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Tendências pedagógicas no ensino da

Educação Física
Júlio Ferreira da Costa Neto1
Márcio Rabelo Mota2

Resumo
As questões relacionadas com a atuação dos professores de Educação Física
no contexto escolar, em termos das abordagens pedagógicas, normalmente, reque-
rem dos profissionais da área um posicionamento claro sobre a utilização de uma ou
de outra tendência. Cada uma das propostas ou teorias pedagógicas que vêm sendo
utilizadas na Educação Física retrata períodos históricos, opções políticas e ideoló-
gicas sobre o tema. O objetivo principal deste artigo é discutir as concepções peda-
gógicas presentes no trabalho do professor de Educação Física. Foram analisados
vários artigos e livros sobre essas abordagens e suas aplicações nas aulas de Educação
Física. De modo geral, os professores seguem os preceitos metodológicos segundo
os quais têm mais ligação ideológica e pedagógica. Os conteúdos trabalhados nas
aulas de Educação Física retratam exatamente esses preceitos ideológicos. O esporte
é predominante nas aulas de Educação Física, com algumas exceções.

Palavras-chave: Educação. Educação Física Escolar.

1 Introdução
A escola é por excelência o local da transmissão de cultura, de conhecimen-
to técnico-científico e de valores sociopolíticos. Por ser assim, ela possui um papel
primordial na sociedade moderna e de modo geral vai sempre sofrer influências do
sistema político e econômico vigente (capitalista, socialista, entre outros). No Bra-
sil, as escolas sempre fizeram parte do instrumental de disseminação dos regimes

1
Professor do curso de Geografia - UniCEUB; Analista Ambiental do CECAV/ICMBIO;
Mestre em Geografia pela Universidade de Brasília - UnB; Aluno de graduação em Edu-
cação Física - UniCEUB. [email protected].
2
Professor do curso de Educação Física do UniCEUB, Mestre e doutorando em Educação
Física pela UCB. [email protected].
Univ. Hum., Brasília, v. 6, n. 2, p. 89-103, jul./dez. 2009
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político-econômicos pelos quais o país passou ao longo do tempo. Nos períodos de


ditaduras (Vargas de 1930 a 1945 e a Militar de 1964 a 1985) e de democracia, isso
ficou sempre evidente. Diante dessa realidade, a disciplina de Educação Física (EF)
passou também por uma série de transformações, produto das circunstâncias que
passaram seus professores diante das mais diversas fases sociais e políticas do país
(MARTINS, 2002; FREITAS, 1999).

A EF ao longo do tempo se inseriu no currículo escolar, passando de uma


disciplina puramente prática, para uma disciplina com a responsabilidade de parti-
cipar também do processo de formação integral do aluno. Os professores deveriam
trabalhar não somente com os aspectos biológicos e com o movimento humano,
mas também com os valores morais e com os de ordem emocional e psicológica.
Foi uma mudança drástica na forma de atuar e na forma de ministrar as aulas. O
ensinar passou para um nível mais complexo (MARTINS, 2002).

As escolas no Brasil mudaram seu papel de formar trabalhadores para as


indústrias, o que caracterizou durante muito tempo o dito ensino profissionalizan-
te, para formar cidadãos críticos, independentes e participativos, nos moldes do
capitalismo neoliberal dos últimos anos, evidenciado na Lei de Diretrizes e Bases
da Educação atualmente em vigor. Essa tarefa se mostra um tanto quanto difícil
diante da complexidade da sociedade brasileira (NEVES, 1994).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) tanto para o Ensino Fun-


damental quanto para o Ensino Médio, estabelecem diretrizes para a educação
brasileira no sentido de nortear a atuação dos professores de todas as áreas do
conhecimento (BRASIL, 1998a; 1998b; 1998c).

