Técnicas de Tradução
Técnicas de Tradução
Técnicas de Tradução
PLANO DE DISCIPLINA
EMENTA: Aspectos metodológicos do ensino da língua de sinais como segunda língua, por meio
do contexto e textualização em sinais articulado com o uso da língua e da prática da análise
linguística. Atividades metalinguísticas como instrumento de apoio para a discussão dos aspectos
da língua. Uso de recursos expressivos da língua que convêm às condições de produção do
discurso e às finalidades e objetivos do texto: expressões não manuais.Atividades de prática como
componente curricular.
OBJETIVO: Fornecer aos alunos subsídios teóricos e práticos para o exercício de docência em
Língua Brasileira de Sinais como segunda língua e/ou língua estrangeira (L2/LE) para pessoas
ouvintes.
BIBLIOGRAFIA:
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BIBLIOGRAFIA BÁSICA:
ALMEIDA FILHO, J. C. P. Dimensões comunicativas no ensino de línguas. Campinas: Pontes,
1998.
GESSER, A. Teaching and learning brazilian sign language as a foreign language: a
microethnographic description. 1999. 124 f. Dissertação (Mestrado em Letras), Universidade
Federal de Santa Catarina, 1999. Disponível em:
<https://repositorio.ufsc.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/80603/143145.pdf?sequence=1&is
Allowed=y>. Acesso em: 13 mar. 2016.
GESSER, Audrei. Um olho no professor surdo e outro na caneta: ouvintes aprendendo a
Língua Brasileira de Sinais. 2006. 221 f. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) –
Universidade Estadual de Campinas, 2006. Disponível em:
<file:///C:/Users/C%C3%ADntia/Downloads/GesserAudrei.pdf>. Acesso em 13 mar. 2016.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR:
BOHN, H. I. Avaliação de materiais. In: BOHN, H. I.; VANDRESEN, P. (orgs.) Tópicos de
linguística aplicada: o ensino de línguas estrangeiras. Série Didática. Florianópolis: Editora
UFSC, 1988. p.292-313.
BROWN, H. D. Principles of language learning and teaching. San Francisco State University:
Longman, 2000.
CORACINI, M. J.; BERTOLDO, E. S. (Orgs.) O desejo da teoria e a contingência da prática:
discursos sobre e na sala de aula (língua materna e língua estrangeira). Campinas: Mercado de
Letras, 2003.
FELIPE, T. A. LIBRAS em contexto: Curso Básico. Manual do estudante/cursista: Brasília:
MEC/SEESP, 2001.
FELIPE, T. A. LIBRAS em contexto: Curso Básico. Manual do professor/instrutor. Brasília:
MEC/SEESP, 2001.
CRONOGRAMA DE AULAS
Mês: julho/2018
Dia Tópicos/Atividades
Manhã: Concepções de metodologia de ensino de línguas
02/07
Tarde: metodologia de ensino de línguas estrangeiras
Manhã: o ensino da língua portuguesa no processo educacional da criança surda
03/07
Tarde: Operação global de ensino e as competências do professor
04/07 Manhã: Organização das aulas
Tarde: Organização das aulas
05/07 Manhã: aula prática
Tarde: aula prática
Manhã: aula prática
06/07
Tarde: aula prática
Manhã: aula prática
07/07
Entrega do texto dissertativo
__________________ ______________________
Assinatura do Professor Assinatura da Coordenação
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modismo, e alguns professores seguidores ortodoxos (que seguem uma doutrina, moral, dogma
como se fossem verdades absolutas) de uma ou outra tendência.
Em conformidade com a limitação das metodologias e aos seus “altos” e “baixos”
provenientes de alguns modismos na área, sugiro iniciar uma discussão descolada da imagem ideal
e normativa da prática de ensino, pois como veremos adiante, elas não correspondem à realidade e
especificidades que encontraremos cotidianamente nas salas de aula.
Em linhas gerais, pode-se afirmar que as metodologias de ensino de línguas orais têm
oscilado (balançado de um lado para outro) entre uma abordagem cujo foco é no uso da língua e
noutra com o foco na forma. Dentro destas duas visões antagônicas (opostas, contrárias) é delineado
o campo investigativo de ensino e aprendizagem de línguas e no qual um panorama geral dos
inúmeros métodos será introduzido posteriormente. Você deve estar se perguntando a esta altura:
(1) qual a diferença entre abordagem e metodologia de ensino? E, (2) o que significa uma
abordagem com foco na forma e outra com foco no uso da língua? Vamos por partes.
As terminologias na literatura especializada de ensino de línguas têm sido alvo de inúmeras
discussões e até confusões. Todo o conceito passa por releituras e refinamentos teóricos, e neste
sentido torna-se dependente das significações elaboradas por cada pesquisador. Você poderá
encontrar definições distintas ou equivalentes sobre um mesmo termo. Pense, por exemplo, sobre as
inúmeras definições na lingüística sobre o significante língua... É para evitar algumas ambigüidades
(obscuridade, imprecisão) e possíveis mal entendidos que se torna relevante, antes do início de
qualquer discussão, pontuar e situar o entendimento (sempre provisório!) dos conceitos utilizados.
Nesta disciplina, o termo metodologia será utilizado para se referir ao “estudo das práticas
pedagógicas de uma forma mais abrangente”, ou seja, o estudo dos métodos de uma forma geral
(Brown, 1994: 51). Abordagem é empregada como um conceito mais abstrato, indicador de um
conjunto de pressupostos, crenças e princípios teóricos sobre a natureza da língua(gem) e da
aprendizagem (Brown,1994: 51). Almeida Filho (1997a), na mesma linha de raciocínio, expande o
conceito, afirmando que abordagem é a filosofia de ensinar, ou seja, “a orientação do fazer do
professor”, e, por ser constituída por idéias mais abstratas, se mobiliza a orientar não somente os
métodos empregados para promover a experiência com e na língua alvo, mas todos os outros
elementos envolvidos no processo ensino-aprendizagem, a saber, o planejamento curricular, os
materiais, a produção/extensões das aulas e a avaliação.
Por ora, vejamos o esquema hierárquico proposto, em 1963, por Edward Anthony e refinado
por Brown (1994: 51):
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Vejam que na hierarquia proposta acima, dois outros termos estão inter- relacionados:
método e técnica. Método diz respeito a “um plano geral de apresentação sistemática da língua
baseado em uma abordagem” e técnica (na literatura especializada outros termos podem, algumas
vezes, ser utilizados como sinônimos de técnica. São eles: tarefa, procedimento, atividade,
exercício.
Retomando a segunda pergunta posta acima, que questiona a diferença sobre o significado
de uma abordagem de ensino com foco na forma e outra no uso de língua, o que dizer? Em linhas
gerais, pode-se afirmar que estas duas linhas mestras e orientadoras do processo ensino-
aprendizagem de línguas diferem em seus construtos teóricos a partir de, pelo menos, três
categorias de comparação (Brown, 1994; Almeida Filho, 1997a, 1998): o conceito de língua(gem);o
conceito de ensinar; o conceito de aprender
Através da análise destes conceitos, encontraremos traços distintivos que nos fazem
compreender quando uma abordagem é mais gramatical (forma) ou mais comunicativa (uso). Para a
abordagem de viés estrutural a língua(gem) deve ser entendida e estudada a partir da análise da
estrutura formal da língua alvo. Portanto, nesta abordagem se contempla o estudo da gramática, o
que inclui o estudo da sintaxe e da fonética, por exemplo. As regras e as funções destas regras
seriam o objeto de aprendizagem pelo aluno. No outro extremo, ou seja, para a abordagem
comunicativa, a língua(gem) é concebida com um instrumento de comunicação e interação social.
Os indivíduos são partícipes na construção discursiva, e de maneira sempre negociada buscam a
compreensão mútua que vai além da simples decodificação lingüística. Aspectos psicológicos,
sociais e culturais moldam também a comunicação verbal da língua de que fazem uso, e neste
sentido, tais aspectos comporiam o contexto de significados na interação.
A visão de ensino na abordagem gramatical usualmente se pauta em livros didáticos ou
materiais cujo objetivo é transmitir conteúdos da estrutura gramatical da língua alvo. Já na
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Aluno falando para a professora: “Agora estou começando a entender que o sucesso de
aprendizagem de línguas não depende exclusivamente das metodologias de ensino que o professor
utiliza, mas será que ensinar L1, L2 ou LE é tudo igual? O que estes termos significam?”
A situação descrita nos remete novamente a essa fase importante na nossa construção de
conhecimento: a definição dos termos. Na literatura especializada encontraremos algumas
divergências (opiniões contrárias), o que gera algumas confusões. Há uma tendência simplista em
se conceber os termos em uma perspectiva exclusivamente de ordem: L1 sendo a primeira língua
que falamos; L2 como a segunda; e língua estrangeira (LE) a língua como uma língua pertencente a
um povo de outro país. No Brasil, a Língua Inglesa, por exemplo, é – do ponto de vista nacional e
institucional – uma LE.
Entretanto, quando se começa a estudar contextos de minorias e contextos bi/multilingües,
tais definições parecem conturbar esse entendimento. E por que isso ocorre? Por que o status da
língua não deve ser definido apenas em relação à língua oficial ou nacional de um país e sim a partir
da perspectiva dos usuários, em suas respectivas comunidades de fala. No cenário brasileiro, temos
a língua portuguesa como língua primeira (L1) da maioria dos indivíduos, mas no caso dos surdos,
trata-se de uma língua segunda (L2). O mesmo pode proceder para algumas etnias indígenas e para
imigrantes alemães, italianos e japoneses, por exemplo. Além disso, o indivíduo pode ter mais do
que uma L2, como é o caso bem marcado dos indivíduos de países Africanos e Asiáticos (Ellis,
1994). O bi/multilingüismo é, conforme vimos na disciplina de Lingüística Aplicada, um fenômeno
mais recorrente e comum do que se pensa (Grosjean, 1996).
Neste material, portanto, entende-se como L1 (ou LM) a língua materna e natural do
indivíduo que funciona como meio de socialização familiar; L2 como aquela utilizada pelo falante
em função também de contatos lingüísticos na família, comunidade ou em escolas bilíngües (papel
social e/ou institucional), podendo a L2 ser ou não de uso oficial da sociedade envolvente (Ellis,
1994), e língua estrangeira (LE) próxima à definição de Almeida Filho (1998: 11): “língua dos
outros ou de outros, de antepassados, de estranhos, de dominadores, ou língua exótica”. Gostaria de
extrapolar, entretanto, um pouco mais no conceito de LE, pensando este nos contextos de línguas de
sinais. Tenho defendido (Gesser, 2006: 67) que na perspectiva de muitos ouvintes a LIBRAS é uma
“língua estrangeira” em seu sentido mais amplo, pois sabemos que a comunidade majoritária
ouvinte pertence a uma tradição oral – e aqui não me refiro em oposição à modalidade escrita –
que concebe a língua no sentido vocal-auditivo e não espaço-visual. Ao tratar a relação dos
ouvintes com a LS como “estrangeira” não estou levando em consideração somente questões de
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modalidades distintas, bem como o fato de a LS pertencer a uma minoria lingüística “invisível”, e
que não é falada e entendida na sociedade brasileira (cf. Cavalcanti, 1999a). Afinal, seria um
paradoxo chamar de “estrangeira” uma língua Brasileira de sinais, língua esta que está
contemplada – juntamente com mais de 200 línguas – no Livro de Registros das Línguas.. Enfim, o
uso (sempre entre aspas) da palavra “estrangeira” para fazer reflexões em torno da LS é – no
sentido de De Certeau (1994) – uma “tática/estratégia” que lanço mão para sensibilizar e pontuar
o quão alheia é a língua de sinais para a maioria dos ouvintes...
As definições são sempre complexas. Mas o que nos interessa por ora é que fique claro que
a literatura tem apontado diferenças na forma que a L1, L2 e LE são ensinadas, por sua vez
influenciadas pela distinção entre a noção de aquisição e aprendizagem (Krashen, 1981). Isto não
anula a possibilidade de se fazer paralelos, pois além de as teorias de aquisição de L1 iluminarem os
estudos de como se aprende línguas outras, há quem diga também que a aprendizagem de L1 em
contextos formais de sala de aula teria mais sucesso se adotasse as perspectivas de ensino de L2/LE.
