Perto Demais de Sua Propria Desaparicao

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DOI: https://doi.org/10.26512/rfmc.v9i3.

42997

Perto Demais de sua Própria Desaparição: O Povo que Falta e a


Farsa da Democracia Estética
[Too Close to its Own Demise: The Missing People and the Farce of Aesthetic Democracy]

Vladimir Safatle∗

Resumo: Trata-se de discutir a natureza da autonomia estética como modelo de emancipa-


ção social. Para tanto, há de se partir das dificuldades atuais de consolidação da autonomia
estética, sem no entanto deixar de usá-la para criticar formas de conciliação entre arte e
vida que parecem perder de vista os problemas resultantes da articulação contemporânea
entre cultura e produção capitalista.
Palavras-chave: Autonomia. Emancipação. Arte Popular. Indústria Cultural, Contra-
hegemonia.

Abstract: This article aims to discuss the aesthetic autonomy as a model for social emanci-
pation. It starts from the contemporary challenges for the defense of aesthetic autonomy,
using autonomy for criticizing discourses that seems to sustain a possible conciliation
between life and art that not take into account the problems resulting from the connection
between culture and capitalistic production.
Keywords: Autonomy. Emancipation. Popular Art. Cultural Industry. Contra Hegemony.

∗ Professor titular do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP). Doutor em Filosofia pela Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4428-0131.

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Nunca o artista teve tanta necessidade de um povo,


mas ele constata no ponto mais alto que o povo falta
Gilles Deleuze e Félix Guattari

Há um livro sobre teoria estética que o discurso da integração social através


começa com a seguinte frase: “Tornou- das dinâmicas intervencionistas do ca-
se autoevidente que nada referente pitalismo de estado ainda afirmava sua
à arte é autoevidente mais, nem em hegemonia. Mesmo que tal integra-
si, nem em sua relação ao todo, nem ção em operação nos ditos estados de
mesmo em seu direito de existência” bem-estar social fosse paga com a pre-
(ADORNO , 2019). Talvez haja real- servação de relações coloniais, com o
mente certa necessidade de começar subdesenvolvimento dos países do en-
toda discussão a respeito da possibili- tão chamado Terceiro Mundo, com o
dade da experiência estética na soci- recurso massivo à espoliação de um
edade contemporânea repetindo esta subproletariado composto por imigran-
frase. Começar por dizer: “não é certo tes, os processos de integração social
que algo como a experiência estética e psicológico ao horizonte normativo
possa, de fato, existir”. Pois há de do capitalismo encontravam formas de
se sentir o risco de sua inexistência, se sustentar. No entanto, por um mo-
a dificuldade monstruosa de sua afir- mento, nesse contexto histórico do final
mação contemporânea, o desconforto dos anos sessenta, as lutas políticas pa-
que ela causa, antes de simplesmente receram mover-se para fora da regula-
referendá-la em alguma chave de segu- ção administrativa dos conflitos sociais,
rança ontológica. A existência da expe- criando sequências de revoltas estrutu-
riência estética não é certa, talvez ela rais no interior dessas mesmas socieda-
sequer seja mais possível no interior do des de alta integração, isso enquanto os
horizonte histórico que é o nosso. Há ditos países do Terceiro Mundo conti-
uma coordenada histórica que, se não a nuavam suas lutas anticoloniais e suas
invalida por completo, ao menos a pro- tentativas de sair da estabilização desi-
blematiza de forma dramática. gual do subdesenvolvimento. Ou seja,
Quando foi escrita, no final da dé- quando for dito haver se tornado autoe-
cada de sessenta do século XX, essa afir- vidente que nada relacionado à arte era
mação ressoava certa situação histórica autoevidente mais, o horizonte político-
que se fazia sentir nas sociedades mais social estava longe de parecer fechado a
integradas ao desenvolvimento capita- possibilidades de transformações estru-
lista. Estávamos em uma época na qual turais e revolucionárias. As lutas polí-

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ticas indicavam a irredutibilidade das mente para um estado atual das obras,
contradições sociais efetivas. e sim para uma estratégia necessária no
Essa não era apenas uma descrição interior de seus procedimentos de com-
do horizonte político-social da época. posição e criação. Para existir nesse mo-
Os próprios campos da produção es- mento histórico, as obras de arte pre-
tética pareciam animados por experi- cisavam estar muito próximas de sua
ências em vias de aprofundamento de própria desaparição. Elas precisavam
sua capacidade crítica e de elaboração se construir a partir de sua própria im-
formal, seja no cinema, nas artes visu- possibilidade, sentir o risco iminente
ais, na literatura, no teatro e mesmo de sua mudez, lutar contra as tendên-
na música, que Theodor Adorno, o au- cias internas de seus materiais.
tor da afirmação em questão, conhecia A estratégia apontava para os pro-
tão bem. Talvez fosse o caso de lem- blemas resultantes da consolidação dos
brar que o momento histórico no qual processos de integração psíquica e libi-
ele insiste na insegurança estrutural a dinal que se mostrarão uma das bases
tudo referente à arte era o momento de mais sólidas do capitalismo. Essa in-
plena produção de Boulez, Berio, Li- tegração se dava de forma preferencial
geti, Cage, Feldman, Stockhausen, mas não através dos sistemas de reprodução
também de John Coltrane, Thelonius material de instituições como a famí-
Monk, Astor Piazzolla, entre tantos ou- lia, as práticas religiosas, a escola ou
tros. Adorno conhecia bem as poten- os hospitais. Todos esses sistemas es-
cialidades da produção musical de seu tavam submetidos a um microssistema
tempo, que encontrava nos seminários que colonizava os demais, dando-lhes
de Darmstadt um local privilegiado de seu ritmo, suas estruturas narrativas,
debate e apresentação. Mais ou menos organizando suas intensidades, seus li-
à mesma época em que escreveu a afir- mites, suas “pessoas”, seus conflitos,
mação que comentamos, ele apresen- sua “visibilidade”. Pois não haveria in-
tava um texto-manifesto, Vers une mu- tegração social ao capitalismo sem a in-
sique informelle, no qual defendia o que tegração psíquica produzida pela res-
entendia ser um campo de potenciali- trição dos usos da linguagem às formas
dades imanentes da produção musical avalizadas por uma junção em plena
de sua época. ascensão entre cultura e produção in-
Poderia então parecer algo contra- dustrial. Junção que recebia uma alcu-
ditório e talvez mesmo extemporâneo nha conhecida, “indústria cultural”, e
enunciar exatamente nesse momento que ficaria mais compacta e coesa com
que sequer o direito de existência da o passar do tempo. Essa integração po-
arte era autoevidente. Mas o diagnós- deria perdurar, como de fato ocorreu,
tico em questão não apontava exata- mesmo depois da dessolidarização com

