Artigo Vanessa - Corrigido

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS

CAMPUS NORTE
UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE PORANGATU
CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA

VANESSA APARECIDA RIBEIRO DE SOUZA

MÚSICA COMO INSTRUMENTO PARA O ENSINO DE HISTÓRIA:


DITADURA MILITAR (1964-1985).

PORANGATU- GO
2024
2

VANESSA APARECIDA RIBEIRO DE SOUZA

MÚSICA COMO INSTRUMENTO PARA O ENSINO DE HISTÓRIA:


DITADURA MILITAR (1964-1985).

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como


requisito parcial para obtenção do título de Licenciada
em História, pela Universidade Estadual de Goiás –
UEG/ Câmpus Norte/ Unidade Universitária de
Porangatu, sob a orientação do Prof. Dr. José Fernando
Saroba Monteiro

PORANGATU- GO
2024
2

Ficha Catalográfica

VANESSA APARECIDA RIBEIRO DE SOUZA


2

MÚSICA COMO INSTRUMENTO PARA O ENSINO DE HISTÓRIA:


DITADURA MILITAR (1964-1985).

Aprovado em _______de ______________de _________, pela Banca Examinadora


constituída pelos professores:

_______________________________________________
José Fernando Saroba Monteiro - Orientador
Especialista em Educação para Diversidade, Direitos Humanos e Cidadania
Universidade Estadual de Goiás

_______________________________________________
Luis Rafael da Silva Valadão - Avaliador
Especialista em Educação para a Diversidade, Direitos Humanos e Cidadania
Universidade Estadual de Goiás

_______________________________________________
Romildo Flosino - Avaliador
Especialista em Docência Universitária Universidade
Estadual de Goiás

PORANGATU- GO
2024
2

DEDICATÓRIA
2

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................................8

1. BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA DITADURA MILITAR NO BRASIL (1964-1985)


....................................................................................................................................................10

3. ESTRATÉGIAS E ABORDAGENS PARA INCORPORAR A MÚSICA NO CURRÍCULO


ESCOLAR.................................................................................................................................18

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................23

REFERÊNCIAS.........................................................................................................................25

MÚSICA COMO INSTRUMENTO PARA O ENSINO DE HISTÓRIA:


2

DITADURA MILITAR (1964-1985) 1

VANESSA APARECIDA RIBEIRO DE SOUZA2

RESUMO
Esta pesquisa tem por escopo analisar a importância da utilização da música como fonte
histórica em sala de aula, com foco nas canções produzidas durante o período da Ditadura
Militar no Brasil, que vigeu no país de 1964 a 1985. Com base nisso, vislumbra-se ressaltar a
relevância desse período histórico na educação, promovendo uma abordagem crítica e
reflexiva, buscando compreender a influência da música no cenário político, social e cultural
do país, abordando-se para tanto, fatos históricos que contribuíram para o desenvolvimento e
consolidação da música de protesto como parte da cultura brasileira. Essa pesquisa também
mostra-se relevante, contribuindo na construção da identidade do aluno como um agente
histórico crítico e reflexivo. Portanto, o professor de História pode superar as barreiras que
dificultam o uso da música como fonte histórica, aproveitando-a como uma ferramenta
adicional na construção do conhecimento histórico do aluno e de sua identidade. Dessa forma,
a utilização da música como documento histórico está alinhada com as demandas do ensino de
História na pós-modernidade.

Palavras-chave: Ditadura Militar; Fonte histórica. História, Música.

ABSTRACT
This research aims to analyze the importance of using music as a historical source in the
classroom, focusing on Brazilian Popular Music (MPB) during the period of the Military
Dictatorship in Brazil, which lasted from 1964 to 1985. It intends to emphasize the relevance
of this historical period in education, promoting a critical and reflective approach, as well as
understanding the influence of music on the political, social, and cultural scene of the country,
addressing historical facts that contributed to the development and consolidation of MPB as
part of Brazilian culture. This research is also important to help build the student's identity as a
critical and reflective historical agent. Therefore, the History teacher can overcome the
barriers that hinder the use of music as a historical source, taking advantage of it as an
additional tool in the construction of the student's historical knowledge and identity. Thus,
using music as a historical document aligns with the demands of History education in the post-
modernity.

Keywords: Military Dictatorship; Historical source; History; Music.

1 Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, apresentado a banca como exigência para obtenção de grau
de Licenciatura em História na Universidade Estadual de Goiás/ Campus Norte/ Unidade Universitária de
Porangatu.
2 Licencianda em História. Universidade Estadual de Goiás/ Campus Norte/ Unidade Universitária de Porangatu.
E-mail: [email protected]
2

INTRODUÇÃO.

A música encontra-se na intersecção da expressão cultural e da narrativa coletiva de