Na nossa disciplina MEN em LIBRAS como L2 o foco esta voltado para a aprendizagem da
língua por alunos ouvintes. Então, os termos L2 e LE serão sempre relacionados nesta discussão,
pois assumo com Almeida Filho (1998: 12) que em toda aprendizagem de línguas há um processo
de desestrangeirização, podendo a língua-alvo tornar-se (ou não!) uma língua mais familiar para o
aprendiz. O status de L2/LE, a meu ver, serve tanto para se entender a relação de aprendizagem do
ouvinte com a LIBRAS, quanto a do surdo com o português.
Variados métodos são agrupados sob a abordagem gramatical e são desenvolvidos entre os
séculos XVIII e meados do século XX. As habilidades mais enfatizadas eram a escrita, as regras
gramaticais, a memorização de vocabulário e também traduções de textos, em função da
aprendizagem, no século XVIII, das línguas consideradas clássicas latim e grego – línguas estas
utilizadas pela elite letrada da época na religião, filosofia, política e negócios. Orientados pelo
Método Clássico, os professores eram considerados autoridades máximas, e centralizavam o ensino
nas habilidades de escrita e leitura, desconsiderando totalmente a comunicação oral. Com o passar
dos tempos – data-se que no século XIX – o Método Clássico começou a ser chamado de Método
da Tradução e Gramática; ainda que com uma nova “roupagem” mantinha suas características
originais. Este perdurou até o século XX com força e popularidade, pois “requer poucas habilidades
especializadas por parte dos professores” além do que “os testes de regras gramaticais e de tradução
são fáceis de construir e pode objetivamente ser pontuados na avaliação” Brown (1994: 53)
[tradução minha].
Registra-se que a primeira reação contra o Método da Tradução e Gramática teve seu inicio
por volta de 1920 (Celce-Murcia, 1991a: 4). Nesta onda, o argumento era de que parte gramatical
usada era inapropriada para a aprendizagem efetiva da língua inglesa, além do que muita ênfase era
dada em aprender sobre a língua e não em como usar a língua. Embora a tradução fosse relevante
quando a comunicação internacional era feita pelo latim escrito, as tentativas de uso e extensões de
ensino oral das línguas ficavam comprometidas, pois havia mais ênfase nas formas literárias e não
na linguagem natural falada pelos usuários.
Ainda que o Método Direto surja como alternativa ao Método de Tradução e Gramática, é
importante destacar, anteriormente, o Método Seriado (de Gouin) na nossa discussão, dado que
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não tem recebido muita atenção na profissão. Conforme ilustra Brown (1994), as idéias do francês
François Gouin foram ofuscadas pela proeminência do Método Direto. Gouin era professor de latim
e começou a elaborar algumas idéias, no final do século XX, a partir de sua própria experiência de
aprendizagem do alemão em idade avançada. Residiu em Hamburgo para aprender o idioma e o
fazia através de memorizações de verbos, palavras e da gramática da língua alemã. Resultou dessa
experiência um fracasso e concluiu que aprender uma língua é “transformar percepções em
conceitos” da mesma forma que fazem as crianças. Então, neste método a língua é ensinada
“diretamente (sem tradução) e conceitualmente (sem explicações das regras gramaticais) [a partir
de] uma série de sentenças conectadas que são facilmente percebíveis” (Brown, 1994: 55).
O Método Direto, todavia, ganha mais popularidade no século 20. Esse método,
desenvolvido pelo alemão Charles de Berliz, enfatizava as habilidades áudio- orais e o uso da
língua alvo pelo aluno, relegando como secundária a leitura e a escrita, pois acreditava que os
aprendizes poderiam confundir os sons com a grafia. Da mesma forma que o método de Gouin, a
premissa era de que o aprendizado de uma segunda língua deveria ser igual ao da primeira língua,
com interação natural e uma aprendizagem indutiva da gramática pelos alunos. Estes repetiam e
imitavam o modelo oferecido pelo professor. Critica-se este método especialmente por entender que
a linguagem praticada pelos alunos era a de sala de aula e não a linguagem que os alunos estariam
usando na vida real.
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O Método Direto entra, nos anos 30, em declínio e os currículos escolares voltam a enfatizar
o Método de Tradução e Gramática, enfatizando além da gramática, o ensino da língua através da
leitura. Permanece esta visão de leitura extensiva e intensiva agregada às explicações gramaticais
até mais ou menos o inicio da II Guerra Mundial. Neste cenário de conflito internacional, os
Estados Unidos precisavam de soldados comunicando em outras línguas (de aliados e de inimigos),
marcando a partir daí o início de “uma revolução no ensino de línguas”. A emergência para se
adquirir competência lingüístico-comunicativa pelos militares fomentou cursos intensivos com foco
em habilidades áudio-orais. Muitos investimentos foram feitos para se construir o que é atualmente
conhecido como “Programa de Treinamento Especializado do Exército”, popularmente, Método do
Exército. Dadas as necessidades dos soldados em guerra, a característica principal era a atividade
oral, com foco na conversação, prática de pronúncia e muita repetição. O olhar de várias
instituições voltou-se para este método, e seguido de adaptações e novas formulações o método do
exército é então denominado entre profissionais de ensino como Método Audiolingual. Mas quais
eram as suas bases teóricas?
O Método Audiolingual tornou-se dominante entre as décadas de 40 e início de 60 e,
embora seja orientado por alguns preceitos de Método Direto, há nele influências significativas das
teorias que estavam em voga: a lingüística estrutural e a psicologia comportamental. Há neles uma
supervalorização da língua falada, sustentando que o aprendizado estaria ligado ao comportamento
de reflexos condicionados. Para tanto, a habilidade de fala era desenvolvida a partir de imitações,
repetições e memorizações de palavras e frases. A pronúncia é enfatizada no lugar da gramática
(esta relegada a um plano menor), e laboratórios de línguas e materiais audiovisuais são criados e
intensamente utilizados no ensino. O enfoque, como se vê, recai para o uso da língua, mas concebe
o aprendizado com um “molde” de hábitos, centrado e manipulado pelo professor para evitar que
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alunos não cometessem erros. A popularidade do método começou a entrar em declínio e severas
críticas foram feitas: apontava-se que a língua não poderia ser adquirida somente pela repetição, ou
por formação de hábitos; e que erros não deveriam ser necessariamente evitados (Brown, 1994: 58).
Outra questão era a de que havia repetição de frases que eram incompreensíveis para os próprios
aprendizes, sem qualquer tipo de interação comunicativa. Coibia-se a liberdade de expressar formas
não treinadas, e por isso a criatividade e os interesses dos alunos não era sequer contemplado.
No período subseqüente (anos 70) os profissionais vivem certa revolução com a gramática-
gerativa de Chomsky, afirmando que o nativo de uma língua tem uma predisposição inata para
adquirir a língua, ou seja, possui uma “gramática universal”. A mente humana já está pré-
determinada biologicamente para adquirir uma língua, pois possui princípios rígidos internalizados.
Chomsky – ao desenvolver sua teoria da Gramática Universal – não estava tratando do aprendizado
de uma L2, mas sua teoria tem implicações e aplicações para esta área de conhecimento (cf.
Krashen). Esta abordagem, conhecida como racionalista (ou cognitiva), contrapõe-se com a
abordagem empiricista (behavorista) que fundamentou o método audiolingual. A primeira concebe
o uso da língua como uma função intelectual, onde a aprendizagem deve ser carregada de sentido:
saber uma língua é ser capaz de criar novas sentenças na língua. Já na segunda (empiricista)
concebe-se a língua como um hábito, de uso automático, imitativo, cuja aprendizagem recai na
memorização e exercícios repetitivos pautados em estímulos. Nesta atmosfera da abordagem
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cognitiva são formulados vários métodos: Silencioso, Comunitário, da Resposta Física Total,
Sugestopedia, e Natural.
O Método Silencioso, idealizado por Caleb Gateno em 1972, tem uma inclinação bastante
voltada para a resolução de problemas, ainda que Gateno pensasse em uma perspectiva humanista.
Nele, o aprendiz era motivado a descobrir o seu aprendizado sem ser ensinado, e por isso os
processos indutivos de ensino eram postulados pelo professor. Nesta perspectiva acreditava-se
promover a independência, a autonomia e a responsabilidade do aluno no processo da
aprendizagem da língua alvo. Atividades de resolução de problemas eram feitas, e o aluno levado a
descobrir ou criar novas produções ao invés de apenas repeti-las ou emita-las. Os professores, por
sua vez, ficam em silêncio, promovendo feedback através de sinais ou por intermediações com o
uso de objetos físicos. Todos os desafios são resolvidos pelo o aluno e o professor deve ficar fora de
cena para não intervir no processo. As críticas ao método referem-se ao fato de o professor ocupar
um papel muito distante, e neste sentido, provocar uma atmosfera menos interativa e comunicativa.
As falhas recaem no fato de que em muitos casos não há necessidade de o aluno ficar horas a fio
tentando resolver uma questão já que o professor pode interferir e rapidamente guiar este aluno sem
que este “sofra” tanto. A lição que esse método nos ensina é procurar permitir aos alunos – em
alguns momentos das nossas aulas – que se sintam desafiados para buscar respostas e não recebê-las
prontinhas a toda hora (Brown, 1994: 63).
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aumento das ondas cerebrais e baixa na pressão sangüínea e pulsos. Para atingir este estado “alfa”
na sala de aula, o professor utiliza músicas barrocas e assim, supunha, criava-se o estado de
concentração relaxada. O professor é responsável pela explicação do conteúdo, variando as
atividades de diálogo, drama e tradução, por exemplo. Os alunos são sugestionados e devem se
comportar de forma infantil para que o seu aprendizado fique mais aberto. Muitas críticas foram
feitas ao método, mas a principal está para o fato de se requerer do aluno uma quantidade excessiva
de memorização ao invés de entendimento da língua alvo. Contudo, pode-se tirar como sugestão a
possibilidade de se fomentar maneiras de tornar a sala de aula um ambiente mais relaxante e
tranqüilo para a aprendizagem de L2 (Brown, 1994: 61).
Tracy Terrel dedicou-se no desenvolvimento do Método Natural com base nos estudos de
aquisição de L2 do colega Krashen (krashen & Terrel, 1983). Utilizou alguns pressupostos do
Método da Resposta Física Total para argumentar que os alunos aprenderiam melhor se protelassem
a produção lingüística até que esta naturalmente surgisse. Neste sentido não há expectativa que os
alunos produzam linguagem logo de início, pois entendem que no processo há um “período
silencioso”. Da mesma forma que a aquisição de L1, o aprendiz de L2 passará por estágios de
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aprendizado, e tem a autonomia na sala de aula para decidir quando deve falar. Neste método a
comunicação é o objetivo primeiro e evita-se a correção de erros feitos pelos alunos. Para a
aprendizagem ocorrer o professor será aquele que promoverá o insumo lingüístico, e este deve ser
compreensível e ir um pouco além do nível do aluno. As atividades têm um caráter significativo e
são relacionadas com o mundo real de comunicação. Esta abordagem ensina aos professores que há
necessidade de respeitar o “tempo” dos alunos. Promover esta atmosfera permite aos alunos
decidirem quando produzir na língua alvo na qual estão expostos.
Encerramos este passeio histórico sobre as metodologias de ensino de línguas orais com o
Método de Ensino de Língua Comunicativo. Este tem seus idealizadores na Inglaterra, no final
dos anos 60 e início de 70, e é embasado, por exemplo, nos trabalhos de Michael Halliday. A
abordagem comunicativa começava a dar um tom mais humanista, focado em um processo mais
interativo para o ensino da língua. Assim, os cursos de línguas foram desenvolvidos e neles a língua
não era mais focada em descrições de conceitos gramaticais ou lexicais, e sim em sistemas de
significados necessários para o uso comunicativo (Almeida Filho, 1998). O professor de Lingüística
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Aplicada inglês David Wilkins desenvolve alguns significados para o uso comunicativo de línguas
destacando dois tipos: as categorias de funções comunicativas (pedidos, ofertas, recusas e queixas)
e as categorias nocionais (conceitos de quantidade, tempo, seqüência, freqüência, localização).