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as promessas econômicas que um dia o A construção estética do povo e seus


capitalismo havia nos levado a acredi- descontentes
tar.
Contra isso, só restava à arte
deslocar-se para o limiar de sua própria O sintagma “politicamente relevante”
impossibilidade, servindo-se de todas foi acrescido de forma meio abrupta
as estratégias possíveis para nos lem- à argumentação porque tal emergên-
brar que nos falta língua, fornecendo a cia abrupta esconde um pressuposto.
figura do desconforto com a língua na Pois há um processo histórico no qual
esperança de fazer desse desconforto a a experiência estética se desenvolve até
força de emergência de outra sensibili- colocar-se abertamente como modelo de
dade capaz de decompor as dinâmicas emancipação social. Esse processo está
de integração psíquica que acabariam ligado à constituição histórica da auto-
por fornecer um freio a nossas expecta- nomia estética. Uma constituição para
tivas de emancipação social. Pois, para a qual convergem dinâmicas muitas ve-
que tal emancipação pudesse efetiva- zes contraditórias, constituição que é
mente se realizar, seria necessário certa a expressão de um verdadeiro campo
forma de desintegração psíquica que se de combate no interior do qual mode-
faz sentir todas as vezes que percebe- los distintos do que devemos entender
mos que a língua nos falta, ou antes, por “autonomia” parecem estar em con-
que a língua com sua garantia de or- fronto.
dem, lugares e hierarquia nos exila. No entanto, no interior desse com-
Cinquenta anos depois, seria o caso bate, há um eixo que deve ser privilegi-
de repetir esse gesto e começar mais ou ado. Pois há de se lembrar que não será
menos do mesmo ponto. Começar re- por uma razão anódina que a autono-
petindo: “Tornou-se autoevidente que mia estética se consolidará no exato mo-
nada referente à arte é autoevidente mento em que a arte for compreendida
mais, nem em si, nem em sua relação como força indutora da construção de
ao todo, nem mesmo em seu direito de um povo por vir, de uma comunidade
existência”. Repetir a fim de lembrar por vir. Como se coubesse à arte a pro-
que, para ser politicamente relevante, a dução de vínculos e mitos que outrora
arte deve colocar em questão sua possi- foram assumidos pela religião com seu
bilidade histórica. Só assim ela realiza poder unificador. Se era o caso de de-
politicamente a relevância de sua pró- salojar a religião do lugar de poder uni-
pria possibilidade. ficador das esferas sociais de valores,
uma espécie de experiência estética po-
deria ter a função de reconstrução dos
horizontes sociais de experiência. Pode-
mos encontrar as raízes desse impulso

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em textos programáticos do século XIX de todos os indivíduos. Já nenhuma


europeu, como a Educação estética do força será oprimida. Reina então a ge-
homem, de Schiller e sua afirmação da ral liberdade e igualdade dos espíritos!”
necessidade de uma “revolução total de (HEGEL, HÖLDERLIN, SCHELLING,
todo o modo de sensação” (SCHILLER, 2003, p. 217, tradução adaptada). Ou
2011, p. 129, tradução adaptada ), se seja, a produção da emancipação so-
esquecer em sua influência decisiva no cial, espaço no qual nenhuma força será
jovem Marx, ou ainda o Mais antigo pro- mais oprimida, passa pela renovação
grama do idealismo alemão, fragmento dos laços sociais através da capacidade
de texto que unia Hölderlin, Hegel e de novas partilhas produzidas pelo po-
Schelling. ema, pela capacidade que o poema te-
Esse pequeno texto é paradigmático ria de chamar por uma terra e um povo
de certa forma de crítica social e de ação que ainda não existe. Este impulso não
política que atravessará o século XIX. se esgotará no começo do século XIX,
A procura pela emancipação popular mas, como mostrarei em outro texto,
passava aqui pela recusa de instituições irá atravessar o século XX e terá, inclu-
que até então não teriam sido capazes sive, no Brasil um lugar privilegiado de
de ser a expressão orgânica da força po- seu exercício.
pular: “Perante a ideia da humanidade, Que a reflexão sobre a autonomia
quero mostrar que não há nenhuma estética se consolide exatamente nesse
ideia de Estado, porque o Estado é algo momento, eis algo que não deveria nos
de mecânico, como também não existe surpreender. Ela não nasce aí, pois terá
uma ideia de máquina. Só aquilo que suas raízes em outro debate, próprio ao
é objeto da liberdade se chama ideia. século XVIII, como veremos à frente.
Temos, pois, de ir além do Estado!”, Mas é nesse momento que ela se con-
(HEGEL, HÖLDERLIN, SCHELLING, solida e se generaliza, saindo do regime
2003, p. 216, tradução adaptada) dirá o estrito da estética musical para a econo-
texto, marcado aí claramente pelos im- mia geral da arte. Tal generalização tem
pulsos destituintes da Revolução Fran- uma razão clara. Pois se tratava de fazer
cesa e pela defesa da força construtiva das obras de arte vetores de transforma-
da ideia. Essa recusa de instituições ções materiais da sensibilidade e, para
nos levaria à abertura em direção a uma tanto, elas precisariam romper o vín-
nova comunidade baseada na força da culo mimético com a ordem naturali-
criação própria à poesia e sua suspen- zada da reprodução material da vida. A
são das dicotomias entre mito e razão, autonomia estética aparecia nesse mo-
entre razão e sensibilidade: “Só então mento histórico como estratégia que irá
nos aguardará a idêntica formação de se impor na construção de um povo,
todas as forças, tanto do singular como mesmo que Hegel maduro não possa