uma sociedade, desempenhando um papel crucial na maneira como as pessoas interpretam e
assimilam acontecimentos históricos. A relação simbiótica entre música e História é
particularmente evidente ao analisarmos períodos caracterizados por conflitos e regimes
autoritários, onde a arte se manifesta frequentemente como forma de resistência, memória e
comunicação. Neste contexto, o presente artigo propõe uma investigação sobre a
potencialidade da música como instrumento pedagógico no Ensino de História,
particularmente do período da Ditadura Militar no Brasil, que se estendeu de 1964 a 1985.
Portanto, a música como fonte histórica é uma ferramenta pedagógica que transcende a
mera transmissão de informações, pois promove o desenvolvimento do pensamento crítico,
incentivando os alunos a analisarem e refletirem sobre as intrincadas relações de poder e as
experiências humanas durante a Ditadura Militar Brasileira. Neste período, a música emergiu
como um veículo poderoso para a contestação política, refletindo as tensões sociais e
capturando a essência da época para as gerações futuras.
Deste modo, com a abordagem da música como elemento central, este artigo analisa
como algumas canções, concebidas como músicas de protesto, constituem um eficiente
recurso pedagógico para o ensino de História, indo além do texto escrito e alcançando uma
dimensão emocional e cognitiva que favorece o engajamento e o entendimento dos alunos,
contribuindo para o diálogo sobre inovações no ensino de História e destaca a relevância de
métodos interdisciplinares para a educação histórica atual.
A escolha baseia-se em razões acadêmicas, científicas e sociais. Academicamente, a
pesquisa busca contribuir para a área da Educação, especialmente no campo do Ensino de
História, fornecendo uma abordagem inovadora e engajadora. Cientificamente, o estudo busca
investigar as potencialidades e limitações do uso da música como recurso didático no Ensino
de História. Socialmente, a pesquisa busca promover uma reflexão crítica sobre a Ditadura
Militar e suas consequências, visando contribuir para a formação de cidadãos conscientes e
engajados com a defesa dos direitos humanos e democracia.
Atrelado a isso, a justificativa desta pesquisa se baseia na importância e relevância de
abordar a Ditadura Militar no Ensino de História, devido aos seus impactos na sociedade
brasileira e na preservação da memória histórica. Além disso, acredita-se que o uso da música
como ferramenta de ensino pode estimular o interesse e o envolvimento dos alunos,
promovendo uma aprendizagem significativa, crítica e reflexiva. Espera-se, assim, contribuir
2

para a formação de cidadãos conscientes sobre os direitos humanos, a democracia e a


importância da luta pela liberdade.
Com bases nessas premissas, a problemática envolvida na pesquisa se relaciona com a
falta de interesse dos alunos em aprender sobre a Ditadura Militar, devido ao distanciamento
temporal e emocional do período. Além disso, a abordagem tradicional da história pode ser
pouco atrativa e dificultar a compreensão dos eventos e das consequências desse período
histórico. Nesse sentido, é necessário investigar se a música pode ser uma ponte entre os
alunos e a História, despertando o interesse e facilitando a compreensão dos fatos históricos.
Quanto à metodologia utilizada, envolve a análise de letras de músicas,
contextualizando-as dentro dos eventos históricos da época e explorando sua relação com a
resistência política, censura, propaganda e a memória coletiva da sociedade. O estudo também
pondera as estratégias didáticas para a incorporação desses recursos musicais em sala de aula,
com o objetivo de estimular uma compreensão mais empática e aprofundada do período
histórico em questão.
Para tanto, o artigo se encontra estruturado em três tópicos: o primeiro apresenta uma
contextualização histórica sobre a Ditadura Militar no Brasil; o segundo avalia a música como
instrumento de protesto durante a Ditadura Militar; o terceiro propõe uma revisão
bibliográfica sobre o Ensino de História e o uso da música como recurso didático; e, por fim, o
quarto faz seleção e análise das músicas relacionadas ao tema, vislumbrando uma melhor
compreensão de tudo que foi discutido no decorrer do trabalho.
Ao final espera-se que esse estudo contribua para a valorização do ensino de História e
para uma reflexão sobre a importância da música como instrumento de resistência e protesto.
Além disso, espera-se que ele possa estimular o interesse dos estudantes pelo tema,
promovendo uma maior compreensão e conscientização sobre os acontecimentos históricos
que ocorreram durante a Ditadura Militar no Brasil.

1. BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA DITADURA MILITAR NO BRASIL (1964-


1985)
2

Preliminarmente, ressalta-se que não é possível compreender plenamente a Ditadura


Militar sem levar em consideração o contexto em que ela se insere. Todavia não é uma tarefa
fácil fazê-lo, haja vista ter sido um período da história do Brasil conturbado e obscuro,
marcado pela repressão e violação dos direitos humanos, exigindo do crítico um olhar
multidimensional. Para tanto, autores brasileiros têm contribuído significativamente para a
análise desse período, resgatando memórias e discutindo as suas consequências. Com base
nisso, neste tópico serão contempladas algumas dessas abordagens, numa perspectiva social,
política e econômica, a fim de compreender a dinâmica do poder e as complexidades da
democracia.
Conforme realçado, uma das críticas mais contundentes ao regime militar diz respeito à
violação dos direitos humanos. Durante esse período, ocorreram abusos generalizados, como
prisões arbitrárias, torturas e desaparecimentos forçados. Essas práticas violaram os princípios
fundamentais da dignidade humana e representaram um grande retrocesso para a democracia
brasileira (FIDELIS, 2014).
Além disso, de acordo com Clara Mello Costa (2021), no contexto das violações dos
Direitos Humanos, foram estabelecidos órgãos de segurança e repressão, como o
Departamento de Operações de Informação do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-
CODI). Esse departamento foi responsável por promover atos de tortura e desaparecimentos
forçados. Durante esse período, os direitos civis e políticos sofreram amplas violações,
resultando na prisão arbitrária e tortura de milhares de pessoas, e até mesmo no assassinato de
algumas delas por motivações políticas.
A repressão não se limitou apenas aos militantes de esquerda, atingindo também
estudantes, intelectuais e membros de movimentos sociais. O regime também impôs censura à
imprensa e cerceou a liberdade de expressão. Jornais e revistas foram fechados, programas de
rádio e televisão foram suspensos e livros foram proibidos de circular. Essas restrições
comprometeram a transparência e o direito à informação, fundamentais para o funcionamento
saudável de uma sociedade democrática.
Do ponto de vista político, para o estudioso Gaspari (2002), a Ditadura Militar
representou um golpe nas instituições democráticas, e reprimiu severamente qualquer forma de
oposição política, perseguindo, prendendo, torturando e matando aqueles que questionavam a
autoridade do governo. Sob o pretexto de combater a ameaça comunista, as Forças Armadas
deram um golpe de Estado e ao assumir o poder, extinguiram os partidos políticos existentes e
limitaram o espaço de participação da sociedade civil.
2