Estas estão articuladas e expandidas em seu livro “Planejamento Nocional” (Notional Syllabuses),
escrito em 1976. Embora o movimento comunicativo tenha as suas origens na tradição de estudos
de significação (semântica) na Europa, há também uma expansão nos Estados Unidos, na década de
70, fundamentado no trabalho de Dell Hymes (1972) e com a agregação de valores que enfatizam a
educação como instrumento de mudanças sociais. Inseridos nessa atmosfera do movimento
reconstrucionista, a língua passa a ser concebida para além de um simples processo de codificação e
decodificação, destacando os professores e alunos como agentes ativos, que se engajam no processo
ensino-aprendizagem através de atividades de negociação e construção de sentidos, e que dá vazão,
portanto, à produção criativa, imprevisível e singular da natureza interacional.
sua disposição dois livros didáticos, orientados basicamente por princípios cognitivistas. O livro
inicialmente usado e intitulado Um curso básico em ASL prioriza o conhecimento gramatical, e a
língua alvo é apresentada através de atividades de repetição de substituição ou de transformação do
exemplo proferido pelo professor, e também de atividades de pergunta e respostas. Estava também
a disposição dos professores o livro chamado Um curso básico em comunicação manual, cuja linha
mestra estava para o método audiolingual – neste caso o livro era composto de várias figuras para se
promover a prática da língua alvo.
Outro livro utilizado é a série denominada American Sign Language, cuja perspectiva de
ensino está pautada em um conceito “espiral” e também interativo, o que inclui, por um lado, um
aprofundamento do conteúdo na medida em que o conhecimento da língua ia progredindo, e por
outro, a oportunidade de o aprendiz praticar o conteúdo em pares e/ou em grupos. Com a
disseminação das descrições da ASL, os professores passam a incluir a discussão das características
lingüísticas da língua como objeto de ensino. Contudo, o conhecimento sobre a língua alvo, ainda
que efetivo pelos alunos, não dava conta de tornar os alunos usuários, “capazes de conversar
naturalmente em ASL”, ou seja, era possível observar que “os alunos não se sentiam confortáveis
em interações interculturais com os surdos” (Wilcox & Wilcox, 1997: 84). Resulta daí o
entendimento de que a competência gramatical/estrutural de uma língua é apenas uma parte do
processo de aprendizagem, já que questões de interação intercultural devem também ser enfatizadas
para efetivamente fluir no desempenho lingüístico.
Neste cenário, financiamentos do governo americano são liberados e um novo projeto
curricular é desenvolvido dentro de uma abordagem funcional, cuja ênfase está para a comunicação
pautada em funções lingüísticas do tipo saudações, como fazer solicitações, como dar
direcionamentos, etc. O projeto (“Sinalizando naturalmente”) foi desenvolvido na Califórnia e
provou ser uma orientação tanto mais efetiva para a aprendizagem da dos ouvintes com uma forma
de mostrar a complexidade da ASL. Inserem-se aí os postulados da abordagem comunicativa – ao
se propor a prática de uso de linguagem em situações reais através do ensino das funções, e também
cognitiva – ao se propor um foco em aspectos como pronúncia, marcações não-manuais,
habilidades expressivas e receptivas... (Wilcox & Wilcox, 1997). Os professores surdos americanos
têm sido encorajados a abordar o ensino comunicativamente, e no contexto de ensino da ASL, o
caminho percorrido das abordagens e metodologias parece ter sido o mesmo: inicia-se em uma
visão mais gramatical-estrutural para uma mais comunicativo-interativa.
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No Brasil, a discussão é incipiente (nova, que está no início), mas pode-se destacar o projeto
pioneiro coordenado por Tânia Felipe em 1993, intitulado “Metodologia do ensino de LIBRAS para
ouvintes”, que resulta na formulação do livro LIBRAS em Contexto – Curso Básico. Embora no
material não haja um esboço refletindo teoricamente as metodologias padrões de ensino de línguas
e as possíveis transposições e/ou aplicações no contexto da LIBRAS, pode-se encontrar algumas
orientações metodológicas postuladas pela equipe no capítulo Orientações para o aluno (Felipe,
2001a: 15). Vejamos o guia na íntegra:
Para que o aluno alcance um nível razoável em seu desempenho comunicativo, precisará
ter o desejo e oportunidade de se comunicar em LIBRAS, por isso as orientações metodológicas,
abaixo, servirão dos seguintes princípios gerais que nortearão o ensino/aprendizagem desta
língua:
● Evite falar durante as aulas: devido ao fato de as línguas de sinais utilizarem o
canal gestual-visual, muitos alunos ouvintes ficam tentados a falar em sua língua enquanto tentam
formular uma palavra ou frase na língua que estão aprendendo. Esta atitude pode ocasionar um
ruído na comunicação, ou seja, uma interferência mútua de códigos que prejudica o processo de
aprendizagem de uma segunda língua já que cada uma tem sua própria estrutura. Tente
“esquecer” sua língua oral-auditiva quando estiver formulando frases em LIBRAS. Um
aprendizado de uma segunda língua pode ter o suporte da primeira para se compreender e
comparar as gramáticas das duas línguas, mas quando se esta estruturando uma frase tente
“pensar” em LIBRAS;
● Use a escrita ou expressões corporais para se expressar: em um primeiro
momento, devido ao fato de não se ter ainda um domínio da língua, o aluno, motivado por uma
insegurança natural, é tentado a usar sua língua para perguntar ao professor ou aos seus colegas
o que não consegue apreender de imediato. Uma alternativa, para evitar esta interferência, é a
comunicação através da datilologia, da escrita, ou tentar a utilização de expressões corporal e
facial a partir do contexto, recursos utilizados pelos próprios surdos ao se comunicarem com
ouvintes, que não conseguem compreendê-los, quando se expressam oralmente, ou não sabem a
língua de sinais. Tente sempre se expressar em LIBRAS, o professor entenderá sua comunicação e
o induzira aos sinais que serão necessários para a situação comunicativa que deseja expressar;
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● Não tenha receio de errar: o erro não deve ser entendido com falha, mas como um
processo de aprendizagem. Tenha segurança em si mesmo. Na comunicação sempre o erro está
presente, mas o contexto ajuda a perceber a intenção comunicativa e o professor ou o colega
poderá ajudar a encontrar a forma adequada para a situação. Pense na mensagem que se quer
transmitir e não nas palavras isoladamente;
● Desperte a atenção e memória visuais: como os falantes de línguas orais-auditivas
desenvolvem geralmente mais atenção e memória auditivas, é necessário um esforço para o
desenvolvimento da percepção visual do mundo – um olhar, uma expressão fácil, sutis mudanças
na configuração das mãos são traços que podem alterar o sentido da mensagem;
● Sempre fixe o olhar na face do emissor da mensagem: as línguas de sinais são
articuladas em um espaço neutro à frente do emissor, mas como as expressões faciais e corporais
podem especificar tipos de frases e expressões adverbiais, é preciso estar atento ao sentido dos
sinais no contexto onde estão colocados. O importante é a frase e não o sinal isolado. É, também,
considerado falta de educação o desviar o olhar durante a fala de alguém pois representa
desinteresse no assunto;
● Atente-se para tudo que está acontecendo durante a aula: preste atenção nas
orientações e conversas do professor com outro aluno e nas atividades feitas pelos seus colegas de
classe. Tudo é aprendizagem;
● Demonstre envolvimento pelo que está sendo apresentado: através de aceno de
cabeça, expressão facial e certos sinais, o receptor demonstra ao emissor da mensagem que está
interessado, compreendendo e que este pode continuar sua fala (função fática da linguagem);
● Comunique-se com seus colegas de classe, em LIBRAS, mesmo em horário extra-
classe ou em outros contextos, assim pode-se sempre exercitar e apreender as vantagens de se
saber uma língua de sinais em certas situações onde se quer falar a distancia, o som atrapalha ou
mesmo a mensagem deve ser sigilosa;
● Envolva-se com as comunidades surdas: como todo o aprendizado de língua, o
envolvimento com a cultura e os usuários é importantíssimo, portanto, não basta ir às aulas e revê-
las através da fita de vídeo, é preciso também buscar um convívio com os surdos para poder
interagir em LIBRAS e, consequentemente, ter um melhor desempenho lingüístico.
Em conformidade com as idéias expostas, também há no capítulo Orientações para o
instrutor/professor (Felipe, 2001b: 15) princípios pautados em como ensinar a LIBRAS. Vejamos:
23
Ensinar uma língua de sinais para ouvintes é tarefa difícil, por isso, certos princípios
podem ser seguidos para melhor ensino-aprendizado:
a) Desperte em seus alunos a segurança em si mesmos, reduzindo ao máximo as
correções quando eles estiverem tentando se comunicar;
b) Quando for fazer uma atividade individual, solicite primeiro aos alunos mais
desinibidos ou aos que estão demonstrando ter compreendido melhor a atividade;
c) Estimule sempre a produção, incentivando o uso da LIBRAS em todas as situações
mesmo fora da sala de aula;
d) Faça sempre atividades que exercitem a visão;
e) Nunca fale em português junto com a LIBRAS, porque como estas línguas são de
modalidades diferentes, uma pode interferir negativamente sobre a outra, já que uma necessita
uma atenção auditiva e a outra, visual;
f) Faça o aluno perceber que não deve anotar nas aulas porque isso desvia a
atenção visual. A revisão das aulas em casa poderá ser feita através do Livro do Estudante e da
Fita que acompanha esse livro;
g) Não faça o aluno repetir suas frases ou memorizar listas de palavras, coloque-o
sempre em uma situação comunicativa onde ele precisara usar um sinal ou uma frase. A tarefa do
instrutor de língua é habilitar o aluno a ser um bom usuário, isto é, a usar a língua que está
aprendendo para poder se comunicar;
h) Incentive seus alunos a participarem de atividades sócio-culturais realizadas nas
comunidades surdas para que possam se comunicar em língua de sinais brasileira.
O ensino comunicativo tem seu caminho bifurcado em várias direções (Brown, 1994: 80-
84). Vejamos o diagrama:
24
Ensino centrado
no aprendiz
Aprendizagem Aprendizagem
baseada em cooperativa
tarefas
sino Comunicati
Educação Aprendizagem
centrada no interativa
conteúdo
Educação da
língua como um
todo
genuínas, cujo foco estará para a negociação dos significados no uso de linguagem. Para tanto,
atividades em dupla e em grupo são estimuladas para promover as trocas, e, portanto, promover um
espaço de trocas lingüísticas espontâneas, que remetam às conversas cotidianas reais.
4. Educação da língua como um todo – neste viés, derruba-se a idéia de que a língua
deva ser ensinada por partes isoladas. Trata-se de um foco holístico para o ensino de línguas, cuja
ênfase está para situações e contextos reais de uso de linguagem. Acredita-se que as atividades
devem ser conduzidas a partir do todo para as partes menores, então seria mais produtivo e eficiente
para aprendizagem dos alunos, por exemplo, a leitura de um texto/artigo em sua forma original ao
invés de partes adaptadas do mesmo. Além disso, as habilidades são integradas e utilizadas,
evitando-se o uso isolado ou enfatizado de uma ou outra. A aprendizagem é centrada no aluno e
como interação é a palavra-chave, as atividades são mais trabalhadas em grupo do que
individualmente.
5. Educação centrada no conteúdo – refere-se ao estudo simultâneo da língua alvo e
conteúdo, disciplina e/ou assunto. O conteúdo é que ditaria as formas e seqüências lingüísticas, e a
língua passa a ser o meio cuja finalidade vai além da proficiência lingüística. É primordial a
aquisição do conteúdo, e este está geralmente relacionado às necessidades e/ou interesse do aluno.
Assim, concomitantemente à construção de conhecimentos em matemática ou geografia, por
exemplo, adquire-se a língua alvo. Neste tipo de enfoque, todavia, são requeridos profissionais
habilitados tanto na proficiência lingüística como em conhecimento de disciplinas diversas.