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ser descrito exatamente como um de- teria restado outra coisa senão ser mera
fensor da autonomia da arte. art pour l’art. Não podendo transformar
No entanto, não serão poucos os que o mundo através da realização de ideais
questionarão essa compreensão da au- reformadores que viam na circulação
tonomia estética em sua relevância po- das obras de arte um potencial “edu-
lítica. Pois um dos esquemas mais utili- cador” e de reforma social, ela teria
zados de compreensão da arte em nos- se voltado a uma reflexão estéril sobre
sos dias parte do pressuposto de que, na si mesma. Lembremos, por exemplo,
verdade, a consolidação da autonomia do que fala Pierre Bourdieu a respeito
estética seria expressão de algo exata- da formação do campo literário e artís-
mente contrário, a saber, de uma forma tico, com suas exigências de autonomia
de compensação social. Sem mais po- da arte e dos artistas, na França da se-
der alimentar a ilusão de que seria o gunda metade do século XIX:
motor a impulsionar as transformações
do mundo, a impulsionar as mudanças Como não supor que a expe-
radicais em seus modos de apresenta- riência política desta geração,
ção, ou ainda, sem mais poder alimen- com o fracasso da revolução de
tar a ilusão de ter a força de interdi- 1848 e com o golpe de estado
tar a circulação nesse mundo, não teria de Luís Napoleão Bonaparte,
restado à arte outra coisa que se voltar além da longa desolação do Se-
a si mesma, tomar a si própria como gundo Império, não tenha de-
seu objeto, criando com isto uma dinâ- sempenhado um papel na ela-
mica autorreferencial que apenas de- boração da visão desencantada
nunciaria sua impotência efetiva em ser do mundo político e social que
uma prática social com capacidade de segue o culto da arte pela arte?
transformação de outras esferas sociais Esta religião exclusiva é o úl-
de valores. Essa perspectiva defende timo recurso dos que recusam a
que a experiência moderna de autote- submissão e a demissão (BOUR-
matização da forma seria herdeira de DIEU , 1998, p. 104).
certa decepção histórica. Sobretudo, ela
defende que autonomia é autolegisla-
ção (o que não é tão evidente quanto Afirmações desta natureza procuram
possa inicialmente parecer, ao menos sustentar que a sequência de decep-
quando estamos a falar de autonomia ções históricas na Europa do século XIX
estética). Diante da incapacidade histó- (1830, 1848, 1871) teria mostrado à li-
rica da arte ser motor de transformação teratura, em especial, e à arte, em geral,
social, isto a partir principalmente da sua impotência em se colocar como mo-
segunda metade do século XIX, não lhe tor do processo de transformação so-
cial. Recusar a submissão do artista

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ao gosto jornalístico e à afirmação do colapso definitivo. Autonomia que se-


modo de vida de uma época de reino ria apenas uma visão purificada da arte,
filistino da burguesia só seria possível própria a certo elitismo que desdenha
através da constituição de uma “reli- de portar funções sociais específicas1 ,
gião exclusiva” marcada pelo culto da assombrada pela compreensão da ex-
arte pela arte. Este modelo compensa- periência estética como expressão do
tório, que fustiga tanto a independência gênio e procura heroica e viril do su-
social do artista quanto a independên- blime. Como se fosse questão de de-
cia formal de sua linguagem, servirá fender certo “excepcionalismo estético”
de fundamento para todas as denún- (DE BOEVER, 2019) com sua figura
cias que levantarão a voz contra os “for- fáustica do gênio criador que suspende
malismos” da arte no século XX, assim a ordem como um soberano que teria
como contra a pretensa incapacidade a força de decretar estados de exceção.
de a arte integrar, em seu interior, a re- Ou seja, seria o caso de nos despedir-
lação crítica com o mundo social. Pois mos dessa experiência estética que seria
se trata de desqualificar as consequên- apenas uma forma insidiosa de mistifi-
cias políticas das demandas de auto- cação social, isso em prol de uma arte
nomia estética por estas pretensamente mais colaborativa, que “não se inquieta
serem a expressão mais bem acabada mais em distinguir-se das culturas po-
de uma dinâmica melancólica de pura pulares através da originalidade de sua
e simples evasão. Nessa leitura da au- língua” (GEFEN, 2021. p. 16). Arte que
tonomia estética como expressão de certa possa ser apreendida por todos, sendo
forma de melancolia social, a dificuldade assim uma experiência mais democrá-
e estranhamento da linguagem artística tica e menos hierárquica. Contra certa
seriam apenas marcas de sua irrelevân- “abstração” presente nessas estratégias
cia, de sua mistificação. de autonomia estética, haveria de se en-
Essa compreensão da autonomia es- contrar formas de um realismo saudá-
tética como forma de melancolia social vel e democrático.
pode levar à compreensão do questio-
namento sobre a possibilidade histórica
da experiência estética esconder, na ver-
dade, o declínio de uma experiência es- Democracia estética como farsa
tética específica, essa vinculada a uma
Isto talvez nos permita melhor abordar
autonomia que teria entrado enfim em
um topos constantemente mobilizado

1 Sendo que valeria meditar sobre afirmações de Adorno como: “Desde os primórdios da era burguesa, a raison d’ëtre de toda arte
autônoma consiste em que somente aquilo que não tem utilidade responde por aquilo que o útil poderia ser um dia, o uso feliz, o
contato com as coisas para além da antítese entre o utilizar e a falta de utilidade. Isso faz com que as pessoas que querem algo melhor
rebelem-se contra o que é prático” (ADORNO, 2021, pp. 184-185).

