Arquitetura, Psicologia e Neurociência: Discussões e (Inter) Relações

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Arquitetura, Psicologia e Neurociência: discussões e (inter)relações

Chapter · March 2023


DOI: 10.55232/1087002.35

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João Paulo Lucchetta Pompermaier


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Capítulo 35 - DOI:10.55232/1087002.35

ARQUITETURA, PSICOLOGIA E NEUROCIÊNCIA:


DISCUSSÕES E (INTER)RELAÇÕES
João Paulo Lucchetta Pompermaier, Sandra Aparecida Piloto Lopes,
Vaneza Krombauer

RESUMO: Na profissão do arquiteto e urbanista estão intrínsecos os aspectos humanos, este


profissional tem papel significativo no planejamento de espaços alinhados às condições sociais,
políticas e econômicas. Novos conceitos vêm sendo incorporados ao ato projetual, provocando
uma quebra de paradigmas, alterando a forma de projetar e resultando em espaços mais
flexíveis e disruptivos. Este artigo tem o objetivo de expor conceitos teóricos acerca da
arquitetura, psicologia e neurociência, propondo uma discussão sobre suas (inter)relações em
projetos arquitetônicos, urbanísticos e de interiores. Metodologicamente, este trabalho se
estrutura como uma pesquisa descritiva realizada por meio de uma revisão bibliográfica da
literatura. As (inter)relações entre arquitetura, psicologia e neurociência fornecem subsídios
que auxiliam os profissionais na compreensão de muitos fenômenos relacionados ao habitar,
onde a finalidade é a busca constante por espaços melhores. A união dos conhecimentos resulta
em possibilidades de intervenção interdisciplinar para o desenvolvimento de projetos cada vez
mais voltados para o bem-estar e a promoção da qualidade de vida.
Palavras-chave: Projeto de Arquitetura, Psicologia Ambiental, Neuroarquitetura.

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INTRODUÇÃO

Está intrínseco na profissão do arquiteto e urbanista os aspectos humanos. Este


profissional tem papel significativo no planejamento de espaços alinhados às condições
sociais, políticas e econômicas. A arquitetura se insere no contexto das ciências sociais
aplicadas, pois possui “interfaces e especificidades que, pela amplitude de atuação e
abordagem, possibilita um diálogo permanente com outras áreas de conhecimento, o que
lhes confere um caráter interdisciplinar”. Envolve “arte, ciência, tecnologia, inovação e
sociedade” se relacionando “fortemente ao bem-estar social e à qualidade de vida da
população” (BRASIL, 2019, p. 2).

Novos conceitos vêm sendo incorporados ao ato projetual, provocando uma


quebra de paradigmas, alterando a forma de projetar e resultando em espaços mais
flexíveis e disruptivos. Nos últimos anos estamos acompanhando uma transformação no
conhecimento científico, onde áreas de estudo, antes fragmentadas, passaram a se integrar
com a arquitetura, proporcionando melhorias significativas para o ambiente construído.

As obras de arquitetura “[...] parecem constituir uma poesia transcendente, um


nível de significado e importância que se sobrepõe à apresentação imediata de um lugar
e que deve ser interpretado - enquanto complemento a uma percepção e experiência
sensoriais -, para fins de apreciação, pelo intelecto e pela sensibilidade” (UNWIN, 2013,
p. 5).

Este artigo tem o objetivo de expor conceitos teóricos acerca da arquitetura,


psicologia e neurociência, propondo uma discussão sobre suas (inter)relações em projetos
arquitetônicos, urbanísticos e de interiores. Metodologicamente, este trabalho se estrutura
como uma pesquisa descritiva realizada por meio de uma revisão bibliográfica da
literatura.

A união dos conhecimentos da arquitetura, psicologia e neurociência resulta em


possibilidades de intervenção interdisciplinar para o desenvolvimento de projetos cada
vez mais voltados para o bem-estar e a promoção da qualidade de vida.

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ARQUITETURA

A evolução da arquitetura está inerentemente relacionada com a história das


civilizações. As primeiras manifestações arquitetônicas, ainda primitivas, remontam aos
tempos pré-históricos, nos primeiros anos da evolução humana (OLIVEIRA, 2016).
Daquela época até os dias atuais a humanidade se transformou e a arquitetura
acompanhou este processo.

Desde os primeiros tratados de arquitetura escritos por Vitrúvio, a (inter)relação


entre a solidez, funcionalidade e beleza já faziam parte da tríade de criação de projetos.
“Os elementos básicos da arquitetura descritos por Vitrúvio permaneceram
essencialmente inalterados desde a Antiguidade” (ROTH, 2017, p. 9). Somando a isto,
muitos movimentos e diferentes estilos moldaram a história, revolucionando as técnicas
de construção e os materiais empregados.