6. Aprendizagem baseada em tarefas – nesta vertente do ensino comunicativo, a
tarefa ocupa o seu lugar central. Acredita-se que a aprendizagem será efetiva, pois há nela um
propósito de uso da língua que vai além de um ensino pautado na gramática ou vocabulário. Então,
situações que solicitem como obter informação, como dar instruções, como fazer solicitações no
trabalho e escola, como relatar ou contar uma estória, etc. As tarefas têm um caráter que vise, em
primeira instância, a comunicação.
questões de sala de aula, estabelecendo elos entre seu ensino e suas teorizações com a sua prática
e a aprendizagem do aluno.
Vimos, no capítulo anterior, que as metodologias de ensino foram formuladas e idealizadas
para contornar e tentar resolver problemas de ordem prática. Ainda que “limitadas”, pois não dão
conta de outras variáveis condizentes com as diferenças individuais e contextuais, as metodologias
são orientadas e pautadas em teorias de aquisição/aprendizagem de línguas, pois na história do
ensino de línguas a busca tem sido em encontrar formas para promover uma aprendizagem mais
eficiente para um número maior de aprendizes. É nessa direção que várias disciplinas têm
segmentado a questão e sugerido aos professores distintas opiniões para se alcançar este objetivo:
O psicólogo educacional aconselhou: “olhe para o que os princípios da instrução da
língua(gem) se sustentam”, e nós [professores] experimentamos mais conscientemente com os
vários modelos educacionais. O lingüista descritivo aconselhou: “olhe para uma melhor descrição
da estrutura da língua(gem)”, e nós experimentamos com formas alternativas de descrição da
estrutura lingüística. O sócio- lingüista aconselhou: “ensine a língua(gem) através do seu uso
funcional”, e nós experimentamos com a substituição do nosso ementário lingüístico formal para
um ementário funcional objetivado em projeções das necessidades comunicativas dos aprendizes.
Os especialistas em desenvolvimento da língua(gem) infantil aconselharam: “olhe para o modelo
natural de aquisição de língua(gem)”, e nós experimentamos com as mudanças ao conduzir a
instrução em conformidade com o que ali é encontrado”. Os humanistas aconselharam:
“centralize o seu ensino no aprendiz e ensine a língua como um todo”, e nós começamos a
experimentar mais conscientemente com as formas que refletem esta visão... (Celce-Murcia, 1991a:
23) [tradução e ênfase minhas].
Escopo de investigação
O processo de aquisição/aprendizagem de L2/LE é fenômeno bastante complexo, pois há
nele uma variedade de fatores. Por exemplo, idade, gênero, interesse, aptidão, e fatores sócio-
psicológicos como motivação, personalidade, atitude, estilo cognitivo, estratégico são de suma
importância para se compreender se ocorre e como ocorre a aprendizagem pelos alunos. Essa
pletora (superabundância) de variáveis não permite respostas fáceis ou seguras sobre o assunto...
Diferentes pesquisadores têm dado inúmeras interpretações em suas pesquisas,
especificamente quanto ao entendimento dos termos aquisição e aprendizagem. Krashen (1981),
por exemplo, define aquisição como o processo “subconsciente”, onde a língua se desenvolveria
informalmente sem a necessidade de instrução. É o entendimento do processo de aquisição da nossa
27
língua materna. Já o segundo termo está relacionado com o processo “consciente” de se estudar
uma dada língua. Na aprendizagem pressupõe-se um ensino formal enquanto que na aquisição a
língua é adquirida naturalmente. Krashen (op. cit.) faz a distinção entre os termos, pois entende que
o processo de segunda língua deve seguir os mesmos moldes da aquisição da primeira, sendo
desnecessário o ensino da gramática e correção de erros. Veremos, mais adiante, um pouco mais
sobre as hipóteses sustentadas por Krashen (op. cit.). Por ora, é importante dizer que não é há
definições simples para o entendimento de aquisição e aprendizagem, podendo significar coisas
diferentes para diferentes pessoas, e por isso serão usadas, no decorrer deste material, como termos
sinônimos e intercambiáveis.
Mas, qual é o escopo das investigações sobre aquisição de segunda língua? Ellis (1994: 15-
17) delimita quatro grandes questões: (1) O que os aprendizes de segunda língua adquirem? (2)
Como os aprendizes adquirem uma segunda língua? (3) quais são as diferenças que existem na
forma que os aprendizes individuais adquirem uma segunda língua? (4) Qual efeito a
instrução/ensino tem na aquisição da segunda língua?
A primeira pergunta sobre o que os aprendizes adquirem é a preocupação das pesquisas
desenvolvidas entre o final da década de 60 e início dos anos 70. Nessa linha procurava-se entender
por que os alunos produziam sentenças incorretas. Amostras das produções dos aprendizes eram
coletadas com o intuito de descrever as principais características, procurando regularidades.
Posteriormente, os pesquisadores verificavam se havia mudanças ou não de uso de linguagem pelo
aprendiz no decorrer de um período para tentar mapear o que é aprendido.
A pergunta que indaga como se adquire uma segunda língua é assunto de pesquisa que
privilegia o processo, e nisto implica considerar os aspectos internos – que buscam entender o que a
mente processa para converter o insumo lingüístico em conhecimento lingüístico, e os aspectos
externos – que busca entender qual é o papel da situação social em que o aprendizado ocorre.
Em relação a terceira grande pergunta nos estudos de aquisição de linguagem, o foco é nas
diferenças individuais de aprendizagem. Aqui, pela primeira vez, desloca-se o olhar da
aprendizagem (o que se aprende e como se aprende) para o aprendiz (quem é? quais as
características?). Acredita-se que diferentes aprendizes têm diferentes ritmos para aprender uma
língua, que há diferenças na forma como aprendem, nas estratégias que utilizam, na forma que são
motivados, etc.
Finalmente, há também um interesse central em se descobrir qual o papel da instrução e
seus efeitos na aquisição da linguagem. Alguns pesquisadores argumentam que a aquisição de uma
28
L2/LE deve deixar a instrução explícita de lado, promovendo ambientações similares aos contextos
de aquisição da L1 em crianças (Krashen, 1981). Contudo, não da para se negar que os efeitos da
instrução têm um papel central no desenvolvimento e aprimoramento das pedagogias de L2, já que
as salas de aula permitem fazer um controle mais rigoroso da quantidade e do tipo de insumo
lingüístico que os aprendizes são expostos.
Notas sobre as teorias de aquisição de segunda língua
Pesquisas com o foco no processo merecem uma atenção especial, pois nos introduz aos
modelos e hipóteses que configuram as teorias no campo de aquisição de segundas línguas. A
literatura especializada destaca três grandes modelos: o inatista, o cognitivo, e o sócio-
construtivista.
MODELO INATISTA
No modelo inatista, a hipótese do insumo, como é mais conhecida, é desenvolvida nos
estudos de Krashen (1981) para tentar explicar o processo de aquisição, que por sua vez, compõe o
arcabouço teórico com mais outras 4 hipóteses. A primeira, referida como hipótese da aquisição-
aprendizagem, pontua a diferença entre os dois processos para argumentar que uma segunda língua,
para ser de fato internalizada, precisa se pautar na mesma perspectiva que a aquisição da L1 das
crianças. A diferença está em conceber aquisição como um processo intuitivo e subconsciente, e no
caso de aprendizagem, o entendimento é o oposto, ou seja, um processo monitorado e consciente.
Para Krashen, portanto, aquisição e aprendizagem são dois processos excludentes. Esta primeira
distinção nos conduz ao entendimento da hipótese do monitor. Nela é pontuada a idéia de que se os
aprendizes “monitoram” a língua extensivamente ao produzi-la é porque os aprendizes não
adquiriram a língua. O monitor é comparado a um editor, e seu uso demanda do aprendiz tempo,
conhecimento consciente das regras, preocupação com regras, fazendo da atuação lingüística um
ato não-espontâneo. Em seu entendimento, portanto, a aquisição da linguagem ocorreria de uma
maneira predizível, ou seja, seguindo uma ordem “natural”, daí a hipótese da ordem natural. Já na
hipótese do insumo, Krashen enfatiza que para ocorrer aquisição é necessário que os aprendizes
sejam expostos a um insumo compreensível e que este seja estruturalmente um pouco mais
elaborado e complexo do que o seu nível atual de competência lingüística. Então, para um aprendiz
produzir enunciados na língua alvo, a compreensão é pré-requisito. Refere-se a conhecida fórmula
(i+1). Um insumo fácil, sem desafio (i+0) tanto como um insumo muito difícil e complexo (i+2)
emperrariam o processo de aquisição. Em sua quinta formulação teórica, o pesquisador destaca a
hipótese do filtro afetivo dizendo que se o aluno está ansioso, se tem baixa auto-estima, se não se
29
sente parte do grupo no ambiente,então a aquisição será “bloqueada”. Podemos ver ai que fatores
emocionais podem inibir a faculdade de linguagem dos alunos.
Embora tenha alguns pontos fortes, a teoria de Krashen tem também seus pontos fracos e
por isso recebido severas críticas de outros estudiosos sobre o assunto. Uma das principais questões
está para a forma nebulosa que o autor usa os termos subconsciente ao se referir à aquisição e
consciente para à aprendizagem, já que muitos têm apontado que estes são termos muito difíceis de
se definir (McLaughin et allii, 1983). Outra crítica é o fato de Krashen declarar que não há
interfaces entre aprendizagem e aquisição, e também renegando a zero a idéia de ensino explícito de
regras gramaticais. A este respeito muitos estudos apontam direções positivas e afirmam que a
instrução na forma pode desencadear a competência comunicativa na L2 (cf. Brown, 2000: 280). Há
também certo essencialismo em Krashen ao dizer que o insumo é a variável para a aquisição,
sugerindo um descrédito total aos aprendizes e aos seus esforços no processo de exposição
lingüística. Promove-se, em contra partida, evidências para a hipótese do produto (output) que, de
uma forma geral, pregam que se adquire linguagem produzindo, tentando novas regras e
vocabulário a partir da correção, e ajustando a produção aos interlocutores. Este enfoque é dado no
modelo sócio-construtivista, como veremos adiante. (Swain & Lapkin, 1995).
MODELO COGNITIVO
Neste modelo tem-se outro olhar sobre a aquisição de L2. Irá contestar as hipóteses de
Krashen, que em essência são pautadas na aquisição de L1, para mostrar que a teorização sobre o
assunto deve se desvincular dos termos consciente/subconsciente. McLaughlin et allii (1983), por
exemplo, argumentam em seu modelo de processamento e atenção que as informações lingüísticas
podem ser processadas de forma controlada ou automática. Este mecanismo de processamento, por
sua vez, se justapõe as categorias de atenção, e com isso, pode sem tratar tanto de uma atenção focal
como periferal. Então na aprendizagem de uma L2 seriam consideradas controladas as habilidades
novas e automáticas, isto é, àquelas mais praticadas e exercitadas. Pensemos no exemplo de dirigir
um carro. Inicialmente todas as nossas atenções estão voltadas para desempenhar as habilidades de
pisar na embreagem, dar a partida, engatar a primeira marcha, soltar a embreagem (aos poucos) e ir
acelerando gradativamente – e guiar o carro pelo caminho que queremos percorrer... Quando somos
iniciantes, processamos “controladamente” essas etapas até o ponto que dirigimos o carro de uma
forma mais “automática”. Neste exemplo poderíamos dizer também que no início de nossa tarefa de
aprender a dirigir o carro, nossa atenção é mais focal, ou seja, depositamos uma atenção intencional,
ao passo que depois de “automatizada” a nossa atenção passa a ficar mais periferal. Veja-se que
30
ainda que tentemos separá- las para fins de discussão, estas operações ocorrem simultaneamente.
Brown (2000: 284) – a partir do modelo de processamento desenvolvido por Barry McLaughlin –
esquematiza uma aplicação prática em relação à aquisição de L2:
MODELO SÓCIO-CONSTRUTIVISTA
Os modelos sócio-construtivistas estão pautados tanto nas teorias de aquisição de L1 como
de L2. Os estudiosos que se inscrevem neste viés, concordam que a linguagem tem uma estrutura
biológica que distingue o comportamento humano, mas entendem que ela é um produto sócio-
cultural que se serve do ambiente externo para sua estruturação. A linguagem, portanto, é concebida
como um produto sócio-cutural. A interação mediada pela linguagem é, portanto, o foco de
31
explicação neste modelo. Retomamos o que vimos na disciplina de Lingüística Aplicada, quando
estudamos a concepção de Lev Vygotsky sobre a linguagem. Aliás, os modelos aqui desenvolvidos
para se compreender a aquisição de L2 são potencialmente embasados na obra do psicólogo russo.
