Processos de Sujeicao Uma Reflexao A Luz de Butler
Processos de Sujeicao Uma Reflexao A Luz de Butler
Processos de Sujeicao Uma Reflexao A Luz de Butler
Tarcyanie Cajueiro Santos - Universidade de Sorocaba | Sorocaba | São Paulo | Brasil. E-mail:
[email protected] | Orcid: https://orcid.org/0000-0002-7913-3492
Resumo: Este artigo busca ampliar a discussão sobre os estudos de gênero e as questões que
constituem os sujeitos, especialmente no tocante à área de comunicação, e reflete sobre os processos
de sujeição – do sujeito – enquanto forma de poder. Parte-se do seguinte problema: o que constitui o
sujeito no discurso da youtuber Louie Ponto sobre relações de gênero? Para tanto, discorre-se sobre
a constituição do sujeito e as relações de poder que envolvem este processo a partir de Foucault e
Butler. Como percurso metodológico, utiliza-se a análise discursiva, amparada na abordagem de Stuart
Hall. Com base no pensamento foucaultiano e butleriano sobre a constituição do sujeito, levando em
conta as relações de poder implicadas neste processo, percebeu-se que o discurso de Louie Ponto se
encontra afinado a essa perspectiva, na qual o poder atua numa esfera ambígua entre a condição
externa e anterior ao sujeito, mas, ao mesmo tempo, no sujeito, enquanto processo que o constitui
como tal.
Abstract: This article seeks to broaden the discussion on gender studies and the issues that constitute
subjects, especially regarding the area of communication, and reflects on the processes of subjection –
of the subject – as a form of power. It starts with the following problem: what constitutes the subject in
the discourse of youtuber Louie Ponto on gender relations? In order to do so, we discuss the constitution
of the subject and the power relations that involve this process based on Foucault and Butler. As a
methodological approach, discursive analysis is used, supported by Stuart Hall's approach. Based on
Foucauldian and Butlerian thinking about the constitution of the subject, taking into account the power
relations involved in this process, it was noticed that Louie Ponto's discourse is in tune with this
perspective, in which power acts in an ambiguous sphere between condition external and prior to the
subject, but, at the same time, in the subject, as a process that constitutes it as such.
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Creative Commons — Atribuição 4.0 Internacional — CC BY 4.0
Resumen: Este artículo busca ampliar la discusión sobre los estudios de género y las cuestiones que
constituyen sujetos, especialmente en lo que se refiere al área de la comunicación, y reflexiona sobre
los procesos de sujeción -del sujeto- como forma de poder. Se parte del siguiente problema: ¿qué
constituye el sujeto en el discurso del youtuber Louie Ponto sobre las relaciones de género? Para ello,
discutimos la constitución del sujeto y las relaciones de poder que envuelven este proceso a partir de
Foucault y Butler. Como enfoque metodológico se utiliza el análisis discursivo, apoyado en el enfoque
de Stuart Hall. A partir del pensamiento foucaultiano y butleriano sobre la constitución del sujeto,
teniendo en cuenta las relaciones de poder involucradas en ese proceso, se percibió que el discurso
de Louie Ponto sintoniza con esta perspectiva, en la que el poder actúa en un ámbito ambiguo entre
condición externa y condición. anterior al sujeto, pero, al mismo tiempo, en el sujeto, como proceso que
lo constituye como ta.
Partindo desse ponto de vista, o autor elabora uma conceituação que permite,
de forma geral, definir o exercício do poder, já que o ser humano se constitui como
sujeito nas relações de poder. Um dos aspectos que o autor estabelece para tal
definição é a importância de verificar o tipo de realidade com a qual estamos lidando,
ou o contexto específico em que estamos inseridos, pois o poder implica não somente
uma questão teórica, mas faz parte de nossa experiência de vida. Assim, Foucault
(1995, p. 234) defende uma nova economia das relações de poder, em suas palavras:
“mais empírica, mais diretamente relacionada à nossa situação presente, e que
implica relações mais estreitas entre teoria e a prática”.