Ademais, conforme Napolitano (2018), durante esse período, sindicatos, movimentos


sociais e estudantis foram enfraquecidos, sendo muitas vezes impedidos de se organizar e de
expressar suas demandas, e os militares de forma autoritária e centralizadora, reprimiam a
pluralidade de ideias e o pluralismo político, que são fundamentais para uma sociedade
democrática.
No campo econômico, foi adotada uma política de desenvolvimento com foco em um
aparente crescimento econômico e modernização do país, que mais tarde resultaram em
retrocessos. Outro problema relevante do regime militar foi o aprofundamento da desigualdade
social. Durante esse período, houve uma ampliação da concentração de renda, com a
privilegiada elite militar e empresarial controlando os meios de produção e acumulando
riqueza. Ao mesmo tempo, os trabalhadores e a classe média foram afetados por uma política
econômica repressiva, com aumento da inflação e estagnação dos salários (NAPOLITANO,
2018).
Assim, de acordo com Stephan (2016) o objetivo da tomada de poder pelos militares
era restabelecer a ordem política e social, conter as ideias comunistas e a subversão, dispersar
movimentos de oposição ao projeto de desenvolvimento e tornar-se uma potência econômica
importante na política internacional. É importante destacar que o termo "segurança nacional"
foi utilizado pelo Brasil para garantir a manutenção da coesão do sistema político imposto,
como forma de defesa do governo. Durante o Regime Militar, os militares utilizaram a
corrupção e o comunismo como argumentos principais para deflagrar o golpe e instituir a
ditadura.
Ao mesmo tempo, a censura impediu que as várias denúncias que recaíam sobre o
grupo militar fossem realmente analisadas:

Ao que parece que todos, conspiradores e governistas, acreditavam que se tratava de


mais uma intervenção militar à brasileira: cirúrgica, de curta duração, que logo
devolveria o poder aos civis, em um ambiente político "saneado", como as direitas
gostavam de dizer. No entanto, o que se viu foi o gradual abandono das ilusões
"moderadoras" que estavam no espírito do golpe civil-militar, rumo a uma ditadura.
O golpe civil-militar rapidamente se transformaria em um regime militar
(NAPOLITANO, 2018, p. 67).

O referido autor destaca a forma como o golpe inicialmente ganhou apoio e como a
gradual ascensão do regime militar foi um processo de abandono das promessas iniciais e
avanço autoritário, aproveitando-se da ingenuidade e as ilusões daqueles que apoiaram o
golpe, acreditando que ele traria uma solução rápida e eficaz para os problemas políticos e
2

sociais do país. No entanto, o que aconteceu foi o aprofundamento da repressão e a violação


dos direitos humanos, culminando em um longo período de ditadura no Brasil.

1.1. A censura musical durante o regime militar.

Para além de todas as mazelas advindas da forte repressão e autoritarismo impostos


pelos governos militares, a censura às manifestações artísticas também marcaram esse período
obscuro da história do Brasil, sobretudo no que diz respeito às produções musicais. Portanto
além da censura moral e dos bons costumes que imperava em todos os setores da sociedade,
também houve no Brasil uma censura política em relação a música, durante a Ditadura Militar.
Conforme Carneiro (2013), a música, como forma de expressão popular e veículo de
ideias, acabou sendo alvo frequente da censura, que buscava controlar o que era difundido e
consumido pela população e consequentemente muitos artistas tiveram suas obras proibidas,
boicotadas ou modificadas, buscando se adequar às normas impostas pelos censores, onde
qualquer conteúdo considerado subversivo, crítico ao regime ou que tivesse mensagens
consideradas perigosas pelas autoridades poderia ser censurado.
Ainda segundo a autora, nesse contexto, a censura às manifestações artísticas deixou
um legado de repressão e limitação da liberdade de expressão no Brasil. Muitas músicas que
falavam sobre a realidade social e política do país foram silenciadas, impedindo que a música
brasileira refletisse a diversidade de vozes e ideias existentes na sociedade e foi uma das
ferramentas utilizadas pelo governo para controlar e reprimir expressões culturais que
contestassem o regime instalado.
De acordo com Souza (2009) a censura de músicas era realizada pelo Serviço de
Censura e Diversões Públicas (SCDP) subordinado a Divisão de Censura e Diversões Públicas
(DCDP) do Departamento da Polícia Federal, órgão responsável por analisar e aprovar todas
as obras que seriam lançadas no país, na tentativa de unificar e padronizar as diretrizes e a
atuação da atividade censória em todo o território nacional. O Decreto n° 20.493, de 24 de
janeiro de 1946, aprovou a criação do Serviço de Censura de Diversões Públicas e estabeleceu
a censura prévia em seu artigo 41, senão vejamos:

Art. 41. Será negada a autorização sempre que a representação, exibição ou


transmissão radiotelefônica: a) contiver qualquer ofensa ao decôro público; b)
contiver cenas de ferocidade ou fôr capaz de gerir a prática de crimes; c) divulgar ou
induzir aos maus costumes; d) fôr capaz de provocar o incitamento contra o regime
vigente, a ordem pública, as autoridades e seus agentes; e) puder prejudicar a
cordialidade das relações com outros povos; f) fôr ofensivo às coletividades ou às
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religiões; g) ferir, por qualquer forma, a dignidade ou o interêsse nacional; h) induzir


ao desprestígio das fôrças armadas (BRASIL, 1946).