Definitivamente, a história das civilizações foi marcada, em grande parte, pelas


manifestações arquitetônicas, não só pela construção de edifícios, mas também pelo
planejamento de áreas urbanas, paisagens e ambientes (ROTH, 2017). A arquitetura e a
história trabalham com as variáveis do espaço e do tempo. Enquanto a arquitetura cria
espaços tridimensionais dinamizados pela dimensão temporal, a história brinca com essa
dimensão, tornando-a a essência de sua trajetória. O lugar e o tempo são, portanto, as
bases da história. A evolução desses conceitos infinitamente debatidos tem sido o ponto
central na abordagem da história da arquitetura, que a compreende como um fato cultural
plural que se estende do projeto de edifícios ao projeto da cidade (PEREIRA, 2010).

Segundo Frampton (1997, p. 18), a arquitetura "é uma expressão da cultura e da


história de uma sociedade". Corroborando com esta ideia, Santiago Calatrava, importante
e reconhecido arquiteto espanhol, em uma de suas frases mais icônicas definiu: “A
arquitetura é a arte que determina a identidade do nosso tempo e melhora a vida das
pessoas”.

O processo de transformação proporcionou repensar o que realmente é a


arquitetura, levando os profissionais a desenvolverem projetos centrados nas pessoas,
baseados em suas necessidades, capazes de promover o bem-estar físico, emocional e
espiritual, voltados para a melhoria da qualidade de vida.

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Conforme Ching (2013), a arquitetura é projetada e construída em resposta a um
conjunto de condições existentes. Essas condições podem ser de natureza social, política
e econômica ou simplesmente de natureza funcional. De maneira ampla, a arquitetura se
constitui como um processo de resolução de problemas, assim, “a fase inicial de qualquer
processo de projeto é o reconhecimento de uma condição problemática e a decisão de se
encontrar uma solução para ela” (CHING, 2013). De acordo com Roth (2017, p. 4), “os
humanos constroem para satisfazer suas necessidades. Porém, ao fazer isso, dão
expressão a sentimentos e valores [...] No entanto, diferentemente das outras artes,
arquitetura tem o poder de afetar e condicionar o comportamento humano”. Ching (2013)
complementa que

Enquanto arte, a arquitetura é mais do que a satisfação de exigências puramente


funcionais de um programa construtivo. Fundamentalmente, as manifestações
físicas da arquitetura acomodam a atividade humana. Todavia, o arranjo e a
organização das formas e espaços também determinam a maneira como a
arquitetura pode promover iniciativas, trazer respostas e comunicar
significado.

A arquitetura é uma linguagem que se materializa dia a dia, com ou sem a presença
do arquiteto. É a partir da materialização do projeto que se representará a humanidade
frente ao agora e frente ao futuro (CHING, 2013).

PSICOLOGIA

A psicologia é a ciência que se dedica ao estudo do comportamento e dos


processos mentais. “[...] Se preocupa [...] com a razão por que fazemos o que fazemos,
sentimos o que sentimos e pensamos o que pensamos” (HENRY; REISBERG; GROSS,
2009, p. 33). Grimberg (2018, p. 30) afirma que para Jung, “a realidade é resultante do
processo psicológico, do encontro entre o comportamento objetivo das coisas e a nossa
visão subjetiva delas”.

Por meio das relações sociais, culturais e ambientais, a psicologia busca


compreender como os indivíduos interagem com o meio no qual estão inseridos,
auxiliando-os com questões emocionais, comportamentais e psicológicas e com as
experiências de vida (HENRY; REISBERG; GROSS, 2009; TELES, 1989). Trata-se de
um campo extenso, possuindo diversas vertentes de estudo, cada uma com um foco
específico. Entre elas, está a psicologia ambiental, área que concentra as discussões deste
estudo.

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“A psicologia ambiental interessa-se tanto pelos efeitos das condições ambientais
sobre os comportamentos e condutas do indivíduo, como pela maneira como o indivíduo
percebe ou age sobre o ambiente” (MOSER, 2018, p. 10). Refere-se a uma ciência “que
trata do “psicológico”, quer dizer, do indivíduo enquanto ser que pensa, que sente e que
age, de um lado, e do ambiente, de outro lado” (MOSER, 2005). Fatores físicos (ruído,
poluição, arranjo) e sociais (densidade, heterogeneidade de população) estão ligados à
sua percepção e ao comportamento humano. Nesse contexto, “a psicologia ambiental
estuda as interrelações do indivíduo com o ambiente em suas dimensões físicas e sociais”
(MOSER, 2018).