Os PCNs da área da EF trazem uma proposta que procura democratizar, hu-


manizar e diversificar a prática pedagógica da área, buscando ampliar de uma visão
apenas biológica para um trabalho que incorpore as dimensões afetivas, cognitivas e
socioculturais dos alunos. Incorporam questões principais nas quais o professor deve
considerar no desenvolvimento do seu trabalho, subsidiando as discussões, os pla-
nejamentos e as avaliações da prática da disciplina (BRASIL, 1998a; 1998b; 1998c).

A EF nos PCNs é responsável pela inserção dos alunos no que se denomina


cultura corporal, objetivando o lazer, a expressão dos sentimentos, o afeto, as emo-
ções e a melhoria e a manutenção da saúde geral do indivíduo (BRASIL, 1998a).
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Além disso, a EF tratada nesse documento transita pelo universo conceitual das teo-
rias pedagógicas do construtivismo, do desenvolvimentismo, da cultura corporal, da
psicomotricidade, das abordagens críticas e das mais modernas que tratam das ques-
tões relacionadas com a saúde física e mental (RODRIGUES, 2002; DAÓLIO, 1996).

Costa e Nascimento (2006), em pesquisa que objetivou tentar entender as


maneiras de atuação dos professores de EF, chamam a atenção para o fato de que
do total dos profissionais avaliados, 95,2 % trabalham em suas aulas com atividades
ligadas aos jogos (motores, sensoriais, criativos, intelectivos e pré-desportivos); es-
porte institucionalizado (basquetebol, voleibol, handebol, atletismo, futebol, futsal,
ciclismo e outros) e esportes alternativos (capoeira, escaladas, passeios, bets, ma-
lha, peteca e outros). Isso demonstra que, de um modo ou de outro, as orientações
contidas nos PCNs de EF vêm sendo utilizadas mesmo que em partes determina-
das, assim como se utilizam também de alguns dos outros preceitos metodológicos
presentes na EF escolar.

As teorias pedagógicas que vêm sendo utilizadas pelos professores de Edu-


cação Física retratam períodos históricos, opções políticas e ideológicas sobre o
tema. Este artigo tem como objetivo, discutir o trabalho do professor de Educação
Física Escolar na efetivação da sua atuação no âmbito das concepções pedagógicas
ainda em voga no seu campo de trabalho.

Esta pesquisa teve como método de investigação um amplo levantamento


bibliográfico em artigos científicos em revistas científicas especializadas na área de
Educação Física, Pedagogia e ensino, assim como em livros sobre o assunto.

Após esse levantamento, foram avaliados trabalhos de pesquisa que levan-


taram os métodos empregados e as propostas pedagógicas seguidas por alguns
professores de EF com vistas à melhor compreensão e avaliação da problemática
deste estudo.

2 Revisão de literatura

2.1 Aspectos históricos da Educação Física escolar

A EF inserida nas escolas estruturadas nos idos dos séculos XVIII e XIX foi
grandemente marcada pelo caráter militar e pelos aspectos biológicos e ligados à
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saúde, à medicina e à higiene. Nas décadas de 1930 e 1940, no Brasil e no mundo, os


governantes precisavam manter o cidadão bem treinado, controlado e dócil. A EF era
calistênica, ritmada e marcada pela disciplina e a rigidez. Nesse período, os métodos
originários da Europa – os métodos ginásticos – predominavam e marcaram a forma
como eram organizadas as aulas de EF. A origem desses métodos era alemã, sueca,
francesa e americana (BRACHT, 1999; RESENDE, SOARES; MOURA; 2009).

Nas décadas de 1950, 1960 e 1970, surgem nas aulas de EF as figuras do


esporte e da aptidão física, com ênfase principal na primeira, centrado na competi-
ção e na possibilidade de demonstração de hegemonia e entorpecimento da socie-
dade brasileira em detrimento da crítica e do questionamento do regime político
recém-imposto (BETTI, 1999; BRACHT, 1999).