Como se vê, o texto do referido dispositivo, apresenta uma série de restrições e


censuras à liberdade de expressão, caracterizando uma política de controle e cerceamento da
informação. No artigo 41, são previstas várias condições para negar a autorização de
representação, exibição ou transmissão radiotelefônica. A primeira restrição é em relação ao
decoro público, o que pode ser um conceito muito subjetivo e passível de interpretação
arbitrária por parte da autoridade responsável.
Ademais, o texto traz justificativa vaga e aberta a interpretações diversas, podendo ser
utilizada para silenciar qualquer tipo de manifestação ou conteúdo considerado incômodo
pelas autoridades. A divulgação ou indução aos maus costumes também é mencionada como
motivo para negar autorização, o que novamente é uma justificativa que pode ser amplamente
utilizada para censurar qualquer conteúdo que represente um desafio aos padrões morais das
autoridades vigentes.
A possibilidade de incitar contra o regime vigente, a ordem pública, as autoridades e
seus agentes é motivo para negação de autorização, o que claramente cerceia a liberdade de
expressão e impede críticas e manifestações contrárias ao governo. A preocupação com a
cordialidade das relações com outros povos é mencionada como critério para negar
autorização, o que pode ser uma justificação para evitar críticas a governos estrangeiros,
mesmo que sejam legítimas e necessárias (SOUZA, 2009).
De mais a mais, conforme pondera Souza (2009) a ofensa às coletividades ou religiões
também é citada como razão para negação de autorização, o que pode ser utilizado para proibir
conteúdos que tratem de questões sensíveis ou críticas a determinados grupos, cerceando a
liberdade de expressão e o debate público. Por fim, a indução ao desprestígio das forças
armadas é mencionada como motivo para negar autorização, o que visa proteger a imagem e
reputação das instituições militares, mas pode também inibir a crítica e a abordagem crítica de
temas relacionados a essas instituições.
Em resumo, o texto revela uma forte tendência à censura e controle da liberdade de
expressão, limitando a manifestação de ideias contrárias ao governo, promovendo a
autocensura e cerceando o debate público. Em virtude dessa regulamentação vigente, muitas
letras de músicas foram alteradas ou tiveram partes cortadas para evitar qualquer tipo de
referência política ou social, em que o objetivo era manter um ambiente cultural controlado e
evitar a disseminação de ideias contrárias ao regime militar.
2

Nesse contexto, diversos artistas brasileiros se destacaram, dentre eles Caetano Veloso
e Gilberto Gil, icônicos representantes da música popular brasileira, os quais tiveram suas
composições censuradas durante o regime militar. Porém para ambos a censura apenas
destacava a importância da música como meio de resistência e a tentativa do regime de sufocar
vozes que não se alinhavam com a ideologia dominante (CARNEIRO, 2013).
De acordo com Silva Junior (2017), outro ícone importante deste período foi o músico
Geraldo Vandré, que criou a composição musical "Pra não dizer que não falei das flores", mais
uma canção que se não apenas se opunha à ditadura, mas também denunciava suas barbáries e
convidava o povo à luta. Na letra da música, são destacadas as injustiças presentes nos campos
(como a fome nas grandes plantações), enfatizando também a presença do exército nas ruas,
convidando as pessoas a se unirem na luta contra a ditadura, transmitindo a mensagem de que
é necessário agir em vez de esperar passivamente.
Assim, através de suas obras, eles ressaltaram a resistência e a necessidade de lutar pela
liberdade de expressão, utilizando a música como forma de denúncia e conscientização
política, deixando um legado de reflexão sobre a importância da liberdade artística e do papel
da música como forma de resistência e manifestação cultural.

2. A MÚSICA COMO FONTE HISTÓRICA

Conforme José D’Assunção Barros (2019), fonte histórica é tudo aquilo que, por ter
sido produzido pelos seres humanos ou por trazer vestígios de suas ações e interferência, pode
nos proporcionar um acesso significativo à compreensão do passado humano e de seus
desdobramentos no presente.
Neste sentido, a música tem sido uma importante forma de expressão cultural ao longo
da história humana, transmitindo emoções, ideias e valores de diferentes épocas e sociedades.
Por essa razão, a música é considerada uma importante fonte histórica para compreendermos e
analisarmos o passado. Assim, utilizar a música como recurso no estudo da História também
implica em não restringí-la do meio acadêmico e escolar, sendo possível aplicar o
entendimento histórico-musical em diversos outros ambientes onde a música é ouvida.
De acordo com José Eduardo (Zuza) de Mello (2019), qualquer estilo musical pode ser
objeto de análise histórica e social, estando relacionado tanto a movimentos sociais quanto a
outras possibilidades de investigação em diferentes áreas. Ademais, segundo o autor, pensar na
música de forma histórica não se limita apenas a produções antigas ligadas a fatos passados ou
2

eventos históricos em si, pois a música que é contextualizada historicamente possibilita a


