n
Geralmente őca claro a situação especíőca que você vai precisar usar
uma das sentenças A ou B. Mas, não custa nada escrever as duas
sentenças.
n A∨ B
n+1 A
..
.
m C
m+1 B
..
.
k C
k +1 C ∨E n, (n + 1)–m, (m + 1)–k
n A→ B
..
.
m A
m+1 B →E n, m
n ¬A
..
.
m A
m+1 ⊥ ¬E n, m
29.3 Estratégias
Vamos supor que queremos mostrar que o argumento (A∧B)∨(A∧C ) .Û.
A ∧ (B ∨ C ) é válido. Começamos a prova escrevendo a premissa e a
conclusão em baixo. (Com o máximo de espaço possível entre elas.)
CAPÍTULO 29. CONSTRUINDO PROVAS 278
1 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C )
..
.
n A ∧ (B ∨ C )
1 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C )
2 A∧B
..
.
n A ∧ (B ∨ C )
n+1 A ∧C
..
.
m A ∧ (B ∨ C )
m+1 A ∧ (B ∨ C ) ∨E 1, 2–n, n + 1–m
Agora você tem duas tarefas separadas, a saber, preencher cada uma
das duas subprovas. Na primeira subprova, trabalhamos do őm para o
começo a partir da conclusão A ∧ (B ∨C ). Isso é uma conjunção, assim
dentro da primeira subprova, você terá dois subobjetivos separados:
provar A, e provar B ∨C . Esses subobjetivos permitem justiőcar a linha
n usando a regra ∧I. A sua prova agora őca assim:
CAPÍTULO 29. CONSTRUINDO PROVAS 279
1 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C )
2 A∧B
..
.
i A
..
.
n−1 B ∨C
n A ∧ (B ∨ C ) ∧I i , n − 1
n+1 A ∧C
..
.
m A ∧ (B ∨ C )
m+1 A ∧ (B ∨ C ) ∨E 1, 2–n, (n + 1)–m
1 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C )
2 A∧B
3 A ∧E 2
4 B ∧E 2
5 B ∨C ∨I 4
6 A ∧ (B ∨ C ) ∧I 3, 5
7 A ∧C
..
.
m A ∧ (B ∨ C )
m+1 A ∧ (B ∨ C ) ∨E 1, 2–6, 7–m
1 (A ∧ B) ∨ (A ∧ C )
2 A∧B
..
.
k A
k +1 A ∧C
..
.
n−1 A
n A ∨E 1, 2–k , (k + 1)–(n − 1)
n+1 A∧B
..
.
l B ∨C
l +1 A ∧C
..
.
m−1 B ∨C
m B ∨C ∨E 1, (n + 1)–l , (l + 1)–(m − 1)
m+1 A ∧ (B ∨ C ) ∧I n, m
Examine com calma o esquema acima e tente entender tudo o que foi
feito. Deixaremos a tarefa de őnalizar esta prova preenchendo as linhas
.
ausentes indicadas por .. como um exercício para você. É importante
tentar fazê-lo e, caso tenha problemas, procurar ajuda de professores,
monitores e colegas.
Vamos dar outro exemplo para ilustrar como aplicar as estratégias
ao lidar com condicionais e negação. A sentença ‘(A → B) → (¬B →
¬A)’ é uma tautologia. Vamos ver se conseguimos encontrar uma prova
disso, sem premissas, usando as estratégias. Primeiro escrevemos a
sentença no őnal de uma folha de papel. Como não dá para trabalhar
do começo para o őm, já que não há nenhuma premissa de onde partir,
trabalhamos do őm para o começo e criamos uma subprova para obter
a sentença que queremos ‘(A → B) → (¬B → ¬A)’ usando a regra →I.
CAPÍTULO 29. CONSTRUINDO PROVAS 282
1 A→B
..
.
n ¬B → ¬A
n+1 (A → B) → (¬B → ¬A) →I 1–n
1 A→B
2 ¬B
..
.
n−1 ¬A
n ¬B → ¬A →I 2–(n − 1)
n+1 (A → B) → (¬B → ¬A) →I 1–n
1 A→B
2 ¬B
3 A
..
.
n−2 ⊥
n−1 ¬A ¬I 3–(n − 2)
n ¬B → ¬A →I 2–(n − 1)
n+1 (A → B) → (¬B → ¬A) →I 1–n
CAPÍTULO 29. CONSTRUINDO PROVAS 283
1 A→B
2 ¬B
3 A
4 B →E 1, 3
5 ⊥ ¬E 2, 4
6 ¬A ¬I 3–5
7 ¬B → ¬A →I 2–6
8 (A → B) → (¬B → ¬A) →I 1–7
1 A∨B
2 ¬A
3 A
..
.
m B
m+1 B
..
.
k B
k +1 B ∨E 1, 3–m, (m + 1)–k
Observe que você possui ‘¬A’ na linha 2 e ‘A’ como suposição da sua
primeira subprova. Isso lhe dá ‘⊥’ usando ¬E, e de ‘⊥’ você obtém a
conclusão ‘B’ da primeira subprova usando a regra ⊥E . Lembre-se de
que você pode repetir uma sentença que já apareceu na prova usando
a regra de reiteração R. Portanto, a prova completa őca:
1 A∨B
2 ¬A
3 A
4 ⊥ ¬E 2, 3
5 B ⊥E 4
6 B
7 B R6
8 B ∨E 1, 3–5, 6–7
n ¬A
..
.
m ⊥
m+1 A PI n–m
Aqui, temos que iniciar uma subprova com a suposição ¬A; a última
linha da subprova deve ser ‘⊥’. Vamos citar a subprova e usar PI como
regra. Na subprova, agora temos uma suposição adicional (na linha n)
para trabalhar.
Neste ponto, parece que uma estratégia óbvia para tentar justiőcar
‘⊥’ através da regra ¬E seria inserir A na prova, aplicar a regra ¬E
para justiőcar ‘⊥’ e tentar agora provar A. O esquema da sua prova
őcaria, então, com a seguinte aparência:
n ¬A
..
.
m−1 A
m ⊥ ¬E n, m − 1
m+1 A PI n–m
1 ¬(A ∨ ¬A)
..
.
m ⊥
m+1 A ∨ ¬A PI 1–m
1 ¬(A ∨ ¬A)
..
.
m−1 A ∨ ¬A
m ⊥ ¬E 1, m − 1
m+1 A ∨ ¬A PI 1–m
Note que o que temos que fazer agora é provar ‘A∨¬A’, que é exata-
mente a sentença original que queremos provar. Só que agora estamos
em uma situação diferente: queremos provar ‘A ∨ ¬A’ dentro de uma
subprova que tem uma suposição para nos auxiliar. Em geral, ao lidar
com novas metas, devemos voltar e começar com as estratégias básicas.
Nesse caso, devemos primeiro tentar trabalhar do őm para o começo a
CAPÍTULO 29. CONSTRUINDO PROVAS 287
1 ¬(A ∨ ¬A)
2 A
..
.
m−3 ⊥
m−2 ¬A ¬I 2–(m − 3)
m−1 A ∨ ¬A ∨I m − 2
m ⊥ ¬E 1, m − 1
m+1 A ∨ ¬A PI 1–m
1 ¬(A ∨ ¬A)
2 A
3 A ∨ ¬A ∨I 2
4 ⊥ ¬E 1, 3
5 ¬A ¬I 2–4
6 A ∨ ¬A ∨I 5
7 ⊥ ¬E 1, 6
8 A ∨ ¬A PI 1–7
CAPÍTULO 29. CONSTRUINDO PROVAS 288
Exercícios
A. Use as estratégias para encontrar provas para cada um dos oito
seguintes argumentos:
1. A → B, A → C .Û. A → (B ∧ C )
2. (A ∧ B) → C .Û. A → (B → C )
3. A → (B → C ) .Û. (A → B) → (A → C )
4. A ∨ (B ∧ C ) .Û. (A ∨ B) ∧ (A ∨ C )
5. (A ∧ B) ∨ (A ∧ C ) .Û. A ∧ (B ∨ C )
6. A ∨ B, A → C, B → D .Û. C ∨ D
7. ¬A ∨ ¬B .Û. ¬(A ∧ B)
8. A ∧ ¬B .Û. ¬(A → B)
1. ¬A → (A → ⊥)
2. ¬(A ∧ ¬A)
3. [(A → C ) ∧ (B → C )] → [(A ∨ B) → C ]
4. ¬(A → B) → (A ∧ ¬B)
5. (A ∨ ¬B) → (A → B)
Como essas devem ser provas de sentenças a partir de nenhuma
premissa, você começará com a respectiva sentença na parte inferior da
prova, as quais não terão premissas.
D. Use as estratégias para encontrar provas para cada um dos sete
seguintes argumentos e sentenças:
1. ¬¬A → A
2. ¬A → ¬B .Û. B → A
3. A → B .Û. ¬A ∨ B
4. ¬(A ∧ B) → (¬A ∨ ¬B)
5. A → (B ∨ C ) .Û. (A → B) ∨ (A → C )
6. (A → B) ∨ (B → A)
7. ((A → B) → A) → A
Regras
adicionais da
LVF
No Capítulo 28, introduzimos as regras básicas de nosso sistema de
provas para a LVF e nesta seção, apresentaremos algumas regras adi-
cionais a esse sistema. Veremos que em nosso sistema de provas es-
tendido é um pouco mais fácil de trabalhar. No entanto, veremos, no
Capítulo 32 que essas regras adicionais não são, estritamente falando,
necessárias.
289
CAPÍTULO 30. REGRAS ADICIONAIS DA LVF 290
m A∨ B
n ¬A
B SD m, n
m A∨ B
n ¬B
A SD m, n
m A→ B
n ¬B
¬A MT m, n
m ¬¬A
A EDN m
i A
j B
k ¬A
l B
B LTE i – j , k –l
mas não há meio caminho em que nenhuma das duas seja verdadeira.1
Pode haver tantas linhas quantas você quiser entre i e j , e tantas linhas
quantas quiser entre k e l . Além disso, as subprovas podem vir em
qualquer ordem, e a segunda subprova não precisa vir imediatamente
após a primeira.
Para ver a regra em ação, considere:
P .Û. (P ∧ D) ∨ (P ∧ ¬D)
Aqui está uma prova correspondente ao argumento:
1 P
2 D
3 P ∧D ∧I 1, 2
4 (P ∧ D) ∨ (P ∧ ¬D) ∨I 3
5 ¬D
6 P ∧ ¬D ∧I 1, 5
7 (P ∧ D) ∨ (P ∧ ¬D) ∨I 6
8 (P ∧ D) ∨ (P ∧ ¬D) LTE 2–4, 5–7
1 A → ¬A
2 A
3 ¬A →E 1, 2
4 ¬A
5 ¬A R4
6 ¬A LTE 2–3, 4–5
1 Você pode às vezes encontrar lógicos ou őlósofos falando sobre “tertium non daturž.
Esse é o mesmo princípio que o terceiro excluído; signiőca “não há terceira viaž. Lógicos
que têm dúvidas sobre provas indiretas também têm dúvidas sobre a LTE.
CAPÍTULO 30. REGRAS ADICIONAIS DA LVF 293
m ¬(A∧ B)
¬A∨ ¬B DeM m
m ¬A∨ ¬B
¬(A∧ B) DeM m
m ¬(A∨ B)
¬A∧ ¬B DeM m
m ¬A∧ ¬B
¬(A∨ B) DeM m
Essas são todas as regras adicionais do nosso sistema de provas para a LVF.
Exercícios
A. As provas a seguir estão sem citações (números de regra e linha).
Adicione-os sempre que necessário:
CAPÍTULO 30. REGRAS ADICIONAIS DA LVF 294
1 W → ¬B
2 A ∧W
3 B ∨ ( J ∧ K)
1. 4 W
5 ¬B
6 J ∧K
7 K
1 L ↔ ¬O
2 L ∨ ¬O
3 ¬L
4 ¬O
2.