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em debates estéticos contemporâneos a lidade de comunicarmos nossos sen-


respeito da possibilidade de estarmos, timento ao Outro, defendendo assim
na verdade, diante de uma mutação da certo cosmopolitismo com consequên-
produção artística em direção a regimes cias, ao mesmo tempo, estéticas e polí-
mais adaptados a uma vida democrá- ticas.
tica. Pois seria o caso de lembrar como Nesse contexto, valeria a pena lem-
a discussão sobre a possível readapta- brar que dirá Otília e Paulo Arantes a
ção da produção artística aos quadros respeito da aparência de democratiza-
da vida democrática tem, na verdade, ção do juízo de gosto no esteio da cons-
a idade da Crítica do Juízo, de Kant, ao tituição da esfera pública burguesa:
menos se seguirmos uma linha de lei-
tura que parece começar com Hannah
Arendt e sua compreensão da articula- na comunicação pública, que
ção entre estética e política a partir da vincula os indivíduos em torno
emergência de um: “senso comum que da obra-mercadoria devassada
é um senso comunitário, sensus com- pela crítica, todos reclamam
munis” (ARENDT, 1992, p. 72). Kant com razão a mesma competên-
falará de um “gemeinschaftlichen Sin- cia judicativa. A esfera pública
nes”. Nesse sentido, a experiência es- da arte autônoma não só anteci-
tética seria algo como os prolegômenos pava como prefigurava a mira-
para toda convivência possível à diver- gem política burguesa. Iguais
sidade, isso graças à emergência de um no juízo estético – cuja uni-
senso comum (que não por acaso vem versalidade pressuposta, po-
do grego αισθησις κοινη) que permitiria: rém indeterminável e tacita-
“ajuizar a priori a comunicabilidade dos mente partilhada, recalcava o
sentimentos que são ligados a uma re- bourgeois no homem genérico –
presentação dada (sem a mediação de iguais também no céu abstrato
um conceito)” (KANT, 1995, § 40), rea- da política, futuros citoyens de
lizando assim expectativas de comuni- uma República dos fins que an-
cação universal e reconhecimento gené- tes fora das Letras (ARANTES,
rico. Juízos de gosto não se contenta- ARANTES, 1992, p. 41).
riam em serem solipsistas. Eles expres-
sariam o desejo de serem comunicáveis
e partilhados. Quando julgamos, julga-
ríamos como membros de uma comu- Essa leitura da arte como antecâ-
nidade, seja ela atual ou potencial. O mara da vida democrática, ao menos
que nos levaria a defender que “gosto” na maneira que as democracias liberais
é um julgamento vinculado à possibi- a concebem, parte da pressuposição da
autonomia da arte ter a mesma idade

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que a esfera pública liberal-burguesa2 . própria linguagem a fim de recuperar


Paulo e Otília Arantes fornecem o con- seu potencial de conciliação com a ex-
texto histórico da defesa transcenden- periência ordinária e seu sistema de for-
tal feita por Kant. Eles entendem bem mas.
que toda determinação transcendental Por essa razão, há de se lembrar como
é uma instituição social. Nesse sen- a universalidade que a obra de arte as-
tido, a recuperação da autonomia esté- pira não deveria em absoluto ser arti-
tica valeria como garantia de que nosso culada a alguma pretensa tradutibili-
sistema de experiências sociais já por- dade genérica em um campo indexado
taria em si a possibilidade de constru- pela existência de um senso comum.
ção de campos alargados de reconheci- Melhor seria ver nela a figura do ex-
mento no interior do qual seria possível cesso em relação aos processos de de-
“pensar por si, pensar no lugar de qual- terminação imanentes de sentido so-
quer outro, pensar sempre em acordo cialmente partilhado. Levar em conta
consigo próprio” (KANT, 1995, § 40), tal excesso exige um modo de relação
operar descentramentos de perspectiva que não é apenas relação à alteridade,
sem que para tanto seja necessário uma mas algo mais estrutural, a saber, rela-
radical transformação do domínio da ção ao que se apresenta como aconteci-
dimensão prática e seu sistema de re- mento que destitui os limites do senso
produção material da vida. Ou seja, as comum3 . Não é por acaso que o funda-
condições de atualidade e o horizonte mento de um dos eixos centrais de pro-
de suas possibilidades imanentes já de- dução da experiência estética nos últi-
finiriam o campo no interior do qual se mos duzentos anos não será exatamente
desdobrará as dinâmicas de produção e o sensus communis, mas o que é despro-
reconhecimento que uma obra de arte vido de senso, insensato pois estabe-
seria capaz. Esse era o risco de integrar lecido em relação à loucura, que, não
o juízo de gosto em uma “faculdade”. por acaso, será considerada por Kant
Nesse sentido, não deixa de ser des- como um sensus privatus, como uma
provido de interesse perceber que mui- paradoxal linguagem privada. E não se
tos dos que defendem atualmente o trata apenas de lembrar de experiências
ocaso da autonomia estética engajam- subjetivas articuladas entre a criação e
se nessa via por querer preservar o po- a loucura (Hölderlin, Nerval, Artaud,
tencial “democrático” do senso comum. Munch, Schumann, Bispo do Rosário
Como se fosse o caso de livrar a arte de ou a consciente e voluntária exploração
sua crença na irredutibilidade de sua limiar de Lygia Clark, entre tantos ou-

2 Ver, a esse respeito, FRÜCHLT, 2011; 2014. A crítica a posições dessa natureza tinha sido feita previamente por PRADO JUNIOR,
2007.
3 Sobre a compreensão da obra de arte como acontecimento, ver sobretudo BADIOU, 1998.

