Ferraz - e - Fusari - A - Educação - Escolar - de - Arte - Tem Uma História

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Maria Heloísa C.

de 1 Ferraz
Maria F. de Rezende e Fusari

Metodologia do
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro , SP, Brasil)
Ensino de Arte
Ferraz, Maria Heloísa C . de T.
Metodologia do ensino de arte : fundamentos e proposições / Fundamentos e Proposições
Maria Heloísa C . de T. Ferraz, Maria F. de Rezende e Fusari. - 2. ed.
rev. e ampl. - São Paulo : Cortez, 2009.

Bibliografia.
I S B N 978-85-249-1465-2

1. Arte (Ensino médio) - Estudo e ensino I . Fusari, Maria F. de


Rezende e. I I . Título.
23 edição revista e ampliada por
Maria Heloísa C . de T. Ferraz

08-11533 CDD-707

índices para catálogo sistemático:


1. Arte : Estudo e ensino 707
A educação escolar de
Arte tem uma história
\&€DITORfi 37

; "O diálogo com o passado torna-o presente"


Alfredo Bosi ( 1 9 9 2 )

Neste capítulo, abordaremos o ensino de arte no B r a s i l ao longo d a


história, e como são constituídas as práticas pedagógicas artísticas n o s
seus diversos momentos. A correlação histórica e a contextualização do
processo educativo de arte nos f a z e m compreender as correntes sociais e
Foto 2
A u l a d e Arte, 1 9 9 1 . E s c o l a N. S. d a s G r a ç a s , SP
os rumos pedagógicos que m a r c a m o desenvolvimento dos conhecimentos
artísticos n a escola. Estes estudos objetivam r e d i m e n s i o n a r p o s i c i o n a -
mentos e n o v a s orientações sobre o trabalho de arte n a escolarização e
na sociedade no m u n d o contemporâneo.

1. Determinantes socíoculturaís

A s práticas educativas, a s s i m como as outias áreas de conhecimento,


surgem de mobilizações políticas, sociais, pedagógicas, filosóficas, e, n o
caso de arte, também de teorias e proposições artísticas e estéticas. Q u a n d o
aprofundamos nossos conhecimentos sobre essas articulações, e m c a d a
momento histórico, certamente aprendemos a c o m p r e e n d e r m e l h o r a
questão do processo educacional e s u a relação com a nossa v i d a .
N o B r a s i l , por e x e m p l o , f o r a m importantes os m o v i m e n t o s c u l t u -
rais n a correlação entre arte e educação desde o século 19. A fundação
de centios artísticos como a Escola de Belas-Artes no R i o de Janeiro, o
Conservatório Dramático e m Salvador, e a presença d a Missão F r a n c e s a
e de artistas europeus de renome, d e f i n i r a m nessa ocasião a formação d e
Foto 3
EMEI P a r a d a d e T a i p a s , SP, 2 0 0 5
A EDUCAÇÃO ESCOIAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA
METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 39

profissionais de arte ao nível institucional. N o século 20, f o r a m muitos


c) a promulgação da L e i de Diretrizes e Bases d a Educação Brasileira
os fatores sociais, educacionais e culturais a i n f l u i r n o ensino artístico. O
4024/61, que transformou a d i s c i p l i n a A r t e e m u m a "prática e d u c a t i v a "
início de movimentos modernistas como a " S e m a n a de 22", a criação de
(ensino ginasial), b e m como e m " a t i v i d a d e complementar de iniciação
u n i v e r s i d a d e s (anos 30), a manifestação das Bienais de São Paulo a partir
artística" (ensino colegial) e a substituição do C a n t o Orfeônico pela E d u -
de 1951, dos movimentos universitários ligados à culti-ira popular (anos
cação M u s i c a l ;
50/60), d a contracultura (anos 70), a introdução d a pós-graduação e m en-
sino de arte (anos 70), a organização profissional e a criação de associações d) o caos, os conflitos, os tecnicismos e a dependência c u l t u r a l de-

de arte-educadores (a partir dos anos 80), entre outros, a c o m p a n h a r a m o lineados no ensino de arte, após a introdução d a Educação Artística nas

ensino de arte e m s u a expansão n a educação f o r m a l e outras experiências escolas brasileiras c o m a L e i de Diretrizes e Bases 5.692/71;

(em m u s e u s , centros culturais, escolas de arte, conservatórios e t c ) . Desde e) a retomada de m o v i m e n t o s de organização de educadores ( p r i n -
o final do século passado, o debate m a i s eloquente é o d a globalização, o cipalmente as associações de arte-educadores), iniciada nos anos 80;
desenvolvimento tecnológico influenciando a educação, e as teorias d a f) a retomada das investigações e experiências pedagógicas no campo
recepção e d a crítica cultural. Consequentemente, as n o v a s orientações da arte; sistematizações de cursos ao nível de pós-graduação;
educativas, incluindo a arte, estão conectadas com as mudanças, propondo g) a formação de pesquisadores e consequente crescimento de pes-
encaminhamentos que consideram o ser h u m a n o e m seus aspectos singu- quisas n a área;
lares e múltiplos, consciente de sua condição como cidadão do planeta,
h) as novas concepções estéticas e tendências d a arte contemporânea,
m a s também preparado p a r a as transformações e p a r a ser transformador
m o d i f i c a n d o os h o r i z o n t e s artísticos e consequentemente a docência
e integrado e m sua cultura. e m arte;
Isto nos faz ver que as correlações dos m o v i m e n t o s culturais com a i) os debates sobre conceitos e metodologias do ensino de arte, realizados
arte e com a educação e m arte não acontecem no v a z i o , n e m desenraizadas e m caráter nacional e internacional, a partir dos anos 80;
das práticas sociais v i v i d a s p e l a sociedade como u m todo. A s mudanças
j) a luta p a r a inclusão d a obrigatoriedade de A r t e n a escola e a d i s -
que ocorrem são caracterizadas pela dinâmica social que interfere, mo-
cussão d a N o v a L e i de Diretrizes e Bases d a Educação N a c i o n a l , após a
dificando o u conservando as práticas vigentes.
Constituição Brasileira de 1988;'
Dentre as m a i s relevantes interferências sociais e culturais que m a r c a m
k) a promulgação d a L e i de Diretrizes e Bases 9.394/96, tornando o
o ensino e aprendizagem artísticos brasileiros podemos destacar:
ensino de arte componente c u r r i c u l a r obrigatório nos diversos níveis dçi
a) os comprometimentos do ensino artístico (desenho) c o m a i n d u s - educação básica;
trialização visando a u m a preparação para o trabalho (operários), originado
no século 19 durante o B r a s i l I m p e r i a l e presente até as p r i m e i r a s décadas
1 . A C o n s t i t u i ç ã o Federal de 1988 tratou d a e d u c a ç ã o básica, i n c l u i n d o a e d u c a ç ã o infantil, c o m o
do século 20; dever do E s t a d o e r e s p o n s a b i l i d a d e dos m u n i c í p i o s , a t r i b u i n d o " à U r ú ã o , aos estados e ao Distrito
Federal legislar concorrentemente sobre e d u c a ç ã o , cultura, ensino e d e s p o r t o " cf. José C a r l o s L i b â n e o
b) os princípios do liberalismo (ênfase na liberdade e aptidões i n d i v i -
et a l . , A estrutura e a organização do ensino no Brasil. S ã o Paulo: C o r t e z , 2003, p. 241-248. O r g a n i z a d a
duais) e do positivismo (valorização do racionalismo e exatidão científica), a sociedade, f o r a m discutidas no país inteiro as s u g e s t õ e s de r e d a ç ã o d a n o v a L e i de D i r e t r i z e s e
Bases d a E d u c a ç ã o N a c i o n a l , e, entre elas, o Projeto d e L e i n . 1.258-C, de 1988, que t a m b é m incluía
por u m lado, e d a experimentação psicológica, por outro, influenciando
a obrigatoriedade do ensino de arte n a e d u c a ç ã o básica. N e s s e Projeto, o ensino de arte tinha p o r
a educação escolar e m geral (escolas " t r a d i c i o n a l " e " n o v a " ) e também a finalidade: "... d e s e n v o l v e r a c r i a t i v i d a d e , a p e r c e p ç ã o e a s e n s i b i l i d a d e estética, respeitadas as es-

educação e m arte, ao longo do século 20; pecificidades de c a d a l i n g u a g e m artística, pela habilitação e m c a d a u m a d a s á r e a s , s e m prejuízo d a
i n t e g r a ç ã o das artes c o m as d e m a i s d i s c i p l i n a s " ( C a p . V I l , art. 33).
A EDUCAÇÃO ESCOLAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA
METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 41