É nesse sentido que Michael Long se contrapõe a Krashen ao defender a hipótese da interação.
Nela, diz o autor, “o insumo compreensível é o resultado da interação modificada” sendo este
“definido como as várias modificações que os falantes nativos e outros interlocutores criam a fim de
render o insumo compreensível para os aprendizes” Brown (2000: 287) [tradução e ênfase minhas].
Interessante neste modelo é ficarmos atentos quanto às implicações para a sala de aula: o currículo,
as atividades, os materiais e as práticas dos professores buscam integrar o papel do insumo e da
interação em um processo de construção social contínuo. Para finalizar a discussão, vejamos o
esquema resumido de Brown (2000: 288) das teorias e modelos de aquisição de L2:
Esta unidade traz alguns questionamentos da profissão: ensinar é uma arte ou ciência? Os
professores nascem professores ou são preparados? O processo ensinar-aprender é previsível ou
não? Quais os princípios de ordem cognitiva, afetiva e lingüística devem pautar o ensino? A
discussão aponta para uma abordagem eclética, com práticas de um ensino reflexivo, onde o
dinamismo, a relevância, a adaptabilidade e a flexibilidade são as palavras de ordem para se
conceber o ensino na atualidade, e, portanto, sermos bem sucedidos no nosso objetivo de
professores: o de promover a aprendizagem. Essa construção de conhecimento nos fornece
subsídios para pensar algumas relações sobre o ensino de LIBRAS L2/LE.
PRINCÍPIOS COGNITIVOS
Dizem respeito, principalmente, às funções mentais e intelectuais. Todos aqueles processos
internos monitorados e/ou desencadeados na nossa relação de aprendizagem/aquisição de uma
língua. São eles: automaticidade, aprendizado significativo, antecipação da recompensa, motivação
intrínseca, e investimento estratégico.
1. Automaticidade – A aprendizagem de uma segunda língua envolve um movimento
ágil do controle de algumas formas da língua ao processo automático de um número relativamente
ilimitado dessas formas. Analisar demais a língua, pensar muito sobre suas formas, e
conscientemente hesitar sobre suas regras, tudo isto tende a impedir a formação da
automaticiidade. (Brown, 1994: 17) [tradução minha].
2. Aprendizado significativo – A aprendizagem significativa conduzirá a uma
retenção de longo prazo melhor do que o aprendizado rotulado. (Brown, 1994: 18) [tradução
minha].
3. Antecipação da recompensa – Os seres humanos são universalmente inclinados a
agir, ou “comportar-se”, pela antecipação de algum tipo de recompensa – tangíveis ou intangíveis,
de longo prazo ou curto prazo – que irá garantir como um resultado do comportamento. (Brown,
1994: 19) [tradução minha].
4. Motivação intrínseca – As recompensas mais fortes são àquelas intrinsecamente
motivadas dentro do aprendiz. O fato de o comportamento ser desencadeado das necessidades,
vontades e desejos dentro de cada um, o próprio comportamento é auto-recompensador; portanto,
nenhuma recompensa administrada externamente é necessária. (Brown, 1994: 20) [tradução
minha].
5. Investimento estratégico – O domínio bem sucedido de uma segunda língua se
dará em grande medida ao ‘investimento’ pessoal do próprio aprendiz de tempo, esforço, e atenção
a segunda língua na forma de uma bateria de estratégias individualizadas para compreender e
34
PRINCÍPIOS LINGÜÍSTICOS
A forma pela e na qual os alunos lidam com o complexo sistema lingüístico que lhes é
exposto. São eles: efeito da língua nativa, interlíngua, e competência comunicativa.
10. Efeito da língua nativa – A língua nativa dos aprendizes será um sistema
altamente significativo sobre o qual aprendizes dependerão para prever o sistema da língua alvo.
Enquanto o sistema nativo exercitará tanto os efeitos de facilitar e interferir sobre a produção e
compreensão da nova língua, os efeitos de interferência são provavelmente os mais salientes.
(Brown, 1994: 26) [tradução minha].
11. Interlíngua – Aprendizes de segunda língua tendem a passar por um processo de
desenvolvimento sistemático ou experimental-sistemático enquanto eles progridem na competência
35
Ecletismo no ensino
A área de instrução de línguas chegou a um ponto de maturidade que reconhece que o
contexto de ensino-aprendizagem é tão complexo, variando de lugar para lugar, de um grupo de
indivíduos para outro, com propósitos educacionais distintos (aprender língua para ler textos
técnicos, aprender línguas para viagem, para passar no vestibular...) e com cargas horárias
determinadas, que hoje não se fala mais em métodos separadamente, nem tampouco da necessidade
de se criar novos métodos. Nenhuma metodologia e/ou método sozinho pode assumir a
responsabilidade da composição heterogênea dos contextos e dos indivíduos. Por isso, tanto a
sublimação quanto a segmentação dos métodos podem conduzir a uma prática reducionista
(limitada, reduzida). É desse entendimento que se fala em abordagem eclética (que inclui categorias
variadas) para o ensino de línguas segundas e/ou estrangeiras, pois pressupõe que o professor pode
dispor de todas as metodologias, sem que estas sirvam de dogmas (princípios religiosos e/ou moral,
estabelecido como verdade e que não se contesta) em seus fazeres de sala de aula.
Entretanto, usar, combinar, adaptar e/ou refinar os métodos em questão só fará sentido
dentro deste viés se o professor pensar a partir de uma relação inversa: o contexto, a situação e as
necessidades dos aprendizes determinariam a prática do professor e não mais o método. Sendo
assim, temos uma abordagem mais dinâmica, fluida e multifacetada, ou seja, uma abordagem que
vê o ensinar- aprender, metaforicamente, como um caminho de mão dupla com várias bifurcações e
atalhos...
Vale lembrar que o professor deve estar atento e preparado para fazer conexões não
idealizadas entre a teoria (princípios derivados de pesquisa, podendo ser inclusive a teorização
sobre os inúmeros métodos de ensino e das teorias de aprendizagem) e a prática (escolhas que o
36
professor faz na sala de aula). Caso contrário, continuaremos gravitando aqui e acolá, carregando
conosco o sentimento daquilo que Coracini e Bertoldo (2003) expressam bem no título de sua obra:
“o desejo da teoria e a contingência da prática”.
Por uma prática de ensino reflexivo
Prabhu (1990), ao polemizar a idéia de que “não há melhor método de ensino”, postula que
há um fator mais básico do que a escolha entre os métodos: “o entendimento subjetivo do
professor acerca do ensino que ministra”. Está denominado aí o senso de plausibilidade. O autor
argumenta que os professores precisam ter uma compreensão sobre a forma que atingem o objetivo
desejado no ensino que praticam. Noutras palavras, o professor deve estar atento a respeito de como
o seu “ensino age sobre o aprendizado e como este ocorre, [pois] professar a crença num método
pode meramente demonstrar o quão congelado está o senso de plausibilidade de um professor e o
quão inseguro ele se sente frente às rotinas do ensino” (172). É necessário que os professores
contem com as experiências vividas com os seus alunos, e comecem, a partir das experiências
profissionais, a criar suas próprias rotinas de trabalho, por sua vez geradas pela sua intuição
pedagógica, ou seja, “senso de plausibilidade”. Neste processo inclui um professor engajado no
processo, um professor aberto a mudanças. Mas como este entendimento ocorre? Como evitar que
as condições de trabalho congelem este espírito, limitando-se em apenas rotinas mecânicas e
rotineiras de ensino? Pode-se afirmar que ocorre dentro de uma prática da reflexão continuada ou
como é conhecido na literatura de Ensino Reflexivo.
O norte-americano Donald Shön tem trabalhado com reformas curriculares nos cursos de
formação de professores e desde o início dos anos 90 emprega a expressão do “professor reflexivo”
para articular a idéia de valorização da prática profissional enquanto construção de conhecimento.
Essa noção é crucial, pois conforme a observação de Shön (1983), o professor formado não
consegue dar respostas às situações concretas de sala de aula, que emergem na correria do cotidiano
e extrapolam as teorizações científicas. O professor estaria refletindo sua prática, através da
observação, análise e problematização constantes, que por sua vez resultariam em um repertório de
experiências configuradas em conhecimentos práticos. Em contextos brasileiros, autores como
Cavalcanti & Moita Lopes (1991), por exemplo, têm discutido sobre a formação do professor.
Argumentam que os cursos de licenciatura, de uma forma geral, têm tido uma preocupação elevada
em desenvolver a proficiência lingüística do futuro professor de línguas. Argumentam que a
“prática de ensino” tal como está sendo discutida em cursos de formação fica sucumbida a um
receituário de atividades, sem incluir ou prever uma formação que defenda o ensino reflexivo, onde
37
Para que esta prática ocorra com sistematicidade o professor deve lançar mão de algumas
ferramentas, como diários, memorandos, questionários, gravações das próprias aulas, relatos
retrospectivos das aulas, etc. Com base em Richards (op. cit.), veja um roteiro bem simplificado de
algumas perguntas que você pode se questionar na sua atuação profissional:
No modelo de Almeida Filho (op. cit.), a abordagem de ensinar é a força potencial básica do
ensino, pois nela se instauram as crenças, pressuposições e princípios sobre os conhecimentos de
linguagem, de aprender e de ensinar. Diz respeito a um nível mais abstrato na operação se
comparado com o nível mais concreto do planejamento, da produção de materiais, dos métodos, das
técnicas/recursos e da avaliação, por exemplo. A abordagem que orienta o professor imprime
movimento e ação ao processo. Nela residem as energias que motivam o professor a produzir
experiências na língua alvo ao aluno. Essas energias não são unilaterais (apenas do professor para o
aluno) nem tampouco fixas, pois são compostas de outros valores (pautados em princípios
lingüísticos, cognitivos e afetivos) que retro alimentam as práticas do professor em sala de aula,
dando assim o dinamismo na relação ensino-aprendizagem.
Mas quais os pilares da abordagem direcionadora de ensino do professor? Almeida Filho
(1999) diz que os professores apóiam-se em várias
40
competências, que por sua vez vão sendo construídas e desenvolvidas ao longo da formação
e da atuação profissional. A competência do professor refere-se enquanto “história de
desenvolvimento da agregação profissional e intelectual do professor de língua” e é inerentemente
dinâmica. O quadro de Almeida Filho (1997b: 18) tem suas raízes teórica nos estudos de Hymes
(1972) e Canale & Swain (1980), dentre outros, e configura 5 competências inter-relacionadas: a
implícita, a teórica, a aplicada, a profissional e a lingüístico-comunicativa. Vejamos o quadro:
A competência implícita seria aquela que tem como base as crenças, intuições e
experiências do professor. A maioria de nós, professores ou não, já fomos algum dia alunos, e a
partir dessa experiência (re)formulamos o nosso ensino, tendo como modelo nossos professores e
sempre orientados pelas tradições culturais do meio que nos cerca. Geralmente esta competência
assume o papel principal quando o professor não dispõe de outras competências – construídas na
formação acadêmica. A competência teórica, por outro lado, é aquela que traz explicações sobre os
saberes de ensinar e aprender. A construção desta competência fornece ao professor uma
capacidade de compreender as tendências,
as suas implicações sobre a prática e especialmente, vincular uma coisa com a outra, o que
lhe promove, em contrapartida, a competência aplicada. Esta capacita o professor a ensinar a partir
do que conhece, ou seja, trata-se de uma competência teórica vivenciada, que lhe permite extrapolar
da competência implícita para um patamar onde sabe explicar com plausibilidade por que ensina da
41
forma que ensina e por que alcança os resultados que alcança. A competência lingüístico-
comunicativa refere-se à capacidade do professor produzir a linguagem que ensina em contextos
significativos de uso, ou seja, que tenha a capacidade de promover insumo lingüístico que
contemple tanto o conhecimento das regras da forma da língua (gramatical) como de uso
(contextual e sociolingüístico). Por fim, Almeida Filho (op. cit.) destaca a competência profissional
cuja constituição está para a conscientização do professor sobre os papéis de profissional, político,
educador, facilitador... Está vinculada ao senso de responsabilidade e comprometimento com a
profissão, e manifesta-se toda vez que o professor procura aprimorar-se – fazendo cursos, pós-
graduações, participando de congressos – visando o crescimento ao longo da trajetória profissional.