Na década de 1980, a EF ainda trabalhava em uma perspectiva esportivista


e, com o início das manifestações de liberdade política que culminariam em 1985,
com o fim do período de ditadura militar, começam os movimentos voltados para
a crítica do modelo de sociedade capitalista vigente. Na educação, surgem os de-
fensores dos modelos metodológicos crítico-superadores dos conteúdos em que
existe claramente a contestação do regime capitalista em detrimento do modelo
marxista. A EF não passou ilesa por esse período; os profissionais denominados re-
novadores queriam que a crítica social fizesse parte das aulas e isso de certa forma
ocorreu (RESENDE, SOARES; MOURA; 2009).

2.2 Abordagens pedagógicas em Educação Física escolar

As questões relacionadas com a atuação dos professores de EF no contex-


to da Educação Física Escolar (EFE), em termos das abordagens pedagógicas do
construtivismo, do desenvolvimentismo, da psicomotricidade e as abordagens
críticas, podem dar uma ideia do universo de discussões que cercam essa temáti-
ca. Essas abordagens, ao longo do tempo, vêm subsidiando o trabalho diário dos
professores. Elas trataram e ainda tratam de eixos centrais da conduta profissional
dos professores. Norteiam seus ideários como educadores e refletem momentos
históricos e políticos da sociedade em que estamos inseridos (DARIDO, 2003).

Soares (1996) em relação às tendências pedagógicas ou dos movimentos do


pensamento na Educação Física, presentes ainda hoje no Brasil, faz uma divisão
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didática que dá uma noção clara da evolução das práticas adotadas ao longo tempo
(Quadro 1).

Quadro 1 - Movimento do Pensamento da Educação Física Escolar – A Educação


Física e seu conteúdo de ensino no tempo.

Movimento do
Conteúdo a ser ensinado na
pensamento da Cronologia
escola
Educação Física
Ginástica que compreendia
Movimento ginástico Século XIX e início exercícios militares; jogos;
europeu do século XX. dança; esgrima; equitação;
canto.
Esporte. Há aqui uma
Afirma-se a partir de
Movimento esportivo homogeneização do esporte no
1940.
conteúdo do ensino.
Afirma-se a partir
Psicomotricidade dos anos 1970 e Condutas motoras.
mantém-se até hoje.
* Cultura corporal
Tem início no
* Cultura física decorrer dos anos Ginástica, esporte, jogo,
1980 e mantém-se danças, lutas, capoeira...
* Cultura de até hoje.
movimento
Fonte: Adaptado de SOARES (1996).

Segundo Darido (2001), essas abordagens evidenciam os aspectos relacio-


nados com o desenvolvimento motor (desenvolvimentista – Go Tani e Gallahue);
com a interação do indivíduo com o mundo que o cerca e a sua reorganização
constante (construtivista, interacionista – Jean Piaget, João Batista Freire); com
as questões sociais, o marxismo e o neomarxismo (crítico-superadora – José Li-
baneo, Demerval Saviani, Medina, Valter Bracht, Lino Castellani Filho, Michele
Ortega Escobar, Carmem Lúcia Soares, Celli Taffarel, Elizabeth Varjal e o Coletivo
de Autores); com a cultura corporal e a compreensão da contextualização do indi-
víduo nas ações desenvolvidas nas aulas de Educação Física (Abordagem sistêmica
– Mauro Betti e Jocimar Daólio); com a parte psicológica, a afetiva e cognitiva dos
alunos (psicomotricida, a educação pelo movimento – Jean Le Bouch); com os
jogos cooperativos valorizando a cooperação e não a competição (jogos coope-
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rativos – Fábio Broto); com o estilo de vida e a saúde do corpo (Saúde Renovada
– Dartagnan Pinto Guedes e Marcus Nahas); com a possibilidade de fazer com os
indivíduos possam ter a capacidade crítica de analisar a sociedade em que vivem a
partir das práticas esportivas, nas aulas de Educação Física (Crítico – emancipató-
ria – Elenor Kunz); e a concepção pedagógica que é tratada nos PCNs de Educação
Física (visão que engloba praticamente todas as outras concepções).