1) a elaboração dos Parâmetros C u r r i c u l a r e s N a c i o n a i s de Arte pelo P a r a este estudo, apresentaremos u m a síntese das tendências pedagó-
Ministério de Educação ( M E C ) e o Referencial C u r r i c u l a r N a c i o n a l p a r a gicas mais influentes no ensino de arte no Brasil, com vistas à compreensão
a Educação Infantil n a última década do século 20.
da prática educacional d a arte e s u a relação c o m a v i d a dos brasileiros.
A preocupação c o m a educação e m arte t e m m o b i l i z a d o pesquisado-
res, professores, estetas e artistas, que p r o c u r a m f u n d a m e n t a r e intervir
nessas práticas educativas. N o Brasil, desde o f i n a l dos anos 80 têm-se
2. Tendências pedagógicas no ensino de Arte
d i v u l g a d o inúmeros trabalhos desta o r d e m , tanto aqueles elaborados
aqui quanto os de outros países. São propostas que refletem atuações em arte
O s tratados sobre a educação escolar brasileira i d e n t i f i c a m o século
e são baseadas:
19 como o marco d a sistematização do ensino e o predomínio do E s t a d o
• nas necessidades psicológicas dos alunos o u e m suas necessidades laico. A n t e c e d e n d o esse período, a educação escolar no B r a s i l foi, sobre-
e problemas ambientais, comunitários e sociais; tudo, responsabilidade de grupos religiosos, entre os quais p r e v a l e c e r a m
• no ensino e a p r e n d i z a g e m pensados a partir da própria arte, como os jesuítas. Depois das reformas do Marquês de P o m b a l e o período e m
u m sistema de conhecimento do m u n d o ; no conhecimento d a que D . J o ã o V I , rei de Portugal, trouxe a Corte ao B r a s i l (1808-1821), o
arte a d v i n d o do fazer artístico e t a m b é m d a apreciação e história Estado a s s u m i u as conduções do ensino.
da arte;
N o s colégios jesuíticos europeus, a educação estava v o l t a d a p a r a os
• nas articulações dos atos perceptivos e de verbalização dos a k m o s nobres e burgueses abonados, deixando completamente de lado a e d u c a -
como base d a experiência estética; ção popular. N o B r a s i l f u n d a r a m "escolas de ler e escrever" e de d o u t r i n a
• nos alcances e limites d a interdisciplinaridade e entre os diversos e m vários locais. A s crianças e r a m atraídas principalmente pelos métodos
métodos de ensinar e aprender os conhecimentos de arte; que os jesuítas u t i l i z a v a m , e que f a z i a m do conhecimento u m a t r a t i v o ,
• nas necessidades de mudanças d a formação do(a) professor(a) aproveitando a música, o canto coral, o teatro e mesmo u m grande aparato
de arte, v i s a n d o à m e l h o r i a d a qualidade de escolarização desde cerimonial. O s colégios criados por eles como suporte d a missão t i n h a m
a infância. por f i n a l i d a d e a formação religiosa e e r a m destinados aos filhos d a elite
da colónia. C o m relação aos nativos, e r a m educados nas missões e nos
A História que estamos considerando, portanto, é aquela que está sendo sistemas de " r e d u ç õ e s " destinadas à catequese. A s reduções, a s s i m c o m o
construída por professores e altmos e m suas práticas e teorias pedagógicas. as residências e os colégios, tornaram-se verdadeiras "escolas-oficinas"
E , observando a história do ensino artístico, percebemos o quanto nossas que f o r m a v a m artesãos e pessoas p a r a trabalhar e m todas as áreas fabris.
ações também estão demarcadas pelas concepções de cada época. Nesses locais, os "irmãos o f i c i a i s " e x e r c i a m e e n s i n a v a m vários ofícios,
É importante frisar-se também que o esforço de caracterização da tais como p i n t u r a , carpintaria, instrumentos m u s i c a i s , tecelagem etc. E m
história da educação brasileira, a partir d a análise das relações entre a cada redução no século 17 foi criada u m a escola de canto coral, música e
escola e a sociedade, p e r m i t i u identificar tendências que f o r a m denomi- dança. Segundo relatos, como o do abade suíço Clóvis L u g o n , e m seu l i v r o
nadas tradicional, n o v a , tecnicista e progressista. E s s a s tendências f o r a m A República "Comunista" Cristã dos Guaranis (1977), os nativos a p r e n d e r a m
percebidas e utilizadas como u m a matriz analítica das práticas pedagógicas i n c l u s i v e a construir e tocar os m a i s v a r i a d o s i n s t r u m e n t o s e t a m b é m
e das políticas públicas p a r a a educação. composição m u s i c a l .
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A EDUCAÇÃO ESCOLAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA
METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 43

Q u a n d o o Marquês de P o m b a l e x p u l s o u os jesuítas de P o r t u g a l e
do Brasil, e m 1759, o sistema educacional ficou desorganizado, e h o u v e
mudanças de algtms cursos, p r i n c i p a l m e n t e o de h u m a n i d a d e s , que era
a base dos estudos jesuíticos, e foi substituído por " a u l a s régias" ( G h i -
raldenijr.,2006).

A transferência da Corte e m 1808 m u d o u o cenário político, econó-


mico, educacional e cultural brasileiro.

Dentre as ações p r o m o v i d a s por D . J o ã o V I , gestou-se a formação


de u m Estado político e a composição do sistema e d u c a c i o n a l leigo e
superior. O sistema educacional escolar ficou estruturado e m três níveis:
primário (das p r i m e i r a s letras), secxmdário e superior. F o r a m c r i a d o s
também cursos profissionalizantes.

A n o v a o r d e m económica e social t a m b é m pedia reformas culturais.


A s s i m , v e m ao B r a s i l a convite do rei a Missão Artística Francesa, c o m a
incumbência de r e f o r m u l a r os padrões estéticos vigentes.

C o m a v i n d a d a Missão Artística F r a n c e s a , e m 1816, f o i c r i a d a a


Escola Real das Ciências, A r t e s e Ofícios no R i o de Janeiro (Decreto R e a l
Figura 3
de 12 de agosto desse ano), transformada, dez anos depois, e m I m p e r i a l Jean-Baptiste Debret ( 1 7 Ó 8 - 1 8 4 8 ) — Ilustração
A c a d e m i a e E s c o l a de Belas-Artes. Este ato p e r m i t i u a instalação oficial
do ensino artístico no B r a s i l , m a s que a c o m p a n h a v a as orientações de
instituições s i m i l a r e s europeias. O s artistas e técnicos nomeados t i n h a m O desenho e outias d i s c i p l i n a s artísticas e r a m ensinados nas escolas
como modelo as academias de arte d a E u r o p a , as quais se b a s e a v a m n a primárias, secrmdárias e n o r m a i s (escolas p a r a formação de professores)
estética neoclássica, valorizando categorias como a h a r m o n i a , o equilíbrio e nos liceus de artes e ofícios, que f o r a m criados c o m feições m a i s profis-
e o domínio dos materiais. N a s aquarelas, desenhos e g r a v u r a s de Debret^ sionalizantes e tendo orientações pedagógicas e estéticas definidas. N o s
artista que veio ao B r a s i l com a Missão Francesa, é possível perceber-se liceus de artes e ofícios (denominados e m a l g u m a s regiões como escolas
o ideário de u m a n o v a c u l t u r a artística e, neste caso especial, também de artes e ofícios)^, procurava-se atender à d e m a n d a de preparação de
a riqueza das imagens que registraram o cotidiano e a v i d a no período habilidades técnicas e mão-de-obra especializada, consideradas f i m d a -
colonial (fig. 3). mentais à urbanização e expansão d a indústria nacional.