5 L
6 ⊥
7 ¬¬L
8 L
CAPÍTULO 30. REGRAS ADICIONAIS DA LVF 295
1 Z → (C ∧ ¬N )
2 ¬Z → (N ∧ ¬C )
3 ¬(N ∨ C )
4 ¬N ∧ ¬C
5 ¬N
6 ¬C
7 Z
8 C ∧ ¬N
3.
9 C
10 ⊥
11 ¬Z
12 N ∧ ¬C
13 N
14 ⊥
15 ¬¬(N ∨ C )
16 N ∨C
1. E ∨ F , F ∨ G , ¬F .Û. E ∧ G
2. M ∨ (N → M ) .Û. ¬M → ¬N
3. (M ∨ N ) ∧ (O ∨ P ), N → P , ¬P .Û. M ∧ O
4. (X ∧ Y ) ∨ (X ∧ Z ), ¬(X ∧ D), D ∨ M .Û. M
CAPÍTULO 31
Conceitos de
teoria da
prova
Neste capítulo, apresentaremos um novo vocabulário. A seguinte ex-
pressão:
A1, A2, . . . , An ⊢ C
signiőca que existe uma prova que termina com C cujas suposições
não descartadas estão entre A1, A2, . . . , An . Quando queremos dizer
que não é o caso que existe uma prova que termine com C a partir de
A1 , A2 , . . . , An , escrevemos:
A1, A2, . . . , An ⊬ C
296
CAPÍTULO 31. CONCEITOS DE TEORIA DA PROVA 297
não descartadas, ou seja, dizer que a sentença A pode ser provada sem
nenhuma premissa, escrevemos: ⊢ A. Nesse caso, dizemos que A é um
teorema.
A é um teorema se e somente se ⊢ A
Para ilustrar isso, suponha que desejamos mostrar que ‘¬(A ∧ ¬A)’
é um teorema. Assim, precisamos de uma prova de ‘¬(A ∧ ¬A)’ que
não tenha suposições não descartadas. No entanto, como queremos
provar uma sentença cujo operador lógico principal é uma negação,
vamos começar com uma subprova dentro da qual assumimos ‘A ∧ ¬A’,
e mostrar que essa suposição leva a uma contradição. Levando em
consideração tudo isso, a prova é assim:
1 A ∧ ¬A
2 A ∧E 1
3 ¬A ∧E 1
4 ⊥ ¬E 3, 2
5 ¬(A ∧ ¬A) ¬I 1–4
Exercícios
A. Mostre que cada uma das quatro seguintes sentenças é um teorema:
1. O →O
2. N ∨ ¬N
3. J ↔ [ J ∨ (L ∧ ¬L)]
4. ((A → B) → A) → A
B. Forneça provas para cada um dos quatro argumentos seguintes:
1. C → (E ∧ G ), ¬C → G ⊢ G
CAPÍTULO 31. CONCEITOS DE TEORIA DA PROVA 299
2. M ∧ (¬N → ¬M ) ⊢ (N ∧ M ) ∨ ¬M
3. (Z ∧ K ) ↔ (Y ∧ M ), D ∧ (D → M ) ⊢ Y → Z
4. (W ∨ X ) ∨ (Y ∨ Z ), X → Y, ¬Z ⊢ W ∨ Y
1. R ↔ E, E ↔ R
2. G , ¬¬¬¬G
3. T → S , ¬S → ¬T
4. U → I , ¬(U ∧ ¬I )
5. ¬(C → D), C ∧ ¬D
6. ¬G ↔ H , ¬(G ↔ H )
E. Neste capítulo, alegamos que é muito difícil mostrar que duas sen-
tenças não são dedutivamente equivalentes, assim como mostrar que
uma sentença não é um teorema. Por que aőrmamos isso? (Sugestão:
pense em uma sentença que seria um teorema se e somente se A e B
fossem dedutivamente equivalentes.)
CAPÍTULO 32
Regras
derivadas
Nesta seção, veremos por que introduzimos as regras do nosso sistema
de provas em dois lotes separados. Em particular, queremos mostrar
que as regras adicionais do Capítulo 30 não são estritamente necessá-
rias, mas podem ser derivadas das regras básicas aprestadas no Capí-
tulo 28.
m A
m A
k A∧ A ∧I m, m
k +1 A ∧E k
300
CAPÍTULO 32. REGRAS DERIVADAS 301
Para ser claro: isso não é uma prova, mas um esquema de prova.
Aőnal, foi usada uma variável, A, da metalinguagem em vez de uma
sentença da LVF, entretanto o ponto é simples: quaisquer que sejam as
sentenças da LVF que atribuímos a A, e quaisquer que sejam as linhas
em que estivéssemos trabalhando, poderíamos produzir uma prova ge-
nuína. Assim, você pode pensar nisso como uma receita para produzir
provas.
De fato, é uma receita que nos mostra o seguinte: qualquer coisa
que possamos provar usando a regra R, podemos provar (com mais
uma linha) usando apenas as regras básicas do Capítulo 28 sem R.
É isso que signiőca dizer que a regra R pode ser derivada de outras
regras básicas: qualquer coisa que possa ser justiőcada usando R pode
ser justiőcada usando apenas as outras regras básicas.
m A∨ B
n ¬A
Agora você deseja, na linha k , provar B. Você pode fazer isso com a
regra SD, introduzida no Capítulo 30, mas igualmente, você pode fazer
isso com as regras básicas do Capítulo 28:
m A∨ B
n ¬A
k A
k +1 ⊥ ¬E n, k
k +2 B ⊥E k + 1
k +3 B
k +4 B Rk +3
k +5 B ∨E m, k –k + 2, k + 3–k + 4
tema não possibilita novas provas. Sempre que você usar a regra SD,
você pode provar a mesma coisa usando algumas linhas extras apli-
cando apenas as nossas regras básicas. Assim, SD é uma regra deri-
vada.
m A→ B
n ¬B
Agora você deseja, na linha k , provar ¬A. Você pode fazer isso com
a regra MT, introduzida no Capítulo 30. Igualmente aqui, você pode
fazer isso com as regras básicas do Capítulo 28:
m A→ B
n ¬B
k A
k +1 B →E m, k
k +2 ⊥ ¬E n, k + 1
k +3 ¬A ¬I k –k + 2
m ¬¬A
k ¬A
k +1 ⊥ ¬E m, k
k +2 A PI k –k + 1
CAPÍTULO 32. REGRAS DERIVADAS 303
m A
n B
k ¬A
l B
m A
n B
k ¬A
l B
..
.
i A∨ ¬A
i +1 B ∨E i , m–n, k –l
őzer isso, você poderá concluir B e completar sua prova usando PI.
Dentro da subprova você precisa trabalhar um pouco para obter ‘⊥’.
Todo este procedimento está explicitado no esquema abaixo. Examine-
o com calma.
m ¬B
m+1 A
..
.
n B
n+1 ⊥ ¬E m, n
n+2 ¬A
..
.
l B
l +1 ⊥ ¬E m, l
l +2 ¬A ¬I (m + 1)–(n + 1)
l +3 ¬¬A ¬I (n + 2)–(l + 1)
l +4 ⊥ ¬E l + 3, l + 2
l +5 B PI m–(l + 4)
m ¬(A∧ B)
k A
k +1 B
k +2 A∧ B ∧I k , k + 1
k +3 ⊥ ¬E m, k + 2
k +4 ¬B ¬I k + 1–k + 3
k +5 ¬A∨ ¬B ∨I k + 4
k +6 ¬A
k +7 ¬A∨ ¬B ∨I k + 6
k +8 ¬A∨ ¬B LTE k –k + 5, k + 6–k + 7
m ¬A∨ ¬B
k A∧ B
k +1 A ∧E k
k +2 B ∧E k
k +3 ¬A
k +4 ⊥ ¬E k + 3, k + 1
k +5 ¬B
k +6 ⊥ ¬E k + 5, k + 2
k +7 ⊥ ∨E m, k + 3–k + 4, k + 5–k + 6
k +8 ¬(A∧ B) ¬I k –k + 7
Exercícios
A. Forneça esquemas de prova que justiőquem a adição da terceira e
quarta regras de De Morgan como regras derivadas.
D. Mostre que se você tivesse LTE como regra básica, poderia justiőcar
PI como regra derivada. Ou seja, suponha que você tenha a prova:
m ¬A
...
n ⊥
Sua tarefa é tentar provar A, a partir desta prova, com a seguinte res-
trição: você não pode usar a regra PI. Pode usar apenas a regra LTE e
todas as outras regras básicas.
Correção e
completude
No Capítulo 31, vimos que podemos usar provas para testar os mes-
mos conceitos que antes testávamos com tabelas de verdade. Vimos
que podemos não apenas usar provas para comprovar que um argu-
mento é válido, como também para veriőcar se uma sentença é uma
tautologia ou se duas sentenças são ou não equivalentes. Também co-
meçamos a usar a roleta simples de maneira análoga ao uso da roleta
dupla. Por exemplo, do mesmo modo que ⊨ A denota que temos uma
tabela de verdade que mostra que A é uma tautologia, de modo similar
⊢ A passou a denotar que temos uma prova de A sem premissas não
descartadas.
Você pode ter se perguntado naquele ponto se os dois tipos de ro-
letas sempre funcionam da mesma maneira. Será que sempre que você
consegue mostrar que A é uma tautologia usando tabelas de verdade,
conseguirá também mostrar que A é um teorema usando uma prova? E
o inverso, também é verdadeiro? Será que essa correspondência entre
os testes que fazemos com tabelas de verdade e aqueles feitos com pro-
vas em dedução natural vale também para as noções de argumentos
válidos, ou de pares de sentenças equivalentes? O fato é que a res-
posta para todas essas perguntas e muitas outras questões semelhantes
é sim. E isso pode ser demonstrado. Primeiro temos que deőnir cada
uma destas noções de dois modos separados, um modo via valorações
(tabelas de verdade) e outro via provas formais em dedução natural.
Depois temos que provar que estas diferentes deőnições são equivalen-
307
CAPÍTULO 33. CORREÇÃO E COMPLETUDE 308
Uma sentença cuja tabela de verdade só tem Uma sentença que pode ser provada sem
Tautologia / Teorema
Vs sob o conectivo principal nenhuma premissa
Uma sentença cuja tabela de verdade só tem Uma sentença cuja negação pode ser provada
Contradição
Fs sob o conectivo principal sem quaisquer premissas
Uma sentença cuja tabela de verdade contém Uma sentença que não é um teorema nem uma
Sentença contingente
Vs e Fs sob o conectivo principal contradição
Sentenças equivalentes As colunas sob os conectivos principais são As sentenças podem ser provadas uma da
idênticas outra
Sentenças Sentenças que não possuem uma única linha
Sentenças a partir das quais se pode provar
incompatíveis na tabela de verdade, onde todas são
uma contradição
(inconsistentes) verdadeiras
Sentenças que tenham pelo menos uma linha Sentenças a partir das quais não se pode
Sentenças compatíveis
na tabela de verdade onde elas todas são provar uma contradição.
(consistentes)
verdadeiras
Um argumento cuja tabela de verdade não tem
nenhuma linha na qual tem Vs sob todos os Um argumento em que se pode provar a
Argumento válido
conectivos principais das premissas e F sob o conclusão a partir das premissas
conectivo principal da conclusão
309
CAPÍTULO 33. CORREÇÃO E COMPLETUDE 310
ticamente uma sentença contingente como uma sentença que não pode
ser provada ser uma tautologia ou uma contradição. Não existe um
modo prático de provar esse tipo de declaração negativa. Nunca sa-
beremos se não existe alguma prova de que uma declaração é uma
contradição e ainda não a encontramos. Não temos nada a fazer nessa
situação, senão recorrer a tabelas de verdade. Da mesma forma, pode-
mos usar provas para mostrar que duas sentenças são equivalentes, mas
e se quisermos provar que elas não são equivalentes? Não temos como
mostrar que nunca encontraremos a prova relevante. Então, temos que
voltar às tabelas de verdade de novo.