Para o autor, o poder não é arbitrário e de domínio absoluto, mas atua por meio
de conflitos, ou de antagonismos estratégicos. Isso significa que as relações de poder
estão sempre em disputas, ou seja, há sempre formas de resistências contra as
diferentes formas de poder. Nessa concepção, para descobrir o que significa a
sanidade, pode-se investigar o que ocorre no campo da insanidade. Do mesmo modo,
ele afirma que, para compreender as relações de poder, podem-se investigar as
formas de resistências, dito de outra maneira, investigar as oposições existentes nas
relações de poder. Por exemplo, as oposições que se desenvolveram ao longo da
Para ele, essas oposições possuem caráter de luta, em que forças são
disputadas constantemente, havendo pontos em comum em todas elas. Primeiro, são
lutas transversais, não se limitam a um único país, ou seja, não estão confinadas a
uma forma política e econômica particular de governo. Segundo, o objetivo dessas
lutas inscreve-se em seus efeitos de poder enquanto tal. Para ilustrar, Foucault cita a
profissão médica, que não é criticada por ser lucrativa, mas pelo fato de exercer um
poder sem controle sobre os corpos das pessoas. Terceiro ponto em comum entre as
lutas é que todas são imediatas, pois são as instâncias de poder mais próximas as
criticadas (e porque não dizer, enfrentadas). A preocupação não está em objetificar o
“inimigo mor”, como determinado sistema, por exemplo, nem em encontrar soluções
para tais problemas no futuro: é o efeito imediato do poder que preocupa.
Como quarto elemento, Foucault (1995, p. 234-235) cita que são lutas que
questionam o estatuto do indivíduo: “por um lado, afirmam o direito de ser diferente e
enfatizam tudo aquilo que toma os indivíduos verdadeiramente individuais. Por outro
lado, atacam tudo aquilo que separa o indivíduo, que quebra sua relação com os
outros, fragmenta a vida comunitária”. Isso implica que essas lutas não são nem a
favor nem contra o “indivíduo”, mas batalhas que se travam contra o “governo da
individualização”. Já o quinto ponto se refere aos efeitos de poder, que estão
relacionados aos privilégios do saber, de deter conhecimento ou de estabelecer uma
“verdade”. O último ponto considera que essas lutas estão em torno da questão “quem
somos?”, num sentido ontológico, pela busca em determinar “quem somos”, de outro
modo, que lugar pertencemos na sociedade. Segundo o autor:
Mas é neste ponto que Butler (2019) aponta, diferentemente das postulações
de Foucault, que o poder considerado como condição do sujeito não é,
necessariamente, o mesmo poder que o sujeito venha a exercer. Para ela, esse é um
ponto crucial da discussão, pois o poder que inaugura o sujeito perde sua continuidade
para o poder que é exercido pelo sujeito. O poder muda de status, há uma inversão
significativa quando o poder passa de uma condição da ação para a “própria” ação do
sujeito. A autora argumenta que, ao assumir o poder, este não se retira facilmente de
um lugar para outro, não se trata de uma transferência intacta, mas, quando o sujeito
se apropria do poder – esse ato de apropriação – implica uma alteração do poder.
Consequentemente, esse poder assumido, ou apropriado pelo sujeito poder atuar
contra o poder que lhe possibilitou ser assumido. Para Butler (2019, p. 21), “na medida
em que as condições de subordinação tornam possível a assunção do poder, o poder
assumido permanece ligado a essas condições, mas de forma ambivalente”. Desse
modo, o poder assumido pelo sujeito, paradoxalmente, conserva sua subordinação ao
mesmo tempo em que se opõe a ela. A ambivalência, nesse sentido, é tanto
resistência quanto recuperação do poder, que forma o vínculo da ação do sujeito.
[...] O poder não só age sobre o sujeito como também, em sentido transitivo,
põe em ato o sujeito, conferindo-lhe existência. Como condição, o poder
precede o sujeito. No entanto, o poder perde sua aparência de prioridade
quando é exercido pelo sujeito, uma situação que dá origem à perspectiva
inversa de que o poder é efeito do sujeito, de que é algo que os sujeitos
efetuam. (BUTLER, 2019, p. 22, grifo da autora).