2 . Jean-Baptiste D e b r e t n a s c e u e m Paris e m 18 de a b r i l de 1768 e faleceu nessa m e s m a c i d a d e 3 . Ver A l m e i d a , J o s é R i c a r d o Pires, Instrução pública no Brasil (1500-1889). História e legislação,

e m 28 de j u r A o de 1848. C h e g o u ao Brasil e m 1816 c o m a M i s s ã o F r a n c e s a e v i v e u a q u i por q u i n z e T r a d . de p u b l i c a ç ã o francesa de 1889 p o r A n t o n i o C h i z z o t t i . 2. e d . rev.. S ã o P a u l o ; E D U C , 2000.

anos. Ver Debret, Jean-Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Belo H o r i z o n t e ; Itatiaia; S ã o P a u l o : p. 179. Ver t a m b é m M a n f r e d i , S i l v i a M a r i a . Educação profissional no Brasil, S ã o P a u l o : C o r t e z , 2002,

E d i t o r a da U n i v e r s i d a d e de S ã o Paulo, 1989. p. 78: entre 1858 e 1886 foram c r i a d o s os liceus d o R i o d e Janeiro, S a l v a d o r , Recife, São P a u l o , M a -
ceió e O u r o Preto.
A EDUCAÇÃO ESCOWR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 45

N o Brasil, como na Europa, o desenho era considerado a base de todas O ensino de desenho nas escolas primárias e secundárias valorizava o tiaço,
as artes, tornando-se matéria obrigatória nos anos iniciais de estudo d a o contorno, a configuração, e era voltado sobretudo p a r a o aprimoramento
A c a d e m i a I m p e r i a l . N o ensino primário e secundário, o desenho também do conhecimento técnico e estética neoclássica. Daí ser muito reconhecida
tinha por objetivo ser útil e desenvolver as habilidades gráficas, técnicas a habilidade de saber copiar as figuras, objetos o u outios desenlios que
e o domínio d a racionalidade. C o m isso, os professores p r e p a r a v a m os e r a m apresentados pelo professor. Este, apoiado e m referenciais de ordem
alunos p a r a serem, no futuro, bons profissionais e com formação regida imitativa, levava aos alimos os modelos que e r a m selecionados da tradição
por regras fundamentadas no pensamento dominante, como a estética d a clássica o u de livros, p a r a serem repetidos pelos aprendizes. O perfeito
"beleza e do b o m gosto". conhecimento das formas como a reprodução de desenhos de ornatos (es-
C o m relação à música, que era a manifestação artística preferida d a tilização de elementos naturais), a cópia e o desenho geométiico^ v i s a v a à
corte portuguesa, somente a partir de 1854 é que foi estabelecido oficial- preparação do estudante p a r a a v i d a profissional e p a r a as atividades que
mente o s e u ensino nas escolas brasileiras,* pois, até esse momento, fazer se d e s e n v o l v i a m tanto e m fábricas quanto e m serviços artesanais.
músi^ca n a escola significava p r i n c i p a l m e n t e cantar seguindo as formas O s programas de desenho do n a t u r a l , desenho decorativo e dese-
e temas europeus. E m documentos como a publicação de José R i c a r d o n h o g e o m é t i i c o e r a m centrados nas representações c o n v e n c i o n a i s de
Pires de A l m e i d a (2000) sobre a Instrução pública no Brasil (1500-1889), vê- imagens; os conteúdos e r a m b e m d i s c r i m i n a d o s e a b r a n g i a m noções de
se claramente citados a obrigatoriedade das disciplinas Desenho Linear, proporção, perspectiva, construções geométricas, composição, esquemas
Música e Ginástica no ensino primário. de l u z e sombra. N a s Escolas N o r m a i s , os cursos de desenho incluíam
N a s famílias m a i s abastadas, as m e n i n a s e r a m educadas e m s u a s a i n d a o "desenlio p e d a g ó g i c o " , e m que os alunos a p r e n d i a m esquemas
casas, onde t i n h a m aulas de música (piano) e bordado, entie outias. de constiuções gráficas p a r a " i l u s t i a r " suas aulas.
Nesse período, a nossa historiografia não i n f o r m a sobre o ensino de N e s s a concepção t r a d i c i o n a l de educação, o que v a l e sempre é o pro-
teatio. Aparentemente, foi João Caetano q u e m primeiro tentou criar u m a duto a ser alcançado: é m a i s importante o resultado dos trabalhos do que o
Escola de A r t e Dramática no Rio de Janeiro, e m meados do século 19, m a s desenvolvimento dos alunos e m arte. Isto ficava (e fica ainda) evidente pela
sem conseguir efetivá-la''. preocupação com as mostras dos trabalhos em finais de períodos escolares,
como ocorria também com as apresentações de música (canto orfeônico),
de teatro e até de dança, especialmente preparadas p a r a esse fim.
A "Pedagogia Tradicional" e as aulas de Arfe
D o ponto de v i s t a m e t o d o l ó g i c o , os p r o f e s s o r e s , s e g u i n d o essa
" p e d a g o g i a t r a d i c i o n a l " (que p e r m a n e c e até hoje), e n c a m i n h a v a m os
N a s primeiras décadas do século 20, o ensino de arte, mais especial-
conteúdos através de atividades a serem fixadas p e l a repetição e t i n h a m
mente o desenho, apresentava-se i m p r e g n a d o do sentido utilitário de
por finalidade exercitar o olho, a m ã o , a inteligência, a memorização, o
preparação técnica para o tiabalho, irúciado no século anterior. N a prática.

6. C o m a R e f o r m a E d u c a c i o n a l C a r l o s M a x i m i l i a n o (Dec, n. 11.530) n o p e r í o d o de 1915 a 1925,


4. O decreto que instituía o ensino da m ú s i c a n a s escolas públicas i n d i c a v a a p e n a s que d e v e r i a
o d e s e n h o g e o m é t r i c o foi incluído tanto p a r a a escola p r i m á r i a c o m o s e c u n d á r i a . E m 1931, a r e f o r m a
h a v e r " n o ç õ e s d e m ú s i c a e exercícios de canto", c o n f o r m e nos d i z F o n t e r r a d a , M a r i s a T r e n c h , De
F r a n c i s c o C a m p o s (Dec. n. 19.890) d i s p ô s sobre a o r g a n i z a ç ã o do e n s i n o s e c u n d á r i o . N a n o v a estru-
tramas efios. Um ensaio sobre música e educação. São P a u l o , E d i t o r a U N E S P , 2005, p. 194.
tura c o n s t a v a m as d i s c i p l i n a s : D e s e n h o e M ú s i c a ( C a n t o O r f e ô n i c o ) . E m 1942, G u s t a v o C a p a n e m a
5. Ver Santana, A r ã o P a r a n a g u á de. Teatro efiirrnação de professores. São Luís: E D U F M A , 2000, p r o m u l g o u a L e i O r g â n i c a do E n s i n o S e c u n d á r i o ( D e c . n. 4.244) e o n o v o c u r r í c u l o i n c l u i u D e s e n h o ,
p.85. C a n t o O r f e ô n i c o e Trabalhos M a n u a i s .
METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE *7
) 46 A EDUCAÇÃO ESCOLAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA

A s s i m , a i n d a nesse m o m e n t o , o ensino e a a p r e n d i z a g e m de arte


gosto e o senso m o r a l . É importante frisar-se que os conteúdos desta m o -
c o n c e n t r a m - s e a p e n a s n a " t r a n s m i s s ã o " de conteúdos reprodutivistas,
dalidade pedagógica e r a m considerados verdades absolutas e a relação
d e s v i n c u l a n d o - s e d a r e a l i d a d e social e das diferenças i n d i v i d u a i s . O s
do professor c o m o aluno tinha u m caráter b e m m a i s autoritário. O u t r o
conteúdos e r a m percebidos e trabalhados como u m f i m e m s i m e s m o . O
ponto a ser considerado sobre a "pedagogia t r a d i c i o n a l " é a importância
conhecimento continua centrado no professor, que p r o c u r a d e s e n v o l v e r
de perceber-se nesta tendência aquilo que pode ser modelar e, portanto,
e m seus alunos t a m b é m a memorização, habilidades m a n u a i s e h á b i t o s
) perpassa o tempo e está sempre a t u a l e aquilo que é ultrapassado (peda-
\, artística e esteticamente) e, portanto, necessita ser superado. Por de precisão, organização e l i m p e z a , mas sem deixá-los criar o u e x p l o r a r

exemplo, as mostras de trabalhos de alunos são importantes e d e v e m ser essas habilidades.

exploradas, m a s , s e m influenciar a produção dos trabalhos, s e m preocu-


pações c o m o " b e m acabado" e, se possível, ter a participação dos alunos
^ nas escolhas das obras; assim, as mostras tomam-se momentos importantes A "Pedagogia Nova" e as aulas de Arfe
) de comimicação entre os educandos e a comtmidade.

) A partir dos anos 50, além do Desenho, f a z i a m parte do currículo A "Pedagogia N o v a " , t a m b é m conhecida por M o v i m e n t o d a E s c o l a
) escolar as matérias Música, C a n t o Orfeônico e Trabalhos M a n u a i s , que N o v a , tem suas origens n a E u r o p a e Estados U n i d o s (século 19), e no B r a s i l
> m a n t i n h a m de a l g u m a forma o caráter e a metodologia do ensino artístico v a i surgir a partir de 1930, passémdo a ser d i s s e m i n a d a dos anos 40 aos
anterior. O Canto Orfeônico, e m particular, fora instituído por Villa-Lobos 60 c o m as escolas experimentais. E s s e m o v i m e n t o s u r g i u com o Manifesto
com a finalidade de difundir ideias sobre u m a pedagogia revolucionária dos pioneiros da Educação Nova (1932) e foi resultante das reivindicações e
que pudesse levar às novas gerações e a toda a sociedade o acesso à arte conscientização de d i v e r s a s mobilizações sociais sobre a necessidade de
' culta, assim como o folclore, sinónimo de nossa brasilidade: "... a consciên- democratização da educação brasileira. Estruturado c o m base pedagógica
) cia m u s i c a l d a criança não deve ser f o r m a d a tão-somente pelo estudo dos renovada, defendia u m a escola piiblica obrigatória p a r a todas as classes
) mestres clássicos estrangeiros, m a s simultaneamente pela compreensão sociais.''
) racional e quase intuitiva das melodias e dos ritmos fornecidos pelo próprio
N a Escola N o v a , a ênfase é a expressão como u m dado subjetivo e i n d i -
folclore n a c i o n a l " ^. N o entanto, firmara-se pela valorização dos aspectos
v i d u a l que os alunos m a n i f e s t a m e m todas as atividades, as quais p a s s a m
nacionalistas, noções de c i v i s m o e organização. A temática das músicas
de aspectos intelectuais p a r a afetivos. A preocupação c o m o método, c o m
escolhidas era diversificada e c o m base n a c u l t u r a popular brasileira. O
o aluno, seus interesses, s u a espontaneidade e o processo do trabalho carac-
' canto e m conjimto era enriquecido com as variedades melódicas o r i u n d a s
terizam u m a pedagogia essencialmente experimental, fLmdamentada e m
) das diferentes canções folclóricas, o que poderia favorecer o d e s e n v o l v i -
novos estudos pedagógicos, filosóficos e psicológicos. F o r a m importantes
) mento d a educação estética, mas a formalização pedagógica tradicional e
no desenrolar desse m o v i m e n t o as reflexões assentadas nos trabalhos de
V o conservadorismo d e r a m lugar às conduções reprodutivistas e diretivas
dos professores e demais gestores escolares.'^ psicanálise, psicologia c o g n i t i v a e gestalt.

B r a s i l ria S E M A ( S u p e r i n t e n d ê n c i a d e E d u c a ç ã o M u s i c a l e Artística), q u a n d o p r e p a r o u t a m b é m u m
7. Ver V i l l a - L o b o s , s . d . , p. 33 a p u d L i s b o a , A l e s s a n d r a C o u t i n l i o , Villa-Lobos e o Canto orfeônico:
Guia prático.
Miísica, n a c i o n a l i s m o e i d e a l civilizador. São P a u l o : U n e s p , 2005, p. 28. D i s s e r t a ç ã o de M e s t r a d o .
9. Ver L i b â n e o , J o s é C a r l o s et a l . Educação escolar: políticas, e s t r u t u r a e o r g a n i z a ç ã o . S ã o P a u l o :
8. A p a r t i c i p a ç ã o d e V i l l a - L o b o s deu-se i n i c i a l m e n t e e m 1930, q u a n d o a p r e s e n t o u ao G o v e r n o
C o r t e z , 2003.
de São P a u l o u m p l a n o de e d u c a ç ã o m u s i c a l ; dois a n o s d e p o i s foi n o m e a d o s u p e r v i s o r m u s i c a l no
48 A EDUCAÇÃO ESCOIAR DE ARTE TEM UMA HISTORIA METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 49

Diferentes autores marcaram com suas ideias os trabalhos dos pro-


fessores de Arte no Brasil, firmando a tendência da "Pedagogia N o v a " no
século 20. Entre eles destacam-se John D e w e y (a partir de 1900) e Viktor
-•-f*.j»

Lowenfeld (a partir de 1939), dos Estados Unidos, e Herbert Read (a partir


de 1943), da Inglaterra. C o m a publicação de seu livro Educação pela arte
(traduzido e m vários países), R e a d contribuiu para a formação de u m •3
dos movimentos mais significativos do ensino artístico. Influenciado por
esse movimento e m nosso país. Augusto Rodrigues liderou a criação d a
"Escolinha de Arte do B r a s i l " , no R i o de Janeiro (em 1948), estruturada
nos moldes e princípios d a "Educação Através d a Arte"'° e que depois se
Figura 4
expandiu para vários estados brasileiros:
D e s e n h o d e c r i a n ç a , grafite e lápis d e cor s/ p a p e l ,
2 0 x 3 0 c m . Biblioteca Infantil, 1 9 3 7
C o l . M ó r i o d e A n d r a d e - lEB/USP
Estava muito preocupado em liberar a criança através do desenho, da pintura.
Comecei a ver que o problema não era esse, era um problema muito maior,
era ver a criança no seu aspecto global, a criança e a relação professor-alimo, A s palavras de Augusto Rodrigues sintetizam as ideias da Escola N o v a ,
a observação do comportamento delas, o estímulo e os meios para que elas que v i a o aluno como ser criativo, a quem se devia oferecer todas as condi-
pudessem, através das atividades, terem um comportamento mais criativo, ções possíveis de expressão artística, supondo-se que, assim, ao "aprender
mais harmonioso. fazendo", saberiam fazê-lo, também, cooperativamente, n a sociedade.
As crianças vinham cada vez mais, e as idades eram as mais diferentes. Feliz-
O ensino de arte, portanto, direciona-se p a r a a expressão livre da
mente, tínhamos duas coisas muito positivas para um começo de experiência
criança e o reconhecimento de seu desenvolvimento natural. O movimento
no campo da educação, através de uma escola. A experiência era feita em
modernista favorece muito essa nova interpretação e surgem debates sobre
campo aberto, e a diferença de idades também foi outra coisa fundamental
a importância da livre expressão como u m fator d a formação artística e
para que eu pudesse entender, um pouco, o problema da criança e o da
estética. C o m o decorrência desses fatos, as novas orientações artísticas
educação através da arte. Deveríamos ter um comportamento aberto, livre
com a criança; uma relação em que a comunicação existisse através do fazer e fortaleceram o reconhecimento e valorização do desenho espontâneo,
não do que pudéssemos dar como tarefa ou como ensinamento, mas através por exemplo, como condição para u m novo processo educativo no q u a l
do fazer e do recorúiecimento da importância do que era feito pela criança aprender é igual a aprender fazendo e com liberdade. Desde os anos de
e da observação do que ela produzia. De estimulá-la a trabalhar sobre ela 1930, artistas e intelectuais brasileiros como A n i t a Malfatti, Flávio de
mesma, sobre o resultado último, desviando-a, portanto, da competição e C a r v a l h o , Osório Cesar e Mário de A n d r a d e , entre outros, motivaram-se
desmontando a ideia de que ali estavam para ser artistas (Depoimento de pelas produções artísticas das crianças, analisando e colecionando seus
Augusto Rodrigues, 1980: 34). tiabalhos e também realizando exposições (fíg. 4 ) . "