A tabela 33.2 resume quando é melhor usar provas e quando é me-
lhor usar tabelas de verdade.
Tabela 33.2: Quando fornecer uma tabela de verdade e quando fornecer uma prova.
Exercícios
A. Em cada um dos doze casos abaixo, use uma prova ou uma tabela
de verdade para mostrar que:
CAPÍTULO 33. CORREÇÃO E COMPLETUDE 312
Dedução
Natural para
a LPO
314
CAPÍTULO 34
Regras básicas
da LPO
A linguagem da LPO faz uso de todos os conectivos da LVF e no âm-
bito da teoria da prova não seria diferente. No sistema de provas da
LPO usaremos todas as regras básicas e derivadas da LVF, assim como
o símbolo ‘⊢’ e todas as noções de teoria da prova introduzidas na
Parte VI. Entretanto, precisaremos de algumas novas regras básicas
para governar os quantiőcadores e o símbolo de identidade.
1 ∀x R(x, x, d )
2 R(a, a, d ) ∀E 1
1 ∀x R(x, x, d )
2 R(d, d, d ) ∀E 1
315
CAPÍTULO 34. REGRAS BÁSICAS DA LPO 316
m ∀x A(x)
A(c) ∀E m
1 ∀x B(x) → B(k )
2 B(b) → B(k ) uso incorreto de ∀E 1
1 R(a, a, d )
2 ∃x R(a, a, x) ∃I 1
CAPÍTULO 34. REGRAS BÁSICAS DA LPO 317
1 R(a, a, d )
2 ∃x R(x, x, d ) ∃I 1
1 G (a, a)
2 ∃x G (x, a) ∃I 1
m A(. . . c . . . c . . .)
∃x A(. . . x . . . c . . .) ∃I m
1 R(a, a, d )
2 ∃x R(x, a, d ) ∃I 1
3 ∃y∃x R(x, y, d ) ∃I 2
1 R(a, a, d )
2 ∃x R(x, a, d ) ∃I 1
3 ∃x ∃x R(x, x, d ) uso incorreto de ∃I 2
uma vez que a expressão da linha 3 não é uma sentença da LPO, pois
temos aqui um choque de variáveis.1
1 ∀x F (x)
2 F (a) ∀E 1
3 ∃x F (x) ∃I 2
agora na praia de Ponta Negra. Este domínio, claro, é vazio. Considere também as
seguintes sentenças restritas a este domínio: (a) ‘Alguém é imortal’; (b) ‘Todos são imor-
tais’. (a) é claramente falsa, porque não há mesmo nenhum marciano imortal surfando
na praia de Ponta Negra. Mas (b) é considerada verdadeira, porque nenhum elemento
do domínio a contradiz. ‘Todos são imortais’ seria falsa apenas se algum elemento do
domínio fosse mortal, ou seja, se algum dos marcianos surfando agora em Ponta Ne-
gra fosse mortal. Como não há nenhum marciano lá, nenhum elemento do domínio é
mortal. Então, a condição que atestaria a falsidade de (b) não ocorre e, por isso, (b) é
verdadeira. Mas é vacuamente verdadeira.
CAPÍTULO 34. REGRAS BÁSICAS DA LPO 320
1 ∀x F (x)
2 F (a) ∀E 1
Schock nas décadas de 1950 e 1960 são exemplos desta abordagem alternativa.
CAPÍTULO 34. REGRAS BÁSICAS DA LPO 321
‘F (r 79002 )’, . . . , e assim por diante até őcarmos sem espaço, tempo ou
paciência. Isso mostra que temos um modo de provar ‘F (c)’ para todos
os nomes c. Mas se F (c) vale para todos os nomes c, então estamos
justiőcados a dizer que ‘F ’ vale para tudo, ou seja, podemos deduzir
‘∀y F (y)’. Um rascunho ainda incompleto desse raciocínio em uma
prova seria:
1 ∀x F (x)
2 F (a) ∀E 1
3 ∀y F (y) versão preliminar de ∀I 2
k c
m A(c)
∀x A(x) ∀I k –m
os matemáticos querem provar, por exemplo, que todos os números naturais satisfazem
uma certa propriedade, eles mostram que um número genérico n, do qual não sabemos
nada, satisfaz a propriedade. Por exemplo, se para um número genérico n é verdade
que 2n 2 = n, então essa propriedade vale para todos os números e podemos concluir que
∀x ( 2x
2 = x).
CAPÍTULO 34. REGRAS BÁSICAS DA LPO 322
1 ∀x A(x, j )
2 j
3 A( j, j ) ∀E 1
4 ∀x A(x, x) uso incorreto de ∀I 2–3
1 d
2 G (d )
3 G (d ) R2
4 G (d ) → G (d ) →I 2–3
5 ∀z (G (z ) → G (z )) ∀I 1–4
1 ∀x O (x, x)
2 m
3 O (m, m) ∀E 1
4 ∀x O (x, m) uso incorreto de ∀I 2–3
sem substituir, ela ocorrerá fora da subprova rotulada e isso seria uma
violação da restrição 1 da regra.5
Por őm, a restrição 2, de modo exatamente análogo ao explicado no
caso da regra ∃I (p. 317), tem apenas o papel de evitar que se produza
um choque de variáveis.
1 ∃x F (x)
2 ∀x(F (x) → G (x))
3 b F (b)
4 F (b) → G (b) ∀E 2
5 G (b) →E 4, 3
6 ∃x G (x) ∃I 5
7 ∃x G (x) ∃E 1, 3–6
m ∃x A(x)
i c A(c)
j B
B ∃E m, i – j
Agora, suponha que tentamos oferecer uma prova para justiőcar esse
argumento:
1 L(d )
2 ∃x ¬L(x)
3 d ¬L(d )
4 L(d ) ∧ ¬L(d ) ∧I 1, 3
5 L(d ) ∧ ¬L(d ) uso incorreto de ∃E 2, 3–4
1 L(d )
2 ∃x ¬L(x)
3 d ¬L(d )
4 L(d ) ∧ ¬L(d ) ∧I 1, 3
5 ∃x(L(x) ∧ ¬L(x)) ∃I 4
6 ∃x(L(x) ∧ ¬L(x)) uso incorreto de ∃E 2, 3–5
Por őm, não custa reforçar que de acordo com a convenção da nota-
ção que estamos adotando, em qualquer instância de substituição A(c)
de uma sentença ∃x A(x), todas as ocorrências de x em A(x) devem
ter sido substituídas por c.6
Exercícios
A. Explique por que essas duas ‘provas’ estão incorretas. Além disso,
forneça interpretações que invalidariam os argumentos falaciosos des-
sas ‘provas’:
1 ∀x R(x, x)
2 a
3 a
4 R(a, a) ∀E 1
5 ∀y R(a, y) ∀I 3–4
6 ∀x ∀y R(x, y) ∀I 2–5
1 ∀x ∃y R(x, y)
2 ∃y R(a, y) ∀E 1
3 a R(a, a)
4 ∃x R(x, x) ∃I 3
5 ∃x R(x, x) ∃E 2, 3–4
pítulo, ∀E, ∃I, ∀I e ∃E, verá que apenas a regra ∃I não exige a substituição de todas as
ocorrências de c em A( c) para a obtenção de A(x) (ou, alternativamente, no caso das
regras ∀E e ∃E, de x em A(x) para a obtenção de A( c)). Todas as outras três regras
exigem a substituição de todas as ocorrências. É por isso que apenas para a regra ∃I
usamos a notação alternativa A(. . . c . . . c . . .) e A(. . . x . . . c . . .). Para todas as outras
regras usamos a notação mais econômica A( c) e A(x), que já garante, por convenção,
que todas as ocorrências sejam substituídas.
CAPÍTULO 34. REGRAS BÁSICAS DA LPO 328
E. Forneça uma prova para cada uma das nove aőrmações seguintes.
1. ⊢ ∀x F (x) → ∀y(F (y) ∧ F (y))
2. ∀x(A(x) → B(x)), ∃x A(x) ⊢ ∃x B(x)
3. ∀x(M (x) ↔ N (x)), M (a) ∧ ∃x R(x, a) ⊢ ∃x N (x)
4. ∀x ∀y G (x, y) ⊢ ∃x G (x, x)
5. ⊢ ∀x R(x, x) → ∃x ∃y R(x, y)
6. ⊢ ∀y ∃x(Q (y) → Q (x))
7. N (a) → ∀x(M (x) ↔ M (a)), M (a), ¬M (b) ⊢ ¬N (a)
8. ∀x ∀y(G (x, y) → G (y, x)) ⊢ ∀x∀y(G (x, y) ↔ G (y, x))
9. ∀x(¬M (x) ∨ L( j, x)), ∀x(B(x) → L( j, x)), ∀x(M (x) ∨ B(x)) ⊢
∀xL( j, x)
F. Escreva uma chave de simbolização para o seguinte argumento, e
forneça uma prova para ele:
Há uma pessoa que gosta de todos os que gostam de todos
que essa pessoa gosta. Portanto, há uma pessoa que gosta
de si mesma.
G. Mostre que cada par de sentenças é dedutivamente equivalente.
1. ∀x(A(x) → ¬B(x)), ¬∃x(A(x) ∧ B(x))
2. ∀x(¬A(x) → B(d )), ∀x A(x) ∨ B(d )
3. ∃x P (x) → Q (c ), ∀x(P (x) → Q (c ))
H. Para cada um dos cinco pares de sentenças a seguir, construa uma
prova de sua equivalência ou uma interpretação mostrando que não
são equivalentes.
Provas com
quantificado-
res
No Capítulo 29 discutimos estratégias para construir provas usando
as regras básicas de dedução natural para a LVF. Nesta seção, vere-
mos que essas mesmas estratégias também se aplicam às regras para
os quantiőcadores. Assim, podemos usar a estratégia do őm para
o começo, se quisermos provar sentenças quantiőcadas, ∀x A(x) ou
∃x A(x), justiőcando-as respectivamente com as regras de introdução
∀I ou ∃I. Por outro lado, veremos também que podemos usar a estraté-
gia do começo para o őm a partir de sentenças quantiőcadas, aplicando
as regras de eliminação ∀E ou ∃E.
Especiőcamente, suponha que você queira provar ∀x A(x) com uma
estratégia de baixo para cima, usando a regra ∀I. Então o que você pre-
cisa fazer é introduzir imediatamente acima de ∀x A(x) uma subprova
rotulada, sem premissas, na qual o rótulo c é um nome novo, e que
tem A(c) como sua última sentença, conforme o seguinte esboço:
332
CAPÍTULO 35. PROVAS COM QUANTIFICADORES 333
k c
..
.
n A(c)
n+1 ∀x A(x) ∀I k –n
..
.
m ∃x A(x)
..
.
n c A(c)
..
.
k B
k +1 B ∃E m, n–k
1 ∀x(A(x) → B)
..
.
n ∃x A(x) → B
1 ∀x(A(x) → B)
2 ∃x A(x)
..
.
n−1 B
n ∃x A(x) → B →I 2–(n − 1)
1 ∀x(A(x) → B)
2 ∃x A(x)
3 d A(d )
..
.
n−2 B
n−1 B ∃E 2, 3–(n − 2)
n ∃x A(x) → B →I 2–(n − 1)
1 ∀x(A(x) → B)
2 ∃x A(x)
3 d A(d )
4 A(d ) → B ∀E 1
5 B →E 4, 3
6 B ∃E 2, 3–5
7 ∃x A(x) → B →I 2–6
1 ∃x A(x) → B
..
.
n ∀x(A(x) → B)
1 ∃x A(x) → B
2 d
..