compreensão do ser humano em sua vida cotidiana e em uma forma específica de expressão.
Quanto ao ensino da História, Claúdio José Xavier (2010), explica que a forma como o
Ensino da História é abordado tem evoluído ao longo do tempo e esclarece que no passado, os
documentos históricos utilizados em sala de aula eram principalmente textos escritos. No
entanto, com o passar do tempo, começou-se a dar mais importância a objetos e imagens e
também a música passou a ser utilizada como uma ferramenta para ensinar História. Ao usar a
música como recurso didático, é possível levar os estudantes a refletirem sobre determinados
acontecimentos históricos, compreenderem diferentes perspectivas e se envolverem de forma
mais significativa com o conteúdo abordado. Além disso, a música pode proporcionar uma
experiência sensorial, estimulando a imaginação e a criatividade dos alunos (Xavier, 2010).
No entanto, é importante ressaltar que a utilização da música no Ensino da História
deve ser feita de forma consciente e crítica. Xavier, alerta que é necessário analisar as letras
das músicas escolhidas, considerando aspectos como a veracidade dos fatos apresentados, a
visão dos artistas e as mensagens transmitidas. Também é importante contextualizar as
músicas dentro do período histórico abordado, a fim de evitar distorções ou simplificações
excessivas.
De acordo com Marcos Napolitano (2001), as músicas têm sido amplamente utilizadas
nas aulas de história, uma vez que evidenciam os problemas da sociedade em que seu autor
está inserido. Além disso, o historiador destaca a importância de analisar tanto a letra quanto a
melodia da música, pois, embora a letra seja privilegiada nesses estudos, a melodia, harmonia
e ritmo da canção também influenciam na sua compreensão, facilitando o entendimento da
mesma. c da música na compreensão das realidades da cultura popular.
Mirian Perez (2008) argumenta que, mais do que considerar a música como um
documento, é essencial encarar o trabalho com música como uma construção de conhecimento
e conceitos. Isso leva o aluno a pensar, interpretar e compreender determinados
acontecimentos históricos como parte de um processo de ensino-aprendizagem, e não apenas
como algo a ser memorizado.
No contexto brasileiro, a música possui um potencial significativo como fonte
histórica, pois reflete as transformações e particularidades da nossa sociedade ao longo dos
séculos. Além disso, é importante considerar o contexto histórico e social no qual uma música
foi produzida, para evitar análises superficiais e equivocadas, pois a música também pode
refletir as condições sociais e econômicas de determinada época, podendo abordar temas como
2

a desigualdade, o trabalho, a pobreza e a exploração, fornecendo insights sobre as condições


de vida da população e as injustiças que enfrentavam (CERRI; FERREIRA, 2007).
Como exemplo, pode-se mencionar o estudo dos aspectos culturais, sociais e políticos
de períodos históricos específicos, como a Ditadura Militar, que vigorou no Brasil de 1964 a
1985, período em que as músicas tornam-se uma forma de expressão e de mobilização popular,
proporcionando uma compreensão mais ampla e profunda sobre a realidade vivida na época.
Conforme exposto anteriormente, nesse período, diversos artistas utilizaram a música como
meio de protesto contra o sistema, transmitindo mensagens de resistência e crítica através das
letras e melodias, por meios das quais é possível obter informações valiosas sobre como as
pessoas pensavam, sentiam e expressavam suas opiniões naquele contexto histórico específico.
Além disso, de acordo com Cerri e Ferreira (2007) através das letras das músicas,
pode-se perceber os temas abordados pelos artistas, como a resistência à opressão, a luta pelos
direitos humanos e a busca pela liberdade, assim como músicas produzidas nesses períodos
também pode revelar informações sobre a repressão e censura sofridas pelos artistas, bem
como as estratégias utilizadas por eles para driblar essas restrições e transmitir suas mensagens
de forma criativa e subversiva.
Ademais, a análise de outras características das músicas, como a melodia, o ritmo e as
escolhas instrumentais, permite entender como esses elementos foram utilizados pelos artistas
para transmitir suas mensagens de forma mais impactante. Por exemplo, a utilização de ritmos
mais marcantes e vibrantes pode refletir a energia e a revolta presentes naquele momento
histórico.
Assim, compreende-se que por meio do estudo da música como fonte histórica, é
possível obter uma análise mais completa e abrangente dos aspectos culturais, sociais e
políticos do período estudado, sendo uma ferramenta valiosa para compreender as
complexidades e contradições da sociedade da época, proporcionando uma visão mais ampla
sobre os sentimentos, ideias e desejos das pessoas que viveram nesse contexto específico.

2.1. A música como registro histórico da Ditadura Militar

Conforme discutido no tópico anterior, a música tem desempenhado um papel


fundamental como registro histórico, sobretudo do período da Ditadura Militar no Brasil, que
foi certamente o mais sombrio de toda a história brasileira, em que os artistas foram
ativamente censurados e perseguidos pelo governo ditatorial. No entanto, apesar das restrições
2

impostas, a música emergiu como uma forma de resistência e denúncia à repressão e às