10. Ver Instituto N a c i o n a l de E s t u d o s e P e s q u i s a s E d u c a c i o n a i s , Escolinha de Arte do Brasil. 11. A C o l e ç ã o de desenhos de c r i a n ç a s de M á r i o de A n d r a d e faz parte do acervo do Instituto
Brasília: I N E P , 1980. Ver t a m b é m A z e v e d o , F e r n a n d o A n t o n i o G o n ç a l v e s de. Movimento Escolinhas de de E s t u d o s Brasileiros d a U n i v e r s i d a d e de São P a u l o e foi e s t u d a d a p e l a p e s q u i s a d o r a Rejane
Arte: e m cena m e m ó r i a s de N o é m i a Varela e A n a M a e Barbosa. São Paulo: E s c o l a de C o m u n i c a ç õ e s G a l v ã o Coutiiúio e m s u a tese de D o u t o r a d o A coleção de desenhos infantis do acervo Mário de Andrade,
e Artes d a U n i v e r s i d a d e de São Paulo, 2000 ( d i s s e r t a ç ã o d e Mestrado). apresentada à Escola de C o m u n i c a ç õ e s e Artes d a U n i v e r s i d a d e de S ã o Paulo, e m 2002. Sobre as
50 A EDUCAÇÃO ESCOLAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA
METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 51

A Educação M u s i c a l representa ainda u m a efetiva mudança de con-


mensão, a arte deixa de ser compreendida como u m campo preferencial
cepção pedagógica e artística a partir d a segimda metade do século pas-
de saberes sistematizados e, como as demais, tornam-se u m a prática p a r a
sado, quando passa a ocupar o espaço da música nas escolas por decreto
aprimorar a "personalidade" e hábitos dos adolescentes. Os cursos de for-
oficial.'- O Canto Orfeônico persistira até os anos 50, mas foi substituído
mação de professores de Música, Artes Plásticas e Desenho, por exemplo,
por essa n o v a orientação de ensino da música que b u s c a v a desenvolver a
eram pouquíssimos, havendo, portanto, u m a grande carência de docentes
percepção auditiva, o ritmo, a expressão corporal, o trabalho e m conjunto,
nessas Imguagens artísticas para assumir o ensino de arte, incluindo o
estimulando as crianças e jovens a improvisar, a criar e a experimentar
Teatro, que foi instituído e m muitas escolas. Surgem desse modo n o v o s
sons e instrumentos. A Educação M u s i c a l era obrigatória desde o Jardim-
cursos de licenciatura e o reconhecimento dos já existentes.
de-Infância (Educação Infantil) e seguia os rumos e as orientações de ex-
periências educativas que se desenrolavam principalmente n a E u r o p a . " Embora e m nosso país o movimento escolanovista não tenha atingido
todas as camadas sociais e a escola pública de muitas regiões, intimeros
Essa proposta de alteração de ensmo de música esbarrava com u m
professores p u d e r a m aprimorar-se. A m p l i a r a m seus métodos, b u s c a r a m
problema: os professores necessitavam de mais conhecimentos sobre esses >
por conta própria informações e passaram a trabalhar com atividades que
assuntos, e poucos tiveram e m s u a formação noções das novas aborda-
m o t i v a v a m o estudante, seu interesse, e v a l o r i z a v a m sua espontaneidade.
gens metodológicas. C o m isso, muitos tiveram de recorrer a cursos de
Os professores estavam atentos às particularidades dos seus alimos, suas
atualizações e aos livros que d i f u n d i a m os novos métodos.
mdividualidades que se s o m a v a m às experiências sociais do trabalho co-
A L e i de Diretrizes e Bases d a Educação Brasileira n . 4024 de 20 de letivo e da inserção n a comunidade (métodos como trabalho e m equipe,
dezembro de 1961 trouxe ainda outras mudanças: a principal foi a resposta estudos do meio, centros de interesse e t c ) .
às questões originadas do novo contexto em que se v i v i a no país e das
E m síntese, n a Pedagogia N o v a , o ensino e a aprendizagem de arte
discussões no âmbito educacional, definindo claramente o papel do Estado
referem-se às experimentações artísticas, inventividade e ao conhecimento
na educação e optando pelo caráter humanístico do ensino e a formação
de s i próprio, concentrando-se n a figura do aluno e n a aquisição de sabe-
do aluno. Propôs u m a organização do currículo escolar compreendendo
res vinculados à sua realidade e diversidade i n d i v i d u a l . Essa mudança
disciplinas e práticas educativas'*, entre elas a arte. C o m essa n o v a d i -
de foco foi muito importante, pois colocou ênfase no educando — o u ser
que aprende — e não apenas no conhecimento.
e x p o s i ç õ e s que m a r c a r a m o p e r í o d o , ver á " S e m a n a dos loucos e das c r i a n ç a s " , o r g a n i z a d a por
Flávio de C a r v a l h o c o m a c o l a b o r a ç ã o de O s ó r i o C e s a r no C l u b e dos Artistas M o d e r n o s ( C A M ) e m
S ã o Paulo, e m 1933: Ferraz, M . Heloísa C . T . Arte e loucura. Limites do imprevisível, S ã o Paulo: L e m o s
Editorial, 1998, p. 42-44.
A "Pedagogia Tecnicista" e as aulas de Arfe
12. A i n t r o d u ç ã o d a E d u c a ç ã o M u s i c a l nos "Jardtns-de-Infância, n a s E s c o l a s P r é - P r i m á r i a s ,
P r i m á r i a s , S e c u n d á r i a s e N o r m a i s " deu-se c o m o Decreto Federal n. 51.215 de 2 1 / 8 / 1 9 6 1 .