.
n−1 A(d ) → B
n ∀x(A(x) → B) ∀I 2–(n − 1)
1 ∃x A(x) → B
2 d
3 A(d )
..
.
n−2 B
n−1 A(d ) → B →I 3–(n − 2)
n ∀x(A(x) → B) ∀I 2–(n − 1)
1 ∃x A(x) → B
2 d
3 A(d )
4 ∃x A(x) ∃I 3
5 B →E 1, 4
6 A(d ) → B →I 3–5
7 ∀x(A(x) → B) ∀I 2–6
Exercícios
A. Use as estratégias para encontrar provas para cada um dos oito
argumentos e teoremas seguintes:
Use somente as regras básicas da LVF, além das regras básicas dos
quantiőcadores.
Isso requer o uso de PI. Use apenas as regras básicas da LVF, além das
regras básicas dos quantiőcadores.
CAPÍTULO 36
Transformação
de quantifica-
dores
Nesta seção, introduziremos quatro regras adicionais às regras básicas
da seção anterior com o objetivo de agilizar a interação entre os quan-
tiőcadores e a negação. Essas regras de transformação de quantificadores
serão chamadas regras TQ.
No Capítulo 15, notamos que ∀x ¬A é logicamente equivalente a
¬∃x A. Adicionaremos, então, duas novas regras em nosso sistema de
provas para reŕetir os dois sentidos dessa equivalência.
m ∀x ¬A
¬∃x A TQ m
m ¬∃x A
∀x ¬A TQ m
339
CAPÍTULO 36. TRANSFORMAÇÃO DE QUANTIFICADORES 340
m ∃x ¬A
¬∀x A TQ m
m ¬∀x A
∃x ¬A TQ m
Exercícios
A. Mostre nos quatro casos seguintes que as sentenças são dedutiva-
mente inconsistentes:
1. S (a) → T (m), T (m) → S (a), T (m) ∧ ¬S (a)
2. ¬∃x R(x, a), ∀x ∀y R(y, x)
3. ¬∃x ∃y L(x, y), L(a, a)
4. ∀x(P (x) → Q (x)), ∀z (P (z ) → R(z )), ∀y P (y), ¬Q (a) ∧ ¬R(b)
As regras para
a identidade
No Capítulo 22, mencionamos o őlosoőcamente controverso princípio
da identidade dos indiscerníveis, que aőrma que objetos que são indistin-
guíveis em todos os aspectos são, de fato, idênticos entre si. Entretanto,
dissemos também que esse não é um princípio válido na LPO. Disso
resulta que não importa o quanto você saiba sobre dois objetos, você
não vai conseguir provar que eles são idênticos a partir de suas outras
propriedades e relações. Isso traduz-se no fato de que não é possível
inferir nenhuma aőrmação de identidade ‘a = b’ que contenha dois no-
mes diferentes a partir de um grupo de sentenças nas quais o próprio
predicado de identidade não ocorra. A regra de introdução da identi-
dade da LPO não pode, portanto, permitir a conclusão de aőrmações
de identidade com nomes diferentes, do tipo ‘a = b’.
Por outro lado, todo objeto é idêntico a si mesmo. Ou seja, não são
necessárias quaisquer premissas para concluir que algo é idêntico a si
mesmo. Por isso o esquema geral da regra de introdução da identidade é
simplesmente:
c= c =I
Observe que essa regra não requer referência a nenhuma linha an-
terior da prova. Para qualquer nome c, você pode escrever c = c em
qualquer ponto, justiőcando apenas com a regra =I.
342
CAPÍTULO 37. AS REGRAS PARA A IDENTIDADE 343
m a= b
n A(. . . a . . . a . . .)
A(. . . b . . . a . . .) =E m, n
m a= b
n A(. . . b . . . b . . .)
A(. . . a . . . b . . .) =E m, n
1 a
2 b
3 a =b
4 a=a =I
5 b =a =E 3, 4
6 a =b →b =a →I 3–5
7 ∀y(a = y → y = a) ∀I 2–6
8 ∀x ∀y(x = y → y = x) ∀I 1–7
1 a
2 b
3 c
4 a =b ∧b = c
5 a =b ∧E 4
6 b =c ∧E 4
7 a =c =E 5, 6
8 (a = b ∧ b = c ) → a = c →I 4–7
9 ∀z ((a = b ∧ b = z ) → a = z ) ∀I 3–8
10 ∀y ∀z ((a = y ∧ y = z ) → a = z ) ∀I 2–9
11 ∀x ∀y∀z ((x = y ∧ y = z ) → x = z ) ∀I 1–10
Obtivemos a linha 7 substituindo ‘b’ na linha 6 por ‘a’; uma vez que
já tínhamos ‘a = b’ na linha 5. Note que as restrições à regra ∀I são
respeitadas. Os nomes ‘a’, ‘b’ e ‘c ’ não ocorrem fora das subprovas
rotuladas que os introduzem. Além disso, a prova tem três subprovas
CAPÍTULO 37. AS REGRAS PARA A IDENTIDADE 345
Exercícios
A. Forneça uma prova para cada um das dez seguintes asserções.
Regras
derivadas
Lembramos que na LVF primeiro introduzimos as regras básicas do
sistema de provas e depois adicionamos outras regras. Posteriormente
mostramos que essas regras adicionais eram todas regras derivadas
das regras básica da LVF. Faremos o mesmo no caso caso da LPO. No
Capítulo 34 introduzimos algumas regras básicas para a LPO e no Ca-
pítulo 36 adicionamos as regras de transformação de quantiőcadores,
TQ. Veremos que todas as quatro regras TQ podem ser derivadas das
regras básicas da LPO.
A prova abaixo mostra que a primeira regra TQ é derivada, ou seja,
que a inferência de ¬∃x A(x) a partir de ∀x ¬A(x) que ela autoriza
pode ser feita usando apenas as regras básicas.
1 ∀x ¬A(x)
2 ∃x A(x)
3 c A(c)
4 ¬A(c) ∀E 1
5 ⊥ ¬E 4, 3
6 ⊥ ∃E 2, 3–5
7 ¬∃x A(x) ¬I 2–6
347
CAPÍTULO 38. REGRAS DERIVADAS 348
1 ∃x ¬A(x)
2 ∀x A(x)
3 c ¬A(c)
4 A(c) ∀E 2
5 ⊥ ¬E 3, 4
6 ⊥ ∃E 1, 3–5
7 ¬∀x A(x) ¬I 2–6
Isso explica por que essas duas regras podem ser tratadas como deri-
vadas. Justiőcativas semelhantes podem ser oferecidas para as outras
duas regras TQ.
Exercícios
A. Mostre que a segunda e a quarta regra TQ são regras derivadas.
CAPÍTULO 39
Provas e
semântica
Apresentamos ao longo deste livro muitas noções as quais foram clas-
siőcas de formas diferentes: umas como noções da teoria da prova e
outras como noções semânticas. Falaremos neste capítulo, mesmo que
brevemente, de suas diferenças e conexões. Por exemplo, usamos duas
roletas diferentes. Por um lado, a roleta simples ⊢, para simbolizar a
noção de dedutibilidade. Quando aőrmamos
A1, A2, . . . , An ⊢ C
estamos dizendo que há uma prova que termina com C e cujas úni-
cas suposições não descartadas estão entre A1, A2, . . . , An . Esta é uma
noção da teoria da prova. Por outro lado, a roleta dupla ⊨ representa
simbolicamente a noção de sustentação. E a aőrmação
A1, A2, . . . , An ⊨ C
signiőca que não há nenhuma valoração (ou interpretação) na qual
A1, A2, . . . , An são todas verdadeiras e C é falsa. Isso diz respeito a
atribuições de verdade e falsidade às sentenças. Essa é portanto uma
noção semântica.
Embora nossas noções semântica e de teoria da prova sejam no-
ções diferentes, há uma conexão profunda entre elas. Para explicar essa
conexão, começaremos considerando a relação entre a classiőcar uma
sentença como um teorema (p. 297) e classiőca-la como uma validade
lógica (p. 228).
349
CAPÍTULO 39. PROVAS E SEMÂNTICA 350
da LVF e no Capítulo 46, apresentaremos uma prova detalhada de que o sistema formal
de provas da LVF é correto.
CAPÍTULO 39. PROVAS E SEMÂNTICA 351
A é uma validade lógica? faça uma prova para ⊢ A proponha uma interpretação na qual A
seja falsa
A é uma contradição? faça uma prova para ⊢ ¬A proponha uma interpretação na qual A
seja verdadeira
A e B são equivalentes? faça duas provas, uma para A ⊢ B e outra proponha uma interpretação na qual A e
para B ⊢ A B tenham diferentes valores de verdade
A1, A2, . . . , An são compatí- proponha uma interpretação na qual to- prove uma contradição a partir das supo-
veis? das as sentenças A1, A2, . . . , An sejam ver- sições A1, A2, . . . , An
dadeiras
A1, A2, . . . , An .Û. C é válido? faça uma prova para a sentença C a partir proponha uma interpretação na qual cada
das suposições A1, A2, . . . , An uma das suposições A1, A2, . . . , An seja
verdadeira e C falsa
352
PARTE VIII
Lógica Modal
353
CAPÍTULO 40
Introduzindo
a Lógica
Modal
A lógica modal (LM) é a lógica que trata de modalidades, maneiras
pelas quais uma aőrmação pode ser verdadeira. As duas modalidades
mais conhecidas são Necessidade e Possibilidade. Uma aőrmação pode ser
verdadeira, mas também pode ser necessariamente verdadeira (verda-
deira não importando como o mundo possa ser). Por exemplo, verda-
des lógicas não são apenas verdadeiras por causa de alguma caracterís-
tica acidental do mundo, mas verdadeiras em qualquer circunstância.
Uma dada aőrmação pode não ser realmente verdadeira, mas pode ter
sido verdadeira. Usamos o operador modal □ para expressar necessi-
dade e ^ para expressar possibilidade. Assim, você pode ler □A como é
necessariamente o caso que A, e ^A como é possivelmente o caso que A.
Existem muitos tipos diferentes de necessidade e possibilidade. Por
exemplo, é humanamente impossível correr a 200 km/h. Dado o tipo de
criaturas que somos, nenhum ser humano pode fazer isso. Mas, ainda
assim, não é fisicamente impossível correr tão rápido. Ainda não temos a
tecnologia para fazer isso, mas certamente é ősicamente possível trocar
minhas pernas biológicas por pernas robóticas que possam funcionar
a 200 km/h. Por outro lado, é ősicamente impossível correr a uma
velocidade maior que a da luz, pois isso iria contra as leis da física.
354
CAPÍTULO 40. INTRODUZINDO A LÓGICA MODAL 355
40.1 A linguagem da LM
Para poder usar a lógica modal temos que adquirir duas habilidades:
precisamos saber fazer provas e precisamos saber construir interpreta-
ções. Antes disso, porém, precisamos entender a gramática da LM e
saber reconhecer as sentenças corretas de sua linguagem.
A linguagem da LM é uma extensão da LVF. Tem um estoque inő-
nito de letras sentenciais (sentenças atômicas); os conectivos lógicos ¬,
∧, ∨, → e ↔; além dos operadores modais □ e ^.
Se ao invés da LVF tivéssemos estendido a LPO com os operado-
res modais □ e ^, obteríamos um outro conjunto de sistemas modais
conhecido como LMQ - Lógica Modal Quantiőcada. A LMQ é muito
mais poderosa do que a LM, mas também é muito, muito mais com-
plicada. Assim, vamos manter as coisas simples e começar com uma
extensão da LVF.
As regras de construção de sentenças da LM são todas as da LVF
mais duas novas regras para os operadores modais. Assim, temos a
seguinte deőnição formal para uma sentença da LM:
A
P ∨Q
□A
^C ∨ □D
¬□(C ∨ □D)
□^(S ∧ (Z ↔ (□W ∨ ^Q )))
..