Neste sentido, a competência profissional perpassa por todas as outras competências anteriores.
O contexto de sala de aula é atravessado por inúmeras variáveis. Uma delas é a diversidade
lingüística. Vimos na disciplina de Lingüística Aplicada que há uma resistência por parte de muitos
professores em aceitar a heterogeneidade de línguas e culturas em sala de aula em função do mito
do monolingüismo ou dos ideais de língua padrão. Ainda que o nosso foco seja a discussão do
ensino da LIBRAS para ouvintes, o professor deve estar atento às diversidades, pois certamente
atuará em contextos repletos de variedades e usos lingüísticos. Não há sala de aula “ideal”,
homogênea – inclusive de ensino de L2/LE. Ainda que testes de nivelamento (que tentam “medir” o
nível de conhecimento lingüístico do aluno) possam ser utilizados, outras variáveis estarão
presentes.
O lingüista Yorio (1976: 61) desenvolveu uma taxonomia elucidando as variáveis do aluno
na aquisição/aprendizagem de L2/LE. Dentre os fatores, destaca a idade, cognição, língua materna,
42
insumo, domínio afetivo, e histórico educacional do aprendiz. Mesmo passado alguns anos depois
de sua elaboração, a taxonomia tem elementos que podem ser confrontados com as atuais teorias
e/ou modelos de aquisição de segunda língua. Além disso, é muito útil para o professor pensá-las
em seu contexto de sala de aula, no sentido de entender a complexidade de fatores que englobam o
processo ensino-aprendizagem de línguas.
Em relação ao primeiro item destacado por Yorio (op. cit.) está a idade e suas variáveis, já
que há uma diferença na forma pela qual crianças, adolescentes e adultos aprendem uma língua em
função dos aspectos biológicos, cognitivos e sociais. Além do período crítico defendido na
aquisição de L1 (cf. Noam Chomsky), há um processo de maturação do pensamento (cf. Jean
Piaget), relacionados aos níveis de abstração que se distinguirá dos indivíduos com diferentes
idades. O aspecto social (familiar, escolar, e do grupo), todavia, tem também um papel a
representar, na medida em que contextualiza o aprendiz no ambiente que o circunda. Por exemplo,
as pressões de um grupo podem afetar o rendimento do aluno na sua aprendizagem de L2, da
mesma forma que a sociedade, de uma forma ampliada, pode, ao atribuir valores de mais ou menos
prestígio à língua-alvo, fazer o mesmo tipo de interferência. Além dos atravessamentos sociais, há
que se verificar o contexto de aprendizagem da língua: é ambiente de LE ou ambiente bilíngüe,
qual o tipo de contato – a língua é familiar, próxima ou distante da língua materna do aprendiz...
Finalmente, quem é o nosso aluno? Ele é instruído ou não? Quais são as suas características, o seu
perfil, o seu estilo de aprendizagem? Na lista das variáveis, é necessário, ilustra Yorio (op. cit.),
pensar também o tipo de instrução na língua alvo, a duração, o lugar, o material, a fonte de
instrução, as aptidões dos alunos. Tudo isso se inclui na variável insumo lingüístico, prevendo ou
não um ensino explícito da gramática da língua. O aspecto afetivo, por sua vez, pode afetar o
processo de aquisição, e daí que fatores sócio-culturais, egocêntricos e a motivação para
aprendizagem devem ser cuidadosamente olhados. A interação do aluno com a língua estrangeira
pode ser diferente se o seu aluno tem auto-estima baixa, depressão ou ansiedade, por exemplo.
Estas variáveis podem se aplicar também aos professores, ainda que Yorio (op. cit.) foque
exclusivamente os alunos, pois a interação professor-aluno é de fundamental importância no
processo de aquisição de L2/LE.
Os contextos de LIBRAS abarcam, certamente, todas essas variáveis. É possível que você
encontre salas de aula umas menos heterogêneas do que outras, mas via regra, os cursos de
LIBRAS apresentam uma elevada heterogeneidade, variando a idade, gênero, proficiência e/ou
conhecimento na língua, área de formação educacional, nível de escolaridade, necessidades e
43
objetivos individuais dos alunos para a aprendizagem da língua de sinais (Gesser, 1999; 2006). Por
exemplo, é muito recorrente encontrar, sob o mesmo teto de sala de aula, alunos fluentes na
LIBRAS e outros que nada sabem, da mesma forma que há também alunos com interesses diversos
(alguns são intérpretes, outros familiares e amigos, e outros ainda “curiosos”). Ainda que a LIBRAS
desempenhe um papel importante na vida de cada um destes, será que ensinar a língua para quem
atua como intérprete deve ter a mesma abordagem do que para um familiar de surdo, por exemplo?
E, o que dizer sobre àqueles professores ouvintes de crianças surdas, que por sua vez, ministram
disciplinas distintas como o português, a matemática e a geografia? Seria viável pensar uma
abordagem de ensino de LIBRAS que primasse os conteúdos disciplinares? Claro que as
necessidades de cada um são diferentes, e ainda não há tradição no ensino de LIBRAS para
ouvintes em se focar em públicos com interesses variados e necessidades específicas para a
aprendizagem da língua alvo. Mas fica aqui registrado a importância de você professor construir
esses contextos e articular essas questões em seu local de trabalho (seja na escola, na universidade
ou em associações privadas e públicas)... Em caso de salas de salas de aula heterogêneas, que é a
regra da realidade das salas de aula de LIBRAS, procure pensar o tipo de insumo lingüístico que
possa atender as emergências de uso da língua pelos ouvintes. Por fim, não esqueça o que bem
pontua Almeida Filho (1998: 15), que uma abordagem contemporânea de ensinar línguas conta
como cerne principal – além de todas as variáveis mencionadas – com o sentido ou a significação e
[a]prender uma língua nessa perspectiva é aprender a significar nessa nova língua e isso implica
entrar em relações com outros numa busca de experiências profundas, validas, pessoalmente
relevantes... Aprender LE [língua estrangeira] assim é crescer numa matriz de relações interativas
na língua-alvo que gradualmente se desestrangeiriza para quem a aprende.
sobre o sistema o qual está exposto e que eles seriam situações concretas nas quais o professor
poderia intervir e promover correções (Ellis, 1994; Brown, 1994).
A língua materna tem um papel no processo de aquisição/aprendizagem de L2/LE, mas há
um consenso sobre o uso discriminado dela no ensino, significando, por exemplo, momentos de
explicações breves sobre algum mal entendido, ou sobre algum aspecto gramatical, cultural ou de
procedimentos de avaliação. Assim, poderia dizer-se que o bom uso da língua materna seria aquele
que “conduz as práticas mais eficientes e intensivas na língua estrangeira” ao passo que um mau
uso é aquele que “conduz os alunos a se distanciarem da língua alvo ou que tende torná-los
passivos” (Grittner, 1977 apud Cogen & Philip, 1982: 151). A partir deste critério, e pensando que
o contexto de ensino de LIBRAS conta também com professores surdos, pode-se pensar em recorrer
à língua materna dos alunos na versão escrita, através de uso de transparências, explanações no
quadro ou materiais escritos, por exemplo. Em alguns momentos, o português escrito pode ter um
papel de auxiliar na aprendizagem dos ouvintes, cabe ao professor ponderar o uso dentro da sala de
aula e lembrar que todos os alunos que aprendem uma segunda língua recorrem à primeira, fazendo
transferências, generalizações e lançando mão de estratégias comunicativas (Gesser, 1999; 2006).
Ainda que o uso do português em aulas de LIBRAS seja mal visto por alguns membros da
comunidade surda, pois remete à língua do opressor, do colonizador; é importante destacar que em
termos de aprendizagem que a LM do aprendiz ouvinte será o sistema lingüístico de referência, e
coibi-la pode significar criar barreiras emocionais (frustração, medo, ansiedade, etc.) na relação que
o aprendiz estabelecerá com a língua alvo (pense, por exemplo, na relação inversa: o quanto a
LIBRAS é importante para o surdo aprender o português).
Estilos cognitivos de aprendizagem
Por que algumas pessoas preferem trabalhar individualmente e outras em grupo? Por que
algumas pessoas só desenvolvem bem uma tarefa de cada vez enquanto outras funcionam melhor
fazendo várias coisas ao mesmo tempo? Por que para umas o planejamento e a organização são
fundamentais e outras pessoas não? Ou ainda, por que alguns indivíduos correm mais riscos e
outros evitam este tipo de situação? Estas são algumas das perguntas que levaram os pesquisadores
a investigar os estilos cognitivos (ou estilos de aprendizagem), que por sua vez, têm apontado que
umas pessoas aprendem diferente umas das outras. Associados aos fatores de personalidade, o estilo
cognitivo é entendido como uma forma automática de responder a informações e situações do
ambiente de aprendizagem circundante.
45
Estratégias de aprendizagem
As pesquisas que investigam as estratégias de aprendizagem têm focado, em grande medida,
alunos aprendendo inglês como L2. Destes estudos desdobram- se hipóteses para a discussão em
outras línguas. As estratégias são formas utilizadas pelo aprendiz para lidar com as informações
apresentadas, e são desenvolvidas para contornar dificuldades, obstáculos e demandas de uma
situação de aprendizagem. Diferentemente do estilo cognitivo, que reflete de forma mais ou menos
estável o modo como a pessoa pensa, e que, portanto, afeta a abordagem para a aprendizagem; as
estratégias são mais especificas e refletem os processos adotados pelo indivíduo para solucionar
tarefas específicas. Pode-se dizer que as estratégias são individuais, pois cada um de nós pode
desenvolver maneiras distintas para descobrir uma fórmula matemática ou escrever um resumo, por
exemplo. As falas de algumas alunas ouvintes iniciantes apontam algumas estratégias utilizadas na
aprendizagem da LIBRAS:
Para gravar um sinal eu faço relações, por exemplo: “colher” uso “c” de colher,
“professor” uso o “p” de professor e quando não tem equivalência com a letra do alfabeto eu
associo a uma idéia que me faça recordar do sinal...
O interessante é que para eu conseguir decorar os sinais eu precisei fazê-los em frente ao
espelho. Compreendi que dessa forma eu estimularia a minha visão, a minha memória visual.
Sei que o conteúdo é muito específico e diferente do que a gente aprende nas aulas de
LIBRAS, mas para desenvolver minha compreensão fico assistindo aquelas interpretações de cultos
religiosos no quadradinho da TV. Alterno ora vendo e ouvindo simultaneamente e ora diminuindo
o volume para prestar atenção só na sinalização. Algumas coisas eu entendo outras não, mas como
a linguagem é especifica de religião é fácil prever o que esta sendo dito...
Tenho dificuldade em guardar certos sinais de letras, então fico praticando fora da sala de
aula quando estou sozinha e quando leio alguma palavra em algum lugar pratico a datilologia.
Também comecei a fazer isso tentando traduzir para sinais alguma fala que ouço na televisão, mas
me falta vocabulário e conhecimento na estrutura da LIBRAS.
Eu reparei que prestar atenção na configuração de mão das palavras, principalmente
relacionar as que têm configuração igual, tem me ajudado a memorizar mais facilmente os sinais.
Ainda estou achando que tudo está um pouco vago porque no momento que o professor fala
eu entendo, porém no momento seguinte me esqueço, então para gravar faço desenhos no caderno
tentando reproduzir os sinais apresentados pelo professor.
47
escrita e a leitura da língua portuguesa teria um papel neste processo de aprendizagem por alunos
ouvintes? É sabido que o sistema de escrita em sinais é ainda incipiente e está em processo de
padronização. Por isso, caberia o questionamento sobre a sua importância no ensino da língua de
sinais para ouvintes. Esta é uma questão que precisa de mais amadurecimento e pesquisas. Não é
objetivo aqui aprofundar as questões sobre a escrita e a leitura, ou ainda, sobre as teorias que
investigam os aspectos de processamento cognitivo das habilidades produtivas e receptivas da
língua de uma forma geral. Para o momento, apenas elucidarei alguns aspectos que são foco de
preocupação no ensino das habilidades fala e compreensão oral, e na medida do possível, paralelos
com a LIBRAS serão estabelecidos.
conteúdo apreendido, e pode ser em forma de conversas iniciadas pelo aluno ou por exercícios
formulados e direcionados pelo professor
3. Responsiva – são aquelas respostas “rápidas” dadas pelos alunos a partir das
perguntas feitas pelo professor.