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tros), mas dos processos de criação que precisam assumir um limite. Pois seria
se constroem deliberadamente contra interessante se perguntar sobre o que
as garantias comunicacionais do senso práticas contra-hegemônicas precisam
comum. preservar para organizar o antagonismo
Seria melhor levar em conta tal na forma da “contra-hegemonia”, o que
excesso ao invés de defender al- elas não devem tocar e questionar. O
guma forma possível de uso “contra- quanto contra-hegemonia é dependente
hegemônico” do senso comum, como da preservação da hegemonia. Ou se
se fosse possível transformá-lo através quisermos: o que quanto tal preserva-
de ações como essas que visam: “tor- ção não implicará movimento em um
nar visível o que o consenso dominante primeiro momento e paralisia em um
tende a obscurecer e obliterar, dando segundo momento? Exatamente como
voz a todos os silenciados no interior vimos de forma exaustiva nas práticas
da estrutura da hegemonia existente” políticas populistas de esquerda.
(MOUFFE, 2013, P. 93). Por mais po- Uma forma de começar por pensar
liticamente engajada que tais perspec- sobre tal paralisia consiste em lembrar
tivas possam parecer, elas cometem os que, quando Kant escreve a Crítica do
mesmos erros que as estratégias popu- Juízo, nos encontrávamos no momento
listas de esquerda em política, a saber, histórico em que a experiência esté-
compor forças em direção à hegemo- tica lutava por se livrar de funções so-
nia, mas acabar por encontrar a parali- ciais específicas, de sua submissão às
sia. Uma paralisia que nunca é tema- demandas comunicacionais da lingua-
tizada a partir das contradições ima- gem e a programas de edificação moral
nentes às próprias cadeias populistas e pedagógica em nome de uma nova es-
de equivalência. Pois seria o caso de truturação da sensibilidade. Essa luta
se perguntar sobre o riscos de práticas produzirá, na verdade, a pressão pelo
contra-hegemômicas que precisam ope- que não tem lugar no interior da vida
rar com a pressuposição de um senso social com seus modelos hegemônicos
comum no interior do qual se desdo- de reprodução material e de determi-
brará os antagonismos. Pois há uma nação subjetiva. Nesse sentido, a te-
exigência, ao menos quando estamos a mática da experiência estética como vi-
falar do campo estético, de certa res- olência contra a imaginação (que apa-
trição do domínio da luta, pois se trata rece em Kant, mas quando o sublime
de lutar no interior de uma gramática entra em cena) deve ser compreendida
pressuposta, para desviar seus elemen- como a tentativa de liberar a sensibi-
tos, hackear seus procedimentos, rede- lidade, o tempo e o espaço dos mo-
finir seus agentes. Tais operações, por delos de colonização produzidos pelo
mais que tenham seu interesse e valor, primado histórico da consciência, com

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seus modos historicamente situados (e autores como Christoph Menke quando


não transcendentalmente deduzidos) afirmam que o livre jogo da imaginação
de presença e representação. Por isso, a não segue lei alguma5 . Décadas atrás,
emergência da autonomia estética será Adorno e Horkheimer já haviam insis-
mais ambígua do que a emergência da tido que o primeiro serviço fornecido
esfera pública liberal-burguesa. A in- pela Indústria Cultural ao consumidor
sistência em sua necessidade não será era exatamente o “esquematismo”: “A
apenas expressão de fidelidade retar- função que o esquematismo kantiano
datária a um projeto liberal de esfera ainda atribuía ao sujeito, a saber, refe-
pública, mas pode também se colocar rir de antemão a multiplicidade sensí-
como o seu contrário, a saber, como re- vel aos conceitos fundamentais, é to-
conhecimento da inefetividade de pos- mada ao sujeito pela indústria cultural.
tular horizontes normativos de con- O esquematismo é o primeiro serviço
senso potencial. prestado por ela ao cliente” (ADORNO,
Tendo problemáticas dessa natureza HORKHEIMER, 1991, p. 103). É o es-
em vista, lembremos ainda como, longe quematismo da imaginação que a in-
de uma faculdade livre, a imaginação dústria cultural toma do sujeito, é sua
é uma faculdade disciplinada em seus imaginação que é expropriada. Tomada
modos de organização da experiência essa só possível porque tal esquema-
sensível. Tal natureza da imaginação tismo sempre foi um produto social.
foi explorada de forma paradigmática Essa era uma maneira de criticar o des-
por Heidegger em sua crítica ao intui- conhecimento do caráter socialmente
cionismo de Kant4 . Partindo de críticas regulado da imaginação e das estrutu-
dessa natureza podemos complemen- ras sociais da comunicação que o senso
tar insistindo que a violência da experi- comum permite.
ência estética contra a imaginação será Isso explica como a incomunicabili-
violência contra as limitações sociopo- dade crescente da experiência estética
líticas implicadas no próprio exercício será a expressão maior de uma decisão
esquematizador da imaginação e contra política. Pois para a experiência estética
aquilo que a pretensa transcendentali- não haverá outra alternativa a não ser
dade do senso comum procura escon- fazer a gramática da linguagem ordiná-
der. Nesse ponto, não é possível seguir ria desabar, impedir que ela nomeie o

4 “A percepção imediata de um dado, por exemplo, desta casa, já contém necessariamente uma vista prévia esquematizadora da
visão em geral, é apenas através desta vista prévia [Vor-stellung] que o ente reencontrado pode se manifestar como casa, pode ofe-
recer a vista de uma ‘casa dada’” (HEIDEGGER, 2019, p. 130). Essa vista prévia é conformação do mundo à natureza projetiva da
representação do sujeito. Na verdade, ela é o eixo de um “psicologismo” que habitaria a estética transcendental kantiana.
5 Cf. FRÜCHLT, MENKE, REBENTISCH, 2012, pp. 126-135. Do ponto de vista antropológico, não é a imaginação que pode
nos fornecer um espaço de desdobramento das conexões e produções produzidas por uma estética da força. Melhor seria procurar
tematizar diretamente o conceito de “pulsão”.