.
CAPÍTULO 41
Dedução
natural para
a LM
Na Parte VI apresentamos um sistema em dedução natural para a LVF
no qual explicitamos as regras de inferência que regem os conetivos
lógicos da LVF. Agora, sabendo que a linguagem da LM é uma extensão
da LVF, que além dos conectivos lógicos tem os operadores modais □ e
^, precisamos especiőcar as regras de inferência para tais operadores
modais. Ora, é exatamente isso o que faremos neste capítulo. Vamos
apresentar os sistemas em dedução natural para as lógicas modais K,
T, S4 e S5.
Como antes, usaremos ‘⊢’ para expressar dedutibilidade. Entre-
tanto, será útil adicionar um índice ao símbolo ‘⊢’ para indicar em qual
sistema modal estamos trabalhando. Assim, por exemplo, se quisermos
dizer que podemos provar C a partir de A1, A2, . . . An no sistema K, es-
crevemos: A1, A2, . . . An ⊢K C.
Os sistemas em dedução natural para as lógicas modais K, T, S4
e S5 têm algumas peculiaridades que gostaríamos de chamar atenção.
Além de novas regras básicas para o operador modal □, eles têm um
tipo especial de subprova.
Esse tipo especial de subprova, que chamaremos de subprova estrita,
parece uma subprova comum, exceto que tem um □ em sua linha de
358
CAPÍTULO 41. DEDUÇÃO NATURAL PARA A LM 359
suposição em vez de uma fórmula. Ela nos permite provar coisas e raci-
ocinar sobre possibilidades alternativas. O que podemos provar dentro
de uma subprova estrita vale para qualquer possibilidade alternativa,
em particular, nas possibilidades alternativas onde as suposições em
vigor em nossa prova podem não valer. Em uma subprova estrita todas
as suposições param de valer, e não é permitido citar nenhuma linha
fora da subprova estrita, com exceção daquelas linhas explicitamente
autorizadas por certas regras modais.
Cada sistema modal tem um tipo especial de regra, cujo papel prin-
cipal é determinar explicitamente o que será permito inserir dentro de
uma subprova estrita. Por exemplo, a regra RK vai reger as subprovas
estritas do sistema K, a regra R4 vai reger as subprovas estritas do
sistema S4 e a regra R5 vai reger as subprovas estritas do sistema S5.
Outro fato importante a ressaltar é que a regra de introdução do
□ (□I) não é a mesma para todos os sistemas. Embora elas tenham
a mesma estrutura, elas diferem quanto às suas restrições. Isso será
melhor detalhado nas seções seguintes.
41.1 Sistema K
Começamos com um sistema modal particularmente simples, chamado
K em homenagem ao őlósofo e lógico Saul Kripke. O sistema K tem
todas as regras de dedução natural da LVF, mais duas novas regras
básicas para o operador modal □: a regra RK e a regra de introdução
do □ (□I).
A regra RK permite introduzir uma sentença A em uma subprova
estrita, quando □A ocorre fora desta subprova. Assumir que uma sen-
tença A é necessária (assumir □A) equivale a assumir A em todas as
situações alternativas possíveis. É essa ideia que a regra RK descrita a
seguir busca expressar:
CAPÍTULO 41. DEDUÇÃO NATURAL PARA A LM 360
m □A
□
n A RK m
1 □A
2 □
3 □
4 A uso incorreto de RK 1
como esta:
1 A
2 A R1
3 A→A →I 1–2
1 □
2 A
3 A R2
4 A→A →I 2–3
5 □(A → A) □I 1–4
m □
n A
□A □I m–n
1 A
2 □
3 A R1
4 □A uso incorreto de □I 2–3
Essa não é uma prova legítima. Como uma linha interna da subprova
estrita (a linha 3) cita uma linha externa (a linha 1), então a restrição
de aplicação da regra □I não é satisfeita e, portanto, sua aplicação na
linha 4 é ilegítima.
Vejamos agora um exemplo com aplicações corretas das regras □I
e RK.
1 □A
2 □B
3 □
4 A RK 1
5 B RK 2
6 A∧B ∧I 4, 5
7 □(A ∧ B) □I 3–7
1 □(A → B)
2 □A
3 □
4 A RK 2
5 A→B RK 1
6 B →E 4, 5
7 □B □I 3–6
8 □A → □B →I 2–7
41.2 Possibilidade
Na seção anterior, vimos todas as regras básicas para K. Mas você
deve ter notado que todas essas regras eram sobre necessidade, □, e
nenhuma delas era sobre possibilidade, ^. Isso não é um problema
uma vez que podemos definir possibilidade em termos de necessidade:
^A =df ¬□¬A
m ¬□¬A
^A Def^ m
m ^A
¬□¬A Def^ m
m ¬□A
^¬A CM m
m ^¬A
¬□A CM m
m ¬^A
□¬A CM m
m □¬A
¬^A CM m
41.3 Sistema T
O sistema K é um sistema modal muito simples e tão fraco que nem
mesmo permite que você prove uma sentença A a partir de □A. Mas se
estivermos pensando em □ como expressando necessidade, deveríamos
ser capazes de fazer esta inferência: se A é necessariamente verdadeira,
então ela certamente deve ser verdadeira!
Isso nos leva a um novo sistema modal, T, que obtemos adicio-
nando ao sistema K a seguinte regra de eliminação do □ (□E), também
conhecida como RT:
m □A
n A □E m
41.4 Sistema S4
Vimos que no sistema T é permitido retirar as caixas de necessidade
de uma sentença: de □A, você pode inferir A. Mas, e se quiséssemos
adicionar caixas extras? Ou seja, podemos ir de □A para □□A?
Bem, isso pode ser feito no sistema T desde que A seja um teorema.
Porque do mesmo modo que você pode colocar a prova de A dentro de
uma subprova estrita e aplicar a regra □I para concluir □A; você pode
repetir este processo quantas vezes quiser. Ou seja, você pode colocar
a prova de A em uma subprova estrita aninhada em outra subprova
estrita e com duas aplicações da regra □I concluir □□A. Por exemplo,
podemos provar ‘□□(P → P )’ da seguinte forma:
CAPÍTULO 41. DEDUÇÃO NATURAL PARA A LM 366
1 □
2 □
3 P
4 P R3
5 P →P →I 3–4
6 □(P → P ) □I 2–5
7 □□(P → P ) □I 1–6
m □A
□
n □A R4 m
m □
n A
□A □I m–n
1 □A
2 □
3 □A R4 1
4 □□A □I 2–3
5 □A → □□A →I 1–6
41.5 Sistema S5
No sistema S4 sempre podemos adicionar uma caixa na frente de ou-
tra caixa, mas não podemos adicionar automaticamente uma caixa na
frente de um losango. Ou seja, S4 geralmente não permite a inferência
de □^A a partir de ^A. Isso pode lhe parecer uma lacuna, pelo menos
se você estiver lendo □ e ^ como expressando necessidade e possibilidade
respectivamente. Parece intuitivo que se A é possivelmente verdadeira,
então não poderia deixar de ser possivelmente verdadeira. Ou seja, se
A é possivelmente verdadeira (^A), então necessariamente A é possi-
velmente verdadeira (□^A). O sistema modal S5 nos permite incluir
esta intuição na LM. Ele é obtido adicionando-se a seguinte regra ao
sistema S4:
CAPÍTULO 41. DEDUÇÃO NATURAL PARA A LM 369
m ¬□A
□
n ¬□A R5 m
m □
n A
□A □I m–n
1 ^A
2 ¬□¬A Def^ 1
3 □
4 ¬□¬A R5 2
5 ^A Def^ 4
6 □^A □I 3–5
1 ^□A
2 ¬□¬□A Def^ 1
3 ¬□A
4 □
5 ¬□A R5 3
6 □¬□A □I 4–5
7 ⊥ ¬E 2, 6
8 □A IP 3–7
1 □A
2 □¬□A
3 ¬□A □E 2
4 ⊥ ¬E 1, 3
5 ¬□¬□A ¬I 2–4
6 □
7 ¬□A
8 □
9 ¬□A R5 7
10 □¬□A □I 8–9
11 ¬□¬□A R5 5
12 ⊥ ¬E 10, 11
13 □A PI 7–12
14 □□A □I 6–13
Acabamos de ver que o sistema S5 é estritamente mais forte que S4, pois
há coisas que podem ser provadas em S5, mas não podem em S4 como
por exemplo: ‘^□A → □A’.
O ponto importante sobre S5 pode ser colocado assim: se você
tiver uma longa sequência de caixas e losangos em qualquer combina-
ção, você pode excluir todos, exceto o último. Por exemplo, a sentença
‘^□^^□□^□A’ pode ser simpliőcada para ‘□A’ com apenas um ope-
rador.
Exercícios
A. Forneça provas em K para as quatro seguintes asserções:
1. □(A ∧ B) ⊢K □A ∧ □B
2. □A ∧ □B ⊢K □(A ∧ B)
3. □A ∨ □B ⊢K □(A ∨ B)
4. □(A ↔ B) ⊢K □A ↔ □B
CAPÍTULO 41. DEDUÇÃO NATURAL PARA A LM 372
1. ¬□A ⊢K ^¬A
2. ^¬A ⊢K ¬□A
3. ¬^A ⊢K □¬A
4. □¬A ⊢K ¬^A
1. □(A → B), ^A ⊢K ^B
2. □A ⊢K ¬^¬A
3. ¬^¬A ⊢K □A
1. P ⊢T ^P
2. ⊢T (A ∧ B) ∨ (¬□A ∨ ¬□B)
Semântica
para a LM
Neste capítulo, vamos tratar dos aspectos semânticos da Lógica modal.
Inicialmente veremos as circunstâncias sob as quais sentenças modais
são consideradas verdadeiras. Em seguida, veremos como avaliar a va-
lidade de argumentos envolvendo tais sentenças modais, levando em
consideração as peculiaridades dos diversos sistemas de dedução na-
tural apresentados no capítulo anterior. Para dar conta de tudo isso,
veremos também que será necessário estender os conceitos semânticos
da LVF apresentados no Capítulo 12.
42.1 Interpretações da LM
A grande ideia por trás da semântica da LM é que as sentenças não
são apenas verdadeiras ou falsas e ponto őnal. Dizemos que uma sen-
tença é verdadeira ou falsa em um dado mundo possível. Assim, a mesma
sentença pode muito bem ser verdadeira em alguns mundos, mas falsa
em outros. Grosso modo, dizemos que □A é verdadeira se e somente
se A é verdadeira em todos os mundos possíveis, e ^A é verdadeira se
e somente se A é verdadeira em algum mundo.
Precisamos reőnar essa ideia e torná-la mais precisa. Para fazer
isso, vamos especiőcar o que é uma interpretação para a LM. A primeira
coisa que você precisa incluir em uma interpretação é uma coleção de
mundos possíveis. Mas, o que exatamente é um mundo possível? A ideia
por trás da noção de mundo possível é a mesma que suscita a noção
373
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 374
Até agora, todas essas regras devem parecer muito familiares. Es-
sencialmente, todas elas funcionam exatamente como as tabelas de ver-
dade para a LVF. A única diferença é que na LM as regras das tabelas
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 376
1 2
A ¬A
¬B B
¬A ⊨K ¬^A
¬A A
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 379
a ele. Portanto, como tudo o que for provado dentro de uma subprova
estrita é verdadeiro em todos os mundos possíveis acessíveis a w, então
□B é verdadeira w. É por isso que □I é uma regra correta.
▷ ∀wRww
Isto signiőca que todo mundo acessa ele próprio. Com essa restrição
podemos introduzir uma nova relação de consequência, ⊨T , como se-
gue:
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 381
m □A
A □E m
Para justiőcar a regra □E, é suőciente mostrar que não existe uma
contrainterpretação para:
□A ⊨T A
Caso existisse, precisaríamos construir uma interpretação na qual
□A fosse verdadeira em algum mundo w, mas A fosse falsa nesse
mundo. Neste caso teríamos:
(3) Rww.