4. Transacional (diálogo) – aqui o aluno desempenhará um pouco além do tipo
responsivo. Conforme as respostas vão sendo dadas pelo aluno, o professor expande fazendo
perguntas subseqüentes, a fim de manter uma conversação “guiada” pelo professor.
5. Interpessoal (diálogo) – o desempenho neste tipo será mais livre. Nela o aluno pode
ter dificuldades de expressar a idéia em função da falta de vocabulário, mas o objetivo aqui é tornar
o diálogo/conversa mais próximo das conversas das relações sociais do dia-a-dia.
6. Extensiva (monólogo) – o aluno desempenha na língua alvo contando estórias,
piadas, fazendo apresentações orais, resumos ou relatando algum episódio particular. Podem ser
planejadas pelo aluno ou não. Dependerá do nível de proficiência de cada grupo.
As características listadas estão pautadas em teorizações de ensino de línguas orais e podem
(ou não) aparecer no contexto da LIBRAS. Os tipos de dificuldades não listados podem ser
reveladores para entender a relação de aprendizagem por ouvintes, por isto é necessário desenvolver
mais pesquisa sobre o tema. Alem disso, devemos ficar atentos que a característica especifica da
LIBRAS – espaço visual – pode fazer com que haja um maior ou menor grau de dificuldade de
aprendizagem pelos alunos (Gesser, 2006). A sinalização (expressão em sinais) é uma importante
habilidade para se enfatizar no ensino. O aluno ouvinte precisa desenvolvê-la e o professor precisa
dispor de estratégias e técnicas que façam com que os alunos efetivamente usem os sinais. Sabe-se
que alguns lugares como as associações, federações, igrejas e algumas escolas existe o encontro de
surdos. A ida a estes lugares oferece ao aluno uma oportunidade de contato diferente da sala de
aula. Entretanto, nem sempre todos os alunos poderão freqüentar os locais. A interação com
usuários da língua de sinais, em contextos cotidianos, é um fator relevante para o desenvolvimento
e fluência na língua, mas é também responsabilidade do professor promover situações para este
aspecto ser trabalhado, especialmente para que suas questões inter-relacionadas de cadencia,
entonação, ênfase, velocidade e continuidade e a regras conversacionais da LIBRAS sejam
adquiridas. Além disso, destaca-se também a importância de enfatizar nas aulas as expressões não-
manuais. O aluno ouvinte tem bastante dificuldade, no início da aprendizagem, em compreender a
diferença que a expressão da face tem para marcar aspectos gramaticais. Vejamos alguns
depoimentos e relatos de alunos ouvintes iniciantes da aprendizagem da LIBRAS:
52
Por fim, lembre-se que em todo processo de aprendizagem há fatores de ordem afetiva em
jogo como ansiedade, exposição, atitudes em relação à língua- alvo, motivação, dentre outros.
Aprender qualquer língua é tarefa árdua, que demanda dos alunos um empenho cognitivo muito
grande, e o aprendizado de língua de sinais, para ouvintes iniciantes, é tarefa das mais árduas
(Jacob, 1996), pois um movimento tem que ser feito, literalmente da “boca” para as “mãos”
(Gesser, 2006: 167). Se os seus alunos se sentirem hostilizados ou mesmo amedrontados, a
aprendizagem da língua de sinais pode ficar comprometida. Então, crie um ambiente amigável e
cooperativo e procure encontrar formas para ensinar os aspectos desta língua tão rica e bela que é a
LIBRAS!
Em resumo, as duas habilidades de compreensão visual e de sinalização estão naturalmente
interligadas, e serão desempenhadas dependendo do objetivo do ensino, e das técnicas e atividades
que o professor utilizar. Não se esqueça, todavia, que as técnicas ou atividades utilizadas para
trabalhar essas habilidades lingüísticas devem ter um teor estimulante, com o intuito de motivar o
aprendiz. Faça uso de linguagem autêntica e contextos significativos, sempre contemplando as
necessidades dos alunos. Nos momentos que abordar a forma e o uso da língua alvo, destaque o
papel da interação, da significação e da fluência, fazendo uma alternância entre técnicas e
atividades que foquem a língua “do menor para o maior” (botom-up) e “do maior para o menor”
(top-down). A intervenção e a correção devem ser apropriadas, e nisto inclui considerar
cuidadosamente a forma das respostas dos aprendizes em conformidade com a idade e o nível de
conhecimento da língua. Além disso, encoraje os seus alunos para o uso e desenvolvimento de
estratégias e sempre crie situações que dêem aos alunos a oportunidade de iniciar a comunicação
em sinais (Brown: 1994: 245-269).
Observações sobre o ensino de vocabulário
53
comunicativo, haveria momentos para o ensino explícito das regras gramaticais? Se afirmativo,
como fazer?
Sabemos que a competência gramatical é parte da competência lingüística, mas certamente o
seu domínio isolado não é suficiente se pensarmos outros níveis de produção e compreensão na
língua alvo.
objetivo de uma aula é focar nos classificadores da LIBRAS, por exemplo, há que se pensar em
técnicas e/ou atividades para promover o uso deste elemento gramatical em situações significativas,
de uso real de linguagem. Não bastaria apenas dizer “olhe a LIBRAS tem classificadores, e esses
são alguns exemplos deles”. Contextualização é a palavra-chave para qualquer momento de ensino
estrutural da língua-alvo. Isto quer dizer, promover situações de uso, oferecer momentos em que os
alunos possam praticar e aplicar o seu aprendizado de forma que não fique apenas restrito às
definições das regras gramaticais. Outro ponto é fazer com que as atividades de gramática
despertem algum tipo de motivação nos alunos. Isto irá depender de como o professor aborda um
conteúdo, por exemplo, e como envolve os alunos para a aprendizagem, caso contrário os alunos
podem ficar entediados e desestimulados. Finalmente, os alunos não devem sentir-se
sobrecarregados com as nomenclaturas gramaticais. Então, ao ensinar a LIBRAS, pense em que
instâncias da aula valem a pena falar de regras explicitamente...
Celce-Murcia (1991b) nos ilumina sobre a questão, apontando que a idade, o nível de
proficiência do aluno, a base educacional, habilidades lingüísticas, registro, necessidades e
objetivos podem guiar o professor na hora de decidir se uma aula deve ter foco na gramática ou não.
Estudos mostram que os adultos podem se beneficiar mais do estudo explícito da regras da língua
se comparado às crianças e/ou adolescentes. Além disso, o nível de proficiência lingüística também
conotará resultados distintos: se o aprendiz é iniciante e o professor enfatizar as regras da língua em
excesso, a aquisição da fluência pode ficar comprometida. Isto quer dizer que os alunos podem
sentir-se pressionados e começar a monitorar demasiadamente a sua produção comunicativa em
prol de uma acuidade gramatical. Há diferença também entre alunos letrados e não-letrados. Para
estes últimos será bastante difícil dissolver a complexidade e nomenclatura das regras gramaticais.
Uma das habilidades lingüísticas que requer mais acuidade é a escrita na língua alvo (o mesmo para
o signwriting?). Neste caso, o ensino sobre a língua pode iluminar, mas não é o caso do registro
usado em conversas informais. Por fim, as necessidades individuais (profissão, viagem, testes de
proficiência...) podem requerer dos aprendizes mais ou menos conhecimento gramatical na L2. Há
ainda falta de estudos que mostrem esta relação com contextos de aprendizagem da gramática da
LIBRAS, mas arrisco dizer que, guardadas as devidas diferenças da modalidade lingüística, a
ponderação das variáveis parecem coerentes para se iniciar uma reflexão sobre a questão no ensino
de LIBRAS para ouvintes.
Ensino da datilologia
56
“aquecimento das mãos”, de forma descontraída e lúdica, para então adentrar aos conteúdos
lingüísticos da LIBRAS.
Mas quais seriam essas técnicas? Crookes & Chaudron (1991: 52-54) nos apresenta uma
taxonomia de atividades/técnicas de ensino de línguas classificadas em controladas,
semicontroladas, e livres, que por sua vez podem ter um teor mais manipulado ou não, mais
mecânico, significativo ou comunicativo:
Técnicas controladas: aquecimento (warm-up), contextualização (setting), organizacional
(organizational), explicação de conteúdo (content explanation), atuação de papéis (role-play
demonstration), apresentação de diálogo/narrativa (dialogue/narrative presentation), declamação
de diálogo/narrativa (dialogue/narrative recitation), leitura em voz alta (reading aloud), checagem
(checking), pergunta-resposta, exposição (question-answer, display), treino de repetição (drills),
tradução (translation), ditado (dictation), cópia (copying), identificação (identification),
reconhecimento (recognition), revisão (review), teste (testing), treino de repetições significativas
(meaningful drills).
Técnicas semicontroladas: geração de idéias (brainstorming), contagem de estórias
(story-telling), pergunta-resposta, referencial (question-answer, referential), narrativa/diálogo com
pistas (cued narrative/dialogue), transferência de informação (information transfer), troca de
informação (information exchange), resumo (wrap-up), exposição/ narração exposition/narration),
preparação (preparation).
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Técnicas livres: Atuação de papéis (role-play), jogos (games), relatório (report), resolução
de problemas (problem solving), drama (drama), simulação (simulation), entrevista (interview),
composição (composition), conversação (conversation). [tradução minha].
7. MATERIAL DIDÁTICO
A maioria dos professores faz uso, em suas aulas, de materiais didáticos (livros, CDs, fitas-
cassete, gravuras, pôsteres, etc). Estes, por sua vez, podem ou não ser produzidos pelo próprio
professor. No caso de ensino de línguas orais, especificamente pensando o ensino de Inglês como
LE no Brasil, há uma grande indústria bibliográfica. O mesmo não é verdade para materiais
voltados ao ensino de LIBRAS, tanto como L1 como L2/LE. Embasaremos nossa discussão a partir
dos preceitos teórico-metodológicos da literatura de línguas orias, formulados por alguns
pesquisadores envolvidos com seleção, avaliação e elaboração de materiais didáticos, no sentido
de iluminar o seu contexto de atuação. Além disso, objetiva-se fazer um levantamento de materiais
produzidos e utilizados para o ensino de LIBRAS. Este levantamento servirá como ponto de partida
para compreendermos como o ensino e a aprendizagem da língua de sinais no Brasil tem sido
abordada e que tipos de estudos têm sido desenvolvidos neste segmento.
Na unidade anterior vimos algumas técnicas que podem ser utilizadas para promover o
insumo lingüístico ao aprendiz, focando o tipo e o conteúdo da prática de linguagem e a integração
das habilidades receptiva e produtiva da língua. Para empregá-las, entretanto, o professor precisará
fazer uso de materiais, como por exemplo, livros didáticos, gravuras, fotos, mapas, textos, filmes,
objetos, etc. Estes materiais podem ser adquiridos prontos ou ainda produzidos pelo próprio
professor. O livro-texto é o material mais comum e presente em cursos de línguas, mas sabemos
que na área de ensino de LIBRAS há uma escassez enorme de materiais disponíveis no mercado,
contando com apenas a publicação dos livros: Libras em Contexto (Felipe, 1993, 2001a/b), Coleção
Aprendendo LSB (Pimenta, 2004) e Curso LIBRAS 1 (Pimenta & Quadros, 2006).