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que quer que seja, para que um outro importantes da vida legal e es-
campo de experiência seja possível. A piritual da humanidade em ge-
arte mostrará saber, melhor que qual- ral é o fato de que aquele que
quer outra práxis, que “César é tam- possui o verdadeiro poder é ca-
bém senhor da gramática”, que o exer- paz de determinar o conteúdo
cício do poder encontra-se fundamen- dos conceitos e das palavras.
tado na elaboração das condições sin- Cæsar dominus et supra gramma-
táticas da vida social, na imposição de ticam: César também é senhor
uma gramática que regulará o sentido da gramática (SCHMITT, 1994,
das ações, o horizonte dos problemas, a p. 202).
configuração das soluções, a estrutura
dos sujeitos agentes, a urgência das de-
cisões. Todo desejo de incomunicabi- Há de se lembrar disso no momento
lidade, de inexistência, de inexpressão histórico que é o nosso, em que nada
que a arte parece mobilizar, de forma referente à arte é autoevidente mais. A
cada vez mais insistente desde o final falta de evidência da arte talvez esteja
do século XVIII, apoiando-se preferen- ligada a outra falta de evidência, esta
cialmente em sua dimensão de auto- concernente à possibilidade de trans-
nomia, ganhando força inicialmente no formações estruturais da vida social. A
interior de certas correntes do roman- partir do momento em que a arte asso-
tismo para chegar até nós, aponta para ciou seu destino à emergência da pres-
o questionamento de tal domínio gra- são por rupturas sociais, ela parece ter
matical6 . Vale para a experiência esté- selado seu destino em um horizonte de
tica o que disse Carl Schmitt a respeito aparente retração revolucionária, como
da política: o que conhecemos atualmente, onde até
mesmo as forças que deveriam ser as
mais dispostas à ruptura acomodam-se
No que diz respeito a concei- ao horizonte de ajustes da sociedade ca-
tos políticos decisivos, interessa pitalista, mesmo quando esses ajustes
justamente quem os interpreta, se vendem como formas de “estéticas
define e aplica; quem, através da intervenção”. Vale ainda hoje o que
da decisão concreta, diz o que disse um dia Walter Benjamin a respeito
é paz, desarmamento, interven- de obras de arte que, a despeito de seu
ção, ordem pública e segurança. conteúdo de ruptura, preservavam as
Uma das manifestações mais técnicas e modalidades de circulação

6 Sobre a relação entre romantismo e processo revolucionário, ver sobretudo LÖWY, SAYRE, 2015. É de Michael Löwy algumas das
formulações mais significativas sobre a natureza de crítica social a animar o romantismo, na qual o recurso a horizontes pré-modernos
pode servir tanto como empuxo conservador como desvio para a projeção de energias utópicas. Ver também LÖWY, 2012.

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próprias ao campo estabelecido da co- transformação social, ela não deveria


municação socialmente legitimada: “o mais procurar construir um povo por
aparelho burguês de produção e pu- vir, mas “encontrar o povo” e ser capaz
blicação pode assimilar uma surpreen- de falar em sua linguagem.
dente quantidade de temas revolucio- Seria, no entanto, interessante
nários, e até mesmo propagá-los, sem perguntar-se sobre o sistema de pres-
colocar seriamente em risco sua pró- supostos que tal tarefa enuncia. Pois é
pria existência e a existência das classes evidente como ela opera com a estranha
que o controlam.” (BENJAMIN, 1987, evidência de que algo como o “povo”
p. 128). fale uma linguagem, fale uma lingua-
gem una ou que, ao menos, se desdobre
em um campo de tradutibilidade gené-
rica. Linguagem essa na qual o sentido
A ideologia do encontro com o povo se articularia à origem, no interior da
qual uma voz unitária se constituiria ar-
Neste sentido, nunca seria demasiado ticulando em uníssono a multiplicidade
insistir como o campo da comunica- do que se dispersa no campo social de
ção não se desdobra em alguma “es- experiência. Daí essa naturalidade com
fera pública” potencialmente portadora que se aceita a existência de uma lin-
de vínculos privilegiados ao mundo da guagem unificada própria do povo em
vida, mas encontra-se completamente toda sua extensão, linguagem essa cuja
colonizado pela estrutura monopolista circulação seria portadora da força de
da indústria cultural, por suas figuras, dar visibilidade a experiências denega-
seu tempo, sua visibilidade, sua forma das de sofrimento social e de fazer desse
de narrar, sua espetacularização. Trata- sofrimento motor de crítica e transfor-
se de não esquecer que a organização mação.
das formas de circulação define necessa- Poderíamos nos perguntar qual o in-
riamente o escopo das potencialidades do teresse em afirmar a existência de uma
sentido. O que acaba por levar a expe- linguagem do povo, a não ser daqueles
riência estética, ao contrário, à necessi- que se colocam como seus porta-vozes,
dade de exploração sistemática das es- com a legitimidade e a pretensa auto-
tratégias de não-comunicação. ridade que tal autoenunciação implica-
Esse horizonte da comunicação apa- ria. E no contexto sócio-histórico que é
rece, para muitos, como um fármaco o nosso, não é tarefa difícil perceber que
possível para o pretenso divórcio entre normalmente tal tarefa é assumida pela
experiência estética autônoma e o que indústria cultural e seu sistema de pro-
se costuma chamar de “linguagem do dutos. Ou seja, há de se admirar que
povo”. Pois, segundo esse esquema, se a o mais profundamente “popular” seja
arte gostaria de realizar expectativas de