De (1) podemos concluir que A deve ser verdadeira em todos os mun-
dos acessíveis a w, em particular nele próprio, pois em (3) temos que
Rww. Logo:
(4) A é verdadeira em w.
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 382
▷ ∀w 1 ∀w 2 ∀w 3 ((Rw 1w 2 ∧ Rw 2w 3 ) → Rw 1w 3 )
m □A
□
□A R4 m
Lembramos que a ideia por trás das subprovas estritas é que elas
são maneiras de provar coisas que devem ser verdadeiras em todos os
mundos acessíveis. Assim, a regra R4 signiőca que sempre que □A for
verdadeira em um mundo, □A também deve ser verdadeira em todos
os mundos acessíveis a este mundo. Logo, devemos ter □A ⊨S4 □□A.
Para constatar isso, tente construir uma contrainterpretação para
esta aőrmação:
□A ⊨S4 □□A
Precisaríamos construir uma interpretação na qual □A seja verda-
deira em um dado mundo w 1 , mas □□A falsa nesse mundo. Assim
teríamos:
(1) □A é verdadeira em w 1 e (2) □□A é falsa em w 1 .
De (2) se segue que w 1 deve acessar algum mundo w 2 , no qual □A é
falsa. Logo, existe um w 2 tal que:
(3) Rw 1w 2 e (4) □A é falsa em w 2 .
De (4) podemos concluir que w 2 deve acessar algum mundo w 3 , no
qual A é falsa. Logo, existe um w 3 tal que:
(5) Rw 2w 3 e (6) A é falsa em w 3 .
Como a relação de acessibilidade é transitiva, de (3) e (5) temo que w 1
acessa w 3 , isto é:
(7) Rw 1w 3 .
Mas, de (1) podemos concluir que A é verdadeira em todo mudo aces-
sível a w 1 , em particular, verdadeira em w 3 . Assim:
(8) A é verdadeira em w 3 .
De (6) e (8), temos que A é verdadeira e falsa em w 3 . Contradição!
Portanto, não há uma interpretação na qual □A seja verdadeira em
um dado mundo, mas □□A falsa nesse mundo. Consequentemente,
□A ⊨S4 □□A é válido.
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 384
▷ ∀w 1 ∀w 2 (Rw 1w 2 → Rw 2w 1 )
m ¬□A
□
¬□A R5 m
(7) Rw 3w 1 .
(8) Rw 3w 2
Mas, de (6) se segue que □A é verdadeira em w 3 e consequentemente,
A é verdadeira em todos os mundos que w 3 acessa, em particular w 2 ,
pois em (8) temos que Rw 3w 2 . Logo:
(9) A é verdadeira em w 2 .
▷ ∀w 1 ∀w 2 Rw 1w 2
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 386
Isto signiőca que todo mundo acessa todo mundo. Usando essa restri-
ção na relação de acessibilidade, poderíamos ter deőnido ⊨S5 assim:
Exercícios
A. Apresente contrainterpretações para as quatro seguintes aőrmações
falsas:
1. ¬P ⊨K ¬^P
2. □(P ∨ Q ) ⊨K □P ∨ □Q
3. ⊨K ¬□(A ∧ ¬A)
4. □A ⊨K A
1. □(M → O ), ^M ⊨T O
2. □A ⊨T □□A
1. ^A ⊨S4 □^A
2. ^A, □(^A → B) ⊨S4 □B
CAPÍTULO 42. SEMÂNTICA PARA A LM 387
Leitura adicional
A lógica modal é um grande subcampo da lógica. Nós apenas arra-
nhamos a superfície. Se você quiser aprender mais sobre lógica modal,
aqui estão alguns livros que você pode consultar:
Metateoria
388
CAPÍTULO 43
Formas
normais
43.1 Forma Normal Disjuntiva
Às vezes é útil considerar grupos restritos de sentenças com formas
particularmente simples. Por exemplo, podemos considerar o grupo
restrito formado pelas sentenças atômicas e pelas sentenças que são
negações de sentenças atômicas:
A3
A ∧ ¬B
¬C
¬ J ∧ ¬A 3 ∧ C
F2 ∧ J
..
.
389
CAPÍTULO 43. FORMAS NORMAIS 390
literais:
A
A ∧ ¬B ∧ C
(A ∧ B) ∨ (A ∧ ¬B)
(A ∧ B) ∨ (A ∧ B ∧ C ∧ ¬D ∧ ¬E)
A ∨ (C ∧ ¬P 234 ∧ P 233 ∧ Q ) ∨ ¬B
..
.
A B C S
V V V V
V V F F
V F V V
V F F F
F V V F
F V F F
F F V V
F F F V
Note que S é verdadeira em quatro linhas da tabela de verdade: nas
linhas 1, 3, 7 e 8. Na linha 1 de nossa tabela, as três letras sentencias ‘A’,
‘B’ e ‘C ’ são verdadeiras. Utilizamos esta informação para construir
uma sentença que será verdadeira nesta linha e falsa em todas as outras.
A sentença é:
A ∧B ∧C
Note que uma conjunção só é verdadeira quando todos os seus conjun-
tos são verdadeiros. Então esta conjunção só será verdadeira quando
‘A’, ‘B’ e ‘C ’ forem. Ou seja, só na linha 1 da tabela de S.
Fazemos a mesma coisa com as outras linhas da tabela em que S é
verdadeira. A próxima delas é a linha 3, onde as colunas de referência
indicam que ‘A’ é verdadeira, ‘B’ é falsa e ‘C ’ é verdadeira. Utilizamos
esta informação para construir uma sentença que será verdadeira nesta
linha e falsa em todas as outras. A sentença é:
A ∧ ¬B ∧ C
(A ∧ B ∧ C ) ∨ (A ∧ ¬B ∧ C ) ∨ (¬A ∧ ¬B ∧ C ) ∨ (¬A ∧ ¬B ∧ ¬C )
Repare que, devido à sua construção, esta sentença terá uma tabela
de verdade idêntica à da sentença S. Será verdadeira exatamente nas
linhas 1, 3, 7 e 8, e falsa nas demais; exatamente como S. Ou seja,
esta sentença é logicamente equivalente a S. Repare também que esta
sentença é uma disjunção de conjunções de literais. Ou seja, é uma sen-
tença na FND. Ela é, então, a sentença que queríamos. Uma sentença
na FND que é logicamente equivalente a S.
Partimos de uma sentença qualquer e construímos uma sentença na
FND logicamente equivalente à sentença original. A estratégia que uti-
lizamos para esta construção não depende de nenhuma característica
especíőca de S. S é uma sentença qualquer e por isso nossa estratégia é
completamente geral. Podemos, então, utilizá-la como base para cons-
truir uma prova do teorema da forma normal disjuntiva da seguinte
forma.
(±A1 ∧ . . . ∧ ±An )
CAPÍTULO 43. FORMAS NORMAIS 394
Exercícios
A. Para cada uma das 6 sentenças abaixo apresente duas outras senten-
ças logicamente equivalentes à sentença original. Uma delas na FND e
outra na FNC.
1. (A → ¬B)
2. ¬(A ↔ B)
3. (¬A ∨ ¬(A ∧ B))
4. (¬(A → B) ∧ (A → C ))
5. (¬(A ∨ B) ↔ ((¬C ∧ ¬A) → ¬B))
6. ((¬(A ∧ ¬B) → C ) ∧ ¬(A ∧ D))
CAPÍTULO 44
Conectivos
funcional-
mente
completos
Dos conectivos da LVF, a negação, simbolizada por ‘¬’, é o único co-
nectivo de um lugar (unário), ou seja, que se liga a uma única sentença.
Todos os outros são conectivos de dois lugares (binários) e se ligam a
exatamente duas sentenças, embora possamos imaginar conectivos de
n lugares (n-ários), que se ligariam a n sentenças. Por exemplo, pode-
ríamos propor um conectivo de três lugares cujo símbolo poderia ser
um coração, ‘♥’, e estipular que ele tem a seguinte tabela de verdade
característica:
397
CAPÍTULO 44. CONECTIVOS FUNCIONALMENTE COMPLETOS 398
A B C ♥(A, B, C )
V V V F
V V F V
V F V V
V F F F
F V V F
F V F V
F F V F
F F F F
Tal conectivo provavelmente não corresponde nem aproximadamente
a nenhuma expressão do português. Pelo menos não do jeito que ‘∧’
corresponde a ‘e’, por exemplo. Independentemente disso, há uma
questão interessante a ser feita aqui. Suponha que queremos construir
uma sentença que diz exatamente o que ‘♥(A, B, C )’ diz, ou seja: uma
sentença tautologicamente equivalente a ‘♥(A, B, C )’, cuja tabela é idên-
tica à tabela de ‘♥(A, B, C )’. Será que para fazer isso nós precisamos
adicionar à LVF o conectivo ‘♥’ e sua tabela característica? Ou será
que para dizer o que ‘♥(A, B, C )’ diz, os conectivos que já existem na
LVF bastam?
Vamos refazer esta pergunta de um modo mais geral e preciso. An-
tes disso, aqui vai um pouco de vocabulário: chamemos um grupo de
conectivos de conjunto funcionalmente completo se e somente se formos
capazes de construir qualquer tabela de verdade usando apenas conec-
tivos pertencentes a esse grupo.
A partir da deőnição acima podemos refazer de maneira mais pre-
cisa a nossa pergunta: será que o conjunto total de conectivos da LVF,
{¬, ∧, ∨, →, ↔}, é funcionalmente completo?
(A ∧ B ∧ ¬C ) ∨ (A ∧ ¬B ∧ C ) ∨ (¬A ∧ B ∧ ¬C )
é suőciente para mostrar que {¬, ∧} também é, uma vez que nos dá
um método para substituir disjunções por conjunções combinadas com
negações.
1 Considere, por exemplo, uma sentença com os três tipos de conectivos, tal como
‘((¬A∧B)∨¬C )’. É fácil ver como a aplicação desta equivalência transforma esta sentença
em uma que contém apenas disjunção e negação:
((¬A ∧ B) ∨ ¬C ) ⇐⇒ (¬(¬¬A ∨ ¬B) ∨ ¬C )
a sentença da direita é equivalente à da esquerda e só emprega ‘¬’ e ‘∨’.
CAPÍTULO 44. CONECTIVOS FUNCIONALMENTE COMPLETOS 400
¬A e (A ↑ A)
(A∨ B) e ((A ↑ A) ↑ (B ↑ B))
¬A e (A ↓ A)
(A∧ B) e ((A ↓ A) ↓ (B ↓ B))
Provando
equivalências
45.1 Substituibilidade de equivalentes
Na Seção 12.2 vimos que duas sentenças P e Q são equivalentes (na
LVF) se e somente se para toda valoração seus valores de verdade são
idênticos. Vimos também muitos exemplos disso e usamos tabelas de
verdade e provas em dedução natural para mostrar tais equivalências.
No Capítulo 43, provamos que toda sentença da LVF é equivalente
a uma sentença na forma normal conjuntiva e a uma outra na forma
normal disjuntiva. Se P e Q são equivalentes, elas sempre têm o mesmo
valor de verdade, qualquer uma sustenta a outra, e partir de qualquer
uma delas você pode provar a outra.
Duas sentenças não precisam ser idênticas para serem equivalentes:
as sentenças ‘¬¬A’ e ‘A’ têm sempre o mesmo valor de verdade, mas
a primeira começa com o símbolo ‘¬’, enquanto a segunda não. Mas
você pode se perguntar: dado um par de sentenças equivalentes, sem-
pre que substituímos uma sentença pela outra, os resultados também
são equivalentes? Por exemplo, considere as sentenças ‘¬¬A → B’ e
‘A → B’. Veja que a segunda sentença é o resultado de substituir ‘¬¬A’
por ‘A’ na primeira. E essas duas sentenças também são equivalentes.