injustiças sociais.
De acordo com Boris Fausto (1995) os Atos Institucionais eram determinações do
poder executivo e tinham como objetivo legitimar e legalizar as ações políticas. À medida que
os Decretos Institucionais avançavam, também aumentava a intensidade do regime,
caracterizado por seu autoritarismo, capaz de negar os direitos garantidos pela constituição
brasileira, impondo a opressão militar e policial, além do silenciamento dos oponentes.
Com o AI-5, de 13 de dezembro de 1968, instalou-se no país a repressão e a censura
aos meios de comunicação. Música e movimentos opositores ao regime passaram a ser
perseguidos, muitos manifestantes foram caçados, diversos foram detidos e outros perderam
suas vidas por se oporem a ditadura. A música foi uma das formas de oposição a essa situação,
Gilberto Gil, Caetano Veloso, Geraldo Vandré, Chico Buarque, Raul Seixas, foram alguns dos
muitos artistas brasileiros que compuseram canções criticando o governo e principalmente a
censura imposta (FAUSTO, 1995).
De acordo com Demerval Monteiro (2014), na década de 1960 surgiu um tipo de
canção repleta de críticas de viés político-social alimentadas ainda mais no período pós-golpe
devido aos embates entre a ala esquerdista e o regime militar vigente, a “canção de protesto”.
Muitas canções foram compostas nessa época, expressando a revolta, a tristeza e o desejo de
mudança da população, cujas letras e melodias foram utilizadas como uma maneira de
transmitir mensagens políticas subversivas e conscientizar a sociedade sobre os abusos
cometidos pelo governo militar.
Um dos exemplos mais emblemáticos é a música “Pra não dizer que não falei das
flores” de Geraldo Vandré, composta em 1968. A canção foi um hino de protesto contra a
ditadura, inspirando e mobilizando milhares de jovens durante a época. Outro exemplo
importante é a música “Apesar de Você” de Chico Buarque, lançada em 1970, e que foi uma
resposta direta às imposições do regime militar, que censurava e perseguia os artistas. Com
sua letra aparentemente inocente, Chico conseguiu transmitir uma mensagem de resistência e
de esperança em meio à opressão.
Além dessas duas músicas, inúmeros outros artistas e grupos musicais contribuíram
para o registro histórico da Ditadura Militar. De acordo com Sofia Lerche Ferreira (2004)
nomes como Milton Nascimento, Elis Regina, Cássia Eller, entre outros, dedicaram suas
carreiras a denunciar as injustiças do regime e a lutar pela democracia. A música da época
tornou-se um registro artístico e histórico valioso, pois revela as angústias, os desafios e as
2

lutas do povo brasileiro durante a Ditadura Militar. As letras das canções são uma forma de
manifestação popular que mostram a resistência da sociedade civil diante do regime opressor.
Atualmente, essas músicas continuam sendo tocadas e relembradas como um símbolo
da coragem e persistência do povo brasileiro contra a ditadura. Elas ajudam a manter viva a
história daquele período, garantindo que as gerações futuras nunca se esqueçam das
atrocidades cometidas e do poder transformador da música como expressão da luta por
liberdade e justiça.

3. ESTRATÉGIAS E ABORDAGENS PARA INCORPORAR A MÚSICA NO


CURRÍCULO ESCOLAR.

A música como forma de expressão representa um reflexo específico de uma época


passada, sendo um valioso recurso para o historiador e, consequentemente, para o professor de
História. Além disso, ela desempenha um papel nobre e crucial no ensino/aprendizagem,
proporcionando uma abordagem metodológica mais significativa. Portanto, incorporá-la no
currículo escolar pode trazer diversos benefícios para os alunos, estimulando sua criatividade,
desenvolvendo suas habilidades sociais e emocionais, além de promover a inclusão e
diversidade cultural. Ademais a música também pode ser integrada a outras disciplinas, como
geografia, matemática e literatura, por meio de atividades que relacionem os conteúdos dessas
disciplinas com músicas relacionadas.
Nesse sentido, acredita-se que ao utilizar a música como ferramenta e ao mostrar aos
alunos que eles são parte integrante da História, segue-se um caminho que leva ao objetivo de
despertar o interesse deles pela aula e desenvolver o pensamento crítico. Além disso, é
importante realizar uma leitura crítica da música, incluindo a análise da letra e melodia, assim
como de todas as formas de expressão artística, como fontes para compreender a História, e
isso implica reconhecer que a música é uma experiência humana (MONTEIRO, 2014).
Segundo Morin, esse reconhecimento é essencial, senão vejamos:

A canção tem uma dupla substância: musical e verbal. [...] Tanto a música como a
letra nos remetem a princípios de análise heterogêneos, divergentes.[...] A própria
música é algo de sincrético na canção. Comporta o tema melódico, o ritmo, o arranjo
musical, o acompanhamento e a orquestração. Embora o tema musical seja o mais
refratário à análise conceitual e ao estudo sociológico, o arranjo e o ritmo inserem-se
nos gêneros, nos estilos e nas modas. (MORIN, 2001,p. 137).
2

Conforme se vê, o autor destaca a complexidade da canção como uma forma de


expressão artística e ressalta que é composta por duas substâncias distintas, a música e a letra,
que podem ser analisadas de maneiras diferentes e até mesmo contraditórias. É interessante
notar que, embora a música possa ser mais difícil de ser analisada conceitualmente e
sociologicamente, o arranjo e o ritmo da canção se inserem em gêneros, estilos e influências
contemporâneas.
Em outras palavras, isso significa que, dentro do contexto sociocultural, a canção pode
ser influenciada por tendências e estilos musicais específicos, pois a canção é muito mais do
que apenas música ou letra isoladamente, mas sim uma combinação de elementos
heterogêneos que se unem para criar uma experiência musical única e complexa.
Por esssas razões, a inclusão da música no currículo escolar é uma temática que vem
sendo discutida por autores da área educacional ao longo dos anos, com o intuito de trazer a
compreensão de que não trata-se apenas de uma linguagem cultural, mas uma ferramenta
pedagógica eficaz. Para tanto, diversos estudos fundamentam e destacam a importância dessa
prática para o desenvolvimento cognitivo, social e emocional dos alunos. De acordo com
Swanwick (2003), a música é uma linguagem universal que permite expressar emoções, ideias
e sentimentos de forma única. Por isso, é fundamental que as escolas valorizem a música
como uma disciplina central no currículo, promovendo a ampliação das experiências musicais
dos estudantes.
Corroborando, Romanelli (2009) ressalta a importância de se valorizar a cultura
musical local e global, promovendo a diversidade e o respeito às diferenças culturais e nesse
contexto, a música pode ser utilizada como um meio de promover a identidade cultural dos
alunos e desenvolver neles uma consciência crítica sobre a música e sua função na sociedade.
O uso desse tipo de abordagem é defendida por Perrenoud (2006), o qual explica que trata-se
de uma abordagem inovadora e eficaz para a incorporação de novas metodologias no currículo
escolar. Essas abordagens, que privilegiam a vivência prática e lúdica dos alunos, permitem
que eles desenvolvam habilidades musicais e se envolvam ativamente na produção, apreciação
e reflexão musical.
Além disso, Joly (2003) destaca a importância da interdisciplinaridade na incorporação
da música no currículo, isso quer dizer que a música pode ser utilizada como uma ferramenta
de aprendizagem em diferentes disciplinas, como a matemática, literatura, entre outras. Dessa
forma, a música se torna um recurso pedagógico transversal, potencializando a aprendizagem
dos alunos e tornando-a mais significativa.
2