Os estudos acerca da psicologia ambiental são relativamente recentes e remontam


às décadas de 1950 e 1960, se consolidando a partir da Conferência de Estocolmo em
1972. Suas raízes estão caracterizadas como internas e externas à psicologia. Nas raízes
internas “estão elementos ligados à Escola da Gestalt, ao behaviorismo, a psicologia
social e à incorporação da perspectiva ambiental à compreensão do indivíduo”. Já nas
raízes externas encontramos “conhecimentos originados das ciências sociais
(antropologia, sociologia, geografia) e bioecológicas, e arquitetura-urbanismo” (ELALI,
2006).

Em função da variedade de raízes que fundamentam a área, as temáticas tratadas


pela psicologia ambiental são amplas, abrangendo “atitudes e comprometimento pró-
ambientais, sustentabilidade, perspectiva temporal, situações de risco (acidentes naturais
ou não), ambientes naturais e restauradores, cognição e percepção ambientais, avaliação
de edificações e conjuntos edificados” (ELALI, 2006).

A psicologia ambiental, segundo Moser (2005), pode ser entendida como uma
psicologia do espaço já que analisa as percepções, atitudes e comportamentos do
indivíduo em sua relação com o contexto físico e social. Moser (2005, p. 282) ainda
destaca que a relação indivíduo-ambiente é analisada em quatro níveis de referência
espacial e social, sendo eles:

1) o microambiente: espaço privado, a moradia, implicando o indivíduo; 2) os


ambientes de proximidade: os espaços partilhados semipúblicos, o habitat
coletivo, o bairro, o lugar de trabalho, os parques e os espaços verdes,
concernentes à comunidade de proximidade ou de vizinhança; 3) os ambientes
coletivos públicos: as cidades, os vilarejos, e os povoamentos diversos,
implicando os agregados de indivíduos; e 4) o ambiente global: o ambiente em
sua totalidade, construído ou não, os recursos naturais e os concernentes à
sociedade enquanto tal.

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Elali (2006) destaca a existência de aspectos físicos, funcionais e
comportamentais, sendo:

Os aspectos físicos estão relacionados às características da(s) área(s)


edificada(s) analisada(s), tais como suas dimensões, técnicas e materiais
construtivos utilizados, condições de conforto (iluminação, ventilação,
temperatura, nível de ruído), estabilidade, entre outros. [...] Os aspectos
funcionais dizem respeito às atividades ocorridas no local, abarcando, entre
outros, principais usos e fluxos presentes, mobiliário e equipamentos
necessários, quantidade de pessoas presentes e suas atividades naquele
contexto. [...] Os aspectos comportamentais se referem à dinâmica ocupacional
do edifício ou conjunto edificado, ou seja, como os usuários percebem e
relacionam-se com o ambiente, as atividades que realizam no local e os papéis
sociais assumidos ao fazê-lo (ELALI, 2006, p. 161).

A psicologia ambiental traz “conceitos aplicáveis através de estratégias para que


o espaço, o ambiente construído se torne um “lugar”, onde experiências de valência
positiva possam ser vividas, gerando memórias afetivas” (DIONIZIO, 2022, p.36). Em
termos de psicologia ambiental, quando referimos a “lugar”, vai além de uma localização
abstrata, para uma totalidade mais concreta, onde a qualidade ambiental é determinada
pela essência do lugar” (NESBITT, 2006).

NEUROCIÊNCIA

A neurociência é um campo científico que estuda questões acerca do sistema


nervoso do homem e dos animais e como ele funciona na geração dos comportamentos
(PURVES et al., 2010). Em 1970 nos Estados Unidos foi criada a “Society for
Neuroscience”, uma entidade “com o objetivo de alavancar as pesquisas e discussões
sobre o sistema nervoso”. Na década de 80 começaram a ser produzidas as primeiras
neuroimagens, revolucionando a compreensão do funcionamento do cérebro e
possibilitando uma visão mais dinâmica do sistema nervoso. Mas foi somente na década
de 90 que os avanços no conhecimento foram de fato revolucionários, possibilitando
descobertas significativas sobre o cérebro (TIEPPO, 2019).