Esse é um fato geral e não é difícil ver porque é verdadeiro. Em
qualquer valoração, calculamos o valor de verdade de uma sentença
"de dentro para fora". Então, para determinar o valor de verdade da
senteça ‘¬¬A → B’, primeiro calculamos o valor de verdade de ‘¬¬A’ e
404
CAPÍTULO 45. PROVANDO EQUIVALÊNCIAS 405
Isso signiőca que, uma vez que tenhamos mostrado que duas sen-
tenças são equivalentes (por exemplo., ‘¬¬A’ e ‘A’, ou ‘A ∧ B’ e ‘B ∧ A’)
CAPÍTULO 45. PROVANDO EQUIVALÊNCIAS 406
(5) (¬S ∨ ¬T )
Portanto, podemos substituir em (4) a parte ‘¬(S ∧ T )’ por (5), cujo
resultado é a seguinte sentença:
(6) (¬R ∧ (¬S ∨ ¬T ))
¬( R ∨ (S ∧ T ) )
(¬( R ∧¬ (S ∧ T ) ) DeM
(¬(R ∧ ¬( S ∧ T ) )
(¬(R ∧ (¬ S ∨ ¬ T ) ) DeM
¬¬P ⇔ P (EDN)
(P → Q) ⇔ (¬P ∨ Q) (Cond)
¬(P → Q) ⇔ (P ∧ ¬Q)
(P ∨ Q) ⇔ (Q ∨ P) (Comut)
(P ∧ Q) ⇔ (Q ∧ P)
(P ∨ P) ⇔ P (Id)
(P ∧ P) ⇔ P
(P ∧ (P ∨ Q)) ⇔ P (Abs)
(P ∨ (P ∧ Q)) ⇔ P
(P ∧ (Q ∨ ¬Q)) ⇔ P (Simp)
(P ∨ (Q ∧ ¬Q)) ⇔ P
(P ∨ (Q ∨ ¬Q)) ⇔ (Q ∨ ¬Q)
(P ∧ (Q ∧ ¬Q)) ⇔ (Q ∧ ¬Q)
A dupla negação pode ser removida, uma vez que ‘¬¬A’ é equivalente
a ‘A’:
Exercícios
A. Considere as seguintes sentenças:
1. (A → ¬B)
2. ¬(A ↔ B)
3. (¬A ∨ ¬(A ∧ B))
4. (¬(A → B) ∧ (A → C ))
5. (¬(A ∨ B) ↔ ((¬C ∧ ¬A) → ¬B))
6. ((¬(A ∧ ¬B) → C ) ∧ ¬(A ∧ D))
Para cada sentença, encontre uma sentença equivalente na FND e outra
na FNC, fornecendo uma cadeia de equivalências. Use (Id), (Abs) e
(Simp) para simpliőcar suas sentenças o máximo possível.
CAPÍTULO 46
Teorema da
correção
Neste capítulo vamos relacionar os dois aspectos distintos nos quais
estudamos a LVF: a sua semântica, dada pelas tabelas de verdade (es-
tudadas na Parte III), e o seu sistema formal, dado pelo sistema de
dedução natural (apresentado na Parte VI). Nós vamos comprovar que
o sistema formal da LVF é correto: através dele só conseguimos provar
formalmente a validade de argumentos que são de fato válidos quando
analisados via tabelas de verdade. Intuitivamente, um sistema formal é
correto quando é impossível, através dele, provar quaisquer argumen-
tos inválidos. Obviamente esta é uma propriedade altamente desejável.
Ela nos diz, quando satisfeita, que o sistema formal de provas nunca
nos levará ao erro. Na verdade, se o nosso sistema formal não fosse
correto, nós não poderíamos conőar nas provas feitas através dele. O
objetivo deste capítulo é provar que o sistema formal de provas da LVF
apresentado na Parte VI é correto.
Vamos tornar essa ideia mais precisa. Em primeiro lugar, um pouco
de notação.
▷ Nós vamos usar a letra maiúscula grega Γ (gama) como abrevia-
ção para uma lista qualquer de sentenças A1, A2, . . . , An .
▷ Vamos também nos lembrar que o símbolo ‘⊨’ indica sustentação.
Ou seja, Γ ⊨ C denota que as sentenças de Γ sustentam C e, por
413
CAPÍTULO 46. TEOREMA DA CORREÇÃO 414
1 F → (G ∧ H )
2 F
3 G ∧H →E 1, 2
4 G ∧E 3
5 F →G →I 2–4
F → (G ∧ H ) ⊨ F → (G ∧ H )
F → (G ∧ H ), F ⊨ F
As linhas 3 e 4, por sua vez, serão inocentes se elas forem sustentadas
pelas suposições não descartadas neste setor da prova. Ou seja, as
linhas 3 e 4 serão inocentes, respectivmente, se
F → (G ∧ H ), F ⊨ G ∧ F
F → (G ∧ H ), F ⊨ G
Não é difícil veriőcar que isso de fato se dá nos dois casos. Com relação
à linha 5, repare que ela depende apenas da suposição da linha 1, uma
vez que a suposição da linha 2 foi descartada na passagem da linha
4 para a 5, quando sua subprova foi őnalizada. Então a linha 5 será
inocente se
F → (G ∧ H ) ⊨ F → G
o que, novamente, não é difícil de veriőcar em uma tabela de verdade.
O que nós queremos mostrar é que não é por mera coinciência que
todas as linhas desta prova são inocentes.
trações (provas) com alguma marca. Vamos, neste capítulo, nos exercitar nesta prática,
usando o símbolo ‘♦’ para fazer este papel.
CAPÍTULO 46. TEOREMA DA CORREÇÃO 417
▷ ‘∆i ’ abreviará a lista das suposições (se houver) das quais a linha
i da prova analisada depende.
▷ ‘Si ’ denotará de modo genérico a sentença da linha i da prova
analisada.
▷ Com estas duas notações, podemos fazer a seguinte abreviação:
Aqui vale a pena sermos bem minuciosos. Repare que esta notação
está fazendo uma aőrmação condicional. Seu antecedente (para todo
i < n, ∆i ⊨ Si ) equivale à aőrmação de que todas as linhas anteriores à
linha n são inocentes, e seu consequente (∆n ⊨ Sn ) equivale à aőrmação
de que a linha n é inocente. Ou seja, a notação ‘se (para todo i < n,
3 Esta prova do Lema da Inocência poderia ser apresentada de modo mais preciso e
conciso se explicitássemos o uso que fazemos do princípio da indução finita (PIF). O PIF
fornece um poderoso método de prova muito empregado nas demonstrações de resulta-
dos metatetóricos sobre a lógica. Optamos por ocultar a referência explícita ao PIF nesta
prova por razões de economia didática. Nós mencionamos este princípio anterioremente
no Capítulo 33 - Correção e Completude, quando falamos ali de provas indutivas. Vale apena
rever.
CAPÍTULO 46. TEOREMA DA CORREÇÃO 419
i A
j B
n A∧ B ∧I i , j
(2) ∆i ⊨ A
(4) ∆n ⊨ A
(5) ∆n ⊨ B
4 ∆ só poderia ter alguma sentença ausente em ∆ se a linha i estivesse em uma sub-
i n
prova őnalizada em linha anterior à linha n. Mas se este fosse o caso, nós não poderíamos
usar a linha i na aplicação da regra ∧I.
CAPÍTULO 46. TEOREMA DA CORREÇÃO 420
i A∧ B
n A ∧E i
5 Para entender melhor este passo da prova considere v uma valoração qualquer que
m A∨ B
i A
j C
k B
l C
n C ∨E m, i – j , k –l
O mesmo raciocínio feito nos lemas anteriores nos assegura que não
há sentença em ∆m que não esteja também em ∆n . Portanto, como, por
(1), ∆m ⊨ A∨ B, então
(2) ∆n ⊨ A∨ B
Mas se, conforme (2), qualquer valoração que faz todas as sentenças de
∆n verdadeiras, faz também A ∨ B verdadeira, então as propriedades
da tabela de verdade da disjunção asseguram que qualquer valoração
que faz todas as sentenças de ∆n verdadeiras faz A verdadeira ou faz
B verdadeira. Ou seja, de (2) temos que:
(3) ∆n ⊨ A ou ∆n ⊨ B
Vamos analisar estas duas alternativas:
CAPÍTULO 46. TEOREMA DA CORREÇÃO 422
Caso 1: ∆n ⊨ A .
Repare que, por (1),
(4) ∆ j ⊨ C
Repare também, através do esquema da regra representado
acima, que a única sentença em ∆ j que pode não estar em ∆n
é A. Então, de (4) temos:
(5) ∆n , A ⊨ C
Mas a hipótese deste caso é que ∆n ⊨ A. Então de (5) e desta
hipótese temos:
(6) ∆n ⊨ C
Caso 2: ∆n ⊨ B .
Raciocinando exatamente como no caso 1, considerando agora
que ∆l ⊨ C, também concluímos que
(7) ∆n ⊨ C
Assim, como (3) nos assegura que ∆n ⊨ A ou ∆n ⊨ B e como vimos
que em ambas essas alternativas ∆n ⊨ C, então concluímos incondici-
onalmente que ∆n ⊨ C, o que, de acordo com (*), őnaliza a prova do
lema.♦
i A
j ¬A
n ⊥ ¬E i , j
(2) ∆n ⊨ A
(4) ∆n ⊨ A∧ ¬A
Mas note que (5) aőrma que nenhuma valoração faz todas as sentenças
de ∆n verdadeiras. Ou seja, (5) está dizendo que a condição (a) exi-
gida para qualquer contraexemplo de (6) é impossível. Nunca ocorre.
Então (5) garante que (6) não tem contraexemplo: (6) não será falsa
em nenhuma situação que respeite o que (5) diz. É isso que nos auto-
riza concluir (6) a partir de (5) e ter conőança de que não cometemos
nenhum erro.
A estranheza desta passagem se dá porque, apesar de aceitarmos
(6) como verdadeira, a propriedade que (6) expressa sobre as valora-
ções não é instanciada por nenhuma valoração, quando (5) é mesmo
verdadeira. Nenhuma valoração satisfaz as condições de aplicabilidade
de (6). Ela é verdadeira apenas porque não tem contraexemplo que a
falsiőque.
O caso da aőrmação (6) é similar, por exemplo, ao da seguinte
aőrmação:
(7) Todas as pessoas com mais de 400 anos têm três pés.
A propriedade sobre as pessoas que a aőrmação (7) expressa não
é instanciada por ninguém. Nenhuma pessoa satisfaz a condição de
aplicabilidade da propriedade (7), já que ninguém tem mais de 400
anos. Mas note que ao não ser instanciada, (7) não tem contraexemplo.
Um contraexemplo para (7) seria dado por uma pessoa que tivesse mais
de 400 anos e não tivesse três pés. Como ninguém tem mais de 400
anos, (7) não tem contraexemplo.
A convenção clássica estabelecida é considerar vacuamente verdadei-
ras sentenças como (6) e (7) que não são instanciáveis. São classiőcadas
como verdadeiras porque não têm contraexemplo, mas são rotuladas de
vacuamente verdadeiras porque não têm instâncias. Tratamos rapida-
mente deste assunto no âmbito da LPO na Seção 15.2.
CAPÍTULO 46. TEOREMA DA CORREÇÃO 425
i A
j ⊥
n ¬A ¬I i – j
(2) ∆ j ⊨ ⊥ e
(3) ∆i ⊨ A
(6) ∆n , A ⊨ ⊥
Então, pelo mesmo racioncínio de contraposição usado no Lema da
regra ¬E, de (6) nós podemos inferir que
(7) nenhuma valoração faz todas as sentenças de ∆n e A verdadeiras.