De acordo com Tani et al. (1988), a abordagem pedagógica desenvolvimen-


tista trata a EF com base em elementos do desenvolvimento motor, procurando
discutir as formas como o indivíduo aprende habilidades e tarefas motoras neces-
sárias à sua vida e tem um caráter predominantemente biológico e físico.

A abordagem construtivista interacionista, que tem no Brasil João Batista


Freire como seu maior representante, coloca como princípio o construtivismo, que
é a construção do conhecimento a partir da interação do sujeito com o mundo.
Nesse caso, para cada criança, a construção desse conhecimento exige uma ela-
boração, uma ação sobre o mundo. Essa abordagem também está baseada na con-
cepção de que o conhecimento é um processo construído pelo indivíduo durante
toda a sua vida, não estando pronto ao nascer nem sendo adquirido passivamente
de acordo com as pressões do meio. Conhecer é sempre uma ação que implica em
esquemas de assimilação e acomodação em um processo de constante reorganiza-
ção (FREIRE, 1989).

Para Bracht (1999), a proposta crítico-superadora tem como base funda-


mental a pedagogia histórico-crítica desenvolvida por Dermeval Saviani e colabo-
radores. Essa proposta evidencia que o objeto da EF é a cultura corporal, que os
temas mais característicos são o esporte, a ginástica, o jogo, as lutas, a dança e a
mímica. Evidencia que esses temas sejam tratados de uma maneira dialética com
enfoque nas relações culturais da sociedade. O indivíduo influencia a sociedade e
esta influencia o indivíduo. Além disso, o movimento deve ser trabalhado e apre-
endido em seus aspectos contraditórios.

A proposta de atuação do professor de EF de Elenor Kunz, a crítico emanci-


patória, parte de uma concepção de movimento que ele denomina de dialógico. O
movimento humano é entendido como uma forma de comunicação com o mundo.
Outro princípio importante em sua pedagogia é a noção de sujeito tomado numa
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perspectiva iluminista de sujeito capaz de crítica e de atuação autônomas. A pro-


posta aponta para a tematização dos elementos da cultura do movimento, de forma
a desenvolver nos alunos a capacidade de analisar e agir criticamente nessa esfera
(BRACHT, 1999).

Daólio (1996), o maior representante da proposta pedagógica denominada


cultura corporal ou Educação Física plural, defende que essa deve abarcar todas as
formas da chamada cultura corporal – jogos, esportes, danças, ginásticas e lutas – e
deve abranger todos os alunos. O seu objetivo não será a aptidão física dos alunos,
nem a busca de um melhor rendimento esportivo, mas os elementos da cultura
corporal deverão ser tratados como conhecimentos a serem sistematizados e re-
construídos pelos próprios alunos (DAÓLIO, 1996; CASTELLANI FILHO, 1997).

As aulas devem atingir todos os alunos, sem discriminação dos menos hábeis,
ou das meninas, ou dos gordinhos, dos baixinhos ou dos mais lentos. Essa EF parte
do pressuposto de que os alunos são diferentes, recusando o binômio igualdade/de-
sigualdade para compará-los. O processo de reavaliação das aulas deve ser constante
em função desses aspectos ligados à individualidade e à pluralidade. As aulas mistas
sempre serão bem vindas no dia a dia escolar (DAÓLIO, 1996; FARIA, 2004).

A psicomotricidade é uma tendência metodológica de trabalho na EF, ten-


do a psicologia como sua área de base e tendo como finalidade a educação e ree-
ducação psicomotora. Trabalha basicamente com conteúdos tais como: a consci-
ência corporal, a lateralidade, a coordenação motora, os esquemas corporais e o
equilíbrio. É muito rica quando trata das capacidades psicomotoras, levando os
alunos a um amplo desenvolvimento psicomotor quando se encontram na fase de
desenvolvimento de habilidades fundamentais. Sofre inúmeras críticas em função
da utilização da EF como uma disciplina complementar para o aprendizado das
disciplinas de Matemática e de Português (LAVOURA et al., 2006).