Segundo Tieppo (2019, p. 29),

O avanço técnico e científico sobre o sistema nervoso nos deu um substrato


poderoso para a investigação sobre a complexidade humana. A ciência do
cérebro evoluiu num ritmo alucinante nos últimos 25 anos e os conhecimentos
adquiridos não são usados apenas para o avanço da medicina, mas também por
profissionais das mais diferentes áreas, como a economia, a educação, o
direito, a psicologia, a gestão de pessoas, o marketing, entre outras.

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Nesse contexto surge o que se chama neuroarquitetura, um termo popular para se
referir a neurociência aplicada à arquitetura. Esse campo multidisciplinar entrelaça
ciência e experiência combinando neurociência, psicologia e arquitetura como uma linha
de pensamento projetual que estuda como o ambiente construído impacta o cérebro e o
comportamento humano (VILLAROUCO et al., 2021).

Os estudos de neuroarquitetura são bastante recentes. Foi somente em 2003, com


a fundação da Academy of Neuroscience for Architecture (ANFA) em San Diego, na
Califórnia (EUA) que o termo passou a ser utilizado oficialmente. Na Convenção
Nacional do Instituto Americano de Arquitetos (AIA) realizada em junho de 2003, o
neurocientista Fred Gage e o arquiteto John Paul Eberhard promoveram discussões que
levaram a avanços significativos na arquitetura. Atualmente, a ANFA tem por missão
“promover e avançar o conhecimento que liga a pesquisa em neurociência a uma
compreensão crescente das respostas humanas ao ambiente construído” (ANFA, 2022).

As descobertas da neurociência possibilitaram uma compreensão muito mais


ampla sobre a interação entre cérebro, corpo e meio ambiente. Através das relações entre
mente e espaço, e entre a percepção das formas e suas reações provocadas no cérebro, a
neuroarquitetura busca um aprofundamento em temas antigos no conhecimento dos
arquitetos, como harmonia, equilíbrio e bem-estar (GONÇALVES; PAIVA, 2018).

Alguns autores destacam a importância da união dessas duas ciências


(neurociência e arquitetura). Segundo Crizel (2020, p. 34), “o estabelecimento da
neurociência como uma forma de compreensão do modo de ser e de agir do ser humano
tem oferecido grandes insights para o ato projetual”. Para Pompermaier (2021) pensando-
se em futuras práticas projetuais, entende-se que a neuroarquitetura é extremamente
importante, pois permite pensar nos projetos de forma mais assertiva e objetiva.
Vecchiato et al. (2015) destaca que na atualidade as descobertas neurocientíficas podem
contribuir ainda mais para a melhoria do projeto de edifícios criando ambientes que
satisfaçam as necessidades humanas. Villarouco et al. (2021), ainda complementa que a
neuroarquitetura fornece subsídios para decisões de projeto pautadas na melhoria da
qualidade de vida.

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(INTER)RELAÇÕES

Um dos livros mais importantes da arquitetura é intitulado “Arte de projetar em


arquitetura” escrito por Ernst Neufert e publicado pela primeira vez em 1936 (NEUFERT,
2013). Todo arquiteto e urbanista conhece esse manual que se tornou uma referência
internacional para o desenvolvimento de projetos. Observa-se que no título, Neufert
utiliza a palavra “arte” para se referir ao ato de projetar. Mas o que diferencia a arquitetura
das demais expressões artísticas? O que a distingue das outras artes é o caráter essencial
da arquitetura que inclui o ser humano como elemento central (ZEVI, 1996).

Conforme Pallasmaa (2013a, p. 124),

Uma edificação é encontrada, não apenas vista; ela é acessada, confrontada,


adentrada, relacionada com nosso corpo, percorrida e utilizada como um
contexto e uma condição para diversas atividades e coisas. Uma edificação
direciona, confere escala e emoldura ações, relações, percepções e
pensamentos.

Como dizia Aristóteles, o homem enquanto “animal político” é profundamente


vinculado à cidade e à arquitetura. O mundo moderno, reconhecendo as tradições gregas,
romanas e cristãs, retorna o seu foco no homem (MALARD, 2005). “A psicologia surgiu
como um conjunto de pensamentos que tinham o humano como sua preocupação central”
(BOCK, 2019).

A psicologia e a neurociência evoluíram muito nas últimas décadas. O


conhecimento sobre o homem possibilitado pelo avanço dessas ciências levou a um
entendimento muito mais claro sobre as limitações, fragilidades e imperfeições do ser
humano. Entretanto, esses conhecimentos precisam se expandir para além das fronteiras
do campo no qual surgiram. De nada adianta um “salto” do conhecimento se o mesmo
estiver fragmentado. E é nessa perspectiva que a integração de diferentes áreas somam-
se para promover transformações nas formas de pensar e agir da sociedade.

