1982 0216 Rcefac 16 3 0941
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RESUMO
Objetivos: avaliar o sistema auditivo periférico, por meio de audiometria tonal, em agricultores resi-
dentes em área de intenso uso de agrotóxicos no Estado do Rio de Janeiro. Métodos: foram avalia-
dos 70 indivíduos, de ambos os gêneros, moradores de Campos dos Goytacazes, com idade variando
entre 25 e 59 anos, sendo 35 agricultores e 35 não agricultores. Todos os indivíduos tiveram sua
audição periférica avaliada, por meio de audiometria tonal nas frequências de 250, 500, 1.000, 2.000,
3.000, 4.000, 6.000 e 8.000Hz. Foram excluídos indivíduos com alteração de orelha externa e média
e/ou com alguma queixa otológica. Além disso, foi realizada anamnese com questões relacionadas
à saúde, situação sócio-econômica, educação e exposição ao agrotóxico. Foi considerada perda
auditiva, os limiares maiores ou iguais a 25dB em qualquer das frequências testadas. Resultados:
o Odds Ratio de perda auditiva foi 3,67 vezes (IC95%: 2,08-6,48) maior entre agricultores (94,3%),
quando comparados aos não agricultores (25,7%). Além disso, a maior parte das alterações auditivas
foi observada nas frequências mais agudas. Conclusão: o presente estudo sugere que a atividade
agrícola e possivelmente a exposição a agrotóxicos aumenta o risco de perda auditiva.
por exemplo substâncias químicas que, consi- frequências de 1, 2, 3 e 4KHz e 47% apresentaram
deradas isoladamente ou em combinação com o perda auditiva bilateral nas frequências de 3, 4, 6 e
ruído, podem trazer e/ou potencializar os danos à 8KHz19.
saúde do trabalhador 8,9. O Brasil é um dos principais usuários de
Diversos estudos têm demonstrado que agrotóxicos no mundo, especialmente na agricultura.
substâncias químicas podem provocar danos ao Apesar disso, são raros os estudos que avaliaram
ser humano e ao meio ambiente. Ainda que o foco o impacto da exposição a essas substâncias sobre
principal dos estudos sobre saúde auditiva seja a a capacidade auditiva de agricultores brasileiros.
exposição a ruído, são cada vez mais frequentes os O presente estudo teve como objetivo avaliar o
estudos sobre os impactos das exposições químicas sistema auditivo periférico, por meio da audiometria
sobre a capacidade auditiva, especialmente de tonal, em agricultores residentes em uma área de
trabalhadores 10-13. As desordens sensoriais do intenso uso de agrotóxicos no Estado do Rio de
sistema auditivo também têm sido associadas às Janeiro.
drogas medicamentosas, como aminoglicosideos,
quinino e outras drogas14.
MÉTODOS
Existe a suspeita de que muitos compostos
químicos possam ser ototóxicos ou neurotóxicos,
mas poucas pesquisas foram realizadas para De acordo com as normas preconizadas para
sua confirmação.Entre os grupos de produtos estudos envolvendo seres humanos, este estudo
químicos descritos como potencialmente ototóxicos foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em
encontram-se os agrotóxicos. Muitos pesticidas Pesquisa (CEP) do Instituto de Estudos em Saúde
são neurotóxicos e potencialmente podem afetar Coletiva – Universidade Federal do Rio de Janeiro
a audição. Alguns estudos apontaram os organo- conforme a resolução CEP número de parecer
fosforados como potenciais causadores de perda 113/2009, processo número 51/2009. Todos os
auditiva permanente bilateral14-17. participantes do estudo foram orientados a respeito
dos procedimentos a serem realizados para a
Em estudo transversal realizado com 830
pesquisa, todas as dúvidas foram esclarecidas e
indivíduos, os achados sugeriram que o risco
assinaram o consentimento livre esclarecido.
de desenvolver disfunção cognitiva leve é de
aproximadamente cinco vezes maior no grupo de O presente trabalho é um estudo epidemio-
indivíduos expostos a pesticidas do que no grupo lógico, transversal.
de não expostos18. Foram avaliados 70 indivíduos, sendo 35
Em outro estudo realizado para estimar a preva- agricultores e 35 não agricultores, de ambos os
lência de alterações periféricas em um grupo de sexos, com idade variando entre 25 e 59 anos,
trabalhadores expostos a inseticidas organofos- moradores de Campos dos Goytacazes, sem queixa
forados e piretroídes, desordens auditivas foram auditiva. Entre estes, 54 eram do sexo masculino e
evidenciadas. Entre aqueles expostos apenas aos 16 do sexo feminino.