A abordagem que trata a importância da cooperação se contrapondo a


competição, defendida por Fábio Brotto, coloca os jogos cooperativos como base
dessa tendência pedagógica. Tenta mostrar a importância do jogo e a utilização das
suas mais variadas possibilidades. Ganhadores e perdedores dependem uns dos
outros numa dialética direta. Fica clara a procura pelos valores humanitários e de
solidariedade entre as pessoas (DARIDO, 2003).
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Em relação à proposta pedagógica de atuação denominada Saúde Renova-


da, Guedes (1999) defende que a escola e a disciplina de Educação Física em par-
ticular, assumam a incumbência de desenvolver programas que levem os alunos a
perceberem a importância de se adotar um estilo de vida mais saudável, fazendo
com que a atividade física direcionada à promoção da saúde torne-se componen-
te habitual no cotidiano das pessoas. Afirma que a ideia de promoção da saúde
nas aulas de EF não se baseou nas tendências anteriores que tratavam de maneira
equivocada e deturpada de somente evidenciar a prática de exercícios físicos sem a
preocupação com a educação propriamente dita, em um contexto bem mais amplo
(GUEDES, 1999; NAHAS, 2006).

Dentro do que é tratado nos PCNs sobre Educação Física, é possível vislum-
brar uma tentativa de englobar partes de praticamente todas as propostas tratadas
nessa pesquisa. Segundo Rodrigues (2002), essa proposta pedagógica tem sua ori-
gem ligada às orientações dadas por organismos internacionais, principalmente
pelo Banco Mundial e pela UNESCO, sobre o modelo de reforma educacional e
curricular a ser seguido pelos países em desenvolvimento, nos idos dos anos 1990.

Notadamente os princípios neoliberais imperavam nesse período da histó-


ria e, no Brasil, no início do segundo governo do Presidente Fernando Henrique
Cardoso, marcado pela instalação definitiva do modelo neoliberal, no qual a glo-
balização e seus efeitos se mostravam mais evidentes. Dessa forma, os princípios
do neoliberalismo marcaram bastante o eixo principal dos PCNs (RODRIGUES,
2002; BRASIL, 1996; BRASIL, 1998a; 1998b; 1998c; TAFFAREL, 1997).

Os PCNs de EF identificam possibilidades de socialização no convívio so-


cial por meio da EF que atua diretamente na formação dos valores, atitudes, habi-
lidades e competências voltadas para a integração entre pessoas e grupos e para o
reconhecimento da diversidade de padrões de beleza, saúde e desempenho. Além
disso, os conteúdos se dividem em três partes: esportes, jogos, lutas e ginásticas,
a primeira parte; atividades rítmicas e expressivas, a segunda; e os conhecimen-
tos sobre o corpo, a terceira parte (RODRIGUES, 2002; BRASIL, 1996; BRASIL,
1998a; 1998b; 1998c; TAFFAREL, 1997).

Em alguns momentos, encontramos nos PCNs de EF, sugestões relativas


à organização dos conteúdos ao longo dos ciclos do ensino fundamental. Essas
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estão quase sempre vinculadas a uma gama de conceitos, vivências, aquisição e


aperfeiçoamento de habilidades específicas de esportes, além dos jogos, das lutas,
da ginástica e das danças. Da mesma forma, são sugeridas a compreensão e a re-
flexão dos aspectos histórico-sociais, técnicos e táticos desses mesmos conteúdos.
O que não fica claro é o sentido dado ao termo reflexão e no caso dessa tendência
pedagógica, notadamente neoliberal, repensar e reavaliar ideias e atitudes diante
de algum fato social vivenciado pelo aluno, não era o objetivo principal (RODRI-
GUES, 2002).

A Tabela 1, na página seguinte sintetiza, praticamente todas as abordagens


aqui tratadas, suas principais características e defensores (DARIDO, 2003).