13. F o r a m muito importantes as contribuições de C a r l Orff ( A l e m a n h a ) , E m i l e Jacques Dalcroze Pode-se considerar como u m marco dessa tendência tecnicista a insti-
(Suiça) e Zoltan Kodály (Hungria). tuição da L e i n . 5.692/71, que introduz a Educação Artística no currículo
14. Conf. Janete de A n d r a d e Sartori, e m s u a d i s s e r t a ç ã o de M e s t r a d o , A arte da fazer Arte
escolar de 1°. e 2°. G r a u s (Ensino Fundamental e Médio). A s disciplinas de
na escola: resgate histórico e prática docente, São Paulo, Centro Universitário Salesiano, 2000, p. 36, a
distinção entre disciplinas e práticas educativas foi estipulada no Parecer n . 131/62 do C F E : "as
arte existentes, como Desenho, Música, Trabalhos Manuais, Artes Aplicadas,
atividades que d e v e m atender às necessidades do adolescente de ordem física, artística, cívica, m o r a l Educação Musical, deixam de existir e os professores têm que complementar
e religiosa, colocam o acento principal na m a t u r a ç ã o d a personalidade, c o m a f o r m a ç ã o dos hábitos
suas formações. A s dificuldades são inúmeras. Os professores aderem e m
correspondentes, embora necessitem t a m b é m da a s s i m i l a ç ã o de certos conliecimentos".
suas práticas às orientações pedagógicas tradicional e escolanovista, sem
52 A EDUCAÇÃO ESCOIAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA MEFODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 53

questionamentos ou reflexões sobre o que seria melhor para o ensino de teriais didáticos, como apostilas, livros e m a n u a i s curriculares. O s livros
arte. Enfatiza o "saber construir" reduzido aos seus aspectos técnicos e ao didáticos nos anos 70/80 estão e m pleno auge mercadológico, apesar de
uso de materiais diversificados (sucatas, por exemplo), ao mesmo tempo sua discutível qualidade e não-compartilhamento de recursos para o apri-
em que admitem o "saber exprimirem-se" espontaneísta, na maioria dos moramento dos conceitos de arte. A l g u m a s revistas de grande circulação
casos caracterizando poucos compromissos com o conhecimento de lin- contribuíram para a divulgação e adesão ao ideário tecnicista'^
guagens artísticas, que se transformam e m meras atividades.
Segundo o educador José C e r c h i F u s a r i , u m resultado desastroso d a
A tendência tecnicista manifesta-se principalmente a partir da segun- influência tecnicista n a educação escolar foi a descrença gerada no pro-
da metade do século 20, no m u n d o , e a partir de 1960/1970, no Brasil, fessorado, incluindo os professores de Arte, e m relação ao planejamento
seguindo as mudanças ocorridas n a sociedade i n d u s t r i a l e tecnológica e do ensino. Planejar as aulas, ao invés de transformar-se e m algo desejado,
as novas metas económicas, sociais e políticas. necessário e até prazeroso, transformou-se e m u m pesadelo para os profes-
N a "Pedagogia Tecnicista", o professor tende a ser responsável por sores, pois tiveram que adotar o modelo mecanicista de produzir planos,
seu planejamento, que deve se mostrar competente e incluir os elementos nos quais t i n h a m que executar a modelagem dos objetivos educacionais,
curriculares essenciais: objetivos, conteúdos, estratégias, avaliação. A d i - passando para os conteúdos, às estratégias e à avaliação. E não u m a pro-
nâmica do ensino e da aprendizagem não é questionada, pois o elemento posta n a qual esses elementos se interdependem e dialogam entre s i " .
principal é o sistema técnico de organização da aiãa e do curso. Orientados por
u m a concepção mais mecanicista, os professores brasileiros passaram a
tratar seus planejamentos e planos de aulas centrados nos objetivos que Tendência Realisfa-Progressisfa e o ensino de Arfe
eram operacionalizados de forma minuciosa. C o m isso, p o d i a m verificar
as mudanças nos comportamentos dos alunos segundo o estabelecido Segtmdo Libâneo (1985), a tendência progressista manifesta-se nos
nesses objetivos, e a s s i m atender às n o r m a s sociais. F a z parte a i n d a movimentos pedagógicos que apontam p a r a u m a anáUse crítica das rea-
desse contexto tecnicista a recomendação do uso abundante de recursos lidades sociais e u m a educação conscientizadora.
tecnológicos, audiovisuais, sugerindo u m a " m o d e r n i z a ç ã o " do ensino. A s s i m , ao lado das tendências pedagógicas tradicional, escolanovista
A l g u m a s escolas trabalhavam inclusive com gravadores, projetores de e tecrúcista, desponta no Brasil, entre 1961 /1964, u m importante trabalho
slides e filmes, além de outros meios, como o mimeógrafo, cartazes etc. desenvolvido por Paulo Freire, que repercutiu politicamente pelo seu mé-
A educação escolar, como já explicitado anteriormente, tem u m cará- todo revolucionário de alfabetização de adultos. Voltado para o diálogo
ter de intencionalidade (objetivos educacionais) e sistematização (atende educador-educando e visando à consciência crítica, influencia principal-
às características dos sistemas de ensino, por exemplo, a seriação, ciclos mente movimentos populares e a educação não-formal. Retomado a partir
e t c ) . Para desenvolver o processo de ensino e aprendizagem, a educação de 1971, é considerado nos dias de hoje como u m a "Pedagogia Libertadora",
escolar necessita de u m a base técnica, que é necessária e bem-vinda. O e m u m a perspectiva de consciência crítica d a sociedade.
que ocorre principalmente a partir da intiodução da L D B N n. 5.692/71 é a Partia de u m a concepção de filosofia d a educação de que o h o m e m
supervalorização da dimensão técnica da educação, sem bases reflexivas, é o "sujeito da história" e não seu "objeto". E , no Brasil, que v i v e r a seu
o que acaba no seu desvirtuamento para o tecnicismo.

Devido à ausência de bases teóricas mais fundamentadas, muitos 15. Ver as revistas Escola, Nova Escola, Ensino, publicadas d e s d e a d é c a d a de 1980.

seguem os planejamentos, as propostas e atividades d i v u l g a d a s por m a - 16. Depoimento do prof. José C e r c h i F u s a r i à autora e m j u n h o de 2008.
METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 55
54 A EDUCAÇÃO ESCOIAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA

confrontada com o saber trazido de fora. O professor é mediador da relação


passado colonizado, subjugado e dependente, segundo a análise do filósofo
pedagógica — um elemento insubstituível. É pela presença do professor
e professor Paulo G h i r a l d e l l i (2006, p. 107), seria necessário romper c o m que se torna possível uma "ruptura" entre a experiência pouco elaborada
essa situação, e libertar as pessoas, principalmente o h o m e m simples, de e dispersa dos alunos, rumo aos conteúdos culturais, permanentemente
sua incapacidade de manifestar-se. Desse modo, a educação seria f u n d a - reavaliados face às realidades sociais (Cenafor, 1983, p. 30).
mental para "forjar u m a n o v a mentalidade, trabalhar p a r a a conscienti-
zação do homem brasileiro frente aos problemas nacionais e engajá-lo n a A educação escolar deve assumir, por meio do ensino e d a aprendiza-
luta política". Para Paulo Freire, essa atuação junto ao sujeito oprimido, gem do conhecimento acumulado pela humanidade, a responsabiUdade
aquele que não aparece, nern tem voz na sociedade — mas também produz de dar ao educando o i n s t i u m e n t a l para que ele exerça u m a c i d a d a n i a
cultura —, só se daria com a busca de conhecimento de cada comunidade mais consciente, crítica e participante. Tem-se buscado elaborar, discutir e
e o comprometimento educacional. Somente considerando o local onde explicitar, então, u m a "Pedagogia Histórico-Crítica" (Saviani, 1980), o u seja,
se dá a v i d a para essas pessoas é que se torna possível u m trabalho de u m a prática e teoria d a educação escolar mais realista, mais "Crítico-Social
educação conscientizadora. " A comunidade permaneceu, então, como dos Conteúdos" (Libâneo, 1985), sem deixar de considerar as contiibuições
ponto de partida e ponto de chegada de sua prática. Daí as teses do ensino das outras perspectivas pedagógicas. Essa pedagogia escolar procura p r o -
regionalizado, comunitário, ligado aos costumes e à c u l t u r a do local de piciar a todos os estudantes o acesso e contato com os conhecimentos culturais
v i d a d a população a ser educada"'^. necessários p a r a u m a prática social v i v a e tiansformadora.