inseticidas, 63,8% apresentaram perda auditiva, Os agricultores foram recrutados de forma
com tempo médio entre início da exposição e início aleatória no Sindicato dos Trabalhadores Agrícolas
do aparecimento da perda de 7,3 anos. Para o de Campos dos Goytacazes, sendo que 35 se
grupo com exposição a ruído e agrotóxico a preva- encaixaram nos critérios de inclusão. Os agricultores
lência de perda auditiva foi de 66,7%, com tempo selecionados para a pesquisa apresentaram idade
médio para desenvolver de 3,4 anos14. A diferença média de 46,57 anos, sendo que para serem
encontrada entre o grupo de expostos apenas a incluídos era necessário que tivessem histórico de
pesticidas e os expostos simultaneamente a ruído e exposição crônica a inseticidas, fungicidas e/ou
agrotóxicos foi estatisticamente significante. herbicidas. A pesquisa audiológica foi realizada no
Em outro estudo, 1622 agricultores do estado próprio sindicato, em sala silenciosa, com cabine
de Nova York foram entrevistados por meio de audiométrica tratada acusticamente para realização
um questionário. Para avaliar a confiabilidade do do exame.
questionário, foram realizadas 376 audiometrias. O grupo controle foi recrutado no Hospital
Os resultados da pesquisa revelaram que 36% Municipal Geral de Guarus no ambulatório de
dos pacientes referiram apresentar perda auditiva, ortopedia e com funcionários do setor de limpeza,
caracterizado como alguma dificuldade para por apresentarem nível sócio econômico próximo
escutar em uma ou ambas as orelhas. No exame ao grupo de agricultores, foram excluídos todos
audiométrico 9% apresentaram perda auditiva que relataram exposição à ruído e produto químico
bilateral nas frequências de 0,5, 1 e 2KHz, ou história de alteração otológica. A idade média
29% apresentaram perda auditiva bilateral nas do grupo controle foi de 44,45 anos. A pesquisa foi
Para facilitar análise dos exames das audiome- agudas, o risco encontrado foi de 4,1 (IC95%: 1,5
trias foram realizadas as médias das frequências – 11,3) e 4,7 (IC95%: 1,7 – 13,0) para as orelhas
da fala (0,5 – 2KHz) e as médias das frequências direita e esquerda respectivamente.
altas (4 – 8KHz). Foram considerados resultados Para controlar variáveis de confusão, os resul-
alterados quando essas médias apresentaram tados foram ajustados por exposição a ruído, idade,
valores maiores que 20dB, segundo Frota20. Foram grau de escolaridade, consumo de cigarro, ingestão
analisados os riscos estimados de perda auditiva de álcool regularmente, uso de medicamentos
na orelha direita e esquerda para as médias das regularmente e presença de pressão alta.Foi
frequências da área da fala e das frequências altas. observado aumento no risco em todas as médias:
Entre os agricultores, na área da fala, o risco de para área da fala na orelha direita 17,0 (IC95%:
apresentarem perda auditiva foi de 12,7 (IC95%: 3,3 3,6 – 79,3) na orelha esquerda 14,8 (3,4 – 64,4),
– 49,2) para orelha direita e 9,2 vezes (IC95%: 2,7 frequências altas na orelha direita 7,1 (1,9 – 26,3) e
– 21,7) para orelha esquerda. Já nas frequências orelha esquerda 7,0 (2,0 – 23,8 (Tabela 3).
Tabela 3 - Risco estimado (OR) da associação entre trabalho agrícola e perda auditiva
Não
Agricultores ORb (IC 95%) ORa* (IC 95%)
agricultores
OD área fala 19 (54,28%) 3 (8,57%) 12,67 (3,26 – 49,23) 17,05 (3,66 – 79,39)
OE área fala 19 (54,28%) 4 (11,42%) 9,20 (2,67 – 21,66) 14,90 (3,44 – 64,48)
OD média agudos 23 (65,71%) 11 (31,42%) 4,182 (1,54 – 11,35) 7,14 (1,93 – 26,37)
OE média agudos 24 (68,57%) 11 (31,42%) 4,76 (1,73 – 13,06) 7,03 (2,08 – 23,84)
Legenda: ORb – OddsRatio Bruta; ORa – OR ajustada
* ajustado por exposição à ruído, idade, escolaridade, cigarro, álcool, medicamentos e pressão alta.
dB
ABSTRACT
Purposes: to evaluate the peripheral auditory system, by means of pure tone audiometry for farmers
living in areas of heavy use of pesticides in the State of Rio de Janeiro. Methods: 70 individuals of
genders, 35 farmers and 35 non-farmers, with ages between 25 and 59 years, residents Campos
dos Goytacazes, were enrolled into the study. All subjects had their peripheral hearing evaluated by
means of pure tone audiometry at frequencies of 250, 500, 1,000, 2,000, 3,000, 4,000, 6,000 and
8,000 Hz. Individuals with alterations in external and middle ear and/or with a otologic complaint were
excluded from the study. In addition, interview was conducted regarding health issues, socioeconomic
status, education and exposure to pesticides. Hearing loss was considered if hearing thresholds were
equal or more than 25 dB at any frequency tested. Results: the Odds Ratio of hearing loss was
3.67 times (95% CI: 2.08 - 6.48) higher among agricultural workers (94.3%) when compared to non-
agricultural workers (25.7%). Furthermore, most of the hearing alterations were observed in the higher
frequencies. Conclusion: this study suggests that the agricultural activity and possible exposure to
pesticides increases the risk of hearing loss.
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Recebido em: 03/09/2012
Aceito em: 06/12/2013