Em suma, os diversos autores apresentados defendem a importância da música no


currículo escolar, destacando estratégias e abordagens para sua incorporação de forma efetiva.
A música pode ser utilizada como uma ferramenta de expressão, desenvolvimento cultural e
cognitivo dos alunos, potencializando sua aprendizagem e ampliando suas experiências
musicais.

3.1 Estudo de caso: análise das letras e mensagens transmitidas pelas músicas e
utilização no ensino da História da Ditadura Militar

O estudo de caso proposto tem como objetivo analisar as letras e mensagens


transmitidas pelas músicas durante a Ditadura Militar no Brasil (1964-1985) e discutir sua
utilização no ensino da História desse período. A análise das letras e mensagens das músicas
pode trazer uma perspectiva diferenciada sobre o contexto histórico, as lutas e resistências da
época e a importância da liberdade de expressão.
A utilização das músicas nas aulas de História sobre a Ditadura Militar pode ser uma
estratégia pedagógica eficaz para incentivar a reflexão dos estudantes sobre este período, pois
através das letras e mensagens, os alunos podem entender o contexto histórico e social da
época, assim como as lutas e resistências que ocorreram, bem como as músicas também
podem ser utilizadas como ponto de partida para debates e discussões em sala de aula. Os
estudantes podem analisar as letras, identificar as mensagens transmitidas, as referências
históricas e discutir o impacto da censura na produção artística. Além disso, eles podem fazer
conexões com outras manifestações culturais da época, como o cinema e o teatro, e comparar
as diferentes formas de resistência (MONTEIRO, 2014).
Sabe-se que durante a Ditadura Militar no Brasil, a censura foi uma prática recorrente
nas artes, incluindo a música. No entanto, muitos artistas encontraram maneiras de contornar a
censura e transmitir suas mensagens através de letras e metáforas inteligentes e criativas. Para
iniciar esta análise podemos mencionar a música "Pra Não Dizer que Não Falei das Flores", a
qual é considerada um dos hinos da resistência durante a Ditadura Militar no Brasil, composta
por Geraldo Vandré e lançada em 1968, a música foi proibida de ser tocada e transmitida
devido ao seu conteúdo político contestador.
A letra desta música é repleta de metáforas inteligentes que denunciam a censura e a
falta de liberdade presentes na época. Vandré (1968) utiliza a flor como símbolo da liberdade e
da luta por um país melhor, fazendo referência à “ainda fazem da flor o seu mais forte refrão”
2

e à “pelos campos há fome em grandes planatações” que simbolizam a opressão e a falta de


perspectivas. Além disso, a composição também incentiva a união e a luta do povo brasileiro.
Vandré (1968) diz “Vem, vamos embora, que esperar não é saber, quem sabe faz a hora
não espera acontecer”, encorajando a ação e a resistência ativa contra a Ditadura. Apesar da
censura, a mensagem de resistência contida na música foi amplamente disseminada e se
tornou um símbolo de esperança e luta pelos direitos civis e democracia. Até hoje, "Pra Não
Dizer que Não Falei das Flores" é lembrada como uma das músicas mais marcantes desse
período sombrio da história brasileira.
Outras músicas, como “Apesar de Você” de Chico Buarque, também trouxeram
mensagens de resistência, mas de forma mais sutil. A letra da música utiliza metáforas para
criticar o regime militar e seus abusos de poder, fazendo referência ao medo e à repressão,
porém de maneira poética. A música "Cálice" de Chico Buarque e Gilberto Gil é outro
exemplo relevante, pois também utiliza metáforas para falar sobre a censura e a perseguição
política. A palavra "Cálice" é usada para representar a máscara que o regime militar colocava
sobre a sociedade, impedindo-a de expressar-se livremente.
Ademais essas músicas são exemplos de como os artistas da época encontravam
maneiras criativas de abordar temas sensíveis e perigosos, utilizando metáforas para se
esquivar da censura e transmitir mensagens de resistência de maneira mais sutil. Isto deixa
evidente que a música brasileira foi uma importante forma de manifestação durante o regime
militar, permitindo que artistas expressassem sua insatisfação e inconformidade com o
governo, mesmo diante das ameaças e restrições impostas pelo regime (JOLY, 2016).
Outras composições de letras profundas e extremamente relevantes para análise
daquele período trata-se de "O Bêbado e a Equilibrista" de Elis Regina e "Tropicália" de
Caetano Veloso. Ambas as músicas abordam de forma poética e simbólica aspectos
importantes desse período histórico, permitindo uma compreensão mais profunda e emocional
dos acontecimentos. Em "O Bêbado e o Equilibrista", a letra escrita por João Bosco e Aldir
Blanc utiliza metáforas e referências históricas para transmitir a mensagem de resistência e
esperança.
A figura do bêbado representa o povo brasileiro, porque assim como um bêbado que
perde o equilíbrio e não consegue se movimentar de forma coordenada, o povo estava sendo
oprimido e reprimido pelo governo autoritário. Essa figura retrata a impotência e a fragilidade
que a população sentia diante das arbitrariedades do regime. Já a figura do equilibrista
representa a esperança e a luta pela liberdade. O equilibrista simboliza a coragem daqueles
que se opunham ao regime e arriscavam suas vidas em nome da resistência. Ele tenta
2