Ou seja, de acordo com (7), A tem que ser falsa em qualquer valoração
onde todas as sentenças de ∆n são verdadeiras. Então,
Reescrita segundo nossa notação, (8) diz que ∆n ⊨ ¬A; e isso, de acordo
com (*), őnaliza a prova o lema.♦
Prova. Suponha que tenhamos usado uma regra derivada para obter
alguma sentença, A, na linha n de alguma prova da LVF, e que todas
as linhas anteriores da prova são inocentes. Mas qualquer uso de uma
regra derivada é, na verdade, uma abreviação de vários usos das re-
gras básicas de inferência. Ou seja, poderíamos ter usado apenas as
regras básicas para obter a sentença A em alguma linha n + k , sem a
introdução de quaisquer outras suposições. Portanto, aplicando várias
vezes (exatamente k + 1 vezes) os resultados já demonstrados de que
todas as regras básicas são conőáveis, concluímos que a linha n + k é
inocente. Conseqüentemente, a regra derivada é conőável.♦
É isso! Provamos que todas as regras (básicas ou não) são conőá-
veis, e assim completamos a prova do Lema da Inocência e őnalizamos
a demonstração do Teorema da Correção.
CAPÍTULO 46. TEOREMA DA CORREÇÃO 427
O fim e o começo...
Demonstramos que o sistema formal de provas da LVF que aprende-
mos neste livro é Correto. Isto signiőca que qualquer prova formal que
őzermos nesse sistema será a prova de um argumento válido de acordo
com a semântica das tabelas de verdade. O nosso sistema de provas
é correto; ele jamais produzirá a prova de um argumento que não seja
válido.
E como őzemos a demonstração disso? Bem, lembre que uma prova
formal é apenas uma seqüência (de comprimento arbitrário) de aplica-
ções de regras. Mostramos que nenhuma aplicação individual de qual-
quer regra nos levará ao erro. Segue-se (por indução) que nenhuma
prova formal (sequência őnita de aplicações de regras) nos levará ao
erro. Ou seja: nosso sistema de provas é correto.
Fazer isso deu um pouco de trabalho. Tivemos que introduzir no-
tações, deőnições, propor e demonstrar lemas e organizar tudo de um
modo bastante detalhado, o que consumiu umas boas páginas deste
texto e exigiu alguns de seus neurônios para acompanhar tudo. Mas a
ideia geral da Correção de um sistema formal é simples e, no caso da
LVF, além de simples ela, desde o princípio, pareceu plausível, quase
óbvia. Este é um excelente exemplo do tipo de desaőo geral que a ló-
gica coloca a quem se atreve a estudá-la e, por isso, é um ótimo ponto
para őnalizar este livro. O livro termina aqui, mas a lógica não termina
com ele. Ela está apenas começando. Esperamos por você nas nossas
próximas aventuras.
Exercícios
A. Complete os Lemas deste capítulo que foram deixados como exer-
cícios. Ou seja, mostre que as seguintes regras são conőáveis:
428
APÊNDICE A
Notação
simbólica
1.1 Nomenclatura alternativa
Lógica verofuncional. A LVF também é conhecida por outros no-
mes. Às vezes é chamada de lógica sentencial, porque lida fundamen-
talmente com sentenças. Às vezes é chamada de lógica proposicional,
a partir da ideia de que trabalha fundamentalmente com proposições.
Preferimos continuar usando lógica verofuncional, para enfatizar o fato
de que ela lida apenas com atribuições de verdade e falsidade a sen-
tenças, e que seus conectivos são todos verofuncionais.
429
APÊNDICE A. NOTAÇÃO SIMBÓLICA 430
negação ¬, ∼
conjunção ∧, &, ·
disjunção ∨
condicional →, ⊃
bicondicional ↔, ≡
quantiőcador universal ∀x, (x)
APÊNDICE B
Sistemas
formais
alternativos
Ao formular nosso sistema de dedução natural, tratamos certas regras
de dedução natural como básicas, e outras como derivadas. No entanto,
poderíamos igualmente ter considerado várias regras diferentes como
básicas ou derivadas. Ilustraremos este ponto considerando alguns tra-
tamentos alternativos de disjunção, negação e quantiőcadores. Tam-
bém explicaremos por que őzemos as escolhas que őzemos.
433
APÊNDICE B. SISTEMAS FORMAIS ALTERNATIVOS 434
m A∨ B
i A
j C
k B
l C
n A→ C →I i – j
n+1 B→ C →I k –l
n+2 ¬C
n+3 A
n+4 C →E n + 3, n
n+5 ⊥ ¬E n + 2, n + 4
n+6 ¬A ¬I n + 3–n + 5
n+7 B SD m, n + 6
n+8 C →E n + 7, n + 1
n+9 ⊥ ¬E n + 2, n + 8
n + 10 C PI n + 2–n + 9
m A
n−1 B
n ¬B
¬A ¬I* m–n
m ¬A
n−1 B
n ¬B
A ¬E* m–n
m A(. . . c . . . c . . .)
k ∃xA(. . . x . . . c . . .)
Isso ainda não é permitido, já que neste novo sistema não temos a
regra ∃I. Podemos, no entanto, oferecer o seguinte:
m A(. . . c . . . c . . .)
m+1 ¬∃xA(. . . x . . . c . . .)
m+2 ∀x¬A(. . . x . . . c . . .) TQ m + 1
m+3 ¬A(. . . c . . . c . . .) ∀E m + 2
m+4 ⊥ ¬E m + 3, m
m+5 ∃xA(. . . x . . . c . . .) PI m + 1–m + 4
4 Warren Goldfarb segue esta linha em Deductive Logic, 2003, Hackett Publishing Co.
APÊNDICE B. SISTEMAS FORMAIS ALTERNATIVOS 437
m ∃xA(. . . x . . . x . . .)
i A(. . . c . . . c . . .)
j B
k B
m ∃xA(. . . x . . . x . . .)
i A(. . . c . . . c . . .)
j B
k A(. . . c . . . c . . .) → B →I i – j
k +1 ¬B
k +2 ¬A(. . . c . . . c . . .) MT k , k + 1
k +3 ∀x¬A(. . . x . . . x . . .) ∀I k + 2
k +4 ¬∃xA(. . . x . . . x . . .) TQ k + 3
k +5 ⊥ ¬E k + 4, m
k +6 B PI k + 1–k + 5
Referência
rápida
3.1 Tabelas-verdade típicas
A ¬A A B A∧ B A∨ B A→ B A↔ B
V F V V V V V V
F V V F F V F F
F V F V V F
F F F F V V
439
APÊNDICE C. REFERÊNCIA RÁPIDA 440
Predicados
Identidade
Há no máximo F (s).
Uma maneira de dizer ‘há no máximo n F (s)’ é colocar um
sinal de negação antes da simbolização para ‘há pelo me-
nos n + 1 F [(s)’. De forma equivalente, ] podemos oferecer:
um ∀x 1 ∀x 2 (F (x [ 1 ) ∧ F (x 2 )) → x 1 = x 2
dois ∀x 1 ∀x 2 ∀x 3 (F (x 1 ) ∧ F (x 2 ) ∧ ]F (x 3 )) →
(x 1 = x 2 ∨ x 1 =[ x 3 ∨ x 2 = x 3 )
três ∀x 1 ∀x 2 ∀x 3 ∀x 4 (F (x 1 ) ∧ F (x 2 ) ∧ F (x 3 ) ∧ F (x 4 )) →
(x 1 = x 2 ∨ x 1 = x 3 ∨ x 1 = x 4 ]∨
x 2 = x 3 ∨ x 2 =[ x 4 ∨ x 3 = x 4 )
n ∀x 1 . . . ∀x n+1 (F (x 1 ) ∧ . . . ∧
] F (x n+1 )) →
(x 1 = x 2 ∨ . . . ∨ x n = x n+1 )
Há exatamente F (s).
Uma maneira de dizer ‘há exatamente n F (s)’ é juntar as duas
simbolizações acima e dizer ‘há pelo menos n F (s) e há no má-
ximo n F (s)’. As seguintes fórmulas equivalentes são mais curtas:
APÊNDICE C. REFERÊNCIA RÁPIDA 442
Reiteração Negação
m A
i A
A Rm
j ⊥
¬A ¬I i – j
Conjunção m ¬A
n A
m A ⊥ ¬E m, n
n B
A∧ B ∧I m, n
m A∧ B
A ∧E m
Prova indireta
m A∧ B
B ∧E m i ¬A
j ⊥
A PI i – j
Condicional
i A
j B
Explosão
A→ B →I i – j
m A→ B
n A m ⊥
B →E m, n A ⊥E m
APÊNDICE C. REFERÊNCIA RÁPIDA 444
Disjunção Bicondicional
i A
m A j B
A∨ B ∨I m k B
l A
m A
A↔ B ↔I i – j , k –l
B∨ A ∨I m
m A↔ B
m A∨ B
n A
i A
B ↔E m, n
j C
k B m A↔ B
l C n B
C ∨E m, i – j , k –l A ↔E m, n
APÊNDICE C. REFERÊNCIA RÁPIDA 445
m A∨ B i A
n ¬A j B
B DS m, n k ¬A
l B
m A∨ B B LTE i – j , k –l
n ¬B
A DS m, n Regras de De Morgan
m ¬(A ∨ B)
Modus Tollens ¬A ∧ ¬B DeM m
m A→ B
m ¬A ∧ ¬B
n ¬B
¬(A ∨ B) DeM m
¬A MT m, n
m ¬(A ∧ B)
Eliminação da dupla
¬A ∨ ¬B DeM m
negação
m ¬¬ A m ¬A ∨ ¬B
A EDN m ¬(A ∧ B) DeM m
APÊNDICE C. REFERÊNCIA RÁPIDA 446
m ∀x A(x) m A(. . . c . . . c . . .)
∃xA(. . . x . . . c . . .) ∃I m
A(c) ∀E m
x não pode ocorrer em
A(. . . c . . . c . . .)
Introdução do universal
Eliminação do existencial
k c
m ∃x A(x)
m A(c)
i c A(c)
∀x A(x) ∀I k –m
j B
B ∃E m, i – j
(1) c não deve ocorrer fora da
subprova rotulada. c não deve ocorrer fora da subprova
(2) x não deve ocorrer em A( c) rotulada.
Introdução da identidade
c= c =I
Eliminação da identidade
m a= b m a= b
n A(. . . a . . . a . . .) n A(. . . b . . . b . . .)
A(. . . b . . . a . . .) =E m, n A(. . . a . . . b . . .) =E m, n
APÊNDICE C. REFERÊNCIA RÁPIDA 447
m ∀x¬A m ∃x¬A
¬∃xA TQ m ¬∀xA TQ m
m ¬∃xA m ¬∀xA
∀x¬A TQ m ∃x¬A TQ m
APÊNDICE C. REFERÊNCIA RÁPIDA 448
Glossário
antecedente – a sentença à esquerda do símbolo ‘→’ em um condici-
onal.
argumento – um grupo de sentenças que corresponde à expressão lin-
guística de um raciocínio. Uma delas é a conclusão a que se
chega e todas as outras são as premissas das quais se parte.
449
GLOSSÁRIO 450
regra de eliminação – são regras que nos permitem provar algo a par-
tir de uma sentença que tenha esse conectivo como operador
lógico principal.
regra de introdução – são regras que nos permitem provar uma sen-
tença que tenha esse conectivo como operador lógico princi-
pal.
relação – tipo especial de predicado que une (relaciona) dois ou
mais indivíduos. Relações podem ser binárias, como ‘
ama ’ que relaciona dois indivíduos, o que ama e o que é
amado, podem ser ternárias, como ‘ pegou emprestado
o de ’ que relaciona três indivíduos, quem pegou
emprestado, a coisa que foi emprestada e quem emprestou;
e também podem ser quaternárias ou, de um modo geral, n-
árias, para qualquer n őnito.
ppgfil
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM FILOSOFIA