A partir dos anos 80, acreditando e m u m papel específico que a escola U m a p e d a g o g i a que leve e m conta esses objetivos, no d i z e r d e
tem c o m relação a mudanças nas ações sociais e culturais, educadores D e m e r v a l S a v i a n i , valorizará a escola;
brasileiros m e r g u l h a m e m u m esforço de conceber e d i s c u t i r práticas
e teorias de educação escolar para essa realidade. Conscientizam-se de não será indiferente ao que ocorre em seu interior; estará empenhada em
que a escola funcione bem; portanto, estará interessada em métodos de en-
como a escola se configura no presente, com vistas a transformá-la r u m o
sino eficazes. Tais métodos se situarão para além dos métodos tradicionais
ao futuro. E nos c o n v i d a m a discutir as ações e as ideias que queremos
e novos, superando por incorporação as contribuições de uns e de outros.
modificar n a educação e m arte, como u m desafio e compromisso c o m a
Portanto, serão métodos que estimularão a atividade e iniciativa dos alunos,
tiansformação da sociedade.
sem abrir mão, porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos
Começa a se "desenhar" u m a reformulação pedagógica que incorpora alunos entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o diálogo
criticamente aspectos positivos das pedagogias tradicional, nova, tecnicista com a cultura acumulada historicamente; levarão em conta os interesses
e libertadora e pretende ser mais "realista e crítica". A função da educação dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico,
e d a escola pode ser sintetizada nos seguintes aspectos: mas sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua
ordenação e gradação pra efeitos do processo de transmissão-assimilação
dos conteúdos cognitivos.
(...) agir no interior da escola é contribuir para transformar a própria socieda-
de. Cabe à escola difimdir os conteúdos vivos, concretos, indissoluvelmente Não se deve pensar, porém, que os métodos acima indicados terão um caráter
ligados às realidades sociais. Os métodos de ensino não partem de um eclético, isto é, constituirão um somatório dos métodos tradicionais e novos.
saber espontâneo, mas de uma relação direta com a experiência do aluno Não. Os métodos tradicionais assim como os novos implicam uma autono-
mização da pedagogia em relação à sociedade. Os métodos que preconizo
mantêm continuamente presente a vinculação entre educação e sociedade.
17. Ver Ghiraldelli J r , P a u l o , História da educação brasileira. São P a u l o : C o r t e z , 2006, p. 108.
56 A EDUCAÇÃO ESCOIAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 57

Enquanto no primeiro caso professor e alunos são sempre considerados em enquanto e m outras encontrávamos proposições sem clareza ctirricular.
termos individuais, no segundo caso, professor e alunos são tomados como Vários municípios e até estados da União ainda mantinham os cursos com
agentes sociais (Saviani, 1980, p. 60-61). professores ministrando aulas de A r t e sem formação específica na área
(licenciados e m outras disciplinas, arquitetos, pedagogos, publicitários
Libâneo (1985) também contribui p a r a este novo rumo pedagógico, etc.) e, inclusive, havia locais com ausência total desses profissionais. A
ressaltando a natureza do trabalho docente hoje, no qual " u m saber, u m carga horária era indefinida n a grande maioria das cidades. Ausência de
saber ser e u m saber fazer pedagógico" d e v e m "integrar os aspectos mate- cursos de formação em muitas regiões. Essa é ainda a nossa realidade,
r i a l / formal do ensino e, ao mesmo tempo, articulá-los com os movimentos embora nos últimos dez anos tenha h a v i d o u m esforço de melhoria tanto
concretos tendentes ã transformação d a sociedade".'* do ensino como da formação irúcial e contínua de professores.
Depois dessas reflexões, fica então u m a questão: que história d a Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram propostos como diretrizes
educação escolar e m Arte queremos fazer?
pedagógicas e considerados um referencial importante para a educação
escolar no país, por seu comprorrússo de assegurar a democratização e u m
ensino de qualidade para todos os estudantes. P a r a muitos, os P C N s têm
3.0 ensino da Arte na conternfioroneidade demonstrado a sua contribuição, como u m a proposta de prática educa-
tiva adequada às necessidades sociais, económicas e culturais brasileira.
Analisando os documentos e observando o cuidado e m seu detalhamento,
A novo LD8N n. 9.394/96 e os Parâmetros Curricuiares
vê-se que o texto em geral engloba ideias, premissas, procedimentos e
Nacionais
conteúdos condizentes com as teorias e práticas contemporâneas, e tem
como direcionamento tanto os conliecimentos próprios das áreas compo-
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de A r t e para o ensino f u n d a - nentes do currículo, como os saberes considerados fundamentais para o
mental ( P C N s - A r t e ) inserem-se no processo histórico do ensino e apren-
fortalecimento da identidade e a formação do cidadão. C o m referência aos
dizagem de arte, logo após a divulgação de sua versão preliminar e m
P C N S de A r t e , tais saberes foram direcionados ao autoconhecimento, ao
1996, quando foram apresentados para discussão e crítica aos professores
outro, ao fazer e perceber arte com autonomia e criticidade, ao desenvolvi-
e m todo o B r a s i l . "
mento do senso estético e à interação dos indivíduos no ambiente social/
No momento de sua primeira divulgação, a situação do ensino de Arte tecnológico/cultural, preparando-os para u m m u n d o e m transformação
em nosso país mostrava-se (e ainda se mostra) de grande disparidade: havia e para serem sujeitos no processo histórico.
propostas renovadoras em algumas regiões, com professores atuaUzados,
N o Brasil, havia u m compromisso com a elaboração do Plano Decenal
de Educação para Todos (1993-2003) — diretrizes políticas voltadas para
18. Ver Libâneo, José C a r l o s . Democratização da escola pública: pedagogia crítico-social dos con- a recuperação da escola fundamental — e o cumprimento da recém-pu-
t e ú d o s . São Paulo: L o y o l a , 1985.
blicada L e i de Diretrizes e Bases d a Educação Nacional (Lei n . 9.394/96),
19. O s Parâmetros Curriculares Nacionais—Arte para oV.eZ". Ciclos do Ensino Fundamental foram
publicados e m 1997 e os P C N s - Arte, 3". e 4". C i c l o s e m 1998. F i z e r a m parte da e l a b o r a ç ã o desses
que enfatizava a educação básica como u m processo de continuidade
documentos: Rosa lavelberg ( c o o r d e n a ç ã o dos P C N s , 1°. e 2°. C i c l o s ) , M a r i a E R. F u s a r i , M a r i a H e - e a p r i m o r a m e n t o da c i d a d a n i a . A L D B N resultara de extenso debate
loísa C . T. Ferraz, Regina S. B. M a c h a d o , como elaboradoras; consultoria de A n a Mae T. B. Barbosa,
e participação da sociedade pela defesa do ensino público e gratuito e
I n g r i d D . K o u d e l a e Assessoria de Heloísa M . Salles, Isabel A . M a r q u e s , Iveta M . M . A . F e r n a n d e s ,
K a r e n Muller, Ricardo Brein, entre outros. entre suas proposições, ficou estabelecido o que seria núcleo c o m u m e
METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 59
58 A EDUCAÇÃO ESCOLAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA

conhecimentos artísticos e estéticos. Fazer e conhecer arte dentro de u m


parte diversificada para o ensino e m todo o território nacional, i n c l u i n -
trajeto sustentado de aprendizagem, ou seja, aprendizagem contextuali-
do o ensino de arte. Hoje, a arte é área de conhecimento obrigatório e m
zada, reflexiva e criadora, passou a ser considerada u m a das p r i n c i p a i s
toda a educação básica e compete aos órgãos púbUcos como conselhos,
metas das novas proposições curriculares. Porém, ainda falta muito p a r a
secretarias de educação e escolas tratarem de s u a m e l h o r inserção no
atender às solicitações dos especialistas que v i r a m nos P C N s u m caminho
currículo escolar.
para a melhoria do ensino de arte no Brasil, mas que exigia, ainda, u m a
A s s i m , com a L D B N e as orientações dos P C N s vemos a consolidação ação eficaz e consistente n a educação e u m trabalho de base que tratasse
da posição d a área de Arte como área de conhecimento e estudo n a e d u - de programas de formação de professores na área, e atendessem as p r e -
cação escolar e, consequentemente, o reconhecimento de sua importância nússas estabelecidas.
na formação e desenvolvimento de crianças e jovens.
A s novas diretrizes metodológicas procuram encaminhar a organização
de currículos a partir da reflexão e discussão conjunta n a unidade escolar, Compromissos com a educação escolar de arfe
de maneira a integrar outros projetos, e m u m a visão inter e transdisci-
pUnar. Os objetivos da área são sintetizados na busca do conhecimento Percebendo a relevância de conhecer o processo histórico do ensino da
de arte como cultura e linguagem e caminho para o desenvolvimento de arte e nele saber interferir com consciência, A n a Mae Barbosa apresenta-
potencialidades dos educandos (percepção, observação, imaginação, sen- nos importantes reflexões nessa área. Essas ideias aparecem nitidamente
sibilidade). Os conteúdos se organizam a partir de eixos norteadores de e m todos os seus livros, que nos c o n v i d a m a discutir e encontrar formas
aprendizagem, a saber: produção em arte — desenvolvimento do percurso de ação n a atualidade. Mostia-se preocupada com a democratização do
de criação pessoal; fruição — apreciação significativa d a arte e reflexão conhecimento da arte (isto é, com a necessidade de assumirmos o compro-
sobre a arte enquanto produto pessoal e pertencente à multiplicidade das misso de ampliar o acesso d a maioria da população aos domínios estéticos
culturas humanas, de todas as épocas. Esta, talvez seja u m a das principais e artísticos). O s textos de A n a Mae são contiibuições essenciais que p o d e m

e inovadoras metas do ensino de arte, que busca o diálogo com todas as conduzir nosso trabalho de professores a posicionamentos m a i s claros.
Dentie as suas proposições lembramos a ênfase que faz na recuperação
culturas e formas de arte, do erudito ao popular. A proposição d a área,
histórica do ensino de arte, para que se possam perceber "as realidades
como consta dos P C N s de Arte, passou a incorporar as quatro linguagens:
pessoais e sociais, aqui e agora, e lidar criticamente com elas".^°
Artes Visuais, Dança, Música e Teatro, de modo que os educandos, ao longo
do curso, possam ter acesso fundamentado a essas modalidades artísti- Outro encaminhamento orientado por A n a Mae Barbosa (1991), e
cas. Mas não significa que o documento esteja sugeriiido a retomada d a que v e m interferindo qualitativamente no processo e melhoria do ensino
polivalência, como foi entendido por muitos professores, o u seja, que o de arte, é a "proposta tiiangular". Desenvolvida a partir das experiências
professor de Arte integre e m sua prática essas modalidades artísticas e, feitas no M u s e u de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo,
s i m , que a escola possibilite a presença de professores habilitados para
assumirem as diversas linguagens de arte. C a d a u m a dessas linguagens 20. Ver A n a M a e Barbosa, Arte-Educação: conflitos e acertos. São Paulo: M a x L i m o n a d , 1984,
p. 39. Ver a i n d a Arte-Educação no Brasil. Das origens ao modernismo. São Paulo: Perspectiva, 1978; O
pressupõe conhecimentos específicos, que f o r a m analisados e sistemati-
ensino da Arte e sua história. S ã o Paulo: M A C / U S P , 1990; Tópicos utópicos. Belo H o r i z o n t e : E d i t o r a
zados também por especialistas, autores do documento. C / A r t e , 1998; John Dewey e o ensino da Arte no Brasil. São Paulo: Cortez, 2001; Inquietações e mudanças
no Ensino da Arte. São Paulo: Cortez, 2002; Arte/Educação contemporânea. Consonãncias internacionais.
A s ideias contidas nos P C N s p r o p a g a r a m - s e no país e, m e s m o
São Paulo: C o r t e z , 2005.
quando rebatidas, h o u v e apoio a novas discussões e pelo acréscimo dos
60 A EDUCAÇÃO ESCOIAR DE ARTE TEM UMA HISTÓRIA METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE 61

difundiu-se amplamente desde a década de 1990 e hoje integra bibho- neste capítulo. Consultar livros, documentos, material iconográ-
grafias e projetos curriculares. T e m por base a conexão de três facetas do fico, internet, educadores o u pessoas da comunidade, arrolando:
conhecimento e m arte — o fazer artístico, a análise de obras artísticas e épocas, locais, materiais e técnicas utilizados, Uvros didáticos,
a história d a arte. modalidades artísticas e estéticas trabalhadas.
Atualmente, e m nosso país, é bastante evidente a modificação de • Localizar e m bibliotecas de universidades e v i a internet artigos,
conceitos e a variedade de métodos, como a abertura para a incorporação monografias, trabalhos de conclusão de curso, dissertações de
da diversidade cultural e a inclusão dos eixos de aprendizagem (produção, Mestrado e teses de Doutorado sobre o ensino e a aprendizagem
fruição, reflexão) presentes nos P C N s e e m muitas propostas de nossos de Arte.
dias, o que modifica o entendimento d a área e possibilitam às crianças e • Analisar criticamente propostas do e para o ensino de Arte, veicula-
jovens a ampliação de suas potencialidades. das nas mídias e, e m especial, por revistas de grande circulação.
A c r e d i t a m o s que a consciência e a interferência sobre o processo
educativo (e, neste caso, mais especificamente, de arte) é fundamental
para o professor, para os alunos, enfim, para todos os querem u m a e d u - Leituras de aprofundamento
cação transformadora. A consciência histórica e a reflexão crítica sobre os
conceitos, as ideias e as atuações educacionais de nossa época possibilitam A Z E V E D O , Fernando de. " A arte como instrumento da educação popular na
nossa contribuição efetiva na construção de práticas e teorias de educação reforma", conferência realizada em 1930 e publicada no livro Novos caminhos
e novos fins: a nova política de educação no Brasil. São Paulo: Melhoramentos,
escolar e m arte que atendam às implicações i n d i v i d u a i s e sociais dos a l u -
1958, pp. 117-131.
nos, às suas necessidades e interesses, e, ao mesmo tempo, proporcionam
BARBOSA, Ana Mae (org.). Inquietações e mudanças no ensino da Arte. São Paulo:
o domíruo de conhecimentos básicos d a arte.
Cortez, 2002.
O compromisso com tal projeto e d u c a t i v o exige u m competente
BRASIL. Secretaria de Educação Fi.mdamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:
trabalho docente. N o caso da ação educativa de arte, direcionada para
arte. Brasília: MEC/SEF, 1998.
crianças e jovens, o professor terá de entrelaçar a sua prática-teoria artís-
F O N T E R R A D A , Marisa Trench de Oliveira. "Desenredando a Trama da Música
tica e estética a consistentes propostas pedagógicas. E m síntese, é preciso
na Escola Brasileira". In: De tramas e fios. Um ensaio sobre música e educação. São
aprender a saber arte e saber ser professor de arte. Paulo: Editora UNESP, 2005, pp. 191-259.
G H I R A L D E L L I JR., Paulo. História da educação brasileira. São Paulo: Cortez,
2006.
Atividades complementares MARQUES, Isabel A. Dançando na escola. São Paulo: Cortez, 2003.
•REZENDE E FUSARI, Maria R de & F E R R A Z , Maria Heloísa C. de T A arte no
• Discutir os tópicos deste capítulo, comparando com sua história currículo escolar. I n : Arte na Educação Escolar. 2. ed. revista. São Paulo: Cortez,
pessoal (lembranças) de aprendizado de arte como aluno (a) na 2001, pp. 17-50.
escola. S A N T A N A , Arão P. Teatro e formação de professores. São Luís: E D U F M A , 2000.
• • Fazer u m a pesquisa sobre a história do ensino e aprendizagem T I R A P E L I , Percival. Arte no Império. Do Neoclássico ao Ecletismo, séc. 19. São Paulo:
de arte de sua localidade, comparando-a ao histórico apresentado Editora Nacional, 2006.

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