atravessar um abismo, que seria a repressão, mas acaba caindo. Essa queda representa a
dificuldade de alcançar a liberdade plena, mas também demonstra que a luta pela liberdade
não pode ser abandonada.
A música faz referências diretas a personagens e acontecimentos da ditadura, como a
busca por desaparecidos políticos, representada pela frase "Com tanta gente que partiu/ Num
rabo de foguete". Isso remete aos casos de pessoas que foram presas, torturadas e
desapareceram durante o período autoritário. Além disso, a saudade de um tempo de liberdade
é mencionada na frase "Chora/A nossa Pátria mãe genti/choram Marias e Clarisses/No solo do
Brasil". Essa passagem conecta a história de repressão vivida pelo país ao sofrimento e à
tristeza causada por essa situação.
Já a música "Tropicália" de Caetano Veloso, escrita em parceria com Gilberto Gil, é
considerada um marco do movimento cultural que levou o mesmo nome. A canção apresenta
uma mistura de estilos musicais e influências diversas, simbolizando a busca por uma
identidade brasileira autêntica e original, em meio a um contexto de censura e repressão. A
letra faz referências a diferentes elementos da cultura brasileira, como Jorge Ben Jor, Carmen
Miranda, Nelson Rodrigues e o livro "Macunaíma" de Mário de Andrade, mostrando a
diversidade e riqueza cultural do país. Ao mesmo tempo, a música traz críticas sutis à censura
e à repressão, como na frase “Sobre a cabeça os aviões/ Sob os meus pés os caminhões aponta
contra os chapadões”.
Assim, pode-se vislumbrar que "Tropicália" pode ser explorada no ensino da Ditadura
Militar para ilustrar o movimento cultural da época, que buscava uma ruptura com a cultura
estrangeira e uma valorização da brasilidade. Além disso, a música aborda indiretamente a
censura e a resistência artística, temas importantes para entender o contexto da ditadura.
Ao utilizar essas músicas como recursos educacionais, é possível despertar nos alunos
uma conexão emocional com o período histórico estudado, permitindo uma compreensão mais
profunda das experiências vividas durante a ditadura militar. Além disso, a análise das letras e
mensagens transmitidas pelas músicas contribui para uma reflexão crítica sobre a importância
da liberdade de expressão e a resistência política e cultural em momentos de autoritarismo e
repressão.
Por fim conclui-se que a análise das letras e mensagens transmitidas pelas músicas
durante a Ditadura Militar no Brasil é uma forma de compreender o período histórico de
maneira mais profunda e plural. Através das músicas, os estudantes podem ter acesso a
diferentes perspectivas sobre o regime militar, as lutas e resistências da época, e refletir sobre
a importância da liberdade de expressão e da democracia. A utilização das músicas no ensino
2

da História é uma estratégia pedagógica enriquecedora, pois estimula a reflexão crítica e


possibilita uma aprendizagem mais significativa.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por todo o exposto, é possível concluir que o uso da música como instrumento para o
Ensino de História, especificamente sobre a ditadura militar no Brasil (1964-1985), é uma
abordagem que possibilita uma maior compreensão e reflexão sobre esse período tão
importante da história do país. A Ditadura Militar deixou um legado de repressão, violência e
restrição dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros e através da música, é possível
resgatar e refletir sobre as memórias desse período, bem como trazer à tona histórias e vozes
de resistência e de luta pela democracia.
As músicas de protesto em oposição ao regime militar eram composições de luta social
e, ao mesmo tempo, carregadas de emoção e romantismo e por esta razão ainda são muito
ouvidas até os dias de hoje, representando um momento significativo na história musical do
país, consolidando um estilo conhecido como canções de protesto, mantendo relação direta
com a chamada MPB, também surgida neste período.
Ao utilizar canções que foram produzidas e interpretadas durante a ditadura, como as
que foram aqui analisadas, cujas letras expressavam críticas ao regime, denunciavam a
violência e a censura, assim como canções que serviram de instrumento de manipulação e
propaganda do governo militar, os alunos podem ter acesso a diferentes perspectivas e
sentimentos que permearam a sociedade naquele momento.
Além disso, a música possibilita a compreensão de como a ditadura afetou a vida
cultural do país, através da censura e perseguição a artistas e intelectuais, em que muitos
músicos foram exilados ou tiveram suas músicas proibidas de serem veiculadas nas rádios, o
que evidencia a importância da música como forma de resistência e de expressão da liberdade
de pensamento. Ao aprender sobre a ditadura militar através da música, os alunos são
desafiados a desenvolver habilidades de interpretação, análise e reflexão crítica. É
fundamental que eles sejam estimulados a questionar, debater e buscar diferentes fontes de
informação para compreender os diversos discursos presentes nas canções (MONTEIRO,
2014).
Por fim, a música como instrumento para o ensino de História permite que os alunos
desenvolvam empatia e sensibilidade, ao se conectarem com as histórias e narrativas vividas
2

por diferentes personagens de determinado período. Essa abordagem torna o aprendizado mais
significativo e instiga a curiosidade e o interesse dos estudantes pela história do Brasil.
2

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