2.3 Formas de atuação pedagógica em Educação Física

Em estudo feito por Costa e Nascimento (2006), fica evidente que as prá-
ticas pedagógicas são utilizadas de forma bastante variada nas escolas de hoje,
século XXI. No estudo dos autores supracitados, foram avaliadas as práticas dos
professores em escolas públicas (31 estaduais) e particulares (10). Participaram ao
todo 63 professores, dos quais, 46 eram das escolas estaduais e 17 das privadas, no
Município de Maringá, no Estado do Paraná, no ano de 2006. Foram aplicados
questionários que objetivavam saber, além de outros assuntos, qual era a “doutrina”
pedagógica assumida pelo professor em aulas diárias. A pesquisa mostrou como
um dos resultados, e é o que nos interessa nesse caso, que poucos conseguiram se
definir como seguidores de uma ou outra abordagem. Os que se definiram foram:
tradicional (01), tecnicista (01) e abordagens críticas (03). Nas escolas particulares,
os professores apontaram: o construtivismo (05), o sócio-construtivismo (01) e
abordagens críticas (01). 5 (cinco) professores das escolas estaduais e particulares
não responderam à questão.

De acordo com Resende; Soares e Moura (2009), os professores de EF


atuantes nas escolas do município do Rio de Janeiro, a partir das concepções
pedagógicas estudadas, elaboram ou estruturam suas aulas, na maioria dos ca-
sos, tendo como parâmetros as concepções ligadas ao desenvolvimento motor
e à saúde renovada; poucos utilizam intervenções que contemplam a proposta
crítico-superadora.
Tabela 1 – Principais características das abordagens pedagógicas na Educação Física.
Construti- Sistema Críticoe-
Aborda- Desenvolvi- Críticosu- Psicomotrí- Jogos Coo- Saúde
vista Intera- Cultura mancipa- PCN
gens mentista peradora cidade perativos Renovada
cionista Corporal tória
Bracht, V.,
Tani, G.
Castellani, Guedes, D. Marcelo
Manoel, E. J. Betti, M.; Jean Le
Autores Freire, J. B. L., Taffarel, Fábio Brotto P.; Nahas, Elenor Kunz Jadu Caio
Gallahue, Daólio, J. Bouch
C., Soares, M. V. Costa
D. L.
C. L.
Sociologia Fisiologia, Psicologia
Area de Filosofia
Psicologia Psicologia Antropo- Psicologia Psicologia Fisiologia Sociologia e e
Base Politíca
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logia Politíca Sociologia


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Introduzir
Transforma- Reflexão
o aluno
Construção ção social Indivíduos crítica
Transforma- Reeducação Melhorar a na esfera
Finalidade Adaptação do conheci- Reconhecer cooperati- emancipa-
ção Social psicomotora Saúde da cultura
mento o papel da vos tória dos
corporal de
cultura alunos
movimento
Cultura
Habilidade, Conhe-
corporal, Incorpo-
aprendiza- Cultura po- Cultura cor- Transcen- cimentos
Temática motivos Consciência ração de Estilo de
gem, desen- pular, jogo, poral, visão dência de sobre corpo,
principal Atitudes, corporal novos va- vida
volvimento lúdico. histórica limites esportes,
comporta- lores
motor lutas, jogos
mento
Habilidades Conhe- Vivência do
Brincadeiras
básicas, cimento jogo, espor- Conhe-
populares, Conheci-
habilidades sobre o jogo, te, dança, Jogos coo- cimento,
Conteúdos jogos sim- Exercícios mentos em
especificas, esporte, ginástica perativos exercícios
bólicos, jogo esportes
jogo, espor- dança, Técnicas físicos
de regras
te, dança ginástica corporais
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Fonte: Adaptado de DARIDO (2003)
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A proposta desenvolvida nos PCNs de EF engloba partes de algumas


das tendências pedagógicas aqui descritas. Essa característica quase aglutina-
dora demonstra que esse documento, por mais que tenha sido ideologicamente
construído dentro de um modelo neoliberal, pode ser utilizado como ponto
inicial para a reflexão sobre as práticas pedagógicas da EF. Dessa forma, talvez
esta fosse uma das possibilidades de diálogo crítico entre os PCNs, o conheci-
mento produzido historicamente como cultural, a prática pedagógica da EF e
as contradições da realidade social do Brasil (RODRIGUES, 2002).