Butler consente com Foucault nesse aspecto da resistência e vai mais adiante
com esse pensamento, pois percebe que não há somente a possibilidade de inversão
de significados, abre-se um caminho para possibilidades significativas muito além
daquelas que o termo tinha sido previamente vinculado e empregado. E nesse
aspecto, com base na construção discursiva do sujeito, que está constantemente em
processo e incorpora atos repetidos ao longo do tempo através e pelos discursos de
poder/saber, o sujeito pode ser constituído pelo discurso, mas não ser,
necessariamente, determinado por ele, havendo sempre a possibilidade de ação.
Butler (2003), em outro texto, afirma que o sujeito negocia suas construções, e
é nesse ponto de negociação que emergem as possibilidades de subversão. Todavia,
como Butler adverte, não há possibilidade de ação fora das práticas discursivas, que
mantêm a inteligibilidade do sujeito. Portanto, repetir e incorporar tais práticas se torna
inevitável, mas é possível, nas reiterações, distanciar dos propósitos primeiros do
poder. Por isso, não existe toda e qualquer nova possibilidade, mas a viabilidade de
redescrever as possibilidades existentes no domínio da cultura.
4 Metodologia
Interessa-nos compreender o discurso de Louie Ponto, uma vez que seu canal,
no YouTube, visa compartilhar e abordar questões sobre as experiências e vivências
LGBT+. O canal “Louie Ponto” existe desde 21 de abril de 2008. A princípio,
apresentava canções interpretadas por ela, mas, com o passar do tempo, passou a
trazer questões cotidianas, análises de filmes ou histórias em quadrinhos, programas
e outras produções de entretenimento que expunham, e expõem, a temática LGBT+.
O canal possui 671 mil inscritos e, em média, mais de 25 mil visualizações por vídeo.
Dessa forma, Louie está entre os canais mais seguidos que abordam questões de
gênero e sexualidade no Brasil. (TERTO, 2018).
Louie continua dizendo que, desde que começou a compartilhar sua vivência
na Internet, as pessoas perguntam quando ela percebeu ser “diferente”, mas ela
afirma que, na verdade, ela nunca se sentiu “igual”. Esta fala nos remete ao
pensamento foucaultiano, de que todas as pessoas devem ter o direito de serem
“diferentes”, uma vez que temos, de fato, nossas diferenças e é isso “que toma os
indivíduos verdadeiramente individuais” (FOUCAULT, 1995). Louie ainda reitera este
pensamento na passagem: “o conceito de anormalidade é terrível! Ele só existe
porque existe uma norma estabelecida. A gente só se sente diferente porque existe
um modelo que deve ser seguido. E é desse modelo que a gente se sente diferente”
(PONTO, 2020).
[...] assim que eu fui pra escola e meu círculo social se expandiu. Nem era, a
princípio, uma questão de sexualidade, porque eu era criança. Eu nem sabia
o que era sexualidade, sexo, atração física e romântica. E nem os meus
colegas sabiam, mas eles reproduziam aquilo que eles viam e ouviam. E
sapatão passou a ser a palavra usada pra me atingir. (PONTO, 2020).
Louie destaca o papel das relações sociais, em todos os seus níveis, que
reproduzem e reforçam o padrão de inadequação das pessoas que não correspondem
com a norma estabelecida.
6 Considerações finais
Como explanado, ainda que Butler (2019) compartilhe com a ideia foucaultiana
de que o poder mais que uma força opressora e absoluta, tende a ser também
produtiva, possibilitando as resistências do sujeito, ela também agrega o aspecto
psíquico à sua reflexão. Butler defende que a formação do sujeito se inscreve num
Referências
AGGIO, Juliana Ortegosa. Práticas críticas de si: Foucault e Butler. Veritas, Porto Alegre, v.
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BUTLER, Judith. A vida psíquica do poder: teorias da sujeição. Belo Horizonte: Autêntica,
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HALL, Stuart. The work of representation. In: HALL, Stuart (org.). Representation: cultural
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PONTO, Louie. E esse tal de empoderamento? (minha história). YouTube, 22 jun. 2020.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=OKeZemVulow. Acesso em: 21 set. 2022.
SPARGO, Tamsin. Michel Foucault e a teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2019.
TERTO, Amauri. 9 canais LGBT no YouTube que vão expandir a sua mente. HoffPost
Brasil, 26 jun. 2018. Disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/2018/06/26/9-canais-
lgbt-no-youtube-que-vao-expandir-a-sua-mente_a_23468772/. Acesso em: 15 fev. 2021.