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atualmente tão facilmente traduzível pós-fordista abriria espaços potenciais


na lógica cultural do Capital, de suas para a recuperação do trabalho vivo que
aspirações monopolistas e, sobretudo, se aproxima do que faz um virtuose.
de seus dispositivos de personalização Pois a indústria cultural abriria sempre
proprietária. O “popular” tornou-se, espaço para o informal, o não progra-
por alguma dessas coincidências fan- mado, para a improvisação criativa9 .
tásticas próprias a nosso tempo, o mais Um encaminhamento adequado do
profundamente monetizado e que mais problema deveria passar por certas
facilmente se traduz em modelo espe- estratégias tradicionalmente materia-
tacular de apresentação. Uma tradução listas. A primeira delas nos lembra
sem resistência e sem decomposição. O como uma análise da economia polí-
que nos coloca questões sobre como efe- tica da mídia demonstra que a natureza
tivamente se produz o popular em uma oligopolista descrita a partir no final
era histórica como a nossa, sobre quais dos anos quarenta do século passado
são os interesses por trás da enunciação apenas aprofundou-se com a criação
da unidade da linguagem popular ou de grandes conglomerados multimídia
de sua pretensa tradutibilidade gené- transnacionais, nos quais convergem
rica de base. o controle dos meios de comunicação,
No entanto, alguns preferem nos fa- dos processos de produção de produ-
zer acreditar que conceitos como “in- tos midiático-culturais e das pesquisas
dústria cultural” seriam simplesmente tecnológicas em novas mídias´10 . Ou
obsoletos, devido a sua incapacidade seja, essa pretensa democratização, que
em dar conta da dimensão ativa dos parece ser também transformação de
processos de recepção, com sua dis- receptores passivos em produtores de
persão irredutível e criadora7 , e em li- conteúdo, parece singularmente aco-
dar com a irresistível democratização modar a uma concentração cada vez
da produção e do acesso ou do enrai- maior da posse dos meios. Múltiplos
zamento orgânico entre arte e vida8 . produtores de conteúdo acomodam-se
Isso quando ele não foi lido a partir de à natureza oligopolista e concentraci-
sua pretensa dependência de um hori- onista dos meios. Deveríamos iniciar
zonte fordista de produção, incapaz de nossas análises desse ponto. O dito ca-
levar em conta como nossa realidade pitalismo imaterial nem por isso deixou

7 Como os clássicos estudos de mídia baseados nas teorias dos usos e gratificações, por exemplo BLUMLER, KATZ, 1974.
8 Ver, por exemplo, SHUSTERMAN, 2000.
9 Como nos quer fazer crer VIRNO, 2004, pp. 57-59.
10 O tempo apenas mostrou a adequação de afirmações como: “Tudo está tão estreitamente justaposto que a concentração do espí-
rito atinge um volume tal que lhe permite passar por cima da linha de demarcação entre as diferentes firmas e setores técnicos. A
unidade implacável da indústria cultural atesta a unidade em formação da política” (ADORNO, HORKHEIMER, 1991, p. 116). Para
uma análise consistente da economia política da mídia, ver MOSCO, 2009.

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de ser capitalismo monopolista. imagens e estratégias de rentabilidade


É necessário dizer isto porque tal na- próprio ao processo de industrialização
tureza oligopolista implica necessari- da cultura. Um sistema de disposições
amente certa padronização e estereo- de conduta é encenado de forma estra-
tipia da produção. Os meios organi- tégica.
zam os modos de recepção, ainda mais Nesse contexto, o Eu se torna o nome
quando estamos a falar de meios ime- de um modo de inserção em vivências
diatamente monetizados e submetidos integradoras ao sistema de produção
a imperativos industriais de alta ren- capitalista. E deveríamos insistir que
tabilidade. Pensando a estereotipia da tais integrações se dão atualmente por
recepção, Adorno e Horkheimer falarão “vivências”, já que a decomposição das
que o primeiro serviço fornecido pela distinções entre esferas pública e pri-
Indústria Cultural ao consumidor seria vada trouxe um problema novo, a saber,
o “esquematismo”. Neste sentido, eles a tendência de transformação da esfera
chegam mesmo a afirmar que a atitude privada em espaço imediatamente or-
do público já seria parte do sistema. ganizado a partir da possibilidade es-
Frase essa que deve ser compreendida tratégica de rentabilização e codifica-
em seu efetivo contexto. Pois, para além ção, isso devido a sua adequação per-
da figura equivocada de consumidores feita aos processos de reprodução ma-
catatônicos, o que está de fato em jogo terial da esfera pública. Dessa forma,
aqui é a compreensão da maneira que a queda da distinção entre arte e vida,
sujeitos devem “agir como” no interior expectativa utópica vanguardista por
da vida social, encenando seus próprios excelência, acabou, à sua maneira, por
comportamentos em uma generaliza- ocorrer, mas sem a realização emanci-
ção de “sintomas de uma consciência patória que um dia prometeu. Pois ela
duplicada” (Symptome eines gedoppelten ocorreu como integração da fronteira
Bewußtseins)11 . Desta forma, consolida- da esfera privada à dinâmica de valo-
se outra forma muito peculiar de esteti- rização do Capital. A tecnofilia de cer-
zação da existência, mas sem o potencial tos setores da crítica social peca pelo
de emancipação que um dia se depo- abandono de uma teoria da extração da
sitou nesse processo. Forma na qual mais-valia relativa através da rentabili-
o social, assim como as esferas do que zação daquilo que, até então, era des-
anteriormente fora descrito como vida provido de capacidade de produção de
privada, são imediatamente conforma- valor, a saber, a vida privada e seu uni-
dos como experiência codificável no in- verso de relações imediatas.
terior do sistema de narrativas, lugares, Nesse contexto, seria necessário in-

11 Desenvolvi de forma sistemática essas questões em SAFATLE, 2008.

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sistir que a antecipação da sociedade operada nos limites gramaticais estrei-