Com o avanço tecnológico, o arquiteto perdeu um pouco sua sensibilidade,


distanciando a teoria da prática. Entretanto, quando os arquitetos começaram a relacionar
o conhecimento proveniente da psicologia e posteriormente da neurociência alteraram as
percepções sobre a forma de projetar. Os espaços passaram a ser projetados pensando nos
impactos que podem gerar para os indivíduos que os utilizam. Para Pallasmaa (2013b, p.
14), “até mesmo os arquitetos exímios não inventam as realidades da arquitetura. Na

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verdade, eles revelam o que já existe e quais os potenciais naturais das condições dadas
ou aquilo que a situação específica exige”. Corroborando, Unwin (2013, p. 3) descreve
que “como em qualquer disciplina criativa, a aventura da arquitetura pode se inspirar na
análise daquilo que os outros fizeram e, por meio dessa análise, tentar entender as
maneiras que eles encontraram para alcançar os desafios”. O arquiteto antevê alternativas
antes de tornar concreto, sendo um processo oscilante constante (PALLASMAA, 2013b).

A busca por uma arquitetura verdadeiramente humana, direciona para soluções


nas bases da psicologia e da neurociência. Em termos gerais, “enquanto a psicologia
ambiental nos informa sobre qual comportamento está ocorrendo no espaço, a
neurociência vai além e explica o porquê de esse comportamento acontecer”
(VILLAROUCO et al., 2021). A arquitetura munida da psicologia e da neurociência
promove estímulos comportamentais nos indivíduos, influenciando seu modo de ser,
pensar e agir. A sensibilidade enfatizada por meio das dimensões mentais e intelectuais
envolvidas no processo projetual contribui para a compreensão de nossa cultura e de nós
mesmos (PALLASMAA, 2011).

Nessa perspectiva, Villarouco et al. (2021) explica que:

O conhecimento das respostas humanas sobre os ambientes detém alto poder


de decisão no planejamento e criação dos espaços que buscam uma interação
harmoniosa entre humano e ambiente. Desse modo, a qualidade do ambiente
construído está associada ao nível do entendimento de nossas respostas aos
estímulos do espaço – quanto mais soubermos sobre esse feedback, mais
acurada será a projetação e materialização espacial para seus usuários.

Lynch (1960, p. 11) afirma que “todo cidadão possui numerosas relações com
algumas partes da sua cidade e sua imagem está impregnada de memórias e
significações”. Assim, a cidade compreende, além de construções físicas e concretas,
elementos de significado e provocam sensações físicas que afetam o psicológico do ser
humano e o colocam como centro das preocupações e referências de relação homem e
cidade.

Em experiências memoráveis de arquitetura, espaço, matéria e tempo se fundem


em uma dimensão única, na substância básica da vida, que penetra em nossas
consciências. Identificamo-nos com esse espaço, esse lugar, esse momento, e essas
dimensões se tornam ingredientes de nossa própria existência. A arquitetura é a arte de

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nos reconciliar com o mundo, e esta mediação se dá por meio dos sentidos
(PALLASMAA, 2011, p. 68).

Assim, cabe ressaltar novamente a importância da união dos conceitos de


arquitetura, psicologia e neurociência. Essa interdisciplinaridade reflete em projetos
arquitetônicos genuinamente humanos.

CONCLUSÕES

A intenção da prática da arquitetura não é impor regras, pelo contrário. As


(inter)relações entre arquitetura, psicologia e neurociência fornecem subsídios que
auxiliam os profissionais na compreensão de muitos fenômenos relacionados ao habitar,
onde a finalidade é a busca constante por espaços melhores.

Infere-se que as diversas áreas do conhecimento se entrelaçam e


(inter)relacionam-se com o objetivo maior de compreender as reações humanas e o
ambiente, com a intenção de qualificar e garantir segurança aos usuários. Entende-se que
a fragmentação do conhecimento deveria estar em desuso e que a perspectiva holística
seja considerada novo paradigma de projetos.

Depreende-se, que o desenvolvimento da tecnologia e o avanço do conhecimento


da neurociência, corroboram para que projetos sejam desenvolvidos voltados para
qualificar a vida do ser humano com cada vez mais assertividade.

Por fim, entende-se que arquitetos e urbanistas devem explorar a combinação


multidisciplinar da arquitetura, psicologia e neurociência para poder “servir ainda mais
às funções humanas ao gerar prazer e satisfação” (VILLAROUCO, 2021).

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