Darido (2003) evidencia de maneira didática as diferenças presentes nas


abordagens pedagógicas na EF e esclarece ainda que as abordagens coexistem
e, dependendo do período histórico em que estão inseridas, tentam suplantar
a anterior. Mesmo assim, é possível identificar na atuação dos professores mar-
cas de uma ou mais de uma dessas abordagens pedagógicas.

3 Considerações finais
Vislumbra-se ao logo desta pesquisa praticamente todas as propostas
pedagógicas que passaram ou ainda passam pelas práticas cotidianas das aulas
de EF. Algumas marcadas por posições políticas e ideológicas bem incisivas,
outras por um cientificismo tecnicista evidente que, por meio do contexto edu-
cacional por excelência, sempre foi muito complexo. Ensinar não é uma tarefa
fácil. Utilizar modelos de práticas de ensino e atuação em aulas de EF, levando
em consideração aspectos culturais, técnico-científicos, psicológicos, emocio-
nais, políticos, médicos, biológicos, ideológicos e outros mais, nos faz pensar
que o trabalho com seres humanos, na sua maioria em formação, torna-se pra-
ticamente inviável enquanto tarefa. O que motiva então a tentativa de conti-
nuar a desvendar esse enigma metodológico? É possível afirmar que jamais
se chegará a um modelo de conduta pedagógica padrão para a EF (FREIRE,
1996).

O professor tem a obrigação de continuar aprendendo, aprimorando-se


e tentando ser o melhor ser humano possível, de modo a fazer com que suas
aulas sejam importantes e marcantes para seus alunos, não somente hoje, mas
para o resto de suas vidas (FREIRE, 1996).
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Segundo Freire (1996), o ato de ensinar exige segurança, competência pro-


fissional, generosidade, comprometimento, compreensão de que a educação é uma
forma de intervenção no mundo, liberdade, autoridade, disponibilidade para o di-
álogo, além de saber escutar, saber que a educação também é ideológica e querer
bem aos educandos, em suma, que sejamos coerentes, democráticos e humanos.
Como o profissional de EF também é professor, há que se prestar atenção em tudo
isso.

Esta pesquisa mostrou que, nos dias atuais, a maioria dos professores de EF
se utiliza de conceitos, métodos, práticas e pedagogias que retrataram preceitos
doutrinários de períodos históricos e que, em alguns casos, não se justificam na
atualidade.

As tendências mais modernas começam a ter uma melhor aceitação em


função de se encaixarem na sociedade atual, na qual, cuidar das vivências motoras
das crianças, da saúde, trabalhar a socialização, a cidadania, a cultura popular, o
lazer, de forma multidisciplinar, mediante a interação com outras áreas (Pedagogia,
Psicologia, Fisioterapia, Medicina etc.), são considerados temas muito importantes
a serem trabalhados pelos professores de EF no ambiente escolar.

Os conteúdos das aulas de Educação Física escolar refletem exatamente a


concepção metodológica seguida pelo professor. O esporte continua predominan-
te, embora existam exceções.

Pedagogical trends in the teaching of Physical Education

Abstract
Issues related to the performance of physical education teachers in the
school context in terms of pedagogical approaches typically require from the pro-
fessionals a clear position on the use of one or another trend. Each of the proposals
or pedagogical theories that have been used in physical education depicts historical
periods and political and ideological views on the theme. The main objective of
this paper is to discuss the pedagogical assumptions present in the work of physi-
cal education teacher. We analyzed several articles and books on these approaches
and their application in physical education classes. Generally the teachers follow
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those methodological principles which have a stronger ideological and pedagogic


connection. The contents approached/studied in physical education classes accura-
tely portray these ideological precepts. With some exceptions, sports are the main
subject in physical education classes.

Keywords: Education. Physical Education.

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