reconciliada é um atentado contra a re- tos da indústria cultural.
conciliação, seria necessário insistir em Colocações dessa natureza podem
uma afirmação dessa natureza contra nos levar à compreensão de que expe-
os que acreditam que a circulação da riências estéticas fieis a seu conteúdo
diferença possa conviver, de forma ima- de verdade não encontram o povo. Elas
nente, sem ao menos a autoconsciência o desconstituem. Essa é uma maneira
dramática de suas contradições, lá onde de interpretar afirmações politicamente
impera a generalização desafetada da relevantes para essa discussão como:
gestão da cultura, da “economia cria-
tiva” e de suas “pessoas” que se organi- O artista deixou de ser o Um-
zam como “posicionamento de marca”. Só extraído de si mesmo, mas
O máximo que se pode produzir, nesse ele também deixou de se en-
caso, é a posição de uma “cumplicidade dereçar ao povo, de invocar o
desafiadora”12 com os regimes mais fe- povo como força constituída.
tichizados da cultura: operação típica Nunca ele teve tanta necessi-
da generalização da racionalidade cí- dade de um povo, mas ele cons-
nica à produção cultural e aos usos tata no ponto mais alto que o
extensivos da paródia e da alegoria13 . povo falta – o povo é o que mais
Diante dos que veem tal alegorização falta. Não são os artistas popu-
como potencial emancipador, há de se lares ou populistas, mas Mal-
lembrar que o uso da alegoria no uni- larmé que pode dizer que o Li-
verso da indústria cultural retira-lhe o vro necessita do povo, e Kafka,
caráter de contração temporal que Wal- que a literatura é uma questão
ter Benjamin reconhecia14 . Pois ela não do povo, e Klee, que o povo é o
está, nesse caso, a ser pensada no inte- essencial, mas que no entanto
rior de uma teoria da revolução como falta (DELEUZE, GUATTARI,
repetição histórica. Ela não tende a sa- 1980, p. 427).
turar os “agoras” com o que não se rea-
lizou no passado. Não há promessa al-
guma na alegoria em seu uso midiático, As colocações de Deleuze e Guattari
apenas a celebração de uma conciliação são precisas. À sua maneira, elas ex-
primem a consciência de entrarmos em

12 Ver, a esse respeito, FOSTER, 1996.


13 Para uma defesa da alegoria, ver OWENS, 1984, pp. 52-87.
14 Lembremos de Benjamin a afirmar: “Enquanto no símbolo, a transfiguração da decadência, o rosto transfigurado da natureza se
revela fugazmente na luz da redenção, na alegoria o observador tem diante de si a faccies hippocratica da histórica como paisagem
primordial petrificada. A história, com tudo aquilo que tem em si de extemporâneo, de sofrimento e de malogro, ganha expressão na
imagem de um rosto” (BENJAMIN, 2011, p. 176). Essa contração temporal da alegoria prepara a temporalidade revolucionária que
encontramos nas Teses sobre o conceito de história.

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uma era histórica na qual as obras de recuperado pelo país oficial via, exata-
arte chegam a nós como a constatação mente, seu aparato de indústria cultu-
de que o povo falta, e esta é a única pos- ral16 .
sibilidade de que elas efetivamente “le- Seria ainda o caso de lembrar que a
vem a uma terra aberta”. Não são os própria temática da crítica da indús-
artistas “populares ou populistas” que tria cultural exige certa topologia, pois
nos mostram essa operação na qual uma nem todos os lugares em seu interior
terra aberta começa por um povo que são iguais. Haveríamos, por exemplo,
falta, mas são exatamente aqueles que de levar em conta a possibilidade de
chegam muito próximo do nada, como processos através dos quais é possível
Mallarmé. O mesmo Mallarmé que di- partir de formas aparentemente estere-
zia: “escavando o verso a esse ponto, otipadas para explodi-las do seu inte-
encontrei dois abismos que me desespe- rior e desenvolvê-las de forma tal a sair
ram. Um é o Nada”15 . por completo do horizonte da indústria
Isso não significa em absoluto que cultural. O caso do jazz entre Charlie
a reflexão sobre a experiência estética Parker e o free jazz é um exemplo para-
deva ignorar as dinâmicas do que vem digmático nesse sentido, onde mesmo a
de uma multiplicidade de espaços e tra- improvisação saí por completo do hori-
dições no interior da vida social. Na zonte de variação até então tipificado17 .
verdade, a crítica do “popular” é uma O caso do tango e de Astor Piazzolla
das condições necessárias para liberar com seu enriquecimento progressivo da
tais dinâmicas múltiplas de sua colo- forma pelo uso de contrapontos, recur-
nização unitária, seja ela mercantil ou sos a canons, composições de fugas, é
nacional-identitária, permitindo a me- outro. Além disso, mesmo dentro da in-
lhor compreensão das expressões que dústria cultural, nem todos os lugares
se levantaram contra processos de co- são idênticos.
lonização no interior de um imaginário Além disso, mesmo dentro da in-
popular-nacional ou mesmo, em nosso dústria cultural nem todos os luga-
caso brasileiro, do imaginário “antropo- res são idênticos, nem tudo está igual-
fágico” hegemônico de um “país não- mente perto do centro. Há lugares nos
oficial” que é, diga-se de passagem, quais dinâmicas temporárias de mar-
apenas o reverso complementar do país gem, algo como a versão cultural das
oficial. Reverso que a todo momento é “zonas autônomas temporárias”, per-

15 A este respeito, ver, sobretudo, AGOSTINHO, 2020.


16 De fato, a discussão sobre os problemas imanentes à defesa da relação entre experiência estética e expressões populares através
da mediação da indústria cultural, tal como desenvolvida em solo nacional, nos remete às críticas à construção estética do Brasil via
Tropicália, tal como desenvolvida em SCHWARZ, 1987; 2012. Essa discussão será retomada, de forma sistemática, em publicações
futuras com as quais o autor deste artigo está envolvido.
17 Ver a esse respeito, LYRA, 2021.

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mitem complexificações formais, circu- nica, já que mobilizam e procuram des-


lações setorizadas de produções e des- viar elementos e materiais da própria
construções de padrões de previsibili- indústria cultural e muitas vezes de
dade, como foi o caso da música eletrô- hackear materiais estranhos à indústria
nica no início dos anos noventa do sé- cultural. As margens passam muito ra-
culo passado. Esses lugares, é verdade, pidamente ao centro, mas elas existem,
existem por um tempo curto, mas exis- nem que seja por um tempo. Ou seja,
tem. Eles são frágeis em sua capacidade é possível e necessário reatualizar a crí-
de contraposição à dinâmica neutrali- tica da indústria cultural, sem negligen-
zadora da indústria cultural hegemô- ciar sua complexidade imanente.

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Recibido: 16/11/2021
Aprobado: 23/11/2021
Publicado: 31/12/2021

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