Adotar ou não um livro, pode ter suas vantagens e desvantagens. O livro- texto, em muitas
circunstâncias, pode ser excessivamente prescritivo e de caráter homogêneo, e quando adotado por
alguma instituição de maneira massiva pode fazer os professores ficarem amarrados às ideologias
inscritas no material, além de coibir-lhes o desenvolvimento criativo de outros recursos para ensinar
a língua alvo. Pode se afirmar que há ainda, na maioria dos livros, certa pasteurização da
linguagem, ou seja, como nos lembra Richards (2002) uma porção significativa de linguagem não-
60
autêntica e construída para dar conta de incorporar os aspectos do ensino que a unidade quer focar,
perdendo-se daí ilustrações de uso real de linguagem. Por outro lado, o professor que não dispõe de
opções acaba tendo que organizar e planejar todo o programa das aulas, incluindo o conteúdo, os
objetivos, as atividades, as técnicas, etc., o que demanda trabalho dobrado. Sem o uso do livro o
conteúdo pode ficar mais solto e sem seqüencialidade. Ainda que a sobrecarga seja grande, alguns
professores põem em prática idéias maravilhosas e criativas no desenvolvimento de materiais
particulares, que por sua vez são muito úteis no ensino de línguas.
Na nossa sociedade, os livros simbolizam a materialização de um conhecimento, e por isso
são geralmente escritos por profissionais qualificados que dedicam estudos em um longo processo
de testagem em situações de ensino- aprendizagem antes de uma publicação massiva. Ainda que
seja considerado um elemento importante em cursos de línguas em algumas culturas, o livro deve
servir ao professor e não o contrário. Nas palavras de Cunningsworth (1984: 1) “os livros são bons
serventes, mas pobres chefes”. O professor que utiliza livro didático deve ter a liberdade de
formular e reformular os objetivos sempre pensando nas necessidades dos aprendizes, procurando
atender o seu contexto imediato. Mas como avaliar um livro-texto? Quais critérios seguir? Se o
livro não se encaixa em meu contexto, posso adaptá-lo? Como fazer? Vejamos estes pontos por
partes.
Delineando princípios e critérios para avaliar o livro didático
Embora cada professor avaliador possa estar preocupado com aspectos distintos na hora de
avaliar um determinado material, Cunningsworth (1984: 5-6) nos aponta que alguns princípios
devem ser considerados. Em primeiro lugar, os livros devem estabelecer as pontes entre as
necessidades dos aprendizes e os objetivos do programa. Em segundo lugar, os livros devem
contemplar a linguagem que o aprendiz fará uso, pensando em equipá-los a partir dos propósitos
específicos, pois há uma diferença entre a linguagem usada em sala de aula, de livros, e a
linguagem do mundo real. É necessário também que o livro não imponha um método rígido para a
aprendizagem – cada aluno tem formas distintas de aprender e neste sentido o livro deve apresentar
possibilidades que facilitem a aprendizagem. O quarto princípio diz que os livros devem ter um
papel claro de suporte para a aprendizagem, com veredas prazerosas e acessíveis ao aluno, pois
funciona apenas como mediador entre a linguagem apresentada, o processo de aprendizagem e o
aprendiz. Não se trata apenas de contemplar um desempenho lingüístico desejado ou de apresentar
os itens indicados, mas de centrar também no aprendiz, em seus desejos e sentimentos na relação
que estabelece com a língua alvo.
61
Em termos de conteúdo lingüístico, ou seja, o que é ensinado, o livro didático pode focar em
vários aspectos da linguagem – forma, função e estruturas comunicativas interacionais. O professor
deve ficar atento se o livro aborda estes aspectos sozinhos ou separadamente, se há mais ênfase em
um aspecto ou noutro, se a língua é abordada gramaticalmente ou comunicativamente e se a
estrutura delineada no material atende as necessidades dos alunos. Além disso, se o foco é na forma
(gramática) é necessário verificar os aspectos em evidência (ex.: aspectos fonológicos, lexicais e
discursivos) e de que forma são apresentados sugerindo-se a prática dos alunos. E as regras de uso,
como são tratadas? Há no livro algum momento para se trabalhar as etiquetas conversacionais e
culturais da língua alvo, permitindo ao aluno compreender como que a língua opera em situações
reais de uso da linguagem? Outro aspecto que o professor deve ficar atento é em relação às
variedades da língua – há menções sobre os dialetos (geográficos, de classe, idade), estilos (formal,
informal, neutro), gêneros discursivos (acadêmico, familiar, profissional)? Finalmente, quais
habilidades o livro propõe trabalhar e de que forma? Isoladamente ou de forma integrada? Esses e
outros questionamentos devem ser feitos, e para sistematizar alguns critérios para você avaliar os
livros daqui por diante, tomemos como base a adaptação feita e aqui traduzida dos itens sugeridos
em Robinett (1978: 249-251), McIntire (1982: 194-203) e Brown (1994: 150-151).
✓ habilidades expressivas
5. Conteúdo geral (O livro reflete o que é conhecido como língua(gem) e
aprendizagem de línguas?)
✓ validade – o livro abarca o que pretende alcançar?
✓ autenticidade da linguagem
✓ apropriação e ocorrência dos tópicos, situações, e contextos
✓ nível de proficiência – está de acordo com o nível esperado?
6. Qualidade do material para a prática
✓ exercícios – há uma variedade de exercícios controlados e livres?
✓ clareza nas direções – são claras tanto para os alunos quanto para o professor?
✓ participação ativa dos alunos – isto é encorajado efetivamente?
✓ explicação gramatical e lingüística – indutiva ou dedutiva?
✓ material de revisão – há suficiente exercícios de revisão?
7. Seqüência (Como o livro é ordenado?)
✓ através de estruturas gramaticais
✓ através de habilidades
✓ através de situações
✓ através de algum tipo de combinação dos elementos acima
8. Vocabulário (O livro dá atenção suficiente para o estudo das palavras?)
✓ relevância
✓ freqüência
✓ estratégias para análise das palavras
9. Fatores sociolingüísticos gerais
✓ variedade lingüística (local, regional, dialetos...)
✓ conteúdo cultural – o livro contempla aspectos culturais dos falantes da língua- alvo?
Há preconceitos culturais?
10. Específico para questões da língua de sinais
✓ as informações em relação a LIBRAS procedem?
✓ as partes transcritas são claras?
✓ como a iconicidade dos sinais é representada?
63
Sim. Mas em primeiro lugar, é necessário que você faça experimentos a partir das atividades
propostas no material, registrando se funcionam bem em que circunstâncias (entra em cena o
professor pesquisador). Só a partir deste levantamento é que será possível reformular atividades e
acrescentar e alterar os conteúdos. Além disso, cada contexto e cada aluno (conforme discutido
anteriormente) têm suas características e necessidades imediatas, e isto dará o norte para as suas
intervenções e criações. Exemplos de material lingüístico para casar com o conteúdo do livro
podem ser textos diversos na forma sinalizada e/ou escrita. Há nestas modalidades diversos gêneros
e tipos que devem ser utilizados no ensino. Vimos na disciplina de Lingüística Aplicada que os
64
gêneros discursivos (cf. Bakhtin) compreendem diversas formas e lá buscamos refletir como a
linguagem se apresentaria em gêneros formais e informais, por exemplo, na LIBRAS. Os alunos
ouvintes precisam utilizar a LIBRAS em conformidade com as regras discursivas presentes em cada
gênero (palestra, sermão, piada, contos, estórias, etc.). Podemos utilizar calendários, anúncios,
propagandas, fotos, mapas, menus de restaurante, livros infantis, tiras cômicas, etc. como fontes de
insumo para praticar e desenvolver o conhecimento lingüístico na LIBRAS. Você pode desenvolver
um arquivo para armazenar atividades que trabalhem as habilidades da LIBRAS ou conteúdos
lingüísticos específicos agregando técnicas distintas para a prática e participação dos alunos.
Lembre-se que a sua organização e classificação dos materiais irá facilitar o preparo de suas aulas
no decorrer de sua profissão.
Você também poderá incluir em seu arquivo materiais gravados na LIBRAS. Não esqueça,
todavia, que ao confeccionar este tipo de material será necessário pensar qual o objetivo que se quer
alcançar, ou seja, faça a pergunta: o que pretendo que meus alunos aprendam nesta atividade? Para
tanto, você precisa adequar a linguagem pensando sempre o nível de conhecimento lingüístico dos
alunos e a forma lingüístico-comunicativa que quer se focar. Faça um banco de dados com outros
colegas professores surdos, sistematizando todo o tipo de filmagem que possa ser trabalhado para
ensinar a língua de sinais e aspectos da cultura surda. Outra idéia é que a língua de sinais produzida
pelos alunos ouvintes pode ser gravada pelo professor como parte de uma atividade, e o professor
pode usar o material para explorar aspectos de vocabulário, gramática e a expressão corporal e
facial dos alunos. Quando o aluno se vê produzindo e falando na língua- alvo fica mais fácil
verificar, com o auxílio do professor, os pontos fortes e fracos de seu desempenho e expressão em
sinais, e neste sentido trabalhar questões específicas.
Continuando na trilha que discute os aspectos mais concretos da sala de aula, ou seja,
naqueles aspectos que, pautados em objetivos, necessidades e interesses são mais passíveis de
mudanças e implementos: o planejamento de cursos, unidades e aulas de língua de sinais. É sabido,
todavia, que a elaboração de um pode ou não contar com a participação do professor no momento
da sua elaboração. Da mesma forma as unidades. Isto por que, dependendo da instituição que você
atuará, pode ser o caso de já existir um delineamento ou projeto a se seguir, ou ainda um
determinado material didático. Nestes casos, não há muito o quê fazer a curto-prazo. O
planejamento das aulas, por outro lado, conta com a participação direta, efetiva e freqüente dos
professores. Isto significa dizer que todo professor, ao adentrar uma sala de aula, deve ter o seu
plano de ensino pré- desenvolvido para “gerenciar” os conteúdos a serem ministrados em cada
encontro com os alunos.
Os professores de LIBRAS (a maioria sem formação específica), por sua vez, têm ensinado
a partir de suas experiências como alunos (Gesser, 1999), integrando fragmentos importantes e
pioneiros de conhecimentos construídos sobre e na LIBRAS geralmente obtidos em cursos
intensivos oferecidos por associações de surdos e/ou a partir de algum projeto específico, como é o
caso exemplar do curso Libras em Contexto idealizado por lingüistas, intérpretes e professores
surdos em parceria do MEC e Feneis, ou ainda por se orientar em pesquisas estrangeiras. Hoje
contamos com a Licenciatura Letras-LIBRAS que se inscreve como mais uma ação de
compromisso com a comunidade surda, possibilitando uma formação reconhecida às pessoas que
pretendem atuar como professores de língua de sinais no Brasil.
O planejamento pode ser feito dependendo da necessidade. Diferentes situações
educacionais requerem diferentes planejamentos. No caso do ensino de LIBRAS para ouvintes,
especialmente devido ao que manda o decreto 5626, tem desenhado o surgimento de “situações
novas’ (pensemos na inclusão do ensino de LIBRAS como disciplinas optativas e obrigatórias nos
cursos de Licenciatura nas universidades). Em linhas gerais, pode-se afirmar que o planejamento
pode ser procedente em pelo menos dois casos: em contextos educacionais onde já exista um curso
implantado que precise ser revisto e modernizado, ou no processo de criação de contextos novos.
Estes podem ter natureza “geral” e “instrumental”. No primeiro o ensino da língua poder estar
relacionado a uma disciplina curricular em instituições pública ou em cursos “livres” – que são
oferecidos sem ter o elo com a grade curricular da formação acadêmica. Os cursos de natureza
instrumental, por outro lado, tem como base o ensino de língua para fins específicos – aprender o
idioma para viajar, para fazer negócios, para dar aulas de um determinado conteúdo, etc. (Almeida
Filho, 1997b). Há, no universo de ensino de LIBRAS, diversas possibilidades de cursos: para
alunos iniciantes, intermediários, avançados, cursos sobre a história e cultura surda, curso da
lingüística da LIBRAS, curso intensivo de datilologia, curso para professores de disciplinas
escolares (biologia, química, física, etc.), curso sobre a sociologia da surdez, estudos surdos, curso
para formar intérprete, etc.
Mas quais questões devem ser contempladas na elaboração de planejamento? (Almeida
Filho, 1997b: 38) sugere um roteiro composto de etapas distintas, mas interligadas entre si. Todo
planejamento deve ter uma fundamentação teórica explícita da abordagem de
ensino/aprendizagem de línguas. Uma vez definida a abordagem norteadora, é necessário fazer
uma análise do contexto de realização do curso, com levantamento de dados sobre a “política
educacional, número de aulas por semana, recursos físicos e humanos; e, aspectos individuais dos
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